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Resumão fevereiro

Resumão · Há no espírito o luto profundo daquele céu de bruma dos lugares onde a natureza dorme por meses, à espera do sol avaro que não vem. POMPEIA, R. Canções sem metro

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Resumãofevereiro

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Literatura

Textos auxiliares

Texto 1

Poética

Que é a poesia?

uma ilha

cercada

de palavras

por todos os lados

Que é o poeta?

um homem

que trabalha o poema

com o suor dos eu rosto

um homem

que tem fome

como qualquer outro

homem

(Cassiano Ricardo)

Texto 2

Melhor um mágico na mão do que dois voando

Discretamente maquilado, sorri o pálido rosto do mágico debaixo dos refletores, enquanto no alto a

mão volteia, se espalma e, em gesto de quase dança, mergulha seca na cartola.

Mas algo parece retê-la lá dentro. Esforça-se o mágico, puxa, joga para trás o peso do corpo. Tenta

sorrir para o público. E já o antebraço afunda na cartola, some o cotovelo. Ainda luta cravando a outra mão

no tampo da mesinha. Depois os pés. Inútil. O ombro é tragado no vórtice das abas, nem se salvam o pescoço

esticado, a cabeça. Diante da plateia expectante que acredita tratar-se de um novo truque, todo o corpo

desaparece pouco a pouco, num último adejar das caudas do fraque.

No fundo de cetim preto, triunfa o coelho. Pela primeira vez, conseguiu botar um mágico na cartola.

(Marina Colasanti)

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Literatura

Arte e Literatura: conceitos iniciais Resumo

A arte

A palavra arte é derivada do termo latino “ars”, que significa arranjo ou habilidade. Neste sentido, podemos

entender a noção de arte como um meio de criação, produção de novas técnicas e perspectivas. Há

diferentes visões artísticas, mas todas possuem em comum a intenção de representar simbolicamente a

realidade, sendo assim, resultado de valores, experiências e culturas de um povo em um determinado

momento ou contexto histórico.

Quadro “Antropofagia”, de Tarsila do Amaral

A arte pode ser composta pela linguagem não verbal (por meio de imagens, sons, gestos, etc.) ou, ainda, pela

linguagem verbal, formada por palavras. Quando ocorre a fusão entre os dois tipos de linguagem, chamamos

de linguagem mista ou híbrida. É importante dizer, ainda, que ainda que a arte faça referência a algum período

histórico ou político, essa não possui compromisso de retratar fidedignamente a realidade e possui o intuito

de instigar, despertar o incômodo, romper com os padrões.

A literatura

Além disso, a literatura também é um tipo de manifestação artística e sua “matéria prima” são as palavras,

que podem compor prosas ou versos literários. A linguagem, em geral, explora bastante o sentido conotativo

e o uso das figuras de linguagem contribuem para a construção estética do texto. Os movimentos literários,

que estudaremos em breve, estão vinculados a um contexto histórico e possuem características que

representam os anseios e costumes de um determinado tempo.

Os textos literários têm maior expressividade, há uma seleção vocabular que visa transmitir subjetividade,

uma preocupação com a função estética, a fim de provocar e desestabilizar o leitor, as palavras possuem

uma extensão de significados e faz-se preciso um olhar mais atento à leitura, que não prioriza a informação,

mas sim, o caráter poético.

Veja, abaixo, exemplos de textos literários:

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Literatura

Anúncios classificados

Vendedoras. Ótima aparência, excelente salário. Rua tal, no tal. Recusada.

Boutique cidade precisa moça boa aparência entre 25 e 30 anos. Marcar entrevista tel. no tal. Recusada.

Moças bonitas e educadas para trabalhar como recepcionistas. Garantimos ganhos acima de um milhão.

Procurar D. Fulana das 12,00 às 20,00 horas, na rua tal, no tal. Recusada.

Senhor solitário com pequeno defeito físico procura moça de 30 anos para lhe fazer companhia. Não precisa

ser bonita. Endereço tal.

Desta vez ela não disfarçou a corcunda nem pôs óculos escuros para esconder o estrabismo. Contratada. (CUNHA, Helena Parente. Cem mentiras de verdade, 1985)

Morte do Leiteiro

Há pouco leite no país,

é preciso entregá-lo cedo.

Há muita sede no país,

é preciso entregá-lo cedo.

Há no país uma legenda,

que ladrão se mata com tiro.

Então o moço que é leiteiro

de madrugada com sua lata

sai correndo e distribuindo

leite bom para gente ruim.

Sua lata, suas garrafas

e seus sapatos de borracha

vão dizendo aos homens no sono

que alguém acordou cedinho

e veio do último subúrbio

trazer o leite mais frio

e mais alvo da melhor vaca

para todos criarem força

na luta brava da cidade.

Na mão a garrafa branca

não tem tempo de dizer

as coisas que lhe atribuo

nem o moço leiteiro ignaro,

morador na Rua Namur,

empregado no entreposto,

com 21 anos de idade,

sabe lá o que seja impulso

de humana compreensão.

E já que tem pressa, o corpo

vai deixando à beira das casas

uma apenas mercadoria.

E como a porta dos fundos

também escondesse gente

que aspira ao pouco de leite

disponível em nosso tempo,

avancemos por esse beco,

peguemos o corredor,

depositemos o litro…

Sem fazer barulho, é claro,

que barulho nada resolve.

Meu leiteiro tão sutil

de passo maneiro e leve,

antes desliza que marcha.

É certo que algum rumor

sempre se faz: passo errado,

vaso de flor no caminho,

cão latindo por princípio,

ou um gato quizilento.

E há sempre um senhor que acorda,

resmunga e torna a dormir.

Mas este acordou em pânico

(ladrões infestam o bairro),

não quis saber de mais nada.

O revólver da gaveta

saltou para sua mão.

Ladrão? se pega com tiro.

Os tiros na madrugada

liquidaram meu leiteiro.

Se era noivo, se era virgem,

se era alegre, se era bom,

não sei,

é tarde para saber.

Mas o homem perdeu o sono

de todo, e foge pra rua.

Meu Deus, matei um inocente.

Bala que mata gatuno

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Literatura

também serve pra furtar

a vida de nosso irmão.

Quem quiser que chame médico,

polícia não bota a mão

neste filho de meu pai.

Está salva a propriedade.

A noite geral prossegue, a manhã custa a chegar,

mas o leiteiro

estatelado, ao relento,

perdeu a pressa que tinha.

Da garrafa estilhaçada,

no ladrilho já sereno

escorre uma coisa espessa

que é leite, sangue… não sei.

Por entre objetos confusos,

mal redimidos da noite,

duas cores se procuram,

suavemente se tocam,

amorosamente se enlaçam,

formando um terceiro tom

a que chamamos aurora. Carlos Drummond de Andrade

Poema Brasileiro

No Piauí de cada 100 crianças que nascem

78 morrem antes de completar 8 anos de idade

No Piauí

de cada 100 crianças que nascem

78 morrem antes de completar 8 anos de idade

No Piauí

de cada 100 crianças

que nascem

78 morrem

antes

de completar

8 anos de idade

Antes de completar 8 anos de idade

antes de completar 8 anos de idade

antes de completar 8 anos de idade

antes de completar 8 anos de idade

Ferreira Gullar, 1962.

Diferenças entre o texto literário e o não-literário

Diferente do poema da autora Cecília Meireles, em que há uma transmissão de sensibilidade nos versos, os

textos não literários são aqueles que possuem o caráter informativo, que visam notificar, esclarecer e

utilizam uma linguagem mais clara e objetiva. Jornais, artigos, propagandas publicitárias e receitas

culinárias são ótimos exemplos de textos não literários, pois esses têm o foco em comunicar, informar,

instruir, etc.

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Literatura

Exercícios

1.

PICASSO, P. Cabeça de touro. Bronze, 33,5 cm x 43,5 cm x 19 cm. Musée Picasso, Paris. França, 1945. JANSON, H. W.

Iniciação à história da arte. São Paulo: Martins Fontes, 1988.

Na obra Cabeça de touro, o material descartado torna-se objeto de arte por meio da

a) reciclagem da matéria-prima original.

b) complexidade da combinação de formas abstratas.

c) perenidade dos elementos que constituem a escultura.

d) mudança da funcionalidade pela integração dos objetos.

e) fragmentação da imagem no uso de elementos diversificados.

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Literatura

2. Inverno! inverno! inverno!

Tristes nevoeiros, frios negrumes da longa treva boreal, descampados de gelo cujo limite escapa-nos

sempre, desesperadamente, para lá do horizonte, perpétua solidão inóspita, onde apenas se ouve a

voz do vento que passa uivando como uma legião de lobos, através da cidade de catedrais e túmulos

de cristal na planície, fantasmas que a miragem povoam e animam, tudo isto: decepções, obscuridade,

solidão, desespero e a hora invisível que passa como o vento, tudo isto é o frio inverno da vida.

Há no espírito o luto profundo daquele céu de bruma dos lugares onde a natureza dorme por meses, à

espera do sol avaro que não vem. POMPEIA, R. Canções sem metro. Campinas: Unicamp, 2013.

Reconhecido pela linguagem impressionista, Raul Pompeia desenvolveu-a na prosa poética, em que

se observa a

a) imprecisão no sentido dos vocábulos.

b) dramaticidade como elemento expressivo.

c) subjetividade em oposição à verossimilhança.

d) valorização da imagem com efeito persuasivo.

e) plasticidade verbal vinculada à cadência melódica.

3. Essa lua enlutada, esse desassossego

A convulsão de dentro, ilharga

Dentro da solidão, corpo morrendo

Tudo isso te devo.

E eram tão vastas

As coisas planejadas, navios,

Muralhas de marfim, palavras largas

Consentimento sempre. E seria dezembro.

Um cavalo de jade sob as águas

Dupla transparência, fio suspenso

Todas essas coisas na ponta dos teus dedos

E tudo se desfez no pórtico do tempo

Em lívido silêncio. Umas manhãs de vidro

Vento, a alma esvaziada, um sol que não vejo

Também isso te devo. HILST, H. Júbilo, memória, noviciado da paixão. São Paulo: Cia. das Letras, 2018.

No poema, o eu lírico faz um inventário de estados passados espelhados no presente. Nesse processo,

aflora o

a) cuidado em apagar da memória os restos do amor.

b) amadurecimento revestido de ironia e desapego.

c) mosaico de alegrias formado seletivamente.

d) desejo reprimido convertido em delírio.

e) arrependimento dos erros cometidos.

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Literatura

4. Eu sobrevivi do nada, do nada

Eu não existia

Não tinha uma existência

Não tinha uma matéria

Comecei existir com quinhentos milhões

e quinhentos mil anos

Logo de uma vez, já velha

Eu não nasci criança, nasci já velha

Depois é que eu virei criança

E agora continuei velha

Me transformei novamente numa velha

Voltei ao que eu era, uma velha PATROCÍNIO, S. In: MOSÉ, V. (Org ). Reino dos bichos e dos animais é meu nome. Rio de Janeiro: Azougue, 2009

Nesse poema de Stela do Patrocínio, a singularidade da expressão lírica manifesta-se na

a) representação da infância, redimensionada no resgate da memória.

b) associação de imagens desconexas, articuladas por uma fala delirante.

c) expressão autobiográfica, fundada no relato de experiências de alteridade.

d) incorporação de elementos fantásticos, explicitada por versos incoerentes

e) transgressão à razão, ecoada na desconstrução de referências temporais.

