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SERGIO DE LUCENA FERREIRA
SANEAMENTO BÁSICO NO BRASIL: A QUESTÃO DA
UNIVERSALIZAÇÃO DOS SERVIÇOS NO CONTEXTO DE
PARTICIPAÇÃO PRIVADA
SALVADOR
2003
SERGIO DE LUCENA FERREIRA
SANEAMENTO BÁSICO NO BRASIL: A QUESTÃO DA
UNIVERSALIZAÇÃO DOS SERVIÇOS NO CONTEXTO DE
PARTICIPAÇÃO PRIVADA
Versão definitiva da monografia apresentada no curso de graduação de Ciências Econômicas da Universidade Federal da Bahia como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Ciências Econômicas
Orientador: Prof. José Carrera Fernandez
SALVADOR
2003
AGRADECIMENTOS
Durante a elaboração deste trabalho monográfico e ao longo do curso de graduação em
economia, contei com valiosos apoios e incentivos de várias pessoas que merecem, neste
momento, a minha homenagem, apesar do risco de ocorrer em omissões quando citá-las.
Ao meu orientador Prof. José Carrera Fernandez, que mesmo com todos os seus afazeres
aceitou ser meu orientador na elaboração da monografia e acompanhou atentamente ao
andamento do trabalho e principalmente pela paciência em me orientar durante todo esse
tempo.
Aos meus amigos Vanderlei Gomes e Luciano Damasceno, pela amizade, interlocução e
principalmente pelo apoio dado nos momentos mais difíceis durante o processo de realização
deste trabalho.
A todos os colegas da faculdade que de alguma forma contribuíram para este trabalho ao
tornarem agradáveis esses cinco anos de estudo e pelos trabalhos desenvolvidos em equipe,
fornecendo experiência para minha vida profissional.
A Ingrind Queiroz, minha noiva, pelo carinho e dedicação com que sempre tem me tratado.
A minha irmã Simone Lucena, que mesmo à distância muito contribuiu com críticas e
sugestões.
E por fim aos meus pais que são responsáveis por toda a minha formação educacional e
cultural, pois sem o esforço deles seguramente não seria possível a conclusão desta etapa de
vida.
RESUMO
Este trabalho aborda a questão do saneamento básico no Brasil e analisa a parceria público-
privado para prestação dos serviços de saneamento, a partir do diagnóstico dos déficits desses
serviços no setor de saneamento. A participação privada no setor de saneamento tornou-se
necessária devido à atrofia dos mecanismos de financiamento que sustentaram o setor nas
décadas passadas além da restrição fiscal a que o setor público foi submetido. Dessa forma, é
feita uma avaliação de seis concessões municipais, atraídas para investir no setor. Observa-se
que, tanto as companhias estaduais de saneamento básico quanto os municípios, não estão
aptos a obterem financiamentos e os investimentos requeridos se afiguram bastante elevado e
atrativos à iniciativa privada. Percebe-se desta forma, que esta iniciativa talvez tenha maior
interesse apenas em investir em áreas com maiores possibilidades de retorno financeiros,
deixando sem atendimento justamente as áreas mais pobres, onde estão aqueles que não tem
condições de pagar tarifas mais elevadas.
Palavras-chave: Saneamento básico – Brasil; déficit; privatização
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
TABELA 1 - DISTRIBUIÇÃO REGIONAL DA COBERTURA EM SANEAMENTO BÁSICO........................9
TABELA 2 - DISTRIBUIÇÃO REGIONAL DA COBERTURA EM ESGOTAMENTO SANITÁRIO COM A
INTRODUÇÃO DE FOSSA SÉPTICA........................................................................................10
TABELA 3 - DÉFICIT DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA DE FAMÍLIAS POR RENDIMENTO................11
TABELA 4 – DISTRIBUIÇÃO REGIONAL DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA ......................................12
TABELA 5 – DISTRIBUIÇÃO REGIONAL DOS DÉFICITS EM ESGOTAMENTO SANITÁRIO .................14
TABELA 6 -INVESTIMENTOS COMO PROPORÇÃO DO PIB 1970 – 97............................................17
TABELA 7 - REALIZAÇÕES DO PLANASA %...........................................................................19
TABELA 8 -COBERTURA REGIONAL EM 1991 % .........................................................................19
TABELA 9 - DADOS SOBRE A CAPACIDADE DE PAGAMENTO DE ESTADOS, MUNICÍPIOS,
COMPANHIAS DE SANEAMENTO E ÓRGÃOS MUNICIPAIS DE SANEAMENTO - 1996/97 ..........26
QUADRO 1 - CONCESSÃO DOS SERVIÇOS DE SANEAMENTO BÁSICO À INICIATIVA PRIVADA.......32
QUADRO 2 - TRANSFORMAÇÕES INSTITUCIONAIS EM CURSO NOS ESTADOS ..............................34
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 6
2 O DÉFICIT DO SETOR E AS DESIGUALDADES REGIONAIS..................... 8
3 A POLÍTICA DE SANEAMENTO BÁSICO NO BRASIL ............................... 16
3.1 CARACTERÍSTICAS DO MODELO INSTITUCIONAL...................................... 18 3.2 ALGUNS PROCESSOS DE PARTICIPAÇÃO PRIVADAS NO SETOR .............. 25
4 AS RECENTES EXPERIÊNCIAS DE PRIVATIZAÇÃO DE SANEAMENTO
NO BRASIL ............................................................................................................ 35
4.1 SEIS EXEMPLOS DE PRIVATIZAÇÃO................................................................ 37 4.2 AS DIFICULDADES ENCONTRATADAS PELA PRIVATIZAÇÃO E A
ATRATIVIDADE DO SETOR DE SANEAMENTO.............................................. 43
5 CONCLUSÃO.......................................................................................................... 45
REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 48
1 INTRODUÇÃO
No Brasil assim como em outros países que adotaram o modelo de abertura e globalização1,
as políticas públicas nas áreas sociais vem sendo substancialmente diminuídas, o que
demonstra um total descompromisso com os serviços de saneamento básico. Isso fez
aumentar ainda mais a pobreza no Brasil. Nassif (2000) tomando por base as informações do
Ministério da Saúde, mostrou que a cada 24 horas morrem no Brasil 20 crianças devido à falta
de saneamento básico, especialmente esgoto sanitário, os dados revelam que 25% dos 41,8
milhões de domicílios brasileiros não são atendidos por rede de abastecimento de água e 55%
não têm acesso a esgoto sanitário, ou seja, 88 milhões de brasileiros não são assistidos por
esgoto sanitário.
Esse quadro demonstra a necessidade da retomada imediata dos investimentos em saneamento
básico, para que a sociedade brasileira consiga atingir adequadamente os serviços de
saneamento com o crescimento da população. A situação agrava-se principalmente nos
pequenos municípios e comunidades menos desenvolvidas onde estão localizadas grandes
partes das populações de baixa renda. Isso porque, são nessas áreas que se encontram os
maiores déficits desses serviços e, portanto, faz-se necessário o atendimento dessas demandas.
Apesar dos grandes investimentos realizados durante as décadas de 70 e 80, na fase áurea do
Plano Nacional de Saneamento (PLANASA), houve um grande aumento da demanda pôr
serviços de saneamento básico no Brasil. Isso acarretou um aumento dos déficits,
concentrando-se, sobretudo, nas regiões mais pobres do país, Norte e Nordeste. Atualmente o
poder público encontra-se bastante limitado no que concerne ao atendimento das crescentes
demandas desses serviços.
É diante desse cenário de atrofia dos mecanismos de financiamentos, que sustentaram o setor
durante décadas, que o governo passou a focar os setores de infra-estrutura, instituindo
programas de incentivos à privatização, em especial para o setor de saneamento básico que, a
partir daí pôde contar com a participação privada.
1 Desregulamentação dos mercados, privatizações e progressiva diminuição do papel do estado, seguindo ordeiramente aos dez mandamentos do que ficou conhecido como "Consenso de Washington".
A nossa preocupação com este trabalho é com o recente período de intensa privatização das
empresas públicas prestadora de serviços, que ao serem privatizadas tenderão ao aumento
significativos das tarifas, haja vista que a lógica de determinação dos preços das empresas
privadas, que visam primeiramente a obtenção de lucro, difere em muito das empresas
estatais, pelo menos nas práticas verificadas ao longo do tempo.
Nosso objetivo com este trabalho foi estabelecer uma análise da concessão privada no setor de
saneamento básico como elemento indutor de desenvolvimento, dando ênfase às
potencialidades do setor e a capacidade de atração de investimento privado para o mesmo,
sem que se perca de vista o aumento da cobertura ao nível da demanda existente. O trabalho
está organizado em cinco capítulos, descritos a seguir. Após esta introdução, no capítulo dois,
é feita uma análise dos déficits do setor de saneamento básico no país, mostrando as
desigualdades regionais existentes no país com claras evidências de iniqüidade social. Para
que a preterida universalização seja alcançada, faz-se necessário à utilização de enormes
recursos em investimentos para o atendimento dessas demandas. O capítulo três analisa a
queda dos investimentos públicos no setor de saneamento do país e alguns problemas
enfrentados na gestão pública do setor que culminaram na extinção do modelo do PLANASA.
São também apresentadas propostas para a privatização no setor e alguns exemplos de
privatização. No capítulo quatro, à luz de alguns processos de privatização, são analisadas seis
experiências de concessões privadas, onde se tenta demonstrar as dificuldades encontradas e
os fatores de atratividade para o setor. Por fim, no quinto capítulo, encontra-se a conclusão,
com algumas considerações a respeito das privatizações e da principal atratividade para o
capital privado.
2 O DÉFICIT DO SETOR E AS DESIGUALDADES REGIONAIS
Durante os últimos 40 anos, o Brasil expandiu os serviços de saneamento de maneira bastante
expressiva, sendo que o fornecimento de água cresceu para atingir mais de 100 milhões de
brasileiros e os serviços de esgotamento sanitário estenderam-se para mais de 50 milhões.
Atualmente o nível de cobertura dos serviços de abastecimento de água alcança cerca de 78%
e o de acesso aos serviços de esgoto já atinge quase que 70%. Esses dados demonstram que
apesar dos avanços, os serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário no Brasil
estão distantes da preterida universalização. Taís índices apontam também no sentido de que o
saneamento básico2 precisa ser atacado em um de seus vieses mais forte que é o esgotamento
sanitário (CARRERA, 2001, p.6).
Segundo o Banco Mundial, o Brasil enfrenta duas crises no gerenciamento dos recursos
hídricos, que são as secas nas regiões do Nordeste e a poluição de águas em grandes centros
urbanos. As desigualdades de atendimento dos serviços de saneamento básico localizam-se
especialmente nas regiões Norte e Nordeste, onde se verificam os menores índices de
cobertura, com claros sinais de iniqüidade social. Os índices de baixo atendimento se
concentram mais nas camadas de baixa renda - especialmente nas periferias dos grandes
centros urbanos, pequenos municípios e localidades em áreas rurais. A grande maioria dos
rios que cruzam áreas urbanas está poluída, elevando os riscos de doenças (principalmente de
doenças de veiculação hídrica). A poluição das águas nessas áreas limita os usos múltiplos
dos recursos hídricos (abastecimento de água, turismo, lazer, pesca, irrigação, geração de
energia, entre outras), impactando negativamente as economias das regiões afetadas, além de
tornar muito oneroso os custos de tratamento de água para os seus usuários.
2 Para fins deste estudo, considera-se saneamento básico o abastecimento de água tratada e esgotamento sanitário, sendo este último a coleta de esgoto e seu tratamento.
Tabela 1 - Distribuição regional da cobertura em saneamento básico
Total de domicílios atendidos
Cobertura (%)
Total de domicílios atendidos
Cobertura (%)
Norte 2.263.971 1.265.955 55,9 130.780 5,8Nordeste 12.053.041 7.474.788 62,0 2.652.885 22,0Sudeste 21.207.265 18.942.002 89,3 15.576.786 73,5Sul 7.554.319 6.094.050 80,7 1.726.312 22,9Centro-Oeste 3.358.132 2.421.686 72,1 1.034.083 30,8Brasil 46.421.832 36.187.206 78,0 21.120.846 45,5
N.º domicílios
Esgotamento sanitário (Rede de esgoto)Abastecimento de água
Região Geográfica
Fonte: IBGE - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, 2001 Nota: 1) Para Brasil: exclusive a área rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá. 2) Para Região Norte: exclusive a área rural de todas as Unidades da Federação componentes.
