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Análise de dados quantitativos sobre a violência urbana em Macaé, com a devida caracterização das suas vítimas.
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CRIMINALIDADE URBANA E JUVENTUDE:
AS ESTATSTICAS RECENTES E
O PERFIL DA POPULAO JOVEM MACAENSE1
Ricardo Cesar Rocha da Costa2
Scheila Ribeiro de Abreu e Silva3
O Municpio de Maca, no estado do Rio de Janeiro, vive, desde a dcada de
1970, um crescimento econmico vertiginoso. De pacata cidade eminentemente
agrcola, passou a um municpio industrial, de importncia nacional, considerando a
produo dos poos petrolferos instalados na bacia continental.
Nesse perodo ps-descoberta do petrleo, Maca assistiu tambm a um
acelerado crescimento populacional, de 123% em apenas duas dcadas enquanto que a
cidade do Rio de Janeiro, s para efeito de comparao, cresceu 15% nesse mesmo
perodo.4
A urbanizao que ocupou o seu territrio de forma desenfreada ocasionou uma
srie de conseqncias, desde a emergncia de constantes demandas nas reas de
transporte, sade, educao, saneamento bsico, moradia, entre outras, at ao
surgimento de mazelas como o desemprego, a favelizao e o aumento exponencial da
criminalidade.
A crescente violncia urbana que atinge Maca tem invariavelmente apontado,
com preocupao, para as favelas que proliferam na cidade, ocupando
desordenadamente a periferia, com um elevado ndice de jovens entre 15 e 24 anos de
idade desempregados ou exercendo trabalho precarizado. Esses jovens, segundo os
dados apurados pela Pesquisa Domiciliar efetuada pela Prefeitura entre 2001 e 2003,
atravs do Programa Maca Cidado, apresentam um elevado contingente fora da
escola, com percentuais mais altos entre os negros do sexo masculino (cf. OLIVEIRA,
1 Artigo publicado originalmente na obra Todas as cores na educao: contribuies para uma
reeducao das relaes tnico-raciais no ensino bsico, organizada por Jos Flvio Pessoa de Barros e
Luiz Fernandes de Oliveira. Rio de Janeiro: Quartet/FAPERJ, 2008, p. 269-289. 2 Professor de Sociologia do IFRJ Instituto Federal do Rio de Janeiro, Campus So Gonalo. Por ocasio do artigo, lecionava Sociologia na FAETEC, era Professor substituto no Curso de Servio Social da UFF, em Campos dos
Goytacazes, e exercia ainda a funo de Assessor Tcnico da Prefeitura Municipal de Maca. 3 Pedagoga. Coordenadora da Educao Tcnica do Instituto Nossa Senhora da Glria Maca e Orientadora pedaggica da Secretaria Municipal Especial de Educao / Prefeitura Municipal de Maca. 4 Cf. IBGE, Censos Demogrficos, 1980, 1991, 2000.
2005). O senso comum, reforado pela mdia, classifica, invariavelmente, o grupo
social afro-descendente como aquele que tem uma relao mais direta com os altos
ndices de criminalidade que a cidade passou a ostentar, estabelecendo uma relao de
estigmatizao e de segregao, ao mesmo tempo, tnico-racial e scio-espacial, que
nos remete aos estudos desenvolvidos pelo socilogo Loc Wacquant a respeito dos
guetos nas cidades norte-americanas e nas periferias urbanas francesas (cf., entre outros
trabalhos, WACQUANT, 2001).
Mas exatamente o grupo citado acima o principal vitimizado pelo fenmeno
do aumento da violncia urbana no Brasil, nas ltimas dcadas. S para citar como
exemplo, em 2002, as causas externas foram responsveis por um percentual de 72%
em relao ao total de mortes de jovens brasileiros na faixa de 15 a 24 anos de idade
sendo que 39,9% se referiam a homicdios , enquanto que, fora dessa faixa, os bitos
por causas externas era da ordem de 9,8% do total. Desagregando esses dados sob um
recorte tnico-racial, os bitos por homicdios entre os jovens negros era superior em
74% em relao aos jovens brancos que haviam sido vtimas de homicdios (ver
WAISELFISZ, 2004). Essa elevada diferena percentual entre os bitos de brancos e de
afro-descendentes que havia influenciado alguns pesquisadores, duas dcadas antes
desses nmeros, a afirmar que tal fato se tratava de uma poltica de extermnio (cf.
PINHEIRO, 1984).
Alm do alvo do extermnio ser o jovem negro e do sexo masculino, este
tambm se caracteriza por residir nas reas mais pobres das metrpoles brasileiras, se
levarmos em conta todos os estudos j realizados at o momento, sobre a incidncia do
nmero de homicdios nos diversos municpios (cf. CANO & SANTOS, 2000).
