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Conheça todos os títulos dos Cadernos de Formação Direitos Humanos e Cidadania Educação Popular e Direitos Humanos Participação Social e Direitos Humanos Direito à Cidade Conselhos Participativos Municipais Governo Aberto Planejamento e Orçamento Cadernos de Formação Direito à Cidade

Série Cadernos de Formação: Direito à Cidade

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8162019 Seacuterie Cadernos de Formaccedilatildeo Direito agrave Cidade

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Conheccedila todos os tiacutetulos dosCadernos de Formaccedilatildeo

Direitos Humanos e Cidadania

Educaccedilatildeo Popular e Direitos Humanos

Participaccedilatildeo Social e Direitos Humanos

Direito agrave Cidade

Conselhos Participativos Municipais

Governo Aberto

Planejamento e Orccedilamento

Cadernos de Formaccedilatildeo

Direito agrave Cidade

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Cadernos de Formaccedilatildeo

Direito agrave cidade

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Expediente

Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo

Fernando Haddad ndash Prefeito

Eduardo Matarazzo Suplicy ndash Secretaacuterio de Direitos Humanos e Cidadania

Guilherme Assis de Almeida ndash Secretaacuterio Adjunto de Direitos Humanos e Cidadania

Giordano Morangueira Magri ndash Chefe de Gabinete

Maria Joseacute Scardua ndash Coordenadora da Poliacutetica Municipal de Participaccedilatildeo Social

Eduardo Santarelo Lucas e Karen KristensenMedaglia Motta (estagiaacuteria) ndash Equipe da Coordenaccedilatildeo de Participaccedilatildeo Social

Instituto Paulo Freire

Paulo Freire ndash Patrono

Moacir Gadotti ndash Presidente de Honra

Alexandre Munck ndash Diretor Administrativo-Financeiro

Acircngela Antunes Francisca Pini e Paulo Roberto Padilha ndash Diretores Pedagoacutegicos

Nataacutelia Caetano ndash Coordenadora do Projeto

Editora Instituto Paulo Freire

Janaina Abreu ndash Coordenaccedilatildeo Graacutefico-Editorial

Aline Inforsato e Izabela Roveri ndash Identidade Visual Projeto Graacutefico Diagramaccedilatildeo e Arte-Final

Acircngela Antunes Francisca Pini Julio Talhari Moacir Gadotti e Paulo Roberto

Padilha ndash Preparaccedilatildeo de Originais e Revisatildeo de Conteuacutedo

Daniel Shinzato Janaina Abreu e Julio Talhari ndash Revisatildeo

Alcir de Souza Caria Amanda Guazzelli Deisy Boscaratto Fabiano Angeacutelico

Lina Rosa Nataacutelia Caetano Rosemeire Silva Samara Marino Sandra Vaz

Sheila Ceccon Washington Goacutees ndash Pesquisadores - Redatores

Flaacutevia Rolim ndash Colaboradora

Capa

Foto de capa ndash Embratur

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4 | Cadernos de Formaccedilatildeo

Palavras do prefeito

Guarda Civil Municipal (GCM) utiliza bicicletas em ronda na aacuterea da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (creacutedito Marcelo UlissesGCM)

Eacute com grande satisfaccedilatildeo que apresento 20 publicaccedilotildees ineacuteditas coordenadas pela Secre-taria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) para os processos de formaccedilatildeo de

conselheiros(as) em direitos humanos e participaccedilatildeo social Trata-se de sete Cadernos de For-maccedilatildeo dois Cadernos de Orientaccedilatildeo dez Cadernos de Colegiados e um Caderno do Ciclo Partici-pativo de Planejamento e Orccedilamento

O objetivo eacute permitir uma melhor compreensatildeo das relaccedilotildees entre direitos humanos cida-dania Educaccedilatildeo Popular participaccedilatildeo social direito agrave cidade bem como apresentar formas eferramentas de gestatildeo mais participativas adotadas pela atual administraccedilatildeo Nesse sentido

apresentamos tambeacutem dez importantes conselhos desta cidade sua composiccedilatildeo estruturafuncionamento e o mais importante como e onde participar

Estas publicaccedilotildees demonstram o esforccedilo da atual administraccedilatildeo municipal em ampliar equalificar cada vez mais o diaacutelogo entre governo e sociedade civil para fortalecer a democraciaparticipativa nesta cidade

Satildeo Paulo dezembro de 2015Fernando Haddad

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Eacute uma grande satisfaccedilatildeo para a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SM-DHC) de Satildeo Paulo entregar agrave populaccedilatildeo de nossa cidade estes sete Cadernos de Formaccedilatildeo

Apesar de ser um oacutergatildeo com pouco tempo de existecircncia muito nos orgulham as inuacutemeras rea-lizaccedilotildees que ela conseguiu conquistar Uma delas foi a oferta de cursos de formaccedilatildeo e produccedilatildeode subsiacutedios teoacuterico-praacuteticos

As publicaccedilotildees que ora entregamos satildeo destinadas a todos(as) os(as) cidadatildeos(atildes) que seinteressam pelos assuntos aqui tratados e em especial aos conselheiros(as) municipais que

lutam pela defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que haacute anos vecircm demandando cursos e

materiais de formaccedilatildeo que possam subsidiar a sua atuaccedilatildeoComo os(as) leitores(as) poderatildeo perceber a SMDHC convidou outras secretarias de gover-no para tambeacutem fazerem parte desta coleccedilatildeo estabelecendo as devidas relaccedilotildees entre suasrespectivas atuaccedilotildees e a promoccedilatildeo dos direitos humanos um importante marco da Gestatildeo

Fernando Haddad Assim natildeo apenas se valoriza a democracia representativa como tambeacutemse impulsiona cada vez mais a necessaacuteria democracia participativa e consequentemente osprocessos de gestatildeo e de participaccedilatildeo social de maneira dialoacutegica e transparente o que resultanuma cidade mais justa mais plural e mais respeitosa em relaccedilatildeo agrave diversidade

Ao definirmos a estrutura desta coleccedilatildeo respeitando a especificidade de cada caderno

buscamos sempre associar cada tiacutetulo ao tema geral dos direitos humanos numa perspectivainterdisciplinar intersecretarial e intersetorial Dois cadernos um deles intitulado Conselhos

Participativos Municipais e o outro Planejamento e Orccedilamento couberam agrave Secretaria Muni-

cipal de Relaccedilotildees Governamentais (SMRG) O de Governo Aberto estaacute relacionado agrave SecretariaMunicipal de Relaccedilotildees Internacionais e Federativas (SMRIF) Os outros quatro cadernos satildeo di-retamente vinculados agraves atividades da proacutepria SMDHC a saber Direitos Humanos e Cidadania

Educaccedilatildeo Popular e Direitos Humanos Participaccedilatildeo Social e Direitos Humanos e Direito agrave Cidade

Estamos certos de que publicaccedilotildees como estas muito podem contribuir para o fortalecimentoda democracia participativa bem como para a ampliaccedilatildeo da transparecircncia e da promoccedilatildeo da jus-ticcedila social e econocircmica consequentemente para uma cidade mais justa sustentaacutevel e solidaacuteria

Satildeo Paulo dezembro de 2015Eduardo Matarazzo Suplicy

Palavras do secretaacuterio

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IntroduccedilatildeoPrezados conselheiros e prezadas conselheiras da cidade de Satildeo Paulo

Para Paulo Freire patrono da Educaccedilatildeo Brasileira a aprendizagem acontece ao longo davida Eacute um processo contiacutenuo e permanente sem um momento certo para ocorrer Ensinar eaprender exigem a consciecircncia de que somos seres inacabados e incompletos curiosos quesabemos escutar que temos abertura e aceitamos o novo que refletimos criticamente sobre apraacutetica e que rejeitamos toda e qualquer forma de discriminaccedilatildeo

A disponibilidade para o diaacutelogo a humildade a generosidade e a alegria de ensinar eaprender satildeo tambeacutem caracteriacutesticas fundamentais para que haja aprendizado Isso aumenta

nossa convicccedilatildeo de que a mudanccedila eacute possiacutevel por mais que a realidade se apresente como algoaparentemente jaacute dado e imutaacutevel

Se ainda nos deparamos com qualquer tipo de violaccedilatildeo aos direitos humanos temos diantede noacutes o desafio de educarmos e de nos educarmos para intervirmos nessa realidade injusta

Com determinaccedilatildeo e esperanccedila fica mais faacutecil a defesa dos direitos da inclusatildeo sociocultural eda compreensatildeo de que toda pessoa pode e deve contribuir para processos de ensino e de apren-dizagem emancipatoacuterios Quem se emancipa torna-se mais autocircnomo e livre

Foi justamente nessa direccedilatildeo que apoacutes consultados conselheiros e conselheiras integran-tes dos oacutergatildeos da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) solicitaram agrave

Coordenaccedilatildeo de Participaccedilatildeo Social cursos de formaccedilatildeoAleacutem de oferecer os cursos a SMDHC sugeriu tambeacutem a criaccedilatildeo desta seacuterie de sete cader-

nos de formaccedilatildeo composta por diferentes temas que se completam Pretende-se assim agre-gar ainda mais qualidade na atuaccedilatildeo de conselheiros e conselheiras na cidade de Satildeo Paulo Paraconcretizar esse objetivo a SMDHC contou com a contribuiccedilatildeo do Instituto Paulo Freire (IPF)

organizaccedilatildeo da sociedade civil de interesse puacuteblico sem fins lucrativos que haacute 25 anos atuapara o fomento da educaccedilatildeo como meio de promoccedilatildeo dos direitos humanos

Este Caderno de Formaccedilatildeo Direito agrave Cidade convida-nos a pensar em algumas caracteriacutesticasda megaloacutepole de Satildeo Paulo com quase 12 milhotildees de habitantes bem como de outras cidades

A cidade natildeo dorme a cidade transpira a cidade acolhe a cidade inspiraA cidade eacute conflito a cidade eacute dura a cidade eacute beleza a cidade eacute feiura

A cidade eacute palco a cidade eacute cenaacuterio a cidade eacute desejo a cidade eacute trabalhoA cidade eacute arte a cidade eacute cultura a cidade eacute esporte a cidade eacute ternura

[hellip]

Nossa cidade taacute prenha nossa cidade taacute nuaNossa cidade educa ela eacute todinha sua

Nossa cidade merece um pouco mais de poesiaDe norte a sul leste-oeste centro e periferia

Nossa cidade arrepia1

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8 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

Quais imagens e sentimentos os versos acima nos trazem O quanto a cidade onde vivemosaproxima-se ou distancia-se da cidade dos nossos sonhos Eacute possiacutevel ampliar a participaccedilatildeosocial na definiccedilatildeo da gestatildeo e ocupaccedilatildeo dos espaccedilos puacuteblicos Essas e outras questotildees seratildeo

discutidas neste caderno Faremos referecircncia a tratados estatutos e legislaccedilotildees que procuramregular a poliacutetica de desenvolvimento urbano e as funccedilotildees sociais da cidade visando ao bem-es-tar de seus habitantes

Este caderno proposto pela SMDHC e por sua Coordenaccedilatildeo do Direito agrave Cidade estimula-nosao fortalecimento da defesa dos direitos humanos pois mostra que a cidade pertence a todos eque todos tambeacutem satildeo responsaacuteveis pela garantia do direito a ela

O primeiro capiacutetulo traccedila um panorama sobre a constituiccedilatildeo das cidades mostra comosurgiram e se desenvolveram Tambeacutem analisa as relaccedilotildees sociais no contexto da defesa do

direito agrave cidade

No segundo capiacutetulo discute-se o processo de urbanizaccedilatildeo brasileiro os fundamentos denosso direito agrave cidade em diferentes acircmbitos bem como nos permite entender a funccedilatildeo socialda cidade e da proacutepria propriedade

Ao tratar da implementaccedilatildeo do direito agrave cidade no municiacutepio de Satildeo Paulo o terceiro capiacutetu-

lo mergulha nas discussotildees sobre a poliacutetica habitacional as novas agendas de direitos humanose a gestatildeo democraacutetica Convida-nos assim a novas formas de participaccedilatildeo e de apropriaccedilatildeo doespaccedilo puacuteblico Aleacutem dos avanccedilos jaacute obtidos em Satildeo Paulo fica o desafio da luta permanente detodos pela garantia ao direito agrave cidade que se associa ao direito agrave dignidade Isso exige de todosdisponibilidade criatividade e intensa participaccedilatildeo social

Satildeo Paulo dezembro de 2015Equipe do Instituto Paulo Freire

1Trechos do poema da muacutesica ldquoA cidaderdquo de Paulo Roberto Padilha (CD Velho Amigo Satildeo Paulo 2014)

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1 A constituiccedilatildeo das cidadesQuando se pensa ou se reivindica o direito agrave cidade certamente se faz referecircncia a alguns

aspectos que de acordo com determinada compreensatildeo satildeo extremamente necessaacuterios agrave vida

urbana um haacutebitat que facilite as relaccedilotildees sociais sentimento de pertencimento a fim de tor-nar possiacutevel a apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico condiccedilotildees dignas de vida valorizaccedilatildeo das pessoase dos espaccedilos de convivecircncia novas formas de participaccedilatildeo social na administraccedilatildeo puacuteblica lo-cal igualdade de direitos Para que isso se concretize algumas mudanccedilas satildeo almejadas o querepresenta evidentemente a superaccedilatildeo de certos desafios

Pretendemos aqui apresentar reflexotildees iniciais que abordem a cidade como expressatildeo decriatividade de transformaccedilatildeo mas tambeacutem de relaccedilotildees de dominaccedilatildeo opressatildeo segregaccedilatildeo edisputa de interesses O objetivo portanto eacute contribuir para um debate que se fundamenta naconcepccedilatildeo do direito agrave cidade como direito humano

11 Cidade compreensatildeo que temos e defendemos

Se a cidade revela o conjuntode coisas que fazemos na vida coti-diana que vai da nossa existecircnciaagraves formas como nos relacionamoscom os outros isso significa que

ela representa um estilo de vidamuito particular em comparaccedilatildeo aoutros lugares se considerarmoszonas mais ou menos urbanas ru-rais ou mesmo rurbanas Essa di-

ferenccedila eacute estabelecida pela forma

de organizaccedilatildeo e sua densidadepopulacional com zonas residen-ciais comerciais e industriais quedemandam infraestruturaserviccedilos de transporte atividade econocircmica e assim por diante Eacute

nesse ambiente que nos socializamos aprendemos a nos comunicar e nos transformamoscom base nos saberes coletivos Eacute tambeacutem onde atuamos para manter nossa condiccedilatildeo mate-rial de existecircncia a fim de suprir as necessidades vitais

Contudo ao se propor uma reflexatildeo sobre a cidade eacute importante salientar que ela possui

um conjunto de significados que ultrapassam uma definiccedilatildeo mais precisa Nesse sentido a con-cepccedilatildeo de cidade em que nos baseamos eacute aquela que agrega a vida cotidiana das pessoas quedesempenham papeacuteis sociais e reproduzem sua existecircncia em niacuteveis riquiacutessimos de cultura de

Satildeo Paulo possui hoje mais de 11 milhotildees de habitantes (creacutedito MarcosSantosUSP Imagens)

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10 | Cadernos de Formaccedilatildeo

12 A importacircncia de compreendermos a histoacuteria e o surgimento das cidades

Recorrer agrave histoacuteria da humanida-de eacute fundamental para compreendero significado do direito agrave cidade comodireito humano Isso porque homens emulheres se inserem na cidade por in-

teiro com necessidades materiais e so-

ciais Raquel Rolnik (1995) ao definir oque eacute cidade identifica seu surgimen-to e transformaccedilotildees como expressatildeoda racionalidade humana capacidade

de abstraccedilatildeo memoacuteria manutenccedilatildeode relaccedilotildees sociais e poliacuteticas adapta-ccedilatildeo ao trabalho coletivo e agrave especializaccedilatildeo (o que vai gerar o circuito de troca e consumo)

A autora aponta algumas dimensotildees essenciais na constituiccedilatildeo de qualquer cidade Uma delas

eacute o poder de atraccedilatildeo ndash a imagem eacute a da ldquocidade como um imatilderdquo ndash que originalmente esteve associado

aos templos religiosos sobretudo na Mesopotacircmia no terceiro milecircnio antes da era cristatilde Ali os pri-meiros nuacutecleos urbanos se reuniram para a construccedilatildeo dos zigurates ndash locais cerimoniais ndash no mesmomomento em que se iniciou o processo de sedentarizaccedilatildeo com a ocupaccedilatildeo permanente do territoacuteriopara a agricultura e moradia

A intervenccedilatildeo humana na natureza desde a fabricaccedilatildeo tijolos para a edificaccedilatildeo de templosateacute a construccedilatildeo de cidades inteiras se ampliou de tal modo que a humanidade passou cada vezmais a interagir com um meio construiacutedo Surgiu entatildeo uma nova relaccedilatildeo em que a arquitetura setransformou num repositoacuterio da memoacuteria coletiva registro das accedilotildees dos antepassados de modo

a poder ser lida como um texto Eacute a ldquocidade como escritardquo nas palavras de Rolnik (1995) que elevao niacutevel de abstraccedilatildeo de homens e mulheres e exige uma racionalidade que nessa mesma eacutepocafez surgir aleacutem da escrita padrotildees de medida e formas de gestatildeo do trabalho coletivo

relaccedilotildees interculturais e intertransculturais A cidade soacute existe porque haacute pessoas que a fazemem sua estrutura e dinacircmica

Quando se fala em relaccedilotildees de forccedila e interesses em conflito eacute indispensaacutevel pensar que essasituaccedilatildeo estaacute integrada agrave dinacircmica da cidade e ao cotidiano vivido Historicamente a cidade repre-senta esse conjunto de relaccedilotildees sociais e materiais de existecircncia A vida urbana ganha estrutura eforma por meio do conjunto de accedilotildees e relaccedilotildees envolvidas no arranjo territorial e administrativo nocomeacutercio na divisatildeo social do trabalho e no proacuteprio processo de urbanizaccedilatildeo Fica evidente assim

que a centralidade desse processo se encontra em algo substantivamente humano De fato as ci-dades contemporacircneas (sobretudo as grandes metroacutepoles) com imensos edifiacutecios torres parquesestradas e assim por diante satildeo o resultado de um longo percurso histoacuterico relacionado ao trabalho

Zigurate na Mesopotacircmia atual Iraque

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13 Relaccedilotildees sociais e direito de expressatildeo numa cidade democraacutetica

Pensemos agora nos tempos atuais e numa cidade democraacutetica em que a liberdade de ex-pressatildeo e manifestaccedilatildeo das diferentes opiniotildees satildeo possiacuteveis qual significado existe na organi-zaccedilatildeo da vida puacuteblica Como as relaccedilotildees satildeo ou podem vir a ser estabelecidas

Existe uma predominacircncia do mercado nas cidades principalmente quando evidenciamos oestaacutegio em que o modo de produccedilatildeo coletivo foi organizando-se na relaccedilatildeo capitalista de produccedilatildeoestaacutegio de desenvolvimento da sociedade atual As pessoas para satisfazerem suas necessidadesmais simples de subsistecircncia tem de se inserir no circuito de trocas representado pelo mercadoe mediado pelo dinheiro No entanto consumimos produtos por meio da aquisiccedilatildeo da moeda de

troca que representa o valor equivalente do produto vendido no mercado Esse valor vai para obolso do produtor Essa relaccedilatildeo organiza a estrutura do trabalho e da vida nas cidades pois tudo eacutemediado pela moeda de troca Assim a forccedila de trabalho eacute transformada em mercadoria e passa a

ocultar o acuacutemulo de excedente por parte dos donos dos meios de produccedilatildeo que se apropriam deforma desigual do valor dos produtos vendidos

E eacute justamente a vida coletiva que se configura como caracteriacutestica fundamental dos nuacute-cleos urbanos e sua gestatildeo ndash organizaccedilatildeo dos fluxos de pessoas das aglomeraccedilotildees regulamen-taccedilatildeo do cotidiano ndash que revela a ldquocidade poliacuteticardquo (ROLNIK 1995) A cidade poliacutetica caracteri-

za-se pela centralidade do poder urbano e pela hierarquizaccedilatildeo social que ao longo da histoacuteriase desenvolveu por meio da dominaccedilatildeo e do autoritarismo poliacutetico-administrativo com origemna cidadela fortificada e no poder do rei com base na guerra Desde a poacutelis grega passando pelacivitas romana a cidade poliacutetica eacute menos um espaccedilo geograacutefico do que uma praacutetica social base-ada nas relaccedilotildees de poder de modo que ldquocidadatildeordquo designava na Greacutecia antiga aquele que podiaparticipar da vida poliacutetica e natildeo todos os habitantes Isso explica porque em muitas cidades

contemporacircneas como Satildeo Paulo que natildeo possuem centro ou apresentam muacuteltiplas centrali-dades o poder poliacutetico natildeo deixou de estar concentrado nas matildeos de alguns poucos grupos Eacuteque o processo de hierarquizaccedilatildeo e controle social nem sempre implicou concentraccedilatildeo espacial

sobretudo apoacutes os avanccedilos tecnoloacutegicos recentes

Todas essas dimensotildees da cidade ndash seu poder de atraccedilatildeo sua abertura para a escritadas accedilotildees humanas seu aspecto poliacutetico ndash como diz Rolnik (1995 p 25-26) ldquoao concentrare aglomerar as pessoas intensifica as possibilidades de troca e colaboraccedilatildeo entre os ho-mens potencializando sua capacidade produtivardquo Eacute o que permite vermos a ldquocidade comomercadordquo e revela o trabalho como elemento central para o surgimento das cidades Os

determinantes estatildeo em trecircs componentes que para Rolnik satildeo essenciais especializaccedilatildeodo trabalho coletivo circuito de troca e consumo A especializaccedilatildeo comeccedilou jaacute com a divisatildeo

entre campo e cidade passou pela divisatildeo de atividades dentro da proacutepria cidade e culminoucom a especializaccedilatildeo entre cidades o que permitiu intensificaccedilatildeo das trocas e fez com queo campo natildeo fosse mais apenas fornecedor (de alimentos) mas consumidor de produtos

oriundos dos centros urbanos

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Esses aglomerados urbanos satildeo produtos de inuacutemeras accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovi-das pelo Estado por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio comercial)e a pela proacutepria populaccedilatildeo e expressam as disparidades existentes na sociedade contemporacircnea

ou seja na sociedade do capital Dentre elas temos produccedilatildeo imobiliaacuteria privada majoritariamentedestinada agraves classes meacutedias e altas praacutetica da retenccedilatildeo de terras ociosas de diferentes segmentosdo capital nas aacutereas urbanizadas utilizadas para futura especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ausecircncia de poliacuteti-

cas significativas em habitaccedilatildeo que quando ocorrem resumem-se na construccedilatildeo de moradias nasperiferias das cidades ausecircncia de regulaccedilatildeo dos valores estabelecidos para as aacutereas centrais falta

de incentivo ao estabelecimento de moradias populares

Foto Jorge MarutaJornal da USP USP Imagens

desconsiderar as dimensotildees poliacuteticas e econocircmicas presentes nesse contexto pois satildeo essasrelaccedilotildees que determinam a funccedilatildeo social da cidade Com essa compreensatildeo eacute possiacutevel imaginaras relaccedilotildees sociais (interaccedilotildees positivas ou conflitantes) dos habitantes com seus familiares

amigos comunidades e tambeacutem com o Estado por meio do uso de espaccedilos e serviccedilos puacuteblicosou privados em lugares que satildeo parte do seu cotidiano

Para a nossa discussatildeo tomaremos por base a compreensatildeo sobre cidades perifeacutericas especifi-camente aquelas existentes nos paiacuteses comumente chamados de subdesenvolvidos emergentesou perifeacutericos para situar a realidade brasileira e considerar todas as particularidades que emergemquando defendemos o direito agrave cidade Apesar de suas singularidades ndash como tamanho da popula-

ccedilatildeo composiccedilatildeo eacutetnica extensatildeo territorial e costumes ndash essas cidades apresentam tambeacutem se-melhanccedilas como os grandes aglomerados urbanos que em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas

afastadas do centro urbano e satildeo marcados por significativa extensatildeo territorial e presenccedila de casasinacabadas com reduzido ambiente construtivo alta densidade populacional inexistecircncia de aacutereasverdes proximidade de rios ou coacuterregos falta de ordenamento do sistema viaacuterio restriccedilatildeo de mobi-lidade urbana com pouca diversidade e disponibilidade de transporte coletivo bem como precaacuteria

infraestrutura viaacuteria baixa oferta de serviccedilos e equipamentos puacuteblicos de sauacutede educaccedilatildeo lazeresportes e cultura altos iacutendices de violecircncia

Favela Paraisoacutepolis localizada na zona sul da cidade de Satildeo Paulo (creacutedito Jorge MarutaJornal da USPUsp Imagens)

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Eacute nesse cenaacuterio que inuacutemeras formas de opressatildeo satildeo naturalizadas e tecircm respaldo inclu-sive legal como no caso da segregaccedilatildeo territorial ligada agrave propriedade privada fenocircmeno tido

como ldquoaceitaacutevelrdquo e protegido por lei A cidade que temos ainda eacute em grande parte e infelizmen-te aquela das taxas de lucro da propriedade privada e das desigualdades em que o capital jaacute

em seu estaacutegio financeiro vem alcanccedilando um ldquoterreno lucrativo para a produccedilatildeo e absorccedilatildeo deexcedente de capitalrdquo (HARVEY 2012 p 74) Mas a cidade que queremos eacute aquela que possibi-lita o exerciacutecio da liberdade democraacutetica e da criatividade expressa no territoacuterio vivido e que natildeoestaacute subordinada agrave relaccedilatildeo de troca Uma cidade humanizada capaz de estabelecer o direito emsua totalidade para que todos possam viver de forma livre e diversificada natildeo fazendo da vidacotidiana uma mera sobrevivecircncia

Entretanto eacute importante reconhecer que houve um salto positivo quando discutimos terri-toacuterio espaccedilo puacuteblico e relaccedilotildees sociais sob a perspectiva da cidade democraacutetica principalmentepor esta reconhecer a participaccedilatildeo social sobretudo na ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e na tomada

de decisotildees poliacuteticas que em muitos casos ocorrem motivadas por reivindicaccedilotildees conformeveremos adiante quando apontarmos o reconhecimento do direito agrave cidade no Brasil

14 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

O Prefeito de Satildeo Paulo Fernando Haddad pedalando durante a inauguraccedilatildeo do maior mural de grafite a ceacuteu aberto da Ameacuterica Latina na

avenida 23 de maio (creacutedito Heloisa BallariniSECOM)

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Direito agrave Cidade | 15

2 As cidades brasileiras e

seu processo de urbanizaccedilatildeo

Com base no contexto apresentado partiremos entatildeo para a realidade brasileira e seusinuacutemeros desafios Em decorrecircncia de um passado como colocircnia o processo de urbanizaccedilatildeo noBrasil eacute heranccedila do desenvolvimento tardio desigual e combinado Ocorreu somente no seacuteculoXX com a chegada das induacutestrias faacutebricas e empresas de grande porte generalizando-se pelo

territoacuterio nacional apenas a partir da deacutecada de 1970 Se o processo de urbanizaccedilatildeo e formaccedilatildeodas cidades industriais europeias como afirma Lefebvre (2001) ocorreu em fins do seacuteculo XVIIIe iniacutecio do seacuteculo XIX com a expansatildeo e desenvolvimento do modo de produccedilatildeo capitalista foisomente no seacuteculo XX que nosso paiacutes superou o modelo arcaico de organizaccedilatildeo e produccedilatildeoadotando a partir de entatildeo o modelo capitalista mas com muitas marcas desse passadoagroexportador o que explica de certo modo a dependecircncia da economia internacional

Ao mesmo tempo em que a dependecircncia econocircmica em relaccedilatildeo ao capital financeiro inter-nacional eacute histoacuterica haacute de se considerar tambeacutem que trouxe benefiacutecios para o desenvolvimento

de infraestrutura em atividades relacionadas ao trabalho Essa situaccedilatildeo contribuiu portantopara o financiamento e a construccedilatildeo de ferrovias portos navegaccedilatildeo e geraccedilatildeo de eletricidadefatores essenciais para o processo de desenvolvimento industrial

O urbanizaccedilatildeo do Brasil foi tardia ocorrendo apenas apoacutes a industrializaccedilatildeo generalizada no seacuteculo XX (creacutedito Imagens USP)

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16 | Cadernos de Formaccedilatildeo

De acordo com Ermiacutenia Maricato (2003) em 1890 a populaccedilatildeo urbana totalizava uma meacutediade 68 a 10 Com a emergecircncia da matildeo de obra livre ou seja a relaccedilatildeo de trabalho baseada nomodo de produccedilatildeo capitalista esses nuacutemeros se elevaram As cidades representavam o futuro

a modernidade e todas as expectativas de mudanccedila no aspecto social e cultural do paiacutes Foi so-mente depois da Revoluccedilatildeo de 1930 que esse cenaacuterio se modificou de fato ao incorporar poliacuteti-

cas puacuteblicas no processo de urbanizaccedilatildeo e industrializaccedilatildeo ultrapassando o modelo econocircmicoagroexportador e a poliacutetica do ldquocafeacute com leiterdquo (Repuacuteblica Oligaacuterquica)

No entanto o vieacutes autoritaacuterio populista e paternalista do periacuteodo possibilitou a con-tinuidade de um Estado que trabalhava aliado aos interesses da oligarquia Prosseguiu

assim a desigualdade entre as classes sociais e outras heranccedilas do periacuteodo colonial comoa concentraccedilatildeo de terra de renda e de poder expressa nas relaccedilotildees de favor mando obe-

diecircncia e arbiacutetrio nas decisotildees legais (MARICATO 2003) Essa modernizaccedilatildeo com base no de-senvolvimento do atraso deixou suas marcas nas metroacutepoles brasileiras como a segregaccedilatildeoterritorial e os danos ao meio ambiente

Esse cenaacuterio soacute pocircde ser evidenciado deacutecadas depois agrave medida que as cidades brasilei-ras foram ficando cada vez mais ldquoassociadas agrave violecircncia poluiccedilatildeo das aacuteguas e do ar crianccediladesamparada traacutefego caoacutetico enchentes entre outros inuacutemeros malesrdquo (MARICATO 2003 p152) Isso porque conforme o desenvolvimento do paiacutes extinguiram-se as oportunidades para a

populaccedilatildeo imigrante e tambeacutem migrante Cresceram as periferias de forma exorbitante assim

como a pobreza e a alta densidade de ocupaccedilatildeo do solo Esses fatores geraram uma ampla se-gregaccedilatildeo urbana eou ambiental aleacutem das dificuldades de acesso aos serviccedilos puacuteblicos comotransporte saneamento abastecimento sauacutede educaccedilatildeo creches e lazer

Curiosidades sobre a cidade de Satildeo Paulo

Sobre a populaccedilatildeo urbana em Satildeo Paulo

1872 ndash 30 mil habitantes1900 ndash 240 mil habitantesAnos 1950 ndash populaccedilatildeo passou de pouco mais de2 milhotildees de habitantes para mais de 35 milhotildees

(motivo expansatildeo do setor industrial)2000 ndash passa de 10 milhotildees2010 ndash passa de 11 milhotildees e 200 mil

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2Mananciais correspondem a reservas hiacutedricas ou fontes utilizadas para o abastecimento puacuteblico de aacutegua Disponiacutevel em lthttpsitesabesp

combrsiteinternaDefaultaspxsecaoId=31gt Acesso em 10 ago 2015

21 O direito agrave cidade e a Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade

O direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta que soacute recentemente ndash final doseacuteculo XX ndash passou a ter reconhecimento mundial apesar de seu significado protagonis-mo essencial para esse reconhecimento principalmente no que diz respeito agrave implemen-taccedilatildeo da reforma urbana Destaca-se assim o Movimento Nacional pela Reforma Urbanaque criado em 1985 consolidou no Brasil a luta pelo direito agrave cidade na deacutecada de 1980

Utilidade puacuteblica

O portal da prefeitura de Satildeo Paulo

disponibiliza informaccedilotildees sobre ohistoacuterico demograacutefico da cidade deSatildeo Paulo com inuacutemeras ilus-traccedilotildees antigas dos pontos maisconhecidos do municiacutepio Acessehttpsmduprefeituraspgovbr

historico_demograficoindexphp

O crescimento desordenado gerou ocupaccedilotildees em aacutereas de mananciais2 e topos de morrondash que natildeo satildeo de interesse do mercado imobiliaacuterio dada a restriccedilatildeo pela legislaccedilatildeo urbaniacutesti-ca ndash criando aacutereas residenciais propensas a enchentes desmoronamentos e deslizamentos de

terras Some-se a isso um contexto de desemprego discriminaccedilatildeo informalidade e ilegalidadedado ao grande contingente populacional Por outro lado recursos puacuteblicos e privados satildeo cadavez mais utilizados para investimentos em aacutereas concentradas que satildeo valorizadas porque pas-

sam a dispor de saneamento baacutesico asfalto transporte e seguranccedila o que soacute beneficia o capitalimobiliaacuterio a construccedilatildeo civil e o estoque de terras urbanas dentre outros interesses da burgue-sia nacional e internacional

Portanto a questatildeo urbana e habitacional deve ser compreendida com base na relaccedilatildeo poliacuteticae econocircmica da sociedade brasileira aleacutem de algumas particularidades em sua formaccedilatildeo soacutecio-his-

toacuterica uma vez que ao mesmo tempo em que a populaccedilatildeo convive com um cenaacuterio mediado poralugueacuteis altos imoacuteveis ilegais e deacuteficit habitacional bairros com infraestrutura urbana se beneficiamda especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Conclui-se que essa questatildeo eacute produto do capitalismo e expressa suascontradiccedilotildees no cotidiano vivido por seus habitantes num contexto urbano de violaccedilatildeo dos direitos

humanos como o direito agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave moradia entre outros Como resposta agraves inuacutemerascondiccedilotildees precaacuterias de vida grupos atuam em diversos setores sociais em busca de mudanccedilas nomodo de governar planejar e desenvolver as cidades isto eacute lutam pelo direito agrave cidade

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Esse periacuteodo foi marcado pela efervescecircncia de debates e manifestaccedilotildees poliacuteticas de di-ferentes segmentos da sociedade civil que reivindicavam melhorias na cidade e na democra-tizaccedilatildeo do processo poliacutetico Em 1987 com a convergecircncia desses debates assim como com a

correlaccedilatildeo de forccedilas vigente foi criado o Foacuterum Nacional pela Reforma Urbana cujo objetivoprincipal era inserir a questatildeo urbana como pauta da agenda puacuteblica Esse movimento no finaldo regime militar passou a adotar uma concepccedilatildeo de cidade na sua totalidade entendendo o

direito agrave cidade como um direito coletivo que busca alcanccedilar ldquoa cidade de todos a casa aleacutem dacasa a casa com asfalto com serviccedilos puacuteblicos com escola com transporte com direito a umavida socialrdquo (SAULE JR amp UZZO 2009)

Vale ressaltar o protagonismo desse movimento junto a outros grupos populares (or-ganizaccedilotildees da sociedade civil movimentos sociais de luta pela moradia pastorais entida-

des de profissatildeo etc) que travaram um embate com as forccedilas poliacuteticas conservadoras naAssembleia Nacional Constituinte o que culminou posteriormente na influecircncia dessesgrupos sobre a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 sobretudo em relaccedilatildeo agraves temaacuteticas do campourbano Baseando-se na compreensatildeo de certo descaso do poder puacuteblico sobre segregaccedilatildeo

territorial saneamento habitaccedilatildeo e transporte esses grupos elaboraram uma proposta delei para inserccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal com vistas a atuar nesse contexto e participar doprocesso de criaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

De acordo com Nelson Saule Jr e Karina Uzzo (2009) o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana no ano de 1986 ldquodefine o conceito de reforma urbana como uma nova eacutetica socialrdquo erepudiam ldquoa cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitosrdquo Foi inau-gurada assim de forma criacutetica e em acircmbito nacional uma proposta de reforma urbana por meioda construccedilatildeo de uma plataforma poliacutetica que reivindicava uma nova cidade e o fim dos privileacute-

A populaccedilatildeo de Satildeo Paulo apresenta algumas especificidades em termos demograacuteficos eurbanos entre as quais merecem destaque certos aspectos de gecircnero e idade assim como sua

distribuiccedilatildeo territorial (importante quando se debate direito agrave cidade como direito humanomulher idosos e regiotildees perifeacutericas)

Feminilizaccedilatildeo ao longo dos anos tem sido crescente a predominacircncia numeacuterica de mulhe-res no conjunto da populaccedilatildeo Dados do Censo de 1980 indicam naquela data uma proporccedilatildeo

de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no municiacutepio Em 2000 essa relaccedilatildeo jaacute erade 91 para 100 e estima-se que atualmente esteja em torno de 90 ou seja existem 9 homenspara cada 10 mulheres na cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Referecircncias

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CARLOS AFA O espaccedilo urbano novos escritos sobre a cidade Satildeo Paulo FFLCH 2007a

______ O lugar nodo mundo Satildeo Paulo FFLCH 2007b

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LI B Y LEONG A VITIELLO D amp ACOCA A Chinatown Then and Now Gentrification in Boston NewYork and Philadelphia New York AALDEF 2013

MARICATO E ldquoMetroacutepole legislaccedilatildeo e desigualdaderdquo Estudos Avanccedilados vol 17 n 48 Satildeo Paulomaiago 2003 p 150-167

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SANTORO P F ldquoO desafio de planejar e produzir expansatildeo urbana com qualidade a experiecircncia colom-biana dos Planos Parciais em Bogotaacute Colocircmbiardquo Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionaisvol 13 n 1 Recife mai 2011 p 91-115

38 | Cadernos de Formaccedilatildeo

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FONSECA F ldquoOs grandes e poucos divulgados avanccedilos do governo Haddadrdquo Poliacutetica Carta Maior 20abr 2014 Disponiacutevel em ltwwwcartamaiorcombrEditoriaPoliticaOs-grandes-e-pouco-divulga-dos-avancos-do-governo-Haddad430759gt Acesso em 3 ago 2015

MAMANI U R ldquoO caminho do direito agrave cidade na Boliacuteviardquo Diaacutelogos propostas histoacuterias para uma cida-dania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche-dph-8586htmlgtAcesso em 3 ago 2015

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Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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Cadernos de Formaccedilatildeo

Direito agrave cidade

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Expediente

Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo

Fernando Haddad ndash Prefeito

Eduardo Matarazzo Suplicy ndash Secretaacuterio de Direitos Humanos e Cidadania

Guilherme Assis de Almeida ndash Secretaacuterio Adjunto de Direitos Humanos e Cidadania

Giordano Morangueira Magri ndash Chefe de Gabinete

Maria Joseacute Scardua ndash Coordenadora da Poliacutetica Municipal de Participaccedilatildeo Social

Eduardo Santarelo Lucas e Karen KristensenMedaglia Motta (estagiaacuteria) ndash Equipe da Coordenaccedilatildeo de Participaccedilatildeo Social

Instituto Paulo Freire

Paulo Freire ndash Patrono

Moacir Gadotti ndash Presidente de Honra

Alexandre Munck ndash Diretor Administrativo-Financeiro

Acircngela Antunes Francisca Pini e Paulo Roberto Padilha ndash Diretores Pedagoacutegicos

Nataacutelia Caetano ndash Coordenadora do Projeto

Editora Instituto Paulo Freire

Janaina Abreu ndash Coordenaccedilatildeo Graacutefico-Editorial

Aline Inforsato e Izabela Roveri ndash Identidade Visual Projeto Graacutefico Diagramaccedilatildeo e Arte-Final

Acircngela Antunes Francisca Pini Julio Talhari Moacir Gadotti e Paulo Roberto

Padilha ndash Preparaccedilatildeo de Originais e Revisatildeo de Conteuacutedo

Daniel Shinzato Janaina Abreu e Julio Talhari ndash Revisatildeo

Alcir de Souza Caria Amanda Guazzelli Deisy Boscaratto Fabiano Angeacutelico

Lina Rosa Nataacutelia Caetano Rosemeire Silva Samara Marino Sandra Vaz

Sheila Ceccon Washington Goacutees ndash Pesquisadores - Redatores

Flaacutevia Rolim ndash Colaboradora

Capa

Foto de capa ndash Embratur

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4 | Cadernos de Formaccedilatildeo

Palavras do prefeito

Guarda Civil Municipal (GCM) utiliza bicicletas em ronda na aacuterea da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (creacutedito Marcelo UlissesGCM)

Eacute com grande satisfaccedilatildeo que apresento 20 publicaccedilotildees ineacuteditas coordenadas pela Secre-taria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) para os processos de formaccedilatildeo de

conselheiros(as) em direitos humanos e participaccedilatildeo social Trata-se de sete Cadernos de For-maccedilatildeo dois Cadernos de Orientaccedilatildeo dez Cadernos de Colegiados e um Caderno do Ciclo Partici-pativo de Planejamento e Orccedilamento

O objetivo eacute permitir uma melhor compreensatildeo das relaccedilotildees entre direitos humanos cida-dania Educaccedilatildeo Popular participaccedilatildeo social direito agrave cidade bem como apresentar formas eferramentas de gestatildeo mais participativas adotadas pela atual administraccedilatildeo Nesse sentido

apresentamos tambeacutem dez importantes conselhos desta cidade sua composiccedilatildeo estruturafuncionamento e o mais importante como e onde participar

Estas publicaccedilotildees demonstram o esforccedilo da atual administraccedilatildeo municipal em ampliar equalificar cada vez mais o diaacutelogo entre governo e sociedade civil para fortalecer a democraciaparticipativa nesta cidade

Satildeo Paulo dezembro de 2015Fernando Haddad

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Direito agrave Cidade | 5

Eacute uma grande satisfaccedilatildeo para a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SM-DHC) de Satildeo Paulo entregar agrave populaccedilatildeo de nossa cidade estes sete Cadernos de Formaccedilatildeo

Apesar de ser um oacutergatildeo com pouco tempo de existecircncia muito nos orgulham as inuacutemeras rea-lizaccedilotildees que ela conseguiu conquistar Uma delas foi a oferta de cursos de formaccedilatildeo e produccedilatildeode subsiacutedios teoacuterico-praacuteticos

As publicaccedilotildees que ora entregamos satildeo destinadas a todos(as) os(as) cidadatildeos(atildes) que seinteressam pelos assuntos aqui tratados e em especial aos conselheiros(as) municipais que

lutam pela defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que haacute anos vecircm demandando cursos e

materiais de formaccedilatildeo que possam subsidiar a sua atuaccedilatildeoComo os(as) leitores(as) poderatildeo perceber a SMDHC convidou outras secretarias de gover-no para tambeacutem fazerem parte desta coleccedilatildeo estabelecendo as devidas relaccedilotildees entre suasrespectivas atuaccedilotildees e a promoccedilatildeo dos direitos humanos um importante marco da Gestatildeo

Fernando Haddad Assim natildeo apenas se valoriza a democracia representativa como tambeacutemse impulsiona cada vez mais a necessaacuteria democracia participativa e consequentemente osprocessos de gestatildeo e de participaccedilatildeo social de maneira dialoacutegica e transparente o que resultanuma cidade mais justa mais plural e mais respeitosa em relaccedilatildeo agrave diversidade

Ao definirmos a estrutura desta coleccedilatildeo respeitando a especificidade de cada caderno

buscamos sempre associar cada tiacutetulo ao tema geral dos direitos humanos numa perspectivainterdisciplinar intersecretarial e intersetorial Dois cadernos um deles intitulado Conselhos

Participativos Municipais e o outro Planejamento e Orccedilamento couberam agrave Secretaria Muni-

cipal de Relaccedilotildees Governamentais (SMRG) O de Governo Aberto estaacute relacionado agrave SecretariaMunicipal de Relaccedilotildees Internacionais e Federativas (SMRIF) Os outros quatro cadernos satildeo di-retamente vinculados agraves atividades da proacutepria SMDHC a saber Direitos Humanos e Cidadania

Educaccedilatildeo Popular e Direitos Humanos Participaccedilatildeo Social e Direitos Humanos e Direito agrave Cidade

Estamos certos de que publicaccedilotildees como estas muito podem contribuir para o fortalecimentoda democracia participativa bem como para a ampliaccedilatildeo da transparecircncia e da promoccedilatildeo da jus-ticcedila social e econocircmica consequentemente para uma cidade mais justa sustentaacutevel e solidaacuteria

Satildeo Paulo dezembro de 2015Eduardo Matarazzo Suplicy

Palavras do secretaacuterio

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Direito agrave Cidade | 7

IntroduccedilatildeoPrezados conselheiros e prezadas conselheiras da cidade de Satildeo Paulo

Para Paulo Freire patrono da Educaccedilatildeo Brasileira a aprendizagem acontece ao longo davida Eacute um processo contiacutenuo e permanente sem um momento certo para ocorrer Ensinar eaprender exigem a consciecircncia de que somos seres inacabados e incompletos curiosos quesabemos escutar que temos abertura e aceitamos o novo que refletimos criticamente sobre apraacutetica e que rejeitamos toda e qualquer forma de discriminaccedilatildeo

A disponibilidade para o diaacutelogo a humildade a generosidade e a alegria de ensinar eaprender satildeo tambeacutem caracteriacutesticas fundamentais para que haja aprendizado Isso aumenta

nossa convicccedilatildeo de que a mudanccedila eacute possiacutevel por mais que a realidade se apresente como algoaparentemente jaacute dado e imutaacutevel

Se ainda nos deparamos com qualquer tipo de violaccedilatildeo aos direitos humanos temos diantede noacutes o desafio de educarmos e de nos educarmos para intervirmos nessa realidade injusta

Com determinaccedilatildeo e esperanccedila fica mais faacutecil a defesa dos direitos da inclusatildeo sociocultural eda compreensatildeo de que toda pessoa pode e deve contribuir para processos de ensino e de apren-dizagem emancipatoacuterios Quem se emancipa torna-se mais autocircnomo e livre

Foi justamente nessa direccedilatildeo que apoacutes consultados conselheiros e conselheiras integran-tes dos oacutergatildeos da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) solicitaram agrave

Coordenaccedilatildeo de Participaccedilatildeo Social cursos de formaccedilatildeoAleacutem de oferecer os cursos a SMDHC sugeriu tambeacutem a criaccedilatildeo desta seacuterie de sete cader-

nos de formaccedilatildeo composta por diferentes temas que se completam Pretende-se assim agre-gar ainda mais qualidade na atuaccedilatildeo de conselheiros e conselheiras na cidade de Satildeo Paulo Paraconcretizar esse objetivo a SMDHC contou com a contribuiccedilatildeo do Instituto Paulo Freire (IPF)

organizaccedilatildeo da sociedade civil de interesse puacuteblico sem fins lucrativos que haacute 25 anos atuapara o fomento da educaccedilatildeo como meio de promoccedilatildeo dos direitos humanos

Este Caderno de Formaccedilatildeo Direito agrave Cidade convida-nos a pensar em algumas caracteriacutesticasda megaloacutepole de Satildeo Paulo com quase 12 milhotildees de habitantes bem como de outras cidades

A cidade natildeo dorme a cidade transpira a cidade acolhe a cidade inspiraA cidade eacute conflito a cidade eacute dura a cidade eacute beleza a cidade eacute feiura

A cidade eacute palco a cidade eacute cenaacuterio a cidade eacute desejo a cidade eacute trabalhoA cidade eacute arte a cidade eacute cultura a cidade eacute esporte a cidade eacute ternura

[hellip]

Nossa cidade taacute prenha nossa cidade taacute nuaNossa cidade educa ela eacute todinha sua

Nossa cidade merece um pouco mais de poesiaDe norte a sul leste-oeste centro e periferia

Nossa cidade arrepia1

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8 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

Quais imagens e sentimentos os versos acima nos trazem O quanto a cidade onde vivemosaproxima-se ou distancia-se da cidade dos nossos sonhos Eacute possiacutevel ampliar a participaccedilatildeosocial na definiccedilatildeo da gestatildeo e ocupaccedilatildeo dos espaccedilos puacuteblicos Essas e outras questotildees seratildeo

discutidas neste caderno Faremos referecircncia a tratados estatutos e legislaccedilotildees que procuramregular a poliacutetica de desenvolvimento urbano e as funccedilotildees sociais da cidade visando ao bem-es-tar de seus habitantes

Este caderno proposto pela SMDHC e por sua Coordenaccedilatildeo do Direito agrave Cidade estimula-nosao fortalecimento da defesa dos direitos humanos pois mostra que a cidade pertence a todos eque todos tambeacutem satildeo responsaacuteveis pela garantia do direito a ela

O primeiro capiacutetulo traccedila um panorama sobre a constituiccedilatildeo das cidades mostra comosurgiram e se desenvolveram Tambeacutem analisa as relaccedilotildees sociais no contexto da defesa do

direito agrave cidade

No segundo capiacutetulo discute-se o processo de urbanizaccedilatildeo brasileiro os fundamentos denosso direito agrave cidade em diferentes acircmbitos bem como nos permite entender a funccedilatildeo socialda cidade e da proacutepria propriedade

Ao tratar da implementaccedilatildeo do direito agrave cidade no municiacutepio de Satildeo Paulo o terceiro capiacutetu-

lo mergulha nas discussotildees sobre a poliacutetica habitacional as novas agendas de direitos humanose a gestatildeo democraacutetica Convida-nos assim a novas formas de participaccedilatildeo e de apropriaccedilatildeo doespaccedilo puacuteblico Aleacutem dos avanccedilos jaacute obtidos em Satildeo Paulo fica o desafio da luta permanente detodos pela garantia ao direito agrave cidade que se associa ao direito agrave dignidade Isso exige de todosdisponibilidade criatividade e intensa participaccedilatildeo social

Satildeo Paulo dezembro de 2015Equipe do Instituto Paulo Freire

1Trechos do poema da muacutesica ldquoA cidaderdquo de Paulo Roberto Padilha (CD Velho Amigo Satildeo Paulo 2014)

