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 [ 6 4  DICAS  ]      2      7      d     e      j     u     n      h     o      d     e      2      0      1      5 FAROESTE  Caixa apresenta seis obras da época de ouro do gênero COLOSSO Romance de Teixeira Coelho busca alívio do peso da história CES ÁRI A ÉVORA Álbum póstumo “Mãe Carinhosa” traz canções inéditas da mítica cantora de Cabo Verde SENHORA SENTIMENTO      P     a     r      t     e      i     n      t     e     g     r     a     n      t     e      d     a      F     o      l      h     a      d     e      S  .      P     a     u      l     o  .      A     n     o      8  .      N           7      7  .      N      ã     o     p     o      d     e     s     e     r     v     e     n      d      i      d     o     s     e     p     a     r     a      d     a     m     e     n      t     e  .      F     o      t     o      J     o     e      W     u     e     r      f     e      l      /      D      i     v     u      l     g     a     ç      ã     o

Revista Folha Guia Especial,27 de Junho de 2015

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  • [ 64 DICAS ]

    27de

    junhode

    2015

    FAROESTE Caixa apresenta seis obras da poca de ouro do gnero

    COLOSSO Romance de Teixeira Coelho busca alvio do peso da histria

    CESRIA VORA

    lbum pstumo Me Carinhosatraz canes inditas da mticacantora de Cabo Verde

    SENHORASENTIMENTO

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  • 27 de junho de 2015 [Guia Folha ] 3

    05 Colosso, o novo romance deTeixeira Coelho, reflete sobre ahistria e suas angstias11 Indita no Brasil, novelaMal entendido em Moscou,de Simone de Beauvoir,retrata vida a dois14 Ensaios deAs Pequenas Virtudesfizeram de Natalia Ginzburguma ensasta indispensvel16 Aspecto onrico e livre daarte lrica so os destaquesde Uma Histria da pera

    26 Me Carinhosacelebra a memria dacantora cabo-verdianaCesria vora30 Joo Donatochega aos 80 anosesbanjando balanoe leveza em O CouroT Comendo!31 Poemas Musicaisdo Oriente Mdio traza sofisticao hipnticada msica sria

    32 Coleo Faroeste apresenta seis obrasfundamentais do perodo ureo do gnero35 Um Novo Dueto melodrama exemplar dofrancs Emmanuel Mouret37 O refinamento estilstico do italiano MarioBava em quatro filmes de terror

    ESCALA DE AVALIAOEntenda os smboos utilizados peloGuia Folha - Livros, Discos, Filmesna avaliao que consta na fichatcnica dos lanamentos

    /ruim= regular* bom**muito bom*** timo

    FotosDivu

    lgao

    NDICE

    Mozart retratadoporDorisStock

  • 4 [Guia Folha ] 27 de junho de 2015

    SOBOSIGNODAHISTRIA

    Divulgao

    Alexandre [email protected]

    SterlingHaydenno faroeste

    ReinadodoTerror

    Em Colosso, seu maisrecente romance, o escri-tor e crtico de arte Teixei-raCoelhocontinua refletin-do sobre a histria e as an-gstiasqueelaprovoca.Nasclebres Teses sobre a Fi-losofia daHistria,WalterBenjamin fala do estadode emergncia em que vi-vemos como sendo a regrae no a exceo. O filso-fo alemo se referia ao fas-cismo, mas outros regimes

    inclusive os ditos demo-crticostambmcriamvo-luntariamente esse estadode emergncia. Combinan-do fico com reflexo en-sastica, o romance pe emcenatrsatormentadosper-sonagensdadisporapolti-cabrasileiradofimdoscu-lo 20 que, vivendo no exte-rior,soacossadospela his-tria pessoal, pela histriado mundo, pelo presente epelo passado.

    Diante dessa situaode exasperao permanen-te, o romance reivindica odireito do sujeito de sesalvar, de procurar algumalvio individual ao exces-sivo peso da histria. Aomesmo tempo, Colossoilumina retrospectivamen-te os trs livros anterioresdo autor Niemeyer, umRomance, Histria Natu-ral da Ditadura e O Ho-mem que Vive, que na-vegam sobre um leito co-mum e compem a srieO Anjo da Histria.

    Gnero que se confundecom a origem do cinema evai muito alm domero re-latodeaventuras,ofaroestetambmproblematizaahis-tria. Os seis clssicos queintegramaColeoFaroes-te discutem temas funda-mentaisdahistriadosEUAcomooracismo,aGuerradeSecessoeamarchaparaoOeste.Almdisso,osfilmesmais representativos dognero no so apenas umespelho da sociedade dapoca que evocam, mastambm da poca em queforam realizados.

    A seo de discos des-taca Me Carinhosa, dis-co pstumo da cantora ca-bo-verdiana Cesria vora.Com sua voz doce emelan-clica, Cesria cantou comlricasinceridadeasagrurasdeseupovodiantedasvicis-situdesdahistria,masseucanto tambmumnimo,umimpulsoparasuper-las.

    AO LEITOR

  • 27 de junho de 2015 [Guia Folha ] 5

    Por Caio Liudvik

    NOVOROMANCEDETEIXEIRACOELHO,COLOSSOFAZDAVIAGEMEDOEXLIOUMAFORMADERESISTIRSOMBRAESMAGADORADAHISTRIA

    Annimo, com vontade de ser in-visvel e preso entre dois scu-los. Assim Josep Marlia se auto-define para um brazilianista brasilei-ro (o narrador) que, como ele, fez doexlio uma espcie de resistncia pes-soal a ser devorado pelo miasma tr-gico que infecta instituies e valores,mesmo aps a suposta redemocratiza-o do pas Brasil, uma das frmulasobsessivas de Colosso, novo roman-ce de Teixeira Coelho.

    O encontro inicial dos dois perso-nagens se d num restaurante de Ca-

    daqus, namesma provncia catal emque Teixeira Coelho ambienta parte deHistria Natural da Ditadura, umadasobras-primasda literatura brasilei-ra contempornea. E outras marcas doromanceanteriorressurgem,acomeardaprpriamatriahistrica,que revol-veorastrotraumticodoshorrorestota-litrios de direita e de esquerda e suasnovas feies no novo sculo islmi-co e bolivariano.

    Noporacaso,o livro trazareprodu-o do Angelus Novus, de Paul Klee,tema de clebre meditao de Walter

    Marcelo

    Justo/Folhap

    ress

    OescritoreensastaTeixeiraCoelho

    ARTE DAFUGA

    LIVROS

  • 6 [Guia Folha ] 27 de junho de 2015

    Benjamin sobre os ventos ftidos e po-dres da histria, como lemos em Colos-so. Josep Marlia tem o costume de dese-nhardemodosdiversos, emseuscadernoseemguardanaposderestaurantes,osdoisH de Horror Histria.

    Alm da penria econmica da famlia,ele viveu de perto os efeitos dos anos dechumboaonamorarJlia,umacompanhei-ra dos guerrilheiros que, dcadas depois,se veria envolvida cumprindo a parbolahistrica da esquerda nacional, do heros-mo juvenil realpolitik dopodernoes-cndalo do mensalo, como vemos no se-gundo dos trs captulos do livro, em queo narrador conversa com ela.

    So, tantonocasode Josepcomode J-lia,depoimentosturvados.Deumlado,pe-lo fluxo de associaes livres do narrador,como sua longa digresso (em pargrafode extenso to asfixiante como a imen-sido modernista do terror que ele des-creve)sobreumavisitaacampodeconcen-traonazista.Epor,outro,pelasuarecusaa transformaros testemunhosqueest re-colhendoembiografiaordenada,oquere-meteaoutraobraanteriordeTeixeiraCoe-lho, Niemeyer, um Romance.

    Quantosdigresses,muitasvezeselas

    AngelusNovus(1920),dePaulKlee.DesenhodiscutidoemColossoeestreproduzidonos livrosdasrieOAnjodaHistria,que reneaindaNiemeyer,umRomance,HistriaNaturaldaDitaduraeOHomemqueVive,deTeixeiraCoelho

    Reprod

    uo

    LIVROS

  • A VERDADE DE DENTRO PARA FORA

    PrefcioRomeu Tuma JuniorRomeu Tuma Junior

    VENDA NAS MELHORES LIVRARIAS

    Mark Felt, o Garganta Profunda (Watergate, 1972-1974). Pedro Collor de Mello (Impeachment do irmo e

    Presidente da Repblica, Fernando Collor de Mello). Roberto Jefferson (Escndalo do mensalo, 2005).

    Agora, seguindo a tradio, o tenente-coronel Andr Soares, tambmde dentro para fora, abre a caixa-preta das irregularidades e atos ilcitos

    da ABIN (Agncia Brasileira de Inteligncia).

    27 de junho de 2015 [Guia Folha ] 7

    cumprem no livro uma funo de mesclarprincpio que o Teixeira Coelho crtico eterico reputa como marca da passagemda literatura moderna ps-moderna afico com a reflexo ensastica. Num da-do momento, por exemplo, o narrador fa-la do riso sarcstico da Histria que hno fatodeque James Joycecujoheri emUlisses consideravaaHistria umpesa-delo do qual queria despertar tenha co-moquefugidoemdesesperodaIrlanda,mas que ela no tenha jamais sado dele,voltando com fora em tudo o que ele ti-nha para escrever.

    Assim tambm a sombra colossal doBrasil pesa sobre os emigrados deste ro-mance, contrapontosombriofluideznoidentitria to elogiada por Teixeira Coe-lhoemACulturaeSeuContrrio: Apri-meira obrigao de cada um de ns paraconsigo prprio a ampliao da esfera

    de presena de seu ser, o que se conse-guemudandodelugar(viajando),mudan-doasfontesdenossassensaes(verumacatedralquenoconhecemos,umapintu-ra que ainda no visitamos, umautor queainda no lemos).

    Para esse imperativo (tico e esttico)de abertura coopera um estado de espri-to de leveza que, ecoando as propostasde Italo Calvino para um milnio que defato seja distinto dos pesadelos e tonela-das da histria recente, se encarna numasegunda grande personagem feminina deColosso, a jovem Amlie. Ela a obra-primaemformademulherquevempreen-cher,comsuasaquarelas,asmoldurasqueJosepMarliaaprendeuamoldar,encanta-do com esse ofcio terrestre que o redi-mia das abstraes intelectualistas.

    Ela a anima (Jung) que num fler-te com o sublime romntico sem clichsde happy end hollywoodiano vem lhepreencher os dias errticos de uma ou-tra consistncia, conciliao, enfim, como mundo visvel, indito gosto pela vida,promessa de felicidade que, num trata-dosobreoamor,Stendhalviacomoessn-cia da beleza.

    COLOSSOAUTOR Teixeira CoelhoEDITORA IluminurasQUANTOR$ 48 (216 pgs.)AVALIAO***

  • 8 [Guia Folha ] 27 de junho de 2015

    ANTES QUEO SONHO ACABEDaniel um jovem dos anos1970, preso entre o desejo deexplorarasexualidadeeavon-tade de fugir e construir vidaprpria longe de sua pequenacidade, um lugar onde osveios de vento que as almasgostamdebrincar,comoagen-te brinca no rio, que fazemaligao das coisas.

    rfo de me, vive s tur-ras com o pai violento, encon-trando alento na natureza enos passeios de bicicleta pe-lo mato. At que v sua vidainvadida pelo exrcito, quemonta base na vizinha Xam-bio e comea a perseguir eexterminar os guerrilheirosdo Araguaia enquanto espa-lha na cidade o medo de umainvaso sovitica e o risco docomunismo.

    Numa trama que pareceter sido preparada para o ci-nema, tamanha a sucessode eventos, o tambm rotei-rista Hermes Leal faz um ro-mance de aventura, onde oprotagonista se v envolvi-do com personagens inspi-rados em guerrilheiros fa-mosos, como Osvaldo e Di-nalva, com muita persegui-o, paixes, tiroteios e lutas.(ROBERTOTADDEI)

    AUTORHermes LealEDITORAGeraoQUANTOR$ 29,90 (208 pgs.)e R$ 14,90 (e-book)AVALIAO*

    O LIVRO DA MORTEFaltavaumaaventuraprotago-nizada pelos deuses africanosque interrompesse a hegemo-nia eurocntrica na literaturade entretenimento. O cariocaP.J. Pereira gosta de comentarque O Livro do Silncio, OLivro da Traio e o recm-lanado O Livro da Mortenascerampara desfazer o pre-conceito que ele mesmo tinhaem relao ao candombl.

    Ai a terra onde vive-mos, o mundo fsico. Orum o mundo dos orixs, a resi-dncia de Xang, Ogum, Ian-s e outros deuses. O jornalis-ta Newton Fernandes mal sa-bia disso quando foi envol-vido pelo universo mitolgi-co do povo iorub. A trilogiaDeuses de Dois Mundos en-trelaa duas jornadas contur-badas, a do ambicioso jorna-lista e a dos prprios deusesem litgio (masculino versusfeminino).

    O ltimo volume da trilo-gia encerra a saga sobrena-tural do perplexo New, masno a guerra eterna dos ori-xs contra o preconceito. Nomulticultural Brasil do sculo21, muito espanta a anacrni-ca violncia de certos radicaiscontra as tradies africanas.(NELSONDEOLIVEIRA)

    AUTOR P.J. PereiraEDITORA Livros de Safra/Da Boa ProsaQUANTOR$ 44,90 (338 pgs.), R$31 (e-book) e R$ 119,70 (trilogiaDeuses de Dois Mundos)AVALIAO**

    RISZ:AS ORQUDEASH um entrelaamento derealidades aliengenas no pri-meiro romance da premiadaNoemi Jaffe. No apenasno plano social e pessoalderiszeMartim,mastambmna esfera mais profunda dosreinos humano e vegetal, reu-nindo protagonistas e orqu-deas.Naverdade, fazendodasorqudeas tambm exticasprotagonistas.

