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REVERBERAÇÕES DO NEOLIBERALISMO NA POLÍTICA DE SAÚDE E A ATUAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL FRENTE A GESTÃO EBSERH: ponderações sobre a prática profissional no Ambulatório do Hospital Universitário Lauro Wanderley Aline de Oliveira Mendes 1 Karina Karla de Souza Bastos 2 RESUMO: Este artigo tem por objetivo apresentar algumas ponderações sobre as inflexões do neoliberalismo na política de saúde, bem como a atuação dos/as assistentes sociais nesse campo institucional, sobretudo, frente a gestão EBSERH, destacando as particularidades no espaço de vivência do estágio supervisionado I, o Hospital Universitário Lauro Wanderley, localizado em João Pessoa PB. O estudo utiliza pesquisa bibliográfica e anotações do diário de campo, pautado numa abordagem qualitativa. As análises realizadas, nos permitem afirmar que as transformações desencadeadas pelo capitalismo, sobretudo a partir dos anos 1990 tem dificultado a concretização dos princípios do SUS, implicando novos desafios ao Serviço Social. Palavras-Chave: Neoliberalismo; Sistema Único de Saúde; HULW. ABSTRACT: The purpose of this article is to present some considerations about the inflections of neoliberalism in health policy, as well as the role of social workers in this institutional field, especially in relation to EBSERH management, highlighting the particularities in the living space of the supervised stage I, The Lauro Wanderley University Hospital, located in João Pessoa - PB. The study uses bibliographic research and field journal annotations, based on a qualitative approach. The analyzes made allow us to affirm that the transformations unleashed by capitalism, especially since the 1990s, have made it difficult to materialize SUS principles, implying new challenges to Social Work. Keywords: Neoliberalism; Health Unic System; HULW. 1 Graduanda em Serviço Social, 7º período pela Universidade Federal da Paraíba. E-mail: [email protected] 2 Graduanda em Serviço Social, 8º período pela Universidade Federal da Paraíba. E-mail: [email protected]

REVERBERAÇÕES DO NEOLIBERALISMO NA POLÍTICA DE … · sobretudo, frente a gestão EBSERH, destacando as particularidades ... seu exercício profissional através da mediação

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REVERBERAÇÕES DO NEOLIBERALISMO NA POLÍTICA DE SAÚDE E A

ATUAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL FRENTE A GESTÃO EBSERH: ponderações

sobre a prática profissional no Ambulatório do Hospital Universitário Lauro

Wanderley

Aline de Oliveira Mendes1

Karina Karla de Souza Bastos2

RESUMO: Este artigo tem por objetivo apresentar algumas ponderações sobre as inflexões do neoliberalismo na política de saúde, bem como a atuação dos/as assistentes sociais nesse campo institucional, sobretudo, frente a gestão EBSERH, destacando as particularidades no espaço de vivência do estágio supervisionado I, o Hospital Universitário Lauro Wanderley, localizado em João Pessoa – PB. O estudo utiliza pesquisa bibliográfica e anotações do diário de campo, pautado numa abordagem qualitativa. As análises realizadas, nos permitem afirmar que as transformações desencadeadas pelo capitalismo, sobretudo a partir dos anos 1990 tem dificultado a concretização dos princípios do SUS, implicando novos desafios ao Serviço Social. Palavras-Chave: Neoliberalismo; Sistema Único de Saúde; HULW. ABSTRACT:

The purpose of this article is to present some considerations about the inflections of neoliberalism in health policy, as well as the role of social workers in this institutional field, especially in relation to EBSERH management, highlighting the particularities in the living space of the supervised stage I, The Lauro Wanderley University Hospital, located in João Pessoa - PB. The study uses bibliographic research and field journal annotations, based on a qualitative approach. The analyzes made allow us to affirm that the transformations unleashed by capitalism, especially since the 1990s, have made it difficult to materialize SUS principles, implying new challenges to Social Work.

