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Actividade catalítica das enzimas Breves noções sobre cinética das reacções químicas Nas células realizam-se inúmeras reacções químicas acompanhadas de transferência de energia. O conjunto de todas as reacções celulares tem o nome de metabolismo. Nas reacções de metabolismo podem considerar-se dois processos: o anabolismo e o catabolismo. O anabolismo diz respeito ao conjunto de reacções químicas que conduzem à biossíntese de moléculas complexas a partir de moléculas mais simples, enquanto que o catabolismo corresponde ao conjunto de reacções químicas de degradação de moléculas complexas em moléculas mais simples. Em qualquer reacção química rompem-se ligações existentes nas moléculas que reagem e estabelecem-se novas ligações. Durante a ruptura e a formação de ligações químicas ocorrem transferências de energia. Se as moléculas formadas numa reacção possuírem menor quantidade de energia que os reagentes, a reacção é exoenergética. A energia utilizada na ruptura das ligações das moléculas que reagem é menor que a energia transferida aquando da formação de novas ligações. É o caso da generalidade das reacções catabólicas. Quando as moléculas formadas numa reacção possuem maior quantidade de energia que a contida nas moléculas reagentes, a reacção é endoenergética. É utilizada mais energia na ruptura das ligações das moléculas que reagem do que a energia transferida ao estabelecerem-se novas ligações. É o caso das reacções de anabolismo. Para que uma reacção química se inicie têm de ocorrer colisões entre os átomos das moléculas envolvidas. Quanto maior for o número de colisões mais facilitada será a reacção química entre os reagentes. Esse número de colisões depende da energia cinética das moléculas, isto é, da sua agitação. Muitas vezes é necessário fornecer certa quantidade ao sistema, aquecendo-o, por exemplo, de modo a aumentar as colisões entre as moléculas. A energia que é necessário fornecer ao sistema para iniciar uma reacção química é designada por energia de activação. 1

Resumo - enzimas

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Actividade catalítica das enzimas

Breves noções sobre cinética das reacções químicas

Nas células realizam-se inúmeras reacções químicas acompanhadas de transferência de energia. O conjunto de todas as reacções celulares tem o nome de metabolismo. Nas reacções de metabolismo podem considerar-se dois processos: o anabolismo e o catabolismo. O anabolismo diz respeito ao conjunto de reacções químicas que conduzem à biossíntese de moléculas complexas a partir de moléculas mais simples, enquanto que o catabolismo corresponde ao conjunto de reacções químicas de degradação de moléculas complexas em moléculas mais simples.

Em qualquer reacção química rompem-se ligações existentes nas moléculas que reagem e estabelecem-se novas ligações. Durante a ruptura e a formação de ligações químicas ocorrem transferências de energia.

Se as moléculas formadas numa reacção possuírem menor quantidade de energia que os reagentes, a reacção é exoenergética. A energia utilizada na ruptura das ligações das moléculas que reagem é menor que a energia transferida aquando da formação de novas ligações. É o caso da generalidade das reacções catabólicas.

Quando as moléculas formadas numa reacção possuem maior quantidade de energia que a contida nas moléculas reagentes, a reacção é endoenergética. É utilizada mais energia na ruptura das ligações das moléculas que reagem do que a energia transferida ao estabelecerem-se novas ligações. É o caso das reacções de anabolismo.

Para que uma reacção química se inicie têm de ocorrer colisões entre os átomos das moléculas envolvidas. Quanto maior for o número de colisões mais facilitada será a reacção química entre os reagentes. Esse número de colisões depende da energia cinética das moléculas, isto é, da sua agitação. Muitas vezes é necessário fornecer certa quantidade ao sistema, aquecendo-o, por exemplo, de modo a aumentar as colisões entre as moléculas. A energia que é necessário fornecer ao sistema para iniciar uma reacção química é designada por energia de activação.

A ocorrência de qualquer reacção química é acompanhada de uma variação energética contínua cuja representação gráfica toma o nome de perfil energético da reacção. De início – estado inicial – a energia associada ao sistema é menor. Depois, à medida que a reacção começa a ocorrer, a quantidade de energia aumenta até atingir um máximo que caracteriza o chamado estado de transição. Este aumento de energia do sistema corresponde à energia de activação, a quantidade de energia necessária ao desencadear

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uma reacção química. A partir daí a energia associada ao sistema volta a baixar até atingir o estado de equilíbrio – estado final – que pode ir desde a total transformação do(s) reagente(s) em produto(s) – reacções irreversíveis – até qualquer proporção relativa entre reagente(s) e produto(s) – reacções reversíveis. A diferença de energia entre o(s) reagente(s) e o(s) produto(s) dá-nos ideia se estamos em presença de uma reacção endoenergética ou exoenergética.

