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Rui Barbosa Encontra-se na Codificação Kardequiana este grande ensinamento: «O trabalho impõe - se ao homem, por ser uma conseqüência de sua natureza corpórea. É expiação e, ao mesmo tempo, meio de aperfeiçoamento da sua inteligência. Sem o trabalho, o homem permaneceria sempre na infância, quanto à inteligência. Por isso é que seu alimento, sua segurança e seu bem-estar dependem do seu trabalho e da sua atividade.» Os Espíritos, por meio de seus comunicados, não se cansam de advertir-nos, sob as mais variadas formas, o grande valor do trabalho. Ele «é a escada divina de acesso aos lauréis imarcescíveis do espírito». «O que o homem não deve esquecer, em todos os sentidos e circunstâncias da vida, é a prece do trabalho e da dedicação, no santuário da existência de lutas purificadoras, porque Jesus abençoará as suas realizações de esforço sincero». «Não olvidemos que Jesus passou entre nós, trabalhando.» Rui Barbosa, bem podemos dizer, passou toda a sua vida orando, por meio do trabalho profícuo, patriótico e humano! Seu cérebro, como foi dito, era uma verdadeira máquina a serviço da Humanidade. Tinha uma concepção, acerca dos ensinamentos de Jesus, que transcendia às interpretações rasteiras, tendenciosas dos pseudo representantes do Cristo na Terra, desses homens que, ainda hoje, julgam necessária a implantação, em nossa pátria, da pena de morte, como se ela não fôsse uma aberração em face do pensamento cristão! Apreciemos, por exemplo, este belo trecho em que Rui bem sintetiza o perfeito entrelaçamento da oração com o trabalho: «Oração e trabalho são os recursos mais poderosos na criação moral do homem. A oração é o íntimo sublimar- se d'alma pelo contacto com Deus. O trabalho é o interior, o desenvolver, o apurar das energias do corpo e do espírito, mediante a ação contínua de cada um sobre si mesmo e sobre o mundo onde labutamos. O indivíduo que trabalha acerca-se continuamente do Autor de todas as coisas, tomando na sua obra uma parte, de que depende também a dele. O Criador começa e a criatura acaba a criação de si própria.» A Codificação Kardequiana também afirma que «constranger os homens a procederem em desacordo com o seu modo de pensar, é fazê-I os hipócritas. A liberdade de consciência é um dos caracteres da verdadeira civilização e do progresso», e mais ainda: «toda crença é respeitável, quando sincera e conducente à prática do bem».

Rui Barbosa

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Vida e obra visando as reflexões espirituais de Rui Barbosa

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  • Rui Barbosa

    Encontra-se na Codificao Kardequiana este grande ensinamento: O trabalho impe

    - se ao homem, por ser uma conseqncia de sua natureza corprea. expiao e, ao mesmo

    tempo, meio de aperfeioamento da sua inteligncia. Sem o trabalho, o homem permaneceria

    sempre na infncia, quanto inteligncia. Por isso que seu alimento, sua segurana e seu

    bem-estar dependem do seu trabalho e da sua atividade.

    Os Espritos, por meio de seus comunicados, no se cansam de advertir-nos, sob as

    mais variadas formas, o grande valor do trabalho. Ele a escada divina de acesso aos lauris

    imarcescveis do esprito.

    O que o homem no deve esquecer, em todos os sentidos e circunstncias da vida,

    a prece do trabalho e da dedicao, no santurio da existncia de lutas purificadoras, porque

    Jesus abenoar as suas realizaes de esforo sincero.

    No olvidemos que Jesus passou entre ns, trabalhando.

    Rui Barbosa, bem podemos dizer, passou toda a sua vida orando, por meio do trabalho

    profcuo, patritico e humano! Seu crebro, como foi dito, era uma verdadeira mquina a

    servio da Humanidade. Tinha uma concepo, acerca dos ensinamentos de Jesus, que

    transcendia s interpretaes rasteiras, tendenciosas dos pseudo representantes do Cristo na

    Terra, desses homens que, ainda hoje, julgam necessria a implantao, em nossa ptria, da

    pena de morte, como se ela no fsse uma aberrao em face do pensamento cristo!