No caso especfico de Maca, a exploso de violncia, noticiada pelos meios de
comunicao em 2007, que tem vitimizado os jovens de 15 a 24 anos, atribuda pela
polcia s disputas do trfico de drogas que envolveriam 95% dos casos de
assassinatos. Atestando esse fato, a reportagem exibida pelo programa Fantstico no
quadro Profisso Reprter, sobre as cidades mais violentas do pas, em 04 de maro
de 2007, informou que h dois anos no ocorria nenhum latrocnio (roubo seguido de
morte) em Maca, e que a violncia se encontrava concentrada nas favelas da cidade.
No jornal O Globo, edio de 28 de fevereiro de 2007, Daniel Bandeira, delegado titular
da 123 DP (Maca), afirmou que os jovens recrutados pelo trfico so de origem pobre
e que se tornam presas fceis porque so desqualificados e no encontram vagas no
mercado de trabalho.
Esses dados, na verdade, no deveriam ser apresentados como qualquer
novidade, j que, segundo o Mapa da Violncia nos Municpios Brasileiros, editado
pela Organizao dos Estados Ibero-Americanos para a Educao, a Cincia e a Cultura
OEI, Maca apresentou, entre 2002 e 2004, a taxa mdia recorde de 187 homicdios,
para cada cem mil habitantes, de jovens de 15 a 24 anos. Este nmero representava,
nesse perodo, o 5 maior ndice nacional apurado de homicdios de jovens, entre todos
os municpios brasileiros, e o 2 maior do Estado do Rio de Janeiro, atrs apenas de
Itagua, na regio metropolitana. Em 2008, no entanto, um novo Mapa da Violncia
dos Municpios Brasileiros, consolidando, dessa vez, dados apurados entre 2002 e
2006, apontou que a taxa mdia de homicdios de jovens diminuiu para 152,7 mortes
por cem mil habitantes, deixando Maca no 18 lugar nacional e terceiro do Rio de
Janeiro, atrs de Duque de Caxias (8 lugar nacional, com taxa de 176,8) e de
Carapebus, ex-distrito macaense, emancipado em 1997 (16 lugar nacional e taxa de
158,7). De qualquer forma, contabilizando-se nas estatsticas todas as faixas etrias da
populao, Maca continuou ostentando o inglrio ttulo de municpio fluminense com a
maior taxa mdia de homicdios (15 lugar nacional, taxa de 85,9) e com a maior taxa
de mortes por arma de fogo (6 lugar nacional, com taxa de 72,2).5
Neste artigo, objetivamos apresentar o perfil dos jovens de Maca, na faixa
etria de 15 a 24 anos, segundo os resultados da Pesquisa Domiciliar, realizada pela
Coordenadoria do Programa Maca Cidado entre 2001 e 2003. Diante desta conjuntura
em que se destaca uma acentuada e crescente criminalidade urbana, temos o modesto
objetivo de contribuir para que os rgos competentes possam analisar a possibilidade
de implementao de polticas pblicas eficazes, direcionadas para esses jovens
vitimizados pela violncia, a curto, a mdio e a longo prazos.
Como desejamos identificar esse jovem vitimizado pela violncia em Maca,
uma primeira pergunta que se pode fazer se ele corresponde ao perfil de grande parte
da juventude brasileira que, ano aps ano, engrossa as estatsticas sobre a criminalidade
urbana, como demonstram diversos estudos acadmicos que vm sendo desenvolvidos
5 Cf. a matria Em dez anos, 500 mil homicdios, em O Globo, 30 de janeiro de 2008, p. 3. S para
ilustrar a dimenso do 6 lugar nacional obtido por Maca, nesse ltimo quesito (taxas de mortes por
armas de fogo), vale a pena citar quais foram os primeiros cinco municpios, com suas respectivas taxas:
Guara, PR (92,4); Foz do Iguau, PR (90,1); Serra, ES (86,8); Recife, PE (78,6) e Vitria, ES (72,7).
Para efeito de comparao, Itagua, dessa vez, apareceu em 7 lugar (71,7) e a taxa mdia do municpio do
Rio de Janeiro, tambm nesse quesito, foi de 42,0 mortes por cem mil habitantes, com o municpio de So
Paulo apresentando taxa de 23,4 (estes dois ltimos dados foram retirados pelos autores diretamente do
Mapa da Violncia nos Municpios Brasileiros, editado em 2008 e disponibilizado na Internet (www.ritla.net), na mesma data de publicao da matria pelo jornal O Globo, citada nesta nota).
sobre o assunto (ver, por exemplo, as obras supracitadas de PINHEIRO, 1984; CANO
& SANTOS, 2000; e WAISELFISZ, 2004). Portanto, queremos saber se esses jovens
macaenses que constam das diversas edies dos Mapas da Violncia so, em sua
maioria, moradores da periferia urbana, pobres e negros.
