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Revista SME: Educação em Movimento Volume 1 - Número 2/3 - janeiro a dezembro de 2012 R. SME ISSN 2237-9835 Goiânia v.1 n.2 p. 1- dezembro 2012

Revista SME Gyn 2012

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Revista da SME Goiânia/2012

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Page 1: Revista SME Gyn 2012

Revista SME: Educação em Movimento

Volume 1 - Número 2/3 - janeiro a dezembro de 2012

R. SME

ISSN 2237-9835

Goiânia v.1 n.2 p. 1- dezembro 2012

Page 2: Revista SME Gyn 2012

Equipe diretiva da SME:Secretária Municipal de Educação Neyde Aparecida da SilvaChefia de Gabinete Débora da Silva QuixabeiraDiretor Departamento Pedagógico (DEPE)Pe. Francisco PrimDiretora Departamento de Administração Educacional (DAE)Clarislene Paula DomingosDiretora Departamento de Alimentação Educacional (DALE)Noeme Diná SilvaDiretora Departamento de Gestão Pessoal (DGP)Marta Helena AlmeidaDiretor Departamento Administrativo (DA)Valfran de Sousa RibeiroDiretor do Fundo Municipal de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (FMMDE)Haroíso Ferreira de Oliveira

SME: Educação em MovimentoEditor: Luiz Fernandes Dourado

Conselho Editorial: Creude Pereira de Jesus Bessa -SMEElciva Gonçalves França CME e SMEn - Francisco Prim - SMEGenivalda A. C. dos Santos - SMEGislene M.A. Guimarães - SMEIêda Leal de Souza - SintegoJanaína Cristina de Jesus - PUC/GO e SMEJoão Ferreira de Oliveira - UFGMaria Augusta Mundim UFG - Maria Margarida Machado UFG - Miriam Fábia Alves - UFGRomilson Martins Siqueira PUC/GO e SME - Roseneide Ramalho da Silva - SME

Capa:A obra “Cerrado e cidade” de autoria do artista plástico e professor da Universidade Federal de Goiás Zé César (José César Teatini de Souza Clímaco).

Revisão:Eliane Faccion

Secretaria ExecutivaLindaura O. D. de Moura / GO-00876 JP/ DRT-GO

SME: Educação em MovimentoÉ uma publicação da SME Goiânia que aceita colaboração, reservando-se o direito de publicar ou não o material enviado ao conselho editorial. As colaborações devem ser enviadas à revista em meio eletrônico para o endereço: [email protected]

SME

EDUCAÇÃO EM

MOVIMENTO

EXPEDIENTE

SME: Educação em Movimento / Secretaria Municipal de Educação de Goiânia - v. 1, n.2/3, janeiro a dezembro de 2012.2012 - Goiânia: SME, 2012.SemestralISSN 2237-98351. Educação - Periódico - SME

Page 3: Revista SME Gyn 2012

EditorialFormação dos profissionais da educação

Luiz Fernandes Dourado

Entrevista A Formação dos Profissionais: o trabalho das universidades e da SME

Edward Madureira Brasil

Wolmir Therezio Amado

Artigos1. Política de Formação Continuada em Rede e a qualidade da educação pública

Profª. Ms Marcilene Pelegrini Gomes e Prof. Dr Romilson Martins Siqueira

2. Formação de professores para a EJA: da lógica das competências à formação humana omnilateral

Cláudia Borges Costa e Joel Ribeiro Zaratim

3. Formação sindical, herdeira da educação popular

Iêda Leal de Souza

4. Uma breve história da SME de Goiânia

Arlene Carvalho de Assis Clímaco e Walderês Nunes Loureiro

5. Um olhar sobre a trajetória do Conselho Municipal de Educação de Goiânia

Acácia Aparecida Bringel

6. A identidade do indígena na mídia impressa

Simone Antoniaci Tuzzo e Claudiomilson Fernandes Braga

Relatos e experiências pedagógicas

1. Por uma jornada pedagógica com qualidade social

Jovenília Rodrigues Pereira, Maria Avelina de Carvalho e Romilson Martins Siqueira

SUMÁRIO

SME

EDUCAÇÃO EM

MOVIMENTO

Page 4: Revista SME Gyn 2012

2. A elaboração de planos de formação

Alessandra Gomes Jácone, Cínthia Camilo, Eleny Macedo de Oliveira e Eulâmpia Neves

Ferreira

3. Diálogos e práticas na formação inicial e continuada de professores

Nancy Nonato de Lima Alves, Daniela da Costa Britto Pereira Lima, Vanessa Gabassa,

Márcia Ferreira Torres Pereira e Simone de Magalhães Vieira

4. Um relato sobre a formação de professores do ensino fundamental

Salete Flôres Castanheira, Maria Gonçalves Araújo e Maria Angélica de Oliveira

5. O estágio como espaço formativo na educação de adolescentes, jovens e adultos

Janaína Cristina, Mª . Emília de Castro e Mª. José do Nascimento

6. O Conselho Municipal de Educação de Goiânia na defesa dos direitos das crianças

Acácia Aparecida Bringel e Milna Martins Arantes

7. Do sonho à realização profissional: formação continuada e atuação na SME

Maria do Socorro Barbosa Lima

7. Música e aprendizagem

Alessandro de Oliveira Branco

Documento Secretaria Municipal de Educação. Portaria SME Nº. 019, de 04-04-2012. Regulamenta os critérios e procedimentos para a concessão da Licença para Aprimoramento Profissional aos detentores do Cargo de Profissional de Educação II (PE II) e dá outras providências.

SUMÁRIO

SME

EDUCAÇÃO EM

MOVIMENTO

Page 5: Revista SME Gyn 2012

EDITORIAL

SME

EDUCAÇÃO EM

MOVIMENTO

Page 6: Revista SME Gyn 2012

Formação dos profissionais da educação

SME: Educação em movimento é uma revista da Secretaria Municipal de

Educação (SME) de Goiânia, que procura contribuir com a reflexão sobre as

políticas e gestão da educação básica pública, especialmente no município de

Goiânia, por meio de sua Editoria e Conselho Editorial, integrados por

pesquisadores e profissionais da educação da SME, Conselho Municipal de

Educação (CME), Universidade Federal de Goiás (UFG) e Pontifícia

Universidade Católica de Goiás (PUC-GO).

Em seu segundo volume , articulando os números 2 e 3, traz como

temática central a formação dos profissionais da educação, além de outros artigos

sobre políticas e gestão da educação básica. A valorização dos profissionais da

educação tem sido objeto de várias lutas, demandas e ações político-pedagógicas,

tendo como destaque aquelas direcionadas à formação, por meio de formação

inicial e continuada. Este número da revista busca situar essa temática, dando

especial contorno à efetivação de políticas mediadas pelas ações da SME, UFG e

PUC-GO.

Assim, busca dar continuidade, como periódico da área de educação, à

divulgação de diferentes concepções, análises e experiências que contribuam para

a melhoria e democratização da educação básica de qualidade.

A proposta editorial deste número da SME: Educação em Movimento

estrutura-se por meio das seguintes seções: Entrevista, Artigo, Relatos e

experiências pedagógicas e Documento.

Para a seção Entrevista, organizada por este editor, foram convidados

Edward Madureira Brasil, reitor da Universidade Federal de Goiás, e Wolmir

Therezio Amado, reitor da Pontifícia Universidade Católica de Goiás. São dois

educadores e gestores com ampla trajetória e compromisso com a educação em

Goiás e no país, especialmente com a educação superior. Esta entrevista permite

ao leitor apreender o complexo cenário da formação de professores no Brasil e em

Goiás e, sobretudo, das políticas e gestão direcionadas à formação empreendidas

pelas duas universidades, pioneiras na região Centro-Oeste, e a sua interface com

a educação básica, especialmente, com a Secretaria Municipal de Educação de

Goiânia.

Page 7: Revista SME Gyn 2012

Na seção Artigo, as temáticas têm por centralidade a formação e, ainda,

outras reflexões sobre políticas e gestão direcionadas à educação. Importante

destacar a busca de articulação entre as ações de formação da SME e das

universidades goianas, resultando em artigos escritos em co-autoria por

profissionais da UFG e da PUC-GO com profissionais da SME. Trata-se de uma

experiência que, certamente, enriquecerá ainda mais os esforços de articulação e

cooperação entre as três instituições de ensino e espaços de formação

A seção Relatos e experiências pedagógicas apresenta ações

desenvolvidas por diferentes atores e que contribuem para uma visão rica sobre as

possibilidades de atuações coletivas e reflexões sobre a vivência e a melhoria dos

processos formativos na cidade de Goiânia e sua interface com a proposta

político-pedagógica da SME.

A seção Documento tem por objetivo disseminar iniciativas institucionais

da Secretaria Municipal da Educação e do Conselho Municipal de Educação de

Goiânia, e traz nesta edição a Portaria SME Nº. 019, de 04 abril de 2012, que

estabelece critérios e procedimentos para a concessão da licença para

aprimoramento profissional aos detentores do cargo de Profissional de Educação

II (PE II) e dá outras providências. Essa Portaria se articula à temática deste dossiê

e traduz o esforço político-pedagógico da SME em consolidar sua política de

formação, em atendimento ao disposto no Estatuto dos Servidores do Magistério

Público do Município de Goiânia.

Este número conta com a participação do professor da Universidade

Federal de Goiás e artista plástico Zé César ( José César Teatini de Souza Clímaco)

com a obra: “Cerrado e cidade” que ilustra a capa desta edição. Obra que retrata as

várias possibilidades geopolíticas inseridas nesse contexto e o compasso e

descompasso que compõe a região Centro-Oeste.

Esperamos que a revista SME: Educação em movimento possa se

consolidar, ainda mais, contando com colaboradores de diferentes instituições e

espaços educativos, contribuindo, desse modo, para a compreensão, a avaliação e

a melhoria da educação básica em nosso país, Estado e no município de Goiânia.

A revista dispõe de um canal direto de comunicação, por meio do e-mail

[email protected]. Os artigos e contribuições, assim que forem

recebidos, serão encaminhados para pareceristas e, sendo aprovados, serão

Page 8: Revista SME Gyn 2012

publicados.

A participação de todos - estudantes, professores, funcionários, pais,

especialistas e interessados - é fundamental para que esta publicação seja, cada

vez mais, referência e se consolide como canal de ampla discussão e avaliação das

políticas, programas e ações da educação básica, com especial destaque para

aquelas desenvolvidads pela SME, no esforço de garantir uma educação pública,

gratuita, laica, democrática e de qualidade para todos(as).

Luiz Fernandes Dourado

Editor

Page 9: Revista SME Gyn 2012

ENTREVISTA

SME

EDUCAÇÃO EM

MOVIMENTO

Page 10: Revista SME Gyn 2012

A formação dos profissionais: o trabalho das universidades e da SME

O objetivo desta seção é discutir os atuais marcos e as políticas de

formação dos profissionais da educação e, sobretudo, dos professores brasileiros,

a partir das investigações, programas de formação inicial e continuada, além das

diferentes experiências na Universidade Federal de Goiás (UFG) e na Pontifícia

Universidade Católica de Goiás (PUC-GO).

O professor Luiz Fernandes Dourado, editor da SME: Educação em

Movimento, entrevista os professores Edward Madureira Brasil, reitor da UFG, e

Wolmir Therezio Amado, reitor da PUC-GO. São dois educadores e gestores com

ampla trajetória e compromisso com a educação superior em Goiás e no país. A

participação dos dois convidados permite ao leitor apreender a formação de

professores, as políticas e a gestão direcionadas à formação realizadas pelas duas

universidades, pioneiras no Centro-Oeste, e sua interface com a educação básica,

especialmente, com a Secretaria Municipal de Educação de Goiânia.

Luiz Fernandes Dourado – Ao longo das últimas décadas, o que mudou no

projeto e na dinâmica acadêmica das universidades brasileiras e goianas?

Edward Madureira Brasil - Nas duas últimas décadas foram muitas as

transformações na educação superior brasileira. Vimos um grande crescimento

das instituições privadas; a implantação de processos avaliativos como o exame

nacional dos cursos, conhecido como “provão”; estamos presenciando uma crise

no setor privado pela impossibilidade da população de continuar pagando

mensalidade – é só ver a existência do Prouni, das bolsas universitárias da

Organização das Voluntárias de Goiás e da inadimplência nas mensalidades.

Outra transformação se deu com as instituições públicas, que passaram por

período de estagnação no número de vagas, alterado a partir de 2006 com a

expansão dos campi das universidades federais no interior e, depois, com o

Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades (Reuni), já no

A formação dos profissionais: o trabalho das universidades e da SME

O objetivo desta seção é discutir os atuais marcos e as políticas de

formação dos profissionais da educação e, sobretudo, dos professores brasileiros,

a partir das investigações, programas de formação inicial e continuada, além das

diferentes experiências na Universidade Federal de Goiás (UFG) e na Pontifícia

Universidade Católica de Goiás (PUC-GO).

O professor Luiz Fernandes Dourado, editor da SME: Educação em

Movimento, entrevista os professores Edward Madureira Brasil, reitor da UFG, e

Wolmir Therezio Amado, reitor da PUC-GO. São dois educadores e gestores com

ampla trajetória e compromisso com a educação superior em Goiás e no país. A

participação dos dois convidados permite ao leitor apreender a formação de

professores, as políticas e a gestão direcionadas à formação realizadas pelas duas

universidades, pioneiras no Centro-Oeste, e sua interface com a educação básica,

especialmente, com a Secretaria Municipal de Educação de Goiânia.

Luiz Fernandes Dourado – Ao longo das últimas décadas, o que mudou no

projeto e na dinâmica acadêmica das universidades brasileiras e goianas?

Edward Madureira Brasil - Nas duas últimas décadas foram muitas as

transformações na educação superior brasileira. Vimos um grande crescimento

das instituições privadas; a implantação de processos avaliativos como o exame

nacional dos cursos, conhecido como “provão”; estamos presenciando uma crise

no setor privado pela impossibilidade da população de continuar pagando

mensalidade – é só ver a existência do Prouni, das bolsas universitárias da

Organização das Voluntárias de Goiás e da inadimplência nas mensalidades.

Outra transformação se deu com as instituições públicas, que passaram por

período de estagnação no número de vagas, alterado a partir de 2006 com a

expansão dos campi das universidades federais no interior e, depois, com o

Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades (Reuni), já no

segundo mandato do presidente Lula; a implantação de grande número de campi

Page 11: Revista SME Gyn 2012

dos institutos federais de educação ciência e tecnologia. No período, estabeleceu-

se um ambiente de competição entre as instituições públicas pelos recursos

financeiros e, em especial, por recursos a serem obtidos pela apresentação de

projetos em agências financiadoras públicas e, também, pela interação com

empresas e indústrias.

Wolmir Therezio Amado - Em cinco décadas, o sistema de ensino

superior brasileiro passou por expressivas mudanças. Na década de 60, havia

poucas instituições, basicamente para atividades de transmissão do

conhecimento, com cerca de 100.000 alunos e um corpo docente fracamente

profissionalizado. Encontramos, hoje, uma complexa rede de estabelecimentos,

com formatos organizacionais e tamanhos variados, com grande crescimento do

setor privado. Esse sistema, hoje com quase 2.500 instituições, absorve mais de

seis milhões de alunos na graduação e aproximadamente 180.000 mil alunos na

pós-graduação stricto sensu. Houve a incorporação de um público mais

diferenciado socialmente, o aumento significativo do ingresso de estudantes do

gênero feminino, a entrada de alunos já integrados no mercado de trabalho, a

expansão do setor privado e a interiorização e regionalização do ensino. Houve a

consolidação do projeto das instituições comunitárias, diferenciando-se

claramente do setor privado com fins econômicos e posicionando-se como atores

imprescindíveis para o desenvolvimento equilibrado do sistema em temas

estratégicos como a inclusão equitativa da população mais desfavorecida e a

formação de professores para a educação básica. A PUC Goiás, como

universidade comunitária profundamente inserida no cenário regional, foi

protagonista de todas as transformações dessas décadas para o ensino superior no

Centro-Oeste e no Brasil.

Luiz Fernandes Dourado – A universidade brasileira avançou na

consolidação da premissa constitucional da indissociabilidade entre ensino,

pesquisa e extensão? De que forma tais princípios se materializam na UFG e

na PUC-GO?

Wolmir Therezio Amado - Consolidar o princípio da indissociabilidade

‘“Houve a incorporação de um público

mais diferenciado

socialmente, o aumento

significativo do ingresso de

estudantes do gênero

feminino”

(Wolmir Amado)

Page 12: Revista SME Gyn 2012

de ensino, pesquisa e extensão talvez seja um dos maiores desafios da

universidade brasileira. Isso porque essa relação pressupõe que cada uma dessas

dimensões esteja solidificada na instituição e que haja no país um projeto de

universidade que, de fato, valorize de forma igualitária tais dimensões. Em seus

53 anos, a PUC Goiás tem sua trajetória marcada pela busca da excelência em suas

ações. Desse modo, a extensão por ela desenvolvida pauta-se na tradição de uma

Instituição de Ensino Superior (IES) comunitária, filantrópica e católica e se

realiza por meio de seus programas permanentes. Atualmente com 46 cursos de

graduação e a ampliação e diversificação dos campos de investigação científica, a

universidade persegue sua missão de desenvolver a formação humana integral,

associada à produção, socialização do conhecimento e difusão da cultura

universal. A universidade tem buscado materializar esse princípio, sobretudo por

meio do incentivo à participação de seus acadêmicos naquilo que produz na

pesquisa e na extensão. Tal incentivo se dá tanto por ações que visam à interação

entre graduação, pós-graduação e extensão a exemplo das edições da Semana de

Cultura e Cidadania, um evento que já faz parte da agenda da cidade e da região;

da Semana de Ciência e Tecnologia em sintonia com as propostas do Ministério de

Ciência e Tecnologia, quanto pelos programas de iniciação científica, pelos

projetos de extensão e pelo estímulo às diversas e inovadoras formas de iniciativas

estudantis, como as ligas acadêmicas.

Edward Madureira Brasil - Só podemos falar sobre a indissociabilidade

entre ensino, pesquisa e extensão se considerarmos a titulação do corpo docente; a

existência de uma pós-graduação stricto sensu robusta; e o desenvolvimento de

uma grande quantidade de projetos de pesquisa e extensão que precisam ser

materializados com qualidade – que depende da titulação e pós-graduação stricto

sensu. Nas universidades federais, a titulação dos professores vem crescendo

muito, basta ver o caso da UFG, que passou de algo em torno de 600 doutores, em

2005, para 1.500, em 2012. A pós-graduação em nível de mestrado e doutorado

também cresceu muito nas federais. A UFG, por exemplo, passou de 38 cursos, em

2005, para mais de 60, em 2012. Por conta das duas grandes expansões, os

projetos de pesquisa e de extensão triplicaram.

“...a titulação dos professores vem crescendo

muito, basta ver o caso da UFG,

que passou de algo em torno

de 600 doutores, em

2005, para 1.500, em

2012”

(Edward Madureira Brasil)

Page 13: Revista SME Gyn 2012

Luiz Fernandes Dourado – As universidades goianas vivenciaram um

grande processo expansionista marcado pela complexificação e

interiorização de suas atividades. Que lugar ocupam nesse processo as

licenciaturas e qual o compromisso com a educação básica de qualidade?

Edward Madureira Brasil - Realmente, a UFG é, hoje, uma instituição

muito mais complexa que a existente em 2005. Os dois processos de expansão, o

primeiro, da criação de novos cursos nos campus de Catalão e Jataí e, depois, a

grande expansão do Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades

Federais (Reuni), criou novos cursos em Goiânia, Catalão, Jataí e Cidade de

Goiás. A quantidade de vagas passou de cerca de 3.000, em 2005, para mais de

6.000, em 2012, e o quantitativo de professores evoluiu de um número em torno de

1.200, para 2.200 no mesmo período. Para que a educação básica possa ser

concretizada com qualidade, é preciso que diversos fatores sejam analisados.

Precisamos ter professores licenciados bem formados, recebendo salários dignos,

as escolas devem ter infraestrutura bem definida, com diversos ambientes

obrigatórios, como biblioteca, laboratórios, etc. A UFG tem cuidado para que

nossos licenciados sejam bem formados; entretanto, dois fatos nos preocupam

imensamente e dependem, de forma indireta, da atuação da universidades: os

foto: divulgação SME

Page 14: Revista SME Gyn 2012

baixos salários dos professores e as desigualdades econômicas e culturais das

famílias brasileiras, o que impede que mais jovens se interessem por seguir a

carreira de professor, provocando a não ocupação de vagas em nossos cursos de

licenciatura, sobretudo naqueles oferecidos nos campi dos municípios do interior

do Estado.

Wolmir Therezio Amado - Os cursos de formação de professores

integram a tradição de nossa universidade desde sua origem: os cursos de História

e Geografia foram criados em 1949; Pedagogia e Letras em 1952; Física e

Matemática são de 1969; Biologia, em 1974, Filosofia em 1977; Educação Física,

em 2000 e Química, em 2004. A formação de professores foi objeto de constante

investimento na PUC, com progressiva e constante expansão do número de

cursos, mesmo quando a demanda oscilava ou quando a tendência das demais

instituições era de retração e diminuição de investimentos nas licenciaturas. A

universidade não abre mão de apostar na formação de professores como

importante espaço que qualifica o projeto formativo. A PUC Goiás não tem

medido esforços para qualificar, quantitativamente ou qualitativamente, o

ingresso, a permanência e a conclusão dos cursos com qualidade junto aos

acadêmicos. Ao longo desta história fortaleceu o Colegiado das licenciaturas,

ampliou parcerias com as redes de ensino e tem marcado presença no cenário do

debate local, nacional e internacional, seja pelos fóruns de defesa da educação,

seja pela representatividade em conselhos estaduais e municipais. A PUC Goiás

tem presença constante nas direções da Anfop e, mais recentemente, na

Presidência do Conselho Nacional de Educação. Nos projetos internos, tem

inovado em ações que qualificam os cursos de formação de professores,

destacando-se o Vestibular Social, com 50% de bolsas para alunos que

comprovem condições socioeconômicas desfavoráveis. O que se tem notado é a

retomada da procura pelos cursos de formação de professores e a revitalização de

um projeto acadêmico que valoriza a formação humana, política, pedagógica e

técnica da profissão docente. Há, também, o compromisso de construir um Centro

de Formação de Professores como espaço político e pedagógico para tornar a

docência e a valorização da escola eixos da formação e da profissionalização. No

novo espaço da PUC Goiás, em processo de construção, será implementado um

“A universidade

não abre mão de apostar na formação de professores

como importante espaço que qualifica o

projeto formativo”

( )Wolmir Amado

Page 15: Revista SME Gyn 2012

Projeto Político-pedagógico de Formação de Professores, com forte referência na

articulação do ensino-pesquisa-extensão e da prática da postura investigativa na

formação docente. Há, ainda, experiências exitosas em cursos modulares e em

cursos das licenciaturas que, além de atender às Diretrizes Curriculares

Nacionais, inovam na forma como se operacionalizam o currículo e a formação

dos profissionais. Soma-se a tudo isso o constante debate interno entre docentes e

discentes, para o aprofundamento das questões políticas e teóricas no campo de

defesa da educação básica, particularmente na defesa da aprendizagem com

qualidade social.

Luiz Fernandes Dourado – Quais são as principais experiências exitosas e as

dificuldades na política de formação de professores no país? E

especificamente na PUC-Goiás e na UFG?

Wolmir Therezio Amado - As principais dificuldades na formação de

professores no Brasil referem-se à adesão de alunos ao projeto das licenciaturas.

Ela ganha centralidade quando se reconhece o campo de desvalorização social da

profissão docente. É preciso investir na educação, seja pelo aumento do PIB em

10%, seja pela valorização do Piso Nacional Docente que deve ser compatível

com o que se espera na qualidade exigida dos docentes. No que se refere ao Piso

Nacional, há que se efetivarem políticas que ajudem as prefeituras na sua

implementação. Por outro lado, há um processo de evasão nas licenciaturas, o que

significa a necessidade de políticas que assegurem a entrada e a permanência dos

estudantes. E falta, nacionalmente um estudo sobre o perfil socioeconômico e

cultural dos alunos que ingressam nas licenciaturas, bem como as razões das

escolhas dessa profissão. Na PUC Goiás, além do Vestibular Social, outras

iniciativas estão sendo implementadas como o Programa de Orientação

Acadêmica (Proa), que visa fortalecer nos discentes a construção de um projeto

acadêmico pautado no estudo, pesquisa, leitura, escrita e afirmação da identidade

docente. A experiência piloto desse programa será implementada nas

licenciaturas e se pautará em quatro eixos: metodologia de ensino e estudo;

metodologia de pesquisa e a produção intelectual; leitura e expressão; habilidades

sociais e relações interpessoais. As atividades no interior do Proa visam fortalecer

Page 16: Revista SME Gyn 2012

a leitura, a escrita e a produção textual dos discentes das licenciaturas. Elas serão

organizadas em quatro formatos: nos grupos de estudos interdisciplinares (GEI)

com temas comuns às licenciaturas; nos grupos de estudos e pesquisas

disciplinares (Geped), cuja proposta prevê o atendimento individual dos alunos

por parte dos professores das disciplinas; workshops interdisciplinares com temas

do cotidiano em oficinas, palestras, vivências, minicursos, dentre outros; e pelo

atendimento da monitoria. Em síntese, o Proa nas licenciaturas é considerado um

ambiente de aprendizagem e agrega uma série de atividades para fortalecer no

discente o estudo, o debate e a produção intelectual como condições fundamentais

para o exercício da profissão docente. Outra experiência de extrema relevância

para a PUC Goiás é o Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência

(Pibid). Por meio dele, acadêmicos e docentes têm vivenciado boas experiências

formativas no contato direto com as escolas públicas. O Pibid tem oportunizado

espaço para a análise, crítica e proposição de iniciativas inovadoras para garantir a

aprendizagem dos alunos nas instituições públicas. Ganham nossos acadêmicos,

nossos docentes e os parceiros da escola, pois todos articulam projetos comuns

que ampliam o sentido da educação na escola pública. O Pibid na PUC Goiás é um

programa permanente, fato que o credencia a ocupar lugar de destaque na nova

Proposta Político-pedagógica do Centro de Formação de Professores.

Edward Madureira Brasil - A formação de professores que a

universidade promove por meio das licenciaturas enfrenta inúmeros desafios,

muitos deles associados à carreira e à remuneração dos professores da educação

básica, pois trata-se de um trabalho que exige alto grau de envolvimento e

compromisso, com longas jornadas, alta carga horária e remuneração

insatisfatória. Há, portanto, um elevado grau de stress e tensão entre os

profissionais, o que interfere na demanda para os cursos de licenciatura. É preciso,

portanto, alterar esse quadro. A busca por políticas e práticas de formação de

professores mais adequadas para dar conta das exigências na formação de

professores nas universidades fez com que a UFG aprofundasse as discussões a

respeito das licenciaturas, em consonância com políticas e programas

implementados no país para formar e qualificar professores, resultando na

‘‘Há, portanto, um elevado

grau de stress e tensão entre os profissionais, o que interfere na

demanda para os cursos de

licenciatura’’

(Edward Madureira Brasil)

Page 17: Revista SME Gyn 2012

abertura de novos cursos, tanto na modalidade presencial quanto a distância, a

ampliação do Programa Bolsas de Licenciatura (Prolicen), a ampliação e

consolidação do Programa de Iniciação a Docência (Pibid), a realização do II

Encontro Nacional das Licenciaturas e I Encontro Nacional do Pibid e do

Seminário com o Conselho Estadual de Educação. O Pibid é uma experiência

exitosa que, desde a publicação de seu primeiro edital, em 2007, oferece bolsas de

iniciação à docência aos alunos de cursos de licenciaturas, para antecipar o

vínculo entre os futuros professores e as salas de aula da rede pública. Com esta

iniciativa a Capes tem oferecido a esses alunos a oportunidade de cumprir um dos

princípios norteadores do programa: a formação de professores da educação

básica com simetria invertida, isto é, o preparo do professor em lugar similar ao

que vai atuar. Há o Programa de Formação Inicial e Continuada, Presencial e a

Distância de Professores para a Educação Básica (Parfor), caracterizado por um

conjunto de ações de colaboração com as secretarias de educação dos estados e

municípios e as instituições de educação superior. Os cursos na modalidade a

distância são ofertados pela Universidade Aberta do Brasil (UAB). Embora

reconheçamos o papel do Parfor para a formação de professores, uma das

dificuldades é o fato de o professor estar em serviço, o que limita sua frequência às

aulas. Podemos citar ainda programas como a Formação em Educação de Jovens e

Adultos; o Programa Escola Ativa Educação no Campo, para capacitar

professores que atuam em escolas no campo; o Programa de Apoio à Formação

Superior e Licenciaturas Interculturais (Prolind) Educação Indígena, que visa a

formação de professores indígenas em nível superior para docência nos anos

finais do ensino fundamental e ensino médio, com uma característica diferenciada

de atividades que contemplam tempo-universidade e tempo-comunidade.

Luiz Fernandes Dourado – Que concepção de qualidade de ensino e de

educação norteia o projeto institucional da UFG e PUC-GO?

Edward Madureira Brasil - A UFG atua conforme estabelecem seus

documentos fundamentais, o Estatuto e o Regimento Geral. Dessa forma, a UFG

quando transmite, sistematiza e produz conhecimento, o faz ampliando e

aprofundando o ser humano para a reflexão crítica, o exercício profissional, a

Page 18: Revista SME Gyn 2012

solidariedade nacional e internacional, em que se objetiva alcançar uma sociedade

justa, em que os cidadãos se empenhem na busca de soluções democráticas para os

problemas nacionais. A UFG, ao implementar suas atividades, o faz de modo a

consolidar-se como uma instituição que articula unidade e pluralidade, teoria e

prática, formação inicial e continuada, tendo como objetivo político-pedagógico a

construção do saber, a ampla formação cultural e o desenvolvimento de

programas, projetos e ações para a solução dos problemas e uma maior inclusão

social.

Wolmir Therezio Amado - Toda ação acadêmica da PUC Goiás tem seu

alicerce em dois parâmetros que norteiam sua prática pedagógica cotidiana,

expressam de maneira inequívoca a política da instituição, orientam e organizam

os projetos pedagógicos dos cursos e demais programas, estimulam o caráter

inovador e social de suas intervenções e socializam a produção do conhecimento

científico e cultural. Os dois parâmetros são a excelência acadêmico-institucional

e a qualidade social. A excelência acadêmico-institucional é o parâmetro

científico-cultural que orienta a ação pedagógica e expressa a determinação da

PUC Goiás em oferecer ensino, pesquisa e extensão de qualidade. Exige,

portanto, a busca de eficiência e eficácia em todas as dimensões do processo

foto: divulgação SME

Page 19: Revista SME Gyn 2012

acadêmico, nos projetos pedagógicos com a participação dos educadores; na

permanente qualificação do corpo docente e técnico-administrativo; na

observância de diretrizes curriculares que respondam às reais demandas do

mundo do trabalho; na infraestrutura que atenda às necessidades de formação dos

alunos de modo geral e dos portadores de deficiências de modo especial; na

modernização e manutenção dos laboratórios; na permanente atualização do

acervo bibliográfico físico e virtual e na procura da sustentabilidade financeira,

que dá adequado suporte orçamentário às demandas acadêmicas. A qualidade

social é o parâmetro político que orienta a ação acadêmica da instituição no seu

compromisso social. Ela realiza o preceito constitucional do direito de todos os

cidadãos à educação, formando-os como pessoas, habilitando-os ao pleno

exercício da cidadania e à inserção qualificada no mundo do trabalho. Qualidade

social requer que a instituição assuma papel decisivo no desenvolvimento

humano e social da região, que abra suas portas aos processos da inclusão,

dialogue com os segmentos sociais, amplie as modalidades de acesso e de

permanência dos alunos, mantendo um diálogo permanente com a comunidade,

atenda a contento às necessidades das pessoas com deficiências e que atenda às

demandas atuais do mundo do trabalho.

Luiz Fernandes Dourado – Os programas federais de formação dos

profissionais da educação têm sido objeto de quais ações nas universidades

em Goiás?

Wolmir Therezio Amado - Na PUC Goiás as experiências federais que

mais qualificam o projeto formativo dos discentes das licenciaturas são o Pibid, o

Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (Pibic) e o

Financiamento do Ensino Superior (Fies). Em relação ao Pibid, a PUC Goiás tem

fortalecido as parcerias com as escolas públicas e qualificado as redes de ensino

por meio do estudo, debate, pesquisa e produção do conhecimento, onde os alunos

da PUC Goiás centram suas experiências num projeto formativo com base na

postura investigativa e na produção intelectual. Já o Pibic tem contribuido para

formar um quadro de discentes nas licenciaturas extremamente comprometido

com a produção do conhecimento acadêmico e científico. Formar professores

‘‘A qualidade social é o

parâmetro político que

orienta a ação acadêmica da instituição no

seu compromisso

social.’’

(Wolmir Amado)

Page 20: Revista SME Gyn 2012

pesquisadores é um dos objetivos centrais do Pibic na PUC Goiás. Por fim, o Fies

tem oportunizado a permanência dos alunos nas licenciaturas, uma vez que

flexibiliza a adesão e a forma de pagamento. Ressalta-se, neste caso, a

possibilidade de o aluno, após formado, pagar o financiamento por meio de

trabalho na escola pública.

Edward Madureira Brasil - A UFG tem cumprido um importante papel

social e institucional no desempenho de suas atividades acadêmicas e científicas

no estado de Goiás, desde a produção e inovação tecnológica até a formação de

profissionais qualificados, comprometidos com o crescimento e o

desenvolvimento do estado e do país. A UFG oferece diversos cursos de

licenciatura, tanto na modalidade presencial como a distância, nos programas

Universidade Aberta do Brasil, Prodocência e Parfor. Alguns dos cursos de

licenciatura são nas áreas de Biologia, Artes Cênicas, Educação Física, Física,

dentre outras. A UFG desenvolve um curso pioneiro de formação de professores

em Biologia, no Continente Africano, na cidade de Maputo, em Moçambique. A

UFG criou recentemente as seguintes licenciaturas: Intercultural Indígena,

Libras, Dança, Enfermagem e Psicologia. A Política de Formação de Professores

da UFG explicita em seus princípios éticos, acadêmicos e científicos a

preocupação com a qualidade e o compromisso do fazer pedagógico dos egressos

dos seus cursos de licenciatura, frente aos atuais desafios do campo educacional,

na busca constante de estabelecer vínculos com a realidade escolar, não apenas na

formação inicial mas também na formação continuada dos professores. A política

de formação de professores promove constantemente ações e estratégias

pedagógicas e administrativas, para buscar soluções aos problemas do cotidiano

escolar. Um exemplo dessas medidas é a implementação do curso de Libras para

atuação nas escolas. Esta é apenas uma de várias medidas necessárias para o

atendimento das inúmeras demandas do campo educacional.

‘‘A UFG desenvolve um curso pioneiro

de formação de professores em

Biologia, no Continente

Africano, na cidade de Maputo’’

(Edward Madureira Brasil)

Page 21: Revista SME Gyn 2012

Luiz Fernandes Dourado – Quais as ações da universidade goiana para

regulamentar a colaboração entre os entes federados?

Edward Madureira Brasil - A autonomia dos entes federados e a disputa

pelo poder nacional impõem barreiras enormes ao processo de colaboração entre

os entes federados no Brasil. A universidade tem um papel limitado no processo de

regulamentação dessa colaboração. O que faz com grande intensidade é participar

dos fóruns que debatem os assuntos em disputa entre os entes federados, como

educação, saúde, segurança, direitos humanos, ocupação geográfica etc,

integrando comissões instaladas nas esferas de governo e desenvolvendo estudos

acadêmicos que embasam possíveis ações de colaboração a serem desenvolvidas.

Essas atuações podem significar, no final, regulamentações de colaborações que

muitas vezes são frágeis, pois dependem dos partidos que se encontram no poder e

da tensão entre os componentes desses partidos.

Wolmir Therezio Amado - A PUC entende ser fundamental para o país a

elaboração e a efetiva implementação de um sistema nacional de educação, desde

a educação infantil até a educação superior O sistema deve ter efetiva sinergia,

com reciprocidade entre os diversos níveis de governo (União, estados e

municípios) e entre os diversos setores, o público, o comunitário e o privado. Por

isso, a PUC Goiás não mede esforços para fazer parte de todas as instâncias

disponíveis e aptas a promover a integração e a colaboração entre as diferentes

agências que compôem o cenário do ensino superior nacional. É claro que

compete aos órgãos específicos dos entes federados, tais como as secretarias de

educação, em sinergia com as instâncias participativas como os conselhos de

educação, regulamentar e promover a cooperação em nível nacional. Nossas

parcerias com esses órgãos garantem a plena inserção da PUC na construção do

sistema, mesmo porque temos a convicção de que, por sua natureza e vocação

comunitária, nossa instituição muito tem a contribuir com esta causa. E a história

dos últimos cinquenta anos do ensino superior no Centro-Oeste corrobora nossa

convicção.

‘‘A PUC entende ser

fundamental para o país a

elaboração e a efetiva

implementação de um sistema

nacional de educação’’

(Wolmir Amado)

Page 22: Revista SME Gyn 2012

Luiz Fernandes Dourado – Quais os projetos de formação e a contrapartida

institucional das universidades para os profissionais da Secretaria

Municipal de Educação (SME) ?

