352
RETRATO DE PORTUGAL

Retrato de Portugal

Embed Size (px)

DESCRIPTION

RETRATO DE PORTUGALFactos e AcontecimentosCoordenação de António ReisInstituto Camões, Círculo de Leitores, Temas & Debates2007

Citation preview

RETRATODEPORTUGALCoordenaodeAntnioReisRETRATODEPORTUGALFactoseacontecimentosCAPA E DESIGN GRFICO:Fernando Rochinha DiogoCARTOGRAFIA:Fernando PardalREVISO TIPOGRFICA:Fotocompogrfica, Lda.COMPOSIO:Fotocompogrfica, Lda.FOTOMECNICA:Fotocompogrfica, Lda. Instituto Cames, Crculo de Leitores, Temas & DebatesPrimeira edio para a lngua portuguesaImpresso e encadernado em Abril e Maio de 2007por Printer Portuguesa, Ind. Grfica, Lda.Casais de Mem Martins, Rio de MouroEdio n.o7057Depsito legal n.o257 837/075SumrioSumrio%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%Prefcio 7 Apresentao 10 Introduo 12 O Estado 21 SociedadeA sociedade 43 O territrio 80 A lngua portuguesa 101 A comunicao social 114 A sociedade do conhecimento e da informao 131 O desporto 170 O ambiente 181 A economia 203 A educao 227 CulturaO patrimnio cultural 249 A literatura 264 A arquitectura 275 As artes visuais 285 As artes do espectculo 297 O cinema 314 Design e moda 321 Bibliografias 337 Autores 345 Crditos fotogrficos 351 7PrefcioPrefcio%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%Manuel Lobo AntunesSecretrio de Estado Adjunto e dos Assuntos EuropeusAterceira Presidncia portuguesa da Unio Europeia (UE), em 2007 (depois de 1992 e2000), ser, assim o esperamos, mais um marco na nossa participao no projectode integrao europeia, assinalando o nosso empenho e a nossa convico no idealeuropeu, com ambio, maturidade e realismo.Muito se alcanou ao longo destas duas dcadas de reencontro de Portugal com a Europa.Consolidmos e aprofundmos a nossa democracia. Logrmos notveis progressos no tocanteao desenvolvimento econmico e construo de uma sociedade mais justa e solidria.Importa no esquecer donde partimos. Enquanto os nossos parceiros europeus construama paz europeia, na base da liberdade, da democracia e da prosperidade partilhada, Portugalesteve margem, orgulhosamente s, pobre, iletrado, amordaado e obcecado pelo sonhoda manuteno, pela fora militar, de um imprio do Minho a Timor, num tempo em que era im-possvel parar os ventos da autodeterminao (dos Portugueses e dos povos colonizados).A revoluo do 25 de Abril de 1974 inaugurou uma nova vaga democrtica, no s naEuropa (Portugal e Espanha), mas tambm na Amrica Latina. Com a revoluo pudemosvoltar a olhar para a Europa, iniciando um caminho que deixou bem claro que no poderiahaver Europa sem Portugal e Espanha.Apesar da enorme melhoria das condies econmicas e sociais em Portugal, no hou-ve propriamente um milagre europeu. No Portugal de hoje persistem ndices e factores deexcluso e desigualdade que nos devem preocupar e mobilizar para a conquista de novasmetas,designadamenteoreforodasociedadecivil,tendoemvistaumacidadaniamaisactivaecriativa,nosplanospoltico,econmicoecultural.Portugalhojeumpaslivreecertamente mais prspero do que era, mas persistem alguns atavismos que no desapare-cem no espao de uma gerao. A construo de uma sociedade livre, responsvel e em-penhada uma tarefa diria. Porm, inegvel que temos hoje oportunidades que so in-comparveis em relao ao Portugal de antanho.SinalevidentedamudanaquePortugalsetornoutambmnumpasdeimigrao.A maioriadessesimigrantestemdadoumimportantecontributoparaodesenvolvimentoeconmico de Portugal, e nossa obrigao garantir que a sua integrao se faa nas con-dies que desejamos e defendemos igualmente para os emigrantes portugueses, nomea-damente na Europa.H quem argumente que os fundos europeus so o equivalente moderno das especia-rias da ndia ou do ouro do Brasil, que em Portugal a riqueza sempre passou, mas nunca sefixou, e que no h razo para que a histria mude.Ora eu creio que a histria j mudou. Da Europa no vieram s os fundos com que seconstruram as auto-estradas e os carros de grande cilindrada. A participao na aventuraeuropeia trouxe-nos algo muito mais importante: um novo sentimento de pertena na edifi-cao do mais ambicioso projecto de comunidade poltica e econmica escala mundial.Confrontou-nos com uma nova exigncia colectiva, um novo desgnio, que a todos mobiliza 8PrefcioEstado, empresas e cidados. A Europa imps-nos uma emulao saudvel. Puxou por ns.Obrigou-nos comparao e competio com sociedades abertas e dinmicas.A nossa condio de pas perifrico, em relao ao centro poltico e econmico da UE(que se deslocou para leste), obriga-nos, por outro lado, a estar presentes em todos os n-cleos de vanguarda da integrao europeia. Trata-se de um imperativo estratgico: estar nocentro da deciso europeia, participar, mold-la na medida das nossas capacidades edos nossos interesses e beneficiar da mudana. Este objectivo tem sido plenamente al-canado.Aocontrriodoshabituaisprofetasdadesgraanacional,orgulho-medosresultadosque alcanmos em apenas duas dcadas.A nossa identidade colectiva sai sempre reforada quando submetida ao confronto aber-to. Encaro com confiana o futuro de um povo que singrou no mar vasto e desconhecido, eque construiu a histria de uma nao que caminha para os seus nove sculos, e cuja ln-gua falada por 240 milhes de pessoas no mundo (a terceira da Europa ocidental, a seguirao ingls e ao espanhol, e bem frente do francs e do alemo).O crescimento e a vitalidade da lngua portuguesa, nos seus vrios sotaques (aucara-do, crioulo e continental), em termos de nmero de falantes, de obras publicadas, de con-tedosnaInternet,depalavramusicada,etc.,garantemaperenidadedanossaculturaeidentidade, j no exclusivamente portuguesa, mas como membro de uma famlia maior, re-sultadodosnossoslaosmiscigenados,quenosasseguramumaidentidadeprprianummundo cada vez mais padronizado e compressor das especificidades culturais. Que melhorhomenagem poderia ser feita a Cames, verdadeiro fundador da lngua e arauto da sua vo-cao universalista?A Europa tambm ganhou com a adeso de Portugal: no apenas a mera extenso domercado interno, no apenas a adio de mais dez milhes de consumidores para os pro-dutos dos outros pases da UE. A Europa reencontrou-se com um pas que apresentou a Eu-ropa a muitas partes do mundo e que, em virtude do peso da sua histria e da sua cultura,, entre os pases de semelhante dimenso, um dos muito poucos que se podem afirmar co-mo um actor global.A integrao europeia teve um impacto muito significativo na nossa poltica externa.Mudou, desde logo, os hbitos de uma diplomacia que era puramente defensiva e orien-tada para a preservao do regime de ento e do imprio colonial.AlterouprofundamenteanossarelaocomEspanha.AotempodeSalazareFranco,entre Portugal e Espanha no havia praticamente nem estradas nem pontes. Os dois ditado-res apoiaram-se mutuamente em momentos-chave (sobretudo quando os respectivos regi-mes estiveram em perigo, face ao desenrolar do conflito mundial), mas suspeitavam profun-damente um do outro, mantendo-se fiis tradio de desconfiana secular. Hoje Portugale Espanha so parceiros incontornveis na UE. As nossas economias esto profundamenteinterligadas e abriram-se novas perspectivas para o reforo da cooperao, no apenas noplano bilateral mas tambm no plano externo (por exemplo na Amrica Latina e no Magre-be), com benefcios mtuos cada vez mais evidentes.A Europa amplificou o nosso poder de influncia no mundo. Sem um Portugal plenamen-te integrado na Europa, muito provavelmente no teria havido autodeterminao do povo deTimor Leste (nem tampouco a UE poderia ter tido uma palavra a dizer num processo que,no obstante as dificuldades actuais, ficar registado como um caso de sucesso na histriadas Naes Unidas).A nossa adeso ajudou-nos a restabelecer os laos com os parceiros africanos, depois9Prefciodos traumas da descolonizao. As nossas relaes com os pases africanos encontram-sehoje num novo patamar, e a isso no certamente indiferente o facto de esses pases sabe-rem que Portugal o seu advogado natural junto da UE.As prprias relaes com o Brasil, sobretudo no plano econmico, beneficiaram de umnovoimpulsoapsaadesodePortugalUE(emrespostaaoapelodoentoprimeiro--ministro, engenheiro Antnio Guterres, as empresas portuguesas investiram fortemente noBrasil,demodoaganharadimensoquelhespermitiriaresistirmelhorcompetiodomercado interno europeu; por outro lado, os investidores brasileiros tm vindo progressiva-mente a tomar conscincia de que uma empresa brasileira criada em Portugal se torna umaempresa europeia, da retirando todas as vantagens que o espao econmico europeu po-de oferecer).Aintegraoeuropeiaabriu-nostambmasportasaoaprofundamentodasrelaescom novas reas prioritrias para a UE (como as relaes com a Rssia, o Mediterrneo e oMdio Oriente) e aos grandes temas da diplomacia multilateral, em que a UE tem um pesonico (no qual podemos projectar os nossos interesses, beneficiando do efeito multiplicadoreuropeu).A Presidncia portuguesa da UE em 2007 ter de se defrontar com uma fase de algumdesencanto europeu. A crise que existe se que de verdadeira crise podemos falar antes uma crise de expectativas, porventura de falta de ambio e de dvidas quanto ao fu-turo do projecto europeu.Vejo esta actual melancolia europeia como uma fase transitria, como uma oportunida-de. O inconformismo esse trao fundamental do carcter dos povos europeus exigirque a breve trecho os nossos responsveis polticos busquem novas respostas para os de-safios do mundo de hoje, aos quais s poderemos fazer face atravs de solues colecti-vas, fiis aos princpios da solidariedade e da coeso europeia.Esta fase de incerteza quanto ao futuro do projecto europeu ser ultrapassada, porqueas circunstncias histricas assim o exigiro. No possvel adiar indefinidamente o debatee a definio de novas polticas e instrumentos no tocante a questes como o papel da Eu-ropa no mundo (e tambm os seus limites), o aprofundamento da coeso econmica e so-cial, a coordenao econmica (no basta uma moeda comum), a fiscalidade, a energia, oambiente ou as migraes.Por vezes ignoramos inclusivamente o que a Europa representa para tantos. Refastela-dos no nosso conforto, ciosos dos nossos privilgios, esquecemo-nos de que a Europa ,cada vez mais, sinnimo de esperana, neste mundo injusto, inseguro e desregulado, emque muitos so pura e simplesmente desorbitados do processo de globalizao econmica.Como temos visto, aqui bem perto de ns, a Europa encarna um sonho pelo qual muitos es-to dispostos a morrer. com convico nesta ideia e cientes do que ela significa para tantos, europeus eno europeus que abraaremos a tarefa de presidir, durante seis meses, UE. Espera-mos poder contribuir para o seu aperfeioamento, que permanente e que se vai concreti-zando passo a passo. F-lo-emos concentrando-nos naquilo que nos pode unir e conduzir auma Unio mais forte, mais til e com vantagens palpveis para a vida dos cidados euro-peus e tambm para o resto do mundo. Parece-me que esta uma empresa digna, e quemerece o empenho de todos os portugueses que nela queiram colaborar.10ApresentaoApresentao%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%Simonetta Luz AfonsoPresidente do Instituto CamesOInstituto Cames instituio tutelada pelo Ministrio dos Negcios Estrangeiros tem por misso a promoo e a difuso da lngua e cultura portuguesas no mun-do. No ano de 2007, em que Portugal presidir, no 2.osemestre e pela 3.avez, aoConselho da Unio Europeia, o Instituto Cames