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Direito agrave Cidade | 9

1 A constituiccedilatildeo das cidadesQuando se pensa ou se reivindica o direito agrave cidade certamente se faz referecircncia a alguns

aspectos que de acordo com determinada compreensatildeo satildeo extremamente necessaacuterios agrave vida

urbana um haacutebitat que facilite as relaccedilotildees sociais sentimento de pertencimento a fim de tor-nar possiacutevel a apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico condiccedilotildees dignas de vida valorizaccedilatildeo das pessoase dos espaccedilos de convivecircncia novas formas de participaccedilatildeo social na administraccedilatildeo puacuteblica lo-cal igualdade de direitos Para que isso se concretize algumas mudanccedilas satildeo almejadas o querepresenta evidentemente a superaccedilatildeo de certos desafios

Pretendemos aqui apresentar reflexotildees iniciais que abordem a cidade como expressatildeo decriatividade de transformaccedilatildeo mas tambeacutem de relaccedilotildees de dominaccedilatildeo opressatildeo segregaccedilatildeo edisputa de interesses O objetivo portanto eacute contribuir para um debate que se fundamenta naconcepccedilatildeo do direito agrave cidade como direito humano

11 Cidade compreensatildeo que temos e defendemos

Se a cidade revela o conjuntode coisas que fazemos na vida coti-diana que vai da nossa existecircnciaagraves formas como nos relacionamoscom os outros isso significa que

ela representa um estilo de vidamuito particular em comparaccedilatildeo aoutros lugares se considerarmoszonas mais ou menos urbanas ru-rais ou mesmo rurbanas Essa di-

ferenccedila eacute estabelecida pela forma

de organizaccedilatildeo e sua densidadepopulacional com zonas residen-ciais comerciais e industriais quedemandam infraestruturaserviccedilos de transporte atividade econocircmica e assim por diante Eacute

nesse ambiente que nos socializamos aprendemos a nos comunicar e nos transformamoscom base nos saberes coletivos Eacute tambeacutem onde atuamos para manter nossa condiccedilatildeo mate-rial de existecircncia a fim de suprir as necessidades vitais

Contudo ao se propor uma reflexatildeo sobre a cidade eacute importante salientar que ela possui

um conjunto de significados que ultrapassam uma definiccedilatildeo mais precisa Nesse sentido a con-cepccedilatildeo de cidade em que nos baseamos eacute aquela que agrega a vida cotidiana das pessoas quedesempenham papeacuteis sociais e reproduzem sua existecircncia em niacuteveis riquiacutessimos de cultura de

Satildeo Paulo possui hoje mais de 11 milhotildees de habitantes (creacutedito MarcosSantosUSP Imagens)

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10 | Cadernos de Formaccedilatildeo

12 A importacircncia de compreendermos a histoacuteria e o surgimento das cidades

Recorrer agrave histoacuteria da humanida-de eacute fundamental para compreendero significado do direito agrave cidade comodireito humano Isso porque homens emulheres se inserem na cidade por in-

teiro com necessidades materiais e so-

ciais Raquel Rolnik (1995) ao definir oque eacute cidade identifica seu surgimen-to e transformaccedilotildees como expressatildeoda racionalidade humana capacidade

de abstraccedilatildeo memoacuteria manutenccedilatildeode relaccedilotildees sociais e poliacuteticas adapta-ccedilatildeo ao trabalho coletivo e agrave especializaccedilatildeo (o que vai gerar o circuito de troca e consumo)

A autora aponta algumas dimensotildees essenciais na constituiccedilatildeo de qualquer cidade Uma delas

eacute o poder de atraccedilatildeo ndash a imagem eacute a da ldquocidade como um imatilderdquo ndash que originalmente esteve associado

aos templos religiosos sobretudo na Mesopotacircmia no terceiro milecircnio antes da era cristatilde Ali os pri-meiros nuacutecleos urbanos se reuniram para a construccedilatildeo dos zigurates ndash locais cerimoniais ndash no mesmomomento em que se iniciou o processo de sedentarizaccedilatildeo com a ocupaccedilatildeo permanente do territoacuteriopara a agricultura e moradia

A intervenccedilatildeo humana na natureza desde a fabricaccedilatildeo tijolos para a edificaccedilatildeo de templosateacute a construccedilatildeo de cidades inteiras se ampliou de tal modo que a humanidade passou cada vezmais a interagir com um meio construiacutedo Surgiu entatildeo uma nova relaccedilatildeo em que a arquitetura setransformou num repositoacuterio da memoacuteria coletiva registro das accedilotildees dos antepassados de modo

a poder ser lida como um texto Eacute a ldquocidade como escritardquo nas palavras de Rolnik (1995) que elevao niacutevel de abstraccedilatildeo de homens e mulheres e exige uma racionalidade que nessa mesma eacutepocafez surgir aleacutem da escrita padrotildees de medida e formas de gestatildeo do trabalho coletivo

relaccedilotildees interculturais e intertransculturais A cidade soacute existe porque haacute pessoas que a fazemem sua estrutura e dinacircmica

Quando se fala em relaccedilotildees de forccedila e interesses em conflito eacute indispensaacutevel pensar que essasituaccedilatildeo estaacute integrada agrave dinacircmica da cidade e ao cotidiano vivido Historicamente a cidade repre-senta esse conjunto de relaccedilotildees sociais e materiais de existecircncia A vida urbana ganha estrutura eforma por meio do conjunto de accedilotildees e relaccedilotildees envolvidas no arranjo territorial e administrativo nocomeacutercio na divisatildeo social do trabalho e no proacuteprio processo de urbanizaccedilatildeo Fica evidente assim

que a centralidade desse processo se encontra em algo substantivamente humano De fato as ci-dades contemporacircneas (sobretudo as grandes metroacutepoles) com imensos edifiacutecios torres parquesestradas e assim por diante satildeo o resultado de um longo percurso histoacuterico relacionado ao trabalho

Zigurate na Mesopotacircmia atual Iraque

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13 Relaccedilotildees sociais e direito de expressatildeo numa cidade democraacutetica

Pensemos agora nos tempos atuais e numa cidade democraacutetica em que a liberdade de ex-pressatildeo e manifestaccedilatildeo das diferentes opiniotildees satildeo possiacuteveis qual significado existe na organi-zaccedilatildeo da vida puacuteblica Como as relaccedilotildees satildeo ou podem vir a ser estabelecidas

Existe uma predominacircncia do mercado nas cidades principalmente quando evidenciamos oestaacutegio em que o modo de produccedilatildeo coletivo foi organizando-se na relaccedilatildeo capitalista de produccedilatildeoestaacutegio de desenvolvimento da sociedade atual As pessoas para satisfazerem suas necessidadesmais simples de subsistecircncia tem de se inserir no circuito de trocas representado pelo mercadoe mediado pelo dinheiro No entanto consumimos produtos por meio da aquisiccedilatildeo da moeda de

troca que representa o valor equivalente do produto vendido no mercado Esse valor vai para obolso do produtor Essa relaccedilatildeo organiza a estrutura do trabalho e da vida nas cidades pois tudo eacutemediado pela moeda de troca Assim a forccedila de trabalho eacute transformada em mercadoria e passa a

ocultar o acuacutemulo de excedente por parte dos donos dos meios de produccedilatildeo que se apropriam deforma desigual do valor dos produtos vendidos

E eacute justamente a vida coletiva que se configura como caracteriacutestica fundamental dos nuacute-cleos urbanos e sua gestatildeo ndash organizaccedilatildeo dos fluxos de pessoas das aglomeraccedilotildees regulamen-taccedilatildeo do cotidiano ndash que revela a ldquocidade poliacuteticardquo (ROLNIK 1995) A cidade poliacutetica caracteri-

za-se pela centralidade do poder urbano e pela hierarquizaccedilatildeo social que ao longo da histoacuteriase desenvolveu por meio da dominaccedilatildeo e do autoritarismo poliacutetico-administrativo com origemna cidadela fortificada e no poder do rei com base na guerra Desde a poacutelis grega passando pelacivitas romana a cidade poliacutetica eacute menos um espaccedilo geograacutefico do que uma praacutetica social base-ada nas relaccedilotildees de poder de modo que ldquocidadatildeordquo designava na Greacutecia antiga aquele que podiaparticipar da vida poliacutetica e natildeo todos os habitantes Isso explica porque em muitas cidades

contemporacircneas como Satildeo Paulo que natildeo possuem centro ou apresentam muacuteltiplas centrali-dades o poder poliacutetico natildeo deixou de estar concentrado nas matildeos de alguns poucos grupos Eacuteque o processo de hierarquizaccedilatildeo e controle social nem sempre implicou concentraccedilatildeo espacial

sobretudo apoacutes os avanccedilos tecnoloacutegicos recentes

Todas essas dimensotildees da cidade ndash seu poder de atraccedilatildeo sua abertura para a escritadas accedilotildees humanas seu aspecto poliacutetico ndash como diz Rolnik (1995 p 25-26) ldquoao concentrare aglomerar as pessoas intensifica as possibilidades de troca e colaboraccedilatildeo entre os ho-mens potencializando sua capacidade produtivardquo Eacute o que permite vermos a ldquocidade comomercadordquo e revela o trabalho como elemento central para o surgimento das cidades Os

determinantes estatildeo em trecircs componentes que para Rolnik satildeo essenciais especializaccedilatildeodo trabalho coletivo circuito de troca e consumo A especializaccedilatildeo comeccedilou jaacute com a divisatildeo

entre campo e cidade passou pela divisatildeo de atividades dentro da proacutepria cidade e culminoucom a especializaccedilatildeo entre cidades o que permitiu intensificaccedilatildeo das trocas e fez com queo campo natildeo fosse mais apenas fornecedor (de alimentos) mas consumidor de produtos

oriundos dos centros urbanos

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Esses aglomerados urbanos satildeo produtos de inuacutemeras accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovi-das pelo Estado por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio comercial)e a pela proacutepria populaccedilatildeo e expressam as disparidades existentes na sociedade contemporacircnea

ou seja na sociedade do capital Dentre elas temos produccedilatildeo imobiliaacuteria privada majoritariamentedestinada agraves classes meacutedias e altas praacutetica da retenccedilatildeo de terras ociosas de diferentes segmentosdo capital nas aacutereas urbanizadas utilizadas para futura especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ausecircncia de poliacuteti-

cas significativas em habitaccedilatildeo que quando ocorrem resumem-se na construccedilatildeo de moradias nasperiferias das cidades ausecircncia de regulaccedilatildeo dos valores estabelecidos para as aacutereas centrais falta

de incentivo ao estabelecimento de moradias populares

Foto Jorge MarutaJornal da USP USP Imagens

desconsiderar as dimensotildees poliacuteticas e econocircmicas presentes nesse contexto pois satildeo essasrelaccedilotildees que determinam a funccedilatildeo social da cidade Com essa compreensatildeo eacute possiacutevel imaginaras relaccedilotildees sociais (interaccedilotildees positivas ou conflitantes) dos habitantes com seus familiares

amigos comunidades e tambeacutem com o Estado por meio do uso de espaccedilos e serviccedilos puacuteblicosou privados em lugares que satildeo parte do seu cotidiano

Para a nossa discussatildeo tomaremos por base a compreensatildeo sobre cidades perifeacutericas especifi-camente aquelas existentes nos paiacuteses comumente chamados de subdesenvolvidos emergentesou perifeacutericos para situar a realidade brasileira e considerar todas as particularidades que emergemquando defendemos o direito agrave cidade Apesar de suas singularidades ndash como tamanho da popula-

ccedilatildeo composiccedilatildeo eacutetnica extensatildeo territorial e costumes ndash essas cidades apresentam tambeacutem se-melhanccedilas como os grandes aglomerados urbanos que em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas

afastadas do centro urbano e satildeo marcados por significativa extensatildeo territorial e presenccedila de casasinacabadas com reduzido ambiente construtivo alta densidade populacional inexistecircncia de aacutereasverdes proximidade de rios ou coacuterregos falta de ordenamento do sistema viaacuterio restriccedilatildeo de mobi-lidade urbana com pouca diversidade e disponibilidade de transporte coletivo bem como precaacuteria

infraestrutura viaacuteria baixa oferta de serviccedilos e equipamentos puacuteblicos de sauacutede educaccedilatildeo lazeresportes e cultura altos iacutendices de violecircncia

Favela Paraisoacutepolis localizada na zona sul da cidade de Satildeo Paulo (creacutedito Jorge MarutaJornal da USPUsp Imagens)

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Eacute nesse cenaacuterio que inuacutemeras formas de opressatildeo satildeo naturalizadas e tecircm respaldo inclu-sive legal como no caso da segregaccedilatildeo territorial ligada agrave propriedade privada fenocircmeno tido

como ldquoaceitaacutevelrdquo e protegido por lei A cidade que temos ainda eacute em grande parte e infelizmen-te aquela das taxas de lucro da propriedade privada e das desigualdades em que o capital jaacute

em seu estaacutegio financeiro vem alcanccedilando um ldquoterreno lucrativo para a produccedilatildeo e absorccedilatildeo deexcedente de capitalrdquo (HARVEY 2012 p 74) Mas a cidade que queremos eacute aquela que possibi-lita o exerciacutecio da liberdade democraacutetica e da criatividade expressa no territoacuterio vivido e que natildeoestaacute subordinada agrave relaccedilatildeo de troca Uma cidade humanizada capaz de estabelecer o direito emsua totalidade para que todos possam viver de forma livre e diversificada natildeo fazendo da vidacotidiana uma mera sobrevivecircncia

Entretanto eacute importante reconhecer que houve um salto positivo quando discutimos terri-toacuterio espaccedilo puacuteblico e relaccedilotildees sociais sob a perspectiva da cidade democraacutetica principalmentepor esta reconhecer a participaccedilatildeo social sobretudo na ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e na tomada

de decisotildees poliacuteticas que em muitos casos ocorrem motivadas por reivindicaccedilotildees conformeveremos adiante quando apontarmos o reconhecimento do direito agrave cidade no Brasil

14 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

O Prefeito de Satildeo Paulo Fernando Haddad pedalando durante a inauguraccedilatildeo do maior mural de grafite a ceacuteu aberto da Ameacuterica Latina na

avenida 23 de maio (creacutedito Heloisa BallariniSECOM)

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Direito agrave Cidade | 15

2 As cidades brasileiras e

seu processo de urbanizaccedilatildeo

Com base no contexto apresentado partiremos entatildeo para a realidade brasileira e seusinuacutemeros desafios Em decorrecircncia de um passado como colocircnia o processo de urbanizaccedilatildeo noBrasil eacute heranccedila do desenvolvimento tardio desigual e combinado Ocorreu somente no seacuteculoXX com a chegada das induacutestrias faacutebricas e empresas de grande porte generalizando-se pelo

territoacuterio nacional apenas a partir da deacutecada de 1970 Se o processo de urbanizaccedilatildeo e formaccedilatildeodas cidades industriais europeias como afirma Lefebvre (2001) ocorreu em fins do seacuteculo XVIIIe iniacutecio do seacuteculo XIX com a expansatildeo e desenvolvimento do modo de produccedilatildeo capitalista foisomente no seacuteculo XX que nosso paiacutes superou o modelo arcaico de organizaccedilatildeo e produccedilatildeoadotando a partir de entatildeo o modelo capitalista mas com muitas marcas desse passadoagroexportador o que explica de certo modo a dependecircncia da economia internacional

Ao mesmo tempo em que a dependecircncia econocircmica em relaccedilatildeo ao capital financeiro inter-nacional eacute histoacuterica haacute de se considerar tambeacutem que trouxe benefiacutecios para o desenvolvimento

de infraestrutura em atividades relacionadas ao trabalho Essa situaccedilatildeo contribuiu portantopara o financiamento e a construccedilatildeo de ferrovias portos navegaccedilatildeo e geraccedilatildeo de eletricidadefatores essenciais para o processo de desenvolvimento industrial

O urbanizaccedilatildeo do Brasil foi tardia ocorrendo apenas apoacutes a industrializaccedilatildeo generalizada no seacuteculo XX (creacutedito Imagens USP)

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16 | Cadernos de Formaccedilatildeo

De acordo com Ermiacutenia Maricato (2003) em 1890 a populaccedilatildeo urbana totalizava uma meacutediade 68 a 10 Com a emergecircncia da matildeo de obra livre ou seja a relaccedilatildeo de trabalho baseada nomodo de produccedilatildeo capitalista esses nuacutemeros se elevaram As cidades representavam o futuro

a modernidade e todas as expectativas de mudanccedila no aspecto social e cultural do paiacutes Foi so-mente depois da Revoluccedilatildeo de 1930 que esse cenaacuterio se modificou de fato ao incorporar poliacuteti-

cas puacuteblicas no processo de urbanizaccedilatildeo e industrializaccedilatildeo ultrapassando o modelo econocircmicoagroexportador e a poliacutetica do ldquocafeacute com leiterdquo (Repuacuteblica Oligaacuterquica)

No entanto o vieacutes autoritaacuterio populista e paternalista do periacuteodo possibilitou a con-tinuidade de um Estado que trabalhava aliado aos interesses da oligarquia Prosseguiu

assim a desigualdade entre as classes sociais e outras heranccedilas do periacuteodo colonial comoa concentraccedilatildeo de terra de renda e de poder expressa nas relaccedilotildees de favor mando obe-

diecircncia e arbiacutetrio nas decisotildees legais (MARICATO 2003) Essa modernizaccedilatildeo com base no de-senvolvimento do atraso deixou suas marcas nas metroacutepoles brasileiras como a segregaccedilatildeoterritorial e os danos ao meio ambiente

Esse cenaacuterio soacute pocircde ser evidenciado deacutecadas depois agrave medida que as cidades brasilei-ras foram ficando cada vez mais ldquoassociadas agrave violecircncia poluiccedilatildeo das aacuteguas e do ar crianccediladesamparada traacutefego caoacutetico enchentes entre outros inuacutemeros malesrdquo (MARICATO 2003 p152) Isso porque conforme o desenvolvimento do paiacutes extinguiram-se as oportunidades para a

populaccedilatildeo imigrante e tambeacutem migrante Cresceram as periferias de forma exorbitante assim

como a pobreza e a alta densidade de ocupaccedilatildeo do solo Esses fatores geraram uma ampla se-gregaccedilatildeo urbana eou ambiental aleacutem das dificuldades de acesso aos serviccedilos puacuteblicos comotransporte saneamento abastecimento sauacutede educaccedilatildeo creches e lazer

Curiosidades sobre a cidade de Satildeo Paulo

Sobre a populaccedilatildeo urbana em Satildeo Paulo

1872 ndash 30 mil habitantes1900 ndash 240 mil habitantesAnos 1950 ndash populaccedilatildeo passou de pouco mais de2 milhotildees de habitantes para mais de 35 milhotildees

(motivo expansatildeo do setor industrial)2000 ndash passa de 10 milhotildees2010 ndash passa de 11 milhotildees e 200 mil

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Direito agrave Cidade | 17

2Mananciais correspondem a reservas hiacutedricas ou fontes utilizadas para o abastecimento puacuteblico de aacutegua Disponiacutevel em lthttpsitesabesp

combrsiteinternaDefaultaspxsecaoId=31gt Acesso em 10 ago 2015

21 O direito agrave cidade e a Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade

O direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta que soacute recentemente ndash final doseacuteculo XX ndash passou a ter reconhecimento mundial apesar de seu significado protagonis-mo essencial para esse reconhecimento principalmente no que diz respeito agrave implemen-taccedilatildeo da reforma urbana Destaca-se assim o Movimento Nacional pela Reforma Urbanaque criado em 1985 consolidou no Brasil a luta pelo direito agrave cidade na deacutecada de 1980

Utilidade puacuteblica

O portal da prefeitura de Satildeo Paulo

disponibiliza informaccedilotildees sobre ohistoacuterico demograacutefico da cidade deSatildeo Paulo com inuacutemeras ilus-traccedilotildees antigas dos pontos maisconhecidos do municiacutepio Acessehttpsmduprefeituraspgovbr

historico_demograficoindexphp

O crescimento desordenado gerou ocupaccedilotildees em aacutereas de mananciais2 e topos de morrondash que natildeo satildeo de interesse do mercado imobiliaacuterio dada a restriccedilatildeo pela legislaccedilatildeo urbaniacutesti-ca ndash criando aacutereas residenciais propensas a enchentes desmoronamentos e deslizamentos de

terras Some-se a isso um contexto de desemprego discriminaccedilatildeo informalidade e ilegalidadedado ao grande contingente populacional Por outro lado recursos puacuteblicos e privados satildeo cadavez mais utilizados para investimentos em aacutereas concentradas que satildeo valorizadas porque pas-

sam a dispor de saneamento baacutesico asfalto transporte e seguranccedila o que soacute beneficia o capitalimobiliaacuterio a construccedilatildeo civil e o estoque de terras urbanas dentre outros interesses da burgue-sia nacional e internacional

Portanto a questatildeo urbana e habitacional deve ser compreendida com base na relaccedilatildeo poliacuteticae econocircmica da sociedade brasileira aleacutem de algumas particularidades em sua formaccedilatildeo soacutecio-his-

toacuterica uma vez que ao mesmo tempo em que a populaccedilatildeo convive com um cenaacuterio mediado poralugueacuteis altos imoacuteveis ilegais e deacuteficit habitacional bairros com infraestrutura urbana se beneficiamda especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Conclui-se que essa questatildeo eacute produto do capitalismo e expressa suascontradiccedilotildees no cotidiano vivido por seus habitantes num contexto urbano de violaccedilatildeo dos direitos

humanos como o direito agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave moradia entre outros Como resposta agraves inuacutemerascondiccedilotildees precaacuterias de vida grupos atuam em diversos setores sociais em busca de mudanccedilas nomodo de governar planejar e desenvolver as cidades isto eacute lutam pelo direito agrave cidade

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18 | Cadernos de Formaccedilatildeo

Esse periacuteodo foi marcado pela efervescecircncia de debates e manifestaccedilotildees poliacuteticas de di-ferentes segmentos da sociedade civil que reivindicavam melhorias na cidade e na democra-tizaccedilatildeo do processo poliacutetico Em 1987 com a convergecircncia desses debates assim como com a

correlaccedilatildeo de forccedilas vigente foi criado o Foacuterum Nacional pela Reforma Urbana cujo objetivoprincipal era inserir a questatildeo urbana como pauta da agenda puacuteblica Esse movimento no finaldo regime militar passou a adotar uma concepccedilatildeo de cidade na sua totalidade entendendo o

direito agrave cidade como um direito coletivo que busca alcanccedilar ldquoa cidade de todos a casa aleacutem dacasa a casa com asfalto com serviccedilos puacuteblicos com escola com transporte com direito a umavida socialrdquo (SAULE JR amp UZZO 2009)

Vale ressaltar o protagonismo desse movimento junto a outros grupos populares (or-ganizaccedilotildees da sociedade civil movimentos sociais de luta pela moradia pastorais entida-

des de profissatildeo etc) que travaram um embate com as forccedilas poliacuteticas conservadoras naAssembleia Nacional Constituinte o que culminou posteriormente na influecircncia dessesgrupos sobre a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 sobretudo em relaccedilatildeo agraves temaacuteticas do campourbano Baseando-se na compreensatildeo de certo descaso do poder puacuteblico sobre segregaccedilatildeo

territorial saneamento habitaccedilatildeo e transporte esses grupos elaboraram uma proposta delei para inserccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal com vistas a atuar nesse contexto e participar doprocesso de criaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

De acordo com Nelson Saule Jr e Karina Uzzo (2009) o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana no ano de 1986 ldquodefine o conceito de reforma urbana como uma nova eacutetica socialrdquo erepudiam ldquoa cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitosrdquo Foi inau-gurada assim de forma criacutetica e em acircmbito nacional uma proposta de reforma urbana por meioda construccedilatildeo de uma plataforma poliacutetica que reivindicava uma nova cidade e o fim dos privileacute-

A populaccedilatildeo de Satildeo Paulo apresenta algumas especificidades em termos demograacuteficos eurbanos entre as quais merecem destaque certos aspectos de gecircnero e idade assim como sua

distribuiccedilatildeo territorial (importante quando se debate direito agrave cidade como direito humanomulher idosos e regiotildees perifeacutericas)

Feminilizaccedilatildeo ao longo dos anos tem sido crescente a predominacircncia numeacuterica de mulhe-res no conjunto da populaccedilatildeo Dados do Censo de 1980 indicam naquela data uma proporccedilatildeo

de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no municiacutepio Em 2000 essa relaccedilatildeo jaacute erade 91 para 100 e estima-se que atualmente esteja em torno de 90 ou seja existem 9 homenspara cada 10 mulheres na cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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20 | Cadernos de Formaccedilatildeo

bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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Expediente

Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo

Fernando Haddad ndash Prefeito

Eduardo Matarazzo Suplicy ndash Secretaacuterio de Direitos Humanos e Cidadania

Guilherme Assis de Almeida ndash Secretaacuterio Adjunto de Direitos Humanos e Cidadania

Giordano Morangueira Magri ndash Chefe de Gabinete

Maria Joseacute Scardua ndash Coordenadora da Poliacutetica Municipal de Participaccedilatildeo Social

Eduardo Santarelo Lucas e Karen KristensenMedaglia Motta (estagiaacuteria) ndash Equipe da Coordenaccedilatildeo de Participaccedilatildeo Social

Instituto Paulo Freire

Paulo Freire ndash Patrono

Moacir Gadotti ndash Presidente de Honra

Alexandre Munck ndash Diretor Administrativo-Financeiro

Acircngela Antunes Francisca Pini e Paulo Roberto Padilha ndash Diretores Pedagoacutegicos

Nataacutelia Caetano ndash Coordenadora do Projeto

Editora Instituto Paulo Freire

Janaina Abreu ndash Coordenaccedilatildeo Graacutefico-Editorial

Aline Inforsato e Izabela Roveri ndash Identidade Visual Projeto Graacutefico Diagramaccedilatildeo e Arte-Final

Acircngela Antunes Francisca Pini Julio Talhari Moacir Gadotti e Paulo Roberto

Padilha ndash Preparaccedilatildeo de Originais e Revisatildeo de Conteuacutedo

Daniel Shinzato Janaina Abreu e Julio Talhari ndash Revisatildeo

Alcir de Souza Caria Amanda Guazzelli Deisy Boscaratto Fabiano Angeacutelico

Lina Rosa Nataacutelia Caetano Rosemeire Silva Samara Marino Sandra Vaz

Sheila Ceccon Washington Goacutees ndash Pesquisadores - Redatores

Flaacutevia Rolim ndash Colaboradora

Capa

Foto de capa ndash Embratur

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4 | Cadernos de Formaccedilatildeo

Palavras do prefeito

Guarda Civil Municipal (GCM) utiliza bicicletas em ronda na aacuterea da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (creacutedito Marcelo UlissesGCM)

Eacute com grande satisfaccedilatildeo que apresento 20 publicaccedilotildees ineacuteditas coordenadas pela Secre-taria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) para os processos de formaccedilatildeo de

conselheiros(as) em direitos humanos e participaccedilatildeo social Trata-se de sete Cadernos de For-maccedilatildeo dois Cadernos de Orientaccedilatildeo dez Cadernos de Colegiados e um Caderno do Ciclo Partici-pativo de Planejamento e Orccedilamento

O objetivo eacute permitir uma melhor compreensatildeo das relaccedilotildees entre direitos humanos cida-dania Educaccedilatildeo Popular participaccedilatildeo social direito agrave cidade bem como apresentar formas eferramentas de gestatildeo mais participativas adotadas pela atual administraccedilatildeo Nesse sentido

apresentamos tambeacutem dez importantes conselhos desta cidade sua composiccedilatildeo estruturafuncionamento e o mais importante como e onde participar

Estas publicaccedilotildees demonstram o esforccedilo da atual administraccedilatildeo municipal em ampliar equalificar cada vez mais o diaacutelogo entre governo e sociedade civil para fortalecer a democraciaparticipativa nesta cidade

Satildeo Paulo dezembro de 2015Fernando Haddad

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Eacute uma grande satisfaccedilatildeo para a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SM-DHC) de Satildeo Paulo entregar agrave populaccedilatildeo de nossa cidade estes sete Cadernos de Formaccedilatildeo

Apesar de ser um oacutergatildeo com pouco tempo de existecircncia muito nos orgulham as inuacutemeras rea-lizaccedilotildees que ela conseguiu conquistar Uma delas foi a oferta de cursos de formaccedilatildeo e produccedilatildeode subsiacutedios teoacuterico-praacuteticos

As publicaccedilotildees que ora entregamos satildeo destinadas a todos(as) os(as) cidadatildeos(atildes) que seinteressam pelos assuntos aqui tratados e em especial aos conselheiros(as) municipais que

lutam pela defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que haacute anos vecircm demandando cursos e

materiais de formaccedilatildeo que possam subsidiar a sua atuaccedilatildeoComo os(as) leitores(as) poderatildeo perceber a SMDHC convidou outras secretarias de gover-no para tambeacutem fazerem parte desta coleccedilatildeo estabelecendo as devidas relaccedilotildees entre suasrespectivas atuaccedilotildees e a promoccedilatildeo dos direitos humanos um importante marco da Gestatildeo

Fernando Haddad Assim natildeo apenas se valoriza a democracia representativa como tambeacutemse impulsiona cada vez mais a necessaacuteria democracia participativa e consequentemente osprocessos de gestatildeo e de participaccedilatildeo social de maneira dialoacutegica e transparente o que resultanuma cidade mais justa mais plural e mais respeitosa em relaccedilatildeo agrave diversidade

Ao definirmos a estrutura desta coleccedilatildeo respeitando a especificidade de cada caderno

buscamos sempre associar cada tiacutetulo ao tema geral dos direitos humanos numa perspectivainterdisciplinar intersecretarial e intersetorial Dois cadernos um deles intitulado Conselhos

Participativos Municipais e o outro Planejamento e Orccedilamento couberam agrave Secretaria Muni-

cipal de Relaccedilotildees Governamentais (SMRG) O de Governo Aberto estaacute relacionado agrave SecretariaMunicipal de Relaccedilotildees Internacionais e Federativas (SMRIF) Os outros quatro cadernos satildeo di-retamente vinculados agraves atividades da proacutepria SMDHC a saber Direitos Humanos e Cidadania

Educaccedilatildeo Popular e Direitos Humanos Participaccedilatildeo Social e Direitos Humanos e Direito agrave Cidade

Estamos certos de que publicaccedilotildees como estas muito podem contribuir para o fortalecimentoda democracia participativa bem como para a ampliaccedilatildeo da transparecircncia e da promoccedilatildeo da jus-ticcedila social e econocircmica consequentemente para uma cidade mais justa sustentaacutevel e solidaacuteria

Satildeo Paulo dezembro de 2015Eduardo Matarazzo Suplicy

Palavras do secretaacuterio

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IntroduccedilatildeoPrezados conselheiros e prezadas conselheiras da cidade de Satildeo Paulo

Para Paulo Freire patrono da Educaccedilatildeo Brasileira a aprendizagem acontece ao longo davida Eacute um processo contiacutenuo e permanente sem um momento certo para ocorrer Ensinar eaprender exigem a consciecircncia de que somos seres inacabados e incompletos curiosos quesabemos escutar que temos abertura e aceitamos o novo que refletimos criticamente sobre apraacutetica e que rejeitamos toda e qualquer forma de discriminaccedilatildeo

A disponibilidade para o diaacutelogo a humildade a generosidade e a alegria de ensinar eaprender satildeo tambeacutem caracteriacutesticas fundamentais para que haja aprendizado Isso aumenta

nossa convicccedilatildeo de que a mudanccedila eacute possiacutevel por mais que a realidade se apresente como algoaparentemente jaacute dado e imutaacutevel

Se ainda nos deparamos com qualquer tipo de violaccedilatildeo aos direitos humanos temos diantede noacutes o desafio de educarmos e de nos educarmos para intervirmos nessa realidade injusta

Com determinaccedilatildeo e esperanccedila fica mais faacutecil a defesa dos direitos da inclusatildeo sociocultural eda compreensatildeo de que toda pessoa pode e deve contribuir para processos de ensino e de apren-dizagem emancipatoacuterios Quem se emancipa torna-se mais autocircnomo e livre

Foi justamente nessa direccedilatildeo que apoacutes consultados conselheiros e conselheiras integran-tes dos oacutergatildeos da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) solicitaram agrave

Coordenaccedilatildeo de Participaccedilatildeo Social cursos de formaccedilatildeoAleacutem de oferecer os cursos a SMDHC sugeriu tambeacutem a criaccedilatildeo desta seacuterie de sete cader-

nos de formaccedilatildeo composta por diferentes temas que se completam Pretende-se assim agre-gar ainda mais qualidade na atuaccedilatildeo de conselheiros e conselheiras na cidade de Satildeo Paulo Paraconcretizar esse objetivo a SMDHC contou com a contribuiccedilatildeo do Instituto Paulo Freire (IPF)

organizaccedilatildeo da sociedade civil de interesse puacuteblico sem fins lucrativos que haacute 25 anos atuapara o fomento da educaccedilatildeo como meio de promoccedilatildeo dos direitos humanos

Este Caderno de Formaccedilatildeo Direito agrave Cidade convida-nos a pensar em algumas caracteriacutesticasda megaloacutepole de Satildeo Paulo com quase 12 milhotildees de habitantes bem como de outras cidades

A cidade natildeo dorme a cidade transpira a cidade acolhe a cidade inspiraA cidade eacute conflito a cidade eacute dura a cidade eacute beleza a cidade eacute feiura

A cidade eacute palco a cidade eacute cenaacuterio a cidade eacute desejo a cidade eacute trabalhoA cidade eacute arte a cidade eacute cultura a cidade eacute esporte a cidade eacute ternura

[hellip]

Nossa cidade taacute prenha nossa cidade taacute nuaNossa cidade educa ela eacute todinha sua

Nossa cidade merece um pouco mais de poesiaDe norte a sul leste-oeste centro e periferia

Nossa cidade arrepia1

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8 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

Quais imagens e sentimentos os versos acima nos trazem O quanto a cidade onde vivemosaproxima-se ou distancia-se da cidade dos nossos sonhos Eacute possiacutevel ampliar a participaccedilatildeosocial na definiccedilatildeo da gestatildeo e ocupaccedilatildeo dos espaccedilos puacuteblicos Essas e outras questotildees seratildeo

discutidas neste caderno Faremos referecircncia a tratados estatutos e legislaccedilotildees que procuramregular a poliacutetica de desenvolvimento urbano e as funccedilotildees sociais da cidade visando ao bem-es-tar de seus habitantes

Este caderno proposto pela SMDHC e por sua Coordenaccedilatildeo do Direito agrave Cidade estimula-nosao fortalecimento da defesa dos direitos humanos pois mostra que a cidade pertence a todos eque todos tambeacutem satildeo responsaacuteveis pela garantia do direito a ela

O primeiro capiacutetulo traccedila um panorama sobre a constituiccedilatildeo das cidades mostra comosurgiram e se desenvolveram Tambeacutem analisa as relaccedilotildees sociais no contexto da defesa do

direito agrave cidade

No segundo capiacutetulo discute-se o processo de urbanizaccedilatildeo brasileiro os fundamentos denosso direito agrave cidade em diferentes acircmbitos bem como nos permite entender a funccedilatildeo socialda cidade e da proacutepria propriedade

Ao tratar da implementaccedilatildeo do direito agrave cidade no municiacutepio de Satildeo Paulo o terceiro capiacutetu-

lo mergulha nas discussotildees sobre a poliacutetica habitacional as novas agendas de direitos humanose a gestatildeo democraacutetica Convida-nos assim a novas formas de participaccedilatildeo e de apropriaccedilatildeo doespaccedilo puacuteblico Aleacutem dos avanccedilos jaacute obtidos em Satildeo Paulo fica o desafio da luta permanente detodos pela garantia ao direito agrave cidade que se associa ao direito agrave dignidade Isso exige de todosdisponibilidade criatividade e intensa participaccedilatildeo social

Satildeo Paulo dezembro de 2015Equipe do Instituto Paulo Freire

1Trechos do poema da muacutesica ldquoA cidaderdquo de Paulo Roberto Padilha (CD Velho Amigo Satildeo Paulo 2014)

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1 A constituiccedilatildeo das cidadesQuando se pensa ou se reivindica o direito agrave cidade certamente se faz referecircncia a alguns

aspectos que de acordo com determinada compreensatildeo satildeo extremamente necessaacuterios agrave vida

urbana um haacutebitat que facilite as relaccedilotildees sociais sentimento de pertencimento a fim de tor-nar possiacutevel a apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico condiccedilotildees dignas de vida valorizaccedilatildeo das pessoase dos espaccedilos de convivecircncia novas formas de participaccedilatildeo social na administraccedilatildeo puacuteblica lo-cal igualdade de direitos Para que isso se concretize algumas mudanccedilas satildeo almejadas o querepresenta evidentemente a superaccedilatildeo de certos desafios

Pretendemos aqui apresentar reflexotildees iniciais que abordem a cidade como expressatildeo decriatividade de transformaccedilatildeo mas tambeacutem de relaccedilotildees de dominaccedilatildeo opressatildeo segregaccedilatildeo edisputa de interesses O objetivo portanto eacute contribuir para um debate que se fundamenta naconcepccedilatildeo do direito agrave cidade como direito humano

11 Cidade compreensatildeo que temos e defendemos

Se a cidade revela o conjuntode coisas que fazemos na vida coti-diana que vai da nossa existecircnciaagraves formas como nos relacionamoscom os outros isso significa que

ela representa um estilo de vidamuito particular em comparaccedilatildeo aoutros lugares se considerarmoszonas mais ou menos urbanas ru-rais ou mesmo rurbanas Essa di-

ferenccedila eacute estabelecida pela forma

de organizaccedilatildeo e sua densidadepopulacional com zonas residen-ciais comerciais e industriais quedemandam infraestruturaserviccedilos de transporte atividade econocircmica e assim por diante Eacute

nesse ambiente que nos socializamos aprendemos a nos comunicar e nos transformamoscom base nos saberes coletivos Eacute tambeacutem onde atuamos para manter nossa condiccedilatildeo mate-rial de existecircncia a fim de suprir as necessidades vitais

Contudo ao se propor uma reflexatildeo sobre a cidade eacute importante salientar que ela possui

um conjunto de significados que ultrapassam uma definiccedilatildeo mais precisa Nesse sentido a con-cepccedilatildeo de cidade em que nos baseamos eacute aquela que agrega a vida cotidiana das pessoas quedesempenham papeacuteis sociais e reproduzem sua existecircncia em niacuteveis riquiacutessimos de cultura de

Satildeo Paulo possui hoje mais de 11 milhotildees de habitantes (creacutedito MarcosSantosUSP Imagens)

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12 A importacircncia de compreendermos a histoacuteria e o surgimento das cidades

Recorrer agrave histoacuteria da humanida-de eacute fundamental para compreendero significado do direito agrave cidade comodireito humano Isso porque homens emulheres se inserem na cidade por in-

teiro com necessidades materiais e so-

ciais Raquel Rolnik (1995) ao definir oque eacute cidade identifica seu surgimen-to e transformaccedilotildees como expressatildeoda racionalidade humana capacidade

de abstraccedilatildeo memoacuteria manutenccedilatildeode relaccedilotildees sociais e poliacuteticas adapta-ccedilatildeo ao trabalho coletivo e agrave especializaccedilatildeo (o que vai gerar o circuito de troca e consumo)

A autora aponta algumas dimensotildees essenciais na constituiccedilatildeo de qualquer cidade Uma delas

eacute o poder de atraccedilatildeo ndash a imagem eacute a da ldquocidade como um imatilderdquo ndash que originalmente esteve associado

aos templos religiosos sobretudo na Mesopotacircmia no terceiro milecircnio antes da era cristatilde Ali os pri-meiros nuacutecleos urbanos se reuniram para a construccedilatildeo dos zigurates ndash locais cerimoniais ndash no mesmomomento em que se iniciou o processo de sedentarizaccedilatildeo com a ocupaccedilatildeo permanente do territoacuteriopara a agricultura e moradia

A intervenccedilatildeo humana na natureza desde a fabricaccedilatildeo tijolos para a edificaccedilatildeo de templosateacute a construccedilatildeo de cidades inteiras se ampliou de tal modo que a humanidade passou cada vezmais a interagir com um meio construiacutedo Surgiu entatildeo uma nova relaccedilatildeo em que a arquitetura setransformou num repositoacuterio da memoacuteria coletiva registro das accedilotildees dos antepassados de modo

a poder ser lida como um texto Eacute a ldquocidade como escritardquo nas palavras de Rolnik (1995) que elevao niacutevel de abstraccedilatildeo de homens e mulheres e exige uma racionalidade que nessa mesma eacutepocafez surgir aleacutem da escrita padrotildees de medida e formas de gestatildeo do trabalho coletivo

relaccedilotildees interculturais e intertransculturais A cidade soacute existe porque haacute pessoas que a fazemem sua estrutura e dinacircmica

Quando se fala em relaccedilotildees de forccedila e interesses em conflito eacute indispensaacutevel pensar que essasituaccedilatildeo estaacute integrada agrave dinacircmica da cidade e ao cotidiano vivido Historicamente a cidade repre-senta esse conjunto de relaccedilotildees sociais e materiais de existecircncia A vida urbana ganha estrutura eforma por meio do conjunto de accedilotildees e relaccedilotildees envolvidas no arranjo territorial e administrativo nocomeacutercio na divisatildeo social do trabalho e no proacuteprio processo de urbanizaccedilatildeo Fica evidente assim

que a centralidade desse processo se encontra em algo substantivamente humano De fato as ci-dades contemporacircneas (sobretudo as grandes metroacutepoles) com imensos edifiacutecios torres parquesestradas e assim por diante satildeo o resultado de um longo percurso histoacuterico relacionado ao trabalho

Zigurate na Mesopotacircmia atual Iraque

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13 Relaccedilotildees sociais e direito de expressatildeo numa cidade democraacutetica

Pensemos agora nos tempos atuais e numa cidade democraacutetica em que a liberdade de ex-pressatildeo e manifestaccedilatildeo das diferentes opiniotildees satildeo possiacuteveis qual significado existe na organi-zaccedilatildeo da vida puacuteblica Como as relaccedilotildees satildeo ou podem vir a ser estabelecidas

Existe uma predominacircncia do mercado nas cidades principalmente quando evidenciamos oestaacutegio em que o modo de produccedilatildeo coletivo foi organizando-se na relaccedilatildeo capitalista de produccedilatildeoestaacutegio de desenvolvimento da sociedade atual As pessoas para satisfazerem suas necessidadesmais simples de subsistecircncia tem de se inserir no circuito de trocas representado pelo mercadoe mediado pelo dinheiro No entanto consumimos produtos por meio da aquisiccedilatildeo da moeda de

troca que representa o valor equivalente do produto vendido no mercado Esse valor vai para obolso do produtor Essa relaccedilatildeo organiza a estrutura do trabalho e da vida nas cidades pois tudo eacutemediado pela moeda de troca Assim a forccedila de trabalho eacute transformada em mercadoria e passa a

ocultar o acuacutemulo de excedente por parte dos donos dos meios de produccedilatildeo que se apropriam deforma desigual do valor dos produtos vendidos

E eacute justamente a vida coletiva que se configura como caracteriacutestica fundamental dos nuacute-cleos urbanos e sua gestatildeo ndash organizaccedilatildeo dos fluxos de pessoas das aglomeraccedilotildees regulamen-taccedilatildeo do cotidiano ndash que revela a ldquocidade poliacuteticardquo (ROLNIK 1995) A cidade poliacutetica caracteri-

za-se pela centralidade do poder urbano e pela hierarquizaccedilatildeo social que ao longo da histoacuteriase desenvolveu por meio da dominaccedilatildeo e do autoritarismo poliacutetico-administrativo com origemna cidadela fortificada e no poder do rei com base na guerra Desde a poacutelis grega passando pelacivitas romana a cidade poliacutetica eacute menos um espaccedilo geograacutefico do que uma praacutetica social base-ada nas relaccedilotildees de poder de modo que ldquocidadatildeordquo designava na Greacutecia antiga aquele que podiaparticipar da vida poliacutetica e natildeo todos os habitantes Isso explica porque em muitas cidades

contemporacircneas como Satildeo Paulo que natildeo possuem centro ou apresentam muacuteltiplas centrali-dades o poder poliacutetico natildeo deixou de estar concentrado nas matildeos de alguns poucos grupos Eacuteque o processo de hierarquizaccedilatildeo e controle social nem sempre implicou concentraccedilatildeo espacial

sobretudo apoacutes os avanccedilos tecnoloacutegicos recentes

Todas essas dimensotildees da cidade ndash seu poder de atraccedilatildeo sua abertura para a escritadas accedilotildees humanas seu aspecto poliacutetico ndash como diz Rolnik (1995 p 25-26) ldquoao concentrare aglomerar as pessoas intensifica as possibilidades de troca e colaboraccedilatildeo entre os ho-mens potencializando sua capacidade produtivardquo Eacute o que permite vermos a ldquocidade comomercadordquo e revela o trabalho como elemento central para o surgimento das cidades Os

determinantes estatildeo em trecircs componentes que para Rolnik satildeo essenciais especializaccedilatildeodo trabalho coletivo circuito de troca e consumo A especializaccedilatildeo comeccedilou jaacute com a divisatildeo

entre campo e cidade passou pela divisatildeo de atividades dentro da proacutepria cidade e culminoucom a especializaccedilatildeo entre cidades o que permitiu intensificaccedilatildeo das trocas e fez com queo campo natildeo fosse mais apenas fornecedor (de alimentos) mas consumidor de produtos

oriundos dos centros urbanos

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Esses aglomerados urbanos satildeo produtos de inuacutemeras accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovi-das pelo Estado por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio comercial)e a pela proacutepria populaccedilatildeo e expressam as disparidades existentes na sociedade contemporacircnea

ou seja na sociedade do capital Dentre elas temos produccedilatildeo imobiliaacuteria privada majoritariamentedestinada agraves classes meacutedias e altas praacutetica da retenccedilatildeo de terras ociosas de diferentes segmentosdo capital nas aacutereas urbanizadas utilizadas para futura especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ausecircncia de poliacuteti-

cas significativas em habitaccedilatildeo que quando ocorrem resumem-se na construccedilatildeo de moradias nasperiferias das cidades ausecircncia de regulaccedilatildeo dos valores estabelecidos para as aacutereas centrais falta

de incentivo ao estabelecimento de moradias populares

Foto Jorge MarutaJornal da USP USP Imagens

desconsiderar as dimensotildees poliacuteticas e econocircmicas presentes nesse contexto pois satildeo essasrelaccedilotildees que determinam a funccedilatildeo social da cidade Com essa compreensatildeo eacute possiacutevel imaginaras relaccedilotildees sociais (interaccedilotildees positivas ou conflitantes) dos habitantes com seus familiares

amigos comunidades e tambeacutem com o Estado por meio do uso de espaccedilos e serviccedilos puacuteblicosou privados em lugares que satildeo parte do seu cotidiano

Para a nossa discussatildeo tomaremos por base a compreensatildeo sobre cidades perifeacutericas especifi-camente aquelas existentes nos paiacuteses comumente chamados de subdesenvolvidos emergentesou perifeacutericos para situar a realidade brasileira e considerar todas as particularidades que emergemquando defendemos o direito agrave cidade Apesar de suas singularidades ndash como tamanho da popula-

ccedilatildeo composiccedilatildeo eacutetnica extensatildeo territorial e costumes ndash essas cidades apresentam tambeacutem se-melhanccedilas como os grandes aglomerados urbanos que em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas

afastadas do centro urbano e satildeo marcados por significativa extensatildeo territorial e presenccedila de casasinacabadas com reduzido ambiente construtivo alta densidade populacional inexistecircncia de aacutereasverdes proximidade de rios ou coacuterregos falta de ordenamento do sistema viaacuterio restriccedilatildeo de mobi-lidade urbana com pouca diversidade e disponibilidade de transporte coletivo bem como precaacuteria

infraestrutura viaacuteria baixa oferta de serviccedilos e equipamentos puacuteblicos de sauacutede educaccedilatildeo lazeresportes e cultura altos iacutendices de violecircncia

Favela Paraisoacutepolis localizada na zona sul da cidade de Satildeo Paulo (creacutedito Jorge MarutaJornal da USPUsp Imagens)

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Eacute nesse cenaacuterio que inuacutemeras formas de opressatildeo satildeo naturalizadas e tecircm respaldo inclu-sive legal como no caso da segregaccedilatildeo territorial ligada agrave propriedade privada fenocircmeno tido

como ldquoaceitaacutevelrdquo e protegido por lei A cidade que temos ainda eacute em grande parte e infelizmen-te aquela das taxas de lucro da propriedade privada e das desigualdades em que o capital jaacute

em seu estaacutegio financeiro vem alcanccedilando um ldquoterreno lucrativo para a produccedilatildeo e absorccedilatildeo deexcedente de capitalrdquo (HARVEY 2012 p 74) Mas a cidade que queremos eacute aquela que possibi-lita o exerciacutecio da liberdade democraacutetica e da criatividade expressa no territoacuterio vivido e que natildeoestaacute subordinada agrave relaccedilatildeo de troca Uma cidade humanizada capaz de estabelecer o direito emsua totalidade para que todos possam viver de forma livre e diversificada natildeo fazendo da vidacotidiana uma mera sobrevivecircncia

Entretanto eacute importante reconhecer que houve um salto positivo quando discutimos terri-toacuterio espaccedilo puacuteblico e relaccedilotildees sociais sob a perspectiva da cidade democraacutetica principalmentepor esta reconhecer a participaccedilatildeo social sobretudo na ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e na tomada

de decisotildees poliacuteticas que em muitos casos ocorrem motivadas por reivindicaccedilotildees conformeveremos adiante quando apontarmos o reconhecimento do direito agrave cidade no Brasil

14 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

O Prefeito de Satildeo Paulo Fernando Haddad pedalando durante a inauguraccedilatildeo do maior mural de grafite a ceacuteu aberto da Ameacuterica Latina na

avenida 23 de maio (creacutedito Heloisa BallariniSECOM)