Perfil demogrfico, tnico-racial e econmico da populao jovem de Maca
Segundo dados do Censo Demogrfico do IBGE de 2000, 20% da populao
brasileira possuem entre 15 e 24 anos de idade. A mesma pesquisa apurou que, nessa
faixa etria, estavam representados 19% dos habitantes do municpio de Maca. A
Pesquisa Domiciliar do Programa Maca Cidado, de 2001-2003, praticamente
confirma esse ndice: entre a populao residente de 130.335 habitantes, encontrava-se
na faixa etria de 15 a 24 anos o total de 25.463 pessoas, correspondendo a 19,5% da
populao. Desse total de jovens, 50,3% eram do sexo feminino e 49,7% do sexo
masculino. Segundo o critrio tnico-racial, 49,69% dos jovens recenseados eram
brancos, 49,81% afro-descendentes e 0,5% se definia como pertencente a outras etnias.
Analisando mais de perto os dados apurados pelo Programa Maca Cidado,
uma primeira constatao, que consideramos ser bastante relevante, diz respeito
distribuio desigual desses 25.643 jovens pelo territrio de Maca, como podemos
verificar na tabela a seguir:
Tabela 1 Maca Nmero e percentual de jovens, entre 15 e 24 anos, em bairros e distritos, e sua concentrao relativa no conjunto da populao, na mesma faixa etria, em 2001-2003.
Bairros / Distritos
Total da populao
Total de jovens entre 15 e
24 anos
Concentrao de jovens em
relao ao total de jovens do
municpio
(%)
Bairro da Glria 3.278 589 2,31
Cavaleiros 2.027 351 1,38
Gr. dos Cavaleiros 3.251 582 2,29
Imboassica 381 81 0,32
Lagoa 1.585 315 1,24
Vale Encantado 70 21 0,08
Miramar 5.660 1.124 4,41
Praia Campista 4.000 783 3,08
Riviera Fluminense 5.493 985 3,87
Visc. de Arajo 10.008 1.973 7,75
Aroeira 12.671 2.565 10,07
Botafogo 9.103 1.854 7,28
Virgem Santa 408 87 0,34
Cajueiros 3.594 692 2,72
Centro 8.443 1.492 5,86
Imbetiba 5.037 849 3,33
Ajuda 3.783 765 3,00
Barra de Maca 18.756 3.927 15,42
Cabinas 21 4 0,02
Lagomar 4.232 842 3,31
Parque Aeroporto 16.863 3.526 13,85
S. Jos do Barreto 1.257 255 1,00
Cach. de Maca 1.128 166 0,65
Crrego do Ouro 3.114 606 2,38
Glicrio 1.733 304 1,19
Frade 1.481 230 0,90
Sana 1.434 246 0,97
1 Distrito Rural 1.524 249 0,98
Total 130.335 25.643 100,00
Fonte: Pesquisa Domiciliar do Programa Maca Cidado, 2001-2003.
Como vemos, a Tabela 1 mostra-nos que, nos seis bairros mais populosos do
municpio (que assinalamos em negrito), que reuniam 75.844 moradores (58,2% da
populao de Maca), estavam concentrados, entre 2001 e 2003, 60,23% da populao
jovem macaense entre 15 e 24 anos. Em ordem decrescente de concentrao de jovens,
teramos a seguinte relao:
1 - Barra de Maca 15,42%
2 - Parque Aeroporto 13,85%
3 - Aroeira 10,07%
4 - Visconde de Arajo 7,75%
5 - Botafogo 7,28%
6 - Centro 5,86%
Todos os bairros relacionados situam-se na rea urbana de Maca. Por outro
lado, bairros e distritos da regio serrana e a rea Rural do 1 Distrito, destacam-se por
apresentar uma concentrao de jovens, de 15 a 24 anos, inferior a 1% em relao ao
total de jovens existentes em Maca, nessa faixa etria. Um dos motivos, certamente, a
falta de alternativa de emprego nessas regies.
Fazendo um recorte tnico-racial da distribuio espacial dessa populao jovem
seguindo a metodologia desenvolvida pelo Programa Maca Cidado na primeira
etapa do projeto Mapeamento Scio-cultural do Municpio de Maca (cf. OLIVEIRA,
2005) , identificamos uma maioria de jovens afro-descendentes em doze bairros,
conforme apresentamos na Tabela 2.
Tabela 2 Maca - Percentual de jovens afro-descendentes, entre 15 e 24 anos, em bairros selecionados, 2001-2003.