5. amora

a palavra amora

seria talvez menos doce

e um pouco menos vermelha

se não trouxesse em seu corpo

(como um velado esplendor)

a memória da palavra amor

a palavra amargo

seria talvez mais doce

e um pouco menos acerba

se não trouxesse em seu corpo

(como uma sombra a espreitar)

a memória da palavra amar Marco Catalão, Sob a face neutra

É correto afirmar que o poema

a) aborda o tema da memória, considerada uma faculdade que torna o ser humano menos amargo e sombrio.

b) enfoca a hesitação do eu lírico diante das palavras, o que vem expresso pela repetição da palavra “talvez”.

c) apresenta natureza romântica, sendo as palavras “amora” e “amargo” metáforas do sentimento amoroso.

d) possui reiterações sonoras que resultam em uma tensão inusitada entre os termos “amor” e “amar”.

e) ressalta os significados das palavras tal como se verificam no seu uso mais corrente.

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Literatura

6. O rio que fazia uma volta atrás de nossa casa era a imagem de um vidro mole que fazia uma volta

atrás de casa.

Passou um homem e disse: Essa volta que o rio faz por trás de sua casa se chama enseada. Não era

mais a imagem de uma cobra de vidro que fazia uma volta atrás de casa.

Era uma enseada.

Acho que o nome empobreceu a imagem. BARROS, M. O livro das ignorãças. Rio de Janeiro: Best Seller, 2008.

O sujeito poético questiona o uso do vocábulo “enseada” porque a

a) terminologia mencionada é incorreta.

b) nomeação minimiza a percepção subjetiva.

c) palavra é aplicada a outro espaço geográfico.

d) designação atribuída ao termo é desconhecida.

e) definição modifica o significado do termo no dicionário.

7. Uma planta é perturbada na sua sesta* pelo exército que a pisa.

Mas mais frágil fica a bota.

Gonçalo M. Tavares, 1: poemas.

*sesta: repouso após o almoço.

Considerando que se trata de um texto literário, uma interpretação que seja capaz de captar a sua

complexidade abordará o poema como

a) uma defesa da natureza.

b) um ataque às forças armadas.

c) uma defesa dos direitos humanos.

d) uma defesa da resistência civil.

e) um ataque à passividade.

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Literatura

8.

TEXTO I TEXTO II

Fotografia de Jackson Pollock pintando em seu

ateliê, realizada por Hans Namuth em 1951. CHIPP,

H. Teorias da arte moderna. São Paulo: Martins

Fontes, 1988

MUNIZ, V. Action Photo (segundo Hans Namuth em

Pictures in Chocolate). Impressão fotográfica, 152,4 cm x

121,92 cm, The Museum of Modern Art, Nova Iorque,

1977. NEVES, A. História da arte 4. Vitória: Ufes – Nead,

2011.

Utilizando chocolate derretido como matéria-prima, essa obra de Vick Muniz reproduz a célebre

fotografia do processo de criação de Jackson Pollock. A originalidade dessa releitura reside na

a) apropriação parodística das técnicas e materiais utilizados.

b) reflexão acerca dos sistemas de circulação da arte.

c) simplificação dos traços da composição pictórica.

d) contraposição de linguagens artísticas distintas.

e) crítica ao advento do abstracionismo.

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Literatura

9. TEXTO I

ALMEIDA, H. Dentro de mim, 2000. Fotografia p/b. 132 cm x 88 cm. Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa.

TEXTO II

A body art põe o corpo tão em evidência e o submete a experimentações tão variadas, que sua

influência estende-se aos dias de hoje. Se na arte atual as possibilidades de investigação do corpo

parecem ilimitadas – pode-se escolher entre representar, apresentar, ou ainda apenas evocar o corpo

– isso ocorre graças ao legado dos artistas pioneiros. SILVA, P R. Corpo na arte, body art, body modification: fronteiras. II Encontro de História da Arte: IFCH-Unicamp, 2006

(adaptado).

Nos textos, a concepção de body art está relacionada à intenção de

a) estabelecer limites entre o corpo e a composição.

b) fazer do corpo um suporte privilegiado de expressão.

c) discutir políticas e ideologias sobre o corpo como arte.

d) compreender a autonomia do corpo no contexto da obra.

e) destacar o corpo do artista em contato com o expectador.

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Literatura

10. Somente uns tufos secos de capim empedrados crescem na silenciosa baixada que se perde de vista.

Somente uma árvore, grande e esgalhada mas com pouquíssimas folhas, abre-se em farrapos de

sombra. Único ser nas cercanias, a mulher é magra, ossuda, seu rosto está lanhado de vento. Não se

vê o cabelo, coberto por um pano desidratado. Mas seus olhos, a boca, a pele – tudo é de uma aridez

sufocante. Ela está de pé. A seu lado está uma pedra. O sol explode.

Ela estava de pé no fim do mundo. Como se andasse para aquela baixada largando para trás suas

noções de si mesma. Não tem retratos na memória. Desapossada e despojada, não se abate em

autoacusações e remorsos. Vive. Sua sombra somente é que lhe faz companhia. Sua sombra, que se

derrama em traços grossos na areia, é que adoça como um gesto a claridade esquelética. A mulher

esvaziada emudece, se dessangra, se cristaliza, se mineraliza. Já é quase de pedra como a pedra a

seu lado. Mas os traços de sua sombra caminham e, tornando-se mais longos e finos, esticam-se

para os farrapos de sombra da ossatura da árvore, com os quais se enlaçam. FRÓES, L. Vertigens: obra reunida. Rio de Janeiro: Rocco, 1998

Na apresentação da paisagem e da personagem, o narrador estabelece uma correlação de sentidos

em que esses elementos se entrelaçam. Nesse processo, a condição humana configura-se

a) amalgamada pelo processo comum de desertificação e de solidão.

b) fortalecida pela adversidade extensiva à terra e aos seres vivos

c) redimensionada pela intensidade da luz e da exuberância local.

d) imersa num drama existencial de identidade e de origem.

e) imobilizada pela escassez e pela opressão do ambiente.

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Literatura

Gabarito

1. D

O enunciado fala em um material descartado tornando-se obra de arte, visto que há uma nova

funcionalidade que lhe é atribuída a partir da junção de objetos. É válido ressaltar que a reciclagem

implicaria na transformação do objeto fonte.

2. E

A plasticidade verbal verifica-se na oscilação do tamanho dos sintagmas. Além disso, a cadência

melódica diz respeito à construção do texto como prosa poética, indicado no próprio título “Canções

sem metro”.

3. B

A expressão “isso te devo” reveste-se de um sentido potencialmente irônico, pois o eu-lírico indica por

meio dela sentimentos negativos (expressos pelo desassossego, alma esvaziada, etc) causados por

esse interlocutor. Nota-se, também, o amadurecimento do eu-lírico em função dessas experiências

vividas e um desapego em relação a essa figura com quem eu-poético teve um vínculo emocional.

4. E

O poema se constrói com base em incongruências temporais propostas a partir de transformações do

eu lírico.

5. D

O jogo de palavras em que se dispõe o eu írico para cultivar um sentimento no leitor traz a análise

morfológica dos termos “amor” e “amar”, de modo a ressignificar seus sentidos para a caracterização

literária.

6. B

O uso do substantivo “enseada” destitui o cenário admirado pelo eu lírico de beleza, graça, poesia. Ou

seja, trata-se de uma perda da impressão subjetiva sobre o espaço, característica típica de Manoel de

Barros.

7. D

A interpretação do texto aborda a resistência, representada pela planta, em aguentar a imensidão de

repressão, aí caracterizada pelo exército de pisadas. Embora ela sofra, há também o impacto por quem

a pisa, demonstrando, desse modo, uma força contrária para se fortalecer diante a ações hostis.

8. A

O texto II propõe um diálogo intertextual. Há um elemento paródico ao se utilizar o chocolate derretido

como matéria-prima da obra de arte. É válido ressaltar que não necessariamente a paródia implica uma

atitude de zombaria.

9. B

A partir da análise dos dois textos, é possível identificar que a concepção de body art diz respeito à

utilização do corpo como suporte para a expressão do sujeito.

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Literatura

10. A

O enunciado reforça o entrelaçamento dos elementos contidos no texto, e a letra A, por meio da palavra

“amalgamada”, evidencia essa fusão da mulher com a natureza.

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Literatura

Gêneros literários: épico/narrativo

Resumo

Os gêneros literários

Os gêneros literários são conjuntos ou categorias que reúnem aspectos semelhantes de forma e conteúdo

em relação às produções literárias. Esse agrupamento também pode ser realizado de acordo com

características semânticas, contextuais, discursivas e sintáticas. O filósofo Aristóteles foi o primeiro a definir

os gêneros e os dividiu em três importantes classificações: épico ou narrativo, dramático e lírico.

Gênero épico/narrativo

No gênero épico, do grego “epikos”, há a presença de uma narrativa mitológica com temáticas grandiosas e

heróicas sobre a história de um povo e seus personagens. O narrador fala de um determinado passado e

apresenta também o espaço onde sucederam as ações. Em geral, o texto é constituído por versos e há a

presença de elementos míticos ou fantasiosos.

Duas obras muito conhecidas são “Ilíada” e “Odisseia”, heróis épicos da Grécia Antiga. Na Idade Média, Dante

Alighieri retoma a escrita com “Divina Comédia”; já na Era Moderna, Luís Vaz de Camões revive o gênero com

“Os Lusíadas”. Abaixo, você encontra um pequeno trecho de “Ilíada” e algumas características da lírica

épica:

“Torna ao conflito o herói; se à frente há pouco

Era atroz, o furor se lhe triplica.

Quando o leão, que assalta agreste bardo,

Sem rendê-lo o pastor golpeia e assanha,

Foge e a grei desampara; a pulo a fera

Trepa, amedronta o ermo, umas sobre outras

Atropela as lanígeras ovelhas,

Do redil sai ovante e ensangüentado:

Anda assim na baralha o cru Tidides.”

Já o texto gênero narrativo nasce na modernidade derivado do épico, no entanto, é constituído em prosa.

São exemplificados pelas novelas, romances, contos, etc. Por desenvolver uma estrutura diferente das

antigas obras épicas, ela é caracterizada por:

• Apresentação: Introdução dos personagens, tempo, espaço em que seguirá a narrativa.

• Desenvolvimento: parte da história é desenvolvida com base nas ações dos personagens, direcionando

a um momento de ápice.

• Clímax: momento da história de maior tensão, é o ápice da narrativa.

• Desfecho: finalização dos conflitos e desenvolvimentos, conclusão dos peronagens e de suas relações.

