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Robson Pinheiro(Angelo Inácio)3-A Marca da besta-Trilogia O reino das Sombras

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  • A Ademildes e Marcos Leo, dois grandes amigos, parceiros e grande apoio nas

    tarefas a mim confiadas pelos espritos. Agradeo pelo empenho,

    pelo ombro amigo, por poder contar com vocs em etapas importantes da minha vida.

  • L U Z N A S O M B R A

    por Angelo Incio, xiv

    1 Prlogo,18

    2

    0 prenncio do fim, 62

    3

    Os tempos do fim, 120

    4

    Os maiorais do inferno, 172

    5 Matrix ou o poder da mdia, 262

    6

    Salto entre as dimenses, 298

    7

    Obsesses modernas, 364 8

    Agnere, 392 A P N D I C E

    "Os Agneres", segundo a Revista Espirita, 468

    9

    Esclarecimentos finais, 472

    1 0 Os daimons, 510

    P O S F C I O por Leonardo Mller I E D I T O R , 618

  • E S T E U M L I V R O que fala de luz! Esta a xv saga dos filhos da luz dissipando as trevas, a escurido. Mas este livro no foi escrito para pessoas fracas nem para religiosos que no suportam que suas verdades sejam questionadas. Tampouco para aqueles que tm medo de encarar a realidade porque vivem fechados em suas iluses.

    , sim, um livro que tira o vu da iluso, que desconstri mitos e desnuda certas crenas. Es-crevo algo que desmascara o mal e arranca o dis-farce do diabo, revelando-o e colocando a desco-berto a estratgia, a organizao e a estrutura dos opositores da poltica divina.

    Falo nestas pginas sobre como os represen-

  • tantes das foras superiores do bem levam a luz escurido, dissipam as trevas da ignorncia espi-ritual e fazem claridades onde houver sombra.

    Sobretudo, este um livro escrito para quem tem coragem de se expor como agente das foras que patrocinam a evoluo do mundo. No para os fracos, nem para os indecisos, nem mesmo para aqueles cujas mentes estejam engessadas por uma interpretao restritiva de doutrinas, filoso-fias ou crendices.

    Escrevo para aquele que se enquadra na ca-tegoria de livre-pensador. Enfim, para os no-vos homens, para os construtores do amanh, da

    xvi nova civilizao.

  • " D I S S E - M E A I N D A : No seles as palavras da profecia

    deste livro, porque prximo est o tempo.

    Apocal ipse 22:10

    " M A S Q U E I M P O R T A ? contanto que Cristo, de qualquer modo. seja anunciado, ou por pretexto ou de verdade.

    nisto me regozijo, s im. e me regozijarei" Fil ipenses 1:18

  • T R A N S C O R R I A o ms de fevereiro do ano 21 de 1997. O barulho e o som de msicas es-tridentes atestavam que vivamos aquelas experincias durante o carnaval. O mdium esta-va em coma, sobre a maca do hospital, enquanto familiares e amigos se revezavam entre preocupa-es, lgrimas e cuidados com o moribundo. Du-rante o perodo em que estava desacordado, seu esprito pairava entre as diversas formas-pensa-mento nas quais mergulhara. Traumas, conflitos e medos reprimidos durante anos vieram tona durante aquele processo, que marcaria profunda-mente sua vida.

    De repente, durante o coma, ele sentiu uma

  • presena; outro ser que pairava a seu lado chama-va-o para tomar cincia de algo que estava muito alm de sua compreenso naquele momento. Era muito delicado aquele estado em que se encontra-va. Alm das dificuldades orgnicas, as emoes desencontradas e os sentimentos que emergiam de seu psiquismo faziam daquela uma experincia singular. Seria o ponto final de uma existncia?

    Espritos abnegados haviam interferido em seu favor, a fim de que pudesse cumprir um pro-grama previamente elaborado pelo Alto. A en-tidade que se apresentava a seu lado trazia novas diretrizes para o que lhe restava de vida no veculo

    22 material. Novos planos, novas propostas. Sua vida fsica encontraria seu termo aqui,

    conforme a programao original de sua atual existncia falou a entidade sem se identificar. Porm, levamos seu caso a instncias superiores por julgarmos ser mais adequado prolongar sua existncia do que ter de recomear em novo cor-po. Demoraria muito seu processo de educao, de despertamento para a realidade do esprito, at que pudesse levar a cabo as responsabilidades que lhe foram conferidas. Dessa forma, obtivemos permisso para uma transfuso fludica de gran-de intensidade, que lhe dar mais tempo entre os encarnados. Contudo, a durao de sua vida de

  • pender da qualidade e da intensidade do traba-lho a ser desenvolvido.

    O mdium, desdobrado, mal e mal se dava conta da voz que lhe penetrava o mago do esprito. No obstante, gravava cada detalhe atravs dos ca-nais da intuio e da mediunidade, tomando cons-cincia daquilo que lhe estava sendo proposto, de modo mais amplo, somente na esfera mental.

    A esta altura, depende de voc a prorro-gao de sua vida no corpo fsico. Precisamos de algum que se exponha diretamente, em nome de certas ideias que devem ser ventiladas. Ser necessria dedicao incondicional ao trabalho da psicografia de novos livros, que tenham como 23 escopo divulgar verdades mais amplas e que des-pertem questionamentos nas mentes que entra-ro em sintonia com tais mensagens. Aceita essa incumbncia?

    Balbuciando mentalmente, o mdium res-ponde afirmativamente.

    Voc ser exposto como algum que traiu os princpios doutrinrios; ser acusado de desleal-dade doutrina esprita e, em nome de algo im-palpvel, ter de enfrentar o julgamento daque-les que se dizem representantes da verdade. Ver seu nome ser desprezado por muitos, enquanto amado por outros. Lutar em meio ao fogo cruza-

  • do entre aqueles seus irmos de ideal. Alm des-se aspecto, sua sade ser muito frgil a partir de ento, pois haver de se expor em regies densas da esfera extrafsica. Receber amparo direto, po-rm ter que ser forte para enfrentar as calnias que desabaro sobre voc.

    "De toda forma falou a voz do Imortal , o segredo ter coragem e no se deixar levar pelos aplausos do mundo, das pessoas deslumbradas. Nada de se render s fantasias e imaginao do povo que, em algum momento, tentar envolv-lo no culto personalidade. Os temas abordados atravs de sua mediunidade tero de ser primei-

    24 ramente testados e provados tanto por voc quan-to pela equipe que lhe dar apoio, na retaguarda. Primeiro, tero de provar o sabor das verdades es-critas em parceria com os Imortais; depois, essas mesmas verdades sero aproveitadas por quantos estiverem maduros para absorv-las. Porm, no se engane: no ser fcil."

    Intimamente, o mdium aceitava a proposta. Mas no podia sequer verbalizar o que sentia. Seu esprito pairava num ambiente nada familiar, no qual suas habilidades psquicas estavam diminu-das. Tambm seu corpo fsico estava sob efeito de sedativos e outras drogas fortes, com as quais os mdicos pretendiam prolongar sua vida.

  • Depois do dilogo intenso em emoes, o mdium foi acoplado ao corpo fsico por alguns momentos, enquanto providncias mais urgentes foram tomadas para executar a referida transfuso energtica.

    Espritos especialistas na rea da medicina montaram ali mesmo, dentro do hospital, em se-gundo plano, equipamentos que os olhos mortais no podiam perceber. Os enfermeiros de planto sentiram uma sensao incomum, como se uma brisa acariciasse sua pele, refrescando-a e produ-zindo uma sensao de que algo de sobre-humano estivesse ocorrendo ali. Realmente estava. 0 mo-vimento daquelas entidades no ambiente extra- 25 fsico do hospital fazia com que se despertassem certas intuies e percepes na equipe de enfer-magem e nos mdicos encarnados que ali traba-lhavam. Um arrepio, algumas vezes; em outras, a percepo de vultos, ou mesmo a impresso de que algum mais estava se movendo, em velocida-de mais alta do que a habitual. Tudo isso era per-cebido no ambiente do CTI.

    A noite, conduziram-se para fora do corpo dois doadores de energia vital, ou ectoplasma, a fim de que pudesse ocorrer a transfuso fludica. Cada um deles teve seu duplo etrico acoplado ao do mdium, como se fios invisveis se entrelaas-

  • sem a ambos. Via-se o corpo etrico do mdium hospitalizado pairar sobre seu aparelho fsico. Era semelhante a uma nvoa, embora tivesse contor-nos delimitados; irradiava luminosidade fraca, plida, e sobrepunha-se ao corpo carnal abatido. Outras duas estruturas de natureza similar, igual-mente desprovidas de rgos, porm mais bri-lhantes ou iluminadas, puseram-se junto do cor-po etrico do mdium. Fios tenussimos, como se fossem capilares fludicos, conectavam os trs veculos de carter fsico, porm plasmtico isto , os duplos etricos desdobrados. De dentro desses os, elementos riqussimos em vitalidade

    26 corriam cleres para o organismo debilitado, rea-tivando suas propriedades, que j estavam quase exauridas. A proporo que a transferncia ener-gtica se concretizava, os chacras do duplo etri-co iluminavam-se e faziam a transformao dos fluidos em vitalidade, que voltava a abastecer cada rgo e clula do corpo fsico, devidamente.

    Enfermeiros e mdicos do espao acorreram ao local manipulando recursos extrados da na-tureza, que foram adicionados aos elementos ec-toplsmicos ali transfundidos. Gradualmente, o cosmos orgnico ganhava vitalidade, e via-se cla-ramente que os rgos eram energizados atravs dos recursos cedidos pelos doadores desdobra-

  • dos. Aps mais de 10 horas de intensa atividade, um dos mdicos invisveis olhou o mdium ga-nhando mais qualidade vital e disse:

    hora de me acoplar inteiramente a cada clula, a cada rgo. Preciso acelerar o processo de ressuscitamento das clulas fsicas quase exauri-das. Meu mdium quase no tinha mais condies de reativar a vida orgnica; por pouco no haveria retorno. 0 cordo de prata est por demais enfra-quecido. Vou me acoplar inteiramente a suas c-lulas e coordenar a reestruturao celular dentro de seu corpo, plenamente incorporado.

    0 mdico iluminou-se por completo e, con-centrando sua mente, elevou-se alguns centme- 27 tros sobre o corpo do mdium e sobreps-se ao corpo fsico enfraquecido. Ponto a ponto, obser-vamos as clulas do perisprito do mdico do es-pao sendo absorvidas e justapostas s clulas do corpo do mdium. Era como se cada uma absor-vesse ou engolisse sua correspondente astral, en-quanto o psicossoma do mdico do espao molda-va-se prpria forma perispiritual do mdium, assumindo-lhe a configurao esttica. Ocorreu ali o fenmeno conhecido por alguns como supe-rincorporao.1 Consistia numa justaposio das

    1 Superincorporao um termo, ao que tudo indica, cunhado por

  • clulas do corpo perispiritual do desencarnado e do encarnado, nesse caso em particular visando conceder ao mdium maior tempo na atual exis-tncia. Interessados na continuidade das tarefas atravs do sensitivo, todos ouvimos o mdico es-piritual anunciar, plenamente de posse de cada tomo fsico, num fenmeno somente compar-vel a uma materializao:

    Estou tirando meu mdium daqui... Naturalmente, os encarnados ali presentes

    se assustaram. Um calafrio percorreu a espinha de todos ao sentirem que algo diferente sucedia; uma coisa to intensamente forte e mais poderosa que a prpria morte, que os mdicos da Terra no conseguiram explicar. Pensavam que a entidade do espao tencionava tirar o mdium do CTI, mas no era esse o intento. No era isso que queria di-

    Ranieri, mdium que se dedicou por mais de 10 anos ao estudo

    terico e prtico da materializao antes de apresentar tal novi-

    dade (RANIERI, R. A. Materializaes luminosas. 2a ed. So Paulo: Lake, 2005, v parte, cap. 3). As sesses que serviram de base para seu livro contaram com a participao de mdiuns notveis, como

    Francisco Peixoto Lins, o Peixotinho (1905-1966), e Chico Xavier (1910-2002), entre outros, e sucederam por volta de 1950, em Pe-dro Leopoldo, MG. 0 trabalho de Ranieri ser retomado adiante,

    uma vez que ele figura como personagem desta obra.