Ainda que recentes incrementos tenham se verificados nos índices de cobertura nos serviços
de saneamento básico no país, persiste uma demanda significativa da população desasistida.
Para termos idéia da gravidade desses índices basta observamos que, com base nos dados da
PNAD em 1996, o atendimento dos serviços de abastecimento alcançavam 77,6%, e os de
rede coletoras de esgotos 40,3%. Considerando-se fossas sépticas, como solução adequada à
disposição final dos esgotos, a cobertura subiria para 43,1%, reduzindo o déficit em 1,1
milhão de domicílios nas áreas rurais. Existindo, portanto 8,8 milhões de domicílios não
atendidos por redes de abastecimento de água, e 23,7 milhões não ligados às redes coletoras
de esgotos (PENA; ABICALIL, 1999).
Comparando a PNAD 1996 com a PNAD 2001, está última mostra que a cobertura de
abastecimento de água aumentou muito pouco durante esse período, passando para cerca de
78,0% de domicílios que são atendidos pelos serviços de abastecimento de água, o que
representa 10,2 milhões de domicílios não atendidos; enquanto que a cobertura de rede
coletora de esgoto aumentou para 45,5 %, que representa apenas 21,1 milhões de domicílios
ligados à rede coletora de esgotos (Tabela 1).
Tabela 2 - Distribuição regional da cobertura em esgotamento sanitário com a introdução de fossa séptica
Total(c/ fossa séptica)
Cobertura %
(c/ fossa séptica)
Cobertura %
Cobertura %
Norte 1.064.211 52,8 - - 5,8 Nordeste 2.331.605 41,4 195.971 23,6 43,0 Sudeste 2.165.354 83,7 188.391 74,3 84,5 Sul 3.143.290 64,5 402.908 28,2 69,8 Centro-Oeste 421.280 43,3 12.374 31,2 43,7 Brasil 9.125.740 65,2 799.644 47,2 66,9
RuralN.º domicílios
Região Geográfica
Urbano
Fonte: IBGE - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, 2001 Nota: 1) Para Brasil: exclusive a área rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá. 2) Para Região Norte: exclusive a área rural de todas as Unidades da Federação componentes. Se considerarmos novamente fossa séptica apenas na área rural como solução adequada, a
cobertura subiria para 47,2%, fazendo cair o déficit em 799.644 domicílios rurais. No entanto,
admitindo-se que nas áreas urbanas, além das rurais, a introdução de fossas sépticas também
pode se constituir em solução adequada à disposição final dos esgotos, o nível de cobertura
dos serviços aumentaria significativamente, saltando para 65,2%, o que elevaria a cobertura
total no Brasil para 66,9%3 (Tabela 2) e reduziria o déficit em esgotamento sanitário para
9.125.740 domicílios urbanos.
Há claros sinais de iniqüidade social, tendo em vista que dos 14,0 milhões de domicílios no
Brasil com renda familiar de até 2 salários-mínimos, somente 8,4 milhões estão ligados à
redes públicas de abastecimento de água, ou seja, 40% dos domicílios dessa faixa de renda
não são atendidos. Isso equivale dizer também que cerca de 5,6 milhões de famílias com
renda mensal familiar em até 2 salários-mínimos não são atendidas por redes de
abastecimento de água (Tabela 3). Em 1996, esse percentual atingia 42,5% dos não atendidos
e que correspondiam a 4,0 milhões de domicílios (PENA; ABICALIL, 1999, p.112).
Nas áreas consideradas rurais pelo IBGE, as desigualdades são ainda mais acentuadas. Em
1996, 14,9 % dos 3,5 milhões de domicílios com renda mensal de até 2 salários-mínimos
eram atendidos por redes de abastecimento de água, representando um déficit nesse segmento
de renda de 85,1% equivalente a cerca de 3,0 milhões de famílias (PENA; ABICALIL, 1999,
3 É comum entre os pesquisadores não se considerar fossa séptica em áreas urbanas. Neste trabalho, entretanto, adota-se a fossa séptica como solução também adequada nas áreas urbanas, como periferias por exemplo.
p.112). Em 2001, 12,1% dos 3,8 milhões de domicílios atendidos na mesma faixa de renda
eram atendidos por redes de abastecimento de água, o que demonstra um déficit desse
segmento de 87,9% representando cerca de 3,4 milhões de famílias (Tabela 3).
Tabela 3 - Déficit de abastecimento de água de famílias por rendimento
CO NE N SE S TotalUrbana 26,4 28,9 57,0 10,4 11,0 22,0 Rural 91,4 89,2 - 87,0 81,5 87,9 Total 41,0 51,3 57,0 23,5 32,3 40,0 Urbana 19,4 13,8 43,0 4,9 6,3 10,5 Rural 88,6 82,1 - 76,9 75,5 79,5 Total 28,5 28,9 43,0 11,0 19,5 19,8 Urbana 12,5 6,4 29,8 2,7 5,2 5,6 Rural 85,1 77,4 - 66,6 76,5 74,1 Total 17,4 12,7 29,8 4,9 13,1 9,6 Urbana 8,3 4,8 27,7 1,4 4,2 3,8 Rural 100,0 68,7 - 76,0 77,3 77,1 Total 11,7 7,4 27,7 2,7 8,1 5,8
Classe de Rendimentos Situação
Até 2 SM
Mais de 2 a 5 SM
Mais de 5 a 10 SM
Mais de 10 SM
Déficit (%)
Fonte: IBGE - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, 2001
Nota:
1) Para Brasil: exclusive a área rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá.
2) Para Região Norte: exclusive a área rural de todas as Unidades da Federação componentes.
3) A categoria Sem rendimento inclui as pessoas de referência que receberam somente em benefícios.
4) Exclusive os rendimentos dos moradores cuja condição no domicílio era pensionista, empregado doméstico ou
parente de empregado doméstico.
Quando se analisa o acesso aos serviços de abastecimento de água para os segmentos de renda
maiores, observa-se que os déficits vão caindo e os índices de atendimento se aproximam da
universalização. Para famílias com renda entre 2 e 5 salários-mínimos o déficit cai pela
metade, passando para 19,8%. Novamente ocorre uma redução pela metade do déficit quando
o segmento de renda dobra para a faixa compreendida entre 5 e 10 salários-mínimos. Para as
famílias com rendimentos superiores a 10 salários-mínimos o nível de atendimento aproxima-
se bastante da universalização. De acordo com (PENA; ABICALIL, 1999) esses dados, além
de poder demonstrar a qualidade de vida da população, servem também para distinguir os
pobres dos não pobres.
É nas regiões mais pobres, especialmente o Norte e Nordeste e principalmente nas áreas
urbanas, que esses números são ainda mais dramáticos. Na região Nordeste, o déficit urbano
chega a 28,9%, enquanto que na região Norte atinge 57,0%. Comparativamente com as
regiões Sul e Sudeste, respectivamente, os déficits são 11,0 % e 10,4% (Tabela 3).
Tabela 4 – Distribuição regional de abastecimento de água
Total Déficit (%) Total Déficit (%)
Norte 2.263.971 - 1.265.955 44,1 - -Nordeste 8.706.711 3.346.330 7.033.720 19,2 441.068 86,8Sudeste 19.527.302 1.679.963 18.605.190 4,7 336.812 80,0Sul 6.222.740 1.331.579 5.802.228 6,8 291.822 78,1Centro-Oeste 2.907.204 450.928 2.376.305 18,3 45.381 89,9Brasil 39.613.032 6.808.800 35.072.123 11,5 1.115.083 83,6
Região Geográfica
Urbano RuralTotal de domicílios atendidosN.º domicílios
Urbano Rural
Abastecimento de água
Fonte: IBGE - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, 2001
Nota:
1) Para Brasil: exclusive a área rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá.
2) Para Região Norte: exclusive a área rural de todas as Unidades da Federação componentes.
Os déficits dos serviços apresentam diferenças de acordo ao grau de urbanização dos
municípios, sendo proporcionalmente menor nas áreas urbanas e bastante elevados nas áreas
rurais (ainda que para a região Norte a PNAD 2001 não tenha dados, mas é justo supor que o
déficit nas áreas rurais dessa região seja ainda muito elevado). De acordo com os dados da
PNAD 1996, havia um déficit estimado de 8,9% em abastecimento de água, que representava
2,8 milhões de domicílios, num universo urbano de 32,2 milhões de domicílios. Em
esgotamento sanitário os índices de cobertura são muito inferiores, com um déficit urbano
aproximado de 51,1%, representando 16,4 milhões de domicílios de um total de 7,5 milhões
de domicílios (PENA; ABICALIL, 1999).
A PNAD 2001 mostra que o déficit de abastecimento de água aumentou para 11,5%,
correspondente a 4,5 milhões de domicílios sem rede de abastecimento de água de um total de
39,6 milhões de domicílios urbanos (tabela 4). Para esgotamento sanitário apurou-se que o
déficit urbano é de 24,2% (considerando-se rede coletora e fossa séptica nas áreas urbanas),
representando 30,0 milhões de domicílios (tabelas 1 e 2). Esse crescimento do déficit está
fortemente concentrado nas regiões mais pobres, que são as regiões Norte e Nordeste do país.
Em 1996, o déficit urbano na região Norte em termos de rede de abastecimento de água era de
30,9%, o que representa um total de 4,8 mil domicílios. Na região Nordeste, o déficit é de
13,9%, correspondendo a 9,6 mil domicílios. Em 2001, ao déficit urbano de abastecimento de
água na região Norte passou para 44,1%, o que corresponde a aproximadamente 1,0 milhão de
domicílios. No Nordeste, o déficit aumentou para 19,2%, totalizando quase 1,7 milhões de
domicílios sem acesso aos serviços de abastecimento de água.(Tabela 4).
Para as áreas consideradas rurais, a PNAD 2001, apurou um déficit total no país de cerca de
83,6% no abastecimento de água, que equivale a 1,1 milhão de domicílios rurais não ligados à
rede de abastecimento de água (tabela 4). No que tange aos serviços de abastecimento de água
nas áreas rurais, os índices de atendimento são ainda piores quando comparados com as
médias de atendimentos dos serviços nas áreas urbanas. O déficit para os serviços de água das
áreas rurais apresenta distribuição, além de mais elevada, mais uniforme.
Esse fator de aumento significativo nos déficits dos serviços em saneamento, sobretudo nas
regiões mais pobres e especialmente quando a prestação desses serviços exige uma adequação
da infra-estrutura pública baseada em redes (como é o caso dos serviços de abastecimento de
água), pode ser explicado pelo fato de que os índices de urbanização apresentam uma forte
correlação com o atendimento dos serviços de saneamento. É justamente nas Regiões Norte e
Nordeste que a urbanização vem crescendo em velocidade acima da média nacional
(ABICALIL, 2002, p.118).
No esgotamento sanitário, o déficit urbano nacional é 24,2% mais elevado que o déficit de
água (Tabela 5), o que pode sugerir que os investimentos em saneamento básico devam
priorizar sobretudo a eliminação do déficit em esgotamento sanitário, revertendo a tradição
que priorizava os investimentos para aumentos da rede de abastecimento de água.
Tabela 5 – Distribuição regional dos déficits em esgotamento sanitário
Total Déficit (%) Total Déficit
(%)Norte 2.263.971 - 1.194.991 47,2 - Nordeste 8.706.711 3.346.330 4.936.110 43,3 244.351 92,7 Sudeste 19.527.302 1.679.963 17.582.282 10,0 348.249 79,3 Sul 6.222.740 1.331.579 4.857.960 21,9 414.550 68,9 Centro-Oeste 2.907.204 450.928 1.451.177 50,1 16.560 96,3 Brasil 39.613.032 6.808.800 30.022.520 24,2 1.023.710 85,0
Região Geográfica
Esgotamento SanitárioN.º domicílios Total de domicílios atendidos
Urbano RuralRuralUrbano
Fonte: IBGE - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, 2001
Nota:
1) Para Brasil: exclusive a área rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá.
