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CONTEÚDO Abreviações usadas neste Livro-Texto e Comentário .....................................................................6 Uma Palavra do Autor: Um Breve Sumário desse Método Interpretativo ......................................8 INTRODUÇÃO I. Uma Palavra a Respeito da Tendência na Interpretação Bíblica Para Especializações em Hermenêutica .......................................................................................................................11 II. A Experiência do Autor no Ensino da Hermenêutica em Igrejas Locais, Classes, e Seminários ............................................................................................................................16 III. A Questão da Autoridade .....................................................................................................18 IV. A Necessidade de Procedimentos Hermenêuticos Não-Técnicos ........................................19 A. Indiferença entre os Crentes B. Dogmatismo Entre os Crentes V. Pressuposições Básicas sobre a Bíblia .................................................................................21 VI. Declarações Gerais sobre o Método Contextual/Textual .....................................................22 VII. Alguns Comentários Gerais para o Leitor ............................................................................23 A BÍBLIA I. O Cânon................................................................................................................................25 II. Reivindicações da Inspiração ...............................................................................................27 III. O Propósito da Bíblia ..........................................................................................................27 A. Não um Livro de Regras B. Não um livro de Ciência C. Não um Livro Mágico IV. Pressuposições do Autor sobre a Bíblia ..............................................................................29 V. Evidência para Autoridade e Inspiração Sobrenatural da Bíblia..........................................24 A. Profecia Preditiva B. Descobertas Arqueológicas C. Consistência da Mensagem D. Pessoas Transformadas Permanentemente VI. Problemas Relacionados com nossa Interpretação da Bíblia ...............................................31 VII. As Principais Fontes Textuais da nossa Bíblia Moderna .....................................................32 A. Antigo Testamento B. Novo Testamento C. Breve explanação dos problemas e teorias do criticismo textual D. Os princípios básicos do criticismo textual E. Alguns exemplos do problema dos manuscritos copiados à mão no NT Grego F. O problema da tradução de uma linguagem para outra G. O problema da linguagem humana ao descrever Deus

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  • CONTEDO Abreviaes usadas neste Livro-Texto e Comentrio .....................................................................6 Uma Palavra do Autor: Um Breve Sumrio desse Mtodo Interpretativo ......................................8 INTRODUO I. Uma Palavra a Respeito da Tendncia na Interpretao Bblica Para Especializaes em

    Hermenutica .......................................................................................................................11 II. A Experincia do Autor no Ensino da Hermenutica em Igrejas Locais, Classes, e

    Seminrios ............................................................................................................................16 III. A Questo da Autoridade .....................................................................................................18 IV. A Necessidade de Procedimentos Hermenuticos No-Tcnicos ........................................19 A. Indiferena entre os Crentes B. Dogmatismo Entre os Crentes V. Pressuposies Bsicas sobre a Bblia .................................................................................21 VI. Declaraes Gerais sobre o Mtodo Contextual/Textual .....................................................22 VII. Alguns Comentrios Gerais para o Leitor ............................................................................23 A BBLIA I. O Cnon ................................................................................................................................25 II. Reivindicaes da Inspirao ...............................................................................................27 III. O Propsito da Bblia ..........................................................................................................27 A. No um Livro de Regras B. No um livro de Cincia C. No um Livro Mgico IV. Pressuposies do Autor sobre a Bblia ..............................................................................29 V. Evidncia para Autoridade e Inspirao Sobrenatural da Bblia ..........................................24 A. Profecia Preditiva B. Descobertas Arqueolgicas C. Consistncia da Mensagem D. Pessoas Transformadas Permanentemente VI. Problemas Relacionados com nossa Interpretao da Bblia ...............................................31 VII. As Principais Fontes Textuais da nossa Bblia Moderna .....................................................32 A. Antigo Testamento B. Novo Testamento C. Breve explanao dos problemas e teorias do criticismo textual D. Os princpios bsicos do criticismo textual E. Alguns exemplos do problema dos manuscritos copiados mo no NT Grego F. O problema da traduo de uma linguagem para outra G. O problema da linguagem humana ao descrever Deus

  • AUTORIDADE BBLICA I. Definio Pressuposicional do Autor ...................................................................................41 II. A Necessidade de Interpretaes Verificveis .....................................................................41 III. Exemplos de Abuso Interpretativo .......................................................................................43 O INTRPRETE I. Condicionamento Pressuposicional ......................................................................................44 II. Alguns Exemplos de Condicionamento Evanglico ............................................................45 III. O que Pode Ser Feito? ..........................................................................................................50 IV. A Responsabilidade do Intrprete ........................................................................................50 O MTODO CONTEXTUAL DE INTERPRETAO BBLICA I. Sua Histria e Desenvolvimento ..........................................................................................51 A. Interpretao Judaica B. A Escola de Alexandria C. A Escola de Antioquia D. Os Princpios Bsicos de Antioquia II. Questes Interpretativas .......................................................................................................54 A. O que o autor original disse? B. O que o autor original quis dizer? C. O que o autor original disse sobre o mesmo assunto em outros lugares? D. O que outros autores bblicos dizem sobre o mesmo assunto? E. Como os ouvintes originais entenderam a mensagem e como responderam a ela? F. Como essa verdade se aplica aos meus dias? G. Como essa verdade se aplica minha vida? H. A responsabilidade do Intrprete I. Alguns livros teis ALGUMAS POSSVEIS ARMADILHAS INTERPRETATIVAS I. Necessidade de um Foco Textual e Processo Lgico na Interpretao ................................71 A. O contexto literrio da passagem B. O contexto histrico C. O gnero literrio D. A sintaxe e gramtica E. O significado original da palavra e conotaes F. Uso apropriado de passagens paralelas II. Exemplos de Abusos das Primeiras Cinco Questes Interpretativas ...................................77

  • PROCEDIMENTOS PRTICOS PARA INTERPRETAO I. Os Aspectos Espirituais ........................................................................................................77 A. Orao por auxlio B. Pureza pessoal C. Desejo de conhecer Deus D. Aplicar a verdade na vida II. O Processo Lgico ...............................................................................................................77 A. Ler em diversas tradues B. Leia o livro inteiro ou a unidade literria C. Escreva suas observaes textuais 1. propsito da passagem 2. gnero da passagem D. Neste ponto til voc comparar seu esboo E. Releia o livro inteiro e esboce as unidades F. Compare suas observaes com outros recursos bblicos G. Compare as passagens paralelas significativas H. Povos orientais apresentavam verdades em pares de tenso I. Teologia Sistemtica J. Uso de Passagens Paralelas III. Ordem Proposta para uso de Ferramentas de Pesquisa ........................................................83 EXEMPLO DE CATEGORIAS DE ANOTAES I. Ciclos de Leitura ..................................................................................................................85 II. Procedimentos Exegticos ....................................................................................................87 III. Procedimentos bsicos para um estudo acadmico de palavras do NT ...............................88 IV. Um breve sumrio de princpios hermenuticos ..................................................................90 UMA LISTA SELETA DE FERRAMENTAS DE PESQUISA RECOMENDADAS I. A Bblia ................................................................................................................................91 II. Como Pesquisar ....................................................................................................................91 III. Hermenutica .......................................................................................................................91 IV. Introduo bsica aos livros bblicos ...................................................................................92 V. Enciclopdias Bblicas e Dicionrios ...................................................................................92 VI. Conjuntos de Comentrios ...................................................................................................92 VII. Estudo de Palavras ...............................................................................................................93 VIII. Contexto Histrico ................................................................................................................93 IX. Teologias ..............................................................................................................................94 X. Apologtica ..........................................................................................................................94 XI. Dificuldades Bblicas ...........................................................................................................94 XII. Criticismo Textual ................................................................................................................95 XIII. Lxicos ............. .....................................................................................................95

  • XIV. Sites para comprar livros usados e com descontos ..............................................................95 UM GUIA PARA A BOA LEITURA BBLICA: UMA BUSCA PESSOAL PELA VERDADE VERIFICVEL......................................................................................................96 BREVE DEFINIO DE FORMAS VERBAIS QUE CAUSAM IMPACTO NA EXEGESE I. Breve Desenvolvimento Histrico do Hebraico .................................................................104 II. Aspectos da Predicao ......................................................................................................104 A. VERBOS B. DERIVAES C. MODOS D. Waw E. INFINITIVOS F. INTERROGATIVAS G. NEGATIVAS H. SENTENAS CONDICIONAIS DEFINIES DAS FORMAS GRAMATICAIS GREGAS QUE INFLUENCIAM A INTERPRETAO I. TEMPO ..............................................................................................................................110 II. VOZ....................................................................................................................................111 III. MODOS. ............................................................................................................................112 IV. FERRAMENTAS DE PESQUISA ....................................................................................112 V. NOMES ..............................................................................................................................113 VI. CONJUNES E CONECTORES ...................................................................................113 VII. SENTENAS CONDICIONAIS .......................................................................................115 VIII. PROIBIES .....................................................................................................................115 IX. O ARTIGO .........................................................................................................................116 X. MODOS DE DEMONSTRAR NFASE NO GREGO .....................................................116 EXEMPLO DE FOLHAS DE TRABALHO I. Exemplo de unidade literria em Romanos 1-3 .................................................................119 II. Exemplo em Tito ................................................................................................................124 III. Exemplos a partir dos comentrios do Dr. Utley A. Efsios 2 ........................................................................................................131 B. Romanos 5 ....................................................................................................152 C. Romanos 6 ....................................................................................................168 APNCIDES Apndice 1, AT como Histria .......................................................................................180 Apndice 2, Historiografia do Antigo Testamento Comparada a Culturas Contemporneas do Antigo Oriente ............................................183 Apndice 3, Narrativa do AT ...........................................................................................185 Apndice 4, Profecia do AT .............................................................................................187

  • Apndice 5, Profecia do NT .............................................................................................191 Apndice 6, Poesia Hebraica ...........................................................................................194 Apndice 7, Literatura Hebraica de Sabedoria ................................................................197 Apndice 8, Apocalptica .................................................................................................201 Apndice 9, Interpretando Parbolas ...............................................................................203 Apndice 10, Glossrio de Termos Usados em Hermenutica ........................................207 Apndice 11, Bibliografia de livros recomendados .........................................................216 Apndice 12, Declarao Doutrinria ..............................................................................220 Poema de Hermenutica (autoria de um estudante aposentado) ......................................220