Keywords: Neoliberalism; Health Unic System; HULW.

1 Graduanda em Serviço Social, 7º período pela Universidade Federal da Paraíba. E-mail: [email protected] 2 Graduanda em Serviço Social, 8º período pela Universidade Federal da Paraíba. E-mail: [email protected]

1. INTRODUÇÃO

A princípio, gostaríamos de ressaltar que a discussão abordada neste estudo

é resultado da vivência no Estágio Supervisionado I, realizado no Hospital

Universitário Lauro Wanderley no setor de Serviço Social do Ambulatório, articulados

ao diálogo com autores renomados do Serviço Social, a exemplo de, Bravo (2007),

Mota (2009), Iamamoto (1997), Yazbek (2009), dentre outros.

Partimos do pressuposto que o estágio desenvolve função imprescindível no

processo de formação do alunado. Conforme o CFESS (s/d), o estágio

supervisionado tem por finalidade capacitar os/as alunos/as de Serviço Social para o

seu exercício profissional através da mediação entre o conhecimento absorvido na

formação acadêmica e a realidade social, pois este espaço possibilita conhecer a

realidade institucional, articulada ao aporte teórico metodológico, o instrumental

técnico-operativo, e a dimensão ético-político para intervir no campo de ação.

O estágio permite concretizar a integralização da formação profissional, a

medida em que oferece as bases para os processos de formação entre teoria e

prática. Aqui, nos cabe ressaltar a importância da categoria mediação enquanto

“potencialidade heurística e interventiva” do Serviço Social (PONTES, 1997, p. 155).

Uma vez que a mediação, em suas dimensões ontológicas e reflexivas permitem

uma compreensão dialética do movimento do ser social recorrer as categorias

concretas que se articulam e dão sentido ao processo histórico, buscando

compreender as conexões e articulações entre os acontecimentos para capturar a

essência do real concreto e sair do plano aparente-abstrato (PONTES, 1997).

Neste estudo, versaremos sobre análise do desenvolvimento histórico da

política de saúde, no seu marco legal e conceitual. Considerando as principais

demandas e observações sobre a prática do Assistente Social na Saúde, sobretudo

no Hospital Universitário Lauro Wanderley, destacando o setor do Ambulatório,

buscando fazer interlocução com aporte teórico e legal, desvelando os principais

limites e impasses à concretização do Sistema Único de Saúde e atuação dos

profissionais de Serviço Social na cena contemporânea.

2. Inflexões do neoliberalismo na política de saúde: desmontes, retrocessos e

descontinuidades das propostas do SUS

O período da década de 1990 é marcado por uma conjuntura de reformas no

âmbito da administração do aparelho Estatal. Diante de um cenário de instabilização

financeira e política teve-se a necessidade de medidas para conter a inflação e a

crise que percorria o país desde meados dos anos 80. No que diz respeito ao

governo de Fernando Henrique Cardoso – FHC (1995-2003), tem-se formulação do

Plano Diretor da Reforma do Estado - PDRE, idealizado pelos intelectuais orgânicos

do Ministério Administrativo da Reforma do Estado na direção de Bresser Pereira

concretizaram a implementação do Plano em seu governo. O PDRE procuraria

trazer mudanças na legislação no aspecto administrativo, no qual seria adotada uma

cultura gerencialista que focaria nos resultados e não nos processos, tendo em vista

que se considerava o Estado burocrático. Com intuito de promover a estabilidade

econômica, FHC traz também a proposta do Plano Real que surgiu a partir de

discussões no consenso de Washington.

Embora a nomenclatura social-liberal fizesse parte do ideário que o PDRE

queria estabelecer, nota-se que o caráter progressista do plano não se concretizava,

pelo contrário, o que caracteriza esse processo de implantação desse plano são as

regressões e desmontes, visto que nesse período há a implantação da ideologia

neoliberal. Com o cenário de redefinição do aparelho estatal, a partir do PDRE-mare,

configura-se vários processos como: abertura comercial, privatizações e

aprofundamento da relação público-estatal.

