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Com muita satisfação temos a alegria de poder colocar em suas mãos mais uma edição da Revista da FAE. Assim como todas as edições, esta também foi elaborada por meio de contribuições valiosas e primorosas de autores e pareceristas - profissionais fundamentais neste processo - para os quais desejamos agradecer em nome da nossa instituição e corroborar que este canal de conhecimento sempre estará à disposição. Durante a elaboração desta edição tornou-se possível aflorar uma percepção sobre as reflexões do ambiente acadêmico expressas nas temáticas estudadas e apresentadas pelos pesquisadores, educadores, empresários e discentes em relação a questões ligadas à compreensão dos aspectos econômicos, melhoria contínua na gestão de empresas, métodos de ensino, educação e responsabilidade social.
Citation preview
F A E C e n t r o U n i v e r s i t á r i o
Sumário Summary
Eficácia da política monetária no Brasil: análise empírica pós-regime de metas de inflação
Marcos Wagner Fonseca
Capital Humano no Brasil no Período Colonial Augusta P. Raiher
A Dinâmica do Mercado Imobiliário Informal: Estudo de Caso Na Cidade de Curitiba
Maria Fernanda Prigol Becker Scalco, Gilson Batista de Oliveira
Organizações Cooperativas e suas principais participações nos Estados Brasileiros (1995-2007)
Patrícia Estanislau, Paulo Roberto Santana Borges
Atributos que influenciam a compra de automóveis por mulheresPatrícia Regina Caldeira Daré Artoni, Danilo Sofiato, Eduardo Cruz
Garcia, Rafael Porto Braga, Elton Siqueira Paiva, Vinícius Kazuo
Competências Empreendedoras em Núcleos de Associativismo: Um Estudo nos Núcleos Setoriais Brasileiros da Associação
Empresarial de Balneário Camboriú e Camboriú em Santa CatarinaLúcia Natália Borges Laste, Fernando César Lenzi, Ivan de Souza
Dutra, Mônica Maier
Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos (SCM) uma Estrutura Conceitual
Antonio Cezar Bornia, Joisse Antonio Lorandi
Valor Justo: Impactos do SFAS 157 nas empresas Brasileiras listadas na NYSE
Fátima de Souza Freire, Isabel Cristina Henriques Sales, Jorge Katsumi Niyama, Luciana Miyuki Ikuno
O Consumidor Pune o Comportamento Socialmente Irresponsável das Empresas?
Marie Agnes Chauvel, Renata Céli Moreira da Silva
Patrocínio Esportivo no Futebol: Convergência das Percepções entre Gestores e Torcedores
Debora Thariane Ferrari, Ricardo Boeing da Silveira
Aplicação da análise multivariada no desempenho e hierarquização das escolas estaduais do núcleo regional de
União da VitóriaJair Mendes Marques, Paulo Anselmo Santana Owsiany
Metodologia de Pesquisa em Administração: Considerações sobre Estudo de Caso
Flávio Régio Brambilla
Effectiveness of monetary policy in Brazil: empirical analisys after inflation targeting system Marcos Wagner Fonseca
Human Capital in Brazil in the Colonial PeriodAugusta P. Raiher
The dynamics of the real estate: a case study in the city of CuritibaMaria Fernanda Prigol Becker Scalco, Gilson Batista de Oliveira
Cooperative Organizations and their main participation in the Brazilian States (1995-2007)Patrícia Estanislau, Paulo Roberto Santana Borges
Attributes that influence car purchasing for womenPatrícia Regina Caldeira Daré Artoni, Danilo Sofiato, Eduardo Cruz Garcia, Rafael Porto Braga, Elton Siqueira Paiva, Vinícius Kazuo
Entrepreneurial Skills Centers in Associations: A Study in the Brazilian Industry Centers of Camboriu Balneario and Camboriu Business Association in Santa Catarina Lúcia Natália Borges Laste, Fernando César Lenzi, Ivan de Souza Dutra, Mônica Maier
Conceptual Framework of Supply Chain Management (SCM)Antonio Cezar Bornia, Joisse Antonio Lorandi
Fair Value: sfas 157 impacts on nyse’s listed Brazilian companiesFátima de Souza Freire, Isabel Cristina Henriques Sales, Jorge Katsumi Niyama, Luciana Miyuki Ikuno
Does the consumer punish the socially irresponsible behavior of Companies?Marie Agnes Chauvel, Renata Céli Moreira da Silva
Sports Sponsorship in Football: convergence of perceptions between managers and fans.Debora Thariane Ferrari, Ricardo Boeing da Silveira
Application of multivariate analysis on performance and hierarchical state schools of the Regional Centre of União da Vitória.Jair Mendes Marques, Paulo Anselmo Santana Owsiany
Research methodology in administration: considerations about case studyFlávio Régio Brambilla
06
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Os artigos publicados na Revista da FAE são de inteira responsabilidade de seus autores. As opiniões neles emitidas não representam, necessariamente, pontos de vista da FAE Centro Universitário.
A Revista da FAE tem periodicidade semestral e está disponível em www.fae.eduEndereço para correspondência:
FAE Centro Universitário - Núcleo de Pesquisa AcadêmicaRua 24 de Maio, 135 - 80230-080 - Curitiba-PRTel.: (41) 2105-4093 - e-mail: [email protected]
Associação Franciscana de Ensino Senhor Bom Jesus
PresidenteFrei Guido Moacir Scheidt, ofm
Diretor GeralJorge Apóstolos Siarcos
FAE Centro Universitário
Reitor da FAE Centro Universitário
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Frei Nelson José Hillesheim, ofmPró-Reitor Acadêmico
Diretor Acadêmico
André Luis Gontijo ResendePró-Reitor Administrativo
Régis Ferreira NegrãoDiretor de Campus – FAE Centro Universitário, Campus Centro
Antônio Lázaro ConteDiretor de Campus – FAE Centro Universitário, Campus Cristo Rei
Carlos Roberto de Oliveira Almeida SantosDiretor Acadêmico FAE São José dos Pinhais
Marcus Vinícius GuaragniCoordenador dos Programas de Pós-Graduação Lato Sensu
Gilberto Oliveira SouzaCoordenador dos Programas de Pós-Graduação Stricto Sensu
José Henrique de FariaSecretário-Geral
Eros Pacheco NetoDiretor do Instituto de Ciências Jurídicas
Sérgio Luiz da Rocha PomboOuvidoria
Samar Merheb Jordão
Editor
Frei Nelson José Hillesheim, ofm
Coordenação Editorial Cleonice Bastos Pompermayer (coordenação editorial)
Zenira Anastácio Fernandes (revisão de texto)
Priscilla Zimmermann Fernandes (revisão de texto)
Ana Maria Coelho Pereira Mendes (normalização)
Edith Dias (normalização bibliográfica)
Braulio Maia Junior (diagramação)
Eliel Fortes Barbosa (diagramação)
Ewerton Diego Oliveira da Silva (diagramação)
Comitê Editorial
Bruno Harmut Kopittke, Dr. (UFSC); Francisco Antonio Pereira Fialho, Dr. (UFSC); Glauco Ortolano, Ph.D (Lauder Institute/Wharton School/University of Phennsyl-vania); Harry J.; Burry, Ph.D (Baldwin Wallace); Heloísa Lück, Ph.D (UFPR); Heloiza Matos, Dra. (USP); Jair Mendes Marques, Dr. (FAE Centro Universitário, UTP); João Benjamim da Cruz Junior, Ph.D (UFSC); Cleverson Vitório Andreoli, Dr. (USP); Mirian Beatriz Schneider Braun, Dra. (Unioeste); Christin Luiz da Silva, Dr. (UFSC).
Pareceristas
André Carlos Martins Menck, Dr. (UFU), Edmundo Brandão Dantas, Dr. (UNB), Ana Maria Coelho Pereira Mendes, Dra. (FAE), Anivaldo Tadeu Roston Chagas, Dr. (IESCAMPM), Marcelo Weishaupt Proni, Dr. (Unicamp), Marcello da Silva Budolla, Ms. (ASCJ), Maria Alice Pereira de Moura e Claro, Dra. (FAE e CNSP), Maria Augusta de Castilho, Dra. (UCDB), Amilton Dalledone, Ms. (FAE e FALEC), Leide Albergoni do Nascimento, Ms. (UP), José Edmilson de Souza Lima, Dr. (FAE e UFPR), Arnaldo José França Mazzei Nogueira, Dr. (PUC/SP e USP), José Vicente Bandeira de Mello Cordeiro, Dr. (FAE), Antonio Batocchio, Dr. (UNICAMP), Márcio Jacometti, Ms. (UTFPR), Érico Eleutério da Luz, Ms. (FAE), João Eduardo Prudêncio Tinoco, Dr. (UNIFECAP,UNISANTOS e INEP/MEC), Ana Akemi Ikeda, Dra. (USP), Carla Cristina Dutra Búrigo, Dra. (UFSC E UFRGS), Alysson Ramos Artu-so, Ms. (FAE), Lafaiete Santos Neves, Dr. (FAE), Álvaro Martim Guedes, Dr. (UNESP), Daniele Cristine Nickel, Dra. (FAE), Débora Pereira Cláudio, Dra. (FAE, FACINTER e UTP), Bezamat de Souza Neto, Dr. (FAUF e MACKENZIE), Anapatrícia Morales Vilha, Dra. (UFABC e UNICAMP), Marcel Bursztyn, Dr. (UNB), Leonardo Freire de Mello, Dr. (UNIVAP e UNICAMP), Antonio Vico Mañas, Dr. (PUC/SP) Alberto Borges Matias, Dr. (USP), Miguel Eduardo Moreno Añez, Dr. (UFRN), Ivam Ricardo Peleias, Dr. (FECAP e PUC/SP), João Zani, Dr. (UNISINOS), José Luíz Munhós, Dr. (FUNENSEG,PUC/SP, UNOCHAPECÓ E UNOPAR)
Projeto gráfico: Editorial Design
IndexaçãoCAPES/Qualis
LatindexPortal Livre/CNEN
GeoDadosDistribuição
Comunidade Científica: 500 exemplaresPermuta: 150 exemplares
Revista da FAE, n.1/2, jan./dez. 1998 –Curitiba, 1998 –
v. il. 28cm.
Semestral
Substitui ADECON: revista da Faculdade CatólicaAdministração e Economia
ISSN 1516-1234
1. Abordagem interdisciplinar do conhecimento.I. FAE Centro Universitário. Núcleo de Pesquisa Acadêmica.
CDD – 001
Coordenadores de Curso
Aline Fernanda Pessoa Dias da Silva (Direito)
Élcio Douglas Joaquim (Informática, Sistemas de Informação Empresarial e Curso Superior de Tecnologia em Sistemas para Internet)
Cleuza Cecato (Letras, Português e Inglês)
Daniele Cristine Nickel (Psicologia)
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BibliotecasSoraia Helena F. Almondes (Biblioteca – Campus Centro)Edith Dias (Biblioteca – Campus Centro)Joana Paula Coradi (Biblioteca – Campus Cristo Rei)Fernanda Périco Jorge (Biblioteca – São José dos Pinhais)
Apresentação
Prezados leitores
Com muita satisfação temos a alegria de poder colocar em suas mãos mais uma edição da Revista da FAE.
Assim como todas as edições, esta também foi elaborada por meio de contribui-ções valiosas e primorosas de autores e pareceristas - profissionais fundamentais neste processo - para os quais desejamos agradecer em nome da nossa instituição e corrobo-rar que este canal de conhecimento sempre estará à disposição.
Durante a elaboração desta edição tornou-se possível aflorar uma percepção so-bre as reflexões do ambiente acadêmico expressas nas temáticas estudadas e apresen-tadas pelos pesquisadores, educadores, empresários e discentes em relação a questões ligadas à compreensão dos aspectos econômicos, melhoria contínua na gestão de em-presas, métodos de ensino, educação e responsabilidade social.
Estes temas encontram-se sequenciados a partir de uma importante análise empírica sobre a Eficácia da política monetária pós-regime de inflação. Direcionando ainda o eixo de reflexão para o contexto macro da economia, o artigo seguinte apresenta uma análise do Capital humano no Brasil no período colonial. Mantendo o mesmo contexto, o artigo A dinâmica do mercado imobiliário informal apresenta um estudo de caso na cidade de Curitiba. E, ainda, um artigo sobre Organizações cooperativas, que analisa a contribuição das cooperativas no desenvolvimento regional dos estados brasileiros.
Voltados para um momento contemporâneo, no qual a competitividade exige cada vez mais das empresas a adoção de tecnologias de gestão, os artigos seguem claramente esta tendência.
Nesta abordagem, o artigo Atributos que influenciam a compra de automóveis por mulheres buscou identificar quais são os atributos valorizados no momento de adquirir um carro, segundo o olhar do mercado feminino. Em seguida, o artigo Competências empreendedoras em núcleos de associativismo desenvolve e apresenta os resultados de um levantamento em uma associação empresarial no Balneário de Camboriú em Santa Catarina. Complementando este enfoque, o artigo intitulado Gerenciamento de cadeia de suprimentos desenvolve um estudo conceitual à luz de visões e metodologias anco-radas na literatura específica para o tema. Esta abordagem finaliza com o artigo Valor justo: impactos do SFAS 157 nas empresas brasileiras listadas na NYSE, o qual buscou uma verificação sobre o nível de evidenciação da mensuração a valor justo.
Os artigos seguintes apresentam temas em linhas pontuais, porém com contribuições extremamente interessantes e instigadoras.
O artigo O consumidor pune o comportamento socialmente irrespon-sável das empresas buscou uma investigação sobre as atitudes e inten-ções de compra em relação a empresas que possuem práticas socialmente ir- responsáveis.
O artigo Patrocínio esportivo no futebol: convergência das percepções entre gestores e torcedores identifica e analisa no ambiente futebolístico as estratégias de patrocínio esportivo.
Para nos conduzir a uma reflexão sobre educação e práticas de ensino, dois artigos completam esta edição. O penúltimo nos traz o resultado da aplicação da Análise multivariada no desempenho e hierarquização das escolas estaduais do núcleo regional de União da Vitória; e o último proporciona uma contribuição aos estudos de Administração e Ciências Sociais como Psicologia e Sociologia, dentre outras, sobre a utilização do Método de estudo de caso orientando sobre pontos fracos e fortes para o uso do método.
Esperamos que mais uma vez tenhamos contribuído para este admirável ambiente de busca e crescimento que envolve as pessoas e as instiga a construir um mundo cada vez melhor.
Paz e Bem!Frei Nelson José Hillesheim, ofm
Editor
Eficácia da política monetária no Brasil: análise empírica pós-regime de metas de inflação Effectiveness of monetary policy in Brazil: empirical analisys after inflation targeting system
7R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 6-29, jan./jun. 2011
Eficácia da política monetária no Brasil: análise empírica pós-regime de metas de inflaçãoEffectiveness of monetary policy in Brazil: empirical analisys after inflation targeting system
Marcos Wagner Fonseca1
Resumo
Este trabalho analisa empiricamente a eficácia da política monetária em de-
terminar a trajetória da inflação e variáveis selecionadas no período pós-
-metas de inflação. Para isso, utilizou-se de modelos econométricos de séries
temporais, mais especificamente, Vetores Autorregressivos (VAR). Estima-
ram-se nove modelos VAR para as variáveis: Selic, PIB, IPCA, Câmbio, Crédito
Total, Crédito Livre, M1 e IGP-DI, tendo como base o modelo VAR1 com as va-
riáveis: Selic, Pib e Ipca. Com a aplicação das funções de resposta a impulso
(FRI), pôde-se verificar que um choque de 1 desvio padrão (aumento de 3,8
pontos percentuais) na taxa Selic, provocou queda no IPCA. Através da de-
composição da variância e dos testes de causalidade de Granger, verificou-
-se que a variável chave da política monetária é a taxa Selic e que, o objetivo
do Banco Central é manter a inflação em um patamar desejado.
Palavras-chave: Política Monetária; Taxa Selic; Inflação
Abstract
This paper empirically analyzes the effectiveness of the monetary policy in
determining the inflation trajectory and the selected variables in the post-in-
flation targeting period. For this, time series econometric models were used,
more specifically Vector Autoregression (VAR). Nine VAR models were es-
timated for the variables: Selic, GDP, IPCA, Exchange rate, Total Loans, Free
Credit, M1 and IGP-DI, based on the model VAR1 with the variables: Selic,
GDP and IPCA. With the implementation of the impulse response functions
(FRI), it was found that a shock of one standard deviation (an increase of
3.8 percentage points) in the Selic rate caused a drop in IPCA. Through the
decomposition of variance and tests of Granger causality, it was found that
the key variable of the monetary policy is the Selic rate and that the Central
Bank’s goal is to keep inflation at a desired level.
Keywords: Monetary Policy Selic Rate, Inflation. Jel Classification: E51, E52, E58.
1 Doutor em Desenvolvimento Econômico pela Universidade Federal do Paraná. Professor da Universidade Federal do Paraná. E-mail: [email protected].
8
Introdução
Nos últimos anos, a inflação no Brasil, e em
alguns outros países, tem diminuído consideravel-
mente, principalmente a partir de 1990. Durante
essa década, como afirma Rocha e Oreiro (2008,
p.3), “um número crescente de países implementou
o inflation targeting – doravante IT – um regime de
metas inflacionárias. A disseminação se deu em
parte em razão do fracasso de outras estratégias de
âncoras nominais, como metas de taxas de câmbio
ou metas monetárias dirigidas por bancos centrais”.
O regime de metas inflacionárias baseia-se
na definição de uma meta explícita para a variação
dos preços por parte das autoridades monetárias e
no compromisso por parte dos bancos centrais de
utilizarem os instrumentos necessários para que se
alcance o resultado desejado. Segundo Giambiagi
e Carvalho (2001), a experiência internacional
do regime de metas tem alcançado resultados
positivos, ou seja, os países que aderiram ao regime
estão acompanhando de fato uma queda da inflação
em relação aos níveis iniciais.
Segundo Curado e Dezordi (2004), o regime
de metas remove o incentivo do Banco Central em
perseguir primordialmente uma taxa de desempre-
go abaixo da taxa natural, ou seja, o viés inflacio-
nário. Os instrumentos de política monetária visam
uma maior transparência e responsabilidade, muitas
vezes, acompanhada de independência instrumen-
tal do Banco Central. Teoricamente, a perseguição
ao objetivo central da estabilidade de preços, não
implica em desprezar outras variáveis, como taxa
de câmbio, produto ou emprego, mas reconhece
que as tentativas de realizar ajustes de curto prazo,
através da política monetária, podem ser inócuas no
longo prazo.
No Brasil, o regime foi adotado no ano de
1999, no contexto de uma grave crise cambial, com
alta acelerada da taxa de câmbio e temores de uma
retomada do processo de inflação elevada. Nesse
ambiente de incertezas, as autoridades monetárias
anunciaram que até o final de junho do mesmo ano
seriam divulgadas as características do novo regime.
Desta maneira, o regime de metas inflacionárias
passou a ser a nova forma de condução da política
monetária no país.
A política monetária propaga-se na econo-
mia por meio dos mecanismos (canais) de transmis-
são, que demonstram o efeito que as alterações na
taxa básica de juros provocam nas variáveis macro-
econômicas até atingir a inflação.
Segundo Fonseca (2008, p. 94), “identificar
os canais de transmissão presentes na economia é
relevante para a condução da política monetária”. No
Brasil, a literatura sobre mecanismos de transmissão
da política monetária é recente e possui um espa-
ço aberto a novas pesquisas. O BCB desenvolveu e
ainda desenvolve diversas ferramentas para identi-
ficar os principais canais pelos quais a política mo-
netária atinge as variáveis reais da economia. Des-
se modo, como descreve Fonseca (2008), pode-se
citar o canal da taxa de juros, o canal da taxa de
câmbio, o canal da riqueza e o canal do crédito
como sendo os principais mecanismos utilizados
pelos formuladores da política monetária para a sua
transmissão.
Apesar de existirem diversos mecanismos de
transmissão, que desempenham um papel funda-
mental na condução e eficácia da política monetá-
ria, deve-se ressaltar que desde a implantação do
regime de metas de inflação a taxa de juros do mer-
cado de reservas bancárias tornou-se o principal
instrumento utilizado pelo BCB para a condução da
política monetária. Diante da necessidade de repri-
mir a alta dos preços e evitar o descumprimento da
meta, o Banco Central eleva a taxa básica da eco-
nomia provocando a redução nos níveis de investi-
O regime de metas inflacionárias baseia-se na
definição de uma meta explí-cita para a variação dos pre-
ços por parte das autoridades monetárias e no compro-
misso por parte dos bancos centrais
9R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 6-29, jan./jun. 2011
mentos e de consumo. Com demanda e investimen-
to retraídos, os preços encontram maior dificuldade
para subirem.
Com base no exposto, a problemática deste
trabalho consiste em analisar como o Banco Central
do Brasil vem conduzindo a política monetária des-
de a implantação do regime de metas inflacionárias
e se tem conseguido cumprir seus objetivos. Assim,
busca-se analisar a eficácia da política monetária
no combate à inflação e o impacto sobre as demais
variáveis macroeconômicas pós-regime de metas
de inflação no Brasil. Para isso, na sequência desta
introdução, a segunda seção apresenta uma revisão
da literatura sobre o tema, a terceira define os as-
pectos metodológicos, a quarta seção apresenta os
resultados dos modelos VAR (Vetores Autorregres-
sivos) e a quinta seção sintetiza algumas considera-
ções finais.
2 Revisão de Literatura
A revisão de literatura trata de expor de ma-
neira sucinta os principais mecanismos de trans-
missão da política monetária e, também, aspectos
conceituais e experienciais do regime de metas de
inflação no Brasil e em outros países.
2.1 Mecanismos de Transmissão da Política Monetária
Como dito anteriormente, é reconhecido que
a taxa de juros é o principal instrumento de con-
dução da política monetária para manter a estabili-
dade do nível de preços, no entanto, a política mo-
netária age sobre a economia através de múltiplos
canais, ou mecanismos de transmissão. Além da
taxa de juros, seguem os demais mecanismos que
as autoridades monetárias utilizam para tentar al-
cançar a estabilização econômica.
2.1.1 Canal da Taxa de Juros
Como já destacado, é o principal canal de
transmissão da política monetária após a implan-
tação do regime de metas. Como explica Fonseca
(2008), no modelo IS-LM, um aumento na oferta
de moeda diminui a taxa de juros de equilíbrio do
mercado monetário, afetando as decisões de inves-
timento das empresas e tornando viáveis alguns
projetos que estavam “engavetados”. Os gastos dos
consumidores com bens duráveis e moradia tam-
bém aumentam quando a taxa de juros diminui. O
aumento dos investimentos das empresas e dos
gastos dos consumidores provoca um aumento so-
bre a renda que, por sua vez, aumenta o consumo
e cria um efeito multiplicador na renda final. Esta se
ajusta ao novo nível de taxa de juros real aumentan-
do a demanda agregada, a renda e o produto.
Fonseca (2009) descreve o modelo apresen-
tado por Taylor, em 1995, que assume que uma po-
lítica monetária restritiva provoca um aumento na
taxa de juros nominal no curto prazo. Levando-se
em consideração que os agentes econômicos têm
expectativas racionais e que os preços e salários são
rígidos no curto prazo, a taxa de juros real de curto
prazo também se eleva, aumentando as expectati-
vas dos agentes quanto ao nível da taxa de juros
no futuro. Esta expectativa de aumento da taxa de
juros de longo prazo faz diminuir o investimento das
empresas, bem como os gastos dos consumidores
em bens duráveis e com moradia, ocasionando, as-
sim, queda no produto.
2.1.2 Canal da Taxa de Câmbio
Quando a política monetária provoca uma al-
teração na taxa de juros ocorre como consequência
uma modificação no nível da taxa de câmbio. Se-
gundo Fonseca (2008), quando a taxa de juros do-
méstica diminui, devido a um aumento da oferta de
10
moeda, as aplicações realizadas em ativos em mo-
eda doméstica tornam-se menos atrativas que as
aplicações realizadas em ativos em moeda estran-
geira. A procura por aplicações em moeda estran-
geira provoca uma depreciação na taxa de câmbio,
ou seja, a moeda doméstica é desvalorizada, impul-
sionando as exportações e restringindo as importa-
ções, o que aumenta o saldo em conta corrente e o
dispêndio com bens domésticos, criando um efeito
multiplicador da renda e um aumento do produto.
2.1.3 Canal da Riqueza
Este canal de transmissão considera que os
consumidores possuem balanços patrimoniais que
podem afetar suas decisões de gastos. Como expli-
ca Fonseca (2008), a composição patrimonial será
formada pela riqueza herdada e pela acumulação
de excedente ao longo da vida produtiva dos con-
sumidores. A existência da hipótese sobre o ciclo
de vida apresenta a riqueza como um dos fatores
determinantes do consumo do indivíduo ao longo
de sua vida e condiciona a determinação do consu-
mo não pela renda corrente, mas pela riqueza, que,
por sua vez, determina o nível de consumo durante
a vida do indivíduo. Portanto, mudanças na rique-
za de um indivíduo pode ser a principal causa para
provocar alteração no consumo.
2.1.4 Canal do Crédito
Segundo Fonseca (2008), este canal não dei-
xa de ser uma interpretação sobre como a taxa de
juros afeta a economia. Diferentemente do canal da
taxa de juros, o canal do crédito enfatiza a presença
de informação assimétrica no mercado financeiro,
havendo imperfeições para a transmissão da políti-
ca monetária. O canal do crédito é um mecanismo
de transmissão que evidencia o problema da limi-
tação da oferta de crédito existente no mercado fi-
nanceiro, desde a existência de informação assimé-
trica e risco moral, até a composição, organização
e atuação do setor financeiro e do setor produtivo.
Existem dois mecanismos de transmissão da políti-
ca monetária que são consequência dos problemas
de informação assimétrica nos mercados de crédito:
o canal de empréstimos bancários e o canal de ba-
lanço. O canal de empréstimos bancários surge do
reconhecimento da função que os bancos desem-
penham no sistema financeiro, qual seja, a oferta de
crédito, mas para isso os bancos têm que buscar re-
cursos no mercado através da captação de fundos.
Esta captação depende do volume de moeda em
circulação: quanto maior o volume de moeda, maior
é a captação e, por conseguinte, a disponibilidade
de empréstimos bancários aos agentes. No canal
de balanço, a política monetária pode afetar as em-
presas da seguinte forma: um aumento na taxa de
juros, em decorrência de uma diminuição da oferta
monetária, pode levar a uma queda no preço das
ações, diminuindo o valor patrimonial das firmas e
aumentando a possibilidade de seleção adversa e
do risco moral, criando dificuldades para as firmas
conseguirem tomar recursos para continuar o pro-
cesso produtivo e também para o investimento. A
consequência pode ser uma queda no produto e no
emprego.
2.2 Regime de Metas de Inflação
O tema metas de inflação começou a ser
discutido com intensidade nos meios acadêmicos
e internacionais a partir do início dos anos 1990,
quando os primeiros países adotaram esta política
de controle da inflação. Os principais fundamen-
tos teóricos que justificam a adoção do regime de
metas para a inflação, segundo Montes (2008),
estão baseados nos argumentos relacionados à
importância da reputação, credibilidade e da trans-
parência da autoridade monetária e suas políticas
para economias que convivem com taxas de infla-
ção indesejada. O primeiro dos países desenvolvi-
dos a adotar o regime de metas de inflação foi a
11R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 6-29, jan./jun. 2011
Nova Zelândia, em 1990, seguida pelo Canadá, em
1991, Reino Unido, em 1992, Suécia e Finlândia, em
1993, Austrália e Espanha, em 1994, seguidos por
muitos outros países que implementaram essa polí-
tica, inclusive o Brasil, um país em desenvolvimento,
em 1999.
Como afirmam Teles e Nemoto (2005), a
popularidade do regime de metas de inflação tem
aumentado, tanto pelo número crescente de países
que o adotam quanto pelo número de economis-
tas que o indicam como sendo o principal meio de
manter a inflação em um nível baixo e estável. Os
adeptos deste regime apontam como vantagem o
fato de o mesmo apresentar uma maior transparên-
cia de objetivos de política monetária, implicando
desta forma, um aumento da credibilidade desta
política.
Segundo Pelicione e Resende (2007), o regi-
me de metas de inflação parte da hipótese de neu-
tralidade da moeda presente na abordagem ortodo-
xa, ou seja, a moeda não afeta as variáveis reais da
economia no longo prazo. Assim, nesta abordagem,
o regime de metas de inflação, e a política monetá-
ria a ele associada, não teria efeito algum sobre o
investimento e o crescimento econômico no longo
prazo. Ainda conforme os autores, uma vez que os
agentes formam expectativas racionais sobre a po-
lítica monetária, poderiam inclusive, num contexto
de credibilidade da autoridade monetária, facilitar a
convergência da inflação esperada para a meta de
inflação.
O regime de metas tem como principal carac-
terística a fixação e anúncio de uma meta quantita-
tiva para a taxa de inflação nos próximos períodos,
ou seja, o banco central prevê o comportamento
da inflação no futuro e adota uma política restritiva
sempre que a inflação prevista for superior à meta,
ou então, uma política expansionista quando a in-
flação prevista for inferior à meta. Assim, segundo
Libânio (2004, p.16), “o banco central elevaria a taxa
de juros em relação ao seu valor natural de longo
prazo quando houver a expectativa de que a infla-
ção efetiva supere a meta”.
Quanto à condução da política monetária
pelos países que implantaram o regime de metas
de inflação, como confirma Zettel (2006), os países
emergentes encontram maiores desafios na condu-
ção e na adoção do regime de metas uma vez que,
segundo o autor, estes países possuem instituições
fracas, levando os agentes a acreditarem que em
algum momento a autoridade monetária quebrará
a regra. Este tipo de comportamento se reflete em
expectativas de inflação mais altas do que as obser-
vadas em países desenvolvidos. Além disso, as fases
iniciais de adoção do regime de metas são acom-
panhadas por altos custos de desinflação, devido
principalmente à falta de credibilidade e à inércia in-
flacionária.
Países da América Latina chegaram a atingir
a taxa de inflação média anual em 500%, no início da
década de 1990, sendo que o Brasil, a Argentina e o
Peru, tiveram inflações de quatro dígitos, enquanto
isso, no mesmo período, países desenvolvidos regis-
travam inflação de cerca de 4% ao ano. Em virtude
disso, alguns países da América Latina seguiram o
exemplo dos países desenvolvidos, adotando tam-
bém o regime de metas de inflação. As metas foram
implementadas em 1990 no Chile, em 1994 no Peru,
em 1999 na Colômbia, juntamente com o Brasil, e no
México em 2001. Durante o início da adoção do re-
gime de metas, em 1990, os países industrializados
que adotaram o regime, enfrentavam uma realidade
econômica oposta a dos países em desenvolvimen-
to. Os países desenvolvidos adotaram o regime em
um contexto de inflação moderada enquanto que,
os países emergentes viviam em uma situação em
que as taxas de inflação já se mostravam elevadas e
estavam em processo de aceleração.
Segundo Sicsú (2002), deve-se reconhecer
que a inflação assumiu uma trajetória descenden-
te durante os últimos anos nos sete países desen-
volvidos que adotaram o novo regime. A inflação
desse conjunto de países manteve a sua trajetó-
ria em declínio após a implantação do novo regi-
me, se comparada à década anterior. No entanto,
o autor destaca que o regime não foi o responsá-
vel pela trajetória descendente da inflação nesses
países, uma vez que, com exceção do Canadá, os
demais países já possuíam uma trajetória descen-
dente da inflação antes da implantação do regime
12
de metas. Assim, não existem argumentos sólidos
que garantam que a adoção de metas inflacionárias
seja a responsável pela queda da inflação. Além dis-
so, segundo o autor, países desenvolvidos que não
adotaram o regime também obtiveram sucesso no
controle do nível de preços, dentre eles estão os Es-
tados Unidos, Japão, Noruega, Dinamarca, Bélgica,
Holanda, Áustria e Portugal, o que confirma mais
uma vez que o regime de metas não pode explicar
o bom resultado da inflação nos países desenvolvi-
dos nos anos 1990. Outro ponto importante a ser
destacado é que, tanto os países desenvolvidos que
adotaram o regime, quanto os que não adotaram,
apresentam crescimento semelhante, ou seja, não é
evidente que o regime de metas tenha criado um
cenário macroeconômico mais favorável de cresci-
mento nos anos 1990.
Quanto aos países emergentes, influenciados
por um grande número de economistas e
banqueiros centrais, como afirma Zettel (2006),
adotaram o regime de metas de inflação, visando
obter sucesso no controle do nível de preços, uma
vez que os defensores deste regime afirmam que
ele favorece a redução do patamar e da volatilidade
da taxa de juros, a estabilidade do crescimento
econômico e seu desempenho frente a choques e
a diminuição dos custos associados aos períodos
A análise empírica do trabalho partiu da construção
e estimação de um mode-lo econométrico com Séries
Temporais, especialmente pela aplicação do método de Vetores Autorregressivos
(VAR).
de desinflação. No entanto, os custos ou taxa de
sacrifício, como coloca a autora, são maiores para
as economias emergentes quando comparadas
com a de economias desenvolvidas. Este argumento
baseia-se na carência de uma série de pré-requisitos
básicos para a adoção do regime enfrentados pelos
países emergentes, dentre eles, a ausência de um
mercado financeiro desenvolvido, de instituições
sólidas, de bases de dados atualizadas e a falta de
credibilidade nos formuladores de políticas.
3 Método de Abordagem
A realização da análise empírica do trabalho
partiu da construção e estimação de um modelo
econométrico com Séries Temporais, especialmen-
te pela aplicação do método de Vetores Autorre-
gressivos (VAR). Segundo Stock e Watson1 (2001),
citados por Gomes e Holland (2003), nesta meto-
dologia, cada equação definida é uma regressão fei-
ta pelo método de Mínimos Quadrados Ordinários
(MQO) de determinada variável em variáveis defa-
sadas de si própria e de outras variáveis do modelo.
Algumas vantagens desta abordagem são a falta de
exigência em estipular quais variáveis são endóge-
nas e quais são exógenas (sendo todas reconheci-
das como endógenas) e também a falta de imposi-
ção de fortes restrições.
Para analisar empiricamente a eficácia da po-
lítica monetária pós-regime de metas de inflação
em determinar a trajetória da inflação e de variáveis
macroeconômicas selecionadas, se fez necessário
definir essas variáveis, e o período para a constru-
ção dos modelos econométricos.
Optou-se por utilizar no modelo econométrico
somente as variáveis que são mais relevantes no
1 STOCK, J. H. e WATSON, M. W. Vector Autoregressions. Journal of Economic Perspectives, vol. 15, n. 4, março 2001.
13R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 6-29, jan./jun. 2011
estudo da política monetária, sendo que o vetor de
variáveis utilizado na construção dos modelos VAR
está composto das seguintes séries econômicas:
1. SELIC: Taxa de juros Selic do Banco
Central do Brasil (definida como a série
4189, taxa de juros selic acumulada no
mês, anualizada – Banco Central do Bra-
sil);
2. IPCA: Índice Nacional de Preços ao
Consumidor – amplo (definida como a
série 433, índice nacional de preços ao
consumidor-amplo (IPCA) – variação %
mensal – Banco Central do Brasil);
3. CÂMBIO: Índice da Taxa de Câmbio Efe-
tiva Real (definida como a série 11752,
índice da taxa de câmbio efetiva real
(IPCA) jun/1994=100 – Banco Central
do Brasil);
4. PIB: Produto Interno Bruto (definido
como a série 4380, PIB mensal valores
correntes R$ (milhões) – Banco Central
do Brasil);
5. M1: Meios de Pagamento (definido como
a série 1824, meios de pagamento M1 R$
(mil) – Banco Central do Brasil);
6. CREDLIVRE: Crédito Livre (definido
como total de crédito livre R$ (milhões)
– Banco Central do Brasil);
7. CREDTOTAL: Crédito Total (definido
como total de crédito ao sistema finan-
ceiro R$ (milhões) – Banco Central do
Brasil);
8. IGPDI: Índice Geral de Preços (definido
como IGP-DI com periodicidade mensal
% a.m – IPEADATA).
Todas as séries são de periodicidade mensal
e o período é de janeiro de 2000 a junho de 2009.
As variáveis de PIB, M1, Crédito livre e total, foram
deflacionadas pelo Índice Geral de Preços Disponi-
bilidade Interna (IGP-DI) para ter seus valores reais
e, juntamente com a variável câmbio, foram trans-
formadas em log para obter resultados em valor
percentual. A seguir, as séries foram submetidas
ao teste de raiz unitária de Dickey Fuller Aumen-
tado (ADF) para verificar a estacionariedade das
variáveis, ou seja, a capacidade de uma variável de
voltar ao nível inicial, no longo prazo, após tomar
um choque. Percebeu-se que todas as variáveis são
estacionárias em primeira diferença, sendo que as
variáveis IGPDI e IPCA são estacionárias em nível a
1% de significância e a SELIC é estacionária em nível
a 5% de significância.
Dadas as variáveis selecionadas para o
modelo econométrico, foram definidos nove
modelos VAR, sendo:
VAR 1: SELIC, PIB, IPCA;
VAR 2: SELIC, PIB, IPCA, CAMBIO;
VAR 3: SELIC, PIB, IPCA, CREDTOTAL;
VAR 4: SELIC, PIB, IPCA, CREDLIVRE;
VAR 5: SELIC, PIB, IPCA, M1;
VAR 6: SELIC, PIB, IPCA, IGPDI;
VAR 7: M1, PIB, IPCA;
VAR 8: M1, PIB, IGPDI;
VAR 9: SELIC, PIB, IGPDI.
As séries foram sub-metidas ao teste de
raiz unitária de Dickey Fuller Aumentado
(ADF) para verificar a estacionariedade das
variáveis,
14
Segundo Gomes e Holland (2003), as matri-
zes de coeficientes de um VAR estimado são de di-
fícil interpretação direta e por isso faz-se necessário
a aplicação das seguintes estatísticas: Funções de
Resposta a Impulso (FRI), Decomposição da Vari-
ância dos Erros de Previsão e Teste de Causalidade
de Granger, que são definidas da seguinte maneira:
As FRI podem ser definidas como a derivada parcial de
Yjt+k tratadas como função do horizonte k, com respeito
a um choque específico no tempo ‘t’, mantendo todos
os outros choques constantes. Na sua forma conjunta,
essas funções ligam o valor corrente do termo do erro
aos futuros valores de Yt ou, equivalentemente, ligam
os valores passados e correntes do termo de erro aos
valores correntes de Yt. A Decomposição de Variância
mede a importância do erro na jth equação na explicação
dos movimentos inesperados na ith variável. Quando os
erros do VAR são não correlacionados entre as equações,
a variância do erro de previsão no período ‘h’ em diante
pode ser escrita como a soma dos componentes vindos
de cada um destes erros. O Teste de Causalidade de
Granger examina se os valores defasados da variável,
digamos Yjt, ajudam a prever outra variável, digamos Yjt,
condicional ao uso dos valores defasados de todas as
variáveis com exceção de Yjt. O teste de causalidade de
Granger é o teste ‘F’ da hipótese que valores defasados
da jth variável podem ser excluídos da equação ith na
forma reduzida do VAR. A rejeição da hipótese indica
que tais defasagens são úteis, na margem, na previsão
de Yit (STOCK e WATSON, 2001, citados por GOMES e
HOLLAND, 2003, p. 346 - 347).
Portanto, na sequência serão desenvolvidas
a análise descritiva e a análise empírica, conforme
especificado anteriormente.
4 Resultados e Discussões
A partir da definição dos modelos VAR, apli-
cou-se o teste de cointegração de Johansen para
verificar a existência de vetores cointegrantes, pois
esta é uma exigência do modelo. Os testes para os
modelos VAR 1, 7, 8 e 9 apresentaram dois vetores
cointegrantes e, os testes para os modelos VAR 2, 3,
4 e 6 apresentaram três vetores cointegrantes.
Para a realização das estimações dos mode-
los VAR é necessário escolher adequadamente o
número de defasagens a ser adotado. Para tanto,
toma-se como base de informação o critério de
Schwarz (SC), o qual aponta para o período anali-
sado que o número de defasagens mais apropriado
para os modelos são duas defasagens. O critério de
Schwarz só não apontou duas defasagens para o
VAR 7 (uma defasagem) e para o VAR 8 (três defa-
sagens). Sendo assim, decidiu-se por adotar duas
defasagens para cada modelo.
Após a obtenção dessas informações,
aplica-se a Função Resposta Impulso (FRI)
com a decomposição de Cholesky, com a aqual
verifica-se o impacto de um choque na taxa Selic
sobre as demais variáveis. Neste trabalho, as FRI
demonstraram o impacto (ao longo de 24 períodos)
nas demais variáveis, onde o choque de 1 desvio
padrão na taxa Selic provocará uma resposta por
parte das variáveis, em cada modelo VAR estimado.
No período, a taxa Selic teve média de 16,6 e o
desvio padrão de 3,8, o que significa que o choque
é de 3,8 pontos percentuais.
O modelo VAR 1 estabelece as FRI visuali-
zadas na figura 1.1, do anexo 1. Percebe-se que um
choque de 3,8 pontos percentuais na taxa Selic, ou
seja, uma política monetária restritiva, num primeiro
momento provoca uma queda no PIB, que chega
ao seu nível mais baixo por volta do oitavo mês e,
a partir daí, volta a crescer até atingir seu estado
inicial por volta do décimo nono mês. Já o efeito
esperado de um choque na taxa Selic sobre o IPCA
se mostra mais lento, sendo que, primeiro o IPCA
dá um salto atingindo o pico já no segundo mês
e, depois vai decrescendo lentamente até atingir
o nível mínimo no vigésimo mês. Este salto inicial
do IPCA em resposta a um aumento na Selic é
conhecido como price-puzzle e pode ser explicado
pelo impacto do aumento da taxa de juros sobre
a dívida pública e pela permanência da alta dos
preços por conta dos preços administrados. Apesar
deste efeito inicial, verifica-se que o nível de preços
diminui e retorna ao nível inicial no longo prazo,
15R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 6-29, jan./jun. 2011
o que por sua vez, demonstra que a taxa Selic é
instrumento de política monetária.
A análise da Decomposição da Variância
mostra que a taxa Selic aumentou sua influência na
variação do IPCA, ao longo do período analisado,
sendo que no primeiro mês sua influência era de
3,37% e, no vigésimo quarto mês aumentou para
19,34%. Outro fato é que o IPCA passa a influenciar
a Selic, em 23,6%, e o PIB, em 22,3%. Uma obser-
vação que chama a atenção na tabela 6.1 do anexo
6, é o fato de o IPCA influenciar a ele mesmo em
73,8% de sua variação, o que pode ser explicado
pelo efeito da inércia inflacionária.
O teste de causalidade de Granger, na tabela
2.1 do anexo 2, indica que as variáveis influenciam
umas às outras, exceto o PIB, que não influencia
o IPCA. No entanto, o mais relevante é que a Selic
causa o PIB e o IPCA, o que reforça a eficácia da
política monetária. Para que se possa verificar efeti-
vamente o efeito da política monetária é necessário
analisar os resultados com a inclusão de outras va-
riáveis no modelo.
A FRI para o modelo VAR 2, no qual se inclui
a variável câmbio, conforme figura 1.2 do anexo 1,
indica que um choque na taxa Selic faz com que
o índice da taxa de câmbio aumente sem muita
intensidade, ou seja, há uma pequena depreciação
cambial, que atinge o pico no décimo mês e,
depois declina rumo ao nível inicial. A análise da
Decomposição da Variância mostra que o câmbio
possui uma influência considerável sobre as
demais variáveis do modelo, sendo que ele passa
a influenciar 58,4% da variação da Selic, 57,3% da
variação do PIB e 31% da variação do IPCA. O teste
de causalidade de Granger, na tabela 2.2 do anexo
2, confirma a forte influência do câmbio sobre as
outras variáveis, uma vez que, verifica-se que o
câmbio causa o PIB, a SELIC e o IPCA. A influência
do câmbio, principalmente sobre o IPCA, pode ser
explicada pelo grande número de contratos que são
indexados à taxa de câmbio. Outra constatação é
que nem SELIC, nem IPCA causam o câmbio, só o
PIB pode causar, mas a um nível de significância de
10%. Se for considerado o nível de significância de
5%, nenhuma das variáveis causa o câmbio, o que
demonstra que a taxa de câmbio não é objetivo da
política monetária.
No modelo VAR 3, conforme figura 1.3
do anexo 1, a variável incluída foi o crédito total
(CREDTOTAL) ao sistema financeiro. A FRI de
Cholesky mostra que um choque na Selic, ou seja,
um aperto monetário, faz com que o crédito total
diminua até o nono mês, passa a aumentar até o
vigésimo mês, não retornando ao nível inicial e, após
o vigésimo mês cai novamente, mas com menos
intensidade. Logo após o choque, o nível de crédito
total entra em declínio devido à parcela de crédito
com recursos livres que o compõe, o qual depende
da taxa de juros. A Decomposição da Variância
mostra que CREDTOTAL influencia a variação da
SELIC em 21,7%, o PIB em 25,1% e o IPCA em 8,6%.
Pode-se verificar também que a SELIC influencia a
variação do crédito total em 11,1% e o IPCA influencia
o crédito total em 26,3%. No teste de causalidade
de Granger, tabela 2.3 do anexo 2, verifica-se que
o CREDTOTAL causa a SELIC, o PIB e o IPCA, no
entanto, ele não é causado pela SELIC, nem pelo
PIB, somente pelo IPCA a um nível de significância
de 5%. Isto quer dizer que, uma vez que o crédito
total é composto, tanto pelo crédito livre, quanto
pelo crédito direcionado, o qual não tem ligação
direta com a taxa Selic, pode-se inferir que as
variações na oferta de crédito total sofrem efeitos
de outras variáveis que não a taxa de juros Selic.
O modelo VAR 4, no qual é incluída a
variável crédito livre (CREDLIVRE), figura 1.4 do
anexo 1, indica que um aumento na SELIC provoca
uma queda significativa no CREDLIVRE nos treze
primeiros meses. Após atingir o menor valor no
décimo terceiro mês, a oferta de crédito livre volta
a subir, mas sem muita intensidade, e não retorna
ao nível inicial após percorridos os 24 períodos.
A Decomposição da Variância mostra que o PIB
é influenciado pelo crédito livre em 13,4% e que
a SELIC e o IPCA influenciam as variações do
CREDLIVRE em 25,4% e 40,2%, respectivamente.
No teste de causalidade de Granger, tabela 2.4
do anexo 2, pode-se verificar que o CREDLIVRE
16
causa a SELIC e o PIB, e causa o IPCA a um nível
de significância de 5%. Outra constatação é que
o PIB não causa o CREDLIVRE, o IPCA causa o
CREDLIVRE e, a SELIC causa o CREDLIVRE, mas a
um nível de significância de 10%. A queda na oferta
de crédito livre após o choque de 1 desvio padrão
na taxa Selic, é a resposta esperada de uma política
monetária contracionista.
No modelo VAR 5, a variável incluída foi o
agregado monetário M1, figura 1.5 do anexo 2, a FRI
mostra que um aumento na taxa Selic faz com que
M1 aumente no primeiro e segundo mês e decline a
partir daí até o décimo primeiro mês. Depois de ter
seu valor mais baixo registrado no décimo primeiro
mês, M1 retoma o crescimento aumentando até
o vigésimo quarto período. A Decomposição da
Variância indica que M1 não é responsável por
grandes alterações nas demais variáveis, sendo
responsável por apenas 9% da variação da Selic e
8,2% da variação do PIB. Pode-se verificar também
que o PIB é responsável por 44.9% das variações
de M1, ou seja, M1 depende da demanda agregada
por moeda, o IPCA é responsável por 23,1% das
variações de M1 e a SELIC é responsável por apenas
11,7% das variações de M1, o que demonstra que
não é o objetivo da política monetária controlar
o agregado monetário. O teste de causalidade de
Granger, tabela 2.5 do anexo 2, confirma o que já
foi explanado a respeito da influência de M1 sobre
as demais variáveis, sendo que, M1 não causa o PIB,
nem o IPCA e, causa SELIC somente a um nível de
significância de 10%. Outra constatação do teste
de causalidade de Granger é a influência do PIB
sobre M1, ou seja, PIB causa M1, já o IPCA e a SELIC
causam M1 somente a um nível de significância
de 5%, o que comprova que o principal papel da
política monetária é atingir o IPCA e não o agragado
monetário M1.
O modelo VAR 6, figura 1.6 do anexo 1, onde
foi incluído a variável IGP-DI, mostra que ao longo
dos 24 períodos a variável sofre oscilações, sendo
que, aumenta até o segundo mês, diminui até o sé-
timo mês, volta a aumentar até chegar no décimo
nono mês e, por fim, declina até o final do período,
até o vigésimo quarto mês. A análise da Decom-
posição da Variância mostra que o IGPDI influencia
significativamente as demais variáveis, sendo res-
ponsável por 59,9% das variações da SELIC, 50,5%
das variações do PIB e 45,4% das variações do IPCA.
Ao contrário disto, o índice não sofre influência da
SELIC, nem do PIB, somente do IPCA, em torno de
12,3%, o que indica que, ao provocar um choque na
SELIC de 1 desvio padrão, a política monetária tem
como foco atingir o IPCA e não o IGP-DI. O teste de
causalidade de Granger confirma esta relação entre
as variáveis, indicando que IPGPI causa SELIC, PIB e
IPCA, mas não é causado pela SELIC, nem pelo PIB,
somente pelo IPCA.
No modelo VAR 7 o instrumento de política
monetária, ou seja, a taxa Selic, foi substituída pelo
agregado monetário, M1, que apresentou no período
a média de 18,83 e desvio padrão de 0,17. Conforme
figura 1.7 do anexo 1, a FRI indica que um choque de
1 desvio padrão em M1, ou seja, um choque de 0,17
pontos percentuais, faz com que o PIB caia até no
segundo mês, aumente alcançando o pico no oitavo
mês e, após o pico, passa a declinar até o final do
período analisado. O IPCA aumenta até o segundo
mês, alcança seu valor mais baixo no oitavo mês e,
retoma a trajetória de crescimento até o final do
período analisado, sem retornar ao seu nível inicial.
A análise da Decomposição da Variância indica
que M1 é influenciado pelo PIB e pelo IPCA, 46,1%
e 34,5%, respectivamente. M1, por sua vez, não é
responsável pelas variações nem do PIB, nem do
IPCA. O teste de causalidade de Granger reforça
estas informações, apresentando a não causalidade
de M1 sobre as demais variáveis. E, como já visto
na decomposição da variância, PIB causa M1 e IPCA
também causa, mas a um nível de significância de
5%. A partir das informações de que M1 não causa
o PIB nem o IPCA, pode-se afirmar que M1 não é o
instrumento de política monetária do Banco Central
do Brasil.
No modelo VAR 8 ainda utiliza-se o M1 como
instrumento de política monetária, mas o IPCA é
substituído pelo IGP-DI para que se possa verificar
se o efeito de M1 sobre o IGP-DI é o mesmo que
para o IPCA, ou seja, que este efeito se apresente
nulo. Pode-se visualizar na figura 1.8 do anexo 1, a
17R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 6-29, jan./jun. 2011
FRI de M1 sobre o PIB e o IGPDI. O PIB cai até o
segundo mês, sobe até o nono mês onde atinge
o seu valor mais alto e volta a declinar até o final
do período. O IGPDI dá um salto no segundo mês,
diminui até o sexto mês e volta a se elevar até o final
do período. A Decomposição da Variância mostra
que as variações de M1 são influenciadas pelas
variações do PIB e do IGPDI, em 43,6% e 34,5%,
respectivamente. Não ocorre o mesmo quando se
analisa a dependência dessas variáveis para com M1,
sendo que, M1 é responsável por somente 8,2% das
variações do PIB e quanto ao IGPDI, M1 não produz
efeitos sobre esta variável, o que permite afirmar,
mais uma vez, que M1 não é instrumento de política
monetária. O teste de causalidade de Grander,
tabela 2.8 do anexo 2, confirma esta relação, visto
que M1 não causa PIB nem IGPDI.
No modelo VAR 9, volta-se a trabalhar com a
SELIC como instrumento da política monetária e, ao
invés de usar o IPCA como nível de preços, usa-se
o IGPDI. A FRI, que pode ser visualizada na figura
1.9 do anexo 1, indica que um choque de 1 desvio
padrão na taxa SELIC provoca uma queda do PIB
até o oitavo mês e depois ele volta a crescer até o
final do período analisado. O efeito sobre o IGPDI
é semelhante, diminui até o nono mês e passa a
aumentar até o final do período, mas não retorna
ao nível inicial. A Decomposição da Variância indica
que, tanto a SELIC, quanto o PIB, sofrem variações
quando o IGPDI se altera, sendo que, IGPDI influencia
SELIC em 62,9% e influencia PIB em 54,3%. Como
esperado, pode-se também constatar que, nem a
SELIC, nem o PIB, são responsáveis pelas variações
do IGPDI. Por fim, no teste de causalidade de
Granger, tabela 2.9 do anexo 2, verifica-se de fato
que o IGPDI causa SELIC e PIB, no entanto, o índice
não é causado por nenhuma das variáveis, ou seja,
está mais do que provado que o índice que a política
monetária busca influenciar, através de choques na
taxa SELIC, é o IPCA.
A análise empírica confirmou alguns pontos
levantados durante a leitura dos trabalhos que
sustam teoricamete a monografia e, também, na
análise descritiva. Primeiramente, que a política
monetária pós-regime de metas de inflação tem
sido eficiente para manter a inflação (IPCA) na meta
estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional. A
taxa Selic, como taxa básica de juros, é o instumento
de política monetária utilizado pelo Banco Central
do Brasil. As demais variáveis acrescentadas nos
modelos VAR 2 a VAR 9 corroboram a eficácia da
política monetária pós-regime de metas de inflação
e a utilização da taxa Selic como instrumento de
política monetária.
5 Considerações Finais
A estimação dos modelos VAR, com a apli-
cação das funções de resposta a impulso, a decom-
posição da variância e os testes de causalidade de
Granger, indicou que a taxa de juros Selic é, de fato,
o instrumento utilizado pelo Banco Central para re-
alizar política monetária e que a Selic é capaz de
influenciar a variação da inflação.
A partir da função de resposta a impulso
(FRI), verificou-se que um aumento de 1 desvio
padrão (3,8 pontos percentuais) na taxa de juros
Selic causa uma diminuição no IPCA ao longo dos
24 períodos analisados, o que indica que a política
monetária tem cumprido o seu objetivo principal,
qual seja, controlar a inflação.
A estimação dos nove modelos VAR possibi-
litou a observação do comportamento das variáveis
As variáveis que sofrem as maiores alterações, decorren-tes da variação na taxa Selic,
são o PIB e a inflação.
18
selecionadas ao longo dos 24 períodos. Através da
decomposição da variância e dos testes de causa-
lidade de Granger, verificou-se que, ao utilizar M1
como instrumento de política monetária em subs-
tituição à taxa Selic, não se observam variações
consideráveis na inflação, ou seja, um choque de 1
desvio padrão (0,17 pontos percentuais) em M1 não
causa efeito, nem sobre o PIB, nem sobre o nível
de preços. Diante disso, é possível afirmar que M1
não é a variável utilizada pela política monetária
para controle da inflação. Outra constatação atra-
vés dos modelos e testes foi que, ao substituir a va-
riável IPCA pela variável IGP-DI, observou-se que a
influência da taxa Selic não foi a mesma, sendo que,
para as variações do IPCA, têm-se como um dos
principais resnponsáveis a taxa de juros Selic, já no
caso do IGP-DI, foi possível observar que esta vari-
ável não sofre influência da Selic, uma vez que um
choque de 1 desvio padrão (3,8 pontos percentuais)
na Selic não fez variar significativamente o nível de
preços representado pelo IGP-DI. Diante disso, foi
possível inferir que o foco da política monetária está
em atingir o IPCA e não o IGP-DI.
Uma vez verificada a transmissão da política
monetária através da taxa básica de juros Selic e,
verificada a influência desta sobre o nível de preços,
representado pelo IPCA, pode-se afirmar que, ao
longo dos 24 períodos analisados, dentro do regime
de metas de inflação, a política monetária tem
cumprido o seu objetivo de estabilizar os preços, o
que por sua vez, remete para a eficácia da política
monetária dentro do regime de metas inflacionárias.
A análise realizada neste trabalho permitiu
observar qual a relação existente entre a política
monetária e as variáveis selecionadas. Verificou-
-se que a variável utilizada como instrumento pela
política monetária é, sem dúvida, a taxa de juros
Selic e, as variáveis que sofrem as maiores altera-
ções, decorrentes da variação na taxa Selic, são o
PIB e a inflação. Observou-se que, para o período
do regime de metas, o PIB cresceu como resulta-
do da diminuição da Selic, no entanto, cresceu a
passos lentos, a taxas pequenas, ou seja, a Selic
não diminuiu o suficiente para que o produto da
economia obtivesse um crescimento expressivo
que pudesse alcançar o produto potencial. Quanto
à inflação, considerando todo o período analisa-
do, verificou-se que o nível de preços decresceu,
em resposta à variação da taxa de juros Selic que,
apesar de ter diminuído no período, ainda manteve-
-se em um patamar elevado, mantendo assim a
estabilidade inflacionária, o que aponta para a
eficácia da política monetária pós-regime de metas
de inflação.
A taxa de juros Selic é, de fato, o instrumento utilizado pelo Banco Central para realizar
política monetária e que a Selic é capaz de influenciar a
variação da inflação.
• Recebido em: 28/12/2010
• Aprovado em: 10/03/2011
19R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 6-29, jan./jun. 2011
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handle/10183/10108/000595746.pdf?sequence=1>. Acesso em: 13 maio 2009.
20
Response to Cholesky One S.D.Innovations 2 S.E.
Response of SELIC to SELIC
Response of PIB to SELIC
Response of IPCA to SELIC
+-
2
1
0
.02
.01
.00
-.01
-.02
-.03
-.04
-1
5 10 15 20
5 10 15 20
.20
.15
.10
.05
.00
-.05
-.105 10 15 20
ANEXO 1 FUNÇÃO RESPOSTA IMPULSO
Figura 1.1 – Função resposta impulso modelo VAR 1
21R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 6-29, jan./jun. 2011
Figura 1.2 – Função resposta impulso modelo VAR 2
Figura 1.3 – Função resposta impulso modelo VAR 3
-0.8
-0.4
0.0
0.4
0.8
1.2
5 10 15 20 -.02
-.01
.00
.01
5 10 15 20
-.10
-.05
.00
.05
.10
.15
5 10 15 20 -.04
-.02
.00
.02
.04
.06
5 10 15 20
Response to Cholesky One S,D. Innovations 2 S.E.+-
Response of SELIC to SELIC Response of PIB to SELIC
Response of CAMBIO to SELICResponse of IPCA to SELIC
-1.0
-0.5
0.0
0.5
1.0
1.5
5 10 15 20 -.020 -.015 -.010 -.005 .000 .005 .010
5 10 15 20
-.10 -.05 .00 .05 .10 .15 .20
5 10 15 20 -.04 -.03 -.02 -.01 .00 .01 .02
5 10 15 20
Response to Cholesky One S.D. Innovations 2 S.E.+-
Response of SELIC to SELIC Response of PIB to SELIC
Response of CREDTOTAL to SELICResponse of IPCA to SELIC
22
Figura 1.4 – Função resposta impulso modelo VAR 4
Figura 1.5 – Função resposta impulso modelo VAR 5
-1.0
-0.5
0.0
0.5
1.0
1.5
5 10 15 20 -.020 -.015 -.010 -.005 .000 .005 .010
5 10 15 20
-.10 -.05 .00 .05 .10 .15 .20
5 10 15 20 -.05 -.04 -.03 -.02 -.01 .00 .01
5 10 15 20
Response to Cholesky One S.D. Innovations 2 S.E.+-
Response of SELIC to SELIC Response of PIB to SELIC
Response of CREDLIVRE to SELICResponse of IPCA to SELIC
-1.0
-0.5
0.0
0.5
1.0
1.5
5 10 15 20 -.03
-.02
-.01
.00
.01
.02
5 10 15 20
-.10 -.05 .00 .05 .10 .15 .20
5 10 15 20 -.06
-.04
-.02
.00
.02
.04
5 10 15 20
Response to Cholesky One S.D. Innovations 2 S.E.+-
Response of SELIC to SELIC Response of PIB to SELIC
Response of M1 to SELICResponse of IPCA to SELIC
23R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 6-29, jan./jun. 2011
Figura 1.6 – Função resposta impulso modelo VAR 6
-1.0
-0.5
0.0
0.5
1.0
1.5
5 10 15 20 -.03
-.02
-.01
.00
.01
.02
5 10 15 20
-.10
-.05
.00
.05
.10
.15
5 10 15 20 -.2
-.1
.0
.1
.2
.3
5 10 15 20
Response to Cholesky One S.D. Innovations 2 S.E.+-
Response of SELIC to SELIC Response of PIB to SELIC
Response of IGPDI to SELICResponse of IPCA to SELIC
24
Figura 1.7 – Função resposta impulso modelo VAR 7
-.01
.00
.01
.02
.03
.04
.05
5 10 15 20
-.010
-.005
.000
.005
.010
.015
5 10 15 20
-.10
-.05
.00
.05
.10
.15
5 10 15 20
Response to Cholesky One S.D. Innovations 2 S.E.+-
Response of M1 to M1
Response of IPCA to M1
Response of PIB to M1
25R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 6-29, jan./jun. 2011
Figura 1.8 – Função resposta impulso modelo VAR 8
-.01
.00
.01
.02
.03
.04
.05
5 10 15 20
-.010
-.005
.000
.005
.010
.015
5 10 15 20
-.2
-.1
.0
.1
.2
5 10 15 20
Response to Cholesky One S.D. Innovations 2 S.E.+-
Response of M1 to M1
Response of IGPDI to M1
Response of PIB to M1
26
Figura 1.9 – Função resposta impulso modelo VAR 9
-0.5
0.0
0.5
1.0
5 10 15 20
-.03
-.02
-.01
.00
.01
.02
5 10 15 20
-.2
-.1
.0
.1
.2
.3
5 10 15 20
Response to Cholesky One S.D. Innovations 2 S.E.+-
Response of SELIC to SELIC
Response of PIB to SELIC
Response of IGPDI to SELIC
27R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 6-29, jan./jun. 2011
Tabela 2.1 – Teste de causalidade de Granger para o grupo VAR 1Sample: 2000M01 2009M06
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Prob.
PIB does not Granger Cause SELIC 112 5.88396 0.0038
SELIC does not Granger Cause PIB 5.69541 0.0045
IPCA does not Granger Cause SELIC 112 5.73037 0.0043
SELIC does not Granger Cause IPCA 4.77012 0.0104
IPCA does not Granger Cause PIB 112 7.56433 0.0008
PIB does not Granger Cause IPCA 0.85483 0.4282
ANEXO 2 TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER
Tabela 2.2 – Teste de causalidade de Granger para o grupo VAR 2Sample: 2000M01 2009M06
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Prob.
PIB does not Granger Cause SELIC 112 5.88396 0.0038
SELIC does not Granger Cause PIB 5.69541 0.0045
IPCA does not Granger Cause SELIC 112 5.73037 0.0043
SELIC does not Granger Cause IPCA 4.77012 0.0104
CAMBIO does not Granger Cause SELIC 112 8.86793 0.0003
SELIC does not Granger Cause CAMBIO 0.04907 0.9521
IPCA does not Granger Cause PIB 112 7.56433 0.0008
PIB does not Granger Cause IPCA 0.85483 0.4282
CAMBIO does not Granger Cause PIB 112 12.9160 9.E-06
PIB does not Granger Cause CAMBIO 2.74047 0.0691
CAMBIO does not Granger Cause IPCA 112 11.9984 2.E-05
IPCA does not Granger Cause CAMBIO 0.18313 0.8329
Tabela 2.3 – Teste de causalidade de Granger para o grupo VAR 3Sample: 2000M01 2009M06
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Prob.
PIB does not Granger Cause SELIC 112 5.88396 0.0038
SELIC does not Granger Cause PIB 5.69541 0.0045 0.0038
IPCA does not Granger Cause SELIC 112 5.73037 0.0043
SELIC does not Granger Cause IPCA 4.77012 0.0104 0.0043
CREDTOTAL does not Granger Cause SELIC 112 7.81470 0.0007
SELIC does not Granger Cause CREDTOTAL 1.60076 0.2065 0.0003
IPCA does not Granger Cause PIB 112 7.56433 0.0008
PIB does not Granger Cause IPCA 0.85483 0.4282 0.0008
CREDTOTAL does not Granger Cause PIB 112 12.7590 1.E-05
PIB does not Granger Cause CREDTOTAL 0.08163 0.9217 9.E-06
CREDTOTAL does not Granger Cause IPCA 112 7.03819 0.0013
IPCA does not Granger Cause CREDTOTAL 3.68252 0.0284 2.E-05
IPCA does not Granger Cause CAMBIO 0.18313 0.8329
28
Tabela 2.4 – Teste de causalidade de Granger para o grupo VAR 4Sample: 2000M01 2009M06
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Prob.
PIB does not Granger Cause SELIC 112 5.88396 0.0038
SELIC does not Granger Cause PIB 5.69541 0.0045
IPCA does not Granger Cause SELIC 112 5.73037 0.0043
SELIC does not Granger Cause IPCA 4.77012 0.0104
CREDLIVRE does not Granger Cause SELIC 112 5.48850 0.0054
SELIC does not Granger Cause CREDLIVRE 2.63012 0.0767
IPCA does not Granger Cause PIB 112 7.56433 0.0008
PIB does not Granger Cause IPCA 0.85483 0.4282
CREDLIVRE does not Granger Cause PIB 112 17.4150 3.E-07
PIB does not Granger Cause CREDLIVRE 1.28456 0.2810
CREDLIVRE does not Granger Cause IPCA 112 4.62883 0.0118
IPCA does not Granger Cause CREDTOTAL 8.80257 0.0003
IPCA does not Granger Cause CREDLIVRE 0.18313 0.8329
Tabela 2.5 – Teste de causalidade de Granger para o grupo VAR 5Sample: 2000M01 2009M06
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Prob.
PIB does not Granger Cause SELIC 112 5.88396 0.0038
SELIC does not Granger Cause PIB 5.69541 0.0045
IPCA does not Granger Cause SELIC 112 5.73037 0.0043
SELIC does not Granger Cause IPCA 4.77012 0.0104
M1 does not Granger Cause SELIC 112 3.00063 0.0540
SELIC does not Granger Cause M1 4.22425 0.0171
IPCA does not Granger Cause PIB 112 7.56433 0.0008
PIB does not Granger Cause IPCA 0.85483 0.4282
M1 does not Granger Cause PIB 112 2.19962 0.1158
PIB does not Granger Cause M1 22.5800 7.E-09
M1 does not Granger Cause IPCA 112 1.01281 0.3667
IPCA does not Granger Cause M1 3.34595 0.0389
Tabela 2.6 – Teste de causalidade de Granger para o grupo VAR 6Sample: 2000M01 2009M06
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Prob.
PIB does not Granger Cause SELIC 112 5.88396 0.0038
SELIC does not Granger Cause PIB 5.69541 0.0045
IPCA does not Granger Cause SELIC 112 5.73037 0.0043
SELIC does not Granger Cause IPCA 4.77012 0.0104
IGPDI does not Granger Cause SELIC 112 13.2768 7.E-06
SELIC does not Granger Cause IGPDI 0.04987 0.9514
IPCA does not Granger Cause PIB 112 7.56433 0.0008
PIB does not Granger Cause IPCA 0.85483 0.4282
IGPDI does not Granger Cause PIB 112 7.29336 0.0011
PIB does not Granger Cause IGPDI 0.26102 0.7708
IGPDI does not Granger Cause IPCA 112 15.1449 2.E-06
IPCA does not Granger Cause IGPDI 6.89200 0.0015
29R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 6-29, jan./jun. 2011
Tabela 2.7 – Teste de causalidade de Granger para o grupo VAR 7Sample: 2000M01 2009M06
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Prob.
PIB does not Granger Cause M1 112 22.5800 7.E-09
M1 does not Granger Cause PIB 2.19962 0.1158
IPCA does not Granger Cause M1 112 3.34595 0.0389
M1 does not Granger Cause IPCA 1.01281 0.3667
IPCA does not Granger Cause PIB 112 7.56433 0.0008
PIB does not Granger Cause IPCA 0.85483 0.4282
Tabela 2.8 – Teste de causalidade de Granger para o grupo VAR 8Sample: 2000M01 2009M06
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Prob.
PIB does not Granger Cause M1 112 22.5800 7.E-09
M1 does not Granger Cause PIB 2.19962 0.1158
IGPDI does not Granger Cause M1 112 0.27327 0.7614
M1 does not Granger Cause IGPDI 1.52290 0.2228
IGPDI does not Granger Cause PIB 112 7.29336 0.0011
PIB does not Granger Cause IGPDI 0.26102 0.7708
Tabela 2.9 – Teste de causalidade de Granger para o grupo VAR 9Sample: 2000M01 2009M06
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Prob.
PIB does not Granger Cause SELIC 112 5.88396 0.0038
SELIC does not Granger Cause PIB 5.69541 0.0045
IGPDI does not Granger Cause SELIC 112 13.2768 7.E-06
SELIC does not Granger Cause IGPDI 0.04987 0.9514
IGPDI does not Granger Cause PIB 112 7.29336 0.0011
PIB does not Granger Cause IGPDI 0.26102 0.7708
Capital Humano no Brasil no Período ColonialHuman Capital in Brazil
in the Colonial Period
31R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 30-43, jan./jun. 2011
Capital Humano no Brasil no Período ColonialHuman Capital in Brazil in the Colonial Period
Augusta P. Raiher 1
Resumo
O foco deste trabalho é a análise da formação de capital humano no Brasil
no período colonial. Para isso, fez-se uma análise discriminatória, via revisão
bibliográfica, dos principais componentes do capital humano neste período,
agregando-os, posteriormente. Como resultado, observou que a formação
de capital humano no Brasil-Colônia ficou muito aquém do que se poderia
ter auferido, com uma formação ínfima, o que certamente não afetou o su-
cesso do sistema de produção do período, mas, possivelmente teve efeitos
sobre o crescimento econômico subsequente do país.
Palavras-chave: Capital humano; Brasil-Colônia.
AbstractThis work focuses on the analysis of how the human capital was formed dur-
ing the colonial period in Brazil. For that, it was made a discriminatory analy-
sis, through bibliographical revision, of the main components of the human
capital in that period, joining them later. As a result, it was observed that the
formation of human capital when Brazil was a colony fell far short of what it
could have gained with a minuscule formation. That certainly didn’t affect
the success of the production system of that period but it possibly had ef-
fects on the subsequent economic growth of the country.
Keywords: Human Capital; Brazil-Colony.
1 Doutora em Economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Professora da Univer-sidade Estadual de Ponta Grossa. E-mail: [email protected].
32
Introdução
Diversos autores argumentam que o capital
humano de um país é importante na determina-
ção do seu crescimento econômico. Miles e Scott
(2005) observaram a escolaridade média per capita
de diversos países em 1960 e seu correspondente
PIB (produto interno bruto) per capita em 1985 e
concluíram que os países com maiores níveis de es-
colaridade em 1960 tiveram níveis mais elevados de
PIB per capita em 1985.
Da mesma forma, Krueger e Lindahl (2001)
investigaram se a mudança e o nível inicial da edu-
cação estavam correlacionados com o crescimen-
to econômico e encontraram como resultado uma
relação positiva. Benhabib e Spiegel (2002), relacio-
nando o nível de capital humano e o crescimento
subsequente da produtividade, observaram a exis-
tência uma relação positiva, na qual, a nação que
possui um maior nível de capital humano tende a
exibir uma produtividade total dos fatores (PTF)
mais elevada. Além disso, os resultados sugerem
que um nível baixo de capital humano inicial de
um país faz com que este esteja, com o passar do
tempo, mais distante e mais longe do país líder em
relação à PTF. Ao mesmo tempo, o país que tem
baixa PTF inicial e baixo nível de capital humano em
relação ao país líder tem, proporcionalmente, baixo
crescimento econômico.
Assim, diversas análises empíricas revelam
que a acumulação de capital humano é uma con-
dição prévia para o crescimento econômico. Consi-
derando que isso seja verdadeiro, então, a formação
de capital humano que se teve desde o descobri-
mento do Brasil foi importante para a determinação
do seu crescimento econômico subsequente. Mas
como foi essa formação? Esse é o objetivo dessa
pesquisa, ou seja, analisar a formação de capital hu-
mano no Brasil no período colonial.
Para isso, este trabalho está divido em qua-
tro seções, incluindo esta. Na segunda seção faz-se
uma análise segmentada da evolução de cada com-
ponente do capital humano no decorrer do período
colonial, via revisão bibliográfica. Na terceira seção,
mensuram-se todos os componentes e, a partir daí,
tem-se a formação de capital humano no Brasil-Colô-
nia. As considerações finais sumarizam esta pesquisa.
2 Análise dos Diferentes Compo- nentes do Capital Humano
Qualquer fator que aumente o retorno do tra-
balho, que eleve a produtividade, é entendido como
capital humano. Assim, a elevação da produtividade
da mão de obra seria o maior benefício de se inves-
tir em capital humano, uma vez que com ele é possí-
vel ampliar o nível de conhecimento e de habilidade
de toda uma sociedade. Para Schultz (1961), a edu-
cação formal, a capacitação, a experiência, a pró-
pria alimentação, a saúde, a migração (visando tirar
proveito de melhores oportunidades de trabalho),
o ambiente familiar, cultural e a sociedade onde se
vive, formam o capital humano de um indivíduo1.