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    Abreviaturas Usadas Neste Estudo AB Anchor Bible Commentaries [Comentrios da Bblia Anchor], ed. William Foxwell Albright e David Noel Freedman ABD Anchor Bible Dictionary [Dicionrio da Bblia Anchor] (6 vols.), ed. David Noel Freedman AKOT Analytical Key to the Old Testament [Chave Analtica para o Antigo Testamento] de John Joseph Owens ANET Ancient Near Eastern Texts [Textos do Antigo Oriente Mdio], James B. Pritchard BAGD A Greek-English Lexicon of the New Testament and Early Christian Literature [Um Lxico Grego-Ingls do Novo Testamento e Literatura Crist Primitiva], Walter Bauer, 2 edio de F. W. Gingrich e Fredrick Danker BDB A Hebrew and English Lexicon of the Old Testament [Um Lxico Hebraico Ingls do Antigo Testamento] de F. Brown, S. R. Driver e C. A. Briggs BHS Biblia Hebraica Stuttgartensia, GBS, 1997 DSS Dead Sea Scrolls [Rolos do Mar Morto] IDB The Interpreters Dictionary of the Bible [Dicionrio do Intrprete da Bblia] (4 vols.), ed. George A. Buttrick ISBE International Standard Bible Encyclopedia [Enciclopdia Bblica Padro Internacional] (5 vols.), ed. James Orr BJ Bblia de Jerusalm JPSOA The Holy Scriptures According to the Masoretic Text: A New Translation [As Sagradas Escrituras de Acordo com o Texto Massortico (The Jewish Publication Society of America) KB The Hebrew and Aramaic Lexicon of the Old Testament [O Lxico Hebraico Aramaico do Antigo Testamento] de Ludwig Koehler e Walter Baumgartner LAM The Holy Bible From Ancient Eastern Manuscripts [A Bblia Sagrada a Partir de Antigos Manuscritos Orientais] (a Peshita) de George M. Lamsa LXX Septuagint (Greek-English) [Septuaginta (Grego-Ingls] de Zondervan, 1970 MOF A New Translation of the Bible [Uma Nova Traduo da Bblia] de James Moffatt

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    TM Texto Massortico Hebraico NAB New American Bible Text [Texto da Nova Bblia Americana] NASB New American Standard Bible NEB New English Bible NET NET Bible: New English Translation [Bblia NET: Nova Traduo Inglesa], Segunda Edio Beta NIDNTT New International Dictionary of New Testament Theology [Novo Dicionrio Internacional de Teologia do Novo Testamento] (4 vols.), de Colin Brown NIDOTTE New International Dictionary of Old Testament Theology and Exegesis [Novo Dicionrio Internacional de Teologia e Exegese do Antigo Testamento] (5 vols.), ed. Willem A. VanGemeren NVI Nova Verso Internacional

    NJB New Jerusalem Bible [Nova Bblia de Jerusalm] NRSV New Revised Standard Bible OTPG Old Testament Parsing Guide [Guia Analtico do Antigo Testamento] de Todd S. Beall, William A. Banks e Colin Smith REB Revised English Bible RSV Revised Standard Version SEPT The Septuagint (Greek-English) [A Septuaginta (Grego-Ingls] de Zondervan, 1970 TCNT The Twentieth Century New Testament [Novo Testamento do Sculo Vinte] TEV Todays English Version das Sociedades Bbicas Unidas YLT Youngs Literal Translation of the Holy Bible [Traduo Literal da Bblia Sagrada de Young] de Robert Young ZPBE Zondervan Pictorial Bible Encyclopedia [Enciclopdia Ilustrada da Bblia de Zodervan] (5 vols.), ed. Merrill C. Tenney

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    UMA PALAVRA DO AUTOR: COMO ESTE COMENTRIO PODE AJUDAR VOC?

    Interpretao bblica um processo racional e espiritual que tenta compreender um escritor antigo de tal maneira que a mensagem de Deus possa ser compreendia e aplicada nos nossos dias.

    O processo espiritual crucial mas difcil de definir. Envolve uma rendio e abertura a Deus. Deve haver uma fome (1) por Ele, (2) para conhec-Lo e (3) para servi-Lo. Este processo envolve orao, confisso e a disposio para mudana de estilo de vida. O Esprito crucial no processo interpretativo, mas por que cristos sinceros, piedosos compreendem a Bblia diferentemente um mistrio.

    O racional mais fcil de descrever. Ns devemos ser consistentes e honestos ao texto e no ser influenciados por nossos preconceitos pessoais ou denominacionais. Ns todos somos historicamente condicionados. Nenhum de ns um intrprete objetivo, neutro. Este comentrio oferece um processo racional cuidadoso contendo trs princpios interpretativos estruturados para nos ajudar a superar nossos preconceitos. Primeiro Princpio

    O primeiro princpio observar o cenrio histrico em que o livro bblico foi escrito e a ocasio histrica particular para seu autor. O autor original tinha um propsito, uma mensagem para comunicar. O texto no pode significar alo para ns que nunca significou para o autor original, antigo, inspirado. Sua inteno no nossa necessidade histrica, emocional, cultural, pessoal ou denominacional a chave. Aplicao um parceiro fundamental para interpretao, mas interpretao apropriada deve sempre preceder aplicao. Deve ser reiterado que todo texto bblico tem um e somente um significado. Este significado o que autor bblico original pretendia atravs da liderana do Esprito comunicar para sua poca. Este significado nico pode ter muitas aplicaes possveis para diferentes culturas e situaes. Estas aplicaes podem ser vinculadas verdade central do autor original. Por esta razo, este comentrio guia de estudo destinado a fornecer uma introduo para cada livro da Bblia. Segundo Princpio

    O segundo princpio identificar as unidades literrias. Todo livro bblico um documento unificado. Os intrpretes no tm direito de isolar um aspecto da verdade excluindo outros. Portanto, ns devemos nos esforar para compreendermos o propsito do livro bblico todo antes de ns interpretamos as unidades literrias individuais. As partes individuais captulos, pargrafos ou versculos no podem significar o que o todo no significa. A interpretao deve mover-se de uma abordagem dedutiva do todo para uma abordagem indutiva para as partes. Portanto, este comentrio guia de estudo destinado a ajudar o estudante a analisar a estrutura de cada unidade literria por pargrafos. Divises de pargrafo e captulo no so inspiradas, mas elas nos ajudam ao identificar unidade de pensamentos.

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    Interpretar num nvel de pargrafo no sentena, orao, frase ou nvel de palavra a chave ao seguir o significado pretendido do autor bblico. Pargrafos so baseados num tpico unificado, muitas vezes chamado o tema ou sentena tpica. Toda palavra, frase, orao e sentena no pargrafo se relaciona de algum modo com este tema unificado. Elas o limitam, expandem, explicam e/ou questionam. Uma verdadeira soluo para interpretao adequada seguir o pensamento do autor original numa base pargrafo-por-pargrafo atravs das unidades literrias individuais que constituem o livro bblico. Este comentrio guia de estudo destinado a ajudar o estudante a fazer isso comparando tradues modernas inglesas.

    1. O texto grego da United Bible Society a quarta edio revisada (UBS4). Este texto foi divido em pargrafos por eruditos textuais modernos.

    2. A New King James Version (NKJV) uma traduo literal palavra-por-palavra baseada na tradio de manuscrito grego conhecida como o Textus Receptus. Suas divises de pargrafos so mais longas do que as outras tradues. Estas unidas mais longas ajudam o estudante a ver os tpicos unificados.

    3. A New Revised Standard Version (NRSV) uma traduo modificada palavra-por-palavra. Ela forma um meio-ponto entre as duas seguintes verses modernas. Suas divises de pargrafo so bastante uteis ao identificar os assuntos.

    4. A Todays English Version (TEV) uma traduo dinmica equivalente publicada pela United Bible Society. Ela tenta traduzir a Bblia de tal maneira que um leitor ou falante de ingls moderno possa compreender o significado do texto Grego. Muitas vezes, especialmente nos Evangelhos, ela divide pargrafos pelo que fala em vez de pelo assunto, da mesma como a NVI. Para os propsitos do intrprete, isto no til. interessante observar que tanto a UBS4 e TEV so publicadas pela mesma entidade, contudo a diviso de pargrafo delas difere.

    5. A New Jerusalem Bible (NJB) uma traduo dinmica equivalente baseada na traduo catlica francesa. muito til ao comparar a diviso de pargrafos a partir de uma perspectiva europia.

    6. O texto impresso a Updated New American Standard Bible de 1995 (NASB), que uma traduo palavra-por-palavra. Os comentrios versculo por versculo seguem esta diviso de pargrafos.

    Terceiro Princpio

    O terceiro princpio ler a Bblia em tradues diferentes a fim de compreender a mais ampla extenso possvel de significado (campo semntico) que as palavras ou frases bblicas podem ter. Muitas vezes uma palavra ou frase grega pode ser compreendida de vrias maneiras. Estas tradues diferentes produzem estas opes e ajudam identificar e explicar as variaes de manuscrito grego. Estas no afetam doutrinas, mas elas realmente nos ajudam a tentar regressar ao texto original redigido por um antigo escritor inspirado.

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    Quarto Princpio O quarto princpio observar o gnero literrio. Os autores originais inspirados escolheram

    registrar suas mensagens de formas diferentes (e.g., narrativa histrica, drama histrico, poesia, profecia, evangelho [parbola], carta, apocalptico). Estas formas diferentes tm solues especiais para interpretao (veja Gordon Fee e Doug Stuart, Entendes o que ls? Ou Robert Stein, Playing by the Rules [Jogando pelas Regras]).

    Estes princpios tm me ajudado a superar muito do meu condicionamento histrico forando-me a lutar com o texto antigo. Minha esperana que ser uma bno para voc tambm.

    Bob Utley East Texas Baptist University 27 de junho de 1996

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    INTRODUO

    I. Uma Palavra a Respeito da Tendncia na Interpretao Bblica Para

    Especializaes em Hermenutica

    Posso lembrar, quando era novo crente, como fiquei contente por entender mais sobre Cristo, a vida crist e a Bblia. Disseram-me que era alegria e tarefa de todo crente estudar a Bblia. Mas posso lembrar-me de quanto fiquei frustrado quando comecei a ler a Bblia. Era como se estivesse numa emocionante aventura transformada em um confuso pesadelo.

    A ideia de estudo bblico pessoal assusta muitos cristos. Parece ser muito difcil

    sem treinamento formal. Contudo o Salmo 119 persistentemente conclama todos os cristos para se alimentarem da nutrio espiritual que encontram na Escritura (Mayhue 1986, 45). Mas havia esperana. Disseram-me que os estudos iriam me providenciar as

    ferramentas e tcnicas necessrias para entender a Bblia por mim mesmo, mas acabou sendo verdade apenas em parte. Era verdade que o treinamento cristo abriu a Bblia para mim em muitos caminhos maravilhosos. No entanto, rapidamente se tornou evidente que eu necessitava de mais educao e especializao se realmente quisesse entender a Bblia. De repente, percebi que para compreender a Bblia plenamente seriam necessrios anos de lingustica, semntica, hermenutica e percia teolgica e exegtica. A essa altura, minha educao era tal que percebi que os especialistas que me treinaram no interpretavam a Bblia com uniformidade (Silva 1987, 2,3). Cada um deles afirmava que ter percia em seus campos de estudos era crucial para a uma interpretao adequada, mas ainda continuavam a discordar sobre como interpretar certas passagens de difcil entendimento. Esses comentrios no tm a inteno de ser uma dura crtica ao sistema educacional cristo, mas um reconhecimento de que no pde garantir tudo quanto prometia. De alguma forma, em algum lugar, devia-se ter mais que educao.

    A Bblia to simples, que o menos culto pode entender sua mensagem bsica, e to

    profunda que o mais culto acadmico jamais poder exaurir seu completo significado (Schultz e Inch 1976, 9).

    De alguma maneira temos relegado a interpretao da Bblia para o uso

    exclusivo de acadmicos especialistas. Tomamos a Bblia, que um livro escrito para pessoas comuns, e a demos aos privilegiados, especialistas acadmicos.