Wolmir Therezio Amado - Um dos principais projetos interinstitucionais

entre a PUC Goiás e a SME está no fornecimento dos estágios como campo de

estudo dos acadêmicos nas licenciaturas e a formação continuada dos

profissionais da instituição. As instituições-campo de estágio da PUC Goiás

participam de um amplo projeto formativo, que prevê a formação continuada em

contextos, inclusive com direito à certificação, à isenção de taxas em eventos

organizados pela PUC, além de outras iniciativas. Da mesma forma, a PUC Goiás

tem sido presença constante no debate e nas assessorias de reconstrução das

propostas pedagógicas das etapas e modalidades da educação na SME, o que

significa profunda inserção e articulação entre a formação inicial e a continuada.

Destaca-se, ainda, a parceria da PUC Goiás na formação continuada da SME, seja

pela promoção de temas de interesse da rede, seja pela disponibilização de

espaços físicos para a realização dos cursos promovidos pelo Centro de Formação

dos Profissionais da Educação (Cefpe), seja pela promoção das jornadas

pedagógicas que têm a PUC, historicamente, como parceira.

Edward Madureira Brasil - A Universidade Federal de Goiás atua em

parceria com a SME na formação continuada dos professores em exercício, por

meio de cursos de capacitação (extensão e pós-graduação), grupos de pesquisa,

reestruturação curricular e atualizações. Parte das ações são realizadas com

recursos próprios da universidade ou contam com o apoio de agências de fomento:

MEC, MS, Capes, Fapeg. Por meio de programas como o Parfor, para a formação

de professores dos cursos na modalidade a distância, tanto de graduação quanto de

pós-graduação e extensão, a UFG contribui com a qualificação de professores da

rede para o exercício da sua profissão, com vagas específicas para atender a

demanda de formação, em cursos de licenciatura como Física, Artes Visuais,

Educação Física, Ciências Biológicas, Artes Cênicas, etc. A UFG oferece ainda a

possibilidade de qualificação em diversos cursos de pós-graduação lato sensu . Há

uma parceria institucionalizada para a realização de estágios curriculares

‘‘A Universidade

Federal de Goiás atua em parceria com a

SME na formação

continuada dos professores’’

(Edward Madureira Brasil)

Page 23: Revista SME Gyn 2012

obrigatórios, por meio de convênio e, como contrapartida, os professores dos

cursos de graduação oferecem à SME vagas para professores e servidores para

participar de semanas acadêmicas, científicas e pedagógicas ou cursos de

extensão. A aproximação entre a rede municipal e a UFG é cada vez maior e

potencializa a articulação desejável entre a universidade e a educação básica.

Luiz Fernandes Dourado – Que balanço pode ser feito do trabalho da

universidade com a infância, a juventude e a terceira idade goiana?

Edward Madureira Brasil - No que diz respeito a infância e juventude, a

UFG desenvolve ações por meio do Centro de Estudos e Pesquisas Aplicados à

Educação (Cepae), que atua com crianças a partir da alfabetização, com

adolescentes e jovens em todo o ensino fundamental e médio, desenvolvendo,

além de propostas inovadoras de formação, projetos de diferentes manifestações

artísticas e culturais. Um outro espaço de atuação com crianças é a creche da UFG,

que lida com educação infantil e atende crianças de zero a três anos e onze meses.

Várias outras ações são desenvolvidas com jovens, especialmente o ‘‘Programa

Faz O Quê’’, um projeto da TV UFG com a Prograd e Centro de Seleção, que visa

levar à juventude informações sobre os cursos de graduação de forma criativa e

interativa. ‘‘O Projeto UFG Vai a Escola’’ aproxima a UFG das escolas de ensino

médio, levando informações sobre a UFG, seus cursos e seu processo seletivo.

Com a mesma característica, é desenvolvido o ‘‘Projeto Espaço das Profissões’’,

que, neste caso, traz para os ambientes da UFG mais de 30.000 estudantes todos os

anos. São desenvolvidos inúmeros projetos artísticos e culturais, voltados para

jovens e adultos da comunidade goiana, bem como programas de orientação a

adolescentes nas mais diversas áreas, especialmente no campo da saúde e também

para a terceira idade, por meio das ligas acadêmicas e núcleos de estudos na área

de saúde, que oferecem atividades de orientação e promoção da saúde física e

mental.

Wolmir Therezio Amado - A PUC Goiás traz em sua história as marcas

da tradição de um rico trabalho realizado com a infância, juventude e terceira

idade locais, cujo respeito tem alcançado uma dimensão nacional. Ao longo dos

‘‘A PUC-Goiás traz em sua história as marcas da

tradição de um rico trabalho

realizado com a infância, a

juventude e a terceira idade’’

(Wolmir Amado)

Page 24: Revista SME Gyn 2012

últimos 30 anos, diversas iniciativas realizadas em parceria com a sociedade civil

e outras instituições têm permitido à PUC Goiás contribuir efetivamente com

avanços nas discussões e proposições de políticas públicas voltadas a esses

sujeitos. Compreende-se que, tanto pela extensão e pesquisa quanto pelo ensino,

essas temáticas circulam produzindo indagações, ciência e acompanhamento

dessa população, em especial, por sua condição de vulnerabilidade social. Desse

modo, a universidade cumpre seu maior objetivo, que é a produção e a difusão do

“conhecimento a serviço da vida”. Esse trabalho pode ser identificado em grupos

de pesquisa que abordam as referidas temáticas, além dos programas permanentes

de extensão, a exemplo do Centro de Estudo, Pesquisa e Extensão Aldeia Juvenil,

Escola de Circo, Escola de Formação da Juventude, Programa Aprender a Pensar,

Centro de Educação Comunitária de Meninos e Meninas e Programa de

Gerontologia Social – Universidade Terceira Idade.

Luiz Fernandes Dourado – Qual o papel das universidades na melhoria do

processo formativo dos profissionais da educação na qualidade da educação

básica?

Wolmir Therezio Amado - O papel das universidades na melhoria do

processo formativo dos profissionais da educação e da educação básica está no

fortalecimento de um projeto de formação inicial e continuada, comprometido

com a qualidade social e com a educação como bem público. A universidade deve

ser um locus de crítica e de proposição às políticas educacionais implementadas

no campo da educação básica. Além de qualificar o debate e a formação dos

futuros profissionais, as universidades devem ajudar na construção de políticas

públicas que fortaleçam os princípios da gestão democrática, da valorização

docente e da melhoria da aprendizagem discente. Há que se fortalecer o diálogo e

as parcerias com a SME no sentido de colocar todo o conjunto de estudos e

infraestrutura da universidade na consecução da formação inicial e continuada,

com vistas à construção da identidade docente comprometida com a escola

pública e com a qualidade social. Portanto, cabe às universidades serem espaço de

reflexão crítica e parceiras na promoção de projetos que aprimorem o saber-fazer

docente e discente. A exemplo disso, no semestre passado, o Departamento de

Page 25: Revista SME Gyn 2012

Educação da PUC Goiás fez uma grande discussão durante o 3º Ciclo de Debates

do EDU, cuja temática de 2012 versou sobre a “Educação Pública em Debate:

enfrentamentos e perspectivas”. A pauta de reflexão que contou com a presença

dos movimentos sociais, fóruns de defesa da educação pública, as redes de ensino,

professores da educação básica, professores da PUC Goiás e acadêmicos de todas

as licenciaturas, reafirmou o compromisso das licenciaturas da PUC Goiás em seu

manifesto dos cursos de formação de professores da PUC Goiás em defesa da

educação pública e da formação e valorização dos profissionais da educação. O

teor deste documento expressa o sentido e o posicionamento dos cursos de

formação de professores com a defesa da educação pública de qualidade no

município e no estado de Goiás.

Edward Madureira Brasil - Construir uma educação básica com

qualidade em um país é uma meta complexa e que envolve muitos componentes,

a maior parte deles é alheia às ações que as universidades podem realizar

diretamente. A universidade pode discutir periodicamente os projetos

pedagógicos de suas licenciaturas; qualificar seus professores, titulá-los,

incentivá-los a participar de seminários, simpósios e conferências que debatem os

problemas da educação básica, apoiando a realização de estudos sobre as

condições que as escolas devem possuir para desenvolver uma educação de

qualidade; interagir com as redes estaduais e municipais de ensino por meio dos

estágios e desenvolver projetos que visem a compreensão dos problemas

existentes e, é claro, propor soluções para esses problemas. A UFG tem atuado em

todas essas vertentes. Entretanto, a universidade tem ação limitada sobre a

definição das prioridades dos governos estaduais e municipais ao alocar os

recursos públicos, ao definir os salários a serem pagos aos professores, ao

estabelecer as condições de infraestrutura nas escolas e, enfim, alterar o quadro da

grande desigualdade social brasileira e da desmotivação em que encontram-se

nossos jovens para ingressar na carreira docente, fruto dos salários que lhes são

oferecidos e das condições desfavoráveis que encontrarão nas salas de aula.

‘‘Construir uma educação

básica com qualidade em

um país é uma meta complexa

e que envolve muitos

componentes’’

(Edward Madureira Brasil)

Page 26: Revista SME Gyn 2012

ARTIGOS

SME

EDUCAÇÃO EM

MOVIMENTO

Page 27: Revista SME Gyn 2012

Política de Formação Continuada em Rede e a qualidade da educação pública

Marcilene Pelegrine Gomes

Romilson Martins Siqueira

“Se quisermos verdadeiramente emancipar o homem

do mundo do medo e da dor, então a denúncia

do que hoje se chama razão e ciência é o melhor

serviço que a razão pode prestar.”

(HORKHEIMER, 2000, p. 178) (Grifos nossos).

Resumo

O presente artigo tem como objetivo discutir os pressupostos e os eixos

que fundamentam a Política de Formação Continuada em Rede da SME, tendo em

vista a formação e valorização dos profissionais da educação e a melhoria da

qualidade do ensino público no Município de Goiânia.

Palavras-chave: Política de Formação Continuada. Políticas em Rede.

Qualidade da educação. Formação e valorização profissional.

As ideias que compõem este texto são sínteses de um processo de

discussão que se iniciou no Centro de Formação dos Profissionais da Educação

(CEFPE), no primeiro semestre de 2012, e que culminou no Seminário de

1. Mestre e doutoranda em Educação pela UFG. Professora efetiva do Departamento de Educação da PUC Goiás. Professora da Secretaria Municipal de Educação. Formadora do CEFPE.

2. Doutor e Mestre em Educação pela UFG. Professor efetivo do Programa de Pós-Graduação em Educação da PUC Goiás. Diretor do Departamento de Educação da PUC Goiás. Professor da Secretaria Municipal de Educação. Formador do CEFPE.

3. Ao longo do segundo semestre de 2011 o CEFPE organizou uma intensa agenda interna de discussões que mobilizou toda a equipe de formadores a fim de construir e fortalecer sua unidade epistemológica e política em torno do seu objeto de trabalho: a formação continuada.

4. O CEFPE foi criado em 1999 com a função de propor e implementar a política de formação continuada dos profissionais da SME. Nesse caso, há que ressaltar que esta formação não está restrita aos professores, por compreender que todos os profissionais envolvidos, direta ou indiretamente, com a promoção da aprendizagem têm o direito à formação continuada, sejam docentes ou funcionários administrativos.

1

3

2

4

Page 28: Revista SME Gyn 2012

Articulação do Departamento Pedagógico (DEPE) em maio deste ano. Reafirma

os princípios e os pressupostos que norteiam a Política de Formação em Rede,

objeto de trabalho do CEFPE como instância responsável pela formação

continuada dos profissionais da Secretaria Municipal de Educação de Goiânia

(SME). Ademais, este texto é um convite à reflexão, ao estudo, ao debate e à

contribuição de todos os profissionais da educação na construção da Política de

Formação Continuada desta rede pública de educação.

Este documento afirma o lugar da formação continuada em uma Secretaria

que dialoga em rede. Tomemos como ponto de partida para os sentidos

atribuídos à ideia de política, de formação continuada e de rede. O sentido da

expressão política não se configura como uma ação isolada, esporádica, setorial

ou governamental. Trata-se de príncípios que revelam a intencionalidade, a

natureza e a razão das ações formativas tendo em vista o desenvolvimento da

profissionalidade e, sobretudo, a melhoria da qualidade da educação pública na

SME.

Da mesma forma, o sentido empregado à formação rompe com a

perspectiva pragmática que alinha a lógica do aprender-fazendo em cursos. A

formação ganha outro sentido quando apreendida nas trocas de experiência, em

contextos, no coletivo. No que se refere ao termo continuada, entende-se aqui o

sentido de um processo continuum que se dá ao longo da vida e da profissão. O

termo rede é entendido na perspectiva dialógica e dinâmica que parte da escuta, do

debate e da construção de ações articuladas com todos os segmentos e instâncias

educativas da SME, a fim de garantir a unidade na diversidade.

Por Política de Formação Continuada em Rede compreende-se o

conjunto de pressupostos políticos, epistemológicos e pedagógicos que orientam

os saberes e práticas, tendo em vista a unidade das ações formativas empreendidas

pela SME. A Política dialoga em rede externa (Conselho Municipal de Educação,

agências formadoras, Secretarias Municipais, movimentos sociais, dentre outros)

e interna (entre os Departamentos e instâncias da SME), a fim de qualificar e

5. O sentido é a forma pessoal como cada um compreende o mundo, as relações, as experiências. Já os significados referem-se à cultura, aos valores, às crenças, às ideias e pensamentos acordados e decididos nas relações coletivas.

5

Page 29: Revista SME Gyn 2012

garantir a consecução das Propostas Político-Pedagógicas da Educação Infantil,

Ensino Fundamental da Infância e da Adolescência e da Educação de

Adolescentes, Jovens e Adultos. Essa Política materializa-se por meio de Projetos

Formativos e Ação Formativa.

Projetos Formativos são aqueles que, em seu processo de elaboração,

tomam como ponto de partida as avaliações institucionais, as avaliações de ações

formativas anteriores, os referenciais legais e epistemológicos. Os projetos

formativos devem anunciar qual será a formação em rede para cada etapa ou

modalidade da educação durante o ano letivo. Eles devem explicitar os

pressupostos, os princípios, o eixo, o tema central da formação naquele ano, as

diferentes ações formativas que serão oferecidas e o corpus teórico que embasará

todas as ações formativas. Devem ter como referência os tempos da vida e os

processos educativos decorrentes. Portanto, um Projeto Formativo pressupõe

planejamento sistemático e nunca se encerra nele mesmo ou em uma única ação

formativa, uma vez que ele necessita estabelecer mediações com outros projetos

anteriores e posteriores.

Por ação formativa compreende-se toda atividade cujo princípio é a

formação continuada dos profissionais da educação. O que a constitui no seu

aspecto formativo em rede é a possibilidade de articulá-la num conjunto de

princípios e práticas com intencionalidade, portanto, planejamento e avaliação.

Neste caso, um projeto formativo que parte da política de formação da SME pode

ser estruturado em:

Cursos de curta, média e longa duração (presenciais ou a distância com a

utilização do ambiente virtual de aprendizagem): ações de formação promovidas

e coordenadas pela SME, com o objetivo de estudar e discutir temáticas relativas

ao trabalho docente, com carga horária variada.

6. Neste caso, no início de cada ano letivo o CEFPE deverá divulgar o Projeto Formativo da Educação Infantil, do Ensino Fundamental em Ciclos e da Educação de Jovens e Adultos, com base no que foi discutido coletivamente. Este projeto formativo deverá contemplar todas as ações formativas que comporão o projeto, o que implica que cada instância que queira contribuir na execução de uma ação formativa deve discuti-la e aprová-la coletivamente, fazendo-a constar no Projeto. Cada ação formativa deve articular-se com outras e com o projeto maior, definido para cada etapa e modalidade.

7. Nenhuma ação formativa deverá ser desenvolvida sem que tenha sido discutida coletivamente e contemplada no Projeto Formativo. Toda ação formativa deverá explicitar o referencial teórico, os princípios, vincular-se aos eixos da Política de Formação e atender ao perfil de profissional que ela enseja.

6

7

Page 30: Revista SME Gyn 2012

Eventos de grande porte: ações de formação promovidas e coordenadas

pela SME voltadas para o grande público, com o objetivo de discutir as propostas

político-pedagógicas da SME.

Grupos de Trabalho e Estudo: ações de formação, com o objetivo de

estudar temas específicos e propor ações que auxiliem a prática docente no espaço

educacional.

Cursos em parceria com o MEC: ações de formação promovidas e

coordenadas pela SME e financiadas com recursos do Governo Federal

(MEC/FNDE).

Cursos, simpósios, seminários, congressos e conferências oferecidos em

parceria com as Instituições de Ensino Superior (IES).

Palestras e encontros formativos: ações promovidas pelo CEFPE,

Unidade Regional de Educação (URE), Centro Municipal de Atendimento à

Inclusão (CMAI), Divisão de Estudos e Projetos (DIEP) e Divisões de Educação.

Estas atividades devem ocorrer articuladas a um projeto formativo maior e sua

elaboração e execução devem explicitar os pressupostos da política de formação e

sua estreita vinculação com as propostas pedagógicas da SME.

Formação em Contexto: ação que deve ser suscitada pelas instituições

educacionais, incentivadas e apoiadas pelo CEFPE e Divisões, bem como

acompanhadas em seu processo, planejamento, desenvolvimento,

sistematização, documentação e socialização pelas URE.

Propor uma política de formação em rede implica ações, opções e políticas

estratégicas da SME para garantia do direito à aprendizagem e à formação

humana de todos os sujeitos – professores, funcionários administrativos,

educandos. O que se espera é que essa política oportunize e fortaleça a formação

continuada, comprometida com uma educação pública de qualidade social.

Neste sentido, a política de formação continuada da SME deve orientar-se por

meio de pressupostos políticos, epistemológicos e pedagógicos, com foco na

unidade das ações.

8. O social aqui nos remete ao sentido político enquanto ato intencionado, objetivado. Constitui-se na sua expressão pública, ou seja, enquanto coisa pública, bem comum, portanto, para todos. Não se converte em direito para ajustar e compensar conflitos. Na verdade, constitui o direito subjetivo e universal em si mesmo. Constitui o fundamento da polis no sentido de reconhecer todos os sujeitos como indivíduos.

8

Page 31: Revista SME Gyn 2012

Pressupostos políticos

Um aspecto importante a se considerar é que a política de formação deve

manter estreita relação com as políticas públicas, particularmente as políticas

educacionais. Entende-se que a Política de Formação deve ser uma das dimensões

que expressam as políticas públicas para a educação, que deve contribuir na

garantia dos direitos sociais, humanos e civis. As ações formativas, desenvolvidas

em diferentes instâncias, devem levar em conta as articulações com outras ações e

políticas setoriais como cultura, meio ambiente, saúde, promoção social, bem

como aquelas inerentes à educação. Entende-se que as políticas públicas

expressam a ação do Estado a serviço de um projeto de sociedade, o que significa

compreender que esse projeto se consolida na disputa de interesses que move

diferentes segmentos sociais. Portanto, nenhuma política pública é neutra ou a-

política. Ela é sempre expressão de forças que demandam do Estado uma ação ou

uma resposta social. Neste sentido, defende-se que, na elaboração das ações

formativas estejam presentes o diálogo entre estas ações e as políticas públicas

intersetoriais, tendo em vista a qualidade social da educação como bem comum,

portanto, para todos.

Em tempos de exclusão e marginalização, fruto de um processo de

organização social pautada na desigualdade e na barbárie, ter acesso ao

conhecimento contribui para a garantia da inclusão social. Todavia, há que

compreender que em tempos de neoliberalismo exacerbado, o discurso da

inclusão social também pode incorrer em uma falácia. Portanto, quando se fala em

inclusão social, fala-se em todas as formas que se contrapõem à lógica da

exclusão, num processo interno de crítica a essa lógica, ao mesmo tempo em que

põem-se em pauta as lutas cotidianas.

Nesse sentido, a inclusão social aqui defendida não se reporta a ajustar os

desajustados mas, acima de tudo, a manter alerta a crítica ao modelo econômico

9. Ver Azevedo (1997).

10. Compreendido como uma das formas de renovação do Liberalismo clássico, em que põe-se em evidência a propriedade, o individualismo, o mercado, o lucro. O neoliberalismo se constitui no renovado esforço do modelo de desenvolvimento e sociabilidade capitalista em manter a hegemonia de um processo econômico, desigual e combinado, que articula exclusão e inclusão.

9

10

Page 32: Revista SME Gyn 2012

vigente, que mascara as contradições sociais em nome de uma suposta igualdade

de direitos. Dessa forma, a concepção de inclusão social que permea as ações

formativas deve considerar o sentido ampliado da inclusão, que passa pela

reiterada luta em favor dos direitos humanos, sociais, políticos e civis. Isto

permite colocar em pauta o respeito às diferenças e à diversidade, ao mesmo

tempo em que reafirma que a condição de igualdade humana só se concretiza em

condições de emancipação dos sujeitos. Todas as ações formativas devem situar,

no plano macroeconômico-social, as contradições que se evidenciam ao tomar, na

formação, os objetos de estudo. Nenhum conhecimento é neutro, como nenhuma

ação formativa pode deixar de evidenciar o estranhamento e o posicionamento

político e crítico.

Mas de qual formação continuada se fala quando se pensa em uma política

de formação em rede? Naquela que toma como ponto de partida a dialeticidade, a

historicidade e a identidade profissional. A formação continuada deve

possibilitar situações em que a produção e a apropriação do conhecimento se

dêem no movimento dialético de ação-reflexão-ação. Isto implica considerar o

conhecimento tácito como ponto de partida que passa a ser interrogado,

questionado, posto em dúvida e que, num ato consciente, é retomado,

transformado e ressignificado. Assim, a formação continuada toma como ponto

de partida o conhecimento tácito dos profissionais, mas o problematiza e o elucida

de forma crítica.

Portanto, a experiência de trabalho do profissional da educação pode ser

compreendida sobre dois aspectos importantes. Primeiro, refere-se ao saber

tácito, ou seja, àquilo por ele produzido em sua história e atuação profissional,

acumulando um conjunto de saberes-fazeres inerentes à sua ação. Segundo, existe

11. Aspecto que permite apreender o movimento, a contradição, a dinâmica, a relação de uma coisa e outra e não de oposição de uma e outra, bem como a historicidade dos fenômenos num reiterado processo de tensão entre presente–passado, todo–parte, universal–singular, social–individual.

12. Para se compreender aquilo que expressa a historicidade de uma coisa é preciso compreendê-la nos processos de interseção entre homem-trabalho-cultura, processos que não se dão na perspectiva individual e nem atemporal.

13. Nesse caso, “a questão da identidade nos remete necessariamente a um projeto político.” (CIAMPA, 2001, p. 73). Projeto político que implica reconhecer o projeto de sociedade e suas condições de produção que operam a inclusão e a exclusão dos indivíduos.

14. Para Saviani (1991), “a construção do pensamento se daria, pois, da seguinte forma: parte-se do empírico, passa-se pelo abstrato e chega-se ao concreto.” (p.11)

12 13

11

14

Page 33: Revista SME Gyn 2012

outro sentido e significado para a experiência que a formação continuada deve

apreender. Trata-se da experiência como sentido humano, daquilo que foi vivido e

marcado na vida do sujeito, de forma singular, portanto, pessoal. Assim, “a

experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca. Não o que se

passa, não o que acontece, ou o que toca.” (LARROSA, 2002, p. 21). Neste

sentido, a formação continuada não pode traduzir-se em ações formativas

esporádicas, fragmentadas e que não tragam o sentido da experiência para os

sujeitos.

Nessa perspectiva, a formação continuada deve objetivar o

desenvolvimento pessoal, humano e profissional, não pelo acúmulo de

conhecimentos adquiridos, mas, acima de tudo, pelo fortalecimento de uma

postura investigativa e crítica da própria atuação profissional. Entende-se que o

desenvolvimento profissional abarca as dimensões da formação humana, ética,

política, estética e também pedagógica, o que permite um processo de

profissionalização comprometido com a qualidade.

Pressupostos epistemológicos

Do ponto de vista epistemológico, a Política de Formação Continuada da

SME reafirma os pressupostos que norteiam a aprendizagem e o desenvolvimento

humano em uma perspectiva histórico cultural e nos fundamentos do

materialismo histórico dialético, como método de estudo e compreensão da

realidade. É deste lugar epistêmico que se parte para a compreensão do sentido

político e pedagógico que articula as ações formativas em rede. Portanto,

compreende-se,

o papel da ação humana na história, ato que constitui-se no e pelo

trabalho, na e pela atividade, na e pela produção de cultura. Portanto, é a

15. Profissionalização aqui entendida como reconhecimento do saber-fazer da profissão naquilo que compete aos direitos dos trabalhadores da educação, particularmente no que se refere à sua valorização como trabalhador e como pessoa humana.

16. O materialismo histórico dialético se propõe estudar aquilo que engendra os processos de produção da base material da sociedade e seus desdobramentos nas formas de produzir a sociabilidade humana.

17. “Seguindo o referencial marxista, apresentam-se três aspectos fundamentais da atividade humana: a) ser orientada por um objetivo, b) fazer uso dos instrumentos de mediação e c) produzir algo que podemos caracterizar como elemento da cultura – seja por sua existência física seja por sua existência simbólica - e que consiste na objetivação do ser humano.” (ZANELLA, 2004, p. 130)

15

16

17

Page 34: Revista SME Gyn 2012

atividade ou ação humana intencional deliberada, ação consciente, livre, que

constitui a vida produtiva e a vida genérica do homem, tornando-o criador e

criatura: “o homem faz da atividade vital o objeto da vontade e da consciência.”

(MARX, 2001, p. 116);

que os processos de aprendizagem e de desenvolvimento humano são

construções sociais. Para Vygotsky, não é possível discutir separadamente

aprendizagem e desenvolvimento. Sua constituição recíproca depende dos

processos de interação social dos indivíduos. O desenvolvimento humano

(entendendo nesse caso os processos psíquicos, afetivos, cognitivos, motores) e a

aprendizagem fundamentam-se nas relações sociais entre indivíduos e o mundo

exterior e desenvolvem-se num processo histórico. É deste lugar que a Política de

Formação Continuada entende os processos de aprendizagem e desenvolvimento

humano, ou seja, na compreensão de que o ser humano, em suas dimensões psico-

físico e social, constitui-se socialmente na história. É nela que o homem vai,

dialeticamente, se distanciando de sua condição biológica para a sua condição

social, sem, contudo, perder de vista a primeira. Esse processo só se concretiza

18. Ainda que interdependentes, para Vygostky, as duas categorias são diferentes e não se interpõem uma em relação à outra.

18

foto: divulgação SME

Page 35: Revista SME Gyn 2012

quando se percebe que a vida e o desenvolvimento humanos não se descolam

daquilo que se processa no modo de produção da vida material;

que a produção e a apropriação da cultura se dá na e pela mediação

sujeito-sujeito e sujeito-signos. O que se quer discutir aqui é a importância do

outro para os processos de produção e apropriação do conhecimento. Para

Vygotsky (1987), é na relação social, mediatizada pelos elementos e signos

construídos historicamente, que a cultura se faz presente. A cultura é aqui

entendida como produto e processo em que se dá a objetivação e subjetivação

humana. Portanto, “o ser humano se apropria da cultura e concomitantemente nela

se objetiva, constituindo-se assim como sujeito” (ZANELLA, 2005, p. 99). Para

Horkheimer (1990), a produção da cultura é resultado de um processo que se

engendra nas condições históricas construídas pela evolução e pela transformação

da ação humana na natureza. Portanto, a cultura é produzida na História e sob

diferentes condições econômicas de produção;

o papel das ações formativas como mediadoras na construção do

conhecimento científico. Para Vygostky (1991), conhecimento científico é

aquele que advêm da elaboração intelectual e pressupõe a atenção deliberada,

memória lógica, capacidade de abstração e domínio de signos. Envolve, portanto,

experiência e atitude consciente e sistemática, bem como a capacidade de inter-

relacionar diferentes conceitos. Portanto, num movimento dialético ascendente e

descendente, o conhecimento/conceito científico parte do conhecimento

espontâneo, mas retorna num processo que implicou o desenvolvimento da

consciência reflexiva. O conhecimento a priori não pode mais ser o mesmo, uma

vez que a atitude do pensamento abstrato (análise, síntese, comparação,

generalização) exigiu a elucidação da realidade. Este é o processo que a Política

de Formação Continuada deve empreender em suas ações formativas - possibilitar

aos profissionais da educação a aquisição do conhecimento científico por meio do

pensamento crítico, divergente e transformador. Reafirma-se, aqui, a importância

19. O outro aqui referido não necessariamente precisa ser um “outro humano”.

20. “o fato de (...) produzir cultura [implica] em objetivação do sujeito que a empreende. Porém, esse processo de objetivação pressupõe ao mesmo tempo a subjetivação do sujeito, pois, ao apropriar-se da atividade, o sujeito apropria-se da história humana e imprime a esta sua marca. O movimento de objetivação e subjetivação é possível graças à característica fundamental da atividade humana, isto é, o fato de ser mediada por signos.” (ZANELLA, 2004, p. 132)

19

20

Page 36: Revista SME Gyn 2012

da atitude investigativa e da problematização da realidade como pontos de partida

para a formação continuada dos profissionais.

Pressupostos pedagógicos

Para a construção de uma Política de Formação Continuada em Rede há

que se considerar também os pressupostos pedagógicos que devem orientar sua

condução:

A formação como processo contínuo – ato que se dá na articulação entre

os saberes advindos da formação inicial e aqueles construídos no exercício da

profissão. As ações formativas devem partir do diálogo com as agências

formadoras sobre os conhecimentos e o perfil dos profissionais formados por elas,

dos objetivos delineados nos Projetos Formativos e da implementação da

formação em contexto na SME. Esta última consiste nas ações formativas,

formais e informais, realizadas no ambiente de trabalho, tendo como ponto de

partida a reflexão sobre a prática pedagógica dos profissionais que atuam nesse

espaço. Os princípios que fundamentam a formação em contexto, segundo

Cunha e Prado (2010), Canário (2001), Ferreira e Zurawski (2011), se constituem:

a) na realização in loco, já que é no espaço de trabalho que deve-se consolidar um

projeto de formação articulado à PPP da instituição; b) na interlocução, que

pressupõe o envolvimento e diálogo dos profissionais pedagógicos e

administrativos entre si e com outros interlocutores (teóricos, profissionais de

outras agências formativas, apoios, profissionais de outras instituições da Rede e

de outras redes etc.); c) na observação das necessidades e interesses dos

profissionais, ato que pressupõe o envolvimento de todos os participantes, desde a

escolha da temática a ser estudada, sua problematização, até a busca de caminhos

que promoverão mudanças na prática institucional; i) no foco do processo de

aprendizagem e desenvolvimento dos sujeitos, a fim de promover a qualidade do

ensino-aprendizagem.

Os saberes da formação – que se constituem na articulação entre o

conhecimento científico, o conhecimento pedagógico e o conhecimento sobre a

21. Síntese teórica do documento “Orientações para elaboração do Plano de Formação nas instituições de Educação Infantil/2012”, elaborado pela equipe da educação infantil do CEFPE.

21

Page 37: Revista SME Gyn 2012

rede. Nesta perspectiva, os saberes da formação são aqueles que se coadunam na

perspectiva de fortalecimento da identidade profissional, ato que se dá na

“significação social da profissão; da revisão constante dos significados sociais da

profissão; da revisão das tradições. Mas também da reafirmação das práticas

consagradas culturalmente e que permanecem significativas. Práticas que

resistem a inovações porque prenhes de saberes válidos às necessidades da

realidade. Do confronto entre as teorias e as práticas, da análise sistemática das

práticas à luz das teorias existentes, da construção de novas teorias.” (PIMENTA,

1999, p. 19) Os saberes científicos são construídos no diálogo e acúmulo teórico

que os profissionais vão adquirindo na formação inicial e continuada. Eles

expressam o saber sistematizado e referendado à luz da ciência. Para Pimenta

(1999), os saberes pedagógicos são aqueles advindos da experiência, do

conhecimento e das práticas pedagógicas constituídas na ação profissional. Já os

saberes sobre a Rede são aqueles que permitem aos profissionais a compreensão

das atividades meio e das atividades fim numa Secretaria Municipal de Educação e

que implicam em uma leitura de rede com ações articuladas. Os saberes sobre a

Rede permitem aos profissionais compreender a função social da educação

pública, bem como seu papel profissional na consecução desta função. Numa

perspectiva histórica e social, os saberes da formação articulam os saberes

científicos, os saberes pedagógicos e os saberes sobre a Rede, a fim de garantir o

desenvolvimento profissional e pessoal dos trabalhadores na educação.

A postura investigativa e a práxis pedagógica - pressuposto que implica

fortalecer, em todas as ações formativas, a prática da problematização, da reflexão

crítica, do posicionamento político e da ação transformadora. Neste caso, a

formação deve tomar os objetos de estudo nas ações formativas e recolocá-los à

luz da ação-reflexão-ação. Isto implica uma formação que mobilize os sujeitos

para uma atitude investigativa que objetive a resolução de problemas com base no

referencial teórico. Por postura investigativa entende-se aquela em que o

22. Sobre os saberes da experiência, estes “surgem como núcleo vital do saber docente, a partir do qual o(a)s professor(a)s tentam transformar suas relações de exterioridade com os saberes em relações de interioridade com sua própria prática. Nesse sentido os saberes da experiência não são saberes como os demais, eles são, ao contrário, formados de todos os demais, porém retraduzidos, ́ polido´ submetidos às certezas construídas na prática e no vivido.” (TARDIF, 1991, p. 234).

22

Page 38: Revista SME Gyn 2012

profissional questiona, busca, estuda, discute, registra, documenta e socializa com

seus pares o saber-fazer acumulados.

A interdisciplinaridade – compreendida como produto e processo de

estudo e produção do conhecimento sistematizado. Ela trata do conhecimento. Ela

questiona-o, interroga, o estranha e o valida. A atitude do pensamento

interdisciplinar implica colocar-se na condição de fazer uso da razão, do

esclarecimento e elucidar objetos do conhecimento sob o olhar da ciência. Para

Japiassu (2000), a interdisciplinaridade requer do pensamento humano a

capacidade de conhecer o universal e o abstrato e a exigência de conhecer o

“porquê” das coisas. Portanto, a interdisciplinaridade é uma atitude que move o

pensamento e a ação, uma vez que o “conhecimento deve partir do simples para o

complexo, do abstrato para o concreto, do real para o imaginário (...) sendo o

princípio da máxima exploração das potencialidades de cada ciência, da

compreensão de seus limites, o princípio da diversidade e da criatividade.”

(FAZENDA, 1994, p. 38). O ponto de partida e de chegada de uma ação

interdisciplinar está na condução de uma metodologia participativa e dialógica.

Busca-se, com isso, achar os pontos de convergência em uma ação que se

desenvolve num trabalho cooperativo e reflexivo. Para JAPIASSU (1976, p.74):

“a interdisciplinaridade caracteriza-se pela intensidade das trocas entre os

especialistas e pelo grau de interação real das disciplinas no interior de um mesmo

projeto de pesquisa”. A atitude do pensamento e da ação interdisciplinares

coadunam-se com a postura investigativa, já que implica uma "atitude de abertura

frente ao problema do conhecimento." (FAZENDA, 1979, p. 39).

Eixos da Política de Formação Continuada

Tomando como referência que o eixo é aquilo que está na base e que

sustenta a articulação dos Projetos e das Ações formativas em Rede, destacam-se

aqueles que, de forma interdisciplinar, devem perpassar a formação profissional, a

saber:

Conhecimento da base espistemológica que orienta as Propostas

Político-Pedagógicas da Secretaria Muncipal de Educação de Goiânia.

Reconhecimento das características e especificidades dos tempos da vida

Page 39: Revista SME Gyn 2012

(infância, adolescência, juventude, adultícia e terceira idade).

Inclusão social, diversidade humana e cultural, diferenças individuais,

direitos humanos, processos de participação e cidadania.

Gestão democrática e organização do trabalho pedagógico (interações,

tempos, espaços, materiais e documentação pedagógica).

Currículo, conhecimento e práticas pedagógicas.

A instituição educacional como locus de formação em contextos.

A garantia desses eixos nas propostas formativas deve considerar que as

temáticas propostas para a formação sejam situadas no campo das políticas

públicas; o desenvolvimento da postura investigativa; o domínio da linguagem

oral e escrita, particularmente nos registros reflexivos diários sobre o processo de

formação; a interface interdisciplinar do objeto de estudo nas diferentes áreas do

conhecimento; a vivência e a expressão de diferentes linguagens artísticas nos

projetos e ações formativas.

O perfil do profissional desejado

Considerando os princípios que norteiam esta Política de Formação

Continuada, tendo em vista o fortalecimento da identidade e a valorização da

profissionalização dos trabalhadores em educação, os Projetos e Ações

formativas devem propiciar condições para que os sujeitos desta Política possam:

ter ciência e clareza de sua responsabilidade política e da sua competência

técnica naquilo que compreende o saber-fazer da sua profissão e a qualidade da

educação pública;

constituir-se como pesquisadores/investigadores da própria prática

profissional, quando a interrogam, questionam e alteram posturas e práticas;

reconhecer o fundamento do seu trabalho no contexto das ações

educativas, compreendendo o fenômeno educativo e as relações sociais que dele

decorrem;

23. Os termos aqui utilizados diferenciam-se daqueles comumente utilizados no campo das ciências e da pesquisa científica. Trata-se de reafirmar o compromisso com a postura investigativa para o processo de compreensão da realidade.