Qualquer fator que aumente o retorno do
trabalho, que eleve a produtividade, é entendido como capital humano.
O capital humano de um país é importante na de-terminação do seu cres-
cimento econômico.
1 No caso da saúde, ela tem um efeito quantitativo (crescimento populacional) e também um efeito de aumentar a qualidade dos recursos humanos. A alimentação também é um fator de qualidade em países subdesenvolvidos, ressaltando, porém, que o seu efeito diminui à medida que aumenta o seu con-sumo, chegando a um ponto que qualquer adicional se torna puro consumo. Schultz (1960) argumenta que é possível que o setor de saúde também tenha essa característica.
33R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 30-43, jan./jun. 2011
Neste contexto, pode-se dizer que a defini-
ção acerca do capital humano é significativamente
ampla, envolvendo diversos elementos, não se re-
duzindo simplesmente a educação. Por isso, neste
artigo analisaram-se, além da educação, a educação
profissional e a condição de vida da população bra-
sileira no período colonial, elementos estes que po-
dem elevar a produtividade dos indivíduos, além do
que, analisou-se a evasão de cérebros africanos que
ocorreu com a escravidão e seu efeito sobre o capital
humano brasileiro.
2.1. Educação
A vinda dos jesuítas em 1549 para o Brasil
foi o marco inicial da história da educação no país.
Desde a sua chegada, sistematizaram uma organi-
zação educacional, fundando as suas residências e
os seus centros de ações, visando à conquista e o
domínio das almas “perdidas” (OLINDA, 2003). De
acordo com Aranha (1996), quinze dias após a pre-
sença dos jesuítas no Brasil, já havia se edificado
a primeira escola elementar brasileira (em Salva-
dor), estendendo, posteriormente, de Salvador para
o Sul, onde, em1570 já possuíam cinco escolas de
instrução elementar (em Porto Seguro, Ilhéus, São
Vicente, Espírito Santo e São Paulo de Piratininga)
e três colégios (no Rio de Janeiro, Pernambuco e
na Bahia).
Primeiramente, o ensino se concentrou no
catecismo, na língua dos índios, em representações
de autores, com o objetivo de impressionar os nati-
vos ingênuos. Segundo Olinda (2003), foi nestas
escolas de ler e escrever, fixa ou ambulante, que
se teve início a uma política educativa de propaga-
ção da fé e da obediência. Ressalta-se que, com o
desenvolvimento do projeto educacional jesuítico,
duas categorias de ensino foram implementadas no
Brasil: a instrução simples primária, que eram esco-
las de primeiras letras para os filhos de portugueses
e dos índios e; a educação média, referindo-se aos
colégios destinados aos meninos brancos que se
formavam mestres em artes / bacharéis em letras.
Por isso que autores, como Olinda (2003), argu-
mentam que essa forma de organização da educa-
ção foi a responsável pela determinação do grau de
acesso ao ensino, em que, poucos se beneficiaram
numa magnitude maior, enquanto que a maioria da
população pouco se beneficiou.
De acordo com Paiva (2007), a catequese foi
o interesse inicial do ensino jesuítico com o objetivo
de domesticar os índios; contudo, o interesse maior
concentrou-se, posteriormente, nas instalações dos
colégios, em que, por meio deles preparariam no-
vos missionários. Os primeiros foram construídos
em São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Olinda.
Nestes colégios primeiramente se ensinava latim e
casos de consciência; em seguida, passou-se a ter
aulas de teologia, doutrina cristã, latim, sintaxe e
sílaba, gramática portuguesa, retórica, matemática,
música, artes e ofício, sempre preservando a cultura
portuguesa.
Segundo Albuquerque (1993, p.18), como
resultado do sistema educacional jesuítico teve-se:
[...]a transmissão de uma educação homogênea -mesma
língua, religião, visão do mundo, mesmo ideal de homem
culto, ou seja, letrado e erudito- plasmando, de norte ao
sul, uma identidade cultural; a catequese como processo
de aculturação, embora destrutiva, de filhos de colonos
e órfãos, trazidos de Portugal, com meninos índios e
mestiços, elidindo a distinção de raças e dissolvendo
costumes não europeus; a contraposição de escolas e da
igreja à autoridade patriarcal da casa grande [...]
Em 1759 tinham-se 25 residências, 36 missões
e 17 colégios e seminários, além de seminários meno-
res e escolas de primeiras letras instaladas em todas
as cidades onde havia casa da Companhia de Jesus
(ARANHA, 1996). Nesta fase, o ensino oficial da lín-
gua portuguesa era restrito aos filhos de portugue-
ses e aos filhos dos senhores de engenho, ou seja, a
elite brasileira, destacando que o número de letrados
não passava de 0,5% da população. Foi neste perí-
odo, 1759, que os jesuítas foram expulsos do Brasil
pelo Marques de Pombal, o qual implantou uma polí-
tica pública proibindo o uso da língua geral, impondo
o uso exclusivo do português.
34
Aranha (1996) argumenta que os jesuítas fo-
ram expulsos da colônia em função das diferenças
de objetivos que eles detinham comparados com
os interesses da corte. Enquanto os jesuítas preo-
cupavam em converter (religiosamente) os nati-
vos, Pombal preocupava-se em reerguer Portugal
da decadência que se encontrava diante da outra
potência europeia, além do que, a educação jesuíta
não convinha aos interesses comerciais emanados
por Pombal, ressaltando que se as escolas jesuíticas
tinham como objetivos servir aos interesses da fé,
Pombal buscava organizar o ensino para servir aos
interesses do Estado. Portanto, a partir de 1759, a
educação passou a ser dirigida pelo Estado, tendo,
de acordo com Olinda (2003), a primeira desastrosa
reforma do ensino no país.
Com a expulsão, levou-se também a organi-
zação monolítica baseada na Ratio Studiorium2, em
que, dessa ruptura pouca coisa restou de prática edu-
cativa no Brasil. Continuava a funcionar o seminário
Episcopal no Pará e os seminários de São José e de
São Pedro que não se encontrava sobre a jurisdição
jesuítica, a escola de artes e edificações militares na
Bahia, e a escola de artilharia no Rio de Janeiro. Por
meio do alvará de 28 de junho de 1759, Pombal su-
prime as escolas jesuíticas e cria, então, a aula régia
de latim, grego e retórico, criando, também, a dire-
toria de estudos, que só passou a funcionar após o
afastamento de Pombal. Percebendo que a educação
do Brasil estava estagnada, Portugal cria em 1772 um
subsídio literário para a manutenção do ensino médio
e primário, constituindo-se de uma taxação que inci-
dia sobre a carne verde, vinho, vinagre e aguardente.
Contudo, Aranha (1996) ressalta que esse imposto
nunca foi cobrado com regularidade, afetando dire-
tamente a manutenção dos salários dos professores
que ficavam longos períodos sem receber.
2 Constitui-se de um documento escrito por Inácio de Loiola, no qual expressava sua visão do ensino do catolicismo, servindo como modelo nos processos educativos nas épocas em que era utilizado. A Ratio surgiu devido a necessidade de unificar o procedimento pedagógico dos jesuítas diante da explosão do número de colégios confiados à Companhia de Jesus, os quais visavam a formação das elites nobres e a expansão missionária.
Esses professores geralmente não tinham
preparação para a função, já que eram improvisados
e mal pagos. Olinda (2003) argumenta que o ensino
primário, que se limitava aos colégios, dependia da
ajuda de particulares ou religiosos para a sua manu-
tenção, já que a lacuna deixada pela expulsão dos
jesuítas era preenchida apenas por alguns letrados,
enquanto que, o ensino superior dependia da instru-
ção das Universidades europeias, principalmente de
Coimbra.
Assim, apesar dos esforços, Pombal não
conseguiu implementar uma instrução popular,
gerando apenas uma fragmentação do sistema
educacional, permitindo uma pluralidade de aulas
isoladas e dispersas, consentindo que pessoas
semianalfabetas ministrassem matérias.
O resultado, portanto, da ação de Pombal so-
bre a reestruturação da educação no Brasil foi a de
que, no início do século XIX, ela estava reduzida a
quase nada. Com a queda de Pombal, a organização
escolar regrediu ainda mais, em que, os subsídios
não eram suficientes para arcar com as despesas e
os professores passavam a não receber pagamento
por meses e, até mesmo, por ano.
Segundo Olinda (2003), em 1808 tinha-se
411.141 habitantes, dos quais 21,6% eram brancos, 1,4%
índios, 43% negros e mulatos livres e 33,9% eram ne-
gros e mulatos escravos, destacando que o percentu-
al de alfabetizados correspondia apenas a população
branca. Assim, no final do período colonial tinha-se
uma enorme população de analfabetos contrastando
com uma minoria de letrados.
Com a vinda de D. João VI em 1808, junta-
mente com uma burocracia civil, militar e eclesiás-
tica (quinze mil pessoas), o Brasil passou por algu-
mas transformações, sendo criados cargos, cursos,
cadeiras, escolas e as primeiras faculdades. De acor-
do com Oliveira (2004), D. João VI permitiu a aber-
tura de escolas de primeiras letras em todo o país,
multiplicaram-se as escolas secundárias de artes e
ofícios e o ensino superior avançou enormemente
com a implantação da academia Militar, academia
da Marinha, a escola de medicina e de cirurgia no
Rio de Janeiro e na Bahia. Desta forma, a transfe-
35R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 30-43, jan./jun. 2011
rência do aparelho do Estado metropolitano por-
tuguês para o território colonial, com a vinda da
família real, inaugurou uma nova fase para o Brasil-
-Colônia, marcando o fim da etapa de colonização,
alterando conjuntamente a estrutura educacional.
2.2 Educação Profissional
A força de trabalho colonial era formada
pelos escravos e pelos trabalhadores livres. Santos
(2007) argumenta que a partir da introdução do es-
cravo em determinadas ocupações, desenvolvidas
por intermédio da força física e pela utilização das
mãos, verificou-se um consequente afastamento
dos indivíduos livres das referidas atividades como
forma de não deixar dúvidas quanto a sua própria
condição na sociedade, ou seja, a de não pertencer
ao grupo dos trabalhadores do sistema escravista e,
por conseguinte, não se identificar com eles.
Desta forma, tinha-se um tratamento discri-
minatório referente as diversas ocupações manu-
ais no Brasil-Colônia, que levou a aprendizagem das
profissões efetuadas por meio das Corporações de
Ofícios, as quais não tinham o mesmo desenvolvi-
mento que a da dos países europeus.
De acordo com Santos (2007), na Europa
tinha-se uma integração entre os homens livres e
os escravos nos locais de aprendizagem, em que,
os escravos, além de terem o mesmo tipo de for-
mação, estavam sujeitos às mesmas normas de
tratamento e de conduta no interior das referidas
Corporações. Ao contrário, no Brasil-Colônia as
Corporações de Ofícios possuíam rigorosas nor-
mas de funcionamento que contavam com o apoio
das Câmaras Municipais3 para dificultar ao máximo
e, até mesmo, impedir o ingresso de escravos. Cas-
tanho (2009) alega que o principal objetivo das
Corporações no Brasil era a de controlar o merca-
do de trabalho dos ofícios, mediante a certificação
daqueles que estavam aptos a exercê-las.
A discriminação que ocorria ao impedir o aces-
so dos negros e mulatos nas Corporações se dava a
partir das normas rígidas de ingresso e pela própria
distinção do ensino oferecido, na medida em que esta
estava centrada única e exclusivamente naqueles ofí-
cios que eram exercidos pelos homens livres. Neste
sentido, os requisitos para a admissão de aprendizes
nas Corporações contribuíram para que se tivesse o
embranquecimento dos ofícios, na medida em que os
homens brancos e livres procuravam preservar para
si algumas atividades manuais (SANTOS, 2007).
Para a época, esse processo discriminató-
rio em relação aos ofícios possivelmente não teve
consequências quanto a disponibilidade de mão de
obra na sociedade, em virtude do modelo econômi-
co a que o Brasil estava submetido, estando o siste-
ma colonial fundado no pacto colonial, com o exclu-
sivismo do comércio da colônia para a metrópole,
baseado no modelo agroexportador, imposto pelos
portugueses devido a sua resistência em permitir
que se implantassem estabelecimentos industriais
na colônia. Santos (2007) relata, cronologicamente,
o fechamento de diversas indústrias a partir de 1706,
findando, em 1785, com a expedição de um alvará
que obrigava o fechamento de todas as fábricas,
exceto as que tecessem fazendas grossas de algo-
dão, próprias para o uso do vestuário dos negros.
A ação discriminatória, que teve como conse-
quência a recusa de de-terminados grupos sociais em desempenhar alguns ofícios, aliada ao fecha-mento de indústrias e a
proibição de se construir novas unidades, produziu
como resultado a escassez de mão de
obra treinada.
3 Segundo Prado Junior (1976), as Câmaras eram responsáveis por grande parte dos negócios públicos, chegando, num dado momento, a legislar sobre quase todos os assuntos governa-mentais.
36
Assim, a ação discriminatória, que teve como
consequência a recusa de determinados grupos
sociais em desempenhar alguns ofícios, aliada ao
fechamento de indústrias e a proibição de se cons-
truir novas unidades, produziu como resultado a es-
cassez de mão de obra treinada para o século XIX.
Isso porque, com a vinda de D. João VI para o Brasil,
em 1808, retomou-se o processo de desenvolvimen-
to industrial, em que, com o alvará joanino de 1º de
janeiro de 1808, permitiu-se o livre estabelecimen-
to de fábricas e manufaturas no Brasil, revogando
a proibição total de fábricas de 1785 (CASTANHO,
2009).
A solução encontrada para a falta de mão
de obra foi a aprendizagem compulsória (Colégio
das Fábricas, criado em 1809), consistindo em
ensinar ofícios às crianças e aos jovens que não
tivessem outra opção, como era o caso dos órfãos,
encaminhados aos arsenais militares e da marinha,
onde eram encaminhados e colocados a trabalhar
como artífices de onde, após alguns anos, ficavam
livres para escolher onde e para quem trabalhar. Em
1810 instituiu-se a companhia de artífices no Arsenal
Real do Exército; em 1811 criou-se uma instituição
do aprendizado na real impressão; a Carta Régia,
de 1812, ordenou a formação de uma escola de
serralheiros, oficiais de lima e espingardeiros para se
ocuparem de preparar fechos de armas na capitania
de Minas Gerais, onde ainda se deu a aprendizagem
de lapidação de diamantes e uma tentativa, não
de todo exitosa, de estabelecer o ensino têxtil. Em
1816 teve-se o grande acontecimento para o avanço
da educação profissional, com a vinda da celebrada
Missão Artística Francesa, encabeçada por Joachim
Lebreton e composta por renomados artistas da
pintura, da arquitetura e da escultura, juntamente
com alguns especialistas em ofícios como de
serralheiro, ferreiro, carpinteiro de carros, curador
de peles e curtidor.
Segundo Castanho (2009), visando justificar
a vinda da Missão, criou-se, em 1816, a Escola
Real de Ciências, Artes e Ofícios. Destaca-se que
se teve, ainda neste período, o desenvolvimento
da aprendizagem nos “trens” militares, que eram
oficinas para fabricação e conserto de armamentos,
tendo a transferência para a coroa do seminário de
São Joaquim, para o aquartelamento de tropa e a
instalação de um Corpo de Artífices Engenheiros,
além da criação do seminário dos Órfãos da Bahia,
em 1819, a ser instalado e mantido com o produto
das loterias.
Castanho (2009) argumenta, por fim, que a
independência do Brasil, proclamada em 1822, não
alterou o modelo econômico vigente, em que, a
agricultura de exportação com uma estrutura es-
cravista de produção continuou predominando,
aparecendo, subsidiariamente, atividades manufa-
tureiras e industriais.
2.3 Condições de Vida
2.3.1 Alimentação
A monocultura latifundiária que predominou
no período colonial, com o cultivo de produtos vol-
tados para a demanda externa, deixou em segundo
plano a produção de gêneros voltada para o abas-
tecimento interno. Segundo Castro (1953), uma das
consequências desse modelo de colonização foi
a ocorrência de fome endêmica nessas áreas que
detinham o predomínio de lavouras monoculturas
(cana-de-açúcar), em virtude de que, a adoção de
um sistema de exploração especializado em um
único produto comprometia a produtividade do
solo, além do que, Freyre (1978) destaca que essa
monocultura acarretava numa carência de víveres
frescos, submetendo grande parte da população a
um regime alimentar deficiente, assentado no uso
constante de peixe seco e farinha de mandioca,
bem como pela utilização de gêneros importados
que, devido as técnicas de armazenamento da épo-
ca, muitas vezes chegavam já deteriorados.
Porém, Panegasse (2008) argumenta que,
embora as regiões especializadas na produção de
cana-de-açúcar tenham sofrido limitações na ma-
nutenção de seu repertório alimentar, a produção
37R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 30-43, jan./jun. 2011
de víveres para o consumo interno não foi totalmen-
te desconsiderada. Parte dos donos de engenhos
concedia áreas para o cultivo de alimentos, além do
que, nas regiões situadas as margens das grandes
plantações de cana-de-açúcar realizavam-se o cul-
tivo de inúmeros vegetais. Contudo, sempre existiu
uma hierarquização das culturas, ficando sempre as
melhores terras para o plantio da cana-de-açúcar,
enquanto que, os solos mais pobres destinavam-se
ao plantio de hortaliças e mandioca (SCHWARTZ,
1988).
Panegasse (2008) relata que em Minas Ge-
rais também se verificou essa carência de víveres,
embora não se tivesse a prática da monocultura. O
autor argumenta que a obsessão dos mineradores
pela extração de ouro originou um absoluto desin-
teresse da população pela agricultura, mesmo de
subsistência, restringindo a disposição de gêneros
aos habitantes da região e levando-os a crise de
fome constante, sobretudo no período inicial da
exploração aurífera (final do século XVII e início de
XVIII).
Portanto, fica nítido que, embora se tenha
tido áreas que eram destinadas à produção interna,
na maioria das vezes esta era em quantidade e
qualidade insuficiente para atender a população
presente no Brasil-Colônia.
2.3.2 Condições de Vida da Maioria da População
No início da colonização, a maioria dos habi-
tantes, segundo Schwartz (1988), compunha-se dos
que forneciam o trabalho indispensável para tornar
o açúcar um empreendimento lucrativo. O autor ar-
gumenta que o capital inicial e os feitores experien-
tes e qualificados eram fundamentais para o êxito
da atividade, entretanto, os trabalhadores, qualifi-
cados e não qualificados, é que formavam o am-
plo alicerce sobre o qual se estruturava a sociedade
colonial, desempenhados pelos escravos africanos,
precedidos anteriormente pelos índios.
Entre o período de 1540 e 1570 teve-se o
apogeu da escravidão do gentio nos engenhos do
litoral brasileiro em geral. O caráter intensivo da ati-
vidade açucareira e o número aparentemente ines-
gotável de trabalhadores em potencial, contribuí-
ram para o penoso cativeiro suportado pelos povos
nativos do Brasil, destacando que o regime de tra-
balho constante e árduo deixava pouco tempo para
o lazer (SCHWARTZ (1988))4. Ressalta-se que as
doenças epidêmicas trazidas pelos europeus dizi-
maram parte dessa população indígena no meado
do século XVI, acarretando em perdas para o setor
açucareiro, além do que, acarretou em fome para a
população como um todo, tendo em vista que par-
te da produção alimentícia do Brasil era produzi-
da pelos índios. O autor destaca que, mesmo nos
anos em que não se tinha a manifestação de série
de doenças epidêmicas, a taxa de mortalidade dos
indígenas era elevada.
A transição da predominância indígena para
a africana na composição da força de trabalho
escrava ocorreu aos poucos, ao longo de aproxi-
madamente meio século. Quando os senhores de
engenhos acumulavam recursos financeiros sufi-
cientes, compravam alguns cativos africanos e iam
acrescentando outros à medida que o capital e o
crédito tornavam-se disponíveis. Schwartz (1988)
infere que no final do século XVI, a mão de obra
dos engenhos era mista, mudando crescentemente
a favor dos africanos a partir daí.
Em 1600, levando em conta apenas a popu-
lação branca e de negros, estes últimos correspon-
diam a 80% da população. Desta forma, no período
colonial, a maior parte da população brasileira tra-
balhava nas fazendas de açúcar, vivendo em sen-
zalas, com péssimas condições de higiene e misé-
ria intensa, destacando que, tanto nessas fazendas
como também nas minas de ouro (a partir do sé-
culo XVIII), eles eram tratados da pior forma pos-
sível. Trabalhavam muito, recebendo apenas trapos
de roupa e uma alimentação de péssima qualida-
de, passando as noites nas senzalas, onde muitos
eram acorrentados para evitar fugas (ANTONIL,
4 O autor ressalta que há pouca investigação, ou nenhuma, acer-ca das condições de vida dos índios nos engenhos.
38
1982). Eram constantemente castigados fisicamen-
te, sendo que o açoite era a punição mais comum
no Brasil-Colônia.
Nas minas, tinham condições de vida miserá-
veis e eram colocados para trabalhar o máximo de
horas possíveis a troco de uma alimentação muito
pobre. Viviam em constante perigo, principalmente
por causa dos desmoronamentos, no qual a maioria
morria soterrada. Assim, os donos dos escravos es-
tavam sempre a substituir escravos mortos, doentes
ou demasiadamente gastos pelo trabalho duro.
Na cidade, o trabalho dos escravos era me-
nos duro e as condições eram melhores, não haven-
do tanta violência e muitos desempenhavam boas
profissões. Os escravos domésticos, mais próximos
da casa grande, estando sob a condição de criado
de quarto, amas de crianças, mucamas, cozinheiras,
costureiras e negro de recado, apresentavam uma
posição ligeiramente melhor do que a dos negros
do campo e das minas (ANTONIL, 1982). Mas, como
a maioria dos escravos estava localizada no campo,
suas condições de vida eram as piores possíveis.
2.4 Desperdício de Cérebro
A evasão de cérebros é um tipo específico
de movimento migratório, referindo-se a emigra-
ção de pessoal altamente qualificada de uma dada
localidade. Muita ênfase foi dada à pesquisa deste
assunto, principalmente, a partir da década de 1950,
em virtude do aumento e da grande dimensão da
migração de pessoas qualificadas dos países menos
desenvolvidos para os de maior desenvolvimento
econômico e social (SABBADINI; AZZONI, 2006).
O termo “Evasão de Cérebro” normalmente é
usado como sinônimo para o movimento de capital
humano, em que, a palavra “cérebro” refere-se a
qualquer habilidade, competência ou atributo perten-
cente a um indivíduo, enquanto que, “evasão” insinua
uma taxa de saída desses indivíduos num nível maior
do que a desejada. Segundo Giannoccolo (2004), a
motivação principal para migrar consiste na busca
por renda mais elevada, melhores postos de trabalho
(que muitas vezes não existem ou são escassos nos
A evasão de cérebros é um tipo específico de movimento mi-
gratório, referindo-se a emigração de pes-soal altamente quali-ficada de uma dada
localidade.
países de origem), aspecto social, privados, entre
outros, em que indivíduos, com uma mão de obra
mais qualificada, saem, geralmente, de países pobres
para os ricos. Nos países pobres conseguem se quali-
ficar com um custo mais baixo e se deslocam para os
países mais ricos onde o retorno para o seu capital
humano é mais alto. Destaca-se que essa migra-
ção acarreta, portanto, resultados negativos para o
desenvolvimento dos países que enviam, principal-
mente porque perdem capital humano.
Contudo, essa literatura acerca da “Evasão de
Cérebros” argumenta que, por vezes, tem-se “des-
perdício de cérebros”, referindo-se ao desperdício
de habilidades que acontece quando trabalhadores
qualificados migram para outros países, empregan-
do-se em trabalhos que não requerem a aplicação
das habilidades e experiência que esses indivíduos
possuem (GIANNOCCOLO, 2004).
No caso do Brasil-Colônia, com a vinda de
escravos africanos deveria se ter uma fuga de cére-
bros positiva para o Brasil, tendo em vista que esses
africanos que aqui chegaram eram procedentes de
uma região mais desenvolvida que o Brasil naquela
época. Se considerar, conforme Acemoglu, Johnson
e Robinson (2002), que a urbanização e a renda são
positivamente correlacionados5, então, no ano de
1600 a estimativa de Maddison (2001) era a de que
no Brasil a população/Km2 era de 0,0005, enquanto
que na África era significativamente superior, sendo
5 De acordo com os autores, um país que detenha 10% de popula-ção a mais do que outro país, tem, em média, 46% de renda per capita maior, e, portanto, os autores concluem que a urbaniza-ção é um bom substituto para o rendimento.
39R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 30-43, jan./jun. 2011
0,002. Portanto, considerando o período inicial do
tráfico de escravo, pode-se dizer que o desenvolvi-
mento da África era mais intenso que a do Brasil, e
consequentemente, os seus habitantes já detinham
certas habilidades.
Corroborando com esses dados, The Encyclo-
pedia of World History (2001) relata que o tráfico de
escravo da África para o Atlântico Sul claramente
conduziu a exportação de milhões de jovens, ho-
mens e mulheres produtivos. O próprio Schwartz
(1988) ressalta que a transição do uso da mão de
obra indígena para a do africano se deu parcial-
mente e crescentemente em favor do último, dada
a percepção dos portugueses quanto as habilida-
des relativas dos africanos e dos indígenas, sendo
maiores para os primeiros. Isso pode ser comprova-
do pelo preço médio de um africano que era de 25
mil-réis em 1572, enquanto que a dos nativos, com
a mesma habilidade, atingia apenas 9 mil-réis. Essa
diferença quanto ao preço, segundo o Schwartz
(1988), está intrinsecamente relacionado com a
produtividade do trabalho, relativamente maiores
para os africanos.
Portanto, a vinda dos africanos para o Brasil,
embora tenha sido uma evasão de cérebros força-
da, constituiu-se de um desperdício de cérebros, à
medida que a maioria deles foi posto para labutar
em trabalhos extremamente forçados e manuais,
com um desgaste físico intenso e com grande ex-
ploração das suas capacidades físicas.
3 Formação do Capital Humano no Período Colonial
Após a análise segmentada dos principais
elementos que formam o capital humano de um
indivíduo, resta mensurar o resultado final dessa
formação do capital humano no Brasil-Colônia.
No campo da educação, observou-se ni-
tidamente que a vinda dos jesuítas, embora com
interesses divergentes e atingindo a população
desigualmente, foi relevante quanto à introdução
da escolaridade no país, estando, em 1759, com 25
residências, 36 missões e 17 colégios e seminários,
além de seminários menores e escolas de primei-
ras letras instaladas em todas as cidades onde havia
casa da Companhia de Jesus. Contudo, a expulsão
dos jesuítas acarretou na primeira reforma desas-
trosa da educação brasileira, advinda, principalmen-
te, pela extinção das escolas jesuíticas, além do que,
os jesuítas foram substituídos por professores que,
de forma geral, não possuíam preparação para a
função. Assim, depois de dois séculos após o seu
descobrimento, o Brasil detinha apenas 21,6% de in-
divíduos alfabetizados, referindo-se basicamente à
população branca do país.
Neste contexto, fica nítido que as instituições
escolares6 do Brasil-Colônia, que inicialmente tive-
ram um crescimento significativo e que definharam
no final do período, foram criadas e organizadas de
acordo com os interesses da sociedade, do regime
de produção presente no país. E como implicação,
observa-se que o seu resultado final ficou muito
aquém do que se poderia esperar se fosse traçado
uma linha de tendência educacional apenas con-
siderando o período jesuítico. Isso significa que o
Brasil deixou de formar capital humano, no âmbito
da educação.
6 De acordo com Nascimento et al. (2007), a instituição escolar não é feita apenas de professores, alunos e métodos, embora eles sejam importantes. Ela se constitui a partir de interesses que identificam os marcos que são a identidade da sociedade. Isso se dá através de princípios em uma comunidade politica-mente organizada, ocupando determinado território e dirigida por um governo, estabelecendo desta forma as relações que absorvem as tendências dominantes em cada momento da his-tória.
40
No caso da educação profissional, a discri-
minação que ocorreu ao impedir o acesso dos ne-
gros e mulatos nas Corporações de Ofício, visando
preservar para os homens brancos e livres deter-
minadas atividades manuais, resultou num avanço
limitado do treinamento profissional. Da mesma for-
ma que a educação evolui de forma insignificante
em decorrência do interesse social e do sistema de
produção existente, a educação profissional tam-
bém evoluiu mediocremente, em que, a forma mais
visível de se avaliar isso é por meio da falta de mão
de obra que se observou no século XIX (período se-
guinte).
Outro ponto relevante na formação de ca-
pital humano dos indivíduos é a sua condição de
vida. As referências mostradas na seção anterior
evidenciam que os escravos eram representantes
da grande massa da população no período colonial,
destacando que, destes, a maioria vivia no campo,
vivendo em senzalas, com péssimas condições de
higiene e miséria, trabalhando duramente, sendo
tratados da pior forma possível. Isso significa que,
a condição de vida da maioria da população era a
pior possível.
Além disso, diversos autores argumentam que
o sistema de produção presente no país neste pe-
ríodo (constituindo-se da monocultura latifundiária)
deixou em segundo plano a produção de gêneros
voltada para o abastecimento interno, acarretando
em fome endêmica e na carência de víveres frescos,
submetendo grande parte da população a um regi-
me alimentar deficiente. Juntando isso a forma como
a maioria da população era tratada, pode-se inferir
que o nível de condição de vida não era o mais pro-
pício para alavancar a produtividade dos indivíduos,
contribuindo negativamente para a formação de ca-
pital humano do país.
Considerando que os africanos detinham de-
terminado nível de capital humano, a sua vinda de-
veria, portanto, contribuir para elevar a formação de
capital humano do país significativamente. Porém,
as péssimas condições de vida que eram oferecidas
a eles certamente impactaram negativamente sobre
suas produtividades. Por outro lado, à medida que
a maioria dos escravos foi posta para labutar em
trabalhos extremamente forçados e manuais, com
um desgaste físico intenso e com grande explora-
ção das suas capacidades físicas, também teve um
impacto negativo sobre as suas produtividades.
Além do que, a discriminação que ocorreu com a
exclusão destes escravos das Corporações de Ofí-
cio e das escolas, estagnou-os em termos de capital
humano. Isso significa que o Brasil-Colônia deixou
de ganhar em termos de formação de capital huma-
no com a vinda dos africanos, constituiu-se de um
desperdício de cérebros.
Assim, considerando a escolaridade, o treina-
mento e as condições de vida que se teve no Brasil
no período colonial, aliado ao desperdício de cére-
bros que se verificou, pode-se inferir que a forma-
ção de capital humano ficou muito aquém do que
se poderia ter, com uma formação ínfima. Isso certa-
mente não afetou o sucesso do sistema de produ-
ção do período, mas, sim, teve efeitos sobre os perí-
odos seguintes, principalmente no que se refere ao
avanço industrial, e seguramente foi um dos fatores
limitadores do crescimento econômico subsequen-
te do país.
A formação insipiente do capital humano no Brasil-Colônia possi-velmente teve efeitos
negativos sobre o cres-cimento econômico sub-
sequente do país.
41R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 30-43, jan./jun. 2011
• Recebido em: 25/11/2010
• Aprovado em: 04/04/2011
7. Referindo-se a educação, educação profissional e condições de vida.
4 Considerações Finais
O objetivo deste artigo era o de analisar a for-
mação de capital humano do Brasil no período co-
lonial. Como resultado, observou que essa formação
foi conduzida dentro dos interesses da sociedade e
do sistema de produção daquela época, com uma
formação muito aquém do que se poderia ter tido.
No acaso da educação, visualizou-se nitida-
mente um avanço inicial, com uma grande queda
no final do período, tendo como resultado final um
avanço muito pequeno comparado com o que se
poderia ter tido. Do mesmo modo, a discriminação
que ocorreu ao impedir o acesso dos negros e mu-
latos nas Corporações de Ofício resultou num avan-
ço limitado do treinamento profissional. No que se
refere ás condições de vida da população brasileira,
pode-se dizer que estas não eram as mais propí-
cias para se elevar a produtividade dos indivíduos,
principalmente pelo tratamento que era dado aos
escravos e pelo sistema de produção existente (mo-
nocultura latifundiária).
Assim, a forma como foi conduzida a evolu-
ção desses componentes do capital humano7 por
si só já resultaria naquilo que foi relatado anterior-
mente como “uma formação muito aquém da que
se poderia ter obtido”; contudo, o desperdício de
cérebros africanos que ocorreu, principalmente em
virtude das péssimas condições de vida que eram
oferecidas a eles, juntamente com os trabalhos
extremamente forçados nos quais eram obrigados
a trabalhar, contribuiu ainda mais para que o Brasil
deixasse de ganhar em termos de capital humano
no período colonial.
Dado que, muitos autores [como Miles e
Scott (2005), Krueger e Lindahl (2001) Benhabib
e Spiegel (2002)] consideram existir uma relação
positiva entre a acumulação de capital e o cres-
cimento subsequente de determinada sociedade,
essa formação insipiente do capital humano no
Brasil-Colônia possivelmente teve efeitos negati-
vos sobre o crescimento econômico subsequente
do país.
42
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A Dinâmica do Mercado Imobiliário Informal: Estudo de Caso Na Cidade de CuritibaThe dynamics of the real estate: a case study in the city of Curitiba
45R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 44-59, jan./jun. 2011
A Dinâmica do Mercado Imobiliário Informal: Estudo de Caso na Cidade de Curitiba1
The Dynamics of the Real Estate: A Case Study in the City of Curitiba
Resumo
As péssimas condições habitacionais e a segregação das classes sociais no
espaço são marcas da urbanização brasileira. Milhões de brasileiros encon-
tram alternativas para o acesso ao solo urbano e à moradia através de pro-
cessos e mecanismos informais e ilegais. São muitas as consequências socio-
econômicas, urbanísticas e ambientais desse fenômeno. No entanto, poucos
são os estudos existentes sobre o mercado informal de terras urbanas. A im-
portância atual desse mercado, a perspectiva do seu crescimento, e as con-
sequências dessa ordem urbanística excludente, justificam a escolha deste
objeto de estudo. Como resultados principais da pesquisa, ressalta-se que
a comercialização de imóveis nas áreas ocupadas irregularmente em Curiti-
ba tende a se consolidar como prática corrente, seguindo as mesmas regras
de diferenciação de preços do mercado formal, e desta forma, o mercado
imobiliário se afirma como agente estruturador da cidade, formando áreas
de expansão e desconcentração, e contribuindo para a pobreza urbana e a
desigualdade socioespacial.
Palavras-chave: Mercado imobiliário; informalidade; segregação socioespa-
cial; urbanização.
Abstract
The bad housing conditions and segregation of social classes are trademarks
in the Brazilian urbanization. Millions of Brazilians find alternative access to
urban land and housing through informal and illegal processes and mechanis-
ms. There are many socioeconomic, urban and environmental consequences
of this phenomenon. However, there are few studies on the informal market
for urban land. The importance of this current market, its prospect of growth
and the exclusion consequences of urban order justify the choice of this stu-
dy. As main results of the research, it was noticed that the trade of properties
in illegally occupied areas in Curitiba tends to be consolidated as practice,
following the same rules of differentiation of formal market prices, and thus,
the real estate market is stated as the structuring agent of the city, forming
areas of expansion and decentralization and contributing to urban poverty
and socio-spatial inequality.
Keywords: Real estate market; Informality; Socio-spatial segregation; Urban-ization.
1 Artigo baseado no trabalho de conclusão de curso da primeira autora, intitulado “A dinâmica do mercado imobiliário informal na cidade de Curitiba”, apresentado ao curso de Ciências Econômi-cas da FAE Centro Universitário. Curitiba, 2007.
2 Mestre em Master Urbanisme et Territoires pelo Institut d’Urbanisme de Paris. Assistente de pes-quisa no Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas. E-mail: [email protected]
3 Doutor em Desenvolvimento Econômico pela Universidade Federal do Paraná Professor da Uni-versidade Federal da Integração Latino-Americana. E-mail: [email protected]
Maria Fernanda Prigol Becker Scalco2
Gilson Batista de Oliveira3
46
Introdução
A urbanização brasileira é marcada forte-
mente pelas péssimas condições habitacionais,
pelo encarecimento do preço da moradia e, prin-
cipalmente, pela segregação das classes sociais no
espaço, características comuns a todas as cidades
brasileiras. Dados recentes mostram que um em
cada cinco habitantes da Região Metropolitana de
Curitiba mora em área de ocupação irregular, nome
dado aos bairros nascidos de invasões de terras,
com condições precárias de vida.
Um dos principais mecanismos de acesso
às ocupações irregulares é a comercialização dos
imóveis, caracterizando o chamado mercado imobi-
liário informal. Esta comercialização de imóveis nas
áreas ocupadas irregularmente se consolida como
prática corrente, seguindo as mesmas regras de
diferenciação de preços do mercado formal. Esta
prática expulsa a população mais pobre destas ocu-
pações, e como consequência, tem-se uma intermi-
nável expansão espacial da localização da pobreza,
caracterizada pelo processo sequencial ocupação/
comercialização/expulsão, que reafirma e reproduz
o padrão de segregação socioespacial da cidade.
Neste sentido, a implementação de políticas
públicas deve garantir a permanência da população
envolvida nos programas habitacionais, e para isso é
preciso conhecer melhor a dinâmica deste mercado
imobiliário informal. No entanto, poucos são os es-
tudos sistemáticos e abrangentes sobre o tema. Os
estudos urbanos e de economia urbana têm, em sua
maioria, como objeto o mercado fundiário e imobili-
ário formal. A importância atual desse mercado e a
perspectiva do seu crescimento, diante dos enormes
índices de favelização, impõem a urgência de trazê-
-lo como uma das prioridades de objeto de estudo.
O objetivo geral do presente artigo é caracte-
rizar o mercado imobiliário informal presente na re-
alidade de Curitiba, com base em levantamentos de
campo realizados em ocupações irregulares localiza-
das na região oeste da cidade, nos bairros Caximba,
São Miguel, Tatuquara, Orleans, Butiatuvinha e Au-
gusta. Como objetivos específicos, destacam-se: i)
identificar os determinantes da formação de preços
imobiliários em ocupações irregulares e os principais
elementos que constituem esse mercado; ii) compa-
rar as dinâmicas imobiliárias das ocupações irregu-
lares e dos mercados formais e identificar os fatores
Um em cada cinco habitantes da Região
Metropolitana de Curitiba mora em área de ocupação irregular, nome dado aos bairros nascidos de invasões de terras, com condições
precárias de vida.
e atributos que articulem os dois mercados no que
diz respeito aos processos de valorização e desva-
lorização dos imóveis; iii) analisar de que maneira o
mercado imobiliário pode influenciar na estruturação
e na segregação da cidade de Curitiba.
1 Espaço Urbano sob a Ótica Econômica
Os processos de industrialização e urbaniza-
ção são intimamente associados. Primeiramente, a
Revolução Industrial introduz uma forte alteração
no modo de produção: o produtor é separado das
suas condições de produção. A mecanização da
agricultura no campo traz um aumento na produ-
tividade, que acaba reduzindo o nível de emprego,
induzindo a migração para as cidades, neste caso
por fatores de mudança das relações de produção.
Por outro lado, há um aumento da população no
campo, pela redução da mortalidade decorrente
das evoluções de saneamento e saúde da época. A
disponibilidade de terra, no entanto, é limitada físi-
ca ou socialmente, pois não há reservas de terras
agricultáveis ou as terras são monopolizadas por la-
tifúndios. Diante disso, se não existe a possibilidade
em que é possível adotar técnicas de cultivo que
elevam a produtividade da terra, a população é le-
vada à migração pela estagnação de seus métodos
de trabalho (SINGER, 1973).
47R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 44-59, jan./jun. 2011
Desta forma, cria-se um enorme contingen-
te populacional nas cidades em busca de emprego.
Neste momento de intensas transformações eco-
nômicas e urbanas, impulsionadas pelo desenvol-
vimento industrial, começa a crise de moradias. A
associação da pequena cultura e da indústria, com
a propriedade da terra e da moradia, anteriormente
eram a base de um certo bem-estar dos trabalhado-
res. Com o desenvolvimento industrial, esta situação
se torna um entrave para o trabalhador, e prejudica
toda a classe operária, sendo o ponto de partida da
queda dos salários. A crise da moradia seria, então,
estrutural no capitalismo; é um problema inevitável
e historicamente necessário (ENGELS, 1971).
Diante disso, as soluções para os problemas
habitacionais são paliativas, visto que as causas dos
problemas não são atacadas. Apenas transferem o
problema de lugar, e não o eliminam, pois a mesma
necessidade econômica fará com que os mesmos
problemas surjam em outros lugares.
Com o grande contingente populacional nas
cidades em busca de emprego, junto com a escas-
sez de imóveis destinados ao uso habitacional, as
casas de cômodos passam a ser negócios rentáveis.
As condições habitacionais, desta forma, passam a
ser precárias e anti-higiênicas, indicando riscos de
epidemias.
A necessidade de remodelação do espa-
ço urbano aos interesses industriais, junto com as
preocupações higienistas em relação ao perigo das
epidemias, e as preocupações político-militares, fi-
zeram com que processos de renovação urbana
se desencadeassem. Este tipo de renovação urba-
na tem como principal marca a demolição de uma
enorme quantidade de imóveis no centro da cida-
de, justamente onde os trabalhadores devem e po-
dem habitar. Desta forma começa então a produção
da crise da moradia: a combinação de um rápido
e enorme aumento populacional nas cidades com
a destruição de muitos imóveis utilizados para fins
habitacionais.
No entanto, as moradias precárias não são eli-
minadas com a destruição dos imóveis precários du-
rante os processos de renovação urbana, são apenas
deslocadas, pois novas moradias precárias surgem.
No Brasil, esse processo marca o começo da faveli-
zação das periferias das grandes cidades - no Rio de
Janeiro, a favelização dos morros do centro da cida-
de. Confirma-se a tese de que a mesma necessidade
econômica fará com que os problemas habitacionais
ressurjam em outros lugares.
Além disso, pode-se destacar obstáculos que
impedem que o setor habitacional se desenvolva. De
um lado, a propriedade privada da terra dificulta o
acesso a grandes extensões de terra, o que impede a
adoção de métodos industriais que garantiriam uma
maior produtividade. De outro, existe o problema da
falta de demanda solvável, quando se relaciona o alto
valor da moradia em relação ao poder de compra da
população. Não é possível diminuir o valor da mora-
dia enquanto não se consegue industrializar o setor,
e, além disso, a demanda formada por aqueles que
têm poder de compra (demanda solvável) tende a ser
pequena, pois o desenvolvimento da produção capi-
talista leva à proletarização da população (RIBEIRO;
PECHMAN, 1983).
A reprodução de conjuntos habitacionais nas periferias, junto com o in-
centivo à indústria de cons-trução nacional, e a ocu-
pação ilegal de terras pela população desfavorecida,
são fatores que contribuem para o crescimento
das periferias.
48
Outra característica da urbanização no Brasil, e que contribui para o entendimento do problema habi-
tacional, é o crescimento urbano em direção à periferia. O incentivo à extensão da aglomeração por meio da
especulação imobiliária, marca a lógica capitalista de produção do espaço, que procura sempre novos empre-
endimentos, novas localizações para obter lucro. Um exemplo dessa dinâmica é o deslocamento das famílias
de classe alta em busca de tranquilidade e segurança, em grandes empreendimentos imobiliários construídos
longe dos centros urbanos. Além disso, a reprodução de conjuntos habitacionais nas periferias, junto com o
incentivo à indústria de construção nacional, e a ocupação ilegal de terras pela população desfavorecida, são
fatores que contribuem para o crescimento das periferias.
2 A Evolução do Espaço Urbano em Curitiba
Até 1960, o crescimento populacional de
Curitiba ocorreu de forma radiocêntrica1, incentiva-
do pelo esgotamento de áreas disponíveis no cen-
tro e pela sua crescente especialização como área
prestadora de serviço e comércio, provocando a
ocupação de bairros limítrofes à área central. Em
1970, inicia-se o processo de ocupação de bairros
não limítrofes ao Centro, onde o custo da terra era
mais acessível, tendo início o processo de periferi-
zação da população curitibana e seu consequente
extravasamento para a Região Metropolitana, ligado
à dinâmica de reestruturação da base produtiva do
estado do Paraná.
A partir de 1980, é possível perceber a con-
solidação do modelo de ocupação da periferia. En-
quanto que as taxas de crescimento populacional se
mantinham praticamente iguais até a década de 60,
relacionando Curitiba e as cidades do seu entorno; a
partir da década de 80, percebe-se que as taxas di-
minuem para a cidade de Curitiba, e aumentam nas
cidades da Região Metropolitana. A tendência de ex-
pansão da cidade para a periferia pode ser percebida
também dentro da cidade de Curitiba, a partir da dé-
cada de 80, quando o bairro do Boqueirão torna-se
o mais populoso e o bairro Centro perde importância
relativa em termos populacionais.
TABELA 1 – População e taxa de crescimento anual de Curitiba e região metropolitana com e sem Curitiba – 1970 a 2000
LOCALPOPULAÇÃO
1970 Taxa 1980 Taxa 1991 Taxa 1996 Taxa 2000
Curitiba 609.026 5,34 1.024.975 2,29 1.315.035 2,34 1.476.253 1,83 1.587.315
RMC 901.959 5,41 1.527.129 2,94 2.099.558 3,32 2.471.771 2,87 2.768.394
RMC sem Curitiba 292.933 5,54 507.354 4,04 784.523 4,88 995.518 4,37 89.784
FONTE DOS DADOS BRUTOS: IBGE, censos de 1970 a 2000.NOTAS: Dados elaborados pelo IPPUC; Taxa: média geométrica de incremento anual, que representa a evolução anual no período.
1 Crescimento urbano e populacional que se dá em torno do centro da cidade.
49R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 44-59, jan./jun. 2011
TABELA 2 – Principais bairros de Curitiba em números populacionais - 2000
BAIRROSPOPULAÇÃO
1970 (*) 1980 (*) 1991 (*) 1996 (*) 2000 (*)
Água Verde 25.114 4 31.979 10 45.438 6 49.863 6 49.866 8
Boqueirão 27.003 2 52.668 1 64.086 3 66.462 4 68.495 4
Cajuru 15.982 11 45.425 3 76.384 2 84.286 3 89.784 3
Centro 37.086 1 42.371 4 37.003 10 35.845 13 32.623 15
Cidade Industrial
21.973 5 45.904 2 116.001 1 150.985 1 157.461 1
Sítio Cercado 993 66 20.752 15 52.498 4 89.034 2 102.410 2
(*) – os números à direita ordenam os bairros de maior populaçãoFONTE DOS DADOS BRUTOS: IBGE, censos de 1970 a 2000.NOTA: Dados elaborados pelo IPPUC.
Nos últimos 10 anos, a cidade vem se expandindo na direção sul e sudoeste, indicando as regionais
do Portão, Pinheirinho e Bairro Novo como áreas de maior concentração populacional e maiores taxas de
crescimento. Nas demais direções, a mancha urbana ultrapassou os limites municipais, reforçando o processo
de conurbação que caracteriza a Região Metropolitana de Curitiba. Quando se analisa a distribuição espacial
da renda na cidade, percebe-se que as áreas de expansão da cidade coincidem com os locais de moradia da
população de mais baixa renda.
TABELA 3 – População e taxas de crescimento das administrações regionais de Curitiba – 1991 a 2000
ADMINISTRAÇÕESREGIONAIS
1991 1991-1996 1996 1996-2000 2000
POPULAÇÃOTAXA DE
CRESCIMENTOPOPULAÇÃO
TAXA DECRESCIMENTO
POPULAÇÃO
ABS. % R ABS. R ABS. % R ABS. R ABS. % R
R1 – Matriz 201.442 15,32 2º 0,08 8º 202.266 13,70 3º 0,00 8º 202.304 12,75 3º
R2 – Boqueirão 168.327 12,80 4º 1,04 6º 177.254 12,01 4º 1,51 6º 188.192 11,86 5º
R3 – Cajuru 153.694 11,69 5º 2,38 4º 172.886 11,71 5º 3,15 2º 195.742 12,33 4º
R4 – Boa Vista 200.934 15,28 3º 0,83 7º 209.421 14,19 2º 1,89 5º 225.696 14,22 2º
R5 – Santa Felicidade 140.250 10,67 6º 2,05 5º 155.235 10,52 6º 1,90 4º 167.387 10,55 7º
R7 – Portão 257.564 19,59 1º 2,48 3º 291.080 19,72 1º 0,89 7º 301.600 19,00 1º
R8 – Pinheirinho 126.513 9,62 7º 3,81 2º 152.542 10,33 7º 3,08 3º 172.254 10,85 6º
R10 – Bairro Novo 66.311 5,04 8º 11,75 1º 115.569 7,83 8º 3,80 1º 134.140 8,45 8º
FONTE DOS DADOS BRUTOS: IBGE, censos de 1970 a 2000.NOTA: Dados elaborados pelo IPPUC; dados em números absolutos, porcentagem referente ao total e ranking dos maiores números.
Quanto à situação habitacional, de acordo com pesquisas realizadas pela Fundação João Pinheiro em 2002,
a Grande Curitiba apresenta um déficit de 75 mil unidades. No entanto, quando se analisa os dados referentes ao
cadastro de famílias em programas habitacionais, percebe-se que o número de inscritos aumentou consideravelmen-
te a partir de 2003. Levando em conta que o número de inscritos é sempre menor que o real déficit habitacional, pois
nem todas as famílias chegam a fazer o cadastro, podemos deduzir que o real déficit habitacional nos dias de hoje é
certamente muito maior.
Enquanto as necessidades habitacionais não são atendidas em sua plenitude pelos serviços públicos, a po-
pulação procura outras formas de moradia. Dados recentes (FERNANDES, 2006) mostram que um em cada cinco
habitantes da Região Metropolitana de Curitiba mora em área de ocupação irregular.
50
GRÁFICO 1 – Número de inscritos por ano e região – posição em 31/12/2005
2.000
N°
de in
scri
tos
0%
4.000
6.000
8.000
10.000
12.000
14.000
16.000
18.000
até
19
94
199
5
199
6
199
7
199
8
199
9
20
00
20
01
20
02
20
03
20
04
20
05
FONTE: COHAB-CT
GRÁFICO 2 – Evolução do número de ocupações irregulares em Curitiba – 1971 a 2000
FONTE: IPPUC
51R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 44-59, jan./jun. 2011
Analisando a dinâmica demográfica e a distri-
buição espacial da renda, percebe-se a evidência da
expansão urbana de Curitiba na direção sudoeste,
além da conurbação da capital com os municípios li-
mítrofes na região leste. O custo da terra nessas áreas,
principalmente a sudoeste, é mais baixo. Estas áreas
também coincidem com as áreas de implantação da
maioria dos empreendimentos de habitação social,
por parte do poder público; com as áreas de maior
incidência de ocupações irregulares e, portanto, de
vulnerabilidade social; além de coincidir com as áre-
as de fragilidade ambiental. No entanto, as áreas mais
centrais da cidade, que contam com toda a infraestru-
tura necessária já implantada, estão sendo abandona-
das. Essa observação é importante para destacar os
custos econômicos e sociais deste tipo de expansão
urbana, guiada principalmente pela especulação imo-
biliária e pela diferenciação do preço da terra urbana.
FONTE: Banco Mundial; IPEA; IPPUC.
FIGURA 1 - Custo da terra - 2002
FONTE: IPPUC
FIGURA 2 - Ocupações irregulares por bairro em
Curitiba – 1999 a 2000
Diante disso, pode-se concluir que na cida-
de de Curitiba, a região norte/nordeste concen-
tra maiores valores imobiliários, menores taxas
de crescimento populacional e menor número de
ocupações irregulares; enquanto que a região sul/
sudoeste caracteriza-se pelo oposto: menores va-
lores imobiliários, maiores taxas de crescimento
populacional e, significativamente maior número
de ocupações irregulares. Portanto, a expansão da
cidade ocorre predominantemente em direção ao
sul/sudoeste, sobre as terras de menor valor e é co-
mandada pela população de baixa renda, de forma
irregular, ou ilegal.
52
3 Caracterização da Dinâmica do Mercado Imobiliário
De acordo com Gottdiener (1997), a dinâmica
do mercado imobiliário - ao contrário dos demais
mercados que têm causas essencialmente econômi-
cas (por exemplo, causadas por mudanças na locali-
zação dos empregos e das indústrias) - é orientada
por “um resultado dialético de fatores (…) que se ma-
nifestam através da linha de frente dos padrões de
desenvolvimento imobiliário que congregam a inter-
venção do Estado, formas de acumulação de capital
e a manipulação dos mercados de terra” (p.235).
Desta forma, o espaço é conformado e con-
trolado, e os estágios na produção do ambiente
construído podem ser relacionados com os ciclos de
acumulação de capital. Chegando ao apogeu de um
ciclo, quando começa a haver uma crise de supera-
cumulação no circuito primário de capital (circuito
da produção), começam os investimentos no setor
imobiliário em grande volume, o que faz disparar a
especulação, afastando a crise. A grande quantida-
de de capital investido no setor imobiliário, não pode
ser aplicada novamente no setor primário, o que leva
a uma “subcapitalização do circuito primário”, mar-
cando o declínio do ciclo de acumulação do capi-
tal (WALKER; HARVEY apud GOTTDIENER, 1997, p.
243).A lógica do mercado imobiliário pode adquirir
duas formas institucionais diferentes, diretamente
relacionadas com o capital monetário acumulado
pelos indivíduos ou grupos sociais. A primeira delas
está condicionada por um marco normativo e jurídi-
co regulado pelo Estado na forma de um conjunto
de direitos que estabelecem o marco das relações
econômicas legais. As relações econômicas que se
estabelecem à margem do sistema legal do direito
definem o campo da economia informal. Assim, a
lógica de mercado de acesso à terra urbana se ma-
nifesta através de relações legais ou ilegais. No pri-
meiro caso, a coordenação é exercida pelo mercado
formal, enquanto no segundo caso o processo de
acesso ao solo urbano é mediado por um mercado
informal (BECCATINI apud ABRAMO, 2005, p.2).
Desta forma, “para ocupar o solo urbano é necessário pagar
por ele, mediante a compra ou aluguel da propriedade
imobiliária. O mercado é o elo entre as relações sociais de
produção e a cidade, determinando a possibilidade de uso e
ocupação do solo mediante o pagamento do preço por ele
estipulado” (PEREIRA, 2002, cap.2).
Assim, os preços estipulados refletem os va-
lores desses espaços. Para Villaça (1998), o valor do
espaço urbano é determinado pelos elementos que
conformam esse espaço (edifícios, ruas, praças, in-
fraestrutura) e pela localização desses elementos,
que está ligada ao valor de toda a cidade.
O solo urbano, considerado aqui como uma
mercadoria, apresenta características particulares
que fazem com que a formação de seus preços
seja diferente das outras mercadorias (SMOLKA,
1987 apud PEREIRA, 2002, cap.2). Primeiramente
o solo não é reproduzível, pois não é produto do
O solo não é reproduzível, pois não é produto do traba-lho humano; está sujeito ao
monopólio; e é heterogêneo, pois se diferencia de acordo com suas condições físico-ambientais, localização, etc.
O espaço é conformado e controlado, e os estágios na produção do ambiente construído podem ser relacionados
com os ciclos de acumula-ção de capital.
53R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 44-59, jan./jun. 2011
trabalho humano; está sujeito ao monopólio; e é
heterogêneo, pois se diferencia de acordo com suas
condições físico-ambientais, localização, etc.
Além dos aspectos que formam os preços
do solo urbano, é importante destacar que o capital
envolvido nas questões referentes ao mercado imo-
biliário deve ser aplicado corretamente para se tor-
nar lucrativo. O investimento deve ser feito de for-
ma a promover o empreendimento certo, no lugar
certo, para o consumidor certo. Para isso, o espaço
da cidade deve ser organizado, de forma a adequar
o uso do solo aos interesses do capital imobiliário.
Neste sentido, percebe-se que o planejamento ur-
bano praticado pelo poder público é subordinado
aos interesses da valorização do capital e do mer-
cado imobiliário, pois é justamente essa articulação
– Estado e setor imobiliário – que conforma o espa-
ço nos dias atuais.
Sobre o mercado informal de terras, há um
enorme desconhecimento empírico. Assim, a carên-
cia de informações produz algo como um “senso
comum” sobre esse mercado e sobre a informali-
dade urbana, alimentando reflexões, políticas urba-
nas e representações sobre o universo dos pobres.
Com o objetivo de obter uma melhor compreensão
do mecanismo do mercado imobiliário informal na
cidade de Curitiba, este artigo apresenta parte de
uma pesquisa que analisou dados coletados por um
grupo de iniciação científica. Os dados apresenta-
dos foram levantados em campo, na região oeste
de Curitiba, em ocupações irregulares existentes
nos bairros Caximba, São Miguel, Tatuquara, Orle-
ans, Butiatuvinha e Augusta. Para maiores detalhes
ver Becker (2007), que traz o detalhamento do es-
tudo realizado.
A partir da análise dos dados levantados na
pesquisa de campo, foi possível perceber como se dá
a formação de preços nestas ocupações irregulares.
Na ocupação denominada Moradias da Ordem no
bairro Tatuquara, por exemplo, não há nenhum tipo
de serviço ou infraestrutura disponível aos moradores
e isso se reflete no preço dos dois imóveis encontra-
dos à venda: R$ 2.500,00 e R$ 5.000,00.
O imóvel de menor valor na ocupação Terra
Santa está em condições extremamente precárias,
com uma construção de madeira. Na Pompeia,
a variação dos preços dos 4 imóveis à venda é
bastante grande, de R$ 3.000,00 a R$ 25.000,00.
Neste caso, a variação de preços também está
ligada às condições da edificação, pois todas as
outras características e precariedades são comuns
a todos os imóveis.
No bairro São Miguel, na regional do Portão,
a área denominada Bela Vista II está localizada em
faixa de drenagem. Os preços dos imóveis à venda
nesta área são menores que os preços da ocupação
Bela Vista I, pois a fragilidade ambiental e os riscos
são bem maiores.
No bairro do Caximba, na regional Bairro
Novo, percebe-se que as condições da edificação
também estão fortemente ligadas à diferenciação
de preços, sendo que todos os lotes estão em
área de fragilidade ambiental. A Vila Juliana é um
loteamento clandestino localizado em faixa de
drenagem. A área é toda inundável, mas mesmo
assim os preços dos 9 lotes visitados variam de R$
2.800,00 a R$ 35.000,00. Os lotes que apresentam
A carência de informa-ções produz algo como um “senso comum” sobre esse mercado e sobre a informa-lidade urbana, alimentando reflexões, políticas urbanas e representações sobre o
universo dos pobres.
54
preços mais extremos, ou seja, o mais barato e o
mais caro, possuem a mesma área, 360 m2 e são
beneficiados pelos mesmos serviços urbanos e
infraestrutura: apenas água e coleta de lixo. O
que os diferencia é novamente a conservação e
a qualidade das construções. Portanto, nestes
casos, o preço dos imóveis é determinado pela
construção, e o valor da terra acaba não influindo
quando se trata da diferenciação dos preços dentro
da ocupação.
No bairro Orleans, na regional Santa Felici-
dade, foram feitos levantamentos na área de ocu-
pações irregulares denominada Real II A. Analisan-
do a diferenciação dos preços, percebe-se que as
condições de estética e de conservação dos imóveis
estariam relacionadas aos preços determinados (o
que só pode ser verificado pela análise das fotos),
pois todas as outras características são comuns. No
entanto, os preços são bastante diferentes. Para um
imóvel de 200 m2 pede-se R$ 35.000,00 e para ou-
tro, mais bem conservado, de 220 m2, o preço é R$
45.000,00.
Ainda na regional Santa Felicidade, no bairro
Butiatuvinha, a ocupação chamada Três Pinheiros
está sujeita a inundações com frequência, e ainda
está em área de preservação ambiental. Foram
encontrados 8 imóveis à venda, e os preços variam
entre R$ 90,00 e R$ 250,00 o m2. O imóvel mais
barato é uma casa, localizada em um lote onde
vivem mais duas famílias. O terreno está sujeito a
deslizamentos de terra e inundações. O imóvel mais
caro tem perfil plano e solo firme. No entanto, os
dois imóveis com valores extremos têm apenas
acesso à coleta de lixo, dentre todos os serviços
urbanos e de infraestrutura.
Diante deste caso, pode-se afirmar que, da
mesma forma que o mercado imobiliário formal
determina menores valores para as áreas de fragili-
dade ambiental, o mercado informal também esti-
pula menores valores para os terrenos expostos a
maiores riscos. Dentro de uma grande área de fra-
gilidade ambiental, ainda sim é possível diferenciar
áreas de menor valor e maior risco, e áreas de maior
estabilidade e melhores condições.
Por fim, no bairro Augusta, localizado também
na regional Santa Felicidade, foram feitos levantamen-
tos na ocupação denominada Vila São José, em pro-
cesso de regularização. Os preços dos imóveis encon-
trados à venda, variam de R$ 66 a R$ 375 o m2, valores
em sua maioria superiores aos encontrados em todas
as outras ocupações irregulares. No bairro Augusta é
que foram encontrados os 3 imóveis com maiores pre-
ços por m2, dentre todos os estudados, com valores
entre R$ 285 e R$ 375 por m2.
A pesquisa realizada neste assentamento do
bairro Augusta constata que os programas de re-
gularização fundiária impactam sobre o mercado
imobiliário informal também na cidade de Curitiba.
Os preços nestas áreas sofrem acréscimo de valor
quando enquadrados pelo poder público em planos
de melhoria e regularização. Estes programas me-
lhoram a situação das famílias moradoras, evidente-
mente, porém não são acompanhados de políticas
de controle da venda dos lotes após as melhorias.
Diante disso, os moradores muitas vezes optam pela
comercialização dos lotes recém-regularizados, que
por terem sido valorizados, mostram expectativas
de lucros, e optam pela moradia em outra área irre-
gular. Desta forma, os programas de regularização
fundiária - sem controle sobre o mercado de terras
- apesar de terem grande alcance social, não são efi-
cazes, na medida em que geram um novo processo
de expulsão da população mais pobre e um novo
ciclo de irregularidade.
A informalidade do mer-cado de trabalho é uma barreira para o ingresso no mercado imobiliário
formal de imóveis, e este seria outro motivo pelo qual as famílias optam pela moradia em áreas
irregulares.
55R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 44-59, jan./jun. 2011
Diante da comparação dos preços dos mer-
cados formal e informal de imóveis, procura-se
primeiramente encontrar razões pelas quais as fa-
mílias decidem comprar moradias nas áreas irregu-
lares, já que não seria uma questão de ofertas mais
baratas. Segundo Abramo (2001), existem diversos
fatores, como por exemplo, a proximidade de fontes
de emprego e o pertencimento a uma comunidade.
Além disso, a favela pode constituir um local de con-
centração de atividades de comércio e de serviços
que pode gerar renda aos seus moradores.
A informalidade do mercado de trabalho é
uma barreira para o ingresso no mercado imobiliário
formal de imóveis, e este seria outro motivo pelo qual
as famílias optam pela moradia em áreas irregulares.
Portanto, não são só as proximidades e acessibilida-
des das favelas aos equipamentos, infraestrutura e
empregos que contam para a escolha das famílias,
mas também questões sociais e culturais.
Abramo (2001) ainda procura estabelecer re-
gras de como os preços do mercado informal são
determinados. Primeiramente, é preciso perceber
que as transformações do ambiente construído for-
mal determinam parte das dinâmicas de valorização/
desvalorização do mercado informal assim como o
inverso também é verdadeiro. Outro fato que po-
deria valorizar os preços no mercado informal seria
o surgimento de uma concentração de comércio e
serviços no entorno; além da liberdade construtiva
e plástica nas intervenções, pois as áreas irregulares
não são regidas por regras urbanísticas formais.
Além da valorização em relação à proximida-
de de serviços e comércio, as edificações são valo-
rizadas, quanto mais antiga for a área de ocupação
e quanto mais consolidada for a construção (casas
em alvenaria por exemplo, são mais valorizadas). O
investimento feito pelas famílias com materiais de
construção e melhoramentos nas suas moradias,
costuma refletir diretamente no preço do imóvel, e
estas casas costumam ser as mais valorizadas, inde-
pendente da sua localização dentro da favela.
O mercado imobiliário informal acaba sendo
autorreferenciado, isto é, não se baseia em preços
de imóveis de outras áreas irregulares, ou se baseia
apenas nos preços dos imóveis dos bairros mais
valorizados da cidade.
Analisando os dados já coletados em áreas de
ocupação irregular, e confrontando as características
dos imóveis com seus respectivos preços do mercado
informal, percebe-se que o investimento em materiais
de construção acaba sendo uma importante referência
na formação dos preços na realidade curitibana. Ressal-
ta-se também a importância da consolidação da área
de ocupação, ou seja, quanto mais antiga, maior será a
valorização.
As informações levantadas confirmam que
o mercado imobiliário nas áreas de ocupações ir-
regulares segue o mesmo padrão do mercado for-
mal. Há uma diferenciação interna dos preços dos
lotes, como na ocupação Três Pinheiros, no bairro
Butiatuvinha, onde o preço do imóvel varia entre R$
15.000,00 e R$ 45.000,00. Os preços maiores têm
relação com a acessibilidade aos equipamentos e
serviços dos bairros vizinhos, bem como às quali-
dades construtivas da edificação existente no lote, e
também em relação às condições do terreno (firme,
fora de risco de inundações, etc.). Além disso, outro
fator que eleva o preço dos lotes é o enquadramen-
to da ocupação em planos de regularização a serem
executados pelo Poder Público.
O menor preço encontrado nas áreas pesqui-
sadas está na Vila Juliana, no bairro Caximba, e é jus-
tificado pelo fato do imóvel à venda estar localizado
em área sujeita a inundações frequentes, e também
pelas condições precárias da edificação de madei-
ra. Nesse caso, verifica-se que as restrições ambien-
tais funcionam como redutor de preços tanto para
o mercado formal quanto para o informal. De fato,
as áreas com fragilidade ambiental, não edificáveis
segundo a legislação urbanística, não interessam ao
mercado imobiliário formal. Por sua vez, mesmo sem
considerar a legislação, o mercado informal incorpo-
56
ra a desvalorização, tendo em vista os riscos per-
manentes a que os moradores estarão sujeitos ao
ocuparem essas áreas.
A comparação entre os preços praticados nas
áreas irregulares com aqueles dos bairros populares
vizinhos indica que não ocorre uma disparidade
exagerada de valores entre eles, o que pode ser jus-
tificado pelo fato dos preços nas ocupações irregu-
lares referirem-se ao terreno, mais a casa existente.
Entretanto, relativamente, os preços dos imóveis
nas ocupações podem ser considerados elevados,
uma vez que não oferecem ao morador as mesmas
condições de acesso aos benefícios da urbanização
a que têm direito os bairros regulares da cidade.
Abramo (2001) considera a própria irregula-
ridade como principal motivo dos preços elevados
nas favelas, porque isenta o morador das limitações
impostas pela legislação urbanística e flexibiliza a uti-
lização do imóvel, o que é especialmente valorizado
pelas famílias com renda baixa, que têm nesse imóvel
o único patrimônio. Essa flexibilidade é incorporada
ao preço, tornando o lote irregular comparativamente
mais caro do que outros nos bairros vizinhos, sujeitos
à imposição da lei.
A partir da análise do mercado imobiliário for-
mal e informal, percebe-se que a produção do espaço
e, consequentemente, a estruturação das cidades, é
um processo que está intimamente ligado ao setor
imobiliário, ou circuito secundário de capital, e legiti-
mado pela articulação deste com o Estado.
No que se refere à constituição de áreas de
expansão e desconcentração, o mercado formal de
terras procura sempre novos empreendimentos e
novas localizações para obter lucros. Desta forma, a
lógica capitalista de produção do espaço incentiva
a extensão da aglomeração por meio da especula-
ção imobiliária, ou seja, incita o crescimento urbano
em direção às periferias.
A criação de novas áreas de especulação
imobiliária, em detrimento das antigas áreas cen-
trais - que são abandonadas mesmo tendo toda a
infraestrutura necessária para o seu funcionamento
- é possível na medida em que o poder público atua
disponibilizando a infraestrutura necessária. Quan-
do a acessibilidade às áreas periféricas é melhora-
da pelos investimentos públicos, o valor de uso dos
terrenos aumenta, atraindo o capital imobiliário.
Com isso, “a sobreposição dos investimentos públi-
cos e privados acaba por valorizar o preço da terra,
o que incentiva a retenção especulativa das terras
e premia com a valorização aqueles que esperam
para utilizar seus terrenos” (BRASIL, 2001, p. 64)
É fácil perceber então como funciona a articu-
lação entre o setor imobiliário e o Estado, na cons-
tituição de novas áreas de expansão. É importante
ressaltar que, sem a intervenção do Estado, os em-
preendimentos imobiliários não são viáveis. Para Got-
tdiener, “a articulação entre o Estado e o setor imo-
biliário promove mudança desordenada numa escala
maciça” (1997, p. 248). Nestes casos, as intervenções
do governo não representam políticas de planejamen-
to e desenvolvimento do uso da terra, e não incluem
a participação da população mais afetada pelo cres-
cimento suburbano. Os efeitos sobre os padrões es-
paciais das cidades são imprevistos e desordenados,
pois não são controlados por uma política coerente
de governo.
Portanto, a ocupação das periferias não foi
feita pela livre escolha dos moradores, ao contrário
do que indicam as análises pelo lado da demanda.
A articulação entre o Estado e o setor imobiliário
favoreceu ao longo de muito tempo o crescimento
em direção às periferias, de forma desordenada, em
detrimento de um crescimento de forma planejada
e coordenada, que poderia ter preservado os
valores de comunidade.
Além disso, a comercialização de imóveis nas
áreas ocupadas irregularmente tende a se consolidar
como prática corrente, seguindo as mesmas regras
de diferenciação de preços do mercado formal. Essa
comercialização irá expulsar a população mais pobre
desses lugares, em geral também ocupado por po-
pulação de baixa renda. Como consequência, tem-se
uma interminável expansão espacial da localização
da pobreza, caracterizada pelo processo sequencial
ocupação/comercialização/expulsão, que reafirma e
reproduz o padrão de segregação socioespacial da
cidade brasileira.
57R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 44-59, jan./jun. 2011
De acordo com Pereira, Becker e Scalco
(2007), a vigência, no mercado formal e informal,
das mesmas regras determinantes do preço dos
imóveis reforça a hipótese que ações/políticas que
provocassem uma redução geral nos preços dos
imóveis urbanos teriam possibilidade de gerar im-
pactos positivos para a população de baixa renda
de forma generalizada e não apenas para uma po-
pulação-alvo. Uma vez que os dois mercados, for-
mal e informal, estruturam-se da mesma maneira, e
atuam no mesmo espaço urbano, a eventual redu-
ção de preços no primeiro certamente teria rebati-
mento sobre o segundo.
Outra questão derivada da existência desse
mercado imobiliário informal refere-se à efetividade
de programas de regularização fundiária que não
estejam acompanhados de uma política de controle
da venda do lote pelo morador logo após sua re-
gularização. Evidentemente, considera-se que es-
ses programas têm grande alcance social, na me-
dida em que estende à população das ocupações
o acesso aos benefícios da cidade legal. Entretan-
to, a prática corrente da comercialização dos lotes
recém-regularizados e a expulsão da população-al-
vo, que irá iniciar o processo de irregularidade em
outro local da cidade, exigem uma discussão mais
aprofundada sobre a essência desse círculo vicioso,
a qual não se limita à questão da regularização ou
não de uma área.
4 Considerações Finais
A forma de industrialização e consequente ur-
banização do Brasil, seguindo a linha do sistema eco-
nômico capitalista, marca as cidades com o crescente
problema habitacional. Grande parte da população
brasileira encontra alternativas para o acesso ao solo
urbano e à moradia através de processos e mecanis-
mos informais e ilegais, diante da falta de políticas efi-
cazes de habitação social somada ao encarecimento
dos preços das moradias. As aglomerações urbanas
se expandem em direção às áreas periféricas, resul-
tado de um esforço do capital imobiliário em obter
maiores lucros, junto com a proliferação das alter-
nativas informais de moradia, ocupando as terras de
menor valor. Este processo também é relevante na
realidade curitibana, conforme mostram os estudos
da evolução urbana, da dinâmica populacional e da
localização dos níveis de renda na cidade.
Além disso, a comercialização de imóveis nas
áreas ocupadas irregularmente tende a se consolidar
como prática corrente, seguindo as mesmas regras
de diferenciação de preços do mercado formal, e
contribuindo para a expansão espacial da localização
da pobreza, caracterizada pelo processo sequencial
ocupação/comercialização/expulsão. Desta forma, o
mercado imobiliário se afirma como agente estrutura-
dor das cidades, formando áreas de expansão e des-
concentração, e contribuindo para a pobreza urbana
e a desigualdade socioespacial.
FIGURA 4 - Círculo vicioso de segregação socioespacial nas cidades brasileiras
FONTE: BECKER, 2007
COMERCIALIZAÇÃO DOS IMÓVEIS
EXPULSÃO DA POPULAÇÃO MAISPOBRE DESSAS OCUPAÇÕES
MERCADO IMOBILIÁRIO INFORMALOCUPAÇÕES IRREGULARES
REAFIRMAÇÃO DO PADRÃO DESEGREGAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL
DA CIDADE BRASILEIRAMESMOS PADRÕES DE DIFERENCIAÇÃO
DE PREÇOS DO MERCADO FORMAL
58
O presente estudo mostrou que a diferencia-
ção de preços no mercado imobiliário informal das
ocupações irregulares de Curitiba obedece a certa
lógica e regularidade, de acordo com os dados levanta-
dos em campo, confirmando a sua existência enquanto
mercado regular que controla o acesso à terra urbana.