2) Para Região Norte: exclusive a área rural de todas as Unidades da Federação componentes.
Nas áreas rurais verifica-se que os níveis de coberturas em esgotamento sanitário de todas as
regiões do país são baixos, embora as regiões Sul e Sudeste apresentem indicadores melhores
do que a média nacional. Os déficits dos serviços de esgotos no país, assim como os de água,
também são grandes e uniformemente distribuídos.
Comparando os déficits em esgotamento sanitário na área rural, que é de 85,0%, com o de
abastecimento de água, que é de 83,6%, observa-se que os déficits nacionais nas áreas rurais,
tanto de água quanto de esgotos, são muito próximos. De todo modo, as desigualdades
regionais ainda persistem, mas as duas regiões mais desenvolvidas do país possuem índices
menores do que a média nacional.
O déficit do setor de saneamento básico no país concentra-se no atendimento à população de
baixa renda (Tabela 3), localizadas principalmente nas regiões menos desenvolvidas, nas
periferias dos grandes centros urbanos, pequenas localidades e em áreas rurais esgotos
(PENA; ABICALIL, 1999, p.111). É justamente nos níveis de renda mais baixos, ou seja, nas
populações com menor capacidade de pagamento de tarifas, que se deve discutir de que forma
a universalização dos serviços de saneamento básico pode ser feita, sem que isso implique em
maior endividamento do setor público, já que as medidas adotadas pelo Governo Federal
restringem, via de regra, os limites de endividamento do setor público.
É diante desse cenário de necessidade de investimentos para universalizar os serviços de
saneamento básico, e da perda da capacidade de realização de investimentos pelo setor
público, que surge, de forma quase que inevitável, a necessidade de parcerias privadas no
setor de saneamento básico do país.
3 A POLÍTICA DE SANEAMENTO BÁSICO NO BRASIL
O início da década de 1980 é marcado pela inflexão dos investimentos no setor de saneamento
no país, proporcionados pelo PLANASA (Plano Nacional de Saneamento) cujo objetivo
principal era a eliminação do déficit de abastecimento de água e serviços de esgotos até 1980.
Além do choque do petróleo, em 1979, a elevação substancial das taxas de juros no mercado
internacional associada à suspensão do crédito aos países endividados levou o país a adotar
medidas políticas recessivas, que previam, entre outras medidas contenção dos gastos e dos
investimentos públicos. Neste período, o governo passa a controlar as tarifas de água e esgoto
devido a política anti-inflacionária de controle dos preços (período que o país chegou a atingir
índices de hiper-inflação), o que antes se constituía fator de equilíbrio financeiro das CESBs4
(Companhias Estaduais de Saneamento Básico) agora fica bastante comprometido. Esse fator
de controle sobre as tarifas do setor público (não apenas das empresas de saneamento), irá se
constituir numa grande forma de intervencionismo do Estado para fins políticos em
detrimento de uma lógica administrativa-econômica que vai perdurar até meados da década de
1990, e constituindo-se, portanto, numa das principais causas de desequilíbrios das CESBs.
Durante a primeira década de criação do PLANASA as CESBs contaram com uma linha de
crédito continua e crescente, devido principalmente aos mecanismos de financiamento criados
no Governo de Castelo Branco cuja base a Política Nacional de Saneamento apoiou-se na
criação do Banco Nacional de Habitação (BNH) em 1964 e na criação do Fundo de Garantia
por Tempo de Serviço (FGTS) em 1966. Este último acolhia recursos correspondentes a 8%
do salário mensal dos trabalhadores, tendo por objetivo a sustentação de políticas de habitação
e infra-estrutura sanitária.
Como observado por Alvarez (2000), os investimentos atingiram o ápice no início da década
de 80 e a partir de então passaram a declinar nos anos subseqüentes. Durante o período de
investimentos mais intensos no setor, na década de 70, os investimentos alcançaram a média
anual de 0,34% do PIB caindo para 0,28 % e atingindo a menor média histórica do setor na
década de 90, de apenas 0,13%. Para se ter uma idéia da redução dos recursos, o ano com
4 As Companhias Estaduais de Saneamento Básico são empresas de economia mista, com controle acionário de cada estado da federação. Estas empresas detêm, mediante concessão municipal, o monopólio da administração, operação, manutenção, construção e comercialização dos serviços de água e esgoto.
maior taxa de investimento é 1981 com 0,47%, e 1994, é o pior, com 0,07%. Entretanto, a
partir de 1995 houve uma reversão do que parecia ser uma tendência a queda de investimentos
no setor, quando estes alcançaram 0,38% do PIB, em 1998. Porém, o que se viu logo no
próximo ano, em 1999, foi novamente uma forte redução de até 41% dos investimentos
mantendo-se estável em 2000, com somente 0,25% do PIB. Essa forte queda nos
investimentos comprometeu a redução dos déficits dos serviços. É válido salientar que o
PLANASA foi formalmente extinto em 1992, sendo substituído pelo Programa de
Saneamento para Núcleos Urbanos (PRONURB) 1990/94, e mais tarde, a partir de 1995, no
inicio do governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, passa a ser o Pró-Saneamento,
destinado à ampliação da oferta de saneamento a toda a população do país, em especial as
camadas de baixa renda.
Tabela 6 -Investimentos como proporção do PIB 1970 – 97
Fonte: Abicalil Apud Alvarez, 2000, p.12.
Atualmente o poder público acha-se muito limitado ao atendimento das crescentes demandas
desses serviços. A inadequação ou mesmo a falta dos serviços de saneamento constituem
sérios riscos à saúde pública, principalmente no que tange a doenças de veiculação hídrica, e
em especial nas regiões Norte e Nordeste onde encontram-se os menores índices de cobertura
A ausência de tratamento adequado dos resíduos constitui-se na principal causa de degradação
ambiental, de forma que, num contexto de urbanização e industrialização aceleradas a
poluição das águas nessas áreas limita os usos múltiplos dos recursos hídricos (abastecimento
de água, turismo, lazer, pesca, irrigação, geração de energia, entre outras) impactando
negativamente nas economias das regiões afetadas.
Período Investimento (%)1970-1979 0,341980-1989 0,281990-1994 (Pronurb) 0,101995-1997 0,171995 0,101996 0,171997 0,25
Diante desse cenário de atrofia dos mecanismos de financiamento que sustentaram nas
décadas passadas o setor de saneamento básico no pais, devido principalmente a incapacidade
de endividamento, perda de pessoal técnico e gerencial qualificado e influência de políticas
nefastas, a partir de 1995, o governo anuncia uma séries de reformas cuja finalidade é
recuperar a capacidade de investimentos nos setores de infra-estrutura no país. Para isso o
governo passou a focar o setor de infra-estrutura através do Programa Nacional de
Desestatização (PND), que passou a ser um elemento importante para a participação privada
no setor. Desta forma, as novas políticas para o setor devem estar em conformidade com o
novo modelo de desenvolvimento do Estado, que para tal estabelece como metas prioritárias a
redução do déficit público, via menor participação do Estado no mercado, ensejando a
privatização de empresas estatais e enxugamento do quadro de funcionários das empresas
públicas como forma de diminuir os custos das mesmas.
O foco central da Política Nacional de Saneamento na década de 1990 é caracterizado pela
ênfase na modernização e ampliação da cobertura dos serviços cujo objetivo principal nas
gestões do presidente Fernando Henrique Cardoso (1995/2002) era atingir a universalização
do acesso aos serviços de abastecimento de água, coleta, tratamento e destinação final dos
esgotos sanitários e dos resíduos sólidos, previstos até 2010, com volume de investimentos
previstos pelo Governo Federal, em 1998, de R$ 44,2 bilhões. Essa política não chegou a ser
institucionalizada na forma de lei, o que prejudicou sua implementação (TUROLLA, 2002,
p.17). A universalização pressupõe a garantia de fornecimento no nível da demanda essencial,
o cumprimento dos padrões de qualidade em consonância com a manutenção da saúde
pública, a preservação do meio ambiente e o atendimento adequado aos usuários diretamente
envolvidos, de acordo aos direitos dos consumidores, bem como a aplicação do moderno
Código de Defesa do Consumidor (PENA; ABICALIL, 1999, p.120). O fornecimento dos
serviços de saneamento devem ser respeitados tanto no caso de serem prestados pela iniciativa
privada ou por empresas públicas.
3.1 CARACTERÍSTICAS DO MODELO INSTITUCIONAL
As prestações dos serviços de água e redes de esgotos, por reflexo ainda do PLANASA, são
atendidas por 255 CESBs mais a autarquia estadual do Acre, através de concessões municipais
5 A empresa de Mato Grosso municipalizou a prestação dos serviços, devolvendo os serviços de saneamento às prefeituras.
e que correspondem a aproximadamente 80% da população atendida pelos serviços de
saneamento.O PLANASA realizou grandes investimentos e dessa forma foi possível melhorar
de expressivamente o abastecimento de água e serviços de esgoto com relação aos baixos
níveis verificados no período anterior (Tabela 7 e 8).
Tabela 7 - Realizações do PLANASA %
População urbana atendida 1970 1991 1995
Abastecimento de água 60 86 91
Esgoto (rede coletora) 22 49 66
Fonte: Parlatore, 2000, p.285-286. Nota: Em 1991, apenas 20% da população urbana eram atendidas por estações de tratamento de
esgotos.
Tabela 8 -Cobertura regional em 1991 %
Norte Nordeste Centro-Oeste Sudeste Sul Total
Água 67,0 68,0 80,0 93,0 90,0 86,0
Esgoto (coleta) 2,0 13,0 33,0 70,0 18,0 49,0 Fonte: Parlatore, 2000, p.286.
Conforme Parlatore (2000), ainda que importantes realizações tenham sido feitas, o
PLANASA não logrou a universalização dos serviços, principalmente nas regiões onde os
índices de pobrezas são mais significantes, como as regiões norte e nordeste, as quais os
tratamentos de esgotos são quase nulos. Os dados apresentados no capítulo anterior também
demonstram que persistem as diferenças regionais. Algumas diretrizes do PLANASA jamais
lograram êxito, exemplos, como; a) a eliminação do déficit de abastecimento de água e
serviço de esgoto; b) política tarifária com vistas a equilibrar receitas e despesas, introduzindo
simultaneamente subsídios cruzados6 com ênfase ao atendimento aos consumidores de baixa
renda; c) desenvolvimento institucional das CESBs e dotar as companhias estaduais de uma
visão empresarial; d) auto-sustentação financeira do setor, através da consolidação dos
6 O subsídio cruzado parte do princípio de que quem consome mais paga mais por m3 de água, como forma de subsidiar os consumidores de baixa renda.
Fundos de Água e Esgoto (FAEs) estaduais, via recursos do FGTS e transferências
orçamentárias federal e estaduais; e) estudo de viabilidade global em âmbito estadual e não
municipal ou de cada sistema, f) a excessiva prioridade de construção de sistemas em
detrimento do setor de operações, acarretando posteriormente uma degradação dos sistemas e
um índice bastante elevado de perdas, que, na avaliação de Turolla, (2002, p.13), isso se deve
também porque o BNH não financiava o setor de operações. Advém também a constatação
que os empreiteiros e fabricantes de equipamentos, exerciam um poderoso lobby para área de
construção sem se preocupar com a operação desses sistemas construídos, visto que, o lucro
advinha do custo de construção e não da operação. Como as diretrizes e as metas propostas
não foram atingidas de forma plena, o PLANASA foi extinto em 1992.