    Wycliffe escreveu: Cristo e seus apstolos ensinaram ao povo na linguagem

    que mais lhes era familiar. Certo que, quanto mais se compreende a verdade da f crist, mais evidente se torna a prpria f. Logo, a doutrina no deve estar somente em Latim, mas na lngua vulgar e, como a f da igreja est na Escritura, quanto mais dela puder ser conhecido, melhor ser. O leigo deve entender a f, e como as doutrinas da nossa f esto nas Escrituras, os crentes devem t-las em uma linguagem em que plenamente possam entender (Mayhue 1986, 106).

    Pode-se comparar aquilo que temos feito com os princpios de interpretao ao

    que (1) os judeus fizeram com seus especialistas da lei, os escribas; (2) os Gnsticos fizeram com sua nfase intelectual e conhecimento secreto, que somente eles

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    dispensavam; e ao que (3) a Igreja Catlica Romana fez na Idade Mdia, com a diviso clrigo/laicato, que continua at o presente. E ns temos novamente tomado a Bblia do alcance da pessoa comum somente para fazer suas verdades disponveis ao especialista. Temos feito com a Bblia o que a medicina fez com os mdicos: um especialista para cada sistema do corpo humano e como se no bastasse, discordando entre si a respeito de diagnsticos e tratamentos. A mesma tendncia afeta quase todas as reas da vida humana contempornea, incluindo as disciplinas acadmicas das faculdades crists e dos seminrios. Com a fartura de informao de que dispomos hoje, nem mesmo os especialistas podem manter-se em seus prprios campos. Ento, como a maioria dos cristos poderia esperar acompanhar a academia do conhecimento bblico, quando nem mesmo os especialistas podem fazer isso? Gordon Fee, em Interpreting the Word of God, fez esta declarao:

    As sugestes apontadas nesse trabalho podem soar to distantes para o homem

    comum, queles a quem a Bblia foi originalmente endereada, que a interpretao acaba se tornando um negcio reservado aos especialistas. Felizmente, o Esprito Santo, como o vento, sopra onde quer (Joo 3.8), e fazendo assim, tem um maravilhoso modo de graciosamente ignorar o especialista e vir diretamente a ns (Schultz e Inch 1976, 126).

    Acredito que devemos concordar que nessa rea da hermenutica (os princpios

    da interpretao bblica) e exegese (a prtica da interpretao) temos inadvertidamente tomado a Bblia das mos daqueles para quem de fato ela foi dada. Daniel Webster comenta o seguinte:

    Eu acredito que a Bblia seja para ser entendida e recebida no significado bvio

    e simples das suas passagens, desde que no posso conformar-me crendo que um livro que para salvao e converso do mundo inteiro tenha encoberto seu significado de forma misteriosa e duvidosa de tal maneira que somente os crticos e filsofos possam descobri-lo (Mayhue 1986, 60).

    Parece-me claramente que a insistncia na educao avanada como uma

    necessidade para interpretar a Bblia deve estar equivocada, diante do fato que a vasta maioria do mundo nunca teve, no tem e nunca ter o nvel de treinamento teolgico que desfrutam Europa e Amrica, desde o Iluminismo.

    Muitas das pessoas creem que livros de referncia, como comentrios e

    dicionrios bblicos, so ferramentas necessrias para o estudo da Bblia. Sem dvida so de enorme ajuda, pois nos do as percepes dos estudiosos da Bblia. Mas muitos cristos, especialmente aqueles em circunstncias humildes, no podem ter esse tipo de ajuda. Ser que devem esperar por essas ferramentas para poder estudar a Bblia? Se sim, muitos tero que esperar para sempre (Sterrett 1973, 33).

    Pode-se estar seguro que o idioma vernculo ir transmitir a maior parte dos fatores gramaticais para a compreenso dos escritos bblicos. Se assim no fosse, a massa da Cristandade seria desqualificada para o estudo bblico, e a Bblia seria acessvel a somente uns poucos privilegiados (Traina 1985, 81).

    A igreja deve voltar a uma balanceada posio entre (1) educao e (2)

    capacitao sobrenatural. H muitos fatores envolvidos em uma adequada compreenso da mensagem bblica, no menos dos quais a motivao espiritual, o compromisso e o dom espiritual do intrprete. Obviamente, uma pessoa com mais

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    instruo ser mais capacitada para alguns aspectos da tarefa, mas no necessariamente as questes cruciais.

    A presena do Esprito Santo e a habilidade da linguagem para comunicar a

    verdade se combinam para dar tudo que voc precisa para estudar e interpretar a Bblia por voc mesmo (Henricksen 1973, 37).

    Podemos afirmar que a interpretao bblica tanto um dom espiritual como

    uma disciplina aprendida? Isso no implica que todos os cristos no tenham o direito e a responsabilidade de interpretar as Escrituras por si mesmos, mas ser que algo alm da educao est envolvido? Uma boa analogia talvez seja o dom do evangelismo. Em ocasies para o testemunho bem claro quando esse dom presente. Sua eficcia e frutos so visveis. Mas isso remove ou diminui dos poucos dotados a responsabilidade bblica de testemunhar? No. Todos os crentes podem aprender a fazer um melhor e mais eficaz trabalho de compartilhar sua f por meio dos estudos (treino) e experincia pessoal, e acredito que isso tambm verdade em relao a interpretar a Bblia. Devemos combinar nossa dependncia do Esprito (Silva 1987, 24-25) com as percepes da educao formal e os benefcios da experincia prtica.

    Pode parecer a essa altura, que estou advogando uma aproximao anti-intelectual da

    interpretao bblica. Certamente esse no o caso. Spurgeon nos adverte disso quando diz, estranho que certos homens que tanto falam do que o Esprito lhes tem revelado se preocupam to pouco com o que Ele tem revelado a outros (Henricksen 1973, 41).

    Isso nos traz a questo de como balanceamos essas duas bvias verdades: (1) A habilidade de Deus em comunicar atravs da sua Palavra ao homem no culto, e (2) como a educao pode facilitar esse processo. Primeiro, gostaria de afirmar que nossas oportunidades para a educao certamente devem ser tomadas em considerao. A quem muito dado, muito ser cobrado (Lucas 12.48). Muitos cristos carecem de motivao para melhorar, mas no carecem de oportunidades. Somos administradores no apenas das nossas oportunidades, mas tambm da nossa motivao e atitude.

    Deus o seu prprio intrprete, mas o estudante da Escritura deve trazer para sua

    tarefa uma mente disciplinada e um corao aquecido. F no oferece atalhos para uma leitura responsvel da Bblia. Nem podemos entregar a tarefa da interpretao bblica a uns poucos especialistas. Nenhum de ns pode evitar a tarefa da interpretao. Sempre ouvimos algum falar, ou se lemos algo que algum tem escrito, interpretamos o que est sendo dito. No diferente quando abrimos a Bblia. A questo no quando abrimos a Bblia. A questo no se necessitamos interpretar, mas como melhor ou pior fazemos isso (Jasen 1986, 17).

    Sobre a necessidade do corao aquecido, gostaria de acrescentar que embora nosso corao possa assim estar, ele ainda pecaminoso (Silva 1987, 23, 118). Precisamos sempre tomar muito cuidado ao vincular nossa compreenso da Bblia ao entendimento de Deus. Todos ns temos sido, e continuamos a ser, afetados pelo pecado. Em ltima anlise, nem nossos melhores princpios hermenuticos ou procedimentos exegticos nem um corao aquecido podem sobrepujar nossa propenso para o pecado. Por isso a humildade deve acompanhar nossas interpretaes.

    Uma hermenutica adequada demanda uma postura de humildade. Isso inclui no

    somente a humildade para aprender de outros, mas o mais importante: a humildade de

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    estar sob o julgamento da prpria Palavra que est interpretando. Apesar da tarefa do intrprete requerer estudo e julgamento, sua tarefa ltima deixar a Palavra que ele est estudando se enderear a ele e cham-lo a obedincia (Gordon Fee citado em Shultz e Inch 1976, 127).

    Outra possvel soluo o conceito de graus variados ou nveis de

    interpretao. bvio que as pessoas sem treinamento no tero a profundidade de conhencimento dos intrpretes que estudaram. Mas isso no significa dizer que conhecimento incompleto seja conhecimento defeituoso.

    Dizer que entendemos a Palavra de Deus no significa dizer que podemos

    entender tudo, resolver todos os problemas da interpretao e ter as respostas a todas as questes. O significado preciso de algumas coisas parece estar ainda secreto (Sterrett 1973, 16)

    Se for assim, todo o conhecimento humano est na mesma categoria. A tarefa

    do Esprito de guiar os filhos de Deus na verdade (Joo 14.26; 16.13-14; 1 Joo 2.20-21) apenas expandida pelas nossas habilidades intelectuais. O bsico da f crist pode ser entendido por qualquer um por meio de uma simples leitura da Bblia numa traduo que se possa compreender. na rea de maturidade e equilbrio que a educao crist se torna uma ajuda de inestimvel valor. Ns podemos confiar no Esprito na rea da interpretao. Certamente haver m compreenso de algumas coisas e problemas, mas os estudiosos acadmicos esto por acaso livres delas? A necessidade crucial para a igreja moderna envolver todos os cristos em um estudo da Bblia significativo, pessoal e dirio por eles mesmos. E tal necessidade requer treinamento nas tcnicas interpretativas que eles possam compreender e utilizar.

    O desafio da igreja sublinhar o estudo individual da Bblia entre aqueles que creem na Bblia (Osborne e Woodward 1979, 13).

    Mais ainda pode ser acrescentado:

    estudo profundo da Bblia, como temos visto, significativo para todo crente,

    seja um leigo estudante da Palavra ou um profissional cristo. Devemos lembrar que Deus no requer de ns brilhantismo, mas que sejamos fiis. Gastar uma grande quantidade de tempo em detalhado estudo da Escritura no nos torna gnios, mas faz de ns crentes disciplinados. Fidelidade e disciplina so dois lados de uma mesma moeda (Osborne e Woodward 1979, 82).

    As tcnicas hermenuticas devem ser reduzidas a conceitos do senso comum,

    pois elas devem realmente envolver nada mais que simples aplicao da razo humana e das habilidades da linguagem (Fee 1982, 16; Sire 1980, 51). Deus quer se comunicar conosco, e ns de forma to insuficiente queremos entender Sua mensagem. As tcnicas necessitam equilibrar o processo analtico individual enquanto fornecem um bom e confivel material de referncia to rpido quanto possvel ao processo. Isso particularmente verdadeiro em relao ao material de pano de fundo histrico e cultural. Gordon Fee oferece essas sugestes de grande ajuda:

    No deixe que o no especialista se desespere; mas deixe-o preparado para estudar,

    no simplesmente para devocionalizar o texto. Para o estudo ele deve usar essas ferramentas bsicas: (a) Mais de uma boa traduo contempornea. Isso ir assinalar os momentos em que os problemas ocorrem. Ele deve estar certo de usar tradues que reconhecem as diferenas entre prosa e poesia e estar consciente dos pargrafos. (b) Ao

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    menos um bom comentrio, especialmente um que leve em conta os princpios hermenuticos apresentados nesse estudo (por exemplo, C. K. Barrett, em I Cor.; F. F. Bruce, em Hebreus; R. D. Brown em Joo). Novamente, consultar vrios ir geralmente possibilitar avaliar diversas opes. (c) Seu prprio senso comum. A Escritura no cheia de significados obscuros que devem ser escavados por mineiros em minas sombrias. Tente descobrir o que claramente pretendido pelo autor bblico. Essa inteno geralmente repousa sobre a superfcie e necessita somente de um pequeno insight na gramtica e histria para tornar-se visvel. Muito frequentemente esse significado repousa bem na superfcie e o profissional o perde porque est muito preocupado em escavar primeiro e olhar depois. Nessa hora, o no profissional tem muito a ensinar ao profissional. (Gordon Fee em Interpreting the Word of God, citado em Shultz e Inch 1976, 127).

