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REVISTARJNDAÇÃO JONES DOS SA.N1DS NEVES

ANO)I - TRIMESTRALVITÓRIA - ESPÍRITO SANTO

Registrada sob número 1854 P. 209173,na Divisão de Censura e Diversões Públi­cas do Departamento de Polícia Federal

de Bras"z'lia (DF).

CONSELHO EDITORIALSebastiaã José Balarini - Anto~ioLuiz Borjaille - André T. Abe - Fer­nando B. Bettarello - Roberto daCunha Penedo Carlos Alberto F.Perim - Carlos Caser - Arleida P.Badke - Antonio Carlos Carpinte­ro - Antonio Luiz Causo

DIRETOR EXECUTIVOFernando Lima Sanchotene

SECRETÁRIA EXECUTIVARegina Maria Monteiro

CAPA E PROGRAMAÇÃO VISUALIvan Alves Vieira FilhoOctavio Kucht.

,

Criada pela Lei Estadual3043 de 31 de dezembro de 1975

OSjETIVOS .

Diretor Técnico := .Antonio, L. Bo:JdWe

Diretor SuperintendenteSebastião]. Balarini

Programar e implementar pesquisas de apoio ao Governo Estadual n~ .elaboração de seus prograRlas de desenvolvimento; " .".formular diagnósticos, realizar estudos e promover a elaboração deplanos e.programas de desenvolvimento urbano e regional;manter um sistema de informações sócio-econômicas na áre~ de ~ua' •

. atuação;formar recursos humanos voltados para o estudo e a pesquisa aplicaldosà realidade capixaba.

DIRETORIA

FOTOLITOTraçolito Ltda.

DISTRIBUIÇÃO DIRIGIDAOs artigos assinados são de inteiraresponsabilidade dos autores.Colaborações, em forma de artigos,ensaios ou resumos bibliográficos,são aceitos se encaminhados aoDiretor Responsável.

REDAÇÃOAvenida Cesar Hilal, 437 - 1<?andar- Vitória - ES Telefone: 227-5044

DIAGRAMAÇÃO, COMPOSIÇÃO,MONTAGEM E IMPRESSÃO

Fundaçaã Ceciliano Abel de Almeida- Campus Universitário de Goiabeiras- Telefone: 227-5164

CONTATO COMERCIALAssinaturas - (anual.- Cr$ 80,00)No endereço da redação, com a Se­cretária Executiva.

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,lNDICE

Revista da Fundação Jones Santos Neves 1SS/01 00-2295 Vitória, ES Nl? 4 Out/Dez 1979

"

Patrimônio ambiental:aspectos na Grande Vitória

Igreja e Residência dos ReisMagos: uma proposta de utilização

A queda do Porto de São Mateus

Fortificações: um legado esquecido

SItias arqueológicos e ,acervopr~ -histórico no Espírito Santo

Maria Stellade Novaes: consciência e crítica

A atuação dolPHAN no Espírito Santo

Patrimônio:t) di#cil caminho da preservação

Em<defesa de nosso Patrimônio~

Ap!Dpriação cultural:uma questão ideológica

Vida" hos arquivos capixabas,.. ..,.

.~~is~à bibliográfica

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38Foto capa: Rogério Medeiros

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CARTA DO EDITOREspírito Santo está ameaçado de ficar sem memória. A documen­tação, a contribuição arquitetônica, o legado indígena, as artes,enfim, as manifestações culturais agonizam de forma inexorá­vel. O patrimônio ambiental e natural não sobreviverá se nábfor apreciado pela comunidade, notadamente pelas novas

gerações. O objetivo desta edição é alimentar os esforços para o des-pertar de uma consciência do valor das expressões culturais de cada

época. A luta em favor da preservaçaõ do patrimônio cultural e daidentidade do povo espirito-santense é de todos nós, norteados pela

necessidade constante de entendimento de nossa realidade e do pro­cesso histórico que lhe deu origem. É essencial a conscieritizaça-o da

nova geração e a incorporaçaõ de todos os segmentos da comunidadeno sentido de evitar a destruiçaõ do patrimônio cultural e natural em

processo no Estado.FLS

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Patrimônio ambiental:aspectos na Grande Vitória

Fundação Jones dos Santos Neves

o legado de bens culturais, históri­cos e artísticos e o potencial de recursosnaturais da Grande Vitória estão ameaç-a-·dos de ex!inção, devido ao r~pido processode industrialização e de urbanização de­sencadeados na região nas últimas déca­das. Ambos os processos tem comprome­tido o patrimônio ambiental urbano,mais suscetível à renovação urbana, pelofato de ser explorado de forma exaustivasem que hajam programas de proteção,recuperação ou correta avaliação do po­tencial existente e de seu papel na ma­nutenção das condições ambientais. Porisso, a necessidade de intervenção no es­paço físico, social e cultural da região deVitória levou a Fundação Jones dos San­tos Neves a elaborar o Plano de Preserva­ção do Patrimônio Ambiental Urbano eNatural da Grande Vitória, concluídoem agosto de 1978.

O trabalho visa o enquadramentoda região de Vitória no Programa de Ci­dades Históricas, através de subsídios àelaboração de programas de restauração,revitalização e utilização do patrimônioexistente, além da formação de um arqui­vo que auxilie em futuros projetos deintervenção. Procura, ainda, despertar aconsciência da existência de um patrimô­nio cultural e natural local, através deprogramas de divulgação junto à popu­lação, constituindo-se num alerta às au­toridades. municipais, estaduais e federais

a problemática que está sendo vivi-pela Grande Vitória, principalmente

quanto aos riscos de destruição irrever­sível a que está sujeito o patrimônio, acurto espaço de tempo, devido à rapidezdas transformações físico-espaciais e só­cio-econômicas que tem ocorrido.

ConcQitoA conceituação inicial do patri­

mônio, maI)ctida até três décadas atrás,abrangia somente os elementos coril signi-

Convento São Francisco - Vitória

ficativo valor histórico ou artístico e devalor excepcional, considerados isolada­mente. Mas esse pensamento sofreu am­pliações, adquirindo um caráter maisabrangente, chegando a atingir diversasmanifestações culturais. Mais recente­mente, organismos estrangeiros e nacio­nais tem reformulado o conceito debem cultural que vem perdendo seu cará­ter de excepcionalidade pela representa­tividade. A nova abordagem não exclui,em hipótese alguma, os bens culturaisexcepcionais, mas transcende a obra iso­lada abrangendo também os espaços dacidade com destaque representativo nosaspectos históricos, culturais, formais, so­ciais, técnicos e afetivos.

Essa visão de conjunto deveorientar a p~ese:v~ção dos bens cul­turais e arqmtetomcos, cujo relaciona­.mento determina a leitura ga cidade. O

correto seria preservar manchas arquiterô·nicas de várias épocas, ciclos econômicose classes sociais da cidade. Desta forma, oplano se preocupa, não somente com amera preservação de edificações, mas,também, com a trama de interações quelhe confere vitalidade e importânc.ia,transformando-o num patrimônio vivo.

O plano prevê a preservação deruas, praças, parques, jardins, bairros,praias e espaços culturais ou de afetivida­de à população da cidade, bem como opotencial mais significativo de recursosnaturais existentes na região, como osrecursos hídricos, a cobertura vegetal dedeterminadas áreas, morros, afloramentosrochosos, ilhas e manguezais.

o legadoO legado de bens culturais existen­

tes na região remonta ao ano de 1535, da·

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Edifrcio Glória - Vitória Solar Monjardim - Vitóri

ta da fundação da Capitania do EspíritoSanto. A região possuía expressivo pa­trimônio natural, apresentando um dosecótipos mais ricos do Brasil. Apresentoucrescimento extremamente lento até finsdo século passado, devido à instabilidadepolítico-administrativa e à deficiência decomunicações a que esteve confinada.Dos municípios levantados, é a capital,Vitória, a que apresenta legado mais sig­nificativo. Fundada em meados do sécu­lo XVI, com implantação típica lusitana,em sítio elevado dominando o mar, apre­sentou seu desenvolvimento intimamenteligado às condições físico-espaciais dosítio, cuja expansão se fez através da con­quista sucessiva de zonas alagadiças, bai­xios, manguezais e aterros de áreas demar.

Na passagem para o atual século,com o processo imigratório e consequentedesenvolvimento da hiterlândia do rioS~nta Maria da Vitória, a função portuá­ria ganha novo impulso, constituindo-se,até os dias atuais, numa das principaisatividades econômicas da cidade. A cul­tura do café e o desenvolvimento das co­municações marítimas, fluviais e ferroviá­rias do início do século geraram transfor­mações significativas na economia regio­nal, tendo reflexo nas cidades através daampliação da malha urbana e remodela­ção dos setores mais antigos com abertu­ra e retificação de vias e demolição de

grande parte do casario existente. Porém,é a partir da década de 60, com a erradi­cação do café e subsequente migração

-maciça do campo que começam a se pro­cessar as alterações mais significativas naregião, agravando-se a partir dos anos70, devido ao impacto ambiental causa­do pelo contingente populacional queafluiu para a região e pela industrializa­ção, através da implantação dos grandesprojetos.

Dos bens culturais e arquitetôni­cos remanescentes dos períodos anterio­res da urbanização, encontram-se maisameaçados aqueles localizados nos cen­tros das cidades, por situarem-se nasáreas mais dinâmicas e, portanto, os pri­meiros setores sujeitos à renovação urba­na.

A grande concentração nas áreascentrais obriga altos investimentos eminfra-estrutura por parte do poder públi­co, além dos aumentos sucessivos do va­lor do solo nessas áreas. Isso acaba crian­do pressões no sentido de ocupar toda equalquer parcela de espaço vago e tirar omáximo rendimento possível através doaumento das áreas construídas para arevenda.

A especulação imobiliária, as pres-. sões advindas da imposição de um siste­

ma viário que comporte número crescen­te de automóveis e a falta de tradiçãono que concerne à preservação dos bens

culturais, configurou a destruição paulatina e gradativa do patrimônio histórÍC<e ambiental urbano.

Os mecanismos para garantir a prEservação do patrimônio ambiental urbano não poderão se restringir somente aitombamento, o que não proporcioneficiência na abordagem de ~mplas SlJ

perfícies de transformação. E necessirio serem acionados outros instrumertos, como a auto-preservação-estímuladpor parte dos próprios p(opdetári01através de incentivos fiscais, controle durbaniza,ção e renovação. urbanas; o USI

de leis mais amplas em planejamentourbano e a participação da sociedade c:vil nas decisões de projetos de desenvovimento urbano.

Compatibilização .Coloca-se, ainda, a questão de cc

mo compatibilizar crescimento econômco e qualidade de vida, ou seja, orientar ­desenvolvimento urbano de forma qu.não contribua para a destruição dgcomponentes mais substanciais da cult1.ra de qualquer povo: seus elementos con:trutivos e suas maneiras de ser. Sobponto de vista sociológico, parece havEum consenso de que o meio-ambÍente s(rá mais rico quanto mais diversificaçãcontiver, seja pelo acúmulo histórico, s(ja pelas criações contemporânoos. Daentão, valorizar-se-á com maior ênfas

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aquilo que não poderá mais ser reprodu­zido, visando salvar o pouco remanescen­te, a fIm de evitar a formação de uma ci­dade sem história, de um povo despojadode seu mais alto valor de identidade na­cional - seu patrimônio cultural.

Quanto ao patrimônio natural, oEstado do EspJrito Santo possuia. 90%de sua área primitiva em matas tropi­cais atlânticas, matas altas da restinga,e matas dos tabuleiros terciários. Hoje,o total dessas formações vegetais, asquais demoraram milhares de anos parase formar, não atinge 2% de sua áreaatual. Observa-se uma transformaçãodo meio ambiente até há poucas déca­das inimaginável e que poderá ter cará­ter sombrio para as gerações futurasque aquí tenham de viver. Proteger opatrimônio natural não significa apenaspreservacionismo utópico e dissociadodo crescimento humano, mas tomar me­didas que possam evitar tragédias futuraspara o meio ambiente ao qual o homemse encontra irreversivelmente ligado.

Na parte que toca à preservação dopatrimônio natural, é urgente a consci­entização da população e do poder cons­tituído no sentido de evitar novas inter­ferências e tentar minimizar as interfe­rências já realizadas.

Metodologia'Foram adotadas, para a realização

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do trabalho, três diretrizes básicas para le­vantamento do espaço urbano e natural:levantamento dos espaços edificados, le­vantamento de espaços abertos e levan­tamento de elementos do patrimônio na­tural. Após o levantament·o da histórialocal da cidade, uma primeira aborda­gem de evolução urbana, elaborou-se umalistagem de edificações e dos principaisespaços edificados a serem preservados,classificados segundo os grupos de histo­ricidade, caracterização, conservação, re­presentatividade, raridade e valores cul­turais e paisagísticos. Também uma lis­tagem dos principais espaços abertos deuso coletivo dos centros urbanos, com­preendendo ruas, praças, largos, parques,etc. com recomendações de revalorizaçãoe integração entre os diversos espaços.

Entre as edificações a serem pre­servadas, destacam-se o Palácio Anchie­ta, a Escola Maria Ortiz, o prédio da As­sembléia Legislativa, Igreja São Gonçalo,Igreja Santa Luzia, Teatro Carlos Gomes,Hotel Europa, Igreja Nossa Senhora doRosário, Bar Britz, Bar Santos, ForteSão João, todos no município de Vitó­ria. Já em Vila Velha, devem ser alvode preservação o Convento da Penha,Igreja do Rosário, Igreja da Barra doJucu, Farol de Santa Luzia, entre ou­tras. No município da Serra, destacam-secomo elementos de preservação a Igrejade São Benedito, a Igreja de Queimados,

o Conjunto dos Reis Magos e outras.Em Viana, devem merecer atenção aIgreja Matriz, a Estação Ferroviária, aIgreja de Belém e uma casa colonial nodistrito de Bonito.

Enquanto isso, o patrimônio natu­ral de Vitória deve constituir-se do Pe­nedo, Maciço Central, Afloramentos Ro­chosos, Mangues e outros. Em Vila Velhao morro da Ponta da Fruta, os manguesde Aribirí, Lagoa de ]abaeté, Outeiro daPenha, Morro do Moreno, etc. Já nomunicípio da Serra devem merecer aten­ção a orla marítima, as lagoas Capuba eJacuném, o Mestre Alvaro, o Morro dosReis Magos e a lagoa Carapebus.

Uma volta ao passadoFoi em 23 de maio de 1535 que

Vasco Fernandes Coutinho aportou nacosta do Espírito Santo, acompanhadopor 60 pessoas, numa pequena praia en­tre os morros da Penha e J aburuna; naentrada da baía de Vitória. No localedificaram pequena aldeia de casas co­bertas de palha, que passou a ser conhe­cida como Vila do Espírito Santo. Masas sucessivas lutas com os indígenasocasionou a mudança da vila para umlocal que oferecesse maior proteção.

O local escolhido foi junto à eXten­sa montanha da ilha de Vitória, em umcurto espigão da face sul, com parte altaa 20/25 m. acima do nível do mar, mais

Vitor Huqo Nogueira

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Uso constante:a melhor forma

de preservar

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ou menos ondulada, com extensão poucosuperior a 80.000 m2 cercado de encostasfortemente inclinadas e limitado por man­guezais distando mais de uma légua daentrada da baía da Vitória.

A ilha pertencia a Duarte Lemos e,na carta de doação, estava vetada a facul­dade de fundar vila ou povoado em Vitó­ria. Da fazenda de Duarte, na ilha de Vi­tória, supõe-se que faça parte a Capela deSanta Luzia, hoje restaurada e transfor­mada em galeria de arte. O prédio apre­senta nítida influência barroca no fron­tão, possivelmente alterado no séculoXVIII, e também a ala lateral da nave daCapela.

A data de fundação da cidade deVitória não é exata, porém Ocorreu noperíodo 1549/51, variando segundo al­guns autores. Até meados de mil e sete­.centos, a Companhia de Jesus tem papelfundamental na fundação de aldeias e liacatequese aos índios. As fazendas eramespecializadas em atividades específicas eserviam para abastecer a sede de Vitória.As aldeias, fundadas no século XVI, hojetransformaram-se nas cidades de Itape­mirim, Guarapari, Anchieta e Nova Al­meida. A aldeia de Reis Magos (Nova Al­meida) é a única do Estado que conservao traçado urbanístico das aldeias jesuítas.

VitóriaA cidade se desenvo lveu segundo

modelo medieval, com ruas tortuosas eestreitas, seguindo a topografia do terre­no. Na paisagem, se destacava o ColégioJesuíta, pelas dimensões e local de im­plantação; em frente à igreja de Miseri­córdia, edificada no início do séculoXVII, ligada por viela estreita e tortuosaà Igreja Matriz de Nossa Senhora daVitória. Numa pequena elevação, na pe­riferia da Vila, foi edificado o Conventode São Francisco, compreendendo a igre­ja, o convento e um amplo patio interno;o Convento do Carmo, com Capela daOrdem Terceira que, segundo Saint-Hilai­re, pertencia a uma belíssima fazenda.Ambos os conventos possuíam extensospomares.

Enquanto a arquitetura religosaconstruía sólidas edificações para a pos­teridade,~>.~rquitetura civil caracteriza­va-se pela· transitoridade e simplicidade,que poderia ser descrita da seguinte for­ma:

• as casas, na maioria terreas, pos-

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suíam pouquíssimas aberturas;as janelas, de guilhotina, pos­suíam escuros sem venezianas eeram fechadas por tramelas demadeira;

• o cômodo da frente era utiliza­do para receber, no corpo cen­tral as alcovas e nos fundos a sa­la de jantar, normalmente ava­randada;

• a cozínha e o banheiro ficavamseparados do corpo da casa.

O século XVIII se caracterizou, naProvíncia, pelo isolamento, pelo lento de­senvolvimento e pelo militarismo. Com adescoberta de ouro na Capitania de MinasGerais, a Coroa tomou medidas de prote-

ção à reglao aurífera proibindo no Espíri­to Santo o comércio com o exterior e ou­tras capitanias e a construção de estradasde penetração no interior. A cidade deVitória foi fortificada por se constituirem ponto estratégico de penetração. Essasituação de dependência agravou-se emmeados do século, com a expulsão dosjesuítas e a desativação das aldeias e fa­zendas.

Durante esse século, recebeu intensoaparato militar. Numa extensão poucosuperior a um quilômetro, foram constru­ídas e reaparelhadas as seguintes fortale·zas: a de São João no estreitamento dabaía defronte ao Penedo;'o fortim S. Dio­go, na prainha junto ao Largo da Concei·ção; a de Nossa Senhora, d() Monte Car-

mo, proxlma a Avenida Jerônimo Monteiro, na altura dos Correios e Telegrafosa S. Inácio ou S. Maurício, próximo acCais dos Padres, na confluência das rua;General Osório e Nestor Gomes; e o fortim da Ilha do Boi, na entrada da baíaDas fortalezas resultou apenas parte d;muralha do forte S. João e onze canhões.

Em fins do século, a economia foativada com a abertura das relações commerciais, através do restabelecimento daligações marítimas com o Rio de JaneiroBahia e outros portos menores. Exportava-se madeira, açucar, panos e algodão limportava-se vinhos, azeite, linhas e sedas.

O advento do café, as imigrações loutras transformações que se processaram no Estado, no decorrer do séculcXIX, possibilitaram uma série de transformações na Capital, que resultaram n;modificação da estrutura urbana colonial existente. Se num momento a cidadloferecia condições desejáveis de segurança aos habitantes, no futuro, apresentari;condicionantes graves em relação à necessidadede transferência de sítio.

A dificuldade de áreas· urb~nizáveipara expansão fez com que a cidade crescesse sobre si mesma, resultando na sobreposição dos tecidos urbanos de diferenteépocas e na expansão em terras conguistadas dos baixios, mangues e mar.

Até fins do século XIX, a cidadlteve crescimento extremamente lentonão passando do núcleo inicial de' pov.oamento, limitada a oeste peJo mangue d<Campinho e a oeste pelo Largo da Conceição. As ruas eram mal calçadas e frequentemente enlameadas pelas águas servidas. Os principais melhoramentos executados a partir de 1892, por Muniz Freire, constituiram-se no início dos aterrodo ~ampinho, do Largo da Conceição ,na retificação parcial da área junto a<Porto. Essas obras foram concluídas n;década seguinte onde foram edificadona área do aterro do Campinho, o ParqwMoscoso, e no aterro da Conceição a Praça Costa Pereira.

Através da atividade comercialmantida com as Colônias e com oUiroEstados, a cidade se dinamizou e o Portecomeçou a adquirir vida. Nele podia seobservado intenso movimento de barcoe barcaças, onde eram comercializadocafé, madeira, frutas, cereais e linha. •

Se, durante todo o período colo

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Edificação jesuíta - Ilha do Frade - Vitória.

