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Página 1 de 26 CONSELHO DE DISCIPLINA SECÇÃO NÃO PROFISSIONAL Processo disciplinar n.º 25 – 2020/2021 DESCRITORES: Agente desportivo – Agente de arbitragem – Futebol – Ficha de Jogo – Árbitro principal – Covid-19 – Absolvição

SECÇÃO NÃO PROFISSIONAL

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CONSELHO DE DISCIPLINA

SECÇÃO NÃO PROFISSIONAL

Processo disciplinar n.º 25 – 2020/2021

DESCRITORES: Agente desportivo – Agente

de arbitragem – Futebol – Ficha de Jogo –

Árbitro principal – Covid-19 – Absolvição

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ESPÉCIE: Processo Disciplinar

PARTES: Sérgio José Santos Guelho (NIC 13863827), agente de arbitragem, na qualidade de

arguido

DATA DO ACÓRDÃO: 10.09.2021

TIPO DE VOTAÇÃO: Unanimidade

RELATOR: Tiago Coelho Magalhães

OBJETO: Factos ocorridos por ocasião do jogo oficial n.º 260.04.030, disputado entre a Sporting

Clube São João de Ver – Futebol, SAD (1106), e o Sport Clube Beira Mar (967), em 15.11.2020, a

contar para a 5.ª Jornada do Campeonato de Portugal, época desportiva 2020/2021

NORMAS APLICADAS: Artigos 3.º, 4.º, alínea b), 12.º, 15.º, 181.º, todos do RDFPF; artigos 7.º e

8.º, n.º 1, do Regulamento da FPF – Covid-19 para a Retoma da Prática Competitiva de Futebol,

Futsal e Futebol de Praia

SUMÁRIO:

I. Ainda que a acusação padeça de alguma insuficiência factual, tal não conduz

automaticamente à conclusão de que a respetiva responsabilidade disciplinar seria

necessariamente indetetável, não se verificando nulidade insuprível, desde que ela satisfaça o

mínimo indispensável à vinculação temática da autoridade decidente e o arguido dê mostras de

haver entendido o sentido e alcance da acusação, que assim cumpre a sua função primordial de

garantia, assegurando o efetivo direito de defesa do arguido.

II. Nos termos da norma 6 das Normas e Instruções para Árbitros, bem como da Lei 5 das

Leis de Jogo e dos artigos 19.º, n.º 1, alínea i), e 20.º, n.º 2, do Regulamento de Arbitragem, é

dever do árbitro preencher de forma completa a Ficha de Jogo, relatando e descrevendo todas

as situações relevantes que possam configurar a prática de ilícitos disciplinares.

III. Para se concluir pelo preenchimento dos elementos objetivos da infração disciplinar

prevista e sancionada pelo artigo 181.º, n.º 1, do RDFPF, é necessário que, voluntariamente e

ainda que de forma meramente culposa, (i) um agente de arbitragem (ou delegado ao jogo da

FPF) (ii) elabore o respetivo relatório relativo a jogo oficial (iii) em violação das normas

regulamentares, designadamente de forma negligente, defeituosa ou incompleta, (iv)

conquanto sanção mais grave não seja aplicável por força de outra disposição do RDFPF.

IV. Deparando-se com uma situação de dúvida relativamente à veracidade, ou não, da

matéria de facto imputada ao arguido, o órgão decisor deve necessariamente adotar uma

decisão favorável ao arguido, como impõe o princípio in dubio pro reo, ancorado no princípio da

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presunção de inocência, constitucionalmente consagrado no artigo 32.º, n.º 2, da Lei

Fundamental.

V. Não é possível imputar a um agente de arbitragem a prática da infração prevista e

sancionada pelo artigo 181.º, n.º 1, do RDFPF, por alegadamente não ter mencionado na Ficha

de Jogo que, em violação das normas regulamentares vigentes em contexto pandémico

associado à doença Covid-19, estiveram presentes no recinto desportivo adeptos não

autorizados, se não se alega em sede de acusação e muito menos se logra provar, em face dos

elementos constantes dos autos, em que condições aqueles adeptos terão acedido e

permanecido no recinto desportivo e se o árbitro principal viu efetivamente que aqueles

adeptos haviam acedido e permanecido no recinto desportivo, em violação das normas

regulamentares aplicáveis.

ACÓRDÃO

Acordam, em Plenário, ao abrigo dos artigos 216.º, n.º 1, e 229.º do Regulamento

Disciplinar da Federação Portuguesa de Futebol (1), os membros do Conselho de Disciplina,

Secção Não Profissional, da Federação Portuguesa de Futebol (2),

I – RELATÓRIO DE TRAMITAÇÃO PROCESSUAL

§1. Registo inicial

1. Por deliberação da Secção Não Profissional do Conselho de Disciplina da Federação

Portuguesa de Futebol (doravante “FPF”), datada de 20.11.2021 (cf. fls. 1 dos autos), foi

autuado o presente processo disciplinar, de acordo com o artigo 232.º, n.º 1, do Regulamento

Disciplinar da FPF (doravante “RDFPF”), visando apurar a eventual responsabilidade disciplinar

do agente de arbitragem Sérgio José Santos Guelho, que interveio na qualidade de árbitro

(1) Regulamento Disciplinar da Federação Portuguesa de Futebol, com as alterações aprovadas pelo Direção da

Federação Portuguesa de Futebol na sua reunião de 10.07.2020, doravante abreviado, por mera economia de texto,

por RDFPF. O texto regulamentar encontra-se disponível, na íntegra, na página oficial da FPF na internet e foi

publicitado pelo Comunicado Oficial n.º 460, de 13.07.2020.

(2) Adiante apenas identificado como CDSNP.

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principal no jogo oficial n.º 260.04.030, disputado, em 15.11.2020, entre a Sporting Clube São

João de Ver – Futebol, SAD (“SC São João de Ver”), e o SC Beira Mar, a contar para a 5.ª Jornada

do Campeonato de Portugal, época desportiva 2020/2021, por alegadamente não ter feito

constar da Ficha de Jogo que, no decurso daquele jogo, adeptos afetos à equipa da SC São João

de Ver, identificados com adereços como camisolas e cachecóis, assistiram ao jogo, colocados

no muro, do lado de fora do complexo desportivo, tal como se encontra relatado no Relatório

de Ocorrências elaborado pelo Delegado da FPF ao jogo em causa.

2. O presente processo disciplinar foi autuado e registado, distribuído a Inquiridor (cfr.

verso da capa) e os autos conclusos à Comissão de Instrução Disciplinar da FPF (fls. 21), tendo

sido nomeada Instrutora, por despacho do Senhor Coordenador da Comissão de Instrução

Disciplinar da FPF (fls. 21).

3. No momento da sua autuação, o processo disciplinar encontrava-se instruído com os

seguintes elementos:

a) Deliberação do CDSNP de instauração do presente processo disciplinar (fls. 1);

b) Comunicado Oficial da FPF n.º 198, de 20.11.2020, e excerto do respetivo mapa

de processos sumários anexo (fls. 2 e 3);

c) Ficha de Jogo referente ao jogo oficial n.º 260.04.030, bem como as fichas

técnicas das respetivas equipas (fls. 4 a 15);

d) Relatório de Ocorrências elaborado pelo Delegado da FPF ao jogo oficial n.º

260.04.030, incluindo 2 (duas) fotografias anexas ao mesmo (fls. 16 a 20).