    Uma Palavra ao Leigo

    Para muitas pessoas leigas, h um crescente desinteresse e indiferena para

    com o estudo bblico pessoal. Muitos desejam algum pra lhes interpretar a Bblia. Tal coisa ressoa do princpio bblico do sacerdcio do crente, que foi to entusiasticamente reforado pela Reforma. Ns todos somos responsveis por conhecer a Deus atravs de Cristo e por entender para ns mesmos Sua vontade para nossas vidas (i.e., competncia da alma). No delegamos essa maravilhosa responsabilidade a outro, no importa o quanto respeitamos tal pessoa. Afinal, todos ns prestaremos contas a Deus sobre nosso entendimento da Bblia e sobre como vivenciamos seus ensinos (cf. 2 Cor 5.10). Por que a razo o material de estudo bblico pr-digerido (sermes, comentrios) to evidente nos dias de hoje? Primeiro, creio que o enorme nmero de interpretaes to prontamente disponveis na cultura ocidental tem causado grande confuso. como se ningum concordasse a respeito da Bblia. Mas esse no o caso. Contudo, importante distinguir entre verdades principais, verdades crists histricas e questes perifricas. Os pilares centrais da f crist so compartilhados por todas as denominaes. Refiro-me a doutrinas sobre a pessoa e obra de Cristo, o desejo de Deus de salvar, o lugar central da Bblia e outras verdades que so comuns a todos os cristos. Pessoas leigas precisam ser treinadas para distinguir entre o trigo e a palha. O fato de haver muitas interpretaes disponveis no nos isenta da responsabilidade de escolher aquelas que esto mais de acordo com a inteno autoral inspirada expressa em um contexto bblico. Mas no apenas a variedade de interpretaes uma barreira, mas tambm as tradies denominacionais do intrprete. Com frequncia, leigos sabem o que o texto bblico significa antes mesmo de estud-lo ou l-lo por si mesmos. Frequentemente nos tornamos to confortveis em um sistema teolgico que esquecemos os problemas que esses sistemas criados pelos homens tm causado atravs da histria da igreja. Tambm nos esquecemos de quantos sistemas diferentes, aparentemente conflitantes, existem na comunidade crist. No devemos nos limitar quilo com o que somos familiares! Devemos fazer um esforo para remover as lentes da tradio denominacional e cultural e ver a Bblia luz do seu prprio tempo. Tradies denominacionais e culturais podem ser de grande ajuda, mas devem sempre estar sujeitas a Bblia, e no o contrrio. um pouco doloroso examinar o que temos aprendido, mas crucial que o faamos, individualmente, sem considerar nesse aspecto pastores, professores, cnjuge, amigos ou nossa educao parental. Devemos compreender que todos temos sido afetados, no somente por nossos pais, nosso lugar de nascimento, nosso tempo de nascimento, mas tambm por nossas experincias pessoais e tipo de personalidade. Tudo isso influencia grandemente como

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    interpretamos a Bblia. No podemos eliminar ou mudar estes fatores, mas podemos reconhecer sua presena, que nos ajudar a no sermos indevidamente influenciados por eles. Todos ns somos historicamente condicionados. Havia um tempo na Amrica quando os leigos conheciam a Bblia tanto quanto os pregadores, mas em nossos dias de especializao e invaso da mdia das massas, fizemos opo pelo especialista. Contudo, a interpretao bblica devemos fazer por ns mesmos. Claro que isso no significa que no iremos consultar os dotados, chamados, e treinados lderes cristos, mas no podemos permitir que a interpretao deles se torne a nossa, sem uma anlise bblica pessoal, individual e piedosa. Todos ns somos afetados pelo pecado, mesmo depois de salvos. Isso afeta todo aspecto da nossa compreenso sobre Deus e sobre seus propsitos. Devemos reconhecer a grande verdade que nosso entendimento nunca ser o entendimento de Deus. Precisamos nos agarrar s verdades principais do Cristianismo, mas tambm permitir expresso mxima da interpretao e prtica nas reas no perifricas ou no essenciais. Necessitamos cada qual decidirmos onde ficam os limites e vivermos de modo adequado, pela f, amor, na luz que temos da Escritura. Sumarizando, acredito que a igreja deva devotar mais energia na comunicao dos princpios para uma compreenso correta da inteno do autor bblico inspirado antigo. E ns, como leitores da Bblia, devemos tambm reduzir nossas pressuposies encadeadas na tradio, no denominacionalismo ou nas experincias, de forma que possamos verdadeiramente buscar a mensagem do escritor bblico inspirado, mesmo quando essa possa violar nossos vieses pessoais ou tradies denominacionais. Devemos deixar de lado nossas tcnicas de texto-prova e irmos em direo a uma interpretao verdadeiramente contextual do autor bblico original. A nica pessoa inspirada na interpretao bblica o autor original. Os crentes devem reexaminar seus objetivos e motivos luz de Efsios 4.11-16. Queira Deus nos guiar na plenitude da Sua Palavra em pensamentos e aes.

    II. A Experincia do Autor no Ensino da Hermenutica em Igrejas Locais, Classes, e

    Seminrios

    Como pastor por quinze anos e professor universitrio por dezesseis, tive ampla oportunidade de observar e discutir questes hermenuticas com cristos de diversos grupos denominacionais. Tenho pastoreado em igrejas batistas do sul (EUA) e ensinado em trs faculdades batistas do sul (extenso de Wayland Baptist University, Lubbock, Texas; The Hispanic School of Theology, Lubbock, Texas; e East Texas Baptist University, Marshall, Texas), e numa faculdade bblica carismtica (Trinity Bible Institute, Lubbock, Texas). Desde que aposentado, tenho ministrado cursos por muitos anos no seminrio Emas, no Haiti (OMS Emmaus Seminary); no seminrio batista armnio em Yerevan, Armnia, e no seminrio interdenominacional de Novi Sod, Srvia. Tambm sou membro associado da Igreja Metodista Unida (United Methodist Church) e da Igreja Presbiteriana da Amrica (Presbyterian Church of America). Fiz meu trabalho doutoral em um seminrio interdenominacional, o Trinity Evangelical Divinity School em Chicago. Isso tem me permitido ministrar para diferentes linhas por muitos anos. Um tema comum que tem sido desenvolvido nessas discusses a bvia carncia de treinamento nos conceitos hermenuticos e procedimentos. Muitos cristos, ao interpretar a Bblia, dependem de

    1. Textos-prova 2. Literalizao

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    3. Alegoria/moralismo 4. Doutrinamento denominacional 5. Experincia pessoal 6. Condicionamento cultural

    H uma desesperada necessidade de uma aproximao hermenutica textual,

    verificvel e consistente. crucial que os princpios hermenuticos sejam apresentados em (1) Linguagem no-tcnica; (2) Princpios declarados de modo simples; e (3) Princpios que possam ser demonstrados com muitos exemplos bblicos relevantes. Os leigos respondem prontamente a uma abordagem hermenutica simplificada que pode providenciar um procedimento mais consistente e confivel para a interpretao pessoal das Escrituras. Muitos leigos sentem a relatividade de grande parte do estudo bblico ao qual eles so apresentados nas igrejas locais, na literatura crist e tambm na mdia. Tenho ensinado hermenutica em muitos contextos:

    1. Seminrios livres 2. Seminrios em igrejas locais 3. Escolas bblicas dominicais 4. Faculdades 5. Classes universitrias

    Em cada um desses contextos tenho encontrado leigos que esto abertos e ansiosos

    por responder a uma abordagem de estudo bblico consistente e verificvel. H uma verdadeira fome por compreender a Bblia e viver luz dos seus ensinos. Mas h tambm uma enorme frustrao por causa de

    1. Multiplicidade de interpretaes 2. Relativismo das interpretaes 3. Arrogncia denominacional conectada com certas interpretaes 4. Falta de habilidade de verificar o que eles tm aprendido no nome de Deus

    Este livro-texto no designado para ser uma apresentao tcnica, exaustiva e

    acadmica da hermenutica, mas uma introduo para a maioria dos crentes a abordagem contextual/temtica da escola de interpretao textual (i.e., Antioquia da Sria) e a aplicao desses princpios na vida e estudo dirio. A Introduo ir focar em cinco reas especficas:

    1. A necessidade de treinamento hermenutico 2. Princpios contextuais e textuais da hermenutica bblica 3. Algumas das principais armadilhas da hermenutica contempornea 4. Alguns procedimentos de orientao metodolgica, e 5. Os recursos de estudo bblico disponveis aos leigos que falam portugus.

    Este livro-texto foi designado para elevar o interesse e o desejo dos cristos por

    interpretar as Escrituras por si mesmos. reconhecidamente um passo inicial, mas no obstante crucial. A Bibliografia fornece numerosos recursos adicionais para posterior estudo tcnico da Bblia. O objetivo maior desse livro-texto que se reconhea que h um problema nos nossos mtodos populares de interpretao bblica e que h uma abordagem mais consistente, verificvel disponvel aos leigos. E como uma jornada de

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    milhas comea com um primeiro passo, essa Introduo ir iniciar os leigos no emocionante caminho do estudo bblico pessoal, dirio, que transforma o estilo de vida.

