29

SacerdoteS 28.2

Embed Size (px)

DESCRIPTION

A Fronteira da Magia - Eu acredito no impossível

Citation preview

Page 1: SacerdoteS 28.2
Page 2: SacerdoteS 28.2

2

Capítulo 28 – A Fronteira da Magia

Parte 2 – Eu acredito no impossível — CORRAM! FUJAM DAQUI E LEVEM O CRISTAL PARA O MAIS LONGE QUE PUDEREM. Meithel corria desesperadamente. Havia um misto de medo e raiva em seu rosto, mas era ao segundo sentimento que pertenciam as lágrimas que ele derrubava. Foi usado. Como detestava ser enganado, ser usado da forma como foi; era tudo culpa dele, culpa de sua ignorância. Mas ele corria sozinho após o grito de Mifitrin. Somente ele corria para a saída do templo. Mifitrin havia ficado para atrasar o Guardião e El-kens, contrariando-a, também ficou. Mas Meithel não podia se preocupar com isso agora, pois o portal es-tava logo a sua frente, o portal que o levaria de volta para o labirinto no templo de Kaiser e de lá continuaria fugindo. O portal estava aber-to acima do altar de pedra, já podia ver através dele. Quase tropeçava em seus próprios pés enquanto corria, mas não se permitiria cair. Pre-cisava se redimir pelo erro que cometeu, pelo grave erro que Mifitrin, Elkens e ele cometeram. Precisava tirar o Cristal dali. Abraçou o grande Cristal de quatro Faces o mais forte que pôde e subiu pelos de-graus do altar. Baixou a cabeça e se jogou com toda força através do arco de pedra, mal acreditando que seria capaz de fugir. Mas no se-gundo em que cruzou o portal ele já não estava mais aberto. Caiu es-tatelado no chão, ainda no templo de Zander rodeado pela Fronteira da Magia. Não conseguiu escapar. Olhou para trás e viu Zander apontando um dedo para o portal, o mesmo dedo que usou para tran-cá-lo. Mifitrin e Elkens estavam caídos no chão, um de cada lado do

Page 3: SacerdoteS 28.2

F r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i a

3

Guardião. Meithel estava preso ali com seus amigos, preso com o Cristal e preso com o verdadeiro aliado de Mon. Mifitrin assistia Meithel correndo de longe. Continuava usando todas as suas forças para imobilizar Zander, mas sabia que não agüentaria por muito tempo. Foi então que se deu conta de que Elkens continua-va parado no mesmo lugar, mesmo após ter gritado para ele correr. Mas ele não foi e ela se irritou de vê-lo ali. A visão de Zander trans-passando o coração de Elkens com a Espada da Lei lampejou em sua mente. O Sacerdote da Alma precisava sair dali. — VÁ ELKENS! NÃO VOU CONSEGUIR SEGURÁ-LO POR MUITO TEMPO. Mas Elkens estava decidido a ficar ao lado da Sacerdotisa desta vez. Já havia se separado dela na cidade de Buor, o que lhe foi muito dolo-roso, e ainda há pouco voltou a abandoná-la para que ela enfrentasse Zephir, o sétimo Cavaleiro. Mas já se cansou de fazer isso; não iria se separar daquela a quem tanto apreciava nem mais uma vez sequer. Fi-caria e lutaria ao seu lado. Mifitrin olhava para Elkens mas tudo o que enxergava era a cena em que Zander o assassinava. Ele precisava sair dali. — Você sabe que não temos chance contra ele – a voz de Mifitrin era severa, embora tremesse levemente. – Estou fazendo isso para que vo-cê e Meithel possam escapar. Elkens a encarou e respondeu apenas com o olhar, mas Mifitrin esta-va disposta a não aceitar sua decisão. — Vamos morrer… – ela quase implorava que ele fugisse, mas isso não aconteceu e ela sabia que não aconteceria. Talvez sua visão fosse concreta, talvez não tivesse como mudar aquilo. E sua confirmação veio com a resposta dada pelo Sacerdote:

Page 4: SacerdoteS 28.2

4

— Não vou desistir de lutar ao seu lado, Mifitrin. Não vou abando-ná-la nunca mais! Ao ouvir esta última frase de Elkens, Zander soltou uma gargalhada. Mifitrin utilizava todas as suas forças tentando impedir que Zander tocasse seu colar e executasse qualquer feitiço que fosse, mas isso era inútil. Alguém que esteja pelo menos em Ginden-gan, o quarto nível de concentração, mantém uma ligação tão forte com seu colar que não precisa sequer tocá-lo para conseguir usar sua magia. E, utilizando-se disso, Zander acumulou magia na superfície de seu corpo e fez com que ela explodisse. Mifitrin foi atirada para longe dele e caiu no chão, de onde observou seu inimigo sorrindo. Elkens também foi pego pela explosão, sendo jogado para longe do Guardião. Mifitrin esperou que Zander avançasse contra ela, aproveitando-se de que ela ainda estava caída no chão, e usasse algum ataque letal. Mas isso não aconteceu; Zander sequer olhava para ela. Estava olhando para o outro lado com um fascínio nos olhos. Ela acompanhou seu olhar e vislumbrou Meithel, ainda correndo em direção ao portal, le-vando consigo o Cristal de quatro Faces. Droga!, pensou Mifitrin desapontada. Esperava que Meithel já esti-vesse longe deles, mas ainda estava ao alcance de Zander. Do chão, Elkens e Mifitrin viram quando Zander apontou o dedo in-dicador em direção a Meithel, então recitou algumas palavras em si-lêncio para trancar o portal. Neste momento Mifitrin receou que não pudesse mudar suas previsões, nenhuma delas…

♦ Tudo estava ao favor de Zander. Seu plano perfeito funcionou e ago-ra o Cristal estava completo, sendo que seus únicos inimigos presentes