Além disso, a análise dos dados coletados também
pôde evidenciar a existência de critérios particulares de
diferenciação de preços de acordo com as variáveis e
características específicas do território das favelas, que
não são baseados na dinâmica do mercado formal. É o
caso dos imóveis cujo preço é determinado pelas ca-
racterísticas da construção, pelos riscos oferecidos de
acordo com o grau de fragilidade ambiental, ou pelo
enquadramento da área em questão em programas de
melhoria e regularização, por parte do poder público.
As consequências sociais dessa lógica de mercado são evidentes, não só para a população
diretamente afetada, que sofre com condições sub-
-humanas de moradia e com a iminência de proces-
sos de despejo; mas também para toda a sociedade
brasileira, que se vê hoje ilhada em meio a tantos
casos de violência. Mas também há consequências
ambientais gravíssimas decorrentes dessa forma de
estruturação das áreas urbanas. As áreas de manan-
ciais, ou as beiras dos rios, assim como as áreas de
preservação, não são ocupadas por falta de cons-
cientização ambiental ou por falta de educação da
população menos favorecida. A ocupação de áreas
ambientalmente frágeis se dá simplesmente por fal-
ta de opção diante do caos habitacional e urbano.
Ou melhor, se dá pela opção escolhida pelo Estado
de articulação com o setor imobiliário, ao longo de
muito tempo, favorecendo o crescimento em dire-
ção às periferias, de forma desordenada - em de-
trimento de um crescimento de forma planejada e
coordenada, que poderia ter preservado os valores
de comunidade.
Portanto, a viabilidade da produção da cidade
nos moldes capitalistas depende da intervenção do
Estado, e a gestão pública passa a ser amarrada aos
movimentos determinados pela lógica de mercado.
Da mesma forma que, por outro lado, a superação
dessa ordem urbanística excludente depende de
ações por parte do poder público. A mudança co-
meça pela conscientização e inquietação de toda a
população diante da realidade, passando pela orga-
nização da sociedade civil, que pode então exercer
pressão em busca de soluções.
No entanto, é importante ressaltar que as
intervenções devem acontecer na escala da área
urbana como um todo, e não apenas intervenções
pontuais. Os programas de regularização fundiária
e de intervenção em favelas são importantes, e de
grande alcance social, mas acabam sendo soluções
paliativas, visto que a lógica de mercado também
atua nessas áreas, gerando processos de exclusão
intermináveis. A questão parece estar centrada,
portanto, nas possibilidades e limites de uma
intervenção sobre as regras de funcionamento do
mercado, que nada mais são do que as regras da
produção capitalista da cidade.
• Recebido em: 15/02/2011
• Aprovado em: 04/05/2011
59R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 44-59, jan./jun. 2011
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Organizações Cooperativas e suas principais participações nos Estados Brasileiros (1995-2007)Cooperative Organizations and their main participation in the Brazilian States (1995-2007)
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Organizações Cooperativas e suas principais participações nos Estados Brasileiros (1995-2007)Cooperative Organizations and their main participation in the Brazilian States (1995-2007)
Resumo
O desenvolvimento econômico regional, quando visualizado no desenvolvi-
mento endógeno faz do indivíduo a principal peça do desenvolvimento lo-
cal. As cooperativas auxiliam na alocação destes atores do processo de de-
senvolvimento, quão cooperados e assalariados. Deste modo o capital social
incorpora-se nas relações. Este trabalho tem como objetivo analisar a contri-
buição das cooperativas no desenvolvimento regional dos Estados brasilei-
ros, através do número de empregos diretos fornecido pela Relação Anual de
Informações Sociais - RAIS, Produto Interno Bruto brasileiro e cooperativo,
faturamento das cooperativas e a diferenciação de IFDM entre municípios
com e sem cooperativas para o período de 1995 á 2007. Metodologicamente
utilizou-se pesquisa bibliográfica e estatística comparativa dos dados quanti-
tativos. Como resultado, há acréscimo de 4.509 cooperativas e 100.500 em-
pregos no Brasil sendo a média do Índice Firjan de Desenvolvimento Munici-
pal - IFDM maior nos municípios com cooperativas. Portanto, as cooperativas
geram empregos e atuam socialmente nas localidades.
Palavras-chave: Desenvolvimento Endógeno; Cooperativismo; Emprego.
Abstract
The regional economic development, when viewed in the endogenous de-
velopment turns the individual into the centerpiece of local development.
Cooperatives help in the allocation of these actors in the development pro-
cess, as members and employees. Thus, social capital incorporates itself in
the relations. This work aims to analyze the contribution of cooperatives to
regional development of Brazilian states through the number of direct jobs
provided by the Annual Social Information - RAIS, Brazilian Gross Internal
Product and cooperative, the cooperative sales and the differentiation among
municipalities with IFDM and without cooperatives for the period between
1995 to 2007. Methodologically, we used literature and comparative statics
of the quantitative data. As a result, there is an increase of 100,500 jobs and
4,509 cooperatives in Brazil and the average of the Municipal Development
Index Firjan - IFDM higher in municipal cooperatives. Therefore, cooperatives
generate jobs and social work in the places.
Keywords: Endogenous Development; Cooperativism; Jobs.
Patrícia Estanislau 1
Paulo Roberto Santana Borges 2
1 Mestre em Desenvolvimento Regional e Agronegócio pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Pesquisadora da Faculdade Estadual de Ciências e Letras de Campo Mourão. E-mail: [email protected]
2 Mestre em Desenvolvimento Econômico pela Universidade Federal do Paraná. Professor da Faculdade Estadual de Ciências e Letras de Campo Mourão. E-mail: [email protected].
62
Introdução
objetivo deste artigo é avaliar os impactos da
contribuição das atividades cooperativas no desen-
volvimento regional dos Estados brasileiros. Para tal
será verificada a participação das cooperativas em re-
lação ao Produto Interno Bruto - PIB, seu faturamento
nos últimos anos, número de empregos diretos gera-
dos pelas cooperativas, sua influência na renda per
capita domiciliar e a diferenciação através de indi-
cador socioeconômico, nos municípios das Unida-
des Federativas brasileiras com e sem cooperativas.
O estudo sobre a importância das coopera-
tivas nos Estados se faz necessária dado ao surgi-
mento cada vez mais intenso dessas associações e
a crescente adesão de indivíduos inserindo-se nelas
na condição de cooperados ou empregados. Em
ambos os casos há inserção deles no mercado de
trabalho ou qualificação laboral, havendo adicional-
mente elevação do capital social da região.
Fez-se o uso de pesquisa bibliográfica e
estatística descritiva. Assim se examinará dados
das cooperativas, tais como, total de ramos, total
de cooperados, empregos diretos e a participação
das mesmas no emprego formal total de cada
Estado, partindo da hipótese da alteração do
número de postos de trabalho no período de 1995
a 2007. O ano-base para a distinção dos Índices de
Desenvolvimento Econômico para Estados será o
ano de 2005.
No referencial teórico será analisado o desen-
volvimento econômico, bem como o desenvolvimen-
to regional dentro da perspectiva de desenvolvimen-
to endógeno, com breve visão sobre capital social
e o cooperativismo. Após, mostrar-se-á o número e
a participação das cooperativas, ramos, empregos
gerados no período de 1995 a 2007 a critério de re-
sultados, bem como à inserção do contexto das co-
operativas, dentro do enfoque do desenvolvimento
regional endógeno e do capital social, logo após, se-
rão apresentadas as discussões sobre os dados esta-
tísticos e a conclusão.
2 Referencial Teórico
A visão de Oliveira (2007) sobre a teoria do
desenvolvimento endógeno é que as regiões mais
desenvolvidas do País, quanto mais apropriadas à
infraestrutura para concepção de capital humano,
apresentam-se com as maiores possibilidades de
atração de empreendimentos ou sucesso desses no
local e/ou região escolhida para sua instalação.
O desenvolvimento endógeno retém a aten-
ção na regionalidade contribuindo para a redução
de desigualdades regionais, que servem como ins-
trumento de políticas públicas para correção des-
sas distorções. Responde a questões sobre o cres-
cimento variado entre regiões e nações, mesmo
dispondo das mesmas condições na busca de fato-
res produtivos. Alguns fatores tais como: o capital
social, o capital humano, o conhecimento, a pesqui-
sa e desenvolvimento, a informação e as instituições
quando originados dentro da região e tendo esses
fatores ou direcionando-os, poderia desenvolvê-los
O desenvolvimento endógeno retém a
atenção na regionalidade contribuindo para a
redução de desigualdades regionais, que servem como
instrumento de políticas públicas para correção
dessas distorções.
Pesquisa bibliográ-fica e estatística
descritiva.
63R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 60-73, jan./jun. 2011
internamente, adquirindo condições de atingir o
desenvolvimento acelerado e equilibrado (SOUZA
FILHO, 2005).
Boisier (1989) coloca a comunidade como
ator principal. Ela tenderá a estabelecer priorida-
des do desenvolvimento regional e suas propostas
deverão ter dimensões sociais e políticas. O desen-
volvimento regional depende do conjunto destes
elementos: da participação da região no uso de re-
cursos nacionais, do símbolo e dimensão da colisão
da política econômica sobre a região e capacidade
de organização social em manter o crescimento em
longo prazo.
Souza Filho (2005) identificou que essas co-
operações não desencadeiam o processo econômi-
co, mas faz as regiões enfrentarem e se adaptarem
aos desafios e oportunidade. Deve também procu-
rar manter e ampliar o estoque de capital social em
sua comunidade, fortalecendo a auto-organização
social, estimulando a prática de soluções colabora-
tivas para problemas comuns e promovendo a par-
ticipação e a abertura ao diálogo com os diversos
integrantes das comunidades regionais.
Nesse sentido Lima (2004) ilustra que as
cooperativas são formas alternativas de empresas
capitalistas. Seu trabalho autogestionário possibilita
o uso da força de trabalho, permitindo a redução
dos custos e aumentando a competitividade das
empresas.
As cooperativas pos-suem três características essenciais: gestão, pro-
priedade e repartição das sobras do exercício.
Singer (2004) diferencia o desenvolvimento
capitalista e o desenvolvimento solidário. O primei-
ro é realizado sob a propriedade do capital e adap-
tado às virtudes de competição, do individualismo
e do Estado mínimo. Já o segundo é o efetivado
por comunidades de pequenas firmas associadas
ou de cooperativas de trabalhadores, com valores
da cooperação e ajuda mútua entre pessoas ou fir-
mas, mesmo quando competem entre si nos mes-
mos mercados.
Schneider (2004) caracteriza o cooperativis-
mo como uma doutrina que considera as coopera-
tivas como forma ideal de organização da humani-
dade, baseado na economia solidária, democracia,
participação e direitos e deveres iguais para todos,
sem discriminação de qualquer natureza, para to-
dos os sócios. A cooperativa é uma união voluntária
de pessoas com a finalidade de satisfazer aspira-
ções e necessidades econômicas, sociais e cultu-
rais comuns, por meio de um empreendimento de
propriedade coletiva e democraticamente gerido.
Sendo um meio para que um determinado grupo de
indivíduos atinja objetivos específicos, por meio de
um acordo voluntário para cooperação recíproca.
Quanto aos princípios doutrinários do coo-
perativismo, de acordo com Veiga e Fonseca (2001)
se destacam a adesão voluntária e livre, a gestão
democrática e a participação econômica dos mem-
bros, a autonomia e independência, educação, for-
mação e informação cooperativista e a intercoope-
ração e o interesse pela comunidade.
Os mesmos autores demonstram que a socie-
dade cooperativa funciona democraticamente. Seu
principal objetivo é a prestação de serviços aos as-
sociados, chamados de cooperados, que são donos
e usuários, com direito a um voto (correspondente
a uma cota parte) nas Assembleias Gerais (órgão
máximo de uma cooperativa) e que cada coopera-
do decide as deliberações, tomadas pertinentes à
empresa cooperativa. Logo após, as Assembleias
Gerais hierarquicamente, tem-se Conselho Adminis-
trativo e o Conselho Fiscal.
A quota parte não pode ser transferida a ter-
ceiros e quando a cooperativa no final do exercício
64
contábil auferir lucros, este retorna proporcional-
mente, em relação as operações de cada coopera-
do. As cooperativas são abertas à participação de
novos associados. Defendem preços justos, promo-
vem integração entre cooperativas e estabelece um
compromisso educativo, social e econômico.
As cooperativas possuem três característi-
cas essenciais: gestão, propriedade e repartição das
sobras do exercício. Segundo Zylbersztajn (1994) o
cooperativismo está fundamentado em questões
de solidariedade, igualdade, democracia e fraterni-
dade, objetivando o apoio e a prestação de serviços
a seus associados como empresa social.
No que tange a organização cooperativa,
Bialoskorski Neto (2007) compreende esta, como
tendo o objetivo de distribuir resultados às chama-
das “sobras” aos seus membros, em dinheiro, no fi-
nal do período contábil, demonstrando assim trans-
parência para o associado, que pode visualizar o
comportamento econômico da cooperativa. Outra-
mente pode ser objetivado resultados econômicos,
que são disseminados aos associados em forma de
melhores preços de aquisição ou venda dos produ-
tos, em forma de prestação de serviços de assistên-
cia técnica e outros.
As cooperativas vistas como empresas, exer-
cem duplo sentido, quanto ao mercado, atuan-
do com igual competitividade quanto às demais
empresas não cooperativadas e obedecem às mes-
mas regras, porém, com objetivos diferentes por
força das próprias características ideológicas.
Em seu trabalho Silva e Holz (2008) demons-
tram que, o cooperativismo não visando o lucro,
satisfaz às necessidades do grupo que dele faz
parte, com promoção de bens e serviços a custos
menores, gerando um melhor bem-estar social. Em
relação ao excedente das transações que é investi-
do e aplicado em seu local de atuação, permitindo
assim uma melhor distribuição de renda e riqueza,
que é transformado em bens e serviços, de acordo
com o ramo da cooperativa, a custos mais acessí-
veis.
Na cooperativa há integração conjunta entre
os membros, o que visa à participação cooperativa
e se recusa à competição entre si. Existe uma
igualdade entre os participantes. O objetivo máximo
dos sócios é propiciar trabalho e renda a quem
precisa para difundir no país de modo democrático
e igualitário de organizar atividades econômicas
(SINGER, 2002).
Segundo estudo desenvolvido por Oliveira,
Delgado e Oliveira (2008) algumas cooperativas
ajudam a construir e reproduzir capital social e re-
forçam o desenvolvimento da economia solidária.
Pois atuam na perspectiva de ajudar a minimização
do desemprego e a exclusão social e ao se articula-
rem umas com as outras.
Na concepção de Schneider (2004) as coo-
perativas podem contribuir para melhora das ques-
tões sociais regionais, gerando empregos, des-
fazendo a concentração de riquezas. E se houver
concentração nas cooperativas, isto não resultará
em exclusão, haverá sim uma integração/concentra-
ção da empresas que representa milhões de copro-
prietários cooperativados. É um processo que refor-
ça as condições para uma melhor redistribuição da
renda e das oportunidades.
De acordo com o trabalho por Montaldi et
al. (2004), as cooperativas permitem extensão de
consumo e investimento aos associados. Isto causa
benefícios, pois injetam, de forma direta e indireta,
recursos na economia local, implicando no seu
desenvolvimento.
As cooperativas podem ser concebidas com
inúmeros fins desde que respeitados os princípios
cooperativistas. Hoje no Brasil, se desdobram em
13 ramos, segundo a Organização das Cooperativas
Brasileiras (OCB)1 (2009): Agropecuário (composto
de produtores rurais); Consumo (dedicadas à com-
pra de artigos de consumo para seus cooperados);
Crédito (destinadas a promover a poupança e finan-
ciar necessidades ou empreendimentos dos seus
cooperados); Educacional (composto por profis-
sionais autônomos, para prestarem ou contratarem
serviços educacionais); Especial (constituídas por
pessoas que precisam ser tuteladas, ou que tenham
1 Órgão Máximo, das cooperativas no país que reúne as OCEs (Organizações da Cooperativas Estaduais) e é integrante da OCI América (Organizações das Cooperativas da América La-tina) e da OCI (Organizações das Cooperativas Internacionais).
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algum grau de deficiência, ex-condenados, depen-
dentes químicos e adolescentes a partir de 16 anos
em situação familiar difícil econômica, social ou afe-
tiva, visa à inserção no mercado de trabalho des-
ses indivíduos); Habitacional (objetiva à construção,
manutenção e administração de conjuntos habita-
cionais para o seu quadro social, podendo contratar
ou fornecer serviços); Infra-estrutura (seu quadro
social atende com serviços essenciais, como ener-
gia e telefonia); Mineral (sua finalidade é pesquisar,
extrair, lavrar, industrializar, comercializar, importar
e exportar produtos minerais); Produção (são de-
dicadas à produção de bens e produtos, quando
detenham os meios de produção, no entanto a ma-
téria-prima advir de terceiros); Saúde (dedicam à
preservação e promoção da saúde humana, poden-
do contratar ou fornecer serviços); Trabalho: (tem a
finalidade de melhorar a remuneração e as condiç
ões de trabalho, de forma autônoma); Transporte
(criado pela OCB em 30 de abril de 2002 é compos-
to pelas cooperativas que atuam no transporte de
cargas e passageiros); Turismo e lazer (criado pela
OCB no dia 28 de abril/2000, composto pelas coo-
perativas que prestam serviços turísticos, artísticos,
de entretenimento, de esportes e de hotelaria); Ou-
tro (Composto pelas cooperativas que não se en-
quadram nos ramos citados anteriormente).
Nos 13 ramos do cooperativismo brasileiro
são encontrados incalculáveis os exemplos de
impulso à economia das comunidades, de bom
emprego das vocações locais e de superação de
crises econômicas ou de problemas climáticos
(BRASIL, 2006).
3 Evolução das Cooperativas e Total de Empregos no Brasil
A participação do cooperativismo no PIB
brasileiro é notável. Sua participação das coopera-
tivas no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro e o
PIB do cooperativismo, considerando os valores no-
minais, praticamente apresentaram a mesma evolu-
ção, já que sua variação foi em torno de 80%. Essa
TABELA 1 – Participação do Cooperativismo no PIB Brasileiro
Item 2002 2003 2004 2005 2006 2007
PIB Brasil (R$ trilhões)
1.256 1.543 1.669 1.938 2.118 2.262
PIB do cooperativismo (R$ bilhões)
70 86 93 108 118 126
PIB - Participação do Cooperativismo/brasileiro (%)
5,57 5,58 5,58 5,87 5,94 6,01
FONTE- OCB (2009)
ras entre 2002 e 2004 apresentou uma elevação
de 56,96%, o equivalente a R$ 23,58 bilhões. Já
entre 2004 e 2005 teve uma queda em torno de
R$ 4 bilhões (-6,22%). Mas, voltou a crescer em 2006,
ultrapassando R$ 70 bilhões em 2007. Pode-se dizer
que esse faturamento foi crescente em quase todo
o período, exceto em 2005. O faturamento das co-
operativas tem acompanhado o crescimento do PIB
brasileiro, conforme demonstrado na Tabela 2.
Segundo a OCB (2009) as cooperativas do
ramo agropecuário tiveram especial participação no
faturamento do sistema 2007, gerando R$ 60 bilhões,
o que corresponde a expressivos 83% do total o que
indica sua importância para o sistema cooperativista
e econômico do país. Pode-se concluir que grande
parte desse faturamento é proveniente das movimen-
tações monetárias de exportações ou do agronegó-
cio dessas cooperativas.
Acredita-se que com o faturamento crescen-
te, visto os princípios cooperativistas (gestão, pro-
priedade e repartição) são comprovados na prática.
Como nas Assembleias Gerais é decidido e distribu-
ída as sobras do exercício, o faturamento2 volta para
os cooperados em forma de sobras. A região em
que este cooperado está inserida é beneficiada, vis-
to que há uma maior circulação de montante mone-
tário. Este montante promove maior movimentação
2 A maioria das cooperativas retira parte de seus lucros para re-investirmos na própria cooperativa.
participação na economia brasileira foi crescente
no período conforme Tabela 1, o que incrementou o
faturamento do cooperativismo perante às transa-
ções brasileiras.
O faturamento das cooperativas brasilei-
66
TABELA 2 – Faturamento das Cooperativas em R$ Bilhões
AnoFaturamento (R$ bilhões)
% Participação
% Acumulado
% Variação
2002 41,40 11,39
2003 55,78 15,35 11,39 0,00
2004 64,98 17,89 26,75 34,73
2005 60,94 16,77 44,63 16,49
2006 68,02 18,72 61,41 -6,22
2007 72,20 19,87 80,13 11,62
Total 363,32 100,00 100,00 6,15
FONTE- OCB (2009)
Conforme OCB (2009), o cooperativismo
está presente em 1.751 municípios de todos os es-
tados do Brasil. De acordo com a Tabela 3, nota-se
o total de cooperativas no ano de 2007 é bastante
expressivo, sendo 7.682 unidades espalhadas entre
as 27 unidades federativas. Dentre os ramos de ati-
vidade entre as cooperativas, a atividade ligada ao
ramo de trabalho é que mais se destaca com 1.826
unidades. As cooperativas de crédito destacam-
-se no tocante ao número de cooperados, com
2.851.426 no ano de 2007. Porém, o ramo de ativida-
de que mais emprega formalmente é o ramo ligado
à agropecuária com 139.608 empregos.
O número de cooperados é bem expressivo.
Em 2007 no Brasil existiam 7.687.568 cooperados es-
palhados nos 13 ramos cooperativistas. E, estima-se
que 25 milhões de brasileiros estão ligados a essas
cooperativas. Conforme informações da OCB, em
1995, eram 3,5 milhões de brasileiros, ligados ao coo-
perativismo, dobrando 12 anos depois.
Segundo OCB (2009) o faturamento dessas
firmas ultrapassou R$ 72 bilhões. Os 13 ramos de
atividade juntos foram responsáveis por 6% do Pro-
duto Interno Bruto (PIB) brasileiro, somando R$ 126 bi-
lhões. Destaca-se que desta quantia, R$ 60 bilhões
foram proporcionados pelo ramo agropecuário. As-
sim, em 2007 esse ramo foi responsável por 2,85%
do PIB brasileiro e 47,45% do PIB das cooperativas
do Brasil.
Esses agentes do sistema cooperativo, sendo
cooperados, recebem incentivos em forma de assis-
tência técnica e formação cooperativista. Ao recebe-
ram assistência técnica, desenvolvem competências
e habilidades que melhoram sua contribuição na so-
ciedade. Em relação à formação cooperativista, esta,
inúmeras vezes, insere o cooperado como indivíduo
na sociedade, dando-lhe muitas vezes, oportunida-
de de trabalho e geração de renda, melhorando seus
conhecimentos ou aprimorando-os. Além de muitas
vezes, o inserir em uma rede de contatos com outros
cooperados.
TABELA 3 – Cooperativas, Cooperados e Funcionários por ramos de atividade em 2007
Ramo de Atividade Cooperativas Cooperados Funcionários
Agropecuário 1.554 879.649 139.608
Consumo 141 2.468.293 8.984
Crédito 1.148 2.851.426 37.266
Educacional 337 62.152 2.913
Especial 12 385 13
Habitacional 381 98.599 1.258
Infraestruutura 147 627.523 5.867
Mineral 40 17.402 77
Produção 208 11.553 1.427
Saúde 919 245.820 41.464
Trabalho 1.826 335.286 6.682
Transporte 945 88.386 5.363
Turismo e Lazer 24 1.094 39
Total 7.682 7.687.568 250.961
Fonte: OCB – Organização das Cooperativas Brasileiras
Igualmente, como as importâncias do coope-
rado dentro da comunidade local têm-se os empre-
gos diretos ofertados pelas cooperativas, que em
2007 no total nos Estados brasileiros correspondeu
a 250.961 postos de trabalho. Os atores do contex-
to cooperativista se integram à sociedade, e distri-
buem os frutos da cooperação em forma de desen-
volvimento local, captando as potencialidades da
região em que vivem e as transformando coletiva-
mente em resultados. Há de se comentar também,
de bens e eleva o consumo, que por consequência
gera maior demanda por mercadorias pressionando
a criação de empregos, além de aumentar a arreca-
dação de impostos pelos governos das três esferas
(federal, estadual e municipal).
67R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 60-73, jan./jun. 2011
sobre os indivíduos ligados indiretamente ao coope-
rativismo. Ao prestarem serviços às cooperativas ou
tendo algum grau de parentesco com cooperados
ou funcionários, o número de pessoas ligadas indi-
retamente ao cooperativismo aumenta ainda mais.
Todas as relações entre os demais integrantes
se forem respeitados os princípios cooperativistas,
contribuem para a construção de organizações de
gestão de base atuantes, de atores sociais e de so-
ciedade civil saudável. Isso faz avançar o capital so-
cial, beneficiando a localidade em que está inserida a
cooperativa. Facilita aos grupos e indivíduos, formas
recíprocas de ajuda e de cooperação, que permite
à determinada comunidade ter chances de compe-
titividade e de sobrevivência no mercado, gerando
oportunidades, capacidades e potencialidades nos
diversos atores da sociedade.
A constituição das cooperativas por vezes
leva em consideração a heterogeneidade entre as
regiões no território brasileiro. A região norte do
país, pelo contexto territorial de atividades ligadas
ao extrativismo tem potencialidades a desenvolver
práticas cooperativas (ligadas ao ramo de produ-
ção, consumo) que possibilitam melhor desempe-
nho à produção, escoamento e preços, dado a nego-
ciação conjunta. O centro oeste devido à demanda
do povoamento nas últimas décadas teve estímulo
ao surgimento de cooperativas agrícolas e urbanas,
mas, também, cooperativas habitacionais que propi-
ciaram o desenvolvimento regional. A estas duas
regiões percebe-se o salto qualitativo para o apro-
veitamento das potencialidades destas localidades
(SILVA et al. 2003).
Schneider (2004) diz que o cooperativismo
muito tem a contribuir para o desenvolvimento in-
tegral, humano e sustentável. Os sócios de uma co-
operativa são membros ativos daquela comunidade,
nela têm inserido suas raízes. Em relação às sobras
do exercício, os associados priorizam também a re-
aplicação da maior parte dos excedentes gerados
pela cooperativa dentro do próprio município ou da
Região. As cooperativas são importantes para acrés-
cimo da renda dos associados, comparativamente a
pessoas não associadas. Por exemplo, os associados
de todas as cooperativas brasileiras representam
apenas 3,02% da população brasileira, mas são res-
ponsáveis por 6% do Produto Interno Bruto do País.
Em relação ao número de cooperativas, este,
vem expandindo-se. Como apresenta a Tabela 4,
ressalta-se que no período de 1995 a 2007, há um in-
cremento de 4.509 cooperativas, respondendo por
65% de aumento no número total de cooperativas.
Alguns Estados tiveram um incremento substancial,
é o caso do Estado São Paulo com um adicional no
período de 820 cooperativas, Rio Grande do Sul com
802 cooperativas, e Minas Gerais com 744 coopera-
tivas. Mesmo olhando os Estados que menor incre-
mento de cooperativas tiveram no período de 1995
a 2007, nota-se que existia em 1995 um número pe-
queno destes estabelecimentos é o caso do Estado
de Roraima com apenas duas cooperativas em 1995
e passando a ter onze estabelecimentos cooperati-
vos em 2007, Amapá possuía três estabelecimentos
em 1995 e passou a oito estabelecimentos em 2007.
Relaciona-se o número de cooperativas com
número de empregos gerados por ela. No geral,
houve um incremento de 100.500 empregos, no pe-
ríodo. Detalha-se que o Estado que mais incremento
apresentou no período, foi o Estado do Paraná com
19.132 empregos, seguido de São Paulo com 16.267
empregos e Rio Grande do Sul com 13.181 postos de
trabalho.
No entanto, os Estados que menor tiveram
incremento no número de empregos gerados dire-
tamente por cooperativas, foi o Maranhão com re-
dução de 32 postos de trabalho, seguido do Estado
do Sergipe que contribui com apenas 182 empregos
diretos e Roraima (237).
68
TABELA 4 – Número de Cooperativas e empregos formais nos anos de 1995 e 2007
EstadosCooperativas Empregos
1995 2007 Diferença 1995 2007 Diferença
Rio Grande do Sul 1.293 2.095 802 28.385 41.556 13.181
Minas Gerais 1.148 1.892 744 19.343 29.297 9.954
São Paulo 1.032 1.852 820 28.029 44.296 16.267
Paraná 924 1.443 519 32.345 51.477 19.132
Santa Catarina 572 921 349 12.319 23.941 11.622
Rio de Janeiro 343 560 217 5.919 9.739 3.820
Goiás 262 393 131 5.513 7.964 2.451
Bahia 223 332 109 2.494 3.132 638
Espírito Santo 181 198 17 2.724 4.604 1.880
Mato Grosso 138 340 202 2.133 5.717 3.584
Ceará 121 174 53 1.598 4.460 2.862
Pernambuco 108 163 55 879 3.038 2.159
Distrito Federal 106 125 19 1.674 2.193 519
Mato Grosso do Sul 99 180 81 1.447 3.562 2.115
Rio Grande do Norte 57 93 36 835 1.657 822
Paraíba 52 76 24 506 2.303 1.797
Pará 40 128 88 787 2.192 1.405
Piauí 39 62 23 411 693 282
Rondônia 38 98 60 191 1.787 1.596
Alagoas 32 53 21 1.092 2.935 1.843
Sergipe 29 64 35 363 545 182
Maranhão 29 46 17 549 517 -32
Tocantins 19 49 30 393 897 504
Amazonas 15 57 42 366 1.472 1.106
Acre 4 20 16 86 385 299
Amapá 3 8 5 50 354 304
Roraima 2 11 9 39 276 237
Ignorado 5 0 -5 29 0 -29
Total 6.914 11.433 4.519 150.499 250.999 100.500
FONTE: RAIS (Relação Anual de Informações Sociais)
Ressalta-se a importância das cooperativas na promoção e geração de empregos, entre as Unidades
Federativas brasileiras, visto que ao possibilitarem estas vagas, condicionam seus trabalhadores, treinando-os e
remunerando-os. Essa remuneração eleva o consumo, que pede ampliação da produção e para essa aumentar,
há necessidade de promover investimentos e capital humano. Essa visão alimenta o processo econômico, que
continuado, alavanca indicadores socioeconômicos, chegando ao desenvolvimento regional.
Identificando o total de empregos diretos gerados pelas cooperativas, pode-se ver a participação do
mesmo dentro do total de emprego formal de cada Estado Brasileiro, de acordo com o Gráfico 1. Excetuando os
Estados de Amapá, Alagoas, Ceará, Maranhão, Piauí e o Distrito Federal, todos os demais mostraram crescimento
69R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 60-73, jan./jun. 2011
no número de empregos gerados pelas cooperativas, no total de emprego formal de cada Estado. Ressaltando,
que os Estados que tiveram maior aumento neste item, foram Rondônia com 0,57%, e Rio Grande do Sul atingiu
0,42% e Bahia chegou a 0,32%.
0,00 0,50 1,00 1,50 2,00 2,50
RO AC AM RR PA AP TO MA PI CE RN PB PE AL SE BA MG ES RJ SP PR SC RS MS MT GO DF Total
Participação dos Empregos diretos das Cooperativas no Total de Empregos Formais em 1995 Participação dos Empregos diretos das Cooperativas no Total de Empregos Formais em 2007
FONTE: Resultados da Pesquisa
FONTE: Dados compilados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA Data e Resultados da Pesquisa.
GRÁFICO 1 – Participação dos Empregos Diretos gerados pelas Cooperativas no total do Emprego Formal nos anos de 1995 e 2007
GRÁFICO 2 – Renda domiciliar Per Capita por Estados Brasileiros em 1995 e 2007 e diferença no período.
Dada a movimentação dos atores sociais no mercado de trabalho, observa-se que o total de empregos
gerados pelas cooperativas influencia a renda domiciliar per capita no período. Fazendo uma conexão com o
total de incremento de postos de trabalho gerados pelas cooperativas no período analisado, com a diferença da
renda domiciliar per capita do mesmo período, pode-se observar a seguinte situação: nos Estados de Rorai-
ma, Acre, Rondônia, Amazonas e Amapá que apresentam menor incremento no total de empregos gerados
pelas cooperativas, também ocorreu queda da renda domiciliar per capita. Já nos Estados em que o volume de
empregos diretos gerados pelas cooperativas foi maior, como é o caso do Paraná, São Paulo, Rio Grande do Sul,
Santa Catarina e Minas Gerais houve um incremento na renda domiciliar per capita.
-200 0
200 400 600 800
1000
AC AL AP AM BA CE DF ES GO MA MT MS MG PA PB PR PE RR SP SE TO Renda Percapita Domiciliar em 1995 Renda Per capita Domiciliar em 2007 Diferença entre a Renda domiciliar Per capita de 1995 e 2007
PI RJ RN RS RO SC
Entretanto, o Distrito Federal, Mato Grosso do Sul e Goiás, os aumentos da renda domiciliar per capita
foram satisfatórios, a diferença observada no número de empregos gerados pelas cooperativas no período,
não foi na mesma proporção em relação a renda.
O aumento na renda domiciliar per capita ajuda na redução da pobreza e inserção do indivíduo na so-
ciedade. A cooperativa ajuda neste contexto. Ilha (2008) em seu artigo trabalha a questão do capital social e
70
0
0,2
0,4
0,6
0,8
1
Municípios sem Cooperativas Municípios com Cooperativas
AC AL AM AP BA CE ES GO MA MG MS MT PA PB PE PI PR RJ RN RO RR RS SC SE SP TO BR
FONTE: Resultados da Pesquisa
GRÁFICO 3 - Municípios por estados no ano de 2000 com cooperativas e sem cooperativas
o cooperativismo no desenvolvimento regional, ressaltando não só o papel social das cooperativas, mas seu
papel econômico na sociedade. No tocante ao aspecto social, reflete a valorização do trabalho, buscando no
coletivo, vantagens individuais, incrementando também o capital social.
A saber, se as cooperativas influenciam os indicadores de qualidade de vida, usa-se para este estudo
um indicador de desenvolvimento, o Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal (IFDM)3, que mede o grau de
desenvolvimento dos municípios brasileiros, através de uma média simples de fatores, como renda e emprego,
educação e saúde. O índice refere-se ao ano-base de 2005, sendo o indicador socioeconômico mais atual.
Como métodos foram separados todos os municípios por Estado que possuíam uma ou mais coopera-
tivas de acordo com o total de estabelecimentos fornecido pela Relação Anual de Informações Sociais (RAIS)
fornecida pelo Ministério do Trabalho e Emprego, dos municípios sem a presença deste empreendimento.
Após, foram elaborados dois valores médios dos IFDM, um com municípios com cooperativas e outro com
municípios sem cooperativas, para cada Estado brasileiro. Em todos os Estados brasileiros, a média do IFDM
foi maior nos municípios com cooperativas, que pode ser visualizado no Gráfico 3.
Estes resultados levam a constatar que no Brasil os municípios com cooperativas têm IFDM médio de
0,6132 e municípios sem cooperativas o IFDM médio é de 0,5485.
3 Varia entre 0 e 1, sendo quanto mais próximo de 1, maior o nível de desenvolvimento da localidade, e quanto mais próximo de 0, menor o nível de desenvolvimento. O IFDM é calculado pela FIRJAN, Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro junto a Assessoria de Pesquisas Econômicas.
As análises estatísticas, obtidas de acordo com o teste t, mostram que as diferenças entre as médias dos
municípios, significativas a um nível de 99% em que, o IFDM nos municípios com cooperativas correlaciona-se
positivamente, sendo que a diferença média entre os municípios com e sem cooperativas é verdadeira.
Esse desempenho é a imagem do investimento nos indivíduos, com ações educativas, promovidas pelo
sistema cooperativista. Associados, os indivíduos são capazes de fazer as coisas acontecerem de uma forma
mais equitativa, tanto no acesso, quanto na distribuição dos recursos (BRASIL, 2006).
Com o cooperativismo há o fortalecimento da organização social das comunidades, considerado como
a capacidade de associar para obter ganhos individuais e coletivos, tendo como fontes principais a confiança,
o associativismo, a cooperação, a ação coletiva e a reciprocidade de favores. A inserção do capital social
capacita as pessoas a realizarem determinados projetos, que sozinhas não conseguiriam, condicionando-as
à mobilização dos fatores produtivos, num processo de autogestão. Assim a sustentabilidade econômica e
social contribui para a satisfação de vida dos associados (MOREIRA; MAYORGA; KHAN, 2008).
71R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 60-73, jan./jun. 2011
Em suma, considera-se que as cooperativas
indicam de certa forma uma contribuição para o de-
senvolvimento regional dos Estados brasileiros pelo
menos no tocante quantitativo. No âmbito da teo-
ria do desenvolvimento endógeno as cooperativas
são alocadoras de recursos, capazes de fomentar o
desenvolvimento das potencialidades da região, em
que está inserida. Assim, no período em questão,
sua contribuição em relação aos agentes locais foi
representativa, visto a movimentação dos postos
de trabalho assim gerados e consequente aumento
da renda per capita nos Estados citados. Enfim, no
desenvolvimento socioeconômico a presença das
cooperativas fortalece o vínculo do indivíduo com
a sociedade, visto a atuação desta, direta e indireta-
mente a promover o bem-estar.
4 Considerações Finais
O objetivo principal deste trabalho foi analisar
a contribuição das cooperativas nos Estados
Brasileiros, visto o impacto de suas atividades em
relação ao PIB, faturamento e comparações com
IFDM. Conforme visto, o desenvolvimento econômi-
co de uma região consiste na elevação de indicado-
res socioeconômicos mediante a qualidade de vida
da localidade. Propositalmente, a teoria do desenvol-
vimento endógeno trata a questão do indivíduo
inserido junto à sociedade, aumentando o capital
social que visa ações coordenadas em prol de um
objetivo comum, como peça fundamental a ocorrên-
cia do desenvolvimento local.
As cooperativas, inseridas neste contexto,
ajudam na alocação desses indivíduos como atores
do processo de desenvolvimento, ora como coo-
perados fomentando a eles cursos de qualificação,
que são usados junto à sociedade. De outra manei-
ra, as cooperativas geram como empresas empre-
gos, que contribuem na geração de renda e inser-
ção de pessoas na sociedade. Desta forma, o capital
social fomenta ações de desenvolvimento econômi-
co, pois pode ser gerador de aprendizagem coletiva,
importantes para o dinamismo econômico.
A metodologia abordada consistiu a mos-
trar os efeitos teóricos acima citados e a abordar
estatisticamente a composição das cooperativas
em ramos, empregos e sua relação com a renda e
a confirmação de que em média, municípios com
pelo menos uma cooperativa, possuem condições
socioeconômicas melhores que municípios sem a
presença das mesmas, de acordo com IFDM apre-
sentado.
No tocante ao número de empregos gerados
no período de 1995 a 2007 houve um incremento
de 4.509 cooperativas e 100.500 empregos diretos
o que ocasionou em alguns Estados como o Mato
Grosso do Sul, Goiás e o Distrito Federal aumentos
satisfatórios da renda domiciliar per capita. E no
Brasil, como visto, a média de IDFM dos Estados foi
maior nos municípios com cooperativas tendo IFDM
médio de 0,6132 e municípios sem cooperativas
IFDM de 0,5485.
O ramo agropecuário responde por 20%
do total de cooperativas registradas. Entre 2002 e
2007 o PIB do cooperativismo brasileiro apresentou
um crescimento na mesma taxa do PIB do Brasil.
O faturamento do cooperativismo foi crescente em
quase todo o período estudado, acompanhando o
crescimento do PIB. A região Sul deteve a maior
parcela da receita do cooperativismo brasileiro. Na
segunda posição ficou a região Sudeste, ainda que
a maior parte das cooperativas esteja localizada
nessa região.
Em média, municípios com pelo menos uma cooperativa, possuem
condições socioeconômi-cas melhores que municí-pios sem a presença das mesmas, de acordo com
IFDM apresentado.
72
Essa movimentação, busca a potencialida-
de local atrelada ao bem-estar, na teoria de desen-
volvimento endógeno. O cooperativismo fomenta
ações ligadas à capacitação de seus cooperados e
com o incremento da comunidade local, movimen-
ta-se em direção ao capital social, que aumentado,
fornece maiores capacitações aos atrativos locais,
aumentando o produto local e diminuindo as desi-
gualdades sociais.
O cooperativismo comprova seus impactos
positivos, enquanto sociedade eficiente, como
gerador de empregos e eficaz no foco social. As
cooperativas surgem com o intuito de melhorar a
qualidade de vida das pessoas que passaram pelo
trauma de viver a experiência da exclusão social
e econômica. Desta forma, fica eminente que há
probabilidade para vislumbrar o desenvolvimento
socioeconômico em que manifeste não somente
a questão econômica, mas a social, educacional,
cultural e humana.
Acredita-se que existem muitas possibili-
dades de gerar políticas públicas baseadas nos
princípios cooperativistas, todavia, isso depende da
constituição de parcerias entre as diversas esferas
do Poder Público, as Instituições de Ensino e de-
mais entidades. São as atuações coletivas que din-
amizam as mudanças imprescindíveis, para a con-
strução de planos locais que podem encadear ao
desenvolvimento regional.
Considerando a necessidade de contribuições
de estudos baseados na discussão crítica sobre as
modalidades de cooperativas existentes e a escolha
de uma região para a constatação da contribuição
das mesmas, julga-se fundamental a realização de fu-
turas pesquisas. Estas proporcionarão o aperfeiçoa-
mento e avaliação constante da abordagem. Nesse
sentido, a conduta das futuras pesquisas poderia, en-
tre outros, ter como objetivos:
a) desenvolver estudos que apontem para
as diferentes modalidades de cooperati-
vas adotadas numa sociedade que
representem a segmentação da atividade
econômica que regem o enquadramen-
to das vocações sociais cooperativos,
constantes nos estatutos sociais, tendo
a ver com as necessidades de todo o
conjunto comunitário; e
b) identificar o grau de sucesso de uma
região que seja imbuída pelo espírito co-
operativista e que se possa constatar o
nível de contribuição das cooperativas
em nível regional.
As cooperativas sur-gem com o intuito de melhorar a qualidade de vida das pessoas que passaram pelo
trauma de viver a ex-periência da exclusão social e econômica.
• Recebido em: 01/12/2010• Aprovado em: 29/03/2011
73R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 60-73, jan./jun. 2011
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Atributos que influenciam a compra de automóveis por mulheresAttributes that influence car purchasing for women
75R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 74-91, jan./jun. 2011
Atributos que influenciam a compra de automóveis por mulheresAttributes that influence car purchasing for women
Resumo
O comportamento de compra das mulheres tem sofrido mudanças devido ao seu cres-
cente poder aquisitivo e decorrentes alterações em seus papéis sociais. O mercado
automobilístico não está alheio a essas condições, sendo assim, neste trabalho buscou-
-se identificar quais são os atributos valorizados no momento de adquirir um carro pelo
mercado, lançando um olhar sob as especificidades do mercado feminino. Para tanto,
foi realizada uma pesquisa quantitativa descritiva com amostragem não probabilística,
delimitada por indivíduos entre 18 e 30 anos de idade da cidade de São Paulo. Os da-
dos foram coletados por meio de uma Survey eletrônica, em que foram discriminados
os atributos por meio de uma escala Likert. Os resultados apontam para diferenças
nas avaliações dos atributos conforme o gênero do respondente. Foi possível desta-
car diferenças significativas no comportamento de compra das mulheres que devem
ser levadas em consideração nos esforços de marketing. A pesquisa aponta ser uma
preocupação mais significativa para as mulheres os atributos como: argumentação do
vendedor no ponto de venda, os serviços pós-venda, cuidados com manutenção e
seguro do veículo. O estudo aponta também oportunidades de construção de diferen-
ciais competitivos a empresas no ramo automobilístico.
Palavras-chave: Comportamento do Consumidor; Consumidor Feminino; Atributos
de Compra.
Abstract
The buying behavior of women has changed because of their growing purchasing
power and changes in their social roles. The automotive market is not alien to these
conditions. Therefore, this study aimed to identify the attributes which are valued at the
time of acquiring a car, casting a look at the specifics of the female market. For this,
we designed a descriptive quantitative research with non-probability sampling, among
individuals aged between 18 and 30 years in São Paulo. Data were collected through
an electronic Survey, in which the attributes were discriminated using a Likert scale.
The results indicate differences in rating the attributes according to the gender of the
respondent. It was possible to highlight significant differences in buying behavior of
women that should be considered in marketing efforts. The research shows that for a
more significant concern for women are the attributes such as: the seller´s arguments
at the point of sale, after-sales services, maintenance and vehicle insurance. The study
also points out the opportunities to build competitive advantages to companies in the
automotive industry.
Keywords: Consumer Behavior; Female Consumer; Attributes Of Purchase.
Patrícia Regina Caldeira Daré Artoni1
Danilo Sofiato2
Eduardo Cruz Garcia3
Rafael Porto Braga4
Elton Siqueira Paiva5
Vinícius Kazuo6
1 Doutoranda em Administração na FGV-SP. Professora da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Email: [email protected]
2 Graduado em Administração pela Universidade Presbiteriana Mackenzie Analista Fiscal da Lác-teos Brasil. Email:[email protected] ou [email protected]
3 Graduado em Administração pela Universidade Presbiteriana Mackenzie Inside Sales/Pricing Coordinator da Fedex Trade Networks (Brazil). Email: [email protected]
4 Graduado em Administração pela Universidade Presbiteriana Mackenzie Consultor de Negócios da Tecsinapse e sócio-Diretor da Von Vögel. Email: [email protected]
5 Graduado em Administração pela Universidade Presbiteriana Mackenzie Assistente de Contro-ladoria e Finanças na GEP. Email: [email protected].
6 Graduado em Administração pela Universidade Presbiteriana Mackenzie Analista Financeiro do Banco Santander. Email: [email protected]
76
Introdução
Nas décadas de 70 e 80 o mercado brasilei-
ro tinha a sua disposição apenas quatro marcas de
fabricantes nacionais de automóveis, inclusive com
pouca variedade entre os modelos, limitando as op-
ções para o comprador. Porém, de acordo com o
relatório divulgado pela ANFAVEA (Associação Na-
cional dos Fabricantes de Veículos Automotores) em
2009, existem dezenove montadoras no mercado.
Numa perspectiva financeira, o faturamento líquido
do mercado de automóveis representou em 2008
cerca de 18% do PIB industrial do país. No entanto,
o alto faturamento da indústria não representa ne-
cessariamente um aumento no preço dos veículos, já
que o consumidor possui atualmente uma variedade
de modelos disponíveis no mercado, com diferentes
faixas de preços, além de contar com a facilidade dos
financiamentos a juros cada vez mais baixos e um
poder aquisitivo cada vez maior (YAMAGUTI, 2005).
Além da grande variedade de opções, há
também a diversidade dos consumidores, e seus
comportamentos exigem estudos mais profundos e
específicos no assunto, como por exemplo, a dife-
rença entre consumidores do sexo masculino e fe-
minino. Segundo Engel, Blackwell e Miniard (2000),
os gerentes de marketing sempre deram importân-
cia ao consumidor feminino por causa do volume de
produtos que consomem. Mas, recentemente ocor-
reu um maior interesse graças ao intensivo cresci-
mento do mercado feminino, proporcionado prin-
cipalmente pelo aumento dessa população frente a
masculina, uma maior participação no mercado de
trabalho e a um melhor posicionamento na hierar-
quia empresarial, em que a mulher hoje ocupa altos
cargos corporativos. Em uma escala global, elas são
responsáveis por $20 trilhões em gastos com con-
sumo e $13 trilhões em salários, o que representam
um crescimento de mercado maior que o da China
e o da Índia juntos – na verdade, mais de duas vezes
maior. (SILVERSTEIN; SAYRE, 2009).
No tangente ao principal objeto de estudo
deste artigo, uma pesquisa sobre os automóveis
publicada por Silverstein e Sayre pela Harvard
Business Review, em setembro de 2009, destaca
que as mulheres são responsáveis pela decisão
de compra de veículos em 60% dos casos. Porém,
destacam que apesar destes dados, as indústrias
automobilísticas são exemplos de empresas
que negligenciam em suas ofertas o mercado
feminino. Portanto, neste trabalho estudou-se o
comportamento do consumidor de automóveis,
com o objetivo de identificar quais são os atributos
valorizados no momento de adquirir um carro pelo
mercado, lançando um olhar sob as especificidades
do mercado feminino.
Os artigos e teses existentes são limita-
dos para responder a questão a que este artigo se
propõe. Em busca realizada nas Bibliotecas Digitais
de Teses e Dissertações (BDTD) e do Instituto Brasi-
leiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT)
em outubro de 2009 utilizando as palavras-chave
“mulher/feminino”, “comportamento do consu-
midor” e “carros/automóveis” pode-se notar que
apenas cinco ocorrências tratavam do tema “mulhe-
res” e “carros”. Nenhuma delas aborda mulheres
como consumidoras no que se refere a suas especifi-
cidades em relação a compra de veículos, sendo esta
a principal contribuição do artigo.
Os gerentes de marketing sempre deram importân-cia ao consumidor femini-no por causa do volume de produtos que conso-mem. Mas, recentemente ocorreu um maior inte-
resse graças ao intensivo crescimento do mercado
feminino.
77R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 74-91, jan./jun. 2011
2 Referencial Teórico
As a market, women represent a bigger opportunity than
China and India combined. So why are companies doing
such a poor job of serving them? (Michael J. Silverstein
and Kate Sayre)
Segundo Kotler e Armstrong (2005) para que
um profissional de marketing consiga atingir seus ob-
jetivos, ele deve se valer de suas ferramentas, conhe-
cidas como mix de marketing: Produto, Preço, Dis-
tribuição e Promoção. Entende-se por distribuição o
esforço alocado por determinada empresa em tornar
o produto acessível para seu consumidor de forma
conveniente, sendo importante fator de influencia na
percepção do cliente, dada a diversidade de caracte-
rísticas do ponto de venda (CHURCHILL JR.; PETER,
2000; KOTLER, 2000). A promoção, segundo Kotler
e Armstrong (2005), abrange todo o trabalho relati-
vo à comunicação e promoção da empresa, de seus
produtos e de seus serviços, e o preço refere-se ao
custo de obtenção da oferta, sob a ótica do cliente e
para as empresas trata-se do único componente do
mix de marketing que produz receita. Para Mowen e
Minor (1997), o preço pode ser usado como estraté-
gia na sensibilidade do consumidor aos preços, indi-
cador para um produto que apresenta alta qualida-
de e ainda pode influenciar o consumidor de maneira
positiva ou negativa em relação ao produto, depen-
dendo da maneira como for exposto. Por fim, o pro-
duto, na definição de Kotler e Armstrong (2005, p.
416) trata-se de “algo que pode ser oferecido a um
mercado para satisfazer a um desejo ou necessida-
de”. Vale neste momento apresentar uma diferencia-
ção entre desejo e necessidade, já que este servirá
de base para a discussão sobre reconhecimento do
problema no processo de compra do consumidor.
Para Sheth, Mittal e Newman (2001):
Necessidade é a condição insatisfatória de um cliente,
que o leva a uma ação que tornará essa condição melhor.
Um Desejo é o afã de obter mais satisfação do que é
absolutamente necessário para melhorar uma condição
insatisfatória. (SHETH; MITTAL; NEWMAN, 2001, p. 59)
Portanto, a necessidade nasce por desconfor-
to nas condições físicas ou psicológicas dos indiví-
duos, enquanto o desejo ultrapassa o nível das suas
condições físicas ou psicológicas mínimas. Como
exemplificam os autores, qualquer carro pode levá-lo
ao seu destino, mas o indivíduo utilizar um Porsche
satisfaz um desejo de emoção, velocidade e prestígio.
(SHETH; MITTAL; NEWMAN, 2001)
Já para Engel, Blackwell e Miniard (2000) a
necessidade ocorre quando existe uma discrepân-
cia entre o estado desejado e a situação atual. Com
o aumento desta, ocorre uma situação de desper-
tar chamada Impulso, que quanto maior for a sua
intensidade, maior será a urgência do indivíduo em
supri-la. Com o tempo, certos padrões de compor-
tamento se tornam mais eficazes para suprir tais
necessidades, e estes surgem para funcionar como
desejos.
No desenvolvimento de qualquer produto é
necessário definir os benefícios que por ele serão
proporcionados. Esses benefícios são comunicados
e oferecidos ao mercado por meio dos atributos do
produto (KOTLER; ARMSTRONG, 1997).
De acordo com Peter e Olson (1996), os atri-
butos podem ser vistos como propriedade ou carac-
terísticas intrínsecas do produto. Seguindo a mesma
linha, Joas (2002, p. 32) acrescenta que essas pro-
priedades ou características “podem ser concretas,
observáveis, mensuráveis e de importância relevante
quando da escolha entre as alternativas disponíveis”.
De acordo com Lemos (2007, p. 29), “o estudo e a
mensuração dos atributos são fundamentais para o
entendimento das crenças do consumidor em rela-
“O estudo e a mensuração dos atributos são fundamen-
tais para o entendimento das crenças do consumidor em relação a um determina-
do produto ou marca”.
78
ção a um determinado produto ou marca”. Ainda de
acordo com o autor, os consumidores normalmente
avaliam primeiramente o produto pelos seus atribu-
tos para posteriormente avaliar a marca para formar
sua preferência. Porém, por meio de uma releitura de
Chao e Gupta por Lemos (citado por LEMOS, 2007),
a grande quantidade de informações acerca dos atri-
butos dos produtos pode tornar o processo de deci-
são de compra muito mais complexo, levando o con-
sumidor a uma extensa busca de informações.
Há diversas maneiras na literatura acadêmica
de se classificar um produto que relevam as ques-
tões concretas, mensuráveis, observáveis, tangíveis
e intangíveis. Alpert (1971) classificou os atributos
em três classes: salientes, que são aqueles perce-
bidos facilmente pelo consumidor em um produto,
mas que não possuem necessariamente relevância
no processo de compra; importantes, que são consi-
derados relevantes no momento da decisão de com-
pra de um produto e determinantes. Como exemplo,
Lemos (2007, p.30) cita os opcionais de automó-
veis, como direção hidráulica e ar-condicionado, que
mesmo sendo considerados atributos importantes
do produto, são provavelmente considerados bási-
cos em um automóvel de alto valor; e determinan-
tes, que são aqueles que podem fazer com que o
consumidor tome sua decisão de compra.
MacMillan e McGreath (1996) complemen-
tam estes conceitos classificando três classes:
básicos, que são aqueles que devem ser encontra-
dos em todos os produtos de uma categoria, sendo
considerado o “mínimo necessário” para colocar um
produto à venda; discriminadores, que diferenciam o
produto dos seus concorrentes – e quando vistos de
maneira positiva, são considerados diferenciadores.
Como citado por Lemos (2007), no ramo automobi-
lístico um poder típico diferenciador é a seguran-
ça; e os energizadores, semelhantes aos atributos
determinantes citados por Alpert (1971), pois tornam
os produtos distintos dos concorrentes, embasan-
do o consumidor em sua decisão de compra. Além
disso, os atributos podem ser considerados positivos
ou negativos, independente do seu tipo de classifi-
cação. De acordo com Lemos (2007), os positivos
agradam o consumidor, o que favorece a vendo
do produto, enquanto os negativos desagradam o
mesmo, o que dificultando a venda.
A idade destes consumidores também afeta
a avaliação de atributos, segundo Shiffman e Kanuk
(1997), sendo um fator relevante quando os atribu-
tos de um automóvel são avaliados. Consumidores
com idade entre 16 e 29 anos mostram maior pre-
ocupação com estilo e tecnologia do que as faixas
etárias mais velhas. Já os consumidores com idades
entre 30-49 anos e mais de 50 anos demonstram
uma tendência maior a sofrer influência sobre a va-
riável durabilidade.
Para Alpert (1971), consumidores de diversas
marcas, produtos e serviços normalmente possuem
personalidades distintas e possivelmente comprem
estes produtos por motivos e necessidades diferen-
tes. Outros autores também procuraram classificar os
atributos em suas categorias.
Mowen e Minor (1997) apresentam os bene-
fícios como resultados positivos que os atributos
oferecem aos consumidores, expondo a opinião dos
consumidores de três formas: Opinião sobre atribu-
to do objeto; opinião sobre os benefícios do atribu-
to; opinião sobre os benefícios do objeto. Para mos-
trar esta diferença, os autores utilizam um exemplo
de automóvel esporte ideal, como mostrado no qua-
dro 1.
QUADRO 1 - Exemplo de automóvel esporte ideal
Atributos Benefícios
Capacidade do motor
Aceleração rápidaPermite ultrapassagem mais seguraPermite a pilotagem em curvas mais rapidamenteGera sentimento de excitação e diversão
Suspensão ativa
Permite a pilotagem em curvas mais rapidamenteGera sentimento de excitação e diversão
Boa frequência de manutenção
Economia de dinheiro e tempo
Estilo futurísticoFaz o proprietário sentir-se melhor
FONTE: Elaborado pelos autores baseado em Mowen e Minor (1997)
79R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 74-91, jan./jun. 2011
Na abordagem do comportamento do consu-
midor, Engel, Blackwell e Miniard definem como:
“as atividades diretamente envolvidas em obter,
consumir e dispor de produtos e serviços, incluin-
do os processos decisórios que antecedem e suce-
dem estas ações” (ENGEL; BLACKWELL; MINIARD,
2000). Ainda pelos autores, a influência no compor-
tamento do consumidor pode ser um grande desa-
fio, mas uma das principais tarefas do marketing é
desenvolver um produto ou serviço que atenda as
necessidades e expectativas do consumidor.
Como demonstram Engel, Blackwell e Miniard
(2000), deve-se levar em consideração quatro
premissas fundamentais para influenciar o compor-
tamento do consumidor: o consumidor é soberano
e tem a habilidade de evitar tentativas de influên-
cia; entender sua motivação e comportamento por
meio de pesquisa; o comportamento do consumi-
dor poderá ser influenciado se o mesmo for tratado
ciente de suas ações e a persuasão e influência do
consumidor, devidamente restringidas por leis, pela
ética e pela moral, podem ser benéficas a sociedade.
Para Serralvo e Ignacio (2004) a análise do compor-
tamento do consumidor não se dá apenas por fato-
res econômicos ou ambientais, mas principalmen-
te por psicológicos e sociais, que são considerados
fatores internos. Os fatores ambientais, considera-
dos fatores externos, são impulsores que fazem com
que os consumidores respondam de acordo com o
grupo a que pertencem.
Segundo Engel, Blackwell e Miniard (2000)
os principais critérios de avaliação que interferem
na decisão de compra são: preço, nome da marca,
país de origem, similaridade alternativa de esco-
lha, o envolvimento, o conhecimento, e as diferen-
ças individuais, como os recursos disponíveis, sua
personalidade, valores e estilo de vida, bem como
também sua classe social, cultura e família. Existem
vários modelos que auxiliam o entendimento des-
tes fatores na consciência do comprador. Segundo
o Modelo de Estímulo e Resposta apresentado por
Kotler e Armstrong (2005) o comprador está sujei-
to tanto a estímulos ambientais - dentre eles eco-
nômicos, políticos, tecnológicos e culturais que po-
dem influenciar a compra ou rejeição de um produto
- quanto a estímulos de marketing, que empresa uti-
liza para estimular a demanda de seus produtos pe-
los compradores. Dentre esses meios, os principais
são os ‘4 Ps’, já explorados neste trabalho.
Ainda segundo Kotler e Armstrong (2005) o
comportamento do consumidor é influenciado pelas
características do comprador, que são expostos
por meio de fatores culturais, que exercem enorme
influência no comportamento do consumidor, pois
abrangem hábitos, costumes e ideologias. Estes
possuem três fatores distintos: Cultura, que são
valores e percepções adquiridas pelo convívio fami-
liar; Subcultura, que são culturas menores de grupos
de indivíduos que possuem valores semelhantes e
vida em comum; e Classe Social, partições homo-
gêneas da sociedade que partilham comportamen-
tos e valores, fatores sociais, grupos de referência,
família, papéis sociais e status. O grupo de referên-
cia diz respeito aos grupos com influência direta ou
indireta nas atitudes do comprador; a família, que
representa o fator mais influente para os indivíduos;
e os Papéis Sociais e as Posições Sociais, que dizem
Os principais critérios de avaliação que interferem
na decisão de compra são: preço, nome da marca, país
de origem, similaridade alternativa de escolha, o envolvimento, o conheci-
mento, e as diferenças indi-viduais, como os recursos disponíveis, sua persona-lidade, valores e estilo de vida, bem como também sua classe social, cultura e
família.
80
respeito a influência do status do indivíduo em seu
comportamento de compra, fatores pessoais, que
são características pessoais e experiências de vida
são fatores que também influenciam as decisões do
comprador, como Idade e Estágio de Ciclo de Vida,
que demonstram que em certos momentos da vida
o desejo de compra se modifica; Ocupação, que
diz respeito propriamente a profissão do compra-
dor; Condições Econômicas, que são o poder de
compra; Estilo de Vida, que representa o padrão
de vida do comprador por meio de seus interes-
ses e atividades; e personalidade e autoconheci-
mento, esta primeira variável importantíssima de
análise do comprador, pois cada ser humano possui
uma personalidade distinta, que tem forte ligação
com o autoconhecimento e fatores psicológicos: as
decisões do comprador também são influenciadas
por fatores psicológicos tais como: Motivação, que
representa o grau de necessidade do comprador
de adquirir um produto ou serviço; Percepção, em
que indivíduos selecionam e interpretam diversas
informações sensoriais, tais como o ambiente que o
cerca, formando uma imagem do mundo; Aprendi-
zado, que representam mudanças em seu compor-
tamento devido a experiências vividas; e Crenças e
Atitudes, que por sua vez representam um pensa-
mento descritivo sobre algo que podem definir
atitudes do comprador por meio do aprendizado as
pessoas adquirem suas crenças e atitudes. Abaixo
serão detalhados alguns fatores de maior impor-
tância para o trabalho.
Segundo Engel, Blackwell e Miniard (2000),
as classes sociais são grupos de indivíduos que apre-
sentam similaridades de comportamentos graças a
sua posição econômica, estando os indivíduos cien-
tes delas ou não. Os autores ainda realizam uma
releitura de Max Weber e, com alguma simplifica-
ção, pode-se dizer que as classes são estratificadas
de acordo com suas relações na produção e aquisi-
ção de bens. Já para Karsaklian (2004) a visão que a
sociedade moderna tem dos produtos não é apenas
de suprir uma simples necessidade, mas sim do valor
que ele representa. É por isso que seu consumo só
faz sentido no contexto ao qual está inserido, neste
caso, a classe social.
Como as diversas classes sociais possuem
características únicas, a estratégia da empresa pre-
cisa levar em consideração estas peculiaridades.
Segundo Karsaklian (2004), existem cinco caracte-
rísticas fundamentais de uma classe social: grandes agregações, por serem grupos em que a comuni-
cação se dá de forma indireta, diferentemente dos
grupos de tamanho reduzido; hierarquizadas, que
existe uma superioridade ou inferioridade relativa
entre as classes sociais, diferentemente das faixas
etárias e do estilo de vida, que determinam o com-
portamento do consumidor; evolutivas, puxadas
pela própria noção de hierarquização das classes
sociais, os indivíduos procuram mobilidade entre
elas, o que é possível em muitos países – consi-
derando que existem sociedades nas quais esta
mobilidade não é possível, como na Índia - e pode
exemplificar certas decisões de compra; multidi-mensionais, classes sociais não podem ser definidas
apenas por renda ou instrução do indivíduo. Como
Sheth, Mittal e Newman (2001, p. 178) ilustram, a
renda - por mais que seja um fator importante para
medir a classe social - não é um fator determinante.
Deve-se considerar também a instrução e a ocupa-
ção deste indivíduo, e relativamente homogêneas:
já que os indivíduos possuem os mesmos valores
e ocupam a mesma posição, os mesmos tendem a
ter um comportamento homogêneo, tanto de ves-
tuário como de lazer. Portanto, segundo Karsaklian
(2004), esta é a principal característica que interes-
sa ao empresário, já que é a principal característica
para realizar uma segmentação do mercado.
Segundo Engel, Blackwell e Miniard (2000),
os fatores que determinam as classes sociais vêm
sendo estudados desde 1920. Contudo, nove vari-
áveis foram identificadas por Gilbert e Kahl (1982)
em três categorias distintas:
– Variáveis Econômicas: Ocupação, Ren-
da e Riqueza;
– Variáveis de Interação: Prestígio Pesso-
al, Associação e Socialização;
– Variáveis Políticas: Poder, Consciência
de Classe e Mobilidade.
No estudo do comportamento do consumi-
dor, algumas variáveis são mais importantes que
outras e para a maioria dos pesquisadores desta
área, são seis as principais, ainda baseadas na relei-
tura no estudo de Gilbert e Kahl (1982):
– Ocupação, considerado o melhor indi-
cador simples da classe social, por ser
81R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 74-91, jan./jun. 2011
um assunto corriqueiro quando se co-
nhece outro indivíduo, já que provavel-
mente, em algum momento, alguém irá
perguntar ao outro “o que você faz”?.
Além disso, é a maior base do estilo de
vida da pessoa e dos benefícios como
prestígio, honra e respeito.
– Desempenho Pessoal, observado pelo
sucesso ou destaque perante os outros
indivíduos da mesma ocupação, um indi-
víduo pode ter o seu status influenciado.
E embora não seja um indicador deter-
minante, a renda pode ser um indicador
do desempenho pessoal. Não apenas
na sua ocupação, mas o desempenho
também pode ser apurado em outras
atividades, como filantropia, projetos
sociais, culturais.
– Interações, os indivíduos ficam mais
confortáveis quando estão em gru-
pos de valores e comportamentos se-
melhantes, portanto, as variáveis como
prestígio, que implica a outras pessoas
respeito, associação, que é determinada
pelo cotidiano de indivíduos que têm os
mesmos interesses e a socialização, em
que o indivíduo aprende habilidades,
costumes e atividades para sua convi-
vência em sociedade, são a essência da
classe social.
– Posses, que conforme citam os auto-
res Engel, Blackwell e Miniard (2000, p.
440): “[...] são símbolos de associação
de classe – não apenas o número de pos-
ses, mas a natureza das escolhas feitas”.
Como posse e riqueza estão intimamen-
te ligadas e riqueza é o acúmulo de ren-
da, posses podem ser consideradas ren-
das futuras, mas principalmente refletem
a classe social dos indivíduos. Uma casa,
a universidade, um clube, dentre outros,
são exemplos de posse. Além disso, pro-
dutos e marcas também podem repre-
sentar posses.
– Orientações de valor, em que os valo-
res são um conjunto de crenças em co-
mum que rege como as pessoas devem
se comportar. Portanto, se um deter-
minado grupo de indivíduos possui os
mesmo valores, pode-se agrupá-los em
um determinado segmento. Por isso é
importante para os pesquisadores dos
consumidores procurarem descobrir
quais são os valores deste determinado
grupo. Dentre estes estão ideais políti-
cos, religião, sistema econômico, etc.,
além de valores mais específicos, como
comportamento sexual, criação de fi-
lhos, aborto, etc.
– Consciência de Classe, em que os indiví-
duos de determinada classe social têm
a consciência de si mesmos como algo
distinto no que diz respeito aos inte-
resses políticos e econômicos. Quanto
maior o grau desta consciência, maior
a possibilidade de se organizarem para
defenderem seus interesses.
Além destas, Sheth, Mittal e Newman (2001,
p.172) expõem que a renda e a idade são também
pontos de grande influência no comportamento do
consumidor. Para eles, a idade se refere a idade cro-
nológica, ou seja, o tempo de vida de um indivíduo
desde seu nascimento, e não a idade psicológica
ou mental. Exerce a grande influência no compor-
tamento do cliente por três principais razões: as
necessidades e desejos mudam conforme a idade
do indivíduo; ajuda a determinar o ciclo de vida de
um cliente, que é a quantia de gastos que uma em-
presa pode esperar de um determinado cliente; e
finalmente é o estudo das composições etárias de
uma população, que influenciam o comportamen-
to dos mercados, valores e demandas dos clientes.
Mowen e Minor (2006, p. 317) ressaltam a importan-
te mudança da composição etária e da distribuição
de renda e como esses fatores podem se relacionar
de forma diferente de um período de tempo para
outro.
Outro forte fator de composição etária é a
imigração, pois os imigrantes tendem a ser mais
jovens e terem mais filhos. Para Engel, Blackwell e
Miniard (2000, p. 36), houve um grande aumento
na expectativa de vida da população na maioria
dos países, o que levanta questionamentos como
“se você é um administrador de uma determinada
empresa, você faria investimento pressupondo
muitos consumidores no futuro?”.
82
Solomon (2002, p. 352) apresenta o conceito
de Coorte de idade, que consiste em um grupo de
pessoas que possuem idade e experiências de vida
semelhantes e, consequentemente, recordações em
comum; portanto os profissionais de marketing pre-
cisam direcionar suas estratégias exclusivamente
para cada coorte de idade, o que pode causar certo
sentimento de nostalgia nestes consumidores.
Para Sheth, Mittal e Newman (2001, p. 222),
existem três formas de se classificar estes clientes
por grupos etários: a primeira é pelo ano de nasci-
mento, a segunda é pelo ano escolar que o indivíduo
frequenta, como pré-escolares, ensino primário e
secundário, universitários, adultos e adultos madu-
ros; a terceira é pelo ciclo de vida da família, em que
são captados os momentos do indivíduo no contex-
to familiar como casamento, divórcio, nascimento e
morte.
Segundo Kotler (1998, p. 181) não há nenhum
processo de análise único utilizado por todos os
consumidores em todas as situações de compra,
mas sim vários processos de análise de decisão. A
maior parte dos modelos atuais do processo decisó-
rio do consumidor é orientada cognitivamente, isto
é, os julgamentos sobre os produtos são formados
pelos consumidores amplamente relacionados em
bases racionais e conscientes.
Além dessas atribuições Solomon (2002,
p. 24) destaca que todas as atividades envolvidas
têm como objetivo saciar as necessidades e desejos
destes mesmos consumidores. O comportamento
do consumidor é na verdade um processo que não
se mantém apenas na ação de compra, mas sim um
processo contínuo que se estende da pré-compra,
em que o consumidor tem a necessidade de satis-
fazer um desejo, da compra, em que o consumidor
vivencia a atividade de compra, e a pós-compra, que
é a satisfação do cliente com o produto ou serviço
adquirido. A perspectiva de investigação dominante
é o positivismo lógico, em que os dois objetivos são
entender e prever o comportamento do consumidor
e descobrir relações de causa e efeito que direcio-
nam a persuasão.
Segundo Kotler (2000) o trabalho do profis-
sional de marketing não termina quando o produ-
to é comprado; ele deve monitorar a satisfação, as
ações e a utilização em relação ao produto depois
de efetuada a compra. Segundo Engel, Blackwell e
Miniard (2000) são sete os estágios de tomada de
decisão do consumidor: (1) Reconhecimento do pro-blema: quando o consumidor identifica em um pro-
duto uma capacidade de solucionar um problema
em comparação ao custo deste, fazendo com que
seja percebida uma necessidade ou um desejo não
satisfeito deste consumidor, ressaltando que existe
uma diferença entre desejo e necessidade; (2) Bus-ca de informações: os consumidores procuram por
informações e soluções para atender suas necessi-
dades. Esta busca pode ser interna, em que o indiví-
duo usa seu conhecimento armazenado na memó-
ria, ou ela pode ser externa, coletando no mercado
e no ambiente em que se vive; (3) Avaliação de al-ternativa pré-compra: os consumidores começam a
se indagar sobre quais opções existem e qual seria
a melhor na comparação entre os diversos produ-
tos disponíveis no mercado com o que consideram
de maior importância, fazendo uma seleção mais es-
pecífica do que procuram para atender a sua neces-
sidade antes da compra; (4) Compra: ainda pelos
autores, a decisão é influenciada pelos fatores indi-
viduais e ambientais; (5) Consumo: tendo sido rea-
lizada a compra seu consumo pode ser imediato ou
postergado, mas em ambos os casos a utilização do
produto influencia a satisfação do consumidor, que
determina se o mesmo irá realizar uma nova compra
ou descartar o produto; (6) Avaliação pós-consumo:
o consumidor pode experimentar tanto a satisfação,
que ocorre quando a expectativa sobre o produto é
atingida ou mesmo superada, ou a insatisfação, se
as expectativas são frustradas sobre os fatores es-
perados pelo consumidor; e (7) Descarte: o último
estágio no modelo do processo de decisão do con-
sumidor, em que os mesmos têm a opção de um
descarte sumário, reciclagem ou remarketing.
Segundo MACÊDO (2003) as concepções so-
bre gênero e a mulher sempre buscaram uma maior
compreensão sobre indivíduos socialmente discri-
minados pela determinante biológica, com o objeti-
vo de propor a superação dessa condição.
A reflexão acadêmica feminista foi desenvol-
vida próxima ao movimento feminista e foi motivada
por dois fatores: a reestruturação das Ciências So-
ciais e a formulação de um projeto de emancipação
da mulher.