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  • zer. Ele, o elevado amigo do espao, referia-se retirada do mdium do estgio de semitranse que lhe antecederia a morte orgnica; seu propsito era retir-lo do limbo entre as dimenses e co-ordenar, por si s, o acoplamento do esprito ao corpo fsico, fortalecendo-lhe o cordo de prata e os laos encarnatrios.

    Naqueles momentos em que esteve de posse total de cada clula do corpo emprestado, absor-veu toda infeco, toda inflamao e todo micro-organismo virulento; toda espcie de contamina-o que estava prestes a determinar o fim da vida fsica do mdium. Profundamente concentrado em aspirar os elementos daninhos vida fsica, 29 o mdico do espao absorveu em seu perisprito toda a contraparte energtica e etrica da comu-nidade virai e bacteriana que agia sobre o corpo fsico do mdium. Quando se desacoplou lenta-mente, outros seres da erraticidade sucederam-lhe dentro do corpo emprestado, cada um cum-prindo seu papel, com a finalidade de reorganizar desde a vida orgnica, celular, at vida emocio-nal e mental do pupilo que retomava a encarna-o, visando ao prosseguimento de suas tarefas. Era a prorrogao do prazo de sua atual existncia; uma concesso do Alto objetivando tarefas espe-cficas no mbito medinico.

  • To logo o mdico se deslocou para a dimen-so astral, abandonando o corpo do mdium para ser trabalhado por outra entidade ainda dentro do hospital, dirigiu-se diretamente para recantos na-turais, junto ao mar. Pairando sobre as guas, vi-mos os elementos aderidos a seu psicossoma, ab-sorvidos do corpo do mdium, serem atrados pela natureza e dispersos em seu energismo. Asseme-lhavam-se fumaa expelida por chamins de f-bricas da Terra. A fuligem mrbida, que era o re-sultado da ao das comunidades de vrus e bact-rias, desprendeu-se do corpo perispiritual do m-dico amigo, que, a esta altura, sentia-se exausto.

    3o Quase desfalecido, devido ao acoplamento ntimo com o corpo fsico fragilizado, levitou, rumando para regies ignotas da espiritualidade, onde cer-tamente se retemperaria, sob as bnos de Maria de Nazar, esprito que administra a misericrdia para os filhos da Terra e os filhos do Cordeiro.

    No hospital, o mdium acordava para nova oportunidade, que deveria preencher sua ficha de servios e lutas renovadoras.

    Aps esse evento, dirigimo-nos, alguns esp ritos, ao Hall dos Escritores, uma espcie de pal-cio em nossa metrpole, onde se renem tanto os espritos que ali estagiam, ligados arte e litera-tura, quanto outros encarnados ou no , que

  • nos encontramos periodicamente para deliberar a respeito de tarefas em comum na rea da literatura entre os dois lados da vida. O palacete era estrutu-rado em material translcido, e irradiava de cada detalhe a luz do Sol, que brilhava intensamente naquele momento. Aguardvamos a visita de re-presentantes do Mundo Maior, que viriam trazer novas instrues quanto ao nosso trabalho junto Crosta. ramos mais de 20 espritos diretamen-te ligados tarefa medinica. Alm daqueles que, quando encarnados, tiveram suas vidas ligadas de alguma forma literatura e que agora ensaiavam a continuao de suas atividades ao lado de diversos mdiuns, encarnados no plano fsico. 31

    Adentraram no ambiente os guardies Ja-mar e Anton, que traziam deliberaes do Alto. Na Terra, o calendrio marcava o primeiro de maro de 1997.

    Angelo, estamos aqui com as propostas do Alto em relao ao mdium cuja vida fsica foi pro-longada, numa demonstrao da compaixo divina. Mas. como toda concesso traz responsabilidades inerentes falou Anton , temos alguns aponta-mentos para fazer a respeito. Voc pediu autoriza-o para escrever, como o fazia quando encarnado. Pois bem. temos tanto o mdium quanto a pauta a ser abordada; no poder fugir a esses tpicos es-

  • tabelecidos. Portanto, voc, como esprito, e tam-bm o mdium devem ser preparados gradual e progressivamente para o objetivo maior.

    Como assim? No s chegar e comear a escrever atravs do mdium? Que tipo de preparo devo ter? No bastam os anos que passei na Terra s voltas com o jornalismo e a literatura?

    No! no bastam! Anton foi taxativo. Digamos: seu trabalho na Terra teve um valor in-contestvel no que concerne ao jornalismo e l i-teratura terrestre, porm aqui voc ser outro tipo de escritor; outra literatura deve ocupar sua men-te, a partir de ento.

    32 No entendo... Se no quiser a oportunidade, temos ou-

    tros interessados. Decida-se! interferiu Jamar, sem deixar margem a dvidas.

    Claro, claro respondi sem titubear. No poderia perder aquela oportunidade,

    pois a vida de morto no me caa bem; no aguen-tava ficar ali como alma penada me envolvendo em coisas de espiritualidade sem ter a mnima inclinao para esprito beatificado. Qualquer coisa servia, inclusive um mdium que no era l grande coisa, uma vez que precisava ser prepara-do por mim.

    Assim que vocs conversarem entre si

  • retomou o primeiro guardio, apontando para nosso grupo de escritores do Alm , retornaro ao hospital, onde ainda se encontra o mdium, e observaro seu corpo mental. Podero reativar as faixas do passado espiritual, estruturadas em for-ma de pensamento, a fim de trabalharem mais tarde com o rapaz cuja vida foi prolongada para o servio dos Imortais. Portanto, agora, vocs tm de se conhecer e explorar as experincias que tra-zem na bagagem espiritual, com vistas a encontrar um denominador comum, em termos de espiri-tualidade. As diretrizes do Alto esto aqui, neste documento. Estejam vontade para conversar e fazer seu planejamento. 33

    Anton, o guardio, aps falar de nossas in-cumbncias junto ao mdium, apresentou-me alguns espiritos que deveriam trabalhar em sin-tonia com aquela proposta. No entanto, o traba-lho estava planejado para se realizar ao longo de alguns anos e no imediatamente, em pouco tem-po. Juntamente com outros espritos que se apre-sentariam aos poucos, teramos alguns anos dis-posio para desenvolver os temas que deveriam ser discutidos atravs daquele mdium. Fui apre-sentado a um esprito que, se eu estivesse na Ter-ra dos encarnados, certamente classificaria como excntrico, no mnimo. Aqui, era to somente um

  • esprito diferente, com ideias arrojadas, diferen-ciadas; um especialista, como se poder ver. Este esprito Jlio Verne. 2

    Que bom conhec-lo fui logo me pro-nunciando. Sempre desejei conhecer mais pro-fundamente voc e seus escritos. Mas, agora, mi-nha natural curiosidade se concentra em sua atua-o do lado de c da vida...

    Pois bem. C estou a me retemperar no espao, antes de minhas prximas aventuras no mundo dos que se consideram vivos respon-deu-me Jlio Verne. Trago aqui dois pupilos, com os quais lidei mais diretamente como esprito,

    34 enquanto estavam encarnados.

    3 Nascido na Frana, Jules Verne (18281905) dos maiores es-critores em matria de aventura e fico cientfica, considerado

    precursor de avanos cientficos como submarino, mquinas vo-

    adoras e viagem Lua. Sua estreia como escritor, em 1862, com

    Cinco semanas em um balo, expressa bem o gnero ficcional to

    recheado de informaes socioculturais e geogrficas acuradas

    que caracterizaria definitivamente seu estilo. Sucesso desde a pri-

    meira obra. seu currculo est recheado de best-sellers, rendendo

    mais de 3o superprodues cinematogrficas e quase uma centena

    de adaptaes para TV ao longo dos anos, entre elas: Vinte mil lguas

    submarinas. Viagem ao centro da Terra eA volta ao mundo em 80 dias

    (fonte: Wikipdia).

  • E me apresentou Ranieri e Voltz,3 um escritor de origem alem. Na companhia destes, mais al-guns espritos se apresentaram, pois juntos deve-ramos compor um grupo que objetivasse transmi-tir algo atravs do mdium que nos fora confiado.

    Jlio Verne exps seu pensamento de manei-ra clara:

    Tenho alguma experincia no estudo das estruturas dimensionais do mundo, na com-preenso das esferas da vida extrafsica, e creio que poderei ser til de alguma maneira. No en-tanto, no trabalho sozinho e tambm no quero escrever nenhum livro; pretendo apenas contri-buir com meu conhecimento de forma a lhe faci- 35 litar, ngelo, o trabalho que o espera. Trabalhei junto a Ranieri e optamos, na poca, por usar de uma linguagem simblica para discorrer a respei-

    3 William Voltz (1938-1984) foi escritor alemo que ganhou desta-que desde sua estreia na fico cientfica, em 196a. Foi um dos es-

    critores da coleo Perry Rhodan, sua principal obra. Embora no

    tenha sido o criador da srie, teve seu nome para sempre associa-

    do a ela. A elaborao das diretrizes da srie, durante o perodo

    em que permaneceu como escritor-chefe, na dcada de 1970, e

    nos anos que antecederam sua morte, norteou mesmo os escri-

    tores que o sucederam, devido a sua enorme popularidade (fonte: Wikipedia).

  • to da vida extrafsica. - Sei, usaram de figuras de linguagem, fize-

    ram uma espcie de parbolas modernas... Isso mesmo. vida extrafsica no pode-

    ria ser abordada em suas mincias no tempo em que Ranieri escreveu seus livros. Como nosso alvo mental eram os espritas, teramos de adaptar certas verdades usando imagens fortes, vigorosas, porm figurativas, simblicas, como abordamos juntos nos livros 0 abismo, 4 Aglon e os espritos do mar,

    5 entre outros.

    Parece que os espritas no estavam nada preparados para uma abordagem mais clara, no

    36 isso? E creio que ainda no esto! respondeu

    Jlio Verne. Pois mesmo hoje parece que mui-tos espritas esto um tanto perdidos em fanta-sias, em leituras de romances que se atm a his-trias de amor e coisas semelhantes. Contudo, se recebemos uma incumbncia de instncias su-periores, vamos l... Por certo teremos trabalho pela frente.

    4 RANIERI, R. A. Pelo esprito Andr Luiz. 0 abismo. Guaratinguet: Edifrater, s.d. 5 RANIERI, R. A. Pelos espritos Jlio Verne e Andr Luiz. Aglon e os

    espritos do mar. Guaratinguet: Edifrater, 1987.

  • Aps breve pausa, Jlio Verne continuou, fa-lando agora a respeito de seu outro mdium, no esprita.

    Veja o caso de Voltz, por exemplo. E um excelente escritor, que, quando encarnado, no teve noes de doutrina esprita; portanto, evi-dentemente no se utilizava do vocabulrio esp-rita. Associei-me mentalmente a ele na produo literria em seu pas sem que ao menos se desse conta do processo medinico em andamento. Ele escrevia com extrema facilidade e captava meus pensamentos.