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2 As cidades brasileiras e

seu processo de urbanizaccedilatildeo

Com base no contexto apresentado partiremos entatildeo para a realidade brasileira e seusinuacutemeros desafios Em decorrecircncia de um passado como colocircnia o processo de urbanizaccedilatildeo noBrasil eacute heranccedila do desenvolvimento tardio desigual e combinado Ocorreu somente no seacuteculoXX com a chegada das induacutestrias faacutebricas e empresas de grande porte generalizando-se pelo

territoacuterio nacional apenas a partir da deacutecada de 1970 Se o processo de urbanizaccedilatildeo e formaccedilatildeodas cidades industriais europeias como afirma Lefebvre (2001) ocorreu em fins do seacuteculo XVIIIe iniacutecio do seacuteculo XIX com a expansatildeo e desenvolvimento do modo de produccedilatildeo capitalista foisomente no seacuteculo XX que nosso paiacutes superou o modelo arcaico de organizaccedilatildeo e produccedilatildeoadotando a partir de entatildeo o modelo capitalista mas com muitas marcas desse passadoagroexportador o que explica de certo modo a dependecircncia da economia internacional

Ao mesmo tempo em que a dependecircncia econocircmica em relaccedilatildeo ao capital financeiro inter-nacional eacute histoacuterica haacute de se considerar tambeacutem que trouxe benefiacutecios para o desenvolvimento

de infraestrutura em atividades relacionadas ao trabalho Essa situaccedilatildeo contribuiu portantopara o financiamento e a construccedilatildeo de ferrovias portos navegaccedilatildeo e geraccedilatildeo de eletricidadefatores essenciais para o processo de desenvolvimento industrial

O urbanizaccedilatildeo do Brasil foi tardia ocorrendo apenas apoacutes a industrializaccedilatildeo generalizada no seacuteculo XX (creacutedito Imagens USP)

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16 | Cadernos de Formaccedilatildeo

De acordo com Ermiacutenia Maricato (2003) em 1890 a populaccedilatildeo urbana totalizava uma meacutediade 68 a 10 Com a emergecircncia da matildeo de obra livre ou seja a relaccedilatildeo de trabalho baseada nomodo de produccedilatildeo capitalista esses nuacutemeros se elevaram As cidades representavam o futuro

a modernidade e todas as expectativas de mudanccedila no aspecto social e cultural do paiacutes Foi so-mente depois da Revoluccedilatildeo de 1930 que esse cenaacuterio se modificou de fato ao incorporar poliacuteti-

cas puacuteblicas no processo de urbanizaccedilatildeo e industrializaccedilatildeo ultrapassando o modelo econocircmicoagroexportador e a poliacutetica do ldquocafeacute com leiterdquo (Repuacuteblica Oligaacuterquica)

No entanto o vieacutes autoritaacuterio populista e paternalista do periacuteodo possibilitou a con-tinuidade de um Estado que trabalhava aliado aos interesses da oligarquia Prosseguiu

assim a desigualdade entre as classes sociais e outras heranccedilas do periacuteodo colonial comoa concentraccedilatildeo de terra de renda e de poder expressa nas relaccedilotildees de favor mando obe-

diecircncia e arbiacutetrio nas decisotildees legais (MARICATO 2003) Essa modernizaccedilatildeo com base no de-senvolvimento do atraso deixou suas marcas nas metroacutepoles brasileiras como a segregaccedilatildeoterritorial e os danos ao meio ambiente

Esse cenaacuterio soacute pocircde ser evidenciado deacutecadas depois agrave medida que as cidades brasilei-ras foram ficando cada vez mais ldquoassociadas agrave violecircncia poluiccedilatildeo das aacuteguas e do ar crianccediladesamparada traacutefego caoacutetico enchentes entre outros inuacutemeros malesrdquo (MARICATO 2003 p152) Isso porque conforme o desenvolvimento do paiacutes extinguiram-se as oportunidades para a

populaccedilatildeo imigrante e tambeacutem migrante Cresceram as periferias de forma exorbitante assim

como a pobreza e a alta densidade de ocupaccedilatildeo do solo Esses fatores geraram uma ampla se-gregaccedilatildeo urbana eou ambiental aleacutem das dificuldades de acesso aos serviccedilos puacuteblicos comotransporte saneamento abastecimento sauacutede educaccedilatildeo creches e lazer

Curiosidades sobre a cidade de Satildeo Paulo

Sobre a populaccedilatildeo urbana em Satildeo Paulo

1872 ndash 30 mil habitantes1900 ndash 240 mil habitantesAnos 1950 ndash populaccedilatildeo passou de pouco mais de2 milhotildees de habitantes para mais de 35 milhotildees

(motivo expansatildeo do setor industrial)2000 ndash passa de 10 milhotildees2010 ndash passa de 11 milhotildees e 200 mil

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Direito agrave Cidade | 17

2Mananciais correspondem a reservas hiacutedricas ou fontes utilizadas para o abastecimento puacuteblico de aacutegua Disponiacutevel em lthttpsitesabesp

combrsiteinternaDefaultaspxsecaoId=31gt Acesso em 10 ago 2015

21 O direito agrave cidade e a Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade

O direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta que soacute recentemente ndash final doseacuteculo XX ndash passou a ter reconhecimento mundial apesar de seu significado protagonis-mo essencial para esse reconhecimento principalmente no que diz respeito agrave implemen-taccedilatildeo da reforma urbana Destaca-se assim o Movimento Nacional pela Reforma Urbanaque criado em 1985 consolidou no Brasil a luta pelo direito agrave cidade na deacutecada de 1980

Utilidade puacuteblica

O portal da prefeitura de Satildeo Paulo

disponibiliza informaccedilotildees sobre ohistoacuterico demograacutefico da cidade deSatildeo Paulo com inuacutemeras ilus-traccedilotildees antigas dos pontos maisconhecidos do municiacutepio Acessehttpsmduprefeituraspgovbr

historico_demograficoindexphp

O crescimento desordenado gerou ocupaccedilotildees em aacutereas de mananciais2 e topos de morrondash que natildeo satildeo de interesse do mercado imobiliaacuterio dada a restriccedilatildeo pela legislaccedilatildeo urbaniacutesti-ca ndash criando aacutereas residenciais propensas a enchentes desmoronamentos e deslizamentos de

terras Some-se a isso um contexto de desemprego discriminaccedilatildeo informalidade e ilegalidadedado ao grande contingente populacional Por outro lado recursos puacuteblicos e privados satildeo cadavez mais utilizados para investimentos em aacutereas concentradas que satildeo valorizadas porque pas-

sam a dispor de saneamento baacutesico asfalto transporte e seguranccedila o que soacute beneficia o capitalimobiliaacuterio a construccedilatildeo civil e o estoque de terras urbanas dentre outros interesses da burgue-sia nacional e internacional

Portanto a questatildeo urbana e habitacional deve ser compreendida com base na relaccedilatildeo poliacuteticae econocircmica da sociedade brasileira aleacutem de algumas particularidades em sua formaccedilatildeo soacutecio-his-

toacuterica uma vez que ao mesmo tempo em que a populaccedilatildeo convive com um cenaacuterio mediado poralugueacuteis altos imoacuteveis ilegais e deacuteficit habitacional bairros com infraestrutura urbana se beneficiamda especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Conclui-se que essa questatildeo eacute produto do capitalismo e expressa suascontradiccedilotildees no cotidiano vivido por seus habitantes num contexto urbano de violaccedilatildeo dos direitos

humanos como o direito agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave moradia entre outros Como resposta agraves inuacutemerascondiccedilotildees precaacuterias de vida grupos atuam em diversos setores sociais em busca de mudanccedilas nomodo de governar planejar e desenvolver as cidades isto eacute lutam pelo direito agrave cidade

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Esse periacuteodo foi marcado pela efervescecircncia de debates e manifestaccedilotildees poliacuteticas de di-ferentes segmentos da sociedade civil que reivindicavam melhorias na cidade e na democra-tizaccedilatildeo do processo poliacutetico Em 1987 com a convergecircncia desses debates assim como com a

correlaccedilatildeo de forccedilas vigente foi criado o Foacuterum Nacional pela Reforma Urbana cujo objetivoprincipal era inserir a questatildeo urbana como pauta da agenda puacuteblica Esse movimento no finaldo regime militar passou a adotar uma concepccedilatildeo de cidade na sua totalidade entendendo o

direito agrave cidade como um direito coletivo que busca alcanccedilar ldquoa cidade de todos a casa aleacutem dacasa a casa com asfalto com serviccedilos puacuteblicos com escola com transporte com direito a umavida socialrdquo (SAULE JR amp UZZO 2009)

Vale ressaltar o protagonismo desse movimento junto a outros grupos populares (or-ganizaccedilotildees da sociedade civil movimentos sociais de luta pela moradia pastorais entida-

des de profissatildeo etc) que travaram um embate com as forccedilas poliacuteticas conservadoras naAssembleia Nacional Constituinte o que culminou posteriormente na influecircncia dessesgrupos sobre a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 sobretudo em relaccedilatildeo agraves temaacuteticas do campourbano Baseando-se na compreensatildeo de certo descaso do poder puacuteblico sobre segregaccedilatildeo

territorial saneamento habitaccedilatildeo e transporte esses grupos elaboraram uma proposta delei para inserccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal com vistas a atuar nesse contexto e participar doprocesso de criaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

De acordo com Nelson Saule Jr e Karina Uzzo (2009) o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana no ano de 1986 ldquodefine o conceito de reforma urbana como uma nova eacutetica socialrdquo erepudiam ldquoa cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitosrdquo Foi inau-gurada assim de forma criacutetica e em acircmbito nacional uma proposta de reforma urbana por meioda construccedilatildeo de uma plataforma poliacutetica que reivindicava uma nova cidade e o fim dos privileacute-

A populaccedilatildeo de Satildeo Paulo apresenta algumas especificidades em termos demograacuteficos eurbanos entre as quais merecem destaque certos aspectos de gecircnero e idade assim como sua

distribuiccedilatildeo territorial (importante quando se debate direito agrave cidade como direito humanomulher idosos e regiotildees perifeacutericas)

Feminilizaccedilatildeo ao longo dos anos tem sido crescente a predominacircncia numeacuterica de mulhe-res no conjunto da populaccedilatildeo Dados do Censo de 1980 indicam naquela data uma proporccedilatildeo

de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no municiacutepio Em 2000 essa relaccedilatildeo jaacute erade 91 para 100 e estima-se que atualmente esteja em torno de 90 ou seja existem 9 homenspara cada 10 mulheres na cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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38 | Cadernos de Formaccedilatildeo

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Sites

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Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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4 | Cadernos de Formaccedilatildeo

Palavras do prefeito

Guarda Civil Municipal (GCM) utiliza bicicletas em ronda na aacuterea da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (creacutedito Marcelo UlissesGCM)

Eacute com grande satisfaccedilatildeo que apresento 20 publicaccedilotildees ineacuteditas coordenadas pela Secre-taria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) para os processos de formaccedilatildeo de

conselheiros(as) em direitos humanos e participaccedilatildeo social Trata-se de sete Cadernos de For-maccedilatildeo dois Cadernos de Orientaccedilatildeo dez Cadernos de Colegiados e um Caderno do Ciclo Partici-pativo de Planejamento e Orccedilamento

O objetivo eacute permitir uma melhor compreensatildeo das relaccedilotildees entre direitos humanos cida-dania Educaccedilatildeo Popular participaccedilatildeo social direito agrave cidade bem como apresentar formas eferramentas de gestatildeo mais participativas adotadas pela atual administraccedilatildeo Nesse sentido

apresentamos tambeacutem dez importantes conselhos desta cidade sua composiccedilatildeo estruturafuncionamento e o mais importante como e onde participar

Estas publicaccedilotildees demonstram o esforccedilo da atual administraccedilatildeo municipal em ampliar equalificar cada vez mais o diaacutelogo entre governo e sociedade civil para fortalecer a democraciaparticipativa nesta cidade

Satildeo Paulo dezembro de 2015Fernando Haddad

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Eacute uma grande satisfaccedilatildeo para a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SM-DHC) de Satildeo Paulo entregar agrave populaccedilatildeo de nossa cidade estes sete Cadernos de Formaccedilatildeo

Apesar de ser um oacutergatildeo com pouco tempo de existecircncia muito nos orgulham as inuacutemeras rea-lizaccedilotildees que ela conseguiu conquistar Uma delas foi a oferta de cursos de formaccedilatildeo e produccedilatildeode subsiacutedios teoacuterico-praacuteticos

As publicaccedilotildees que ora entregamos satildeo destinadas a todos(as) os(as) cidadatildeos(atildes) que seinteressam pelos assuntos aqui tratados e em especial aos conselheiros(as) municipais que

lutam pela defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que haacute anos vecircm demandando cursos e

materiais de formaccedilatildeo que possam subsidiar a sua atuaccedilatildeoComo os(as) leitores(as) poderatildeo perceber a SMDHC convidou outras secretarias de gover-no para tambeacutem fazerem parte desta coleccedilatildeo estabelecendo as devidas relaccedilotildees entre suasrespectivas atuaccedilotildees e a promoccedilatildeo dos direitos humanos um importante marco da Gestatildeo

Fernando Haddad Assim natildeo apenas se valoriza a democracia representativa como tambeacutemse impulsiona cada vez mais a necessaacuteria democracia participativa e consequentemente osprocessos de gestatildeo e de participaccedilatildeo social de maneira dialoacutegica e transparente o que resultanuma cidade mais justa mais plural e mais respeitosa em relaccedilatildeo agrave diversidade

Ao definirmos a estrutura desta coleccedilatildeo respeitando a especificidade de cada caderno

buscamos sempre associar cada tiacutetulo ao tema geral dos direitos humanos numa perspectivainterdisciplinar intersecretarial e intersetorial Dois cadernos um deles intitulado Conselhos

Participativos Municipais e o outro Planejamento e Orccedilamento couberam agrave Secretaria Muni-

cipal de Relaccedilotildees Governamentais (SMRG) O de Governo Aberto estaacute relacionado agrave SecretariaMunicipal de Relaccedilotildees Internacionais e Federativas (SMRIF) Os outros quatro cadernos satildeo di-retamente vinculados agraves atividades da proacutepria SMDHC a saber Direitos Humanos e Cidadania

Educaccedilatildeo Popular e Direitos Humanos Participaccedilatildeo Social e Direitos Humanos e Direito agrave Cidade

Estamos certos de que publicaccedilotildees como estas muito podem contribuir para o fortalecimentoda democracia participativa bem como para a ampliaccedilatildeo da transparecircncia e da promoccedilatildeo da jus-ticcedila social e econocircmica consequentemente para uma cidade mais justa sustentaacutevel e solidaacuteria

Satildeo Paulo dezembro de 2015Eduardo Matarazzo Suplicy

Palavras do secretaacuterio

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IntroduccedilatildeoPrezados conselheiros e prezadas conselheiras da cidade de Satildeo Paulo

Para Paulo Freire patrono da Educaccedilatildeo Brasileira a aprendizagem acontece ao longo davida Eacute um processo contiacutenuo e permanente sem um momento certo para ocorrer Ensinar eaprender exigem a consciecircncia de que somos seres inacabados e incompletos curiosos quesabemos escutar que temos abertura e aceitamos o novo que refletimos criticamente sobre apraacutetica e que rejeitamos toda e qualquer forma de discriminaccedilatildeo

A disponibilidade para o diaacutelogo a humildade a generosidade e a alegria de ensinar eaprender satildeo tambeacutem caracteriacutesticas fundamentais para que haja aprendizado Isso aumenta

nossa convicccedilatildeo de que a mudanccedila eacute possiacutevel por mais que a realidade se apresente como algoaparentemente jaacute dado e imutaacutevel

Se ainda nos deparamos com qualquer tipo de violaccedilatildeo aos direitos humanos temos diantede noacutes o desafio de educarmos e de nos educarmos para intervirmos nessa realidade injusta

Com determinaccedilatildeo e esperanccedila fica mais faacutecil a defesa dos direitos da inclusatildeo sociocultural eda compreensatildeo de que toda pessoa pode e deve contribuir para processos de ensino e de apren-dizagem emancipatoacuterios Quem se emancipa torna-se mais autocircnomo e livre

Foi justamente nessa direccedilatildeo que apoacutes consultados conselheiros e conselheiras integran-tes dos oacutergatildeos da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) solicitaram agrave

Coordenaccedilatildeo de Participaccedilatildeo Social cursos de formaccedilatildeoAleacutem de oferecer os cursos a SMDHC sugeriu tambeacutem a criaccedilatildeo desta seacuterie de sete cader-

nos de formaccedilatildeo composta por diferentes temas que se completam Pretende-se assim agre-gar ainda mais qualidade na atuaccedilatildeo de conselheiros e conselheiras na cidade de Satildeo Paulo Paraconcretizar esse objetivo a SMDHC contou com a contribuiccedilatildeo do Instituto Paulo Freire (IPF)

organizaccedilatildeo da sociedade civil de interesse puacuteblico sem fins lucrativos que haacute 25 anos atuapara o fomento da educaccedilatildeo como meio de promoccedilatildeo dos direitos humanos

Este Caderno de Formaccedilatildeo Direito agrave Cidade convida-nos a pensar em algumas caracteriacutesticasda megaloacutepole de Satildeo Paulo com quase 12 milhotildees de habitantes bem como de outras cidades

A cidade natildeo dorme a cidade transpira a cidade acolhe a cidade inspiraA cidade eacute conflito a cidade eacute dura a cidade eacute beleza a cidade eacute feiura

A cidade eacute palco a cidade eacute cenaacuterio a cidade eacute desejo a cidade eacute trabalhoA cidade eacute arte a cidade eacute cultura a cidade eacute esporte a cidade eacute ternura

[hellip]

Nossa cidade taacute prenha nossa cidade taacute nuaNossa cidade educa ela eacute todinha sua

Nossa cidade merece um pouco mais de poesiaDe norte a sul leste-oeste centro e periferia

Nossa cidade arrepia1

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8 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

Quais imagens e sentimentos os versos acima nos trazem O quanto a cidade onde vivemosaproxima-se ou distancia-se da cidade dos nossos sonhos Eacute possiacutevel ampliar a participaccedilatildeosocial na definiccedilatildeo da gestatildeo e ocupaccedilatildeo dos espaccedilos puacuteblicos Essas e outras questotildees seratildeo

discutidas neste caderno Faremos referecircncia a tratados estatutos e legislaccedilotildees que procuramregular a poliacutetica de desenvolvimento urbano e as funccedilotildees sociais da cidade visando ao bem-es-tar de seus habitantes

Este caderno proposto pela SMDHC e por sua Coordenaccedilatildeo do Direito agrave Cidade estimula-nosao fortalecimento da defesa dos direitos humanos pois mostra que a cidade pertence a todos eque todos tambeacutem satildeo responsaacuteveis pela garantia do direito a ela

O primeiro capiacutetulo traccedila um panorama sobre a constituiccedilatildeo das cidades mostra comosurgiram e se desenvolveram Tambeacutem analisa as relaccedilotildees sociais no contexto da defesa do

direito agrave cidade

No segundo capiacutetulo discute-se o processo de urbanizaccedilatildeo brasileiro os fundamentos denosso direito agrave cidade em diferentes acircmbitos bem como nos permite entender a funccedilatildeo socialda cidade e da proacutepria propriedade

Ao tratar da implementaccedilatildeo do direito agrave cidade no municiacutepio de Satildeo Paulo o terceiro capiacutetu-

lo mergulha nas discussotildees sobre a poliacutetica habitacional as novas agendas de direitos humanose a gestatildeo democraacutetica Convida-nos assim a novas formas de participaccedilatildeo e de apropriaccedilatildeo doespaccedilo puacuteblico Aleacutem dos avanccedilos jaacute obtidos em Satildeo Paulo fica o desafio da luta permanente detodos pela garantia ao direito agrave cidade que se associa ao direito agrave dignidade Isso exige de todosdisponibilidade criatividade e intensa participaccedilatildeo social

Satildeo Paulo dezembro de 2015Equipe do Instituto Paulo Freire

1Trechos do poema da muacutesica ldquoA cidaderdquo de Paulo Roberto Padilha (CD Velho Amigo Satildeo Paulo 2014)

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1 A constituiccedilatildeo das cidadesQuando se pensa ou se reivindica o direito agrave cidade certamente se faz referecircncia a alguns

aspectos que de acordo com determinada compreensatildeo satildeo extremamente necessaacuterios agrave vida

urbana um haacutebitat que facilite as relaccedilotildees sociais sentimento de pertencimento a fim de tor-nar possiacutevel a apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico condiccedilotildees dignas de vida valorizaccedilatildeo das pessoase dos espaccedilos de convivecircncia novas formas de participaccedilatildeo social na administraccedilatildeo puacuteblica lo-cal igualdade de direitos Para que isso se concretize algumas mudanccedilas satildeo almejadas o querepresenta evidentemente a superaccedilatildeo de certos desafios

Pretendemos aqui apresentar reflexotildees iniciais que abordem a cidade como expressatildeo decriatividade de transformaccedilatildeo mas tambeacutem de relaccedilotildees de dominaccedilatildeo opressatildeo segregaccedilatildeo edisputa de interesses O objetivo portanto eacute contribuir para um debate que se fundamenta naconcepccedilatildeo do direito agrave cidade como direito humano

11 Cidade compreensatildeo que temos e defendemos

Se a cidade revela o conjuntode coisas que fazemos na vida coti-diana que vai da nossa existecircnciaagraves formas como nos relacionamoscom os outros isso significa que

ela representa um estilo de vidamuito particular em comparaccedilatildeo aoutros lugares se considerarmoszonas mais ou menos urbanas ru-rais ou mesmo rurbanas Essa di-

ferenccedila eacute estabelecida pela forma

de organizaccedilatildeo e sua densidadepopulacional com zonas residen-ciais comerciais e industriais quedemandam infraestruturaserviccedilos de transporte atividade econocircmica e assim por diante Eacute

nesse ambiente que nos socializamos aprendemos a nos comunicar e nos transformamoscom base nos saberes coletivos Eacute tambeacutem onde atuamos para manter nossa condiccedilatildeo mate-rial de existecircncia a fim de suprir as necessidades vitais

Contudo ao se propor uma reflexatildeo sobre a cidade eacute importante salientar que ela possui

um conjunto de significados que ultrapassam uma definiccedilatildeo mais precisa Nesse sentido a con-cepccedilatildeo de cidade em que nos baseamos eacute aquela que agrega a vida cotidiana das pessoas quedesempenham papeacuteis sociais e reproduzem sua existecircncia em niacuteveis riquiacutessimos de cultura de

Satildeo Paulo possui hoje mais de 11 milhotildees de habitantes (creacutedito MarcosSantosUSP Imagens)

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10 | Cadernos de Formaccedilatildeo

12 A importacircncia de compreendermos a histoacuteria e o surgimento das cidades

Recorrer agrave histoacuteria da humanida-de eacute fundamental para compreendero significado do direito agrave cidade comodireito humano Isso porque homens emulheres se inserem na cidade por in-

teiro com necessidades materiais e so-

ciais Raquel Rolnik (1995) ao definir oque eacute cidade identifica seu surgimen-to e transformaccedilotildees como expressatildeoda racionalidade humana capacidade

de abstraccedilatildeo memoacuteria manutenccedilatildeode relaccedilotildees sociais e poliacuteticas adapta-ccedilatildeo ao trabalho coletivo e agrave especializaccedilatildeo (o que vai gerar o circuito de troca e consumo)

A autora aponta algumas dimensotildees essenciais na constituiccedilatildeo de qualquer cidade Uma delas

eacute o poder de atraccedilatildeo ndash a imagem eacute a da ldquocidade como um imatilderdquo ndash que originalmente esteve associado

aos templos religiosos sobretudo na Mesopotacircmia no terceiro milecircnio antes da era cristatilde Ali os pri-meiros nuacutecleos urbanos se reuniram para a construccedilatildeo dos zigurates ndash locais cerimoniais ndash no mesmomomento em que se iniciou o processo de sedentarizaccedilatildeo com a ocupaccedilatildeo permanente do territoacuteriopara a agricultura e moradia

A intervenccedilatildeo humana na natureza desde a fabricaccedilatildeo tijolos para a edificaccedilatildeo de templosateacute a construccedilatildeo de cidades inteiras se ampliou de tal modo que a humanidade passou cada vezmais a interagir com um meio construiacutedo Surgiu entatildeo uma nova relaccedilatildeo em que a arquitetura setransformou num repositoacuterio da memoacuteria coletiva registro das accedilotildees dos antepassados de modo

a poder ser lida como um texto Eacute a ldquocidade como escritardquo nas palavras de Rolnik (1995) que elevao niacutevel de abstraccedilatildeo de homens e mulheres e exige uma racionalidade que nessa mesma eacutepocafez surgir aleacutem da escrita padrotildees de medida e formas de gestatildeo do trabalho coletivo

relaccedilotildees interculturais e intertransculturais A cidade soacute existe porque haacute pessoas que a fazemem sua estrutura e dinacircmica

Quando se fala em relaccedilotildees de forccedila e interesses em conflito eacute indispensaacutevel pensar que essasituaccedilatildeo estaacute integrada agrave dinacircmica da cidade e ao cotidiano vivido Historicamente a cidade repre-senta esse conjunto de relaccedilotildees sociais e materiais de existecircncia A vida urbana ganha estrutura eforma por meio do conjunto de accedilotildees e relaccedilotildees envolvidas no arranjo territorial e administrativo nocomeacutercio na divisatildeo social do trabalho e no proacuteprio processo de urbanizaccedilatildeo Fica evidente assim

que a centralidade desse processo se encontra em algo substantivamente humano De fato as ci-dades contemporacircneas (sobretudo as grandes metroacutepoles) com imensos edifiacutecios torres parquesestradas e assim por diante satildeo o resultado de um longo percurso histoacuterico relacionado ao trabalho

Zigurate na Mesopotacircmia atual Iraque

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13 Relaccedilotildees sociais e direito de expressatildeo numa cidade democraacutetica

Pensemos agora nos tempos atuais e numa cidade democraacutetica em que a liberdade de ex-pressatildeo e manifestaccedilatildeo das diferentes opiniotildees satildeo possiacuteveis qual significado existe na organi-zaccedilatildeo da vida puacuteblica Como as relaccedilotildees satildeo ou podem vir a ser estabelecidas

Existe uma predominacircncia do mercado nas cidades principalmente quando evidenciamos oestaacutegio em que o modo de produccedilatildeo coletivo foi organizando-se na relaccedilatildeo capitalista de produccedilatildeoestaacutegio de desenvolvimento da sociedade atual As pessoas para satisfazerem suas necessidadesmais simples de subsistecircncia tem de se inserir no circuito de trocas representado pelo mercadoe mediado pelo dinheiro No entanto consumimos produtos por meio da aquisiccedilatildeo da moeda de

troca que representa o valor equivalente do produto vendido no mercado Esse valor vai para obolso do produtor Essa relaccedilatildeo organiza a estrutura do trabalho e da vida nas cidades pois tudo eacutemediado pela moeda de troca Assim a forccedila de trabalho eacute transformada em mercadoria e passa a

ocultar o acuacutemulo de excedente por parte dos donos dos meios de produccedilatildeo que se apropriam deforma desigual do valor dos produtos vendidos

E eacute justamente a vida coletiva que se configura como caracteriacutestica fundamental dos nuacute-cleos urbanos e sua gestatildeo ndash organizaccedilatildeo dos fluxos de pessoas das aglomeraccedilotildees regulamen-taccedilatildeo do cotidiano ndash que revela a ldquocidade poliacuteticardquo (ROLNIK 1995) A cidade poliacutetica caracteri-

za-se pela centralidade do poder urbano e pela hierarquizaccedilatildeo social que ao longo da histoacuteriase desenvolveu por meio da dominaccedilatildeo e do autoritarismo poliacutetico-administrativo com origemna cidadela fortificada e no poder do rei com base na guerra Desde a poacutelis grega passando pelacivitas romana a cidade poliacutetica eacute menos um espaccedilo geograacutefico do que uma praacutetica social base-ada nas relaccedilotildees de poder de modo que ldquocidadatildeordquo designava na Greacutecia antiga aquele que podiaparticipar da vida poliacutetica e natildeo todos os habitantes Isso explica porque em muitas cidades

contemporacircneas como Satildeo Paulo que natildeo possuem centro ou apresentam muacuteltiplas centrali-dades o poder poliacutetico natildeo deixou de estar concentrado nas matildeos de alguns poucos grupos Eacuteque o processo de hierarquizaccedilatildeo e controle social nem sempre implicou concentraccedilatildeo espacial

sobretudo apoacutes os avanccedilos tecnoloacutegicos recentes

Todas essas dimensotildees da cidade ndash seu poder de atraccedilatildeo sua abertura para a escritadas accedilotildees humanas seu aspecto poliacutetico ndash como diz Rolnik (1995 p 25-26) ldquoao concentrare aglomerar as pessoas intensifica as possibilidades de troca e colaboraccedilatildeo entre os ho-mens potencializando sua capacidade produtivardquo Eacute o que permite vermos a ldquocidade comomercadordquo e revela o trabalho como elemento central para o surgimento das cidades Os

determinantes estatildeo em trecircs componentes que para Rolnik satildeo essenciais especializaccedilatildeodo trabalho coletivo circuito de troca e consumo A especializaccedilatildeo comeccedilou jaacute com a divisatildeo

entre campo e cidade passou pela divisatildeo de atividades dentro da proacutepria cidade e culminoucom a especializaccedilatildeo entre cidades o que permitiu intensificaccedilatildeo das trocas e fez com queo campo natildeo fosse mais apenas fornecedor (de alimentos) mas consumidor de produtos

oriundos dos centros urbanos

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Esses aglomerados urbanos satildeo produtos de inuacutemeras accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovi-das pelo Estado por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio comercial)e a pela proacutepria populaccedilatildeo e expressam as disparidades existentes na sociedade contemporacircnea

ou seja na sociedade do capital Dentre elas temos produccedilatildeo imobiliaacuteria privada majoritariamentedestinada agraves classes meacutedias e altas praacutetica da retenccedilatildeo de terras ociosas de diferentes segmentosdo capital nas aacutereas urbanizadas utilizadas para futura especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ausecircncia de poliacuteti-

cas significativas em habitaccedilatildeo que quando ocorrem resumem-se na construccedilatildeo de moradias nasperiferias das cidades ausecircncia de regulaccedilatildeo dos valores estabelecidos para as aacutereas centrais falta

de incentivo ao estabelecimento de moradias populares

Foto Jorge MarutaJornal da USP USP Imagens

desconsiderar as dimensotildees poliacuteticas e econocircmicas presentes nesse contexto pois satildeo essasrelaccedilotildees que determinam a funccedilatildeo social da cidade Com essa compreensatildeo eacute possiacutevel imaginaras relaccedilotildees sociais (interaccedilotildees positivas ou conflitantes) dos habitantes com seus familiares

amigos comunidades e tambeacutem com o Estado por meio do uso de espaccedilos e serviccedilos puacuteblicosou privados em lugares que satildeo parte do seu cotidiano

Para a nossa discussatildeo tomaremos por base a compreensatildeo sobre cidades perifeacutericas especifi-camente aquelas existentes nos paiacuteses comumente chamados de subdesenvolvidos emergentesou perifeacutericos para situar a realidade brasileira e considerar todas as particularidades que emergemquando defendemos o direito agrave cidade Apesar de suas singularidades ndash como tamanho da popula-

ccedilatildeo composiccedilatildeo eacutetnica extensatildeo territorial e costumes ndash essas cidades apresentam tambeacutem se-melhanccedilas como os grandes aglomerados urbanos que em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas

afastadas do centro urbano e satildeo marcados por significativa extensatildeo territorial e presenccedila de casasinacabadas com reduzido ambiente construtivo alta densidade populacional inexistecircncia de aacutereasverdes proximidade de rios ou coacuterregos falta de ordenamento do sistema viaacuterio restriccedilatildeo de mobi-lidade urbana com pouca diversidade e disponibilidade de transporte coletivo bem como precaacuteria

infraestrutura viaacuteria baixa oferta de serviccedilos e equipamentos puacuteblicos de sauacutede educaccedilatildeo lazeresportes e cultura altos iacutendices de violecircncia

Favela Paraisoacutepolis localizada na zona sul da cidade de Satildeo Paulo (creacutedito Jorge MarutaJornal da USPUsp Imagens)

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Eacute nesse cenaacuterio que inuacutemeras formas de opressatildeo satildeo naturalizadas e tecircm respaldo inclu-sive legal como no caso da segregaccedilatildeo territorial ligada agrave propriedade privada fenocircmeno tido

como ldquoaceitaacutevelrdquo e protegido por lei A cidade que temos ainda eacute em grande parte e infelizmen-te aquela das taxas de lucro da propriedade privada e das desigualdades em que o capital jaacute

em seu estaacutegio financeiro vem alcanccedilando um ldquoterreno lucrativo para a produccedilatildeo e absorccedilatildeo deexcedente de capitalrdquo (HARVEY 2012 p 74) Mas a cidade que queremos eacute aquela que possibi-lita o exerciacutecio da liberdade democraacutetica e da criatividade expressa no territoacuterio vivido e que natildeoestaacute subordinada agrave relaccedilatildeo de troca Uma cidade humanizada capaz de estabelecer o direito emsua totalidade para que todos possam viver de forma livre e diversificada natildeo fazendo da vidacotidiana uma mera sobrevivecircncia

Entretanto eacute importante reconhecer que houve um salto positivo quando discutimos terri-toacuterio espaccedilo puacuteblico e relaccedilotildees sociais sob a perspectiva da cidade democraacutetica principalmentepor esta reconhecer a participaccedilatildeo social sobretudo na ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e na tomada

de decisotildees poliacuteticas que em muitos casos ocorrem motivadas por reivindicaccedilotildees conformeveremos adiante quando apontarmos o reconhecimento do direito agrave cidade no Brasil

14 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

O Prefeito de Satildeo Paulo Fernando Haddad pedalando durante a inauguraccedilatildeo do maior mural de grafite a ceacuteu aberto da Ameacuterica Latina na

avenida 23 de maio (creacutedito Heloisa BallariniSECOM)

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2 As cidades brasileiras e

seu processo de urbanizaccedilatildeo

Com base no contexto apresentado partiremos entatildeo para a realidade brasileira e seusinuacutemeros desafios Em decorrecircncia de um passado como colocircnia o processo de urbanizaccedilatildeo noBrasil eacute heranccedila do desenvolvimento tardio desigual e combinado Ocorreu somente no seacuteculoXX com a chegada das induacutestrias faacutebricas e empresas de grande porte generalizando-se pelo

territoacuterio nacional apenas a partir da deacutecada de 1970 Se o processo de urbanizaccedilatildeo e formaccedilatildeodas cidades industriais europeias como afirma Lefebvre (2001) ocorreu em fins do seacuteculo XVIIIe iniacutecio do seacuteculo XIX com a expansatildeo e desenvolvimento do modo de produccedilatildeo capitalista foisomente no seacuteculo XX que nosso paiacutes superou o modelo arcaico de organizaccedilatildeo e produccedilatildeoadotando a partir de entatildeo o modelo capitalista mas com muitas marcas desse passadoagroexportador o que explica de certo modo a dependecircncia da economia internacional

Ao mesmo tempo em que a dependecircncia econocircmica em relaccedilatildeo ao capital financeiro inter-nacional eacute histoacuterica haacute de se considerar tambeacutem que trouxe benefiacutecios para o desenvolvimento

de infraestrutura em atividades relacionadas ao trabalho Essa situaccedilatildeo contribuiu portantopara o financiamento e a construccedilatildeo de ferrovias portos navegaccedilatildeo e geraccedilatildeo de eletricidadefatores essenciais para o processo de desenvolvimento industrial

O urbanizaccedilatildeo do Brasil foi tardia ocorrendo apenas apoacutes a industrializaccedilatildeo generalizada no seacuteculo XX (creacutedito Imagens USP)

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16 | Cadernos de Formaccedilatildeo

De acordo com Ermiacutenia Maricato (2003) em 1890 a populaccedilatildeo urbana totalizava uma meacutediade 68 a 10 Com a emergecircncia da matildeo de obra livre ou seja a relaccedilatildeo de trabalho baseada nomodo de produccedilatildeo capitalista esses nuacutemeros se elevaram As cidades representavam o futuro

a modernidade e todas as expectativas de mudanccedila no aspecto social e cultural do paiacutes Foi so-mente depois da Revoluccedilatildeo de 1930 que esse cenaacuterio se modificou de fato ao incorporar poliacuteti-

cas puacuteblicas no processo de urbanizaccedilatildeo e industrializaccedilatildeo ultrapassando o modelo econocircmicoagroexportador e a poliacutetica do ldquocafeacute com leiterdquo (Repuacuteblica Oligaacuterquica)

No entanto o vieacutes autoritaacuterio populista e paternalista do periacuteodo possibilitou a con-tinuidade de um Estado que trabalhava aliado aos interesses da oligarquia Prosseguiu

assim a desigualdade entre as classes sociais e outras heranccedilas do periacuteodo colonial comoa concentraccedilatildeo de terra de renda e de poder expressa nas relaccedilotildees de favor mando obe-

diecircncia e arbiacutetrio nas decisotildees legais (MARICATO 2003) Essa modernizaccedilatildeo com base no de-senvolvimento do atraso deixou suas marcas nas metroacutepoles brasileiras como a segregaccedilatildeoterritorial e os danos ao meio ambiente

Esse cenaacuterio soacute pocircde ser evidenciado deacutecadas depois agrave medida que as cidades brasilei-ras foram ficando cada vez mais ldquoassociadas agrave violecircncia poluiccedilatildeo das aacuteguas e do ar crianccediladesamparada traacutefego caoacutetico enchentes entre outros inuacutemeros malesrdquo (MARICATO 2003 p152) Isso porque conforme o desenvolvimento do paiacutes extinguiram-se as oportunidades para a

populaccedilatildeo imigrante e tambeacutem migrante Cresceram as periferias de forma exorbitante assim

como a pobreza e a alta densidade de ocupaccedilatildeo do solo Esses fatores geraram uma ampla se-gregaccedilatildeo urbana eou ambiental aleacutem das dificuldades de acesso aos serviccedilos puacuteblicos comotransporte saneamento abastecimento sauacutede educaccedilatildeo creches e lazer

Curiosidades sobre a cidade de Satildeo Paulo

Sobre a populaccedilatildeo urbana em Satildeo Paulo

1872 ndash 30 mil habitantes1900 ndash 240 mil habitantesAnos 1950 ndash populaccedilatildeo passou de pouco mais de2 milhotildees de habitantes para mais de 35 milhotildees

(motivo expansatildeo do setor industrial)2000 ndash passa de 10 milhotildees2010 ndash passa de 11 milhotildees e 200 mil

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Direito agrave Cidade | 17

2Mananciais correspondem a reservas hiacutedricas ou fontes utilizadas para o abastecimento puacuteblico de aacutegua Disponiacutevel em lthttpsitesabesp

combrsiteinternaDefaultaspxsecaoId=31gt Acesso em 10 ago 2015

21 O direito agrave cidade e a Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade

O direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta que soacute recentemente ndash final doseacuteculo XX ndash passou a ter reconhecimento mundial apesar de seu significado protagonis-mo essencial para esse reconhecimento principalmente no que diz respeito agrave implemen-taccedilatildeo da reforma urbana Destaca-se assim o Movimento Nacional pela Reforma Urbanaque criado em 1985 consolidou no Brasil a luta pelo direito agrave cidade na deacutecada de 1980

Utilidade puacuteblica

O portal da prefeitura de Satildeo Paulo

disponibiliza informaccedilotildees sobre ohistoacuterico demograacutefico da cidade deSatildeo Paulo com inuacutemeras ilus-traccedilotildees antigas dos pontos maisconhecidos do municiacutepio Acessehttpsmduprefeituraspgovbr

historico_demograficoindexphp

O crescimento desordenado gerou ocupaccedilotildees em aacutereas de mananciais2 e topos de morrondash que natildeo satildeo de interesse do mercado imobiliaacuterio dada a restriccedilatildeo pela legislaccedilatildeo urbaniacutesti-ca ndash criando aacutereas residenciais propensas a enchentes desmoronamentos e deslizamentos de

terras Some-se a isso um contexto de desemprego discriminaccedilatildeo informalidade e ilegalidadedado ao grande contingente populacional Por outro lado recursos puacuteblicos e privados satildeo cadavez mais utilizados para investimentos em aacutereas concentradas que satildeo valorizadas porque pas-

sam a dispor de saneamento baacutesico asfalto transporte e seguranccedila o que soacute beneficia o capitalimobiliaacuterio a construccedilatildeo civil e o estoque de terras urbanas dentre outros interesses da burgue-sia nacional e internacional

Portanto a questatildeo urbana e habitacional deve ser compreendida com base na relaccedilatildeo poliacuteticae econocircmica da sociedade brasileira aleacutem de algumas particularidades em sua formaccedilatildeo soacutecio-his-

toacuterica uma vez que ao mesmo tempo em que a populaccedilatildeo convive com um cenaacuterio mediado poralugueacuteis altos imoacuteveis ilegais e deacuteficit habitacional bairros com infraestrutura urbana se beneficiamda especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Conclui-se que essa questatildeo eacute produto do capitalismo e expressa suascontradiccedilotildees no cotidiano vivido por seus habitantes num contexto urbano de violaccedilatildeo dos direitos

humanos como o direito agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave moradia entre outros Como resposta agraves inuacutemerascondiccedilotildees precaacuterias de vida grupos atuam em diversos setores sociais em busca de mudanccedilas nomodo de governar planejar e desenvolver as cidades isto eacute lutam pelo direito agrave cidade

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Esse periacuteodo foi marcado pela efervescecircncia de debates e manifestaccedilotildees poliacuteticas de di-ferentes segmentos da sociedade civil que reivindicavam melhorias na cidade e na democra-tizaccedilatildeo do processo poliacutetico Em 1987 com a convergecircncia desses debates assim como com a

correlaccedilatildeo de forccedilas vigente foi criado o Foacuterum Nacional pela Reforma Urbana cujo objetivoprincipal era inserir a questatildeo urbana como pauta da agenda puacuteblica Esse movimento no finaldo regime militar passou a adotar uma concepccedilatildeo de cidade na sua totalidade entendendo o

direito agrave cidade como um direito coletivo que busca alcanccedilar ldquoa cidade de todos a casa aleacutem dacasa a casa com asfalto com serviccedilos puacuteblicos com escola com transporte com direito a umavida socialrdquo (SAULE JR amp UZZO 2009)

Vale ressaltar o protagonismo desse movimento junto a outros grupos populares (or-ganizaccedilotildees da sociedade civil movimentos sociais de luta pela moradia pastorais entida-

des de profissatildeo etc) que travaram um embate com as forccedilas poliacuteticas conservadoras naAssembleia Nacional Constituinte o que culminou posteriormente na influecircncia dessesgrupos sobre a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 sobretudo em relaccedilatildeo agraves temaacuteticas do campourbano Baseando-se na compreensatildeo de certo descaso do poder puacuteblico sobre segregaccedilatildeo

territorial saneamento habitaccedilatildeo e transporte esses grupos elaboraram uma proposta delei para inserccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal com vistas a atuar nesse contexto e participar doprocesso de criaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

De acordo com Nelson Saule Jr e Karina Uzzo (2009) o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana no ano de 1986 ldquodefine o conceito de reforma urbana como uma nova eacutetica socialrdquo erepudiam ldquoa cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitosrdquo Foi inau-gurada assim de forma criacutetica e em acircmbito nacional uma proposta de reforma urbana por meioda construccedilatildeo de uma plataforma poliacutetica que reivindicava uma nova cidade e o fim dos privileacute-

A populaccedilatildeo de Satildeo Paulo apresenta algumas especificidades em termos demograacuteficos eurbanos entre as quais merecem destaque certos aspectos de gecircnero e idade assim como sua

distribuiccedilatildeo territorial (importante quando se debate direito agrave cidade como direito humanomulher idosos e regiotildees perifeacutericas)

Feminilizaccedilatildeo ao longo dos anos tem sido crescente a predominacircncia numeacuterica de mulhe-res no conjunto da populaccedilatildeo Dados do Censo de 1980 indicam naquela data uma proporccedilatildeo

de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no municiacutepio Em 2000 essa relaccedilatildeo jaacute erade 91 para 100 e estima-se que atualmente esteja em torno de 90 ou seja existem 9 homenspara cada 10 mulheres na cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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Palavras do prefeito

Guarda Civil Municipal (GCM) utiliza bicicletas em ronda na aacuterea da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (creacutedito Marcelo UlissesGCM)

Eacute com grande satisfaccedilatildeo que apresento 20 publicaccedilotildees ineacuteditas coordenadas pela Secre-taria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) para os processos de formaccedilatildeo de

conselheiros(as) em direitos humanos e participaccedilatildeo social Trata-se de sete Cadernos de For-maccedilatildeo dois Cadernos de Orientaccedilatildeo dez Cadernos de Colegiados e um Caderno do Ciclo Partici-pativo de Planejamento e Orccedilamento

O objetivo eacute permitir uma melhor compreensatildeo das relaccedilotildees entre direitos humanos cida-dania Educaccedilatildeo Popular participaccedilatildeo social direito agrave cidade bem como apresentar formas eferramentas de gestatildeo mais participativas adotadas pela atual administraccedilatildeo Nesse sentido

apresentamos tambeacutem dez importantes conselhos desta cidade sua composiccedilatildeo estruturafuncionamento e o mais importante como e onde participar

Estas publicaccedilotildees demonstram o esforccedilo da atual administraccedilatildeo municipal em ampliar equalificar cada vez mais o diaacutelogo entre governo e sociedade civil para fortalecer a democraciaparticipativa nesta cidade

Satildeo Paulo dezembro de 2015Fernando Haddad

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Eacute uma grande satisfaccedilatildeo para a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SM-DHC) de Satildeo Paulo entregar agrave populaccedilatildeo de nossa cidade estes sete Cadernos de Formaccedilatildeo

Apesar de ser um oacutergatildeo com pouco tempo de existecircncia muito nos orgulham as inuacutemeras rea-lizaccedilotildees que ela conseguiu conquistar Uma delas foi a oferta de cursos de formaccedilatildeo e produccedilatildeode subsiacutedios teoacuterico-praacuteticos

As publicaccedilotildees que ora entregamos satildeo destinadas a todos(as) os(as) cidadatildeos(atildes) que seinteressam pelos assuntos aqui tratados e em especial aos conselheiros(as) municipais que

lutam pela defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que haacute anos vecircm demandando cursos e

materiais de formaccedilatildeo que possam subsidiar a sua atuaccedilatildeoComo os(as) leitores(as) poderatildeo perceber a SMDHC convidou outras secretarias de gover-no para tambeacutem fazerem parte desta coleccedilatildeo estabelecendo as devidas relaccedilotildees entre suasrespectivas atuaccedilotildees e a promoccedilatildeo dos direitos humanos um importante marco da Gestatildeo

Fernando Haddad Assim natildeo apenas se valoriza a democracia representativa como tambeacutemse impulsiona cada vez mais a necessaacuteria democracia participativa e consequentemente osprocessos de gestatildeo e de participaccedilatildeo social de maneira dialoacutegica e transparente o que resultanuma cidade mais justa mais plural e mais respeitosa em relaccedilatildeo agrave diversidade

Ao definirmos a estrutura desta coleccedilatildeo respeitando a especificidade de cada caderno

buscamos sempre associar cada tiacutetulo ao tema geral dos direitos humanos numa perspectivainterdisciplinar intersecretarial e intersetorial Dois cadernos um deles intitulado Conselhos

Participativos Municipais e o outro Planejamento e Orccedilamento couberam agrave Secretaria Muni-

cipal de Relaccedilotildees Governamentais (SMRG) O de Governo Aberto estaacute relacionado agrave SecretariaMunicipal de Relaccedilotildees Internacionais e Federativas (SMRIF) Os outros quatro cadernos satildeo di-retamente vinculados agraves atividades da proacutepria SMDHC a saber Direitos Humanos e Cidadania

Educaccedilatildeo Popular e Direitos Humanos Participaccedilatildeo Social e Direitos Humanos e Direito agrave Cidade

Estamos certos de que publicaccedilotildees como estas muito podem contribuir para o fortalecimentoda democracia participativa bem como para a ampliaccedilatildeo da transparecircncia e da promoccedilatildeo da jus-ticcedila social e econocircmica consequentemente para uma cidade mais justa sustentaacutevel e solidaacuteria

Satildeo Paulo dezembro de 2015Eduardo Matarazzo Suplicy

Palavras do secretaacuterio

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IntroduccedilatildeoPrezados conselheiros e prezadas conselheiras da cidade de Satildeo Paulo

Para Paulo Freire patrono da Educaccedilatildeo Brasileira a aprendizagem acontece ao longo davida Eacute um processo contiacutenuo e permanente sem um momento certo para ocorrer Ensinar eaprender exigem a consciecircncia de que somos seres inacabados e incompletos curiosos quesabemos escutar que temos abertura e aceitamos o novo que refletimos criticamente sobre apraacutetica e que rejeitamos toda e qualquer forma de discriminaccedilatildeo

A disponibilidade para o diaacutelogo a humildade a generosidade e a alegria de ensinar eaprender satildeo tambeacutem caracteriacutesticas fundamentais para que haja aprendizado Isso aumenta

nossa convicccedilatildeo de que a mudanccedila eacute possiacutevel por mais que a realidade se apresente como algoaparentemente jaacute dado e imutaacutevel

Se ainda nos deparamos com qualquer tipo de violaccedilatildeo aos direitos humanos temos diantede noacutes o desafio de educarmos e de nos educarmos para intervirmos nessa realidade injusta

Com determinaccedilatildeo e esperanccedila fica mais faacutecil a defesa dos direitos da inclusatildeo sociocultural eda compreensatildeo de que toda pessoa pode e deve contribuir para processos de ensino e de apren-dizagem emancipatoacuterios Quem se emancipa torna-se mais autocircnomo e livre

Foi justamente nessa direccedilatildeo que apoacutes consultados conselheiros e conselheiras integran-tes dos oacutergatildeos da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) solicitaram agrave

