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ÓRGÃO DE DIVULGAÇÃO DAS ATIVIDADES DA ACADEMIA DE HISTÓRIA MILITAR TERRESTRE DO BRASIL/RIO GRANDE DO SUL (AHIMTB/RS) - ACADEMIA GENERAL RINALDO PEREIRA DA CÂMARA - E DO INSTITUTO DE HISTÓRIA E TRADIÇÕES DO RIO GRANDE DO SUL (IHTRGS)

210 ANOS DO NASCIMENTO DE CAXIAS – 70 ANOS DA CRIAÇÃO DA FEB

Editor: Luiz Ernani Caminha Giorgis, Cel – Presidente daAHIMTB/RS e Vice do [email protected]

Projeto Gráfico: Fabricio Gustavo Dillenburg - Núcleo de Estudos de História Militar Vae [email protected]

Capa:Ínido brasileiro pescando com arco e flecha, fotografia de Stan Wayman.

NÚCLEO DE ESTUDOS DE HISTÓRIA MILITAR VAE VICTISMais de duas décadas de trabalho voltado para a divulgação da História Militar

O Núcleo de Estudos de História Militar Vae Victis tem grande orgulho em participar da elaboração do informativo O Tuiuti, marco da formação histórica militar brasileira. Com o objetivo de divulgar a História, sobretudo em seu viés militar, o Núcleo de Estudos de História Militar Vae Victis trabalha tendo em vista a clareza de informação, a amplitude das análises, a relevância do material audiovisual, a atualização das hipóteses e a consistência na argumentação.

Nossa Missão: é levar ao máximo possível de pessoas o conhecimento da História Militar, divulgando sua importância, resgatando os seus valores e as suas memórias, preservando documentos e fornecendo subsídios para uma educação integral e de qualidade.

Nossa Postura: é independente, livre de qualquer posição política ou religiosa, voltada unicamente para a preservação e divulgação do conhecimento histórico, sem qualquer conexão com entidades que não tenham cunho explicitamente cultural, visando fornecer informação e compreensão com acessibilidade.

Para saber mais sobre nosso trabalho visite:

www.nucleomilitar.com / www.nucleomilitarblog.com

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nações em particular, de sua fé, vida, costumes e das causas mais notáveis de sua rusticidade. Por seu interesse militar despertam nossa atenção a rusticidade dos índios (endurance), seu desprezo pelas riquezas e as guerras entre eles na Amazônia.

A seguir, sintetizamos os pontos que nos chamaram a atenção, em especial os que foram usados em apoio às atividades

O padre jesuíta João Daniel, por 18 anos missionário na Amazônia Brasileira, foi dali levado com

outros companheiros para a prisão no cárcere de São Julião, em Lisboa. E escreveu precioso manuscrito, por volta de 1797, chamado Thesouro Descoberto no Máximo Rio Amazônia, dividido em seis partes. A 2ª parte começou a ser publicada no Brasil em 1840 como Notícia Geral dos índios e de algumas

Cel Cláudio Moreira BentoHistoriador Militar e Jornalista, Presidente da FAHIMTB

Aspectos de Interesse Militar dos

Índios da AmazôniaBrasileira

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militares terrestres na Amazônia, ou terrestres e anfíbias. E refere o citado padre João Daniel, em trechos que tivemos que adaptar à linguagem atual e em estilo mais fácil de entendimento pelo leitor:

“No rio Amazonas há nações que por viverem na selva e na sombra de árvores são tão brancas como os mais brancos europeus...” E mais adiante: “Eles não possuem barba e neste particular não há diferença entre homens e mulheres...” Existem algumas mulheres índias que, além de suas feições femininas, possuem olhos azuis e outras olhos verdes, com uma esperteza e vivacidade tão graciosa que podem ombrear com as mais escolhidas (belas) brancas...”

Sobre o espírito guerreiro dos índios da Amazônia, o padre João observou:

“As tradições que mais cultuam são as suas guerras e batalhas que têm tido com seus inimigos e tribos contrárias. E, com frequência, se põem a pregar e a contá-las aos demais ou entre si, à semelhança de pregadores em seus púlpitos. E isto, especialmente quando necessitam de animação para alguma batalha. E nestes sermões, com a finalidade de melhor desempenharem o seu papel de motivadores e de melhor animarem os auditórios com suas palavras, conservam numa mão um arco e na outra uma flecha. [...]. E todas estas ações belicosas para convencerem os demais de sua valentia e de que nada temem”.