4. Na sequência da aludida nomeação, a Sra. Instrutora promoveu as seguintes

diligências probatórias e oficiou e juntou aos autos, designadamente, os seguintes documentos:

a) Em 18.01.2021, juntou detalhe de inscrição do agente de arbitragem Sérgio José

Santos Guelho, na FPF (fls. 23), bem como o respetivo “cadastro de dirigente” (fls.

24) e cadastro disciplinar (fls. 25);

b) Junção de Relatório de Observação e Formação elaborado pelo Observador da

Equipa de Arbitragem, relativamente ao jogo oficial n.º 260.04.030 (fls. 30 a 33);

c) Junção de mensagem de correio eletrónico remetida pela Guarda Nacional

Republicana (“GNR”), em 11.12.2020, declarando que o jogo dos autos “decorreu

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sem incidentes, motivo pelo qual não foi elaborado relatório de policiamento de

eventos desportivos” (fls. 36 e 37);

d) Junção de “Ficha de Dados do Árbitro”, relativa ao agente de arbitragem Sérgio

José Santos Guelho (fls. 42 a 44);

e) Junção de mensagem de correio eletrónico, datada de 19.01.2021, remetida pelo

Diretor do Canal 11, a solicitação da Sra. Instrutora, confirmando que o jogo em

causa nos autos “não foi transmitido nem recolhidas imagens” (fls. 47 e 48);

f) Em 19.01.2021, junção de suporte digital de gravação vídeo do jogo dos autos,

“retirada do website “new.instatscout.com”” (fls. 49 e 50).

5. Em 19.01.2021, a Sra. Instrutora elaborou proposta de acusação (fls. 55 e ss.), a qual

mereceu adesão tácita do Sr. Inquiridor, nos termos e para os efeitos do artigo 238.º, n.º 1, do

RDFPF, in fine (como decorre de cota lavrada a fls. 51).

6. A acusação foi regularmente notificada ao arguido Sérgio José Santos Guelho, em

conformidade com o n.º 1 do artigo 240.º do RDFPF, por mensagem de correio eletrónico,

datada de 08.03.2021 (fls. 52 e ss).

7. Em 12.04.2021, através de mensagem de correio eletrónico, o arguido Sérgio José

Santos Guelho apresentou defesa escrita, subscrita e apresentada pelo seu Ilustre Mandatário,

nos termos de procuração aí junta, requerendo a tomada de declarações ao arguido e a

inquirição de 2 (duas) testemunhas (cfr. fls. 72 e ss.). A propósito da tempestividade da defesa

em causa, a Sra. Instrutora lavrou cota, fazendo constar que, “para os devidos efeitos legais, em

especial em relação a tempestividade da defesa apresentada, que os prazos estiveram suspensos

entre a notificação da acusação e a apresentação da peça defensiva” (fls. 88).

8. Na fase de instrução, a Sra. Instrutora procedeu à inquirição da testemunha Élio Filipe

Dias Nascimento, que interveio no jogo dos autos como árbitro assistente n.º 1 (auto de

inquirição a fls. 99 e suporte digital de gravação da inquirição a fls. 93), e à inquirição da

testemunha Pedro Miguel Figueiredo Nunes, que interveio no jogo dos autos como árbitro

assistente n.º 2 (auto de inquirição a fls. 100 e suporte digital da gravação da respetiva inquirição

a fls. 95), e ainda procedeu à tomada de declarações ao arguido (auto a fls. 101 e respetivo

suporte digital de gravação das declarações a fls. 97).

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9. A Sra. Instrutora procedeu à elaboração de relatório final do processo disciplinar, ao

abrigo do disposto no artigo 243.º, n.º 1, do RDFPF, que consta de fls. 103 e ss., no qual, a final,

é proposta a condenação do arguido Sérgio José Santos Guelho “pela infração disciplinar

prevista e sancionada pelo número 1 do artigo 181.º do RDFPF, por referência à norma 6.4 das

Normas e Instruções para Árbitros e ao artigo 20.º, n.º 2, alínea d) do Regulamento de

Arbitragem”, propondo a aplicação da sanção de repreensão.

10. Em seguida, os autos foram, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 243.º

do RDFPF, conclusos ao Relator, como resulta de fls. 128.

11. O Relator designado considerou encontrarem-se reunidas as condições processuais

para encerramento da fase de instrução, pelo que prosseguiram os autos para elaboração de

projeto de acórdão, nos termos do artigo 245.º do RDFPF.

§2. Da acusação

12. Em síntese, nos termos do libelo acusatório deduzido nos autos, o arguido Sérgio

José Santos Guelho vem acusado da prática da infração disciplinar prevista e sancionada pelo

artigo 181.º, n.º 1, do RDFPF, por ter preenchido de forma incompleta a Ficha de Jogo relativa

ao jogo oficial n.º 260.04.030, disputado entre a SC São João de Ver e o SC Beira Mar, em

15.11.2020.

13. Assim é, uma vez que a Ficha de Jogo refere que não houve adeptos presentes no

evento desportivo em causa, pese embora o Relatório de Ocorrências elaborado pelo Delegado

da FPF ao jogo dos autos refira que alguns adeptos afetos à equipa do SC São João de Ver terão

assistido ao jogo, por cima de um muro ou encostados ao mesmo – o que inclusive conduziu ao

sancionamento da SC São João de Ver, em processo sumário, por presença de pessoas não

autorizadas no recinto desportivo, em violação do disposto nos artigos 7.º e 8.º, n.º 1, alínea e),

do Regulamento Covid-19.

14. Mais adiantava a acusação que o arguido sabia que era sua obrigação elaborar e

preencher a Ficha de Jogo de forma correta, completa e pormenorizada e que, ao ter preenchido

aquela Ficha de Jogo de modo incompleto, não fazendo constar a presença de adeptos no

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recinto desportivo, em violação do Regulamento Covid-19, o arguido não agiu com todo o

cuidado e diligência a que está regulamentarmente obrigado, e que pode e é capaz de observar.

§3. Da defesa

15. No prazo de que dispunha para o efeito, o arguido apresentou defesa escrita (fls. 72

e ss. dos autos), subscrita por Ilustre Mandatário constituído nos autos, requerendo a inquirição

de 2 (duas) testemunhas e a tomada de declarações ao próprio arguido.

16. Na defesa apresentada, o arguido invoca a nulidade da acusação deduzida nos autos,

por alegada “omissão de factos relevantes da acusação”, na medida em que o texto do libelo

acusatório não referiria: (i) quantos adeptos se encontravam no recinto desportivo; (ii) a qual

dos clubes seriam afetos esses adeptos; (iii) se o muro fazia parte do complexo desportivo e em

que parte do mesmo se encontrariam os adeptos; bem como (iv) se esses adeptos se

encontravam no interior do complexo desportivo. De acordo com a defesa escrita, esses factos

seriam “essenciais e indispensáveis à acusação”, “[p]ara que o arguido ou alguém colocado na

sua posição seja capaz de perceber todo o libelo acusatório e factual sobre o qual é acusado / e,

com isso, preparar, de forma devida, a sua defesa” (artigos 7, 8 e 9 da defesa). Tais factos, conclui

a defesa, “carecem ser alegados” e, “[n]ão o tendo sido, não pode agora existir alteração dos

factos que conduziram à acusação do aqui arguido”, “[p]elo que, em consequência, é nula a

acusação” (artigos 16, 17 e 18 da defesa).