Coordenaccedilatildeo de Participaccedilatildeo Social cursos de formaccedilatildeoAleacutem de oferecer os cursos a SMDHC sugeriu tambeacutem a criaccedilatildeo desta seacuterie de sete cader-

nos de formaccedilatildeo composta por diferentes temas que se completam Pretende-se assim agre-gar ainda mais qualidade na atuaccedilatildeo de conselheiros e conselheiras na cidade de Satildeo Paulo Paraconcretizar esse objetivo a SMDHC contou com a contribuiccedilatildeo do Instituto Paulo Freire (IPF)

organizaccedilatildeo da sociedade civil de interesse puacuteblico sem fins lucrativos que haacute 25 anos atuapara o fomento da educaccedilatildeo como meio de promoccedilatildeo dos direitos humanos

Este Caderno de Formaccedilatildeo Direito agrave Cidade convida-nos a pensar em algumas caracteriacutesticasda megaloacutepole de Satildeo Paulo com quase 12 milhotildees de habitantes bem como de outras cidades

A cidade natildeo dorme a cidade transpira a cidade acolhe a cidade inspiraA cidade eacute conflito a cidade eacute dura a cidade eacute beleza a cidade eacute feiura

A cidade eacute palco a cidade eacute cenaacuterio a cidade eacute desejo a cidade eacute trabalhoA cidade eacute arte a cidade eacute cultura a cidade eacute esporte a cidade eacute ternura

[hellip]

Nossa cidade taacute prenha nossa cidade taacute nuaNossa cidade educa ela eacute todinha sua

Nossa cidade merece um pouco mais de poesiaDe norte a sul leste-oeste centro e periferia

Nossa cidade arrepia1

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8 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

Quais imagens e sentimentos os versos acima nos trazem O quanto a cidade onde vivemosaproxima-se ou distancia-se da cidade dos nossos sonhos Eacute possiacutevel ampliar a participaccedilatildeosocial na definiccedilatildeo da gestatildeo e ocupaccedilatildeo dos espaccedilos puacuteblicos Essas e outras questotildees seratildeo

discutidas neste caderno Faremos referecircncia a tratados estatutos e legislaccedilotildees que procuramregular a poliacutetica de desenvolvimento urbano e as funccedilotildees sociais da cidade visando ao bem-es-tar de seus habitantes

Este caderno proposto pela SMDHC e por sua Coordenaccedilatildeo do Direito agrave Cidade estimula-nosao fortalecimento da defesa dos direitos humanos pois mostra que a cidade pertence a todos eque todos tambeacutem satildeo responsaacuteveis pela garantia do direito a ela

O primeiro capiacutetulo traccedila um panorama sobre a constituiccedilatildeo das cidades mostra comosurgiram e se desenvolveram Tambeacutem analisa as relaccedilotildees sociais no contexto da defesa do

direito agrave cidade

No segundo capiacutetulo discute-se o processo de urbanizaccedilatildeo brasileiro os fundamentos denosso direito agrave cidade em diferentes acircmbitos bem como nos permite entender a funccedilatildeo socialda cidade e da proacutepria propriedade

Ao tratar da implementaccedilatildeo do direito agrave cidade no municiacutepio de Satildeo Paulo o terceiro capiacutetu-

lo mergulha nas discussotildees sobre a poliacutetica habitacional as novas agendas de direitos humanose a gestatildeo democraacutetica Convida-nos assim a novas formas de participaccedilatildeo e de apropriaccedilatildeo doespaccedilo puacuteblico Aleacutem dos avanccedilos jaacute obtidos em Satildeo Paulo fica o desafio da luta permanente detodos pela garantia ao direito agrave cidade que se associa ao direito agrave dignidade Isso exige de todosdisponibilidade criatividade e intensa participaccedilatildeo social

Satildeo Paulo dezembro de 2015Equipe do Instituto Paulo Freire

1Trechos do poema da muacutesica ldquoA cidaderdquo de Paulo Roberto Padilha (CD Velho Amigo Satildeo Paulo 2014)

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Direito agrave Cidade | 9

1 A constituiccedilatildeo das cidadesQuando se pensa ou se reivindica o direito agrave cidade certamente se faz referecircncia a alguns

aspectos que de acordo com determinada compreensatildeo satildeo extremamente necessaacuterios agrave vida

urbana um haacutebitat que facilite as relaccedilotildees sociais sentimento de pertencimento a fim de tor-nar possiacutevel a apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico condiccedilotildees dignas de vida valorizaccedilatildeo das pessoase dos espaccedilos de convivecircncia novas formas de participaccedilatildeo social na administraccedilatildeo puacuteblica lo-cal igualdade de direitos Para que isso se concretize algumas mudanccedilas satildeo almejadas o querepresenta evidentemente a superaccedilatildeo de certos desafios

Pretendemos aqui apresentar reflexotildees iniciais que abordem a cidade como expressatildeo decriatividade de transformaccedilatildeo mas tambeacutem de relaccedilotildees de dominaccedilatildeo opressatildeo segregaccedilatildeo edisputa de interesses O objetivo portanto eacute contribuir para um debate que se fundamenta naconcepccedilatildeo do direito agrave cidade como direito humano

11 Cidade compreensatildeo que temos e defendemos

Se a cidade revela o conjuntode coisas que fazemos na vida coti-diana que vai da nossa existecircnciaagraves formas como nos relacionamoscom os outros isso significa que

ela representa um estilo de vidamuito particular em comparaccedilatildeo aoutros lugares se considerarmoszonas mais ou menos urbanas ru-rais ou mesmo rurbanas Essa di-

ferenccedila eacute estabelecida pela forma

de organizaccedilatildeo e sua densidadepopulacional com zonas residen-ciais comerciais e industriais quedemandam infraestruturaserviccedilos de transporte atividade econocircmica e assim por diante Eacute

nesse ambiente que nos socializamos aprendemos a nos comunicar e nos transformamoscom base nos saberes coletivos Eacute tambeacutem onde atuamos para manter nossa condiccedilatildeo mate-rial de existecircncia a fim de suprir as necessidades vitais

Contudo ao se propor uma reflexatildeo sobre a cidade eacute importante salientar que ela possui

um conjunto de significados que ultrapassam uma definiccedilatildeo mais precisa Nesse sentido a con-cepccedilatildeo de cidade em que nos baseamos eacute aquela que agrega a vida cotidiana das pessoas quedesempenham papeacuteis sociais e reproduzem sua existecircncia em niacuteveis riquiacutessimos de cultura de

Satildeo Paulo possui hoje mais de 11 milhotildees de habitantes (creacutedito MarcosSantosUSP Imagens)

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10 | Cadernos de Formaccedilatildeo

12 A importacircncia de compreendermos a histoacuteria e o surgimento das cidades

Recorrer agrave histoacuteria da humanida-de eacute fundamental para compreendero significado do direito agrave cidade comodireito humano Isso porque homens emulheres se inserem na cidade por in-

teiro com necessidades materiais e so-

ciais Raquel Rolnik (1995) ao definir oque eacute cidade identifica seu surgimen-to e transformaccedilotildees como expressatildeoda racionalidade humana capacidade

de abstraccedilatildeo memoacuteria manutenccedilatildeode relaccedilotildees sociais e poliacuteticas adapta-ccedilatildeo ao trabalho coletivo e agrave especializaccedilatildeo (o que vai gerar o circuito de troca e consumo)

A autora aponta algumas dimensotildees essenciais na constituiccedilatildeo de qualquer cidade Uma delas

eacute o poder de atraccedilatildeo ndash a imagem eacute a da ldquocidade como um imatilderdquo ndash que originalmente esteve associado

aos templos religiosos sobretudo na Mesopotacircmia no terceiro milecircnio antes da era cristatilde Ali os pri-meiros nuacutecleos urbanos se reuniram para a construccedilatildeo dos zigurates ndash locais cerimoniais ndash no mesmomomento em que se iniciou o processo de sedentarizaccedilatildeo com a ocupaccedilatildeo permanente do territoacuteriopara a agricultura e moradia

A intervenccedilatildeo humana na natureza desde a fabricaccedilatildeo tijolos para a edificaccedilatildeo de templosateacute a construccedilatildeo de cidades inteiras se ampliou de tal modo que a humanidade passou cada vezmais a interagir com um meio construiacutedo Surgiu entatildeo uma nova relaccedilatildeo em que a arquitetura setransformou num repositoacuterio da memoacuteria coletiva registro das accedilotildees dos antepassados de modo

a poder ser lida como um texto Eacute a ldquocidade como escritardquo nas palavras de Rolnik (1995) que elevao niacutevel de abstraccedilatildeo de homens e mulheres e exige uma racionalidade que nessa mesma eacutepocafez surgir aleacutem da escrita padrotildees de medida e formas de gestatildeo do trabalho coletivo

relaccedilotildees interculturais e intertransculturais A cidade soacute existe porque haacute pessoas que a fazemem sua estrutura e dinacircmica

Quando se fala em relaccedilotildees de forccedila e interesses em conflito eacute indispensaacutevel pensar que essasituaccedilatildeo estaacute integrada agrave dinacircmica da cidade e ao cotidiano vivido Historicamente a cidade repre-senta esse conjunto de relaccedilotildees sociais e materiais de existecircncia A vida urbana ganha estrutura eforma por meio do conjunto de accedilotildees e relaccedilotildees envolvidas no arranjo territorial e administrativo nocomeacutercio na divisatildeo social do trabalho e no proacuteprio processo de urbanizaccedilatildeo Fica evidente assim

que a centralidade desse processo se encontra em algo substantivamente humano De fato as ci-dades contemporacircneas (sobretudo as grandes metroacutepoles) com imensos edifiacutecios torres parquesestradas e assim por diante satildeo o resultado de um longo percurso histoacuterico relacionado ao trabalho

Zigurate na Mesopotacircmia atual Iraque

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13 Relaccedilotildees sociais e direito de expressatildeo numa cidade democraacutetica

Pensemos agora nos tempos atuais e numa cidade democraacutetica em que a liberdade de ex-pressatildeo e manifestaccedilatildeo das diferentes opiniotildees satildeo possiacuteveis qual significado existe na organi-zaccedilatildeo da vida puacuteblica Como as relaccedilotildees satildeo ou podem vir a ser estabelecidas

Existe uma predominacircncia do mercado nas cidades principalmente quando evidenciamos oestaacutegio em que o modo de produccedilatildeo coletivo foi organizando-se na relaccedilatildeo capitalista de produccedilatildeoestaacutegio de desenvolvimento da sociedade atual As pessoas para satisfazerem suas necessidadesmais simples de subsistecircncia tem de se inserir no circuito de trocas representado pelo mercadoe mediado pelo dinheiro No entanto consumimos produtos por meio da aquisiccedilatildeo da moeda de

troca que representa o valor equivalente do produto vendido no mercado Esse valor vai para obolso do produtor Essa relaccedilatildeo organiza a estrutura do trabalho e da vida nas cidades pois tudo eacutemediado pela moeda de troca Assim a forccedila de trabalho eacute transformada em mercadoria e passa a

ocultar o acuacutemulo de excedente por parte dos donos dos meios de produccedilatildeo que se apropriam deforma desigual do valor dos produtos vendidos

E eacute justamente a vida coletiva que se configura como caracteriacutestica fundamental dos nuacute-cleos urbanos e sua gestatildeo ndash organizaccedilatildeo dos fluxos de pessoas das aglomeraccedilotildees regulamen-taccedilatildeo do cotidiano ndash que revela a ldquocidade poliacuteticardquo (ROLNIK 1995) A cidade poliacutetica caracteri-

za-se pela centralidade do poder urbano e pela hierarquizaccedilatildeo social que ao longo da histoacuteriase desenvolveu por meio da dominaccedilatildeo e do autoritarismo poliacutetico-administrativo com origemna cidadela fortificada e no poder do rei com base na guerra Desde a poacutelis grega passando pelacivitas romana a cidade poliacutetica eacute menos um espaccedilo geograacutefico do que uma praacutetica social base-ada nas relaccedilotildees de poder de modo que ldquocidadatildeordquo designava na Greacutecia antiga aquele que podiaparticipar da vida poliacutetica e natildeo todos os habitantes Isso explica porque em muitas cidades

contemporacircneas como Satildeo Paulo que natildeo possuem centro ou apresentam muacuteltiplas centrali-dades o poder poliacutetico natildeo deixou de estar concentrado nas matildeos de alguns poucos grupos Eacuteque o processo de hierarquizaccedilatildeo e controle social nem sempre implicou concentraccedilatildeo espacial

sobretudo apoacutes os avanccedilos tecnoloacutegicos recentes

Todas essas dimensotildees da cidade ndash seu poder de atraccedilatildeo sua abertura para a escritadas accedilotildees humanas seu aspecto poliacutetico ndash como diz Rolnik (1995 p 25-26) ldquoao concentrare aglomerar as pessoas intensifica as possibilidades de troca e colaboraccedilatildeo entre os ho-mens potencializando sua capacidade produtivardquo Eacute o que permite vermos a ldquocidade comomercadordquo e revela o trabalho como elemento central para o surgimento das cidades Os

determinantes estatildeo em trecircs componentes que para Rolnik satildeo essenciais especializaccedilatildeodo trabalho coletivo circuito de troca e consumo A especializaccedilatildeo comeccedilou jaacute com a divisatildeo

entre campo e cidade passou pela divisatildeo de atividades dentro da proacutepria cidade e culminoucom a especializaccedilatildeo entre cidades o que permitiu intensificaccedilatildeo das trocas e fez com queo campo natildeo fosse mais apenas fornecedor (de alimentos) mas consumidor de produtos

oriundos dos centros urbanos

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Esses aglomerados urbanos satildeo produtos de inuacutemeras accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovi-das pelo Estado por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio comercial)e a pela proacutepria populaccedilatildeo e expressam as disparidades existentes na sociedade contemporacircnea

ou seja na sociedade do capital Dentre elas temos produccedilatildeo imobiliaacuteria privada majoritariamentedestinada agraves classes meacutedias e altas praacutetica da retenccedilatildeo de terras ociosas de diferentes segmentosdo capital nas aacutereas urbanizadas utilizadas para futura especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ausecircncia de poliacuteti-

cas significativas em habitaccedilatildeo que quando ocorrem resumem-se na construccedilatildeo de moradias nasperiferias das cidades ausecircncia de regulaccedilatildeo dos valores estabelecidos para as aacutereas centrais falta

de incentivo ao estabelecimento de moradias populares

Foto Jorge MarutaJornal da USP USP Imagens

desconsiderar as dimensotildees poliacuteticas e econocircmicas presentes nesse contexto pois satildeo essasrelaccedilotildees que determinam a funccedilatildeo social da cidade Com essa compreensatildeo eacute possiacutevel imaginaras relaccedilotildees sociais (interaccedilotildees positivas ou conflitantes) dos habitantes com seus familiares

amigos comunidades e tambeacutem com o Estado por meio do uso de espaccedilos e serviccedilos puacuteblicosou privados em lugares que satildeo parte do seu cotidiano

Para a nossa discussatildeo tomaremos por base a compreensatildeo sobre cidades perifeacutericas especifi-camente aquelas existentes nos paiacuteses comumente chamados de subdesenvolvidos emergentesou perifeacutericos para situar a realidade brasileira e considerar todas as particularidades que emergemquando defendemos o direito agrave cidade Apesar de suas singularidades ndash como tamanho da popula-

ccedilatildeo composiccedilatildeo eacutetnica extensatildeo territorial e costumes ndash essas cidades apresentam tambeacutem se-melhanccedilas como os grandes aglomerados urbanos que em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas

afastadas do centro urbano e satildeo marcados por significativa extensatildeo territorial e presenccedila de casasinacabadas com reduzido ambiente construtivo alta densidade populacional inexistecircncia de aacutereasverdes proximidade de rios ou coacuterregos falta de ordenamento do sistema viaacuterio restriccedilatildeo de mobi-lidade urbana com pouca diversidade e disponibilidade de transporte coletivo bem como precaacuteria

infraestrutura viaacuteria baixa oferta de serviccedilos e equipamentos puacuteblicos de sauacutede educaccedilatildeo lazeresportes e cultura altos iacutendices de violecircncia

Favela Paraisoacutepolis localizada na zona sul da cidade de Satildeo Paulo (creacutedito Jorge MarutaJornal da USPUsp Imagens)

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Eacute nesse cenaacuterio que inuacutemeras formas de opressatildeo satildeo naturalizadas e tecircm respaldo inclu-sive legal como no caso da segregaccedilatildeo territorial ligada agrave propriedade privada fenocircmeno tido

como ldquoaceitaacutevelrdquo e protegido por lei A cidade que temos ainda eacute em grande parte e infelizmen-te aquela das taxas de lucro da propriedade privada e das desigualdades em que o capital jaacute

em seu estaacutegio financeiro vem alcanccedilando um ldquoterreno lucrativo para a produccedilatildeo e absorccedilatildeo deexcedente de capitalrdquo (HARVEY 2012 p 74) Mas a cidade que queremos eacute aquela que possibi-lita o exerciacutecio da liberdade democraacutetica e da criatividade expressa no territoacuterio vivido e que natildeoestaacute subordinada agrave relaccedilatildeo de troca Uma cidade humanizada capaz de estabelecer o direito emsua totalidade para que todos possam viver de forma livre e diversificada natildeo fazendo da vidacotidiana uma mera sobrevivecircncia

Entretanto eacute importante reconhecer que houve um salto positivo quando discutimos terri-toacuterio espaccedilo puacuteblico e relaccedilotildees sociais sob a perspectiva da cidade democraacutetica principalmentepor esta reconhecer a participaccedilatildeo social sobretudo na ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e na tomada

de decisotildees poliacuteticas que em muitos casos ocorrem motivadas por reivindicaccedilotildees conformeveremos adiante quando apontarmos o reconhecimento do direito agrave cidade no Brasil

14 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

O Prefeito de Satildeo Paulo Fernando Haddad pedalando durante a inauguraccedilatildeo do maior mural de grafite a ceacuteu aberto da Ameacuterica Latina na

avenida 23 de maio (creacutedito Heloisa BallariniSECOM)

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Direito agrave Cidade | 15

2 As cidades brasileiras e

seu processo de urbanizaccedilatildeo

Com base no contexto apresentado partiremos entatildeo para a realidade brasileira e seusinuacutemeros desafios Em decorrecircncia de um passado como colocircnia o processo de urbanizaccedilatildeo noBrasil eacute heranccedila do desenvolvimento tardio desigual e combinado Ocorreu somente no seacuteculoXX com a chegada das induacutestrias faacutebricas e empresas de grande porte generalizando-se pelo

territoacuterio nacional apenas a partir da deacutecada de 1970 Se o processo de urbanizaccedilatildeo e formaccedilatildeodas cidades industriais europeias como afirma Lefebvre (2001) ocorreu em fins do seacuteculo XVIIIe iniacutecio do seacuteculo XIX com a expansatildeo e desenvolvimento do modo de produccedilatildeo capitalista foisomente no seacuteculo XX que nosso paiacutes superou o modelo arcaico de organizaccedilatildeo e produccedilatildeoadotando a partir de entatildeo o modelo capitalista mas com muitas marcas desse passadoagroexportador o que explica de certo modo a dependecircncia da economia internacional

Ao mesmo tempo em que a dependecircncia econocircmica em relaccedilatildeo ao capital financeiro inter-nacional eacute histoacuterica haacute de se considerar tambeacutem que trouxe benefiacutecios para o desenvolvimento

de infraestrutura em atividades relacionadas ao trabalho Essa situaccedilatildeo contribuiu portantopara o financiamento e a construccedilatildeo de ferrovias portos navegaccedilatildeo e geraccedilatildeo de eletricidadefatores essenciais para o processo de desenvolvimento industrial

O urbanizaccedilatildeo do Brasil foi tardia ocorrendo apenas apoacutes a industrializaccedilatildeo generalizada no seacuteculo XX (creacutedito Imagens USP)

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16 | Cadernos de Formaccedilatildeo

De acordo com Ermiacutenia Maricato (2003) em 1890 a populaccedilatildeo urbana totalizava uma meacutediade 68 a 10 Com a emergecircncia da matildeo de obra livre ou seja a relaccedilatildeo de trabalho baseada nomodo de produccedilatildeo capitalista esses nuacutemeros se elevaram As cidades representavam o futuro

a modernidade e todas as expectativas de mudanccedila no aspecto social e cultural do paiacutes Foi so-mente depois da Revoluccedilatildeo de 1930 que esse cenaacuterio se modificou de fato ao incorporar poliacuteti-

cas puacuteblicas no processo de urbanizaccedilatildeo e industrializaccedilatildeo ultrapassando o modelo econocircmicoagroexportador e a poliacutetica do ldquocafeacute com leiterdquo (Repuacuteblica Oligaacuterquica)

No entanto o vieacutes autoritaacuterio populista e paternalista do periacuteodo possibilitou a con-tinuidade de um Estado que trabalhava aliado aos interesses da oligarquia Prosseguiu

assim a desigualdade entre as classes sociais e outras heranccedilas do periacuteodo colonial comoa concentraccedilatildeo de terra de renda e de poder expressa nas relaccedilotildees de favor mando obe-

diecircncia e arbiacutetrio nas decisotildees legais (MARICATO 2003) Essa modernizaccedilatildeo com base no de-senvolvimento do atraso deixou suas marcas nas metroacutepoles brasileiras como a segregaccedilatildeoterritorial e os danos ao meio ambiente

Esse cenaacuterio soacute pocircde ser evidenciado deacutecadas depois agrave medida que as cidades brasilei-ras foram ficando cada vez mais ldquoassociadas agrave violecircncia poluiccedilatildeo das aacuteguas e do ar crianccediladesamparada traacutefego caoacutetico enchentes entre outros inuacutemeros malesrdquo (MARICATO 2003 p152) Isso porque conforme o desenvolvimento do paiacutes extinguiram-se as oportunidades para a

populaccedilatildeo imigrante e tambeacutem migrante Cresceram as periferias de forma exorbitante assim

como a pobreza e a alta densidade de ocupaccedilatildeo do solo Esses fatores geraram uma ampla se-gregaccedilatildeo urbana eou ambiental aleacutem das dificuldades de acesso aos serviccedilos puacuteblicos comotransporte saneamento abastecimento sauacutede educaccedilatildeo creches e lazer

Curiosidades sobre a cidade de Satildeo Paulo

Sobre a populaccedilatildeo urbana em Satildeo Paulo

1872 ndash 30 mil habitantes1900 ndash 240 mil habitantesAnos 1950 ndash populaccedilatildeo passou de pouco mais de2 milhotildees de habitantes para mais de 35 milhotildees

(motivo expansatildeo do setor industrial)2000 ndash passa de 10 milhotildees2010 ndash passa de 11 milhotildees e 200 mil

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2Mananciais correspondem a reservas hiacutedricas ou fontes utilizadas para o abastecimento puacuteblico de aacutegua Disponiacutevel em lthttpsitesabesp

combrsiteinternaDefaultaspxsecaoId=31gt Acesso em 10 ago 2015

21 O direito agrave cidade e a Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade

O direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta que soacute recentemente ndash final doseacuteculo XX ndash passou a ter reconhecimento mundial apesar de seu significado protagonis-mo essencial para esse reconhecimento principalmente no que diz respeito agrave implemen-taccedilatildeo da reforma urbana Destaca-se assim o Movimento Nacional pela Reforma Urbanaque criado em 1985 consolidou no Brasil a luta pelo direito agrave cidade na deacutecada de 1980

Utilidade puacuteblica

O portal da prefeitura de Satildeo Paulo

disponibiliza informaccedilotildees sobre ohistoacuterico demograacutefico da cidade deSatildeo Paulo com inuacutemeras ilus-traccedilotildees antigas dos pontos maisconhecidos do municiacutepio Acessehttpsmduprefeituraspgovbr

historico_demograficoindexphp

O crescimento desordenado gerou ocupaccedilotildees em aacutereas de mananciais2 e topos de morrondash que natildeo satildeo de interesse do mercado imobiliaacuterio dada a restriccedilatildeo pela legislaccedilatildeo urbaniacutesti-ca ndash criando aacutereas residenciais propensas a enchentes desmoronamentos e deslizamentos de

terras Some-se a isso um contexto de desemprego discriminaccedilatildeo informalidade e ilegalidadedado ao grande contingente populacional Por outro lado recursos puacuteblicos e privados satildeo cadavez mais utilizados para investimentos em aacutereas concentradas que satildeo valorizadas porque pas-

sam a dispor de saneamento baacutesico asfalto transporte e seguranccedila o que soacute beneficia o capitalimobiliaacuterio a construccedilatildeo civil e o estoque de terras urbanas dentre outros interesses da burgue-sia nacional e internacional

Portanto a questatildeo urbana e habitacional deve ser compreendida com base na relaccedilatildeo poliacuteticae econocircmica da sociedade brasileira aleacutem de algumas particularidades em sua formaccedilatildeo soacutecio-his-

toacuterica uma vez que ao mesmo tempo em que a populaccedilatildeo convive com um cenaacuterio mediado poralugueacuteis altos imoacuteveis ilegais e deacuteficit habitacional bairros com infraestrutura urbana se beneficiamda especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Conclui-se que essa questatildeo eacute produto do capitalismo e expressa suascontradiccedilotildees no cotidiano vivido por seus habitantes num contexto urbano de violaccedilatildeo dos direitos

humanos como o direito agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave moradia entre outros Como resposta agraves inuacutemerascondiccedilotildees precaacuterias de vida grupos atuam em diversos setores sociais em busca de mudanccedilas nomodo de governar planejar e desenvolver as cidades isto eacute lutam pelo direito agrave cidade

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18 | Cadernos de Formaccedilatildeo

Esse periacuteodo foi marcado pela efervescecircncia de debates e manifestaccedilotildees poliacuteticas de di-ferentes segmentos da sociedade civil que reivindicavam melhorias na cidade e na democra-tizaccedilatildeo do processo poliacutetico Em 1987 com a convergecircncia desses debates assim como com a

correlaccedilatildeo de forccedilas vigente foi criado o Foacuterum Nacional pela Reforma Urbana cujo objetivoprincipal era inserir a questatildeo urbana como pauta da agenda puacuteblica Esse movimento no finaldo regime militar passou a adotar uma concepccedilatildeo de cidade na sua totalidade entendendo o

direito agrave cidade como um direito coletivo que busca alcanccedilar ldquoa cidade de todos a casa aleacutem dacasa a casa com asfalto com serviccedilos puacuteblicos com escola com transporte com direito a umavida socialrdquo (SAULE JR amp UZZO 2009)

Vale ressaltar o protagonismo desse movimento junto a outros grupos populares (or-ganizaccedilotildees da sociedade civil movimentos sociais de luta pela moradia pastorais entida-

des de profissatildeo etc) que travaram um embate com as forccedilas poliacuteticas conservadoras naAssembleia Nacional Constituinte o que culminou posteriormente na influecircncia dessesgrupos sobre a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 sobretudo em relaccedilatildeo agraves temaacuteticas do campourbano Baseando-se na compreensatildeo de certo descaso do poder puacuteblico sobre segregaccedilatildeo

territorial saneamento habitaccedilatildeo e transporte esses grupos elaboraram uma proposta delei para inserccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal com vistas a atuar nesse contexto e participar doprocesso de criaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

De acordo com Nelson Saule Jr e Karina Uzzo (2009) o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana no ano de 1986 ldquodefine o conceito de reforma urbana como uma nova eacutetica socialrdquo erepudiam ldquoa cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitosrdquo Foi inau-gurada assim de forma criacutetica e em acircmbito nacional uma proposta de reforma urbana por meioda construccedilatildeo de uma plataforma poliacutetica que reivindicava uma nova cidade e o fim dos privileacute-

A populaccedilatildeo de Satildeo Paulo apresenta algumas especificidades em termos demograacuteficos eurbanos entre as quais merecem destaque certos aspectos de gecircnero e idade assim como sua

distribuiccedilatildeo territorial (importante quando se debate direito agrave cidade como direito humanomulher idosos e regiotildees perifeacutericas)

Feminilizaccedilatildeo ao longo dos anos tem sido crescente a predominacircncia numeacuterica de mulhe-res no conjunto da populaccedilatildeo Dados do Censo de 1980 indicam naquela data uma proporccedilatildeo

de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no municiacutepio Em 2000 essa relaccedilatildeo jaacute erade 91 para 100 e estima-se que atualmente esteja em torno de 90 ou seja existem 9 homenspara cada 10 mulheres na cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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Direito agrave Cidade | 5

Eacute uma grande satisfaccedilatildeo para a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SM-DHC) de Satildeo Paulo entregar agrave populaccedilatildeo de nossa cidade estes sete Cadernos de Formaccedilatildeo

Apesar de ser um oacutergatildeo com pouco tempo de existecircncia muito nos orgulham as inuacutemeras rea-lizaccedilotildees que ela conseguiu conquistar Uma delas foi a oferta de cursos de formaccedilatildeo e produccedilatildeode subsiacutedios teoacuterico-praacuteticos

As publicaccedilotildees que ora entregamos satildeo destinadas a todos(as) os(as) cidadatildeos(atildes) que seinteressam pelos assuntos aqui tratados e em especial aos conselheiros(as) municipais que

lutam pela defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que haacute anos vecircm demandando cursos e

materiais de formaccedilatildeo que possam subsidiar a sua atuaccedilatildeoComo os(as) leitores(as) poderatildeo perceber a SMDHC convidou outras secretarias de gover-no para tambeacutem fazerem parte desta coleccedilatildeo estabelecendo as devidas relaccedilotildees entre suasrespectivas atuaccedilotildees e a promoccedilatildeo dos direitos humanos um importante marco da Gestatildeo

Fernando Haddad Assim natildeo apenas se valoriza a democracia representativa como tambeacutemse impulsiona cada vez mais a necessaacuteria democracia participativa e consequentemente osprocessos de gestatildeo e de participaccedilatildeo social de maneira dialoacutegica e transparente o que resultanuma cidade mais justa mais plural e mais respeitosa em relaccedilatildeo agrave diversidade

Ao definirmos a estrutura desta coleccedilatildeo respeitando a especificidade de cada caderno

buscamos sempre associar cada tiacutetulo ao tema geral dos direitos humanos numa perspectivainterdisciplinar intersecretarial e intersetorial Dois cadernos um deles intitulado Conselhos

Participativos Municipais e o outro Planejamento e Orccedilamento couberam agrave Secretaria Muni-

cipal de Relaccedilotildees Governamentais (SMRG) O de Governo Aberto estaacute relacionado agrave SecretariaMunicipal de Relaccedilotildees Internacionais e Federativas (SMRIF) Os outros quatro cadernos satildeo di-retamente vinculados agraves atividades da proacutepria SMDHC a saber Direitos Humanos e Cidadania

Educaccedilatildeo Popular e Direitos Humanos Participaccedilatildeo Social e Direitos Humanos e Direito agrave Cidade

Estamos certos de que publicaccedilotildees como estas muito podem contribuir para o fortalecimentoda democracia participativa bem como para a ampliaccedilatildeo da transparecircncia e da promoccedilatildeo da jus-ticcedila social e econocircmica consequentemente para uma cidade mais justa sustentaacutevel e solidaacuteria

Satildeo Paulo dezembro de 2015Eduardo Matarazzo Suplicy

Palavras do secretaacuterio

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IntroduccedilatildeoPrezados conselheiros e prezadas conselheiras da cidade de Satildeo Paulo

Para Paulo Freire patrono da Educaccedilatildeo Brasileira a aprendizagem acontece ao longo davida Eacute um processo contiacutenuo e permanente sem um momento certo para ocorrer Ensinar eaprender exigem a consciecircncia de que somos seres inacabados e incompletos curiosos quesabemos escutar que temos abertura e aceitamos o novo que refletimos criticamente sobre apraacutetica e que rejeitamos toda e qualquer forma de discriminaccedilatildeo

A disponibilidade para o diaacutelogo a humildade a generosidade e a alegria de ensinar eaprender satildeo tambeacutem caracteriacutesticas fundamentais para que haja aprendizado Isso aumenta

nossa convicccedilatildeo de que a mudanccedila eacute possiacutevel por mais que a realidade se apresente como algoaparentemente jaacute dado e imutaacutevel

Se ainda nos deparamos com qualquer tipo de violaccedilatildeo aos direitos humanos temos diantede noacutes o desafio de educarmos e de nos educarmos para intervirmos nessa realidade injusta

Com determinaccedilatildeo e esperanccedila fica mais faacutecil a defesa dos direitos da inclusatildeo sociocultural eda compreensatildeo de que toda pessoa pode e deve contribuir para processos de ensino e de apren-dizagem emancipatoacuterios Quem se emancipa torna-se mais autocircnomo e livre

Foi justamente nessa direccedilatildeo que apoacutes consultados conselheiros e conselheiras integran-tes dos oacutergatildeos da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) solicitaram agrave

Coordenaccedilatildeo de Participaccedilatildeo Social cursos de formaccedilatildeoAleacutem de oferecer os cursos a SMDHC sugeriu tambeacutem a criaccedilatildeo desta seacuterie de sete cader-

nos de formaccedilatildeo composta por diferentes temas que se completam Pretende-se assim agre-gar ainda mais qualidade na atuaccedilatildeo de conselheiros e conselheiras na cidade de Satildeo Paulo Paraconcretizar esse objetivo a SMDHC contou com a contribuiccedilatildeo do Instituto Paulo Freire (IPF)

organizaccedilatildeo da sociedade civil de interesse puacuteblico sem fins lucrativos que haacute 25 anos atuapara o fomento da educaccedilatildeo como meio de promoccedilatildeo dos direitos humanos

Este Caderno de Formaccedilatildeo Direito agrave Cidade convida-nos a pensar em algumas caracteriacutesticasda megaloacutepole de Satildeo Paulo com quase 12 milhotildees de habitantes bem como de outras cidades

A cidade natildeo dorme a cidade transpira a cidade acolhe a cidade inspiraA cidade eacute conflito a cidade eacute dura a cidade eacute beleza a cidade eacute feiura

A cidade eacute palco a cidade eacute cenaacuterio a cidade eacute desejo a cidade eacute trabalhoA cidade eacute arte a cidade eacute cultura a cidade eacute esporte a cidade eacute ternura

[hellip]

Nossa cidade taacute prenha nossa cidade taacute nuaNossa cidade educa ela eacute todinha sua

Nossa cidade merece um pouco mais de poesiaDe norte a sul leste-oeste centro e periferia

Nossa cidade arrepia1

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8 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

Quais imagens e sentimentos os versos acima nos trazem O quanto a cidade onde vivemosaproxima-se ou distancia-se da cidade dos nossos sonhos Eacute possiacutevel ampliar a participaccedilatildeosocial na definiccedilatildeo da gestatildeo e ocupaccedilatildeo dos espaccedilos puacuteblicos Essas e outras questotildees seratildeo

discutidas neste caderno Faremos referecircncia a tratados estatutos e legislaccedilotildees que procuramregular a poliacutetica de desenvolvimento urbano e as funccedilotildees sociais da cidade visando ao bem-es-tar de seus habitantes

Este caderno proposto pela SMDHC e por sua Coordenaccedilatildeo do Direito agrave Cidade estimula-nosao fortalecimento da defesa dos direitos humanos pois mostra que a cidade pertence a todos eque todos tambeacutem satildeo responsaacuteveis pela garantia do direito a ela

O primeiro capiacutetulo traccedila um panorama sobre a constituiccedilatildeo das cidades mostra comosurgiram e se desenvolveram Tambeacutem analisa as relaccedilotildees sociais no contexto da defesa do

direito agrave cidade

No segundo capiacutetulo discute-se o processo de urbanizaccedilatildeo brasileiro os fundamentos denosso direito agrave cidade em diferentes acircmbitos bem como nos permite entender a funccedilatildeo socialda cidade e da proacutepria propriedade

Ao tratar da implementaccedilatildeo do direito agrave cidade no municiacutepio de Satildeo Paulo o terceiro capiacutetu-

lo mergulha nas discussotildees sobre a poliacutetica habitacional as novas agendas de direitos humanose a gestatildeo democraacutetica Convida-nos assim a novas formas de participaccedilatildeo e de apropriaccedilatildeo doespaccedilo puacuteblico Aleacutem dos avanccedilos jaacute obtidos em Satildeo Paulo fica o desafio da luta permanente detodos pela garantia ao direito agrave cidade que se associa ao direito agrave dignidade Isso exige de todosdisponibilidade criatividade e intensa participaccedilatildeo social

Satildeo Paulo dezembro de 2015Equipe do Instituto Paulo Freire

1Trechos do poema da muacutesica ldquoA cidaderdquo de Paulo Roberto Padilha (CD Velho Amigo Satildeo Paulo 2014)

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1 A constituiccedilatildeo das cidadesQuando se pensa ou se reivindica o direito agrave cidade certamente se faz referecircncia a alguns

aspectos que de acordo com determinada compreensatildeo satildeo extremamente necessaacuterios agrave vida

urbana um haacutebitat que facilite as relaccedilotildees sociais sentimento de pertencimento a fim de tor-nar possiacutevel a apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico condiccedilotildees dignas de vida valorizaccedilatildeo das pessoase dos espaccedilos de convivecircncia novas formas de participaccedilatildeo social na administraccedilatildeo puacuteblica lo-cal igualdade de direitos Para que isso se concretize algumas mudanccedilas satildeo almejadas o querepresenta evidentemente a superaccedilatildeo de certos desafios

Pretendemos aqui apresentar reflexotildees iniciais que abordem a cidade como expressatildeo decriatividade de transformaccedilatildeo mas tambeacutem de relaccedilotildees de dominaccedilatildeo opressatildeo segregaccedilatildeo edisputa de interesses O objetivo portanto eacute contribuir para um debate que se fundamenta naconcepccedilatildeo do direito agrave cidade como direito humano

11 Cidade compreensatildeo que temos e defendemos

Se a cidade revela o conjuntode coisas que fazemos na vida coti-diana que vai da nossa existecircnciaagraves formas como nos relacionamoscom os outros isso significa que

ela representa um estilo de vidamuito particular em comparaccedilatildeo aoutros lugares se considerarmoszonas mais ou menos urbanas ru-rais ou mesmo rurbanas Essa di-

ferenccedila eacute estabelecida pela forma

de organizaccedilatildeo e sua densidadepopulacional com zonas residen-ciais comerciais e industriais quedemandam infraestruturaserviccedilos de transporte atividade econocircmica e assim por diante Eacute

nesse ambiente que nos socializamos aprendemos a nos comunicar e nos transformamoscom base nos saberes coletivos Eacute tambeacutem onde atuamos para manter nossa condiccedilatildeo mate-rial de existecircncia a fim de suprir as necessidades vitais

Contudo ao se propor uma reflexatildeo sobre a cidade eacute importante salientar que ela possui

um conjunto de significados que ultrapassam uma definiccedilatildeo mais precisa Nesse sentido a con-cepccedilatildeo de cidade em que nos baseamos eacute aquela que agrega a vida cotidiana das pessoas quedesempenham papeacuteis sociais e reproduzem sua existecircncia em niacuteveis riquiacutessimos de cultura de

Satildeo Paulo possui hoje mais de 11 milhotildees de habitantes (creacutedito MarcosSantosUSP Imagens)

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10 | Cadernos de Formaccedilatildeo

12 A importacircncia de compreendermos a histoacuteria e o surgimento das cidades

Recorrer agrave histoacuteria da humanida-de eacute fundamental para compreendero significado do direito agrave cidade comodireito humano Isso porque homens emulheres se inserem na cidade por in-

teiro com necessidades materiais e so-

ciais Raquel Rolnik (1995) ao definir oque eacute cidade identifica seu surgimen-to e transformaccedilotildees como expressatildeoda racionalidade humana capacidade

de abstraccedilatildeo memoacuteria manutenccedilatildeode relaccedilotildees sociais e poliacuteticas adapta-ccedilatildeo ao trabalho coletivo e agrave especializaccedilatildeo (o que vai gerar o circuito de troca e consumo)

A autora aponta algumas dimensotildees essenciais na constituiccedilatildeo de qualquer cidade Uma delas

eacute o poder de atraccedilatildeo ndash a imagem eacute a da ldquocidade como um imatilderdquo ndash que originalmente esteve associado

aos templos religiosos sobretudo na Mesopotacircmia no terceiro milecircnio antes da era cristatilde Ali os pri-meiros nuacutecleos urbanos se reuniram para a construccedilatildeo dos zigurates ndash locais cerimoniais ndash no mesmomomento em que se iniciou o processo de sedentarizaccedilatildeo com a ocupaccedilatildeo permanente do territoacuteriopara a agricultura e moradia

A intervenccedilatildeo humana na natureza desde a fabricaccedilatildeo tijolos para a edificaccedilatildeo de templosateacute a construccedilatildeo de cidades inteiras se ampliou de tal modo que a humanidade passou cada vezmais a interagir com um meio construiacutedo Surgiu entatildeo uma nova relaccedilatildeo em que a arquitetura setransformou num repositoacuterio da memoacuteria coletiva registro das accedilotildees dos antepassados de modo

a poder ser lida como um texto Eacute a ldquocidade como escritardquo nas palavras de Rolnik (1995) que elevao niacutevel de abstraccedilatildeo de homens e mulheres e exige uma racionalidade que nessa mesma eacutepocafez surgir aleacutem da escrita padrotildees de medida e formas de gestatildeo do trabalho coletivo

relaccedilotildees interculturais e intertransculturais A cidade soacute existe porque haacute pessoas que a fazemem sua estrutura e dinacircmica

Quando se fala em relaccedilotildees de forccedila e interesses em conflito eacute indispensaacutevel pensar que essasituaccedilatildeo estaacute integrada agrave dinacircmica da cidade e ao cotidiano vivido Historicamente a cidade repre-senta esse conjunto de relaccedilotildees sociais e materiais de existecircncia A vida urbana ganha estrutura eforma por meio do conjunto de accedilotildees e relaccedilotildees envolvidas no arranjo territorial e administrativo nocomeacutercio na divisatildeo social do trabalho e no proacuteprio processo de urbanizaccedilatildeo Fica evidente assim

que a centralidade desse processo se encontra em algo substantivamente humano De fato as ci-dades contemporacircneas (sobretudo as grandes metroacutepoles) com imensos edifiacutecios torres parquesestradas e assim por diante satildeo o resultado de um longo percurso histoacuterico relacionado ao trabalho

Zigurate na Mesopotacircmia atual Iraque

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13 Relaccedilotildees sociais e direito de expressatildeo numa cidade democraacutetica

Pensemos agora nos tempos atuais e numa cidade democraacutetica em que a liberdade de ex-pressatildeo e manifestaccedilatildeo das diferentes opiniotildees satildeo possiacuteveis qual significado existe na organi-zaccedilatildeo da vida puacuteblica Como as relaccedilotildees satildeo ou podem vir a ser estabelecidas

Existe uma predominacircncia do mercado nas cidades principalmente quando evidenciamos oestaacutegio em que o modo de produccedilatildeo coletivo foi organizando-se na relaccedilatildeo capitalista de produccedilatildeoestaacutegio de desenvolvimento da sociedade atual As pessoas para satisfazerem suas necessidadesmais simples de subsistecircncia tem de se inserir no circuito de trocas representado pelo mercadoe mediado pelo dinheiro No entanto consumimos produtos por meio da aquisiccedilatildeo da moeda de

troca que representa o valor equivalente do produto vendido no mercado Esse valor vai para obolso do produtor Essa relaccedilatildeo organiza a estrutura do trabalho e da vida nas cidades pois tudo eacutemediado pela moeda de troca Assim a forccedila de trabalho eacute transformada em mercadoria e passa a

ocultar o acuacutemulo de excedente por parte dos donos dos meios de produccedilatildeo que se apropriam deforma desigual do valor dos produtos vendidos

E eacute justamente a vida coletiva que se configura como caracteriacutestica fundamental dos nuacute-cleos urbanos e sua gestatildeo ndash organizaccedilatildeo dos fluxos de pessoas das aglomeraccedilotildees regulamen-taccedilatildeo do cotidiano ndash que revela a ldquocidade poliacuteticardquo (ROLNIK 1995) A cidade poliacutetica caracteri-

za-se pela centralidade do poder urbano e pela hierarquizaccedilatildeo social que ao longo da histoacuteriase desenvolveu por meio da dominaccedilatildeo e do autoritarismo poliacutetico-administrativo com origemna cidadela fortificada e no poder do rei com base na guerra Desde a poacutelis grega passando pelacivitas romana a cidade poliacutetica eacute menos um espaccedilo geograacutefico do que uma praacutetica social base-ada nas relaccedilotildees de poder de modo que ldquocidadatildeordquo designava na Greacutecia antiga aquele que podiaparticipar da vida poliacutetica e natildeo todos os habitantes Isso explica porque em muitas cidades

contemporacircneas como Satildeo Paulo que natildeo possuem centro ou apresentam muacuteltiplas centrali-dades o poder poliacutetico natildeo deixou de estar concentrado nas matildeos de alguns poucos grupos Eacuteque o processo de hierarquizaccedilatildeo e controle social nem sempre implicou concentraccedilatildeo espacial

sobretudo apoacutes os avanccedilos tecnoloacutegicos recentes

Todas essas dimensotildees da cidade ndash seu poder de atraccedilatildeo sua abertura para a escritadas accedilotildees humanas seu aspecto poliacutetico ndash como diz Rolnik (1995 p 25-26) ldquoao concentrare aglomerar as pessoas intensifica as possibilidades de troca e colaboraccedilatildeo entre os ho-mens potencializando sua capacidade produtivardquo Eacute o que permite vermos a ldquocidade comomercadordquo e revela o trabalho como elemento central para o surgimento das cidades Os

determinantes estatildeo em trecircs componentes que para Rolnik satildeo essenciais especializaccedilatildeodo trabalho coletivo circuito de troca e consumo A especializaccedilatildeo comeccedilou jaacute com a divisatildeo

entre campo e cidade passou pela divisatildeo de atividades dentro da proacutepria cidade e culminoucom a especializaccedilatildeo entre cidades o que permitiu intensificaccedilatildeo das trocas e fez com queo campo natildeo fosse mais apenas fornecedor (de alimentos) mas consumidor de produtos

oriundos dos centros urbanos

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Esses aglomerados urbanos satildeo produtos de inuacutemeras accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovi-das pelo Estado por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio comercial)e a pela proacutepria populaccedilatildeo e expressam as disparidades existentes na sociedade contemporacircnea

ou seja na sociedade do capital Dentre elas temos produccedilatildeo imobiliaacuteria privada majoritariamentedestinada agraves classes meacutedias e altas praacutetica da retenccedilatildeo de terras ociosas de diferentes segmentosdo capital nas aacutereas urbanizadas utilizadas para futura especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ausecircncia de poliacuteti-

cas significativas em habitaccedilatildeo que quando ocorrem resumem-se na construccedilatildeo de moradias nasperiferias das cidades ausecircncia de regulaccedilatildeo dos valores estabelecidos para as aacutereas centrais falta

de incentivo ao estabelecimento de moradias populares

Foto Jorge MarutaJornal da USP USP Imagens

desconsiderar as dimensotildees poliacuteticas e econocircmicas presentes nesse contexto pois satildeo essasrelaccedilotildees que determinam a funccedilatildeo social da cidade Com essa compreensatildeo eacute possiacutevel imaginaras relaccedilotildees sociais (interaccedilotildees positivas ou conflitantes) dos habitantes com seus familiares

amigos comunidades e tambeacutem com o Estado por meio do uso de espaccedilos e serviccedilos puacuteblicosou privados em lugares que satildeo parte do seu cotidiano

Para a nossa discussatildeo tomaremos por base a compreensatildeo sobre cidades perifeacutericas especifi-camente aquelas existentes nos paiacuteses comumente chamados de subdesenvolvidos emergentesou perifeacutericos para situar a realidade brasileira e considerar todas as particularidades que emergemquando defendemos o direito agrave cidade Apesar de suas singularidades ndash como tamanho da popula-

ccedilatildeo composiccedilatildeo eacutetnica extensatildeo territorial e costumes ndash essas cidades apresentam tambeacutem se-melhanccedilas como os grandes aglomerados urbanos que em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas

afastadas do centro urbano e satildeo marcados por significativa extensatildeo territorial e presenccedila de casasinacabadas com reduzido ambiente construtivo alta densidade populacional inexistecircncia de aacutereasverdes proximidade de rios ou coacuterregos falta de ordenamento do sistema viaacuterio restriccedilatildeo de mobi-lidade urbana com pouca diversidade e disponibilidade de transporte coletivo bem como precaacuteria

infraestrutura viaacuteria baixa oferta de serviccedilos e equipamentos puacuteblicos de sauacutede educaccedilatildeo lazeresportes e cultura altos iacutendices de violecircncia

Favela Paraisoacutepolis localizada na zona sul da cidade de Satildeo Paulo (creacutedito Jorge MarutaJornal da USPUsp Imagens)

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Eacute nesse cenaacuterio que inuacutemeras formas de opressatildeo satildeo naturalizadas e tecircm respaldo inclu-sive legal como no caso da segregaccedilatildeo territorial ligada agrave propriedade privada fenocircmeno tido

como ldquoaceitaacutevelrdquo e protegido por lei A cidade que temos ainda eacute em grande parte e infelizmen-te aquela das taxas de lucro da propriedade privada e das desigualdades em que o capital jaacute

em seu estaacutegio financeiro vem alcanccedilando um ldquoterreno lucrativo para a produccedilatildeo e absorccedilatildeo deexcedente de capitalrdquo (HARVEY 2012 p 74) Mas a cidade que queremos eacute aquela que possibi-lita o exerciacutecio da liberdade democraacutetica e da criatividade expressa no territoacuterio vivido e que natildeoestaacute subordinada agrave relaccedilatildeo de troca Uma cidade humanizada capaz de estabelecer o direito emsua totalidade para que todos possam viver de forma livre e diversificada natildeo fazendo da vidacotidiana uma mera sobrevivecircncia

Entretanto eacute importante reconhecer que houve um salto positivo quando discutimos terri-toacuterio espaccedilo puacuteblico e relaccedilotildees sociais sob a perspectiva da cidade democraacutetica principalmentepor esta reconhecer a participaccedilatildeo social sobretudo na ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e na tomada

de decisotildees poliacuteticas que em muitos casos ocorrem motivadas por reivindicaccedilotildees conformeveremos adiante quando apontarmos o reconhecimento do direito agrave cidade no Brasil