ir desenvolver um programa especfico deactividades, bem como colaborar com inmeras entidades nacionais e estrangeiras na reali-zao de aces especiais.Neste contexto, pareceu-nos indispensvel criar algumas peas que funcionassem co-mo segmentos dum fio condutor para a comunicao duma imagem qualificada do nossopas, construda a partir das suas grandes realidades, factos e instituies.Dentrodesteesprito,oenormesucessoeinteressesuscitadosporumaobralanadaaquando da Exposio Universal de Hannover Portugal 2000 levaram-nos agora suaactualizao e reedio. O grande xito assentou na forma como apresentava a outros po-vos e naes e relembrava aos prprios portugueses as nossas especificidades hist-ricas e culturais e as frmulas encontradas para se organizar e reger a vida em sociedade.Tratou-se duma pea de referncia, ensastica, informativa e didctica, fruto dum reptolanado a Antnio Reis, historiador e reconhecido especialista do sculo XX em Portugal, pa-ra coordenar uma obra voltada para o exterior, em que a anlise da evoluo da sociedadeportuguesa, da sua economia e das suas instituies seria complementada por uma panor-mica do renascimento cultural ocorrido desde 1974 at ento o retrato deste pas em mu-dana no ltimo quartel do sculo XX.Como parmetros temporais para essa anlise, impunha-se proceder de forma adequa-da a uma sntese desse percurso. Aos autores de cada captulo, especialistas e investiga-dores universitrios de alto mrito, pediu-se a concentrao em dois momentos-chave destametamorfose: o 25 de Abril e o final do milnio, em que o pas investe decididamente na for-mao e na educao, no desenvolvimento de novas competncias e no crescente acessoaos domnios mais elevados do conhecimento.Durante este perodo verificaram-se em Portugal extraordinrias evolues e mudanasde incontornveis efeitos, consequncia do reencontro nacional com a liberdade e a demo-cracia, e duma nova atitude comunicante, participativa e empenhada no dilogo internacio-nal,igualmenteenaturalmentemarcadaspelaadesoUnioEuropeia,em1986.Numapoca de grandes alteraes escala planetria, tratou-se de um ciclo de impetuosa trans-formaoanveldoterritrionacional,dosseushabitantesetodososgrandessectores,desde o econmico ao cultural, aqui com manifestas e inovadoras frmulas criativas daarquitectura ao cinema, da literatura cincia, da msica s artes plsticas e performativas.11ApresentaoRetomado o projecto, apresenta-se agora uma viso das ltimas trs dcadas. Mais umavez, e tambm pela necessidade da actualizao da obra, se prova a permanente evoluodo pas, as novas coordenadas, os novos dilogos, parceiros, inspiraes e esperanas.O peso especfico da lngua portuguesa, expresso oficial de 200 milhes de habitantesdo planeta mas tambm lngua de trabalho e de cincia em fruns internacionais, o xito ereconhecimento extramuros de autores e artistas de inspirao contempornea e as exposi-es em instituies de renome nas principais capitais mundiais so demonstraes do in-teresse e da importncia da defesa e promoo duma imagem de Portugal antigo e moder-no, pioneiro duma globalizao que agora se implementa.Esperamos,pois,queestaobrarenovadacontribuaparaummelhorconhecimentodePortugal e dos seus valores e que, atravs dela, se demonstre com impacto e dignidade oseutrajectonorumodaexpresso,dademocratizao,dadefesadosdireitoshumanos,das novas tecnologias e meios de comunicao, das energias renovveis e das preocupa-es ambientais, indubitavelmente traados pelo sculo XX para um novo milnio e, espera-mos, um Novo Mundo.Ao Prof. Antnio Reis e a todos os que colaboraram neste trabalho o meu reconhecimen-to, bem como Misso para a Presidncia Portuguesa do Conselho da Unio Europeia, queem boa hora o integrou nos seus projectos especiais.12IntroduoIntroduo%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%Antnio ReisTrinta e trs anos depois do derrube damaislongaditaduraeuropeiados-culoXX logoseguidadofimdomaisantigoimpriocolonialeuropeuedaimplantao,numacidentadomasrpidopercurso de dois anos, de uma democraciaparlamentar,evinteeumanosdepoisda integrao europeia, Portugal hoje umpas diferente. Um pas que viveu num pra-zo de tempo de uma gerao o que a ge-neralidadedosseusparceirosdaUnioEuropeia (a 15) viveu em mais de meio s-culo,equeenfrentahojedesafiosseme-lhantes.Eumasociedadeemacentuadoprocessodemudana,embuscadendi-cesdedesenvolvimentoestruturalidnti-cosaosdassociedadesmaisavanadasdo seu espao geopoltico. o retrato deste pas em mudana, emmeados da primeira dcada do sculo XXI,que aqui, pois, pretendemos deixar esbo-ado. Um retrato que no pode, porm, ig-norar as condicionantes do passado maisou menos longnquo nem to-pouco deixardeinterrogarosdesafiosdofuturoprxi-mo.Umretratosujeito,pois,sleisdaperspectivanasuadimensotemporal.Quemmudamudasempredealgoparaalgo.Emsuma,poderamosdesdejfor-mularumaduplaeambiciosainterroga-o:dondevemPortugal,paraondevaiPortugal?No dispondo de uma clara individuali-dadenaturalnoconjuntodaPennsulaIbrica nem de uma homogeneidade geo-grfica interna, sem sequer poder reivindi-carumabasetnico-culturalprpria,Por-tugalfoiumaconstruodoshomens,eno da Natureza, como bem demonstrouJosMattoso(inAIdentidadeNacional,1998).FrutodavontadedosbaresdoCondadoPortucalensenosegundoquar-tel do sculo XII, o seu prprio nome reme-te para um centro administrativo na foz dorio Douro e no para um povo, como acon-tece com a Alemanha, a Frana ou a Ingla-terra. A sua identidade , pois, obra de umEstado e de uma administrao centraliza-da no poder rgio, cujo territrio se consti-tui ao longo de sculo e meio, entre 1096 e1249,numaduplaluta:contraovizinhoreino cristo de Leo e Castela e contra oIslo, cujo domnio se estendia inicialmen-teataorioDouro.ComaconquistadoAlgarve naquela ltima data, as suas fron-teiras no continente europeu manter-se-odesdeentopraticamenteintactas,numcasorarodeestabilidadeecontinuidadeterritorial,eantecipando-se,assim,emmais de dois sculos unificao do Esta-do espanhol.ComocompreenderquePortugalte-nhaescapadoaestalgicaunificadoradoespaoibrico,quenopoupouterri-trios to ou mais individualizados como aCatalunhaouoPasBasco?Fazendova-ler, primeiro, o seu estatuto de reino cris-toempenhadonocombatepresenamuulmananaPennsulaIbrica,mano-brando,depois,habilmenteentreoscon-flitosdosdiversosreinospeninsulareseestabelecendo,em1373,umaalianacom a Inglaterra, que lhe foi preciosa quan-do a sua independncia se viu seriamenteameaada,porrazesdinsticas,pelopoderosovizinhocastelhanoem1385,13IntroduoPortugal lana-se, em seguida, na grandeaventuradaexpansomartima,apartirde 1415, com a conquista de Ceuta no Nor-te de frica. E saindo da Pennsula e daEuropaerepartindo-sepelomundoque,afinal, garantir a prazo a sua individualida-de poltica tanto na Pennsula como na Eu-ropa.Tendonasuaorigemumcomplexoconjunto de motivaes econmicas, pol-ticasereligiosas,cujahierarquizaofoimotivoparaacerbaspolmicasentreoshistoriadores,ocertoqueaconstruodoimprioportugus,nasuaprimaziacronolgica e na especificidade das suascaractersticas,contribuirdecisivamenteparaumasingularrelaodosPortugue-ses com eles prprios e com os restantespovos.Econstitui-se,porissoeanossover,emsegundoepoderosofactordeidentidade e coeso, apesar de, ou talvezmesmoporque,marcadopelamesmain-trnseca fragilidade que estivera na origemdo prprio reino portugus. O grande poe-mapicodeLusdeCames,noporacaso intitulado Os Lusadas, a est parao confirmar e, simultaneamente, para acen-tuar esse lado de quase fico ou de irrealcomqueosPortuguesesviveramasuaaventuramartimaeasuagrandezaimpe-rial, como Eduardo Loureno to bem sou-be assinalar (O Labirinto da Saudade: Psi-canlise Mtica do Destino Portugus, 1978,pp. 22-23).Fragilidadeeficoqueiroconhecera sua imediata confirmao no episdio datransitriaperdadaindependnciaem consequnciadamorteemcombate,em1578,dojovemreiD.SebastioemMarrocosedaimposiodosdireitosdi-nsticosdeFilipeIIdeEspanha,bemcomonosubsequentefenmenodames-sinica crena no regresso do rei desapa-recido.A recuperaodaindependnciaem 1640 j no conseguir apagar uma talvisoprofticaemessinicadasuahist-ria, que um padre Antnio Vieira, nessa se-gunda metade do sculo XVII, ir traduzir nasua concepo de Portugal como uma na-o eleita e do seu imprio como o QuintoImprio, o de Cristo. Nem to-pouco permi-tirasuperaodoestatutodenaosu-balterna, com a agravante de se acentuar oprocesso de isolamento cultural em relao Europa, que a instaurao da Inquisioem 1536 viera iniciar e a fidelidade Con-tra-Reforma aprofundara.Ao longo do sculo XVIII, Portugal vivernuma atitude complexa de repulsa e atrac-osimultneaemrelaoEuropadasLuzes, ao mesmo tempo que o eixo de gra-vidadedoseuimpriosedeslocadoOriente para o Brasil, cujo ouro ir alimen-tarumaprosperidadeilusria.Fascinadocom D. Joo V pelas manifestaes artsti-casdaEuropaeatpelassuasmodas,sensvelcomomarqusdePombalaosprogressosdascinciasenecessidadede um desenvolvimento econmico autno-mo,dividido,depois,entreoprossegui-mento de uma via reformadora e a reacoconservadora de D. Maria I, Portugal nave-garnestesculoentreosapelos,cuida-dosamentefiltrados,dosseusestrangei-radosmoderni zaoeuropei aeadesconfiana e mesmo a hostilidade de umconservadorismocatlicoavessoinova-o, numa subtil e delicada dialctica entreas Luzes e as Trevas.Com as invases napolenicas e a fugada corte para o Brasil, Portugal parece pro-curar a sobrevivncia fora de si, promoven-doaprincipalcolniaasededoimprioat 1821. At meados do sculo XIX, sujeitoprimeiro tutela britnica, mergulhado de-poisnanicaverdadeiraguerracivildasua histria, entre liberais e absolutistas, enos posteriores conflitos entre as diferentesfacesliberais,Portugalexperimentaafragilidadedasuaindependncianaba-lana da Europa, ao mesmo tempo que osseus romnticos Garrett e Herculano o procuram refundar nas suas razes cultu-raisehistricas,pelapoesia,peloteatro,14Introduopelo romance e pela prpria histria comocincia.Empenhadonasegundametadedeste sculo em no perder o comboio eu-ropeu do desenvolvimento industrial, , po-rm, com pessimismo que a sua elite inte-lectualdeentoencaraadistnciaqueoseparadamodernidadeeuropeia,assimprolongando em novo contexto a dialcticaentre as Luzes e as Trevas.EntreaperdadoBrasilem1822transformado,alis,emimprioentregueaofilhodoseuprpriorei,numaoriginalseparaobemdiferentedadascolniasespanholas da Amrica e o incio do so-nhoafricanonofinaldosculo,Portugalbuscaumanovaformadeexistir,envoltonum inquieto clima de insegurana e auto--interrogaosobreoseudestino.AnterodeQuentaleOliveiraMartins,cadaumsua maneira, procedem ento a uma esp-cie de ajuste de contas com a nossa hist-ria,numprocessosumriodequesaemcondenados o catolicismo jesutico e inqui-sitorial,oabsolutismorgiocentralistaeoprprio imprio ultramarino. Mas divergironaalternativa,atradospelautopiasocia-lista o primeiro, pela utopia de um cesaris-mo rgio o segundo, ambos comungando,assim,nadesconfianarelativamenteaorepublicanismoparlamentarquecomea-va ento a espreitar no horizonte. Ser es-te,todavia,quesairvencedorem1910,aproveitando o descrdito da Coroa e sa-bendocavalgarnahoracertaaondana-cionalistadesencadeadapeloUltimatobritnico de 1890, que intimara Portugal acederosterritriossituadosentreAngolae Moambique.Entre o renascer da mstica nacionalista,comoseufrutoimediatonosonhodeumimprioafricano,eanecessidadedeace-leraramodernizaoeuropeiadopas,aRepblicavivermergulhadanumacon-tradiodifcildesanar.EmvoosseusmelhoresintelectuaisosseareirosAntnioSrgio,RaulProena,JaimeCor-tesotentarosegurarasduaspontasdameada,combatendosempre,certo,as