96

Revista Sem Fronteiras

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Revista de Ciência, Tecnologia e Inovação Sem Fronteiras, publicada pela Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior do Paraná.

Citation preview

Page 1: Revista Sem Fronteiras
Page 2: Revista Sem Fronteiras
Page 3: Revista Sem Fronteiras

C A R TA A O L E I T O R

os últimos anos, as ciências de um modo geral tornaram-se

muito mais precisas e complexas. Cada vez mais presentes em nossas

vidas, nos desafiam a refletir sobre as profundas mudanças em curso

neste início de século – climáticas, por exemplo, e a busca por fontes

alternativas e limpas de energia, entre as quais a bioenergia, tema de

capa desta edição.

Nessa situação, um dos aspectos mais intrigantes é, sem dúvi-

da alguma, equilibrar os novos postulados científicos com os conceitos

sobre os quais nos apoiamos durante a maior parte do nosso apren-

dizado. Por isto, também não poderíamos, nesta edição, deixar de

abordar assuntos das áreas da genética clínica; da biotecnologia; da

física e da matemática; e da antropologia, entre outras.

No processo de comunicação com o público, experiências

como essa ao mesmo tempo em que fascinam quem está do lado

da produção da informação certamente geram alguma expectativa

por parte da comunidade científica e também do público leigo. Como

catalisadores, jornalistas que atuam no meio procuram colaborar com

cientistas e pesquisadores, transformando conteúdos altamente espe-

cializados em informação acessível à maioria. Mas esta nem sempre

é uma tarefa fácil.

É desejo da Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensi-

no Superior do Paraná, que promove e financia esta publicação sob

a ótica de um mundo melhor, sem fronteiras, ampliar o diálogo com

o público acadêmico e não acadêmico, bem como prestar contas da

aplicação dos recursos investidos nessa área. Descontadas as inevi-

táveis lacunas de um primeiro número, desejamos que os artigos e as

reportagens aqui tratadas contribuam minimamente para isso.

N

Page 4: Revista Sem Fronteiras

SEÇÕES

1

12

6

82

10

14

15

15

16

16

17

18

Carta ao leitor

Ensaio Por Waldemiro Gremski

Produção científica e qualidade de vida

Entrevista salmo raskin

Genética clínica: ela ainda não chegou ao sUs

MemóriaCaminhos do Pelourinho na Vila nossa senhora da luz

Perfil maria Helena FUnGaro

Uma vida dedicada à genética de microorganismos

Notícias de C&TDescobrindo os mistérios do universo

o maior acelerador de partículas já construído começa a funcionar

Linguagem sem números

Tribo amazônica não tem palavras que expressam quantidades exatas

Desligamento de genes

Terapia de silenciamento de genes combate o HiV em roedores

A família aumentou

Fósseis do maior dinossauro brasileiro são encontrados em minas Gerais

Laser para aplicação biomédica

Uem desenvolve laser para ser usado em cirurgias

Ao estilo de Sherlock Holmes

método analisa vestígios de solo e diz se um suspeito esteve na cena de um crime

Evento - 60º reunião anual da sBPC

marco antonio raupp: “a ciência brasileira vive um bom momento”

Page 5: Revista Sem Fronteiras

SEÇÕES

reportagens

CAPA Bioenergia. Brasil amplia vantagensO Brasil usa combustíveis limpos para atender 45,8% de suas demandas energéticas, enquanto a

média mundial não passa de 13%. O país domina, desde os anos setenta, tecnologias de produção de

etanol a partir da cana-de-açúcar e, nas últimas duas décadas, passou a produzir biocombustíveis,

atualmente misturados ao diesel. Mas há ainda um longo caminho a percorrer para aumentar a

produtividade destes combustíveis e ganhar escala para abastecer também o mercado externo.

CIÊNCIA

A força da biotecnologia Pesquisas realizadas pela Universidade estadual de maringá na área chamam a atenção

de indústrias bioquímicas e de fármacos da região.

Um problema fundamental Jovens brasileiros não demonstram interesse por matemática e física na hora de

escolher uma profissão.

HUMANIDADES

Festa no pedaço estudos do núcleo de antropologia Urbana da UsP propiciam uma compreensão renovada da

vida urbana e dos valores contemporâneos para além dos diagnósticos alarmistas.

Cuidadores de idosos: o país precisa desta profissão o aumento do número de idosos na américa latina vai quadruplicar entre 2005 e 2050 e superar

a população jovem em 30%.

MEIO AMBIENTE

Rio de informações Pesquisadores da Unioeste e da Uem preparam catálogo da ictiofauna do Baixo iguaçu.

Urbanização impõe novos desafios Cerca de 12% dos recursos hídricos mundiais estão no Brasil, mas os desafios não param de crescer.

TECNOLOGIA E INOVAÇÃO

Mudanças em curso Consolidação da política nacional de inovação, calcada principalmente na lei do Bem é uma

dessas mudanças.

LIVROS

RESENHA Por Wander melo miranda

Pop e política da cópia

36

20

28

68

77

48

54

58

89

87

Page 6: Revista Sem Fronteiras

E X P E D I E N T E

GOVERNADOR roberto requião

VICE-GOVERNADOR

Orlando Pessuti

SECRETÁRIA DE ESTADO DA CIÊNCIA,

TECNOLOGIA E ENSINO SUPERIOR

lygia Pupatto

DIRETOR GERAL

Jairo Pacheco

José Tarcísio Pires Trindade

REVISTA DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E

INOVAÇÃO SEM FRONTEIRAS

CONSELHO EDITORIAL Antônio Alpendre, Jairo Pacheco,

José Eduardo Gonçalves,

José Tarcisio Pires Trindade,

Patrícia Castro, Regina Célia Rocha

DIRETORIA TÉCNICA Patrícia Castro

EDITORA CHEFE Regina Célia Rocha

EDITORA ASSISTENTE Helen Mendes

REPORTAGEM Apolo Theodoro, Camilla Toledo,

Célio Yano, Ciméa Bevilacqua,

Cláudia Izique, Marcos Gouvea,

Miriam Karam, Rodrigo Apolloni,

Romeu de Bruns

FOTÓGRAFOS Bruno Stock, Carllos Bozelli,

Diego Singh, Marcos Borges,

Thiago Terebezinsky

REVISÃO Pluma Alvarenga Morato

COLABORADORES José Carlos Veiga Lopes,

Maria Helena de Moura Arias,

Wander Melo Miranda,

Waldemiro Gremski

APOIO Alexandre Sfeir Conter,

Euzilene A. Silva,

José Lázaro Jr,

Marcelo Barão,

Susana Branco,

OS ARTIGOS ASSINADOS NÃO REFLETEM NECESSARIAMENTE

A OPINIÃO DA SETI.

DIAGRAMAÇÃO Visualita Programação Visual

IMPRESSÃO Imprensa Oficial do Estado

TIRAGEM 20 mil exemplares

CONTATO [email protected]

SETI

Avenida Prefeito Lothário Meissner, 350 – Jardim Botânico – CEP

80210-170 – Curitiba – PR – Telefone (41) 3281-7300 – Fax (41)

3281-7334 – www.seti.pr.gov.br

Page 7: Revista Sem Fronteiras

A P R E S E N TA Ç Ã O

Como professora universitária tenho uma enorme satisfação em participar do

nascimento de uma revista que se propõe a difundir ciência e tecnologia dentro e fora

das universidades, faculdades e institutos de pesquisa. Tenho repetido por onde ando

que o desenvolvimento do país e a superação das nossas inaceitáveis desigualdades

passam pela educação e pela capacitação em ciência e tecnologia. Mais que isso,

tenho dito que a educação é capaz de realizar uma verdadeira revolução silenciosa,

provocando uma ruptura em séculos de dependência e desigualdades sociais.

Contemporaneamente, apesar de se produzir cada vez mais conhecimentos,

não se tem conseguido fazer com que eles cheguem a todos que dele tenham ne-

cessidade. Este processo marginaliza pessoas e até mesmo países, tornando desigual

o acesso aos benefícios gerados pela ciência. Esta revista visa, portanto, enfrentar

o desafio de fazer chegar a pesquisadores e aos cidadãos em geral informações

sobre os principais temas e avanços em ciência e tecnologia. A partir de uma abor-

dagem que considera a produção mais relevante em nível nacional e internacional,

apresenta as principais iniciativas desenvolvidas no Paraná em ciência, tecnologia e

ensino superior.

Vivemos atualmente num mundo que se transforma num ritmo nunca visto

anteriormente e que tende a continuar acelerando este movimento. Neste mundo no

qual “tudo que é sólido desmancha no ar”, a informação e o conhecimento são as fer-

ramentas que permitem que os indivíduos e as instituições não apenas se adaptem

melhor às mudanças, mas também que consigam nelas intervir, não ficando comple-

tamente subordinados aos ritmos da globalização e dos mercados.

Romper fronteiras, construir o futuro

Lygia Pupatto

Secretária de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior

Page 8: Revista Sem Fronteiras

Os estudos da genética avançam em

várias áreas do conhecimento – agricultura,

medicina, antropologia e ciência forense – e

ganham corpo com as discussões em torno de

dilemas éticos relacionados às pesquisas com

células-tronco embrionárias, à clonagem humana

e aos alimentos geneticamente modificados, por

exemplo. Nesta entrevista, o médico geneticista

Salmo Raskin, reeleito presidente da Sociedade

Brasileira de Genética Médica, falou sobre

políticas públicas em genética clínica, pesquisas

nacionais e internacionais na área e também

sobre as terapias gênicas e a genômica pessoal.

Paranaense, Raskin é um dos poucos cientistas

brasileiros a integrar o Projeto Genoma

Humano. Em Curitiba, ele leciona na Pontifícia

Universidade Católica do Paraná, Universidade

Positivo e Faculdade Evangélica. Trabalha ainda

nos Hospitais Pequeno Príncipe e Nossa Senhora

das Graças e é diretor do Genetika - Centro de

Aconselhamento e Laboratório de Genética.

SALMO RASKIN

Genética clínica

Ela ainda não chegou ao SUS

E N T R E V I S TA

HELEN MENDES

6 | semFRONTEiRAS

Page 9: Revista Sem Fronteiras

O senhor foi reeleito presidente da Sociedade Brasileira

de Genética Médica para o período 2008-2010. Quais

são as propostas para esta nova gestão?

SalmoRaskin Existem várias, mas a mais

importante é a tentativa de incluir junto ao Sistema

Único de Saúde (SUS) uma política de atendimento

voltada ao aconselhamento genético, além de exames

laboratoriais que detectam doenças genéticas. Em

2004, o Ministério da Saúde instituiu um grupo de

trabalho, que fez a parte técnica e elaborou uma

política pública para a área de genética clínica. O

projeto está pronto no Departamento de Atenção

Especializada da Secretaria de Atenção à Saúde. Falta

transformá-lo em realidade.

O que isto significa? O aconselhamento genético

poderá prevenir novas doenças?

SalmoRaskin Sim, novos casos poderão ser

prevenidos e as pessoas entenderão melhor porque

seus filhos nascem com certas doenças. Às vezes, uma

doença pode se repetir por causa da hereditariedade,

mas existem tratamentos específicos para ela. Então,

há um enorme conjunto de atitudes que poderiam ser

tomadas e não são porque 140 milhões de pessoas

não têm acesso à genética clínica.

Uma das principais causas da mortalidade infantil no

Brasil são as anomalias congênitas. Elas representam

13% dos óbitos de crianças com menos de um ano,

de acordo com a última avaliação da Fundação

Oswaldo Cruz. Os índices desta doença também

poderão diminuir com políticas públicas para a área

da genética?

SalmoRaskin Exatamente. O Brasil está em

um patamar em que as anomalias congênitas já

ultrapassaram, e muito, os índices em que se deve

incluir a genética no sistema público de saúde.

Neste ano, a Agência Nacional de Saúde incluiu

exames laboratoriais de DNA para detecção de

doenças genéticas nos procedimentos cobertos pelos

planos de saúde. Quais doenças podem ser detectadas

através destes exames?

SalmoRaskin Essa foi uma batalha ganha

pela diretoria anterior da Sociedade Brasileira de

Genética Médica, da qual eu era presidente. Mais de

1.200 doenças podem ser detectadas. Também é

“Tomando os cuidados

necessários, é possível

usufruir dos

benefícios que os

exames de dna podem

proporcionar”.

semFRONTEiRAS | 7

Page 10: Revista Sem Fronteiras

O senhor está otimista com os possíveis resultados

que estas pesquisas podem ter aqui no Brasil? Quais

são as perspectivas?

SalmoRaskin Eu estou otimista, porém

cauteloso. É importante que a sociedade saiba que

essas pesquisas terão algum resultado prático daqui

a dez, vinte anos, e não daqui um ou dois anos, como

alguns vêm propagando. Também não se pode

deixar de dizer que o Brasil ainda carece de muito

investimento em pesquisa. Assim, no momento em

que os administradores brasileiros entenderem a

importância da pesquisa científica, o país dará um

salto enorme e poderá ser um dos líderes mundiais

na área.

O Brasil está entrando em tempo de obter resultados

nessa área?

SalmoRaskin Está sim. Nós fazemos

algumas críticas, mas também temos que aplaudir

o que está sendo bem feito, e a aprovação da lei

veio em boa hora. Com isso, o Brasil fica ao lado dos

países mais desenvolvidos na pesquisa com células-

tronco. Nos Estados Unidos, e agora vou dar um

exemplo negativo, o governo federal não aprovou

lei para a pesquisa com verba federal. Portanto,

podemos dizer que o Brasil, neste momento, está à

frente desse país.

Hoje, com a chamada genômica pessoal, uma

pessoa já pode fazer um mapeamento de seu DNA

por um preço razoável com a técnica de análise

de SNPs - polimorfismos de nucleotídeo único.

Qual a sua opinião sobre estes serviços? É possível

fazer um planejamento de saúde com base nesses

resultados?

SalmoRaskin Eu acho que ainda há muita

desinformação sobre este assunto. Ainda não

existe uma tecnologia capaz de fazer o mapa

genético completo do indivíduo. Estes testes são

bastante superficiais e não têm a capacidade de

dar o retorno proposto. Algumas pessoas, leigas no

assunto, são levadas a imaginar que este teste é um

estudo completo do genoma humano, mas isto só

vai acontecer dentro de uns cinco ou dez anos, não

agora. Portanto, este é um teste que tem um intuito

mais comercial. Existem, sim, centenas de testes

genéticos, mas eles devem ser orientados para

“nesTe momenTo,

o brasil esTá

à frenTe dos

esTados unidos

em relação à

exisTência

de uma lei

aprovando a

pesquisa

com células-

Tronco”.

possível detectar se a pessoa tem predisposição para

desenvolver certas doenças genéticas e se ela tem

riscos de ter filhos com tais doenças.

Hoje, com maior disponibilidade de exames genéticos,

muitas pessoas temem que resultados que indicam

predisposição a doenças de difícil tratamento

dificultem a contratação de um plano de saúde ou

mesmo o ingresso em um emprego. Os benefícios

desta nova medicina personalizada poderiam ser

perdidos diante de preocupações como estas? O que

poderia ser feito?

SalmoRaskin Entendo que uma sociedade

de especialidade médica reconhecida pelo Conselho

Federal de Medicina deve ter o papel de reguladora e

controladora. É o que a Sociedade Brasileira de Genética

Médica está propondo. Além disso, os resultados dos

exames só podem ser acessados pelo paciente e seu

médico, de modo que nenhum dos problemas citados

acontecerá. Países mais desenvolvidos do que o nosso

nessa área, onde os exames já são feitos há mais de

uma década, já tomaram esses cuidados. Os Estados

Unidos acabaram de aprovar uma lei federal tornando

crime a liberação dos resultados para outras pessoas

que não o paciente e seu médico. Tomando esses

cuidados, é possível usufruir dos enormes benefícios

que esses exames podem proporcionar.

Neste ano, o Supremo Tribunal Federal validou a Lei

de Biossegurança, que libera pesquisas com células-

tronco embrionárias sob certas condições. Como o

senhor avalia esta aprovação?

SalmoRaskin Eu acho que foi um passo muito

importante, sob vários aspectos. É como se dissessem:

“Vão em frente, a pesquisa científica é importante para

o Brasil passar para o patamar de país desenvolvido”.

Acho que esta é a mensagem principal. Outras,

secundárias, também foram dadas. Por exemplo, a

de que o Brasil é um país laico, e, mesmo as religiões

sendo, obviamente, importantes dentro da sociedade,

não são elas que definem, por si próprias, os rumos

do país, elas definem apenas um dos componentes da

sociedade. E a própria lei, que permite pesquisas com

células-tronco embrionárias em certas circunstâncias,

é uma abertura para que, no futuro, milhões de

pessoas possam ter uma esperança.

“esTamos aTrás

na área das

Terapias

gênicas. o

sucesso dos

resulTados é mais

lenTo do que se

imaginava”.

8 | semFRONTEiRAS

Page 11: Revista Sem Fronteiras

uma determinada situação. É possível fazer testes

absolutamente precisos para problemas que possam

estar afetando uma família. O aconselhamento

genético feito por médico especialista é o momento

no qual se identifica se existe nessa família alguma

situação de risco elevado.

As pesquisas com terapias gênicas vêm mostrando

resultados promissores. Recentemente, foi anun-

ciado que cientistas conseguiram combater o HIV

em roedores através do desligamento de genes. O

Brasil produz este tipo de pesquisa?

SalmoRaskin Nesta área estamos um

pouco atrás. O motivo é que as terapias que

pretendem corrigir o material genético alterado

vêm se desenvolvendo com sucesso lento, mais

do que se imaginava. Num dado momento houve

pessimismo e dúvidas quanto à continuidade das

investigações científicas por causa dos problemas

encontrados. Contudo, parece que os principais

problemas de segurança e de eficiência começam a

ser contornados e a possibilidade de se corrigir um

erro genético retornou com bastante força. Claro,

ainda está em fase de pesquisa, mas há progressos

em algumas áreas. Cito o tratamento de doenças

neurológicas como o Mal de Parkinson: nos Estados

Unidos, pesquisadores estão aplicando a terapia

gênica num grupo pequeno de pacientes, o que é um

avanço. Eu acredito que o Brasil precisa acordar para

esta área, porque ela tem um enorme potencial.

O senhor tem pesquisas importantes sobre a fibrose

cística, não?

SalmoRaskin Esta é uma área pela qual eu

tenho um interesse muito grande e que eu pesquiso

há mais de vinte anos. A fibrose cística é uma doença

genética e hereditária que ataca principalmente

o pulmão. Até poucos anos atrás esta doença era

pouco diagnosticada no Brasil, o que não significa

que ela é rara. Ela não era diagnosticada porque os

médicos não a conheciam muito bem e os sinais às

vezes se confundem com sinais de outras doenças

mais freqüentes. Porém, com a ajuda dos nossos

trabalhos, conseguimos demonstrar ao governo

brasileiro porque era importante o SUS incluir o

diagnóstico dessa doença no teste do pezinho. Isto

foi feito há cerca de quatro anos no Paraná e desde

então o número de casos diagnosticados é muito

grande, muito maior do que antes. Com o diagnóstico

precoce, a qualidade de vida dos pacientes tem

aumentado de maneira exponencial.

O que a fibrose cística causa e como o diagnóstico

precoce pode melhorar a qualidade de vida dos

pacientes?

SalmoRaskin A fibrose cística é uma doença

que causa problemas no pulmão e no pâncreas,

principalmente. No pulmão, ela causa pneumonias

repetidas. No pâncreas, ela altera a absorção de

gorduras, causando desnutrição no paciente. Então

forma-se um ciclo vicioso: a desnutrição leva a

pneumonias, que levam à desnutrição. Este ciclo leva

os pacientes a óbito em torno da segunda década de

vida. Com o diagnóstico, o tratamento da doença,

que é iniciado aos cinco ou seis anos, pode começar

já no primeiro ano de vida.

Como um dos cientistas que integram o Projeto

Genoma Humano, qual o balanço que o senhor faz

da participação do Brasil neste projeto?

SalmoRaskin O Brasil teve um papel

secundário no projeto porque acordou muito tarde,

somente dois anos antes de sua conclusão. As

verbas para os pesquisadores brasileiros foram

direcionadas, principalmente, para a compreensão

da genética do câncer. O pesquisador brasileiro é

muito bem preparado, habilitado e contribuiu de

maneira significativa, mesmo em pouco tempo.

Fora isso, não houve uma grande contribuição.

Eu tive a oportunidade de ser um dos primeiros

pesquisadores brasileiros a fazer parte do projeto

por uma coincidência do destino: eu havia começado

a fazer meu treinamento em genética nos Estados

Unidos quando o Projeto Genoma Humano começou,

em 1990. Foi uma coincidência porque a universidade

para a qual eu passei a fazer pesquisa foi chamada

para fazer parte do projeto, e eu fui de carona. Então,

tive a oportunidade, durante três anos, de identificar

os genes humanos relacionados à produção do

hormônio do crescimento. Nesse momento fui

convidado a fazer parte do projeto.

“o TraTamenTo da

fibrose císTica é

iniciado aos cinco

ou seis anos

de idade. com o

diagnósTico, é

possível

começar no

primeiro ano de

vida”.

E N T R E V I S TA

semFRONTEiRAS | 9

Page 12: Revista Sem Fronteiras

Graduada em biomedicina, a professora e

pesquisadora Maria Helena Pelegrinelli Fungaro,

que está completando trinta anos na Universidade

Estadual de Londrina, encantou-se com a genética

molecular de microorganismos e fez uma carreira

brilhante.

Hoje, ela diz que pode dividir sua trajetória em

três fases. A primeira está relacionada aos estudos

de um fungo modelo, o Aspergillus nidulans, e ao

desenvolvimento de uma metodologia de introdução

de um fragmento de DNA nesse microrganismo, com

base num protocolo que não era descrito na literatura.

“Eu considero esse artigo um marco na minha

carreira”, resume a pesquisadora. Constantemente

citado pela literatura científica, o artigo é usado por

pesquisadores para diferentes finalidades.

A segunda fase é marcada por estudos sobre

fungos que se aplicam ao controle biológico de

p E R f I l

pragas na agricultura, o Metharhizium anisopliae e a

Beauveria bassiana, e análises de variação genética

a partir de testes de DNA. “Essa metodologia não

existia na UEL e mesmo na maioria dos estados

brasileiros”, relata a pesquisadora. A terceira fase

começou há cerca de seis anos com os estudos

sobre fungos que produzem toxinas em alimentos

como algumas espécies de Aspergillus. “Eu adoro

fazer pesquisa, mas antes de tudo sou professora”,

afirma ainda. “Quando você ensina alguma coisa em

que acredita, você tem uma resposta muito rápida.

É diferente da pesquisa, que é mais de longo prazo.

Ao final de cada semestre ou final de um curso de

extensão, a resposta já está ali”.

vida acadêmica

Maria Helena nasceu em janeiro de 1959, em

Londrina. É neta de italianos. Possui graduação

em ciências biológicas pela Universidade Estadual

10 | semFRONTEiRAS

Page 13: Revista Sem Fronteiras

A IMpLANtAçãO dO pROjEtO GENOMA , cOM

O SEqüENcIAMENtO dO dNA, E A pESqUISA

EM pROtEôMIcA, qUE EStUdA O cONjUNtO dE

pROtEíNAS dOS SERES vIvOS, EStãO ENtRES AS

pRINcIpAIS AtIvIdAdES dA pESqUISAdORA NA

UNIvERSIdAdE EStAdUAL dE LONdRINA.