Bairros
Afro-descendentes, entre
15 e 24 anos (%)
1 Imboassica 87,66
2 Cabinas 75,00
3 Botafogo 71,63
4 Ajuda 67,84
5 S. J. do Barreto 67,84
6 1 Distr. Rural 60,64
7 Lagomar 58,55
8 Barra de Maca 57,32
9 Cajueiros 54,19
10 Miramar 52,49
11 Aroeira 51,58
12 Virgem Santa 50,58
Fonte: Pesquisa Domiciliar do Programa Maca Cidado, 2001-2003.
Procurando estabelecer algum tipo de relao entre as Tabelas 1 e 2, ou seja,
entre a localizao geogrfica da maioria dos jovens macaenses e a sua identificao
tnico-racial, observamos que a interseo existente entre as duas listagens de bairros
exatamente a posio que ocupam em relao distribuio espacial da riqueza no
municpio de Maca. Para isso, recorremos aos dados divulgados pelo IBGE no Censo
Demogrfico de 2000, no que diz respeito ao rendimento mdio mensal domiciliar a
razo entre o somatrio das rendas de todos os domiclios e o nmero de domiclios
existentes.
Segundo o IBGE, o rendimento mdio mensal domiciliar do municpio de
Maca, em 2000, foi de R$ 1.360,85. Analisando os dados disponibilizados pelo Censo,
verificamos que apenas seis bairros de Maca apresentaram um rendimento mdio
domiciliar superior mdia do municpio: Cavaleiros, Glria, Lagoa, Imbetiba, Riviera
Fluminense e Centro.6 Como esses bairros contavam com uma populao de 26.551
6 O rendimento mdio mensal domiciliar de Cavaleiros, em 2000, segundo o IBGE, foi de R$ 3.603,04.
habitantes (20,4% da populao macaense), conclumos que Maca apresentava uma
elevada concentrao espacial da renda nesses domiclios.
Nos bairros citados, residiam, em 2001-2003, apenas 17,99% da populao
jovem macaense, entre 15 e 24 anos de idade. O maior destaque nesse sentido o
Centro, que, conforme vimos na Tabela 1, concentrava 5,86% dos jovens do municpio.
Este bairro a nica exceo estatstica que encontramos ao cruzarmos as informaes
das Tabelas 1 e 2: os bairros que se destacaram por concentrar a populao jovem e por
identificar os maiores percentuais de afro-descendentes, em 2001-2003, eram bairros
que apresentavam um rendimento mdio mensal domiciliar inferior, em 2000, ao
rendimento mdio do municpio de Maca. Assim, selecionando alguns bairros,
elaboramos a Tabela 3, em ordem crescente de rendimento mdio mensal domiciliar:
Tabela 3 Maca Rendimento mdio mensal domiciliar, em 2000. Percentual de afro-descendentes e concentrao relativa de jovens, entre 15 e 24 anos, entre 2001 e 2003, em bairros
selecionados.
Bairros
Rendimento mdio mensal
domiciliar
(em reais, de 2000)
Afro-descendentes entre
15 e 24 anos existentes no
bairro
(%)
Jovens entre 15 e 24 anos em
relao ao total do municpio,
nesta faixa etria (%)
Botafogo 318,58 71,63 7,28
Lagomar 346,45 58,55 3,31
Ajuda 382,11 67,84 3,00
Virgem Santa 386,66 50,58 0,34
S.J. do Barreto 433,16 67,84 1,00
Barra de Maca 438,67 57,32 15,42
Imboassica 467,04 87,66 0,32
Cabinas 617,27 75,00 0,02
Parque Aeroporto 695,90 47,30 13,85
Cajueiros 744,41 54,19 2,72
Aroeira 762,11 51,58 10,07
Visc. de Arajo 851,26 47,19 7,75
Miramar 974,39 52,49 4,41
Fontes: Pesquisa Domiciliar do Programa Maca Cidado, 2001-2003 e IBGE, Censo Demogrfico,
2000.
Relacionamos na tabela acima todos os bairros de Maca com rendimento mdio
mensal domiciliar inferior a R$ 1.000,00, em valores de 2000, excluindo a rea Rural
do 1 Distrito e os bairros e distritos da regio serrana. A populao urbana
correspondia, em 2000, a 95% dos residentes de Maca, segundo o IBGE.
Destacamos duas observaes: em primeiro lugar, quase todos os treze bairros
mais pobres do municpio apresentaram maioria de populao afro-descendente, na
faixa etria de 15 a 24 anos. As excees so Parque Aeroporto e Visconde de Arajo,
com ndices de 47,30% e 47,19%, respectivamente. Mas esses so percentuais bastante
altos, caso comparemos com o Centro que, excludo da lista por apresentar um
rendimento domiciliar acima da mdia, apresentou uma populao afro-descendente, no
grupo de 15 a 24 anos, de 36,46%. J em Cavaleiros, por exemplo, o percentual de afro-
descendente foi de apenas 11,4%.