    Estamos em 1956 e aUnio Sovitica acaba de in-vadir a Hungria. A fugitivarisz uma estranha em SoPaulo. A pretexto de estudaras orqudeas nos trpicos,risz abandonou Budapestee o passado obscuro. Quema recebeu do lado de c doAtlntico foi o diretor do Jar-dim Botnico, Martim, que aajuda com o novo idioma e anova rotina. E se apaixona porsua estranheza rizomtica, derecm-nascida.

    Ao longodo romance, Noe-mi Jae manobra bem a mu-dana de narrador, valorizan-do as camadas secretas derisz, mesmo quando refleti-das nas ris de Martim. Umadessas camadas, talvez amais dolorosa, a evidnciaviva de que a utopia comunis-ta finalmente cedeu buro-cracia militarista. (NO)

    AUTORNoemi JaeEDITORA Companhia das LetrasQUANTOR$ 39,90 (224 pgs.)AVALIAO**

    FICO BRASILEIRA

  • 27 de junho de 2015 [Guia Folha ] 9

    LAPA ENOTURNO DA LAPALapa um estado de esprito,territriomais imaginrioquereal. No h uma nica Lapa.Cadacronista, sambista,artis-ta, romancista,poetaoujorna-listaqueescreveusobreobair-rocariocacriousuaLapa.Oro-mancenaturalistadeLusMar-tins, de 1936, revela a Lapadesgraada dos bordis e daprostituio.Ottuloinicialeraesse mesmo: Prostituio.Pouco antes do lanamento,Jorge Amado sugeriu Lapa.

    Os palavres e a crueza danarrativa ofenderam os mora-listas. Acusado de subversivoe comunista, o autor foi per-seguido pelo Estado Novo deGetlio Vargas e os exempla-res do romance, incinerados.O relato da perseguio infa-me rendeu tima introduoao livro de memrias Notur-no da Lapa, de 1964.

    Nelas, outro o estado deesprito: o naturalismo spe-ro d lugar evocao nos-tlgica. O cenrio se amplia,ganha cores. Dcadas de-pois, voltam vida as noita-das bomias, os bares e caba-rs, os companheiros de farra,a fauna annima, a penria fi-nanceira, a exaltao poti-ca etc. o apogeu, logo vema decadncia. Hoje resta ami-tologia literria, at mais fa-bulosa. (NELSONDEOLIVEIRA)

    AUTOR Lus MartinsEDITORA Jos OlympioQUANTOR$ 65 (464 pgs.)AVALIAO**

    ENIGMAS DA PRIMAVERAVamos chamar o nosso heri de Majnun,propeonarradordonovoromancede JooAlmino. A referncia o longo poema Lai-la eMajnunespciedeRomeue Julietamuulmano, escrito pelo maior poeta daliteratura persa, Nizami (1141-1209).

    O protagonista do romance no persa,um jovembrasiliensevivendoconfortavelmentenaCapital Fe-deral. Mas sua fascinao pela tradio islmica, principalmen-te pela presena muulmana na Espanha do sculo 13, promo-ve uma quixotesca jornada de autoconhecimento.

    Apaixonado por uma Laila mais velha e atento s redes so-ciais, Majnun se deixa arrastar pelas ondas de revolta que sesucedem a partir da Primavera rabe, incluindo as de junho de2013, brasileiras. Numa viagem a Granada, o rapaz surta devez. Em seu delrio, antigas histrias do Oriente Mdio inva-dem o presente.

    De um lado, a tradio de tolerncia do Isl, do outro, o fun-damentalismo religioso: as duas foras que disputam a almaidealista de Majnun, atormentada tambm pela volpia e pe-la culpa. (NO)

    AUTOR Joo AlminoEDITORARecordQUANTOR$ 42 (288 pgs.) e R$ 29 (e-book)AVALIAO**

    OescritorediplomataJooAlmino D

    ivulga

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  • 10 [Guia Folha ] 27 de junho de 2015

    O URUGUAIORadicado em Paris nos anos1960, o escritor, ator, drama-turgo e cartunista argentinoCopi (codinome de Ral Da-monte,mortoem1987)produ-ziu a maior parte de sua obraem francs. Sua primeira no-vela, O Uruguaio, foi tradu-zidapelo ento jovemescritorespanhol Enrique Vila-Matas,que disse ter descoberto comelealiberdadeaonarrar.Ne-la, um narrador escreve paraseu mestre por um motivoque, vou logo confessando,me foge.

    Seu ltimo trabalho, A In-ternacional Argentina, edita-do em 1988, tambm integraesta edio, ambos traduzi-dos pelo poeta Carlito Azeve-do. Os textos so iconoclas-tas, satricos, s vezes surrea-listas (Recebemos a visita dopapa da Argentina, peque-no e magrinho, veste-se deouro e voa, ou ento, Per-cebi uma estranha movimen-tao sob os lenis: o presi-dente se fazia sodomizar pelopapa da Argentina!), e avan-am propositalmente contraas certezas do leitor. A tradu-o para o portugus, aindaque tardia, para se comemo-rar. (ROBERTOTADDEI)

    AUTOR CopiTRADUO Carlito AzevedoEDITORARoccoQUANTOR$ 34,50 (208 pgs.) eR$ 22,50 (e-book)AVALIAO**

    A GRANDE FOMEA prosa mordaz e sedutora deJohn Fante est de volta nessacoletneaorganizadapeloseubigrafo, at agora indita noBrasil.Aspreciosidades foramencontradas nos arquivos doescritor, dez anos aps suamorte, e tm origem variada.

    A maior parte do livro composta de fices que apa-receram em revistas de mea-dos do sculo passado, masnunca foram reunidas em li-vro. Uns poucos textos eramoriginalmente exerccios decaptulo de romance. H tam-bm um Prlogo para Per-gunte ao P, resumo pre-cioso da bblia que incendioua mente de geraes de leito-res e escritores.

    Arturo Bandini, principalheri de Fante, tambm rea-parece nessa reunio de al-ter egos do autor que ensinoumuito novato a costurar auto-biografia e fico. Encontra-mos Bandini na infncia, emQuaquaraquaqu, DibberLannon. Num dos melhorescontos da coletnea,A Gran-de Fome (tambmsobre a in-fncia), o moleque se chamaDan Crane,mas amudana denome no engana ningum.Sabemos que Arturo Bandi-ni. Sabemos que John Fante.(NELSONDEOLIVEIRA)

    AUTOR John FanteTRADUORobertoMuggiatiEDITORARecordQUANTOR$ 35 (288 pgs.)e R$ 24 (e-book)AVALIAO***

    SOMBRAS NAPLACE DES VOSGESO comissrio Maigret maisviciante que o crack. Bem, tal-vez no seja, mas chega pertodisso: estar viciado o leitorque seexpuser ao ritmo fren-ticoditadoporSimenonnos li-vrosprotagonizadospelopoli-cialparisiense.Longedeseremuma droga (causam no mxi-mo fadiga ocular e dores nascostasselidossemintervalos),so livros curtos, provocandobaratos passageiros que exi-gem novas doses urgentes.

    Neste, cujo ttulo original LOmbre Chinoise (1932,12 da srie que vem sen-do publicada fora da ordem),Raymond Couchet assassi-nado no escritrio de seu la-boratrio na Place des Vos-ges. No Htel Pigalle, Maigretdescobre dois hspedes sus-peitos, a amante do morto eseu filho do primeiro casa-mento. O filho que sabia de-mais se suicida. Epronto, eiso vcio nos pegando pelo p.

    Para nossa tranquilidade,Simenon deixou 75 roman-ces e 28 contos com Maigret.Graas a essa longa srie, oslivros de Maigret garantemao leitor um mundo contnuo,confivel, como afirmou Ju-lian Barnes. (JOCA REINERSTERRON)

    AUTORGeorges SimenonTRADUOAndr TellesEDITORA Companhia das LetrasQUANTOR$ 24,90 (144 pgs.) eR$ 16,90 (e-book)AVALIAO***

    FICO ESTRANGEIRA

  • 27 de junho de 2015 [Guia Folha ] 11

    O ROSTO DEUM OUTRO comum, ao se mencionar ojapons Kobo Abe (1924-1993),creditarseusromances influncia deKafka. Introdu-toremseupasdo temadacri-sedeidentidade,praticantedeum surrealismo que no des-preza a narratividade e o sen-tido, Abe influenciou Takaha-shi (Sayonara, Gangsters),Ogawa (Hotel ris) e Mura-kami (1Q84). Todos empali-decem diante domestre.

    O Rosto de um Outro apenas seu segundo ttulo tra-duzido. O primeiro (Mulherdas Dunas, Aliana CulturalBrasil-Japo, 1995) inen-contrvel. Menos, porm, queoDVDde AMulher daAreia,adaptaodeHiroshi Teshiga-hara premiada em Cannes em1963. Pormeio dos dirios deseu protagonista, O Rosto deum Outro relata a infelicida-de de um cientista que temseu rosto esfacelado em aci-dente de laboratrio.

    Em busca de novo rosto,depara-se com dilemas rela-cionados a identidade e fisio-nomia. Ao explorar a crise ja-ponesa do ps-guerra, Abeantecipou questes de epige-ntica e reimplantes de rosto,possveis somente no sculo21. (JRT)

    AUTOR Kobo AbeTRADUO Leiko GotodaEDITORA Cosac NaifyQUANTOR$ 36,90 (288 pgs.)AVALIAO***

    MAL-ENTENDIDOEM MOSCOUExpurgada da coletnea A Mulher Desilu-dida (1963), a novela Mal-entendido emMoscou explora aspectos formais e tem-ticos que Simone de Beauvoir j aplicara adois romances anteriores, O Sangue dosOutros (1944)eOsMandarins (1954), o

    que certamente justificou o corte, mas no o tempo 29 anos,sendo afinal publicada em 1992 numa revista francesa neces-srio para vir a pblico.

    Quanto forma, a histria de Andr e Nicole, um casal sexa-genrio de professores que viaja a Moscou nos anos 1960 pa-ra visitar Macha, jovem filha dele com a primeira mulher, guar-da similaridades com a estruturao, distribuda em dois focosnarrativos distintos, dos romancesmencionados.

    Nesta novela, porm, a predominncia da voz de Nicole,insatisfeita com a aposentadoria e as manias senis de Andr,alm de contrafeita com a beleza e a juventude de Macha, o acerto literrio indelvel. Crnica da vida a dois em vias dese perder na repetio cotidiana, no que pese sua condio depstumo, e que bem poderia ter sido publicado em vida por es-colha da autora, merece ser lido. (JOCAREINERS TERRON)

    AUTOR Simone de BeauvoirTRADUO Stella Maria da Silva BertauxEDITORARecordQUANTOR$ 25 (144 pgs.)AVALIAO*

    AescritoraefilsofaSimonedeBeauvoir

    Arquivo Folhapress

  • 12 [Guia Folha ] 27 de junho de 2015

    O MDICOE O MONSTROHistrias de horror exercemfascnio intrigante. Todas asculturas sentiram esse impul-so contraditrio de atrao erepulsa pela face demonacada realidade. Na literatura ouno folclore, relatos sobre enti-dades sobrenaturais, quandobemtramados,costumampro-vocar um efeito desestabiliza-dor. Se essas entidades agemdentrodens, entoesseefei-to multiplicado por dez.

    Bem antes da psicanlise,os anti-heris de E.T.A. Ho-mann, Edgar Allan Poe e Os-car Wilde descobriram queo mal que assombra o mun-do mais interno que exter-no. Ainda no sculo 19, a es-sa confrariadobizarro juntou-se Robert Louis Stevenson. Oautor precisava de dinheiro eseu editor carecia de uma boahistria fantasmagrica parao natal de 1885.

    A narrativa sobre o bon-doso mdico que tambm o monstro abominvel surgiupara atender o mercado dehistrias macabras, mas lo-go foi reconhecida comoobra-prima universal. Sua mensa-gem central em cada um dens habita outro extrapola omero entretenimento gtico.(NELSONDEOLIVEIRA)

    AUTORRobert Louis StevensonTRADUO Jorio DausterEDITORA Penguin-CompanhiaQUANTOR$ 19,90 (160 pgs.) eR$ 13,90 (e-book)AVALIAO***

    CARMEN EOUTRAS HISTRIASCarmen e Outras Histriasreneoscontosenovelascom-pletos de Prosper Merime(1803-1870), um dos expoen-tes do romantismo francs. Ovolumevememboahora,poisrecolocaaobradoautoremcir-culao (ao lado da Carmenrecentemente lanada pelaeditora34, comtraduoeco-mentrio de Samuel Titan Jr.).

    A reunio traz os textosvertidos por Mario Quintana,com apresentao de GlriaCarneiro doAmaral e notas deBruno Gambarotto. Alm daconhecida novela que d t-tulo ao livro, consagrada pelapera de Georges Bizet e poroutras adaptaes, o livro traznarrativas como Mateus Fal-cone (que tambm consta daedio da 34, com o ttulo deMateo Falcone), A Vnusde Ille e Colomba.