17. Por outro lado, em sede de defesa escrita, o arguido vem alegar que a imputação da

prática de infração disciplinar em causa não possui qualquer fundamento, pois tal corresponde

a “não saber as concretas funções que são desempenhadas por um árbitro ao longo do jogo”

(artigo 21 da defesa), que “não é um polícia, não é um inspetor, não é um fiscal e, muito menos,

não tem funções meramente administrativas” (artigo 22 da defesa). Pelo contrário, alega que o

papel do árbitro coincide com a aplicação das Leis do Jogo “[e] que a verdade desportiva não

seja comprometida” (artigos 24 e 25 da defesa), pelo que “um árbitro de futebol está obrigado

a relatar todos os factos, que sejam relevantes, desde que os tenha visualizado” (artigo 28).

Assim, alega o arguido que, “[s]e tivesse visto, seguramente tê-lo-ia descrito” (artigo 35). E

considera que a presença daqueles adeptos “não [seria] assim tão visível” (artigo 38), uma vez

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que tal circunstância não é referida no Relatório de Policiamento da Guarda Nacional

Republicana.

18. Assim, em sede da defesa escrita apresentada, o arguido considera que a acusação

“parte do princípio, errado, […] que o Arguido viu a situação factual que é ali descrita” (artigo

47) e ainda conclui que “[a]o Conselho de Disciplina compete apurar ilícitos disciplinares” (artigo

55) e não “decidir se um árbitro viu bem ou mal uma determinada situação factual durante um

jogo” (artigo 56) ou “se um lance de jogo é infração passível de expulsão ou não” (artigo 59 da

defea).

19. Em face dos argumentos expendidos, o arguido considera que deve ser “absolvido

da infração disciplinar que lhe é imputada, por falta de fundamento factual e jurídico”.

II – COMPETÊNCIA DO CONSELHO DE DISCIPLINA

20. De acordo com o artigo 43.º, n.º 1, do RJFD2008 (3), compete a este Conselho, de

acordo com a lei e com os regulamentos e sem prejuízo de outras competências atribuídas pelos

estatutos e das competências da Liga Profissional, instaurar e arquivar procedimentos

disciplinares e, colegialmente, apreciar e punir as infrações disciplinares em matéria desportiva.

No mesmo sentido, dispõe o artigo 15.º do Regimento deste Conselho (4).

III – QUESTÕES PRÉVIAS

21. Tendo em conta a defesa escrita apresentada, nos autos, pelo arguido, a fls. 72 e ss.,

importa apreciar, a título de questão de prévia que obstaria ao conhecimento do fundo da

questão, a invocada nulidade da acusação deduzida nos autos, com fundamento na falta de

alegação de “factos […] essenciais e indispensáveis à acusação” (artigo 7), como sejam aqueles

(3) Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 248-B/2008, de 31 de dezembro (regime jurídico das federações desportivas e do

estatuto de utilidade pública desportiva) e alterado pelo artigo 4.º, alínea c), da Lei n.º 74/2013, de 6 de setembro

(Cria o Tribunal Arbitral do Desporto e aprova a respetiva lei) e ainda pelos artigos 2º e 4º Decreto-Lei n.º 93/2014,

de 23 de junho, cujo texto consolidado constitui anexo a este último.

(4) Disponível, na íntegra, na página da Federação Portuguesa de Futebol.

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que a defesa elenca no respetivo artigo 6: “a) Quantos adeptos alegadamente ali encontravam?;

b) Adeptos de que clube?; c) O muro fazia parte do Estádio?; d) Em que muro/parte/zona do

Estádio alegadamente se encontram os adeptos; e) Os adeptos estavam no interior do Estádio?”

[sic].

22. No que tange a este putativo vício e sem prejuízo da apreciação que adiante se fará,

cumpre recordar que, nos termos do artigo 238.º, n.º 3, do RDFPF, a acusação “deve conter os

seguintes elementos, sob pena de nulidade: a) Identificação do arguido; b) A narração dos factos

constitutivos das infrações disciplinares que lhe são imputadas; c) A indicação das disposições

legais e regulamentares aplicáveis e, sendo disso caso, as circunstâncias atenuantes e

agravantes; d) As sanções abstratamente aplicáveis; e) A descrição e valor dos danos causados

pelos factos cuja reparação é pedida pelos interessados; f) A data e a assinatura do instrutor”.

Neste particular, cumpre atentar que o processo disciplinar desportivo, à semelhança do

processo contraordenacional, assume “natureza mista”, pelo que, não tendo de existir uma

estreita equiparação entre o ilícito disciplinar e o ilícito criminal (5), assume “clara feição de

procedimento administrativo até ao momento da eventual impugnação judicial” (6). É, aliás, por

tal razão que o artigo 11.º do RDFPF convoca, em primeiro lugar, “as regras constantes do Código

de Procedimento Administrativo” como direito subsidiariamente aplicável na tramitação do

procedimento disciplinar.

23. Nessa medida, “no domínio do processo sancionatório, a preservação das garantias

de defesa tem que passar, nos parâmetros de um Estado de direito, pela observância do princípio

do contraditório, de forma a ser dada ao arguido a possibilidade de conhecer a imputação que

lhe é feita e a oportunidade de se defender”, daí que o que se exige é que “seja assegurado o

«núcleo mínimo» do exercício do contraditório” (7). Em contexto próximo do presente, o

Supremo Tribunal Administrativo vem sustentando precisamente que “[o] direito de defesa e

audiência do arguido em processo disciplinar é hoje, reconhecidamente, um direito fundamental,

(5) Cf. Acórdão n.º 103/91 do Tribunal Constitucional, relatado pelo Juiz Conselheiro Monteiro Diniz, onde, citando a lição de Eduardo Correia, se assevera «Assim: “uma coisa será o direito criminal, outra coisa o direito relativo à violação de uma certa ordenação social, a cujas infracções correspondem reacções de natureza própria. Este é, assim, um aliud que, qualitativamente se diferencia daquele, na medida em que o respectivo ilícito e as reacções que lhe cabem não são directamente fundamentáveis num plano ético-jurídico, não estando, portanto, sujeitos aos princípios e corolários do direito criminal”» (acedido na versão disponível em www.tribunalconstitucional.pt). (6) Cf. Acórdão n.º 363/2005 do Tribunal Constitucional, relatado pelo juiz Conselheiro Bravo Serra, acedido na versão disponível em www.tribunalconstitucional.pt. (7) Idem.

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ou melhor, um direito de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias para efeitos do

art.º 17.º da CRP, mas isso não significa que a sua violação tenha como imperativa consequência

a nulidade do acto final” (8).

24. Na verdade, “o direito de audiência e defesa do arguido em processo disciplinar

pretende, essencialmente, garantir que ninguém seja condenado sem que lhe seja assegurado

previamente o direito de se defender com eficácia. E, para isso, tem de ser dada ao arguido a

oportunidade de se pronunciar sobre o conteúdo da acusação, o que supõe, em primeiro lugar,

que a acusação seja levada ao seu conhecimento e, em segundo lugar, que contenha os

elementos referidos nos citados preceitos legais, únicos que o legislador considerou essenciais e,

por isso, indispensáveis para habilitar o arguido na sua defesa”, de tal modo que, “ainda que a

acusação padeça de alguma insuficiência factual, (…), tal não conduz automaticamente à

conclusão de que a respectiva responsabilidade disciplinar seria necessariamente indetectável,

não se verificando nulidade insuprível desde que ela satisfaça o mínimo indispensável à

vinculação temática da autoridade decidente e o arguido dê mostras de haver entendido o

sentido e alcance da acusação e isto porque a acusação, a despeito de, eventualmente, não ser

uma peça modelar, ainda assim, cumpre a sua função primordial de garantia, assegurando o

efectivo direito de defesa do arguido” (9).

