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REVISTA NEUROCIÊNCIAS U NIVERSIDADE F EDERAL DE S ÃO P AULO DISCIPLINA DE NEUROLOGIA ESCOLA PAULISTA DE MEDICINA JUNTA EDITORIAL EDITOR EXECUTIVO JOSÉ OSMAR CARDEAL EDITORES ASSOCIADOS ALBERTO ALAIN GABBAI ESPER ABRÃO CAVALHEIRO FERNANDO MENEZES BRAGA CONSELHO EDITORIAL ACARY DE SOUZA BULLE DE OLIVEIRA CARLOS JOSÉ REIS DE CAMPOS DELRIO FAÇANHA DA SILVA GILBERTO MASTROCOLA MANZANO HENRIQUE BALLALAI FERRAZ JOÃO ANTONIO MACIEL NÓBREGA JOÃO BAPTISTA DOS REIS FILHO LUIZ CELSO PEREIRA VILANOVA MARCIA MAIUMI FUKUJIMA PAULO HENRIQUE FERREIRA BERTOLUCCI SUSANMEIRE NEGRO MINATTI-HANUCH

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R E V I S T A

NEUROCIÊNCIAS

U N I V E R S I D A D E F E D E R A L D E S Ã O P A U L O

D I S C I P L I N A D E N E U R O L O G I A

E S C O L A P A U L I S T A D E M E D I C I N A

JUNTA EDITORIAL

EDITOR EXECUTIVO

JOSÉ OSMAR CARDEAL

EDITORES ASSOCIADOS

ALBERTO ALAIN GABBAIESPER ABRÃO CAVALHEIRO

FERNANDO MENEZES BRAGA

CONSELHO EDITORIAL

ACARY DE SOUZA BULLE DE OLIVEIRACARLOS JOSÉ REIS DE CAMPOS

DELRIO FAÇANHA DA SILVAGILBERTO MASTROCOLA MANZANO

HENRIQUE BALLALAI FERRAZJOÃO ANTONIO MACIEL NÓBREGA

JOÃO BAPTISTA DOS REIS FILHOLUIZ CELSO PEREIRA VILANOVA

MARCIA MAIUMI FUKUJIMAPAULO HENRIQUE FERREIRA BERTOLUCCI

SUSANMEIRE NEGRO MINATTI-HANUCH

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EXPEDIENTE

REVISTA NEUROCIÊNCIASDisciplina de Neurologia – Escola Paulista de Medicina

Universidade Federal de São Paulo

VOLUME VI – NÚMERO 3 – SET/DEZ 1998

Produção Editorial:LEMOS EDITORIAL & GRÁFICOS LTDA.

Rua Rui Barbosa, 70 – Bela VistaCEP 01326-010 – São Paulo/SP

Telefax: (011) 251-4300e-mail: [email protected]

Diretor Executivo: Paulo LemosDiretor Comercial: Idelcio D. Patrício

Gerente-geral: Silvana De AngeloGerentes de Negócio: Exalta de Camargo Dias, Jefferson Motta Mendes e Jorge Rangel

Produção Editorial: Danielle Biancardini e Miriam AloiaEditoração Eletrônica: Fabiana Fernandes

Revisão: Lúcia T.T. Iwassaki, Claudia Blanco Padovani e Nilma GuimarãesCoordenadora Depto. Comercial: Elieuza P. Campos

Atendimento às Agências de Publicidade: Valéria SilvaRepresentante no Rio de Janeiro: Roberto Amoêdo

Periodicidade: Quadrimestral

Toda correspondência relacionada ao Editorial, bem como textos para publicaçãodevem ser encaminhados aos cuidados do Conselho Editorial para:

REVISTA NEUROCIÊNCIAS

Disciplina de Neurologia – Escola Paulista de MedicinaUniversidade Federal de São Paulo

ISSN 0104-3579

Rua Botucatu, 740 – CEP 04023-900 – São Paulo / SPe-mail: [email protected]

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ÍNDICE

Rev. Neurociências 6(3): 103, 1998

EDITORIAL 105

ARTIGOSAspectos Neurológicos do Desenvolvimento doComportamento da Criança 106LUIZ CELSO PEREIRA VILANOVA

Múltipla Deficiência e Baixa Visão 111MARIA INÊS R. S. NOBRE, HELOISA G. R. G. GAGLIARDO, K. MONTEIRO DE CARVALHO,MARILDA B. S. BOTEGA & PAULO R. SAMPAIO

Esclerose Múltipla 114ENEDINA MARIA LOBATO DE OLIVEIRA & NILTON AMORIM DE SOUZA

Exame Neuropsicológico no Diagnóstico Diferencialdas Demências Primárias 119IVAN HIDEYO OKAMOTO & PAULO HENRIQUE FERREIRA BERTOLUCCI

Hidroterapia 126MÁRCIA CRISTINA BAUER CUNHA, RITA HELENA DUARTE DIAS LABRONICI,ACARY DE SOUZA BULLE OLIVEIRA & ALBERTO ALAIN GABBAI

Enxaqueca na Infância e na Adolescência 131DEUSVENIR DE SOUZA CARVALHO

Aspectos Gerais e Práticos do EEG 137DÉLRIO FAÇANHA DA SILVA & MÁRCIA MARQUES DE LIMA

RELATO DE CASOAcidente Vascular Cerebral Isquêmico: Relato de umCaso com Imagem Radiológica Atípica 147MARIO FERNANDO PRIETO PERES, ROBERTO GOMES NOGUEIRA,MÍRIAM VERA CHIRCIU, JOÃO NORBERTO STÁVALE & ALBERTO ALAIN GABBAI

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NORMAS PARA PUBLICAÇÕES

NORMAS PARA PUBLICAÇÕES Rev. Neurociências 6(3): 104, 1998

Título: em português e em inglês, sintético e restrito aoconteúdo, mas contendo informação suficiente paracatalogação.

Autor(es): referir nome(es) e sobrenome(s) do modocomo preferir para indexação, seu grau e posição.Referir a instituição em que foi feita a pesquisa que deuorigem ao artigo e referir o título maior de cada autor ougrupo de autores, ex.: * Professor Adjunto, ** Pós-graduando, *** Residente. Identificar o endereço paracorrespondência.

Resumo e Summary: devem permitir uma visãopanorâmica do trabalho contendo objetivos, métodos,resultados e conclusões. Nos artigos com casuística,não exceder 250 palavras. Nas comunicações brevesou relato de casos, não exceder 150 palavras.

Unitermos e key words: referir após o Resumo e oSummary, respectivamente.

Texto: apresentar a matéria do artigo seqüencialmente:introdução, material (casuística) e métodos, resultados,comentários (discussão e conclusões), referênciasbibliográficas, eventualmente agradecimentos, suportefinanceiro. Não repetir no texto dados que constem detabelas e ilustrações, bem como de suas legendas. Otexto deverá ser redigido em espaço duplo; a cada iníciode parágrafo, dar 5 espaços. Numerar as páginas noalto e à direita.

Tabelas: até cinco, apresentadas em páginas sepa-radas. Não separar com linhas horizontais ou verticaisos dados que contêm. De cada uma, devem constar seunúmero de ordem, título e legenda.

Ilustrações: até duas figuras (gráficos ou fotos), comtamanho não superior a 6 cm x 9 cm cada. Gráficosdevem ser encaminhados, de preferência suas fotos.Fotos em preto e branco bem contrastadas; eventuaisdetalhes com setas, números ou letras. Identificar cadailustração com seu número de ordem, nome do autor e

do artigo, com etiqueta colada no verso e nela marcadana parte superior. Não grampear, nem colar as ilustra-ções, embalar cada uma em separado. Encaminhar emseparado as respectivas legendas. Ilustrações repro-duzidas de textos já publicados devem ser acom-panhadas de autorização de reprodução, tanto do autorcomo da publicadora. Ilustrações em cores podem serpublicadas; dado seu custo elevado, a despesa será deresponsabilidade dos autores, assim como o custo pornúmero de tabelas e ilustrações acima dos mencionadose desde que sua publicação seja autorizada pela editora.As fotos não serão devolvidas aos autores. Manter osnegativos destas.

Referências: até cerca de 30, restritas à bibliografiaessencial ao conteúdo do texto. Numerar conse-cutivamente as referências na ordem de ocorrência notexto. O padrão de disposição das referências segueas normas do Index Medicus.

Artigos: Autor(es) — Título. Periódico, volume: páginainicial — página final, ano.

Livros: Autor(es) ou editor(es), título, edição, se nãofor a primeira; se for o caso, tradutor(es). Cidade,publicadora, ano, páginas inicial e final.

Capítulos de livros: Autor(es), título, demais dadossobre o livro como no item anterior.

Resumos: Autor(es), título, publicadora, ano, páginasinicial e final e, entre parênteses “abstr”.

Tese: Autor, título, cidade, ano, páginas inicial e final,nível (mestrado, doutorado, ...), instituição.

Endereçar os trabalhos a:

Prof. Dr. José Osmar CardealRua Borges Lagoa, 873 — Cj 11CEP 04038-031 — São Pauloe-mail: [email protected]

A Revista Neurociências é voltada à Neurologia e às ciências afins. Publica artigos de interesse científico etecnológico, feitos por profissionais dessas áreas, resultantes de estudos clínicos ou com ênfase em temas decunho prático. Os artigos devem ser inéditos e fica subentendido que serão publicados exclusivamente nestarevista, com o que se comprometem seus autores. A Junta Editorial da revista reserva-se o direito de avaliar,aceitar ou recusar artigos. Quando aceitos, sugerir modificações para aprimorar seu conteúdo, se necessárioaperfeiçoar a estrutura, a redação e a clareza do texto. São aceitos artigos em português e inglês. Para publicação,será observada a ordem cronológica de aceitação dos artigos. Provas tipográficas serão fornecidas em casosespeciais. Poderão ser oferecidas separatas dos artigos, responsabilizando-se os autores pela despesa de suatiragem. Os artigos são de responsabilidade de seus autores. Para avaliação, devem ser encaminhados aoEditor Executivo em disquete e poderão ser utilizados editores de texto “Word” para “Windows 95”, fonte TimesNew Roman, tamanho 12 e espaço duplo; alternativamente no formato “texto.txt”. Deverá também ser enviadauma cópia do texto original conforme digitado. Adotar as recomendações abaixo.

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EDITORIAL

EDITORIAL Rev. Neurociências 6(3): 105, 1998

s indiscutíveis avanços que vem sofrendo a avaliação neuropediátrica, tanto a nascidade termo como a de pré-termo decorrem, em grande parte, da melhor compreensão sobre ocomportamento das crianças. O artigo “Aspectos neurológicos do desenvolvimento docomportamento da criança”, escrito pelo professor Vilanova, possibilita-nos inteirar sobre essesnovos conhecimentos à luz da prática clínica diária.

A eficácia do tratamento de pacientes portadores de múltiplas deficiências depende, emgrande parte, da obtenção de um diagnóstico preciso. Na criança, o momento do diagnóstico éde fundamental importância, pois o diagnóstico tardio pode significar dificuldades adicionais àreabilitação, como estabelecido nos estudos de Nobre e colaboradores em “Múltipla deficiênciae baixa visão”.

Pacientes com esclerose múltipla continuam apresentando grandes dificuldades,particularmente diagnósticas e de tratamento. Na medida em que os conhecimentos sobre a suaimunopatologia avançam, novas perspectivas terapêuticas se abrem. Nesse sentido, o artigo“Esclerose múltipla” dos autores Oliveira e Souza mostra-nos essa entidade contemplada pelosseus vários aspectos, como vista atualmente.

O diagnóstico das demências primárias ainda apresenta grandes desafios, em que pesemos progressos conseguidos em outras áreas, principalmente com os recursos da tomografiacomputadorizada e da ressonância nuclear magnética. Para as demências a avaliaçãoneuropsicológica presta relevantes contribuições no diagnóstico diferencial. Para conferir essesaspectos basta o leitor apreciar as informações contidas no artigo dos autores Okamoto eBertolucci.

Desde 1987, pacientes com limitações físicas decorrentes de afecções neuromuscularescontam com um método alternativo para tratamento, a hidroterapia na Escola Paulista de Medicina– UNIFESP. Cunha e colaboradores apresentam-nos os métodos modernos aplicados a essespacientes, além de nos brindarem com precioso histórico evolutivo sobre a hidroterapia até osdias atuais.

É relativamente comum observar que crianças e adolescentes portadores de enxaquecatenham seu problema neurológico não adequadamente equacionado, ora com investigações etratamentos desnecessários, ora colocadas em lugar comum como portadoras de “problemapsicológico”. Para atualização, em termos de diagnóstico e de tratamento, o professor Deusvenirapresenta-nos seu artigo enfocando exatamente esses aspectos.

O desenvolvimento dos métodos diagnósticos por imagem foi tão exuberante que osneurofisiológicos parecem ter sido colocados em segundo plano. No entanto, o eletrencefalograma(EEG) também evoluiu, incorporando técnicas digitais (EEG digital, EEG com mapeamento), econtinua sendo insubstituível em muitas condições clínicas. O artigo “Aspectos gerais e práticosdo EEG”, dos autores Silva e Lima, nos proporciona preciosos conhecimentos de natureza práticapara a boa leitura e interpretação do EEG.

Uma das principais contribuições que a tomografia computadorizada trouxe para o setordas doenças neurovasculares foi, sem dúvida, possibilitar o diagnóstico mais preciso e fazerdiagnóstico diferencial com outras patologias, particularmente com tumores cerebrais. O casorelatado por Peres e colaboradores mostra que a etapa diagnóstica ainda não está totalmenteresolvida e nos apresenta um caso como correlação anatomopatológica sobre acidente vascularcerebral com imagem atípica, sugerindo tumor cerebral.

José Osmar Cardeal

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ARTIGO

* Prof. Adjunto, Chefe do Setor de NeurologiaInfantil da Disciplina de Neurologia daEscola Paulista de Medicina – UNIFESP.

RESUMOO autor faz uma análise do desenvolvimento docomportamento da criança, procurando integrarconhecimentos de natureza teórica com a práticaclínica.

UNITERMOSDesenvolvimento, comportamento da criança.

VILANOVA, L.C.P. – Aspectos Neurológicos do Desenvolvimento do Comportamento da Criança Rev. Neurociências 6(3): 106-110, 1998

Aspectos Neurológicos doDesenvolvimento doComportamento da CriançaLuiz Celso Pereira Vilanova*

O desenvolvimento do comportamento da criança tem sido motivo devárias publicações nas últimas décadas, tanto da criança nascida a termocomo da pré-termo. Em 1923, foi criada uma comissão destinada a coordenare estimular as investigações no campo do desenvolvimento infantil,patrocinada pelo National Research Council.

Em 1925, o Dr. Arnould Gessel e a Dra. Catherine S. Amatruda iniciaramuma série de publicações sobre o desenvolvimento do comportamento infantil,cujo conteúdo, ainda nos dias atuais, constitui um alicerce do conhecimentonessa área1. Esses trabalhos, com características normativas e descritivas,mostraram o comportamento infantil encontrado em 50% das crianças, sem,contudo, uma análise qualitativa ou do que é patológico ou simplesmentevariação da normalidade.

Em 1931, Shirley estudou, longitudinalmente, 25 crianças (MinnesotaInfant Study) caracterizando os comportamentos, principalmente delocomoção e da função visuo-motora, que foram observados em 25%, 50% e75% das crianças2.

Em 1948, Jean Piaget publicou suas pesquisas teóricas no campo dodesenvolvimento da cognição infantil3,4.

Em 1950, Lèfevre, em nosso meio, ao padronizar o exame neurológicodo recém-nascido a termo, caracterizou o comportamento e as reações dosneonatos normais5.

Posteriormente, Andrè Tomas e seus discípulos descreveram, compa-rativamente, o padrão neurológico do recém-nascido a termo e a pré-termo6.

No final da década de 70 e principalmente no início da década de 80, ostrabalhos sobre o desenvolvimento do recém-nascido a pré-termo, espe-cialmente os de muito baixo peso, passaram a ser realizados por equipesmultidisciplinares.

Desse modo, o enfoque, inicialmente mais dirigido a aspectos psico-neurológicos, foi deslocado para aspectos mais abrangentes, envolvendoavaliações multidisciplinares. Pôde-se, então, delinear melhor o compor-tamento do recém-nascido a termo e a pré-termo, bem como do lactente esuas reações perante a estímulos de diversas naturezas. Assim, a integração

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intersensorial tem sido melhor avaliada, eviden-ciando-se que a auditivo-visual e a auditivo-motora jáestão presentes ao nascimento7,8,9.

Assim, tem sido documentado que o recém-nascidonormal apresenta resposta de orientação ao som, voltandoa cabeça lentamente em direção à fonte sonora, desde que,em condições ideais de teste (estado de alerta, posiçãofacilitadora e estímulo acústico de longa duração)7,8,9,10,11.A resposta de orientação ao som, de controle subcortical,tem sido observada de 50% a 100% dos neonatos nosprimeiros dias de vida, com decréscimo da sua ocorrênciaaos dois meses e reaparecimento com uma resposta maiselaborada, de localização aos quatro meses12,13. De um lado,tal resposta pode ser considerada como um automatismoinato que se modifica com a maturação do sistema nervosocentral (SNC). Por outro, ainda utilizando-se estímulosauditivos, Hammond11, num estudo com 31 neonatosverificou que, especialmente quando alerta, a criança entre5 e 8 dias após o nascimento e previamente estimuladapela voz materna é capaz de reagir de modo diferente aela.

De Casper & Fifer14 demonstraram, em experimentorealizado correlacionando registro de mudanças de sucçãoe presença de voz materna, que o recém-nascido, ainda noberçário, onde tem pouco contato com a mãe, já discriminae prefere a voz materna. Esses experimentos, mostrandoque a criança é capaz de reagir de modo diferente à vozmaterna em relação a outro tipo de voz, podem indicaruma capacidade de comportamento aprendido preco-cemente. Essa análise mais global do desenvolvimento dascrianças tem acarretado inclusive a necessidade de umarevisão da terminologia até então empregada, levando-seem conta os novos conceitos e conhecimentos determinadospor essas pesquisas. Termos como reflexo, reflexo arcaico,reflexo primitivo, reação e automatismo têm sidoempregados pelos neurologistas, muitas vezes comosinônimos, gerando dificuldade inclusive na compreensãodesses fenômenos pela equipe multidisciplinar que atendeao lactente, especialmente aos patológicos.

A medula espinhal, com seus circuitos neuronaiscontrola a maioria dos reflexos, sendo as primeirasdescrições feitas no início do século por Sherrington,possibilitando a ativação e inibição integrada emdiferentes grupos musculares. Assim, a percussão comum martelo sobre um tendão provoca a distensão dosfusos musculares excitando as terminações nervosaslocalizadas na fibra intrafusal. Desse modo, um estímulonervoso é gerado e, pela via aferente, estabelece sinapsecom o centro de associação medular, em que seráelaborado um potencial de ação como resposta. As salvasde potenciais de ação produzidas irão ativar osmotoneurônios do corno anterior da medula corres-

pondentes àquele músculo estirado, com conseqüentecontração dos músculos agonistas e relaxamento dosantagonistas, determinando uma resposta que é ummovimento. Esse padrão de resposta mais primitivo, oprimeiro a surgir na vida intra-uterina, com seu substratoanatomofisiológico bem-definido, pode também serorganizado por estruturas do tronco encefálico, como oreflexo estapediano, o reflexo fotomotor ou o pupilar.Todos esses reflexos podem ser obtidos nos recém-nascidos normais, variando apenas de um grupomuscular para outro o seu tempo de latência, devido àvariação do comprimento do arco reflexo.