Uma vida dedicada à genética de microorganismos

de Londrina (UEL) e mestrado e doutorado em

Agronomia (Genética e Melhoramento de Plantas)

pela Universidade de São Paulo (USP). Foi um

caminho difícil. “Fiz o 1º grau e o 2º grau em Londrina,

sempre em colégio público. Estudei no iEL (instituto

de Educação de Londrina) e no Vicente Rijo. Depois

ingressei na UEL e fiz biomedicina. Quando terminei a

universidade ainda não tinha curso de pós-graduação

e eu já estava encantada com a área de genética.

Então as professoras Olivia Nagy Arantes, que foi

minha orientadora, e Eleonora Marchesi me ajudaram

a fazer um curso de trinta dias de aperfeiçoamento

na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz,

em Piracicaba”, lembra a pesquisadora. Nessa cidade

ela encontrou o professor João Lúcio de Azevedo,

responsável pela implementação da genética de

microrganismos no Brasil. “Eu o considero meu pai

científico”, sublinha a pesquisadora.

No mestrado, passou em primeiro lugar e foi

contemplada com uma bolsa de estudos. Na lendária

Escola de Agronomia Luiz de Queiroz, da USP, ela ficou

entre 1982 e 1984, de onde saiu mestre em genética

de microrganismos – nessa época, Maria Helena não

tinha emprego. ingressou no doutorado, no mesmo

grupo e área do mestrado. Seis meses depois, fez a

seleção para trabalhar como professora temporária

da UEL. “Estudei muito, fui admitida como professora

temporária, mas precisei trancar o doutorado em

março de 1985”. Surgiu então o concurso para a vaga

definitiva e a carreira na UEL. A biologia molecular

veio um pouco mais tarde. No doutorado, encerrado

em 1991, ainda trabalhou com melhoramento de

uma levedura para a produção de coalho. Na Luiz de

Queiroz, Maria Helena viveu a experiência de professor

visitante, participando ativamente de toda a rotina

do Laboratório de Genética de Microrganismos. “isso

mudou a minha vida, eu cresci muito”, conta.

MARCOS GOUVEA

semFRONTEiRAS | 11

Page 14: Revista Sem Fronteiras

produção científica e qualidade de vida

A importância do conhecimento como base para o desenvolvimento de

uma região, estado ou país alcançou um consenso jamais visto. Considerado

assunto de segurança nacional por boa parte das nações, constitui o

diferencial entre o desenvolvimento e o subdesenvolvimento, entre a

riqueza e a pobreza, a dependência e a independência, entre a inclusão e

a exclusão.

Sem ele o país torna-se um simples coadjuvante no processo econômico

mundial, mero fornecedor de mão-de-obra barata, matéria-prima e

commodities, obrigando-se a pagar um alto preço por tecnologias prontas,

muitas vezes superadas, por vezes verdadeira sucata. Países sem domínio

em ciência e tecnologia estão destinados à pobreza, fadados a serem uma

economia periférica, tendo que sempre vender mais, para receber menos.

Quando se fala de conhecimento, porém, deve-se considerá-lo não

apenas ciência, mas também tecnologia e inovação, além de educação

e cultura. São patamares que coexistem entre si, entrelaçam-se e, juntos,

respondem por um progresso abrangente e harmonioso. É o equilíbrio

entre estas partes de um todo que possibilita o acesso aos bens resultantes

do conhecimento a todas as camadas da população. Um país que investe

em apenas um dos níveis que constituem o conhecimento, como é o caso

do Brasil, dificilmente irá alcançar um desenvolvimento com crescimento

sustentável, do qual emane justiça social, inclusão e cidadania.

No caso do Brasil, todos os indicadores apontam uma evolução substancial

da sua pesquisa científica, tanto em quantidade como em qualidade. O país

ocupa hoje a 15ª posição no “ranking” mundial, com mais de 19.400 papers

publicados, participando com 2,02% da produção científica mundial, à frente

de países como a Suécia e a Suíça. Trata-se, porém, de um conhecimento

produzido essencialmente no âmbito das universidades, em especial nas

públicas, que constitui a ciência, em boa parte dos casos ciência básica,

fundamental para a formação de recursos humanos qualificados, mas que,

isoladamente, não assegura o desenvolvimento de nenhum país. Ou seja,

embora um sistema de pesquisa bem estruturado seja parte indispensável

para encaminhar o país a uma independência econômica, será o uso criativo

deste conhecimento que irá gerar o avanço tecnológico e a inovação, dos

quais irão resultar, além de novos produtos, também estratégias, processos,

tecnologias e serviços inovadores. São etapas indispensáveis para que o país

sedimente um lastro sólido com vistas a um desenvolvimento que independa

de choques e humores externos.

Ocorre que o ambiente inovador por excelência é a empresa. A

interação entre quem produz ciência com o setor produtivo é, portanto,

etapa fundamental para transformar o conhecimento em novos produtos ou

agregando-lhes valor tecnológico. Nessa relação, porém, chama a atenção

E N S A I O

WALdEMIRO GREMSKI

Professor Titular Sênior da UFPR,

Professor Titular e

Diretor de Pesquisa e Pós-Graduação

da PUC-PR

12 | semFRONTEiRAS

Page 15: Revista Sem Fronteiras

a existência de um grande fosso entre a produção

científica do país, essencialmente universitária,

e o setor empresarial, algo ainda distante de ser

superado. A Coréia do Sul é um exemplo de país

que conseguiu superar as barreiras do crescimento

econômico. Com uma produção científica próxima à

brasileira, teve mais de cinco mil patentes registradas

nos Estados Unidos em 2006, o que representa

3% da inovação tecnológica mundial, o Brasil não

chegou a 300. Ressalte-se que há vinte anos, ambos

os países exibiam números semelhantes: cerca de 80

patentes por ano.

Várias são as razões para explicar essa realidade:

um processo de industrialização que nunca ocorreu

com ênfase na inovação, agências de financiamento

que cobram essencialmente a publicação de

papers, ausência de incentivo para o registro de

patentes, problemas de ordem político-ideológica

e corporativa das universidades que dificultam a

parceria universidade-empresa, ausência de cultura

de inovação empresarial, entre outras.

A solução reside, portanto, na implementação

de uma política voltada para a inovação tecnológica,

da qual participem a academia e a empresa, além

do Estado como ente planejador e normatizador. A

inovação cria o desenvolvimento sustentável, pois

independe de decisões externas, como autorizações

de matrizes e afluxo de capitais, sendo, por esta

razão, auto-estimulante. Quanto maior o nível

tecnológico agregado a um produto, maior é a

escala de conhecimentos produzidos, com alto nível

de competitividade e preço, com maior geração

de riqueza e, em muitos casos, com geração de

empregos nos diversos patamares da escala de

produção do mesmo. Consolida, além disso, a

produção científica local na medida em que passa

a exigir, de forma crescente, cada vez mais ciência e

recursos humanos qualificados para a pesquisa.

Outra decorrência será a fixação de

pesquisadores das áreas de inovação (engenharias,

tecnologias da informação, agroindústria, biotec-

nologia, etc.) nas empresas, hoje praticamente

confinados à academia. Como atualmente não há

demanda de doutores por parte do setor produtivo,

a pós-graduação brasileira dedica-se a formá-los

para produzirem papers, mantendo o país como um

grande produtor de ciência, fornecendo preciosas

informações para que outros países criem seus

produtos com alto valor tecnológico, os quais

serão, por sua vez, importados pelo Brasil, com a

conseqüente dependência tecnológica e sangria de

recursos.

Por outro lado, exemplos da competência

brasileira na criação de tecnologia, quando

há planejamento e financiamento apropriados,

não faltam. Basta ver o sucesso das pesquisas

desenvolvidas pela Embrapa, uma das grandes

responsáveis pelo sucesso do nosso agronegócio

em diferentes regiões do país, da Coope da UFRJ,

com a tecnologia da exploração de petróleo em

águas profundas, da Embraer, da Fiocruz, das

pesquisas na área de biotecnologia, entre tantos

exemplos. Verifica-se que, mesmo havendo políticas

adequadas de planejamento, o enorme atraso nesse

campo tão estratégico poderá ser recuperado, como

já aconteceu em outras situações. Há muito sabe-

se que o desenvolvimento científico-tecnológico de

um país não depende apenas do volume de recursos

investidos, mas do destino que é dado aos mesmos,

além da sua continuidade.

É imprescindível romper este círculo, profun-

damente vicioso, por interpor-se no caminho do

desenvolvimento do país. Cabe aos três atores

do processo – academia (universidade/centros de

pesquisa), empresa e Estado – juntar esforços nesta

direção.

semFRONTEiRAS | 13

Page 16: Revista Sem Fronteiras

N O T í c i a S d e C&t

descobrindo os mistérios do universo

A expectativa é que o LHc revolucione nosso conheci-mento do minúsculo mundo do interior dos átomos até a vastidão do universo

No dia 10 de setembro deste ano, começou a funcionar

o maior instrumento científico já construído para observar as

menores partículas existentes no universo. O mais poderoso

acelerador de partículas do mundo, o Large Hadron Collider

(Grande Colisor de Hádrons), LHC, é uma estrutura colossal

instalada em um túnel de 27 km de circunferência, 100 metros

abaixo do solo, na fronteira da Suíça com a França, que vai

permitir que físicos investiguem as origens do universo e do

que ele é feito. O projeto é liderado pelo CERN (Organização

Européia de Pesquisa Nuclear).

O primeiro feixe de partículas percorreu com sucesso

os 27 quilômetros do LHC, ainda sem colisões. Este evento

marca a transição de mais de duas décadas de preparação

para o período de descobertas científicas. “É um momento

fantástico. Agora podemos esperar uma nova era de

compreensão das origens e evolução do universo”, disse o

líder do projeto Lyn Evans.

O acelerador vai produzir colisões entre feixes de

prótons ou de íons, que viajarão em velocidades muito

próximas à da luz, em um vácuo semelhante ao do espaço.

Supercondutores magnéticos operando em temperaturas

extremamente baixas (2 K ou -271º C) conduzirão os feixes

através do anel. Cada feixe consistirá de cerca de 3000

grupos com até 100 bilhões de partículas, cujas chances de

colisão são minúsculas por causa do tamanho. Entretanto,

como os feixes se cruzarão cerca de 30 milhões de vezes por

segundo, o LHC poderá gerar até 600 milhões de colisões

por segundo.

Uma vez que serão produzidas colisões com as maiores

energias já observadas em laboratório, os físicos estão

ansiosos para ver o que será revelado nesta escala de energia.

Quatro enormes detectores irão observar essas colisões para

que os físicos possam explorar novos territórios de matéria,

energia, espaço e tempo. Quando as partículas colidem, a

energia liberada forma novas partículas, de acordo com a

equação de Einstein E=m.c2. Um dos objetivos do projeto é

descobrir partículas que nunca foram vistas, mas que foram

previstas em cálculos, como é o caso do bóson de Higgs, que

daria massa a tudo o que existe no universo.

Outra expectativa é detectar a partícula que constitui a

matéria escura, que forma a maior parte do universo. Todas

essas colisões vão gerar uma enorme quantidade de dados,

cerca de 15 petabytes (15 milhões de gigabytes) anualmente,

que vão ser armazenados e distribuídos por uma estrutura

construída pelo CERN. Esta estrutura, chamada de LHC

Computing Grid, ligará dezenas de milhares de computadores

em todo o planeta e vai fazer com que cientistas do mundo

todo acessem e analisem esses dados.

“O LHC é uma máquina de descobertas. Seu programa

de pesquisa tem o potencial de mudar profundamente nossa

visão do universo, continuando a tradição da curiosidade

humana, que é tão antiga quanto a humanidade em si”,

afirma o diretor geral do CERN, Robert Aymar.

Incidente

Um incidente ocorrido no LHC nove dias após sua

inauguração vai suspender as atividades do acelerador até

o segundo trimestre de 2009. Um grande vazamento de

hélio ocorreu em um setor do túnel do LHC, provavelmente

por uma falha na conexão entre dois ímãs do supercondutor.

O setor teve que ser aquecido até a temperatura ambiente

para inspeção dos ímãs. Neste período, serão investigadas as

causas do problemas e feitos os reparos.

Div

ulg

ação

CE

RN

HELEN MENdES

14 | semFRONTEiRAS

Page 17: Revista Sem Fronteiras

Um

a lin

gu

age

m s

em

me

ros Uma das primeiras coisas que

aprendemos quando crianças são

os números. Mas, contar pode não

ser tão universal quanto parece.

Cientistas do MIT (Massachusetts

Institute of Technology) descobriram

que uma tribo que vive no Amazonas

não tem palavras para os números

em sua língua. Em 2004, a equipe

relatou que a tribo Pirahã parecia ter

palavras que significavam “um”, “dois”

e “muitos”. Esta conclusão foi baseada

em experimentos nos quais os

membros da tribo contavam objetos,

como gravetos e sementes, que eram

dispostos pelos pesquisadores.

Dessa vez, os cientistas pediram

aos indígenas que fizessem uma

contagem decrescente dos objetos

à medida que estes iam sendo

removidos. Foi descoberto então que

os membros da tribo usam a palavra

que antes se pensava ser “dois” para

cinco ou seis objetos, e que eles

usam a palavra “um” para qualquer

quantidade menor que essa. Portanto,

as palavras não significam números,

mas sim quantidades relativas. “Nós

mostramos que os Pirahãs não têm

qualquer método lingüístico para

expressar quantidades exatas, nem

mesmo ‘um’”, dizem os pesquisadores

no artigo publicado no periódico

Cognition. Os resultados sugerem que

a linguagem exata para números é

uma invenção cultural, uma tecnologia

cognitiva, e não uma linguagem

universal.

Com um tipo de terapia gênica, cientistas conseguiram,

pela primeira vez, combater o vírus HIV em camundongos. O

grupo de pesquisadores, liderado pela Universidade Harvard, de

Boston (EUA), relatou na revista Cell que não apenas reduziu

a quantidade de vírus em camundongos infectados, como

preveniu a infecção em animais saudáveis. A técnica aplicada,

chamada RNA de interferência, ou RNAi, funciona com a

inserção em uma célula de pequenos segmentos de RNA, que

interrompem a produção de proteínas específicas e “silenciam”

um gene. Neste caso, foram bloqueados dois genes do vírus

e um encontrado nos linfócitos T dos roedores, as células do

sistema imunológico que são atacadas pelo vírus.

Uma das dificuldades em se pesquisar o HIV é que nenhum

outro animal além dos seres humanos é infectado pelo vírus,

nem mesmo os macacos, nossos parentes mais próximos.

Para estas pesquisas, os cientistas usaram camundongos

“humanizados”, ou seja, o grupo injetou células-tronco de

cordão umbilical humano na medula espinhal dos roedores

recém-nascidos. Suas medulas passaram a produzir sangue com

características humanas, e assim, seus linfócitos se tornaram

suscetíveis ao HIV. Para que o RNA chegasse até os linfócitos,

a equipe ligou a molécula a um anticorpo, uma proteína que se

liga especificamente aos linfócitos T, que levou o RNA de carona

até as células infectadas.

Em ratos já infectados com o HIV, a carga de vírus no

sangue caiu significativamente depois do tratamento. Em

animais saudáveis tratados com o RNAi, o vírus não conseguiu

se instalar. Se este tratamento se tornar disponível, ele poderá

ser usado para diminuir a quantidade de medicamentos

antiretrovirais e de efeitos colaterais sofridos pelos pacientes. O

maior problema das drogas antiretrovirais é a sua toxicidade, e a

nova técnica, pelo menos para os camundongos, não foi tóxica.

desligamento de genes

semFRONTEiRAS | 15

iSto

ckp

ho

to

Div

ulg

ação

Page 18: Revista Sem Fronteiras

Fósseis de um titanossauro que viveu há 65

milhões de anos no Brasil foram encontrados por

paleontólogos em Uberaba, Minas Gerais. O mais

novo membro da família de dinossauros brasileiros é

também o maior a pisar por estas terras; o herbívoro

tinha 15 a 20 metros de comprimento, 3,5 metros de

altura e peso entre 12 e 16 toneladas. Os fósseis do

gigante pré-histórico foram encontrados em camadas

de rochas que representam os últimos níveis do

período Cretáceo, o que significa que o gigante viveu

no finalzinho da era dos dinossauros.

O Uberabatitan ribeiroi, batizado em

homenagem ao local onde foi descoberto e ao

geólogo e paleontólogo Luís Carlos Borges Ribeiro,

foi descrito em artigo publicado na revista científica

Palaeontology, por Ismar de Souza Carvalho, da

Universidade Federal do Rio de Janeiro, e Leonardo

Salgado, da Universidade Nacional do Comahue,

na Argentina. Os paleontólogos puderam analisar

farto material, correspondente a três indivíduos. A

descrição da espécie foi feita com base nos ossos

muito bem preservados de um destes indivíduos.

“A importância desta descoberta é a possibilidade

de se compreender melhor o contexto geológico, a

evolução das espécies, o ambiente e a paleoecologia”,

afirma Ismar Carvalho.

RECONSTRUçãO ARTíSTiCA DA ESPÉCiE

Herbívoro gigante é a mais nova

espécie da família de dinossauros

brasileiros

a família aumentou

Uma equipe de pesquisadores da Universidade

Estadual de Maringá (UEM) está desenvolvendo um

laser capaz de cortar tecidos humanos, para uso

em cirurgias. A equipe já produziu e patenteou um

vidro óptico que será usado na construção deste

laser. A principal característica deste vidro é ser livre

de íons OH-, o que permite que sejam introduzidos

em sua estrutura metais de transição e terras raras,

materiais específicos para que o laser emitido esteja

na freqüência certa para o corte cirúrgico. O vidro

será então inserido em uma cavidade ressonante,

onde uma luz incidirá sobre ele para que seja emitido

o laser.

Por causa da estrutura do vidro, o laser operará

na região espectral do infravermelho médio, ideal

para o corte de tecidos biológicos. A próxima etapa

será colocar o vidro no sistema e desenvolver o laser.

A produção desse laser demanda alta tecnologia, que

hoje o Brasil não possui – todas as opções no mercado

são importadas. “Nosso desafio é produzir o laser

para aplicação biomédica a um custo 10 a 15 vezes

menor do que o existente no mercado internacional

e popularizar as cirurgias”, diz Mauro Baesso, do

Departamento de Física da UEM e coordenador do

projeto. Para isso, os pesquisadores estão fazendo

parcerias com instituições nacionais e internacionais.Las

er p

ara

aplic

ação

bio

méd

ica

N O T í c i a S d e C&t

Rec

on

stru

ção

art

ísti

ca: R

od

olf

o N

og

uei

ra

Dep

arta

men

to d

e G

eolo

gia

da

UFR

J

16 | semFRONTEiRAS

Page 19: Revista Sem Fronteiras

Na ficção, o detetive Sherlock Holmes era capaz de dizer por onde seu companheiro Dr. Watson havia

andado apenas olhando para a sujeira em seus sapatos. A ciência forense já pode ligar uma pessoa à cena

de um crime a partir de vestígios de solo em sapatos, pneus e outros objetos. Uma equipe de pesquisadores

da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e uma perita criminal da Polícia Científica do Paraná construíram

um método capaz de caracterizar o solo de uma região para compará-lo a amostras coletadas em objetos

de suspeitos.

O estudo foi feito com amostras do solo de três bairros de Curitiba: Sítio Cercado, Cajuru e Cidade

Industrial, e dois bairros da região metropolitana: Alto Maracanã, em Colombo, e Rio Grande, em São José

dos Pinhais. “A escolha dos locais se baseou em um estudo da Secretaria de Segurança Pública do Estado,

que mostrou que estas foram as regiões com maiores índices de criminalidade, entre janeiro e outubro de

2004”, explica o professor do Departamento de Solos e Engenharia Agrícola da UFPR, Vander de Freitas

Melo.

O grupo conseguiu mostrar, com esse estudo, que duas amostras coletadas em um mesmo local

são semelhantes entre si, e diferentes das de outros locais. A maior contribuição da pesquisa, publicada

no periódico Forensic Science International foi gerar 56 variáveis, ou características químicas e físicas do

solo, analisando-se apenas 1g de material. Atualmente, os estudos publicados na literatura internacional

trabalham com um número muito menor de variáveis, o que torna mais difícil a confirmação forense.

O maior desafio da pesquisa foi a necessidade de trabalhar com pequenas quantidades de amostras,

de 1g de solo, para simular a situação real de investigação criminal, em que se tem apenas vestígios. Para

contornar este problema, a equipe precisou fazer vários ajustes metodológicos aos métodos convencionais

da análise de solo. O resultado foi um método que emprega 13 análises, começando pelas físicas e

terminando com as químicas destrutivas, para determinar as 56 características do solo. “Se as amostras

confrontadas forem semelhantes, é extremamente alta a probabilidade de que o investigado esteve no local

do crime”, diz Melo.

pequenas

diferenças no solo podem

significar

evidências

ao estilo de sherlock Holmes

N O T í c i a S d e C&t

semFRONTEiRAS | 17

SX

C

Page 20: Revista Sem Fronteiras

N O T í c i a S d e C&t

em enTrevisTa à revisTa sem fronTeiras, o presidenTe da sbpc , marco

anTonio raupp, faz um balanço da 60a reunião e fala sobre as demandas

por inclusão de regiões como a amazônia e o semi-árido

“ciência brasileira vive um bom momento”

MARcO ANtONIO RAUpp

CLáUDiA iziQUE

A 60ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira

para o Progresso da Ciência (SBPC) reuniu cerca de

15 mil pessoas no campus da Universidade Estadual

de Campinas (Unicamp), entre os dias 13 e 18 de julho.

Os temas das conferências, mesas-redondas, cursos e

seminários foram Energia, Ambiente e Tecnologias.

A reunião da SBPC voltou a Campinas depois de 60

anos. Em outubro de 1949, a cidade abrigou o primeiro

encontro da então recém-criada Sociedade Brasileira

para o Progresso da Ciência do qual participaram pouco

mais de uma centena de pesquisadores e cientistas.

“Esse primeiro encontro marcou a forma como a SBPC

se pronunciaria sobre os diversos eventos científicos

nacionais”, disse Marco Antonio Raupp na abertura da

60ª reunião.

Ao longo de seis décadas, o Brasil desenvolveu

e consolidou um sistema forte de pós-graduação

e pesquisa e a ciência brasileira ganhou papel de

destaque no cenário internacional. “Hoje, temos que

trabalhar para construir novas estruturas para que

a ciência e o conhecimento possam levar os seus

benefícios a todo o povo brasileiro”, afirmou, citando

especificamente as demandas por inclusão de regiões

como a Amazônia e o Semi-árido.

Essa é a razão pela qual a próxima reunião anual da SBPC,

em 2009, será realizada em Manaus, Amazonas. “Temos que

promover a melhoria das condições operacionais das instituições

federais da Amazônia”, afirmou Raupp. Já estão agendadas

duas reuniões preparatórias para o encontro, nos municípios

de Oriximiná, no Pará, e Tabatinga, no Amazonas, das quais

deverão participar cientistas e pesquisadores brasileiros e de

países da região. “O Brasil é o país líder da região. Mas só isso

não adianta, é preciso exercer a liderança. A SBPC será palco

dessa cooperação entre países.”