Actuação enzimática – significado biológico

Uma das formas de acelerar a velocidade das reacções é, como já foi referido, promover o aumento de temperatura provocando assim, um aumento da velocidade das partículas e, como tal, o número de partículas em estado de transição. Outras das formas de acelerar a velocidade deu uma reacção é adicionar-lhe um catalisador. O efeito dos catalisadores, em geral, é diminuir a energia de activação de uma determinada reacção química. Ao fazê-lo tornam possível que maior quantidade de moléculas atinja o estado reactivo de transição. Um grupo especial de biocatalisadores diz respeito às enzimas. Para além dos catalisadores orgânicos, como as enzimas, existem também os catalisadores inorgânicos.

O amido por exemplo é um polissacarídeo cujas moléculas são muitos estáveis nas condições normais de temperatura e pressão. No laboratório a sua decomposição por hidrólise em maltose (açúcar redutor) é muito lenta. No entanto, torna-se mais fácil a uma temperatura elevada e adicionando um catalisador inorgânico, neste caso, o ácido clorídrico. A velocidade da reacção aumenta ainda consideravelmente, em presença da saliva. Na saliva existe uma enzima, a amílase, que catalisa a hidrólise do amido, permitindo que ela ocorra a uma temperatura de 37ºC, a temperatura do corpo humano.

Pode então dizer-se que as enzimas possibilitam a reacção necessária à realização das reacções químicas metabólicas nas condições de temperatura intracelulares.

Constituição das enzimas

As enzimas têm uma composição proteica, sendo formadas por uma ou mais cadeias polipeptídicas. Porém certas enzimas apresentam na sua constituição dois componentes: uma proteína designada por apoenzima e uma substância não proteica designada de cofactor. O complexo apoenzima-cofactor é chamado holoenzima. A holoenzima só é funcional quando a apoenzima está ligada ao cofactor. Este último ajuda a ligação do substrato à enzima. Há três tipos de cofactores: os grupos prostéticos (moléculas orgânicas ligadas permanentemente à apoenzima; coenzimas (compostos orgânicos temporariamente ligados à apoenzima – apenas durante a catálise é que o cofactor se liga à enzima); iões metálicos (Cu 2+, Mn2+, Ca2+ - actuam ao nível do centro activo e permitem um melhor ajustamento do substrato à enzima).

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Ligação enzima-substrato

As enzimas são moléculas proteicas globulares de grandes dimensões comparadas com as dimensões da maioria dos substratos.

A configuração espacial de uma enzima determina a existência de uma região, o centro activo, complementar da configuração espacial de todo ou parte do substrato. A nível do centro activo da enzima estabelecem-se ligações intermoleculares com a molécula de substrato, formando-se o complexo enzima-substrato – há ligação entre grupo químicos de uma pequena parte da superfície das moléculas da enzima e grupos químicos da superfície das moléculas de substrato. Assim a molécula é activada, verificando-se rapidamente mudanças químicas. O estabelecimento de ligações entre a enzima e o substrato é transitório. Ao terminar a reacção libertam-se os produtos formados, ficando a enzima intacta. Essa molécula enzimática pode então actuar sobre outra molécula de substrato, repetindo-se o ciclo até que todo o substrato esteja transformado.

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Especificidade da acção das enzimas e manutenção da sua integridade

Uma das características mais importantes das enzimas é a sua especificidade de acção, ou seja, cada enzima só actua sobre um determinado substrato ou uma determinada classe de substratos. No primeiro caso tem-se um caso de especificidade de acção absoluta e no segundo de especificidade de acção relativa. A amílase apresenta especificidade absoluta pois só actua sobre o amido, mas certas lipases e proteases apresentam especificidade relativa pois actuam, respectivamente, sobre diferentes lípidos e diferentes prótidos.

Uma outra característica das enzimas é que, tal como todos os catalisadores não inorgânicos, não se gastam durante as reacções que catalisam. A sua concentração mantém-se, pois, sempre constante durante o decorrer da reacção

Modelos de ligação enzima-substrato

Modelo chave-fechadura ou de Fisher: modelo teórico explicativo da actividade enzimática proposto por Emil Fisher nos finais do século passado (1884). Segundo Fisher, o centro activo de uma enzima tem uma estrutura química tal, que nele só podem ligar-se moléculas de um substrato que tenham uma estrutura química complementar desse centro activo.