Alguns problemas foram decisivos para a extinção do PLANASA, conforme destacado por
Parlatore (2000, p.286-287), os mais importantes são:
♦ A rigidez do modelo, excessivamente uniforme e centralizado, não contemplando,
portanto, as diferenças regionais e as peculiaridades locais e capacidade financeiras nas
três esferas de governo;
♦ A Constituição Federal de 1967 que concentrou fortemente os recursos na união,
reduzindo as receitas dos estados e municípios, resultando em perda de aporte financeiros
das autoridades locais e estaduais através da integralização das FAEs;
♦ Os municípios ficaram impossibilitados de exercer sua prerrogativa de poder concedente,
como previsto na Constituição Federal;
♦ Os municípios que não aderiram ao plano ficaram à margem dos financiamentos e ainda
obrigados a custear com seus próprios recursos, na maioria das vezes escassos e
insuficientes;
♦ As dificuldades financeiras das companhias e dos estados impossibilitavam de receber
recursos adicionais, que eram resolvidos com programas de refinanciamento, acentuando
o endividamento;
♦ O fator mais importante de sustentação do plano - a cobrança de tarifas realistas - ficou
impossibilitado pelas políticas de combate a inflação e contenção salarial (arrocho
salarial);
♦ Durante o PLANASA o êxodo rural acentuou-se bastante, implicando no crescimento
desordenado das cidades e levando consequentemente ocupação de grandes áreas urbanas,
tornando-se cada vez mais oneroso sanear tais espaços;
♦ Endividamento crescente, a cobrança de tarifas não condizentes com a realidade, falta de
capacidade em atingir altos padrões de desempenho além da baixa produtividade e custos
crescentes por ingerência políticas nas CESBs; e
♦ Implementação de tecnologias incompatíveis com a realidade nacional, fazendo-se com
que houvesse elevados custos em obras e por conseqüência a deterioração econômico-
financeira do sistema.
Atualmente, há uma grande preocupação a respeito de qual seria o modelo institucional mais
adequado para o setor. Na opinião de Parlatore (2000), dois fatores são preponderantes na
indefinição desse novo modelo a ser implantado. A desordem administrativa das CESBs criou
um obstáculo a obtenção de novos créditos e amortizações de empréstimos anteriores, devido
as administrações inadequadas, e a perspectiva de privatização e parceria entre as esferas
públicas e privadas impossibilitou a introdução de um modelo institucional exclusivamente
público, de maneira que, mediante a expectativa de privatização "tornou-se a questão de saber
a quem cabe determinar a prestação desses serviços e , conseqüentemente quem tem o poder
de agir como poder concedente ." (Ibid., p.288). Dessa forma poder-se-ia dizer que a
iniciativa privada necessita de horizontes claros para investir.
A Constituição Federal, de 1988, expressa claramente, no seu inciso V do Artigo 30, que a
titularidade dos serviços de interesses local é de competência dos municípios, nesse caso
enquadram-se a grande maioria dos municípios brasileiros, mas onde predominar o interesse
comum na prestação dos serviços, como no caso das regiões metropolitanas, não há clara
definição constitucional, permitindo nestes casos interpretações variadas.
Entretanto, algumas iniciativas políticas foram tomadas, com o intuito de disciplinar a
prestação dos serviços de saneamento. O governo federal apresentou o projeto de lei federal
PL 266/96, que visa dentre outras coisas disciplinar a prestação dos serviços de saneamento,
ou seja, trata da titularidade sobre as atividades de saneamento, quando afetar principalmente
a prestação dos serviços de interesse comum (chamados também de serviços integrados).
Outra iniciativa foi a instituição de programas federais na década de 1990 voltados para a
redução das desigualdades socioeconômicas e para modernização do desenvolvimento
institucional dos sistemas de saneamento. Alguns exemplos como: Programa Pró-Saneamento
com utilização de recursos do FGTS e a instituição de diversos outros programas
complementares como o Programa de Ação Social em Saneamento (PASS) que visa o
atendimento de serviços de água, esgoto e coleta de lixo às populações carentes de grandes
cidades e municípios de pequeno e médio porte. Têm-se também programas voltados para a
melhoria da qualidade da água, geração de emprego etc. Com destaque para o Programa de
Modernização do Setor de Saneamento (PMSS) que visa modernizar o setor estimulando a
eficiência e eficácia da prestação dos serviços, contando com recursos do Banco Mundial.
Instituir ajuda financiamentos aos estados para criação de mecanismos de regulação e controle
dos serviços de saneamento, motivados pelas recentes privatizações no país, além do mais as
CESBs desde que foram criadas nunca submeteram-se a nenhum tipo de regulação dos
serviços prestados.
Há, também, a existência de um Projeto de Lei n.º 4.147, apresentado pelo Poder Executivo à
Câmara dos deputados em 2001, que até o momento não foi ainda apresentado no plenário
para votação. Este projeto reafirma a titularidade dos serviços de interesse local aos
municípios mesmo que estes estejam inseridos em regiões metropolitanas, aglomeração
urbana ou micro-região. Porém, se ao menos uma das atividades de infra-estrutura ou
instalações operacionais envolver mais de um município, será considerado de interesse
comum e sua titularidade será do respectivo estado, salvo o Distrito Federal que teria a
titularidade em sua área geográfica. Entretanto, essa possibilidade dos estados terem a
titularidade dos serviços na forma como prevê o Projeto, atingiria 459 municípios apenas do
total de 5.559 municípios brasileiros, o que representa 8,3% dos municípios, acontece que
esse pequeno número de municípios representa os melhores sistemas com viabilidade
econômico-financeira (TUROLLA, 2002, p.19).
Enquanto não se define o direito pela titularidade dos serviços nas unidades federativas do
país, as incertezas persistirão, de toda forma:
Os obstáculos a superar, como a falta de uma política bem definida de privatização do setor e a indefinição quanto ao exercício das funções do poder concedente, são problemas momentâneos. É justo supor que a desenvoltura da concessão privada de serviços de saneamento é bastante provável.(PARLATORE 2000, p.290).
Evidentemente que não há unanimidade em torno da idéia de participação privada no setor e
argumentos, consistentes de certa maneira, evidenciam ue grandes transformações poderão
ocorrer principalmente no que concerne à capacidade reguladora do Estado na orientação
científica e tecnológica local de avaliar e adaptar novas tecnologias às especificidades
socioeconômicas e ambientais do país.
Andreoli e Pelaez (2000), observam que a passagem do Estado interventor para o Estado
regulador deveria ser resultado de um processo de longo prazo e não é o caso brasileiro, que
ao que tudo indica implementa um projeto político desarticulado e de curto prazo com vistas
muito mais a melhorar a imagem do país no cenário internacional, afetado profundamente
pela inflação e pela crise da dívida externa, do que aumentar a eficiência dos serviços
públicos. Exemplificando o argumento acima, para o setor de saneamento no país, fica claro
que a criação de um sistema de inovação tecnológica no setor de saneamento, a exemplo da
Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar), onde somente foi possível devido a
capacitação tecnológica da Companhia. Essa capacitação foi gerada por meio de um vetor de
capacitação interligado a partir dos níveis micro, meso e macroeconômico e que também pode
se constituir ao mesmo tempo como inibidor desse mesmo processo.
O nível macro é o ponto de partida da análise, baseado no fato de que as políticas de
desenvolvimento, dos governos militares, propiciaram a geração de um modelo de
financiamento centralizado para o setor de saneamento cuja viabilidade técnico-econômica
encontrava-se fundamentado na criação de empresas estaduais controladoras dos sistemas de
saneamento dos municípios via concessões. No nível micro, foi o resultado da criação das
(CESBs), que no decorrer das três últimas décadas do século XX, viabilizou o acúmulo de
conhecimento na operação adaptação e desenvolvimento de novas tecnologias adaptadas às
realidades locais. Essa capacitação tecnológica fez com que surgissem demandas específicas
por conhecimento científico e tecnológico, de empresas privadas e universidades, propiciando
a incubação de sistemas locais de inovação. No nível meso esse processo de incubação gerou
o aparecimento de clusters locais na área de saneamento, que tende a ser reforçado através das
trocas de pesquisa e experiências entre as CESBs, constituindo-se no que se chama de um
sistema setorial de inovação tecnológica, e tendo como exemplo o PROSAB - Programa de
Pesquisa em Saneamento Básico através do estimulo à formação de redes nacionais de
pesquisa.
Com a política de privatização do setor de saneamento o modelo de operação dos sistemas de
saneamento municipais passará por profundas transformações. Isso causará impacto tanto no
nível micro quanto meso, na medida em que o sistema setorial de inovação baseia-se na
cooperação entre as CESBs e que pelo modelo de gestão estatal não concorriam entre si. Ou
seja, com a privatização essas condições deixariam de existir pelo desestimulo do capital de
curto prazo agindo como inibidor dessa rede nacional de pesquisa das CESBs, (ANDREOLI;
PELAEZ, 2000, p.8).
Tendo como agravamento, o marco regulatório prevê a transição do atual modelo centralizado
estadual de gestão dos serviços de saneamento para um modelo descentralizado em nível
municipal e operado por empresas privadas, ainda que os arranjos institucionais, conforme
prevê o projeto de lei 266, venham repassar a titularidade dos serviços aos Estados, quando o
atendimento envolver dois ou mais municípios, (porém na totalidade dos municípios
brasileiros não possuem os chamados serviços integrados). Ficariam, portanto os municípios
com "(...) o controle da gestão dos respectivos sistemas de saneamento, o que causaria, por
conseqüência, uma dispersão do poder para concessão dos serviços" (ARAÚJO apud.
ANDREOLI; PELAEZ, 2000, p.7).
A centralização da atividade regulatória no nível federal de agências especializadas a
exemplos da ANATEL, ANEEL e ANP, respectivamente nos ramos de telecomunicações,
energia elétrica e petróleo, permite, em princípio, um maior controle técnico e político das
estratégias privadas do setor e mesmo o desempenho desses mercados. Diante uma regulação
que deve ser reconhecida como prerrogativa do poder concedente subnacional perguntar-se-ia
então: Qual seria a capacidade dos órgãos municipais e mesmos estaduais de induzir
indiretamente o desenvolvimento de tecnologias mais eficazes e adequadas à preservação do
meio ambiente e ainda mais, de que maneira a universalização dos serviços principalmente no
que tange as camadas mais carentes da população seriam realizados? Como se vê, à
capacitação para o exercício de regulador nas mãos de diferentes municípios existente pode
constituir-se um risco “regulatório”.
A coordenadora Executiva do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC) Lazzarini
(2002), observa que a tendência de privatização dos serviços de saneamento leva a um
enfraquecimento dos direitos dos consumidores e ressalta que a maioria dos países
desenvolvidos não privatizou o setor de saneamento. Países como Canadá; Japão; Bélgica;
Suécia; Itália; Alemanha; Dinamarca e Áustria nesses países 100% dos serviços são públicos,
sendo que apenas nos EUA 85% são públicos. As experiências da Inglaterra e França que
privatizaram seus serviços não foram tão animadoras, segundo Lazzarine (2000):
- Na Inglaterra, dois anos após a privatização as tarifas tiveram aumentos da ordem de
30% e os lucros das empresas alcançaram até 360%;
- A França, tem 75% da água potável é controlada por grandes empresas privadas, que
são as maiores do mundo, totalizando atualmente cinco empresas. E no caso dos
esgotos a participação privada é de apenas 40%.
Como se vê a falta de uma política clara de privatização e a falta de um desenho claro e
adequado das estruturas de regulação e controle para o setor, continua a ser o maior
empecilho, mas de toda forma a parceria público-privado na prestação desses serviços parece
ser inevitável.
3.2 ALGUNS PROCESSOS DE PARTICIPAÇÃO PRIVADA NO SETOR
Não bastante os argumentos mostrados no item anterior uma série de problemas foram se
avolumando no decorrer dos anos. Esses problemas nos remetem a esse atual cenário de
mudanças de agentes na gestão dos serviços de saneamento, se não vejamos alguns
problemas:
1. Prioridade na produção de água em detrimento da distribuição fazendo elevar os números
de perdas do consumo;
2. No inicio priorizou-se o abastecimento de água relegando o esgotamento sanitário para
segundo plano, conforme visto na Tabela 7, causando sérios impactos ambiente;
3. Atuação comercial deficiente, fazendo com que ocorresse perda de faturamento e de
arrecadação devida principalmente à deficiência na medição do consumo, estrutura
tarifária inadequada e regras eficazes para corte por falta de pagamento;
4. Atendimento inadequado com lentidão na solução dos problemas;
5. Atraso tecnológico e gerencial, elevando os custos operacionais;
6. Ingerência política nas gestões; e
7. Baixos níveis de abastecimento de água e tratamento de esgotos gerando sérios problemas
de saúde, como aumento das doenças de veiculação hídrica e poluição do meio ambiente.
