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Celso Ferrarezi Junior Renato Bossa (orgs.) Semântica, semânticas uma introdução Prefácio de Rodolfo Ilari .c@] editoracontexto

Semântica cognitiva

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semântica cognitiva

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Page 1: Semântica cognitiva

Celso Ferrarezi JuniorRenato Bossa

(orgs.)

Semântica, semânticasuma introdução

Prefácio de Rodolfo Ilari

.c@]editoracontexto

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Copyright © 2013 dos Organizadores

Todos os direitos desta edição reservados àEditora Contexto (Editora Pinsky Ltda.)

Foto de capaJaime Pinsky

Montagem de capa e diagramaçáoGustavo S. Vilas Boas

Preparação de textosDaniela Marini Iwamoto

RevisãoAna Paula Luccisano

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, sr, Brasil)

Semântica, semânticas: uma introdução / organizadores Celso FerrareziJunior e Renato Basso. - São Paulo: Contexto, 2013.

Vários autores.Bibliografia.ISBN 978-85-7244-801-7

I. Linguística 2. Semântica I. Ferrarezi junior, Celso. lI. Basso,Renato.

13-05037 CDD-401.43fndices para catálogo sistemático:

I. Estudos semânticos: Linguística 401.432. Semântica: Estudos 401.43

EDITORA CONTEXTO

Diretor editorial: Jaime Pinsky

Rua Dr. José Elias, 520 - Alto da Lapa05083-030 - São Paulo - sp

PABX: (lI) 3832 5838contextots'editoracontexro.com.br

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Semântica Cognitiva

Paula Lenz

o que é a Semântica Cognitiva?

Nossa experiência com a língua que falamos é tão intensa e íntima quetudo nos parece normal. Geralmente, não nos damos conta de uma série defenômenos que ocorrem no nosso processo de comunicação cotidiano. Porexemplo, não atentamos que fazemos escolhas de palavras, de estruturas defrase e de entonações quando verbalizamos nossas ideias, nem que reconhe-cemos todos esses elementos quando entendemos nossos interlocutores; nãonotamos que sistematicamente estruturamos conceitos em termos de outros;nem percebemos que crenças subjazem à maioria dos nossos conceitos.

Da mesma forma que, geralmente, não paramos para observar a formacomo falamos e para pensar por que falamos como falamos, tomamos comoverdadeiros certos conceitos e pressupostos que nos são passados tradicional-mente sem questioná-los. É com o questionamento de alguns desses conceitose pressupostos que iniciamos a apresentação do que é a Semântica Cognitiva.

As visões tradicionais mantêm que a linguagem (assim como o pensa-mento) é inerentemente literal: conseguimos nos comunicar e entender unsaos outros porque usamos no nosso dia a dia uma linguagem literal. Emconsequência dessa tradição, enraizada nos nossos conceitos, aceitamoscomo verdades incontestáveis, por exemplo, que a linguagem usada parafalar de coisas comuns e corriqueiras é essencialmente literal; a linguagemtécnica ou científica é e deve ser literal; a linguagem figurada só é encon-trada em textos literários; a habilidade de falar metaforicamente requerhabilidades cognitivas e linguísticas especiais, diferentes das empregadas

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na vida cotidiana; as asserções figurativas ou poéticas são distintas doconhecimento verdadeiro, por isso devem ser evitadas em certos tipos delinguagem. Naturalmente, essas "verdades incontestáveis" não vieram donada. A ideia de que a metáfora deve ser evitada, por exemplo, advém dacrença de que a linguagem é independente da cognição e de que a linguagemfigurativa é apenas um embelezamento da linguagem literal, com poucovalor cognitivo. Tais crenças têm repercussões na forma como a linguagemé entendida. A Semântica, por exemplo, é vista na Linguística, na Lógicae na Filosofia como o estudo do sentido literal. Dessa forma, o sentidometafórico está, digamos assim, relegado à Pragmática.

Entretanto, muitos estudos têm mostrado que grande parte da linguagemé estruturada metaforicamente. O uso da metáfora na linguagem cotidiana,ou mesmo em uma linguagem especializada, é tão comum e rotineiro que,segundo alguns pesquisadores (Pollio et al., 1977), chegamos a proferir,em média, quatro figuras de linguagem a cada minuto de conversa numdiscurso livre. De modo geral, não identificamos isto porque fomos ensi-nados a pensar em metáfora como algo em destaque, relacionado à poesiae à retórica, ou como um recurso para suprir lacunas de vocabulário, nãocomo parte da nossa linguagem convencional.

Em 1980, Lakoff e Johnson publicam o livro Metaphors WeLive by, noqual argumentam que a metáfora não é apenas um modo de fazer poesia ouum recurso da retórica, mas faz parte da forma como pensamos e raciocina-mos. As evidências, segundo os autores, estão na estrutura linguística queusamos para falar sobre uma infinidade de conceitos com os quais lidamosno nosso dia a dia. Por exemplo, falamos de TEMPO em termos de DINHEIRO

(Economize seu tempo; Tenho muito tempo, posso gastá-lo como e comquem quiser; Poupe meu tempo; Preciso recuperar o tempo perdido; Nãovale apena investir tanto tempo para aprender programação; Não sobroutempo pra fazer o bolo; Vou separar parte do meu tempo), de AMOR emtermos de VIAGEM (Veja só aonde chegamos; Não dá mais pra continuar, émelhor você seguir o seu caminho e eu o meu; Temospercorrido uma longaestrada juntos), de IDEIAS em termos de PLANTAS (Finalmente suas ideiasfrutificaram; Aquela ideia morreu na videira; Está brotando uma novateoria; Ele tem uma mente fértil). I E isto independe do tema e gênero dis-cursivo. Ou seja, o que Lakoff e Johnson defendem, como tese geral, é queas metáforas são sistêmicas e não meras elocuções elaboradas no momento

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da fala, e isso explica por que usamos e compreendemos essas expressõeslinguísticas. Nesse sentido, os autores aplicam o termo "metáfora" para oconceito, o nível mental (ou seja, a metáfora conceitual), que representamem letras maiúsculas, enquanto sua realização linguística é tratada como"expressão metafórica" - Lakoff e Johnson denominam esse fenômeno de"metáfora conceitual". Nos exemplos anteriores, estão presentes as metá-foras conceituais TEMPOÉ DINHEIRO,OAMORÉ UMAVIAGEM,IDElASSÃoPLANTAS.Diante da presença de tantas metáforas na língua, questiona-se a ideia deque a linguagem convencional seja literal.