I

nial, a cidade esteve voltada sobre si mes­ma, onde as relações se desenvolviam emcaráter local, a nova fase faz com que acidade abra-se para os' espaços externos.A área mais dinâmica, que se localizavana parte alta, deslocou-se para a partebaLxa, junto ao porto. A cidade vestiunova roupagem, através de novas edifica­ções ou reformas nas existentes. Até oinício do século XX, a imagem da cidadeconservava suas características paisagísti­cas e culturais sem grandes alterações.Dando prosseguimento às obras de me­lhoramentos urbanos, houve re­novação no núcleo antigo da ci- .~dade através da retificação e am- 11>

pliação das vias, o que resultou <na demolição de grande parte cd .. ""o casano eXlstente e na trans- iformação do traçado colonial. "-

A ampliação e remodela- ~ção do aparelho político-institu­cional ocasionou: a remodela­ção/descaracterização do PalácioAnchieta, com a demolição daigreja de São Tiago, e reconstru­ção da estrutura interna da edifi­cação e revestimento das facha­das çom motivos neo-clássicos eneo-barrocos e a construção dopó,tico e do acesso principal daMisericórdia para ser edificadoo Palácio Domingos Martins (As­sembléia Legislativa); a Catedralem estilO neo-gótico substituiu avelha Igreja Matriz; o Me~cado

Público foi demolido e o EdemParque cortado ao meio paraa implantação da Avenida Ca­pixaba, atual Jerônimo Montei­ro.

Da mesma forma que asedificações, os espaços de uso so­cial, ;as ruas, as praças, largos eescadarias foram transformados.Assim, a es~adaria do Palácio,.de linhas retas e simples, recebe traço neo­barroco de linhas curvas. A praça JoãoClímacq, principal espaço cívico da ci­dade, foi remodelada, recebendo traçadoart-noveaux, ocasião em que foi demoli­do ~ o coreto, local onde aconteciam con­certos music<tis e outras atividades so­ciais.

As obras de melhoramentos, ini-,oiadas em fins do século passado e que ti­veram continuidade até fins da década'

de 20, transformaram radicalmente a ci­dade de Vitória. Com as transformações,o traçado colonial foi ampliado e remode­lado para dar lugar às novas vias. Quartei­rões inteiros de edificações, na cidade al­ta, foram demolidos, desaparecendo assiminúmeros exemplares das edificações detaipa. Hoje é possível encontrar-se algunsremanescentes dessas edificações na ruaMuniz Freire, uma vez que foi conserva­do o seu traçado original.

Nos anos 20, foram retomadas asobras de melhoramentos que compreen-

deram os· aterros dos bairros São João,da Ilha de Santa Maria e de J ucutuquara,Maurípe, Bombas e Goiabeiras. Foramretomadas as obras de saneamento eserviços urbanos iniciadas na década de1900/1910. Foi dada continuidade àdemolição maciça de casas velhas e insa­lubres, retificação de ruas, ampliaçãodos serviços de água, esgostos pluviais, lim­peza pública. Foram construídas escada­rias na parte alta da cidade, stlbs~ituíndo

as ladeiras mais íngremes. Foi, no período1924/1928. construída uma ponte ligan­do Vitória a Ilha do Príncipe e ao conti­nente. De ferro, pré-moldada. importadada Alemanha.

Com o crescimento da cidade emdireção ao mar. manguezais e baixios, apaisagem se modificou sensivelmcnte. De­vido aos aterros foram altcrados os limi­tcs da cidade, eliminando inúmeras pra­inhas e ligando ilhas c afloramentos ro­chosos que, na parte central, se tornarammais lineares, diminuindo assim a intcgra­

'ção entre água e terra.Em 1941, foram construí­

dos os diques guias que ligavamas ilhas do Boi, do Sururu e doBode e. em 1946. começou afuncionar o Cais Comercial paranavios de grande calado, com adragagem do canal de acesso.

Em 1952, com a conclusãodo aterro da Esplanada, transfor­mou-se de maneira definitiva operfil do centro urbano. Da cur­va do Saldanha da Gama à Ilhado Princípe, as avenidas, osarmazéns e o cais do Porto rom­peram a integração direta da ci­dade com a baía.

Nos anos 50, os edifíciosainda eram esparsos, restringin­do-se ao centro da cidade e atal ponto desejáveis que a inau­guração de um novo prédio seconstituía num evento social dacidade. Mudanças mais significa­tivas ocorrem a partir dos anos60 e, principalmente, na déca­da de 70.

Dos diversos setores daárea central da cidade é a partealta, o núcleo histórico que apre­senta maior número de edifica­ções dos períodos anteriores deurbanização.

Ainda existem, do século XVI, aIgreja Santa Luzia, o Palácio Anchieta e oConvento São Francisco. Do século XVII,o Convento do Carmo e do século XVIIIa igreja São Gonçalo e a Igreja do Rosá­rio. Algumas edificações de arquiteturapopular, próximas a Catedral e na ruaMuniz Freire são os últimos remanescen­tes das edificações de taipa do séculoXVIII e XIX. Com exceção das igrejas, amaior parte dessas edificações encontram-

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se descaracterizadas pelas diversas obrasde remodelação que foram executadas.Os dois exemplos mais nítidos de desca­racterização são o Convento São Francis­co, alterado pelas demolições e inserçãode um volume desarmônico ao conjuntoe o Palácio Anchieta, que, do antigoColégio Jesuíta, possui somente as gros­sas paredes de alve naria. de pedra.

Constituem ameaça ao patrimônio,ainda, as demolições, sendo mais atingi­das as residências, últimos remanescentesda arquitetura popular. O desuso tambémpode se constituir em ameaça às edifica­ções que, quando são abandonadas ousub-habitadas, deterioram-se em curto es­paço de tempo. O mesmo pode observar­se em relação aos exemplares de arquite­tura religiosa, que passam a maior partedo tempo fechadas.

A renovação de diversos setoresvem sendo feita sem um plano urbanísti­co adequado que vise ordenar o antigotraçado e edificações, com as novas edi­ficações e vias de circulação. Desta forma,o acervo do patrimônio histórico, cultu­ral e ambiental da cidade está sujeito adesaparecer definitivamente.

A ocupação do restante da ilha é re­lativamente recente e apresenta-se poucosignificativa em elementos de patrimôniohistórico e artístico, porém sua maiorcontribuição é ao patrimônio natural de­vido às condições paisagísticas e ecológi­cas de excepcional valor que apresenta ailha de Vitória.

Vila VelhaEmbora tenha havido transferência,

para a ilha de Vitória, do principal núcleode residências da pequena vila, fundadaem 1535, ainda persistiu a tendência decrescimento da vila fundada entre os mor­ros da Penha e J aburuna. Ainda no séculoXVII, foi construído, na entrada da baíade Vitória, o forte S. Francisco Xavier,de planta circular, junto ao morro daPenha. N6 século XIX foi fundada aSanta Casa de Misericórdia de Vila Velhae a Hospedaria de Imigrantes, durante oprocesso de imigração. Na Ponta deSanta Luzia foi edificado, em 1971, oFarol de Santa Luzia, para apoio à nave­gação.

Até o início do atual século, VilaVelha apresentou crescimento extrema­mente lento. A cidade não se estendiaalém do núcleo inicial de fundação. A li-

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gação com Vitória era feita através dalinha de barcos, fazendo percurso: Vitó­ria, Paul, São Torquato e Vila Velha.

Na década de 30, com a construçãoda estrada de Vila Velha, após a ligaçãode Vitória com o Continente através daPonte Florentino Avidos, em 1928, au­mentou a população daquela cidade. Ocrescimento urbano se manteve lento atéa década de 50. O centro urbano não seestendia muito além da atual Av. Cham­pagnhat. A Praia da Costa era desabitadae coberta de vegetação de restinga. Aconstrução da rodovia Carlos Lindem­berg, nos anos 50, induziu outro eixode expansão urbana com o surgimentodos bairros de Cobilândia e Ibes e a-ex­pansão do bairro da Glória, no outrolado da rodovia.

As transformações mais significati­vas se processaram na cidade somente apartir da década de 60, com as modifica­ções sócio-econômicas que ocorreram noEstado, com a erradicação do café.

Vila Velha caracteriza-se comocentro secundário, dependendo em altograu de comércio, serviço especializadoe da oferta de empregos que oferece Vi­tória, caracterizando-se como cidade pre­dominantemente residenciaL

No município de Vila Velha desta­ca-se com maior enfase o patrimônio na­tural. Quanto ao Patrimônio Histórico,não apresenta expressivo legado históri­co e arquitetônico em número de obras,destacando-se, dentre as poucas edifica­ções existentes, como principais, oConver;to da Penha e a Igreja do Rosário.

E importante ser preservado o nú­cleo histórico da cidade, com ambiêncianos monumentos existentes, e dar ênfaseao Patrimônio Natural, através de planosque visem a ocupação ordenada, com pa­râmetros compatíveis com a qualidadeecológica e paisagística que possuem etraçar recomendações de proteção à orlamarítima, que se constitui num dosprincipais potenciais para o uso do turis­mo e lazer.

SerraO mumclplO de Serra localiza-se

ao norte da região de Vitória, com o po­voamento datando do início do séculoXVI. Compreende atualmente os distri­tos da sede, Nova Almeida, Carapina,Calogi e Queimado. Alé.m desses distri­tos destacam-se os balneários de Cara-

pebus, Manguinhos e Jacaraípe com ocu·pação posterior a 1920. As transforma·ções mais significativas se processararrno município a partir do século xx.principalmente após os anos 50.

Na década de 70, consolidou-se <ocupação do planalto de Carapina e edesenvolvimento dos balneários, a uma ta·xa de crescimento populacional, em set€anos, que chegou a duplicar a populaçãcdo município.

A sede possui a função político-administrativa e apresenta crescimento muitclento, o que lhe permitiu manter caracte·rísticas urbanas do século passado e iniciedeste praticamente sem alterações.

A orla marítima caracteriza-se pelepredominância de atividades turísticas (de lazer, enquanto a atividade resideneiatransitória tende a assumir caráter de permanência.

Próximo à Serra, destaca-se o Mestre Álvaro, a principal montanha da região que se constitui num importantemarco de orientação e de paisagem, apresentando biótipo muito raro devido ialtitude e proximidade do mar.

A sede do município foi fundad,pelos jesuítas no ,ano de 1558 junto imontanha Mestre Alvaro, denominada inicialmente de aldeia Nossa Senhora d,Conceição. O sítio onde está implantad~,cidade é praticamente plano, destacando-se, ao fundo, o Mestre Álvaro. Destaca-se na cidade a Igreja Matriz, edificad,possivelmente no século XVII, porérrcompletamente descaracterizada pela inserção de volumes anexos e elementos decorativos.

A cidade conserva muito de seu aspecto bucólico. A maior contribuiçãepara o patrimônio histórico são as edificações de arquitetura popular, remanescentes dos períodos anteriores de urbanização, que se apresentam com poucas alterações. .

Nova AlmeidaFoi fundada pelos jesuítas, rec~

bendo a denominação de Santo Ináeicdos Reis Magos, em 1558, localizando-sjunto à foz do rio Reis Magos. Destacouse como uma das mais importantes a:deias de catequese do Estado. Implant~

da numa colina, onde se descortinam v:suais da foz do rio, do mar,' da cadeide montanhas, o conjunto dos Reis M~

gos cpmpreende as edificaç'ões da Igrej

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de Nave única, possuindo retábulo queserve de enquadramento de uma pinturados· Reis Magos, a residência que se de­senvolve ao redor do claustro e, no entre­meio, a torre sineira.

Em frente à edificação, há uma pra­ça de forma retangular, ornada com pal­meiras imperiais, tendo o cruzeiro ao cen­tro. Ao redor da praça, localizam-se ashabitações e demais atividades desenvol­vidas na aldeia, em edificações térreasque, possivelmente, apresentam condiçõesarquitetônicas bem rudimentares.

QueimadoEm 1848, aconteceu uma insurrei­

ção de escravos na vila de Queirllado,episódio ligado à construção da igreja deSão José. Os escravos da região esperavama alforia, conforme lhes havia prometidoo Frei Gregório de Bene, após a edifica­ção da Igreja. Atraiçoados pelo padreforam combatidos pelas tropas do Gover­no, culminando com o enforcamentodos líderes em frente à Igreja.

A igreja de Queimado localiza-seem zona rural, em sítio elevado, numa pe­quena clareira. O acesso é dificultadopelas péssimas condições da estrada e pelafalta de sinalização. Da Igreja de NaveUnica e sem torre, ruiu a coberturà e aparede posterior da Sacristia. Na frenteda. Igreja, prolonga-se um patamar compequena escadaria e aos fundos, locali­za-se o cemitério.

A população da vila migrou maci­çamente, restando atualmente uma popu­lação de menos de 100 pessoas na sededo distrito.

VianaCom a penetração através do rio

J ucu, os jesuítas fundaram, próxima àmontanha de Araçatiba, uma fazenda queabrangia grande extensão de terras. Eraespecializada na produção de cana-de­açucar e póssuía também um engenhode beneficiamento 'do açúcar que abas­

o colégio de Vitória. Com a expul­dos jesuít,as, .a fazenda passou a ser

administrada por coronéis, porém acabou. caindo em estagnação. Em 1818, o con­junto da fazenda compreendia aindaConvento residência e Igreja com duastorres.

Em' 1813, foi fundada a cidade deViana, por intervenção do então Gover­nador Frandsco .Alberto Rubim, com a

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Antigo Colégio do Carmo - Vitória

vinda de 30 casais açorianos. A fundaçãoda cidade marcou o início do povoamen­to do interior do Estado e estabeleceucomunicação com Minas através daconstrução da estrada Vitória-Ouro Preto.

Viana apresenta crescimento muitolento desde sua fundação, não chegandoa se expandir além da elevação, núcleode fundação da cidade. Destaca-se, noponto mais elevado, a igreja Matriz deViana, implantada na praça SoldadoApolinário. A construção da igreja datade 1815, porém foi praticamente des­truída por um incêndio em 1848.

Das duas edificações do séculoXIX, no centro da cidade, uma já se en­contra relativamente descaracterizada.A outra, em Bonito, próximo de Viana,é um casarão de fazenda do século pas­sado, conservando as características ar­quitetônicas originais com pouquíssi­mas alterações, constituindo-se num dosmelhores exemplares de arquitetura ruralda região de Vitória.

A igreja de Araçatiba, último rema­nescente da antiga fazenda, está tombadae restaurada pelo IPHAN, fazendo-se ne­cessárias algumas obras de manutenção.

A igreja de Belém ruiu parcialmentecom a construção da BR 101, devido ocorte do terreno ter sido realizado emárea muito próxima à sacristia. Sua dete-

. riorização foi acelerada devido à lenda de

que, no seu interior, estaria escondido umtesouro, onde foram feitas diversas esca­vações.

Viana possui características de vilapacata, com poucas atividades sócio-cul­turais. Os dois principais espaços da ci­dade são a praça Soldado Apolinário,onde está implantada a Matriz e a praçada Prefeitura, em nível mais baixo.

Para a' faixa de terra localizada àdireita da rodovia, junto à montanha.faz-se necessário preservar as caracte­rísticas paisagísticas e limitar os gaba­ritos da altura, visando preservar osvisuais da Igreja.

Consideracões finaisO do~umento faz ainda um amplo

estudo das condições sobre o patrimônionatural da Grande Vitória que, a cada diamais e mais sofre as mutações decorrentesda falta de planejamento. Nesse sentido,as propostas do presente documento es­tão incluídas nos diversos planos direto­res que estão sendo elaborados com aparticipação da Fundação J ones dosSantos Neves, evitando que as transfor­mações ambientais possam ocasionar odesequilíbrio do ecossistema a níveisirreparáveis. Como exemplos, o aterro dosmangues, a ocupação indiscriminada dosmorros poderão atingir diretamente a fau­na e a flora existentes na região.

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Igreja e Residência dos ReisMagos: uma proposta de utilização

A edificação recebe nova função, voltando-se para os interesses da comunidade Vitor Hugo Nogue

o uso de monumentos históricosnão se deve limitar apenas à sua adapta­ção como museus ou centros culturaisque os liguem aos valores de seu passado,mas ocupá-los também com escolas, cen­tros de saúde, órgãos administrativos, cen­tros de assistência social ou quaisquer ou­tras atividades que condigam com a reali­dade atual da população no seu dia-a-dia.Por ser um bem comum das comunidades,sua apropriação deve atender, de imedia­to, os interesses desta como um todo.

Dentro dessas linhas, foi idealiz;:\.doum projeto de utilização e revitalizaçãoda Igreja e Residência dos Reis Magos, emNova Almeida, pelos arquitetos FernandoSchwab F'irme e Helena Maria Gomes,promovidos pela Prefeitura Municipal daSerra, t:undação Jones dos Santos Nevese oLftros órgãos envolvidos no processocu ltural.

O prdjeto, concluído em setembrodo corrente ano, acatou diversas sugestõespropostas, selecionando alguns pontosconsiderados importantes. Dentre as pro­postas encaminhadas, selecionou-se aque­las que melhor se adaptavam à utilizaçãodo monumento, considerando, ainda,

aquelas de maiores possibilidades de adap­tação.

A igreja data do século XVI, tentogrande importância na primeira metadedo século XVII, quando obteve dos Reisde Portugal uma grande área de terra des­tinada aos índios. Seus edifícios foraminaugurados na mesma época, sobreviven­do até os dias atuais, depois de terem ser­vido de base para a catequese e entradasde índios Aimorés e Paranaub ís no atualEstado de Minas Gerais. Serviu, também,

•como primeiro centro divergente de civi­lização ao norte da capitania, tornando­se, em 1878, Casa de Câmara e cadeia davila.

Aspectos da edificaçãoA edificação dos Reis Magos pos­

sui planta quadrangular; apresentando naala oeste a Igreja, com frontão triangular.De entre-meio, a torre sineira e a residên­cia de 40is pavimentos que se desenvol­ve ao redor do claustro. No pavimentosuperior a residência apresenta duas ce­las na ala norte, quatro na ala oeste eduas na ala sul. No pavimento inferiorapresenta dois acessos:- um na ala sul,

outro na leste e, ainda, quatro celasala oeste e três na ala norte uma dquais é a sacristia.

As paredes foram edificadas coblocos irregulares de laterita argamas~

das com caulim, misturado com conch,revestidos provavelmente com argamasde tabatinga. As vergas e marcos são (braúna e canela, duas madeiras de lei. ]\pavimento inferior, não há referência'revestimento, sendo, possivelmente, (terra batida. No anda! superior, os palmentos são de pranchas corridas. A fachda principal volta-se para a grande praçapresentando' um só plano com frontitriangular na Igreja que possui três janlas, um óculo central e a porta princip,A torre sineira é simples e encimada p'abóboda de berço, em tijolos com aca~

mento natural no extradorso em forma:(meia laranja. O pavimento superior aprsenta quatro janelas e, no interior, a porprincipal, tendo em cima um medalhão.

A edificação mostra uma arquitetra rústica em acabamento, sendo apenrequintada no trabalho de talha de retbulo. Procurando evitar alterações na dfinição geral, situou-se as diferentes ati,

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32 pontos31 pontos30 pontos28 pontos

- 26 pontos24 pontos

- 22 pontos6 pontos

- 4 pontos

dades cela por cela, afim de melhor apro­veitar o espaço.

Avaliacão das atividadesP~ra se avaliar as propostas recebi­

das, foram definidos nove aspectos consi­derado s significativos:

1) Natureza da atividade: entenden­do-se o caráter da atividade que será de­senvolvida ou seja: se ela será voltada parao uso da população local ou para a atra­ção de turistas e visitantes.

2) Compatibilidade entre a propos­ta e o monumento: análise das funçõespropostas e contração com a natureza ini­cial do conjunto como monumento reli­gioso e de difusão cultural.

3) Disponibilidade da área para odesempenho proposto: relaciona as exi­gências de espaço demandadas para ativi­dade proposta, com a oferta efetiva veri­ficada no interior e exterior do monu­me,nto.

4) Adaptabilidade do monumento àfunção proposta: verificação da implanta­ção de uma determinada função em rela­ção -às alterações, adaptações ou instala­ções e compatibilidade das obras com omonumento.

5) Frequência de utilizaçaõ: umadas primeiras intenções é o uso permanen­te ou mais contínuo possível. Portanto,esse aspecto considera as possibilidades deimplementação dessa utilização junto aopúblico.

6) Relação entre os ônus de implan­tação e manutenção e os benefícios pro­duzidos - interligar as atividades demanutenção com fórmulas que garantambenefícios que assegurem a auto-sustenta­ção do empreendimento. Devem ser con­siderados igualmente os benefícios finan­ceiros,.como também os de ordem cultu­rais.

7) Segurança: assegurar a integrida­de física do monumento, que corre riscoscom possíveis adaptações destinadas à im­plantaçãC? de determinadas atividades.

8) Caráter da atividade: utilizaçãodo monumento ligado a sua conservação,que se relaciona com a natureza das ativi­dades propostas. Atividades sazonais, es­porádicas, pouco representam em termosde comunidade e perpetuação do conjun­to.