Chiusoli, Pacanhan e Lopes (2004) apresen-
tam uma leitura de Blecher (citado por eles), em que
as mulheres preteridas nas propagandas e grupos
83R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 74-91, jan./jun. 2011
comerciais já passaram a comprar produtos de cate-
gorias que eram exclusivamente de uso dos homens,
como cuecas, ternos, etc. Os autores também des-
tacam em seus estudos o poder de decisão das mu-
lheres na compra: na indústria automobilística, cerca
de 80% de todas as vendas no ramo é da compe-
tência delas.
Segundo Engel, Blackwell e Miniard (2000),
os gerentes de marketing sempre deram importân-
cia ao consumidor feminino por causa do volume
de produtos que consomem; porém recentemente
ocorreu um maior interesse no mercado feminino
graças ao seu intensivo crescimento pelo aumen-
to de sua população em relação à masculina, pela
maior participação e melhor posicionamento no
mercado de trabalho, com altos cargos corporati-
vos.
Chiusoli, Pacanhan e Lopes (2004, p.3) afir-
mam que a fragmentação do mercado atualmente
força os profissionais de marketing a identificar os
melhores segmentos de mercado e um dos setores
que vem aumentando de forma espantosa é o de
mulheres consumidoras; os autores citam que: “[...]
são hoje responsáveis por 85% da tomada de deci-
são nos pontos-de-venda”.
Para Sheth, Mittal e Newman (2001), estes
mesmos profissionais precisam utilizar seus
conhecimentos para satisfazer tanto as mulheres
quanto os homens, já que produtos tipicamente
masculinos estão passando a ser consumidos em
peso pelo público feminino e vice-versa.
Engel, Blackwell e Miniard (2000) defendem
que o principal fator de impacto no comportamento
de compra das mulheres é justamente sua maior
participação na renda familiar. Outros fatores
abordados dizem respeito às alterações no próprio
comportamento das famílias e na disparidade entre
salários masculinos e femininos, apesar de existirem
casos em que mulheres conseguem salários maiores
do que os dos homens.
Sheth, Mittal e Newman (2001) demonstram
que com a mudança do recurso “tempo” nas famílias
duas alterações ocorrem: a redução de horas livres
e a mudança da alocação do tempo. As empresas
precisam adaptar seus horários a fim de captar o
público-alvo feminino, levando em consideração que
estes clientes têm pouco tempo livre.
Ainda segundo Sheth, Mittal e Newman
(2001), quando dois cônjuges trabalham, há cada
vez menos contato entre os membros da família e
algumas tarefas passam a ser terceirizadas, como
por exemplo, afazeres domésticos
Popcorn e Marigold (2003) apresentam um
estudo sobre o público feminino que está embasado
em oito verdades sobre o marketing direcionado às
mulheres (vide quadro 2).
QUADRO 2 - Verdades sobre o Marketing direcionado a mulheres.
1ª Verdade
Trata-se da naturalidade como as mulheres se comunicam, repartem informações, instruções ou ajuda sincera. Quando um produto ou serviço atende a uma necessidade ou desejo de uma delas, a boa referência se espalha com rapidez às outras.
2ª Verdade
As mulheres têm a habilidade de serem multitarefas e necessitam de produtos e serviços que as ajudem a integrar suas vidas de forma inconsútil.
3ª Verdade
“Se ela tiver de pedir será tarde demais”. As mulheres costumam guardar para si suas necessidades. O marketing para elas deve antecipar suas necessidades e desejos.
4ª Verdade
“Dirija o Marketing para a visão periférica da mulher e ela verá você sob uma nova luz inteiramente nova”. Isso está relacionado a capacidade que a mulher tem de captar pequenos detalhes que considera relevantes em uma escolha.
5ª Verdade
“...vá até ela, garanta a fidelidade dela para sempre”. A inserção da mulher no mercado de trabalho não a livrou das tarefas domésti-cas. Por isso, a conveniência e praticidade de alguns produtos e serviços são tão valorizadas por elas.
6ª Verdade
A influência materna é tão forte que pode influenciar os hábitos de compra futuros de seus filhos. Os consumidores se sentem mais seguros na escolha de um produto em que suas cuidadosas mães confiavam. “Esta geração de consumidoras vai levar você até a geração seguinte”.
7ª Verdade
"A cogeração é o melhor modo de criar uma marca.” Quando as consumidoras aceitam uma marca, produto ou serviço, permanecem fiéis a ela.
8ª Verdade
“Tudo tem importância...” As logomarcas e campanhas publicitárias não podem esconder informações aos olhos atentos das consumidoras.
FONTE: elaborado pelos autores com base em Popcorn e Marigold (2003)
84
3 Procedimentos Metodológicos
Malhotra (2004) considera que uma pesquisa quantitativa pode ser descritiva ou causal, em que a primeira é usada para descrever características de grandes grupos, enquanto a segunda analisa ten-dências relativas a relações de causa e efeito. Como o objetivo desta pesquisa é mensurar a importância atribuída aos diversos atributos de uma oferta de automóveis pelo mercado consumidor e verificar se há indícios de diferenças de gênero nesta avaliação, a pesquisa de campo deste trabalho pode ser classi-ficada como quantitativa descritiva.
Para Rodrigues (2005), as amostras utilizadas em pesquisas são subconjuntos, necessariamente fi-nitos, de determinada população nas quais diversos elementos serão examinados para elaborar o estu-do estatístico desejado. Segundo Hair et al. (2006), a seleção do método é dividida em duas formas, a não probabilística, em que a escolha da unidade fica a cargo do pesquisador, e a probabilística, em que cada elemento da população tem uma probabilida-de de ser selecionado.
Ambos os métodos possuem diversas ramifi-cações, mas para o propósito deste trabalho, foi uti-lizada apenas a não probabilística por amostragem, que segundo Hair et al. (2006) consiste na seleção de amostras mais disponíveis ao pesquisador, mas que são extremamente difíceis de serem generalizadas já que alguns elementos podem fugir do público-alvo desejado.
Segundo Hair et al. (2006) se o pesquisador deseja realizar um estudo descritivo, a necessidade de uma grande quantidade de dados implica na utilização de surveys ou acesso a banco de dados, que possuem características quantitativas e são utilizadas quando o pesquisador analisa modelos teóricos ou problemas de pesquisa bem definidos.
Após a obtenção dos dados, inicia-se a análise que, neste trabalho foi utilizada a análise multivariada fatorial. Para Corrar e Dias Filho (2007), a análise fatorial é uma técnica estatística em que se procura identificar dimensões de variabilidade comuns num campo de fenômenos pela avaliação de diversas variáveis. Estas dimensões, chamadas de fator, ajudam a explicar a correlação de determi-nados grupos de variáveis.
Ainda para Corrar e Dias Filho (2007), a prá-tica mais comum de análise fatorial é a explorató-ria, em que o pesquisador não tem o conhecimento prévio da relação de dependência das variáveis, mas existe também a confirmatória, que apresen-ta uma hipótese preconcebida de determinados fatores. O pesquisador precisa ainda definir alguns passos que são influenciados pelo tipo de pesquisa, que são: qual método de extração; que tipo de aná-lise será realizada; como será feita a escolha dos fatores e como aumentar poder de explicação.
Neste estudo foi utilizada uma pesquisa quan-titativa, descritiva e exploratória, com uma amostra-gem não probabilística por conveniência, delimitada por indivíduos entre 18 e 30 anos de idade da cidade de São Paulo. Os dados foram coletados por sur-veys, que foram analisados pelo método da análise fatorial exploratória e pelos testes não paramétricos de Mann-Whitney.
3.1 Instrumento Coleta de Dados
Foi elaborado um questionário com base na escala métrica Likert de “1” a “5”, na qual o entrevistado deveria responder “1” para os atributos considerados menos importantes e “5” para os mais importantes, conforme apresentado em anexo.
3.2 Análise dos Dados
As análises foram feitas com o uso do progra-ma SPSS®, utilizando-se os métodos de análise fato-rial e o teste não paramétrico Mann-Whitney, devido a falta de normalidade dos dados obtidos.
De acordo com Stevenson (2001), o teste Mann-Whitney é utilizado parar verificar se duas amostras independentes provêm de uma popula-ção com medianas iguais. O teste se baseia em uma soma de postos. Dispõem-se os dados em postos, como se todas as observações fizessem parte de uma única amostra. Freund (2006) complementa, afirmando que o teste Mann-Whitney (também co-nhecido como “Teste-U“) ajuda a averiguar se duas amostras independentes provêm de populações
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idênticas. Afirma também que o teste exige apenas que as populações sejam contínuas.
3.3 Seleção de Atributos
Com base na teoria revisão de literatura fo-ram levantados os atributos oferecidos aos consu-midores em ofertas de veículos. Foi realizada uma seleção das variáveis com base em atributos dispo-níveis no mercado automobilístico brasileiro, e nas recomendações de atributos propostas por Lemos (2007), conforme exposto no quadro a seguir, fo-ram consideradas três classificações de atributos de veículos e elaborados seus componentes constituin-tes (vide quadro 4).
Com base nestes atributos, partiu-se para a
construção do instrumento de coleta de dados.
4. Coleta e Análise de Dados
4.1 Escala Métrica e Distribuição
A distribuição do questionário foi feita eletro-
nicamente por meio do Google Docs Survey Tool, na
qual o questionário pôde ser elaborado, editado e
divulgado por meio de um endereço eletrônico ge-
rado pela ferramenta. Os 22 atributos de automóveis
considerados na pesquisa foram avaliados demons-
trando o quanto cada um deles poderia influenciar
na decisão de compra dos consumidores. O bene-
fício de utilizar uma ferramenta web para realizar a
pesquisa e armazenar os dados é a limitação de pre-
enchimento pelo usuário na programação no site,
melhorando a qualidade e confiabilidade dos dados.
A distribuição do questionário foi feita
eletronicamente por meio do Google Docs Survey Tool, na qual o questionário pôde
ser elaborado, editado e divulgado por meio de um
endereço eletrônico gerado pela ferramenta.
QUADRO 3 - Classificação dos Atributos
Classificação dos Atributos
Atributo
Características Internas (Tangível)
Ar-condicionado
Design Interno (Estofado, desenho, quali-dade)
Rádio Embutido
Quantidade de Espelhos
Tipo de câmbio manual/automático
Airbag
Direção Hidráulica
Trio Elétrico
Características Externas (Tangível)
Tamanho do porta-malas
Modelo do carro (Sedan, Pick up, Hatch, etc.)
Potência do Motor
Tipo de Combustível (Flex, diesel e gasolina)
Design externo (farol, formato, estilo, cor)
Marketing e Vendas (Intangível)
Propaganda na mídia sobre o carro
Preço de compra à vista
Preço de revenda e a desvalorização do veículo
Condições de financiamento
Zero ou usado
Marca do fabricante
Reputação do Carro (Imagem do veículo no mercado)
Serviços Pós-Venda, Manutenção e Seguro do veículo
Argumentação do vendedor no ponto de venda
FONTE: Elaborado pelos autores com base em Mowen e Minor (2006).
86
Com o objetivo de atingir a população-alvo da
pesquisada, o endereço eletrônico do questionário
foi enviado apenas as pessoas aptas a responderem
as perguntas dentro da faixa etária estabelecida
no problema de pesquisa, que são as que residem
na região de São Paulo e que estão dentro da faixa
etária entre 18 e 30 anos. Foi utilizada a técnica bola
de neve no processo de seleção dos respondentes,
em razão dela envolver “a identificação de sujeitos e
pedir-lhes que indiquem outros, os quais, por sua vez,
indicarão outros e assim sucessivamente, até que se
atinja o ponto de redundância” (ALVES-MAZZOTTI;
GEWANDSZNAJDER, 1998, p. 163). No caso desse
trabalho, como ponto de partida, optou-se pela escolha
de elementos da rede de contatos dos pesquisadores
que atendessem os requisitos do público-alvo da
pesquisa e solicitou-se que enviassem o mesmo a
demais conhecidos de mesmo perfil. Dentre as 321
respostas recebidas, obtivemos 141 respostas do
público masculino e 180 do feminino.
4.2 Exclusão de Outliers
Após a coleta de dados iniciou-se a exclusão
dos outliers, responsáveis por possíveis distorções
nos resultados da análise. Entre eles estão respos-
tas incoerentes, como o grau de importância muito
elevado ou pouco elevado em sequência, respostas
repetitivas e escárnios. Dessa análise foram excluí-
das 26 repostas, restando ao final 136 respostas do
sexo masculino e 159 do feminino.
4.3 Análise Fatorial
Tendo em vista que o objetivo principal desse estudo era descobrir os fatores que influenciam a deci-
são de compra das mulheres por automóveis, foi gerada uma análise fatorial no conjunto de atributos para
agrupá-los dentro de fatores. Para essa análise a amostra foi restringida somente ao grupo de mulheres, tota-
lizando 159 indivíduos avaliados. Como o KMO da análise fatorial resultou em 0,761 e houve rejeição do teste
de Barlett´s Test, a amostra é adequada para analisar a presente pesquisa. As comunalidades também foram
adequadas, quase todas acima de 0,5, sendo que o único atributo que foi abaixo deste valor foi a potência do
motor, que teve uma comunalidade de 0,497. Porém, como o valor estava muito próximo de 0,5, ele foi man-
tido na análise.
Dos 22 atributos originais do questionário, na análise fatorial foram agrupados em 7 fatores, que explicam
65% da variância total dos dados. Para a nomeação de cada um dos fatores, consideraram-se os atributos que
o compunham, conforme o quadro 5.
QUADRO 5 - Composição dos fatores.
Aspectos Técnicos
Conforto Sensorial
Valor percebido PropagandaEspaço-Tamanho
Valor FinanceiroCustos Pós-
Posse
Ar-condicionado
Rádio embutido Zero ou usado PropagandaTamanho do porta-malas
Preço de Com-pra
Condições de financiamento
Design internoQuantidade de espelhos
Marca do fabricante
Argumentação do vendedor
Modelo de carro (Sedan, Pickup, Hatch)
Preço de revenda e desvalorização do veículo
Potência do motor
Design externo Tipo de câmbioReputação do carro
Tipo de Combustível
Direção hidráulica
Airbag
Serviços pós-venda, manutenção e seguro
FONTE: Elaborado pelos autores.
Atr
ibu
tos
Fat
or
87R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 74-91, jan./jun. 2011
TABELA 1 - Média, Mediana e Mann-Whitney
Atributo Sexo Média MedianaMann-
Whitney
FinanciamentoMasculino 3,06 3
0,000Feminino 3,65 4
Design InternoMasculino 3,67 4
0,030Feminino 3,94 4
Pós-VendaMasculino 3,62 4
0,003Feminino 3,99 4
RádioMasculino 2,32 2
0,001Feminino 2,87 3
EspelhosMasculino 2,17 2
0,002Feminino 2,62 3
ArgumentaçãoMasculino 2,29 2
0,021Feminino 2,58 3
FONTE: Elaborado pelos autores
No quadro 5, é interessante notar que o item
potência do motor foi alocado na análise fatorial
no mesmo grupo que atributos como “condições
de financiamento” e “tipo de combustível”, sendo
considerado um “custo pós-posse” para as mulhe-
res. A propaganda também é outro fator que pode
influenciá-las na decisão de compra, feitas estas
nas diversas mídias disponíveis hoje no mercado ou
mesmo pelo vendedor no ponto de venda. Com rela-
ção aos aspectos considerados “intangíveis”, como a
marca e a reputação do carro, mas que normalmen-
te costumam ter grande peso na decisão de compra
foi criado um fator denominado “valor percebido”. É
importante notar que este fator costuma ter relação
direta com o fator “propaganda”, já que as propa-
gandas normalmente influenciam a imagem criada
do produto na mente do consumidor.
Os atributos como ar-condicionado, direção
hidráulica e trio elétrico foram agrupadas em uma
única categoria chamada “aspectos técnicos”.
Porém, como Lemos (2007) ainda ressalta alguns
atributos considerados importantes em um carro
comum podem ser considerados básicos em carros
de luxo. Já atributos que poderiam ser considerados
determinantes na análise foram representados pelo
grupo “conforto sensorial”, que compreende rádio
embutido, tipo de câmbio, airbag e quantidade de
espelhos.
As mulheres se mostraram também influen-
ciáveis por questões ligadas a valores financeiros,
como o preço de compra a vista, o preço de reven-
da e a desvalorização do veículo ao longo do tem-
po. Por último, também mostraram que a decisão
de compra está correlacionada com o “tamanho/
espaço” do automóvel, já que este fator englobou
atributos como o tamanho do porta-malas e o mo-
delo do carro.
4.4. Teste Não Paramétrico (Mann-Whitney)
Definido os fatores que influenciam a de-
cisão de compra, foi feita uma comparação para
todos os atributos, revelando a diferença de impor-
tância entre homens e mulheres, para cada um des-
tes. Para tanto, foi utilizado um teste não paramé-
trico de Mann-Whitney, com nível de significância
de 5%.
Na tabela 1 são comparadas as médias do
grau de importância dos atributos entre os sexos,
em que são mostrados os seis atributos pesquisados
cujas médias foram consideradas distintas para um
intervalo de confiança de 95%, elucidando também
qual é a mediana de cada um desses atributos para
cada sexo, além do resultado correspondente do tes-
te de Mann-Whitney. É possível notar também que
as mulheres atribuíram maior importância do que os
homens a estes referidos atributos.
88
Como premissa básica foi considerada que
os atributos têm comportamento comum entre os
sexos, fazendo com que estes seis casos citados se-
jam opostos a premissa, corroborando com a hipó-
tese de que os homens e as mulheres se comportam
diferentemente em relação a esses atributos. Assim,
Financiamento, Desing Interno, Pós-Venda, Rádio,
Espelhos e Argumentação são os atributos que
mostraram ter importâncias distintas quando ava-
liados pelos diferentes gêneros.
Ainda de acordo com a pesquisa, 59,8% das
mulheres consideram o atributo Condições de Fi-
nanciamento um item muito importante ou impor-
tante e 20,8% um item sem importância ou pouco
importante, enquanto que, para os homens, apenas
46,3% classificam este atributo como muito impor-
tante ou importante e 35,3% o julgam como sem
importância ou pouco importante. Para o atributo
Design Interno foi demonstrado maior interesse
pelas mulheres do que pelos homens, com 67,8%
delas o considerando um atributo muito importante
ou importante, contra 42,6% deles o classificando
como um item sem importância, pouco importante
ou indiferente em relação a ele.
Com relação aos Serviços Pós-Venda, 72,3%
das mulheres o classificam como um atributo muito
importante ou importante, enquanto que 23,5% dos
homens são indiferentes e 17,6% o consideram um
item sem importância ou pouco importante. Com
relação a ter um Rádio Embutido no automóvel,
58,8% dos homens afirmam que o considera um
item sem importância ou com pouca importância,
enquanto que 36,5% das mulheres o classifica como
importante ou muito importante.
Com relação a Quantidade de Espelhos, a
maioria dos homens (65,4%) o considera um atri-
buto sem importância ou com pouco importância,
enquanto que 27,7% das mulheres o julga indiferente
e 25,2% o considera importante ou muito importan-
te. Para os homens, a Argumentação do Vendedor
é classificada como um atributo sem importância
ou pouco importante para 61% deles, enquanto que
32% das mulheres o considera um item indiferente e
20,8% um atributo muito importante ou importante.
5 Conclusão
Por meio da pesquisa foi possível atingir o
objetivo geral do presente trabalho, que se refere a
importância relativa de determinados atributos em
veículos no momento da compra. Engel, Blackwell e
Miniard (2000) mostram que o comportamento de
compra das mulheres foi modificado por sua maior
participação na renda familiar e das alterações no
próprio comportamento das famílias, o que é de-
monstrado também por Chiusoli, Pacanhan e Lopes
(2004), que afirmam que um dos setores que vem
aumentando é o de mulheres consumidoras, que
são responsáveis por 85% da tomada de decisão
nos pontos-de-venda.
Portanto, por meio do estudo realizado, foi
possível identificar e classificar com a análise fato-
rial os sete fatores que influenciam na decisão de
compra de automóveis por mulheres da amostra se-
lecionada: Aspectos Técnicos, Conforto Sensorial,
Valor Percebido, Propaganda, Espaço-Tamanho,
Valor Financeiro e Custos Pós-Posse. Além disso,
a pesquisa demonstrou uma distinção significativa
entre homens e mulheres em seis dos vinte e dois
atributos pesquisados, que são Financiamento, De-
sing Interno, Pós-Venda, Rádio, Espelhos e Argu-
mentação, ou seja, estes seis são os atributos, que
segundo Alpert (1971) são chamados como determi-
nantes, ou para MacMillan e McGreath (1996), ener-
gizadores, no que diz respeito ao comportamento
de compra das mulheres.
Sendo o carro, segundo Kotler e Armstrong
(2005), um bem durável de compra comparável e,
de acordo com Lemos (2007), que considera que
a análise dos atributos de qualquer produto é fun-
damental, uma vez que os consumidores avaliam
o produto pelos seus atributos, pode-se dizer que
pelos resultados obtidos por meio do questionário
que qualquer esforço de marketing voltado para o
público-alvo da pesquisa, ou seja, mulheres de 18-30
anos da grande São Paulo, deve focar os atributos
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descritos no teste de Mann Whitney, já que Popcorn
e Marigold (2003) destacam nas suas verdades que
as mulheres repartem informações, e quando um
produto atende sua necessidade, a boa referência
se espalha com rapidez as outras.
Solomon (2002) destaca também que o
comportamento do consumidor é um processo que
não se mantém apenas na ação de compra e sim
um processo contínuo, que vai da pré-compra até
a pós-compra, o que na pesquisa demonstrou ser
uma preocupação mais significativa para as mulhe-
res, pois atributos como Argumentação e Pós-Ven-
da se mostraram mais importantes para as mulheres
do que para os homens.
Portanto, a identificação destes fatores
e atributos, que influenciam diferentemente a
compra do público masculino e feminino, poderá
representar um diferencial competitivo para as
montadoras de automóveis e seus respectivos es-
forços de marketing, principalmente em um merca-
do tão acirrado é o atual.
Sete fatores que influenciam na decisão de
compra de automóveis por mulheres da amostra
selecionada: Aspectos Técnicos, Conforto
Sensorial, Valor Percebido, Propaganda, Espaço-
Tamanho, Valor Financeiro e Custos Pós-Posse.
• Recebido em: 14/10/2010
• Aprovado em: 30/05/2011
90
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Competências Empreendedoras em Núcleos de Associativismo: Um Estudo nos Núcleos Setoriais Brasileiros da Associação Empresarial de Balneário Camboriú e Camboriú em Santa CatarinaEntrepreneurial Skills Centers in Associations: A Study in the Brazilian Industry Centers of Camboriu Balneario and Camboriu Business Association in Santa Catarina
93R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 92-105, jan./jun. 2011
Competências Empreendedoras em Núcleos de Associativismo: Um Estudo nos Núcleos Setoriais Brasileiros da Associação Empresarial de Balneário Camboriú e Camboriú em Santa Catarina
Entrepreneurial Skills Centers In Associations: A Study In The Brazilian Industry Centers Of Camboriu Balneario And Camboriu Business Association In Santa Catarina
ResumoA Associação Empresarial de Balneário Camboriú e Camboriú – ACIBALC pratica o associativismo por meio dos
Núcleos Setoriais brasileiros desde a sua fundação, em 2002 e, atualmente, estão em atividade os núcleos automo-
tivo, informática, farmácias magistrais, mulheres empreendedoras e moveleiro. Com a pesquisa objeto deste estudo,
buscou-se desenvolver um levantamento de competências dos empreendedores que participaram desse movimento
como forma de analisar as suas ações desenvolvidas na empresa e atribuídas a sua origem com a participação nos
nucleos setoriais. Os dados foram obtidos por meio de uma pesquisa quantitativa e descritiva composta de amostras
não probabilísticas, numa população considerada de 45 empreendedores, em que foram aplicados dois questionários
nos meses de abril e maio do ano de 2010, respondidos por empreendedores presentes nas reuniões dos núcleos. Dos
resultados evidenciados, ressaltou-se que as Competências Empreendedoras estão mais presentes nos empreende-
dores do núcleo de informática, destacando-se ações de persistência, comprometimento, busca de informações e in-
dependência e autoconfiança. Também pode-se considerar que a participação em núcleos setoriais é de grande valia
aos empreendedores. A sua participação faz com que ocorram mudanças na maneira como o empreendedor faz a
gestão e lidera sua empresa, assim como pode gerar tanto mudanças na parte física da empresa e nos colaboradores,
quanto economicamente. É possível constatar, por meio deste estudo, que a participação não deixa o empreendedor
isolado, e sim que o faz estar em aproximação com outros empreendedores, o que gera troca de experiências e infor-
mações, criando parcerias e gerando oportunidades, o que leva ao desenvolvimento de competências empreende-
doras. Quando o empreendedor passou a participar do núcleo, apenas a sua presença durante as reuniões propiciou
mudanças em sua postura empresarial, com alteração de alguns costumes e quebras de paradigmas estratégicos.
Houve ações de rede e cooperação identificadas que apontam para indícios de elementos pró-associativismo, e que
sugerem novos estudos. Os resultados da pesquisa se restringem apenas a amostra, não podendo generalizar os
resultados. Dessa forma, é possível replicar o método em outros ambientes com características semelhantes, incre-
mentando e comparando os resultados. A partir da análise e considerações feitas neste estudo, sugere-se para novas
pesquisas um estudo sobre como melhorar o comportamento empresarial dos empreendedores que participam
dos núcleos setoriais, devido às melhorias significativas que isto pode causar, bem como analisar com investiga-
ções mais profundas se as ações por competências empreendedoras mais estimulam ou inibem o associativismo.
Palavras-chave: Associativismo; Empreendedorismo; Núcleos Setoriais
AbstractThe Camboriu Balneario and Camboriu Business Association - ACIBALC - practices associations through the Brazilian
Industry Centers since its foundation in 2002 and currently the automotive, the informatics, the farmacies, the entre-
preneurial women and the furniture nuclei are functioning. It was developed in this an inventory of the skills of the
entrepreneurs who participated in this movement as a way to analyze their actions developed in the company and its
origin attributed to the participation in the sector clusters. Data were collected through a descriptive and quantitative
research consisted of non-probabilistic sample of a population of 45 entrepreneurs, in which two questionnaires were
applied in April and May of 2010, answered by entrepreneurs who participated in the meetings of the nuclei. From
the shown results, it was pointed out that the entrepreneurial skills are more present in the computer science cluster,
highlighting actions of persistence, commitment, information search, self-confidence and independence. You can
also take into account that participation in the cluster sectors is of great value to entrepreneurs. Participation makes
changes occur in how the entrepreneurs manage and lead their company, and can also generate physical changes
in the company, change the employees’ attitudes as well as make economic changes. You can observe through this
study that participation does not leave the entrepreneur alone, but that makes him or her be in proximity with other
entrepreneurs and that leads to an exchange of experiences and information, creating partnerships and creating
opportunities, which consequently leads to the development of entrepreneurial skills. Just by participating in the
clusters, the participants started to show changes in some of their business attitudes such as customs and break-
ing some strategic paradigms. It was noticed network action and cooperation which show signs of pro-associative
elements and suggest new studies. The research results are restricted only to the sample obtained and the results
cannot be generalized. Thus, it is possible to replicate the method in other environments with similar characteristics,
improving and comparing the results. From the analysis and considerations made in this study, it is suggested that
new researches on how to improve the corporate behavior of entrepreneurs who participate in sector clusters should
be done, due to the significant improvements this may cause. Further investigation should be done to check whether
the actions of entrepreneurial skills over stimulate or inhibit the association.
Keywords: Associations, Entrepreneurship, Sector Clusters
Lúcia Natália Borges Laste1
Fernando César Lenzi2
Ivan de Souza Dutra3
Mônica Maier4
1 Graduada em Administração de Empresas pela Universidade do Vale do Itajaí. E-mail: [email protected]
2 Doutor em Administração pela Universidade de São Paulo. Professor da Universidade do Vale do Itajaí e Professor de Pós Graduação em diversas Universidades no País. E-mail: [email protected]
3 Doutor em Administração Universidade de São Paulo. Professor da Universidade Estadual do Centro-Oeste Professor do Programa de Pós-Graduaçao em Administração da Universidade Estadual de Londrina E-mail: [email protected] .
4 Especialista em Gestão Financeira de Negócios pela Universidade Estadual do Centro-Oeste
94
Introdução
O Brasil é considerado um dos países com
maior índice de empreendedores do mundo, se-
gundo o Global Entrepreneurship Monitor – GEM
(2008). No relatório do GEM (2008) verifica-se, ain-
da, que, assim como acontece em outros países em
desenvolvimento, a principal motivação do empre-
endedor brasileiro é a necessidade de fazer alguma
atividade, o que pode ser observado em cerca 61%
dos casos. Apesar desse número estar diminuindo,
segundo a pesquisa este índice chegou a nove em-
preendedores por necessidade para cada dez, refle-
tindo nos altos índices de mortalidade das empre-
sas brasileiras.
De acordo com o SEBRAE (2010a), todo o
ano as Juntas Comerciais brasileiras registram a
abertura de aproximadamente 470 mil novas em-
presas no país. Muitas delas não ultrapassam a bar-
reira do segundo, terceiro ou quarto ano de vida:
49,4% morrem com até dois anos de existência,
56,4% com até três, e 59,9% com até quatro anos
de mercado. Naquele estudo também pesquisou-se
quais os motivos que levam as empresas a atingi-
rem esses altos índices de mortalidade, e uma evi-
dência é significativa no insucesso das empresas
brasileiras: baixo nível de formação gerencial.
Entre as causas ligadas ao baixo nível de ge-
renciamento merecem destaque a falta de planeja-
mento na abertura do negócio, falta de capital de
giro, problemas financeiros, ponto inadequado e a
falta de conhecimento sobre gestão. Nesse sentido
Dutra (2005), Dutra e Previdelli (2005) em estudo
sobre a mortalidade empresarial constatou que 98%
dos Micro e Pequenos negócios que encerraram ati-
vidades no norte do estado do Paraná, não tinham
plano de negócios e seus dirigentes tinham pouca
formação gerencial. Segundo o SEBRAE (2010c),
de cada dez problemas que pequenas empresas
possuem, nove são comuns a todas. Desta forma, é
possível que por meio de ações em conjunto as em-
presas possam mudar este cenário com cooperação,
advinda do associativismo.
A cooperação entre as empresas é algo que
vem crescendo no Brasil. Segundo Mattos et al.
(2002) boa parte da população mundial tem algum
vínculo com movimentos associativos. Já, na realida-
de brasileira este índice cai significativamente, che-
gando a apenas 8% da população, o que pode ser
considerado um significativo espaço para o cresci-
mento do associativismo de empreendedores. Para
Lewis (1992), as empresas criam um grande potencial
de competitividade quando envolvidas com movi-
mentos associativos. Dutra et al. (2009) apresentou
um caso bem sucedido, em que o associativismo e a
cooperação dos Hotéis Roteiro de Charme formaram
um conjunto de organizações em modelo de Rede
de Negócios com o aumento do poder competitivo.
Ou seja, esta é a era de alianças entre organizações
do ponto de vista estratégico e para as pequenas
empresas isto torna-se essencial para a sobrevivên-
cia e crescimento.
Com a finalidade de trabalhar o associativismo,
buscando a integração e fortalecimento das empresas
foi criado o Projeto Empreender no SEBRAE (2010a).
O projeto trabalha o associativismo com núcleos
setoriais, que são grupos de empreendedores do
De cada dez problemas que pequenas empresas
possuem, nove são comuns a todas.
O Brasil é considera-do um dos países com maior índice de empre-endedores do mundo,
segundo o Global Entrepreneurship
Monitor.
95R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 92-105, jan./jun. 2011
mesmo ramo de atividade que se reúnem para discutir
problemas em comum e soluções para estes.
Diante desse cenário e considerando a
relevância do associativismo no desenvolvimento
empreendedor, o principal objetivo da pesquisa
apresentada neste estudo foi:
identificar as Competências Empreendedoras
dos participantes de Núcleos Setoriais para o
associativismo na cidade de Balneário Camboriú-
SC e Camboriú-SC ambas no Brasil e seu reflexo nas
ações de desenvolvimento estratégico da empresa.
Para atender a esse objetivo foram consi-
deradas duas questões de pesquisa:
1. Quais as Competências Empreende-
doras dos participantes dos Núcleos
Setoriais brasileiros da Associação
Empresarial de Balneário Camboriú-
-SC e Camboriú-SC?
2. Qual o reflexo da participação nesses Nú-
cleos Setoriais acima mencionados para
o empreendedor desenvolver Competên-
cias Empreendedoras e melhorar o de-
sempenho estratégico da empresa?
O estudo está organizado de forma a apre-
sentar uma revisão da literatura, a metodologia uti-
lizada na pesquisa, os resultados encontrados e as
considerações finais, com as contribuições dadas
pela pesquisa e sugestões para futuros estudos.
1 Competências de Pessoas em Organizações e Competências Empreendedoras
Para sustentar a pesquisa proposta a funda-
mentação teórica contemplou os temas de compe-
tências e competências empreendedoras por serem
a base do conhecimento necessário para a proposta
apresentada na introdução deste estudo.
O gerenciamento de pessoas nas organiza-
ções mudou muito os perfis procurados pelas em-
presas. Para Dutra (2004), os funcionários obedien-
tes e disciplinados foram trocados pelo perfil de
autônomos e empreendedores. Essa mudança de
padrão de exigência fez com que a cultura das em-
presas estimulasse e apoiasse a iniciativa individual,
criatividade e busca autônoma para resultados da
empresa ou negócio. Esse novo modelo de gestão
que busca profissionais, com determinadas caracte-
rísticas capazes de fazer com que eles e as empre-
sas, façam a diferença no mercado, é chamada de
Gestão Por Competências.
Fleury e Fleury (2004) trazem uma defini-
ção de competência de pessoas em organizações
direcionando para os aspectos do conhecimento,
julgamento e habilidades para desenvolvimento
de determinada atividade. Dutra (2004) reafirma
a definição desse tipo de competência como um
somatório de duas linhas, a entrega e característi-
cas da pessoa que pode ajudá-la a se entregar com
maior facilidade. Sendo assim, de um lado estão as
competências como um conjunto de conhecimen-
tos, habilidades e atitudes necessárias para a pes-
soa exercer seu trabalho (input), e de outro lado, as
competências de entrega da pessoa para a organi-
zação (output).
O modelo da árvore das competências orga-
nizacionais é uma ferramenta que também possibi-
lita o direcionamento para a definição dos planos de
autodesenvolvimento e pode ser usada para mape-
ar campos de domínios de competências e planejar
metas a médio prazo (DUTRA, 2001). Segundo Gra-
migna (2002), o desenvolvimento de competências
do ser humano pode ser comparado ao processo de
crescimento.
Prahalad e Hamel (1990) comparam as com-
petências às raízes de uma árvore que oferecem à
organização o alimento, a sustentação e a estabilida-
de. O uso constante das competências impulsiona e
fortalece as organizações. Segundo Dutra (2004) a
aprendizagem está ligada à construção das relações
de trabalho na empresa.
Para cultivar uma árvore é necessário conhecer
seus componentes: raízes, tronco e copa, que juntos
formam um todo. Para crescer sadia e gerar frutos
é necessário receber em cada parte os cuidados
necessários.
96
A raiz corresponde as atitudes, valores, cren-
ças e princípios formados ao longo da vida. Pode-se
tomar como exemplo a função gerencial para listar
algumas atitudes que são diferenciais nas ações: sen-
sibilidade interpessoal, energia e iniciativa para resol-
ver problemas, disponibilidade para ouvir e receber
feedback, interesse e curiosidade, tenacidade e per-
sistência, flexibilidade e adaptabilidade, abertura e
receptividade a inovações, postura positiva e dinâ-
mica, integridade e bom senso com todas as pesso-
as, compartilhamento do sucesso com a equipe de
trabalho, reconhecer publicamente as contribuições,
sendo de honestidade e ética, compromisso com re-
sultados, senso de orientação para metas, automoti-
vação e autocontrole, busca permanente de desen-
volvimento (PRAHALAD; HAMEL, 1990).
O tronco corresponde ao conhecimento, e
quanto maior este conhecimento, mais a competên-
cia se fortalece e permite que o profissional enfrente
com flexibilidade e sabedoria os diversos desafios de
sua rotina. Na visão de Gramigna (2002), o conheci-
mento é um indicador de competências que ajuda a
lidar com o paradoxo da fortaleza e da flexibilidade.
Quanto mais conhecimento se coloca na bagagem,
mais as pessoas se tornam fortes e permite serem
flexíveis para enfrentarem as mudanças e as rupturas
que surgem em microintervalos de tempo.
Na sociedade atual, o profissional necessita
estar em constante aprimoramento, apropriando-se
de novas teorias e entendendo que o conhecimen-
to está sempre em constante evolução. Portanto, o
profissional deve traçar metas de autodesenvolvi-
mento constante.
A copa corresponde às habilidades, agir com
talento, capacidade técnica, obtendo resultados
positivos. A habilidade só é válida quando disponibi-
lizada, neste caso, é necessário demonstrar que sabe.
A habilidade é o que se pode chamar de conheci-
mento utilizado de forma correta e estas precisam
ser demonstradas na prática. O bom profissional deve
expressar em suas ações que se apropriou e entende
realmente do que está tratando, que sabe o que está
fazendo. Não adianta ter vários títulos e informações e
não aplicar este conhecimento.
Para Mills et al. (2002) e Javidan (1998) recur-
sos articulados entre si formam as Competências
Organizacionais. Como parte do sustento de van-
tagens competitivas, os recursos e competências
são parte importante para a organização. Gramig-
na (2002) define “competência” como um conjunto
de comportamentos e capacidades dominadas por
pessoas e organizações trazendo eficácia em suas
ações a cada situação enfrentada. Diante disso, o
ramo de atividade em que o indivíduo está inseri-
do determinará algumas competências que ele terá
e faz com que algumas características prevaleçam
sobre as outras.
Um conceito de uma pessoa com compe-
tência é relacionado a ter iniciativa, superando ex-
pectativas, compreendendo e envolvendo-se com o
todo, e que por suas ações é reconhecida. Analisan-
do os conceitos de Fleury e Fleury (2004), percebe-
-se que um profissional competente é alguém que
se envolve com o que realiza. Portanto, associar o
conceito de competência ao empreendedorismo
pode configurar uma forma diferente de entender o
perfil dos empreendedores a partir das suas ações
associativas.
Diante do exposto, pode-se direcionar a dis-
cussão sobre Competências Empreendedoras, quer
dizer, “competências de pessoas empreendedoras”. O
conjunto mais pertinente ao estudo das Competências
Empreendedoras é o modelo de competências indivi-
duais. Zarifian (2001) diz que não se obriga um indi-
víduo a ser competente, portanto, pressupõe-se que
não se pode obrigar ninguém a ser empreendedor.
Assim como uma pessoa pode lapidar suas próprias
competências, um empreendedor pode construir e
adequar suas individualidades a fim de criar uma com-
petência empreendedora.
A partir dos estudos de Spencer e Spencer
(1993) e Cooley (1990) pode-se identificar que as
competências mais abordadas por diversos estudio-
sos são: busca de oportunidades e iniciativa, correr
riscos calculados, exigência de qualidade e eficiência,
persistência, comprometimento, busca de informa-
ções, estabelecimento de metas, planejamento e mo-
nitoramento sistemáticos, persuasão e rede de conta-
tos, independência e autoconfiança.
No quadro 1, constata-se a divisão das Com-
petências Empreendedoras em três conjuntos de
ações: realização, planejamento e poder. Esses con-
juntos apontam uma série de competências carac-
terizadas por comportamentos manifestos pelo em-
preendedor frente aos desafios vivenciados no seu
dia a dia.
97R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 92-105, jan./jun. 2011
QUADRO 1 – Competências Empreendedoras em Três Conjuntos de Ações – 1990
CONJUNTO DE REALIZAÇÃO
1. Busca de oportunidades e iniciativa:
• fazcoisasantesdesolicitadoou,antesdeforçadopelascircunstâncias;
• ageparaexpandironegócioanovasáreas,produtosouserviços;
• aproveitaoportunidadesforadocomumparacomeçarumnegócio,obterfinanciamentos,equipamentos,terrenos,localdetrabalho
ou assistência.
2. Correr riscos calculados:
• avaliaalternativasecalculariscosdeliberadamente;
• ageparareduzirosriscosoucontrolarosresultados;
• coloca-seemsituaçõesqueimplicamdesafiosouriscosmoderados.
3. Exigência de qualidade e eficiência:
• encontramaneirasdefazerascoisasmelhore/oumaisrápido,oumaisbarato;
• agedemaneiraafazercoisasquesatisfazemouexcedempadrõesdeexcelência;
• desenvolveouutilizaprocedimentosparaassegurarqueotrabalhosejaterminadoatempoouqueotrabalhoatendaapadrõesde
qualidade previamente combinados.
4. Persistência:
• agediantedeumobstáculo;
• agerepetidamenteoumudadeestratégiaafimdeenfrentarumdesafioousuperarumobstáculo;
• assumeresponsabilidadepessoalpelodesempenhonecessárioparaatingirasmetaseobjetivos.
5. Comprometimento:
• fazumsacrifíciopessoaloudespendeumesforçoextraordinárioparacomplementarumatarefa;
• colaboracomosempregadosousecolocanolugardeles,senecessário,paraterminarumtrabalho;
• esforça-separamanterosclientessatisfeitosecolocaemprimeirolugaraboavontadeemlongoprazo,acimadolucroemcurtoprazo.
CONJUNTO DE PLANEJAMENTO
1. Busca de informações:
• dedica-sepessoalmenteaobterinformaçõesdeclientes,fornecedoreseconcorrentes;
• investigapessoalmentecomofabricarumprodutooufornecerumserviço;
• consultaosespecialistasparaobterassessoriatécnicaoucomercial.
2. Estabelecimento de metas:
• estabelecemetaseobjetivosquesãodesafiantesequetêmsignificadopessoal;
• definemetasemlongoprazo,claraseespecíficas;
• estabelecemetasemcurtoprazo,mensuráveis.
3. Planejamento e monitoramento sistemáticos:
• planejadividindotarefasdegrandeporteemsubtarefascomprazosdefinidos;
• constantementerevisaseusplanoslevandoemcontaosresultadosobtidosemudançascircunstanciais;
• mantémregistrosfinanceiroseutiliza-osparatomardecisões.
CONJUNTO DE PODER
1. Persuasão e rede de contatos:
• utilizaestratégiasdeliberadasparainfluenciaroupersuadirosoutros;
• utilizapessoas-chavecomoagentesparaatingirseusprópriosobjetivos;
• ageparadesenvolveremanterrelaçõescomerciais.
2. Independência e autoconfiança
• buscaautonomiaemrelaçãoanormasecontrolesdeoutros;
• mantémseupontodevista,mesmodiantedaoposiçãoouderesultadosinicialmentedesanimadores;
• expressaconfiançanasuaprópriacapacidadedecompletarumatarefadifíciloudeenfrentarumdesafio.
FONTE: Cooley (1990)
98
Com base no modelo de competências do
Quadro 1, ainda é possível pressupor que um indi-
víduo com competências individuais bem definidas
poderá utilizá-las para ações estratégicas e empre-
endedoras. No entanto, é importante ressaltar que
não basta ter competências individuais bem defini-
das, é necessário, sobretudo, que exista ou que se
busque o espaço adequado para que estas gerem
resultados concretos a organização.
Um aspecto ainda a ser observado é que se
o indivíduo não assimilar tais competências e re-
produzi-las em resultados para a organização, após
ter sido estimulado, o esforço terá pouco valor, se
tornará quase nulo para efeito dos negócios. Nesse
ponto, as Competências Empreendedoras devem
ter um foco bem definido na busca de resultados
estratégicos por parte do profissional em prol da
empresa.
Devido a significância observada nas dez
competências estudadas por Cooley (1990), foram
estas as escolhidas na base deste estudo, seguindo
a metodologia apresentada na seção seguinte.
3 Metodologia
A pesquisa realizada neste estudo está caracte-
rizada como quantitativa, sendo de caráter analítico e
descritivo, em que se buscou quantificar os dados das
competências individuais de cada entrevistado com a
finalidade de analisar as associações entre perfis dos en-
trevistados e suas ações empreendedoras.
O universo da pesquisa foi composto por 45
empreendedores que participam dos núcleos seto-
riais da Associação Empresarial de Balneário Cam-
boriú e Camboriú – ACIBALC e representam 27,2%
dos associados desta entidade. O número de pes-
soas e/ou empresas que participam dos núcleos
são: núcleo automotivo (20), núcleo das farmácias
magistrais (08), núcleo de informática (10), núcleo
moveleiro (07).
Todos os empreendedores participantes dos
núcleos setoriais da ACIBALC foram listados para
que respondessem ao questionário. Os questioná-
rios foram aplicados em reunião do núcleo, e pela
ausência de alguns participantes durante a reunião
foram respondidos 36 questionários na primeira
pesquisa de um total de 45 entregues, totalizando
80% da população indicada.
O segundo questionário foi aplicado aos
dois núcleos que obtiveram melhor pontuação na
pesquisa realizada anteriormente, sendo desta
forma, respondidos 13 questionários do total de
18 entregues, correspondendo a 72,22% do total
destes dois núcleos. A amostra aplicada é do tipo
não probabilista e intencional.
A coleta de dados ocorreu por meio de dois
questionários. O primeiro com dez questões, cada
questão com três afirmações estruturadas, apresenta-
das com situações que possivelmente foram vivencia-
das pelos empreendedores. Essas afirmações foram
construídas de forma que pudessem identificar as dez
competências abordadas por Lenzi (2008) a partir
dos estudos realizados em Spencer e Spencer (1993),
Cooley (1990), Pinchot III (1989), Dutra (2004), Fleury
e Fleury (2004) e McClelland (1971). O questionário
foi composto por 30 questões e foi respondido pelo
próprio empreendedor.
O segundo questionário foi aplicado aos dois
núcleos que obtiveram melhor pontuação na pes-
quisa realizada anteriormente, sendo desta forma,
respondidos 13 questionários do total de 18 entre-
gues, correspondendo a 72,22% do total destes dois
núcleos. Esse segundo questionário foi respondido
pela consultora dos núcleos setoriais sobre cada
participante com o intuito de comparar os resul-
tados e identificar se algum dos entrevistados se
autoavaliou significativamente diferente do que
representa ser. Essa segunda pesquisa teve como
objetivo validar os resultados finais, visto que a con-
sultora reconhece os resultados das ações de cada
um dos empreendedores pesquisados.
Cada afirmação dos instrumentos propõe
uma reflexão ao entrevistado por meio de uma es-
cala numérica. A pontuação da escala para cada afir-
mação se dá de 1 a 5, tendo 5 quando a interpretação
da questão for “sempre” e 1 quando for “nunca”. Nos
intervalos de 2 a 3 há a possibilidade de interpreta-
ções intermediárias para cada situação. As questões
são tabuladas com notas e a soma total de pontos
é de 150, representando o máximo possível de se
atingir em termos de pontuação das competências
empreendedoras.
99R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 92-105, jan./jun. 2011
A avaliação é feita através da pontuação por
competência. Cada questão contém 3 afirmações cor-
respondentes com o máximo de 5 pontos, totalizan-
do 15 por competência. As questões de destaque são
aquelas que obtiveram de 12 a 15 pontos, baseando-se
que cada questão é pontuada de 1 a 5 pontos, a pon-
tuação 3 representa um valor médio. Desta forma, para
que seja reconhecida a competência o empreendedor
deve estar acima da média, através do alcance de 4
pontos, que multiplicados por 3 questões totalizam o
mínimo de 12. A pontuação final ocorre através de uma
tabela que identifica a intensidade de cada um dos
comportamentos.
A tabulação das respostas ocorreu de forma
que as situações e notas mais altas correspondessem
à presença integral da competência, enquanto as
notas mais baixas caracterizam-se pela sua ausência.
Com os dados tabulados na primeira rodada
da pesquisa, pode-se observar qual o núcleo setorial
que apresenta ter a maior concentração de partici-
pantes com as competências empreendedoras. Desta
forma, foi aplicado o segundo questionário com os dois
núcleos que tiveram a melhor pontuação.
Com os empreendedores pesquisados na se-
gunda rodada da pesquisa, buscou-se identificar,
também, se a participação no núcleo setorial pode
ajudar no melhor desempenho quanto as compe-
tências identificadas nos empreendedores e quais as
mudanças estratégicas que eles consideram significa-
tivas em suas empresas desde o ingresso no grupo.
O questionário possui perguntas abertas sobre inova-
ções na empresa e fechadas quanto às competências
que o indivíduo considera que foram incrementadas
depois da sua participação no núcleo.
Na tabulação e análise dos dados obtidos
foram utilizados os recursos de funções da planilha
de dados do programa Microsoft Excel®1, quanto à
elaboração de tabelas e gráficos apresentados.
Os resultados desta pesquisa restringem-
-se apenas à amostra, não podendo generalizar
os resultados. Desta forma, é possível replicar
este método em outros ambientes com caracte-
rísticas semelhantes, incrementando e compa-
rando os resultados.
4 Resultados e Análises
A pesquisa aplicada com os empreendedo-
res entrevistados teve como objetivo identificar as
competências empreendedoras fundamentadas
em um constructo desenvolvido por Lenzi (2008)
a partir de Fleury e Fleury (2004), Dutra (2004),
Colley (1990), Spencer e Spencer (1993), McClelland
(1971) e Pinchot III (1989). Portanto, os resultados são
analisados a partir das seguintes competências em-
preendedoras:
• BOI–BuscadeOportunidadeseIniciativa
• CRC–CorrerRiscosCalculados
• EQE–ExigênciadeQualidadeeEficiência
• PER–Persistência
• COM–Comprometimento
• BDI–BuscadeInformações
• EDM–EstabelecimentodeMetas
• PMS – Planejamento e Monitoramento
Sistemáticos
• PRC–PersuasãoeRededeContatos
• IAC–IndependênciaeAutoConfiança
A Tabela 1 demonstra o resultado da pesquisa
feita com os 36 empreendedores e participantes dos
núcleos setoriais em cada uma das competências
mencionadas.
1 Microsoft Excel é um programa de computador que exerce cál-culos e funções matemáticas com dados e trabalha com ele-mentos textuais ou numéricos, e sua marca é registrada pela empresa Microsoft Corporation.
100
TABELA 1 - Distribuição do número de participantes dos núcleos setoriais por competências empreendedoras se-gundo pontuação individual-ano
COMPETÊNCIAS 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10
PONTUAÇÃO BOI CRC EQE PER COM BDI EDM PMS PRC IAC
1
2
3
4 1
5
6 1 2 1 1 1 2
7 2 1 3 3 2
8 4 1 2 2 3 2 1
9 8 5 6 2 5 7 6 1
10 2 7 5 3 4 6 6 3
11 8 3 5 2 2 4 3 3 2 7
12 7 5 7 9 5 4 9 6 6 6
13 3 7 4 8 7 7 6 4 6 6
14 1 3 8 6 12 5 2 2 3 6
15 2 1 8 10 11 1 1 6
TOTAL 36 36 36 36 36 36 36 36 36 36
FONTE: Os autores.
Pode-se constatar que os empreendedo-
res pesquisados possuem algumas competências
observadas a partir da pontuação 12. Para melhor
identificação, o gráfico 1 apresenta a distribuição do
número de empreendedores conforme a presença
das competências.
GRÁFICO 1 – Distribuição do número de colaboradores segundo o tipo e presença das Competên-cias Empreendedoras – 2010
Menos de 12 pontosDe 12 a 15 pontos
5
10
15
20
25
30
35
40
23
13
20
1617
19
5
31
2
34
9
27
18 18
24
12
20
16
12
24
01
- B
OI
02
- C
RC
03 -
EQ
E
04
- P
ER
05
- C
OM
06
- B
DI
07 -
ED
M
08
- P
MS
09
- P
RC
10 -
IAC
FONTE: Elaborado pelos autores.
No Gráfico 1 pode-se observar que as compe-
tências persistência (PER), comprometimento (COM)
e busca de informações (BDI) representam a maior di-
ferença de número de acordo com a concentração de
empreendedores. Neste caso, as respectivas compe-
tências são as que maior representam a presença nos
empreendedores. Após estas, outra competência que
apresenta número significativo é a independência e au-
toconfiança (IAC).
As competências de busca de oportunidades
e iniciativa (BOI) e planejamento e monitoramento
sistemático (PMS) também apresentam número mais
elevado de empreendedores quando comparados aos
que as possuem ou não, mas nestes casos, represen-
tam a ausência destas competências.
Pode-se dizer então que as competências per-
sistência (PER), comprometimento (COM), busca de
informações (BDI) e independência e autoconfiança
(IAC) são as de maior relação com os empreendedo-
res pesquisados, enquanto as competências busca
de oportunidades e iniciativa (BOI) e planejamento
e monitoramento sistemático (PMS) são as que me-
nor relação apresentam com os empreendedores da
pesquisa.
101R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 92-105, jan./jun. 2011
Para identificar qual o núcleo apresenta o maior número de participantes com as competên-cias descritas desta pesquisa, foram tabulados os resultados pessoais dos entrevistados, de acordo com seus respectivos núcleos. Procurou-se, então, identificar o núcleo com a maior concentração de participantes com as competências empreendedo-ras estudadas.
De acordo com os dados apresentados na pesquisa, o núcleo de farmácias magistrais foi o que apresentou a maior concentração de participantes com as competências empreendedoras, seguido pelo núcleo de informática.
A segunda pesquisa realizada, dessa vez apli-cada ao núcleo das farmácias magistrais e informática, pela pontuação obtida na pesquisa anterior, demons-trou que todos os participantes acreditam que o perfil empreendedor pode ser aperfeiçoado com a partici-pação deles num núcleo.
Os participantes dos núcleos das farmácias magistrais e informática apontaram que as principais ou mais evidentes competências que são aperfeiçoadas pela participação do empreendedor no núcleo são a busca de oportunidades e iniciativa (BOI), exigência de qualidade e eficiência (EQE) e comprometimento (COM).
10%
0%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90% 84,61% 84,61% 84,61%
76,92% 76,92%
30,80%
46,15% 46,15% 46,15%
23,07%
01
- B
OI
02
- C
RC
03 -
EQ
E
04
- P
ER
05
- C
OM
06
- B
DI
07
- E
DM
08
- P
MS
09
- P
RC
10 -
IAC
GRÁFICO 2 – Competências empreendedoras aperfeiçoadas pela participação nos Núcleos Setoriais – 2010
FONTE: Elaborado pelos autores.
Na primeira etapa da pesquisa, envolvendo to-
dos os núcleos, constatou-se que as principais com-
petências empreendedoras entre os entrevistados são
persistência, comprometimento, busca de informa-
ções e a independência e autoconfiança. E as com-
petências menos encontradas entre os participantes
foram a busca de oportunidades e iniciativa e o pla-
nejamento e monitoramento sistemáticos. Com isto,
pode-se identificar que as competências que foram
identificadas nos participantes não são exatamente as
que foram apontadas por eles como as principais alte-
radas pela participação no grupo.
Entre as competências que foram apresenta-
das por eles por serem aperfeiçoadas pelo núcleo e
que também foram identificadas no perfil dos inte-
grantes estão: comprometimento (COM), busca de
informações (BDI) e persuasão e rede de contatos
(PRC).
A competência exigência de qualidade e efi-
ciência (EQE) foi apresentada na pesquisa como
uma competência que é alterada pela participação
no núcleo, mas, no entanto não teve grande pontua-
ção entre os entrevistados. A busca de oportunida-
de e iniciativa (BOI) também foi identificada pelos
pesquisados como principal competência melhora-
da pela participação no núcleo e, no entanto ela foi
avaliada como uma das menos identificadas entre os
empreendedores avaliados.
Uma inferência possível de se atribuir, conside-
rando esse resultado da competência de busca de
oportunidade e iniciativa (BOI) não estar presente de
maneira significativa entre os entrevistados, é a de que
a os nucleados acreditam que essa seja uma competên-
cia que pode ser melhorada no grupo, ainda que os
resultados não sejam tão evidentes.
Quanto ao que se diz com a aplicação do se-
gundo instrumento de pesquisa, sobre quais mu-
danças ocorrem nas organizações dos empreende-
dores que participam dos núcleos, os entrevistados
citaram:a) maior conhecimento técnico dos servi-
ços prestados através da troca de expe-riências proporcionada no núcleo;
b) realização de planejamento;
c) maior visibilidade e credibilidade da em-presa perante os clientes e comunidade;
d) maior controle administrativo;
e) melhoria da rentabilidade, por melhor determinação do preço de venda e re-dução de custos;
102
f) participação em projetos sociais;
g) novas oportunidades surgem para em-
presa, pela constante busca por novida-
des do setor dentro do núcleo;
h) cooperação entre os parceiros do mesmo
setor, no qual os empreendedores se tor-
nam mais persistentes e confiantes, não
pensando em desistir nos momentos difí-
ceis da empresa;
i) aumento da rede de contatos;
j) maior comprometimento;
k) realização de ações de marketing;
l) qualificação dos funcionários através de
treinamentos, cursos, visitas técnicas e
troca de experiências com os funcioná-
rios das outras empresas do setor;
m) maior iniciativa;
n) melhor atendimento ao cliente, melhoria
dos produtos e serviços ofertados através
de treinamento cursos técnicos;
o) organização da empresa;
p) fortalecimento do setor.
Em uma análise do ponto de vista de resulta-
dos para empresa é possível mencionar que a par-
ticipação dos empreendedores nos núcleos setoriais
estimula uma série de comportamentos que podem
ser associados a ações estratégicas necessárias para
que a empresa tenha melhor desempenho de diferen-
ciação ou inovação no mercado.
Considerando o associativismo os itens de-
vem ser destacados especialmente os itens de co-
operação entre os parceiros (h), o aumento da rede
de contatos (i), e maior comprometimento (j), que
fortalecem os vínculos do associativismo e auxilia
no aumento do poder de competição dos negócios,
conforme Dutra et al. (2009).
Por meio de competências empreendedoras
mais desenvolvidas é evidente que o empreendedor
poderá melhor sua percepção de mercado no que
tange ações de diagnósticos, prognósticos, visão de
longo prazo, diferenciação, alta performance e busca
de rentabilidade.
Diante desses aspectos, parece coerente e
relevante afirmar que o envolvimento dos empre-
endedores em núcleos setoriais permite uma me-
lhora estratégica da empresa por meio do desen-
volvimento e aperfeiçoamento de competências
do empreendedor e levanta indícios de que isso
contribui para o associativismo, sugerindo estudos
sobre o que isso pode implicar nos resultados as-
sociativistas.
Essa é uma questão que pode extrapolar os
limites das fronteiras da ação empreendedora intra-
organizacional. Por esse motivo, isso levanta muita
discussão nos estudos organizacionais, especialmen-
te se a estratégia empreendedora individual conflita,
inibe ou as articulações e o alinhamento das empre-
sas para o associativismo e/ou a cooperação interor-
ganizacional.
5 Considerações Finais
Tendo como objetivo principal identificar as
competências empreendedoras e seu desenvol-
vimento estimulado na participação em núcleos
setoriais da Associação Empresarial de Balneário
Camboriú e Camboriú, pode-se considerar que esta
pesquisa alcançou seu objetivo.
O envolvimento dos empreendedores em nú-cleos setoriais permite uma melhora estratégi-ca da empresa por meio
do desenvolvimento e aperfeiçoamento de
competências do empreendedor.
103R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 92-105, jan./jun. 2011
A respeito das competências empreendedo-
ras, a “persistência”, o “comprometimento”, a “busca
de informações” e a “independência e autoconfiança”
foram as que mais se destacaram entre os empreen-
dedores pesquisados.
O núcleo que apresentou maior grau de com-
petências referente ao número de participantes foi
o núcleo das farmácias magistrais, seguido pelo nú-
cleo de informática.
A pesquisa com os núcleos que apresentaram
maior número de competências empreendedoras
mostrou que todos os empreendedores acreditam
que a participação em núcleos setoriais pode alterar
seu perfil empreendedor. Desta forma percebe-
se a importância de um empreendedor não ficar
isolado. A convivência com outros empreendedores
que também têm as mesmas dificuldades, que
passam por situações parecidas ou até mesmo
idênticas fazem com que o empreendedor observe
o comportamento do outro e saiba como agir em
determinadas situações, assim como se portar e se
posicionar melhor diante do seu trabalho.
Os empreendedores pesquisados acreditam
que as principais competências empreendedoras
que são aperfeiçoadas pela participação deles nos
núcleos setoriais, em ordem decrescente são: busca
de oportunidade e iniciativa, exigência de qualidade e
eficiência, comprometimento, busca de informações,
persuasão e rede de contatos, persistência, estabe-
lecimento de metas, planejamento e monitoramento
sistemáticos, correr riscos calculados, e independên-
cia e autoconfiança. Desta maneira, percebe-se que
os pensamentos das pessoas entrevistadas estão ali-
nhados com a definição de competência, como um
conjunto de habilidades que somadas atuam para o
desenvolvimento de uma gestão mais eficiente, como
tratada na teoria acima pelos autores Fleury e Fleury
(2004) e Dutra (2001).
Nota-se que todas as competências foram ci-
tadas pelos empreendedores como sendo aperfeiço-
adas durante a participação do indivíduo no núcleo.
Algumas foram mais citadas do que outras, pois são
motivadas naturalmente e com maior frequência pela
participação no núcleo, sendo assim mais observadas
por eles. Um exemplo tipicamente citado é a busca de
oportunidade e iniciativa, que é um dos principais mo-
tivadores que leva uma pessoa a participar do grupo
num primeiro momento.
Outras duas competências que foram as mais
citadas entre os pesquisados também estão próxi-
mas as ações que o núcleo provoca de imediato. A
busca pela exigência de qualidade e eficiência está
entre um dos requisitos para a participação no nú-
cleo. Os empreendedores cobram uns aos outros
pela qualidade e eficiência, pois um dos objetivos
do núcleo é ser visto como um grupo de empresas
em que se pode confiar e que prima pela qualidade
e eficiência.
A competência que trata do comprometi-
mento também é motivada a todo o momento em
que o empreendedor participa do núcleo. O empre-
endedor passa a entender seu papel na sociedade,
a importância do seu negócio e do núcleo, o com-
prometimento do empreendedor é observado neste
momento como essencial para a continuação dos
trabalhos.
Entre as melhorias causadas através da parti-
cipação em núcleos setoriais, pode-se observar que
ocorreram mudanças na empresa e nos empreen-
dedores. Entre as melhorias na empresa observa-se
que são muitos os ganhos, desde a qualificação de
funcionários, maior qualidade nos serviços e pro-
dutos oferecidos, melhora nos custos da empresa,
melhora do layout da empresa, engajamento social,
entre outros.
No empreendedor, entre as mudanças ob-
servadas está a atitude associativista. Ele passa a
integrar um grupo de empresários que se preocu-
pa com problemas da classe e sente que unido aos
seus concorrentes se torna mais forte. Além disto, o
empreendedor também passa a se preocupar com
a constante atualização técnica e capacidade de
gestão, assim seu comportamento e atitudes vão
sendo aperfeiçoados.
Com esta pesquisa pode-se confirmar que a
participação em núcleos setoriais é de grande valia
aos empreendedores. A sua participação faz com
que ocorram mudanças na maneira como o empre-
104
endedor faz a gestão e lidera sua empresa, assim
como pode gerar mudanças na parte física da em-
presa, nos colaboradores e nas condições econô-
micas. Fica evidente que a participação não deixa
o empreendedor isolado, e sim que o faz estar em
aproximação com outros empreendedores, o que
gera troca de experiências e informações, criando
parcerias e gerando oportunidades e desenvolven-
do competências empreendedoras.
A partir da análise e considerações feitas neste
projeto, sugere-se para novas pesquisas um estudo
sobre como melhorar o comportamento empresarial
dos empreendedores que participam dos núcleos
setoriais, devido as melhorias significativas que
isto pode causar. Um estudo a ser feito pode ser
realizado com os núcleos que apresentaram ter mais
competências empreendedoras neste estudo, a fim
de identificar os motivos que os fizeram ser destaque
nesta pesquisa.
Quando o empreendedor passa a participar do
núcleo, apenas a sua presença durante as reuniões já
começa a mudar sua postura empresarial, mudam-se
alguns costumes e quebram-se paradigmas. E, se o gru-
po estiver mais exposto a cursos, treinamentos e situa-
ções que o fizer trabalhar mais seu lado comportamen-
tal, acredita-se que o empreendedor conseguirá atingir
maiores resultados. Desta forma, um estudo sobre pos-
sibilidades e maneiras de melhorar o perfil empresarial
seria de grande valia para os núcleos. Cabe ressaltar que
esta melhora do empreendedor acabará refletindo nas
empresas e na sociedade.
Se o grupo estiver mais exposto a cursos, treina-mentos e situações que
o fizer trabalhar mais seu lado comporta-
mental, acredita-se que o empreendedor con-seguirá atingir maiores
resultados.
O empreendedor também passa a se preocupar com
a constante atualização técnica e capacidade de gestão, assim seu com-
portamento e atitudes vão sendo aperfeiçoados. • Recebido em: 10/01/2011
• Aprovado em: 18/04/2011
105R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 92-105, jan./jun. 2011
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Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos (SCM) uma Estrutura ConceitualConceptual Framework of Supply
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107R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 106-125, jan./jun. 2011
1 Doutor em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina. Professor da Universidade Federal de Santa Catarina. Email: [email protected].
2 Doutor em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina. Professor da Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail: [email protected].
Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos (SCM) Uma estrutura conceitualConceptual Framework Of Supply Chain Management (SCM)
ResumoO propósito deste artigo é contribuir para a formação de uma estrutura conceitual do
Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos, confrontando diferentes enfoques da sua de-
finição, evolução e analisar o gerenciamento da cadeia de suprimentos como uma filo-
sofia gerencial e como gerenciamento de processos. A metodologia de pesquisa para
atingir ao objetivo proposto é de pesquisa bibliográfica, com uma abordagem descritiva e
qualitativa do problema em estudo: o Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos. Com o
Estudo evidencia-se a necessidade de um gerenciamento das organizações que busque
compreender e utilizar um modelo de gestão que considere os relacionamentos inter-
firmas, nos quais administrar uma organização é administrar os elos e interfaces de sua
cadeia de suprimentos. Os componentes do produto e a satisfação do consumidor final
são de responsabilidade de toda cadeia: fornecedores, produtores, operadores logísticos
e varejistas, o que exige processos superiores em todo canal. No contexto de modelos de
referências dos processos que compõem a cadeia, aborda-se, o GSCF – (Global Supply
Chain Forum) e o SCOR-model (Supply Chain Operations Reference) do Supply Chain
Council (SCC). Conclui-se que de forma geral os autores entendem que, gerenciar uma
empresa é administrar os processos que se desenvolvem de forma interfuncional e inte-
rorganizacional ao longo de sua Cadeia de Suprimentos, passando-se de uma realidade
individual para um conceito de redes de empresas.
Palavras-chave: Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos; Interorganizações; Filo-sofia gerencial; Redes de empresas; Processos de gestão.
AbstractThe purpose of this paper is to introduce a conceptual framework for the supply
chain management, taking into account all the different meanings of its definition,
evolution and to analyze the supply chain management as a philosophy and process
management. The research methodology to achieve the proposed objective is
bibliographic search, with a descriptive approach and qualitative study of the problem
in the Supply Chain Management. The study highlights the need for a management
that seeks to understand and use a model that considers the inter-organizational
relationships, where firms administer an organization is to manage the links and
interfaces of your Supply Chain. The product components and final consumer
satisfaction are the responsibility of the whole chain, suppliers, producers, retailers
and logistics operators, which requires superior processes throughout the channel. In
the context of the referential process versions that makes the chain, are the GSCF
(Global Supply Chain Forum), SCOR (Supply Chain Operations References), SCC
(Supply Chain Council). It is concluded that in general the authors understand that
managing a company is to manage processes that develop so inter functional and inter-
organizational along your supply chain, passing a reality individual for business networks.
Keywords: Supply Chain Management; Managerial philosophy; Business networks; Management processes.
Antonio Cezar Bornia 1
Joisse Antonio Lorandi 2
108
Introdução
A necessidade de enfrentar a competição glo-bal entre empresas tem feito evoluir o processo de gestão, de uma realidade individual para o concei-to de redes de empresas. Estas passam a competir de forma integrada através de organizações virtuais componentes de uma rede. “Uma das principais ca-racterísticas da nova economia é a transição da efi-ciência individual para a eficiência coletiva. A com-petitividade é e será cada vez mais, relacionada ao desempenho de redes interorganizacionais através de parcerias compartilhadas e não de empresas iso-ladas” (FLEURY; FLEURY, 2003, p.129).
Toda organização faz parte de uma ou mais cadeia de suprimentos (SC), quer a companhia ven-da produtos ao consumidor final, produza algum serviço, fabrique produtos, ou extraia matéria-prima (HANDIELD; NICHOLS JR., 1999; LAMBERT; COO-PER, 2000). A integração da cadeia de suprimentos a partir do seu gerenciamento caracteriza o para-digma pelo qual as empresas estão se direcionando para manter a vantagem competitiva. A forma como esta cadeia de suprimentos necessita ser gerenciada depende de diversos fatores, incluindo a complexi-dade do produto, a variedade de fornecedores e a variedade de matéria-prima (LAMBERT; COOPER, 2000). De modo crescente, as empresas estão ado-tando o Supply Chain Management (SCM) para redu-zir custos, incrementar vendas e as ações no merca-do e construir uma sólida relação com o consumidor (FERGUSON, 2000).
Nenhuma organização pode desenvolver uma estratégia de vantagem competitiva qu otimize somente suas eficiências internas, a vantagem competitiva real somente é alcançada quando o fluxo como um todo é mais eficiente e mais eficaz que o dos concorrentes. O novo paradigma competitivo é cadeia de suprimentos concorrendo com cadeia de suprimen-tos. (CHRISTOPHER, 1999). Para se ter sucesso em um mercado altamente dinâmico, as empresas não podem despender grande volume de recursos para competir como entidades individuais, antes, elas necessitam competir como redes ou canais de parceiros. Aqueles que ignorarem as forças da integração da cadeia de suprimentos somente verão uma lacuna entre eles e os líderes em ascensão (LEE, 2000).
Considerando-se um determinado produto, mesmo que o fabricante tenha conseguido a exce-lência operacional, se os membros da cadeia de su-primentos (SC) fornecedores, atacadistas e varejis-tas, continuam operando em condições precárias, o produto será penalizado pela ineficiência sistêmica
do canal, diante do consumidor final. Nenhuma ope-ração produtiva ou parte dela existe isoladamente, ou seja, todas as operações fazem parte de uma rede maior, de processos interconectados com outras operações internamente na organização e externa-mente com outras empresas (SLACK; CHAMBERS; JOHNSTON, 2002).
Os processos-chave interfuncionais e inter-companhias gerenciados de forma integrada envol-vendo fornecedores, fabricantes, distribuidores e clientes é o que está se denominando de gerencia-mento da cadeia de suprimentos (SCM do inglês Su-pply Chain Management).
O gerenciamento da cadeia de suprimentos é um tema ainda em construção. Por isso, gera ambi-guidades tanto na área acadêmica como na sua prá-tica. Um significante desafio para os pesquisadores de cadeia de suprimentos é a diversidade que ainda é crescente no âmbito da literatura. Através de publi-cações em periódicos, não somente os especializa-dos, mas também em Journals populares, o SCM tem sido examinado em diferentes perspectivas cercan-do um campo de pesquisa multidimensional. Entre-tanto, a literatura referente ao SCM é composta por “retalhos” não conectados (CROMM; GIANNAKIS, 2004). O que justifica o objetivo deste artigo.
O objetivo do estudo é analisar e confrontar, a partir de um referencial teórico, as diferentes visões dos autores consultados, a fim de consolidar a for-mação de uma estrutura conceitual do gerenciamen-to da cadeia de suprimentos.
Metodologia da pesquisa quanto aos proce-dimentos técnicos, caracteriza-se como pesquisa bibliográfica, pois explica a problemática abordada a partir de referenciais teóricos. Em relação aos obje-tivos pretendidos, a pesquisa tem caráter descritivo e qualitativo que ocorre segundo Beuren, (2003), quando há a necessidade de um maior conheci-mento sobre a temática a ser abordada, o que exige
Pesquisa bibliográfica explica
a problemática abordada a partir
de referenciais teóricos.
109R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 106-125, jan./jun. 2011
uma investigação que possibilite o levantamento de hipóteses e a identificação de variáveis que tenham implicações com o objeto de estudo, a SCM. Para atingir ao objetivo pretendido, o artigo está estrutu-rado da seguinte forma:
Na segunda seção, apresenta-se uma confron-tação de diferentes enfoques em relação à defini-ção de supply chain, a fim de possibilitar a formação de um conceito próprio de cadeia de suprimentos. Após, faz-se uma classificação da SC quanto à sua complexidade.
Na terceira seção, apresenta-se uma confron-tação de diferentes enfoques em relação à definição de Supply Chain Management, a fim de possibilitar a formação de um conceito próprio de gerenciamen-to de cadeia de suprimentos. Após, aborda-se os as-pectos da coordenação da SCM em termos de filoso-fia gerencial ou de gerenciamento de processos. Em relação aos processos, abordam-se os modelos de referências defendidos pelo GSCF e o SCOR-model.
A quarta seção trata de um apanhado histó-rico de diferentes enfoques quanto aos motivos do seu surgimento e dos fatores responsáveis pelo que se conhece atualmente por gerenciamento da cadeia de suprimentos. E, por fim elabora-se uma conclusão geral do artigo e dos modelos apresentados.