    Mas, ento, qual era o objetivo de uma par-ceria assim? 37

    claro que estou prestes a expressar um ponto de vista com o qual muitos espritas no concordariam. Mas fato que a realidade de Voltz anloga de inmeros autores que, na atuali-dade, so considerados escritores de fico, de fantasia. Faz-se necessrio abordar certas verda-des fora do mbito esprita, atingindo alvos dis-tintos daqueles que esto na mira dos escritores do meio espiritualista. Os Imortais que nos diri-gem de mais amplas dimenses nos incumbiram de escrever numa linguagem apropriada a certo universo literrio digamos, mais materialista

    que atrasse tambm determinado crculo de

  • indivduos que no tm acesso ao vocabulrio e mensagem esprita ou, simplesmente, no sinto-nizam com a forma religiosa de ver alguns proble-mas da vida.

    Entendo... balbuciei, j com a mente em ebulio. Quer dizer que os dirigentes espiri-tuais resolveram falar de algumas verdades numa linguagem romanceada ou literria sem se utilizar de um vocabulrio propriamente esprita?

    Isso mesmo. Assim, deveramos atingir um pblico diferente, de maneira distinta, pouco usual entre os religiosos. Usariam da intuio e de certas habilidades de alguns escritores da Terra, de forma a transmitir conceitos e ideias, revendo contedos ou paradigmas bastante difundidos.

    Interferindo na conversa e na fala de Jlio Verne, Voltz complementou:

    Minha linguagem apresentava caractersti-ca mais cientfica, no entanto no ignorava a ne-cessidade de trabalhar com meu pblico alguns conceitos muito necessrios para o despertar de uma nova conscincia. Na poca, no podia ima-ginar que estava sendo usado por um esprito... Somente bem mais tarde, nos ltimos anos da existncia fsica, ao ser diagnosticado com cncer, que me dei conta de que havia uma fora sobre-humana agindo sobre mim. Porm, minha volta

    38

  • no havia quem pudesse ouvir meus pensamentos mais ntimos, com quem eu pudesse dividir aque-las impresses.

    Nessa poca, trabalhei ainda mais inten-samente com Voltz tornou a falar Jlio Verne. Em parceria mental e emocional, logramos de-senvolver mais de 800 sinopses de livros, resu-mos de uma histria que seria considerada fico, mas que, no fundo, trazia o germe de uma nova mentalidade para os leitores. Alis, foram mais de 1 milho de leitores, cujas mentes foram trabalha-das atravs dos escritos de Voltz, sem que ele pr-prio suspeitasse, em grande parte do tempo, que

    a sendo mdium ao elaborar seus enredos e personagens e produzir seus textos.

    E quais ideias eram trabalhadas atravs de seus escritos, j que eram considerados obra de fico?

    Pois bem explicou Voltz. Na verdade, percebo hoje com mais clareza, movia-me uma aspirao que me impelia a trabalhar na mente dos leitores ideias de fraternidade, do mundo fu-turo unido em torno do objetivo comum de evo-luo da humanidade. Em minha obra parti de animais conhecidos na Terra e criei seres, geral-mente baseados em criaturas terrestres e mari-nhas, como meio de descrever possveis habitan-

    39

  • tes de outros mundos. "Na poca, sem saber que era conduzido por

    mos e pensamentos dos seres invisveis, des-crevi, numa historia pica, de maneira roman-ceada, a saga da humanidade ao entrar em con-tato com seres intergalcticos. Imaginei aquele mundo fantstico por minha conta, como acredi-tava na ocasio, de modo a incutir certos conceitos e tratar de temas como o convvio com as dife-renas e com seres diferentes. O entrechoque de civilizaes espaciais suscitaria o despertamento do conhecimento humano em sua melhor acep-o, que se pode chamar de espiritual, ao mesmo tempo proporcionando e exigindo mudana por parte dos habitantes da Terra. Um aspecto inte-ressante que os personagens gozavam de fa-culdades psquicas extraordinrias, que empre-gavam no auxlio humanidade. claro que no os descrevi como mdiuns; entretanto, qualquer um que meditasse um pouco mais poderia ver que seus atributos pressagiavam o momento na histria em que os homens conviveriam normal-mente com o invisvel, com faculdades paranor-mais e medinicas. Foi a maneira que escolhi, ou melhor, que os espritos escolheram, sem que eu o soubesse, para enfocar certas verdades atravs de meus escritos."

    40

  • Ou seja, voc era mdium sem saber sequer o que era um mdium...

    Rimo-nos da situao curiosa de Voltz. Eu, particularmente, refleti bastante sobre quantos profissionais roteiristas e escritores de fico cientfica, romances e tantos outros estilos lite-rrios, assim como artistas de modo geral eram usados como mdiuns, sem o saberem. Sobretu-do tendo-se em vista que muitos mdiuns espri-tas, ou que se declaram espritas, ainda no esta-vam preparados para levar uma mensagem mais universal, ou ao menos numa linguagem univer-sal, mais abrangente, queles que jamais ouvi-ram falar de espiritismo e, s vezes, nem sequer apreciam a prtica religiosa. Como essas pessoas tomariam contato com conceitos de espirituali-dade, com certas verdades universais e extrema-mente importantes mudana de paradigmas a que os tempos atuais tm incitado? Gomo rece-beriam notcias acerca da realidade da vida extra-fisica se os autores encarnados e mesmo os de-sencarnados ficassem restritos linguagem e ao mbito religiosos? Nem sei como seriam atingi-das as mentes da maioria absoluta de indivduos ao redor do globo, que nunca escutaram a palavra espiritismo. Talvez, os Imortais estivessem tra-balhando com outros mdiuns, fora do mbito

    41

  • espiritualista, a fim de preparar o mundo para a transformao em larga escala que tem se opera-do e, em breve, deve realizar-se ainda com maior intensidade.

    Absorto nesses pensamentos, quase nem percebi quando Ranieri 6 se manifestou:

    Quando o reverendo Vale Owen7 escreveu seu livro medinico relatando a vida numa col-nia espiritual A vida alm do vu , muita gente pensou que estava delirando. Dcadas mais tar-

    6 Nascido em Belo Horizonte, MG, O mdium R. A. Ranieri (1919-1989) participou ativamente do movimento esprita local, inclu-sive convivendo com Chico Xavier, que poca residia em Pedro

    Leopoldo, a apenas 3okm da capital mineira. Aps curta perma-

    nncia no Rio de Janeiro, a partir de 1950 radicou-se no Vale do

    Paraba, SP. Foi delegado de polcia, profisso na qual se aposen-

    tou, chegando a eleger-se prefeito de Guaratinguet (1969-1972) e deputado estadual por So Paulo em 1974. Pode-se acrescentar

    s obras de sua autoria citadas neste livro aquela que das mais

    conhecidas (RANIERI, R. A. Pelo esprito Andr Luiz. Sexo alm da

    morte. Guaratinguet: Edifrater, s.d.). 7 Sacerdote britnico que atingiu grande projeo por seu trabalho de divulgao de ideias espritas, George Vale Owen (1859-1931) foi tido por Arthur Conan Doyle em seu The History of Spintu-alism (traduzido equivocadamente no Brasil como Histria do es-piritismo) como dos principais mdiuns de ento. A trajetria

    4 2

  • de, quando Chico Xavier publicou Nosso lar, 8 mui-tos espritas ortodoxos imaginaram que ele estava copiando ou plagiando a ideia de Vale Owen. Mas, como pode notar, meu caro ngelo, Deus susci-ta seus mdiuns em todo lugar e fala de verdades imortais com o vocabulrio apropriado ao tipo de pblico que deseja atingir.

    Diante de tudo que era exposto pelos autores do Alm Jlio Verne, R. A. Ranieri e W. Voltz , fiquei imaginando coisas, situaes e fiz minhas dedues a partir da. Estes foram meus pensa-mentos naquela ocasio. Que seria a verdade cien-

    do reverendo interessa, entre diversos aspectos, pelo fato de ve-

    rificar-se que demorou mais de 10 anos para aceitar a veracidade

    dos fenmenos espritas e, ainda, por haver recusado o produto

    financeiro de suas obras, a despeito do grande sucesso alcanado

    por elas. Aos 53 anos de idade, renunciou conduo de sua par-

    quia e passou a dedicar-se inteiramente difuso do espiritismo

    (fontes: http://autoresespiritasclassicos.com/; http ://christians-piritualism.org).

    8 UM dos livros espritas mais conhecidos do Brasil, Nosso lar j vendeu mais de 1,5 milho de exemplares, desde seu lanamento,

    em 1944, e ao longo de aoio voltou a frequentar as listas de mais

    vendidos por semanas, por ocasio do centenrio do nascimento

    de seu autor (XAVIER, Francisco Cndido. Pelo esprito Andr Luiz. Rio de Janeiro: FEB, 1944).

    43

  • tfica ou a verdade medinica, em seus estudos e abordagens? Verdade ou fico? E onde comea e termina cada uma? At que ponto a fico no en-cobriria uma realidade alm-fsica? Na ocasio em que Jlio Verne escreveu a respeito de uma viagem imaginria Lua ou ao centro da Terra, e outras do gnero, foi duramente criticado, pois que essas coisas soavam impossveis; verdadeiro delrio para os padres da poca. Quando Gali-leu insistiu em sua teoria de que a Terra girava em torno do Sol e no o contrrio , foi severamen-te repreendido e levado aos tribunais por aqueles que se julgavam nicos detentores da verdade e da religio daqueles tempos, sendo forado a abjurar suas convices. J pensou no que enfrentou Ale-xander Fleming ao descobrir a penicilina e ter de enfrentar os mdicos, os cientistas da poca que no aceitavam nem acreditavam na sua eficcia? 9

    Suas teorias eram fico ou realidade?

    Ranieri pareceu captar meus pensamentos

    9 Escocs radicado na Inglaterra. Alexander Fleming (1881-1955) foi o descobridor da penicilina, fato que anunciou em 1939. Das

    primeiras descobertas sintetizao do antibitico, transcorre-

    ram-se mais de 10 anos. pois no obteve reconhecimento, tam-

    pouco financiamento nos anos subsequentes pesquisa. Aprodu-

    o industrial do remdio teve incio somente por volta de 1940,

    44

  • mais profundos e acrescentou, como a pr lenha na fogueira de minhas conjecturas:

    Quando foi apresentada ao mundo a possi-bilidade de falar atravs dos continentes usando o equipamento chamado telgrafo, muita gente no acreditou e at os cientistas declararam ser im-possvel. Voc j pensou em como reagiram aque-les que viveram na poca em que foi concebida e lanada a primeira televiso?

    Fatos como esses acrescentou Verne levam-nos a cogitar se a fico cientfica, em suas mais variadas abordagens, bem como os filmes com enredos que sugerem uma realidade alterna-tiva ou espiritual, constituem mera fico ou se, na verdade, traduzem a percepo de uma reali-dade que a maioria ainda desconhece.

    "As sries televisivas ficcionais, a literatura no esprita e outras produes seriam to desti-tudas de elementos reais e palpveis, a ponto de no merecer crdito? E as revelaes espritas ou medinicas no ortodoxas, seriam simplesmente

    rendendo-lhe, junto com os qumicos Florey e Chain, o Prmio Nobel de Fisiologia e Medicina de 1945. Curiosamente, optou por

    no registrar a patente da penicilina, por acreditar que facilitaria

    a difuso de to importante ferramenta para combater inmeras

    doenas que assolavam a populao (fonte: Wikipdia).

    45

  • delrio dos mdiuns? Quanto produo de cer-tos espritos, seriam apenas plgio de algum que descreveu, antes, a mesma realidade? Ou uma forma diferente de falar a mesma coisa?"