9) Integridade: uso predatório, co­mo o turístico, acaba por consumir asfórmulas que geram o projeto.

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Resultado da AvaliacãoForam selecionalas nove propostas.

Analisou-se cada uma delas, atribuindo­lhes pontos. Fazendo-se uma soma algé­brica, obteve~se uma relação de funçõesprioritárias em ordem decrescente. Desti­nou-se então maior espaço para as ativi­dades que obtiveram maior número depontos, até que esgotassem as possibili­dades do prédio.

Foram selecionadas as seguintespropostas:

l. Ativid. musicais2. Biblioteca3. Pequeno Auditório4. Galeria de arte5. Culto religioso6 _ Oficinas de arte7.' Museu8. Festival de verão9. Loja Turística

A PropostauÉ da essência do homem criar ma­

terial e, moralmente, fabricar coisas e fa­bricar-se a sí mesmo Homo Faber"BERGSON.

Para uma utilização adequada e per­manente da edificação e que esteja volta­da para os interesses da comunidade, pen­sou-se numa escola. Escola que formasseindivíduos no sentido de ampliar a cons­ciência do fazer, atividade que era desen­volvida nesta edificação desde o início desua construção. Voltada para a criaçãoartística iria preencher uma lacuna ine­xistente na região. Seria uma atividadepermanente que engendraria uma sequên­cia de atividades culturais que, por sí só,não subsistiria, a menos que possuíssemuma infra-estrutura muito forte, o que épossivelmente exógeno à comunidade.

N a Igreja, deve permanecer a ati­vidade de culto, função que existe desd~

sua fundação e que se mantém até hoje.O que se propõe é um uso mais intenso,inclusive para cerimônias de casamentose batizados. Atividades musicais comoconcertos de câmara e apresentações decorais, podem utilizar o mesmo espaço.Basta que se restaure o retábulo, cujapintura original encontra-se coberta porduas ou três camadas de tinta, e ele esta­ria adequado para receber de volta o qua­dro dos Reis Magos que já se encontratotalmente restaurado.

Pode-se utilizar um mesmo espaçopara o funcionamento de um pequeno

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Conjunto dos Reis Magos: única aldeia jesu ítica que ainda conserva o traçado original

auditório e de uma galeria de arte. Oprimeiro se prestaria a promoções da es­cola e uso da comunidade para conferên­cias, palestras, debates, filmes e reuniões.

A galeria, além de promover exposi­ções de trabalhos da própria escola, servi­ria como espaço a outros artistas que qui­sessem utilizá-lo. Essas exposições, con­tendo um número de obras de arte supe·rior ao que comporta o espaço, poderiamse estender às paredes do claustro vizinho.

Cada exposição doaria uma obra aoacervo da galeria, que poderia ficarpermanentemente exposto em outros es­paços ou serem recolhidos ao acêrvo re­manescente em um depósito.

Uma pequena biblioteca, junto aohall de entrada, serviria às necessidadesda escola, e poderia atender à populaçãoque quisesse dela se servir. Seria total­mente compatível com o monumento ..Oacêrvo deve ser voltado para os assuntosministrados nos cursos e aos interesses dopúblico em geral e se formaria com doa­ções de particulares e livrarias.

O festival de verão poderia desen,­volver-se por todo o mês de janeiro. Eproposto não apenas com o caráter ini­cial de festividade, mas como uma opor­tunidade de amplo intercâmbio de idéias,através da m'i1.:3tração de cursos e com aparticipação de elementos de outros esta­dos ou países. Festividades propostas pe­la Fundação Cultural poderiam diluir-seao longo deste período.

Basicamente, esse centro estaria vol­tado para a iniciação artística, com possi­bilidade de desenvolver diferentes níveisde expressão tais como expressões gráfi­cas, plásticas, musicais corporais ou tea­trais.

As oficinas/ateliês utilizariam, co­mo espaço de expressão, as celas do pré­dio, comunicando-se, na maioria das ve­zes através do claustro, e, em certos ca­sos: internamente, de acordo com as pos­siblidades oferecidas pelo prédio. Quase

todas as celas, principalmente as do pa­vimento superior, tem condições de venti-.!ação e iluminação suficientes às ativida­des ali localizadas.

As atividades de dança e teatro, pornão terem espaço físico definido, pode­riam ser exercidas no auditório, no pátiointerno, nas áreas externas ou na sala demúsica.

Destinar-se-ia com.r.artimentos cha­mados de servíços para funções de apoioàs atividades principais. Foram localiza­dos dois conjuntos de sanitários, um paracada sexo, um depósito geral para cadei­ras, stands, cavaletes e outros materiaisvolumosos; um depósito destinado aomaterial de limpeza e uma sala parautilização da administração. Na entradadestinou-se uma área para informaçõesturísticas relacionadas com a história domonumento.

E importante não esquecer queatividades turísticas são predadoras, tra­zendo poucos benefícios para a comuni­dade. Além do mais o próprio monu­mento já é uma atração turística, o quebastará para que esta seja uma atividadesecundária.

o espaço externoO conjunto dos Reis Magos, em

Nova Almeida, é a única aldeia jesuíticaque ainda conserva o traçado original.Implantado sobre o planalto junto àsmargens do rio Reis Magos, o conjuntocompreende a Igreja de nave única, atorre sineira de entremeio, e a residên­cia que abriga dois pisos abrindo para oclaustro. Em frente ao conjunto, duasalas de palmeiras imperiais formam umapraça de forma retangular de 32,50 m153m, inserida em outra praça maior de,aproximadamente, 16.540m2.

Circundando a praça, uma rua queserve de acesso às residências que, comexceção de um sobrado à. direita, são

térreas. Atrás da edificação, a área pertencente ao conjunto, estende-se até os limites de um morro.

São excelentes as condições qUlapresentam os espaços externOs. Diversas atividades propostas para o monumento podem ser desenvolvidas comopor exemplo, as aulas de pintura, de desenho, de teatro, dança, música, apresentação de grupos folclóricos como o Reizado, Ticumbi e Congadas. Da mesm;forina o festival de verão.

Organização internaPara a direção da escola, dever;

ser formada uma Comissão Executiva (um Conselho Deliberativo. O primeiredeve ser formado pelos professores d,escola e, o segundo, por representante:das instituições envolvidas e membro:da comunidade (em maior número).

A Comissão Executiva, formad,pelos professores, deve ter um coordenador, e as seguintes atribuições:1 Coordenar as atividades desenvolvi

das na escola;2 - Tomar decisões em conjunto;3 - Reunir-se semanalmente para ava

liar os trabalhos e solucionar eventuais problemas;

4 - Levar as decisões da Comissão aeConselho Deliberativo.O Conselho Deliberativo por su,

vez, terá as seguintes funções:1 Aprov.ar as deliberações do corpe

de professores;2 - Procurar viabilizar as atividades es

colares, divulgando, conseguindcverbas e materiais;

3 - Exercer todas as funções externa:de ligação entre a escola e demai:entidades como o MEC, FUNARTE, Governo Estaduál, FederalIPHAN, etc.

A implantaçãoPara que se possa utilizar o prédi9

é necessário o trabalho de restauraç~f

de suas partes de terioraâas, intrddtlç:~~

de equipamentos inexistentes, como>/~instalações hidráulicas e sanitárias, inst~

lação elétrica (ampliação) e defmição d:manutenção.

É importante que se defina qual,instituição base que tomará frente enqualquer trabalho de revitalização de monumentos culturais, para que ele nã<venha servir a outro fms que não esse.

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A queda do Porto de São MateusFernando Schwab Firme*

o processo de deteriorização daárea do Porto de São Mateus iniciou-se nadécada de 20, com o início da decadênciado transporte fluvial, vindo a consolidar­se por volta de 1940, com a paralizaçãototal da atividade econômica do porto. Apartir de então, passa a se processar emrítmo acelerado a queda física de todo ocasario que se caracterizara como estru­tura suporte das atividades econômicas.Desaparece de vez o caráter integradoque faz com que uma cidade não sejaapenas um aglomerado acidental de edi­fícios, mas um organismo multifuncionalcom lugar específico designado a cadafunção, segundo determinações sociais eculturais. Processa-se a desintegração pelaperda da função.

O caminho que poderia conduzir àreabilitação da área passa justamente pe­las pegadas deste processo degenerativo,no sentido inverso. Seria necessário des­cobrir novas funções para o porto, dentrodo organismo que é a cidade para que areintegração se processasse naturalmente.

As primeiras tentativas, nesse senti­do, ligadas a iniciativas de estabelecimen­to de um programa estadual de restaura­ção, partiram de um grupo de trabalhocoordenado pela Prof. Maria CeC11ia Nas­cif, que percorreu o Estado procurandocatalogar e documentar todos os monu­mentos históricos de valor significativopara preservação. Na área de São Mateusforam localizadas casas e identificados

proprietários para facilitar o poste­rior tombamento a nível estadual.

Tempos mais tarde, foi formado umconvênio entre a Fundação Cultural e aFundação J ones dos Santos Neves paraelaboração de um projeto que culminariacom a restauração dos prédios e a reabi­litação da área para a cidade.

Em meados de 1977, realizamosnossa 1a visita a São Mateus e ao seu por­to. Já então o estado dos prédios era de-

sesperador, tratando-se na verdade deuma tarefa de reconstrução de quaseruínas. Por pouco desistimos da tarefa,tamanho o desânimo provocado por aque­le monte perigoso de escombros, porém,o entusiasmo reinante em torno da "res­tauração" nos levantou o ânimo para ten­tar iniciar alguma ação prática.

A perda de função: o principal obstáculo

Foi feita a restituição aerofotogra­métrica da área na escala de 1(1000 paramelhor determinação dos acessos existen­tes, dos centros de quadra que, tomadospelo matagal, impediam uma inspeção emedição eficientes para suprir a falta deplanta cadastral, na época inexistente, eelemento importante como mapa básicode um zoneamento local. Ao mesmo tem-

*Técnico da Fundação Jones Santos Neves

po foram levantados os "Greides" dasruas incluídas na área do porto e medidastodas as "Festadas" dos prédios de inte­resse históri'co para facilitar o posteriordesenho das fachadas após levantamentodetalhado.

Planejou-se realizar o trabalho emduas etapas: numa 1a etapa seriam levan-

tados e desenhados todos os prédiose encaminhada uma proposta preliminarpara utilização da área; numa 2a etapa,definidas as novas funções dos prédios,seus usuários e os programas de adapta­ção, seriam executados os projetos cons­trutivos.

Para implementação da la etapa,partimos em missão individual e com urna

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cadeira desmontável, prancheta e blocosesboçamos durante dias os exteriores e in­teriores de todas as casas. Após isto feito,retificamos todos os desenhos em pran­chetas, acrescentando linhas de cota emplantas e fachadas que serviriam para opreenchimento com as medições diretasa serem realizadas em seguida. Para execu­tar esta tarefa, valemo-nos do entusiasmodos alunos do Centro de Artes da UFES,frequentadores e promotores anuais dassemanas de arte na área do porto paraconseguirmos formar 4 grupos de traba­lho, os quais, com certo risco, medirampor dentro e por fora todos os prédios,completando a informação apenas visualfornecida pelos esboços.

Todos os prédios, após algumas vi­sitas para esclarecer uma ou outra medi­ção duvidosa, foram então desenhados naescala de l/50, já então incluindo corteslongitudinais e transversais, constituindo­se este material no elemento base para aelaboração dos futuros projetos de adap­tação dos casarões.

Na ocasião, apresentou-se uma pro­posta preliminar de utilização, motivadagrandemente pela influência das semanasde arte e que propunha uma espécie decampus avançado para as artes, com ativi­dades permanentes e um festival anualpara maior divulgação do local e dos tra­balhos ali realizados.

J á nesta fase, tornou-se impraticá­vel o convênio, pois as verbas destinadasao suporte das despesas de projeto nuncaforam repassadas à FJSN, tornando muitooneroso o prosseguimento com recursospróprios. Mesmo assim, após contatocom o CRUTAC/U FES, solicitando-seàquele centro sua contribuição nas defi­niçOes de programas de projeto para adap­tação dos prédios, obtivemos as coordena­das para o início dos estudos de um restau­rante, alojamentos feminino e masculino,

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algumas oficinas de arte, um alojamentode professores e a residência do diretor docampus avançado.

Estudou-se a implantação de umaârea preliminar, sem discussão ou com­promisso, enquanto permanecia indefini­da a questão dos recursos de projeto.

Na época, o grosso volume resul­tante do levantamento e proposta preli­minar foi citado na imprensa como o Pro­jeto de Reabilitação. Falou-se mesmo emdatas de início de obras! E no entanto,nada era definitivo. .

Ainda hoje, em 1979, ao ser assina­do o contrato para obras de escoramentodas ruínas, a notícia veiculada é a de queas obras de restauração foram contrata­das.

Tal maneira de divulgar, seja a cul­pa da fonte ou do veículo dê informação,desperta expectativas que ao serem frus­tradas desacreditam definitivamente ostrabalhos e seus promotores.

A visita do Prof. Silva Telles, doIPHAN, interrompeu os estudos de adap­tação de prédios para a CRUTAC, sob ajusta alegação de que seria urgente pro­mover o escoramento das casas ou nãorestaria nada para se restaurar. Porém, aburocracia exigia para a liberação das ver­bas de escoramento, uma medida expedi­ta e de emergência, nada menos que umprojeto. Tal projeto foi encaminhado e,após tramitação mais ou menos longa,resultou na liberação de verbas para esco­ramento após licitação pública.

Deve-se assinalar aqui, que entre avisita do Dr. Augusto Silva Telles e o está­gio atual das coisas, onde se processa otrabalho de escoramento, recebeu o portode São Mateus a visita de um perito daUNESCO, o Dr. Raul Pastranã, que apósexaminar a proposta e o local, fez críti­cas muito pertinentes e valiosas, que de­monstram a importância da discussão das

propostas antes de saudá-las .como fconsumado.

Segundo o Dr. Pastranã, a propoda FJSN seria basicamente centrada nuatividade externa à cidade de São Matejá que se apoiava nas semanas de art,nos programas de treinamentoCRUTAC. Segundo seu ponto de vi!o caminho da reintegração da áreaporto à cidade e à região deveria paida análise da cidade, seu equipamentlestrutura de prestação de serviços, paidenficiadas as carências e aspirações, tlizá-Ias na proposta de reconstruçãoporto, atraindo assim a' vida quotidi<da população para a área dos casarões.

Projetos não são problemas e sindefinição de sua utilidade e sua elaboção em resposta a uma demanda ef,va. Se não houver interessados. realmené inútil projetar, produzir pap~l. Não éficiente clamar, esbravejar pelo descaseipreciso colocar em contato os possívinteressados com idéias de utilizaç.~o p,que se chegue a um compromisso, incsive quanto à manutenção futura.

À medida que o tempo pa~sa,. cprecia-se o valor de uso dos imóveis conabrigo. Breve cairá a zero, tornando-secusto do reparo igual ao da construçãoprédios novos, em que pese seu valor C1

tural e histórico.A solução desta questão, se não s·t

gir de estudos como as recomendações I

UNESCO, 'com discussões das propostaté o estabelecimento de sua forma denitiva e o compromisso das entidadespessoas interessadas no uso dos inlóvesurgirá com a ação do tempo sobre aqulas empenas e paredes de pedra e cal. Brve não haverá mais sobre o que discutos levantamentos e as fotografias serãodocumentos históricos de uma área urbna degenerada e sepultada no passadoeste será o último degrau da queda.

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Fortificações: um legado esquecidoJoão Euripedes Franklin Leal*

Um aspecto da evolução urbana deVitória que está intimamente ligado aocrescimento da própria cidade, é o siste­ma defensivo, do qual, por alguma sorte,ainda resta uns pouco s vestígios. Em, ou­tras regiões, mais desenvolvidas, fatalmen­te ter-se-ia preservado todo o conjuntoque poderia servir inclusive, quando nada,como atração turística, carreando divisaspara o Estado, que seriam superiores àsgeradas pelos empreendimentos imobiliá­rios que o destruiu substituindo-o porconstruções inespre~sivase massifican tes.

O sistema defensivo de Vitória foi,durante os séculos XVI e XVII, relativa­mente dirÍlÍnuto, muitas vezes até aquémdas necessidades da Capitania para sua se­gurança.

Somente após os ataques holande­ses (1625 e 1640) e a notícia de uma su­posta serra de esmeralda no interior daCapitania do Espírito Santo é que se des­pertou para a necessidade de melhorar asfortificações de Vitória. Mas, ainda assim,relegou-se a tarefa a um prano secundá­rio} até que houve a descoberta de outro,em grandes proporções, na região de Mi­nas Gerais. A partir de então deu-se umaradical mudança da política colonial por­tuguesa em relação ao Espírito Santo. Asprincipais iniciativas foram: proibiu-se aprocura do ouro e sua mineração no Es­pírito Santo, por ser região próxima aolitoral e assim favorecer a cobiça estran­geira e a consequente invasão; proibiu-sea abertura de qualquer estrada que atin­gisse o interior, impedindo-se terminan­temente qualquer comunicação com Mi­nas Gerais, quer por via fluvial (rio doce)ou por via terrestre, temendo o uso des­tes caminhos, tanto por contrabandistasde ouro, como por possíveis invasores es­trangeiros, devido ser o litoral capixaba omais próximo da área de mineração. Con­s~q'uentemente, o Governo de Portugal

·passou a considerar a Capitania como a

"defesa natural das Minas Gerais" ou atrincheira natural para a defesa das MinasGerais" proibindo qualquer "ato de civi­lização", entradas ou povoamento do in­terior, que implicassem em progresso re­gional, imobilizando o Espírito Santo,por quase todo o século XVIII e provo­cando uma defasagem de desenvolvimen­to ainda hoje mensurável em relação aosestados vizinhos. A medida complementara esta política foi o conveniente aparelha­mento das fortificações de Vitória visan­do, primordialmente, defender as MinasGerais porquanto seria extravagante aconstrução de tantas fortalezas para de­fender apenas a humilde Vila da Vitória.que por si só era inexpressiva. Durantequase todo o século XVIII, houve umaverdadeira psicose governamental para as­segurar o bom funcionamento do sistemadefensivo instalado na baía de Vitória.

Muito interessante é o relatório doCapitão-Mor Dionísio de Carvalho deAbreu, que argumentando a posição estra­tégica do Espírito Santo como defesa deMinas Gerais, descreveu a situação dasfortalezas militares e pediu as providên­cias cabíveis. Por este relatório, datadode 1724, o sistema defensivo de Vitóriaestava nas seguintes condições:Fortaleza da Barra de São Francisco Xa­vier: em forma de círculo, situada na bar­ra da baía do Espírito Santo, possuindonove peças de artilharia, sendo uma decalibre desesseis e as restantes de calibreoito. Havia mais duas peças desmontadase a murada estava bastante danificada.Fortaleza de São João: em forma semi­sextavada irregular, situada em frente aoPão de Açúcar (Penedo). Sua artilhariaestava "desmontada e compunha-se de seispeças de calibre doze e uma de calibre de­sesseis.

*Técnico da Fundação Jones Santos Neves

Fortaleza de Nossa Senhora da Vitória:em forma semi-circular. Situada no lugarsuperior ao monte onde estava a Fortale­za de São João, co m quatro pe ças de arti­lharia, todas desmontadas, sendo uma decalibre desesseis, outra de calibre vintequatro e duas de calibre oito.Fortim de São Tiago: em forma de semi­círculo irregular, com pequena área, situa­da em uma praia da Vila da Vitória, comtrês peças de artilharia de calibre oito, to­das desmontadas.Fortaleza de Nossa Senhora do Monte doCarmo: em forma de meia estrela regular,com cinco ângulos, situada na marinha daVila da Vitória, com oito peças de artilha­ria calibre seis e oito, todas montadas emcarretas, mais quatro de bronze e duas deferro desmontadas.Reduto Santo Inácio: de forma quadran­gular, com três peças de artilharia de cali­bre oito, todas desmontadas.

Em resposta à solicitação, veio aoEspírito Santo' o Engenheiro Sargento­Mor Nicolau de Abreu de Carvalho quecomandou a realização de reparos nessasseis fortificações sendo as mais importan­tes os seguintes:Fortaleza da Barra de São Francisco Xa­vier: parafeito, esflanada, guarita, quartel

'e casa de pólvora.Fortaleza de S. João: parapeito, torreão,portada, esplanada, guarita e casa de pól­vora.Fortaleza de Nossa Senhora do Monte doCarmo: parapeito ,esplanda, porta, casade arma e casa de pólvora.