    III. A Questo da Autoridade

    Pessoalmente, a questo se h ou no um Deus nunca na realidade foi uma questo para mim. Eu, seguindo os escritores bblicos, tenho assumido a existncia de Deus. Nunca senti a necessidade de argumento filosfico para apoiar minha f neste ponto. As cinco provas da existncia de Deus por Toms de Aquino so interessantes para quem procura evidncias racionalistas para o assunto. No entanto, mesmo os argumentos filosficos no provam de fato a existncia do Deus da Bblia, o Pai do nosso Senhor Jesus Cristo. Na melhor das hipteses eles somente apontam uma necessidade lgica, um motor no movido, ou uma causa primeira. Igualmente, a questo sobre se podemos conhecer a Deus (filosofia grega) nunca tem sido uma preocupao central para mim. Tenho assumido que Deus est tentando comunicar-se conosco. E isso no verdade somente na revelao natural: (1) Deus testemunha por meio da criao (Sl 19-1-6; Rm 1.19-20) e no (2) testemunho moral interior da humanidade (Rm 2.14,15), mas exclusivamente na revelao escrita de Deus (2 Tm 3.15-17). Deus tem falado por meio de eventos, leis, e profetas (cf. Mt 5.17-19). Ele tem falado do modo supremo no Seu Filho (Jo 1.1-14; Heb 1.1-3; Mt 5.21-48). A questo central para mim girava em torno do que Deus estava dizendo. Esse interesse se desenvolveu desde muito cedo na minha vida crist. Desejando conhecer a Bblia fiquei horrorizado diante de todas as diferentes interpretaes das Escrituras. Era como se cada um tivesse sua prpria opinio a respeito da Bblia, com frequncia baseada em seu tipo de personalidade, ou no pano de fundo denominacional, experincia pessoal ou formao parental. Eles estavam convencidos e tambm convenciam. Eu ficaria surpreso se, com algum grau de certeza, algum deles pudessem realmente saber o que Deus estava dizendo. No seminrio eu fui finalmente introduzido ao conceito de autoridade bblica. Ficou claro para mim que a Bblia era a nica base para a f e prtica, e que isso no era um clich para defender algumas teologias e metodologias tradicionais. Era uma resposta especfica para a questo da autoridade. Mesmo depois de aceitar a autoridade da Bblia como devidamente interpretada, ainda permanecia a difcil tarefa de saber qual sistema hermenutico o melhor, e a mesma desorientao que senti no labirinto das interpretaes encontrei na rea da hermenutica. Na realidade, a divergncia de princpios hermenuticos expressos e no expressos, conscientes e no conscientes, pode ser realmente a causa da multiplicidade de interpretaes. Os princpios hermenuticos eram extremamente difceis de analisar porque eles mesmos no so inspirados, mas foram desenvolvidos em diferentes tradies teolgicas e atravs de crises histricas. E h intrpretes devotos em todos os diferentes sistemas. Como ento se decide qual sistema usar? A questo bsica pra mim repousa na verificabilidade e consistncia, e estou certo disso porque vivo em tempos dominados pelo mtodo cientfico. Contudo preciso alguns limites na interpretao. Existe ambivalncia na hermenutica porque ela ao mesmo tempo um dom (arte) e um conjunto de diretrizes lgicas para compreenso da linguagem humana (cincia). Qualquer que sejam os princpios da interpretao, eles devem balancear essas duas perspectivas.

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    A escola de Antioquia (Sria) de interpretao ofereceu o melhor equilbrio disponvel. O seu enfoque contextual/textual permite ao menos alguma medida de verificabilidade. Nunca haver unanimidade, mas ao menos ela sublinhou a importncia de interpretar as Escrituras no seu sentido normal e bvio. Deve-se admitir que sua abordagem era basicamente uma reao histrica contra a escola alegrica de Alexandria (Egito). Essa uma simplificao (Silva 1987, 52-53), mas ainda de boa ajuda us-la ao analisarmos as duas abordagens bsicas de interpretao bblica da igreja. A escola de Antioquia, com sua metodologia aristotlica, proveu uma adequada base lgica para a interpretao da Reforma/Renascena, que define o cenrio para nossa orientao cientfica moderna. A abordagem contextual/textual da interpretao permite que a Bblia fale primeiro ao seu prprio tempo (um significado), e depois aos nossos dias (vrias aplicaes), o que preenche a lacuna temporal e cultural em uma metodologia aceitvel para a comunidade intelectual dos nossos dias. Eles a aceitam porque basicamente o mesmo mtodo que usado para interpretar toda a literatura antiga, e ele se encaixa com as formas do pensamento da mentalidade acadmica moderna. Assim que a hermenutica se tornava uma preocupao central no meu ministrio, comecei a analisar a pregao, ensino, e os escritos religiosos com mais cuidado. Foi apavorante ver os abusos que eram feitos no nome de Deus. como se a igreja louvasse a Bblia e depois pervertesse a sua mensagem. E no era verdade apenas com respeito aos leigos, mas tambm com respeito aos lderes das igrejas. No era uma questo de piedade, mas sim verdadeira ignorncia dos princpios bsicos de interpretao. A alegria que encontrei ao conhecer a Bblia por meio da inteno e propsito do autor foi simplesmente algo inimaginvel para os crentes amveis e compromissados. Decidi ento desenvolver um livro-texto com a inteno de introduzir leigos aos princpios bsicos de interpretao do mtodo de Antioquia, o mtodo com enfoque contextual/textual. quela poca (1977) no havia muitos livros disponveis sobre hermenutica, o que era especialmente verdade para os leigos. Tentei aumentar o interesse pela exposio das nossas interpretaes defeituosas assim como nossos vieses conscientes, combinando isso com uma explanao do mtodo contextual e uma lista de erros teolgicos comuns encontrados nas nossas interpretaes. Finalmente, uma sequencia de procedimentos foi proposta com o fim de ajudar os crentes sobre como caminhar atravs das diferentes tarefas hermenuticas e sobre o tempo certo de fazer consulta e uso das ferramentas de pesquisa.

    IV. A Necessidade de Procedimentos Hermenuticos No-Tcnicos

    A. Indiferena entre os Crentes

    Esse problema permaneceu em meu corao como pastor por muitos anos. Estou dolorosamente consciente do declnio do conhecimento bblico entre os crentes em nossos dias. Essa carncia de conhecimento tem sido a raiz de muitos problemas na igreja contempornea. Eu sei que os crentes modernos amam a Deus tanto quanto as geraes passadas amaram a Ele e Sua Palavra, ento qual a causa da degenerao da nossa compreenso, no somente a respeito do contedo da Escritura, mas tambm sobre o seu significado e sobre como ele pode ser aplicado hoje? Em minha opinio, um senso de frustrao tem feito com que a maioria dos cristos se tornasse indiferente e aptica em relao ao estudo e interpretao da Bblia. Essa apatia se pode discernir em vrias reas da vida moderna. Um dos grandes problemas nossa atitude cultural de consumismo. Ns como pessoas somos

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    acostumados com a gratificao instantnea de todos os nossos feitos. Nossa cultura tem transformado a mentalidade de indstria fast food em uma norma cultural. Somos acostumados com um produto instantaneamente consumido e prontamente disponvel. A maturidade crist baseada no conhecimento bblico e no estilo dirio de vida no pode se harmonizar com essa expectativa cultural. O conhecimento da Bblia s acessvel por meio do preo de uma vida de orao, persistncia, treinamento, estudo regular e aplicao pessoal. Mas infelizmente muitos dos crentes modernos esto seguindo o materialismo americano do sculo 21 e no desejam pagar tal preo pessoal. Igualmente, a dicotomia antibblica de clero/leigos tem acentuado o problema. Por pouco nossa mentalidade assustadora no tira completamente dos leigos o senso do dever de estudar a Bblia pessoalmente. O refro deixe o pregador fazer isso tem se tornado nossa mentalidade. O problema com essa mentalidade , E se o pastor interpretar mal? ou E se voc mudar de pastor? Essa atitude aptica se afasta da verdade bblica que a Reforma reenfatizou (Lutero), a doutrina da competncia da alma (1Pe 2.5,9; Ap 1.6). Essa atitude refora o enfoque de retirar de ns a responsabilidade espiritual e a direcionarmos a outros. Os lderes das igrejas ento se tornam gurus ou intermedirios em vez de treinadores (Ef 4.11-12). Ns no apenas temos como cultura dividido a vida em secular e sagrado, mas temos tambm delegado o sagrado a substitutos. Outra causa principal para apatia entre a maioria dos crentes modernos na rea do estudo bblico, a tendncia crescente de especializaes. O estudo bblico tem se tornado o domnio tcnico de especialistas treinados. Os princpios e procedimentos so to complicados que as pessoas se sentem incapazes a no ser que tenham vrios graus doutorais: Lingustica, Grego, Hebraico, Hermenutica e Teologia. No fim das contas esse problema introduz o perigo do gnosticismo moderno, em que a verdade espiritual acessvel somente a uma elite intelectual. Mas claro, nem os da elite concordam plenamente entre si, porque nem mesmo as habilidades tcnicas trazem consenso. Isso nos traz para a prxima razo para apatia, que a multiplicidade de interpretaes. Os confrontos no so apenas de diferentes denominaes, mas mesmo dentro de uma mesma h divergncia de opinies. No de surpreender que a maioria dos crentes se confunda diante de tanto desacordo, que geralmente se apresenta como um vigoroso estilo dogmtico. B. Dogmatismo Entre os Crentes

    Por acaso surpreende que haja confuso e relutncia em se envolver com o

    processo de interpretao? Ao lado desses fatores externos mencionados previamente, h muitos fatores internos. Se h uma apatia pelo envolvimento no estudo da Bblia, tambm parece que uma vez que a deciso feita para superar aquela apatia, uma imediata polarizao e exclusivismo resultam. O nvel de dogmatismo entre os estudantes ocidentais modernos muito grande. Isso parece envolver vrios fatores. O primeiro frequentemente relacionado com a tradio espiritual. Com frequncia o dogmatismo uma resposta aprendida de nossos pais ou mestres das igrejas que pode ser tanto a completa identificao com sua viso e prtica ou a completa rejeio de sua posio. Essa transferncia, assimilao, ou reao negativa geralmente sem relao com o estudo pessoal da Bblia. Frequentemente nossos vieses, pressuposies e a priores so transmitidos atravs da famlia.

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    Se nossos pais no nos carimbam com sua viso espiritual, asseguradamente nossa denominao o far. Muito do que ns cremos no resultado do estudo da Bblia, mas da doutrinao denominacional. Hoje poucas igrejas ensinam sistematicamente o que creem e por qu. Esse problema afetado no somente pelo denominacionalismo, mas pela localizao geogrfica da igreja. Assim como bvio que a era (ps-modernidade) em que vivemos afeta nosso sistema de f, assim tambm o faz a localizao geogrfica. O paroquialismo to significante nessa questo quanto o parentalismo ou a tradio denominacional. Por mais de trinta anos estive envolvido com evangelismo de parcerias e tive membros das igrejas e estudantes em viagens missionrias para trabalhar com igrejas da minha denominao em pases estrangeiros, e tenho ficado surpreso ao ver como so diferentes as expresses de f de igrejas da mesma tradio denominacional! Esse fato realmente abriu meus olhos para a doutrinao paroquial e denominacional (no da leitura da Bblia) que tem afetado a todos ns. A segunda causa central do dogmatismo entre os crentes relacionada a fatores pessoais. Assim como somos afetados pelo tempo, lugar, e pais, assim tambm, somos igualmente impactados por nossa prpria pessoalidade. Esse conceito ser desenvolvido com mais detalhes em sees subsequentes desse livro-texto, mas necessrio mencionar no incio quanto de nosso tipo de personalidade, experincia pessoal, e dom espiritual afetam nossas interpretaes. Frequentemente nosso dogmatismo pode ser expresso como se isso aconteceu comigo deve acontecer com voc, e se isso nunca aconteceu comigo, deveria nunca acontecer com voc. Ambas frases so falsas!