2 Cadeia de Suprimentos
Cadeias de suprimentos existem em: indús-trias de manufatura, em indústrias de serviços, e até mesmo na casa das pessoas. Outros termos existen-tes são “cadeias de demanda” ou “cadeias de valor”, independente de qualquer termo usado, a intenção é fazer referência ao processo integrado de valor, do produtor para um usuário final. Para se formar uma estrutura conceitual de Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos, cabe, inicialmente, definir cadeia de su-primentos e como esta pode ser classificada quanto à sua complexidade.
2.1 Definição de Cadeia de Suprimentos
A definição de cadeia de suprimentos demons-tra ser um termo de maior consenso entre os autores do que a do gerenciamento da cadeia de suprimen-tos (MENTZER et al., 2001). O quadro 1 apresenta al-gumas definições para cadeia de suprimentos:
FONTE: os autores
QUADRO 1 - Definições de cadeia de suprimentos na visão de diversos autores.
Lambert, Stock e Vantine (1998, p. 822)Cadeia de suprimentos é a integração dos processos do negócio do usuário até
os fornecedores originais que proporcionam bens e serviços e informações que
agregam valor para o cliente.
Christopher (1999, p. 13) A cadeia de suprimentos representa uma rede de organizações, através de ligações
nos dois sentidos, dos diferentes processos e atividades que produzem valor na
forma de bens e serviços que são colocados nas mãos do consumidor final.
Lummus e Vokurka (1999, p. 11)
Uma definição sintetizada de SC pode ser estabelecida como: todas as atividades
envolvidas na entrega do produto desde a matéria-prima até o consumidor
incluindo recursos de matéria-prima e componentes, fabricação e montagem,
armazenagem e rastreamento de estoques, entrada de pedido e gerenciamento do
pedido, distribuição através de todos os canais, entrega ao consumidor, e o sistema
de informação necessário para monitorar todas estas atividades.
Ballou, Gilbert e Mukherjee (2000, p. 9)A cadeia de suprimentos se refere a todas as atividades associadas com a trans-
formação e o fluxo de bens e serviços, incluindo o fluxo de informações, para o
suprimento de matérias-primas e ao usuário final.
Mentzer et al. (2001, p. 4)Uma cadeia de suprimentos é definida como uma equipe de 3 ou mais entidades
(organizações ou indivíduos) diretamente envolvidas num fluxo upstream e
downstream de bens, serviços, financeiro e informação para atender ao consumidor.
Handfield e Nichols Jr (2002, p. 35)
Identificam a cadeia de suprimentos como abrangendo todas as organizações e as
atividades associadas com o fluxo e a transformação de bens, deste o estágio de
matérias-primas até o consumidor final, com o fluxo financeiro e de informações
associados. Os fluxos de material e de informação correm nos dois sentidos por
toda a cadeia.
110
Cadeia de suprimentos é um assunto globalizado, ultrapassa as fronteiras dos países, autores do mundo inteiro estão escrevendo sobre isso, o que torna difícil se chegar a uma definição de consenso. Os autores aci-ma foram escolhidos porque escrevem sobre logística e supply chain há vários anos.
Na definição de cadeia de suprimentos alguns elementos chave devem ser considerados e vem comple-
mentando o conhecimento na área ao longo dos anos, estes serão demonstrados no quadro 2 onde se faz uma
confrontação dos diferentes enfoques tratados por autor.
Todavia, não é o objetivo classificar as definições analisadas em termos de boas ou ruins, já que foram estabe-
lecidas em determinado momento e através de um recorte dentro de um texto maior e o objetivo dos autores
nem sempre é descrever com detalhes os diversos elementos que caracterizam a cadeia de suprimentos, mas
muitas vezes colocar suas ideias de maneira sucinta subentendendo determinados conceitos, que poderão
ficar evidentes no decorrer do texto.
As expressões processos e atividades são usadas como sinônimo por alguns autores. Entretanto, nos
modelos de referência que estão sendo desenvolvidos para o gerenciamento da cadeia, como por exemplo o
SCOR-model, há uma diferenciação de hierarquia entre processo e atividade. Isto é, existem os processos, e den-
tro destes têm-se as diversas atividades que os compõem. Então, em termos de definição de SC, é importante se
enfatizar, que existem os processos que compõem a cadeia de suprimentos, e as atividades que operacionalizam
estes processos.
O termo fluxo é um fator importante, pois caracteriza o processo de integração entre os parceiros, como
Christopher (1999) bem coloca, as ligações se dão nos dois sentidos. O fluxo de informações e de recursos fi-
nanceiros ao longo da cadeia é outro elemento que tem sido acrescentado e se identifica como essencial para
alimentar e dar suporte aos processos de relacionamentos interfuncionais e intercompanhias.
Na figura 1 são evidenciados os fluxos upstream e dowstream de bens, serviços, informações, recursos
financeiros e conhecimento.
QUADRO 2 - Definições de cadeia de suprimentos na visão de diversos autores.
Elementos-chave na caracterizaçãode uma cadeia de suprimentos
1. integração de processos de negócio X X
2. integração de atividades X X X X
3. inclusão do consumidor final X X X X X X
4. fluxo de bens de serviços X X X X X X
5. fluxo de informações X X X X X
6. fluxo de recursos financeiros X X
7. número de entidades que compõem uma SC X
8. enfatizam a agregação de valor ao cliente X X
9. o retorno
Lam
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199
8)
Ch
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01)
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ls J
r.
(20
02)
FONTE: os autores
111R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 106-125, jan./jun. 2011
FIGURA 1 - Cadeia de suprimentos integradas
Rede de Fornecedores Empresa Rede de Distribuidores
Fluxos de Informação, Produto, Serviços, Dinheiro e Conhecimento
Base de Recursos (Capacidade, Informações, “Core” Competência e Financeiro)
Co
nsu
mid
ore
s F
inais
Gerenciamento do Relacionamento
Engenharia
Logísctica
Operações
Abastecimento
FONTE: Handfield e Nichols Jr. (2002, p.09).
Em relação ao elemento chave número
mínimo de entidades que formam uma cadeia de
suprimentos Mentzer et al. (2001) têm seu mérito
no aspecto de consolidar que 3 entidades já se
caracterizam como uma cadeia.
A ênfase na agregação de valor é tratada so-
mente por dois autores, mas deve-se considerar que
está subentendida nas demais definições, já que tra-
tam do atendimento às necessidades dos clientes. E o
aspecto do retorno é um fato recente que vem sendo
destacado como componente da arquitetura da SC,
no sentido de que é necessário se pensar num trata-
mento que se deva dar aos resíduos resultantes após
o término do ciclo de vida do produto.
Uma definição de cadeia de suprimentos,
deve considerar os elementos descritos no quadro
2, mas é importante se acrescentar que, segundo
Ballou, Gilbert e Mukherjee (2000, p. 07), “cadeia
de suprimentos é um termo emergente que
enfatiza interações entre marketing, logística e
produção”. Não é um assunto estático, ele evolui
na medida em que as áreas de marketing, logística
e produção evoluam acompanhando a satisfação
das necessidades dos consumidores e também as
necessidades do planeta.
Então, a cadeia de suprimentos representa a
dinâmica integrada de redes de organizações que
compõem as relações de processos de negócios,
que produzem valor através do fluxo de produtos,
serviços, informação e recursos financeiros ao longo
do canal, desde os fornecedores de primeira linha
até o consumidor final, bem como o destino do pro-
duto após o seu uso.
2.2 Classificação da Cadeia de Suprimentos quanto à sua Complexidade
Cadeias de suprimento podem ter diferen-
tes níveis crescentes de complexidade, desde uma
cadeia de suprimento de uma única fase, podendo
chegar a ter até “n” fases. Incorpora as funções de
recebimento e fluxo de matéria-prima, manufatura
do produto, distribuição e entrega; inclui processos
de fluxo de informação e tomada de decisão e inclui
funções de administração financeira, de capital de
giro, de financiamento das atividades, estoques e de
equipamentos.
Fluxo de Informação, Produto, Serviços, Dinheiro e Conhecimento
112
Em consideração aos relacionamentos da supply chain, pode-se encontrar 3 graus de complexidade da
cadeia de suprimentos: direta, estendida e superior, conforme figura 2.
TIPOS DE DELACIONAMENTOS NO CANAL
Cadeia de suprimentos direta
Cadeia de suprimentos estendida
Cadeia de suprimentos superior
Fornecedor Organização Consumidor
Fornecedores dos fornecedores
Fornecedor Organização ConsumidorConsumidor do
consumidor
Consumidorinicial
Consumidorfinal
Fornecedor Organização Consumidor
Provedorfinanceiro
Pesquisa demercado
FIGURA 2 - Tipos de relacionamentos no canal
FONTE: Adaptado de Mentzer, et al. (2001, p.5)
Apesar de teoricamente a cadeia de supri-
mentos começar no fornecedor inicial e terminar no
varejo, a cadeia de suprimentos tem seu gerencia-
mento limitado, na esmagadora maioria das vezes, ao
elo fornecedor-cliente, e numa menor parte das ve-
zes, ao elo fornecedor de nível 2 – fornecedor de nível
1 – cliente (WANKE, 2006). Esta limitação é devido à
complexidade no gerenciamento dos interesses en-
tre os parceiros que compõem a SC, mas é factível
que o desempenho de uma empresa é amplamen-
te influenciado em um grau maior ou menor pelas
ações das organizações que fazem parte do canal na
qual operam, gerenciadas ou não.
Organizações não existem de forma isola-
da. Elas dependem das capacidades e recursos
embutidos em seus fornecedores, consumidores e
colaboradores. A definição dos limites e fronteiras
de algum sistema social é totalmente arbitrário, lar-
gamente dependente das intenções do observador
(CROOM; GIANNAKIS, 2004).
Então, um desempenho satisfatório de uma
empresa analisada individualmente depende da
qualidade de inserção desta organização nos rela-
cionamentos da rede e de como a cadeia como um
todo está sendo administrada. Esse gerenciamento
que ocorre entre os parceiros que compõem uma
rede, se caracteriza no Supply Chain Management,
que é, segundo Lambert e Cooper (2000, p. 66),
“Uma nova forma de gerenciamento dos negócios
e seus relacionamentos”. Administrar uma empresa
é gerenciar os seus relacionamentos e parcerias nos
canais onde está operando, através do SCM.
“Cadeia de supri-mentos é um termo
emergente que enfa-tiza interações entre marketing, logística e
produção”.
113R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 106-125, jan./jun. 2011
3 Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos
Existe a necessidade do desenvolvimento
de uma estrutura conceitual em torno do fenôme-
no cadeia de suprimentos para diminuir a confusão
em relação à natureza do SCM e tornar mais com-
preensível e aplicável para acadêmicos e práticos
(CROOM; GIANNAKIS, 2004). Ademais, a maioria
dos trabalhos publicados em SCM são identificados
por serem de natureza empírica e descritiva, adicio-
nando pouco no desenvolvimento teórico e concei-
tual e a percepção dos acadêmicos do escopo do
Supply Chain Management é variada (CROOM; RO-
MANO; GIANNAKIS, 2000).
A diversidade de publicações em Supply Chain Management não implica que haja um mape-
amento de um problema de domínio comum. Mui-
tos textos de autores em diversas áreas, oferecem
um viés compreensivo relacionado a seus campos
de atuação. Por exemplo: em uma pesquisa desen-
volvida com entrevistados europeus e americanos,
demonstrou que, para os americanos, a importância
do gerenciamento das operações é tratada como
problema principal de domínio no SCM, enquanto
europeus enfatizam primeiramente os relaciona-
mentos no canal, o que denota, divergências de
foco em torno do assunto (CROMM; GIANNAKIS,
2004). O que justifica um confronto de diferentes
enfoques, para possibilitar a formação de uma es-
trutura conceitual básica.
3.1 Definições de Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos
No quadro 3, demonstram-se definições
sobre o gerenciamento da cadeia de suprimentos,
para que a partir de diferentes enfoques se possa
consolidar uma abordagem em SCM:
QUADRO 3 - Definições de gerenciamento da cadeia de suprimentos na visão de diversos autores
FONTE: os autores
Cooper et al. (1997, p. )Gerenciamento da cadeia de suprimentos é uma filosofia integrativa do gerenciamento do
fluxo total de um canal de distribuição desde o fornecedor até o consumidor final.
Christopher (1999, p. 37)
Define gerenciamento da cadeia de suprimentos como o gerenciamento dos relacionamentos
upstream e downstream com fornecedores e consumidores para entregar um valor superior
ao consumidor com baixo custo para todos os participantes do conjunto da cadeia.
Lambert e Cooper
(2000, p. 66)
Definem gerenciamento da cadeia de suprimentos como a integração de processos-chave
até o usuário final a partir do fornecedor original que provê bens, serviços e informações que
adicionam valor ao consumidor e outros acionistas.
Ranzoline (2001, p. 53)
Conceitua SCM como sendo a administração sinérgica dos canais de suprimentos de todos
os participantes da cadeia de valor, através da integração de seus processos de negócios,
visando sempre agregar valor ao produto final, em cada elo da cadeia, gerando vantagens
competitivas sustentáveis ao longo do tempo.
Tan (2001, p. 42)
Supply Chain Management forma uma organização virtual composta de entidades inde-
pendentes com metas comuns de gerenciamento eficiente e eficaz todas estas entidades e
operações, incluindo a integração de compras, gerenciamento da demanda, design de novos
produtos e desenvolvimento e planejamento e controle de fabricação.
Mentzer et al. (2001, p. 17-18)
O gerenciamento da cadeia de suprimentos é definido como a coordenação sistêmica, estra-
tégica da tradicional função dos negócios e as táticas através destes negócios dentro de uma
companhia particular e através dos negócios dentro de uma cadeia de suprimentos, para o
propósito de aperfeiçoar o desempenho no longo prazo das companhias individualmente e
da cadeia como um todo.
Larson e Halldorsson, (2002, p. 36)
Define gerenciamento da cadeia de suprimentos como a identificação e o gerenciamento
da cadeia de suprimentos específica que são críticas para as operações de compras de uma
organização.
114
As definições do quadro 3 refletem diferentes formas de tratar o assunto, mas, segundo Tan (2001), três
descrições distintas predominam: (a) o gerenciamento da cadeia de suprimentos pode ser usado como um sinô-
nimo para descrever atividades de compras e suprimentos do manufaturador; (b) pode ser usado para descrever
as funções de transporte e logística do atacadista e varejista; (c) pode ser usado para descrever todas as ativida-
des que adicionam valor, do extrator de matéria-prima até o usuário final incluindo a reciclagem.
Para se fundamentar de uma forma mais específica descreve-se no quadro 4, fatores-chave que devem
compor a caracterização do SCM:
Ao analisar-se as definições do quadro 3 considerando seus elementos relevantes na caracterização do
SCM, percebe-se que muitos aspectos divergem principalmente em termos de nomenclatura utilizada para
descrever determinada situação. Como segue:
Por exemplo, Cooper, Lambert, Pagh (1997) tratam da filosofia integrativa (termo amplo), nem uma das
demais trata com estes termos, mas pode-se entender que todos os 8 elementos estão relacionados com uma
filosofia integrativa.
Já, o gerenciamento do fluxo total é menos abrangente que o item anterior, mas continua sendo amplo,
pois não define o que comporia o fluxo total. Esta forma de descrever o gerenciamento da cadeia de suprimen-
tos é um dos fatores que muitas vezes, inviabilizam a sua aplicação prática na medida em que não delimita os
processos que compõem este fluxo.
O fator-chave, Gerenciamento dos relacionamentos, é tratado de forma direta por Christopher (1999) e
por Ranzoline (2001) e indiretamente pelos demais autores. Este aspecto enfatiza a importância da gestão de
relacionamentos na cadeia, está diretamente ligado com as questões comportamentais que envolvem os parti-
QUADRO 4 – Elementos-chave na definição de cadeia de suprimentos
Elementos-chave na caracterizaçãodo gerenciamento da cadeia de suprimentos
1. Filosofia integrativa X
2. Gerenciamento do fluxo total X X
3. Gerenciamento dos relacionamentos X X
4. Integração dos processos-chave X X
5. Agregar valor em cada elo da cadeia X X X
6. Coordenação sistêmica, estratégica e tática da tradicional função dos negócios
X
7. Sincronizar as necessidades dos parceiros X X
8. Formar uma organização virtual X
Co
op
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et
al.
(19
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Ch
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(20
02)
FONTE: Os autores
115R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 106-125, jan./jun. 2011
cipantes, tanto das culturas internas de cada organi-
zação, bem como das relações intercompanhias.
Integração dos processos-chave, elemento
tratado diretamente por, Lambert e Cooper (2000)
e de certa forma por Ranzoline (2001), que delimi-
tam ou simplificam os processos a serem gerencia-
dos, fator importante para viabilizar a implementa-
ção de uma SCM, já que a torna algo factível de ser
administrado. Determinam os processos-chave a se-
rem gerenciados de forma integrada interfuncional e
interorganizacional, desde a origem na extração de
matéria-prima até o consumidor final considerando
os elos e as interfaces da cadeia.
Agregar valor em cada elo da cadeia, foi
descrito de forma direta por Christopher (1999), e por
Ranzoline (2001), e de forma indireta pelos demais
autores, já que tratam de atender as necessidades
do consumidor. Entretanto, é importante se enfatizar,
que o agregado de valor deve se dar em todo o canal,
para que este possa ser competitivo isto é, todos os
parceiros devem ser competitivos individualmente e a
cadeia como um todo.
Coordenação sistêmica estratégica e tática
das tradicionais funções do negócio e sincronizar
as necessidades dos parceiros são dois aspectos
que se complementam e estão relacionados com
os demais.
Formação de uma organização virtual, outro
termo abrangente e recente, que foi tratado de forma
direta por Tan (2001), e indiretamente pelos demais,
mas o fato de defender a ideia de que o Supply Chain
Management forma uma organização virtual dá uma
versão importante para o entendimento do que seja o
SCM. Isto é, começa a formalizar os diversos aspectos
estratégicos e operacionais que vêm sendo tratados
como inerentes ao gerenciamento da cadeia de su-
primentos para que seja administrado como se fosse
uma “organização virtual”. E isto tem implicação mais
ampla, no sentido de que todas as ferramentas e mo-
delos aplicados em uma organização individualmente
possa ser adaptado ao SCM.
Concentre-se nas necessidades reais do cliente, sincronize
operações em toda a empresa, substitua ativos por infor-
mações, elimine a repetição de esforços e o desperdício.
Essas são as receitas para criar uma cadeia de fornecimen-
to (ou supply chain) integrada, colaborativa, adaptativa e
virtual (KEARNEY, 2004, p. 128).
Para que a cadeia de suprimentos atue como
um fluxo contínuo e num canal de suprimentos sem
costuras de ponta a ponta, o seu gerenciamento
deve considerar a filosofia básica da coprodução
onde o fornecedor passa a ser uma extensão da fá-
brica até o cliente (CHRISTOPHER, 1999). As ques-
tões operacionais e dos relacionamentos permeiam
as necessidades de gerenciamento da cadeia para
funcionar como uma entidade única, integrando a
coordenação de aspectos funcionais internos com
processos externos.
Então, o gerenciamento da cadeia de su-
primentos é administrar o fluxo de forma sincro-
nizada de bens, serviços, informações, finanças e
relacionamentos, através dos processos-chave in-
terfuncionais e intercompanhias, que viabilizem o
agregado de valor em cada elo e interface da ca-
deia até o consumidor final e em todo o ciclo de
vida do produto, como uma organização virtual.
116
3.1 Coordenação do Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos
Os elementos da SCM são capturados em uma
trilogia de coordenação, que são: (a) Coordenação in-
trafuncional (administração das atividades e proces-
sos dentro da função logística de uma empresa); (b)
Coordenação de atividades interfuncionais (adminis-
tração de atividades entre funções dentro da empre-
sa) e (c) Coordenação de atividades inter-organiza-
cionais na SC que estão localizadas entre empresas
dentro do fluxo do produto no canal, tal como entre
empresa e seus fornecedores (BALLOU; GILBERT;
MUKHERJEE, 2000).
FIGURA 3 - As três dimensões do gerenciamento da
cadeia de suprimentos
FONTE: Ballou, Gilbert e Mukherjee (2000, p.10)
O SCM coordena a inter-relação da função
logística da empresa com as demais áreas funcionais
internas e com os processos integrados com outras
organizações da rede. Esta coordenação das três
dimensões abarca as questões da filosofia e do
gerenciamento de processos. Alguns autores definem
SCM em termos operacionais, envolvendo o fluxo de
materiais e produtos. Outros a definem como uma
filosofia de gerenciamento e outros, ainda, como um
processo de gerenciamento. A partir da diversidade
de visões e experiências, Mentzer et al. (2001) divide
as coordenações do SCM em termos de: filosofia
gerencial e gerenciamento de processos.
3.1.1 Filosofia Gerencial
O SCM pode ser visto como uma filosofia,
baseando-se no fato que cada empresa na cadeia
de suprimentos direta ou indiretamente afeta a per-
formance de todos os outros membros da SC, bem
como o resultado de toda cadeia (COOPER; LAM-
BERT; PAGH, 1997). O efetivo uso desta filosofia re-
quer que as atividades realizadas entre os parceiros
da cadeia estejam alinhadas com as estratégias da
companhia e harmonizadas com a estrutura orga-
nizacional, processos, cultura, incentivos e pessoas
(ABELL, 1999). A intenção real é criar uma cultura
orientada para a cadeia de suprimentos (BOWER-
SOX; CLOSS, 2001) e a mudança da cultura corpo-
rativa de todos os membros da cadeia de valor é,
segundo Tan (2001), o mais importante pré-requi-
sito para conduzir ao gerenciamento da cadeia de
suprimentos.
Baseado na literatura revisada por Mentzer et
al. (2001), a filosofia do gerenciamento da cadeia de
suprimentos deve ter as seguintes características:
1. um sistema para gerir a SC como um todo
e para gerenciar o fluxo total de produtos
do fornecedor até o consumidor final;
O SCM coordena a inter--relação da função logís-tica da empresa com as demais áreas funcionais internas e com os pro-cessos integrados com outras organizações da
rede.
Coordenaçãointerfuncional
Coordenaçãointer-
organizacionalSUPPLY
CHAIN
MANAGEMENT
Coordenação intra funcional
117R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 106-125, jan./jun. 2011
2. uma orientação estratégica com esforço
cooperativo para sincronizar e convergir
intrafirmas e interfirmas capacidades
estratégicas e operacionais em uma uni-
dade conjunta e,
3. focar no consumidor para criar um úni-
co e individualizado recurso de valor
para entender as formas de satisfação
do consumidor final.
O Supply Chain Management é uma filosofia
de integração para gerenciar o fluxo de um canal
desde o fornecedor até o consumidor final (COO-
PER; ELLRAM, 1993). Então o efetivo gerenciamen-
to da SC requer a integração entre os parceiros.
Segundo Lee (2000), existem três dimensões cha-
ve para sua efetivação: integração da informação,
coordenação e linkage organizacional.
A integração não está completa se faltar
um firme relacionamento organizacional entre as
companhias. Por exemplo, em uma cadeia de su-
primentos ideal, segundo Lee (2000), toda infor-
mação deve ser transparente através da cadeia de
suprimentos. O compartilhamento de informações
entre os membros de uma cadeia de suprimentos é
um requisito fundamental para um efetivo gerencia-
mento do canal (HANDFIELD; NICHOLS JR., 1999).
Para que haja uma efetiva coordenação, é ne-
cessária uma estrutura de liderança e poder através
de uma empresa que assuma o papel da governan-
ça na cadeia de suprimentos (LAMBERT; STOCK;
VANTINE, 1998; BOWERSOX; CLOSS, 2001). Mas,
segundo Christopher (1999, p.13) “existe uma ética
quase Darwiniana da sobrevivência do mais forte
dirigindo a estratégia corporativa. Entretanto, tal
filosofia pode ser autodestrutiva se ela conduzir a
uma falta de boa vontade de cooperar para compe-
tir.” O desenvolvimento e a manutenção de relacio-
namentos eficazes exigem uma mudança na prática
de governança. Os executivos devem aprender a
gerenciar por meio da persuasão e da cooperação,
em vez da coerção (BOWERSOX; CLOSS, 2001).
Contudo, a integração da informação e co-
ordenação por si mesmas não podem sustentar
totalmente a integração da SC. O componente or-
ganizacional isto é, a governança também precisa
ser inserida, através da “linkage” entre as empre-
sas, a qual pode começar pelo incremento de um
conjunto de medidas de performance através da
cadeia de suprimentos (LEE, 2000). Se as empre-
sas desejam produzir desempenho operacional e
financeiro sustentável, elas devem alinhar suas es-
tratégias, capacidades e estilo de liderança com
o consumidor (CHRISTOPHER; GATORNA, 2005).
Isto é, a sua governança, em termos de filosofia de
gerenciamento, deverá refletir o alinhamento entre
as atividades operacionais da cadeia e o seu posi-
cionamento estratégico.
3.1.2 Gerenciamento de Processos Através de Modelos de Referências
Alguns autores têm focado o SCM como
gerenciamento de processos. Um eficaz geren-
ciamento da cadeia requer o entendimento e o
gerenciamento de 3 importantes fatores: quem
são os membros da SC; quais os processos da ca-
deia de suprimentos “linkados” entre eles e qual o
tipo e o nível de integração que estes processos re-
querem (SPENS; BASK,2002 LAMBERT; COOPER,
2000).
Dois destacados modelos de gerenciamento
da cadeia de suprimentos têm como componente
chave a integração dos processos partindo de ati-
vidades e tarefas que devem ser alinhadas com as
estratégias do canal. São eles: (1) o modelo GSCF
desenvolvido pelo Global Supply Chain Fórum e (2)
SCOR- model, ou modelo de referência das operações
na cadeia de suprimentos (Supply-Chain opera-
tions reference-model) desenvolvido pelo SCC ou
118
Supply-Chain Council.
(1) O GSCF - define Supply Chain Manage-
ment como a integração de processos de negócio
chave para atender ao usuário final. Neste sentido,
o sucesso do SCM requer uma mudança do geren-
ciamento de funções individuais para a integração
de atividades e processos chave na SC (LAMBERT;
COOPER, 2000). O GSCF identifica 8 processos
chave que fazem parte da essência do SCM:
1. Gerenciamento do relacionamento com o
consumidor;
2. Gerenciamento do serviço ao
consumidor;
3. Gerenciamento da demanda;
4. Atendimento do pedido;
5. Gerenciamento do fluxo de manufatura;
6. Procurement;
7. Desenvolvimento e comercialização do
produto e,
8. Retorno.
De acordo com o modelo do GSCF, o geren-
ciamento das empresas parceiras, em cada cadeia
de suprimentos deve considerar estes oito proces-
sos (LAMBERT et al., 2001). Cada um destes oito
processos é interfuncional e intercompanhias. Como
demonstrado na figura 4, cada parte do processo é
dividida em uma sequência de subprocessos estra-
tégicos e todos os subprocessos são detalhados por
um conjunto de atividades (LAMBERT et al., 2005).
A figura 4 apresenta os oitos processos de
negócios-chaves identificados pelo GSCF, que
abrangem toda a cadeia de suprimentos e cortam
a empresa através das áreas funcionais. Essas áreas
funcionais incluem o marketing, pesquisa e desen-
volvimento, finanças, produção, compras e logística
(LAMBERT et al., 2001). O SCM, como praticado
atualmente, está emergindo para o marketing, logís-
tica e produção (BALLOU; GILBERT; MUKHERJEE,
2000). Para cada um desses processos, que levam
em consideração as áreas funcionais, o modelo pre-
vê o desdobramento em processos estratégicos e
FIGURA 4 - Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos: Integrando e Gerenciando os Processos de
Negócios através da Cadeia de Suprimentos.
LogísticaMarketing e VendasCompras
P&D
Gerenciamento do Relacionamento com o Cliente
Gerenciamento do Serviço do Cliente
Gerenciamento da Demanda
Desenvolvimento de Produto e Comercialização
Gerenciamento do Retorno
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Fluxo de Informações
Fornecedor1º Camada
Fornecedor 2º Camada Cliente
Cliente Final
Gerenciamento do Fluxo da Manufatura
Gerenciamento do Relacionamento com o Fornecedor
Atendimento de Pedidos
Fluxo do ProdutosProdução Finanças
LogísticaMarketing e VendasCompras
P&D
Gerenciamento do Relacionamento com o Cliente
Gerenciamento do Serviço do Cliente
Gerenciamento da Demanda
Desenvolvimento de Produto e Comercialização
Gerenciamento do Retorno
Proc
esso
s do
Ger
enci
amen
to d
a C
adei
a de
Sup
rimen
tos
Fluxo de Informações
Fornecedor1º Camada
Fornecedor 2º Camada Cliente
Cliente Final
Gerenciamento do Fluxo da Manufatura
Gerenciamento do Relacionamento com o Fornecedor
Atendimento de Pedidos
Fluxo do ProdutosProdução Finanças
FONTE: Lambert, et al., (2001, p. 14).
119R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 106-125, jan./jun. 2011
operacionais que permitam a sua implementação
por meio da interligação de suas atividades.
Os oito processos chave percorrem toda a cadeia de
suprimentos e através das empresas e dentro dos silos
funcionais em cada empresa. Os silos funcionais incluem
Marketing, pesquisa e desenvolvimento, finanças, produ-
ção, compras e logísticas. As atividades nestes processos
se localizam na parte interna destes silos funcionais, mas
um processo conjunto não pode estar contido dentro de
uma função (LAMBERT et al., 2001, p.14).
O modelo de Gerenciamento da Cadeia de
Suprimentos proposto por Lambert et al., (2001) é
baseado na integração dos processos-chaves de ne-
gócios das empresas, por meio de suas cadeias de
suprimentos. Para Lambert et al (2001), o sucesso
do gerenciamento da cadeia de suprimentos requer
uma integração das funções de negócios com os
processos-chave dentro das empresas. Entretanto,
as companhias tradicionais são organizadas em fases
funcionais com a divisão de responsabilidades por
funções e, muitas vezes, os limites funcionais impe-
dem o gerenciamento do processo. (CHRISTOPHER,
1999).
Um ponto chave no SCM é que todos os pro-
cessos devem ser visto como um sistema (LUMMUS;
VOKURKA, 1999). Ainda neste sentido, a maneira
ideal de gerenciar os processos é considerando-os
como entidades e não os fragmentando. Não há
nada a fazer senão uma mudança de um enfoque
funcional para um enfoque no processo (CHRISTO-
PHER, 1999).
(2) O SCOR-model - é um método que faz uso
de benchmarking e de avaliações para o aperfeiçoa-
mento do desempenho da cadeia de suprimentos. O
SCOR é um modelo de estrutura interfuncional que
contém as definições de padrões de processos, ter-
minologias e métricas associados aos processos da
cadeia de suprimentos, confrontando-os com as me-
lhores práticas. O modelo foi projetado para auxiliar
no aprendizado das companhias em relação aos pro-
cessos internos e externos ao seu ramo de atuação
(STEWART, 1997). Conforme o SCC (2006), o SCOR-
-model versão 8.0 define 5 processos-chave:
a) Planejar - no escopo do processo de pla-
nejamento e gerenciamento do abasteci-
mento e da demanda como modelo de
referência tem-se: definição de recursos
e demanda, planejamento de estoques,
distribuição, produção e planejamento de
capacidade;
b) Abastecer - aquisição de matéria-prima,
qualificação e certificação de fornecedo-
res, monitorando qualidade, negociação
de contratos com vendedores e recebi-
mento de materiais;
c) Fabricar – fabricando o produto final,
testando, embalando, mudanças nos
processos, lançamento e apropriação de
produtos;
d) Entregar – gerenciamento do pedido e
crédito, gerenciamento do armazém, do
transporte, da expedição e atendimento,
e criação de base de dados dos consu-
midores, produtos e preços;
e) Retorno – da matéria-prima, do produ-
to acabado, manutenção, reparos e ins-
peção. Estes processos estendem-se à
pós-venda dando suporte ao consumi-
dor.
O maior objetivo do modelo SCOR é aperfei-
çoar o alinhamento entre o mercado e a reação es-
tratégica de uma SC, usando indicadores que pos-
sibilitem o gerenciamento destes 5 processos, na
premissa de um alinhamento e de um desempenho
superior. O poder do SCOR é prover um formato
padrão para facilitar a comunicação. Ele é um ins-
trumento que objetiva melhor gerenciamento da
empresa para projetar e reconfigurar a SC, a fim de
atingir a performance desejada (HUAN; SHEORAN;
WANG, 2004).
Uma importante deficiência no gerenciamen-
to de cadeias de suprimentos é a comunicação entre
seus membros. O canal é composto por empresas
de diferentes segmentos, com culturas diferentes e
processos diversos. O modelo SCOR tem como pro-
posta realizar esta comunicação e o equilíbrio entre
os processos, com o uso de uma linguagem e métri-
cas padronizadas considerando as especificidades
de cada cadeia de suprimentos.
O alinhamento estratégico do modelo SCOR
é na estratégia de operações. A partir desse aspec-
to, o modelo é construído e a relação com as métri-
cas é estabelecida. O SCOR é focado na eficiência e
tudo gira em torno da movimentação dos insumos e
dos produtos manufaturados através dos processos,
120
atividades e tarefas, seja para frente ou para trás ao
longo da cadeia. O ponto-chave é a redução de cus-
tos e o ganho da eficiência de seus ativos. O SCOR
utiliza o conceito de processo de negócio a partir da
construção de um modelo de referência.
O GSCF e o SCOR representam modelos de
referência para a coordenação dos processos de
negócios ao longo do canal. O GSCF foca no ge-
renciamento de relacionamentos na cadeia de supri-
mentos e o SCOR foca na busca de eficiência transa-
cional (LAMBERT et al., 2005). Mas, em ambos, um
ponto-chave é o grau de conectividade com outras
companhias através do fluxo logístico, de materiais,
informação e financeiro ao longo do canal.
Então, a coordenação do SCM em termos de
filosofia gerencial e dos processos a partir de mode-
los de referência, alinhados com as metas e estraté-
gias do canal, possibilitam um serviço superior e a
manutenção da competitividade do canal.
As diferentes formas de definir o Supply Chain
Management, contribuem para se formar uma es-
trutura conceitual, que abarque todos os elementos
que compõem esta nova forma de administrar os
negócios. Este fato, já é percebido pela diversida-
de na descrição dos fatores responsáveis pelo seu
surgimento e evolução, que são responsáveis pelo
que se entende atualmente por gerenciamento da
cadeia de suprimentos.
4 Evolução do Supply Chain Management – SCM
Historicamente, o termo gerenciamento
da cadeia de suprimentos tem várias definições
(MENTZER et al, 2001), estas divergências surgem
já na descrição de seu histórico e no motivo de seu
aparecimento e evolução. A prática do SCM come-
ça com as empresas japonesas e em suas redes
tipo “Keiretsus”, como é o caso da Toyota, apesar
do termo (SCM) não ser utilizado por estas empre-
sas. Pode-se enfatizar que a prática do SCM foi
criada no Japão e a teoria do SCM foi desenvolvi-
QUADRO 5 - O aparecimento e a evolução do gerenciamento da cadeia de suprimentos
Tan, (2001, p. 41)
A intensa competição global nos anos 80 força as organizações de classe
mundial a oferecer produtos de baixo custo, confiáveis e de alta qualidade com
grande flexibilidade de design. No processo rápido em ambiente de manufatura
JIT just in time com pouco estoque para amortecer a produção ou problemas
de cronograma, os manufaturadores começam a visualizar o real benefício e
importância do estratégico e cooperativo relacionamento comprador-fornece-
dor. O conceito de SCM surge com manufaturadores experimentados com
parcerias estratégicas com seus fornecedores imediatos.
Croom, Giannakis (2004, p. 28)
O termo Supply Chain Management foi primeiro usado no senso comum por
Oliver e Weber (1982) e então replicado por Houlihan (1984, 1985, 1988) em
uma série de artigos para descrever o gerenciamento do fluxo de materiais
através das fronteiras organizacionais. Desde então, os pesquisadores têm
investigado o conceito de SCM. (Ellram, 1991), (Harland, 1994), estabelecendo
estas bases teóricas e operacionais como nós conhecemos hoje.
Lambert e Cooper, (2000, p. 67)
O termo SCM foi originalmente introduzido pelos consultores no início dos anos
80 e tem subsequentemente ganhado tremenda atenção. Desde então, prin-
cipalmente a partir dos anos 90, os acadêmicos têm atentado para criar uma
estrutura conceitual para o gerenciamento da cadeia de suprimentos.
Lummus e Vokurka, (1999, p. 13)
A história da cadeia de suprimentos pode ser descrita a partir da indústria têxtil
com o programa de resposta rápida (QR) (quick response) e depois pelo ECR
– resposta eficiente ao consumidor (efficient consumer response) na indústria.
Mais recentemente, uma variedade de companhias através de muitas indústrias
têm iniciado a visualizar a todos os processos da cadeia de suprimentos.
FONTE: os autores.
121R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 106-125, jan./jun. 2011
da no Ocidente. No quadro 5 demonstra-se alguns
pontos de vista neste sentido:
Há um consenso de que o SCM teve sua ori-
gem na década de 80 em decorrência de diversos
fatores que impulsionaram o seu surgimento com
destaque para a tecnologia da informação (EDI, có-
digo de barras, QR, ECR, RFID) e os movimentos
da produção enxuta relacionados com o TQC e o
JIT. Segundo Metz (1998), o fator que permitiu com
que o gerenciamento da cadeia de suprimentos se
desenvolvesse foi o avanço das tecnologias chave:
informação, transporte e manufatura, atrelados ao
marketing, à satisfação do consumidor, à customi-
zação e à logística.
Já para Ballou, Gilbert e Mukherjee (2000),
embora o SCM seja um termo novo para descrever o
gerenciamento das atividades do fluxo de produtos, o
conceito tem evoluído em distribuição física e logísti-
ca desde o início dos anos 60, o que é novo é a ênfase
para determinar a expansão das fronteiras.
O Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos, começou a
ser aplicado apenas no início dos anos 90. Mesmo a nível
internacional, são poucas as empresas que já conseguiram
implementá-lo com sucesso e, a nível acadêmico, o
conceito ainda pode ser considerado em construção. [...]
O que parece claro é que este novo conceito chegou para
ficar (FLEURY, 2005, p. 1).
O início dos anos 90 se caracteriza no corte
epistemológico do SCM. Foi quando houve um salto
de qualidade e começou a se fundamentar uma es-
trutura conceitual e começou a se consolidar como
um modelo a ser adotado pelas empresas, caracteri-
zando-se como uma necessidade competitiva. Desta
forma, pode-se dizer que existe o antes da década de
1990, caracterizado por diversos fatores e processos
que são trabalhados de forma isolada entre os mem-
bros de uma cadeia de suprimentos, e o depois de
1990, em que estes processos são responsáveis pela
consolidação da integração compartilhada da cadeia
de suprimentos, a qual vem evoluindo ao longo do
tempo.
A partir deste período de ruptura nos rela-cionamentos da cadeia de suprimentos, uma das mais frutíferas aplicações de TI tem sido na área da coordenação intercompanhia do fluxo de materiais
e informações, identificado como Supply Chain Ma-nagement. (BARUT; FAISST; KANET, 2002) . Neste aspecto, segundo Handfiel e Nichols Jr. (1999, p.5).
[...] três maiores evoluções no mercado em tecnologia
têm trazido o gerenciamento da SC para o foco prioritá-
rio da atenção do gerenciamento:
1. A revolução da informação;
2. Demanda do consumidor em áreas do produto e cus-
tos dos serviços, qualidade, tecnologia e tempo de
ciclo tem conduzido o crescimento da competição
global;
3. O surgimento de novas formas de relacionamentos
inter-organizacionais.
São fatores relacionados a evoluções tecno-
lógicas que propiciaram a evolução da suplly chain
adequada a um ambiente globalizado. Hoje, prati-
camente todo produto tem conteúdo e implicações
globais (PALAGYI, 2005). “Temos que reconhecer
a necessidade de considerar os mercados sob um
ponto de vista global ao formularmos estratégias
de produção, distribuição e marketing” (CHRISTO-
PHER, 1999, p.115). O campo de competição está
agora deslocado para o gerenciamento da cadeia
de suprimentos global. O sucesso das companhias
como Procter-Gamble, HP, Dell Computer e Wal
Mart é testemunha que uma bem orquestrada ca-
deia de suprimentos compacta e integrada é crucial
A globalização, as inovações tecnológicas e a crescente competitividade
têm exigido com que as organizações busquem
novas formas de se manter no mercado. Dentre essas
formas, encontra-se a integração da cadeia de suprimentos através do
gerenciamento da cadeia de abastecimento.
122
para a competitividade da corporação (LEE, 2000).
A globalização, as inovações tecnológicas e a crescente competitividade têm exigido com que as orga-
nizações busquem novas formas de se manter no mercado. Dentre essas formas, encontra-se a integração da
cadeia de suprimentos através do gerenciamento da cadeia de abastecimento.
Uma importante tendência recente no SCM é o retorno, reciclando ou reutilizando os produtos depois do
usuário final ter utilizado no fim de sua vida útil, sua logística reversa. As organizações estão agora estendendo seu
canal de distribuição além do consumidor final para incluir a reciclagem do produto final (HANDFIELD; NICHOLS
Jr., 1999). A figura 5 apresenta as atividades e empresas envolvidas:
Extração minérios/matéria-prima
Manufatura MPcomponentesManufatura Manufatura
produto
final
Atacadista
Varejista
Consumidorfinal
Reciclagem
Distribuição e armazenagem física
FIGURA - 5 Atividades e empresas em uma cadeia de suprimentos
FONTE: Tan, (2001, p. 40)
As organizações estão incorporando a utilização da logística reversa na cadeia para gerenciar o fluxo
de bens e serviços movendo-se para trás em toda a SC. O gerenciamento da cadeia de suprimentos se funde
e, às vezes, se confunde com a logística, provocando divergências: se é uma extensão da logística ou se ela é
parte do SCM.
5 Conclusão
Este estudo aborda a partir de uma revisão bibliográfica fundamentada em autores do gerenciamento da cadeia de suprimentos, diferentes posições que formam a estrutura conceitual em torno do assunto. Parte-se do entendimento do que caracteriza uma cadeia de suprimentos, constatando-se que em termos de SC não há muitas divergências na sua definição.
A partir do entendimento do que é uma cadeia de suprimentos, busca-se dar uma definição de geren-ciamento da cadeia de suprimentos, confrontando a opinião de diversos autores em torno do assunto. Neste sentido, dois aspectos se destacam na explicação do que consiste o SCM, de um lado visto como uma filosofia gerencial e de outro como gerenciamento de processos.
Mas, o que se destaca e o que torna o SCM uma ferramenta que possa ser aplicada, dada a sua comple-xidade é o entendimento de que administrar a SC é administrar os processos que estão envolvidos e que estão linkados entre os parceiros que a compõem. Neste sentido, os modelos de referência do GSCF e o SCOR-model organizam e orientam para uma forma de gerenciar a SC a partir de processos e atividades.
123R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 106-125, jan./jun. 2011
• Recebido em: 12/11/2010
• Aprovado em: 10/03/2011
A filosofia gerencial deve delimitar as políti-cas e estratégias das decisões que são tomadas no gerenciamento dos processos, principalmente atra-vés da formação de uma governança corporativa, que alinhe os interesses individuais dos parceiros em torno dos objetivos da cadeia.
Para compreender uma área de estudos, é ne-cessária uma avaliação da forma como esta evoluiu ao longo dos anos para alcançar o modelo que se conhece atualmente. Isto é tratado pela análise dos fatores que são responsáveis pelo surgimento e de-senvolvimento do SCM. A determinação dos fatos que provocaram a sua evolução se caracteriza por uma discordância entre os autores da área, moti-vados principalmente pelas percepções pessoais e culturais de cada autor, considerando o contexto em que estes atuam.
As diversas ênfases em relação aos fatores responsáveis pela evolução e surgimento do Geren-ciamento da Cadeia de Suprimentos, ocorrem, porque praticamente todos os fatos relacionados, tiveram participação uns mais outros menos, ao longo de sua construção. No âmbito da SCM, devido à complexidade de seu entendimento e da forma de se aplicar na prática, não é apenas um aspecto que explica o seu desenvolvimento, mas uma série de ferramentas, modelos, que no conjunto contribuíram
e ainda contribuem para o entendimento do SCM como conhecido atualmente. Certamente, no futuro, novas ferramentas farão parte dessa nova forma de administrar os negócios.
A globalização, inovações tecnológicas e a crescente competitividade, que se tornaram deter-minantes da sobrevivência das empresas a partir dos anos 90, têm provocado com que as organizações busquem novas formas de satisfazer o consumidor. Este período, caracteriza um corte epistemológico do Supply Chain Management. Foi quando houve um salto de qualidade e começou a se formar uma estrutura conceitual e uma aplicação prática passou a se consolidar como uma necessidade do contexto do momento.
124
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Valor Justo: Impactos do SFAS 157 nas empresas Brasileiras listadas na NYSE Fair Value: sfas 157 impacts on nyse’s listed Brazilian companies
127R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 126-143, jan./jun. 2011
Valor Justo: Impactos do SFAS 157 nas empresas brasileiras listadas na NYSEFair Value: sfas 157 impacts on nyse’s listed Brazilian companies
1 Doutora em Economia pela Université des Sciences Sociales Toulouse I. Professora da Universidade de Brasília. E-mail: [email protected]
2 Mestranda do Programa Multiinstitucional e Inter-Regional de Pós-Graduação em Ciências Contábeis (UnB, UFPB, UFPE e UFRN). Contadora da Eletrobrás-Eletronorte. E-mail: [email protected]
3 Pós-doutor pela University of Otago. Professor da Universidade de Brasília. E-mail: [email protected] 4 Mestranda do Programa Multiinstitucional e Inter-Regional de Pós-Graduação em Ciências
Contábeis (UnB, UFPB, UFPE e UFRN).
ResumoDiante do processo de convergência internacional da contabilidade e do aumento da necessidade
da transparência e relevância das informações, a verificação do nível de evidenciação de
informações contábeis se torna oportuna. O debate sobre a mensuração a valor justo culminou
com a publicação do SFAS 157, que engloba o que foi apresentado em diversas normas. Nesse
ambiente, esse artigo tem como objetivo analisar o nível da adoção do SFAS 157 nas empresas
brasileiras listadas na Bolsa de Nova Iorque (NYSE) com o intuito de verificar o nível de
evidenciação das mensurações a valor justo. A análise foi feita por meio das notas explicativas das
demonstrações consolidadas anuais no formato 20-F, em dezembro de 2008, tendo em vista a
obrigatoriedade da adoção da norma ocorrer a partir deste ano. Destarte, dentre as empresas que
estavam em conformidade com os US GAAP, todas adotaram o SFAS 157; entre as que estavam
de acordo com os BR GAAP, uma não adotou a norma; dentre as que estavam em conformidade
com os IFRS, não houve menção do SFAS 157 em suas notas explicativas ou requerimento de
reconciliação com os US GAAP. A comparação da média total de ativos financeiros (21,97%) e
passivos financeiros (1,52%) mensurados a valor justo em relação aos ativos e passivos totais, das
empresas que adotaram os US GAAP, mostrou-se incompatível. Nas que adotaram os BR GAAP, a
média total de ativos financeiros (12,54%) e passivos financeiros (16,99%) mensurados a valor justo,
em relação aos ativos e passivos totais, foram compatíveis.
Palavras-chave: Valor Justo; SFAS 157; Evidenciação
AbstractGiven the accountings’ international convergence process and the increase of the need for
information’s transparency and relevance, the verification of the disclosure of accounting information
becomes timely. The debate over the fair value measurement had its climax with the publication of
SFAS 157, which includes what was presented in various standards. In this environment, this paper
aims to analyze the level of the adoption of SFAS 157 by NYSE’s listed Brazilian companies with
the purpose of verifying the level of disclosure of fair value measurements. The analysis was done
using the notes to the consolidated financial statements presented at 20-F statement, in December
2008, the year that the standard became mandatory. Thus, among the companies that were in
accordance with US GAAP, all adopted SFAS 157; among the companies that were in accordance
with BR GAAP, one did not adopt the standard; among the companies that were in accordance
with IFRS, there were no mentions of SFAS 157 at the notes for the financial statements or request
to conciliate with US GAAP. The average comparison of total financial assets (21.97%) and financial
liabilities (1.52%) measured by fair value in relation to total assets and liabilities, within companies
that adopt US GAAP, turned out to be incompatible. Within the companies that adopted BR GAAP,
the mean comparison of total financial assets (12.54%) and financial liabilities (16.99%) measured by
fair value in relation to total assets and liabilities turned out to be compatible.
Keywords: Fair Value; SFAS 157; Disclosure.
Fátima de Souza Freire1
Isabel Cristina Henriques Sales2
Jorge Katsumi Niyama3
Luciana Miyuki Ikuno4
128
A globalização dos mercados de capitais e o
crescente aumento da necessidade de captação de
recursos em bolsas de valores estrangeiras contribu-
íram para a necessidade do aumento da comparabi-
lidade entre a contabilidade dos países. O processo
de convergência teve seu marco inicial com a criação
do International Accounting Standards Board (IASB)
em 2001, ano de transição de estrutura e objetivos do
IASC para o IASB. A partir de então, o objetivo prin-
cipal passou a ser a adoção integral das International
Financial Reporting Standards (IFRS) pelos países
e não apenas a harmonização contábil (WEFFORT,
2005).
Outro evento significativo para o processo
de convergência, em 2002, foi o acordo Norwalk
Agreement entre o Financial Accounting Standards
Board (FASB) e o IASB, através do qual os dois
Conselhos se comprometeram a convergir suas
normas por meio de esforços e trabalhos conjuntos.
Esse acordo foi reforçado em 2006 com a formu-
lação de um roteiro por ambos para o processo de
convergência a ser seguido até 2008, ano em que
foi realizada uma atualização do Memorando de En-
tendimento (Norwalk Agreement) entre os conselhos
com o intuito de identificar as prioridades e marcos
para se completar os projetos conjuntos remanes-
centes até 2011. Em cinco de novembro de 2009, os
conselhos publicaram um relatório de progresso com
a finalidade de apresentar a intensificação de seus
programas de trabalho e reafirmar os seus compro-
metimentos quanto à convergência de suas normas.
Recentemente, tanto o FASB quanto o IASB têm
procurado convergir também a contabilidade a valor
justo.
Em setembro de 2006, o FASB emitiu a nor-
ma SFAS 157 – mensuração a valor justo, com o in-
tuito de aumentar a consistência e a comparabilida-
de nas mensurações a valor justo, apresentar uma
definição única para fins de demonstrações contá-
beis e aumentar as evidenciações sobre essas men-
surações. Em novembro do mesmo ano, o IASB emi-
tiu um Discussion Paper sobre a mensuração a valor
justo baseada no SFAS 157. Já em maio de 2009, foi
emitido o Exposure Draft, semelhante ao SFAS 157.
No Exposure Draft são listados alguns pontos
de divergência, tais quais: aplicação em alguns itens,
referência ao mercado (principal ou mais vantajo-
so), requisitos de apresentação para circunstâncias
em que a entidade usa um ativo conjuntamente com
outros de maneira que difere do maior e melhor uso
do ativo, mensuração de passivos, entre outros.
A Comissão de Valores Mobiliários dos Es-
tados Unidos, Securities and Exchange Comission
(SEC), em novembro de 2007, autorizou o uso das
IFRS nas demonstrações contábeis de empresas es-
trangeiras listadas nos Estados Unidos, sem a recon-
ciliação com os United States Generally Accepted
Accounting Principles (US GAAP), a partir dos anos
posteriores a 15 de novembro de 2007 (SEC, 2007).
O intuito de se requerer o uso das IFRS é torná-las
um conjunto de normas globais uniformes a serem
adotadas integralmente e aplicadas de maneira si-
milar em todos os países. Isso devido ao fato dessa
consistência contribuir para o aumento da compa-
rabilidade da contabilidade e, desse modo, tornar as
informações mais úteis aos investidores.
No Brasil, de acordo com Instrução nº 457, de
13 de julho de 2007, a Comissão de Valores Mobiliá-
rios (CVM) determinou que as publicações das de-
monstrações contábeis consolidadas devessem estar
em consonância com as IFRS a partir do exercício
findo em 2010. O processo de convergência foi
Introdução
O aumento da utilização da contabilidade a valor justo tem feito surgir vários
desafios para usuários das informações,
especialmente em países em desenvolvimento.
129R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 126-143, jan./jun. 2011
fundamentado por esse órgão por meio da Delibe-
ração nº 539, de 14 de março de 2008, que aprova
o pronunciamento conceitual básico do Comitê de
Pronunciamentos Contábeis – CPC (dispõe sobre a
estrutura conceitual para a elaboração e apresenta-
ção das demonstrações contábeis, mais próximas
aos padrões internacionais) e por meio da aprovação
das leis 11.638/07 e 11.941/09, que alteram a Lei Socie-
tária 6.404/76.
Diante dessa possibilidade, a partir do ano de
2008, algumas empresas brasileiras listadas na Bolsa
de Nova Iorque (NYSE) começaram a apresentar as
suas demonstrações consolidadas no formato 20-F
em conformidade com as IFRS. As empresas bra-
sileiras listadas na NYSE também apresentam suas
demonstrações consolidadas no formato 20-F de
acordo com os US GAAP ou de acordo com os prin-
cípios geralmente aceitos no Brasil (BR GAAP), com
a reconciliação com os US GAAP.
Com a emissão do Exposure Draft sobre
mensuração a valor justo pelo IASB em 2009,
similar ao SFAS 157, cabe investigar quais são os
impactos nas evidenciações das notas explicativas
relacionadas ao valor justo por meio da análise da
adoção do SFAS 157, visto que as normas no IASB
e do FASB tendem a ser semelhantes. Acrescenta-
se a isso a afirmação de Kumarasiri e Fisher (2011)
de que o aumento da utilização da contabilidade
a valor justo tem feito surgir vários desafios para
usuários das informações, especialmente em países
em desenvolvimento.
Assim, surge o segu inte problema de pesqui-
sa: quais os impactos da adoção do SFAS 157 entre
as empresas brasileiras listadas na NYSE? Com base
no artigo de Bhamornsiri, Ghinn e Schroeder (2010)
foi realizada uma reaplicação para as empresas bra-
sileiras listadas na NYSE com o objetivo de examinar
e avaliar a adoção do SFAS 157 e as evidenciações
resultantes dessa norma. De tal forma, os objetivos
específicos do presente estudo são:
1) Determinar a proporção das compa-
nhias analisadas que foram afetadas
pelos requerimentos de evidenciação
do SFAS 157;
2) Determinar quais as atividades mais afe-
tadas pelos requerimentos de eviden-
ciação do SFAS 157;
3) Determinar as principais categorias de
ativos e passivos financeiros que foram
evidenciados pelas empresas afetadas
pelo SFAS 157;
4) Determinar em qual extensão o valor
justo é utilizado para mensurar os ativos
e passivos financeiros;
5) Determinar a proporção em que os ati-
vos e passivos financeiros são classifi-
cados em cada nível de mensuração do
valor justo;
6) Determinar quais são os principais mé-
todos utilizados para a mensuração do
valor justo;
7) Determinar quais foram os efeitos no
resultado das empresas contidas na
amostra em decorrência da adoção do
SFAS 157.
O presente trabalho é estruturado em cin-
co partes. Após esta introdução, a segunda parte
proferirá sobre o SFAS 157 e trabalhos relacionados.
Será apresentada a metodologia utilizada no estu-
do em uma etapa posterior a esta (terceira parte).
Na quarta parte serão apresentados e analisados
os resultados encontrados. Finalmente, na quinta e
última etapa serão apresentadas as considerações
finais sobre os principais aspectos referentes ao as-
sunto proposto.
A mensuração a valor justo se refere principal-mente às suas vantagens e desvantagens, à rele-vância das informações
resultantes dessa mensu-ração, à comparabilidade e à consistência resultan-tes de sua adoção, além
de seus obstáculos e problemas.
130
2 Referencial Teórico
2.1 Valor Justo
A discussão sobre a mensuração a valor justo
se refere principalmente às suas vantagens e des-
vantagens, à relevância das informações resultantes
dessa mensuração, à comparabilidade e à consis-
tência resultantes de sua adoção, além de seus obs-
táculos e problemas.
Barlev e Haddad (2003) fazem uma compara-
ção entre a contabilidade a custo histórico e a valor
justo, e se posicionam favoráveis ao valor justo. Os
autores (BARLEV; HADDAD, 2003) defendem que
as informações resultantes da contabilidade a valor
justo são mais relevantes do que as fornecidas pela
contabilidade a custo histórico, isso porque esta ten-
de a não corresponder à posição financeira e ao lucro
real. Barlev e Haddad (2003) destacam, ainda, que a
contabilidade a valor justo fornece uma evidenciação
mais completa e transparente; no sentido de serem
informações verdadeiras e precisas. Portanto, as de-
monstrações do resultado do exercício que tomam
como base o valor justo tendem a refletir o valor eco-
nômico real das atividades da empresa. Os balanços
patrimoniais dessas empresas, por sua vez, espelham
ativos, passivos e patrimônios líquidos mensurados a
valor justo (BARLEV; HADDAD, 2003).
Penman (2007) realizou um estudo envolven-
do as principais vantagens e desvantagens da men-
suração a valor justo. Em seu trabalho concluiu que,
da mesma forma em que a contabilidade a custo his-
tórico possui seus problemas de implementação, a
contabilidade a valor justo também conta com suas
próprias dificuldades. Dentre a pesquisa de opinião
realizada pelo autor (PENMAN, 2007) com base em
declarações públicas feitas em relação à contabili-
dade a valor justo, tanto a favor quanto contra, por
uma diversidade de normatizadores, reguladores,
analistas e preparadores, foram listadas uma série de
vantagens e desvantagens em relação ao valor justo.
As principais vantagens são: 1) os investidores estão
preocupados com valores e não com custos; 2) com
o passar do tempo, os preços a custo histórico se
tornam irrelevantes para avaliar a posição financei-
ra da empresa; 3) o valor justo reflete a substância
econômica verdadeira; 4) a contabilidade a valor jus-
to retrata o lucro econômico; 5) o valor justo é uma
mensuração baseada no mercado que não é afetada
por fatores específicos da entidade. Já as principais
desvantagens são: 1) os perigos de se estimar o valor
justo marcando a modelo em vez de marcado a mer-
cado; 2) preocupações a respeito da introdução do
excesso da volatilidade nos ganhos e; 3) efeitos de
feedback que podem causar danos aos negócios e
certamente aumentar os riscos sistemáticos.
Cairns et al. (2009) analisam o uso do
valor justo em empresas listadas no Reino Unido
e na Austrália por volta da data da adoção das
IFRS em 2005. Foi testada se a comparabilidade
na escolha de políticas dentro e entre países
mudou em relação às mensurações obrigatórias e
opcionais de valor justo após a adoção das IFRS.
Os resultados mostraram que em relação às normas
que requeriam o uso da mensuração a valor justo,
a comparabilidade aumentou, principalmente para
instrumentos financeiros. Porém para as normas
que davam a opção da utilização a valor justo a
comparabilidade se reduziu.
Ronen (2008) questiona o papel informa-
cional do valor justo e a contribuição dessas infor-
mações para a avaliação da eficácia e eficiência da
gerência para aumentar o valor dos acionistas. O
autor afirma que as informações obtidas no nível
1 da hierarquia do valor justo podem ser objetiva-
mente determinadas e dessa forma serem confiá-
veis. Já as informações obtidas no nível 2 e 3 da
hierarquia suscitam preocupações. Apesar de ques-
tionar a relevância das mensurações a valor justo
obtidas sob o SFAS 157, pois acredita que os valores
de saída não refletem o valor de uso do ativo, Ronen
(2008) afirma que o valor de saída é parcialmente
relevante. Isso porque quantifica o custo de opor-
tunidade de se manter determinado item engajado
em operações específicas do plano de negócios da
131R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 126-143, jan./jun. 2011
entidade e também fornece informações que con-
tribuem para a avaliação do risco em que a empresa
está exposta.
Já o estudo de Bhamornsiri, Guinn e Schroe-
der (2010) examina e avalia as informações eviden-
ciadas sob o SFAS 157 nas notas explicativas dos
relatórios trimestrais de empresas listadas no For-
tune 500, em 31 de março de 2008. Os autores en-
contraram que a maioria dos dados utilizados para
a mensuração a valor justo eram observáveis e men-
surados pelo nível 1 ou nível 2 da hierarquia apresen-
tada no SFAS 157. Todavia, a pesquisa mostrou uma
incompatibilidade com a extensão da mensuração
de ativos e passivos, sendo que as dos ativos eram
significativamente maiores. Essa pesquisa mostra-se
relevante no sentido que analisa as evidenciações
das mensurações a valor justo em todos os níveis da
hierarquia do SFAS 157, e deste modo tornam mais
transparentes as informações obtidas no nível 2 e
3, que de acordo com Ronen (2008), são objetos
de preocupações devido ao questionamento de sua
confiabilidade.
Nota-se que é extenso o debate sobre os prós
e contras da contabilidade a valor justo e que essa
discussão tem aumentado após a crise financeira de
2008. Todavia, de acordo com Laux e Leuz (2009),
a contabilidade a valor justo não é responsável pela
crise e também não é meramente um sistema de
mensuração que relata os valores dos ativos sem
ter os seus próprios efeitos econômicos. De acordo
com os autores, esse debate representa um dos
maiores desafios para a evolução da mensuração
a valor justo e para a ampliação por parte dos
normatizadores dessa contabilidade para as outras
áreas.
Laux e Leuz (2009) concluem seu estudo
apontando quatro importantes questões a respei-
to desses debates: 1) muito da controvérsia resulta
da confusão sobre o que é diferente ou novo sobre
a contabilidade a valor justo, bem como as visões
distintas sobre os seus propósitos; 2) enquanto há
interesses legítimos sobre a marcação ao mercado
(ou valor justo puro) em tempos de crise financei-
ra, é menos claro que esses problemas aplicam-
-se a contabilidade a valor justo como estipulado
pelas normas contábeis, tanto pelo IFRS, quanto
pelo USGAAP; 3) a contabilidade do custo histó-
rico é improvável de ser a solução, pois sobre ela
há inúmeras preocupações, bem como problemas
que podem ser maiores do que aqueles referentes
à contabilidade a valor justo; 4) poderia haver pro-
blemas de implementação na prática. Outro fator
destacado por Laux e Leuz (2009) diz respeito às
regras contábeis interagirem com outros elementos
da estrutura institucional, que podem dar origem a
consequências não pretendidas.
Apesar da discussão e questionamentos quan-
to à contabilidade a valor justo, tanto o FASB em seu
SFAS 157 (2006) quanto o IASB em seu Exposure
Draft – Fair Value Measurement (2009) defendem que
com uma definição única de valor justo, em conjunto
com a estruturação para a sua mensuração, a consis-
tência e a comparabilidade irão aumentar. Também é
esperado pelos Conselhos que as evidenciações pro-
postas sobre mensurações a valor justo irão contribuir
para a melhoria da qualidade das informações forne-
cidas para os usuários das demonstrações contábeis.
Torna-se, então, interessante estudar as evidenciações
feitas por parte das empresas sobre valor justo sob a
norma que requer essas divulgações.
Assim, esse trabalho enfoca o SFAS 157 ao in-
vés das normas internacionais do IASB, por serem
as diretrizes mais completas sobre as mensurações
a valor justo na elaboração das demonstrações con-
tábeis. Além de que, em razão do acordo Norwalk
Agreement firmado entre o IASB e o FASB, e fren-
te ao esforço contínuo para a convergência de suas
normas, o IASB emitiu um Discussion Paper baseado
no SFAS 157 (2006) em Novembro de 2006. O Ex-
posure Draft proveniente desse Discussion Paper foi
emitido em maio de 2009.
132
2.2 SFAS 157
O FASB emitiu o SFAS 157 (2006) devido
ao fato de que existiam diversas definições de va-
lor justo nos diferentes pronunciamentos, e poucas
orientações para as mensurações a valor justo. Por-
tanto, essa norma tem como objetivo: definir valor
justo, estabelecer uma estrutura para a mensuração
a valor justo e expandir as evidenciações relativas a
essas mensurações. Deste modo, busca aumentar a
consistência e a comparabilidade na contabilização
a valor justo.
No Brasil, Lustosa (2010) confrontou as ca-
racterísticas do SFAS 157 a conceitos clássicos de
capital e renda, chegando a conclusão de que a
terminologia “valor justo” presente na norma não é
correta, tendo em vista a definição e os conceitos
de mensuração do SFAS 157 serem, segundo Lus-
tosa (2010), incorretos.
De acordo com o SFAS 157 (2006, p. 2),
“valor justo é o preço que devia ser recebido na
venda de um ativo ou pago na transferência de
um passivo em uma transação ordenada entre
participantes de mercado na data da mensuração.”.
O FASB destaca que essa transação, a venda de
um ativo ou transferência de um passivo, é uma
transação hipotética na data da mensuração, vista
sob a perspectiva do participante do mercado. O
Conselho ainda destaca três conceitos relacionados
a essa definição de valor justo: transação ordenada,
participantes de mercado e mercado principal (e na
falta deste o mais vantajoso).
De acordo com o SFAS 157 (2006), as defini-
ções desses conceitos são: a) transação ordenada é
uma transação que foi exposta ao mercado anterior-
mente à data de mensuração, para que dessa for-
ma sofresse influência de atividades de marketing,
que usualmente envolvem tais ativos e passivos; não
sendo, portanto, uma transação forçada; b) mercado
principal é o mercado em que o ativo seria vendido
e o passivo transferido pela entidade com o maior
volume e nível de atividade para esses ativos e pas-
sivos, e o mercado mais vantajoso é o mercado em
que maximizaria o valor a ser recebido pela venda do
ativo e minimizaria o valor a ser pago pelo passivo; c)
participantes do mercado são compradores e ven-
dedores independentes da entidade, que possuem
um conhecimento razoável sobre esses ativos e pas-
sivos e suas transações e que são hábeis e dispostos
a negociar.
Como um dos objetivos do SFAS 157 (2006)
é justamente aumentar a consistência e compara-
bilidade das mensurações a valor justo, essa norma
apresenta uma hierarquia de mensuração que prio-
riza os inputs utilizados para a mensuração do valor
justo. São considerados três níveis na hierarquia do
valor justo em que é dada uma maior prioridade aos
inputs observáveis, que seriam os preços cotados
no mercado (sem ajuste) em mercados ativos para
ativos e passivos idênticos (nível 1); a menor prio-
ridade é dada aos inputs não observáveis, que re-
fletem as premissas da entidade sobre quais são
as premissas que os participantes de mercado uti-
lizariam para determinar o preço desses ativos e
passivos (nível 3); e em um nível intermediário se
encontram os inputs que não são aqueles do nível
1, e que são observáveis para os ativos e passivos
tanto diretamente como indiretamente, podendo
ter ajustes (nível 2).
O SFAS 157 também busca expandir a evi-
denciação das mensurações dos ativos e passivos a
valor justo, tanto em períodos intermediários quan-
to em períodos anuais subsequentes ao reconheci-
mento inicial. Bem como é descrito na norma (SFAS
157, 2006), o enfoque dado nas evidenciações é nos
inputs utilizados para a mensuração do valor justo,
e as mensurações a valor justo recorrentes que uti-
lizam inputs não observáveis (nível 3). Portanto, o
FASB lista os seguintes requisitos para a evidencia-
ção:
– As mensurações a valor justo na data do
relatório das demonstrações contábeis;
– O nível dentro da hierarquia do valor jus-
to no qual se encontram as mensurações
a valor justo em sua totalidade;
– Para as mensurações classificadas no
nível 3, a reconciliação do saldo inicial
e final, separadamente apresentando as
mudanças ocorridas no período atribuí-
vel aos seguintes fatores: total de ganhos
ou perdas do período (realizados e não
133R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 126-143, jan./jun. 2011
realizados), separando esses ganhos e
perdas incluídas nos lucros (ou mudan-
ças nos ativos líquidos), e uma descri-
ção da onde esses ganhos e perdas que
são incluídos nos lucros (ou mudanças
no ativo líquido) são registrados na de-
monstração de resultados (ou ativida-
des);
– O montante do total de ganhos e
perdas do período citados no parágrafo
anterior que são incluídos nos lucros (ou
mudanças nos ativos líquidos), que são
atribuíveis a mudanças dos ganhos e
perdas não realizados relacionados aos
ativos e passivos ainda mantidos na data
do relatório das demonstrações contábeis
e uma descrição de onde esses ganhos e
perdas não realizados são registrados na
demonstração de resultados (ou ativida-
des);
– Em períodos anuais, as técnicas de ava-
liação utilizadas para mensurar o valor
justo e uma discussão sobre as mudan-
ças nas técnicas de avaliação durante o
período, se ocorrer.
O FASB ainda enfatiza que as evidenciações
quantitativas requeridas pelo SFAS 157 devem
ser apresentadas em um formato tabular. O
Conselho sugere, adicionalmente, que o valor justo
evidenciado por essa norma poderia ser combinado
com as informações de valor justo evidenciadas sob
outras normas (SFAS 157, 2006).
3 Procedimentos Metodológicos
O estudo analisa as empresas brasileiras lis-
tadas na Bolsa de Valores de Nova Iorque (NYSE)
que apresentaram as demonstrações contábeis
anuais de acordo com o formato 20-F no ano de
2008. Para elaborar a listagem das empresas, foi
acessado o site da NYSE. Em seguida foi realizada
uma pesquisa por região, ferramenta disponibiliza-
da pela Bolsa, com base nas palavras-chave: “Amé-
rica Latina” e “Brasil”. A lista continha um total de 27
empresas. Todavia, deste total foram utilizadas para
a análise 25 empresas, pois duas não possuíam as
demonstrações para 2008. Para cada empresa fo-
ram coletadas as demonstrações contábeis consoli-
dadas no formato 20-F referentes a 31 de dezembro
de 2008. Optou-se por esse ano de análise tendo
em vista que o SFAS 157 passou a ser efetivo para
as demonstrações contábeis anuais emitidas a par-
tir do ano fiscal após 15 de novembro de 2007.
Com base na lista das 25 empresas utilizadas,
primeiramente foi realizada uma classificação entre
as companhias que adotavam as IFRS, os princípios
e práticas contábeis geralmente aceitos no Brasil (BR
GAAP) ou nos Estados Unidos (US GAAP). Ressalta-
se que foram analisadas somente as notas explicativas
das empresas que adotavam os BR GAAP ou US GAAP.
Todavia, uma empresa que adotava os BR GAAP foi
excluída da análise, pois fazia a reconciliação apenas
com as IFRS, não permitindo analisar as evidenciações
sob o SFAS 157. As empresas que adotavam as
IFRS não foram analisadas, pois não requerem as
evidenciações de valor justo do SFAS 157. Entretanto,
o estudo de empresas que adotam os BR GAAP torna-
se oportuna devido ao fato de que essas devem fazer
a conciliação com os US GAAP e, portanto, devem
evidenciar os requerimentos referentes à mensuração
do valor justo presentes no SFAS 157. De tal modo, o
grupo de estudo totalizou 21 empresas.
Após essa etapa, foi executada uma análise
do conteúdo das notas explicativas para se verificar
em qual proporção as empresas são afetadas pelo
SFAS 157, quais as atividades mais tocadas por essa
norma, quais as principais categorias de ativos e
passivos financeiros evidenciadas, qual a extensão
dessa evidenciação, qual o nível de mensuração em
cada nível da hierarquia de mensuração e quais os
efeitos no resultado da adoção do SFAS 157.
O estudo analisa as empresas brasileiras
listadas na Bolsa de Valores de Nova Iorque (NYSE) que apresentaram as
demonstrações contábeis anuais de acordo com o
formato 20-F.
134
4 Análise dos Resultados
4.1 Companhias Afetadas pela Adoção do SFAS 157
As vinte e cinco empresas brasileiras listadas
na NYSE que foram objeto inicial de análise para a
classificação de acordo com as normas utilizadas,
foram separadas entre empresas que adotavam
as IFRS (12%), os BR GAAP (56%) ou os US GAAP
(32%), conforme a Tabela 1, a saber:
Com base na Tabela 1 é possível observar
que todas as empresas que utilizavam os US GAAP
fornecem as evidenciações requeridas no SFAS 157.
Entre as empresas que não proveem essas eviden-
ciações, uma adota os BR GAAP e o restante são
empresas que adotam as IFRS. Essa empresa que
adota os BR GAAP, que é da área de transporte
aéreo, não menciona e nem adota o SFAS 157, pois
ao invés de fazer a reconciliação com os US GAAP
como as outras empresas BR GAAP, ela realiza a re-
conciliação com as IFRS.
4.2 Áreas de Atividades que são mais Afetadas pelo SFAS 157
O SFAS 157 tem impacto em diferentes seto-
res. De acordo com as 21 empresas que compõem
a amostra e que adotam o SFAS 157, as atividades
mais impactadas são: Telecomunicações (23,80%) e
Eletricidade (14,28%). O Transporte Aéreo foi a área
de atividade menos afetada, visto que suas empre-
sas adotam as IFRS e os BR GAAP com reconcilia-
ção com as IFRS, que não requerem o SFAS 157.