Esse trabalho, realizado em 1734,passou a ter manutenção contínua tendoo rei ordenado que, de três em três anos,fosse um engenheiro à Capitania para ins­peção e o assunto "defesa militar dasminas gerais" tornou-se uma constante na

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Planta da Bafa de Vitória em 1767

correspondência oficial da época.De grande interesse cartográfico e

histórico é a planta da baía de Vitória,realizada pelo Engenheiro José AntônioCaldas, em 1767, mostrando eSJ;ecialmen­te a situação do sistema defensIvo do Es-.pírito Santo, conforme mapa anexo, cujooriginal encontra-se no Arquivo HistóricoUltramarino, em Lisboa. Junto a essaplanta encontra-se a nota explicativa se­guinte:

"plano do Rio do EspíritoSancto, comprehendida a bar­ra suas fortalezas e Vilas.

Explícaçaõ

Os Algarismos que vaõ nota­dos na barra deve-se emten­der por braças de oUo pal­mos, foy esta sonda feita commarés mortas, e com maréscheias de agoas vivas, ha deter no mais baixo da barra,tres braças e. meia.

Pelo Rio acima the a vilada Vitória, onde não vaõ no­tadas as braças, tem fundo ca­IhlS de passar hUnla Nau. O lu­gar notado com a letra N he apraia de Suh a, onde o Olan­des fes o seu desembarque no

prinCIpIO do Reinado do Se­nhor D. Joaõ quarto. O Riochamado, Rio da costa, assuas areas tem emtopido abarra, principalmente emtempo de seca, e no tempo decheias fica a barra mais largameia braça. Na ponta do Nor­deste da Ilha do Boy; pode-sefazer huma boa fortificaçaõ,para a defeza da barra, e im­pedimento a alguns lanxoens,que possão fazer desembar­ques na praia de Maroipe. "

A planta em questão, além de seprestar ao conhecimento da baia de Vitó­ria no século XVIII e a estudos sobre oseu assoreamento, serve como documen­to informativo para uma análise da evo­lução urbana e territorial da região. Nelapodemos encontrar as referências seguin­tes:Na margem sul: Morro fronteiro a barra(Moreno), rio da costa, Convento de N.S. da Penha dos religiosos franciscanos,Forte de São Francisco Xavier da barra,Vila do Espirito Santo (Vila Velha), riode areviri (Aribiri), Pão de Açúcar (Pene­do).Na margem norte: Ponta de Piraem (Tu-

barão), Ilha do Boy, Ilha dos Frades, riode Maroipe (canal de Camburi), letra N(demarcando a praia de Suá), Ponta daPraia de Bento Ferreira, Forte de S.João, Reduto de N.S. da Vitoria, Forte deS. Diogo (próximo a atual escadaria S.Diogo, na Praça Costa Pereira), Fortalezade N.S. do Carmo (próximo a atual PraçaOito), Forte de S. Ignacio (próximo aatual rua General Osório). Nesse lugar es­rá situada a Vila da Vitoria (cidade alta).

Nessa rápida e ligeira análise docu­mental, concluímos a existência de umamplo interrelacionamento sócio-econô­mico e político, entre Espírito Santo eMinas Gerais, desde o século XVIII, espe­cialmente aqui demonstrado sob o aspec­to da produção aurífera versus sistemadefensivo de Vitória.

Podemos concluir também que todaa documentação advinda deste ou de ou2tros fatos da história constitui um patri"imônio que deve ser melhor conservado,conhecido e divulgado porquanto fornece'ainda à atualidade uma gama de inforI)la::ções valiosas e práticas, necessárias deserem consideradas, desmistificando ahipótese, às vezes ainda encontrável, detecnicistas menos avisados e sem umrazoável nível de visualização do hori­zonte humano, 'lue renegam o seu valo•.

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Sítios arqueológicos e acervopré-histórico no Espírito Santo

Celso Perota*

* Professor do Departamento de Ci~nci.as Sociais da Ufes

IntroduçãoOs sítios arqueológicos representam

uma importante documentação histórica.Além de serem repositório da cultma ma­teríal das populações pré-históricas, al­guns sítios arqueológicos podem contervaliosas informações geomorfológicas, bo­tânicas e zoológicas, notadamente os sam­baquis litorâneos.

Podemos, em estudos aprofundadosnos sítios arqueológicos, reconstituir osambientes prímitivos. Hoje em dia com apr9fupda alteração da paisagem, decor­rente de inúmeros fatores, é difícil ao ar­queólogo encontrar um sítio cujas carac­terísticas não estejam alteradas.

Pela Legislação do Instituto do Pa­trimônio Histórico e Artístico Nacíonal(Lei na 3.924 de 26/7/1961) os sítiosarqueológicos existentes em todo terrí­tórío nacional e todos os seus elementos(acervo) são de propriedade e proteçãodo Poder Público.

Essa Lei, como outras complemen­tares, é hoje desrespeitada por uma sériede fatores: a prímeira é o desconhecí­menta público da Lei, bem como o valordo sítio arqueológico e dos objetos nelecontido. As informações de achados for­tuitos de sítios arqueológicos só chegamao arqueólogo quando se encontra algumobjeto de valor, ou seja, qualquer coisaque chame a atenção. Por outro lado, afalta de informação, bem como a falta depessoal especializado, aliado à falta de re­cursos financeiros, dificultam uma açãoimediata que requer o sítio, quando é en­contrado por leigos. A ação de coleciona­dores bem como de "amadores" tambémé prejudicial e é um destaque na falta deobservação de tal Lei.

A proteção desse Patrimônio, por­tanto, é necessária, mas extremamentedificil, pois a maior parte dele ainda é des­conhecido pela falta de pesquisas sistemá­tiCàS.

<I

Os sítios arqueológicosO Estado do Espírito Santo, por

suas características geográficas, teve umaacentuada população pré-histórica. As in­formações de C-14 afirmam que, desde4.000 AC, parte do litoral já havia sidohabitado.

Poderíamos recuar essa data, se pu­dessemos precisar, bem como provar acontemporaneidade dos habitantes pré­históricos com espécie animal da faunaextinta, cujos fósseis foram e são encon­trados na Serra da Gironda em Cachoeirodo Itapemirím.

Vale destacar que pesquisadores doMuseu Nacional acham possível este fatoe atribuem a uma ponta de projetil a pro­va do relacionamento do homem com afauna extinta.

Por razões de ordem metodológica,acreditamos que tal afirmativa ainda éprematura, pela falta de pesquisas meto­dológicas na área e que não permitem taisconclusões.

Mas de fato, há cerca de 4.000 a.C.,nosso índio já conhecia o solo espirito­santense permanecendo nele até nossosdias, visto termos ainda uma pequena par­cela de população autoctone, representa­da pelos remanescentes dos índios tupini­quim em Caieiras Velhas, Pau-Brasil eComboios, nos municípios de Aracruz eLinhares.

Desse longo espaço de tempo o nos­so índio percorreu quase todo o territóriocapixaba, notadamente os vales dos ríos.

. Em um estudo relacionado a pa­drões de povoamente das populações pré­históricas podemos afirmar que, nos valesdos principais rios, como Doce, Crícaré,Itapemirim, Santa Maria e Jucu, tivemosum intenso povoamento.

Além disso a região litorânea é que

teve uma acentuada preferência no esta­belecimento de aldeias. Este fato pode-seexplicar pela farta alimentaç,lo que o mare principalmente os mangues propiciavamàs populações indigenas.

A baia de Vitória, a região do Mari­rícu (Barra Nova em São Mateus) Guara­pari e Anchieta, bem como os mangue­zais do Piraque-Açu e Mirím foram habi­tados.

Na baia de Vitória é onde repousamos principais sítios arqueológicos do tiposambaqui. Desde a década de 30 estessambaquis estão sendo visitados e feliz­mente, pelo difícil acesso à eles, algunspermanecem intactos.

Nessa área, em regiões próximasdos mangues, há também urna grandeconcentração de outros tipos de sítios,definidos como abertos, que foram narealidade grandes aldeias pré-históricasque conheceram uma tecnologia diver­sificada, sendo alguns notadamente pré­cerâmicos e outros do período cerâmi-co.

No rio Piraque-Açu e Mirim tam­bém são registrados alguns sambaquismas naquela região, desde o Seco XVII,temos conhecimento da sua destruição,pois as conchas dos sambaquis servirampara alimentar indústrías caseiras parafabricação de cal para construções.

Os vales dos ríos Doce, Cricarée Itapemirim representam também im­portantes repositários de antigas aldeias.

No rio Doce e seus afluentes, sãoconstantes os achados de sítios arqueo­lógicos. No seu curso inferior, o rio pe­netra numa área de restingas de planícielitorânea, onde a área é comumente ala­gada e onde há um excelente ambientepara o desenvolvimento da vida animal,temos uma grande incidência de sítios

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o patrimônio cultural pré·histórico poderá desaparecer

facas, recipientes de alimentaçãe candieiros.

o problema da preservaçã,dos sítios e do acêrvo

No Estado do Espírito Salto em especial na década d60/70 houve um acelerado prccesso de destruição do nosso p,trimônio cultural pré-históricdecorrente da especulação imebiliária bem como pela execuçãde grandes projetos industriaisagro-pastoris.

Mas a destruição dos sítícnão é atual, uma gran~ePart

das cidades capixabas for~;rn<ye:

tão situadas em locais de ti .aaldeias indígenas.Vitór·pari, Lirihares, São Mara, Anchieta, Piúma,jNova Almeida, são cida.tritos onde é comuill.dmenta de materialarq

quando se faz alguma aberturatlra obras. Estes são sítios que estdiavelmente perdidos pois nãopossibilidade de um estudo siste

Uma preocupação constantequeologia são as áreas de manguesadjacências. Como foi dito anterioessas são regiões preferenciais deção do homem pré-histórico eotl.dcalizam os "sambaquis" que, p0l:racterístícas, merecem e devem Sevados por serem importantes~

além de servirem para aproveitarrirístíco, como já é feito no Esta4c:ita Catarina.

Com a constante devastaçãosão dos mangues estes importantementos' arqueológicos estãoameaçados de destruição.

A preservação do acêrvotra preocupação. É necessanoSecretaria do Patrimônio HistóArtístico Nacional leve a efeito sugramação e instale o já criado MuseArqueologia e Artes Populares, progra.tiifdo para .ser montado no Convento d~~$

va Almeida, quando então podererIl9~;~)um local apropriado para exposiçã();; u;).]da e proteção do acêrvo arqueoló .Espírito Santo.

TRADIÇÃO ARA TU, representada porduas fases a Jacareipe e Itaúnas com data­ção que vão de AD 1.345 a Ad. 1780.

o acervo arqueológicoEstas diferentes tradiçõe s culturais

que passaram pelo Espírito Santo deixa­ram nos sítios a marca de sua expressãocultural que é representada pelos teste­munhos arqueológicos que são retíradosnas escavações sistemáticas.

Do acêrvo pré-histórico podemosdestacar: objetos confeccionados em pe­dra, como lâminas de machados, tantolascado como polido, percutores, alisa­dores, lascas de pedras (que tiveram vá­rios usos como raspadores, facas, perfura­dores e alisadores), mão de pilão, bigor­nas de polimento e para trituração de ve­getais, adornos labiais (tembetá) e pontasde projetil.

Em cerâmica podemos destacar, ovasilhame utilitário de diversas formas,urnas funerárias, mainças de fuso, cachim­bos e tortuais.

Em osso destacamos pontas de pro­jetil, adornos labiais, contas de colar,dentes de mamíferos perfurados para co­lar, perfuradores, agulhas e carimbos.

Em conchas temos, raspadores, pla­cas de colar, contas perfuradas para colar,

As tradições já definidas são:

TRADIÇÃO ITAIPU que tem como áreade dispersão todo o litoral sul do Brasil.Está presente no Espírito Santo pela FasePotiri com datação de C-14 avaliada emAD 515 (SI-821). É uma etapa pré-cerâ­mica cujos vestígios são encontrados nabaia de Vitória e no rio Reis Magos, prin­cipalmente.Dentre as Tradições ceramistas, destaca­mos:

TRADIÇÃO TUPI-GUARANI, constatadaem todo litoral e no vale dos rios Doce eCricaré, com datações de c:14 avaliada emAD 895 (~1-828) e AD. 1390 (SI-839).TRADIÇAO UNA, representada pela faseTangui encontrada em todo sul do Esta­do, notadamente na região acidentada,tem uma datação de C-14 avaliada em AD810 (SI-1189).

tanto do tipo sambaqui como desítios abertos.

Nas regiões acidentadas doEstado, notadamente no Sul, écomum o aparecimento de abri­gos sob-rocha onde normalmen­te encontramos material arqueo­lógico. O estudo arqueológicoexplica tal fato pois a TradiçãoUna (que particularmente liga­mos ao grupo linguístico Puri­-Coroado), tem um dado diag­nóstico que é o sepultamentoe ritos funerários pratícadosem áreas cobertas (grutas ouabrigos sob-rocha).

Devemos destacar que, en­tre os abrigos naturais, o Espí­rito Santo conta com a gruta doLimoeiro, no município de Cas­telo, onde já foram realizadaspesq uisas sistemáticas de ar­queologia e onde a EmpresaCapixaba de Turismo está em­preendendo um projeto para o aproveita­mento turístico do local.

Culturalmente ainda não podemosformalizar um quadro geral da evolução,pois muitas regiões ainda não foram co­bertas por pesquisas sistemáticas. Apesardisso, podemos ainda informar que tive­mos no Espírito Santo a presença de vá­rias Tradições culturais, cujas informaçõespode-se documentar nos sítios arqueológi­cos.

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DEPOIMENTO

Maria Stellade Novaes: consciência e crítica

Maria Stella de Novaes retrata suaépoca com emoção e audácia. Seus 85

nos são de lucidez e seu depoilnentof,remeia os anos de paciência e perseye­

ança dedicados à preservação da memó­ia espírito-santer;se. Seu. falar ~ macio e!ausado. Uma 'VIda ded1Cada as letras.

Bistoriadora, poetisa, professora, é, tam­1;>ém, botânica e folclorista.

Conheceu de perto os governos deem diante, pois frequentou o Pa­

desde então. Quando fala sobre suade lembrar que é "sobrinha doFernando Monteiro e dos Pre­

sid,entes Jerônimo e Bernardino Monteiroe,por afinidade, sobrinha de FlorentinoAVIdos".

Seu depoimento foi prestado emseu recanto de trabalho, silencioso econstante, todo azul, sua cor preferida,cercada de livros, plantas e conchas, obje­tos principais de sua atividade. Alí, tuâo~stá intimamente ligado ao Espírito

~anto~h~r~~~d~o:x~er~fs~:~'descontraí-(fis, com uma pitada de humor, e olhar

unspecto, Maria Stella de Novaes falae sua vida, seu testemunho de uma

épq2a e o que mudou. Começa falando deYitória, ontem e hoje, descrevendo-a nap~!l1leiradécada desse século.

-- "Naquele tempo, Vitória era ver­dideiramente Cidade-Presépio. De longe,bonita, com a moldura de seus morros co­pertos de matas virgens enfeitadas de ipês,

árnaubeiras, três-marias e outros ornatosáturais da selva. A entrada da baía era~cantada em prosa e ver"so - mistura del.lanabara, com seu Pão de Açúcar

.9nforme e:x;pressão de Harth. ~as, deerto! Sem a,gua, luz e esgotos! A noite,inguém podia sair sem ~arda-chuva,

porque os dejetos eram atirados das ja­nelas. Pela manhã, os transeuntes deviamter cuidado pisar".

uma pequena pausa, voltaselriedade e continua:

"Vitória de ontem era mais boni­atraente. Distinguia-se pela en­navios. Os passageiros iam para

o tombadilho apreciar a baía, com a cur­va da Capixaba, o Penedo e a molduraverde dos morros! Um encanto!

Sobre as mudanças, afirma que osaterros ganharam o mar e tiraram o atra­tivo das praias, como Bento Ferreira,Suá e outras: "A baía, miniatura da Gua­nabara, se foi".

"Temos agora somente um Porto,no prolongamento do Rio Santa Mariada Vitória. - A cidade está desfiguradaquanto ao passado".

Falando sobre o processo de im­plantação de uma política de preserva-

São poucas as pessoas quevivenciaram as principais

mudanças de Vitória, a partir de1910. Maria Stella de Novaes éUma delas. Nessa entrevista a

João Eurípedes, Arleida PenhaBadke - Todeska - e Fernando

Sanchotene, ela conta osprincipais fatos que marcaramVitória ontem e hoje. Otexto

final é de Fernando Sanchotene.

ção do patrimônio, enfatiza, não dei­xando dúvidas:

"TARDE DEMAIS. Com osaterros, a demolição dos prédios antigos ea febre de edifícios de apartamentos,Vitória perdeu suas paisagens e o restode seu passado. Lembremo-nos do Quar­tel da Polícia, do edifício do Forum, daresidência Episcopal, do castelinho doDr. Kosciusko, da Chácara do Dr. Ceci­liano de Almeida. Não há nada de fatopara se preservar. É triste, mas é verdade.Cuidemos porém da conservação de algo.Recordação é o melhor. O Palácio An­chieta. que deveria ser Afonso Brás, pre-

cisa ser pintado de azul, cor que recordaas obras jesuíticas em Vitória. A Assem­bléia também deveria ser azul. Depoisque pintaram o Carmo de amarelo cpêssego mataram-lhe a projeção no urba­nismo. O Solar Monjardim e a Igreja deSanta Luzia também poderiam ser azuis.A Igreja de Santa Luzia era um interes­sante e valioso Museu de Arte Religiosa.Por que não se reorganiza?

Mas ela também se preocupa como visual das ruas, lamentanâo a poda dasárvores. Em lugar disso, sugere que elascresçam livremente. Recomenda a utili­zação do pau-brasil na arborização dascidades, retirando os canteiros retangu­lares do trevo da Praça Costa Pereiraplantando ali árvores. Na vida agitada quepassou a reger a população capixaba, no­~adame.nt~ ~m Vitóri,a,. propõe 9.u.e, juntoas mstltUlçoes bancanas, farmaClas, cor­reios e outros estabelecimentos e repar­tições, sejam colocados bancos, sofás oupoltronas, "para que os interessados nãofiquem esperando de pé até serem aten­didos" .

Maria Stella de Novaes entende que"a nomenclatura urbana deva sofrer umarevisão, a fim de ter melhor cunho regio­nal e biográfico. Basta que um estranhomorra ou qualquer amigo dos vereadorespara que seu nome seja posto numa rua.Em seguida pergunta:- "Por~ue não se dá o nome de LuizaGrimaldi à Avenida Beira-Mar? Ela foiuma dama valorosa que realizou um Go­verno equilibrado e derrotou Caverdischquando, após incendiar S. Vicente, veioatacar a Capitania. Em muitos estadoshoje é cultivada a memória de muitasmulheres, como Joana Angélica, AnitaGaribaldi, Ana Neri e ioutras. Por quenão ela? E a terceira ponte poderiadenominar-se Henrique Coutinho, jáque a segunda está denominada de "Prin­cipe". Coutinho foi o idealizador dessetransporte para o Continente.

o passadoMaria Stella -de Novaes procura re-

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I

lembrar os principais momentos do gover­no de HenrIque da Silva Coutinho.

- "O Presidente era uma figura bo­nita, de rara distinção que Freparou avinda do Dr. Jerônimo. Sofreu muito,porque a política do tempo era mesqui­nha, insuportável. Vitória, naquele tem­po, era uma cidade de gente faladeira. OCoronel desapropriou um conjunto decasarões situados ao lado do Palácio,na Praça João Clímaco e ajardinou olocal, para construir um coreto, ondea Banda de Música da Polícia fazia re­tretas. Providenciou uma enorme caixad 'água, a fim de que as plantas sempree~tivessem bem tratadas. Liquidou ~ dí­VIda externa, com o resultado 'da ahena­ção da Estrada de Ferro do Sul ao Espí­rito Santo e da Estrada de Ferro Carave­las. Idealizou uma ponte para o conti­nente e deu, para isso, as devidas pro­vidências, conforme carta endereçada aDom Fernando. Nela, informava-llie quehavia depositado a verba em Londres,para o trabalho, e esperava os en,genhei­ros que deveriam realizar os prImeirosestudos. A ponte deveria partir do Caisou Praça 8 de Setembro para ArRolas,em Paul. Na referida carta dizia: 'Deusnos auxilie, meu bom amigo. Nossaterra ainda há de ser grande e nossacapital um encanto".

Segundo ela, passado o Governopara Jerônimo Monteiro, Coutinho seretira para Niterói, onde exerceu umcargo federal, conseguido pelo generalPinheiro Machado. Conta, ainda, queJerônimo Monteiro, ao chegar para as­sumir o Governo, hospedou-se no HotelEuropa, o primeiro a ter água em caixapara uso doméstico e instalações hidráu­licas. O hotel localiza-se na rua Duquede Caxias e foi fundado por JacquesBoudessier.

Uma das principais metas do Go­verno Jerônimo Monteiro, segundo conta,foi enfrentar o magno problema de águae de esgotos. Um assunto que preferiunão falar muito, porque trata-o detalha­damente em livro publicado sobre a bio­grafia de Jerônimo Monteiro.