25. Socorrendo-nos, a este propósito, do lugar paralelo do processo penal, note-se que

uma acusação que “narra factos bastantes minimamente suscetíveis de justificarem a aplicação

de uma pena” não será nula, como decidiu o Tribunal da Relação de Coimbra, em acórdão de

13.10.2010 (10). Também não será nula “a acusação que balizou, suficientemente, o

comportamento do arguido no tempo e no espaço, e que até indica, de forma clara, a motivação

para o mesmo”, no seguimento de acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora, em

03.06.2014 (11).

26. Em face do enquadramento assim oferecido, é inelutável concluir-se que o libelo

acusatório não padece do citado vício de nulidade – e, bem assim, de qualquer outro que o

contamine. Todos os requisitos consagrados no artigo 283.º, n.º 3, do RDFPF encontram-se

(8) Cf. Acórdão do STA de 22.06.2010, relatado pela Juiz Conselheira Fernanda Xavier, acessível em www.dgsi.pt. (9) Idem. (10) Acórdão do TRC relatado pelo Juiz Desembargador Vieira Marinho, acessível em www.dgsi.pt. (11) Acórdão do TRE relatado pelo Juiz Desembargador João Amaro, acessível em www.dgsi.pt.

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cumpridos e verificados, sejam os requisitos de pendor mais formal, como seja a identificação

do arguido ou a data e assinatura do instrutor, sejam os requisitos de índole mais material, em

particular os “factos constitutivos das infrações disciplinares que lhe são imputadas” e a

“indicação das disposições legais e regulamentares aplicáveis e, sendo disso caso, as

circunstâncias atenuantes e agravantes”.

27. Mesmo relativamente às questões que o arguido enuncia, na sua defesa, como

correspondendo a informação putativamente omitida do texto do libelo acusatório, cumpre

atentar que a acusação alega expressamente a “existência de adeptos que assistiam ao jogo,

alguns, por cima do muro (e encostados ao mesmo, do lado de fora do Estádio), outos em pé em

cima do muro” (artigo 8.º da acusação), reiterando adiante a alegação de que “adeptos do SC

São João Ver que estavam em pé em cima do muro do estádio, ou sobre ele debruçados” (artigo

9.º da acusação). E mais alegava expressamente a acusação que essa circunstância, traduzida na

presença de pessoas não autorizadas no complexo desportivo, conduziu ao sancionamento da

SC São João de Ver, em processo sumário (artigo 10.º da acusação), uma vez que os factos em

causa haviam sido descritos no Relatório de Ocorrências elaborado pelo Delegado da FPF ao

jogo, ao passo que a Ficha de Jogo omitia qualquer referência à presença daquelas pessoas não

autorizadas, antes indicando que teriam estado “zero” adeptos no recinto desportivo (artigos

9.º, 11.º a 13.º da acusação). É esse o quadro factual em apreço nos autos, tal como se encontra

definido e fixado pela acusação deduzida, bem como as imputações de facto dirigidas pela

acusação contra o arguido Sérgio José Santos Guelho, daí que os factos em discussão que

poderiam, no entendimento da acusação, sustentar a imputação ao arguido da prática de uma

infração disciplinar encontram-se descritos e enquadrados, sendo facilmente percetíveis (sem

prejuízo de, naturalmente, adiante, se aferir da suficiência ou insuficiência das alegações

factuais em causa para concluir pelo eventual sancionamento do arguido). A tudo isso ainda se

soma a circunstância de a acusação invocar e analisar, com detalhe, as normas que consagram

deveres que, de acordo com o libelo acusatório, terão sido violados pelo arguido e o

consequente (putativo) enquadramento jurídico-disciplinar que poderão merecer.

28. Para além de que, perante o teor da defesa escrita, é certo que o arguido não teve

dúvidas quanto ao teor da imputação que lhe foi dirigida, assim como quanto aos concretos

factos em que as mesmas se sustentam (e que, nos termos constantes da sua defesa escrita,

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refutam), uma vez que apresentou uma defesa clara e inequívoca face às referidas alegações e

imputações constantes do libelo acusatório deduzido nos autos.

29. Nessa medida, improcede necessariamente o invocado vício de nulidade da

acusação, aduzido pelo arguido na sua defesa escrita.

30. Inexistem outras questões prévias que obstem ao conhecimento da causa ou que

cumpra previamente decidir, sendo os elementos constantes do processo disciplinar bastantes

para conhecer do mérito.

IV – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

§1. A prova no direito disciplinar desportivo

31. Em sede de direito disciplinar desportivo, atenta a particular natureza sancionatória

do respetivo processo, tem plena validade a convocação – em sede de exame crítico da prova –

do princípio geral da livre apreciação da prova, consagrado no artigo 127.º do Código do

Processo Penal (doravante “CPP”), de acordo com o qual, “[s]alvo quando a lei dispuser

diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da

entidade competente”. O RDFPF prevê expressamente este princípio no n.º 2 do art.º 220.º,

onde estatui que, “[s]alvo quando o Regulamento dispuser diferentemente, a prova é apreciada

segundo as regras da experiência e a livre convicção dos órgãos disciplinares”.

32. Todavia, no âmbito disciplinar desportivo, a concreta conformação do mencionado

princípio vê-se condicionada pelo valor especial e reforçado que os relatórios oficiais e

declarações complementares das equipas de arbitragem e dos delegados da FPF merecem em

tal contexto. Com efeito, o RDFPF – numa aproximação à previsão constante do artigo 169.º do

CPP – dispõe, no n.º 3 do artigo 220.º, que os factos presenciados pelas equipas de arbitragem

e pelos delegados da FPF, no exercício de funções, constantes de relatórios de jogo e de

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declarações complementares, se presumem verdadeiros enquanto a sua veracidade não for

‘fundadamente’ posta em causa (12).

33. Destarte, a credibilidade probatória reforçada de que gozam tais relatórios oficiais

só sairá abalada quando, perante a prova produzida, existirem fundadas razões para acreditar

que o seu conteúdo não é verdadeiro. Para além disso, e em segundo lugar, no que tange à

atividade decisória, a força probatória reforçada de que tais relatórios beneficiam impõe ao

julgador, quando entenda impor-se o afastamento da presunção de veracidade, um “especial

dever de fundamentação” (13).

34. Em todo o caso, importa ainda tomar em linha de conta que, à semelhança do

processo penal, são, neste contexto e à luz do que determina o n.º 1 do artigo 220.º do RDFPF,

“admissíveis as provas que não forem proibidas por lei (…) podendo os interessados apresentá-

las diretamente ou requerer que sejam produzidas quando forem de interesse para a justiça da

decisão”.

35. Mister é, contudo, notar que a admissibilidade, em sede disciplinar desportiva, de

todas “as provas que não forem proibidas por lei” nunca se poderá fazer (sob pena de

incompreensível contradição) sem a consequente transposição do regime (probatório material)

legal inerente a cada meio de prova. Tal aferição releva especialmente quando, em sede

disciplinar, se apresentem meios de prova a que a lei atribua especial relevância probatória.