No que tange à política de saúde, no início dos anos 90 é criada uma

legislação específica para o SUS que são as leis 8.080 e 8.142. A primeira, Lei

Orgânica da Saúde, apresenta os aspectos gerais como organização, promoção e

prevenção da saúde; a segunda, Lei do Controle Social dispõe acerca da

participação popular na gestão da política, e da transferência de recursos.

Similarmente, no mesmo ano, materializa-se a Implantação do SUS até 1993; esse

momento caracteriza-se de maneira flexível, passível à mudanças nas estratégias.

Ao longo da década também houve a criação de Normas Operacionais Básicas –

NOBs, que não faziam parte da legislação do SUS mas orientavam a implantação do

sistema.

Outro importante passo é a criação do Programa Saúde da Família – PSF,

criado em 1994, traz uma nova perspectiva na análise na atenção primária à saúde,

priorizando o atendimento à família nos aspectos de diagnóstico, prevenção,

reabilitação e cuidados primários em saúde. O Programa de Agentes Comunitários

em Saúde, vinculados aos PSF, implantado no País em 1991, tem como objetivo a

aproximação dos usuários da política de saúde, a partir de sua realidade. Esses

agentes fazem contato com as famílias, e discutem o problema no PSF, juntamente

com a equipe de saúde.

Após o ápice do neoliberalismo, é possível vislumbrar alguns impasses para a

concretização do Sistema Único de Saúde Brasileiro, que ferem os princípios

contidos na Constituição Federal de 1988, podemos elencar dentre eles,

o desrespeito ao princípio de equidade na alocação de recursos públicos pela não unificação do orçamento federal, estaduais e municipais; afastamento do princípio da integralidade, ou seja indissolubilidade entre prevenção e atenção curativa, havendo prioridade para a assistência médico hospitalar em detrimento das ações de promoção e proteção da saúde (BRAVO, 2009, p.101).

É fato que o projeto de saúde fundamentado na política de ajustes possui

como tendência basilar “a contenção de gastos com a racionalização da oferta e a

descentralização com isenção de responsabilidade do poder Central” (CFESS, 2010,

p.22), visto que o campo da saúde constitui um importante setor de acumulação

para o capital, dificultando ainda mais a concretização de sistemas públicos

universais de saúde (GIOVANELLA, 2012).

Nesse cenário neoliberal, encontra-se em contraposição dois projetos no que

diz respeito à política de Saúde: de um lado há o projeto vinculado ao mercado, com

parcerias e a perspectiva da privatização; e o projeto da Reforma Sanitária,

articulado aos princípios do SUS pautado na universalização do acesso aos

cidadãos. O projeto privatista tem como uma das marcas a perspectiva da

benevolência, e não do direito, como salienta BRAVO (2001):

A Saúde fica vinculada ao mercado, enfatizando-se as parcerias com a sociedade

civil, responsabilizando a mesma para assumir os custos da crise. A

refilantropização é uma de suas manifestações com a utilização de agentes

comunitários e cuidadores para realizarem atividades profissionais com o objetivo de

reduzir os custos.

Após a saída de FHC da presidência em 2002, o ex- sindicalista Luiz Inácio

Lula da Silva, popularmente conhecimento como Lula, foi eleito por meio do Partido

dos Trabalhadores (PT) com uma margem significativa de votos, e o anseio da

população por novos rumos na política brasileira. Partindo desse pressuposto, sabe-

se que a gestão de Lula trouxe avanços no que diz respeito ao âmbito social, com a

criação de programas como Minha casa, minha vida, Prouni, além de dar

prosseguimento as ações que haviam sido iniciadas na presidência de FHC: o

programa Bolsa Escola foi aperfeiçoado e tornou-se o Bolsa Família, se constituindo

como um marco nos programas de transferência de renda.