Leia, abaixo, um trecho da obra “Senhora”, de José de Alencar e identifique as características do texto

narrativo:

“Filho de um empregado público e órfão aos dezoito anos, Seixas foi obrigado a abandonar seus estudos na

Faculdade de São Paulo pela impossibilidade em que se achou sua mãe de continuar-lhe a mesada.

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Literatura

Já estava no terceiro ano, e se a natureza que o ornara de excelentes qualidades lhe desse alguma energia

a força de vontade, conseguiria ele vencendo pequenas dificuldades, concluir o curso; tanto mais quanto um

colega e amigo, o Torquato Ribeiro lhe oferecia hospitalidade até que a viúva pudesse liquidar o espólio.

Mas Seixas era desses espíritos que preferem a trilha batida, e só impelidos por alguma forte paixão, rompem

com a rotina. Ora, a carta de bacharel não tinha grande solução para sua bela inteligência mais propensa à

literatura e ao jornalismo.”

Elementos do gênero épico/narrativo

Os elementos da narrativa são essenciais para o gênero, pois é por meio deles que ocorre o decorrer das

ações da história. Dividem-se em cinco:

• Personagem: São as pessoas presentes na narrativa. De acordo com sua importância, são denominados

como “protagonistas” (figuras principais) ou “coadjuvantes” (personagens secundários).

• Enredo: É o tema/assunto da história, que pode ser contada de maneira linear ou não-linear (respeitando

ou não a cronologia). E a partir dele que irá se desdobrar o decorrer da narrativa.

• Tempo: Podendo ser cronológico (que segue uma linearidade dos acontecimentos) ou de modo interior

e digressivo, é importante ressaltar que toda a narrativa é transmitida em um certo tempo para que se

façam os acontecimentos.

• Espaço: É o local em que se desenvolve a narrativa. Podendo ser físico ou psicológico, determinará onde

as ações irão acontecer.

• Narrador: Também chamado de “foco narrativo”, é a “voz” do texto, ou seja, é quem irá transmitir as

ideias presentes da narrativa.

Obs: É importante lembrar os tipos de narradores: há o narrador-personagem, que é aquele que narra e

também faz parte do enredo; há o narrador-observador, que não faz parte do enredo e narra a história em 3ª

pessoa e, por fim, há o narrador onisciente, que é aquele que narra e sabe os anseios e sentimentos dos

personagens.

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Literatura

Textos de apoio:

TEXTO I

Cessem do sábio grego e do troiano

As navegações grandes que fizeram;

Cale-se de Alexandro e de Trajano

A fama das vitórias que tiveram;

Que eu canto o peito ilustre Lusitano,

A quem Neptuno e Marte obedeceram.

Cesse tudo o que a musa antiga canta

Que outro valor mais alto se alevanta

CAMÕES, Luís Vaz de. Os Lusíadas

TEXTO II

O arquivo

No fim de um ano de trabalho, joão obteve uma redução de quinze por cento em seus vencimentos.

joão era moço. Aquele era seu primeiro emprego. Não se mostrou orgulhoso, embora tenha sido um os

poucos contemplados. Afinal, esforçara-se. Não tivera uma só falta ou atraso. Limitou-se a sorrir, a

agradecer ao chefe.

No dia seguinte, mudou-se para um quarto mais distante do centro da cidade. Com o salário reduzido, podia

pagar um aluguel menor.

Passou a tomar duas conduções para chegar ao trabalho. No entanto, estava satisfeito. Acordava mais cedo,

e isto parecia aumentar-lhe a disposição.

Dois anos mais tarde, veio outra recompensa.

O chefe chamou-o e lhe comunicou o segundo corte salarial.

Desta vez, a empresa atravessava um período excelente. A redução foi um pouco maior: dezessete por cento.

Novos sorrisos, novos agradecimentos, nova mudança.

Agora joão acordava às cinco da manhã. Esperava três conduções. Em compensação, comia menos. Ficou

mais esbelto. Sua pele tornou-se menos rosada. O contentamento aumentou.

Prosseguiu a luta.

Porém, nos quatro anos seguintes, nada de extraordinário aconteceu.

(...)

A vida foi passando, com novos prêmios.

Aos sessenta anos, o ordenado equivalia a dois por cento do inicial. O organismo acomodara-se à fome.

Uma vez ou outra, saboreava alguma raiz das estradas. Dormia apenas quinze minutos. Não tinha mais

problemas de moradia ou vestimenta. Vivia nos campos, entre árvores refrescantes, cobria-se com os

farrapos de um lençol adquirido há muito tempo.

O corpo era um monte de rugas sorridentes.

Todos os dias, um caminhão anônimo transportava-o ao trabalho. Quando completou quarenta anos de

serviço, foi convocado pela chefia:

— Seu joão. O senhor acaba de ter seu salário eliminado. Não haverá mais férias. E sua função, a partir de

amanhã, será a de limpador de nossos sanitários.

O crânio seco comprimiu-se. Do olho amarelado, escorreu um líquido tênue. A boca tremeu, mas nada disse.

Sentia-se cansado. Enfim, atingira todos os objetivos. Tentou sorrir:

— Agradeço tudo que fizeram em meu benefício. Mas desejo requerer minha aposentadoria.

O chefe não compreendeu:

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Literatura

— Mas seu joão, logo agora que o senhor está desassalariado? Por quê? Dentro de alguns meses terá de

pagar a taxa inicial para permanecer em nosso quadro. Desprezar tudo isto? Quarenta anos de convívio? O

senhor ainda está forte. Que acha?

A emoção impediu qualquer resposta.

joão afastou-se. O lábio murcho se estendeu. A pele enrijeceu, ficou lisa. A estatura regrediu. A cabeça se

fundiu ao corpo. As formas desumanizaram-se, planas, compactas. Nos lados, havia duas arestas. Tornou-

se cinzento.

João transformou-se num arquivo de metal. Victor Giudice

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Literatura

Exercícios

1. Autorretrato falado Venho de um Cuiabá de garimpos e de ruelas entortadas.

Meu pai teve uma venda no Beco da Marinha, onde nasci.

Me criei no Pantanal de Corumbá entre bichos do chão,

aves, pessoas humildes, árvores e rios.

Aprecio viver em lugares decadentes por gosto de estar

entre pedras e lagartos.

Já publiquei 10 livros de poesia: ao publicá-los me sinto

meio desonrado e fujo para o Pantanal onde sou

abençoado a garças.

Me procurei a vida inteira e não me achei — pelo que

fui salvo.

Não estou na sarjeta porque herdei uma fazenda de gado.

Os bois me recriam.

Agora eu sou tão ocaso!

Estou na categoria de sofrer do moral porque só faço

coisas inúteis.

No meu morrer tem uma dor de árvore.

Manoel de Barros

Uma obra literária pode combinar diferentes gêneros, embora, de modo geral, um deles se mostre

dominante. O poema de Manoel de Barros, predominantemente lírico, apresenta características de um

outro gênero. Qual?

a) Gênero épico.

b) Gênero poético.

c) Gênero elegíaco.

d) Gênero dramático.

e) Gênero narrativo.

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Literatura

2. “Musa, reconta-me os feitos do herói astucioso que muito peregrinou, dês que desfez as muralhas sagradas de Troia;

muitas cidades dos homens viajou, conheceu seus costumes,

como no mar padeceu sofrimento inúmeros na alma,

para que a vida salvasse e de seus companheiros a volta.”

HOMERO. Odisseia. Tradução: Carlos Alberto Nunes. 5. ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 1997. Coleção Universidade. (Fragmento).

O texto acima é parte da cena de abertura do poema épico grego Odisseia. A partir da leitura atenta do

fragmento e dos conhecimentos acumulados sobre o gênero épico, podemos afirmar que este:

a) Tem como característica principal a existência de cinco fatores: tempo, espaço, narrador,

personagem e enredo.

b) Responde à necessidade humana de expressão da individualidade e da subjetividade, a partir da

presença marcante de um eu lírico.

c) Gira em torno, principalmente, do cuidado com a linguagem, concentrando-se mais na forma do

que no conteúdo.

d) Celebra, em estilo solene e grandioso, um acontecimento histórico protagonizado por um herói.

e) Concentra-se no diálogo como principal fio condutor da história.

3. Ed Mort só vai Mort. Ed Mort. Detetive particular. Está na plaqueta. Tenho um escritório numa galeria de Copacabana

entre um fliperama e uma loja de carimbos. Dá só para o essencial, um telefone mudo e um cinzeiro.

Mas insisto numa mesa e numa cadeira. Apesar do protesto das baratas. Elas não vencerão. Comprei

um jogo de máscaras. No meu trabalho o disfarce é essencial. Para escapar dos credores. Outro dia

entrei na sala e vi a cara do King Kong andando pelo chão. As baratas estavam roubando as máscaras.

Espisoteei meia dúzia. As outras atacarama mesa. Consegui salvar a minha Bic e o jornal. O jornal era

novo, tinha só uma semana. Mas elas levaram a agenda. Saí ganhando. A agenda estava em branco.

Meu último caso fora com a funcionária do Erótica, a primeira ótica da cidade com balconista topless.

Acabara mal. Mort. Ed Mort. Está na plaqueta. VERISSIMO, L. F. Ed Mort: todas as histórias. Porto Alegre: L&PM, 1997 (adaptado).

Nessa crônica, o efeito de humor é basicamente construído por uma

a) segmentação de enunciados baseada na descrição dos hábitos do personagem.

b) ordenação dos constituintes oracionais na qual se destaca o núcleo verbal.

c) estrutura composicional caracterizada pelo arranjo singular dos períodos.

d) sequenciação narrativa na qual se articulam eventos absurdos.

e) seleção lexical na qual predominam informações redundantes.

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Literatura

4. Em casa, Hideo ainda podia seguir fiel ao imperador japonês e às tradições que trouxera no navio que

aportara em Santos. […] Por isso Hideo exigia que, aos domingos, todos estivessem juntos durante o

almoço. Ele se sentava à cabeceira da mesa; à direita ficava Hanashiro, que era o primeiro filho, e

Hitoshi, o segundo, e à esquerda, Haruo, depois Hiroshi, que era o mais novo. […] A esposa, que também

era mãe, e as filhas, que também eram irmãs, aguardavam de pé ao redor da mesa […]. Haruo

reclamava, não se cansava de reclamar: que se sentassem também as mulheres à mesa, que era um

absurdo aquele costume. Quando se casasse, se sentariam à mesa a esposa e o marido, um em frente

ao outro, porque não era o homem melhor que a mulher para ser o primeiro […]. Elas seguiam de pé, a

mãe um pouco cansada dos protestos do filho, pois o momento do almoço era sagrado, não era hora

de levantar bandeiras inúteis […]. NAKASATO, O. Nihonjin. São Paulo: Benvirá, 2011 (fragmento).

Referindo-se a práticas culturais de origem nipônica, o narrador registra as reações que elas

provocam na família e mostra um contexto em que

a) a obediência ao imperador leva ao prestígio pessoal.

b) as novas gerações abandonam seus antigos hábitos.

c) a refeição é o que determina a agregação familiar

d) os conflitos de gênero tendem a ser neutralizados.

e) o lugar à mesa metaforiza uma estrutura de poder

5. Leia o texto a seguir e classifique-o de acordo com o gênero:

O lobo e o leão

Um Lobo, que acabara de roubar uma ovelha, depois de refletir por um instante, chegou à conclusão

que o melhor seria levá-la para longe do curral, para que enfim fosse capaz de servir-se daquela

merecida refeição, sem o indesejado risco de ser interrompido por alguém.