Raupp enumerou os desafios atuais que se colocam

para o país - a globalização, o desenvolvimento sustentável

e a economia do conhecimento – e as saídas que, na sua

avaliação, estão na educação de qualidade; na capacidade de

transformar conhecimento em “bens com valor econômico”;

na sustentabilidade econômica, ambiental e “político-social-

cultural”; e na competitividade das empresas.

Esse cenário, segundo ele, pauta as ações da SBPC,

notadamente, o compromisso da entidade de ampliar a base de

pesquisa “buscando mais qualidade” e “uma distribuição justa e

estratégica” da pesquisa por todo o território nacional.

Em entrevista à revista Sem Fronteiras, Raupp avaliou os

principais resultados do encontro.

18 | semFRONTEiRAS

Page 21: Revista Sem Fronteiras

qual a sua avaliação do encontro deste ano?

A reunião foi muito boa em termos de participação e trouxe

temas importantes para o debate, temas que a SBPC ainda trata

muito pouco como a energia, o meio ambiente e a inovação

tecnológica. Tivemos dois grupos de trabalho sobre o etanol,

combustível que abre novas oportunidades para o país, o

qual nos vários debates foi tratado também na perspectiva

da segurança alimentar e da produção sustentável. A nossa

intenção é discutir os caminhos que o país deve seguir na

busca da inserção do conhecimento no setor produtivo e, como

conseqüência, na capacidade de inovação de nossas empresas

e serviços públicos com responsabilidade social e ambiental.

qual a principal mudança na organização da 60ª reunião

anual?

Sempre trabalhamos em torno de temas, mas não com as

características e com os procedimentos adotados na última

reunião. O Brasil jamais teve tanta capacidade de investimento em ciência e tecnologia e precisa, agora, discutir as suas

prioridades. Por isso, definimos as 16 temáticas fundamentais para o país. Os temas estratégicos, como energia e inovação,

foram analisados paralelamente a questões relacionadas às políticas públicas. Tivemos várias conferências, mesas-redondas,

mini-cursos e painéis sobre saúde, e outros tantos sobre biologia, em que foram avaliadas as perspectivas para a melhoria das

pesquisas com células-tronco. Todos os debates dessa 60ª Reunião Anual tiveram um foco.

Estivemos, por exemplo, analisando também questões relacionadas à biodiversidade. O governo está enviando ao Congresso

um projeto de lei de acesso ao patrimônio genético do país que vai substituir a medida provisória 2.186, editada em 2000.

Precisamos estar prontos para acompanhar e interferir nesse debate. A SBPC participa da proposta de um projeto de lei sobre

o acesso à biodiversidade. Temos um grupo de trabalho e pretendemos fazer propostas, já que a medida provisória trata mal os

pesquisadores.

a 61ª reunião da sbpc será no amazonas. qual será o tema principal?

A Amazônia é um dos grandes desafios do país. Uma instituição como o INPA (Instituto de Pesquisas da Amazônia), por exemplo,

tem grande responsabilidade sobre pesquisa científica, mas não tem o tamanho adequado que essa responsabilidade exige. Não

tem gente e nem equipamentos suficientes. Temos que promover a melhoria das condições operacionais dessas instituições

federais da Amazônia. Já tivemos uma reunião no Pará, em 2007, onde foram levantados vários problemas. Agora temos uma

proposta concreta para a ampliação da ciência e da tecnologia na região. É preciso ampliar o conhecimento sobre a biodiversidade,

criar condições de preservação do patrimônio genético e cultural para fundamentar uma política de desenvolvimento. Já estão

agendados dois encontros preparatórios, para os quais estão convidados cientistas de outros países. O Brasil é o país mais forte

da região, porém não adianta ser só o líder, é preciso exercer a liderança e a SBPC será palco da cooperação entre países.

qual é, na sua avaliação, a missão atual da sbpc?

Durante vários anos, lutamos por uma organização de um sistema permanente de ciência e tecnologia no país. Agora, o destaque

está em o que a ciência e a tecnologia podem oferecer para a sociedade brasileira em matéria de inovação, desenvolvimento

regional, entre outros. Essa é a nossa bandeira. Para tanto, precisamos de uma legislação adequada. Vamos apresentar projetos

de lei no Congresso e defender projetos, como foi o caso da lei de Biossegurança que autorizou o uso de células-tronco

embrionárias em pesquisas, entre outros. Precisamos aproveitar esse bom momento, em que o Governo Federal prevê investir

R$ 10 bilhões por ano em ciência e tecnologia. Esse é um valor razoável e, considerando o número de cientistas que atualmente

existem no país, pode abrir boas perspectivas para incrementar a atividade de investigação científica.

Tom

as M

ay/S

BP

C

semFRONTEiRAS | 19

Page 22: Revista Sem Fronteiras

C I ê N C I A

20 | semFRONTEiRAS

Page 23: Revista Sem Fronteiras

PESQUiSAS REALizADAS PELA UNiVERSiDADE ESTADUAL

DE MARiNGá NA áREA DE BiOTECNOLOGiA CHAMAM

ATENçãO DE iNDúSTRiAS BiOQUíMiCAS E DE FáRMACOS

A força da biotecnologia

RODRiGO APOLLONi

Fotos Thiago Terebezinsky

semFRONTEiRAS | 21

Page 24: Revista Sem Fronteiras

dIóGENES ApARícIO

GARcIA cORtEz,

professor pós-doutor

do Departamento de

Farmácia e Farmacologia:

“Graças ao trabalho da

UEM, um clareador dental

obteve registro na Anvisa

e hoje está em quase

todo o país”.

LúcIO cARdOzO FILHO,

doutor em Engenharia de

Alimentos, professor do

Departamento de Engen-

haria Química: “Uma das

interações mais efetivas na

UEM é proporcionada pelas

incubadoras”.

iSto

ckp

ho

to

22 | semFRONTEiRAS

Page 25: Revista Sem Fronteiras

Com mais de 250 grupos de pesquisa e cerca de dois mil

pesquisadores, a Universidade Estadual de Maringá (UEM) está entre

as instituições brasileiras de ensino superior que mais produzem

ciência e tecnologia. Indicador de relevância para a ciência no país,

o número de bolsistas de pesquisa CNPq (categorias 1 e 2) reflete

essa vocação: são cerca de 110, para uma população de dois mil

professores. Um destaque é a área de biotecnologia, com pesquisas

sobre bioprospecção de microorganismos endofíticos, aplicações

em nanotecnologia e isolamento e identificação de bioativos da

medicina popular.

Por causa dessas e de outras pesquisas básicas na área,

Maringá atrai para a região, há algum tempo, indústrias bioquímicas

e de fármacos. Também cresce a interação entre a universidade e

empresas do setor, segundo o professor Diógenes Aparício Garcia

Cortez, do Departamento de Farmácia e Farmacologia da UEM.

“Alguns de meus mestrandos vêm de empresas buscando experiência

e capacitação, e os resultados chamam a atenção dos empresários”,

afirma. Um exemplo recente é um clareador dental: “O interessado

foi ao meu laboratório com a fórmula e queria melhorar o produto.

Nós alteramos a fórmula e obtivemos excelentes resultados”, conta.

Essa pessoa incubou uma empresa na própria UEM. “O produto foi

tão bem desenvolvido que obteve o registro na Agência Nacional de

Vigilância Sanitária (Anvisa) e, hoje, está em quase todo o país.”

Outro exemplo envolve a medicina popular. “A partir de relatos

de populares, verificamos a atividade biológica de algumas espécies

vegetais. Fazemos o isolamento e a identificação de substâncias

bioativas. Isto é algo inédito na UEM e está despertando interesse

das indústrias”, explica Diógenes. O trabalho envolve professores da

microbiologia, farmacologia e outros departamentos. “Recebi uma

bolsa de doutorado de uma indústria local e ela sinalizou que poderá

pagar outra bolsa para realizar uma pesquisa no nosso laboratório.

Isso é muito importante.”

O professor Lúcio Cardozo Filho, do Departamento de

Engenharia Química, dá como exemplo a parceria com a Plaspet,

empresa maringaense do setor de plásticos. “Essa parceria, junto

com um projeto enviado à Financiadora de Estudos e Projetos (Finep),

resultou na construção do Laboratório de Inovações Tecnológicas

em Macromoléculas (Labitem), dirigido ao melhoramento do

C I ê N C I A

semFRONTEiRAS | 23

Page 26: Revista Sem Fronteiras

tipo de produto que a empresa comercializa.”

O tempo de “namoro” com a Plaspet foi de sete

anos e as perspectivas são animadoras. “Estamos

desenvolvendo um material a ser incorporado

à espuma, e outros relacionados à reciclagem

de embalagens PET”, conta o professor Adley

Rubira, do Departamento de Química. Para Rubira,

parcerias como a firmada com a Plaspet indicam

uma inflexão. “Até recentemente, as empresas

não confiavam seus problemas à universidade. E

os pesquisadores esperavam que as empresas

viessem atrás daquilo que eles estavam fazendo.

Felizmente, isso mudou.”

Para Lúcio Cardozo, um campo de interação

importante é o das incubadoras tecnológicas. “Elas

refletem a procura por novos produtos, criados

a um baixo custo e com um rigoroso processo

de desenvolvimento”. Segundo ele, as empresas

fornecem algum tipo de apoio a praticamente

todos os departamentos em que há pesquisa. E não

fazem isso por boa vontade: “a competitividade do

mercado e as leis ambientais impõem condições e

determinam essa procura. E a universidade oferece

esse suporte que é caro – quase gratuitamente”.

como avançar

Na avaliação do diretor de Pesquisa da Pró-

Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da UEM,

professor Benedito Prado Dias Filho, é possível

aprofundar a relação entre a universidade e as

empresas. “As empresas brasileiras não têm

tradição, é preciso incentivo e capital de risco para

intermediar essa relação.” Segundo ele, agências

de fomento – caso da Finep – desempenham

esse papel.

Para o professor Emerson Marcelo Girotto,

do Departamento de Química, é preciso confiar

mais na universidade. “Os empresários devem

confiar não apenas para melhorar o que já existe,

mas para o desenvolvimento de novos produtos.”

Ele também alerta para as dificuldades existentes

AdLEy FORtI RUbIRA,

pós-doutor em Química,

professor do Departa-

mento de Química: “As

empresas não con-

fiavam seus problemas

à universidade e os

pesquisadores ficavam

esperando. Isso mudou”.

bENEdItO pRAdO

dIAS FILHO, professor

pós-doutor e diretor de

Pesquisa da Pró-Reitoria

de Pesquisa e Pós-

Graduação: “Este é o

momento de identificar

as vocações”.

EdvANI cURtI MUNIz,

professor pós-doutor

do Departamento de

Química: “O futuro da

biotecnologia é promis-

sor e o crescimento

será exponencial”.

24 | semFRONTEiRAS

Page 27: Revista Sem Fronteiras

no momento de se negociar o porcentual de cada

parte sobre as patentes de produtos criados na

universidade. “Os envolvidos deveriam negociar de

forma mais efetiva”, avalia.

O professor Edvani Curti Muniz, do

Departamento de Química, lembra que há uma lei

para definir os valores correspondentes ao recurso

aplicado e à exploração econômica da patente. A

divisão depende do tipo de parceria, se envolve o

desenvolvimento de produto ou, então, a prestação

de serviço. “No desenvolvimento de um produto a

universidade tem uma porcentagem maior, até

porque fornece uma estrutura maior, assim como

pesquisadores. Quando é uma prestação de serviço,

ela define previamente o que vai fazer, ganha para

isso e a porcentagem de participação pode ser

pequena ou mesmo nula.”

Para Benedito Prado Dias Filho, nos próximos

anos é possível que a questão de patentes – a

produção e patenteamento de produtos de base

tecnológica – não seja o principal foco da UEM. “Na

minha opinião, a prestação de serviços tecnológicos

é que será muito forte.”

biocombustíveis

O professor João Alencar Pamphile, do

Departamento de Biologia Celular e Genética,

vê como promissoras as possibilidades de

interação entre universidade e empresas no setor

de biocombustíveis. “Temos uma experiência

interessante no curso de Biotecnologia Aplicado à

Agroindústria. O curso atrai profissionais de usinas

e empresas na região”, observa. “Um desses

profissionais demonstrou interesse em estudar

as linhagens empregadas na produção do etanol,

principalmente de um subproduto, o creme, que é

utilizado como ração animal.”

EMERSON MARcELO GIROttO, professor

pós-doutor do Departamento de Química:

“Nosso objetivo é implantar no brasil um

projeto da área de nanotecnologia que

facilita o diagnóstico precoce do câncer a

partir dos Labs-on-a-Chip (LOc)”.

jOãO ALENcAR pAMpHILE, profes-

sor doutor do Departamento de Biologia

Celular e Genética: “A bioprospecção de

microorganismos endofíticos abre um

campo importante para o melhoramento

genético de culturas”.

C I ê N C I A

semFRONTEiRAS | 25

Page 28: Revista Sem Fronteiras

Biotecnologia sucede a era da informática

instituto de Biologia Molecular do Paraná

A era da biotecnologia ganhou um importante impulso com o

seqüenciamento do genoma humano, concluído em 2003. O projeto, que

levou treze anos e custou cerca de três bilhões de dólares, determinou a

seqüência de bases químicas que formam o DNA e identificou os 25 mil

genes do genoma humano.

Hoje, qualquer pessoa pode ter o seu DNA decodificado, mas esse

serviço, que já virou um grande negócio nos Estados Unidos, ainda é

inacessível para a maioria: o mapeamento de todos os seis bilhões de

caracteres e probabilidades para cerca de duas mil doenças custa 350

mil dólares. Um outro tipo de exame custa mil dólares e analisa apenas

as ‘letras’ de DNA que variam entre as pessoas. Neste caso, o cliente fica

sabendo sobre possíveis riscos de condições como o mal de Alzheimer e

outras menos graves, como a calvície.

Contudo, muitos pesquisadores estão lutando para baratear o custo

de exames que utilizam a tecnologia do DNA: é o caso dos testes para

detecção de um tipo raro de câncer em crianças, o câncer de córtex

adrenal, que, no Paraná, têm o apoio da Secretaria de Ciência, Tecnologia

e Ensino Superior.

A era da informática, que começou

no final dos anos 1940, sucedendo a era

industrial, tinha a previsão de durar pelo

menos um século, mas atingiu o seu ápice

por volta do ano 2000. O setor continua em

desenvolvimento, porém atualmente é visto

como um coadjuvante de todo o complexo

tecnológico mundial. A biotecnologia é a

ciência mais promissora da atualidade e o

Paraná tem tradição e ótimos exemplos nessa

área.

seq

üen

ciam

ento

do g

enom

a hum

ano

Chips de DNA Uma técnica bem

sucedida de estudo do genoma é a de microarray

(microarranjo), ou chips de DNA. Esta análise permite

a verificação da expressão de genes em resposta

a diferentes situações ambientais. Uma aplicação

prática dessa tecnologia é o estudo da interação

entre patógenos e seus hospedeiros.

Na UEM, uma nova linha de pesquisa usará essa

tecnologia para bioprospecção de microorganismos

endofíticos, ou seja, fungos e bactérias que existem

no interior de praticamente todas as espécies

vegetais, sem lhes causar doenças. Compreender

a interação desses microorganismos com seus

hospedeiros leva ao melhoramento genético de

culturas, pois permite mapear genes que determinam

as interações benéficas. Um grupo de pesquisadores

dessa universidade trabalha com microorganismos

da região para aplicação econômica. Um exemplo é o

Metarhizium anisopliae, microorganismo que atua no

controle de insetos-praga.

Microscopia eletrônica de bactérias endofíticas no

interior da folha de milho

C I ê N C I A

Div

ulg

ação

iBM

P

iSto

ckp

ho

to

iSto

ckp

ho

to

26 | semFRONTEiRAS

Page 29: Revista Sem Fronteiras

A biotecnologia também avança ao lado da

ciência dos materiais, que permite construir

molecularmente um material de acordo com

as nossas necessidades. Essas duas ciências

estão inaugurando a era dos biomateriais, que

abre caminho para a medicina preventiva e para

o tratamento do câncer e de outras doenças

importantes. Neste ano, num congresso

realizado em Amsterdã, o pesquisador Teruo

Okano mostrou que é possível implantar lentes

de contato que liberam medicamentos para

o tratamento de doenças específicas do olho

humano.

FUSãO dA bIOtEcNOLO-GIA cOM A cIêNcIA dOS MAtERIAIS

Um grande número de pesquisadores da área biotecnológica

afirma que já conseguiu diminuir um laboratório de química para que

ele caiba em um dispositivo do tamanho de um chaveiro. Os Labs-on-

a-chip são dispositivos que têm a capacidade de realizar reações de

laboratório em escala miniatura. Esses laboratórios super compactos

podem detectar bactérias, vírus e células cancerígenas através de

ensaios imunológicos, fazer reações bioquímicas, analisar células,

entre outros. As vantagens são a rapidez da resposta e a redução dos

custos nos testes de toxicidade. A UEM tem um projeto de laboratório

de pesquisa com nanofilmes que podem ser usados na criação

dos labs-on-a-chip. O projeto aguarda aprovação do CNPq para ser

instalado no Departamento de Química da universidade.

Lab

orató

rio co

mpacto

O número de parcerias na UEM cresce a cada ano. No

final da década passada, elas somavam 134 e em dezembro

de 2006, chegaram a 246. Se considerados os convênios

com empresas de economia mista, governo e órgãos de

fomento, o total chega a 551. Esse volume de acordos

viabilizou, por exemplo, lasers de aplicação biomédica,

estudos biotecnológicos sobre a Stevia rebaudiana, mais

comumente utilizada como adoçante, e sobre organismos

que se alojam nas turbinas da hidrelétrica de itaipu –

nesse caso, o objetivo é prevenir problemas nas unidades

geradoras decorrentes do processo de incrustação.

Há, ainda, um extenso rol de projetos conjuntos com os

setores elétrico, industrial, farmacêutico e agroindustrial,

entre outros. “Essa aproximação possibilita à universidade

ampliar o leque de novas tecnologias”, destaca o assessor

de planejamento, Ariston Azevedo.

parcerias que dão certo

Grande concentração de conídios de Metarhizium anisopliae

iSto

ckp

ho

to

iSto

ckp

ho

to

iSto

ckp

ho

to

semFRONTEiRAS | 27

Page 30: Revista Sem Fronteiras

Um problema fundamentalWaldemiro GremskiC I Ê N C I A

Jovens brasileiros não demonstram

interesse por matemática e Física na hora

de escolher uma proFissão

célio Yano e miriam Karam

ilust

raçã

o s

imo

n d

ucr

oq

uet

28 | semFronteiras

Page 31: Revista Sem Fronteiras

do exemplo clássico do chip de computador, que

através de bilhões de cálculos por segundo é capaz

de exibir vídeos, organizar informações e simular

jogos, até a organização do trânsito e a distribuição

de energia nas cidades, para as quais são usadas as

matrizes e as equações diferenciais, praticamente

tudo o que nos cerca depende da matemática e

da física. em outras áreas do conhecimento, como

a medicina, aplica-se a teoria dos conjuntos para

informar a compatibilidade genética entre dois

pacientes, enquanto na climatologia e na economia

buscam-se novas fórmulas para prever desastres

climáticos ou oscilações na bolsa de valores.

na fronteira entre a física e a química, a

nanotecnologia é hoje uma das áreas com maior

potencial no brasil, afirma o físico e ministro da ciência

e tecnologia, sérgio rezende. estruturas e novos

materiais são desenvolvidos a partir da manipulação

de átomos – o prefixo nano significando a bilionésima

parte de uma unidade. tintas não poluentes; madeiras

autolimpantes, impermeáveis e resistentes ao ataque

de fungos; borrachas termoplásticas recicláveis;

adesivos de alto desempenho, entre outros produtos,

estarão disponíveis em um futuro não muito distante

graças a essa ciência. a física médica, na sua interface

com a área de diagnóstico e radiologia, entre outras,

também tem crescido no país, trazendo perspectivas

de novos empregos.

apesar da relevância e da contribuição das

ciências exatas para o desenvolvimento do país,

são elas, entre as demais, as que menos seduzem

os jovens brasileiros atualmente. para se ter uma

idéia, em 2007, no último vestibular da universidade

Federal do paraná, um dos mais disputados no

estado, a concorrência para o curso de matemática

ficou em menos de quatro candidatos por vaga,

enquanto a média geral do processo seletivo foi

de 9,65. para física, a disputa foi ainda menos

acirrada: 2,98 candidatos por vaga. nas duas

carreiras, o bacharelado teve menos inscritos do

que a licenciatura, e os índices são semelhantes aos

verificados nos principais vestibulares do brasil. no

maior deles, da universidade de são paulo (usp),

a concorrência geral para o ano de 2008 foi de

12,31 candidatos por vaga. Já a disputa por física

e matemática teve pouco mais de três candidatos

por vaga. “a matemática ainda carrega o estigma

da dificuldade”, lamenta o matemático e educador

edilson roberto pacheco, do departamento de

matemática da universidade estadual do centro-

oeste (unicentro).

Evasão

Quanto aos índices de evasão, o último

levantamento realizado pelo instituto nacional de

estudos e pesquisas educacionais (inep), em 2005,

revelou que o curso de matemática registrava a maior

taxa no país – 44%. isto significa que para cada dez

alunos que ingressaram no curso naquele ano, quatro

desistiram de concluí-lo. Física ficou em quinto lugar,

com 34%, atrás de normal superior (38%), marketing

e publicidade (36%) e educação física (34%). cada

um dos cursos tem fatores próprios para explicar as

desistências, mas, para o matemático e professor da

uFpr, higídio oquendo, as duas disciplinas da área

de exatas possuem semelhanças nesse aspecto. “são

profissões que pressupõem uma capacidade muito

grande de abstração e de raciocínio. diferente do que

acontece em outros cursos, a compreensão integral

de cada matéria é essencial para o entendimento do

próximo módulo”, afirma. em sua opinião, além de

habilidade, é preciso alguma afinidade com os números.

“infelizmente, poucos têm tempo para dedicar várias

horas do seu dia para resolver um problema”, afirma.

semFronteiras | 29

Page 32: Revista Sem Fronteiras

Para o professor Jorge Megid Neto, da Faculdade

de Educação da Unicamp, “os índices de desistência,

quando altos, refletem a falta de perspectiva de

trabalho e empregabilidade para carreiras como

a de matemático ou a de físico”. “É fato”, concorda

categórico o professor Edilson Roberto Pacheco, que

trabalha em mudanças, ainda pioneiras no Paraná,

na grade curricular do curso de matemática, para

vencer o principal desafio que se impõe aos

professores da matéria: ser interessante. Pacheco

acredita que até mesmo os alunos que escolhem o

curso porque pensam gostar da matéria não têm

noção clara do que vão encontrar pela frente. Nem

das reais dificuldades que virão quando o assunto

chegar ao cálculo diferencial integral, por exemplo.