Apesar de propor e dispor-se a colocar ações de cunho social na prática, a

perspectiva neoliberal aprofundou-se nos processos econômicos do Governo Lula,

permanecendo as práticas de retrocessos e desmontes. As políticas mantiveram um

caráter específico do período neoliberal, focalizadas.

As ações desenvolvidas no âmbito da saúde sofreram mudanças no que diz

respeito a gestão, alocação de recursos, e a criação de propostas inovadoras.

Destaca-se aqui algumas iniciativas tomadas: Criação do Programa Brasil

Sorridente, com o intuito de abranger o tratamento odontológico a população;

Criação do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) com a prestação de

um atendimento primeiro e rápido até a chegada da unidade hospitalar, além da

criação da Farmácia Popular que se constitui como uma parceria com farmácias de

todo âmbito nacional, até 90% de desconto em relação aos produtos

comercializados (MENICUCCI, 2011).

O Programa Saúde da Família (PSF) recebe uma nova nomenclatura em

2008 tornando-se Estratégia Saúde da Família (ESF), no qual não obtém mais um

caráter de programa dada a ideia de término que a terminologia adota, mas passa a

ser estratégia porque reorganiza a modelo assistencial primária em saúde a partir do

modelo sanitário.

Tendo em vista as limitações que apresenta o ESF, e atentando para o fato

de que, segundo a NOB/SUS (1996) a equipe seria formada apenas por médico,

enfermeiro, odontólogo, agente comunitários de saúde e auxiliar odontológico, sendo

explicito um mínimo de categoria interdisciplinar para atender os usuários da

atenção básica. A partir dessa problemática, são criados os Núcleos de Apoio à

Saúde da Família pelo Ministério da Saúde em 2008:

Considerando a Portaria nº 399/GM, de 22 de fevereiro de 2006, que aprova as

Diretrizes Operacionais do Pacto pela Saúde 2006, bem como a Portaria nº 699/GM,

de 30 de março de 2006, que regulamenta as Diretrizes Operacionais dos Pactos

pela Vida e de Gestão, resolve: Art. 1º Criar os Núcleos de Apoio à Saúde da

Família - NASF com o objetivo de ampliar a abrangência e o escopo das ações da

atenção básica, bem como sua resolubilidade, apoiando a inserção da estratégia de

Saúde da Família na rede de serviços e o processo de territorialização e

regionalização a partir da atenção básica. Art. 2º Estabelecer que os Núcleos de

Apoio à Saúde da Família - NASF constituídos por equipes compostas por

profissionais de diferentes áreas de conhecimento, atuem em parceria com os

profissionais das Equipes Saúde da Família - ESF, compartilhando as práticas em

saúde nos territórios sob responsabilidade das ESF, atuando diretamente no apoio

às equipes e na unidade na qual o NASF está cadastrado.

Diante do exposto, vale destacar um importante marco do Governo do PT, A

Política Nacional de Humanização (PNH). Criada em 2003, foi um importante marco

do Governo do PT, e traz a concepção de uma nova cultura de atendimento em

saúde, preconizando ações de perspectiva acolhedora com todos os envolvidos na

política de saúde: usuários, profissionais, gestores e afins.

3. O Serviço Social no Hospital Universitário Lauro Wanderley: principais demandas

Ambulatoriais e condições de trabalho

O Hospital Universitário Lauro Wanderley encontra-se localizado no Campus I

da Universidade Federal da Paraíba, no Bairro de João Pessoa – PB. Foi

inaugurado oficialmente em fevereiro de 1980, se constituindo como estrutura de

saúde de referência para todo o território paraibano, disponibilizando atendimento

para os municípios do Estado, sendo referência também na atenção ambulatorial

especializada.