A segunda observao diz respeito concentrao de jovens entre 15 e 24 anos:
apesar da excluso dos 5,86% do Centro, destacados na Tabela 1, a soma dos
percentuais da ltima coluna da Tabela 3 apresenta, como um dado extremamente
revelador, que 69,49% dos jovens macaenses, na faixa etria em questo, so residentes
nos bairros mais pobres da cidade.
Assim, podemos inferir que a grande maioria da juventude macaense de 15 a 24
anos, destacada nacionalmente pelo Mapa da Violncia, por apresentar o 5 maior
ndice de homicdios nessa faixa etria, entre 2002 e 2004, afro-descendente e reside
em bairros e localidades da rea urbana, que no oferecem as mesmas condies de
qualidade de vida apresentada pelos jovens que moram nos bairros mais nobres da
cidade.
Restaria verificar as condies de acesso dessa juventude educao pblica ou
a possibilidade de insero no mercado de trabalho em Maca, como alternativas de
sobrevivncia ou melhoria futura da qualidade de vida.
A juventude de Maca e seu acesso escola e ao mundo do trabalho
Para refletir sobre o acesso educao por parte da juventude entre 15 e 24 anos,
vamos primeiramente subdividi-la em dois grupos de idades: de 15 a 19 anos e de 20 a
24 anos.
No municpio de Maca como um todo, constatamos que apenas 71% do total de
12.738 residentes, que se encontravam na faixa etria de 15 a 19 anos entre 2001-2003,
freqentavam a escola. Este nmero pode estar relacionado a ndices elevados de evaso
escolar, em um grupo de idade que corresponde etapa do Ensino Mdio. J entre 20 e
24 anos, a permanncia na escola foi uma realidade para apenas 25,5% do total de
12.724 jovens macaenses residentes, que pertenciam a essa faixa etria. Este dado pode
significar que o acesso universidade, na poca da pesquisa, ainda no era uma opo
para os jovens que concluam o Ensino Mdio em Maca.
Vejamos a distribuio da freqncia escolar dos jovens macaenses pelos bairros
e distritos:
Tabela 4 Maca Freqncia escola, segundo grupos de idade de 15 a 19 anos e de 20 a 24 anos
bairros e distritos 2001-2003.
Bairros / Distritos
Freqncia escola entre
15 e 19 anos (%)
Freqncia escola entre 20 e
24 anos (%)
Bairro da Glria 80,2 37,7
Cavaleiros 94,0 65,7
Gr. dos Cavaleiros 74,7 23,4
Imboassica 60,5 27,9
Lagoa 85,9 46,2
Vale Encantado 81,3 25,0
Miramar 76,9 33,4
Praia Campista 74,3 26,4
Riviera Fluminense 73,7 25,8
Visc. de Arajo 76,0 28,5
Aroeira 73,3 28,0
Botafogo 56,4 14,5
Virgem Santa 64,1 14,6
Cajueiros 80,8 31,4
Centro 81,7 45,3
Imbetiba 82,7 41,0
Ajuda 59,7 13,5
Barra de Maca 63,1 16,2
Cabinas 66,7 100,0(*)
Lagomar 59,8 13,0
Parque Aeroporto 74,2 25,6
S. Jos do Barreto 55,0 23,3
Cach. de Maca 61,1 16,9
Crrego do Ouro 60,8 16,9
Glicrio 63,9 19,3
Frade 71,1 18,1
Sana 64,2 15,9
1 Distrito Rural 62,2 15,4
Fonte: Pesquisa Domiciliar do Programa Maca Cidado, 2001-2003.
(*) Este percentual de 100% para a freqncia escolar em Cabinas estatisticamente
irrelevante, por se referir a apenas 1 residente.
Verificando os percentuais apresentados por alguns bairros, podemos destacar os
seguintes dados: em Botafogo, por exemplo, encontramos 43,6% dos jovens entre 15 e
19 anos fora da escola. Na Ajuda eram 40,1%, em 2001-2003. Em Lagomar, 40,2%. Em
So Jos do Barreto, o maior percentual encontrado: 45%. Para efeito de contraste,
observamos que em Cavaleiros apenas 6% dos jovens entre 15 e 19 anos encontravam-
se fora da escola entre 2001 e 2003.
