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e s p e c i a l revista ponto movel cidade do saber ponto movel cidade do saber Jauá 6

Revista Jauá

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r e v i s t a

pontomovel

cidade do saber

pontomovel

cidade do saber

Jauá

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SABERES EFAZERES

JAUÁ

DICASCULTURAIS

NOSSAGENTE

PAINELCRIATIVO

LAZER

QUEM CONTAUM CONTO

SABOR DA TERRA

LÁ VEMHISTÓRIA

AÇÃOGOVERNAMENTAL

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26Sumário

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GENTEQUE FAZ

www.cidadedosaber.org.br71 3644.1631

Para consolidar as práticas de democratização do acesso a bens culturais e esportivos, a Cidade do Saber agora tem o seu Ponto Móvel, que prioriza o atendimento às localidades da orla e zona rural de Camaçari, por estarem mais distantes, geograficamente, da sede da instituição, no centro da cidade. Assim, desde julho de 2009, mais de 4.000 pessoas, de 12 diferentes localidades, já foram beneficiadas por este projeto, nos espaços próprios do caminhão adaptado (biblioteca, brinquedoteca e mini-lan house) ou nas oficinas que ocorrem nas dependências de Associações Comunitárias, grandes parcerias deste trabalho!

1 ano

3

Areias

Arembepe

Cordoaria

Vila de Abrantes

Barra do Jacuípe

Jauá

Camaçari

Sede CamaçariCidade do Saber

Barra do Pojuca

Distrito de Monte Gordo

Distrito de Abrantes

Monte Gordo2

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3

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8 5

4

6

9Parafuso

jauaJaua’’

Sejam bem vindos

Continuamos nossa viagem a bordo do caminhão-baú do Projeto Ponto Móvel da Cidade do Saber, que leva arte, esporte e lazer à população dos distritos de Camaçari. Dessa vez, o destaque é para os escantos das pessoas e das belas paisagens de Jauá, praia tão cobiçada por moradores, veranistas e turistas.

Como parte da nossa proposta de contribuir para preservar o histórico e fortalecer as tradições de cada localidade

Editorial

visitada, mergulhamos nesse universo e registramos um pouco dos costumes, crenças e do dia-a-dia desses habitantes que, diariamente, ajudam a escrever os capítulos da história do lugar.

As habilidades do artista plástico Monal e as brincadeiras de criança de Dona Euzébia estão contempladas nesta edição, que integra uma coletânea de publicações produzidas pela Cidade do Saber – Instituto Professor Raimundo Pinheiro,

para valorizar e divulgar a riqueza e a diversidade da cultura de Camaçari.

Como já fizemos em Barra do Pojuca, Monte Gordo, Barra do Jacuípe, Arembepe e Areias, convidamos você a pegar essa carona e, agora, visitar Jauá. Nossas próximas paradas estão programadas para Vila de Abrantes e o povoado de Cordoaria (remanescente quilombola), além de dois novos destinos a integrarem a coleção: Parafuso e a sede de Camaçari. Até lá.

Boa leitura!

Esta publicação segue as normas do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, assinado em 1990, em vigor desde janeiro de 2009.

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jauaJaua’’

Pertencente ao distrito de Abrantes, Jauá é a localidade da orla de Camaçari com as praias mais frequentadas pela população da sede do município. Seu nome faz menção a uma espécie de papagaio, típica do litoral da Bahia e também chamada de Acumatanga ou Camutanga.

Rica em belezas naturais formadas, também, por dunas e lagoa, Jauá foi originalmente uma vila de pescadores e, pela proximidade com a capital baiana, foi uma das primeiras a ser frequentada por veranistas na região em que está localizada, na Estrada do Coco. Mas ainda hoje é possível se reportar aos tempos do vilarejo, ao se observar na praia, em determinados horários do dia, a chegada de barcos carregados de peixes, que são a base da alimentação na região.

Praia cobiçada por moradores e turistasEm Jauá, muitas mães criaram seus filhos com uma alimentação baseada em nutrientes dos frutos do mar. Elas alternavam a atividade de marisqueiras com a de lavradoras, plantando principalmente a mandioca. Margarida Maria da Conceição foi uma dessas mulheres que proviam tudo para os filhos com o suor do próprio trabalho. Parteira famosa na região, ajudou muitas crianças a virem ao mundo, de Abrantes a Areias. Dona Margarida, como boa parte das parteiras, gostava de rezar para vários santos, mas, depois das orações nas casas das comadres, dançava a noite inteira o samba-de-roda que ajudava a organizar.