No entanto, contrariando a sua vontade, seus planos bruscamente mudaram de rumo, quando, no

caminho, ele cruzou com um poderoso Leão, que sem muita conversa, de um só bote, lhe tomou a

ovelha.

O Lobo, contrariado, mas sempre mantendo uma distância segura do seu oponente, disse em tom

injuriado, com uma certa dose de ironia: "Você não tem o direito de tomar para si aquilo que por direito

me pertence!"

O Leão, sentindo-se um tanto ultrajado pela audácia do seu concorrente, olhou em volta, mas como o

Lobo estava longe demais e não valia a pena o inconveniente de persegui-lo apenas para lhe dar uma

merecida lição, disse com desprezo: "Como pertence a você? Você por acaso a comprou ou, por acaso,

terá o pastor lhe dado como presente? Por favor, me diga, como você a conseguiu?"

a) Gênero lírico – crônica.

b) Gênero épico – anedota.

c) Gênero narrativo – conto.

d) Gênero lírico – poema.

e) Gênero narrativo – fábula.

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Literatura

6. Menina

A máquina de costura avançava decidida sobre o pano. Que bonita que a mãe era, com os alfinetes na

boca. Gostava de olhá-la calada, estudando seus gestos, enquanto recortava retalhos de pano com a

tesoura. Interrompia às vezes seu trabalho, era quando a mãe precisava da tesoura. Admirava o jeito

decidido da mãe ao cortar pano, não hesitava nunca, nem errava. A mãe sabia tanto! Tita chamava-a

de ( ) como quem diz ( ). Tentava não pensar as palavras, mas sabia que na mesma hora da tentativa

tinha-as pensado. Oh, tudo era tão difícil. A mãe saberia o que ela queria perguntar-lhe intensamente

agora quase com fome depressa depressa antes de morrer, tanto que não se conteve e — Mamãe, o

que é desquitada? — atirou rápida com uma voz sem timbre. Tudo ficou suspenso, se alguém gritasse

o mundo acabava ou Deus aparecia — sentia Ana Lúcia. Era muito forte aquele instante, forte demais

para uma menina, a mãe parada com a tesoura no ar, tudo sem solução podendo desabar a qualquer

pensamento, a máquina avançando desgovernada sobre o vestido de seda brilhante espalhando luz

luz luz. ÂNGELO, I. Menina. In: A face horrível. São Paulo: Lazuli, 2017.

Escrita na década de 1960, a narrativa põe em evidência uma dramaticidade centrada na

a) insinuação da lacuna familiar gerada pela ausência da figura paterna.

b) associação entre a angústia da menina e a reação intempestiva da mãe.

c) relação conflituosa entre o trabalho doméstico e a emancipação feminina.

d) representação de estigmas sociais modulados pela perspectiva da criança.

e) expressão de dúvidas existenciais intensificadas pela percepção do abandono.

7. TEXTO I

João Guedes, um dos assíduos frequentadores do boliche do capitão, mudara-se da campanha havia três anos. Três anos de pobreza na cidade bastaram para o degradar. Ao morrer, não tinha um vintém nos bolsos e fazia dois meses que saíra da cadeia, onde estivera preso por roubo de ovelha. A história de sua desgraça se confunde com a da maioria dos que povoam a aldeia de Boa Ventura, uma cidadezinha distante, triste e precocemente envelhecida, situada nos confins da fronteira do Brasil com o Uruguai.

MARTINS, C. Porteira fechada. Porto Alegre: Movimento, 2001 (fragmento).

TEXTO II

Comecei a procurar emprego, já topando o que desse e viesse, menos complicação com os homens,

mas não tava fácil. Fui na feira, fui nos bancos de sangue, fui nesses lugares que sempre dão para

descolar algum, fui de porta em porta me oferecendo de faxineiro, mas tava todo mundo escabreado

pedindo referências, e referências eu só tinha do diretor do presídio. FONSECA, R. Feliz Ano Novo. São Paulo: Cia. das Letras, 1989 (fragmento).

A oposição entre campo e cidade esteve entre as temáticas tradicionais da literatura brasileira. Nos

fragmentos dos dois autores contemporâneos, esse embate incorpora um elemento novo: a questão

da violência e do desemprego.

As narrativas apresentam confluência, pois nelas o(a)

a) criminalidade é algo inerente ao ser humano, que sucumbe a suas manifestações.

b) meio urbano, especialmente o das grandes cidades, estimula uma vida mais violenta.

c) falta de oportunidades na cidade dialoga com a pobreza do campo rumo à criminalidade.

d) êxodo rural e a falta de escolaridade são causas da violência nas grandes cidades.

e) complacência das leis e a inércia das personagens são estímulos à prática criminosa.

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Literatura

Texto para as questões 8 e 9

(…) Não resguardei os apontamentos obtidos em largos dias e meses de observação: num momento de

aperto fui obrigado a atirá-los na água. Certamente me irão fazer falta, mas terá sido uma perda irreparável?

Quase me inclino a supor que foi bom privar-me desse material. Se ele existisse, ver-me-ia propenso a

consultá-lo a cada instante, mortificar-me-ia por dizer com rigor a hora exata de uma partida, quantas

demoradas tristezas se aqueciam ao sol pálido, em manhã de bruma, a cor das folhas que tombavam das

árvores, num pátio branco, a forma dos montes verdes, tintos de luz, frases autênticas, gestos, gritos,

gemidos. Mas que significa isso?

Essas coisas verdadeiras não ser verossímeis. E se esmoreceram, deixá-las no esquecimento: valiam pouco,

pelo menos imagino que valiam pouco. Outras, porém, conservaram-se, cresceram, associaram-se, e é

inevitável mencioná-las. Afirmarei que sejam absolutamente exatas? Leviandade.

(…) Nesta reconstituição de fatos velhos, neste esmiuçamento, exponho o que notei, o que julgo ter notado.

Outros devem possuir lembranças diversas. Não as contesto, mas espero que não recusem as minhas:

conjugam-se, completam-se e me dão hoje impressão de realidade (…) (RAMOS, Graciliano. Memórias do cárcere. Rio, São Paulo: Record, 1984.)

8. A relação entre autor e narrador pode assumir feições diversas na literatura. Pode-se dizer que tal

relação tem papel fundamental na caracterização de textos que, a exemplo do livro de Graciliano

Ramos, constituem uma autobiografia – gênero literário definido como relato da vida de um indivíduo

feito por ele mesmo.

A partir dessa definição, é possível afirmar que o caráter autobiográfico de uma obra é reconhecido

pelo leitor em virtude de:

a) Conteúdo verídico das experiências pessoais e coletivas relatadas

b) Identidade de nome entre autor, narrador e personagem principal

c) Possibilidade de comprovação histórica de contextos e fatos narrados

d) Notoriedade do autor e de sua história junto ao público e a sociedade

9. Essas coisas verdadeiras podem não ser verossímeis

Com a frase acima, o escritor lembra um princípio básico da literatura: a verossimilhança – isto é, a

semelhança com a verdade – é mais importante do que a verdade mesma. A melhor explicação para

este princípio é a de que a invenção narrativa se mostra mais convincente se:

a) Parecer contar uma história real.

b) Quer mostrar seu caráter ficcional

c) Busca apoiar-se em fatos conhecidos

d) Tenta desvelar as contradições sociais

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Literatura

10. Tudo no mundo começou com um sim. Uma molécula disse sim a outra molécula e nasceu a vida.

Mas antes da pré-história havia a pré-história da pré-história e havia o nunca e havia o sim. Sempre

houve. Não sei o quê, mas sei que o universo jamais começou.

[...]

Enquanto eu tiver perguntas e não houver resposta continuarei a escrever. Como começar pelo início,

se as coisas acontecem antes de acontecer? Se antes da pré-pré- história já havia os monstros

apocalípticos? Se esta história não existe, passará a existir. Pensar é um ato. Sentir é um fato. Os dois

juntos – sou eu que escrevo o que estou escrevendo. [...] Felicidade? Nunca vi palavra mais doida,

inventada pelas nordestinas que andam por aí aos montes.

Como eu irei dizer agora, esta história será o resultado de uma visão gradual – há dois anos e meio

venho aos poucos descobrindo os porquês. É visão da iminência de. De quê? Quem sabe se mais tarde

saberei. Como que estou escrevendo na hora mesma em que sou lido. Só não inicio pelo fim que

justificaria o começo – como a morte parece dizer sobre a vida – porque preciso registrar os fatos

antecedentes. LISPECTOR, C. A hora da estrela. Rio de Janeiro: Rocco, 1998 (fragmento).

A elaboração de uma voz narrativa peculiar acompanha a trajetória literária de Clarice Lispector,

culminada com a obra A hora da estrela, de 1977, ano da morte da escritora. Nesse fragmento, nota-

se essa peculiaridade porque o narrador

a) observa os acontecimentos que narra sob uma ótica distante, sendo indiferente aos fatos e às

personagens.

b) relata a história sem ter tido a preocupação de investigar os motivos que levaram aos eventos

que a compõem.

c) revela-se um sujeito que reflete sobre questões existenciais e sobre a construção do discurso.

d) admite a dificuldade de escrever uma história em razão da complexidade para escolher as

palavras exatas.

e) propõe-se a discutir questões de natureza filosófica e metafísica, incomuns na narrativa de

ficção.

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Literatura

Gabarito

1. E

O poema apresenta características do gênero narrativo. Essa mistura dos gêneros - em que o verso se

aproxima da prosa - é uma herança da poesia modernista. Uma das características do gênero narrativo

que se mostra no poema de Manoel de Barros é a apresentação dos fatos numa sequência temporal, tal

como se dá quando contamos uma história. (Comentário Uerj)

2. D

O gênero épico é conhecido por exaltar grandes feitos, por trazer a imagem do herói.

3. D

O efeito de humor é obtido pela concatenação de sequências inusitadas/absurdas/estranhas: baratas

roubando objetos; o rosto do King Kong andando pela sala; uma ótica com uma balconista fazendo

topless.

4. E

O lugar à mesa nas práticas culturais nipônicas reflete uma pirâmide hierárquica na qual a mulher ocupa

o lugar mais baixo.

5. E

A fábula de Esopo apresenta os elementos característicos do gênero narrativo: enredo, personagens,

clímax, espaço e tempo.

6. D

A hesitação da menina em perguntar à mãe o sentido da palavra “desquitada”, somada ao clima gerado

após a pergunta, representa o estigma social em relação à figura da mãe solteira.

7. C

A falta de oportunidades econômicas e educacionais na cidade, que exige sempre referências na hora

do emprego, dialoga com a pobreza das áreas pobres, alimentando, assim, a criminalidade e violência.

