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S U M Á R I O. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . · 2017-12-06 · das relações interpessoais de afetividade em sala de aula, ... concepção do termo é resultado de uma

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. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . S U M Á R I O. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . APRENDIZAGEM E METODOLOGIAS EM RELAÇÃO AOS

SUJEITOS COM ALTAS HABILIDADES/ SUPERDOTADOS

INTRODUÇÃO............................................................................................ 04

1 CAPÍTULO 1 - CONSTRUÇÃO DE PRÁTICAS EDUCAIONAIS: PRIMEIRAS PALAVRAS AOS PROFESSORES...................................... 07

2 CAPÍTULO 2 - APRENDIZAGEM E METODOLOGIAS: ATIVIDADES DE ESTIMULOS AOS ALUNOS................................................................ 15

3 CAPÍTULO 3 - ALUNO E FAMÍLIA: A RELAÇÃO ESSENCIAL.............. 29

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................................................... 46

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PRECE NO LIMIAR

Senhor, no silêncio deste dia Que amanhece,

Venho pedir-te a paz, a sabedoria e a força.

Quero olhar hoje o mundo com os olhos cheios de amor;

ser paciente, compreensível, manso e prudente. Quero ver os meus irmãos

além das aparências; Quero vê-los como Tu mesmo os vês,

e assim não ver senão o bem em cada um. Cerra meus ouvidos a toda calúnia.

Guarda a minha língua de toda a maldade. Que só de bênçãos se encha o meu espírito.

Que eu seja tão bondoso e alegre, que todos quantos se achegarem a mim

sintam a tua presença. Reveste-me da tua graça, Senhor, e que no decurso deste dia eu não

te ofenda, e te revele a todos.

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INTRODUÇÃO

Visamos desenvolver com estas reflexões a capacidade de sentir, de compreender, de gerar insights, sobre a sociedade brasileira, dentro do desafio de (re) construí-las mais harmonizadas, equilibradas, igualitárias. É indispensável para o educador, psicólogo, médico etc., para o aluno, esta capacidade que nos leve a compreender1 – além de entender – a sociedade como um todo, constituída pela “soma” dos indivíduos, dos lares, pela formação das instituições, pela constituição do Estado.

Necessário perceber a panorâmica dos problemas atuais que estamos vivendo: desemprego, violência e criminalidade, poluição, falta de saúde, de educação, desigualdade social, falta de habitação, entre outros, onde o indivíduo é o epicentro.

A violência está crescendo a cada dia, principalmente nas grandes cidades brasileiras. Os crimes estão cada vez mais presentes no cotidiano das pessoas.

O problema ambiental tem afetado diretamente a saúde das pessoas em nosso país. Os rios estão sendo poluídos por lixo doméstico e industrial, trazendo doenças e afetando os ecossistemas. Lembremo-nos do caso de rompimento da barragem de rejeitos da mineradora Samarco, cujos donos são a Vale a anglo-australiana BHP, que causou uma enxurrada de lama que inundou várias casas no distrito de Bento Rodrigues, em Mariana, na Região Central de Minas Gerais, na tarde do dia 05.11.2015.

O ar, principalmente nas grandes cidades, está recendo toneladas de gases poluentes, derivados da queima de combustíveis fósseis.

Nos dias de hoje, pessoas que possuem uma condição financeira melhor estão procurando os planos de saúde e o sistema privado, pois a saúde pública encontra-se em estado de crise aguda. A disseminação do zika vírus e sua provável ligação com casos de microcefalia tornaram-se uma emergência de saúde pública internacional, declarou no dia 01.02.2016 a Organização Mundial da Saúde (OMS).

A educação pública encontra vários problemas e dificuldades: prédios mal conservados, falta de professores, poucos recursos didáticos, baixos salários, greves, violência dentro das escolas, entre outros.

O que fazer? Educar! Como? A construção da identidade pessoal é um processo de construção de

sujeito, enquanto pessoa, enquanto ser humano. O indivíduo forma-se a partir da educação recebida no Lar, por seus pais ou responsáveis. Desempenhará seus papéis sociais de forma competente, amável, responsável, em conformidade com os exemplos que receba no Lar, primeiramente. Este fato se consolida, principalmente, quando é ensinado a fazer constantes autoavaliações, num constante relacionamento saudável consigo mesmo.

A posteriori, virá a Escola e a Igreja. Estas duas Instituições formarão, respectivamente, a cidadania e religiosidade, isto é, a vivência das virtudes. Daí, a 1 Compreender, em sentido próprio, supõe algo mais do que o frio entendimento de uma mensagem objetiva: envolve, de algum modo, a captação de um alguém, um alguém vivo e concreto que expressou aquela mensagem. Nesses contextos, "compreender" não se deixa substituir por "entender", "conhecer" etc.

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concepção de sujeito humano como portador da capacidade de simbolizar, de representar, de criar e compartilhar significados em relação aos seres humanos e aos objetos com os quais convive.

Um dos vetores com enorme potencial transformador é a mídia. Então, como contribuir para um processo social educativo, no sentido de esclarecer os limites e possibilidades para o avanço das práticas pedagógicas, tendo como tema a influência da televisão (mídia mais usada) na vida do educando? Nada contra os programas televisivos, mas o FS, o SS, o BBB o que ensinam para uma vida saudável, com um bom gerenciamento das emoções, dos impulsos?

Nessa esteira que estamos, podemos citar, pelo menos, mais um vetor: a globalização.

O termo globalização aponta para duas imagens: a primeira pressupõe a extensão de uma determinada cultura até seu limite, o globo. Na segunda as culturas heterogêneas tornam-se incorporadas e integradas a uma cultura dominante, que acaba por cobrir o mundo inteiro. Coisas que eram mantidas separadas são agora colocadas em contato e em justaposição. As culturas se acumulam umas sobre as outras, se empilham, sem princípios óbvios de organização.

Esta definição nos garante que todos nós já estamos incluídos de algum modo em todos os espaços, inclusive num sistema de comunicação. No entanto, observamos que a discussão sobre o tema é acirrada, principalmente no meio intelectual brasileiro: quais diferenças terão permissão para permanecer nessa incorporação de culturas? Qual é o problema a ser observado se a globalização mescla mundo, mistura valores? Por que nos inquietarmos diante desse fenômeno e por que a exclusão fica tão evidente?

Se existe necessidade de falarmos sobre inclusão é porque estamos em dúvida sobre o conceito de pessoa humana. E se este conceito está sob suspeita é porque as formas de conhecimento de que dispomos estão desequilibradas em relação ao nosso modo de ser e de agir no cotidiano.

Diante desta realidade novas perguntas podem ser formuladas complementando as primeiras: o que está acontecendo com a pessoa humana e a consciência humana? Por que ela está confusa com relação às imagens da realidade? E que realidade é esta que nos invade, disfarçada, escondida em simbolismos dissimulados e manipuladores?

Essas inquietações nos atingem como profissionais da educação, da aprendizagem humana, da psicologia, da sociologia, da psicopedagogia, da neuropsicopedagogia, além de outros profissionais.

Durante o processo de desenvolvimento normal a identidade infantil vai se constituindo através das formas sociais que ela compreende e vivencia conforme são sintetizadas no mundo psíquico em desenvolvimento; o adolescente, na continuidade da vida infantil, integrará as imagens adequadamente; o adulto as disponibiliza em sistemas coerentes de valores no mundo do trabalho e das relações afetivas; o idoso torna-se generativo, íntegro e sábio.

A educação prioriza os aspectos cognitivos do aluno em detrimento de outros fatores também importantes para o processo educativo. Não devemos pensar apenas na cabeça do aluno, pois o coração também é importante. A inteligência emocional, não obstante Daniel Goleman trazer o excelente contributo no final da

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década de 90,2 está esquecida e a inteligência volitiva nem sequer é considerada. Ora não somente o pensar, mas também o sentir e o querer integram a inteligência.

Ora, ao examinarmos a Pedagogia do Afeto pensamos na designação das relações interpessoais de afetividade em sala de aula, fundamentada na Psicologia Transpessoal conhecida como a quarta força, oriunda dos estudos de Maslow, Sutich, Fadiman e Grof, muito embora Jung tenha sido o pioneiro a considerar a dimensão espiritual do ser humano.

Nessa linha é que se fundamenta esse modelo de ensino voltado para o ser, pela necessidade de se pensar nas mudanças que ocorrem na contemporaneidade no que tange à educação dos indivíduos.

Maturana3 define bem quando afirma que vivemos uma cultura na qual desvaloriza as emoções, e não vemos o entrelaçamento cotidiano entre razão e emoção, que constitui o viver humano, e não nos damos conta de que todo sistema racional tem um fundamento emocional.

A Pedagogia do Afeto pode complementar o trabalho da Psicopedagogia Preventiva, não só no seu objetivo de evitar dificuldades de aprendizagem, mas de otimizar relações humanas afetivas no ambiente escolar.

O hábito do estudo sistematizado, o domínio da interpretação através do mundo da leitura que nos leve a leitura do mundo, para que vivamos contextualizados, agindo com eficiência e competência, diante dos enfrentamentos necessários ao bom viver.

Refletindo sobre APRENDIZAGEM E METODOLOGIAS EM RELAÇÃO AOS SUJEITOS COM ALTAS HABILIDADES/SUPERDOTADOS, pensamos no ser humano baseado no seu potencial, para que as atitudes sociais sejam concretizadas na organização de serviços educacionais integrativos, transformando-nos em cidadãos críticos, criativos, responsáveis, fluindo uma vida social digna, saudável, feliz, portanto, cidadã.

Edgar Morin, filósofo contemporâneo, escreveu um lindo livro: Os sete saberes necessários à Educação do Futuro4, que visa uma educação construtiva da totalidade, para o ser humano integral e não apenas a um de seus componentes. Sete eixos/caminhos para uma construção educativa interdisciplinar, cidadã.

2 GOLEMAN, Daniel. Trabalhando com a inteligência emocional. Rio de Janeiro: Objetiva, 1999. 3 MATURANA, Humberto. Emoções e linguagem na educação e na política. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1998 4 MORIN, Edgar. Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro. 8ª ed. Editora Cortez. São Paulo, 2003.

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CAPÍTULO 1 CONSTRUÇÃO DE PRÁTICAS EDUCAIONAIS: PRIMEIRAS PALAVRAS AOS PROFESSORES

A proposta de atendimento educacional especializado para os alunos com altas habilidades/superdotação tem fundamento nos princípios filosóficos que embasam a educação inclusiva. Tem como objetivo formar professores e profissionais que identifiquem alunos com altas habilidades/superdotação, oportunizando a uma aprendizagem diferenciada e ampliando o atendimento, com vistas ao pleno desenvolvimento das potencialidades desses alunos.

Para subsidiar as ações voltadas para essa área e contribuir para a implantação, pensamos em procedimentos a serem construídos para atender às necessidades e interesses de todos os alunos, garantindo que tenham acesso a espaços destinados ao atendimento e desenvolvimento de sua aprendizagem.

Sabemos que os Estados dispõem, em consonância com o MEC, Núcleos organizados para atendimento às necessidades educacionais especiais dos alunos, oportunizando o aprendizado específico e estimulando suas potencialidades criativas e seu senso crítico, com espaço para apoio pedagógico aos professores e orientação às famílias de alunos com altas habilidades/superdotação.

Sabemos que a psicopedagogia surgiu da necessidade de compreensão do processo de aprendizagem, de caráter interdisciplinar, uma vez que possui seu próprio objeto. Sistematiza um corpo teórico, definindo seu objeto de estudo e delimitando seu campo de atuação.

A psicopedagogia deve trabalhar com a aprendizagem humana. O tema aprendizagem é bastante complexo e é de grande importância lembrar que a concepção do termo é resultado de uma visão de homem e, em razão disso, acontece à práxis psicopedagógica. Tem por objeto de estudo as características da aprendizagem humana, principalmente o aprendizado, bem como o "tratamento" e prevenção na possibilidade de não aprendizagem.

Na clínica, acontece a relação do sujeito com sua história pessoal e o tipo de aprendizagem que está construindo(?). Na prevenção são avaliados os procedimentos que interferem no processo de aprendizagem, observando-se as áreas: biológica – afetiva – intelectual.

Clinicamente, o psicopedagogo tem que compreender as teorias do conhecimento; quais os meios mais eficientes, eficazes e efetivos para que se efetue a relação ensino/aprendizagem.

A Neuropsicopedagogia é uma área de conhecimento e pesquisa na atuação interdisciplinar, voltada para os processos de ensino-aprendizagem, que integra avaliação e a intervenção em situações que envolvam esses processos no plano individual ou coletivo. Ela ainda é considerada uma práxis (prática fundamentada em referenciais teóricos) e não, necessariamente, uma ciência. Entende-se como área de estudo das neurociências na qual objetiva a análise dos processos cognitivos, emocionais e volitivos, dentro de um paradigma holístico/sistêmico.

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Observa-se, em nosso cenário uma maior conscientização da necessidade de se investir em programas para alunos com potencial elevado, disseminando informações a respeito de altas habilidades/superdotação e das condições que favorecem o seu reconhecimento, desenvolvimento e expressão.

Para isso, é essencial o investimento na formação de professores; o reconhecimento de que as necessidades do superdotado, a serem levadas em conta nas propostas educacionais, passam pelas áreas cognitiva, emocional, volitiva, acadêmica, afetiva e social; o estabelecimento de uma parceria produtiva entre família e escola; e a oferta de uma variedade de modalidades de atendimento a este aluno. Daí há necessidade de formar professores e outros profissionais na área de altas habilidades/superdotação, especialmente no que diz respeito a planejamento de ações, estratégias de ensino, métodos de pesquisa e recursos necessários para o atendimento. Oferecer oportunidades educacionais que atendam às necessidades acadêmicas, intelectuais, emocionais, volitivas, psicológicas e sociais, que promovam o desenvolvimento de habilidades de pensamento crítico, criativo e de pesquisa e cultivem seus interesses e habilidades; fornecer à família do aluno informação e orientação sobre altas habilidades/superdotação e formas de estimulação do potencial superior.

--- x --- Um pensamento de Maturama diz: "o conhecimento do conhecimento

compromete". Ora, será que nós neuropsicopedagogos (ou futuros) conhecendo melhor o modo como a criança e o adolescente conhecem a si mesmo e ao mundo, nos comprometemos com uma articulação aberta e envolvente, no processo educativo? Será que criamos situações favoráveis para que ele alcance uma maturidade integrada, feliz e criativa, para si e para a sociedade?

Diferentes conceitos, valores e costumes vividos neste início de século, exigem de nós uma visão crítica e flexível. Em épocas de grandes transformações como a que estamos atravessando, o binômio conservação x inovação, faz-se tão presente que se torna quase tangível. Frente às mudanças vertiginosas que assistimos e participamos, mais do que nunca a consciência da necessidade de conservar vivo o próprio eixo histórico-cultural não é só pensada, mas sentida. A existência humana é caracterizada por hábitos. Todo indivíduo que não os tem socialmente considerados bons, tem-nos maus.

O ato gera o hábito e este constitui uma diferente natureza que se incorpora à conduta. O hábito é responsável pelo caráter do ser humano, tomando-o digno ou vulgar, conforme a contextura emocional de que se reveste, porquanto os valores que exornam a personalidade definem-lhe a forma de ser.

A construção da identidade pessoal (natureza/conduta) é um processo de construção de sujeito, enquanto pessoa, enquanto ser humano. O indivíduo forma-se a partir da educação recebida no Lar, por seus pais ou responsáveis. Desempenhará seus papéis sociais de forma competente, amável, responsável, em conformidade com os exemplos que receba no Lar, primeiramente. Este fato se consolida, principalmente, quando é ensinado a fazer constantes autoavaliações, num constante relacionamento saudável consigo mesmo.