Por conta dos hábitos festeiros, Maria dos Santos de Freitas, 65 anos, filha de Dona Margarida, diz que herdou da mãe

a animação e chegou a reunir um grupo pra fazer um terno de boi em Jauá. Além disso, todo final de ano, Maria saía pelas ruas com amigos e parentes para fazer um ritual que, segundo ela, trazia prosperidade: “Antigamente, no Ano Novo, a gente saía em grupo com umas latas e uns galhos de pau, cantando pelas ruas de Jauá, até chegar ao rio, em Areias. Ali, a gente jogava os ramos na água e enterrava o Ano Velho”.

Indê, indê, indê Indê, indê, indá Enterrar o Ano Velho que o Novo vai chegar! Meu sogro e minha sogra, Escutem o que eu vou dizer Carro não anda sem boi E eu canto sem beber

Dona Maria, moradora da

Rua da Paz

Praias são boa opção para

crianças

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jauaJaua’’

Ternos de reis A cultura local é um ponto forte. No passado, os ternos de reis eram as manifestações mais comumente encontradas em Jauá. Dona Euzébia de Souza Santos, 83 anos, foi uma das brincantes mais animadas dos ternos em Pé de Areias (uma das comunidades de Jauá). Junto com as amigas Maria, Noca e Binha, ela saía pelas portas das casas cantando as quadras dos reis. Uma das brincadeiras que ela mais gostava de participar era a da Maria Angélica.

“Uma das moças do terno representava a Maria Angélica, que dançava com um balaio na cabeça, ficava escondida e

Esporte Radical

Sobre as dunas de Jauá é possível assistir ao nascer e ao pôr-do-sol com uma visão

panorâmica de toda a orla do local. As dunas são consideradas um parque

recreativo natural e fazem parte da Área de Proteção Ambiental do Parque das

Dunas de Abrantes. São procuradas para o sandboard, um esporte que teve início em Florianópolis, Santa Catarina. Muito semelhante ao snowboard (na neve), o esporte é praticado em dunas de areia,

usando uma prancha de fibra ou madeira com comprimento entre 1,20m e 1,70m.

Suas manobras são adaptações de outros esportes como surf, skate e snowboard.

Fonte: pt.wikipedia.org/wiki/sandboard

quando a gente cantava a música ela entrava sambando e o pessoal batia palma”, lembra. “Depois, era a parte dos homens, que vinham com uma burrinha. Tinha também o Pica Pau, que vinha na cabeça de algum rapaz que dançava e cantava a música dele”, completa.

Maria Angélica, cadê Simão? Maria Angélica, cadê Simão? Tá no limoeiro catando limão Maria Angélica, adeus, adeus, adeus

Segundo dona Euzébia, no Dia de Reis tinha um encontro de ternos que vinham até de Areias, como era o caso do Terno do Peixinho Dourado, do qual ela gostava muito.

Dona Euzébia: lembrança dos ternos

Praias de Jauá encantam visitantes

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jauaJaua’’

Apesar de muitas tradições já estarem extintas, durante todo o ano é possível acompanhar manifestações populares, dentre as quais as mais famosas são a festa do padroeiro de Jauá, Bom Jesus dos Navegantes (a lavagem, no final de janeiro); a Festa de Iemanjá; a festa do padroeiro de Pé de Areias, São Miguel (em setembro); e o carnaval (fevereiro). Estes festejos têm como característica principal o sincretismo religioso, reunindo contribuições do catolicismo e do candomblé, entre outras.

Dona Maria Freitas conta que, há algumas décadas, a festa em homenagem aos padroeiros era bastante diferente da que acontece nos dias atuais, quando ganhou grandes proporções, ao estilo das micaretas. “Não tinha festa profana, tinha o dia do baile dançante. No mais, só missa e procissão”. Já o carnaval de Jauá, ao contrário da folia na capital baiana, é uma festa tranquila, marcada pela presença de blocos carnavalescos tradicionais e

também blocos formados por homens travestidos de mulheres.

Encantos das praias Com inúmeras barreiras de corais, na maré baixa a Praia de Jauá oferece formação de piscinas naturais propícias ao banho de mar, sobretudo de crianças, e à prática do mergulho. São cerca de 2,5km de orla, divididos em quatro praias e com mais de 50 barracas que servem bebidas, frutos do mar e acarajé.

A Pedra da Baleia, por exemplo, é uma das praias protegidas por recifes e localizada no centro urbano. A Praia do Grilo é outra opção para os banhistas e está ao norte de Jauá, perto da praia da Pedra da Baleia.

Ao sul de Jauá, a Praia do Japonês é excelente para prática do surf. A Praia do Sororoca é mais afastada do centro urbano e também é procurada para a prática de esportes, como surf, kitesurf e outros.