Assim, o HULW é uma instituição pública, não lucrativa, de assistência à

saúde, e de apoio ao ensino, pesquisa e extensão, dispondo de atendimento

especializado com total aptidão tecnológica a fim de promover um atendimento

qualificado, fortalecendo as ações e serviços do Sistema Único de Saúde da

Paraíba. Apresenta como missão o cuidar em saúde, a promoção do bem-estar e o

desenvolvimento de atividades de ensino e pesquisa para formação dos saberes

científicos, da prática ética, por meio do respeito e na dignidade humana.

(HISTÓRIA DO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO LAURO WANDERLEY – MISSÃO E

VALORES, 2015).

O Hospital encontra-se dividido em duas áreas que compõem seu espaço

físico: hospitalar, em que os serviços estão organizados em diversas clínicas; e

ambulatorial, em que são disponibilizados diversos serviços em consultas

especializadas, paramédicas, pré-natal para gestação de alto risco e cirurgias

ambulatoriais. Entre os programas e os projetos de cunho multidisciplinar

desenvolvidos no hospital ofertados para a população, tem-se: Programa de

Atenção Multidisciplinar ao Adolescente (PROAMA), Programa de Saúde do

Trabalhador (PROSAT), Núcleo de Reabilitação de Fissuras Lábio Palatinos,

Programa de Atendimento ao Diabético, ambos localizados na unidade ambulatorial.

É preciso, todavia, pontuar que nos primeiros anos do século XXI emerge

uma série de debates em torno dos Hospitais Universitários pelo Ministério da Saúde

e da Educação, com a concepção de reestruturar a oferta de serviços na esfera

pública. Por meio dessas discussões ocorreu a criação, em 2003, da Comissão

Interministerial de Refinanciamento e Gestão para os HU’s no âmbito nacional.

Diante disso, a partir de 2011, no mandato da Presidente Dilma Rouseff, foi

implantada a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) que se

estabeleceria como um novo sistema de administração e gerência para os Hospitais

Universitários de âmbito nacional. Através do projeto Nacional de Reestruturação

dos Hospitais Universitários (REHUF), estabelecido em 2010, entendia-se que era

necessária a gerência de caráter privado para reorganizar e reformar os HU’s, visto

que esses hospitais se encontravam em estado de sucateamento, e as crises que se

apresentavam nesse campo. Assim, o governo federal repassaria os recursos

financeiros para a empresa pública de caráter privado. O ideário neoliberal de cunho

gerencialista se estabeleceria, dando continuidade à política do neoliberalismo que

teve sua ascensão na década de 90 no governo de Fernando de Henrique Cardoso

– FHC.

É notório que após o estabelecimento da Gestão da EBSERH há uma

aproximação do modelo de gestão das empresas privadas para o âmbito do Estado,

com a parceria do público e privado, fomentando os processos de privatização.

Conseguinte, esse modelo de gestão ocasiona desmontes no que tange a

precarização e flexibilizações nas relações trabalhistas, e traz a perspectiva do

Estado não interventivo, preconizando que este não conseguiria responder as

demandas eficientemente (BEHRING, 2010).

Uma realidade vivenciada pelo HULW, em que é constado que os recursos

destinados via SUS são insuficientes para a manutenção e investimento dos

serviços, resultando em um acúmulo de dívidas para o Hospital, decorrente na

escassez de material e insumos necessários para a funcionamento adequado

(MIRANDA, 2011). É preciso salientar ainda que, somado a este fator, temos os

cortes de verbas nos Ministérios em 2015, que afetara os HU´s, visto que o MEC

sofreu um corte nos gastos de 33 %, e é um dos órgãos responsáveis pelo

financiamento dos Hospitais Universitários.

Sob esta perspectiva de sucateamento e com a justificativa de solucionar as

crises dos HU´s, dada a progressiva redução de pessoal que assolou o setor público

e da ausência de investimentos para absorver a missão de atenção social, as

demandas de ensino, pesquisa, extensão e assistência, o documento elaborado

para o Programa Nacional de Reestruturação dos Hospitais Universitários Federais

(REHUF) comprova a necessidade de um novo modelo de gestão. Assim, em 2013,

o HULW, adere a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) que busca

a atualização da gestão dos recursos humanos.