“Aí, começa a enroscar e eles patinam mesmo”. Depois

de participar do Fórum Estadual das Licenciaturas

em Matemática do Paraná no ano passado, Edílson

Roberto Pacheco e um grupo de seu departamento

na Universidade Estadual do Centro Oeste (Unicentro)

discutiram uma proposta alternativa, que será

votada pelo conselho da instituição. Além de incluir

disciplinas como português e filosofia, a grade do

curso de licenciatura procurou introduzir ‘uma pitada’

do curso de bacharelado, para permitir que os alunos

que pretendam seguir a carreira acadêmica tenham

base para enfrentar a seleção para a pós-graduação.

Mudanças

O professor Jorge Megid, no entanto, acredita

não haver necessidade de mudanças de currículos, já

adaptados às novas diretrizes curriculares dos cursos

de graduação de 2001, e essas diretrizes estão – dentro

do possível – coerentes com as inovações no campo

da educação e com a atualidade dos conhecimentos

de cada área. Reforçando a idéia de que é grande a

diversidade entre as instituições de ensino superior do

país e entre as estruturas administrativas (públicas e

privadas, estaduais, municipais e federais), Megid diz

que a indústria brasileira absorve pouco os físicos e

os matemáticos, dando preferência aos engenheiros,

ao contrário de outros países. Assim, de acordo com

Megid, para os bacharéis a profissão fica restrita à

carreira no ensino superior – mestrado, doutorado e

pós-doutorado. Outra opção está em órgãos públicos,

como o IBGE e outros centros de estatística, por

exemplo, mas, novamente, as vagas não são muitas.

Nesse caso, para quem segue a carreira de prof

essor universitário (doutorado e dedicação exclusiva)

os salários variam entre R$ 6 e R$ 8 mil, segundo a

Secretaria de Recursos Humanos do Ministério

do Planejamento, Orçamento e Gestão. A renda

é comparável a de pesquisadores de países como

Estados Unidos, Inglaterra e França. Para fazer suas

pesquisas, o docente pode ainda receber uma bolsa

do CNPq, cujo valor varia de acordo com o edital

correspondente ao seu projeto. Para os licenciados em

matemática ou física, o campo é inesgotável, avalia o

professor Megid. O déficit brasileiro de professores

é tão grande que levaria pelo menos dez anos para

atender a demanda. Mas, uma vez atendida, haveria

novo déficit por causa do crescimento populacional.

Para minimizar esse déficit, as instituições de ensino

superior, incentivadas pelo Ministério da Educação,

criam cursos de licenciatura à distância. O professor

Megid, no entanto, é cético quanto à qualidade

desses cursos, especialmente quando a carga horária

presencial é muito baixa, menos de 20% da carga

horária total.

A professora Celi Espasandin Lopes, que está

fazendo pós-doutorado na University of Georgia,

nos Estados Unidos, aponta um problema “básico”

para nossos professores: “uma meta importante

seria conseguir centralizar o trabalho docente em

uma escola; a quantidade de escolas que a maioria

dos professores tem que percorrer para completar

a jornada e melhorar seu salário inviabiliza que

ele participe efetivamente de um projeto político

pedagógico em uma escola”, afirma.

Apartheid

Para o diretor de Educação Básica da

Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de

Nível Superior (Capes), Dilvo Ristoff, que falou na

60ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o

Progresso da Ciência (SBPC), em julho deste ano, em

Campinas, há problemas de outra ordem afetando

a qualidade do ensino das exatas no país. “Existe

um apartheid que separa o campus da escola, a

graduação do ensino básico e os professores das

licenciaturas dos professores das disciplinas do

ensino médio. Esses professores, que deveriam

estar próximos uns dos outros, não só pertencem

30 | semFronteiras

Page 33: Revista Sem Fronteiras

a sistemas de ensino distintos, autônomos e que

se declaram auto-suficientes, como dificilmente se

encontram em algum evento acadêmico ou científico

e raramente se comunicam”, disse na ocasião. Nessas

condições, segundo ele, o que se forma é o químico,

não o professor de química; o físico, não o professor

de física; o biólogo, não o professor de biologia.

“Enquanto isso continuar, a formação do professor

continuará sendo um rótulo, um título, sem conexão

com as demandas da escola”.

Impacto

“A transmissão eletromagnética sem fio, o laser e os semicondutores presentes nos computadores

e celulares são alguns exemplos do impacto da física na atualidade. Na medicina, há muitos aparelhos

provenientes dos avanços dessa ciência. Além disso, seus conhecimentos são essenciais para muitas

outras áreas, como as engenharias. Outra contribuição fundamental refere-se à construção da nossa

visão do mundo, além de suas inter-relações com outras áreas do conhecimento, como as artes e as

humanidades. No Brasil, a física também tem um papel significativo: a nanotecnologia, por exemplo, é

uma área de grande potencial no país”.

Interação

“A ciência é uma atividade social que tem interfaces com outros campos do saber, como as hu-

manidades, as artes e as técnicas. Por exemplo, as grandes teorias da física, como a relatividade e a física

quântica, foram revoluções do pensamento humano que contribuíram para alterar a nossa visão de

mundo. Além disso, as tecnologias modernas influenciam na produção e na imaginação dos artistas”.

Popularização

“A Sociedade Brasileira de Física tem tido um papel de destaque com as suas revistas de pesquisa e

divulgação, com seus encontros e agora com um novo site voltado para a divulgação e a educação cientí-

fica. Na realidade, a política de popularização da ciência e da tecnologia do MCT não privilegia a física,

mas apóia atividades em todas as áreas. Há cinco anos, temos um programa para a divulgação científica

que realiza editais para projetos nessa área em todo o país e gera também muitos programas novos. A

popularização da C&T e a melhoria do ensino de ciências é hoje uma importante linha de ação dentro da

IV Prioridade Estratégica para o Desenvolvimento Social do Plano de Ação 2007-2010”.

Imp

acto

s e

po

pu

lari

zaçã

o d

a ci

ên

cia

“as tecnologias modernas

inFluenciam na produção e

na imaginação dos artistas”

trecho do depoimento do

Físico e ministro da ciência e

tecnologia, sérgio rezende, à

revista Sem FronteiraS:

div

ulg

ão

mc

t

semFronteiras | 31

Page 34: Revista Sem Fronteiras

A escola possível

o ensino da matemática e das ciências naturais – física, química e biologia

– nas escolas de ensino fundamental vem sendo questionado por profissionais

da educação que discordam da metodologia aplicada atualmente. para eles,

em vez de privilegiar conteúdos específicos de cada disciplina, ensinados de

maneira descontextualizada das demais áreas, a educação científica deveria

estar conectada e atenta à realidade dos alunos e da sociedade em geral.

para os adeptos dessa educação divergente e questionadora, desvincular

os conteúdos específicos de cada disciplina das práticas e finalidades sociais

mais amplas não só é alienante como transforma a educação científica

em um buraco negro que suga a curiosidade das crianças. as professoras

mira roxo e maria inês nobre ota, de londrina, paraná, estão entre os que

querem ver a educação científica trilhando outros caminhos.

com licenciatura em filosofia, psicologia e sociologia da educação

pela puc-sp e bacharelado em pedagogia, mira é professora do ensino

fundamental na nossa escol(h)a, em londrina. maria inês é graduada em

física pela unicamp, mestre em ensino de ciências no instituto de Física da

universidade de são paulo (ifusp) e doutora em educação pela Faculdade de

educação da universidade de são paulo (Feusp).

Espaço de descobertas

elas defendem o envolvimento de alunos, professores e funcionários

no processo educacional, aproveitando cada ocasião para impulsionar o

conhecimento nas mais diferentes áreas. segundo mira, uma aula em que as

crianças ficam sentadas na sala, apenas ouvindo o professor, é enfadonha e

antipedagógica. “sentada, a criança não tem relação com o deslocamento. o

simples caminhar com as crianças pela escola tem uma conexão direta com

a ciência”, observa.

a escola deve ser um espaço de descobertas, na opinião das professoras.

“por exemplo, o trabalho na horta permite que os alunos criem conceitos que

passariam despercebidos se ensinados com o enfoque tradicional”, observa

maria inês. para mira, a cozinha é uma verdadeira aula de química, “porque,

ali, podem ser vistas transformações de matérias. isso desperta a curiosidade

e abre um leque de possibilidades para a criança”. na escola onde mira

E d u C A ç ã o C I E N t í f I C A

proFessoras deFendem

uma educação apoiada

na realidade

apolo theodoro

32 | semFronteiras

Page 35: Revista Sem Fronteiras

trabalha, é Maria, a zeladora, quem cuida da horta. Por

que a Maria? “Porque ela é quem mais sabe de horta

na escola”, responde.

Mas é a curiosidade das crianças o que mais

preocupa as professoras: “De maneira geral, elas

não são estimuladas a fazer perguntas, esperando a

resposta pronta em vez de ir buscá-la”, critica Mira.

“Essa maneira de ensinar dá respostas a questões

que não foram formuladas pelos alunos. É o professor

falando e as crianças ali paradas, sentadas, só ouvindo”,

completa Inês.

O método de ensino que prega uma única

resposta a tudo e ignora a divergência, é chamado de

“educação convergente”, um modelo que se reflete

depois na formação dos professores segundo Mira: “nas

minhas aulas eu

dava problemas aos

alunos, mas eles não

conseguiam argumentar por

medo de errar”. A professora

tributa tal postura à velha pregação de

que a ciência é absoluta e tem a verdade

sobre a natureza. “Não deveria ser nada disso,

ciência é conhecimento construído a partir da

interpretação da realidade”.

Prisão do conhecimento

Mira acrescenta que o livro didático é outra

manifestação da educação convergente, modelo

que leva à fragmentação do conhecimento: “Essa

fragmentação causa perda do todo e da parte porque

o aluno não vê a parte inserida no todo e nem o

todo composto das partes”. Para Inês, a educação

científica “deve estimular as pessoas a questionar o

tempo todo e a buscar outras fontes de informações

para não convergir”.

Um projeto pedagógico consistente, na opinião

de Inês, deveria envolver todos os que estão na escola,

ilust

raçã

o s

imo

n d

ucr

oq

uet

semFronteiras | 33

Page 36: Revista Sem Fronteiras

em vez de apenas considerar os alunos. O papel do

professor nesse processo é ter o espírito aberto para

buscar informações nas fontes, pesquisar em livros

e na internet e ter predisposição para investigar:

“o professor deve estimular o aluno a procurar

informação, a questionar tudo, pois educação cien-

tífica é lançar o problema e fazer com que todos

possam resolvê-lo”.

Ironizando a chamada grade curricular, que,

“como o próprio nome diz, é prisão do conhecimento”,

a professora Mira Roxo deixa um recado final:

“Alfabetização não é letração, abrange todas as áreas,

todas as linguagens, todas as fontes e, principalmente,

o contexto. É uma alfabetização sem limites”.

Para finalizar, a professora Maria Inês Ota

sustenta com convicção que essa escola é possível,

basta ter vontade. “O discurso está pronto, o que falta

é gente que chegue à escola e tente mudá-la. E essa

mudança só pode ser feita na escola pública, por uma

razão: a escola privada transformou a educação em

mercadoria, que é fazer o aluno passar no vestibular”,

defende.

Professores de matemática, física,

química e biologia de universidades e facul-

dades públicas paranaenses estão levando

suas experiências em sala de aula às escolas

municipais mais distantes dos grandes cen-

tros urbanos. Iniciado em 2007, como parte

das atividades do programa Universidade

sem Fronteiras, da Secretaria de Ciência,

Tecnologia e Ensino Superior, esse trabalho

é realizado em parceria com os Núcleos

Regionais de Educação por meio de ofici-

nas, laboratórios, seminários, reuniões para

construção de materiais didáticos e de um

museu itinerante de ciências.

Na

rua

de

olh

o n

a lu

a

o encontro da universidade com a escola pública

“Os shows de química e de física duram em

média uma hora e reúnem até 300 alunos do ensi-

no fundamental e médio. Nessas atividades, sempre

tentamos relacionar os experimentos com algo do

cotidiano do aluno a fim de facilitar a sua compreen-

são”, relata Patrícia Caldana, uma das 1.394 bolsistas

do programa. Ela participa, em 19 municípios com

baixo índice de desenvolvimento humano da região

norte do Estado, do projeto museu itinerante de

ciências, coordenado pela Universidade Estadual de

Londrina (UEL), que também divulga astronomia:

“Na rua de olho na lua” e “Chuva de meteoros sagi-

tarianos”, por exemplo, reúnem dezenas de crianças

e adultos interessados nos fenômenos da natureza.

em Jandaia do sul, o encontro da universidade com o ensino básico

34 | semFronteiras

Page 37: Revista Sem Fronteiras

“esse modo de ensinar, novo, diferente,

mais próximo da realidade, portanto mais

fácil de entender, desperta interesse pela

ciência e também ajuda a quebrar certos

tabus, como os que pregam que a física e

a química não servem para nada, além de

serem muito difíceis de compreender”, co-

menta ainda patrícia. “essa experiência

também é positiva para os acadêmicos que

participam do projeto; além disso, mostra

as dificuldades que teremos de enfrentar

futuramente, como professores”. (rr)

semFronteiras | 35

Page 38: Revista Sem Fronteiras

B I O E N E R G I A

36 | semfronteiras

Óleo vegetal usado no Centro de

referência em agroecologia (CPra),

na região de Curitiba, emprega

girassol como matéria-prima

Brasil amplia vantagensMas há neCessidade de Mais Pesquisa e

organização do ProCesso Produtivo

Cláudia iziquefotos: Marcos Borges

Page 39: Revista Sem Fronteiras

semfronteiras | 37

Brasil amplia vantagens

o mundo começa a conviver com a idéia de que a era dos hidrocarbonetos

pode estar próxima do fim: a produção de petróleo na rússia parece ter

alcançado seu pico, a arábia saudita anunciou a suspensão dos planos para

aumentar sua capacidade produtiva e o preço do petróleo chegou a atingir,

em julho deste ano, o valor recorde de us$ 147 o barril, mais de 100% acima

da cotação de uma década atrás. o mundo também descobriu que os gases de

efeito estufa (gee) gerados, principalmente, pelo uso de combustíveis fósseis,

ameaçam o equilíbrio do planeta. os riscos de escassez e de aquecimento

Page 40: Revista Sem Fronteiras

B I O E N E R G I A

oFERTA INTERNA DE ENERGIA - BRASIL 2007

no Brasil, quase metade da matriz energética corresponde às energias renováveis.

no mundo, este percentual representa 12,7 %.

Fonte: MME

BioMassa

30,9%

hidráuliCa e

eletriCidade

14,9%

PetrÓleo e derivados

17,4%

gás natural

9,3%Carvão Mineral

6,0%

urÂnio

1,4%

238,3 milhões TEP (2% da energia mundial)RENOVÁVEL

Brasil: 46%

oeCd: 6%

Mundo: 12%

BIOMASSA

lenha: 12%

Produtos de Cana: 15,7%

outras: 3,2%

teP: (tonelada equivalente de petróleo)

a capacidade de

produção da usina de

Biodiesel instalada no

instituto de tecnologia do

Paraná (tecpar) é de 500

a 1000 litros por dia

as previsões para

2008-2012 são de um

mercado de 1 bilhão de

litros/ano de biodiesel B2. a

partir de 2013, a demanda

deverá subir para 2,4

bilhões de litros anuais

silv

ane

trev

isan

to

net

ti

Mar

cos

Bo

rges

38 | semfronteiras

Page 41: Revista Sem Fronteiras

global – e, é claro, o instinto de sobrevivência -

desencadearam uma corrida mundial em busca de

alternativas energéticas limpas e renováveis que

podem mudar de forma dramática a geoeconomia

mundial.

O Brasil tem vantagens comparativas:

utiliza combustíveis limpos para atender 44% de

suas demandas energéticas, enquanto a média

mundial não passa de 13%. O país ainda investe

timidamente em tecnologias de geração de

energia eólica, solar ou marítima, mas domina,

desde a década de 1970, tecnologias de produção

do etanol a partir da cana-de-açúcar e, nas últimas

duas décadas, passou a produzir biocombustíveis

- extraídos de algumas oleaginosas, como a soja,

por exemplo –, atualmente misturados ao diesel.

Mas há ainda um longo caminho a percorrer para

aumentar a produtividade desses combustíveis e

ganhar escala para abastecer também o mercado

externo.

Etanol

O Brasil produz anualmente mais de 17

bilhões de litros de etanol obtidos da sacarose

da cana-de-açúcar. É o segundo maior produtor

mundial, atrás dos Estados Unidos, com cerca de

20 bilhões de litros produzidos a partir do milho. Nos

últimos 35 anos, a produtividade das lavouras saltou

de três mil para seis mil litros de etanol por hectare de

cana, aumentando a competitividade do combustível

em relação à gasolina. “Mas o país investiu muito

pouco em pesquisa para entender o que acontece na

planta quando ela converte a energia solar em energia

química”, exemplificou Rogério Cerqueira Leite,

coordenador do Centro de Pesquisa em Bioetanol que

o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) pretende

inaugurar ainda este ano, em Campinas, no Estado de

São Paulo. É preciso, portanto, acelerar as pesquisas

em toda a cadeia de produção de etanol para manter

a dianteira, já que os Estados Unidos, o principal

concorrente – e, potencialmente, o maior mercado

consumidor – investiram US$ 1,5 bilhão em 2007

no desenvolvimento de tecnologias de produção do

biocombustível.

Iniciativas

Há várias em curso no país, como o Centro de

Pesquisa em Bioetanol, que vai realizar pesquisa básica

e aplicada para superar deficiências tecnológicas e

aumentar a competitividade do produto nacional. As

principais demandas foram identificadas por meio de

um amplo diagnóstico do setor encomendado pelo

na safra

2007/2008, o

Paraná produziu

2,8 milhões de

toneladas de

açúcar e 1,6

bilhões de litros

de álcool. destes,

600 mil foram

destinados à

exportação

ag

ênci

a e

stad

ual

de

no

tíci

as

semfronteiras | 39

Page 42: Revista Sem Fronteiras

pelos avanços realizados à cadeia produtiva do

etanol no país. “O Bioen vai criar um grande centro

virtual de pesquisas para somar esforços das

universidades e empresas”, diz Carlos Henrique de

Brito Cruz, diretor-científico da Fapesp. O programa

contará com várias linhas de investigação –

biologia genômica, biomassa, alcoolquímica, entre

outras -, parte delas desenvolvidas em parceria

com empresas como a Dedini, Oxiteno e Braskem.

O governo de São Paulo – Estado responsável

por 63% da produção do etanol no país – anunciou

a instalação de um Parque Tecnológico de

Biocombustíveis em Piracicaba, que contará com

investimentos de R$ 100 milhões em pesquisas

sobre matérias-primas renováveis, tecnologia de

conversão de biomassa e resíduos agroindustriais,

além de tecnologias ambientais. “O parque

representará a convergência do conhecimento

na área de biocombustíveis, seja ele público ou

privado”, explicou Luciano de Almeida, secretário-

adjunto da Secretaria de Desenvolvimento.

Estruturada a área de pesquisa, o desafio

será o de aumentar a produção de etanol sem

comprometer a de alimentos. Para abastecer

10% da demanda mundial do combustível,

além dos ganhos tecnológicos, o país terá que

ampliar as lavouras de cana-de-açúcar que

Ministério de Ciência e Tecnologia ao Centro de

Gestão de Estudos Estratégicos (CGEE), e levado a

cabo pelo Núcleo Interdisciplinar de Planejamento

Estratégico (NIPE) da Universidade Estadual de

Campinas (Unicamp), com a coordenação de

Cerqueira Leite. Os pesquisadores da Unicamp

tinham como tarefa identificar as ações necessárias

para expandir a produção brasileira de etanol de

forma a substituir de 5% a 10% a gasolina utilizada

no planeta até 2025. Concluíram que, para atingir

essa meta, será necessário investir em tecnologias

que permitam a utilização também da celulose,

da palha e do bagaço da planta – que concentra

2/3 da energia –, desenvolver a agricultura de

precisão, otimizar processos industriais e garantir a

sustentabilidade ambiental, social e econômica da

produção. “Temos que reduzir o impacto ecológico

e fechar com saldo positivo a conta dos gastos com

energia, emissão de carbono, desgaste do solo,

entre outros”, afirmou Cylon Gonçalves da Silva,

um dos coordenadores do projeto patrocinado

pelo MCT.

A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado

de São Paulo (Fapesp) também arquitetou um

programa de pesquisas em Bioenergia, batizado

com o nome de Bioen. O Estado reúne importantes

universidades e centros de pesquisas responsáveis

A produção de cana

de açúcar deve

aumentar 10% no

Paraná em 2008.

As regiões norte e

noroeste do estado

concentram a maior

parte das lavouras

40 | semfronteiras

un

ião

da

ind

úst

ria

de

Can

a-d

e-a

çúca

r (u

nic

a)

Page 43: Revista Sem Fronteiras

semfronteiras | 41

a competitividade em energia eólica ainda depende

de muita pesquisa e desenvolvimento

devido aos altos custos, a energia solar é pouco usada

no Brasil, mas pode representar uma solução para parte

dos problemas de escassez de energia

div

ulg

ação

/Co

pel

isto

ckp

ho

to

atualmente ocupam seis milhões de hectares

para algo em torno de 42 milhões de hectares.

Os especialistas garantem que, num país com

uma área agricultável de 152,5 milhões de

hectares, é possível aumentar a produção de

cana sem deslocar a de alimentos. As áreas com

potencialidade de plantio foram mapeadas pelos

pesquisadores do NIPE: abrangem regiões como

o norte do Tocantins, o sul do Maranhão, Mato

Grosso, Goiás e Triângulo Mineiro.

Biodiesel

O Brasil também domina a tecnologia

de produção de biocombustíveis extraídos de

oleaginosas. O principal insumo é a soja, grão

que guarda 18% de óleo na semente. O produto

é adicionado numa proporção de 3% ao diesel

vendido nos postos de gasolina, desde o mês de

julho, e deverá atingir o percentual de 5% em

2010. “Temos que ter volume para atender essa

imposição legal”, diz Frederico Durães, diretor

da Embrapa Agroenergia, unidade de pesquisa

criada pela Empresa Brasileira de Pesquisa

Agropecuária em 2006.

Para atender essa demanda é preciso

ampliar, como ele diz, o mix de matérias-primas

com potencial para gerar biodiesel, como o

girassol, o algodão, o amendoim, o dendê, o

pinhão-manso, entre outros, que atendam tanto

ao agronegócio como a agricultura familiar. O

pinhão-manso, por exemplo, pode gerar até

duas toneladas de óleo por hectare, contra

0,5 tonelada por hectare produzida a partir da

soja. O problema é que a soja ainda é a única

oleaginosa sobre a qual o país tem domínio

tecnológico, adquirido ao longo de mais de

25 anos de pesquisa. Nas demais, ainda serão

necessários vários anos de investigação para se

obter volume, escala e para atender as demandas

de sustentabilidade do produto.

Page 44: Revista Sem Fronteiras

desde 2004, o instituto agronômico do

Paraná (iapar), em parceria com a empresa

Brasileira de Pesquisas agropecuárias (embrapa)

e a empresa Paranaense de extensão rural

(emater-Pr), vem desenvolvendo estudos sobre

a utilização de várias oleaginosas na produção

de biocombustíveis. as pesquisas integram o

Programa Paranaense de Bioenergia, criado em

2003 pelo governo estadual com o objetivo de

fomentar a pesquisa e o desenvolvimento, as

aplicações e o uso da biomassa, com foco inicial

na produção de biodiesel, adicionando-o à matriz

energética estadual. À frente desse programa,

estão as secretarias de Ciência, tecnologia

e ensino superior (seti) e da agricultura e

abastecimento (seaB).