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Através dos hábitos são expressas as emoções e aspirações, geralmente estruturadas durante os doze primeiros anos de vida. As excelentes faculdades da alegria e do bem-viver são desenvolvidas/concretizadas quando vividas pela família no cotidiano.

Outros valores, como a fé, a esperança, a alegria, a honestidade, a confiança, os sentimentos que enriquecem a vida, serão vividos pela criança, pelo adolescente quando os pais desde os primeiros dias de vida da criança, multiplicam os exemplos (melhores instrumentos pedagógicos para o ensinar).

Os hábitos devem estruturar-se em comportamentos éticos, que vêm sendo desrespeitados, em face do afã de conseguir-se o triunfo, o sucesso de qualquer maneira, importando apenas alcançar-se o topo da aspiração, sem qualquer respeito pelos meios empregados.

O sucesso, no entanto, está muito longe de ser essa situação invejosa que se coloca na condição de alcançar-se o destaque, o comando, a posição relevante.

O sucesso real é aquele que se baseia nos padrões da consciência livre de conflitos, harmonizada com os ideais que são perseguidos. São eles que formam o caráter, ensejando os sentimentos adequados para a existência harmônica, rica de compensações emocionais e espirituais.

O hábito, portanto, de pensar e de agir corretamente, torna-se indispensável para uma existência digna. Decorrente dele, a ação da gratidão assume postura compatível com as conquistas logradas, ensejando novos horizontes a serem alcançados.

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Entretanto, como ponto de partida, é relevante apontar o reconhecimento crescente de que uma boa educação para todos não significa uma educação idêntica para todos. Em função deste reconhecimento, tem sido salientada a necessidade de o professor estar equipado para propiciar uma educação de boa qualidade, levando em conta as diferenças individuais e encorajando o desenvolvimento de talentos, competências e habilidades diversas. Os alunos com altas habilidades/superdotação, em especial, vêm mobilizando o interesse de educadores de diferentes países, nos quais propostas educacionais vêm sendo implementadas, promovendo-se melhores condições para identificação, desenvolvimento e expressão desses alunos. As propostas, na prática, refletem políticas educacionais que oferecem orientações para a ação, proporcionando o apoio à educação do superdotado, necessário para que o seu potencial possa se desenvolver de forma o mais plena possível.

Em Taiwan, o cuidado com crianças com altas habilidades e com os superdotados surgiu da consciência de que uma ilha, com poucos recursos naturais como é o caso daquele país, necessitava desenvolver de forma intensa os seus recursos humanos; entre estes, deveriam receber uma atenção diferenciada aqueles alunos que se sobressaiam pelo potencial intelectual superior, com maiores chances de contribuir para o desenvolvimento científico e tecnológico daquele país.

Também, e óbvio, nos Estados Unidos, há o interesse continuado pela educação do superdotado, afinal apontam a necessidade de um largo contingente de indivíduos altamente talentosos para que os Estados Unidos possam manter a sua liderança na indústria, na educação superior, nas ciências, entre outras áreas, no presente século. De forma similar, na Inglaterra os alunos superdotados são

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focados como àqueles que têm muito a contribuir para o futuro bem-estar da sociedade, desde que seus talentos sejam desenvolvidos plenamente durante sua educação formal.

- - - - - - - - x - - - - - - - - A Neuropsicopedagogia objetiva compreender a construção do

conhecimento com todos os fatores que a influenciam, facilitando o aprendizado e identificando o que impede o sujeito de aprender.

A aprendizagem ocorre por meio de um processo complexo com diversos fatores que conduzem o aluno as dificuldades de aprendizagem, porém, o principal é compreender que aprender envolve significância e experiência.

--- x --- Dos Australopthecus aos

Ptecantropóides, destes ao homo-habilis, ao homo-erectus, ao homem de Neandertal sapiens, ao homem de cro-magnon sapiens, ao homo sapiens e ao homo sapiens-sapiens a evidência empírica, acadêmica é

patente. Não queremos polemizar, mas evidenciar diferentes pensamentos

científicos, todos muito respeitáveis. Questões paradigmáticas!

PARADIGMA – de acordo com Thomas S. Kuhn, filósofo e historiador da ciência, paradigma significa “a constelação de crenças, valores e técnicas partilhadas pelos membros de uma comunidade científica.” É o modelo, a maneira, a forma que permite a explicação de certos aspectos da realidade. É um conjunto de regras e padrões que nos mostra como resolver problemas dentro de certos limites. É, de forma simplista, como percebemos o mundo.

PARADIGMA MATERIALISTA - percebe a realidade de uma forma material, mecânica. Interpreta a “realidade” de uma forma newtoniana/cartesiana, isto é, de modo reducionista. Este paradigma reduz e limita o ser humano a um conjunto atômico que, através de um epifenômeno, produz inteligência. Tem o foco nas partes do conjunto e, mesmo quando enxerga o todo não o relaciona com as partes.

PARADIGMA HOLÍSTICO – percebe a realidade de uma maneira mais ampla, mais total. Tem o foco no todo relacionando com as partes, sabendo que o todo é maior que a soma das partes. Nesta dimensão o ser humano é analisado com todas as suas potencialidades: biológicas, psicológicas, sociais e espirituais (não necessariamente um termo religioso).

Nesse ententimento, façamos uma reflexão. Quantos quadrados você poderá formar com o desenho ao lado?

Ao falarmos em paradigmas, tomemos uma ciência. Por exemplo, a Psicologia. Vejamos:

A psicologia já nasceu polêmica. Polêmicas e radicalismos têm caracterizado sua história. Cabe-nos discernir, dentro de nossa filosofia pessoal, o que é mais lógico, mais claro, que nos forneça melhores subsídios para a compreensão do Homem.

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Dentro de uma análise rápida teremos: A PSICOLOGIA ocidental nasceu de duas fontes distintas: de um lado,

da ciência experimental e laboratorial, e, do outro, de interesses clínicos e hospitalares. Em seu esforço para legitimá-la enquanto ciência, seus praticantes tomaram como modelo a física clássica, concentrando-se no observável e esquivando-se do inobservável: o mundo da experiência interior. Assim, a psicologia experimental foi dominada pelo behaviorismo5, ou 1ª FORÇA.

A psicologia e a psiquiatria clínicas, por outro lado, nasceram de uma preocupação pelo tratamento das patologias. Já que muito do sofrimento do ser humano decorre de forças inconscientes, o trabalho clínico se concentrou no subjetivo e no inconsciente. A psiquiatria e a psicologia clínicas foram dominadas pela psicanálise6, ou 2ª FORÇA. Assim, a psicanálise e o behaviorismo lançaram as bases da psicologia clínica e experimental, sobre as quais reinaram soberanas ao longo da maior parte do século XX, tornando-se as principais forças dentro da psicologia ocidental.

Contudo, em torno da década de 1960 levantou-se a suspeita de que, ao lado das inúmeras contribuições trazidas por essas linhas de pensamento, elas haviam acarretado também distorções e limitações significativas: Ficou cada vez mais aparente a sua incapacidade de fazer justiça à totalidade da experiência humana. Elas se concentravam na psicopatologia ou traçavam generalizações acerca das complexidades da vida cotidiana a partir de condições simples controladas em laboratório, ignorando dimensões cruciais da experiência humana, como a consciência e o bem-estar psicológico.

Além disso, elas às vezes consideraram patológicas certas experiências transpessoais vitais. Freud, por exemplo, interpretou essas experiências como reflexos da impotência infantil, ao passo que outros psicanalistas as viram como "formas de regresso à união com o seio" ou "neuroses narcisistas". Como notou o filósofo Jacob Needleman, "o freudianismo institucionalizou uma subestimação das possibilidades humanas".

A psicologia humanista, ou 3ª FORÇA, surgiu em reação a tais imposições. Nas palavras de Abraham Maslow, um dos fundadores da psicologia humanista e transpessoal:

Nosso ponto de vista não nega de forma alguma o quadro freudiano habitual, mas representa um acréscimo e um suplemento a este. Simplificando um pouco, é como se Freud nos tivesse fornecido a metade doente da psicologia e agora tivéssemos de completá-la, acrescentando-lhe a metade sã. Talvez essa psicologia da saúde venha a nos dar mais condições de controlar e melhorar nossas vidas, tornando-nos pessoas melhores. (grifos nossos)

5 Behaviorismo ou Psicologia Comportamental – criada por John B. Watson. Reformulou os conceitos de consciência e imaginação, negando o valor da introspecção. Watson rejeitou tudo o que não pudesse ser mensurável, replicável ou observável em laboratório. Segundo ele, somente o comportamento manifesto era possível de ser validado cientificamente. Os estudos posteriores demonstraram que essa postura não era correta em alguns aspectos, mesmo assim os estudos de Watson foram determinantes para a expansão da psicologia. 6 Psicanálise – criada por Sigmund Freud, o estudo psicanalítico focaliza prioritariamente a patologia e o extremo sofrimento diante da própria impotência e da limitação humana. Freud teve inúmeros seguidores e muitos de seus postulados sobre a psique continuam válidos e dão suporte às outras escolas que se desenvolveram a partir da psicanálise. Freud também teve dissidentes que evidenciaram outros aspectos importantes da psique humana que ele não admitia. O principal discípulo de Freud foi Carl Gustav Jung que é considerado um dos precursores da Psicologia Transpessoal devido aos seus inúmeros estudos sobre o ocultismo.

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Os psicólogos humanistas queriam estudar a experiência humana e tudo o que há de mais essencial à vida e ao bem-estar, e não o que é fácil de medir em laboratório. Uma das descobertas, em particular, viria a ter um impacto imenso, dando origem finalmente à psicologia transpessoal, ou 4ª FORÇA. As pessoas que gozam de excepcional saúde psicológica tendem a viver aquilo que chamamos de "experiências de pico": experiências de expansão da identidade e de união com o universo, breves porém extremamente intensas, cheias de sentido e júbilo, além de benéficas. Experiências semelhantes têm sido registradas ao longo da história e chamadas de místicas, espirituais e unitivas ou, no Oriente, de samadhi e satori.

Vejamos o esquema abaixo, num entendimento paradigmático:

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- - - - - - - - x - - - - - - - -

Para o senso-comum o aluno com altas habilidades ou com superdotação é aquele que apresentará sempre um excelente rendimento na escola, destacando-se como o melhor da classe. Isto, entretanto, nem sempre acontece. Muitas vezes, observa-se uma discrepância entre o potencial (aquilo que a pessoa é capaz de realizar e aprender) e o desempenho real (aquilo que o indivíduo demonstra conhecer). Muitos são os fatores aos quais se pode atribuir este desempenho inferior. Tanto uma atitude negativa com relação à escola, como as características do currículo e métodos utilizados, além de baixas expectativas por parte do professor. Paralelamente poderão ocorrer pressões de colegas com relação ao aluno que se destaca por suas ideias ou habilidades marcantes. Tudo isto são fatores que se relacionam entre si de maneira interdependente e complexa.

Outros fatores poderão surgir, como, por exemplo:

Fatores Individuais o Baixa autoestima; o Depressão; o Ansiedade; o Perfeccionismo; o Irritabilidade; o Não-conformismo; o Hostilidade e comportamento agressivo; o Lócus de controle externo; o Impulsividade e déficit de atenção; o Necessidade de ser aceito pelos colegas.

Fatores Familiares o Baixas expectativas parentais.;

BEHAVIORISMO

PSICANÁLISE

HUMANISTA TRANSPESSOAL

FOCO NO HOMEM DOENTE

FOCO NO HOMEM SAUDÁVEL

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o Atitudes inconsistentes dos pais a respeito das o realizações do(a) filho(a); o Excessiva pressão dos pais em relação ao desempenho o acadêmico; o Conflitos familiares; o Clima familiar em que prevalece menor grau de apoio,

segurança e compreensão das necessidades da criança ou do jovem.

Fatores do Sistema Educacional o Ambiente acadêmico pouco estimulante; o Métodos de ensino centrados no professor; o Excesso de exercícios repetitivos; o Baixas expectativas do professor com relação ao

desempenho do aluno; o Pressão ao conformismo; o Procedimentos docentes rígidos, com padronização do

conteúdo, aliado ao pressuposto de que todos os alunos devem aprender no mesmo ritmo e de mesma forma.

Fatores da Sociedade o Cultura anti-intelectualista, que se traduz por uma pressão

em relação aos alunos que se dedicam e se sobressaem na área acadêmica. Os rótulos “nerd” ou “cdf”, usados, muitas vezes, de maneira pejorativa, constituem-se formas de discriminar negativamente esses alunos.

o Maior valorização da beleza física comparativamente à inteligência, especialmente no gênero feminino, o que faz com que um largo contingente de alunas com altas habilidades não expressem ou mesmo neguem suas habilidades intelectuais superiores.

Gostaria que vocês comentassem de forma ampla, sobre os quatro fatores acima descritos.

- - - - - x - - - - - Neste momento preciso dizer uma questão particular, por isto, peço licença.

Trabalhei cinco anos, entre 2010 a 2014 na SEDUC/CASIES - Secretaria de Estado de Educação/Centro de Apoio e Suporte à Inclusão da Educação Especial. Minha experiência aponta que os fatores familiares são os essenciais. O importante não é o que fazem comigo; o importante é o que eu faço com o que fazem comigo. Na página quatro escrevemos: "O indivíduo forma-se a partir da educação recebida no Lar, por seus pais ou responsáveis. Desempenhará seus papéis sociais de forma competente, amável, responsável, em conformidade com os exemplos que receba no Lar, primeiramente".

- - - - - x - - - - - Ainda com o senso-comum, mas também com alguns estudiosos,

escutamos dizer que a participação de alunos com altas-habilidades e com superdotação em programas especiais fortalece uma atitude de arrogância e de superioridade.

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Ora, o que falei acima, possivelmente venha contrapor esta ideia do senso-comum e de alguns estudiosos. Os programas especiais não desumanizam o aluno. Onde quer que se esteja, o que quer que se esteja fazendo, os valores humanos serão os mesmos, se efetivamente foram cultivados desde a infância. Logo, efetivamente isto não acontecerá. O atendimento especializado, quando de boa qualidade, produz estudantes mais satisfeitos academicamente, entusiasmados com as propostas curriculares, mais ajustados social e emocionalmente (Renzulli, 2004).

Uma vez livres das pressões exercidas por colegas que tendem a criticar, ridicularizar e mesmo rejeitar os alunos que se destacam por um desempenho marcante, em um ambiente estimulador, com o apoio de professores bem qualificados e possibilidades de interação com colegas com características ou interesses similares, esses alunos crescem em competência e em habilidade.

Para finalizar este capitulo podemos dizer que várias são as questões que são objetos de discussão por parte dos estudiosos das altas habilidades/superdotação. Uma delas diz respeito ao termo - superdotado - que tem sido questionado e rejeitado por distintos especialistas da área, como Julian Stanley, da Universidade Johns Hopkins.

Este educador, que há mais de 30 anos criou um programa para jovens com desempenho excepcionalmente elevado na área de matemática, considerou que os termos superdotação e superdotado tendem a obstruir o nosso pensamento gerando resistência com relação aos esforços a favor de melhores condições à educação de jovens com altas habilidades. Lembrou Stanley que o termo sugere uma bipolaridade - superdotado versus não-superdotado – razão de sua preferência pela utilização de outros termos, como jovens com raciocínio excepcional. Além desse, altas habilidades, aptidões superiores, indivíduos mais capazes, bem-dotados, com alto potencial ou talentos especiais, são também comuns na literatura especializada.