Padrões comportamentais mais complexos, muitasvezes denominados de reflexos arcaicos ou primitivos,são na realidade comportamentos automáticos inatosclaramente desencadeados por determinada incitação.Desse modo, a reação tônica cervical assimétrica(RTCA) deve ser considerada uma reação posturaldesencadeada pela rotação do segmento cefálico,alternando a distribuição do tônus corporal flexor eextensor determinando a postura do esgrimista. Essepadrão de organização de resposta necessita daintegração entre centros motores medulares e do troncocerebral15.

Do mesmo modo, a reação de Moro, a reação doendireitamento, a marcha inata, a sucção, a preensãopalmar, a reação de voracidade ou dos pontos cardeaissão padrões motores automáticos inatos, determinadosgeneticamente e característicos da espécie, que estarãopresentes em todas as crianças normais. Entretanto, emsituações clínicas é possível que esses automatismospossam não ser observados, especialmente se não forempesquisados nos estados ideais do sistema nervosocentral, principalmente com a criança em vigília e semchoro e fora da fase do choque do nascimento, que podedurar até 48 horas após o nascimento. Esses padrõesprimitivos de reação comportamental desaparecerão deestruturas mais recentes do SNC, do ponto de vistaevolutivo, especialmente as do sistema extrapiramidallocalizadas em região subcortical. Desse modo, a per-manência da reação tônica cervical assimétrica além dos3 meses ou da preensão palmar exagerada após os 6meses é mais comum acontecer na encefalopatiahiperbilirrubínica do que no comprometimento motorde padrão espástico, o que comprova serem essesfenômenos controlados pelo sistema extrapiramidal16.

Assim, padrões mais primitivos darão lugar aautomatismos adquiridos relacionados com postura elocomoção, isto é, padrões táxicos que também sãodeterminados biologicamente e que são característicosde cada espécie. Dessa forma é o desenvolvimento dotônus postural: inicialmente o tônus cervical, que

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permitirá à criança o sustento da cabeça aos 3 meses;posteriormente o do tronco, que permitirá que ela semantenha sentada com apoio aos 6 meses e sem apoiomanual aos 9 meses, e finalmente possa se manter empé apoiada aos 11 meses, determinando um desenvol-vimento do tônus em direção cefalocaudal.

Tanto a inibição de automatismos inatos como osurgimento dos automatismos adquiridos seguem umacronologia determinada pelo relógio biológico e umatraso em uma das etapas poderá ser prejudicial para odesenvolvimento global da criança, já que estas estãointer-relacionadas. Desse modo, a reação tônica cervicalassimétrica determinando a extensão do braço ipsilateralà face e flexão do contralateral contribui tanto para ummelhor contato físico da criança ao mamar no seiomaterno como para uma exploração visual do que acriança segura. A sua não-inibição, após os 3 meses deidade, irá impedir que a criança, ao segurar um objeto,possa olhá-lo e levá-lo à boca, já que o braço ipsilateralao rosto será mantido com tônus extensor. Além deprejudicar a exploração do mundo, que é feitainicialmente de modo oral, irá também impedir que acriança desenvolva sua postura sentada, já que em suafase inicial ela irá necessitar se apoiar com as mãos àfrente.

O nível superior do controle motor é realizado porestruturas corticais e subcorticais, com destaque o córtexmotor primário, a área pré-motora e as áreas motorassuplementares. Esse conjunto de estruturas enviaráinfluências para os neurônios da medula espinhal e parao tronco cerebral, permitindo a coordenação e seqüen-cialização de movimentos automáticos mais complexose que serão adquiridos no transcorrer da vida da criança,por um processo de aprendizagem. Esse conjunto deestruturas não está totalmente pronto ao nascimento, masà medida que apresenta uma maturação mais adequada,passa a inibir padrões mais primitivos que eramorganizados por níveis hierarquicamente inferiores.Desse modo, a criança desenvolverá suas habilidadesou comportamentos aprendidos, isto é, atos práxicos,dos mais elementares (praxia motora) aos maiscomplexos (praxias ideomotoras e ideatórias). Entre-tanto, diferente das outras etapas do desenvolvimento,essa etapa depende não apenas do componentebiológico, mas das vivências e experiências da criança.

Assim, o componente biológico irá sofrer umamodulação pelos estímulos externos ou pelo circuns-tancial, as células cerebrais poderão sofrer modificações,diminuindo ou aumentando o número de conexões comas células subjacentes. Apesar de o indivíduo nascer como número total e definitivo de células do SNC, a maiorparte das sinapses neocorticais irá acontecer após o

nascimento. Esse processo de formação de sinapses(sinaptogênese) e o de mielinização dependem nãosomente de um componente biológico, mas também deestímulos externos. A modulação cerebral pela expe-riência, um tipo particular do fenômeno mais amplo daplasticidade cerebral, é responsável por processos maisbásicos como o de adaptação e mais complexos, comoo da aprendizagem. Assim, é fácil entendermos que,apesar de a criança normal, nos primeiros meses de vida,apresentar um desenvolvimento neurológico regidobasicamente por um programa biológico, com poucainterferência dos estímulos externos, esses estímulosserão fundamentais nessa ocasião para realizar umprocesso silencioso naquele momento de modulaçãocerebral.

Assim, para uma criança poder ter todo seu potencialpara os processos de aprendizagem, é necessário efundamental que ela, já desde as primeiras semanas,possa ter experiências adequadas somestésicas, comoser tocada, sensoriais pelos estímulos visuais, auditivose olfativos, e motoras, realizando movimentos, manipu-lando objetos e, também, interagindo com adultos, parapoder ir ajustando o controle postural e de tônus e,posteriormente, ao desenvolver maior número depossibilidades sinápticas, possa ter memória e apren-dizagem mais eficientes.

Contudo, é fundamental reconhecermos a impor-tância da possibilidade de modulação cerebral pelaexperiência, especialmente no seguimento de lactentesnascidos a pré-termo.

Desse modo, nesse seguimento, se nos basearmos nocomportamento esperado para criança nascida a termo,fazendo a compensação matemática para os prematurosdenominada de idade corrigida, teremos em muitoscomportamentos, especialmente naqueles mais sensíveisà modulação cerebral pela experiência (como oscomportamentos relacionados aos estímulos auditivos),a curiosa e perigosa sensação de constatarmos que osprematuros amadurecem mais cedo que as crianças atermo. Isso acaba acarretando uma impossibilidade deidentificarmos precocemente, muitas vezes, uma criançaprematura com o desenvolvimento anormal, pois a idadecorrigida colocou-a junto com a criança nascida a termo,fato esse também observado por Miller et al.17.

De fato, temos verificado que a curva de desen-volvimento da criança prematura normal tende a serigual a da criança de termo em épocas diferentesdependendo da função analisada. Assim teríamos pri-meiramente o comportamento a estímulos auditivos seequiparando entre 9 e 12 meses, o motor aos 15 meses eo de linguagem posteriormente. Por esse motivo, para otrabalho multidisciplinar do desenvolvimento da criança

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na Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP –EPM), não temos adotado a idade corrigida como válidapara esse seguimento. Assim acreditamos ser necessárioestabelecermos a curva do desenvolvimento da criançaprematura, que será diferente para cada faixa deprematuridade.

Um outro aspecto importante nesse seguimento é,além de observar o comportamento espontâneo e as

padrão táxico pode ser normal para faixa etária, mascom grave alteração nos comportamentos que envolvema interação e a comunicação com outro.

Crianças prematuras, especialmente com prema-turidade extrema (idade gestacional inferior a 30semanas), têm sido consideradas como crianças derisco, por possuírem uma situação potencial paraapresentarem um distúrbio neurológico ocasionadopor fatores biológicos ou ambientais18. Além disso,as condições clínicas quando adversas podem fav-orecer o aparecimento de distúrbios da maturaçãobiológica afetando o desenvolvimento global. Poressa razão, o acompanhamento do desenvolvimentodessas crianças tem um enfoque preventivo, em quea criança que apresenta um desvio do padrão esperadodeve ser identificada precocemente para sua famíliaser orientada.

SUMMARYNeurological aspects of the child’s development and behaviorThe author makes an analysis of the development of the child’s behavior,trying to integrate theoretical knowledge with clinical practice.

KEY WORDSDevelopment, child’s behavior.

Referências

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Zahar5. Lefèvre, A.F.B. Contribuição para a pradonização do exame

neurológico do recém-nascido normal. Tese Faculdade deMedicina da Universidade de São Paulo, 1950, S. Paulo.

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12. Pinto, E.B.; Vilanova, L.C.P. & Vieira, R.M. O desenvolvimentodo comportamento da criança no primeiro ano de vida. Casado Psicólogo, 1997. São Paulo.

13. Costa, S.A. Avaliação da resposta de movimentação dacabeça ao som, em crianças: evolução no primeiro semestre

FIGURA 1

FIGURA 2

reações aos estímulos de natureza diversa, avaliar asfunções que importam na interação sociocultural, seadequadas para o contato e a comunicação com outraspessoas, possibilitando o diagnóstico mais precoce dosdistúrbios pervasivos do desenvolvimento em que o

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VILANOVA, L.C.P. – Aspectos Neurológicos do Desenvolvimento do Comportamento da Criança Rev. Neurociências 6(3): 106-110, 1998

de vida. Tese de Doutorado Universidade Federal de SãoPaulo, 1998. São Paulo.

14. De Casper, A. & Fifer, W.P. Of human bonding: newborns prefertheir mother voice.Science, 208:1174-1176, 1980.

15. Barraquer, L.B. Neurologia Fundamenta.l 2ª ed. Toray, 1968,Barcelona.

16. Volpe, J.J. Neurology of Newborn. Saunder. 1987, Pliladelphia.17. Miller, G.; Dubowitz, L.M.S. & Palmer, P. Follow-up of pre-

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18. Wajnsztejn, R.; Vilanova, L.C.P. & Vieira, R.M.Desenvolvimento neurológico no segundo ano de vida de

crianças nascidas pré-termo e de baixo peso. In: Bassetto,M.C.A.; Brock, R. & Wajnsztejn, R. Neonatologia um conviteà atuação fonoaudiológica. Lovise, 1998.

Endereço para correspondência:Luiz Celso Pereira VilanovaUniversidade Federal de São PauloEscola Paulista de Medicina – Disciplina de NeurologiaRua Botucatu, 740 – Vila ClementinoCEP 04023-900 São Paulo (SP)E-mail: [email protected]

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ARTIGO

NOBRE, M.I.R.S.; GAGLIARDO, H.G.R.G.; CARVALHO, K.M.; BOTEGA, M.B.S. Rev. Neurociências 6(3): 111-113, 1998& SAMPAIO, P.R. – Múltipla Deficiência e Baixa Visão

* Mestre em Neurociências. Terapeuta Ocupa-cional – CEPRE-FCM-UNICAMP.

** Mestre em Neurociências. Terapeuta Ocu-pacional – CEPRE-FCM-UNICAMP.

*** Profa Dra. Médica Oftalmologista. Depar-tamento de Oftalmologia – FCM-UNICAMP.

**** Fonoaudióloga – CEPRE/FCM-UNICAMP.*****Médico Oftalmologista — Departamento de

Oftalmologia – FCM-UNICAMP.

RESUMOCrianças com múltipla deficiência apresentamcom freqüência deficiência visual associada.Geralmente, as crianças com quadro neurológicograve têm o quadro motor intensamente com-prometido, sendo esse priorizado em programasde habilitação infantil. Devido à dificuldade emse observar as respostas visuais nessas crian-ças, normalmente o possível diagnóstico oftal-mológico é tardio, comprometendo ainda maisseu desenvolvimento.Durante um período de 3 meses, em um serviçode visão subnormal, os autores encontraramuma freqüência de 50% de crianças com múltipladeficiência associada à deficiência visual.Verificou-se que a média de chegada dessascrianças ao serviço foi de 21 meses, sendotodas institucionalizadas.Conclui-se que o comprometimento neuromotorpode retardar o encaminhamento dessas crian-ças ao oftalmologista. As que apresentamresíduo visual podem ser privadas de esti-mulação adequada nos períodos sensíveis dedesenvolvimento da visão, podendo terprejudicado seu desenvolvimento visual e, emconseqüência, o desenvolvimento neuromotor.

UNITERMOSVisão subnormal, desenvolvimento neuromotor,múltipla deficiência.

Múltipla Deficiência e Baixa Visão

Maria Inês R.S. Nobre*Heloisa G.R.G. Gagliardo**K. Monteiro de Carvalho***Marilda B.S. Botega****Paulo R. Sampaio*****

INTRODUÇÃO

O nível de gravidade dos comprometimentos em crianças multideficientestem aumentado nos últimos anos, principalmente pelo alto índice deprematuros que sobrevivem graças ao progresso da medicina pré-natal eneonatal. O potencial dessas crianças era, em muitos casos, subestimado,ora pelas reais dificuldades e pela não-clareza dos diagnósticos, ora pelaescassez de terapeutas especializados nessa área. Hoje, muitos dessesproblemas foram superados, mas alguns ainda persistem.

Segundo a nomenclatura do Centro Técnico Nacional Francês, para aidentificação desse grupo de crianças “diferentes”, muitos termos têm sidoutilizados: crianças com deficiências associadas, multideficientes, pluri-deficientes, multincapacitados.

Zaldivar & Rubio1 definem como pessoas plurideficientes aquelas queapresentam simultaneamente uma combinação de deficiências sensoriais,psíquicas e/ou físicas. Para esses autores, falar de pessoas plurideficientesimplica algo mais que falar em uma ou mais deficiências. Os plurideficientessão indivíduos com uma combinação particular de déficits, que se inter-relacionam, estabelecendo determinadas limitações em cada pessoa.

Há uma grande dificuldade em se definir essas crianças. Segundo aOrganização Mundial da Saúde (OMS), a incapacidade é definida como todarestrição ou ausência da capacidade de realizar uma atividade na forma oudentro da margem que se considera normal para o ser humano.

Partimos do princípio de que crianças com múltipla deficiência apresentamuma ampla gama de necessidades e, dificilmente, uma única pessoa estaráapta a solucionar todas as necessidades dessas crianças. Sendo assim, elasdevem ser atendidas por uma equipe multidisciplinar.

Devido à complexidade na evolução dessas crianças, sugerimos avaliaçõesem intervalos pequenos.

A criança com múltipla deficiência, em geral, chega tardiamente ao serviçode estimulação visual; isso pode ser devido à gravidade neurológica dos casos,

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NOBRE, M.I.R.S.; GAGLIARDO, H.G.R.G.; CARVALHO, K.M.; BOTEGA, M.B.S. Rev. Neurociências 6(3): 111-113, 1998& SAMPAIO, P.R. – Múltipla Deficiência e Baixa Visão

dificuldade de acesso aos centros especializados,dificuldade para se definir o diagnóstico ou, ainda, poroutros motivos.

Essas crianças recebem intervenção prioritariamentena área motora. O desenvolvimento neuromotor podeestar atrasado se a terapia física não se iniciar preco-cemente. O atraso motor faz a criança atuar como tendouma idade menor e aumentar o risco de superproteção,o que é comum em famílias de deficientes.

A ausência de atividades devido à baixa estimulaçãovisual é um problema comum entre essas crianças. Issoleva, em muitos casos, a uma auto-estimulação carac-terizada, nos casos de deficiência visual, como manei-rismos. Esses comportamentos, socialmente, podem sermais incapacitantes que a própria deficiência visual.

Segundo Veitzman2, no cuidado com criançasdeficientes visuais, o diagnóstico precoce e o tratamentomédico adequado assumem primordial importância. Aausência total ou parcial da visão pode interferir nahabilidade motora, fundamental para o processo deindependência. Leal et al.3 referem que as experiênciasvisuais são as mais numerosas e minuciosas em relaçãoàs oferecidas pelos outros sentidos.

OBJETIVOS

Este trabalho tem o propósito de apresentar osresultados preliminares de um estudo e comentar ascaracterísticas do atendimento em intervenção precocea crianças com visão subnormal, em um hospitaluniversitário. Assim, verificar o número de crianças comdeficiência visual que chegam a um serviço de inter-venção precoce em visão subnormal e que apresentamoutras deficiências associadas; verificar a média de idadecom que essas crianças chegam ao serviço; levantar ascaracterísticas específicas da população de estudo.

CASUÍSTICA E MÉTODOS

A população-alvo foi constituída por crianças nafaixa etária de 0 a 3 anos, com diagnóstico de deficiênciavisual, moradoras em diferentes regiões do Brasil,atendidas em um serviço de estimulação em visãosubnormal. Compôs-se uma amostra de tamanho 18, nãoprobabilística, obtida segundo critério de viabilidade dacoleta de dados e de facilidade do acesso ao usuário.Utilizou-se um protocolo para avaliação do desenvol-vimento infantil e avaliação funcional da visão, adaptadode Knobloch & Pasamanick4 e Barraga5 e, avaliaçãooftalmológica de rotina.

Fizeram parte desse estudo, crianças atendidas numperíodo de 3 meses durante o ano de 1998. Não preten-deu-se, portanto, generalizar os resultados.

As avaliações foram aplicadas por uma equipemultidisciplinar, composta por terapeutas ocupacionais,fonoaudiólogo e médico oftalmologista, com duraçãomédia de quarenta minutos. Os pais ou responsáveisestiveram presentes durante a realização de todos osprocedimentos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Verificou-se que 9 (50%) dentre os 18 casos apre-sentaram outras deficiências, associadas à deficiênciavisual. Gagliardo et al.6 relatam que dentre os casosavaliados, 67,51% apresentaram associação de de-ficiência visual com outras deficiências.

Sobre esse mesmo aspecto, Hyvärinen7 relata que70% das crianças deficientes visuais possuem tambémoutras deficiências.

Devido à dificuldade em se observar as respostasvisuais nessas crianças, normalmente o possíveldiagnóstico oftalmológico é tardio, comprometendoainda mais seu desenvolvimento. Geralmente é difícilde se obter ou entender as respostas dadas pelas criançascom múltipla deficiência, principalmente aquelas comquadro neurológico associado. Nesses casos, a maioriados métodos convencionais apresenta resultadosduvidosos no que se refere à estimativa da acuidadevisual, devido aos comportamentos reflexos dessascrianças, que vão interferir nas respostas. Assim,Veitzman2 relata que é urgente a participação dosoftalmologistas em equipes multidisciplinares. Damesma forma, Hyvärinen8 sugere uma interação maiorentre médicos e outros membros da equipe, pois, a partirdessa interação, os médicos adquirem mais conhe-cimentos sobre o funcionamento da visão em criançascom múltipla deficiência.

Verificou-se que foi de 21 meses a média de idadede chegada dessas crianças ao serviço de intervençãoprecoce. Observa-se que o comprometimento neuro-motor pode retardar o encaminhamento dessas criançasao oftalmologista, pois a deficiência motora é primei-ramente diagnosticada. Essas crianças poderiam serbeneficiadas por uma intervenção, se a detecção e odiagnóstico fossem realizados no primeiro ano de vida.Dessa forma, obteria repercussão favorável no seudesenvolvimento como um todo, a partir da estimulaçãovisual adequada. Sonksen et al .9 sugerem que aintervenção seja realizada no primeiro ano de vida,favorecendo um maior benefício para a eficiência visual.