Sobre a educação dos guerreiros:

“Para fazerem os índios se criarem valentes, costumam alguns pais e parentes, desde a infância, castigá-los com pancadas [...] que só será bom sofredor do trabalho quem desde menino se acostumou a padecer. E só desfalece na adversidade e na tempestade quem foi criado com mimos e regalos”.

Sobre sua atuação como remadores de brancos:

“Os índios por suas provas de valentia são os que mais sofrem no trabalho, nas doenças e nas adversidades. Causa grande espanto o quanto aturam ao remar uma canoa de brancos, dia e noite, sem dormirem, a não ser 2 ou 3 horas, por semanas inteiras e até meses. O mesmo se observa em outros trabalhos. E isto muitas vezes passando dias inteiros sem outra alimentação que um punhado de farinha-de-pau (de mandioca) misturada com água e que eles chamam de tiquara”.

Sobre o desapego a bens materiais, observou o padre João Daniel:

“O desapego que demonstram pela riqueza e bens materiais é inimitável. Se têm o que comer, como produto da caça na selva ou dos peixes dos rios, ficam mais contentes [...]. Não se preocupam de onde virão os utensílios de suas casas, porque são despojados de tudo...E o maior cuidado que possuem, é em alimentar o estômago e mantê-lo satisfeito...Deste seu incomparável desapego a bens

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terrenos eles veem se perderem o cacau, o cravo, a salsa, preciosas essências, prata, ouro e diamantes e as demais riquezas de que o Amazonas é abundante e pela posse das quais os europeus atravessam o Atlântico e aqui se expõem a tantos perigos. Toda a riqueza desses índios se resume em possuírem um pouco de farinha-de-pau (de mandioca) que é seu pão de cada dia. [...]. Todos os seus móveis, trastes e utensílios domésticos se resumem em 1 panela, 1 cuia (cabaça para beber água), 1 machira (rede de dormir), que muitos substituem por uma esteira, a que chamam miaçaba, tecida de palmas ou cipó. E se querem se mudar de local não necessitam bestas de carga e nem muitos botes para o seu transporte...Dissemos que usam machados de pedra e facas de pau. Eles usam dentes de animais, especialmente de cotia, que são muito duros e aguçados, com os quais alguns índios realizam seus trabalhos. Também a faca de pau ou de algum osso, com o que alguns fabricam machados, para pouco lhes serve. E o que com ela não podem fazer usam as unhas e dentes como as feras...”

Entre suas bebidas diversas chamou atenção o seguinte:

“Chá Padú usado pelos índios do rio Negro, cujas folhas na boca, substituem o sono e se mastigadas saciam a fome e a sede, além de outros admiráveis efeitos em que é superior ao Affamael Betele (sic) da Ásia”.

Sobre o inestimável valor dos cachorros para os índios, o padre fez este interessante registro:

“É indispensável aos índios possuírem algum cachorro de caça. Não só para caçarem, mas para lhes servirem de companhia. A experiência de muitos relata que numa caminhada, tendo algum cachorrinho a mulher ou um filho o leva no colo e o filho ou a filha que possa caminhar vai a pé. Na hora da alimentação um bocado é reservado ao dono e o outro ao cachorro. Assim o cachorro na mesa do índio ocupa o 2º lugar. E argumentam que os cachorros não só os acompanham na caça, mas a descobrem e a levantam e muitas vezes a matam”.

Sobre os enfeites com colares, das índias, registrou:

A luta “Huka-Huka” é uma tradição que fortalece e purifica os guerreiros

“Os enfeites mais comuns nas índias da Amazônia é usarem grandes colares e gargantilhas. [...] feitas com dentes dos índios que matam e que algumas tribos os comem. Estes colares são símbolos de nobreza e brasão de valentia. Nos dentes figuram o número de homens que eles deram honrada sepultura e alguns em suas barrigas”.