24. De acordo com Saviani (2003:13) “o trabalho educativo é o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens”.

23

24

Page 40: Revista SME Gyn 2012

reconhecer-se como integrante de um coletivo de profissionais que deve

primar pela garantia dos direitos dos sujeitos que freqüentam as instituições

educativas;

desenvolver cotidianamente a cultura do registro e da reflexão crítica do

seu trabalho a fim de compartilhar seus saberes e suas práticas em contextos de

trabalho coletivos;

constituir-se como profissionais éticos, críticos e com sensibilidade

estética.

Desafios à implementação da Política de Formação Continuada em Rede

Dentre os desafios que se colocam à implementação da Política de

Formação Continuada em Rede, destacam-se:

a articulação da Política de Formação Continuada no âmbito das demais

políticas estratégicas da SME e, em particular, com a avaliação institucional;

a garantia do diálogo e da troca de experiência entre as instâncias do

DEPE.

um estudo aprofundado sobre o perfil dos profissionais da SME, bem

como suas necessidades e demandas por formação;

a articulação da Política de Formação com o diagnóstico e os resultados da

avaliação da aprendizagem discente;

a articulação entre a Política de Formação e a Formação em Contextos;

a mudança da “cultura dos cursos” para a “cultura da formação

permanente”;

a mudança na cultura da formação que deve romper com o “aprender

fazendo” para a autonomia e autoria intelectual dos profissionais que participam

da formação;

o fortalecimento da cultura da publicação e da socialização das produções

dos profissionais que participam da formação, bem como daquelas experiências

formativas que são centrais nas Propostas Político Pedagógicas da SME;

a ampliação do sentido dado à formação. Há que se construir na SME uma

cultura humana e estética que propicie aos profissionais da educação outras

experiências formativas como acesso aos bens culturais e simbólicos: cinemas,

Page 41: Revista SME Gyn 2012

shows, teatro, vivências etc. Trata-se, sobretudo, da ampliação e da educação do

olhar estético em todos os profissionais.

Enfim, construir uma Política de Formação Continuada em Rede

pressupõe considerar que sua elaboração e implementação também se dá na

dialeticidade, na cotidianidade e no movimento. Nela, nada se encerra em si

mesmo, mas, acima de tudo, se abre ao diálogo e à construção coletiva de um novo

lugar para se pensar a formação: humana, política, técnica, ética e estética.

Portanto, sua razão de existir só faz sentido se ela qualificar e alterar os sujeitos e

suas práticas tendo em vista a melhoria da qualidade do ensino.

Referências

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2001. Disponível em: www.institutoabaporu.com.br/.../fazer-da-formacao-um-projeto.pdf.

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Page 43: Revista SME Gyn 2012

Formação de professores para a EJA: da lógica das competências à formação humana omnilateral

Cláudia Borges Costa

Joel Ribeiro Zaratim

‘‘Ao pensar a educação na perspectiva da luta emancipatória, não poderia

senão restabelecer os vínculos – tão esquecidos – entre educação e trabalho,

como que afirmando: digam-se onde está o trabalho em um tipo

de sociedade e eu direi onde está a educação. (SADER, 2005, p.17)’’

Resumo

O presente artigo é um convite à reflexão acerca da formação de

professores para a educação de jovens e adultos (EJA). O estado da arte sobre a

EJA no Brasil revela a importância do diálogo dessa modalidade com o mundo do

trabalho. Nesse sentido, a concepção de omnilateralidade gramsciana permite

compreender que a formação educativa não precisa ficar distante da formação

para o trabalho.

Palavras-chave: Educação de jovens e adultos. Formação de professores.

Trabalho. Omnilateralidade.

Introdução

A epígrafe citada acima sinaliza a concepção de educação assumida ao

longo deste artigo e demonstra a preocupação em trazer a questão do trabalho para

dialogar com a educação. O debate torna-se necessário, principalmente pela atual

1

2

1. Coordenação do Fórum Goiano de EJA. Apoio Pedagógico da Rede Municipal de Educação de Goiânia e doutoranda em Educação (UnB).

2. Professor Assistente da Universidade Estadual de Goiás, mestre em Educação (UFG). Conselheiro Titular do Conselho Municipal de Educação.

Page 44: Revista SME Gyn 2012

configuração da globalização econômica, que, junto com a adoção de uma política

de formação para as competências e a produtividade, acaba interferindo no

processo educativo de crianças, adolescentes, jovens e adultos do país.

Quem lida diariamente com os educandos da Educação de Jovens e

Adultos (EJA) constata que a maioria é constituída, essencialmente, de

trabalhadores e com essa compreensão se faz necessário um olhar diferenciado

para a modalidade, inclusive no que diz respeito à formação de professores.

O texto discute a formação de professores para EJA, desde a formação

inicial até a continuada, por meio de um contorno formativo que se apropria do

debate sobre as relações estabelecidas entre a educação e a questão do trabalho,

enquanto produção travada nas relações contraditórias do mercado capitalista,

como construção humana produzida historicamente.

Contexto atual da EJA

A EJA tem se afirmado na história da educação brasileira de forma

precária nas políticas públicas voltadas ao âmbito educacional (FARIAS, 2006).

Os esforços para assegurar o acesso e a permanência de jovens e adultos que não

tiveram acesso à escola ou dela foram excluídos vinculam-se à pauta

reivindicatória de movimentos de educadores e os grupos sociais que defendem o

acesso e a seguridade de uma educação de qualidade para todos, considerando,

inclusive, os esforços em oferecer uma educação mais prolongada, não aligeirada

por meio da criação de proposta curricular específica.

A história da educação brasileira tem demonstrado que a EJA revela-se

como sinônimo de programas, os quais se esforçam para contrabalançar as

distorções reais que são aquelas dos direitos negados ao processo de

escolarização.

A Constituição Federal de 1988, marco de garantia aos direitos humanos,

incluiu, conforme Artigo 208, a educação a todos como dever do Estado.

Durante os governos de Fernando Henrique Cardoso, 1995 a 2002, foram

implementadas inúmeras reformas educacionais (SANFELICE, 2003) e a

aprovação de uma nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB nº

9.394/1996).

Page 45: Revista SME Gyn 2012

A referência da EJA na LDB 9.394/1996 reafirma o direito de jovens e

adultos trabalhadores terem acesso ao ensino básico, dentro de suas condições e

especificidades. Determina que o poder público tem o dever de assegurar essa

modalidade de educação gratuitamente, na forma de cursos e exames supletivos.

A partir de 2003, com o governo Lula, entre os diversos programas sociais

criados (FREITAS, 2007), percebe-se também nesse conjunto de ações

afirmativas uma ampliação do acesso à EJA, bem como um olhar mais específico

para essa modalidade. Uma tentativa de articular escolarização com educação

profissional tem sido cultivada em alguns projetos, como por exemplo, o

Programa ProJovem Urbano do Ministério da Educação.

Pensar a educação de jovens e adultos significa, sobretudo, falar de jovens

e adultos, trabalhadores estudantes, que formam e são formados ao longo da

história, no seio das relações sociais de produção, marcadas pela exclusão e

marginalização da maioria da população. A própria distorção da relação

foto: divulgação SME

3. O ProJovem Urbano tem como finalidade primeira proporcionar formação integral aos jovens, por meio de uma efetiva associação entre Formação Básica, para elevação da escolaridade, tendo em vista a conclusão do ensino fundamental; Qualificação Profissional, com certificação de formação inicial; Participação Cidadã, com a promoção de experiência de atuação social na comunidade. (http://www.projovem.gov.br)

3

Page 46: Revista SME Gyn 2012

idade/nível de ensino, observada nos sujeitos educandos da EJA, vem

reafirmando essa condição excludente do jovem e adulto no Brasil, que, por uma

situação de sobrevivência, acabam abandonando a escola e se lançando no

mercado de trabalho, ainda que desqualificados profissionalmente e submetendo-

se a qualquer condição.

Os sujeitos que compõem a educação de jovens e adultos sobrevivem

essencialmente da força do seu próprio trabalho. Assim, estão sob o jugo das

“demandas do processo de acumulação de capital sob as diferentes formas

históricas de sociabilidade que assumir.” (FRIGOTTO, 2003, p. 30).

Os trabalhadores estudantes da EJA estão vivendo a condição de contratos

temporários, muitos labutam na informalidade e acabam por compor a faixa de

desempregados deste país. A exigência de uma qualificação profissional é ainda

mais perversa, pois impõe a esse sujeito a “culpa” de não conseguir uma

colocação ou como dizem no senso comum: “quem não tem competência não se

estabelece”, lógica do capitalismo, que transfere a responsabilidade do plano

social para o individual.

Na argumentação de Ciavatta (2009, p.19), “O trabalho sempre foi uma

atividade separada da atividade da escola - o primeiro, próprio do mundo do fazer

e da servidão; a segunda, próprio do mundo do saber”. Como dois universos

apartados, eles têm sido a marca tradicional na sociedade ocidental.

Na educação de jovens e adultos, a discussão do mundo do trabalho tem

sido, historicamente, relegada a segundo plano, dessa forma, é de fundamental

importância inseri-la nesse debate, sobretudo no atual contexto em que programas

e projetos reconhecem a importância da formação integral dos trabalhadores.

Diante desse contexto, qual seria a formação aos professores que

possibilitaria condições para atender a demanda da EJA?

Muitos olhares se intercruzam

De maneira geral, a formação de professores com perfil para atuar na EJA,

assim como a formação docente em geral, tem apresentado conflitos. O tipo de

formação que recebem, observado mais intensamente a partir da década de 1990,

está revestido de uma roupagem do capitalismo, que aponta a qualidade da

Page 47: Revista SME Gyn 2012

educação como instrumento principal para o aperfeiçoamento da demanda e a

acumulação de riquezas.

Nesse sentido, as políticas públicas de expansão das instituições

superiores de formação docente, desde 1999, como os institutos superiores de

educação e dos cursos normais superiores foram

criados como instituições de caráter técnico-profissionalizante, de baixo custo, a expansão exponencial desses novos espaços de formação da juventude atual por educação em nível superior, oferecendo-lhes uma qualificação mais ágil, flexível, adequada aos princípios da produtividade e eficiência e com adequação às demandas do mercado competitivo e globalizado (FREITAS, 2002, p. 143).

Na formação de professores específica para EJA, sobretudo no campo da

formação inicial, Machado (2008) traz a reflexão de que no ano de 2006, com o

governo Lula, as novas diretrizes curriculares do curso de pedagogia, por

exemplo, reafirmaram os pedagogos como profissionais para atenderem, além da

educação infantil, os períodos iniciais do ensino fundamental, bem como jovens e

adultos, o que de certa forma contribuiu para perceber a importância da inserção

da EJA nas licenciaturas. Na opinião de Machado (2008, p. 165):

Essa realidade não muda radicalmente a quase total ausência de formação específica para atuar com jovens e adultos, que ainda é marca dos cursos de licenciatura no País. Os cursos de disciplinas específicas [...] que habilitaram professores no final dos anos 1980 e 1990 – não propiciaram a oportunidade de aprender, nas disciplinas pedagógicas e no estágio, sobre os desafios de atuar com os alunos jovens e adultos q u e r e t o r n a m a o p r o c e s s o d e e s c o l a r i z a ç ã o , a n o s a p ó s e s t a r e m a f a s t a d o s d a e s c o l a ; m e n o s , a i n d a , s o b r e c o m o e n f r e n t a r e s s e s desafios.

São inúmeros os desafios no âmbito da formação dos professores da EJA.

Na formação inicial, é preciso que as licenciaturas incorporem em seus currículos

as discussões pertinentes à EJA, sobretudo a de que elas absorvam a importância

de conhecer o público majoritário da modalidade, a saber, trabalhadores-

estudantes.

Os sujeitos educandos dessa modalidade carregam marcas de uma

profunda desigualdade social. São jovens e adultos que fazem parte do

Page 48: Revista SME Gyn 2012

contingente de subempregados e desempregados do país. A discussão da

concepção de educação que tem permeado os debates na modalidade reporta-se à

abordagem gramsciana (em que a formação da cultura geral não pode estar

distante da formação para o trabalho).

Preparar as novas gerações para o trabalho significa pensar o homem

omnilateralmente, na sua totalidade, com sua potencialidade de transformar a

realidade e não simplesmente submetê-lo ao mundo da produção, tal como

afirmaram Engels e Marx:

A produção de ideias, de representações e da consciência está em primeiro lugar direta e intimamente ligada à atividade material e ao comércio mater ial dos homens; é a l inguagem da vida real . As representações, o pensamento, o intercâmbio intelectual dos homens surge aqui como emanação direta de seu comportamento material ( 1 9 8 0 , p.25).

Paulo Freire (1979, p. 66), no início do processo de democratização no

Brasil, final dos anos 1970, fala de uma educação diferenciada, de uma educação

que rompesse com os setores privilegiados da sociedade. Em sua opinião, seria

necessária uma educação que não perdesse de vista a “vocação ontológica do

homem, a de ser sujeito”, mas que também estivesse atenta à realidade do período,

que apresentava sua especificidade de transição.

Freire enfatiza a importância do sujeito e seu compromisso com a

realidade.

Nenhuma ação educativa pode prescindir de uma reflexão sobre o homem e de uma análise sobre suas condições culturais. Não há educação fora das sociedades humanas e não há homens isolados [...] Se a vocação ontológica do homem é a de ser sujeito e não objeto, só p o d e r á d e s e n v o l v ê - l a n a m e d i d a e m q u e , r e f l e t i n d o s o b r e s u a s condições espaço-temporais, introduz-se nelas, de maneira crítica. Quanto mais for levado a refletir sobre situacionalidade, sobre seu e n r a i z a m e n t o espaço-temporal, mais 'emergerá' dela conscientemente “carregado” de compromisso com sua realidade, da qual, porque é sujeito, não deve ser simples espectador, mas deve intervir cada vez mais (FREIRE, 1979, p. 61).

O debate que vem sendo travado nas duas últimas décadas no meio

educacional aponta para a existência, na educação, de uma disputa teórica entre

Page 49: Revista SME Gyn 2012

campos opostos, isto é, de um lado o projeto de educação que se afirma na

formação das competências, de cunho neoliberal, apoiando a formação de

professores para as novas configurações do capitalismo e do mercado; e, de outro,

em oposição à política neoliberal, o de formação humana gramsciana (2000a),

como alternativa de educação que retoma o trabalho como natureza central.

Machado (2008) enfatiza o grande desafio da formação dos professores de

EJA, tanto na formação inicial como na formação continuada. Ele afirma que na

última década dois movimentos podem ser destacados como contribuição na

formação continuada dos professores de EJA. Os dois movimentos propiciaram,

de forma concreta, mudanças no campo da formação desses professores. No caso

do movimento legal, o Parecer CNE/CEB Nº 11/2000, entre outras normas,

aponta a importância de uma formação afinada com a complexidade da

modalidade. O segundo movimento, representado pela sociedade civil, tem-se

pautado pela preocupação com uma formação que dialogue com a ação

pedagógica das salas de aula.

Os vários encontros propostos pelos movimentos dos fóruns de EJA têm

construído o percurso de uma formação dos professores que exija reflexão crítica

sobre o fazer pedagógico. Conforme Freire (2004, p. 38), “a prática docente

crítica, implicante do pensar certo, envolve o movimento dinâmico, dialético,

entre o fazer e o pensar sobre o fazer.” Em sua opinião, a formação do educador

deve ser constante e o momento mais importante dessa formação é o da reflexão

crítica sobre a sua ação pedagógica.

O Grupo de Trabalho-18 de EJA (Anped) também se revela nesse segundo

movimento como possibilidade de reflexão, crítica e formação aos professores de

EJA, os quais podem acessar as pesquisas que, quase sempre, buscam dialogar

4. “um, mais ligado aos órgãos oficiais de governo, com a presença importante do órgão normativo nacional em educação: o Conselho Nacional de Educação (CNE), que, através da Câmara de Educação Básica fixou, em 2000, as diretrizes curriculares para EJA e, outro, que advém da sociedade civil organizada em defesa da EJA, com destaque para participação dos Fóruns de EJA e do Grupo de Trabalho de Educação de Jovens e Adultos (GT-18), da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped).” (MACHADO, 2008, p. 167).

5. Criados desde 1996, conforme Machado (2008, p. 169) “Esse movimento, de 1996 até os dias atuais, promoveu a mobilização dos diversos estados da federação, sendo que os fóruns, hoje, estão presentes em todos eles e no Distrito Federal, constituindo-se, em alguns estados, por uma organização descentralizada em vários fóruns regionais.”

4

5

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com as práticas desenvolvidas nas salas de aula. Esse Grupo de Trabalho também

apoia a busca de políticas públicas que fortaleçam a modalidade.

Com a ascensão de um governo democrático-popular, o de Lula, a EJA

torna-se um pouco mais visível no cenário da educação brasileira. A inserção da

modalidade no Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização

do Magistério/Fundeb, Lei nº 11.494/2007, já assinala outro olhar para a EJA. A

oferta pública de educação escolar na modalidade de EJA integrada à educação

profissional marca outro momento na história da educação brasileira: rompe-se,

ainda que de forma tímida, com a dualidade histórica educação/propedêutica,

trilhando caminho diferente da educação profissional.

A retomada da centralidade do trabalho na EJA torna-se mais significativa.

A formação dos professores de EJA no âmbito inicial ou continuado deverá fazer o

esforço de se apropriar do debate do trabalho enquanto produção travada nas

relações contraditórias do mercado capitalista e também como constituição

humana, produzida historicamente.

À guisa de conclusão

Partindo-se de uma concepção gramsciana de educação, que propõe uma

formação omnilateral de homem, percebemos, nesse contexto, uma proposta

educacional radicalmente humanista e oposta à formação para o mercado de

trabalho capitalista. Assim sendo, conhecendo os sujeitos da educação de jovens e

adultos, suas aspirações, suas limitações e seus problemas, esse modelo de

formação proporciona um ensino mais harmonioso e menos subjetivo, ou seja,

menos ligado aos ditames do capital, que reduz o homem apenas à materialidade

corporal, a ser objeto de domínio.

A formação numa perspectiva omnilateral requer que os sujeitos estejam

em iguais condições de usufruir o tempo necessário ao desenvolvimento de suas

6. Com o Decreto nº 5.478 de 24 de junho de 2005, o Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos (Proeja) é criado. Depois de acirrados debates, houve a promulgação do Decreto nº 5.840 de 13 de julho de 2006. No novo decreto, ampliou a oportunidade de ofertas de cursos nos sistemas estaduais, municipais e entidades nacionais de serviço social, propiciando a integração dos cursos de formação inicial também no ensino fundamental na modalidade de EJA, o que resultou então na criação do Proeja-FIC (BRASIL, 2007).

6

Page 51: Revista SME Gyn 2012

potencialidades, tanto no plano físico como no mental. Tempo dedicado ao ócio,

não como ação estática, estanque, mas estruturado na relação ação-reflexão-ação,

fruto da contemplação de sua inserção social. Formação da cultura geral que não

pressupõe estar distante da formação para o trabalho, mas estar distante de

constituir os sujeitos como objetos que vivem em função do capital, que se

apropriou do trabalho como forma de subjugar o homem pelo homem.

Ao concluir esse artigo não podemos deixar de fazer referência ao

pensamento freireano, que traduz de forma contundente o que se espera para a

formação dos formadores de EJA, que é, arriscaríamos dizer, formação

omnilateral:

Se, na experiência de minha formação, que deve ser permanente, começo por aceitar que o formador é o sujeito em relação a quem me considero o objeto por ele formado, me considero como um paciente que recebe os conhecimentos-conteúdos-acumulados pelo sujeito que sabe e a são a mim transferidos. Nesta forma de compreender e de viver o processo formador, eu, objeto agora, terei a possibilidade, amanhã, de me tornar o falso sujeito da "formação" do futuro objeto de meu ato formador. É preciso que, pelo contrário, desde os começos do processo, vá ficando cada vez mais claro que, embora diferentes entre si, quem forma se forma e re-forma ao formar e quem é formado forma-se e forma ao ser formado. É neste sentido que ensinar não é transferir conhecimentos, conteúdos nem formar é ação pela qual um sujeito criador dá forma, estilo ou alma a um corpo indeciso e acomodado. Não há docência sem discência, as duas se explicam e seus sujeitos, apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto, um do outro. Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender (FREIRE, 2004).

Essa formação mais humanizada e menos reificada vê os sujeitos docentes

como profissionais que se distanciam da lógica das competências, firmada no

espírito do capitalismo, aproximando-os da formação humana omnilateral.

Referências

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maio de 2000. Dispõe sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação de Jovens e

Adultos. Disponível em:

Page 52: Revista SME Gyn 2012

<http://portal.mec.gov.br/secad/arquivos/pdf/eja/legislacao/parecer_11_2000.pdf>. Acesso em:

24 de maio de 2012.

____. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação

nacional. <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm>. Acesso em: 24 de maio de

2012.

_____. Decreto nº 5.840, de 13 de julho de 2006. Institui o Programa Nacional de Integração da

Educação Profissional com a Educação Básica na modalidade de Educação de Jovens e Adultos-

PROEJA. Diário Oficial da União, de 14/07/2006.

_____ Lei nº 11.494/2007 e pelo Decreto nº 6.253/2007 - Fundo de Manutenção e

Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – Fundeb

pela Emenda Constitucional nº 53/2006. Disponível em: <http://www.fnde.gov.br/index.php/

financ-fundeb>. Acesso em: 24 de maio de 2012

CIAVATTA, Maria. Mediações históricas de trabalho e educação – Gênese e disputas na

formação dos trabalhadores (Rio de Janeiro, 1930-60). Rio de Janeiro: Lamparina, CNPQ, Faperj,

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Curitiba: SEED/PR, 2006. p. 14-21.

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Page 53: Revista SME Gyn 2012

Formação sindical, herdeira da educação popular

Iêda Leal de Souza

Resumo

O presente artigo abrange a história do Sindicato dos Trabalhadores em

Educação de Goiás (Sintego) contextualizando-a politicamente para entender o

projeto de formação desenvolvido pelo Sintego ao longo de sua história “tem que

entender a história do pensamento humano, conhecer o que de fato ocorreu com os

movimentos populares no Brasil e, principalmente, o que aconteceu no

movimento sindical do final da década de 70 para cá, a fundação da CUT, a

derrubada da ditadura civil-militar. Esses elementos embasam consequentemente

a política de formação cutista e, daí, a formação político-sindical e a concepção

político-pedagógica do Sintego, as quais, às vezes, até se confundem”, afirma a

autora.

Palavra-chave: Educação. História. Movimento Sindical. Projeto de Formação

Pedagógica. Formação político sindical.

Se formos buscar na História da Humanidade ou da própria natureza ,

quando foi que a atividade intelectual passou a ser vista ou percebida como uma

dimensão importante do ser humano, talvez tenhamos que nos remeter ao tempo

em que o próprio ser humano começou a existir como tal, diferenciando-se dos

outros animais e dos demais seres vivos.

1

2

1. Presidenta do Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Goiás (Sintego/2011/2014). Secretária da Igualdade Racial da Central Única dos Trabalhadores de Goiás (CUT-GO) 2009/2015. Diretora Executiva da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), em exercício. Coordenadora do Centro de Referência Negra Lélia Gonzáles de Goiás (CRNLG/GO). E-mail: [email protected]

2. Relatórios da Escola Centro-Oeste de Formação Sindical da CUT Apolônio de Carvalho. Coleção História da Sociedade: Aquino, Denise, Oscar, Jacques - 2.2 História da Educação: Período Primitivo, Período Oriental, Período Grego, Período Romano, Período Medieval, Período do Renascimento, Período Moderno. http://www.pedagogia.com.br/historia.php

Page 54: Revista SME Gyn 2012

O pensar, a sabedoria, a sapiência e outros fenômenos do cérebro com

outros nomes, misturados aos sentimentos, podem até não terem sido percebidos

por muito tempo, ao ponto de receberem uma nomenclatura própria e distinta,

mas, seguramente, acompanharam mulheres e homens desde sempre.

E, de uma coisa escondida no meio das outras, no meio dos gestos, das

ações, ou seja, no meio das práticas e dos movimentos da vida, passaram a ser, ao

longo do tempo, algo com natureza e propriedade específicas. De algo meramente

vivencial e espontâneo evoluíram para o preparado, pensado, planejado, com

lugar e tempo específicos na vida humana.

O que difere uma experiência da outra, antes e depois da mudança? É que,

antes, pensar-sentir-fazer eram uma coisa só, não havendo momentos distintos

dedicados a um e a outro. Depois, embora seja, mesmo hoje, impossível alguém

deixar totalmente de pensar e de sentir quando está fazendo algo com as mãos, os

pés, os braços ou o corpo inteiro, foram sendo criadas situações que apresentam

momentos específicos e próprios para sentir, pensar e fazer.

De situações quase espontâneas, chegou-se à situações muito complexas,

por exemplo, eventos para extravasar e/ou expressar sentimentos como os rituais

religiosos, os divertimentos, as expressões artístico-culturais, esportivas;

momentos para exortar e/ou doutrinar, contar a história dos antepassados, falar

dos mitos, explicar fenômenos da realidade, o que, de certa forma, pode ser

entendido como educativos (ou formativos, se quisermos); momentos para

laborar, seja coletando, caçando e pescando, plantando e colhendo, criando

animais para a alimentação, ou ajeitando o lugar de ficar, buscando uma caverna

para se proteger, ajeitando a cama, ou construindo a moradia.

E daí, nas três dimensões da vida, vimos, desde um passado infinitamente

distante aos nossos dias, a intensificação da complexidade e da especificidade,

chegando ao ponto de se criar grandes instituições encarregadas de cuidar de cada

uma delas. E, dentre as tais, figura a educação com seu intrincado e volumoso

aparato institucional, que, por si só, já demanda uma infinitude de trabalho,

movimento, infraestrutura, pessoas e diversidades que ultrapassam os limites da

compreensão da mente humana.

E imaginar que foi com isso, ou seja, com esse incomensurável

desenvolvimento do pensar humano, que se materializou todo o mundo físico ao

Page 55: Revista SME Gyn 2012

nosso redor, inclusive, grandes intervenções transformadoras na natureza, dentre

as quais, a própria humanidade. “Mundo louco!”, dizemos.

O pensar, então, ao sair da obscuridade, passou por muitas experiências

diferenciadas, avançou, ganhou corpo e até se separou das outras dimensões da

vida, ganhou nome próprio, a teoria, que não ficou só no mero pensar espontâneo,

corriqueiro, mas se materializou em ambientes propícios, as escolas, pessoas que

se dedicaram exclusivamente à arte de pensar, os pensadores, uns que falavam

sobre as ideias e uns que nem falavam, apenas se dedicavam ao pensamento, à

meditação, à escrita.

Ao longo do tempo, pensar também ganhou característica classista, com o

surgimento e o desenvolvimento das sociedades de classes. Chegou até ao ponto

de se colocar acima das atividades braçais ou manuais. Assim, pensar era mais

importante que fazer, tanto quanto, por exemplo, o pensador era considerado mais

importante socialmente que o agricultor e o pastor, o construtor. O rico podia se

dedicar ao pensar, estudar, ao domínio da escrita, e ao pobre restavam os serviços

pesados, feitos com os braços e com as mãos. Era normal na sociedade escravista,

por exemplo, que o escravo trabalhasse no pesado, produzindo alimentos,

vestuários, habitação para garantir o sustento e o exercício da arte e ciência do

filósofo. E é importante observar que o pensar também, ao chegar aos nossos

tempos moderno-contemporâneos, em que instituiu-se a divisão e a

especialização social do trabalho, gerou profissões em que aqueles e aquelas que a

elas se dedicam são trabalhadores da intelectualidade, não produzem diretamente

coisas, embora nisso influenciem, mas são produtores de ideias.

Mas, ao fazer a crítica à sociedade de classes, já beirando os nossos dias,

Brecht, com seu poema Perguntas de um Operário Letrado, põe o dedo na ferida,

ao lembrar as grandes obras da humanidade, que até receberam o título de

maravilhas do mundo, classificadas de primeira a oitava, e faz a pergunta por onde

estavam os construtores, afinal, ou se algum rei ou grande líder tinha colocado as

mãos na massa para materializar as belezas visíveis de tais feitos.

3. http://pt.wikipedia.org/wiki/Bertolt_Brecht#Biografia

4. Perguntas de um Operário Letrado http://pensador.uol.com.br/frase/MTQ5MDc5/.

3

4

Page 56: Revista SME Gyn 2012

Há, provavelmente talvez o próprio Brecht, quem tenha indagado sobre o

Brasil e suas grandes obras: onde estavam os trabalhadores? Quem foi que

construiu as mais de cinco mil cidades deste país? Quem foi que levou este país a

este colosso que é? Não será, por exemplo, o, de tão belo e sublime, sagrado Canto

das Três Raças, cantado por Clara Nunes, um exemplo de denúncia à

historiografia que se negou a registrar os inúmeros anônimos artífices deste país?

Vinícius de Moraes, com seu poema Operário em Construção, que se

tornou patrimônio do povo brasileiro, diz bem claro que o trabalhador pensa,

reflete e produz teoria, enquanto produz coisas. E, ao olhar para si próprio e o

mundo que o cerca, percebe sua miséria e as causas dela, assim como a riqueza dos

patrões e suas causas, e que ambas – a miséria de uns e a riqueza de outros – se

interrelacionam.

Vamos lembrar! O poema de Vinícius nasceu na década de 50, um

momento significativo da história da classe trabalhadora brasileira, preconizando

avanços da democracia e, ao mesmo tempo, a pré-ditadura civil-militar de 1964.

E, sintomaticamente, mais de duas décadas depois, serviu para a exaltação do

novo passo do movimento sindical que, de tão significativo, recebeu o nome de

“Novo Sindicalismo”.

E, então, para entender o projeto de formação do Sindicato dos

Trabalhadores em Educação de Goiás (Sintego), é preciso tudo isso. Tem que

entender a história do pensamento humano, conhecer o que de fato ocorreu com os

movimentos populares no Brasil e, principalmente, o que aconteceu no

movimento sindical do final da década de 70 para cá, a fundação da CUT, a

derrubada da ditadura civil-militar.

5. http://pt.wikipedia.org/wiki/Vinicius_de_Moraes

6. http://www.infoescola.com/literatura/vinicius-de-moraes/

7. Weffort, Francisco. Democracia e Movimento Operário: algumas questões para a História do período 1945-1964. Brasiliense 1978, http://www.serverweb.unb.br/matriculaweb/graduacao/ disciplina.aspx?cod=185523.

8. Coleção Cadernos de Formação Sindical – Formação de Dirigentes – Organização e Representação Sindical de Base (ORSB) – Módulo I – Secretaria Nacional de Formação - Central Única dos Trabalhadores – Bangraf.

9. Coleção Cadernos de Formação Sindical – Formação de Dirigentes – Organização e Representação Sindical de Base(ORSB) – Módulo II– Secretaria Nacional de Formação - Central Única dos Trabalhadores – Bangraf.

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Page 57: Revista SME Gyn 2012

Muitos sindicalistas daquele tempo foram cada vez mais desenvolvendo a

ideia de que não bastava mudar por fora, ou seja, a sociedade brasileira, mas,

mudar por dentro o movimento sindical. Tinha que democratizar o Brasil e o

sindicalismo. Levantaram-se, então, vários elementos que acabaram se tornando

concepções e princípios que balizaram o novo sindicalismo que estava nascendo e

acabou se consolidando no Brasil. Um desses princípios, talvez o mais

importante, foi o da liberdade e autonomia sindical.

Esses elementos embasam consequentemente a política de formação

cutista e, daí, a formação político-sindical e a concepção político-pedagógica do

Sintego, as quais, às vezes, até se confundem. Por exemplo, não dá para falar em

liberdade e autonomia sindical sem pensar em democratização das relações do

trabalho e, quando falamos disso, estamos tratando, no âmbito específico de nossa

categoria e de nossa profissão, de gestão democrática escolar e educacional, que

acaba significando também a luta por democratização do Estado e da sociedade.

Avançamos, cada vez mais, na convicção da necessidade de fortalecer

nosso Projeto de Formação Político-Sindical, entendendo que – muito embora

sejamos profissionalmente os trabalhadores da intelectualidade e tenhamos

passado naturalmente por um longo processo preparatório, desde a educação

básica até a universidade, com formação inicial e continuada e tudo mais, como

exigência para assumir a profissão – fica uma lacuna que só a formação político-

sindical dá conta. “Tem coisa que a gente não aprende no banco da universidade e

que só aprende mesmo na luta, no trampo e nos espaços de reflexão do sindicato”,

dizia uma professora ao avaliar um curso de formação de dirigentes sindicais em

organização e representação sindical de base.

O Sintego fez várias experiências de formação sindical em sua história. Os

veteranos do Movimento dão notícias, muitas vezes saudosas, das formações que

ocorriam entremeadas às mobilizações das greves. “Houve um tempo em que

10. Coleção Cadernos de Formação Sindical – Formação de Dirigentes – Organização e Representação Sindical de Base (ORSB) – Módulo III – Secretaria Nacional de Formação - Central Única dos Trabalhadores – Bangraf.

11. Relatórios de Atividades Sindicais – SINTEGO – 1ª. Reunião do Coletivo Estadual de Formação, março/2011.

12. Relatório do Curso de Formação de Dirigentes Sindicais em Organização e Representação Sindical de Base da CUT – Turma 4 – Módulo 5, Goiânia/2011.

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estudávamos muito, tirávamos tempo para isso, fazíamos isso, inclusive nos

momentos de vários embates (greves, manifestações, paralisações), o que

ajudava a manter os ânimos e evitar a dispersão. Muita gente que aderiu à luta foi

por causa da influência da formação, que, na verdade, respondia as necessidades

reais dos problemas que enfrentávamos no exercício da profissão e de militantes”,

relata uma antiga dirigente do Sintego, ainda dos tempos do Centro dos

Professores de Goiás (CPG).

A característica básica dessa experiência era a formação com foco

principal na prática sindical. Num momento mais adiante, experimentou-se um

caráter de busca de respostas às necessidades da profissão. Realizaram-se

seminários pedagógicos regionais, mesclando políticas educacionais e sindicais,

em parceria com a universidade.

Depois, avaliou-se que quem deveria oferecer a formação pedagógica (de

viés profissional) seria o Estado, de quem deveria ser cobrada. Ao Sintego, caberia

a formação político-sindical.

Em 2004, desenvolveu-se um programa de formação com vistas a atender

a demanda do Sindicato, que percorreu todo o Estado de Goiás. Cada equipe foi

constituída de um membro da diretoria como coordenador, um assessor

contratado e um apoio técnico-operacional. Dentre os assessores, havia

professores da UEG e da UFG. As avaliações foram muito positivas em relação ao

trabalho realizado. Nas 36 regionais sindicais do Sintego e em Goiânia, mais de

800 pessoas foram atingidas, envolvendo dirigentes sindicais e militantes de base.

Desde 2007, o Sintego desenvolve um projeto, em parceria com a

Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação(CNTE) e o Sindicato de

Educadores da Suécia (Lärarförbundet), que está em fase de avaliação e

reelaboração, mas, em Goiás, entra em sua segunda fase, com uma segunda turma

de formação de 50 dirigentes sindicais prevista para começar no primeiro

semestre de 2013. Trata-se de um curso com duração de três anos.

13. Relatórios de Atividades Sindicais – SINTEGO – Cadernos de Anotações – Reunião da Diretoria, junho/2012.

14. Relatórios de Atividades Sindicais – SINTEGO – Plano de Formação “Projeto Peão do Trecho”/2004.

15. Relatórios de Atividades Sindicais – SINTEGO – Programa de Formação CNTE/ SINTEGO – Período 2007-2011 – 1ª. Turma.

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Page 59: Revista SME Gyn 2012

O programa está sendo desenvolvido em todo o Brasil e trabalha quatro

eixos formativos básicos estratégicos do movimento sindical educacional e

cutista: Concepção política e sindical; Teoria e prática sindical; Planejamento e

ação sindical; e Temas transversais. Cada eixo subdivide-se em mais quatro

módulos com respectivos fascículos.

Nas palavras do Secretário de Formação da CNTE, Gilmar Soares, “esse

Programa é muito importante para criar um novo conceito de atuação sindical,

incentivando os sindicatos a promoverem a formação política dos trabalhadores

da educação. Por isso, várias reuniões do coletivo nacional foram realizadas para

preparar melhor as atividades a serem desempenhadas nas entidades e possibilitar

uma visão crítica da realidade social, que é o objetivo maior do Programa. A

atividade de formação é, hoje, central nas entidades filiadas à CNTE, do ponto de

16. http://www.cnte.org.br/index.php/secretarias/formacao Introdução à Sociologia. Teoria Política. Economia Política. Introdução à História do Movimento Sindical. Movimento Sindical dos Trabalhadores e Trabalhadoras em Educação no Brasil. Fundamentos de Filosofia. Teoria e Prática da Comunicação Sindical. Como Fazer Análise de Conjuntura. Concepção, Estrutura e Organização Sindical. Negociação Coletiva e Orçamento Público na Área de Educação. Planejamento Estratégico Situacional. Gestão Sindical: Planejamento Estratégico e Ação Sindical. Sistema Democrático de Relações do Trabalho.

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foto: divulgação SME

Page 60: Revista SME Gyn 2012

vista de que é necessário renovar o quadro de dirigentes para fortalecer a luta.

Trabalhar a formação é fundamental. A meta é preparar os eventos de forma a

garantir que o tema trabalhado nos fascículos seja alcançado por todos. Assim,

poderemos ter uma melhor contribuição do próprio dirigente na intervenção na

sociedade, no sindicato, nas assembleias, nas reuniões de diretoria, e assim por

diante”.