    As histrias conservam ofrescor dos personagens for-tes, do humor fino e da aocontnua, elementos que M-rime dominava, redimensio-nando o pitoresco das pai-xes, da violncia e do exotis-mo da cor local a sua verda-deira expressodeesprito depoca e de marca pessoal doautor. (BRUNO ZENI)

    AUTOR Prosper MrimeTRADUOMario QuintanaEDITORA ZaharQUANTOR$ 69,90 (536 pgs.) eR$ 29,90 (e-book)AVALIAO***

    TEXTOSPARA NADANoteatroounaprosadefico,os personagens angustiadosdeSamuelBeckettsempreper-seguiramofugitivosentidoon-tolgico, e fracassaram. Essafoi a contribuio do autor ir-lands, prmio Nobel de Lite-ratura de 1969: a derrotaabsoluta.

    Sua novela Textos paraNada composta de 13 frag-mentos emqueumaconscin-cia confusa questiona a pr-pria objetividade subjetiva.Todo o espao narrativo sur-ge dissolvido no movimentoneurtico desse questiona-mento sem fim.

    Aprisionado na insani-dade dos signos, esse sujei-to prossegue a fala espirala-da dos narradores da trilo-gia Molloy, Malone Mor-re e O Inominvel, conce-bida aps a Segunda GuerraMundial. Na obra de Beckett,o limbo amorada do ser.

    Nos melhores momentosdessaobra, a linguagemem-boscada e desnudada. Entoas coisas passam a ser e noser ao mesmo tempo. H si-lncio e no h silncio, h al-gum e no h ningum, dizo narrador quntico de Tex-tos para Nada, dubl do Ga-to de Schrdinger. (NO)

    AUTOR Samuel BeckettTRADUO Eloisa Arajo RibeiroEDITORA Cosac NaifyQUANTOR$ 23,90 (80 pgs.)AVALIAO***

    CLSSICO

  • 27 de junho de 2015 [Guia Folha ] 13

    PARASORECONQUISTADOQuem inventou a traduode-veria ser f da Torre de Babel.Se cada cidado temamuscu-latura adaptada para ler e es-crevernoprprioidioma,qual-quer alterao da ordem rei-nante s pode ser menos doque excelente. Nenhum textofica igualoumelhornoutra ln-gua. Por isso, de admirar acoragemdeumaequipedoba-charelado de letras daUniver-sidadeFederal doParan, quese aventurou pelos versos ar-caicos do ingls JohnMilton maior poeta da Gr-Bretanhadepois de Shakespeare.

    Trabalho feito individual-mente por cada um dos in-tegrantes e depois discutidoem reunies deliberativas.O que ficaria melhor no ttu-lo? Paraso reganho, re-cobrado, reencontrado oureconquistado?

    Nesseexercciocaprichosoe ousado, oferecemaos tradu-tores e linguistas uma oportu-nidade de estudo e prazer. E ans, mortais leitores, o desa-fio de entrar em contato comum escritor da primeira me-tade do sculo 17, j bastan-te enigmtico na verso origi-nal. Um paraso spero a con-quistar, mas altamente com-pensador. (VIVIEN LANDO)

    AUTOR JohnMiltonTRADUO vrios (coordenaode Guilherme Gontijo Flores)EDITORA CulturaQUANTOR$ 56 (304 pgs.)AVALIAO*

    DUPLOAUTORRETRATOCOM ESPELHOApoesiatemseuscanaispr-prios,almdeseusmistrios.Sorarosospoetasestrangei-roscontemporneospublica-dos em traduo no Brasil e,

    quando isto acontece, quase sempre vem a rebo-que da consagrao internacional. No o casodacanadenseKathleenMcCracken, traduzidaaquipor JosRobertoOSheaemediobilngueepra-ticamente desconhecida.

    Publicada desde o final dos anos 1970 em re-vistas especializadas (a antologia rene parte desua produo de 1978 a 2014, incluindo indi-tos), McCracken divide seu panorama sentimen-tal entre Ontrio, Toronto, Dublin e Belfast, poismigrou para a Irlanda h dcadas.

    Em seus poemas, marcados pela amplitudeda estrada e da floresta, ecoam a metafsica zende Gary Snyder e a imagtica campestre de JimHarrison e Jim Dodge, com seus mustangues, ca-minhoneiros e a presena da mitologia indgenanorte-americana. Narrativos, repletos de perso-nagens, tm na memorialstica o seu componen-te mais forte. (JOCAREINERS TERRON)

    AUTOR KathleenMcCrackenORGANIZAO Beatriz Kopschitz BastosTRADUO Jos Roberto OSheaEDITORA ExMachinaQUANTOR$ 32 (208 pgs.)AVALIAO*

    POESIA

    Extrado de Duplo Autorretrato com Espelho, deKathleen McCracken, traduo de Jos Roberto OShea

    Esqueci-me das mesas de pau-rosada sala azul, das estrelas friascortando a noite de Ontriode fora a fora

    soltei a mo firme do meu irmoao volante, noites de rdio beira do lago do moinho, a lanternade furaco

    para tornar indelvel a imagem que ficoudos teus braos abertos como asasdiante da vidraa branca efechando

    Sand Street

  • 14 [Guia Folha ] 27 de junho de 2015

    AS PEQUENAS VIRTUDESComestepequeno livrode textosmemorialsticos,NataliaGinz-burg conquistou um lugar entre as maiores ensastas do sculo20,ao ladodeVirginiaWoolfeSusanSontag.Publicadopelapri-meira vez em 1962, o volume que chega agora ao Brasil, comapoiodogovernoitalianotraduo,daquelasobrasque,apsa leitura, torna-se imperativo convencer outras pessoas a junta-ram-se a ela.

    Os 11 ensaios foram escritos entre os anos 40 e 60, perodoem que ela enfrentou o fascismo italiano, teve trs filhos, per-deu omarido para a represso e estabeleceu-se comoescritora.Mais do que isso, h na tessitura dos textos uma capacidade demanter-se atenta e no sucumbir s descrenas e desesperan-as que assolaram omundo aps a Segunda Guerra Mundial.

    intil acreditar que podemos sair curados de 20 anoscomo aqueles que passamos, escreve ela em O Filho do Ho-mem, de 1946.

    Em1949, no antolgico OMeuOfcio, defende que quan-do somos felizes, nossa fantasia temmais fora; quando somosinfelizes, ento nossa memria que age com mais vivacida-de. a partir dessa equao que ela aponta uma sada queainda hoje,mais de seis dcadas depois, parece ser necessria:a renncia s pequenas virtudes em nome das grandes, no apoupana, mas a generosidade e a indiferena ao dinheiro; noaprudncia,mas a coragemeodesdmpeloperigo; no a ast-cia,mas a franqueza e o amor verdade; no a diplomacia,masoamoraoprximoeaabnegao; noodesejode sucesso,maso desejo de ser e de saber. (ROBERTOTADDEI)

    AUTORNatalia GinzburgTRADUOMaurcio Santana DiasEDITORA Cosac NaifyQUANTOR$ 32,90 (160 pgs.)AVALIAO***

    A FASCINAODAS PALAVRASA figura de Cortzar parecemesmo inesgotvel, por contade sua obra plural, polidrica,que permite sempre novascombinaes de leituras, sen-tidos, redescobertas, sustos.

    Para alm de seus escri-tos, ou como um complemen-to de suas inquietaes per-manentes, a personalidadedoescritor tambm era fascinan-te, com suas ideias polticassempre comprometidas comos movimentos de esquerdana Amrica Latina.

    Nessa reunio de conver-sas com o jornalista uruguaioOmar Prego Gadea, colhidasemmuitos encontros no apar-tamentodeCortzar emParis,o autor de O JogodaAmareli-nha esmia seus livros, falade poesia, jazz, tango, cinemae de tantas outras questesque ajudamaentender no so processo criativo e suas ra-zes na intimidade, mas o tem-povivido, a histria, comsuasmarcas na literatura. (REYNAL-DODAMAZIO)

    AUTORES Julio Cortzare Omar Prego GadeaTRADUOAri Roitmane PaulinaWachtEDITORA Civilizao BrasileiraQUANTOR$ 55 (296 pgs.)AVALIAO**

    Oescritor JulioCortzaresuagataFranelleemParis (1967)

    Xinhua/Museu Nacional de Belas Artes da Argentina

    MEMRIA/CRNICA

  • 27 de junho de 2015 [Guia Folha ] 15

    NA DOBRA DO DIAMriodeAndradedefendiaquesedevees-creverpara jornalcomosefossepara livro.Nesta coletnea de crnicas, Marcelo Mou-tinho atualiza a recomendao, reunindotextos originalmente publicados na inter-net. O autor carioca no segue a crnica l-rica la Rubem Braga, que ilumina o coti-

    diano ao encontrar sentidos epifnicos at em guarda-chuvas.Antes, partindo de uma letra de msica, de um filme, de um

    livro, ou mesmo de uma fotografia, parece seguir a linhagemde uma crnica capaz de desacelerar o tempo a tal ponto quefaz parecer fcil extrair da os instantneos de uma experin-cia prosaica, com os detalhes pequenos e duradouros guarda-dos namemria.

    E chega a nos convencer que ns tambm, em nossas vidaspacatas ou agitadas, no subrbio ou com vistas para o centrodametrpole, somos feitosdematria essencialmente literria,comoumbalo de So Joo que enfeita o cu e depois provocaincndio, para enfim se apagar. (ROBERTOTADDEI)

    AUTORMarceloMoutinhoEDITORARoccoQUANTOR$ 34,50 (232 pgs.)AVALIAO**

    O SOL E O PEIXEEsta breve seleo de pequenos ensaios deVirginiaWoolfcarecedemelhorjustificao.O subttulo Prosas Poticas, que organi-zaria o volume, no se aplica. No so en-saios onde a autora inglesa trabalha a lin-guagem de forma potica, mas apenas tex-tos onde a subjetividade se apresentamais

    forte do que de costume, com textos abertos que mais consti-tuem perguntas do que certezas. o prazer o fim de tudo? Deondevemesseavassalador interessepelanaturezadaalma?()A isso que resposta pode haver? Nenhuma.

    Mas, pergunta-se, precisamos mesmo de algum motivomaior para ler Virginia Woolf? Pois ento: dos nove ensaiosaqui reunidos, seis so inditosnoBrasil. Entre eles, umasens-vel homenagemaopai, LeslieStephen, umabreve crnica sobreA Paixo da Leitura, e outros dois que deveriam ser adota-dos emescolas de arte doBrasil: A Pintura e OCinema. (RT)

    AUTOR VirginiaWoolfTRADUO Tomaz TadeuEDITORAAutnticaQUANTOR$ 37,50 (112 pgs.)e R$ 26,90 (e-book)AVALIAO***

    CONVERSAESCOM R.F.LUCCHETTIO nome de R.F. Lucchetti ain-da misterioso para muitagente,mas trata-se de umdosmais produtivos e cultuadosartistas brasileiros. Sua traje-tria extensa e multifacetadapode agora ser decifrada e re-conhecidapormeiodoapaixo-nadolivro-entrevistaassinadopor Rafael Spaca.

    O ficcionista, desenhistae roteirista de filmes, hist-rias em quadrinhos e fotono-velas reinou nos domnios domistrio e do terror, o chama-do lado B da cultura. Lucchet-ti comeou a publicar na d-cada de 1940, colaborou comdesenhistas importantes, co-mo Nico Rosso, Eugnio Co-lonnese e Rodolfo Zalla, ecom os cineastas Jos MojicaMarins (o ZdoCaixo) e IvanCardoso, alm de ser autor deNoiteDiablica, primeiro li-vro de terror escrito no Brasil.

    Sua produtiva carreira nocinema mapeada na filmo-grafia que completa o volu-me. Por causa do sobreno-me italiano, adotou muitasvezes pseudnimos sugeri-dos pelas editoras, que te-miam que a assinatura pu-desse atrapalhar o sucessodas boas histrias que criava.Por isso,muita gente o conhe-ce mesmo sem saber. (MARIOBRESIGHELLO)

    AUTORRafael SpacaEDITORA VerveQUANTOR$ 30 (160 pgs.)AVALIAO***

  • 16 [Guia Folha ] 27 de junho de 2015

    COM OS SCULOSNOS OLHOSCircunscrito ao perodo tene-broso da ditadura militar noBrasil, de 1964 ao final da d-cadade1970, o ensaiodeFer-nandoMarques,escritorepro-fessordaUniversidadedeBra-slia, analisa as produes doteatromusicalquetiveramim-portante papel de resistnciapoltica.

    Montagens que se tor-naram emblemticas, comoArena Conta Zumbi, SeCorrer oBichoPega, se Ficar oBicho Come, ORei da Vela,Roda Viva, Vargas, Gotadgua, entre outras, coloca-ram em cena a discusso darealidade brasileira em con-tato com o que havia de me-lhor na linguagem teatral, in-fluenciadas pela dramaturgiaalem de Bertolt Brecht e Er-win Piscator.

    Na concluso de Marques,o poder que os musicais tmde somar elementos diver-sos, e mesmo dspares, cor-responder sua capacida-de de aglutinao cultural.(REYNALDODAMAZIO)

    AUTOR FernandoMarquesEDITORA PerspectivaQUANTOR$ 60 (368 pgs.)AVALIAO**

    UMA HISTRIA DA PERAQuemdetesta pera considera aquilo tudo umbando de desati-nados gritando toa. Ou por um bom cach. Quem ama, curva-sereverenteaomenor fraseado,semnemesperarpeloddepei-to. Essa musa controversa, que no admite meios termos, temhistria curta na vida criativa da humanidade. Mas colorida.