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CAPÍTULO 2 APRENDIZAGEM E METODOLOGIAS:

ATIVIDADES DE ESTIMULOS AOS ALUNOS. Antes o psicopedagogo diagnosticava/tratava o aluno com algum tipo de

dificuldade de aprendizagem. Com as mudanças paradigmáticas na Pedagogia e na Psicologia nova forma de se compreender a aprendizagem foi construída. O sujeito aprendente possui todas as potencialidades para aprender e é por meio de uma comunicação empática que o psicopedagogo age como um facilitador para o aprendizado e a mudança do aluno.

Acima falamos sobre a Psicologia quando mencionamos as questões paradigmáticas. Com a 3ª Força da Psicologia, valorizamos acima de tudo o potencial das pessoas para o crescimento, criando um ambiente que lhes dê condições de fazer fluir este potencial latente. Desta forma, os bons resultados, levam a crer que ao unir sentimentos, valores com os conhecimentos neuropsicopedagógicos pode-se fazer uma diferença real e profunda na vida escolar destes estudantes.

Podemos conceituar a área e fundamentar a teoria com a determinação de seu objeto de estudo. A Neuropsicopedagogia é uma área multi/interdisciplinar resultante da integração da Neurologia, da Psicologia e da Pedagogia. Mas caracteriza-se por um saber independente que possui seus próprios instrumentos e seu próprio objeto de estudo. Mas não se solidificou completamente, pois existe ainda uma delimitação mais precisa da teoria. Há uma grande influência de diversas áreas que são bases para a prática neuropsicopedagógica como, a Psicologia, a Pedagogia, a Psicanálise, a Sociologia, as neurociências, a Biologia, a Filosofia, a Epistemologia, a Antropologia, a Fonoaudiologia, a Linguística e a Neurolinguística. Isto dificulta uma articulação entre esses diversos conhecimentos de forma interdisciplinar, podendo desta forma, fazer com que a Neuropsicopedagogia perca seu foco.

Tendo como referência estes novos conceitos podemos compreender a necessidade de se olhar o sujeito aprendente de forma particularizada, pois o processo de aprendizagem ocorre de forma individual, com caráter subjetivo.

A aprendizagem deve ser entendida como um processo, que se inicia com o nascimento, aliás, já existe teoria que ela começa na vida intrauterina e acompanha o sujeito até a sua morte. Conduz o ser humano a transformações a partir das relações intra e inter-relacionais no seu contexto de vida. São constituídas

pelas aquisições de habilidades, raciocínios, atitudes, valores, vontades, interesses, aspirações, integração, participação e realização.

Portanto, o processo de aprendizagem se relaciona com a transmissão da cultura através das gerações, o que é uma definição mais ampla da palavra educação.

Falando em educação, vejamos como é a nossa inteligência:

Conhecimento é o que sabemos. Assim falamos quase que diariamente. Mas esta

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expressão ou este conceito é unilateral. Organiza-se somente no aspecto cognitivo. Contudo, faltam duas outras dimensões: a emocional e a volitiva.

A Inteligência é uma só, contudo, didaticamente podemos dividi-la em três partes, conforme o esquema acima.

Assim temos: pensar, sentir e querer; razão, sentimento e vontade. O uso das inteligências emocional e volitiva leva-nos a aplicabilidade do que sabemos, humanizando sempre as nossas relações: primeiramente a intrapessoal e posteriormente a interpessoal. Isto nos traz sucesso.

Os lares, as escolas e as igrejas, nos últimos tempos, têm privilegiado, sobremaneira, as pessoas portadoras de muito conhecimento. Estas, se não usarem correlativamente as inteligências emocional e volitiva, poderão se deixar facilmente trair pela vaidade e com isso se tornarem até arrogantes. Ora, toda ação, todo posicionamento de arrogância não permite aplicar corretamente o que sabemos.

Percebe-se, portanto, pela compreensão do processo de aprendizagem que o sujeito apropria-se do conhecimento, construindo o saber, assimilando o objeto quando o organiza de forma significativa, em termos de espaço, tempo e causalidade. Para a psicologia humanista: para que ocorra aprendizagem é preciso que se deixe o aluno aprender; aquele que ensina não deve ser autoritário; a aprendizagem deverá ser significante e cheia de sentimentos, e não apenas envolver a mente, com a exposição de acontecimentos que se tornam superficiais no dia a dia do aluno, pois assim progredirá de forma acelerada quando possui um significado prático para àquele que aprende. Portanto, o principal da aprendizagem é o seu significado, combinando o lógico, o intuitivo, o intelecto, os sentimentos, o emocional, o conceito, a experiência, a ideia e o significado. Quando aprendemos dessa maneira, somos integrais.

Então, outro fator importante será a congruência (autenticidade/acordo interno ou sinceridade), ou seja, a ação do facilitador, daquele quer pretende ajudar, e, por isto mesmo, encontra-se coerente e congruente, aceitando os sentimentos, as atitudes, as experiências, de se ser genuíno e integrado na relação com o outro.

Desta forma, uma relação fundada nas atitudes acima descritas pode sintetizar-se nos termos seguintes:

• Respeito; • Confiança; • Aceitação; • Autenticidade; • Tolerância. Assim o neuropsicopedagogo na Instituição Escolar, deverá agir,

produzindo as atitudes acima descritas, confiando na capacidade de todos os alunos, mesmo àqueles que estejam com dificuldades de aprendizagem. Então, na prática neuropsicopedagógica, a aceitação incondicional, a compreensão empática e a congruência são fatores indispensáveis ao processo de aprendizagem.

Quando num ambiente impregnado dessas atitudes, as pessoas desenvolvem uma maior autocompreensão, uma maior autoconfiança, uma maior capacidade de escolher os comportamentos que terão, aprendem de modo mais significativo, são mais livres para ser e transformar-se.

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PROMOÇÃO DA CRIATIVIDADE

Criatividade é um tema muito interessante. São comentados os grandes criadores da humanidade até hoje. A arte, a literatura, as descobertas científicas é sempre muito envolvente e nos enche de prazer, nas articulações daqueles que, acreditando em suas possibilidades realizaram feitos de interesse para toda comunidade global.

Criar dá prazer! É uma competência especial, essencial. É melhor ainda saber que somos competentes, mesmo que não tenhamos muita compreensão sobre a criatividade.

Todos somos criativos, pelo menos em potencial. Pensamos em criatividade como um recurso humano, como uma função psicológica que todos nós podemos desenvolver em diferentes graus e dimensões, de acordo com a história de vida de cada um. Sendo assim, a criatividade não só existe em potencial, como pode ser desenvolvida de fato.

Existem barreiras impeditivas ao processo de criar? Sim! Como podemos trabalhar no sentido de aprimorar nossas ferramentas criativas, nosso potencial latente, nosso talento?

Para responder as perguntas acima haverá esforços e certo talento criativo. Alguém disse, um dia, que a necessidade é a mãe da criação. Vamos partir do princípio de que a criatividade tem, também, um pai, que é o divertimento. Criar pode e deve conter uma dimensão de prazer, de alegria, de realização. Ao construirmos pensamentos, ideias, reflexões, com bases lúdicas, estaremos aprimorando nossas habilidades criativas. Dentro deste princípio, vamos explorar o significado da palavra criatividade, seus conceitos e suas múltiplas significações.

A palavra criatividade em japonês tem o seguinte som “kuriaru”. O significado literal é “algo novo que nasce”. Se você fosse definir o que é criatividade, a partir de um idioma só seu, como seria esta palavra? Qual seria o seu significado? Você acrescentaria algo novo ao significado de criatividade escrito em japonês? Vamos imaginar que o alfabeto do seu idioma particular fosse composto, em parte, pelas letras abaixo.

Que letras são estas? O que significam? Use estas letras para escrever a palavra criatividade. Dê um significado a cada uma delas, um significado que se relacione com o fenômeno criativo. Brinque com estes símbolos e construa o seu conceito de criatividade. Você pode acrescentar novas letras, se quiser.

Uma vez construída sua própria definição sobre o que é criatividade, podemos retomar a discussão sobre este conceito, que apresenta algum consenso em sua definição e expressa diferentes formas de abordagem do tema por parte de diversos pesquisadores.

Se você utilizou, na sua definição de criatividade, a expressão “produzir algo novo” aproximou-se da maior parte dos conceitos existentes.

Se também argumentou sobre a necessidade deste “algo novo ser útil em alguma instância”, também chegou perto do que pensa a maioria dos investigadores da área. Criatividade parece incluir estas duas características, além de outras mais. Vamos ver o que dizem diferentes pesquisadores:

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Criatividade é o processo que resulta em um produto novo, que é aceito como útil e/ou satisfatório por um número significativo de pessoas em algum ponto no tempo. (Stein, citado em Alencar, 1995, p. 13)

Pessoas de mente científica (...) geralmente definem criatividade como “combinação original de ideias conhecidas” (...). As combinações originais precisam ter algum tipo de valor, pois chamar uma ideia de criativa é dizer que ela não é apenas nova, mas interessante. (Boden, 1999, pp. 81-82)

A criatividade, como conceito, constitui uma construção teórica elaborada para tentar apreender uma realidade psicológica que se define, essencialmente, por dois critérios que são relativos: os critérios de novidade e de valor; existindo consenso entre os especialistas de que a criatividade se refere à capacidade de produzir algo que, simultaneamente, é novo e valioso em algum grau. (Martínez, 2001, p. 92).

Há vários conceitos sobre criatividade, cada um deles acrescentando uma nova dimensão ao fenômeno. Em geral, todos concordam que algo criativo tem que atender aos critérios de ser original e útil, em um determinado tempo histórico. Um produto ou ideia, para serem considerados criativos, têm que contar com a concordância de um grupo social, em um determinado momento do tempo. Esta proposição é fácil de ser verificada. Vamos examinar o exemplo de Van Gogh.

Vincent Van Gogh (1853-1890), pintor holandês, é considerado um dos maiores mestres da história da arte de todos os tempos. Por meio do seu trabalho, Van Gogh estabeleceu as bases da pintura do século XX. Mais ousado do que os impressionistas, o holandês expressou seus sentimentos por meio de uma representação totalmente subjetiva da realidade. Van Gogh criou uma nova “linguagem” plástica, desconstruindo modos de pintar e propondo variações de pinceladas originais nunca antes experimentadas. Este notável pintor, entretanto, não foi compreendido pela sociedade de sua época. Sua obra, hoje considerada genial e vendida por preços exorbitantes, não foi reconhecida quando Van Gogh era vivo. O seu grupo social não conseguiu identificar a originalidade do seu trabalho, apenas a dimensão de transgressão da sua obra, que não foi bem recebida pela sociedade da época. Foi necessária a passagem do tempo para que a obra deste grande artista pudesse adquirir reconhecimento e exercer profunda influência na arte contemporânea. O exemplo de Van Gogh nos mostra que a criatividade necessita da chancela do grupo social e histórico para emergir, precisa ser reconhecida pelo outro, que vai atribuir valor e utilidade para a produção criativa.

Vygotsky foi um dos defensores desta visão da criatividade. Ele compreendia a criatividade como fenômeno potencialmente universal, isto é, patrimônio de todos, e também considerava a criatividade muito mais como regra do que exceção. Ele reforça a percepção da criatividade como fenômeno presente, de modo potencial, em todos os seres humanos. Na sua concepção, não podemos definir se um indivíduo é criativo ou não apenas a partir de seu desempenho individual. As características que compõem o fenômeno da criatividade são dadas pelas experiências de vida de cada sujeito em seu cenário histórico e cultural.

Vygotsky compreende a criatividade como fenômeno psicológico, isto é, a criatividade faz parte do nosso repertório psicológico, assim como a inteligência, a memória, a afetividade, as emoções etc. O sujeito criativo desenvolve suas funções psicológicas em um cenário social que é, também, histórico e cultural. O modo como este sujeito vai construir as rotas de desenvolvimento de sua criatividade se

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relaciona com este cenário, ou seja, como ele é significado, percebido e internalizado.

Ora, podemos, a partir desta assertiva de Vygotsky, afirmar que o sujeito é sempre um ser ativo nesta construção do desenvolvimento, um ator que vai atuar no sentido de produzir o novo e reconhecer o novo, mormente, se na sua formação, no seu processo educativo, contou com seus pais, convivendo em ambiente propício para tal mister. Se contou com exemplos que o estimularam a avançar na transformação de suas potencialidades em competente possibilidades.

Então, criatividade, indivíduo e cultura são interdependentes, formam um mesmo sistema, em que o indivíduo se torna sujeito, se torna ator, desenvolvendo suas habilidades criativas em um cenário sócio-histórico.

A pós-graduação deverá ter uma dimensão bastante ampla, porém, pode ser resumida num único objetivo: aprender a pensar inteligentemente. Daí, a nossa tarefa é essencial no desenvolvimento da criatividade. Através de uma atitude interdisciplinar, uma visão de totalidade, que estabeleça uma perspectiva metodológica abrangente, nós podemos estimular todos aqueles que estão em nosso entorno.

Lembremo-nos que a inteligência cognitiva constitui apenas 1/3 da inteligência integral. Os outros 2/3 são constituídos pela inteligência emocional e pela inteligência volitiva. Temos o PENSAR, o SENTIR e o QUERER.

- - - - - x - - - - - Vamos abrir aqui um enorme parêntese para falar um pouco sobre a

relaçao ensino/aprendizagem para todos. Comecemos nossa discussão fazendo a seguinte pergunta: pode haver ensino sem que haja aprendizagem?

PODE HAVER ENSINO SEM QUE HAJA APRENDIZAGEM? Suponhamos uma situação em que um professor universitário apresente,

em detalhes, os aspectos mais difíceis e complicados da teoria da relatividade de Einstein a grupo de crianças de sete anos. Suponhamos que o professor em questão seja profundo conhecedor do assunto e faça uma brilhante exposição, utilizando meios audiovisuais ou quaisquer outros recursos que a didática moderna possa recomendar. Apesar de tudo isso, as crianças nada aprendem daquilo que ele apresentou. Podemos dizer que, embora as crianças nada tenham aprendido acerca da teoria da relatividade de Einstein, o professor esteve ensinando durante sua apresentação? A resposta afirmativa, neste caso claramente extremo e exagerado, parece pouco plausível. Mas suponhamos – uma suposição, agora, não tão absurda – que a audiência desse professor fosse composta, não de crianças de sete anos, mas de universitários no último ano do curso de física, e que o resultado fosse o mesmo: os alunos nada aprenderam acerca da teoria da relatividade de Einstein através da exposição. Podemos dizer que, embora o professor tivesse estado a ensinar a teoria da relatividade, os alunos não a aprenderam? A resposta afirmativa, aqui, parece bem mais plausível. Mas qual é, realmente, a diferença entre a primeira e a segunda situação? Vamos colocar esta questão, por enquanto, entre parênteses, para analisar algumas respostas que têm sido dadas à pergunta com que iniciamos este parágrafo: pode haver ensino sem que haja aprendizagem?