    Apreciemos, por exemplo, este belo trecho em que Rui bem sintetiza o perfeito

    entrelaamento da orao com o trabalho:

    Orao e trabalho so os recursos mais poderosos na criao moral do homem. A

    orao o ntimo sublimar- se d'alma pelo contacto com Deus. O trabalho o interior, o

    desenvolver, o apurar das energias do corpo e do esprito, mediante a ao contnua de cada

    um sobre si mesmo e sobre o mundo onde labutamos. O indivduo que trabalha acerca-se

    continuamente do Autor de todas as coisas, tomando na sua obra uma parte, de que depende

    tambm a dele. O Criador comea e a criatura acaba a criao de si prpria.

    A Codificao Kardequiana tambm afirma que constranger os homens a procederem em

    desacordo com o seu modo de pensar, faz-I os hipcritas. A liberdade de conscincia um

    dos caracteres da verdadeira civilizao e do progresso, e mais ainda: toda crena

    respeitvel, quando sincera e conducente prtica do bem.

  • Convenhamos que a guia de Haia, cujo esprito voejava muito acima das ideias

    ultramontanas, dizia abertamente que de todas as liberdades sociais, nenhuma era to

    congenial ao homem, e to nobre, e to frutificadora, e to civilizadora, e to pacfica, e to

    filha do Evangelho, como a liberdade religiosa.

    Por pensar assim, de maneira to similar com o ponto de vista da Terceira Revelao, e

    como no podia, de maneira alguma, permitir que sua conscincia fsse cerceada na liberdade

    de apontar onde estava a verdade e onde se encontrava o erro, foi constantemente acusado

    de materialista e ateu, como se tal coisa fsse possvel admitir-se, quando seus atos e suas

    atitudes foram sempre as de um homem profundamente espiritualizado.

    Nesta oportunidade, estas suas palavras so uma vibrante confirmao do que

    acabamos de dizer: A minha reputao de incredulidade, materialismo e atesmo nasceu da

    especulao maligna de adversrios sem escrpulos, em questes onde a minha atitude era

    justamente o penhor mais claro da seriedade das minhas crenas morais. Foi por ser um

    esprito religioso que,em 1875, como presidente do Conservatrio Dramtico

    Na Bahia, levantei contra mim as iras da ortodoxia oficial, pronunciando-me pela

    representao dos Jesutas, de A. Enes; que, ento como antes, como depois do Dirio da

    Bahia, nas conferncias do Vale dos Beneditinos e na Cmara dos Deputados tive a honra de

    ser um dos advogados mais antigos, ardentes e tenazes da liberdade de cultos; que, em 1877,

    apoiando-me nas autoridades mais insignes da teologia alem, defendi, no O Papa e o

    Conclio, a verdade crist contra a infalibilidade papal.

    A explorao eleitoral truncou e falsificou os meus escritos. O plpito ressoou, nos

    sertes e nas cidades, sob as apstrofes mais violentas e as histrias inverossmeis contra o

    meu nome.

    Rui Barbosa um exemplo vivo da tese reencarnacionista, um caso tpico desse

    fenmeno, se assim nos podemos expressar, a que ns espritas chamamos reminiscncias, e

    mais ainda, em muitas oportunidades, por meio das antenas medinicas, recebia ele a

    inspirao necessria, para a defesa das incumbncias que lhe estavam afetas.

    Quando criana, aprendera, em quinze dias, a anlise gramatical e a conjugar todos os

    verbos regulares.

    Recitava, para seu pai, versos de Cames e longos trechos dos sermes do Padre

    Antnio Vieira, aps simples leitura. O que lhe ensinavam, aprendia com incrvel facilidade, e

  • sozinho, qual autodidata, aprendia muitas coisas que um menino normal s com dificuldade

    conseguiria aprender, e isto mesmo desde que auxiliado por professores.