    Carolyn Abbate e Roger Parker, americana e britnico, res-pectivamente, acreditaramnesse aspecto onrico e livre da artelrica e construram um livro que se d ao luxo de transitar porvrios temas sem se compromissar com nenhum deles, nem seamarrar a leis cronolgicas, temticas ou classificatrias. O queliberta Uma Histria da pera da prateleira das enciclop-dias e dicionrios sobre o tema.

    Levantando questes crnicas, como a importncia ou a in-significncia da letra na pera e portanto a pertinncia ou node legendas ou cantoria em idioma no original, o texto mer-gulha afoito na polmica entre pera sria e cmica, e na divinadesobedincia de compositores como Wolfgang Amadeus Mo-zart. De quem citam o trecho de uma carta a seu pai, Leopold:Numa pera, a poesia simplesmente tem de ser uma filha obe-diente da msica. Vindo de quem passou de filho obedienteem Salzburg para genial artista rebelde em Viena, a afirmaoganha novas nuances.

    O livro permite-se a admiraes e desprezos, com a mes-ma radicalidade do pblico operstico. Por amor e dio e pro-vavelmente tambm por disponibilidade, apresenta excelen-tes fotos e ilustraes as quais, apesar da traduo desafinada,compem um volume necessrio num cenrio nacional de qua-se nada sobre o tema. (VIVIEN LANDO)

    AUTORES Carolyn Abbate e Roger ParkerTRADUO Paulo GeigerEDITORA Companhia das LetrasQUANTOR$ 74,90 (662 pgs.)AVALIAO**

    Divulgao

    AsopranoGeraldineFarrarnaperaSuorAngelica,dePuccini

    TEATRO/MSICA

  • 27 de junho de 2015 [Guia Folha ] 17

    A CANOBRASILEIRANos 11 artigos dessa colet-nea, que abordam um sculode msica brasileira, a antro-ploga Santuza Cambraia Na-ves(1952-2012)buscaumavi-sodotodoapartirdodetalhesurpreendente.

    Algumas interpretaesesto incorporadas percep-o comum. o caso do textosobre Chico Buarque, publi-cado originalmente em 2004,que, com base em trs exem-plos, analisa a mudana daabordagem poltica nas letrasdo compositor.

    Para a estudiosa, TemMais Samba, do incio dacarreira, adota uma atitudefranciscana, enquanto Ape-sar de Voc, dos anos 70, marcada pela vingana cria-tiva, e Vai Passar, da dca-da seguinte, traz a perspec-tiva de um futuro libertador.

    Sobre Caetano Veloso,ela investe com proprieda-de numa aproximao ines-perada com Dostoivski. Co-mo o romancista russo, argu-menta a autora, o tropicalis-ta soube construir uma est-tica de fragmentos a partir deum procedimento polifnico.(OSCAR PILAGALLO)

    AUTOR Santuza Cambraia NavesEDITORA ZaharQUANTOR$ 54,90 (208 pgs.)AVALIAO**

    AS RAZES DO ROMANTISMOCom base em conferncias proferidas porIsaiahBerlinem1965,este livroapresentaasorigensreligiosase,porassimdizer,psico-his-tricas do romantismo (uma espcie de com-plexo de inferioridade alemo ante a moder-nizao europeia), almde autores represen-tativos, caractersticas essenciais como cul-to do gnio, primitivismo la Rousseau, tras-bordamentodasemoeseosdesdobramen-tosdomovimentoromnticonosculo20,en-treosquaisexistencialismoenazifascismo.OfilsofobritniconascidonaLetnianosbrin-da com sua descomunal capacidade de desfi-lar, comflunciaerigor,aarqueologiadossis-temas de pensamento modernos, suas basese consequncias sociais e polticas. No semcriticar as tendncias insanas (sob o panode fundo da tragdia hitlerista) da revolta ro-mntica contra o Iluminismo, ele faz justia profundidade e legado de contestadores co-mo Schelling,Blake,ByroneSchopenhauervalorizando-os no que contribuem para umaexpanso dos conceitos ocidentais de racio-nalidade, pluralismo, liberdade e tolerncia.(CAIO LIUDVIK)

    AUTOR Isaiah BerlinTRADUO IsaMara LandoEDITORA Trs EstrelasQUANTOR$ 43,90(256 pgs.)AVALIAO***

    Divulgao

    OfilsofoIsaiahBerlin

    ENSA

    IO

  • 18 [Guia Folha ] 27 de junho de 2015

    A NOVAOBSCURIDADEPublicada por Jrgen Haber-masnomesmoanoqueODis-cursoFilosficodaModernida-de (1985), esta coletnea deartigoseentrevistastraduzseudenso debate para a arena deconjunturas polticas maisimediatas. Por exemplo, a po-lmica (de ressonncias toatuaisparaocontextobrasilei-ro) sobre a criminalizao deprotestos pblicos no violen-tos e a crise das energias ut-picas damodernidade, dada acorrosodoEstadodebem-es-tar social no fim dos anos 70.

    Um dos principais eixosdo livro o ataque ao cha-mado neoconservadorismo.Ele a nova obscuridade,depois do pesadelo totalit-rio, contra as Luzes do inaca-bado projeto moderno. Ele um centauro intelectual com-posto de aspiraes culturaisreacionrias e eis sua novi-dade ante os velhos conserva-dores subservincia ao quea modernidade teria de pior,isto , a ascenso de sistemastecnoburocrticos que sufo-cam os potenciais emancipa-trios imanentes cultura se-cularizada, democrtica e im-pulsionada pela razo comu-nicativa. (CAIO LIUDVIK)

    AUTOR Jrgen HabermasTRADUO Luiz RepaEDITORAUnespQUANTOR$ 66 (390 pgs.)AVALIAO***

    FILOSOFIA ECOSMOVISOA grandeza do projeto filosfi-co de Mrio Ferreira dos San-tos (1907-1968) ainda pou-co (re)conhecida nos bancosuniversitrios nacionais. Issonodeadmirar, numcenriocultural e institucionalemquea formaopareceexigirqueaousadia do pensar original vficando para trs como insen-sata expectativa juvenil, emdetrimentodoaprendizadodebem comentar comentadoresde autores de lnguas alheias.

    Raros entre ns os filso-fos no s professores de fi-losofia e um deles o autordeste livro de 1952. Trata-seda abertura de cunho didti-co, esclarecendo termos comosujeito e objeto, razo e expe-rincia, fatos e conceitos deuma monumental Enciclop-dia de Cincias Filosficas eSociais, projeto que, at pe-lo ttulo, sugere o rigor racio-nal que Santos exigia do em-preendimento filosfico.

    Inclusive no mbito dacosmoviso metafsico-re-ligiosa, que, em tempos decrise, lamenta a certa altu-ra, tende a cair no esqueci-mento ou, pior, sobreviver emvariantes caricaturais. (CL)

    AUTORMrio Ferreira dos SantosEDITORA RealizaesQUANTOR$ 49,90 (288 pgs.)AVALIAO***

    UMA TEMPORADACOM MONTAIGNEEisumadeliciosa introduoavidaeobrade Michel deMon-taigne (1533-1592). No sema leveza de sua origem (umprograma radiofnico dirio),o livro de Compagnon desce profundezaetraztonaaatua-lidade do autor dos Ensaiosnomedo gnerofundadoporesse livro crucial.

    Passeamos por temas co-mo a amizade, a mortalidade,o que sei eu? que Montaig-ne transforma em (di)lema c-tico do qual as modernas filo-sofiasdo sujeito, deDescartesem diante, configuram longodesdobramento e resposta.

    A crise de identidade nagnese do moderno ecoa emMontaigne tambm pela ce-lebrao pr-rousseaunia-na do bom selvagem brasi-leiro uma imagem mtica aservio da crtica dos costu-mes europeus, comomostra oprofessor no Collge de Fran-ce, especialista no que chamade antimodernos, linhagemque de, Baudelaire a Barthes,e filha de Montaigne, se com-praz em desmontar as certe-zas (como a razo e o progres-so) em que o ocidental, ten-do provado a ma do conhe-cimento de sua relatividade,no podemais repousar. (CL)

    AUTORAntoine CompagnonTRADUORosemary CosthekAbilioEDITORAWMFMartins FontesQUANTOR$ 27,50 (168 pgs.)AVALIAO***

    FILOSOFIA

  • 27 de junho de 2015 [Guia Folha ] 19

    CRER & DESTRUIROcinemahollywoodianops-SegundaGuer-rapopularizouaideiadequeosnazistasse-riamunsbroncos, tantoquesedeixaramle-var por Hitler. A premissa, no entanto, noprocede, como demonstra Christian IngraoemCrer&DestruirOsIntelectuaisnaM-quina de Guerra da SS Nazista.

    Originalmente uma tese de doutorado quase um tero daspginas dedicado a notas e bibliografia, a obra aborda acontribuio de 80 intelectuais alemes para a formulao dosdogmasnazistas. Entre eles, o historiador francs destaca o tra-balho de Hans Gnther, que defendia o conceito de raa ariana,ou nrdica. No topo da hierarquia das raas, os arianos teriammais qualidades estticas e espirituais.

    J no final dos anos 1920, essa viso conquistou a oficialida-de nazista, em cujo imaginrio biolgico se misturavam, se-gundo o autor, o determinismo racial, o nordicismo e o antisse-mitismo de formulao erudita. (OSCAR PILAGALLO)

    AUTOR Christian IngraoTRADUOAndr TellesEDITORA ZaharQUANTOR$ 79,90 (480 pgs.) e R$ 49,90 (e-book)AVALIAO*

    OS ANOS VERTIGINOSOSMesmosemcitarEricHobsbawn,ohistoria-doralemoPhilippBlomescrevecontraumatesecentraldoseucolegabritnico.EmErados Extremos, Hobsbawn defendeu a no-o de umbreve sculo 20, de 1914 (Pri-meira Guerra Mundial) a 1991 (fim docomunismo).

    Para Blom, no entanto, o incio sculo 20 corresponde cro-nologia. Em Os Anos Vertiginosos, ele argumenta que as es-truturas da Europa j desmoronavam antes da ecloso da guer-ra. Portanto, o sculo, em termos histricos, j insinuava a fei-o que omarcaria.

    Segundo o autor, a belle poque s merece esse nome secomparada com o horror que a sucedeu. Para avali-la sem es-se parmetro deformador, Blom pede ao leitor que esquea ahistria posterior. Ele prprio, no entanto, cita com frequn-cia personagens que s teriam relevncia depois do tempo danarrativa.

    Recheada de anedotas, a obra oferece uma viso alternati-va do perodo, em geral visto como o auge da civilizao. (OP)

    AUTOR Philipp BlomTRADUO Clvis MarquesEDITORARecordQUANTOR$ 70 (602 pgs.)AVALIAO*

    BRASIL:UMA BIOGRAFIAA opo de tratar o Brasil co-mo objeto de uma biografia, eno de uma histria, deu desada a Lilia M. Schwarcz e M.Heloisa Starling a liberdadenecessriaparaabordaropascom todas as suas ambiguida-des, avanos e recuos. Ao lon-godaobra, as autorasmostra-ramquesouberamtirarprovei-to do artifcio.

    O livro apresenta e discu-te os problemas centrais daconstruo do Estado-Nao.A herana do autoritarismo edo personalismo, por exem-plo, vista como entrave aofortalecimento das institui-es. O passado escravocrata,outro exemplo, est na raiz dadesigualdade social e do ra-cismo silencioso.

    As autoras esticam a cro-nologia at 1995, por consi-derarem que a histria dosgovernos de FHC, Lula e Dil-ma ainda est se fazendo. Naconcluso, produzem umasntese doBrasil atual que de-veria pautar o debate polti-co: Se a democracia se con-solida e caminha para a fren-te, a Repblica ainda lembraum esboo que no alcanouforma. (OP)

    AUTORES Lilia M. Schwarcz eHeloisaM. StarlingEDITORA Companhia das LetrasQUANTOR$ 59,90 (846 pgs.) eR$ 39,90 (e-book)AVALIAO***

    HISTRIA

  • 20 [Guia Folha ] 27 de junho de 2015

    O GATO, O CACHORRO,CHAPEUZINHO, OS OVOSEXPLOSIVOS, O LOBO E OGUARDA-ROUPA DA VOVUmcasalbritnico,comcurrculoemdesigngrfico,assinaessapardiabem-humoradade Chapeuzinho Vermelho e do Lobo Mau.O gato narrador enfrenta a irreverncia do

    cachorro que tenta colorir o clssico infantil do francs CharlesPerrault, do sculo 17, com recursosmodernos. Como super-he-ris, raios de bondade, ovos explosivos e cestas voadoras.

    Questionando por qual razo, afinal, o Lobo no come ame-nina da cestinha assim que a encontra na estrada, e como elapode ser to tonta a ponto de confundir o vilo peludo com suaav, e ainda se a idosa est at agora no guarda-roupa, o co-aprendiz tentar enfiar o freio da lgica na imaginao livre dafbula original, vrias vezes modificada ao longo dos sculos,inclusive pelos irmos Grimm. E acaba levando uma merecidalivrada na cabea.