Muitas pessoas dão uma resposta negativa a esta pergunta, afirmando que não há ensino sem aprendizagem. Este é um dos slogans que freqüentemente aparecem na literatura educacional. Correndo o risco de caracterizar algumas posições altamente complexas de uma maneira um pouco simplista, poderíamos

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dizer que, em relação às duas situações que imaginamos no parágrafo anterior, os que afirmam que não há ensino sem aprendizagem podem se dividir em dois grupos: de um lado estariam os que afirmam que naquelas situações não houve ensino, visto não ter havido aprendizagem. Do outro lado, porém, estariam aqueles que, quando confrontados com situações desse tipo, levantam a seguinte questão: Será que não houve mesmo aprendizagem? Ainda supondo que os alunos, tanto em um como no outro caso, nada tenham aprendido acerca da teoria da relatividade de Einstein, argumentam, será que eles não aprenderam alguma coisa através da exposição do professor? Eles poderão ter aprendido, por exemplo, no caso das crianças de sete anos, que, embora o professor estivesse falando o tempo todo, ninguém estava entendendo nada, que as aulas com a professora regular são muito mais divertidas, que o retro-projetor utilizado pelo professor é um "negócio bacana", etc.. No caso dos universitários, eles poderão ter aprendido que o professor devia desconhecer o nível da classe para dar uma aula dessas, que o curso que eles fizeram não deve ter sido muito bom, se não os capacitou a entender uma apresentação sobre a teoria da relatividade de Einstein, etc. Em poucas palavras: os alunos, em um como no outro caso, devem ter aprendido alguma coisa, e, conseqüentemente, houve ensino nas situações imaginadas – este o argumento.

A dificuldade com essa sugestão é óbvia: embora possa ter havido aprendizagem nas situações imaginadas, o que os alunos aprenderam não foi aquilo que o professor lhes estava expondo! Poderiam, talvez, ter aprendido as mesmas coisas, se a exposição houvesse sido sobre a química de Lavoisier, ou sobre as peças de Sheakespeare, ou sobre a filosofia de Kant. Isto, por si só, já indica que algo não está muito certo e que há necessidade de que algumas coisas sejam esclarecidas e colocadas em seus devidos lugares. Vamos, de uma maneira muito simples e elementar, tentar esclarecer alguns desses problemas.

Se prestarmos atenção a algo muito simples, como a regência do verbo ensinar, poderemos começar a esclarecer a situação. Quem ensina, ensina alguma coisa a alguém. A situação de ensino é uma situação que envolve três componentes básicos: alguém que ensina (digamos, o professor), alguém que é ensinado (digamos, o aluno), e algo que o primeiro ensina ao segundo (digamos, o conteúdo). Não faz sentido dizer que fulano esteve ensinando sicrano a tarde toda sem mencionar (ou sugerir) o que estava sendo ensinado (se frações ordinárias, andar de bicicleta, amarrar os sapatos, atitude de tolerância, etc.) (4). Também não faz sentido dizer que beltrano esteve ensinando História do Brasil nas duas últimas horas, sem mencionar (ou indicar) a quem ele estava ensinando História do Brasil (se a seus filhos, se aos alunos da quarta série, etc.).

Nos dois casos que imaginamos, o professor universitário estava expondo a um grupo de alunos um certo conteúdo, a saber, a teoria de relatividade de Einstein. Este conteúdo os alunos, por hipótese, não aprenderam. Que eles tenham aprendido outras coisas, as quais ele, claramente, por hipótese, não estava interessado em transmitir-lhes, parece irrelevante à questão: pode haver ensino sem que haja aprendizagem? Por isso, vamos deixar de lado o "segundo grupo" dos que afirmam que não há ensino sem aprendizagem e discutir a posição do "primeiro grupo", ou seja, daqueles que afirmam que, visto não ter havido aprendizagem (da teoria da relatividade, naturalmente) nos casos em questão, não houve ensino.

Será que esta afirmação é verdadeira? Cremos que não. É importante notar que a afirmação cuja veracidade aqui vai ser colocada em dúvida é uma afirmação composta, que diz (pelo menos) duas coisas: em primeiro lugar, afirma que não houve ensino; em segundo lugar, afirma que não houve ensino porque não houve aprendizagem. Afirmar simplesmente "não houve ensino" é constatar algo;

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afirmar, porém, "não houve ensino porque não houve aprendizagem" é, além de constatar algo, oferecer uma explicação: é indicar a razão (ou a causa) em virtude da qual não houve ensino. A afirmação cuja veracidade vamos questionar é a composta, que inclui a explicação da constatação. Isto pode parecer meio complicado, mas no fundo é simples, como, esperamos, se vai ver.

Se for verdade que não há ensino sem aprendizagem, então não existe uma distinção entre ensino bem sucedido e ensino mal sucedido. Todo ensino é, por definição, bem sucedido, isto é, resulta, necessariamente, em aprendizagem. Dizer, portanto, que fulano ensinou raiz quadrada a sicrano e sicrano aprendeu raiz quadrada é ser redundante, é incorrer em pleonasmo, é dizer a mesma coisa duas vezes. Dizer, por outro lado, que fulano ensinou raiz quadrada a sicrano e sicrano não aprendeu raiz quadrada é incorrer em autocontradição, é afirmar e negar a mesma coisa, ao mesmo tempo, porque se fulano ensinou, então sicrano (necessariamente) aprendeu, e se sicrano não aprendeu, então fulano (necessariamente) não ensinou. Ora, tudo isso nos parece absurdo. Parece-nos perfeitamente possível afirmar que, embora fulano tivesse ensinado raiz quadrada a sicrano durante a tarde toda, sicrano não aprendeu raiz quadrada. Em outras palavras, a distinção entre ensino bem sucedido (que resulta em aprendizagem) e ensino mal sucedido (que não resulta em aprendizagem) parece inteiramente legitima. Ora, se esta distinção é legítima, então não é verdade que não há ensino sem aprendizagem (ou que todo ensino resulta em aprendizagem).

Mas parece haver um certo vínculo conceitual entre ensino e aprendizagem. Dificilmente diríamos que uma pessoa está ensinando algo a alguém se esta pessoa não tem a menor intenção de que este alguém aprenda o que está sendo ensinado. Talvez o que o slogan esteja querendo dizer é que se não houver, por parte de quem apresenta um certo conteúdo, a intenção de que alguém aprenda aquilo que ele está expondo, então não há ensino. Esta afirmação parece ser aceitável. Ela apresenta uma dificuldade, porém: a noção de intenção. Como é que se determina que uma pessoa tem, ou não tem, a intenção de que alguém aprenda o que ela está expondo? Esta é uma dificuldade séria, porque esta questão é virtualmente equivalente à seguinte pergunta: Como é que se determina que uma pessoa está, ou não está, ensinando?

A QUESTÃO DA INTENÇÃO Imaginemos que alguém esteja levando aos lábios um copo contendo um

líquido vermelho. O que é que esta pessoa está fazendo? A esta pergunta pode-se responder, obviamente, com uma descrição dos movimentos físicos da pessoa em questão: ela está levando aos lábios um copo que contém um líquido vermelho. Mas esta resposta é pouco informativa. Para se oferecer uma resposta que seja mais informativa, porém, é necessário que se faça menção da intenção (ou do propósito) que a pessoa tem a levar aos lábios o copo com o líquido. A pessoa pode estar meramente saciando a sua sede com um bom vinho. Ou pode estar se embebedando. Ou pode estar se suicidando com um líquido venenoso. Ou pode estar comungando. Ou, ainda, pode estar fazendo um número de coisas que não vem ao caso enumerar. Sua intenção ao tomar o líquido é que vai determinar o que esta pessoa esta realmente fazendo. É bom ressaltar que a questão da intenção é sumamente importante. Se se descobre que a pessoa em pauta tinha meramente a intenção de saciar sua sede, mas que alguém (sem ela saber) despejou veneno no líquido, causando sua morte, nós não diríamos que ela se suicidou, e sim que foi assassinada. Se sua intenção era saciar a sede, mas, por puro engano, bebeu um líquido venenoso ao invés do vinho que pensava estar bebendo, nós não diríamos

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que houve suicídio, e sim um lamentável acidente, que veio a ser fatal, se, naturalmente, em conseqüência disso, a pessoa veio a falecer. Estas distinções são importantes, principalmente em contextos jurídicos. Em nosso caso, porém, elas não parecem nos ajudar muito na determinação da intenção da pessoa que levou aos lábios o copo com o líquido vermelho. De que maneira poderíamos determinar sua intenção?

Deve ser dito claramente que não há maneiras seguras e infalíveis de determinar a intenção de alguém. Intenções não são coisas direta e imediatamente observáveis, como o são movimentos físicos – pelo menos no caso de outras pessoas. (A situação parece bastante diferente quando se trata de nossas próprias intenções: a elas temos acesso direto e imediato, se bem que não através da observação.) Contudo, uma intenção pode, muitas vezes, ser indiretamente determinada através do contexto em que certos movimentos físicos são realizados, com ajuda do nosso conhecimento (mesmo que elementar) acerca do desenvolvimento e comportamento das pessoas. Se, no nosso caso, a pessoa estava levando o copo aos lábios dentro de uma igreja, na presença de um sacerdote, etc., é bastante plausível que sua intenção era comungar – pelo que sabemos do comportamento "normal" das pessoas, dificilmente ela estaria tentando se embebedar ou cometer suicídio ali. Se a pessoa, porém, estava levando o copo aos lábios em um clube noturno, onde esteve a dançar, tem o semblante alegre e descontraído, é bem possível que sua intenção fosse meramente saciar a sede – dificilmente estaria comungando ali, por exemplo. E assim por diante. Quando estamos na posição de observadores, procurando descobrir a intenção de alguém, precisamos analisar o contexto e, com base em nosso conhecimento acerca do comportamento "normal" das pessoas, aventar uma hipótese, que terá maior ou menor probabilidade de ser correta, dependendo das circunstâncias. Em alguns casos pode ser impossível determinar a intenção de alguém. Em outros pode ser até razoavelmente fácil (o que não exclui a possibilidade de erro). No nosso caso, não há dados que permitam determinar qual das hipóteses é mais provável, ou mesmo se alguma delas tem certa possibilidade, pois só oferecemos a descrição de um movimento físico: o de levar aos lábios um copo com líquido vermelho – não descrevemos o contexto. Mas em grande parte dos casos há uma indicação do contexto, da situação, que nos permite inferir qual a intenção do agente ao realizar certos movimentos.

Voltemos agora à afirmação que fizemos acima de que se não houver, por parte de quem apresenta um certo conteúdo, a intenção de que alguém aprenda aquilo que está se expondo, então não há ensino. O problema que esta afirmação enfrenta, dissemos, está relacionado com a dificuldade em determinar a intenção de alguém, a partir dos movimentos físicos que realiza. Esta dificuldade, contudo, não é intransponível, como acabamos de ver, e é compartilhada por todas as situações em que atribuímos intenções a outras pessoas, algo que fazemos em grande freqüência. Constantemente atribuímos intenções aos outros e, embora muitas vezes erremos ao fazê-lo, com surpreendente freqüência acertamos.

Estamos agora em condições de responder à pergunta que formulamos no primeiro parágrafo desta segunda parte: Qual é realmente a diferença entre a primeira e a segunda situação que imaginamos naquele parágrafo? Por que é que no primeiro caso parece plausível dizer que o professor não estava ensinando, e que no segundo parece bem mais plausível dizer que o professor estava ensinando, embora em ambos os casos os alunos nada hajam aprendido? No primeiro caso, os fatos da situação – o contexto – mais nosso conhecimento de que crianças "normais" de sete anos têm condições de aprender nos indicam que o professor

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dificilmente poderia ter a intenção de que as crianças aprendessem os aspectos mais complicados da teoria da relatividade de Einstein. Por bizarro que possa parecer, é bem mais plausível imaginar que o professor estivesse ensaiando uma aula ou conferência, e que a presença das crianças fosse puramente acidental ou ornamental. No segundo caso, porém, a situação é alterada. A audiência é composta de alunos no último ano do Curso de Física. Baseados nesse fato, e em nosso conhecimento (ou na suposição razoável) de que alunos no último ano do Curso de Física têm, em geral, condições de entender a teoria da relatividade de Einstein, torna-se bem mais plausível atribuir ao professor a intenção de que os alunos aprendessem o que ele estava expondo, ou seja, a intenção de ensinar. Em um caso, portanto, é plausível afirmar que o professor não estava ensinando, e no outro é plausível afirmar que estava. Em nenhum dos dois casos, porém, houve aprendizagem. A plausibilidade das afirmações acima não se deve, portanto, ao fato de os alunos não haverem ou haverem aprendido o que lhes era exposto. Deve-se, isto sim, ao fato de que em um caso não faz sentido atribuir ao professor a intenção de que seus alunos viessem a aprender o que expunha, e no outro faz.

Foi por isso que ressaltamos acima que não iríamos discutir a afirmação simples de que não houve ensino naquelas situações e sim a afirmação composta de que não houve ensino porque não houve aprendizagem. Embora as situações sejam, exceto pela audiência, idênticas, estamos propensos a acreditar que no primeiro não houve ensino e que no segundo pode ter havido. Mas não estamos propensos a acreditar que este seja o caso porque na primeira situação não tenha havido e na segunda tenha havido aprendizagem, pois, por hipótese, não houve aprendizagem em nenhuma delas. Baseamo-nos no fato de que no primeiro não é plausível atribuir ao professor a intenção de causar (ou produzir, ou ocasionar, ou ensejar) a aprendizagem dos alunos, enquanto no segundo é.

O CONCEITO DE ENSINO Em relação ao conceito de ensino, podemos resumir as nossas

conclusões e sugerir algumas de suas implicações: Primeira: O conceito de ensino faz referência a uma situação ou atividade

triádica, isto é, de três componentes, quais sejam, aquele que ensina, aquele a quem se ensina, e aquilo que se ensina. Esta conclusão sugere que não é muito apropriado dizer que alguém ensinou a si próprio alguma coisa, sendo, portanto, um autodidata (o termo "didata" provém do verbo grego didaskein, que quer dizer, exatamente, "ensinar"). Quando dizemos que uma pessoa esta ensinando algo a uma outra pessoa, pressupomos que a primeira saiba (ou domine) o que está ensinando e que a segunda não saiba (ou domine) o que está sendo ensinado. Se há, porém, apenas uma pessoa em jogo, mais um certo conteúdo, ou esta pessoa já sabe (ou domina) este conteúdo, em cujo caso não precisa ensiná-lo a si própria, ou esta pessoa não sabe (ou domina) o conteúdo em questão, em cujo caso não tem condições de ensiná-lo a si própria. Designar certas pessoas como autodidatas parece, portanto, bastante descabido. Isso não quer dizer, porém, que alguém não possa aprender por si próprio um certo conteúdo, sem que alguma outra pessoa necessariamente lho ensine. Neste caso, porém, a pessoa que vem aprender um dado conteúdo por si própria não é um autodidata, mas sim um auto-aprendiz.

Segunda: Para que uma atividade se caracterize como uma atividade de ensino não é necessário que aquele a quem se ensina aprenda o que está sendo ensinado; basta que o que ensina tenha a intenção de que aquele a quem ele ensina aprenda o que está sendo ensinado. Esta segunda conclusão é rica em implicações. Em primeiro lugar, ela implica a existência de ensino sem aprendizagem (o que

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poderíamos chamar de ensino mal sucedido). Em segundo lugar, ela sugere que coisas realmente não ensinam, porque não podem ter a intenção de produzir a aprendizagem. Isto, por sua vez, significa que não é muito correto dizer: "A natureza me ensinou", ou "a vida me ensinou", etc. Significa, também, que é só com muito cuidado que podemos falar em ensino através de máquinas (máquinas de ensinar, computadores, por exemplo), ou mesmo através de livros. Um computador (ou um livro) só ensina na medida em que a pessoa que o programou (ou escreveu) teve a intenção de que alguém aprendesse através dele.