Outro aspecto levantado por elafoi o cuidado com gue Jerônimo Mon­teiro se dedicou à educação. A Adminis­tração distinguiu-se pela Reforma da Ins­trução. Falou sobre o assunto com certamágoa, pois não entende como uma es­cola que "ele criou e cuja vida acompa­nhou, levado pelo futuro da infância eda juventude', ainda não recebeu seunome: Escola Jerônimo Monteiro, em lu­gar de Escola Maria Ortiz. Para ela, ashomenagens a Maria Ortiz deveriam ser

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feitas em forma de um busto "onde ascrianças poderiam depositar flores".

Sobre a vida social da época, a es­critora diz que foi Jerônimo Monteiroum estimulador de recepções em Palá­cio, geralmente às terças-feiras, ou nasdatas nacionais. E prossegue:

- "Vitoria, nesse per{odo, distin­guiu-se pelo chamado espírito terra.ntei(termo regional que signitica apego àterra), o vitoriense era daqui. Haviamuita cordialidade e muita futrica. Aossábados, formavam-se os assustados:reupiam-se duas ou mais famílias e apa­reCIam numa casa, que tIVesse plano, pa­ra algumas horas de reunião dançante. As­sim, a mocidade se divertia, as mãesconversavam e os pais jogavam. cartas,mas nunca a dinheiro. Os assustados erammuito queridos, geralmente dir~idos pe­la senhora Adelaide Adnet, eXImia pia­nista, mas que jamais estudou música.

Ela se lembra quando, aOs feriados,o povo reunia-se em frente ao Palácio,"para manifestações ao Presidente, dis­cursos inflamados, distribuição de docese músicas no coreto".

Sobre a vida religiosa, lembra-se dasnovenas ao S. Sacramento, o Mes de Ma­ria, a Quaresma, com Via Sacra, as quar­tas e sextas-feiras. "Tudo muito lindo,com a catedral antiga tomada pelos fiéis".Com muito humor lembra uma passagemdaquele tempo:

"Os rapazes gozavam as trevas:levavam martelos e pregos. Na hora dastrevas, pregavam a bainha do vestido dasmoças no chão. (Lembremo-nos da modanesse tempo). Que tragédia quando acen­diam as luzes e elas levantavam. DomFernando, com essa passagem, determi­nou que as trevas se fIZessem com luzesacessas".

Seu rosto, antes alegre, se contraipara afirmar:

"O Dr. Bernardino Monteiroenfrentou o duro da Grande Guerra e agripe eSJ?anhola. Cuidou principalmentedo interIor do Estado, com as estradasde rodagem e a lavoura de cacau, noRio Doce".

Em seguida volta aos fatos alegres:- "No dia 10 de outubro de 1918

entrou uma baleia e um baleio te (o filho),na baía de Vitória. O povo correu para ocais, o comércio fechou as portas, os fun­cionários públicos abandonaram as repar­tições, os alunos deixaram de ir a escola.Uma festa! No ano seguinte houve feria­do, em homenagem à baleia".

Com Nestor Gomes a vida social ar­refeceu. Suas três residências, segundoela, serviam muito bem para despistar asvisitas. Florentino Avidos'acreditava que

"o flaVO precisava mais", numaalusãeàs obras sociais empreendidas como ,casa de órfãos da Santa Casa, além dtuma fazenda-laboratório: a fazenda Maruípe "uma das melhores do Brasil"FOI um Governo voltado à remodelaçãeda cidade, com a abertura da Avenida Capixaba, a construção de prédios para repartições públicas, da Ponte para o Continente, que leva o seu nome, tendo ,efetiva participação de Moacir Avidos.

Uma vida aos 80Maria Stella de Novaes é hoje urr

exemplo à nossa velhice. Mantém urrtrabalho diário, constante, desenvolven·do estudos nas diversas áreas em queatua. Estuda as flores e seus segredostendo como flor preferida o lírio: "porque tem a pureza da cor, a retidão das li,nhas na corola e a rigidez da haste. Nãose verga".

Sobre seus trabalhos inéditos, hádois livros sobre Anchieta, sendo umpremiado em concurso do Conselho deCultura. Sua maior preocupação comAnchieta é a de que "o Apóstolo nãotem uma obra para que centenas de pe·regrinos ou simples visitantes a compree a leia".

Permanece inédita, ainda, sua obra"História Militar no Espírito Santo".Uma obra que, segundo ela, "projetariao Estado no cenário brasileiro". Da mes­ma forma, a biografia de Afonso Cláudio,"o grande amigo e protetor na fase duradas acumulações remuneradas". Nessaobra, a autora descreve toda a sua ati­vidade no Movimento Republicano e naCampanha Abolicionista.

"Um homem extraordinário.Conheci-o bem. Dava-me lições de Direi­to a fim de que J?udessemos nos defenderdo Governo. Orientou nossos estudos enosso trabalho".

Permanece na prateleira "A mulherna História do ESplrito Santo" e sobremoluscos, a fim de atender a um pedidodo Instituto de MalacoJogia de Juiz deFora, q1.l;e o publicará. E autora de umplano de arborização do Contorno, co l11bambu, além de um plano sobre Turisjmo, premiado em concurso. Além disS9icostuma ler, diariamente A Gazeta, T~~3buna e Jornal do Brasil, para "mante~0me informada". E quando questionad~porque tanta dedicação a seu trabalho,ela responde, finalizando a conversa:- "O trabalho é intenso e a vida se vai!." Não perco tempo, mas, à noite, apósàs 18 horas, não trabalho. Nada escrevo.É' tempo de oração, do repouso, do pen­samento em Deus, da preparação para aoutra vida!

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IPHAN tem novo nome: SPHAN,mas as funcões são as mesmas-

.'

Os destinos das cidades históricasbrasileiras e a conservação de todo o acer­vo cultural do País estão, agora, sendotraçados por dois órgãos: a SPHAN, Se­cretaria do Patrimônio Histórico e Artís­tico Nacional, do MEC, e a FundaçãoPró-Memória, A SPHAN foi criada coma finalidade de proporcionar maior fle­xibilidade de ação, maior saldo orçamen­tário e melhor administração do Patri­mônio Histórico, nova ~trutura quecorresponde ao antigo IP:BÂN, Por ou­tro lado, caberá a Fundação Pró-Memó­ria vocacionar adequadamente os imó­veis que foram tombados pelo IPHANe que constituíam bens da União, .

A SPHAN, criada no dia J 3 de no­vembro, através do decreto-lei nO 84,198,passa a gerir os recursos destinados aoprograma de cidades históricas da Secre­taria de Planejamento, integrando, tam­bem em seus quadros, o Centro Nacionalde Referência Cultural, ficando entãosob sua responsabilidade a preservaçãodo Patrimônio Arqueológico, o Patrimô­nio Etnográfico, que empreende asetnias indígenas e a produção da artepopular; a vitalização do artezanato, aconservação de arquivos públicos histó­ricos e a preservação de bens móveis ouimóveis de cunho artístico ou histórico,

Aloísio Magalhães, ex-presidente doextinto IPHAN e atual secretário do Pa­trimônio, diz que é muito importante pa­ra o novo órgão que ele mantenha a fle­xibilidade adquirida. Explica que "naverdade foi em nome desta flexibilidadeque todas as mudanças foram operadas.O IPHAN estava aprisionado na trama doprocesso administrativo do serviço pú­blico, o que não seria tão ruim assim se oIPHAN não fosse uma entidade muitoespecial". Para ele, a falta de agilidade doInstituto causava todo o tipo de proble­mas, desde as dificuldades para obtençãode verbas, até às questões operacionais.

Na preservação,pouco interesse pelaarquitetura popular

Cita, como exemplo, a questão da mão­de-obra formada pelo IPHAN duranteos 43 anos de vida, cujos profissionaisacabam dedicando-se a outros ofícios,por não haver possibilidade de enqua­drá-los ao IPHAN de acordo com os pa­d~ões do serviço público.

A estrutura do novo órgão deveráser aprovada, em regimento interno, pe­lo Ministério da Educação e Cultura,nos termos do Decreto nO 68.885, de 6de julho de 1971, que irá, ainda, apontara competência de suas unidades. Mas en­quanto isso não acontece, a SPHAN man­terá a competência, o acêrvo, os critérios,as funções e o fundo contábel criado peloartigo 15 do decreto nO 66.967 de 27 dejulho ~e 1970, pertinente ao IPHAN.

Sobre suas finalidades, a SPHAN,segundo o Artigo 20 do decreto nO84.198, terá como objetivos mven­tariar, classificar, tombar, conservare restaurar monumentos, obras e docu­mentos e demais bens de valor históri­co, artístico e arqueológico existentes noPaís, bem como, tombar e proteger oacervo paisagístico do País.

A criação da Fundação Pró-Memó­ria no dia 19 de nobembro, através de

Projeto-de-Iei será um desdobramento daSecretaria, que atuará através desse ór­gão, possibilitando a eliminação de pro­blemas aparentemente simples, como acontratação de pessoal, como diz AloísioMagalhães:

- "Precisamos de pedreiros, cnta­lhadores e artesãos com formação especia­lizada e sua contratação através doIPHAN tinha de ser submetida a concur­sos. Outro problema que poderemos su­perar será o de salários. Não é possíveloferecermos ao profissional de nível uni­versitário a remuneração que o serviçopúblico oferece",

Para assegurar o bom desempenhoda nova fundação, foi delimitada umaoutra fórmula para obtenç,lo de verbas,além da administração vocacional dosbens imóveis tombados nelo IPHAN. Osbens não tombados, co:Uo edifícios, fa­zendas e heranças adjacentes, deixarãomais ou menos livre o que Aloísio Maga­lhães define como "as oscilações tempe­ramentais dos orçamentos", o que se tor­na particularmente importante quandose leva em conta que o problema culturaldo Brasil ainda se encontra aos cuidadosdos interesses culturais da administraçãovigentl~.

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A atuacão do....

IPHAN no Espírito SantoJosé Antônio Carvalho*

* Professor de História da Arte na Univeridade Federal do Espírito Santo o IPHAN no Estado. - Te:to apresentado no IV Simp'ósio de História, realizado, em Vitória, de 6 a 10 de novembro de 1978.

1. Breve Histórico do Instituto doPatrimônio Histórico e Artísti­co Nacional.

Só em 1934, o Govern,o brasileirotomou a si a proteção efetiva do patri­mônio histórico e artístico nacional, atra­vés do artigo 184 da Constituiçaõ da Re­pública dos Estados Unidos do Brasil. E,para ficar encarregado de "promover emtodo o País, de modo permanente, otombamento, a conservação, o enrique­cimento e o conhecimento do patrimô­nio histórico e artístico nacional", criou­-se pela Lei na 378, de 13 de janeiro de1937, o Serviço do Patrimônio Histórico eArtístico Nacional (SPHAN) , vinculadoao Ministério da Educação e Saúde.

E foi esse órgão que, dirigido pelopulso forte e dinâmico de Rodrigo MeloFranco de Andrade, congregou estudiososda arte brasileira e publicou uma série deartigos importantíssimos que, a partir dadécada de 40, saíam na então chamadaRevistu do Serviço do Patrimônio Histó­rico e A rtútico Nacional (revista doSPHAN). Esses trabalhos, escritos por es­tudiosos brasileiros - como LUCIO COS­TA, SERGIO BUARQUE DE HOLAN­DA, MARIO DE ANDRADE, SALOMÃODE VASCONCELOS, D. CLEMENTEMARlA DA SILVA NIGRA, HANNAHLEVY, GASTÃO CRULS, J. WASTHRODRIGUES, CONEGO RAIMUNDOTRINDADE, NORONHA SANTOS, AR­TUR CESAR FERREIRA REIS, Pe. SE­RAFIM LEITE, LUIS SAIA, LOUREN­ÇO LUIS LACOMBE e, inclusive um ca­pixaba, MARIO ARISTIDES FREIRE -,e por estrangeiros interessados no Brasil ­como ROBERT CHESTER SMITH, L. L.VAUTHIER, GERMAIN BAZIN -, fo­ram o marco inicial dos estudos sérios,profundos e analíticos da arte feita noBrasil, principalmente no período colo­nial. Foi com eles que se desenvolveu ogosto pela História da Arte Brasileira e se

abriu o campo de pesquisas. A criaçãode museus ativou estudos e publicaçõesque, de um modo geral, ficaram maispresos ao período acima citado. RodrigoMelo Franco de Andrade foi, também,responsável pela for maçã(', de técnicos emrestauração.

A atuação do SPHAN passou a sefazer de acordo com o Decreto-Lei nO25, de 30 de novembro de 1937, que or­ganizou a proteção ao patrimônio histó­rico e artístico nacional, regulamentandoo quê e como deveria ser preservado.

Em 2 de janeiro de 1946, o decre­to-lei nO 8.534, alterava o nome deSPHAN para Diretoria do Patrimônio His­tórico e Artútico Nacional (DPHA·N). ADPHAN passou a ter uma estrutura or­ganizada, diferente da que possuía oSPHAN. Esse possuía apenas o ConselhoConsultivo e os órgãos necessários ao seufuncionamento, enquanto aquela passavaa ter, além do Conselho Consultivo, nosmoldes do SPHAN e comandado pelo Di­retor-Geral: uma Divisa0 de Estudos eTombamentos (com seções de Arte ?;

História); outra de Conservaçaõ e Res­tauraçaõ (com seções de Projetos eObras); 4 distritos; além de três museus(Inconfidência em Ouro Preto; Ouro emSabará; e Missões no Rio Grande do Sul).O Decreto na 20.303, também de 02/0111946, aprovava o Regimento da DPHAN.Esse decreto foi alterado pela portarianO 230, de 26 de março de 1976, queaprovou o Regimento Interno do Insti­tuto do patrimônio Histórico e ArtlsticoNacional (IPHAN). A alteração não sedeu apenas no nome. O novo órgão,com todas as atribuições anteriores, pas­sou a ter uma organização melhor es-

truturada, que lhe permite uma ação maintensa e efetiva em todo o territórbrasileiro, embora tenha ainda, basicmente, toda a estrutura da DPHA.!acrescida de O1;:ltros órgãos necessários.ORGANIZAÇAO é a seguinte, correspodendo, também, ao capítulo lI, do Rgimento Interno do IPHAN:

"Are 20 .' O Instituto do Patrimônio Histrico e Artí~tico Nacional terá a seguinte estrutur

1 Orgão Colegiado1.1 - Conselho Consultivo.

2 Órgão de Planejamento2.1 - Coordenadoria de Planejament<:>

2.1.1 - Serviço de Planejameto, Controle e Avaliaçãe

2.1. 2 - Serviço de Controle (Comércio de Obras (Arte e Desenvolvimen

_ do Fundo.3 - Orgão de Administração de Atividad,

Específicas.3.1 Divisão de Estudos, Pesquisas

Tombamento.3.1.1 - Seção de Estudos e Pe

quisas3.1.2 Seção de Inventário

Tombamento3.1.3 Laboratório Central (

Documentação" Fotogr.fica e Microftlmagem.

3.2 - Divisão de Conservação e Resta,ração3.2.1 ~ Seção de Análise e Obra3.2.2 - Seção de Projetos Arqu

tetânicos3.2.3 - Centro de Restauraçã

de Bens Culturais3.3 - Divisão de Museus e de Difusâ

Cultural3.3.1 - Seção de Atividades

seológicas3.3.2 - Seção de Divulgação3.3.3 Biblioteca

3.4 Divisão de Arqueologia3.4.1 - Seção de Pesquisa

Campo3.4.2 - Seção de Controle e

dastro

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r

4 Órgão de Administração de AtividadesAuxiliares4.1 - Divisão de Pessoal

4.1.1 - Seção de RecrutamentoSeleção e Aperfeiçoa­mento do Pessoal

4.1.2 Seção de Cadastro e Le­gislação do Pessoal

4.1.3 Seção de Atividades Au­xiliares

4.2 - Divisão de Execução Orçamentá­ria e Financeira4.2.1 Seção de Execução Or­

çamentária4.2.2 - Seção de Execução Fi­

nanceira4.3 - Divisão de Serviços Gerais

4.3.1 - Seção de Material4.3.2 - Seção de Ativida4es Au­

xiliares5 Órgãos Descentralizados

5.1 -Diretorias Regionais5.1.1 Seção de Obras5.1.2 - Seção de Estudos e Tom­

bamento5.1.3 - Seção de Arqueologia5.1.4 - Seção de Controle de Co­

mércio de Obras de Arte5.1.5 - Laboratório de Recupe­

ração de Obras de Arte5.1.6 - Laboratório de Docu­

mentação Fotográfica eMicrofIlmagem

5.1.7 - Seção de Atividades Au­xiliares

5.1.8 - Representações5.1.9 Administração do Parque

Histórico Nacional deGuararapes

5.2 Museus e Casas Históricas5.2.1 - Se.ção de Atividades Au­

xiliares5.2.2 Seção Museológica

Art. 30 . As Diretorias Regionais, em númerode nove, são os órgãos de execução das atividades­-fim do Instituto, em cada região, assim discrimina­dos:

1" . Diretoria, com sede na cidade deBelém, compreendendo os estados deAmazonas, Pará, Acre e Territórios doAmapá e Roraima;

I! 2a Diretoria, com sede na cidade de SãoLuiz, compreendendo os estados de Ma­ranhão, Piauí e Ceará;

lI! 3a Diretoria, com sede na cidade de Re­cife, compreendendo os estados do RioGrande do Norte, Paralba, Pernambuco,Alagoas e Território de Fernando deNoronha:

IV - 4a Diretoria, com sede na cidade de Sal­vador, compreendendo os estados deSergipe e Bahia;

V - 5a Diretoria, com sede na cidade do Riode Janeiro, compreendendo os estadosdo Espírito Santo e Rio de Janeiro:

IV ~ 6a Diretoria, com sede na cidade de Be­"lo Horizonte, compreendendo o esta­do de Minas Gerais;

HV - 7a Diretoria, com sede na cidade deBrasl1ia, compreendendo o Distrito Fe-

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deral e os estados de Goiás, Mato Gros­so Território de Rondônia;

HIV - 8a Diretoria, com sede na cidade de SãoPaulo, compreendendo os estados deSão Paulo e Paraná;

IX-9a Diretoria, com sede na cidade de Por­to Alegre, compreendendo os estadosde Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

§ l° A Administração do Pargue HistóricoNacional dos Guararapcs criado, pelo Decreto nO

68.527, de 19 de abril de 1971, é unidade inte­grante da estrutura da 3a Diretoria Regional.

§ 20 A 5a Diretoria Regional. para as ativi­dades de recuperação de obras de arte e de docu­mentação fotográfica e microfilmagem, se apoiar<lno Cent!'"ü de Restauraçáo de I)cns Culturais e noLaboratório Central de Documentaç'io Fotográ­fica e Microfilmagem.

§ 30 Nas capitais de Unidades da Federaçãoonde nã6 se localizarem sedes de Diretoria Regio ..nal haverá Representações, subordinadas direta­mente ao Diretor Regional a cuja jurisdição es­tiver compreendida a cidade.

§ 40 As· Diretorias Regionais receberão ori­entação técnica das Divisões de Estudos, Pesquisase Tombamento; de Conservação e Restauração;e de Arqueologia.

Art. 40 . Os Grupos de Museus e Casas His­tóricas integradas por unidades executivas de ati­vidades museológicas e constituídos segundo in­teresses regional e adminístrativo, compreendem:

GRUPO 1a) Unidade Museológica Sede - Museu da

Inconfidência em Ouro Preto, no Estadode Minas Gerais;

b) Unidades Museológicas Locais Casa daBaronesa e Casa da Rua Pilar, em OuroPreto, Casa da Rua Direita, em Mariana,Casa Setecentista de Santa Rita Durãoe Museu Regio nal de São João Del Re i,no Estado de Minas Gerais;

GRUPO 11

GRUPO lI!

GRUPO IVa) Unidade Museológica Sede Casa de

Benjamim Constant, na cidade do Riode Janeiro, Estado do Rio de J an eiro;

b) Unidades Museológicas Locais Casad~ Hera 1 em Vassouras, Forte DefensorPerpétuo e Museu de Arte Sacra naIgreja de Santa Rita, em Parati, Conven­to Franciscano em Cabo Frio, recolhi­mento de Santa Tereza, em !taipu, todasno Estado do Rio de Janeiro; SolarMonjardim e Igreja de Santa Luzia, emVitória, Museu de Arte Sacra na Igrejados Reis Magos, em Nova Almeida, to­dos no Estado do Espírito Santo.

GRUPO V

GRUPO VI

GRUPO VII..........

Par;ígrafo Único. Os Grupos de Museus e Ca­sas Históricas receberão orientação técnica da Di­visão de Museus e Difusão Cultural.