    O livro, lindamente ilustrado, encanta tanto as crianas me-nores quanto seus pais, delicadamente levados a lhes contar,antes de dormir, Chapeuzinho Vermelho, a verdadeira histriaresgatando assimmais um elo quase perdido. (VIVIEN LANDO)

    AUTORESDiane e Christyan FoxTRADUOMonica StahelEDITORAWMFMartins FontesQUANTOR$ 37,50 (32 pgs.)FAIXA ETRIA de 3 a 7 anosAVALIAO**

    O PSSARONA GAIOLAOs sofrimentos enfrentadospelo pintor holands Vincentvan Gogh alimentaram sua ar-te revolucionria e ficaram re-gistrados tambm na corres-pondncia que ele manteve,por mais de 20 anos, com seuirmo mais jovem, Theo, quefuncionoucomomelhoramigoemecenas.

    Javier Zabala, ilustrador eescritor espanhol, inspirou-se numa dessas cartas parao livro Um Pssaro na Gaio-la. O premiado e experienteZabala j ilustrou Cervantes eShakespeare e dedicou qua-tro anos para completar seudilogo com o universo visuale mental de Van Gogh.

    Aqui, predominam tonssombrios, traos elegantes edesenhos-colagens pontiagu-dos caractersticos do ilustra-dor espanhol. A escolha refle-te os estados de alma de VanGogh, suas dvidas e dificul-dades de se manter como ar-tista.O textomisterioso e tris-te serve como uma legenda epermite compreender que opssaro funciona como me-tfora da priso qual o ar-tista sentiu estar condena-da sua existncia. (MARIOBRESIGHELLO)

    AUTOR Vincent Van GoghILUSTRAES Javier ZabalaTRADUOMauro GasparEDITORA Pequena ZaharQUANTOR$ 44,90 (32 pgs.)AVALIAO**

    IlustraodeJavierZabalaparaOPssaronaGaiola Fo

    tosDivu

    lgao

    INFANTOJUVENIL

  • 27 de junho de 2015 [Guia Folha ] 21

    A PEQUENA ALICE NOPAS DAS MARAVILHASVinte e cinco anos aps publicar Alice noPas dasMaravilhas, Lewis Carroll decidiureescrever o prprio livro, quela altura jum imenso sucesso entre crianas e adul-tos, para um publico de 0 a 5 anos. O au-tor explica que sua ambio (ser v?)

    ser lidoporcrianasde0a5anos.Ser lido?No,nemtanto!Maisjusto dizer: ser manuseado, babado, ter as pginas dobradas,ser amarfanhado, beijado por aqueles pequenos iletrados des-conhecedores da gramtica....

    Ao adaptar o texto para esses leitores, Carroll identificouo fascnio que o livro exerce no pblico infantil tambm comoobjeto de manuseio e props uma reapropriao ttil para suaconsagrada narrativa. Mesmo assim, o texto da segunda versono subestima os pequenos leitores. Foi escrito para ser lidoem voz alta e as muitas perguntas que ele inseriu em todos osmomentos da histria deixama leitura parecida comouma gos-tosa conversa, um recurso valorizado na traduo.

    Omesmoesprito de reinveno inspira osdesenhosdo ilus-trador Emmanuel Polanco, cujos traos do nova vida perso-nagem to conhecida. (MARIO BRESIGHELLO)

    AUTOR Lewis CarrollILUSTRAES Emmanuel PolancoTRADUOMarina ColasantiEDITORAGalerinhaQUANTOR$ 49 (56 pgs.)FAIXA ETRIA at 10 anosAVALIAO**

    IlustraodeEmmanuelPolancoparaAPequenaAlice

    noPasdasMaravilhas

  • 22 [Guia Folha ] 27 de junho de 2015

    PORTAS DO DENKioskerman o pseudnimosugestivo do argentino PabloHolmberg, quadrinista e blo-gueiroqueficou famosopubli-cando primeiro na internetsuastirascompostasrigorosa-mente por quatro quadrinhosdo mesmo tamanho. Portasdo den a seleo de algu-mas delas, transpostas para oformato livro.

    A estrutura a mesma. Aspginas compem-se de qua-drinhos quadrados e semprena mesma proporo. A im-presso inicial que o livroequivale quele filme francsque muitos amam, mas que agente acha uma chatice. As ti-ras, dispostas de modo to li-near e sem um ponto de con-tato aparente, subvertem alinguagem de maneira criati-va, mas isso pode desestimu-lar a leitura.

    Vale insistir. Depois de su-perados trs quartos, o leitorcompreende a lgica e come-a a adorar o livro. At d pa-ra adivinhar o por qu do ttu-lo. So pginas feitas de mo-mentos humanos, ideias, pro-blemas, conflitos e descober-tas projetados em inusita-das circunstncias que fazemdo volume um paraso ondese divertir e refletir. (MARIOBRESIGHELLO)

    AUTOR KioskermanTRADUO Cecilia ArbolaveEDITORA Lote 42QUANTOR$ 42,90 (120 pgs.)AVALIAO**

    TALCO DE VIDROUma dentista bem-sucedida, bem casadacomummaridoamoroso,cardiologista,doisfilhos na escola, um consultrio bem mon-tado, uma casabemdecorada, uma casadepraia, umcarro novo. Nadadisso seria sufi-ciente para competir com o sorriso da pri-ma,fiel rival desdea infnciamaisbonita,

    mais divertida emais pobre, mas tambmmais livre.O sorriso da prima, entrevisto em sesso para tratar uma c-

    rie, vai abrindo uma criemonstruosa nomundinho perfeito dadentista desenhando umadestruio cujas linhas sero, a cer-ta altura, feitas de cocana. Ou de Talco de Vidro, ttulo do no-vo lbum do fluminenseMarcello Quintanilha.

    Conhecido pelo trabalho ultrarrealista e pela veia de cronis-ta de obras premiadas como Sbado dosMeus Amores, Quin-tanilha sai domeio social onde reside amaioria de suas tramasfavelas e conflitos entre pobres e miserveis para observarcomo a classemdia sofre. Seu estilo, antesmais fotogrfico,agora abraa o expressionismo preto e branco e o uso de umatcnica emdesuso: as retculas.O resultado impactante, tantono mergulho psicolgico quanto na fruio dos contrastes des-sa narrativa chiaroscura. (RONALDOBRESSANE)

    AUTORMarcello QuintanilhaEDITORA VenetaQUANTOR$ 59,90 (160 pgs.)AVALIAO***

    HQ

    Divu

    lgao

    QuadrinhosdeMarcelloQuintanilhadolbumTalcodeVidro

  • 27 de junho de 2015 [Guia Folha ] 23

    A FORMA DA LUZOInstitutoMoreiraSallesho-je uma das mais importantesinstituies de conservao,pesquisaedivulgaode foto-grafia brasileira, incluindoaquelarealizadaporestrangei-ros, que, alis, ocupam lugarde destaque em nossa icono-grafia. A Forma da Luz pres-ta homenagem a cinco nomesdepesodesseacervo, relevan-tes na formao de uma foto-grafiamodernabrasileira:oar-gentino Horacio Coppola, ofrancsMarcelGautherot,a in-glesaMaureenBisilliat, ohn-garo Thomas Farkas e o norte-americano David Drew Zingg.

    Mesmo que se destaque, aprincpio, o olhar estrangeiroque procura o primitivo ouo autenticamente brasileiropara ento concili-lo ao tec-nolgico, marca da formaomodernista desses artistas (oque confere certa melancolias imagens, por aquele Brasilutpico que no foi), prevale-ce oolhar atento, que sedeixaatravessar e transformar peloobservado.

    Os profetas de Aleijadinhocaptados por Coppola ou ospescadores sob o sol flagra-dos por Gautherot extrapolama moldura ordenada pela tra-dio europeia e nos falam deperto, pela lente sensvel dosfotgrafos. (CRISTINA PAIVA)

    ORGANIZAO Sergio Burgie Samuel Titan Jr.EDITORA IMSQUANTOR$ 89,90 (200 pgs.)AVALIAO***

    MALDICIDADEAo virar a primeira pgina de Maldicida-de, precedida pela guarda em papel pretofosco,umaportasemiabertanosespera.Pa-rece feita de ummadeirite tosco,mas obri-lhoda fotografiaempreto ebranco lhe con-fere umaspectometlico. Dois orifcios en-vidraadosnorevelamoquehdentro: re-

    fletem a rua logo em frente, espao pblico degradado onde ocorpodeumhomemcruzaemdireoaumcarroeumapilhadejornais.

    Num ritual semelhante passagem pela antessala do ci-nema, o artista visual Miguel Rio Branco nos convida a entrar,anunciando, nessa primeira cena, o lugar que nos reserva emsua fico: como espectadores de um universo dos entre-lu-gares, em que nem tudo o que parece e no qual nos vemosrefletidos.

    Em400pginasde imagens enenhum texto, RioBranco afir-ma a preponderncia da imagem na construo de umamitolo-gia da cidade contemporneano uma cidade idealizada,masaquela que mais nos repulsa e atrai, feita de destroos, restos,corpos abandonados, ces sarnentos e asfalto, que o artista re-colheu ao longo de sua carreira emvrias partes domundo. (CP)

    AUTORMiguel Rio BrancoEDITORA Cosac NaifyQUANTOR$ 198 (400 pgs.)AVALIAO***

    FOTOGRAFIAMiguel Rio Branco/Divulgao

    FotografiadeMiguelRioBranco

  • 24 [Guia Folha ] 27 de junho de 2015

    DA MATRIADO MUNDOSea rivalidade entre catlo-goselivrosacirrada,estaedi-ocorrelatodaexposiodeEliane Prolik no Museu OscarNiemeyer (MON) de Curitibafavorece a discusso positiva-mente:ocartercircunstancialdocatlogoganhaestatutope-rene pela ambio visual dolivro.

    Da a aproximao macroe micro s estruturas, planos,perspectivas e semnticasperceptivas das obras, s pos-svel quando a apresentaocaleidoscpica se faz median-te a explorao visual grfica,transladada ao plano das p-ginas, comooutra experinciain situ dos trabalhos.

    Isso acontece, em espe-cial com aquele que d titulo edio, umdosmais contun-dentes aportes da arte brasi-leira recente ao territrio li-miar entre escultura, instala-o e espao pblico.

    A dialtica sem fim anun-ciada por essas peas espe-cula sobre sua estrutura emsi e sobre a relao externaforma-mundo, potencializan-do os desgnios da artista. Osvaliosos textos crticos hon-ram uma obra geradora de vi-so prpria. (ADOLFO MONTEJONAVAS)

    AUTOR Eliane ProlikEDITORAMONQUANTOR$ 50 (78 pgs.)AVALIAO***

    HISTRIAS DE FANTASMAPARA GENTE GRANDEAvidaeopensamentodojudeualemoAbyWarburg (1866-1929) so desafios previ-sibilidade. Filho debanqueiros, negociou atrocadesuaheranapor livroseviagensdeestudo, e constituiu uma das mais impor-tantes bibliotecas do Ocidente. Intelectual

    autnomo,Warburgprocuroucompreenderadinmicaeo lugardas imagens na sociedade como e porqu nascem, persistem,morremerenascem,seguindosuaintuionaformaodecon-ceitos inditos emtodos de abordagem que romperam limitesdas disciplinas tradicionais.

    Histrias de Fantasma para Gente Grande rene seus tex-tos mais importantes, em ordem cronolgica. Neles, acompa-nhamos a evoluo de seu pensamento, que parte do interessepelapresenade tpicosdaAntiguidadepagnaartedoRenas-cimento (como a pintura da Vnus de Botticelli a partir de poe-mas clssicos), e se abre a imagens que vo de mapas astrol-gicos a smbolos ritualsticos indgenas, interpretados a partirde associaes entre antropologia, psicologia e histria da ar-te, originando assimumnovo campode estudos. Entre seus se-guidores esto nomes como E. Gombrich e Georges Didi-Huber-man. (CRISTINA PAIVA)

    AUTORAbyWarburgORGANIZAO LeopoldoWaizbortTRADUO Lenin Bicudo BrbaraEDITORA Companhia das LetrasQUANTOR$ 54,90 (432 pgs.)AVALIAO***

    Divulgao

    ObradaartistaparanaenseElianeProlik

    ARTE/ARQUITETURA

  • 27 de junho de 2015 [Guia Folha ] 25

    impossvel separar o papel deMrioPedrosa (1900-1981) como um dosmaisimportantescrticosdeartebra-sileirosde suaatuaocomomilitantepo-ltico. No que suas reflexes no se sus-tentemsozinhas,masporque tudoquees-creveu tem um sentido: o esforo de com-preensodosfenmenosartsticosemteo-rias estticas refinadas se articula segun-do um anseio de interveno sobre a rea-lidade, a fim de promover modernizaesna arte e, no final, nas instituies brasi-leiras em geral.

    Tal vis permeia os escritos agora reu-nidos emdois volumes pela editora CosacNaify, os primeiros de uma srie que traraobracompletadocrticoemsetelivrosdi-vididosemquatroeixos:arte,arquitetura,

    Arqu

    ivoFo

    lhap

    ress

    OcrticoMrioPedrosa

    Por Cristina Paiva

    CRTICAMILITANTE

    ARQUITETURA ENSAIOS CRTICOSAUTORMrio PedrosaORGANIZAOGuilhermeWisnikEDITORA Cosac NaifyQUANTOR$ 49,90(208 pgs.)AVALIAO***

    culturaepoltica.ArteEnsaioseArqui-teturaEnsaiosCrticos,organizadosporLorenzo Mamm e Guilherme Wisnik, res-pectivamente, trazem seus escritos maisrelevantes nessas reas.