verses mais radicais desse nacionalis-mo, dessem elas pelo nome de saudosis-mocomTeixeiradePascoais,aindanocamporepublicano,oudeintegralismolusitanocomAntnioSardinha,jnocampo monrquico. E em vo tentaro sal-vararepblicademocrtico-parlamentarda sua vertiginosa corrida de 16 anos parao abismoditatorial,propondoingenua-mente a subordinao dos partidos e dosdirigentespolticosaumaelitedesbiosdetentores do segredo das melhores refor-masinstitucionais,econmicaseeducati-vas para o pas.Ainstabilidadegovernativa,osinteres-sesdaoligarquiafinanceira,afragilidadedo tecido econmico e social na sequnciada crise financeira do ps-Primeira GuerraMundial abrem caminho soluo ditatorialpela mo do Exrcito, que acabar por en-tregaropoderaumacadmicoconserva-dor,deformaocatlico-tradicionalista,especialistaemfinanasepoliticamenteambiciosoOliveiraSalazar.Comeleamsticanacionalista,desconfiadadaEuro-padasdemocraciasliberaiseferozmenteanticomunista, ser usada como instrumen-toaoserviodeumEstadoforteedeumpoder autoritrio e centralizado, que fez deumcorporativismomitigadoosucedneodo regime de partidos e encarou o desen-volvimento econmico com reserva mental.E comeleoimprioserusadonoape-nascomoinstrumentodesobrevivnciapoltica pessoal mas tambm como escudoda civilizao crist e ocidental, numa vi-soquedesafiavaostensivamenteosventosdaHistriaelevavasltimasconsequncias, incluindo as de ordem jur-dico-constitucional, a mstica de um Portu-galpluricontinental,estendendo-sedoMi-nhoaTimor.NahoradoTerceiroMundo,erafatalqueumtalsonho,afinalumoutromododesentiroimpriocomofico,sevolvesseempesadeloedesseorigemaum despertar convulso e confuso.15IntroduoSeaparticipaoportuguesanaPri-meiraGuerraMundial,pelosseusefeitosperversosnodomniofinanceiroeinstitu-cional,foiemgrandeparteresponsvelpelo rpido declnio e queda do regime re-publicano,asguerrascoloniaisemAngo-la,MoambiqueeGuin,entre1961e1974, foram por sua vez a causa determi-nantedaquedadoregimeditatorialdochamado Estado Novo. Em 1974 como em1926,asForasArmadasintervinhamem nome das exigncias de uma difusa einteriorizada opinio pblica que, num ca-socomonooutro,exprimiamaisumare-cusa do status quo do que uma alternativapoltico-ideolgicapredefinida.Ese,des-tafeita,assumemocompromissodains-taurao de um regime democrtico parla-mentarepluralista,nemporissodeixamde se mostrar seduzidas num primeiro mo-mento, graas ao activismo de uma mino-ria,pormodelosrevolucionriosterceiro--mundistas,queprocuravamcombinarasuareconversoemexrcitodeliberta-o com o recalcado comunista de d-cadas. Portugal correu o risco, nesse agi-tado perodo de 1974-1975, de sair de umanacronismo histrico para tombar noutro.O vanguardismorevolucionrio-militares-barrou,porm,comprofundasresistn-cias de mentalidade de largos estratos dapopulao,eficazmentemobilizadospe-lospartidosdemocrticos,comossocia-listasdeMrioSoarescabea,epelaIgreja Catlica.Consumadaemcurtssimoprazodetempoadescolonizao,comaindepen-dnciatotalparaasantigascolniascomexcepodeTimorLeste,queseviuanexado pela Indonsia at 1999, e de Ma-cau,quesemantevesobadministraoportuguesaat20deDezembrode1999,poracordocomaRepblicaPopulardaChina , nem por isso ela foi sentida comoum drama, se exceptuarmos o meio milhoderetornados,noentantologoreintegra-doscomumasurpreendenterapideznasociedade portuguesa. O trauma das guer-ras coloniais fora, afinal, mais forte. E o po-tencialtraumadofimdociclodemaisdecincosculosdeimpriover-se-ia,ento,facilmentesublimadopeloempenhamentonatransiodemocrticacomtodososseusconflitosideolgicos,primeiro,naconstruo de um destino europeu, com aintegraonaComunidadeEuropeia,de-pois.No ter sido esta a ltima e derradeiraconfirmao do que houve de onrico e fic-cionalnaaventuraimperialdosPortugue-ses, como Eduardo Loureno tem vindo aacentuar? Uma aventura imperial que, afi-nal de contas, raros e modestos sinais ex-teriores de poder produziu no seu territrioeuropeuenasuaprpriacapital.OndeestamonumentalidadedeLisboacom-paradacomadassedesdeoutrosimp-rioseuropeus?Asuamajestaderesidemaisnesseseumagnficoesturio,comoque a impelir-nos para o mar Atlntico, doque nos seus edifcios, de onde se desta-cammaisosmosteirosdoqueospal-cios.Talcomonorestodopas,comomostram os casos de Mafra e Tomar. Sin-tomaticamente, como se o imprio estives-sesempreforadensefossedaordemdo milagre...Regressado a si prprio e reencontradocomaliberdade,Portugallanou-senosbraosdaEuropa,comoentusiasmoeo frenesidequemprocuravarecuperarotempo perdido nessa espcie de fuga de siprprioedostemposdoisolamentosala-zaristaedasguerrascoloniais.Comoquedando razo, com um sculo de atraso, aoprograma das Conferncias do Casino dosintelectuais da Gerao de 70 e, com meiosculodeatraso,aosapelosdosintelec-tuaisseareiros.Foiasuareconciliaocom o esprito de abertura que, em Quatro-centos,olanounaaventuradasdesco-bertas, mas que, em Novecentos, acabaraporfech-lonumaredomadevidroimuneaos novos tempos, aps sculos de oscila-16Introduoo entre uma atitude de isolamento e essaatitude de abertura.Asexignciasdaparticipaodecor-pointeironaconstruodaUnioEuro-peia comandam, desde ento, as mudan-asemcursonosdiferentesdomniosdasociedade portuguesa, como amplamentesedocumentaaolongodossucessivoscaptulosdestaobra.Mudanasopera-das,alis,emcurtssimotempo,levandoPortugalafazerem20ou30anosoqueos outros pases europeus fizeram ao lon-go de 50 ou 60, apesar dos atrasos aindaevidentes nos planos econmico e educa-tivo. Sem que, como assinala Antnio Bar-reto (Portugal na periferia do centro: mu-danasocial:1960a1995,inAnliseSocial, n.o134, 1995, 5.o), to numerosas ebruscas viragens lhe tenham causado ver-tigem,graasaumanotvelcapacidadedeadaptaoeabsorodeconflitos.Mudanasqueaindanoforamsuficien-tes,porm,paraanularatensolatenteentreasexpectativaseavontadeconsu-mista dos Portugueses, ao nvel dos euro-peusdospasesmaisdesenvolvidos,eainferioridadedotecidoeconmicoepro-dutivo,dascompetnciastecnolgicaseda experincia competitiva, que torna Por-tugalnomaisperifricodospasesdocentro, com as aspiraes deste e as de-bilidadesdaquele,comosublinhaomes-moautor(Portugal:1960/1995:Indicado-res Sociais, 1996).Pasdepobrescommentalidadederi-cos,comodesdeasdescobertastantasvezes nos descobrimos? Uma tal dicotomiajnodcontadainegvelmelhoriadosndices econmicos, sociais e culturais en-tretantoverificada,quevemrelativizaraalegadapobrezasemignorarasubsistn-ciadeaindapreocupantesndicesdeex-clusoeiliteracia,afragilidadedoactualEstado-providnciaeapermannciadesignificativasassimetriasdedesenvolvi-mentoregional.Deumacoisaesto,po-rm, hoje os Portugueses certos: de ques no mbito da Unio Europeia, e enquan-toseusparceirosactivoseintervenientes,poderorecuperarosatrasosqueaindaexperimentameenfrentarosdesafiosdaglobalizaoeconmicaedasnovastec-nologias.Seria,todavia,demasiadoempobrece-dor reduzir o destino de Portugal, ao cabodeumaaventurahistricadequasenovesculos, a uma simples nivelao pelos n-dicesdedesenvolvimentoestruturaleuro-peus.ComosugereAugustoSantosSilva,a dialctica do dfice e da dissidncia emrelaoEuropa,que,comovimos,tantomarcouanossacultura,podeedevesersuperada por uma atitude de diferena co-municante (in Parte Devida, 1999, pp. 213--214). Uma atitude que, em certa medida, altimaExposioUniversaldeLisboaem1998simbolizou,aouniracapacidadederealizao e o esprito de modernidade eu-ropeusaberturaaomundo,eaoligaranossamemriadosoceanosaodesafiouniversaldasuapreservaoambiental.Umaatitudequedeve,porm,ultrapassara passividade acrtica e estimular sempre aafirmao de uma identidade nacional pr-pria,atravsdavalorizaodopatrimnioe da criatividade cultural e artstica, j queno h identidade possvel sem memria esemimaginrioprprios.Umaatitudequedevefazerdapolticalusfona,noplanoexterno,edumaeficazpolticadeintegra-o dos imigrantes, no plano interno, a pon-te entre a vocao universalista do passadoe a afirmaointernacionaldopresente.ParaqueoinevitvelenfraquecimentodoEstado nacional no arraste consigo a dilui-o dessa identidade de que ele foi o prin-cipal agente construtor. Para que a globali-zaoincontornveleasociedadedeinformaonecessrianonostransfor-mem nos clones uns dos outros e, em l-tima anlise, numa Amrica menor. E paraquearealistaocupaodonossolugarprprionaEuropanonosimpeadesa-ber quem somos, afinal, como destino.17IntroduoAsreflexesconstantesdestaintrodu-odevemmuitoaodilogointeriorquemantive com Eduardo Loureno (O Labirin-to da Saudade: Psicanlise Mtica do Desti-no Portugus, 1978, e Portugal como Desti-noSeguidodeMitologiadaSaudade,1999) e Jos Mattoso (Identificao de UmPas,1985,Portugal:OSabordaTerra,1998,e AIdentidadeNacional,1998).Co-mobvio,nenhumdelespodeserres-ponsabilizado por todas as opinies e inter-pretaes que aqui deixei esboadas.Tambmoscolaboradoresdestelivro,cujadisponibilidadeetrabalhoagradeo,deram o seu contributo indirecto para estareflexo introdutria.A Simonetta Luz Afonso devo a iniciativadaobra,agoraem2.aediorevistaeac-tualizada, bem como o estmulo e exemplarapoio sua concepo e coordenao.Nota ao leitor: o smbolo 4iidentifica assun-tos ilustrados nas pginas a cores.O Estado% % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % %O Estado%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%Antnio ReisA Constituio da Repblica PortuguesaNa primeiradcadadosculoXXI,eaps um sculo em que conheceuquatro diferentes regimes polticos(Monarquia Constitucional, I Repblica, Es-tadoNovoeIIIRepblica),Portugalvive,desdeaaprovaodaConstituiode1976,aexperinciademocrticamaisbem-sucedida da sua histria.Nascida da revoluo de 25 de Abril de1974edocompromissoentoassumidopelo Movimento das Foras Armadas de fa-zerelegerporsufrgiouniversaledirectoumaAssembleiaConstituinte,aConstitui-o de 1976 foi concebida no calor de umprocessodetransioatravessadopormltiplas contradies, que deixaram a suamarca no texto inicial.A prtica constitucional determinou, po-rm,queasuacargaprogramticadependorfortementesocializanteacabassepor ceder aplicao das regras de legiti-mao e funcionamento de uma democra-ciarepresentativa,comaconsequentein-troduodasmodificaesadequadasaocarcteromaisabrangentepossvelpr-prio de uma Lei Fundamental.Combinandoapreocupaodemoli-beralnafundamentaodasoberaniaenaorganizaodopoderpolticocomapreocupaoigualitriaesolidaristanadefiniodasresponsabilidadesdoEsta-do,aConstituiode1976,comaajudadassucessivasrevisesqueaaliviaramde uma retrica ideolgica demasiado da-tada, revelou-se apta a estabelecer o qua-droinstitucionalmaisadequadoparaaaplicaodeumprojectodemocrticodevida colectiva, com a flexibilidade de meiosnecessria para se adaptar evoluo his-trica.Cerimnia de promulgao da Constituio e encerramento da Assembleia Constituinte(2 de Abril de 1976).21OEstado%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%RetratodePortugal hoje pacfica na sociedade portugue-saeparatodasasforaspolticasrepre-sentadas no Parlamento a definio de Por-tugalcomoumaRepblicasoberana,baseada na dignidade da pessoa humanaenavontadepopulareempenhadanaconstruo de uma sociedade livre, justa esolidria(artigo1.o),bemcomoadefini-odaRepblicaPortuguesacomoumEstado de direito democrtico, baseado nasoberaniapopular,nopluralismodeex-pressoeorganizaopolticademocrti-cas, no respeito e na garantia de efectiva-o dos direitos e liberdades fundamentaise na separao e interdependncia de po-deres, visando a realizao da democraciaeconmica, social e cultural e o aprofunda-mentodademocraciaparticipativa(arti-go 