8. B

Uma vez que se trata de uma autobiografia, aquele que está sendo biografado (personagem principal)

acaba por ser, também, o autor e o narrador de sua própria história.

9. A

A verossimilhança não pode ser confundida com veracidade. Por isso, parecer contar uma história real

é o mais importante.

10. C

Nesse fragmento de “A hora da estrela”, deparamo-nos com um narrador que tece reflexões sobre

questões existenciais (“Enquanto eu tiver perguntas e não houver respostas”, continuarei a escrever”),

e sobre a própria construção de sua narrativa (“Como eu irei dizer agora, esta história...”)

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Literatura

Gêneros literários: lírico

Resumo

Os textos do gênero literário lírico costumam ser breves, pois, diferentemente dos épicos/narrativos, não há

uma história sendo contada, há a supressão do enredo. Versam sobre sentimentos, divagações e expressões

do eu-lírico e é por meio deles que o indivíduo extravasa suas emoções, por

isso a subjetividade é uma das características principais desse modo de escrita.

Os poemas são textos que se enquadram, em sua maioria, nesse gênero.

Observação: eu-lírico é a voz que fala com o leitor dentro do texto.

O poeta é autor do eu-lírico. É comum autores masculinos escreverem um eu-lírico

do gênero oposto e vice-versa.

Os textos poéticos representam muito o gênero lírico, que mantém relações estreitas com a música.

Antigamente, as obras eram acompanhadas por instrumentos musicais. Recursos sonoros se fazem

presentes nesses textos até a atualidade, como métrica, rima e figuras de linguagem moram neles.

Recursos sonoros

Métrica: organização silábica de acordo com a fala e não com a ortografia que privilegia a sonoridade dos

versos. Conta-se desde a primeira sílaba até a última tônica do verso.

Exemplo:

E/ra u/ma/ ca/sa

Mui/to en/gra/ça/da

Não/ ti/nha/ te/to

Não /ti/nha /na/da Vinicius de Moraes

Os versos acima têm 4 sílabas métricas.

Os versos podem ser classificados de acordo com as sílabas métricas:

Versos de 5 e 7 sílabas métricas são chamados de redondilhas. Os de 5 sílabas métricas são chamados de

redondilhas menores e os de 7, redondilhas maiores. Esses versos são muito populares.

Versos de 8, 9, 10, 11 sílabas métricas/poéticas, por exemplo, são classificados de acordo com a sua

quantidade. Ex: 11 sílabas métricas – versos hendecassílabos.

Além desses, há os versos de 12 sílabas poéticas, ou também conhecidos como versos Alexandrinos. São

muito importantes para a criação de textos épicos.

→ de acordo com a fala: é¹ ru² ma³ cá4 sa (paramos de

contar na última silaba tônica do verso).

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Literatura

Rima: repetições sonoras no final dos versos. Podem ser avaliadas quanto a disposição nos versos e quanto

a qualidade.

Quanto à “disposição” nos versos Quanto à “qualidade”

Alternadas: ABAB

Emparelhadas: AABB

Interpoladas: ABBA

Misturadas (requer poemas longos para

que possa existir)

Pobre: rima de palavras pertencentes à mesma classe

gramatical.

Rica: rima de palavras pertencentes a classes gramaticais

diferentes.

Preciosa: rimas de palavras pertencentes a mais de duas

classes gramaticais (ex: estrela / vê-la).

Obs.: versos brancos são os que não apresentam rimas.

Outros recursos sonoros:

Anáfora: repetição de um mesmo termo no início dos versos, gerando um eco proposital dentro do texto.

Aliteração: Repetição de sons consonantais. Exemplo:

Vozes veladas, veludosas vozes,

Volúpias dos violões, vozes veladas,

Vagam nos velhos vórtices velozes

Dos ventos, vivas, vãs, vulcanizadas

Cruz e Souza

Assonância: repetição de sons vocálicos.

Sou Ana, da cama

Da cana, fulana, bacana (sacana)*

Sou Ana de Amsterdam

Chico Buarque

Refrão: não é uma figura de linguagem, mas um verso (ou conjunto de versos) que se repete a fim de criar

ritmo.

Textos de apoio

As pombas

Vai-se a primeira pomba despertada...

Vai-se outra mais... mais outra... enfim dezenas

Das pombas vão-se dos pombais, apenas

Raia sanguínea e fresca a madrugada.

E à tarde, quando a rígida nortada

Sopra, aos pombais, de novo elas, serenas,

Ruflando as asas, sacudindo as penas,

Voltam todas em bando e em revoada...

Também dos corações onde abotoam

Os sonhos, um a um, céleres voam,

Como voam as pombas dos pombais;

No azul da adolescência as asas soltam,

Fogem... Mas aos pombais as pombas voltam,

E eles aos corações não voltam mais.

Raimundo Correia

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Literatura

Meus oito anos

Oh! que saudades que tenho

Da aurora da minha vida,

Da minha infância querida

Que os anos não trazem mais!

Que amor, que sonhos, que flores,

Naquelas tardes fagueiras

À sombra das bananeiras,

Debaixo dos laranjais!

Como são belos os dias

De despontar da existência!

– Respira a alma inocência

Como perfumes a flor;

O mar é – lago sereno,

O céu – um manto azulado,

O mundo – um sonho dourado,

A vida – um hino d’amor!

Que auroras, que sol, que vida,

Que noites de melodia

Naquela doce alegria,

Naquele ingênuo folgar!

O céu bordado d´estrelas,

A terra de aromas cheia,

As ondas beijando a areia

E a lua beijando o mar!

Oh! dias de minha infância!

Oh! meu céu de primavera!

Que doce a vida não era

Nessa risonha manhã!

Em vez das mágoas de agora,

Eu tinha nessas delícias

De minha mãe as carícias

E beijos de minha irmã!

Livre filho das montanhas,

Eu ia bem satisfeito,

Da camisa aberto o peito,

– Pés descalços, braços nus –

Correndo pelas campinas

À roda das cachoeiras,

Atrás das asas ligeiras

Das borboletas azuis!

Naqueles tempos ditosos

Ia colher as pitangas,

Trepava a tirar as mangas,

Brincava à beira do mar;

Rezava às Ave-Marias,

Achava o céu sempre lindo,

Adormecia sorrindo

E despertava a cantar!

[…]

Oh! que saudades que tenho

Da aurora da minha vida,

Da minha infância querida

Que os anos não trazem mais!

– Que amor, que sonhos, que flores,

Naquelas tardes fagueiras

À sombra das bananeiras,

Debaixo dos laranjais!

Casemiro de Abreu

Erro de português

Quando o português chegou Debaixo de uma bruta chuva Vestiu o índio Que pena! Fosse uma manhã de sol O índio tinha despido O português.

Oswald de Andradre

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Literatura

Exercícios

1. TEXTO I

No meio do caminho

No meio do caminho tinha

uma pedra

Tinha uma pedra no meio

do caminho

Tinha uma pedra

No meio do caminho tinha

uma pedra ANDRADE, C. D. Antologia poética. Rio de Janeiro/ São Paulo: Record, 2000. (fragmento).

TEXTO II

DAVIS, J. Garfield, um charme de gato -7. Trad. De A gência Internacional Press. Porto Alegre: L&PM, 200.

A comparação entre os recursos expressivos que constituem os dois textos revela que

a) o texto I perde suas características de gênero poético ao ser vulgarizado por histórias em quadrinho.

b) o texto II pertence ao gênero literário, porque as escolhas linguísticas o tornam uma réplica do texto I.

c) a escolha do tema, desenvolvido por frases semelhantes, caracteriza-os como pertencentes ao mesmo gênero.

d) os textos são de gêneros diferentes porque, apesar da intertextualidade, foram elaborados com finalidades distintas.

e) as linguagens que constroem significados nos dois textos permitem classificá-los como pertencentes ao mesmo gênero.

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Literatura

2. Primeira lição Os gêneros de poesia são: lírico, satírico, didático, épico, ligeiro.

O gênero lírico compreende o lirismo.

Lirismo é a tradução de um sentimento subjetivo, sincero e pessoal.

É a linguagem do coração, do amor.

O lirismo é assim denominado porque em outros tempos os versos sentimentais eram

declamados ao som da lira.

O lirismo pode ser:

a) Elegíaco, quando trata de assuntos tristes, quase sempre a morte.

b) Bucólico, quando versa sobre assuntos campestres.

c) Erótico, quando versa sobre o amor.

O lirismo elegíaco compreende a elegia, a nênia, a endecha, o epitáfio e o epicédio.

Elegia é uma poesia que trata de assuntos tristes.

Nênia é uma poesia em homenagem a uma pessoa morta.

Era declamada junto à fogueira onde o cadáver era incinerado.

Endecha é uma poesia que revela as dores do coração.

Epitáfio é um pequeno verso gravado em pedras tumulares.

Epicédio é uma poesia onde o poeta relata a vida de uma pessoa morta. CESAR, A. C. Poética. São Paulo: Companhia das Letras, 2013.

No poema de Ana Cristina Cesar, a relação entre as definições apresentadas e o processo de

construção do texto indica que o(a)

a) caráter descritivo dos versos assinala uma concepção irônica de lirismo.

b) tom explicativo e contido constitui uma forma peculiar de expressão poética.

c) seleção e o recorte do tema revelam uma visão pessimista da criação artística.

d) enumeração de distintas manifestações líricas produz um efeito de impessoalidade.

e) referência a gêneros poéticos clássicos expressa a adesão do eu lírico às tradições literárias.

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Literatura

3. Anoitecer

A Dolores

É a hora em que o sino toca,

mas aqui não há sinos;

há somente buzinas,

sirenes roucas,

apitos aflitos, pungentes, trágicos,

uivando escuro segredo;

desta hora tenho medo.

[...]

É a hora do descanso,

mas o descanso vem tarde,

o corpo não pede sono,

depois de tanto rodar;

pede paz – morte – mergulho

no poço mais ermo e quedo;

desta hora tenho medo.

Hora de delicadeza,

agasalho, sombra, silêncio.

Haverá disso no mundo?

É antes a hora dos corvos,

bicando em mim,

meu passado, meu futuro, meu degredo;

desta hora, sim, tenho medo. ANDRADE, C. D. A rosa do povo. Rio de Janeiro: Record, 2005 (fragmento).

Com base no contexto da Segunda Guerra Mundial, o livro “A rosa do povo” revela desdobramentos da

visão poética. No fragmento, a expressividade lírica demonstra um(a)

a) defesa da esperança como forma de superação das atrocidades da guerra.

b) desejo de resistência às formas de opressão e medo produzidas pela guerra.

c) olhar pessimista das instituições humanas e sociais submetidas ao conflito armado.

d) exortação à solidariedade para a reconstrução dos espaços urbanos bombardeados.

e) espírito de contestação capaz de subverter a condição de vítima dos povos afetados.