    ParaPedrosa, amodernizaodaarte eda arquitetura seriam fundamentais numprocesso de superao de nossa condiodepasperifriconosistemacapitalistaamaiorpartedeseusensaiosfoiescritaentreosanos1950e1970,pocadetransforma-es econmicas, polticas e culturais quePedrosa vivenciou intensamente, pormsem nunca lhes atribuir uma funo utili-tria ou de propaganda, como muitos daesquerda na poca.

    Movidopeloespritohumanistadasvan-guardas,eleacreditavanopoderdaartedeprovocar mudanas coletivas por meio desensibilizao esttica e emsua capacida-dedeconciliarnossascontradiesemumnovo modelo de desenvolvimento. Belasutopias que, se no nos servemmais, des-pertam discusses sobre o lugar da arte edo intelectual nos dias de hoje.

    ARTE ENSAIOSAUTORMrio PedrosaORGANIZAO LorenzoMammEDITORA Cosac NaifyQUANTOR$ 79,90(624 pgs.)AVALIAO***

  • 26 [Guia Folha ] 27 de junho de 2015

    odade, sodade, sodade, dess-nhaterra,SoNicolau,eraore-fro que ecoava no nibus em

    queeuestavanodistanteanode1992,atra-vessandoo rio Sena, emdireoaoMuseudoLouvre.Meiosonolento,tentandoenten-der o que ouvia o ritmo era quase bra-sileiro, a letraeraquaseemportugus,fui sendo seduzidopor aquela voz aomes-mo tempo imponente e sensvel. Nofimdacano, ouviu-se onomeda cantora, Ces-ria vora (1941-2011).

    Cerca de umano depois, umamigo quetambmmoravaemParismecontouqueojornalbrasileirocomoqualcolaboravaha-via recusado uma entrevista com a artista

    cabo-verdiana por julg-la um sucesso lo-cal: No vai repercutir por aqui, disse oeditor.Mesesmais tarde, essa senhora es-tava encantando a plateia paulistana emmemorvel show no Sesc Pompeia. Per-deu o jornal, por no confiar no furo (e nofaro) do reprter.

    MasoquetemCesriavora?Oqueator-nouemtopouco tempoumsucessomun-dial, um talento reconhecido em toda par-te?AssimcomoasmaravilhosasClementi-na de Jesus, Helena Meirelles, Dona CliadoCoco,nossassenhorinhastalentosas,ela temamsica na alma, no corpo, no co-rao, se mostrando por inteiro na simpli-cidade tocante de sua arte. Assim comoas

    SODADENAALMAS

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    /Divulga

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    DISCOS

  • 27 de junho de 2015 [Guia Folha ] 27

    Por Wagner AmorosinoCD RENE GRAVAES FEITAS PELA CANTORA CABO-VERDIANACESRIAVORAENTRE1997E2005

    trs acima citadas, no obstante ter can-tado a vida toda, foi namaturidade que sefezconhecermundialmente, jcomorepre-sentante oficial damsica de Cabo Verde.

    Cesria cantava suas mornas ritmoassemelhadoaosamba-canoesuasco-ladeiras canes mais animadas, maisprximasdosritmoscaribenhoscomsin-gelezaesabedoria,destilandoemoodes-de a primeira nota.

    Agora,oseloSescnostrazumpresente,o lbum Me Carinhosa, que rene gra-vaes feitasentre1997e2005,noapro-veitadasnosdiscosdecarreira.Lanadonomercado internacional em2013, pela gra-vadora Lusfrica, o disco tem 12 canes

    inditas e uma regravao, Sentimento,msica presente em seu ltimo lbum ofi-cial, de 2009, Nh Sentimento.

    E quanto sentimento carrega essa voz!As mornas de um dos mais insignes auto-resda ilha,B.Leza, DordiSodadeeTal-vez, trazem uma nostalgia suave; o tommelanclico vem com a coladeira Tchonde Frana, que descreve a dor de um ca-bo-verdiano que vai viver na Frana e per-de seumar azul.

    EmQuemTemdio, de outro compo-sitor clebre, Frank Cavaquinho, ela retra-ta a disputa entre dois grupos carnavales-cos de sua cidade natal, Mindelo. Cidadeonde cantava em bares obscuros o abole-rado tema mexicano Dos Palabras, ni-camsica em espanhol do CD, recordaode seus duros anos emCabo Verde, de on-de saiu depois de um complicado hiatoem sua carreira para ganhar o mundo, umGrammy, a Legio de Honra...

    Mas como nossas senhorinhas, Ces-riavoranuncaseseparoudaessncia. Enadouradummimenor, naquinturadumsolmaior,nocantnossentimentocomodizaletraemblemticadacanoquefechaodisco, NsCaboVerdeCesria traduza funo essencial domsico: transformarsons em emoo, em sodade.

    ME CARINHOSAARTISTA Cesria voraGRAVADORA Selo SescQUANTOR$ 20AVALIAO**

    Acantoracabo-verdianaCesriavora

  • 28 [Guia Folha ] 27 de junho de 2015

    MPB

    PRIMOS DISTANTESDo ramo da Vanguarda Paulista que inclui o grupo Rumo e seupeculiarssimohumordevemdescenderestesdivertidosPrimosDistantes, que lanam seu primeiro CD. Somam receita dosesgenerosas domelhor rockinho caseiro nacional (P,sabe o L-ki, aquele disco do Arnaldo...? desconstri Juliano em Todanoite, a melhor cano do disco).

    OsNOprimos JulianoCosta eCaioCosta tocamecantamosimpasses amorosos na companhia e produomusical do talen-toso e despudoradoRafael Castro em saborosssimos e irnicosarranjos, que fazem fluir deliciosamente as faixas.

    A distncia entre os dois explorada inteligentemente nolbum, que alterna seus diferentes mas aparentados timingscomposicionais: a voz de drago e o especial talento perfor-mtico de Juliano quase roubam a cena, ao vivo (os impag-veis, desajeitados e autorreferentes personagens de DragoouTodanoite),mas combinammuitobem,nodisco, como ro-mantismodesencantado e engraadodas canes deCaio (Ca-nastro, Co). (ROBERTOALVES)

    ARTISTAS Juliano Costa e Caio CostaGRAVADORA independenteQUANTOR$ 15AVALIAO**

    NATLIA MATOSH temposqueospaulistas tmoprazerdese embeber no exuberante eflvio musicalqueemanadoPar,emdeliciososshowsaovivo.NoprojetoPratadaCasa,doSescPom-peia, Natlia Matos lanou recentemente

    seu primeiro lbum. A excelente direo musical de GuilhermeKastrup, alm do inegvel talento da cantora (e compositora),fazem com que o disco se some com brilho prprio, femininoe intenso aos deslumbrantes trabalhos dos conterrneos Fe-lipe Cordeiro, Lu e Saulo Duarte.

    O time instrumental que a acompanha em esmerados arran-jos inclui, alm da bateria de Kastrup, as apuradas guitarras ecordas dos paulistas Rodrigo Campos e Kiko Dinucci, este tam-bm o autor, com Germano Melo, da envolvente Cio, que re-torna no final em inspirado dubmix de Victor Rice. Num con-junto impecvel, destacam-seodueto comZecaBaleiro emCo-raoSangrando, deDonaOnete, e os belos versos deAlmirzi-nho Gabriel, em A Flor do Segredo (A gente quase combina/A flor do segredo rimar por dentro). (ROBERTOALVES)

    ARTISTANatlia MatosGRAVADORANaturaMusicalQUANTOR$ 24,90AVALIAO**

    ZERIMADepois de cinco anos semgra-var, e sabendo que este 14lbum de Luiz Melodia ape-nas seu nono disco de compo-sies inditas em41 anos decarreira,pode-se intuiroenor-me descompasso entre a in-dstria fonogrficaeapoticaverstil deste compositor plu-ral (ex-maldito) que retomaaquiaversatilidadertmicadeoutrora, com prolas prpriase algumas recriaes notveis(demsicasdeRicardoAugus-to, Srgio Sampaio, parceiros,ou Dona Ivone Lara & DlcioCarvalho).

    Num lbum com perfumefamiliar e atmelanclico, ho-menagem irm Marize (o t-tulo um anagrama do no-me), a voz rouca e suingantede Melodia no sobe o tom earranha canes de dor de co-tovelo enobrecidas por arran-jos especficos (at de cordasou violes), ainda que a sono-ridade matriz reforce a predi-leo pelos sopros to van-tajosos para o balano vocaldo interprete, independen-temente de se a msica exa-la perfume de gafieira, sambade roda, samba-cano, valsaou bossa nova.

    Marcas da identidade deummestredo sincretismomu-sical que, com64anos e cheiode graa, no grava nunca toa. (ADOLFOMONTEJONAVAS)

    ARTISTA Luiz MelodiaGRAVADORA Som LivreQUANTOR$ 25,90AVALIAO***

  • 27 de junho de 2015 [Guia Folha ] 29

    DANCDesde que estreou com Ef-mera,em2010,Tulipavemsefirmandopelaoriginalidade.Otimbre de voz nico, associa-do habilidade para comportimas letrasemportugus,setornou uma marca registradaque a cantora sabe aproveitarmuito bem. Se Tudo Tanto(2012) j apontava o caminhopara o pop-rock, Danc tempotencialparaagradaraosou-vidos mais eclticos. No novotrabalho,apresenamarcantedos metais e sopros ganha acompanhiadaguitarratropica-lista de LannyGordin (emEx-pirou) e da pegada malemo-lente do paraense Felipe Cor-deiro (em Virou, com parti-cipao de Manoel Cordeiro,pai domsico).

    A ideia de fazer danar vaimuito alm dos sintetizado-res e das batidas eletrnicas.Aqui Tulipa consegue captaros mais variados ritmos doBrasil e do mundo, e o resul-tado orgnico e cheio de hu-mor. Enquanto Fsico umahomenagem escancarada aopop 80s de Olivia Newton-John, Tafet remete bos-sa nova de Joo Donato, comparticipao do prprio msi-co nos vocais e no fender rho-des. (LGIANOGUEIRA)

    ARTISTA TulipaGRAVADORA Pommelo/NaturaMusicalQUANTO R$ 30AVALIAO*

    SAMBAS & CHOROSSambas & Choros, primeiroCDdotrombonistaSilvioGian-netti, tem suingue e magia.Dedicado a trs trombonistasda pesada (Raul de Barros,Gilberto Gagliardi e WalterAzevedo), o disco puro suin-gue. Amagia fica por conta dosomcapazdetransportaroou-vinte para um salo de gafiei-ra, e das boas.

    Entre as sacolejantes ebem executadas msicas es-to Bole Bole, de WaldirAzevedo, e Na Glria, deAry Santos e Raul de Barros.Dois Amigos, choro de Hud-son Nogueira, traz o duo detrombones, formadoporGian-netti e Jaziel Gomes, no trom-bone baixo, conduzido pelopandeiro de Leandro Lui, paramostrar que pouco pode sermuito. No caso, muito bom.

    Se Acaso Voc Chegas-se, de Lupicnio Rodrigues,Escurinha, de Geraldo Fil-me, e Vamos Luta, deGon-zaguinha, com um belo arran-jo do trompetista RubinhoAntunes, ganharam, alm dosom bonito do trombone deGiannetti, sua voz para inter-pret-las. Bomde ouvir e dan-ar. (CARLOS BOZZO JUNIOR)

    ARTISTA Silvio GiannettiGRAVADORA independenteQUANTOR$ 25AVALIAO**

    DE BAILE SOLTONascido no Recife, em umafamlia que at hoje mantmforte ligaocomsuasorigensrurais, Siba cresceu entre a ci-dade e o interior. Esses doisuniversos se fundem emDe Baile Solto, novo traba-lho solo do msico, ex-inte-grante da banda Mestre Am-brsio. A poesia que exala decada faixa conquista at o ou-vintemenosfamiliarizadocomos ritmos damsica de rua dePernambuco.Atual e certeiro, ele versa so-brequestespolticasesociaissem deixar de lado o carterdanantedolbum,queentre-laa as guitarras da msicacongolesa com ciranda e ma-racatu de baque solto. Tere-mos muros, grades, vidros eportes/ Mais exigncia nasespecificaes/ Mais vigiln-cia, muito menos excees/Que lindo acordo de cidada-nia!, diz Marcha Macia.Preste ateno, ainda, emTrs Carmelitas, um entretantos destaques do repert-rio: Flutuar/ suspende as do-res/Tesonhar/reacendeasco-res. (LN)

    ARTISTA SibaGRAVADORA YBMusicQUANTOR$ 20AVALIAO**

  • 30 [Guia Folha ] 27 de junho de 2015

    INSTRUMENTAL

    PARCERIAQuando tinha oito anos, CainCavalcantequehoje tem24foi levado pelo pai a uma rodadechoro,emFortaleza.Naoca-sio, ogaroto, que j conheciao violo e o tocava precoce-mente desde os seis anos,conheceu um dos melhoresamigos deste instrumento: oviolonistadoTrioMadeiraBra-sil, Z Paulo Becker, 43.

    H cerca de trs anos, umaparceria entre ambos se esta-beleceu pela afinidade musi-cal. O resultado? Este brilhan-te CD com o duo.

    So dez msicas muitobem construdas, superbu-riladas e executadas de ma-neira a dar inveja a quem to-ca violo e muito prazer paraquemas escuta. Para o instru-mento, s h ganhos. Conce-bidas para os de seis cordas,as msicas expem uma bra-silidade suingada, mas querequer expertise no violo pa-ra passar inclume pelo cho-ro, baio, galope, samba, val-sa e coco. Coisa que ambostm de sobra.