Pela análise da Tabela 9, verificamos a perda dos órgãos públicos na capacidade de captar
recursos, devido principalmente pela incapacidade de planejamento e gerenciamento capazes
de obterem aprovação. É valido observar que para obtenção de recursos do FGTS as
companhias necessitam demonstrar índices de desempenho previamente acordado.
Tabela 9 - Dados sobre a capacidade de pagamento de estados, municípios, companhias
de saneamento e órgãos municipais de saneamento - 1996/97
N.º de solicitações analisadas
N.º de solicitações com possiblidades
de captação de emprestimos
%N.º de
solicitações analisadas
Nº de solicitações com possiblidades
de captação de emprestimos
%
Estado 15 3 20,0 18 6 33,0
Municipio 1.177 647 55,0 1.676 587 35,0
Companhias estaduais 19 12 67,0 20 11 55,0
Serviços municipais 0 0 - 41 33 75,0
Tomador
1996 1997
Fonte: BNDES Apud. Parlatore, 2000, p. 295.
A deterioração econômico-financeira das CESBs, empresas municipais e autarquias ao longo
dos anos, demonstram bem a reduzida capacidade dessas empresa em alavancar recursos para
fazer face as necessidades de investimentos. Como reflexo da perda de capacidade de
endividamento do setor público os financiamentos com recursos do FGTS reduziram-se de
uma média de R$ 773 milhões, em 1996, para R$ 356 milhões, em 1997, uma redução de
46% no montante de recursos. No ano de 2000, o endividamento de curto prazo das CESBs
eram da ordem de R$ 3,3 bilhões que representavam 35% das receitas operacionais, o que
reforça a limitação da capacidade de pagamento dessas empresas7.
O capítulo anterior indica que a superação do déficit do setor de saneamento deverá requerer
investimentos bastante elevados e dessa forma, evidenciando a magnitude dos obstáculos a
serem superados. Apesar das necessidades de investimentos serem elevados, o governo
7 Dado citado em Abicalil (2002, p.127).
federal, do então Presidente Fernando Henrique Cardoso, através da resolução de n.º 2521, do
Conselho Monetário Nacional, em 1998, vetou todas as linhas de financiamento para o setor
de saneamento via recursos do FGTS, ficou estabelecido que qualquer investimento público
será contabilizado como despesa e conseqüentemente lançado na conta de passivo público,
aumentando assim o déficit público. É com base nesses problemas que devem ser analisadas a
proposta do governo na potencialização da iniciativa privada e dos setores públicos na
prestação adequada dos serviços de saneamento.
Como previsto pela Constituição Federal, a prestação dos serviços de saneamento é de
responsabilidade dos municípios (principalmente), e dos estados, mas os investimentos são de
responsabilidades de todos os níveis de governo, e em particular, o governo federal é quem
gerencia os programas de investimentos financiados a partir de recursos do FGTS, do BNDES
(Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e de fontes externas.
O Programa de Fomento à Parceria Público/Privado para Prestação de Serviços de
Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário (PROPAR), com recursos da CEF (Caixa
Econômica Federal) e do BNDES, financiam os estudos necessários à preparação da
participação privada no setor mediante concessões (parcial ou plena) ou na criação de uma
empresa de economia mista público/privada. Este processo de financiamento não ficará
sujeito às mesmas restrições que impediram as CESBs de obterem financiamentos mediante
instituições públicas.
A CEF instituiu, programa de Financiamento a Concessionários Privados de Serviços de
Saneamento (FCP/SAN), destinados a financiamentos em concessões operadas por agentes
privados o FCP/SAN-BNDES, também financia investimentos em concessionários
administrados por agentes privados em obras de infra-estrutura com recursos do BNDES e o
FCP/SAN-FGTS aplicará recursos do FGTS.
Os governos estaduais têm tomado iniciativas no sentido de reestruturar as operadoras
estaduais. A Cedae (Rio de Janeiro) e a Cesan (Espírito Santo) encontram-se em avançado
processo nas operações para suas privatização. A Sanemat (Mato Grosso) municipalizou a
prestação de serviços, devolvendo os sistemas locais de oferta de serviços sanitários às
prefeituras municipais. A Cagece (Ceará) ampliou seus mercados de operação no interior do
estado e subconcedeu parte de suas operações na capital Fortaleza para um operador privado.
Atualmente há no Brasil cerca de 26 concessões municipais, plenas ou parciais localizadas
unicamente nas regiões Sul e Sudeste e em cidades de porte médio (Quadro 1). Há também 9
CESBs em processo de transformação institucional com alguns casos já bastante avançados
como os mencionados acima e dois casos de acionistas privados que são o da Sanepar
(Paraná), (Quadro 2), que seguindo as diretrizes do processo de privatização vendeu 39,6% de
suas ações em 1998 a um consórcio privado formado pelos grupos: Construtora Andrade
Gutierrez, Companhia Paranaense de Energia Elétrica (Copel), ao Grupo Dominó (liderado
pelo então Banco Opportunity) e o grupo Francês Vivendi. Na Saneatins, (Tocantins), o
grupo privado Emsa chegou a ter o controle acionário, mas depois retornou ao Estado. Porém,
tanto a Sanepar quanto a Saneatins continuam sendo de Economia Mista (como as demais
CESBs) porém com Administração Privada. Como se vê em ambos os casos o governo detém
o controle acionário.
As perspectivas futuras demonstram que haverá um forte incremento das participações
privadas, sejam por intermédios de aumento dos números de concessões privadas, quer por
participação minoritária ou majoritária nas CESBs ou mesmo pelo surgimento de novas
formas de organizações para prestação dos serviços a exemplo de empresa para prestação de
serviços por contrato de gestão entre outras formas.
Os quadros 1 e 2 demonstram respectivamente alguns programas de privatização dos serviços
de água e esgotos em nível municipal e as transformações institucionais que algumas CESBs
estão passando, no caminho as diferentes formas de parcerias que poderão ser instituídas ao
longo das recentes transformações em curso no país.
Fica evidenciado que o modelo de privatização a partir do domínio municipal, no Brasil, não
seguiu a seqüência lógica de outros países em que os sistemas regulatórios precederam a
parceria público/privado. O que nota-se é a inexistência de uma estrutura regulatória nos
municípios. E fora esse particular, o modelo de privatização no Brasil apresenta muitas
semelhanças com o modelo francês, baseado no domínio municipal da prestação dos serviços
de águas e esgotos.
Pela análise do quadro 1, até junho de 1999, 28 licitações foram realizadas contemplando um
total de 32 municípios;
♦ A maiorias das concessões privadas estão concentradas nos Estados de São Paulo com 17
municípios (sendo que Ourinhos e Jaú concentram duas concessões cada um: sendo uma
para água e outra para esgoto). No Rio de Janeiro existem 13 municípios (7 áreas de
concessões) isto porque duas concessões abrangem 8 municípios consorciados na Região
dos Lagos no Rio. Há ainda mais quatro concessões municipais, fora do eixo Rio-São
Paulo: Paraná, Espírito Santo, Pará e Mato Grosso do Sul;
♦ Os contratos firmados têm optado por concessões plenas8 ou parciais, respectivamente no
Rio de Janeiro e em São Paulo. Neste último estado, em especial, a opção foi por
concessões parciais e do tipo BOT9, e não plena. Isso pode ser explicado pelo temor de
desgaste político, pelas perdas dos serviços ou inadequação nas prestações desses serviços
na hipótese de agentes privados não demonstrar capacidade de resolver os problemas;
♦ O investimento total previsto é de R$ 1,09 bilhões, sendo que esse valor não contempla os
estados de Espírito Santo, Pará e Mato Grosso Sul, cujos valores ou não foram divulgados
ou estão estimados em reais;
♦ A maciça concentração dos investimentos nas regiões sul e principalmente sudeste,
contribuem ainda mais para aumentar as disparidades regionais dos serviços de
saneamento;
♦ E, por fim, vale ressaltar que há tanto contratos de concessões com municípios de
população superior a 200 mil habitantes (6) quanto de municípios com população inferior
8 Contrato de concessão plena a empresa privada tem total responsabilidade sobre a operação, manutenção, administração e investimentos de capital para expansão da oferta dos serviços de saneamento básico (água e esgoto) e recebe diretamente o pagamento pelos consumidores. 9 Concessões Parciais Precedidas de Obras Públicas do Tipo BOT (Build, Operate, Transfer) - nesse tipo de concessão a empresa não administra o sistema já existente e sim constrói uma nova instalação específica sobre a qual poderá auferir as receitas relativas à prestação desse novo serviço, ficando também com a responsabilidade pela administração dessa nova instalação. Vale ressaltar que ao final do período de concessão o poder concedente poderá licitar novamente os serviços ou passar a operar diretamente, porque os ativos operacionais são de propriedades do poder concedente.
a 10 mil habitantes (3), o que parece ajudar a combater os argumentos de que as
concessões privadas restringem-se somente a municípios maiores.
Vale ressaltar que é justamente nos menores municípios que se concentram as populações
com níveis de renda mais baixos e, portanto, com menor capacidade de pagamento de tarifas.
É também nesse agrupamento de pequenos municípios que, na maioria das vezes pela
ausência de economias de escala, os custos unitários de implantação e operação dos sistemas
são mais elevados. Mas é verdadeiramente nesses municípios que a participação
governamental deve ocorrer pela concessão de subsídios em circunstâncias excepcionais de
forma a ajudar o cidadão menos favorecido economicamente para pagar pelos custos dos
serviços, e auxiliando na implantação de estações de tratamento de esgoto, principalmente
porque o beneficiário pelo tratamento de esgoto seria a própria comunidade ao contrário do
abastecimento de água em que o beneficiário é apenas o indivíduo (KELMAN, 2002, p.71).
Em alguns casos os consócios de empreiteiras incluem uma empresa estrangeira especializada
em operação e gestão, ficando a cargo das empresas nacionais a construção de infra-estrutura,
que nos remota aos tempos do PLANASA, em que havia excessiva ênfase na construção de
sistemas em detrimento da operação. Dessa forma deveria se propor o pagamento por
resultados obtidos dos serviços de saneamento e não o pagamento de empresas construtoras
de infra-estrutura. Por que desta forma estaria se pagando por resultados alcançados e não por
promessas (Ibid., p.71).
Empresa Localidade e população (mil hab.).
Grupo privado Modalidade
Data de contrato e início da operação
Invest. (R$ milhões)
Principais obras e instalações
Águas de Limeira Limeira (SP)-217
Consócio CBPO /Lyonnaise des Eaux
Plena 1/9/1994 início 02/06/1995 110
Elevatórios e tratamento de esgotos
Águas de Juturnaiba
Araruama, Saquarema e Silva (RJ)-200
Consórcio Developer, Cowan, Queiroz , Trana e Erco
Plena 1/12/1997 início 16/03/1998 73
Adutoras, reservatório e redes de água, redes elevatória e tratamento de esgoto
PróLagos
Cabo Frio, Búzios, São Pedro dAldeia, Iguaba e Arraial do Cabo (RJ)-220./700 no verão
Consócio PEM, Monteiro Aranha, Planup e Epal
Plena - Exceto arraial do cabo (somente água)
25/4/1998 início 13/7/1998 230
Adutoras, redes e tratamento de água, redes, elevatórios e tratamento de esgoto
Companhia de Saneamento de Jundiaí
Jundiaí (SP)-289 Consórcio Augusta Velloso, Coveg e Tejofran
Parcial Tipo BOT (tratamento de esgoto)
18/1/1996 início 15/9/1998 30
Emissários e tratamento de esgoto
Cavo Itu Serviços de Sanea-mento S.A
Itu (SP)-113
Companhia Auxiliar de Viação e Obras - grupo Camargo Corrêa
Parcial (tratamento de esgotos)
11/3/1996 início 15/5/1998 25
Emissários, elevatórias e tratamento de esgoto
Águas do Imperador
Petropólis (RJ)-240
Consórcio Developer, Cowan, Queiroz Galvão, EIT e Trana
Plena 22/10/1997 início 1/1/1998 100 Tratamento de
água e de esgoto
Ambient Serviços Ambientais
Ribeirão Preto (SP)-450
Consórcio REK e CH2M Hill Intl. Co.