14 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

O Prefeito de Satildeo Paulo Fernando Haddad pedalando durante a inauguraccedilatildeo do maior mural de grafite a ceacuteu aberto da Ameacuterica Latina na

avenida 23 de maio (creacutedito Heloisa BallariniSECOM)

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2 As cidades brasileiras e

seu processo de urbanizaccedilatildeo

Com base no contexto apresentado partiremos entatildeo para a realidade brasileira e seusinuacutemeros desafios Em decorrecircncia de um passado como colocircnia o processo de urbanizaccedilatildeo noBrasil eacute heranccedila do desenvolvimento tardio desigual e combinado Ocorreu somente no seacuteculoXX com a chegada das induacutestrias faacutebricas e empresas de grande porte generalizando-se pelo

territoacuterio nacional apenas a partir da deacutecada de 1970 Se o processo de urbanizaccedilatildeo e formaccedilatildeodas cidades industriais europeias como afirma Lefebvre (2001) ocorreu em fins do seacuteculo XVIIIe iniacutecio do seacuteculo XIX com a expansatildeo e desenvolvimento do modo de produccedilatildeo capitalista foisomente no seacuteculo XX que nosso paiacutes superou o modelo arcaico de organizaccedilatildeo e produccedilatildeoadotando a partir de entatildeo o modelo capitalista mas com muitas marcas desse passadoagroexportador o que explica de certo modo a dependecircncia da economia internacional

Ao mesmo tempo em que a dependecircncia econocircmica em relaccedilatildeo ao capital financeiro inter-nacional eacute histoacuterica haacute de se considerar tambeacutem que trouxe benefiacutecios para o desenvolvimento

de infraestrutura em atividades relacionadas ao trabalho Essa situaccedilatildeo contribuiu portantopara o financiamento e a construccedilatildeo de ferrovias portos navegaccedilatildeo e geraccedilatildeo de eletricidadefatores essenciais para o processo de desenvolvimento industrial

O urbanizaccedilatildeo do Brasil foi tardia ocorrendo apenas apoacutes a industrializaccedilatildeo generalizada no seacuteculo XX (creacutedito Imagens USP)

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16 | Cadernos de Formaccedilatildeo

De acordo com Ermiacutenia Maricato (2003) em 1890 a populaccedilatildeo urbana totalizava uma meacutediade 68 a 10 Com a emergecircncia da matildeo de obra livre ou seja a relaccedilatildeo de trabalho baseada nomodo de produccedilatildeo capitalista esses nuacutemeros se elevaram As cidades representavam o futuro

a modernidade e todas as expectativas de mudanccedila no aspecto social e cultural do paiacutes Foi so-mente depois da Revoluccedilatildeo de 1930 que esse cenaacuterio se modificou de fato ao incorporar poliacuteti-

cas puacuteblicas no processo de urbanizaccedilatildeo e industrializaccedilatildeo ultrapassando o modelo econocircmicoagroexportador e a poliacutetica do ldquocafeacute com leiterdquo (Repuacuteblica Oligaacuterquica)

No entanto o vieacutes autoritaacuterio populista e paternalista do periacuteodo possibilitou a con-tinuidade de um Estado que trabalhava aliado aos interesses da oligarquia Prosseguiu

assim a desigualdade entre as classes sociais e outras heranccedilas do periacuteodo colonial comoa concentraccedilatildeo de terra de renda e de poder expressa nas relaccedilotildees de favor mando obe-

diecircncia e arbiacutetrio nas decisotildees legais (MARICATO 2003) Essa modernizaccedilatildeo com base no de-senvolvimento do atraso deixou suas marcas nas metroacutepoles brasileiras como a segregaccedilatildeoterritorial e os danos ao meio ambiente

Esse cenaacuterio soacute pocircde ser evidenciado deacutecadas depois agrave medida que as cidades brasilei-ras foram ficando cada vez mais ldquoassociadas agrave violecircncia poluiccedilatildeo das aacuteguas e do ar crianccediladesamparada traacutefego caoacutetico enchentes entre outros inuacutemeros malesrdquo (MARICATO 2003 p152) Isso porque conforme o desenvolvimento do paiacutes extinguiram-se as oportunidades para a

populaccedilatildeo imigrante e tambeacutem migrante Cresceram as periferias de forma exorbitante assim

como a pobreza e a alta densidade de ocupaccedilatildeo do solo Esses fatores geraram uma ampla se-gregaccedilatildeo urbana eou ambiental aleacutem das dificuldades de acesso aos serviccedilos puacuteblicos comotransporte saneamento abastecimento sauacutede educaccedilatildeo creches e lazer

Curiosidades sobre a cidade de Satildeo Paulo

Sobre a populaccedilatildeo urbana em Satildeo Paulo

1872 ndash 30 mil habitantes1900 ndash 240 mil habitantesAnos 1950 ndash populaccedilatildeo passou de pouco mais de2 milhotildees de habitantes para mais de 35 milhotildees

(motivo expansatildeo do setor industrial)2000 ndash passa de 10 milhotildees2010 ndash passa de 11 milhotildees e 200 mil

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2Mananciais correspondem a reservas hiacutedricas ou fontes utilizadas para o abastecimento puacuteblico de aacutegua Disponiacutevel em lthttpsitesabesp

combrsiteinternaDefaultaspxsecaoId=31gt Acesso em 10 ago 2015

21 O direito agrave cidade e a Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade

O direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta que soacute recentemente ndash final doseacuteculo XX ndash passou a ter reconhecimento mundial apesar de seu significado protagonis-mo essencial para esse reconhecimento principalmente no que diz respeito agrave implemen-taccedilatildeo da reforma urbana Destaca-se assim o Movimento Nacional pela Reforma Urbanaque criado em 1985 consolidou no Brasil a luta pelo direito agrave cidade na deacutecada de 1980

Utilidade puacuteblica

O portal da prefeitura de Satildeo Paulo

disponibiliza informaccedilotildees sobre ohistoacuterico demograacutefico da cidade deSatildeo Paulo com inuacutemeras ilus-traccedilotildees antigas dos pontos maisconhecidos do municiacutepio Acessehttpsmduprefeituraspgovbr

historico_demograficoindexphp

O crescimento desordenado gerou ocupaccedilotildees em aacutereas de mananciais2 e topos de morrondash que natildeo satildeo de interesse do mercado imobiliaacuterio dada a restriccedilatildeo pela legislaccedilatildeo urbaniacutesti-ca ndash criando aacutereas residenciais propensas a enchentes desmoronamentos e deslizamentos de

terras Some-se a isso um contexto de desemprego discriminaccedilatildeo informalidade e ilegalidadedado ao grande contingente populacional Por outro lado recursos puacuteblicos e privados satildeo cadavez mais utilizados para investimentos em aacutereas concentradas que satildeo valorizadas porque pas-

sam a dispor de saneamento baacutesico asfalto transporte e seguranccedila o que soacute beneficia o capitalimobiliaacuterio a construccedilatildeo civil e o estoque de terras urbanas dentre outros interesses da burgue-sia nacional e internacional

Portanto a questatildeo urbana e habitacional deve ser compreendida com base na relaccedilatildeo poliacuteticae econocircmica da sociedade brasileira aleacutem de algumas particularidades em sua formaccedilatildeo soacutecio-his-

toacuterica uma vez que ao mesmo tempo em que a populaccedilatildeo convive com um cenaacuterio mediado poralugueacuteis altos imoacuteveis ilegais e deacuteficit habitacional bairros com infraestrutura urbana se beneficiamda especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Conclui-se que essa questatildeo eacute produto do capitalismo e expressa suascontradiccedilotildees no cotidiano vivido por seus habitantes num contexto urbano de violaccedilatildeo dos direitos

humanos como o direito agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave moradia entre outros Como resposta agraves inuacutemerascondiccedilotildees precaacuterias de vida grupos atuam em diversos setores sociais em busca de mudanccedilas nomodo de governar planejar e desenvolver as cidades isto eacute lutam pelo direito agrave cidade

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Esse periacuteodo foi marcado pela efervescecircncia de debates e manifestaccedilotildees poliacuteticas de di-ferentes segmentos da sociedade civil que reivindicavam melhorias na cidade e na democra-tizaccedilatildeo do processo poliacutetico Em 1987 com a convergecircncia desses debates assim como com a

correlaccedilatildeo de forccedilas vigente foi criado o Foacuterum Nacional pela Reforma Urbana cujo objetivoprincipal era inserir a questatildeo urbana como pauta da agenda puacuteblica Esse movimento no finaldo regime militar passou a adotar uma concepccedilatildeo de cidade na sua totalidade entendendo o

direito agrave cidade como um direito coletivo que busca alcanccedilar ldquoa cidade de todos a casa aleacutem dacasa a casa com asfalto com serviccedilos puacuteblicos com escola com transporte com direito a umavida socialrdquo (SAULE JR amp UZZO 2009)

Vale ressaltar o protagonismo desse movimento junto a outros grupos populares (or-ganizaccedilotildees da sociedade civil movimentos sociais de luta pela moradia pastorais entida-

des de profissatildeo etc) que travaram um embate com as forccedilas poliacuteticas conservadoras naAssembleia Nacional Constituinte o que culminou posteriormente na influecircncia dessesgrupos sobre a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 sobretudo em relaccedilatildeo agraves temaacuteticas do campourbano Baseando-se na compreensatildeo de certo descaso do poder puacuteblico sobre segregaccedilatildeo

territorial saneamento habitaccedilatildeo e transporte esses grupos elaboraram uma proposta delei para inserccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal com vistas a atuar nesse contexto e participar doprocesso de criaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

De acordo com Nelson Saule Jr e Karina Uzzo (2009) o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana no ano de 1986 ldquodefine o conceito de reforma urbana como uma nova eacutetica socialrdquo erepudiam ldquoa cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitosrdquo Foi inau-gurada assim de forma criacutetica e em acircmbito nacional uma proposta de reforma urbana por meioda construccedilatildeo de uma plataforma poliacutetica que reivindicava uma nova cidade e o fim dos privileacute-

A populaccedilatildeo de Satildeo Paulo apresenta algumas especificidades em termos demograacuteficos eurbanos entre as quais merecem destaque certos aspectos de gecircnero e idade assim como sua

distribuiccedilatildeo territorial (importante quando se debate direito agrave cidade como direito humanomulher idosos e regiotildees perifeacutericas)

Feminilizaccedilatildeo ao longo dos anos tem sido crescente a predominacircncia numeacuterica de mulhe-res no conjunto da populaccedilatildeo Dados do Censo de 1980 indicam naquela data uma proporccedilatildeo

de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no municiacutepio Em 2000 essa relaccedilatildeo jaacute erade 91 para 100 e estima-se que atualmente esteja em torno de 90 ou seja existem 9 homenspara cada 10 mulheres na cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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CARLOS AFA O espaccedilo urbano novos escritos sobre a cidade Satildeo Paulo FFLCH 2007a

______ O lugar nodo mundo Satildeo Paulo FFLCH 2007b

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38 | Cadernos de Formaccedilatildeo

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MAMANI U R ldquoO caminho do direito agrave cidade na Boliacuteviardquo Diaacutelogos propostas histoacuterias para uma cida-dania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche-dph-8586htmlgtAcesso em 3 ago 2015

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Sites

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Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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IntroduccedilatildeoPrezados conselheiros e prezadas conselheiras da cidade de Satildeo Paulo

Para Paulo Freire patrono da Educaccedilatildeo Brasileira a aprendizagem acontece ao longo davida Eacute um processo contiacutenuo e permanente sem um momento certo para ocorrer Ensinar eaprender exigem a consciecircncia de que somos seres inacabados e incompletos curiosos quesabemos escutar que temos abertura e aceitamos o novo que refletimos criticamente sobre apraacutetica e que rejeitamos toda e qualquer forma de discriminaccedilatildeo

A disponibilidade para o diaacutelogo a humildade a generosidade e a alegria de ensinar eaprender satildeo tambeacutem caracteriacutesticas fundamentais para que haja aprendizado Isso aumenta

nossa convicccedilatildeo de que a mudanccedila eacute possiacutevel por mais que a realidade se apresente como algoaparentemente jaacute dado e imutaacutevel

Se ainda nos deparamos com qualquer tipo de violaccedilatildeo aos direitos humanos temos diantede noacutes o desafio de educarmos e de nos educarmos para intervirmos nessa realidade injusta

Com determinaccedilatildeo e esperanccedila fica mais faacutecil a defesa dos direitos da inclusatildeo sociocultural eda compreensatildeo de que toda pessoa pode e deve contribuir para processos de ensino e de apren-dizagem emancipatoacuterios Quem se emancipa torna-se mais autocircnomo e livre

Foi justamente nessa direccedilatildeo que apoacutes consultados conselheiros e conselheiras integran-tes dos oacutergatildeos da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) solicitaram agrave

Coordenaccedilatildeo de Participaccedilatildeo Social cursos de formaccedilatildeoAleacutem de oferecer os cursos a SMDHC sugeriu tambeacutem a criaccedilatildeo desta seacuterie de sete cader-

nos de formaccedilatildeo composta por diferentes temas que se completam Pretende-se assim agre-gar ainda mais qualidade na atuaccedilatildeo de conselheiros e conselheiras na cidade de Satildeo Paulo Paraconcretizar esse objetivo a SMDHC contou com a contribuiccedilatildeo do Instituto Paulo Freire (IPF)

organizaccedilatildeo da sociedade civil de interesse puacuteblico sem fins lucrativos que haacute 25 anos atuapara o fomento da educaccedilatildeo como meio de promoccedilatildeo dos direitos humanos

Este Caderno de Formaccedilatildeo Direito agrave Cidade convida-nos a pensar em algumas caracteriacutesticasda megaloacutepole de Satildeo Paulo com quase 12 milhotildees de habitantes bem como de outras cidades

A cidade natildeo dorme a cidade transpira a cidade acolhe a cidade inspiraA cidade eacute conflito a cidade eacute dura a cidade eacute beleza a cidade eacute feiura

A cidade eacute palco a cidade eacute cenaacuterio a cidade eacute desejo a cidade eacute trabalhoA cidade eacute arte a cidade eacute cultura a cidade eacute esporte a cidade eacute ternura

[hellip]

Nossa cidade taacute prenha nossa cidade taacute nuaNossa cidade educa ela eacute todinha sua

Nossa cidade merece um pouco mais de poesiaDe norte a sul leste-oeste centro e periferia

Nossa cidade arrepia1

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8 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

Quais imagens e sentimentos os versos acima nos trazem O quanto a cidade onde vivemosaproxima-se ou distancia-se da cidade dos nossos sonhos Eacute possiacutevel ampliar a participaccedilatildeosocial na definiccedilatildeo da gestatildeo e ocupaccedilatildeo dos espaccedilos puacuteblicos Essas e outras questotildees seratildeo

discutidas neste caderno Faremos referecircncia a tratados estatutos e legislaccedilotildees que procuramregular a poliacutetica de desenvolvimento urbano e as funccedilotildees sociais da cidade visando ao bem-es-tar de seus habitantes

Este caderno proposto pela SMDHC e por sua Coordenaccedilatildeo do Direito agrave Cidade estimula-nosao fortalecimento da defesa dos direitos humanos pois mostra que a cidade pertence a todos eque todos tambeacutem satildeo responsaacuteveis pela garantia do direito a ela

O primeiro capiacutetulo traccedila um panorama sobre a constituiccedilatildeo das cidades mostra comosurgiram e se desenvolveram Tambeacutem analisa as relaccedilotildees sociais no contexto da defesa do

direito agrave cidade

No segundo capiacutetulo discute-se o processo de urbanizaccedilatildeo brasileiro os fundamentos denosso direito agrave cidade em diferentes acircmbitos bem como nos permite entender a funccedilatildeo socialda cidade e da proacutepria propriedade

Ao tratar da implementaccedilatildeo do direito agrave cidade no municiacutepio de Satildeo Paulo o terceiro capiacutetu-

lo mergulha nas discussotildees sobre a poliacutetica habitacional as novas agendas de direitos humanose a gestatildeo democraacutetica Convida-nos assim a novas formas de participaccedilatildeo e de apropriaccedilatildeo doespaccedilo puacuteblico Aleacutem dos avanccedilos jaacute obtidos em Satildeo Paulo fica o desafio da luta permanente detodos pela garantia ao direito agrave cidade que se associa ao direito agrave dignidade Isso exige de todosdisponibilidade criatividade e intensa participaccedilatildeo social

Satildeo Paulo dezembro de 2015Equipe do Instituto Paulo Freire

1Trechos do poema da muacutesica ldquoA cidaderdquo de Paulo Roberto Padilha (CD Velho Amigo Satildeo Paulo 2014)

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1 A constituiccedilatildeo das cidadesQuando se pensa ou se reivindica o direito agrave cidade certamente se faz referecircncia a alguns

aspectos que de acordo com determinada compreensatildeo satildeo extremamente necessaacuterios agrave vida

urbana um haacutebitat que facilite as relaccedilotildees sociais sentimento de pertencimento a fim de tor-nar possiacutevel a apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico condiccedilotildees dignas de vida valorizaccedilatildeo das pessoase dos espaccedilos de convivecircncia novas formas de participaccedilatildeo social na administraccedilatildeo puacuteblica lo-cal igualdade de direitos Para que isso se concretize algumas mudanccedilas satildeo almejadas o querepresenta evidentemente a superaccedilatildeo de certos desafios

Pretendemos aqui apresentar reflexotildees iniciais que abordem a cidade como expressatildeo decriatividade de transformaccedilatildeo mas tambeacutem de relaccedilotildees de dominaccedilatildeo opressatildeo segregaccedilatildeo edisputa de interesses O objetivo portanto eacute contribuir para um debate que se fundamenta naconcepccedilatildeo do direito agrave cidade como direito humano

11 Cidade compreensatildeo que temos e defendemos

Se a cidade revela o conjuntode coisas que fazemos na vida coti-diana que vai da nossa existecircnciaagraves formas como nos relacionamoscom os outros isso significa que

ela representa um estilo de vidamuito particular em comparaccedilatildeo aoutros lugares se considerarmoszonas mais ou menos urbanas ru-rais ou mesmo rurbanas Essa di-

ferenccedila eacute estabelecida pela forma

de organizaccedilatildeo e sua densidadepopulacional com zonas residen-ciais comerciais e industriais quedemandam infraestruturaserviccedilos de transporte atividade econocircmica e assim por diante Eacute

nesse ambiente que nos socializamos aprendemos a nos comunicar e nos transformamoscom base nos saberes coletivos Eacute tambeacutem onde atuamos para manter nossa condiccedilatildeo mate-rial de existecircncia a fim de suprir as necessidades vitais

Contudo ao se propor uma reflexatildeo sobre a cidade eacute importante salientar que ela possui

um conjunto de significados que ultrapassam uma definiccedilatildeo mais precisa Nesse sentido a con-cepccedilatildeo de cidade em que nos baseamos eacute aquela que agrega a vida cotidiana das pessoas quedesempenham papeacuteis sociais e reproduzem sua existecircncia em niacuteveis riquiacutessimos de cultura de

Satildeo Paulo possui hoje mais de 11 milhotildees de habitantes (creacutedito MarcosSantosUSP Imagens)

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10 | Cadernos de Formaccedilatildeo

12 A importacircncia de compreendermos a histoacuteria e o surgimento das cidades

Recorrer agrave histoacuteria da humanida-de eacute fundamental para compreendero significado do direito agrave cidade comodireito humano Isso porque homens emulheres se inserem na cidade por in-

teiro com necessidades materiais e so-

ciais Raquel Rolnik (1995) ao definir oque eacute cidade identifica seu surgimen-to e transformaccedilotildees como expressatildeoda racionalidade humana capacidade

de abstraccedilatildeo memoacuteria manutenccedilatildeode relaccedilotildees sociais e poliacuteticas adapta-ccedilatildeo ao trabalho coletivo e agrave especializaccedilatildeo (o que vai gerar o circuito de troca e consumo)

A autora aponta algumas dimensotildees essenciais na constituiccedilatildeo de qualquer cidade Uma delas

eacute o poder de atraccedilatildeo ndash a imagem eacute a da ldquocidade como um imatilderdquo ndash que originalmente esteve associado

aos templos religiosos sobretudo na Mesopotacircmia no terceiro milecircnio antes da era cristatilde Ali os pri-meiros nuacutecleos urbanos se reuniram para a construccedilatildeo dos zigurates ndash locais cerimoniais ndash no mesmomomento em que se iniciou o processo de sedentarizaccedilatildeo com a ocupaccedilatildeo permanente do territoacuteriopara a agricultura e moradia

A intervenccedilatildeo humana na natureza desde a fabricaccedilatildeo tijolos para a edificaccedilatildeo de templosateacute a construccedilatildeo de cidades inteiras se ampliou de tal modo que a humanidade passou cada vezmais a interagir com um meio construiacutedo Surgiu entatildeo uma nova relaccedilatildeo em que a arquitetura setransformou num repositoacuterio da memoacuteria coletiva registro das accedilotildees dos antepassados de modo

a poder ser lida como um texto Eacute a ldquocidade como escritardquo nas palavras de Rolnik (1995) que elevao niacutevel de abstraccedilatildeo de homens e mulheres e exige uma racionalidade que nessa mesma eacutepocafez surgir aleacutem da escrita padrotildees de medida e formas de gestatildeo do trabalho coletivo

relaccedilotildees interculturais e intertransculturais A cidade soacute existe porque haacute pessoas que a fazemem sua estrutura e dinacircmica

Quando se fala em relaccedilotildees de forccedila e interesses em conflito eacute indispensaacutevel pensar que essasituaccedilatildeo estaacute integrada agrave dinacircmica da cidade e ao cotidiano vivido Historicamente a cidade repre-senta esse conjunto de relaccedilotildees sociais e materiais de existecircncia A vida urbana ganha estrutura eforma por meio do conjunto de accedilotildees e relaccedilotildees envolvidas no arranjo territorial e administrativo nocomeacutercio na divisatildeo social do trabalho e no proacuteprio processo de urbanizaccedilatildeo Fica evidente assim

que a centralidade desse processo se encontra em algo substantivamente humano De fato as ci-dades contemporacircneas (sobretudo as grandes metroacutepoles) com imensos edifiacutecios torres parquesestradas e assim por diante satildeo o resultado de um longo percurso histoacuterico relacionado ao trabalho

Zigurate na Mesopotacircmia atual Iraque

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13 Relaccedilotildees sociais e direito de expressatildeo numa cidade democraacutetica

Pensemos agora nos tempos atuais e numa cidade democraacutetica em que a liberdade de ex-pressatildeo e manifestaccedilatildeo das diferentes opiniotildees satildeo possiacuteveis qual significado existe na organi-zaccedilatildeo da vida puacuteblica Como as relaccedilotildees satildeo ou podem vir a ser estabelecidas

Existe uma predominacircncia do mercado nas cidades principalmente quando evidenciamos oestaacutegio em que o modo de produccedilatildeo coletivo foi organizando-se na relaccedilatildeo capitalista de produccedilatildeoestaacutegio de desenvolvimento da sociedade atual As pessoas para satisfazerem suas necessidadesmais simples de subsistecircncia tem de se inserir no circuito de trocas representado pelo mercadoe mediado pelo dinheiro No entanto consumimos produtos por meio da aquisiccedilatildeo da moeda de

troca que representa o valor equivalente do produto vendido no mercado Esse valor vai para obolso do produtor Essa relaccedilatildeo organiza a estrutura do trabalho e da vida nas cidades pois tudo eacutemediado pela moeda de troca Assim a forccedila de trabalho eacute transformada em mercadoria e passa a

ocultar o acuacutemulo de excedente por parte dos donos dos meios de produccedilatildeo que se apropriam deforma desigual do valor dos produtos vendidos

E eacute justamente a vida coletiva que se configura como caracteriacutestica fundamental dos nuacute-cleos urbanos e sua gestatildeo ndash organizaccedilatildeo dos fluxos de pessoas das aglomeraccedilotildees regulamen-taccedilatildeo do cotidiano ndash que revela a ldquocidade poliacuteticardquo (ROLNIK 1995) A cidade poliacutetica caracteri-

za-se pela centralidade do poder urbano e pela hierarquizaccedilatildeo social que ao longo da histoacuteriase desenvolveu por meio da dominaccedilatildeo e do autoritarismo poliacutetico-administrativo com origemna cidadela fortificada e no poder do rei com base na guerra Desde a poacutelis grega passando pelacivitas romana a cidade poliacutetica eacute menos um espaccedilo geograacutefico do que uma praacutetica social base-ada nas relaccedilotildees de poder de modo que ldquocidadatildeordquo designava na Greacutecia antiga aquele que podiaparticipar da vida poliacutetica e natildeo todos os habitantes Isso explica porque em muitas cidades

contemporacircneas como Satildeo Paulo que natildeo possuem centro ou apresentam muacuteltiplas centrali-dades o poder poliacutetico natildeo deixou de estar concentrado nas matildeos de alguns poucos grupos Eacuteque o processo de hierarquizaccedilatildeo e controle social nem sempre implicou concentraccedilatildeo espacial

sobretudo apoacutes os avanccedilos tecnoloacutegicos recentes

Todas essas dimensotildees da cidade ndash seu poder de atraccedilatildeo sua abertura para a escritadas accedilotildees humanas seu aspecto poliacutetico ndash como diz Rolnik (1995 p 25-26) ldquoao concentrare aglomerar as pessoas intensifica as possibilidades de troca e colaboraccedilatildeo entre os ho-mens potencializando sua capacidade produtivardquo Eacute o que permite vermos a ldquocidade comomercadordquo e revela o trabalho como elemento central para o surgimento das cidades Os

determinantes estatildeo em trecircs componentes que para Rolnik satildeo essenciais especializaccedilatildeodo trabalho coletivo circuito de troca e consumo A especializaccedilatildeo comeccedilou jaacute com a divisatildeo

entre campo e cidade passou pela divisatildeo de atividades dentro da proacutepria cidade e culminoucom a especializaccedilatildeo entre cidades o que permitiu intensificaccedilatildeo das trocas e fez com queo campo natildeo fosse mais apenas fornecedor (de alimentos) mas consumidor de produtos

oriundos dos centros urbanos

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Esses aglomerados urbanos satildeo produtos de inuacutemeras accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovi-das pelo Estado por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio comercial)e a pela proacutepria populaccedilatildeo e expressam as disparidades existentes na sociedade contemporacircnea

ou seja na sociedade do capital Dentre elas temos produccedilatildeo imobiliaacuteria privada majoritariamentedestinada agraves classes meacutedias e altas praacutetica da retenccedilatildeo de terras ociosas de diferentes segmentosdo capital nas aacutereas urbanizadas utilizadas para futura especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ausecircncia de poliacuteti-

cas significativas em habitaccedilatildeo que quando ocorrem resumem-se na construccedilatildeo de moradias nasperiferias das cidades ausecircncia de regulaccedilatildeo dos valores estabelecidos para as aacutereas centrais falta

de incentivo ao estabelecimento de moradias populares

Foto Jorge MarutaJornal da USP USP Imagens

desconsiderar as dimensotildees poliacuteticas e econocircmicas presentes nesse contexto pois satildeo essasrelaccedilotildees que determinam a funccedilatildeo social da cidade Com essa compreensatildeo eacute possiacutevel imaginaras relaccedilotildees sociais (interaccedilotildees positivas ou conflitantes) dos habitantes com seus familiares

amigos comunidades e tambeacutem com o Estado por meio do uso de espaccedilos e serviccedilos puacuteblicosou privados em lugares que satildeo parte do seu cotidiano

Para a nossa discussatildeo tomaremos por base a compreensatildeo sobre cidades perifeacutericas especifi-camente aquelas existentes nos paiacuteses comumente chamados de subdesenvolvidos emergentesou perifeacutericos para situar a realidade brasileira e considerar todas as particularidades que emergemquando defendemos o direito agrave cidade Apesar de suas singularidades ndash como tamanho da popula-

ccedilatildeo composiccedilatildeo eacutetnica extensatildeo territorial e costumes ndash essas cidades apresentam tambeacutem se-melhanccedilas como os grandes aglomerados urbanos que em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas

afastadas do centro urbano e satildeo marcados por significativa extensatildeo territorial e presenccedila de casasinacabadas com reduzido ambiente construtivo alta densidade populacional inexistecircncia de aacutereasverdes proximidade de rios ou coacuterregos falta de ordenamento do sistema viaacuterio restriccedilatildeo de mobi-lidade urbana com pouca diversidade e disponibilidade de transporte coletivo bem como precaacuteria

infraestrutura viaacuteria baixa oferta de serviccedilos e equipamentos puacuteblicos de sauacutede educaccedilatildeo lazeresportes e cultura altos iacutendices de violecircncia

Favela Paraisoacutepolis localizada na zona sul da cidade de Satildeo Paulo (creacutedito Jorge MarutaJornal da USPUsp Imagens)

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Eacute nesse cenaacuterio que inuacutemeras formas de opressatildeo satildeo naturalizadas e tecircm respaldo inclu-sive legal como no caso da segregaccedilatildeo territorial ligada agrave propriedade privada fenocircmeno tido

como ldquoaceitaacutevelrdquo e protegido por lei A cidade que temos ainda eacute em grande parte e infelizmen-te aquela das taxas de lucro da propriedade privada e das desigualdades em que o capital jaacute

em seu estaacutegio financeiro vem alcanccedilando um ldquoterreno lucrativo para a produccedilatildeo e absorccedilatildeo deexcedente de capitalrdquo (HARVEY 2012 p 74) Mas a cidade que queremos eacute aquela que possibi-lita o exerciacutecio da liberdade democraacutetica e da criatividade expressa no territoacuterio vivido e que natildeoestaacute subordinada agrave relaccedilatildeo de troca Uma cidade humanizada capaz de estabelecer o direito emsua totalidade para que todos possam viver de forma livre e diversificada natildeo fazendo da vidacotidiana uma mera sobrevivecircncia

Entretanto eacute importante reconhecer que houve um salto positivo quando discutimos terri-toacuterio espaccedilo puacuteblico e relaccedilotildees sociais sob a perspectiva da cidade democraacutetica principalmentepor esta reconhecer a participaccedilatildeo social sobretudo na ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e na tomada

de decisotildees poliacuteticas que em muitos casos ocorrem motivadas por reivindicaccedilotildees conformeveremos adiante quando apontarmos o reconhecimento do direito agrave cidade no Brasil

14 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

O Prefeito de Satildeo Paulo Fernando Haddad pedalando durante a inauguraccedilatildeo do maior mural de grafite a ceacuteu aberto da Ameacuterica Latina na

avenida 23 de maio (creacutedito Heloisa BallariniSECOM)

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2 As cidades brasileiras e

seu processo de urbanizaccedilatildeo

Com base no contexto apresentado partiremos entatildeo para a realidade brasileira e seusinuacutemeros desafios Em decorrecircncia de um passado como colocircnia o processo de urbanizaccedilatildeo noBrasil eacute heranccedila do desenvolvimento tardio desigual e combinado Ocorreu somente no seacuteculoXX com a chegada das induacutestrias faacutebricas e empresas de grande porte generalizando-se pelo

territoacuterio nacional apenas a partir da deacutecada de 1970 Se o processo de urbanizaccedilatildeo e formaccedilatildeodas cidades industriais europeias como afirma Lefebvre (2001) ocorreu em fins do seacuteculo XVIIIe iniacutecio do seacuteculo XIX com a expansatildeo e desenvolvimento do modo de produccedilatildeo capitalista foisomente no seacuteculo XX que nosso paiacutes superou o modelo arcaico de organizaccedilatildeo e produccedilatildeoadotando a partir de entatildeo o modelo capitalista mas com muitas marcas desse passadoagroexportador o que explica de certo modo a dependecircncia da economia internacional

Ao mesmo tempo em que a dependecircncia econocircmica em relaccedilatildeo ao capital financeiro inter-nacional eacute histoacuterica haacute de se considerar tambeacutem que trouxe benefiacutecios para o desenvolvimento

de infraestrutura em atividades relacionadas ao trabalho Essa situaccedilatildeo contribuiu portantopara o financiamento e a construccedilatildeo de ferrovias portos navegaccedilatildeo e geraccedilatildeo de eletricidadefatores essenciais para o processo de desenvolvimento industrial

O urbanizaccedilatildeo do Brasil foi tardia ocorrendo apenas apoacutes a industrializaccedilatildeo generalizada no seacuteculo XX (creacutedito Imagens USP)

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De acordo com Ermiacutenia Maricato (2003) em 1890 a populaccedilatildeo urbana totalizava uma meacutediade 68 a 10 Com a emergecircncia da matildeo de obra livre ou seja a relaccedilatildeo de trabalho baseada nomodo de produccedilatildeo capitalista esses nuacutemeros se elevaram As cidades representavam o futuro

a modernidade e todas as expectativas de mudanccedila no aspecto social e cultural do paiacutes Foi so-mente depois da Revoluccedilatildeo de 1930 que esse cenaacuterio se modificou de fato ao incorporar poliacuteti-

cas puacuteblicas no processo de urbanizaccedilatildeo e industrializaccedilatildeo ultrapassando o modelo econocircmicoagroexportador e a poliacutetica do ldquocafeacute com leiterdquo (Repuacuteblica Oligaacuterquica)

No entanto o vieacutes autoritaacuterio populista e paternalista do periacuteodo possibilitou a con-tinuidade de um Estado que trabalhava aliado aos interesses da oligarquia Prosseguiu

assim a desigualdade entre as classes sociais e outras heranccedilas do periacuteodo colonial comoa concentraccedilatildeo de terra de renda e de poder expressa nas relaccedilotildees de favor mando obe-

diecircncia e arbiacutetrio nas decisotildees legais (MARICATO 2003) Essa modernizaccedilatildeo com base no de-senvolvimento do atraso deixou suas marcas nas metroacutepoles brasileiras como a segregaccedilatildeoterritorial e os danos ao meio ambiente

Esse cenaacuterio soacute pocircde ser evidenciado deacutecadas depois agrave medida que as cidades brasilei-ras foram ficando cada vez mais ldquoassociadas agrave violecircncia poluiccedilatildeo das aacuteguas e do ar crianccediladesamparada traacutefego caoacutetico enchentes entre outros inuacutemeros malesrdquo (MARICATO 2003 p152) Isso porque conforme o desenvolvimento do paiacutes extinguiram-se as oportunidades para a

populaccedilatildeo imigrante e tambeacutem migrante Cresceram as periferias de forma exorbitante assim

como a pobreza e a alta densidade de ocupaccedilatildeo do solo Esses fatores geraram uma ampla se-gregaccedilatildeo urbana eou ambiental aleacutem das dificuldades de acesso aos serviccedilos puacuteblicos comotransporte saneamento abastecimento sauacutede educaccedilatildeo creches e lazer

Curiosidades sobre a cidade de Satildeo Paulo

Sobre a populaccedilatildeo urbana em Satildeo Paulo

1872 ndash 30 mil habitantes1900 ndash 240 mil habitantesAnos 1950 ndash populaccedilatildeo passou de pouco mais de2 milhotildees de habitantes para mais de 35 milhotildees

(motivo expansatildeo do setor industrial)2000 ndash passa de 10 milhotildees2010 ndash passa de 11 milhotildees e 200 mil

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2Mananciais correspondem a reservas hiacutedricas ou fontes utilizadas para o abastecimento puacuteblico de aacutegua Disponiacutevel em lthttpsitesabesp

combrsiteinternaDefaultaspxsecaoId=31gt Acesso em 10 ago 2015

21 O direito agrave cidade e a Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade

O direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta que soacute recentemente ndash final doseacuteculo XX ndash passou a ter reconhecimento mundial apesar de seu significado protagonis-mo essencial para esse reconhecimento principalmente no que diz respeito agrave implemen-taccedilatildeo da reforma urbana Destaca-se assim o Movimento Nacional pela Reforma Urbanaque criado em 1985 consolidou no Brasil a luta pelo direito agrave cidade na deacutecada de 1980

Utilidade puacuteblica

O portal da prefeitura de Satildeo Paulo

disponibiliza informaccedilotildees sobre ohistoacuterico demograacutefico da cidade deSatildeo Paulo com inuacutemeras ilus-traccedilotildees antigas dos pontos maisconhecidos do municiacutepio Acessehttpsmduprefeituraspgovbr

historico_demograficoindexphp

O crescimento desordenado gerou ocupaccedilotildees em aacutereas de mananciais2 e topos de morrondash que natildeo satildeo de interesse do mercado imobiliaacuterio dada a restriccedilatildeo pela legislaccedilatildeo urbaniacutesti-ca ndash criando aacutereas residenciais propensas a enchentes desmoronamentos e deslizamentos de

terras Some-se a isso um contexto de desemprego discriminaccedilatildeo informalidade e ilegalidadedado ao grande contingente populacional Por outro lado recursos puacuteblicos e privados satildeo cadavez mais utilizados para investimentos em aacutereas concentradas que satildeo valorizadas porque pas-

sam a dispor de saneamento baacutesico asfalto transporte e seguranccedila o que soacute beneficia o capitalimobiliaacuterio a construccedilatildeo civil e o estoque de terras urbanas dentre outros interesses da burgue-sia nacional e internacional

Portanto a questatildeo urbana e habitacional deve ser compreendida com base na relaccedilatildeo poliacuteticae econocircmica da sociedade brasileira aleacutem de algumas particularidades em sua formaccedilatildeo soacutecio-his-

toacuterica uma vez que ao mesmo tempo em que a populaccedilatildeo convive com um cenaacuterio mediado poralugueacuteis altos imoacuteveis ilegais e deacuteficit habitacional bairros com infraestrutura urbana se beneficiamda especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Conclui-se que essa questatildeo eacute produto do capitalismo e expressa suascontradiccedilotildees no cotidiano vivido por seus habitantes num contexto urbano de violaccedilatildeo dos direitos

humanos como o direito agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave moradia entre outros Como resposta agraves inuacutemerascondiccedilotildees precaacuterias de vida grupos atuam em diversos setores sociais em busca de mudanccedilas nomodo de governar planejar e desenvolver as cidades isto eacute lutam pelo direito agrave cidade

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Esse periacuteodo foi marcado pela efervescecircncia de debates e manifestaccedilotildees poliacuteticas de di-ferentes segmentos da sociedade civil que reivindicavam melhorias na cidade e na democra-tizaccedilatildeo do processo poliacutetico Em 1987 com a convergecircncia desses debates assim como com a

correlaccedilatildeo de forccedilas vigente foi criado o Foacuterum Nacional pela Reforma Urbana cujo objetivoprincipal era inserir a questatildeo urbana como pauta da agenda puacuteblica Esse movimento no finaldo regime militar passou a adotar uma concepccedilatildeo de cidade na sua totalidade entendendo o

direito agrave cidade como um direito coletivo que busca alcanccedilar ldquoa cidade de todos a casa aleacutem dacasa a casa com asfalto com serviccedilos puacuteblicos com escola com transporte com direito a umavida socialrdquo (SAULE JR amp UZZO 2009)

Vale ressaltar o protagonismo desse movimento junto a outros grupos populares (or-ganizaccedilotildees da sociedade civil movimentos sociais de luta pela moradia pastorais entida-

des de profissatildeo etc) que travaram um embate com as forccedilas poliacuteticas conservadoras naAssembleia Nacional Constituinte o que culminou posteriormente na influecircncia dessesgrupos sobre a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 sobretudo em relaccedilatildeo agraves temaacuteticas do campourbano Baseando-se na compreensatildeo de certo descaso do poder puacuteblico sobre segregaccedilatildeo

territorial saneamento habitaccedilatildeo e transporte esses grupos elaboraram uma proposta delei para inserccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal com vistas a atuar nesse contexto e participar doprocesso de criaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

De acordo com Nelson Saule Jr e Karina Uzzo (2009) o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana no ano de 1986 ldquodefine o conceito de reforma urbana como uma nova eacutetica socialrdquo erepudiam ldquoa cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitosrdquo Foi inau-gurada assim de forma criacutetica e em acircmbito nacional uma proposta de reforma urbana por meioda construccedilatildeo de uma plataforma poliacutetica que reivindicava uma nova cidade e o fim dos privileacute-

A populaccedilatildeo de Satildeo Paulo apresenta algumas especificidades em termos demograacuteficos eurbanos entre as quais merecem destaque certos aspectos de gecircnero e idade assim como sua

distribuiccedilatildeo territorial (importante quando se debate direito agrave cidade como direito humanomulher idosos e regiotildees perifeacutericas)

Feminilizaccedilatildeo ao longo dos anos tem sido crescente a predominacircncia numeacuterica de mulhe-res no conjunto da populaccedilatildeo Dados do Censo de 1980 indicam naquela data uma proporccedilatildeo

de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no municiacutepio Em 2000 essa relaccedilatildeo jaacute erade 91 para 100 e estima-se que atualmente esteja em torno de 90 ou seja existem 9 homenspara cada 10 mulheres na cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Referecircncias

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SANTORO P F ldquoO desafio de planejar e produzir expansatildeo urbana com qualidade a experiecircncia colom-biana dos Planos Parciais em Bogotaacute Colocircmbiardquo Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionaisvol 13 n 1 Recife mai 2011 p 91-115

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MAMANI U R ldquoO caminho do direito agrave cidade na Boliacuteviardquo Diaacutelogos propostas histoacuterias para uma cida-dania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche-dph-8586htmlgtAcesso em 3 ago 2015

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Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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Direito agrave Cidade | 7

IntroduccedilatildeoPrezados conselheiros e prezadas conselheiras da cidade de Satildeo Paulo

Para Paulo Freire patrono da Educaccedilatildeo Brasileira a aprendizagem acontece ao longo davida Eacute um processo contiacutenuo e permanente sem um momento certo para ocorrer Ensinar eaprender exigem a consciecircncia de que somos seres inacabados e incompletos curiosos quesabemos escutar que temos abertura e aceitamos o novo que refletimos criticamente sobre apraacutetica e que rejeitamos toda e qualquer forma de discriminaccedilatildeo

A disponibilidade para o diaacutelogo a humildade a generosidade e a alegria de ensinar eaprender satildeo tambeacutem caracteriacutesticas fundamentais para que haja aprendizado Isso aumenta

nossa convicccedilatildeo de que a mudanccedila eacute possiacutevel por mais que a realidade se apresente como algoaparentemente jaacute dado e imutaacutevel

Se ainda nos deparamos com qualquer tipo de violaccedilatildeo aos direitos humanos temos diantede noacutes o desafio de educarmos e de nos educarmos para intervirmos nessa realidade injusta

Com determinaccedilatildeo e esperanccedila fica mais faacutecil a defesa dos direitos da inclusatildeo sociocultural eda compreensatildeo de que toda pessoa pode e deve contribuir para processos de ensino e de apren-dizagem emancipatoacuterios Quem se emancipa torna-se mais autocircnomo e livre

Foi justamente nessa direccedilatildeo que apoacutes consultados conselheiros e conselheiras integran-tes dos oacutergatildeos da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) solicitaram agrave

Coordenaccedilatildeo de Participaccedilatildeo Social cursos de formaccedilatildeoAleacutem de oferecer os cursos a SMDHC sugeriu tambeacutem a criaccedilatildeo desta seacuterie de sete cader-

nos de formaccedilatildeo composta por diferentes temas que se completam Pretende-se assim agre-gar ainda mais qualidade na atuaccedilatildeo de conselheiros e conselheiras na cidade de Satildeo Paulo Paraconcretizar esse objetivo a SMDHC contou com a contribuiccedilatildeo do Instituto Paulo Freire (IPF)

organizaccedilatildeo da sociedade civil de interesse puacuteblico sem fins lucrativos que haacute 25 anos atuapara o fomento da educaccedilatildeo como meio de promoccedilatildeo dos direitos humanos

Este Caderno de Formaccedilatildeo Direito agrave Cidade convida-nos a pensar em algumas caracteriacutesticasda megaloacutepole de Satildeo Paulo com quase 12 milhotildees de habitantes bem como de outras cidades

A cidade natildeo dorme a cidade transpira a cidade acolhe a cidade inspiraA cidade eacute conflito a cidade eacute dura a cidade eacute beleza a cidade eacute feiura

A cidade eacute palco a cidade eacute cenaacuterio a cidade eacute desejo a cidade eacute trabalhoA cidade eacute arte a cidade eacute cultura a cidade eacute esporte a cidade eacute ternura

[hellip]

Nossa cidade taacute prenha nossa cidade taacute nuaNossa cidade educa ela eacute todinha sua

Nossa cidade merece um pouco mais de poesiaDe norte a sul leste-oeste centro e periferia

Nossa cidade arrepia1

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8 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

Quais imagens e sentimentos os versos acima nos trazem O quanto a cidade onde vivemosaproxima-se ou distancia-se da cidade dos nossos sonhos Eacute possiacutevel ampliar a participaccedilatildeosocial na definiccedilatildeo da gestatildeo e ocupaccedilatildeo dos espaccedilos puacuteblicos Essas e outras questotildees seratildeo

discutidas neste caderno Faremos referecircncia a tratados estatutos e legislaccedilotildees que procuramregular a poliacutetica de desenvolvimento urbano e as funccedilotildees sociais da cidade visando ao bem-es-tar de seus habitantes

Este caderno proposto pela SMDHC e por sua Coordenaccedilatildeo do Direito agrave Cidade estimula-nosao fortalecimento da defesa dos direitos humanos pois mostra que a cidade pertence a todos eque todos tambeacutem satildeo responsaacuteveis pela garantia do direito a ela

O primeiro capiacutetulo traccedila um panorama sobre a constituiccedilatildeo das cidades mostra comosurgiram e se desenvolveram Tambeacutem analisa as relaccedilotildees sociais no contexto da defesa do

direito agrave cidade

No segundo capiacutetulo discute-se o processo de urbanizaccedilatildeo brasileiro os fundamentos denosso direito agrave cidade em diferentes acircmbitos bem como nos permite entender a funccedilatildeo socialda cidade e da proacutepria propriedade

Ao tratar da implementaccedilatildeo do direito agrave cidade no municiacutepio de Satildeo Paulo o terceiro capiacutetu-

lo mergulha nas discussotildees sobre a poliacutetica habitacional as novas agendas de direitos humanose a gestatildeo democraacutetica Convida-nos assim a novas formas de participaccedilatildeo e de apropriaccedilatildeo doespaccedilo puacuteblico Aleacutem dos avanccedilos jaacute obtidos em Satildeo Paulo fica o desafio da luta permanente detodos pela garantia ao direito agrave cidade que se associa ao direito agrave dignidade Isso exige de todosdisponibilidade criatividade e intensa participaccedilatildeo social

Satildeo Paulo dezembro de 2015Equipe do Instituto Paulo Freire

1Trechos do poema da muacutesica ldquoA cidaderdquo de Paulo Roberto Padilha (CD Velho Amigo Satildeo Paulo 2014)

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Direito agrave Cidade | 9

1 A constituiccedilatildeo das cidadesQuando se pensa ou se reivindica o direito agrave cidade certamente se faz referecircncia a alguns

aspectos que de acordo com determinada compreensatildeo satildeo extremamente necessaacuterios agrave vida

urbana um haacutebitat que facilite as relaccedilotildees sociais sentimento de pertencimento a fim de tor-nar possiacutevel a apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico condiccedilotildees dignas de vida valorizaccedilatildeo das pessoase dos espaccedilos de convivecircncia novas formas de participaccedilatildeo social na administraccedilatildeo puacuteblica lo-cal igualdade de direitos Para que isso se concretize algumas mudanccedilas satildeo almejadas o querepresenta evidentemente a superaccedilatildeo de certos desafios

Pretendemos aqui apresentar reflexotildees iniciais que abordem a cidade como expressatildeo decriatividade de transformaccedilatildeo mas tambeacutem de relaccedilotildees de dominaccedilatildeo opressatildeo segregaccedilatildeo edisputa de interesses O objetivo portanto eacute contribuir para um debate que se fundamenta naconcepccedilatildeo do direito agrave cidade como direito humano

11 Cidade compreensatildeo que temos e defendemos

Se a cidade revela o conjuntode coisas que fazemos na vida coti-diana que vai da nossa existecircnciaagraves formas como nos relacionamoscom os outros isso significa que

ela representa um estilo de vidamuito particular em comparaccedilatildeo aoutros lugares se considerarmoszonas mais ou menos urbanas ru-rais ou mesmo rurbanas Essa di-

ferenccedila eacute estabelecida pela forma

de organizaccedilatildeo e sua densidadepopulacional com zonas residen-ciais comerciais e industriais quedemandam infraestruturaserviccedilos de transporte atividade econocircmica e assim por diante Eacute

nesse ambiente que nos socializamos aprendemos a nos comunicar e nos transformamoscom base nos saberes coletivos Eacute tambeacutem onde atuamos para manter nossa condiccedilatildeo mate-rial de existecircncia a fim de suprir as necessidades vitais

Contudo ao se propor uma reflexatildeo sobre a cidade eacute importante salientar que ela possui

um conjunto de significados que ultrapassam uma definiccedilatildeo mais precisa Nesse sentido a con-cepccedilatildeo de cidade em que nos baseamos eacute aquela que agrega a vida cotidiana das pessoas quedesempenham papeacuteis sociais e reproduzem sua existecircncia em niacuteveis riquiacutessimos de cultura de

Satildeo Paulo possui hoje mais de 11 milhotildees de habitantes (creacutedito MarcosSantosUSP Imagens)

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10 | Cadernos de Formaccedilatildeo

12 A importacircncia de compreendermos a histoacuteria e o surgimento das cidades

Recorrer agrave histoacuteria da humanida-de eacute fundamental para compreendero significado do direito agrave cidade comodireito humano Isso porque homens emulheres se inserem na cidade por in-

teiro com necessidades materiais e so-

ciais Raquel Rolnik (1995) ao definir oque eacute cidade identifica seu surgimen-to e transformaccedilotildees como expressatildeoda racionalidade humana capacidade

de abstraccedilatildeo memoacuteria manutenccedilatildeode relaccedilotildees sociais e poliacuteticas adapta-ccedilatildeo ao trabalho coletivo e agrave especializaccedilatildeo (o que vai gerar o circuito de troca e consumo)