“estamos trabalhando com oleaginosas e

com opção de produção no verão, como o girassol

e a mamona, e no inverno, com o amendoim e o

nabo forrageiro”, afirma dalziza de oliveira, do

iapar. as pesquisas começaram com o girassol,

que está sendo plantado na região de londrina,

e têm perspectivas interessantes. “o problema é

a grande população de pombas que destroem a

planta”, relata dalziza, apontando um problema

que também precisa ser solucionado pela

pesquisa.

as pesquisas buscam encontrar produtos

que atendam tanto às demandas do agronegócio,

como o girassol e a mamona, quanto à agricultura

familiar, que não utiliza a colheita mecanizada e

deve associar a produção de oleaginosas também

à de alimentos. “nesse caso, o amendoim pode

ser uma boa opção”, sublinha dalziza de oliveira.

Para garantir maior eficiência em pequenas

propriedades, o iapar investiga também a

utilização das tortas residuais como ração animal

e na adubação. “nos próximos dois ou três anos,

teremos definidas tecnologias de plantio”.

o instituto divide as plantas com potencial

para a produção de biodiesel em três grupos. no

primeiro estão a soja e o algodão, para os quais já

se tem tecnologia de cultivo e cadeia de produção

consolidada no estado. o segundo grupo abrange

espécies sobre as quais já se tem conhecimento

agronômico, mas que ainda exigem maiores

estudos, como é o caso do amendoim, mamona,

girassol, nabo forrageiro e canola. e o terceiro

engloba espécies como o cártamo, linho, crambe,

pinhão-manso e tungue, introduzidas há pouco

tempo no Paraná, e sobre as quais ainda há muito

que pesquisar.

recentemente, o iapar concluiu o programa

de zoneamento agroclimático da mamona, um

estudo fundamental para definir a melhor época

de plantio em cada região do estado, reduzir

riscos de perdas e facilitar a contratação de

crédito e seguro agrícola. o zoneamento do nabo

forrageiro e da canola deve ficar pronto no final

do ano. “nas culturas de soja, milho e trigo, já

constatamos que os fatores mais importantes

são os extremos de temperatura e o excesso de

Biomassa: a contribuição do Paraná

até o final de 2009, o estado deverá

Produzir CerCa de 280 Milhões de litros de

Biodiesel Por ano

42 | semfronteiras

Page 45: Revista Sem Fronteiras

Mar

cos

Bo

rges

Mar

cos

Bo

rges

isto

ckp

ho

to

Carro movido a óleo vegetal

Mar

cos

Bo

rges

Mini-usina compacta utilizada

no Centro Paranaense de

referência em agroecologia,

região de Curitiba

semfronteiras | 43

Page 46: Revista Sem Fronteiras

Mar

cos

Bo

rges

44 | semfronteiras

agrícolas, aumentando sua renda e gerando

riquezas”, adiantou o diretor de engenharia

da Copel, luiz antonio rossafa. o estudo foi

encomendado pelo governador roberto requião.

Mestrado em bioenergia

Com a expansão da produção de biodiesel

no estado, o Paraná também investe na formação

de pesquisadores para criar competências

regionais e fazer avançar as pesquisas na área de

biocombustíveis. no início deste ano, por iniciativa

da seti e de 12 instituições de ensino superior e

de pesquisa, foi estruturado o curso de mestrado

em Bioenergia. o objetivo do curso, já submetido

à avaliação da Coordenação de aperfeiçoamento

de Pessoal de nível superior (Capes), é formar

pessoal qualificado para atuar em pesquisa e

desenvolvimento e no magistério superior.

umidade, porque estão relacionados à ocorrência

de doenças”, esclarece Paulo henrique Caramori,

especialista em agrometeorologia do instituto.

o óleo extraído de oleaginosas a partir das

pesquisas realizadas pelo iapar é testado numa

usina semi-industrial de produção de biodiesel

instalada no instituto de tecnologia do Paraná

(tecpar), na Cidade industrial de Curitiba, com

capacidade para 500 a mil litros por dia. “o produto

é misturado ao diesel em diferentes proporções e

testado em motores do ciclo diesel”, explica Bill

Jorge da Costa, diretor técnico. a usina é uma das

ações do Programa Paranaense de Bioenergia.

Mercado

no Paraná, três empresas de pequeno e médio

porte, todas em rolândia, norte do estado, têm

autorização da agência nacional de Petróleo (anP)

para produzir biodiesel: a Biolix, com capacidade

de nove milhões de litros por ano; a Big-frango,

com 12 milhões de litros por ano; e a Biopar, com

36 milhões de litros por ano. duas novas usinas

devem ser instaladas no Paraná – uma em Marialva,

no norte, e outra, da Petrobras, em Palmeira, no sul

– elevando a capacidade de produção de biodiesel

no Paraná para 280 milhões de litros por ano

até o final de 2009. nos cálculos da secretaria

estadual de agricultura e abastecimento, esse

volume deverá atender a demanda do estado –

de 120 milhões de litros por ano – e o excedente

poderá ser exportado para outras regiões e até

mesmo para outros países, segundo o engenheiro

agrônomo richardson de souza.

o estudo de viabilidade de produção do

biodiesel, elaborado pela Companhia elétrica do

Paraná (Copel) em parceria com secretarias de

estado, universidades e institutos de pesquisa, deve

sugerir modelos para a instalação de pequenas e

médias usinas de processamento de oleaginosas. “a

idéia é estruturar arranjos produtivos que atendam,

da melhor maneira, os pequenos produtores

Mini-usina compacta utilizada no Centro Paranaense

de referência em agroecologia, região de Curitiba

Page 47: Revista Sem Fronteiras

semfronteiras | 45

a expectativa do Programa Paranaense de Bioenergia é

estender a produção de biodiesel também à agricultura familiar.

de acordo com estudos desenvolvidos pelo governo federal, a

cada 1% de substituição de óleo diesel por biodiesel produzido

com a participação da agricultura familiar, são gerados cerca

de 45 mil empregos no campo. “a produção de oleaginosas em

lavouras familiares faz com que o biodiesel seja uma alternativa

importante para a erradicação da miséria no país, pela

possibilidade de ocupação de enormes contingentes de pessoas”,

afirma o agrônomo richardson de souza.

outra ação planejada pelo governo estadual é instalar mini-

usinas de extração de óleos vegetais a frio, por meio de prensagem

mecânica, no interior, para atender pequenas cooperativas e

associações de produtores que produziriam combustível para

suas máquinas. o primeiro protótipo já está em operação na

Colônia Witmarsum, em Palmeiras, apoiado pela rede evangélica

de assistência social. a usina extrai o óleo a frio, com pequenas

prensas. o processo não inclui produtos químicos, como solventes,

e garante o aproveitamento das tortas para alimentação humana

e animal. também estão em operação as mini-usinas de Pitanga,

na associação dos trabalhadores da Cidade e do Campo), e de

Curitiba, no Centro de referência em agroecologia (CPra).

a produção de etanol também poderá contribuir para a

integração de pequenos produtores ao mercado. a Cooperativa

Mista de Produção, industrialização e Comercialização de

Biocombustíveis do Brasil ltda (Cooperbio), na região de

redentora, no rio grande do sul, por exemplo, está implantando

um projeto-piloto de produção de biocombustíveis associada à

lavoura de alimentos em pequenas propriedades em parceria

com a Petrobras. serão nove microdestilarias, cada uma delas

com capacidade para processar o equivalente a sete toneladas

de cana por dia para a produção de 500 litros de álcool. três já

estão em operação.

esse projeto piloto reúne 15 mil famílias de pequenos

produtores de soja, milho, feijão e fumo e com uma área de

produção de cana que não pode ser superior a dois hectares

por família. a cana é colhida pelos agricultores, moída na

propriedade - com moendas móveis oferecidas pela Cooperbio – e

o suco é transportado para as microdestilarias patrocinadas pela

Petrobras. o bagaço e o vinhoto são utilizados na recuperação do

solo e no trato dos animais.

Mais empregos

para a agricultura

familiar

isto

ckp

ho

to

Page 48: Revista Sem Fronteiras

Paraná cria uma via de inovação no estudo e aproveitamento da biomassa

Centro Paranaense de Referência em Agroecologia – CPRA (Pinhais) O CPRA, vinculado à Secretaria de Agricultura e

Abastecimento do Paraná, vem usando óleo vegetal obtido a partir do girassol em tratores para testes de rendimento.

Escola Latino Americana de Agroecologia (Lapa) No curso superior de Tecnologia em Agroecologia, professores

e alunos fazem reflexões críticas sobre as fontes de energia, suas possibilidades e seus limites. Nos cursos técnicos,

oferecidos em parcerias com movimentos sociais do campo, são produzidas oleaginosas como o girassol e a mamona.

Fundação Assis Gurgacz – FAG (Cascavel) Promove pesquisas nas áreas de produção de biodiesel com óleos vegetais

e gorduras animais. Também faz testes com motores e realiza estudos de viabilidade técnico-econômico-ambiental de

matérias primas disponíveis no mercado nacional.

Instituto de Tecnologia do Paraná – Tecpar (Curitiba) Referência no Estado, o Tecpar trabalha com fontes

renováveis de energia desde os anos 80. Em sua sede, na Cidade Industrial de Curitiba, estão o Centro de

Referência em Biocombustíveis (Cerbio), da Agência Nacional do Petróleo (ANP), e uma usina própria de

biodiesel com capacidade de produção de 500 a 1000 litros por dia.

Mini usinas comunitárias (Curitiba, Palmeira e Pitanga) São incentivadas pelo governo estadual: a primeira

delas foi instalada na Cooperativa de Witmarsum, no município de Palmeira, sul do Estado. Cerca de 60 grupos

de agricultores participam desse projeto, onde o óleo vegetal prensado a frio é aproveitado como alimento e

como biocombustível. As outras duas funcionam em Curitiba (CPRA) e em Pitanga.

Instituto de Tecnologia para o Desenvolvimento – Lactec (Curitiba)

Testa o biodiesel em geradores de energia elétrica, para uso em locais onde não há rede pública de energia, e

em indústrias, como fonte de emergência. Avalia resultados de desempenho de motores movidos a biodiesel,

encaminhando-os ao MCT. Pesquisa células a combustível, que geram energia a partir de hidrogênio, obtido a

partir de reforma de etanol e metanol, e a emissão de gases não regulamentados por lei. Um gerador movido

a biodiesel abastece parte do prédio.

Granja Colombari (São Miguel do Iguaçu)

A granja de suínos Colombari armazena os dejetos dos animais em um biodigestor de biogás. A energia

produzida é suficiente para abastecer a propriedade e ainda gera um excedente que é enviado à rede pública,

através de uma parceria com a Itaipu e a Companhia Paranaense de Energia Elétrica (Copel).

Produção de álcool no Paraná (norte e noroeste do Paraná) Segundo maior produtor de álcool do país, com 30

indústrias do setor, o Paraná produziu 1,6 bilhão de litros de álcool na safra 2007-2008. A atividade está presente em 130

dos 399 municípios do Estado. As lavouras se concentram nas regiões norte e noroeste.

Porto de Paranaguá (Litoral) Abriga o primeiro terminal público de embarque de etanol do país: sua capacidade de

armazenamento é de 37,5 mil m3 do produto. Foi inaugurado em outubro de 2007.

Universidade Estadual de Ponta Grossa – UEPG Contará em breve com uma planta piloto para geração de

biocombustíveis e um laboratório para análises. O objetivo é melhorar o aproveitamento dos resíduos gerados na síntese

de biodiesel e desenvolver novas tecnologias para produção de catalisadores.

46 | semfronteiras

Page 49: Revista Sem Fronteiras

Universidade Estadual de Londrina – UEL Estuda a otimização da reação de transesterificação, com a mistura

de catalisadores para melhorar o rendimento do processo de obtenção do biodiesel. Uma outra rota de obtenção

de biocombustível, a pirólise catalítica (craqueamento) de óleos vegetais, também é objeto de pesquisa. A diferença

é que esta reação não precisa do álcool e não gera sub-produtos como a glicerina, apresentando-se como uma

solução interessante para pequenos empresários e agricultores.

Universidade Estadual de Maringá – UEM Pesquisa o biodiesel e executa plantas de produção que ficam à disposição de

empresários. Desenvolve nanocatalisadores, faz ensaios e análises do óleo. Também estuda o reaproveitamento dos subprodutos

do biodiesel, bem como as linhagens especiais empregadas na produção do etanol.

Universidade Estadual do Centro-oeste – Unicentro (Guarapuava) Resultado de uma parceria com um grupo de empresários

da região, a usina piloto Lumabio já publicou vários trabalhos científicos na área de biocombustíveis. Está instalada na Incubadora

Tecnológica de Guarapuava.

Universidade Estadual do oeste do Paraná – Unioeste

- Biodigestores (oeste do Paraná – Toledo)

Estuda o potencial de produção de energia renovável no meio rural, particularmente de biomassa vegetal e de resíduos rurais.

Graças a esse trabalho, algumas propriedades do oeste do Estado já contam com biodigestores que processam os resíduos

orgânicos de suínos e bovinos para geração de biogás e biofertilizantes.

Universidade Federal do Paraná – UFPR A produção de biodiesel, a otimização de processos, o uso de co-produtos como a

glicerina, a torta e o farelo de óleo vegetal e de compósitos plastificados com amido e glicerol estão entre as principais pesquisas

da instituição. Além disso, desenvolve catalisadores e polímeros alternativos para uso em células a combustível. No Laboratório de

Energia da Biomassa, pesquisa-se o potencial da biomassa florestal como fonte para a matriz energética. Há ainda estudos sobre o

uso de resíduos de madeira como combustível renovável para o setor industrial, especialmente para produção de vapor e energia

elétrica, e projetos relacionados à atualização de tecnologias de produção de briquetes de resíduos florestais e de briquetes de

carvão vegetal.

Pró-Natureza Limpa (Toledo) Graças a esse projeto, resultado de uma parceria entre a Unioeste e a Prefeitura de Formosa do

Oeste, famílias poderão receber incentivos para separar o lixo orgânico de outros materiais. O lixo que iria para um aterro sanitário

servirá de matéria prima para geração de energia elétrica e térmica. Todos os equipamentos usados pelo projeto foram construídos

com material de ferro-velho.

Companhia de Energia Elétrica do Paraná – Copel (Curitiba) Com o objetivo de diversificar e descentralizar a matriz energética

paranaense, a Copel está investindo em novas tecnologias de fontes renováveis de energia. Está prevista a instalação de pequenas

e médias usinas de processamento de oleaginosas, bem como a estruturação de arranjos produtivos que aumentem a renda de

pequenos produtores agrícolas. Também serão formadas parcerias com usinas de álcool e açúcar para a construção de pequenas

centrais termelétricas. As usinas, de até 120 MW, produzirão eletricidade a partir do bagaço de cana.

Instituto Agronômico do Paraná – Iapar (Londrina) Pesquisa culturas de oleaginosas com potencial para

produção de biodiesel, como amendoim, girassol, nabo forrageiro, colza, mamona, tungue e pinhão-manso.

As pesquisas incluem o zoneamento agrícola, o manejo do solo, o melhoramento de materiais genéticos e

o controle de doenças. Também são feitos testes de prensas para extração de óleo e análise de viabilidade

econômica para cada cultura. O instituto destaca-se ainda na produção de sementes básicas e certificadas, a fim

de disponibilizar os materiais genéticos aos produtores do Paraná. Também há estudos para o aproveitamento

das tortas residuais para alimentação animal.

Pesquisas desenvolvidas nas universidades e institutos Paranaenses na área da Bioenergia revelaM CoMPetênCias eM várias frentes e tiraM a Produção aCadêMiCa do anoniMato.o oBJetivo é enContrar soluções que diversifiqueM a Matriz energétiCa, diMinuaM a dePendênCia dos CoMBustíveis fÓsseis e reduzaM a eMissão de Poluentes.

a seguir, alguns exeMPlos dessa Produção:

semfronteiras | 47

Page 50: Revista Sem Fronteiras

Rio de informações

M E I O A M B I E N T E

Pesquisadores da unioeste e da ueM PreParaM

catálogo da ictiofauna do Baixo iguaçu

rodrigo aPolloni

Bru

no

sto

ck

48 | semfronteiras

Page 51: Revista Sem Fronteiras

Rio de informações desde a primeira vez em que foi descrito por um viajante

europeu, no século 16, até o início do século 21, o Baixo iguaçu

– área da bacia hidrográfica compreendida entre união da

Vitória e foz do iguaçu – sofreu transformações importantes.

tais mudanças – definidas, fundamentalmente, pela construção

de reservatórios de usinas hidrelétricas e pela introdução de

espécies exóticas de peixes – implicaram em efeitos sobre

a fauna. nos últimos anos, pesquisadores de universidades

paranaenses vêm realizando um importante trabalho de

detecção e análise desses efeitos. ele inclui o levantamento

e descrição das espécies – assim como um grande número

de trabalhos científicos em áreas como taxonomia, ictiologia,

limnologia, gestão ambiental e engenharia de pesca.

semfronteiras | 49

Page 52: Revista Sem Fronteiras

um desses projetos resultará na publicação,

em breve, de um catálogo da ictiofauna do

Baixo iguaçu. o responsável, professor gilmar

Baumgartner – doutor em ecologia de ambientes

aquáticos continentais e coordenador do

grupo de Pesquisas em recursos Pesqueiros

e limnologia da unioeste, campus toledo –

explica que o levantamento começou em 1994,

por pesquisadores da ueM. “a partir de 2003

começamos a avaliar dois reservatórios de usina

da tractebel e, em 2006, iniciamos um trabalho

com a copel que abrange o trecho compreendido

entre salto caxias e união da Vitória”, explica.

ao todo, o monitoramento abrange oito

reservatórios - salto do Val, foz do areia, segredo,

derivação do Jordão, santiago, cavernoso,

caxias e chopim 1 - e alguns afluentes do Baixo

iguaçu. entre pesquisadores da unioeste e do

núcleo de Pesquisas em limnologia ictiologia

e aqüicultura (nupélia) da ueM, cerca de 80

pessoas participam do trabalho. além de fazer

coletas, as equipes também trabalham com

materiais coletados anteriormente. os espécimes

vêm sendo detalhadamente examinados,

medidos e fotografados.

o catálogo, explica Baumgartner, trará

informações sobre 83 espécies de peixes –

número que pode aumentar, uma vez que o

estudo ainda está em andamento. “o objetivo

é atingir dois públicos, o científico e o leigo,

que inclui estudantes e praticantes de pesca

desportiva. o trabalho, portanto, vai auxiliar em

duas frentes: no gerenciamento e na formação

de consciência ambiental”. a parte científica

trará um manual de identificação com todas as

características de cada espécie; a parte voltada

ao público leigo, informações sobre a biologia,

reprodução, hábitos alimentares e distribuição

espacial na bacia hidrográfica. a obra será

oficialmente apresentada durante o xViii

encontro Brasileiro de ictiologia, que acontece

em janeiro de 2009 em cuiabá (Mt).

Endemismo

Para a pesquisadora carla simone Pavanelli,

pós-doutora em sistemática, curadora do nupélia

e participante do projeto, o trabalho ganha em

importância na razão em que se está examinando

de forma específica o Baixo iguaçu. “É uma fauna

que apresenta uma série de peculiaridades e

difere, por exemplo, da fauna da bacia do rio

Paraná e de qualquer outra bacia.”

gilmar Baumgartner ressalta a riqueza da

fauna estudada. “as características do iguaçu

acabaram por determinar o desenvolvimento de

espécies endêmicas, ou seja, que só existem ali.

algumas, inclusive, estão adstritas a pequenos

trechos do rio”, salienta gilmar. a “descoberta”

dessas espécies representa, em si, uma enorme

riqueza de conhecimentos.

até o momento, as pesquisas revelaram

coisas importantes. cerca de 10% das espécies

catalogadas, por exemplo, jamais foram descritas.

as espécies “novas”, porém, permanecerão

sem nome científico no catálogo. isso acontece,

explica carla Pavanelli, em função de alguns

requisitos necessários ao “batismo científico”

de uma espécie, dentre os quais a publicação da

descoberta em revistas científicas internacionais.

“as descrições estão sendo feitas em separado.

assim, as que tiverem saído antes da publicação

M E I O A M B I E N T E

50 | semfronteiras

Page 53: Revista Sem Fronteiras

ao todo, 15 espécies exóticas foram identificadas,

dentre elas o tucunaré, peixe-rei, carpas, tilápias,

dourado, pintado e caxara. “em minha avaliação,

essa é a grande surpresa do estudo. essas espécies,

que podem ter sido introduzidas no rio de forma

deliberada ou por acidente, ameaçam as espécies

originárias. nossa grande preocupação é com o

tipo de substituição que pode acontecer no meio

ambiente”, pondera gilmar.

do catálogo serão incorporadas à obra. as demais

serão elencadas sem nome científico, mas com

todas as informações necessárias para que se possa

identificá-las, checar se são mesmo novas espécies e

chegar até elas na natureza.”

Impacto

a pesquisa também revelou o impacto da

introdução de espécies exóticas no Baixo iguaçu.

semfronteiras | 51

Page 54: Revista Sem Fronteiras

Apareiodon vittatus –

canivete

Astyanax sp B - lambari

do rabo vermelho

Bryconamericus ikaa –

pequira

Pimelodus britskii -

mandi pintado

Pimelodus ortmanni –

mandi

52 | semfronteiras

Foto

s d

e G

erp

el/

Un

ioes

te

Page 55: Revista Sem Fronteiras

a relação entre hidroelétricas e pesquisas de

ictiofauna não é gratuita. a partir do momento em que

ocorrem alterações significativas em um curso de rio,

fatalmente são verificadas mudanças nas populações

de peixes. “a lei ambiental exige o monitoramento desse

impacto”, explica gilmar Baumgartner. “nos estudos

anteriores, o objetivo era mais o de levantamento das

espécies.

com a construção dos reservatórios, passamos,

também, a avaliar o impacto e a buscar subsídios para

o manejo das populações.” e que tipo de impacto já foi

verificado no Baixo iguaçu? como a bacia hidrográfica

não possui espécies migradoras, ele foi minimizado.

Mesmo assim, há registro de aumento do número de

indivíduos de algumas espécies – caso, por exemplo,

de certos tipos de lambaris. o estudo não identificou,

porém, reduções significativas de indivíduos das

espécies originárias do próprio rio.

Da demanda energética à pesquisa de impacto ambiental

semfronteiras | 53

Bru

no

sto

ck

Page 56: Revista Sem Fronteiras

M E I O A M B I E N T E

54 | semfronteiras

isto

ckp

ho

to

Page 57: Revista Sem Fronteiras

Urbanizaçãoimpõe novos desafios

O Brasil é um dos países mais ricos do mundo em água doce.

Seus rios totalizam vazões médias anuais de quase 180 mil metros

cúbicos por segundo, ou o mesmo que 72 piscinas olímpicas por

segundo – volume que corresponde a aproximadamente 12% da

disponibilidade mundial. Segundo a Agência Nacional das Águas

(ANA), a quantidade de águas em território nacional seria suficiente

para atender cerca de 57 vezes a demanda atual e abastecer uma

população de até 32 bilhões de pessoas (quase cinco vezes a

população mundial).