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Sobre as fortificações de proteção das aldeias, registrou:

“Muitas aldeias guerreiras indígenas se protegem com muralhas de madeira dura que nem pedra. Em outras aldeias a muralha é feita de palmeira juçara, que possui espinhos tão grandes e duros que muitos usam como agulhas para fazerem meias. E as muralhas de juçara só podem ser penetradas e rompidas pelo fogo. Isto por crescerem cheias de grandes e agudos espinhos e de tão enlaçadas umas

Sobre a característica de ser anfíbio o índio da Amazônia, registrou:

“A comunicação dos índios normalmente é feita pelo mar, rios, baías, lagos. E se pode chamá-los de anfíbios, por passarem a maior parte de suas vidas na água. Para tal dispõem de barcos leves e rápidos feitos de cascas de árvores. Outros usam balsas e jangadas. E outros não se cansam com estas construções. Quando querem navegar, apanham qualquer madeira boiando, cavalgam nela e com o remo na mão viajam. E se a favor da correnteza, navegam bem, sem temor de molharem suas vestes e nem correm maior risco do que o de serem atacados por um crocodilo ou jacaré”. 1

Sobre os vícios dos índios, o padre classificou-os:

“1º: o vício da carne (sexo); 2º: o da bebida; e 3º: o do canibalismo, não-generalizado”.

As guerras entre Índios Amazônicos e sua Arte Militar

Sobre isto registrou o padre João Daniel:

“São muito frequentes as guerras entre os índios. Guerreiam umas nações contra as outras. Embora todos sejam guerreiros, algumas nações são mais inquietas e propensas a Marte. E cada povoação (aldeia) tem outras aliadas, não só para não se agredirem, mas também para se dar as mãos umas as outras, e se defenderem

Índios Yanomami (Foto: Napoleon Chagnon)

as outras que se tornam impenetráveis. Outras tribos constroem as muralhas de taboca, material que na Ásia chamam de bambu. E quando elas seguram as muralhas, podem dizer de sua eficiência os portugueses que têm combatido na Índia, onde alguns potentados as usam. E zombam dos europeus que, querendo atacá-los, voltam constrangidos e com as mãos na cabeça, surpresos com a resistência deste tipo de muralha. Outras tribos fortificam suas aldeias com árvores e estacas disponíveis”.

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de ataques. Os motivos das suas guerras são três: - o apetite de se comerem, uns aos outros (canibalismo); - por indução dos brancos para lhes venderem os índios que apanham; - por causa de apanharem uns aos outros as mulheres. Este terceiro motivo é o mais comum! Pois em toda a parte há Helenas formosas, que com o fogo da concupiscência acendem o da guerra. E não satisfeitos com as índias das suas povoações querem roubar as dos seus contrários. As suas armas são, como já dissemos, arco e flecha, que igualmente lhes servem para pescar em lugar de redes, para caçarem nos matos, e para pelejarem nas guerras. São porém ordinariamente diversas estas armas, quando combatem, quanto a grandeza dos arcos e das flechas. Pois são muito maiores no comprimento e grossura e as chamam Taquaras. Colocam como ponta de flecha, facas de pau duro como ferro, ou de algum osso de animal, ou das cascas de Taboca, muito pontiaguda e aguçadas de dois fios, as quais atravessam qualquer homem, como também ao maior boi, ou fera do mato, e ainda atravessam uma porta e qualquer tábua. Para irem direitas lhes põem no remate penas atadas com cordéis, coisa de meio palmo ou mais, à proporção da lança que tem adiante. As hastes as fazem de umas canas sem nós, muito lisas e esféricas, que por este uso se chamam frechais. E não sendo ocas como as nossas, com âmago estupendo são tanto ou mais leves. Os arcos com que as lançam são de pau, a que já por seu uso os brancos chamam de pau de arco, muito duro e forte. E por não conterem ferro, os índios possuem a arte

de o lavrarem do tamanho que querem. Os destinados à flechas taquaras tem 7, 8 ou mais palmos de comprimento. A sua grossura é como o pulso de um menino. São facetados por uma banda, e esféricos no mais. Pela parte facetada lhe põem um fortíssimo cordel de alto e baixo, tecido de pita. E para o prenderem nas pontas fazem no arco umas cabacinhas. Quando querem entesar o arco para lançarem as flechas, o encurvam nos joelhos, puxam o cordel. E pondo-lhe a flecha a atiram com tanta força, que repassam qualquer porta ou tábua em distância de 200 até 300 passos. Algumas nações, além destas taquaras usam as suas flechas pequeninas e miúdas. E em lugar do arco as introduzem dentro de uns compridos canudos, a que chamam garavatana, (zarabatana). E a assoprando para o alto contra os inimigos, por elevação vão cair em cima das cabeças dos mesmos. E mesmo que toquem muito levemente na carne do inimigo, matam em breve espaço, porque vão hervadas com o seu veneno Bororê. Destas flechas miúdas eles usaram muito contra os portugueses e mais europeus nas muitas guerras que tiveram no princípio das conquistas. E eram algumas vezes tantas que pareciam chuveiros. Mas pouco estrago faziam, por caírem nos chapéus e fardas e não atingirem os corpos. Outras nações não usam arco e flechas, mas de balestilha. E tanto uns como outros atiram as suas armas com muita perícia, e rapidez que apenas uma flecha sai do arco, quando outra já está nele. Assim, enquanto um soldado carrega e dispara sua espingarda, pode um Tapuia atirar