Page 5: SacerdoteS 28.2

F r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i a

5

eram três Sacerdotes medíocres. Mon estava impaciente atrás daquela muralha e instigava o Guardião a libertá-lo o quanto antes. Agora Zander não precisava mais ter medo de usar todo o poder do seu colar; mesmo que seu colar percebesse o que estava fazendo e tentasse puni-lo, isso não significaria nada quando o imperador das sombras fosse libertado. Agora Zander não tinha mais medo de ser punido. Mifitrin não sabia o que Mon tinha prometido à Zander em recom-pensa pela sua ajuda, mas o que quer que fosse, Zander acreditava que não dependeria mais de seu colar, pois o usava sem nenhum receio. Quinze anos atrás Mirundil, o Guardião do Tempo, também acreditou que, quando Mon fosse libertado, não dependeria mais de seu colar. Estavam presos ali, sem nenhuma chance de vitória, e o pior: o Cristal continuava ao alcance de Zander. E assim como não poderiam sair dali, também ninguém poderia entrar para ajudá-los. Definitivamente era o fim. Os três Sacerdotes teriam de enfrentar Zander sozinhos se quisessem impedir que Mon fosse libertado, por mais impossível que isso fosse. Morton havia ensinado Mifitrin a acreditar no impossível, mas três Sacerdotes derrotando um Guardião era algo que fugia com-pletamente do sentido da existência. Era algo completamente impos-sível de se acreditar, mesmo indo contra os ensinamentos do Mago Morton. Mesmo indo contra os princípios da única pessoa que Mifi-trin realmente respeitou e confiou. Ela não podia acreditar no impos-sível, não desta vez. Mifitrin olhou na direção do portal e viu Meithel se levantando do chão. Mesmo na distância em que se encontravam, Mifitrin conseguiu enxergar a decepção em seus olhos. Zander, ainda apontando o dedo indicador para o Sacerdote da Magia, gritou para que pudesse ser ou-vido: — ME ENTREGUE O CRISTAL!

Page 6: SacerdoteS 28.2

6

Elkens percebeu que imediatamente o olhar de Meithel se alterou, mas Mifitrin entendeu antes dele o que isso significava. Ao ver isso as palavras de Zander ecoaram em sua mente: “Quando juramos lealdade a Mon, ele nos concede poderes inimagináveis. Mon me deu o poder de controlar qualquer um que use um colar da Magia…”. Meithel era o único ali com um colar da Magia, à exceção de Zander, por isso podia ser controlado pelo Guardião da mesma maneira que ele controlou os Cavaleiros e os demais protetores da Magia. Meithel agora era mais uma marionete de Zander. — Elkens – disse Mifitrin para o amigo próximo a ela. – Detenha o Meithel. — O quê? — Ele está sendo controlado por Zander. Não deixe ele se aproximar com o Cristal. Elkens olhou mais uma vez para Meithel e percebeu que realmente era verdade. Ele segurava o Cristal entre as duas mãos estendidas e anda-va tolamente na direção do Guardião. Não havia dúvidas de que es-tava sendo controlado. Elkens correu na sua direção para impedi-lo de continuar se aproximando do inimigo. — Não vou deixar você passar – disse ele assim que ficou de frente para o companheiro. Meithel não disse nada. Tirou uma das mãos do Cristal e tocou leve-mente seu colar. Imediatamente surgiram cinco esferas alvas à sua volta. Meithel disparou a primeira delas contra Elkens e ela explodiu em seu peito. Elkens recuperou-se do golpe inesperado e disse: — Sinto muito Meithel, mas não vou deixar você passar. Este era o segundo confronto entre Elkens e Meithel. Da primeira vez eles se enfrentaram na Floresta de Pedra, mas naquela ocasião esta-

Page 7: SacerdoteS 28.2

F r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i a

7

vam enfrentando as ilusões de Shiron, e o Cavaleiro criou uma ilusão para que Meithel enxergasse Elkens como se fosse Mudriack. Mas agora Meithel reconhecia o homem diante dele; sabia muito bem que estava atacando Elkens, seu amigo, mas não conseguia evitar. Todos os seus movimentos, inclusive sua respiração, eram controlados com-pletamente pela vontade de Zander, e ele não podia fazer nada para evitar. Meithel disparou a segunda das cinco esferas contra Elkens, mas este criou uma barreira rubra onde a esfera de Meithel se chocou e explo-diu. Meithel disparou as três esferas restantes de uma única vez, mas nenhuma delas chegou a ultrapassar o feitiço de defesa de Elkens. O Sacerdote da Alma ficou de frente para Meithel, encarando-o e im-pedindo a sua passagem. Mas o desespero de Zander para conseguir o Cristal, agora também era o desespero de Meithel. Elkens estava à sua frente e Meithel o encarava com uma fúria irreconhecível em seu ros-to, uma fúria que não parecia ser dele. Elkens olhava para o amigo com medo. A batalha entre os dois Sacerdotes iria começar a qualquer momento. Meithel voltou a tocar seu colar e uma espiral de luz alva passou a rodopiar seu corpo em grande velocidade: era o Ciclone Gama, o ata-que mais poderoso do Sacerdote. Mas enquanto ele se preparava para atacar o amigo, Elkens conjurou em seus braços uma luz rubra que os envolveu: o kotetsu… Enquanto isso, Mifitrin e Zander estavam frente a frente. — Acha mesmo que podem me impedir de pegar o Cristal? A voz de Zander era maliciosa, mas Mifitrin respondeu de forma con-fiante:

Page 8: SacerdoteS 28.2

8

— Alguém mais sábio que você um dia me disse para acreditar no im-impossível. Zander sorriu. — Mas se me lembro bem esse alguém já morreu há quinze anos. Será mesmo mais sábio que eu? Mifitrin não gostou do modo sarcástico com que Zander se referiu a Morton, por isso decidiu que era hora de atacar. Mas desta vez Zan-der foi mais rápido… Sem tocar seu colar, ele conjurou uma argola de luz sólida à sua frente e a disparou contra Mifitrin. A Sacerdotisa tentou se defender, mas a argola prendeu-se em seu corpo, apertando-a firmemente. A argola lhe prendeu na altura da cintura, prendendo seus dois braços colados ao corpo. Porém, nada mais aconteceu a não ser prender Mifitrin, o que a dei-xou intrigada. — O que é isso? Zander sorria maliciosamente. — Esse é um feitiço extremamente simples utilizado principalmente por Feiticeiros. Trata-se de um feitiço capaz de detectar quando um inimigo tenta usar magia. Normalmente é utilizado contra prisionei-ros, pois, quando a pessoa presa pela argola tenta utilizar magia, ela simplesmente… explode! O coração de Mifitrin gelou. — Mas você não precisa se preocupar com isso – Zander continuou. – A argola só irá explodir se você tentar utilizar magia, mas, da forma como seus braços estão presos, não poderá nem tocar seu colar. Mifitrin riu, tentando desesperadamente mostrar que não estava com medo e, embora não tenha sido muito convincente, ainda disse:

Page 9: SacerdoteS 28.2

F r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i a

9

— Sabe tão bem quanto eu que não preciso tocar meu colar para usar magia. Zander riu ainda mais ao ouvir o que ela disse: — Não tente me enganar, eu te conheço Mifitrin. Conheço toda a sua história, sei tudo sobre você e cada um dos seus desprezíveis amigos. Eu sei que você foi o último discípulo do Mago Morton, assim como sei que participou da batalha na última tentativa de Mon escapar, quinze anos atrás, na qual Morton morreu. Sei que você passou os anos seguintes treinando como uma Sacerdotisa, treinada pelo Mestre do Tempo Kantus, mas sei que desistiu de ser uma Sacerdotisa por conta das suas péssimas habilidades de concentração. Nos anos se-guintes tornou-se uma Guerreira sob o ensinamento do General do Tempo Manjourus, mas também sei que desistiu de ser Guerreira e voltou a ser Sacerdotisa para poder vir ajudar seus amigos. Mifitrin ouvia tudo espantada. Qual era o interesse de Zander nela e nos outros? Por que procuraria saber sobre eles? — Sabendo de tudo isso, conheço também o seu ponto fraco: a con-centração. Sei que é praticamente incapaz de elevar sua concentração a Ginden-gan e por isso sei que está mentindo. Você não consegue usar magia sem tocar seu colar, o que é ridículo para alguém que se chama de protetor. Mifitrin foi pega em sua mentira. Zander não precisava ter medo de-la, pois sabia que, imobilizada como estava, não conseguiria realizar qualquer feitiço e, mesmo que por algum acaso conseguisse, sua argola explodiria e de qualquer maneira ela não lhe causaria mais problemas. Mifitrin estava definitivamente fora da batalha. Zander apontou o dedo indicador para Mifitrin e ela sentiu seu corpo se enrijecer. Zander levantou levemente o indicador e o corpo de Mifi-trin acompanhou o movimento de seu dedo, elevando-se no ar. Zander

Page 10: SacerdoteS 28.2

10

então fez um gesto brusco com a mão e o corpo de Mifitrin foi arre-messado para longe do seu caminho. Agora só havia Elkens entre Zander e Meithel. O Cristal estava logo ali… Elkens estava de costas para Zander e estava tão concentrado na ba-talha que estava prestes a travar contra seu amigo que nem se deu conta de que Zander já havia tirado Mifitrin da batalha. Disposto a atacar Meithel antes que ele chegasse a usar o Ciclone Gama, o que certamente o derrotaria, Elkens começou a correr na direção do amigo. Quando estava diante dele, atacou-o sem hesitar com o braço direito, mas alguma coisa segurou seu braço e o impediu de atingir Meithel. Sem entender o que estava acontecendo, Elkens tentou atingi-lo com o braço esquerdo, mas este também foi imobilizado por alguma coisa e o impediu de atingir Meithel mais uma vez. Ele então olhou para trás e compreendeu o que estava acontecendo. Zander caminhava rapidamente na sua direção, apontando o dedo in-dicador para ele. Era um feitiço de telecinese. Olhou além do Guar-dião e viu Mifitrin caída no chão, também imobilizada, com algo que se assemelhava a uma argola presa à altura de sua cintura, prenden-do-lhe os dois braços de forma que ela não podia tocar seu colar. Zander fez um gesto brusco com a mão e o corpo de Elkens foi jogado no ar, caindo no chão muito longe de onde estava um segundo atrás. Agora não havia nada entre Zander e Meithel. Quando compreendeu que não precisava mais atacar Elkens, Meithel cancelou seu feitiço e o Ciclone Gama, ainda em formação, desintegrou-se em flocos de luz. Ajoelhando-se ao chão, Meithel ofereceu o Cristal de quatro Faces ao seu Guardião. — NÃO ENTREGUE MEITHEL!

Page 11: SacerdoteS 28.2

F r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i a

11

Mas não adiantava gritar e Elkens sabia disso. O feitiço de controle de Zander era tão poderoso que nem mesmo os Cavaleiros podiam li-vrar-se dele, portanto Meithel não tinha a menor chance. Zander es-tava há três passos de conseguir o Cristal, mas Elkens não permitiria que isso acontecesse. Ainda caído no chão onde foi atirado pelo Guardião, Elkens apontou a mão em direção a Zander, tocou seu colar com a outra mão, então gritou: — RAÍZES DE ROZAN! Zander sentiu o chão tremer sob seus pés, então parou assustado. O chão explodiu quando uma imensa raiz rubra saiu dali. A raiz pren-deu-se no corpo de Zander e cresceu rapidamente, elevando-o no ar e imobilizando-o. — Acredita que um estúpido Sacerdote como você pode me deter? To-dos vocês não passam de uma grande piada… O corpo do Guardião brilhou por um décimo de segundo quando ele acumulou magia na superfície do seu corpo, o mesmo feitiço que já ha-via utilizado antes, então essa magia explodiu. As raízes de rozan vi-raram pó e Zander estava livre mais uma vez. Deu três passos na di-reção de Meithel e tomou o Cristal das suas mãos que continuavam estendidas. Agora estava tudo perdido… O Guardião tinha posse do Cristal de quatro Faces e nada seria capaz de impedi-lo de libertar Mon. Os minutos estão contados…

— Precisamos ser rápidos. — Posso sentir que eles estão lutando. — Somente os três não serão capazes de derrotar o Guardião.