A autora aponta algumas dimensotildees essenciais na constituiccedilatildeo de qualquer cidade Uma delas

eacute o poder de atraccedilatildeo ndash a imagem eacute a da ldquocidade como um imatilderdquo ndash que originalmente esteve associado

aos templos religiosos sobretudo na Mesopotacircmia no terceiro milecircnio antes da era cristatilde Ali os pri-meiros nuacutecleos urbanos se reuniram para a construccedilatildeo dos zigurates ndash locais cerimoniais ndash no mesmomomento em que se iniciou o processo de sedentarizaccedilatildeo com a ocupaccedilatildeo permanente do territoacuteriopara a agricultura e moradia

A intervenccedilatildeo humana na natureza desde a fabricaccedilatildeo tijolos para a edificaccedilatildeo de templosateacute a construccedilatildeo de cidades inteiras se ampliou de tal modo que a humanidade passou cada vezmais a interagir com um meio construiacutedo Surgiu entatildeo uma nova relaccedilatildeo em que a arquitetura setransformou num repositoacuterio da memoacuteria coletiva registro das accedilotildees dos antepassados de modo

a poder ser lida como um texto Eacute a ldquocidade como escritardquo nas palavras de Rolnik (1995) que elevao niacutevel de abstraccedilatildeo de homens e mulheres e exige uma racionalidade que nessa mesma eacutepocafez surgir aleacutem da escrita padrotildees de medida e formas de gestatildeo do trabalho coletivo

relaccedilotildees interculturais e intertransculturais A cidade soacute existe porque haacute pessoas que a fazemem sua estrutura e dinacircmica

Quando se fala em relaccedilotildees de forccedila e interesses em conflito eacute indispensaacutevel pensar que essasituaccedilatildeo estaacute integrada agrave dinacircmica da cidade e ao cotidiano vivido Historicamente a cidade repre-senta esse conjunto de relaccedilotildees sociais e materiais de existecircncia A vida urbana ganha estrutura eforma por meio do conjunto de accedilotildees e relaccedilotildees envolvidas no arranjo territorial e administrativo nocomeacutercio na divisatildeo social do trabalho e no proacuteprio processo de urbanizaccedilatildeo Fica evidente assim

que a centralidade desse processo se encontra em algo substantivamente humano De fato as ci-dades contemporacircneas (sobretudo as grandes metroacutepoles) com imensos edifiacutecios torres parquesestradas e assim por diante satildeo o resultado de um longo percurso histoacuterico relacionado ao trabalho

Zigurate na Mesopotacircmia atual Iraque

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13 Relaccedilotildees sociais e direito de expressatildeo numa cidade democraacutetica

Pensemos agora nos tempos atuais e numa cidade democraacutetica em que a liberdade de ex-pressatildeo e manifestaccedilatildeo das diferentes opiniotildees satildeo possiacuteveis qual significado existe na organi-zaccedilatildeo da vida puacuteblica Como as relaccedilotildees satildeo ou podem vir a ser estabelecidas

Existe uma predominacircncia do mercado nas cidades principalmente quando evidenciamos oestaacutegio em que o modo de produccedilatildeo coletivo foi organizando-se na relaccedilatildeo capitalista de produccedilatildeoestaacutegio de desenvolvimento da sociedade atual As pessoas para satisfazerem suas necessidadesmais simples de subsistecircncia tem de se inserir no circuito de trocas representado pelo mercadoe mediado pelo dinheiro No entanto consumimos produtos por meio da aquisiccedilatildeo da moeda de

troca que representa o valor equivalente do produto vendido no mercado Esse valor vai para obolso do produtor Essa relaccedilatildeo organiza a estrutura do trabalho e da vida nas cidades pois tudo eacutemediado pela moeda de troca Assim a forccedila de trabalho eacute transformada em mercadoria e passa a

ocultar o acuacutemulo de excedente por parte dos donos dos meios de produccedilatildeo que se apropriam deforma desigual do valor dos produtos vendidos

E eacute justamente a vida coletiva que se configura como caracteriacutestica fundamental dos nuacute-cleos urbanos e sua gestatildeo ndash organizaccedilatildeo dos fluxos de pessoas das aglomeraccedilotildees regulamen-taccedilatildeo do cotidiano ndash que revela a ldquocidade poliacuteticardquo (ROLNIK 1995) A cidade poliacutetica caracteri-

za-se pela centralidade do poder urbano e pela hierarquizaccedilatildeo social que ao longo da histoacuteriase desenvolveu por meio da dominaccedilatildeo e do autoritarismo poliacutetico-administrativo com origemna cidadela fortificada e no poder do rei com base na guerra Desde a poacutelis grega passando pelacivitas romana a cidade poliacutetica eacute menos um espaccedilo geograacutefico do que uma praacutetica social base-ada nas relaccedilotildees de poder de modo que ldquocidadatildeordquo designava na Greacutecia antiga aquele que podiaparticipar da vida poliacutetica e natildeo todos os habitantes Isso explica porque em muitas cidades

contemporacircneas como Satildeo Paulo que natildeo possuem centro ou apresentam muacuteltiplas centrali-dades o poder poliacutetico natildeo deixou de estar concentrado nas matildeos de alguns poucos grupos Eacuteque o processo de hierarquizaccedilatildeo e controle social nem sempre implicou concentraccedilatildeo espacial

sobretudo apoacutes os avanccedilos tecnoloacutegicos recentes

Todas essas dimensotildees da cidade ndash seu poder de atraccedilatildeo sua abertura para a escritadas accedilotildees humanas seu aspecto poliacutetico ndash como diz Rolnik (1995 p 25-26) ldquoao concentrare aglomerar as pessoas intensifica as possibilidades de troca e colaboraccedilatildeo entre os ho-mens potencializando sua capacidade produtivardquo Eacute o que permite vermos a ldquocidade comomercadordquo e revela o trabalho como elemento central para o surgimento das cidades Os

determinantes estatildeo em trecircs componentes que para Rolnik satildeo essenciais especializaccedilatildeodo trabalho coletivo circuito de troca e consumo A especializaccedilatildeo comeccedilou jaacute com a divisatildeo

entre campo e cidade passou pela divisatildeo de atividades dentro da proacutepria cidade e culminoucom a especializaccedilatildeo entre cidades o que permitiu intensificaccedilatildeo das trocas e fez com queo campo natildeo fosse mais apenas fornecedor (de alimentos) mas consumidor de produtos

oriundos dos centros urbanos

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Esses aglomerados urbanos satildeo produtos de inuacutemeras accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovi-das pelo Estado por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio comercial)e a pela proacutepria populaccedilatildeo e expressam as disparidades existentes na sociedade contemporacircnea

ou seja na sociedade do capital Dentre elas temos produccedilatildeo imobiliaacuteria privada majoritariamentedestinada agraves classes meacutedias e altas praacutetica da retenccedilatildeo de terras ociosas de diferentes segmentosdo capital nas aacutereas urbanizadas utilizadas para futura especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ausecircncia de poliacuteti-

cas significativas em habitaccedilatildeo que quando ocorrem resumem-se na construccedilatildeo de moradias nasperiferias das cidades ausecircncia de regulaccedilatildeo dos valores estabelecidos para as aacutereas centrais falta

de incentivo ao estabelecimento de moradias populares

Foto Jorge MarutaJornal da USP USP Imagens

desconsiderar as dimensotildees poliacuteticas e econocircmicas presentes nesse contexto pois satildeo essasrelaccedilotildees que determinam a funccedilatildeo social da cidade Com essa compreensatildeo eacute possiacutevel imaginaras relaccedilotildees sociais (interaccedilotildees positivas ou conflitantes) dos habitantes com seus familiares

amigos comunidades e tambeacutem com o Estado por meio do uso de espaccedilos e serviccedilos puacuteblicosou privados em lugares que satildeo parte do seu cotidiano

Para a nossa discussatildeo tomaremos por base a compreensatildeo sobre cidades perifeacutericas especifi-camente aquelas existentes nos paiacuteses comumente chamados de subdesenvolvidos emergentesou perifeacutericos para situar a realidade brasileira e considerar todas as particularidades que emergemquando defendemos o direito agrave cidade Apesar de suas singularidades ndash como tamanho da popula-

ccedilatildeo composiccedilatildeo eacutetnica extensatildeo territorial e costumes ndash essas cidades apresentam tambeacutem se-melhanccedilas como os grandes aglomerados urbanos que em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas

afastadas do centro urbano e satildeo marcados por significativa extensatildeo territorial e presenccedila de casasinacabadas com reduzido ambiente construtivo alta densidade populacional inexistecircncia de aacutereasverdes proximidade de rios ou coacuterregos falta de ordenamento do sistema viaacuterio restriccedilatildeo de mobi-lidade urbana com pouca diversidade e disponibilidade de transporte coletivo bem como precaacuteria

infraestrutura viaacuteria baixa oferta de serviccedilos e equipamentos puacuteblicos de sauacutede educaccedilatildeo lazeresportes e cultura altos iacutendices de violecircncia

Favela Paraisoacutepolis localizada na zona sul da cidade de Satildeo Paulo (creacutedito Jorge MarutaJornal da USPUsp Imagens)

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Eacute nesse cenaacuterio que inuacutemeras formas de opressatildeo satildeo naturalizadas e tecircm respaldo inclu-sive legal como no caso da segregaccedilatildeo territorial ligada agrave propriedade privada fenocircmeno tido

como ldquoaceitaacutevelrdquo e protegido por lei A cidade que temos ainda eacute em grande parte e infelizmen-te aquela das taxas de lucro da propriedade privada e das desigualdades em que o capital jaacute

em seu estaacutegio financeiro vem alcanccedilando um ldquoterreno lucrativo para a produccedilatildeo e absorccedilatildeo deexcedente de capitalrdquo (HARVEY 2012 p 74) Mas a cidade que queremos eacute aquela que possibi-lita o exerciacutecio da liberdade democraacutetica e da criatividade expressa no territoacuterio vivido e que natildeoestaacute subordinada agrave relaccedilatildeo de troca Uma cidade humanizada capaz de estabelecer o direito emsua totalidade para que todos possam viver de forma livre e diversificada natildeo fazendo da vidacotidiana uma mera sobrevivecircncia

Entretanto eacute importante reconhecer que houve um salto positivo quando discutimos terri-toacuterio espaccedilo puacuteblico e relaccedilotildees sociais sob a perspectiva da cidade democraacutetica principalmentepor esta reconhecer a participaccedilatildeo social sobretudo na ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e na tomada

de decisotildees poliacuteticas que em muitos casos ocorrem motivadas por reivindicaccedilotildees conformeveremos adiante quando apontarmos o reconhecimento do direito agrave cidade no Brasil

14 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

O Prefeito de Satildeo Paulo Fernando Haddad pedalando durante a inauguraccedilatildeo do maior mural de grafite a ceacuteu aberto da Ameacuterica Latina na

avenida 23 de maio (creacutedito Heloisa BallariniSECOM)

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Direito agrave Cidade | 15

2 As cidades brasileiras e

seu processo de urbanizaccedilatildeo

Com base no contexto apresentado partiremos entatildeo para a realidade brasileira e seusinuacutemeros desafios Em decorrecircncia de um passado como colocircnia o processo de urbanizaccedilatildeo noBrasil eacute heranccedila do desenvolvimento tardio desigual e combinado Ocorreu somente no seacuteculoXX com a chegada das induacutestrias faacutebricas e empresas de grande porte generalizando-se pelo

territoacuterio nacional apenas a partir da deacutecada de 1970 Se o processo de urbanizaccedilatildeo e formaccedilatildeodas cidades industriais europeias como afirma Lefebvre (2001) ocorreu em fins do seacuteculo XVIIIe iniacutecio do seacuteculo XIX com a expansatildeo e desenvolvimento do modo de produccedilatildeo capitalista foisomente no seacuteculo XX que nosso paiacutes superou o modelo arcaico de organizaccedilatildeo e produccedilatildeoadotando a partir de entatildeo o modelo capitalista mas com muitas marcas desse passadoagroexportador o que explica de certo modo a dependecircncia da economia internacional

Ao mesmo tempo em que a dependecircncia econocircmica em relaccedilatildeo ao capital financeiro inter-nacional eacute histoacuterica haacute de se considerar tambeacutem que trouxe benefiacutecios para o desenvolvimento

de infraestrutura em atividades relacionadas ao trabalho Essa situaccedilatildeo contribuiu portantopara o financiamento e a construccedilatildeo de ferrovias portos navegaccedilatildeo e geraccedilatildeo de eletricidadefatores essenciais para o processo de desenvolvimento industrial

O urbanizaccedilatildeo do Brasil foi tardia ocorrendo apenas apoacutes a industrializaccedilatildeo generalizada no seacuteculo XX (creacutedito Imagens USP)

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16 | Cadernos de Formaccedilatildeo

De acordo com Ermiacutenia Maricato (2003) em 1890 a populaccedilatildeo urbana totalizava uma meacutediade 68 a 10 Com a emergecircncia da matildeo de obra livre ou seja a relaccedilatildeo de trabalho baseada nomodo de produccedilatildeo capitalista esses nuacutemeros se elevaram As cidades representavam o futuro

a modernidade e todas as expectativas de mudanccedila no aspecto social e cultural do paiacutes Foi so-mente depois da Revoluccedilatildeo de 1930 que esse cenaacuterio se modificou de fato ao incorporar poliacuteti-

cas puacuteblicas no processo de urbanizaccedilatildeo e industrializaccedilatildeo ultrapassando o modelo econocircmicoagroexportador e a poliacutetica do ldquocafeacute com leiterdquo (Repuacuteblica Oligaacuterquica)

No entanto o vieacutes autoritaacuterio populista e paternalista do periacuteodo possibilitou a con-tinuidade de um Estado que trabalhava aliado aos interesses da oligarquia Prosseguiu

assim a desigualdade entre as classes sociais e outras heranccedilas do periacuteodo colonial comoa concentraccedilatildeo de terra de renda e de poder expressa nas relaccedilotildees de favor mando obe-

diecircncia e arbiacutetrio nas decisotildees legais (MARICATO 2003) Essa modernizaccedilatildeo com base no de-senvolvimento do atraso deixou suas marcas nas metroacutepoles brasileiras como a segregaccedilatildeoterritorial e os danos ao meio ambiente

Esse cenaacuterio soacute pocircde ser evidenciado deacutecadas depois agrave medida que as cidades brasilei-ras foram ficando cada vez mais ldquoassociadas agrave violecircncia poluiccedilatildeo das aacuteguas e do ar crianccediladesamparada traacutefego caoacutetico enchentes entre outros inuacutemeros malesrdquo (MARICATO 2003 p152) Isso porque conforme o desenvolvimento do paiacutes extinguiram-se as oportunidades para a

populaccedilatildeo imigrante e tambeacutem migrante Cresceram as periferias de forma exorbitante assim

como a pobreza e a alta densidade de ocupaccedilatildeo do solo Esses fatores geraram uma ampla se-gregaccedilatildeo urbana eou ambiental aleacutem das dificuldades de acesso aos serviccedilos puacuteblicos comotransporte saneamento abastecimento sauacutede educaccedilatildeo creches e lazer

Curiosidades sobre a cidade de Satildeo Paulo

Sobre a populaccedilatildeo urbana em Satildeo Paulo

1872 ndash 30 mil habitantes1900 ndash 240 mil habitantesAnos 1950 ndash populaccedilatildeo passou de pouco mais de2 milhotildees de habitantes para mais de 35 milhotildees

(motivo expansatildeo do setor industrial)2000 ndash passa de 10 milhotildees2010 ndash passa de 11 milhotildees e 200 mil

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Direito agrave Cidade | 17

2Mananciais correspondem a reservas hiacutedricas ou fontes utilizadas para o abastecimento puacuteblico de aacutegua Disponiacutevel em lthttpsitesabesp

combrsiteinternaDefaultaspxsecaoId=31gt Acesso em 10 ago 2015

21 O direito agrave cidade e a Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade

O direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta que soacute recentemente ndash final doseacuteculo XX ndash passou a ter reconhecimento mundial apesar de seu significado protagonis-mo essencial para esse reconhecimento principalmente no que diz respeito agrave implemen-taccedilatildeo da reforma urbana Destaca-se assim o Movimento Nacional pela Reforma Urbanaque criado em 1985 consolidou no Brasil a luta pelo direito agrave cidade na deacutecada de 1980

Utilidade puacuteblica

O portal da prefeitura de Satildeo Paulo

disponibiliza informaccedilotildees sobre ohistoacuterico demograacutefico da cidade deSatildeo Paulo com inuacutemeras ilus-traccedilotildees antigas dos pontos maisconhecidos do municiacutepio Acessehttpsmduprefeituraspgovbr

historico_demograficoindexphp

O crescimento desordenado gerou ocupaccedilotildees em aacutereas de mananciais2 e topos de morrondash que natildeo satildeo de interesse do mercado imobiliaacuterio dada a restriccedilatildeo pela legislaccedilatildeo urbaniacutesti-ca ndash criando aacutereas residenciais propensas a enchentes desmoronamentos e deslizamentos de

terras Some-se a isso um contexto de desemprego discriminaccedilatildeo informalidade e ilegalidadedado ao grande contingente populacional Por outro lado recursos puacuteblicos e privados satildeo cadavez mais utilizados para investimentos em aacutereas concentradas que satildeo valorizadas porque pas-

sam a dispor de saneamento baacutesico asfalto transporte e seguranccedila o que soacute beneficia o capitalimobiliaacuterio a construccedilatildeo civil e o estoque de terras urbanas dentre outros interesses da burgue-sia nacional e internacional

Portanto a questatildeo urbana e habitacional deve ser compreendida com base na relaccedilatildeo poliacuteticae econocircmica da sociedade brasileira aleacutem de algumas particularidades em sua formaccedilatildeo soacutecio-his-

toacuterica uma vez que ao mesmo tempo em que a populaccedilatildeo convive com um cenaacuterio mediado poralugueacuteis altos imoacuteveis ilegais e deacuteficit habitacional bairros com infraestrutura urbana se beneficiamda especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Conclui-se que essa questatildeo eacute produto do capitalismo e expressa suascontradiccedilotildees no cotidiano vivido por seus habitantes num contexto urbano de violaccedilatildeo dos direitos

humanos como o direito agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave moradia entre outros Como resposta agraves inuacutemerascondiccedilotildees precaacuterias de vida grupos atuam em diversos setores sociais em busca de mudanccedilas nomodo de governar planejar e desenvolver as cidades isto eacute lutam pelo direito agrave cidade

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18 | Cadernos de Formaccedilatildeo

Esse periacuteodo foi marcado pela efervescecircncia de debates e manifestaccedilotildees poliacuteticas de di-ferentes segmentos da sociedade civil que reivindicavam melhorias na cidade e na democra-tizaccedilatildeo do processo poliacutetico Em 1987 com a convergecircncia desses debates assim como com a

correlaccedilatildeo de forccedilas vigente foi criado o Foacuterum Nacional pela Reforma Urbana cujo objetivoprincipal era inserir a questatildeo urbana como pauta da agenda puacuteblica Esse movimento no finaldo regime militar passou a adotar uma concepccedilatildeo de cidade na sua totalidade entendendo o

direito agrave cidade como um direito coletivo que busca alcanccedilar ldquoa cidade de todos a casa aleacutem dacasa a casa com asfalto com serviccedilos puacuteblicos com escola com transporte com direito a umavida socialrdquo (SAULE JR amp UZZO 2009)

Vale ressaltar o protagonismo desse movimento junto a outros grupos populares (or-ganizaccedilotildees da sociedade civil movimentos sociais de luta pela moradia pastorais entida-

des de profissatildeo etc) que travaram um embate com as forccedilas poliacuteticas conservadoras naAssembleia Nacional Constituinte o que culminou posteriormente na influecircncia dessesgrupos sobre a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 sobretudo em relaccedilatildeo agraves temaacuteticas do campourbano Baseando-se na compreensatildeo de certo descaso do poder puacuteblico sobre segregaccedilatildeo

territorial saneamento habitaccedilatildeo e transporte esses grupos elaboraram uma proposta delei para inserccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal com vistas a atuar nesse contexto e participar doprocesso de criaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

De acordo com Nelson Saule Jr e Karina Uzzo (2009) o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana no ano de 1986 ldquodefine o conceito de reforma urbana como uma nova eacutetica socialrdquo erepudiam ldquoa cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitosrdquo Foi inau-gurada assim de forma criacutetica e em acircmbito nacional uma proposta de reforma urbana por meioda construccedilatildeo de uma plataforma poliacutetica que reivindicava uma nova cidade e o fim dos privileacute-

A populaccedilatildeo de Satildeo Paulo apresenta algumas especificidades em termos demograacuteficos eurbanos entre as quais merecem destaque certos aspectos de gecircnero e idade assim como sua

distribuiccedilatildeo territorial (importante quando se debate direito agrave cidade como direito humanomulher idosos e regiotildees perifeacutericas)

Feminilizaccedilatildeo ao longo dos anos tem sido crescente a predominacircncia numeacuterica de mulhe-res no conjunto da populaccedilatildeo Dados do Censo de 1980 indicam naquela data uma proporccedilatildeo

de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no municiacutepio Em 2000 essa relaccedilatildeo jaacute erade 91 para 100 e estima-se que atualmente esteja em torno de 90 ou seja existem 9 homenspara cada 10 mulheres na cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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20 | Cadernos de Formaccedilatildeo

bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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38 | Cadernos de Formaccedilatildeo

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Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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8 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

Quais imagens e sentimentos os versos acima nos trazem O quanto a cidade onde vivemosaproxima-se ou distancia-se da cidade dos nossos sonhos Eacute possiacutevel ampliar a participaccedilatildeosocial na definiccedilatildeo da gestatildeo e ocupaccedilatildeo dos espaccedilos puacuteblicos Essas e outras questotildees seratildeo

discutidas neste caderno Faremos referecircncia a tratados estatutos e legislaccedilotildees que procuramregular a poliacutetica de desenvolvimento urbano e as funccedilotildees sociais da cidade visando ao bem-es-tar de seus habitantes

Este caderno proposto pela SMDHC e por sua Coordenaccedilatildeo do Direito agrave Cidade estimula-nosao fortalecimento da defesa dos direitos humanos pois mostra que a cidade pertence a todos eque todos tambeacutem satildeo responsaacuteveis pela garantia do direito a ela

O primeiro capiacutetulo traccedila um panorama sobre a constituiccedilatildeo das cidades mostra comosurgiram e se desenvolveram Tambeacutem analisa as relaccedilotildees sociais no contexto da defesa do

direito agrave cidade

No segundo capiacutetulo discute-se o processo de urbanizaccedilatildeo brasileiro os fundamentos denosso direito agrave cidade em diferentes acircmbitos bem como nos permite entender a funccedilatildeo socialda cidade e da proacutepria propriedade

Ao tratar da implementaccedilatildeo do direito agrave cidade no municiacutepio de Satildeo Paulo o terceiro capiacutetu-

lo mergulha nas discussotildees sobre a poliacutetica habitacional as novas agendas de direitos humanose a gestatildeo democraacutetica Convida-nos assim a novas formas de participaccedilatildeo e de apropriaccedilatildeo doespaccedilo puacuteblico Aleacutem dos avanccedilos jaacute obtidos em Satildeo Paulo fica o desafio da luta permanente detodos pela garantia ao direito agrave cidade que se associa ao direito agrave dignidade Isso exige de todosdisponibilidade criatividade e intensa participaccedilatildeo social

Satildeo Paulo dezembro de 2015Equipe do Instituto Paulo Freire

1Trechos do poema da muacutesica ldquoA cidaderdquo de Paulo Roberto Padilha (CD Velho Amigo Satildeo Paulo 2014)

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1 A constituiccedilatildeo das cidadesQuando se pensa ou se reivindica o direito agrave cidade certamente se faz referecircncia a alguns

aspectos que de acordo com determinada compreensatildeo satildeo extremamente necessaacuterios agrave vida

urbana um haacutebitat que facilite as relaccedilotildees sociais sentimento de pertencimento a fim de tor-nar possiacutevel a apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico condiccedilotildees dignas de vida valorizaccedilatildeo das pessoase dos espaccedilos de convivecircncia novas formas de participaccedilatildeo social na administraccedilatildeo puacuteblica lo-cal igualdade de direitos Para que isso se concretize algumas mudanccedilas satildeo almejadas o querepresenta evidentemente a superaccedilatildeo de certos desafios

Pretendemos aqui apresentar reflexotildees iniciais que abordem a cidade como expressatildeo decriatividade de transformaccedilatildeo mas tambeacutem de relaccedilotildees de dominaccedilatildeo opressatildeo segregaccedilatildeo edisputa de interesses O objetivo portanto eacute contribuir para um debate que se fundamenta naconcepccedilatildeo do direito agrave cidade como direito humano

11 Cidade compreensatildeo que temos e defendemos

Se a cidade revela o conjuntode coisas que fazemos na vida coti-diana que vai da nossa existecircnciaagraves formas como nos relacionamoscom os outros isso significa que

ela representa um estilo de vidamuito particular em comparaccedilatildeo aoutros lugares se considerarmoszonas mais ou menos urbanas ru-rais ou mesmo rurbanas Essa di-

ferenccedila eacute estabelecida pela forma

de organizaccedilatildeo e sua densidadepopulacional com zonas residen-ciais comerciais e industriais quedemandam infraestruturaserviccedilos de transporte atividade econocircmica e assim por diante Eacute

nesse ambiente que nos socializamos aprendemos a nos comunicar e nos transformamoscom base nos saberes coletivos Eacute tambeacutem onde atuamos para manter nossa condiccedilatildeo mate-rial de existecircncia a fim de suprir as necessidades vitais

Contudo ao se propor uma reflexatildeo sobre a cidade eacute importante salientar que ela possui

um conjunto de significados que ultrapassam uma definiccedilatildeo mais precisa Nesse sentido a con-cepccedilatildeo de cidade em que nos baseamos eacute aquela que agrega a vida cotidiana das pessoas quedesempenham papeacuteis sociais e reproduzem sua existecircncia em niacuteveis riquiacutessimos de cultura de

Satildeo Paulo possui hoje mais de 11 milhotildees de habitantes (creacutedito MarcosSantosUSP Imagens)

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10 | Cadernos de Formaccedilatildeo

12 A importacircncia de compreendermos a histoacuteria e o surgimento das cidades

Recorrer agrave histoacuteria da humanida-de eacute fundamental para compreendero significado do direito agrave cidade comodireito humano Isso porque homens emulheres se inserem na cidade por in-

teiro com necessidades materiais e so-

ciais Raquel Rolnik (1995) ao definir oque eacute cidade identifica seu surgimen-to e transformaccedilotildees como expressatildeoda racionalidade humana capacidade

de abstraccedilatildeo memoacuteria manutenccedilatildeode relaccedilotildees sociais e poliacuteticas adapta-ccedilatildeo ao trabalho coletivo e agrave especializaccedilatildeo (o que vai gerar o circuito de troca e consumo)

A autora aponta algumas dimensotildees essenciais na constituiccedilatildeo de qualquer cidade Uma delas

eacute o poder de atraccedilatildeo ndash a imagem eacute a da ldquocidade como um imatilderdquo ndash que originalmente esteve associado

aos templos religiosos sobretudo na Mesopotacircmia no terceiro milecircnio antes da era cristatilde Ali os pri-meiros nuacutecleos urbanos se reuniram para a construccedilatildeo dos zigurates ndash locais cerimoniais ndash no mesmomomento em que se iniciou o processo de sedentarizaccedilatildeo com a ocupaccedilatildeo permanente do territoacuteriopara a agricultura e moradia

A intervenccedilatildeo humana na natureza desde a fabricaccedilatildeo tijolos para a edificaccedilatildeo de templosateacute a construccedilatildeo de cidades inteiras se ampliou de tal modo que a humanidade passou cada vezmais a interagir com um meio construiacutedo Surgiu entatildeo uma nova relaccedilatildeo em que a arquitetura setransformou num repositoacuterio da memoacuteria coletiva registro das accedilotildees dos antepassados de modo

a poder ser lida como um texto Eacute a ldquocidade como escritardquo nas palavras de Rolnik (1995) que elevao niacutevel de abstraccedilatildeo de homens e mulheres e exige uma racionalidade que nessa mesma eacutepocafez surgir aleacutem da escrita padrotildees de medida e formas de gestatildeo do trabalho coletivo

relaccedilotildees interculturais e intertransculturais A cidade soacute existe porque haacute pessoas que a fazemem sua estrutura e dinacircmica

Quando se fala em relaccedilotildees de forccedila e interesses em conflito eacute indispensaacutevel pensar que essasituaccedilatildeo estaacute integrada agrave dinacircmica da cidade e ao cotidiano vivido Historicamente a cidade repre-senta esse conjunto de relaccedilotildees sociais e materiais de existecircncia A vida urbana ganha estrutura eforma por meio do conjunto de accedilotildees e relaccedilotildees envolvidas no arranjo territorial e administrativo nocomeacutercio na divisatildeo social do trabalho e no proacuteprio processo de urbanizaccedilatildeo Fica evidente assim

que a centralidade desse processo se encontra em algo substantivamente humano De fato as ci-dades contemporacircneas (sobretudo as grandes metroacutepoles) com imensos edifiacutecios torres parquesestradas e assim por diante satildeo o resultado de um longo percurso histoacuterico relacionado ao trabalho

Zigurate na Mesopotacircmia atual Iraque

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13 Relaccedilotildees sociais e direito de expressatildeo numa cidade democraacutetica

Pensemos agora nos tempos atuais e numa cidade democraacutetica em que a liberdade de ex-pressatildeo e manifestaccedilatildeo das diferentes opiniotildees satildeo possiacuteveis qual significado existe na organi-zaccedilatildeo da vida puacuteblica Como as relaccedilotildees satildeo ou podem vir a ser estabelecidas

Existe uma predominacircncia do mercado nas cidades principalmente quando evidenciamos oestaacutegio em que o modo de produccedilatildeo coletivo foi organizando-se na relaccedilatildeo capitalista de produccedilatildeoestaacutegio de desenvolvimento da sociedade atual As pessoas para satisfazerem suas necessidadesmais simples de subsistecircncia tem de se inserir no circuito de trocas representado pelo mercadoe mediado pelo dinheiro No entanto consumimos produtos por meio da aquisiccedilatildeo da moeda de

troca que representa o valor equivalente do produto vendido no mercado Esse valor vai para obolso do produtor Essa relaccedilatildeo organiza a estrutura do trabalho e da vida nas cidades pois tudo eacutemediado pela moeda de troca Assim a forccedila de trabalho eacute transformada em mercadoria e passa a

ocultar o acuacutemulo de excedente por parte dos donos dos meios de produccedilatildeo que se apropriam deforma desigual do valor dos produtos vendidos

E eacute justamente a vida coletiva que se configura como caracteriacutestica fundamental dos nuacute-cleos urbanos e sua gestatildeo ndash organizaccedilatildeo dos fluxos de pessoas das aglomeraccedilotildees regulamen-taccedilatildeo do cotidiano ndash que revela a ldquocidade poliacuteticardquo (ROLNIK 1995) A cidade poliacutetica caracteri-

za-se pela centralidade do poder urbano e pela hierarquizaccedilatildeo social que ao longo da histoacuteriase desenvolveu por meio da dominaccedilatildeo e do autoritarismo poliacutetico-administrativo com origemna cidadela fortificada e no poder do rei com base na guerra Desde a poacutelis grega passando pelacivitas romana a cidade poliacutetica eacute menos um espaccedilo geograacutefico do que uma praacutetica social base-ada nas relaccedilotildees de poder de modo que ldquocidadatildeordquo designava na Greacutecia antiga aquele que podiaparticipar da vida poliacutetica e natildeo todos os habitantes Isso explica porque em muitas cidades

contemporacircneas como Satildeo Paulo que natildeo possuem centro ou apresentam muacuteltiplas centrali-dades o poder poliacutetico natildeo deixou de estar concentrado nas matildeos de alguns poucos grupos Eacuteque o processo de hierarquizaccedilatildeo e controle social nem sempre implicou concentraccedilatildeo espacial

sobretudo apoacutes os avanccedilos tecnoloacutegicos recentes

Todas essas dimensotildees da cidade ndash seu poder de atraccedilatildeo sua abertura para a escritadas accedilotildees humanas seu aspecto poliacutetico ndash como diz Rolnik (1995 p 25-26) ldquoao concentrare aglomerar as pessoas intensifica as possibilidades de troca e colaboraccedilatildeo entre os ho-mens potencializando sua capacidade produtivardquo Eacute o que permite vermos a ldquocidade comomercadordquo e revela o trabalho como elemento central para o surgimento das cidades Os

determinantes estatildeo em trecircs componentes que para Rolnik satildeo essenciais especializaccedilatildeodo trabalho coletivo circuito de troca e consumo A especializaccedilatildeo comeccedilou jaacute com a divisatildeo

entre campo e cidade passou pela divisatildeo de atividades dentro da proacutepria cidade e culminoucom a especializaccedilatildeo entre cidades o que permitiu intensificaccedilatildeo das trocas e fez com queo campo natildeo fosse mais apenas fornecedor (de alimentos) mas consumidor de produtos

oriundos dos centros urbanos

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Esses aglomerados urbanos satildeo produtos de inuacutemeras accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovi-das pelo Estado por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio comercial)e a pela proacutepria populaccedilatildeo e expressam as disparidades existentes na sociedade contemporacircnea

ou seja na sociedade do capital Dentre elas temos produccedilatildeo imobiliaacuteria privada majoritariamentedestinada agraves classes meacutedias e altas praacutetica da retenccedilatildeo de terras ociosas de diferentes segmentosdo capital nas aacutereas urbanizadas utilizadas para futura especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ausecircncia de poliacuteti-

cas significativas em habitaccedilatildeo que quando ocorrem resumem-se na construccedilatildeo de moradias nasperiferias das cidades ausecircncia de regulaccedilatildeo dos valores estabelecidos para as aacutereas centrais falta

de incentivo ao estabelecimento de moradias populares

Foto Jorge MarutaJornal da USP USP Imagens

desconsiderar as dimensotildees poliacuteticas e econocircmicas presentes nesse contexto pois satildeo essasrelaccedilotildees que determinam a funccedilatildeo social da cidade Com essa compreensatildeo eacute possiacutevel imaginaras relaccedilotildees sociais (interaccedilotildees positivas ou conflitantes) dos habitantes com seus familiares

amigos comunidades e tambeacutem com o Estado por meio do uso de espaccedilos e serviccedilos puacuteblicosou privados em lugares que satildeo parte do seu cotidiano

Para a nossa discussatildeo tomaremos por base a compreensatildeo sobre cidades perifeacutericas especifi-camente aquelas existentes nos paiacuteses comumente chamados de subdesenvolvidos emergentesou perifeacutericos para situar a realidade brasileira e considerar todas as particularidades que emergemquando defendemos o direito agrave cidade Apesar de suas singularidades ndash como tamanho da popula-

ccedilatildeo composiccedilatildeo eacutetnica extensatildeo territorial e costumes ndash essas cidades apresentam tambeacutem se-melhanccedilas como os grandes aglomerados urbanos que em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas

afastadas do centro urbano e satildeo marcados por significativa extensatildeo territorial e presenccedila de casasinacabadas com reduzido ambiente construtivo alta densidade populacional inexistecircncia de aacutereasverdes proximidade de rios ou coacuterregos falta de ordenamento do sistema viaacuterio restriccedilatildeo de mobi-lidade urbana com pouca diversidade e disponibilidade de transporte coletivo bem como precaacuteria

infraestrutura viaacuteria baixa oferta de serviccedilos e equipamentos puacuteblicos de sauacutede educaccedilatildeo lazeresportes e cultura altos iacutendices de violecircncia

Favela Paraisoacutepolis localizada na zona sul da cidade de Satildeo Paulo (creacutedito Jorge MarutaJornal da USPUsp Imagens)

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Eacute nesse cenaacuterio que inuacutemeras formas de opressatildeo satildeo naturalizadas e tecircm respaldo inclu-sive legal como no caso da segregaccedilatildeo territorial ligada agrave propriedade privada fenocircmeno tido

como ldquoaceitaacutevelrdquo e protegido por lei A cidade que temos ainda eacute em grande parte e infelizmen-te aquela das taxas de lucro da propriedade privada e das desigualdades em que o capital jaacute

em seu estaacutegio financeiro vem alcanccedilando um ldquoterreno lucrativo para a produccedilatildeo e absorccedilatildeo deexcedente de capitalrdquo (HARVEY 2012 p 74) Mas a cidade que queremos eacute aquela que possibi-lita o exerciacutecio da liberdade democraacutetica e da criatividade expressa no territoacuterio vivido e que natildeoestaacute subordinada agrave relaccedilatildeo de troca Uma cidade humanizada capaz de estabelecer o direito emsua totalidade para que todos possam viver de forma livre e diversificada natildeo fazendo da vidacotidiana uma mera sobrevivecircncia

Entretanto eacute importante reconhecer que houve um salto positivo quando discutimos terri-toacuterio espaccedilo puacuteblico e relaccedilotildees sociais sob a perspectiva da cidade democraacutetica principalmentepor esta reconhecer a participaccedilatildeo social sobretudo na ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e na tomada

de decisotildees poliacuteticas que em muitos casos ocorrem motivadas por reivindicaccedilotildees conformeveremos adiante quando apontarmos o reconhecimento do direito agrave cidade no Brasil

14 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

O Prefeito de Satildeo Paulo Fernando Haddad pedalando durante a inauguraccedilatildeo do maior mural de grafite a ceacuteu aberto da Ameacuterica Latina na

avenida 23 de maio (creacutedito Heloisa BallariniSECOM)

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2 As cidades brasileiras e

seu processo de urbanizaccedilatildeo

Com base no contexto apresentado partiremos entatildeo para a realidade brasileira e seusinuacutemeros desafios Em decorrecircncia de um passado como colocircnia o processo de urbanizaccedilatildeo noBrasil eacute heranccedila do desenvolvimento tardio desigual e combinado Ocorreu somente no seacuteculoXX com a chegada das induacutestrias faacutebricas e empresas de grande porte generalizando-se pelo

territoacuterio nacional apenas a partir da deacutecada de 1970 Se o processo de urbanizaccedilatildeo e formaccedilatildeodas cidades industriais europeias como afirma Lefebvre (2001) ocorreu em fins do seacuteculo XVIIIe iniacutecio do seacuteculo XIX com a expansatildeo e desenvolvimento do modo de produccedilatildeo capitalista foisomente no seacuteculo XX que nosso paiacutes superou o modelo arcaico de organizaccedilatildeo e produccedilatildeoadotando a partir de entatildeo o modelo capitalista mas com muitas marcas desse passadoagroexportador o que explica de certo modo a dependecircncia da economia internacional

Ao mesmo tempo em que a dependecircncia econocircmica em relaccedilatildeo ao capital financeiro inter-nacional eacute histoacuterica haacute de se considerar tambeacutem que trouxe benefiacutecios para o desenvolvimento

de infraestrutura em atividades relacionadas ao trabalho Essa situaccedilatildeo contribuiu portantopara o financiamento e a construccedilatildeo de ferrovias portos navegaccedilatildeo e geraccedilatildeo de eletricidadefatores essenciais para o processo de desenvolvimento industrial

O urbanizaccedilatildeo do Brasil foi tardia ocorrendo apenas apoacutes a industrializaccedilatildeo generalizada no seacuteculo XX (creacutedito Imagens USP)

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De acordo com Ermiacutenia Maricato (2003) em 1890 a populaccedilatildeo urbana totalizava uma meacutediade 68 a 10 Com a emergecircncia da matildeo de obra livre ou seja a relaccedilatildeo de trabalho baseada nomodo de produccedilatildeo capitalista esses nuacutemeros se elevaram As cidades representavam o futuro

a modernidade e todas as expectativas de mudanccedila no aspecto social e cultural do paiacutes Foi so-mente depois da Revoluccedilatildeo de 1930 que esse cenaacuterio se modificou de fato ao incorporar poliacuteti-

cas puacuteblicas no processo de urbanizaccedilatildeo e industrializaccedilatildeo ultrapassando o modelo econocircmicoagroexportador e a poliacutetica do ldquocafeacute com leiterdquo (Repuacuteblica Oligaacuterquica)

No entanto o vieacutes autoritaacuterio populista e paternalista do periacuteodo possibilitou a con-tinuidade de um Estado que trabalhava aliado aos interesses da oligarquia Prosseguiu

assim a desigualdade entre as classes sociais e outras heranccedilas do periacuteodo colonial comoa concentraccedilatildeo de terra de renda e de poder expressa nas relaccedilotildees de favor mando obe-

diecircncia e arbiacutetrio nas decisotildees legais (MARICATO 2003) Essa modernizaccedilatildeo com base no de-senvolvimento do atraso deixou suas marcas nas metroacutepoles brasileiras como a segregaccedilatildeoterritorial e os danos ao meio ambiente

Esse cenaacuterio soacute pocircde ser evidenciado deacutecadas depois agrave medida que as cidades brasilei-ras foram ficando cada vez mais ldquoassociadas agrave violecircncia poluiccedilatildeo das aacuteguas e do ar crianccediladesamparada traacutefego caoacutetico enchentes entre outros inuacutemeros malesrdquo (MARICATO 2003 p152) Isso porque conforme o desenvolvimento do paiacutes extinguiram-se as oportunidades para a

populaccedilatildeo imigrante e tambeacutem migrante Cresceram as periferias de forma exorbitante assim

como a pobreza e a alta densidade de ocupaccedilatildeo do solo Esses fatores geraram uma ampla se-gregaccedilatildeo urbana eou ambiental aleacutem das dificuldades de acesso aos serviccedilos puacuteblicos comotransporte saneamento abastecimento sauacutede educaccedilatildeo creches e lazer

Curiosidades sobre a cidade de Satildeo Paulo

Sobre a populaccedilatildeo urbana em Satildeo Paulo

1872 ndash 30 mil habitantes1900 ndash 240 mil habitantesAnos 1950 ndash populaccedilatildeo passou de pouco mais de2 milhotildees de habitantes para mais de 35 milhotildees

(motivo expansatildeo do setor industrial)2000 ndash passa de 10 milhotildees2010 ndash passa de 11 milhotildees e 200 mil

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Direito agrave Cidade | 17

2Mananciais correspondem a reservas hiacutedricas ou fontes utilizadas para o abastecimento puacuteblico de aacutegua Disponiacutevel em lthttpsitesabesp

combrsiteinternaDefaultaspxsecaoId=31gt Acesso em 10 ago 2015

21 O direito agrave cidade e a Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade

O direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta que soacute recentemente ndash final doseacuteculo XX ndash passou a ter reconhecimento mundial apesar de seu significado protagonis-mo essencial para esse reconhecimento principalmente no que diz respeito agrave implemen-taccedilatildeo da reforma urbana Destaca-se assim o Movimento Nacional pela Reforma Urbanaque criado em 1985 consolidou no Brasil a luta pelo direito agrave cidade na deacutecada de 1980

Utilidade puacuteblica

O portal da prefeitura de Satildeo Paulo

disponibiliza informaccedilotildees sobre ohistoacuterico demograacutefico da cidade deSatildeo Paulo com inuacutemeras ilus-traccedilotildees antigas dos pontos maisconhecidos do municiacutepio Acessehttpsmduprefeituraspgovbr

historico_demograficoindexphp

O crescimento desordenado gerou ocupaccedilotildees em aacutereas de mananciais2 e topos de morrondash que natildeo satildeo de interesse do mercado imobiliaacuterio dada a restriccedilatildeo pela legislaccedilatildeo urbaniacutesti-ca ndash criando aacutereas residenciais propensas a enchentes desmoronamentos e deslizamentos de

terras Some-se a isso um contexto de desemprego discriminaccedilatildeo informalidade e ilegalidadedado ao grande contingente populacional Por outro lado recursos puacuteblicos e privados satildeo cadavez mais utilizados para investimentos em aacutereas concentradas que satildeo valorizadas porque pas-

sam a dispor de saneamento baacutesico asfalto transporte e seguranccedila o que soacute beneficia o capitalimobiliaacuterio a construccedilatildeo civil e o estoque de terras urbanas dentre outros interesses da burgue-sia nacional e internacional

Portanto a questatildeo urbana e habitacional deve ser compreendida com base na relaccedilatildeo poliacuteticae econocircmica da sociedade brasileira aleacutem de algumas particularidades em sua formaccedilatildeo soacutecio-his-

toacuterica uma vez que ao mesmo tempo em que a populaccedilatildeo convive com um cenaacuterio mediado poralugueacuteis altos imoacuteveis ilegais e deacuteficit habitacional bairros com infraestrutura urbana se beneficiamda especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Conclui-se que essa questatildeo eacute produto do capitalismo e expressa suascontradiccedilotildees no cotidiano vivido por seus habitantes num contexto urbano de violaccedilatildeo dos direitos

humanos como o direito agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave moradia entre outros Como resposta agraves inuacutemerascondiccedilotildees precaacuterias de vida grupos atuam em diversos setores sociais em busca de mudanccedilas nomodo de governar planejar e desenvolver as cidades isto eacute lutam pelo direito agrave cidade

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18 | Cadernos de Formaccedilatildeo

Esse periacuteodo foi marcado pela efervescecircncia de debates e manifestaccedilotildees poliacuteticas de di-ferentes segmentos da sociedade civil que reivindicavam melhorias na cidade e na democra-tizaccedilatildeo do processo poliacutetico Em 1987 com a convergecircncia desses debates assim como com a

correlaccedilatildeo de forccedilas vigente foi criado o Foacuterum Nacional pela Reforma Urbana cujo objetivoprincipal era inserir a questatildeo urbana como pauta da agenda puacuteblica Esse movimento no finaldo regime militar passou a adotar uma concepccedilatildeo de cidade na sua totalidade entendendo o

direito agrave cidade como um direito coletivo que busca alcanccedilar ldquoa cidade de todos a casa aleacutem dacasa a casa com asfalto com serviccedilos puacuteblicos com escola com transporte com direito a umavida socialrdquo (SAULE JR amp UZZO 2009)

Vale ressaltar o protagonismo desse movimento junto a outros grupos populares (or-ganizaccedilotildees da sociedade civil movimentos sociais de luta pela moradia pastorais entida-

des de profissatildeo etc) que travaram um embate com as forccedilas poliacuteticas conservadoras naAssembleia Nacional Constituinte o que culminou posteriormente na influecircncia dessesgrupos sobre a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 sobretudo em relaccedilatildeo agraves temaacuteticas do campourbano Baseando-se na compreensatildeo de certo descaso do poder puacuteblico sobre segregaccedilatildeo

territorial saneamento habitaccedilatildeo e transporte esses grupos elaboraram uma proposta delei para inserccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal com vistas a atuar nesse contexto e participar doprocesso de criaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

De acordo com Nelson Saule Jr e Karina Uzzo (2009) o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana no ano de 1986 ldquodefine o conceito de reforma urbana como uma nova eacutetica socialrdquo erepudiam ldquoa cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitosrdquo Foi inau-gurada assim de forma criacutetica e em acircmbito nacional uma proposta de reforma urbana por meioda construccedilatildeo de uma plataforma poliacutetica que reivindicava uma nova cidade e o fim dos privileacute-

A populaccedilatildeo de Satildeo Paulo apresenta algumas especificidades em termos demograacuteficos eurbanos entre as quais merecem destaque certos aspectos de gecircnero e idade assim como sua

distribuiccedilatildeo territorial (importante quando se debate direito agrave cidade como direito humanomulher idosos e regiotildees perifeacutericas)

Feminilizaccedilatildeo ao longo dos anos tem sido crescente a predominacircncia numeacuterica de mulhe-res no conjunto da populaccedilatildeo Dados do Censo de 1980 indicam naquela data uma proporccedilatildeo

de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no municiacutepio Em 2000 essa relaccedilatildeo jaacute erade 91 para 100 e estima-se que atualmente esteja em torno de 90 ou seja existem 9 homenspara cada 10 mulheres na cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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20 | Cadernos de Formaccedilatildeo

bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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SAULE JR N amp UZZO K ldquoA trajetoacuteria da reforma urbana no Brasilrdquo Diaacutelogos propostas histoacuteriaspara uma cidadania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche--dph-8583htmlgt Acesso em 3 ago 2015

UNFPA Relatoacuterio sobre a situaccedilatildeo da populaccedilatildeo mundial 2011 New York UNFPA 2011 Disponiacutevel emltwwwuncvfilesPT-SWOP11-WEBpdfgt Acesso em 11 ago 2015

VERIacuteSSIMO A A ldquoPorque fomos a Medelliacuten e Bogotaacuterdquo Agrave beira do urbanismo 12 mar 2012 Disponiacutevelem lthttpabeiradourbanismoblogspotcombr201203porque-fomos-medellin-e-bogotahtmlgtAcesso em 3 ago 2015

Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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1 A constituiccedilatildeo das cidadesQuando se pensa ou se reivindica o direito agrave cidade certamente se faz referecircncia a alguns

aspectos que de acordo com determinada compreensatildeo satildeo extremamente necessaacuterios agrave vida

urbana um haacutebitat que facilite as relaccedilotildees sociais sentimento de pertencimento a fim de tor-nar possiacutevel a apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico condiccedilotildees dignas de vida valorizaccedilatildeo das pessoase dos espaccedilos de convivecircncia novas formas de participaccedilatildeo social na administraccedilatildeo puacuteblica lo-cal igualdade de direitos Para que isso se concretize algumas mudanccedilas satildeo almejadas o querepresenta evidentemente a superaccedilatildeo de certos desafios

Pretendemos aqui apresentar reflexotildees iniciais que abordem a cidade como expressatildeo decriatividade de transformaccedilatildeo mas tambeacutem de relaccedilotildees de dominaccedilatildeo opressatildeo segregaccedilatildeo edisputa de interesses O objetivo portanto eacute contribuir para um debate que se fundamenta naconcepccedilatildeo do direito agrave cidade como direito humano

11 Cidade compreensatildeo que temos e defendemos

Se a cidade revela o conjuntode coisas que fazemos na vida coti-diana que vai da nossa existecircnciaagraves formas como nos relacionamoscom os outros isso significa que

ela representa um estilo de vidamuito particular em comparaccedilatildeo aoutros lugares se considerarmoszonas mais ou menos urbanas ru-rais ou mesmo rurbanas Essa di-

ferenccedila eacute estabelecida pela forma

de organizaccedilatildeo e sua densidadepopulacional com zonas residen-ciais comerciais e industriais quedemandam infraestruturaserviccedilos de transporte atividade econocircmica e assim por diante Eacute

nesse ambiente que nos socializamos aprendemos a nos comunicar e nos transformamoscom base nos saberes coletivos Eacute tambeacutem onde atuamos para manter nossa condiccedilatildeo mate-rial de existecircncia a fim de suprir as necessidades vitais