Art. 50 O IPHAN será dirigido por um Dire­tor Geral; a Coordenadoria de Planejamento e os

Igreja do Rosário:Vila Velha e Vitória

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Grupos de Museus e Casas .Históricas por Coorde­nadores; as Diretorias Regionais por Diretores Re­gionais; as Divisões, o Laboratório Central, o Cen­tro de Restauração, por Diretores; A Biblioteca,o Arquivo, as Seções, os Laboratórios das Direto­rias Regionais, as Representações e as UnidadesMuseológicas Locais por Chefes; e a Administraçãodo Parque Histórico Nacional dos Guararapes porAdministrador, cujos cargos e funções serão pro­vidos na forma da legislação vigente.

Parágrafo Único. A Unidade Museológica Se­de de cada Grupo de Museus e Casas Históric~s se­rá dirigida pelo Coordenador do respectivo Grupo.

Art. 60 Os ocupantes dOIs cargos ou funçõesde direção serão substituídos, em suas faltas ou im­pedimentos, por servidores por eles indicados, de­signados na forma da legislação própria".

2. Funcionamento do IPHAN noEspírito Santo. j

Desde a sua criação, o IPHAN ti­nha, no Espírito Santo, um Representantedo Diretor-Geral. O primeiro Represen­tante foi André Carloni. Ajudado ou Ori­entado por Mario Aristides Freire, AndréCarloni foi, na realidade, o primeiro res­ponsável pela preservação e restauraçãoda maioria dos monumentos tombadosque temos hoje. SU31 ação, representandoo Diretor-Geral do Orgão no Espírito San­to se extendeu por mais de 20 anos.

Em 1965, por desistência sua, foidesignado o arquiteto Dr. ChristianoWoelffel Fraga que teve sua atuação mar­cada pelo tombamento da Igreja de NossaSenhora da Conceição de Guarapari epela restauração atual da maior parte dosmonumentos, com obras, inclusive, emmonumentos não tombados, como é o ca­so da Igreja de Muribeca; da Matriz deViana; da Igreja de Queimados; da Igrejade Nossa Senhora de Belém, na entradapara Viana. Tentou o tombamento demonumentos importantes como o Fortede São João e o Convento Franciscanode Santo Antônio, além da Igreja de Nos­sa Senhora de Belém. Arrolou a Igrejade Nossa Senhora da Conceição, Matrizde Viana, para tombamento, cujo proces­so está em andamento.

O Dr. Christiano Woelffel Fragapermaneceu à frente do IPHAN, no Es­pírito Santo, até 1977, quando fomosdesignados, por indicação sua, por nãodesejar mais exercer as funções, emboracontinu<; a colaborar com a Representa­çio do Orgão no Espírito Santo, na orien­taç;io das restaurações.

Na realidade, a Representação doIPHAN, no Espírito Santo, se resume àpessoa do Representante. É ele quem

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cuida do expediente, fiscaliza as obras,comparece às solenidades, apresenta su­gestões sobre as restaurações, embargaobras não autorizadas nas proximidadesde monumentos tombados e outras ati­vidades ligadas à preservação do patri­mônio histórico e artístico do Estado doEspírito Santo.

Com a nova organização do IPHAN,transcrita acima, o Espírito Santo estáincluído em uma Diretoria Regional(Art. 20 ítem 5.1.8 - Representações),a de nO 5 (Art. 30 , item V e § 3 0 ). Ouseja, o Espírito Santo possui uma Repre­sentação do IPHAN, subordinada à 5aDiretoria Regional q u~ tem sua sedeno Rio de Janeiro.

Aos poucos, vai-se montando, noEstado, essa RepreS'entação. Ainda se re-

Convento da Penha - Vila Velha

duz, na parte de pessoal, ao Representan­te, mas já temos uma parte de mobiliário;pretendemos uma sede e pessoal para or­ganizar todo o trabalho, que não é pouco.Pretendemos, também, ter uma bibliote­ca especializada em arte brasileira e his;tó­ria, e, em particular, sobre a arte e históriado Espírito Santo.

3. Patrimônio Nacional e Patri­mônio Regional.

Logo no início de sua criação, oIPHAN sentiu que sua responsabilidade seextendia a todos os monumentos que en­contrasse e que apresentassem caracterís­ticas de sua construção original. E isso fa­zia sentido, já que era o único órgão exis­tente com a função específica da preser-

vação dos bens culturais que o Brasilpossuía.

Hoje, porém, o IPHAN parece sen­tir o problema de modo diverso. Compre­en'dendo a necessidade de uma atençãomais direta aos monumentos tombadose sentido que a quantidade deles - àmedida que se estuda e que se conhecemelhor cada região - aumenta sempre,o IPHAN parece ter optado por uma des­centralização da sua atividade, procuran­do incentivar a criação de órgãos muni­cipais ou estaduais que arquem com aresponsabilidade da preservação dos mo­numentos que interessem, diretamente, àhistória regional dos estados onde essesmonumentos se situem.

Assim sendo, parece ser desejo doIPHAN que todo Estado tenha seu órgãoque lhe seja similar, a fim de preservaros monumentos locais, enquanto elepróprio se preocuparia apenas com osde interesse nacional. Mas, mesmo assim,importa-se o IPHAN pela preservação erestauração dos monumentos de interesseregional, procurando orientar os órgãoslocais nas restaurações: enviando téc:nicos,fazendo sugestões, às vezes fornecendoverbas, ou participando efetivamente naformação de restauradores, como nos doiscursos que realizou em Belo Horizonte,um para arquitetos, outro para formadosem cursos de arte de nível superior.

Se levarmos em conta essa nova pe­rspectiva do IPHAN, verificamos que, demodo geral, pela pobreza do EspíritoSanto em monumentos de interesse nacio­nal, a maioria dos edifícios tombados estáligada ao patrimônio histór:Íco e artís­tico regional. E, apesar disso, apenas oIPHAN, no Estado, preserva, restaura econserva os monumentos aqui existentes,como veremos adiante.

4. Monumentos tombados no Es­pírito Santo.

Uma publicação do IPHAN1973 relaciona como tombados, nopírito Santo, os seguintes monumentos

1. Igreja de Nossa Senhora dasunção e residência anexa,Anchieta;

2. Igreja de Nossa Senhora da Con­ceição, em Guarapari;

3. Igreja dos Reis Magos e residên­cia anexa, compreendendo apraça fronteira, em N.ova Almei­da, Município da Serra.

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tos das igrejas que os jesuítas construí­ram.

Possivelmente outras edificações,no Espírito Santo, mer«:cessem ser tom­badas e devessem sê-lo. A medida em queos estudos forem sendo feitos e os monu­mentos apresentarem as condições neces­sárias ao tombamento, eles serão tomba­dos.

1. Reis Magos em Nova Almeida.O edifício estava bastan te arruina­

do em 1944. Passou ele, no século passa­do, por uma série de necessidades, emvirtude da pobreza da então Provínciado Espírito Santo, até que desabou todaa parte traseira da Residência. A parteda frente era utilizada pela Casa da Câ­mara e Cadeia e era a única parte que aProvíncia às vezes consertava.

Em 1944, o IPHAN (entãoSPHAN), fez uma restauração de todo oedifício que, mais tarde, voltou a sofreralguns reparos e se apresenta hoje umpouco sujo ~as, inteiramente restauradoe completo. E um dos mais belos exem­plares de construção dos jesuítas e, den­tro do Espírito Santo, é o mais rico detodos os mon~mentos erigidos pelospadres da Companhia. Possui uma porta­da de pedra de lioz; do mesmo materialsão as vergas, ombreiras e peitoris das trêsjanelas da frontaria; a portada da entra­da lateral é também em pedra de lioz, e averga, ombreiras e batente do piso da por­ta de acesso ao coro, vindo da torre,também o são. Ainda de pedra de lioz sãotodas as pias de água benta existentes:uma de pé, batismal, à esquerda de quementra pela porta principal; e uma deparede à direita de quem entra pela mes­ma porta; à esquerda de quem entra pelaporta lateral está outra de parede; à es­querda da porta de entrada da sacristia,pelo lado de fora, está uma pequena, tam­bém de parede; e, no interior da sacristia,uma pia dotada de caixa para água corren­'te, com uma torneira, é também de lioz.Seu retábulo de madeira, em talha é umapeça riquíssima, revelando, por sua "rus­ticidade", a possibilidade da mão-de-obraindígena, com motivos da fauna enrique-

Obras de restauracão em monu­mentos do Estado do Espí­rito Santo já executados.

6.

Forte de São João: descaracterizado

São João está entre os primeiros aldeia­mentos existentes no Espírito Santo e foiuma das aldeias nomeadas até fins do sé­culo XVI. A outra era a de Nossa Se­nhora da Conceição. São João continuouexistindo, até a primeira metade do séculoXVII, como aldeia de visita, até o aban­dono total, em virtude da fundação daAldeia de Reis Magos. A Igreja data de1584. É verdade que, do edifício existen­te hoje, apenas a nave e a torre unida àfachada são da época dos jesuítas.

Já o segundo monumento, era' umaIgreja de fazenda: a maior fazenda de ga­do que jamais existiu no Espírito Santo.Deve datar de meados do século XVII pa­ra o fim. Sofreu algumas modificaçõesmas ainda conserva quase todos OS aspec-

5. Monumentos que a representa­ção do IPHAN pretende tombarno Espírito Santo.

Dos monumentos do Espírito Santode interesse nacional que esta Represen­tação tem interesse em tombar e, paratanto já está preparando a documentaçãonecessária, até o momento, são dois e, porsinal, erigidos pelos jesuítas: o primeiro éa Igreja de São João Batista, em Carapina,município da Serra; e o segundo é a Igrejade Nossa Senhora das Neves, em Muribe­ca, município de Presidente Kenedy ,junto à divisa com o Estado do Rio de J a­neiro.

O primeiro dos monumentos cita­dos (Igreja de São João Batista) foi aIgreja de uma aldeia indígena, fundadapelos jesuítas e dotada de Residência.

4. Igreja de Nossa Senhora da Aju­da, em Araçatiba, município deViana (esses 4 monumentos fo­ram construídos pelos jesuítas) ;

5. Igreja de Nossa Senhora do Ro­sário, em Vila Velha;

6. Igreja e Convento de Nossa Se­nhora da Penha, compreendendotodo o outeiro onde a constru­ção fica situada, em Vila Velha;

7. Igreja de Santa Luzia, em Vitó­ria'

8. Igr~ja de Nossa Senhora do Ro­sário, em Vitória;

9. I~reja de São Gonçalo, em Vitó­na;

10 .Casa e Chácara do Barão deMonjardim, antiga Fazenda Ju­cutuquara, em Vitória;

11.Casa na Rua José Marcelino, nO197;

12.Casa na Rua José Marcelino, nO203/205.

Além desses. encontra-se arroladapara tombamento a Igreja Nossa Senhorada Conceição, Matriz de Viana.

Se' formos analisar detidamente ocaráter dos tombamentos citados, vamosver que, além dos 4 edifícios que foramdos jesuítas (sem contar o palácio do Go­verno, inteiramente desfigurado, e nãotombado) e o Convento da Penha, fran­ciscano, que apresentam caráter nacio­nal, só a Igreja de Nossa Senhora do Ro­sário em Vila Velha, por sua antiguidade(segundo Mario Freire, sua pedra d'ara éde 1535), mereceria o tombamento emâmbito nacional. Todos os outros monu­mentos são de interesse da história regio­nal. E um caso nos parece bastante inte­ressante: a Igreja de São Gonçalo foitombada por causa de duas importantesimagens situadas em seu interior e quenão lhes pertencem, pois foram do antigoColégio dos Jesuítas no Espírito Santo:

ão Francisco Xavier e Santo Inácio deoiola. E as duas casas da rua José Mar­

celino que só à arquitetura civil de Vitó­ria interessaria. Além desses, o "SolarMonjardim", tem um interesse Nacional,por ser uma das poucas casas de fazendadas mais bem conservadas existenteshoje, embora não seja um monumentode grande porte.

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cidos pela conotação da crença do nossoíndio.

Essa Igreja com residência será embreve um museu como consta do Regi­mento Interno do IPHAN, como trans­crito acima (ítem 1: Transcrição da orga­nização do IPHAN: art. 40 , Grupo IV,item b).

2. Igreja de Santa Luzia em Vitória.Também em 1944, se fez a restau­

ração na Igreja de Santa Luzia. O prédioestava bastante danificado e, na restaura­ção, cometeu-se um tremendo crime con­tra o monumento, não só quapdo se per­mitiu a reconstrução da casa anexa a ele,mas também porque com esta reconstru­ção, fechou-se um óculo que existia pri­mitivamente e retirou-se uma sineira exis­tente ao lado desse óculo.

A capela de Santa Luzia está in­cluída como museu no Regimento In­terno do IPHAN, conforme citado aci­ma para a Igreja dos Reis Magos. NessaCape la onde hoje, provisoriamente, en­quanto a UFES não consegue um outro lu­gar, funciona a Galeria de Arte e Pesquisada UFES, administrada pelo Centro deArtes. Foram feitas outras obras de con­servação do monumento que, como o deReis Magos, é Próprio Nacional.

3. Igreja de Nossa Senhora do Rosárioem Vitória.

As primeiras obras de restauraçãoe conservação deste monumento datamda época de André Carloni mas, em 1969,se fez /lova restauração. O crime maiorcontra o monumento são as várias cons­truções à sua volta que não só "sufoca­r2 m" o edifício mas, também, tiraram abeleza da escadaria de acesso, como ain­ela se pode ver por fotografias do princí­pio deste século.

4. Solar Monjardim em Vitória.Obras de conservação foram feitas

muito cedo mas a restauração do monu­mento só se fez entre 1970 e 1974, poisnessa época o edifício se achava bastantearruinado. O Solar também está incluí­do no Regimento Interno do IPHAN co­mo Museu, tal como as duas igrejas acimacitadas.

5. Igreja de Nossa Senhora da Ajudaem Araçatiba.

As obras de restauração dessa Igre-

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ja, apesar de ter havido outras antes, da­tam de 1969. A Igreja apresenta, comoas i,grejas p.equenas que os jesuítas cons­trUlram, 3 janelas sobre a nave. Estão nomesmo caso: a Igreja de São João Batistaem Carapina; a Igreja de Nossa Senhorada Conceição em Guarapari; e a de NossaSenhora das Neves em Muribeca. Só que,na Igreja de Nossa Senhora da Ajuda, asjanelas são dotadas de sacadas, com ba­laustradas, dando para o interior como sefossem portas. Fato esse que acontece emuma falsa janela, sobre a capela-mor daIgreja do Convento da Penha.

6. Casa nO 197 da rua José Marcelinoem Vitória.

Nesta casa, o IPHAN também fezobras de restauração em uma época bem

Solar Monjardim - Vitória

recente: 1970. Seu estado era bastanteprecário.

7. Igreja de Nossa Senhora da Concei­ção em Guarapari.

Nesta Igreja, tombada em 1967, oIPHAN realizou obras de conservação epequenos reparos. A restauração deveráser uma obra para o futuro. Dela foramretirados dois altares laterais que se si­tuavam (inclinados) sobre as paredes ondese ergue o arco cruzeiro.

8. Igreja de São Gonçalo em Vitória.Esta Igreja também recentemente

recebeu a atenção do IPHAN: foi restau­rada em 1973. Dela foi retirado um púl­pito em concreto existente dentro da na­ve.

9. Convento e Igreja de Nossa Senholda Penha em Vila Velha.

Este edifício ainda não teve grand,obras de restauração. Alguns pequenos rparos apenas. Há, porém, a intenção duma restauração, pois algumas part<foram acrescentadas ao edifício. Nãoserá, porém, assim o acreditamos, ant(de um estudo sobre o monumento.

Além desses monumentos, a Igrejde São Benedito, em São Mateus, tambélsofreu restauração em 1951. Nessa obr:o IPHAN foi ajudado pelo povo que COI

tribuiu para os trabalhos. Como dissemcacima, também se fez obras em outremonumentos não tombados como: Igreje Convento Franciscano de Santo Anténio; Igreja de Nossa Senhora da Conceção (Matriz) de Viana; Igreja de NossSenhora do Amparo de Itapemirim; Ignja de Nossa Senhora de Belém, na entradpara Viana.

7. Monumentos que estão sendrestaurados pelo IPHAN-ES.

Presentemente, o IPHAN está retaurando dois monumentos: a Igreja dNossa Senhora do Rosário em Vila Velhe a Igreja de Nossa Senhora da Assunçãecom residência anexa, em Anchieta.

I. Igreja de Nossa Senhora do Rosári(Vila Velha.

Aqui, as obras maiores estavalligadas à reparação do madeiramento dtelhado. O IPHAN está evidando esfoJços para conseguir a telha própria (telhcanal), para substituir a telha francesa qucobre hoje a Igreja, restaurando o telhadque, assim, retomará seu primitivo a:pecto.

11. Residência e Igreja de Nossa Senhorda Assunção em Anchieta.

Esta Igreja necessita de umaração em. quase todos os. seus aSI}ec:tô)Teve, há alguns anos, necessidaderos e, nessa época, restaurou-se ata de Anchieta, que estava bastantenada. E desobstruiu-se a sala quepor baixo dela, onde se instalou ode Anchieta.

Essa obra de restauração está sendfeita precedida por um estudo profunddo monumento, feito através de doclmentos do século passado, executado pcnós, como parte da Dissertação de Mestndo. Nesse trabalho, fizemos um levant,

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menta das modificações e alterações in­troduzidas no edifício após a exp1tlsão dosjesuítas. Esse estudo facilitará o desenvol­vimento das obras que implicarão na alte­ração de vários dos aspectos que a Igrejaapresenta hoje.

8. Considerações finaisO IPHAN tem lutado, até 8_gora,

praticamente sozinho para a preserva­ção dos monumentos. Não só no ,Espí­rito Santo mas em todo o Brasil. E ver­dade que em estados como Bahia, Per­nambuco, Minas Gerais, Rio de Janeiro,existe o Patrimônio Local, estadual,que também se empenha na conservaçãoe restauração dos monumentos. Aqui, noEspírito Santo, temos que aguardar otrabalho que vem desenvolvendo, nessesentido, a Fundação Jones dos SantosNeves.

De qualquer forma, há monumen­tos no Espírito Santo que mereceriamtombamento por parte do Estado, bemcomo sua restauração e conservação. Po­demos citar alguns como:a IGREJA DENOSSA SENHORA DE BELÉM, em Via­na, construída em meados do séculoXVIII; a IGREJA DE SÃO JOSÉ emQueimados, de meados do século passadoe bastante relacionada à História do Es­pírito Santo; a primitiva MATRIZ DENOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃOem Guarapari, erigida em 1677 pelo en­tão Donatário Francisco Gil de Araújoe que o próprio Estado, através da Cesan,está sufocando suas ruínas com constru­ções imensas e, possivelmente, condenan­do-a à desaparição; o CONVENTO EIGREJA DE SANTO ANTONIO, francis­cano, de princípios do século XVII (finsdo século XVI?), e do qual se poderiarestaurar, pelo menos, a subida antiga;ainda poderíamos citar algumas casasque também poderiam ser incluídas parapreservação, para que se evitassem danosirreparáveis, como a demolição da "Ca­

de Bilhar" que existia na Avenida J e­'nimo Monteiro, junto ao "Beco da Viú­a", um dos poucos exemplares "art-nou­eau" de Vitória; como exemplo, pode­

ríamos citar os fundos do Hotel Europa,já em parte desfigurado; umas das ou­tras casas da rua Duque de Caxias; e, umimportantíssimo monumento natural queconstou de todas as descrições e relató­rios, sobre o Espírito Santo de visitantesdo passado: O PENEDO.

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Todas essas notas são apenas o des­pertar para uma conscientização da im­portância das nossas artes em determina­dos momentos de nossa cultura. Pre­servar os monumentos nacionais ou regio­nais deveria ser o desejo primeiro de to­dos nós. No Espírito Santo, infelizmente,issso não vem acontecendo: o próprioGoverno do Estado ajudou na desfigura­ção do Teatro Carlos Gomes, erguido, apartir de 1927, por André Carloni e,recentemente, "deformado" ou despoja­do de suas características; um Clube, oSaldanha da Gama, cheio de tradição noEspírito Santo, através de um seu presi­dente, para que seus associados tivessemuma piscina, não titubeou em demolir amu!:alha do antigo FORTE DE SÃOJOAO. E, pior, destruindo um patrimô-

Igreja de N. S. da Ajuda - Araçatiba

nio que não lhe pertencia. E dirão todosque ela, a muralha, ainda está de pé? Sim,está, só que fora de seu local primitivo econstruída de LAJOTAS! ! ! Que crimemais inominável se cometeu? ! ! Semfalar nas destruições,do passado, co~o

por exemplo: o COLEGIO DQS JESUI­TAS COM A IGREJA DE SAO TrAGO,hoje, Palá<;.io do Governo; da IGREJA DAMISERICORDIA, hoje, Assembléia Legis­lativa; da IGREJA DE SANTO ANTO­NIO COM O CONVENTO FRANCISCA­NO e a IGREJA DA ORDEM TERCEIRADE SÃO FRANCISCO, onde funcionahoje uma Rádio, e o Bispado, da qual,apenas um frontispício existe; da antigaMATRIZ DE VITORIA, hoje transforma­da na Catedral que conhecemos" de um

estilo "infeliz", sem classificação; daIGREJA DA ORDEM TERCEIRA DOCARMO, hoje inexistente e a transforma­ção do estilo do CONVENTO DO CAR­MO COM A IGREJA para um estilo imi­tativo do gótico, como a infeliz Catedral.