    Oito temas so de Bec-ker, entre eles, Andaluso eRedentor. Flora e Clara eParceria so de Cavalcante.Msicos parceiros entre si ejuntos na msica de qualida-de. (CARLOS BOZZO JUNIOR)

    ARTISTAS Cain Cavalcantee Z Paulo BeckerGRAVADORA independenteQUANTOR$ 25AVALIAO***

    LIVE JAZZ IN RIO, VOL. 1 O COURO T COMENDO!Celebrando os 80 anos como um sbiomu-sical, esbanjando balano e uma levada la-tina nica (cada vezmais fresca e sinttica,com improvisaes harmnicas, as mos

    cheiasdeacordes, riseessetumbaocaracterstico), JooDo-nato explicita seu elixir como uma quintessncia sonora: eis arazo deste disco ao vivo com seu grupo habitual (Ricardo Pon-tes, LuizAlves eRobertinhoSilva), acompanhadodeumvolume2 (O Bicho T Pegando) que omsico vende nos shows.

    Aqui, o repertrio tem clssicos prpios, composies no-vas, releituras cativantes e parcerias.

    Enquantomuita bossa novaparece perfumedeoutrora, JooDonato destila sua alquimia musical fronteiria em Emoricita compassos de Besame Mucho, suas melodias e ritmoscujo horizonte parece suspender-se no ar, como mantras sono-ros (pelo esprito e energia), e passa a prova do tempo (comalegria danante e humor). Com ecos de seu encontro histricocom Chucho Valds, este Donato mais puro e jazzstico sem-pre sinnimo de felicidademusical. (ADOLFOMONTEJONAVAS)

    ARTISTA Joo DonatoGRAVADORADescobertasQUANTOR$ 33AVALIAO***

    INCONSTANTEAo apresentar suas composies, no encar-te de seu primeiro disco como solista, o sa-xofonistaRafaClarimfezquestodecomen-tar cada uma delas, chamando ateno pa-ra a capacidade que amsica instrumental

    tem de evocar imagens, de narrar histrias. Cada msica pos-sui ummotivo, umfilmeaser visto. Est tudonasuamente, co-menta omsico paulista.

    Nas sete faixas do lbum, Clarim revela-se no s um ins-trumentista expressivo,mas tambmum compositor inspirado.Sua bagagem jazzstica (estudou na conceituada Berklee Col-lege of Music, em Boston) transparece em composies comoO nico Caminho e A Relao com o Universo, que desta-cam a bela sonoridade de seu sax tenor. E a romntica baladaUma Chance para Ns parece talhada para telas de cinema.Bem acompanhado por Ricardo Castellanos (piano), Clio Bar-ros (contrabaixo) e Bruno Tessele (bateria), Rafa Clarim se des-taca em uma estreia promissora. (CARLOS CALADO)

    ARTISTARafa ClarimGRAVADORA independenteQUANTOR$ 20AVALIAO**

  • 27 de junho de 2015 [Guia Folha ] 31

    Divu

    lgao

    MSICAINEBRIANTEPor Irineu Franco Perpetuo

    SouzaPereira e FlavioMetne, o CD foi gra-vadoem1995.Chegandoapenasagoraaomercado,incluiimprovisaesdosmsicosenvolvidos e composies de dois autoresradicados na Europa hoje quarentes,masque tinhampoucomaisde20anosnomomentodoregistro,ShafiBadreddin,43,quemora emLuxemburgo, e EliasBachou-ra, 41, que levou seu alade at a Blgica.

    Instrumentosconhecidosdopblicooci-dental,comoviolino,violonceloeclarinete,juntam-seaoutrostpicos,comooney(flautaoriental),buzuq(espciedeala-de) e qanun (ctara persa de sonoridadetantalizante) para fazermsica de cmaradomaisaltonvelumdilogomusicalaci-ma dos esteretipos que bempoderia ser-vir comoexemplopara ooutro tipodedi-logoque tem faltadoentre asmetadesoci-dental e oriental do planeta.

    POEMASMUSICAIS DOORIENTEMDIOARTISTAS vriosGRAVADORA independenteQUANTOR$ 25,90AVALIAO**

    Contrapontos insinuantes, ritmos in-tricados, intervalos inusitados, ins-trumentaesiridescentes:PoemasMusicaisdoOrienteMdioumdaquelesdiscoshipnticos,que teimamemnosairdo aparelho de somdepois de ouvidos pe-la primeira vez.

    Se voc est atrs do fast food musi-cal implcito no rtulo worldmusic, pas-se longe. Oriente e Ocidente, improviso ecomposio,tradiooralepartituraescri-tafundem-seemumlbumsofisticado,quetraz a nosso pas algo da msica da Sriapalco de uma sangrenta guerra civil quese arrasta desde 2011, mas tambm umadas mais ricas produtoras e difusoras decultura de sua regio.

    Iniciativa de dois brasileiros que se en-contravamemDamasco,RosalieHelenade

    Oalaudista srioEliasBachoura

    ERUDITO

  • 32 [Guia Folha ] 27 de junho de 2015

    FILMES

    CLSSICOSESSENCIAIS

    Por Srgio Alpendre

    CAIXATRAZSEISOBRASFUNDAMENTAISDOFAROESTE,GNEROCINEMATOGRFICOPOREXCELNCIA

    CenadeReinadodoTerror,de JosephH.Lewis

    emblemticaaperiodizaopropostana Coleo Faroeste, que apresen-ta seis clssicos. O filmemais antigo de 1940; omais recente, de 1960. jus-tamente nesse perodo que localizamos amaior parte das obras essenciais do gne-ro. Em baixa nos anos 1930, foi recupera-do por ningum menos que John Ford emNoTempodasDiligncias,em1939.Nosanos1960,ognero foideixadoemsegun-do plano. Ford, por sinal, est representa-do com Audazes e Malditos (1960), umdos muitos filmes que demonstram queele no era racista (como at hoje alguns

    desatentos insistememdizer).Umsargen-to negro (Woody Strode) acusado de umassassinato que no cometeu. Estamos noterritriodeHitchcock,especialistaemhis-trias de falsos culpados. Aqui, Ford querdiscutir o racismo presente na sociedadeamericana, e na cavalaria no era diferen-te.Noexagero:destefilmeatofinaldesua carreira, em 1965, Ford no fez outracoisa seno obras-primas.

    Outro pioneiro est presente. RaoulWalsh, comseu ComandoNegro (1940).JohnWayneinterpretaBobSeton,umtexanoque,comomuitosemmeadosdosculo19,

  • 27 de junho de 2015 [Guia Folha ] 33

    Divu

    lgao

    vai regio do Kansas para tentar a vida.Estamos na vspera da Guerra Civil Ame-ricana. Sulistas e nortistas se estranhamedisputam as novas terras da regio. Setonse apaixona porMary (Claire Trevor), filhade um magnata local. Tem o apoio inicialdo irmo dela, Fletch (Roy Rogers), e a ri-validadedeWillCantrell (WalterPidgeon). o menos impactante dos filmes da cole-o, mas est longe de ser indigno de seugrande diretor.

    OfilmeBestrepresentadoporduasp-rolas. Em Reinado do Terror (1958), umhomemsueco (SterlingHayden) vai a umacidadedoTexasreclamarasterrasqueper-tenciam a seu pai. Chegando l, descobrequeopai fora assassinado amandodeumpoderoso dono de hotel. A imagem maismarcante (em um filme cheio de imagensmarcantes) a do duelo final (j adianta-da no incio) entre o sueco com um arpoe um temido pistoleiro. o ltimo filmede um dos maiores diretores da histriado cinema, o injustiado Joseph H. Lewis,

    mestredobaixooramento.OHomemqueLuta S (1959) simplesmente o melhorfilmedeBuddBoetticher(outromestredosoramentosmodestos) e o quarto dos seisfilmesdesuaparceriacomRandolphScott.Trata-se de um faroeste econmico (comotodos os faroestes de Boetticher) e genialsobre um caador de recompensas (Scott)que faz de tudo para entregar um foragidoa Santa Cruz.

    DeAnthonyMann, temosWalterHustoneBarbaraStanwickcomopaiefilhaemAl-mas em Fria (1950). Ele dono de umafazenda, desentende-se com posseiros eadministramal odinheiro. Elaquerherdara fazenda,mas enfrenta uma concorrnciabrava: a viva que seu pai resolveu namo-rar. Aomesmo tempo, muito prxima deum dos posseiros e ainda se envolve comuminescrupulosojogadorebanqueiro.Fa-roestesoturno,banhadopelasguasdoci-nema noir, gnero emqueMann se exerci-tou no final dos anos 1940. um dosmui-tos filmes que justificam o ttulo que Jean-Luc Godard deu a um artigo sobre o dire-tor: Super Mann.

    Completando a coleo, o ainda pou-co conhecido Jacques Tourneur compare-ce com Paixo Selvagem, em que Logan(Dana Andrews) est dividido entre duasmulheres de temperamentos opostos, Lu-cy (Susan Hayward) e Caroline (PatriciaRoc). Ou seja, entre a sofisticao urbanae a tradio rural, o arrojamento aventu-reiro e o fincar razes. Lucy casada comGeorge, o melhor amigo de Logan, e tam-bmestdividida.Naverdade,todosestodivididos entre uma coisa e outra, ou en-tre uma pessoa e outra. chamado de fil-me de fronteira, mas essa fronteira maisespiritual do que fsica.

    CINEMA FAROESTEDIRETORES vriosDISTRIBUIDORA VerstilQUANTOR$ 69,90 (3 DVDs)AVALIAO***

  • 34 [Guia Folha ] 27 de junho de 2015

    ESTRANGEIRO

    TUDO QUE EU AMONeste longa-metragem polons de 2009, odiretor e roteirista Jacek Borcuch arma aaoemtornodojovemJanek(Mateusz Kos-ciukiewicz), que forma uma banda de punkrock com amigos, alm de dar seus primei-ros passos nas relaes amorosas.

    O ano 1981 e o roteiro busca recupe-rar a tenso poltica instaurada a partir da revolucionria as-censo do sindicato Solidariedade (O vento do mar sopra portodo o pas, diz o cartaz nas imagens documentais que abremo filme) em pleno regime comunista: o mpeto anarquista damsica de Janek e sua banda parece no encontrar lugar numtempo de opes polticas muitomarcadas.

    Ainda que peque por certo esquematismo em situaes quebuscam unir o ntimo ao social (o pai do rapaz militar e o desua namorada, sindicalista; o comissrio de polcia, marido davizinha com quem Janek tem um flerte, exerce a represso nu-ma apresentao da banda), o filme encontra sua fora na atitu-de e no carisma do protagonista. (ROBERTOALVES)

    DIRETOR Jacek BorcuchDISTRIBUIDORA LumeQUANTOR$ 37,90AVALIAO*

    VIDA CIGANAComeste longa de 1988, o srvio Emir Kus-turica obteve o prmio de direo em Can-nes, entre as duasPalmasdeOuroque con-quistou com Quando Papai Saiu em Via-gem de Negcios e com o fenomenal Un-derground Mentiras de Guerra.

    O filme mergulha no cotidiano de ciga-nos que vivem na periferia de Sarajevo, pouco antes da guerraque arrasaria a capital da Bsnia, e capta nas relaes tnicas atenso que logo desandaria emmassacres.Mais fascinante queesseaspecto omodocomoKusturica evita o folclorismoe con-segue projetar com lirismo as dificuldades e encantos da vidaimprovisada dos personagens que vagam at a Itlia, onde rea-firmam que no pertencem a lugar nenhum.

    Nesse nomadismo, Kusturica projeta um resduo de autenti-cidade e de liberdade e ainda consegue transpor hbitos, cren-as e emoes numa forma cinematogrfica que parece um eloperdido entre o cinema de Fellini e o de Tarkovski, entre aque-le que enxergava a vida como umpasse demgica e o que via omundo como pura epifania. (CSSIO STARLING CARLOS)

    DIRETOR Emir KusturicaDISTRIBUIDORA VerstilQUANTOR$ 39,90AVALIAO***

    SAINT LAURENTO fascinante filme anterior

    do francs Bertrand Bonello(LApollonide, de 2011, emtorno de famosa casa de mu-lheres na Frana do incio dosculo 20) j indicava que eletinha tudo para abordar a tra-jetria do estilista Yves SaintLaurent do auge da fama banalizao comercial de suamarca com refinamento ci-nematogrfico, sem a obvie-dade e o didatismo que costu-mammarcar as cinebiografiasconvencionais (falas e fatosreveladores; personagens ereferncias passveis de iden-tificao clara).

    O diretor constri seu be-lo retrato atravs de narrativaelptica na qual blocos intro-duzidos por anos marcadosna tela se embaralham entresi e com cenas do estilista jvelho, interpretado por Hel-mut Berger, que surgem dechofre. O mundo da moda seabre cultura em sentido am-plo mas tambm encara a di-tadura domercado.

    Gaspard Ulliel encarnaSaint Laurent com contenoe inteligncia e h prolas decasting, como a breve e deli-cadssima cena chave com adeslumbrante Valeria Bruni-Tedeschi. (RA)

    DIRETOR Bertrand BonelloDISTRIBUIDORA ImovisionQUANTOR$ 39,90AVALIAO**

  • 27 de junho de 2015 [Guia Folha ] 35

    UM NOVO DUETOEmmanuelMourettornou-seconhecidonumcircuitodeapreciadoresdocinemaeuropeupor seu tipo amante desastrado, algo comoumWoody Allen francs perdido numfilmede ric Rohmer. Nos ltimos filmes, o ator/diretorbuscouregistrosdiferentes.Afastan-do-separcialmentedacomdia, realizouA

    Arte de Amar, seu longamais fraco at aqui. Afastando-se ain-da mais, realizou este belssimo UmNovo Dueto, melodramaque parece assinado por algum habituado ao gnero.