    A vida de Rui foi, indiscutivelmente, um modelo de fora de vontade.

    Teve, desde seus primeiros anos, de lutar com a falta de recursos; a enfermidade o

    castigava bastante, e como se isso no fsse o suficiente, tambm a indiferena e a m

    vontade de muitos. Mas, a verdade que o Esprito do Patriarca Jos Borrifcio, com nova

    roupagem carnal, ao voltar Terra, para desempenho de grande misso, tomou o nome de Rui

    Barbosa!

    E veio com esta forte couraa, por ele mesmo forjada e que lhe facultou enfrentar

    todas as perseguies e injustias, razo por que, por um momento sequer, pensou em

    interromper a sua marcha gloriosa!

    Rui, com seu prprio punho, fz o seu retrato, quando disse: Criatura deserdada pela

    Natureza, dos predicados com que se exerce a seduo de homem a homem, talvez no mal

    encarado em moo, mas hoje em dia aguarentado pelos anos, cara de poucos amigos, boca de

    raros sorrisos e, por, sobretudo, ao que me dizem todos Os dias, velho e revelho.

    Em virtude desse seu fsico raqutico, no causou boa impresso, como Embaixador

    Especial do Brasil, na Segunda Conferncia Internacional da Paz, em Haia, no ano de 1907.

    Seus longos discursos, cheios: de profunda erudio, no eram ouvidos com a devida

    ateno. Nessas oportunidades, e para que apreciemos como a fora rememorativa de vidas

    passadas nele se manifestava com toda a pujana, basta citemos o fato de ele indagar, de seus

    colegas, qual o idioma em que desejavam proferisse seus discursos.

    Agora vamos apreciar como sua faculdade medinica se manifestava sempre que seus

    amigos do Espao notavam que ele carecia de auxlio imediato.

    Quando da sesso, em Haia, ento presidida pelo Sr. Mar tens, que ouvira, com mau

    humor, o discurso pronunciado sobre presas martimas, Martens declarou, em tom de

    censura:

    - O memorial do nobre Embaixador do Brasil constar dos processos verbais das

    nossas sesses; devo, porm, observar-lhe que a poltica no da alada da Conferncia.

    E Silo Gonalves, a esse respeito, escreveu: A assemblia aplaudiu: afinal era preciso

    fazer calar aquele erudito loquaz que assombraria o mundo com o seu saber imenso.

  • Chegara para Rui o instante decisivo. Inopinadamente ele se ps de p, com visvel

    emoo, pediu a palavra: as guas h muito contidas iam romper o dique na Holanda. A guia

    sentia-se ferida. A erupo veio. Como tigre provocado, reagiu.

    O prprio Rui, explicando o porqu dessa sua inesperada iniciativa, cujo improviso foi

    feito em francs fluente e escorreito, disse: As foras, a coragem, a resoluo me vieram no

    sei de onde (! ?), vi-me de p, com a palavra nos lbios.

    Pura e indiscutvel manifestao medinica.

    No obstante, como dissemos, ser tido na conta de ateu, incrdulo e materialista,

    convidaram-no para proferir uma conferncia em favor de cinqenta rfs do Asilo N. S. de

    Lourdes, da Feira de Sant'Ana.

    Dessa conferncia, extramos os seguintes trechos que bem falam das suas convices

    religiosas, da sua independncia e do seu idealismo: Diante da criana que me pedia, em

    nome da caridade, uma conferncia popular em benefcio de um asilo de rfs, no me julguei

    com o direito de pesar as minhas foras, e muito menos de examinar, luz de minhas ideias

    particulares, a consagrao religiosa, sob que esse Instituto pio se mantm.

    To-pouco devia subordinar o meu assentimento a, exigncias de uniformidade entre

    a minha crena e a daqueles que me estendiam a mo pelos pequeninos necessitados.