Parcial (tratamento de esgoto)
20/9/1995 45
Emissários, interceptores e tratamento de esgoto
Águas de Mandaguahy Jaú (SP)-97
Consórcio Amafi, Multiservice, Tejafran e Resil
Parcial (produção de água)
24/11/1995 início 15/10/1998
8,4
Tomada de água, estação de recalque, adutoras e tratamento de água
Água do Paraíba Campos (RJ)-350
Consórcio Developer, Carioca Christian Nielsen, Cowan e Queiroz Galvão
Plena 16/9/1996 92
Adutoras, reservatórios, redes e tratamento de água e redes de esgotos
Águas de Niterói Niterói (RJ)-450
Consórcio Developer, Carioca Christian Nielsen, Cowan e Queiróz Galvão
Plena 24/10/1997 175
Adutoras, reservatórios e redes de água, redes elevatórias, interceptores e tratamento de esgoto
Águas de Paranaguá
Paranaguá (PR)-110
Consórcio Carioca, Christian-Nielsen, Developer e Castilho
Plena 6/3/1997 início 5/5/1997 60 Tratamento de
água
Sanear- Saneamento Araçatuba
Araçatuba (SP)-158
Consórcio Arnafi, Multiservice, Tejofran e Resil
Parcial (tratamento de esgotos)
10/5/1996 início 1/1/2000 13
Elevatórias, emissárias e tratamento de esgoto
Ciágua Concessioná-ria de Água de Mairingue
Mairingue (SP)-35
Vilanova e Guaimbê Plena 27/2/1997 início
1/5/1997 30
Adutores, bombeamento e reservatórios de água, redes e interceptadores de esgoto
Telar Ourinhos (SP) - 80 Telar
Parcial tratamento de esgoto
5/2/1996 12 Tratamento de esgoto
Consórcio Novacon (SP)
Pereiras-7 Tuiuti-3 Tanabi-30 Severínia-14 St. Isabel-40 Serrana-31
Novacon
Plena (Pereiras e Tuiuti), Permissão demais localidades
20/8/1994 Pereiras 1,2 Tuiuti 0,7
Captação e tratamento de água
Saneciste (SP)
Mineiros do Tietê -9 Saneciste Plena (Mineiros) 20 /07/ 1995 e
20/12/1996 2,0 (Mineiros)
Redes e bombeamento de água e redes de esgoto e tratamento de esgoto
Salto-100 Parcial (Salto)- (tratamento de esgotos)
(Salto)
Água de Esmeralda Ourinhos (SP)-80
Consórcio Hidrogesp e Multiservice
Subconcessào parcial (produção de água)
16/2/1996 início 7/9/1999 1,2 Poço Fundo
Águas de Cajamar Cajamar (SP)-34
Consórcio Hidrogesp, Multisevice e REK
Subconcessão parcial (produção de água)
23/8/1996 início 18/9/1997 1,5
Captação, bombeamento, adução, tratamento e reservação de água
Aquapérola Berigüi (SP) - 100 Hidrogesp
Parcial Tipo BOT (produção de água)
início 1/8/1999 -
Poço profundo, unidades de resfriamento e reservatório de água
Águas de Marília
Marília (SP) - 180 (60 atendidas)
Hidrogesp, Telar, Infra
Parcial Água -BOT de Poço, Adutora, Reservatório
5/11/1997 início 30/12/1998 2,8
Poço profundo, unidades de resfriamento, adutora e reservatório de água
Águas de Cachoeiro
Cachoeiro de Itapemirim (ES) - 153
Águia Branca, Cepemar, Hidropart
Plena 14/7/1998 50 -
- Tucuruí (PA) - 50 Hidrogesp Plena 15/7/1998 início 22/4/1999 - -
Primav Jaú (SP) - 100 Primav Parcial esgoto 15/11/1998 início 1/10/2000 15 -
Empresa de Saneamento de Nobres LTDA
Nobres (MS) - 15 Economid Engenharia Plena fev/99 8 -
Água Viva Saneamento Básico
Rio Branco do Sul (RJ) - 25 Tibagi Engenharia Plena mar/99 - -
Cia. das Águas de Nova Friburgo
Nova Friburgo (RJ) - 175 Multiservice Plena 16/6/1999 12
Quadro 1 - Concessão dos serviços de saneamento básico à iniciativa privada Fontes: Parlatore, 2000, p.300-301. Elaboração Própria. Informe Infra-Estrutura, 1999.
Estado Modelo de gestão Sistema regulador existente
Sistema regulador a ser
elaborado Bahia (EMBASA)
Indefinido. Embasa renovou 190 contratos de concessão em 1997/98
Indefinido. Inicia discussão sobre Lei de Prestação de serviços, criação de agência reguladora e regulamentação dos serviços
-
Minas Gerais (COPASA)
Indefinido Lei da Política Estadual de Saneamento; Projeto de Lei do Conselho de Saneamento; Criação da Agência Reguladora Multissetorial (saneamento excluído)
Sistema regulador em elaboração; Inicia discussão sobre Lei de prestação dos Serviços e criação de agência reguladora
Pará (COSANPA)
Indefinido. Alternativas preliminares estudadas; ¨ reestruturação da Cosanpa (metropolitana/interior); ¨ contrato de gestão (metas e estruturas de incentivo); ¨ concessão do sistema metropolitano.
Indefinido. Proposta discutidas:¨ minuta de lei para criação de agência reguladora; ¨ modelo de contrato de gestão.
-
Santa Catarina (CASAN)
Em preparação. Venda de 49% das ações da Casan (Sócio estratégico privado - acordo de acionistas e contrato de gestão - abertura de capital da empresa). Dificuldades legais para realização do leilão (disputa com Assembléia Legislativa - Problemas com a Comissão de Valores Imobiliários).
Indefinido. No momento, apenas minuta de acordo de acionistas e contrato de gestão
-
Paraná (SANEPAR)
Implementado: manutenção da Sanepar, com nova composição: ¨ Sócio estratégico privado - 39% das ações ordinárias da empresa; ¨ acordo de acionistas
Indefinido. Estudos devem começar em outubro de 1998
-
Espírito Santo (CESAN)
Em preparação - venda integral das ações da empresa: ¨ acordo de acionistas e contrato de gestão; ¨ adesão dos municípios; ¨ outorga de concessões.
Lei de criação de agência reguladora multissetorial (não inclui saneamento); Lei Estadual de Concessões.
Lei de Prestação dos Serviços; Regulamento dos Serviços; Agência reguladora (nova ou multissetoril); edital de venda, acordo de acionistas e contrato de gestão com a empresa.
Mato Grosso∗ (SANEMAT)
Implementado. Baseado em: ¨ municipalização dos serviços prestados pela Sanemat; ¨ acordo de transição/gestão compartilhada e de municipalização;
♦ Lei de prestação dos Serviços; ¨ Lei de Criação da Agência reguladora; ¨ Lei de Criação do Conselho Estadual de saneamento; ¨ Leis de Concessão para Estado e Municípios; ¨ Convênio para consórcios intermunicipais; ¨ Minuta de edital de concessão; ¨
♦ Pretende-se criar uma agência reguladora para o Estado, um Conselho Estadual de Saneamento e alguns conselhos regionais. A intenção é que à agência reguladora
Regulamento dos serviços; ¨ Sistemas de informação.
tenha uma função normatizadora e arbitral. Nestes casos as tarifas seriam definidas a nível municípal.∗
Pernambuco (COMPESA)
Indefinido. As propostas cogitadas são: Concessão precedida de obra pública, do Sistema Produtor de Pirapama; Revisão do modelo de gestão dos serviços de esgotos na Grande Recife: ¨ separação dos serviços de água dos serviços de esgoto; ¨ modelo condominial para esgotos com concessão de lotes de coleta; ¨ dificuldade: questão da titularidade dos sistemas metropolitanos.
Em elaboração. Inclui resíduos sólidos; ¨ definição da titularidade; ¨ lei de criação da agência reguladora; ¨ regulamento: qualidade, tarifas e atendimento aos usuários; ¨ sistemas de informação ¨ minuta de convênios para consórcios intermunicipais e com agência.
-
Rio de Janeiro (CEDAE)
Em preparação: ¨ venda integral das ações da Cedae; ¨ concessão dos sistemas metropolitanos e do interior (adesão municipal); ¨ dificuldades: titularidade no sistema metropolitano.
Aprovado. ¨ leis de concessão, prestação dos serviços e tarifas; ¨ agência reguladora implantada - Asep/RJ (Multi-ssetorial e autonôma - deretoria colegiada).
Ainda em elaboração: ¨ editais de venda das ações da empresa; ¨ regulamento dos serviços
São Paulo (SABESP)
indefinido. Cogita-se de venda de ações da Sabesp para parceiro estratégico, com acordo de acionistas para operação privada. Empresa já abriu capital.
Lei da Política Estadual de Saneamento/Conselho Estadual de Saneamento. Projeto de lei de criação da agência reguladora.
-
Mato Grosso do Sul (SANESUL)∗
Opção pela desestatização da companhia. ¨adotando-se como premissa básica o entendimento de que o poder concedente é municipal.
- -
Quadro 2 - Transformações institucionais em curso nos estados Fonte: Parlatore, 2000, p.303-304. ∗Dados atualizados e/ou inseridos pelo autor.
4 AS RECENTES EXPERIÊNCIAS DE PRIVATIZAÇÃO DE SANEAMENTO NO BRASIL
Nesse capítulo, desenvolve-se uma análise do desempenho de algumas empresas privadas no
setor de saneamento básico do Brasil. É importante ressaltar que esta análise não pretende
extrapolar a necessária compatibilização da ótica pública com a ótica privada. Sabe-se que o
setor público objetiva a democratização com a qualidade dos serviços, aumento do
investimento e a regulação e fiscalização das empresas e tarifas. Por outro lado, setor privado
objetiva regras claras para investir e dessa forma garantir o retorno sobre o capital investido
com o máximo de segurança possível. Não se objetiva, pois, buscar a retirada do poder
público do setor de saneamento, porque o saneamento básico, por si só, já é papel primordial
do estado.
Vimos nos capítulos anteriores que os déficits dos serviços de saneamento básico no Brasil
são bastante elevados e algumas barreiras precisam ser removidas para que a universalização
dos serviços seja alcançada. O endividamento crescente das empresas públicas de saneamento
e mais o contingenciamento do crédito ao setor público fazem com que a parceria com o setor
privado na realização dos investimentos e operações dos sistemas de saneamento seja
inevitável e em alguns casos recomendáveis.
Mesmo com a indefinição da questão da titularidade e a inexistência de um desenho mais
claro que se adeqüe melhor as estruturas de regulação do setor e a falta de estruturas tarifária
definidas, surgiram no Brasil alguns processos de concessões privadas principalmente através
de municípios autônomos10. Mesmo antes da edição das leis de concessões, Lei 8.987, de
13.02.95, alguns municípios autônomos já vinham negociando a concessão dos serviços de
saneamento à exploração pela iniciativa privada.