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Literatura

4. Esses chopes dourados [...]

quando a geração de meu pai

batia na minha

a minha achava que era normal

que a geração de cima

só podia educar a de baixo

batendo

quando a minha geração batia na de vocês

ainda não sabia que estava errado

mas a geração de vocês já sabia

e cresceu odiando a geração de cima

aí chegou esta hora

em que todas as gerações já sabem de tudo

e é péssimo

ter pertencido à geração do meio

tendo errado quando apanhou da de cima

e errado quando bateu na de baixo

e sabendo que apesar de amaldiçoados

éramos todos inocentes. WANDERLEY, J. In: MORICONI, I. (Org.). Os cem melhores poemas brasileiros do século. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001

(fragmento).

Ao expressar uma percepção de atitudes e valores situados na passagem do tempo, o eu lírico

manifesta uma angústia sintetizada na

a) compreensão da efemeridade das convicções antes vistas como sólidas.

b) consciência das imperfeições aceitas na construção do senso comum.

c) revolta das novas gerações contra modelos tradicionais de educação.

d) incerteza da expectativa de mudança por parte das futuras gerações.

e) crueldade atribuída à forma de punição praticada pelos mais velhos.

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Literatura

5. Irerê, meu passarinho do sertão do Cariri,

Irerê, meu companheiro,

Cadê viola? Cadê meu bem? Cadê Maria?

Ai triste sorte a do violeiro cantadô!

Ah! Sem a viola em que cantava o seu amô,

Ah! Seu assobio é tua flauta de irerê:

Que tua flauta do sertão quando assobia,

Ah! A gente sofre sem querê!

Ah! Teu canto chega lá no fundo do sertão,

Ah! Como uma brisa amolecendo o coração,

Ah! Ah!

Irerê, solta teu canto!

Canta mais! Canta mais!

Prá alembrá o Cariri!

VILLA-LOBOS, H. Bachianas Brasileiras n. 5 para soprano e oito violoncelos (1938-1945). Disponível em: http://euterpe.blog.br.

Acesso em: 23 abr. 2019.

Nesses versos, há uma exaltação ao sertão do Cariri em uma ambientação linguisticamente apoiada no(a)

a) uso recorrente de pronomes.

b) variedade popular da língua portuguesa.

c) eferência ao conjunto da fauna nordestina.

d) exploração de instrumentos musicais eruditos.

e) predomínio de regionalismos lexicais nordestinos

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Literatura

6. Casamento Há mulheres que dizem:

Meu marido, se quiser pescar, pesque,

mas que limpe os peixes.

Eu não. A qualquer hora da noite me levanto,

ajudo a escamar, abrir, retalhar e salgar.

É tão bom, só a gente sozinhos na cozinha,

de vez em quando os cotovelos se esbarram,

ele fala coisas como “este foi difícil”

“prateou no ar dando rabanadas”

e faz o gesto com a mão.

O silêncio de quando nos vimos a primeira vez

atravessa a cozinha como um rio profundo.

Por fim, os peixes na travessa,

vamos dormir.

Coisas prateadas espocam:

somos noivo e noiva. PRADO, A. Poesia reunida. São Paulo: Siciliano, 1991.

O poema de Adélia Prado, que segue a proposta moderna de tematização de fatos cotidianos,

apresenta a prosaica ação de limpar peixes na qual a voz lírica reconhece uma

a) expectativa do marido em relação à esposa.

b) imposição dos afazeres conjugais.

c) disposição para realizar tarefas masculinas.

d) dissonância entre as vozes masculina e feminina.

e) forma de consagração da cumplicidade no casamento.

7. Sobre o gênero lírico, estão corretas, exceto:

a) Gênero marcado pela subjetividade dos textos. Presença de um eu lírico que manifesta e expõe seus sentimentos e sua percepção acerca do mundo.

b) As mais conhecidas estruturas formais do gênero lírico são a elegia, o soneto, o hino, a sátira, o idílio, a écloga e o epitalâmio.

c) São longos poemas narrativos em que um acontecimento histórico protagonizado por um herói é celebrado.

d) Nota-se, no gênero lírico, a predominância de pronomes e verbos na 1ª pessoa e a exploração da musicalidade das palavras.

e) Os poemas do gênero lírico podem apresentar forma livre ou estruturas formais.

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Literatura

8. A viagem

Que coisas devo levar

nesta viagem em que partes?

As cartas de navegação só servem

a quem fica.

Com que mapas desvendar

um continente

que falta?

Estrangeira do teu corpo

tão comum

quantas línguas aprender

para calar-me?

Também quem fica

procura

um oriente.

Também

a quem fica

cabe uma paisagem nova

e a travessia insone do desconhecido

e a alegria difícil da descoberta.

O que levas do que fica,

o que, do que levas, retiro?

MARQUES, A. M. In: SANT’ANNA, A. (Org.). Rua Aribau. Porto Alegre: Tag, 2018.

A viagem e a ausência remetem a um repertório poético tradicional. No poema, a voz lírica dialoga com

essa tradição, repercutindo a

a) saudade como experiência de apatia.

b) presença da fragmentação da identidade.

c) negação do desejo como expressão de culpa.

d) persistência da memória na valorização do passado.

e) revelação de rumos projetada pela vivência da solidão.

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9. Carta ao Tom 74

Rua Nascimento Silva, cento e sete

Você ensinando pra Elizete

As canções de canção do amor demais

Lembra que tempo feliz

Ah, que saudade,

Ipanema era só felicidade

Era como se o amor doesse em paz

Nossa famosa garota nem sabia

A que ponto a cidade turvaria

Esse Rio de amor que se perdeu

Mesmo a tristeza da gente era mais bela

E além disso se via da janela

Um cantinho de céu e o Redentor

É, meu amigo, só resta uma certeza,

É preciso acabar com essa tristeza

É preciso inventar de novo o amor

MORAES, V.; TOQUINHO. Bossa Nova, sua história, sua gente. São Paulo: Universal; Philips,1975 (fragmento).

O trecho da canção de Toquinho e Vinícius de Moraes apresenta marcas do gênero textual carta,

possibilitando que o eu poético e o interlocutor

a) compartilhem uma visão realista sobre o amor em sintonia com o meio urbano.

b) troquem notícias em tom nostálgico sobre as mudanças ocorridas na cidade.

c) façam confidências, uma vez que não se encontram mais no Rio de Janeiro.

d) tratem pragmaticamente sobre os destinos do amor e da vida citadina.

e) aceitem as transformações ocorridas em pontos turísticos específicos.

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10. À garrafa

Contigo adquiro a astúcia

de conter e de conter-me.

Teu estreito gargalo

é uma lição de angústia.

Por translúcida pões

o dentro fora e o fora dentro

para que a forma se cumpra

e o espaço ressoe.

Até que, farta da constante

prisão da forma, saltes

da mão para o chão

e te estilhaces, suicida,

numa explosão

de diamantes. PAES, J. P. Prosas seguidas de odes mínimas. São Paulo: Cia. das Letras, 1992.

A reflexão acerca do fazer poético é um dos mais marcantes atributos da produção literária

contemporânea, que, no poema de José Paulo Paes, se expressa por um(a):

a) reconhecimento, pelo eu lírico, de suas limitações no processo criativo, manifesto na expressão “Por translúcidas pões".

b) subserviência aos princípios do rigor formal e dos cuidados com a precisão metafórica, como se em "prisão da forma".

c) visão progressivamente pessimista, em face da impossibilidade da criação poética, conforme expressa o verso "e te estilhaces, suicida".

d) processo de contenção, amadurecimento e transformação da palavra, representado pelos versos "numa explosão / de diamantes".

e) necessidade premente de libertação da prisão representada pela poesia, simbolicamente comparada à "garrafa" a ser "estilhaçada".

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Gabarito

1. D No caso, temos uma história em quadrinhos que retoma um poema de Drummond. Aliás, o conhecimento do poema é fundamental para a compreensão da paródia realizada nos últimos quadrinhos da história. Por fim, enquanto o texto 1 traz uma reflexão de caráter existencial e filosófica, o texto 2 tem um objetivo mais modesto, que é provocar humor. Atente-se para a intertextualidade.

2. B

O caráter didático do texto justifica seu “tom explicativo e contido”, embora seja discutível se somente esse tom é capaz de constituir “uma forma peculiar de expressão poética”.

3. C

No texto, o eu-lírico não demonstra qualquer tipo de esperança com relação ao fim da guerra - sente-se oprimido. Mesmo ao descansar, quando busca a paz, ou a morte, ainda ouve a continuidade da guerra, sugerida de forma metonímica por diversos vocábulos do texto, como sino (igreja), buzinas (trânsito), sirenes (ambulâncias).

4. B

A angústia do eu lírico tem a ver com o fato de ele pertencer à geração “do meio”, e ser “errado quando apanhou da de cima \ e errado quando bateu na de baixo”. No entanto, ela afirma que “apesar de amaldiçoados \ éramos todos inocentes”, já que o ato de bater nos filhos era visto como “normal” pelo senso comum.

5. B

Linguisticamente, percebe-se a manifestação da oralidade no texto escrito, o que fica exemplificado pelos termos “cantador”, “amô”, “querê”, “prá”. Com isso, o texto se apropria de expressões populares (que não são, necessariamente, regionais) do português.

6. E

No poema, fica evidente a cumplicidade de um casal. O eu lírico apresenta-se como uma esposa que, em vez de se revoltar com a tarefa de limpar peixes, como o fazem algumas mulheres, aproveita o momento para inteirar-se mais afetuosamente de seu marido, como se fosse um ritual íntimo dos dois.

7. C

As características descritas na opção “c” referem-se ao gênero épico. 8. E

O estado de abandono e solidão do eu lírico o fazem buscar novos rumos: línguas para aprender, a procura por um oriente ou por novas paisagens, travessias e descobertas.

9. B

É possível reconhecer pela semântica textual os tempos verbais no pretérito imperfeito e expressões interjetivas enfatizando o tom de nostalgia – valorização do passado.

10. D O texto trabalha gradativamente o processo de construção poética, associando a imagem final dos “diamantes” à riqueza da plurissignificação da palavras possibilitada pela poesia.

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Gêneros literários: dramático e ensaístico

Resumo

Gênero Dramático

Como gênero dramático, entende-se textos que foram criados para serem representados, encenados, como

ocorre com os textos de cunho teatral. A voz narrativa está vinculada aos personagens, encenada por atores,

e esses contam uma história por meio de diálogos ou monólogos.

Alguns exemplos de gênero dramático são a comédia, a tragédia, a tragicomédia e a farsa.

Encenação da peça “Grande Sertão Veredas”. Disponível em: https://vejasp.abril.com.br/atracao/grande-sertao-veredas/

Gênero Ensaístico

Não faz parte dos gêneros literários clássicos (épico, dramático e lírico), mas, com o passar do tempo, textos

novos foram aparecendo e não se encaixavam na divisão clássica de gêneros, por isso muitos teóricos

defendem o surgimento desse gênero.

É um texto não ficcional que apresenta características literárias (uso artístico expressivo da linguagem).

Exemplos de textos que se enquadram nesse gênero:

● Carta;

● Crônicas;

● Discursos;

● Autobiografias;

● Biografias;

● Ensaios;

● etc.

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Obs.: para um texto ser enquadrado nesse gênero ele deve apresentar literariedade, isto é, características

literárias. Dessa forma, não é qualquer carta, crônica etc. que pode ser encaixada nesse gênero.