(12) O valor probatório qualificado a que o RDFPF alude constitui um mecanismo regulamentar compreendido e

justificado pelo cometimento de funções particularmente importantes aos árbitros e delegados da FPF, a quem

compete representar a instituição no âmbito dos jogos oficiais, cumprindo e zelando pelo cumprimento dos

regulamentos, nomeadamente em matéria disciplinar (ainda que isso possa não corresponder aos interesses

egoísticos dos clubes). Na verdade, encontramo-nos, nesta sede, no domínio do exercício de poderes de natureza

pública – in casu, disciplinares –, que se sobrepõem aos interesses particulares dos clubes. No quadro competitivo,

enquanto os clubes concretizam interesses próprios, compete a quem tem o poder e o dever de organizar a prova e

fazer cumprir os regulamentos prosseguir um interesse superior ao interesse próprio de cada um dos clubes que a

integram. Neste conspecto, o interesse superior da competição, realizado no âmbito de determinados poderes de

natureza pública (que são exercidos em representação da própria FPF), justifica perfeitamente que os relatórios dos

árbitros e dos delegados e declarações complementares respetivas – vinculados que estão a deveres de isenção e

equidistância –, gozem da aludida presunção de veracidade (presunção “juris tantum”). Trata-se, afinal, da

consequência necessária e justificada do exercício, no quadro do jogo, da autoridade necessária para assegurar a

ordem, a disciplina e o cumprimento dos regulamentos, distanciando-se das disputas que envolvem os participantes

nas provas.

(13) Convocando o pensamento de PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, “[a] limitação do julgador consiste em que ele deve

“fundadamente” pôr em causa a autenticidade ou veracidade do documento”. Cf. Comentário ao Código de Processo

Penal, 2.ª Edição, Lisboa: Universidade Católica Editora, 2008, pág. 452.

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§2. Factos provados

36. Analisada e valorada, à luz das regras da experiência comum e dos princípios que

norteiam a prova no direito disciplinar desportivo, toda a prova produzida em sede de inquérito

e de instrução constante dos autos, isolada e conjugadamente, considera-se provada a seguinte

factualidade relevante para a decisão:

1) O arguido Sérgio José Santos Guelho encontrava-se inscrito na Federação

Portuguesa de Futebol como árbitro da modalidade de Futebol 11, Categoria C3, na

época 2020/2021.

2) O arguido Sérgio José Santos Guelho não apresentava averbada, à data dos factos,

no seu cadastro disciplinar, a prática de qualquer infração disciplinar.

3) No dia 15.11.2020, pelas 11:00 horas, realizou-se, no Estádio do Sporting Clube São

João de Ver, o jogo n.º 260.04.030, disputado entre a SC São João de Ver – Futebol,

SAD, e o Sport Clube Beira Mar, a contar para a 5.ª Jornada do Campeonato de

Portugal, época desportiva 2020/2021.

4) A equipa de arbitragem que dirigiu o jogo oficial em causa foi constituída

pelo árbitro principal, Sérgio José Santos Guelho, pelo árbitro assistente n.º 1, Élio

Filipe Dias Nascimento, e pelo árbitro assistente n.º 2, Pedro Miguel Figueiredo

Nunes.

5) No jogo em causa, a segurança esteve a cargo da Guarda Nacional Republicana, que

não elaborou relatório de policiamento por considerar que não existiram

quaisquer incidentes.

6) O presente jogo contou com a presença de Delegado da FPF e de Observador da

Equipa de Arbitragem.

7) Na Ficha de Jogo referente ao jogo oficial n.º 260.04.030, constava que não houve

presença de adeptos, no Estádio onde ocorreu o evento desportivo em causa.

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8) No Relatório de Ocorrências elaborado pelo Delegado da FPF ao jogo, constava a

presença de adeptos que assistiam ao jogo, colocados por cima de um muro, do

lado de fora do Estádio, outros encontrando-se de pé, em cima do mesmo muro.

9) Na Ficha de Jogo relativa ao jogo oficial em causa, o árbitro principal, arguido Sérgio

José Santos Guelho, não fez constar a presença de adeptos da SC São João de Ver

que se encontravam de pé, em cima do muro do Estádio, ou sobre ele debruçados.

10) No campo referente à informação sobre o número aproximado de espectadores, o

arguido Sérgio José Santos Guelho, enquanto árbitro principal, fez constar o

número zero (“0”).

11) No que se refere à presença de adeptos nos muros, a SC São João de Ver, na

qualidade de clube visitado, foi sancionada pela presença de adeptos no recinto

desportivo, por ocasião da realização do jogo oficial n.º 260.04.030.

§3. Factos não provados

37. Analisada e valorada a prova produzida nos autos, à luz das regras da experiência

comum, julgam-se por não provados os seguintes factos que assumem relevância para a decisão

a ser proferida, no âmbito deste processo disciplinar:

1) O arguido Sérgio José Santos Guelho preencheu de forma incompleta a Ficha de

Jogo que remeteu à Federação Portuguesa de Futebol, uma vez que nela não fez

constar todas as informações relevantes referentes ao jogo dos

autos, designadamente, a presença de adeptos no Estádio.

2) O arguido bem sabia que era sua obrigação elaborar a Ficha de Jogo de

forma correta, completa e pormenorizada.

3) O arguido Sérgio José Santos Guelho, ao ter preenchido a Ficha de Jogo referente

ao jogo dos autos de forma incompleta, não fazendo constar a presença de adeptos

no Estádio, não agiu com todo o cuidado e diligência a que está regulamentarmente

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obrigado – e que pode e é capaz de observar –, no sentido de cumprir aquela

obrigação.

§4. Motivação

38. A convicção formada e que subjaz à decisão ora tomada quanto à matéria de facto

apoia-se, fundamentalmente, na descrição constante do campo “Outros Comentários” do

Relatório de Ocorrências elaborado pelo Delegado da FPF ao jogo (fls. 18), incluindo as 2 (duas)

fotografias juntas ao mesmo (fls. 19 e 20), em particular quando confrontado com a Ficha de

Jogo, a fls. 4 e ss., sem esquecer os demais elementos probatórios (ou a sua falta).

39. Assim, em concreto, a factualidade julgada provada resulta primacialmente dos

seguintes elementos probatórios constantes dos autos:

a) Facto provado 1) – resulta da análise da “Ficha de Dados do Árbitro” referente ao

arguido Sérgio José Santos Guelho, com expressa menção à sua inscrição, na época

desportiva 2020/2021, como árbitro da modalidade de Futebol 11, Categoria C3 (fls.