TABELA 1 - Empresas classificadas por atividade - 2011
Classificação por atividade
Normas utilizadas
Empresas com
disclosure do SFAS
157
Empresas sem
disclosure do SFAS
157
Total de empresas
Aeroespacial US GAAP 1 0 1
ÁguaBR GAAP
1 0 1
Aviação
IFRS 0 1 2
BR GAAP
0 1
Banco US GAAP 2 0 2
Cervejeira IFRS 0 1 1
Commodities químicas
BR GAAP
1 0 1
ConstruçãoBR GAAP
1 0 1
Distribuição de gás
BR GAAP
1 0 1
Eletricidade
US GAAP 1 0 3
BR GAAP
2 0
Ferro e açoUS GAAP 2 0 3
IFRS 0 1
Papel US GAAP 1 0 1
Petróleo e gás US GAAP 1 0 1
Produtos alimentícios
BR GAAP
1 0 1
Retalhistas de produtos alimentares e atacadistas
BR GAAP
1 0 1
TelecomunicaçõesBR GAAP
5 0 5
TOTAL 21 4 25
FONTE: Os autores
O SFAS 157 tem impacto em diferentes setores. De acordo com as 21
empresas que compõem a amostra e que adotam o SFAS 157, as ativida-des mais impactadas
são: Telecomunicações (23,80%) e Eletricidade
(14,28%).
135R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 126-143, jan./jun. 2011
4.3 Principais Categorias de Ativos e Passivos Financeiros Evidenciados sob o SFAS 157
O Quadro 1, a seguir, apresenta as principais
categorias de ativos e passivos financeiros mensu-
rados a valor justo evidenciados pelas empresas uti-
lizadas na amostra dessa pesquisa.
de caixa, títulos e valores mobiliários e derivativos.
Porém os tipos de ativos e passivos financeiros
mensurados a valor justo variam de acordo com a
empresa e sua área de atividade. Muitas das empre-
sas não detalham as categorias de ativos e passivos
financeiros e apenas dão o valor total de ativos e
passivos financeiros mensurados a valor justo. To-
davia, foi observado que há uma incompatibilidade
da proporção em que ativos e passivos financeiros
são evidenciados.
4.4 Extensão em que Ativos e Passivos Financeiros são Evidenciados a Valor Justo
A análise de conteúdo das notas explicativas
permitiu verificar que todas as empresas perten-
centes ao grupo avaliado evidenciaram pelo menos
em um nível da hierarquia proposta pelo SFAS 157.
Porém, para fins de comparação, uma das empresas
foi retirada do grupo devido ao fato de evidenciar
apenas um item não recorrente (goodwill em inves-
timentos) sendo que todas as outras empresas evi-
denciaram itens recorrentes, totalizando 20 empre-
sas nessa etapa, sendo que oito dessas empresas
adotam os US GAAP e 12 adotam os BR GAAP.
No Apêndice A há os resumos das evidencia-
ções de ativos e passivos financeiros que adotam os
US GAAP. Já no apêndice B encontram-se os resu-
mos dos ativos e passivos financeiros que adotam
os BR GAAP.
Na Tabela 3 do Apêndice A, pode-se observar
que a média do total de ativos financeiros que são
mensurados a valor justo em relação aos ativos
totais das empresas que adotam os US GAAP é
de 21,97%. Pode-se notar também que a área de
atividade que mais evidencia ativos financeiros
a valor justo em relação ao total de ativos é a
bancária (instituição 1 com 31,01% e instituição 2
com 23,65%). Na Tabela 4 do Apêndice A, pode-se
observar que há uma discrepância da média dos
passivos financeiros que são mensurados a valor
Nota-se que as principais categorias de ati-
vos e passivos financeiros evidenciados pelo grupo
analisado são: equivalentes de caixa, investimentos
QUADRO 1 - Principais categorias de ativos e passivos finan-ceiros mensurados a valor justo - 2011
Empresas que adotam os US GAAP
Principais categorias de ativos financeiros
Principais categorias de passivos fin.
Certificados de depósito bancário
Contratos futuros de commodities
Contratos futuros de com-modities
Dívida a longo prazo
Fundo mútuo Dívida a curto prazo
Swap de moeda estrangeira Swap de moeda estrangeira
Swap de taxa de juros Swap de taxa de juros
Título financeiro do tesouro (LTF)
Títulos de dívida de governos estrangeiros
Títulos de dívida de soberania brasileira
Títulos do governo brasileiro
Empresas que adotam os BR GAAP
Principais categorias de ativos financeiros
Principais categorias de passivos fin.
Certificados de depósito bancário
Dívida a curto prazo
Contrato de swap com taxa de juros prefixada
Dívida a longo prazo
Contratos de swap de taxa de juros de câmbio
Empréstimos e financiamen-tos sob hedge de valor justo
Investimentos a curto prazo Swap de moeda estrangeira
Investimentos a longo prazo Swap de taxa de juros
Notas do tesouro brasileiro
Títulos de capitalização
Títulos e valores mobiliários
FONTE: Os autores
136
justo em relação aos passivos totais de empresas
que adotam os US GAAP (1,51%) e a média dos
ativos financeiros que são mensurados a valor
justo em relação aos ativos totais (21,97%). Apesar
da porcentagem do total de passivos financeiros
mensurados a valor justo em relação ao total de
passivos ser 81% na área de atividade de papel, o
seu montante (U$2.191 milhões) é menor do que o
total de ativos financeiros mensurados a valor justo
pela instituição 1 da atividade de bancos (U$134.987
milhões).
No Apêndice B, Tabela 5, é possível verificar
que a média dos ativos financeiros mensurados a
valor justo em relação à média de ativos totais de
empresas que adotam os BR GAAP é 12,54%. As ati-
vidades que possuem as maiores porcentagens do
total de ativos financeiros mensurados a valor justo
e o total de ativos são Telecomunicações (empresa
1 com 40,51% e empresa 4 com 20,77%) e Distribui-
ção de Gás (22,97%). Na tabela 6 do Apêndice B,
pode-se notar que a média dos passivos financei-
ros mensurados a valor justo em relação à média
de passivos totais de empresas que adotam os BR
GAAP é 16,99%. Dentre as atividades, as que mais
se destacam em relação à porcentagem do total de
passivos financeiros mensurados a valor justo em
relação ao total de passivos são as de Telecomuni-
cações (empresa 3 com 52,39% e empresa 4 com
31,36%) e Commodities Químicas (48,80%). As ati-
vidades relacionadas à Água e Distribuição de Gás
não evidenciaram nenhum passivo financeiro men-
surado a valor justo.
4.5 Proporção dos Ativos e Passivos Finan-ceiros de Acordo com os Três Níveis da Hierarquia da Mensuração a Valor Justo
Ainda de acordo com as Tabelas 3 e 4 do
Apêndice A e Tabelas 5 e 6 do Apêndice B, nota-
-se que entre as empresas que adotam os US GAAP
a maioria das mensurações dos ativos financeiros é
baseada no nível 1 (67,68%) e a maioria dos passivos
é mensurado com base no nível 2 (90,45%). De ma-
neira similar nas empresas que adotam os BR GAAP,
a maioria das mensurações dos ativos é baseada no
nível 1(50,55%) e a totalidade dos passivos é mensu-
rada com base no nível 2 (100%).
4.6 Efeitos da Adoção do SFAS 157 de Ganhos e Perdas no Resultado
O Quadro 2, a seguir, resume se houve ou não
impacto da evidenciação dos ganhos e perdas re-
sultantes da adoção do SFAS 157 em empresas que
adotam os US GAAP.
Em relação à evidenciação de efeitos de ga-
nhos e perdas no resultado das empresas brasileiras
listadas na NYSE que adotavam os US GAAP, não
houve impacto significativo. As empresas do grupo
analisado quase não possuíam mensurações base-
adas no nível 3. Entretanto, as que possuíam, apre-
sentaram os impactos de ganhos e perdas nas no-
tas explicativas conforme proposto pelo SFAS 157.
Das empresas brasileiras listadas na NYSE
que adotam os BR GAAP, apenas uma apresentou
mensuração baseada no nível 3 da hierarquia, con-
tudo não publicou a evidenciação a respeito do
impacto de ganhos e perdas provenientes desses
ativos nas notas explicativas.
QUADRO 2 - Evidenciação de ganhos e perdas no nível 3 de ativos e passivos financeiros de empresas que adotam US GAAP - 2011
AtividadeNão há
mensuração no nível 3
Ganhos e perdas no lucro líquido
Ganhos e perdas
em outros resultados e receitas
abrangentes
Ganhos e perdas em itens
ainda mantidos
Banco 1 X X X
Banco 2 X
Eletricidade X
Ferro e aço (n=2)
X
Aviação X
Papel X
Petróleo e gás
X
FONTE: Os autores
137R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 126-143, jan./jun. 2011
4.7 Principais Modelos de Mensuração a Valor Justo
A Tabela 2, abaixo, apresenta um resumo dos
principais modelos utilizados para a mensuração a
valor justo. Pode ser observado que o modelo mais
utilizado, tanto pelas empresas que adotam os US
GAAP (75%) quanto os BR GAAP (33,33%), é o flu-
xo de caixa descontado. Também é importante notar
que 4 (33,33%) do total de 12 empresas que adotam
os BR GAAP não especificam os métodos utilizados
para a mensuração do valor justo no item referente
ao disclosure sob o SFAS 157.
analisa o impacto da norma SFAS 157 nas empresas
brasileiras listadas na Bolsa de Valores de Nova York
– NYSE.
Entre as empresas listadas na NYSE foram
analisadas aquelas que adotam ou os BR GAAP (12
empresas que permitiam a comparação) ou os US
GAAP (8 empresas que possibilitavam a compara-
ção). A média do total de ativos financeiros que são
mensurados a valor justo em relação aos ativos to-
tais nas empresas que adotam os US GAAP é 21,97%
(Tabela 3 do Apêndice A) e a média dos passivos
financeiros em relação à média do total dos passi-
vos é 1,51% (Tabela 4 do Apêndice A). Todavia, nota-
-se uma incompatibilidade da proporção da média
de ativos e passivos financeiros mensurados a valor
justo. Pode-se observar também que a área de ati-
vidade que mais evidencia ativos financeiros a valor
justo em relação ao total de ativos para empresas
que adotam os US GAAP é a bancária (instituição
1 com 31,01% e instituição 2 com 23,65%). Um fator
que deve ser destacado é que apesar da porcenta-
gem do total de passivos financeiros mensurados a
valor justo em relação ao total de passivos ser de
(81%) na área de atividade de papel, o seu montante
(U$2.191 milhões) é consideravelmente menor que o
total de ativos financeiros mensurados a valor justo
pela instituição 1 da atividade de bancos (U$134.987
milhões).
TABELA 2 - Principais modelos utilizados para a mensuração do valor justo - 2011
Número de companhias
ModeloEmpresas
que utilizam US GAAP
Empresas que
utilizam BR GAAP
Fluxo de caixa descontado 6 5
Modelos de precificação geralmente utilizados em itens similares
2 0
Black-Scholes 2 1
Modelo de Monte Carlo 2 0
Modelos internos 1 1
Valor descontado do fluxo de caixa contratual
1 1
Garman & Kohlhagen 1 1
Serviços de precificação como Bloomerang, Reuters, Brokers
1 1
Não especificado 1 4
FONTE: Os autores
5 Considerações Finais
Diante da preocupação por parte do IASB e
do FASB em aumentar a consistência e a compara-
bilidade da mensuração a valor justo, bem como me-
lhorar a transparência das informações fornecidas,
torna-se viável analisar o nível de divulgação das in-
formações mensuradas a valor justo e verificar se as
empresas estão adotando e evidenciando conforme
as normas relacionadas ao assunto. O estudo, então,
A área de atividade que mais evidencia ativos
financeiros a valor justo em relação ao total de ativos para empresas
que adotam os US GAAP é a bancária (instituição
1 com 31,01% e instituição 2 com 23,65%).
138
Nas tabelas 5 e 6 do Apêndice B, pode-se
verificar que em média os ativos financeiros men-
surados a valor justo pelas empresas brasileiras que
adotam os BR GAAP representam 12,54% em rela-
ção à média dos ativos totais, sendo que a mesma
análise para os passivos financeiros mostra que a
média é 16,99%. Em relação às empresas que ado-
tam os BR GAAP a discrepância entre a extensão da
mensuração a valor justo de ativos e passivos finan-
ceiros não se destaca tanto quanto à verificada nas
empresas que adotam os US GAAP. As atividades
que possuem uma maior extensão de mensuração a
valor justo com a adoção do SFAS 157 (comparando
o total de ativos e passivos financeiros com o total
de ativos e passivos) foram as empresas de Tele-
comunicações (empresa 1 com 40,51%) e Distribui-
ção de Gás (22,7%) para ativos; e Telecomunicações
(empresa 3 com 52,39%) e Commodities Químicas
(48,80%) para passivos.
Em relação à evidenciação de efeitos de ga-
nhos e perdas no resultado das empresas brasileiras
listadas na NYSE que adotavam os US GAAP, não
houve impacto significativo.
Nota-se que a maior parte da mensuração a
valor justo é baseada nos níveis 1 e 2 da hierarquia
proposta pelo SFAS 157. Considerando que esses ní-
veis de mensuração utilizam dados observáveis e
também que a norma SFAS 157 requer a evidenciação
dos métodos utilizados para a mensuração a valor jus-
to, pode-se afirmar que a norma atende ao objetivo
de aumentar a transparência e comparabilidade das
informações fornecidas aos usuários, aumentando o
valor de relevância dessas informações.
Futuras pesquisas podem enfocar as eviden-
ciações sobre valor justo das empresas que ado-
tam as IFRS após a efetiva convergência da norma
proposta do IASB com a norma SFAS 157 do FASB
proveniente do Exposure Draft emitido em maio de
2009 e, também do Exposure Draft que o IASB es-
pera publicar no segundo trimestre de 2010 sobre a
mensuração proposta da análise incerta das men-
surações de valor justo do nível 3. Estudos com-
parativos sobre o nível de evidenciação do valor
justo entre as empresas que adotam os BR GAAP
e empresas que adotam as IFRS serão oportunos
após o ano de 2010, com o requerimento de que as
empresas brasileiras listadas publicamente deverão
cumprir as normas internacionais, para medir a efe-
tividade da convergência.
• Recebido em: 01/03/2011• Aprovado em: 25/05/2011
139R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 126-143, jan./jun. 2011
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BRASIL. LEI N.º 11.638 de 28 de dezembro de 2007. Altera e revoga dispositivos da Lei no 6.404, de 15 de dezembro
de 1976, e da Lei no 6.385, de 7 de dezembro de 1976, e estende às sociedades de grande porte disposições relativas à
elaboração e divulgação de demonstrações financeiras. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 28
de dez. 2007. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/l11638.htm>. Acesso em 12 jan.
2011.
BRASIL. LEI N.º 11.941 de 27 de maio de 2009. Altera a legislação tributária federal relativa ao parcelamento ordinário de
débitos tributários; concede remissão nos casos em que especifica; institui regime tributário de transição, Diário Oficial
[da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 28 de maio 2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_
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WEFFORT, E. F. J. O Brasil e a harmonização contábil internacional. São Paulo: Atlas, 2005.
140
Apêndice A
TABELA 3 - Resumo das evidenciações de ativo financeiro de empresas que adotam US GAAP (U$ milhões) - 2011
Área de Atividade Nível 1 Nível 2 Nível 3Total Passivos
FinanceirosTotal Passivos
Aviação 633,20 122,30 109,70 865,20 8.643,90
% total de ativos fin. 73,18% 14,14% 12,68% 100,00%
% do total de ativos 7,32% 1,41% 1,27% 10,00% 100,00%
Banco (n=2)
Instituição 1 119.730 4.173 11.084 134.987 435.290
% total de ativos fin. 88,70% 3,09% 8,21% 100,00%
% do total de ativos 27,50% 0,96% 2,55% 31,01% 100,00%
Instituição 2 38.266 47.042 9.620 94.928 401.375
% total de ativos fin. 40,31% 49,56% 10,13% 100,00%
% do total de ativos 9,53% 11,72% 2,40% 23,65% 100,00%
Eletricidade 40 1.758 0 1.798 24.781
% total de ativos fin. 2,22% 97,78% 0% 100,00%
% do total de ativos 0,16% 7,09% 0% 7,25% 100,00%
Ferro e aço (n=2)
Empresa 1 2.408 0 0 2.408 79.931
% total de ativos fin. 100,00% 0,00% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 3,01% 0,00% 0,00% 3,01% 100,00%
Empresa 2 0 3.571 0 3.571 15.709
% total de ativos fin. 0,00% 100,00% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 0,00% 22,73% 0,00% 22,73% 100,00%
Papel 217 362 0 579 5.230
% total de ativos fin. 37,48% 62,52% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 4,15% 6,92% 0,00% 11,07% 100,00%
Petróleo e Gás 1.810 47 0 1.857 125.695
% total de ativos fin. 97,47% 2,53% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 1,44% 0,03% 0,00% 1,47% 100%
Todas as companhias (n=8)
Média 20.388,02 7.134,41 2.601,713 30.124,14 137.081,86
% total de ativos fin. 67,68% 23,68% 8,64% 100,00%
% do total de ativos 14,87% 5,20% 1,90% 21,97% 100,00%
FONTE: Os autores
141R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 126-143, jan./jun. 2011
TABELA 4 - Resumo das evidenciações de passivos financeiro de empresas que adotam US GAAP (U$ milhões) - 2011
Área de Atividade Nível 1 Nível 2 Nível 3Total Passivos
FinanceirosTotal Passivos
Aviação 0 166,5 0 166,5 6.364,6
% total de ativos fin. 0,00% 100,00% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 0,00% 2,62% 0,00% 2,62% 100,00%
Banco (n=2)
Instituição 1 0 1.999 42 2.041 398.028
% total de ativos fin. 0,00% 97,94% 2,06% 100,00%
% do total de ativos 0,00% 0,50% 0,01% 0,51% 100,00%
Instituição 2 0 6.759 1.248 8.007 365.743
% total de ativos fin. 0,00% 84,41% 15,59% 100,00%
% do total de ativos 0,00% 1,85% 0,34% 2,19% 100,00%
Eletricidade 0 94 0 94 15.448
% total de ativos fin. 0,00% 100,00% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 0,00% 0,61% 0,00% 0,61% 100,00%
Ferro e aço (n=2)
Empresa 1 0 380 0 380 34.884
% total de ativos fin. 0,00% 100,00% 0% 100,00%
% do total de ativos 0,00% 1,09% 0,00% 1,09% 100,00%
Empresa 2 0 686 0 686 12,393
% total de ativos fin. 0,00% 100% 0,00% 100%
% do total de ativos 0,00% 5,53% 0,00% 5,53% 100,00%
Papel 0 2.191 0 2.191 2.705
% total de ativos fin. 0,00% 100,00% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 0,00% 81% 0,00% 81% 100,00%
Petróleo e Gás 7 2 0 9 63.127
% total de ativos fin. 77,78% 22,22% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 0,01% 0,00% 0,00% 0,01% 100,00%
Todas as companhias (n=8)
Média 0,875 1.534,687 161,25 1.696,812 112.336,575
% total de ativos fin. 0,05% 90,45% 9,50% 100,00%
% do total de ativos 0,00% 1,36% 0,15% 1,51% 100,00%
FONTE: Os autores
142
Apêndice B
TABELA 5 - Resumo da evidenciação dos Ativos Financeiros (R$ Milhões)
Atividade N1 N2 N3 Total Ativos Fin. Total Ativos
Água 0 544.066 0 544.066 20.113.911
% do total ativos fin. 0,00% 100,00% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 0,00% 2,70% 0,00% 2,70% 100,00%
Commodities Químicas 778.3 2.150,8 0 2.929,1 22.701,9
% do total ativos fin. 26.57% 73,43% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 3,43% 9,47% 0,00% 12,90% 100,00%
Construção 0 541.788 0 541.788 5.538.858
% do total ativos fin. 0,00% 100,00% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 0,00% 9,78% 0,00% 9,78% 100,00%
Distribuição de gás 1.397,5 736,2 0 2.133,7 9.667,2
% do total ativos fin. 65,50% 34,50% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 14,46% 7,61% 0,00% 22,07% 100,00%
Eletricidade 624.588 433.395 0 1.057.983 16.243.172
% do total ativos fin. 59,04% 40,96% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 3,84% 2,67% 0,00% 6,51% 100,00%
Produtos alimentícios 82,3 654,5 0,3 737,1 11.219,5
% do total ativos fin. 11,16% 88,80% 0,04% 100,00%
% do total de ativos 0,73% 5,83% 0,00% 6,56% 100,00%
Retalhistas de produtos alimentares e atacadistas
0 1.361.702 0 1.361.702 13.546.193
% do total ativos fin. 0,00% 100% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 0,00% 10,05% 0,00% 10,05% 100,00%
Telecomunicações (n=5)
Empresa 1 13.883 3.025 0 16.908 41.734
% do total ativos fin. 82,11% 17,89% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 33,26% 7,25% 0,00% 40,51% 100,00%
Empresa 2 1.974.391 2.035.430 0 4.009.821 19.992.009
% do total ativos fin. 49,24% 50,76% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 9,87% 10,18% 0,00% 20,05% 100,00%
Empresa 3 1.554.591 387.573 0 1.942.164 14.563.986
% do total ativos fin. 80,04% 19,96% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 10,67% 2,66% 0,00% 13,33% 100,00%
Empresa 4 2.126.875 2.815.033 0 4.941.908 23.785.104
% do total ativos fin. 43,04% 56,96% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 8,94% 11,83% 0,00% 20,77% 100,00%
Empresa 5 2.040.425 29.179 0 2.069.604 17.670.188
% do total ativos fin. 98,59% 1,41% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 11,55% 0,16% 0,00% 11,71% 100,00%
Todas as companhias (n=12)
Média 694.750,925 679.561,041 0.025 1.374.311,991 10.961.561,97
% do total ativos fin. 50,55% 49,45% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 6,34% 6,20% 0,00% 12,54% 100,00%
FONTE: Os autores
143R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 126-143, jan./jun. 2011
TABELA 6 - Resumo da evidenciação dos Passivos Financeiros (r$ milhões) - 2011
Atividade N1 N2 N3 Total Ativos Fin. Total Ativos
Água 0 0 0 0 10.565.996
% do total ativos fin. 0% 0% 0% 0%
% do total de ativos 0% 0,00% 0% 0,00% 100,00%
Commodities Químicas 0 9.283,7 0 9.283,7 19.022,1
% do total ativos fin. 0% 100,00% 0% 100,00%
% do total de ativos 0,00% 48,80% 0% 48,80% 100,00%
Construção 0 313.557 0 313.557 3.455.037
% do total ativos fin. 0% 100,00% 0% 100,00%
% do total de ativos 0% 9,07% 0% 9,07% 100,00%
Distribuição de gás 0 0 0 0 4.978,9
% do total ativos fin. 0% 0% 0% 0%
% do total de ativos 0% 0% 0% 0% 100,00%
Eletricidade 0 1.626.828 0 1.626.828 11.136.221
% do total ativos fin. 0% 100,00% 0%
% do total de ativos 0% 14,61% 0% 14,61% 100,00%
Produtos alimentícios 0 67,5 0 67,5 7.108,9
% do total ativos fin. 0% 100,00% 0,00% 100,00%
% do total de ativos 0% 0,95% 0% 0,95% 100,00%
Retalhistas de produtos alimentares e atacadistas
0 89.804 0 89.804 8.034.202
% do total ativos fin. 0% 100,00% 0% 100,00%
% do total de ativos 0% 1,12% 0% 1,12% 100,00%
Telecomunicações (n=5)
Empresa 1 0 3.525 0 3.525 30.323
% do total ativos fin. 0% 100,00% 0% 100,00%
% do total de ativos 0% 11,62% 0% 11,62% 100,00%
Empresa 2 0 2.452.651 0 2.452.651 9.946.317
% do total ativos fin. 0% 100,00% 0% 100,00%
% do total de ativos 0% 24,66% 0% 24,66% 100,00%
Empresa 3 0 3.558.570 0 3.558.570 6.792.181
% do total ativos fin. 0% 100,00% 0% 100,00%
% do total de ativos 0% 52,39% 0% 52,39% 100,00%
Empresa 4 0 4.682.786 0 4.682.786 14.929.773
% do total ativos fin. 0% 100,00% 0% 100,00%
% do total de ativos 0% 31,36% 0% 31,36% 100,00%
Empresa 5 0 222.073 0 222.073 11.434.892
% do total ativos fin. 0% 100,00% 0% 100,00%
% do total de ativos 0% 1,94% 0% 1,94% 100,00%
Todas as companhias (n=12)
média 0 1.079.928,767 0 1.079.928,767 6.354.670,992
% do total ativos fin. 0,00% 100,00% 0% 100,00%
% do total de ativos 0,00% 16,99% 0% 16,99% 100,00%
Legenda: N1: Nível 1; N2: Nível 2; N3: Nível 3.FONTE: Os autores
O Consumidor Pune o Comportamento Socialmente Irresponsável das Empresas?Does the consumer punish the socially
irresponsible behavior of Companies?
145R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 144-161, jan./jun. 2011
O Consumidor Pune o Comportamento Socialmente Irresponsável das Empresas?Does the consumer punish the socially irresponsible behavior of Companies?
1 Doutora em Administração pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. E-mail: [email protected]
2 Doutoranda em Administração da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Professora da Universidade Federal de São João Del Rei. E-mail: [email protected]
Marie Agnes Chauvel 1
Renata Céli Moreira da Silva 2
ResumoMundialmente há uma pressão para que as organizações tenham práticas socialmente
responsáveis. Embora alguns estudos tenham sido feitos sobre o comportamento
dos consumidores frente à Responsabilidade Social Corporativa (RSC), ainda há
divergências nos resultados encontrados. Dois pontos nesses estudos chamam
atenção: a atitude positiva dos pesquisados em relação à RSC e o fato de que esta
não resulta num comportamento de compra que favoreça as empresas socialmente
responsáveis. O presente artigo buscou contribuir para um melhor conhecimento
desse tema, investigando as atitudes e intenções de compra em relação a empresas
que têm práticas socialmente irresponsáveis. Para isso, foi realizada uma pesquisa
junto a estudantes de graduação e pós-graduação em administração. O instrumento
de coleta de dados foi um questionário compreendendo perguntas fechadas e abertas,
construído com base no material estudado para a revisão de literatura. Os resultados
encontrados confirmaram alguns achados de estudos anteriores, mostrando que os
consumidores gostariam de deixar de comprar produtos de empresas socialmente
irresponsáveis, mas de forma geral, na prática, acabam comprando.
Palavras-chave: Irresponsabilidade Social, Consumidor
AbstractWorldwide, organizations are pressured to undertake socially responsible practices.
Although some research has been developed concerning consumer behavior in re-
lation to Corporative Social Responsibility (CSR), the results are still divergent. Two
aspects of those researches have come up: the interviewee’s positive attitude towards
CSR, and the fact that such attitude does not result in a consumer behavior that en-
dorses socially responsible companies. The present article seeks to contribute to a
better understanding of this theme by investigating consumer attitudes and inten-
tions in relation to socially irresponsible companies. To this end, a survey was made
with business undergrad and grad students. The instrument used was a questionnaire
formed by open and closed questions based on the material studied in the works that
compose our bibliography. The results reaffirmed some previous studies, showing that,
although consumers prefer to stop buying products from socially irresponsible com-
panies, they generally do otherwise.
Keywords: Social Irresponsibility, Consumer.
146
O tema Responsabilidade Social Corporati-
va (RSC) tem sido alvo de muitos debates tanto no
meio empresarial quanto no meio acadêmico. Esse
assunto tem estado na pauta de diversos meios de
comunicação, como revistas, jornais, artigos e semi-
nários. Além disso, segundo Silva e Chauvel (2010),
os estudantes de administração, por exemplo, tam-
bém estão demandando das faculdades o debate
deste tema em sala de aula.
Hoje, pode-se dizer que há uma pressão cres-
cente, em âmbito mundial, para que as empresas
sejam socialmente responsáveis, ou seja, para que
elas pratiquem a Responsabilidade Social (KLEIN,
2004; CHEAH; CHAN; CHIENG, 2007). Essa pressão
pode vir de diversas partes: empregados, fornece-
dores, grupos da comunidade, organizações não-
-governamentais e governos (McWILLIAMS; SIE-
GEL; WRIGHT, 2006). Segundo Melo Neto e Froes
(2001), a globalização também acabou reforçando
essa pressão, pois trouxe uma grande concentração
do poder econômico e uma grande exclusão social.
Kotler e Armstrong (1998) sublinham que
os consumidores representam outro público que
exerce influência nesse sentido, pois eles estão mais
atentos às práticas sociais das empresas. Muitos
consumidores passam a dar preferência a produtos
de empresas socialmente corretas (LAROCHE;
BERGERON; BARBARO-FORLEO 2001), apesar de
esse critério ainda não estar na cabeça de todos no
momento de realizar uma compra (BOULSTRIDGE;
CARRIGAN, 2000). Além disso, as pessoas hoje
possuem mais informação (FUENTES-GARCÍA et
al., 2008), o que facilita saber sobre a prática de
Responsabilidade Social das empresas.
Portanto, nos dias de hoje, não é só o lucro
que é importante para a organização. É fundamen-
tal que ela pratique os princípios da Responsabili-
dade Social (MILES; WHITE, 1998). Dessa forma,
muitas empresas estão se tornando socialmente
responsáveis (BARBOSA, 2007; BIES et al., 2007) e
elas buscam comunicar aos seus stakeholders suas
ações sociais, para conquistar uma boa imagem na
sociedade.
Diversos estudos têm sido feitos sobre o tema.
Há estudos que abordam a Responsabilidade Social
na ótica do consumidor, ou seja, estudos que inves-
tigam a percepção dos consumidores no que tan-
ge ao comportamento socialmente responsável das
empresas, se eles valorizam isso na compra e se são
influenciados por isso no que diz respeito à intenção
de compra de um produto (SEN; BHATTACHARYA,
2001). Essa abordagem da Responsabilidade Social
na ótica do consumidor é relevante, pois é importante
saber se e como o comportamento socialmente res-
ponsável das organizações pode influenciar a inten-
ção de compra.
Além disso, é interessante pesquisar se o
consumidor é capaz de “punir” as empresas social-
mente irresponsáveis, isto é, se está disposto a dei-
xar de comprar algum produto ou serviço de uma
organização que se envolveu com algum escândalo
corporativo, sofreu denúncias de práticas ilegais
contra o meio ambiente ou praticou algum outro
ato socialmente irresponsável (D’ANGELO, 2003).
O objetivo deste artigo é o de contribuir para
a exploração dessa vertente de pesquisa, investi-
gando as atitudes dos consumidores em relação à
irresponsabilidade social das empresas e verifican-
do se as práticas socialmente irresponsáveis das
empresas influenciam o comportamento de compra
dos consumidores.
O presente artigo está organizado da seguin-
te forma: neste item é apresentada a introdução ao
assunto. Em seguida, é realizada uma revisão da li-
Introdução
Não é só o lucro que é importante para a organi-zação. É fundamental que ela pratique os princípios
da Responsabilidade Social.
147R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 144-161, jan./jun. 2011
teratura que aborda o conceito de RSC e os resul-
tados obtidos em estudos existentes sobre a Res-
ponsabilidade Social e o consumidor. Em seguida,
é descrito o método da pesquisa e são mostrados
os resultados e sua análise. Por fim, são feitas algu-
mas considerações finais e sugestões para futuras
pesquisas.
2 Revisão da Literatura
2.1 A Responsabilidade Social Corporativa (RSC)
De acordo com Carroll (1999), a discussão
sobre RSC foi iniciada com Howard R. Bowen,
quando este publicou um livro sobre os negócios
e a responsabilidade social. A definição usada para
o termo foi “obrigação dos homens de negócios
de adotar diretrizes, decisões e linhas de ações
desejáveis no âmbito dos objetivos e valores de
nossa sociedade” (CARROLL, 1999, p. 269). Essa
publicação ocorreu em 1953. Portanto, a partir da
década de 1950, a questão da RSC passou a ser
discutida e ganhar importância nos negócios.
Posteriormente, nas décadas de 1960 e 1970,
essa discussão foi disseminada por diversos países.
Começaram a ser discutidos também os problemas
de proteção ambiental, os direitos das mulheres e os
problemas que o capitalismo gerava, pois não era ca-
paz de atender às necessidades dos indivíduos de
forma equilibrada, gerando desigualdades sociais
(SCHOMMER; ROCHA, 2007).
Segundo Schommer e Rocha (2007), foi a
partir da década de 1980 que o debate a respeito da
RSC ganhou novos destaques, por causa de fatores
como: avanço da globalização, privatização de em-
presas estatais, flexibilização da produção. Com es-
ses acontecimentos, os debates começaram a abor-
dar e discutir o papel de cada ator para o equilíbrio
entre dimensões econômicas, sociais e ambientais.
Faria e Sauerbronn (2008) apontam também, en-
tre os fatores que estimularam as discussões sobre
RSC, a globalização acelerada, o crescente poder
político e econômico das grandes empresas e os
grandes escândalos corporativos. Na mesma dire-
ção, Melo Neto e Froes (2001) sugerem que uma
das origens dessas discussões foi a globalização, já
que esta trouxe concentração de poder econômico
nas multinacionais e exclusão social. Por isso, se-
gundo eles, passou-se a cobrar das empresas uma
postura socialmente responsável.
De acordo com Drucker (1995), essas discus-
sões vieram à tona devido à ineficiência do gover-
no em cumprir seu papel. Vários autores sublinham,
porém, que, ainda assim, o papel do estado conti-
nua importantíssimo. Mesmo assumindo atribuições
sociais, as empresas não o substituem (SANTOS,
2008).
Existem inúmeras definições sobre o que é
RSC. Por isso, alguns autores afirmam que se trata
de um conceito ainda em construção (ASHLEY,
2002; HIGUCHI; VIEIRA, 2007).
Segundo Carroll (1991), a RSC pode ser de-
finida por meio do modelo da “pirâmide da RSC”.
Essa pirâmide é composta de quatro dimensões:
econômica, legal, ética e filantrópica. A dimensão
econômica – que é a base da pirâmide – refere-se
“A pirâmide da RSC” é composta de quatro dimensões:
econômica, legal, ética e filantrópica.
148
a ter um desempenho consistente, maximizando os
resultados. A dimensão legal diz respeito a levar em
consideração as leis e regulamentos. A dimensão
ética refere-se a estar de acordo com as expectati-
vas (morais e éticas) da sociedade. Adicionalmente,
a dimensão filantrópica está associada a contribuir
para melhorar o bem estar da sociedade.
Ferrell, Fraedrich, Ferrell (2001) também con-
sideram essas quatro dimensões como sendo as di-
mensões básicas da RSC. Esses autores sublinham,
além disso, que a RSC ocorre quando a empresa
busca maximizar os efeitos positivos e minimizar os
efeitos negativos gerados por ela para a sociedade.
Também para Mohr, Webb, Harris (2001), a RSC é
um comprometimento da empresa em reduzir ou
eliminar os impactos negativos e elevar os impac-
tos positivos, ou seja, aumentar os benefícios para a
sociedade a longo prazo. Os autores dão exemplos
de como as empresas podem atuar de forma so-
cialmente responsável: obedecendo a leis e normas
éticas, tratando bem seus funcionários, protegendo
o meio ambiente e contribuindo com ações de ca-
ridade.
Enderle e Tavis (1998) afirmaram que a RSC
possui dimensões econômica, social e ambiental.
Esses autores também consideram a relação das or-
ganizações com seus stakeholders, apontando que
a RSC está associada a um grupo de envolvidos que
não se restringe à empresa e aos seus clientes. Os
stakeholders podem ser: funcionários, comunidade,
consumidores, investidores, fornecedores, grupos
ambientais (MAIGNAN; FERREL; FERREL, 2005).
Maignan e Ferrell (2004) consideram que há
múltiplas abordagens de RSC, que são: obrigação
social, ética, obrigação em relação aos stakeholders
e o processo gerencial (diz respeito ao gerencia-
mento que é necessário para o negócio).
Segundo Ashley (2002, p. 6), a RSC é defini-
da como o:
compromisso que uma organização deve ter para com
a sociedade, expresso por meio de atos e atitudes que
a afetem positivamente, de modo amplo, ou a alguma
comunidade, de modo específico, agindo proativamente
e coerentemente no que tange a seu papel específico na
sociedade e a sua prestação de contas para com ela. A
organização, nesse sentido, assume obrigações de caráter
moral, além das estabelecidas em lei, mesmo que não
diretamente vinculadas a suas atividades, mas que possam
contribuir para o desenvolvimento sustentável dos povos.
Assim, numa visão expandida, responsabilidade social é
toda e qualquer ação que possa contribuir para a melhoria
da qualidade de vida da sociedade.
Dessa forma, ao mostrar que a RSC apresenta
algumas dimensões, o presente estudo se posiciona
de forma a considerar o conceito de Irresponsabilida-
de Social como o desrespeito por parte da empresa
de alguma das dimensões da RSC.
2.2 A Responsabilidade Social na Ótica do Consumidor
Existem estudos que buscam investigar a
reação dos consumidores em relação às empresas
socialmente responsáveis. A seguir, são brevemente
apresentados e discutidos os resultados de pesqui-
sas que relacionam o Comportamento do Consumi-
dor e a RSC.
Dentre os estudos internacionais, Carrigan e
Attalla (2001) fizeram um estudo utilizando a téc-
nica de grupo de foco. Seus resultados trazem evi-
dências de que a crescente sofisticação dos consu-
midores ainda não necessariamente se reflete num
comportamento de compra favorável às empresas
éticas e desfavorável às empresas antiéticas. Singh
et al. (2008), em seus estudos, também obtiveram
evidências de que o impacto da comunicação das
empresas em relação à RSC sobre a percepção dos
consumidores é fraco. Sen e Bhattacharya (2001)
verificaram que as iniciativas socialmente respon-
sáveis, sob certas condições, podem até diminuir a
intenção de comprar dos consumidores.
Lichtenstein, Drumwright, Braig (2004) iden-
tificaram que a RSC das empresas afeta a decisão
de compra do consumidor e também influencia as
doações dos consumidores para causas ligadas a
organizações sem fins lucrativos. Meijer e Schuyt
(2005) obtiveram evidências de que alguns fatores
influenciam a sensibilidade do consumidor a realizar
compras socialmente responsáveis como: ter um ní-
vel maior de educação, ser do sexo feminino e ser
149R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 144-161, jan./jun. 2011
de uma idade mais avançada. Becker-Olsen, Cud-
more, Hill (2006), em sua pesquisa, verificaram que
o consumidor valoriza as práticas socialmente res-
ponsáveis que são relacionadas com as atividades
da empresa e também as práticas proativas de RSC.
Adicionalmente, Creyer (1997) em seu estudo mos-
trou que os consumidores se mostraram propensos a
valorizar atitudes éticas das empresas e punir as que
são irresponsáveis.
Dentre os estudos nacionais acerca do com-
portamento do consumidor e a RSC, Urdan (2001)
verificou que o consumidor ainda não está propenso
a comprar produtos de empresas que possuem um
comportamento ético. Motta e Rossi (2003) investi-
garam a influência do fator ecológico na decisão de
compra dos consumidores. Seus resultados mostra-
ram que os entrevistados não davam valor ao fator
ecológico no momento da compra, contudo tinham
uma atitude positiva frente à atuação ecológica da
empresa. Além disso, os autores concluíram que os
consumidores não possuem informações suficien-
tes sobre produtos pertencentes às empresas eco-
logicamente corretas. De modo semelhante, o estu-
do de Castro, Siqueira, Kubrusly (2007) mostrou
que os consumidores possuem atitudes positivas
em relação às empresas socialmente responsáveis,
contudo, normalmente, isso não afeta sua decisão
de compra. Silva e Bertrand (2009) também identi-
ficaram, em sua pesquisa, uma atitude positiva, que,
porém, não se refletia no comportamento de com-
pra. As autoras também identificaram que os consu-
midores estavam insatisfeitos com a quantidade de
informações sobre as ações de RSC das empresas.
Por outro lado, há também estudos que
apontam uma influência favorável da RSC. Mrtvi
(2003) obteve evidências de que a RSC é um fa-
tor que diferencia a marca em relação às outras no
setor de cosméticos. Romaniello e Amâncio (2005)
investigaram a percepção dos estudantes de admi-
nistração no que tange à RSC e os seus resultados
mostraram que o comportamento de compra dos
pesquisados é influenciado pela RSC. 53% dos en-
trevistados responderam que seu comportamento
de compra é influenciado por esse fator e 79,1% res-
ponderam que puniriam as empresas socialmente
irresponsáveis.
Serpa e Avila (2006b) fizeram um estudo
sobre os efeitos da RSC na percepção do consumi-
dor e na sua intenção de compra. Os resultados da
pesquisa mostraram que os consumidores estão dis-
postos a pagar um pouco mais por um produto que
pertence a uma empresa que pratica a RSC. Além
dessa pesquisa, Serpa e Avila (2006a) também bus-
caram identificar se uma ação social que tem impac-
to direto na vida dos consumidores afeta o processo
decisório de compra desses consumidores. Os re-
sultados apontaram que essas ações sociais de fato
influenciam de forma mais positiva as intenções de
compra dos consumidores.
Serpa e Fourneau (2007) buscaram estudar
a percepção do consumidor em relação ao tópico
RSC. Seus resultados trouxeram evidências de que
os pesquisados ainda possuem alguma dificuldade
em definir o conceito de RSC, mas consideram
que as empresas socialmente responsáveis devem
ajudar a resolver os problemas sociais do país. Os
entrevistados disseram que há pouca informação
sobre o tema no Brasil. Outro resultado foi que o
público estudado considera os aspectos negativos
na hora de fazer a compra, isto é, tende a não comprar
produtos de empresas socialmente irresponsáveis,
porém, não necessariamente compra das empresas
que praticam a RSC.
Em resumo, os resultados das pesquisas ain-
da divergem. No que diz respeito especificamente
ao Brasil, alguns estudos apontam que, apesar de
uma atitude positiva frente à RSC, esta pode exercer
As empresas socialmente
responsáveis devem ajudar a resolver os
problemas sociais do país.
150
pouca influência sobre o comportamento de com-
pra. Também é notável a questão da falta de infor-
mações sobre RSC, que surgiu em várias pesquisas.
Diante desse quadro, optou-se, neste trabalho, por
investigar os impactos da Irresponsabilidade Social.
Esperava-se, com isso, contribuir para um melhor
entendimento da influência da RSC sobre o com-
portamento dos consumidores. O intuito era que,
ao direcionar a investigação para o lado negativo
da Irresponsabilidade Social, poder-se-ia identificar
atitudes desfavoráveis às empresas que desrespei-
tam a RSC em alguma de suas dimensões (mesmo
não dando preferência a produtos ou serviços de
empresas que praticam a RSC, poderia ser detec-
tada uma rejeição aos que provêm de empresas
socialmente irresponsáveis).
do consumidor. Nesta etapa, ao mostrar que a RSC
apresenta algumas dimensões, o presente estudo se
posiciona, conforme descrito na revisão da literatura,
considerando a definição de Irresponsabilidade So-
cial como sendo o desrespeito de dimensões da RSC
por parte da empresa.
A segunda etapa consistiu na elaboração do
questionário para a coleta de dados. O questionário
foi feito com base nos estudos de Castro, Siqueira,
Kubrusly (2007) e Silva e Bertrand (2009), fazendo-
-se adaptações para o cenário de Irresponsabilida-
de Social. Como foi descrito anteriormente, Castro,
Siqueira, Kubrusly (2007) e Silva e Bertrand (2009)
realizaram uma pesquisa para investigar se a RSC
influencia na decisão de compra do consumidor. O
presente artigo realizou adaptações nos questionários
desses autores para elaborar um que pudesse captar
a influência da Irresponsabilidade Social das em-
presas no comportamento do consumidor. Ou seja,
enquanto Castro et al. (2007) e Silva e Bertrand
(2009) buscaram informações sobre a reação dos
consumidores frente à RSC, o presente estudo bus-
cou informações sobre a reação dos consumidores
no que tange à Irresponsabilidade Social.
O questionário teve perguntas para medir
se os consumidores julgam importante deixar de
comprar de empresas socialmente irresponsáveis
e também perguntas para medir o comportamento
de compra dos pesquisados em relação a produtos
de empresas socialmente irresponsáveis, para assim
comparar o que eles pensam com como eles agem.
As opções para as respostas dessas perguntas esta-
vam organizadas em escala Likert de 5 pontos (Dis-
cordo Totalmente – 1; até Concordo Totalmente – 5).
O questionário também teve perguntas para
investigar se os entrevistados estão satisfeitos em
relação às suas compras socialmente responsáveis e
se eles estão satisfeitos com as informações dispo-
níveis sobre RSC de empresas e a quantidade de
informações disponíveis sobre a Irresponsabilidade
Social das empresas. As opções de respostas para
essas perguntas foram “Sim” ou “Não”. Também
Medir se os consumidores julgam importante deixar de comprar de empresas
socialmente irresponsáveis e medir o comportamento
de compra dos pesquisados em relação a produtos
de empresas socialmente irresponsáveis,
3 Método
Este artigo é caracterizado como uma pes-
quisa descritiva (GIL, 1987). A primeira etapa da pes-
quisa consistiu em realizar uma revisão bibliográfica,
focando no conceito de RSC e as pesquisas exis-
tentes no Brasil e no exterior sobre a RSC na ótica
151R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 144-161, jan./jun. 2011
havia uma pergunta para saber quais fatores o
consumidor considera mais relevante para avaliar
uma empresa como socialmente irresponsável.
O questionário compreendia também uma
questão em que os entrevistados tinham que colo-
car em ordem de importância o que eles levam em
consideração no momento em que efetuam a com-
pra de um produto (reputação socialmente respon-
sável, conveniência, preço, marca e qualidade). Por
fim, foram também levantados os dados demográfi-
cos dos entrevistados. O questionário foi aplicado a
76 estudantes de administração (autopreenchimen-
to), pertencentes à graduação, mestrado e douto-
rado. A amostra foi por acessibilidade (os questio-
nários foram enviados por e-mail para os alunos de
graduação, mestrado e doutorado de uma universi-
dade, tendo um retorno de 76 questionários preen-
chidos válidos).
A próxima etapa consistiu no tratamento dos
dados, o que foi feito por meio de estatística descri-
tiva e estatística não paramétrica para as questões
de escala Likert de 5 pontos, pois, segundo McCla-
ve et al. (2008), essa é a estatística a ser utilizada
quando existem dúvidas a respeito da normalidade
da distribuição de frequência da população, como
era o caso. O teste estatístico não-paramétrico utili-
zado foi o Sign Test, que é um teste que “fornece in-
ferências sobre a mediana da população” (MCCLA-
VE; BENSON; SINCICH, 2008, p. 14-5). Em seguida,
procedeu-se à análise dos dados.
4 Análise dos Resultados
4.1 Perfil dos Entrevistados
Foram pesquisados no total 76 estudantes de
administração, pertencentes à graduação, mestrado
e doutorado. Os dados demográficos são mostrados
a seguir: (a) 34 indivíduos são do sexo feminino (45%
do total) e 42 do sexo masculino (55% do total); (b)
em relação à faixa etária, 49 (64%) pertencem à faixa
etária dos 20 anos, 20 (26%) à faixa dos 30 anos,
5 (7%) à faixa dos 40 anos e 2 (3%) à faixa dos 50
anos; (c) 32 (42%) pesquisados moram com os pais,
18 (24%) moram sozinhos, 19 (25%) moram com o
cônjuge/companheiro, 3 (4%) moram com amigos e
4 (5%) moram com “outros”, como exemplo, irmãos
ou filhos; (d) 61 (80%) entrevistados não possuem
filhos e 15 (20%) possuem; (e) 35 (46%) ajudam a
pagar as despesas de casa junto com outras pessoas
da casa, 21 (28%) não participam das despesas da
casa e 20 entrevistados (26%) pagam, sozinhos, as
despesas de casa; (f) 47 entrevistados (62%) são do
mestrado, 20 (26%) são da graduação e 9 (12%) do
doutorado.
4.2 Análise das Entrevistas
4.2.1 Julgamento dos Consumidores
Analisando as questões que buscam medir
se os consumidores julgam importante deixar de
comprar de empresas socialmente irresponsáveis
(questões de 1 a 3) por meio de estatística descriti-
va, pode-se observar que a maioria das respostas foi
positiva, ou seja, a maioria dos entrevistados possui
uma atitude positiva em relação a deixar de comprar
produtos de empresas socialmente irresponsáveis.
Eles acham importante deixar de fazer esse tipo de
compra e julgam o comportamento de deixar de
comprar produtos de empresas irresponsáveis como
algo positivo. Na Tabela 1, são mostrados a média, a
mediana, a moda e o desvio padrão das respostas
(as respostas foram em escala Likert de 5 pontos,
começando com 1 para “Discordo Totalmente”). A
maioria dos entrevistados respondeu “Concordo
em parte” para as perguntas sobre a atitude dos
consumidores em relação à compra socialmente
responsável, como pode ser visto através da média,
mediana e da moda.
152
Para avaliar essas três questões por meio de testes estatísticos, foi feito o Sign Test, conforme mencionado
no método. A hipótese nula foi Ho=3, onde 3 é o ponto “Nem Discordo, Nem Concordo” da escala Likert de 5
pontos. A Tabela 2 mostra os resultados para os testes estatísticos realizados.
Questões referentes à atitude Média Mediana ModaDesvio Padrão
É importante, para mim, deixar de comprar produtos de empresas que mostram não ser socialmente responsáveis.
33158 4 4 121338
Eu fico realmente insatisfeito em saber que a empresa da qual eu compro os produtos, não é socialmente responsável.
35658 4 4 119259
Eu gostaria de deixar de comprar produtos de empresas socialmente irresponsáveis, mas não possuo informações suficientes sobre as empresas.
39079 4 4 103509
FONTE – Os autores
TABELA 1 - Estatísticas referentes às questões de atitude
TABELA 2 – Teste não-paramétrico sign test
Questões referentes à atitude Hipóteses Resultados
É importante, para mim, deixar de comprar produtos de empresas que mostram não ser socialmente responsáveis.
Ho: mediana = 3Ha: mediana > 3
Não rejeita Ho a 10%
Eu fico realmente insatisfeito em saber que a empresa da qual eu compro os produtos, não é socialmente responsável.
Ho: mediana = 3Ha: mediana > 3
Rejeita Ho a 1%
Eu gostaria de deixar de comprar produtos de empresas socialmente irresponsáveis, mas não possuo informações suficientes sobre as empresas.
Ho: mediana = 3Ha: mediana > 3
Rejeita Ho a 1%
FONTE – Os autores
Analisando a primeira questão, pode ser visto
que a hipótese nula não foi rejeitada a um nível de
significância de 10%, ou seja, não há evidências de
que os indivíduos entrevistados acham importante
deixar de comprar produtos de empresas
irresponsáveis. Entretanto, em relação às questões
2 e 3, ambas tiveram a hipótese nula rejeitada a
1% de significância. Com isso, há evidências a 1%
de significância de que os indivíduos pesquisados
ficam insatisfeitos em saber que a empresa na qual
eles compraram produto é irresponsável e que eles
também gostariam de deixar de comprar produtos
de empresas socialmente irresponsáveis, contudo
acham que não possuem informações suficientes
sobre as empresas.
Portanto, de forma geral, pode ser visto
que os indivíduos pesquisados demonstram que
ficam insatisfeitos ao saber que compraram algo
de uma empresa irresponsável e gostariam de
deixar de comprar desse tipo de empresa, isto é, o
julgamento deles mostra uma atitude positiva no
que tange a “punir” empresas irresponsáveis. Como
foi visto anteriormente, estudos mostram atitude e
julgamento positivos dos consumidores em relação
à compra de produtos de empresas socialmente
responsáveis (MOTTA; ROSSI, 2003; CASTRO,
SIQUEIRA, KUBRUSLY, 2007; SILVA; BERTRAND,
2009) e, quando se trata de Irresponsabilidade Social,
isso também ocorre, já que os indivíduos julgam
positivamente a atitude de punição em relação a
empresas irresponsáveis.
4.2.2 Comportamento dos Consumidores
Esse item analisa as questões 4 a 11, que se re-
ferem ao comportamento dos consumidores, ou seja,
como eles se comportam em relação à compra de
produtos de empresas socialmente irresponsáveis.
Na Tabela 3, são apresentados a média, a mediana, a
moda e o desvio padrão das respostas.
153R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 144-161, jan./jun. 2011
Analisando essas questões sobre o compor-
tamento dos consumidores entrevistados, pode ser
observado que a maioria dos respondentes não
possui um comportamento de compra que leva em
conta a questão da RSC, visto que a maioria res-
pondeu que não deixa de comprar um produto só
porque a empresa é irresponsável. A única resposta
que mostrou que os consumidores pesquisados já
tiveram um comportamento em que eles “puniram”
a empresa socialmente irresponsável, deixando de
comprar seu produto, foi quando o produto era
nocivo para o ambiente e para outras pessoas, mos-
trando que saúde e ambiente podem ser questões
valorizadas pelos consumidores. Entretanto, os
consumidores entrevistados continuam valorizando
qualidade e preço, pois disseram que não deixaram
de comprar um produto de uma empresa social-
mente irresponsável que tivesse qualidade ou bom
preço. Vale ressaltar também que a maioria dos
consumidores da pesquisa nunca fez boicote a em-
presas irresponsáveis e que, em geral, eles não se
preocupam em saber se a empresa é responsável
ou não.
Para avaliar essas questões através de testes
estatísticos, foi feito o Sign Test, conforme mencio-
nado no método. A hipótese nula foi Ho=3, onde 3 é
o ponto “Nem Discordo, Nem Concordo” da escala
Likert de 5 pontos. A Tabela 4 mostra os resultados
para os testes estatísticos realizados.
Questões referentes ao comportamento Média Mediana Moda Desvio Padrão
Eu comprei produtos/serviços mesmo sabendo que eles foram pro-duzidos por uma empresa socialmente irresponsável.
3,1316 3 3 e 4 1,26851
Eu deixei de comprar produtos que são nocivos para o ambiente e para outras pessoas.
3,6711 4 4 1,10016
Eu deixei de comprar produto/serviço só porque ele foi produzido por uma empresa socialmente irresponsável.
2,9079 3 4 1,24555
Eu deixei de comprar um produto que estava com o preço mais baixo, só porque ele foi produzido por uma empresa socialmente irresponsável.
2,6974 3 1 1,37618
Eu fiz boicote a produtos/serviços de empresas envolvidas em escândalos de irresponsabilidade social.
2,3816 2 1 1,38532
Eu deixei de comprar produto/serviço de boa qualidade só porque ele foi produzido por uma empresa socialmente irresponsável.
2,4737 2 1 1,30101
Em geral, quando compro um produto/serviço, eu não me preocupo em saber se a empresa é socialmente responsável.
3,2632 3 4 1,05031
FONTE – Os autores
TABELA 3 - Estatísticas referentes às questões de comportamento
O julgamento do consumidor mostra uma atitude positiva
no que tange a “punir” empresas
irresponsáveis.
154
Somente uma questão teve a hipótese nula
rejeitada, que foi a segunda questão que queria sa-
ber se o consumidor já deixou de comprar produtos
nocivos para o ambiente e para outras pessoas. Essa
questão teve a hipótese nula rejeitada a 1% de signi-
ficância, mostrando evidências de que os indivídu-
os pesquisados se preocupam em não comprar um
produto que é nocivo para o ambiente e pessoas.
Por conseguinte, ao analisar essas questões,
pode ser visto que, no que se refere ao comporta-
mento de compra, os consumidores não “punem”
as empresas socialmente irresponsáveis. Somente a
questão sobre produtos nocivos para o ambiente e
para as pessoas evidenciou um comportamento de
punição das empresas que comercializam tais pro-
dutos. Ou seja, o comportamento não é de punição a
empresas socialmente irresponsáveis, porém, referin-
do-se aos produtos que podem ser nocivos para am-
biente e pessoas, os indivíduos pesquisados “punem”
as empresas e deixam de comprar seus produtos.
Dessa forma, pode ser visto que, apesar de
os consumidores pesquisados julgarem que devem
deixar de comprar de empresas que são irrespon-
sáveis, na prática isso é difícil de ocorrer. Em outras
palavras, os entrevistados pensam que isso deve ser
feito, mas não se comportam de acordo com esse
pensamento. Essas evidências estão de acordo com
pesquisas descritas na revisão da literatura que mos-
tram que os consumidores acham que devem com-
prar produtos de empresas socialmente responsá-
veis, mas, na hora de comprar, não se comportam
dessa maneira (CASTRO et al., 2007; SILVA; BER-
TRAND, 2009). Outros pesquisadores também
mostraram essa ausência de um comportamen-
to de compra socialmente responsável (CARRI-
GAN; ATTALLA, 2001; URDAN, 2001; MOTTA; ROS-
SI, 2003).
TABELA 4 - Teste não-paramétrico sign test
Questões referentes ao comportamento Hipóteses Resultados
Eu comprei produtos/serviços mesmo sabendo que eles foram produzidos por uma empresa socialmente irresponsável.
Ho: mediana = 3Ha: mediana > 3
Não rejeita Ho a 10%
Eu deixei de comprar produtos que são nocivos para o ambiente e para outras pessoas.Ho: mediana = 3Ha: mediana > 3
Rejeita Ho a 1%
Eu deixei de comprar produto/serviço só porque ele foi produzido por uma empresa socialmente irresponsável.
Ho: mediana = 3Ha: mediana > 3
Não rejeita Ho a 10%
Eu deixei de comprar um produto que estava com o preço mais baixo, só porque ele foi produzido por uma empresa socialmente irresponsável.
Ho: mediana = 3Ha: mediana > 3
Não rejeita Ho a 10%
Eu fiz boicote a produtos/serviços de empresas envolvidas em escândalos de irrespon-sabilidade social.
Ho: mediana = 3Ha: mediana > 3
Não rejeita Ho a 10%
Eu deixei de comprar produto/serviço de boa qualidade só porque ele foi produzido por uma empresa socialmente irresponsável.
Ho: mediana = 3Ha: mediana > 3
Não rejeita Ho a 10%
Em geral, quando compro um produto/serviço, eu não me preocupo em saber se a empresa é socialmente responsável.
Ho: mediana = 3Ha: mediana > 3
Não rejeita Ho a 10%
FONTE – Os autores
Eles “puniram” a empresa socialmente irresponsável, deixando de comprar seu
produto, quando o produto era nocivo para o ambien-te e para outras pessoas, mostrando que saúde e
ambiente podem ser ques-tões valorizadas pelos
consumidores.
155R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 144-161, jan./jun. 2011
4.2.3 Importância dos Atributos na hora de Fazer a Compra
Pediu-se aos pesquisados que ordenassem
por importância os atributos percebidos na hora
de decidir pela compra. Os atributos listados foram:
reputação socialmente responsável da empresa,
preço, conveniência, qualidade e marca. A ordem
de importância consistiu em colocar 1 para o mais
importante e 5 para o menos importante. A Tabela
5 mostra a média, mediana, moda e desvio padrão
das respostas.
TABELA 5 – Ordem de importância dos atributos
4.2.4 Satisfação em relação ao Comporta-mento Socialmente Responsável
No questionário, havia perguntas para avaliar
a satisfação do consumidor em relação ao seu
modo de comprar socialmente responsável e, para
essa pergunta, as respostas possíveis eram “Sim”
ou “Não.
As respostas foram bastante divididas, pois
pode ser visto que 51% dos entrevistados estão
satisfeitos com seu modo de comprar socialmente
responsável e 49% não estão satisfeitos com seu
modo de comprar socialmente responsável.
Houve uma pergunta aberta para saber por
que os consumidores estavam satisfeitos ou não
com esse modo de comprar. Os que responderam
que estavam satisfeitos com seu modo de comprar
socialmente responsável, justificaram da seguinte
forma:
“Porque são poucas empresas que realmente tentam
fazer a diferença. A maioria, a meu ver, é jogada de
marketing e hipocrisia.”
“Não é a minha primeira preocupação ao adquirir um
produto/serviço.”
“Não disponho de informações confiáveis e isentas sobre
o quanto as empresas adotam práticas responsáveis de
negócio ou não.”
“Privilegio empresas socialmente responsáveis. Penso
que assim, estou incentivando outras empresas a agirem
da mesma forma.”
“Porque muitas vezes não há disponibilidade de
informações quanto às responsabilidades sociais da
empresa.”
Analisando esses relatos, pode-se ver que al-
guns estão satisfeitos, porque consideram que há
poucas informações a respeito do tema, então não
há nada que eles possam fazer. Outros disseram
que consideram a RSC das empresas na hora de
comprar e outros mostraram ser céticos em relação
à pratica da RSC, e por isso, estão satisfeitos com
a forma de comprar, já que não acreditam muito na
RSC.
Atributos Média Mediana ModaDesvio Padrão
População social-mente responsável
4.2895 5 5 1.03041
Preço 2.4474 2 2 0.92944
Conveniência 3.4342 4 4 1.07499
Qualidade 1.3026 1 1 0.56615
Marca 3.4868 3.5 3 1.14884
FONTE – Os autores
Como pode ser visto na Tabela 5, o atributo
que os consumidores entrevistados consideram
mais importante para decidir sobre a compra de um
produto ou serviço é a qualidade (média 1,3026).
O segundo atributo em ordem de importância é o
preço (média 2,4474), seguido respectivamente da
marca, conveniência e, por último, da reputação
socialmente responsável.
Dessa forma, pode ser visto que a reputação
socialmente responsável ainda não é levada muito
em consideração na decisão de compra do consu-
midor, já que é menos prioritária que os atributos
qualidade e preço do produto. No estudo de Castro,
Siqueira, Kubrusly (2007) e Silva e Bertrand (2009)
o atributo “Reputação Socialmente Responsável foi
o quarto mais importante, porém na presente pes-
quisa este atributo ficou em quinto lugar, sendo por-
tanto o menos importante.
156
Os que responderam que não estavam
satisfeitos com seu modo de comprar socialmente
responsável, justificaram da seguinte forma:
“Existem poucas informações sobre assuntos relaciona-
dos à responsabilidade social das empresas.”
“Porque conheço empresas que são socialmente irres-
ponsáveis e mesmo assim não deixo de comprar.”
“Falta de opções e possibilidades de comprar outra marca
e de informação confiável. O fato de utilizar o argumento
socialmente responsável não me faz acreditar que real-
mente o seja.”
Analisando os relatos acima, é interessante
observar a repetição do ceticismo em relação a
ações de RSC. Há consumidores que são céticos
em relação a isso, que não acreditam nessas
práticas socialmente responsáveis. Outra questão
que está muito presente nos depoimentos é a falta
de informações existentes sobre as empresas que
praticam a RSC e empresas que são irresponsáveis.
Porém, houve um relato dizendo que mesmo
sabendo de casos de irresponsabilidade social, a
pessoa continua a comprar dessas empresas, o que
a deixa insatisfeita com esse comportamento.
Interessante ressaltar que, como foi visto an-
teriormente, houve evidências estatísticas de que
os consumidores entrevistados gostariam de deixar
de comprar produtos de empresas socialmente ir-
responsáveis e que eles não possuem informações
suficientes sobre as empresas. Esse discurso de não
haver informações suficientes foi o motivo de mui-
tos dizerem que estão satisfeitos com seu compor-
tamento de compra socialmente responsável (visto
que não há informações e então é difícil saber de
quem comprar, logo a pessoa fica satisfeita, pois não
há o que fazer mesmo) e o motivo de muitos dizerem
que não estão satisfeitos com seu comportamento
(pois como há poucas informações há uma dificul-
dade em agir de forma responsável, o que torna os
indivíduos insatisfeitos).
4.2.5 Satisfação em relação às Informações sobre RSC
Por conseguinte, foi interessante perguntar
sobre a quantidade de informações sobre RSC
que as empresas divulgam e a quantidade de
informações sobre o envolvimento de empresas
em ações de Irresponsabilidade Social. Para essas
perguntas, as respostas eram “Sim” ou “Não”.
Em relação à satisfação com as informações
sobre RSC que as empresas divulgam, somente
13% dos entrevistados disseram estar satisfeitos,
enquanto 87% deles disseram estar insatisfeitos,
mostrando que a maioria acha que há poucas
informações. Além disso, no que tange à satisfação
com as informações sobre o envolvimento de
empresas em ações de Irresponsabilidade Social,
somente 7% dos entrevistados disseram estar
satisfeitos enquanto 93% deles disseram estar
insatisfeitos, mostrando que a maioria também acha
que existem poucas informações.
Logo, pode ser visto que essa falta de infor-
mações pode ser um fator negativo. Como relatou a
pesquisa de Romaniello e Amâncio (2005) e a pre-
sente pesquisa sobre o julgamento dos consumido-
res, eles estão dispostos a “punir” as empresas irres-
ponsáveis, e, com a escassez de informação
4.2.6 Elementos de uma Empresa
Socialmente Irresponsável
Finalmente, havia uma questão para saber
quais os elementos mais importantes para avaliar
uma empresa como socialmente irresponsável. Fo-
ram dados seis elementos e os entrevistados deve-
riam escolher três deles, numerando com 1 o mais
relevante até o 3, o menos relevante. Os elementos
dados foram: (1) não respeitar as leis, (2) não pagar/
sonegar impostos, (3) não respeitar os direitos dos
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funcionários, (4) produzir e comercializar produtos
ou serviços que podem causar danos aos consumi-
dores, (5) fazer propaganda enganosa e (6) causar
danos ambientais como poluição ou acidentes.
A Tabela 6 mostra os resultados descritivos
(média, mediana, moda, desvio padrão).
TABELA 6 – Elementos da irresponsabilidade social
5 Considerações Finais
O presente estudo buscou complementar os
estudos já existentes sobre a RSC, investigando se os
consumidores “punem” as empresas socialmente irres-
ponsáveis. A ideia dessa pesquisa surgiu de estudos
anteriores que relataram a disposição dos consumido-
res em comprar produtos de empresas socialmente
responsáveis (CASTRO; SIQUEIRA; KUBRUSLY, 2007;
SILVA; BERTRAND, 2009) – porém, que apesar de ha-
ver essa disposição, ela dificilmente é vista na prática
– e de uma pesquisa que mostrou uma eventual atitu-
de de “punição” de empresas irresponsáveis (ROMA-
NIELLO; AMÂNCIO, 2005), mas não aprofundou este
resultado, pois este tópico não era seu objetivo.
De acordo com os resultados, os consumidores
entrevistados possuem uma atitude positiva em rela-
ção a deixar de comprar produtos de empresas so-
cialmente irresponsáveis, isto é, eles julgam esse tipo
de ação como uma prática positiva. Entretanto, no
que tange ao seu comportamento, é observado que
o consumo de produtos de empresas que são social-
mente irresponsáveis ainda é efetuado, isto é, apesar
de acharem importante não consumir produtos de
empresas irresponsáveis, os consumidores pesquisa-
dos ainda não colocam isso em prática, não ‘punindo’
essas empresas. O resultado é relevante, pois reforça
achados anteriores como os de Urdan (2001), Motta e
Rossi (2003), Castro, Siqueira, Kubrusly (2007), Silva
e Bertrand (2009). Diferentemente do que se espera-
va quando se decidiu fazer a pesquisa, ao direcionar a
investigação para o lado negativo (irresponsabilidade
social), manteve-se a tendência de um comportamen-
to de compra que não leva em consideração a RSC.
Também se manteve a inconsistência entre atitude e
comportamento.
Contudo, somente um fator comportamental
se mostrou favorável à punição de empresas irres-
ponsáveis que foi a questão de deixar de comprar
produtos que são nocivos ao ambiente e às pesso-
as, o que mostra que esse pode ser o único fator
relevante levado em consideração nos dias de hoje
Elementos Irresponsabilidade
SolcialMédia Mediana Moda
Desvio Padrão
Não respeitar as leis 2.0625 2 3 0.92871
Não pagar/sonegar impostos
1.7143 2 1 0.75593
Não respeitar os direitos dos funcio-nários
2.9 3 3 0.31623
Produzir e comer-cializar produtos ou serviços que podem causar danos aos consumidores
1.697 1 1 0.80951
Fazer propaganda enganosa
2.3077 2 2 0.63043
Causar danos ambientais como poluição ou acidentes
1.9375 2 2 0.75935
FONTE – Os autores
Como pode ser visto na média obtida, o
elemento considerado mais relevante para clas-
sificar uma empresa como irresponsável é “pro-
duzir e comercializar produtos ou serviços que
podem causar danos aos consumidores”, o que está
de acordo com a questão que foi estatisticamente sig-
nificante sobre o comportamento dos consumidores
em relação a “punir” empresas, deixando de com-
prar produtos nocivos ao ambiente e às pessoas.
Em seguida, o fator considerado mais importante
foi “não pagar/sonegar impostos”, seguido respec-
tivamente de “causar danos ambientais como polui-
ção ou acidentes”, “não respeitar as leis”, “fazer pro-
paganda enganosa” e “não respeitar os direitos dos
funcionários”.
158
• Recebido em: 09/12/2010
• Aprovado em: 27/04/2011
para deixar de comprar de determinada empresa.
Isto é, os indivíduos da pesquisa se preocupam com
danos ambientais e com danos aos próprios indiví-
duos e já deixaram de comprar produtos que apre-
sentavam essas características danosas. Assim, o
comportamento dos entrevistados, de modo geral,
não é de punição a empresas socialmente irrespon-
sáveis, porém, isso só ocorre em relação a produtos
que podem ser nocivos para ambiente e pessoas.
Além disso, grande parte dos entrevistados
disse estar satisfeita com seu modo de comprar. As
justificativas foram que não possuem informações
suficientes para deixar de comprar os produtos de
determinada empresa. Ou seja, dentro do que sabem,
estão satisfeitos com suas escolhas de consumo, pois
não têm informações que comprovem a irresponsa-
bilidade das empresas das quais são clientes.
Indo na mesma direção, coerentemente com
estudos anteriores, a maioria dos pesquisados avaliou
que há pouca informação disponível sobre a RSC e a
Irresponsabilidade Social das empresas. É provável
que essa falta de informações contribua para minimi-
zar o desconforto causado pela inconsistência entre
atitude e comportamento. Se tivessem mais informa-
ções, os consumidores possivelmente se sentiriam
mais impelidos a “punir” as empresas irresponsáveis,
deixando de comprar seus produtos. Nesse sentido, a
imprensa e os meios de comunicação, bem como as
empresas socialmente responsáveis, poderiam, por
meio da divulgação do conceito de RSC e das práti-
cas a ele relacionadas, contribuir para incentivar um
comportamento mais vigilante dos consumidores.
Logo, as implicações gerenciais do presente
artigo apontam para a importância da divulgação das
ações de RSC das empresas, seja por elas mesmas ou
pela mídia, e também da denúncia de ações irrespon-
sáveis e escândalos vindos do ambiente corporativo.
Uma sugestão para futuros estudos que
desponta ao final desta pesquisa é a de investigar
experimentalmente o tema. Isto poderia ser feito por
meio de um experimento de campo, manipulando-
-se a variável informação sobre RSC das empresas.
Além disso, seria desejável, é claro, replicar a pesquisa
junto a outros públicos de diferente nível educacional
e formação. Outra questão que vale ser investigada é
o ceticismo expressado pelo público estudado sobre
as práticas de RSC das empresas. Esse tema surgiu
na única pergunta aberta contida no questionário.
Assim, parece indicado aprofundá-lo, verificando sua
influência sobre as opiniões e o comportamento dos
consumidores. Também seria interessante investigar
se se trata de uma característica associada à cultura
brasileira já que, segundo DaMatta (1983), a descon-
fiança é um traço marcante da sociedade brasileira.
Por fim, um estudo interessante a ser feito futura-
mente seria por meio de entrevistas em profundi-
dade ou grupos focais, ou seja, uma abordagem
qualitativa, para investigar com mais profundidade
o comportamento do consumidor em relação à
punição de empresas irresponsáveis.
A desconfiança é um traço
marcante da sociedade brasileira.
Os consumidores entrevistados, de forma
geral, ainda não possuem comportamentos punitivos
para as empresas irresponsáveis, e, uma das
possíveis causas pode ser a deficiência na disponibilidade
de informação.
159R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 144-161, jan./jun. 2011
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Patrocínio Esportivo no Futebol: Convergência das Percepções entre Gestores e Torcedores.Sports Sponsorship in Football: convergence of perceptions between managers and fans.
Resumo
O segmento desportivo vem apresentando crescimento dentro do cenário do marketing. O
futebol, como paixão nacional, é a escolha de diversas empresas que pretendem atingir um público
diversificado e massificado. O objetivo do trabalho é identificar e analisar no ambiente futebolístico
as estratégias de patrocínio esportivo das empresas que apóiam, concomitantemente, equipes rivais
de futebol e times adversários que são patrocinados por companhias concorrentes. Foi utilizada a
metodologia de pesquisa quantitativa, com abordagem descritiva, cuja coleta de dados foi através de
questionário estruturado destinado aos usuários de um site de relacionamento que são os torcedores
das equipes estudadas. Houve ainda o uso de pesquisa qualitativa dirigida aos gestores de marketing
das corporações. Tomou-se como base a percepção do torcedor, enquanto consumidor, com relação
às referidas estratégias. Os gestores das corporações que optam pelo segmento desportivo também
apresentaram suas impressões sobre o retorno proporcionado e o esperado com essa parceria. Com
a análise dos resultados das duas pesquisas percebeu-se que há grande visibilidade de marca e as
conseqüências do patrocínio são bastante animadoras para as organizações. O patrocínio beneficia
tanto a organização apoiadora quanto a equipe de futebol.
Palavras-chaves: Marketing Esportivo; Patrocínio; Futebol.
Abstract
The sport segment keeps growing in the marketing scene. Soccer, as national passion, is the choice
of several companies that intend to reach a diversified and massive public. The objective of the
work is to identify and to analyze the strategies of sportive sponsorship in the football environment
of the companies that support, concomitantly, rival teams of soccer and adversaries teams who
are sponsored by competitors companies. The methodology of quantitative research was used,
with descriptive approach whose collection of data was done through a structuralized question-
naire destined to the users of a relationship site who are the fans of the studied teams. The use of
qualitative research directed to the marketing managers of the corporations was also present. The
perception of the fans, while consuming, was overcome as basis, regarding the related strategies.