Como resultado da 1ª fase, foi publicado um relatório com a temática

"Elementos para uma avaliação do Programa de Formação da CNTE: um novo

conceito de atuação sindical?", de autoria do professor Zacarias Gama, do

Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas e Formação Humana (PPFH),

da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). O relatório abrange a

realização do primeiro Programa de Formação da CNTE, efetivado com diversas

entidades filiadas, inclusive o Sintego, no período de 2007-2010, e foi construído

a partir de uma coleta de dados, em março de 2011, em todas as afiliadas.

Em 2011 demos passos importantes. Criamos o Coletivo Estadual de

Formação (Colefor), uma Coordenação Estadual de Formação (Coordefor) e

Coordenações Regionais de Formação (CRF). Iniciamos um Plano de Formação

Permanente, estabelecendo o Dia Estadual de Formação, no último sábado de

cada mês, em Goiânia e em todas as regionais sindicais. Junto a isso, foi preciso

um Curso de Formação de Formadores, específico para o coletivo.

A perspectiva, no entanto, é muito propícia à retomada e recuperação do

Projeto que revê e avança na Política de Formação do Sintego. Necessário

considerar que não basta fazer a formação, mas criar e consolidar a estrutura

formativa.

Em uma demanda gigantesca de pessoas, de movimentos e desafios, como

é a do nosso sindicato, não dá para pensarmos política de formação e nem outra

política se não o fizermos em grandes proporções, se não estivermos dispostos a

17. http://www.cnte.org.br/images/pdf/elementos_avaliacao_programa_formacao_cnte.pdf Elementos para uma avaliação do Programa de Formação da CNTE: Um novo conceito de atuação sindical?

18. http://www.cnte.org.br/index.php/secretarias/formacao/8786-educadores-as-participam-de-reuniao-do-coletivo-de-formacao

19. Relatórios de Atividades Sindicais – SINTEGO – 1ª. Reunião do Coletivo Estadual de Formação, março/2011.

20. Relatórios de Atividades Sindicais – SINTEGO – Seminário de Gestão Sindical – Relatório da Oficina de Formação – julho/2011.

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Page 61: Revista SME Gyn 2012

21. Relatório do 1º. Encontro Estadual de Formação(EEFOR) da CUT-GO, março/2012.

22. Relatório do Encontro da Política Nacional de Formação (ENAFOR) da CUT, novembro/2011.

ousar megaprojetos de organização e formação político-sindical, como resposta

estratégica do sindicalismo combativo e consequente da classe trabalhadora.

A formação político-sindical sempre foi vista como um dos eixos

prioritários para os sindicatos pertencentes ao Novo Sindicalismo, no qual se

inscreve o Sintego, entendida como instrumento fundamental da política

estratégica sindical cutista. Num mundo cada vez mais complexo, no embate

classista, exigem-se lideranças e dirigentes sindicais sempre mais e melhor

preparados. E isto não acontece espontânea e imediatísticamente. É preciso criar

espaços específicos para pensar e refletir a prática, a ação sindical e a vida em

todos os seus aspectos, já que os trabalhadores não são seres desligados dos

outros, mas, tanto quanto, sofrem as influências do mundo em que vivem e o

influenciam, por sua vez. Não seremos felizes direito se não ousarmos dar conta

do grande desafio de teorizar (pensar) profundamente a nossa prática e não menos

intensamente praticar a teoria. Eis o grande desafio.

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Page 62: Revista SME Gyn 2012

Uma breve história da SME de Goiânia

Arlene Carvalho de Assis Clímaco

Walderês Nunes Loureiro

Resumo

O presente artigo abrange o nascimento da Secretaria Municipal de

Educação de Goiânia (SME), em 1961, até o início dos anos 2000. A SME viveu

momentos de relações marcadamente clientelistas e de buscas de democratização,

como na eleição de diretores e na participação dos diferentes segmentos

(professores, funcionários, alunos e pais) nas decisões administrativas e

pedagógicas da escola e de suas relações com as escolas. O artigo mostra que a

SME buscou engajar-se nos movimentos da educação nacional, na busca da

democratização e na preocupação com a aprendizagem dos alunos.

Palavra-chave: Secretaria Municipal de Educação de Goiânia. Clientelismo.

Democratização. Aprendizagem do aluno.

Analistas políticos em Goiás comumente fazem referência às nossas

heranças coronelísticas, que se manifestam sob várias formas, entre as quais o

nepotismo, o empreguismo para correligionários e variadas formas de

apadrinhamento, tal como “naturalmente” é defendido por grande parte de

políticos, administradores públicos e população. Tais analistas reafirmam,

também, que um estado republicano deve pautar sua conduta por normas

impessoais, claramente definidas, às quais todos devem submeter-se igualmente.

Partindo dessa perspectiva, nossas reflexões acerca da caminhada

histórica da educação municipal em Goiânia vão na seguinte direção: que

1

2

1. Doutora em Sociologia; profª. aposentada da Faculdade de Educação da UFG; integrante do Grupo Diretivo da SME na gestão 2001-2004.

2. Doutora em educação, profª aposentada da faculdade de educação da UFG; Secretária municipal de educação de Goiânia na gestão 2001-2004.

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mecanismos têm sido adotados no sentido de fazer com que a educação seja

acessível a todos, tal como prescreve a lei maior? De que forma têm sido definidos

tais mecanismos? Quais os agentes envolvidos na construção do projeto

educacional do município? A educação municipal tem sido pensada para a

população ou com a população à qual se destina? Tentar entender tais questões

supõe referirmo-nos a tradições político-culturais que tanto têm marcado nossa

história.

E a história de Goiás não pode ser separada do movimento denominado

revolução de 1930, uma vez que Goiânia é sua filha emblemática.

Com a revolução de 1930, ocorre a perda de hegemonia da facção

dirigente de Goiás, à época, os Caiados, e a facção que assume o poder, sob

liderança do médico Pedro Ludovico Teixeira, está sintonizada com o novo poder

de Getúlio Vargas, em nível nacional e, em Goiás, com o capital que se expandia

nas regiões Sul e Sudoeste do Estado.

O governo que se estabelecia em Goiás em 1930 apresentava um discurso

moderno de superação do retrógrado e do estabelecimento de uma nova

administração sem as velhas práticas do passado. Segundo o discurso do novo

governo, a administração do Estado deveria ser planejada e científica. A criação

de Goiânia era proposta como a concretização do progresso de Goiás. Além disso,

Goiânia possibilitava maior aproximação com as regiões Sul e Sudoeste, de

expansão do capital agrícola.

Apesar do discurso inovador, Pedro Ludovico não modernizou sua prática

política em relação a seus antecessores. No campo específico da educação, não

houve mudanças significativas em relação aos Caiados, pelo menos até 1937,

quando, a partir de então, os recursos para a educação foram reduzidos, porque a

construção da nova capital tornou-se, para Pedro Ludovico, sua principal meta de

governo.

A política de industrialização de Vargas necessitava de apoio dos estados

periféricos, produtores de matéria prima e de alimentos para abastecer as regiões

do Centro-Sul. Os interesses dos industriais do Centro-Sul, das classes

dominantes goianas e dos governos federal e estadual se uniram e se integraram à

3. Sobre a Revolução de 1930 em Goiás, ver Silva, 2001.

4. Sobre a educação em Goiás no período 1930-1945, ver Nepomuceno, 1994.

3

4

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Marcha para o Oeste e à política econômica de Vargas.

Um dos temas educacionais que se destacou no Estado Novo foi o ensino

rural, que passou a ser defendido como um remédio para curar o êxodo rural.

Apesar da integração de Goiás com o governo Vargas, o governo goiano não

investiu no ensino agrícola e esse foi implantado no estado, nesse período, pela

iniciativa privada. (Loureiro, 2011).

O nascimento da Secretaria Municipal de Educação de Goiânia

Com a construção de Goiânia e a Marcha para o Oeste, intensificou-se a

migração para Goiás. Na década de 1950, o início da construção de Brasília e da

rodovia Belém-Brasília intensificaram a migração e o desenvolvimento, criando a

necessidade de mais escolas, não só de ensino primário como de ginásios.

Durante a década de 1950, houve, em Goiás, crescimento da educação em

todos os níveis, mas o ginásio (6ª a 9ª séries do atual ensino fundamental) teve um

crescimento maior, com estímulo à privatização por meio de subvenções e

convênios. (Loureiro, 2011)

foto: divulgação SME

Page 65: Revista SME Gyn 2012

Com a ampliação do número de alunos e escolas, houve a necessidade de

se criar um órgão para coordenar as atividades educacionais na prefeitura. Isso

ocorreu em 1959, com a criação do Departamento de Educação e Cultura do

município. Em 1961, a separação política entre as administrações dos governos do

estado e do município, que até então vinham sendo do mesmo partido, levou à

instituição da Secretaria Municipal de Educação (SME). (Clímaco, 1991).

Mesmo com a criação da Secretaria Municipal de Educação, a lotação do

pessoal nas escolas obedecia ao critério clientelista. No período de 1961 a 1973,

houve apenas um concurso, em 1969; mesmo assim, houve resistência. A

realização de concurso público na SME só voltou a ocorrer a partir de 1985. “Até

1955 cabia ao prefeito a contratação dos professores. A partir de 1955, as

contratações eram feitas por prefeitos e vereadores, sendo comum a contratação

de normalistas ou leigos, não concursados e cujo contrato tinha caráter

permanente dependendo do poder do vereador” (Bittar, 1993 p. 66). A cidade

estava dividida em regiões e cada região era área de domínio de um vereador. Com

a inexistência de concurso, a indicação de diretores e de professores com contratos

especiais era feita pelos vereadores.

No intuito de proceder a uma 'administração racional' da educação

municipal, em conformidade com as orientações que emanavam do MEC, à época

dos governos militares, os sucessivos secretários de educação se valeram da

promulgação de regimentos internos, “que oficializam as alterações procedidas

em sua estrutura e que foram aprovadas pelos decretos [...] 132/1970; 636/1972;

207/1973; 752/1977’’ (Jesus, 2004, p. 98). A despeito da suposta racionalidade

desses regimentos, a SME e suas unidades tinham seu cotidiano delineado pela

força cada vez maior dos vereadores que decidiam, em consonância com critérios

próprios, não considerando a qualificação de candidatos e as necessidades de

pessoal da SME. O importante era consolidar seu poder sobre sua área, sem

preocupação com o encaminhamento das questões pedagógicas. (Dourado,

1990).

Na perspectiva pedagógico-educacional, tais regimentos indicavam uma

clara “hierarquização e, consequentemente, diferenciação entre as funções de

comando e execução...” (Jesus, 2004, p. 106). Tal espírito prevaleceu até o início

dos anos 1980, quando, já no bojo do processo de redemocratização,

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restabelecem-se as eleições para governadores, o que vai refletir-se na nomeação

de prefeitos e respectivos secretários.

A redemocratização nacional e a SME

Com o movimento de redemocratização nacional, com as discussões na

área da educação, especialmente da escola pública, e com a mobilização da

categoria dos professores tanto no plano nacional como em Goiânia, algumas

alterações se processaram, no âmbito da SME, a partir da década de 1980.

Foi implantado o Conselho do Magistério Público Municipal com

representação de professores, da administração da SME, da Câmara Municipal e

do Gabinete do Prefeito. Esse Conselho se incumbiu de elaborar o primeiro

Estatuto do Magistério Público Municipal de Goiânia, que vigorou de 1983 até

1988, quando foi reformulado. A aprovação, em 1983, do Estatuto do Magistério

Público Municipal de Goiânia, antiga reivindicação dos professores, contemplava

vários pontos defendidos pela categoria, como a valorização do magistério,

carreira do magistério, concurso público, escolha do dirigente escolar através de

eleição direta, licença para aprimoramento profissional, estruturação do conselho

de magistério e implementação dos grêmios estudantis nas escolas (Silva, 2000).

Até meados da década de 1980, a escolha dos dirigentes escolares era feita

pelos poderes públicos. Na gestão da professora Dalísia Dolles, da Universidade

Federal de Goiás (UFG), foi modificada essa forma de escolha e a indicação dos

diretores passou a ser por lista tríplice e concurso. Era realizada em três etapas: a)

indicação por lista tríplice pela comunidade escolar (professores, alunos e

funcionários); b) avaliação dos currículos dos candidatos encaminhados pela lista

tríplice, com ênfase na titulação e na experiência; c) prova escrita, cujo objetivo

básico era avaliar a competência técnica do candidato ao cargo.

Mesmo com a escolha do dirigente por etapas, sem eleição direta com a

participação de toda a comunidade escolar, em cinco escolas municipais o

resultado não foi respeitado, tendo prevalecido o critério de escolha anterior, o

clientelismo. Além disso, foi elevado o índice de renovação de mandatos de

antigos diretores (75%). (Dourado, 1990)

Foi extinta a Comissão da Educação Moral e Cívica, instituída no período

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ditatorial, cujas referências apareceram já no Regimento Interno de 1972,

provavelmente em atenção à recém-aprovada Lei 5692/71, que introduziu a

reforma do ensino hoje referente à educação básica.

Foram redirecionadas as atividades do Núcleo de Orientação e

Supervisão: o Núcleo, que até 1982 congregava somente os técnicos em educação

ou especialistas em orientação e supervisão, assumiu caráter mais amplo,

incorporando profissionais licenciados em várias áreas do conhecimento, revendo

sua atuação, reorientando-a para constituir o Setor de Ensino, até então pouco

expressivo na SME. Essas posições eram respaldadas por discussões nacionais e,

em Goiás, tanto a UFG como a então Universidade Católica de Goiás (UCG)

participaram do movimento em prol da reformulação dos cursos de formação do

educador.

Houve nessa mesma gestão a criação do cargo de coordenador pedagógico

nas escolas e os especialistas passaram a ser os coordenadores pedagógicos. A

transformação dos especialistas em coordenadores pedagógicos não foi bem

aceita por esses profissionais, que estavam agrupados no Núcleo de Orientação e

Supervisão; sentiam que perdiam privilégios, conquistados ao longo dos anos, e

que seria um nivelamento com os professores. Além da reação dos pedagogos na

SME e nas escolas, havia ainda a reação das entidades - associações dos

supervisores e dos orientadores (Bittar, 1993).

Foi criado o Setor de Apoio Estudantil, cujo objetivo básico era o de

estimular a criação das associações de pais e dos grêmios estudantis.

“Houve uma forte resistência dos técnicos (supervisores e orientadores) e de parcela dos diretores e professores ao trabalho proposto pelo Setor de Apoio Estudantil. Não admitiam a existência de grêmios e associação dos pais, temendo uma ingerência dos mesmos no cotidiano escolar. A maior parte dos grêmios e associações, apesar da existência legal e regimental, não se concretizaram na escola.” (Bittar, 1993, p.72)

A partir de 1986, assumiu o mandato o primeiro prefeito eleito de Goiânia

após o golpe militar, Daniel Antônio, do PMDB. O prefeito assumiu em clima

5. À época, o curso de Pedagogia da UFG formava profissionais em diferentes especialidades: Ensino das Disciplinas e Atividades dos Cursos Normais, Administração Escolar, Orientação Educacional e Supervisão Escolar (Silva, 1998).

5

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conturbado pelas denúncias de fraude na apuração dos votos e na eleição. Além

dessas denúncias, houve outras, de “ingerência e favorecimento político, de

corrupção, de clientelismo e empreguismo” (Bittar, 1993, p. 75). Frente aos fortes

indícios de que as denúncias poderiam se confirmar, ainda em 1986, foi decretada

intervenção estadual no município de Goiânia, em virtude da qual foi nomeado,

em 1987, o novo prefeito, Joaquim Roriz.

Antes da intervenção ser decretada, a secretária de Educação, Dalísia

Doles, e toda a sua equipe colocaram os cargos à disposição. Decretada a

intervenção, assume a SME, Maria de Fátima Avelino. Daniel Antônio consegue

reassumir nos últimos dois meses de 1988 e concluir o mandato. Seu sucessor foi

Nion Albernaz (1989-1992), então no PMDB, cuja secretária de Educação foi

Linda Monteiro.

Machado (1977), referindo-se ao Relatório Geral de Atividades (1989 a

1992) dessa administração, afirma que ele “é uma reedição das metas

preconizadas por Dalísia Dolles” (p. 66) e que, embora a administração se

apresente “como democrática e modernizante, ranços dos equívocos presentes

nas gestões anteriores ainda permanecem...” (p. 68).

O nascimento das unidades regionais

A eleição municipal de 1992 elegeu um prefeito do Partido dos

Trabalhadores (PT), que já vinha acumulando discussões e experiências sobre as

questões educacionais (Damasceno, 1988). Na SME, pode-se perceber a

repercussão da crise política pela qual passou a administração de Goiânia no

período, por meio das sucessivas equipes que a dirigiram. Os dois primeiros anos

de administração da SME (1993-1994), sob a coordenação da secretária Mindé

Badauy de Menezes, orientaram-se por quatro prioridades: a qualidade do ensino,

a democratização do acesso e da permanência do aluno na escola, a

democratização da gestão da escola e a valorização do professor.

Essa gestão caracterizou-se pela tentativa de superação das relações

autoritárias entre a SME e as escolas. O processo inicial revela uma opção por uma

descentralização real em todos os níveis de atuação da SME, buscando articulação

entre as esferas do pedagógico e do administrativo. Para estudos e elaboração de

Page 69: Revista SME Gyn 2012

um anteprojeto que orientaria as discussões nas unidades escolares e em

seminários regionais, foi nomeada uma comissão, com a participação de duas

professoras da Faculdade de Educação da UFG, que apresentaram um anteprojeto

de extensão para a criação de núcleos regionais, hoje unidades regionais. As

escolas foram agrupadas em cinco núcleos, agrupamento que teve como critério

sua localização, tendo sido uma das escolas, a de acesso mais fácil na região,

escolhida como sede. A criação dos núcleos tinha como objetivo constituir um elo

entre as escolas e a SME para aproximação entre essas duas instâncias e, dessa

forma, possibilitar relações mais democráticas e eficazes no âmbito da educação

municipal.

A partir de 1998, sob administração municipal do PSDB, os núcleos

regionais tornaram-se unidades regionais de ensino (URE), como parte do Projeto

de Modernização Administrativa, quando seu número foi reduzido a quatro,

redução que teve como meta dar maior racionalidade e proximidade à vinculação

entre escola e Unidade Regional, facilitando o processo de acompanhamento às

escolas.

Terceiro mandato de Nion Albernaz

Nion Albernaz, eleito pelo PSDB, assumiu em 1997 o executivo de

Goiânia para um terceiro mandato. A direção da SME ficou a cargo de Jônathas

Silva, professor do Curso de Direito da UFG e Secretário Estadual de Educação na

gestão do governador Henrique Santillo (1987-1990). O Plano de Ação da SME

(1998-2000) ressalta a evasão e retenção como problemas graves. O Plano

defende a educação de qualidade, a democratização do acesso e a permanência,

bem como a gestão democrática, sendo a democratização preconizada somente

para a escola. A valorização e capacitação do professor aparecem como uma

grande meta nesse Plano. Os objetivos do Plano de Ação da SME buscavam ser

alcançados com a implantação do programa Escola Para o Século XXI,

responsável pela introdução dos ciclos em parte das escolas da rede municipal de

educação de Goiânia.

6. Tipo de atividade prevista no regimento das universidades que se pautam por atividades de ensino, pesquisa e extensão.

6

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No que se refere à contratação de professores, deve-se destacar que, sob a

influência das discussões da nova LDB de 1996 e da Constituição de 1988, os

concursos de 1998 e 1999 da SME já não incluíram a categoria PI, ou seja,

professor formado em nível médio (curso normal).

Uma segunda gestão petista

Em 2001, assume a administração da cidade uma nova gestão petista,

agora já desfrutando da aprovação de novos instrumentos legais relativos à

criança (ECA, Lei 8.069/90) e à educação (LDB, Lei 9394/96) e PNE (Lei

10.172/2001).

A essa altura, a nova administração que assume dispõe, também, de um

vasto arsenal de estudos sobre a educação no país, de experiências que se

multiplicavam em diferentes municípios e estados, em que blocos democrático-

populares vinham assumindo o poder, além da experiência de implantação da

organização dos ciclos na SME, ainda que de forma restrita até aquela data.

A conjuntura do momento resultou na convergência de alguns pontos

importantes, tais como: orientações do prefeito eleito para evitar planos

mirabolantes; experiência com políticas públicas educacionais por parte de

alguns professores universitários, que passaram a integrar a equipe; dedicação e

experiência com o dia a dia escolar do restante da equipe, formada

majoritariamente por professores da casa, a maioria deles, à época, lotados em

escolas.

Tais circunstâncias, aliadas aos propósitos da equipe de contribuir para

uma gestão de caráter democrático, expressaram grandes possibilidades de se

encurtar a distância, que até então parecia intransponível, entre o corpo

administrativo da SME e a escola, onde ocorre a relação professor-aluno,

finalidade última de qualquer sistema de ensino.

A tarefa, por princípio interminável, já que o atendimento às demandas

democráticas, sempre desdobram-se em novas demandas, exigiu muito esforço,

paciência, dedicação e, mesmo, confrontos. Esforço, paciência, dedicação e

capacidade de diálogo foram exigidos em todos os momentos, desde o início de

janeiro de 2001, quando da semana de planejamento, em que começou a ser

Page 71: Revista SME Gyn 2012

definida uma estratégia de diálogo com a comunidade escolar acerca do que então

aparecia como mais urgente: reorganização do Centro de Formação dos

Profissionais da Educação (Cefpe); superação de diferentes formas de

organização do ensino fundamental; conclusão de uma proposta para a educação

infantil; construção de instrumentos legais para a autonomia financeira da SME e

das unidades educacionais e de mecanismos de democratização das relações entre

o gabinete da Secretária, os departamentos e suas divisões, as unidades regionais,

cujos titulares passaram a integrar o Grupo Diretivo, bem como entre este e as

unidades educacionais.

Todo o esforço despendido no trabalho dessa equipe, sob a forma de

debates, seminários e estudos junto aos professores, foi-se concretizando em

documentos contendo os princípios da gestão (2002), orientações para a educação

infantil (2004), para o ensino da infância e da adolescência (2004); para EJA

(2004), entre outros, e que foram distribuídos para todos os professores dos

respectivos níveis e/ou modalidades de ensino.

No caso da questão financeira, foram providenciados projetos de lei que,

aprovados, deram origem ao Fundo Municipal de Manutenção e

Desenvolvimento do Ensino (FMMDE), Lei nº 8.075/2001 e ao Programa de

Autonomia Financeira das Instituições Educacionais (Pafie), Lei nº 8.183/2003.

Referências

BITTAR, Mona. A proposta pedagógica da Secretaria Municipal de Educação de Goiânia -

1983/1996: caminhos e descaminhos. 1993. 116 p. Dissertação (Mestrado em Educação) -

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo. 1993.

CLIMACO, Arlene Carvalho de Assis. Clientelismo e cidadania na construção de uma rede

pública de ensino: a Secretaria Municipal de Educação de Goiânia (1961-1973). Goiânia: Editora

da UFG, 1991.

DAMASCENO, Alberto et al. A educação como ato político partidário. São Paulo: Cortez, 1988.

7. Constituído pela Secretária de Educação, Chefia de Gabinete, diretores de todos os departamentos que integram a SME, diretores das três divisões que passaram a compor o Departamento Pedagógico - Educação Fundamental, Educação Infantil, Educação de Jovens e Adultos, as chefias das cinco unidades regionais, além da Assessoria Especial. Esse grupo diretivo totalizava 19 pessoas, que dirigiam a SME. Do total, quatro eram professores universitários e não faziam parte da educação básica pública de Goiânia e 14 procediam da educação municipal pública. Essa composição da direção garantia conhecimento, legitimidade e valorização dos trabalhadores da SME, possibilitando uma aceitação inicial desses dirigentes.

7

Page 72: Revista SME Gyn 2012

DOURADO, Luiz Fernandes. Democratização da escola: eleição de diretores, um caminho?

1990. 176 p. 1990. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal de Goiás.

Goiânia, 1990.

JESUS, Janaína Cristina de. Autoritarismo e democratização (re)configurando os espaços de

poder da burocracia estatal: a trajetória da Secretaria Municipal de Educação de Goiânia. 2004.

190 p. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2004.

LOUREIRO, Walderês Nunes. Qualidade da educação e privatização de recurso público.

Goiânia: Editora da UFG, 2011.

MACHADO, Maria Margarida. Política Educacional para Jovens e Adultos: A experiência do

Projeto AJA (93/96) na Secretaria Municipal da Educação de Goiânia. 1997. 160 p. Dissertação

(Mestrado em Educação) - Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 1997.

NEPOMUCENO, Maria Araújo. A ilusão pedagógica. 1930-1945: Estado, sociedade e educação

em Goiás. Goiânia: Editora da UFG, 1994.

SILVA, Ana Lúcia. A Revolução de 30 em Goiás. Goiânia: Cânone Editorial; Agepel, 2001.

SILVA, Andréia Ferreira. Reformulação da formação de professores na UFG: concepções,

propostas e campos científicos em disputa - 1978-1984. 1998. 178 p. Dissertação (Mestrado em

Educação) - Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 1998.

SILVA, Marta Jane da. Aceleração da aprendizagem: uma análise do subprojeto da Secretaria

Municipal de Educação de Goiânia. 2000. 166 p. Dissertação (Mestrado em Educação) -

Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2000.

Page 73: Revista SME Gyn 2012

Um olhar sobre a trajetória do Conselho Municipal de Educação de Goiânia

Acácia Aparecida Bringel

Resumo

Este artigo apresenta um breve histórico da origem dos conselhos de

educação no Brasil, com enfoque nas mudanças de sua natureza e funções, a partir

do princípio da gestão democrática, segundo os marcos regulatórios da

Constituição Federal de 1988, delineando aspectos da trajetória do Conselho

Municipal de Educação (CME) de Goiânia.

Palavras-chave: Sistemas de ensino. Conselhos municipais de educação. Gestão

democrática da educação.

Introdução

Com a promulgação da Constituição Federal (CF) de 1988, denominada

de “Constituição Cidadã”, apresentou-se, a partir do princípio da gestão

democrática nela estabelecido, a possibilidade de abertura de espaço para a

participação social, para “pensar o diferente” e para o exercício da autonomia no

processo educativo (GRACINDO, 2009).

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), Lei nº

9.394/96, reitera tal princípio e determina alguns parâmetros para a gestão

democrática do ensino público, entre os quais: a liberdade dos sistemas para se

organizarem nos termos dessa lei; a participação dos profissionais da educação na

elaboração do projeto pedagógico da escola; e a participação da comunidade

escolar, por meio dos conselhos escolares ou equivalentes.

1

1. Cientista Social, Mestre em Educação Brasileira/UFG e Assessora Técnica do CME/ Goiânia.

Page 74: Revista SME Gyn 2012

Foi a partir desses marcos legais que se apresentaram espaços de

tensionamento nas relações de poder, decorrentes do embate de forças político-

ideológicas, com visões distintas de sociedade e Estado, sobretudo, no que se

refere ao papel do Estado em sua responsabilidade de ofertar a educação escolar.

Tal condição colocou aos sistemas de ensino, por conseguinte aos conselhos de

educação, a exigência de uma nova prática na gestão da educação.

Para Bordignon (2009), a Constituição de 1988 marca importantes

mudanças no percurso dos conselhos de educação. Essas mudanças se referem à

natureza e funções desses órgãos no âmbito dos sistemas de ensino. Segundo o

autor, “os movimentos pela democratização da gestão requerem, hoje, dos

conselhos, nova posição: de responder às aspirações da sociedade e em nome dela

exercer suas funções” (idem, p. 61).

A discussão sobre a gestão da educação tem sido objeto de vários estudos e

pesquisas no Brasil e em outros países. De acordo com Dourado (2007, p.1),

“trata-se de temática com várias perspectivas, concepções e cenários complexos

em disputa”, o que implica vários recortes possíveis de análise sobre a gestão da

educação. Esse autor enfatiza ainda que, ao se analisar a temática, coloca-se como

uma perspectiva importante “não reduzir a análise das políticas e da gestão

educacional à mera descrição dos seus processos de concepção e/ou de execução,

importando, sobremaneira, apreendê-las no âmbito das relações sociais em que se

forjam as condições para sua proposição e materialidade” (idem).

De acordo com Souza (2009, p.91), as pesquisas no campo da gestão

educacional e escolar evidenciam “o papel político que a gestão educacional

carrega intrinsecamente, por meio do qual a política educacional opera”.

Acrescenta ainda que,

Decorrendo desta constatação, as pesquisas do campo têm apostado em temáticas como a gestão democrática e o papel dos dirigentes escolares, assim como sobre a efetividade dos organismos colegiados na gestão escolar e educacional e suas potencialidades de incremento da participação e da autonomia institucional.

Este artigo está estruturado em dois tópicos. No primeiro, apresenta-se um

breve histórico da origem dos conselhos de educação no Brasil, com destaque para

o período após a promulgação da Constituição Federal de 1988 e demais leis

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que dela demandaram, no que tange à educação nacional, como marcos

regulatórios importantes para que se compreenda a natureza e as funções dos

conselhos de educação no momento atual.

No segundo tópico, pretende-se apresentar aspectos da trajetória do

Conselho Municipal de Educação (CME) de Goiânia, no período de 1997 a 2010,

buscando apreendê-los no contexto mais amplo em que se assenta a constituição

do órgão.

Conselhos de educação no Brasil

Os primeiros conselhos de educação no Brasil datam do Império. Em

1842, na Província da Bahia, criou-se o primeiro conselho de educação oficial do

Reino, denominado Concelho de Instrução Pública. Em 1854, no Rio de Janeiro,

criou-se o Conselho Director do Ensino Primário e Secundário do Município da

Corte. Estes dois conselhos ̶ o primeiro, provincial, o segundo, municipal ̶

assentavam-se em uma organização escolar marcadamente excludente, com o

ensino secundário “nas mãos da iniciativa privada e o ensino primário relegado ao

abandono, com pouquíssimas escolas, sobrevivendo à custa do sacrifício de

alguns mestres-escola, que, destituídos de habilitação para o exercício de

qualquer profissão rendosa, se viam na contingência de ensinar” (ROMANELLI

apud BRINGEL, 2002, p.42).

Com a maioria dos colégios secundários nas mãos de particulares, apenas

as famílias de altas posses podiam arcar com o pagamento da educação de seus

filhos. O Estado priorizava a oferta de ensino superior, pois o interesse da

monarquia vinculava-se à necessidade que o Reino tinha de preencher o quadro

geral da administração e da política.

O desgaste do regime imperial resultou de vários fatores, destacando-se o

fim da escravidão, o fim do regime do padroado, o avanço do movimento

republicano e o conflito com o exército devido à supremacia do poder civil.

Em meio às grandes transformações socioeconômicas do período,

diferentes posições políticas foram tomadas pelas elites imperiais. Essas políticas

acabaram por favorecer o enfraquecimento da monarquia.

Com a Proclamação da República, em 1889, e a promulgação da

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Constituição de 1891, o federalismo tornou-se a principal orientação do novo

regime político brasileiro. Segundo Dourado (2001, p. 284),

após a proclamação da República em 1889, no bojo da Constituição de 1891, é afirmado o princípio da laicidade, indicando a progressiva separação entre Estado stricto sensu e a Igreja. A educação, nesse contexto, apesar de ser debatida, é ainda vista como demanda individual, não se constituindo em direito social.

Entre 1889 e 1934, várias reformas foram efetivadas na educação do país.

De acordo com o Manifesto dos Pioneiros, os planos e as reformas educacionais

empreendidos, desde Benjamin Constant, eram parciais e arbitrários, resultando

em uma organização do ensino fragmentada e caótica. De acordo com Bordignon

(2009, p. 30), “o Manifesto advogava que a política educacional devia buscar a

coerência interna e unidade na multiplicidade. Nele não era proposta,

explicitamente, a organização dos atuais sistemas de ensino, mas todo o seu teor

continha essa concepção”.

Segundo Dourado (2001), no período, é marcante o embate entre os

defensores da educação pública - que se dava a favor de uma escola laica e pública,

e cujos partidários eram os publicistas - e os defensores da educação confessional,

do ensino religioso e da função supletiva do Estado no campo educacional, que

objetivavam uma estrutura educacional marcada pela interligação entre as esferas

pública e privada, em consonância com os princípios patrimoniais da sociedade e

do Estado.

No período em destaque, foram criados o Conselho Superior de Ensino

(1911), com atribuições e composição restritas ao ensino superior; o Conselho

Nacional de Ensino (1925), que transmudou o Conselho Superior de Ensino, a

partir da ampliação de sua composição e atribuições, para assim abranger todos os

níveis de ensino. Foi criado o primeiro Conselho Nacional de Educação (CNE),

em 1931, como órgão consultivo do Ministro de Educação e Saúde Pública para os

assuntos relativos ao ensino. Em 1936, criou-se o segundo CNE, que,

diferentemente dos outros, atendia a dispositivo constitucional. A esse respeito

Cury (2006, p. 46) enfatiza que

a Constituição Federal de 1932, em seu § único do art. 152, constitucionalizava o Conselho Nacional de Educação. Tratava-se da

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elevação à dignidade constitucional de um Conselho, diferentemente dos outros similares existentes, desde a Velha República, comumente criados por Leis ordinárias ou mesmo decretos.

À medida que o Estado Novo se deteriorava por força da luta interna, dos

reflexos da guerra no país e da divisão do exército, a destituição de Vargas

tornava-se inevitável. Dutra (1945-50), eleito pelo voto popular, desde o

momento em que assumiu a Presidência, empenhou-se em cumprir a promessa de

elaborar uma nova Constituição, recolocando o país rumo à democratização.

Partidos políticos, sindicatos, imprensa e universidade passaram, desde então, a

vivenciar um momento de ampla liberdade de expressão, consagrado pela

Constituição de 1946.

A organização educacional construída pelo Estado Novo permaneceu,

revogando-se apenas os aspectos visivelmente autoritários da legislação. Para

Dourado (2001, p.286), “o fato novo reside na inclusão, intrínseca à Constituição

de 1946 - caracterizada pelo espírito liberal e democrático - da previsão de a União

legislar sobre as diretrizes e bases da educação nacional”.

Direitos de expressão, direitos individuais são formalmente resguardados,

intensificando as mudanças no campo educacional, associados evidentemente às

políticas populistas, ao discurso do desenvolvimentismo e da modernização.

Com a crise de poder, nos primeiros anos da década de 60, propiciou-se o

rompimento de uma situação histórico-política, cujo desfecho foi o golpe militar.

Para Dourado (2001, p.287), “o sistema de poder instaurado após 1964 sofre

várias transfigurações {mutabilidade}, visando perpetuar-se {durabilidade}”. A

mutabilidade e durabilidade caracterizaram-se por períodos de agudo

autoritarismo, bem como por períodos de normalidade republicana, visto que “a

coalizão de forças vitoriosas não era apenas heterogênea, era contraditória,

agregando interesses divergentes sob a crença do consenso entre as partes”.

No âmbito das políticas educacionais empreendidas pelos governos

militares, ficava evidente a privatização do público, mediante alterações

significativas no processo de expansão do ensino.

É nesse contexto que é promulgada a Lei n° 4.024/61. Acerca da trajetória

dos conselhos, Cury (2006, p. 46) enfatiza que “a Lei n. 4.024/61, fruto da

Constituição de 1946, substituiu o “velho” CNE pelo Conselho Federal de

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Educação (CFE)”. A lei ainda dispunha sobre “a existência de órgãos normativos

estaduais sob o nome de Conselhos Estaduais da Educação” (idem).

A esse respeito, Bordignon (2009, p.56) esclarece:

Os conselhos estaduais de educação e o do Distrito Federal, embora já previstos na Constituição de 1934, dispositivo mantido na Constituição de 1946, somente foram efetivamente criados e passaram a funcionar a partir da aprovação da primeira LDB (Lei nº 4.024/61). Entre 1962 e 1965 todos os estados criaram seus conselhos de educação. Antes, além da Bahia, haviam criado conselhos de educação, no início do século 20, Acre e Alagoas e, em 1946, o Rio Grande do Sul.

No que se refere aos conselhos municipais, alguns municípios na Bahia,

em Pernambuco, no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul, em períodos distintos,

protagonizaram a criação de conselhos municipais; contudo, eles eram limitados

em sua competência e atuação.

Com o crescente repúdio ao regime militar, devido ao esgotamento do

“milagre econômico” e, consequente, à crise nos anos 80, desencadeou-se um

grande movimento de insatisfação popular. Eclodiram grandes greves entre os

trabalhadores mais organizados, como os metalúrgicos e operários da indústria

automobilística, fazendo surgir novas lideranças sindicais, organização de novos

partidos políticos e o movimento das “Diretas Já!”.

Desse modo, numa complicada manobra política, os conservadores

(inclusive participantes do regime militar) aliaram-se à oposição e, juntos,

encerraram um capítulo da história do país. A redemocratização manteve a

tradição política brasileira e instalou uma nova ordem política, sem que fossem

destronadas as elites da véspera. Assim, os setores políticos que ascenderam não

impulsionaram e nem promoveram mudanças profundas na estrutura política do

país.

Nesse contexto, é promulgada a Constituição Federal (CF) de 1988, que

traz a descentralização e a gestão democrática como princípios para a educação.