    Meus pensamentos viajavam na anlise de certos contornos da experincia medinica. Ra-nieri voltou a falar:

    Quando os espritos, atravs de Chico Xa-vier, descreveram uma cidade no plano espiritual, os espritas mais ortodoxos ficaram boquiabertos. Andr Luiz chegou a escrever sobre alimentao no mundo dos espritos, sobre contrabando em Nosso Lar, bem como a respeito do uso de armas eltricas e de equipamentos de rdio destinados comunicao dos espritos. A poca, soou como uma obra fantasiosa; hoje, ocupa posio oposta: plenamente aceita pelo meio esprita, referncia para anlise de qualquer novo texto psicografado.

    Senti como se aqueles espritos estivessem falando para mim, ngelo Incio, pois os pensa-mentos introduzidos por suas observaes susci-tavam mil e uma ideias em minha cabea. Neste momento, antevi uma forma de trabalhar em par-ceria com os novos amigos, que estavam ao meu lado. E as reflexes no paravam a...

    Jlio Verne interferiu em minhas elucubra-es, de maneira a fazer calmaria em meio tem-

    46

  • pestade intelectual que assolava minha mente. Quero analisar por um instante o trabalho

    que o aguarda. Angelo. Algumas de suas aborda-gens traro contedos muito semelhantes qua-se iguais, na realidade, tamanha similitude entre

    aos de alguns livros editados, principalmente aqueles dos quais fui autor ou inspirador. Refiro-me s obras de Voltz e de Ranieri. que almejamos falar das mesmas verdades, agora num vocabul-rio mais esprita ou que seja compreendido entre espritas tambm, muito embora sem que outras pessoas se sintam agredidas por uma linguagem religiosa, sectarista. Nosso trabalho em conjunto ou parceria no representar nenhuma inovao, em termos espirituais. Quem ler Eliphas Lvi, 1 0 por exemplo, ver teorias interessantes a respei-to da magia e alta magia. Ramatis, em Magia de redeno,11 aborda verdades antes combatidas pe-

    10 Ocultista francs, Eliphas Lvi o pseudnimo de Alphonse

    Louis Constant (18101875). Sua contribuio ao ocultismo tida por alguns como a mais importante do sculo xix d-se justa-mente no auge da efervescncia espiritualista observada em todo

    o mundo, sobretudo na Europa e na Amrica do Norte. Sua obra

    mais conhecida Dogma e ritual da alta magia (So Paulo: Madras, 1 9 9 7 ) . (Fonte: Wikipdia.) 11 Originalmente lanado em 1967, Magia de redeno dos textos

    47

  • los espritas, mas que agora voc poder analisar sob novo prisma. Nada exatamente novo naquilo que pretendemos transmitir.

    "Voltz, por sua vez, lhe oferecer as imagens mentais daquilo que ele percebeu e presenciou na esfera extrafsica, facilitando assim, atravs das matrizes do seu pensamento, a descrio das mesmas paisagens, as quais voc visitar em mo-mento oportuno. Apenas queremos que associe nossos pensamentos s ideias espritas, a fim de que, uma vez amadurecidas, as mentes que lerem seus textos possam ter uma noo mais exata da-quilo que antes j falvamos, porm com vocabu-lrio apropriado ao contexto em que escrevemos. hora de traduzir nossos pensamentos para a poca e o pblico atuais."

    Desta vez foi Voltz quem comentou, talvez em aluso sua prpria experincia, quando en-carnado:

    Muitos escritores da chamada fico his-trica, da fico cientfica e da futurmica espa-cial penetraram na realidade do esprito atravs

    atribudos a Ramatis. assinado por seu primeiro mdium, que

    maior repercusso ganhou. Contudo, o conjunto de sua obra vis-to de forma controversa no espiritismo (MAES, Herclio. Pelo esp-rito Ramatis. Magia de redeno. Limeira: Conhecimento, 1998).

    48

  • da intuio e trouxeram elementos preciosos para o enriquecimento do pensamento espiritual. Ou seja. alguns autores vivenciaram certas experin-cias atravs de sonhos, desdobramentos e xtase e. aps essas vivncias fora do corpo ou em estado alterado de conscincia, interpretaram e coloca-ram no papel o resultado de suas observaes.

    Falo agora baseado em minhas prprias experincias disse Jlio Verne. Escritores de toda parte captam de outras dimenses da vida determinada realidade, algo muito concreto e de existncia objetiva. Ao retornarem ao corpo f-sico, traduzem essa mesma realidade de acordo com o seu objetivo imediato ou sua forma natural de ver a vida e o mundo que os cerca. Frequente-mente, essa interpretao figura um tanto fanta-siosa, primeira vista, para depois se converter em algo teoricamente possvel, que, de modo sub-sequente, ganha ares de coisa palpvel, coeren-te, de existncia comprovadamente reconhecida. Quando descrevi a viagem Lua ou ao centro da Terra, por exemplo, no me referia ao mero do-mnio do fantstico, mas a eventos que presenciei desdobrado, na poca, antevendo o futuro da hu-manidade. Parte deles sucederia na esfera fsica; outra parcela, nos planos da imortalidade. A lin-guagem utilizada era a forma que escolhi, ou me-

    49

  • lhor, que escolheram para mim, culminando na-quilo que se convencionou chamar fico cient-fica de Verne. E, assim como me vali de Ranieri e Voltz, cada um em sua rea e seu crculo de ao, a fim de dar vazo a minha inspirao e meus pen-samentos, tambm eu recebia o estmulo direto de Dante Alighieri, 1 2 que me impulsionava a es-crever sem que eu o soubesse, dirigindo-me, em esprito, durante minhas incurses pelas esferas do mundo extrafsico.

    Jlio Verne abordava um assunto muito inte-ressante e que mexia muito comigo, diante do tra-balho a servio dos Imortais, proposto por Anton. Teramos muito a realizar em conjunto, sem dvi-da. Antes que eu pudesse concluir meu raciocnio, porm, foi Anton quem interferiu, de volta con-versa, como que antecipando algumas questes,

    12 Dante Alighieri (1265-1321) foi escritor, poeta e poltico italia-

    no. considerado o primeiro e maior poeta da lngua italiana. 0 poema pico A divina comdia, sua obra mais importante, foi

    escrito nesse idioma e alcanou repercusso mesmo numa po-

    ca em que era somente o latim que conferia prestgio produo

    intelectual. A divina comdia acabou por tornar-se a base da lngua

    italiana moderna (fonte: Wikipdia). No Brasil, h tradues con-fiveis nas editoras Nova Cultural e 34, lanadas em 2009, ambas

    conforme o Acordo Ortogrfico (2008).

    50

  • ambientes e fatos que certamente objetivava que eu visualizasse, visitasse ou presenciasse, no mo-mento adequado.

    H algum tempo, os clones eram conside-rados fico. Hoje, j se percebe a possibilidade de realizar a clonagem humana. Isso, considerando-se apenas o que se revela ao pblico leigo, a quem se destinam as migalhas da verdade que a mdia faz escapar. Mas que est ocorrendo realmente no interior dos laboratrios ao redor do mundo? Ser que a clonagem humana j no foi experi-mentada? E quanto possibilidade de haver vida fora da Terra: sero os milhares de relatos pelo mundo afora, mencionando aparies, abdues e outros fenmenos ufolgicos, to somente fruto da imaginao de alguns? Quem pode atestar com absoluta certeza, a no ser os espritos superiores, que alguns governos no possuem naves e at se-res capturados em eventuais acidentes com essas mesmas naves ou UFOS? Realidade ou fico? Ou uma fico que encobre a realidade?

    Sem dar tempo para que me recuperasse das indagaes e dos raciocnios motivados por suas palavras. .Anton foi o porta-voz dos demais, que ali se reuniam em conversa entre amigos espirituais:

    Portanto, retomando a discusso a respei-to do aspecto ficcional de livros e filmes, preciso

    51

  • dizer que, muitas vezes, os espritos intencional-mente lanam mo de certos artifcios atravs de mdiuns-escritores ou de mdiuns-artistas que no possuem vnculo ou comprometimento com qualquer doutrina. Isso ocorre pelo simples fato de estarem isentos do patrulhamento e da rejei-o imediata daqueles seus pares que se julgam soberanos defensores da verdade. Canalizadas por meio da inspirao de escritores, autores, ro-teiristas e tantos outros, pouco a pouco tais obras cumprem sua tarefa junto multido, abrindo ca-minho para que, mais tarde, a realidade ltima seja descortinada atravs dos canais ortodoxos. A, sim, essa verdade relativa, mesclada com o toque pessoal, artstico e imaginativo do escritor-m-dium, encontra a realidade final, despida dos ele-mentos ficcionais e das interpretaes pessoais. Quando as ideias em torno de determinada ques-to tornam-se mais difundidas e aceitas, ento o Plano Superior estabelece que seus pormenores se reconfigurem, deixando de lado os atrativos da linguagem figurada e de outros recursos da cons-truo literria e artstica, visando assumir feio mais verossmil ou verdadeira.

    Comecei a compreender melhor minha ta-refa junto ao mdium, assim como a tarefa que o aguardava a partir dali. Era chegada a hora de es-

    52

  • ses escritores, fantasmas para o mundo, despirem sua linguagem dos artifcios do fantstico e do fic-cional de que se valeram e, assim, reelaborarem conceitos, ideias e descries daquilo que haviam presenciado noutra poca, quando no conheciam o pensamento esprita ou no puderam ser claros o suficiente. Desejavam contribuir para a evolu-o do pensamento humano e, por isso, seriam aproveitados pelos dirigentes espirituais na tarefa que os esperava.

    Agora, sim, Anton proporcionou-me um momento de refazimento intelectual, diante da Tempestade de ideias que havia sido despertada em mim.

    Assim que percebi o chamado ao trabalho como uma incumbncia de seres comprometi-dos, sobretudo, com a verdade universal. Minha atividade junto ao mdium objetivava desbravar, ou melhor, descortinar horizontes novos ou inu-sitados, que pudessem compor o quadro das ex-

    periencias espirituais de muitos companheiros encarnados. No com a misso de trazer fatos ri-gorosamente verdadeiros, no sentido de que esti-vessem psis litteris de acordo com cada pormenor da realidade, mas que sejam verossmeis, acima de tudo. Ou seja: a verossimilhana do quadro pinta-do nortearia o trabalho, sobrepondo-se preciso

    53

  • minuciosa do enredo ou da descrio, o que, de mais a mais, soava como preciosismo descabido.

    Ao escrever, seria lcito lanar mo de figu-ras de linguagem, de estilos diferentes, de adap-taes, entrevistas, vivncias pessoais, experin-cias que ainda no haviam sido relatadas pelos prprios autores de fico, mas verdadeiras em seu fundo. Envolta em tudo isso, transpareceria uma verdade maior-, a essncia de tudo: a realida-de espiritual. Conclu que diversas nuances pode-riam ser transmitidas empregando-se recursos de linguagem a fim de descrever o panorama ex-trafsico. difcil prescindir completamente des-ses elementos. Em outras palavras: parbolas e figuras narrativas eram artifcios vlidos, embora fosse necessrio erradicar elementos do univer-so estritamente fantstico, ficcional. Ao mesmo tempo, atuando como farol e mecanismo regula-dor, estaria o contedo espiritual, tico e moral, que necessariamente sobressairia do texto, de forma verossmil.