    Posso no crer em Lourdes; mas Lourdes no me separa da Humanidade.

    Nessa mesma conferncia ele deu a conhecer a smula de sua religio, bastando,

    apenas, citemos os trechos que se seguem, para realar a sua perfeita identidade de vistas

    com o que prega o Espiritismo: ... religio, no sepultada no mistrio de uma lngua morta;

    no a desses pseudo-apstolos do paganismo infantilista, caluniadores do Evangelho,

    pregadores hipcritas e mentirosos da opresso sacerdotal, com a boca cheia de Deus e a

    conscincia cauterizada de interesses mundanos; no a das diatribes no plpito, na imprensa,

    nas pastorais, nas letras apostlicas; no a do dio, da ciso entre os homens, da

    desconfiana no lar domstico, da separao entre os mortos, do privilgio, do

    amordaamento das almas, da tortura, da ignorncia, da indigncia no esprito e no corpo, do

    cativeiro moral e social; mas a do homem novo, nascido sob a cruz; do esprito que vivifica,

    e no da letra que mata; da comunicao interior entre o corao e Deus; da caridade

    brandura para com todos os homens; religio de luz,que se alimenta de luz, e que na luz se

    desenvolve; religio cujo pontfice o Cristo, religio de igualdade, fraternidade, justia e paz;

  • religio em cujas entranhas se formou a Civilizao moderna, em cujos seios sugou o leite de

    suas liberdades e de suas instituies, e a cuja sombra amadurecer e frutificar a sua

    virilidade; religio de tudo quanto o ultramontanismo nega, amaldioa e inferna. Por ela o

    altar algum dia, e no longe, no ser mais uma especulao; por ela as conscincias no tero

    mais contas que dar de si seno ao Onipotente; por ela todas as crenas sero iguais perante a

    lei, todas as convices igualmente respeitveis perante os homens.

    Em que pese ao Vaticano, aos partidos reatores, s transaes polticas e s realezas

    impopulares!

    So eloqentes as palavras de Rui, a seguir transcritas, contidas no discurso que

    proferiu, em nome da Academia de Letras, quando do saimento do atade de Machado de

    Assis, do Silogeu: Mestre e companheiro, disse eu que nos amos despedir.

    Mas disse mal. A morte no extingue: transforma; no aniquila: renova; no divorcia:

    aproxima.

    Reformador, em seu nmero de Abril de 1951, transcreve um artigo intitulado Rui,

    um Universo, publicado na Revista Brasileira de. Panificao, e que,.

    data vnia, reproduziremos aqui:

    "Na imensa comemorao de Rui Barbosa, toda a sua vida pblica e particular foi

    examinada e aclamada a sua figura apostolar do Direito. Nenhum detalhe do seu talento

    deixou de ser examinado. Rui estudante, sabendo aos cinco anos de idade conjugar todos os

    verbos regulares; Rui sem idade para matricular-se na Faculdade, dedicando-se, durante um

    ano, ao estudo do alemo; Rui, orador desde moo; escritor primoroso, enriquecendo a lngua

    portuguesa; advogado de todos os perseguidos, jornalista insigne, parlamentar, diplomata,

    internacionalista; Rui, poeta, religioso e crente no Espiritismo, e Rui com conhecimentos de

    Medicina. Espanta realmente caber numa cabea tanta inteligncia e num corao tanta

    bondade!

    Falaram do seu amor s rezas, mas nada disseram do seu interesse pela pintura e pela

    msica.

    Na "Orao aos Moos", Rui falou nas relaes humanas com os nossos amigos de

    "alm-vida".