2.o).Aarticulaoentreoestabeleci-mentodasregrasformaisdeorganizaodo poder democrtico e a definio de ob-jectivosprogramticosmnimosnoexerc-cio desse mesmo poder uma imagem demarca da Constituio Portuguesa, que fazdela uma das mais longas do mundo (296artigos).Comefeito,numPortugalsadoem1974 de uma longa ditadura conservadoraeopressiva,aelaboraodaConstituionopodiaficarconfinadaconsagraode uma carta de direitos, liberdades e ga-rantiaseredacodaslinhasgeraisdeum sistema de funcionamento democrticodos rgos de soberania. Teria tambm dedarrespostasprementesexpectativaseanseiosdemudanasocial,queesmaga-doramentesefizeramsentir,numadimen-sopopularqueextravasavadaredutoraexpresso utpica com que eram encarna-dosemsectoresminoritrios.Graasaossbios equilbrios que os deputados consti-tuintes souberam gerar, tanto no respeitanteaocontrolorecprocodosdiferentespode-res, como no respeitante ao modelo econ-mico-social, foi possvel dar a resposta jus-taaosanseiosdasociedadeportuguesa,prevenindotentativasdeinvoluoantide-mocrtica e criando um clima de progressi-va paz social propcio resoluo negocia-da dos conflitos.Consolidadas as instituies represen-tativas,reorganizadaavidaeconmicaegarantidososdireitosfundamentaisdostrabalhadores, ficou aberto o caminho, nadcadade80,aduasrevisesconstitu-cionais,asquais,semempobreceremouviolaremosprincpiosfundamentaisdaConstituio de 1976, mais no fizeram doque dispensar algumas vlvulas de segu-ranadosistemaentomontado,numasalutar confirmao da maturidade demo-crticadoregimeinstitudoporforadarevoluode25deAbrilde1974.Comefeito,tantoaaceitaodeumrgodesoberania poltico-militar como o ConselhodaRevoluo,at1982,comoaapostanum forte sector pblico da economia, at1989,longedeserevelaremcomoresul-tantes de princpios imutveis da arquitec-tura institucional do Estado ou da organiza-o econmica da sociedade, funcionaramantes como benficas e teis almofadas deprotecodeumademocraciacujopartono foi fcil.Emtermosjurdico-constitucionais,operodo que decorre entre a aprovao daConstituio de 1976 e a reviso constitu-cional de 1982 deve, no entanto, ser con-sideradocomoumperododetransio,durante o qual vigorou o regime de duplalegitimidade dos rgos do poder polticoestabelecidonaPlataformadeAcordoConstitucionalcelebradaem26deFeve-reirode1976entreoMovimentodasFor-as Armadas e os principais partidos pol-ticos. Um regime em que se combinava al egi ti mi dadedemocrti cadosrgosemergentesdosufrgiopopular(Assem-bleiadaRepblicaepresidentedaRep-blica) com a legitimidade revolucionria doConselhodaRevoluo.Porseulado,comarevisoconstitucionalde1989eli-minou-se o equvoco que subsistia entre oquedeveriaserentendidocomobaliza22OEstado%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%OEstadoprogramtica mnima de uma Constituiolargamente consensual e o que se afigura-vaserantesumaimposioideologica-menteredutoradeobjectivosmaispr-priosdeumprogramapartidrioegover-namental.Comonatural,todaestaevoluoconstitucional no se fez sem tenses con-flituaisesemposiesdevotocontrrias.Assim, se em 1976 a Constituio foi apro-vada com os votos favorveis dos partidosdeesquerda(PartidoSocialistaPS,PartidoComunistaPortugusPCP,MovimentoDemocrticoPortugus/Comis-sesDemocrticasEleitoraisMDP/CDE e Unio Democrtica Popular UDP) edo centro-direita (Partido Social-Democrata PSD) e o voto contrrio do partido de di-reita(CentroDemocrticoSocialCDS),j as revises de 1982 e 1989 tiveram a seufavoresteltimopartidoecontraoPCP.Em1980saiugoradaumatentativalidera-dapeloantigoprimeiro-ministroelderdoPSD S Carneiro de levar a cabo uma revi-sodaConstituiopelaviareferendrianoprevistanoseutexto,oqualimpeaaprovaodeumamaioriaqualificadadedois teros dos deputados. Quanto s revi-ses de 1992 e 1997, limitou-se a primeiraaadaptaraConstituiosexignciasdoTratadodaUnioEuropeiaratificadonoano seguinte, e a ltima a aprofundar os di-reitos,liberdadesegarantiasdoscida-dos,almdeintroduziralgumasaltera-esnosi stemael ei toral ,deformaareforar a democracia participativa. Ambastiveram o voto contrrio do PCP e do CDS.As revises de 2001, 2004 e 2005 tambmnoforamunnimes,apesardeosseusprincipaisescoposseremmaislimitados:adaptao s exigncias de adeso ao Tri-bunalPenalInternacional(2001),alarga-mentodasautonomiasregionais(2004)epossibilidadedereferendosobretratadoeuropeu (2005). Tal no impediu, porm, erespeitadasqueforamsempreasregrasprocessuais da reviso, que Portugal tives-se ultrapassado, a partir de 1989, a querelaconstitucional,esefossesolidificando,aolongo da ltima dcada, o necessrio con-senso em torno da Lei Fundamental.Esteconsensohojeparticularmenteforte em tudo o que diz respeito aos princ-pios fundamentais da Constituio (artigos1.oa11.o),aosdireitosedeveresfunda-mentais, incluindo os direitos, liberdades egarantias pessoais, de participao pol-ticaedostrabalhadoreseosdireitosedevereseconmicos,sociaiseculturais(artigos 12.oa 79.o), bem como organiza-odopoderpoltico(artigos108.oa276.o). Mas mais frgil na parte respeitan-te organizao econmica (artigos 80.oa107.o),ondesefazemsentirasreivindica-es favorveis ora a um maior peso do Es-tadonaeconomia(PCP)oraaumamenorinterveno estatal (PSD e CDS).Deentreosprincpiosfundamentais,para alm dos constantes nos j aqui refe-ridosartigos1.oe2.o,cumpresalientaroque estabelece o carcter unitrio do Esta-do (artigo 6.o), o que rege as relaes inter-nacionais (artigo 7.o), o que exprime as ta-refas fundamentais do Estado (artigo 9.o) eoqueconsagraopapelprimordialdosu-frgiouniversaledospartidospolticosnaorganizaoeexpressodavontadepo-pular (artigo 10.o).Ahomogeneidadetnicaelingusticada sociedade portuguesa, a par da neces-sidade histrica de coeso face ao podero-sovizinhoibrico,explicamfacilmenteocarcter unitrio do Estado. Foi preciso es-perarpelaConstituiode1976paraquefossereconhecidaaosarquiplagosatln-ticosdosAoreseMadeiraumaespecialautonomiapoltico-administrativacomoinerentedireitoadisporemdergosdegovernoprprio.Quantoregionalizaopuramenteadministrativadocontinente,embora constitucionalmente admitida, viu asua institucionalizao em concreto rejeita-da no referendo de 1998 por cerca de doisterosdoseleitoresvotantes,apesarde23OEstado%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%RetratodePortugalumaabstenoligeiramentesuperiora50por cento. Em compensao tm funciona-do rgos de coordenao do planeamen-to regional nas cinco regies-plano em queseencontradivididoocontinente:Norte,Centro,LisboaeValedoTejo,AlentejoeAlgarve. J no que respeita aos 308 munic-pios, a Constituio e a lei vieram consagrarumvastoconjuntodeatribuiesprpriascom os respectivos meios de financiamento.Apesar disso, o poder central continua a serresponsvel pela gesto directa de mais detrs quartos dos recursos do Estado.No domnio das relaes internacionais,pautadas pelos valores humanistas e paci-fistas,assumeparticularrelevooreconhe-cimentododireitoinsurreiocontrato-das as formas de opresso, a manutenodelaosprivilegiadosdeamizadeecoo-perao com os pases de lngua portugue-saeoempenhonoreforodaidentidadeeuropeia.De entre as tarefas fundamentais come-tidas ao Estado, para alm das directamen-te decorrentes dos valores liberais e solida-ristasdoEstadodedireitodemocrtico,avultam a proteco e valorizao do patri-mnio cultural, natural e ambiental, a defe-saedifusointernacionaldalnguaportu-guesaeapromoodaigualdadeentrehomens e mulheres.Por ltimo, impe-se assinalar que a es-tabilidadeconstitucionaltemsidoassegu-radaporumapertadoregimedereviso,querquantoaosseustermoseprazos,querquantoaosseuslimitesmateriais.Aoevitarafrmulareferendria,privilegiandoa aprovao por maioria de dois teros dosdeputadosemefectividadedefunes,esem que o presidente da Repblica possarecusar a promulgao da respectiva lei dereviso (artigo 286.o), a Constituio consa-grou um mecanismo que aposta na criaodeconsensosparlamentaresinterpartid-rios e previne solues de ruptura poltica esocial.Aoestabelecerumvastoesignifi-cativo conjunto de limites materiais da revi-so(artigo288.o),incluindoentreoutrosaformarepublicanadegoverno,asepara-odasigrejasdoEstado,osdireitosdoscidadosedostrabalhadores,osprinc-pios fundamentais de organizao do Esta-dodedireitodemocrtico eaautonomiapoltico-administrativa dos arquiplagos dosAores e da Madeira, a Constituio procu-ra,tambm,asseguraraperenidadedasprincipais conquistas histricas, ou mais re-centes, do Estado democrtico moderno.TambmporestasrazesaConstitui-o de 1976, apesar das controvrsias quesuscitounosprimeirosanosdasuavign-cia,temvindoareforaroseuprestgio,solidez e aceitao, contribuindo decisiva-mente para que Portugal viva a experinciademocrticamaisconseguidadasuahis-tria.A organizaodo poder polticoe a forma de governoNa organizao do poder poltico, submeti-daaoprincpiodaseparao,equilbrioecontrolo recproco dos poderes, consagrou--se uma forma de governo semipresidencia-lista ou, mais rigorosamente e sobretudo apartirdarevisode1982,parlamentaristacomcorrectivopresidencial (cf.Vitorino,1994).OpresidentedaRepblica,eleitoporsufrgiouniversaledirectoparaumman-dato de cinco anos, sem que seja admitidaa reeleio para um terceiro mandato con-secutivo,temopoderdedissoluodoParlamento unicameral (Assembleia da Re-pblica, composta por 230 deputados elei-tos em 20 crculos eleitorais de acordo como sistema de representao proporcional eo mtodo da mdia mais alta de Hondt naconversodosvotosemnmerodeman-datos)ededemitirogoverno,nestecasoapenasquandotalsetornenecessrioparaasseguraroregularfuncionamentodasinstituiesdemocrticas(artigo24OEstado%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%OEstadoO hemiciclo da Assembleia da Repblica.195.o, n.o2). Tem ainda o poder de subme-ter a referendo questes de relevante inte-ressenacional,mediantepropostadaAs-sembleiadaRepblicaoudogovernoemmatriasdasrespectivascompetncias(artigos 134.oe 115.o), bem como o direitodevetosobrediplomasemanadosdaAs-sembleiadaRepblica,aindaqueestapossa ultrapassar o veto presidencial con-firmandooseuvotopormaioriaabsolutaoudedoisteros,conformeasmatriasem causa (artigo 136.o). Por seu lado, o go-verno,chefiadoporumprimeiro-ministro,quenomeadopelopresidentedaRep-blica,ouvidosospartidosrepresentadosnaAssembleiaetendoemcontaosresul-tadoseleitorais,responsvelperanteopresidentedaRepblicaeaAssembleiadaRepblica(artigos187.oe190.o).Are-jeiodoprogramadogovernopelaAs-sembleiadaRepblica,anoaprovaodeumamoodeconfianaouaaprova-o de uma moo de censura por maioriaabsolutadosdeputadosemefectividadede funes determinam automaticamente ademisso do governo (artigo 195.o).Este sistema de governo permitiu supe-rar com relativa facilidade as crises gover-namentaisocorridasat1987easseguraraestabilidadedasinstituies.Conduziu,comefeito,querneutralizaoimediataouacurtoprazodegovernosdeiniciativapresidencialsembaseparlamentardeapoio, como aconteceu em 1978-1979 como III e IV governos constitucionais, quer aoimpedimento do prolongamento artificial degovernosdebaseparlamentarprecria,comoaconteceuem1978,1983e1985com o II, VIII e IX governos constitucionais,queraindainviabilizaodealternativasdegovernonoquadroparlamentarcomduvidosoapoionaopiniopblica,comoaconteceunasdissoluesparlamentaresde 1979 e 1987, da responsabilidade, res-pectivamente,dospresidentesRamalhoEanes e Mrio Soares.Tendo a Constituio de 1976 estabeleci-do um sistema eleitoral proporcional, que di-25OEstado%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%RetratodePortugalO general Ramalho Eanes na tomadade posse