    Desta vez, foi outro esprito, que nos obser-vava e tinha escapado minha percepo, quem introduziu seu pensamento, como a me socorrer com suas observaes:

    Veremos esses mesmos elementos de lin-guagem presentes na prpria mensagem de Jesus

    54

  • declarou o esprito, denotando que sabia exata-mente o que eu pensava. Ele pinta um quadro fantstico do fim do mundo e do breve retorno do Filho do homem. Os fatos se sucederam da for-ma exata tal qual relatou? E, em razo disso, sua mensagem perdeu ou teve diminuda sua credibi-lidade? Algum viu o Filho do homem vir nas nu-vens com poder e glria?' 3 Quem registrou a corte anglica que Jesus descreveu, juntando os esco-lhidos de um canto a outro do mundo?' 4 Aqueles foram mecanismos usados por Jesus para ilustrar uma verdade mais ampla, mais interna. Eis bons exemplos de figuras de linguagem do Evange-lho, cujo objetivo nada mais que transmitir uma mensagem e mostrar determinada realidade ain-da oculta ou obscura ao pleno entendimento. Caso nos reportemos ao ltimo livro da Bblia, o Apo-calipse de Joo, a que proliferam ilustraes, smbolos e figuras que alcanam nveis dignos da mais pura fantasia diria o leitor apressado ou no familiarizado com a exegese bblica e a her-menutica. 0 prprio cristo da atualidade costu-ma ver no livro proftico o mais impenetrvel do Novo Testamento. Abem da verdade, so recursos

    13 Cf. Mt 24:3o; Mc l3:26; Lc 21:27.

    14 Cf. Mt 24:31;Mc 13:27.

    55

  • empregados pelo apstolo com o intuito de ilus-trar a histria do mundo e enunciar a interveno do Alto na politica humana.

    Parece que os benfeitores queriam me levar a assumir o compromisso com a tarefa que me aguardava junto ao mdium sem qualquer obje-o nem constrangimento, entretanto com a viso clara a respeito dos recursos com os quais deveria contar.

    As experincias que a princpio seriam apre-sentadas ao mdium que me serviria de instru-mento, j relatadas em alguns livros, poderiam at mesmo ser rejeitadas por ele, nos primeiros momentos do transe medinico. Por isso, apro-veitaria sua inclinao natural para aceitar o pen-samento do codificador do espiritismo e, em par-ceria com outros espritos, abordaria os temas propostos sob uma tica verossmil, embora ain-da no contemplada em toda a extenso segundo se delinearia na psicografia.

    A ttulo de exemplo, examinemos o livro an-terior desta trilogia 0 reino das sombras, intitula-do Senhores da escurido, que seria escrito anos mais tarde, ao longo de 2008 . Deve-se notar que alguns textos que compem certos captulos j haviam sido escritos anteriormente, em outras obras, como o caso dos captulos 8 e 9, respec-

    56

  • tivamente: "Sob o signo do mal" e "Escravo da agonia". Seu contedo j fora percebido, captado e interpretado pelo prprio W. Voltz, no mesmo perodo histrico em que ocorreram os fatos re-latados. Por esse motivo, tais captulos como a totalidade dos prprios livros, em ltima anlise no representam nada de novo. No obstante, o escritor no dispunha dos elementos do conheci-mento esprita para elaborar as conexes de tudo quanto percebeu com a vida espiritual. por esse motivo que, ao perceber a realidade extrafsica com que se deparou, deu asas sua interpretao brilhante acerca de assuntos to palpveis e ins-tigantes. Embora com personagens diferentes, com implicaes ticas menos abrangentes e com nuances da trama totalmente engenhosas, sob o ponto de vista estilstico, nota-se que a verdade captada a mesma. Minha contribuio? Seria exatamente revelar o lado esprita da situao, dos fenmenos, do enredo, revisitando paisa-gens e personagens sob a orientao de Anton e seus especialistas, como Jlio Verne fez com seu pupilo, poca. Assim como outro amigo espiri-tual pretende, muito em breve, escrever a verso e a viso esprita de obras como Carandiru,'5 Ma-

    15 Carandiru (BRA/ARG, 2 0 0 2 , 147 min. Dir.: Hector Babenco) um

    57

  • trix' 6 e Cidade de Deus.' 7 Ser que suas iniciativas sero classificadas como plgio de produes to respeitadas e de grandeza sobejamente reconhe-cida, sob o aspecto estilstico e narrativo? Ou se-ro esses futuros trabalhos considerados fico, apenas porque no trazem o estilo de obras me-dinicas consagradas?

    Seja como for, o contato com este grupo de espritos que se prope ao trabalho conjunto,

    filme baseado no best-seller brasileiro Estao Carandiru (So Pau-lo: Cia. das Letras, 1999), que vendeu cerca de 500 mil cpias e foi agraciado com o Prmio Jabuti. No livro, o mdico Druzio Varella

    relata suas experincias como mdico na Casa de Deteno de So

    Paulo, clebre, entre outras razes, pelo massacre de 1 1 1 presos,

    ocorrido em 1992 (fonte: Wikipdia). '

    6 Mafra; (EUA, 1999, 136 min. Dir.: A. & L. Wachowski) o longa-

    metragem que inicia e d nome trilogia cinematogrfica qu al-

    canou enorme sucesso de bilheteria ao redor do mundo (no total, a srie lucrou mais de us$ 1,1 bilho) e recebeu quatro estatuetas do Oscar. O filme visto como um marco tanto na esttica cinemato-

    grfica e nos efeitos especiais, como sobretudo no retrato que faz

    da realidade virtual, com elementos como inteligncia artificial,

    recheado de referncias filosofia, ao ocultismo, literatura e

    mitologia, tornando-se dos grandes cones da cultura lyberpunk

    (fonte: http://en.wikipedia.org). 17 Cidade de Deus (BRA, 2002, 130 min.) um longa dirigido por

    58

  • parceria espiritual, ensinou-me a aguardar o futu-ro, sem pressa, com cautela ao me adiantar com-batendo ideias, trabalhos e verdades levadas a p-blico de maneira diferente daquela que aprendi.

    E. como o esprito que se manifestou por l-timo queria guardar sua identidade, conservei-o no anonimato, embora parecesse muitssimo comprometido com as ideias espritas, conforme suas palavras seguintes sugeriam.

    Muitos sensitivos, em todo o Brasil, tm tido experincias medinicas que comprovam a universalidade dos ensinos transmitidos de uma a outra latitude do planeta. Ser que essa univer-salidade s possvel dentro dos limites orto-doxos do movimento esprita ou as inteligncias imortais realmente se comunicam e se utilizam de intrpretes os mais diversos, espritas ou no: escritores-mdiuns, mdiuns-autores, mdiuns-

    Fernando Meirelles e Ktia Lund, que alou Meirelles condio

    de diretor aclamado em Hollywood, aps o lanamento mundial

    do filme, no ano seguinte. A narrativa retrata o crime organizado e

    o tranco de drogas no conjunto habitacional que d nome ao filme, situado na capital do Rio de Janeiro, e baseia-se no romance ho-

    mnimo de Paulo Lins (So Paulo: Cia. das Letras, 1997), recebido pela crtica como uma das maiores obras da literatura brasileira

    contempornea (fonte: http://en.wikipedia.org).

    59

  • terapeutas, mdiuns-cientistas, que no perten-am exatamente ao corpo de representantes da fi-losofia esprita?' 8

    "Meditemos com efeito sobre essa realidade que supera a fantasia, a imaginao e a fico, mas no descartemos a possibilidade de que os esp-ritos do Senhor no encontram barreiras para se manifestar; que grande parte do que hoje rejei-tado pelos renomados estudiosos da mediunidade e dos fenmenos espritas pode estar recheado de mensagens e verdades, que os mdiuns mission-rios do movimento no aceitariam psicografar.

    "Antes de se aventurar a fechar questo, de-clarando terminantemente: 'Isso no existe!', tal-vez seja indicado refletir sobre o desenvolvimento dos conceitos espritas, que apresentam clara pro-gresso desde as primeiras mensagens a Kardec, em 1855 de resto, como ocorre com tudo o mais.

    18 Inmeras vezes, ao longo da obra kardequiana, os espritos

    conclamam toda a gente, esclarecendo que o trabalho de desper-

    tamento tem na humanidade seu alvo, e no est de modo algum

    circunscrito ao terreno religioso, tampouco esprita. "O todos vs,

    homens de boa-f, conscientes da vossa inferioridade em face dos mundos disseminados pelo Infinito!... lanai-vos em cruzada

    contra a injustia e a iniquidade" (KARDEC, A. 0 Evangelho segundo o espiritismo. 1 2 0 A ed. Rio de Janeiro: FEB, 2 0 0 2 . Grifo nosso).

    60

  • Alm disso, h que levar em conta a possibilidade de se haver interpretado por um vis limitado ou especfico algo dotado de implicaes mais am-plas, que escaparam ao momento da anlise."

    As palavras do elevado esprito encerraram as observaes levadas a efeito, e com chave de ouro. Quanto a mim, teria muito que me prepa-rar, a partir daquele encontro. Tudo o mais es-tava condicionado forma como o mdium rea-giria e se comportaria diante das mensagens que receberia de ns. Restava apenas aguardar para ver os resultados. Jlio Verne, Voltz, Ranieri e al-guns benfeitores, como Pai Joo, Anton, Jamar e outros mais, que comporiam a equipe espiritual responsvel, mostravam-se satisfeitos com os ru-mos que tomava o projeto. Cumpramos um man-dato provindo de dimenses mais altas; no havia como recusar.

    61

  • OD I A E R A C O M O qualquer outro do ano. E, como de costume, uma noite profunda sucedia os acontecimentos tambm nor-mais daquele dia, comum a todos os mortais. As atividades em escritrios, fbricas, escolas e sho-ppings pareciam ter chegado ao termo enquanto a noite caia lentamente, quase calma, no fossem os habitantes da vida noturna, que surgiam ou des-pertavam para viver experincias em grande parte inconfessveis, favorecidas pela escurido. A ati-vidade na casa esprita tambm dava mostras de ter-se encerrado quando os trabalhadores se di-rigiam a suas residncias, muitos deles cansados por partirem da jornada profissional diria dire-

    65

  • tamente para aquele momento dedicado a atendi-mentos na instituio.

    Na cidade, tudo parecia correr de forma nor-mal, como sempre. Viaturas lanavam-se s ruas, policiais faziam sua ronda, hospitais recebiam enfermos e feridos, e os bares, boates e demais casas noturnas despertavam para novo expedien-te, no perodo mais concorrido. Luzes se apaga-vam, outras se acendiam, e mais outras, coloridas, quase sombrias, piscavam inquietas, indicando os redutos de algum inferninho que se abria para receber os bomios da vida clandestina. Um par de namorados trocava carcias, no enlevo de seus coraes apaixonados e de seus corpos ardentes. Enfim, era uma noite como muitas outras noites.

    Os poucos bairros arborizados da capital, prximos a grande parque, iluminavam-se ao menos pelos faris de centenas de carros e pelas luzes de suas casas noturnas, que fervilhavam de gente, medida que a noite assumia lentamente a feio de uma madona recheada de estrelas, rumo madrugada, que logo sucederia o dia anterior. Contudo, quela hora, o calor da tarde ainda pa-recia se refletir sobre o comportamento da popu-lao noturna. Bancas de revista, floristas, jovens perambulando em busca de aventuras; rvores que ocultavam, talvez, alguma surpresa indeseja-

    66

  • da para os transeuntes incautos ou desavisados. Embora o aspecto social nada extraordinrio,

    bastante igual ao de qualquer noite, algo agitava os bastidores da normalidade. Outros sons, outras paisagens, outras imagens e personagens se mo-vimentavam numa dimenso, por assim dizer, pa-ralela, diferente, quase imaterial. Mas a maioria, a quase totalidade das pessoas, no notava ou no percebia essa movimentao, esse burburinho de vozes inaudveis ao comum dos mortais. Era um mundo dentro do mundo, ou melhor, eram mui-tos mundos dentro do mundo de todo mundo.