Os desafios são inúmeros: o maior rio do Paraná, o rio Iguaçu,

ilustra bem essa constatação. Ele nasce na Região Metropolitana

de Curitiba e acaba 1.300 quilômetros depois, nas Cataratas do

Iguaçu, em Foz do Iguaçu, região oeste do Estado. Mais de 1.200

quilômetros de suas águas estão em boas condições, segundo

a Superintendência de Desenvolvimento de Recursos Hídricos

e Saneamento Ambiental do Paraná (Suderhsa), que há mais

de 40 anos faz o monitoramento da qualidade da água dos rios

paranaenses. O maior problema está nos seus primeiros 70

quilômetros: ao atravessar a capital e seu entorno, o Iguaçu

ainda padece de problemas comuns aos grandes centros urbanos

brasileiros (segundo a Companhia de Saneamento do Paraná,

85% da população de Curitiba conta com serviços de coleta e

tratamento de esgoto).

cerca de 12% dos recursos hídricos

Mundiais estão no Brasil, Mas os

desafios não ParaM de crescer

caMilla toledo

semfronteiras | 55

Page 58: Revista Sem Fronteiras

Ocupações irregulares e poluição

“Ligações irregulares de esgoto e falta de

saneamento básico representam a maioria dos

problemas na área de recursos hídricos no Brasil,

somados ainda às ocupações em área de manancial

e à poluição das indústrias”, explica Eduardo Gobbi,

professor doutor em Engenharia Ambiental da

Universidade Federal do Paraná (UFPR). Atualmente,

pouco mais da metade (54%) dos domicílios

brasileiros contam com coleta de esgotos, informa

a Agência Nacional de Águas. Nas regiões com

maiores coberturas – como na região hidrográfica

do rio Paraná – os índices se aproximam de 70%

Já nos rios do interior do Estado, os problemas

são pontuais e típicos de regiões agropecuárias.

“O processo erosivo, a expansão da produção

agrícola, a retirada de matas ciliares, o lançamento

de agrotóxicos e de dejetos de animais são alguns

dos fatores de degradação da qualidade de rios

nas regiões dedicadas à produção de alimentos no

Brasil”, detalha o professor.

Além das águas superficiais, muitas localidades

recorrem às águas subterrâneas para abastecimento

público. Sob o território paranaense, encontram-se 11

aqüíferos, dentre os quais destacam-se o Serra Geral,

o Caiuá – amplamente utilizado para abastecimento

público – e o Guarani. Este último possui mais de 1,2

milhão de quilômetros quadrados espalhados por

oito estados brasileiros, além de Argentina, Paraguai

e Uruguai, onde estão armazenados cerca de 48 mil

quilômetros cúbicos de água. Na opinião do geólogo

Everton de Souza, presidente da Câmara Técnica

de Águas Subterrâneas, do Conselho Nacional de

Recursos Hídricos, e vice-presidente da Associação

Brasileira de Águas Subterrâneas (ABAS), os maiores

desafios estão na identificação dos usuários e na

ausência de uma rede eficiente de monitoramento

da qualidade e quantidade dessas águas.

“Hoje, no país, muitos poços ainda são

perfurados de forma clandestina, sem cadas-

tramento ou outorga dos órgãos ambientais,

em grande parte por falta de conscientização

da sociedade. Portanto, podemos dizer que

desconhecemos a totalidade de informações

fundamentais para uma boa gestão, como a

quantidade e a qualidade da água disponível ”,

afirma o geólogo. Para superar estes desafios,

Everton aposta na construção dos planos de

recursos hídricos. “Eles irão integrar a rede de

monitoramento de recursos subterrâneos com

a de recursos superficiais e reconhecer suas

interconexões”.

Mundo moderno e urbano

Devido às dimensões continentais do Brasil,

os ciclos hidrológicos são muito variados e diferem

de região para região. “Nas regiões Sul e Sudeste,

por exemplo, não existem períodos tão definidos

como nas demais regiões do Brasil, em que as fases

são bem características e podem até mesmo ser

denominadas de estação da seca ou das chuvas”,

explica o engenheiro civil especialista em gestão de

recursos hídricos, Edson Manassés. “Os ciclos são

permanentes em suas regiões; o que muda são as

demandas”, afirma. Neste sentido, a urbanização

é sempre um grande desafio para a gestão das

águas no Brasil. Além da ocupação irregular de

mananciais, que compromete a qualidade da água,

a impermeabilização do solo e a construção de

calçadas e pavimentação de ruas, conseqüências

desse processo, reduzem a infiltração da água

no solo e diminuem a recarga dos aqüíferos. Os

desmatamentos e a erosão também influenciam

negativamente o ciclo hidrológico.

O crescimento das cidades traz ainda outra

preocupação: com a impermeabilização do solo

também é necessário aumentar o potencial de

escoamento da água para evitar enchentes. Isto

é feito através da drenagem pluvial que direciona

M E I O A M B I E N T E

56 | semfronteiras

Page 59: Revista Sem Fronteiras

a água da chuva a locais onde o lançamento destas

vazões pode ser feito, geralmente rios e lagos. “A

implantação de galerias pluviais em áreas urbanizadas,

através de tubulações, canais, bocas de lobo e bueiros

é a metodologia mundialmente utilizada”, destaca o

engenheiro civil especializado em gestão de recursos

hídricos, Carlos Alberto Galerani. “A tendência da

grande maioria dos projetistas é aliar essas galerias à

implantação de bacias de detenção, que tem função

inversa às galerias pluviais: deter o escoamento na

fonte ou onde ele é produzido e, com isso, diminuir a

ocorrência de cheias”, completa.

Ele ressalta que as cheias são um processo

natural do rio. “Elas se tornam enchentes quando

a população ocupa uma área de escoamento do

rio que não deveria estar ocupada”, comenta. Uma

das alternativas apontadas pelo especialista é a

implantação de políticas públicas que favoreçam

a saída das famílias desses locais ambientalmente

inadequados para ocupação urbana. Além de trazer

prejuízos ambientais e econômicos, as enchentes

colocam a saúde da população em risco. Por isto,

a drenagem se apresenta como um dos quatro

pilares do saneamento básico – os outros três são

o abastecimento de água, a coleta e tratamento de

esgoto e a coleta e a disposição final de lixo.

LEgIsLaçãO tardIa

Antes da gestão participativa que reconhece a água como elemento essencial à saúde da população e ao desenvolvimento sustentável, os recursos hídricos foram, por muito tempo, administrados apenas por setores que os aproveitavam comercialmente.

entre 1910 e 1940, o modelo de propriedade conjunta terra-água era a tônica da gestão da água, que não era regulada pelo poder público.

É criado em 1934, o Código das Águas, trazendo profundas alterações no Código Civil.

A primeira legislação contemplando o tema água foi redigida somente em 1981, quando os impactos da urbanização já apresentavam conseqüências negativas como enchentes e piora na qualidade da água. É então criada a lei da política nacional do meio ambiente.

É sancionada em 1997, a lei das águas, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos e prevê a participação popular. A instância superior do sistema é o Conselho Nacional de Recursos Hídricos. Surgem, na seqüência, os sistemas estaduais de gerenciamento e os conselhos estaduais de recursos hídricos

Atualmente, a gestão participativa e descentralizada se dá através dos comitês de bacias hidrográficas. Já a execução do planejamento fica a cargo das Agências de Bacias.

Atualmente, apenas duas bacias hidrográficas em rios de domínio da União fazem a cobrança do uso da água: Paraíba do Sul e a Piracicaba-Capivari-Jundiaí, conhecida como PCJ. Em rios de domínio estadual a cobrança ocorre em São Paulo, Rio de Janeiro e Ceará. A questão é polêmica.

Cálculos da Câmara Técnica de Cobrança do Comitê do Alto Iguaçu-Afluentes do Alto Ribeira indicam que a cobrança pelo uso da água em todas as 16 bacias hidrográficas paranaenses poderia direcionar, a cada ano, entre R$ 17 milhões e R$ 25 milhões à melhoria da qualidade dos rios.

JoSÉ LUIz SCRoCCARo, Diretor Operacional

de Águas da Suderhsa

“a gestão ParticiPatiVa É,

seM dúVida, uMa forMa de

garantir os usos MúltiPlos

das águas seM PreJuízos às

futuras gerações”.

semfronteiras | 57

isto

ckp

ho

to

Page 60: Revista Sem Fronteiras

I N O VA Ç Ã O

58 | semfronteiras

isto

ckp

ho

to

Page 61: Revista Sem Fronteiras

São evidentes os contrastes existentes no campo

da ciência e tecnologia, no Brasil. O país se destaca

como um dos países que mais produzem artigos

científicos no mundo (é o 15º, à frente de nações como

Suíça e Suécia), ao mesmo tempo, ainda tem um

ambiente pouco favorável à inovação tecnológica está

na 43ª colocação, segundo definiu recentemente o

Economist Intelligence Unit, braço de pesquisas

macroeconômicas da revista britânica The

Economist.

O avanço na produção científica brasileira é

inegável. Em 1970, foram publicados 64 artigos (0,019%

da produção mundial). Neste ano, a participação

chegou a 2,02%. Nessas três décadas, enquanto o

total mundial pouco mais que dobrou, o montante

brasileiro cresceu mais de 250 vezes, o que lhe

permitiu chegar às primeiras colocações do ranking.

E isso em um país que investe apenas 1% do PIB em

ciência e tecnologia, enquanto a Coréia do Sul e boa

parte dos países que apresentam maior crescimento

no campo científico aplicam cerca de 3%.

Esse bom desempenho indica que, apesar do

baixo investimento, os mecanismos que estimulam

essas publicações – em especial a avaliação a que

são submetidos os programas de pós-graduação nas

instituições de ensino, principal origem dos artigos

– têm sido eficientes. Se o crescimento da ciência

brasileira continuar – e nada indica que haverá

mudanças nessa área – a expectativa é que o Brasil

alcance a 10ª posição dentro de 10 anos.

Academia e iniciativa privada

Contudo, se o desempenho nos últimos anos

é positivo e a perspectiva, otimista, o que leva a The

Economist a considerar o Brasil um ambiente pouco

favorável à inovação? Uma primeira pista vem da

qualidade desses artigos, refletida no chamado

“ranking de impacto”, ou seja, o quanto esses artigos

servem como referência mundo afora.

Esse ranking é elaborado com base no índice

médio de citações por autores de cada país, e é liderado

por Estados Unidos, Canadá e Reino Unido. Sob esse

ponto de vista, o desempenho brasileiro se assemelha

ao de países em estágio similar de desenvolvimento,

como México e Argentina. A comparação com a

Irlanda, por exemplo, é interessante, já que esse país

tem três vezes menos artigos que o Brasil, mas é duas

vezes mais citado.

Outro indicativo vem da baixa integração

entre a academia e a iniciativa privada. O professor

universitário e consultor Cláudio Roberto Vicente, da

Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), fez

sua tese de mestrado exatamente sobre esse tema,

indicando como a gestão relacionamento-cliente

(CRM) pode ser utilizada pelas instituições científicas

como forma de aproximação com a indústria.

Um dos dados apurados por Vicente é

sintomático: enquanto apenas 12% dos engenheiros

e cientistas brasileiros estão alocados em pesquisa

e desenvolvimento industrial, esse índice é de 79%

nos Estados Unidos e de 55% na Coréia – país que,

há 25 anos, tinha indicadores de ciência e inovação

Mudanças em curso

Consolidação da polítiCa naCional de inovação,

CalCada prinCipalmente na lei do Bem, é uma dessas

mudanças

romeu de Bruns

semfronteiras | 59

Page 62: Revista Sem Fronteiras

similares aos nossos, mas com um programa de

investimentos pesados em educação e na criação de

institutos de pesquisa (eram pouco mais de 40 e hoje

já passam de 10 mil), passou a competir em pé de

igualdade com as economias mais desenvolvidas do

planeta. “A Coréia fez o que o Brasil precisa fazer”,

resume Vicente.

Essa pouca integração universidade-indústria

se reflete no baixo número de patentes que o Brasil

registra. Sobre isso, mais uma vez vale o exemplo

da Coréia. Nos anos 1980, empresas coreanas e

brasileiras registravam em média 80 patentes por

ano nos EUA. Hoje, enquanto a Coréia faz mais de

6 mil registros por ano, o Brasil não passa de 200;

a Universidade de Campinas (Unicamp), campeã

nessa área, sugere que algo não vai bem nessa

relação. A questão não é nova: de um lado, critica-

se o isolamento da universidade; de outro, deve-se

chamar a atenção para a inapetência das empresas

brasileiras em investirem em inovação.

De modo geral, as empresas costumam alegar

falta de incentivos. Porém, vale destacar que a

Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), ligada ao

Ministério da Ciência e Tecnologia, disponibilizou R$

450 milhões em recursos não reembolsáveis para

projetos inovadores, no ano passado. Desse montante,

um terço não chegou a ser repassado porque os

projetos apresentados não foram adequadamente

elaborados, o que é sinal de que muitas empresas

não estão preparadas para acessar esses recursos.

Lei do Bem

Apesar disso, as fontes entrevistadas são

unânimes em reconhecer que está em curso uma

mudança cultural no país, com a consolidação de

política nacional de inovação, calcada na Lei 11.196, de

2005 (lei do bem), Lei 10.973, de 2004 (lei de inovação

tecnológica), além das linhas de financiamento do

BNDES, Fundos Setoriais e iniciativas de âmbito

estadual.

“O investimento em inovação tecnológica e

científica tem que ser bastante coordenado, não vai

ser um órgão governamental sozinho que mudará

o quadro. Temos que popularizar mais a ciência e a

sociedade é o principal ator no processo”, afirma o

coordenador geral de Programas Estratégicos da

Capes, Luciano de Azevedo Soares Neto.

Ele tem percorrido o país nos últimos meses

divulgando a chamada pública MEC-MCT-MDIC,

uma fonte de recursos para projetos de inovação

científica e tecnológica sem prazo para se encerrar.

Um dos diferenciais dessa forma de financiamento

é que ela permite às empresas se associarem a

instituições científicas públicas para desenvolverem

suas propostas. Além de dois processos em fase final

de análise, outros 114 estão inscritos – isto em apenas

quatro meses. “Temos sido contatados por instituições

do país inteiro”, comemora Soares Neto.

O coordenador da Agência Paranaense de

Propriedade Industrial (APPI), abrigada no Núcleo

de Inovação Tecnológica (Nitpar), da Secretaria de

Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (SETI), Marcus

Julius Zanon, reconhece que o tempo de registro

de uma patente no país ainda é muito demorado.

“Enquanto aqui a concessão de uma patente pode

levar até oito anos, na Espanha a demora é de três

anos, chegando a dois nos casos de urgência”, afirma.

• deduções de imposto de renda e da contribuição

sobre o lucro líquido (Csll) de gastos efetuados

em atividades de p&d.

• redução do imposto sobre produtos industrial-

izados (ipi) na compra de máquinas e equipamen-

tos para p&d.

• depreciação acelerada desses bens.

• amortização acelerada de bens intangíveis.

Principais incentivos da Lei do Bem

• redução do imposto de renda retido na

fonte incidente sobre remessa ao exterior

resultantes de contratos de transferência de

tecnologia.

• isenção do imposto de renda retido na fonte

nas remessas efetuadas para o exterior, des-

tinadas ao registro e manutenção de marcas,

patentes e cultivares.

60 | semfronteiras

Page 63: Revista Sem Fronteiras

“Mas o Brasil vem passando por um processo de

modernização da área de propriedade industrial na

última década”.

Desde 2005, o Instituto Nacional da Propriedade

Industrial (INPI) triplicou o número de pessoal (os

examinadores de patentes passaram de 110 para os

atuais 295, com previsão de chegar a 400 até o final

do ano) e eliminou da fila de espera cerca de 100 mil

processos só de registro de marcas. Por esta razão

espera-se que o estoque de processos iniciados há

mais de cinco anos seja zerado até meados de 2009.

“O problema maior, no entanto, é que há

demandas novas. O Brasil pressiona para aderir ao

chamado Protocolo de Madri, acordo que permite a

integração de sistemas, fazendo com que o mesmo

registro de marca ou patente tenha validade em

quase uma centena de países”, informa Júlio Zanon.

Esse crescimento da demanda é, portanto, a principal

motivação para que o sistema de registro de patentes

no Brasil se equipare aos padrões internacionais.

outra importante fonte de inovação reside nos institutos científicos. no Brasil, eles

desempenham papel relevante no que diz respeito aos avanços tecnológicos, como é o

caso da embrapa no desenvolvimento do setor agropecuário, do ita e da embraer no setor

aeroespacial, da Coope, da ufrJ, na prospecção de petróleo em águas profundas, Butantan

e fiocruz na saúde, entre outros. “o papel dos institutos de pesquisa é fundamental na

transferência de conhecimento pois normalmente eles estão mais conectados com o mercado

e a sociedade”, afirma Bill Jorge da Costa, diretor técnico do tecpar, instituto paranaense

que se dedica principalmente às tecnologias industriais básicas (prestação de serviços como

análises, ensaios e calibrações) nos segmentos industriais e agrícolas, desde os anos 1940.

os institutos nacionais de Ciência e tecnologia, que substituirão os institutos do

milênio, do Conselho nacional de desenvolvimento Científico e tecnológico (Cnpq) devem

reforçar o setor. eles foram anunciados pelo ministro sérgio rezende na 60ª reunião anual

da sociedade Brasileira para o progresso da Ciência (sBpC), em Campinas. o programa, que

terá r$ 270 milhões do governo federal nos três primeiros anos, poderá contar com recursos

totais de r$ 400 milhões se somada a participação de outros ministérios, de agências

estaduais de amparo à pesquisa e de entidades como o Banco nacional de desenvolvimento

econômico e social (Bndes). “os institutos do milênio conseguiram excelentes resultados,

mas têm recursos muito limitados. os institutos nacionais vão substituí-los com mais

sustentabilidade. vamos entrar em uma fase de sistematização e de consolidação do apoio

à ciência e à tecnologia”, disse rezende. o novo programa já tem participação garantida do

Bndes, dos ministérios da saúde e da educação e das fundações de amparo à pesquisa de

são paulo (fapesp), rio de Janeiro (faperj) e minas Gerais (fapemig).O p

ape

l do

s in

stit

uto

s

div

ulg

ação

tec

par

semfronteiras | 61

Vista aérea do

Instituto de

Tecnologia do

Paraná, em Curitiba

Page 64: Revista Sem Fronteiras

I N O VA Ç Ã O

62 | semfronteiras

Page 65: Revista Sem Fronteiras

Apostando no futuropolítiCas púBliCas para a área de CiênCia, teCnoloGia

e inovação inCluem a miCro e a pequena empresa

I N O VA Ç Ã O

A micro e a pequena empresa são as que mais geram empregos

no país. No Paraná, de acordo com a Secretaria de Estado da Fazenda,

dos 218 mil estabelecimentos inscritos no cadastro de contribuintes do

ICMS, 169 mil (77,5%) são pequenas e micro empresas. Um dos fatores

condicionantes do sucesso deste setor é o acesso a novas tecnologias: por

isso, políticas públicas que visam a maior sustentação do setor vêm sendo

ampliadas nos últimos anos no país e no Estado.

Em 2004, foi criado o programa Paraná Inovação, que funciona por

meio de um acordo entre a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Ensino

Superior (SETI), a Rede Paranaense de Incubadoras e Parques Tecnológicos

(Reparte) e o Ministério da Ciência e Tecnologia/Finep, e tem recursos

da ordem de R$ 8 milhões, divididos entre o governo federal e estadual.

Desde a sua criação, o programa já financiou 70 projetos nas áreas de

agronegócio, biotecnologia, energia e saúde, em praticamente todas as

regiões do Estado. Entre os projetos concluídos estão: um cateter urinário,

charque de galinha poedeira e um software para gestão de energia.

“O Paraná Inovação fomenta projetos de pesquisa e desenvolvimento

de produtos e processos inovadores, empreendidos por pesquisadores

e em cooperação com empresas de base tecnológica com vocação para

a inovação e a utilização de técnicas avançadas ou pioneiras, e isto é

fundamental para o sucesso da micro e pequena empresa”, disse a secretária

Lygia Pupatto durante o lançamento do terceiro edital do programa, no

final de julho deste ano, cujos recursos somam R$ 3,9 milhões.

A preocupação com o acesso às novas tecnologias e com a geração de

novos postos de trabalho no segmento inovação também está embutida em

dois programas criados recentemente: o Sistema Brasileiro de Tecnologia

(Sibratec), anunciado em novembro de 2007 pelo presidente Luís Inácio

Lula da Silva, e o Extensão Tecnológica Empresarial, uma das atividades

do programa Universidade sem Fronteiras, anunciado no início deste ano

pela secretária. Neste caso, o diferencial é o público – exclusivamente

municípios com baixo índice de desenvolvimento humano.

semfronteiras | 63

Page 66: Revista Sem Fronteiras

Incubadoras tecnológicas

Ao oferecer um ambiente encorajador e infra-

estrutura de serviços necessários ao desenvolvimento

de empreendimentos inovadores, as incubadoras

tecnológicas também têm desempenhado papel

fundamental junto à micro e pequena empresa. No

Paraná, por exemplo, muitas empresas de sucesso no

mercado nacional e internacional já desenvolveram

produtos inovadores na Incubadora Tecnológica

do Tecpar (Intec), nas incubadoras instaladas nas

universidades estaduais de Londrina (UEL), Maringá

(UEM), Ponta Grossa (UEPG), Guarapuava (Unicentro)

e Cascavel (Unioeste), e nas incubadoras associadas à

Reparte. Os produtos desenvolvidos nesses ambientes

vão desde infra-estrutura em telecomunicações,

softwares, automação industrial até esportes e lazer.

Uma das instituições de ensino de maior tradição

no campo do desenvolvimento de tecnologias aplicadas

é a Universidade Federal Tecnológica do Paraná

(UTFPR), que conta com 10 campi e 16 mil alunos

espalhados pelo estado. Ao todo, são desenvolvidos,

por ano, cerca de 200 projetos de cunho tecnológico

e outros 60 de cunho social, com empresas parceiras.

A infra-estrutura conta com cinco pré-incubadoras

(chamadas de hotéis tecnológicos) e cinco incubadoras

que ao longo dos últimos anos graduaram 57 empresas

e geraram casos de sucesso como a Esystech, a única

companhia brasileira fora do eixo São Paulo-São José

dos Campos com projeto aprovado pela Financiadora

de Estudos e Projetos (Finep) na modalidade de

adensamento da cadeia aeroespacial.

Na avaliação da professora Isaura Alberton

de Lima, pró-reitora de Relações Empresariais e

Comunitárias da UTFPR, tanto as parcerias com

empresas de desenvolvimento de projetos incubados

quanto o da Esystech são exemplos de como o

Conhecimento, criatividade e ousadiaProdutos gerados nas incubadoras instaladas nas universidades estaduais mostram como

anda a criatividade dos empreendedores paranaenses. Alguns exemplos:

Software

Entre os produtos desenvolvidos pela empresa

Guenka, na Incubadora Internacional de Empresas

de Base Tecnológica da Universidade Estadual de

Londrina (Intuel), estão os sistemas de gestão em-

presarial, controle de produção e gerenciamento de

equipe de vendas. Uma equipe de 14 funcionários cria

softwares para uma empresa multinacional, fornece-

dora de sistemas para montadoras automobilísticas. Automação industrial

Na Incubadora Tecnológica de Maringá, a Skin Tech criou

um sistema de automação para máquinas industriais de lavar

roupas. Sua principal vantagem é que o funcionário não precisa

ter contato com os produtos químicos usados na lavagem. Este

é o primeiro sistema automatizado que permite que sejam usa-

dos produtos em pó no lugar dos produtos líquidos. Um programa

faz a dosagem dos químicos e controla todo o funcionamento

das máquinas, informando por um monitor em que etapa está

o processo. O sistema atende máquinas de lavar hospitalares,

industriais e de hotelaria. Há uma unidade em teste no Hospital

Universitário da UEM.