Terceira: A intenção de produzir a aprendizagem, isto é, a intenção de ensinar, só pode ser constatada mediante análise do contexto em que certas atividades são desenvolvidas. Se esta análise tornar razoável a atribuição da intenção em pauta, podemos concluir que pode estar havendo ensino; caso contrário, seremos forçados a admitir que não esteja. Esse exame do contexto é, portanto, extremamente importante. A presente conclusão, quando vista à luz das precedentes, tem pelo menos três implicações bastante significativas. Em primeiro lugar, desde que ensinar é sempre ensinar alguma coisa, algum conteúdo, a alguém, quem quer que seja que pretenda estar ensinando tem a obrigação de indicar, de maneira clara e inequívoca, exatamente o que é que ele tenciona que seus alunos aprendam. Se o conteúdo a ser aprendido não é claramente indicado, a pessoa que o expõe pode estar fazendo uma variedade de coisas (um discurso, uma pregação, etc.), mas dificilmente estará ensinando, pois se torna bastante problemático atribuir-lhe a intenção de que os alunos aprendam algo que não é especificado. Em segundo lugar, é necessário que as atividades desenvolvidas por quem pretende estar ensinando estejam relacionadas, de alguma maneira, com o conteúdo a ser aprendido. Isto significa que, embora as atividades que possam ser consideradas atividades de ensino, em geral, sejam virtualmente ilimitadas, as atividades que podem ser considerada de ensino de um conteúdo específico são limitadas pela natureza do conteúdo em questão. Se as atividades desenvolvidas não têm relação com esse conteúdo, torna-se difícil atribuir ao suposto ensinante a intenção de que seus alunos aprendam o conteúdo que lhes está sendo proposto. Em terceiro lugar, desde que ensinar é sempre ensinar alguma coisa a alguém, é necessário que quem pretende estar ensinando conheça e leve em consideração a condição de seus alunos (sua idade, seu desenvolvimento, seu nível intelectual, etc.) para não apresentar-lhes conteúdos para os quais não estão preparados e que não têm condições de aprender e para não desenvolver atividades inadequadas à condição desses alunos. Torna-se bastante problemático atribuir a alguém a intenção de que seus alunos aprendam um certo conteúdo se esse conteúdo, por exemplo, está acima da capacidade desses, ou se as atividades escolhidas como meios para alcançar esse objetivo não podem ser desenvolvidas ou acompanhadas pelos alunos.

Com essas conclusões chegamos, porém, ao segundo tópico a ser discutido nesta parte do trabalho. Até agora discutimos a possibilidade de haver ensino sem aprendizagem. Discutamos agora a questão inversa: pode haver aprendizagem sem ensino?

PODE HAVER APRENDIZAGEM SEM QUE HAJA ENSINO? A resposta a essa pergunta parece ser bem mais fácil do que a resposta à

questão anterior. Parece óbvio que pode haver aprendizagem sem ensino. Atrás já aludimos ao fato de que é possível que, durante uma aula ou exposição, alguém aprenda coisas que o professor não está querendo lhe ensinar (isto é, coisas que o professor não tem a intenção de que ele venha a aprender), como, por exemplo, que

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o assunto da exposição é terrivelmente maçante. Este seria um exemplo de aprendizagem sem ensino. Acabamos de sugerir que o chamado autodidata é, na realidade, um auto-aprendiz, alguém que aprende um certo conteúdo sozinho, e não alguém que o ensina a si mesmo. Sugerimos, também, que não é muito correto dizer que a natureza e a vida ensinam. Nestes casos, também, parece ser muito mais correto dizer que certas pessoas aprendem determinadas coisas por si próprias. Estes seriam exemplos de aprendizagem sem ensino. Parece claro, portanto, que pode haver aprendizagem sem ensino.

Mas consideremos a posição de alguém que argumente da seguinte maneira. Concordo não ser muito correto dizer que a natureza e a vida ensinem coisas às pessoas; é muito mais correto dizer que as pessoas aprendem sozinhas – se bem que através de seu contacto com a natureza ou através de sua experiência da vida. Mas – continua o argumento – esta situação não é diferente da do aluno na sala de aula: o aluno, na sala de aula, também aprende, na realidade, sozinho – se bem que, muitas vezes, através de seu contacto com o professor. A sua aprendizagem, prossegue o argumentante, não é o produto, ou o resultado, ou a conseqüência do ensino do professor: há muitos fatores que incidem sobre ela, como, por exemplo, a motivação do aluno, suas condições de saúde e alimentação, o clima sócio-emocional na sala de aula, as condições do meio ambiente (a temperatura da sala, etc.), e assim por diante. Um dos fatores mais importantes a incidir sobre a aprendizagem é a experiência anterior do aluno com conteúdos semelhantes aos que agora se pretende que ele aprenda, a bagagem de experiência e conhecimento que ele traz consigo. É somente na medida em que estes fatores incidem de maneira favorável sobre o aluno que ele vem a aprender, continua o argumentante, e conclui: A aprendizagem do aluno é sempre uma auto-aprendizagem: se ele está doente, ou sub-nutrido, ou não tem motivação, ele não aprende, por melhor que seja o professor. Ao professor cabe, portanto, simplesmente facilitar a aprendizagem, remover os obstáculos a ela, criar-lhe condições propícias. A aprendizagem, porém, é sempre um ato do aluno e nunca a conseqüência de um ato do professor, a saber, do ato de ensinar. Toda aprendizagem, portanto, diz o slogan, é auto-aprendizagem. Aqui termina o argumento.

Várias observações podem ser feitas aos que assim argumentam. Em primeiro lugar, os que assumem essa posição respondem afirmativamente à pergunta: Pode haver aprendizagem sem que haja ensino? É verdade que vão mais longe, afirmando que a aprendizagem, em hipótese alguma, pode ser entendida como uma conseqüência do ensino. Em segundo lugar, precisa ser dito que grande parte das afirmações feitas pelos que defendem essa posição é perfeitamente aceitável – por exemplo, o que se diz acerca dos vários fatores que incidem sobre a aprendizagem. É este fato que faz com que a posição em pauta pareça ter uma certa plausibilidade inicial. O que precisa ser esclarecido – e esta é uma terceira observação – é o papel do ensino, e, conseqüentemente, do professor, no processo de aprendizagem.

Estamos entrando, aqui, porém, em uma área perigosa para o filósofo, pois esta última questão parece levantar um problema de natureza empírica acerca do qual somente um psicólogo poderia nos dar informações. Um filósofo que se preocupa essencialmente com questões conceituais faria bem, poderia parecer, em não se intrometer nesta área. Para esclarecer nosso objetivo, portanto, é necessário que indiquemos claramente em que sentido um filósofo pode contribuir para a solução desse problema. Vimos atrás que o conceito de ensino inclui uma referência ao conceito de aprendizagem (mais precisamente, faz referência à intenção de

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produzir a aprendizagem). O que queremos examinar aqui é se o conceito de aprendizagem exclui a possibilidade de que a aprendizagem seja vista como o produto, o resultado, ou a conseqüência do ensino, pelo menos em alguns casos. Já admitimos a possibilidade de que a aprendizagem ocorra sem ensino. Queremos, agora, examinar a suposta impossibilidade de que ela aconteça em decorrência do ensino, como efeito ou conseqüência deste. Se esta impossibilidade for real, isto é, se o conceito de aprendizagem logicamente exclui a possibilidade de que a aprendizagem seja vista como (em alguns casos) uma decorrência do ensino, então o ensino, como uma atividade que é desenvolvida com a intenção de que dela resulta a aprendizagem, é um empreendimento fútil. Não caberá mais ao professor ensinar – restar-lhe-á apenas a tarefa de detectar obstáculos e empecilhos à aprendizagem (como falta de motivação, desnutrição, etc.) e de procurar encontrar maneiras de remover esses obstáculos e empecilhos, tornando-se, portanto, caso venha a ser bem sucedido, um facilitador da aprendizagem. Diga-se de passagem que essa tarefa não é pequena, nem fácil, e muito menos indigna. Todo professor sensível se dedica a ela. Acontece, porém, que muitos professores acreditam que, além da tarefa de detectar obstáculos e empecilhos à aprendizagem e de procurar encontrar maneiras de removê-los, cabe-lhes a tarefa de ensinar, ou seja, de desenvolver certos tipos de atividade que deverão resultar na aprendizagem, por parte dos alunos, de certos conteúdos. Ora, essa tarefa só é realizável se a impossibilidade a que nos referimos não for real.

Para elucidar essas questões que, embora conceituais, têm muitas implicações práticas, é necessário levar em conta o que psicólogos afirmam acerca da natureza da aprendizagem. Mas nossa investigação não é equivalente a uma investigação psicológica, de natureza empírica.

Há um certo sentido em que é verdade que toda aprendizagem á auto-aprendizagem, que é o seguinte: ninguém pode aprender por mim. Se eu quero vir a saber (ou dominar) um certo conteúdo, sou eu e ninguém mais que tenho que aprender esse conteúdo. Alguém pode me explicar em detalhe o conteúdo a ser aprendido, pode discuti-lo comigo, esclarecer minhas dúvidas, estabelecer paralelos entre esse conteúdo e outros que já conheço (ou domino), etc., mas a aprendizagem, em última instância, é minha. Sou eu que tenho que assimilar, compreender, dominar o que deve ser aprendido. Se for só isso que se quer dizer quando se afirma que toda aprendizagem é auto-aprendizagem, então o slogan é perfeitamente aceitável.

Mas muita gente quer dizer mais com o slogan. Quer dizer que o professor não deve interferir no processo de aprendizagem do aluno (a não ser para remover obstáculos a essa aprendizagem) e que este deve descobrir por si só aquilo que deve aprender. O melhor que o professor pode fazer, em uma linha de ação positiva, talvez seja criar condições propícias para que o aluno descubra, ele próprio, o conteúdo a ser aprendido. Interpretado dessa maneira, o slogan já não nos parece tão aceitável. Em primeiro lugar, essa aprendizagem por descoberta parece inteiramente apropriada em contextos nos quais a pessoa está aprendendo sozinha, sem o auxílio do professor, ou em contextos nos quais aquilo que deve ser aprendido ainda não foi descoberto por ninguém, sendo, portanto, desconhecido. Em segundo lugar, não nos parece que jamais tenha sido provado que, no que diz respeito a conteúdos já conhecidos, já descobertos por alguém, a melhor maneira de aprender esses conteúdos seja trilhar o caminho seguido por quem originalmente os descobriu. Em outras palavras, parece ser bem possível, por exemplo, que a melhor maneira de aprender um dado conteúdo já conhecido seja seguir o caminho inverso daquele percorrido por quem descobriu esse conteúdo. Ou algum outro caminho,

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talvez. Essas questões precisam ser investigadas empiricamente. Não há garantias conceituais para a suposição de que no caso de verdades já conhecidas – estamos falando agora de conteúdos cognitivos – a melhor maneira de aprendê-los seja redescobri-las. Por um lado, o processo de descobrimento (ou redescobrimento) é altamente demorado, e muitas vezes não é bem sucedido. Por outro lado, não há a menor garantia de que, se cada geração precisar redescobrir as verdades já descobertas por prévias gerações, se vá chegar muito além do ponto ao qual as gerações prévias chegaram. Isto nos mostra que, em relação a certos conteúdos, é bem possível que a melhor maneira de ocasionar uma aprendizagem rápida e fácil seja através do ensino.

Ora, se isto é possível – note-se que não estamos dizendo que seja o caso – então não é (logicamente) impossível que a aprendizagem aconteça em decorrência do ensino, como efeito ou conseqüência do ato de ensinar.

Olhe bem para a figura na página seguinte e descreva, por escrito o que vê. Em seguida leia o texto.

O CASO DOS MACACOS QUE NUNCA QUESTIONAVAM

Damásio de Jesus (com adaptações) Contam que um grupo de cientistas colocou cinco macacos numa jaula. No

meio, uma escada e sobre ela um cacho de bananas. Quando um macaco subia na escada para pegar as bananas, os cientistas jogavam um jato de água fria nos que estavam no chão. Depois de certo tempo, quando um macaco ia subir a escada, os outros o pegavam e o enchiam de pancadas. Com mais algum tempo, nenhum macaco subia mais a escada, apesar da tentação das bananas.

Então, os cientistas substituíram um dos macacos por um novo. A primeira coisa que ele fez foi subir a escada, sendo retirado pelos outros, que o surraram. Depois de algumas surras, o novo integrante do grupo não subia mais a escada.

Um segundo macaco foi substituído e o mesmo ocorreu, tendo o primeiro substituto participado com entusiasmo da surra do novato.

Um terceiro foi trocado, um quarto, até que o último dos veteranos foi substituído. Os cientistas então ficaram com um grupo de cinco macacos que, mesmo nunca tendo tomado o jato d’água, continuavam batendo naquele que tentasse pegar as bananas. Se fosse possível perguntar a algum deles por que eles batiam em quem tentasse subir a escada, com certeza a resposta seria: “Não sei, mas as coisas sempre foram assim por aqui”. Passou a ser lei entre eles a proibição de subir a escada para apanhar as bananas, e a pena era severa. Mas nenhum deles conhecia e nem questionava a razão da proibição.

– Aprendi muitos princípios na faculdade e nos livros e nunca os questionei. Escrevi livros sobre eles, aceitando passivamente a proibição ou permissão sem indagar o fundamento, ou, conhecendo-o, sem procurar saber se estava certo ou errado.

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28Durante muito tempo, como na experiência dos símios, fui um “macaco novo”,

levando surras sem saber a razão e contrariando a natureza das coisas pela comodidade de não controverter. Mas comecei a questionar. Daí por que passei a adotar a subjetividade como integrando o conhecimento científico, os sentimentos superiores, como o amor, a compaixão, a humildade, a paciência, como fatores imprescindíveis na teoria/prática pedagógica no contexto educacional, a escola como sendo o melhor lugar para ensinar a aprender...

Hoje, posso apanhar, mas quero saber porque estou apanhando.

"É MAIS FÁCIL DESINTEGRAR UM ÁTOMO DO QUE UM PRECONCEITO". ALBERT EINSTEIN.

Fechamos este enorme parêntese. - - - - - x - - - - -

A imaginação é, também, uma função psicológica humana. Costumamos pensar sobre a imaginação como o exercício de um pensamento aberto a todas as possibilidades. Por meio da imaginação podemos tudo: visitar planetas desconhecidos, imaginar pessoas que não existem, pensar em idéias malucas ou simplesmente divertidas. A imaginação, porém, é uma atividade mental totalmente conectada com a realidade, pois seus conteúdos são retirados da realidade e, posteriormente, transformados e/ou recombinados pela função imaginativa, construindo novas realidades. Daí podermos dizer que a imaginação, combinando ideias, é irmã dileta da produção da criatividade. Na combinação de idéias, o insigth, o ato de criar. Vygotsky também apostou na imaginação como elemento essencial para que houvesse expressão criativa.

As pesquisas realizadas utilizaram como amostra sujeitos representantes de vários campos do conhecimento, como: artes, ciências, arquitetura, matemática, entre outros, todos considerados altamente criativos pelas contribuições prestadas às suas respectivas áreas. Por meio destes estudos, evidenciou-se que as características e os traços de personalidade dos sujeitos estudados apresentavam pontos comuns percebidos nas diversas amostras analisadas. A Psicologia apónta diferentes traços de personalidade típicos de sujeitos criativos em quatro tópicos, a saber:

(a) autonomia, iniciativa e persistência; (b) fl exibilidade e abertura a experiências; (c) autoconfi ança, independência e (d) sensibilidade emocional, espontaneidade e intuição. Uma pessoa é mais do que o somatório dos seus traços de

personalidade. Ela é fruto de uma história pessoal, única e intransferível. Mesmo cientes de que estes traços, por si sós, não são capazes de informar sobre o nível ou grau de criatividade de uma pessoa, eles representam um avanço nas investigações sobre criatividade, pois lançam luzes importantes sobre esta tarefa complexa, que é conhecer a personalidade de pessoas com alto potencial criativo.