    No havia como perceber de forma ostensiva a vida alm dos limites sensoriais de toda a gente. No havia como. Algo inerente natureza humana fora concebido de forma a no permitir o encon-tro das dimenses de maneira intensa, palpvel. Somente sentidos especiais poderiam vislumbrar esse movimento de vida, de ondas e partculas, de mentes e emoes, alm daquilo que era conside-rado normalidade pela maioria.

    Na regio central da metrpole, teve incio intensa atividade. O apartamento ficava em um prdio abandonado, nas imediaes de uma gran-de praa, em cujo centro se encontrava uma cate-dral conhecida. Um farfalhar, certo rebulio, um grito, talvez um rudo agudo e, a seguir, um som

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  • mais sinistro ressoava no ambiente. Movimento ligeiro, cada vez mais rpido, como se fora uma sombra com vida prpria, esgueirava-se por entre as paredes do velho apartamento.

    0 ser movia-se de um lugar a outro como se um felino fora, perseguido por seus predadores. Repentino silncio se instalara; um silncio cons-trangedor, que incomodava os sentidos, as per-cepes. A sombra parecia agora irradiar uma luz embaada, quase uma emanao de fuligem ilumi-nada por ignota lamparina de uma vivenda tosca.

    Logo depois, barulho infernal sucedia ao si-lncio enganador. Luz muito forte, que lembrava um holofote, parecia perseguir a sombra em cada cmodo, de cada apartamento daquele edifcio central. Algo como o reluzir de uma espada ou um relmpago cuja luminosidade houvera sido con-gelada no tempo brandia de um lado a outro, en-quanto a sombra se esgueirava tentando escapulir de um destino quase certo.

    0 estranho ente das trevas saiu correndo do prdio e dirigiu-se para o meio da multido de homens e de almas. Tentava dissipar seu rastro em meio aos transeuntes, bbados e bomios que disputavam seus desejos inquietos com muitos outros que se vendiam, se alugavam, ou simples-mente se davam a tantos outros seres de desejos

    68

  • equivalentes. Junto daquela entidade estranha, criaturas da noite se alvoroaram; voavam atrs dela, quem sabe espantadas por algum sentido que fora acionado, percebendo o imperceptvel para a maioria dos mortais. Insetos, ratazanas, lacraias e alguns escorpies pareciam se agitar instintiva-mente pelos corredores do prdio vazio, em de-bandada diante do farfalhar produzido pela estra-nha criatura. E atrs, alguma coisa, algum que lu-zia como as luzes de uma viatura, movimentando -se em intensa atividade, porm sem barulho, sem rudo, sem incomodar. Outra presena, outro ser, movia-se por entre as paredes, cruzando a barrei-ra da matria...

    0 ser sombrio esgueirava-se por entre as pessoas que vagavam diante da catedral. Seu hlito mental causava arrepios naqueles em quem tocava ou que lhe percebiam, ainda que instintivamente, a presena doentia. Ele tentava correr, quase na tentativa de levitar; mas nada. No conseguiria, tamanha sua falta de imaterialidade. Devido sua condio quase material, quem sabe? huma-na, ao menos no que concerne fisicalidade. Ele simplesmente se arrastava num gorgorejo, uivan-do, sinistro como algum personagem de Stephen King. Sua aparncia esqueltica lembrava a de um vampiro que h muito no saciava sua sede de

    69

  • sangue. Porm, no seu caso, era sede de fluidos, de energias, de um tipo de alimento no material. De perseguidor, agora era perseguido; no com-pletara seu mandato, no cumprira o intento para o qual fora convocado.

    Atrs de si, as luzes chamejantes, o relm-pago que se locomovia com vida prpria, ou sim-plesmente um dos miserveis e abominveis guardies do Cordeiro, pelos quais nutria inten-so dio, devido a sua impotncia ao enfrent-los. Enfim, no divisara muito mais do que o ofuscar de um claro; uma aberrao da natureza, segun-do pensava, a qual se movia perigosamente em direo a ele, impedindo-o de cumprir sua mis-so. Ser que existiam anjos, conforme ouvira fa-lar certa ocasio? Seria aquele relmpago maldito uma espcie de anjo do juzo, que viera para co-brar-lhe os atos criminosos cometidos em nome do seu sistema de vida? Ou os anjos seriam apenas os odiosos sentinelas do Cordeiro?

    De todo modo, no tinha tempo para digres-ses, pois deveria se ocultar da presena daque-le ser que, em tudo, vibrava contrrio aos seus planos. Correndo, cada vez mais veloz, segundo sua capacidade de transitar em meio aos fluidos grosseiros daquela atmosfera infectada de pen-samentos e desejos humanos, sentiu tocar em si

    70

  • algo como se fosse uma luz congelada, um instru-mento do odioso perseguidor, forjado em pura luz. Sua pele ardia ao toque do instrumento em-punhado pelo sentinela. Algo como o rasgar de suas carnes, como se carne tivera, arremetia-o sensao de dor. Ou seria somente seu desespero diante de algum que lhe era, sob todas as formas, superior? Grasnava, quase grunhia, caso assim se pudessem comparar os sons roucos, sunos, que saam de seu arremedo de garganta. 0 desespe-ro aumentava sobremaneira. E o perseguidor no parecia ceder.

    Embora arregimentasse toda a fora acu-mulada dentro de si, oriunda do dio represado, mesmo assim no conseguia velocidade suficiente para escapar da perseguio. Atravessava as pes-soas como se elas fossem feitas de fumaa, embo-ra sentisse certa resistncia material na tentativa. Aqueles que eram violados, cuja defesa energtica se rompia durante a passagem do miservel ser, sentiam-se literalmente usurpados, exauridos de suas reservas energticas. Estremeciam, como se pressentissem algo invisvel perpassando-os. Um arrepio de medo, um medo repentino, quase ma-terial, palpvel.

    De repente, desfaleceu perigosamente, sem foras, embora a energia subtrada daqueles por

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  • quem passava. Quase desmaiou, tamanho o es-foro empregado para fugir da perseguio atroz. Foi iluminado, de um momento para outro sentiu uma luz forte, ofuscante, imaterial, porm perfei-tamente perceptvel. E os raios daquela luz pare-ciam ferir-lhe a pele ressequida, rasgando a pr-pria sombra que vinha de dentro de si.

    Homem alto, forte, de aparncia macia er-guia-se, ostentando algo que se assemelhava a uma espada. Diante dele, curiosamente, o ser prostrava-se defronte igreja, nas escadarias de uma construo de ar medieval. Algo que combi-nava com seu esprito, que havia estacionado no tempo, em termos evolutivos.

    O guardio irradiava luz por todos os poros. Maldita luz, que lhe cegava a alma e fazia com que lgrimas rompessem a aparente fortaleza, e emergissem de seu interior traumas milenares reprimidos no inconsciente. Pde ver de relance como fugiam espavoridos outros espritos vnda-los, acompanhantes ou inquilinos de seus hospe-deiros humanos, e outros ainda, membros de um condomnio espiritual, engajados na disputa por uma vaga no psiquismo enfermo das pessoas que passavam. Quase que seus parceiros humanos fo-ram totalmente liberados de sua influncia ne-fasta apenas sob o influxo da presena do gigante,

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  • que ofuscava sua viso espiritual. Sem v-la, mas sentindo os efeitos de apario to marcante, su-perior, de firmeza inabalvel, debandaram as de-mais criaturas quase materiais, que, ao bater em retirada, devolviam liberdade temporria a seus hospedeiros vivos. As irradiaes da aura do sen-tinela pareciam asas formando em torno de si algo semelhante a um potente campo de foras, que se propagava acima e em torno de si. A viso para o miservel das profundezas era a de um anjo amea-ador. "Um querubim", diria mais tarde, "ungido pelo Cordeiro".

    J podia antever a tortura a que seria subme-tido pelo valente guardio senti-la, at quan-do este, decepcionando o opositor e emissrio das sombras, to somente pronunciou:

    Estou atento s suas artimanhas. Volte e comunique a seus chefes que estamos a caminho. Nada, nenhum poder das profundezas nos dete-r, pois somos enviados da justia suprema, e o que tiver de vir, vir. E no tardar!... 0 juzo1

    Consagrado na tradio crist como juzo final, descrito por v-rios autores nas Escrituras, embora aparea geralmente como dia

    do juzo, dia do Senhor ou, simplesmente, juzo (cf. SI 1:5; Hb 9:27; 2Pe 2:9:1J0 4:17 etc) . Com acerto, o espiritismo fala em juzospe-ridicos. esclarecendo se tratarem de divisores de gua na histria

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  • chegado. V e fale aos comandantes das hostes do abismo que os tempos so chegados.

    Quando o guardio virou-se, como que a des-pedir-se do desordeiro obsessor, este se armou de estranha e irreverente coragem e atirou-se em cima do emissrio do Alto. Logo o sentinela vol-tou-se, encarando-o por instantes, novamente, e as irradiaes eletromagnticas de sua aura rom-peram de vez as ltimas resistncia do inimigo, que foi arremessado ao longe, caindo sobre o solo e rolando como um miservel, corvejando baixi-nho, chorando de dio diante da impotncia con-tra a fora descomunal do guardio. E este apenas se virara, sem desferir qualquer golpe no adver-srio espiritual.

    Olhos lacrimejantes, vermelhos, e ao mesmo tempo sombrios, o esprito do mal fitava o guer reiro, cujo olhar refletia uma luz jamais vista por ele, tamanha a fora moral e a envergadura de sua

    de todos os orbes, ao conclurem ciclos evolutivos. 0 momento de

    transio por que passa a Terra denota proximidade de um juzo planetrio. Para quem reage com ceticismo, vale recordar o alerta

    contido no sermo proftico (Mt 24). de que o juzo vir sorratei-ro. Paulo o reitera: "pois vs mesmos sabeis muito bem que o dia

    do Senhor vir como o ladro de noite" (1Ts 5:2), tal como Pedro: "O dia do Senhor, porm, vir como ladro" (2Pe 3:1o).

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  • forma sublime. A tentativa fora um fracasso. Disso ele tinha

    certeza. A reao inesperada do guardio, ao pro-nunciar as palavras finais, figurou a demonstra-o mxima de fraqueza de sua parte, o que lhe era golpe inadmissvel ao ego. Por isso, intentara o ltimo recurso violento, fruto do mais profundo desespero. Quedara-se, contudo, diante do gesto altivo de quem lhe era superior. 0 esprito aga-chou-se choramingando, encurvado, confuso. O sentinela olhou para cima, ergueu um dos braos e elevou-se a outras dimenses, deixando o esprito infeliz intimidado, ansioso, temendo escusar-se perante seus chefes hierrquicos.

    0 trabalho do guardio apenas comeara. Juntamente com suas hostes espirituais, vinha se preparando para o momento final, a grande bata-lha, o desenlace do grande conflito que se desen-rolava desde milnios no panorama terreno. Sua misso consistia em desmascarar os poderes das trevas e tornar patente o resultado da poltica inu-mana desenvolvida nos bastidores da vida. Afinal, sem que a maioria dos homens o sinta, "de ordi-nrio, so os espritos que vos dirigem".2

    2 lARDEC. Allan. 0 livro dos espritos. 1a ed. esp. Rio de Janeiro: FEB, 2005. item 459. p. 3o6.