Águas tranquilas

atraem banhistas

Barracas oferecem petiscos e bebidas

CURIOSIDADES * A Praia do Japonês tem esse nome

por conta do seu primeiro morador, que era um japonês.

* A Praia do Grilo é chamada assim porque antes havia uma grande quantidade de grilos no lugar.

* Conta-se que, antigamente, para se chegar a Jauá havia um caminho pelo mar e outro pelo rio. O acesso por terra

só se deu pela necessidade de dar socorro a vítimas de um navio naufragado em sua costa.

* Entre os moradores de Camaçari, a localidade de Jauá é carinhosamente chamada de “praia do oi”,

porque é muito comum encontrar amigos e conhecidos por lá, ocasionando a

repetição do cumprimento “oi”.

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Texto completo: http://terreirodejaua.files.wordpress.com/2009/07/kabengele1.pdf

Por que ensinar a África na escola brasileira?

jauaJaua’’ Nossa Gente

Revista Ponto Móvel Cidade do Saber: Você pode nos contar um pouco da sua trajetória até se tornar a diretora da Escola Tancredo Neves?

Mônica: Eu nasci em Jauá e sou filha de uma família com cinco irmãos. Minha mãe, meus avós, todos nasceram aqui. Minha mãe estudou até a 4ª série do ensino fundamental, porque ela casou e o marido não queria que estudasse mais. Quando ele faleceu, ela ficou responsável pela nossa criação sozinha. Muito tempo depois, ela conseguiu uma pensão a que tinha direito, mas, até receber, passamos

por dificuldades. Por conta disso, fui morar com minha tia Maria, que tinha barraca de praia.

Revista Ponto Móvel: Foi quando você começou a trabalhar?

Mônica: Sim, aos 7 anos comecei a trabalhar na barraca de minha tia. Lá eu servia as mesas, mas nunca deixei de estudar. Minha mãe sempre teve preocupação com meus estudos. Aos 11 anos fui trabalhar num lugar chamado Torrão, na casa de Dona Pureza. Ela era professora de matemática e me ajudou

muito, porque eu já estava na 5ª série, mas não sabia direito nem as quatro operações. Agradeço muito a ela por isso. Aos 15 anos fui morar com minha mãe novamente, lá em São Cristóvão.

Revista Ponto Móvel: E você deu continuidade aos estudos?

Mônica: Sim, eu passei a estudar durante a semana e, só nos finais de semana, trabalhava em casa de família. Pela minha dedicação, fui convidada diversas vezes para trabalhos fixos em Salvador mas minha mãe nunca deixou, por conta dos meus estudos.

Mônica Bispo Azevedo, com 17 anos na área de educação, trabalhou com diversos níveis de ensino, da alfabetização ao ginásio. Hoje é diretora da Escola Tancredo Neves, a mesma em que estudou na infância. Nativa de Jauá, encontrou na educação a saída para enfrentar preconceitos e garantir sua cidadania.

“Tive que passar por poucas e boas para ser a Mônica Bispo de hoje”

Assim, eu conclui o curso de Magistério e fiz um concurso para a área. Fiquei sabendo que tinha uma vaga aqui em Jauá, na Escola Tancredo Neves, e me interessei muito porque foi a escola em que eu estudei. Fiquei como prestadora de serviço durante dois anos, depois fiz outro concurso e passei.

Revista Ponto Móvel: Seu objetivo era voltar para Jauá?

Mônica: Sim, minha prioridade era voltar para cá, por isso fiz este outro concurso em 1992, para que fosse efetivada no cargo. Trabalhei durante muitos anos como professora primária. Depois fiz adicionais para ensinar 5ª e 6ª séries, fui professora de ciências. Depois, fiz Letras Vernáculas na Universidade Católica do Salvador e, em seguida, fiz uma pós-graduação na Faculdade Visconde de Cairu. Há pouco tempo, prestei vestibular para Direito e passei, mas não estou cursando por falta de tempo. Quero ter outra profissão, além de ser professora.

Revista Ponto Móvel: E como você chegou à direção da Escola Tancredo Neves?

Mônica: Com a implementação da Lei nº 10.639 em Camaçari, que torna obrigatório o ensino da cultura afro-brasileira nas escolas, fui convidada para ser coordenadora geral de um projeto nas escolas do município. Meu trabalho foi bastante elogiado por conta da minha vivência, pois sempre me colocava como mulher, cidadã, negra, que passou por inúmeras dificuldades para se firmar

Entrevista:

Mônica Bispo

na sociedade, a qual muitas vezes foi preconceituosa comigo. Tive que passar por poucas e boas para ser a Mônica Bispo de hoje. Voltando à questão do cargo de direção, esse foi mais um desafio que aceitei depois do trabalho de treinamento junto à Secretaria de Educação. Fui convidada a trabalhar nesta escola, que, na época, tinha alguns problemas por conta da indisciplina de alunos. Fiz um trabalho de ir à casa dos estudantes que não estavam indo para as aulas e isso surtiu um ótimo efeito. Ganhei o respeito dos pais e desses alunos também.