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CAPÍTULO 3 ALUNO E FAMÍLIA: A RELAÇÃO ESSENCIAL

A construção da identidade pessoal é um processo de construção de sujeitos, de atores sociais, enquanto pessoas, enquanto seres humanos. Tal processo é marcado, sobretudo, pelos exemplos vivenciados por seus pais, por seus irmãos, pelos parentes mais próximos. Daí, a criança se desenvolverá plenamente, entrando na adolescência com segurança, nada obstante as questões hormonais, tão bem apontadas pela biologia, mas psicologicamente preparada para os enfrentamentos necessários, reconhecendo-se no desempenho de papéis sociais de forma responsável, de forma ética, cidadã.

Mas como anda a família neste limiar do século XXI? Que valores ela possui para ajudar na formação de seus filhos?

Considerar a identidade humana inserida nesse processo pressupõe uma concepção do sujeito humano como portador da capacidade de simbolizar, de representar, de criar e compartilhar significados em relação aos objetos com os quais convive, primeiramente no seu lar. Vale ressaltar o que diz Içami Tiba7:

Os pais podem dar alegria e satisfação para um filho, mas não há como lhe dar felicidade. Os pais podem aliviar sofrimentos enchendo-o de presentes, mas não há como lhe comprar felicidade. Os pais podem ser muito bem-sucedidos e felizes, mas não há como lhe emprestar felicidade. Mas os pais podem oferecer aos filhos muito amor, carinho, respeito; ensinar tolerância, solidariedade e cidadania; exigir reciprocidade, disciplina e religiosidade. Reforçar a ética e a preservação da Terra. Pois é de tudo isso que se compõe a autoestima. É sobre a autoestima que repousa a alma, e é nesta paz quer reside a felicidade. (com pequena adaptação)

Tomamos como processo da construção da identidade à identificação, por sugerir um vínculo ou atração, por parte do indivíduo, para com o outro que ombreia, que compartilha de seu grupo social, da sociedade, da humanidade.

A identidade pessoal, por mais repitamos, será construída pela criança pequena, pelo processo em que

ela "toma" o outro inicialmente como modelo: pai e mãe, tornando-se uma adolescente com uma consciência social ética, responsável, cidadã – conforme sejam os exemplos destas duas figuras de autoridade. Não há equívocos ao dizermos que os adolescentes educados, criativos, responsáveis, que ampliam seus valores humanos, tais como o amor, a não violência, a retidão de caráter, a fraternidade, a solidariedade, o senso de justiça num clima de cooperação e respeito aos princípios democráticos, demonstrando, em si mesma, a cada passo, que se importa pelo bem-estar do outro, foram favorecidas pelos constantes exemplos daqueles adultos que foram os responsáveis pelo seu desenvolvimento.

7 TIBA, Içami. Quem ama educa. São Paulo: Editora Gente, 2002.

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Perguntamos como anda a família no século XXI? Perguntamos agora como anda a sociedade neste limiar? Como classificá-la?

Alguns pensadores a classificam como sendo a “sociedade do conhecimento, da comunicação veloz”. Mas perguntamos por que também é a “sociedade da depressão”?

Ora, sabemos que a sobrecarga de informações já foi diagnosticada como um dos grandes males da globalização e do mundo conectado. Em um cenário de extrema competição em que vivemos, no qual o acesso à informação correta não importa onde ela esteja localizada e em qual dispositivo, pode indicar o sucesso ou o fracasso de uma determinada negociação. Existe uma tendência crescente de envio e de acesso a informações estratégicas, na maioria das vezes a partir da utilização de ferramentas de automação como o correio eletrônico, a planilha eletrônica, o banco de dados e o processador de textos.

Quem recebe mais de cinquenta mensagens de correio eletrônico por dia conhece as dificuldades geradas pelo excesso de informações recebidas. Muitos reclamam que, depois do correio eletrônico, tiveram de adicionar pelo menos mais uma hora por dia à sua longa rotina de trabalho.

Da mesma forma que o Sistema Nervoso Biológico detecta mudanças no nosso corpo humano e comanda alterações biológicas no organismo, o “Sistema Nervoso Digital” tem o papel de preparar-nos para um mundo de extrema competição e, ao mesmo tempo, de melhoria do relacionamento com o mercado, com parceiros e consumidores.

Enquanto a meditação, a paciência, a calma, a tolerância, a humildade a indulgência, a cooperação, a intuição facilitam todo o processo para que o Sistema Nervoso Biológico faça as mudanças adequadas à qualidade de vida, à saúde integral, na construção do SER, a pressa, a competição, as agressividades, a lógica, preparam o Sistema Nervoso Digital para a competição, para o TER.

Não queremos nenhuma uniformização, nenhuma padronização na concepção de identidade entre todos os seres humanos, como se faz com a lógica matemática que fundamenta o princípio de igualdade lógica, onde A = A. Ao invés dessa relação que não admite diferença, queremos uma relação de semelhança, pela qual os homens e mulheres, de qualquer idade, de qualquer condição social, de qualquer credo, pertencente à única raça – a humana – compartilhem as semelhanças.

Daí a construção que buscamos neste trabalho, incitando um trabalho interdisciplinar, onde a ciência caminhe ampliando o encontro com o espírito, recuperando, assim, os valores e o saber conservados pelas tradições de diferentes povos, enriquecendo cada vez mais as tradições filosóficas e religiosas que incorporam uma ética compatível com tais associações.

Já não é pequeno o número de pessoas em todos os países que encaram a Terra como um ser pulsante, constituída de diferentes níveis de energia, em que a vida orgânica é coroada pela vida pensante e a consciência individual, pela consciência planetária. Semelhante a ideia de JAMES EPHRAIM LOVELOCK, nascido em 1919, na Inglaterra, que construiu a hipótese de Gaia, com base nos estudos de LYNN MARGULIS, nascida em 1938 nos EUA, bióloga e professora na Universidade de Massachusetts, para explicar o comportamento sistêmico do planeta Terra. A Terra é vista, nesta teoria, por ambos os pesquisadores, como um superorganismo.

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Isto possibilitará a formação de sociedades mais igualitárias, no sentido democrático, orientadas pela ideia de que o bem comum deverá prevalecer sobre apropriações individuais ou minoritárias. Então, competência, envolvimento, sentimento, compromisso, marcam o itinerário de qualquer um de nós que lutamos por uma educação melhor e mais igualitária para todos, afirmando-a diariamente.

A família é um sistema complexo, composto por subsistemas integrados e interdependentes, que estabelece uma relação bidirecional e de mútua influência com o contexto sócio-histórico-cultural no qual está inserida. A família é, também, vista como um dos primeiros contextos de socialização dos indivíduos, possuindo um papel fundamental para o entendimento do processo de desenvolvimento humano. Além de constituir o contexto promotor do desenvolvimento primário, da sobrevivência e da socialização da criança, ela é um espaço de transmissão de cultura, significado social e conhecimento comum agregado ao longo das gerações.

Neste espaço, tanto a criança quanto os membros familiares são participantes ativos. Portanto, para compreender os processos de desenvolvimento do indivíduo, incluindo o desenvolvimento de altas habilidades, precisamos conhecer o contexto de desenvolvimento primário, isto é, a família e seus modos de funcionamento.

Vale ressaltar uma pergunta: o que vem a ser família, nos tempos modernos? Quais os ciclos de vida familiar? Quais as principais tarefas e desafios da família? Quais são os papéis dos valores, das crenças e das práticas parentais como um fator preponderante para a compreensão do desenvolvimento da criança e, consequentemente, da criança com altas habilidades?

Por muito tempo, a família conjugal moderna predominou como modelo socialmente aceito; entretanto, a participação e a inserção da mulher nas diferentes esferas sociais e sua constituição como indivíduo abalaram o patriarcalismo e, consequentemente, a família tradicional nuclear. O modelo tradicional é entendido como um grupo composto por pai, mãe e filhos naturais desta união, com papéis de gênero claramente definidos, ou seja, o pai ocupa a função do provedor material da família e a mãe, a de responsável pelas tarefas domésticas e pelo cuidado dos filhos. Mas, as mudanças no papel feminino geraram uma maior flexibilização das relações, provocando instabilidade e volatilidade nas relações íntimas, sobretudo de famílias nucleares, e uma constante reformulação de projetos individuais e grupais.

A família nuclear tradicional está decrescendo nas últimas décadas por várias razões, particularmente, porque os critérios que a definem são restritos. Em outras palavras:

a) as leis e restrições legais tratam a família e o casamento de maneira rígida;

b) a abordagem genealógica restringe os laços familiares às linhas de parentesco e ancestralidade;

c) a perspectiva biológica associa a ideia de família à de parentes, em função dos laços de consanguinidade; e

d) as estatísticas governamentais definem, em geral, a família com base na divisão da mesma residência e na presença de filhos em comum.

Esses pressupostos definidores da família tradicional estão sendo ultrapassados, na medida em que os padrões de mudança na vida familiar moderna colocam a família nuclear, ou casais de genitores casados ou solteiros vivendo com

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seus filhos solteiros em uma mesma casa, em um espaço secundário. Embora este modelo de família ainda seja o tipo mais encontrado nas sociedades ocidentais, diversas outras formas têm surgido e diferentes padrões de institucionalização de relações afetivas e sexuais passaram a coexistir de forma legítima, havendo, hoje, uma pluralidade de tipos de casamento e formas alternativas de família.

Algumas tipologias de família são genuinamente novas, como famílias de homossexuais ou com filhos concebidos por meio de inseminação artificial, enquanto outras sempre existiram, mas só receberam uma denominação recentemente, como no caso das famílias reconstituídas. Independentemente da tipologia, as estatísticas têm mostrado um aumento crescente de crianças que vivem em lares com apenas um genitor.

O que significa crescer em um lar com apenas um genitor? No passado, a existência de famílias constituídas por um genitor decorria, geralmente, da morte do pai, enquanto hoje, a maioria delas, é resultante de divórcio. O divórcio, por sua vez, introduziu novos componentes no funcionamento das famílias, cujas consequências e implicações para o desenvolvimento de crianças e adolescentes não são, ainda, conclusivas. O que dizer, então, de mães que decidem criar, sozinhas, os seus filhos, isto é, sem a participação de um pai biológico, social ou legal? Embora sejam inúmeras as razões pelas quais um genitor cria, sozinho, seus filhos, em todos os casos, o genitor tem pouco tempo para estar com a(s) criança(s), além do estresse e do cansaço provenientes dessa situação peculiar, o que pode prejudicar a qualidade das relações parentais.

As “famílias reconstituídas”, por sua vez, necessitam de considerável ajustamento por parte de todos os seus membros e as dificuldades podem continuar por muitos anos após a inserção do padrasto ou madrasta na família. Neste caso, as crianças têm que se adaptar à diminuição do tempo despendido com seu pai/mãe e às mudanças na rotina da casa, enfrentar o conflito que surge frequentemente entre a “lealdade” com o pai/mãe biológico(a) e a formação de uma relação mais íntima com o padrasto/madrasta.

Três outras formas de família vêm aumentando nas sociedades ocidentais modernas: a “poligamia”, as “famílias extensas” e as famílias denominadas “multigeracionais”. Com relação à primeira, apesar de ilegal, constitui uma estrutura familiar cuja existência não podemos negar, particularmente no Brasil, onde os homens formam nova família, mantendo, ao mesmo tempo, esposa e filhos de um casamento legal. Estes e outros arranjos similares, em que casais casados legalmente toleram relações estabelecidas fora do casamento por seu cônjuge, merecem a atenção dos professores, pois têm implicações para o desenvolvimento de seus alunos.

Embora a “família extensa” seja comum em muitas culturas, o compartilhamento do mesmo espaço, nas sociedades ocidentais, ocorre mais por razões práticas do que por concepção cultural. A razão principal é econômica e, por isso, encontramos famílias extensas mais frequentemente em grupos com rendimento familiar insuficiente. Neste caso, a inclusão de parentes e mesmo de pessoas que não têm laços de consanguinidade traz muitas vantagens, uma vez que há um aumento das fontes de renda e o compartilhamento dos problemas e dos cuidados das crianças,

A ambivalência da mulher em relação ao seu papel profissional e de mãe provocou mudanças nas relações maritais e parentais, como também propiciou uma maior valorização do papel dos avós e dos irmãos como agentes de cuidado e suporte social no contexto familiar. Apesar da maior participação dos avós e dos

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pais na vida da família, as crianças estão cada vez mais chegando da escola e encontrando uma casa vazia, bem como participando de arranjos complexos em que o transporte e os seus cuidados são compartilhados com outras famílias.

As modificações nas relações parentais têm sido acentuadas nas últimas décadas, sobretudo quanto aos valores relativos à educação e ao processo de socialização dos filhos. Seria possível alguma comparação na educação de filhos da década de 50 com a década atual? Será que poderíamos comparar uma criança com dez anos em 1960 e uma criança com 10 anos em 2016. Será possível avaliar sem considerar as questões mesológicas?

Vygotsky, já mencionado, asseverava que o meio influencia o homem assim como o homem influencia o meio. Sem dúvidas o homem forma e transforma o meio-ambiente. Essa afirmação de Vygotsky e de muitos outros intelectuais da Educação vem solidificar a ideia defendida atualmente de que somente através da Educação é possível uma transformação da sociedade. Ele afirma ainda que é a aprendizagem que conduz, que possibilita o desenvolvimento do homem e, consequentemente, da sociedade como um todo.

Ora, não será o que falamos acima? É prioridade indiscutível a presença dos pais com exemplos significativos, assim como a presença do educador na vida da criança pequena, da criança, do adolescente, do jovem. Podemos considerar os pais e os educadores como representantes deste Meio em que a criança pequena, a criança, o adolescente e o jovem vivem. Resta saber qual desses meios exercerá maior influência - positiva ou negativa - na vida deles...

OS CICLOS DE VIDA FAMILIAR: TAREFAS E DESAFIOS O desenvolvimento humano é um fenômeno complexo, pois compreende

um processo de transformação que ocorre ao longo do tempo, sendo multideterminado tanto por fatores próprios dos indivíduos (traços de personalidade, características físicas), quanto por aspectos mais amplos do contexto social no qual

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estão inseridos. Constituem exemplos de tais aspectos o ambiente físico, as oportunidades e os recursos oferecidos pelo contexto, os valores e as crenças disseminadas em determinada cultura, os momentos históricos específicos, questões sociais e econômicas, além de diversos outros componentes. O desenvolvimento nada mais é do que a inter-relação complexa entre constituição genética e fatores ambientais que, por sua vez, é delimitada por um contexto de relações específicas.

O processo de desenvolvimento implica momentos de estabilidade e caos, continuidade e descontinuidade. O sistema familiar de origem do indivíduo, envolvendo sua dinâmica e especificidades, como valores, crenças, regras, opiniões; as características físicas e de personalidade do indivíduo e sua subjetividade. O movimento de mudança e continuidade ocorre a partir da influência de vários fatores, dentre os quais destacamos o momento histórico de vida do indivíduo; a sociedade e a singularidade de seus aspectos econômicos, políticos, culturais.

A família, por ser um sistema complexo formado por vários subsistemas, como marido-esposa, genitores-filhos, irmãos-irmãos, avós-netos, passa também por transformações ao longo do tempo. E são as diferenciações de um momento anterior e a emergência da nova condição ou situação que provocam a perda de um equilíbrio já estabelecido e o restabelecimento de um novo equilíbrio, com base na condição que emerge. Estes períodos caracterizam o que denominamos de “transições no desenvolvimento” ou “crises normativas”. Assim, nesta seção, destacamos, sucintamente, as transições no ciclo de vida da família, enfatizando as principais tarefas de desenvolvimento familiar, peculiares a cada estágio.