Para Cury (2005, p. 16 ),

A Constituição faz uma escolha por um regime normativo e político, plural e descentralizado, no qual se cruzam novos mecanismos de participação social com um modelo institucional cooperativo, que

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amplia o número de sujeitos políticos capazes de tomar decisões. Por isso mesmo, a cooperação exige entendimento mútuo entre os entes federativos e a participação supõe a abertura de novas arenas públicas de deliberação e mesmo de decisão.

Para esse autor, a insistência na cooperação, na divisão de atribuições

entre os entes federados e a assinalação de objetivos comuns, como normas

nacionais gerais, apontam que, nesta Constituição, “a acepção de sistema se dá

como sistema federativo por colaboração, tanto quanto de Estado Democrático de

Direito” (idem).

Pode-se afirmar que a gestão democrática da educação é princípio

constituinte dos conselhos de educação. Pode-se também afirmar que "um

Conselho de Educação é, antes de tudo, um órgão público voltado para garantir, na

sua especificidade, um direito constitucional da cidadania". Ou seja, os conselhos

de educação são espaços colegiados de mediação, situados na estrutura da

administração pública, "concorrendo dentro da pluralidade própria do Conselho,

para a formação de uma vontade majoritária ou consensual" (CURY 2006, p.42).

Para Bordignon (2009), após 1988, os conselhos de educação são

concebidos como órgãos de representatividade social e deliberação plural,

constituídos como espaços privilegiados para estabelecer o contraponto da

deliberação singular do Executivo, ou seja, encerram espaços de articulação e

interlocução entre sociedade civil e governo.

É na Lei nº 9.394/96, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

(LDBEN), em seu art. 8º, que se evidencia que aos estados, Distrito Federal e

municípios cabe a incumbência de criar seus órgãos normativos, dentro de seu

sistema, à luz das constituições estaduais e leis orgânicas dos municípios, em

continuidade ao que já era exigido na Lei n° 4.024/61, em seu art. 10°.

A organização da educação, portanto, dar-se-á a partir da articulação e do

regime de colaboração entre os respectivos sistemas. Cumpre destacar que a

coordenação da política nacional de educação e a articulação dos diferentes níveis

e sistemas caberão à União, bem como exercer a função normativa, redistributiva

e supletiva em relação às demais instâncias educacionais; por sua vez, os sistemas

de ensino terão a liberdade de organização nos termos da Lei.

Acerca da criação dos sistemas, tem-se, no processo histórico brasileiro,

que a maioria dos conselhos municipais de educação foi instituída antes dos

Page 80: Revista SME Gyn 2012

sistemas. Para Bordignon (2007, p. 12), “é caso da parte precedendo o todo. Em

alguns casos, até os planos de educação antecederam a organização do sistema".

Dessa peculiaridade histórica, efetivada em cenários complexos,

Bordignon (2009) aponta duas vertentes que buscam explicar o fenômeno: a

primeira defende que essa realidade histórica responde aos movimentos sociais

em prol da construção de fóruns de participação democrática na gestão da

educação no município; e a segunda compreende que os sistemas de ensino já

estão instituídos por força de determinação constitucional, sem ser necessário o

ato legal do poder público municipal para efetivá-lo.

Partindo de qualquer uma dessas perspectivas de explicação, cumpre

considerar que, resguardadas as especificidades do processo de criação de cada

conselho municipal, a literatura indica aspectos gerais e intervenientes no

processo de constituição e atuação dos conselhos, a saber:

a desvalorização da cultura de participação social; a falta de autonomia; falta de paridade entre sociedade civil e governo na composição do órgão; baixa representatividade e consequente crise de legitimidade das deliberações; infraestrutura insuficiente; inconsistência nas políticas de formação continuada de conselheiros; falta de publicização dos atos; burocratização excessiva; e, incapacidade de mobilização social (SOUSA, 2011, p.40).

A estes se acrescentam ainda:

O patrimonialismo, clientelismo e personalismo que deveriam ser minimizados na relação conselho – sociedade – Estado se apoderam dos colegiados via principalmente da troca de favores, sucumbência de interesses públicos aos interesses privados, na falta de consciência e envolvimento dos sujeitos bem como do apoderamento do colegiado pelos carreiristas de conselho, intelectuais que possuem respeitável conhecimento técnico do setor e mobilidade política que acabam perpetuando-se no colegiado em consequência da desvalorização da participação de outros segmentos e da grande rotatividade destes (SOUSA, 2011, p.41).

Desse modo, aos sistemas e aos conselhos municipais de educação

apresentam-se desafios para que, de fato, institucionalizem-se os princípios

democráticos na gestão da educação, com participação social. Do ponto de vista

mais amplo, coloca-se o do estabelecimento de novas relações (democráticas) de

Page 81: Revista SME Gyn 2012

poder entre o Estado, o sistema educacional e os agentes desse sistema nos

estabelecimentos de ensino. Para Cury (2005, p. 18), “trata-se de democratizar a

própria democracia”, para assim se inovar como um agente público a serviço da

promoção de uma educação como direito e com qualidade social para todos.

Nos cenários locais, aos CME, há o desafio ̶ a partir das reflexões sobre

suas reais condições de constituição e funcionamento ̶ de se tornarem espaço de

expressão da voz da sociedade, de exercício de poder, de participação das

comunidades escolar e local, nos assuntos referentes à educação. “Sua atribuição

é dizer ao governo o que a comunidade quer, o que deseja ver feito, deliberando e

aconselhando os dirigentes, no que julgarem prudente, sobre as ações a

empreender e os meios a utilizar para o alcance dos fins da escola”

(BORDIGNON, 2005, p. 8).

Corroborando essa assertiva, Cury (2006, p. 65) argumenta que “não será

por falta de atribuições e competências que os conselhos deixarão de se empenhar

na produção de normas para a melhoria da qualidade do ensino fundamental e da

educação infantil”.

Trajetória histórica e interfaces em Goiânia

O Conselho Municipal de Educação (CME) de Goiânia foi criado pela Lei

n° 7.771, de 29 de dezembro de 1997. À época, o então secretário municipal de

educação, subsidiado pelo trabalho de uma comissão externa, encaminhou ao

Poder Executivo Municipal um projeto no qual apresentava a necessidade da

criação do conselho municipal de educação.

O prefeito em exercício (1997-2000) acatou a solicitação e encaminhou o

referido projeto ao Poder Legislativo Municipal, para apreciação. Assim, foi

aprovada a lei de criação do referido órgão, além de fixar suas competências,

objetivos e estabelecer sua composição. Conforme consta do Art. 1º da Lei, o

CME de Goiânia é um “órgão político, financeiro e administrativamente

autônomo, de caráter consultivo e deliberativo acerca dos temas que forem de sua

competência”.

Suas atividades iniciaram-se em 1998, com a elaboração de vários

documentos, entre eles o Regimento Interno, aprovado em 21 de outubro do

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mesmo ano, pelo Conselho Pleno. O primeiro local de funcionamento do CME foi

a sede da Secretaria Municipal de Educação (SME). Posteriormente, o Conselho

realizou suas plenárias nos seguintes locais: Biblioteca da Universidade Católica

de Goiás (hoje Pontifícia Universidade Católica de Goiás); Câmara Municipal de

Goiânia; Reitoria da UCG; Sede da Unidade Regional de Educação (URE);

Central/SME - neste local, o Conselho permaneceu de 1999 a 2002.

Na mesma gestão municipal em que foi criado o CME de Goiânia,

conforme Silva (2007, p.4 ), é importante destacar que,

em relação à democratização do ensino, além da manutenção da eleição de diretores escolares, a Câmara Municipal de Goiânia aprovou a criação dos Conselhos Escolares nas unidades de ensino da rede municipal. Esses Conselhos foram previstos na nova versão do Art. 253 da Lei Orgânica do Município aprovada em 1990, adequada à Constituição Federal de 1988. Dois anos depois, foram regulamentados e implantados nas escolas municipais. Das 114 escolas municipais existentes em 1992, os Conselhos Escolares foram constituídos em 67 e dessas, em apenas sete constavam pais ou mães como presidentes. Nas demais escolas, em 27, os presidentes eram os próprios diretores e nas outras, professores da própria escola. É importante observar que apesar dos Conselhos serem uma determinação da Lei Orgânica Municipal – LOM, houve resistência de diretores e professores à sua criação, uma vez que esta implicaria a legalização da participação de pais e alunos na discussão e deliberação de questões pedagógicas e administrativas da escola.

Tais aspectos do contexto histórico elucidam em que cenário o CME foi

instituído, ou seja, o movimento de democratização da gestão mostrava-se

permeado pelas contradições inerentes ao embate de forças político-ideológicas,

de visões de sociedade e Estado em disputa.

De acordo com Jesus (2004), o movimento de travessia (1997-2000) para

uma perspectiva democrático-popular (2001-2004) é de fundamental importância

para analisar-se a gestão no município. A autora afirma que

em meio a movimentos contínuos de ruptura e conservação, inovação e resistência, avanços e continuidade, o que se revela é uma permanente tensão entre processos de autoritarismo e democratização delineando esta trajetória. Nesta tensão, a evidência [é] de que o espaço de poder da burocracia não é indiferente às interferências externas, nem tampouco às raízes histórico-culturais sendo, ao contrário, movimentado a partir delas (JESUS, 2004, p. 179).

Page 83: Revista SME Gyn 2012

2. A primeira composição do Conselho Pleno do CME de Goiânia era formada por doze membros. Em 1998, o número de conselheiros foi ampliado para treze, com o ingresso de representante do Sinpro.

Pode-se, por essa ótica, inferir que o CME de Goiânia traz em sua

trajetória essa dinâmica de avanços e retrocessos, de tensão entre o velho

(autoritarismo), expresso na tendência à compartimentação, à hierarquização da

burocracia ̶ reforçada por aspectos históricos e culturais local ̶ e o novo

(democratização), que busca instituir outras práticas de gestão da educação.

Nesse período, o Regimento Interno do CME foi regulamentado, por meio

do Decreto Municipal n° 873/03. O documento aprovado sofrera alterações. De

acordo com Souza (2011, p.74):

A alteração no regimento interno visava, entre outras particularidades, adequar a nova estrutura do colegiado que passou a contar com autonomia financeira e de gestão de recursos humanos. Esta estrutura contemplou as seguintes divisões internas: Inspeção e Supervisão Escolar, Assessoria Técnica, Setor de Análise de Processos e Secretaria Executiva. Todas estas Divisões são diretamente ligadas e subordinadas à Direção do CME, composta pelo Presidente, Vice-Presidente e Secretário Geral. A direção do CME e as coordenações das Divisões Internas são eleitas pelos seus pares por um período de dois anos, consolidando assim uma concepção de gestão para o órgão. Além da dotação orçamentária e administração direta dos recursos, o CME foi transferido para uma sede exclusiva e à sua estrutura funcional foi integrado o setor de Inspeção Escolar da Rede Municipal de Ensino, ampliando suas competências e contemplando com mais pertinência as funções do colegiado.

Segundo o Regimento Interno do CME, a duração do mandato dos

conselheiros é de quatro anos. A composição do Conselho Pleno estrutura-se da

seguinte forma: Poder Executivo, quatro representantes; Poder Legislativo, um

representante; Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Goiás (Sintego), um

representante; Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino de Goiânia

(Sepe), um representante; Colegiado de Diretores das Escolas Municipais e dos

Centros Municipais de Educação Infantil, um representante; Movimento

Comunitário, um representante; pais de alunos das escolas públicas municipais de

Goiânia, dois representantes; funcionário das escolas municipais indicado pelo

Sindicato dos Funcionários Públicos do Município de Goiânia (Sindigoiânia), um

representante.

2

Page 84: Revista SME Gyn 2012

A presidência é exercida por um conselheiro eleito por seus pares, por

meio de voto secreto; seu mandato é de dois anos, com possibilidade de reeleição

para igual período. A vice-presidência e a secretaria geral também são exercidas

por conselheiros eleitos por seus pares, por ocasião da eleição da presidência. O

estabelecimento de eleição para escolha da diretoria, no entanto, embora seja um

importante instrumento, não garante por si só a democratização da gestão, no

conselho ou nas escolas, pois não podemos perder de vista as limitações do

sistema representativo, assentado em interesses muitas vezes antagônicos.

A conquista de espaço, fora das dependências da SME, possibilitou ao

CME um processo de construção de sua identidade institucional com mais

autonomia, inclusive com a disponibilidade de espaços para a realização das

atividades de outros conselhos e comissões, sendo eles: Conselho do Fundef (hoje

nomeado Fundeb); Colegiado de Diretores das Escolas Municipais e dos Centros

Municipais de Educação Infantil,; Comissão de Avaliação, Legislação e

Adequação das Normas para a Educação Infantil nas Instituições de Ensino de

Goiânia; e União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (Uncme),

Page 85: Revista SME Gyn 2012

Coordenação de Goiás.

Um marco importante da história do CME foi sua participação na

elaboração do Plano Municipal de Educação (PME) de Goiânia. Pelo período de

um ano, o Fórum, composto por 17 entidades representativas da área educacional,

reuniu-se e elaborou o documento que representou a síntese de posições

consensuais, além de acenar com a maior possibilidade de sua execução.

Findada a gestão (2001-2004), a Prefeitura de Goiânia passou a vivenciar

outro momento histórico-político. No ano de 2007, o CME de Goiânia, com a

aprovação da Lei Municipal nº 8.543, de 05 de julho de 2007, sofreu uma

interferência em sua autonomia. Por meio dessa lei acrescentou-se ao Artigo 4º da

Lei de Criação do Conselho o seguinte disposto: ''Qualquer membro do Conselho

Municipal de Educação de Goiânia poderá ser substituído a qualquer tempo,

desde que solicitado pelo órgão indicado, independente de qualquer situação”.

Em razão da alteração, foi realizada, inclusive, nova eleição para a vice-

presidência, pois o mandato do conselheiro que ocupava essa função na diretoria

fora revogada, logo após a aprovação da alteração da lei de criação do CME.

De acordo com Sousa (2011, p.75),

a intenção com o instituto da revogabilidade do mandato era a substituição dos conselheiros que foram indicados pelo governo anterior, o que nos permite questionar qual o real alcance da autonomia do CME frente ao governo e suas alternâncias, bem como das facilidades que os executivos municipais têm de provocar alterações legais sem o debate público.

No período de 1997 a 2010, foram seis as diretorias que geriram o CME.

Dessas, quatro diretorias tiveram como presidente um representante do

Executivo; as outras duas diretorias foram presididas por representante do Sinpro.

Esse aspecto da história do CME traz várias implicações que, sem dúvida, são

intervenientes na atuação do órgão, por isso precisam ser mais bem

problematizadas em estudos e pesquisas específicos.

Para registrar sua trajetória, o CME realizou no ano de 2010, por meio de

múltiplos olhares de seus técnicos, um documento sobre sua memória. Nos

relatos, foram descritas as atuações do CME, com destaque para a elaboração de

documentos normatizadores emanados da casa; as audiências públicas, fóruns,

Page 86: Revista SME Gyn 2012

referentes à política educacional; os estudos promovidos pelo Conselho Pleno e

pelas divisões deste órgão sobre temas alusivos às competências do CME; a

mobilização dos segmentos educacionais organizados; o desenvolvimento de

uma pesquisa intitulada “Um Estudo sobre as Ações Educativas e Normativas

Desenvolvidas pelo CME”; a participação na Comissão de Avaliação, Legislação

e Adequação das Normas para a Educação Infantil nas Instituições de Ensino de

Goiânia, criada em 05 de julho de 2002, por meio da Lei nº 1.358, com a atribuição

de fiscalizar e dar cumprimento às decisões colegiadas do Conselho Municipal de

Educação de Goiânia; a parceria com a União dos Conselhos Municipais de

Educação (Uncme) ̶ Seção Goiás, no incentivo à criação de conselhos municipais

e à formação de conselheiros no estado; e o fomento de ações, por meio de

parcerias, para a formação e valorização do magistério, como o evento

“Pedagogia da Infância”.

O histórico da caminhada do CME de Goiânia apresenta, como os demais

conselhos de educação do Brasil, a complexidade da constituição de um órgão

colegiado com competências e funções específicas, situado na mediação entre

sociedade civil e governo, e que tem como finalidade precípua buscar a garantia

do direito à educação com qualidade social para todos.

Considerações finais

Arroyo (2002) argumenta que é possível e preciso redefinir a relação entre

educação e cidadania. A educação não pode estar voltada apenas para os interesses

privados do capital, mas deve responder às demandas sociais da população, ter

caráter coletivo, organicamente vinculado às lutas pelos direitos sociais, opondo-

se dessa forma à historicamente conhecida “democracia para poucos”. Ainda

segundo o autor, “a educação não é precondição da democracia e da participação,

mas é parte, fruto e expressão do processo de sua constituição” (ARROYO, p.79),

visto que o processo de formação e constituição do cidadão passa,

necessariamente, pelo espaço pedagógico.

Nesse sentido, compreende-se que a gestão democrática é um desafio

posto aos sistemas, aos conselhos de educação e aos diversos segmentos e

instituições envolvidas na gestão da educação. Bordignon (2009) indica que um

Page 87: Revista SME Gyn 2012

bom caminho para essa travessia histórica é identificar as lógicas que perpassam

as políticas e as ações dos atores envolvidos no processo, fazer o reconhecimento

das “margens do rio” e “ser pontes” rumo à efetivação da democratização das

relações na gestão da educação.

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Page 89: Revista SME Gyn 2012

A identidade do indígena na mídia impressa

Simone Antoniaci Tuzzo

Claudomilson Fernandes Braga

Resumo

Este estudo objetiva identificar e analisar como os sujeitos não indígenas

vêem os indígenas no contexto das relações intergrupais e, particularmente, no

contexto dos processos de demarcação e desocupação de áreas indígenas. Em

razão dos conteúdos publicados nos veículos de mídia, os resultados da pesquisa

possibilitam verificar como esse contexto relacional pode ser observado em uma

perspectiva mais ampla, ou seja, como os não indígenas vêem os indígenas em

geral e como percebem os processos de demarcação de reservas indígenas que

ocorrem no Brasil. Os resultados indicam que as representações dos indígenas que

circulam nos veículos de mídia transcendem o espaço midiático, fazendo eco no

espaço social, ou seja, são as vozes dos atores sociais não indígenas que ecoam nos

espaços midiatizados, que, quando amplificados e legitimados pela mídia, se

tornam naturalizados, e, mesmo em situações potencialmente comunicativas, são

validados como contratos de comunicação, indicando o lugar do indígena no

social e reverberando nas políticas públicas para esta etnia, inclusive nos aspectos

que envolvem a educação indígena.

Palavras-chave: Comunicação. Representações sociais. Conflito. Identidade

2

1

1. Doutora em comunicação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professora Efetiva do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Goiás e do curso de Relações Públicas da UFG. [email protected]

2. Doutor em psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC Goiás). Professor adjunto da Faculdade de Comunicação e Biblioteconomia da Universidade Federal de Goiás (UFG) e coordenador do curso de Relações Públicas (UFG). [email protected]

Page 90: Revista SME Gyn 2012

Introdução

Partindo da noção de que as relações intergrupais (TAJFEL, 1981) são

imagens resultantes daquilo que cada grupo desenvolve a respeito de si mesmo e

do outro e cujo processo de interação entre os grupos indica representações com

funções cognitivas (DOISE, 2002) e que essa centralidade (força) dos conteúdos

relevantes, compreendida em termos e imagens que orientam a relação entre os

grupos, com base em uma realidade objetiva e a sua representação subjetiva, dá

aos elementos representacionais um sentido de enunciação (CAMPOS, 2003), e

que, quanto mais ativado, mais importante ele é para essa situação específica,

nesse trabalho e, em especial, nessa abordagem, a mídia parece ser esse elemento

ativador que mantém essas representações.

Assim, aquilo que Moliner (1995) denomina modelo bidimensional de

representações sociais são os elementos representacionais que indicam

centralidade, e, em certa medida, muito provavelmente, compõe o núcleo central

da representação dos indígenas, ou seja: a imagem que os não indígenas têm dos

indígenas resulta de uma identidade construída, na sua quase totalidade, pelos

conteúdos midiáticos.

Representações sociais e comunicação

As representações sociais descritas por Moscovici (1978) em seu livro La

psychanalyse, son imagem et son public, cujo objetivo foi estudar os processos

psicossociológicos existentes e subjacentes ao modo como a psicanálise foi

transformada em conhecimento do senso comum, descreve as representações

sociais como “sistemas de valores, noções e práticas que proporcionam aos

indivíduos os meios para orientar-se no contexto social e material [...] tornando

inteligíveis a realidade física e social e integrando-se em um grupo ou em uma

relação cotidiana de intercâmbios” (MOSCOVICI, 1978, p. 79).

Outro aspecto importante na compreensão do conceito de representação

social é o seu papel na formação de condutas (GOMES, 2006), o que dito de outro

modo significa que ela modela o comportamento e justifica sua expressão,

(POESCHL, 1995; AMARAL, 1997), situando os sujeitos de forma simbólica nas

Page 91: Revista SME Gyn 2012

relações sociais e nas categorias decorrentes das características da sociedade.

A ideia de modelagem do comportamento e da ação coloca a comunicação

social próxima da teoria das representações sociais, subsidiando em partes ou no

todo o que Rouquette (1996) define como a compreensão dos processos de

formação de conduta e a circulação das representações sociais nas sociedades

contemporâneas, onde o fluxo comunicativo é o resultado global derivado da rede

de interações que une as pessoas umas às outras (WOLF, 1999).

A partir da ideia de que os mass media descrevem e precisam da realidade exterior,

apresentando à audiência uma lista daquilo sobre o que é necessário ter uma

opinião (SHAW, 1979) e, portanto, prescreve a ação, logo representando um guia

de leitura da realidade, dá às representações sociais o que Campos (2005)

denomina de dimensão normativa, ou seja, as representações sociais definem o

que é para um grupo e não para o outro assim como a comunicação.

Nesse sentido, a noção de que o discurso da mídia é o discurso do senso

comum - elaborado e veiculado como verdade, em razão do princípio da

autoridade - marca definitivamente a relação entre coisa e signo (objeto e

representação)(CAMPOS, 2005), pois ambos, representação e comunicação, são

essencialmente enunciados muito mais do que representações, definidos cada vez

mais pelo contexto comunicacional.

Rouquette (1999), ao discutir o papel da comunicação na construção das

representações sociais, afirma que elas são elaboradas e transmitidas a partir da

comunicação, indicando um caminho de análise e oferecendo à comunicação

social um lugar privilegiado na compreensão das representações sociais.

Imagem e identidade

Como ponto de partida, e se apropriando dos conceitos de marketing sobre

marca ou branding, devemos traçar duas visões distintas: uma interna e outra

externa. Segundo Bender (2009, p.171), na visão interna teremos a identidade, na

visão externa, a imagem.

A primeira, a identidade, é o conceito que traçamos para uma marca, um DNA de marca planejado. São os valores e atributos que queremos passar para o mercado. A segunda, a imagem da marca, é a percepção, a maneira como a marca é percebida pela audiência. O que se faz num

Page 92: Revista SME Gyn 2012

planejamento estratégico é, por meio do marketing e da comunicação, aproximar essas duas visões, diminuindo a dissonância cognitiva entre elas. É levar os consumidores a perceberem a marca com o valor que queremos que ela tenha. (BENDER, 2009. p.171)

Entretanto, são nas pesquisas empreendidas por Tajfel (1981), cujos

estudos originalmente desenvolvidos por Sherif (1961), que a questão da

identidade do grupo é colocada em debate. Para Tajfel (1981), a identidade social

é “a parcela do autoconceito dum indivíduo que deriva do seu conhecimento da

sua pertença a um grupo (ou grupos) social, juntamente com o significado

emocional e de valor associado àquela pertença” (p. 291).

Quanto maior o sentimento de pertença, maior a tendência a diferenciar-se

de maneira favorável ao seu próprio grupo (endogrupo), em detrimento do outro

grupo (exogrupo). Assim, a identidade social, esse sentimento de pertença,

ocorre, segundo Tajfel (1981), com base em três pressupostos:

a) como um continuum indo do comportamento interpessoal ao

comportamento intergrupal;

b) a identidade social não é um ato, mas, sobretudo um processo social que

se operacionaliza no interior do indivíduo, no espaço das relações individuais e no

espaço das relações institucionais; é, portanto, um processo intraindividual,

interindividual e intergrupal, em um processo dialético pois o sujeito muda o

comportamento com base na sua participação no grupo, mas também muda o

grupo à medida que se alteram as concepções do indivíduo; e ainda:

c) esse processo não ocorre no vazio, mas em um certo contexto histórico

em que podem ocorrer fusões ou conflitos e, portanto, pressupõe certa

organização social, estrutural e de legitimidade e estabilidade.

Os pressupostos apresentados por Tajfel (1981) possibilitam compreender

que a identidade social pode ser compreendida como um sentimento de pertença,

portanto, de crença na pertença (DEL PRETTE; DEL PRETTE, 2003). Permitem

também inferir que a crença social, assim como o sentimento de pertença, se situa

em um continuum, no qual um extremo se situa a crença na mobilidade social e no

outro a crença na mudança social (TAJFEL, 1981).

Por mudança social, pode-se entender “um movimento social que

representa um esforço de um grande número de pessoas para resolver

Page 93: Revista SME Gyn 2012

coletivamente um problema sentido como comum” (TAJFEL, 1981. p. 277). Por

outro lado, a mobilidade social é, segundo Tajfel (1981), “o movimento dos

indivíduos, famílias e grupos de uma posição social para outra” (p. 277). Assim, as

crenças na mobilidade social, abrindo perspectivas de ascensão social individual,

estimulam estratégias individualistas de ação (comportamentos interindividuais),

ao passo que as crenças na mudança social favoreceriam estratégias coletivas

(comportamentos intergrupais). Dessa forma, em ambos os casos, a relação entre

crenças e ação é mediada pelos processos de identidade social e diferenciação

grupal.

Método, amostra e procedimentos

A pesquisa caracterizada como quantitativa do tipo descritiva foi realizada

na cidade de Normandia, estado de Roraima, entre os dias 21 e 25 de abril de 2011.

Classificada como probabilística por conveniência, a amostra foi composta por 50

sujeitos não indígenas residentes na área urbana do município de Normandia

(RR), sendo 22% do sexo masculino e 78% feminino. A faixa etária média dos

entrevistados era de 28 anos.

O instrumento elaborado com perguntas fechadas de múltipla escolha, do

tipo Likert, possibilitou aos entrevistados indicarem seu grau de concordância ou

discordância, as declarações relativas à atitude investigada, uma vez que a escala

de Likert atribui valores numéricos e/ou sinais as respostas que refletem a força e a

direção da reação do entrevistado à declaração. A escala de Likert permite que

declarações de concordância recebam valores positivos ou altos, ao passo que as

declarações das quais discordam recebam valores negativos ou baixos (Baker,

2005).

Giglio (1996) comenta que pesquisas posteriores à elaboração da escala de

Likert verificaram que há correlação entre julgamento e atitude. As principais

vantagens da escala Likert em relação às demais, segundo Mattar (2001), são a

simplicidade de construção. As respostas situam-se nos seguintes extremos: 1 =

discordo totalmente e 7 = concordo totalmente, cujos valores intermediários

foram assim descritos: 2 = discordo parcialmente; 3 = discordo; 4 = nem concordo

nem discordo; 5 = concordo parcialmente e 6 = concordo. O instrumento de

Page 94: Revista SME Gyn 2012

coleta foi composto de seis blocos de questões assim delineados:

Primeiro bloco - identificação do modo comunicativo operante na região

do conflito e qual o veículo de mídia que mais proporcionou informações sobre o

processo de demarcação e desocupação da Reserva Indígena Raposa Serra do Sol

- RIRSS.

Segundo bloco - com base na expressão indutora “em relação aos

indígenas, você os considera?” - foram apresentadas aos sujeitos da pesquisa

possibilidades de respostas segundo as expressões: uma pessoa que vive na

natureza; uma pessoa que vive em aldeia; uma pessoa que não trabalha; uma

pessoa que tem muita habilidade para o artesanato; uma pessoa que tem uma

cultura diferente; uma pessoa que vive na floresta; uma pessoa que vive como um

selvagem; uma pessoa que sofre preconceito; uma pessoa que é um guerreiro. O

objetivo consistiu em verificar a centralidade das respostas, cujo grau de

concordância ou discordância com as expressões possibilitasse identificar a

estrutura que, muito provavelmente, compõe o núcleo central das representações

sociais do indígena.

Terceiro bloco - foi solicitada aos sujeitos (não indígenas) da pesquisa a

atribuição de um grau de concordância às expressões atribuídas aos indígenas:

foto: divulgação SME

Page 95: Revista SME Gyn 2012

intuitivos, vingativos, criativos, livres, impulsivos, leais, perversos,

manipuladores, solidários, inteligentes, agressivos, fisicamente hábeis,

instintivos, extrovertidos e preguiçosos. Com os resultados buscava-se

demonstrar a opinião (atitude) em relação a esse grupo étnico, possibilitando,

dessa forma, identificar os traços de personalidade que os não indígenas atribuem

aos indígenas, que, em última instância, indicam os traços identitários atribuídos

aos indígenas.

Quarto bloco - buscou identificar a opinião dos não indígenas em relação

aos processos de demarcação de terras indígenas de uma forma geral, ou seja,

como os sujeitos da pesquisa vêem os processos dessa natureza, tanto no estado de

Roraima como no restante do país; para tanto, foram apresentadas expressões,

todas afirmativas - a demarcação de reservas indígenas é justa; os jornais e a

televisão falam a verdade sobre os fatos que ocorrem; os indígenas são ouvidos

nos processos de demarcação; a maioria dos políticos apóia os indígenas, e, após a

demarcação, o governo federal dá autonomia para os indígenas. Solicitou-se aos

pesquisados a atribuição de um valor sobre cada item.

Quinto bloco - tendo como referencial a demarcação e a desocupação da

RIRSS, nesse bloco de questões foi solicitado aos sujeitos que expressassem suas

opiniões sobre a atuação dos indígenas, atribuindo um valor para cada expressão

apresentada - os indígenas conseguiram mais do que mereciam; receberam muito

respeito e consideração; foram muito exigentes em relação aos seus direitos; a

discriminação não foi um problema para eles; eles tiveram influência política no

processo; eles não precisaram de ajuda; eles foram prejudicados após a

demarcação; as autoridades não os ouviram; ficaram calados esperando o governo

tomar as decisões; e eles não falaram muito sobre o assunto. As respostas obtidas

indicam como os não indígenas vêem o comportamento do indígena durante o

processo.

Na última parte do instrumento, as expressões apresentadas buscaram

identificar o grau de concordância e discordância acerca das determinações legais

relatadas pelo Supremo Tribunal Federal, com o objetivo de identificar as

questões relativas à autonomia indígena. As determinações do STF foram as

seguintes:

a) os indígenas da reserva não podem vender ou alugar, ou ainda, transferir

Page 96: Revista SME Gyn 2012

suas terras para outras pessoas;

b) não será cobrado nenhum tipo de imposto aos indígenas que moram na

reserva;

c) os indígenas não podem alugar parte das terras da reserva;

d) os indígenas não podem cobrar tarifas de visitantes (turistas) na reserva;

e) alguns não indígenas podem permanecer em parte da reserva desde que

a Funai autorize;

f) tudo que os indígenas desejarem fazer na reserva deve ser sempre

autorizado; O Governo Federal pode instalar prédios públicos, construir estradas

sem autorização dos indígenas;

g) a Polícia Federal pode atuar na reserva sem autorização dos indígenas;

h) o Governo Federal pode instalar bases militares na reserva sem consulta

às comunidades indígenas da região;

i) o garimpo na reserva deve sempre ser autorizado pelo Congresso

Nacional;

j) o uso dos rios para gerar energia deve ser sempre autorizado pelos

deputados;

k) os rios e as riquezas do solo são controlados pelo Governo Federal;

Também fez parte do instrumento de coleta de dados a identificação

demográfica (gênero e faixa etária) dos sujeitos da amostra. Os elementos que

constituíram o segundo bloco de questões do instrumento de coleta foram

utilizados e validados em estudos realizados pelo Núcleo de Pesquisa

Psicossociológicas (NEP) da PUC Goiás.

As análises dos dados foram feitas com o auxílio do software Statistical

Package for the Social Sciences (SPSS), que propicia análises estatísticas

descritivas e inferenciais. Com duas entradas de dados (Data View), o aplicativo

permitiu desenvolver análises que demonstraram, com o uso da escala Likert,

quais as principais tendências de respostas dos sujeitos pesquisados, indicando a

sua opinião sobre o tema perguntado.

As análises foram executadas em separado, observando-se o objetivo de

cada bloco de questões, cujos resultados foram gerados, observando-se um

intervalo de confiança (IC) igual a 95%, com um desvio padrão igual a 2,0

(dp=2,0%).

Page 97: Revista SME Gyn 2012

Resultados e discussões

Os resultados do primeiro bloco indicam uma realidade típica das cidades

do interior do país. O meio comunicativo preponderante na região do conflito é o

radiofônico. Com um percentual superior à metade das respostas, o rádio

representa o veículo de mídia mais atuante na cidade e na região. Significa,

portanto, que a Folha de S. Paulo, como outro jornal diário, não teve penetração

(direta) de audiência na região.

Apesar da existência de jornais impressos no estado de Roraima, parece

ocorrer, como primeira perspectiva de análise, uma situação de copy desk, ou seja,

os veículos de mídia das cidades do interior e do estado de Roraima, como

também das demais cidades do interior do país, reproduzem em larga escala as

notícias originadas nos veículos do eixo Rio de Janeiro e São Paulo. Duas noções

podem ser apontadas: a capacidade de cobertura e abrangência dessas

organizações e o caráter legitimador desses veículos. Entretanto, essa análise não

é completamente satisfatória e não dá conta de explicar por que o rádio é o meio

comunicacional mais efetivo na região do conflito.

Como o evento de demarcação e desocupação da RIRSS foi, em grande

parte, controlado pelo STF, emerge a figura da Voz do Brasil. Criada em 1935, pelo

presidente Getúlio Vargas, para levar informação do poder executivo à população.

A Voz do Brasil à época, era o principal meio de comunicação de massa.

Pesquisa encomendada pela Associação Brasileira de Emissoras de Rádio

e Televisão (Abert) indica a estrutura de mídia, no país, no ano de 2008: 3.600

emissoras de rádio, cinco redes de televisão de cobertura nacional (não incluída as

afiliadas), 523 jornais diários, 1.200 títulos de revista e mais de uma centena de

rádios comunitárias não oficiais. A mesma pesquisa revela que a audiência

radiofônica entre os horários das 19h e 20h atinge o percentual de 11% da

população nacional. Conforme dados atualizados do censo 2010 (IBGE, 2010),

20,9 milhões de pessoas ouvem rádio nesse horário.

A pesquisa da Abert (2008) também indicou que a audiência da Voz do

Brasil, no horário da sua retransmissão (19 h às 20 h) é de 5% da população (9,5

milhões). A essa informação acrescente-se que, até o ano de 2010, cidades como

Page 98: Revista SME Gyn 2012

São Paulo e municípios vizinhos não eram obrigados a retransmitir a programação

no horário estipulado, em razão de liminar que foi suspensa pelo STF nesse ano,

como resultado do mandado impetrado pela Advocacia Geral da União (Abert,

2011).

Em relação à forma como as pessoas tomaram conhecimento sobre o

processo de demarcação e desocupação da RIRSS, os resultados indicam que,

apesar de o rádio ser o veículo midiático com maior penetração, foi mediante a

informação boca a boca que o evento (ou pelo menos suas informações) se

alastrou.

Tomando-se de empréstimo o entendimento de que comunicação boca a

boca caracteriza-se como uma comunicação interpessoal, em que sujeitos

usuários e não usuários de um produto ou serviço compartilham experiências e

opiniões a respeito dele (NICKLES & WOOD, 1999; 2004), revelando ser

confiável e não tendenciosa, e que provêm de fontes não ligadas às empresas, tais

como amigos, familiares e líderes de opinião, são, normalmente, julgadas e

consideradas válidas.

A comunicação boca a boca é tida como de grande relevância para

modelar atitudes e comportamentos (BROW & REINGER, 1987), em especial

para a difusão de produtos, serviços ou ideias. Murray (1991) acrescenta que a

comunicação boca a boca tem maior credibilidade e é mais confiável do que

outros tipos, por ser acessível pelas relações sociais. Diferentemente das

informações midiáticas que se caracterizam como situações potencialmente

comunicativas e que, apesar de validadas a priori, são essencialmente

monolocutivas (GHIGLIONE, 1984), a comunicação boca a boca pode ser

considerada uma situação de contrato de comunicação, pois os interlocutores

convergem para o mesmo sentido, e a informação tende a ser validada de imediato

pela concordância (ou não).

Assim, o discurso reproduzido pela comunicação boca a boca, que em

última instância representa a reprodução do discurso da mídia local (Voz do

Brasil), converge e representa uma reprodução do discurso também nacional

(Folha de S. Paulo), já que a prática do copy desk é uma realidade no meio

midiático. Portanto, a ideia de uma situação potencialmente comunicativa,

geralmente tratada como contrato de comunicação pelos veículos de massa

Page 99: Revista SME Gyn 2012

concretiza-se não apenas pelo sentido da legitimação, mas, sobretudo, com base

na ideia de subalternidade (SPIVAK, 1994), ou seja, a voz que transita entre o

locutor e o interlocutor não pertence às minorias.