Pensar que a base da linguagem não é literal, no entanto, levanta umasequência de outros questionamentos, que quebram paradigmas estabelecidose visões filosóficas arraigadas na nossa forma de ver e compreender o mundo.Um desses pressupostos diz respeito à noção de verdade, um aspecto funda-mental para que possamos funcionar no mundo. Se cremos ou não cremosno que está sendo dito tem implicação direta na forma como agimos. Navisão da Lógica tradicional, assumida pelas vertentes clássicas dos estudosda Semântica, as condições de verdade daquilo que é dito são estabeleci daspor referência a algo que existe no mundo externo. Essa noção de verdade, noentanto, não dá conta nem mesmo dos fenômenos linguísticos com expressõesnão metafóricas. Consideremos que alguém receba a seguinte comunicaçãode sua costureira: "o vestido ficará pronto na terça-feira". Para que a pessoaque recebeu o recado vá buscar o vestido na terça-feira, pressupõe-se queela entenda, entre outros, o conceito TERÇA-FEIRA,que não tem referente nomundo externo objetivo. Como nos mostra Lakoff(1987: 68-9), embora nossasegmentação do tempo se baseie em um evento da natureza (o ciclo naturaldefinido pelo movimento do sol), o padrão que caracterizamos como fim deum dia e início de outro é idealizado, assim como os ciclos maiores de umcalendário de 7,30 ou 31 dias. Nossa semana contém 7 partes, organizadasem uma sequência linear, sendo cada parte um dia; "terça-feira" é o terceirodia. Note-se, portanto, que "semana" não existe no mundo, mas trata-se deuma convenção idealizada, um modelo cognitivo idealizado (Mel),nos ter-mos de Lakoff(1987). Como nem toda cultura adota este nosso modelo desemana, fica evidente que os aspectos culturais são importantes na construçãodos significados.

Além disso, como argumentam Lakoff e Johnson (2002: 268), em muitassituações, a condição de verdade de uma frase está associada às intenções e

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percepções humanas. Para uma dona de casa brasileira, por exemplo, a frase"o tomate é um legume" é verdadeira e plenamente coerente com o local ondeela encontra tomates no supermercado ou na feira, junto a batatas, cebolas,cenouras e pimentões, e não a outras frutas como bananas, abacaxis, laran-jas. Para um taxonomista, porém, a frase é falsa. Como descrevem Croft eCruse (2004), Fillmore demonstra que uma série de fenômenos linguísticos,como os apresentados anteriormente, não consegue ser explicada nem pelaSemântica Estrutural, nem pela Semântica de Traços nem pela Semântica deCondição de Verdade. A proposta de Fillmore, adotada por Lakoff e outrossemanticistas cognitivos, é de uma semântica da compreensão ou Semânticade Frames, que contemple toda a riqueza do entendimento que o falantedeseja transmitir e do entendimento que o ouvinte constrói a partir fala deseu interlocutor. Note-se que, nesse contexto, questiona-se a separação en-tre Semântica e Pragmática, que considera a língua e seu uso como coisasdissociáveis, conforme argumenta Kempson (1997: 561) na abertura de seucapítulo em The Handbook of Contemporary Semantic Theory:

A Semântica como o estudo do significado em línguas naturais e a Prag-mática como o estudo de como a fala é interpretada poderiam ser um e omesmo estudo. Dado que o significado de uma expressão é a informaçãoque tal expressão traz e que a interpretação pelos usuários da língua é a re-cuperação da informação das expressões, é difícil visualizar essa separação.

Não há como alcançar uma análise semântica dessa natureza apenascom o conhecimento linguístico conforme o entendem as teorias clássicas,pois cada palavra é compreendida em termos de umframe (ou MCI), ondese incluem conhecimento de mundo, experiências, percepções, culturas,comportamentos sociais, convenções etc. Assim, "um conceito como VE-

GETARIANO só faz sentido no frame de uma cultura na qual comer carne écomum" (Croft e Cruse, 2004: 11); uma expressão como "tive um semestremuito pesado" faz parte do nosso vocabulário porque constantemente des-locamos objetos e, ao fazer isto, percebemos que a facilidade ou dificul-dade de deslocá-los está associada a seus pesos (metáfora DIFICULDADES sxoPESOS); uma resposta à pergunta de Pedro (George é um bom cozinheiro?)como a de Maria (Ele é francês) só pode ser compreendida por pessoasque compartilhem o mesmo conhecimento de que, estereotipicamente, osfranceses são excelentes cozinheiros.

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A insatisfação de semanticistas sobre tópicos como estes levou à cria-ção da Linguística Cognitiva, uma área que não se configura exatamentecomo uma teoria única, mas como uma conjunção de várias abordagens quecompartilham os mesmos princípios básicos, com o objetivo geral de inves-tigar o sistema integrado global de estruturação conceitual da linguagem.Dada a sua preocupação com a estrutura da mente, a Linguística Cognitivaconsidera-se parte das ciências cognitivas. Isto é importante para entendera necessidade de métodos de investigação na área que sejam aceitos peloscientistas cognitivos em geral (Gibbs, 2007), como veremos adiante.

A Semântica Cognitiva, que pode ser compreendida como uma das subáreasda Linguística Cognitiva, também se configura como um grupo de pesquisa-dores com focos e interesses diversos, que comungam da mesma preocupaçãocentral, a saber, a de estabelecer de que maneira a estrutura linguística estárepresentada na estrutura conceitual (Talmy, 2011). Pode ser definida comouma área da Linguística Cognitiva que estuda os sistemas conceituais, signi-ficados e inferência humanos (Lakoff e Johnson, 1999: 496), cujos princípiosbásicos podem ser assim sintetizados (Evans et al., 2007): a estrutura conceitualé corpórea, a estrutura semântica é a estrutura conceitual, a representação dosignificado (sentido) é enciclopédica e a construção do significado (sentido)é a conceitualização.

O movimento, que se transformou na área denominada LinguísticaCognitiva no final dos anos 1980, iniciou ainda na década de 1970, quan-do estudiosos interessados nessa relação entre linguagem e pensamento,essencialmente semanticistas gerativistas, começaram a discordar dastendências vigentes na época, dominadas principalmente pela LinguísticaGerativa, de explicar os padrões linguísticos por meio de apelos às proprie-dades estruturais internas e específicas da língua (Kemmer, 2012). Comomenciona Kemmer (2012):

Ao invés de tentar separar a sintaxe do resto da linguagem em um "com-ponente sintático" regulado por um conjunto de princípios e elementosespecíficos a esse componente, a linha de pesquisa que se seguiu foi deexaminar a relação da estrutura da língua com coisas externas à linguagem:princípios e mecanismos cognitivos não específicos à língua, incluindo osprincípios de categorização humana; princípios pragmáticos e interacio-nais; e princípios funcionais em geral, tais como iconicidade e economia.

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A nova área surgiu, portanto, em franca oposição às ideias chomskyanasde que o significado é periférico ao estudo da língua porque as estruturaslinguísticas são governadas por princípios essencialmente independentesdo significado. Como vimos anteriormente, na visão da Linguística Cog-nitiva, as estruturas linguísticas têm a função de expressar significados,portanto, os mapeamentos entre forma e significado são o principal objetoda análise linguística. Em outras palavras, o significado, e não a sintaxe, éo elemento central dos estudos linguísticos, sendo este um dos pressupostosmais importantes da área, compartilhado pelas várias abordagens.

Entre os iniciadores do movimento da Linguística Cognitiva destacam-se Wallace Chafe, Charles Fillmore, George Lakoff, Ronald Langacker,Leonard Talmy e Gilles Fauconnier. A publicação de Metaphors WeLiveby, de Lakoff e Johnson, em 1980, pode ser vista como um dos marcosda nova orientação, que ganhou corpo ao longo da década com os tra-balhos de Lakoff (1987), Langacker (1987) e outros, culminando com aI Conferência em Linguística Cognitiva, em 1989, organizada por RenéDirven, na Alemanha, que estabeleceu definitivamente a área. Naquelaconferência, foi criada aAssociação Internacional de Linguística Cogniti-va (Icla), com reuniões bienais, e o periódico Cognitive Linguistics, cujoprimeiro número foi lançado já em 1990. Além disso, foi aprovada a pro-posta de uma série de livros sobre o tema Cognitive Linguistics Research,cujos primeiros volumes - Concept, Image and Symbol e Foundationsof Cognitive Grammar -, ambos de autoria de Ronald Langacker, forampublicados em 1990 e 1991, respectivamente.

o que a Semântica Cognitiva estuda?