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NOBRE, M.I.R.S.; GAGLIARDO, H.G.R.G.; CARVALHO, K.M.; BOTEGA, M.B.S. Rev. Neurociências 6(3): 111-113, 1998& SAMPAIO, P.R. – Múltipla Deficiência e Baixa Visão

O primeiro ano de vida corresponde a um períodoem que o organismo está pronto para receber e utilizaros estímulos ambientais, reunindo condições satisfa-tórias para a aquisição e desenvolvimento das diferentesfunções. Assim, esse período entre o nascimento e oprimeiro ano de vida caracteriza-se como sendo um dosmais críticos no desenvolvimento da criança, o quereforça a idéia da importância de nele se diagnosticarqualquer alteração de desenvolvimento10.

A detecção e o diagnóstico precoce necessita, pois,de educação da equipe de saúde dos postos de saúde eda família.

Kara-José et al.11 sugerem que os pediatras deveriamser conscientizados quanto à necessidade de avaliar aacuidade visual das crianças. Recomendam alertar ospediatras quanto ao papel fundamental que podem edevem desempenhar na prevenção da deficiência visual.

Em relação à variável sexo, verifica-se predomi-nância do sexo masculino, obtendo-se uma freqüênciade 72,22%. Esse resultado coincide com os observadosem outros estudos12,13.

CONCLUSÃO

Em crianças com múltipla deficiência o diagnósticooftalmológico ocorre tardiamente, em geral após odiagnóstico de outras especialidades.

A avaliação oftalmológica de crianças com compro-metimentos neuromotores deveria ser efetuada conco-mitante à avaliação neurológica e pediátrica.

A associação de quadro neurológico à deficiênciavisual sugere que crianças com lesão neurológica devampassar por avaliação oftalmológica, tão logo seja detec-tado o problema.

SUMMARYMultiple Deficiencies and Low VisionChildren with multiple deficiencies present associated visual deficiencyfrequently. Generally, children with serious neurological disorders have seriousmotor impairment which is prioritized in programs of rehabilitation. Due tothe difficulty in observing the visual answers in those children, the diagnosisof possible visual impairment is delayed. Over a period of 3 months, theauthors found a frequency of 50% of children with multiple deficiencyassociated to the visual deficiency. It was verified that those children took 21months on average to be seen in our service. The neuromotor impairmentcan delay the referral of those children to on eye specialist. Children presentinglow vision can be prevented of habilitation during sensitive periods ofdevelopment of the vision. This could have harmed its visual developmentand in consequence, the neuromotor development.

KEY WORDSLow vision, neuromotor development, multiple deficience.

Referências

1. Zaldivar, F. & Rubio, V. La evaluación de personasplurideficientes. Siglo Cero, 148:21-32, 1993.

2. Veitzman, S. O papel do oftalmologista numa equipemultidisciplinar para a habilitação de crianças deficientesvisuais. Arq Bras Oftal, 55:215-217, 1992.

3. Leal, D.B.; Tavares, S.S.; Ventura, L.O.; Florêncio, T.Atendimento a por tadores de visão subnormal: estudoretrospectivo de 317 casos. Arq Bras Oftal, 58:439-42, 1995.

4. Knobloch, H. & Pasamanick, B. Gesel l e Amatruda.Diagnóstico do desenvolvimento. Rio de Janeiro, Atheneu,1990. 550p.

5. Barraga, N. Sensory Perceptual Development. In: School, G.T.Foundations of Education for Blind and Visually HandicappedChildren and Youth. New York, American Foundation for theBlind, 1986. p.83-98.

6. Gagliardo, H.G.R.G.; Nobre, M.I.R.S.; Carvalho, K.M.M.Intervenção precoce ambulatorial: orientação à família. ArqBras Oftal, 59:352, 1996.

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9. Sonksen, P.M.; Petrie, A.; Drew, K.J. Promotion of visualdevelopment of severely visually impaired babies: evaluationof a developmentally based programme. Dev Med ChildNeurol, 33:320-335, 1991.

10. Nakamura, H.Y. Investigação do comportamento auditivo emrecém-nascidos e lactentes. Campinas, 1996. Dissertaçãode Mestrado – Universidade Estadual de Campinas.

11. Kara-José, N.; Carvalho, K.M.M.; Caldato, R.; Pereira, V.L.;Oliveira, A.M.N.D.; Fonseca Neto, J.C. Atendimento deamblíopes e prevalência na população pré-escolar, Campinas,São Paulo, Brasil. Bol Of Sanit Panamer, 97:31-37, 1984.

12. Carvalho, K.M.M. Visão subnormal: apresentação de ummodelo de atendimento e caracterização das condições dediagnóstico e tratamento em um serviço universitário doBrasil. Campinas: 1993, Tese de Doutorado – UniversidadeEstadual de Campinas.

13. Nobre, M.I.R.S. Atendimento de estimulação em serviço devisão subnormal: características de usuários, opinião econduta de mães. Campinas, 1996. Dissertação de Mestrado– Universidade Estadual de Campinas.

Endereço para correspondência:CEPRE – Faculdade de Ciências Médicas – UNICAMPAv. Adolfo Lutz S/n. – Cidade Universitária Zeferini VazBarão GeraldoCEP 13084-880 Campinas (SP)

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ARTIGO

RESUMOEsclerose múltipla é uma doença crônica queafeta o sistema nervoso, causando destruiçãoda mielina, proteína fundamental na transmissãodo impulso nervoso. Embora as característicasclínicas sejam bem conhecidas, os aspectosetiológicos continuam alvo de exaustivos es-tudos. Com o aprofundamento dos conheci-mentos imunopatológicos, têm-se ampliado asperspectivas terapêuticas.

UNITERMOSEsclerose múltipla, desmielinização.

* Pós-graduanda da Disciplina de Neurologiada Escola Paulista de Medicina – UNIFESP.

** Pós-graduando da Disciplina de Neurologiada Escola Paulista de Medicina – UNIFESP.

OLIVEIRA, E.M.L. & SOUZA, N.A. - Esclerose Múltipla Rev. Neurociências 6(3): 114-118, 1998

Esclerose MúltiplaEnedina Maria Lobato de Oliveira*Nilton Amorim de Souza**

INTRODUÇÃO E HISTÓRICO

Esclerose múltipla, conhecida na literatura de língua francesa comoesclerose em placas, é uma doença que afeta o sistema nervoso, causandodestruição da mielina (desmielinização), proteína fundamental na transmissãodo impulso nervoso1.

Embora as características clínicas sejam bem conhecidas, os aspectosetiológicos constituem o alvo principal de exaustivos estudos. Os fatoresimunológicos e genéticos, a influência ambiental, enfim, fatores que diretaou indiretamente podem contribuir para a determinação da evolução clínicatambém têm sido objeto de pesquisas e estudos multicêntricos em diversospaíses.

A esclerose múltipla é considerada uma enfermidade inflamatória,provavelmente auto-imune1. A suscetibilidade genética e a influênciaambiental talvez sejam responsáveis pelo aparecimento dos primeiros surtos.No entanto, há ainda muitas perguntas sem respostas, especialmente quantoaos mecanismos básicos da doença.

Medaer menciona que, já no século XIV, uma freira alemã, Lidwina vanSchiedam, cuja doença começou aos 16 anos, seria o caso mais antigodescrito. Poser conta a lenda de uma jovem na Islândia que, ao perdersubitamente a visão e a capacidade de falar, fez uma promessa e, sob aintercessão de Santo Thorlakr, recuperou-se gradativamente em 15 dias.

No século XIX, Jean Cruvellier fez uma descrição clínico-patológica daesclerose múltipla. Coube a Charcot, em 1868, a primeira correlação deachados clínicos com a topografia das lesões desmielinizantes.

As primeiras propostas em relação à etiopatogenia datam do século XIX.Em 1884, Pierre Marie sugeriu a presença de um agente infeccioso no iníciodos sintomas. Eichhorst, em 1896, chamou a esclerose múltipla de “doençahereditária e transmissível”.

O diagnóstico de esclerose múltipla é clínico. Não há exame laboratorialisolado que o comprove. Entretanto, a evolução, especialmente dos examesde imagem, elevou o papel dos exames subsidiários.

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OLIVEIRA, E.M.L. & SOUZA, N.A. - Esclerose Múltipla Rev. Neurociências 6(3): 114-118, 1998

EPIDEMIOLOGIA

Os estudos epidemiológicos realizados entre 1920 e1940 na Irlanda, Suíça, Estados Unidos da América,Canadá e Itália estabeleceram um gradiente de preva-lência mais alta em áreas temperadas2.

Estudos realizados por Kurtzke3, quarenta anosdepois, sobre a distribuição geográfica e a incidênciapermitiram dividir o mundo e, especialmente a Europa,em três zonas. Zonas de alta prevalência, com índicesacima de 30/100.000 habitantes, incluíam o norte daEuropa e dos Estados Unidos da América, o sul doCanadá e da Austrália e a Nova Zelândia. Zonas demédia prevalência com taxas de 5 a 25/100.000,compreendiam o sul da Europa e dos Estados Unidos ea maior parte da Austrália. Zonas de baixa prevalência,com taxas inferiores a 5/100.000 habitantes, eramrepresentadas por regiões da Ásia e da África. Essesestudos atribuíam um gradiente relacionado à latitudena distribuição da esclerose múltipla3.

A partir de 1990, novos estudos têm evidenciado queessa distribuição geográfica não é tão real.

O Brasil é considerado um país de baixa prevalência.Segundo Callegaro et al.4, a estimativa da cidade de SãoPaulo é de aproximadamente 5/100.000 habitantes.Entretanto, os estudos na América Latina apontam parataxas de prevalência entre 4 a 12/100.000.

Em relação à distribuição por raça, a esclerosemúltipla é mais comum em brancos, sendo consideradarara entre os orientais, negros e índios. Entretanto,alguns trabalhos brasileiros demonstraram a presençade 30% de negros entre os doentes5.

Quanto à distribuição por sexo, a esclerose múltiplaé mais comum nas mulheres e, levando-se em consi-deração a faixa etária, verificamos que a doença é maiscomum nos adultos jovens, sendo rara antes da puber-dade e após 60 anos.

ANATOMIA PATOLÓGICA

Do ponto de vista anatômico, existem característicasgerais bem-definidas em relação ao comprometimentoobservado na esclerose múltipla. Afeta o sistema nervosocentral, predominantemente o nervo óptico, a medulacervical, o tronco cerebral e a substância branca periven-tricular. Não é conhecida a razão para tal predileção;porém, pode haver relação com a distribuição vascular,o que permitiria maior concentração de citoquinas ecélulas inflamatórias nessas regiões6. As lesões sãomultifocais com evolução temporal diferente e variáveisem tamanho.

Macroscopicamente, as placas parecem focos cinzasde tamanhos variados: desde muito pequenas, seme-lhantes à cabeça de alfinete, até vastas extensões,comprometendo a totalidade de um hemisfério cerebral.

As placas antigas apresentam-se bem demarcadas,enquanto as mais novas, por causa do edema, possuemlimites imprecisos7. Existe perda axonal e redução dosoligodendrócitos nas lesões crônicas que, de modo geral,se apresentam com poucas células e perda abrupta demielina, mais intensa no meio da placa. Em casos delonga duração, nota-se atrofia cerebral com alargamentodos ventrículos laterais. A histopatologia da esclerosemúltipla compreende a presença de processo infla-matório e áreas confluentes de desmielinização.

Entretanto, há achados post mortem compatíveis comesclerose múltipla, sem que o paciente tenha apresentadosintomas ou sinais neurológicos durante a vida6.

A atividade inflamatória das lesões pode ser definidapela associação de quatro fatores: a) quebra da barreirahemato-encefálica, caracterizada pela presença deproteínas séricas no espaço extracelular; b) processoinflamatório na parede vascular; c) expressão antigênicacaracterizada pela presença de antígenos de histocom-patibilidade e moléculas de adesão; d) presença demarcadores da ativação linfocitária traduzidos pelaexpressão de interleucina.

Nos estágios iniciais, a lesão de esclerose múltiplacomeça com uma reação imune celular mediada porcélulas T, determinando inflamação e desmielinização.Com a cronicidade do processo, existem reações imunesespecíficas que determinam lesão do complexo mielina-oligodendrócito8.

QUADRO CLÍNICO

A esclerose múltipla pode envolver qualquer partedo sistema nervoso central, de modo que a lista desintomas e sinais pode ser infinita9.

Caracteristicamente a doença é descrita como dis-seminada no tempo e no espaço, o que implicacomprometimento de diversas áreas do sistema nervosocentral e em épocas diferentes. Evolui na maioria doscasos com exacerbações e remissões.

De acordo com Lublin e Reingold, a evolução clínicada doença foi subdividida em surto-remissiva, progres-siva primária, progressiva secundária e surto-pro-gressiva10.

A forma surto-remissiva caracteriza-se por apresentarepisódios agudos de comprometimento neurológico,com duração de 24 horas ou mais e com intervalo de,no mínimo, trinta dias entre cada surto11.

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A forma progressiva apresenta piora contínua egradual de sinais neurológicos, presentes por seis mesesou mais. Ocasionalmente, pode ocorrer estabilização doquadro. Quando a fase progressiva ocorre após um inícioem surtos, diz-se progressiva secundária.

A forma surto-progressiva apresenta uma combinaçãode exacerbações e progressão, mas de acordo com Lublin& Reingold é a forma mais difícil de ser definida10.

Os sintomas iniciais mais comuns compreendemalterações piramidais, sensitivas e cerebelares, conhe-cidas como sinais maiores, e manifestações visuais eesfincterianas, ditas menores12.

Os sinais piramidais englobam fraqueza, espasti-cidade, sinais de liberação piramidal (hiper-reflexia,sinal de Babinski, clônus uni ou bilateral). As alteraçõescerebelares podem ser divididas em comprometimentodo equilíbrio e da coordenação.

Parestesias, como sintoma sensitivo, são descritascomo “formigamento” ou “adormecimento”, podemestar acompanhadas de hipoestesia superficial e profun-da em um ou mais membros.

Os principais distúrbios visuais são diminuição daacuidade visual, diplopia e escotomas, quase semprereconhecidos como embaçamento visual.

O comprometimento esfincteriano apresenta-se soba forma de incontinência ou retenção urinária e fecal.Além da alteração esfincteriana, observa-se também,disfunção sexual.

Embora menos comuns, existem outros sinais esintomas que podem estar presentes no início da doença.

Sintomas paroxísticos, tais como distonias ou espas-mos tônicos, disartria e ataxia, dores paroxísticas(neuralgia do trigêmeo e outras) são as queixas iniciaisdos pacientes em pequena porcentagem dos casos,estimados numa média de 3,8% a 17%. Sintomas rarossão as manifestações psiquiátricas.

Fadiga, que pode significar menor tolerânciaàs atividades diárias ou ser um sintoma vago emal caracterizado, é uma queixa muito comum e podeser o sintoma mais limitante. Foi relatada em até 87%dos pacientes e piora com a presença de alteraçõespiramidais.

Alterações do sono podem estar presentes e altastaxas de depressão, também foram encontradas em até50,3% de pacientes com esclerose múltipla13.

Alterações cognitivas podem acometer de 13% a 65%dos pacientes com esclerose múltipla. A aplicaçãosistemática de testes neuropsicológicos revela espe-cialmente alteração de memória.

A freqüência de epilepsia varia de 1% a 5% entre ospacientes com esclerose múltipla e é maior que a dapopulação em geral e alguns autores mostraram compro-

metimento do córtex ou áreas subcorticais em pacientescom esclerose múltipla clinicamente definida e quetinham crises generalizadas tônico-clônicas14.

Existe a possibilidade de haver diferenças raciaisdentre os quadros de esclerose múltipla15. O tipo asiáticoou oriental tem maior comprometimento do nervo ópticoe da medula espinhal, maior idade de início e menornúmero de lesões observadas na ressonância nuclearmagnética. Também são apontadas diferenças no grupode pacientes com início dos sintomas após 50 anos,chamado de esclerose múltipla de início tardio. Ospacientes apresentaram comprometimento motor maisacentuado e progressão mais rápida16.

ETIOPATOGENIA

O modelo animal experimental conhecido, encefalo-mielite aguda experimental, tem uma diferença básica:o antígeno é conhecido. Entretanto, muitos aspectos dadoença puderam ser reproduzidos e estudados.

O processo inicial compreende a resposta do endo-télio da barreira hemato-encefálica, que adquire acapacidade de expressar antígenos da classe II do MHC,permitindo a migração de células T CD4+ e CD8+ parao espaço perivascular17. A hipótese para a alteração depermeabilidade da barreira é a capacidade de células Tativadas na periferia induzirem a expressão de moléculasde adesão que permitem a interação com as célulasendoteliais e a migração transbarreira.

As moléculas de adesão envolvidas são ICAM-1VCAM-1 e seus respectivos receptores18,19.

O processo inflamatório celular envolve células TCD4+ e CD8+ e macrófagos, dispostos em forma demanguito perivascular. Tanto a encefalomielite agudaexperimental como a esclerose múltipla apresentampadrão celular semelhante.

A rede de citoquinas na esclerose múltipla foi estu-dada, sugerindo que as citoquinas associadas aoslinfócitos com fenótipo TH1 (fator de necrose tumoralalfa, interleucina-2, interferon -j) promovem a doença.As citoquinas associadas ao fenótipo TH2 (Tgf-b,interleucina-10 e interleucina-4) podem estar envolvidasna modulação do processo inflamatório.

Estudos genéticos evidenciaram haplótipos DR e DQque podem conferir predisposição à doença, assim comoum efeito protetor, ressaltando a complexidade do traçogenético envolvido20.

Os haplótipos Dw2, Dw12, Dw21 e Dw22 foramassociados à doença. O haplótipo Dw2 é o mais comumno norte da Europa e o que tem um papel mais definido.Os demais foram encontrados com maior freqüência

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entre japoneses e pacientes oriundos do sul da Europa21.A existência de grupos étnicos resistentes à doença

contribuiu para evidenciar a importância dos fatoresgenéticos. No entanto, a suscetibilidade à esclerosemúltipla não pode ser apenas explicada por deter-minantes hereditários. A complexidade do fenótiporeflete fatores ambientais ainda não-estabelecidos.

DIAGNÓSTICO

O diagnóstico de esclerose múltipla ainda é clínicoe baseia-se em dados de história e exame físico. Váriosesquemas foram propostos para facilitar o diagnósticoe a classificação da doença. Os mais usados são os deSchumacher et al. (1965)22 e Poser et al. (1983)12.Ambos têm como propósito a demonstração da dis-seminação no tempo e no espaço, característicos dessadoença. A acuidade dos vários critérios em identificarpacientes com esclerose múltipla pode variar de 40% a87%, às vezes, com atraso de alguns anos23 (Rolak,1996). Schumacher et al. (1965)11 postularam comoessencial para o diagnóstico de esclerose múltiplaclinicamente definida: a) duas lesões separadas nosistema nervoso central; b) dois ataques ou surtos comduração mínima de 24 horas, separados por um períodode, no mínimo, um mês; c) exame neurológico alterado;d) sintomas e sinais de comprometimento da substânciabranca; e) intervalo de idade entre 10 e 50 anos; f)ausência de qualquer outra doença que possa justificaro quadro.