Na faixa etria que vai dos 20 aos 24 anos, encontramos os nmeros mais
significativos em quatro bairros da periferia urbana, em relao aos jovens que no
freqentavam qualquer escola entre 2001 e 2003:
1. Lagomar: 87,0%
2. Ajuda: 86,5%
3. Botafogo: 85,5%
4. Virgem Santa: 85,4%
Excluindo parte da Serra e da rea rural, o quinto bairro a se destacar na relao
acima o de Barra de Maca, que apresentava 83,8% dos jovens entre 20 e 24 anos fora
da escola.
Poderia se alegar que o elevado nmero de jovens desse grupo de idade estaria
fora da escola exatamente por corresponder ao perodo do seu ingresso no mercado de
trabalho, aps a concluso do Ensino Mdio. No entanto, os baixos percentuais de
freqncia escola na faixa dos 15 aos 19 anos, encontrados nesses bairros, relativizam
essa ltima possibilidade.
Quanto questo do emprego, no h como deixar de pensar tambm no
cruzamento dos dados acima com o total de desempregados em Maca nesses dois
grupos de idade, principalmente nos bairros que acabamos de destacar.
Para alimentar essas nossas reflexes, apresentamos a seguir os dados
estatsticos consolidados pelo Programa Maca Cidado, com o percentual de pessoas
residentes ocupadas em cada bairro e/ou distrito, nos grupos de idade de 15 a 19 anos e
de 20 a 24 anos de idade.
Tabela 5 Percentual de pessoas residentes ocupadas, por grupos de idades de 15 a 19 anos e de 20 a 24 anos, nos bairros e/ou distritos, 2001-2003.
Bairros / Distritos
Pessoas residentes ocupadas
entre 15 e 19 anos (%)
Pessoas residentes ocupadas
entre 20 e 24 anos (%)
Bairro da Glria 5,0 11,6
Cavaleiros 1,2 4,3
Gr. dos Cavaleiros 4,6 13,9
Imboassica 12,4 15,8
Lagoa 4,0 11,0
Vale Encantado 11,8 5,9
Miramar 6,6 14,7
Praia Campista 5,4 13,8
Riviera Fluminense 6,0 12,6
Visc. de Arajo 6,7 15,1
Aroeira 7,3 15,3
Botafogo 9,5 15,8
Virgem Santa 10,0 20,7
Cajueiros 6,8 15,9
Centro 4,7 13,0
Imbetiba 3,3 12,2
Ajuda 7,0 17,2
Barra de Maca 8,9 15,8
Cabinas 14,3 14,3
Lagomar 7,2 16,2
Parque Aeroporto 7,7 15,6
S. Jos do Barreto 7,3 20,1
Cach. de Maca 5,2 7,4
Crrego do Ouro 9,5 14,1
Glicrio 7,9 11,1
Frade 5,7 11,3
Sana 5,5 11,4
1 Distrito Rural 4,9 11,0
Fonte: Pesquisa Domiciliar do Programa Maca Cidado, 2001-2003.
Deve-se observar que os nmeros apresentados pela tabela acima se referem ao
total de pessoas ocupadas nos bairros. O percentual indicado significa que, do total de
residentes ocupados no bairro, x % est nos grupos de idade assinalados. Essa
informao pode ser interpretada como uma possvel impreciso, j que esses nmeros
no representavam o percentual de jovens que trabalhavam, em relao ao total de
jovens residentes no bairro.
Mas, apesar de reconhecer isso, esses dados tornam-se relevantes no momento
em que lembramos a informao de que 19,6% da populao residente total de Maca
encontravam-se nessas duas faixas etrias, sendo 9,64% (ou 12.915 pessoas)
pertencente ao grupo de 15 a 19 anos e 9,97% (ou 13.364 pessoas) fazendo parte do
grupo de 20 a 24 anos de idade. Em nmeros absolutos, trata-se das duas faixas de idade
que apresentavam o maior nmero de moradores no municpio, no perodo da pesquisa.
Ainda sobre a Tabela 5, destacam-se os percentuais de So Jos do Barreto e
Virgem Santa, onde, respectivamente, 20,1% e 20,7% das pessoas ocupadas tm entre
20 e 24 anos. Cruzando esta informao com as tabelas anteriores, pode-se concluir que,
nestes casos, a baixa freqncia escola (Tabela 4) coincide com o ingresso no mercado
de trabalho, como necessidade de composio da renda das famlias mais carentes
(Tabela 3).
Outra ressalva importante que muitos jovens estudavam e trabalhavam
simultaneamente uma interseo que no aparece nos dados acima.
Uma outra informao que deve ser levada em conta: do total de residentes
macaenses pertencentes ao grupo de 15 a 19 anos, 28,8% (3.716 pessoas) trabalhavam
em 2001-2003. Da mesma forma, do total de moradores de Maca na faixa de 20 a 24
anos de idade, 58,5% (7.817 pessoas) trabalhavam na poca.