Os autores, de modo geral, tendem a classificar os trabalhos da LinguísticaCognitiva em duas grandes linhas de estudo, conhecidas como SemânticaCognitiva e Gramática Cognitiva. Entretanto, como a semântica é centralpara os estudos da Linguística Cognitiva, essa divisão nem sempre é fácilde ser mantida.? Além disso, como acentua Feltes (2007), essa centralidadeda semântica leva a própria Linguística Cognitiva a ser confundida com osestudos de Semântica Cognitiva, em uma relação, em geral, de superposição.

Entretanto uma distinção entre a Semântica Cognitiva e a GramáticaCognitiva, discutida por Evans et al. (2007), é que a Semântica Cognitiva

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está preocupada com a natureza da mente, ou seja, com a forma corno osconceitos estão estruturados na mente e corno construímos o significado(conceitualização). Portanto, os estudos em Semântica Cognitiva voltam-setanto para a investigação da semântica linguística quanto para a modelagemda mente humana. A Gramática Cognitiva, por outro lado, preocupa-se emmodelar o sistema da linguagem (a "gramática" mental), e o faz a partir dosresultados obtidos pela Semântica Cognitiva. Embora interessante, essa dis-tinção, no entanto, não nos parece relevante em si mesma, a não ser cornomarcador de abordagens na área, que diferem no foco e no método (apesarde terem os mesmos princípios básicos), mas que essencialmente considerama semântica corno pano de fundo para os demais fenômenos linguísticos,tais corno a sintaxe e a fonologia. Além disso, corno afirmam Evans et al.(2007: 6), "a maioria dos estudos em Linguística Cognitiva acha necessárioinvestigar a semântica lexical e as organizações gramaticais conjuntamente".

No cenário global da Semântica Cognitiva, muitos estudos voltam-separa a investigação dos princípios fundamentais compartilhados pela áreacorno um todo, apresentando ainda argumentos para suas hipóteses básicase explorando questões empíricas mais específicas de sintaxe e semântica.Pode-se concordar em parte com Croft e Cruse (2004) quando argumen-tam que isto se deve ao fato de os paradigmas a que se opõem, corno aGramática Gerativa e a Semântica de Condições de Verdade, serem aindahoje vigorosos. Os autores discutem três grandes hipóteses que subjazema todas as abordagens da Línguístíca Cognítíva:

A linguagem não é uma faculdade cognitiva autônoma. [...] opõe-se àhipótese bem conhecida da Gramática Gerativa de que a linguagem éuma faculdade ou módulo cognitivo autônomo separado das habilidadesnão linguísticas [...]A Gramática é conceitualização. [...] opõe-se à Semântica de Condiçõesde Verdade, na qual uma metalinguagem semântica é avaliada em termosde verdade e falsidade com relação ao mundo (ou mais precisamente aum modelo de mundo) [...]O conhecimento da língua emerge do uso da língua. [...] opõe-se às tendên-cias reducionistas, tanto da Linguística Gerativa quanto da Semântica deCondições de Verdade, nas quais se buscam o máximo de representaçõesabstratas e gerais da forma gramatical e do significado e consideram-seperiféricos muitos fenômenos gramaticais e semânticos (Croft e Crus e,2004: 1).

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Esses princípios levam a discutir a linguagem de forma multidisciplinar,pois obrigam a considerar ao mesmo tempo aspectos linguísticos (desde oléxico e conceito até a construção destes em formas expressivas que nosfazem sentido, incluindo estruturas maiores como o discurso), psicológicos eneurológicos (desde nossas percepções sensório-motoras, memória, atençãoe categorização até as estruturas mentais ou redes neurais), socioculturais,antropológicos, para citar alguns dos mais evidentes, pois a cognição hu-mana está intrinsecamente ligada à experiência corpórea, social, cultural ehistórica do homem (Lakoff, 1987).

Retomemos os princípios básicos apresentados por Croft e Crus e (2004)para entender melhor os estudos na área. Tomemos o primeiro item: "alinguagem não é uma faculdade cognitiva autônoma". Conforme Lakoff eJohnson (1999), a Linguística Cognitiva (e, portanto, a Semântica Cognitivae a Gramática Cognitiva também) busca usar as descobertas das ciênciascognitivas para explicar a linguagem da forma mais abrangente possível,sem incorporar os pressupostos de nenhuma teoria filosófica estabelecida.Três dos grandes achados das ciências cognitivas com grandes repercussõespara os estudos linguísticos e filosóficos, segundo os autores, são: a menteé inerentemente corpórea, o pensamento é de modo geral inconsciente e osconceitos abstratos são em grande parte metafóricos.

Dizer que a mente é corpórea significa quebrar com a visão cartesianade uma mente transcendental, separada do corpo físico. Em seu livro O errode Descartes, o neurologista António Damásio (1996) mostra que razão eemoção não são formas distintas de racionar e agir, mas são complementarese essenciais para a tomada de decisões, por exemplo. Estudos computa-cionais conexionistas realizados pelo grupo da teoria neural da linguagem(NTL) , coordenados por Lakoff e Feldman em Berkeley, mostram que ascapacidades neuronais que usamos para o controle motor podem tambémser usadas para efetuar raciocínios abstratos.

Compreender que a mente é corpórea implica compreender que nossosconceitos não são exatamente reflexos de uma realidade externa, "mas fun-damentalmente moldados pelos nossos corpos e cérebros, especialmente pelonosso sistema sensório-motor" (Lakoff e Johnson, 1999: 22-3). Por exemplo,o que de verdade existe quando dizemos que o céu é azul? Atribuir ao céu apropriedade inerente de ter cor azul contraria os conhecimentos da Física. A corque vemos é resultante do comprimento de onda da luz refletida pela superfície

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de um objeto, nas condições de iluminação em que se encontra o tal objeto,da percepção desse comprimento de onda nessas condições de iluminação portrês tipos de cones de cor que temos em nossas retinas e do complexo circuitoneural em nossos cérebros conectado a esses cones. No caso do céu, a cor azulpercebida pelo olho humano é uma consequência do espalhamento da luz solarna atmosfera terrestre devido às partículas existentes no ar.

A maioria de nossos conceitos espaciais deriva da forma como é o nossocorpo e como ele funciona no mundo. Compreendemos o corpo como umrecipiente, que tem dentro-fora, frente-atrás-lado, centro-periferia etc.,conceitos gerados por termos um corpo longilíneo, com olhos na extremi-dade superior de um dos lados (frente) e pés na extremidade inferior com amesma direção e sentido dos olhos, ficarmos de pé da forma que ficamos enos movimentarmos como nos movimentamos (para frente, para trás, paracima, para baixo etc.). Como sustentam Lakoff e Johnson (2002: 128),se tivéssemos outra estrutura, redonda, por exemplo, e habitássemos umplaneta com força gravitacional bem menor que a Terra, certamente nossosconceitos seriam diferentes. Entretanto, a forma como interpretamos a nossarelação e experiência com o mundo pode ser culturalmente determinada.Por exemplo, a percepção de uma casa situada entre a posição em que nosencontramos e uma montanha depende da forma como projetamos essesconceitos de frente e atrás e do referente que estabelecemos. Em nossacultura, somos o ponto de referência e tudo o mais está de frente para nós,assim, na nossa percepção, a casa está "na frente da montanha" e a monta-nha está "atrás da casa", mas na cultura dos háussas' a casa está "atrás damontanha" e a montanha está "na frente da casa".