Page 12: SacerdoteS 28.2

12

— Eles precisam da nossa ajuda. Káfka, Algoz, Shanara e Kam estavam correndo pelo labirinto de Kaiser. Estavam livres do feitiço de controle do Guardião e agora já sabiam de toda a verdade. Sabiam que foram enganados por Zander e que Kaiser nunca foi inimigo deles. Agora sabiam que o verdadeiro inimigo era Zander e que ele estava pretendendo libertar Mon do Exí-lio. Eles conheciam o caminho que deviam percorrer pelo labirinto para chegar ao templo do Guardião, pois já haviam passado por ali várias vezes enquanto estavam sob o feitiço de controle. Estavam há apenas dois corredores do último portal, e o coração de cada um dos quatro Cavaleiros passou a bater mais rápido. Quando completaram todo o percurso, se depararam com mais três pessoas diante do arco de pedra. Kaiser estava de frente para o portal; Magai e Zephir estavam posta-dos ao seu lado, ambos com expressões preocupadas no rosto. — O que aconteceu? – perguntou Shanara aos companheiros. – Por que ainda não foram ajudar Elkens e os outros? — Está trancado! – respondeu Magai. – O Guardião trancou o por-tal e Elkens, Meithel e Mifitrin estão presos com ele. — Talvez eu até pudesse tentar abrir – disse Kaiser enquanto conti-nuava estudando o grande arco de pedra sobre o altar – mas eles leva-ram o meu colar. Isso era verdade. Eles haviam deixado para trás todos os colares dos Cavaleiros conforme iam abrindo os portais, mas, só por precaução, Mifitrin resolveu levar o colar de Kaiser consigo, pois ainda acredita-vam que ele era o verdadeiro aliado de Mon. Como aquele era o portal de Kaiser, seu colar era o único que teria alguma chance de abri-lo. Os sete Cavaleiros presentes ficaram em silêncio. Estavam pensando no que fazer para poder ir ajudar os Sacerdotes, mas parecia não ha-

Page 13: SacerdoteS 28.2

F r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i a

13

ver nada a ser feito. Após um longo tempo de silêncio Káfka que-brou-o com um comentário doloroso: — Bulque está morto! Se não fizermos alguma coisa, Elkens e os ou-tros também morrerão. Todos os Cavaleiros ali viram o corpo de Bulque enquanto seguiam para o labirinto de Kaiser, mas nenhum deles teve coragem de dizer qualquer coisa sobre isso antes. A morte de um companheiro era ex-tremamente dolorosa e todos os Cavaleiros sofriam com isso. — Eu realmente temi que eles não conseguissem passar por Bulque e seu canhão – disse Kam com sua voz preocupada. – Acho que eles não tiveram outra escolha senão matá-lo. Mas quando disse isso, Kam olhava diretamente para Kaiser. Kam era conhecido por ser o único dentre os nove Cavaleiros capaz de man-ter-se no quinto nível de concentração a todo momento; fazendo isso é o Cavaleiro com a mente mais aberta de todos, capaz de enxergar a verdade muito além do que qualquer um. Ele estava dentro da mente de cada um dos presentes, inclusive de Kaiser, por isso conhecia a ver-dadeira história por trás da trágica morte de Bulque. Mas também era capaz de sentir a dor que Kaiser estava sentindo, por isso decidiu lhe dar a chance de explicar o que aconteceu. — Eles não mataram Bulque… – ele fez uma pausa, sem saber como contar a todos o que realmente aconteceu. Seus olhos se encheram de lágrimas e ele engoliu em seco antes de prosseguir: – Fui eu quem o matou… Zander me obrigou. Fui obrigado a matar Bulque e não pu-de fazer nada para salvá-lo… Eu estava… — Não é sua culpa, Kaiser – disse Algoz consolando o amigo. – To-dos nós fizemos horrores enquanto o Guardião nos controlava. Vocês sabem que eu fui o assassino de muitos protetores, inclusive ajudei a matar alguns dos quatro Sábios. Também não pude fazer nada para

Page 14: SacerdoteS 28.2

14

salvá-los. De qualquer maneira não se culpe, pois não foi você quem matou Bulque. Foi Zander. — E os amigos deles? – perguntou Zephir aos recém-chegados, prin-cipalmente à Shanara, cujos poderes de cura eram os mais surpreen-dentes de todos os Cavaleiros da Magia. – Eu quase matei um deles também. Era um homem de vestes negras, não era um protetor. Eu quase o matei com minhas garras. — Ele está bem – disse Shanara. – Quando cheguei ao Cemitério de Dragões, ele estava quase morto por causa da grande perca de sangue. Mas eu fiz o que pude para curar o ferimento e agora ele está adorme-cido. Gauton está com ele. — Mas e os outros? – perguntou Kaiser. – Havia mais pessoas com eles, não havia? — A garota que trouxe o último cristal quase morreu no meu jardim – Shanara voltou a responder. – Ela está bem, mas está muito fraca. Está dormindo até agora. — E também tem o domador de demônios – disse Kam. – Ele ficou cuidando dos ferimentos do seu demônio alado, mas disse que viria o quanto antes para ajudar seus amigos. — Mas eles não sabem o caminho – disse Magai. – Nunca consegui-rão chegar até aqui, mas talvez isso seja bom. Creio que eles não con-seguiriam aceitar o fato de não poderem ajudar seus amigos… Novamente todos ficaram em silêncio. Havia um clima pesado entre eles por tudo o que Zander os obrigou a fazer. — Enquanto não encontramos um jeito de entrar – disse Káfka vi-rando-se para Shanara – eu queria que você consertasse o meu escudo. Káfka colocou as duas metades do seu grande escudo no chão. A arma foi partida ao meio por Laserin e seu cristal, ainda no primeiro tem-