    Uma pianista em crise (Jasmine Trinca) vive em um retiroparadisaco no sul da Frana aps amorte do pai. Ela se apaixo-na pelo eletricista Jean (Joey Starr), encarregadode instalar sis-temas de segurana em sua casa. Acontece que Jean tem umanamorada (Virginie Ledoyen) e ela passa a controlar o destinodos amantes demaneira surpreendente emelanclica.

    Alm da direo de Mouret, que preferiu ficar apenas atrsda cmera, brilhamas atrizes neste que umdos poucos filmesa se reter do cinema francs recente. (SRGIO ALPENDRE)

    DIRETOR Emmanuel MouretDISTRIBUIDORA ImovisionQUANTOR$ 39,90AVALIAO**

    BELLE E SEBSTIANFilmes com crianas ou animais tendem a angariar bons lucrosnas bilheterias. Se ofilme temumacriana e umanimal, ento, praticamente um cheque em branco. o caso de Belle e Sebs-tian, longa francsdeenormesucessobaseadoem livrodeCeci-le Aubry e dirigido pelo senegals Nicolas Vanier.

    Sebstian um menino de seis anos que encontra uma ca-dela abandonada, assustada e tida como ummonstro pelos ha-bitantes do vilarejo ondemora, durante a SegundaGuerraMun-dial. Conhecendo-a melhor, ele vai proteg-la daqueles quequeremmat-la, incluindo a alguns soldados nazistas que ocu-pam a regio e so o problemamaior a ser combatido.

    Com belas imagens dos Alpes e uma grande dose de senti-mentalismo (temperadopor uma trilha sonorapouco imaginati-va), o filme pode ser visto com alguma facilidade, mas no pas-sa demais um exemplo de frmula requentada. (SA)

    DIRETORNicolas VanierDISTRIBUIDORA ImovisionQUANTOR$ 39,90AVALIAO=

    EDENA cineasta francesa Mia Han-sen-Lve partiu das experin-ciascomoDJdeseuirmoeco-roteirista, Sven, para recriar aemergncia da chamadafrench touch, variao damsica eletrnica que vicejouna Paris dos anos 1990.

    Misturado saborosa re-constituio de poca, cominstantneos da ascenso dadupla Daft Punk e trilha so-nora irresistvel, o filme se-gue os percalos afetivos deum DJ que oscila entre o su-cesso e as drogas, mas nose orienta apenas pelo per-curso de ascenso e quedapara da extrair uma mensa-gem. O encanto do resultadovemmais domodo como o fil-me busca representar o fasc-nio exercido pela msica ele-trnica sobre os corpos, so-bretudo jovens, e de tentarentender como o hedonismoque acompanha essa cenacultural que eclodiu no mo-mento de ocaso das utopiasfoi ummodo de tentar ocuparo vazio com uma impalpvelsensorialidade.

    Com um ttulo que evoca oparaso e revela suamiragem,o filme de Hansen-Lve olhadesencantado para um mo-mento de sonhos juvenis quedepois foi substitudo por na-damais quemelancolia.(CSSIO STARLING CARLOS)

    DIRETORMia Hansen-LveDISTRIBUIDORA ImovisionQUANTOR$ 39,90

  • 36 [Guia Folha ] 27 de junho de 2015

    BRASILEIRO

    SUPERNADA a So Paulo cinzenta e

    distpica dos pixos e grafi-tes, dos artistas undergrounde sua luta pela prpria sobre-vivncia e a de sua arte, queinspira o instigante segundolonga-metragem de RubensRewald, de 2012.

    Acompanhamos o cotidia-no desencantado de Guto,ator de teatro vivido com in-tensidade e inteligncia porMarat Descartes, que, entrebicos e testes para comer-ciais, tenta pagar as contas,desenvolver seu trabalho co-mo clown em esquetes tea-trais e dar forma minimamen-te satisfatria sua vida afeti-va e familiar.

    Mas a partir do teste pa-ra uma ponta no programa te-levisivo do heri cmico qued ttulo ao longa que a traje-tria de Guto adquire os im-previstos contornosdeumpe-sadelo. O grande achado apresena desconcertante e aenergia estranha que emanada performance de Jair Rodri-gues na pele de Zeca, o come-diante popular que faz o talSuperNada. Para que tudo re-comece a ambiguidade dodesfecho que confere ao fil-me o respiro possvel to bemconhecido dos paulistanos.(ROBERTOALVES)

    DIRETORRubens RewaldDISTRIBUIDORA LumeQUANTOR$ 39,90AVALIAO**

    DE MENORUmgrandefilmeesteprimeirolonga de Caru Alves de Souza,disfaradodemenor inclusi-venoespaoqueaqui lhede-dicado! J deveramos saberreconhecer nesses peque-nos, ntimos e sutis filmesbrasileirosagrandezaquenoestpresentenasficesgran-diloquentes e cheias de te-mas que costumam angariarespao na imprensa.

    Umdos acertos daobra es-t justamente em evitar enun-ciaes redundantes e po-sicionamentos discursivosou psicologizantes acerca daquesto do menor infrator,embora estejamos o tempotodo no mago de sua expe-rincia e significadomaior.

    H certa dramaticidade la-tente em torno da bela, com-plexa e difcil relao entre ajovem advogada Helena e seuirmo Caio (mais jovem e im-pulsivo, problemtico suamaneira), mas o que d o toma refinadapartitura de siln-cios, olhares e abraos queRita Batata e Giovanni Gal-lo executam com esmero. Oscontornos, afetivos mas inde-finidos para eles e para nsdessa relao edesse estar nomundo so a busca que se im-pe. (RA)

    DIRETOR Caru Alves de SouzaDISTRIBUIDORA Bretz FilmesQUANTOR$ 45,90AVALIAO***

    IRM DULCEEste filme segue o filo popu-lar de apelo religioso bem ex-plorado em Chico Xavier.Mas ao contrrio de Daniel Fi-lho,quemostrouavidadom-diumcomdignidadee conten-o, Vicente Amorim escorre-ga na pieguice.

    O filme comea nos anos1920, quando Dulce aindauma garotinha chamada Ma-ria Rita. Preocupada com ospobres, ela lhes distribui pe-daos de po. Passa rapida-menteparaSergipe, em1933,quando ela se torna BiancaComparato, ou seja, Dulce emseus anos iniciais como reli-giosa. Mas isso dura menosde um minuto, e j vamos pa-ra Salvador nos anos 40. Maisadiante, para os anos60, e se-guimos avanando. Trata-sede uma hagiografia padro,com todos os elementos co-muns a esse tipo de filme.

    Poderia ser interessan-te mesmo assim, mas o esti-lo Amorim de direo ba-seado no uso de cmera lentaou tremida, na opulncia de-corativa e no uso chantagis-ta da msica, como se a his-tria de Irm Dulce (ReginaBraga, na segunda metade)no fosse forte o suficiente eprecisasse desses artifcios.(SRGIO ALPENDRE)

    DIRETOR Vicente AmorimDISTRIBUIDORA ParisQUANTOR$ 29,90 e R$ 59,90(Blu-ray)AVALIAO/

  • 27 de junho de 2015 [Guia Folha ] 37

    Divu

    lgao

    BarbaraSteeleemAMaldiodoDemnio

    TERROR COM ESTILOPor Cssio Starling Carlos A mente como anttese da razo um

    dostemasdeAGarotaqueSabiaDemais(1965).Apesardeottuloevocarodocls-sicohitchcockiano,nosetratadeummeropastiche. Bava joga comos desejos e a se-xualidade contida de uma jovem america-na de frias emRoma envolvida numa tra-ma demortes que podem ser tambm fru-to da imaginao.

    OAlertaVermelhodaLoucura (1970)representa o pice de Bava no domnio daimagem num filme em que a cor prota-gonista. A compulso assassina de um es-tilista mistura-se a suas criaes e a alvu-ra dos vestidos de noiva perturbada pe-lo rubro do sangue das vtimas, num estu-do do fetichismo altura dos alcanadospor Buuel e Hitchcock.

    Em Ces Raivosos (1974), filme deao em tempo real, a energia concentra-da em todas as etapas de uma fuga de cri-minosos demonstra como no cinema mui-tas vezes menos mais. No por acaso, ojovem Tarantino encontrou neste filme ainspirao para boa parte da originalida-de de seu Ces de Aluguel.

    Umaextraordinria conjuno astralou cultural deve ter ocorridona It-lianapassagemdosanos1950paraos1960,perodoemqueemergiramproje-tos de cinema cuja influncia se sente ain-da hoje. Alm da trinca Fellini-Antonioni-Visconti, ento no apogeu, Pasolini e Ber-tolucci logo despontariam e Leone apare-ceriaparareinventarowestern.Emmeioa essa constelao de superautores, o no-me de Mario Bava passou despercebidoapenas aosque viamocinema intelectual.

    Aospoucos,asofisticaoestilsticadosfilmes de gnero, aos quais Bava dedicousua carreira comodiretor, inspirou cineas-tas mais jovens a produzir obras comer-ciais com personalidade e, assim, seu no-me se tornou objeto de referncia e culto.

    Os quatro ttulos reunidos na caixaA Arte de Mario Bava cobrem uma d-cada e meia de sua abundante e irregularproduo e ajudam a rever a primeira im-pressodequeodiretor seria umespecia-listadocinemadeterrorouumpioneirodogiallo, o thriller italiana.

    A Maldio do Demnio (1960) umclssico terror gtico em torno de bruxa-rias, retornos do alm e possesses. Bavaconstriumespetculo lgubreemquetu-do depende dos contrastes na imagemempretoebranco, que sugere emvezdemos-trar, devolvendo, assim, o medo a sua ori-gem no desconhecido.

    AARTEDEMARIO BAVADIRETORMario BavaDISTRIBUIDORA VerstilQUANTOR$ 49,90 (2 DVDs)AVALIAO***

  • 38 [Guia Folha ] 27 de junho de 2015

    COLABORADORES

    PRXIMA EDIO 25 de julho

    ADOLFOMONTEJONAVAS Poeta, crtico ecurador independente, autor de PoiesisBruscky (Cosac Naify) e Mrio Carneiro Trnsitos (Circuito), entre outros

    BRUNOZENI Doutor em Letras pela USPe escritor, autor de Corpo a Corpo como Concreto (Azougue Editorial), entreoutros livros

    CAIO LIUDVIK Ps-doutorando em filosofiapela USP, autor de Sartre e o PensamentoMtico (Loyola)

    CARLOSBOZZO JUNIOR Jornalista e crticomusical, colaborador da Folha

    CARLOS CALADO Jornalista, crticomusical,autor de O Jazz como Espetculo(Perspectiva)

    CSSIOSTARLING CARLOS Jornalista e crticode cinema, autor do livro Em Tempo Real(Alameda)

    CRISTINAPAIVA Pesquisadora e crtica deartes visuais e arquitetura; mestre emComunicao e Semitica pela PUC-SP

    IRINEU FRANCOPERPETUO Jornalista e crticomusical, colaborador da Folha e coautor dolivro Populares e Eruditos (Inveno)

    JOCAREINERS TERRON Escritor e designergrfico, autor de Sonho Interrompido porGuilhotina (Casa da Palavra) e Do Fundo doPoo se V a Lua (Companhia das Letras)

    LGIANOGUEIRA Jornalista, escreve sobremsica, moda e cultura pop

    MARIOBRESIGHELLO Tradutor, mestre edoutorando no programa de Lngua eLiteratura Italiana na FFLCH/USP

    NELSONDEOLIVEIRA Escritor e antologista, autor de dio Sustenido e Poeira:Demnios eMaldies, ambos pela LnguaGeral

    OSCARPILAGALLO jornalista, autor de AHistria do Brasil no Sculo 20 (Publifolha)

    REYNALDODAMAZIO Editor e poeta, autor deNu entre Nuvens (Cincia do Acidente) eHoras Perplexas (Editora 34)

    ROBERTOALVES Ps-graduado em TeoriaLiterria pela FFLCH/USP, trabalhou comopesquisador na Cinemateca Brasileira

    ROBERTOTADDEI Autor do romanceTerminlia (Prumo, 2013) e coordenador daps-graduao em formao de escritores doISE Vera Cruz

    RONALDOBRESSANE Escritor e jornalista,autor do infantojuvenil Sandiliche (CosacNaify) e roteirista da graphic novelV.I.S.H.N.U. (Companhia das Letras)

    SRGIOALPENDRE Crtico de cinema eprofessor, edita a revista Interldio (www.revistainterludio.com.br) e o blog Chip Hazard(http://chiphazard.zip.net)

    VIVIEN LANDO Diretora cnica de pera eescritora. Publicou Balalaicas eMandolinas(Objetiva) e Ces (Record)

    WAGNERAMOROSINO Jornalista, msico eprodutor musical

    Presidente Luiz FriasDiretor editorialOtavio Frias FilhoSuperintendentes Antonio ManuelTeixeira Mendes e Judith BritoEditor-executivo Srgio DvilaDiretora de revistas Cleusa Turra

    LIVROS DISCOS FILMES

    EditorManuel da Costa PintoEditor de arteWilson Roberto Santos(interino)Editorde fotografiaGabriel Cabral (interino)

    Telefone (11)3224-4263Endereo Al. Baro de Limeira, 425,5 andar, CEP