como presidente da Repblica,em 14 de Julho de 1976.ficultavapartidaaformaodegovernosmonopartidrioscommaioriaparlamentarabsoluta,aestabilidadegovernativaficou,duranteaprimeiradcadadefunciona-mentodosistema,muitodependentedomaioroumenorsucessodefrmulasdecoligao interpartidria (PSD + CDS entre1979 e 1983, PS + PSD entre 1983 e 1985)oudainiciativapresidencialnasuperaodeimpassesparlamentares.Aevoluopoltica foi, por isso, neste perodo semprecondicionadapelabusca,porpartedospartidosvencedoresdossucessivosactoseleitorais, de frmulas mais ou menos est-veisdegovernao,cujoxito,porsuavez, dependeu, por um lado, do relaciona-mento institucional entre o primeiro-ministroeopresidentedaRepblica,e,poroutrolado,domaioroumenorsucessodosgo-vernos no controlo das crises econmico-fi-nanceiras.Entre1976e1985sucederam-se,as-sim, no poder um governo de maioria relati-va do PS, um governo de base parlamentarPS/CDS,trsgovernosdeiniciativapre-sidencial(oltimodosquaisapenasdegestocomvistapreparaodenovaseleies), trs governos de coligao PSD//CDS(AlianaDemocrticaAD)eumgoverno de coligao PS/PSD (Bloco Cen-tral). Porm, entre 1985 e 2002, coincidindocomaintegraodePortugalnaComuni-dade Europeia, foi a vez dos governos mo-nopartidrios, primeiro do PSD, inicialmen-teminoritrioedepoiscomconfortveismaioriasabsolutasem1987(50,2 %dosvotos)e1991(50,4 %),depoisdoPSem1995 (43,8 %, a escassos quatro mandatosdamaioriaabsoluta)e1999(44 %,commetade dos mandatos parlamentares). En-tre 2002 e 2005, regressou-se frmula decoligaointerpartidria(PSD + CDS),aquesesucedeuumnovogovernomono-partidriodoPS,oprimeirocommaioriaparlamentarabsoluta(45 %dosvotosnaseleies de 2005).OpresidenteRamalhoEanes(1976--1986)dissolveriaaAssembleiadaRep-blicaportrsvezes:em1979,apsofra-cassodedoisgovernosdesuainiciativa,destinados a superar o impasse parlamen-tar gerado pelo derrube do primeiro gover-nominoritriodeMrioSoaresepelarup-turadoacordoentreoPSeoCDSparaviabilizar o segundo governo de Mrio Soa-res;em1983,emconsequnciadacrisequeafectavaacoligaoAD;eem1985,aps a ruptura por parte do PSD do acordogovernamental com o PS. O presidente M-rio Soares (1986-1996), por sua vez, utiliza-riaomecanismodadissoluoapenasuma vez, em 1987, depois de o ParlamentoderrubarogovernominoritriodoPSDdeCavacoSilva,atravsdeumamoodecensura da iniciativa do Partido RenovadorDemocrtico(PRD),lideradopeloex--presidenteRamalhoEanes.OpresidenteJorgeSampaio,porfim,viu-seobrigadoem 2002 a dissolver o Parlamento em virtu-dedadecisodoprimeiro-ministrosocia-listaAntnioGuterresdeapresentarasuademissonasequnciadosmausresulta-dos do PS nas eleies municipais de De-zembrode2001,esemqueoseupartidotenhaqueridoproporumnovoprimeiro-mi-26OEstado%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%OEstadoMrio Soares, presidente da Repblica entre1986 e 1996.Jorge Sampaio sada do Palcio deSo Bento, depois de empossado nasfunes de presidente da Repblica (1996).nistro,dadooimpasseparlamentarcriadopelos partidos da oposio. As eleies de2002 dariam ento lugar a um novo governode coligao PSD/CDS, cujo primeiro-minis-tro, Duro Barroso, se demitiria em Julho de2004,emconsequnciadasuaaceitaodolugardepresidentedaComissoEuro-peia.Substitudopelovice-presidentedoPSD,SantanaLopes,aofimdequatrome-ses o presidente Sampaio decidiu dissolvero Parlamentoeconvocarnovaseleies,por descrer da capacidade do novo primei-ro-ministrodeasseguraraestabilidadeeaeficcia da aco governativa.Verifica-se,assim,que,aolongodosprimeiros trinta anos de vigncia do actualquadro constitucional, a alternncia demo-crticanopodersetraduziunaformaodeexecutivoschefiadosorapeloPS,orapeloPSD,comacurtaexcepodosgo-vernos de iniciativa presidencial, que dura-ramdezasseismeses,etendoaquelesdoispartidosestadocoligadosapenasuma vez e pelo perodo de vinte e nove me-ses.Ouseja,osentidodevotomaioritriooscilou entre o centro-esquerda e o centro--direita,compredomnioparaoprimeirodurantetrezeanos(epresumivelmentemais dois at ao final da presente legislatu-ra em 2009) e para o segundo durante cer-ca de dezassete. O PSD manteve-se comopartido do governo durante dezanove anos(1979-1995e2002-2005)eoPSdurantetreze anos (1976-1978, 1983-1985 e 1995--2002,2005-2007),comtrsinterrupes(1978-1983, 1985-1995 e 2002-2005), a pe-nltima das quais de dez anos. A desloca-o do voto de uma larga faixa de cerca de20 %doeleitorado,oranosentidodoPSoranosentidodoPSD,acaboupordeter-minar a referida oscilao. Assistiu-se, poroutrolado,aumasignificativadiminuioda fora eleitoral dos dois partidos dos ex-tremos do leque parlamentar: o CDS, agoradesignado CDS-PP, de cerca de 16 % paracercade7 %,eoPCP,decercade14 %para cerca de 8 por cento. A quebra desteltimoparcialmentecompensadaes-querdapelaemergncia,desdeaselei-es de 1999, de um novo partido o Blo-codeEsquerda(BE)queatingiuos6,4 % dos votos nas eleies de 2005.Porltimo,note-sequenasonzeelei-es legislativas realizadas at agora, hou-vecincomaioriasabsolutasobtidasportrs foras polticas: a coligao pr-eleito-ral AD, chefiada por S Carneiro, em 1979e 1980, o PSD, chefiado por Cavaco Silva,em 1987 e 1991, e o PS, chefiado por JosScrates,em2005.Odesgastegovernati-vo do PS em duas situaes de crise finan-27OEstado%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%RetratodePortugalceiraentre1976e1978e1983e1985,osucesso da integrao europeia a partir de1986 e o descrdito dos governos de coli-gaoPSD/CDSentre2002e2005foramfactoresquecontriburamdecisivamentepara estes resultados.Finalmente,entre1995e2002eentre2005 e 2006, o PS tornou-se o primeiro par-tidoacolocardirigentesseusaomesmotempo na chefia do governo (Antnio Guter-reseJosScrates)enaPresidnciadaRepblica (Jorge Sampaio), depois das ex-perinciasdecoabitaoinstitucionalentreum presidente militar e governos de diferen-tes bases partidrias e entre um presidentesocialistaegovernosdoPSD.Actualmenteassiste-se experincia indita de coabita-oentreumpresidenteeleitoemJaneirode 2006 com o apoio do PSD e do CDS (Ca-vaco Silva) e um governo do PS.O sistema partidrio,as eleiese a participao polticaParaaconsolidaoeestabilizaodosistemademocrticomuitocontribuiuacontinuidadequerdosistemadeforaspartidrias,querdosistemaeleitoral,quese revelou apto a garantir a alternncia nopoder e a formao de governos de legis-latura.Comefeito,apenasnaseleiesde1985umanovaforapolticaconseguiupr em causa, por um curto perodo, a hie-rarquia habitual do xadrez partidrio: o Par-tido Renovador Democrtico (PRD), consti-tudoemtornodafiguradopresidenteRamalhoEanes,queobteveento18 %dosvotos,custafundamentalmentedoPS, tendo cado nas eleies seguintes, em1987,paraos5 %edesaparecidodepoisdomapaparlamentar.Deresto,osistemaeleitoralproporcionalealeiemvigor,queno contm nenhuma clusula-barreira emtermospercentuais,tmpermitidoocasio-nalmenteaeleiodedeputadosemre-O presidente da Repblica, Anbal CavacoSilva, em cerimnia oficial.presentao de pequenas foras polticas.Assim aconteceu com a UDP, de extrema--esquerda, que elegeu um deputado As-sembleiaConstituinteem1975enaselei-eslegislativasde1976,1979e1980,ecomoPartidodaSolidariedadeNacional(PSN),conhecidocomoopartidodosre-formados,queelegeuumdeputadoparaalegislaturade1991-1995,sempre,emambososcasos,commenosde2 %dosvotos.Maisrecentemente,oBE,umacoli-gao de trs partidos de extrema-esquer-da(PartidoSocialistaRevolucionrioPSR , UDP e Poltica XXI) e independen-tes,elegeudoisdeputadosem1999,commenos de 3 % dos votos, para em 2005 sejuntar ao grupo dos quatro principais parti-dosaoelegeroitodeputadoscom6,4 %dos votos.Com excepo do BE, qualquer dos cin-coprincipaispartidospolticosjexperi-mentou a frmula da coligao pr-eleitoral.OPCPcomaAlianaPovoUnido(APU),que integrou em 1979 o MDP-CDE e, a par-tirde1983,oPartidoEcologistaOsVer-des(PEV),equalsucedeu,apartirde1987,aColigaoDemocrticaUnitria(CDU), de que passou a fazer parte um pe-queno grupo de ex-membros do MDP-CDEaIntervenoDemocrtica(ID);oPSDe o CDS, com a j referida AD, em 1979 e1980;eoPS,comaFrenteRepublicana28OEstado%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%OEstadoFonte: 30 Anos de Constituio, Lisboa, Assembleia da Repblica, 2006.e Socialista(FRS),umacoligaocomduas pequenas foras polticas a AcoSocial-Democrata Independente (ASDI) e aUnio de Esquerda para a Democracia So-cialista (UEDS), dissidentes, respectivamen-te,doPSDedoPSqueseapresentouapenasseleiesde1980.Aocontrrioda AD, que configurou uma coligao entredois dos quatro principais protagonistas dosistema partidrio portugus, aos quais seassociaramnaalturaumpequenopartidomonrquicoeoepisdicoMovimentoRe-formador,tantoaAPUeaCDUcomoaFRS se apresentaram como coligaes cla-ramentehegemonizadaspeloPCPepeloPS, respectivamente.Neste quadro, os dois maiores partidos,o PS e o PSD, polarizam actualmente cercadetrsquartosdoeleitoradoede85 %dosmandatosparlamentares.Represen-tamemPortugalasduasmaioresfamliaspolticas europeias: os socialistas do Parti-do Socialista Europeu (PSE) e os democra-tas-cristosdoPartidoPopularEuropeu(PPE).NocasodoPSD,porm,estafilia-orelativamenterecente(1997),poisanteriormenteestiveraligadoaoPartidoEuropeu dos Liberais, Democratas e Refor-mistas.QuantoaoCDS,querepresentouinicialmenteafamliademocrata-cristeu-ropeia,viriaaassociar-seaosgaulistasfrancesesem1993noGrupodaAlianadosDemocratasEuropeus(actualUnioparaaEuropadasNaes),ondesetemmantidoapesardeterentretantorecupe-radoasuainspiraodemocrata-crist.29OEstadoPS 107PPD 73CDS 42PCP 40UDP 1AD 121PS 74APU 47PSD 7UDP 1AD 126FRS 71APU 41PPD/PSD8UDP 1PS 101PPD-PSD 75APU 44CDS 30PS 112PPD-PSD 88CDS-PP 15PCP//PEV15PS 115PPD-PSD 81CDS-PP15PCP/PEV17BE 2PS 96PPD-PSD 105CDS-PP 14PCP/PEV12BE 3PS 121PPD-PSD 75CDS-PP12PCP/PEV 14BE 8PS 57PPD-PSD88APU 38CDS 22PRD 45PS 60PPD-PSD 148CDU 31CDS 4PRD 7PS 72PPD-PSD 135PCP/PEV 17PSN 1CDS 525-04-1976 02-12-1979(intercalar)05-10-198001-10-199510-10-1999 17-03-2002 20-02-200506-10-1991 19-07-198706-10-1985 25-04-1983Composio da Assembleia da Repblica por grupos parlamentares%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%RetratodePortugalO seu posicionamento crtico relativamentes teses federalistas do PPE estivera na ori-gem do seu afastamento deste partido eu-ropeu. O PCP e o BE, por seu lado, tm vin-do a integrar o Grupo Unitrio da EsquerdaEuropeia.Actualmente,oPSdispede12deputadosnoParlamentoEuropeu,oPSDde sete, o CDS-PP e o PCP de dois cada, eo BE de um.Dopontodevistaprogramtico,qual-querdosquatropartidosparlamentaresmaisantigostemconhecidoasuaevolu-o. O PS, fundado em 1973 na AlemanhaapartirdaAcoSocialistaPortuguesa(ASP) de Mrio Soares, cedo abandonou acomponente marxista do seu iderio inicialparasesituarnocamposocial-democratareformista, tendo, alis, sido precursor dasviragensentretantoexperimentadasnomesmosentidopelospartidossocialistasda Europa Latina, a partir da dcada de 80.OPSD,ondeconvergiraminicialmenteaslinhasdeorientaosocial-crist,liberalesocial-democrata, veio a subalternizar pro-gressivamente esta ltima em favor das pri-meiras, no mbito de uma actuao gover-nativaoudeumaestratgiaoposicionistaditadasporumevidentepragmatismo.O CDS-PP,dematrizdemocrata-cristepretendendoinicialmenteumposiciona-mento centrista, veio, no incio dos anos 90,a adoptar uma orientao populista, conser-vadoraeassumidamentededireita,para,mais recentemente, lhe acoplar a sua inspi-rao original. O PCP, que na revoluo deAbril de 1974 era conhecido como o partidocomunistamaisortodoxamentemarxista--leninista da Europa Ocidental, tem