O segundo bloco de questões, com base na expressão indutora - em relação

aos indígenas, você os considera? - indicou os elementos que provavelmente

compõem o núcleo central das representações do indígena (ABRIC, 1988).

Vive na aldeia; vive junto na natureza; habilidade para o artesanato; vive

na floresta e possui uma cultura diferente, todos com índices de respostas acima de

70%, indica, segundo os dados, certa estabilidade, em razão do percentual de

validade (muito próximo) identificado. A variável guerreiro, com 66% das

respostas, apesar do percentual inferior, poderia indicar certa instabilidade na

representação, porém, não parece ser o caso. Os resultados não mostram que há

contestação dos elementos do sistema central em razão dos percentuais das

respostas.

A ideia de cultura diferente parece representar o núcleo mais central das

representações sociais dos indígenas. Dentre os aspectos possíveis dessa

diferença cultural, a língua representa um dos mais importantes pontos (se não o

mais) dessa diferenciação. Rogers e Steinfatt (1999), ao falar em diferenças

interculturais com base em diferença linguística, propõem um continuum de

algumas possíveis combinações da comunicação humana, cujos pólos vão desde

uma diferença cultural mínima, quando se compartilha a mesma língua, por

exemplo, até a possibilidade de não haver comunicação, caso as diferenças

culturais não sejam explicitadas/negociadas/traduzidas.

Ao reafirmar que as representações sociais têm uma estrutura particular,

composta de crenças-nucleares que geram e gerenciam outras em uma sequência,

Moscovici (2003) afirma, e de certo modo explica, como os sujeitos podem

armazenar e partilhar crenças básicas (estruturantes) e, ao mesmo tempo, integrar

experiências individuais (CAMPOS, 2003).

A noção do indígena que vive na selva, na floresta, que é um guerreiro e

que faz artesanato (colares e cocares) permanece. Quando apenas 34% concorda

com a afirmação de que os indígenas sofrem preconceito, aparece subjacentes às

respostas a força da norma antirracista, cujos discursos tendem a aderir ao

politicamente correto. Pelos discursos identificados, parece haver preconceito se

Page 100: Revista SME Gyn 2012

diz tê-lo e não quando se atribuem determinadas características (sobretudo

negativas) a determinado grupo. Quando 34% também concorda com a afirmação

de que o indígena não trabalha e 20% os considera selvagens (aspectos

considerados como pertencentes ao sistema periférico dessa representação),

parece criar-se uma barreira protetora às representações do núcleo central, dando

a ideia de que não existem imagens e conceitos preconceituosos em relação aos

indígenas.

De fato, os resultados da centralidade das respostas indicam uma

representação do indígena que o coloca em uma posição oposta aos indivíduos

não indígenas e o caracteriza como um ser natural (no sentido de pertencente à

natureza), muito próximo ou mesmo inserido (completamente) na floresta. A ideia

subjacente de que o lugar do indígena é na mata se mantém, sugerindo e até

confirmando que a identidade indígena se aproxima em forma e conteúdo aos

animais, como se fossem menos humanos. Assim, o sentido de infra-humanização

que ocorre em relação aos indígenas brasileiros pode ser compreendido como o

que Souza (2003) denominou de subcidadania. O autor aponta que, no Brasil,

ocorreu um processo de naturalização da desigualdade: “naturalização que não

chega à consciência de suas vítimas, precisamente porque são construídas

segundo as formas impessoais e peculiarmente opacas e intransparentes devido à

ação, [...] que traveste de universal e neutro o que é contingente e particular”

(SOUZA, 2003, p. 179), formando cidadãos de segunda e terceira classes.

Redes invisíveis e objetivas que desqualificam os indivíduos e grupos

sociais precarizados como subprodutores e subcidadãos constituem um fenômeno

de massa, construído também pelos veículos massivos, que constroem cenários

cristalizados e tendencialmente permanentes de desigualdade.

No terceiro bloco, a variância explicada com base na atribuição de um

grau de concordância às expressões atribuídas aos indígenas possibilitou

identificar as características de personalidade atribuídas a essa etnia. Com a

análise fatorial, foi possível gerar dois componentes denominados de traços

positivos e traços negativos (tabela 1). Os componentes negativos

(manipuladores, vingativos, agressivos, perversos, preguiçosos e instintivos),

quando ordenados de modo crescente, indicam, sobretudo, características de

personalidade existentes nas relações intergrupais. Os componentes positivos

Page 101: Revista SME Gyn 2012

(extrovertidos, intuitivos, criativos, solidários, inteligentes, impulsivos e hábeis

fisicamente) parecem indicar características presentes apenas nas relações

interindividuais e também intraindividuais.

Tabela 1: Características indígenas

A variável leais a sua identidade não aparece com variância explicada, o

que significa que, entre os sujeitos entrevistados, não há uma concordância em

relação a esse item. Explica-se em grande medida a ausência de uniformidade de

respostas o fato de os sujeitos do exogrupo não terem clareza da identidade

indígena, o que, de certo modo, explica também que os sujeitos pesquisados não

(re)conhecem a identidade indígena.

Retomando a ideia de que o preconceito expressa especialmente um

posicionamento negativo em relação a um grupo social e que a influência de traços

de personalidade, emoções e cognições são consideradas no surgimento de

fenômenos dessa natureza (ALLPORT, 1979), explica, em grande parte a

atribuição hostil de traços de personalidade nas relações intergrupais, alegando

que os sujeitos (indígenas) pertencem a outro grupo (exogrupo). Os traços

Fonte: Dados da pesquisa

ComponentesCaracterísticas

(1) Negativos (2) Positivos

MANIPULADORES

VINGATIVOS

AGRESSIVOS

PERVERSOS

LIVRES

PREGUIÇOSOS

INSTINTIVOS

LEAIS A SUA IDENTIDADE

EXTROVERTIDOS

INTUITIVOS

CRIATIVOS

SOLIDÁRIOS

INTELIGENTES

IMPULSIVOS

HABILIDADES FÍSICAS

0,866

0,855

0,831

0,750

0,646

0,634

0,589

0,729

0,694

0,664

0,615

0,602

0,540

0,389

Page 102: Revista SME Gyn 2012

positivos existem apenas quando se trata, sobretudo, das relações intragrupais; em

se tratando das relações intergrupais, prevalece a ideia de um indígena carregado

de características de personalidade, pode-se dizer, nada nobres.

A variância explicada (tabela 2) do quarto bloco de questões, resultante da

análise fatorial, identifica como as demarcações de terras indígenas são

percebidas pelos não indígenas.

Tabela 2: Demarcações de Terras Indígenas

Considerando que o objetivo era identificar essa percepção, deve-se levar

em conta a proximidade de uma situação semelhante e que pode influenciar as

possíveis respostas. Entretanto, os resultados parecem não serem influenciados

por uma situação de contato. Prevaleceram resultados decorrentes de situações

potencialmente comunicativas e as respostas indicam o conteúdo que circulou na

mídia.

Permanece uma ambivalência explícita das respostas (componentes 1 e 2).

O fato de atribuir aos veículos de mídia uma clara legitimação (0,822), de certo

modo explica os demais itens pesquisados, ou seja, as respostas dos sujeitos

pesquisados indicam repetições dos conteúdos midiáticos. A ambivalência das

respostas representa, em última análise, uma ambivalência de sentimentos,

crenças, atitude, típicos das sociedades modernas (Katz, Wackenhut & Hass,

1988).

A demarcação e desocupação da RIRSS, objeto das questões apresentadas

no quinto bloco, indicam uma situação de privação relativa (do endogrupo em

relação ao exogrupo) em ambos os componentes.

Fonte: Dados da pesquisa

Componentes

(1) (2)

0,822

0,763 0,512

0,642

0,559

0,958AUTONOMIA INDÍGENA

POLÍTICOS APOIAM INDÍGENAS

DEMARCAÇÕES SÃO JUSTAS

OUVIDOS NA DEMARCAÇÃO

MÍDIA FALA VERDADE

Demarcações de Terras Indígenas

Situações Potencialmente Comunicativas

Page 103: Revista SME Gyn 2012

Tomando-se de empréstimo o conceito clássico de privação relativa,

desenvolvido originalmente por Merton (1957), o sentimento de injustiça,

associado à percepção da ausência de recursos, comparando a posse desse recurso

por um grupo de referência, parece existir nos não indígenas quando afirmam que

os indígenas conseguiram muito mais do que mereciam.

O sentimento de privação relativa parece se confirmar em razão da

categoria de análise - conseguiram muito - apresentar o maior coeficiente de

correlação. Em outras palavras, em um cenário de conflito, assumir que o

exogrupo perdeu ou deixou de ganhar indica aquilo que estrutura a privação

relativa: eles ganharam mais do que mereciam (tabela 3).

Tabela 3: Demarcação Reserva Indígena Raposa Serra do Sol

As pesquisas posteriores sobre privação relativa empreendidas por

Runciman (1966) dão conta da existência de dois tipos de privação: fraterna,

quando o grupo de referência normativo é exterior ao próprio grupo; egoísta,

quando o grupo de referência normativa é o próprio grupo de pertença. Segundo o

autor, essa distinção é importante para atribuir relevância social à primeira. A

privação relativa do tipo fraterna explica a dinâmica dos conflitos entre grupos em

Fonte: Dados da pesquisa

Componentes

0,880

0,417

0,714

0,740

0,593

0,6750,407

0,669

0,681

0,597

0,679

0,527

0,497

Demarcação RIRSS

CONSEGUIRAM MUITO

POSSUEM INFLUÊNCIA POLÍTICA

FORAM RESPEITADOS

NÃO FALARAM DO ASSUNTO

FORAM EXIGENTES

DISCRIMINAÇÃO NÃO É PROBLEMA

FICARAM CALADOS ESPERANDO GOVERNO

AUTORIDADES NÃO OUVIRAM OS INDÍGENAS

FORAM PREJUDICADOS NA DEMARCAÇÃO

FORAM RESPEITADOS

NÃO PRECISAM DE AJUDA

(1) (2) Ganhos do exogrupo

Perdas do exogrupo

Page 104: Revista SME Gyn 2012

busca de um cenário de justiça social.

Brown (1988) reconhece a importância da perspectiva da privação relativa

e afirma que a hipótese explica o fato – insólito – de grupos dominantes

exprimirem descontentamento social na tentativa de reforçar ou recuperar sua

estrutura/posição de dominância.

Na última parte do instrumento, com base na homologação da reserva pelo

STF, as expressões apresentadas identificaram a dicotomia existente entre a

autonomia indígena e a prevalecência da tutela.

Tabela 4:

Os itens do primeiro componente (autonomia), com uma variância

explicada elevada, em termos percentuais, indicam que inexiste a ideia de

autonomia, mesmo em terras indígenas demarcadas. A prévia autorização do

governo federal a todas as possibilidades de usos e frutos do solo, dos rios e das

riquezas traduz que as etnias indígenas e, em especial as etnias da RIRSS, não

possuem autonomia. Um contrassenso em relação à Declaração Universal dos

Direitos dos Povos Indígenas da Organização das Nações Unidas (ONU), que

reconhece e estabelece a eles o direito coletivo à terra, ao uso dos recursos naturais

e à autodeterminação política. Deve-se lembrar que a declaração foi

Fonte: Dados da pesquisa

Componentes

0,857

0,845

0,858

0,811

0,682

0,828

0,838

0,811

0,829

0,656

RIOS E SOLO CONTROLADOS PELO GOVERNO FEDERAL

RIOS (ENERGIA) AUTORIZAÇÃO GOVERNO FEDERAL

GOVERNO (FEDERAL) PODE INSTALAR BASES MILITARES

POLÍCIA FEDERAL PODE ATUAR

GOVERNO (FEDERAL) PODE CONSTRUIR RIRSS

GARIMPO SÓ COM AUTORIZAÇÃO DO CONGRESSO

NÃO PODEM COBRAR TARIFAS

NÃO PODEM ALUGAR

NÃO PODEM VENDER TERRAS

PRECISAM SEMPRE DE AUTORIZAÇÃO

NÃO PAGAM IMPOSTOS

(1) (2) Autonomia Tutela

Decisões Superior Tribunal Federal (STF)

Page 105: Revista SME Gyn 2012

aprovada com o voto de 143 nações, entre elas, o Brasil.

O segundo componente (tutela), cuja variância explicada dos itens

também apresenta valores elevados, só reforça a ideia de uma tutela extinta apenas

no papel, apesar de o Congresso Nacional ter ratificado a Convenção 169 da

Organização Internacional do Trabalho (OIT), que revoga a tutela indígena.

O item garimpo só com autorização do Congresso não apresentou uma variância

expressiva, claramente explicável: garimpagem não é atividade indígena, como

ficou demonstrado no teste de centralidade. As representações do indígena estão

associadas à selva, à floresta, ao artesanato, à caça, à pesca e à luta (guerra).

Considerações finais

De fato, identificam-se nos estudos capítulos de uma mesma história que

se mantém (quase) inalterada. Fora da aldeia (na mídia), o indígena não se

reconhece, mas, sobretudo, não é reconhecido: é invisível. Na aldeia, mantém a

identidade original: caça, pesca e disputa por territórios. Também não é mais

tutelado (pelo menos juridicamente), entretanto, ainda é um sujeito heterônomo.

Comentando o trabalho dissertativo (não publicado) de Carmo (1991),

Entre a cruz e espada: o índio no discurso do livro didático de história, Van Dijk

(2004) argumenta que, de fato, as representações do indígena no Brasil (e, por

extensão, na América Latina) estão todas elas vinculadas à origem dos

descobrimentos, ou seja, permanecem as mesmas representações por ocasião da

chegada dos europeus ao continente, há mais de 500 anos. “Muitas de suas

características não são descritas, são na verdade comparações explícitas e

implícitas com os europeus”, afirma Van Dijk (2004, p. 171). Os resultados do

estudo empírico corroboram aquilo que o autor chama de associações de

características do passado e, com algumas exceções, com o presente.

Tomando de empréstimo o resultado das pesquisas empreendidas por Van

Dijk (2008) em relação aos negros no Brasil, o duplo papel exercido pelo

silenciamento (negação da desigualdade e homogeneização da cultura) parece

fazer eco com os resultados dos estudos empreendidos pelo autor, pois, assim

como outras minorias, também os indígenas não aparecem nos conteúdos

midiáticos. Essas constatações de fato condicionam a relação entre comunicação e

Page 106: Revista SME Gyn 2012

representações sociais. Não se podem comunicar sem partilhar determinadas

representações.

Desse modo, parece pertinente afirmar que fenômenos complexos, como

o preconceito, são na verdade estruturas institucionais, que aparecem, sobretudo,

nos veículos de mídia, como situações potencialmente comunicativas, validadas

como contratos de comunicação, com o objetivo de manter os discursos das elites

dominantes.

Assim, os resultados desse estudo indicam que as representações sociais

dos indígenas veiculadas pela mídia, sobretudo do caso da Reserva Indígena

Raposa Serra do Sol, são, na verdade, parte de um processo de manutenção do

status quo de determinados atores sociais. Essa construção, que também é social,

intenciona manter um discurso hegemônico de uma democracia racial à brasileira,

toda ela construída à custa da marginalização de grupos (negros, indígenas etc.)

minoritários em favor dos grupos majoritários. De fato, aquilo que se veicula na

mídia indica apenas o lugar específico do grupo hegemônico: a fala, a língua, as

vestes, a alimentação, a dança, dentre outros aspectos.

A identidade indígena que circula nos veículos de mídia é associada ao

lugar do subalterno, silenciado (BRAGA & CAMPOS, 2011), cuja característica

aproxima-o de um sujeito menos humano, quase infra-humano. Aquilo que Souza

(2003) denomina de subcidadania, em relação aos indígenas, é na verdade um

processo de naturalização da desigualdade. A identidade social do indígena que

circula nos veículos de mídia é construída segundo formas impessoais e opacas,

formando cidadãos de segunda e terceira classes.

Esse fenômeno de massa que desqualifica determinados grupos sociais

como hegemônicos, ao mesmo tempo precariza outros grupos, tornando-os

invisíveis, subprodutos resultantes da massificação de um protótipo, em

detrimento da construção de um estereótipo. Nessa perspectiva, a categoria

‘‘brasileiro’’, definida por Souza (2003), é toda ela naturalizada, sedimentada. O

indígena brasileiro, muitas vezes considerado menos humano, é, na verdade,

resultante de uma sociedade que, historicamente, construiu contradições e revelou

um processo naturalizado de gente, subgente e não gente. Assim, o indígena,

sujeito da história, quando naturalizado como menos gente, é colocado à margem

do social e de todas as políticas públicas de inclusão, nomeadamente as de caráter

Page 107: Revista SME Gyn 2012

educacional.

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Page 109: Revista SME Gyn 2012

RELATOS E EXPERIÊNCIAS PEDAGÓGICAS

SME

EDUCAÇÃO EM

MOVIMENTO

Page 110: Revista SME Gyn 2012

Por uma jornada pedagógica com qualidade social

Jovenília Rodrigues Pereira

Maria Avelina de Carvalho

Romilson Martins Siqueira

“A educação, qualquer que seja ela, é sempre uma

teoria do conhecimento posta em prática.”

(Paulo Freire)

A Jornada Pedagógica da Rede Municipal de Educação de Goiânia

(RME), criada em 2002, marcou e se fez história entre os profissionais da

educação. Compreender essa afirmação exige pensar sobre o lugar de destaque em

que se situa essa ação diante do extenso conjunto de ações formativas que

constituem a Política de Formação Continuada da Secretaria Municipal de

Educação. Implica, ainda, compreender as dimensões pedagógica e política que

envolvem uma ação formativa e, sobretudo, pensar na constituição dos sujeitos e

na construção da identidade profissional a partir da valorização daquilo que não é

produto, que não é mensurável, que não é coisa, mas existe e é significativo como

elemento constituinte e constitutivo da práxis docente: o saber dos profissionais.

O lugar da Jornada não é outro, senão espaço-tempo de encontros e

reencontros, interações, diálogos, expressão e produção de conhecimentos a partir

da articulação entre teoria, prática e experiências trazidas pelos sujeitos de

diferentes espaços educativos. É lugar de aprendizagens, que possibilitam

avanços nos processos formativos de todos os sujeitos que compõem o espaço

educacional.

1. Especialista em Formação de Professores para o atendimento educacional especial/UFC. Professora da Secretaria Municipal de Educação de Goiânia. Formadora do CEFPE.

2. Doutora em Linguística pela Universidade de Brasília (UnB), mestre em Letras e Linguística pela Universidade Federal de Goiás (UFG). É pesquisadora nas áreas de Etnografia e Letramento. Professora adjunta das Faculdades Objetivo em Goiânia e da Secretaria Municipal de Educação em Goiânia. Formadora do CEFPE.

3. Doutor e Mestre em Educação pela UFG.. Professor efetivo do Programa de Pós Graduação em Educação da PUC Goiás. Diretor do Departamento de Educação da PUC Goiás. Professor da Secretaria Municipal de Educação. Formador do CEFPE.

1

2

3

Page 111: Revista SME Gyn 2012

Esse lugar, reconhecido pelos profissionais da RME, é legitimado pela

Secretaria quando propõe sua reedição. Foram seis edições que reuniram mais de

treze mil profissionais e um conjunto vasto e rico de temáticas discutidas sob a

organização de relatos de experiências, palestras, mesas redondas, minicursos,

oficinas e atividades artístico-culturais.

Em cada reedição da Jornada, o que mantêm-se são as intencionalidades

política e pedagógica de uma gestão e de seus profissionais, norteadas por um

desejo comum de qualificar cada vez mais uma ação formativa que se destaca na

RME pelo que já foi supracitado, pelo que será explicitado e por ser uma ação

de todos e para todos.

O objetivo deste texto é apresentar e discutir elementos que subsidiem a

compreensão da natureza da Jornada Pedagógica, a partir de suas dimensões

histórica, política e pedagógica.

À priori faz-se necessário compreender a ideia de jornada. Em seu sentido

mais restrito e imediato, pode ser traduzida como um percurso que se faz, em uma

certa duração de tempo, em direção a um destino qualquer. Rompendo com esta

ideia de jornada como duração/extensão, a SME defende outro sentido para a ideia

de jornada. Neste caso, a qualifica como Jornada Pedagógica e a redefine em seu

sentido mais amplo: pressupõe um processo contínuo, no qual sujeitos traçam

seus percursos formativos, expressam e ampliam seus conhecimentos num

espaço-tempo educativo.

Se é processo, é histórico, o que implica pensar em sujeitos, vivências,

experiências, saberes, interações sociais, e sobretudo, nas relações estabelecidas

entre esses sujeitos. Se é contínuo, é preciso pensar sobre os fazeres que

constituem a jornada e seu significado na história de uma rede de ensino. São

produções humanas sistematizadas e socializadas, com o objetivo de subsidiar e

qualificar a formação profissional. Assim, o sentido de continuidade pode ser

compreendido sob dois vieses: o que implica a reedição e vale ressaltar que

diferentes aspectos legitimam esse caráter de continuidade, e, outro, que implica

na relação entre conhecimento e sujeito no processo de formação profissional, ou

4. Na época de sua criação, a Jornada Pedagógica da RME foi concebida como parte das ações políticas de uma Gestão Democrático Popular. Ficou um tempo sem reedição mas, atendendo às reivindicações dos profissionais que exigiam seu retorno, novamente foi reeditada como opção política em uma nova Gestão Democrático Popular.

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Page 112: Revista SME Gyn 2012

seja, nas aprendizagens dos sujeitos que não se estancam ou se findam ao término

de um evento, mas ampliam o conjunto de conhecimentos de cada um e são

expressadas no cotidiano das instituições.

Foi sob o discurso de que “O que é bonito é pra se ver” que, em 2001, os

profissionais da educação foram convidados pela Secretaria Municipal de

Educação para participarem da I Jornada Pedagógica, realizada em janeiro de

2002. O discurso, pautado no reconhecimento e valorização profissional,

anunciou a toda Rede a “crença” de uma gestão em seus profissionais. Reafirmou

o compromisso com a educação pública de qualidade, a partir de uma ação de

formação continuada, que legitimava a qualificação de seus profissionais,

propondo-lhes assumir o lugar de pertença, lugar de formadores, de quem tinha a

contribuir, de quem produzia conhecimentos, de quem tinha muito a dizer sobre

as práticas e suas contribuições para o processo de aprendizagem e

desenvolvimento de nossos alunos.

A primeira edição privilegiou, como organização metodológica, o relato

de experiências. Foram mais de 60 trabalhos inscritos, diversas reuniões da

comissão e muita expectativa de se fazer um trabalho de qualidade, que

promovesse aprendizagens, que reafirmasse a capacidade de nossos profissionais

e reconhecesse as experiências como fonte de conhecimento, não como objeto de

reprodução, mas como objeto de estudo, a partir da análise dos elementos

conceituais que subsidiaram as ações educativas ou as experiências relatadas.

A avaliação do evento pela SME foi orientada pelo conjunto de

procedimentos que o promoveram, quais sejam: processo de divulgação,

inscrição e seleção de trabalhos a serem apresentados; processo de divulgação e

inscrição para participação no evento como cursista; organização da

infraestrutura e logistítica de todo o evento. A avaliação dos participantes

constatou a necessidade de aprimoramento de alguns processos, mas, sobretudo,

confirmou o nível de qualidade do trabalho desenvolvido pelos profissionais nas

instituições.

Confirmada a qualidade política e pedagógica da Jornada, foi necessário

compreender: que fundamentos teóricos determinavam as práticas dos

profissionais da RME? Como esses referenciais subsidiavam o trabalho nas

instituições? Que princípios, eixos e temas poderiam ser trabalhados em rede a

Page 113: Revista SME Gyn 2012

fim de qualificar os Projetos Pedagógicos na Educação Infantil, Ciclos e EAJA?

Essas questões orientaram a organização da segunda, e demais edições, da

Jornada Pedagógica em minicursos, palestras, mesas redondas e atividades

culturais.

Vale ressaltar que o grande destaque das Jornadas, o que as caracteriza

como uma ação coletiva e articulada da RME, foi, e ainda é, a atuação dos

profissionais da própria rede que propõem socializar o seu saber-fazer, seja nos

relatos de experiências, quanto nos minicursos que somam, a cada edição, mais

de cinquenta. Abrir espaço para que os profissionais da RME possam mostrar

aquilo que estudam e realizam nas instituições educacionais é o elemento mais

rico que compõe a Jornada Pedagógica.

A estrutura geral de todas as edições mantem-se: 40 horas distribuídas em

palestras, mesas redondas, minicursos, atividades culturais artísticas e atividades

não presenciais.

Os temas centrais das Jornadas Pedagógicas evocam o debate sobre a

qualidade do ensino e da aprendizagem, tendo como foco a qualidade social.

Entende-se que aprender com qualidade social significa aprender coisas

significativas para a vida, para o desenvolvimento humano e para a construção da

subjetividade. Implica, portanto, considerar que crianças, adolescentes, jovens e

adultos são partícipes de um processo em que ressalta a formação humana em

questão. Isto nos remete a pensar: aprender o quê? Aprender como? Aprender pra

quê? Aprender com quem? Aprender onde? Aprender quando? Isto implica

considerar o currículo na RME e as temporalidades da vida.

No cenário aqui esboçado, a Jornada Pedagógica da RME não se traduz

num evento certificador, esporádico e pontual. Ao contrário, integra a Política de

Formação Continuada em rede e dialoga com um conjunto de outras ações

formativas que somam esforços no sentido de qualificar o saber-fazer dos

profissionais da RME. O que se quer dizer aqui é que os sujeitos vivenciam

diferentes momentos formativos ao longo da profissionalidade, sendo, muitos

destes, oferecidos pelo Centro de Formação dos Profissionais da Educação de

Goiânia.

A Jornada é, portanto, mais um espaço e mais uma opção formativa.

Todavia, ela é uma das ações mais desejadas e mais participativas que agregam os

Page 114: Revista SME Gyn 2012

foto: divulgação SME

profissionais da RME. Portanto, a Jornada nasce da experiência proposta pelo

Centro de Formação dos Profissionais da Educação e se fortalece na cultura da

RME como uma ação de rede que mobiliza diferentes profissionais.

Para entender a dimensão pedagógica da Jornada, faz-se necessário

discutir sobre sua constituição como um importante espaço educativo no qual

sujeitos produzem a significação social dos conhecimentos e das habilidades

inerentes ao exercício profissional nas instituições educativas. Trata-se de dizer

que aquilo que constitui a natureza pedagógica da Jornada implica uma postura

profissional de construção crítica dos conhecimentos e da busca de novas formas

de responder aos desafios cotidianos para a resolução dos problemas específicos

da realidade pedagógica. Portanto, aquilo que constitui o pedagógico da Jornada

revela também uma opção política, a saber: qualificar os processos de ensinar e

aprender tendo como princípio a educação como bem público e social.

Compreendida a dimensão e a natureza da Jornada Pedagógica, cabe agora

o seguinte questionamento: por que propor uma atividade desta natureza

envolvendo diferentes sujeitos que atuam em diferentes contextos educacionais?

Page 115: Revista SME Gyn 2012

A resposta não poderia ser outra senão o pressuposto de que a Jornada Pedagógica

permite aos seus participantes a reflexão do conhecimento pedagógico naquilo

que corresponde aos processos ensino-aprendizagem, a gestão, o currículo, a

avaliação, a relação entre os sujeitos do processo educativo e a ampliação da

cultura. Isto implica considerar que os profissionais que participam desta

atividade buscam nessa ação formativa elementos para o exercício da dimensão

política na profissionalidade, essa última entendida como atuação crítica. Da

mesma forma, procuram fortalecer a dimensão pedagógica, que possibilita

múltiplas e diferenciadas experiências ao longo de sua história profissional.

Assim, reeditar a Jornada Pedagógica implica tomá-la, mais do nunca,

como uma opção política e como uma ação estratégica na qualificação das

políticas públicas, particularmente da educação. Entende-se por políticas públicas

o conjunto de ações efetivas do Estado na garantia dos direitos sociais. Elas

expressam, portanto, as dimensões do universo simbólico e cultural próprios da

sociedade e a forma como os indivíduos se colocam neste cenário social. Portanto,

uma política pública, e a educação que se enquadra neste processo, é também

resultado de uma prática social construída coletivamente por diferentes sujeitos.

Assim, a educação é concebida como prática social ou como uma “atividade

humana e histórica que se define no conjunto das relações sociais, no embate dos

grupos ou classes sociais, sendo ela mesma forma específica de relação social. O

sujeito dos processos educativos aqui é o homem e suas múltiplas e históricas

necessidades (materiais, biológicas, psíquicas, afetivas, estéticas e lúdicas.)”

(FRIGOTTO, 2003, p. 31)

A função social da educação, bem como a função social da Jornada

Pedagógica se entrelaçam no aspecto em que todos os profissionais da RME têm o

direito de uma formação de qualidade social. Isto implica repensar tempos,

espaços, ações educativas e aprendizagens durante as ações empreendidas pela

Jornada.

Viver um tempo intensivo de aprendizagens, num espaço pedagógico e

educativo diferenciado e por meio de atividades diversificadas, possibilita aos

sujeitos construirem outros referenciais para a sua ação profissional. Contrária à

pespectiva de modelos a serem apreendidos e incorporados, a Jornada sugere

alguns fundamentos de um processo formativo pautado na:

Page 116: Revista SME Gyn 2012

socializaçao de experiências – entendidas não como receituário

pragmático, mas como um amplo processo em que o indivíduo registra sua

trajetória pessoal e profissional com base naquilo que ele considera como

significativo para seu crescimento como pessoa;

ideia de unidade de Rede – uma vez que, na Jornada, diferentes etapas e

modalidades da Educação Básica se encontram num mesmo espaço-tempo para

discutir as questões da qualidade da educação no município de Goiânia. A ideia de

rede presente nesta ação formativa significa, ainda, uma tentativa de diálogo e

aproximação das Propostas Pedagógicas voltadas para a Educação Infantil,

Ensino Fundamental e Educação de Jovens e Adultos. Este fundamento parte do

princípio de que uma Política de Rede implica, necessariamente, a compreensão

de que a educação se constitui num continnum que objetiva, ao fim e ao cabo, a

formação e o desenvolvimento dos indivíduos;

ideia de valorização do saber-fazer profissional - fundamento que revela

a importância que a SME atribui aos seus profissionais, principalmente quando

compreende que eles podem e devem compartilhar aquilo que lhes é significativo

no campo da profissão. Para tanto, professores e administrativos são concebidos

como educadores e são convidados a compartilhar seus conhecimentos. Valorizar

o saber-fazer do profissional significa, acima de tudo, reconhecer a competência

social e pedagógica destes profissionais. Neste caso, a Jornada abre espaço para

que diferentes sujeitos revelem suas concepções de mundo, de homem e de

processo educativo;

na valorizaçao dos tempos, espaços e aprendizagens - uma vez que a

Jornada concebe a possibilidade de aprender e ensinar em diferentes tempos,

espaços e sob diferentes metodologias. Enquanto espaço formativo, ela agrega

momentos coletivos e individuais que podem acontecer em palestras,

conferências, minicursos, vivências, trocas, debates etc. O que se quer dizer com

isso é que a Jornada Pedagógica é um espaço onde todos podem aprender coisas

significativas para sua experiência profissional. Isto implica, acima de tudo,

diálogo e interação social.

Por fim, há que se destacar aqui o sentido político da Jornada Pedagógica.

Pelo conjunto dos fundamentos que orientam esta ação formativa, não haveria

outro lugar para sua reedição se não fosse uma opção política da SME Goiânia,

Page 117: Revista SME Gyn 2012

que procura resgatar uma das iniciativas que mais despertaram nos profissionais

da RME, o sentimento de pertença. Dito de outra forma, a Jornada desperta nos

profissionais o sentimento de pertencer a uma rede, que dialoga em busca de

referenciais para a qualidade do ensino. Portanto, retomá-la, reeditá-la ou

reinventá-la pressupõe, acima de tudo, explicitar seus princípios e fundamentos

que, desde outrora, foram delineando esta atividade como uma ação dos, e para os,

profissionais da RME. A cada edição, um anúncio político e um chamamento para

que todos os sujeitos do processo educativo ajudem a construir a educação pública

de qualidade no município de Goiânia.

Apresentadas as dimensões histórica, política e pedagógica, é possível

reconhecer e reafirmar o importante lugar ocupado pela Jornada Pedagógica,

como o locus em que questões referentes às políticas educacionais e culturais

sejam discutidas e vivenciadas, num processo formativo que amplia a capacidade

dos sujeitos de reconhecerem o seu fazer profissional comprometido com um tipo

de sociedade, de homem e de mundo.

Assim, a Jornada Pedagógica da RME é espaço de reafirmação do

protagonismo dos profissionais da RME, que têm nesta experiência formativa o

lugar de reconhecimento da sua formação, da sua história e das suas experiências

que qualificam o ensino e a aprendizagem na educação pública do município de

Goiânia.

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Page 118: Revista SME Gyn 2012

A elaboração dos planos de formação

Alessandra Gomes Jácome de Araújo

Cínthia Camilo

Eleny Macedo de Oliveira

Eulâmpia Neves Ferreira

Este relato objetiva descrever a experiência do Centro de Formação dos

Profissionais da Educação (CEFPE), articulada à Divisão de Educação Infantil

(DEI) e às Unidades Regionais de Educação (URE), na formação continuada da

equipe gestora, dirigentes e professores coordenadores, dos Centros Municipais

de Educação Infantil (CMEI), sobre a formação em contexto e o seu processo de

implantação em 117 CMEI da Secretaria Municipal de Educação de Goiânia

(SME) por meio da construção de planos de formação.

A formação em contexto consiste em ações formativas no ambiente de

trabalho, sob a responsabilidade da equipe gestora, tendo como ponto de partida a

reflexão sobre a prática pedagógica dos profissionais que atuam nesse espaço, em

diálogo com referenciais teóricos. Cunha e Prado (2010, p. 101) afirmam que

“essa modalidade formativa ocupa-se da leitura das práticas como referências

para análise, reflexão e crítica a partir do conhecimento que o professor já

construiu na sua experiência docente”.

Seu objetivo principal é desvelar a rotina institucional, dando a conhecer

aquilo que, por se constituir como elemento do cotidiano, escapa aos olhos e à

compreensão dos profissionais, sendo necessária a reflexão e a tomada de

consciência dessa cultura institucionalizada para promover mudanças na prática

pedagógica, a fim de melhorar a qualidade do trabalho desenvolvido,

particularmente no que compete à aprendizagem das crianças.

1. Pedagoga especialista em Educação Infantil pela Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás, professora efetiva da Rede Municipal de Educação de Goiânia, professora formadora do CEFPE.

2. Pedagoga, especialista em Administração Educacional pela UNIVERSO, professora efetiva da Rede Municipal de Goiânia, professora formadora do CEFPE.

3. Licenciada em artes visuais pela Universidade Federal de Goiás, especialista em docência Universitária pela UEG e mestre em Educação pela UFG.

4. Pedagoga, especialista em Linguagem e Matemática pela Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás, professora efetiva da Rede Municipal de Educação de Goiânia, professora formadora do CEFPE.

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4

Page 119: Revista SME Gyn 2012

De acordo com Cunha e Prado (2010), Ferreira e Zurawski (2011) essa

formação se fundamenta nos seguintes princípios: ser realizada in loco a partir de

uma problemática vivenciada pela instituição e/ou das necessidades e interesses

dos profissionais; estabelecer um diálogo permanente entre teoria e prática por

meio da interlocução com diferentes sujeitos – teóricos profissionais de outras

agências formativas, colegas de trabalho, etc.; possibilitar mudança de prática;

documentar por meio de diferentes registros do processo formativo, para tornar o

conhecimento produzido socializável; ser realizada em co-responsabilidade pelo

coletivo de profissionais.

O processo de implementação da formação em contexto na SME,

originou-se com a Avaliação Externa realizada pela DEI e UREs no ano de 2006,

nas 89 instituições de educação infantil existentes na época. Como resultado dessa

avaliação foi publicado o material denominado “Estudos nos Centros Municipais

de Educação Infantil/2008”, que apontou três aspectos considerados os mais

difíceis de serem garantidos na organização do trabalho pedagógico. De um modo

geral, eles se referem ao desenvolvimento da ação educativa em relação aos

Page 120: Revista SME Gyn 2012

conhecimentos científicos, ao planejamento, bem como à constituição da

identidade cultural, racial e religiosa da criança. Esses dados apontaram como

necessidade a realização de uma formação em rede que possibilitasse a

compreensão desses aspectos e a mudança de determinadas práticas pedagógicas.

Para desenvolver tal formação, foi feita a opção de trabalhar com a equipe

gestora por acreditar que os aspectos supracitados estão relacionados a vários

fatores, dentre eles, ao papel dessa equipe de articular o coletivo em prol de um

objetivo comum, que é garantir a aprendizagem e o desenvolvimento da criança,

por meio da elaboração e implementação da Proposta Político-Pedagógica (PPP)

da instituição.

Assim, em 2009 foram criados Grupos de Trabalho e Estudo (GTE)

compostos pelas equipes gestoras dos CMEI, cujo eixo orientador foi a discussão

sobre “Proposta Pedagógica e Currículo” na Educação Infantil, contemplando os

aspectos indicados pela Avaliação Externa, que desde 2008 foi incorporada às

PPP como Avaliação Institucional. Esses GTE foram realizados com os mesmos

sujeitos, nos anos de 2010 e 2011, tendo o mesmo eixo orientador, com enfoques

diferentes.