A Política Nacional de Saneamento, em 1998, previa que os investimentos necessários a
universalização dos serviços de saneamento básico, no Brasil, eram de R$ 44,2 bilhões, o
Ministério das Cidades encomendou estudos recentes a concessionária JNS- Acquaplan, que
10 Municípios autônomos são formados pelas cidades que não concederam a prestação dos serviços de saneamento básico as CESBs ou uma vez vencido os contratos de concessões, os municípios passaram a assumir a administração de seus próprios sistemas de saneamento.
estimou em R$ 178,4 bilhões os investimentos necessários a universalização do
abastecimento de água e o acesso ao esgotamento sanitário no país até 2024, os estudos
prevêem investimentos crescentes partido-se de R$ 6 bilhões para posteriormente se chegar ao
dobro desse valor, segundo Salomon, (2003).
Esses volumes de investimento são realmente elevados para o atendimento geral à população
brasileira, mas ao mesmo tempo são também atrativos à iniciativa privada, além do que, tem-
se por base a informação do BNDES de que o investimento médio demandado pelos
municípios é significativamente menor quando comparado às demandas por investimentos
dos setores de transportes e energia (MOREIRA11, 2002, p.9).
Para justificar o argumento de que a participação privada no setor de saneamento é necessária
e deve ser estimulada pelo setor público, mesmo porque, os volumes de investimentos
afiguram-se bastante atraentes à iniciativa privada. Faz-se análise de duas concessões plenas,
sob a forma de consócios municipais. Na Região dos Lagos no Rio de Janeiro que abrange
oito municípios, divididos em duas áreas de concessão, onde para cada área foi realizada uma
concorrência. E quatro concessões municipais, duas concessões plenas e duas concessões
parciais (tratamento de esgoto), respectivamente: Limeira (SP), Petrópolis (RJ), Ribeirão
Preto e Itu.
Na análise a seguir, optou-se por estudar dois tipos de concessões à iniciativa privada, essa
opção foi feita de forma a demonstrar que qualquer que seja o tipo de concessão, plena ou
parcial, haverá sempre o interesse público de forma a garantir o aumento do investimento e,
sobretudo, no incremento da oferta dos serviços de água ou esgoto. Por outro lado o que se
percebe é o interesse do setor privado na prestação dos serviços de saneamento básico,
aparentemente atraídos mais pela enorme cifra que o setor de saneamento básico no Brasil
deve movimentar nos próximos anos do que pela sua rentabilidade imediata.
11 Terezinha Moreira é chefe do Departamento de Operações de Saneamento do BNDES.
4.1 SEIS EXEMPLOS DE PRIVATIZAÇÃO
A Região dos Lagos no Rio de Janeiro
A situação do saneamento básico da região encontrava-se em situação precária, os esgotos
eram despejados sem tratamento nos rios e praias através das redes pluviais, além da
irregularidade no abastecimento de água, prejudicando o potencial turístico dessas áreas. Em
sendo, portanto, uma região de veraneio onde a população aumenta em cerca de 200% no
período de férias, requeria-se a realização de investimentos de forma prioritária e inadiável.
Decidiu-se em comum acordo entre estado e os municípios, conceder à iniciativa privada os
serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário. Para tanto, como forma de
assegurar os ganhos de receitas, em termos de escala, além do fato de que na temporada de
verão a população aumenta significativamente, os municípios foram divididos em duas áreas
de concessão. A chamada "Área 1" compreendendo os municípios de: Iguaba Grande, São
Pedro da Aldeia, Cabo Frio, Arraial do Cabo e Búzios, ficando a concessão a cabo da empresa
Pró-Lagos. A "Área 2" formada por: Araruama, Saquarema e Silva Jardim, concedida à
empresa Juturnaíba.
O formato do leilão vencido pelas concessionárias Pró-Lagos e Águas de Juturnaíba
determinou que além da menor tarifa ofertada a empresa deve pagar uma proporção da receita
tarifária mensalmente para o poder concedente, esse percentual é chamado como Fator de
Outorga (FO). Neste caso tanto o estado como os municípios foram considerados como
poderes concedentes.
Alguns pesquisadores, por exemplo, Melo (2001), argumenta que o pagamento pelo direito de
outorga onera as concessões e dificulta a transferência dos ganhos com a privatização para a
população via pagamento de tarifas menores. A taxação embutida (FO) demonstra seu efeito
negativo quando é levada em conta no critério de julgamento das propostas dos leilões de
privatização.
Em ambos os casos de concessão, pouca atenção foi dada à questão da regulação, limitando-
se apenas a criação, por parte do governo estadual, de uma agência reguladora que não é
especializada em água como deveria ser, ASEP-RJ, Agência Reguladora de Serviços Públicos
Concedidos do Estado do Rio de Janeiro.
Araruama, Saquarema e Silva Jardim
Com a privatização a concessionária alterou a política de tarifas, de forma de maximizar as
receitas do monopólio. A implementação dessa nova política tarifária introduziu um
diferencial de renda entre a população residente e a flutuante e igualou as tarifas de água e
esgoto de maneira que o consumidor com abastecimento de água, paga também pela coleta e
tratamento do esgoto. Além disso, a cobrança passou a ser direta, sem haver escalonamento
por blocos de consumo (o consumo que ultrapassar o limite de uma faixa de consumo pagará
toda a conta pelo valor único do limite último em que o consumo se situar, ou seja, não será
proporcional às faixas anteriores) e houve a introdução de mais faixas de consumo, fazendo
aumentar o valor das contas para uma faixa que antes tinha o mesmo preço em toda sua
amplitude (MELO, 2001, p.12).
A mudança na estrutura de cobrança apresentou-se como uma forma muito diferente com
relação às políticas da CEDAE (RJ). Para exemplificar um dos aspectos da política tarifária, a
empresa está autorizada, pelo contrato de concessão, de cobrar preços mais altos para ligações
não-hidrometradas, o que pode ser traduzido por um incentivo a hidrometação. Isso hoje pode
ajudar a explicar o porquê de o índice de perdas de faturamento de Juturnaíba ser menor, com
35,7%, que o da estatal CEDAE, com 57,1%, com base nos dados do SNIS -2001.
A nova estrutura tarifária, sem escalonamento em blocos de consumo, passou a vigorar em
março de 1998. A partir, de então, desde de novembro de 1998 até abril de 2001, as tarifas pôr
autorização da ASEP sofreram reajustes de respectivamente 11%, 18,7 e 6,2%.
Atualmente os níveis de atendimento urbano de água e esgoto de Águas de Juturnaíba, são
respectivamente de 90,9% e 1,7% (SNIS, 2001). Esses dados pressupõem que os
investimentos em esgotamento devem superar e muito os investimentos em abastecimento de
água.
No ano de 2001, tomando-se por base os dados do SNIS, a tarifa média de água praticada pela
CAJ (concessionário Águas de Juturnaíba) era de R$ 1,08 enquanto a estatal CEDAE cobrava
a tarifa média (água + esgoto) de R$ 1,08. A CAJ não enviou o valor da tarifa media para a
análise do Diagnóstico de Saneamento do SNIS 2001, mas supõe ser o mesmo valor por causa
da mudança que igualou as cobranças das tarifas de água e esgotos. Desta forma, tanto as
tarifas praticadas pelo CAJ quanto pela CEDAE seriam iguais.
Os investimentos previstos para o Concessionário Águas de Juturnaíba, quando da data de
início da concessão previa que R$ 197 milhões seriam investidos em adutoras, reservatórios
de água, redes elevatórias e tratamentos de esgotos, para uma população estimada em 200
milhões de habitantes (ver tabela 10).
Em agosto último, a Governadora do Rio de Janeiro, Rosinha Matheus, repactuou o contrato
da concessionária Águas de Juturnaíba, antecipando em R$12 milhões de investimentos da
empresa em obras de esgotamento sanitário em troca da outorga que a empresa pagaria ao
governo do Estado (Após 39 meses...). .(Após 39 meses...). (Após 39 meses...).
Iguaba Grande, São Pedro da Aldeia, Cabo Frio, Arraial do Cabo e Búzios
Em Pró-lagos o modelo de privatização ocorreu de forma análoga ao de Juturnaíba. Houve
mudança da estrutura tarifária e as tarifas também tiveram reajustes semelhantes, porém,
devido à falta de atendimento de algumas exigências do contrato de concessão com relação ao
andamento de algumas obras tais aumentos foram postergados para março de 1999, quando a
nova estrutura tarifária foi implementada e já vigorando um aumento de 9,75%, em abril de
2000, 18,7% e 6,8% em janeiro de 2001, autorizados pela ASEP (MELLO, 2001, p.15). A
tarifa média (água + esgoto) praticada pela concessionária de Pró-Lagos, em 2001, era de R$
1, 42, ficando mais alta do que a tarifa média da CEDAE de 1,08. Isso se deve em grande
parte a eliminação da tarifação escalonada em blocos de consumo.
O Grupo Monteiro Aranha, um dos pioneiros na participação de concessões privada na área
de saneamento básico no país e integrante do consórcio de Pró-Lagos, resolveu vender sua
participação a estatal portuguesa Águas de Portugal, alegando ser muito complicado atuar em
um mercado sem sistema regulatório e de difícil estrutura para financiamento. Segundo o ex-
presidente de Pró-Lagos, Vlamir de Castro Paes, foram captados recursos da ordem de R$ 100
milhões junto à Caixa Geral de Depósitos e ao Banco Espirito Santo, para investir em obras
de esgotos das cidades cobertas. Contudo, o retorno foi o pior possível, não somente pela
natureza do investimento ser de capital intensivo, mas, sobretudo porque a inadimplência no
pagamento das tarifas chegou a 70%. (JORGE, 2003).
O investimento previsto para Pró-Lagos na época do contrato de privatização, foram estimado
em cerda de R$ 70 milhões e cuja população era estimada em 220 milhões podendo chegar a
700 milhões no verão (Quadro 1).
Limeira
Antes da privatização a situação de abastecimento em Limeira era muito crítica, com falta
d’água e apenas 2% dos esgotos coletados eram tratados. Atualmente o nível de
abastecimento de água está próximo da universalização com quase 100% de domicílios
urbanos atendidos. E 80% dos esgotos coletados recebem tratamento (Diagnostico, 2001). As
perdas com água tratada são de apenas 18,5 %, bem abaixo da média nacional que fica em
torno de 40%.
O leilão de privatização de Limeira foi feito de forma que o concessionário vencedor fosse o
que oferecesse a menor tarifa, sem a cobrança pela outorga, ficando a empresa Águas de
Limeira como vencedora do leilão. Em Limeira a privatização não criou nem eliminou faixas
de consumo, isso porque a estrutura tarifária foi definida de forma escalonada, modificando-
se apenas os valores dos consumos de água e esgoto que passaram a ter um valor de tarifa
único. No contrato de concessão não houve a autorização para a concessionária cobrar preços
mais elevados para os consumidores não-hidrometrados, cobrando-se, portanto, a tarifa
mínima (até 15 m3), que de certa maneira, devem atingir parcela das famílias pobres que
possuam abastecimento de água tratada (MELO, 2001, p.9).
Desde a privatização o concessionário trabalhou com a mesma tarifa nominal por quase seis
anos e somente em fevereiro de 2001, foi autorizado a reajustar as tarifas em 63,4%, dividido
em três parcelas (Ibid., p.9).
A inexistência de subsídios para as famílias pobres em Limeiras coexiste com a isenção e
redução no valor das tarifas para imóveis pertencentes a o serviço público do município além
do consumo destinado ao uso público em locais como: chafarizes, irrigação de logradouros
públicos, limpeza urbanas e similares, sem, no entanto, definir a fonte de origem para tais
subsídios. Em 2001, de acordo com os dados do SNIS, a tarifa média praticada por Águas de
Limeira era de R$ 0,64, sendo uma das mais baixas da região Sudeste e até mesmo do país.
Vale notar que a SABESP (SP) no mesmo ano praticava uma tarifa média de R$ 1,24, quase o
dobro.
Até o momento, o concessionário Águas de Limeira, investiu R$ 40 milhões com meta de R$
60 milhões a serem investidos até 2010 (MANGABEIRA, 2003). O montante de
investimentos previsto na concessão era de cerca de R$ 110 milhões para a aplicação em
obras de elevatórios e tratamento de esgotos. A população do município estimada na época do
contrato era de aproximadamente de 218 mil habitantes.