42 a 44);

b) Facto provado 2) — decorre da análise do cadastro disciplinar do arguido Sérgio

José Santos Guelho, que consta de fls. 25 dos autos;

c) Factos provados 3) e 4) – decorrem essencialmente da Ficha de Jogo e respetivas

fichas técnicas, a fls. 4 e ss. dos autos, bem como do Relatório de Ocorrências

elaborado pelo Delegado da FPF ao jogo, a fls. 16 e ss., e do Relatório de Observação

e Formação elaborado pelo Observador da Equipa de Arbitragem, a fls. 30 e ss. dos

autos;

d) Facto provado 5) – resulta da mensagem de correio eletrónico remetida aos autos,

em 11.12.2021, pelas 15:36 horas, pela Guarda Nacional Republicana, a fls. 36 e 37,

na qual é referido que o “jogo decorreu sem incidentes, motivo pelo qual não foi

elaborado relatório de policiamento de eventos desportivos”;

e) Facto provado 6) – resulta do Relatório de Ocorrências elaborado pelo Delegado da

FPF ao jogo, a fls. 16 e ss., e do Relatório de Observação e Formação elaborado pelo

Observador da Equipa de Arbitragem, a fls. 30 e ss. dos autos;

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f) Facto provado 7) – decorre da análise da Ficha de Jogo, concretamente a fls. 4 dos

autos, na qual, no campo “Nº aprox. de espectadores”, o árbitro principal registou o

número zero (“0”), nada fazendo constar sequer no campo “Observações” da

mesma Ficha de Jogo (fls. 5), a propósito da presença de pessoas não autorizadas

no recinto desportivo;

g) Factos provados 8) a 11) – resultam, em primeiro lugar, da descrição oferecida pelo

Delegado da FPF ao jogo, no seu Relatório de Ocorrências, no campo “Outros

Comentários” (fls. 18), na qual se pode ler o seguinte: “Durante todo o jogo, um

grupo de adeptos do S.C. São João de Ver, identificados com adereços como

camisolas e cachecóis, esteve a assistir ao encontro, colocados no muro e do lado de

fora do Estádio”. Na mesma descrição, é ainda acrescentado que “[o] acesso é feito

pela rua da Azenha, contígua ao estádio, e que dá acesso à bancada principal do

mesmo” (fls. 18). Além da descrição, o Delegado da FPF ao jogo juntou 2 (duas)

fotografias: a fls. 19 e 20, a que se junta a gravação vídeo do jogo dos autos, cujo

suporte digital consta de fls. 50. Quanto ao sancionamento da SC São João de Ver,

em sede de processo sumário, tal decorre do Comunicado Oficial da FPF n.º 198, de

20.11.2020, e excerto do respetivo mapa de processos sumários anexo (fls. 2 e 3).

40. Relativamente ao juízo decisório subjacente aos factos não provados 1), 2) e 3),

diga-se que os mesmos se alicerçam numa impossibilidade que perpassa todos os presentes

autos: não é possível afirmar, em face da prova existente, que o arguido efetivamente viu a

presença (não autorizada) daqueles adeptos (nem esse facto surge sequer expressamente

alegado em sede de libelo acusatório). Ademais, e sem prejuízo da gravação em formato vídeo

do jogo dos autos (que, ainda assim, não é suficiente para dissipar todas as dúvidas), não se

logra compreender, em face dos elementos probatórios dos autos, se os adeptos estiveram

presentes todo o jogo ou se a sua presença foi meramente espontânea e durante um

determinado segmento do decurso do jogo, o que poderia naturalmente influenciar a

apreciação que se viesse a fazer da conduta do arguido quanto à ausência de referência a essa

presença de adeptos não autorizados, na Ficha de Jogo (na medida em que mais facilmente a

presença daqueles adeptos poderia ter passado despercebida ao árbitro principal). Mais: as

circunstâncias em que se encontravam aqueles adeptos não é sequer alegada, expressamente,

em sede de libelo acusatório.

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41. Além do mais, analisadas as fotografias juntas ao Relatório de Ocorrências do

Delegado da FPF ao jogo, a fls. 19 e 20, não resulta sequer claro e isento de dúvidas que, mesmo

que o árbitro tivesse percecionado a presença daqueles adeptos (não autorizados), concluísse

que, para efeitos regulamentares, os mesmos adeptos se encontravam no interior do recinto

desportivo. Tal conclusão dependeria naturalmente da visibilidade e perceção do árbitro

principal, a partir do nível da superfície de jogo, relativamente à qual não foi produzida qualquer

prova.

42. E também os depoimentos prestados pelas testemunhas Élio Filipe Dias Nascimento,

que interveio no jogo dos autos como árbitro assistente n.º 1 (auto de inquirição a fls. 99 e

suporte digital de gravação da inquirição a fls. 93), e Pedro Miguel Figueiredo Nunes, que

interveio no jogo dos autos como árbitro assistente n.º 2 (auto de inquirição a fls. 100 e suporte

digital da gravação da respetiva inquirição a fls. 95), ou mesmo pelas declarações prestadas pelo

arguido, a seu pedido (auto a fls. 101 e respetivo suporte digital de gravação das declarações a

fls. 97), sem prejuízo da livre apreciação das mesmas, reiteraram que a equipa de arbitragem

não se apercebeu da presença daqueles adeptos, caso contrário teria sido uma circunstância

registada em sede de Ficha de Jogo. Naturalmente, a credibilidade dos depoimentos dos dois

árbitros assistentes, uma vez que intervieram no jogo dos autos, integrando a mesma equipa de

arbitragem do arguido, não se afigura inabalável. Ainda assim, os seus depoimentos revelaram-

se consentâneos e permitem confirmar a demais ausência de elementos probatórios nos autos

que permitisse um juízo decisório diferente.

43. Esta é, de resto, a solução imposta pelo princípio in dubio pro reo, ancorado na

consagração constitucional do princípio da presunção de inocência, no artigo 32.º, n.º 2, da Lei

Fundamental, e no enquadramento do ordenamento jurídico-disciplinar desportivo no quadro

de um Estado de Direito democrático. Encontrando-se o órgão decidente perante uma dúvida

inultrapassável sobre a veracidade, ou não, de determinado facto imputado, isto é, uma situação

de dúvida em sede de apreciação da matéria de facto, deve ser adotada decisão em sentido

favorável ao arguido. Nas ilustrativas palavras do Supremo Tribunal de Justiça, “[o] princípio do

in dubio pro reo constitui uma imposição dirigida ao julgador no sentido de se pronunciar de

forma favorável ao arguido, quando não tiver certeza sobre os factos decisivos para a decisão

da causa; como tal, é um princípio que tem a ver com a questão de facto, não tendo aplicação

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no caso de alguma dúvida assaltar o espírito do juiz acerca da matéria de direito” (14). Assim,

sempre se imporia, em face dos princípios ora enunciados e considerando os elementos

probatórios constantes dos autos, decidir em sentido favorável ao arguido, julgando por não

provados os factos acima enunciados.

V – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

§1. Enquadramento jurídico-disciplinar – Fundamentos e âmbito do poder disciplinar

44. O poder disciplinar exercido no âmbito das competições organizadas pela FPF

assume natureza pública. Com clareza, concorrem para esta proposição as normas constantes

dos artigos 19.º, n.os 1 e 2, da Lei n.º 5/2007, de 16 de janeiro (Lei de Bases da Atividade Física e

do Desporto), e dos artigos 10.º e 13.º, alínea i), do RJFD2008.

45. A existência de um poder disciplinar justifica-se pelo dever legal – de acordo com o

artigo 52.º, n.º 1, do RJFD2008 – de sancionar a violação das regras de jogo ou da competição,

bem como as demais regras desportivas, nomeadamente as relativas à ética desportiva,

entendendo-se por estas últimas as que visam sancionar a violência, a dopagem, a corrupção, o

racismo e a xenofobia, bem como quaisquer outras manifestações de perversão do fenómeno

desportivo (artigo 52.º, n.º 2, do RJFD2008).

46. O poder disciplinar exerce-se sobre os clubes, dirigentes, praticantes, treinadores,

técnicos, árbitros, juízes e, em geral, sobre todos os agentes desportivos que desenvolvam a

atividade desportiva compreendida no seu objeto estatutário (artigo 54.º, n. º1, do RJFD2008).

Em conformidade com o artigo 55.º do RJFD2008, o regime da responsabilidade disciplinar é

independente da responsabilidade civil ou penal.