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10, 12, ou mais flechas. São poucas as nações que atacam a peito descoberto, avançando umas às outras. Seu modo comum de atacar é a traição (surpresa) em repetidos assaltos, quando presumem os seus contrários descuidados, ou ocupados nos seus bailes e beberronas. Por isso as nações mais belicosas e que têm mais inimigos, estão sempre alerta e fortificadas nas suas povoações com fortíssimas cercas de pau a pique ou tabocas, como já dissemos. Quando não podem causar outro dano uns aos outros, queimam as povoações, que sendo de palha ou pindoba ardem em um minuto. Possuem suas espias e atalaias (observadores) que escondidas no sombrio das árvores a que sobem, descortinam e vigiam os rios. E avisam do que enxergam ao longe. Possuem para isso um grande tambor feito do tronco de alguma árvore. E quando o inimigo os acha deste modo prevenidos, ordinariamente se retira. Não obstante o seu grande furor uns com os outros, são como os brancos europeus, muito tímidos. E por isso no princípio das conquistas ainda que se unissem em grandes exércitos, ordinariamente se retiravam por covardes. E por esta razão, possuindo ânimo e valor bastam poucos europeus para vencer exércitos de Tapuias. Especialmente se desanimam quando vêem cair com as balas dos arcabuzes seus camaradas mortos, por ser para eles totalmente nova a arma dos brancos. Porém se chegam a perceber algum medo nos europeus, ou se possuem quem bem os comande,

anime, e estimule, o fazem com tal ardor, coragem, e de modo que parecem leões. E assim se têm portado em muitas ocasiões em que têm lutado ao lado dos portugueses, como em Pernambuco contra os holandeses, também no Maranhão, e em muitas outras partes. E na verdade se tivessem quem bem os capitaneasse e comandasse, não seria suficiente toda a Europa para os desalojar das suas terras na Amazônia, e nem ainda os atacar, pois bastava aos Tapuias jogarem as suas flechas das margens dos rios contra os navegantes. E escondidos e amparados não só com o sombrio do arvoredo imenso das suas matas, mas também detrás das árvores, de onde muito a salvo podem desbaratar grandes exércitos, e vencer aos mais invencíveis gigantes, sem temer que a mosquetaria ou artilharia atacante possam abrir brecha naqueles grossos e duros troncos. Nem ainda os incêndios, que nas matas costumam ser o mais indomável e invencível inimigo, poderiam fazê-los perder um palmo de terra. Pois são de outra espécie aquelas matas da América (Amazônia), que não ardem, nem se queimam, por mais fogo que lhe lancem. Disso decorre que a cada passo estão os seus índios naturais e os europeus fazendo grandes fogueiras no meio dos matos, sem o fogo se estender mais do que à lenha seca que colocam na fogueira. E acesas as abandonam quando se mudam para outra parte, sem receio de que o fogo se propague. Basta para prova o que já tem sucedido

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nas matas e ilha do Maranhão, onde costumam alguns anos faltar as chuvas do inverno, de sorte que a terra se abre em bocas de seca e se secam e queimam as serras com os calores do sol. E assim por mais fogo que se ponha aos matos não ele se ateia, nem os queima. Desta sorte amparados no arvoredo das matas os índios fizeram guerra por muitos anos aos portugueses em todos o Brasil. Guerra que se acabou por diligências do venerável Padre José de Anchieta e outros religiosos da Companhia de Jesus. Assim acabaram com os holandeses no Maranhão, matando muitos como seu alvo, encobertos uns com as árvores ou escondidos, outros nos matos, quando eles iam pelos caminhos e estradas. E matando quantidade de portugueses, cada vez se faziam mais formidáveis. E desta mesma maneira ainda hoje perturbam alguns Índios a navegação do mesmo Amazonas e rio Madeira, e outros zombam das tropas, que por vezes se tem expedido contra eles”.