A instância enunciativa de textos desse gênero é o próprio autor, isto é, não há um narrador ou eu-lírico.

Textos de apoio

Dunsinane. Dentro do Castelo. (Entram, com tambores e bandeiras, Macbeth, Seyton e soldados.) (...) SEYTON: A rainha está morta, senhor.

MACBETH:

Ela só devia morrer mais tarde;

Haveria um momento para isso.

Amanhã, e amanhã e ainda amanhã

Arrastam nesse passo o dia a dia

Até o fim do tempo pré-notado.

E todo ontem conduziu os tolos

À via em pó da morte. Apaga, vela!

A vida é só uma sombra: um mau ator

Que grita e se debate pelo palco,

Depois é esquecido; é uma história

Que conta o idiota, toda som e fúria,

Sem querer dizer nada.

(Entra um mensageiro.)

Não tens língua? Depressa, a história.

SHAKESPEARE, William. Macbeth. Tradução: Barbara Heliodora. São Paulo: Abril, 2010.

A última crônica

A caminho de casa, entro num botequim da Gávea para tomar um café junto ao balcão. Na realidade estou

adiando o momento de escrever. A perspectiva me assusta. Gostaria de estar inspirado, de coroar com êxito

mais um ano nesta busca do pitoresco ou do irrisório no cotidiano de cada um. Eu pretendia apenas recolher

da vida diária algo de seu disperso conteúdo humano, fruto da convivência, que a faz mais digna de ser vivida.

Visava ao circunstancial, ao episódico. Nesta perseguição do acidental, quer num flagrante de esquina, quer

nas palavras de uma criança ou num acidente doméstico, torno-me simples espectador e perco a noção do

essencial. Sem mais nada para contar, curvo a cabeça e tomo meu café, enquanto o verso do poeta se repete

na lembrança: “assim eu quereria o meu último poema”. Não sou poeta e estou sem assunto. Lanço então um

último olhar fora de mim, onde vivem os assuntos que merecem uma crônica.

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Literatura

Ao fundo do botequim um casal de pretos acaba de sentar-se, numa das últimas mesas de mármore ao longo

da parede de espelhos. A compostura da humildade, na contenção de gestos e palavras, deixa-se acrescentar

pela presença de uma negrinha de seus três anos, laço na cabeça, toda arrumadinha no vestido pobre, que se

instalou também à mesa: mal ousa balançar as perninhas curtas ou correr os olhos grandes de curiosidade

ao redor. Três seres esquivos que compõem em torno à mesa a instituição tradicional da família, célula da

sociedade. Vejo, porém, que se preparam para algo mais que matar a fome.

Passo a observá-los. O pai, depois de contar o dinheiro que discretamente retirou do bolso, aborda o garçom,

inclinando-se para trás na cadeira, e aponta no balcão um pedaço de bolo sob a redoma. A mãe limita-se a

ficar olhando imóvel, vagamente ansiosa, como se aguardasse a aprovação do garçom. Este ouve,

concentrado, o pedido do homem e depois se afasta para atendê-lo. A mulher suspira, olhando para os lados,

a reassegurar-se da naturalidade de sua presença ali. A meu lado o garçom encaminha a ordem do freguês.

O homem atrás do balcão apanha a porção do bolo com a mão, larga-o no pratinho – um bolo simples,

amarelo-escuro, apenas uma pequena fatia triangular.

A negrinha, contida na sua expectativa, olha a garrafa de Coca-Cola e o pratinho que o garçom deixou à sua

frente. Por que não começa a comer? Vejo que os três, pai, mãe e filha, obedecem em torno à mesa um

discreto ritual. A mãe remexe na bolsa de plástico preto e brilhante, retira qualquer coisa. O pai se mune de

uma caixa de fósforos, e espera. A filha aguarda também, atenta como um animalzinho. Ninguém mais os

observa além de mim.

São três velinhas brancas, minúsculas, que a mãe espeta caprichosamente na fatia do bolo. E enquanto ela

serve a Coca-Cola, o pai risca o fósforo e acende as velas. Como a um gesto ensaiado, a menininha repousa

o queixo no mármore e sopra com força, apagando as chamas. Imediatamente põe-se a bater palmas, muito

compenetrada, cantando num balbucio, a que os pais se juntam, discretos: “Parabéns pra você, parabéns pra

você…”. Depois a mãe recolhe as velas, torna a guardá-las na bolsa. A negrinha agarra finalmente o bolo com

as duas mãos sôfregas e põe-se a comê-lo. A mulher está olhando para ela com ternura – ajeita-lhe a fitinha

no cabelo crespo, limpa o farelo de bolo que lhe cai ao colo. O pai corre os olhos pelo botequim, satisfeito,

como a se convencer intimamente do sucesso da celebração. Dá comigo de súbito, a observá-lo, nossos olhos

se encontram, ele se perturba, constrangido – vacila, ameaça abaixar a cabeça, mas acaba sustentando o

olhar e enfim se abre num sorriso.

Assim eu quereria minha última crônica: que fosse pura como esse sorriso. Fernando Sabino

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Exercícios

1. Gênero dramático é aquele em que o artista usa como intermediária entre si e o público a

representação. A palavra vem do grego drao (fazer) e quer dizer ação. A peça teatral é, pois, uma

composição literária destinada à apresentação por atores em um palco, atuando e dialogando entre si.

O texto dramático é complementado pela atuação dos atores no espetáculo teatral e possui uma

estrutura específica, caracterizada:

1. pela presença de personagens que devem estar ligados com lógica uns aos outros e à ação;

2. pela ação dramática (trama, enredo), que é o conjunto de atos dramáticos, maneiras de ser e de agir das personagens encadeadas à unidade do efeito e segundo uma ordem composta de exposição, conflito, complicação, clímax e desfecho;

3. pela situação ou ambiente, que é o conjunto de circunstâncias físicas, sociais, espirituais em que se situa a ação;

4. pelo tema, ou seja, a ideia que o autor (dramaturgo) deseja expor, ou sua interpretação real por meio da representação.

COUTINHO, A. Notas de teoria literária. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1973 (adaptado).

Considerando o texto e analisando os elementos que constituem um espetáculo teatral, conclui-se que

a) a criação do espetáculo teatral apresenta-se como um fenômeno de ordem individual, pois não é

possível sua concepção de forma coletiva.

b) o cenário onde se desenrola a ação cênica é concebido e construído pelo cenógrafo de modo

autônomo e independente do tema da peça e do trabalho interpretativo dos atores.

c) o texto cênico pode originar-se dos mais variados gêneros textuais, como contos, lendas,

romances, poesias, crônicas, notícias, imagens e fragmentos textuais, entre outros.

d) o corpo do ator na cena tem pouca importância na comunicação teatral, visto que o mais

importante é a expressão verbal, base da comunicação cênica em toda a trajetória do teatro até

os dias atuais.

e) a iluminação e o som de um espetáculo cênico independem do processo de produção/recepção

do espetáculo teatral, já que se trata de linguagens artísticas diferentes, agregadas posteriormente

à cena teatral.

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2. Pinhão Sai ao mesmo tempo que BENONA entra.

BENONA: Eurico, Eudoro Vicente está lá fora e quer falar com você.

EURICÃO: Benona, minha irmã, eu sei que ele está lá fora, mas não quero falar com ele.

BENONA: Mas Eurico, nós lhe devemos certas atenções.

EURICÃO: Você, que foi noiva dele. Eu, não!

BENONA: Isso são coisas passadas.

EURICÃO: Passadas para você, mas o prejuízo foi meu. Esperava que Eudoro, com todo aquele dinheiro,

se tornasse meu cunhado. Era uma boca a menos e um patrimônio a mais. E o peste me traiu. Agora,

parece que ouviu dizer que eu tenho um tesouro. E vem louco atrás dele, sedento, atacado de verdadeira

hidrofobia. Vive farejando ouro, como um cachorro da molest’a, como um urubu, atrás do sangue dos

outros. Mas ele está enganado. Santo Antônio há de proteger minha pobreza e minha devoção. SUASSUNA, A. O santo e a porca, Rio de Janeiro: José Olympio, 2013 (fragmento)

Nesse texto teatral, o emprego das expressões "o peste" e "cachorro da molest'a" contribui para

a) marcar a classe social das personagens.

b) caracterizar usos linguísticos de uma região.

c) enfatizar a relação familiar entre as personagens.

d) sinalizar a influência do gênero nas escolhas vocabulares.

e) demonstrar o tom autoritário da fala de uma das personagens.

3. Fabiana, arrepelando-se de raiva — Hum! Ora, eis aí está para que se casou meu filho, e trouxe a mulher

para minha casa. É isto constantemente. Não sabe o senhor meu filho que quem casa quer casa... Já

não posso, não posso, não posso! (Batendo com o pé). Um dia arrebento, e então veremos. PENA, M. Quem casa quer casa. Disponível em: www.dominiopublico.gov.br. Acesso em: 7 dez. 2012.

As rubricas em itálico, como as trazidas no trecho de Martins Pena, em uma atuação teatral,

constituem:

a) necessidade, porque as encenações precisam ser fiéis às diretrizes do autor.

b) possibilidade, porque o texto pode ser mudado, assim como outros elementos.

c) preciosismo, porque são irrelevantes para o texto ou para a encenação.

d) exigência, porque elas determinam as características do texto teatral.

e) imposição, porque elas anulam a autonomia do diretor.

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4. São características do gênero dramático:

I. Representam sentimentos e emoções a partir da expressão individual e subjetiva. Nos textos

dramáticos há a predominância de pronomes e verbos na 1ª pessoa e a exploração da

musicalidade das palavras.

II. Nos textos dramáticos o poeta despoja-se do seu “eu” sentimental para atirar-se na direção dos

acontecimentos que o rodeiam. O amor é uma temática, mas na narrativa dramática ele é

abordado em episódios isolados.

III. Os textos dramáticos são produzidos para serem representados, pois a voz narrativa está entregue

às personagens, que contam a história por meio de diálogos ou monólogos sem mediação do

narrador.

IV. O auto, a comédia, a tragédia, a tragicomédia e a farsa integram-se ao gênero dramático.

a) III e IV estão corretas.

b) I e III estão corretas.

c) I e II estão corretas.

d) I e IV estão corretas.

e) II, III e IV estão corretas.

5. Lições de motim

DONA COTINHA – É claro! Só gosta de solidão quem nasceu pra ser solitário. Só o solitário gosta de

solidão. Quem vive só e não gosta da solidão não é um solitário, é só um desacompanhado. (A reflexão

escorrega lá pro fundo da alma.) Solidão é vocação, besta de quem pensa que é sina. Por isso, tem de

ser valorizada. E não é qualquer um que pode ser solitário, não. Ah, mas não é mesmo! É preciso ter

competência pra isso. (De súbito, pedagógica, volta-se para o homem.) É como poesia, sabe, moço?