    V. Pressuposies Bsicas sobre a Bblia

    Neste ponto eu preciso ser o mais transparente o possvel e tentar desvelar

    minhas suposies. Se ns somos to afetados por fatores no-bblicos, por que motivo esse livro-texto no seria apenas mais um na srie? No estou chamando voc para concordar comigo, mas quero providenciar uma metodologia verificvel mais consistente para o estudo pessoal da Bblia (no-tcnico). A metodologia no inspirada, mas um desenvolvimento do modelo cristo antigo. Minhas pressuposies bsicas so:

    A. A Bblia, tanto o Antigo quanto o Novo Testamento, vem do Deus Redentor, o

    nico Deus e Criador. Ele nos deu por meio da instrumentalidade humana para que possamos compreend-lo e saber sua vontade para nossas vidas (cf. 2 Tim 3.15-17). Ela autoridade absoluta.

    B. A Bblia, assim como a hermenutica, no um fim em si mesma, mas um meio de encontro pessoal com Deus (Grant e Tracy 1984, 177; Carson 1984, 11; Silva 1987, vi). Deus tem claramente falado conosco pela Bblia e muito mais claramente em Seu Filho, Jesus Cristo (Heb. 1.1-3). Cristo o foco de toda a Escritura. Ele o seu coroamento, plenitude, e objetivo. Ele o Senhor da Escritura. Nele a revelao completa e final (Joo 1.1-18; 1 Cor 8.6; Col 1.13-20).

    C. A Bblia escrita em linguagem normal, no tcnica. Seu foco o normal e bvio significado das palavras, oraes e sentenas (Silva 1987, 42). O Esprito Santo deu declaraes simples da verdade. Mas isso no dizer que a Bblia no tenha ambiguidades, que no contm expresses idiomticas culturais, ou que ela no contm passagens difceis e, neste ponto, erros de escribas. Contudo ela

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    no tem significados ocultos ou secretos. Ela no contraditria (analogia da f) embora contenha tenses dialticas e paradoxais entre suas verdades.

    D. A mensagem da Bblia primariamente redentiva e entendida por todos os seres humanos (Ez 18.23,32; Jo 4.42; 1 Tim 2.4; 4.10; 2 Pe 3.9). Ela para o mundo, no exclusivamente para Israel (Gn 3.15; 12.3; Ex 19.5-6). Ela para o mundo perdido (cado), no apenas para a igreja. Ela para os seres humanos comuns, no apenas para os dotados de espiritualidade ou intelectualidade.

    E. O Esprito Santo um indispensvel guia para o adequado entendimento. 1. Deve haver um balano entre o esforo humano e piedade (2 Tim 2.15) e a

    direo do Esprito (Jo 14.26; 16.13-14; 1 Jo 2.20-21,27). 2. Interpretao bblica possivelmente um dom espiritual (como evangelismo,

    caridade, ou orao) ainda que seja tambm tarefa de todos os crentes. Embora seja um dom, por meio de uma anlise dos que o receberam todos ns podemos fazer um melhor trabalho.

    3. H uma dimenso espiritual acima do alcance intelectual humano. Os autores originais frequentemente registraram mais do que eles entenderam (eventos futuros, aspectos da revelao progressiva e profecia de mltiplos cumprimentos). Os ouvintes originais com frequncia no compreendiam a mensagem inspirada e suas implicaes. O Esprito nos ilumina para compreendermos a mensagem bsica dos escritores bblicos. Talvez no entendamos todos os detalhes, mas ento, quem pode? O Esprito o verdadeiro autor da Escritura.

    4. A Bblia no fala diretamente sobre toda questo moderna (Spire 1980, 82). Ela ambgua em muitas reas. Algo dela localizado no contexto histrico original (e.g. 1 Cor 15.29) e outras partes so escondidas atrs do ainda no da histria (e.g., Dn 12.4). Deve ser lembrado que a Bblia verdade anloga, no verdade exaustiva. E ela adequada para f e para vida. No podemos saber tudo, nem sobre Deus nem sobre uma doutrina especfica, mas podemos saber o que essencial (Silva 1987, 80).

    VI. Declaraes Gerais sobre o Mtodo Contextual/Textual

    Este livro-texto basicamente uma introduo ao mtodo de interpretao bblica literal ou contextual/textual. Este mtodo se desenvolveu no terceiro sculo A.D em Antioquia, Sria, em reao ao mtodo alegrico, que foi previamente desenvolvido em Alexandria, no Egito. O desenvolvimento histrico e a explicao dessa metodologia sero apresentados em lies posteriores. Nessa seo introdutria deixe-me fazer algumas declaraes sobre o mtodo de Antioquia. A. o nico mtodo disponvel que prov controle sobre a interpretao que

    permite outros verificarem, a partir do texto, uma dada interpretao. Providencia uma medida de segurana e consistncia de tal forma que se pode interpretar a passagem propriamente na luz da inteno do autor original inspirado. Como Gordon Fee diz, Uma Bblia que pode significar qualquer coisa, significa nada.

    B. No um mtodo para especialistas ou lderes da igreja somente, mas um meio de voltar aos ouvintes originais. Esses ouvintes originais devem ter entendido a mensagem em seu prprio meio cultural e contexto existencial. Por causa do tempo, linguagem e cultura, a tarefa de entender o contexto original e a

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    mensagem se torna cada vez mais difcil (Virkler 1981, 19-20). Aquilo que facilmente perceptvel se perde muitas vezes na histria, cultura ou idioma. Portanto, o conhecimento da histria e cultura se torna essencial. Conhecer a linguagem original, sua estrutura, e expresses se torna de grande ajuda. Por causa da lacuna cultural e lingustica, nos tornamos pesquisadores, ou ao menos, leitores de pesquisadores competentes.

    C. Nossa primeira e ltima tarefa na interpretao entender da melhor maneira possvel o que os autores bblicos estavam dizendo nos seus dias, o que os ouvintes originais estavam entendendo, e como essas verdades so aplicveis a nossa cultura e a nossa vida pessoal. Sem esses critrios, no h interpretao que tenha significado!

    Neste ponto, deixe-me elencar algumas questes contextuais e de contedo que se deve fazer a todo texto bblico. 1. O que o autor original disse? (criticismo textual) 2. O que o autor original quis dizer? (exegese) 3. O que o autor original disse em outro lugar sobre o mesmo assunto?

    (passagens paralelas) 4. O que outros autores bblicos disseram sobre o mesmo assunto?

    (passagens paralelas) 5. Como os ouvintes originais entenderam a mensagem e como

    responderam a ela? (aplicao original) 6. Como a mensagem original se aplica ao meu dia? (aplicao moderna) 7. Como a mensagem original se aplica a minha vida? (aplicao pessoal)

    VII. Alguns Comentrios Gerais para o Leitor

    A. O pecado afeta a interpretao de todos (mesmo depois da salvao); afeta a educao, orao e a sistematizao. Eu sei que ele me afeta, mas nem sempre entendo como e onde. Portanto, cada um de ns deve filtrar seu estudo por meio do Esprito Santo que habita em ns. Observe meus exemplos, pondere sobre a lgica e me permita alargar os seus conceitos.

    B. Por favor, no julgue ou rejeite esse livro-texto com base unicamente no que voc tem ouvido ou acreditado. D-me ao menos a oportunidade de desafiar suas compreenses tradicionais. Com frequncia digo aos meus alunos, S por que eu disse algo que vocs nunca ouviram, no significa que sou um misterioso!

    C. Os exemplos que eu uso so controversos. Eles so colocados para fazer voc pensar e reexaminar suas tcnicas de estudo bblico e sua teologia pessoal. Por favor, no se envolva tanto nas ilustraes desses princpios hermenuticos ou procedimentos exegticos a ponto de perder a metodologia que estou tentando apresentar. Esses exemplos servem para: 1. Mostrar interpretaes alternativas 2. Mostrar aspectos inadequados nas interpretaes 3. Ilustrar princpios hermenuticos 4. Chamar e fixar sua ateno

    D. Por favor, lembre-se de que no estou tentando transmitir a voc minha teologia pessoal, mas introduzindo voc em uma metodologia hermenutica crist antiga e em suas aplicaes. No estou procurando que voc concorde comigo, mas desafiando voc a implementar procedimentos interpretativos. Princpios que,

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    mesmo que no respondam a todas as nossas questes, ao menos nos ajudaro a reconhecer quando algum diz menos ou mais do que a prpria passagem da Escritura diz.

    E. Esse livro-texto no primariamente designado a novos cristos. Ele para crentes que esto lutando com maturidade e procurando por expressar sua f em categorias bblicas. Maturidade um processo carregado de tenso de autoexame e estilo de vida na f. uma peregrinao que nunca cessa.

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    A BBLIA

    I. O Cnon

    Considerando que este livro-texto basicamente uma introduo aos princpios contextuais/textuais de interpretao bblica, parece bvio que primeiro necessitamos olhar para a prpria Bblia. Para o propsito deste estudo iremos assumir a direo do Esprito na formao do cnon (a maior de todas as pressuposies).

    A. Pressuposies Gerais do Autor

    1. Deus existe e quer que O conheamos 2. Ele tem revelado a Si mesmo a ns

    a. Ele agiu na histria (revelao) b. Ele escolheu certas pessoas para registrar e explicar Seus atos

    (inspirao) c. Seu Esprito ajuda o leitor (ouvintes) da sua revelao escrita a entender

    suas principais verdades (iluminao)

    3. A Bblia a nica fonte digna de confiana da verdade acerca de Deus (eu sei sobre a vida de Jesus somente atravs da Bblia). Toda sua coleo nossa nica fonte de f e prtica. Livros do AT e do NT, escritos para tempos e ocasies especficos, agora so orientaes inspiradas para todas as ocasies e pocas. Contudo, eles contm verdades culturais que no transcendem seu prprio tempo e cultura (i.e., poligamia, guerra santa, escravido, celibato, lugar da mulher, uso de vu, beijo santo, etc.).

    B. Eu percebo que o processo de canonizao um processo com alguns lamentveis eventos e incidentes, mas minha pressuposio que Deus guiou seu desenvolvimento. A igreja antiga aceitou os livros reconhecidos do AT que eram aceitos pelo Judasmo. Por meio da pesquisa histrica, evidente que as igrejas antigas, no apenas os conclios, decidiram o cnon do Novo Testamento. Aparentemente os critrios seguintes foram envolvidos, de modo consciente ou no.