Contudo ao se propor uma reflexatildeo sobre a cidade eacute importante salientar que ela possui

um conjunto de significados que ultrapassam uma definiccedilatildeo mais precisa Nesse sentido a con-cepccedilatildeo de cidade em que nos baseamos eacute aquela que agrega a vida cotidiana das pessoas quedesempenham papeacuteis sociais e reproduzem sua existecircncia em niacuteveis riquiacutessimos de cultura de

Satildeo Paulo possui hoje mais de 11 milhotildees de habitantes (creacutedito MarcosSantosUSP Imagens)

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10 | Cadernos de Formaccedilatildeo

12 A importacircncia de compreendermos a histoacuteria e o surgimento das cidades

Recorrer agrave histoacuteria da humanida-de eacute fundamental para compreendero significado do direito agrave cidade comodireito humano Isso porque homens emulheres se inserem na cidade por in-

teiro com necessidades materiais e so-

ciais Raquel Rolnik (1995) ao definir oque eacute cidade identifica seu surgimen-to e transformaccedilotildees como expressatildeoda racionalidade humana capacidade

de abstraccedilatildeo memoacuteria manutenccedilatildeode relaccedilotildees sociais e poliacuteticas adapta-ccedilatildeo ao trabalho coletivo e agrave especializaccedilatildeo (o que vai gerar o circuito de troca e consumo)

A autora aponta algumas dimensotildees essenciais na constituiccedilatildeo de qualquer cidade Uma delas

eacute o poder de atraccedilatildeo ndash a imagem eacute a da ldquocidade como um imatilderdquo ndash que originalmente esteve associado

aos templos religiosos sobretudo na Mesopotacircmia no terceiro milecircnio antes da era cristatilde Ali os pri-meiros nuacutecleos urbanos se reuniram para a construccedilatildeo dos zigurates ndash locais cerimoniais ndash no mesmomomento em que se iniciou o processo de sedentarizaccedilatildeo com a ocupaccedilatildeo permanente do territoacuteriopara a agricultura e moradia

A intervenccedilatildeo humana na natureza desde a fabricaccedilatildeo tijolos para a edificaccedilatildeo de templosateacute a construccedilatildeo de cidades inteiras se ampliou de tal modo que a humanidade passou cada vezmais a interagir com um meio construiacutedo Surgiu entatildeo uma nova relaccedilatildeo em que a arquitetura setransformou num repositoacuterio da memoacuteria coletiva registro das accedilotildees dos antepassados de modo

a poder ser lida como um texto Eacute a ldquocidade como escritardquo nas palavras de Rolnik (1995) que elevao niacutevel de abstraccedilatildeo de homens e mulheres e exige uma racionalidade que nessa mesma eacutepocafez surgir aleacutem da escrita padrotildees de medida e formas de gestatildeo do trabalho coletivo

relaccedilotildees interculturais e intertransculturais A cidade soacute existe porque haacute pessoas que a fazemem sua estrutura e dinacircmica

Quando se fala em relaccedilotildees de forccedila e interesses em conflito eacute indispensaacutevel pensar que essasituaccedilatildeo estaacute integrada agrave dinacircmica da cidade e ao cotidiano vivido Historicamente a cidade repre-senta esse conjunto de relaccedilotildees sociais e materiais de existecircncia A vida urbana ganha estrutura eforma por meio do conjunto de accedilotildees e relaccedilotildees envolvidas no arranjo territorial e administrativo nocomeacutercio na divisatildeo social do trabalho e no proacuteprio processo de urbanizaccedilatildeo Fica evidente assim

que a centralidade desse processo se encontra em algo substantivamente humano De fato as ci-dades contemporacircneas (sobretudo as grandes metroacutepoles) com imensos edifiacutecios torres parquesestradas e assim por diante satildeo o resultado de um longo percurso histoacuterico relacionado ao trabalho

Zigurate na Mesopotacircmia atual Iraque

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13 Relaccedilotildees sociais e direito de expressatildeo numa cidade democraacutetica

Pensemos agora nos tempos atuais e numa cidade democraacutetica em que a liberdade de ex-pressatildeo e manifestaccedilatildeo das diferentes opiniotildees satildeo possiacuteveis qual significado existe na organi-zaccedilatildeo da vida puacuteblica Como as relaccedilotildees satildeo ou podem vir a ser estabelecidas

Existe uma predominacircncia do mercado nas cidades principalmente quando evidenciamos oestaacutegio em que o modo de produccedilatildeo coletivo foi organizando-se na relaccedilatildeo capitalista de produccedilatildeoestaacutegio de desenvolvimento da sociedade atual As pessoas para satisfazerem suas necessidadesmais simples de subsistecircncia tem de se inserir no circuito de trocas representado pelo mercadoe mediado pelo dinheiro No entanto consumimos produtos por meio da aquisiccedilatildeo da moeda de

troca que representa o valor equivalente do produto vendido no mercado Esse valor vai para obolso do produtor Essa relaccedilatildeo organiza a estrutura do trabalho e da vida nas cidades pois tudo eacutemediado pela moeda de troca Assim a forccedila de trabalho eacute transformada em mercadoria e passa a

ocultar o acuacutemulo de excedente por parte dos donos dos meios de produccedilatildeo que se apropriam deforma desigual do valor dos produtos vendidos

E eacute justamente a vida coletiva que se configura como caracteriacutestica fundamental dos nuacute-cleos urbanos e sua gestatildeo ndash organizaccedilatildeo dos fluxos de pessoas das aglomeraccedilotildees regulamen-taccedilatildeo do cotidiano ndash que revela a ldquocidade poliacuteticardquo (ROLNIK 1995) A cidade poliacutetica caracteri-

za-se pela centralidade do poder urbano e pela hierarquizaccedilatildeo social que ao longo da histoacuteriase desenvolveu por meio da dominaccedilatildeo e do autoritarismo poliacutetico-administrativo com origemna cidadela fortificada e no poder do rei com base na guerra Desde a poacutelis grega passando pelacivitas romana a cidade poliacutetica eacute menos um espaccedilo geograacutefico do que uma praacutetica social base-ada nas relaccedilotildees de poder de modo que ldquocidadatildeordquo designava na Greacutecia antiga aquele que podiaparticipar da vida poliacutetica e natildeo todos os habitantes Isso explica porque em muitas cidades

contemporacircneas como Satildeo Paulo que natildeo possuem centro ou apresentam muacuteltiplas centrali-dades o poder poliacutetico natildeo deixou de estar concentrado nas matildeos de alguns poucos grupos Eacuteque o processo de hierarquizaccedilatildeo e controle social nem sempre implicou concentraccedilatildeo espacial

sobretudo apoacutes os avanccedilos tecnoloacutegicos recentes

Todas essas dimensotildees da cidade ndash seu poder de atraccedilatildeo sua abertura para a escritadas accedilotildees humanas seu aspecto poliacutetico ndash como diz Rolnik (1995 p 25-26) ldquoao concentrare aglomerar as pessoas intensifica as possibilidades de troca e colaboraccedilatildeo entre os ho-mens potencializando sua capacidade produtivardquo Eacute o que permite vermos a ldquocidade comomercadordquo e revela o trabalho como elemento central para o surgimento das cidades Os

determinantes estatildeo em trecircs componentes que para Rolnik satildeo essenciais especializaccedilatildeodo trabalho coletivo circuito de troca e consumo A especializaccedilatildeo comeccedilou jaacute com a divisatildeo

entre campo e cidade passou pela divisatildeo de atividades dentro da proacutepria cidade e culminoucom a especializaccedilatildeo entre cidades o que permitiu intensificaccedilatildeo das trocas e fez com queo campo natildeo fosse mais apenas fornecedor (de alimentos) mas consumidor de produtos

oriundos dos centros urbanos

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Esses aglomerados urbanos satildeo produtos de inuacutemeras accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovi-das pelo Estado por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio comercial)e a pela proacutepria populaccedilatildeo e expressam as disparidades existentes na sociedade contemporacircnea

ou seja na sociedade do capital Dentre elas temos produccedilatildeo imobiliaacuteria privada majoritariamentedestinada agraves classes meacutedias e altas praacutetica da retenccedilatildeo de terras ociosas de diferentes segmentosdo capital nas aacutereas urbanizadas utilizadas para futura especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ausecircncia de poliacuteti-

cas significativas em habitaccedilatildeo que quando ocorrem resumem-se na construccedilatildeo de moradias nasperiferias das cidades ausecircncia de regulaccedilatildeo dos valores estabelecidos para as aacutereas centrais falta

de incentivo ao estabelecimento de moradias populares

Foto Jorge MarutaJornal da USP USP Imagens

desconsiderar as dimensotildees poliacuteticas e econocircmicas presentes nesse contexto pois satildeo essasrelaccedilotildees que determinam a funccedilatildeo social da cidade Com essa compreensatildeo eacute possiacutevel imaginaras relaccedilotildees sociais (interaccedilotildees positivas ou conflitantes) dos habitantes com seus familiares

amigos comunidades e tambeacutem com o Estado por meio do uso de espaccedilos e serviccedilos puacuteblicosou privados em lugares que satildeo parte do seu cotidiano

Para a nossa discussatildeo tomaremos por base a compreensatildeo sobre cidades perifeacutericas especifi-camente aquelas existentes nos paiacuteses comumente chamados de subdesenvolvidos emergentesou perifeacutericos para situar a realidade brasileira e considerar todas as particularidades que emergemquando defendemos o direito agrave cidade Apesar de suas singularidades ndash como tamanho da popula-

ccedilatildeo composiccedilatildeo eacutetnica extensatildeo territorial e costumes ndash essas cidades apresentam tambeacutem se-melhanccedilas como os grandes aglomerados urbanos que em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas

afastadas do centro urbano e satildeo marcados por significativa extensatildeo territorial e presenccedila de casasinacabadas com reduzido ambiente construtivo alta densidade populacional inexistecircncia de aacutereasverdes proximidade de rios ou coacuterregos falta de ordenamento do sistema viaacuterio restriccedilatildeo de mobi-lidade urbana com pouca diversidade e disponibilidade de transporte coletivo bem como precaacuteria

infraestrutura viaacuteria baixa oferta de serviccedilos e equipamentos puacuteblicos de sauacutede educaccedilatildeo lazeresportes e cultura altos iacutendices de violecircncia

Favela Paraisoacutepolis localizada na zona sul da cidade de Satildeo Paulo (creacutedito Jorge MarutaJornal da USPUsp Imagens)

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Eacute nesse cenaacuterio que inuacutemeras formas de opressatildeo satildeo naturalizadas e tecircm respaldo inclu-sive legal como no caso da segregaccedilatildeo territorial ligada agrave propriedade privada fenocircmeno tido

como ldquoaceitaacutevelrdquo e protegido por lei A cidade que temos ainda eacute em grande parte e infelizmen-te aquela das taxas de lucro da propriedade privada e das desigualdades em que o capital jaacute

em seu estaacutegio financeiro vem alcanccedilando um ldquoterreno lucrativo para a produccedilatildeo e absorccedilatildeo deexcedente de capitalrdquo (HARVEY 2012 p 74) Mas a cidade que queremos eacute aquela que possibi-lita o exerciacutecio da liberdade democraacutetica e da criatividade expressa no territoacuterio vivido e que natildeoestaacute subordinada agrave relaccedilatildeo de troca Uma cidade humanizada capaz de estabelecer o direito emsua totalidade para que todos possam viver de forma livre e diversificada natildeo fazendo da vidacotidiana uma mera sobrevivecircncia

Entretanto eacute importante reconhecer que houve um salto positivo quando discutimos terri-toacuterio espaccedilo puacuteblico e relaccedilotildees sociais sob a perspectiva da cidade democraacutetica principalmentepor esta reconhecer a participaccedilatildeo social sobretudo na ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e na tomada

de decisotildees poliacuteticas que em muitos casos ocorrem motivadas por reivindicaccedilotildees conformeveremos adiante quando apontarmos o reconhecimento do direito agrave cidade no Brasil

14 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

O Prefeito de Satildeo Paulo Fernando Haddad pedalando durante a inauguraccedilatildeo do maior mural de grafite a ceacuteu aberto da Ameacuterica Latina na

avenida 23 de maio (creacutedito Heloisa BallariniSECOM)

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2 As cidades brasileiras e

seu processo de urbanizaccedilatildeo

Com base no contexto apresentado partiremos entatildeo para a realidade brasileira e seusinuacutemeros desafios Em decorrecircncia de um passado como colocircnia o processo de urbanizaccedilatildeo noBrasil eacute heranccedila do desenvolvimento tardio desigual e combinado Ocorreu somente no seacuteculoXX com a chegada das induacutestrias faacutebricas e empresas de grande porte generalizando-se pelo

territoacuterio nacional apenas a partir da deacutecada de 1970 Se o processo de urbanizaccedilatildeo e formaccedilatildeodas cidades industriais europeias como afirma Lefebvre (2001) ocorreu em fins do seacuteculo XVIIIe iniacutecio do seacuteculo XIX com a expansatildeo e desenvolvimento do modo de produccedilatildeo capitalista foisomente no seacuteculo XX que nosso paiacutes superou o modelo arcaico de organizaccedilatildeo e produccedilatildeoadotando a partir de entatildeo o modelo capitalista mas com muitas marcas desse passadoagroexportador o que explica de certo modo a dependecircncia da economia internacional

Ao mesmo tempo em que a dependecircncia econocircmica em relaccedilatildeo ao capital financeiro inter-nacional eacute histoacuterica haacute de se considerar tambeacutem que trouxe benefiacutecios para o desenvolvimento

de infraestrutura em atividades relacionadas ao trabalho Essa situaccedilatildeo contribuiu portantopara o financiamento e a construccedilatildeo de ferrovias portos navegaccedilatildeo e geraccedilatildeo de eletricidadefatores essenciais para o processo de desenvolvimento industrial

O urbanizaccedilatildeo do Brasil foi tardia ocorrendo apenas apoacutes a industrializaccedilatildeo generalizada no seacuteculo XX (creacutedito Imagens USP)

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De acordo com Ermiacutenia Maricato (2003) em 1890 a populaccedilatildeo urbana totalizava uma meacutediade 68 a 10 Com a emergecircncia da matildeo de obra livre ou seja a relaccedilatildeo de trabalho baseada nomodo de produccedilatildeo capitalista esses nuacutemeros se elevaram As cidades representavam o futuro

a modernidade e todas as expectativas de mudanccedila no aspecto social e cultural do paiacutes Foi so-mente depois da Revoluccedilatildeo de 1930 que esse cenaacuterio se modificou de fato ao incorporar poliacuteti-

cas puacuteblicas no processo de urbanizaccedilatildeo e industrializaccedilatildeo ultrapassando o modelo econocircmicoagroexportador e a poliacutetica do ldquocafeacute com leiterdquo (Repuacuteblica Oligaacuterquica)

No entanto o vieacutes autoritaacuterio populista e paternalista do periacuteodo possibilitou a con-tinuidade de um Estado que trabalhava aliado aos interesses da oligarquia Prosseguiu

assim a desigualdade entre as classes sociais e outras heranccedilas do periacuteodo colonial comoa concentraccedilatildeo de terra de renda e de poder expressa nas relaccedilotildees de favor mando obe-

diecircncia e arbiacutetrio nas decisotildees legais (MARICATO 2003) Essa modernizaccedilatildeo com base no de-senvolvimento do atraso deixou suas marcas nas metroacutepoles brasileiras como a segregaccedilatildeoterritorial e os danos ao meio ambiente

Esse cenaacuterio soacute pocircde ser evidenciado deacutecadas depois agrave medida que as cidades brasilei-ras foram ficando cada vez mais ldquoassociadas agrave violecircncia poluiccedilatildeo das aacuteguas e do ar crianccediladesamparada traacutefego caoacutetico enchentes entre outros inuacutemeros malesrdquo (MARICATO 2003 p152) Isso porque conforme o desenvolvimento do paiacutes extinguiram-se as oportunidades para a

populaccedilatildeo imigrante e tambeacutem migrante Cresceram as periferias de forma exorbitante assim

como a pobreza e a alta densidade de ocupaccedilatildeo do solo Esses fatores geraram uma ampla se-gregaccedilatildeo urbana eou ambiental aleacutem das dificuldades de acesso aos serviccedilos puacuteblicos comotransporte saneamento abastecimento sauacutede educaccedilatildeo creches e lazer

Curiosidades sobre a cidade de Satildeo Paulo

Sobre a populaccedilatildeo urbana em Satildeo Paulo

1872 ndash 30 mil habitantes1900 ndash 240 mil habitantesAnos 1950 ndash populaccedilatildeo passou de pouco mais de2 milhotildees de habitantes para mais de 35 milhotildees

(motivo expansatildeo do setor industrial)2000 ndash passa de 10 milhotildees2010 ndash passa de 11 milhotildees e 200 mil

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2Mananciais correspondem a reservas hiacutedricas ou fontes utilizadas para o abastecimento puacuteblico de aacutegua Disponiacutevel em lthttpsitesabesp

combrsiteinternaDefaultaspxsecaoId=31gt Acesso em 10 ago 2015

21 O direito agrave cidade e a Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade

O direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta que soacute recentemente ndash final doseacuteculo XX ndash passou a ter reconhecimento mundial apesar de seu significado protagonis-mo essencial para esse reconhecimento principalmente no que diz respeito agrave implemen-taccedilatildeo da reforma urbana Destaca-se assim o Movimento Nacional pela Reforma Urbanaque criado em 1985 consolidou no Brasil a luta pelo direito agrave cidade na deacutecada de 1980

Utilidade puacuteblica

O portal da prefeitura de Satildeo Paulo

disponibiliza informaccedilotildees sobre ohistoacuterico demograacutefico da cidade deSatildeo Paulo com inuacutemeras ilus-traccedilotildees antigas dos pontos maisconhecidos do municiacutepio Acessehttpsmduprefeituraspgovbr

historico_demograficoindexphp

O crescimento desordenado gerou ocupaccedilotildees em aacutereas de mananciais2 e topos de morrondash que natildeo satildeo de interesse do mercado imobiliaacuterio dada a restriccedilatildeo pela legislaccedilatildeo urbaniacutesti-ca ndash criando aacutereas residenciais propensas a enchentes desmoronamentos e deslizamentos de

terras Some-se a isso um contexto de desemprego discriminaccedilatildeo informalidade e ilegalidadedado ao grande contingente populacional Por outro lado recursos puacuteblicos e privados satildeo cadavez mais utilizados para investimentos em aacutereas concentradas que satildeo valorizadas porque pas-

sam a dispor de saneamento baacutesico asfalto transporte e seguranccedila o que soacute beneficia o capitalimobiliaacuterio a construccedilatildeo civil e o estoque de terras urbanas dentre outros interesses da burgue-sia nacional e internacional

Portanto a questatildeo urbana e habitacional deve ser compreendida com base na relaccedilatildeo poliacuteticae econocircmica da sociedade brasileira aleacutem de algumas particularidades em sua formaccedilatildeo soacutecio-his-

toacuterica uma vez que ao mesmo tempo em que a populaccedilatildeo convive com um cenaacuterio mediado poralugueacuteis altos imoacuteveis ilegais e deacuteficit habitacional bairros com infraestrutura urbana se beneficiamda especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Conclui-se que essa questatildeo eacute produto do capitalismo e expressa suascontradiccedilotildees no cotidiano vivido por seus habitantes num contexto urbano de violaccedilatildeo dos direitos

humanos como o direito agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave moradia entre outros Como resposta agraves inuacutemerascondiccedilotildees precaacuterias de vida grupos atuam em diversos setores sociais em busca de mudanccedilas nomodo de governar planejar e desenvolver as cidades isto eacute lutam pelo direito agrave cidade

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Esse periacuteodo foi marcado pela efervescecircncia de debates e manifestaccedilotildees poliacuteticas de di-ferentes segmentos da sociedade civil que reivindicavam melhorias na cidade e na democra-tizaccedilatildeo do processo poliacutetico Em 1987 com a convergecircncia desses debates assim como com a

correlaccedilatildeo de forccedilas vigente foi criado o Foacuterum Nacional pela Reforma Urbana cujo objetivoprincipal era inserir a questatildeo urbana como pauta da agenda puacuteblica Esse movimento no finaldo regime militar passou a adotar uma concepccedilatildeo de cidade na sua totalidade entendendo o

direito agrave cidade como um direito coletivo que busca alcanccedilar ldquoa cidade de todos a casa aleacutem dacasa a casa com asfalto com serviccedilos puacuteblicos com escola com transporte com direito a umavida socialrdquo (SAULE JR amp UZZO 2009)

Vale ressaltar o protagonismo desse movimento junto a outros grupos populares (or-ganizaccedilotildees da sociedade civil movimentos sociais de luta pela moradia pastorais entida-

des de profissatildeo etc) que travaram um embate com as forccedilas poliacuteticas conservadoras naAssembleia Nacional Constituinte o que culminou posteriormente na influecircncia dessesgrupos sobre a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 sobretudo em relaccedilatildeo agraves temaacuteticas do campourbano Baseando-se na compreensatildeo de certo descaso do poder puacuteblico sobre segregaccedilatildeo

territorial saneamento habitaccedilatildeo e transporte esses grupos elaboraram uma proposta delei para inserccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal com vistas a atuar nesse contexto e participar doprocesso de criaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

De acordo com Nelson Saule Jr e Karina Uzzo (2009) o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana no ano de 1986 ldquodefine o conceito de reforma urbana como uma nova eacutetica socialrdquo erepudiam ldquoa cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitosrdquo Foi inau-gurada assim de forma criacutetica e em acircmbito nacional uma proposta de reforma urbana por meioda construccedilatildeo de uma plataforma poliacutetica que reivindicava uma nova cidade e o fim dos privileacute-

A populaccedilatildeo de Satildeo Paulo apresenta algumas especificidades em termos demograacuteficos eurbanos entre as quais merecem destaque certos aspectos de gecircnero e idade assim como sua

distribuiccedilatildeo territorial (importante quando se debate direito agrave cidade como direito humanomulher idosos e regiotildees perifeacutericas)

Feminilizaccedilatildeo ao longo dos anos tem sido crescente a predominacircncia numeacuterica de mulhe-res no conjunto da populaccedilatildeo Dados do Censo de 1980 indicam naquela data uma proporccedilatildeo

de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no municiacutepio Em 2000 essa relaccedilatildeo jaacute erade 91 para 100 e estima-se que atualmente esteja em torno de 90 ou seja existem 9 homenspara cada 10 mulheres na cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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10 | Cadernos de Formaccedilatildeo

12 A importacircncia de compreendermos a histoacuteria e o surgimento das cidades

Recorrer agrave histoacuteria da humanida-de eacute fundamental para compreendero significado do direito agrave cidade comodireito humano Isso porque homens emulheres se inserem na cidade por in-

teiro com necessidades materiais e so-

ciais Raquel Rolnik (1995) ao definir oque eacute cidade identifica seu surgimen-to e transformaccedilotildees como expressatildeoda racionalidade humana capacidade

de abstraccedilatildeo memoacuteria manutenccedilatildeode relaccedilotildees sociais e poliacuteticas adapta-ccedilatildeo ao trabalho coletivo e agrave especializaccedilatildeo (o que vai gerar o circuito de troca e consumo)

A autora aponta algumas dimensotildees essenciais na constituiccedilatildeo de qualquer cidade Uma delas

eacute o poder de atraccedilatildeo ndash a imagem eacute a da ldquocidade como um imatilderdquo ndash que originalmente esteve associado

aos templos religiosos sobretudo na Mesopotacircmia no terceiro milecircnio antes da era cristatilde Ali os pri-meiros nuacutecleos urbanos se reuniram para a construccedilatildeo dos zigurates ndash locais cerimoniais ndash no mesmomomento em que se iniciou o processo de sedentarizaccedilatildeo com a ocupaccedilatildeo permanente do territoacuteriopara a agricultura e moradia

A intervenccedilatildeo humana na natureza desde a fabricaccedilatildeo tijolos para a edificaccedilatildeo de templosateacute a construccedilatildeo de cidades inteiras se ampliou de tal modo que a humanidade passou cada vezmais a interagir com um meio construiacutedo Surgiu entatildeo uma nova relaccedilatildeo em que a arquitetura setransformou num repositoacuterio da memoacuteria coletiva registro das accedilotildees dos antepassados de modo

a poder ser lida como um texto Eacute a ldquocidade como escritardquo nas palavras de Rolnik (1995) que elevao niacutevel de abstraccedilatildeo de homens e mulheres e exige uma racionalidade que nessa mesma eacutepocafez surgir aleacutem da escrita padrotildees de medida e formas de gestatildeo do trabalho coletivo

relaccedilotildees interculturais e intertransculturais A cidade soacute existe porque haacute pessoas que a fazemem sua estrutura e dinacircmica

Quando se fala em relaccedilotildees de forccedila e interesses em conflito eacute indispensaacutevel pensar que essasituaccedilatildeo estaacute integrada agrave dinacircmica da cidade e ao cotidiano vivido Historicamente a cidade repre-senta esse conjunto de relaccedilotildees sociais e materiais de existecircncia A vida urbana ganha estrutura eforma por meio do conjunto de accedilotildees e relaccedilotildees envolvidas no arranjo territorial e administrativo nocomeacutercio na divisatildeo social do trabalho e no proacuteprio processo de urbanizaccedilatildeo Fica evidente assim

que a centralidade desse processo se encontra em algo substantivamente humano De fato as ci-dades contemporacircneas (sobretudo as grandes metroacutepoles) com imensos edifiacutecios torres parquesestradas e assim por diante satildeo o resultado de um longo percurso histoacuterico relacionado ao trabalho

Zigurate na Mesopotacircmia atual Iraque

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13 Relaccedilotildees sociais e direito de expressatildeo numa cidade democraacutetica

Pensemos agora nos tempos atuais e numa cidade democraacutetica em que a liberdade de ex-pressatildeo e manifestaccedilatildeo das diferentes opiniotildees satildeo possiacuteveis qual significado existe na organi-zaccedilatildeo da vida puacuteblica Como as relaccedilotildees satildeo ou podem vir a ser estabelecidas

Existe uma predominacircncia do mercado nas cidades principalmente quando evidenciamos oestaacutegio em que o modo de produccedilatildeo coletivo foi organizando-se na relaccedilatildeo capitalista de produccedilatildeoestaacutegio de desenvolvimento da sociedade atual As pessoas para satisfazerem suas necessidadesmais simples de subsistecircncia tem de se inserir no circuito de trocas representado pelo mercadoe mediado pelo dinheiro No entanto consumimos produtos por meio da aquisiccedilatildeo da moeda de

troca que representa o valor equivalente do produto vendido no mercado Esse valor vai para obolso do produtor Essa relaccedilatildeo organiza a estrutura do trabalho e da vida nas cidades pois tudo eacutemediado pela moeda de troca Assim a forccedila de trabalho eacute transformada em mercadoria e passa a

ocultar o acuacutemulo de excedente por parte dos donos dos meios de produccedilatildeo que se apropriam deforma desigual do valor dos produtos vendidos

E eacute justamente a vida coletiva que se configura como caracteriacutestica fundamental dos nuacute-cleos urbanos e sua gestatildeo ndash organizaccedilatildeo dos fluxos de pessoas das aglomeraccedilotildees regulamen-taccedilatildeo do cotidiano ndash que revela a ldquocidade poliacuteticardquo (ROLNIK 1995) A cidade poliacutetica caracteri-

za-se pela centralidade do poder urbano e pela hierarquizaccedilatildeo social que ao longo da histoacuteriase desenvolveu por meio da dominaccedilatildeo e do autoritarismo poliacutetico-administrativo com origemna cidadela fortificada e no poder do rei com base na guerra Desde a poacutelis grega passando pelacivitas romana a cidade poliacutetica eacute menos um espaccedilo geograacutefico do que uma praacutetica social base-ada nas relaccedilotildees de poder de modo que ldquocidadatildeordquo designava na Greacutecia antiga aquele que podiaparticipar da vida poliacutetica e natildeo todos os habitantes Isso explica porque em muitas cidades

contemporacircneas como Satildeo Paulo que natildeo possuem centro ou apresentam muacuteltiplas centrali-dades o poder poliacutetico natildeo deixou de estar concentrado nas matildeos de alguns poucos grupos Eacuteque o processo de hierarquizaccedilatildeo e controle social nem sempre implicou concentraccedilatildeo espacial

sobretudo apoacutes os avanccedilos tecnoloacutegicos recentes

Todas essas dimensotildees da cidade ndash seu poder de atraccedilatildeo sua abertura para a escritadas accedilotildees humanas seu aspecto poliacutetico ndash como diz Rolnik (1995 p 25-26) ldquoao concentrare aglomerar as pessoas intensifica as possibilidades de troca e colaboraccedilatildeo entre os ho-mens potencializando sua capacidade produtivardquo Eacute o que permite vermos a ldquocidade comomercadordquo e revela o trabalho como elemento central para o surgimento das cidades Os

determinantes estatildeo em trecircs componentes que para Rolnik satildeo essenciais especializaccedilatildeodo trabalho coletivo circuito de troca e consumo A especializaccedilatildeo comeccedilou jaacute com a divisatildeo

entre campo e cidade passou pela divisatildeo de atividades dentro da proacutepria cidade e culminoucom a especializaccedilatildeo entre cidades o que permitiu intensificaccedilatildeo das trocas e fez com queo campo natildeo fosse mais apenas fornecedor (de alimentos) mas consumidor de produtos

oriundos dos centros urbanos

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Esses aglomerados urbanos satildeo produtos de inuacutemeras accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovi-das pelo Estado por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio comercial)e a pela proacutepria populaccedilatildeo e expressam as disparidades existentes na sociedade contemporacircnea

ou seja na sociedade do capital Dentre elas temos produccedilatildeo imobiliaacuteria privada majoritariamentedestinada agraves classes meacutedias e altas praacutetica da retenccedilatildeo de terras ociosas de diferentes segmentosdo capital nas aacutereas urbanizadas utilizadas para futura especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ausecircncia de poliacuteti-

cas significativas em habitaccedilatildeo que quando ocorrem resumem-se na construccedilatildeo de moradias nasperiferias das cidades ausecircncia de regulaccedilatildeo dos valores estabelecidos para as aacutereas centrais falta

de incentivo ao estabelecimento de moradias populares

Foto Jorge MarutaJornal da USP USP Imagens

desconsiderar as dimensotildees poliacuteticas e econocircmicas presentes nesse contexto pois satildeo essasrelaccedilotildees que determinam a funccedilatildeo social da cidade Com essa compreensatildeo eacute possiacutevel imaginaras relaccedilotildees sociais (interaccedilotildees positivas ou conflitantes) dos habitantes com seus familiares

amigos comunidades e tambeacutem com o Estado por meio do uso de espaccedilos e serviccedilos puacuteblicosou privados em lugares que satildeo parte do seu cotidiano

Para a nossa discussatildeo tomaremos por base a compreensatildeo sobre cidades perifeacutericas especifi-camente aquelas existentes nos paiacuteses comumente chamados de subdesenvolvidos emergentesou perifeacutericos para situar a realidade brasileira e considerar todas as particularidades que emergemquando defendemos o direito agrave cidade Apesar de suas singularidades ndash como tamanho da popula-

ccedilatildeo composiccedilatildeo eacutetnica extensatildeo territorial e costumes ndash essas cidades apresentam tambeacutem se-melhanccedilas como os grandes aglomerados urbanos que em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas

afastadas do centro urbano e satildeo marcados por significativa extensatildeo territorial e presenccedila de casasinacabadas com reduzido ambiente construtivo alta densidade populacional inexistecircncia de aacutereasverdes proximidade de rios ou coacuterregos falta de ordenamento do sistema viaacuterio restriccedilatildeo de mobi-lidade urbana com pouca diversidade e disponibilidade de transporte coletivo bem como precaacuteria

infraestrutura viaacuteria baixa oferta de serviccedilos e equipamentos puacuteblicos de sauacutede educaccedilatildeo lazeresportes e cultura altos iacutendices de violecircncia

Favela Paraisoacutepolis localizada na zona sul da cidade de Satildeo Paulo (creacutedito Jorge MarutaJornal da USPUsp Imagens)

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Eacute nesse cenaacuterio que inuacutemeras formas de opressatildeo satildeo naturalizadas e tecircm respaldo inclu-sive legal como no caso da segregaccedilatildeo territorial ligada agrave propriedade privada fenocircmeno tido

como ldquoaceitaacutevelrdquo e protegido por lei A cidade que temos ainda eacute em grande parte e infelizmen-te aquela das taxas de lucro da propriedade privada e das desigualdades em que o capital jaacute

em seu estaacutegio financeiro vem alcanccedilando um ldquoterreno lucrativo para a produccedilatildeo e absorccedilatildeo deexcedente de capitalrdquo (HARVEY 2012 p 74) Mas a cidade que queremos eacute aquela que possibi-lita o exerciacutecio da liberdade democraacutetica e da criatividade expressa no territoacuterio vivido e que natildeoestaacute subordinada agrave relaccedilatildeo de troca Uma cidade humanizada capaz de estabelecer o direito emsua totalidade para que todos possam viver de forma livre e diversificada natildeo fazendo da vidacotidiana uma mera sobrevivecircncia

Entretanto eacute importante reconhecer que houve um salto positivo quando discutimos terri-toacuterio espaccedilo puacuteblico e relaccedilotildees sociais sob a perspectiva da cidade democraacutetica principalmentepor esta reconhecer a participaccedilatildeo social sobretudo na ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e na tomada

de decisotildees poliacuteticas que em muitos casos ocorrem motivadas por reivindicaccedilotildees conformeveremos adiante quando apontarmos o reconhecimento do direito agrave cidade no Brasil

14 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

O Prefeito de Satildeo Paulo Fernando Haddad pedalando durante a inauguraccedilatildeo do maior mural de grafite a ceacuteu aberto da Ameacuterica Latina na

avenida 23 de maio (creacutedito Heloisa BallariniSECOM)

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Direito agrave Cidade | 15

2 As cidades brasileiras e

seu processo de urbanizaccedilatildeo

Com base no contexto apresentado partiremos entatildeo para a realidade brasileira e seusinuacutemeros desafios Em decorrecircncia de um passado como colocircnia o processo de urbanizaccedilatildeo noBrasil eacute heranccedila do desenvolvimento tardio desigual e combinado Ocorreu somente no seacuteculoXX com a chegada das induacutestrias faacutebricas e empresas de grande porte generalizando-se pelo

territoacuterio nacional apenas a partir da deacutecada de 1970 Se o processo de urbanizaccedilatildeo e formaccedilatildeodas cidades industriais europeias como afirma Lefebvre (2001) ocorreu em fins do seacuteculo XVIIIe iniacutecio do seacuteculo XIX com a expansatildeo e desenvolvimento do modo de produccedilatildeo capitalista foisomente no seacuteculo XX que nosso paiacutes superou o modelo arcaico de organizaccedilatildeo e produccedilatildeoadotando a partir de entatildeo o modelo capitalista mas com muitas marcas desse passadoagroexportador o que explica de certo modo a dependecircncia da economia internacional

Ao mesmo tempo em que a dependecircncia econocircmica em relaccedilatildeo ao capital financeiro inter-nacional eacute histoacuterica haacute de se considerar tambeacutem que trouxe benefiacutecios para o desenvolvimento

de infraestrutura em atividades relacionadas ao trabalho Essa situaccedilatildeo contribuiu portantopara o financiamento e a construccedilatildeo de ferrovias portos navegaccedilatildeo e geraccedilatildeo de eletricidadefatores essenciais para o processo de desenvolvimento industrial

O urbanizaccedilatildeo do Brasil foi tardia ocorrendo apenas apoacutes a industrializaccedilatildeo generalizada no seacuteculo XX (creacutedito Imagens USP)

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De acordo com Ermiacutenia Maricato (2003) em 1890 a populaccedilatildeo urbana totalizava uma meacutediade 68 a 10 Com a emergecircncia da matildeo de obra livre ou seja a relaccedilatildeo de trabalho baseada nomodo de produccedilatildeo capitalista esses nuacutemeros se elevaram As cidades representavam o futuro

a modernidade e todas as expectativas de mudanccedila no aspecto social e cultural do paiacutes Foi so-mente depois da Revoluccedilatildeo de 1930 que esse cenaacuterio se modificou de fato ao incorporar poliacuteti-

cas puacuteblicas no processo de urbanizaccedilatildeo e industrializaccedilatildeo ultrapassando o modelo econocircmicoagroexportador e a poliacutetica do ldquocafeacute com leiterdquo (Repuacuteblica Oligaacuterquica)

No entanto o vieacutes autoritaacuterio populista e paternalista do periacuteodo possibilitou a con-tinuidade de um Estado que trabalhava aliado aos interesses da oligarquia Prosseguiu

assim a desigualdade entre as classes sociais e outras heranccedilas do periacuteodo colonial comoa concentraccedilatildeo de terra de renda e de poder expressa nas relaccedilotildees de favor mando obe-

diecircncia e arbiacutetrio nas decisotildees legais (MARICATO 2003) Essa modernizaccedilatildeo com base no de-senvolvimento do atraso deixou suas marcas nas metroacutepoles brasileiras como a segregaccedilatildeoterritorial e os danos ao meio ambiente

Esse cenaacuterio soacute pocircde ser evidenciado deacutecadas depois agrave medida que as cidades brasilei-ras foram ficando cada vez mais ldquoassociadas agrave violecircncia poluiccedilatildeo das aacuteguas e do ar crianccediladesamparada traacutefego caoacutetico enchentes entre outros inuacutemeros malesrdquo (MARICATO 2003 p152) Isso porque conforme o desenvolvimento do paiacutes extinguiram-se as oportunidades para a

populaccedilatildeo imigrante e tambeacutem migrante Cresceram as periferias de forma exorbitante assim

como a pobreza e a alta densidade de ocupaccedilatildeo do solo Esses fatores geraram uma ampla se-gregaccedilatildeo urbana eou ambiental aleacutem das dificuldades de acesso aos serviccedilos puacuteblicos comotransporte saneamento abastecimento sauacutede educaccedilatildeo creches e lazer

Curiosidades sobre a cidade de Satildeo Paulo

Sobre a populaccedilatildeo urbana em Satildeo Paulo

1872 ndash 30 mil habitantes1900 ndash 240 mil habitantesAnos 1950 ndash populaccedilatildeo passou de pouco mais de2 milhotildees de habitantes para mais de 35 milhotildees

(motivo expansatildeo do setor industrial)2000 ndash passa de 10 milhotildees2010 ndash passa de 11 milhotildees e 200 mil

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2Mananciais correspondem a reservas hiacutedricas ou fontes utilizadas para o abastecimento puacuteblico de aacutegua Disponiacutevel em lthttpsitesabesp

combrsiteinternaDefaultaspxsecaoId=31gt Acesso em 10 ago 2015

21 O direito agrave cidade e a Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade

O direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta que soacute recentemente ndash final doseacuteculo XX ndash passou a ter reconhecimento mundial apesar de seu significado protagonis-mo essencial para esse reconhecimento principalmente no que diz respeito agrave implemen-taccedilatildeo da reforma urbana Destaca-se assim o Movimento Nacional pela Reforma Urbanaque criado em 1985 consolidou no Brasil a luta pelo direito agrave cidade na deacutecada de 1980

Utilidade puacuteblica

O portal da prefeitura de Satildeo Paulo

disponibiliza informaccedilotildees sobre ohistoacuterico demograacutefico da cidade deSatildeo Paulo com inuacutemeras ilus-traccedilotildees antigas dos pontos maisconhecidos do municiacutepio Acessehttpsmduprefeituraspgovbr

historico_demograficoindexphp

O crescimento desordenado gerou ocupaccedilotildees em aacutereas de mananciais2 e topos de morrondash que natildeo satildeo de interesse do mercado imobiliaacuterio dada a restriccedilatildeo pela legislaccedilatildeo urbaniacutesti-ca ndash criando aacutereas residenciais propensas a enchentes desmoronamentos e deslizamentos de

terras Some-se a isso um contexto de desemprego discriminaccedilatildeo informalidade e ilegalidadedado ao grande contingente populacional Por outro lado recursos puacuteblicos e privados satildeo cadavez mais utilizados para investimentos em aacutereas concentradas que satildeo valorizadas porque pas-

sam a dispor de saneamento baacutesico asfalto transporte e seguranccedila o que soacute beneficia o capitalimobiliaacuterio a construccedilatildeo civil e o estoque de terras urbanas dentre outros interesses da burgue-sia nacional e internacional

Portanto a questatildeo urbana e habitacional deve ser compreendida com base na relaccedilatildeo poliacuteticae econocircmica da sociedade brasileira aleacutem de algumas particularidades em sua formaccedilatildeo soacutecio-his-

toacuterica uma vez que ao mesmo tempo em que a populaccedilatildeo convive com um cenaacuterio mediado poralugueacuteis altos imoacuteveis ilegais e deacuteficit habitacional bairros com infraestrutura urbana se beneficiamda especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Conclui-se que essa questatildeo eacute produto do capitalismo e expressa suascontradiccedilotildees no cotidiano vivido por seus habitantes num contexto urbano de violaccedilatildeo dos direitos

humanos como o direito agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave moradia entre outros Como resposta agraves inuacutemerascondiccedilotildees precaacuterias de vida grupos atuam em diversos setores sociais em busca de mudanccedilas nomodo de governar planejar e desenvolver as cidades isto eacute lutam pelo direito agrave cidade

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Esse periacuteodo foi marcado pela efervescecircncia de debates e manifestaccedilotildees poliacuteticas de di-ferentes segmentos da sociedade civil que reivindicavam melhorias na cidade e na democra-tizaccedilatildeo do processo poliacutetico Em 1987 com a convergecircncia desses debates assim como com a

correlaccedilatildeo de forccedilas vigente foi criado o Foacuterum Nacional pela Reforma Urbana cujo objetivoprincipal era inserir a questatildeo urbana como pauta da agenda puacuteblica Esse movimento no finaldo regime militar passou a adotar uma concepccedilatildeo de cidade na sua totalidade entendendo o

direito agrave cidade como um direito coletivo que busca alcanccedilar ldquoa cidade de todos a casa aleacutem dacasa a casa com asfalto com serviccedilos puacuteblicos com escola com transporte com direito a umavida socialrdquo (SAULE JR amp UZZO 2009)

Vale ressaltar o protagonismo desse movimento junto a outros grupos populares (or-ganizaccedilotildees da sociedade civil movimentos sociais de luta pela moradia pastorais entida-

des de profissatildeo etc) que travaram um embate com as forccedilas poliacuteticas conservadoras naAssembleia Nacional Constituinte o que culminou posteriormente na influecircncia dessesgrupos sobre a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 sobretudo em relaccedilatildeo agraves temaacuteticas do campourbano Baseando-se na compreensatildeo de certo descaso do poder puacuteblico sobre segregaccedilatildeo

territorial saneamento habitaccedilatildeo e transporte esses grupos elaboraram uma proposta delei para inserccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal com vistas a atuar nesse contexto e participar doprocesso de criaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

De acordo com Nelson Saule Jr e Karina Uzzo (2009) o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana no ano de 1986 ldquodefine o conceito de reforma urbana como uma nova eacutetica socialrdquo erepudiam ldquoa cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitosrdquo Foi inau-gurada assim de forma criacutetica e em acircmbito nacional uma proposta de reforma urbana por meioda construccedilatildeo de uma plataforma poliacutetica que reivindicava uma nova cidade e o fim dos privileacute-

A populaccedilatildeo de Satildeo Paulo apresenta algumas especificidades em termos demograacuteficos eurbanos entre as quais merecem destaque certos aspectos de gecircnero e idade assim como sua

distribuiccedilatildeo territorial (importante quando se debate direito agrave cidade como direito humanomulher idosos e regiotildees perifeacutericas)

Feminilizaccedilatildeo ao longo dos anos tem sido crescente a predominacircncia numeacuterica de mulhe-res no conjunto da populaccedilatildeo Dados do Censo de 1980 indicam naquela data uma proporccedilatildeo

de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no municiacutepio Em 2000 essa relaccedilatildeo jaacute erade 91 para 100 e estima-se que atualmente esteja em torno de 90 ou seja existem 9 homenspara cada 10 mulheres na cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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13 Relaccedilotildees sociais e direito de expressatildeo numa cidade democraacutetica

Pensemos agora nos tempos atuais e numa cidade democraacutetica em que a liberdade de ex-pressatildeo e manifestaccedilatildeo das diferentes opiniotildees satildeo possiacuteveis qual significado existe na organi-zaccedilatildeo da vida puacuteblica Como as relaccedilotildees satildeo ou podem vir a ser estabelecidas

Existe uma predominacircncia do mercado nas cidades principalmente quando evidenciamos oestaacutegio em que o modo de produccedilatildeo coletivo foi organizando-se na relaccedilatildeo capitalista de produccedilatildeoestaacutegio de desenvolvimento da sociedade atual As pessoas para satisfazerem suas necessidadesmais simples de subsistecircncia tem de se inserir no circuito de trocas representado pelo mercadoe mediado pelo dinheiro No entanto consumimos produtos por meio da aquisiccedilatildeo da moeda de

troca que representa o valor equivalente do produto vendido no mercado Esse valor vai para obolso do produtor Essa relaccedilatildeo organiza a estrutura do trabalho e da vida nas cidades pois tudo eacutemediado pela moeda de troca Assim a forccedila de trabalho eacute transformada em mercadoria e passa a

ocultar o acuacutemulo de excedente por parte dos donos dos meios de produccedilatildeo que se apropriam deforma desigual do valor dos produtos vendidos

E eacute justamente a vida coletiva que se configura como caracteriacutestica fundamental dos nuacute-cleos urbanos e sua gestatildeo ndash organizaccedilatildeo dos fluxos de pessoas das aglomeraccedilotildees regulamen-taccedilatildeo do cotidiano ndash que revela a ldquocidade poliacuteticardquo (ROLNIK 1995) A cidade poliacutetica caracteri-

za-se pela centralidade do poder urbano e pela hierarquizaccedilatildeo social que ao longo da histoacuteriase desenvolveu por meio da dominaccedilatildeo e do autoritarismo poliacutetico-administrativo com origemna cidadela fortificada e no poder do rei com base na guerra Desde a poacutelis grega passando pelacivitas romana a cidade poliacutetica eacute menos um espaccedilo geograacutefico do que uma praacutetica social base-ada nas relaccedilotildees de poder de modo que ldquocidadatildeordquo designava na Greacutecia antiga aquele que podiaparticipar da vida poliacutetica e natildeo todos os habitantes Isso explica porque em muitas cidades

contemporacircneas como Satildeo Paulo que natildeo possuem centro ou apresentam muacuteltiplas centrali-dades o poder poliacutetico natildeo deixou de estar concentrado nas matildeos de alguns poucos grupos Eacuteque o processo de hierarquizaccedilatildeo e controle social nem sempre implicou concentraccedilatildeo espacial

sobretudo apoacutes os avanccedilos tecnoloacutegicos recentes

Todas essas dimensotildees da cidade ndash seu poder de atraccedilatildeo sua abertura para a escritadas accedilotildees humanas seu aspecto poliacutetico ndash como diz Rolnik (1995 p 25-26) ldquoao concentrare aglomerar as pessoas intensifica as possibilidades de troca e colaboraccedilatildeo entre os ho-mens potencializando sua capacidade produtivardquo Eacute o que permite vermos a ldquocidade comomercadordquo e revela o trabalho como elemento central para o surgimento das cidades Os

determinantes estatildeo em trecircs componentes que para Rolnik satildeo essenciais especializaccedilatildeodo trabalho coletivo circuito de troca e consumo A especializaccedilatildeo comeccedilou jaacute com a divisatildeo

entre campo e cidade passou pela divisatildeo de atividades dentro da proacutepria cidade e culminoucom a especializaccedilatildeo entre cidades o que permitiu intensificaccedilatildeo das trocas e fez com queo campo natildeo fosse mais apenas fornecedor (de alimentos) mas consumidor de produtos

oriundos dos centros urbanos

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Esses aglomerados urbanos satildeo produtos de inuacutemeras accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovi-das pelo Estado por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio comercial)e a pela proacutepria populaccedilatildeo e expressam as disparidades existentes na sociedade contemporacircnea

ou seja na sociedade do capital Dentre elas temos produccedilatildeo imobiliaacuteria privada majoritariamentedestinada agraves classes meacutedias e altas praacutetica da retenccedilatildeo de terras ociosas de diferentes segmentosdo capital nas aacutereas urbanizadas utilizadas para futura especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ausecircncia de poliacuteti-

cas significativas em habitaccedilatildeo que quando ocorrem resumem-se na construccedilatildeo de moradias nasperiferias das cidades ausecircncia de regulaccedilatildeo dos valores estabelecidos para as aacutereas centrais falta

de incentivo ao estabelecimento de moradias populares

Foto Jorge MarutaJornal da USP USP Imagens

desconsiderar as dimensotildees poliacuteticas e econocircmicas presentes nesse contexto pois satildeo essasrelaccedilotildees que determinam a funccedilatildeo social da cidade Com essa compreensatildeo eacute possiacutevel imaginaras relaccedilotildees sociais (interaccedilotildees positivas ou conflitantes) dos habitantes com seus familiares

amigos comunidades e tambeacutem com o Estado por meio do uso de espaccedilos e serviccedilos puacuteblicosou privados em lugares que satildeo parte do seu cotidiano