Essa formação nos anos de 2009 e 2010 previa o desenvolvimento de um

plano de ação a ser elaborado a partir da Avaliação Institucional realizada pelas

instituições, com ênfase no trabalho com conhecimentos científicos e não

científicos, contemplando três dimensões que são imbricadas, mas que, por

questões didáticas, foram separadas em: formação continuada dos profissionais,

relação família/instituição e garantia do processo ensino aprendizagem. Essa ação

foi acolhida pelas equipes gestoras, que buscaram a sua implementação.

No ano de 2011, o plano de ação foi incorporado à PPP como prática do

planejamento do trabalho pedagógico. No entanto, observou-se, a partir das

discussões e análise desses planos, certa dificuldade das equipes gestoras de

compreender como deveria acontecer a formação continuada do coletivo,

principalmente, no que se refere à relação entre um estudo e outro, pois a maioria o

realizava de forma fragmentada, sem um fio condutor que articulasse as

temáticas. Outro fator observado, foi o pouco uso de estratégias que desvelassem

a realidade, promovessem reflexões e mudanças de práticas, surgindo, daí a

necessidade de trabalhar com a concepção de formação em contexto e com o plano

Page 121: Revista SME Gyn 2012

de formação.

Assim, o plano de formação é um documento-ação que se caracteriza por

um conjunto de situações diversificadas que são elaboradas, implementadas,

avaliadas e socializadas pelo coletivo, de acordo com as demandas e

singularidades de cada instituição, articuladas à PPP, objetivando “dar

oportunidade para que os professores estudem e aperfeiçoem suas possibilidades

de atuação” (FERREIRA e ZURAWSKI, 2011, p.65).

O plano de formação, desenvolvido pelas instituições, estrutura-se em seis

aspectos fundamentais: contextualização, problematização da realidade,

planejamento das ações formativas – estudos, reflexões e registros

desenvolvimento dessas ações, práticas de intervenção e sistematização,

documentação e socialização. Cada um desses aspectos foram avaliados nos 105

planos sistematizados e entregues ao CEFPE em forma de portfólio, relato de

experiência ou artigo científico. Destes, foram destacados os seguintes itens:

relevância das temáticas, problematização da realidade, referenciais teóricos

utilizados, organização e desenvolvimento do plano, registro do processo

formativo, intervenções e mudanças nas práticas pedagógicas. Porém, todos

foram sistematizados em forma de gráficos que apontaram índices, possibilitando

dados para análise e redefinição da formação em contexto para 2012.

Neste sentido, pontua-se duas importantes análises. A primeira refere-se à

postura investigativa dos profissionais frente à problemática a ser estudada e a

segunda à prática de intervenção da equipe gestora. Observou-se que grande parte

dos coletivos não conseguiu elaborar uma questão problematizadora, revelando

que o plano, como processo de investigação-ação-transformação, ainda precisa

ser incorporado à cultura formativa, evidenciando a dificuldade de tomar o

problema como objeto de análise e reflexão.

Quanto as práticas de intervenção da equipe gestora, em parte dos planos

não foi possível identificá-las e quando aparecem nem sempre auxiliam o coletivo

na resolução da problemática levantada. Este dado é significativo, pois a ausência

dessas práticas leva a ausência de planejamento, estudos e registros, bem como de

ações efetivas que transformem e potencializem a prática institucional.

Contudo, cabe ressaltar que as discussões sobre “Proposta Pedagógica e

Currículo na Educação Infantil”, no que se refere ao desenvolvimento do GTE no

Page 122: Revista SME Gyn 2012

triênio 2009-2011, reverberaram na prática pedagógica das instituições por

presentificarem nos planejamentos e na ação educativa o trabalho com

conhecimentos científicos e não-científicos, a necessidade de realizar estudos e

formações sobre registros reflexivos e a busca pela efetivação dos projetos de

trabalho como possibilitadores de uma postura investigativa diante da realidade e

de apropriação e produção de conhecimentos.

Enfim, ao considerar que a concretização da formação continuada, em

seus diferentes aspectos, se estabelece de modo dialético, com avanços,

retrocessos, rupturas, possibilitando aos sujeitos se colocarem como atores desse

processo, avalia-se que apesar das dificuldades vivenciadas, a SME, em seus

vários espaços (DEI, CEFPE, URE e CMEI), tem buscado estabelecer uma

política de formação articulando os distintos papéis e ações desses espaços de

modo a materializar a formação em contexto, por meio dos planos de formação,

como uma importante dimensão da atuação docente, visando “qualificar as

práticas com as crianças e garantir a elas boas experiências de aprendizagens”

(FERREIRA e ZURAWSKI, 2011, p.66) uma vez que proporciona a reflexão e a

tomada de consciência dos saberes do fazer pedagógico.

Referências

CUNHA, Renata Cristina Oliveira Barrichelo e PRADO, Guilherme do Val Toledo.

Formação centrada na escola, desenvolvimento pessoal e profissional de professores.

Revista de Educação PUC – Campinas, n.28, p.101-111, jan./jun., 2010.

FERREIRA, Marisa Vasconcelos: ZURAWSKI, Maria Paula. Formação de professores

e currículo integrado. Educação Infantil 2. Especial da Revista Educação. Editora

Segmento. Fundação Carlos Chagas. p. 60-75. 2011.

Page 123: Revista SME Gyn 2012

Diálogos e práticas na formação inicial e continuada de professores

Daniela da Costa Brito Pereira Lima

Márcia Ferreira Torres Pereira

Nancy Nonato de Lima Alves

Simone de Magalhães Vieira Barcelos

Vanessa Gabassa

A educação infantil no Brasil passa por mudanças legais e teórico-práticas,

a partir de sua definição como dever do Estado e primeira etapa da educação

básica, expressando a visão de criança cidadã, sujeito de direitos, dentre os quais,

a educação em creches e pré-escolas. Tais mudanças resultam da articulação de

diversos processos e de lutas travadas na sociedade, e se expressam em diferentes

aspectos, dentre os quais a formação de professores para atuar em creches e pré-

escolas. A legislação educacional determina a formação desses profissionais em

nível superior, no curso de Pedagogia, ensejando mudanças no cenário histórico

de atuação de voluntários e/ou educadores sem formação específica.

O estágio do curso de Pedagogia da UFG é definido como componente

curricular de caráter teórico-prático, proporcionando contato prolongado do

futuro professor com o campo de atuação profissional, para desenvolver

conhecimentos, habilidades e atitudes específicas da profissão docente. Requer o

envolvimento com a realidade da instituição educacional, aprendendo a

problematizá-la teoricamente, tendo em vista a construção da autonomia

profissional (GOIÂNIA/FE/UFG, 2003). O estágio abrange o ensino

fundamental (Estágio I e II, 5º e 6º períodos) e a educação infantil (Estágio III e IV,

7º e 8º períodos). A proposta de estágio prevê, ainda, o projeto de formação

continuada para os profissionais das instituições-campo, elaborado e

1. Mestre em Educação, doutoranda em Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento. Professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás e UnU- Anápolis- UEG.

2. Mestre em Educação, professora da Faculdade de Educação da Universidade federal de Goiás.

3. Doutora em Educação, professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás.

4. Mestre em Educação, professora da UnU- São Luis de montes Belos_UEG.

5. Doutora em Educação, professora da Faculdade de educação da Universidade Federal de Goiás.

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Page 124: Revista SME Gyn 2012

desenvolvido anualmente por professores (as) da disciplina, considerando tanto a

realidade, interesses e necessidades de cada instituição, quanto a inserção dos

estagiários(as).

A disciplina de estágio em educação infantil geralmente possui dez turmas

anuais, com inserção majoritária em centros municipais de educação infantil

(CMEI) da RME de Goiânia. As professoras elaboram coletivamente os planos de

curso, em consonância com o projeto de estágio (GOIÂNIA/FE/UFG, 2003),

promovendo estudos conceituais; observação e análise das práticas pedagógicas;

conhecimento crítico-reflexivo do campo de estágio e de seu PPP; construção e

desenvolvimento de propostas de ensino-aprendizagem que se articulam aos

projetos das instituições, mediante parceria com professoras e gestoras em cada

campo de estágio. Verticalizam-se estudos e discussões, envolvendo

historicidade; políticas públicas; indissociabilidade entre cuidado e educação;

práticas pedagógicas; planejamento; diversas linguagens e brincadeira,

explicitando concepções norteadoras dos projetos pedagógicos e do trabalho

docente na educação infantil.

Page 125: Revista SME Gyn 2012

Neste relato, apresentamos experiências de estágio em educação infantil,

ocorridas entre 2010-2012, destacando o projeto de formação continuada em um

CMEI e a formação para educação inclusiva na educação infantil.

Formação Continuada no estágio em educação infantil

A construção da formação continuada no CMEI Viver a Infância

considerou a trajetória histórica e seu PPP, as necessidades e interesses expressos

pela equipe diretiva, e as características observadas pelas alunas de estágio.

Em 2010, buscamos o aprofundamento teórico sobre temas indicados

pelos profissionais do CMEI, favorecendo-lhes estabelecer relações com suas

práticas, vivenciar novas situações e repensar as atuações à luz do que vinha sendo

discutido. Os encontros quinzenais constituíram espaços de reflexão sobre as

ações do CMEI como um todo, ultrapassando o fazer individual das participantes.

Em 2011, abordamos o tema “projetos de trabalho”, numa dinâmica que

toma a pesquisa como prática profissional, constituindo oportunidade coletiva e

colaborativa para elaboração de conhecimentos. Realizamos estudos sobre o

desenvolvimento de projetos de trabalho na educação infantil; definição do tema

geral e dos temas específicos de cada agrupamento; contribuição e

acompanhamento das professoras do CMEI em todas as etapas de elaboração,

execução e avaliação do projeto e das atividades realizadas pelas estagiárias.

Como culminância desse processo foi publicada a primeira revista do

CMEI, que apresenta a experiência do estágio do curso de Pedagogia e tem o

objetivo de divulgar, anualmente, os relatos de experiência construídos pelas

estagiárias, em parceria com as professoras da instituição, revelando uma profícua

interrelação entre a formação inicial e continuada de professores (as).

Estágio e formação para educação inclusiva na educação infantil

O estágio em educação infantil, realizado no Centro de Educação Especial

Helena Antipoff (APAE), se caracterizou por um espaço pedagógico distinto para

a formação do pedagogo.

O Centro, conveniado à SME, atende crianças de zero até seis anos, na área

Page 126: Revista SME Gyn 2012

educacional, clínica e social, com ações conjuntas da educação e saúde, numa

perspectiva democrática e coletiva, considerando a diversidade como meta de

superação das desigualdades. Tendo em vista o compromisso com necessidades e

expectativas de crianças e famílias, assegura propostas educacionais compatíveis

com as políticas públicas para a diversidade. Destacam-se as especificidades das

crianças com deficiências e a atuação multiprofissional no desenvolvimento da

educação infantil inclusiva.

O Centro compõe campo formativo singular pelas especificidades de

atuação e o estudo de seus objetos de investigação, contribuindo para ampliar os

conhecimentos e o campo de atuação pedagógica do futuro professor nas

instituições de educação infantil. Sendo um espaço de formação humana, que

assegura possibilidades de transcender a relação meramente funcionalista no

âmbito da adaptação da criança à realidade, essa experiência correspondeu à

desmistificação do que comparece na educação sobre a inclusão, no sentido de

investir concretamente na reflexão da relação entre professor e aluno e as

ressignificações do processo de formação da criança e do professor de educação

infantil.

O estágio de educação infantil no Centro Helena Antipoff tem

proporcionado às futuras pedagogas a compreensão das reais condições para a

realização do atendimento educacional especializado, favorecendo a

conscientização de que a sociedade requer profundas alterações para aceitar os

limites e se estabelecer na diversidade. Tal processo demanda a ação educativa e

cultural para a derrubada dos mitos e preconceitos, que ainda permeiam a questão

da deficiência.

Considerações finais

Destaca-se, ainda, o papel das gestoras na realização do estágio em

educação infantil nos diferentes campos em que atuamos.

No acolhimento ao estágio, tem sido relevante a disponibilidade das

gestoras para apresentar e discutir a Proposta Pedagógica da SME para a

Educação Infantil e a PPP das instituições, contextualizando a organização

pedagógica, administrativa e financeira. Ademais, a participação das gestoras

Page 127: Revista SME Gyn 2012

propicia segurança às professoras para receber e interagir com a equipe de estágio.

Constitui-se, dessa maneira, o estágio como interlocução entre a formação

inicial e continuada de professores, a partir do que se reconhece o papel formativo

do professor das instituições e a atuação da equipe de estágio na análise e

problematização das práticas pedagógicas. Nessa perspectiva, avança-se na

superação do estágio como fiscalização e prescrição da atividade docente. Toma

lugar o diálogo em práticas compartilhadas entre universidade, especificamente, a

Faculdade de Educação/UFG e as instituições educacionais da RME/Goiânia, por

meio do estágio em educação infantil.

Referências:

GOIÂNIA/FE/UFG. Projeto Político-Pedagógico do Curso de Pedagogia. Goiânia, 2003.

Page 128: Revista SME Gyn 2012

Um relato sobre a formação de professores do ensino fundamental

Salete Flôres Castanheira

Maria Gonçalves Araújo

Maria Angélica de Oliveira

O objetivo deste texto é apresentar um relato acerca da proposta de

trabalho que inseriu professoras em formação inicial e continuada à pesquisa,

visando superar práticas reducionistas, que limitam a formação à mera atividade

instrumental. Buscou-se, por meio da etnografia, o acesso dessas professoras a

uma pedagogia de leitura .

A formação de professores tem sido objeto de investigação de vários

estudiosos. Embora com abordagens teórico-metodológicas distintas,

destacamos na literatura nacional: Fazenda (2002), Mizukami (2003), Rios

(2010), os trabalhos da etnógrafa e sociolinguíista Bortoni-Ricardo (2010). Já no

âmbito internacional, podem ser citados: Gómez & Sacristán (2007), Schõn

(2007), Erickson (1987) Smith (2007) dentre outros. Suas investigações remetem

à formação de professores para a pesquisa.

A formação do professor, para Gómez & Sacristán (2007), não pode se

restringir a um modelo de preparação técnica, de habilidades consideradas

suficientes para produzir na prática os resultados almejados. Os autores defendem

a seguinte proposição:

O professor não pode ser um técnico que aplica as estratégias aprendidas nos anos de sua formação acadêmica, mas deve necessariamente se transformar num investigador, no âmbito natural

1. Etnógrafa, mestre e doutoranda em educação pela Universidade de Brasília. Professora da PUC-GOIÁS , onde coordena o curso de pós-graduação Lato Sensu Sociolinguística e Letramento e ministra a disciplina Estágio Supervisionado III e IV para o Curso de Pedagogia. E-mail: [email protected].

2. Pedagoga pela Universidade Federal de Goiás . Graduanda em Artes Visuais pela UFG. Diretora da Escola Municipal Manoel José de Oliveira. E-mail: [email protected].

3. Especialista em Educação. Pedagoga pela PUC-GOIÁS. Coordenadora Pedagógica do Ciclo II da Escola Municipal Manoel José de Oliveira.

Ver mais em: BORTONI-RICARDO, S. M.; MACHADO, V. R.; CATANHEIRA, S. F. Formação do professor como agente letrador. São Paulo: Editora Contexto, 2010, 191p.

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Page 129: Revista SME Gyn 2012

em que se desenvolve a prática, onde aparecem os problemas de maneira singular e onde devem ser experimentadas estratégias de intervenção também singulares e adequadas ao contexto (SACRISTÁN & PÉREZ, 2007, p.376).

Mizukami (2003) apresenta, como um dos grandes desafios para a

formação continuada de professores, os projetos que associam pesquisa e

formação:

Um dos grandes desafios enfrentados continuamente em projetos que associam pesquisa e formação de professores tem sido o de construir estratégias investigativas e formativas que permitam, processualmente, oferecer respostas, mesmo que provisórias, aos problemas estudados e, ao mesmo tempo, contribuir para que os professores reconstruam suas práticas, considerando o ethos da escola (MIZUKAMI, 2003, p, 42).

Paulo Freire (2005) corrobora:

Ensinar exige reflexão crítica sobre a prática. A formação de professores precisa ser científica, com rigorosidade metódica, associada à pesquisa, possibilitando que, voltando-se sobre si mesma, através da reflexão sobre a prática, a curiosidade ingênua, vá se tornando crítica (FREIRE, 2005, p.39).

Fazenda (2002), ao tratar de políticas de educação e formação de

professores, considera:

A reordenação dos saberes (científico e social) exige uma formação interdisciplinar. Contudo essa formação é mais que uma metodologia de trabalho, esse tipo de formação interdisciplinar exige uma atitude de pesquisa em que a observação, o registro, a análise e a síntese são contempladas. A reconstrução teórica dos saberes nascerá dos embates singulares vividos (FAZENDA, Ivani In: ROSA, Dalva & SOUZA, Vanilton, 2002, p.206).

É nessa perspectiva de formação que o Estágio Supervisionado do

Curso de Pedagogia da PUC-Goiás se insere. Como componente curricular

obrigatório, “visa proporcionar ao aluno os conhecimentos da real situação de

trabalho, construídos na permanente relação teoria e prática num processo de

reflexão, análise e síntese” (PUC/EDU, 2011, p.28).

Page 130: Revista SME Gyn 2012

Consolidado em 360 horas, do total da matriz curricular de 3.200 horas,

desenvolve-se processualmente a partir do início da segunda metade do curso,

conforme exigência do Parecer 28/2001 CNE/CP. É, portanto, distribuído do 5º ao

8º período: Estágios I e II (5º e 6º períodos), referentes à Educação Infantil, e

Estágios III e IV (7º e 8º períodos) referentes aos Anos Iniciais do Ensino

Fundamental ou à Modalidade da EJA. Evidencia-se uma proposta comprometida

com a qualificação teórico-científica do professor em formação inicial, uma vez

que sua estrutura permite maior tempo de permanência do estagiário na escola

campo, e, consequentemente, maior verticalização dos estudos em uma área.

Foi nesse contexto de formação que as acadêmicas do Curso de Pedagogia

da PUC-Goiás iniciaram o Estágio III, turma CO2, em agosto de 2011/2, na Escola

Municipal Manoel José de Oliveira. Os objetivos do Estágio III consistem em

conhecer a gestão e organização do trabalho pedagógico do campo de pesquisa,

bem como a gestão da sala de aula, para, posteriormente, construir uma proposta

de colaboração a ser desenvolvida no semestre posterior, isto é, Estágio IV, o que

ocorreu em 2012/1.

Antes do ingresso das estagiárias no campo, os estudos na academia

estenderam-se desde a concepção de estágio, adotada pelo curso de Pedagogia da

PUC Goiás, até as questões políticas da educação. Ocorreu a discussão sobre o

Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e sua composição: Avaliação

Nacional da Educação Básica (Aneb) e Avaliação Nacional do Rendimento

Escolar (Anresc), também conhecida como Prova Brasil. Os resultados do Saeb

para a compreensão leitora tornaram-se foco de interesse e investigação das

acadêmicas, especialmente por demonstrarem o baixo desempenho nos graus de

competência leitora dos alunos concluintes do ensino fundamental.

Posteriormente, ingressamos no campo de estágio para iniciar a fase

exploratória do trabalho. Logo nos primeiros contatos entre a professora do

estágio e as estagiárias com a equipe gestora e professoras colaboradoras, os

diálogos dirigiram-se para a Prova Brasil, em função de sua aplicação na escola,

em novembro do mesmo ano. O interesse das estagiárias veio ao encontro da

realidade da escola-campo.

A partir das discussões e expectativas, definiram-se duas ações. Na

primeira, o projeto de pesquisa das estagiárias investigaria a seguinte questão: a

Page 131: Revista SME Gyn 2012

partir das práticas de leitura vivenciadas na escola-campo, como contribuir para

elevar o grau de compreensão leitora dos alunos? A segunda seria propor um curso

de formação continuada para as professoras e os gestores da escola, ministrado

pela professora do Estágio Supervisionado, abrangendo os descritores da

avaliação em leitura da Prova Brasil.

A temática do Estágio então se definiu em torno do acesso das professoras

em formação inicial e continuada a uma pedagogia de leitura. O eixo central do

nosso trabalho estava em sintonia com a realidade da escola-campo: a formação

de professores como mediadores da leitura.

Essas ações tiveram como objetivo principal possibilitar que as

professoras da escola-campo, por meio da formação continuada, bem como as

estagiárias do Curso de Pedagogia da PUC Goiás (formação inicial), assumissem

o papel de mediadoras da leitura, empregando estratégias de leitura, com foco na

aprendizagem dos conteúdos escolares inseridos em textos informativos, em

diferentes disciplinas. A seguir encontram-se os objetivos específicos da

formação.

foto: divulgação SME

Page 132: Revista SME Gyn 2012

Aprofundar a discussão sobre currículos, conteúdos, planos, estratégias e

avaliação da leitura na perspectiva de letramento.

Elaborar oficinas empregando estratégias cognitivas de leitura.

Desenvolver a competência comunicativa dos alunos por meio da

avaliação oral da leitura.

Construir em sala de aula ambiente interacional que favoreça o

desenvolvimento linguístico, afetivo e social dos alunos.

Aproveitar de forma adequada o tempo da sala de aula.

Produzir dados para reflexão e análise em relação aos professores em

formação continuada e inicial – estagiárias do Curso de Pedagogia da PUC Goiás

a partir da gravação em áudio de práticas de mediação da leitura e compreensão

leitora.

A partir desses objetivos, as discussões teóricas sobre leitura na

perspectiva do letramento e pesquisas nos sites governamentais sobre o Sistema

de Avaliação da Educação Básica se intensificaram, subsidiando a elaboração do

projeto de pesquisa das estagiárias bem como a programação da formação

continuada. As aulas semanais na academia e a pesquisa exploratória no campo de

estágio permitiram que estagiárias e escola-campo trabalhassem em sintonia,

construindo ao mesmo tempo uma proposta de intervenção para ser desenvolvida

no semestre vindouro, ou seja, no Estágio IV.

As seguintes ações comuns envolveram estagiárias e professores:

Encontros para aprofundamento teórico.

Estudos individuais com leituras direcionadas para discussão nos grupos.

Oficinas para preparação dos planos de aula.

Reflexões sobre os planos de aula e a prática de leitura.

Análises dos vídeos das aulas ministradas a partir dos estudos teóricos

realizados.

Elaboração de novos planos de leitura a partir dessas análises.

Encontros para avaliar o desenvolvimento dos alunos a partir do curso.

Encontros para avaliar as contribuições do curso e propor novas ações.

Nesse contexto, a professora do estágio apresentou o projeto do curso de

formação continuada para a equipe gestora e os professores da Escola Municipal

Manoel José de Oliveira. Aceito o projeto, o curso Mediação pedagógica,

Page 133: Revista SME Gyn 2012

compreensão leitora e aprendizagem dos conteúdos escolares – ler para estudar,

ler para aprender iniciou-se em setembro de 2011, com carga horária de 80 horas,

estruturado em duas fases.

A primeira, composta de 40 horas, estendeu-se de setembro a dezembro de

2011. Nos encontros presenciais, foram discutidos, na sua maioria, os textos que

orientaram os estudos das estagiárias com o intuito de subsidiar os diálogos, os

projetos de pesquisa e os planejamentos.

A segunda fase, também com 40 horas, ocorreu de fevereiro a junho de

2012, totalizando 80 horas. Nesta fase, tanto as professoras colaboradoras como

as estagiárias – agora cursando Estágio IV – 2012/1, desenvolveram práticas de

leitura com base nos estudos e registros anteriores. Os eventos em sala de aula,

letramento das professoras e das estagiárias, foram por elas registrados em vídeos.

As estagiárias analisaram seus registros etnográficos sob a orientação da

professora do estágio. Definidos quais apresentaram contribuições significativas

para as práticas de leitura, passaram a compor o relatório final do estágio: registro,

descrição, análise e síntese.

Os registros documentados pelas professoras foram analisados por elas,

com colaboração da equipe gestora e da professora do estágio.

Em ambos os processos, os eventos que não atingiram os objetivos foram

analisados num processo de ação-reflexão-ação. Tanto o Curso de Formação

Continuada como o Estágio IV foram concluídos em junho de 2011/2.

Participaram desse trabalho sete estagiárias da PUC Goiás e oito

profissionais da escola-campo, entre gestores e professoras. As estagiárias

avaliaram a experiência como singular para a sua formação. Seus depoimentos

sintetizam a ideia de um trabalho intenso de aprender a pensar a prática, o que

exigiu valorizar os conhecimentos construídos ao longo do curso de formação, um

verdadeiro “pensar interdisciplinar”. Os professores da formação continuada

apresentaram os seguintes relatos:

“Quando a PUC Goiás chegou à nossa escola através da professora Salete

Flôres Castanheira, apresentando a proposta de estágio que atenderia ao Ciclo I e

II, oferecemos às estagiárias espaço para realizar essa experiência acadêmica no

nosso contexto escolar. Diante da proposta da professora responsável pelo estágio

de trabalhar com a leitura, constituímos um grupo de estudo cujo objetivo foi

Page 134: Revista SME Gyn 2012

propiciar uma formação continuada envolvendo a leitura. Abraçamos a

oportunidade. Como equipe gestora, acreditamos na proposta, nos envolvemos

com ela e, mesmo com as limitações físicas da nossa escola, nos organizamos

para que acontecesse a formação continuada. O convite foi estendido para a

equipe pedagógica e alguns professores aderiram ao projeto e a participação foi

positiva, pois possibilitou reflexões sobre a práxis pedagógica do contexto da

leitura.”

“Vivenciar essa experiência foi um processo enriquecedor e significativo,

pois trouxe contribuições e reflexões pertinentes para a nossa prática pedagógica.

A formação possibilitou reflexões sobre os processos de desenvolvimento da

leitura em sala de aula e a importância de fazer do nosso aluno um leitor

consciente e crítico.”

“Através de leituras, discussões de textos e artigos relacionados ao assunto

e aulas práticas, foi possível abordar a leitura utilizando, principalmente, textos

informativos, criando possibilidades de usarmos diversas modalidades de leitura

(oral, coletiva, individual), dando ao aluno acesso ao conhecimento da língua

portuguesa. O objetivo foi desenvolver a compreensão leitora do aluno por meio

da leitura tutorial de diversos textos informativos, destacando sua importância e

elementos significativos para a construção do conhecimento. Trabalhar com texto

informativo requer muita pesquisa e preparação antecipada por parte do professor,

objetivando despertar no aluno interesse pela leitura e propiciando aprendizagem

significativa, especialmente dos conteúdos escolares. A importância do uso desse

tipo de texto é fundamental no processo ensino e aprendizagem, permitindo,

também, discutir conhecimentos trabalhados anteriormente, estabelecendo

conexões com outros conteúdos por meio do desenvolvimento da leitura realizada

em sala de aula.”

“Através dos textos, nós, professores, fomos incentivados a discutir e a

refletir sobre o assunto trabalhado, a perceber nas entrelinhas informações

importantes para a compreensão textual e a língua portuguesa, interagindo com

outras disciplinas ao mesmo tempo, como o significado de determinadas

expressões e outros vocábulos. A proposta enfatizou também a necessidade de

organizar o ambiente interacional para favorecer a participação dos alunos. Para

isso, é necessário, preferencialmente, organizar a sala de aula em duplas ou na

Page 135: Revista SME Gyn 2012

forma de “u”, em um ambiente que seja favorável ao ensino e à aprendizagem da

leitura, bem como estabelecer regras de participação e desenvolvimento da aula.

Com foco na leitura tutorial é imprescindível a apresentação do texto e dos

objetivos da aula, preparação do material antecipadamente, levantamento de

conhecimentos prévios dos alunos antes e durante o processo de leitura com

relação à temática da aula, observando imagens, título e perguntas elaboradas pelo

professor, utilizar estratégias de leitura (predição, recapitulação contínua,

inferência, deixa/inferência).”

“Todas essas estratégias são importantes para favorecer a participação do

aluno no processo de leitura. Para isso, fomos orientados com fundamentos

teóricos da sociolinguística interacional a criar um ambiente que motive essa

interação, sendo o professor mediador desse processo. Ressaltou-se, também, a

importância do planejamento, detalhando as ações a serem trabalhadas na sala de

sala. Como professores, sabemos o quanto é fundamental o planejamento das

atividades para que ocorra aprendizagem significativa. Nesse sentido, o curso

reforçou esse pensamento baseado nas teorias pedagógicas e na reflexão dessa

prática. Além de planejar e criar um ambiente que favoreça a aprendizagem do

aluno, refletimos também sobre o papel do professor nesse processo. A mediação

é fundamental para que ocorra a participação do aluno e a avaliação da leitura. É

possível fazer um diagnóstico da aprendizagem através do processo de interação

do aluno com o conhecimento, no caso, o ato de ler, interpretar, discutir e refletir

sobre as informações que estão contidas no texto. E esse diagnóstico é

concretizado com a mediação do professor. Portanto, o papel do professor é

instigar o aluno para que se envolva no processo de leitura de acordo com os

objetivos propostos para o texto em estudo. Quando temos um planejamento, os

objetivos são claros e significativos no processo de aprendizagem. Além disso, o

aluno é levado a trazer os conhecimentos prévios para o momento de discussão da

leitura.”

“Essa experiência validou nossos conhecimentos a respeito da leitura e sua

importância no espaço escolar, onde podemos criar condições para que o aluno se

envolva literalmente numa proposta de leitura dirigida e construída

coletivamente. Como grupo de estudo ficou o desejo e a sensação de 'quero mais'.

Somos sujeitos de nossa própria ação e estar envolvido num grupo de estudo

Page 136: Revista SME Gyn 2012

discutindo concepções e práticas que contribuem para a nossa vivência e prática

em sala de aula é, sobretudo, uma busca em querer o melhor para os nossos alunos.

Somos preocupados com o ensino público e acreditamos que a escola é um lugar

de transformações sociais, e isso só será possível com um trabalho comprometido

com a qualidade do ensino no nosso contexto escolar. Portanto, a leitura é um

caminho que possibilita essa transformação. E para o aluno desenvolver essa

competência leitora precisamos investir em ações pedagógicas significativas e

transformadoras da realidade do nosso aluno.”

Os depoimentos dos participantes do grupo de estudo foram todos

positivos, no sentido de acreditar na proposta e poder colocá-la em prática nas

nossas ações cotidianas, que envolvem a prática pedagógica, especialmente a

leitura.

A parceria com a universidade, ressaltando essa contribuição para discutir

e propor ações que realmente atendam à realidade da escola pública foi de suma

importância. Escola e universidade são promotoras do conhecimento e parceiras

nesse processo. Assim, todos juntos construiremos ações significativas e

importantes para que a nossa educação seja cada vez mais qualitativa.

Referências

BORTONI-RICARDO, S. M.; MACHADO, V. R.; CATANHEIRA, S. F. Formação do professor

como agente letrador. São Paulo: Editora Contexto, 2010, 191p.

FAZENDA, Ivani. Diversidade cultural no currículo de formação de professores – uma dimensão

interdisciplinar. In: ROSA, Dalva & SOUZA Vanilton (org.). Políticas organizativas e

curriculares, educação inclusiva e formação de professores. Rio de Janeiro. DP&A, 2002.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. São Paulo, Paz e Terra, 2005.

GÓMEZ, Pérez. A função e a formação do professor no ensino para a compreensão: diferentes

perspectivas. In: SACRISTÁN, Gimeno & GOMEZ, Pérez. Compreender e transformar o ensino.

Porto Alegre. Artmed, 2007, pp. 353-379.

MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoletti, et al. Escola e aprendizagem da docência: processos de

investigação e formação.São Carlos, Ed. UFSCar, 2003.

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS. Projeto Pedagógico do Curso de

Pedagogia. Unidade Acadêmico-Administrativa de Educação – EDU. Goiânia/GO, 2011.

Page 137: Revista SME Gyn 2012

O estágio como espaço formativo na educação de jovens e adultos

Janaína Cristina

Maria Emilia de Castro

Maria José do Nascimento

A UFG e a PUC Goiás, dentre outras instituições de educação superior

(IES) que formam pedagogos em Goiás, vêm historicamente buscando construir

suas propostas de estágio, em consonância com as demandas para a formação de

professores, sem se descuidarem do aprimoramento da relação entre universidade

e instituições-campo de estágio. Uma relação que deve pautar-se na

horizontalidade e que exige permanente atenção e zelo, posto que sua finalidade

principal é propiciar experiências fundamentais à formação de educadores, que,

em sua maioria, atuarão na educação pública estatal.

Essas universidades, que compõem o Fórum Goiano de EJA, têm como

princípios para realização do estágio a dialogicidade e a referência à escola como

locus de reflexão teórico-prática. Isso significa considerá-la como espaço

privilegiado de pensar o fazer docente e seus profissionais, educandos, além dos

estagiários, como sujeitos na construção e realização das propostas de estágio.

Preservadas as especificidades de cada matriz curricular, essas IES organizam o

1

2

4

3

5

1. Mestre em Educação, professora da PUC GO, professora da Rede Municipal de Educação de Goiânia, membro do Forum Goiano de EJA.

2. Doutora em Educação, Professora da UFG e membro do fórum Goiano de EJA.

3. Mestranda em educação, professora das Redes Municipal de Educação de Goiânia e da rede Estadual de Educação de Goiás.

4. A respeito da constituição, princípios e atividades desse Fórum ver <http://www.forumeja.org.br>

5. No curso de pedagogia da PUC Goiás, o estágio supervisionado totaliza 360 horas. Nos 5º e 6º períodos, volta-se aos estudos e propostas de intervenção na educação infantil e nos 7º e 8º para o ensino fundamental, sendo o trabalho direcionado a crianças e adolescentes ou a jovens e adultos, na modalidade EJA. Na UFG esse estágio totaliza 400 horas, se diferenciando, ao inverter a modalidade de atendimento: nos 5º e 6º períodos volta-se aos anos iniciais do ensino fundamental e nos 7º e 8º períodos, para a educação infantil.

Page 138: Revista SME Gyn 2012

estágio de forma a garantir momentos de: a) aprendizado para os educandos, b)

formação inicial para os estagiários e c) formação continuada para os

profissionais das instituições campo.

Como diretriz comum também está a preocupação em dialogar com os

profissionais, para delinear as propostas de trabalho e de formação, posto que

precisam ser levados em conta o percurso das escolas-campo, seus cronogramas,

limites, possibilidades, interesses e necessidades de estudo. Desse modo, o

estágio se constitui como espaço formativo, que contribui também com as IES na

apreensão das múltiplas especificidades que constituem a identidade da EJA.

Formação do pedagogo e a escola como locus de reflexão

Na formação inicial o estágio busca vivenciar processos de ensino-

aprendizagem, com pesquisa na escola-campo, e desenvolver conhecimentos,

habilidades e atitudes relativas à profissão docente.

Considerando a formação teórico-prática do curso e o contato direto com o

campo de estágio, reconhecido como locus de formação, as acadêmicas são

orientadas à: a) elaboração do diagnóstico inicial por meio de análise documental,

observação participante, além de entrevistas com a direção, coordenação,

educandos e diálogos com professores sobre o fazer pedagógico e temas de

interesse dos alunos; b) elaboração e desenvolvimento do projeto de ensino-

aprendizagem com pesquisa; c) análise dos dados obtidos e sua sistematização

para produção de relatório.

Este processo inicial muitas vezes suscita nos profissionais das

instituições-campo interpretações e percepções variadas; o que na voz da

professora M se reveste da seguinte clareza:

Receber estagiários de pedagogia na sala de aula que está sob a minha responsabilidade se tornou rotina. E uma rotina com sabor de gostosura. Explico. O contato com estudantes em situação de estágio faz com que eu possa refletir sobre a minha própria prática e também sobre os meus pressupostos teóricos. Penso que esse sabor agridoce

6

6. Professora da EJA das escolas municipais Coronel Getulino Artiaga e Itamar Martins Ferreira, as quais são campos de estágio.

Page 139: Revista SME Gyn 2012

pode não ser deleite de todos os/as professores/as que recebem em suas turmas estagiários/as. E isso se deve a nossa curta memória. Às vezes nos esquecemos do tanto que o “estágio” é e foi importante para a nossa constituição profissional. Momento ímpar, porque foi oportunizada, nesse instante, a apreensão da eterna aliança entre a teoria e a prática, entre o fazer e o saber. E, anos depois, quando estamos constituídos da autoridade de ser professor/a e com a responsabilidade do fazer pedagógico, corremos o risco, embora não intencional, de nos distanciarmos do saber e ficamos centradas no “saber fazer” (nem teórico e nem político). Esse sentimento muitas vezes ocorre, porque a maioria dos professores/as não tem o controle do tempo, que é dividido em jornadas triplas de trabalho, além dos afazeres pessoais.

O pensar sobre a prática é fundamental e, nesse processo, a escuta ao outro,

se colocar em seu lugar e planejar a partir das demandas da EJA são momentos

fundantes, pois a visão social de professor e seu papel educativo exigem uma

‘‘posição de protagonismo’’. Na EJA, essa necessidade se torna emergente e

urgente e se constitui nas dimensões prática, teórica e política. Para implementá-

las, é necessário o desenvolvimento de práticas que exigem a percepção da

docência como uma profissão dinâmica e em constante desenvolvimento e de seu

papel de mediador no ensino-aprendizado.