64 | semfronteiras

foto

s: d

ivu

lgaç

ão

Page 67: Revista Sem Fronteiras

conhecimento gerado na universidade é transferido

para a sociedade. “O contato com as empresas é

muito importante para a academia, porque permite

transformar problemas reais em temas de estudo”, diz.

Para facilitar a aproximação com a iniciativa privada, a

Universidade Federal do Paraná (UFPR) criou o Portal de

Relacionamento (www.relacionamento.ufpr.br/portal),

em que é possível acessar um banco de patentes com

as tecnologias desenvolvidas pela instituição. Até o

momento, são 40 patentes cadastradas. Uma delas

é o projeto de biotecnologia que utiliza feromônios

para atrair insetos e, desta forma, combater pragas

agrícolas sem o uso de pesticidas. “A idéia do portal

é unir a visão dos empresários com o conhecimento

dos pesquisadores”, diz o coordenador da iniciativa,

Wanderley Veiga.

Na Pontifícia Universidade Católica (PUC-PR), a

I Mostra de Pesquisa e Inovação, realizada em 2007,

viabilizou 30 projetos que já estão sendo negociados

com empresas. “A mostra faz parte de um leque de

iniciativas que inclui também a construção de um

parque tecnológico, a exemplo do que já existe na

PUC do Rio Grande do Sul. A idéia é atrair e fomentar

empresas de base tecnológica”, afirma Marco Antônio

Barbosa Cândido, superintendente da Associação

Paranaense de Cultura, instituição mantenedora da

PUC-PR. Atualmente, a PUC paranaense detém 228

termos de parceria com empresas localizadas no

Paraná, Santa Catarina e São Paulo, além de algumas

estrangeiras. Nos cálculos de Cândido, esse volume

deverá crescer 58% neste ano. A II Mostra de Inovação,

em setembro, contou com 155 projetos ⎯ 31% a mais

do que no ano passado. Em 2007, foram 10 patentes,

além de sete depósitos de registro de software e 90

marcas registradas. “De maneira geral, a integração

entre academia e setor produtivo é uma tendência

que veio para ficar”, garante.

Indústria têxtil

Em vez de exportar o fio de seda cru, que tem

baixo valor agregado, a empresa Bisa Overseas, de

Maringá, vem exportando cachecóis de seda para

a França. O projeto Seda Justa foi desenvolvido na

Incubadora Tecnológica da Universidade Estadual de

Maringá e o objetivo é proporcionar uma alternativa

de renda às famílias produtoras do casulo de bicho-

da-seda na Vila Rural Esperança. A tecnologia de

beneficiamento do fio de seda segue o conceito de

comércio justo: a rede Artisans du Monde compra os

produtos e paga diretamente às artesãs.

Telecomunicações

A HI Technologies, empresa instalada na Incu-

badora Tecnológica de Curitiba (Intec), desenvolveu

o OpenVida, sistema de telemedicina que permite

o monitoramento dos sinais vitais dos pacientes

em tempo real, através de qualquer computador

conectado à internet, por meio de senha. Esse acom-

panhamento também pode ser feito em ambulâncias

e na casa dos pacientes. Já foi implantado no Hospi-

tal Pilar, em Curitiba.

semfronteiras | 65

(RR, HM e RB)

Page 68: Revista Sem Fronteiras

A Incubadora Tecnológica de Curitiba

(Intec) já graduou 34 empresas,

responsáveis pela criação de mais de

70 produtos e pela geração de cerca de

280 empregos diretos. Foi a primeira

incubadora tecnológica do Paraná e

está instalada no Instituto de Tecnologia

do Paraná (Tecpar). Conta, atualmente,

com 11 projetos incubados.

Brasil: 400 incubadoras, em 25 estados

Empresas graduadas: cerca de 1500

Parques tecnológicos em operação: 10

Empresas instaladas nos parques: cerca de 150

Empregos diretos gerados por incubadoras e parques tecnológicos: cerca de 33 mil

Taxa de mortalidade: abaixo de 20%

Total de empresas vinculadas: mais de 6.300 empresas

Faturamento estimado das empresas graduadas nas incubadoras: R$ 1,6 bilhão

Estimativa de impostos gerados anualmente: R$ 400 milhões

Faturamento estimado das empresas incubadas: R$ 400 milhões

Custo médio para geração de empresa inovadora: R$ 70 mil por empresa

Números que crescem

Fonte: Anprotec/2007

66 | semfronteiras

Page 69: Revista Sem Fronteiras

O Núcleo de Inovação Tecnológica

do Paraná (Nitpar) facilita o acesso das

instituições de pesquisa aos incentivos

oferecidos pela lei de inovação. Para isso, o

núcleo abriga a Agência Paranaense de Pro-

priedade Industrial (APPI), que dissemina a

cultura de PI e orienta os pesquisadores a

proteger os resultados inovadores; a Rede

de Inovação e Prospecção Tecnológicas

para o Agronegócio (Ripa Sul), que atua na

criação e consolidação de indicadores de

avaliação e de impacto dos investimentos

em CT&I para o agronegócio no Paraná; e a

Rede Paranaense de Incubadoras e Parques

Tecnológicos do Paraná (Reparte), que co-

ordena incubadoras e parques tecnológicos.

NITPAR

Incubadoras no Paraná

Fonte: Reparte/2008

21 incubadoras associadas à Reparte

1 incubadora em vias de se associar (Universidade Positivo)

2 incubadoras em formação (Francisco Beltrão e Guaíra)

349 empresas/ projetos hoje são residentes ou não residentes nas incubadoras do Estado

Entre 2000 e 2008:

115 pedidos de patentes e/ou pedidos de registro de propriedade intelectual foram feitos

730 produtos foram gerados por empresas/ projetos incubados

283 postos de trabalho foram gerados durante a incubação; destes, 80 são empresários

ou diretores de empresa

Mais de R$ 5 milhões foi o faturamento durante o período de incubação

165 empresas foram graduadas

147 projetos ou empresas foram inviabilizados

661 empresas e/ ou projetos ingressaram no processo de incubação

semfronteiras | 67

Sede da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Ensino

Superior, onde funciona o NITPAR

Page 70: Revista Sem Fronteiras

h u m a n i d a d e s

68 | semfronteiras

Page 71: Revista Sem Fronteiras

Festa no pedaçociméa bevilacqua

fotos bruno stock

semfronteiras | 69

Page 72: Revista Sem Fronteiras

As conseqüências do crescimento acelerado

dos grandes centros urbanos brasileiros são bem

conhecidas: déficit habitacional, falta de saneamento

básico, aumento dos níveis de poluição, colapso do

sistema de transporte. A deterioração dos espaços

e equipamentos públicos, acompanhada de índices

alarmantes de violência, conduz a uma crescente

privatização da vida coletiva e ao esvaziamento das

formas de sociabilidade. Enfim, as cidades vão mal,

ninguém duvida do diagnóstico. Ou melhor, quase

ninguém.

“É evidente que não há como negar os

inúmeros problemas das grandes cidades, mas será

que este cenário degradado esgota o leque das

experiências urbanas?”, questiona o antropólogo

José Guilherme Cantor Magnani, professor da USP.

“As metrópoles contemporâneas não podem ser

vistas simplesmente como cidades que cresceram

demais e desordenadamente, potencializando fatores

de desagregação”, sugere o professor, para quem a

própria escala das metrópoles propicia a criação de

novos padrões de sociabilidade e de outros espaços

para os rituais da vida pública.

Mas se vai longe o tempo em que os vizinhos

instalavam cadeiras nas calçadas para apreciar

o movimento e colocar a conversa em dia, é

preciso aprender a identificar e compreender as

dinâmicas características das metrópoles atuais.

“Contrariamente às visões que privilegiam, na análise

da cidade, as forças econômicas ou as decisões

dos planejadores, proponho partir dos próprios

moradores, mas não como indivíduos isolados e

submetidos a uma inevitável massificação”, explica

Magnani. “A experiência urbana comporta diferentes

arranjos coletivos, seja nas esferas do trabalho e

das estratégias de sobrevivência, seja no âmbito da

religiosidade, do lazer e da cultura, que se expressam

no uso cotidiano do espaço, dos equipamentos e das

instituições da cidade.”

estudos do núcleo de

antropologia urbana da usp

propiciam uma compreensão

renovada da vida urbana e

dos valores contemporâneos

para além dos diagnósticos

alarmistas

h u m a n i d a d e s

70 | semfronteiras

Page 73: Revista Sem Fronteiras

A investigação desses arranjos característicos

das grandes metrópoles tem sido, nos últimos

vinte anos, a tarefa do Núcleo de Antropologia

Urbana da Universidade de São Paulo (NAU-USP),

coordenado por Magnani e reconhecido como um

dos principais centros de excelência da antropologia

brasileira. Tendo como fundo comum a atenção às

experiências cotidianas e a convivência prolongada

com os grupos pesquisados – um olhar “de perto e

de dentro”, expressão utilizada por Magnani para

diferenciar a perspectiva antropológica de outros

enfoques –, esses estudos têm propiciado uma

compreensão renovada da vida urbana e dos valores

contemporâneos, para além dos diagnósticos

alarmistas e dos grandes números.

O lazer, da periferia ao centro

Um dos primeiros exemplos, que remonta a

meados dos anos 1980, é a pesquisa que deu origem

à tese de doutoramento de Magnani e ao livro Festa

no Pedaço: Cultura Popular e Lazer na Cidade,

hoje um clássico da antropologia urbana brasileira.

Contrariando a visão então corrente no universo

acadêmico, para a qual o lazer era uma questão de

pouca relevância no cotidiano dos trabalhadores

pobres, a pesquisa registrou um amplo e variado

leque de usos do tempo livre nos finais de semana

dos bairros de periferia: circos, bailes, festas de

batizado, aniversário e casamento, torneios de

futebol de várzea, quermesses, comemorações e

rituais religiosos, excursões de farofeiros. “Naquele

universo monótono e carente, quando lido apenas

na chave da pobreza ou da exclusão, havia uma

extensa rede de entretenimento que, embora

não tivesse o brilho e a sofisticação das últimas

novidades da indústria do lazer, ia muito além

da mera necessidade de reposição das forças

despendidas durante a jornada de trabalho”,

recorda Magnani.

verdurada reúne

straight edges,

punks e drag

queens, entre outros

representantes de

tribos urbanas

semfronteiras | 71

Page 74: Revista Sem Fronteiras

Uma das principais contribuições da

experiência na periferia de São Paulo foi revelar a

importância daquilo que os moradores chamavam

de pedaço, espaço intermediário entre o privado

e o público, até então ignorado pela literatura

acadêmica. Surgiu daí o interesse em investigar o

que aconteceria nas regiões centrais, percorridas

diariamente por milhares de pessoas: seriam esses

espaços anônimos, distantes da vizinhança, o

avesso da sociabilidade?

A disposição dos pesquisadores do NAU

para percorrer a pé centenas de quilômetros

pelas ruas de São Paulo e consumir muitas horas

de observação atenta revelou um quadro muito

diferente da conhecida imagem da metrópole

inóspita e impessoal. “Os freqüentadores dos

espaços de encontro e lazer das regiões centrais

da cidade não necessariamente se conhecem, mas

se reconhecem como portadores dos mesmos

símbolos que remetem a gostos, orientações,

valores, hábitos de consumo e modos de vida

semelhantes”, explica Magnani. “Gangues, bandos,

turmas, galeras exibem – nas roupas, nas falas, na

postura corporal, nas preferências musicais – o

pedaço a que pertencem”.

Tribos urbanas?

A presença na paisagem das grandes cidades

contemporâneas de grupos de jovens que se

diferenciam pela aparência física, pelos padrões

de consumo e pelos lugares que freqüentam,

não é propriamente uma novidade. A diferença

apontada por um grande projeto de pesquisa

desenvolvido pelo Núcleo de Antropologia Urbana

sobre jovens na metrópole, que já produziu

estudos sobre straight edges, góticos, pichadores

e baladeiros evangélicos, entre outros, é que esses

renan felipe

candido, adepto do

movimento straight

edge em festa na

casa do estudante

universitário72 | semfronteiras

Page 75: Revista Sem Fronteiras

grupos estão longe de corresponder à noção

de tribos urbanas – metáfora proposta nos anos

1980 pelo sociólogo francês Michel Maffesoli, e

rapidamente popularizada na mídia, que evoca

comunidades efêmeras, localizadas e desprovidas

de organização, constituídas pela adesão a algum

modismo.

Em vez de partir de um elenco qualquer

de itens de consumo, os pesquisadores do NAU

privilegiaram as relações sociais e sua inscrição

nos espaços da cidade. Com isso, foi possível

perceber que esses grupos de jovens não somente

são dotados de regularidade e organização, mas

também que não são comunidades localizadas e

exclusivistas. Ao contrário, desenvolvem redes de

sociabilidade e formas de troca com outros grupos

com os quais, à primeira vista, não teriam nada em

comum.

Um exemplo particularmente interessante é

o trabalho desenvolvido pela pesquisadora Bruna

Mantese de Souza sobre jovens que se auto-

identificam como straight edges. Surgidos como

uma variante do movimento punk, com o qual

ainda compartilham a rejeição ao capitalismo, o

estilo musical e o visual característico – piercings,

tatuagens e outras modificações corporais –, os

straight edges se singularizam por proibições

expressas quanto ao uso de drogas e à ingestão

de bebidas alcoólicas e pela adesão a uma versão

radical do vegetarianismo, o veganismo. Se

essas características pareceriam suficientes para

definir os straight edges como um grupo exótico,

confinado a algum gueto obscuro, a pesquisa

mostrou que eles têm presença visível no cenário

urbano e participação ativa em sua dinâmica, por

meio de relações com uma série de outros grupos

em diferentes contextos.

Por sua posição contrária ao consumo de

todo e qualquer produto de origem animal, as

festas do grupo são denominadas verduradas –

em contraposição às costumeiras churrascadas

ou cervejadas. É isso o que explica o vínculo

aparentemente paradoxal que os straight edges

mantêm com os Hare Krishna, muitas vezes

encarregados da comida que é servida em suas

festas. Além disso, por seu estilo de vida e opção

política, os straight edges também freqüentam

espaços vinculados aos movimentos anarquista

e ambientalista. Desse modo foi possível mapear

um extenso circuito freqüentado pelo grupo,

com seus pontos de preferência na cidade, mas

também identificar a incidência de seu estilo de

vida particular sobre espaços institucionais já

existentes e sobre a própria oferta de produtos de

alguns estabelecimentos comerciais.

h u m a n i d a d e s

verdurada na

casa do estudante

universitário, em

curitiba

semfronteiras | 73

Page 76: Revista Sem Fronteiras

grafite nos muros de curitiba

74 | semfronteiras

Page 77: Revista Sem Fronteiras

semfronteiras | 75

Page 78: Revista Sem Fronteiras

Outro pesquisador do NAU-USP, Alexandre Barbosa

Pereira, escolheu como tema um grupo capaz de

despertar as mais furiosas acusações de irracionalidade:

os pichadores, em sua maioria jovens moradores de

bairros periféricos que se deslocam constantemente para

deixar suas marcas no centro da cidade. “A pichação é um

fenômeno que deve ser estudado sem preconceitos para

que se possa apreender um pouco mais sobre o modo

como os seus autores se organizam no espaço urbano”,

afirma Pereira.

O estudo mostrou que as marcas deixadas pelos

pichadores em muros e edifícios, garatujas sem sentido

para quem não participa desse universo, expressam

elaborados códigos de pertencimento e reconhecimento.

“O pichador, de um modo geral, não quer se comunicar

com a cidade, embora acabe fazendo isso, mas sim se

comunicar com os outros pichadores na cidade”, constata

Pereira.

Além dessa comunicação inscrita na arquitetura

urbana, os pichadores também mantêm pontos de

encontros em regiões centrais, onde regularmente trocam

papéis assinados com as marcas que picham pela cidade

e se informam sobre os lugares pichados, as situações

difíceis passadas com a polícia e sobre o bairro em que

cada um mora. O point também é um espaço de resolução

de conflitos, surgidos principalmente quando um pichador

interfere nas marcas deixadas por outro.

Um dos aspectos mais surpreendentes da pesquisa,

porém, foi constatar o grande esforço dos jovens

pichadores em preservar uma memória da pichação. As

assinaturas de pichadores famosos e os convites para

festas são cuidadosamente colecionados em pastas, ao

lado de matérias de jornais e revistas sobre pichação.

Para esses jovens, tornar-se assunto na imprensa é algo

que aumenta a fama entre os parceiros e consolida uma

reputação. “Por isso mesmo, reportagens condenando a

pichação têm um efeito contrário ao esperado”, explica

Pereira. “Em vez de desestimularem a prática, acabam

motivando ainda mais o pichador a tentar ter sua marca

divulgada em algum meio de comunicação.”

h u m a n i d a d e s

76 | semfronteiras

Page 79: Revista Sem Fronteiras

Cuidadores de idosos: o país precisa desta profissão

h u m a n i d a d e s

o número de idosos na américa

latina vai quadruplicar

entre 2005 e 2050 e superar a

população jovem em 30%

A atividade é tão rara no Brasil, e tão nova,

que até uma palavra pouquíssimo usada teve de

ser resgatada dos dicionários para descrevê-la.

Cuidador é a pessoa que cuida de quem precisa, é

claro. No caso, porém, o objeto do cuidado é que é

preocupação nova nas políticas públicas brasileiras.

E não porque, de repente, a população tenha

começado a viver mais.

De acordo com o IBGE, em 1980, 3% da

população brasileira estavam com mais de 60 anos.

Em 2006, os idosos já somavam 10%, cerca de 17

milhões de pessoas. O ritmo do envelhecimento

da população é preocupante para quem trabalha

pela criação de uma rede de proteção social para o

idoso. Dados do Portal do Envelhecimento, mantido

pela PUC de São Paulo, mostram que a população

brasileira em geral cresce 1,2% ao ano; ao mesmo

tempo, a população idosa está crescendo num

ritmo superior a 3%.

Segundo a Comissão Econômica para a

América Latina e o Caribe (Cepal), o número de

idosos no nosso subcontinente vai quadruplicar

entre 2005 e 2050 e superar a população jovem

em 30%. Basicamente são dois os motivos:

aumento na expectativa de vida e diminuição da

taxa de fecundidade feminina latino-americana. De

5,9 filhos, em 1950-1955, a taxa chegou, atualmente,

a 2,4 filhos por mulher. A esperança de vida alcança

hoje, em média, 73,4 anos para ambos os sexos.

miriam karam

fotos: bruno stock

semfronteiras | 77

Page 80: Revista Sem Fronteiras

Viver melhor

chega-se, então, à conclusão lógica: quanto mais

idosos, mais precisamos de cuidadores, e de políticas

públicas que permitam um envelhecimento saudável à

população. ou seja, já vivemos mais, o desafio agora é

viver melhor. o problema é que, no brasil, as políticas e

os serviços para idosos não têm prioridade, diferente

do japão, onde a aposentadoria chega bem mais tarde,

o respeito pelos mais velhos é maior e o país está bem

equipado com serviços de apoio.

dados do ministério da saúde dão conta que

80% dos idosos são cuidados por mulheres da família,

as quais também têm idade avançada. Há dois tipos

de cuidadores – o profissional, geralmente técnico de

enfermagem, que recebe por isso – e o familiar, que

não é bem treinado.

a dificuldade, explica a presidente do conselho

estadual dos direitos da pessoa idosa, schirley follador

scremin, é que o cuidador ainda não é uma profissão

no brasil. é apenas uma ocupação não regulamentada

que enfrenta resistência de algumas entidades, o que

está atrasando a aprovação do mec.

a secretaria da educação (seed-pr) chegou a

fazer concurso público para completar a necessidade de

professores para criar o curso técnico de formação de

cuidadores, um curso pós-médio com 1,2 mil horas/aula.

“sempre há algum problema quando o curso é novo,

porque as pessoas demoram um pouco para entender”,

diz a representante da secretaria da educação no

conselho, bernadete dal molin schenatto.

bernadete tem esperança que o curso comece

a ser ministrado já no próximo ano, em dez escolas

estaduais que demonstraram interesse. esse será,

então, o primeiro curso formal de cuidadores do brasil,

assim como o paraná também foi pioneiro ao incluir

nos livros didáticos temas sobre o envelhecimento, o

estatuto do idoso e o respeito ao idoso.

78 | semfronteiras

Page 81: Revista Sem Fronteiras

Cursinho rápido

Medidas governamentais, elaboradas pelo

governo federal, ainda são poucas e tímidas. O

Estatuto do Idoso foi escrito em 2003 e, no ano

seguinte, foi criada a Política Nacional de Saúde

do Idoso. Mas quase nada aconteceu de fato. A

campanha nacional de vacinação, talvez a primeira

e única ação concreta que apresenta resultados, é

o grande exemplo brasileiro, reconhecido até no

exterior.

Neste ano, em junho, o Ministério da Saúde

lançou o Guia Prático do Cuidador, uma espécie

de cursinho rápido para tratar de pessoas de

idade avançada. O manual tem ilustrações e

linguagem simples, permitindo aos profissionais

da saúde orientar as pessoas que cuidam de

idosos e proporcionar mais segurança a esses

trabalhadores. O material explica, por exemplo,

como proceder em caso de engasgo, queda ou

maus-tratos. Foram impressos 30 mil exemplares.

Como se vê, há outro desafio: o de formar

pessoal para cuidar do idoso, uma vez que

os trabalhadores da saúde não são treinados

especificamente para isso. Enquanto a figura

do cuidador profissional não se torna comum, a

solução caseira é a que prospera, a mesma que

resolve a vida de muitas mães e seus bebês.

Em muitas delas as duas situações se cruzam e

se completam num mesmo domicílio. Quando é

possível.

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

(IPEA) revela um dado doloroso: um total de 27%

dos idosos precisa de ajuda diária. Um número

considerável de homens e mulheres com mais

de 80 anos, cerca de 270 mil, é incapaz sequer

de andar ou subir poucos degraus. Precisam de

ajuda para tudo.

semfronteiras | 79

Page 82: Revista Sem Fronteiras

pesquisa feita pelo serviço social do

comércio (sesc) e pela fundação perseu abramo

revela que 88% dos idosos contribuem para a

renda familiar, e muitas vezes o idoso é o principal

provedor da família. também o censo 2000 do

ibge verificou que 62,4% dos idosos brasileiros

são responsáveis pelas famílias que viviam em

suas casas. em 2000, 20% dos domicílios tinham

um idoso como responsável, com idade bem

próxima dos 70 anos. as duas pesquisas trazem

outros dados curiosos e/ou impressionantes.

cerca de um terço dos idosos brasileiros vive com

netos e 16% são responsáveis por sua criação.

a responsabilidade pelo sustento da casa está

extremamente concentrada nos ombros dos

idosos com renda mais inferior.