No que se refere ao conjunto enzima-substrato, a especificidade da enzima é devida á

complementaridade entre os grupos químicos do centro activo enzimático e os grupos químicos da superfície da molécula de substrato. Modelo do encaixe induzido ou de Koshland: modelo mais dinâmico proposto por Koshland em

1959. Neste caso é o substrato, que ao combinar-se com a enzima, induz nesta modificações, a nível molecular, levando as moléculas do centro activo a tornarem-se complementares de grupos químicos da molécula do substrato, tal como uma luva provoca uma alteração da sua forma.

Factores que influenciam a actividade enzimática

As enzimas regulam as reacções metabólicas, mas existem condições que afectam a sua acção. A actividade enzimática é influenciada por vários factores entre os quais se destacam: a temperatura, o pH (acidez/alcalinidade do meio), a concentração de substrato e a concentração de enzima.

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Em geral, a actividade enzimática anula-se para valores muito baixos de temperatura, as baixas temperaturas tornam as enzimas praticamente inactivas. A partir de certos valores, a actividade enzimática aumenta com o aumento de temperatura, até atingia um máximo – temperatura óptima. A partir desse máximo, a variação passa a ser inversa, ou seja, aumentando a temperatura baixa a actividade enzimática, até um valor a partir do qual a enzima já não actua (devido à desnaturação da proteína que a constitui). O comportamento das enzimas em função da temperatura pode ser explicado com base em duas ideias principais: dentro de certos limites, quanto maior for a temperatura maior é a agitação das partículas e, consequentemente, os choques entre elas, o que faz com que mais moléculas de substrato choquem com moléculas de enzima e, particularmente, com os seus centros activos; a partir de certos valores de temperatura dá-se a desnaturação da parte proteica da molécula de enzima, altera-se a conformação molecular e desorganiza-se o centro activo.

O pH é outro factor que condiciona a actividade enzimática. Normalmente, para valores de pH muito baixos (meios ácidos) ocorre a desnaturação da maioria das enzimas, o mesmo acontecendo para valores de pH muito altos (meios alcalinos). A generalidade das enzimas tem, pois um pH óptimo de actuação que ronda os 6-8. Há, contudo, enzimas que resistem a valores extremos de pH, como por exemplo a pepsina (que actua no estômago) cujo pH é claramente ácido. Outras existem, cuja actividade se mantém constante para qualquer valor de pH.

Se a temperatura e o pH se mantiverem em valores constantes, a velocidade de uma reacção enzimática pode ainda variar em função da concentração de substrato e da concentração de enzima.

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A velocidade da reacção é proporcional à concentração de substrato até um certo valor máximo, a partir do qual se mantém estacionária. Essa velocidade máxima é atingida quando todas as moléculas da enzima presentes estiverem ocupadas na catálise. Desse modo os centros activos das enzimas atingem a saturação, o que explica a velocidade estacionária. Na fase inicial de uma reacção química em que a concentração de substrato é ainda baixa, a velocidade da reacção vai aumentando progressivamente, uma vez que um maior número de enzimas está a entrar em acção. Ao fim de algum tempo, deixam de existir enzimas disponíveis para a quantidade de substrato, que continua a aumentar. A partir desse momento, atingiu-se a fase de saturação e a velocidade das reacções é máxima e permanece sensivelmente constante, mesmo que se continue a adicionar mais substrato ao meio, pois não existem enzimas livres.

Havendo muito substrato presente a velocidade de reacção é directamente proporcional à concentração da enzima. Quanto maior for a concentração de enzimas maior será a velocidade de reacção.

Propriedades das enzimas

Especificidade. A especificidade enzimática está intimamente relacionada com a configuração induzida pelo substrato no centro activo. A especificidade, como já foi referido, pode ser absoluta ou relativa.

Reversibilidade. Com o auxílio de enzimas, duas moléculas reagentes podem originar uma única molécula; por sua vez, esta molécula pode voltar a dar as duas que a formaram. Por outras palavras, quando uma enzima pode catalisar nos dois sentidos uma reacção, diz-se reversível. Será irreversível, se só o puder fazer num sentido.

Actividade. As enzimas podem manter-se activas fora das células que as produzem, desde que mantidas em condições ambientais semelhantes. É esta propriedade que permite, laboratorialmente, o estudo de reacções químicas.

Concentração enzimática. Pode-se verificar que as enzimas actuam em concentrações diminutas. Assim, para catalisar grandes quantidades de substrato apenas é necessária uma pequena quantidade de enzimas.

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