Pode parecer incrível, mas sendouma das mais antigas cidades do Brasil,Vitória tenha tão pouca coisa de sua his­tória: a não ser a Capela de Santa Luzia,o prédio mais antigo da Capital e daIgreja de Nossa Senhora do Rosário, doséculo XVIII, só a Igreja de São Gonçalo,do século XIX (fins do século XVIII?).E teve condições de possuir uma quanti­dade de mOl:umentos importantes algu­mas vezes maJor.

É preciso que acordemos agora, pa­ra uma conscientização da necessidade depreservação de nossos monumentos. Se,lssim não for, continuaremos a ter casosde edifícios construídos !las proximidadesde monumentos com a sufocação dosmesmos; demolição de casas que são mar­cos importantes de nossa arquitetura eque, por tendência, desaparecerão; e atéa exportação clandestina de nossas obrasde escultura e pintura. Mas, se não tomar­mos a iniciativa, agora, dessa conscien­tização, juntos, principalmente àjuventu­de, vamos ter mais casos como aquele,de um diretor de uma dessas escolasindependentes, de ensino superior, quecomprou uma área de terra na Ilha de Vi­tória, onde existia uma casa em ruínas.Esse diretor mandou demolir a casa arrui­nada e, em entre~sta a umjornal da cida­de, declarou que' o tinha feito antes queo Patrimônio Histórico resolvesse tombara casa. Que tipo de cultura, e de ensino,e de exemplo, pensa esse diretor forne­cer a seus alunos, se ele próprio não sabeo que isso significa?

O IPHAN continuará sua luta, masacreditamos que a tomada de posiçãodo povo da preservação dos monumentospode manter acesa a esperança de que to­dos os marcos importantes de nossa cul­tura artística sejam preservados e, quemsabe, até levar um dos nossos próximosgovernadores a não só abandonar o antigoColégio dos Jesuítas com a Igreja de SãoTiago mas, a restaurá-lo e entregá-lo aopúblico, para ser um centro de cultura lo­cal; local e atuante, exatamente no lugaronde o Espírito Santo começou a se tor­nar culto.

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Patrimônio:o difícil caminho da preservação

Helena Gomes*

Igreja Matriz - Viana

Quanto maior diversidade apre­sentam as manifestações culturaisde um povo, maior riqueza ele terá.Em princípio, deveriam ser protegi­das todas as manifestações culturaisdos povos e o legado da natureza.Entretanto, a ameaça a que estãosujeitos liga-se estreitamente à do­mmação cultural e econômica dasnações, povos e grup.os econômicos.Falar em preservação das manifes­tações culturais irá implicar necessa­riamente numa questão mais ampla,que é a defesa da liberdade de ex­pressão do indivíduo.

Difícil é abordar o assunto semque se incorra em estratificaçõesonde se dá ênfase especial a aspec­tos culturais que, em maior ou me­nor grau, representam as caracterís­ticas culturais da ideolo~a domi­nante. As diferentes manIfestaçõesculturais, menos perceptíveis no es­paço, devido à diferença de apro­priação que apresentam, tendem apassar despercebidas e, não raro, se­rem apagadas da história. Assimtem acontecido com a cultura indí­gena, assim tende a acontecer com acultura negra e com qualquer outra mani­festação ou cultura que não tenha forçade ir contra os valores que são impostospor novas ordens econômicas e culturais.

Preservar nossos monumentos his­tóricos, sítios arqueológicos, sítios paisa­gísticos, preservar nosso patrimônio ambi­entai urbano reveste-se da maior impor­tância, mas preservar comunidades litorâ­neas sujeitas à desagre~ação em funçãoda especulação imobiliaria, do turismo eda alteração dos sistemas hidrológicose poluição marinha, preservar os recur­sos naturais, as pequenás comunidades deimigrantes, as mamfestações culturais ne­gras, como ticumbi, a congada e o reiza­do, reveste-se também da maior impor­tância, pois isso é cultura, herança viva dopovo. Isso é identidade, é a ligação do ho­mem com a terra e com o passado.

A história se escreve no espaço, napedra, no cal, no concreto, na natureza.

As transformações do meio realizadaspelo homem representam sua históriaviva e tendem, como todos os processosda natureza, a se transformarem continua­mente através da destruição e reconstru­ção sucessivas. Porém, a importância des­ses registros se fundamenta no referencialque nos possibilita compreender o passa­do e a interpretação do presente. As ma­nifestações presentes também constituem­se em elementos que serão história ama­nhã. Torna-se, então muito difícil estra­tificar determinados aspectos sem quehaja uma reintegração no tempo presente.

A história deste Estado esta em seusprimeiros esboços. Muito ainda deverá serlevantado o sistematizado. Percebe-se quea influência indígena no Espírito Santo émilito forte, porém ainda não sistemati­zada. Das numerosas tribos que viviam

* Arquiteta

aqui, hoje existe uma pequena rserva indígena em Santa Cruz corrúltimo baluarte. Embora praticmente dizimados, os indígenas eEspírito Santo legaram vocabulárihábitos alimentares, instrumentede trabalho e traços de caráter.

Paralelamente, houve forte ifluência da cultura africana na fcmação do Espírito Santo

dprincip:

mente na região norte o Estadque ainda conserva manifestaçõculturais riquíssimas.

Quanto aos assentament'humanos existentes no Espírito Sato,exemplos de vilas com traçado ubanístico muito primitivo, assi

~ como outras que conservamõ; tradições de seus imigrantes, há!:" d ' d .'" tos e costumes e palses e ongerCl d ' . Iapresentan o pouqulsslmas a terg, ções." O imigrante europeu que p'

voou o interior do Espírito Sanldeparou-se com um meio ambie:te inóspido e completamente distito de seus países de origem. A iventividade do homem ao me

obrigou-o a criar soluções novas e orÍ@nais, tanto no trato à terra como erelação _ aos ~eu~ .instrumentos e SI

produçao arqmtetol11ca. ..Quanto ao trabalho da terra, n~

usando as técnicas de seus países de OI

gem, o imigrante desenvolveu aqui urra~ricultura mais predatória do que ec'logica,. tendo como resultante terr:gastas e com baixa produtividade.!?)<;l.uanto isso, a produção arquitetôl1..~l(com a derrubada das matas,já alterar,;~se as formas construtivas) na zona de i~gração utilizava técnicas de estruturax~madeira, vedação de barro (na técni,de adobe) e o telhado de táboas. Aineexistem muitas casas construídas com esa técnica, mas que vão gradativameri'desaparecendo. Embora não seja arrecido o valor cultural dessas habitações,

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de se registrar que elas representam umperíodo econômico e de utilização da!1ªtureza completamente distintos doatual, residindo aí sua importância.

Observa-se, nas cidades, a destrui­ção paulatina de espaços urbanos e for­mas de vida de períodos anteriores. Osmqrcos históricos são apagados cada vezcom maior frequência.

Cada cidade apresenta uma histori­cidade específica que deve ser respeita­da, uma vez que essa mesma historicida­de é que influencia e direciona o futuro.A cidade é fruto de espírito do tempo re­colhido pelo gênio do lugar. Ela é o so­matório de todos os valores, vivênCias egerações que nela viveram.

Um programa de preservação do pa­trimônio cultural e natural do Estado po­deria enfocar os seguintes aspectos:

• Características e influências dacultura indígena no Espírito Santo;

• Características e influências dacultura negra no Espírito Santo;

• Preservação de elementos repre­sentativos da produção arquitetônica dosdiversos perío~os de urbanização das vi­las e cidades. E importante não somente aprodução arquitetônica histórica e artísti­ca, mas, também, as originais diversifica­das manifestações que evidenciam as téc­nicas construtivas e os materiais utiliza­dos.

• Preservação de espaços urbanosde uso coletivo como ruas, praças, par­ques, escadarias, enfim, garantir a pre­servação e revitalização dos espaços aber­tos no meio urbano;

.. Orientar o desenvolvimento dasvilas e peqUenas cidades da zona da mon­tanha para que se garanta a conservaçãode aspectos urbanísticos e de paisagemque lhe conferem singularidade, riqueza e

. "qualidade;.. Preservar as reservas florestaisexistentes, os recursos hídricos, os

floramentos r~chosos e a região costei-

.. Proteger os sítios de interesseaisagístico e ecológico;

• Divulgar e incentivar a pesquisanos assuntos referentes ao estudo e prote­ção do patrimônio cultural e natural doEstado.

Evolução do Conceito de PreselVa­ção: A preservação do patrimônio históri­co e cultural é "relativamente recente noBrasil. Começa a ser abordada, de forma

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sistemática, a partir de 1937, com a cria­ção do Serviço do Patrimônio Históricoe Artístico Nacional. A partir de então,há maior preocupação com a proteçãodo conjunto de bens existentes no País,cuja conservação esteja ligada a fatosmemoráveis da história do Brasil ou aoseu exepcional valor arqueológico, etno­gráfico ou artístico.

O conceito de patrimônio ampliou­se no tempo e hoje engloba as mais varia­das manifestações culturais e também ossítios naturais de interesse paisagístico eos recursos naturais. Devido à extensãoterritorial do Brasil e às inúmeras obrasde interesse artístico, histórico e cultu­ral, a atuação do IPHAN reduziu-se so­mente a salvaguardar as obras mais ex­pressivas a nível nacional.

Em 1970, a Seplan criou o progra­ma de Cidades Históricas para o nordeste,posteriormente, sendo ampliado para osestado s de Minas Gerais, Rio de Janeiroe Espírito Santo. Esse programa previauma verba de, aproximadamente, Cr$300 milhões para ser utilizada no pro­grama estadua'l de preservação, restaura­ção e conservação do patrimônio existen­te. Entretanto, até a presente data, nãose tem notícias da elaboração de umplano estadual que alocasse esses recur­sos.

Note-se, porém, que a abordagemdo tema, no Espírito Santo, é relativa­mente recente por parte do Governo doEstado que só, a partir de 1975, com otombamento do Porto de São Mateus,faz sua primeira intervenção. Em outrasáreas, "principalmente na região de Vitó­ria, já foram realizados levantamentos,recomendações e medidas de preserva­ção, incorporadas paulatinamente aosplanos diretores municipais. Entretanto,são atuações isoladas e que ainda apresen­tam pouca repercussão junto à comuni­dade.

Parece-me que o problema agrava­se à medida em que existem diversas ins­tituições desenvolvendo trabalhos semque, no entanto, haja um intercâmbio euma integração entre os trabalhos desen­volvidos. A exemplo de outros estados,seria importante criar, no Espírito Santo,um órgão que tratasse especificamente dopatrimônio e que congregasse o potencialde recursos das demais instituições. Te­mos, por exemplo, na universidade umpotencial muito grande e que-está sendo

pouco utilizado. Soma-se a isso o papelcomunitário na preservação do patrimô­nio cultural, porque é impossível tentarpreservar o patrimônio da comunidadesem a sua participação.

Em linhas gerais, a política de pre­servação do patrimônio natural e'culturaldeveria abranger:

1. Instrumentos eficazes na preser­vação do Patrimônio Ambiental Urbano eNatural: a legislação de proteção dos bensculturais e recursos naturais existentestem se mostrado ineficaz, pois não asse­gura a preservação de amplas superfícieem transformação. As pressões econômi­cas geralmente são mais fortes do que osmecanismos legislativos. Faz-se necessá­rio inserir a legislação em planos urbanís­ticos e mesmo em projetos específicosque resultem em intervenções práticas narealidade, uma vez que só o tombamentonão assegura a preservação. Mecanismoscomo auto-preservação estimulada, insen­ção de impostos municipais e incentivosfiscais deveriam ser adotados na preserva­ção do legado cultural.

2. Conservação e Utilizaça-o: a me­lhor forma de preservar um bem culturalé usá-lo, pois com o uso há a conservação,a manutenção, enquanto que, se perma­necer fechado, sua deteriorização podeser mais rápida.

Discute-se, ainda, juntamente com aadoção de critérios sobre o que preservar,a função dada a um bem preservado, poisdevido às implicações econômicas e so­ciais que o envolvem, sua utilização deveser totalmente voltada à comunidade. As­sim, altera-se a imagem de que o patrimô­nio deva ser utilizado para museus ouafins, mas o critério, para melhor aprovei­tamento, deve abranger habitação, esco­las, centros comunitários, bibliotecas eoutros usos sociais. A utilização socialdo patrimônio viria contrapor sua ima­gem sacra e a comunidade deixaria deidentificar os bens preservados como pe­ças de museus.

3. Revitalizaçaõ: revitaHzar um de­terminado bem cultural significa dar umafunção, um uso que ressalte31s qualidadesintrínsecas que ele possui. E a apropria­ção dos espaços que o revitaliza, são osusos que as pessoas fazem dele que ga­rantem sua continuidade no tempo. Emdeterminadas situações, a reciclagem deequipamentos ou a reciclagem do uso

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Nos centros urbanos arenovação urbana é umaameaça ao patrimônio

também funcionam como indutores de rt

vitalização.

4. Educação e Apropriaçaô: UIdos instrumentos mais eficazes paraproblemática do patrimônio constitui-sde divulgação e educação do legado exi,tente, pois só conhecendo a populaçãterá condições de preservar, respeitarse apropriar do que lhe pertence, isto,seu legado histórico e suas criações cuturais e que se constituem nos fund,mentos de sua identidade. No Brasainda não existe uma política definidquanto a' programas de educação e ddivulgação dos bens culturais. Poderiarser criados programas de educação,nível curricular, nas escolas, programade educação de massa, através de dOcementários veiculados pelo rádio e peltelevisão, promoção de eventos culterais; publicações, promoções de exposções fotográficas e iconográficas, pale~

tras, audiovisuais, concursos que inceItivem a pesquisa e outros. Enfim, existuma série de mecanismos que poderã'ser úteis para a educação e conscient:zação do legado cultural e natural exi~

tente.

5. O papel das municipalidades; ,município tem ficado à margem das que~

tões de preservação do legado culturauma vez que não existe ainda legislaçãonível municipal. Cabe ao município a ge~

tão sobre os espaços urbano e natural. Mailógico seria que ele promovesse a conselvação e adequada utilização do patrimênio existente. A legislação de proteçã,deveria fazer parte da legislação urbanútica em vigor no Município. As prefe:turas deveriam manter eficiente fiscal:zação sobre os bens e promover a edecação junto às escolas municipais, dand,ênfase à história social local. Os recursonaturais e as áreas que apresentem grandpotencial paisagístico poderiam alcançamaior produtividade econômica e eco!$gica, se devidamente preservadas e ui!!zadas.

Conc1uíndo, ressalte-se a import~~

cia de preservar o patrimônio cultural'natural do Estado. Além disso, é impoltante começar-se o desenvolvimento dprogramas de recuperação do PatrimôniNatural, pois temos um compromissinalienável com a história do qual depeIde a qualidade de vida das futuras poptlaçães.

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Em defesa de nosso PatrimônioRenato Pacheco"

.. Professor Adjunto e Livre Docente da Universidade Federal do Espírito Santo. Membro do Institu­to Histórico e Geográfico do Espírito Santo.

A defesa de nosso patrimônio cultu­ral é obrigação constitucional, constanteno § único do Art. 180 da vigente Cons­tituição Federal. O melhor entendimentodo texto mostra que a proteção especialabarca, invertendo a ordem:

a) todas as jazidas arqueológicas;b) os monumentos e paisagens na­

turais notáveis;c) os documentos, obras e locais de

valor histórico e artístico.Nenhuma dúvida quanto aos restos

pré-cabralinos, desde que todos os detec­tados merecem eSl?ecial proteção.

Mas, que e monumento notável,paisagem natural notável?

Que é valor histórico, que é valorartútico?

O Brasil, desde o ministério Capa­nema, tendo a colaboração de Rodngode Melo Franco Andrade (e indiretamen-'te do Erande poeta Carlos Drumond deAndrade, funcIOnário do órgão) preocu­pa-se com seus bens culturais. Recente­mente, no dia 12 de novembro de 1979,houve uma reestruturação do ór~ão,

criando-se a Secretaria do PatrimonioHistórico e Artístico Nacional, que subs­titui o IPHAN e está em vias de criaçãoa Fundação Nacional Pró-Memória. Cabeagora à Secretaria, subordinada ao MEC,inventariar, classificar, tombar, conservare restaurar monumentos, obras, docu­mentos e demais bens de valor artístico,histórico e arqueoló~ico do País, assimcomo seu acervo paisagístico. A execu­

o dessa política ficará a cargo da no­I FNPM.

Mas, o que se precisa fazer é umstema nacional de defesa do I?atrimô­io histórico, artístico, paisaglstico e

argueológico, que funcione em três ní­veIS perfeitamente articulados: nacional,estadual e municipal. Isto porque, mui­tas vezes uma paisagem natural, seránotável, no pequenino Estado do Espí­rito Santo e não o seria no gigantescoAmazonas. Uma aluna amazonense doantigo Centro R.ural de Educação de

Base, em Colatina, Espírito Santo, com­parou, certa feita, nosso Rio Doce a umigarapé de bom tamanho ... Os documen­tos que interessam a uma comunidadepodem não ter valor histórico nacional.A carência crônica de verbas fará comque, cada célula da nacionalidade seconscientize dos bens que deve preservar.

No Espírito Santo tal missão foientregue, ao tempo da administraçãoGerhardt Santos, ao Conselho Estadualde Cultura, em combinação com a Funda­ção Cultural, mas os trabalhos não têmse desenvolvido com a presteza que se fazmistér, como se vê no caso do Porto deSão ,Mateus, grande parte do acervo ar­quitetônico se perdeu.

Quanto à possibilidade de uma de­fesa integral do patrimônio, resta saberse, criada uma sistemática de defesa denosso patrimônio e, formados os técni­cos rara operarem o sistema, todo o pa­trimonio arrolado sobreviverá a nós. Sefixarmos Vitória no Século XX, porexemplo, teríamos três períodos prin­cipais que se sobrepõem:

a) até 1908, com todos os resquí­cios coloniais da vila calçada com grandespedras, sobrados e casas de um só pavi­mento, abaixo do nível da rua;

b) até 1950, com a urbanização àeuropéia, alargamento e calçamento comparalelepípedos das ruas, e sobrados ecasas de "art noüveaux" e,

c) desde 1950, asfaltamento dasruas e edificações verticais, mercê do cres­cimento urbano e maior oferecimento deenergia elétrica.

Uma visão saudosista diria que a de­molição de sobrados para, nos terrenossupervalorizados, serem construídos "es­pigões" é uma ofensa ao patrimônio,mas a esta altura os espigões também sãopatrimônio arquitetônico.

Em sín tese, n;lo se podem manterad infinitulJI as construções todas de umperíodo, pois só a ação do tempo vaidestruí-las e não haveria verbas suficientespara sua restauração e manutenção. Éreflexão que faço e que remeto, humilde­mente, ao leitor.

Universidade e patrimônioQuanto aos esforços, o Departa­

mento de História do Centro de EstudosGerais da Universidade Federal do Espí­rito Santo, local onde leciono, tem de­fendido, na medida do possível, nossopatrimônio.

No dia 8 de novembro de 1972,durante o I Simpósio de História, o pro­fessor Guilherme Santos Neves, em belaconferência intitulada: "Em defesa da me­móriacapixaba: disse; "o pouco que aindanos resta desse patriniânio, esse poucodeve ser urgentemente salvo e preserva­do. Que se movam, mas se movam mes­mo: as autoridades, as instituições, oPoder Público, no sentido da defesa im­protelável. Que se informe o público des­se propósito, alertando-o, convocando-opara o esforço comum". O assunto voltoua ser tratado, por nós, durante o II Sim­pósio, no dia 7 de outubro de 1974, e nãosaiu de pauta, como se vê, na recenteproposta nossa para restauração da Igre­ja de S. José do Queimado.

Como não se trata de um órgãoexecutivo, sua contribuição maior deveser no arrolamento de bens culturais, naformação, através de cursos de extensão,de técnicos em defesa do patrimônio e naconscientização do público para o valorde tais bens.

É o que o Departamento de Histó­ria da UFES tem feito nestes últimosanos.