O maior nmero de desempregados em Maca, entre 2001 e 2003, estava
localizado nos bairros perifricos da rea urbana (para verificao desses dados, cf.
COSTA, 2007). Esses bairros unem os maiores ndices de desempregados, os maiores
percentuais de jovens fora da escola e as mais elevadas taxas de jovens que trabalham
(lembrando sempre que, como vimos neste artigo, os jovens entre 15 e 24 anos reuniam
praticamente 20% da populao de Maca, com maior destaque exatamente nesses
bairros mais pobres).
Para concluir, contabilizamos em cada bairro da rea urbana, o nmero de
jovens ocupados dentre o total de jovens residentes. O resultado aponta para um
percentual em torno de 30% de jovens que trabalhavam, no grupo de idades de 15 a 19
anos, ao mesmo tempo em que freqentavam a escola ou, o que mais provvel,
engrossando o percentual de jovens que no estudavam, na idade em que deveriam estar
cursando o Ensino Mdio. Na faixa que vai dos 20 aos 24 anos, como era de se esperar,
o percentual salta para cerca de 60%, em mdia. Na contramo da periferia urbana,
eram trabalhadores apenas 18,2% dos jovens entre 15 e 19 anos que residiam em
Imbetiba; 17,1% daqueles que moravam na Lagoa e apenas 4,6% da populao de
Cavaleiros que pertencia a essa faixa etria. Confiram abaixo:
Tabela 6 Percentual de jovens ocupados, por grupos de idades de 15 a 19 anos e de 20 a 24 anos, nos bairros da rea urbana do 1 Distrito, 2001-2003.
Bairros / Distritos
Jovens ocupados
entre
15 e 19 anos
(%)
Jovens ocupados
entre
20 e 24 anos
(%)
Bairro da Glria 23,0 60,5
Cavaleiros 4,6 27,6
Gr. dos Cavaleiros 26,5 63,1
Imboassica 57,9 65,1
Lagoa 17,1 55,2
Miramar 28,7 65,2
Praia Campista 22,9 61,0
Riviera Fluminense 27,3 64,9
Visc. de Arajo 31,8 69,1
Aroeira 30,2 63,4
Botafogo 35,0 58,6
Virgem Santa 38,5 64,6
Cajueiros 30,2 67,5
Centro 26,0 63,7
Imbetiba 18,2 64,6
Ajuda 26,1 56,4
Barra de Maca 33,4 58,8
Lagomar 26,0 52,0
Parque Aeroporto 30,0 64,8
S. Jos do Barreto 30,3 62,3
Fonte: Pesquisa Domiciliar do Programa Maca Cidado, 2001-2003.
Obs.: foram excludos, da tabela acima, aqueles bairros que apresentaram nmeros que podemos
considerar como estatisticamente irrelevantes.
Portanto, cruzando essas ltimas informaes principalmente aquelas
destacadas pelas Tabelas 4 e 6 , podemos nos arriscar a levantar algumas questes.
Escolhendo o bairro Lagomar como exemplo, percebemos que ele apresentava, em
2001-2003, 87% dos jovens de 20 a 24 anos fora da escola, como se v na Tabela 4.
Mas, segundo a Tabela 6, apenas 52% desses jovens encontravam-se vinculados, de
alguma forma, ao mercado de trabalho. Desse modo, podemos dizer que sobrariam,
no mnimo, 35% dos jovens do bairro, nessa faixa etria, fora da escola e sem trabalho.
Quando ressaltamos que este percentual o mnimo, porque consideramos que uma
parte dos jovens, certamente estuda e trabalha. Logo, aqueles que no estudam, nem
trabalham, devem corresponder a um percentual superior a 35%.
O mesmo raciocnio pode ser feito para os demais bairros. Percebam que, nos
bairros mais pobres da periferia urbana, os menores percentuais de jovens ocupados,
tanto entre 15 e 19 anos, quanto na faixa dos 20 aos 24 anos, praticamente coincidem
com os maiores percentuais de jovens fora da escola nesses dois grupos de idade. Na
verdade, no deve ser uma mera coincidncia estatstica...
Uma Educao crtica e transformadora como um caminho possvel
Como um fenmeno cultural e social que a todos desperta ateno, a juventude
insere-se no contexto das transformaes das chamadas sociedades ps-modernas ou
ps-industriais, as quais, ao longo da histria, apresentaram significativas mudanas,
ocasionando novas formas de ser, viver e consumir. O avano vertiginoso nos campos
cientfico e tecnolgico, as alteraes profundas no mundo do trabalho trouxeram
grandes conseqncias vida social.