The managers of the corporations that opt for the sportive segment have also presented their im-
pressions about this partnership. With the analysis of results of the two researches it was noticed
that there is great brand visibility and the consequences of the sponsorship are extremely good for
the organizations. It was concluded that the sponsorship benefits the supportive organization as
much as the soccer team.
Keywords: Sports Marketing, Sponsorship, Soccer.
1 Graduada em Administração pela Universidade do Vale do Itajaí. E-mail: [email protected]
2 Doutorando em Administração pela Fundação Getúlio Vargas. Professor da Universidade do Vale do Itajaí. E-mail: [email protected]
Debora Thariane Ferrari 1
Ricardo Boeing da Silveira 2
164
Introdução
O esporte, em especial o futebol, é uma das
maiores paixões do brasileiro e cresce devido ao
interesse demonstrado pela sociedade como um
todo. Um dos responsáveis por essa atratividade é
o patrocínio esportivo, que proporcionou divulga-
ção e evolução de várias modalidades de empresas,
o que tornou possível uma massificação do esporte
em termos de audiência, como do número dos par-
ticipantes (POZZI, 1998).
Por essa razão, neste estudo, são apresentados
pontos importantes do marketing esportivo e eviden-
cia como a escolha das estratégias de marketing e
patrocínio esportivo das empresas patrocinadoras é
de fundamental importância para o sucesso ou não
da promoção dos produtos das organizações em
questão. Logo, o objetivo desta pesquisa é analisar o
uso da estratégia de marketing esportivo da mesma
empresa junto a times rivais de futebol, e, de corpo-
rações concorrentes junto às equipes adversárias do
referido esporte.
Segundo Afif (2000) há pessoas que acham
perigoso patrocinar equipes de futebol. O argumen-
to mais comum é de que os torcedores dos outros
times poderão deixar de consumir produtos da
marca patrocinadora se esta não estiver em seus
clubes. As empresas investem quantias significati-
vas em patrocínio esportivo e utilizam-se de estra-
tégias inovadoras a fim de atingir o público alvo de
maneira eficiente.
Há exemplos de organizações concorrentes que
se utilizam de estratégias diferenciadas de marketing
esportivo e optam por patrocinar equipes esportivas
rivais a fim de conquistar como consumidor os tor-
cedores desses clubes em questão. Há ainda aquelas
empresas que preferem patrocinar os clubes opo-
nentes simultaneamente a fim de evitar qualquer
tipo de rejeição por parte dos torcedores mais entu-
siasmados, que poderiam deixar de adquirir os pro-
dutos e/ou serviços oferecidos pela organização por
saber que ela apóia a equipe rival.
Patrocínio esportivo é o investimento que
uma entidade pública ou privada faz em evento,
atleta ou grupos de atletas com a finalidade de
atingir públicos e mercados específicos, recebendo
uma série de vantagens, melhor imagem e simpatia
do público. É um acordo profissional entre patroci-
nador e patrocinado para que sejam alcançados os
objetivos predefinidos por ambas as partes. (CAR-
DIA, 2004; POZZI, 1998). A notória figura do atleta
também influencia no comportamento do consu-
midor. Os desportistas servem como espelho nos
padrões do costume, da moda e até da formação
do caráter do indivíduo. As empresas fazem uso do
endosso de atletas consagrados em seus produtos,
seja através da publicidade ou licenciamento de
produtos, extraindo o máximo do poder de imagem
que essa personalidade pode oferecer à empresa
patrocinadora.
Os desportistas servem como espelho nos pa-drões do costume, da
moda e até da formação do caráter do indivíduo.
O esporte, em especial o futebol, é uma das maiores paixões do brasileiro e cresce
devido ao interesse demonstrado pela sociedade como
um todo.
165R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 162-175, jan./jun. 2011
2 Fundamentação Teórica
O marketing de patrocínio representa uma
oportunidade para uma organização e suas marcas
focarem sua comunicação para públicos restritos,
específicos e altamente desejáveis. O patrocínio
não é substituto de nenhum dos conceitos do mix
promocional, mas pode ser usado como forma de
propaganda, promoção de vendas, e, certamente
como elemento de relações públicas. (SHIMP, 2001;
CARDIA, 2004)
Para Contursi (2003), patrocínio é a aquisição
dos direitos de afiliar, ou associar produtos, eventos
e/ou marcas, com o intuito de diversificar, e/ou am-
pliar os benefícios obtidos com esta associação. Não
se espera que a utilização do patrocínio substitua as
formas mais tradicionais de comunicação, e sim que
as complemente. (SHIMP, 2001).
Shimp (2001) mostra que um dos aspectos
da comunicação de marketing com maior cresci-
mento tem sido o patrocínio. Ligando seus nomes
a eventos e causas especiais, as empresas podem
evitar o ruído intrínseco à publicidade nos meios de
comunicação de massa; os patrocínios ajudam as
empresas a reagir às variações de hábitos de mídia
dos consumidores; contribuem com as empresas a
serem aprovadas por vários públicos.
De acordo com Contursi (2003) o patrocí-
nio pode incluir os seguintes pontos, não devendo,
no entanto, limitar-se apenas a eles: Os direitos de
utilização de logotipos, nomes, marcas e/ou repre-
sentações gráficas, significando uma conexão do
produto com o evento. Estas regalias podem ser
utilizadas em publicidade, promoções, propagan-
das ou outras atividades de divulgação que sejam
empregadas pelo proprietário; o direito de exclusi-
vidade na associação de um produto ou categoria
de serviços; o direito de intitular um evento ou ins-
talação esportiva; a vantagem de utilizar várias de-
signações na conexão com um produto ou evento,
tal como “patrocinador oficial”, “fornecedor oficial”,
“produto oficial”, “apoio”, etc; o direito sobre a uti-
lização de um serviço ou produto, ou o direito do
proprietário do produto em deliberar sobre o even-
to ou produto; o direito de conduzir determinadas
ações promocionais, de acordo com o contrato de
licenciamento, tais como sorteios ou vendas dirigi-
das.
As empresas estão dispostas a empregar altas
quantias em dinheiro para colocar seus nomes em
instalações públicas como estádios, universidades e
edifícios, a fim de mantê-lo bem visível. Patrocinam
também causas importantes como, por exemplo,
rejeição às drogas, melhor alimentação, etc. acre-
ditando que se relacionarem à empresa e/ou marca
à causas que muitas pessoas acreditam, melhora
a reputação da empresa, reforça a consciência da
marca, aumenta a fidelidade dos clientes, promove
as vendas e amplia favoravelmente a cobertura pela
imprensa. (KOTLER, 2002; KOTLER, 2003; SHIMP,
2001; MULLIN; HARDY; SUTTON,2004).
O termo Marketing Esportivo surgiu em
meados de 1978, pela Advertising Age (membro-
-associada da Associação Americana de Marketing)
para descrever a utilização de técnicas de marketing
dentro do esporte. Desde então os estudos no campo
do Marketing Esportivo cresceram, a ponto de tornar-
-se uma área específica de pesquisa, acompanhando
o mercado e o volume de movimentação financei-
ra gerada pelo esporte em todo o mundo. (PITTS e
STOTLAR, 2002). É possível citar trabalhos elabora-
dos por Cardia (2004), Budolla, Melo Neto (2000)
e Teitelbaum (1997) no Brasil, e no exterior, cita-se
como principais trabalhos os escritos por Cornwell,
Roy, Steinard II (2001); Pitts, Stocler (2002).
O marketing de patrocínio representa uma
oportunidade para uma organização e suas marcas focarem sua comunicação
para públicos restritos, específicos e alta-mente desejáveis.
166
Os maiores responsáveis pela popularização
do marketing esportivo em todo o mundo foram as
indústrias de cigarros e bebidas alcoólicas, como
alternativa à proibição pelo Congresso Americano
da veiculação de propagandas em determinados
horários. Não por acaso empresas como Marlboro
e Camel (cigarros), Campari e Fosters (bebidas)
apresentaram um longo e bem-sucedido histórico
de associação com o esporte, especialmente o
automobilismo. (SHANNON, 1999; POZZI, 1998;
AFIF, 2000). Sílvio Lancelloti (apud Pozzi, 1998),
informa que a história dos patrocínios no futebol
esportivo para satisfazer as necessidades ou desejos
de consumidores através do processo de troca, e,
realizar os objetivos da empresa. (AFIF, 2000; PITTS;
STOTLAR, 2002; MULLIN; HARDY; SUTTON, 2004).
Shannon (1999) informa que o crescente inte-
resse no desporto profissional tem dado enfoque no
esporte como um grande negócio rentável. As enor-
mes quantias empregadas nos mais diversos setores
de marketing esportivo não deixam dúvidas de que
o esporte é uma grande empresa de negócios milio-
nários. Zunino (2006) informa ainda que, no futebol,
frequentemente considerado como o esporte brasilei-
ro de maior atração, a estratégia de associação de
marcas ao esporte vem crescendo e aumentando as
relações entre empresas e consumidores esportivos.
Segundo o autor Melo Neto (1997) é vasto o campo
de atuação e abrangência do marketing esportivo –
desde projetos de eventos até projetos de venda de
patrocínio, franchising, licenciamento e de marketing
para clubes, federações entre outros.
Afif (2000) discorre sobre algumas ações que
as empresas podem efetuar com o marketing espor-
tivo: Alternativa à Mídia Convencional: para compa-
nhias que almejam atingir um público específico, o
marketing esportivo é um meio eficiente de comu-
nicação, pois alcança excelentes resultados, traba-
lhando com verbas menores se comparadas com o
custo de uma campanha televisiva. Outra conveni-
ência é que a marca participa do ambiente do jogo,
por meio da publicidade estática ou mais ativamen-
te, se estiver patrocinando alguma equipe ou atleta.
Reforço ou construção da imagem institucional: A
imagem institucional de uma empresa é largamente
favorecida quando se associa ao esporte por tudo
aquilo que representa como força, aventura, emo-
ção, etc. As alegrias que o esporte oferece ao torce-
dor (consumidor) acabam se transferindo à imagem
da empresa. Incremento nas Vendas: Não basta ape-
nas desenvolver um bom produto, determinar cor-
retamente seu preço e torná-lo facilmente acessível
ao cliente. Segmentação do Público-alvo: As em-
presas poderão empregar o marketing esportivo na
segmentação de seu público-alvo, componha-se ele
de homens ou mulheres, jovens ou adultos, pessoas
de baixo ou alto poder de compra. Assim, se quise-
teve início na Itália, em 1952, quando uma empresa
de bebidas colocou anúncios em todos os estádios
do país e garantiu uma cota bastante elevada na
época, a cada clube da Série A.
O marketing esportivo é uma das estratégias,
dentro de um planejamento, que utilizam o esporte
para atingir suas metas. É o processo de elaborar
e implementar atividades de produção, formação
de preço, promoção e distribuição de um produto
Os maiores responsáveis pela popularização do
marketing esportivo em todo o mundo foram as indústrias de cigarros e bebidas alcoólicas, como alternativa à
proibição pelo Congresso Americano da veiculação
de propagandas em determinados horários.
167R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 162-175, jan./jun. 2011
rem buscar atingir um público em especial, basta
escolher a melhor modalidade, aquela que tenha
maior ligação com o público pretendido. Rejuve-
nescimento da Imagem: Cada vez mais empresas
se utilizam do esporte para a comunicação, pois
além de ser ferramenta de marketing, constrói e
rejuvenesce um produto ou marca de uma compa-
nhia. Um case clássico é o do Banco do Brasil que
passava por problemas financeiros. Ao patrocinar o
Voleibol, obteve novas parcerias com seus clientes
atuais e a conquista de novos.
Almeida; Sousa; Leitão (2000) destacam
que, diferentemente do que ocorre na Europa,
onde os recursos do marketing esportivo do fute-
bol são provenientes principalmente da bilheteria,
no Brasil, os recursos disponibilizados através da
modalidade em questão são, em sua maioria, oriun-
dos da televisão. Barros et al. (2007) dizem que a
principal força por trás do marketing esportivo é o
patrocínio e que o patrocínio esportivo é uma opor-
tunidade de alcançar uma audiência maciça e das
empresas patrocinadoras anteciparem a exposição
de sua marca a uma platéia que vai incrementar
suas vendas. Sendo assim, é necessário conhecer
um pouco mais sobre o patrocínio esportivo, po-
der entender qual sua real importância tanto para
a empresa patrocinadora quanto para a empresa e/
ou atleta patrocinado.
No Brasil, o patrocínio de equipes teve início
nos anos 80, quando os clubes começaram a di-
vulgar o nome de empresas em suas camisas. Até
então o patrocínio ainda encontrava muita resistên-
cia por parte das agremiações e dos torcedores. O
vôlei teve papel importante nesse aspecto, pois foi
o esporte que saiu na frente na área. (AFIF, 2000).
Cardia (2004) define patrocínio esportivo
como sendo o investimento que uma entidade pú-
blica ou privada faz em um evento, atleta ou grupo
de atletas com a finalidade precípua de atingir pú-
blicos e mercados específicos, recebendo, em con-
trapartida, uma série de vantagens encabeçadas
por incremento de vendas, promoção, melhor ima-
gem e simpatia do público. As organizações con-
tinuam a intensificar, mundialmente, o patrocínio
esportivo. Uma variedade de atividades desportivas
como segmento da indústria do esporte, tem benefi-
ciado financeiramente empresas e clubes a partir da
vontade de estabelecer uma parceria com empresas
particulares, agências governamentais ou even-
tos desportivos. (BENNETT; HENSON; ZHANG,
2002).
O patrocínio esportivo tornou-se uma ferra-
menta de comunicação, sendo útil na construção de
reconhecimento da marca, imagem da marca e ima-
gem corporativa. (JAVALGI et al., 1994; MCDONALD,
1991; QUESTER, 1997; TURCO, 1995; WITCHER et al.,
1991 apud CORNWELL; ROY, STEINARD II, 2001). De
acordo com Budolla e Souza (2005), o patrocinador
pode conquistar interesse e respeito do consumidor
e, até mesmo, chegar a obter gratidão por parte do
mesmo.
Stotlar (2004) afirma também que a medida
mais adequada da eficácia do patrocínio esportivo
não é aquela da qual emana os patrocínios gerados,
mas sim de saber se os objetivos específicos do mar-
keting da organização foram cumpridos. Uma faceta
importante do marketing de patrocínio esportivo é,
segundo Lough e Irwin (2001), o tamanho do mer-
cado potencial, ou seja, a probabilidade de que exis-
te um significativo consumo básico que irá associar
o patrocinador da mensagem com o acontecimento
desportivo, e, inversamente irá associar o esporte
com a propriedade da imagem do patrocinador.
Patrocínio esportivo é uma oportunidade de alcançar
uma audiência maciça e das empresas patrocinadoras anteciparem a exposição
de sua marca a uma plateia que vai incrementar suas
vendas.
168
Crompton (apud BUDOLLA; SOUZA, 2005)
aponta alguns fatores que incentivaram o cresci-
mento do patrocínio esportivo por parte das em-
presas: aumento do custo da propaganda em tele-
visão; perda da eficiência dos anúncios nas mídias
tradicionais; crescimento do número de veículos de
comunicação; desenvolvimento da comercializa-
ção do esporte; aumento da competitividade. Tais
fatores resultaram da necessidade do desenvolvi-
mento de canais diferenciados de comunicação. No
início dos anos 80 o marketing esportivo tornou-se
disciplina envolvendo pesquisa séria, grandes inves-
timentos e planejamento estratégico. As organiza-
ções necessitaram priorizar seus gastos e justificar
as despesas.
Segundo Afif (2000), no Brasil, o futebol é
a modalidade que possui os maiores investimentos
em patrocínio esportivo, já que ele é considerado a
paixão nacional. Bennett (apud BARROS et al, 2007)
identificou em seus estudos que expectadores de
futebol percebem com maior sensibilidade a marca
patrocinadora e que mais de vinte por cento dos
torcedores estão dispostos a adquirir produtos da
empresa patrocinadora. No futebol, o patrocínio es-
portivo apresenta-se principalmente através da pu-
blicidade e propaganda nos fardamentos dos clu-
bes, nas dependências esportivas (estádios, centros
de treinamento, ônibus da equipe), e no endosso e
fornecimento de equipamentos esportivos a joga-
dores individuais de renome. (ZUNINO, 2006). Os
clubes de futebol são excelentes veículos de comu-
nicação, (BUDOLLA; SOUZA, 2005) são mais bara-
tos que a mídia televisiva, e geram mais tempo de
imagem do que se iguais valores fossem pagos para
as emissoras na forma de comerciais.
Almeida (2009) discorre que cada empresa
tem um motivo diferente na escolha do patrocínio,
podendo ser para atingir um público em especial,
levando-se em conta os objetivos estratégicos da
empresa, seja através de região, faixa etária preten-
dida e imagem que pretende passar, mas sempre
buscando o retorno financeiro esperado. Entretan-
to as empresas, embora percebam crescimento na
venda de seus produtos, após o patrocínio de equi-
pes de futebol, não sabem informar uma porcenta-
gem exata relacionada ao patrocínio, mas o retorno
sobre o investimento é essencial na decisão de con-
tinuidade do mesmo. (FERNANDES, 2009).
Cada companhia deve definir qual o melhor
tipo de patrocínio para cada situação a fim de obter
o retorno esperado, seja o incremento de vendas,
segmentação de público-alvo, construção, retorno
ou rejuvenescimento de imagem.
3 Metodologia
Este trabalho objetiva realizar uma pesquisa
qualitativa e quantitativa, de caráter exploratório
descritivo para descobrir idéias e percepções
bem como descrever características do mercado.
(MALHOTRA, 2006).
A matéria veiculada no dia 24 de julho de
2007, no Portal da Revista Exame traz equipes do
futebol brasileiro, localizas no mesmo estado, com
patrocinadores de um mesmo segmento de merca-
do, que são concorrentes entre si. Por outro lado
a edição revela times rivais que possuem a mesma
empresa como patrocinadora. Foi possível a partir
desta informação, determinar algumas equipes de
futebol do país que serviram como sujeito do es-
tudo. As outras equipes do referido esporte foram
encontradas através de pesquisa feita nos sites dos
clubes, a partir do site do Clube dos 13 – União dos
Grandes Clubes do Futebol Brasileiro, associação
que abriga os maiores clubes do Brasil.
Os clubes foram selecionados além do fator
determinante dos patrocinadores e suas estratégias,
mas também por outros critérios julgados importan-
tes, como por exemplo, os times estarem inseridos
na série A do Campeonato Brasileiro, salvo raras ex-
ceções onde um dos clubes estava inserido na série
A e o maior rival estar na série B e ambos apresenta-
rem patrocinadores que se enquadravam no objeto
de estudo; times com grandes torcidas organizadas,
ou pelo fato do clube estar sempre presente na mí-
dia, seja por seu desempenho vitorioso nos campe-
onatos ou não.
169R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 162-175, jan./jun. 2011
Dos clubes de futebol brasileiros e rivais, que
têm como patrocinadoras organizações do mesmo
segmento e que são concorrentes, foram locali-
zadas as seguintes equipes e empresas conforme
apresentadas no Quadro 1 a seguir:
março de 2008, estão listadas: Cruzeiro Esporte
Clube; Clube Atlético Mineiro – Galo; São Paulo FC
– Tricolor; Corinthians – O poderoso Timão; Santos
Futebol Clube; Esporte Clube Bahia; Esporte Clube
Vitória; Sport Club Internacional; Grêmio; Espor-
te Clube Juventude; Sport Clube do Recife; Clube
Náutico Capibaribe; Figueirense Futebol Clube;
Avaí Futebol Clube; Atlético Paranaense – Furacão;
Coritiba Foot Ball Club – Coxa.
Para a realização dessa pesquisa, foi coleta-
do aleatória e individualmente o login dos mem-
bros usuários de cada uma das comunidades acima
descritas. Foram postados também tópicos infor-
mativos a respeito dessa pesquisa nos fóruns das
comunidades, como forma de abordar um número
maior de participantes, para os quais os questioná-
rios estruturados foram enviados, conforme indica
a Tabela 1 a população e a amostra da pesquisa. Dos clubes de futebol rivais, que apresentam
como patrocinadora a mesma companhia, foram
encontradas as seguintes equipes e empresas,
conforme quadro 2 a seguir:
Utilizou-se algumas comunidades do site de
relacionamento Orkut, as quais serviram de base
para aplicação dos questionários da pesquisa quan-
titativa (AÑANÃ et al. 2006). Foram determinadas
para a coleta as comunidades com maior número
de membros de cada equipe citada nos quadros
anteriores, as quais foram consultadas no dia 26 de
TABELA 1: Amostra Populacional das Comunidades do ORKUT - 2008
Comunidade do Orkut População em 26/03/08
Amostra
Cruzeiro Esporte Clube 313.224 399
Clube Atlético Mineiro – Galo
183.359 399
São Paulo FC – Tricolor 856.843 399
Corinthians – O poderoso Timão
633.549 399
Santos Futebol Clube 231.363 399
Esporte Clube Bahia 120.658 398
Esporte Clube Vitória 65.022 397
Sport Club Internacional 203.961 399
Grêmio 347.937 399
Esporte Clube Juventude 7.069 378
Sport Clube do Recife 94.716 398
Clube Náutico Capibaribe 38.833 395
Figueirense Futebol Clube 33.826 395
Avaí Futebol Clube 19.234 391
Atlético Paranaense – Furacão
91.518 398
Coritiba Foot Ball Club – Coxa
37.306 395
FONTE: Site: www.orkut.com
QUADRO 1 - Clubes Rivais Patrocinados por Organizações Concorrentes - 2007
Equipes Rivais Estado (UF)Empresas
Patrocinadoras
1 Cruzeiro MGConstrutora
Tenda
2 Atlético Mineiro MGMRV
Engenharia
3 São Paulo Futebol Clube SP LG
4 Corinthians SP Samsung
5 Santos SP Semp Toshiba
Fonte: Adaptado do Portal da Revista Exame de 24/07/07
QUADRO 2 - Clubes Rivais Patrocinadas pela mesma Organização - 2007
Equipes RivaisEstado (UF)
Empresas Patrocinadoras
1 Bahia Vitória BAConstrutora
Tenda
2 Grêmio Internacional Juventude RSMRV Engen-
haria
3 Sport Náutico PE LG
4 Figueirense Avaí SC Samsung
5 Atlético PR Coritiba PR Semp Toshiba
Fonte: Adaptado do Portal da Revista Exame de 24/07/07 e dos site dos clubes
170
Um dos instrumentos para coleta dos dados
para a pesquisa foi o questionário estruturado diri-
gido aos integrantes das comunidades já menciona-
das, do site de relacionamento Orkut. O questioná-
rio estruturado foi elaborado com base em Budolla
e Souza (2005) que afirmaram que os torcedores,
enquanto consumidores criam uma relação de gra-
tidão com a organização patrocinadora pelo sim-
ples fato de ela apoiar a causa esportiva. Essa grati-
dão é traduzida quando esses torcedores adquirem
os produtos/serviços da empresa apoiadora como
forma de agradecimento pela contribuição ofereci-
da. O instrumento de coleta de dados foi elaborado
com base também em Afif (2000) que acredita que
pode ser perigoso para uma companhia patrocinar
uma equipe de futebol, já que os torcedores das
equipes adversárias podem não adquirir seus pro-
dutos pelo fato de ela apoiar a equipe arquirrival.
Na pesquisa quantitativa foi utilizado a ferra-
menta disponível no site Survey Monkey, que pro-
porciona o acompanhamento das respostas duran-
te a entrevista, e um link específico para cada time
de futebol, além de dados já tabulados e gráficos
prontos. Foram elaborados dois questionários: um
específico para os clubes cujos rivais são patrocina-
dos por empresas concorrentes, e outro questioná-
rio, específico para os torcedores das equipes rivais
que são patrocinadas simultaneamente pela mesma
empresa.
O início da coleta dos dados se deu no dia 12
de maio de 2008, após fazer parte das comunida-
des já citadas anteriormente e começar a divulgar
quer seja individualmente, usuário por usuário, alea-
toriamente, quer seja publicando nos fóruns. Como
forma de incentivo para a participação dos usuários
do Orkut e integrantes das comunidades na pesqui-
TABELA 2: Amostra Atingida em Percentual - 2008
Comunidade do Orkut
AmostraTotal de
Respondentes
Percentual de Respondentes
Atingido
Cruzeiro Esporte Clube
399 100 25,06
Clube Atlético Mineiro – Galo
399 189 47,36
São Paulo FC – Tricolor
399 136 34,08
Corinthians – O poderoso Timão
399 100 25,06
Santos Futebol Clube
399 100 25,06
Esporte Clube Bahia
398 201 50,5
Esporte Clube Vitória
397 102 25,69
Sport Club Inter-nacional
399 100 25,06
Grêmio 399 129 32,33
Esporte Clube Juventude
378 180 47,61
Sport Clube do Recife
398 103 25,87
Clube Náutico Capibaribe
395 100 25,31
Figueirense Fute-bol Clube
395 144 36,45
Avaí Futebol Clube 391 124 31,71
Atlético Paranaense – Furacão
398 224 56,28
Coritiba Foot Ball Club – Coxa
395 137 34,68
Total: 6338 2169 34,22
FONTE: Elaborado pelos autores
A Tabela 2 revela o percentual de responden-
tes atingidos das referidas comunidades e usuários
pesquisados.
Para a pesquisa qualitativa, foram realizadas
entrevistas semi-estruturadas para os gerentes de
marketing das empresas patrocinadoras já descri-
tas anteriormente.
Um dos instrumentos para coleta dos dados para a pesquisa foi o
questionário estruturado dirigido aos integrantes
das comunidades já mencionadas, do site de relacionamento Orkut.
171R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 162-175, jan./jun. 2011
sa quantitativa, foi deliberado que seria necessário
o sorteio de 3 camisas oficiais das equipes estuda-
das. Após a divulgação dessa informação, os resul-
tados começaram a surgir aumentando o número
de respostas dos questionários.
Já para os gerentes de marketing das orga-
nizações supracitadas, foi definido como instrumen-
to de pesquisa o roteiro estruturado de entrevista.
Foram realizadas duas entrevistas. Uma para as
empresas que patrocinam simultaneamente times
rivais da mesma região e outra para as corporações
concorrentes, do mesmo segmento, que patrocinam
equipes rivais da mesma região. A entrevista foi
adaptada de Ilton Teitelbaum (1997) e foram envia-
das para o e-mail dos responsáveis pelo marketing
das empresas. Algumas, após receber a entrevista
afirmaram não poder colaborar com a pesquisa ale-
gando tratar-se de informações de estratégia, e com
outras empresas não foi possível estabelecer conta-
to por telefone ou e-mail.
Para fins de tratamento de dados foi utiliza-
da na pesquisa qualitativa a categorização simples,
que permitiu compreender os motivos que levaram
as organizações pesquisadas a patrocinar as equi-
pes de futebol em questão, quais os objetivos que
as empresas pretendem atingir com essa parceria,
qual o papel do marketing nessa relação, entre ou-
tros fatores determinantes para a continuidade do
apoio ao clube de futebol.
4 Resultados
Para a pesquisa qualitativa foram elaboradas
entrevistas direcionadas aos gerentes das empresas
patrocinadoras das equipes de futebol em questão.
A primeira entrevista a ser analisada é a da
empresa Minasgás, patrocinadora das equipes do
Sport Club do Recife, Clube Náutico Capibaribe e
Santa Cruz. Foi questionado ao gerente de Market-
ing da empresa como se deu a aproximação entre o
segmento empresarial e os clubes pernambucanos,
o mesmo informou que a iniciativa ocorreu pelo
Vice-Presidente do Santa Cruz, e veio ao encontro
de uma estratégia para aproximar consumidores do
Norte e Nordeste do país.
O segundo ponto questionado foi com rela-
ção ao patrocínio simultâneo de equipes rivais de
futebol. O gerente informou que a Minasgás não pa-
trocina equipes rivais e sim equipes populares de
futebol. Considera os clubes do Recife com apelo
popular e tradição no Nordeste do Brasil.
Quando indagado sobre o uso dessa estraté-
gia, se teria sido para evitar algum tipo de rejeição
por parte dos torcedores/consumidores aos produ-
tos da empresa, o gerente de marketing informou
que não, pois patrocinava o Santa Cruz há dois
anos antes de firmar contrato com Náutico e Sport.
Classifica como ótima a oportunidade de patrocinar
mais de uma equipe. Vê como objetivo da Minasgás
a aproximação dessas torcidas com a marca, atra-
vés da venda de camisas e materiais esportivos com
a logomarca do grupo. E estabelece como meta
para o departamento de marketing/comunicação
da Minasgás a divulgação constante da marca para
capturar valor no capital investido.
O desempenho dos times não é fator determi-
nante para continuidade ou não da parceria. Como
exemplo é citado o rebaixamento do Santa Cruz para
a Série C do Brasileiro, quando foi oportunizada a re-
novação do contrato com a Minasgás. A missão da
empresa é também oferecer condições para os times
melhorarem o próprio desempenho. A ideia é buscar
um casamento ideal entre as necessidades do time
e da empresa. Na opinião do gerente de marketing
da Minasgás, Bretãs, o mercado futebolístico merece
atenção contínua.
A segunda entrevista foi feita com o gerente
de Marketing da Unimed/Florianópolis e a iniciativa
de patrocinar simultaneamente os rivais Avaí e Fi-
gueirense. Na visão da empresa, patrocinar apenas
um dos clubes seria como dividir a região (Grande
Florianópolis) em duas partes. O foco da parceria é
prestigiar a questão cultural de ambas as torcidas.
Foi considerado o alto retorno de investi-
mento no futebol, considerado o maior esporte do
país. A marca acredita na identidade com o público
172
e quer associar-se a uma imagem de saúde e qua-
lidade de vida. Deste modo, o gerente negou que a
estratégia seja para evitar a rejeição por parte dos
torcedores/consumidores de um determinado filão.
Os resultados esperados pela empresa na
parceria com Avaí e Figueirense é obter o retorno
oferecido pelo investimento em futebol, associar a
prática de esportes à saúde (ramo da empresa) e
fortalecer a marca do grupo. A Unimed/Florianópo-
lis explora a imagem de jogadores e técnicos dos
clubes patrocinados em eventos promovidos, liga-
dos a área de Saúde. São usados ainda como mate-
rial promocional da empresa tabelas de jogos dos
campeonatos, personalizados com as logomarcas
dos clubes e da empresa, além de viseiras e outros
materiais esportivos.
O Marketing da Unimed/Florianópolis é res-
ponsável por administrar todas as demandas decor-
rentes da parceria com os clubes. Desde ações de
divulgação e estudos a respeito dos retornos até a
gestão do uso de serviços da empresa pelos clien-
tes.
O gerente de Marketing da Unimed/Floria-
nópolis considera fundamental o papel da mídia
na relação. Ele considera o instrumento capaz de
delinear a imagem que a empresa pretende pas-
sar. A mídia é utilizada para ressaltar os benefícios
advindos da parceria. O desempenho de Avaí e Fi-
gueirense nos campeonatos que disputam não é
determinante para a continuidade da parceria, que
já dura seis anos.
Com a Samsung não foi possível a entrevista
completa, entretanto, a Relações Públicas da mesma
forneceu informações com relação ao futuro do ma-
rketing esportivo da empresa. Na época, a Samsung
não patrocinava mais o Corinthians.
A análise dos questionários aplicados aos
torcedores foi dividida em dois grupos. Grupo 1:
clubes rivais patrocinados por empresas concor-
rentes; Grupo 2: clubes rivais patrocinados simul-
taneamente pela mesma empresa; contando este
com subgrupos das regiões Nordeste (Grupo 2-A)
e Sul (Grupo 2-B). Todas as equipes pesquisadas
apresentaram uma maioria de torcedores do sexo
masculino, com idade até 25 anos, solteiros e com
escolaridade entre Nível Médio e Superior Incom-
pleto.
Os resultados do Grupo 1 demonstram, resu-
midamente, uma maioria de homens, solteiros, com
idade entre 18 e 25 amos, com Ensino Médio ou Su-
perior Incompleto, ditos fanáticos, que percebem os
patrocinadores do clube do coração e, às vezes, os
dos rivais. O diagnóstico comprova estudo de Mar-
shal (apud Melo Neto, 2000) e Pozzi (1998) com
relação à visibilidade e o retorno que a marca rece-
be com o patrocínio esportivo. Os torcedores deste
grupo ainda acompanham os jogos do seu time do
coração no estádio ou pela TV.
O Grupo 1 opta por, às vezes, adquirir os pro-
dutos dos patrocinadores do seu time do coração e
mostra indecisão quanto a comercialização dos arti-
gos dos clubes rivais. As opções mais votadas sobre
a aquisição de mercadorias das marcas rivais foram:
nunca, raramente ou às vezes. E a razão principal
para isto é que os torcedores não desejam contri-
buir financeiramente com o time que eles mais de-
testam. Outros disseram que a marca fica atrelada
ao clube adversário e uma parcela significativa disse
que o fato da empresa patrocinar a equipe rival não
interfere na decisão de compra deles. Por último,
o desempenho dos clubes do coração nos jogos e
campeonatos motiva os torcedores deste grupo a
adquirirem os produtos das empresas patrocinado-
ras.
No Grupo 2-A verifica-se uma maioria do
sexo masculino, solteiros, com idade entre 18 e 25
anos, com Ensino Médio ou Superior Incompleto,
são fanáticos sempre e costumam assistir aos jogos
diretamente do estádio de futebol. Esse subgrupo
sempre percebe a marca da empresa patrocinado-
ra do seu clube do coração e, às vezes, a do time
adversário. Esses torcedores às vezes adquirem os
produtos do seu clube do coração e sabem que os
rivais são patrocinados simultaneamente pela mes-
ma empresa.
A estratégia de uma empresa apoiar con-
juntamente o clube do coração do torcedor e uma
equipe adversária dividiu opiniões. Uma parcela
avaliou que a empresa deveria optar por uma úni-
173R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 162-175, jan./jun. 2011
ca equipe, alguns não dão importância à empresa
patrocinar simultaneamente sua equipe e a rival,
enquanto outros avaliam como boa a estratégia,
pois consegue agradar os torcedores de ambos os
clubes.
Os torcedores deste subgrupo avaliaram que
o patrocínio simultâneo ao seu clube do coração e
aos rivais não interfere no poder de compra deles e,
que o fato do patrocinador estar atrelado também
a uma equipe rival, não mudou a imagem que eles
faziam da empresa. Sentem-se também motivados a
adquirir produtos de acordo com o desempenho de
seus clubes em jogos e campeonatos.
5 Considerações Finais
Com a análise dos resultados das duas pes-
quisas utilizadas percebeu-se grande visibilidade de
marca e os efeitos do patrocínio são bastante ani-
madores para as organizações. O patrocínio benefi-
cia tanto a organização apoiadora quanto a equipe
de futebol.
No que tange à pesquisa qualitativa houve
certa dificuldade de conseguir as informações ne-
cessárias para resolução da pergunta de pesquisa
deste estudo, e como somente duas instituições
responderam a entrevista têm-se a posição apenas
das empresas que patrocinam simultaneamente
equipes rivais de futebol.
Essas informações são confirmadas através
dos resultados obtidos com as pesquisas quantita-
tivas direcionadas aos torcedores. De todo modo
foi possível perceber que o patrocínio às equipes
de futebol é uma ferramenta que o marketing
disponibiliza às organizações que pretendem utili-
zar-se de estratégias diferenciadas e capazes de
atingir um público específico e, ao mesmo tem-
po, massificado. Isso é percebido tanto com as
empresas que apóiam os clubes do Grupo 1, de
maneira focada; como com as empresas parceiras
que dão apoio aos clubes do Grupo 2, de maneira
simultânea.
Inicialmente houve a dificuldade de se con-
seguir o número de respondentes requerido, por
equipe, para o questionário. Como a pesquisa deu-
-se através do Orkut, onde havia a divulgação dos
links referentes a cada clube pesquisado, muitos
usuários desse site de relacionamento acredita-
vam tratar-se de vírus, já que essa prática de enviar
links maliciosos é bastante comum no meio virtual,
e, optavam por não clicar no referido link, e conse-
qUentemente não respondiam a pesquisa.
Um dos fatores que dificultou a efetivação
da pesquisa foi o fato das empresas patrocinado-
ras não fornecerem informações através das entre-
vistas, alegando que são informações de estratégia
e que as mesmas eram confidenciais. Outro ponto
que impediu a perfeita realização dessa pesquisa foi
a dificuldade de se contatar os responsáveis pelo
marketing das empresas patrocinadoras. Quando o
contato com a empresa era possível, o responsável
pelas decisões de marketing esportivo estava em
reunião, ou em viagem de negócios ou em férias.
Com algumas empresas não foi possível o contato
por telefone ou os e-mails enviados não obtiveram
resposta. Duas empresas que patrocinam times ri-
vais simultaneamente responderam a entrevista,
possibilitando o alcance do objetivo.
De todo modo foi possível perceber que o patrocínio
às equipes de futebol é uma ferramenta que o marketing disponibiliza às organizações
que pretendem utilizar-se de estratégias diferenciadas
e capazes de atingir um público específico e, ao
mesmo tempo, massificado.
174
Pode-se citar ainda como limitação, o estu-
do ter-se dado através do Orkut, o que restringe a
pesquisa aos torcedores que se utilizam desse site.
Foram encontrados outros times cujos patrocinado-
res se utilizam da estratégia de patrocinar ao mesmo
tempo, equipes rivais, porém, por se tratar de equi-
pes menores e estarem na segunda divisão do fute-
bol brasileiro, não se utiliza como objeto do estudo, o
que limitou a pesquisa a apenas 16 clubes de futebol.
Através das conclusões obtidas neste traba-
lho, novos estudos podem ser realizados a fim de
enriquecer as correlações conceituais iniciadas por
esta pesquisa. Faz-se possível incluir outros clubes
• Recebido em: 14/10/2010• Aprovado em: 05/04/2011
rivais do país que possuam os mesmos parceiros.
Outra sugestão é aplicar uma técnica/estatística
mais apurada, para que se confirmem a significân-
cia dos dados relatados nesse estudo. É possível
também focar no âmbito do regionalismo e, apro-
veitar o intervalo das partidas de futebol para fa-
zer abordagens diretas aos torcedores em resposta
aos questionários científicos.
175R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 162-175, jan./jun. 2011
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Aplicação da análise multivariada no desempenho e hierarquização das escolas estaduais do núcleo regional de União da Vitória.Application of multivariate analysis on performance and hierarchical state schools of the Regional Centre of União da Vitória.
177R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 176-189, jan./jun. 2011
1 Doutor em Ciências Geodésicas pela Universidade Federal do Paraná. Professor da FAE Centro Universitário. E-mail: [email protected]
2 Mestre em Métodos Numéricos em Engenharia pela Universidade Federal do Paraná. Agente Educacional do Colégio Estadual Zuleide Samways Portes. E-mail: [email protected]
Aplicação da análise multivariada no desempenho e hierarquização das escolas esta-duais do núcleo regional de União da Vitória. Application of multivariate analysis on performance and hierarchical state schools of the Regional Centre of União da Vitória.
ResumoEste trabalho busca identificar a importância das variáveis referente ao desempenho e
à infraestrutura das escolas públicas estaduais do ensino fundamental pertencentes ao
Núcleo Regional de Educação de União da Vitória (NRE-UVA). Para o desenvolvimento
desta pesquisa, utilizou-se como instrumento principal a coleta de dados por meio
de questionários que foram distribuídos nas escolas divididos em três blocos:
escolas, professores e alunos, com o objetivo de obter uma descrição quantitativa de
informações. Organizaram-se os dados utilizando parte das variáveis correspondentes
formando uma matriz para cada bloco, após utilizou-se para análise dos dados a
técnica estatística da Análise Fatorial com o método da rotação Varimax, a fim de
obter os indicadores de maior poder de explicação em cada um dos blocos. A partir
desta análise utilizou-se sobre os indicadores revelados a análise de agrupamento
(Cluster) usando método de Ward, do qual identificou a formação de quatro
agrupamentos na distância um vírgula cinco no eixo das ordenadas, tendo destaque
positivo em desempenho apenas o primeiro grupo formado pelas escolas que
apresentaram as melhores condições de trabalho aos professores e o quarto grupo
formado pelas escolas com melhores recursos, demandas, condições de infraestrutura
e socioeconômica caracterizado pelos diretores e alunos.
Palavras-chave: Escolas; Desempenho; Análise Fatorial; Análise de Agrupamento.
AbstractThis paper seeks to identify the importance of the variables on the performance and
the infrastructure of public schools from elementary schools belonging to the Regional
Education Center of the União da Vitória (NRE-UVA). To develop this research the
main instrument used to collect data were the questionnaires that were distributed
to schools and divided into three blocks: schools, teachers and students, in order to
obtain a quantitative description of information. The data was organized by using a
portion of the corresponding variables in a matrix for each block, and later the statistical
technique of Factor Analysis with Varimax rotation method was used for data analysis,
to obtain indicators of greater explanatory power in each block. After this analysis
we used on the indicators revealed the cluster analysis (Cluster) using Ward’s method,
which identified the formation of four clusters of schools in the distance of a point five
in the ordinate axis, with positive emphasis on performance, with only the first group of
the schools that showed the best working conditions for teachers and the fourth group
formed by schools with better resources, demands, infrastructure and socioeconomic
conditions characterized by the directors and students.
Keywords: Schools, Performance, Factor Analysis, Cluster Analysis.
Jair Mendes Marques1
Paulo Anselmo Santana Owsiany2
178
Introdução
Embora a escola seja responsável por mudan-
ças sociais, políticas e culturais é necessário estar
sempre buscando alternativas que correspondam às
necessidades reais dos alunos e da comunidade que
possa melhorar a qualidade do ensino. Na atualidade,
a qualidade do ensino é avaliada pelo Ministério da
Educação e Cultura (MEC) por meio do Instituto Na-
cional de Ensino e Pesquisa (INEP) através do Exame
Nacional do Ensino Médio (ENEM), Sistema de Ava-
liação da Educação Básica (SAEB) e a Prova Brasil,
quando adquire o papel central e estratégico do mo-
nitoramento do sistema educacional. Mesmo com os
esforços do MEC para avaliar a qualidade do ensino e
a identificação das causas que as instituições de en-
sino enfrentam os problemas ainda continuam. Isto
ocorre pela necessidade de avaliar variáveis relacio-
nadas diretamente aos educandos, professores e as
instituições de ensino.
De acordo com Machniki (2010), o material
didático, a sala de aula, as condições de estudo,
o trabalho do professor, as condições físicas dos
estabelecimentos de ensino, o ambiente escolar e o
ambiente social influenciam no rendimento escolar.
Segundo Souza (2001), a qualidade dos ser-
viços educacionais depende, em grande parte, da
adequação de suas instalações físicas. O ambiente
de uma escola também educa e pode tornar a for-
mação de seus alunos não apenas mais eficiente
como também muito agradável. Perceber o aspecto
negativo do prédio, do pátio, das salas de aula, dos
laboratórios e as questões de limpeza deve ser uma
preocupação constante de todos os gestores.
Diante desta situação, este estudo objetiva
evidenciar a diferença no desempenho das escolas
públicas do ensino fundamental, pertencentes ao
Núcleo Regional de Educação de União da Vitória
e hierarquizá-las mediante um conjunto de indica-
dores de cada bloco: escola, professores e alunos
contendo variáveis relacionadas aos aspectos de
infraestrutura, perfil socioeconômico, localização,
cultura e outras com características diferenciadas
quanto ao desempenho. Assim será possível conhe-
cer as escolas que se destacam positivamente ou
negativamente de acordo com os diretores, profes-
sores e os alunos. É também propósito deste tra-
balho contribuir significativamente na melhoria da
qualidade do ensino e das próprias escolas em ter-
mos de infraestrutura.
1 Análise Multivariada
A análise multivariada é assim chamada por-
que os dados incluem medidas simultâneas sobre
muitas variáveis, consiste de um conjunto de técni-
cas estatísticas que possibilitam analisar e comparar
dados referentes a diversas variáveis. Tais técnicas
vêm sendo ultimamente bastante difundidas e têm
ocupado cada vez mais espaço por conferirem maior
precisão aos resultados e agilidade na mensuração
da satisfação do mesmo com aplicações em diversas
áreas do conhecimento, tais como na área econômi-
ca, ciências médicas, biologia, física e no meio aca-
dêmico. Na prática, quando se faz uma observação
de um indivíduo o mesmo é caracterizado por várias
propriedades, justificando-se assim o emprego das
técnicas multivariadas.
Segundo Chaves Neto (1997) a análise
multivariada, consiste no estudo de soluções para
problemas relacionados com:
a) inferências sobre médias multivariadas;
b) análise da estrutura de covariância de
uma matriz de dados;
c) técnicas de classificação e agrupamentos.
É necessário estar sempre buscando alternativas que correspondam às neces-
sidades reais dos alunos e da comunidade que possa melhorar a qualidade do
ensino.
179R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 176-189, jan./jun. 2011
1.1 Análise Fatorial
A análise fatorial é o nome genérico dado a
uma classe de métodos estatísticos cujo propósito
principal é definir estrutura subjacente em uma ma-
triz de dados, na qual todas as variáveis são simulta-
neamente consideradas, cada uma relacionada com
todas as outras (HAIR et al, 2005).
Segundo Johnson e Wichern (1998) a análise
fatorial é uma técnica estatística multivariada
que trata do relacionamento entre conjuntos de
variáveis, em que:
a) as variáveis aleatórias são agrupadas de
acordo com suas correlações;
b) dentro de um grupo as variáveis aleató-
rias são altamente correlacionadas entre
si;
c) de um grupo para outro as correlações
são baixas;
d) admissível que cada grupo represente
um fator, o qual é responsável pelas cor-
relações observadas.
O objetivo da análise fatorial é descobrir
fatores latentes ou ocultos que geram a estrutura
de correlação de um conjunto de variáveis. Esses
fatores supõem-se independentes e linearmente
correlacionados às variáveis.
1.1.1 Método das Componentes Principais
O método das componentes principais é um
dos mais usados para resolver o problema clássico
da análise fatorial. Análise de componentes princi-
pais está relacionada com a estrutura de covariância
por meio de poucas combinações lineares das vari-
áveis originais em estudo. Os objetivos dessa análise
são a redução da dimensão original e a facilitação
da interpretação das análises realizadas. Em geral
a explicação de toda a variabilidade do sistema de-
terminado por p variáveis só pode ser efetuada por
p componentes principais. No entanto, uma grande
parte dessa variabilidade pode ser explicada por um
número r menor de componentes,
pr ≤
1.1.2 Teste de Esfericidade de Bartlett
De acordo com Marques (2003) o teste de
Bartlett testa a hipótese de que as variáveis não se-
jam correlacionadas na população. A hipótese bá-
sica diz que a matriz de correlação da população é
uma matriz identidade o que indica que o modelo
fatorial é inapropriado. A estatística do teste é dada
por:
Rpn ln6
52)1(2
+
−−−=Χ
que tem uma distribuição qui-quadrado com:
2)1( −
=ppv
grau de liberdade, onde:
n = tamanho da amostra;
p = número de variáveis;
|R| = determinante da matriz de correlação.
A análise fato-rial é o nome genérico dado a uma classe de
métodos estatísticos cujo propósito principal é definir
estrutura subjacente em uma matriz de dados, na qual todas as variáveis são simultaneamente
consideradas.
180
1.1.3 Medida de Adequação da Amostra (MSA) de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO)
Essa medida é representada por um índice
(MSA) que avalia a adequação da análise fatorial,
sendo calculada por:
1.1.5 Rotação de Fatores
A rotação de fatores é uma técnica para girar
os eixos de referência dos fatores em torno da ori-
gem, de forma a orientá-los a facilitar a interpreta-
ção do conjunto de variáveis em cada fator. A rota-
ção pode ser ortogonal ou oblíqua, caso os eixos se
mantiverem ou não em 90 graus entre si durante o
giro. O objetivo é facilitar a leitura dos fatores, pois
a rotação deixa pesos fatoriais altos em um fator
e baixos em outros, definindo mais claramente os
grupos de variáveis que fazem parte de um fator
estudado. A rotação oblíqua é mais realista, porém
mais controversa. O método de rotação mais uti-
lizado é o Varimax o qual simplifica as colunas da
matriz de fatores.
1.2 Análise de Cluster
O objetivo da análise é agrupar objetos se-
melhantes por meio da mínima variância e separar
os grupos pela maximização da variância entre eles,
onde o agrupamento é feito de tal forma que haja
homogeneidade dentro e heterogeneidade entre os
agrupamentos. Encontrar nos dados uma estrutura
natural de agrupamento é uma importante técnica
exploratória. A análise de agrupamento por sua vez
não considera o número de grupos e é realizada
com base na similaridade ou dissimilaridade, ou
seja, distâncias (JOHNSON; WICHERN, 1998).
∑ ∑∑∑∑∑
≠≠
≠
+=
kjjk
kjjk
kjjk
qr
r
22
2
MSA
Onde: r2JK
é o quadrado dos elementos da
matriz de correlação original (exceto a diagonal);
q2JK
é o quadrado dos elementos fora da diagonal
da matriz anti-imagem da correlação.
Valores altos (entre 0,5 e 1) indicam que
a análise fatorial é apropriada, enquanto que os
valores baixos, abaixo de 0,5 indicam que a análise
fatorial pode ser inadequada.
1.1.4 Escolha do Número de Fatores
A escolha do número de fatores é uma das
tarefas mais importantes da Análise Fatorial. Hair
Junior et al. (2005) discutem que, se o pesquisador
opta por um número muito reduzido, não é possí-
vel identificar estruturas importantes existentes nos
dados; por outro lado, se o número é excessivo, ele
pode vir a ter problemas de interpretabilidade dos
fatores. Existem na literatura vários critérios que au-
xiliam na determinação do número de fatores, como
por exemplo:
a) número de fatores igual ao número de
autovalores maiores que 1 (critério de
Kaiser);
b) número de fatores igual ao número de
autovalores maiores que um número V;
c) número de fatores que explicam pelo
menos determinado percentual da vari-
ância total;
d) número de fatores igual a certo valor N.
Encontrar nos dados uma estrutura natural
de agrupamento é uma importante técnica ex-
ploratória.
181R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 176-189, jan./jun. 2011
1.2.1 Medidas de Similaridade e Dissimilaridade
Para agrupar os itens é necessário especifi-
car um coeficiente de similaridade em que quanto
maior o valor observado, mais parecidos serão os
objetos (como o coeficiente de correlação), ou um
coeficiente de dissimilaridade onde quanto maior
o valor observado menos parecidos, ou seja, mais
dissimilares serão os objetos (como a distância eu-
clidiana).
Neste estudo foi utilizada a distância eucli-
diana por ser uma das mais conhecidas e adotadas.
Para definir-se a distância entre dois objetos no es-
paço p-dimensional, sejam...
observações entre dois objetos (indivíduos),
segundo Marques (2003), pode ser calculada da
seguinte forma:
1.2.2 Método de Agrupamento Hierárquico
O método hierárquico pode ser de dois tipos:
aglomerativo e divisível, no qual se estabelece uma
relação de hierarquia entre o objeto e o conjunto de
objetos. Uma vez incorporado a um grupo, o objeto
permanece associado a ele até o final do processo
de agrupamento. Cabe destacar ainda, que o
método hierárquico apresenta como desvantagens,
o fato de que só fundem ou dividem dois clusters
de cada vez, e um cluster já formado não se divide.
Nesse método, os critérios de agrupamentos mais
utilizados são o da associação simples, que é
baseado nas menores distâncias entre os objetos,
e o da associação completa, baseado nas maiores
distâncias entre os objetos e para este estudo
destaca-se o método de Ward.
1.2.2.1 Método de Ward
Considerado um procedimento de agrupa-
mento hierárquico baseado em minimizar a “per-
da de informação” na junção de dois grupos. Este
método é geralmente realizado com a perda de in-
formações assumindo ser um aumento no critério
do Somatório do Quadrado dos Erros (ESS), que é
dado por:
[ ]pXXXX 11211'1 = [ ]pXXXX 22221
'2 =e
( )∑
=
−=p
iii yxyxd
1
2),(
)()(ESS
1
' xxxx j
N
jj −−= ∑
=
Onde xj é a medida multivariada associada
ao j-ésimo item e é a média de todos os itens.
Os resultados do método de Ward podem
ser exibidos como um dendrograma. O eixo vertical
apresenta os valores do ESS em que ocorre a fusão.
O método de Ward é baseado no conjunto de ob-
servações multivariadas que devem ser aproxima-
damente de forma elíptica (JOHNSON; WICHERN,
1998).
2 Material e Métodos
Para testar a viabilidade e a eficiência dos
modelos, foram utilizados conjuntos de dados
quantitativos extraídos da pesquisa feita nas esco-
las de ensino fundamental pertencentes ao Núcleo
Regional de Educação de União da Vitória realiza-
da através de questionários aplicados, em três seg-
mentos: o primeiro para a escola (diretor responsá-
vel por responder), o segundo aos professores e o
terceiro aos alunos. O objetivo da coleta de dados é
levantar características descritivas sobre as escolas,
tais como: educação, estrutura, ambiente, recursos,
cultura, condições socioeconômicas da comunida-
de escolar, localização, entre outras destacando o
aproveitamento na melhoria do ensino de acordo
com a caracterização das amostras.
182
Antes da aplicação dos questionários foi
obtido junto ao Núcleo de Educação informações
das escolas referentes ao início do ano de 2009,
onde foi possível verificar o número de alunos e
professores de cada instituição podendo avaliar
a quantidade de questionários que deveriam ser
usados na coleta de dados. Os dados fornecidos
pelo Núcleo Regional de Educação relataram a
existência de 1.531 professores, 25.020 alunos e
850 turmas do total geral reunindo 42 instituições
de ensino distribuídas entre 9 municípios. Para a
caracterização das amostras calculou-se o número
equivalente a 20% dos alunos e 40% dos professores
de cada instituição para que, posteriormente fossem
aplicados os questionários.
Com o intuito de mensurar estes aspectos,
devido ao número pequeno de escolas entre muitas
variáveis, foram selecionadas apenas um número re-
duzido de variáveis através de consultas as equipes
pedagógicas, diretores, professores e alunos para
cada um dos blocos:
– Variáveis selecionadas do questionário
escola:
E1 - Adaptação para deficientes;
E2 - Quadra de esportes;
E3 – Condição biblioteca;
E4 – Disponibilidade computadores aos
alunos;
E5 – Demanda de pedagogos;
E6 - Premiação na Olimpíada de Mate-
mática;
E7 - Recursos do Governo;
E8 – Grau de risco da escola devido à lo-
calização;
E9 - Nível clientela escolar;
E10 - Serviços gerais;
E11 – Condição dos banheiros;
E12 – Condição das salas de aula.
O critério usado na identificação de determi-
nadas variáveis foi o uso de respostas binárias (0 ou
1) por se tratar de uma opção para cada resposta
(apenas o diretor), considerando o valor 1 (um) para
resposta mais adequada, melhor condição ou satis-
fatório e o valor 0 (zero) para resposta considerada
inadequada, pior condição ou insatisfatório.
– Variáveis selecionadas do questionário
professor:
P1 - Qualidade do material didático do
aluno;
P2 - Condição biblioteca;
P3 - Desinteresse do professor devido ao
salário;
P4 - Desinteresse dos alunos pela condição
social, política e econômica;
P5 - Nível de aprendizagem dos alunos;
P6 - Condições de trabalho do professor;
P7 - Grau de risco da escola devido à loca-
lização;
P8 - Limpeza geral;
P9 - Condições dos banheiros;
P10 – Condições das salas de aulas;
P11- Condição quadro-negro;
P12 - Inexistência de agressão física entre
alunos.
– Variáveis selecionadas do questionário aluno:
A1 - Escolaridade do pai médio ou superior;
A2 - Renda familiar até um salário mínimo;
A3 – Condições da biblioteca;
A4 – Satisfação com a direção da escola;
A5 – Serviços gerais;
A6 - Condições dos banheiros;
A7 - Condições das salas de aula;
A8 - Famílias beneficiadas pelo programa
Bolsa Família;
A9 – Frequência dos responsáveis na escola;
A10 - Estudam no mínimo trinta minutos por
dia;
A11 – Condição quadra de esportes;
A12 – Condição do pátio escolar.
O critério usado para os professores e alunos
na identificação das variáveis foi o uso de respostas
percentuais, ou seja, quanto maior for o percentual
183R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 176-189, jan./jun. 2011
(mais próximo de 1) melhor é a condição ou satisfa-
ção dos mesmos para determinada variável.
O procedimento estatístico foi aplicar sobre
as matrizes o teste da Medida de Adequacidade da
Amostra (MSA) e o teste de esfericidade de Bartlett.
Após a aplicação de ambos os testes foi realizada
em cada matriz a análise fatorial, sendo a extração
dos fatores feita pelo método das componentes
principais através da rotação Varimax, tendo como
critério o número de fatores explicando no mínimo
75% da variância total a fim de obter uma melhor in-
terpretabilidade dos fatores em relação à correlação
entre as variáveis, usando o programa computacio-
nal Matlab 6.0 (MATSUMOTO, 2002).
Baseado no resultado da análise fatorial
sobre a matriz dos questionários das escolas reali-
zou-se uma interpretação sobre os escores fatoriais
finais ponderados (obtidos através a média ponde-
rada entre os escores fatoriais e a proporção de
explicação dos respectivos fatores) das 42 institui-
ções convertidos na escala entre 0 e 1 para identi-
ficar o nível de rendimento percentual das escolas.
Em seguida realizou-se a interpretação dos escores
fatoriais finais nas análises dos professores e
também dos alunos e posteriormente procedeu-se a
análise de agrupamento (Cluster), sobre os escores
fatoriais finais resultantes das análises fatoriais dos
três blocos usando o software Statistica 7.0.
3 Resultados e Discussão
Resultados da análise das escolas:
Teste de Esfericidade de Bartlett e Medida de Adequacidade da Amostra de Kaiser_Meyer Olkin (KMO):
(1) Teste de Esfericidade de Bartlett;
Q2 = 98.242, com p valor = 0 ao nível de 5% indicando que existe uma correlação significativa entre as variáveis.
(2) Medida de Adequacidade da Amostra de Kaiser _Meyer Olkin (KMO).
MSA = 0.5145, como MSA > 0.5 indica que a análise fatorial é adequada.
Na sequência realizou-se a análise fatorial
pelo método das componentes principais, da qual
revelou sete fatores cujo percentual de variância
explicada pelo primeiro fator é 20,5%, o segundo
16,17%, o terceiro 12,25%, o quarto 10,67%, o quinto
8,58%, o sexto 6,83% e o sétimo fator 6,25% de
explicação. Dessa forma os sete fatores explicam
81,08% da variabilidade total.
QUADRO 1 Variáveis que compõem cada fator, de
acordo com os pesos para cada um dos
fatores – questionário escola
No gráfico 1 verifica-se que 14,29% das esco-
las não atingiram o indicador 0,2, isso significa que 6
instituições desempenham menos de 20% dos requi-
sitos relacionados ao nível de infraestrutura e inves-
timento público pelo fato dos fatores F1 e F2 juntos
apresentarem um poder explicativo de quase 37%,
ou seja, são os fatores que mais influenciam no nível
de indicação. Deve-se levar em conta, também, os
demais fatores que correspondem às necessidades
de adaptações do espaço físico, recursos para con-
tratação de funcionários e investimentos tecnoló-
gicos e na segurança em torno da escola. Os resul-
tados apresentados para esse grupo de escolas
estão condizentes com a realidade devido à falta de
investimento no ambiente escolar, pela necessidade
Fator Variáveis de cada fator
F1E5: Demanda de pedagogosE7: Recursos do governo
F2E12: Condição das salas de aulaE3: Condição bibliotecaE11: Condição dos banheiros
F3E1: Adaptação para deficientesE10: Serviços gerais
F4E2: Quadra de esportesE4 Disponibilidade computadores na biblioteca aos alunos
F5 E9: Nível clientela escolar
F6E6: Premiação na Olimpíada de Matemática
F7E8: Grau de risco da escola devido à localização
Fonte: O autor
184
de aumento na demanda funcional, alocação de
recursos para reformas e/ou construção de novas
escolas e nas condições socioculturais da comu-
nidade. No intervalo de 0,2 até 0,4 apresenta um
percentual de 14,29% das escolas com desempe-
nhos que variam de 20% a 40% de suas necessi-
dades. Os resultados, embora um pouco melhor
do que o grupo anterior, apresentam as mes-
mas deficiências significativas nas novas variá-
veis (fatores). Nos indicadores maiores que 0,4
e menores ou iguais a 0,6, são representadas por
35,71% que atingiram um desempenho de até 60%
de aproveitamento, na outra escala cujos valores
são maiores que 0,6 estão localizadas 15 escolas
que representam cerca de 35,71% do total e são
consideradas a partir desta escala as que apon-
tam ter as melhores condições de infraestrutu-
ra, geralmente são as escolas que estão inseridas
mais próximas aos centros urbanos ou estão loca-
lizadas nos municípios com melhores condições
econômicas da região, podendo estar caracteri-
zada numa comunidade com melhores condições
sociais e culturais possibilitando maior favore-
cimento dos líderes políticos. De acordo com a
localização dessas 15 escolas, 10 estão localiza-
das nos dois principais municípios: São Mateus do
Sul e União da Vitória (sede do Núcleo Regional),
ambos com mais de 40 mil habitantes.
No geral, 64,28% das escolas não consegui-
ram obter mais de 60% dos itens necessários para
uma melhor colocação em relação às variáveis da
análise.
GRÁFICO 1 – Indicador de desempenho por escola
Para os resultados da análise da amostra dos
professores tem-se:
Teste de Esfericidade de Bartlett e Medida de
Adequacidade da Amostra de Kaiser_Meyer Olkin
(KMO):
(1) Teste de Esfericidade de Bartlett;
Q2 = 128,4091, com p valor = 0 ao nível de
5% indicando que existe uma correlação
significativa entre as variáveis.
(2) Medida de Adequacidade da Amostra
de Kaiser _Meyer Olkin (KMO).
MSA = 0,5217, como MSA > 0.5 indica que a
análise fatorial é adequada para a amostra utilizada.
Resultaram na análise fatorial seis fatores,
usando como critério que a explicação dos fatores
seja no mínimo de 75%. Sendo assim, o primeiro fator
explica 24,43% da variabilidade total e os demais
fatores apresentam uma proporção de 16,5%, 12,5%,
11,5%, 7,67% e 6,42% respectivamente e os seis
fatores juntos explicam 79% de variabilidade, este
valor é a soma da proporção de todos os fatores.
QUADRO 2 Variáveis que compõem cada fator, de
acordo com os pesos para cada um dos
fatores – questionário professor.
00,20,40,60,8
11,2
0 5 10 15 20 25 30 35 40 45Escolas
Indi
cado
res
FONTE: O autor
FATOR VARIÁVEIS DE CADA FATOR
F1P2: Condição bibliotecaP6: Condições de trabalho do professorP11: Condição quadro-negro
F2P1: Qualidade do material didático do alunoP5: Nível aprendizagem dos alunos
F3
P4: Desinteresse dos alunos pela condição social, política e econômicaP3: Desinteresse Professor devido ao salárioP7 Grau de risco da escola devido à localização
F4 P8: Limpeza geral
F5P12: Inexistência de agressão física entre alunos
F6P9: Condição dos banheirosP10: Condições das salas de aula
FONTE: O autor
185R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 176-189, jan./jun. 2011
O gráfico 2, mostra que 8 escolas tiveram
indicadores menores ou iguais a 0,2 e isso revela
que 19,40% das escolas resumem seu rendimen-
to e condições de infraestrutura abaixo de 20%.
O baixo rendimento pode estar caracterizado
pelas condições de trabalho do professor: pode
ser pela dificuldade de acesso à escola, violência
em torno e principalmente por falta de estrutura
no trabalho apresentando um nível explicativo de
24,43% no fator F1, sendo o fator mais influencia-
do no rendimento. Os demais fatores contribuem
54,57% de explicação da variabilidade total, juntos
podem influenciar no baixo desempenho pela falta
de investimentos na qualidade da educação e nos
demais setores da sociedade. Outras 9 escolas
com uma representação de 21,43% têm um indi-
cador de aproveitamento acima de 0,2 e abaixo
de 0,4, representando um desempenho de 20% a
40% de suas características necessárias, de acordo
com a análise matemática. No intervalo entre 0,4
e 0,6 estão representadas boa parte das escolas
totalizando 19, estimando 45,24% que apresentam
aproveitamento intermediário entre 40% e 60%.
Estas escolas apresentam situações regulares de
trabalho para o professor assim como na infraes-
trutura do prédio escolar e nos materiais didáticos
para uso dos alunos. Encontram-se entre os indi-
cadores 0,6 e 1 um total de 6 escolas representan-
do 14,3% das instituições, das quais, são as que
obtiveram os melhores resultados favoráveis aos
professores em termos de condições de trabalho,
satisfação com o salário, organização do ambiente
escolar e na segurança em torno da escola. Estes
resultados estão baseados na maior representati-
vidade de explicação relacionados aos fatores F1,
F2, F3 e F4 (24,43%, 16,5%, 12,5% e 11,5%).
No geral, 85,7% das escolas não consegui-
ram obter mais de 60% dos itens necessários para
uma melhor colocação em relação às variáveis da
análise. Este resultado, na realidade pode estar re-
lacionado à insatisfação do professor devido ao
salário e nas condições de trabalho que as escolas
oferecem diante de uma sociedade cada vez mais
dependente do sistema educacional.
GRÁFICO 2 – Indicador de desempenho dos professores
por escola
Para os resultados da análise da amostra dos
alunos têm-se:
Teste de Esfericidade de Bartlett e Medida de
Adequacidade da Amostra de Kaiser_Meyer Olkin
(KMO):
(1) Teste de Esfericidade de Bartlett;
Q2 = 211,6622 com p valor = 0 (para gl = v
= 66), portanto, o teste é altamente significativo,
a matriz de correlação é adequada para a análise
fatorial.
(2) Medida de Adequacidade da Amostra
de Kaiser – Meyer - Olkin (KMO).
MSA = 0,6715, verifica-se que a medida está
acima do valor mínimo aceitável 0,5.
Os resultados obtidos do Teste de Esferi-
cidade de Bartlett e Medida de Adequacidade da
Amostra indicam que a análise fatorial é adequada.
Resultou na análise 5 fatores, usando como
critério o número de fatores que juntos expliquem
pelo menos 75% da variabilidade. Sendo assim
o primeiro fator explica um percentual de 33,33%
da variabilidade total e os demais apresentam
uma explicação de 18,92%, 10,08%, 7,92% e 7,67%
respectivamente e os cinco fatores juntos explicam
77,91% de variabilidade, este valor é a soma da
proporção de todos os fatores.
00,20,40,60,8
11,2
0 5 10 15 20 25 30 35 40 45Escolas
Indi
cado
res
FONTE: O autor
186
QUADRO 3 – Variáveis que compõem cada fator, de
acordo com os pesos para cada um dos
fatores – questionário aluno
podem estar situadas em uma comunidade menos
precária nas condições social e econômica. Entre
os indicadores 0,6 e 1 encontram-se situadas nesta
faixa apenas 4 escolas, representando 9% do total
das instituições pesquisadas. Desta forma, segundo
os dados da análise fatorial, resume-se que as es-
truturas físicas do ambiente dessas escolas apre-
sentam melhores condições em comparação com as
demais pela influência da proporção acumulada dos
fatores F1 e F5 (41%). Os demais fatores podem con-
tribuir signitivamente nesses resultados. Conforme
um estudo realizado por Barbosa (2009) o fator
renda familiar e o fator tempo de estudo são uns
dos que mais influenciam o resultado do desempe-
nho das escolas e ainda de um modo mais positivo
se tiver uma clientela mais participativa a seu favor,
tornando evidente que as avaliações das escolas
devem ser baseadas num leque bastante amplo de
variáveis e que juntas trarão ganhos eficientes para
a educação.
GRÁFICO 3 – Indicador de desempenho dos alunos por
escola
De acordo com o gráfico 3, mostrou-se na
análise que 5 escolas possuem como indicado-
res valores menores ou iguais a 0,2, isso evidencia
que dos itens que fazem parte dos questionários dos
alunos, 11,90% das escolas resumem suas condições
de infraestrutura e as condições sociais e econômi-
cas das famílias dos alunos um rendimento inferior a
20%. Estes resultados baseiam-se principalmente no
fator F1, do qual tem o maior porcentual de explica-
ção (33,33%) e no fator F2 (18,92%) que correspon-
de à situação econômica das famílias dos alunos. De
antemão, pode-se afirmar que o investimento nesses
fatores pelos governantes traria melhores resulta-
dos, com exceção da variável A8 (famílias beneficia-
das pelo Bolsa Família), devido ao aumento na renda
familiar.
Entre os indicadores de 0,2 a 0,4 do intervalo
estão localizadas 11 escolas representando 26,19%
do total, cujas características de desempenho não
ultrapassam dos 40% conforme os indicadores do
gráfico 3. Ao verificar os indicadores maiores que
0,4 e menores ou iguais a 0,6, encontra-se dentro
desta faixa de intervalo o maior número de escolas
pesquisadas, atribuindo 52,38% representando mais
da metade do total das instituições com desempe-
nhos entre 40% e 60%. Neste intervalo estão as ins-
tituições com nível de infraestrutura regular e que
3.1 Análise de Agrupamentos
Para o uso da análise de agrupamentos, pri-
meiramente foi usado a Análise Fatorial para obter
os indicadores (escores) que foram convertidos
para o intervalo entre 0 e 1 a fim de facilitar a inter-
pretação dos resultados das escolas, professores e
alunos. Após, calcularam-se então as distâncias eu-
clidianas entre os escores resultando em um total
de 861 distâncias.
00,20,40,60,8
11,2
0 5 10 15 20 25 30 35 40 45Escolas
Indi
cado
res
FONTE: O autor
FATOR VARIÁVEIS QUE COMPÕE CADA FATOR
F1
A3: Condições da biblioteca A4: Satisfação com a direção da escolaA5: Serviços geraisA6: Condição dos banheirosA7: Condições das salas de aula
F2A2: Renda familiar até um salário mínimoA8: Famílias beneficiadas pelo Bolsa Família
F3 A10: Estudam no mínimo 30 min por dia
F4A1: Escolaridade do pai médio ou superiorA9: Frequência dos responsáveis na escola
F5A11: Condição quadra de esportesA12: Condição do pátio da escola
FONTE: O autor
187R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 176-189, jan./jun. 2011
O resultado dessas ligações pode ser dis-
posto em um diagrama em árvore ou dendrograma
como é mais conhecido, do qual possui uma escala
para observar os níveis de distância. O critério de si-
milaridade é representado pela altura resultante de
cada combinação distinta entre as variáveis, ou seja,
quanto mais baixa for essa junção, maior será o grau
de similaridade entre as situações estudadas (São
Paulo, 1992). Desta forma, com intuito de não per-
der estruturas importantes e não correr o risco de ter
problemas de interpretabilidade, optou-se para este
estudo apenas o intervalo de estabilidade compreen-
dido por volta do valor 1,5 do eixo das distâncias da
ligação com uma representação de 4 agrupamentos,
conforme mostra o gráfico 4.
GRÁFICO 4 - Dendrograma referente aos agrupamentos
das escolas - Método de Ward
demanda funcional, nas adaptações físicas às
necessidades especiais e nos recursos materiais
para uso dos alunos. Por outro lado é o grupo
que apresenta a pior condição de infraestrutura
física; revela também um índice menos significa-
tivo na infraestrutura familiar dos alunos relacio-
nado à renda e a necessidade de ajuda de algum
programa social. Resume-se que embora este
grupo apresente boas condições de trabalho e
uma melhor alocação de recursos na área peda-
gógica, sugere-se investir mais em um ambiente
que satisfaça a necessidade do aluno como, por
exemplo, a melhoria nas salas de aula, banheiros e
bibliotecas. O segundo agrupamento está repre-
sentado pelas instituições 33, 25, 31, 7, 17, 18, 4, 11,
13, 39, 28 e 3 que possui indicadores baixos em
pelo menos uma das três análises, considerando-
-se o grupo que apresenta uma significativa varia-
ção entre as escolas, correspondente aos recur-
sos de investimento, tanto na escola quanto na
sociedade. A falta desses recursos, no conjunto
das variáveis utilizadas na pesquisa, reflete baixos
níveis de desenvolvimento no aspecto social e
educacional. O terceiro agrupamento é formado
pelas escolas 22, 12, 8, 6, 19, 10, 32, 30, 27, 9, 42
e 2 que revelou indicadores médios nas análises
dos três questionários não tendo variação expres-
siva entre os indicadores. Pode-se considerar que
este grupo apresenta condições regulares em
infraestrutura e nos demais fatores que envolvem
as questões socioeconômicas. No quarto grupo
estão as escolas 34, 24, 37, 20, 29, 15, 40, 26, 5,
21, 16, 1 e 38 que apresentaram as melhores condi-
ções de infraestrutura no geral, juntamente reve-
lou uma comunidade escolar mais participativa no
desenvolvimento educacional de seus educandos,
além de possuir mais recursos para as necessida-
des dos alunos, porém este grupo caracterizou
aos professores as piores condições de traba-
lho, podendo estar relacionado ao salário e prin-
cipalmente na segurança. Embora essas escolas
supram as necessidades físicas e pedagógicas é
recomendável rever e analisar as necessidades do
educador com a intenção de melhorar a educação.