Revista Ponto Móvel: Como você conseguiu driblar o racismo?

Mônica: Meu cabelo foi a primeira marca da minha identidade, comecei a usar ‘blackão’. Embora minha mãe trabalhasse espichando cabelo e eu já tivesse espichado o meu também, resolvi assumir a minha identidade a partir do meu cabelo. Aos 11 anos, quando eu estudava em Abrantes, um aluno da escola me chamou de petróleo, de escuridão, em plena aula de matemática e todo mundo sorriu. Me senti arrasada, mas, a partir dali, comecei a me interessar e estudar os grupos étnicos, buscando minhas origens. Por uma questão de consciência, a primeira coisa que fiz foi parar de espichar meu cabelo. Mas junto com a minha conscientização ficou evidenciado o preconceito e a discriminação da sociedade. Não foi nada fácil.

Os países considerados mais desenvolvidos são os que investiram maciçamente na educação de qualidade para jovens. A questão é saber que tipo de educação o Brasil precisa para sair da situação em que se encontra. Uma educação que visa não somente o domínio das teorias e novas tecnologias (imprescindíveis, porém não suficientes) mas também, e sobretudo, uma educação cidadã, orientada na busca da construção e consolidação dos princípios de solidariedade e equidade. Uma educação que considere as questões relacionadas com a construção de nossas identidades individuais e coletivas, fazendo delas fonte de riqueza e de desenvolvimento.

A educação habitualmente dispensada aos jovens é focada numa visão eurocêntrica, que, além de ser monocultural, não respeita as diversidades de gêneros, sexos, religiões, classes sociais, “raças” e etnias, as quais contribuíram para a construção do Brasil, um país diverso em todos os sentidos.

*Trecho da conferência de Kabengele Munanga (diretor do Centro de Estudos Africanos da Universidade de São Paulo – USP) proferida no Teatro da Cidade do Saber, na ocasião da comemoração do dia da África (30/05/2008).

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jauaJaua’’ Saberes e Fazeres

Faz tempo que o artista plástico Uilson de Oliveira dos Santos resolveu assinar o nome Uilson Monal em suas telas. Há 23 anos exercendo seus dotes como pintor, Monal conta que, desde os 7 anos, seu talento era notado, tanto que, no colégio, era muito requisitado pelos colegas para fazer ilustrações em trabalhos escolares. “Tudo começou quando um pescador, amigo de meu pai e que também era pintor, me emprestou alguns pincéis e tinta. Em um pedaço de madeira eu pintei a minha primeira tela, que até consegui vender”.

Nessa época, Monal trabalhava como jardineiro na casa de arquitetos, onde

teve a oportunidade de folhear livros que aumentaram o seu conhecimento sobre artes plásticas. Em 1992, ele fez um curso profissionalizante de Desenho Artístico e Publicitário. Depois, teve a oportunidade de levar seu trabalho para Salvador, onde logo teve seu talento reconhecido e foi convidado para trabalhar como marchand (agenciador de obras de arte), ficando por quatro anos na Galeria Paulo Robatto.

Desde então, Monal vem participando de exposições. “A minha temática preferida é a marinha. Como filho de pescador, conheci bastante o mar. O que mais gosto de pintar são os arrecifes de Jauá, minha fonte de

A história de Jauá nas telas de Monal

Aulas e encomendas

de telas:

Uilson Monal: (71) 8783-2910

inspiração, tão rica em detalhes”, revela.

Como bom filho de Jauá, Monal já retratou em diversas telas a bucólica vila de pescadores que vivenciou na infância. Seu talento como retratista também é admirável e grande parte das encomendas que recebe é para atender a clientes que querem ter seus retratos pintados em casa.

Em maio de 2010, o artista representou Camaçari na Bienal Internacional de Arte Contemporânea, na cidade de Rieti, na Itália. Uilson Monal dá aulas particulares para alunos de 8 a 80 anos, em Salvador e em Jauá.

Monal descobriu o talento com

apenas 7 anos

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Saberes e Fazeres

jauaJaua’’

Reconhecida como patrimônio cultural da humanidade, a capoeira tem, em Jauá, um representante que é motivo de orgulho da comunidade. Rogério da Conceição Santos, 28 anos, tem uma história de amor com a capoeira e o ensino dessa arte. Instrutor, discípulo do mestre Grandão, de Vila de Abrantes, realiza trabalho voluntário em Jauá e Pé de Areias.