Os estudos para compreensão da mente corpórea, portanto, incluemdescrições e explicações em pelo menos três níveis de corporificação dosconceitos (Lakoff e Johnson, 1999): 1) no nível neural, que corresponde àsestruturas que caracterizam conceitos e operações cognitivas; 2) no nívelda experiência consciente fenomenológica, que inclui tudo aquilo de quenos damos conta, especialmente nossos próprios estados mentais, corpo,ambiente físico e interações físicas e sociais; 3) no nível do inconscientecognitivo, que consiste em todas as operações mentais que estruturam etomam possível qualquer experiência consciente, inclusive a compreensãoe uso da linguagem. Esses níveis não são construtos independentes, masestão imbricados um no outro.

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o segundo princípio, "a gramática é conceitualização", é o fenômenosemântico fundamental da Linguística Cognitiva. Tal princípio contesta anoção de que a Semântica é puramente condicionada à verdade (Croft eCruse, 2004). Como vimos na primeira parte deste capítulo, toda unidadelinguística evoca umframe semântico, que é em última instância a formacomo conceitualizamos: "terça-feira" evoca umframe de semana; "vegeta-riano" evoca umframe de tipos de alimento; "tomate" evoca umframe decategorias populares e científicas de frutas e verduras; "pesado" evoca umframe de experiências com o peso de objetos; "francês" evoca umframe deexpertise culinária. Esses frames ou Mel podem corresponder à compreensãodo mundo de uma pessoa ou grupo de pessoas de forma perfeita, muito boa,boa, mais ou menos, não muito, em quase nada, ou em nada.

O terceiro princípio é que as categorias e estruturas semânticas, sintáticase morfológicas não são preestabelecidas, mas construídas a cada elocuçãoespecífica de acordo com a ocasião. Nossos raciocínios, nossa compreensão.do mundo e das experiências no mundo, bem como a maneira como vive-mos e agimos no mundo, estão inerentemente relacionadas à forma comocategorizamos. Categorizar é uma condição básica para a sobrevivênciade qualquer animal (Lakoff, 1987). Perceber perigos, saber o que se podecomer, escolher uma roupa para vestir passam pela forma como categori-zamos perigo, alimento e adequação de vestuário a certos eventos. Este éum processo natural, na maioria das vezes automático e inconsciente, queinclui nossas capacidades cognitivas de identificar, classificar e nomearcoisas, eventos e entidades como sendo ou não membros de uma mesmacategoria. Embora tenhamos algumas categorias relativamente estáveis,herdadas socioculturalmente (ex.: a categoria de tipo de alimento para cadarefeição), a categorização é um processo dinâmico, no sentido em que acada novo momento podemos formar novas categorias ou reformular ascategorias existentes (ex.: a categoria de coisas a serem retiradas de casano caso de uma ameaça de desabamento).

A visão de categorização assumida pela Semântica Cognitiva baseia-se nos resultados de Eleanor Rosch sobre prototipicidade, que mostramexistirem membros das categorias mais prototípicos que outros (ex.: noBrasil, um pardal é uma ave mais prototípica que o pinguim), e nos estudosde Wittgenstein sobre a parecência de família, ou seja, que os membrosde uma categoria não precisam compartilhar das mesmas características

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"necessárias e suficientes", como tem sido assumido pela ciência desdeAristóte1es, mas estes se relacionam pela aparência de forma análoga aosmembros de uma família, que podem se assemelhar uns aos outros por teremos mesmos traços faciais, a mesma cor de olhos, o mesmo temperamentoou outras características (Lakoff, 1987: 16).

Como estudar algum desses fenômenosusando a Semântica Cognitiva?

Os estudos em Linguística Cognitiva em geral, e particularmente emSemântica Cognitiva, usam basicamente as mesmas metodologias que tradi-cionalmente fazem parte dos estudos 1inguísticos.A introspecção é a principalmetodologia usada, que geralmente se faz acompanhar por outra, a análiseteórica. Entretanto, para uma área que pretende "integrar a Linguística e asperspectivas psicológicas sobre a organização cognitiva em uma compreensãounificada da estrutura conceitua1 humana" (Talmy, 2011), ou seja, que teminteresse tanto na semântica da língua quanto na estrutura mental humana,essas metodologias sozinhas não são por si sós suficientes para atingir osfenômenos envolvidos. A área precisa, portanto, usar diferentes metodolo-gias que permitam obter resultados adequados para cada aspecto do objetode investigação e capazes de satisfazer o que se espera tanto na Linguísticaquanto nas ciências cognitivas. Uma consequência natural dessa necessidadefoi a geração de uma grande quantidade de estudos mu1tidiscip1inares; nãoobstante, por ser uma área relativamente nova, há muito ainda a aprendersobre formas de buscar respostas mais adequadas às suas inquisições.

A preocupação com este tema tem mobilizado recentemente os es-tudiosos em tomo de workshops e seminários destinados a discutir asmetodologias em prática e o acréscimo de novas técnicas que venham adescortinar os fenômenos de interesse. Um resultado importante de umdesses workshops recentes foi o livro Methods in Cognitive Linguistics,de Gonzalez-Marquez et al. (2007), que, além de contemplar discussõessobre a relevância de diferentes metodologias para promover o avanço e ocrescimento da área, apresenta estudos de casos em várias áreas de atuaçãodos 1inguistas cognitivos. No prefácio do livro, Talmy apresenta uma inte-ressante reflexão sobre as várias metodologias utilizadas pela Linguística

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Cognitiva, destacando dois pontos importantes: o primeiro é que precisa-mos ter clareza de que "cada metodologia tem capacidades e limitações"e o segundo, consequência do primeiro, é que "nenhuma metodologia temprivilégio sobre as demais ou é considerada o padrão ouro da investigação"(Talmy, 2007: xii). Em outras palavras, nenhuma metodologia consegue darconta do fenômeno da linguagem como um todo e todas são necessáriaspara que se alcance o pleno conhecimento da estrutura conceitual humana.

A investigação sobre a estrutura conceitual da linguagem, portanto,exige várias metodologias, entre as quais Talmy cita: introspecção designificados e estruturas das formas linguísticas e expressões, isoladas ouem contextos, bem como a comparação da introspecção de alguém coma reportada por outros; comparação de características linguísticas entrelínguas tipologicamente distintas e entre diferentes modalidades das lín-guas (ex.: língua falada e língua de sinais); exame de como os eventos defala interagem com elementos do contexto, tais como o ambiente físico,o conhecimento prévio dos participantes ou padrões culturais; análise degravações audiovisuais de eventos comunicativos de ocorrência natural,incluindo seus textos, dinâmicas vocais, gestos e linguagem do corpo; exa-me (com ajuda do computador) de corpora, geralmente anotados; examede observações cumulativamente gravadas de comportamento linguístico,como os de aquisição da linguagem por crianças; técnicas experimentais dePsicolinguística; testes instrumentais sobre o funcionamento linguístico docérebro em neurociência; simulação do comportamento linguístico humanoem inteligência artificial.