    1. O Cnon Protestante contm todos os livros inspirados; o cnon est fechado!

    (i.e., a f (At 6:7; 13:8; 14:22; Gl. 1:23; 6:10; Jd vv. 3,20). a. AT aceito pelos judeus b. Trinta e sete livros no NT (um processo histrico progressivo)

    2. Autores do Novo Testamento tiveram contato com Jesus ou um Apstolo (processo histrico progressivo).

    a. Tiago e Judas, com Jesus (seus meios-irmos) b. Marcos, com Pedro (seus sermes em Roma se transformando em um

    Evangelho) c. Lucas, com Paulo (parceria missionria) d. Hebreus, tradicionalmente com Paulo

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    3. Unidade teolgica com treinamento apostlico (mais tarde chamado de regra de f). Os Evangelhos foram escritos depois da maioria dos livros do NT.

    a. Por causa do advento da heresia (i.e., Adocionismo, Gnosticismo, Marcionismo, e Montanismo). b. Por causa do tardar da Segunda Vinda c. Por causa da morte dos doze apstolos

    4. As vidas moral e permanentemente transformadas dos ouvintes onde esses livros foram lidos e aceitos

    5. O consenso das igrejas antigas e dos conclios posteriores pode ser visto nas listas dos livros cannicos.

    a. Orgenes (A.D. 185-254) afirma que havia quatro Evangelhos e Epstolas dos Apstolos em circulao entre as igrejas.

    b. O Fragmento Muratoriano data entre 180-200 A.D, de Roma (a nica cpia disponvel hoje um texto latino, danificado). Ele lista 27 livros como o NT Protestante (mas adiciona Apocalipse de Pedro e Pastor de Hermas).

    c. Eusbio de Cesaria (A.D. 265-340) introduziu uma designao trplice (como Orgenes) para descrever os escritos cristos: (1) recebido, e desse modo aceito; (2) disputado, e assim aceito por algumas igrejas, mas no todas; (3) esprio, e desse modo no aceito pela vasta maioria das igrejas e no deve ser lido. Os nicos nessa categoria de disputados que foram finalmente aceitos, foram: Tiago, Judas, 2 Pedro, e 2 e 3 Joo.

    d. A lista de Cheltenham (em Latim), do Norte da frica (A.D. 360), tem os mesmos 27 livros (exceto Hebreus, Tiago, e Judas [Hebreus no especificamente mencionado, mas deve ser includo nas cartas de Paulo]), como o NT Protestante, mas em uma ordem incomum.

    e. A Carta Pascoal de Atansio, de 367 A.D., a primeira a alistar exatamente os mesmos 27 livros (nem mais, nem menos) do NT Protestante.

    f. O conceito e contedos de uma lista autoritativa de livros nicos foi um desenvolvimento histrico e teolgico.

    6. Leituras sugeridas

    a. O The Canon of the New Testament, de Bruce Metzger (Oxford) b. Artigos sobre cnon, na Zondervan Pictorial Bible Encyclopedia, Vol. 1,

    pp. 709-745c. c. Introduction to the Bible, William E. Nix e Norman Geisler (Moody

    Press), 1968 (esp. p. 22) d. Holy Writings Sacred Text: The Canon in Early Christianity, de John

    Barton (Westminster John Knox Press)

    7. O Antigo e Novo Testamentos so apenas produes literrias do Antigo Oriente Prximo que foram canonizadas como recebidas e reveladas de modo especial dos propsitos divinos. No h nenhuma lista religiosa que diferencie entre livros cannicos (i.e., autoritativos) vs. escritos no-cannicos. Como, por qu, e quando este processo histrico aconteceu?

    a. Pelas decises dos conclios das igrejas do terceiro e quarto sculos A.D.?

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    b. Pelo uso de escritores cristos do segundo sculo? c. Foi pelas igrejas do primeiro at o quarto sculo?

    II. Reivindicaes da Inspirao

    Em nossos dias de reivindicaes e declaraes conflitantes sobre a Bblia, sobre a

    autoridade bblica e interpretao, torna-se extremamente importante que foquemos no que a Bblia reivindica para si prpria. Discusses teolgicas e filosficas e suas reivindicaes so interessantes, mas no inspiradas. Categorias e formulaes humanas tm sido sempre culpadas de afirmaes exageradas. crucial que permitamos a Bblia falar por si mesma. Desde que Jesus o foco da nossa f e doutrina, se pudermos ach-lo falando desse assunto, ser boa informao. Ele fez isso em Mateus 5.17-19, na abertura da seo do chamado Sermo do Monte (Mt 5-7). Ele apresenta claramente sua viso a respeito do corpo de literatura sagrada que chamamos de Antigo Testamento. Observe sua nfase na perptua significncia para a vida e f dos crentes. Tambm note o lugar de Cristo no propsito e cumprimento. Esta passagem no apenas d suporte a um Antigo Testamento divinamente inspirado, mas um supremo enfoque na revelao nEle (tipologia cristocntrica). Contudo, prontamente perceptvel que nos vv. 21-26, 27-31, 33-37, e 38-40 que Ele completamente reorienta a interpretao tradicional do Antigo Testamento entre o Judasmo rabnico dos seus dias. A Escritura, ela mesma inspirada, eterna, cristocntrica, mas nossas interpretaes humanas no o so. Esta uma verdade extremamente fundamental. A Bblia, e no nosso entendimento dela, eterna e inspirada. Jesus intensificou a aplicao tradicional centrada nas regras da Tor, e a elevou a um impossvel nvel de atitude, motivao e inteno. A clssica declarao da inspirao bblica vem do apstolo dos gentios, Saulo de Tarso. Em 2 Timteo 3.15-16 Paulo especificamente declara a ddiva divina (literalmente, soprada por Deus) da Escritura. At esse ponto textualmente incerto se devamos incluir todos os escritos do Novo Testamento que conhecemos nessa declarao. Contudo, por implicao eles seguramente so includos. Tambm, em 2 Pedro 3.15-16 os escritos de Paulo so includos na categoria de Escritura. Outra passagem de Paulo que d esse suporte para inspirao encontrada em 1 Tess. 2.13. Aqui, assim como antes, o foco em Deus como a fonte real das palavras do Apstolo. Essa mesma verdade ecoada pelo apstolo Pedro em 2 Pe 1.20-21. No somente as Escrituras so apresentadas como divinas na origem, mas tambm em propsito. Toda Escritura dada aos crentes para sua f e vida (Rm. 4:23-24; 15:4; I Co. 10:6, 11; I Pe. 1:10-12).

    III. O Propsito da Bblia

    A. No um Livro de Regras

    Muito da nossa m compreenso com respeito Escritura comea em nossos enganos relacionados aos seus propsitos. Um modo de estabelecer o que uma coisa estabelecendo o que ela no . A tendncia humana cada em direo ao legalismo, to evidente entre os fariseus, viva e ativa e habita na sua igreja local. Essa tendncia transforma a Bblia em um extensivo conjunto de regras. Por pouco os crentes modernos tm transformado as Escrituras num livro legalista, um tipo de Talmude Cristo. Deve ser vigorosamente declarado que o foco primrio da Escritura a redeno. Ele existe para confrontar, convencer, e fazer a humanidade desobediente

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    voltar-se para Deus (McQuilkin 183, 49). O foco primrio a salvao (2 Tm 3.15), que foca na semelhana com Cristo (2 Tm 3.17). Essa semelhana com Cristo tambm o objetivo principal (Rm 8:28-29; II Co 3:18; Gl. 4:19; Ef 1:4;I Tess 3:13; 4:3; I Pe 1:15), mas o resultado do primeiro objetivo. Ao menos uma possibilidade para a estrutura e natureza da Bblia seu propsito redentivo, e no um livro sistematizado de regras (i.e., no um Talmude cristo). A Bblia no trata com todas as nossas questes intelectuais. Muitas questes so tratadas de modo ambguo ou incompleto. A Bblia no foi desenhada primariamente como um livro de teologia, mas como uma histria seletiva do relacionamento de Deus com sua criao rebelada. Seu propsito no meramente regras, mas relacionamento. Ela deixa reas descobertas de modo que somos forados a andar em amor (1 Co 13), no em regras (Cl 2.16-23). Devemos ver a prioridade do povo feito em Sua imagem (cf. Gn 1.26-27), no as regras. No um conjunto de regras que apresentado, mas um novo carter, um novo foco, uma nova vida. Isso no implica que a Bblia no contenha regras, porque ela tem, mas elas no cobrem toda a rea. Frequentemente as regras se tornam barreiras em vez de pontes na busca da humanidade por Deus. A Bblia nos prov informao suficiente para vivermos uma vida no prazer de Deus; ela tambm nos providencia algumas diretrizes e limites. Seu dom primrio, contudo, o Guia, o Mestre, no as diretrizes. Conhecer e seguir o Mestre at nos tornarmos semelhantes a Ele o segundo objetivo da Escritura.

    B. No um livro de Cincia

    Outro exemplo de tentativa da humanidade de fazer perguntas das Escrituras para as quais ela no foi designada para responder est na rea da moderna pesquisa cientfica. Muitos querem forar as Escrituras dentro da rede filosfica ou lei natural, particularmente em relao ao mtodo cientfico de raciocnio indutivo. A Bblia no um livro-texto divino sobre lei natural. Ela no anticientfica; ela pr-cientfica! Seu propsito primrio no nesta rea. Muito embora a Bblia no fale diretamente a estas questes, ela fala sobre a realidade fsica, contudo, faz isso na linguagem de descrio (linguagem fenomenolgica ), no cientfica. Ela descreve a realidade em termos dos seus prprios dias. Ela apresenta uma viso de mundo mais do que uma imagem do mundo. Isso quer dizer que ela foca mais no que do que no como. Coisas so descritas assim como elas aparecem (i.e., os cinco sentidos) para a pessoa comum. Alguns exemplos so:

    1. Os mortos realmente vivem embaixo da terra? A cultura hebraica, assim como a nossa, enterra seus mortos. Portanto, na linguagem da descrio, eles esto na terra (Sheol ou Hades).

    2. A terra realmente flutua sobre as guas? Isso com frequncia tem relao com o modelo de universo em trs partes. Os antigos sabiam que a gua estava presente sob a terra (i.e., osis). Sua concluso era expressa em linguagem potica.

    3. Mesmo ns, em nossos dias, falamos nessas categorias. a. o sol se levanta b. o orvalho cai

    Alguns livros que tem sido de enorme ajuda para mim nesta rea.

    1. Religion and the Rise of Modern Science, R. Hooykaas 2. The Scientific Enterprise and the Christian Faith, Malcolm A. Jeeves

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    3. The Christian View of Science and Scripture, Bernard Ramm 4. Science and Hermeneutics, Vern S. Poythress 5. Darwinism on Trial, Phillip Johnson 6. Several good books, Hugh Ross, Pensacola Bible Church, Pensacola, FL 7. Science and Faith: An Evangelical Dialogue, Henry Poe and Jimmy Davis 8. The Battle of Beginnings, Del Ratzsch 9. Coming to Peace with Science, Daniel Falk 10. Mere Christianity: Science and Intelligent Design, William Demoski

    C. No um Livro Mgico

    A Bblia no um livro de regras ou de cincia, mas tambm no um livro mgico. Nosso amor pela Bblia tem nos levado a us-la de modos estranhos. Voc j procurou a vontade de Deus em orao e ento deixou sua Bblia abrir-se e colocou seu dedo ali em um verso? Essa prtica comum trata a Bblia como se ela fosse uma bola de cristal ou um divino tabuleiro de Ouija. A Bblia uma mensagem e no um moderno Urim e Tumim (Ex 28.30). Seu valor est em sua mensagem, no em sua presena fsica. Como cristos, levamos a Bblia para o hospital, no porque podemos l-la, mas porque estamos muito doentes. Fazemos isso porque ela representa a presena de Deus a ns. Para muitos cristos a Bblia se tornou um dolo fsico. Sua presena fsica no seu poder, mas sua mensagem sobre Deus em Cristo. Colocar sua Bblia sobre seu corte cirrgico no ir ajudar a cur-lo mais rpido. Ns no apenas precisamos da mensagem da Bblia ao lado da nossa cama, precisamos de sua mensagem em nosso corao. Tenho ouvido pessoas que ficam aborrecidas se algum deixa uma gota de gua cair sobre uma Bblia ou escreve nela. A Bblia no nada mais que pela de vaca (se voc tem uma Bblia daquelas bem caras), polpa de rvore e tinta. Ela s santa em sua conexo com Deus. A Bblia intil a menos que seja lida e seguida. Nossa cultura reverente diante da Bblia e rebelde diante de Deus. H tempos em nosso sistema judicial o individuo tinha que jurar para falar a verdade enquanto colocava sua mo sobre uma Bblia. Se algum crente, de qualquer forma no iria mentir. Se algum est jurando sobre um livro antigo em que ele no acredita e cujo contedo ele no sabe, o que nos leva a crer que ele no ir mentir? A Bblia no um amuleto mgico. Ela no um livro-texto detalhado, integral, completo sobre fenmenos naturais e ela no um livro de regras de Hoyle sobre o jogo da vida com instrues detalhadas em todas as reas da vida. uma mensagem de Deus que age na histria humana. Ela aponta para Seu Filho e para nossa rebelio.