Conforme Silva, Silva (2013), desde o processo de institucionalização do

Serviço Social enquanto profissão, a saúde se configurou como um de seus

principais campos de inserção, parafraseando Souza (2009, p. 5,6), a [...] resolução

número 218 de 06/03/1967 do Conselho Nacional de Saúde, reconhece a categoria

de assistentes sociais como profissionais de saúde, com todo embasamento ético-

político, teórico-metodológico e técnico-operacional específicos de saúde [...], isto

implica dizer que o Serviço Social é uma profissão qualificada e apta a atuar na área

da saúde.

O Assistente social ao iniciar o desenvolvimento das atividades de trabalho

deve esclarecer junto aos usuários acerca dos objetivos e da sua amplitude

profissional (CE, CFESS, 2012). Parafraseando Iamamoto (1997, 120), “a prática

profissional não tem o poder miraculoso de revelar-se a si própria”, ela deve portanto

está inserida no bojo das relações sociais, no confronto das lutas de classe, da

relação com o Estado, e com os determinantes sociais, vez que constitui uma

profissão inscrita na divisão social do trabalho.

Assim, se faz necessário romper com as visões messiânicas e fatalistas que

permeiam a cultura do Serviço Social, esta última pautada no determinismo da

lógica capitalista, em que o profissional não pode fazer nada, limitando-se a práticas

burocráticas e rotineiras, por vez, a visão messiânica encontra-se desconecta da

perspectiva histórica, acreditando na possibilidade de revolução da profissão.

(IAMAMOTO, 1997).

O assistente social, ao inserir-se no trabalho em equipe da saúde, em possui

uma formação com habilidades e competências que lhe conferem ângulos

particulares de observação e análise das condições que conjugam o quadro de

saúde-doença vivenciada pelo usuário, possibilitando desenvolver ações

diferenciadas dos demais profissionais da área de saúde (idem).

O Serviço Social no HU está articulado com profissionais técnico-

administrativos buscando implementar normas e ações que permitam atender as

demandas apresentadas pelos usuários, manifestadas em doenças e

vulnerabilidades sócio econômicas, demandas institucionais, relativas à organização

do hospital (MANUAL OPERACIONAL DO HULW, 2015).

Os assistentes sociais do HULW desempenham sua função considerando

duas dimensões, a imediata, que pauta no primeiro contato, havendo a escuta das

demandas emergentes, conhecendo sua visão de mundo e expectativas, orientado,

informando e encaminhando; e dimensão mediata, tornando o contato com o usuário

um momento que possibilita entrelaçar informação e formação política na

perspectiva de defesa do exercício de cidadania dos sujeitos.

Os setores de atuação dos assistentes sociais no HULW estão vinculados a

Unidade de Atenção Psicossocial, na qual está inserida o Serviço Social. Assim

sendo, a profissão atua no Ambulatório, nos Programas (PROAMA, Fissurados,

SAE/MI), nas clínicas (CTI, Clínica Cirúrgica, Clínica Pediátrica, DIP, Clínica

Médica), na Unidade de Atenção à Mulher (Planejamento Familiar, Ginecologia,

Mastologia) e na Unidade Materno Infantil (Pré-Natal, Obstetrícia, UTI NEONATAL).

Ressaltaremos aqui, as principais demandas e competências do Assistente

Social no setor Ambulatorial, em razão de ser este, o espaço de nossa observação e

vivência no estágio supervisionado I e II. Nesse sentido, tomaremos como base os

registros do diário de campo.