O autor sintetiza essa lista em quatro métodos: a introspecção linguísti-ca, na qual inclui a metodologia de pensamento analítico (entendido comomanipulação sistemática de ideias, abstração, comparação e raciocínio), aanálise audiovideográfica, a análise de corpus e o método experimental.Poderíamos, no entanto, entender que basicamente utilizamos metodologiasque envolvem nosso próprio conhecimento consciente da e sobre a lingua-gem (ex.: introspecção, pensamento analítico), ferramentas que comple-mentam nossas limitações de memória e atenção (ex.: audiovideografias,corpora anotados) e ferramentas que descortinam processos cognitivosinconscientes (ex.: métodos experimentais, simulações computacionais).

A introspecção linguística é "a atenção consciente de um usuário dalíngua para determinados aspectos dessa língua conforme se manifestam em

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sua própria cognição" (Talmy, 2007: xii). Nesse sentido, podemos pensarque a introspecção é a extração e análise de dados, que podem ser acessa-dos de forma consciente, do nosso "corpus linguístico pessoal". A riquezadesse corpus é incomparável a qualquer outro tipo de fonte, pois além dasestruturas linguísticas (ex.: gramaticais, semânticas, fonológicas) contémnossas intuições e sentimentos sobre essas estruturas e o funcionamento dalíngua como um todo. A questão é que ele não está totalmente "disponível".

O termo "cognitivo" usado na Linguística Cognitiva segue o conceito usadonas ciências cognitivas, ou seja, "qualquer tipo de operação ou estrutura mentalque possa ser estudado em termos precisos" (Lak:off e Johnson, 1999: 11),porém grande parte dessas operações e estruturas ocorre em milissegundose tão automaticamente que não conseguimos ter consciência delas. É o queLakoff e Johnson (1999) chamam de "inconsciente cognitivo", que podeser ilustrado em uma situação na qual ouvimos uma determinada frase. Emquestão de segundos, realizamos uma série de operações que não perce-bemos, tais como dividir sons em traços fonéticos distintivos, identificarfonemas, agrupar morfemas, checar: a estrutura da frase com as diversasestruturas que existem na língua, identificar os significados apropriadosao contexto, fazer inferências a partir do que está sendo dito, interpretar osmovimentos do interlocutor, planejar o que dizer. Os estudos psicolinguís-ticos têm mostrado que além de não termos consciência dessas operaçõestambém não temos controle sobre elas. Assim, podemos até decidir quenão queremos ouvir algo que alguém quer nos contar (ex.: não deixandoque ele fale, tapando os ouvidos ou nos afastando desse alguém), mas, umavez tendo ouvido uma palavra, o processamento é inevitável.

A parte consciente, que tem sido depreendida por meio da introspecção,no entanto, é muito importante e tem sido insumo para as pesquisas emLinguística e em outras áreas, pois, conforme aponta Gibbs (2007: 3), "asintuições de linguistas cognitivos treinados têm proporcionado insightsdetalhados de possíveis interações entre língua-mente-corpo que servemcomo fonte de hipóteses experimentais para os trabalhos sobre o incons-ciente cognitivo".

O significado quer de palavras, frases e orações, quer de expressõesidiomáticas isoladas, conforme enfatiza Talmy (2007),'é entre os fenômenoslinguísticos conscientes aquele mais bem trabalhado pela introspecção. Noentanto, essa facilidade de acesso não ocorre quando se pretende escrutinar

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seus significados em contexto, ou mesmo quando se tenta elencar todos osdiferentes sentidos associados a uma única palavra. Por exemplo, é poucoprovável que alguém consiga lembrar todos os sentidos de "escapar" apenaspela introspecção, embora cada um desses sentidos lhe seja plenamenteconhecido. Se conseguimos pensar em n estruturas sintáticas de dizer amesma coisa (se é que isto é possível), não é incomum termos dúvidas so-bre a aceitabilidade de algumas delas. Além disso, as variações regionais,a experiência de vida e áreas de interesse do falante, entre outros fatores,interferem nas avaliações que faz. Por exemplo, a expressão "cabeça dodedo", de uso corrente no Ceará, não é reconhecida por muitos falantes doSudeste como uma expressão do português. Casos como esses levantamsuspeitas de que não se pode confiar plenamente em nossas intuições. Nessesentido, a complementaridade de métodos é importante.

Uma forma de suprir as limitações do acesso que temos ao nosso corpuslinguístico pessoal em sua plenitude, bem como de nossa memória e aten-ção, tem sido construir corpora que permitam a observação dos fenômenoslinguísticos on-line posteriormente. Uma dessas metodologias, como vimosanteriormente, é fazer gravações em áudio ou filmagens de eventos de fala.Corpora como esses permitem examinar aspectos da fala que são difíceisou impossíveis de examinar por meio da introspecção, tais como elementosda expressividade da fala (ex.: dinâmica vocal, gestos, expressões faciais,linguagem do corpo) ou o tempo em que cada elemento ocorre, sozinho ouem relação aos outros (Talmy, 2007). Um outro tipo de corpus, que contémregistros de linguagem produzida de forma natural, é aquele utilizado pelaLinguística de Corpus. Trata-se de bancos de dados eletrônicos compostospor textos naturais, escritos ou transcrições de fala, compilados segundodeterminados critérios, com o propósito de servir a estudos linguísticos(Sardinha, 2004). Constam de grande quantidade de dados, anotados (ouseja, com informações morfossintáticas), mas geralmente capturam apenasalguns excertos do texto.

Os corpora, portanto, proporcionam uma ampliação e complemen-tação dos dados extraídos do "corpus pessoal", enriquecendo o processodescritivo e facilitando o processo analítico-exploratório dos fenômenoslinguísticos, além de proporcionar uma visão mais coletiva, menos idios-sincrática, do uso da linguagem. Entretanto, é preciso ter clareza de que,apesar da grande quantidade de dados compilados nesses corpora (alguns

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com mais de 2 bilhões de palavras), eles não registram todas as possibili-dades da língua, portanto, não se pode considerar inexistente ou inaceitáveluma palavra ou estrutura sem ocorrências. Nesse contexto, a intuição dofalante nativo tem grande relevância.

Finalmente, os métodos experimentais e de simulação computacionalpropõem-se a preencher a lacuna das metodologias anteriores quantoaos processos cognitivos inconscientes. Os estudos psicolinguísticosapresentam grande variedade de metodologias, mas em termos genéricospode-se dizer que estas consistem na "apresentação a alguns indivídu-os de estímulos ou instruções, preparados com o objetivo de se dirigira um único fator cognitivo, com monitoramento de suas respostas"(Talmy, 2007). Existem métodos que investigam o processamento dalinguagem no momento em que está ocorrendo (métodos cronométricosou de processamento on-line), que requerem equipamentos sensíveis aotempo do processamento (ex.: computadores com caixas de resposta,equipamento de monitoramento ocular e equipamento para eletroence-falograma), aplicados individualmente com cada sujeito da pesquisa; emétodos não cronométricos (ou off-line), que não necessitam de equi-pamentos específicos e podem ser aplicados a uma grande quantidadede sujeitos ao mesmo tempo (Derwing e Almeida, 2005). O uso de umou outro tipo de método, ou de uma ou outra técnica experimental emcada tipo, depende do que se deseja observar. Por exemplo, para in-vestigar a hipótese de que a linguagem metafórica exige maior esforçocognitivo, conforme as teorias clássicas que consideram a metáforaum desvio, pode-se utilizar um teste on-line que mede o tempo que ossujeitos gastam na leitura de frases literais e metafóricas. Se não houverdiferenças estatisticamente significativas entre os tempos de leitura paraum e outro tipo de linguagem, rejeita-se a hipótese. Para verificar seos sujeitos compreenderam de fato as frases que leram, faz-se um testeoff-line, no qual os sujeitos respondem perguntas de compreensão paracada frase, após o término do teste on-line.