Page 15: SacerdoteS 28.2

F r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i a

15

plo. Káfka não conseguiu evitar um sorriso ao admirar sua arma branca quebrada, então acrescentou em um tom divertido: — Eles são fortes… Shanara estudou o escudo branco de Káfka por algum tempo, mas en-tão teve uma idéia. — Nós não podemos entrar – ela disse – mas talvez ainda possamos ajudá-los. — Do que está falando? – perguntou Kaiser esperançoso. Shanara não disse nada, apenas balançou seu báculo branco para que todos olhassem para ele e compreendessem o que ela estava pensando. O báculo de Shanara era uma arma muito curiosa. Suas habilidades de criar ligações mágicas entre um ponto e outro podiam ser usadas das mais variadas maneiras, tanto em batalhas quanto fora delas. — Não será fácil – disse Shanara pensativa enquanto se concentrava em seu báculo – mas creio que haja uma chance…

♦ Zander deu às costas aos Sacerdotes e seguiu a passos largos em dire-ção a grande muralha. Com o Cristal de quatro Faces em suas mãos, pretendia destruí-la por completo, o que cada um dos Sacerdotes sabia ser possível. Mon estava a um passo de finalmente conseguir sua li-berdade após séculos no Exílio. Quando conseguiu se levantar, Elkens correu até Meithel para se cer-tificar de que ele estava bem, de que estava novamente agindo por vontade própria e não sendo comandado pelo Guardião. Meithel esta-va ajoelhado no chão; Elkens imaginou que estivesse ferido, mas os únicos ferimentos que exibia eram decorrentes da batalha contra Kai-ser. O que o mantinha ajoelhado no chão não era ferimento algum, era

Page 16: SacerdoteS 28.2

16

o seu pânico. Seu sentimento de culpa por ter sido um dos principais responsáveis por Zander ter se libertado agora se intensificava em vê-lo em posse da poderosa relíquia da Magia. O plano perfeito de Mon havia funcionado e estava prestes a ser concluído com perfeição; e os Sacerdotes partilhavam toda a culpa por isso. — Levante-se, Meithel – Elkens lhe pediu, ajudando-o a se levantar do chão; suas pernas tremiam tanto que duvidou que Meithel fosse capaz de se manter em pé mesmo que o ajudasse a se levantar. – Ain-da não acabou, Meithel. Ainda podemos detê-lo… Mas o som de uma forte explosão interrompeu o que Elkens dizia e fez com que suas pernas também começassem a tremer quando perce-beu de onde vinha a explosão. Vinha do local onde Mifitrin estivera caída! — MIFITRIN! – Elkens gritou enquanto corria para o local da ex-plosão, mas não demorou para perceber que Mifitrin não estava lá. – MIFITRIN… — Estou aqui, Elkens. A Sacerdotisa estava logo ao seu lado. Parecia cansada, mas feliz consigo mesma. Elkens ficou contente ao ver que ela também não es-tava ferida, mas reparou numa curiosa expressão no rosto da Sacerdo-tisa. Uma expressão de triunfo, de satisfação. E realmente era isso o que Mifitrin estava sentindo. Ela não diria a Elkens o motivo de sua alegria, guardaria para si mesma. Zander a prendeu no interior da argola que explodiria se ela tentasse usar magia, mas também a prendeu de um modo que ela não conse-guisse tocar seu colar. Zander zombou dela por não conseguir atingir o quarto estágio de concentração e assim usar magia sem precisar to-car o colar. Mas Mifitrin conseguiu, e esta era a razão para sua ale-gria. Já havia feito isso na luta contra Kaiser, mas uma série de ra-

Page 17: SacerdoteS 28.2

F r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i a

17

zões e emoções a instigaram a atingir tal nível de concentração, mas desta vez ela podia dizer com certeza que conseguiu unicamente por seu próprio esforço; agora sabia que havia ultrapassado o limite do seu corpo, sabia que poderia voltar a fazer isso quando precisasse. Mi-fitrin atingiu o Ginden-gan e com isso conseguiu usar magia sem tocar seu colar; a argola mágica criada por Zander deveria ter explodido neste momento, mas Mifitrin tinha o Tempo ao seu favor. Conseguiu usar magia para escapar e já estava muito longe quando a argola fi-nalmente explodiu e assustou Elkens. Enquanto o aliado de Mon seguia para a Fronteira da Magia, Mifi-trin, Elkens e Meithel ficaram em pé, um ao lado do outro. Meithel olhava para o chão, envergonhado. Mifitrin se apiedava dele, mas não conseguia se sentir melhor que ele. Os três eram culpados pelo que es-tava acontecendo, eram os verdadeiros culpados por Mon conseguir escapar. Ficaram em silêncio por um tempo indeterminado, incapazes de dizer coisa alguma. Já não havia mais esperança e nenhuma pala-vra que dissessem traria consolo. Não podiam fugir, estavam presos ali e logo Mon estaria com eles. — Não podemos fugir nem tirar o Cristal daqui – Mifitrin quebrou o silêncio, mas nem ela nem Meithel tinham coragem de olhar um para o outro. Elkens era o único que não sentia a vergonha que eles sentiam e o único que procurou pelo olhar de um companheiro. Seus olhos casta-nhos se encontraram com os olhos azuis de Mifitrin e a abrigou a con-tinuar encarando-o. Ela não conseguiu tirar os olhos dele, por mais que desejasse isso. — Só nós resta enfrentar Zander! Mas a sugestão de Elkens não tinha cabimento. Não podiam enfren-tar um Guardião, isto era ilógico.