AS ETAPAS EVOLUTIVAS DO GRUPO FAMILIAR Como entender melhor a dinâmica e o funcionamento das famílias ao

longo do tempo? Possivelmente o primeiro estágio do desenvolvimento familiar é caracterizado pela separação do jovem adulto de sua família de origem e pela busca da própria independência financeira e emocional. A tarefa da família e do jovem neste estágio é estabelecer esta separação sem, no entanto, romper bruscamente com ou fugir das relações familiares. O problema ou a disfunção mais comum nesta etapa é a inexistência de um relacionamento mais igualitário entre os genitores e seus filhos adultos, o que dificulta o afrouxamento dos laços de dependência entre eles e o estabelecimento da independência do jovem adulto.

O segundo estágio é a união das famílias de origem dos jovens adultos pelo casamento, ou seja, é a etapa de estabelecimento de uma nova relação conjugal. A tarefa de desenvolvimento própria desta fase é a transformação dos dois sistemas familiares de origem dos noivos, sua sobreposição e, consequentemente, a promoção do surgimento de um terceiro sistema composto pelo novo casal. Os problemas corriqueiros desta fase são a incapacidade de promover a modificação do status vigente das famílias de origem dos noivos e a dificuldade de formalizar o relacionamento do novo casal em função das deficiências existentes nas fronteiras de um ou de ambos os cônjuges com a sua própria família original.

A terceira etapa do ciclo de vida familiar é a transição do casal decorrente do nascimento dos filhos; é o momento em que os cônjuges se tornam genitores e a família convive com crianças pequenas. A principal tarefa deste período é avançar uma geração, cuidando da promoção do desenvolvimento da geração mais nova ou dos filhos pequenos. Os filhos passam, então, a ser genitores e os genitores, avós. A disfuncionalidade mais comum, neste momento, é o conflito conjugal decorrente

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de desentendimentos relacionados ao cuidado dos filhos e à divisão das tarefas domésticas. É nesta fase que ocorre o maior número de divórcios, estando os casais, em geral, entre o primeiro e o quinto ano de casamento.

O quarto estágio é a transformação do sistema familiar em função do período da adolescência dos filhos. A adolescência é uma fase em que os indivíduos buscam a construção de sua identidade e, portanto, questionam diversas regras, valores e crenças anteriormente estabelecidos no relacionamento com seus genitores, visando se tornarem mais independentes e construírem seu espaço como indivíduos. A família vivencia estas experiências juntamente com os adolescentes e o que representa o marco de entrada do sistema familiar, nesta fase, é o “adolescer” do filho primogênito. A principal tarefa, neste momento, é o aumento da flexibilidade nas interações entre os genitores e os filhos adolescentes e, consequentemente, uma diminuição da autoridade dos primeiros. A dificuldade mais comum enfrentada pelas famílias, nesta fase, é a crise dos trinta e cinco anos, que é vivenciada especificamente pelo casal e caracteriza-se pelo questionamento e pela reflexão acerca das satisfações e insatisfações pessoais, profissionais e conjugais.

A próxima etapa é a chegada das famílias ao meio da vida, proporcionando os recursos e o suporte necessário para que os filhos se tornem independentes e construam seus espaços pessoais e profissionais, dando prosseguimento à trajetória do ciclo de vida familiar. A tarefa básica deste período é encaminhar os filhos adultos e buscar a reestruturação do relacionamento conjugal.

Portanto, é fundamental que os cônjuges resgatem o momento inicial de sua vida conjugal, para que possam suportar a ausência dos filhos. Quando isto não ocorre, os principais problemas são as famílias agarrarem-se aos filhos, dificultando o rompimento natural do vínculo genitores-filhos, e a emergência de sentimentos de vazio e depressão por parte dos genitores, em especial entre as mulheres.

O sexto e último estágio é o estágio tardio da vida, ou seja, a etapa em que os genitores ficam idosos ou chegam ao que é quotidianamente denominado “terceira idade”. A tarefa básica é a aceitação da mudança nos papéis geracionais, isto é, aqueles que antes eram filhos passam a ser genitores; aqueles que antes eram genitores passam a ser avós, com o nascimento dos netos exigindo uma adaptação ao novo papel familiar e à consciência do envelhecimento.

O principal problema desta fase consiste em lidar com questões próprias da idade madura, como a aposentadoria, um casamento, muitas vezes, desequilibrado e disfuncional, e o falecimento de entes queridos.

OS VALORES, AS CRENÇAS E AS PRÁTICAS PARENTAIS E SUA IMPORTÂNCIA PARA A COMPREENSÃO DAS RELAÇÕES FAMILIARES

Os genitores são as primeiras pessoas com as quais a criança interage com maior regularidade e por mais tempo, desde o seu nascimento; além disso, eles são significativamente a fonte primária de influência genética, social e psicológica. É na relação entre a criança e seus genitores que se estabelecem os intercâmbios culturais por meio dos quais os valores, as crenças e as práticas são transmitidos de uma geração para outra. Portanto, os valores e as crenças parentais constituem o principal ponto de contato entre a cultura social mais ampla e a cultura pessoal e exercem influência nas práticas dos genitores dirigidas às suas crianças.

As crenças sobre o cuidado dos filhos agem como mediadoras entre os valores e os comportamentos parentais. Por exemplo, uma mãe que deseja que seu

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filho se torne obediente e submisso às regras impostas por ela (valor), provavelmente acredita que não pode expressar claramente seus sentimentos de amor e afeto pelo seu bebê (crença), segurando ou balançando-o muito, pois pode mimá-lo, tornando-o desobediente e, por isso, não balança seu bebê quando este está chorando (comportamento). O processo de educar um filho envolve, portanto, o sistema de valores e crenças dos genitores que, por sua vez, influenciam suas ações e práticas, facilitando ou dificultando o alcance de determinados objetivos (valores) que os genitores almejam para suas crianças.

Identificar os valores e as crenças dos genitores sobre a educação de filhos constitui um dos passos essenciais para a compreensão do processo de socialização da criança. Um dos temas que tem merecido a atenção de psicólogos e educadores nos últimos anos refere-se às diferenças nos modos de educar de pais e mães provenientes de contextos sociais distintos.

POR QUE E PARA QUÊ E COMO TRABALHAR. Revendo o significado do trabalho, de acordo com Aurélio B. H. Ferreira8,

a origem da palavra trabalhar “vem do Latim vulgar ‘tripaliare’, martirizar com o ‘tripaliu’, um instrumento de tortura”.

Dentro de uma visão do paradigma materialista o trabalho tem essa conotação de ser um peso, e para alguns trabalhar é uma verdadeira tortura. Quem pensa assim trabalha apenas para ganhar dinheiro e subsistir.

Na visão do paradigma holístico o trabalho é um instrumento de crescimento interior, além de ser fonte de subsistência.

Em uma visão holística o trabalho tem duas funções: Uma horizontal em que o ser humano utiliza o trabalho como meio de

subsistência, obtendo o seu alimento, sua segurança e seu bem estar. É através dessa função que o indivíduo modifica o meio, transforma o ‘habitat’ e cria condições de conforto para si e para seus familiares. Nessa função ele exerce o seu papel na sociedade. O trabalho faz com que ele melhore a sua condição de vida e dos que lhe são dependentes.

A outra é a vertical em que o trabalho faz o ser humano desenvolver sua capacidade de pensar, ampliando sua inteligência, bem como aperfeiçoa as suas relações sociais transformando-se interiormente. Nesta função o indivíduo utiliza o trabalho como meio de aprimoramento íntimo, como ser em constante evolução.

8 FERREIRA, Aurélio B. de H. Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa. 11ª ed. Gamma Editores. Rio de Janeiro, 1981.

AS DUAS FUNÇÕES DEVEM ESTAR EM HARMONIA PARA QUE O INDIVÍDUO SINTA-SE PLENO!

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O novo paradigma, com uma percepção holística da realidade, traz o conceito de, através do trabalho, suprirmos as necessidades de atendimento aos interesses do homem, da sociedade e da natureza, de forma a gerar sempre equilíbrio, harmonia, bem estar para se estar sempre bem. É preciso reorganizarmo-nos nossas instituições de forma pertinente para valorizarmos as pessoas com quem convivemos, com quem trabalhamos, a partir da autovalorização; a produção de bens ou de serviços; e a plenitude ou a realização plena dos objetivos da organização. Unindo pessoa, produção e plenitude, alcançaremos cooperação máxima entre todo pessoal, ou seja, entre todos os colaboradores da empresa, obtendo o máximo de ganho e, acima de tudo, de humanidade.

O ESTRESSE E O TÉDIO NO TRABALHO

Estresse e tédio são dois dos maiores obstáculos à integração do propósito de vida com o trabalho diário. Vêm à sobrecarga, às exigências excessivas a cumprir, e não dá para agüentar. De olho no relógio, procuramos apenas nos controlar até o fim do dia.

A motivação para o trabalho, as crenças e o nível de autoestima determinam se vamos “levar as coisas numa boa” em nosso dia-a-dia, ou experimentar o

estresse regularmente. O que estará acontecendo quando nos estressamos? Vejamos as duas dificuldades apontadas abaixo:

1. Trabalho e propósito de vida não estão em sintonia. Uma causa comum do estresse no trabalho é a falta de sintonia entre o trabalho e o propósito de vida. Ou seja, trabalha-se por um motivo que não o de realizar o propósito de vida. Por consequência, o trabalho não tem sentido nem direção, e o estresse se manifesta toda vez que algo perturba a “rotina” confortável.

2. Crenças Enfraquecedoras. Também contribuem para o estresse certas crenças desenvolvidas, tais como:

a) A vítima. Muita gente se enfraquece (e, portanto aumenta o estresse) por se ver como vítima das circunstâncias de seu trabalho. Eis seu raciocínio comum: "Não tenho nenhum controle sobre nada - as coisas simplesmente me acontecem. Minha vida é controlada por forças externas a mim (tais como Deus, minha família, meu chefe, meus amigos, meus filhos, minha doença, o governo ou qualquer um dos inúmeros 'poderes constituídos'). E sempre acabo em desvantagem".

b) Inflexibilidade e Resistência a Mudanças. A incapacidade de ser flexível e a indisposição para aceitar mudanças também contribuem para o estresse no trabalho.

As pessoas bem-sucedidas sabem que as mudanças encerram oportunidades de crescimento, chances de experimentar novas dimensões de vida; por consequência, abraçam as mudanças. E não se trata de suportá-las apenas - produzem-se mudanças, pelas oportunidades que dão. Quando se adota uma perspectiva descontraída, flexível e divertida no trabalho, nenhum evento ou situação consegue perturbá-lo.

c) Autoestima deficiente. Nossa imagem pessoal - o que pensamos ser - também pode influir de maneira significativa na intensidade do estresse que

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experimentamos. Com uma autoestima deficiente, crentes em que não temos valor como pessoa, tendemos a nos aferrar ao que possuímos, excessivamente preocupados com nossos direitos, necessidades e sentimento individuais. Concentrados por completo em nós mesmos, temos muito medo de perder o que é "nosso". Qualquer questionamento a uma decisão ou ação nossa é visto como um desafio - e a consequência natural é o estresse.

Ora, se agora que conhecemos essas duas dificuldades, o que poderemos fazer para melhorar nossas vidas, nossa capacidade para trabalhar contentes, de bem com a vida, com qualidade de vida? Vejamos:

a) Cirurgia no estilo de vida. É frequente, vítima de um estresse constante, precisarmos reavaliar todo o nosso estilo de vida. Como chegamos ao ponto de não fazer nada além de correr de uma atividade para a outra? Tal programação satisfaz, ou preferiríamos dispor de mais tempo livre?

Não raro, o estresse se manifesta porque vivemos sobrecarregados de compromissos. No fim da agenda cheia há um problema a ser resolvido.

b) Equilíbrio em meio ao estresse. No meio de uma reação de estresse, esquecemos nosso propósito de vida por um instante e nos deixamos "levar" pelos estímulos que nos chegam. É quando devemos lembrar: sempre há uma reação melhor do que o estresse. c) Concentração destacada, no tempo presente. Na sociedade moderna, vivemos bombardeados por estímulos, processando muitos dados simultaneamente. Aprendemos a dividir nossa atenção entre duas ou três atividades e assim "fazer o máximo no menor tempo possível". Tal postura conduz ao estresse, sem dúvida - se não constantemente, ao menos de vez em quando.

Ao concentrar a atenção numa coisa de cada vez, reduzimos de maneira drástica o número de situações potencialmente estressantes em nossa vida. Por exemplo, ante um relatório de distribuição para concluir; dois clientes a quem dar atenção; o telefone para atender e a dúvida de um vendedor a esclarecer, você fica tentado a reagir com estresse, dada a sobrecarga de estímulos. A maior parte das pessoas vive situações semelhantes com regularidade, independente do tipo de trabalho. O segredo é dedicar toda a atenção a uma das tarefas concluí-la e só então passar à seguinte.

d) Pausas e recompensas. Querendo o desempenho máximo - além de preservar a concentração - não devemos nos dedicar a uma tarefa ou atividade por horas a fio sem intervalos.

As pausas são vitais. Elas ajudam a interromper o acúmulo de estresse, tanto a nível fisiológico quanto psicológico. Restaurada a concentração, recuperamos nossa perspectiva.

e) Mostre-se receptivo. Sempre há mais a aprender. Aprenda a aprender, principalmente.

f) Recuse-se a se preocupar. A preocupação é um desperdício de energia. A preocupação impede a concentração no aqui e agora, fazendo com que depositemos a atenção no futuro. Temos como desafio constante criar motivações positivas em nossa vida, ou seja, concentrar-nos no que fizemos de bom a cada dia, não nas falhas; acreditar e declarar que nossas necessidades são observadas em vez de nos desesperar e reclamar.

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ESTRESSE E TÉDIO: FACES OPOSTAS DA MESMA MOEDA

O estresse e o tédio são na verdade dois extremos de uma mesma reta, ou faces opostas de uma mesma moeda. O primeiro resulta da superestimulação e o segundo, da baixa estimulação. Não obstante, ambos produzem efeitos semelhantes, quais sejam:

emoções fortes (raiva, depressão, frustração); moléstias físicas (ataques cardíacos, câncer

etc.); alienação por parte dos outros; e sensação de impotência.

COMO DESCOBRIR O TÉDIO? 1. Perceba o valor do trabalho rotineiro no crescimento pessoal. 2. Concentre-se no presente. É possível diminuir o tédio de um trabalho maçante com um esforço consciente para se concentrar no momento presente. Dedique toda a atenção à tarefa que você tem em mãos. 3. Dê mais de si no trabalho. Sua personalidade única anseia por se expressar. Dê-lhe a oportunidade conferindo seu toque especial às tarefas, ou demonstrando um interesse à parte por um cliente. 4. Aprenda com o trabalho. Sempre há mais a aprender. Se descobrir uma maneira de aprender continuamente com seu trabalho, você experimentará menos tédio. 5. Insista na perfeição. Seja qual for o ritmo de seu trabalho, imponha a si mesmo os maiores padrões de perfeição. A diferença entre os que insistem na perfeição no trabalho e os que apenas "trabalham" é óbvia: a perfeição melhora a qualidade do serviço, dá uma sensação de confiança e “mais conhecimento” sobre a atividade e a empresa, e estabelece um compromisso que inclui a disposição para se realizar mais que a obrigação a fim de satisfazer as necessidades de um cliente.