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Apropriação cultural:uma questão ideológica

Kleber Frizzera*

* Presidente do Departamento'Espírito Santo do Instituto dos Arquitetos do Brasil.

o conceito de patrimônio históricoe cultural privilegiando alguns bens excep­cionais no co~unto da produção culturalde uma sociedade e atribuindo ao Estado,como representante da comunidade, a suapreservação e manutenção, só começa asurgir na Europa no final' do séculoXVIII. Gravuras e relatos de Viajantesdeste século, principalmente sobre asruínas da Roma clássica projetam e am­pliam a necessidade de se manter aque­les monumentos, que tinham serVIdo,há séculos, como fornecedores de mate­rial de construção para as obras públicase privadas. Alguns bens culturais e artís­ticos seriam mais representativos da ati­vidade humana e deveriam ser conserva­dos como modelos e tipologia das novasobras. Esse movimento é assumido pelaburguesia ascendente que, na criação doEstado Moderno de cunho nacionalista,vai buscar, na valorização da produçãoartística clássica, os valores sImbólicosque expressem as tradições que ela mes­mo não possuía. A preservação dos mo­numentos culturais assume claramenteseu caráter ideo16;Sico, mistificando areal participação das classes sociais naprod ução social e reforçando o papel dedestaque das classes dominantes nesseprocesso. Conceitos como o de "me­mória nacional" que escamoteam asrelações de produção e o caráter de classedo Estado são estruturados para suporteteórico da preservação proposta e mobi­lizam os varias setores sociais em" tornode símbolos nacionais.

No Brasil, as iniciativas mais con­cretas de preservação do patrimôniohistórico que vão desembocar na cria­ção do IPHAN, na década de 30, coin­cidem com a formação de uma burgue­sia industrial e de sua rarticipação cres­cerne no aparelho estata .

Foi preciso, então, buscar, na cul­tura brasileira, os traços que significassemo caráter progressista e independentedessa burguesia e tivessem um alcancenacional na aliança de classe proposta.O IPHAN encontra esses valores, na artebarroca, principalmente a mineira, frutoda primeIra tentativa autônoma de umaburguesia nacional urbana. Numa obser­vação da relação das obras tombadas~

)Jercebe-se, claramente, a predominânciade monumentos arquitetônicos produzi­dos até o século XVIII. Quase que toda aprodução neoclássica e eclética é despre­zada em nome da qualidade intrínseca daobra mas, no tundo, numa posição dequestionar a crescente influência da cul­tura européia, principalmente francesa einglesa que se estende neste período(Séc. XIX).

Ouro Preto representa o marcomáximo nessa política Qnde, além davalorização da obra excepcional se pre­tende demonstrar a capacidade históricada burguesia na criação de formas auto c­tones de apropriação do território nacio­nal. Na maiona dos tratados sobre OuroPreto e a produção barroca, se procurademonstrar a criatividade de nosso "po­vo" (mistificado na figura do Aleijadi­nho) na manipulação dos valores, normase padrões da cultura européia. Textos epesquisas procuram destacar o resultadoestético das obras nacionais que, mesmosofrendo as limitações de um meio hos­til e pobre, conseguem atingir uma qua­lidade comparável ao produto interna­cional.

A própria perda de poder que oIPHAN foi sofrendo, principalmente apartir da década de 60, atesta a falên­cia do projeto nacionalista com a cres­cente influência do capital multinacio­nal, a quem não interessa qualquer produ­ção art ística e cultural que q uestlOne apenetração maciça de valores e padrõesestrangeiros enlatados.

Observa-se, hoje, além da revita­lização pelo Estado do Instituto do Pa­trimônio, inclusive com a criação de me­canismos mais ágeis e modernos, com suaelevação a nível de secretaria e criaçãoda fundação de memória nacional, umadiscussão entre os setores progressistas,procurando valorizar o valor de uso dosbens tomados e sua apropriação diretapela comunidade. Ainda nessa discussão,setores populares tentam vincular a ques­tão do patrimônio ao problema de acessoà proprIedade coletiva dos meios de pro-

dução, criticando o caráter ideológico)Jreservação do patrimônio histórico. Urdas críticas formuladas é de que a desão sobre os bens que devem ser pres,vados não leva em consideração o qpodem eles expressar sobre o controle litórico dos meios de produção e as reções de poder que decidiram sua execção. A simples preservação de obras ditvulgares ou comuns não garante a merrria fiel da evolução da sociedade. Neseu uso para uma satisfação de uma rcessidade da sociedade garante uma p:ticipação maior dessa comunidade ndeCIsões que envolvem essa utilização.

A luta Relo patrimônio não poestar desvinculada a uma disputa móampla que é da conquista pelas clas~populares do controle e uso de tOlproduto efetivo, bem como da utili,ção dos recursos naturais e ambientapara o atendimento e satisfação de semteresses.

É necessário maior aprofuncmento teórico do conceito de patrirrnio coletivo e de suas respectivas imfcações com as relações das classes em aputa na sociedade brasileira. Encobriraspectos ideológicos subjacentes aos vares simbólicos dos produtos culturais jgados de interesse "nacional" serve aInas aos intere~ses daqueles que ~usc,preservar um SIstema de dommaçao potica e ideológica de apropria)ão do trallho coletivo, illclusive o artIstico, par,reprodução do capital. A defesa de urmemória nacional está ligada à obsei'ção crítica da história e deve servir p,uma conscientização dos reais p~I1'

que as diversas classes desempenha~(íe desempenham na materializaçãoª~!história.

Uma proposta conse9-ue~te

transformação política no paIS nao(~~,negar o valor testemunhal e didatl~que não só os monumentos históric(mas todo o produto cultural, possui i:mo virtualidade de um projeto coletie das formas concretas de alcançar I

ses objetivos.

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Vida nos arquivos capixabasFernando Achiamé*

Tudo que o Homem registra pararecorrer no futuro é matéria de

arquivo.

"O Homem é o maior destruidor dedocumentos." (Lema entre os

arquivistas)

"Ninguém tem maior know how dedevastação que o capixaba."

(Paulo Fraga)

"Os habitantes desta terra não sãorepúblicos (não possuem o sentido

do bem comum)," (Um cronistado Brasil Colonial)

Para a História, todo e qualquertipo de material pode ser considerado umdocumento, na dependência de se consti­tuir prova de uma atividade cultural doser humano. Cultural no sentido antropo­lógico do termo. Mas, aqui, trata-se deprecisar a situação dos documentos pro­duzidos ou recebidos pelos diversos go­vernos espírito-santenses no decorrer desuas atividades e pelos habitantes e ins­tituições privadas desta terra.

Os índios deixaram registros incons­entes de suas atividades nas pontas deechas, cerâmicas, enterramentos, obje­

os vários. Dada a natureza destes obje­os e da maneira como se apresentam,

existe uma técnica específica, a única ha­bilitada a recuperar as informações nelescontidas: a arqueologia.

Os colonizadores portugueses na ca­pitania do Espírito Santo tambél)1 deixa­ram muitos registros insconscientesdesuas atividades cotidianas. Estas ativida-

Vitória - 1910

des eram de natureza vária, no campo daeconomia, da sociedade, da política. Masos registros históricos, quando autênticose fidedignos são inconscientes, no maisdas vezes. Os governantes portuguesesnão elaboravam uma carta de doaçãoou um foral, pensando nos historiadoresdo século XX, mas em registrar e fazervaler u!ila determinação objetiva.

E profundamente lamentável queesta documentação colonial esteja tão po­bremente representada em nossos arqui­vos, sejam estaduais, municipais ou atémesmo privados (eclesiásticos, por exem­plo). Por que o Espírito Santo, uma terraque "fabrica história" (para empregarmosuma expressão do historiador]osé Honó­rio Rodrigues) desde a época colonial,detém em seus arquivos pouquíssima do-

*Diretor do Arquivo Público Estadu.aI

cumentação deste período? Só recorren­do aos acervos do Arquivo Nacional, doArquivo do Estado da Bahia e de arqui­vos portugueses é que se pode recuperaralguma coisa da ação dos governos da en­tão capitania do Espírito Santo.

Recentemente um pesquisador inte­ressado em assuntos filológicos esteveprocurando, sem sucesso, o original deum bando da Camara da Vila de Vitóriaque em 23 de maio de 1795 conclamavaseus habitantes a falarem o português,proibindo assim o uso da língua geral.Semelhante documento, cuja referência é .encontrada no livro "História, Descober­ta e Estatística da Província do EspíritoSanto" de Basílio Carvalho Daemon,tem importância até hoje, passados quaseduzentos anos, para um filólogo provar

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Árvores e papelO malbarateamento dos a

q uivos por parte de prefeituras e cmaras municipais do interior cafxaba é um fato (sempre comhonrosas exceções). Recentemenlo jornalista Rogério Medeiros reazou uma excelente reportagem s'bre um madereiro capixaba que:auto-intitula "assassino de árvorE(Jornal do Brasil,' 11/11/79, p. 20Nesta reportagem o ecólogo caFxaba Paulo Fraga da FJSN afirm

As serrarias na Amazônia "não vão dexar ~ada, a não ser pastos comcima. Ninguém tem maior knowde devastação do que oconseguiram acabar com as tJc,re:stasU(~

Norte do Espírito Santo e Sul daDesaparece, pela sua açãouma infinidade de espécies vegetaismaior valor, inclusive o jacarandá,mais cobiçada árvore do universo".

Se nós capixabas conseguimos qldesaparecesse da fase do universo espcies vegetais de existência única, o qldizer dos documentos elaborados por 11<

mesmos, por sinal também ú!!icos e, iror

e perdas de arquivos são realizados cointenção dolosa, para desaparecer codocumentos comprometedores que ,existiam. Estas ações dolosas de se dttiuirem arquivos ou parte deles para encbrir mal-feitos, para prejudicar adversári,ou para dificultar a ação governamente da justiça são mais comuns do quepensa. --Como um arquivo reflete a vidaas atividades da instituição ao qual pttencem, claro está que muitas vezes tte reflexo não irá interessar em toda S1

plenitude a determinadas pessoas. Os dcumentos podem morrer de duas man(ras:

por "morte natural", quando,mesmos perdem os seus valorcorrentes e não adquirem os vlares permanentes (histórico, Igal, administrativo). Neste ca:constituem lixo e devem ser Igo eliminados;por "assassinato", quando os dcumentos de valor são destrudos por ação ou omissão da cmunidade e/ou de seus responsveis. Neste caso, por serem úrcos, representam uma perda ireparável para a sociedade.

vel. Sim, porque não podemos deixar queesta tarefa seja exercida pelo tempo, pelaágua, pelós ratos ou pelo fogo que nãosabem distinguir um documento valiosode outro sem importância alguma. Paraexemplificar de acordo com nossa reali­dade: estes elementos não sabem distin­guir no arquivo da extinta Secretaria doGoverno, na pasta na 3, do ano de 1951,um processo solicitando quinze dias delicença para tratamento de saúde, deoutro que ilumina diretrizes políticas etentativas institucionais para implantaruma usina siderúrgica em nosso Estado.Arquivo é um serviço-meio, é um proble-

ma de administração. Atualmente, devidoà grande massa de documentos produzidadiariamente, quer pela máquina estatal,quer pelas poderosas instituições priva­das, os documentos devem ser adminis­trados como, por exemplo, se administrapatrimônio mobiliário, transportes ou ma­terial de consumo.

Mas o homem também destroi mui­tos documentos por ação. Tem-se notíciaque muitas prefeituras do interior capixa­ba simplesmente tocaram fogo em seusarquivos, "para se verem livres daquelapapelada velha e imprestável". Tambémé sabido que muitos incêndios, extravios

A destruicão é comumO ha'mem é o maior de'strui­

dor de documentos. E ele os des­trói tanto por ação quanto por o­missão o que é pior, às vezes: Sabe­mos que, onde se guarda tudo, não seguarda nada. Esta é a realidade' denossos arquivos. Guarda-se tudonuma vala comum, os documentossão enterrados neste cemintériochamado "arquivo morto". Mas ochamado "arquivo morto" não estárealmente morto. Se ele perdeu suautilidade para o movimento cor­rente da instituição ao qual perten­ce, possui valores outros que pre­cisam ser preservados. Que valoressão esses? Valores de pesquisa, va­lores de prova (que atestam ofuncionamento da instituição, osprogramas nela desenvolvidos, suasfunções), valores de informação(sobre objetos, pessoas e fenôme­nos). Se os documentos não pos­suirem quaisquer desses valores,não há porque gastar dinheiro man­tendo-se inultimente guardados. As­sim, a principal tarefa dos arquivis- Café Trinxet - Vitóriatas em nossos dias é a seleção. Ne­nhum governo do mundo, como bemasseverou Schellenberg, possui verbas su­ficentes para arquivar todos os papéisque produz. Nos Estados Unidos, porexemplo, só de 3 a 5% da documentaçãoproduzida pelo Governo Fededal anual­men te dá entrada no Arquivo Nacio­nal ou nos centros de arquivo, en­tiro, ficou muito importante a tarefade seleção. Selecionar um arquivo é garan­tir a boa qualidade de sua documentação,conservando somente os papéis possuido­res de valores que justifiquem sua guardapermanente. Selecionar arquivos é separaro joio do trigo, eliminando-se o inserví-

porque não falamos mais a língua geral esim o português. Nenhum arquivo da câ­mara municipal do Espírito Santo (e te­mos muitas de provecta idade) manteve­se, não digo intacto, que seria exigir mui­to, mas ao menos com sua documentaçãocompleta e em condições de pesquisa.A única exceção é o arquivo da CamaraMunicipal da Vila de itapemirim que hámuitos anos foi recolhido ao então Mu­seu Capixaba e lá organizado. Posterior­mente deu entrada no Arquivo PúblicoEstadual onde se encontra.

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camente feitos da mesma celulose?Uma afirmação precisa ser feita,

que todo mundo sabe, mas que é educadodissimular: os arquivos capixabas vemsendo destruídos. E esta situação, nãosendo exclusiva dos arquivos, constituifato mais triste ainda: os restos arqueoló­gicos aqui existentes vem sendo si~tema­

ticamente aniquilados; o Espírito Santo éuma terra que em pleno ano de 1979 nãopossui um museu digno deste nome, coma única exceção do Museu do Colono emSanta Leopoldina.

Podemos explicar historicamente oposicionamento da éomunidad~ capixabaperante os seus documentos. E um pro­cesso que tem suas raízes na vida colonial.Já se disse que O· mais difícil de ser muda­do é a mentalidade de um povo. De modogeral o povo capixaba não conhece o queseja verdadeiramente arquivo. Não sabeque é dono dos arquivos públicos, que osgovernos administram em seu nome.

A própria documentação privadavem sendo destruída. Quando um empre­endimento privado atravessa uma fase degraves dificuldades é comum que os seusresponsáveis se interessem pelo desapare­cimento de muitos papéis, geralmentecom intenção criminosa. Mas tambémse percebe que se uma empresa vai devento em popa, os seus proprietáriosgostam de manter organizados os arqui­vos. Sentem orgulho de documentar oseu início, procuram exibir os papéis co­mo prova de suas atividades passadas,tentando recuperar mesmos aqueles porventura extraviados.

Documento é documentoMas é 'preciso dizer que o capixaba,

mesmo destituído de maior cultura for­mal, escolar, dá um certo valor ao docu­mento. Em nossa terra são encontradi­as expressões como "documento é do­

ento", "pode escrever o que estou di-do", "palavras o vento leva, mas o gue, escrito não". São expressões indlca­as da importância que o povo confe­ao documento escrito. Na ânsia de fi­

xar no p~pel informações im.portantes, opovo mltlfica o documento. E certo que acomunidade só fixa em documento·oque considera importante. Pode-se afir­mar, pedindo licença aos profissionais dapsicofogia social, que os capixabas des­troem documentos por ignorância, e ver­gonha. Ignorância, analfabetismo existemde um lado' e são fatores preponderantes

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nesta destruição. Administradores e pes­soas tem lSeralmente ojeriza, repulsa atudo que e documento velho. Mal com­parando, é como um indivíduo que temvergonha do seu passado, que procuraesquecê-lo. Temos também a mitlficaçãodo documento, que nos nossos diastambém contribui, paradoxalmente, paradestruí-lo. Como já ficou dito antes: ondese guarda tudo, não se guarda nada.

Quando um funcionário público,por exemplo, não procura selecionar osseus processos, não abre mão de sua pape­lada inútil, está contribuindo para malba­ratar a documentação valiosa que juntocom ela existe.

Modernamente, os arquivos vem as­sumindo novas tarefas, o que fatalmenteirá se refletir no Espírito Santo. Aqui ca­be uma citação do dr. Raul Lima:

"No caso das transmissões televisio­nadas, o tape nos permite ver mais tarde oque foi visto horas antes, ver de novo da­qui a anos. A geração futura poderá igual­mente ver o' que a atual está vendo sehouver um bom arquivamento de tapes".

"Ora, o que ocorre agora com osinstrumentos da avançada tecnologia ele­trônica vem ocorrendo, há séculos, com omaterial mais difundido e abundante - odocumento escrito em papel, para não .fa­lar nos outros que o preç:ederam, desde omais vetusto - a pedra. E a guarda do do­cumento, dos documentos em séries e co­leções, para uso intenso e imediato dasatividades cotidianas ou para o sereno emeticuloso estudo do ontem, num e nou­tro caso com assegurado préstimo paraamanhã, que caracteriza o arquivo comofonte e, além de fonte, como veículo decomunicação"; (Da Problemática da Do­cumentação Histórica Rio de Janeiro ­1974).

Sabemos todos que, no País, gravesproblemas (sobretudo em áreas priori­tárià como a saúde e a educação), têm sidoenfrentados pelos diversos governos emuitos destes problemas estão longe deser resolvidos. Então não podemos exigirde nós mesmos que os arquivos (durantetantos anos abandonados) funcionem àsmil maravilhas, num simples toque demágica. Nem podemos exigir que a comu­nidade coloque o arquivo como centro desuas atenções. Mas também não se admiteos papéis servindo somente como lixo oupara escárnio geral. E papéis produzidospelos que, antes de nós, deram,rnuito desi por este Espírito Santo.

Perigo do ComodismoNão se pode assumir a poslçao de

pessoas que afirmam: "Se os capixabasdestroem documentos, não importa!Pelo menos ficará como traço caracte­rístico de nossa época que fornos des­truidores de documentos!" É uma posi­ção comodista e perigosa.

Comodista porque se conformacom a realidade presente e não cuida demodificá-la para melhor. Não é por meracoincidência que dois grandes estadistasespírito-santenses, dois administradoresdinâmicos e de visão, como o foram Je­rônimo Monteiro e Florentino Avidos,valorizaram os documentos capixabascom as soluções da época. O primeirocriando o Arquivo Público e encarregan­do sua organização a ilustres homenspúblicos. O segundo, quase vinte anosapós, dotando a instituição de sede pró­pria e encarregando sua reorganização a·outros ilustres homens públicos. Estesdois presidentes do Estado, ou pelo me­nos suas equipes de governo, sabiam oquanto é importante preservar e organizaro patrimônio arquivístico capixaba. Seeles tivessem se omitido, possivelmenteestariamos hoje a lamen.tar a perda de va­liosos documentos que as gerações passa­das nos legaram.

A tal posição, além de comodista,é perigosa porque,' hoje em dia, preservaros arquivos é questão de sobrevivência pa­ra nossa comunidade. Se parte substancialdos documentos capixabas for destruída,as atividades públicas e privadas, em nos­so Estado não poderão ser exercidas acontento. Guardadas as proporções, écomo se uma pessoa perdesse sua memó­ria, a história de sua existência, com to­das as passagens que serve~ de pontos dereferência, que formam sua personalida­de.

Então, se o Espírito Santo perder,mesmo em parte, seus documentos devalor, estará condenado a possuir umahistó ria mutilada, quer dizer, terá desfigu­rada sua própria identidade. E se tivermosdesfigurada nossa identidade, de nada adi­antarão todos os esforços em prol do de­senvolvimento. Em outras palavras: se avida que existe nos documentos for per­dida, estaremos sofrendo um grande revésna luta pelas nossas vidas e pela constru­ção do futuro.

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. tituto de Arquitetos do Brasil (78).: 14-8, dez. 1968. '.. ,','

Os interessados nodesenvolvimento de

pesquisas sobrepatrimônio histórico

cap ixaba estarã9,:' a, 4

subsidi.adCjf,~e~ ~•t~~balho 'dà 7

,'bihHotecária 8

Conceição Almeida.O material.apresentado

encontra-se àdisposição naBiblioteca da

Fundação Jones doSantos Neves.

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. .

Trabalhos elaborados

Espírito Santo para Fins de Programação

. -'

Em elaboracão. -Plano Diretor Urbano do Município de Vila VeJh;:I--....Proposta de Ordenamento Urbano do Mun' í .Programa de Cooperação para Incentivo à e lsaPrograma de Cidades de Porte Médio - G ve n d Es spírito Santo/BIRD

.. Projeto Análise Ambiental da Região de \li i - Estu o Er são - volume II - Geologia e Pedologia-' :.Planos Regionais do Espírito Santo

Vila Velha: Relatório sobre a Situação Atual de Favelas e Bairros Populares CarentesLocalização e Dimensionamento da Rede Escolar na Grande Vitória

- .. Série Documentos Capixabas 5 - Constituições do Estado do Espírito SantoS~rie Documentos Capixabas 6 - Iconografia Capixaba do Século XIX.

••. - Informações Básicas para o Planejamento Urbano

..