vindo aconhecer, aps a queda dos regimes comu-nistas na antiga Unio Sovitica e na Europado Leste, uma lenta mas progressiva evolu-o, que o leva hoje a aceitar a democraciapolticapluralistaerepresentativacomoumacomponenteessencialdoseumodelodesociedade.QuantoaoBE,fundadosem 1999, cedo se libertou da matriz esquer-distatradicionaldospartidostrotskistaemaosta que estiveram na sua origem, paraadoptaroperfilideolgicodeumaesquer-da moderna, sensvel a causas morais e cul-turais de natureza fracturante e empenhadaemlutassociaisnoquadrodademocraciarepresentativa e participativa.Dosci ncoparti dosparl amentares,aquelequesempreconheceuumamaisequilibrada implantao no territrio nacio-nal , sem dvida, o socialista, enquanto ossociais-democrataseospopularestmosseus basties no Norte e Centro, os comu-nistas na Grande Lisboa e no Alentejo e osbloquistasnosprincipaiscentrosurbanos.Quantoaosarquiplagosatlnticos,ahe-gemoniadossociais-democratasnasre-gies autnomas da Madeira e dos Aoresfoi,emrelaoaestaltima,quebrada,apartirde1996,pelossocialistas,quega-nharamento,pelaprimeiravez,asres-pectivas eleies regionais.Aprincipalfontedefinanciamentodospartidos polticos tem sido o oramento doEstado, na base do nmero de votos obtidopor cada um nas eleies legislativas, des-de que atinjam um mnimo de 50 000. A leiestabelecetambmlimitessdespesasdas campanhas eleitorais.Tambm no que toca ao estatuto dos ti-tulares dos cargos polticos e ao respectivoregime de incompatibilidades, impedimen-toseresponsabilidades,caminhou-seaolongo da primeira metade da dcada de 90para a definio de um quadro mais rigoro-so das condies de exerccio dos cargosemandatos,hoje,todavia,acusadodeuma excessiva rigidez com prejuzo para orecrutamento qualificado dos agentes pol-ticos.Apreocupaoqueestevenabaseda lei aprovada em 1995 reflectia, porm, ocrescentesentimentodedistanciaoedesafeiodoeleitoradoemrelaoaosseus representantes polticos, traduzido emtaxas de absteno cada vez mais altas.Comefeito,entre1975e2005,aabs-teno eleitoral cresceu de uns modestssi-mosenuncamaisigualados8,3 %nas30OEstado%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%OEstadoFonte: in http://eleicoes.cne.pt (2007).eleiesparaaAssembleiaConstituintepara uns preocupantes 37,7 % nas ltimaseleiesparaaAssembleiadaRepblica,emboracomtendnciaparaestabilizarnestaordemdevalores.Tambmaselei-esautrquicasepresidenciaistmco-nhecido este fenmeno, ainda que em me-norescala,comasprimeirasaveremataxa de absteno crescer de 35,4 % para39,1 %, e as segundas de 24,5 % para 37,4por cento. A confirmar o progressivo desin-teresse da populao portuguesa pela par-ticipaopolticaestiveramosresultadosdosdoisprimeirosreferendosnacionais,ambos em 1998: o que incidiu sobre a des-penalizaodainterrupovoluntriadagravidez e o que inquiria sobre a institucio-nalizao em concreto das regies adminis-trativas no continente. Ambos deram a vit-riaaospartidriosdono,masnenhumdosdoisobteveaparticipaodamaioriamnimademetademaisumdoseleitores,necessria para que os seus resultados pu-dessemserconsideradosvinculativos.Noprimeirocaso,ataxadeparticipaoque-dou-se em 31,9 % e no segundo em 48,1 %.Apesardisso,nenhumdospartidosparla-mentarespartidriosdosimexigiuapu-blicao das leis aprovadas na AssembleiadaRepblica,conscientesdainconvenin-cia poltica de tal acto. Em 2007 um novo re-ferendosobreadespenalizaodainter-rupo voluntria da gravidez, quando feitaat s dez semanas, deu a vitria ao simpor59,2 %dosvotos,comumataxadeabsteno de 56 por cento.Oelevadoabstencionismonumaformade participao poltica directa da popula-oemdecisesdealcancenacionalso-bretemasqueinequivocamenteasafec-tam susceptvel de leituras contraditrias.Tantopodequerersignificarumamanifes-taodeprefernciapelosmecanismosde democraciarepresentativacomoformaderesoluodosproblemaspolticosco-mo pode confirmar ao mais elevado grau atendncia para o indiferentismo, o desinte-resseouadesafeiopelasquestesp-blicas,queumapartecrescentedoeleito-rado tem vindo a revelar.So,porm,mltiplasevariadasascausas da absteno eleitoral. A chamadaabstenocrnica,correspondenteaoseleitoresque,porrazesideolgicasouporpuroindiferentismo,serecusamsiste-maticamente a votar, no ultrapassar, se-gundoestudosrecentes(JorgedeSeLusReto,inDiriodeNotcias de10deOutubro de 1999), os 15 % do total do elei-torado. J a absteno flutuante, resultantequerdefactorestcnico-administrativos,comomudanasderesidncia,querdefactores aleatrios de ordem pessoal, atin-gir32 %.Porltimo,aabstenoselecti-31OEstadoNveis de absteno 1975-200780706050403020100%AC'75AR'76AL'76PR'76AR'79AL'79PR'80PR'01PR'06AR'80AL'82AR'83AL'85AR'85PR'86-1PR'86-2PE'87PE'04AR'87AR'02AR'05PE'89AL'89AR'91PR'91AL'93AL'01AL'05PE'94PR'96AR'95AL'97R. NOV'98R. JUN'98R. FEV'07AR'99PE'99AC - Assembleia ConstituinteAR - Assembleia da RepblicaPR - Presidncia da RepblicaAL - AutrquicasR - ReferendoPE - Parlamento Europeu%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%RetratodePortugalManifestao, em 1999, sob a forma de cordo humano, a favor da interveno das tropasda ONU em Timor Leste, em resultado dos violentos confrontos que tiveram lugar nasequncia do referendo acerca da independncia daquele territrio.va, motivada pela falta de informao, pelaocasionalausnciadeidentificaocomumpartidoouaindapelainsuficientedra-matizao do combate poltico como co-rolrio, alis, da crescente estabilidade dosistemademocrticoedadiminuiodaconflitualidadesocialsituar-se-nos24por cento. A estes ltimos factores acresceigualmenteasensaodeimpotnciademuitoscidadosemrelaopartidocra-cia dominante, bem como a chamada crisedasideologias,comoconsequentesenti-mento de diluio das fronteiras partidriase o correlativo fenmeno de mediatizao efulanizao da vida poltica (cf. Cruz, 1994).Porltimo,masnomenosimportante,ocaldoindividualistaehedonistadaculturaps-modernademoldeadesincentivarqualquer tipo de comportamento participa-tivo, e faz-se sentir particularmente nas ge-raes mais jovens, que j no experimen-taramaprivaodasliberdadesimpostapela ditadura.Osinquritosdisponveisparaoinciodadcadade90demonstram,noentanto,queodesinteressepelapolticanotoria-mentemaiselevadoemPortugal(entre68 %e82 %)doquenamdiadeseisadez pases da Unio Europeia (entre 55 % e58 %).ComparadocomaAlemanha,ondea taxa de desinteresse oscila entre os 30 %e 45 %, o contraste ainda maior (cf. idem).Em contrapartida, assiste-se prolifera-odeoutrasformasmenostradicionaisde interveno na vida da comunidade, co-moaassinaturadepeties,aparticipa-oemmanifestaesdeprotestoouemmovimentosdedefesadecausasconcre-tasouaindaoapoioaformasdepressodecarizneocorporativo.Odireitodepeti-o para defesa dos direitos dos cidados,daConstituio,dasleisoudointeressegeral, bem como o direito de aco popu-lar para promover a preveno, a cessaoouaperseguiojudicialdasinfracescontraasadepblica,osdireitosdosconsumidores,aqualidadedevidaeapreservao do ambiente e do patrimniocultural e assegurar a defesa dos bens p-blicos esto, alis, consagrados na Consti-32OEstado%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%OEstadotuio Portuguesa (artigo 52.o), ainda que oltimo seja raramente exercitado.Com o objectivo de reforar as possibili-dadesdeparticipaopolticadoscida-dos, a reviso constitucional de 1997 alar-gouolequedematriaspassveisdereferendonacionalelocal,concedeuodi-reitodeiniciativadaleiedoreferendoagruposdecidadoseleitores,eacaboucomomonopliopartidrionaapresenta-odaslistasdecandidatosaosrgosconcelhiosdopoderlocal,mantendoem-boraessemonoplionascandidaturasAssembleia da Repblica.Est, entretanto, em aberto a possibilida-de de rever a lei eleitoral para a Assembleiada Repblica em moldes que proporcionemuma maior aproximao entre os eleitores eosseusrepresentantes.Aadopodecr-culos uninominais, a par de crculos plurino-minais,constitucionalmentepermitida,comsalvaguarda da proporcionalidade do siste-ma,temvindoaserencaradapelosdoismaiores partidos como uma forma de contri-buir para aquele objectivo.O sistema judicialAbolidos os tribunais especiais e garantidaaindependnciadosjuzesnasequnciadaimplantaodoregimedemocrtico,aConstituioconsagrouumaorganizaojudicial,assenteemvriostiposdetribu-nais, e um estatuto prprio para os magis-trados.Assim,paraalmdoTribunalConstitu-cional, criado com a reviso constitucionalde 1982 e que herdou as funes de fisca-lizao da constitucionalidade das leis, atentoatribudasaoConselhodaRevolu-o, foram definidas trs categorias de tri-bunais: o Supremo Tribunal de Justia e ostribunaisjudiciaisdeprimeiraedesegun-dainstncia;oSupremoTribunalAdminis-trativo e os demais tribunais administrativose fiscais;eoTribunaldeContas.Ospri-meiros so os tribunais comuns em mat-ria cvel e criminal, aos segundos competeojulgamentodasaceserecursoscon-tenciososquetenhamporobjectodirimiros litgios emergentes das relaes jurdicasadministrativas e fiscais, e ao terceiro incum-beafiscalizaodalegalidadedasdespe-saspblicasedejulgamentodascontasquealeimandarsubmeter-lhe,nomeada-mente da Conta Geral do Estado, incluindoadaSeguranaSocial,edascontasdasregies autnomas dos Aores e da Madei-ra. A reviso constitucional de 1997 aboliua existncia permanente dos tribunais mili-tares,limitandoasuaconstituio,paraojulgamentodecrimesdenaturezaestrita-mentemilitar,aoperododevignciadoestado de guerra. ainda admitida a exis-tnciadetribunaismartimos,tribunaisar-bitrais e julgados de paz.A desgovernamentalizaodasestru-turasjudiciriaslevouaumestatutodegrande independncia dos juzes, que go-zam de uma considervel margem de au-togoverno,gerida,noquetocaaosjuzesdostribunaisjudiciais,peloConselhoSu-perior da Magistratura. Este rgo presi-dido pelo presidente do Supremo Tribunalde Justia e composto por dois vogais de-signadospelopresidentedaRepblica,sete eleitos pela Assembleia da Repblicae sete juzes eleitos pelos seus pares. Porsuavez,oMinistrioPblicogozaigual-mente de autonomia e de estatuto prprio,separado do da magistratura judicial. Temcomo rgo directivo a Procuradoria-GeraldaRepblica,presididaporumprocura-dor-geraldaRepblica(nomeadopelopresidente da Repblica, sob proposta dogoverno, para um mandato de seis anos) eintegrandooConselhoSuperiordoMinis-trioPblico,queincluimembroseleitospela Assembleia da Repblica e membroseleitospelosmagistradosdoMinistrioPblico.TantoosmagistradosjudiciaiscomoosmagistradosdoMinistrioPbli-cosoformados,desde1979,noCentrode Estudos Judicirios, organismo respon-33OEstado%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%RetratodePortugalsvel pela sua qualificao tcnica e cien-tfica.Asgarantiaseaqualidadedassolu-esconsagradasconstitucionalmentenodomnio da organizao judicial no foram,porm, suficientes para dar resposta cabalaos desafios colocados por uma crescenteprocuradajustiaporpartedecidadosciososdosseusnovosdireitoseimpulsio-nadapeladinmicaeconmicaesocialdosltimosvinteecincoanos,apesardaexcessivadesigualdadesocialnoacessoao direito que continua a caracterizar o sis-tema. Tanto os agentes do aparelho judicialcomoosseusutentesconvergemdehmuito no reconhecimento do estado de cri-se permanente da justia portuguesa.Aacumulaodosprocessospenden-tes, a lentido das decises e o acentuadoriscodasprescriessoconsequnciasinevitveis da carncia de meios humanosedeinstalaescondignas,doatrasonainformatizaodosistema,doburocratis-mo administrativo, dos hbitos de prolixida-de e erudio na redaco das sentenas,da falta de assessoria de apoio aos juzes,da sobrecarga com contenciosos menores,daausnciademecanismosalternativosde