A convivncia com este mundo contemporneo impele a juventude
necessidade de responder s exigncias sociais que se configuram diante da
efemeridade, dos desafios e das urgncias da ps-modernidade, o que traz angstias,
inseguranas e incertezas. Uma convivncia marcada pela quebra de paradigmas,
valores e concepes; por profundas alteraes na esfera da educao e do trabalho;
pela insero da tecnologia na vida cotidiana; pela violncia e pela falta de condio de
uma vida digna e com qualidade.
Construir uma cidadania autnoma, que responda a tantos desafios com os quais
se deparam, no somente uma necessidade dos adolescentes e jovens de hoje,
tambm uma urgncia social.
As dificuldades que emergem na prtica cotidiana, de quem lida com os jovens
nas atividades educativas formais, no formais e na vida social, suscitam o
aprofundamento do conhecimento terico, prtico e cientfico sobre a adolescncia e a
juventude contemporneas, fortalecendo as instituies que trabalham frente ao
fenmeno juvenil, s polticas pblicas e s prticas sociais, que se impem nos nveis
local, regional, nacional e internacional.
Esto as instituies em busca de caminhos para enfrentar os questionamentos
da juventude. perceptvel o movimento social em torno da temtica juventude na
contemporaneidade. Diversos fruns, congressos, estudos e grupos de trabalho, tm se
formado, buscando estratgias de promoo da cidadania destes sujeitos sociais.
A divulgao, pelos meios de comunicao, dos elevamos ndices de
criminalidade que tm marcado, a ferro e fogo, a capital do petrleo, tm provocado
uma reflexo sobre uma realidade com a qual toda a populao convive, mas que
somente passou a ser efetivamente encarada, aps nos depararmos, ao ler os jornais,
com as manchetes a respeito da morte de tantos jovens, excludos dos benefcios do
processo de crescimento econmico.
A necessidade de se agir torna-se a palavra de ordem. H uma urgncia em
que se promova, de forma sistemtica, a formao de valores e atitudes cidads, que
permitam aos jovens agir com conscincia e de maneira autnoma na sociedade
contempornea.
Os dados, aqui apresentados, so subsdios importantes para as instituies que
se relacionam diretamente com essa populao juvenil, e so referenciais j utilizados
por diversos projetos implementados pelo pas afora, nos bairros, localidades e distritos
mais carentes de investimentos em infra-estrutura.
Investir na juventude macaense, de 15 a 24 anos, significa, alm de elaborar
polticas integradas de segurana pblica, que fujam ao lugar comum da simples
represso, afirmar o papel protagonista da escola, como um espao de construo
cotidiana de cidadania da juventude tema que, pela sua relevncia, ultrapassa o
processo de educao formal. Significa investir na sua qualificao profissional,
fornecendo-lhes perspectivas concretas de obteno de trabalho. Significa potencializar
aquilo que lhe prprio, proporcionando-lhe acesso cultura, tecnologia, ao
conhecimento.
imperioso dar voz e vez aos jovens, oferecendo-lhes condies para a
construo da sua identidade. E no so necessrios grandes esforos para que isso
acontea: questo de prioridade e de comprometimento poltico. Os jovens de Maca,
manchetes dos jornais de forma trgica e dolorosa para toda a sua famlia e para a
sociedade, que, com isso, se incomoda e se mobiliza, no tiveram oportunidade, no
tiveram escolha: no mundo em que vivem, a droga, a violncia e o preconceito falam
mais alto. Passaram pela escola; foram crianas, adolescentes e vtimas.
So muitas as escolas inseridas no contexto social onde os jovens descritos pelo
perfil traado neste texto esto situados. O que esto fazendo essas escolas? Quais so
os seus projetos polticos-pedaggicos? Qual a viso desses educadores acerca desses
jovens? Reproduzem e reforam o preconceito, a marginalizao e a violncia?
Iniciativas escolares importantes, annimas, acontecem. Iniciativas que poderiam se
configurar em projetos-piloto dentro do municpio e na regio. Cabe uma reflexo
acerca dos valores que devem nortear a ao pedaggica do educador, onde quer que ele
esteja inserido. Uma ao pedaggica reflexiva, crtica e, acima de tudo, comprometida,
que possibilite ao jovem estudante ver alm dos limites do seu cotidiano e encontrar
reais caminhos que dignifiquem e potencializem o seu talento.
Finalizando, no podemos deixar de considerar, mais uma vez, que
fundamental instrumentalizar criticamente os jovens, para que possam de fato assumir
seus projetos de vida, posicionando-se frente aos problemas cotidianos a que so
submetidos, contribuindo efetivamente para a busca da sua superao.
responsabilidade de todos alicerar a juventude (no somente o jovem
marginalizado), fornecendo-lhe meios para que, com sua autonomia, com seu estudo e
trabalho, seu vigor, sua criatividade e iniciativa, seja protagonista na construo da sua
histria.
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