Notas:

1 indígenas com estas características de rusticidade e combatividade seriam enfrentados por luso-brasileiros na Amazônia, como inimigos ou como aliados, na luta contra tribos hostis e contra estrangeiros.

Sobre o Autor: O Cel Cláudio Moreira Bento é Historiador Militar e Jornalista. Presidente da Federação de Academias de História Militar Terrestre do Brasil (FAHIMTB) e da AHIMTB/Resende Marechal Mário Travassos, do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS), da Academia Canguçuense de História (ACANDHIS), presidente Emérito fundador das Academias Resendense (ARDHIS) e Itatiaiense (ACIDHIS) de História, acadêmico fundador da Academia Barra-mansense de História (ABH), correspondente do Instituto de Estudos Vale paraibanos (IEV), em Itatiaia, sócio dos institutos Histórico e Geográfico de São Paulo (IHGSP) e do Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Sorocaba (IHGGS).

Cel Cláudio Moreira Bento

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A pólvora era elemento fundamental nos exércitos da Idade Moderna, havendo diversos tipos, conforme

se tratava de fazer pouco ruído, da que fazia pouco fogaréu e da que era para armas curtas ou para canhões.

A pólvora se fabricava a partir de três elementos básicos: Enxofre, Salitre e Carvão. Diego García de Palacio en seus Diálogos Militares, publicado no México em 1583, nos explica a função que cada um deles cumpre na mistura:

Palacio, se somente o enxofre e o salitre misturados se acendessem, pelo fogo em um instante, com a poderosa ventosidade do salitre, apagaría-se a chama sem queimar senão pouca parte da matéria, surgindo a necessidade de incorporar-se, como terceiro elemento, o Carbono.

Assim que, para suprimir este defeito se mescla e acrescenta o carvão, o qual é de tal natureza que, tocado pela chama do fogo, logo se inflama e se converte em fogo sem chama. E quanto este é mais sacudido por algum vento tanto mais se acende e conserva, até converter sua substancia en cinza, o que permite que a deflagração se produza com toda a pólvora carregada, obtendo-se assim o impulso de toda a energia disponível.

"Tercios de

España"Composição e Elaboração daPólvora dos Arcabuzes e

CanhõesHugo A. Cañete

(Fonte: http://www.gehm.es/?p=2723)

(Gentileza doDr. Frederico Aranha)

O enxofre é próprio para fazer fogo com chama e com esta propriedade excede aos outros dois materiais, ou seja, é um material fácil de acender, sendo sua função básica a produção de energia suficiente para a ignição do salitre. O Salitre é uma mescla de nitrato de sódio e nitrato de potássio e sua combustão é muito violenta. Nas palavras de García de

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A melhor pólvora para uso dos arcabuzes precisa das seguintes proporções, segundo García de Palacio: sete partes de salitre bem refinado, dois de enxofre e uma de carbono.

Para se fazer pólvora limpa e de grande potência e qualidade, recomenda-se fazer carvão com cascas de laranja: fechadas as cascas em uma panela nova e muito bem coberta, se colocará o fogo até que se acenda e se ponha como brasa, quando então as cascas estarão carbonizadas, do qual se tomará uma libra, sete de salitre e onze onças de enxofre.

de dois tipos de proporções para sua elaboração, segundo a quantidade que se quer fazer:

- Nove partes de salitre, duas de enxofre e três de carvão.

- Cem partes de salitre, dez de enxofre, trinta e seis de carvão.

Tanto Bernardino de Escalante como Diego García de Palácio coincidem, em suas respectivas obras, em que a carga de pólvora adequada para um canhão será a de duas terças partes do peso do projetil.

Por último, a pólvora para uso do arcabuz deverá ser granulada o mais possível; assim haverá o uso mais proprio para o arcabuz, devido a que a substância de pó fino dificulta a carga do mesmo. Sem dúvida, não haverá necessidade de granular as pólvoras para a artilharia, pois graças ao diâmetro da boca, não há dificuldade de recarga.

Acrescenta ainda García de Palacio outra receita para confeccionar uma pólvora de excepcional qualidade e com a qual não se ouvirá o estrondo, como comumente acontece: tomando cinco partes de bom salitre, uma de enxofre e outra de serragem muito seca, em lugar de carvão, e junto, moído […], se irá acrescentando sangue de cordeiro ou cabrito, em lugar de água.

Enquanto isso, a composição de pólvora para uso da artilharia, o autor dá conta

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