Os critérios de Poser et al. (1983)12 admitem quatrotipos de situações clínicas: A: Clinicamente definida:A1) dois surtos e evidência clínica de duas lesõesseparadas; A2) dois surtos; evidência clínica de umalesão e paraclínica (compreendendo os achados na RNMe nos estudos eletrofisiológicos) de outra. B: Laborato-rialmente definida: B1) dois surtos; evidência clínicaou paraclínica de uma lesão e presença de IgG àeletroforese de proteínas liquóricas; B2) um surto;evidência clínica de duas lesões e presença de IgG; B3)um surto; evidência clínica de uma lesão e paraclínicade outra, e presença de IgG. C: Clinicamente provável:C1) dois surtos e evidência clínica de uma lesão; C2)um surto e evidência clínica de duas lesões; C3) umsurto; evidência clínica de uma lesão e paraclínica deoutra. D: Laboratorialmente provável: D1) dois surtos epresença de IgG.

A avaliação paraclínica é composta de RNM e estudoseletrofisiológicos (potenciais evocados) e identificam ocomprometimento neurológico não observado no examefísico. A associação com evidências clínicas e labora-

toriais permite o diagnóstico de esclerose múltipla. Aslesões são imagens periventriculares, confluentes àsvezes, com aspecto crespo e rugoso, maiores que 6 mm,com localização também infratentorial. São chamadasplacas, que têm aspecto iso ou hipointensas nas imagensem T1 e hiperintensas em T2. As lesões apresentam realceanelar após a injeção de contraste paramagnético e isso,caracteristicamente, reflete a quebra de barreira hemato-encefálica19. Devido à existência de doenças que podemdeterminar o mesmo padrão de lesão à RNM, tais comovasculites, sífilis, doenças desmielinizantes agudas,HTLV-1, neoplasias, Paty et al. (1988)15 e Fazekas et al.6

(1988) criaram critérios para o diagnóstico de esclerosemúltipla do ponto de vista de imagens à ressonâncianuclear magnética. Fazekas et al. (1988)6 consideraramsugestivo para o diagnóstico de esclerose múltipla RNMcom três ou mais áreas de sinal hiperintenso em T2 edensidade de próton, acompanhadas de dois dos seguintescritérios: a) tamanho maior ou igual a 5 mm; b) lesãoinfratentorial; c) lesões adjacentes aos ventrículos laterais.A avaliação do líquor permite diferenciar a esclerosemúltipla de outras doenças neurológicas. De rotina,encontra-se um processo inflamatório linfomonocitário.O aumento da taxa de imunoglobulinas, com distribuiçãooligoclonal, é considerado um aspecto importante, porrefletir síntese de imunoglobulinas intratecal.

TRATAMENTO

Vários tratamentos já foram propostos para aesclerose múltipla, nem todos eficazes. O tratamentodivide-se em curativo, profilático, sintomático e dereabilitação. Até o momento não há profilaxia ou cura,pois os mecanismos básicos da doença não foram aindaplenamente esclarecidos. Em uma visão multidisciplinar,o tratamento tornou-se mais complexo e englobadiversos outros profissionais, ligados a fonoaudiologia,fisioterapia, terapia ocupacional, psicologia. A tentativade encontrar um agente capaz de alterar a evolução daesclerose múltipla, fez com que agentes imunossupres-sores clássicos fossem usados como tratamento24. Osresultados foram modestos e pouco alteraram a evoluçãonatural. Os resultados promissores com o uso do βββββ-interferon25,26 e do copolímero-127, nas formas surto-remissão da esclerose múltipla, e mais recentemente oβββββ-interferon também nas formas progressivas, abriramnovas possibilidades no tratamento. Até o momento,parecem alterar a evolução natural de uma forma maissignificativa. Na fase aguda, os pacientes têm sidotratados com corticóides endovenosos sob a forma de

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OLIVEIRA, E.M.L. & SOUZA, N.A. - Esclerose Múltipla Rev. Neurociências 6(3): 114-118, 1998

pulsoterapia24, o que pode aumentar o intervalo entreos surtos. Outras tentativas de tratamento com anticorposmonoclonais, sobrecarga de antígeno endovenoso,plasmaferese, imunoglobulina endovenosa não apresen-taram resultados satisfatórios e conclusivos nos estudosclínicos e experimentais realizados.

SUMMARYMultiple sclerosisMultiple sclerosis is a chronic disease of the central nervous system thatcauses destruction of myelin, an essential protein related to the conductionof the nervous impulse. Although the clinical features are well recognized,the etiology is the aim of many rearches. With the recent studies ofimmunopathology, new therapies are being attempted.

KEY WORDSMultiple sclerosis, demyelinization.

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Endereço para correspondência:Nilton Amorim de SouzaUniversidade Federal de São PauloEscola Paulista de Medicina – Disciplina de NeurologiaRua Botucatu, 740 – Vila ClementinoCEP 04023-900 São Paulo (SP)E-mail: [email protected]

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ARTIGO

* Pós-graduando da Disciplina de Neurologiada Escola Paulista de Medicina – UNIFESP.

** Professor Adjunto, Chefe do Setor de Neuro-logia do Comportamento da Escola Paulistade Medicina – UNIFESP.

RESUMOAs doenças degenerativas primárias abrangema maioria das causas de demência, com aavaliação neuropsicológica contribuindo com odiagnóstico diferencial e auxiliando na avaliaçãoda gravidade do comprometimento cognitivo. Adoença de Alzheimer é a principal causa dedemência primária, com comprometimento emtestes de avaliação de memória explícita(declarativa, episódica), destacando-se dasdemais áreas cognitivas. Outras causas dedemência, como demência por corpúsculos deLewy e demências fronto-temporais apresentammaior alteração em testes de função executiva.A avaliação neuropsicológica na doença deHuntington revela um comprometimento precocena memória explícita (dificuldade no proces-samento de informações). O exame neuropsi-cológico nas demais causas de demências nãopossui particularidades que as diferenciem.

UNITERMOSDemências primárias, diagnóstico, testes neuro-psicológicos.

OKAMOTO, I.H. & BERTOLUCCI, P.H.F. – Exame Neuropsicológico no Diagnóstico Rev. Neurociências 6(3): 119-125, 1998Diferencial das Demências Primárias

Exame Neuropsicológico noDiagnóstico Diferencial dasDemências PrimáriasIvan Hideyo Okamoto*Paulo Henrique Ferreira Bertolucci**

Demência é uma síndrome de comprometimento cognitivo e compor-tamental, severo o suficiente para interferir com a atividade de vida diária ea qualidade de vida. Existem cerca de 70 doenças que podem causardemência, entretanto nem todas são progressivas. As demências ocorremprimariamente em fases mais tardias da vida, com uma prevalência de 1%aos 60 anos, dobrando a cada 5 anos até atingir 30% a 50% aos 85 anos1. Odiagnóstico preciso das síndromes demenciais é importante para detectarcausas reversíveis de demência, permitindo ao médico predizer o curso dadoença, facilitando o planejamento do paciente e da família quanto a suasatividades sociais, além disso, a padronização do enfoque diagnóstico nasdemências é importante na pesquisa clínica, incluindo estudos epidemio-lógicos e terapêuticos.

Embora existam diversas causas de demência, a doença da Alzheimer (DA)responde por cerca de 70% (isolada ou em associação) dos casos em paísesindustrializados2. Em uma pequena porcentagem dos casos, uma etiologiareversível ou tratável poderá ser identificada como causa de demência, sendo osexemplos mais importantes as doenças da tireóide, neurossífilis, infecções porfungos, deficiências de vitaminas, e lesões estruturais do cérebro como tumores,hematomas subdurais e hidrocefalia (tabela 1).

As doenças degenerativas primárias abrangem a maioria das causas dedemência (tabela 2), havendo critério clínico bem-estabelecido para alguns tiposde demência, como DA, demência com corpúsculos de Lewy e demência dotipo lobo frontal.

O diagnóstico clínico das demências inclui o teste neuropsicológico dopaciente examinado, podendo ajudar no diagnóstico diferencial das diversascausas de demência, bem como avaliar o grau de severidade do comprometimentocognitivo. A exatidão do diagnóstico clínico (neuropsicológico), quandocomparado com o diagnóstico anatomopatológico, varia de doença para doença,atingindo 91,4% na DA5 e 85% na demência vascular6.

Neste artigo tentaremos apresentar algumas características neuropsi-cológicas das diferentes causas de demência degenerativa primária que podem

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TABELA 1Causas freqüentes de síndromes demenciais (Corey-

Bloom, 1996)3

• Doença de Alzheimer (DA)

• Demência associada com corpúsculos de Lewy

• DA e demência vascular (demência mista)

• Depressão

• Demência vascular

• Distúrbios metabólicos

• Intoxicação por drogas

• Infecções

• Lesões estruturais

• Demência secundária ao álcool

• Hidrocefalia

• Doença de Parkinson

• Demência de Pick e outras demências frontais

TABELA 2Doenças degenerativas do SNC causando demência

(Mayeux, Foster, Rossor e Whitehouse, 1993)4

• Doença de Alzheimer (DA)

• Doença de Pick

• Doença de Huntington

• Doença de Parkinson

• Paralisia supranuclear progressiva

• Síndrome de Hallervorden-Spatz

• Epilepsia mioclônica progressiva

• Gliose subcortical progressiva

• Complexo demência-parkinsonismo – ELA

• Degeneração do lobo frontal do tipo não Alzheimer

consiste no indivíduo repetir seqüências de números queacabou de ouvir; podem ainda ser solicitados a repro-duzir seqüências de "toque de blocos" como no CorsiBlock Tapping Test10.

Memória explícita (declarativa, episódica): ospacientes devem ter comprometimento desse subsistemade memória para preencher os critérios diagnósticos doDSM-IV11 de demência. O déficit de aprender infor-mações, no nível episódico, aparece precocemente e estásempre presente, ou seja, o aprendizado de eventos epessoas, que é importante têmporo-espacialmente parao conhecimento autobiográfico, está prejudicado. Outramarca da DA é a dificuldade em resolver problemas dodia-a-dia e de planejar atividades corretamente (secun-dárias ao déficit de aprendizado de informações). Umdéficit em evocar fatos e eventos, principalmente osadquiridos mais recentemente, também está presente, éproporcional ao déficit de aprendizado episódico e podeser percebido na dificuldade dos pacientes em reco-nhecer locais e a relação de pessoas e objetos com esseslocais. Isso explica a confusão, precocemente notada nosindivíduos, quando têm de enfrentar mudanças rápidasde cena e locais12. Testes aqui utilizados são vários,como teste da lista de palavras, teste de aprendizado deassociação pareada, evocação de história (memórialógica), entre outros.

Memória implícita (não-declarativa, semântica,procedural): podemos testar de diferentes maneiras essesubsistema, havendo muita discussão a respeito do

nos ajudar no diagnóstico diferencial entre elas, bemcomo, no caso de DA, mostrar algumas característicasque se diferenciam no estadiamento da doença.

O exame neuropsicológico, em geral, inicia-se com umteste breve, abrangente e simples, que funciona como triagempara detecção do comprometimento cognitivo, sendo os maisutilizados, o miniexame do estado mental7 e a escala dedemência de Blessed8. Esses testes devem ser aplicados demaneira criteriosa, adaptados para idade e escolaridade9, nãosendo aplicáveis como instrumento único para diagnósticoe acompanhamento das demências.

DOENÇA DE ALZHEIMER

A principal característica cognitiva em DA é ocomprometimento progressivo da memória, entretantoos testes dessa área cognitiva são aplicáveis apenas nosestágios mais precoces da doença (leve e moderado),pois os pacientes em estágio severo não são passíveisde teste.

Memória de trabalho (working memory, memóriaprimária): tanto para informações verbais como paravisuoespaciais, parece haver comprometimento na DAleve, embora haja controvérsias. Tipicamente essamemória é testada por meio do span de dígitos, que

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comprometimento ou não de suas diversas áreas. Eslingere Damasio13 demonstraram que o aprendizado dehabilidades, por testes sensório-motores como o teste deperseguição rotatória (outros testes dessa área são odesenho pelo espelho e o teste de leitura invertida), estápreservado em pacientes com DA, apesar do desempenhoinicial desses indivíduos estar abaixo daquele dapopulação-controle. Heindel et al.14 também encontrarampreservação no aprendizado desse teste, entretantoencontraram comprometimento no teste de pré-ativaçãoverbal (priming). Alguns testes de avaliação de primingverbal (priming de complementação de palavras)consistem em ler palavras (por exemplo: cadeira), sendoposteriormente apresentadas as letras iniciais (porexemplo: C-A-D-) e solicitado para completar com aprimeira palavra que vier à cabeça. Esses testes apresentamdiscussão quanto aos resultados encontrados, com algunsestudos demonstrando uma redução significativa no testede priming na complementação de palavras14,15,16 nospacientes, enquanto outros estudos não apresentamcomprometimento nos testes de memória procedural17.Então, pacientes com DA têm evidências de bases neuraisseparadas para o aprendizado sensório-motores dehabilidades, preservado em muitos demenciados leves;para a pré-ativação verbal comprometida em outros tantospacientes. Diferente do que ocorre, por exemplo, nadoença de Huntington (doença degenerativa, que incluidemência como critério diagnóstico), em que ocorrecomprometimento nos testes de aprendizado dehabilidades, e preservação no desempenho de testes depré-ativação verbal18.

Linguagem: os déficits de linguagem observadosprecocemente na DA podem ser notados com adificuldade em nomear objetos (teste de nomeação deBoston), análise de discurso, vocabulário, capacidadedescritiva e compreensão de leitura. A fala podetornar-se um pouco lenta, podendo haver perseveração,repetição de palavras e frases fora de contexto. O testede fluência verbal é muito sensível e utilizado paraavaliar linguagem em estágios precoces da DA. Consisteem solicitar ao paciente, dentro de um tempo deter-minado, a falar o maior número de palavras possíveisque comecem com certa letra (categoria simbólica) oude determinada categoria semântica (por exemplo:animais). Na DA leve, a categoria simbólica parece estarmais comprometida que a categoria semântica, emboraem DA moderada e severa, as duas categorias estejamigualmente comprometidas19. Em estágios iniciais daDA, as capacidades léxicas e semânticas parecem sermais vulneráveis à doença, enquanto as capacidades

sintáticas e fonológicas estão relativamente preserva-das20. Nos estágios moderados da doença, as alteraçõesincluem parafasias (paragramáticas), permanecendomorfemas sintáticos, apesar de haver algumas trocassemânticas e neologismos. Desenvolvem aindadificuldade de compreensão com a evolução da doença(afasia de Wernicke ou afasia transcortical). Na fasesevera da DA, há uma diminuição da fluência, ecolalia,perseveração e sons ininteligíveis, como grunhido emurmúrio, estando a capacidade de comunicação globalseveramente comprometida21.

Atenção: déficits de atenção seletiva, medidos portestes de tempo de reação, com lentificação do tempo,foram demonstradas na DA22. Outros testes utilizados,e que também apresentaram alterações, são o teste desímbolo de dígitos, teste das trilhas e teste de Stroop10,embora existam relatos de desempenho normal nos testesde atenção dos pacientes com DA23.

Demais áreas cognitivas: as funções visuoespaciaisestão comprometidas no curso da doença, com ospacientes perdendo-se, com desorientação espacial, edificuldade em manusear aparelhos complexos. Os testesvisuoespaciais podem ser testes de desenho, cópia,orientação de linhas, construção com blocos, labirinto,leitura de mapa, entre outros21. As funções executivaspodem estar comprometidas, porém parece não ocorrerem estágios iniciais da doença17.

DEMÊNCIA COMCORPÚSCULOS DE LEWY

O diagnóstico clínico de demência com corpúsculosde Lewy (DL) inclui um progressivo declínio cognitivo,que interfere nas atividades de vida diária do indivíduo.Além das alterações cognitivas, que discutiremos aseguir, deve apresentar outros sinais e sintomas comoalucinações visuais recorrentes (em geral bem estru-turadas e detalhadas) e alterações motoras de parkinso-nismo. Pode apresentar história de quedas, síncopes,perdas transitórias de consciência, hipersensibilidade aneurolépticos. Uma das características em DL é aflutuação das funções cognitivas, havendo a possi-bilidade de o indivíduo alternar períodos (horas ousemanas) de profundo déficit cognitivo com períodosde quase-normalidade24. Quando comparados com oexame anatomopatológico, o diagnóstico clínico podeatingir até 90% de sensibilidade e 97% de especificidadeno diagnóstico de DL25.

Testes de exame mental podem confirmar a presença

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de alteração cognitiva, mas podem ser insuficientes paradiferenciar DL de DA e outras demências, necessitandode teste neuropsicológico mais detalhado.

Memória: sintomas de alteração da memória persis-tente nem sempre estão presentes no início da doença,porém tornam-se evidentes com a evolução da doença.Os pacientes com DL estão particularmentecomprometidos nos testes de evocação da memória,enquanto na DA parece haver prejuízo na aquisição econsolidação da memória.

Demais áreas cognitivas: os indicadores clínicos nodiagnóstico de DL são o mal desempenho nos testes defunções executivas e resolução de problemas, como nostestes de Wisconsin (Wisconsin card sorting Test), testedas trilhas (Trail Making), e fluência verbal (por letrase categorias), com relativa preservação das funções nostestes de desempenho visuoespacial (construção comblocos, desenho do relógio ou cópia de figuras). Com oprogredir da demência, essas diferenças podem perder-se, tornando difícil o exame clínico e a diferenciaçãocom outras demências em estágio severo24.

DEMÊNCIAS FRONTO-TEMPORAIS(INCLUINDO DOENÇA DE PICK)

As manifestações precoces das demências fronto-temporais (DFT), apesar de representar um grupoheterogêneo de doenças com características clínicas epatológicas diversas, são relacionadas às alterações decomportamento; podendo apresentar-se como isolamentosocial, depressão, psicose, perda de crítica, desinibição eirritabilidade. Essas alterações podem preceder em algunsanos as alterações intelectuais, mas representam ascaracterísticas diferenciais desse tipo de demência.

Os testes neuropsicológicos de triagem, como oMEEM, podem estar normais no início da doença26,porém variam com a severidade da demência.

Memória: os pacientes com DFT são tipicamentebem orientados no tempo e espaço, sendo capazes defornecer informações; entretanto, desempenham-se malnos testes formais de memória. Essa dissociação poderepresentar uma falha de estratégia na utilização damemória, mais até que uma dificuldade em adquirir ereter informações27.

Linguagem: segundo os critérios clínicos e neuropa-tológicos das DFT28, os distúrbios de linguagemcaracterizam-se pela progressiva redução da fala (faltade espontaneidade e economia na forma de falar),

estereotipia da fala (repetição de repertório limitado depalavras, frases e temas), ecolalia e perseveração, e maistardiamente, mutismo.

Demais áreas cognitivas: outras características quediferenciam DFT são o déficit de iniciação, atingirobjetivos e planejamento (funções executivas), em fasesmais tardias da doença. Outras alterações como apraxiae funções visuoespaciais não são comprometidas comfreqüência29.

DOENÇA DE HUNTINGTON

A doença de Huntington (DH) é uma doençaneurodegenerativa autossômica dominante, caracte-rizada por movimentos anormais, demência e alteraçõespsiquiátricas. O quadro demencial tem característicaspsiquiátricas predominantes, incluindo delírios, depres-são e mania. As alterações cognitivas colocam a DHem um grupo de demências também chamadas de“demências subcorticais”, junto com a doença deParkinson, a paralisia supranuclear progressiva e adoença de Wilson; aqui, sintomas como afasia, apraxiae agnosia, marcadamente de envolvimento cortical, nãosão vistos com freqüência30.