“O primeiro contato que tive com a capoeira foi com o mestre Grandão, em 1997. O trabalho que faço é a realização de um sonho para mim. Dar aulas gratuitamente para a comunidade sempre foi um plano na minha vida”, conta Gia, como ficou conhecido no meio da capoeira.

Ele lembra que, quando adolescente, queria muito praticar a modalidade, mas

Comunidade Capoeirateve que ir até Abrantes para ter aulas. “Eu iniciei esse trabalho em Pé de Areias há um ano e seis meses, sendo que, em Jauá, já tenho mais de três anos. A finalidade do projeto é atender as crianças, porque eu tive essa necessidade quando tinha a idade delas”.

A modalidade ensinada por Gia é a capoeira contemporânea, que, segundo ele, é uma mescla da capoeira-mãe, a Angola, e a Regional, criada por mestre Bimba, em 1928. O projeto que ele fundou em 2008 chama-se Comunidade Capoeira, que atende a todas as faixas etárias, buscando também dar noções de cultura e cidadania aos alunos.

“Eu tenho alunos de 5 a 44 anos e todo mundo faz aula junto, sem distinção de

idade. Para eles, procuro sempre mostrar a importância da capoeira na história do Brasil, chamando a atenção para fatos como a participação de capoeiristas na Guerra do Paraguai”.

O batizado do projeto acontece anualmente, com a coordenação do mestre Grandão, que é responsável pelo trabalho do instrutor Gia. Durante o evento, que conta com a ajuda de alguns comerciantes locais, os alunos trocam de cordel (graduação) e participam de uma extensa programação durante cinco dias. São oferecidos cursos, palestras e um aulão. Gia, que tem mais de 150 alunos em Jauá e Pé de Areias, traz para eles o melhor da capoeira durante os dias do batizado. “A gente sempre traz mestres de outros lugares do Brasil e do mundo”, conta.

Apresentações de capoeira,

samba-de-roda e maculelê

Gia:(71) 8891-2473

VOCê SABiA?

A capoeira é o maior instrumento de divulgação da língua portuguesa pelo

mundo. Atualmente, a modalidade é ensinada em diversos países do

globo terrestre. Através das ladainhas e corridos (músicas) deste esporte-arte, o idioma tem sido

falado nos quatro cantos do planeta. O nome capoeira

vem de origem tupi-guarani e significa vegetação

costeira.

Fontes: pt.wikipedia.org/wiki/Capoeira portalcapoeira.com

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Por Maria dos Santos de FreitasjauaJaua’’ Sabor

da Terra

- ½ kg de talaia (marisco)- alho- cebola- coentro- tomate- limão- mamão verde cortado em cubos- azeite de dendê- leite de coco- sal e pimenta a gosto

ingredientes: Modo de preparo:

Afervente o marisco e depois tempere com sal, pimenta, alho, tomate, cebola, limão e coentro. Coloque tudo na frigideira e acrescente o azeite de dendê e o leite de coco bem grosso. Em seguida, adicione o mamão verde, cortado em cubos pequenos. A moqueca pode ser servida com arroz e farofa de “fere boca”, feita com o camarão seco, triturado e torrado na manteiga.

MOqUECA dE TALAiA

Qualquer atividade extrativista deve estar submetida às regras de preservação ambiental. No caso da pesca artesanal, muito praticada na orla de Camaçari, é comum, até pela questão cultural (valores transmitidos entre gerações), a integração dos agentes com a natureza e o respeito à mesma, o que revela uma consciência da interdependência do homem com o seu meio.

Diferente da atividade de caráter essencialmente comercial, a pesca artesanal está mais relacionada à fonte de alimento das famílias. Em Jauá, por exemplo, as marisqueiras catam um marisco encontrado nas pedras chamado “talaia”. O “fere boca”, um tipo de camarão bem pequeno, também incrementa a alimentação de muitas famílias da comunidade, dando origem a deliciosos e típicos pratos, como o da receita a seguir:

Delícias que vêm do mar

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jauaJaua’’ Gente que Faz

Realizadora de diversos projetos sociais e culturais, a Associação Beneficente Casa de Oxalá (Assobeco) é a ONG responsável pelos projetos do Terreiro de Jauá (tombado como patrimônio cultural da Bahia). A associação fomenta atividades de manutenção do repertório cultural e histórico oriundo das contribuições dos povos africanos. Independentemente da religião, também oferece serviços e atividades à população circunvizinha à área da sua sede.