Page 18: SacerdoteS 28.2

18

— Morton errou ao nos mandar aqui, Elkens. Aceite isso. Ele deve-ria saber que não poderíamos enfrentar um Guardião, é loucura… Mas Elkens não aceitava este fim. Não poderia ser o fim. — Deve haver um motivo para ele ter nos mandado nesta missão, sei que há um motivo para estarmos aqui. — Mas não há, Elkens. Desta vez Morton esteve errado. Não pode-mos derrotar um Guardião… Elkens abriu a boca para responder, mas foi incapaz de encontrar as palavras. Meithel continuava ao seu lado, ainda encarando o chão. Elkens olhou para Zander que se afastava cada vez mais e voltou a abrir a boca, mas Mifitrin o interrompeu: — Eu vi o futuro, Elkens. Logo depois que libertamos Zander meu sexto sentido foi ativado. Eu toquei num vestígio do destino e vi o fu-turo, vi o que vai acontecer. E você quer saber o que eu vi, Elkens? Eu vi Mon escapando. Entende por que estou dizendo que é impossível? Porque é! Mon vai escapar e não podemos mudar isso. O Sacerdote da Alma diminuiu diante da revelação, mas sabia que ela podia não estar concreta. — E o que mais você viu, Mifitrin? Tenho certeza que me viu enfren-tando Zander, pois nada me fará desistir. Sei que você me viu lá… Mifitrin lembrou-se da visão e novamente reviveu a cena em que Zander usava a espada de Kaiser para transpassar o coração de El-kens. Assistiu o seu assassinato mais uma vez e torceu para que aque-la não fosse uma visão concreta. Se aquela visão não fosse concreta, se fosse possível alterá-la, esta era a hora de fazer isso, por isso ela men-tiu: — Você não estava lá, Elkens. Zander estava sozinho. Acho que você vai ficar aqui comigo porque você não estava lá. É a coisa certa a se

Page 19: SacerdoteS 28.2

F r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i a

19

fazer, pois Mon irá escapar e não podemos evitar isso. Você não es-tava lá, Elkens. Não estava… Elkens encheu o peito de ar e sorriu quando respondeu: — Então sua visão estava errada Mifitrin, porque eu vou estar lá. Vou ir até lá e provar que sua visão estava errada, Mifitrin. Se eu es-tiver lá estarei mudando o futuro e talvez possamos impedir que Mon escape. Eu vou estar lá… Elkens afastou-se dos amigos e começou a correr na direção de Zan-der. Mifitrin olhou para ele, mas mal conseguia falar por causa do nó que havia em sua garganta. Elkens não estava mudando o futuro, es-tava fazendo exatamente o que ela sabia que faria. Estava concluindo sua visão. — É IMPOSSIVEL ELKENS, E SABE DISSO – ela gritou en-quanto ele se afastava correndo. – NÃO PODEMOS DERROTAR UM GUARDIÃO, É IMPOSSÍVEL! Elkens parou de correr por um momento, virando-se para ela. Mifitrin enxergou em seu rosto o sorriso mais lindo e verdadeiro que já vira ali. Viu a criança dentro de Elkens, a criança que ainda esbanjava espe-rança, então ouviu sua voz: — Mas eu acredito no impossível, Mifitrin. Eu acredito no impossí-vel! E se foi, voltando a correr, enquanto ela e Meithel continuavam pa-rados ali. Ela começou a tremer, incapaz de tomar uma decisão. Sua respiração se acelerou e ela começou a entrar em pânico. Mas as mãos de Meithel seguraram suas mãos de repente e elas pararam de tremer. Meithel não olhava mais para o chão, olhava para ela: — É o Elkens – ele disse com um sorriso. – O Elkens é assim mesmo, Mifitrin. Ele é assim. Ele está esperando que você tome uma decisão, e eu também – ele apertou as mãos da amiga com mais força, passando

Page 20: SacerdoteS 28.2

20

confiança para ela – Qual é a sua decisão, Mifitrin? O que vamos fazer? Ela entendia que aquilo significava suicídio, mas não lhe restava ou-tra opção. Era aquilo ou ficar parada ali. — Vamos estar lá também – ela disse enquanto puxava Meithel pela mão e começavam a correr atrás de Elkens. – Vamos fazer o impossí-vel!

♦ Mifitrin e Meithel corriam logo atrás de Elkens; os três corriam como uma fúria sem igual, agora sem medo e sem ressentimentos. O último e único desejo que ainda lhes restava era o de deter Zander a qualquer custo, de corrigir o enorme erro que cometeram. Precisavam se redimir por terem enfrentado cada um dos Cavaleiros da Magia para salvar Zander, o aliado de Mon, o traidor que se manteve oculto nos últimos anos, seguindo cada ordem dada por aquele que governa as sombras, por aquele que foi banido de Gardwen por não merecer pisar sobre um solo onde a paz e a beleza da vida não deveriam ser perturbadas. Quando Zander percebeu que estava sendo seguido, parou de andar em direção à muralha e virou-se para encarar seus inimigos. Sem tocar seu colar, executou um feitiço que fez o chão tremer. Elkens, Meithel e Mifitrin recuaram alguns passos e ficaram apreensivos, olhando pa-ra o chão que continuava tremendo como se tivesse acabado de receber um poderoso ataque da marreta branca de Algoz. Algo estava saindo do chão, algo que, pelo tremor que estava causando, parecia assusta-doramente grande. Mas logo perceberam que não havia nada saindo do chão, era o próprio chão que estava se levantando. Enormes pedras

Page 21: SacerdoteS 28.2

F r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i a

21

foram arrancadas, deixando uma cratera gigante entre o Guardião e os Sacerdotes. Mifitrin olhou incrédula para a cratera diante dela, perguntando-se se Zander era tão tolo. — NÃO É UM BURACO QUE VAI NOS IMPEDIR DE TE ALCANÇAR! Mas o objetivo de Zander não era criar um buraco meramente como um obstáculo para atrasá-los e Mifitrin demorou para compreender seu verdadeiro objetivo. As pedras que foram arrancadas do chão pas-saram a girar no ar. Mifitrin se preparou para correr, como se achasse que as pedras seriam lançadas contra eles, mas novamente estava en-ganada. As pedras que giravam entre si passaram a se agrupar de ma-neira ordenada. — A magia dos guerreiros sem-alma – explicou Meithel num sussur-ro. – Ninguém é capaz de criar guerreiros tão fortes quanto os de Zander. Mifitrin e Elkens estremeceram. Já haviam enfrentado esse feitiço e isso foi numa das cavernas no interior da montanha Monaltag, antes de atingirem o lago Lushizar. Foi Mudriack quem utilizou esse feiti-ço, mas era óbvio que os guerreiros sem-alma criado por um Guardião não podiam ser comparados aos de um mero Feiticeiro. Mas algo que os fazia se sentirem ainda pior era o fato de que nem os guerreiros de Mudriack eles teriam conseguido destruir se não fosse pelo Fogo da Magia conjurado pelo próprio Feiticeiro. Foi o Fogo Mágico que des-truiu os guerreiros na ocasião, e não os Sacerdotes. Então como pode-riam derrotar os guerreiros criados por um Guardião? Meithel podia sentir a enorme quantidade de magia contida nos guer-reiros sem-alma ainda em formação. As pedras, de todos os tamanhos, continuavam girando e se juntando, dando forma às monstruosas es-