Memória: está comprometida e aparece precoce-mente na evolução da doença, apresentando dificuldadeem se lembrar de fatos e eventos públicos, assim comoem testes de evocação (memória explícita); entretanto,parece haver mais um déficit em processar informaçõese uma falha na estratégia de evocação do que aquisiçãoe consolidação da memória como ocorre na DA. Nostestes de aprendizado motor e de pré-ativação léxica(priming), que avaliam memória implícita, os indivíduoscom DH têm desempenho normal no teste de priming, eprejuízo no teste de perseguição motora (oposto ao queacontece em DA)14.

Demais áreas cognitivas: a linguagem não temcomprometimento tão importante como nas demênciascorticais, mas parece haver discussão entre os autores31,com os trabalhos demonstrando comprometimento emalguns testes que precisam de um acesso eficiente areserva léxica (WAIS-R vocabulary subtest, teste denomeação de Boston e fluência verbal). O compro-metimento de funções visuoespaciais é marcante em DH,como na cópia da figura complexa de Rey-Osterrieth eteste de orientação espacial (Standardized road map testof directional sense), relacionando-os a uma percepçãoanormal do espaço pessoal30.

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OKAMOTO, I.H. & BERTOLUCCI, P.H.F. – Exame Neuropsicológico no Diagnóstico Rev. Neurociências 6(3): 119-125, 1998Diferencial das Demências Primárias

DOENÇA DE PARKINSON

A doença de Parkinson (DP) é a causa mais comumde demência associada com alterações extrapiramidais.Em um estudo, mais de 65% dos pacientes com DPdesenvolveram demência aos 85 anos31. Na DP comdemência, também ocorre alteração de memória,dificuldade em manter atenção, porém as alteraçõescognitivas corticais não são muito evidentes, como afasiae apraxia, pelo menos em estágios iniciais da doença.

Memória: em geral os trabalhos sugerem um compro-metimento de memória com capacidade preservada emregistrar, armazenar e consolidar informações, porém comdificuldade em utilizar adequadamente essas informações.Os testes para avaliar a memória primária (workingmemory) parecem estar comprometidos devido ao déficitde atenção dos pacientes com DP, ou dependem dosrecursos de atenção solicitados em cada teste32. A memóriaexplícita (declarativa) está preservada para testes dereconhecimento com estímulo verbal e visuoespacial33,34,porém podem estar comprometidos quando os testesimplicam organizar a informação mentalmente, escolher eorganizar de forma ativa a resposta, principalmente quandoo material a ser aprendido não está semanticamenteorganizado (lista de palavras, Rey Auditory Verbal LearningTest, teste de evocação seletiva de Buschke)32.

A memória implícita, abrangendo aprendizadoprocedural e priming léxico, parece estar comprometidanos pacientes demenciados com DP, porém estariapreservada nos não-demenciados com DP14.

Linguagem: são freqüentes as alterações de fala,tornando-se monótona, com diminuição do uso deparâmetros vocais para demonstrar ênfase e alteração.A articulação é imprecisa, por vezes caracterizando umadisartria hipocinética. Outro fenômeno que ocorre é aaceleração do ritmo de fala (taquifemia), e menosfreqüentemente a repetição compulsiva de palavras efrases (palilalia). Há ainda uma diminuição na velo-cidade do movimento articulatório, e possivelmente umaalteração no planejamento da fala, assim como ocorreem outras partes do corpo; entretanto, a taxa dedeterioração da fala nem sempre acompanha asalterações motoras (bradicinesia)35.

Demais áreas cognitivas: há comprometimento nodesempenho de testes visuoespaciais, quer por alteraçãovisuomotora, quer por alteração visuoperceptual,podendo estar relacionadas a um comprometimento derepresentação interna. Testes de função executiva(Wisconsin card sorting test, teste das trilhas B, teste deStroop, fluência verbal, torre de Hanói e variantes) estãoprejudicados nos pacientes com DP32.

PARALISIA SUPRANUCLEARPROGRESSIVA (SÍNDROME DESTEELE-RICHARDSON-OLSZEWSKI)

A paralisia supranuclear progressiva (PSP) é umadoença progressiva, crônica, caracterizada por rigidezextrapiramidal, distonia axial, labilidade pseudobulbar deafeto, dificuldade de deglutição, dificuldade severa demarcha, oftalmoplegia supranuclear e demência. O quadrodemencial não é um critério necessário para o diagnóstico,entretanto ocorre em 60% a 80 % dos pacientes com PSP.

O comprometimento cognitivo da PSP pode seratribuído a alterações subcorticais, como esquecimento,lentificação do pensamento, mudanças de personalidademais do que afasia, agnosia ou alterações visuoespaciais,e as alterações são similares, porém mais severas que naDP36. Particularmente, os indivíduos com PSP apresentamalterações em testes que solicitam movimentos se-qüenciais e mudança de conceito, e outros testes de funçãode lobo frontal. Além desses, testes de procura visual,fluência verbal, span de dígitos, memória verbal ememória lógica podem estar comprometidos na PSP37.

GLIOSE SUBCORTICAL PROGRESSIVA

A gliose subcortical progressiva (GSP) é uma doençaneurodegenerativa rara, freqüentemente familiar, cominício na quarta até sexta décadas. O curso é progressivopor 5 a 30 anos. Inicialmente, é caracterizada pormudanças emocionais, de personalidade e psiquiátricas,com delírios, paranóia, alucinações auditivas, depressão,idéias suicidas, perda de julgamento e comportamentosocial. Mais tarde, as mudanças cognitivas tornam-seevidentes, afetando memória, raciocínio e percepçãovisual, não podendo ser distinguidas clinicamente dadoença de Pick. Achados neurológicos focais não fazemparte da síndrome, porém mutismo pode ocorrer em fasestardias da doença. O exame microscópico mostra intensaastrogliose da substância branca subcortical, princi-palmente na junção córtico-subcortical37.

COMPLEXO ESCLEROSE LATERALAMIOTRÓFICA – DEMÊNCIA

Esta doença tem sido descrita no Japão e em paísesdo Oriente, como um quadro de demência leve amoderada associado com amiotrofia. Na maioria doscasos, as mudanças de personalidade iniciam o quadro38.A demência é descrita com comprometimento de funções

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fronto-temporais, por vezes não sendo possíveldistinguir das alterações cognitivas encontradas na doen-ça de Pick39.

EPILEPSIA MIOCLÔNICAPROGRESSIVA

A epilepsia mioclônica progressiva (EMP) abrangeum grupo de doenças caracterizadas por miocloniasespontâneas e de ação, crises generalizadas, por vezesataxia, e variáveis níveis de comprometimento inte-lectual40. Alguns autores colocam a DA de início precocecomo causa de EMP41.

SUMMARYNeuropsychological examination in the differential diagnosis of primarydementiasPrimary degeneration of the Central Nervous System is the main cause ofdementia. Neuropsychological examination may be helpful not only instablishing the etiology, but also the level of cognitive deficits. Most of the socalled primary dementia cases are due to Alzheimer’s disease, in wich thefirst disturbances are in explicit episodic memory, at a time when otherfunctions are largely spared. Other causes of dementia, like fronto-temporaldementia and Lewy body disease show disturbance in executive functions. InHuntington’s disease there is an early disturbance of explicit memory withslowing of information processing. Though some patterns can be identified(eg slowing of processing and difficulty in shifting strategies in subcorticaldementias), other causes of dementia do not have specific changes at theneuropsychological examination.

KEY WORDSPrimary dementias, diagnosis, neuropsychological examination.

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Endereço para correspondência:Ivan Hideyo OkamotoUniversidade Federal de São PauloEscola Paulista de Medicina – Disciplina de NeurologiaSetor de Neurologia do ComportamentoRua Botucatu, 740 – Vila ClementinoCEP 04023-900 São Paulo (SP)E-mail: [email protected]

OKAMOTO, I.H. & BERTOLUCCI, P.H.F. – Exame Neuropsicológico no Diagnóstico Rev. Neurociências 6(3): 119-125, 1998Diferencial das Demências Primárias

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ARTIGO

* Fisioterapeuta, Mestre em Neurociências,Escola Paulista de Medicina – UNIFESP.

** Fisioterapeuta, Mestre em Neurociências,Escola Paulista de Medicina – UNIFESP.

*** Doutor em Neurologia, Chefe do Setor deDoenças Neuromusculares da EscolaPaulista de Medicina – UNIFESP.

**** Professor Titular da Disciplina de Neurologiada Escola Paulista de Medicina – UNIFESP.

CUNHA, M.C.B.; LABRONINI, R.H.D.D.; OLIVEIRA, A.S.B. & GABBAI, A.A. – Hidroterapia Rev. Neurociências 6(3): 126-130, 1998

RESUMOOs autores realizam uma revisão históricaevolutiva da hidroterapia como método alter-nativo para tratamento de pessoas com limitaçãofísica. Esta é uma forma antiga de tratamentoque passou por várias fases de aceitação ecredibilidade.Atualmente, a hidroterapia tem recebido grandeprestígio, especialmente na reabilitação depacientes portadores de doenças neurológicas,relacionada particularmente com a introdução demétodos modernos como o Bad Ragaz, Halliwicke Watsu.

UNITERMOSHidroterapia, reabilitação.

HidroterapiaMárcia Cristina Bauer Cunha*Rita Helena Duarte Dias Labronici**Acary de Souza Bulle Oliveira***Alberto Alain Gabbai****

INTRODUÇÃO

A hidroterapia originada das palavras gregas hydro (de hydor, hydatos =água) e therapéia (tratamento) tem apresentado grande prestígio como formaalternativa de tratamento para pacientes portadores de deficiência física,incluindo-se aqueles com doenças neurológicas. Entretanto, este não é ummétodo novo. Por uma análise histórica verificamos que o tratamento pormeio da água passou por várias fases, alternando entre o modismo e oesquecimento.

O nosso objetivo é o de realizar uma avaliação histórica, e desse modoapresentar as técnicas mais modernas de terapia, sem dúvida responsáveispelo seu prestígio atual.

HISTÓRICO

A origem do uso da água como forma de terapêutica

Em muitas culturas o uso da água foi relacionado ao misticismo e àsreligiões. O uso da hidroterapia como forma terapêutica data de 2400 a.C.pela cultura proto-indiana que fazia instalações higiênicas1,2. Era sabido queanteriormente, egípcios, assírios e muçulmanos usavam a água com propostascurativas1,3. Há também documentação de que os hindus em 1500 a.C. usavama água para combater a febre1,3. Arquivos históricos constam que civilizaçõesjaponesas e chinesas antigas faziam menções de culto (adoração) para a águacorrente e faziam banhos de imersão por grandes períodos1,3. Homeromencionou o uso da água para tratamento da fadiga, como cura de doenças ecombate da melancolia1,3,4. Na Inglaterra, as águas de Bath foram usadasanteriormente a 800 a.C. com propostas curativas3.

A era da água curativa — 500 a.C. até 300 a.C.

Em 500 a.C., a civilização grega deixou de ver a água como um pontomístico e começou a usá-la para tratamento físico específico1,2. Escolas de

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CUNHA, M.C.B.; LABRONINI, R.H.D.D.; OLIVEIRA, A.S.B. & GABBAI, A.A. – Hidroterapia Rev. Neurociências 6(3): 126-130, 1998

medicina apareceram próximas a nascentes2. Hipócrates(460-375 a.C.) usou a imersão em água quente e friapara tratar muitas doenças, incluindo espasmosmusculares e doenças reumáticas3,5. Recomendava aindaa hidroterapia para o tratamento de outras doençasincluindo icterícia, paralisias e reumatismo2.

Os lacedônios criaram em 334 a.C. o primeiro sistemapúblico de banhos que se tornou parte integrante dasatividades sociais3.

A civilização grega foi a primeira a reconhecer essesbanhos, desenvolvendo centros perto de nascentesnaturais e rios e observando a relação entre os benefíciospara o corpo e a mente, pelos banhos e recreação1,4.

Uso da água durante o Império Romano

Mais adiante, o Império Romano expandiu o sistemade banho desenvolvido pelos gregos1. Os romanosdestacaram-se por sua habilidade na arquitetura econstrução. Como no sistema grego, os banhos romanosforam originalmente usados por atletas e tinham porobjetivo higiene e prevenção das doenças2. O sistemaromano envolvia uma série de banhos com diferentestemperaturas: muito quente “caudarium”, água morna“tepidarium” e muito fria “frigidarium”5. Muitos dessesbanhos eram elaborados e realizados em grandes áreas.Os banhos do imperador Caracalla6 cobriam uma milhaquadrada com uma piscina que media 1.390 pés3. Osbanhos começaram a ser usados por mais pessoas e nãosomente por atletas. Os spa (“special public assistance”)tornaram-se centros de saúde, higiene, descanso paraintelectuais, locais para exercícios e recreação1.

Por volta de 330 d.C., a primeira proposta dos banhosromanos foi a cura e tratamento de doenças reumáticas,paralisias e lesões1. Entretanto, o primeiro modo foi oda terapia em “tanques de água”7, consistindo em sentardentro do tanque e permanecer submerso sem semovimentar.

Uso da água durante o declínio doImpério Romano e Idade Média

Com o declínio do Império Romano a naturezahigiênica dos banhos romanos começou a deteriorar-se.Houve então a proibição do uso de banhos públicos peloCristianismo, havendo um declínio no uso do sistemasde banhos romanos1. Esses banhos elaborados foramdesaparecendo com o decorrer das décadas e por voltade 500 d.C., eles deixaram de existir3. A influência dareligião durante a Idade Média conduziu para um novo

declínio no uso dos banhos públicos e da água comoforma curativa. O Cristianismo nesse período via o usode forças físicas incluindo-se a água como um atopagão1,3. Essa atitude pública persistiu até o século XV,quando ressurgiu o interesse pelo uso da água como ummeio curativo1.

Uso da água durante 1600-1700

No séculos XVII e XVIII banhos com propostashigiênicas não eram aceitos na prática. Entretanto, o usoterapêutico da água começou a ressurgir gradualmente.Em 1700, um físico alemão, Sigmund Hahn, e seus filhosusaram a água para “dores nas pernas e comichão” eoutros problemas médicos2. A disciplina médicacomeçou a se referir a “hidroterapia” e foi então definidapor Wyman e Glazer como aplicação externa da águapara tratamento de qualquer forma de doença9.

Alguns físicos na Inglaterra, França, Alemanha e Itáliapromoveram aplicações internas, (que consistia em beberas águas) e externas (por meio de banhos e compressasquentes e frias) para tratamento de várias doenças4.

Baruch10 creditou à Grã-Bretanha o berço do nasci-mento da hidroterapia científica, com a publicação doSr. John Floyer, em 1697, com o tratado: “An Inquiryinto the Right Use and Abuse of Hot, Cold andTemperature Bath”. Floyer dedicou muito da sua vida aoestudo da hidroterapia. Baruch acreditava que o tratadode Floyer influenciou o professor Frederich Hoffmannda Universidade de Heidelberg para incluir as doutrinasde Floyer em suas aulas. De Heidelberg esses ensinamen-tos foram levados para a França10. Depois disso, o Dr.Currie, de Liverpool, Inglaterra, escreveu trabalhosrelatando sobre a hidroterapia, fornecendo-lhe uma basecientífica pelos seus experimentos2. Esses trabalhos foramtraduzidos em várias línguas9,10. Embora os trabalhos deCurrie não fossem bem aceitos na Inglaterra, eles forambem valorizados na Alemanha9.

John Wesley, o fundador do Metodismo, publicou umlivro em 1747 titulado “An Easy and Natural way ofCuring Most Diseases”. Este livro falava sobre o uso daágua como uma forma de cura1,3. Os escandinavos erussos popularizaram o uso de banhos frios após osbanhos quentes. Os banhos quentes com vapor prece-didos por banhos frios tornaram-se um tradição e forampopulares por muitas gerações3.

Ressurgimento da água como cura em 1800

O uso da hidroterapia neste ponto da história pros-seguiu com técnicas de tratamento que incluíam lençóis,

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CUNHA, M.C.B.; LABRONINI, R.H.D.D.; OLIVEIRA, A.S.B. & GABBAI, A.A. – Hidroterapia Rev. Neurociências 6(3): 126-130, 1998

compressas, fricção fria, banhos sedativos, banhos derede (“hammock”) e de dióxido de carbono10.

Em 1830, um silesiano, Vicent Priessnitz, desenvol-veu programas de tratamento e usava primariamentebanhos ao ar livre1,5. Esses tratamentos consistiam debanhos frios, banhos de chuveiro e bandagens3,11. Pelofato do Sr. Priessnitz não possuir nenhuma credibilidademédica, ele não foi visto favoravelmente por todos osfísicos dessa época. A comunidade científica desa-creditou-o de seus programas de tratamento e viam-nocomo um empírico1. Esses empíricos eram chamados“Naturarezie” (Naturopatas)3. Alguns “hidroterapeutas”,nessa época, viajaram para a Silésia para aprenderemas técnicas desenvolvidas por Priessnitz2.

Durante esse tempo, Sebastian Kniepp (1821-1897),um bavário, modificou as técnicas de tratamento dePriessnitz alternando as aplicações frias com mornas edepois banhos quentes parciais, ou seja, imergir partedo corpo em tanques ou piscinas de diferentes tempe-raturas1,3,11. Os tratamentos da água de Kniepp tambémconsistiam em molhar o corpo com duchas e banhos dechuveiro em diferentes temperaturas com finalidadescurativas2. A “Kniepp Cure” tornou-se popular naAlemanha, no Norte da Itália, Holanda e França e éutilizada até hoje11.

Winterwitz (1834-1912), um professor austríaco, foio fundador da Escola de Hidroterapia e Centro dePesquisa em Viena; ele é lembrado como um dos maisdevotos profissionais no estudo da prática da hidro-terapia, também chamada “hybratics”. Seu instituto ficouconhecido como “Instituto de Hidroterapia”. Ele foiinspirado nos trabalhos de Priessnitz e Currie queobservaram as reações dos tecidos na água em váriastemperaturas5,9. Os estudos de Winterwitz encontraramos fundamentos da hidroterapia e estabilizaram basesfisiológicas da hidroterapia1,9.

Alguns dos alunos de Winterwitz, particularmenteKelogg, Buxbaum e Strasser, contribuíram significan-temente para o estudo dos efeitos fisiológicos de apli-cações de calor e frio, a termorregulação do corpohumano e a hidroterapia clínica2.

Um dos primeiros americanos a se dedicar à pesquisasobre hidroterapia foi o Dr. Simon Baruch. Ele viajoupara a Europa para estudar com o Dr. Winterwitz e paraconversar com aqueles que eram considerados empíricos,como Prieissnitz3. Em seu livro “An Epitome of Hydro-therapy”, Baruch10 discutiu os princípios e métodos douso da água como tratamento de várias doenças comofebre tifóide, gripe, insolação, tuberculose, neurastenia,reumatismo crônico, gota e neurite. Baruch tambémpublicou dois outros livros em 1893: “The Uses of Waterin Modern Medicine” e “The Principles and Practice ofHydrotherapy”3. Ele foi o primeiro professor da Columbia

University de Nova Iorque (EUA) a ensinar hidroterapia.

Desenvolvimento de Spa e hidroterapianos EUA no século XVIII

Spa é um local que é construído numa nascentenatural e circundado por beleza natural12.

O mais antigo dos EUA foi Berkely Springs, WestVirginia, conhecido em 1761 como Warm Springs6.Muitas pessoas que sofriam de reumatismo visitaramesse lugar em que as águas eram ditas curativas.Posteriormente esse spa se tornou um grande hotel para2.000 pessoas6.