Cabe aqui também a observação de que os métodos se complementame que resultados definitivos são mais bem atingidos com a complementa-ridade dos diferentes métodos. Isto é especialmente relevante quando setrata de testes experimentais, que são artificiais por natureza. Derwing eAlmeida (2005: 441) argumentam que "a melhor defesa contra artefatos

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experimentais é a transvalidação metodológica, ou seja, a condução de múl-tiplos experimentos, com técnicas variadas, enfocando o mesmo fenômeno".

Toda a parte experimental exige uma teoria bem estruturada e clara emsuas proposições, para ser possível o levantamento de hipóteses. Nessesentido, os cientistas cognitivos, de modo geral, aceitam bem teorias maisformalistas, por proporcionarem mais condições de falseamento, enquantorejeitam teorias baseadas em intuições, pela grande variedade de respostasincongruentes encontradas, como vimos anteriormente.

A Linguística Cognitiva, segundo Talmy (2011), também pode "repre-sentar um aspecto da língua de forma abstrata por fórmulas simbólicasou diagramas esquemáticos" como os paradigmas mais formalistas, noentanto, não tem interesse em trabalhar dessa forma, pois entende que istonão dá conta de vários fenômenos linguísticos. Assim, continua o autor,os linguistas cognitivos "objetivam demonstrar tais fenômenos atravésde meios descritivos que forneçam precisão e rigor sem formalismos"(Talmy, 2011). Gibbs (2007: 17) concorda que a Linguística Cognitivanão precisa se transformar em uma área formalista, mas argumenta que,uma vez considerando-se parte das ciências cognitivas, precisa

ser mais sensível a algumas das propriedades que são importantes em ma-téria de hipóteses (ex.: construir hipóteses falseáveis, considerar hipótesesalternativas) e tentar articular suas ideias e achados empíricos de formaque possam ser testadas pelos estudiosos de outras disciplinas.

Mais recentemente, Gibbs e Colston (2012) retomam de forma abran-gente a questão sobre a interpretação de linguagem literal e figurativa apartir de resultados experimentais em Psicolinguística e Neurociência dosúltimos 25 anos, enfatizando os erros e acertos de cada metodologia adotada.

Poderia me dar um exemplo?

Para exemplificar um estudo na área da Semântica Cognitiva que ilus-tre concomitantemente o uso dos três tipos de metodologias mencionadas(introspecção, análise de corpora e método experimental), usaremos partede nossa própria pesquisa, que discute o papel das experiências corpóreasna geração das metáforas no pensamento e na linguagem, por meio deestudos empíricos de natureza linguística e psicolinguística. Trata-se do

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estudo realizado com a metáfora DESEJAR É TER FOME, CUj os resultados foramparcialmente publicados em Lima, Gibbs e Françozo (2001).

A análise segue a abordagem de Lakoff e utiliza especificamente oconceito de metáfora primária de Grady (1997), que fornece uma formaimportante de examinar empiricamente como algumas metáforas linguís-ticas são compreendidas via nossas experiências corpóreas. Segundo oautor, a base da metáfora é a cena primária - que é uma representaçãocognitiva de uma experiência recorrente (caracterizada em nível local semmuitos detalhes), que envolve estreita correlação entre duas dimensões daexperiência. No caso, a metáfora DESEJAR É TER FOME é gerada pela corre-lação entre a sensação física de fome (uma experiência sensório-motora)e o simultâneo desejo por comida que a acompanha (uma resposta aoinput sensorial). A realização linguística da metáfora, segundo o autor,deve ocorrer através da linguagem licenciada pelo mapeamento entre osdomínios envolvidos a partir das cenas primárias. Nossa análise, portanto,tem início com a identificação do mapeamento metafórico, a partir doselementos envolvidos nos conceitos de FO~ e DESEJO, sem considerar osdados linguísticos, que foram posteriormente coletados utilizando os termoslicenciados pelo mapeamento. Dois estudos se seguiram, um para verificar arealidade psicológica da teoria e outro para conhecer a estrutura linguísticadas expressões metafóricas, incluindo a busca por pistas linguísticas quepossam apontar o sentido figurativo. Esses estudos foram realizados naslínguas inglesa e portuguesa, para verificar também a hipótese de quaseuniversalidade da metáfora primária.

CENAS PRIMÁRIAS E TERMOS LICENCIADOS

A identificação das cenas primárias partiu das definições dos domíniosfonte e alvo, que se mostram da seguinte forma, respectivamente: quemtem fome tem desejo de comeria fome causa desconforto/quem tem fomebusca saciar a fome; e quem tem desejo deseja algo, alguém ou deseja fazeralguma coisa/desejo causa desconforto/quem tem desejo busca realizar odesejo. O mapeamento, portanto, se realiza como: ter fome é desejar/tersede é desejar/ter apetite por comida é ter apetite por alguma coisa ou poralguérnlo desconforto da fome é o desconforto do desejo. A partir desse

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mapeamento tomou-se possível prever a linguagem licenciada pela metá-fora, por exemplo: fome, sede, apetite, água na boca, dor, pontada.

A coleta dos dados foi realizada em várias e diferentes fontes: exem-plos registrados na coletânea dos sistemas metafóricos identificados porLakoff e colaboradores, em livros e artigos sobre metáfora, em dicionáriosmonolíngues e bilíngues (português e inglês), em corpara (ex.: Bank ofEnglish, BNC), acervos eletrônicos de jornais (ex.: Folha de S. Paulo, TheSeattle Times), revistas e jornais impressos (ex.: Newsweek, Veja), obrasliterárias (ex.: Emily Dickinson, Florbela Espanca), textos publicitários,artigos científicos, entre outros. Os termos licenciados e suas variaçõesforam utilizados como entrada para a busca de ocorrências.

Cada trecho coletado foi analisado, sendo considerados somente aquelesem que o sentido do termo licenciado estava claramente relacionado à me-táfora DESEJAR É TER FOME. Verificou-se que a metáfora apresenta realizaçãolinguística de forma muito semelhante nas duas línguas, ou seja, todos ostermos pesquisados foram encontrados em ambas; os objetos do desejometafórico e as estruturas morfossintáticas das expressões apresentaram asmesmas características; os termos relacionados ao desconforto provocadopela fome não apresentaram realização linguística claramente associada àmetáfora DESEJAR É TER FOME4 nem em uma língua nem na outra, portanto,não foram considerados na análise linguística posterior.