Page 140: Revista SME Gyn 2012

É nesta perspectiva que a elaboração e desenvolvimento dos projetos de

ensino-aprendizagem advêm das análises do diagnóstico inicial, do diálogo com

educandos sobre interesses e necessidades e com professores que contribuem,

entre outros aspectos, refletindo sobre as regências e as particularidades da

aprendizagem dos educandos da EJA. Isso demanda estudo sobre a especificidade

e seriedade com a profissão e os sujeitos, os princípios do processo ensino-

aprendizagem, o planejamento e ensino com pesquisa, o projeto político-

pedagógico, as temáticas dos projetos, entre outros.

Já a formação continuada com os profissionais das escolas se dá a partir do

levantamento dos temas de interesse e por meio do estudo de textos, discussões e

trocas de experiências sobre o trabalho desenvolvido na EJA.

Numa avaliação da formação continuada promovida por essas IES, a

professora M. afirma:

Acredito que foram estas as intenções da contrapartida das IES em relação à formação continuada em serviço dos professores/as que atuam nas escolas campo: a construção de uma formação que tenha a prática educativa e o saber pedagógico como um dos componentes que possibilitam a análise e a compreensão das relações entre o conhecimento produzido e a sociedade; sua interligação entre teoria e prática e incentivando a pesquisa como uma forma de aprendizagem.As ações são realizadas coletivamente e buscam inter-relacionar o cotidiano escolar com pressupostos teóricos que às vezes vêm de encontro com a realidade ou contestam a nossa prática. Penso ser este o sentido político, prático e teórico entrelaçados nessa comunhão entre escola-campo e as IES. Ambos bebem da fonte respeitando seus espaços e construindo, com ética, novos saberes, novas jornadas, novos olhares, enfim, novos 'protagonismos' sonhados, almejados e, quem sabe, realizados.

Nesse processo, que sempre poderá ser aprimorado, crescem juntas

escolas-campo de estágio e universidades.

7

7. Tal entendimento é também o de membros da equipe gestora de escolas-campo, a exemplo da coordenadora pedagógica da E.M. Cel. Getulino Artiaga, Leonice Aleixo, com quem a escrita das reflexões contidas nesse relato foram partilhadas e construídas, a partir de experiências formativas vivenciadas com profissionais da escola.

Page 141: Revista SME Gyn 2012

O Conselho Municipal de Educação de Goiânia na defesa dos direitos das crianças

Acácia Aparecida Bringel

Milna Martins Arantes

Esse relato tem por finalidade apresentar como tem atuado o Conselho

Municipal de Educação (CME) de Goiânia para o cumprimento de suas

atribuições normativas e deliberativas, no âmbito do sistema municipal de ensino,

com vistas à defesa dos direitos das crianças.

Para ilustrar como tem atuado este Conselho, apresentamos a síntese do

caminho percorrido na análise de uma matéria, a qual refere-se a uma denúncia

encaminhada ao órgão pelos familiares de uma criança que recebeu várias

mordidas de outra criança durante sua permanência na instituição de educação

infantil caracterizando possível negligência dos profissionais da instituição na sua

responsabilidade de garantir, de forma indissociável, o cuidar e educar. No relato

ora apresentado serão resguardas a identidade de todos os sujeitos envolvidos.

A matéria em questão foi objeto de análise em parecer da Assessoria

Técnica do CME. O fato ocorreu no momento em que as crianças, que

permanecem em período integral, descansavam outras crianças saíam e chegavam

à instituição, alguns professores estavam no horário de almoço e outros

profissionais ainda não haviam chegado para cumprir o turno de trabalho.

Para cumprir as funções que lhe são devidas, o Conselho Municipal de

Educação, depois de protocolada a denúncia, por meio de suas equipes de

trabalho, procedeu da seguinte forma: primeiramente, a Divisão de Inspeção

Escolar (DIE) verificou in loco a veracidade da denúncia, registrando as

constatações em um relatório; no segundo momento, a Assessoria Técnica

procedeu à análise e buscou fundamentação legal e teórica para elaboração do

1

2

1. Cientista Social, mestre em educação brasileira/UFG e assessora técnica do CME/ Goiânia

2. Graduada em educação artística e educação física, mestre em educação física/ Unicamp e assessora técnica do CME/ Goiânia

Page 142: Revista SME Gyn 2012

parecer, que subsidiou a deliberação do Conselho Pleno quanto às medidas a

serem tomadas.

Há de se atentar que o movimento para a elaboração de uma análise dessa

natureza é dinâmico e complexo, pois envolve questões éticas, legais e

institucionais, e deve ser balizado por fundamentação teórica específica. Desse

modo, a análise empreendida pela Assessoria Técnica, partiu do princípio da

garantia dos direito civis, sociais e humanos das crianças, previstos no art. 227, da

Constituição Federal de 1988 e no art. 4º do Estatuto da Criança e Adolescente

(ECA), Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990.

A partir dessa compreensão, colocou-se como condição sine qua non a

desconstrução da ideia de ação violenta entre crianças, buscando definir com

clareza o que é violência e indisciplina. De acordo com Luz (2010, p. 2):

(…) a realização de atos violentos pressupõe que a pessoa já tenha desenvolvido a capacidade de compreender e interpretar as situações vividas. Por essas características que definem o ato violento (ou a violência), e considerando o desenvolvimento das crianças na faixa etária de 0 (zero) a 5 (cinco) anos, não há como dizer que essas crianças agem de forma violenta. Pois, mesmo que a vontade de incomodar ou machucar possa estar presente nos motivos da criança, elas não conseguem avaliar de forma completa as possíveis consequências de seus atos. Além disso, não possuem controle completo do próprio comportamento, estando mais suscetíveis as reações provocadas pelas emoções. Devemos, ainda, lembrar que diferentemente das crianças maiores e dos adultos, nessa faixa etária de 0 (zero) a 5 (cinco) anos, as crianças ainda não têm completamente desenvolvida a linguagem. Por essa razão a emoção ainda é traduzida basicamente por meio de gestos. Esse entendimento coloca em questão também a atitude de qualificar o comportamento das crianças de indisciplina, pois para isso teríamos que assegurar que elas já possuíssem pleno entendimento das regras de convivência social adotadas pelas instituições de Educação Infantil.

Assim sendo, os termos violência e indisciplina não podem ser utilizados

quando se referem ao comportamento de crianças de até cinco anos de idade, visto

que a intencionalidade é uma qualidade da ação violenta ou da indisciplina, ou

seja, “o autor precisa ter consciência de que sua ação pode causar danos ou

prejuízo a outras pessoas” (LUZ, 2010, p.1).

Retirado o foco da ação da criança, procurou-se apreender o contexto geral

em que ocorreu o fato, centrando as observações na dinâmica de organização dos

Page 143: Revista SME Gyn 2012

tempos e dos espaços da instituição de educação infantil, tendo como referências

normativas as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, a

Resolução CNE/CEB nº 05, de 17 de dezembro de 2009 e a Resolução CME nº

194/07, que dispõe sobre a normatização da educação infantil no município de

Goiânia.

À luz dessas referências, a análise da Assessoria Técnica destacou que é

função sociopolítica e pedagógica das instituições de educação infantil oferecer

todas as condições e recursos para que as crianças usufruam seus direitos civis,

humanos e sociais. Para tal, faz-se necessário, por parte dos profissionais das

instituições, o exercício de reflexão sobre como o tempo e o espaço compõem a

rotina das unidades educacionais, sobre como a sua organização diária favorece

ou não a efetivação dos direitos da criança e quais concepções as rotinas e formas

de organização refletem. A análise enfatizou, desse modo, que o planejamento das

rotinas deve assegurar ações que promovam as aprendizagens e o

desenvolvimento das crianças, assegurando seus interesses, necessidades e

foto: divulgação SME

Page 144: Revista SME Gyn 2012

capacidades atuais. Tais ações devem ter sentido para as crianças e não, apenas,

para os adultos. E que a construção de um ambiente saudável deve ser objetivo de

toda a equipe de educadores.

O parecer, com fundamentos na Resolução CME nº 194/07, chama a

atenção para as condições adequadas do espaço físico, o tamanho das salas, os

espaços abertos, o número de crianças e adultos divididos pela área disponível e

pela razão adulto/criança. O que se pretende é demonstrar que esta Resolução, por

meios das normas que estabelece, busca garantir os direitos da criança, entendida

como sujeito de direitos, que constrói sentido sobre si mesma, os outros e o meio

em que vive, produzindo cultura.

A matéria, depois de concluído o parecer da Assessoria Técnica, foi

encaminhada ao Conselho Pleno, que, mediante apreciação em Sessão Plenária,

deliberou sobre o assunto. Nesse caso específico, a instituição foi convocada a

comparecer ao CME para apresentar sua versão do fato. Após a escuta, o CME

procedeu às medidas cabíveis, conforme a legislação.

A partir desse breve olhar sobre a atuação do CME, pode-se inferir que o

órgão tem buscado garantir os direitos das crianças, conforme o disposto no art.

227 da Constituição Federal de 1988 e no Estatuto da Criança e do Adolescente

(ECA). Os princípios preconizados nesses dispositivos podem ser sintetizados da

seguinte forma: os adultos são responsáveis pelos cuidados e pela educação das

crianças, e a esta responsabilidade, prevista em lei, cabem medidas legais, caso

haja comprovada negligência.

Referências

CME, Parecer AT nº 056, de 27 abril de 2012. Goiânia, Goiás.

LUZ, Iza Rodrigues. Relações entre crianças e adultos na Educação Infantil. Belo Horizonte,

novembro de 2010 (Anais do Seminário Nacional: currículo em movimento – Perspectivas

Atuais).

OLIVEIRA, Zilma Ramos de. Educação Infantil: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez,

2007.

Page 145: Revista SME Gyn 2012

Do sonho à realização profissional: formação continuada e atuação na SME

Maria do Socorro Barbosa Lima

Na década de 60, o sonho de toda menina era ser aeromoça ou professora.

O meu era ser professora.

Iniciei meus estudos no grupo escolar aos sete anos de idade. Ao término

do curso primário, preparei-me para o curso de admissão (um vestibulinho) para

ingressar no curso ginasial em escola pública, que por sinal era uma garantia de

qualidade do ensino nas épocas de 60 e 70. Estudar numa escola pública era

sinônimo de competência e comprometimento com o saber.

Como educadora e apaixonada pela função de ensinar iniciei, em 8 de abril

de 1975, a função de professora primária, logo após ter concluído o curso de

Magistério. Vivenciei uma época de grandes e profundas mudanças em torno da

educação. Durante minha graduação na Universidade Federal de Goiânia,

paralelamente ao curso, aprimorei meus conhecimentos na vivência da sala de

aula. Em 1979, fui convidada pela diretora da escola a assumir as aulas de História

e Educação Moral e Cívica, na Escola Municipal Laurício Pedro Rasmussen,

mudando o contrato para professora de ensino médio (nomenclatura para

professor de 5ª a 8ª série)

A propositura da educação continuada, incentivada pela Secretaria

Municipal de Goiânia, já faz parte da história da rede, pois em 1978 participei de

curso ministrado pela Secretaria, como treinamento de professores da 1ª a 4ª série.

Nas escolas, desempenhei todas as funções compatíveis ao cargo:

professora, secretária-geral, vice-diretora, diretora, coordenadora, supervisora

administrativa, coordenadora da área de ensino da SME e várias outras,

direcionadas ao bom desempenho do ensino.

Com a democratização nas escolas e a escolha dos novos dirigentes pela

lista tríplice, uma nova história permeia a rede de ensino; professores que até

1

1. Socióloga, professora aposentada da Rede Municipal de Educação de Goiânia, Ex- diretora da Escola Municipal Targino Aguiar e da Escola Municipal Prof. Lourenço Campos.

Page 146: Revista SME Gyn 2012

então não estavam qualificados para a função passaram a dirigir escolas, uns com

excelente desempenho, outros nem tanto, havendo assim a presença dos

interventores em algumas delas, dentre eles eu.

Quando assumi a direção da Escola Municipal Targino de Aguiar (em

1984), encontrei-a em condições precárias para funcionamento, desde o mais

simples objeto, como o relógio de parede, como o mimeógrafo onde eram

“rodadas” todas as atividades, da alfabetização à 8ª série, estavam em penhora. A

primeira providência então era resgatar esses objetos tão necessários para a época.

Mas como fazê-lo se não havia recursos? Após reunião com a comunidade escolar,

decidimos fazer uma festa para arrecadar fundos para a manutenção da unidade. A

festa foi um sucesso. Com o dinheiro recuperamos os objetos penhorados,

compramos papel, álcool e material de limpeza para os primeiros meses de gestão.

A escola atendia quatro turnos, havia déficit de professores em diversas áreas e,

para suprir esses déficits, passamos a divulgar, nas universidades e nas

proximidades, a contratação de professores.

Minha permanência na escola era até a realização de novas eleições, como

a comunidade estava satisfeita com meu trabalho não elegeram as candidatas para

que eu continuasse na unidade escolar, onde fui eleita por dois mandatos,

permanecendo sete anos na escola.

A escola passou a ser atendida pelo projeto “Monhangara”, o qual fornecia

ao aluno material básico (caderno, lápis, borracha) e ministrava curso de

capacitação para professores, diretores e secretários. Dentre os cursos ministrados

no ano de 1985 estavam: Administração Escolar, Relações humanas, Estudo

Sociológico da Escola, Conhecimento em Planejamento Curricular, Integração

Escola Comunidade.

Esses cursos foram ministrados pela Secretaria da Educação Estadual de

Goiás - Superintendência de Apoio Técnico e Pedagógico. Pela Secretaria

Municipal, em 1987, foi ministrado um curso de Atualização em Educação para

diretores e professores. Foram abordados prática pedagógica: o exercício da

docência, o currículo como instrumento de trabalho da escola democrática:

abordagens; o currículo como instrumento de socialização do saber; a

organização do trabalho da escola: democratização das relações de trabalho na

escola. No final de 87 e início de 88, foram ministrados cursos de atualização para

Page 147: Revista SME Gyn 2012

diretores e professores de Educação Física, conhecimento sobre a Legislação da

Educação Física. A Educação Física como fator de desenvolvimento Neuro-motor

e psicológico, materiais não convencionais e ginástica expressiva e vários outros

importantes temas para a qualificação e atuação desses profissionais.

Na busca de qualificação profissional e por sede do saber, procurei cursar

uma pós-graduação, na década de 80 não era acessível aos professores, mas fui

atrás de um curso oferecido no Rio de Janeiro. Com aulas presenciais nas férias de

julho e janeiro, consegui da secretária autorização para ausentar-me da escola

durante esse período e lá fui eu para a cidade maravilhosa, em busca de

conhecimento e aprimoramento, do qual me recordo com grande saudades dos

professores e amigos que conquistei.

A atualização sempre esteve presente na minha qualificação profissional:

mesmo depois da aposentadoria, cursei pós-graduação em psicopedagogia, que

muito contribuiu para elevar minha qualidade de vida. Atualmente sou voluntária

numa ONG, trabalhando com crianças com dificuldade de aprendizagem.

Resgatar o prazer e a alegria de contribuir com a formação faz parte do dia a dia do

professor.

Page 148: Revista SME Gyn 2012

Música e Aprendizagem

Alessandro de Oliveira Branco

A música tem poder transformador. Ela contribui para o desenvolvimento

de valores como a dignidade, a cidadania, o senso crítico. Tanto aquele que ouve

quanto aquele que estuda música está sujeito a ser transformado por ela. Foi

pensando nisso que surgiu a ideia de desenvolver na Escola Municipal de Tempo

Integral José Carlos Pimenta, no vilarejo de Vila Rica, em Goiânia (Goiás), o

projeto intitulado Cartola na cartola: o espaço mágico da música e da

aprendizagem, cujo desenvolvimento evidenciou que a música tem realmente um

poder transformador em todos os níveis, considerando a perspectiva educacional

que vê o aluno como ser integral, dotado de habilidades a serem desenvolvidas.

As aulas de música oferecem a oportunidade de enriquecer o universo

cultural, auxiliando os alunos a despertar criticamente, contra a imposição da

cultura de massa, propiciando experiências musicais e estéticas que os levem a

transcender esse nível de realidade. Ensinar os alunos a cantar e a tocar

instrumentos musicais contribui para que a arte ocupe o lugar que poderia estar

sendo ocupado por atividades ilícitas e pouco produtivas.

A Escola Municipal de Tempo Integral José Carlos Pimenta é uma escola

rural, fundada em 1969, que atende crianças de seis a 14 anos. A escola passou a

ser de tempo integral em 2008, atendendo crianças da Vila Rica e de pequenas

propriedades rurais próximas à vila. Apesar da proximidade com a capital do

estado, poucos têm acesso a bens culturais, como cinema, teatro, concertos

musicais, saraus, óperas.

Em 2008, a disciplina Música passou a fazer parte da grade curricular da

escola como disciplina do núcleo opcional da rede municipal de ensino para

potencializar a capacidade de aprendizagem do aluno. No início do trabalho foram

encontradas algumas dificuldades. Os alunos pensavam que combinar notas

musicais e coordenar ritmamente um instrumento musical era algo muito

1

1. Professor da Escola Municipal de Tempo Integral José Carlos Pimenta, graduado em educação musical pela Universidade Federal de Goiás (UFG), especialista em gestão escolar pela Faculdade Darwin, de Brasília-DF2. Projeto vencedor do Prêmio Victor Civita - Educador Nota 10 de 2012.

2

Page 149: Revista SME Gyn 2012

distante de sua realidade, quase inatingível, o que gerava indisciplina e certo

desinteresse pelas aulas.

O desafio inicial era trabalhar a autoestima de cada um, despertando seu

interesse por um instrumento, conhecendo mais sobre determinado estilo musical

e a cultura dele gerada. Optou-se, no início, por uma metodologia que privilegiava

o fazer, na prática, contemplando a musicalidade do aluno, ou seja, a intuição,

deixando questões teóricas para o segundo momento. Violão, cavaquinho e

instrumentos de percussão como pandeiro, timba, chocalho, triângulo, zabumba

integravam a música-aula desenvolvida.

O repertório, no início, era basicamente de músicas folclóricas e regionais,

que, de alguma forma, faziam parte da memória musical dos alunos e eram de fácil

execução. Conseguiu-se, em curto espaço de tempo, montar repertório razoável

com músicas que iam do “Cai Cai Balão” (folclórica), passando por Luar do

Sertão (Catulo da Paixão Cearense/João Pernambuco), Asa Branca (Luiz

Gonzaga) e Naquela Mesa (Sérgio Bittencourt), o que nos possibilitou, em 2009,

participar do concurso da Secretaria Municipal de Educação de Goiânia, junto

com a TV Serra Dourada, afiliada do SBT em Goiânia, onde conseguimos o 1º

lugar entre todas as escolas no município de Goiânia, o que estimulou e fortaleceu

ainda mais o trabalho. Houve nessa época um significativo apoio da comunidade,

que também começou a aproximar-se mais da escola.

Apesar de termos elevado a autoestima dos alunos e conquistado seu

interesse pelas aulas de música e pelas outras disciplinas, ainda havia um grande

desafio: aprimorar o gosto musical dos alunos, formando jovens mais críticos em

relação ao que a mídia, de um modo geral, lhes impõe. Nesse contexto surgiu a

ideia de um projeto que mostrasse outra referência musical para os alunos, um

universo que, infelizmente, não era do conhecimento deles até então, com os

nomes de Ary Barroso, Noel Rosa, Pixinguinha, Nelson Cavaquinho, Chico

Buarque de Holanda, Vila lobos, Cartola e tantos outros da música popular

brasileira.

A primeira etapa consistiu em análise da letra da música As rosas não

falam, de Cartola. Foi proposta uma discussão acerca da letra, sobretudo do trecho

que diz: “...mas que bobagem as rosas não falam simplesmente as rosas exalam o

perfume que roubam de ti...”, promovendo debate, reflexão sobre a poesia na

Page 150: Revista SME Gyn 2012

letra. O objetivo era refletir sobre o conteúdo atual das músicas produzidas no

Brasil.

A etapa seguinte primou pela apreciação musical. Por meio de um

aparelho de som, ouvimos um CD com doze músicas de Cartola. Desse CD

selecionamos três, para desenvolver a parte prática do projeto. As músicas foram

As rosas não falam, Corra e olhe o céu e O sol nascerá. O objetivo era criar

condições para que os alunos se familiarizassem com as melodias e com o ritmo

das músicas, a fim de facilitar a aprendizagem no instrumento específico de cada

um.

Em um terceiro momento, houve a contextualização histórica, com o

auxílio dos professores do turno vespertino, que inseriram em suas disciplinas os

elementos históricos da vida e da obra de Cartola. A participação dos outros

professores foi fundamental. A professora de português, por exemplo, trabalhou

trechos dos livros Cartola – Mestres da Música no Brasil – (Monica Ramalho, Ed.

Moderna) e Cartola – Crianças Famosas – (Angelo Bonito, Edinha Diniz, Ed.

Callis). Trabalhou também com documentários e filmes sobre Cartola.

Trabalhando com o gênero textual entrevista, o grupo de alunos elegeu um que

seria o Cartola e os outros prepararam um roteiro para entrevistá-lo. A professora

de dança elaborou uma coreografia considerando a letra dos sambas Corra e olhe

o céu e O sol nascerá, ambas de Cartola. Na coreografia, trabalhou-se expressão

corporal, postura, tempo e contratempo, passos de samba, ritmo, espírito de

equipe etc. Nas aulas de artes os alunos produziram caricaturas de Cartola e

também ilustrações das letras das músicas. A professora de matemática traçou

uma linha do tempo da vida e obra do autor. O professor de educação física

também deu sua contribuição ao lembrar brincadeiras do tempo do compositor:

bolinha de gude, pega-pega e outras.

A quarta etapa consistiu no estudo do repertório musical de Cartola. O

objetivo dessa etapa era aprender a tocar as músicas escolhidas inicialmente para a

montagem de pequena apresentação de música e dança. Aplicou-se a metodologia

desenvolvida em projetos anteriores, ou seja, privilegiando o fazer musical, na

prática. O método para que os alunos aprendessem a melodia no cavaquinho foi o

método em tablatura, que consiste em indicar a localização das notas do

instrumento através dos números. Para os violões, que ficaram

Page 151: Revista SME Gyn 2012

responsáveis pelo acompanhamento das músicas, o método foi o de leitura de

cifras. E, por fim, a parte da percussão, relativamente mais simples, pois já vinha

trabalhando o ritmo de samba e samba-canção com eles há algum tempo.

Durante toda a execução, a avaliação do projeto foi feita com vários

recursos: relatos e depoimentos verbais no início das aulas, relatórios escritos, em

outras disciplinas e na aula de informática, ficha descritiva da evolução

pedagógica do aluno a cada trimestre, registro de todo o trabalho em portifólio

com fotos e atividades escritas, produção de um vídeo, mostrando o cotidiano e a

metodologia nas aulas de música.

Ao longo de um ano e meio, os alunos aprofundaram conhecimentos nos

estudos práticos, teóricos, nos momentos individuais e coletivos, e mergulharam

em um universo diferenciado de músicos, em especial o Cartola, e com isso

levaram para casa o que aprendiam. Foi possível demonstrar a eles um outro

universo musical, onde a poesia, o sentimento e o bom gosto superam qualquer

barreira supostamente imposta por raça, religião ou classe social. Além do

objetivo principal, que era o de aprimorar o gosto musical dos alunos

Page 152: Revista SME Gyn 2012

desenvolvendo seu senso crítico em relação à música, alguns deles evoluíram

muito no estudo a partir desse projeto, pois as músicas do Cartola, sobretudo os

sambas que trabalhamos, exigiram uma dedicação a mais, fazendo com que

aprimorassem também sua técnica no instrumento.

Page 153: Revista SME Gyn 2012

DOCUMENTO

SME

EDUCAÇÃO EM

MOVIMENTO

Page 154: Revista SME Gyn 2012

SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO

PORTARIA SME Nº. 019, de 04-04-2012.Regulamenta os critérios e procedimentos para a concessão

da Licença para Aprimoramento Profissional aos detentores do Cargo de Profissional de Educação II (PE II) e dá outras providências.

, no uso de suas atribuições A SECRETÁRIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO

legais e com fulcro no Decreto nº. 009, de 03 de janeiro de 2011 e no art. 60, IX do

Decreto nº 1.202 de 13 de junho de 2002,

o que estabelece os Arts. 35 e 36 da Lei Complementar nº. 091, Considerando

de 26 de junho de 2000 (Estatuto dos Servidores do Magistério Público do Município de

Goiânia),

Resolve:

– Regulamentar, na forma disciplinada por esta Portaria, os critérios e Art. 1º

procedimentos para a concessão de Licença para Aprimoramento Profissional aos

detentores de cargo efetivo e estável de Profissional de Educação II (PE II), conforme as

disposições da Lei Complementar n.º 091/2000 (Estatuto dos Servidores do Magistério

Público do Município de Goiânia).

– Considerar para os efeitos desta Portaria, servidor do Magistério em Art. 2º

condições de pleitear a Licença para Aprimoramento Profissional, o detentor de cargo

efetivo e estável de Profissional de Educação II (PE II), considerado apto em estágio

probatório e que conte, no mínimo, com 03 (três) anos de atividades no Magistério

Público do Município de Goiânia.

– Determinar que, para a concessão da Licença para Aprimoramento Art. 3º

Profissional, será obrigatório que o curso de pós-graduação stricto sensu em nível de

Mestrado e Doutorado:

I – seja de área afim com a Educação Infantil ou Ensino Fundamental;

II – seja reconhecido pelo Conselho Nacional da Educação (CNE) e pelo

Ministério da Educação (MEC) e tenha avaliação positiva da Coordenação de

Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior (CAPES);

III – seja considerado de interesse e prioridade para a educação pública

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municipal de Goiânia.

Parágrafo único – Os diplomas ou certificados de cursos de pós-graduação

stricto sensu em nível de Mestrado e Doutorado oferecidos por Instituições de Ensino

Superior estrangeiras deverão ser validados por Universidades brasileiras credenciadas

pelo MEC/CAPES, sob pena do Profissional da Educação II (PE II) beneficiado com a

Licença para Aprimoramento Profissional ter de ressarcir aos cofres públicos os valores

recebidos a título do benefício, nos termos do art. 49, § 3º da Lei nº. 9.394, de 20 de

dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), e, ainda, conforme

determina o art. 4º da Resolução CNE/CES nº. 01, de 03 de abril de 2001, e suas

alterações.

Art. 4º – Para preservar o bom andamento do processo ensino-aprendizagem

nas unidades educacionais será concedida a Licença para Aprimoramento Profissional,

respeitando-se a seguinte proporção:

I – 01 (um) Profissional de Educação II para cada centro municipal de educação

infantil/centro de educação infantil;

II – 01 (um) Profissional de Educação II para cada escola com até 25 (vinte e

cinco) servidores de que tratam esta Portaria lotados na instituição;

III – 02 (dois) Profissionais de Educação II para cada escola com mais de 25

(vinte e cinco) e até 40 (quarenta) servidores de que tratam esta Portaria lotados na

instituição;

IV – 03 (três) Profissionais de Educação II para cada escola com mais de 40

(quarenta) servidores de que tratam esta Portaria lotados na instituição;

IV – 01 (um) Profissional de Educação II por cada Centro Municipal de Apoio à

Inclusão (CMAI);

V – 01 (um) Profissional de Educação II para cada fração de 30 servidores de que

tratam esta Portaria lotados em cada Departamento da Secretaria Municipal de

Educação, Unidade Regional de Educação, Conselho Municipal de Educação ou no

Centro de Formação de Profissionais da Educação.

Art. 5º – Estabelecer que o Profissional da Educação II, ao pleitear a Licença

para Aprimoramento Profissional:

I – esteja lotado e exercendo funções de magistério ou correlatas na Secretaria

Municipal de Educação e no Conselho Municipal de Educação de Goiânia;

II – não esteja no exercício de cargos em comissão ou função gratificada, nem no

exercício de função de Diretor de escola ou Dirigente de centro municipal de educação

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infantil (CMEI)/centro de educação infantil (CEI).

Art. 6º – Determinar que a Licença para Aprimoramento Profissional tenha

duração máxima de até 30 (trinta) meses para Mestrado, e de até 48 (quarenta e oito)

meses para Doutorado, conforme declaração da Instituição de Ensino Superior quanto

ao início e término do curso.

§ 1º – No período em que se encontrar afastado, em razão da Licença para

Aprimoramento Profissional, o Profissional de Educação II não terá direito ao gozo de

férias regulamentares, no entanto, fará jus ao recebimento do vencimento de sua carga

horária definitiva, bem como das vantagens pecuniárias incorporáveis, e o tempo de

afastamento será considerado como de efetivo exercício para todos os efeitos da

carreira.

§ 2º – A carga horária a ser considerada para fins de concessão da licença de que

trata esta Portaria será aquela que o Profissional de Educação II possuir em caráter

definitivo.

§ 3º – Não concluído o curso, dentro dos prazos máximos fixados no caput deste

artigo, o servidor não terá direito à prorrogação do prazo nem à redução de sua carga

horária, salvo no caso de suspensão das aulas do programa de pós-graduação,

devidamente comprovada por meio de documento oficial emitido pela Instituição de

Ensino Superior.

§ 4º – A não conclusão do curso de pós-graduação stricto sensu em nível de

Mestrado ou Doutorado por motivos de abandono ou por reprovação implicará na

suspensão imediata da referida licença, ficando o Profissional de Educação II impedido

de obter novamente Licença para curso do mesmo nível, além de ser obrigado a restituir

os valores recebidos durante o afastamento, devidamente corrigidos, nos termos da

legislação vigente.

Art. 7º – O Profissional de Educação aprovado em processo seletivo para

Mestrado ou Doutorado, ao pleitear a Licença para Aprimoramento Profissional, deverá

apresentar no Setor de Protocolo da Secretaria Municipal de Educação, no prazo de até

60 (sessenta) dias antes da data prevista para o afastamento, a seguinte documentação:

I – Requerimento devidamente assinado pelo Profissional da Educação II;

II – Ofício do Diretor/Dirigente da unidade educacional aquiescendo sobre a

liberação do servidor, bem como informando se existem outros servidores liberados

para o afastamento da referida licença;

III – Comprovante de aprovação na seleção do programa de pós-graduação

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stricto sensu Mestrado ou Doutorado, expedido por meio de documento oficial da

Instituição de Ensino Superior devidamente timbrado, contendo a natureza do curso, a

sua duração, o início e o término, a carga horária, número de créditos, bem como

assinatura e carimbo da autoridade responsável;

IV – Comprovante expedido pela Instituição de Ensino Superior, por meio de

documento oficial devidamente timbrado, informando sobre o reconhecimento do curso

pelo Conselho Nacional de Educação. Na hipótese da Instituição de Ensino Superior ser

estrangeira, o Profissional de Educação II deverá apresentar declaração emitida pela

instituição comprovando que o curso pleiteado será reconhecido por universidades

brasileiras que possuam cursos de pós-graduação reconhecidos e avaliados na mesma

área de conhecimento e em nível equivalente ou superior ou em área afim, nos termos do

art. 49, § 3º da Lei nº. 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional), e, ainda, conforme determina o art. 4º da Resolução CNE/CES nº.

01, de 03 de abril de 2001;

V – Cópia do Projeto de Pesquisa ou equivalente aprovado no processo seletivo

do programa de Mestrado ou Doutorado, acompanhado de justificativa do requerente

explicando a relevância para a Educação Pública Municipal.

Parágrafo único – A falta de qualquer dos documentos relacionados neste

artigo impedirá que o Profissional de Educação II efetive, junto ao Setor de Protocolo da

Secretaria Municipal de Educação, o processo de Licença para Aprimoramento

Profissional.

Art. 8º – O processo, devidamente instruído com a documentação prevista no

artigo anterior, será remetido pelo Setor de Protocolo ao Departamento de Gestão de

Pessoal/Divisão de Assistência ao Servidor para análise quanto ao preenchimento dos

requisitos e condições previstos nos Arts. 2º, 4º, 5º, 7º e 9º desta Portaria.

§ 1º – Se atendidos os requisitos previstos no caput, será enviado pelo

Departamento de Gestão de Pessoal/Divisão de Assistência ao Servidor, à Comissão

constituída por meio de ato do(a) Titular da Pasta, para análise e manifestação quanto à

pertinência do projeto, nos termos do Art. 3º desta Portaria. Não atendidos os requisitos

do caput, o Departamento de Gestão de Pessoal/Divisão de Assistência ao Servidor

manifestará pelo indeferimento do pedido de Licença para Aprimoramento

Profissional, encaminhando os autos ao Titular da Pasta para as providências cabíveis.

§ 2º – Uma vez verificado pela Comissão o pleno atendimento das condições

previstas no Art. 3º desta Portaria, este encaminhará os autos à Divisão de Expediente

para emissão do competente ato do(a) Titular da Pasta deferindo o pedido de Licença

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para Aprimoramento Profissional. Não atendidas às exigências do Art. 3º, a Comissão

manifestará pelo indeferimento do requerimento do servidor, encaminhando os autos ao

Titular da Pasta para as providências cabíveis.

§ 3º – Após o deferimento do(a) Titular da Pasta, o processo será encaminhado

ao Chefe do Poder Executivo para a devida emissão do ato de concessão da Licença para

Aprimoramento Profissional, nos termos do Art. 35, parágrafo único da Lei n.º

091/2000.

Art. 9º – O servidor contemplado com a Licença para Aprimoramento

Profissional só poderá pleitear nova licença desta natureza após laborar na Rede

Municipal de Educação pelo período de, no mínimo, igual ao do afastamento da

primeira licença, contado a partir do dia em que reassumir suas funções.

Art. 10 – A Licença para Aprimoramento Profissional terá vigência a partir do

deferimento pelo titular da Secretaria Municipal de Educação, sendo ratificada por ato

do Chefe do Poder Executivo.

Art. 11 – Uma vez concedida a licença de que trata esta Portaria, o Profissional

da Educação II beneficiado ficará obrigado a assinar Termo de Compromisso com a

Secretaria Municipal de Educação comprometendo-se a:

I – Apresentar cópia do ato do(a) Titular da Secretaria Municipal de Educação

que deferiu a Licença para Aprimoramento Profissional à chefia imediata para, então,

afastar-se de suas funções;

II – Apresentar declaração de frequência, trimestralmente, fornecido pela

Instituição de Ensino Superior na unidade educacional em que estiver lotado;

III – Apresentar-se à Direção do Departamento de Gestão de Pessoal da

Secretaria Municipal de Educação (DGP) para reassumir as suas funções ao término do

período concedido para seu afastamento ou quando da defesa da dissertação/tese, caso

ela ocorra antes do prazo previsto para retorno;

IV - Apresentar a declaração de conclusão do curso de pós-graduação stricto

sensu emitido pela Instituição de Ensino Superior;

V – Prestar serviços à Secretaria Municipal de Educação por um período de, no

mínimo, igual ao do afastamento, contado a partir do momento em que reassumir suas

funções. Em caso contrário, o servidor deverá devolver aos cofres municipais os valores

recebidos, no período de afastamento, a título de indenização, devidamente corrigidos,

conforme disposição da legislação vigente;

VI – Ficar impossibilitado, no período previsto no inciso anterior, de usufruir

das Licenças para Tratar de Interesse Particular e Acompanhamento de Cônjuge, bem

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como de ser cedido para desempenho de suas funções em outros órgãos da

Administração Pública, inclusive do próprio Município, com ou sem ônus para a

Secretaria Municipal de Educação.

Parágrafo único – Em nenhuma hipótese o Profissional de Educação II deverá

afastar-se de suas atividades sem o devido ato do(a) Titular da Pasta deferindo o pedido

de Licença para Aprimoramento Profissional, sob pena de sofrer as sanções

disciplinares previstas na legislação vigente.

Art. 12 – Findo o prazo máximo concedido para o afastamento, o Profissional de

Educação II deverá apresentar-se no Departamento de Gestão de Pessoal da Secretaria

Municipal de Educação para imediata lotação.

§ 1º – O servidor de que trata este artigo ao retornar do afastamento terá

garantida a sua lotação na unidade educacional em que se encontrava em exercício

quando da concessão da Licença para Aprimoramento Profissional.

§ 2º – O não comparecimento do servidor para lotação ao término do prazo da

licença concedida, por um prazo superior a 30 (trinta) dias, implicará na instauração de

processo administrativo disciplinar por abandono de cargo, nos termos do art. 142,

inciso XVII, da Lei Complementar n.º 011, de 11 de maio de 1992 (Estatuto dos

Servidores Públicos do Município de Goiânia).

Art. 13 – O Profissional da Educação II beneficiado com Licença para

Aprimoramento Profissional, deverá entregar um exemplar da Dissertação/Tese ao

Departamento Pedagógico da Secretaria Municipal de Educação com o fim de compor o

acervo do Centro de Formação de Profissionais da Educação.

Parágrafo único – O Profissional de Educação que for beneficiado com a

Licença para Aprimoramento Profissional poderá, após a conclusão do curso de pós-

graduação, ser convocado pelo Centro de Formação dos Profissionais da

Educação/DEPE para ministrar cursos ou palestras sobre a temática de pesquisa

desenvolvida.

Art. 14 – Os casos omissos serão resolvidos pelo(a) Titular da Secretaria

Municipal de Educação, depois de manifestação por Comissão constituída nos termos

do § 1º do Art. 8º desta Portaria.

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Art. 15 – Esta Portaria entra em vigor na data de sua assinatura, revogando-se as

disposições em contrário, em especial a Portaria-SME n.º 021, de 04 de janeiro de 2010.

Dê-se ciência, publique-se e cumpra-se.

Gabinete da Secretária Municipal de Educação, aos 04 (quatro) dias de abril de

2012.

Profª. Neyde Aparecida da Silva

Secretária