EXERCÍCIO DE RETOMADA DO EQUILÍBRIO (EXERCÍCIO A SER REALIZADO ANTES OU NO DECORRER DE SITUAÇÕES ESTRESSANTES)

(TEMPO: DE TRÊS A CINCO MINUTOS)

Faça esse terceiro exercício. Feche os olhos. Comece respirando pelo nariz, devagar e profundamente. Solte o ar pela boca, ligeiramente entreaberta, devagar e completamente. Continue respirando desta maneira permitindo que o seu abdômen suba ao inspirar e desça ao expirar. Enquanto respira, vá relaxando o corpo. Agora se concentre apenas na sensação do ar movendo-se para dentro e para fora dos seus pulmões.

Diga para si mesmo: “Relaxe-se”, cada vez que expirar. Concentre-se nas sensações provocadas pelo ar movendo-se no seu nariz, traqueia ou tórax. Ou no seu abdômen, subindo e descendo.

Agora se concentre numa paisagem serena, mentalize um local da natureza que lhe traga paz. Respire na tranquilidade desse cenário.

Calmamente, vá liberando a imagem; então, abra os olhos e volte ao local de trabalho levando consigo a sensação de serenidade.

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O ENTUSIASMO NO TRABALHO COMO GERADOR DE SAÚDE

Atualmente, o campo da medicina que estuda o binômio mente-corpo tornou-se um campo excitante de pesquisa. Nos últimos cinco anos, centenas de trabalhos foram apresentados acerca dos efeitos causados pelos estados mentais sobre a nossa saúde ou a nossa doença.

O córtex cerebral é formado por dois hemisférios ligados por um grande novelo de fibras

nervosas. Os pesquisadores verificaram que o lado esquerdo do cérebro especializou-se, até certo ponto, no processamento da linguagem, na análise e no pensamento linear. O hemisfério direito é responsável pelo armazenamento e recuperação de imagens e pelo pensamento não verbal. O hemisfério direito parece lidar mais com a imagem do corpo, processando informações emocionais e reagindo ao estresse. O hemisfério direito está ligado de forma muito rica ao sistema límbico (que medeia as nossas emoções e está envolvido com as sensações de prazer, dor e raiva).

Simplificando, o hemisfério esquerdo ajuda a controlar a linguagem e os movimentos corporais conscientes, enquanto que o hemisfério direito se comunica com o mundo interior através de imagens e emoções.

Para resumir a complexa relação entre mente e corpo, podemos dizer que, quando uma pessoa tem uma percepção, seja do mundo exterior ou do interior, os neurônios disparam no córtex cerebral e formam imagens do lado direito do cérebro, o que por sua vez estimula o sistema límbico, e em seguida o hipotálamo e a glândula hipófise. Dependendo da interpretação dada a esta percepção - tranquila ou perturbadora - o sistema nervoso simpático ou parassimpático é ativado e esta reação é sustentada pelos hormônios das suprarrenais. Os hormônios e células nervosas que são estimulados provocam mudanças em cada uma das células do corpo.

O cérebro fabrica substâncias denominadas endorfinas que são analgésicos ou narcóticos naturais. São encontrados em altas concentrações no sistema límbico e em outras áreas que sabemos estar envolvidas na transmissão da dor e no processamento das emoções. As endorfinas são consideradas responsáveis pelo aumento da tolerância à dor durante o parto e nos atos de heroísmo. Diz-se que elas são analgésicos autofabricados. As endorfinas são produzidas em respostas aos estados de imaginação ativa, entusiasmo, prazer e práticas de exercícios. Além de aliviar a dor, elas também provocam sensação de alegria e bem-estar. Estes estados prazerosos parecem estimular o sistema límbico do cérebro e produzir polipeptídios, que são recolhidos pelas células imunológicas. Os polipeptídios afetam, então, as atividades das células imunológicas - sua capacidade de se mover, aprender e, o que é mais interessante, de produzir seus próprios neuropeptídios, que subsequentemente são recolhidos por receptores localizados no cérebro. Eles também aumentam a capacidade das células imunológicas se multiplicarem e atacarem as células cancerosas. Assim, o sistema imunológico pode conversar com o cérebro e este com o sistema imunológico. Esta interação é registrada no sistema límbico e é sentida pela pessoa na forma de emoção e bem-estar - alegria, esperança e amor.

Quando o indivíduo mantém um estado de entusiasmo pelo trabalho que realiza, produz uma grande quantidade de endorfinas que lhe proporcionarão

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sensação de bem-estar e plenitude, liberando-o das tensões, estresses e ansiedades que são comuns nas pessoas que não encontram satisfação naquilo que fazem.

AUTOESTIMA NO TRABALHO

A autoestima tem dois componentes inter-relacionados. Um é o senso básico de confiança diante dos desafios da vida: a autoeficiência. O outro, o senso de merecer a felicidade: o autorrespeito.

Autoeficiência significa confiança no meu funcionamento mental, em minha capacidade para pensar, compreender, aprender, escolher e tomar decisões; é a confiança em minha capacidade para entender os fatos da realidade, que pertencem à esfera dos meus interesses e necessidades, autoconfiança e segurança pessoal.

Autorrespeito significa a certeza de que tenho valor como pessoa; é uma atitude de afirmação de meu direito de viver e de ser feliz; é sentir-me confortável ao expressar de maneira apropriada minhas ideias, vontades e

necessidades; é a sensação de que o prazer e satisfação são meus direitos naturais.

Se um indivíduo se sente inadequado para enfrentar os desafios da vida, se não tem uma autoconfiança básica, confiança em suas próprias ideias, reconheceremos nele uma autoestima deficiente, sejam quais forem suas outras qualidades. Ou, então, se falta ao indivíduo um senso básico de respeito por si mesmo, se ele se desvaloriza e não se sente merecedor de amor e respeito da

parte dos outros, se acha que não tem direito à felicidade, se tem medo de expor suas ideias, vontades e necessidades, novamente reconheceremos uma autoestima deficiente, não importa que outros atributos positivos ele venha a exibir. Autoeficiência e autorrespeito são os dois pilares da autoestima saudável.

AS RAÍZES DA AUTOESTIMA 1. A prática de viver conscientemente. Aqui se inclui o respeito pelos

fatos; participar intensamente daquilo que fazemos enquanto o fazemos; buscar e estar totalmente aberto a qualquer informação, conhecimento ou feedback que afirme nossos interesses, valores, metas e planos; buscar compreender não apenas o mundo a nossa volta, mas também nosso mundo interior.

2. A prática da autoaceitação. É a disposição de admitir, experimentar e assumir a responsabilidade por nossos pensamentos, sentimentos e ações, sem fugir, negar ou refutar, e sem se repudiar, permitindo-nos avaliar nossos conceitos, vivenciar nossas emoções e analisar nossas ações sem necessariamente apreciá-las, aprová-las ou justificá-las.

3. A prática do senso de responsabilidade. O senso de responsabilidade consiste em perceber que somos os autores de nossas escolhas e ações; que cada um de nós é responsável pela própria vida, pelo próprio bem-estar e pela realização de nossas metas; que, se precisarmos da cooperação de outras pessoas para atingir nossos objetivos, devemos oferecer um valor em troca; e que a pergunta não é "de quem é a culpa?", mas sempre "O que precisa ser feito?"

4. A prática da afirmação. Afirmar a si mesmo significa ser autêntico nas relações interpessoais; respeitar os próprios valores e as outras pessoas em contextos sociais; recusar-se a camuflar a realidade sobre quem somos ou do que

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gostamos para evitar a desaprovação do outro; é estar disposto a defender a si mesmo e suas idéias da maneira apropriada em circunstâncias apropriadas.

5. A prática de viver objetivamente. Consiste em estabelecer nossos objetivos ou planos de curto e longo prazo e as providências necessárias para concretizá-los, organizar o comportamento em função desses objetivos, monitorar as ações para garantir que está no caminho certo e prestar atenção ao resultado para saber se precisaremos voltar à estaca zero e quando teremos de fazê-lo.

6. A prática da integridade pessoal. É viver coerentemente com nossos conhecimentos, palavras e atos; é dizer a verdade, honrar nossos compromissos e servir de exemplo dos valores que declaramos admirar; é tratar os outros de maneira justa e benevolente. Quando traímos nossos valores, traímos nossas próprias mentes e a autoestima é inevitavelmente prejudicada.

FONTES INTERIORES DE AUTOESTIMA

1. Razão – agir com bom-senso em todas as situações, buscando refletir sobre cada ação a ser tomada.

2. Realismo - Ter uma atitude realista com otimismo perante a vida, sem subestimar ou superestimar suas capacidades; indivíduos com autoestima elevada tendem a avaliar suas capacidades de maneira realista.

3. Intuição/Emoção – buscar ouvir a intuição, sentir a própria emoção nas ações a serem tomadas, valorizando a inspiração, conectando-a com a razão.

4. Criatividade - Pessoas criativas ouvem seus sinais interiores e confiam neles mais do que a média. São mais autossuficientes. Podem aprender com os outros ou inspirar-se neles. Mas valorizam os próprios pensamentos e as próprias percepções mais que a média das pessoas.

5. Independência - A prática de pensar por si mesmo é tanto causa como consequência da autoestima saudável. Também o é a prática de assumir toda a

responsabilidade pela própria existência - pela concretização de seus objetivos e pela conquista da felicidade.

6. Flexibilidade - Ser flexível é ser capaz de reagir às mudanças sem apegos inadequados ao passado. O apego ao passado diante de circunstâncias novas e mutáveis é, em si, produto da insegurança, da falta de autoconfiança. A rigidez é, em geral, a reação da mente que não confia em si mesma para lidar com o novo, ou dominar o desconhecido.

7. Capacidade para enfrentar mudanças - A autoestima não considera a mudança algo assustador, pelas razões descritas no parágrafo anterior. A autoestima flui com a realidade; a indecisão íntima luta contra ela. A autoestima acelera o tempo de reação; a indecisão íntima retarda-o.

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8. Disponibilidade para admitir (e corrigir) erros -. A pessoa com autoestima saudável não se envergonha de dizer, quando a ocasião exige, "Eu estava errado".

9. Benevolência e cooperação - Se estou centrado em mim mesmo, se estou seguro de meus limites, confiante em meu direito de dizer "sim" e "não" quando quero, a benevolência será a consequência natural. Não tenho por que ter medo dos outros, nem preciso me proteger atrás das muralhas da hostilidade. Se estou seguro de meu direito de existir, se confio que pertenço a mim mesmo, se não me sinto ameaçado pela certeza e pela autoconfiança dos outros, então a cooperação com eles para obtermos resultados comuns tenderá a ser desenvolvida com espontaneidade.

É muito mais provável encontrarmos empatia e compaixão, tanto quanto benevolência e cooperação, em pessoas com autoestima elevada do que nas de baixa autoestima; meu relacionamento com os outros tende a espelhar e refletir meu relacionamento comigo mesmo. Ao comentar a máxima “ama ao teu próximo como a ti mesmo", o filósofo Eric Hoffer observa que o problema é que as pessoas fazem exatamente o contrário: elas odeiam os outros como odeiam a si mesmas. Os criminosos deste mundo, no sentido literal e figurado, não são pessoas que mantêm um relacionamento íntimo e afetivo com seu eu interior.

A seguir colocamos um roteiro que permitirá a mudança de comportamento que impedem o bom desenvolvimento do trabalho em equipe:

REFLEXÃO PARA MUDANÇA DE COMPORTAMENTO

Esse é o nosso quarto exercício. Mentalize um comportamento negativo que dificulta a sua autoestima e o relacionamento com outras pessoas o qual você deseja transmutar, transformar.

Reflita sobre esse comportamento. Pense em todas as consequências para você e para os outros que realmente ocorreram - e aquelas que poderiam ocorrer no futuro – como resultado desse comportamento. Medite permitindo que todos os sentimentos associados a esse comportamento venham a sua mente. Examine as consequências e sentimentos cuidadosamente formulando-os claramente em sua mente.

Agora reflita sobre as possibilidades que você tem em mudar esse comportamento. Medite em todos os benefícios e satisfações que você obterá mudando os sentimentos que levam a esse comportamento. Examine os benefícios e satisfações cuidadosamente formulando-os claramente em sua mente. Consinta que os sentimentos despertados por esses pensamentos prevaleçam: a alegria das possibilidades que se abrem diante de você, o desejo intenso de realizá-las e o forte impulso para começar imediatamente.

Agora recorde-se de situações em que você teve esse comportamento que deseja transmutar e reflita que você pode mudá-lo agindo de forma diferente. Medite sobre as qualidades que você precisa desenvolver para mudar esse comportamento. Reflita que essas qualidades são necessárias para tornar a sua vida muito melhor.

Agora imagine que você possui uma vontade forte e persistente, que você tem as qualidades necessárias para mudar esse comportamento; veja-se prosseguindo firme e decidido, atuando em várias situações com esforço,

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persistência, perseverança e autocontrole; resistindo a qualquer tentativa de desistir de prosseguir. Veja-se alcançando com êxito os objetivos desejados.

PISTAS PARA NOVAS DESCOBERTAS

Maslow, psicólogo humanista, elaborou uma proposta em que expressa a ideia de desenvolvimento do ser humano, partindo do pressuposto da existência de necessidades básicas e de crescimento, as quais seriam sequenciais e hierárquicas.

O princípio norteador de seu trabalho é o de que pessoas se desenvolvem mediante a satisfação de necessidades que aparecem escalonadas. Satisfeitas umas, surgem outras, até que se atinja o ponto superior da pirâmide que sintetiza sua proposta.

Na base da pirâmide estariam as

necessidades fisiológicas orgânicas, necessárias para sobrevivência física. Estariam incluídos aí, comida, água, sono, sexo, etc. satisfeitas essas necessidades, surgiriam as seguintes:

Segurança, abrangendo abrigo, emprego, família, uniões, etc.; Afeto que envolve: carinho, amizade, nos mais diferentes âmbitos; Status ou estima social, enfatizando o reconhecimento nos grupos

sociais de amigos, familiares e de trabalho; Autorrealização ou atualização, o ápice da pirâmide, que é

representada por ideias humanitárias. O indivíduo torna-se mais despojado e voltado para o bem comum. Ele precisa continuamente atualizar-se e concretizar feitos dignificantes.

Muitas interpretações e reformulações foram indicadas para a proposta inicial de Maslow. Contudo, por mais questionada que seja, não podemos deixar de reconhecer que essas necessidades ou carências existem na maioria dos homens e mulheres.

Logo, usando um “espelho” e a pirâmide de Maslow, avalie o exercício acima sobre a reflexão para mudança de comportamento. Anote suas observações.

- - - - - x - - - - - Desenvolver hábitos de estudar sistematizadamente, "entrando" no

mundo da leitura para depois fazermos a leitura do mundo, pautando-nos por diretrizes metodológicas que desenvolvam a contento, a arte do pensar inteligente, da investigação, da criatividade, para sentirmo-nos sujeitos/atores conscientes do processo social que almejamos, é a nossa grande meta.

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Há uma profunda mudança que está se manifestando em todos os domínios da nossa existência e, de certa forma, estamos perguntando qual ou quais as direções desta mudança.

Afirmar que estamos numa época de crise, já é lugar-comum. Poucos são os cidadãos neste planeta que escapam dessa crise.

Em todos os planos, individual, social e ambiental, e em todas as classes sociais, reina certo mal-estar que pode chegar até ao sofrimento físico ou moral.

O que mais desejamos em nossas vidas? Sermos felizes! Existirá alguma dimensão humana que trabalhe o homem e a mulher para essa FELICIDADE?

SIM! A EDUCAÇÃO. Uma educação que construa autonomia, pensamentos inteligentes, criticidade, cidadania. Uma educação da pessoa que vitalize continuamente o processo de harmonização e de desenvolvimento da sensação, do sentimento, da razão e da intuição.

Então, mãos a obra!

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