ANÁLISE LlNGuíSTICA

A análise das expressões linguísticas teve dois objetivos básicos: co-nhecer as expressões para estruturar os experimentos dentro dos padrõesléxico-semânticos e morfossintáticos de uso em situações reais, e verificarse existem pistas linguísticas que favoreçam o reconhecimento da metá-fora pelos usuários da língua. Este estudo foi direcionado pelas seguintesperguntas: Existe restrição no tipo de coisa que pode ser o objeto da fomemetafórica? Ou seja, o objeto do desejo da fome metafórica poder seralgo concreto, abstrato ou uma pessoa? Existe restrição quanto ao usoda metáfora em diferentes tipos de linguagem (ex.: linguagem cotidiana,jomalística, científica) e em diferentes temas (ex.: esporte, política, reli-gião)? Até que ponto as estruturas morfossintáticas usadas para falar da

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fome física são semelhantes ou diferentes daquelas usadas para expressar afome metafórica? Existe restrição quanto ao uso da metáfora nas diferentesclasses gramaticais?

As comparações entre as expressões linguísticas nas duas línguas foramfeitas em termos do fenômeno em si e não em termos dos objetos específi-cos, ou estrutura gramatical. Como resultado desse trabalho, verificamosque a realização de DESEJAR ÉTER FOME e seus usos em português e inglês sãomuito semelhantes em duas formas: os diferentes termos usados para falarda fome física são usados para expressar desejo (inglês: hunger (verbo,substantivo) - hungry - hungrily; thirst (verbo, substantivo) - thirsty,appetite, mouth-water - mouth watering; drool - drooling, famishing;starve - starved - starving; português: fome =faminto - esfaimado - es-fomeado; sede - seco - sedento; apetite - apetecer - apetência; água naboca, babar(-se), e os diferentes termos usados para falar da fome físicapodem ser usados para expressar o desejo por exatamente o mesmo objeto(ex.: sede de lucros -fome de lucros - apetite por lucros).

Há semelhanças entre as duas línguas também no que diz respeito aosquestionamentos que norte aram esse estudo. O objeto desejado expressoem termos da fome metafórica, segundo o que pudemos depreender dasexpressões coletadas, tanto pode ser algo concreto (ex.: As revistas da épocaestavam babando pelo carro) ou algo abstrato (ex.: Ela tinha sede pelo po-der), quanto uma pessoa (ex.: Em vez de comida, eu tinha fome de homens).

As expressões metafóricas não se restringem à linguagem cotidianacomum ou à poesia e integram temas diversos. Por exemplo, encontramosa metáfora DESEJAR É TER FOME em propagandas (ex.: Um prato cheio paraquem tem fome de TV), em textos jomalísticos (ex.: Os uzi israelenses sãode deixar qualquer ministro do Exército de água na boca), em textos cien-tíficos (ex.: Em particular, estabelecemos a importância da condição deplasma faminto [starving plasma] na obtenção de amostras de carbeto desilício amorfo hidrogenado de alto gap.) e em temas variados, tais comoos relacionados à economia (ex.: Os investidores estrangeiros começam aolhar a Bolsa brasileira com algum apetite), política (ex.: O problema éa minha falta de apetite por cargos públicos), esporte (ex.: Acosta apostana sede de vitória de seus jovens jogadores para derrotar a seleção brasi-leira), violência e vingança (ex.: [Saddam Hussein] é um personagem deum drama shakespeariano: inteligente, mas sedento de sangue e amora!),

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comunicação (ex.: O apetite pelas comunidades virtuais depara-se comum ideal de relação humana desterritorializada, transversal, livre), senti-mentos metafisicos (ex.: No entanto, em todos nós existe - eforte - a sedede Deus), amor romântico (ex.: A história de Jonathan Larson trata docotidiano de jovens que têm aluguel para pagar efome de amar), luxúria(ex.: Elas ainda não sabem que uma polegada a mais, uma a menos, poucoimporta para quem tem apetite por mulher).

A análise das estruturas morfossintáticas das expressões metafóricascomparadas com as não metafóricas mostrou que a estrutura para falar dafome física é realizada com apenas um argumento (ex.: alguém tem fome;a fome), enquanto a estrutura para falar da fome metafórica é realizada comdois argumentos (ex.: alguém tem fome de alguma coisa; fome de algumacoisa), com alguma variação no uso da preposição (ex.: hunger for, hungerover, hunger afier, hunger to; fome de,fome do/a, fome por, fome para)em todos os termos. Note-se que mesmo quando se trata de alimento, o usodo segundo argumento já denota desejo (ex.: estou com sede de limonada;tenho fome de umafeijoada).

De modo geral, dentre as expressões metafóricas coletadas, os termoslicenciados ocorrem como substantivos com maior frequência, correspon-dendo a 59% (n = 338) das ocorrências em inglês e 67% (n = 375), emportuguês; em segundo lugar, como adjetivos, com 31% (n = 181), eminglês, e 22%, em português; e finalmente como verbos, em apenas 9,5%(n = 55) das ocorrências em inglês e 11% (n = 64), em português. Foramidentificados apenas dois casos de uso dos termos licenciados como ad-vérbio em inglês e nenhum em português.

ANÁLISE EXPERIMENTAL

A análise experimental buscou evidências não linguísticas da metáfora,examinando a experiência corpórea da fome separada da conceitualizaçãode fome como desejo. Consideramos que algumas experiências corpóreas dafome são mais proeminentes do que outras, em ambos os grupos de falantes.Partimos da hipótese de que se a fome e o desejo são altamente correlaciona-dos e as pessoas dão sentido aos seus desejos metaforicamente em termos dafome, então essas partes mais proeminentes das suas experiências da fome

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Semântica Cognitiva Sl

devem estar mapeadas nos diferentes conceitos de desejo. Assim, as pessoasdevem achar certas formas de expressar o desejo em termos da experiência dafome mais aceitáveis do que quando usados aspectos menos proeminentes.

Realizamos dois experimentos com falantes do português brasileiroe do inglês americano. No primeiro, investigamos a conceitualização dafome física, em termos de três tipos de efeito no corpo: sintomas locais(efeitos da fome em partes específicas do corpo, ex.: dor de estômago),sintomas gerais (efeitos da fome no corpo em geral, ex.: ficar tonto) esintomas de comportamento (comportamentos provocados pela fome, ex.:ficar irritado). Em cada tipo de sintoma foram incluídos itens consideradosintimamente relacionados com a experiência da fome (ex.: o estômagoroncar), possivelmente relacionados com a fome (ex.: suar frio), e nãorelacionados com a fome (ex.: os dedos estalarem). A tarefa dos sujeitosera julgar a frequência com que os itens ocorriam na experiência da fome.Os resultados mostraram que tanto os falantes de português quanto os deinglês julgaram de forma semelhante os diferentes itens, o que indica queas pessoas estudadas têm uma regularidadesignificativa nas experiênciascorpóreas da fome. Note-se que, apesar de a fome ser uma experiênciafísica comum a todo ser humano, a percepção e a conceitualização dessaexperiência poderiam não ter sido necessariamente as mesmas.