Assim sendo, as demandas mais constantes identificadas no setor são: a

busca por encaminhamento de profissionais da instituição para providências

relacionadas à assistência ambulatorial em saúde, por meio da escuta, da oferta de

informações e esclarecimentos técnicos qualificados, que possibilitem uma trajetória

resolutiva, tanto no Hospital Universitário, quanto na rede regional local do SUS; a

busca por informações sobre os direitos trabalhistas e previdenciários – Auxílio

doença, aposentadoria, procuração, BPC/LOAS para idoso e pessoa com deficiência

- ; busca pela orientação sobre os procedimentos necessários para o acesso a

programas e benefícios governamentais, como o Bolsa Família, Benefícios

Eventuais, etc., sobre serviços assistenciais em geral, a exemplo das casas de

apoio, passe livre e outros, sobre o Tratamento Fora de Domicílio (TFD). Os

usuários buscam autorização de lanche ou almoço, quando possuem atendimento

estendido a outro turno.

Ademais, chegam ao ambulatório demandas espontâneas, busca por

encaixes de consulta e exames, por transporte, para que haja locomoção do usuário

até o referido Hospital e sua residência, o que em alguns casos requer contato das

assistentes sociais com as Prefeituras e Secretárias de Saúde, que contribuam para

a continuidade do tratamento e promovam o acesso ao conjunto dos direitos sociais.

Há também a procura por encaminhamento para a Defensoria ou Ministério Público,

para solicitação de aparelhos respiratórios, cadeiras de roda, e demais aparelhos

necessários ao usuário.

Destarte, frente a estas demandas, compete ao Assistente Social do

Ambulatório,

I. Acolher e escutar de forma qualificada os usuários; II. Atender demandas encaminhadas de outros setores do hospital e demais

serviços de rede de saúde e/ou demandas espontâneas III. Manter contato multiprofissional e administrativo com diversos setores do

hospital, bem como os serviços de rede, de acordo com a demanda apresentada;

IV. Realizar orientação aos usuários e acompanhantes; V. Verificar demandas, conforme atendimento dos usuários e/ou familiares, e os

encaminhar a serviços da instituição e a recursos da comunidade (MANUAL OPERACIONAL 2015).

As competências assinaladas deixam claro o compromisso dos profissionais

do Serviço Social Ambulatorial na direção de fomentar a luta e concretização da

cidadania dos sujeitos, expressa neste caso, pela viabilização do acesso dos

usuários aos serviços da instituição e demais serviços ofertados pela rede SUS.

Dentre os procedimentos mais utilizados, de acordo com o Manual

Operacional (2015) estão, o encaminhamento, orientação, apoio, a emissão de

documentos, a realização de contatos e a autorização de alimentação.

O mercado de trabalho demando do profissional de Serviço Social práticas

cada vez mais técnicas-operativas, decorrentes na demora do atendimento,

burocratização, precarização dos recursos e dificuldades no binômio qualidade-

quantidade de atendimento e não atendimento (CFESS, 2010), isto deixa claro que a

atuação deste profissional é permeada cotidianamente por condicionalidades que

dificultam e/ou impossibilitam resultados eficazes na viabilização dos direitos dos

usuários (SILVA, SILVA, 2013).

Esta realidade é identificada na parca disponibilidade de vagas ofertadas para

exames e consultas no HULW, reflexo da “ascensão do capitalismo monopolista

neoliberal [que] ampliou a precarização do sistema de saúde” (SILVA, SILV, 2013, p.

37). As demandas para o âmbito ambulatorial são crescentes, no qual os

quantitativos de vagas são insuficientes para atender todos os usuários que

precisam de atendimento; sobressai-se o fato que muitos usuários, advindos de

localidades distantes, chegarem no período da madrugada no hospital para

conseguir marcar consultas. Essa problemática faz parte de um processo amplo que

tem na política neoliberal seus antecedentes, afetando as políticas sociais, e

consequentemente a Seguridade Social, composta pela Saúde, Assistência Social e

Previdência. Laurell (2009), destaca que as táticas usadas pelo os Neoliberalismos

para implementação de sua ideologia versam entre cortes de gastos sociais e

privatização. Consequentemente, as demandas por serviços crescem, e ocorre a

procura por atividades do âmbito da saúde de cunho privado pelos usuários que

podem pagar, e a expectativa para aqueles que esperam na fila do SUS para um

atendimento.