Page 22: SacerdoteS 28.2

22

tátuas de pedra. Quando ficaram prontas, Elkens lembrou-se da es-tátua de ouro que enfrentou no Templo do Sacrifício e compreendeu que o feitiço-base era o mesmo, apesar de nem mesmo a estátua de Shi-ron poder ser comparada às de Zander em se tratando de poder. Três estátuas foram formadas, idênticas, uma para cada um dos Sa-cerdotes. Não tardaram em atacar com seus punhos, e os Sacerdotes se viram obrigados a recuar para não serem atingidos. Pequenas fendas abriram-se no chão onde as estátuas atingiram. — O que faremos? – perguntou Elkens, mas ninguém respondeu. Os três tinham a mão em seus colares, mas não sabiam o que usar contra os guerreiros sem-alma. Recuavam um passo de cada vez numa tenta-tiva de se afastarem o máximo possível daquelas estátuas colossais. As estátuas estavam chegando cada vez mais perto. — O que faremos? Atacaram mais uma vez, mas novamente atingiram o chão, onde mais fendas foram abertas. — O que faremos…? — Não podemos fazer nada – disse Meithel ao lado de Elkens. – Não temos a menor chance de derrotar estes monstros. Por mais que tenhamos feito coisas incríveis, ainda somos Sacerdotes, nada mais que isso. Não temos a menor chance… — Vocês vão na frente – Mifitrin disse de repente. — O quê? – perguntou Elkens incrédulo. Não podia acreditar no que ouvia, Mifitrin já devia saber que ele não iria mais abandoná-la. — Vocês vão na frente – ela repetiu, então olhou para Elkens e apontou o dedo indicador para ele – e desta vez não discuta! Não há muito tempo… Enquanto continuavam recuando para se afastar das estátuas, Mifi-trin fechou os olhos e tocou seu colar, concentrando-se nele. Elkens e

Page 23: SacerdoteS 28.2

F r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i a

23

Meithel apenas observavam curiosos, então surgiu uma outra Mifi-trin ao lado da primeira. Ela estava apontando o dedo para Elkens, repetindo os exatos movimentos que Elkens havia visto ainda há pou-co: — E desta vez não discuta… Então ela fechou os olhos e tocou seu colar, repetindo os movimentos da Mifitrin original. Outra Mifitrin surgiu: — Não há muito tempo… E outra Mifitrin surgiu, e mais outra, e outra. — Vocês vão na frente… — Não discuta… — Não há muito tempo… Logo todas as réplicas de Mifitrin pararam de falar e fizeram o mes-mo que a original: ficaram em silêncio, fecharam os olhos e tocaram seus colares. Todas conjuraram ao mesmo tempo um bastão formado por luz sólida, anil, então abriram os olhos e gritaram em uníssono: — VÃO AGORA! Elkens ficou sem reação, ao mesmo tempo admirado pelo feitiço de Mifitrin, além de sua coragem, e contrariado em fazer o que ela man-dava, contrariado em fazer o que prometera a si mesmo nunca mais repetir. Mas Meithel o agarrou pelo braço e o forçou a correr para longe das estátuas. Enquanto Mifitrin distraía os guerreiros sem-alma, Elkens e Meithel corriam para o lado oposto, pretendo dar a volta pelas estátuas e a cratera, então poderiam continuar perseguin-do Zander. Enquanto corriam, todas as Mifitrin enfrentavam as es-tátuas; havia pelo menos cinco Sacerdotisas para cada uma das três estátuas, mas o plano não estava funcionando como ela planejava. Uma das estátuas deixou de dar atenção às Sacerdotisas e avançou

Page 24: SacerdoteS 28.2

24

contra os dois Sacerdotes que continuavam correndo, provando que Zander, além de conjurar os guerreiros sem-alma mais poderosos, tam-bém criava os mais inteligentes. A estátua correu a passos largos, cau-sando novos tremores no chão a cada passada, e Elkens e Meithel ti-veram de recuar para não serem esmagados. — Não há como passar – disse Elkens decepcionado. Meithel apenas olhou para ele e respondeu: — Não por baixo. Meithel segurou Elkens pelo pulso e, com a mão livre, tocou seu pró-prio colar. Logo Elkens sentiu seus pés deixarem o chão e ele compre-endeu o que Meithel planejava: estava usando um feitiço de levitação; iriam passar por cima das estátuas. Primeiro precisavam ganhar altura, para que pudessem passar sobre os inimigos de pedra sem qualquer risco. A cada segundo subiam metros e metros no ar, até que logo estava alto o suficiente e Meithel passou a conduzi-los para frente. Levitavam rapidamente por sobre as está-tuas, em direção ao Guardião que agora estava muito perto da grande muralha que protegia os Domínios da Magia. — ESPERE! – gritou Elkens de repente. Parecia apavorado. — O que aconteceu? — Precisamos voltar! Meithel olhou para baixo e entendeu o motivo do desespero do amigo. As Mifitrin estavam desaparecendo rapidamente, pois não agüenta-vam mais que um ataque das estátuas; estavam sendo derrotadas. Não demorou para que somente a verdadeira Mifitrin estivesse na ba-talha e foi nesse momento que Elkens gritou. Mifitrin tentava apenas fugir dos golpes, mas foi atingida pelas costas e jogada de peito no chão. Desta vez parecia ter se machucado, pois não foi tão rápida ao se levantar.