Petrópolis
Com a privatização, a empresa vencedora Águas do Imperador retirou a tarifa popular que
havia em Petrópolis, o que inevitavelmente atingiu as populações mais pobres. A estrutura
tarifária ficou pré-definida de forma escalonada e adotando-se o percentual de 80% da tarifa
de água para cálculo da tarifa de esgoto, podendo cobrar do consumidor com abastecimento
próprio de água o valor pela coleta e tratamento de esgotos.
A conta mínima cobrada em águas do Imperador é de 10 m³ para os consumidores sem
hidrometração e continuou sendo cobrada essa mesma faixa de consumo. Contudo os novos
preços definidos pelo contrato vieram a vigorar em março de 1998, sofrendo uma revisão nos
preços acima da inflação, em janeiro de 1998, de 31,5% (Ibid., p.9). Vale salientar que no
caso de Petrópolis como no da Região dos Lagos o critério de seleção foi o de menor tarifa
mais o menor valor de outorga. Até 2001, a tarifa média praticada pelo concessionário Águas
do Imperador era de R$ 0,87. Estima-se que os investimentos necessários para as obras e
instalações em Petrópolis eram da ordem de mais de R$ 80 milhões para uma população
beirando os cerca de 240 mil habitantes.
Ribeirão Preto e Itu
No Estado de São Paulo, conforme visto no capítulo 3, a opção pela concessão parcial ocorreu
pelo temor de haver possivelmente um desgaste político pelas perdas ou inadequação dos
serviços prestados pelos concessionários privados diante das possíveis dificuldades
encontradas para resolver os graves problemas de saneamento nos municípios do Estado.
Diante disso, registra-se que nos dois casos analisados, tanto de Ribeirão Preto quanto de Itu,
os municípios continuam operando seus respectivos sistemas de abastecimento de água,
concedendo a iniciativa privada apenas os sistemas de esgotos, do tipo BOT.
Dessa forma, como a concessão do tipo BOT prevê que as receitas relativas à prestação dos
serviços sejam auferidas pela respectiva empresa administradora do sistema, no caso nas
empresas de Ribeirão Preto – Ambient – e de Itu – Cavo Itu, os contratos de concessão
prevêem que os bancos arrecadadores transfiram o produto da cobrança diretamente para uma
conta corrente em nome da empresa concessionária. É necessário destacar que as contas de
esgotos são cobradas em conjunto com as de água.
O fato dos municípios poderem contar com um fluxo de receitas próprias, via arrecadação e
depósito em conta corrente, foi importante como garantia para obtenção de financiamentos
junto ao BNDES e para possibilidades de atração de investimentos externos. Isso ocorreu com
a Ambient, que com o apoio do BNDES, foi possível viabilizar recursos nos Estados Unidos
do Global Environmental Fund no valor de R$ 6,6 milhões (Moreira, 2002, p.11).
As cidades de Ribeirão Preto e Itu foram pioneiras nos processos para obtenção de
financiamento do BNDES para construção de sistemas de tratamento de esgotos. A Ambient
obteve financiamento com o BNDES de R$ 30 milhões do total previsto de investimento R$
43 milhões, com prazo de pagamento em 10 anos. A Cavo Itu, recebeu em empréstimos do
BNDES recursos da ordem de R$ 12,9 milhões do total previsto de investimento de R$ 18,2
milhões, com prazo para pagamento também em 10 anos. (MOREIRA, 2002, p.10).
Nestes dois casos de concessões os editais previam que para critério de vencedor do leilão
deveria levar-se em consideração a adoção da menor tarifa como no caso da concessão em
Limeira, também em São Paulo. Em 2001, pelos dados obtidos do Diagnóstico dos Serviços
de Saneamento, a tarifa média de esgoto praticado em Ribeirão Preto e Itu eram iguais de
R$0,83. Enquanto a SABESP no mesmo ano, cobrava a tarifa média de esgotos pôr R$1,33.
4.2 AS DIFICULDADES ENCONTRATADAS PELA PRIVATIZAÇÃO E A
ATRATIVIDADE DO SETOR DE SANEAMENTO
Analisando-se o formato dos leilões vencido pelos concessionários de Pró-Lagos, Águas de
Juturnaiba e Águas de Limeira, é possível perceber que as modificações feitas nas faixas de
consumo, os reajustes acima da inflação do período (como no caso de Águas do Imperador,
em Petrópolis) e a utilização de mecanismo de diferenciação de preços entre residentes e
veranista foram modificações feitas objetivando a maximização das receitas.
Verifica-se que a questão de reajustes de preços das tarifas não é bem definida, haja vista que,
em Limeira, por exemplo, ficou quase seis anos sem reajustes de tarifas para posteriormente
conceder aumentos de 63,4% ou como em Petrópolis com aumentos acima da inflação. Para
evitar-se aumentos excessivos, a regulação econômica a ser criada deverá especificar limites
para aumentos reais que possam advir da grande necessidade de investimentos, podendo
adotar, se for o caso, como limite máximo, a tarifa das empresas públicas de saneamento
básico (CESBs).
Nos formatos dos leilões vencidos pelas empresas Águas do Juturnaíba, Pró-Lagos e Águas
do Imperador, ficaram determinado que além das propostas técnicas (experiencia em
construção, operação, manutenção de sistemas e etc) os concessionários deveriam pagar sobre
o valor da tarifa oferecida o fator de outorga. As receitas provenientes da cobrança dos
direitos de outorga serão divididas pelas entidades previamente acordadas como integrantes
do poder concedente (estado e municípios). Assim a cobrança pela outorga dificulta a oferta
de tarifas mais baixas à população.
Nos contratos de Pró-Lagos e Juturnaíba além da semelhança quanto às estruturas tarifárias os
reajustes tarifários, prevê a iniciativa de proteger as empreiteiras pelo risco de construção
(MELO, 2001, p.17). O modelo de privatização por municípios é bastante positivo e sem
dúvida é o melhor modelo, na medida em que estimula a competição no mercado, competição
essa que é estimulada desde a assinatura dos contratos até a sua renovação (não sendo
permitido a competição direta no mercado, por tratar-se de serviços públicos), de maneira que
o agente privado é quem deve assumir os riscos, o que até o momento ainda não aconteceu.
A melhoria de qualidade e de proteção ao meio ambiente, no setor de saneamento,
normalmente requer a investimentos adicionais em capital. Principalmente porque a indústria
de saneamento é caracterizada por investimentos intensivos em capital com custos
irrecuperáveis, tendo-se em vista, que a maioria dos ativos fixos praticamente não possuem
uso alternativo, caracterizando monopólio do tipo I (monopólio natural).
Por ser monopólio natural, um dos fatores positivos das concessões tem sido que os contratos
prevêem prazos relativamente longos de forma a permitir a maturação do capital investido:
• Araruama, Saquarema e Silva Jardim – concessão de 30 anos;
• I. Grande, S. P. da Aldeia, C. Frio, A. do Cabo e Búzios – concessão de 25 anos;
• Petrópolis – concessão de 30 anos;
• Ribeirão Preto e Itu – concessão de 20 anos cada.
Percebe-se também que há possibilidade de formação de esquemas de garantias, devidamente
constando dos contratos de concessão, para garantia de empréstimos junto a investidores
nacionais e internacionais, como por exemplo, a adoção da cessão de receitas em Ribeirão
Preto e Itu.
5 CONCLUSÃO
O quadro atual de deficiência da cobertura dos serviços de saneamento básico no país impõe-
nos como grande desafio elevar os atuais índices de cobertura dos serviços de saneamento
básico a toda a população. Para tanto, torna-se necessário aumentar significativamente os
investimentos no setor de saneamento para fazer face a demanda pelos serviços de
saneamento.
Pela análise das privatizações ocorridas até o momento, ainda são relativamente poucas as
iniciativas de concessões privadas no país. Essas privatizações ocorreram principalmente por
meio de algumas concessões de municípios autônomos e duas participações acionárias em
empresas estaduais (SANEPAR-PR e SANEATINS-TO), as quais estão fortemente
concentradas nas regiões Sul e Sudeste do país. As concessões que foram feitas ocorreram
num verdadeiro clima de laissez-faire, laissez-passer os quais as empresa privadas adentraram
no setor ansiosa pelas possibilidades de obtenção de recursos financeiros junto a organismos
nacionais (especialmente recursos do FGTS e BNDES) e organismos internacionais e
precavendo-se na forma de contratos pelos riscos elevados inerentes aos serviços de
saneamento básico.
Os investimentos deveriam se concentrar no atendimento prioritário às populações de baixa
renda, localizadas, principalmente nas regiões menos desenvolvidas, especialmente nas
regiões Norte e Nordeste, nas periferias dos grandes centros urbanos, nas pequenas
localidades e em área rural. É nesses locais que se concentram os maiores déficits em
saneamento básico e, sobretudo, onde vivem as populações de baixa renda. Até o momento os
contratos firmados prevêem apenas o aumento da cobertura sem que necessariamente
estabeleçam o atendimento prioritário das populações mais pobres.
Para tanto, tornar-se-ia necessário induzir a desconcentração de recursos nas regiões Sul e
Sudeste, onde estão concentradas a quase totalidades das privatizações. É preciso ainda
estabelecer a adoção de políticas públicas no sentido de direcionar e estabelecer as metas de
universalização nas áreas de concessões e em caso de comprovar-se a incapacidade dos
concessionários privados de atingimento de metas preestabelecidas, far-se-ia necessário a
utilização de recursos públicos, possivelmente de origem fiscal, no sentido de garantir
equidade no acesso aos serviços de saneamento básico.
Entretanto, na tentativa de remover alguns obstáculos, que via de regra, são causadores de
incertezas à cerca das políticas de parcerias privadas no setor de saneamento básico, o
Governo Federal apresentou Projeto de Lei PLS 266/96 para definir a titularidade dos serviços
de interesses comum aos Estados. Além do projeto de Lei n.o 4.147 com vistas a definir a
titularidade dos serviços de interesse local aos municípios. Ambos os projetos até o momento
da publicação deste trabalho ainda encontram-se para votação pelo Congresso Nacional. Há
também a necessidade de se estabelecer o marco regulatório específico do setor de
saneamento para que possa haver estabilidade das regras (de reajuste das tarifas) e
instrumentos de controle para a participação privada no setor, bem como, da realização de
investimentos.
A parceria com o setor privado demonstra-se inevitável e em alguns casos recomendáveis, na
medida em que os municípios demonstram incapacidade para investir nos serviços de
saneamento. Desta foram a opção tem sido por parcerias privadas, principalmente pela
externalidades negativas que a falta de saneamento básico causa a saúda das populações
afetadas, com o aparecimento de doenças relacionadas à poluição hídrica.
Os investimentos que o setor de saneamento básico irá demandar, para os próximos anos, são
bastante elevados e essa possibilidade de atrair investimentos é que demonstra a atratividade
do setor .O volume de investimentos demandado constitui-se num forte elemento de atração
de capitais e por isso também é necessário ter cuidado para que empresas nacionais
(principalmente) construtora de obras de infra-estrutura (formada pr grandes empreiteiros do
país) recebam recursos para construção de obras em detrimento dos serviços de saneamento
que possam prestados. Os recursos de saneamento devem ser canalizados para empresas
prestadoras dos serviços de saneamento de forma que possa haver uma maior democratização
dos serviços.
Conclui-se que ainda que problemas quanto à indefinição com relação à política de
privatização no setor, bem como a imprecisão de quem pode agir como poder concedente dos
serviços de saneamento e a falta de legislação regulatória específica para o setor, não são
problemas impeditivos à entrada de capitais privados no setor de saneamento básico. Porque
os editais e contratos de concessão podem estabelecer mecanismos claros e precisos de forma
a garantir os direitos e deveres dos agentes envolvidos. Como se pode notar, é o grande
volume de recursos para investimento que tem atraído o capital privado a investir no setor
saneamento básico do país e dessa maneira o risco das populações menos capazes de pagar
pelos serviços de saneamento básico ficarem sem atendimento são também bastante elevados
na medida em que a iniciativa privada não tem interesse pelos mais pobre ou pelos pequenos
municípios.
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