O mais famoso spa dos Estados Unidos foi o SaratogaSprings em Nova Iorque. Em 1792, as águas do spaSaratoga foram consideradas como medicinais, e em1794 foi construída uma estrutura com casa de banhose chuveiros para o uso de pessoas com deficiênciafísica6.

Spa e hidroterapia no século XIX

Em 1830 foi construída a primeira casa de banho emHot Springs, Arkansas6. A classe média tinha comoobjetivo o turismo e a parte social mais do que aterapêutica.

Nos Estados Unidos, escolas médicas começaram aensinar os conceitos de hidroterapia. Cada spa tinha umfísico que, geralmente, era o proprietário6. Na América,os spa com objetivos de recreação e interação socialeram conduzidos em conjunto com a hidroterapia. Logoapós a guerra civil, houve um aumento transitório donúmero de spa nos Estados Unidos. Embora houvessevalor curativo e muitos físicos continuassem mantendoo interesse pelo valor da hidrologia médica, no final doséculo XIX, houve um declínio dos spa.

Spa no século XX

Baruch foi considerado o melhor especialista emhidroterapia nos Estados Unidos. Em 1907 ele ocupou aprimeira cadeira de hidroterapia na Columbia University6.Embora a hidroterapia não fosse considerada tãoimportante, Baruch continuou os seus estudos até 19306.Houve então um declínio da hidroterapia que Baruchatribuiu à comunidade médica que consentia com arealização de terapias sendo executadas por pessoas nãotreinadas como “massagistas”.

Em 1937, o presidente do Congresso Americano deFisioterapia criou um comitê para estudar as causas dodeclínio dos spa nos Estados Unidos6.

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CUNHA, M.C.B.; LABRONINI, R.H.D.D.; OLIVEIRA, A.S.B. & GABBAI, A.A. – Hidroterapia Rev. Neurociências 6(3): 126-130, 1998

História moderna da hidroterapia naEuropa

Durante o século XIX as propriedades da flutuaçãocomeçaram a ser estudadas para realizar exercícios empacientes na água. Para Basmajian13 a finalidade dosspa europeus era a de começar a tratar distúrbios“locomotores” e reumáticos. Em 1898, o conceito dehidroginástica foi introduzido por Leydeen e Gold-water1,3 que incluíam a realização de exercícios na águaque serviram como precursores do conceito dereabilitação aquática. A hidroginástica implicavarealização de exercícios na água, sendo estes realizadospor um profissional da saúde.

Em 1928, o físico Water Blount descreveu o uso deum grande tanque com um redemoinho em que estavaincluso um motor para ativar os jatos d’água6. Este setornou conhecido como “tanque de Hubbard”. O tanquede Hubbard foi utilizado inicialmente para realizarexercícios na água6. Este auxiliava e assistia nodesenvolvimento dos programas de exercícios na piscina.

Durante a primeira metade do século, na Europa, ostratamentos foram baseados em duas técnicas: BadRagaz e Halliwick. Mais tarde foi apresentada umatécnica adaptada denominada Watsu.

Hidroterapia no Brasil

No Brasil, a hidroterapia científica teve seu início naSanta Casa do Rio de Janeiro, com banhos de água docee salgada, com Artur Silva, em 1922, que comemorou ocentenário do Serviço de Fisiatria Hospitalar, um dos maisantigos do mundo sob orientação médica. No tempo emque a entrada principal da Santa Casa era banhada pelomar, eles tinham banhos salgados, aspirados do mar, ebanhos doces, com a água da cidade14.

MÉTODOS UTILIZADOS

Bad Ragaz

Bad Ragaz é uma cidade na Suíça que foi construídaao redor de um spa de águas termais. As águas desse spaalimentavam três modernas piscinas, que começaram aser utilizadas para exercícios em 193015. Em 1957 o Dr.Knupfer desenvolveu, na Alemanha, a técnica original dométodo “Bad Ragaz”, que foi trazida para a cidade deBad Ragaz por Nele Ipsen15. A proposta inicial dessatécnica foi a de promover a estabilização do tronco eextremidades, e também trabalhar com exercíciosresistidos. Os exercícios foram primeiramente executados

num plano horizontal. O paciente era auxiliado comflutuadores (anéis) no pescoço, quadril e tornozelos, e porisso a técnica ficou conhecida como “método dos anéis”.

As técnicas do “Bad Ragaz” foram passadas deterapeuta para terapeuta, mas só foram publicadas em 1970,em alemão, por Beatrice Egger que desenvolveu a técnicade facilitação proprioceptiva neuromuscular, aplicada porBridget Davis14. A língua foi um dos obstáculos para muitosfisioterapeutas americanos que começaram a ouvir sobreo “método dos anéis” nos Estados Unidos. Toda adocumentação dessas técnicas e os cursos realizadosderam-se na Alemanha. Hoje há dois livros em inglês quedocumentam as técnicas do método Bad Ragaz5,12.

As técnicas modernas do Bad Ragaz incorporaram as demovimento com planos diretos e padrões diagonais comresistência e estabilização realizadas pelo fisioterapeuta12.Foram utilizados exercícios com o paciente posicionadohorizontalmente, com auxílio de flutuadores, ou estabilizadona borda da piscina15. As técnicas consistiam em: reduçãodo tônus, treino de marcha, estabilização do tronco eexercícios ativos e resistidos8,12. Estas foram utilizadas empacientes com problemas ortopédicos e neurológicos.

Halliwick

Foi desenvolvido por James McMillan em 1949 naHalliwick School for Girls em Southgate, Londres16. Aproposta inicial foi a de auxiliar pessoas com problemasfísicos a tornarem-se mais independentes para nadar16.A ênfase inicial do método era recreativa com o objetivode independência na água.

Com o decorrer dos anos, McMillan manteve a suaproposta original e adicionou outras técnicas a essemétodo. Mais recentemente, essas técnicas têm sidousadas por muitos terapeutas para tratar crianças eadultos com enfermidades neurológicas, na Europa eEstados Unidos.

O método Halliwick enfatiza as habilidades dospacientes na água e não suas inabilidades16.

Watsu

Watsu ou “água Shiatsu” foi criado em 1980 quandoo autor, Harold Dull, começou a flutuar pessoas numapiscina de água quente, aplicando alongamentos emovimentos do “Zen Shiatsu”. O “Zen Shiatsu” é ummétodo que se originou no Harbin Hot Springs e quefoi estudado por Harold Dull no Japão, seguindo osensinamentos de Shizuto Masunaga. Esse método foiconsiderado mais eclético e criativo que as formastradicionais do Shiatsu, que utilizava estritamente pontos

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CUNHA, M.C.B.; LABRONINI, R.H.D.D.; OLIVEIRA, A.S.B. & GABBAI, A.A. – Hidroterapia Rev. Neurociências 6(3): 126-130, 1998

específicos. São utilizados alongamentos passivos,mobilização das articulações e relaxamento, assim comopressão em pontos de acupuntura para balancear aenergia dos meridianos18.

Zen Shiatsu e Watsu utilizaram muitos termos econceitos alheios à medicina ocidental. Também afilosofia oriental adotou a relação de integração corpo-mente, que não era utilizada no conceito tradicional dereabilitação aquática.

Watsu foi criado como uma forma de massagem na águae era utilizada para qualquer pessoa. Entretanto, osterapeutas que realizam reabilitação aquática têm usadoessa técnica para pacientes com doenças neuromuscularese músculo-esqueléticas, sem muito sucesso.

No Watsu o paciente permanece flutuando e a partirdessa postura são realizados alongamentos e rotaçõesdo tronco, que auxiliam para o relaxamento profundo,vindo por meio do suporte da água e dos movimentosrítmicos dos batimentos cardíacos.

De acordo com Morris16, Watsu pode ser descritacomo uma reeducação muscular dirigida que utilizabasicamente alongamentos. Essa técnica deverá serrealizada com cautela pois se não for realizada de formacorreta poderá causar danos específicos como estira-mentos musculares e lesões articulares.

HIDROTERAPIA NA UNIFESP – EPM

Considerando-se a hidroterapia uma forma de terapiaque pode ser realizada em piscina aquecida (temperaturaentre 28° e 33° C), ou até mesmo em piscina nãoaquecida, com grande potencialidade na recuperação depacientes portadores de distúrbios neurológicos,instituímos essa forma de tratamento na UNIFESP —EPM, em 1987. Inicialmente, os nossos pacientes foramtratados na piscina aquecida na UNICID (UniversidadeCidade de São Paulo — Clínica de Fisioterapia) e,posteriormente, na UNIBAN (Universidade Bandei-rantes – Clínica de Fisioterapia). Mais recentemente, emespecial no período do verão, temos utilizado a piscinanão aquecida do Centro Olímpico do Ibirapuera em umprograma de reabilitação de pacientes portadores dosmais diversos problemas neurológicos. A técnicautilizada, mais freqüentemente, é o método Halliwick.

Temos observado, durante esses anos de trabalho,que a hidroterapia proporciona relaxamento, auxilia nofortalecimento muscular, proporciona liberdade demovimentos, melhorando a própria imagem e o de-senvolvimento da independência. Não temos dúvida deque ela tem grande importância como método tera-pêutico auxiliar para os portadores de doenças neuro-lógicas, por exemplo as neuromusculares.

SUMMARYHydrotherapyThis an historical overview of hydrotherapy used as a method of treatmentfor motor disabilities. Hydrotherapy passed along the centuries though phasesdifferent of acceptance and credibility.Nowadays hydrotherapy is accepted, specially for the rehabilitation of patientswith neurological diseases. The modern methods used are: Bad Ragaz,Halliwick and Watsu.

KEY WORDSHydrotherapy, rehabilitation.

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Endereço para correspondência:Márcia Cristina Bauer CunhaDisciplina de Neurologia – Setor NeuromuscularRua Botucatu, 740 – Vila ClementinoCEP 04023-900 São Paulo (SP)

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ARTIGO

* Professor Adjunto, Chefe do Setor de In-vestigação e Tratamento da Cefaléia (SITC),Disciplina de Neurologia da Escola Paulistade Medicina – UNIFESP.

CARVALHO, D.S. – Enxaqueca na Infância e na Adolescência Rev. Neurociências 6(3): 131-136, 1998

RESUMOEmbora seja freqüente a queixa de cefaléia nainfância e na adolescência, os quadros deenxaqueca têm sido pouco reconhecidos econseqüentemente mal conduzidos. Nesse arti-go revela-se de forma sucinta os aspectosclínicos fundamentais, enfatizando-se o trata-mento em bases atuais.

UNITERMOSCefaléia na infância e na adolescência, enxa-queca na infância e na adolescência, tratamentoda enxaqueca na infância e na adolescência.

Enxaqueca na Infância e naAdolescênciaDeusvenir de Souza Carvalho*

Os diversos sinais e sintomas do quadro clínico da enxaqueca na infânciae na adolescência têm sido revisados à luz de novos conhecimentosfisiopatológicos. Os estudos mais recentes apontam para uma desordemneurológica, contrapondo-se à idéia anterior de uma desordem sistêmica,bioquímica, com maiores efeitos sobre vasos intra e extracranianos1.

A idéia de que a enxaqueca seja uma patologia em primeiro lugarneurológica e secundariamente vascular ganha apoio se observarmos essasíndrome na infância e na adolescência, quando há maior associação com aepilepsia e maior incidência de anormalidades no eletrencefalograma(EEG)2,3,4,5,6,7,8,9,10. O fenômeno da depressão alastrante de Leão tem sidoassociado aos mecanismos que teoricamente podem explicar diversosaspectos da síndrome enxaquecosa11. A observação clínica da aura, nas crisesde enxaqueca em crianças, cujos sintomas progridem respeitando mais aseqüência de envolvimento parenquimatoso cerebral (isto é, sintoma visual,seguido de sintoma sensitivo e finalmente déficit motor) do que dos territóriosdas artérias cerebrais, também colabora com a hipótese neuronal e daassociação com o fenômeno da depressão alastrante de Leão (Fig.1).

FIGURA 1Enxaqueca com aura. Freqüência, em porcentagem, do tipo de aura em 72

crianças e seqüência dos sintomas clínicos12.

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CARVALHO, D.S. – Enxaqueca na Infância e na Adolescência Rev. Neurociências 6(3): 131-136, 1998

Diagnóstico – As primeiras manifestações deenxaqueca podem ser bastante precoces como aos 6meses de idade13. A anamnese é fundamental paracaracterizar corretamente o quadro e, uma vez superadasas eventuais dificuldades anamnésticas, principalmentenas crianças de baixa idade, o diagnóstico de enxaquecana infância tem sido firmado por diversoscritérios 14,15,16,7,17,18,19. Os critérios propostos porPrensky & Sommer7 têm sido mais comumente aceitose citados na literatura. Segundo esses autores, aenxaqueca na infância caracteriza-se por: crises decefaléias recorrentes, acompanhadas de pelo menos 3dos 6 aspectos seguintes: 1 - dor abdominal, náusea,vômito; 2 - localização hemicraniana da dor; 3 - caráterlatejante; 4 - alívio após sono; 5 - aura visual, sensitivaou motora; 6 - história familiar.

Mais recentemente, utiliza-se a Classificação eCritérios Diagnósticos das Cefaléias, NevralgiasCranianas e Dor Facial, proposta pelo Comitê deClassificação das Cefaléias da Sociedade Internacionalde Cefaléia20 (tabela 1).

Exames subsidiários não confirmam o diagnóstico edevem ser realizados, quando necessários, com outrasfinalidades, como, por exemplo, para afastar diversaspatologias.

Adicionalmente, compondo o quadro clínico, o fatorhereditariedade não deve estar separado da definição

da enxaqueca. Aparece em 60% a 90 % dos parentespróximos21. É suposta uma herança autossômicadominante, poligênica22. A concordância em gêmeosdizigóticos varia de 7% a 13%, enquanto nos monozi-góticos varia de 22% a 26%23,24,25. A enxaquecahemiplégica familiar tem sido ligada a um fatortransmitido no braço curto do cromossomo 19, ou seja,19p1326.

Epidemiologia – Estudos populacionais da enxa-queca na infância e na adolescência mostram umafreqüência de 2,7% a 22%14,15,27,28,29,30,18,31,32,33. Emescolares de Porto Alegre (RS), na faixa etária de 10 a18 anos, foi observada a enxaqueca em 9,9%34. Quantoao sexo, em baixa idade, há algumas evidências depreponderância em meninos. À medida que se vaiaumentando a faixa etária há uma equiparação com osexo feminino e finalmente, na adolescência, passa apredominar nesse sexo, como em adultos. Os meninosparecem iniciar mais cedo que as meninas, sendo a formacom aura também iniciada mais cedo nos meninos35.

Quadro clínico – Além dos critérios já descritoscomo de grande util idade para o diagnóstico,enfatiza-se que as manifestações da enxaqueca emcrianças diferem das do adulto por preponderar nosexo masculino, considerando-se baixa idade, menorduração das crises, localização freqüentemente frontalbilateral, associação de dor abdominal recorrente, dores

TABELA 1Classificação e critérios diagnósticos da IHS (IHS, 1978), propostos e revisados por diversos autores53,54,55,56

Enxaqueca sem aura Enxaqueca com aura

A. Pelo menos 5 crises preenchendo itens B-D A. Pelo menos 2 crises que safisfaçam itens B-C

B. Cefaléia durando de 1 a 48 horas B. Cefaléia durando de 1 a 48 horas

C. A cefaléia tem pelo menos 2 das abaixo: C. A cefaléia tem pelo menos 3 das abaixo:

1. bilateral (frontal, temporal) ou unilateral 1. um ou mais sintomas aurais totalmente reversíveis que indicam disfunção focal cortical e/ou de tronco cerebral;

2. caráter pulsátil 2. pelo menos um sintoma da aura desenvolve-se gradualmente em mais de 4 minutos, ou 2 ou mais sintomas ocorrem em sucessão;

3. intensidade moderada a intensa 3. nenhum sintoma da aura dura mais de 60 minutos.

4. agravada por atividade física de rotina

D. Durante a cefaléia há, no mínimo, um dos itens:

1. náusea e/ou vômitos

2. fotofobia e/ou fonofobia

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CARVALHO, D.S. – Enxaqueca na Infância e na Adolescência Rev. Neurociências 6(3): 131-136, 1998

do crescimento, cinetose, vômitos cíclicos, vertigens,hiperatividade e distúrbios de sono36,37,38 (vide Fig. 2).Além disso, a precipitação das crises após traumasirrelevantes e a melhora com breve período de sonotambém são fatos mais freqüentemente observados nascrianças com enxaqueca. Crises disfrênicas foraminicialmente quadros descritos apenas na enxaqueca dainfância39,40.

Tratamento – Não se deve desprezar o fato de que

sencadeantes. A maioria dos pais de crianças comenxaqueca quer saber a causa, como aliviar a dor e tercerteza de que não se trata de um tumor cerebral43.

Procedimentos como restrição dietética, acupuntura,biofeedback, auto-hipnose e psicoterapia necessitamestudos controlados44, embora as crianças e adolescentesparecem responder bem ao relaxamento e aobiofeedback45.

É de suma importância, conscientizar os pais sobrea necessidade de, no momento da crise, dar aos filhos omaior apoio psíquico, para abrandar a vivência de-sagradável da enxaqueca. Propiciar repouso emambiente confortável, tranqüilo, silencioso. Observa-seque um breve período de sono, muitas vezes, é suficientepara resolver a crise. A curta duração da crise, emcrianças, em geral dificulta a tentativa de tratamento oralmedicamentoso e a apresentação de medicamentos não-orais (supositórios, por exemplo) evitariam a viainjetável que tanto desagradam as crianças35.

O tratamento farmacológico, quando necessário, deveser proposto em duas bases distintas, ou seja, visando amelhora da crise e a sua prevenção. O tipo de enxaqueca,com aura, sem aura, basilar, familiar hemiplégica,oftalmoplégica ou disfrênica não diferencia a escolhado tratamento medicamentoso. Os efeitos colateraispodem contribuir tanto positiva como negativamentepara essa escolha. Os fatores associados à enxaquecatais como episódios de vertigem paroxística, dor abdo-minal recorrente e vômitos cíclicos podem even-tualmente ser tão freqüentes e duradouros, a ponto dese indicar tratamento medicamentoso para o episódio epara a sua prevenção46.

O uso de medicação para melhora da crise, é resu-mido no quadro 1 e para prevenção, no quadro 2.

Em crianças de baixa idade (pré-escolares, menoresde 6 anos), deve ser sistematicamente muito bemponderado o uso de medicação e, sempre que possível,evitado. O uso da aspirina, em crianças febris, abaixode 12 anos, deve ser evitado pelo risco em potencial dedesenvolverem a síndrome de Reye.

Os derivados de ergot , associados à cafeína,analgésicos e/ou antieméticos não têm ação benéfica emfaixas etárias baixas47. O uso de metoclopramida embaixas idades pode levar a efeitos extrapiramidaisindesejáveis, mesmo em doses reduzidas48. Assim sendo,esses medicamentos são usados empiricamente acimados 6 anos de idade. O sumatriptan, entre os agonistasdos receptores de serotonina, mostrou-se ineficaz emum grupo com idade média de 8 anos49, e ainda são muitocontroversos os resultados nas crianças de baixa idade.Tem sido usado empiricamente acima dos 10 anos. Osnovos triptanos (rizatriptano, naratriptano, zolmitriptano

FIGURA 2Porcentagem de ocorrência ou da ausência de distúrbio

de sono (DS), dor abdominal recorrente (DAR), cinetose(C), hiperatividade (H), vertigens (V), dores do

crescimento (DC), vômitos cíclicos (VC) epseudo-angina (Pa) em 68 crianças com (gráficosuperior) e sem (gráfico inferior) enxaqueca37.