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  • J A M A R E L E V O U - S E a outra frequncia, a outra dimenso da vida. A forma espiritual que o carac-teriza assumiu tom de naturalidade diante dos se-res de mesma estirpe. Envolvido at o mago com as questes de ordem planetria, a dedicao desse esprito humanidade era tamanha que ele se en-volvia completamente no ardor da sua tarefa, qua-se com santidade, no fosse seu lado humano, em-bora desencarnado. Seus amigos ou companheiros de trabalho, os outros guardies, estavam imbu-dos do mesmo fervor, da mesma dedicao. Eram especialistas no trato com entidades sombrias, principalmente aquelas ligadas aos casos comple-xos de obsesso entre os humanos, tais como ma-gos negros e demais seres especializados no mal.

    E os mdiuns, nossos aliados, como esto? perguntou Jamar a Watab, o africano.

    Esto em luta tambm. Entretanto, alguns tm estado to envolvidos com as disputas e intri-gas do movimento esprita ou religioso que cor-rem o risco de perder o foco de seu trabalho neste momento de extrema importncia para os desti-nos do mundo.

    Sim acrescentou outro guardio, que atua sob o comando de Zura, o oriental. Pre-cisamos reacender a f de alguns companheiros nossos da dimenso fsica, pois parece que esto

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  • esfriando em sua dedicao. , os apelos do mundo material nublam os

    sentidos espirituais de nossos aliados e agentes. Acho que se desenvolvem mais durante os pero-dos de perseguio acrescentou Jamar.

    Os guardies levitaram, numa espcie de voo rasante sobre a paisagem do planeta, indo de uma latitude a outra do globo em apenas alguns segun-dos. Jamar apontou rumo ao Capitlio, como a ra-tificar o destino traado.

    Aqueles que lhe eram subordinados e os de-mais agentes da justia voaram na direo indica-da. Arremeteram para o norte e passaram sobre diversas cidades dos homens a uma velocidade alucinante, dificilmente imaginada pelos habi-tantes do mundo para sua prpria locomoo. Os fluidos do ambiente que atravessavam eram so-prados para os lados, devido velocidade de em-puxo. 0 som causado pelo voo rasante da legio de guerreiros da luz parecia o barulho de poderosas asas. Deixaram sua marca na matria etrica e as-tral, como se estivessem sulcando o cu noturno com raios dourados, causando efeito policrmico de intensa beleza. No entanto, esse espetculo so-mente era percebido por outros espritos que es-tivessem naquelas cercanias vibratrias, os quais perceberiam a legio de soldados do Cristo diri-

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  • gindo-se a outro ponto de encontro, visando s observaes tticas.

    As cidades abaixo deles pareciam suceder-se uma a uma, e eram percebidas como um rastro de luzes quando os espritos poderosos as sobrevo-avam. A viso era de paisagens, dos formigueiros humanos, de rvores e florestas aoitados por um vento forte, que acima deles passava sem se deter. Os guardies se lanaram no espao areo, dei-xando as sombras da noite e rumando para o outro hemisfrio do planeta. Sua aparncia era como um feixe de luz iridescente, a qual rasgava as som-bras e a escurido na velocidade do pensamento.

    Seu destino chegou ao fim ao avistarem o especialista Anton, que os aguardava sobre a es-trutura fisioastral do Capitlio. Milsimos antes, cruzaram com um avio que, na dimenso fsica, acabara de decolar do Ronald Reagan Washington National Airport, a poucos quilmetros dali, na outra margem do rio, embora de modo algum tri-pulantes e passageiros os percebessem.

    Como soldados caindo em seus paraquedas, os guardies abriram o crculo do seu voo sobre os fluidos do planeta e deixaram-se pairar lenta-mente, mas mesmo assim numa velocidade acima da compreendida pelos mortais, at que pousaram suavemente ao lado do seu superior hierrquico.

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  • Nenhum som se ouvia no momento do encontro daquelas almas comprometidas com a poltica di-vina. At que Anton e Jamar se pronunciaram sem precisar articular palavra; somente com a fora de seu pensamento. Tratava-se de comunicao mental, espcie de som do pensamento, diferen-te daquele ouvido na fala humana. Era algo per-ceptvel apenas num nvel superior de atividade, noutra dimenso. Em nada similar ao linguajar humano, deficiente por natureza para exprimir a totalidade das intenes e dos pensamentos dos espritos encarnados.

    Anton parecia brilhar mesmo sob a luz do sol, que nascia do outro lado do mundo. Seus cabelos reluziam uma aura dourada, conferindo tom es-pecial sua face, que exprimia firmeza e convic-o. A seu lado, Jamar ardia internamente no fer-vor de seu trabalho e na expectativa de aconteci-mentos que definiriam a poltica do novo mundo, que estava surgindo ou renascendo das cinzas da civilizao. Gomo guardio do alto escalo, Jamar tambm se envolvia numa luminosidade dificil-mente disfarada. E Watab, o africano, participava mentalmente da conversa, deixando seu psiquis-mo livre para ser penetrado pela fora mental dos companheiros. Altivo, o guardio da cor de ba-no erguia-se, junto com os demais, observando a

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  • movimentao abaixo de si, mantendo a sintonia com os objetivos e incumbncias dos quais ins-tncias superiores os encarregaram.

    Receberam, logo aps ter com outro emiss-rio, um agente da justia que estava de prontido naquele continente. Algum que recebera a in-cumbncia de seguir de perto os ltimos aconte-cimentos do plano extrafsico.

    Ramon foi logo se pronunciando, pois trazia importantes observaes a seus superiores:

    Antigos opositores a nosso trabalho foram encaminhados a locais de transio, onde so ave-riguados e catalogados enquanto aguardam novas determinaes de instncias superiores. Cientis-tas da escurido e alguns magos de representati-vidade j foram atendidos por agentes no plano fsico, parceiros nossos no continente sul-ame-ricano. Ao que tudo indica, em breve teremos um desfecho satisfatrio dos ltimos eventos.3 Julius Hallervorden,4 o antigo cientista da escurido,

    3 No relatrio que faz ao longo deste pargrafo e dos seguintes, o

    guardio Ramon reporta-se diretamente aos acontecimentos que

    se desenrolam no volume 2 da trilogia 0 reino das sombras (PINHEI-RO, Robson. Pelo esprito Angelo Incio. Senhores da escurido.

    Contagem: Casa dos Espritos, 2008). 4 Mdico e neurocientista alemo, Julius Hallervorden (1882-

    80

  • est sendo preparado para reencarnar, e o espe-cialista em hipnose, 5 um dos espritos mais reni-tentes, tambm atendido em esfera prxima Crosta e dentro em pouco deve assumir roupagem fsica compatvel com sua necessidade.

    "Porm continuou seu relatrio pessoal temos srias preocupaes no que concerne po-litica nas regies inferiores. Os sistemas de poder esto se reconfigurando em face do que ocorreu com seus ltimos lderes. Parece que os poderosos drages6 tm reorganizado diligentemente o po-der no submundo, e, com esse intuito, acabam de convocar uma reunio urgente entre os maiorais."

    Anton lanou significativo olhar a Jamar e

    1965) foi clebre pesquisador nazista. Examinou ao menos 700 crebros e, durante a Segunda Guerra, dissecou-os s dezenas em

    crianas (fonte: http://de.wikipedia.org/wiki). 5 Este "especialista em hipnose", identificado apenas como o hip-

    no, desempenha papel singular na histria da mediunidade de

    Robson Pinheiro, conforme revela o livro de memrias do m-

    dium. Mais do que o interesse de carter personalista, os porme-

    nores que envolvem tal esprito constituem rico exemplo de como

    a atuao das sombras sagaz, intricada e repleta de artimanhas

    (PINHEIRO, Robson. Os espritos em minha vida. Contagem: Casa dos

    Espritos, 2008, cap. 8). 1 Ao contrrio do que alguns tendem a supor, o nome drago ou

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  • Watab, para em seguida deixar-se penetrar nova-mente pelo pensamento do agente de segurana planetria Ramn:

    Todos os espritos comprometidos com os laboratrios visitados pelos guardies em sua jornada anterior foram expulsos do submundo, e muitos deles, conduzidos ao tratamento ou ao en-frentamento da justia sideral. Verificamos que as instalaes do abismo tanto quanto as arma-dilhas psquicas vinculadas terminaram por su-cumbir, to logo se dispersaram seus mantenedo-res. Na verdade, no havia como os construtores do mundo inferior sustentarem suas obras por muito tempo, permanecendo longe delas. Isso porque, para cri-las, basearam-se, por incrvel que parea, em matrizes de pensamento elabora-das por certos escritores da Terra, como se fossem projetos preexistentes, sobre os quais condensa-ram suas criaes fludicas. A medida que foram

    drages empregado para identificar os representantes mximos

    da poltica oposta do Cordeiro, ou simplesmente a fim de sinte-

    tiz-los numa figura impactante no foi um termo cunhado pelo

    espiritismo, muito menos pelo autor espiritual desta obra. Na ver-

    dade, embora seja eminentemente associado ao Apocalipse, onde recebe mais de 10 menes, nem mesmo Joo Evangelista o res-

    ponsvel por t-lo introduzido. 0 termo j aparece nos profetas

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  • expulsos pelos guardies ou puseram-se a fugir, como se deu com alguns, as edificaes astrais ru-ram, desfazendo-se pouco a pouco. Mas...

    Fale, guardio algum tratou de apress-lo. Bem, nossa preocupao no exatamen-

    te com aquelas construes, mas sobretudo com o que gravamos em determinada reunio de diri-gentes e especialistas do submundo.

    E, dando uma pausa, como que a respirar mais fundo, Ramon entregou a Anton os relat-rios compostos em matria prpria dimenso extrafsica.

    Veja por si mesmo as gravaes terminou falando ao guardio maior.

    Anton olhou apenas superficialmente para o objeto que tinha nas mos e reservou-o para outra hora, quando retornasse a seu escritrio ou base central dos guardies. Sua mente parecia vagar ao longe diante do relatrio apresentado por Ramon. Jamar acompanhava as imagens mentais junta-

    maiores do Antigo Testamento (Is 27:1; 51:9; Ez 29:3; 32:2), assim como em Dn 14, a tambm acompanhado de Bel, o dolo da Babi-

    lnia. (Importa ressaltar que Dn 3:24-90; 13-14 so suplementos gregos, rejeitados pelos cnones hebraico e evanglico, embora admitidos pela Igreja. Fonte: BBLIA de Jerusalm. So Paulo: Pau-lus. 20o3, p. 13.)

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  • mente com Watab, que percebia agora com maior facilidade a tela mental de Anton ao compartilhar com ambos suas preocupaes. 0 momento che-gara. Alguns acontecimentos j estavam em an-damento e ele tinha a certeza de que os altos re-presentantes do governo do mundo j tomavam as medidas iniciais que compunham os planos para grande virada. O mundo deveria se preparar ur-gentemente.

    Surpreendendo Watab com um questiona-mento, Anton mudou bruscamente a direo dos pensamentos:

    Tem notcias dos nossos agentes no Brasil? perguntou o guardio.

    Quase assustado pela reviravolta repentina, Watab respondeu meio lentamente:

    Bem, vejamos... Pessoalmente tenho acom-panhado alguns agentes nossos, no entanto no creio que a situao to promissora. Noto com pesar que alguns tm se enredado numa ferrenha competio com outros que deveriam ser apenas seus aliados. No h dilogo entre aqueles que de-veriam estar mais unidos como parceiros. Alguns querem a todo custo ser reconhecidos, alcanar a to sonhada popularidade ou, curiosamente, ele-var-se na condio de missionrios. Infelizmente, temos de contar com o orgulho humano, o apetite

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  • por aplauso e reconhecimento e a competio que veladamente toma conta da mente de alguns. H um caso particular em que um dos nossos agen-tes, em vez de deixar-se levar pela intuio de seus mentores, vem tentando copiar o modelo de tra-balho de outro, somente porque enxerga suces-so na tarefa que este desempenha. Entretanto, medida que persegue o estilo ou procura adotar o mapa de ao do companheiro, afasta-se gradati-vamente das fontes de inspirao superior que de-veriam lhe marcar a trajetria espiritual.