Responsabilidade demais,atenção de menos

Por que envelhecemos?

Tudo começou com os antibióticos, logo seguidos por outros avanços das ciências da saúde. No século

passado, os países desenvolvidos conseguiram retardar o envelhecimento e aumentar a expectativa média

de vida humana ao nascer. Vencida a morte prematura, a expectativa média de vida da população americana

passou de 47 anos no começo dos anos de 1900 para a média de 77 anos no final do século – 75 anos para os

homens e 80 para as mulheres.

80 | semfronteiras

Page 83: Revista Sem Fronteiras

no brasil, as políticas e os serviços para idosos

não têm prioridade, diferente do japão, onde

o respeito pelos velHos é maior e o país está

equipado com serviços de apoio

semfronteiras | 81

Page 84: Revista Sem Fronteiras

Caminhos do Pelourinho na Vila Nossa Senhora da Luz

M E M Ó R I A

Columna Menio

Em sEu Vocabulário Português E latino (1712-1728)

raPhaEl blutEau dEfinE PElourinho como uma

EsPéciE dE coluna, Em algum lugar Público da ci-

dadE ou Vila, Em final dE jurisdição, quE tEm dE

ExErcitar justiça com PEna dE mortE.

PElourinho também rEsPondE ao quE antigamEntE

Em roma sE chamaVa columna, E algumas VEzEs

culumna mEnio, PorquE um cErto homEm chamado

mEnio mandou lEVantar junto das suas casas uma

coluna sobrE a qual, Em ocasião dE EsPEtáculos

Públicos, armaVa-sE com tábuas um PalanquE, dE

ondE os Via.

como a dita coluna EstaVa Em uma Praça dE con-

curso, ladrõEs, criados, maganos E os quE não

tinham com quE Pagar as suas díVidas Por sEn-

tEnça dos juízEs Eram a Ela condEnados, E com

grandE ignomínia ficaVam ExPostos ao ludíbrio

do PoVo, assim como alguns dElinqüEntEs PrEsos

nas argolas dos PElourinhos.

do

cum

ento

s pa

ra a

his

tóri

a P

aran

aen

se (

moy

sés

mar

con

des

– 1

923

/19

26)

Planta da baía de Paranaguá em aquarela, provavelmente de 1653,

representando o que seria uma nova povoação nos campos de

quereytiba segundo alguns e de curitiba segundo outros.

82 | semfrontEiras

fotos: diego singh

Page 85: Revista Sem Fronteiras

Em uma planta da baía de Paranaguá,

provavelmente do ano de 1653, localizada

no Arquivo Ultramarino de Lisboa pelo

historiador paranaense Moysés Marcondes

no início do século XX, aparecem em

primeiro plano a Vila de Paranaguá e logo

acima da serra, mais tarde denominada de

Serra do Mar, os campos de Quereytiba e

uma povoação nova, representada por

duas casas, um cruzeiro, ou uma cruz, e um

pelourinho.

Esta nova povoação, localizada entre o rio Atuba

(hoje Bairro Alto) e o rio Bacacheri, seria a origem

de Curitiba, conhecida por Vilinha e mais tarde por

Vila Velha, e onde havia, talvez em um tosco oratório

ou em uma simples capelinha, a imagem de Nossa

Senhora da Luz. Nessa região, os moradores teriam

ficado pouco tempo, transferindo-se, por volta de

1660, para o local atualmente conhecido como Praça

Tiradentes, no centro de Curitiba.

A Vilinha teria sido o “ponto final” dos

caminhos das minas de ouro. De acordo com as

indicações feitas no mapa português, foi em 1639

que o general das canoas de guerra Eleodoro Ébano

Pereira anunciou ao seu superior, o capitão-mor da

Vila de Nossa Senhora do Rosário de Paranaguá,

Gabriel de Lara, ter descoberto ouro nos “campos

de Quereytiba” como se dizia antigamente.

Testemunhas por ele inquiridas dez anos mais tarde,

durante um auto (cerimônia pública) realizado em 20

de setembro de 1649, confirmaram a descoberta nos

“ribeiros dos campos de Curitiba” segundo alguns ou

nos “ribeiros de Curiitiba” segundo outros.

Para o pesquisador José Carlos Lopes Veiga,

estudioso da obra de Júlio Moreira, esse auto em

manuscrito é o documento mais antigo de que se

tem notícia sobre as origens do nome da cidade de

Curitiba. A cópia do original (guardado no Arquivo

de Lisboa) está sob os cuidados

do Instituto Histórico e Geográfico

do Paraná. “Este documento deve

contribuir para esclarecer muitas

dúvidas sobre as origens da cidade”,

diz o pesquisador. Um segundo auto

para exame e vistoria no “Ribeiro das

Pedras” foi iniciado e concluído em

maio de 1650.

Documentação inédita

Em tempos anteriores, o rio Atuba, provável

local da primeira povoação de Curitiba, teria sido

o Ribeiro das Pedras. “O rio Atuba em sua parte

inferior percorre região de banhados, alagadiças, e

não sabemos se havia pedras, o que só ocorreria em

suas partes mais altas, próximas às suas cabeceiras”,

afirma o pesquisador. Recentemente, ele encontrou,

no primeiro tabelionato de notas de Curitiba, duas

escrituras lavradas no final do século XVIII referentes

à paragem Arruda, que seria um quarteirão do

município de Colombo, onde foi fundada a colônia

Antônio Prado.

Na primeira escritura, de 15 de setembro de 1788,

o capitão José de Andrade e sua mulher venderam

para Manuel Vaz Torres e Antônio Ribeiro Batista 500

braças de terras que haviam comprado do capitão

Luís Gomes na paragem ao pé da Campina do Arruda,

que de uma parte corria o rumo da cabeceira do rio

de Atuva. Na segunda escritura, de 14 de janeiro de

1793, Pedro Rodrigues Pinto vende a Manuel

Machado de Oliveira 200 braças de terras

lavradias na mesma paragem.

Conforme ainda o pesquisador,

um detalhe interessante que chama

atenção é que a paragem Arruda

tinha início exatamente na subida do

semfrontEiras | 83

Padroeira de curitiba

Espora da época

Page 86: Revista Sem Fronteiras

Ribeirão das Pedras, “correndo a testada rumo do

este até entestar nos cantos das terras e linha de

Manuel Vaz Torres, servindo esta linha a um e outro,

da divisa seguindo até o segundo córrego que dividia

este ao comprador e Antônio Ribas”.

Levantamento do Pelourinho

Moravam nos campos de Curitiba, entre ou-

tros, Baltazar Carrasco dos Reis e o capitão Mateus

Martins Leme, que mais tarde receberia o título de

Capitão Povoador. A comprovação está nas cartas de

sesmaria concedidas a ambos em 1661 e em 1668,

respectivamente, pelo capitão-mor e governador

do Rio de Janeiro e capitão-mor e governador de

Paranaguá. Segundo essa documentação, as terras

de um acabavam quando começavam as de outro,

nas bandas do rio Mariguy, ou seja, nos campos do

novo povoado de Nossa Senhora da Luz.

Como já havia um razoável número de famílias

morando na região, estas queriam a criação de

uma vila, mas só conseguiram o levantamento do

pelourinho, em 1668. Gabriel de Lara levantou o

pelourinho mas não convocou eleições para formar

a Câmara e não escolheu outras autoridades além de

Mateus Leme para administrar a nova vila.

Documentos históricos encontrados pelo

pesquisador comprovam que o pelourinho da Vila de

Nossa Senhora da Luz - que era de madeira - chegou

a ser usado para fixar editais da Câmara Municipal,

cujas sessões ocorriam numa igrejinha na Praça

cantil da época

ferraduras da época

arca das três chaves. século xViii. Primeira urna eleitoral da municipalidade

84 | semfrontEiras

Page 87: Revista Sem Fronteiras

Tiradentes, centro de Curitiba, onde hoje se encontra

a Catedral Metropolitana. Um desses editais solicitava

que ninguém pagasse ordenado “ao reverendo

vigário” uma vez que “era a Câmara que recebia o dito

dinheiro para fazer o pagamento e quem o fizesse

seria condenado em 6$000 e trinta dias de cadeia”.

José de Toledo violou a recomendação do Senado da

Vila de Curitiba e foi preso. Na sessão de 27 de julho

de 1734 o condenaram em 6$000, mas aliviaram a

prisão de trinta dias que constava no edital.

Quanto ao uso do pelourinho para exibição e

castigo de criminosos, o pesquisador José Carlos

Lopes Veiga afirma que não encontrou nenhum

registro histórico a respeito.

A criação da Vila

Em 24 de março de 1693, os moradores da

povoação de Nossa Senhora da Luz e Bom Jesus

dos Pinhais, dizendo que esta já estava bastante

crescida “por já possuir mais de noventa homens, e

quanto mais crescia a gente se iam fazendo maiores

desaforos, andando todos com as armas na mão, e

de que em diante seria pior, por não haver justiça

na dita povoação”, pediram a Mateus Leme, em um

documento, que houvesse justiça.

Em 29 de março de 1693, reuniu-se o povo na

igreja de Nossa Senhora da Luz e Bom Jesus dos

Pinhais em atendimento ao despacho dado pelo

capitão Mateus Leme, o qual disse que era justo tal

pedido, e que se nomeassem os oficiais e realizassem

eleição. Foram então nomeados os juízes, vereadores,

o procurador do conselho e o escrivão da Câmara.

grade de ferro da antiga cadeia da praça da matriz de curiti-

ba, atual Praça tiradentes. foi usada também na antiga cadeia

pública de campo largo, construída em 1991.

o pelourinho da Vila

de nossa senhora

da luz dos Pinhais

era de madeira. a

comprovação está

na receita e despesa

da câmara municipal

referente ao ano de

1704, onde consta:

“por um pelourinho

novo que se fez que

o outro apodreceu e

caiu 2$560”.

qu

adro

de

Eu

ro b

ran

dão

semfrontEiras | 85

Page 88: Revista Sem Fronteiras

Entre fevereiro e junho deste ano, enquanto

obras de revitalização eram feitas na Praça Tiradentes,

em Curitiba, uma equipe de arqueólogos fazia es-

cavações no local. Foi revelada uma calçada formada

por grandes blocos de pedra, do século 19, que agora

pode ser vista no local através de um piso de vidro.

Num mergulho mais profundo, os arqueólogos da

Universidade Federal do Paraná resgataram objetos

deixados no local em períodos tão antigos quanto o

da formação da cidade. Do século 17, foram encontra-

dos utensílios cerâmicos feitos por indígenas, materi-

ais bélicos, como cartuchos e cápsulas, e ferraduras,

pois o local funcionava como um ‘estacionamento’ de

cavalos e carroças. Também surgiram materiais mais

recentes, como faianças industrializadas portuguesas

e inglesas, dos séculos 18 e 19. Segundo o professor

Igor Chmyz, do Departamento de Arqueologia da

UFPR e coordenador da equipe, esta foi a primeira

pesquisa arqueológica feita na praça, que é o local

mais antigo da cidade. (HM)

Inventário da memória

PEsquisa: José CArLos LoPes VeigA, a Partir das sEguintEs fontEs: bolEtim do arquiVo municiPal dE curiti-

ba; dicionário houaiss da língua PortuguEsa; arquiVo ultramarino dE lisboa; liVros dE notas do 1º tabElion-

ato dE curitiba; júlio EstrElla morEira: ElEodoro ébano PErEira E a fundação dE curitiba; raPhaEl blutEau:

Vocabulário Português E latino (1712-1728); ruy cristoVam WachoWicz: a gênEsE da ‘urbE’ curitibana”.

Edição: reginA roChA • fotos: Diego singh/ acErVo musEu ParanaEnsE

die

go

sin

gh

86 | semfrontEiras

Page 89: Revista Sem Fronteiras

Em 1980, Sherrie Levine apresenta na Metro

Pictures Gallery, em Nova York, seu trabalho “After

Edward Weston”. São fotografias feitas por Levine de

conhecidas fotos documentais e realistas de Weston,

sem nenhuma intervenção por parte da artista nas

imagens reproduzidas, a não ser o acréscimo de sua

assinatura artística.

A arte da apropriação toma o modelo como um

outro idêntico, ao desencadear a repetição de uma

imagem que, por sua falta de diferença, demanda

com insistência uma explicação para existir. A imagem

repetida “irrita” a imagem anterior, ao levantar uma

série de questões que vão desde o que repetir e por

que repetir até à da censura econômica do copyright.

O deslocamento ocorrido põe em xeque a concepção

tradicional de criação artística e a do trabalho que se

transforma em propriedade.

A situação pode ser vista como uma síntese do

que é tratado nos textos de Mercedes Bunz, crítica

cultural alemã, jornalista e diretora de uma das

mais prestigiosas revistas eletrônicas de música, a

DE:BUG. Suas reflexões levam a uma compreensão

melhor da “logística da duplicação”, considerando-

se principalmente as mudanças resultantes da

tecnologia da cópia digital, uma nova era da

reprodutibilidade técnica.

A cópia digital, enquanto cópia idêntica, inicia

um novo ordenamento topológico do espaço, no qual

mover-se não tem mais o sentido de abandonar um

lugar. Transporte e duplicação superpõem-se: dados

são transportados sem que se distanciem de seu

lugar original; dois “originais” e dois “lugares” podem

multiplicar-se em escala imprevista.

A progressão sem centro também provoca

mudanças na concepção do tempo, uma vez que o

software sempre favoreceu sua expansão, ao não

apresentar nunca um produto acabado, mas apenas

uma versão. A reprodução se instala no interior do

código, no interior mesmo da tecnologia, para redefini-

la segundo uma lógica da repetição e desdobrar,

assim, o potencial utópico da cópia idêntica. Há um

lugar “u-tópico”, sem localização, que escapa às

regras estabelecidas: “a cópia idêntica pode ser lida

como um signo utópico”.

Para Mercedes Bunz, a aproximação entre o

digital e a música é o que mais se assemelha a essa

“utopia”. Ambos, digital e música, subtraem-se a uma

origem e produzem uma instabilidade comum. Assim

como a música, a cópia digital não copia o original

precedente e sim o duplica; armazenar digitalmente

a música significa torná-la multiplicável, pronta a ser

copiada.

Essa situação instável torna-se uma instância

política em que o político é um ato que reordena o

espaço ao tornar visível uma distribuição específica,

uma ordem enquanto tal, retirando-lhe toda

“naturalidade”. Nesse ambiente, a forma do sujeito

não preexiste ao meio, é programada dentro dele.

Trata-se, ao contrário da duplicação especular do

retrato tradicional, de condensar o rastro do sujeito,

Pop e política da cópia

R E s E n h A

bunz, mercedes. La utopía de la copia: el pop como irritación. sel. e trad. cecilia Pavón. buenos

aires: interzona, 2007. 160p.

WandEr mElo miranda

semfrontEiras | 87

Page 90: Revista Sem Fronteiras

sua aparição a partir de dados que permitem calcular

seus movimentos.

A entrada na “sociedade de controle” (Deleuze)

está marcada por esse sujeito flexibilizado. A técnica

da sujeição ou a tecnologia da subjetivação colhe e

recolhe dados por meio dos quais calcula de antemão

a margem de flutuação do rastro que o inscreve

na rede. Se é o rastro que constitui o usuário e o

torna controlável, não é a rede que aliena o sujeito,

a própria figura do sujeito é que está alienada. A

transformação em sujeito implica uma forma de

subjetivação e com ela a sujeição a um determinado

formato visível e, portanto, controlável: o rastro.

Nesse sentido, o sujeito é tematizado como ausência,

a tecnologia é descrita como terreno ameaçador que

precisa ser civilizado — Explorer, Navigator, Outlook...

O momento de resistência começa com a

exposição da alienação, por meio da apropriação de

uma forma que não será tornada própria, mas que

conserva sua alteridade. Por isso, enquanto a arte

da apropriação multiplica a autoria, a cópia digital

(idêntica) por sua vez altera a lógica do original, ao

sair da cadeia descendente entre original e cópia, ao

tornar esta última independente do autor, do fator de

autorização — “basta um clic”.

A arte torna-se porosa, outros campos e

temas podem aparecer em seu interior. Isso é novo

porque esses outros campos já não devem mais ser —

diferentemente da década de 1990 — reformulados

por artistas. A arte já não é mais hegemônica sobre

outros campos, porque beleza e verdade não são

exclusivas da arte; o poder não precisa mais de

fronteiras na sociedade de controle.

Sabemos, por Foucault, que onde há poder há

resistência. Não há mais nenhum fora; não é possível

hoje retirar-se para uma ordem própria. O horizonte

que Mercedes Bunz descortina é o resgate do antigo

conceito de utopia, adaptado às circunstâncias atuais

e apto a alimentar o regime da produtividade. O pop

e a política articulam-se de modo novo. A rebelião

estridente da contracultura é substituída por uma

“forma tênue de irritação”, que vai mais além do que

um projeto idealista: “o pop entendido como rebelião

individual está para uma política do isolamento. O pop

entendido como política dos nichos está para uma

cultura das relações”.

O desenvolvimento da técnica, enfim, não afeta

apenas o modelo do homem contemporâneo, mas

transforma na mesma medida o campo da técnica.

Artistas se declaram máquinas e as mimetizam; a

identidade de artista transforma-se em imagem de

artista. Em última instância, a ciência em si deixa de

ser o outro da estética e torna-se seu material, dá-lhe

materialidade.

Em vista disso tudo, já entramos num outro

admirável mundo novo?

R E s E n h A

Wander Melo Miranda é professor titular de Teoria da Literatura na UFMG.

88 | semfrontEiras

Page 91: Revista Sem Fronteiras

R E s E n h A

L I V R O s

O trabalho apresentado

no livro risco e Prazer

- os jovens e o imag-

inário da AiDs tem

como objetivo a com-

preensão do imaginário

do risco da AIDS entre

jovens e a forma como

eles articulam represen-

tações e ações frente a

essa questão. Esta publi-

cação será um importante instrumento de pesquisa

a todas as áreas do conhecimento relacionadas a jo-

vens e adolescentes.

risCo e PrAzer - os JoVens e o iMAginário

DA AiDs

leila sollberger jeolás

EduEl

264 páginas; 23 cm; isbn 978-857216-455-9/ 2007

Preço: 38,00

Neste livro apresentam-

se aspectos teóricos

referentes à Psicologia,

Educação, Arte, processo

criador, aprendizagem e

desenvolvimento huma-

nos, sob a perspectiva

da Psicologia Histórico-

Cultural, encabeçada por

L. Vigotski (1896-1934).

O livro tem o propósito

de compreender o homem contemporâneo, o qual

se revela naquilo que produz e reproduz.

PsiCoLogiA eDuCACionAL e Arte - uMA

LeiturA históriCo CuLturAL DA figurA

huMAnA

sonia mari shima barroco

EduEm

211 Páginas; 23cm; isbn 978-85-7628-100-9/2007

PrEço: 35,00

Este livro apresenta uma

coletânea de artigos dedi-

cados à área de adminis-

tração, especificamente

ao desenvolvimento sus-

tentável. São textos de

alta qualidade que cer-

tamente muito ajudarão

a refletir sobre os rumos

desta temática ampla-

mente discutida na socie-

dade contemporânea.

gestão estrAtégiCA PArA o DesenVoLViMento

sustentáVeL

marilisa do rocio oliVEira; sErgio Escorsim;

iVanildE scussiatto Eyng; Patrícia guarniEri; luiz

albErto Pillatti; antonio carlos dE francisco

Editora uEPg

254 Páginas; 23cm; isbn 978-85-7798-000-0/2007

PrEço: 25,00

Este livro tem como pro-

posta buscar reunir textos

de especialistas de áreas

diversas, do país e do ex-

terior, que têm como ob-

jeto de estudos a mente

musical. Espera-se que o

mesmo possa responder

a algumas indagações do

leitor, e que sirva de im-

pulso para novas pesqui-

sas na área de cognição musical.

eM BusCA DA Mente MusiCAL - ensAios soBre os

ProCessos CognitiVos eM MúsiCA - DA PerCePção

à ProDução

bEatriz sEnoi ilari (organizadora)

Editora ufPr

454 Páginas, 23cm; isbn 8573351403/2006

PrEço: 45,00

semfrontEiras | 89

maria hElEna dE moura arias

[email protected]

Page 92: Revista Sem Fronteiras

Neste dicionário o leitor

encontra, para cada ter-

mo, uma definição, sua

gênese e seu desenvolvi-

mento histórico, correntes

e controvérsias em torno

do tema, assim como

os principais autores e

referências bibliográficas

que possam orientá-lo na

ampliação de suas inves-

tigações, se assim for de seu interesse.

DiCionário De trABALho e teCnoLogiA

antonio daVid cattani E lorEna holzmann

(orgs)

Editora ufrgs

358 Páginas; 24cm; isbn 85-7025-894-1/2006

PrEço: 62,00

Arte e vida, natureza

e cultura não se sepa-

ram neste livro, fruto

de anos de convívio de

Lalada Dalglish com as

mulheres ceramistas do

Vale do Jequitinhonha.

Em imagens e palavras,

com grande sensibili-

dade, a autora apresenta

o cotidiano e a obra dessas artesãs, que há gerações

vêm transmitindo às filhas e netas os segredos da

cerâmica, ocupação ancestral, misteriosa e sagrada.

noiVAs DA seCA - CerâMiCA PoPuLAr Do VALe

Do JequitinhonhA

lalada dalglish

Editora unEsP

214 Páginas; 26cm; isbn85-7139-712-0/ 2006

PrEço: 130,00

Esta enciclopédia é a

mais abrangente obra

de referência em design

já composta e permite o

acesso a toda a história

do design moderno, com

listagens de A-Z e com

referências cruzadas.

enCiCLoPéDiA Do Design

mEl byars - tradutorEs: alinE lacErda mEnEgat, andré

dE godoy ViEira, hElEna d. chaVEs barcEllos guasPary

E lEila fErrEira dE souza mEndEs.

Editora unisinos

933 Páginas; 24cm; isbn 1-85669-349-x/2007

PrEço: 390,00

L I V R O s

90 | semfrontEiras

Page 93: Revista Sem Fronteiras

Anel de Diamante

Provocados pelo alinhamento entre a lua, o sol e a terra, eclipses solares totais produzem, em fra-

ções de segundos, fenômenos espetaculares. um desses fenômenos é o anel de diamante, que ocorre

no instante imediatamente anterior à totalidade do eclipse, quando as bordas do disco lunar deixam

escapar a luz do sol. imagem similar a da foto obtida pelo astrônomo josé manoel luís da silva, do ob-

servatório astronômico do colégio Estadual do Paraná, em 1994, na cidade de medianeira, no sudoeste

do Paraná, só se repetirá no século xxii. apesar de ocorrerem em determinados lugares da terra a

cada dezoito meses, em média, estima-se que os eclipses solares totais só se repetem numa mesma

localidade a cada 300 ou 400 anos.

2009 Ano Internacional da Astronomia

Pla

net

ário

co

lég

io E

stad

ual

do

Par

aná

semfrontEiras | 91

Page 94: Revista Sem Fronteiras

92 | semfrontEiras

Page 95: Revista Sem Fronteiras
Page 96: Revista Sem Fronteiras