Mas, ainda assim, o assistente social possui uma formação crítica analítica

que permite buscar formas alternativas para romper com as exigências

burocratizantes e meramente técnicas, mesmo não possuindo o “controle das

condições materiais, organizacionais e técnicas, para o desempenho de seu

trabalho” (YAZBECK, p.11), por ser um profissional dotado de relativa autonomia, é

possível desenvolver estratégias e mecanismos que permitam em seu exercício

profissional concretizar o projeto ético político em consonância com a luta pela

efetivação dos direitos da classe trabalhadora.

Embora as demandas que cheguem ao setor Ambulatorial do HULW sejam

semelhantes, apresentam-se também de maneira diversificada, exigindo

procedimentos distintos para suas respostas. Pode-se afirmar que, nunca seu

processo de trabalho será idêntico, ainda que as tentativas de interesse de seu

empregador sejam transformar esse trabalho em uma ação serializada, maciça, sem

reflexão contida na ação (SODRÉ, 2010), devido a dimensão de seu trabalho vivo

inserido no movimento dinâmico da realidade macrossocial.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao finalizar esta breve análise da realidade dinâmica da política de saúde no

Brasil, podemos concluir que tem sido, o SUS, alvo de ataques da política neoliberal,

enquanto estratégia de reestruturação do capital, desenvolvendo ações focalizadas

e seletivas, desconstruindo os princípios de universalidade e equidade estabelecidos

com a Constituição Federal de 1988. A conjuntura posta, coloca ao Serviço Social

novos desafios, sobretudo no campo de luta e resistência.

Se faz necessário, que as entidades político-organizativas e representativas

da profissão, se articule com demais profissionais da área de saúde e movimentos

sociais para fortalecer a luta em defesa do Projeto de Reforma Sanitária.

Deste modo, podemos constatar que os problemas que permeiam a política

de saúde brasileira, são estruturais, decorrentes do processo de formação da

sociedade capitalista tardia, assim, para alteração do cenário no qual se encontram

é necessário que haja transformações estruturais nas políticas sociais. Acreditamos

que este movimento, apenas se dará no momento em que houver uma ampla

mobilização que questione a cultura política da crise desencadeada pelo capital e

que lute pela ampliação da democracia em todas as esferas da vida social.

A vivência no estágio supervisionado, o qual integra o processo de formação,

permite que o discente articule o conhecimento absorvido na Academia com a

realidade social, que durante este processo irá sistematizar o conhecimento

apreendido entre estas duas esferas que estão intimamente vinculadas e

apresentam uma relação dialética de complementariedade.

Podemos identificar que os principais desafios enfrentados pelo Assistente

Social, perpassam desde as limitações estruturais do próprio Sistema Único de

Saúde, até a resistência ou mesmo ausência de diálogo com membros do corpo

profissional e administrativo.

A hierarquização profissional, também dificulta o trabalho em equipe, assim

como as decisões verticalizadas da Instituição. Contudo, o assistente social neste

espaço vem desenvolvendo suas ações de forma a promover um atendimento

humanizado, visando a facilitação do acesso ao serviço, calcado na perspectiva do

direito e em defesa do compromisso assumido com a classe trabalhadora, em

consonância com os princípios do projeto ético político, compreendo ainda, ser este

um espaço de luta e resistência entre interesses antagônicos.

REFERÊNCIAS:

BEHRING, Elaine Rossetti. Brasil em contra-reforma: desestruturação do Estado

e perda de direitos. Cortez Editora, 2003.

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