O experimento 2 teve como objetivo examinar se o conhecimentosobre a fome demonstrado no experimento 1 estava correlacionado coma compreensão das experiências de desejo. Nesse sentido, separamos ositens do experimento 1 conforme o julgamento dos sujeitos em três grausde proeminência - muito relacionados à fome, moderadamente relaciona-dos à fome e pouco/não relacionados à fome. O desejo foi investigado sobtrês aspectos: o desejo pela pessoa amada (amor), o desejo como atraçãosexual (luxúria) e o desejo por alguma coisa ou de fazer alguma coisa (acategoria outra). Utilizando apenas os itens mais e menos proeminentes,que se apresentaram como grupos distintos com significância estatística,preparamos questões de dois tipos: perguntas que enfocavam os efeitos dostrês tipos de desejo no corpo (ex.: Como você imagina que se sente umapessoa que deseja muito alguém ou alguma coisa? (a)fica tonta (b) sentefraqueza (c)fica com sono (d)fica tagarela) e julgamentos que focalizavamas intuições dos sujeitos sobre a aceitabilidade de formas diferentes de ex-pressar linguisticamente os três tipos de desejo (ex.: Meu estômago dói por

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você - proeminente, amor, luxúria; Você é a única pessoa que acha que osmeus dedos estalam por você - não proeminente, amor, luxúria; Reduzidoà pobreza, o meu estômago ronca pelos velhos tempos - proeminente,outros; A verdade é que os meus dedos estalam por uma oportunidade deir à lua - não proeminente, outros).

O experimento foi realizado com falantes do português e do inglêsque não tinham participado do experimento 1. A análise das médias entresujeitos de cada língua mostrou que os itens anteriormente julgados comoaltamente relevantes à fome foram agora vistos como mais aceitáveis parao desejo. Isto ocorreu tanto nas questões sobre os efeitos do desejo nocorpo quanto no julgamento das expressões 1inguísticas e, de modo geral,foram consistentes entre falantes do português e do inglês. Esses achadosdemonstram que, de modo geral, nossas experiências corpóreas da fomenos permitem predizer que aspectos do desejo podem e não podem serpensados e expressos em termos do nosso entendimento físico, corpóreo,da fome. Além disso, estes corroboram a ideia de que o entendimento queas pessoas têm de expressões metafóricas sobre os desejos humanos - taiscomo os políticos têm fome de poder ou essas crianças têm fome de ca-rinho - é motivado por suas experiências corpóreas relacionadas à fome.

Os resultados experimentais ratificam fortemente as hipóteses de Gradypara esta metáfora em particular. A estrutura das expressões linguísticas,claramente diferentes ao tratar da fome física e da metafórica, pode seruma pista para os ouvintes, mas certamente não é gerada conscientementepelo falante. Sua estrutura morfossintática parece partir do próprio ma-peamento entre FOME e DESEJO, resultado das cenas primárias de cada umadessas experiências. Diferentemente de fome, desejo tem sempre mais deum argumento, que se reproduz na metáfora.

Quais são as grandes linhas de investigaCjão?

A Semântica Cognitiva, como vimos, investiga a representação do co-nhecimento (estrutura conceitual) e a construção dos sentidos (conceituali-zação), buscando caracterizar os princípios gerais que se aplicam a todos osaspectos da linguagem humana, em conformidade com o conhecimento deoutras disciplinas sobre mente e cérebro. Além disso, vimos que o elemento

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central das estruturas linguísticas é o significado, portanto, qualquer aspectoda língua, quer seja fonológico, morfológico, sintático, lexical, entre outros,está imbricado com sua semântica. Nesse sentido, as pesquisas na áreaapresentam grande diversidade, distribuindo-se, por exemplo, entre teoria emodelos; categorização e léxico; construções e gramática; cognição espacial,conceitualização e estruturação de espaço e movimento; metáfora, metonímiae integração conceitual (blending); aquisição da linguagem; ensino/apren-dizagem de segunda língua; análise do discurso; poética cognitiva e estudosliterários; psicolinguística; linguagem gestual; linguística computacional;fenomenologia; filosofia da mente.

Observa-se um crescente número de coletâneas, reunindo discussões tantode aspectos teóricos, sob as diversas abordagens da Semântica Cognitiva,quanto de aspectos aplicados. Paralelamente, as questões metodológicastambém têm sido levantadas sob diferentes olhares, destacando-se os métodosexperimentais e o uso de corpora para estudos semântico-lexicais. A polis-semia, um dos fenômenos mais disseminados na língua, e outros fenômenoscomo a metáfora e a metonímia têm sido amplamente estudados, em busca dosprincípios que governam as relações sistemáticas entre os vários sentidos deuma palavra. Entre os estudos aplicàdos, o ensino/aprendizagem de segundalíngua (língua estrangeira) pode-se caracterizar como uma das áreas de maiordestaque. Mais recentemente, a Lexicografia e a Terminologia têm buscadocada vez mais a contribuição da Semântica Cognitiva para seus trabalhos.

No Brasil, os estudos em Semântica Cognitiva, de modo geral, incluem-se nos 8 grupos de pesquisa que participam do GT5 de Linguística e Cogni-ção, a saber: Gramática e Cognição, liderado pela Profa. Maria MargaridaSalomão (UFJF); Grupo de Estudos de Indeterminação e Metáfora, lideradopela Profa. Mara Zanotto (ruc.st); Gelp - Grupo de Estudos sobre Lingua-gem e Pensamento, liderado pelas Profas. Paula Lenz Costa Lima (UECE) eAna Cristina Pelosi (UFC); INCOGNITO - Interfaces Linguagem, Cognição eCultura, liderado pela Profa. Heliana Mello (UFMG) e pelo Prof. TommasoRaso (UFMG); Processamento Cognitivo da Língua Materna e da LínguaEstrangeira, liderado pela Profa. Márcia Cristina Zimmer (UCPEL); Culturae Semântica Cognitiva, liderado pela Profa. Heloísa Pedroso de MoraesFeltes (ucs); NES - Núcleo de Estudos em Semântica Lexical, liderado peloProf. Heronides Moura (UFSC); Indeterminação e Metáfora no Discurso,liderado pela Profa. Solange Coelho Vereza (UFF).

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NotasI Exemplos adaptados de Lakoff e Johnson (2002).

2 Por exemplo, em seu artigo sobre um panorama da Linguística Cognitiva, Evans et al. (2007) classificam otrabalho de Talmy na linha da Gramática Cognitiva, termo frequentemente associado à pesquisa de Langacker.Porém, Talmy (20 l l ), em seu capítulo no Handbook ofSemantics sobre um panorama da Semântica Cognitiva,coloca-se mais uma vez fortemente associado a ela. Além disso, como acentua Feltes (2007), essa centralidadeda Semântica leva a própria Linguística Cognitiva a ser confundida com os estudos de Semântica Cognitiva,em uma relação, em geral, de superposição.

3 Grupo étnico que habita o norte da igéria, o sul de Níger e o norte dos Camarões.

4 Para detalhes a este respeito, ver Lima et al. (2001).

5 Grupo de Trabalho da Anpoll (Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Letras e Linguística).

o que eu poderia ler para saber mais?

Em seu estágio atual de desenvolvimento, há muito para se ler sobrea Semântica Cognitiva. A seguir, apresento uma lista com algumas dasobras mais importantes, entre as quais estão as referências que utilizei paraconstruir este capítulo. Boa leitura!CROFT,W.; CRUSE,D. A. Cognitive Linguistics. Cambridge: Cambridge University Press, 2004.DAMÀSIO,A. R. o erro de Descartes: emoção, razão e o cérebro humano. Trad. Dora Vicente e Georgina

Segurado. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.DERWING,B. L.; ALMEIDA,R. G. Métodos experimentais em linguística. ln: MAlA, M.; FINGER, r. (eds.).

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