Em 2008, foi reconhecida como Ponto de Cultura pela Secretaria de Cultura do Estado da Bahia e pelo Ministério da Cultura. Desse modo, se potencializou para o desenvolvimento de ações que visam a melhoria da qualidade de vida das comunidades, a exemplo de reforço escolar,

Associação Beneficente Casa de Oxalá

inclusão digital, capacitação em artesanato, oficinas de corte e costura, bordado,  cineclube e gastronomia baiana. Segundo Laércio Messias do Sacramento, Tata de Nkisi do Terreiro de Jauá, os projetos são desenvolvidos há cinco anos e atendem, em média, a 200 pessoas.

Dentre os projetos administrados pela Assobeco está o “Família de Artesãos”, que, a partir da formação de cooperativas, capacita para a produção de peças artesanais com o reaproveitamento do material disponível na mata localizada dentro da área da instituição e na região. Em paralelo, as famílias contam com a alfabetização de jovens, educação ambiental e educação preventiva contra doenças sexualmente transmissíveis.

CONTATOS:(71) 3623-2598/

3623-3861

Oficinas desenvolvem

habilidades da comunidade

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Gente que Faz

jauaJaua’’

Outro projeto gerenciado pela associação é o “Roupas de Sinhá”, que agrega oficinas de corte, costura e bordados, além de aulas de História e Modismo, e Gestão de Negócios. O trabalho prático deste projeto é permeado pelo resgate da história do Brasil dos séculos XVII, XVIII e XIX, com ênfase no estudo das vestimentas do período das sinhás. Esses trajes eram recriados pelas escravas negras africanas com os tecidos e retalhos. Mais tarde, seriam reutilizados e atualizados pelos terreiros de candomblé, como forma de reverenciar o poder dos antepassados africanos. Essas vestes ritualísticas romperam as fronteiras do sagrado, partindo para o

ambiente comercial, estando presentes em restaurantes, pontos turísticos e centros históricos, como forma de atrativo e reafirmação da identidade cultural.

A Assobeco também promove o “Comunidade Cidadã”, com atendimento médico, assistência jurídica, reforço escolar, alfabetização de adultos, alfabetização digital e empréstimo de livros. Ainda para 2010, a associação tem novas propostas. “Vamos inaugurar o CDC (Comunidade Digital Cidadã) e disponibilizar a biblioteca ao público”, diz Laércio.                                         Saiba mais: terreirodejaua.wordpress.com/projetos

Terreiro de Jauá sedia atividades da

Assobeco

Mata existente na área é fonte

de recursos para oficinas

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quem conta um conto identidade

Poesia por Mônica Bispo

Sou mulher e sou negra Mas me chamavam de jambo, chocolate, mulata, parda Que nada! Eu sou negona, Tiraram isso de mim pelo fato d’eu ter tido dona Resquícios da escravidão que massacrou meus irmãos Agora que assumi vi que a liberdade não tem idade É assim que me sinto, livre, Após assumir a minha verdadeira identidade negra Mônica Bispo, muito prazer Sou de Jauá, Camaçari, onde nasci e cresci, Mas muito sofri para chegar aqui Sendo mulher, negra e pobre tive sempre que gritar: Me respeitem, sou um ser humano! Quero apenas batalhar pelo meu lugar Mas isso não me fez lamentar, diminuir ou inferiorizar Muito pelo contrário, me fez lutar Se você tem um ideal, a vitória é real!

A Rua da PazPor Maria dos Santos de Freitas

A Rua da Paz chamava-se Rua de Trás. Quando eu era menina, meu pai contou que aqui passava um cavaleiro, sempre à meia-noite, arrastando latas até uma cancela que tinha perto de uma ponte. Eu mesma vi, certa noite, as latas arrastarem.

jauaJaua’’

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Lá vem História

A Aldeia do Divino Espírito Santo, fundada em 1558 pelos jesuítas nas margens do Rio Joanes, é um dos primeiros marcos referenciais da história de Camaçari, cidade cujo nome de origem tupi-guarani (Camassary) significa “árvore que chora”. A aldeia sediava a missão dos jesuítas de catequizar os índios tupinambás, através da Companhia de Jesus.

Foi somente em 28 de setembro de 1758 que se deu a emancipação da cidade, através do decreto do Marquês de Pombal que alterava o nome do povoado para Vila de Nova Abrantes do Espírito Santo. O marquês também expulsou os jesuítas daquelas terras, que, em seguida, passaram a ser chamadas de Vila de Abrantes.

Antes de ser denominado Camaçari, em 1938, o município teve outros nomes, a exemplo de Montenegro, pela influência política de um dos herdeiros de suas terras, o desembargador Tomaz Garcez Paranhos Montenegro.