Page 25: SacerdoteS 28.2

F r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i a

25

Meithel não sabia o que fazer, não conseguia se decidir o que era prioridade naquela situação: — Precisamos ir e impedir que Mon seja libertado… — NÃO SE ISSO CUSTAR A VIDA DE MIFITRIN – gritou El-kens zangado. Estava decidido a voltar e Meithel não o impediria. – Me faça volta ao chão agora! Meithel olhou uma última vez para o Guardião que estava cada vez mais perto da muralha, mas decidiu que não havia outra maneira e re-solveu que os dois deveriam voltar. Estavam muito longe de Mifitrin para fazê-la levitar também e, mesmo que fizesse isso, as estátuas fi-cariam sem ninguém para atacar e os perseguiriam até que resolvessem voltar ao chão. Definitivamente não havia outra maneira. Há uns dez metros do chão, Elkens fez um movimento brusco, fazen-do com que a mão de Meithel lhe escapasse do aperto em seu pulso. Fazendo isso, Elkens se livrou do feitiço de levitação, então despen-cou pelo ar. Quando atingiu o chão, correu e se atirou contra Mifitrin. Os dois caíram e rolaram pelo chão no exato momento em que uma das estátuas atingia o chão onde Mifitrin estava um segundo atrás. — Você está bem? – perguntou Elkens ajudando-a a se levantar. — Não deviam ter voltado – disse ela irritada. — É, eu sei – Elkens respondeu secamente. – Mas voltamos! Mais uma vez os três Sacerdotes estavam juntos no chão, de volta ao mesmo ponto de onde tinham começado. As estátuas avançavam rapi-damente contra eles. Cada um deles segurava seu colar enquanto recu-avam, e Elkens não conseguiu deixar de refazer a mesma pergunta: — O que faremos? Mas ninguém respondeu, pois não havia nada a ser feito. Que feitiço poderiam usar que fosse forte o bastante para derrotar os guerreiros sem-alma e que fosse, ao mesmo tempo, conjurado de forma rápida e

Page 26: SacerdoteS 28.2

26

precisa? Quanto mais forte um feitiço, assim como a Mundus Solven e o Ciclone Gama, mais tempo é necessário para ser preparado, além de concentração. Duas coisas que eles não tinham no momento. Tempo era algo que Mifitrin podia conseguir, mas isso se a pessoa que esti-vessem enfrentando não se tratasse de um Guardião. Ela sabia que Zander daria um jeito de anular qualquer manipulação do Tempo que ela usasse, portanto seria apenas um desperdício de magia. — Elas são fortes demais – disse Mifitrin por fim. O significado das suas palavras, o que ela tentou omitir, foi claramente dito por Meithel: — É impossível vencer. Os guerreiros sem-alma estavam cada vez mais pertos. O chão tremia enquanto eles corriam. Os Sacerdotes estavam a ponto de desistir quando… NÃO DESISTAM! Os três levaram um susto ao ouvir aquela voz, mas não demoraram a perceber que quem as disse não estava ali. Eles ouviram a voz apenas em suas mentes, pois ela estava vindo de outro lugar. Para Mifitrin era uma voz completamente desconhecida, mas Elkens e Meithel reco-nheceram a voz feminina e sensual: — Shanara? Confiamos em vocês, ela voltou a dizer. Não podemos ir ajudá-los, mas estamos todos aqui. Saibam que não estão sozinhos, contamos com vocês… Meithel sentiu seu coração encher-se de um calor reconfortante, uma sensação que a voz de Shanara sempre lhe causava. A Amazona da Magia se destacava entre os Cavaleiros por sempre dizer o que os ou-tros precisam ouvir. Meithel sabia disso muito bem. Quando ainda era um Aprendiz, esteve prestes a jogar seu colar no lago Lushizar e de-

Page 27: SacerdoteS 28.2

F r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i a

27

sistir de ser um protetor, mas foi Shanara quem lhe convenceu do contrário e lhe incentivou a continuar tentando sempre, sem nunca desistir. Após tantos anos, mais uma vez as palavras de Shanara lhe traziam forças para continuar lutando e esperanças para fazê-lo acre-ditar que era capaz. Elkens e Mifitrin sentiam as mesmas coisas. O fato de saber que todos os Cavaleiros, os mesmos que eles enfrentaram como inimigos, agora estavam torcendo por eles proporcionava uma sensação magnífica. Por mais que estivessem presos ali com Zander, por mais que estivessem isolados e desprovidos de qualquer ajuda, ago-ra sabiam que não estavam sozinhos. Sabiam que havia pessoas tor-cendo e contando com eles e isso os fazia se sentirem maiores e mais importantes do que realmente eram. Sem que se dessem conta, haviam parado de recuar. As gigantescas es-tátuas de pedra continuavam avançando contra eles, mas os Sacerdo-tes haviam parado de fugir. Ainda não sabiam como vencê-las, mas, graças às palavras de Shanara, acreditavam que isso era possível. De repente sentiram que algo estava prestes a acontecer. Continua-vam sentindo a ligação mágica estabelecida por Shanara entre o tem-plo do Guardião e o labirinto em que o templo de Kaiser havia se transformado. Sentiam a ligação cada vez mais forte, o que os levou a achar que Shanara voltaria a se comunicar com eles. Ficaram conten-tes na esperança de ouvir aquela voz reconfortante mais uma vez, mas isso não aconteceu. A voz de Shanara não voltou a ser ouvida como esperavam, mas Shanara lhes mandou um presente através da ligação mágica entre os dois templos estabelecida pelo poder do seu báculo branco. Através desta ligação, Shanara foi capaz de lhes enviar uma grande e surpreendente ajuda. Três objetos brancos e reluzentes apare-ceram no ar diante de cada um dos Sacerdotes.

Page 28: SacerdoteS 28.2

28

O objeto diante de Meithel tinha a forma de uma enorme corrente que dançava a sua volta como uma serpente de pedra. Para Mifitrin surgiu um par de luvas de couro, onde havia três grandes garras presas em cada uma das luvas. Diante de Elkens estava uma enorme marre-ta. Eram as armas brancas de Magai, Zephir e Algoz respectivamen-te. As armas brancas estavam ali para ajudá-los.

Page 29: SacerdoteS 28.2

F r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i aF r o n t e i r a d a M a g i a

29