    IV. Pressuposies do Autor sobre a Bblia

    Ainda que a Bblia tenha sido vtima de abuso por parte das expectativas e usos da humanidade, ela ainda nossa nica guia de f e prtica. Gostaria de elencar minhas pressuposies a respeito da Bblia. Eu creio que a Bblia, tanto Antigo quanto Novo Testamento, a nica clara autorevelao de Deus. O Novo Testamento o perfeito cumprimento e intrprete do Antigo Testamento (devemos ver o AT atravs das novas revelaes de Jesus no NT, que radicalmente universalizou as promessas de Israel). Eu creio que o nico Deus Redentor, Criador, Eterno, foi quem deu incio aos escritos do nosso cnon da Escritura, inspirando certas pessoas escolhidas para registrar e explicar Seus atos nas vidas de

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    indivduos e naes. A Bblia nossa nica e clara fonte de informao sobre Deus e Seus propsitos (Eu sei sobre Jesus apenas por meio das pginas do NT). A revelao natural (cf. Jo 38-39; Sl 19:1-6; Rm.1:19-20; 2:14-15) vlida, mas no completa. Jesus a coroao da revelao de Deus sobre Si mesmo (cf. Jo 1:18; Cl 1:14-16; Hb 1:2-3). A Bblia deve ser iluminada pelo Esprito Santo (cf. Jo 14:23; 16:20-21; I Co. 2:6-16) para que possa ser corretamente compreendida (em sua dimenso espiritual). Sua mensagem tem autoridade, adequada, eterna, infalvel e digna de confiana para todos os crentes. O modo exato da sua inspirao no sabemos, mas bvio aos crentes que a Bblia um livro sobrenatural, escrito por pessoas naturais sobre uma orientao especial.

    V. Evidncia para Autoridade e Inspirao Sobrenatural da Bblia

    Embora a declarao acima seja pressuposicional, assim como todo conhecimento humano, no significa que no haja evidncias confiveis que a suportem. Neste ponto vamos examinar algumas dessas evidncias. A. A Bblia contem muitas predies precisas (histricas, no tipolgicas [Osias

    11.1] ou apocalpticas [Zacarias 9]) sobre eventos futuros, no em formulaes vagas, mas com preciso especfica e frequentemente assustadora. Abaixo, dois bons exemplos.

    1. Era predito que a rea do ministrio de Jesus seria Galilia, Is. 9.1. Era muito

    pouco esperado pela comunidade judaica que esse fosse o lugar, considerado pouco Kosher, por sua longa distncia fsica do Templo. Contudo, a maior parte do ministrio de Jesus ocorreu nessa rea geogrfica.

    2. O lugar do nascimento de Jesus especificamente registrado em Miqueias 5.2. Belm era uma pequena vila cuja nica fama a reivindicar era o fato que vivia ali a famlia de Jess. Contudo, 750 anos antes do nascimento de Jesus, a Bblia aponta para ali como o lugar do nascimento do Messias. Mesmo os estudiosos rabnicos de Herodes sabiam disso (Mt 2.4-6). Alguns podem duvidar sobre a data (oitavo sculo A.C) de ambas profecias, Isaas e Miquias, entretanto, por causa da Septuaginta (que a traduo Grega das Escrituras hebraicas, que comeou aproximadamente em 250-200 B.C.), mesmo a menor dessas profecias foram feitas cerca de 200 anos antes do seu cumprimento.

    B. Outra evidncia se relaciona com a moderna disciplina cientfica da arqueologia. As ltimas dcadas tem visto uma tremenda quantidade de descobertas arqueolgicas. No meu conhecimento nada tem sido encontrado que tenha repudiado as precises bblicas histricas (Nelson Glueck, Rivers in the Desert, p.31, Nenhuma descoberta arqueolgica tem sido feita que contradiga as declaraes histricas da Escritura), muito pelo contrrio. A arqueologia tem facilitado a confiana na historicidade da Bblia cada vez mais.

    1. Um exemplo o uso dos nomes mesopotmicos nas tbuas de Nuzi e Mari, do segundo milnio A.C., que tambm ocorrem em Gnesis. No so o mesmo povo, mas os mesmos nomes. Nomes so caractersticas de um tempo

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    particular e lugar. Os nomes Ter e Naor so comuns no registro bblico e nessas tbuas antigas.

    2. A existncia de uma civilizao hitita na sia Menor outro exemplo. Por muitos anos (19 sculo) a histria secular no teve referncias sobre a estvel e grandemente desenvolvida cultura conhecida por esse nome (Archer 1982, 96-98, 210). Contudo, Gnesis 10 e os livros histricos da Bblia os mencionam vrias vezes (2 Rs 7.6,7; 2 Cr 1.17). Arqueologia tem ento confirmado, no apenas sua existncia, mas sua longevidade e poder (i.e., em 1950 arquelogos encontraram uma biblioteca real de 2000 tbuas cuneiformes onde a nao era chamada tanto de Anatlia quanto Hitita).

    3. A existncia de Belsazar, o ltimo rei da Babilnia (Daniel 5) tem sido frequentemente negada. H dez listas de reis babilnicos na histria secular tomados de documentos babilnicos, mas nenhuma contm o nome Belsazar. Com descobertas arqueolgicas posteriores se tornou bvio que Belsazar era co-regente e oficial em exerccio durante aquele perodo de tempo. Seu pai, Nabonido, cuja me era sacerdotisa da deusa-lua Zin, esteve to envolvido na adorao de Zin (Nana) que teve que se mudar para Tema (Arbia), sua cidade santa, enquanto um exrcito lutava contra o Egito. Ele deixou seu filho, Belsazar, como regente da Babilnia durante sua ausncia.

    C. Uma evidncia a mais para uma Bblia sobrenatural a consistncia da sua mensagem. No significa dizer que a Bblia no contenha material paradoxo. Ela tem, mas esses materiais no se contradizem. surpreendente quando consideramos que ela foi escrita em um perodo de mais de 1600/1400 anos (dependendo da data do xodo, i.e., 1495, 1290 A.C.) por autores de educao radicalmente diferentes e contextos culturais da Mesopotmia ao Egito. Ele composta de vrios gneros literrios e escrita em trs lnguas separadas (Hebraico, Aramaico e Grego Koin). E ainda, mesmo com toda essa variedade (i.e., enredo), uma mensagem unificada apresentada.

    D. Finalmente, uma das maravilhosas evidncias para a inspirao nica da Bblia a vida moral permanentemente transformada de homens e mulheres de diferentes culturas, nveis de educao e condies econmicas diferentes, atravs de toda a histria. Onde quer que a Bblia tenha simplesmente sido lida, houve uma mudana radical e permanente no estilo de vida. A Bblia a melhor apologista de si mesma.

    VI. Problemas Relacionados com nossa Interpretao da Bblia

    O que foi dito acima no implica dizer que ela fcil de entender ou que no haja

    problemas conectados Bblia. Por causa da natureza da linguagem humana e das cpias de manuscritos combinados com o problema da traduo, nossas modernas Bblias devem ser interpretadas de um modo analtico. O primeiro problema com que o leitor moderno ir se deparar, o problema das variaes dos manuscritos existentes. E isso no certo apenas em relao ao Antigo Testamento hebraico, mas tambm em relao ao Novo Testamento grego. Este assunto ser discutido de um modo mais prtico em um captulo subsequente, mas por enquanto olhemos para o problema. Frequentemente chamamos isto de Criticismo Textual. Ele basicamente tenta determinar a redao original da Bblia. Alguns bons livros sobre esse assunto so:

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    A. Biblical Criticism: Historical, Literary and Textual, de B. K. Walke, D. Guthrie,

    Gordon Fee, e R. H. Harrison. B. The Text of the New Testament: Its Transmission, Corruption and Restoration,

    de Bruce M. Metzger. C. Introduction to New Testament Textual Criticism and Scribes, Scrolls, and

    Scriptures, de J. H.Greenlee. D. The Books and the Parchments, de F. F. Bruce. E. The Early Versions of the New Testament, de Bruce Metzger F. The New Testament Documents: Are They Reliable?, de F. F. Bruce G. The King James Version Debate: A Plea for Realism, de D. A. Carson. H. Ancient Orient and Old Testament, de K. A. Kitchen. I. The Orthodox Corruption of Scripture, de Bart D. Ehrman. J. Rethinking New Testament Textual Criticism, editado por David Alan Beach

    VII. As Principais Fontes Textuais da nossa Bblia Moderna

    O texto moderno do Antigo Testamento em hebraico chamado de Texto

    Massortico (o texto consonantal configurado por Rabbi Aquiba em 100 A.D.) Provavelmente era esse o texto usado pelos fariseus dos tempos de Jesus, que eram o nico grupo religioso que havia sobrevivido destruio de Jerusalm por Tito em 70 D.C. Seu nome vem de um grupo de estudiosos judeus que colocaram pontos voclicos, sinais de pontuao e alguns comentrios textuais no texto hebraico (terminado no 9 sculo A.D.) sem pontuao (sem vogais). O que segue um breve esboo das fontes do AT e NT.

    A. Antigo Testamento

    1. Texto Massortico (TM) A forma textual consonantal hebraica foi estabelecida por Rabbi Aquiba em 100 A.D. A adio de pontos voclicos, acentos, notas marginais, pontuao e aparatos foi terminada no 9 sculo A.D. pelos estudiosos massorticos. Essa forma textual citada no Mishnan, Talmude, Targums (traduo aramaica), Pesita (traduo siraca), e Vulgata (traduo latina).

    2. Septuaginta (LXX) A tradio diz que ela foi produzida por 70 estudiosos judeus em 70 dias para a biblioteca de Alexandria, no Egito, supostamente encomendada por um lder judeu do rei Ptolomeu II, que vivia em Alexandria (285-246 B.C.). Os governantes ptolomeus ostentavam a maior biblioteca do mundo. Essa tradio vem da Carta de Aristeu. A LXX prov uma tradio textual hebraica diferente do texto de Rabbi Aquiba (TM). Textos de ambas as tradies estavam representados nos Manuscritos do Mar Morto.

    O problema comea quando esses dois textos no concordam. E, em livros como

    Jeremias e Osias, eles so radicalmente diferentes. Desde a descoberta dos Manuscritos do