    Temos, ento, de recorrer a agentes no ortodoxos, a pessoas de boa vontade que estejam em sintonia com o objetivo dos Imortais. Lamen-tavelmente, a histria se repete, uma vez mais acrescentou Jamar, um tanto cabisbaixo ao escu-tar o amigo, decerto porque ele mesmo j havia observado tais fatos e constatado sua realidade.

    Rompendo os pensamentos que ameaavam esmorecer a equipe, Anton alterou rapidamente o rumo das conversaes:

    Vamos nos ater ao que se passa nas dimen-ses inferiores. necessria toda a ateno po-ltica adotada pelos representantes das sombras, a fim de dar cincia aos nossos parceiros encarna-dos acerca dos mtodos usados pelos sistemas de poder inferior.

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  • E, antes de tomar a deciso de partir dali, An-ton acrescentou:

    hora de provar a f e a dedicao de al-guns de nossos agentes. Acontecimentos impor-tantes definiro o papel daqueles que dizem estar do lado do Cordeiro. Vejamos como reagiro ao fogo das provaes...

    Dizendo isso, voltou-se para Ramn e pe-diu mais detalhes a respeito das questes gove-namentais que envolviam certos paises do mun-do. Logo aps concluir a audio do relatrio, que trouxe novas preocupaes aos guardies, Anton elevou-se ao alto, na companhia dos demais.

    Do O U T R O L A D O DO M U N D O e numa dimen-so diferente, concomitante aos acontecimentos, fatos interessantes se passavam. O esprito es-pio estava de p sobre o brao direito do Cristo Redentor. Indignado, olhava a cidade abaixo de si com uma expresso melanclica, quase depri-mido, no fosse o dio que emanava de dentro de si naquele momento. Deslizou pelo monumento como se estivesse escorregando em algum tipo de graxa ou elemento oleoso, derrapando aqui e ali, at que, depois de muito choramingar, foi parar numa viela qualquer da cidade. Buscava refugiar-se da perseguio implacvel que sofria, levada a

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  • cabo pelo poderoso guardio. Espcie de forte ou base de apoio de certa faco do abismo ali se fi-xara, dominando boa parcela da paisagem extraf-sica da Cidade Maravilhosa.

    O esprito imundo agora estava ancorado so-bre um lugar cujas emanaes txicas exalavam odor ftido, nauseabundo. Observava raivoso os veculos que desfilavam morro abaixo; alguns po-liciais desciam em perseguio a qualquer ban-dido imbudo da disputa por uma fatia do poder naquela comunidade. O ser estranho parecia um monturo de sujeira humana; refletia, em sua apa-rncia quase material, ou melhor, semimaterial, inmeras marcas de batalhas perdidas ou de con-frontos com os odiosos filhos do Cordeiro.

    Desgraados! pensou, rememorando os ltimos acontecimentos, quando pretendeu tirar a vida de um dos representantes da poltica divi-na, em atividade noutra metrpole brasileira, na ocasio. Na tentativa frustrada de provocar o de-sencarne prematuro do agente da justia supe-rior, enfrentara diretamente um dos poderosos sentinelas, que era um dos responsveis pela se-gurana energtica e espiritual do sujeito. A per-seguio foi inevitvel, mas no havia pensado que o tal perseguidor fosse um anjo, um mensa-geiro de fora to superior e olhar to penetrante

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  • quanto sua aparncia refletia. Correra como nun-ca, arrastara-se e, de lance em lance, finalmente conseguiu chegar a este lugar, seguindo o rastro magntico que deixara, prevenindo algo seme-lhante, embora no to assustador como fora a ex-perincia com o guardio.

    Outros espritos imundos, de aura negra, compunham seu cortejo, porm permaneceram nas encostas do morro, escondidos em algum in-ferninho, agitados diante de qualquer movimento suspeito, pois temiam que a perseguio no hou-vesse se encerrado. Formavam um grupo hetero-gneo de espritos vndalos, assassinos e vis, re-pentinamente reduzidos metade de seu nme-ro, imensamente revoltados com sua derrota e o resultado miservel que obtiveram. 0 medo fazia parte desse concerto de emoes desequilibradas. Medo do futuro, medo da reao dos seus superio-res em hierarquia, no submundo; medo, enfim, porque, embora fossem apenas um bando desor-deiro, estavam a servio dos temveis dominado-res do abismo. Tinham certeza de que os sobera-nos no seriam to condescendentes como fora o representante do Cordeiro, o chefe dos guardies. Era uma derrota; terrvel e implacvel derrota exatamente durante uma das mais importantes investidas confiadas a si e a seus camaradas.

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  • Em desespero, continuava a revoada de pen-samentos:

    Tudo est perdido! Nossa misso falhou, comprometi nossa posio... Meus mais eficien-tes colaboradores se foram, capturados pelos sentinelas que acompanhavam o odioso filho do Cordeiro. A esta altura, por certo foram conquis-tados, encerrados em algum lugar ao qual no te-nho acesso. Est tudo perdido, perdido, perdido! gritou, finalmente.

    Um forte bofeto fez com que o esprito rodo-piasse, sem se dar conta do que ocorria. Sua cabe-a deu reviravoltas no ar, dando impresso de que o restante do corpo semimaterial seguia a cabea, que recebera o golpe quem sabe? , desferido na tentativa de arranc-la do pescoo esqueltico.

    Deixe de reclamaes, seu miservel! In-competente! Voc me causa repulsa; uma lsti-ma para nossa organizao.

    Mas, comandante, o senhor no viu de per-to o que ocorreu. Deparei com um dos poderosos!

    Rascai, o espirito que governava a cidade do alto de um dos seus morros, lembrava a figura de um animal escamoso, com uma cabeleira solta sobre os ombros, na tentativa infrutfera de imi-tar os soberanos. Olhos injetados de vermelho, e a pele, mais amarela do que branca, como se fu-

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  • maa de cigarros a tivesse manchado por inteiro. Globos oculares pronunciados, que lhe conferiam aspecto ainda mais degradante, pareciam revo-lucionar-se em sua rbita, inquietos, indo de um lado a outro, talvez como sintoma de sua ansie-dade. No era loucura; apenas inquietao. Uma alma atormentada, dileto representante de outros seres mais truculentos, mais atormentados ainda, de comportamento insalubre.

    Indignado pelo bofeto que recebera de seu imediato, o lder do bando estava tambm frus-trado, amedrontado.

    Voc se demonstrou incapaz de cumprir as ordens que lhe transmiti, seu incompetente! Voc no somente um miservel do escalo in-ferior, como tambm me comprometeu a posi-o diante de nossos soberanos.

    0 esprito ensaiava uma objeo. Se tivesse cumprido sua tarefa, com certeza

    seria convocado para a reunio dos representan-tes do poder. Estaria agora entre os comandantes da desordem!

    Eu falhei, meu senhor! 0 comandante bufava ao represar o dio. Se

    pudesse, mataria ali mesmo o infame e desafor-tunado servial. Mas ele j era morto; no saberia como lan-lo escurido mais profunda do que

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  • sua prpria alma j se encontrava. Tentou avaliar a situao, mensurar as implicaes da derrota causada pelo maldito guardio, que representava a politica superior.

    Rascai procurou ser imparcial em suas ob-servaes, avaliar, quem sabe objetivamente, a derrocada de seus enviados.

    No precisava de muita especialidade para promover a morte do filho do Cordeiro. Uma guarnio era suficiente, se equipada com recur-sos modernos. Estou certo que fizeram o poss-vel, foram valentes, claro, mas... Fato que no sabamos que o agente encarnado era protegido assim, to diretamente, pelos mensageiros celes-tiais. Eles so mais poderosos, tm mais recursos, so avanados em sua tcnica. Isso, nem mesmo eu poderia imaginar. Subestimamos muito a fora e o significado do trabalho que o agente encarna-do representa.

    Entre resmungo e jura de vingana, concluiu dizendo, em volume menor, por entre os dentes:

    0 poderio dos infames guardies vai muito alm do nosso.

    Rascai voltou-se, de maneira a impor medo ou pavor ao esprito que mandara como repre-sentante seu. Fixou os olhos do infeliz, odiando-o profundamente, mas no fundo, no fundo, saben-

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  • do claramente que o miservel no tinha como enfrentar o odioso chefe do comando celestial. S teve como correr, fugir espavorido. Nada mais. Seu dio beirava a loucura. Mas ele era mais astu-to do que aquele dbil que enviara.

    Por certo o guardio no o deixou escapar sem motivo. Conhecendo pelo menos um pou-co da poltica do Cordeiro, posso imaginar que ele queria que voc nos trouxesse algum recado, alguma mensagem, que seja, com a sua derrota desgraada.

    Bem, meu comandante supremo, na ver-dade, o chefe dos exrcitos celestes me pediu que transmitisse algumas palavras queles que domi-nam o abismo.

    Ele lhe pediu?! Bem, podemos interpretar assim, meu se-

    nhor choramingou o miservel esprito das profundezas. Na verdade, ele falou algumas pa-lavras cujo significado no entendi muito bem. Pensei que fosse uma ameaa que sairia de sua boca, mas o que disse...

    Fale logo, esprito da misria... ... prosseguiu cabisbaixo, ainda com

    medo de uma provvel reprimenda, que, naquela circunstncia, no seria nada singela. 0 guar-dio pediu para dizer aos nossos chefes supremos

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  • que o tempo estava acabando. Pronunciou exata-mente estas palavras: "Volte e fale para seus che-fes que estamos a caminho. Nada, nenhum poder das profundezas nos deter, pois somos envia-dos da justia suprema, e o que tiver de vir, vir. E no tardar!... O juzo 7 chegado. V e fale aos comandantes das hostes do abismo que os tempos so chegados".

    Rascal caminhou de um lado para outro irre-quieto, tentando abarcar a extenso das palavras proferidas pelo guardio.

    7 Livros h que examinam o problema dos juzos peridicos (PI-NHEIRO, Robson. Pelo esprito Alex Zarth. Gestao da Terra.

    Contagem: Casa dos Espritos, 2 0 0 2 ) , e em Kardec est o ponto

    de partida, como se pode ver nesta concluso: "Segundo essa in-

    terpretao, no exata a qualificao de juzo final, pois que os Espritos passam por anlogas fieiras a cada renovao dos mun-

    dos por eles habitados, at que atinjam certo grau de perfeio. No h, portanto, juzo final propriamente dito, mas juzos gerais em todas as pocas de renovao parcial ou total da populao dos

    mundos, por efeito das quais se operam as grandes emigraes e

    imigraes de Espritos" (KARDEC, Allan. A gnese, os milagres e as predies segundo o espiritismo. 1a ed. esp. Rio de Janeiro: FEB, 2005,

    cap. 17, p. 507. Recomenda-se a leitura dos itens 47 a 67 nesse ca-

    ptulo, assim como o cap. 18, nos quais h ttulos como "Segundo

    advento do Cristo", "Juzo final" e "So chegados os tempos").

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  • Existe algo de anormal ocorrendo e que ig-noramos moveu-se lentamente. Colocamos em prtica uma parte do plano dos nossos sobe-ranos