50% das crianças que visitam o médico por cefaléiaficam livres desse incômodo após a primeira consulta,sem medicação específica41,42. Em relação ao grandecontingente de crianças e adolescentes com cefaléia,ainda é pequeno o número de crianças com enxaquecaque é referido ao especialista35. Diante disso, vale muitouma orientação não-medicamentosa inicial, prin-cipalmente quando se aguarda uma investigaçãosubsidiária. Nesse período, um diário de anotações dascrises ajuda inclusive para identificar fatores de-

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etc.) ainda não fazem parte de ensaios terapêuticos emcrianças e adolescentes.

O tratamento preventivo deve ser instituído quando,após orientações gerais ao paciente e aos seus res-ponsáveis para evitar estresse e afastar sempre quepossível outros fatores desencadeantes e agravantes,houver uma freqüência de crise igual ou maior que duaspor mês. Pode estar indicada a prescrição demedicamento preventivo quando o tratamento da crisenão é totalmente eficaz e, além disso, o pacienteapresente crises longas e muito incapacitantes,principalmente para as atividades escolares. Os escolaresenxaquecosos perdem em média 2,8 dias de aula porano devido às crises de enxaqueca e perdem mais diasde aula por outras moléstias que as crianças não-enxaquecosas50.

Em nosso meio, o propranolol tem baixo custo e nãohavendo contra-indicação, deve ser a primeira escolha.A flunarizina é a única droga disponível em solução quepode ser melhor dosada em crianças de pouca idade. A

amitriptilina é bem-indicada quando há sinais dedepressão associados, embora possa levar à sonolênciaprejudicando o rendimento escolar. O pizotifeno deveser evitado em crianças com tendência à obesidade. Aopizotifeno, além de ganho de peso, são atribuídostambém, efeitos indesejáveis como sonolência, náusea,vertigens, reações cutâneas e dores musculares. Valelembrar os efeitos colaterais atribuídos ao propranolol,tais como: broncoespasmo, intolerância gástrica,distúrbios de sono (insônia e pesadelos) aumento doapetite, dor abdominal, anorexia.

Quando ocorre a associação de enxaqueca comepilepsia, deve ser instituído cada um dos tratamentoscom suas considerações pertinentes.

A suspensão da medicação preventiva deve sergradativa e após 4 a 6 meses de sucesso em diminuir afreqüência, intensidade e duração das crises. Observarque o melhor momento para essa interrupção é o dasférias escolares. Nas pré-adolescentes, é mais aconse-lhável prolongar o período de uso da medicação

CARVALHO, D.S. – Enxaqueca na Infância e na Adolescência Rev. Neurociências 6(3): 131-136, 1998

QUADRO 1Medicações para tratamento da crise de enxaqueca em crianças

Medicação Apresentação Dose Via de administração

Crianças de baixa idade (pré-escolares ou abaixo de 6 anos):

AAS Comprimido 50 a 100 mg via oral

Paracetamol Solução 10 mg/kg via oral

Se houver proeminentes vômitos, associar:

Domperidona Solução 0,25 mg/kg via oral

Metoclopramida Solução 0,20 mg/kg via oralAmpola 0,30 mg/kg intramuscularAmpola 0,20 mg/kg intravenosa

Crianças de 6 a 12 anos e adolescentes:

AAS Comprimido 100 a 200 mg via oral

Paracetamol Comprimido 250 a 375 mg via oral

Se houver vômitos, associar o mesmo esquema para baixa idade

Medicamentos de uso empírico e controverso em idades acima de 6 ou 10 anos:

Ergotamina Comprimido 1 a 2 mg via oral

Diidroergotamina Comprimido 0,5 a 1 mg via oral

Sumatriptano Comprimido 50 a 100 mg via oral

Sumatriptano Ampola 3 a 6 mg via subcutânea

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QUADRO 2Medicações para tratamento preventivo de enxaqueca em crianças

Medicação Apresentação Dose diária

Propranolol Comprimidos de 10 a 80 mg 5 a 80 mg

Flunarizina Comprimidos e cápsulas de 10 mg 5 a 10 mgSolução a 5 mg/ml 5 a 10 mg

Amitriptilina Comprimidos de 25 e 75 mg 12,5 a 100 mg

Pizotifeno Drágeas de 0,5 mg 0,5 a 1,5 mg

preventiva por pelo menos outros 4 ou 6 meses após amenarca.

Evolução e prognóstico – Bille51, em 1997, mostraa melhor figura desse aspecto, acompanhando indivíduoscom enxaqueca de início na infância, por 37 anos. Ascrianças com enxaqueca, ao chegarem a jovens adultos,62% ficaram livres dos sintomas por mais de 2 anos,porém na idade de 30 anos, somente 40% continuaramlivres.

De modo geral, as crianças e adolescentes lidammelhor com sua enxaqueca que os adultos52.

O fator mais importante para o sucesso no tratamentoda enxaqueca na infância e adolescência é o próprio“médico” e esse deve estar em dose muito adequada ecom mínimos efeitos colaterais.

SUMMARYMigraine in childhood and adolescenceHeadache in childhood and teenage is very common. Migraine is rarelyrecognized and not so well treated. This article reviews the main clinicalaspects and proposes an updated treatment.

KEY WORDSChildhood headache and migraine, treatment of migraine on childhood.

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Endereço para correspondência:Deusvenir de Souza CarvalhoUniversidade Federal de São PauloEscola Paulista de Medicina – Disciplina de NeurologiaRua Botucatu, 740 – Vila ClementinoCEP 04023-900 São Paulo (SP)E-mail: [email protected]

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* Médico Eletrencefalografista do Setor deEEG e Polissonografia da Disciplina deNeurologia – Universidade Federal de SãoPaulo – Escola Paulista de Medicina.

** Médica Eletrencefalografista do Setor deEEG e Polissonografia da Disciplina deNeurologia – Universidade Federal de SãoPaulo – Escola Paulista de Medicina.

RESUMOO conhecimento de alguns aspectos práticos narotina da interpretação do EEG são importantespara evitarmos conclusões errôneas. Nas epi-lepsias, o uso correto das montagens facilita umamelhor interpretação do traçado e o EEG éimprescindível para o diagnóstico das síndromes.Nas demências, podemos encontrar diferentespadrões, sem nenhum achado patognomônico.Variantes benignas não devem ser interpretadascomo anormalidades. Do mesmo modo, ativi-dade epileptiforme no EEG, sem história deepilepsia, não justifica tratamento. O EEG dorecém-nascido é um dos exames de maiorimportância diagnóstica e sobretudo prognósticanas lesões encefálicas. Nos “status epilepticus”não-convulsivos, o EEG é fundamental para osdiagnósticos diferenciais. Nas encefalopatiasmetabólicas, podemos avaliar o grau da encefa-lopatia pelo EEG. Nos comas, o EEG podeavaliar o prognóstico e confirmar o diagnósticode morte encefálica. O mapeamento cerebral,exame realizado somente após a interpretaçãodo EEG digital, não é um exame de rotina.

UNITERMOSEEG, aspectos gerais.

ARTIGO

Aspectos Gerais e Práticos doEEGDélrio Façanha da Silva*Márcia Marques de Lima**

Neste breve resumo geral a respeito de alguns assuntos dentro do vastocampo do EEG, abordaremos alguns aspectos práticos nas epilepsias, norecém-nascido, demências, encefalopatias metabólicas, nas variantes benig-nas e nos comas. Por último, resumidamente alguns conceitos de EEG digitalx EEG convencional x mapeamento cerebral e sua aplicabilidade prática.

EEG NAS EPILEPSIAS

Atividade epileptiforme focal x montagem

Na dependência do tipo de montagem escolhido para a análise do EEG, aatividade epileptiforme focal (AEF) pode conduzir a uma errônea inter-pretação do traçado. Por exemplo, o foco temporal anterior (FTA) é bemevidenciado na montagem com referencial Cz, assim como a onda aguda dovértex (OAV) (Fig. 1). Porém, podem ser interpretados de outra forma quandousarmos a montagem biauricular (Fig. 2): o FTA praticamente não évisualizado e passamos a observar uma onda aguda difusa e bilateral, comaspecto morfológico de “V”, simulando a OAV (grafoelemento fisiológicodo sono). Do mesmo modo, a figura 2 mostra logo ao lado do FTA, a novaapresentação da OAV que simula uma AEF. Em suma, o FTA e a OAV sãobem visualizados na montagem com referencial Cz, enquanto com a bi-auricular (Rf) o FTA simula a OAV e esta ao assumir um aspecto focalassemelha-se a uma AEF. Desse modo, na montagem com Rf (biauricular),devemos estar atentos para não interpretarmos o FTA como OAV, assim comoa OAV como uma AEF. Isso decorre da contaminação do Rf pela FTA (pelaproximidade de F8 ao Rf) e pelos eletrodos centro-parietais serem G1 apenasem duas derivações à esquerda e à direita (C3-Rf, P3-Rf, C4-Rf, P4-Rf),enquanto na montagem com Cz não ocorreu a contaminação com o FTA e aOAV atinge todas as derivações por Cz ser G2.

A OAV é um achado normal no EEG durante o sono não-REM, porémdevemos lembrar que temos os focos da linha média (FLM) e que estes sãosemelhantes às OAV e não devem ser confundidos com grafoelementos

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FIGURA 1Presença de atividade epileptiforme de projeção temporal anterior esquerda, de

fácil identificação na montagem com Cz.

FIGURA 2O mesmo momento da fig. 1, porém em montagem com eletrodo biauricular.

fisiológicos. Do mesmo modo deve-mos estar atentos para não lau-darmos as OAV como anormalidade.O diagnóstico diferencial pode serfeito pela presença de FLM durantea vigília, por polipontas e pela pre-sença de dipolo tangencial1.

Outro cuidado é quando a AEFmuda de lateralidade. A fig. 3 mostraclaramente uma AEF esquerda coma utilização da montagem comreferencial Cz. Ao fazermos a mu-dança, no mesmo momento, para amontagem que utiliza o referencialRf, a AEF é nitidamente melhorvizualizada no hemisfério cerebraldireito (Fig. 4). As figs. 5 e 6ilustram outras situações seme-lhantes. Nesses casos, a utilização deuma montagem transversa ou bipolarseqüencial pode ser útil naelucidação da real lateralidade. Issotem muita importância na avaliaçãopré-cirúrgica de pacientesepilépticos.

A utilização de uma montagembipolar seqüencial, sem a utilizaçãode Cz ou de Rf, pode não demonstrara AEF ou apenas de forma frustradadevido à equipotencialidade, en-quanto é de fácil identificação comreferencial Cz no mesmo momento.

De maneira geral, inicialmente érecomendável uma análise de todoo traçado com a montagem refe-rencial Cz e depois com Rf auricular(A1, A2 ou A1 + A2). As montagensbipolares seqüenciais e transversasutilizamos em um segundo tempo,após a prévia identificação da AEF,e não como opção inicial de umaanálise.

Técnica

O EEG de rotina em um pacienteepiléptico, ou qualquer outro pa-ciente deve ser realizado no mínimopor 30 minutos. Os eletrodos devemser colocados corretamente de acor-do com o sistema internacional 10-202. O paciente deve estar em re-pouso, relaxado, bem alimentado,

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com olhos fechados, em ambientecalmo e com a cabeça lavada e sema utilização de cremes no courocabeludo. Realizamos a hiperpnéiapor 3 minutos, a fotoestimulação ea prova de abrir e fechar os olhos,para verificarmos a reatividade doritmo alfa. Em crianças, é comumobservarmos no EEG ondas lentasdifusas e bilaterais (Fig. 7), frontaisou de predomínio posterior e quegeralmente são normais. O EEG emsono é muito importante em todosos pacientes epilépticos.

Em relação ao sono, é impres-cindível que o EEG seja realmenterealizado em sono e que o pacientepermaneça nesse estado por 30minutos. A simples presença defusos e ondas agudas do vértex poralguns segundos ou minutos, duranteo traçado, não nos deve levar aescrevermos na conclusão do laudoque o exame foi realizado em sono,sobretudo se foi normal. Sabemosque nas fases III e IV do sono não-REM (sono por ondas lentas) asincronização é maior e, portanto, apossibilidade de obtermos uma ati-vidade epileptiforme no EEG émuito grande. Se possível, a obten-ção do sono REM, tem maior valorpara localização da atividade epilep-tiforme.

Crise de ausência (“Petitmaladie”)

As crises de ausências (epilepsiageneralizada primária) apresentam noEEG complexos ponta e poliponta-onda a 3 Hz, difusos e bilaterais,sobretudo durante a hiperpnéia, eatividade de base normal (Fig. 8).Entretanto, também podemos en-contrar atividade lenta delta difusa ebilateral3, isoladamente, ou pre-cedendo os complexos ponta-ondaa 3 Hz. A presença de AEF nãodescarta o diagnóstico de ausência,pois podemos encontrar no EEGdesses pacientes, além dos clássicoscomplexos ponta-onda 3 Hz, AEF na

FIGURA 3EEG mostra foco temporal esquerdo, em montagem com Cz.

FIGURA 4O foco temporal da fig. 3, no mesmo momento, agora melhor vizualizado à

direita, em montagem com biauricular.

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FIGURA 5EEG evidencia atividade epileptiforme de projeção frontotemporal esquerda,

em montagem com Cz.

FIGURA 6O foco da fig. 5, no mesmo instante, ao ser visto com a montagem biauricular, é

melhor evidenciado à direita.

região central, temporal média eoccipital. Entretanto, a identificaçãode AEF na região frontal e/ou tem-poral4,5, no EEG desses pacientes,pode gerar dificuldade diagnóstica:ausência? epilepsia frontal? epilepsiado lobo temporal? O EEG em sono,assim como as características se-miológicas da crise e a reposta aotratamento instituído, podem ajudarno diagnóstico diferencial.

Epilepsia rolândica

Uma das epilepsias mais comunsda criança e do adolescente, benigna,em que, em torno dos 16-18 anos deidade as crises parciais motorasdesaparecem. O EEG apresentaatividade elétrica cerebral de basenormal e AEF na região central outemporal média (Fig. 9), sobretudodurante o sono, quando fica muitofreqüente. A identificação do dipólonessa epilepsia é um dos importantescritérios para considerá-la comobenigna6,7.

Epilepsia do lobotemporal

As crises parciais complexas daepilepsia do lobo temporal são ascrises mais freqüentes do adulto egeralmente rebeldes ao tratamento,sendo a lobectomia temporal um dosrecursos terapêuticos, com exce-lentes resultados na maioria doscasos. O EEG apresenta AEF naregião temporal anterior (Fig. 10). Osono é importante nesses tipos depacientes, principalmente quando oEEG é normal durante a vigília.Devemos lembrar que a AEF podeser por onda aguda, complexo ponta-onda, polipontas ou por onda lenta8.

Síndrome de West

Os espasmos infantis nas crian-ças entre 3 meses e 1 ano de idade,

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não devem ser sempre encaradoscomo a síndrome de West (SW). Énecessário que o EEG apresente ahipsarritmia, isso ajuda a estabelecero diagnóstico diferencial com espas-mos infantis que não são enqua-drados como SW. São vários osquadros que simulam SW, porém oEEG é fundamental nessa distinção.Além disso, o EEG é importante naSW criptogênica, podendo fazer adiferenciação se estamos diante deuma SW benigna (primária) ousecundária9.

Síndrome de Lennox-Gastaut

A síndrome de Lennox-Gastaut(SLG), encefalopatia epilépticagrave, com retardo mental, quegeralmente inicia em torno dos 2anos de idade, sobretudo com crisesde ausência atípica, crises tônicas edrop attacks, apresenta no EEGatividade de base alentecida ecomplexos ponta e poliponta-onda,1-2 Hz, difusos e bilaterais, depredomínio frontal, semicontínuosdurante o sono, e polipontas. O EEGajuda a estabelecer o diagnósticodiferencial com outras epilepsiasque simulam a SLG, os chamadospseudo-SLG.

Terminologia

Devemos evitar o uso de termoscomo disritmia, atividade irritativa,equivalente epiléptico e foco irrita-tivo. Temos preferência por “ativi-dade epileptiforme caracterizada porondas agudas, ondas lentas, com-plexos ponta-onda ou poliponta-onda, polipontas de projeção naregião ...”. As ondas agudas e ondaslentas geralmente são AEF, enquantoos complexos ponta ou poliponta-onda e polipontas são descritosfreqüentemente como atividadeepileptiforme difusa e bilateral, poissão encontrados nas epilepsias

FIGURA 7Ondas lentas difusas e bilaterais, durante a hiperpnéia.

FIGURA 8Complexos ponta-onda 3 Hz difusos e bilaterais da crise de ausência.

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FIGURA 9Foco temporal médio esquerdo (rolândico).

FIGURA 10Foco temporal anterior bilateral, mais evidente à esquerda.

generalizadas. Entretanto, devemos lembrar quepodemos também identificar esses padrões nos EEG dasepilepsias parciais. Nesses casos, o achado de AEcaracterizada por complexo ponta-onda ou polipontasfocais, e que se propagam para regiões ipsi econtralaterais, pode dar ao EEG um aspecto difuso ebilateral (pseudogeneralizado).

Atividade epileptiforme no EEG xpaciente sem epilepsia

A identificação no EEG de AEF ou difusa e bilateralnão significa que o paciente seja epiléptico e por

conseqüência não deve ser estabe-lecido um tratamento com drogasantiepilépticas. Parentes de pacien-tes epilépticos, pacientes com diag-nóstico de enxaqueca, criançashiperativas, distúrbio escolar, dorabdominal, perda de folego e crian-ças normais podem apresentar alte-rações no EEG e sem história decrise epiléptica10. Do mesmo modo,pacientes idosos comumente apre-sentam ondas agudas e ondas lentasna região temporal e, também, nãodevem ser catalogados de epilép-ticos11. Contudo, achamos que apresença de AEF de projeção frontalou temporal anterior mereça umainvestigação e questionamento emrelação à ocorrência de “desliga-mentos” e “esquecimentos” (crisesparciais complexas), mesmo que opaciente negue crises, pois essa AEFgeralmente é sintomática e lesional(epilepsia parcial secundária).

“Status Epilepticus”

Pode haver dificuldade diag-nóstica no status epilepticus (SE)não-convulsivo, seja por crise parcialcomplexa ou por ausência. Essespacientes, às vezes, são diagnos-ticados como portadores de doençapsiquiátrica, pois suas formas deapresentação são muito variadas,desde uma confusão mental até umdistúrbio de conduta. Nesses casos,o EEG é imprescindível para o

diagnóstico diferencial. No SE que se apresenta apenascomo afasia12 ou sob a forma de hemiparesia13, o EEGafasta o diagnóstico de AVC e confirma essa formaincomum de SE. Do mesmo modo, alguns casos de SEtipo parcial simples não devem ser confundidos comcrises de enxaqueca14.