  • O Deputado Ataliba Nogueira, na conferncia feita sobre "Rui Barbosa em Campinas",

    publicada no "Jornal do Comrcio" de 8 de Novembro p. p ., contou o seguinte: Ainda na

    aprazvel estncia hidromineral, ocorreu fato curioso, recordado pelos ntimos com certo

    acento de graa. Estava em voga, quele tempo, uma espcie de distrao noite, de modo

    algum consoante com as leis religiosas, porm que as senhoras praticavam como se fsse

    inocente jogo de damas. Consistia em colocar sobre uma mesinha de trs ps um grande

    crculo de papelo com as letras do alfabeto escritas, uma a uma, em recorte dentado. Lama,

    rsula, Carlota, Baby Rui.

    Barbosa e a filha dum redator do "Jornal do Comrcio", do Rio, sentavam-se em redor

    da mesa e colocavam a ponta dos dedos sobre um clice que, por ao misteriosa - segundo

    diziam - parava ante esta e aquela.

    letra. Algum ia anotando as letras num papel. Formavam-se, assim, palavras e frases,

    vidamente lidas;pelos circunstantes. Resta lembrar que tudo correspondia

    s perguntas formuladas por alguma das moas presentes, quase todas versando sobre

    qual delas se casaria primeiro, as iniciais do noivo, seus traos fisionmicos, se era louro ou

    moreno, se era solteiro ou vivo, fazendeiro ou no. No geral as respostas no provocavam

    mais que risos, gargalhadas e comentrios alegres.

    Certa noite, porm, Batista Pereira, que assistia "sesso", de p, disse que o clice

    estava denotando alguma inquietao, manifestando com isto ter que revelar algum segredo.

    Sentou-se mesa e tambm colocou a ponta do dedo sobre o clice de cristal, o qual, de

    maneira rpida, comeou a percorrer o alfabeto, com algo de nervosismo por parte das moas

    e senhoras que participavam da operao. Ao lado, outra moa apontava letra por letra,

    dizendo nada entender, porm vrias vezes havia o nome de Rui, no apanhado grfico.

    O Conselheiro j se havia recolhido muito cedo, feita a leitura dos jornais de So Paulo,

    que chegavam aps o jantar.

    Terminado o escrito, verificou-se que era uma mensagem em ingls, dirigi da por

    algum "Esprito" ao ilustre hspede _ Ficaram todos estarrecidos e, diante da indeciso geral,

    Batista Pereira opinou que deviam lev-la incontinenti j Rui. Batem porta, o Conselheiro de

    pijama recebe o papel e fica emocionado: _ E' o estilo dele, o estilo perfeito. E o assunto!

    0 mesmo que conversamos em nossa despedida em Haia.

  • Mas, possvel. . Trata-se de William Stead - explica Rui -, o meu amigo e grande

    jornalista ingls, cuja morte os peridicos noticiam, hoje, no afundamento do "Titanic". E ele

    acreditava nestas histrias de Espiritismo!

    E, para finalizarmos, oferecemos aos nossos leitores a perorao de um discurso

    proferido, em 1930, por esse gigante da inteligncia, pelo trabalho e pelo ideal que acalentou

    seu Esprito: Deus, que me infundistes o amor da beleza, da verdade e da justia; que povoais

    da vossa presena as minhas horas de arrependimento, de perdo e de segurana na vossa

    misericrdia; que h dezenas de anos me descobris os meus erros, me reergueis dos meus

    desalentos, me conduzis pelo vosso caminho: dai-me, agora mais do que nunca, o nimo de

    no mentir aos meus semelhantes, de me no corromper nos meus interesses, de no temer

    ameaas, no me irritar de injrias, no fugir a responsabilidades. Se a merc da salvao da

    nossa honra, postas nas vossas mos onipotentes, exigir o sacrifcio de um em satisfao das

    culpas de todos, no vos detenha, Senhor, a misria do resto dos meus dias, cansados e

    inteis. Mas no permitais que as maquinaes do egosmo de alguns prevaleam ao bem de

    um povo inteiro, que a barbaria senhoreie de novo a nossa Ptria, que os semeadores de

    violncias e desunio vejam prosperar outra vez a sua funesta sementeira nas regies

    benditas, sobre cujos cus acendestes a constelao da Vossa Cruz.