resoluo dos conflitos, de formalismosexcessivos na interpretao da lei e do ex-cesso de garantismo que estimula a litign-cia interminvel para quem possui recursosavultados e bons advogados. Para alm dodescrditoparaajustiaedosentimentode impunidade que resultam de tal estadodecoisas,comasconsequnciasperver-sasqueseimaginam,nosotambmdespiciendososcustosbrutaisquedaquidecorremparaofuncionamentodasem-presas e da economia em geral.O consenso sobre o diagnstico e a te-raputica da crise da justia tem-se vindo aimporultimamente.Reflexodissoare-cente assinatura, em Setembro de 2006, deumpactoparaajustiaentreopartidodo governo e o principal partido da oposi-o,oqualparececonterasmedidasdetratamentomaisurgentese,sobretudo,avontade de as aplicar, superando os facto-res de inrcia do sistema e os corporativis-mos instalados.As Foras ArmadasCom a reviso constitucional de 1982, queextinguiuoConselhodaRevoluoepsfimaosistemadeautogovernoemqueseencontravamdesdearevoluode25deAbrilde1974,asForasArmadaspassa-ram a estar integralmente subordinadas aopoderpolticodemocrtico.AeleiodoprimeiropresidentedaRepblicacivilem1986 veio, por seu turno, reforar no planosimblicoessadependncia,aproximan-do-as ainda mais do estatuto que as carac-teriza nas democracias ocidentais.Aleieaprticapolticadominantepreocuparam-se, entretanto, em salvaguar-daraisenoeoapartidarismodainsti-tuiomilitar,conferindo-lheaindaumaprecivel grau de autonomia no plano es-tritamenteorganizativo,nombitodeummodeloconstitucionalelegaldecontrolopolticoquecorresponsabilizaequilibrada-mente o presidente da Repblica, o gover-no e a Assembleia da Repblica (cf. Vitori-no, 1998).Assim,opresidentedaRepblica,queexerceporinernciaocargodecoman-dantesupremodasForasArmadas,no-meia e exonera os principais chefes milita-res(chefedoEstado-Maior-GeneraldasForasArmadasechefesdosestados--maiores do Exrcito, da Armada e da For-a Area), sempre sob proposta do gover-no. A partir de 1995, a escolha dos nomespropostospelogovernodeixoudeestarcondicionadaporumalistaprviadetrsnomesseleccionadospelaprpriainsti-tuiomilitar,quepassouadesempenharum papel meramente consultivo. A Assem-bleiadaRepblicadetm,porsuavez,vastas competncias legislativas no domniodadefesanacional,definiodosdeveres34OEstado%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%OEstadoSoldados portugueses integrados numafora da NATO em misso naBsnia-Herzegovina (1996).dela decorrentes e bases gerais da organi-zao, do funcionamento, do reequipamen-to e da disciplina das Foras Armadas, paraalmdetudooquedigarespeitosrestri-esaoexercciodedireitospormilitares,em nome do estrito apartidarismo dos seusmembros.Porviadosseuspoderesora-mentaisedacompetnciaparaaprovaraschamadas leis de programao militar, quefixam o montante e a distribuio dos inves-timentos em equipamento, exerce igualmen-te uma importante responsabilidade de con-trolodainstituio.Porltimo,existeainda,comdignidadeconstitucionalefunesconsultivas, o Conselho Superior de DefesaNacional,presididopelopresidentedaRe-pblica e integrando o primeiro-ministro, al-gunsministros,doisdeputados,ospresi-dentesdosgovernosregionaisdosAorese da Madeira e os chefes militares.A reconverso de umas Foras Armadasempenhadas ao longo de mais de uma d-cada numa guerra colonial em trs frentes echamadasdepoisadesempenharumdeli-cado papel de conduo da transio paraum regime democrtico acabou por se pro-cessarnumambientedetranquilidadeesemsobressaltos.AplenaintegraodePortugalnoconcertodasdemocraciaseu-ropeias,reforadapelaadesoComuni-dadeEuropeia,eaalteraodocenriogeostratgico contriburam igualmente paraa progressiva diminuio do seu peso espe-cfico interno. Mas se eliminaram quaisquertentaesdeenvolvimentodasForasAr-madasemmissesdeseguranainterna,foradassituaesdeexcepodoestadodeguerraoudosestadosdestioedeemergncia, reforaram, em compensao,a suaimportnciacomoinstrumentodadi-plomaciaedapolticaexternaportuguesanummundoemque,apsaquedadoim-priosovitico,asmissesinternacionaisde paz se tornam cada vez mais frequentes.A reviso constitucional de 1997 reflectiuesse facto ao incluir um novo nmero no ac-tualartigo275.o,queexplicitamentelhesatribui a incumbncia de satisfazer os com-promissosinternacionaisdoEstadoportu-gusnombitomilitareparticiparemmis-seshumanitriasedepazassumidaspelasorganizaesinternacionaisdequePortugal faa parte. As Foras Armadas por-tuguesasparticiparamouparticipam,destemodo, em misses da Organizao das Na-esUnidas(ONU)emAngola,Moambi-que, Lbano, Timor Leste e Sara Ocidental, eem misses da NATO (North Atlantic TreatyOrganization,OrganizaodoTratadodoAtlntico Norte OTAN) ou da UE na Bs-nia-Herzegovina, no Kosovo, no Afeganistoe Repblica do Congo. Em finais de 1999 in-tegraram tambm a Interfet fora interna-cionalque,commandatodoConselhodeSegurana da ONU, interveio em Timor Les-te para pr termo violncia desencadeadapeloExrcitoindonsioeasmilciaslocaiscontraapopulao,queemreferendose35OEstado%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%RetratodePortugalPrimeiro-cabo dirigindo umaautometralhadora.pronunciaraesmagadoramentepelainde-pendncia. E entre Janeiro de 2000 e 2002participaramcomumcontingentede800homensnaUntaet,aadministraotran-sitriadaONUquepreparouatransiopara a independncia do novo Estado de Ti-morLeste.Paraalmdisso,designamfor-asareasenavaisparaoComandodoAtlnticodaNATOeforasterrestresea-reas para o Comando da Europa da NATO,designadamenteparaoseuCorpodeReacoRpida,assegurandoassimoscompromissos do Estado portugus no m-bitodaAlianaAtlntica.TmaindaforasatribudasUniodaEuropaOcidental(UEO).Tambmasacesdecooperaotcnico-militarcomosnovospasesafrica-nos de expresso portuguesa e as missesde interesse pblico (fiscalizao da pescae da poluio ambiental na Zona EconmicaExclusiva e nas guas territoriais, operaesde busca e salvamento, obras de engenha-ria ao servio da qualidade de vida das po-pulaes) se viram revalorizadas neste novocontexto.O Exrcitofoinaturalmenteoramoquesofreu a mais substancial reduo de efecti-vos, que passaram de cerca de 170 000, em1973,paracercade23 000,em2006.NaArmada a reduo foi de 18 000 para 11 000enaForaAreade16 000para8000.A carreira militar foi aberta em 1993 s mu-lhereseoserviomilitarobrigatrioviuoseu tempo drasticamente reduzido para oi-tomesesnoExrcito,sendoquaseinte-gralmente substitudo pelo voluntariado nosrestantes ramos. A partir da reviso consti-tucionalde1997,deixoudeserumaobri-gatoriedadeconstitucional,passandoaleia regular as suas formas. Em 2003 foi inte-gralmentesubstitudopeloregimedevo-luntariado profissionalizado.As relaescom os estados lusfonosNo contexto da poltica externa e das rela-esinternacionaisdoEstadoportugusassumem particular relevo os laos privile-giadosdeamizadeecooperaocomospases de lngua portuguesa, a que se refe-re o artigo 7.oda Constituio.As feridas das guerras coloniais deramrapidamentelugarasentimentosdeliga-o afectiva e cultural e de respeito mtuocomospovosdasex-colniasafricanas,traduzidosnumapolticadecooperaoe solidariedadeavriosttulosexemplareque recolhe o apoio de todos os quadran-tes partidrios portugueses. O regresso dePortugalsuamatrizeuropeiafoi,assim,acompanhado por uma redefinio da suavocaoextra-europeia,nodesempenhode um papel de ajuda diplomtica, econ-micaeculturalquehojereclamadodeCabo Verde a Timor Leste.A constituio em 1997 da ComunidadedosPasesdeLnguaPortuguesa(CPLP)representou simultaneamente o coroamentode um processo de normalizao e aprofun-damentodasrelaescomosnovosesta-dos de lngua oficial portuguesa e o Brasil eo ponto de partida para iniciativas conjuntasnoplanopoltico,econmicoecultural,norespeitopelasinstituiesdemocrticasepelosdireitoshumanos,quecontribuamigualmente para a afirmao desta comuni-dade no sistema internacional.Neste contexto assume ainda particularimportnciaoapoioquetemvindoaser36OEstado%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%OEstadoCimeira constitutiva da Comunidade dos Pases de Lngua Portuguesa (CPLP).canalizadopeloEstadoportugusparaareconstruoedesenvolvimentodeTimorLeste,directamenteeatravsdasensibili-zaodacomunidadeinternacional,bemcomo a colaborao com a ONU em todo oprocessoqueconduziuindependnciadaquelaantigacolniaportuguesadoEx-tremo Oriente.A relao com a UnioEuropeiaAparticipaoactivadePortugalnopro-cessodeunificaopolticaeuropeiaeasua integrao no ncleo de pases funda-doresdoeuroveionaturalmenteredefiniros limites da soberania do Estado, alienan-do em prol da Unio Europeia algumas dassuas funes tradicionais e limitando signi-ficativamenteoalcancedeoutras.Tratou--se do preo a pagar para vencer o atrasoestrutural da sociedade portuguesa e con-ferir-lhepadressuperioresdequalidadedevida.Noforamapenasascompetn-cias do banco central portugus que se vi-ramsubstancialmentereduzidasemfun-odaadopodoeuro.Foramtambmos rgos de soberania em geral presi-dente da Repblica, Assembleia da Rep-blica,governoetribunaisque,emcon-sequnciadarealizaodoprojectodeunificaopoltica,setmvistoprogressi-vamentelateralizadospelasprpriasca-ractersticaseexignciasdoprocessodedecisocomunitrioepeloinevitvelalar-gamento do mbito de matrias objecto doordenamento jurdico comunitrio. Sem es-quecer o crescente peso da tecnoburocra-ciaadministrativanacional,quesereportamuitas vezes directamente Comisso Eu-ropeia e sua estrutura administrativa, as-simcontribuindotambmparaarelativaperdadepoderdosrgosdesoberaniaenquanto tal (cf. Vitorino, 1994).A conscincia das inevitveis limitaesde soberania postuladas pela crescente in-tegraoeuropeianosnoinibecomoestimulaumaintervenomaisactivadoEstadoportugusnasinstituiescomuni-trias,ondesevembatendoporsoluesque, beneficiando a Unio Europeia no seuconjunto, se repercutem igualmente de for-mapositivanodesenvolvimentodasocie-dade portuguesa e na salvaguarda dos in-teressesnacionais.FoiesteoespritoquepresidiunegociaodaAgenda2000,onde, apesar das dificuldades de uma con-juntura restritiva, foi possvel garantir a con-tinuidade de importantes ajudas estruturaisat 2006, no mbito do III Quadro Comuni-trio de Apoio. E foi este tambm o espritoque conduziu aprovao de um novo arti-37OEstado%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%RetratodePortugalgonoTratadodaUniosobreasregiesultraperifricas, onde se incluem os AoreseaMadeira,queassimpassamadispordodireitoapolticasespecficasdeapoio.Domesmomodo,tambmaspreocupa-esportuguesascomalutacontraode-semprego e a excluso social, com o refor-odosdireitosdecidadaniaeuropeiaecomacooperaonocombatecriminali-dadeorganizada,drogaeaoterrorismotm merecido o devido acolhimento nas ins-tncias comunitrias e no Tratado da Unio.Fiel sua vocao europesta, o Estadoportugus vem-se igualmente batendo pelaconsolidaoeoperacionalidadedosme-canismos da Poltica Externa e de Seguran-aComum(PESC),nombitodosquaisassumeparticularrelevoainstituiodaIdentidade Europeia de Segurana e Defe-sa (IESD), futura herdeira da UEO, em arti-culaocomaNATO.Emostrou-se,poroutrolado,empenhadonoprocessodealargamento da Unio Europeia, como for-madeconsolidaodasdemocraciasemergentesforadassuasactuaisfrontei-raseconsequentediluiodefocosdetenso.A Presidncia portuguesa da Unio Euro-peianoprimeirosemestredoano2000,aofazer aprovar a chamada estratgia de Lis-boa,deuumimportantecontributoparaaimplementao de um modelo de desenvol-vimentoeconmico,socialeculturalcapazderesponderaosdesafiosdagobalizao.DaPresidnciaportuguesano2.osemestrede2007espera-seumnovoimpulsoparaestaestratgia,apardenovoscontributospara