Até o final dos anos 60, a economia de Camaçari girava em torno da pecuária e da agricultura de subsistência. Na década de 70, no entanto, o início da implantação do maior complexo industrial integrado do Hemisfério Sul muda sensivelmente a economia. A partir daí, Camaçari passa a ter um novo perfil econômico, garantindo à indústria o papel de protagonista.

Força religiosaA religiosidade de Camaçari é secular e remonta ao povoamento original. Possui influências culturais dos antigos donos da terra, os índios, com seus cultos aos antepassados e à natureza; do catolicismo, desde a chegada dos primeiros jesuítas com os colonizadores portugueses e da matriz africana, trazida pelos negros vindos de diversas partes da África.

Em 1558, com a chegada dos primeiros jesuítas em Vila de Abrantes, inicia-se o processo de catequese dos índios. Vale ressaltar que os Tupinambás, primeiros

Aldeia guarda primeiros registroshabitantes do lugar, já cultuavam seus antepassados e a natureza. O catolicismo é a religião ainda hegemônica e que demonstra mais influência nas manifestações do município, devido à sua participação na vida da população camaçariense desde o período colonial. Isso também acontece devido ao forte processo de conversão de índios e negros escravizados, promovido pela Igreja.

Em Camaçari, além das comemorações no Natal e no São João, comemora-se o Divino Espírito Santo, sob a evocação da qual foi iniciada a colonização da orla; São Francisco de Assis, assumido como padroeiro pelos pescadores; Maria, mãe de Jesus, sob as denominações de Nossa Senhora da Conceição, Nossa Senhora do Parto, Nossa Senhora de Fátima, Nossa Senhora de Boa Viagem; Senhora Santana, Mãe de Maria; e, ainda, São Bento, São Sebastião e São Thomaz da Cantuária, sendo este último o padroeiro da cidade.

jauaJaua’’

Fonte: Câmara Municipal de Camaçari (calendário 2006).

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AçãoGovernamental

É elemento norteador da política pública de Camaçari, desde 2005, o cuidado com as pessoas e com os patrimônios públicos, culturais e naturais de cada lugar. Em Jauá, assim como ocorreu nas diversas outras localidades do município, as melhorias para a qualidade de vida chegaram e priorizam os aspectos do desenvolvimento social, como a educação, a segurança e a prática esportiva.

O Centro Educacional Tancredo Neves, por exemplo, foi reformado, o que possibilitou a ampliação da capacidade de atendimentos para, praticamente, o dobro de alunos. A nova unidade segue o padrão de qualidade estabelecido pela política municipal de educação, baseado em sete eixos: educação

inclusiva, informática, robótica, educação ambiental, arte-educação, ciências experimentais e esporte.

Também passou por reforma o Posto da Polícia Militar, que recebeu novo telhado, pintura, locação de antenas, instalação de grades de proteção, jardinagem e sinalização. Segundo os próprios moradores do local, a readequação do espaço é garantia de maior bem-estar para a comunidade e turistas que visitam o local durante o ano inteiro, ao oferecer melhores condições de trabalho aos policiais.

Ainda no aspecto da revitalização de equipamentos, para torná-los mais acessíveis e aptos para a realização das atividades, foi recuperado o campo de futebol de Jauá, com o propósito

principal de fomentar o lazer e a integração comunitária.

A orla de Camaçari, justamente pelo princípio de fortalecer a sua inclusão às ações do governo e incentivar a relação de pertencimento da sua população à esfera municipal, tem uma gestão especial para o encaminhamento e providências das suas demandas, principalmente as mais emergenciais. Trata-se da Coordenação da Orla de Camaçari, responsável, dentre outros resultados, pela reforma das Agências de Correios, onde se inclui a da localidade de Jauá.

Em Camaçari é assim: onde estão as pessoas, estão as práticas para tornar melhores a vida e a relação com o meio.

Cuidar de toda gente e de cada lugarObras para a melhoria da

qualidade de vida

jauaJaua’’

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dicas Culturais

A Lavagem de Jauá ocorre na última semana do mês de janeiro, período mais festivo do local. O evento corresponde à festa do padroeiro de Jauá, Bom Jesus dos Navegantes. Uma mistura de fé e devoção, que reúne milhares de pessoas durante o final de semana. Além da procissão, há também uma festa popular de rua com trios elétricos, carro pipa e presença de bandas locais.

A parte religiosa começa com o tradicional cortejo, que sai de Gajirus e vai até a igreja, no Largo do Papagaio. No percurso de cerca de cinco quilômetros, mais de 80 baianas se misturam a músicos e cavaleiros, num verdadeiro cortejo cultural. Às 15h, tem início a festa profana com grupos musicais, no palco montado próximo ao largo. Os shows prosseguem sábado e domingo com apresentações de artistas locais. As festividades terminam segunda-feira, com o Baile dos Coroas, às 20h, na praça principal.