    Velho Esprito, com muitas encarnaes em vrios pases da Europa, nas quais se

    salientou pela sua coragem moral e independncia de pensar e de sentir, empolgou- se com o

    surgimento de uma nova nao do Continente americano, fadado a ser o bero de uma

    civilizao amante da liberdade, e que, no futuro, dominaria o mundo como a ptria do

    Evangelho em esprita e verdade, onde a prepotncia, o imperialismo, a explorao do homem

    pelo homem no conseguiriam florescer; desejou, por isso e ardentemente, reencarnar nesse

    pas, que seria o corao do Mundo - o Brasil -, a fim de dedicar toda a sua experincia, o seu

    esforo, a sua inteligncia e o seu grande ideal de liberdade na construo dessa nova

    civilizao crist.

    E a Providncia Divina houve por bem conceder-lhe a graa de seu Esprito reencarnar

    em terras de Santa Cruz, com o nome de Jos Bonifcio de Andrada e Silva, de autoridade

    incontestvel, possuidor de largo esprito de conciliao e de um desprendimento sem igual.

    Jos Bonifcio, segundo o testemunho insuspeito dos historiadores, conhecia muitas

    lnguas e falava seis ou sete. Foi poeta, sbio, poltico, patriota. Sua vida foi repleta de

    pensamentos, palavras e obras.

  • Desencarnou Jos Bonifcio em 1838 e, dez anos aps, em 1849, seu Esprito voltava

    Terra, ento com o nome de Rui Barbosa.

    Por esse simples relato, podemos bem compreender, e avaliar o porqu de sua

    genialidade, da facilidade assombrosa com que se expressava corretamente em vrios

    idiomas. Reminiscncias de seus conhecimentos hauridos em vidas outras.

    Foi um Esprito que muito amou o Brasil e por ele trabalhou heroicamente, embora

    no fsse bem compreendido nessas duas encarnaes, em virtude da sua largueza de vistas e

    de seu inquebrantvel idealismo, porque, como disse ele, em discurso pronunciado na colao

    de grau de bacharis em Cincias e Letras do Colgio Anchieta, de Nova Friburgo, o ideal no

    se define; enxerga-se por clareiras que do para o Infinito: o amor abnegado; a f crist; o

    sacrifcio pelos interesses superiores da Humanidade; a compreenso da vida no plano divino

    da virtude; tudo o que alheia o homem da prpria individualidade, e o eleva, o multiplica, o

    agiganta, por uma contemplao pura, uma resoluo herica ou uma aspirao sublime.

    Disse o Cristo que o homem no vive s de po; porque vive do po e do ideal. O po

    do ventre, centro da vida orgnica. O ideal o esprito, rgo da vida eterna. Entendei, como

    quiserdes, a eternidade e a espiritualidade.

    Seu Esprito, em magnfica comunicao intitulada Orao ao Brasil, por meio da

    mediunidade de Francisco Cndido Xavier, e contida no livro Falando Terra, manifesta

    ainda seu idealismo e grande amor Ptria do Cruzeiro do Sul, em cuja mensagem se refere

    sua anterior encarnao no Brasil.

    No nos podemos furtar ao impulso de transcrever as palavras finais dessa sua orao:

    Grande Brasil! Bero de triunfos esplndidos, aberto glorificao do Cristo, seja Ele a tua

    inspirao redentora, o teu apoio infalvel, a trave-mestra de tua segurana; e, enaltecendo o

    messianismo do teu povo fraterno, em cujo seio generoso se extinguem todos os dios de raa

    e se expungem todas as fronteiras do separatismo destruidor, que o Mestre encontre no

    mago de teu corao o sagrado pois o das Boas Novas de Salvao, descendo, enfim, da cruz

    de nossa impenitncia multissecular para conviver com a Humanidade terrestre, para

    sempre.

    Fonte: Grandes vultos da humanidade e o espiritismo.