FONTE: O autor
Schools
Link
age
Dis
tanc
e
0,0
0,5
1,0
1,5
2,0
2,5
3,0
3,5
4,0
4
1
35
2
3
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1
4
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2
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7
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4
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3
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2
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2
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2
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2
0
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1
5
40
2
6
5
21
1
6
1
Embora exista certa dificuldade em esta-
belecer uma medida que caracterize a magnitude
das condições das escolas no geral e das
condições socioeconômicas da região, é possível,
tomando-se por base os indicadores e os clusters
obtidos, fazer alguma diferenciação entre os
grupos formados, quanto à intensidade do desen-
volvimento.
Nesse sentido, pode-se dizer que o primeiro
grupo composto pelas escolas 41, 35, 23, 36 e 14
apresenta as melhores condições de trabalho ao
professor e bons resultados em investimento na
188
4 Conclusão
Este trabalho procurou através de um nú-
mero significativo de variáveis de cada bloco de
questionário, analisar e avaliar o desempenho e in-
fraestrutura das escolas levando em consideração
várias situações que são comuns no dia a dia destas
instituições.
Ao analisar as características das 42 escolas
públicas do ensino fundamental do NRE de União
da Vitória, observou-se, através dos diagnósticos da
realidade das escolas que, apesar da maioria apre-
sentar estruturas físicas necessárias, faltam recursos
financeiros para o investimento de melhorias e com
isso poder alcançar bons resultados.
Um dos principais desafios dos gestores res-
ponsáveis por estas instituições e dos professores
consiste em administrar e a trabalhar os fatores que
não dependem somente das ações das próprias es-
colas, como o baixo nível cultural da comunidade
escolar, situação socioeconômica das famílias, a in-
diferença e a falta de interesse dos pais na educa-
ção dos filhos entre outros.
Utilizado a ferramenta estatística de análise
fatorial e análise de agrupamentos sobre as três
matrizes de dados foi possível, através dos escores
fatoriais finais, analisar e classificar as escolas do
Núcleo Regional de União da Vitória em função dos
segmentos selecionados e aplicados a esta pesqui-
sa. O método proposto demonstrou que, a eficiên-
cia no sistema de educação varia sistematicamente,
quanto às características social, econômica e cul-
tural, das localizações que esses estabelecimentos
se encontram nos centros urbanos, periferias e
zonas rurais, quanto a gerências educacionais. Em
tais casos, precisa-se considerar e/ou colocar mais
condições que visem no suprimento destas defasa-
gens, compreender a situação socioeconômica para
tentar sanar as restrições desfavoráveis e, assim,
implicar positivamente nos estabelecimentos.
Com os resultados obtidos conclui-se que
11,9% das instituições atingiram resultados favoráveis
aos professores em termos de condições de trabalho,
satisfação com o salário, nível de aprendizagem,
organização do ambiente escolar e na segurança
em torno da escola, mas revelou serem as escolas
com menores indicadores nas condições de infraes-
trutura física e socioeconômica da clientela escolar;
28,57% apresentaram resultados insatisfatórios no
tocante aos fatores revelados; 28,57% atingiram
resultados menos insatisfatórios em infraestrutura,
condições de trabalho e questões socioeconômi-
cas; 30,95% apresentaram melhores indicadores de
desempenhos em infraestrutura, recursos, demandas
e nas condições sociais e econômicas na caracteri-
zação dos diretores e alunos, porém, obtiveram os
menores indicadores nas condições de trabalho dos
professores. Destas análises ficou evidenciado um
aproveitamento desequilibrado entre as escolas,
assim sugere-se que políticas compensatórias não
devam concentrar-se, basicamente, em somente
um dos grupos revelados. Além disso, algumas
escolas podem se espelhar nos trabalhos pedagó-
gicos e administrativos de outras para melhorar seu
desempenho.
Os escores e agrupamentos fornecidos pela
análise fatorial e análise de Cluster respectivamente,
podem ser um dos instrumentos valiosos para os
gestores das escolas e líderes políticos a discutirem
e direcionarem seus projetos de forma mais eficaz
na eficiência de resultados.
• Recebido em: 01/12/2010• Aprovado em: 20/05/2011
189R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 176-189, jan./jun. 2011
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SOUZA, Paulo N. Pereira de. LDB e educação superior. São Paulo: Thomson Learning, 2001.
Metodologia de Pesquisa em Administração: Considerações sobre Estudo de CasoResearch methodology in administration: considerations about case study
191R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 190-208, jan./jun. 2011
Metodologia de Pesquisa em Administração: Considerações sobre Estudo de Casoresearch methodology in administration: considerations about case study
Flávio Régio Brambilla 1
1 Doutorando em Administração pela UNISINOS. Professor da Universidade Luterana do Brasil. E-mail: [email protected]
ResumoA prática da pesquisa proporciona contribuições para Administração e ciências sociais, como
Psicologia, Sociologia, dentre outras. É na pesquisa que a evolução no pensar e construir
conhecimento dos sujeitos toma formas superiores, integrando leitura, interpretação,
exame das realidades e capacidade de abstração, e pensamento crítico acerca do objeto
em estudo. Acredita-se no engajamento em produção intelectual como provedor dos
conhecimentos, sendo subsídios para elaboração de cursos e para sua utilização em sala de
aula. O Estudo de Caso é uma das abordagens de apoio para o lecionar, com base empírica
ancorada por teoria, ilustrando aplicação de conceitos. O trabalho de aprendizagem com
diferentes casos e resoluções no domínio disciplinar, ilustra complexidade no âmbito social,
proporcionando aos estudantes visões menos simplistas. Pesquisa, Metodologia e Estudo
de Caso serão tratados neste ensaio teórico, tendo em vista discutir seus aspectos básicos
e de utilização prática na produção científica dos Cursos de Administração. O Estudo de
Caso como método de pesquisa é norteado por potencialidades e pontos fracos, como em
qualquer situação ou estratégia utilizada para fazer pesquisa. As vantagens são encontradas
diante de situações em que o conhecimento desejado é escasso, existe fragmentação de
conhecimentos, incompletude, unicidade, ou em situações complexas ao ponto de não
serem passíveis indicadores psicométricos diretamente empregados para compreensão dos
fatos. Também pode ser um método utilizado juntamente com outros mais generalistas,
para identificação de particularidades. No Estudo de Caso, como em outras estratégias de
pesquisa, a validade de um conhecimento está associada ao rigor e cuidados adotados pelo
pesquisador.
Palavras-chave: Metodologia de Pesquisa; Estudo de Caso; Administração.
AbstractThe research practice provides contributions for Administration and social sciences as
Psychology, Sociology among others. It is in research that the evolution in thinking and in the
building of knowledge of subjects takes superior forms, integrating reading, interpretation,
examination of realities and abstraction capacity, and critical thought concerning the object
in study. It is believed in engagement to intellectual production as a provider of knowledge,
as it subsidies for elaboration of courses and their use in the classroom. The Case Study is
one of the supportive approaches for teaching, empirically anchored by theory, illustrating
application of concepts. The learning work with different cases and resolutions in a discipline
illustrates complexity in social arena, providing to students less simplistic visions. Research,
method, and Case Study will be discussed in this theoretical paper, focusing on the
presentation of basic aspects. The case study as a research method is guided by the potential
and weaknesses, as in any situation or strategy used to do search. The advantages are
visible in situations where knowledge is scarce, where there is fragmentations of knowledge,
incompleteness, uniqueness, or in complex situations that they are not likely to be used as
psychometric indicators for understanding the facts. It can also be a method to be used
together with other more general ones, to identify particularities. In a Case Study, as in other
research strategies, the validity of knowledge is associated with the rigor and the care taken
by the researcher.
Keywords: Research Methodology; Case Study; Administration.
192
Introdução
Na vivência profissional de um professor,
comumente atenção extra é destinada aos trabalhos
de conclusão de curso. Neste período crítico do
desenvolvimento acadêmico, muitas deficiências do
ensino ou da evolução dos alunos ficam evidentes,
porque a necessidade de entendimento teórico e
científico destes é desafiada. Com certo viés popular,
mas também uma realidade facilmente diagnostica-
da, o exercício da leitura é fundamental para que
o aluno, ao escrever, desenvolva um trabalho de
qualidade. A variedade de fontes, a leitura de textos
realmente acadêmicos (como exemplo, dos artigos
de eventos e revistas científicas), ou a variedade na
leitura de livros, servem aos propósitos da crítica, e
da comparação, capacidade analítica e, porque não,
ao entendimento dos autores mais adequados para
os propósitos em estudo. Assim como o fenômeno
da ‘McDonaldização da Educação’ em geral, existe na
Administração um fenômeno que pode ser descrito
por ‘Chiavenatização da Administração’.
Não se trata de criticar a obra do autor,
tampouco discutir qualidade e competência evidentes
deste ícone da academia no Brasil; mas sim, a adoção
por docentes de seus livros como se fossem as únicas
fontes de referência disponíveis, talvez um artifício ou
caminho mais fácil para construir uma disciplina, já
que o autor apresenta, de forma direta e didática,
resultados gerais de estudos históricos consa-
grados e importantes. Será este um problema de
qualificação docente? O fruto da remuneração que
não contempla a preparação das aulas? Um exemplo
é que, apesar da comunidade conhecer os livros do
referido autor, jamais quem agora escreve encontrou
uma citação do artigo de Chiavenato (1979) sobre
teorias administrativas, que além de fazer parte
importante da área no Brasil, está publicado em
uma das revistas acadêmicas de Administração mais
importantes do país, a Revista de Administração de
Empresas (RAE), publicada pela Fundação Getúlio
Vargas de São Paulo (FGV-EAESP).
Supõe-se que se o autor é o foco, então seus
artigos e não somente os livros, deveriam ser con-
templados nos trabalhos dos alunos. Outro exemplo
de autor renomado é o caso de Michael Porter. Pelo
fato de ser um autor mais referenciado na Pós-Gra-
duação, em Mestrados e Doutorados (em especial
nas áreas de operações e estratégias), não somente
seus livros, mas também seus artigos são igualmente
utilizados nos estudos de estratégia. Aparentemen-
te, os alunos são levados a crer que a alternativa ade-
quada é utilizar da referência A ou B, sendo que a re-
alidade pressupõe que a variedade das fontes é um
requisito importante à qualidade, em especial na re-
alização da pesquisa, na responsabilidade por con-
clusões desenvolvidas. Então, para a qualidade da
pesquisa, não somente a variedade de livros, mas de
periódicos e autores devem ser contemplados, como
artifício para a redução do viés e maior abrangên-
cia teórica.
Não apenas em construções teóricas o risco
de citações inadequadas ou insuficientes é uma re-
alidade. Na questão teórica, o importante é buscar
por fontes fidedignas, variadas e não apenas livros,
também contemplando artigos científicos. Mesmas
regras valem à metodologia, e o ideal é citar a fonte
original da ideia, não sua reprodução, exceto se per-
tinente, agregando valor adicional às ideias origi-
nais. Na realidade brasileira, uma constatação é que,
na metodologia do Estudo de Caso, muitos alunos
citam, por exemplo, o livro de Gil (2002), para utili-
zar os conceitos propostos por Yin (2001), livro pu-
blicado inclusive em português. Novamente, o autor
nacional é ilustre, e inclusive autor de artigos, dentre
eles Gil, Licht e Oliva (2005), importante por tratar
do Estudo de Caso especialmente na Administra-
ção. Por serem textos de acesso gratuito, a questão
financeira não é o inibidor de sua utilização. Inde-
pendente das causas fica evidente que a falta de
material, inclusive produção adicional dos autores
utilizados comumente como padrão, não são o mo-
Assim como o fenômeno da ‘McDonaldização da
Educação’ em geral, existe na Administração
um fenômeno que pode ser descrito por ‘Chiavenatização da
Administração’.
193R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 190-208, jan./jun. 2011
tivo da limitação bibliográfica praticada por alunos,
especialmente ao se tratar dos trabalhos de con-
clusão de curso. Apresentados problemas gerais da
produção em Administração, a motivação deste es-
tudo é o entendimento da pesquisa e suas metodo-
logias. Em foco, o entendimento do Estudo de Caso.
2 Considerações Gerais sobre Pesquisa e Metodologia de Pesquisa
Por seu propósito de orientar, o texto pretende
evoluir de maneira sintética da origem dos métodos,
quais respondem ao propósito de realizar a investi-
gação de maneira consistente e replicável, ou seja,
desde o conceito Pesquisa, que serve para fins de
confirmação ou desconfirmação de um conhecimen-
to desejado acerca dos fenômenos. Pesquisa é “uma
ação de conhecimento da realidade, um processo de
investigação minucioso e sistemático para conhecer
a realidade, seja ela natural ou social” (TOZONI-REIS,
2005, p.7). Como ilustra o conceito essencial, a pes-
quisa é uma busca pelo conhecimento; é a orienta-
ção, que deve ser conduzida de maneira sistemática
e organizada, para objetivos relacionados com a área
de conhecimento específica, ou ainda, numa prerro-
gativa interdisciplinar.
Outros autores caracterizam este conceito.
Para Ohira (1998), a Pesquisa Científica é uma ave-
riguação conduzida por método, desenvolvida com
o intutito de responder ao problema proposto. Este
tipo de pesquisa incorpora trabalhos publicados, os
periódicos acadêmicos e a comunicação aos inte-
ressados pelo assunto, ou o público. Por definição,
Universidade deve ser o locus da pesquisa, porque
incorpora a reunião formal das ciências. A pesquisa
é geradora de autonomia, qual proporciona a ca-
pacidade para tomada de uma decisão conscien-
te. Também culmina em qualificação, dinamismo,
versatilidade, além de estimular as interações. Nas
Universidades, a tríade de sustentação (ensino, pes-
quisa e extensão) apenas pode ser adequadamen-
te articulada quando existir pesquisa, pois como
salientado por Ohira (1998), somente é possível
aprender, ou ensinar, quando existe a prática de
pesquisa. Em síntese, “o professor precisa da práti-
ca da pesquisa, para ensinar eficazmente” (OHIRA,
1998, p.73). Para que a Universidade efetivamente
seja mediadora da educação, deve realizar ativida-
des de pesquisa.
Teixeira (2009) classifica a pesquisa como
a decisão por ações e estratégias adotadas tendo
em vista desenvolver conhecimento original. Dentre
os pressupostos relevantes, é preciso delimitar um
problema a ser respondido; se for o caso, hipóteses
(projeção de afirmações) que devem ser testadas;
bem como objetivos (propósitos). O objetivo
geral é uma afirmação, e deve começar por um
verbo (exemplo: analisar, investigar, desenvolver,
etc.) que serve de resposta ao motivo de fazer a
pesquisa (uma orientação para que o estudioso
mantenha um foco bem definido) e os específicos,
complementando os parâmetros necessários para
delinear o foco do estudo.
Existem duas ideias divergentes em relação
aos objetivos específicos: uma corrente de pesqui-
sadores/orientadores os considera como elementos
adicionais, norteadores de objetivos secundários.
Por sua vez, para outros, os objetivos específicos
são desdobramentos do objetivo geral, para clarifi-
car as ideias em pauta. Uma utilização dos objetivos
específicos como orientadores e ao mesmo tempo
delimitadores pode ser possível, e o essencial em
sua concepção é clareza, e serventia para que o
pesquisador mantenha-se na direção adequada.
Outra definição é a da pesquisa como “o pro-
cedimento racional e sistemático que tem como ob-
jetivo proporcionar respostas aos problemas que
são propostos” (GIL, 2002, p.17). O conceito referido
alerta para outro importante tópico na condução
da pesquisa científica. Trata-se do Problema de
Pesquisa, o qual serve como um questionamento
(em caráter de orientação), sempre expresso na
forma interrogativa, sendo esta questão norteadora
do estudo, que o pesquisador pretende responder,
confirmar ou desconfirmar.
Caracterizar o tema é uma alternativa para
facilitar o estudo, e pode ser uma Delimitação do
194
Tema na forma textual em capítulo à parte, ou cons-
tar da própria introdução do estudo. Refere-se a
proporcionar para o leitor uma visão geral do que
se trata, sendo especialmente útil na identificação
de interesse e relevância. Ainda que deva ser uma
apresentação conceitual curta, deve ser suficiente
para orientar o leitor, e por isso, pelo menos deve
agregar alguns parágrafos quais situam o contexto
teórico central da investigação.
Uma pesquisa deve ser desenvolvida através
da “utilização cuidadosa de métodos, técnicas e
outros procedimentos científicos” (GIL, 2002, p.17).
Neste sentido, diferenciar método de técnicas e
normas é crucial. Basicamente, as técnicas se re-
ferem às estratégias utilizadas na coleta de dados,
evidências e informações, e estão relacionadas ao
método. A metodologia por sua vez, deve ser defi-
nida de acordo com os objetivos da pesquisa. Com-
pete ao pesquisador identificar qual método me-
lhor se enquadra as suas intenções de pesquisa. Por
exemplo, no Método Estudo de Caso, as técnicas
de coleta dos dados podem ser entrevistas, análise
documental, etc.; e de análise dos dados coletados,
a triangulação de dados, análise de conteúdo, ou
demais estratégias. Já a normatização, ou padroni-
zação serve ao propósito de gerar um relatório de
boa apresentação, estruturado de maneira clara.
Definitivamente, a questão normativa, ou ajuste de
estrutura não interfere na metodologia e condução
da pesquisa, apenas em sua apresentação. Existe
no meio acadêmico da graduação, certa confusão
entre método e normas, e em muitos casos, o mé-
todo é negligenciado, sendo a ênfase excessiva des-
tinada ao aspecto normativo. A consequência deste
tipo de orientação pode ser a elaboração de um tra-
balho bem apresentado, mas com resultados irrele-
vantes ou condenados quanto à credibilidade, pela
falta de procedimentos e técnicas que deem rigor.
Ao referenciar os eventos da Associação Na-
cional de Pós-Graduação e Pesquisa em Adminis-
tração (ANPAD), Machado-da-Silva (2009) deixa
evidente que o maior foco de pesquisa são quali-
dades de conteúdo e metodologia e não o apego
aos preceitos técnicos, ou estruturais. O experiente
pesquisador na área destaca que a ANPAD abriu
espaço para trabalhos não apenas nas normas téc-
nicas nacionais, mas também para as internacionais.
O interessante é a razão da entidade em flexibilizar
nos formatos para 2010, por serem estas normas
parte de “um modelo mais simples, mais universal e
mais constante”. Notadamente o esforço é direcio-
nado para qualidade e não para estrutura, que ape-
sar de importante, não se sobrepõe aos requisitos
de qualidade e rigor científicos. Relevantes são os
tipos de pesquisa, e que estas sejam desenvolvidas
e classificadas de maneira adequada, o que quer di-
zer correta.
Maciel (2008) distribui as pesquisas em basi-
camente três categorias, e menciona que em todas
elas o propósito é realizar um planejado processo
de coleta, análise e interpretação dos dados. Estas
categorias propostas pelo autor são: [1] Pesquisas
Exploratórias, as quais servem para que o pesquisa-
dor obtenha “maior familiaridade com um assunto
desconhecido” (MACIEL, 2008, p.173); [2] Pesqui-
sas Descritivas, as quais contam geralmente com
uma abordagem amostral, ou seja, a amostra como
parcela representativa de uma população. Seu uso,
diz Maciel (2008, p.174), serve para “descrever os
comportamentos mais comuns da população”, ou
seja, características gerais. Por fim, as [3] Pesqui-
A pesquisa é uma busca pelo conhecimento; é a
orientação, que deve ser conduzida de maneira
sistemática e organizada, para objetivos
relacionados com a área de conhecimento específica, ou ainda, numa prerrogativa
interdisciplinar.
195R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 190-208, jan./jun. 2011
sas Causais, tendo em vista elucidar um problema,
por meio da relação entre suas variáveis. Trata-se de
“explicar as causas e as consequências” do evento
(MACIEL, 2008, p.175). A pesquisa causal é complexa,
porque nem sempre (e nas ciências sociais quase
nunca) a relação se dá entre uma única variável X
que exerce impacto em uma variável Y. Por sua vez,
tentar justificar que uma variável é única impactante
noutra em ciências sociais é uma falha, ou um erro
metodológico.
Dentre as ideias que definem Metodologia de
Pesquisa, a de identificar caminhos e instrumentos,
bem como uma normativa, criar quadros teóricos e
base empírica é simples, mas atende aos propósitos
deste estudo, que pretende promover uma orien-
tação inicial, e não o esgotamento do assunto. Os
métodos indicam as opções do pesquisador (uma
pesquisa pode seguir apenas um ou um conjun-
to de métodos, dependendo dos propósitos e do
tempo e orçamento, disponíveis ao pesquisador).
É possível resumir essas ideias acerca da metodo-
logia como a definição instrumental e processual
adotada para a coleta e análise dos dados, o que
proporciona melhores condições para reflexão (TEI-
XEIRA, 2009). Metodologia como se entende aqui,
são caminhos que servem para manter foco e rigor
científico, derivados da opção do pesquisador, que
igualmente proporcionam maior credibilidade à in-
vestigação.
Um conceito interessante é o da metodolo-
gia de pesquisa como “um caminho a ser trilhado
pelo pesquisador no processo de produção de
conhecimentos sobre a realidade estudada”
(TOZONI-REIS, 2005, p.17). Os métodos podem ser
classificados conforme alguns exemplos providos
por Teixeira (2009). Podem ser: [1] analíticos (foco
nas partes que compõe um todo de interesse); [2]
indutivos (busca generalizar fatos ou comporta-
mentos específicos, e visa enunciados universal-
mente aceitos); [3] dedutivos (restrito a casos
específicos e seu entendimento, particulari-
za generalizações); [4] cartesianos (ancorados
na razão); [5] teoricamente suportados (específi-
cos para uma ciência); [6] estatísticos (baseados
em técnicas, procedimentos e teorias matemáti-
cas); [7] econométricos (utilizados nas ciências
da economia e, áreas relacionadas – contam com
suporte dos preceitos estatísticos, matemáticos e
das teorias econômicas); [8] descritivos (focalizam
o todo, e fazem o relato geral e amplo de um cenário
ou contexto, relevando características e classifi-
cações); [9] quantitativos (contam com métricas
e classificações detalhadas particulares); e [10]
qualitativos (suportam “a ideia que, na produção
de conhecimentos sobre os fenômenos humanos
e sociais, nos interessa muito mais compreen-
der seus conteúdos do que descrevê-los, explicá-
-los”) (TOZONI-REIS, 2005, p.10). A definição da
abordagem metodológica mais adequada é do
pesquisador, que deve entender seus objetivos de
pesquisa. Apesar de comumente classificados como
qualitativos, estudos de caso também contam com
orientações e procedimentos de coleta e análise de
dados em panorama quantitativo. A definição do
tipo de método pode ser múltipla, e vai depender
dos procedimentos de coleta e análises adotadas.
3 Estudo de Caso
Para ser de fato um Estudo de Caso,
este precisa dispor de múltiplas fontes de evidência, que
conferem robustez aos argumentos.
O uso do Estudo de Caso como método
de pesquisa está em ascendência, o que já não é
mais uma novidade. Entretanto, apesar da boa
adaptabilidade para diversos focos em pesquisa,
a condução deste método requer maior atenção,
para evitar que os resultados sejam irrelevantes ou
inadequados (COUTINHO; CHAVES, 2002).
196
Este método é conceituado por Coutinho e
Chaves (2002, p.222) como “um plano de investiga-
ção que envolve o estudo intensivo e detalhado de
uma entidade bem definida”, que é o caso. Apesar da
aparente simplicidade, bons estudos de caso não são
tão simples como aparentam, e tendem a ser estu-
dos demorados. Dentro do Estudo de Caso existem
diferentes orientações, que requerem detalhamento,
profundidade e entendimento do contexto (tempo e
espaço), contando com as estratégias e ferramentas
adequadas à situação.
Maffezzolli e Boehs (2008) caracterizam o
Estudo de Caso, com base em ao menos quatro pre-
ceitos essenciais. O primeiro se refere à coleta de
dados, que deve ser orientada para que seja em pro-
fundidade (detalhamento/esgotamento) das infor-
mações relevantes. Julga-se neste artigo como prin-
cipal elemento o segundo preceito essencial, qual
orienta que para ser de fato um Estudo de Caso,
este precisa dispor de múltiplas fontes de evidência,
que conferem robustez aos argumentos. Como o
próprio método releva em sua conceituação, é pre-
ciso que exista um contexto especificado, que é o
próprio caso. E por fim, a observação de que um
Estudo de Caso é restrito a um contexto específi-
co e tempo específico; ideias que determinam que
o caso seja delimitado em tempo e espaço. Como
propósito à condução de um Estudo de Caso, Gil
(2002) destaca sua adequabilidade para exploração
das situações reais e de difícil compreensão, com
foco limitado, qual deve ser caracterizado para que
seja provido um entendimento de caráter específi-
co (cada caso é único, e possui suas peculiaridades).
Coutinho e Chaves (2002) são mais diretos, e men-
cionam que o propósito do Estudo de Caso está as-
sociado a motivações relativas a explorar, descrever
ou explicar uma situação.
Coutinho e Chaves (2002) complementam
a caracterização supracitada de Maffezzolli e Boehs
(2008), e adicionam uma quinta característica na
determinação do Estudo de Caso. Além deste tipo de
estudo tratar de objetivo que requer foco específico,
essencialmente deva contar com o emprego de
múltiplas fontes de dados (uma característica
imprescindível), necessariamente ter de destacar a
unicidade e singularidades (o caso) e ser limitado por
fronteiras de tempo e amplitude, ainda é importante
referenciar que “a investigação decorre em ambiente
natural” (COUTINHO; CHAVES, 2002, p.224). O
investigador é integrado ao contexto, o que elimina
a ideia do pesquisador como entidade neutra. Ainda
mais importante com relação ao autor no contexto do
Estudo de Caso, e quanto à errônea delimitação do
caso como sendo sempre uma metodologia de caráter
qualitativo, ou etapa anterior ao método quantitativo,
mencionam Coutinho e Chaves (2002, p.225) que o
autor:
é pessoalmente implicado no estudo, o que leva a que
muitos tendam a associar o Estudo de Caso à investigação
qualitativa o que é todavia uma concepção errada já que
o Estudo de Caso pode também ser conduzido no quadro
de outros paradigmas de investigação como o positivista
ou mesmo o crítico.
E como exemplo; relatam que na perspectiva
dos estudos em educação:
quando o caso é uma escola ou um sistema educativo,
fará todo o sentido que o investigador recorra a dados
numéricos de natureza demográfica, como número
de alunos, taxas de reprovação, origem social, ou seja,
indicadores quantitativos (COUTINHO; CHAVES, 2002, p.
225).
Um exemplo é a própria obra de Yin (2001),
uma das mais relevantes e citadas fontes em estu-
dos de caso na academia, de orientação positivista
e essencialmente quantitativa em grande parte das
Apesar de comumente classificados como quali-tativos, estudos de caso
também contam com orientações e procedi-
mentos de coleta e análi-se de dados em panora-
ma quantitativo.
197R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 190-208, jan./jun. 2011
suas ideias. Todavia, além da discussão entre quali-
tativo ou quantitativo, também não se pode deixar
de contemplar a possibilidade da abordagem meto-
dológica mista.
Mais complexas, e mencionadas por Maffe-
zzolli e Boehs (2008), são as características onto-
lógicas e epistemológicas relacionados ao método
Estudo de Caso. Considera-se a ontologia como um
aspecto de relação literal com a natureza do ser,
relevando existência e a concepção de mundo dos
indivíduos. A centralidade é orientada ao desejo de
saber, e na visão de mundo advinda do pesquisador,
qual naturalmente ocupa a posição de observador.
Por sua vez, para Maffezzolli e Boehs (2008), a epis-
temologia está relacionada à visão do pesquisador
e no seu desejo desbravador e descobridor, em co-
nexão ao método qual sustenta à intervenção para
uma descoberta, relacionada à realidade de interes-
se. Duas correntes epistemológicas importantes são
o positivismo (ciência tradicional) e o interpretati-
vismo (menos ortodoxa que os preceitos da ciência
positiva). A corrente interpretativista está mais cen-
trada em entender do que generalizar a realidade
(MAFFEZZOLLI; BOEHS, 2008). Para fins didáticos,
no quadro abaixo são sintetizadas caracterizações
de ontologia e epistemologia.
como mais próxima da realidade, tendo em vista que
trata das limitações do estudo com maior detalha-
mento. No entanto, apesar de geralmente não
observadas na interpretação, limitações nos estudos
de caso também deveriam ser identificadas, apesar
da substancial diferença entre interpretar uma reali-
dade e a tentativa de identificar suas tendências.
Existe, todavia, outra confusão entre a metodologia
do Estudo de Caso e a sua orientação, geralmente
caracterizada como qualitativa, e que também pode
ser quantitativa. Por exemplo, como é o caso na obra
de Yin (2001), quando a tentativa é a de identificar
causas, geralmente são premissas quantitativas
quais procuram por explanação e delimitação do
controle, o que também ocorre em determinadas
classificações por categorias. Já a tendência da
abordagem qualitativa é a de “compreender as
complexas inter-relações entre tudo o que existe”,
ou seja, procurar entender os objetivos centrais da
pesquisa diante do fenômeno em observação, e não
tecer estatísticas (MAFFEZZOLLI; BOEHS, 2008,
p.97).
Autores como Coutinho e Chaves (2002,
p.236) mencionam sobre a necessidade do pes-
quisador em operacionalizar procedimentos tendo
em vista prover maior credibilidade aos estudos de
caso, e exemplificam esta possibilidade por meio da
“descrição pormenorizada e abundante de todo o
processo da investigação”. Além de sistematizar e
explicitar os procedimentos de pesquisa, também
se menciona que são adequadas descrições com-
pactas, centradas no que é de fato essencial para os
propósitos da investigação.
Além de manter o foco, faz-se importante a
adequada seleção e diferenciação do que é central
e periférico no caso. Critérios de qualidade também
são salientados por outras pesquisas. Na perspecti-
va de Maffezzolli e Boehs (2008, p. 100), “critérios
de qualidade podem ser compreendidos como for-
mas de classificar um estudo”, identificando este
como compatível e adequado aos propósitos e qua-
lidade dos resultados. Alguns cuidados possíveis no
julgamento da qualidade de um Estudo de Caso por
avaliadores e pelo próprio pesquisador são: identifi-
car a existência de fidelidade ao que é inicialmente
Como ilustrado acima, ontologia trata da
realidade em duas caracterizações básicas, como
algo independente ou como parte das circunstân-
cias circundantes do estudo. Já a epistemologia,
centrada em duas e difusas orientações, delimita
uma das razões da ciência positiva ser conceituada
QUADRO 1 - Ontologia e epistemologia no método estudo de caso
ONTOLOGIA
FUNDAMENTAL ANTIFUNDAMENTAL
A realidade é independente
A realidade é circunstancial.
EPISTEMOLOGIA POSITIVISMO INTERPRETATIVISMO
Orientação metodológica central:
Quantitativa. Qualitativa.
Tratamento das limitações:
Observadas.Geralmente não ob-
servadas.
FONTE- Adaptado de Maffezzolli e Boehs (2008).
198
proposto; demonstração de que existe coerência
técnica e acurácia na coleta dos dados; verificação
da pertinência das questões com especialistas no
assunto e com os entrevistados; verificação dos re-
sultados orientada por teorias relevantes; explicita-
ção da qualidade da informação, dos informantes e
da relevância nas contribuições providas; e, efetuar
técnicas de análise como triangulações.
No entendimento de Maffezzolli e Boehs
(2008), a triangulação de dados é uma alternati-
va à verificação da validade de construtos, o que
é praticável através da convergência das informa-
ções. Além deste preceito, os autores apresentam
ainda algumas alternativas, para validar e assegurar
confiabilidade na análise dos casos, como ilustrado
abaixo.
introdução sobre o assunto, objetivo do estudo,
proposições e justificativa da relevância de conduzir
a pesquisa. Coutinho e Chaves (2002) complemen-
tam com elementos a serem inclusos no relatório
do Estudo de Caso: definição do caso com clareza;
descrição do contexto; justificativa da relevância do
estudo; objetivos e foco da investigação; delimita-
ção da estratégia de pesquisa e outras definições.
Numa perspectiva como a de Yin (2001), é
preciso ainda definir se o estudo é de caso simples
ou múltiplos; definir a unidade ou unidades de aná-
lise; fazer uma completa fundamentação teórica;
além de delimitar com clareza como os dados serão
coletados, quem os coletará e quando são relevan-
tes. A descrição adequada dos dados também é um
critério de qualidade. Abaixo, dois autores impor-
tantes acerca dos estudos de caso serão brevemen-
te citados. Trata-se de obras acerca do emprego
desta metodologia, e classificações conceituais.
3.1 Preceitos de Autores Clássicos: Robert K. Yin
O autor Robert K. Yin é um dos mais cita-
dos ao se tratar da metodologia do Estudo de Caso.
Grande parte dos preceitos utilizados por outros au-
tores de metodologia, inclusive este artigo, recebem
grande influência de suas ideias. Para tanto, muitos
dos seus preceitos estarão subentendidos nesta
orientação, o que faz com que apesar deste tópico,
não necessariamente suas ideias estejam limitadas
nestes poucos parágrafos.
Basicamente, na percepção de Maffezzolli
e Boehs (2008) com base na orientação de Yin
(2001), o Estudo de Caso pode ser classificado em
três categorias básicas e não mutuamente exclu-
dentes. Podem ser os casos [1] exploratórios: pri-
mam pelo conhecimento em maior profundidade
(buscam descobrir acerca do caso); [2] descritivos:
constituem o relato de uma situação ou do próprio
cenário do caso e; [3] explicativos: tendo em vista a
explicação das causas de uma situação ou fenôme-
no, mas em sentido diferente daquele da orientação
positivista de ciência. Seja qual for a sua classifica-
ção como caso (simples ou múltiplo), a definição de
uma unidade de análise é elemento obrigatório para
É de importância que o pesquisador registre
adequadamente os passos relacionados ao desen-
volvimento da pesquisa, para fins de atestar qua-
lidade e rigor (MAFFEZZOLLI; BOEHS, 2008). Um
protocolo de pesquisa é uma alternativa. Neste pro-
tocolo é recomendado que sejam incorporados os
instrumentos usados na coleta de dados, os proce-
dimentos e regras adotadas na categorização e in-
terpretação dos dados. Deve ser composto por uma
QUADRO 2 - Preceitos de validade e confiabilidade em estudo de caso.
VALIDADE DO CONSTRUTO
- Forma de mensuração utilizada;- triangulação realizada;- encadeamento das evidências;- revisão das informações;- críticas sobre o grau de
subjetividade atribuído ao processo.
VALIDADE INTERNA- Para a compreensão quando o foco
é uma relação causal.
VALIDADE EXTERNA
- Estabelecimento do domínio pos-sível às generalizações;
- possibilidade de replicação do estudo.
CONFIABILIDADE
- Complemento à validade externa;- capacidade de repetir o estudo e
obter ‘mesmos’ resultados;- uso do protocolo para documentar
etapas da pesquisa;- organização: dos dados e das
fontes de informação.
FONTE- Adaptado de Maffezzolli e Boehs (2008).
199R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 190-208, jan./jun. 2011
a condução adequada do estudo. O caso pode ser
um indivíduo, um evento ou ainda uma organização
(empresa), foco este geralmente adotado nos estu-
dos de Administração.
Não apenas o caso particular é determinante
nesta metodologia. Pode ser uma decisão de pecu-
liaridades, ou ainda advindo de casos múltiplos para
comparação de semelhanças e diferenças. Acer-
ca desta delimitação, lembram Coutinho e Chaves
(2002) que o autor separa o Estudo de Caso entre
as classificações de único ou múltiplo. O único cen-
traliza atenção em uma especificidade, uma orga-
nização, um fenômeno ou contexto. Por sua vez, o
estudo de casos múltiplos, também conhecido por
comparativo ou multicasos, geralmente compa-
ra situações, ou mais fácil de identificar, empresas
com relação a uma questão de pesquisa comum, de
onde através de semelhanças e diferenças o autor
tecerá suas conclusões.
3.2 Preceitos de Autores Clássicos: Robert Stake
Maffezzolli e Boehs (2008), acerca dos pre-
ceitos de Robert Stake lembram que nos estudos
de caso a predominância analítica é interpretativa,
e não determinística. Para Stake (2000), o Estudo
de Caso responde por três tipos. Pode ser [1] intrín-
seco, quando o interesse é um caso específico, para
a compreensão de um fenômeno singular. Refere-
-se a “melhor compreensão de um caso particular”
(COUTINHO; CHAVES, 2002, p.226). Também pode
ser [2] instrumental, quando o caso é uma fonte
para a obtenção de insights sobre o que deseja co-
nhecer, ou ainda, para realizar refino teórico, apri-
morando o conhecimento sobre algo (COUTINHO;
CHAVES, 2002). Por fim o [3] coletivo, para quando
são abordados diversos casos, ou um conjunto de
casos (o que equivale aos casos múltiplos), para que
seja analisada uma situação na relação entre seme-
lhanças e diferenças, que podem elucidar acerca do
objetivo do estudo. Este tipo de análise permite o
conhecimento aprofundado sobre algo.
Outra premissa de Stake (2000) abrange as
estratégias para análise dos dados, mais bem ilustra-
das na sequência deste texto. Basicamente o autor
classifica a análise de casos em dois grupos, que se
compõem da interpretação direta dos fenômenos
ou através do processo de formação e agregação de
categorias à medida que a interpretação dos resulta-
dos evolui. A aproximação do autor ao caso permite
uma adequada capacidade analítica.
Quanto à intimidade do autor com o caso,
se por um lado pode ser causadora de viés, por ou-
tro auxilia na compreensão dos fenômenos em ob-
servação. Porém, mesmo que exterior ao contexto
do caso, a busca por uma aproximação relativa é
recomendável, pois viabiliza futuras comparações
entre casos, através de dimensões de similaridades
e diferenças. Argumentam neste sentido Maffezzolli
e Boehs (2008), acerca de uma generalização na-
turalística para os estudos de caso. Trata-se da ex-
periência acumulada do indivíduo qual o torna apto
a realizar comparações entre casos, com base nas
situações vividas. Do ponto de vista positivista, não
é uma prática aceitável, porém, diante do aspecto
interpretativista, desde que seja uma análise bem
feita por pesquisador apto, os resultados podem
ser satisfatórios.
Apesar da falta de maturidade, práticas que
proporcionam a repetição dos estudos auxiliam na
busca por uma aproximação ao conceito de ciência,
o que é viável desde que os procedimentos sejam
registrados para que outros pesquisadores possam
aplicá-los na mesma ou em similares situações e
contextos. Esta problemática reside nos juízos de
valor.
4 Procedimentos e Exemplos de Ferramentas a serem Utilizadas em Estudo de Caso
Por sua versatilidade, o Estudo de Caso é
uma metodologia utilizável para diversos propósi-
tos. Além de ser uma condição impreterível, “a van-
tagem das múltiplas fontes de evidência para so-
lucionar problemas de pesquisa” tornam a técnica
200
adequada para situações em que estejam disponí-
veis tanto informantes quanto documentos relativos
ao assunto de interesse (MAFFEZZOLLI; BOEHS,
2008, p.96). A criação de categorias de análise, an-
teriores ou até mesmo durante a condução do es-
tudo proporcionam uma flexibilidade neste método
interpretativo não possível em estudos positivistas,
conduzidos por técnicas multivariadas, já que defi-
nidas as questões e coletados os dados, nada mais
será ajustado em termos de coleta. Algumas pos-
sibilidades para coleta de dados em casos seguem
abaixo.
de Análise. Esta é o locus de interesse, seja ela uma
empresa, uma interação ou por vezes um indivíduo.
Uma entrevista é classificada de estruturada quando
“caracteriza-se por um roteiro com questões ‘fecha-
das’ apresentadas ao entrevistado” (TOZONI-REIS,
2005, p.42). Por sua vez, a semiestruturada está
associada a um roteiro de questões, utilizado pelo
entrevistador, qual adapta as questões conforme o
momento, utilizando-as como direcionamento. Ge-
ralmente, este tipo de entrevista deve ser gravado
em aparelho de áudio, mediante o pedido ao entre-
vistado pelo consentimento de fazer o registro, para
que seja posteriormente transcrita e analisada em
detalhe pelo pesquisador. Na entrevista semiestru-
turada, o “roteiro tem o papel de recordar ao entre-
vistador os principais pontos a serem colocados no
diálogo com o entrevistado”, evitando esquecimen-
to de tópicos essenciais (TOZONI-REIS, 2005, p.47).
Outras observações são providas por
Maffezzolli e Boehs (2008) que citam outros atribu-
tos passíveis às entrevistas, que podem atender
a características como: espontaniedade (caráter
perceptivo), focada (direcionada), e devem ser
atentamente desenvolvidas para evitar viés e
imprecisão, que podem resultar da má elaboração
das questões, do roteiro. Dependem também das
habilidades do pesquisador em fazer as pergun-
tas certas, e da capacidade de ouvir e responder
(reagir) aos acontecimentos do momento.
Na percepção de Boyd e Westfall (1964, p.51),
“a maioria das informações usadas em mercadolo-
gia são obtidas por meio de entrevistas”, o que de-
monstra o intenso uso desta técnica nas pesquisas
de Administração. Neste sentido é possível afirmar
que “a linguagem verbal desempenha um impor-
tante papel na representação, armazenamento e
comunicação do pensamento” contido nas organi-
zações (ZALTMAN, 1997, p. 424). Por estas razões
é possível entender a opção dos pesquisadores por
entrevistas, técnica que tem se mostrado uma das
fontes essenciais na coleta dos dados primários, ou
seja, evidências fornecidas diretamente. Também
são importantes os dados secundários, apreciados
a seguir.
Não se pode deixar de mencionar que cada
tipo de coleta, assim como cada fonte de evidência
adotada, apresenta vantagens e desvantagens (MA-
FFEZZOLLI; BOEHS, 2008). Algumas das fontes e
técnicas de evidência serão apresentadas a seguir,
com o objetivo de uma breve descrição acerca de
sua utilização, com o foco no método Estudo de
Caso.
4.1 Dados Primários: Entrevistas
Uma das maneiras mais diretas de obter infor-
mações nas ciências sociais é através da pergunta,
diretamente feita ao informante selecionado (KER-
LINGER, 1980). Geralmente este tipo de intervenção
se dá por meio de entrevistas, sejam estruturadas
ou semiestruturadas. Justamente o fato de ser ob-
tida diretamente do envolvido no contexto, permite
a classificação de dado primário, ou seja, coletado
diretamente no contexto de interesse, na Unidade
QUADRO 3 - Procedimentos para a coleta de dados em estudo de caso.
Tipos de técnicas para coleta de dados em estudos de caso (tipologias)
Diretas / interativas: (dados primários).
Ex. entrevistas; observações; etc.
Indiretas / não interativas: (dados secundários)
Ex. análise documental (registros, cartas, diários,...); etc.
FONTE- Adaptado de Coutinho e Chaves (2002)
201R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 190-208, jan./jun. 2011
4.2 Dados Secundários: Análise Documental
Uma pesquisa em dados secundários, que é a
situação da pesquisa documental, se define por ter
“como principal característica o fato de que a fon-
te dos dados, o campo onde se procederá a coleta
dos dados” reside nos documentos, ou em arquivos.
Este fato não elimina a possibilidade da combinação
com outras formas de coleta das evidências, sejam
elas igualmente secundárias ou mesmo primárias,
como a entrevista (TOZONI-REIS, 2005, p.32).
Outros tipos de registros documentados em
diferentes mídias e formatos podem ser utilizados,
como cartas, memorandos, agendas, avisos organi-
zacionais, recortes de jornal, fontes impressas, fo-
tos, vídeos, arquivos digitais, etc. No entendimento
de Maffezzolli e Boehs (2008, p.102), a análise em
documentos deve ser “uma tarefa de complementa-
ridade às demais fontes de evidência”. O interessan-
te é que muitos dos dados presentes em documen-
tos são históricos e quantitativos, o que por um lado
pode ser de difícil acesso, mas por outro, configura
uma alternativa para obter uma ideia do caso com
maior precisão.
4.3 Observação
A observação apesar de inerente ao ser hu-
mano, não é uma das técnicas mais utilizadas na
Administração. Nos poucos estudos em que é em-
pregada, desponta como complementar, quando
em Estudo de Caso, (ou em posição central, em tra-
balhos conduzidos por preceitos etnográficos). A
observação atende por diferentes tipologias.
Uma das observações viáveis é a chamada
observação direta, onde o pesquisador, por exem-
plo, ao visitar uma empresa, acaba por praticá-la
com naturalidade. A observação direta é adequada
para que o pesquisador compreenda o contexto em
que o fenômeno investigado ocorre, e é uma alter-
nativa de análise em tempo real. O pesquisador não
intervém na situação.
Já na observação participante, o pesquisador
não adota uma postura passiva ou neutra. Neste
contexto, o pesquisador é parte no que investiga, e
é capaz de “perceber a realidade do ponto de vista
de alguém que está inserido no caso e não fora dele”
(MAFFEZZOLLI; BOEHS, 2008, p.103). Este tipo
de intervenção é comum nos estudos antropoló-
gicos, e por sua característica de interferência,
ainda que possa compor parte de um Estudo de
Caso, representa uma alternativa mais próxima dos
preceitos de outro método, a Pesquisa-Ação.
4.4 Artefatos
O uso de artefatos é outra prática utilizada
na Antropologia, comum em um dos seus desdo-
bramentos, a Arqueologia. Como referenciado por
Maffezzolli e Boehs (2008, p.103), os artefatos fí-
sicos são tangíveis, e seu emprego como parte do
procedimento de coleta de dados “depende da se-
letividade e disponibilidade dos mesmos”. Fotogra-
fias e vídeos, assim como em documentos, podem
ser classificados como artefatos dependendo da
percepção do pesquisador. No caso da Antropo-
logia servem como artefatos, já na Administração,
enquadra-se em artefatos, mas também podem ser
caracterizados como documentação, por exemplo,
ao demonstrarem o antes e o depois no caso de
melhoria contínua em equipamentos, etc.
Na continuidade desta apreciação acerca das
técnicas de coleta dos dados, segue uma subdivi-
são do texto destinada à análise. Tão importante
quanto uma boa coleta de dados é que estes sejam
analisados através de procedimentos bem definidos
e ancorados em teoria.
4.5 Facilitadores Conceituais, Triangulação e Análise dos Dados
O procedimento da análise dos dados consis-
te em examinar, categorizar, classificar, recombinar e
por vezes realizar testes com as evidências obtidas
em campo, durante a fase da busca por respostas
ao problema de pesquisa, e dos objetivos do estu-
do. De modo simples, a análise dos dados “consiste
em discutir, analisar e interpretar os dados coleta-
dos”, tendo em vista resultados coerentes e rigo-
rosamente construídos (TOZONI-REIS, 2005, p.73).
202
Dentre diversas possibilidades para concep-
ção dos resultados através dos dados coletados,
“a Triangulação é importante para perceber os ele-
mentos de repetição”, assim como identificar con-
sistências e discrepâncias entre teoria, casos e in-
formantes, além dos casos negativos, importantes
de averiguar (MAFFEZZOLLI; BOEHS, 2008, p. 105).
A Triangulação pode ser realizada em diver-
sas perspectivas, seja triangulação de dados, infor-
mantes ou de métodos. Na triangulação das fontes
de dados “se confrontam os dados provenientes de
diferentes fontes”, o que pode ser feito através das
combinações de técnicas, servindo à coleta de da-
dos qualitativos e quantitativos, por entrevistas, aná-
lise documental, e emprego paralelo de questioná-
rios (COUTINHO; CHAVES, 2002, p. 235). Coutinho
(2008) caracteriza a triangulação como a combina-
ção de visões, métodos e materiais coletados que
podem ser sistematicamente estudados para prover
rigor, amplitude e profundidade ao estudo. A mais
utilizada é a triangulação de dados, qual configura
a “forma de conseguir uma análise de maior alcan-
ce e riqueza” (COUTINHO, 2008, p.10). Um exemplo
na Etnografia é quando o pesquisador compara o
que as pessoas fazem ao que elas dizem fazer. Em
negócios, por exemplo, é uma forma de investigar
a coerência dos discursos de gestores. Um gestor
pode se considerar acessível aos funcionários, mas
o pesquisador através de observação e entrevistas,
quando da triangulação, poderá descobrir que os
funcionários e o que ele presenciou não condizem
ao discurso do gestor, ou vice-versa.
Também na triangulação podem ser identifi-
cados os casos negativos, quais não são compatí-
veis com os resultados gerais. Este tipo de diagnós-
tico pode requerer mais análise.
Em essência, a triangulação constitui “a base
para a validação da pesquisa qualitativa”, e está
relacionada diretamente com a interpretação do
pesquisador. Esta deve ser conduzida com base em
preceitos teóricos e mediante a análise dos dados
coletados através de fontes diversas, um requisito
central em Estudo de Caso (MAFFEZZOLLI; BOEHS,
2008, p.103).
As triangulações viáveis em uma pesquisa
podem ser:
– de dados: requer múltiplas fontes de
dados, que devem se referir ao mesmo
elemento que o pesquisador deseja elu-
cidar;
– de investigadores: quando mais de um
pesquisador participa na condução do
estudo;
– das teorias: quando teorias conflitantes
são utilizadas na interpretação dos da-
dos;
– dos métodos: quando métodos de pes-
quisa são combinados na investigação.
Nas percepções convergentes, a consolida-
ção de hipóteses em construção é possível, para
que estas sejam testadas posteriormente através de
métodos orientados para as generalizações. Já na
identificação de casos conflitantes, um dos benefí-
cios está na rejeição de conclusões prematuras ou
geração de hipóteses pouco consistentes à teoria
e à realidade. O procedimento para a relação en-
tre convergências e divergências está representado
abaixo.
Algumas idealizações podem auxiliar em pro-
cessos de análise de dados, como é o caso de sis-
tematizar categorias teóricas para auxiliar ao pes-
quisador quanto à manutenção do foco. No quadro
abaixo, está expresso um esquema de análise para o
auxílio do autor em relacionar a teoria para que sirva
como base ao processo analítico.
Na primeira coluna, a sugestão é mencionar o
grande tema, ou conceito geral acerca dos demais
pontos de análise. Por exemplo, uma aplicação de
tecnologia numa empresa pode contar com as di-
QUADRO 4 - Representatividade da triangulação de investi-gadores em estudo de caso.
Possibilidades do processo de triangulação (investigadores)
Percepções Convergentes
Favorecem o processo da construção de hipóteses fundamentadas.
Percepções Conflitantes
Evitam a elaboração de conclusões prematuras ou inadequadas.
FONTE - Adaptado de Maffezzolli e Boehs (2008).
203R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 190-208, jan./jun. 2011
mensões organizacional e tecnológica. No exemplo
abaixo, a dimensão tecnológica é explicitada, tendo
ao lado a subdivisão conceitual, ou seja, de compo-
nentes em análise quais compõem a referida dimen-
são. Estas variáveis podem ser como no exemplo,
conceitos, ferramentas ou demais elementos quais
sejam importantes ao estudo. Na caracterização
das variáveis são explicitados os atributos concei-
tuais que a representam na perspectiva da pesqui-
sa. Por exemplo, a Tecnologia de Informação é um
secundários. Como exemplo, dos dados primá-
rios utilizados, as entrevistas, a serem feitas com
colaboradores, gestores, clientes e outros atores
de interesse. Já os dados secundários contam com
documentos, manuais e informações do site da
empresa.
Outra estratégia facilitadora para condução
do Estudo de Caso consiste em fazer sua classifica-
ção, além dos dois tipos propostos por Yin (2001),
conceito que incorpora equipamentos e inteligên-
cia contida nos programas de computador. Por fim,
os referenciais da construção teórica, para que ou-
tros pesquisadores possam se situar na teoria e ain-
da identificar preceitos de interesse, seja por curio-
sidade ou para replicação do estudo.
Também a sistematização do método pode
servir para que o pesquisador mantenha o foco ade-
quado e siga com rigor os procedimentos de pes-
quisa. Na figura abaixo, os passos de condução da
pesquisa estão explicitados, bem como as fontes
múltiplas de dados estão identificadas, de manei-
ra a constituir uma orientação visual eficaz para que
o foco e os procedimentos de pesquisa sejam res-
peitados conforme pré-definidos pelo pesquisador.
Em caso de alterações ao longo da pesquisa, estas
devem ser integradas ao desenho de orientação. Tra-
ta-se de uma representação visual acerca dos proce-
dimentos adotados na investigação.
No topo da ‘Figura 1’, está expressa a existên-
cia de indicadores construídos em teoria, que será
a base para a análise dos dados coletados, direta-
mente ou por intermédio de estruturas de análise,
como quadros, árvores conceituais ou nós e linhas
teóricas. Abaixo as fontes de dados, primários e
de caso simples ou múltiplo, caracterizando também
abordagem ou modalidade na qual se enquadra a
pesquisa. Para Coutinho e Chaves (2002), os casos
únicos podem ser classificados dentro das seguin-
tes modalidades: histórico (evolução institucional);
observacional (observação participante); biográfico
(entrevista intensiva com o indivíduo de interesse);
comunitário (foco em uma comunidade); situacional
(avaliação de um acontecimento com base na per-
cepção dos atores participantes); microetnografia
(participação em pequenas atividades em um am-
biente). Para os casos múltiplos, os autores destacam
duas modalidades: indução analítica (busca concei-
tos abstratos baseados no contexto das observa-
ções); comparação constante (objetiva a geração
teórica mediante comparação sistemática entre di-
ferentes unidades de análise) (COUTINHO; CHAVES,
2002).
Tanto os casos únicos quanto os estudos com
casos múltiplos podem ser subdivididos em duas
modalidades. Os casos podem ser holísticos, anali-
sando o fenômeno em sua totalidade; ou inclusivos,
caso a análise seja dividida em unidades para ca-
racterizações específicas. Por exemplo, analisa-se o
todo ou divide-se por gênero, idade, renda, etc.
QUADRO 5 - Quadro de auxílio teórico para procedimento de análise em estudo de caso
Dimensões Variáveis Caracterização Referencial
Tema; ou conceitos principais.Ex: Dimensão Tecnológica.
Descrição da variável.Exs: Dados; Tecnologia de Infor-mação; Data Mining; etc.
Resumo do conceito em questão.Exs: Dados são fatos em sua forma primária.Tecnologia de Informação é composta por hardware e tam-bém por software.
Listagem das obras: princi-pais autores que abordam o assunto.Ex: Brambilla (2006); Brambilla (2009); etc.
FONTE - Adaptado de Brambilla (2006).
204
É importante destacar que o Estudo de
Caso não é baseado em amostragem estatística.
Neste sentido, a amostra sempre é determinada
por uma escolha, geralmente partindo do pesqui-
sador. Esta escolha está vinculada ao interesse da
pesquisa e também deve ser encaminhada atra-
vés do entendimento da teoria qual suportará a
investigação. No quadro abaixo, adaptado das
ideias de Coutinho e Chaves (2002), a proposta
é que o pesquisador possa classificar o tipo de
Estudo de Caso qual pretende conduzir. Reco-
menda-se que o estudioso identifique sua ideia
de pesquisa através da opção entre os espaços
possíveis dentro do quadro, o que didaticamente
pode ser feito através da marcação dos objetivos
de estudo.
Teoria. Fundamentação teórica e indicadores.
O que a literatura apresenta sobre o assunto. Questões e/ou indicadores desenvolvidos com
base no referencial.
Procedimento de pesquisa com dados secundários.
O que a documentação, os manuais, e o site da empresa proporcionam de informação
pertinente ao estudo.
TRIANGULAÇÃO
Procedimento de coleta dos dados primários (entrevista).
O que os informantes proporcionaram através do
procedimento de coleta dos dados (entrevistados).
FIGURA 1: Exemplo ilustrado do processo de triangulação de dados em estudo de caso
FONTE - Adaptado de Brambilla (2009).
Para melhor aplicação do instrumento propos-
to no ‘Quadro 6’, a explicação de como fazer a sua
utilização é importante. A primeira definição que deve
ser levada em consideração é se o Estudo de Caso
a ser conduzido será único ou múltiplo. No segundo
momento, o tipo de análise a ser conduzida, no que
diz respeito à especificidade ou amplitude da situa-
ção, o que é definido como holístico (quando o foco é
a situação geral) ou inclusivo (quando o interesse está
em um fenômeno, ou em características específicas
de uma situação). Por fim, identificar as característi-
cas que fazem parte da investigação, uma escolha não
exclusiva que pode relevar o teor do estudo quanto a
ser exploratório, descritivo, explicativo, transforma-
dor, avaliativo, ou misto. O estudo é misto quando da
combinação entre duas ou mais alternativas.
QUADRO 6: Instrumento de apoio ao pesquisador para a delimitação de um estudo de caso.
ESTUDO DE CASO Exploratório Descritivo Explicativo Transformador Avaliativo
ÚNICOGlobal (Holístico)
Inclusivo (Embedded)
MÚLTIPLOGlobal (Holístico)
Inclusivo (Embedded)
FONTE - Adaptado de Coutinho e Chaves (2002).
205R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 190-208, jan./jun. 2011
5 Potencialidades e Problemas no Emprego do Estudo de Caso
O Estudo de Caso como método de pesquisa
é norteado por potencialidades e pontos fracos, como
em qualquer situação ou estratégia utilizada para fazer
pesquisa. As vantagens são encontradas diante de
situações em que o conhecimento desejado é escasso,
nas quais existe fragmentação de conhecimentos,
incompletude, unicidade, ou em situações complexas
ao ponto de não serem passíveis de indicadores psico-
métricos diretamente auxiliarem na compreensão dos
fatos. Também pode ser um método utilizado junta-
mente com outros mais generalistas para identificação
de particularidades não detectáveis por estes. Porém,
os problemas também existem, e incluem a condução
isolada de investigação, o risco de apenas descrever
uma realidade sem promover avanços (sistematização
do óbvio), resultados que extrapolam o que o estudo
pode suportar, além das faltas de precisão, objetividade
e ausência de rigor. Coutinho e Chaves (2002) desta-
cam as questões referentes à inexperiência do pesqui-
sador, que podem incluir o desconhecimento ou falta
de conhecimento adequado sobre a técnica, a falta de
conhecimento ou de arcabouço teórico para susten-
tar suas análises, e a falta de contato com a vivência e
com o pensamento acadêmico. Destaca-se em Couti-
nho (2008, p.5), que a credibilidade é essencial para
qualquer tipo de pesquisa, para qualquer emprego
metodológico, e salienta que “sem rigor a investiga-
ção não tem valor”.
Com base no desenvolvido até este ponto
do ensaio teórico acerca da metodologia Estudo de
Caso, em especial em relação às observações pro-
vidas por Coutinho (2008) e Coutinho e Chaves
(2002), no quadro apresentado a seguir é feita uma
comparação didática entre o Estudo de Caso e o
mais positivista dos métodos, o Estudo Experimen-
tal. O objetivo desta relação é demonstrar as dife-
renças necessárias na observação entre as técnicas
no que diz respeito às medidas adotadas para iden-
tificar credibilidade e consistência. Embora não se
possam comparar diretamente diferentes paradig-
mas de ciência, abaixo é provida a visão geral acerca
da importância de critérios a serem atendidos tendo
como objetivo o rigor acadêmico.
Uma alternativa para prover rigor ao Estudo
de Caso é executar o p rocedimento de auditoria
na pesquisa. Para auditoria de pesquisa ser efetua-
da, “uma terceira parte examina sistematicamente o
processo de pesquisa conduzida pelo investigador”
(COUTINHO, 2008, p. 10). Por objetivo, esta prática
pretende analisar se o estudo foi conduzido de ma-
neira sistemática e metódica, e coerente com seus
QUADRO 7 - Critérios de rigor comparados entre estudos experimental e de caso
ESTUDO DE CASO X ESTUDO EXPERIMENTAL
Transferibilidade Generalização
Generalização Naturalística Validade Externa
Credibilidade Validade Interna
Consistência Confiabilidade
Na transferibilidade (confiabilidade/fidelidade/fidedignidade), o pressuposto geral remete à viabilidade de repetir um estudo. O pes-quisador é membro do caso, e por isso repetir não é viável, mas é possível descrever como fazer estudo similar através de detalhada expli-cação da metodologia empregada. Clareza e detalhamento da recolha e análise dos dados agrega o valor relativo ao aspecto de repetição, ou transferibilidade nos estudos de caso. Há a necessidade de documentação adequada dos métodos de coleta e análise de dados.
A generalização natural sofre efeito similar ao da transferibilidade. Como o pesquisador não é neutro, e conduz à interpretação dos resultados, o rigor pode ser obtido se for possível “reduzir ao mínimo a influência da subjetividade inerente ao investigador” (COUTINHO; CHAVES, 2002, p. 234). O autor precisa evidenciar que suas conclusões não são fragmentos da imaginação ou tendenciosas; favoráveis ao que entende por mais adequado aos seus propósitos ou ideologias. Os indicadores e a teoria devem prevalecer na análise dos dados, acima das crenças e ideologias defendidas pelos sujeitos e pelo autor.
Credibilidade, segundo Coutinho (2008, p. 8), “diz respeito ao quanto às construções/reconstruções do investigador reproduzem os fenômenos em estudo”. Por sua vez, a consistência, está estruturada com base na “capacidade de replicar o estudo” que outro estudioso possa seguir relevando o que estava documentado como procedimentos adotados pela investigação original (COUTINHO, 2008, p. 10).
FONTE - Adaptado de Coutinho (2008) e Coutinho e Chaves (2002).
206
propósitos. Trata-se de uma tentativa ou aproxima-
ção ao pensamento do pesquisador, traduzindo suas
premissas de verificação. A tentativa de mapear o
pensamento do pesquisador proporciona um melhor
entendimento de como os dados foram coletados e
analisados, assim como de onde surgiram suas con-
clusões. Além da auditoria, tempo prolongado de
pesquisa e análise de dados e avaliação por pares
podem ser alternativas para obtenção de estudos
com resultados mais próximos do que é possível
identificar da realidade em verificação. Assim como
os pares, participantes da pesquisa podem trabalhar
no sentido de verificar se os resultados representam
a interpretação adequada e descrição das experiên-
cias, ideias ou sentimentos (COUTINHO, 2008).
Além dos princípios relacionados com a trans-
feribilidade (capacidade de a pesquisa ser reconduzi-
da ou reaplicada por outros pesquisadores em mesmo
ou em outro contexto), é preciso que sejam segui-
dos adequados “princípios metodológicos para que a
validade de seus resultados seja assegurada” (OHIRA,
1998, p. 73). A valorização do Estudo de Caso tam-
bém transita pela consciência de que generalização
não é o único objetivo na condução das pesquisas.
Por vezes, justificativas para o estudo, sua unicida-
de, poder de elucidação, caráter crítico e exclusivi-
dade da situação proporcionam relevância (COUTI-
NHO; CHAVES, 2002). Os casos negativos ilustram
situações potenciais para estudo, porque através do
atípico é possível melhor entender o que é o padrão
dominante. Contextualização do cenário, além de
interpretação robusta da situação fortalece a impor-
tância dos casos, o que também pode servir de fon-
te para a geração de hipóteses bem estruturadas a
serem testadas por outros métodos. Para Coutinho
e Chaves (2002), os casos podem ser usados como
metodologia que resulta na geração de hipóteses a
serem testadas, ao contrário de outros métodos que
delas partem. Por fim, é importante a noção de que o
rigor científico não é exclusividade das metodolo-
gias mais ortodoxas, advindas do paradigma posi-
tivista da ciência. Os estudos interpretativos também
devem ser orientados por pressupostos voltados ao
rigor investigativo (COUTINHO, 2008).
6 Considerações Finais
O presente estudo não esgota a totalidade
das ideias da pesquisa, tampouco acerca da esco-
lha e prática do Estudo de Caso como estraté-
gia de pesquisa em ciências sociais, em especial no
âmbito da Administração e demais áreas orienta-
das aos negócios (Contabilidade, Economia, Design,
Moda, Turismo, etc.). Como lembra Coutinho (2008),
há uma dicotomia básica nas ciências sociais, entre
a perspectiva positivista e a fenomenológica. Uma
terceira via, a da teoria crítica, pode ser entendida
como parcialmente integrada ao aspecto fenome-
nológico, que juntamente com o interpretativismo
podem ser incorporadas como face anti ou não posi-
tivista de ciência. Assim, a ciência pode ser dividida
entre metodologias e pressupostos positivistas, na
lógica de ciências tradicionais, ou não positivistas,
incorporando as demais alternativas. O estudo dos
negócios atua com ambas as perspectivas, o que
faz do campo de estudo da gestão uma arena em
constante conflito acerca das questões de rigor. O
pêndulo científico por vezes balança entre extremos,
como é o caso da área de Marketing, onde os estu-
dos multivariados, como a Modelagem de Equações
A valorização do Estudo de Caso também transita pela consciência de que
generalização não é o úni-co objetivo na condução das pesquisas. Por vezes, justificativas para o estu-do, sua unicidade, poder
de elucidação, caráter crítico e exclusividade da
situação proporcio-nam relevância.
207R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 190-208, jan./jun. 2011
Estruturais, representam o racionalismo extremo, e a
Antropologia de mercado ocupa a posição antagô-
nica. Em tal contexto, o Estudo de Caso apresenta-
-se como método intermediário. Por isso, tende a ser
mais bem aceito do que os paradigmas mais livres
em oposição aos preceitos positivistas.
Além da discussão entre orientações científi-
cas, ortodoxas ou não, a relação entre as definições
de estudos qualitativos e quantitativos, também é
controversa. O Estudo de Caso é confundido como
qualitativo em grande parte das situações, o que
não se aplica em todas as pesquisas. A possibilida-
de entre estes extremos é a condução de estudos
mistos. Ainda que o aspecto qualitativo seja
amplamente defendido no Estudo de Caso, por
exemplo, quando são criadas categorias e análises
como a contagem de palavras, fica evidenciada
a orientação senão quantitativa, ao menos quali-
-quantitativa, ou mista. Mais que pelo método ou
orientação escolhida, a validade de um conheci-
mento está associada ao rigor e cuidados adotados
pelo pesquisador (COUTINHO, 2008). O Estudo de
Caso, bem como outros métodos não positivistas
em essência, requerem unificação de terminologias,
como nas ciências ‘duras’, para que a credibilidade e
reconhecimento de sua validade sejam obtidos. Não
é por falta de linearidade, que a pesquisa interativa,
como o Estudo de Caso, seja inválida. Destaca Alves-
-Mazzotti (2006, p.638) que “nenhum conhecimento
é inteiramente objetivo”.
O que é importante na adoção do Estudo de
Caso como método de pesquisa é atender aos requi-
sitos de rigor que garantam sua qualidade. Os proble-
mas relacionados aos estudos com casos emergem
porque “nem sempre a adoção desse delineamento
ocorre com a observância do rigor requerido” (GIL;
LICHT; OLIVA, 2005, p. 48).
• Recebido em: 14/10/2010
• Aprovado em: 13/04/2011
208
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Orientações aos Colaboradores da Revista da FAE
210
Histórico e Missão
A Revista da FAE, existente desde 1998, é um es-
paço para divulgação da produção científica e acadêmica
de temas multidisciplinares, que enfoca, principalmente, as
áreas de Administração, Contabilidade, Economia, Direito,
Engenharia, Educação, Sistemas de Informação, Psicologia
e Filosofia, com o intuito de discutir o posicionamento das
organizações e o desenvolvimento local.
Pela sua missão ser a de formentar a produção e a
disseminação de conhecimento em áreas correlatas à dis-
cussão sobre a gestão de negócios e o posicionamento das
organizações no processo de desenvolvimento local, entre
nossos leitores, encontram-se professores, alunos de gradu-
ação e pós-graduação, consultores, empresários e profis-
sionais de empresas públicas e privadas.
Já com o tema organizações e desenvolvimento, o
objetivo é analisar o papel e a interação da organização, qual-
quer que seja sua origem ou situação societária, no processo
de sustentabilidade econômica, social, ambiental e política.
Além de trabalhos puramente teóricos, serão aceitos
para apreciação artigos resultantes de estudos de casos ou
pesquisas direcionadas que exemplifiquem ou tragam ex-
periências fundamentadas teoricamente e que contribuam
com o debate estimulado pelo objetivo da revista.
Enfatiza-se a necessidade de os autores respeitarem
as normas estabelecidas nas Notas para Colaboradores, es-
pecialmente as referentes ao limite de tamanho. Os trabal-
hos serão publicados de acordo com a ordem de aprova-
ção, porém será priorizado o conteúdo multidisciplinar do
debate.
Todos os artigos estão disponíveis para download,
exceto a última edição.
Objetivo
O objetivo da Revista da FAE é promover a publica-
ção de temas relacionados à gestão de negócios e à inserção
das organizações no processo de desenvolvimento local.
A Revista da FAE deseja motivar e instigar os seus
leitores a compreenderem o papel das organizações no pro-
cesso de desenvolvimento local, tendo acesso à discussão
de temas atuais e relevantes para definição estratégica e op-
eracional das organizações.
Assim, será dada prioridade à publicação de artigos
que, além de inéditos, nacional e internacionalmente, versem
sobre o papel das organizações no desenvolvimento local e
discutam sobre temas contemporâneos da gestão de negó-
cios.
Orientação Editorial
Os trabalhos selecionados pela Revista da FAE
serão aqueles que abordem temas relacionados ao seu
objetivo, ou seja, que se refiram a ferramentas técnicas e
teorias relacionadas à gestão de negócios e à função das
organizações no processo de desenvolvimento local.
Com o tema gestão de negócios, visa-se contri-
buir com o debate sobre sistemas de gestão de produção
e gestão econômica de sistemas produtivos, com o intuito
de discutir o processo de desenvolvimento da organização.
Trata-se de uma visão holística sobre a gestão de negócios,
a partir de uma abordagem multidisciplinar das áreas de
Ciências Sociais Aplicadas (Administração, Contábeis e
Economia), Jurídica (Direito) e Exatas (Engenharias).
Focos
O principal requisito para publicação na Revista
da FAE consiste em que o artigo represente, de fato, uma
contribuição científica. Tal requisito pode ser desdobrado
nos seguintes tópicos:
• O tema tratado deve ser relevante e perti-
nente ao contexto e ao momento e, prefer-
encialmente, pertencer à orientação editorial.
• Oreferencialteórico-conceitualdeverefletir
o estado da arte do conhecimento na área.
• Odesenvolvimentodoartigodeveserconsis-
tente, com princípios de construção científica
do conhecimento.
• Aconclusãodeveserclaraeconcisaeapon-
tar implicações do trabalho para a teoria e/
ou para a prática administrativa.
Espera-se, também, que os artigos publicados na
Revista da FAE desafiem o conhecimento e as práticas
estabelecidas com perspectivas provocativas e inovadoras.
211R e v . F A E , C u r i t i b a , v. 14, n. 1, p. 190-208, jan./jun. 2011
Escopo
A Revista da FAE tem interesse na publicação de
artigos de desenvolvimento teórico e trabalhos empíricos.
Os artigos de desenvolvimento teórico devem ser
sustentados por ampla pesquisa bibliográfica e devem
propor novos modelos e interpretações para fenômenos
relevantes com relação à gestão de negócios e à interação
das organizações no desenvolvimento local.
Os trabalhos empíricos devem trazer avanços ao
conhecimento na área, por meio de pesquisas metodologi-
camente, bem fundamentadas, criteriosamente conduzi-
das, e adequadamente analisadas.
data. As referências bibliográficas completas
deverão ser apresentadas em ordem alfabé-
tica no final do texto, de acordo com as nor-
mas da ABNT (NBR-6023).
• Diagramas,quadros,figurasetabelasdevem
ser numerados sequencialmente, apresentar
título e fonte, bem como ser referenciados
no corpo do artigo.
Permuta
A Revista da FAE faz permuta com as principais faculdades
e universidades do país.
Assinatura
Periodicidade: Anual
Valor: R$ 65,00
• Para assinar, favor entrar em contato pelo
telefone (41) 2105-4093 ou pesquisa@fae.
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Envio de Artigos
Os artigos deverão ser encaminhados para:
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Fone: (41) 2105-4093 - Fax (41) 2105-4195
Agradecemos o seu interesse pela Revista da FAE e espe-
ramos tê-lo(a) como colaborador(a) frequente.
Notas para Colaboradores
A Revista da FAE está aberta a colaborações
do Brasil e do exterior. A pluralidade de abordagens e
perspectivas é incentivada.
Podem ser publicados artigos de desenvolvimento
teórico e artigos baseados em pesquisas empíricas (de 5
mil a 8 mil palavras).
A aceitação e publicação dos textos implicam a
transferência de direitos do autor para a Revista. Não são
pagos direitos autorais.
Os textos enviados para publicação são aprecia-
dos por pareceristas pelo sistema blind review.
Os artigos deverão ser encaminhados para o
Núcleo de Pesquisa Acadêmica (NPA) com as seguintes
características:
• Na folha de rosto deverão constar o título
do trabalho, o(s) nome(s) completo(s) do(s)
autor(es), acompanhado(s) de um breve cur-
rículo, relatando experiência profissional e/
ou acadêmica, endereço, números do tele-
fone e do fax e e-mail.
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título (máximo de dez palavras), o resumo
em português (máximo de 250 palavras) e
as palavras-chave (máximo de cinco), assim
como os mesmos tópicos vertidos para o in-
glês (title, abstract, keywords).
• A formatação do artigo deve ser: tamanho
A4, editor de texto Word for Windows, mar-
gens 2,5 cm, fonte times new roman 13 e/ou
arial 12 e espaçamento 1,5 linha.
• Asreferênciasbibliográficasdevemsercita-
das no corpo do texto pelo sistema autor-
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