a superao da crise institucional vividapela Unio desde o fracasso do processo deaprovao do seu tratado constitucional.Os desafios do futuroimediatoO Estado de direito democrtico possui ho-jeemPortugalumasolideznuncaantesatingida no passado.Noplanoconstitucional,maisdoquecaminhar para novas revises, importa hojesobretudopotenciarasbenfeitoriasintro-duzidasnarevisode1997comvistaaoreforodosmecanismosdademocraciaparticipativa.Seoesquemadefunciona-mentodosrgosdesoberaniadademo-cracia representativa, assente numa equili-bradarepartiodecompetnciasenumeficazcontrolorecprocodepoderes,temprovadoglobalmentebem,,defacto,naesferadautilizaodosinstrumentosdademocraciaparticipativaquesejustificaagorasobretudoapostar,atcomoformade revalorizar a democracia representativaaos olhos do cidado comum.O uso das novas tecnologias com vista facilitao do exerccio do direito de votoe ao reforo das relaes interactivas entreos eleitos e os eleitores e entre os membrosdogovernoeoscidados,oestmuloaousodoreferendolocalearecenteadop-odemedidasdediscriminaopositivaparaasseguraraigualdadedossexosnoacessoacargospolticosconstituem-seem outros tantos contributos para garantir ademocracia das cidads e dos cidados.Sem esquecer, como bvio, a aposta per-manenteecombonsjurosaprazonumaeducao para a cidadania e na extenso atodos dos benefcios da sociedade de infor-mao condies basilares de uma cida-dania activa.No plano da organizao administrativadoEstado,urgecombinarareformadosserviosperifricosdaadministraocen-tral, visando uma melhor coordenao hori-zontaleterritorialdaspolticaspblicas,comoprosseguimentodadescentraliza-odecompetnciasnoapenasparaosmunicpiosmastambmparaasreasmetropolitanas,norespeitodoprincpioda subsidiariedade.Adesburocratizaoda administrao pblica em geral e a suaaproximaoaoscidados,comamelho-ria substancial dos servios prestados, soaindahojeimperativosurgentesedein-38OEstado%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%OEstadoUma das Lojas do Cidado, smbolo da desburocratizao da administrao pblica e da suaaproximao aos cidados.questionvelactualidade,apesardoses-foros que tm vindo a ser empregues e dacrescenteutilizaodosrecursosdastec-nologiasdeinformao,nasequnciadorecente programa Simplex.Umajustiamaisrpidaeeficiente,maisprximaeacessvelaoscidadosecom os meios adequados para combater acorrupoeacriminalidadeeconmicahoje uma exigncia generalizada da socie-dadeportuguesa.Maisdoquedramatizara sua relao com os agentes polticos, im-portarendibilizaraomximoasvirtualida-des da orgnica instituda e conferir-lhe osmeios prticos de actuao.No plano da defesa e da poltica exter-na,porltimo,tudoindicaqueoEstadoportugus est no bom caminho, cada vezmais empenhado em assumir por inteiro assuasresponsabilidadesnombitodaUnio Europeia e de outras organizaes ealianasinternacionaiscomooConselhoda Europa, a Organizao para a Seguran-a e Cooperao Europeia (OSCE), a ONUeaNATO.Oreforodosmecanismosde-mocrticosdecontrolodospoderesdaUnioEuropeiadeve,porm,merecer-lheumaatenopermanente.Talcomoore-foro dos poderes ou mesmo a criao deinstnciasinternacionaisderegulaodaglobalizaoeconmicaemcurso.Conti-nuaraapostarafundonasrelaescomospasesdelnguaportuguesatambmum imperativo incontornvel.39OEstadoSociedade% % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % % %A sociedadeO territrioA lngua portuguesaA comunicao socialA sociedade do conhecimentoe da informaoO desporto43SociedadeA sociedade%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%Joo Ferreira de AlmeidaLus CapuchaAntnio Firmino da CostaFernando Lus MachadoAnlia TorresAsociedade portuguesa tem sido, aolongo das ltimas dcadas, cenriodeintensastransformaes.Numprimeiroplano,importadestacarumcon-juntodeprocessosdefundo,decarcterestrutural,quesemanifestamemPortugalcommaiorintensidadedesdeosanos60.Taisprocessossociaiscomportandovectoresdepermannciaedemudana,de continuidade ou de inflexo de tendn-cias, em combinaes por vezes surpreen-dentes influram de maneira decisiva, sebemquemaissubterrneaegradualdoqueimediatamenteaparente,quernodesencadeamento,em1974,darupturapoltica com o longo perodo anterior de re-gimeditatorial,quernasubsequentemo-dernizao das instituies e da economia,dos valores culturais e dos estilos de vida.Tudoapontaparaqueofuturoprximocontinue a ser fortemente marcado por es-se conjunto de processos estruturais.Emsimultneo,noutroplano,sobres-saemasmudanasmaisdirectamentere-portveis aco colectiva, as quais influen-ciaram, por sua vez, com impactes variveis,aquelastransformaesestruturais,acen-tuando-as,esbatendo-asoureorientando--as, numa sequncia que foi pontuando, deforma saliente, a vida social do pas. So dis-soexemplosnotveisasacespolticaseos movimentos sociais que presidiram ao re-ferido derrube da ditadura e, em seguida, consolidao das instituies democrticas,nasegundametadedosanos70.So-no,igualmente, as orientaes estratgicas que,a nvel poltico, levaram integrao na Eu-ropacomunitria,desdemeadosdosanos80,esetapassucessivasdeparticipaoportuguesanoprocessodeconstruodaUnio Europeia (UE).Incluem-seaqui,tambm,polticasp-blicascomincidnciaeconmica,socialecultural extremamente significativa, mesmoque de sentido varivel ao longo do pero-doemanlise,comoasnacionalizaesdasgrandesempresas,nadcadade70,e a sua posterior privatizao, gradualmen-teemcursoapartirdasegundametadedos anos 80. Assinalem-se tambm as pol-ticas de modernizao de infra-estruturas eliberalizaogradualdaeconomia,napri-meira parte da dcada de 90, e as de inte-grao no espao da moeda europeia, de-senvolvidasdesdeasegundapartedadcada de 90 e culminando com a entradaem circulao do euro em 2002.Noutros domnios, mas com idntica re-levncia,podedestacar-seacrescenteprioridade poltica atribuda aos processosde qualificao escolar, profissional e cien-tficadapopulao;ouapromoodeacesemblemticasderevalorizaodavisibilidadeculturaldopasnopalcointer-nacional,comofoiocasodaExposioMundialdeLisboa(Expo98);ouaspolti-casdesolidariedadesocialcomoasque,em particular na segunda metade dos anos90,tomaramcomoobjectoocombatesformastradicionaisenovasdepobrezaeexclusosocial.Soaindadereferir,an-vel da UE, a contribuio portuguesa paraolanamento,naviragemdomilnio,daagenda de Lisboa, focada na procura demaiorcompetitividadeeuropeianoquadrodo processo de globalizao, e, a nvel na-44Sociedade%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%RetratodePortugalO Pavilho da Utopia, palco de inmeros espectculos e uma das principais atraces durantea Expo 98, agora designado Pavilho Atlntico.cional,asrecentespolticasdeequilbriodas contas pblicas e de racionalizao doEstado, bem como medidas no sentido damudanadeparadigmatecnolgiconaeconomia polticas estas que assentam,tantoasdembitointernacionalcomoasdembitonacional,naprioridadeaoco-nhecimento e inovao.A respeito de todo este conjunto de as-pectos,relativossociedadeportuguesatalcomoelasetemvindoaconfiguraretende a projectar-se no futuro imediato, in-teressarelembrarumconjuntosuficiente-menteelucidativodeelementosinformati-voseanalticos,sebemqueemregistocondensado.Evolues demogrficase recomposies sociaisOs processos de recomposio social pelosquaisapopulaoportuguesatemvindoapassardesdobram-seemdiversasdimen-ses,nomeadamentedemogrficas,geo-grficas,educativasesocioprofissionais.Emcadaumdessesaspectospodemob-servar-sedinmicasespecficas;masmaisimportantesaindasoasconvergnciaseastensesqueseestabelecementreelas,assim como as articulaes recprocas e osefeitos que vo tendo umas nas outras, quernasvertentesquedecorremacentuada-mentedocontextointernacional(emparti-cular, do espao europeu), quer nas verten-tesemqueprevalecemespecificidadesnacionais(Almeida,CostaeMachado,1994; Machado e Costa, 1998; Costa, Mau-ritti, Martins, Machado e Almeida, 2002).Nosanos60,apopulaoportuguesaera ainda em grande medida rural e traba-lhava em formas de agricultura tradicional,quer de assalariamento precrio, muito emespecial nos latifndios do Sul, quer de pe-queno campesinato proprietrio ou rendei-ro,predominantenasregiesdoCentroedoNorte.Verificavam-seentoaltastaxas%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%% %%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%Asociedade45Sociedadedenatalidadeeumperfildemogrficoca-racterizado por uma pirmide etria de ba-se larga e topo afilado. As condies de vi-damuitodifceis,squaisnaalturasevinhaaindasomarorecrutamentomilitaremmassadosjovensdosexomasculino,enviados pelo regime de ento para as for-asarmadasdaGuerraColonial,tudofoicontribuindoparaqueessapopulaoseenvolvesse em intensos movimentos migra-trios.Procurava,assim,viasdeacessoavida melhor, quer na emigrao para a Eu-ropa mais desenvolvida sobretudo paraFrana e para a Alemanha , quer nas mi-graesinternasparaasprincipaiscida-des,muitoemespecialparaasreasemindustrializao de Lisboa e do Porto.A obteno de emprego na indstria ounosserviospessoais,porumlado,eoacessomaiorescolarizaodosfilhos,por outro, foram dois dos vectores dinami-zadores, ou, pelo menos, duas das conse-quncias decisivas destes movimentos po-pulacionais.Comelasveioainseroemmodos de vida urbanos e o comeo de ou-trosprocessosfundamentais:umasignifi-cativa mudana dos valores sociais preva-lecentesedoscomportamentosaelesassociados,bemcomoalteraesglobaisdetendncias,envolvendoodecrscimoda natalidade e a diminuio da dimensodosagregadosdomsticos,comasres-pectivasimplicaessociodemogrficasesocioculturais,ouaindaaaceleraosemprecedentesdaconcentraodapopula-o numa estreita faixa urbanizada do lito-ral do pas, com a correspondente desertifi-cao gradual do resto do territrio.Alguns destes processos esto em cur-so at hoje. Outros sofreram inflexes.Quantoevoluodaestruturademo-grfica,atendnciadefundoparaumprogressivoduploenvelhecimentodapo-pulao,nabaseenotopo,ouseja,para a diminuio da proporo de jovenseparaoaumentodataxadeidosos(verquadro da p. 47).Asconsequnciassomultifacetadas tal como j anteriormente tinha aconteci-do, ou est em plena manifestao, de ummodomaisgeral,noconjuntodospaseseuropeus,emaspectoscomoosdasmudanasnospadresdeconsumo,nossistemasdevaloresounasrelaesinter-geracionais, ou ainda como os das implica-esnaspolticasdeeducao,desegu-ranaedeassistnciasocial.Voltar-se-,adiante, a algumas destas questes.Peloseulado,aevoluooscilantedopeso relativo da faixa intermdia dos adul-tosprimeirodecrescente,depoisemcrescimentoacentuadoe,maisrecente-mente, em quase estacionaridade s secompreende tendo em conta a conjugaodastendnciascontinuadasparaadimi-nuio das taxas de natalidade e de morta-lidade com os movimentos migratrios glo-bai s.Nadcadade60enapri mei rametadedadcadade70,aosfluxosemi-gratriosdeintensidademximasucedeum abrandamento a que se articula, na se-gunda metade da dcada de 70, o regres-so de parte dos emigrantes europeus e, so-bretudo,oretornodemuitosdosantigosresidentes nas ex-colnias, depois do der-rubedadi taduraedasuai nsti tuci o-nalizaocomopasesindependentes.A partir da dcada de 80 aumenta o volumeda recepo a imigrados, em particular pro-venientesdessesnovospasesafricanos.Progressivamente,vai-se-lhesjuntandoumforte contingente de brasileiros e de imigra-dos vindos de pases do Leste europeu.No plano geogrfico, a progressiva de-sertificaodointeriorruralcontinuaaacentuar-se,acompanhadadaconcentra-odapopulaonafaixalitoralurbana,muitoemespecialnasreasmetropolita-nas de Lisboa e do Porto, ou, mais recente-mente, tambm em algumas cidades prxi-masdaquelas(Setbal,Le