47. O quadro normativo agora sumariado revela estarmos na presença de um poder

disciplinar que se impõe, em nome dos valores mencionados, a todos os que se encontram a ele

sujeitos, no âmbito já delineado, e que, por essa razão, assenta na prossecução de finalidades

(14) Acórdão do STJ, de 12.03.2009, relatado pelo Exmo. Senhor Juiz Conselheiro Soreto de Barros (disponível em www.dgsi.pt).

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que estão bem para além dos pontuais e concretos interesses de que serão titulares agentes e

organizações desportivas.

§2. Das infrações disciplinares em geral

48. O RDFPF encontra-se estruturado, no estabelecimento das infrações disciplinares,

pela qualidade do agente infrator – clubes, dirigentes, jogadores, delegados dos clubes e

treinadores, demais agentes desportivos, espectadores, árbitros, árbitros assistentes,

observadores de árbitros e delegados da FPF. Para cada um destes tipos de agente, o RDFPF

recorta tais infrações e respetivas sanções em obediência ao grau de gravidade dos ilícitos,

qualificando assim as infrações como muito graves, graves e leves.

49. E, nos termos do artigo 15.º do RDFPF, “[c]onstitui infração disciplinar o facto

voluntário, ainda que meramente culposo, que por ação ou omissão previstas ou descritas neste

Regulamento viole os deveres gerais e especiais nele previstos e na demais legislação desportiva

aplicável”.

50. Mais acrescenta o artigo 16.º, n.º 1, que “[s]ão sancionadas as infrações disciplinares

cometidas tanto por ação como por omissão na forma consumada e, quando expressamente

prevista, na forma tentada”.

§3. Da infração disciplinar concretamente imputada

51. O libelo acusatório deduzido nos autos imputa ao arguido Sérgio José Santos Guelho

a prática da infração disciplinar prevista e sancionada pelo artigo 181.º, n.º 1, do RDFPF (“Erros

em relatório de jogo oficial e atraso no seu envio”).

52. O n.º 1 do artigo 181.º do RDFPF dispõe o seguinte: “O agente de arbitragem ou

delegado ao jogo da FPF que elabore o respetivo relatório relativo a jogo oficial em violação das

normas regulamentares, designadamente de forma negligente, defeituosa ou incompleta, é

sancionado com repreensão ou, no caso de já ter sido sancionado nos termos do presente artigo

na mesma época desportiva ou nas duas épocas desportivas imediatamente anteriores, com

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suspensão de 8 dias a 1 mês, se sanção mais grave não lhe for aplicável por força de outra

disposição deste Regulamento”.

53. O preceito incriminador em causa convoca necessariamente, no respetivo exercício

interpretativo, outros diplomas regulamentares que norteiam o exercício das funções de agente

de arbitragem, nas competições organizadas pela FPF.

54. Desde logo, nos termos do artigo 19.º, n.º 1, alínea i), do Regulamento de

Arbitragem (15), “[s]ão deveres do agente de arbitragem: […] i) Cumprir as normas e os

regulamentos em vigor”. E, adiante, o artigo 20.º, n.º 2, do mesmo diploma regulamentar prevê

que “[s]ão deveres específicos do árbitro: a) Cumprir e fazer cumprir as leis de jogo e os

regulamentos aplicáveis”. Mais relevante se afigura in casu o disposto na alínea d) do

mencionado artigo 20.º, n.º 2, do Regulamento de Arbitragem, no qual se prevê como dever

específico do árbitro (principal) “[e]laborar o relatório do jogo mencionando os incidentes

ocorridos antes, durante ou após o jogo, bem como os comportamentos imputados aos

jogadores, treinadores, médicos, massagistas, dirigentes e demais agentes desportivos, bem

como os factos que constituam fundamento para a aplicação de sanções disciplinares”.

55. Além disso, as Normas e Instruções para Árbitros preveem, na respetiva norma 6 do

Capítulo 3 (“Após o jogo”), sob a epígrafe “Relatório de jogo”, elencos não taxativos de “motivos

para preenchimento” de determinados campos do relatório de jogo, incluindo exemplos de

preenchimento, perante determinadas situações-tipo, em tópicos relevantes como

“Organização”, “Instalações” e “Policiamento”. As situações encontram-se descritas em elencos

meramente exemplificativos, atendendo à panóplia de factos e ocorrências que podem suceder

no decurso de um jogo oficial, o que dificulta a previsão exaustiva de todos os possíveis

acontecimentos que mereçam ser descritos e relatados no relatório de jogo elaborado pelo

árbitro, em particular tomando em consideração o seu potencial desvalor e consequente

relevância disciplinar.

56. A este propósito, ainda dispõe o ponto 6.9. (da norma 6) das Normas e Instruções

para Árbitros que “[t]odos os elementos da equipa de arbitragem são solidariamente

(15) Regulamento aprovado pelo Comité de Emergência da Federação Portuguesa de Futebol, na sua reunião de 31 de julho de 2020, de acordo com o disposto no artigo 10.º e nas alíneas a) e c) do número 2 do artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 248-B/2008, de 31 de dezembro, na redação que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei n.º 93/2014, de 23 de junho, no artigo 51.º, número 2, alíneas a) e b) e no artigo 53.º dos Estatutos da Federação Portuguesa de Futebol.

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responsáveis com o árbitro pelas informações exaradas no relatório do jogo, não podendo alegar

desconhecimento do que nele constar”.

57. Por fim, importa notar que também a Lei 5 das Leis de Jogo (16), no seu ponto 3,

dispõe que “[o] árbitro deve: […] tomar nota dos incidentes do jogo e remeter às autoridades

competentes um relatório de jogo, onde constem as informações relativas a todas as medidas

disciplinares que tomou, assim como qualquer incidente ocorrido antes, durante ou depois do

jogo”.

§4. O caso concreto: subsunção ao direito aplicável

58. A subsunção ao direito aplicável pressupõe que se efetue uma análise interpretativa

das normas sancionatórias, para assim concluir se se encontram, ou não, preenchidos todos os

elementos típicos, objetivos e subjetivos, que compõem a infração em apreço.

59. Desde logo, cumpre frisar que o arguido Sérgio José Santos Guelho, enquanto agente

de arbitragem inscrito, na FPF, assume a qualidade de “agente desportivo”, pelo que sobre si

recai a necessidade de cumprir as regras e os deveres previstos, entre o mais, no RDFPF e demais

regulamentos, normas e instruções da FPF, e que, por conseguinte, se encontra sujeito ao

exercício do poder disciplinar por parte da própria FPF, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo

3.º e na alínea b) (“elementos da equipa de arbitragem”) do artigo 4.º, todos do RDFPF, na

medida em que pratique factos suscetíveis de se enquadrarem nas infrações disciplinares

naquele previstas.

60. Nos termos do número 1 do artigo 15.º do RDFPF, já acima citado, “[c]onstitui

infração disciplinar o facto voluntário, ainda que meramente culposo, que por ação ou omissão

previstas ou descritas neste Regulamento viole os deveres gerais e especiais nele previstos e na

demais legislação desportiva aplicável”.

(16) Aprovados pelo The International Football Association Board da FIFA, aqui citadas na tradução para língua portuguesa elaborada pelo Conselho de Arbitragem da FPF.

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61. O conceito de infração disciplinar integra os seguintes elementos constitutivos: (i)

um facto voluntário (ativo ou omissivo); (ii) típico; (iii) ilícito e (iv) culposo.