Em algumas síndromes a atividade epileptiformecontínua ou semicontínua não deve ser interpretadacomo SE. A identificação desses quadros evita condutasemergenciais. Por exemplo, a síndrome da ponta-ondacontínua do sono não-REM (“status” eletrográfico dosono não-REM) não deve ser confundida com SE nãoconvulsivo, pois ocorre apenas no sono não-REM edesaparece com o despertar e durante o sono REM15

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(fig.11). Esse achado no EEG da ponta-onda contínuatambém pode ocorrer durante a vigília e é conhecidocomo “status” eletrográfico da vigília16. A epilepsia componta-onda occipital reativa a abertura e fechamentoocular, em que a atividade epileptiforme occipitalcontínua, com os olhos fechados, desaparece com aabertura ocular17. Algumas disgenesias corticais tambémcursam com atividade epileptiforme contínua, porémsem SE clínico. Por outro lado, durante as crises parciaissimples geralmente o EEG cursa sem alteração18, o quenão deve ser interpretado como pseudocrise ou doençaextrapiramidal. Nesses casos, o aumento do número deeletrodos facilita o registro da crise no EEG19.

EEG X DEMÊNCIAS

Na demência mais freqüentementediagnosticada, a de Alzheimer (DA), oEEG na fase inicial pode ser útil nodiagnóstico diferencial com uma depres-são (pseudodemência), pois uma reduçãona freqüência do ritmo alfa em EEGseriados sugere que não seja apenas umadepressão, mas sim a fase inicial da DA20.Alguns pacientes com DA podem apre-sentar no EEG um padrão periódico curtoe difuso, semelhante ao da demência deCreutzfeldt-Jakob (CJ)21,22, que podegerar dificuldade diagnóstica, sobretudose esses pacientes com DA apresentaremmioclonias.

A demência de CJ caracteriza-se noEEG por um padrão periódico curto edifuso, com ondas trifásicas de predomínioanterior. Entretanto, esse padrão periódicopode predominar nas regiões posteriores ouapresentar-se no EEG como periódicocurto e focal (“PLEDs”)23. Devemos lem-brar que o padrão periódico na demênciade CJ nem sempre está presente, mesmocom EEG seriados durante a evolução dadoença. Quando isso ocorre em pacientescom CJ, sobretudo na forma familiar, nafaixa etária dos 50-65 anos de idade e quenão apresentam mioclonias, pode ser difícilum diagnóstico diferencial com DA,dependendo da fase em que se encontra opaciente24,25. O diagnóstico diferencialcom a DA também pode ser dificultadoquando a demência de CJ se apresentaapenas com afasia progressiva, semmioclonias e sem padrão periódico no EEG(apenas na fase final), em paciente na faixa

etária dos 60 anos26. Algumas drogas, como o baclofene o carbonato de lítio, podem provocar no EEG o padrãoperiódico curto e difuso e o paciente clinicamente estardemente, simulando uma demência de CJ27,28. Nessescasos, a retirada de droga leva ao desaparecimento daperiodicidade e da demência.

A demência da coréia de Huntington apresenta noEEG um padrão de atenuação da atividade elétricacerebral, difuso e bilateral. Na demência por múltiplosinfartos, as alterações são geralmente multifocais comparoxismos por ondas lentas theta e delta. Na doençade Parkinson que cursa com demência, o EEG apresentaalentecimento difuso e bilateral29.

FIGURA 11“Status” eletrográfico do sono não-REM (a) desaparece durante o REM (b).

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ENCEFALOPATIAS METABÓLICAS

A encefalopatia metabólica (EM) hepática apresentano EEG alentecimento difuso e bilateral, com predo-mínio de ondas theta e/ou delta, assim como períodosde supressão, dependendo da gravidade da encefalopatia.A presença de ondas trifásicas típicas, de predomínioanterior, é um achado no EEG muito comum nesse tipode EM. A EM renal apresenta achados semelhantes aosda hepática, porém não é comum a ocorrência de ondastrifásicas típicas e mais freqüentemente o EEG apresentacrises eletrográficas, sobretudo durante a fotoestimu-lação. Na hipocalcemia o EEG pode apresentar atividadeepileptiforme freqüente, por vezes contínuas, sob formade status epilepticus, de predomínio posterior ou difusase bilaterais.

VARIANTES BENIGNAS DO EEG

A identificação de alguns padrões eletrográficosconhecidos como variantes benignas (VB) é importantepara que o EEG não seja laudado como anormal. AlgumasVB são semelhantes às atividades epileptiformes, comoo complexo ponta-onda 6 Hz (ponta-onda “fantasma”), apequena ponta benigna do sono, a pseudo ponta-onda eas wickets spikes. Temos também as pontas positivas 6/14 Hz, o “SREDA” (Fig. 12)30, que pode ser confundidocom crise eletrográfica, a descarga rítmica temporalmédia, a pseudo-ponta-onda (hipersincronia hipna-gógica), o ritmo da fenda em pacientes craniotomizadose mais recentemente o potencial “N”31. No caso de dúvidaentre a atividade epileptiforme e a VB, a primeirageralmente fica mais freqüente conforme o sono vai apro-fundando, enquanto a VB só aparecedurante a sonolência32.

RECÉM-NASCIDO

O EEG realizado no recém-nascido (RN) é um dos exames maisimportantes da investigação neuro-lógica, sobretudo pelo aspecto prog-nóstico e, às vezes, como impres-cindível para o diagnóstico dedeterminados quadros clínicos queatingem o RN. No RN, além doEEG, também monitoramos osmovimentos oculares, a respiração,outro eletrodo para EMG e um parao ECG.

Alguns padrões eletrográficos significam mau pro-gnóstico, ou seja, o risco é alto para que o RN apresenteuma encefalopatia: a) as pontas positivas freqüentes33;b) surto-supressão; c) traçado de baixa amplitude; d)longos períodos de inatividade (> 30s, no prematuro),com ausência de grafoelementos próprios da pre-maturidade (delta brush; sawtooth). Ao contrário, o EEGnormal do prematuro (traçado descontínuo, com períodode atenuação variando de 5 a 20 s; presença de delta brushe de sawtooth) ou do RN a termo (tracé alternant)correlacionam-se com um bom prognóstico, tanto doponto de vista motor como intelectual.

Em relação ao diagnóstico, o EEG é importante paracomplementar o diagnóstico da encefalopatia deOhtahara, a encefalopatia mioclônica precoce deAicardi, pelo aspecto de surto-supressão. No statusconvulsivo de 5o dia, a presença do padrão eletrográficotheta pointu alternant complementa o diagnóstico. Alémdisso, o EEG é imprescindível para o diagnóstico dedeterminados tipos de crises epilépticas neonatais, comoapnéia, taquipnéia, mastigação, piscamentos e outrostipos de crises sutis ou ocultas do RN.

COMAS

O EEG tem importância prognóstica no coma trau-mático, pois a identificação do spindle coma ou sleep like ea presença de reatividade do EEG aos estímulos dolorosos,na fase aguda do coma, correlacionam-se a um melhorprognóstico em 87% dos casos, enquanto a ausência desseachados, com atividade delta difuso e sem reatividade noEEG à estimulação dolorosa, está associada à má evoluçãoem 86% dos pacientes comatosos34.

FIGURA 10Foco temporal anterior bilateral, mais evidente à esquerda.

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A presença da atividade alfa em um pacientecomatoso leva ao diagnóstico do “coma alfa”. Esseachado no EEG ocorre geralmente em pacientes comlesão de tronco cerebral, sobretudo na região pontina, eas etiologias mais comuns são o AVC e trauma35.

Alguns pacientes comatosos que não melhoram,apesar de todos os exames neurorradiológicos e clínicosgerais sugerirem que o paciente está com boa evolução,podem estar em SE não-convulsivo. O EEG nesses casosé fundamental, pois ao demonstrar o status eletrográfico,apesar de clinicamente não ser visível, está indicado otratamento de emergência com drogas antiepilépticas, oque leva o paciente a uma melhor e rápida recuperação.

Em relação à morte cerebral, para considerarmos oEEG com silêncio elétrico cerebral, devemos observarse há presença de hipotermia, uso de drogas (benzo-diazepínicos, barbitúricos) e alterações metabólicas.Devemos evitar falar em morte cerebral para o recém-nascido até 7 dias de vida, pois existem muitas discor-dâncias entre o quadro de coma, angiografia cerebral eresultado do EEG, devido à imaturidade do sistemanervoso central. Até os 2 anos de idade é recomendáveldois exames clínicos e 2 exames de EEG, com intervalovariando de 24 a 48 h. O exame deve ser realizado por30 minutos, com todos os eletrodos cerebrais colocadosde acordo com sistema 10-20, aumentar a sensibilidadepara 2 µV/mm, usar filtros de 0,5-70 Hz e não deve serobservada reatividade no EEG aos estímulos dolorosos,visuais e auditivos. Em relação à colocação dos eletrodosno couro cabeludo, devemos usar distâncias duplas, comum mínimo de 10 cm de separação intereletrodos: F3-P3; C3-O1; FP1-T3; F7-T5; F4-P4; C4-O2; FP2-T4; F8-T6. Do mesmo modo, aplicamos essa medida para asmontagens transversas anterior (F7-Fz; Fz-F8), média(T3-Cz; Cz-T4) e posterior (T5-Pz; Pz-T6). Devemosdeixar um canal para o registro dos potenciais cardíacose outro para a monitorização do ambiente (eletrodospodem ser colocados sobre o dorso da mão)36.

EEG CONVENCIONAL X EEG DIGITALX MAPEAMENTO CEREBRAL

Temos observado muita dúvida em relação àimportância do EEG digital (ED) e o mapeamentocerebral (MC), assim como acharem que o ED e o MCsão sinônimos. Podemos dizer que EEG convencional éo registro que não utiliza o computador, não podendoser arquivado em disquetes, não permitindo a mudançadas montagens após a captação do registro e nos obrigaa utilização de pilhas de papel. Ao contrário, o EEGdigital é exibido na tela do monitor colorido, após ser

processado pelo microcomputador, podendo serarmazenado em disquetes, dispensando o uso dearquivos gigantes para empilhamento de papéis. O EDpossui grande vantagem em relação ao EC, por permitiro manuseio das montagens após o registro, de grandeimportância no estudo das atividades epileptiformes. OMC é a representação gráfica do ED por meio de mapaselaborados pelo microcomputador36. Encerrado oregistro do ED, realiza-se a leitura e seleciona-se osmelhores momentos para o MC, ou seja, este só érealizado após a escolha dos fragmentos do ED. Dessaforma, é fundamental a correta seleção dos melhoresmomentos, pois todos os passos seguintes durante arealização do MC serão baseados nos fragmentosescolhidos. Uma escolha inadequada pode levar a umainterpretação e conclusão errôneas do exame.

Achamos que brevemente o ED dominará o cenáriomundial da eletrencefalografia, de modo que os aparelhosde EEG convencional farão parte de um passado dahistória do EEG. Em relação ao MC, que é uma extensãodo ED, não deve ser interpretado isoladamente, mas emconjunto com o ED. Somos de opinião que o MC é umexame que não deve ser solicitado como rotina, estandoreservado apenas para a pesquisa científica em algunscampos na neurologia e psiquiatria.

SUMMARYGeneral and Practical Aspects of the EEGThe knowledgment of some practical aspects in the analysis of the EEGare important to avoid misdiagnosis in the final reports. About epilepsies,the correct use of the montages makes easy the study of the EEG and wecan make the diagnosis of epileptic syndromes. In demented patients wemay find different patterns without a patognomonical type. Benign variantsof the EEG must not be misinterpreted as abnormal findings. In the sameway, patients with epileptiform activity on EEG without a history of epilepsy,should not receive antiepileptic drugs. The EEG in the newborn hasdiagnostic and prognostic values in the encephalic lesions. In non-convulsiveepileptic “status” the EEG makes the differential diagnosis. In metabolicencephalopathies we can evaluate the degree of severity by the EEG. Thecomas may have their prognosis established by the EEG and it helps in thediagnosis of brain death. The brain mapping, carried out only after the digitalEEG, is not a routine exam.

KEY WORDSEEG, general aspects.

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Endereço para correspondência:Délrio Façanha da SilvaUniversidade Federal de São PauloEscola Paulista de Medicina – Disciplina de NeurologiaRua Botucatu, 740 – Vila ClementinoCEP 04023-900 São Paulo (SP)E-mail: [email protected]

SILVA, D.F. & LIMA, M.M. – Aspectos Gerais e Práticos do EEG Rev. Neurociências 6(3): 137-146, 1998

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PERES, M.F.P.; NOGUEIRA, R.G.; CHIRCIU, M.V.; STÁVALE, J.N. & GABBAI, A.A. – Rev. Neurociências 6(3): 147-149, 1998Acidente Vascular Cerebral Isquêmico: Relato de um Caso com Imagem Radiológica Atípica

RELATO DE CASO

* Médico Residente da Disciplina de Neuro-logia da Escola Paulista de Medicina –UNIFESP.

** Professor Adjunto do Departamento deDiagnóstico por Imagem da Escola Paulistade Medicina – UNIFESP.

*** Médica Residente da Disciplina de Neuro-logia da Escola Paulista de Medicina –UNIFESP.

**** Professor Adjunto do Departamento dePatologia Cirúrgica da Escola Paulista deMedicina – UNIFESP.

*****Professor Titular de Neurologia da EscolaPaulista de Medicina – UNIFESP.

RESUMOOs autores apresentam um caso de acidentevascular cerebral isquêmico com uma imagemradiológica atípica, com realce periférico dalesão à tomografia computadorizada com con-traste, assemelhando-se a imagem neoplásica.O diagnóstico foi feito pelo exame anatomo-patológico.

UNITERMOSAcidente vascular cerebral, circulação de luxo,neurorradiologia.

Acidente Vascular CerebralIsquêmico: Relato de um Casocom Imagem Radiológica Atípica

Mario Fernando Prieto Peres*Roberto Gomes Nogueira**Míriam Vera Chirciu***João Norberto Stávale****Alberto Alain Gabbai*****

RELATO DE CASO

JAS, 60 anos, sexo feminino, parda, veio encaminhada de um hospital deatendimento primário com história de rebaixamento súbito do nível daconsciência, diminuição da força muscular no hemicorpo esquerdo e abalosmusculares localizados em membro superior esquerdo.

Ao exame de entrada, a paciente apresentava-se do ponto de vista clínicocom hipertensão arterial, níveis oscilando entre 180x110 e 160x100 mmHg,ausculta cardíaca não apresentava sopros, era rítmica e hipofonética. Auscultarespiratória evidenciava estertoração em dois terços inferiores de hemitóraxdireito, ritmo respiratório regular, freqüência elevada e fadiga respiratória.

Exame neurológico revelou paciente não-responsiva a comandos verbais,desvio do olhar conjugado para direita, resposta motora ausente em dimídioesquerdo, localizava à dor no hemicorpo direito, paresia facial centralesquerda. Reflexo cutâneo-plantar sem resposta à esquerda, em flexão àdireita. Apresentava assimetria de reflexos comparando-se os dimídios.Pupilas isocóricas e fotorreagentes, restante do exame sem anormalidades.

Familiares relataram antecedente pessoal da paciente de hipertensãoarterial de controle irregular.

Foi realizada intubação orotraqueal e instalada ventilação mecânica nosprimeiros momentos da paciente no setor de emergência do Hospital SãoPaulo. O exame radiológico convencional do tórax mostrou imagem sugestivade broncoaspiração e a paciente recebeu antibioticoterapia adequada.

Exames de bioquímica e hematológicos na entrada não revelaramalterações. O eletrocardiograma mostrou hipertrofia ventricular esquerda. Atomografia computadorizada de crânio (figura 1) mostrou imagem hipodensana região fronto-temporal direita com limites irregulares e com realceperilesional ao contraste.

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A paciente apresentou piora do ponto de vista clínico,entrando em sepse e evoluindo a óbito três dias após ainternação, sendo realizada necrópsia.

ANATOMOPATOLOGIA

O exame anatomopatológico mostrou que a lesãointerpretada inicialmente como neoplasia primária dosistema nervoso central apresentava amolecimentoisquêmico em organização, sendo um acidente vascularcerebral isquêmico.

Apresentava também aterosclerose generalizada, aortae ramos, e vasos do polígono de Willis. Hipertensãoarterial sistêmica foi confirmada pelos achados dehialinização de vasos do córtex cerebral e arteríolas renais.

DISCUSSÃO

No presente caso, relatamos uma apresentação radio-lógica atípica de um acidente vascular cerebral isquêmico.

Segundo Osborne1, o diagnóstico clínico pode serinexato em cerca de 10% dos casos de acidente vascularcerebral isquêmico (AVCI), e outras doenças comoneoplasias e infecções podem apresentar uma manifestaçãoinicial súbita, e ter os mesmos sinais localizatórios,assemelhando-se a uma doença vascular cerebral.

Os achados que sugerem AVCI são: o início súbitodo acometimento neurológico, fatores de risco paradoença vascular, imagem radiológica afetando subs-tância branca e cinzenta, de aspecto cuneiforme ougiriforme, e de típica distribuição vascular2.

Os aspectos clássicos de neoplasia3 incluem aevolução gradual dos sintomas. A imagem radiológicaapresenta característica arredondada ou infiltrativa,podendo poupar o córtex cerebral, e não está confinadoa nenhum território arterial específico.

Com a injeção de contraste, a imagem radiológicade um AVCI pode ter um realce periférico que deno-minamos “circulação de luxo”, adaptado do termo eminglês luxury perfusion4. Esse achado, porém, podeaparecer em casos de encefalite, neoplasia infiltranteou até mesmo contusão cerebral, o que torna dificultadapor vezes a interpretação do exame de imagem5,6.

FIGURA 1Imagem frontal direita, não respeitando território vascular, com realce periférico da lesão e desvio de linha média.

PERES, M.F.P.; NOGUEIRA, R.G.; CHIRCIU, M.V.; STÁVALE, J.N. & GABBAI, A.A. – Rev. Neurociências 6(3): 147-149, 1998Acidente Vascular Cerebral Isquêmico: Relato de um Caso com Imagem Radiológica Atípica

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Estudo recente7 revelou que em apenas 0,05% doscasos de acidente vascular cerebral, havia uma imagemincidental sugestiva de neoplasia do sistema nervosocentral.

Outros métodos de imagem podem ser utilizados,para melhor diferenciar o diagnóstico, entre eles aressonância magnética6,8, a angiorressonância9, oSPECT10 e o PET11.

SUMMARYAcute Ischemic Stroke: Case Report with an Atypical Radiologic ImageThe authors report an uncommon case of acute ischemic stroke with anatypical radiologic image, showing a peripheral contrast enhancement lesionon the computerized tomography, resembling a neoplastic disease. Thediagnosis was made by autopsy.

KEY WORDSStroke, luxury perfusion, neuroradiology.

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Endereço para correspondência:Mario Fernando Prieto PeresUniversidade Federal de São PauloEscola Paulista de Medicina – Disciplina de NeurologiaRua Botucatu, 740 – Vila ClementinoCEP 04023-900 São Paulo (SP)E-mail: [email protected]

PERES, M.F.P.; NOGUEIRA, R.G.; CHIRCIU, M.V.; STÁVALE, J.N. & GABBAI, A.A. – Rev. Neurociências 6(3): 147-149, 1998Acidente Vascular Cerebral Isquêmico: Relato de um Caso com Imagem Radiológica Atípica

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AGENDA

AGENDA Rev. Neurociências 6(3): 00-00, 1998

• II Congresso Paulista de Neurologia

13 a 15 de maio de 1999Campos do Jordão, SPDepartamento de Neurologia da AssociaçãoPaulista de MedicinaInf.: Setor de Eventos Científicos da APMFone: (011) 232-3141Fax: (011) 3107-7979

• II Congresso Brasileiro de DoençasCerebrovasculares

18 a 20 de novembro de 1999Pousada do Rio Quente – Goiás, GOInf.: Classe Promoções e EventosTelefax: (062) 241-7399Fone: (062) 241-6021e-mail: [email protected]