São Miguel ArcanjoA Lavagem de Pé de Areias acontece todos os anos na última semana de setembro e tem como padroeiro São Miguel Arcanjo. As homenagens ao padroeiro incluem missa, procissão e muita música.

A comemoração integra o calendário de festas populares de Camaçari e começa com o cortejo das baianas que sai da entrada de Jauá e vai até a Rua Direta de Pé de Areias. No sábado, bandas se apresentam na sede da Associação dos Moradores. Domingo, a festa continua. Para quem aprecia uma boa seresta, a programação de segunda-feira conta com o tradicional Baile dos Coroas, também no espaço da Associação dos Moradores. Na terça-feira, há uma procissão pelas ruas. À noite, às 19h, há missa solene em homenagem ao padroeiro. Construída há 80 anos por padres católicos alemães e pela comunidade local, a Igreja de São Miguel Arcanjo pertence à Paróquia de Vila de Abrantes.

Bom Jesus dos Navegantes

Baianas prontas para o cortejo

que vai de Gajirus até a igreja

Artistas locais participam da

Lavagem de Jauá

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Alunos apresentam trabalhos das

oficinas no Teatro da Cidade do Saber

jauaJaua’’ PainelCriativo

Talentos de Pé de Areias

O segundo ciclo de atividades do Ponto Móvel Cidade do Saber, entre novembro de 2009 e fevereiro de 2010, também contemplou a comunidade de Pé de Areias, em Jauá, levando à população cultura, arte, entretenimento e esporte.

A programação foi desenvolvida na Associação Comunitária e incluiu oficinas de criação literária, futebol, patchwork (arte em retalhos) e percussão. Além disso, no caminhão baú adaptado, que serve de apoio ao projeto, estavam disponíveis uma mini lan house, brinquedoteca e biblioteca.

Integrantes das atividades educativas e familiares participaram, em março de 2010, do encerramento deste período de trocas de conhecimentos e aprendizados entre educadores e educandos. No Teatro Cidade do Saber foram realizadas exposições

e apresentações artísticas, resultado do que foi desenvolvido em três meses de atuação do projeto em Pé de Areias e em outras três comunidades da orla camaçariense (Buris de Abrantes, Cordoaria e Fonte das Águas).

Outra iniciativa da Cidade do Saber, o Palco da Cidade também mudou a rotina dos moradores de Pé de Areias, que contou com representantes neste festival de talentos. Foi a banda Inimigos Públicos que se apresentou na seletiva realizada na sede de Camaçari. Elimar Pinheiro, um dos músicos do grupo, deixa o seu depoimento sobre a participação: “Adoramos a iniciativa! Foi uma ótima oportunidade de mostrar o nosso trabalho, de divulgar a nossa arte, nossas composições. Esperamos que este trabalho continue para dar visibilidade a outros artistas que não têm oportunidade de se apresentar”.

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jauaJaua’’ Lazer ExpedienteCidAdE dO SABER

diretora geral: Ana Lúcia Silveiradiretor de infraestrutura: Utilan Coroadiretor do saber: Arnoldo Valentediretora do teatro: Osvalda Moura

COORdENAÇÃO dO PROJETO REViSTA PONTO MÓVEL CidAdE dO SABER Assessoria de Comunicação da Cidade do Saber (Ascom) Responsável: Carolina DantasPesquisa: Bárbara FalcónTextos: Carolina Dantas e Bárbara FalcónFotos Ascom: Daniel Quirino, Clemente Júnior e Elba CoelhoEquipe Ascom: Carolina Dantas, Bárbara Falcón, Clemente Júnior, Daniel Quirino, Elba Coelho, Bruno Macedo e Camila Mandarino

REALiZAÇÃO

AG Editora diretora executiva: Ana Lúcia MartinsExecutiva de Projetos: Júlia SpínolaEdição: Ana Cristina BarretoFotos: Paulo MacedoRevisão: José EgídioEndereço: Rua Coronel Almerindo Rehem, 82, sala 1207, Ed. Bahia Executive Center, Caminho das Árvores. CEP 41.820-768 - Salvador-BA Tel: (71) 3014-4999

Projeto gráfico: Metta ComunicaçãoEditoração: João Soaresilustrações e arte: Jean Ribeiro e Pablo Antonio

Tiragem: 2.000 exemplares - distribuição gratuita

Agradecimento: ASCOM - Prefeitura Municipal de CamaçariFotos: Agnaldo Silva e Carol Garcia

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Parceiros Cidade do Saber: Mantenedor:

Executor do Projeto

e s p e c i a l

Jauá