62. Apenas se poderá concluir pelo preenchimento de uma infração disciplinar se todos

os elementos constitutivos da infração acima enunciados se verificarem em concreto,

cumulativamente – pois a falta de qualquer um deles comporta, como consequência necessária,

a inexistência de qualquer infração disciplinar.

63. Ora, como já foi mencionado supra, é imputada ao arguido Sérgio José Santos

Guelho a prática da infração disciplinar leve prevista e sancionada pelo artigo 181.º, n.º 1, do

RDFPF (“Erros em relatório de jogo oficial e atraso no seu envio”). Analisemos, pois, a infração

em causa, tomando como referente necessário a factualidade acima julgada provada e que foi

imputada, no texto do libelo acusatório, ao arguido Sérgio José Santos Guelho.

64. Para que se conclua pelo preenchimento do ilícito disciplinar em causa, é necessário

que, voluntariamente e ainda que de forma meramente culposa, (i) um agente de arbitragem

(ou delegado ao jogo da FPF) (ii) elabore o respetivo relatório relativo a jogo oficial (iii) em

violação das normas regulamentares, designadamente de forma negligente, defeituosa ou

incompleta, (iv) conquanto sanção mais grave não seja aplicável por força de outra disposição

do RDFPF.

65. Ora, antecipando o juízo decisório a proferir a final, atenta a factualidade julgada

provada supra, bem como (e sobretudo) a factualidade julgada não provada, conclui-se que os

elementos objetivos da infração disciplinar prevista e sancionada pelo artigo 181.º, n.º 1, do

RDFPF não se encontram verificados in casu.

66. Aliás, recuperando a factualidade acima julgada provada, apenas resultou provado,

em face da prova existente nos autos e do que era alegado em sede de libelo acusatório, que o

Relatório de Ocorrências elaborado pelo Delegado da FPF ao jogo referia que estiveram

presentes, no recinto desportivo, por ocasião do jogo oficial dos autos, público não autorizado,

e que o árbitro principal, aqui arguido, não fez constar na Ficha de Jogo qualquer referência a

essa circunstância (que havia sido descrita e mencionada no Relatório de Ocorrências elaborado

pelo Delegado da FPF ao jogo).

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67. Ora, para que se pudesse concluir que o árbitro principal, ora arguido Sérgio José

Santos Guelho, omitiu os deveres que sobre si impendiam no sentido de refletir e descrever na

Ficha de Jogo situações suscetíveis de relevância disciplinar, nos termos regulamentares acima

enunciados, seria necessário alegar e provar que o árbitro viu efetivamente que estavam

presentes, no recinto desportivo, adeptos não autorizados, em face das normas então vigentes

em matéria de interdição de acesso e permanência no recinto desportivo de adeptos, nos

termos do Regulamento Covid-19. E isso não só não foi devidamente alegado e imputado em

sede de acusação deduzida nos autos, como nem sequer decorre dos elementos probatórios

constantes dos autos.

68. As insuficiências probatórias que foram explanadas em sede de motivação da

decisão proferida a propósito da matéria de facto, maxime no que se refere à factualidade

julgada não provada, evidenciam que não é possível concluir que o árbitro principal tomou

efetivamente conhecimento dos factos e da sua ocorrência. E só provando que o árbitro havido

percecionado a presença de adeptos não autorizados, no recinto desportivo, e posteriormente

não vindo a mencionar esse facto na Ficha de Jogo, é que se poderia equacionar o

sancionamento disciplinar do arguido Sérgio José Santos Guelho.

69. Essa sempre seria, além do mais, a solução imposta pelo princípio da culpa, que

impera em sede de ordenamento jurídico-disciplinar desportivo (sob pena de se resvalar para

uma modalidade de sancionamento desprovido de culpa, o que seria manifestamente

inadmissível). Sem se imputar ao arguido e lograr provar que este viu efetivamente que adeptos

não autorizados tinham acedido e permanecido no recinto desportivo, não é possível imputar-

se ao mesmo a omissão do cumprimento de um dever que não se logra demonstrar que o

mesmo se encontrava em condições de saber que deveria cumprir. Só mediante aquela prova,

que não se alcançou nos presentes autos, é que se poderia concluir que o arguido tomou

conhecimento das circunstâncias de facto relevantes que poderiam justificar a necessidade de

sancionamento do seu comportamento omissivo, por não refletir essas mesmas circunstâncias

em sede de relatório oficial.

70. Pelo que não é possível concluir pelo preenchimento do ilícito disciplinar imputado

ao arguido, solução que, aliás, já resultava da decisão relativa à matéria de facto e da aplicação

in casu do princípio in dubio pro reo, nos termos devidamente desenvolvidos supra.

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71. Assim, em face do exposto, conclui-se pela ausência de preenchimento dos

elementos objetivos e subjetivos do ilícito disciplinar em causa, pelo que o arguido Sérgio José

Santos Guelho deve ser absolvido da prática da infração disciplinar – prevista e sancionada no

artigo 181.º, n.º 1, RDFPF – por que vinha acusado.

VI – DECISÃO

Nestes termos e com os fundamentos expostos, o Conselho de Disciplina – Secção Não

Profissional – da Federação Portuguesa de Futebol decide, nos presentes autos, julgar

totalmente improcedente a acusação e, em consequência, absolver o arguido Sérgio José

Santos Guelho pela prática da infração disciplinar prevista e sancionada pelo artigo 181.º, n.º 1,

do RDFPF.

Sem custas para o arguido.

Registe, notifique e publicite.

Cidade do Futebol, 10 de setembro de 2021

O Conselho de Disciplina, Secção Não Profissional

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RECURSO DESTA DECISÃO

As decisões do Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol são passíveis de recurso, nos termos da

lei e dos regulamentos, para o Conselho de Justiça ou para o Tribunal Arbitral do Desporto.

De acordo com o artigo 44.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 248-B/2008, de 31 de dezembro, na redação conferida pelo

artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 93/2014 de 23 de junho, cabe recurso para o Conselho de Justiça das decisões

disciplinares relativas a questões emergentes da aplicação das normas técnicas e disciplinares diretamente

respeitantes à prática da própria competição desportiva.

O recurso deve ser interposto no prazo de 5 dias úteis (artigo 35.º do Regimento do Conselho de Justiça aprovado

pela Direção da Federação Portuguesa de Futebol, em 18 de dezembro de 2014 e de 29 de abril de 2015 e publicitado

pelo Comunicado Oficial n.º 383, de 27 de maio de 2015).

Em conformidade com o artigo 4.º, n.ºs 1 e 3, da Lei do Tribunal Arbitral do Desporto (aprovada pelo artigo 2.º da Lei

n.º 74/2013 de 6 de setembro, que cria o Tribunal Arbitral do Desporto e aprova a respetiva lei, na redação conferida

pelo artigo 3.º da Lei n.º 33/2014 de 16 de junho - Primeira alteração à Lei n.º 74/2013, de 6 de setembro, que cria o

Tribunal Arbitral do Desporto e aprova a respetiva lei), compete a esse tribunal conhecer, em via de recurso, das

deliberações do Conselho de Disciplina.

Exclui-se dessa competência, nos termos do n.º 6 do citado artigo, a resolução de questões emergentes da aplicação

das normas técnicas e disciplinares diretamente respeitantes à prática da própria competição desportiva.

O recurso para o Tribunal Arbitral do Desporto deve ser interposto no prazo de 10 dias, contados da notificação desta

decisão (artigo 54.º, n.º 2, da Lei do Tribunal Arbitral do Desporto).