Tem de ser recitada em voz alta, que é pra gente sentir o gosto. (FAZ UMA PAUSA.) Você gosta de

poesia? (O HOMEM TORNA A SE DEBATER. A VELHA INTERROMPE O DISCURSO E VOLTA A LHE DAR

AS COSTAS, COMO SEMPRE, IMPASSÍVEL. O HOMEM, MAIS UMA VEZ, CANSADO, DESISTE.) Bem,

como eu ia dizendo, pra viver bem com a solidão temos de ser proprietários dela e não inquilinos, me

entende? Quem é inquilino da solidão não passa de um abandonado. É isso aí. ZORZETTI, H. Lições de motim. Goiânia: Kelps, 2010 (adaptado).

Nesse trecho, o que caracteriza Lições de motim como texto teatral?

a) O tom melancólico presente na cena.

b) As perguntas retóricas da personagem.

c) A interferência do narrador no desfecho da cena.

d) O uso de rubricas para construir a ação dramática.

e) As analogias sobre a solidão feitas pela personagem.

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6. Teatro do Oprimido é um método teatral que sistematiza exercícios, jogos e técnicas teatrais

elaboradas pelo teatrólogo brasileiro Augusto Boal, recentemente falecido, que visa à desmecanização

física e intelectual de seus praticantes. Partindo do princípio de que a linguagem teatral não deve ser

diferenciada da que é usada cotidianamente pelo cidadão comum (oprimido), ele propõe condições

práticas para que o oprimido se aproprie dos meios do fazer teatral e, assim, amplie suas possibilidades

de expressão. Nesse sentido, todos podem desenvolver essa linguagem e, consequentemente, fazer

teatro. Trata- se de um teatro em que o espectador é convidado a substituir o protagonista e mudar a

condução ou mesmo o fim da história, conforme o olhar interpretativo e contextualizado do receptor. Companhia Teatro do Oprimido. Disponível em: www.ctorio.org.br. Acesso em: 1 jul. 2009 (adaptado).

Considerando-se as características do Teatro do Oprimido apresentadas, conclui-se que

a) esse modelo teatral é um método tradicional de fazer teatro que usa, nas suas ações cênicas, a

linguagem rebuscada e hermética falada normalmente pelo cidadão comum.

b) a forma de recepção desse modelo teatral se destaca pela separação entre atores e público, na

qual os atores representam seus personagens e a plateia assiste passivamente ao espetáculo.

c) sua linguagem teatral pode ser democratizada e apropriada pelo cidadão comum, no sentido de

proporcionar-lhe autonomia crítica para compreensão e interpretação do mundo em que vive.

d) o convite ao espectador para substituir o protagonista e mudar o fim da história evidencia que a

proposta de Boal se aproxima das regras do teatro tradicional para a preparação de atores.

e) a metodologia teatral do Teatro do Oprimido segue a concepção do teatro clássico aristotélico,

que visa à desautomação física e intelectual de seus praticantes.

7. Sobre os gêneros literários, afirma-se:

I. O gênero dramático abrange textos que tematizam o sofrimento e a aflição da condição humana.

II. Textos pertencentes ao gênero lírico privilegiam a expressão subjetiva de estados interiores.

III. O gênero épico compreende textos sobre acontecimentos grandiosos protagonizados por heróis.

IV. Em literatura, o romance e a novela são formas narrativas pertencentes ao gênero dramático.

Estão corretas apenas as afirmativas

a) III e IV

b) I e II

c) II e III

d) I e IV

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8. E aqui, antes de continuar este espetáculo, e necessário que façamos uma advertência a todos e a cada

um. Neste momento, achamos fundamental que cada um tome uma posição definida. Sem que cada

um tome uma posição definida, não é possível continuarmos. É fundamental que cada um tome uma

posição, seja para a esquerda, seja para a direita. Admitimos mesmo que alguns tomem uma posição

neutra, fiquem de braços cruzados. Mas é preciso que cada um, uma vez tomada sua posição, fique

nela! Porque senão, companheiros, as cadeiras do teatro rangem muito e ninguém ouve nada. FERNANDES, M.; RANGEL, F. Liberdade, liberdade. Porto Alegre: L&PM, 2009,

A peça Liberdade, liberdade, encenada em 1964, apresenta o impasse vivido pela sociedade brasileira

em face do regime vigente. Esse impasse é representado no fragmento pelo(a)

a) barulho excessivo produzido pelo ranger das cadeiras do teatro.

b) indicação da neutralidade como a melhor opção ideológica naquele momento.

c) constatação da censura em função do engajamento social do texto dramático.

d) correlação entre o alinhamento político e a posição corporal dos espectadores.

e) interrupção do espetáculo em virtude do comportamento inadequado do público.

9. O exercício da crônica

Escrever crônica é uma arte ingrata. Eu digo prosa fiada, como faz um cronista; não a prosa de um

ficcionista, na qual este é levado meio a tapas pelas personagens e situações que, azar dele,

criou porque quis. Com um prosador do cotidiano, a coisa fia mais fino. Senta-se ele diante

de uma máquina, olha através da janela e busca fundo em sua imaginação um assunto qualquer,

de preferência colhido no noticiário matutino, ou da véspera, em que, com suas artimanhas

peculiares, possa injetar um sangue novo. Se nada houver, restar-lhe o recurso de olhar em torno

e esperar que, através de um processo associativo, surja-lhe de repente a crônica, provinda

dos fatos e feitos de sua vida emocionalmente despertados pela concentração. Ou então, em última

instância, recorrer ao assunto da falta de assunto, já bastante gasto, mas do qual, no ato de

escrever, pode surgir o inesperado. (MORAES, V. Para viver um grande amor: crônicas e poemas. São Paulo: Cia das Letras, 1991)

Predomina nesse texto a função da linguagem que se constitui

a) nas diferenças entre o cronista e o ficcionista.

b) nos elementos que servem de inspiração ao cronista.

c) nos assuntos que podem ser tratados em uma crônica.

d) no papel da vida do cronista no processo de escrita da crônica.

e) nas dificuldades de se escrever uma crônica por meio de uma crônica.

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10. Você pode não acreditar

Você pode não acreditar: mas houve um tempo em que os leiteiros deixavam as garrafinhas de leite do

lado de fora das casas, seja ao pé da porta, seja na janela.

A gente ia de uniforme azul e branco para o grupo, de manhãzinha, passava pelas casas e não ocorria

que alguém pudesse roubar aquilo.

Você pode não acreditar: mas houve um tempo em que os padeiros deixavam o pão na soleira da porta

ou na janela que dava para a rua. A gente passava e via aquilo como uma coisa normal.

Você pode não acreditar: mas houve um tempo em que você saía à noite para namorar e voltava

andando pelas ruas da cidade, caminhando displicentemente, sentindo cheiro de jasmim e de alecrim,

sem olhar para trás, sem temer as sombras.

Você pode não acreditar: houve um tempo em que as pessoas se visitavam airosamente. Chegavam

no meio da tarde ou à noite.

Contavam casos, tomavam café, falavam da saúde, tricotavam sobre a vida alheia e voltavam de bonde

às suas casas.

Você pode não acreditar: mas houve um tempo em que o namorado primeiro ficava andando com a

moça numa rua perto da casa dela, depois passava a namorar no portão, depois tinha ingresso na sala

da família. Era sinal de que já estava praticamente noivo e seguro.

Houve um tempo em que havia tempo.

Houve um tempo. SANT’ANNA, A. R. Estado de Minas. 5 maio 2013 (fragmento).

Nessa crônica, a repetição do trecho “Você pode não acreditar: mas houve um tempo em que…”

configura-se como uma estratégia argumentativa que visa

a) surpreender o leitor com a descrição do que as pessoas faziam durante o seu tempo livre

antigamente.

b) sensibilizar o leitor sobre o modo como as pessoas se relacionavam entre si num tempo mais

aprazível.

c) advertir o leitor mais jovem sobre o mau uso que se faz do tempo nos dias atuais.

d) incentivar o leitor a organizar melhor o seu tempo sem deixar de ser nostálgico.

e) convencer o leitor sobre a veracidade de fatos relativos à vida no passado.

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Gabarito

1. C O espetáculo teatral possui uma forma específica: é contado a partir da ação dos personagens e do diálogo entre eles. No entanto, a sua temática pode originar-se de diferentes fontes, de diferentes gêneros textuais, como está afirmado na alternativa C.

2. B

No gênero dramático, a história é contada, principalmente, através da fala dos personagens. Dessa forma, analisar o modo como eles falam é importante, muitas vezes, para compreender determinados aspectos da história. As palavras destacadas são características da região nordeste brasileira.

3. B

As rubricas, utilizadas no teatro para a marcação da cena, em itálico constituem possibilidade, já que o texto pode ser mudado, assim como outros elementos, o que mostra que nem sempre os atores seguem as marcações feitas pelos autores.

4. A

Nos textos dramáticos, não há, necessariamente, predominância da 1ª pessoa e, tampouco, a preocupação com a musicalidade. Além disso, não há um poeta e o amor não é, obrigatoriamente, temática desse gênero. Dessa forma, apenas a III e a IV estão corretas.

5. D

O candidato deve ser capaz de entender que as letras em caixa alta revelam as explicações das cenas interpretada pela personagem Dona Cotinha – fazendo o uso de rubricas.

6. C

Uma das principais finalidades do Teatro do Oprimido é apresentar ao cidadão espectador uma visão mais nítida da própria realidade. A encenação de fatos do cotidiano e o uso de uma linguagem que não seja diferenciada da de um cidadão comum faz com que, por meio do jogo teatral, ator espectador possam interpretar e refletir sobre a situação vivida.

7. C

O gênero dramático diz respeito aos textos que foram escritos para serem encenados. O romance e a novela pertencem ao gênero narrativo.

8. D

01 de abril de 1964 foi quando se instaurou a Ditadura Militar e, antes dela ou mesmo naquele comecinho (o AI-5 só foi promulgado no final desse ano, por exemplo, e não é possível saber quando exatamente a peça foi escrita), não era possível prever com clareza o que aconteceria se você assumisse uma posição política contrária à oficial. Por conta disso, as pessoas evitavam assumir posicionamentos claros, precisando esconder o que de fato pensavam. Esse é o fato denunciado pelo texto: a voz narrativa (simbolizando o Estado) pede que cada um assuma uma posição definitiva, pois o barulho de ficar mudando de posição impede que a peça (ou, metaforicamente, o Governo) ande, mas as pessoas, naquele momento de enorme instabilidade política, tinham medo de assumirem uma posição clara e serem perseguidas por ela. A letra “C” é a que explicita esse impasse, pois ao falar de censura em função do engajamento fala sobre o perigo de se falar o que pensa numa sociedade que não sabe respeitar a diversidade de posicionamentos.

9. E

No texto, predomina a função da linguagem metalinguística, já que a mensagem é centrada na discussão sobre seu próprio código. No texto, uma crônica é utilizada pelo cronista para explicar algumas das dificuldades encontradas por quem escreve esse gênero textual.

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10. B A estratégia argumentativa busca sensibilizar o leitor por meio da repetição da estrutura “você pode não acreditar, mas houve um tempo” em que esse tempo faz referência a uma época considerada mais prazerosa que o tempo atual.