Para a nossa discussatildeo tomaremos por base a compreensatildeo sobre cidades perifeacutericas especifi-camente aquelas existentes nos paiacuteses comumente chamados de subdesenvolvidos emergentesou perifeacutericos para situar a realidade brasileira e considerar todas as particularidades que emergemquando defendemos o direito agrave cidade Apesar de suas singularidades ndash como tamanho da popula-

ccedilatildeo composiccedilatildeo eacutetnica extensatildeo territorial e costumes ndash essas cidades apresentam tambeacutem se-melhanccedilas como os grandes aglomerados urbanos que em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas

afastadas do centro urbano e satildeo marcados por significativa extensatildeo territorial e presenccedila de casasinacabadas com reduzido ambiente construtivo alta densidade populacional inexistecircncia de aacutereasverdes proximidade de rios ou coacuterregos falta de ordenamento do sistema viaacuterio restriccedilatildeo de mobi-lidade urbana com pouca diversidade e disponibilidade de transporte coletivo bem como precaacuteria

infraestrutura viaacuteria baixa oferta de serviccedilos e equipamentos puacuteblicos de sauacutede educaccedilatildeo lazeresportes e cultura altos iacutendices de violecircncia

Favela Paraisoacutepolis localizada na zona sul da cidade de Satildeo Paulo (creacutedito Jorge MarutaJornal da USPUsp Imagens)

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Eacute nesse cenaacuterio que inuacutemeras formas de opressatildeo satildeo naturalizadas e tecircm respaldo inclu-sive legal como no caso da segregaccedilatildeo territorial ligada agrave propriedade privada fenocircmeno tido

como ldquoaceitaacutevelrdquo e protegido por lei A cidade que temos ainda eacute em grande parte e infelizmen-te aquela das taxas de lucro da propriedade privada e das desigualdades em que o capital jaacute

em seu estaacutegio financeiro vem alcanccedilando um ldquoterreno lucrativo para a produccedilatildeo e absorccedilatildeo deexcedente de capitalrdquo (HARVEY 2012 p 74) Mas a cidade que queremos eacute aquela que possibi-lita o exerciacutecio da liberdade democraacutetica e da criatividade expressa no territoacuterio vivido e que natildeoestaacute subordinada agrave relaccedilatildeo de troca Uma cidade humanizada capaz de estabelecer o direito emsua totalidade para que todos possam viver de forma livre e diversificada natildeo fazendo da vidacotidiana uma mera sobrevivecircncia

Entretanto eacute importante reconhecer que houve um salto positivo quando discutimos terri-toacuterio espaccedilo puacuteblico e relaccedilotildees sociais sob a perspectiva da cidade democraacutetica principalmentepor esta reconhecer a participaccedilatildeo social sobretudo na ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e na tomada

de decisotildees poliacuteticas que em muitos casos ocorrem motivadas por reivindicaccedilotildees conformeveremos adiante quando apontarmos o reconhecimento do direito agrave cidade no Brasil

14 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

O Prefeito de Satildeo Paulo Fernando Haddad pedalando durante a inauguraccedilatildeo do maior mural de grafite a ceacuteu aberto da Ameacuterica Latina na

avenida 23 de maio (creacutedito Heloisa BallariniSECOM)

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Direito agrave Cidade | 15

2 As cidades brasileiras e

seu processo de urbanizaccedilatildeo

Com base no contexto apresentado partiremos entatildeo para a realidade brasileira e seusinuacutemeros desafios Em decorrecircncia de um passado como colocircnia o processo de urbanizaccedilatildeo noBrasil eacute heranccedila do desenvolvimento tardio desigual e combinado Ocorreu somente no seacuteculoXX com a chegada das induacutestrias faacutebricas e empresas de grande porte generalizando-se pelo

territoacuterio nacional apenas a partir da deacutecada de 1970 Se o processo de urbanizaccedilatildeo e formaccedilatildeodas cidades industriais europeias como afirma Lefebvre (2001) ocorreu em fins do seacuteculo XVIIIe iniacutecio do seacuteculo XIX com a expansatildeo e desenvolvimento do modo de produccedilatildeo capitalista foisomente no seacuteculo XX que nosso paiacutes superou o modelo arcaico de organizaccedilatildeo e produccedilatildeoadotando a partir de entatildeo o modelo capitalista mas com muitas marcas desse passadoagroexportador o que explica de certo modo a dependecircncia da economia internacional

Ao mesmo tempo em que a dependecircncia econocircmica em relaccedilatildeo ao capital financeiro inter-nacional eacute histoacuterica haacute de se considerar tambeacutem que trouxe benefiacutecios para o desenvolvimento

de infraestrutura em atividades relacionadas ao trabalho Essa situaccedilatildeo contribuiu portantopara o financiamento e a construccedilatildeo de ferrovias portos navegaccedilatildeo e geraccedilatildeo de eletricidadefatores essenciais para o processo de desenvolvimento industrial

O urbanizaccedilatildeo do Brasil foi tardia ocorrendo apenas apoacutes a industrializaccedilatildeo generalizada no seacuteculo XX (creacutedito Imagens USP)

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16 | Cadernos de Formaccedilatildeo

De acordo com Ermiacutenia Maricato (2003) em 1890 a populaccedilatildeo urbana totalizava uma meacutediade 68 a 10 Com a emergecircncia da matildeo de obra livre ou seja a relaccedilatildeo de trabalho baseada nomodo de produccedilatildeo capitalista esses nuacutemeros se elevaram As cidades representavam o futuro

a modernidade e todas as expectativas de mudanccedila no aspecto social e cultural do paiacutes Foi so-mente depois da Revoluccedilatildeo de 1930 que esse cenaacuterio se modificou de fato ao incorporar poliacuteti-

cas puacuteblicas no processo de urbanizaccedilatildeo e industrializaccedilatildeo ultrapassando o modelo econocircmicoagroexportador e a poliacutetica do ldquocafeacute com leiterdquo (Repuacuteblica Oligaacuterquica)

No entanto o vieacutes autoritaacuterio populista e paternalista do periacuteodo possibilitou a con-tinuidade de um Estado que trabalhava aliado aos interesses da oligarquia Prosseguiu

assim a desigualdade entre as classes sociais e outras heranccedilas do periacuteodo colonial comoa concentraccedilatildeo de terra de renda e de poder expressa nas relaccedilotildees de favor mando obe-

diecircncia e arbiacutetrio nas decisotildees legais (MARICATO 2003) Essa modernizaccedilatildeo com base no de-senvolvimento do atraso deixou suas marcas nas metroacutepoles brasileiras como a segregaccedilatildeoterritorial e os danos ao meio ambiente

Esse cenaacuterio soacute pocircde ser evidenciado deacutecadas depois agrave medida que as cidades brasilei-ras foram ficando cada vez mais ldquoassociadas agrave violecircncia poluiccedilatildeo das aacuteguas e do ar crianccediladesamparada traacutefego caoacutetico enchentes entre outros inuacutemeros malesrdquo (MARICATO 2003 p152) Isso porque conforme o desenvolvimento do paiacutes extinguiram-se as oportunidades para a

populaccedilatildeo imigrante e tambeacutem migrante Cresceram as periferias de forma exorbitante assim

como a pobreza e a alta densidade de ocupaccedilatildeo do solo Esses fatores geraram uma ampla se-gregaccedilatildeo urbana eou ambiental aleacutem das dificuldades de acesso aos serviccedilos puacuteblicos comotransporte saneamento abastecimento sauacutede educaccedilatildeo creches e lazer

Curiosidades sobre a cidade de Satildeo Paulo

Sobre a populaccedilatildeo urbana em Satildeo Paulo

1872 ndash 30 mil habitantes1900 ndash 240 mil habitantesAnos 1950 ndash populaccedilatildeo passou de pouco mais de2 milhotildees de habitantes para mais de 35 milhotildees

(motivo expansatildeo do setor industrial)2000 ndash passa de 10 milhotildees2010 ndash passa de 11 milhotildees e 200 mil

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Direito agrave Cidade | 17

2Mananciais correspondem a reservas hiacutedricas ou fontes utilizadas para o abastecimento puacuteblico de aacutegua Disponiacutevel em lthttpsitesabesp

combrsiteinternaDefaultaspxsecaoId=31gt Acesso em 10 ago 2015

21 O direito agrave cidade e a Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade

O direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta que soacute recentemente ndash final doseacuteculo XX ndash passou a ter reconhecimento mundial apesar de seu significado protagonis-mo essencial para esse reconhecimento principalmente no que diz respeito agrave implemen-taccedilatildeo da reforma urbana Destaca-se assim o Movimento Nacional pela Reforma Urbanaque criado em 1985 consolidou no Brasil a luta pelo direito agrave cidade na deacutecada de 1980

Utilidade puacuteblica

O portal da prefeitura de Satildeo Paulo

disponibiliza informaccedilotildees sobre ohistoacuterico demograacutefico da cidade deSatildeo Paulo com inuacutemeras ilus-traccedilotildees antigas dos pontos maisconhecidos do municiacutepio Acessehttpsmduprefeituraspgovbr

historico_demograficoindexphp

O crescimento desordenado gerou ocupaccedilotildees em aacutereas de mananciais2 e topos de morrondash que natildeo satildeo de interesse do mercado imobiliaacuterio dada a restriccedilatildeo pela legislaccedilatildeo urbaniacutesti-ca ndash criando aacutereas residenciais propensas a enchentes desmoronamentos e deslizamentos de

terras Some-se a isso um contexto de desemprego discriminaccedilatildeo informalidade e ilegalidadedado ao grande contingente populacional Por outro lado recursos puacuteblicos e privados satildeo cadavez mais utilizados para investimentos em aacutereas concentradas que satildeo valorizadas porque pas-

sam a dispor de saneamento baacutesico asfalto transporte e seguranccedila o que soacute beneficia o capitalimobiliaacuterio a construccedilatildeo civil e o estoque de terras urbanas dentre outros interesses da burgue-sia nacional e internacional

Portanto a questatildeo urbana e habitacional deve ser compreendida com base na relaccedilatildeo poliacuteticae econocircmica da sociedade brasileira aleacutem de algumas particularidades em sua formaccedilatildeo soacutecio-his-

toacuterica uma vez que ao mesmo tempo em que a populaccedilatildeo convive com um cenaacuterio mediado poralugueacuteis altos imoacuteveis ilegais e deacuteficit habitacional bairros com infraestrutura urbana se beneficiamda especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Conclui-se que essa questatildeo eacute produto do capitalismo e expressa suascontradiccedilotildees no cotidiano vivido por seus habitantes num contexto urbano de violaccedilatildeo dos direitos

humanos como o direito agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave moradia entre outros Como resposta agraves inuacutemerascondiccedilotildees precaacuterias de vida grupos atuam em diversos setores sociais em busca de mudanccedilas nomodo de governar planejar e desenvolver as cidades isto eacute lutam pelo direito agrave cidade

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18 | Cadernos de Formaccedilatildeo

Esse periacuteodo foi marcado pela efervescecircncia de debates e manifestaccedilotildees poliacuteticas de di-ferentes segmentos da sociedade civil que reivindicavam melhorias na cidade e na democra-tizaccedilatildeo do processo poliacutetico Em 1987 com a convergecircncia desses debates assim como com a

correlaccedilatildeo de forccedilas vigente foi criado o Foacuterum Nacional pela Reforma Urbana cujo objetivoprincipal era inserir a questatildeo urbana como pauta da agenda puacuteblica Esse movimento no finaldo regime militar passou a adotar uma concepccedilatildeo de cidade na sua totalidade entendendo o

direito agrave cidade como um direito coletivo que busca alcanccedilar ldquoa cidade de todos a casa aleacutem dacasa a casa com asfalto com serviccedilos puacuteblicos com escola com transporte com direito a umavida socialrdquo (SAULE JR amp UZZO 2009)

Vale ressaltar o protagonismo desse movimento junto a outros grupos populares (or-ganizaccedilotildees da sociedade civil movimentos sociais de luta pela moradia pastorais entida-

des de profissatildeo etc) que travaram um embate com as forccedilas poliacuteticas conservadoras naAssembleia Nacional Constituinte o que culminou posteriormente na influecircncia dessesgrupos sobre a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 sobretudo em relaccedilatildeo agraves temaacuteticas do campourbano Baseando-se na compreensatildeo de certo descaso do poder puacuteblico sobre segregaccedilatildeo

territorial saneamento habitaccedilatildeo e transporte esses grupos elaboraram uma proposta delei para inserccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal com vistas a atuar nesse contexto e participar doprocesso de criaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

De acordo com Nelson Saule Jr e Karina Uzzo (2009) o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana no ano de 1986 ldquodefine o conceito de reforma urbana como uma nova eacutetica socialrdquo erepudiam ldquoa cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitosrdquo Foi inau-gurada assim de forma criacutetica e em acircmbito nacional uma proposta de reforma urbana por meioda construccedilatildeo de uma plataforma poliacutetica que reivindicava uma nova cidade e o fim dos privileacute-

A populaccedilatildeo de Satildeo Paulo apresenta algumas especificidades em termos demograacuteficos eurbanos entre as quais merecem destaque certos aspectos de gecircnero e idade assim como sua

distribuiccedilatildeo territorial (importante quando se debate direito agrave cidade como direito humanomulher idosos e regiotildees perifeacutericas)

Feminilizaccedilatildeo ao longo dos anos tem sido crescente a predominacircncia numeacuterica de mulhe-res no conjunto da populaccedilatildeo Dados do Censo de 1980 indicam naquela data uma proporccedilatildeo

de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no municiacutepio Em 2000 essa relaccedilatildeo jaacute erade 91 para 100 e estima-se que atualmente esteja em torno de 90 ou seja existem 9 homenspara cada 10 mulheres na cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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20 | Cadernos de Formaccedilatildeo

bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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SAULE JR N amp UZZO K ldquoA trajetoacuteria da reforma urbana no Brasilrdquo Diaacutelogos propostas histoacuteriaspara uma cidadania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche--dph-8583htmlgt Acesso em 3 ago 2015

UNFPA Relatoacuterio sobre a situaccedilatildeo da populaccedilatildeo mundial 2011 New York UNFPA 2011 Disponiacutevel emltwwwuncvfilesPT-SWOP11-WEBpdfgt Acesso em 11 ago 2015

VERIacuteSSIMO A A ldquoPorque fomos a Medelliacuten e Bogotaacuterdquo Agrave beira do urbanismo 12 mar 2012 Disponiacutevelem lthttpabeiradourbanismoblogspotcombr201203porque-fomos-medellin-e-bogotahtmlgtAcesso em 3 ago 2015

Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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Esses aglomerados urbanos satildeo produtos de inuacutemeras accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovi-das pelo Estado por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio comercial)e a pela proacutepria populaccedilatildeo e expressam as disparidades existentes na sociedade contemporacircnea

ou seja na sociedade do capital Dentre elas temos produccedilatildeo imobiliaacuteria privada majoritariamentedestinada agraves classes meacutedias e altas praacutetica da retenccedilatildeo de terras ociosas de diferentes segmentosdo capital nas aacutereas urbanizadas utilizadas para futura especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ausecircncia de poliacuteti-

cas significativas em habitaccedilatildeo que quando ocorrem resumem-se na construccedilatildeo de moradias nasperiferias das cidades ausecircncia de regulaccedilatildeo dos valores estabelecidos para as aacutereas centrais falta

de incentivo ao estabelecimento de moradias populares

Foto Jorge MarutaJornal da USP USP Imagens

desconsiderar as dimensotildees poliacuteticas e econocircmicas presentes nesse contexto pois satildeo essasrelaccedilotildees que determinam a funccedilatildeo social da cidade Com essa compreensatildeo eacute possiacutevel imaginaras relaccedilotildees sociais (interaccedilotildees positivas ou conflitantes) dos habitantes com seus familiares

amigos comunidades e tambeacutem com o Estado por meio do uso de espaccedilos e serviccedilos puacuteblicosou privados em lugares que satildeo parte do seu cotidiano

Para a nossa discussatildeo tomaremos por base a compreensatildeo sobre cidades perifeacutericas especifi-camente aquelas existentes nos paiacuteses comumente chamados de subdesenvolvidos emergentesou perifeacutericos para situar a realidade brasileira e considerar todas as particularidades que emergemquando defendemos o direito agrave cidade Apesar de suas singularidades ndash como tamanho da popula-

ccedilatildeo composiccedilatildeo eacutetnica extensatildeo territorial e costumes ndash essas cidades apresentam tambeacutem se-melhanccedilas como os grandes aglomerados urbanos que em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas

afastadas do centro urbano e satildeo marcados por significativa extensatildeo territorial e presenccedila de casasinacabadas com reduzido ambiente construtivo alta densidade populacional inexistecircncia de aacutereasverdes proximidade de rios ou coacuterregos falta de ordenamento do sistema viaacuterio restriccedilatildeo de mobi-lidade urbana com pouca diversidade e disponibilidade de transporte coletivo bem como precaacuteria

infraestrutura viaacuteria baixa oferta de serviccedilos e equipamentos puacuteblicos de sauacutede educaccedilatildeo lazeresportes e cultura altos iacutendices de violecircncia

Favela Paraisoacutepolis localizada na zona sul da cidade de Satildeo Paulo (creacutedito Jorge MarutaJornal da USPUsp Imagens)

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Eacute nesse cenaacuterio que inuacutemeras formas de opressatildeo satildeo naturalizadas e tecircm respaldo inclu-sive legal como no caso da segregaccedilatildeo territorial ligada agrave propriedade privada fenocircmeno tido

como ldquoaceitaacutevelrdquo e protegido por lei A cidade que temos ainda eacute em grande parte e infelizmen-te aquela das taxas de lucro da propriedade privada e das desigualdades em que o capital jaacute

em seu estaacutegio financeiro vem alcanccedilando um ldquoterreno lucrativo para a produccedilatildeo e absorccedilatildeo deexcedente de capitalrdquo (HARVEY 2012 p 74) Mas a cidade que queremos eacute aquela que possibi-lita o exerciacutecio da liberdade democraacutetica e da criatividade expressa no territoacuterio vivido e que natildeoestaacute subordinada agrave relaccedilatildeo de troca Uma cidade humanizada capaz de estabelecer o direito emsua totalidade para que todos possam viver de forma livre e diversificada natildeo fazendo da vidacotidiana uma mera sobrevivecircncia

Entretanto eacute importante reconhecer que houve um salto positivo quando discutimos terri-toacuterio espaccedilo puacuteblico e relaccedilotildees sociais sob a perspectiva da cidade democraacutetica principalmentepor esta reconhecer a participaccedilatildeo social sobretudo na ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e na tomada

de decisotildees poliacuteticas que em muitos casos ocorrem motivadas por reivindicaccedilotildees conformeveremos adiante quando apontarmos o reconhecimento do direito agrave cidade no Brasil

14 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

O Prefeito de Satildeo Paulo Fernando Haddad pedalando durante a inauguraccedilatildeo do maior mural de grafite a ceacuteu aberto da Ameacuterica Latina na

avenida 23 de maio (creacutedito Heloisa BallariniSECOM)

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Direito agrave Cidade | 15

2 As cidades brasileiras e

seu processo de urbanizaccedilatildeo

Com base no contexto apresentado partiremos entatildeo para a realidade brasileira e seusinuacutemeros desafios Em decorrecircncia de um passado como colocircnia o processo de urbanizaccedilatildeo noBrasil eacute heranccedila do desenvolvimento tardio desigual e combinado Ocorreu somente no seacuteculoXX com a chegada das induacutestrias faacutebricas e empresas de grande porte generalizando-se pelo

territoacuterio nacional apenas a partir da deacutecada de 1970 Se o processo de urbanizaccedilatildeo e formaccedilatildeodas cidades industriais europeias como afirma Lefebvre (2001) ocorreu em fins do seacuteculo XVIIIe iniacutecio do seacuteculo XIX com a expansatildeo e desenvolvimento do modo de produccedilatildeo capitalista foisomente no seacuteculo XX que nosso paiacutes superou o modelo arcaico de organizaccedilatildeo e produccedilatildeoadotando a partir de entatildeo o modelo capitalista mas com muitas marcas desse passadoagroexportador o que explica de certo modo a dependecircncia da economia internacional

Ao mesmo tempo em que a dependecircncia econocircmica em relaccedilatildeo ao capital financeiro inter-nacional eacute histoacuterica haacute de se considerar tambeacutem que trouxe benefiacutecios para o desenvolvimento

de infraestrutura em atividades relacionadas ao trabalho Essa situaccedilatildeo contribuiu portantopara o financiamento e a construccedilatildeo de ferrovias portos navegaccedilatildeo e geraccedilatildeo de eletricidadefatores essenciais para o processo de desenvolvimento industrial

O urbanizaccedilatildeo do Brasil foi tardia ocorrendo apenas apoacutes a industrializaccedilatildeo generalizada no seacuteculo XX (creacutedito Imagens USP)

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16 | Cadernos de Formaccedilatildeo

De acordo com Ermiacutenia Maricato (2003) em 1890 a populaccedilatildeo urbana totalizava uma meacutediade 68 a 10 Com a emergecircncia da matildeo de obra livre ou seja a relaccedilatildeo de trabalho baseada nomodo de produccedilatildeo capitalista esses nuacutemeros se elevaram As cidades representavam o futuro

a modernidade e todas as expectativas de mudanccedila no aspecto social e cultural do paiacutes Foi so-mente depois da Revoluccedilatildeo de 1930 que esse cenaacuterio se modificou de fato ao incorporar poliacuteti-

cas puacuteblicas no processo de urbanizaccedilatildeo e industrializaccedilatildeo ultrapassando o modelo econocircmicoagroexportador e a poliacutetica do ldquocafeacute com leiterdquo (Repuacuteblica Oligaacuterquica)

No entanto o vieacutes autoritaacuterio populista e paternalista do periacuteodo possibilitou a con-tinuidade de um Estado que trabalhava aliado aos interesses da oligarquia Prosseguiu

assim a desigualdade entre as classes sociais e outras heranccedilas do periacuteodo colonial comoa concentraccedilatildeo de terra de renda e de poder expressa nas relaccedilotildees de favor mando obe-

diecircncia e arbiacutetrio nas decisotildees legais (MARICATO 2003) Essa modernizaccedilatildeo com base no de-senvolvimento do atraso deixou suas marcas nas metroacutepoles brasileiras como a segregaccedilatildeoterritorial e os danos ao meio ambiente

Esse cenaacuterio soacute pocircde ser evidenciado deacutecadas depois agrave medida que as cidades brasilei-ras foram ficando cada vez mais ldquoassociadas agrave violecircncia poluiccedilatildeo das aacuteguas e do ar crianccediladesamparada traacutefego caoacutetico enchentes entre outros inuacutemeros malesrdquo (MARICATO 2003 p152) Isso porque conforme o desenvolvimento do paiacutes extinguiram-se as oportunidades para a

populaccedilatildeo imigrante e tambeacutem migrante Cresceram as periferias de forma exorbitante assim

como a pobreza e a alta densidade de ocupaccedilatildeo do solo Esses fatores geraram uma ampla se-gregaccedilatildeo urbana eou ambiental aleacutem das dificuldades de acesso aos serviccedilos puacuteblicos comotransporte saneamento abastecimento sauacutede educaccedilatildeo creches e lazer

Curiosidades sobre a cidade de Satildeo Paulo

Sobre a populaccedilatildeo urbana em Satildeo Paulo

1872 ndash 30 mil habitantes1900 ndash 240 mil habitantesAnos 1950 ndash populaccedilatildeo passou de pouco mais de2 milhotildees de habitantes para mais de 35 milhotildees

(motivo expansatildeo do setor industrial)2000 ndash passa de 10 milhotildees2010 ndash passa de 11 milhotildees e 200 mil

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Direito agrave Cidade | 17

2Mananciais correspondem a reservas hiacutedricas ou fontes utilizadas para o abastecimento puacuteblico de aacutegua Disponiacutevel em lthttpsitesabesp

combrsiteinternaDefaultaspxsecaoId=31gt Acesso em 10 ago 2015

21 O direito agrave cidade e a Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade

O direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta que soacute recentemente ndash final doseacuteculo XX ndash passou a ter reconhecimento mundial apesar de seu significado protagonis-mo essencial para esse reconhecimento principalmente no que diz respeito agrave implemen-taccedilatildeo da reforma urbana Destaca-se assim o Movimento Nacional pela Reforma Urbanaque criado em 1985 consolidou no Brasil a luta pelo direito agrave cidade na deacutecada de 1980

Utilidade puacuteblica

O portal da prefeitura de Satildeo Paulo

disponibiliza informaccedilotildees sobre ohistoacuterico demograacutefico da cidade deSatildeo Paulo com inuacutemeras ilus-traccedilotildees antigas dos pontos maisconhecidos do municiacutepio Acessehttpsmduprefeituraspgovbr

historico_demograficoindexphp

O crescimento desordenado gerou ocupaccedilotildees em aacutereas de mananciais2 e topos de morrondash que natildeo satildeo de interesse do mercado imobiliaacuterio dada a restriccedilatildeo pela legislaccedilatildeo urbaniacutesti-ca ndash criando aacutereas residenciais propensas a enchentes desmoronamentos e deslizamentos de

terras Some-se a isso um contexto de desemprego discriminaccedilatildeo informalidade e ilegalidadedado ao grande contingente populacional Por outro lado recursos puacuteblicos e privados satildeo cadavez mais utilizados para investimentos em aacutereas concentradas que satildeo valorizadas porque pas-

sam a dispor de saneamento baacutesico asfalto transporte e seguranccedila o que soacute beneficia o capitalimobiliaacuterio a construccedilatildeo civil e o estoque de terras urbanas dentre outros interesses da burgue-sia nacional e internacional

Portanto a questatildeo urbana e habitacional deve ser compreendida com base na relaccedilatildeo poliacuteticae econocircmica da sociedade brasileira aleacutem de algumas particularidades em sua formaccedilatildeo soacutecio-his-

toacuterica uma vez que ao mesmo tempo em que a populaccedilatildeo convive com um cenaacuterio mediado poralugueacuteis altos imoacuteveis ilegais e deacuteficit habitacional bairros com infraestrutura urbana se beneficiamda especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Conclui-se que essa questatildeo eacute produto do capitalismo e expressa suascontradiccedilotildees no cotidiano vivido por seus habitantes num contexto urbano de violaccedilatildeo dos direitos

humanos como o direito agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave moradia entre outros Como resposta agraves inuacutemerascondiccedilotildees precaacuterias de vida grupos atuam em diversos setores sociais em busca de mudanccedilas nomodo de governar planejar e desenvolver as cidades isto eacute lutam pelo direito agrave cidade

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18 | Cadernos de Formaccedilatildeo

Esse periacuteodo foi marcado pela efervescecircncia de debates e manifestaccedilotildees poliacuteticas de di-ferentes segmentos da sociedade civil que reivindicavam melhorias na cidade e na democra-tizaccedilatildeo do processo poliacutetico Em 1987 com a convergecircncia desses debates assim como com a

correlaccedilatildeo de forccedilas vigente foi criado o Foacuterum Nacional pela Reforma Urbana cujo objetivoprincipal era inserir a questatildeo urbana como pauta da agenda puacuteblica Esse movimento no finaldo regime militar passou a adotar uma concepccedilatildeo de cidade na sua totalidade entendendo o

direito agrave cidade como um direito coletivo que busca alcanccedilar ldquoa cidade de todos a casa aleacutem dacasa a casa com asfalto com serviccedilos puacuteblicos com escola com transporte com direito a umavida socialrdquo (SAULE JR amp UZZO 2009)

Vale ressaltar o protagonismo desse movimento junto a outros grupos populares (or-ganizaccedilotildees da sociedade civil movimentos sociais de luta pela moradia pastorais entida-

des de profissatildeo etc) que travaram um embate com as forccedilas poliacuteticas conservadoras naAssembleia Nacional Constituinte o que culminou posteriormente na influecircncia dessesgrupos sobre a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 sobretudo em relaccedilatildeo agraves temaacuteticas do campourbano Baseando-se na compreensatildeo de certo descaso do poder puacuteblico sobre segregaccedilatildeo

territorial saneamento habitaccedilatildeo e transporte esses grupos elaboraram uma proposta delei para inserccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal com vistas a atuar nesse contexto e participar doprocesso de criaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

De acordo com Nelson Saule Jr e Karina Uzzo (2009) o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana no ano de 1986 ldquodefine o conceito de reforma urbana como uma nova eacutetica socialrdquo erepudiam ldquoa cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitosrdquo Foi inau-gurada assim de forma criacutetica e em acircmbito nacional uma proposta de reforma urbana por meioda construccedilatildeo de uma plataforma poliacutetica que reivindicava uma nova cidade e o fim dos privileacute-

A populaccedilatildeo de Satildeo Paulo apresenta algumas especificidades em termos demograacuteficos eurbanos entre as quais merecem destaque certos aspectos de gecircnero e idade assim como sua

distribuiccedilatildeo territorial (importante quando se debate direito agrave cidade como direito humanomulher idosos e regiotildees perifeacutericas)

Feminilizaccedilatildeo ao longo dos anos tem sido crescente a predominacircncia numeacuterica de mulhe-res no conjunto da populaccedilatildeo Dados do Censo de 1980 indicam naquela data uma proporccedilatildeo

de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no municiacutepio Em 2000 essa relaccedilatildeo jaacute erade 91 para 100 e estima-se que atualmente esteja em torno de 90 ou seja existem 9 homenspara cada 10 mulheres na cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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22 | Cadernos de Formaccedilatildeo

De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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Direito agrave Cidade | 13

Esses aglomerados urbanos satildeo produtos de inuacutemeras accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovi-das pelo Estado por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio comercial)e a pela proacutepria populaccedilatildeo e expressam as disparidades existentes na sociedade contemporacircnea

ou seja na sociedade do capital Dentre elas temos produccedilatildeo imobiliaacuteria privada majoritariamentedestinada agraves classes meacutedias e altas praacutetica da retenccedilatildeo de terras ociosas de diferentes segmentosdo capital nas aacutereas urbanizadas utilizadas para futura especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ausecircncia de poliacuteti-

cas significativas em habitaccedilatildeo que quando ocorrem resumem-se na construccedilatildeo de moradias nasperiferias das cidades ausecircncia de regulaccedilatildeo dos valores estabelecidos para as aacutereas centrais falta

de incentivo ao estabelecimento de moradias populares

Foto Jorge MarutaJornal da USP USP Imagens

desconsiderar as dimensotildees poliacuteticas e econocircmicas presentes nesse contexto pois satildeo essasrelaccedilotildees que determinam a funccedilatildeo social da cidade Com essa compreensatildeo eacute possiacutevel imaginaras relaccedilotildees sociais (interaccedilotildees positivas ou conflitantes) dos habitantes com seus familiares

amigos comunidades e tambeacutem com o Estado por meio do uso de espaccedilos e serviccedilos puacuteblicosou privados em lugares que satildeo parte do seu cotidiano

Para a nossa discussatildeo tomaremos por base a compreensatildeo sobre cidades perifeacutericas especifi-camente aquelas existentes nos paiacuteses comumente chamados de subdesenvolvidos emergentesou perifeacutericos para situar a realidade brasileira e considerar todas as particularidades que emergemquando defendemos o direito agrave cidade Apesar de suas singularidades ndash como tamanho da popula-

ccedilatildeo composiccedilatildeo eacutetnica extensatildeo territorial e costumes ndash essas cidades apresentam tambeacutem se-melhanccedilas como os grandes aglomerados urbanos que em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas

afastadas do centro urbano e satildeo marcados por significativa extensatildeo territorial e presenccedila de casasinacabadas com reduzido ambiente construtivo alta densidade populacional inexistecircncia de aacutereasverdes proximidade de rios ou coacuterregos falta de ordenamento do sistema viaacuterio restriccedilatildeo de mobi-lidade urbana com pouca diversidade e disponibilidade de transporte coletivo bem como precaacuteria

infraestrutura viaacuteria baixa oferta de serviccedilos e equipamentos puacuteblicos de sauacutede educaccedilatildeo lazeresportes e cultura altos iacutendices de violecircncia

Favela Paraisoacutepolis localizada na zona sul da cidade de Satildeo Paulo (creacutedito Jorge MarutaJornal da USPUsp Imagens)

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Eacute nesse cenaacuterio que inuacutemeras formas de opressatildeo satildeo naturalizadas e tecircm respaldo inclu-sive legal como no caso da segregaccedilatildeo territorial ligada agrave propriedade privada fenocircmeno tido

como ldquoaceitaacutevelrdquo e protegido por lei A cidade que temos ainda eacute em grande parte e infelizmen-te aquela das taxas de lucro da propriedade privada e das desigualdades em que o capital jaacute

em seu estaacutegio financeiro vem alcanccedilando um ldquoterreno lucrativo para a produccedilatildeo e absorccedilatildeo deexcedente de capitalrdquo (HARVEY 2012 p 74) Mas a cidade que queremos eacute aquela que possibi-lita o exerciacutecio da liberdade democraacutetica e da criatividade expressa no territoacuterio vivido e que natildeoestaacute subordinada agrave relaccedilatildeo de troca Uma cidade humanizada capaz de estabelecer o direito emsua totalidade para que todos possam viver de forma livre e diversificada natildeo fazendo da vidacotidiana uma mera sobrevivecircncia

Entretanto eacute importante reconhecer que houve um salto positivo quando discutimos terri-toacuterio espaccedilo puacuteblico e relaccedilotildees sociais sob a perspectiva da cidade democraacutetica principalmentepor esta reconhecer a participaccedilatildeo social sobretudo na ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e na tomada

de decisotildees poliacuteticas que em muitos casos ocorrem motivadas por reivindicaccedilotildees conformeveremos adiante quando apontarmos o reconhecimento do direito agrave cidade no Brasil

14 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

O Prefeito de Satildeo Paulo Fernando Haddad pedalando durante a inauguraccedilatildeo do maior mural de grafite a ceacuteu aberto da Ameacuterica Latina na

avenida 23 de maio (creacutedito Heloisa BallariniSECOM)

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Direito agrave Cidade | 15

2 As cidades brasileiras e

seu processo de urbanizaccedilatildeo

Com base no contexto apresentado partiremos entatildeo para a realidade brasileira e seusinuacutemeros desafios Em decorrecircncia de um passado como colocircnia o processo de urbanizaccedilatildeo noBrasil eacute heranccedila do desenvolvimento tardio desigual e combinado Ocorreu somente no seacuteculoXX com a chegada das induacutestrias faacutebricas e empresas de grande porte generalizando-se pelo

territoacuterio nacional apenas a partir da deacutecada de 1970 Se o processo de urbanizaccedilatildeo e formaccedilatildeodas cidades industriais europeias como afirma Lefebvre (2001) ocorreu em fins do seacuteculo XVIIIe iniacutecio do seacuteculo XIX com a expansatildeo e desenvolvimento do modo de produccedilatildeo capitalista foisomente no seacuteculo XX que nosso paiacutes superou o modelo arcaico de organizaccedilatildeo e produccedilatildeoadotando a partir de entatildeo o modelo capitalista mas com muitas marcas desse passadoagroexportador o que explica de certo modo a dependecircncia da economia internacional

Ao mesmo tempo em que a dependecircncia econocircmica em relaccedilatildeo ao capital financeiro inter-nacional eacute histoacuterica haacute de se considerar tambeacutem que trouxe benefiacutecios para o desenvolvimento

de infraestrutura em atividades relacionadas ao trabalho Essa situaccedilatildeo contribuiu portantopara o financiamento e a construccedilatildeo de ferrovias portos navegaccedilatildeo e geraccedilatildeo de eletricidadefatores essenciais para o processo de desenvolvimento industrial

O urbanizaccedilatildeo do Brasil foi tardia ocorrendo apenas apoacutes a industrializaccedilatildeo generalizada no seacuteculo XX (creacutedito Imagens USP)

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De acordo com Ermiacutenia Maricato (2003) em 1890 a populaccedilatildeo urbana totalizava uma meacutediade 68 a 10 Com a emergecircncia da matildeo de obra livre ou seja a relaccedilatildeo de trabalho baseada nomodo de produccedilatildeo capitalista esses nuacutemeros se elevaram As cidades representavam o futuro

a modernidade e todas as expectativas de mudanccedila no aspecto social e cultural do paiacutes Foi so-mente depois da Revoluccedilatildeo de 1930 que esse cenaacuterio se modificou de fato ao incorporar poliacuteti-

cas puacuteblicas no processo de urbanizaccedilatildeo e industrializaccedilatildeo ultrapassando o modelo econocircmicoagroexportador e a poliacutetica do ldquocafeacute com leiterdquo (Repuacuteblica Oligaacuterquica)

No entanto o vieacutes autoritaacuterio populista e paternalista do periacuteodo possibilitou a con-tinuidade de um Estado que trabalhava aliado aos interesses da oligarquia Prosseguiu

assim a desigualdade entre as classes sociais e outras heranccedilas do periacuteodo colonial comoa concentraccedilatildeo de terra de renda e de poder expressa nas relaccedilotildees de favor mando obe-

diecircncia e arbiacutetrio nas decisotildees legais (MARICATO 2003) Essa modernizaccedilatildeo com base no de-senvolvimento do atraso deixou suas marcas nas metroacutepoles brasileiras como a segregaccedilatildeoterritorial e os danos ao meio ambiente

Esse cenaacuterio soacute pocircde ser evidenciado deacutecadas depois agrave medida que as cidades brasilei-ras foram ficando cada vez mais ldquoassociadas agrave violecircncia poluiccedilatildeo das aacuteguas e do ar crianccediladesamparada traacutefego caoacutetico enchentes entre outros inuacutemeros malesrdquo (MARICATO 2003 p152) Isso porque conforme o desenvolvimento do paiacutes extinguiram-se as oportunidades para a

populaccedilatildeo imigrante e tambeacutem migrante Cresceram as periferias de forma exorbitante assim

como a pobreza e a alta densidade de ocupaccedilatildeo do solo Esses fatores geraram uma ampla se-gregaccedilatildeo urbana eou ambiental aleacutem das dificuldades de acesso aos serviccedilos puacuteblicos comotransporte saneamento abastecimento sauacutede educaccedilatildeo creches e lazer

Curiosidades sobre a cidade de Satildeo Paulo

Sobre a populaccedilatildeo urbana em Satildeo Paulo

1872 ndash 30 mil habitantes1900 ndash 240 mil habitantesAnos 1950 ndash populaccedilatildeo passou de pouco mais de2 milhotildees de habitantes para mais de 35 milhotildees

(motivo expansatildeo do setor industrial)2000 ndash passa de 10 milhotildees2010 ndash passa de 11 milhotildees e 200 mil

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2Mananciais correspondem a reservas hiacutedricas ou fontes utilizadas para o abastecimento puacuteblico de aacutegua Disponiacutevel em lthttpsitesabesp

combrsiteinternaDefaultaspxsecaoId=31gt Acesso em 10 ago 2015

21 O direito agrave cidade e a Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade

O direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta que soacute recentemente ndash final doseacuteculo XX ndash passou a ter reconhecimento mundial apesar de seu significado protagonis-mo essencial para esse reconhecimento principalmente no que diz respeito agrave implemen-taccedilatildeo da reforma urbana Destaca-se assim o Movimento Nacional pela Reforma Urbanaque criado em 1985 consolidou no Brasil a luta pelo direito agrave cidade na deacutecada de 1980

Utilidade puacuteblica

O portal da prefeitura de Satildeo Paulo

disponibiliza informaccedilotildees sobre ohistoacuterico demograacutefico da cidade deSatildeo Paulo com inuacutemeras ilus-traccedilotildees antigas dos pontos maisconhecidos do municiacutepio Acessehttpsmduprefeituraspgovbr

historico_demograficoindexphp

O crescimento desordenado gerou ocupaccedilotildees em aacutereas de mananciais2 e topos de morrondash que natildeo satildeo de interesse do mercado imobiliaacuterio dada a restriccedilatildeo pela legislaccedilatildeo urbaniacutesti-ca ndash criando aacutereas residenciais propensas a enchentes desmoronamentos e deslizamentos de

terras Some-se a isso um contexto de desemprego discriminaccedilatildeo informalidade e ilegalidadedado ao grande contingente populacional Por outro lado recursos puacuteblicos e privados satildeo cadavez mais utilizados para investimentos em aacutereas concentradas que satildeo valorizadas porque pas-

sam a dispor de saneamento baacutesico asfalto transporte e seguranccedila o que soacute beneficia o capitalimobiliaacuterio a construccedilatildeo civil e o estoque de terras urbanas dentre outros interesses da burgue-sia nacional e internacional

Portanto a questatildeo urbana e habitacional deve ser compreendida com base na relaccedilatildeo poliacuteticae econocircmica da sociedade brasileira aleacutem de algumas particularidades em sua formaccedilatildeo soacutecio-his-

toacuterica uma vez que ao mesmo tempo em que a populaccedilatildeo convive com um cenaacuterio mediado poralugueacuteis altos imoacuteveis ilegais e deacuteficit habitacional bairros com infraestrutura urbana se beneficiamda especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Conclui-se que essa questatildeo eacute produto do capitalismo e expressa suascontradiccedilotildees no cotidiano vivido por seus habitantes num contexto urbano de violaccedilatildeo dos direitos

humanos como o direito agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave moradia entre outros Como resposta agraves inuacutemerascondiccedilotildees precaacuterias de vida grupos atuam em diversos setores sociais em busca de mudanccedilas nomodo de governar planejar e desenvolver as cidades isto eacute lutam pelo direito agrave cidade

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Esse periacuteodo foi marcado pela efervescecircncia de debates e manifestaccedilotildees poliacuteticas de di-ferentes segmentos da sociedade civil que reivindicavam melhorias na cidade e na democra-tizaccedilatildeo do processo poliacutetico Em 1987 com a convergecircncia desses debates assim como com a

correlaccedilatildeo de forccedilas vigente foi criado o Foacuterum Nacional pela Reforma Urbana cujo objetivoprincipal era inserir a questatildeo urbana como pauta da agenda puacuteblica Esse movimento no finaldo regime militar passou a adotar uma concepccedilatildeo de cidade na sua totalidade entendendo o

direito agrave cidade como um direito coletivo que busca alcanccedilar ldquoa cidade de todos a casa aleacutem dacasa a casa com asfalto com serviccedilos puacuteblicos com escola com transporte com direito a umavida socialrdquo (SAULE JR amp UZZO 2009)

Vale ressaltar o protagonismo desse movimento junto a outros grupos populares (or-ganizaccedilotildees da sociedade civil movimentos sociais de luta pela moradia pastorais entida-

des de profissatildeo etc) que travaram um embate com as forccedilas poliacuteticas conservadoras naAssembleia Nacional Constituinte o que culminou posteriormente na influecircncia dessesgrupos sobre a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 sobretudo em relaccedilatildeo agraves temaacuteticas do campourbano Baseando-se na compreensatildeo de certo descaso do poder puacuteblico sobre segregaccedilatildeo

territorial saneamento habitaccedilatildeo e transporte esses grupos elaboraram uma proposta delei para inserccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal com vistas a atuar nesse contexto e participar doprocesso de criaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

De acordo com Nelson Saule Jr e Karina Uzzo (2009) o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana no ano de 1986 ldquodefine o conceito de reforma urbana como uma nova eacutetica socialrdquo erepudiam ldquoa cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitosrdquo Foi inau-gurada assim de forma criacutetica e em acircmbito nacional uma proposta de reforma urbana por meioda construccedilatildeo de uma plataforma poliacutetica que reivindicava uma nova cidade e o fim dos privileacute-

A populaccedilatildeo de Satildeo Paulo apresenta algumas especificidades em termos demograacuteficos eurbanos entre as quais merecem destaque certos aspectos de gecircnero e idade assim como sua

distribuiccedilatildeo territorial (importante quando se debate direito agrave cidade como direito humanomulher idosos e regiotildees perifeacutericas)

Feminilizaccedilatildeo ao longo dos anos tem sido crescente a predominacircncia numeacuterica de mulhe-res no conjunto da populaccedilatildeo Dados do Censo de 1980 indicam naquela data uma proporccedilatildeo

de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no municiacutepio Em 2000 essa relaccedilatildeo jaacute erade 91 para 100 e estima-se que atualmente esteja em torno de 90 ou seja existem 9 homenspara cada 10 mulheres na cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Direito agrave Cidade | 29

Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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Direito agrave Cidade | 37

No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Referecircncias

Livros artigos teses dissertaccedilotildeesBONDUKI N amp ROSSETO R ldquoO plano nacional de habitaccedilatildeo e os recursospara financiar a autogestatildeordquo Proposta vol 32 n 116 Rio de Janeiro 2008

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CARLOS AFA O espaccedilo urbano novos escritos sobre a cidade Satildeo Paulo FFLCH 2007a

______ O lugar nodo mundo Satildeo Paulo FFLCH 2007b

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LI B Y LEONG A VITIELLO D amp ACOCA A Chinatown Then and Now Gentrification in Boston NewYork and Philadelphia New York AALDEF 2013

MARICATO E ldquoMetroacutepole legislaccedilatildeo e desigualdaderdquo Estudos Avanccedilados vol 17 n 48 Satildeo Paulomaiago 2003 p 150-167

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SANTORO P F ldquoO desafio de planejar e produzir expansatildeo urbana com qualidade a experiecircncia colom-biana dos Planos Parciais em Bogotaacute Colocircmbiardquo Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionaisvol 13 n 1 Recife mai 2011 p 91-115

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SANTOS M A urbanizaccedilatildeo brasileira Satildeo Paulo Hucitec 1993

SOUZA T C S Corticcedilos em Satildeo Paulo programasvistoriasrelatos 303f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em

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FONSECA F ldquoOs grandes e poucos divulgados avanccedilos do governo Haddadrdquo Poliacutetica Carta Maior 20abr 2014 Disponiacutevel em ltwwwcartamaiorcombrEditoriaPoliticaOs-grandes-e-pouco-divulga-dos-avancos-do-governo-Haddad430759gt Acesso em 3 ago 2015

MAMANI U R ldquoO caminho do direito agrave cidade na Boliacuteviardquo Diaacutelogos propostas histoacuterias para uma cida-dania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche-dph-8586htmlgtAcesso em 3 ago 2015

ROLNIK R ldquoImobilidade na cidade de Satildeo Paulo o problema e o falso problemardquo Blog da Raquel Rol-nik 17 mar 2011 Disponiacutevel em lthttpsraquelrolnikwordpresscom20110317imobilidade-na-ci-dade-de-sao-paulo-o-problema-e-o-falso-problemagt Acesso em 3 ago 2015

ROMEIRO P GUIMARAtildeES I M S S G amp KOETZ V ldquoDerecho a la Ciudad en Ameacuterica Latinardquo In SAU-LE JR N ZAacuteRATE L amp EMANUELLI M S (coords) Avanzando en la Implementacioacuten del Derecho ala Ciudad en Ameacuterica Latina y a nivel Internacional Sl Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade sdDisponiacutevel em lthttpsderechoalaciudadflacsofileswordpresscom201401plataforma-global--por-el-derecho-a-la-ciudad-avanzando-en-la-implementacic3b3n-del-derecho-a-la-ciudad-en-am-c3a9rica-latina-y-a-nivel-internacionalpdf gt Acesso em 30 jul 2015

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SAULE JR N amp UZZO K ldquoA trajetoacuteria da reforma urbana no Brasilrdquo Diaacutelogos propostas histoacuteriaspara uma cidadania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche--dph-8583htmlgt Acesso em 3 ago 2015

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VERIacuteSSIMO A A ldquoPorque fomos a Medelliacuten e Bogotaacuterdquo Agrave beira do urbanismo 12 mar 2012 Disponiacutevelem lthttpabeiradourbanismoblogspotcombr201203porque-fomos-medellin-e-bogotahtmlgtAcesso em 3 ago 2015

Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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Eacute nesse cenaacuterio que inuacutemeras formas de opressatildeo satildeo naturalizadas e tecircm respaldo inclu-sive legal como no caso da segregaccedilatildeo territorial ligada agrave propriedade privada fenocircmeno tido

como ldquoaceitaacutevelrdquo e protegido por lei A cidade que temos ainda eacute em grande parte e infelizmen-te aquela das taxas de lucro da propriedade privada e das desigualdades em que o capital jaacute

em seu estaacutegio financeiro vem alcanccedilando um ldquoterreno lucrativo para a produccedilatildeo e absorccedilatildeo deexcedente de capitalrdquo (HARVEY 2012 p 74) Mas a cidade que queremos eacute aquela que possibi-lita o exerciacutecio da liberdade democraacutetica e da criatividade expressa no territoacuterio vivido e que natildeoestaacute subordinada agrave relaccedilatildeo de troca Uma cidade humanizada capaz de estabelecer o direito emsua totalidade para que todos possam viver de forma livre e diversificada natildeo fazendo da vidacotidiana uma mera sobrevivecircncia

Entretanto eacute importante reconhecer que houve um salto positivo quando discutimos terri-toacuterio espaccedilo puacuteblico e relaccedilotildees sociais sob a perspectiva da cidade democraacutetica principalmentepor esta reconhecer a participaccedilatildeo social sobretudo na ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e na tomada

de decisotildees poliacuteticas que em muitos casos ocorrem motivadas por reivindicaccedilotildees conformeveremos adiante quando apontarmos o reconhecimento do direito agrave cidade no Brasil

14 | Coleccedilatildeo direitos humanos e cidadania

O Prefeito de Satildeo Paulo Fernando Haddad pedalando durante a inauguraccedilatildeo do maior mural de grafite a ceacuteu aberto da Ameacuterica Latina na

avenida 23 de maio (creacutedito Heloisa BallariniSECOM)

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Direito agrave Cidade | 15

2 As cidades brasileiras e

seu processo de urbanizaccedilatildeo

Com base no contexto apresentado partiremos entatildeo para a realidade brasileira e seusinuacutemeros desafios Em decorrecircncia de um passado como colocircnia o processo de urbanizaccedilatildeo noBrasil eacute heranccedila do desenvolvimento tardio desigual e combinado Ocorreu somente no seacuteculoXX com a chegada das induacutestrias faacutebricas e empresas de grande porte generalizando-se pelo

territoacuterio nacional apenas a partir da deacutecada de 1970 Se o processo de urbanizaccedilatildeo e formaccedilatildeodas cidades industriais europeias como afirma Lefebvre (2001) ocorreu em fins do seacuteculo XVIIIe iniacutecio do seacuteculo XIX com a expansatildeo e desenvolvimento do modo de produccedilatildeo capitalista foisomente no seacuteculo XX que nosso paiacutes superou o modelo arcaico de organizaccedilatildeo e produccedilatildeoadotando a partir de entatildeo o modelo capitalista mas com muitas marcas desse passadoagroexportador o que explica de certo modo a dependecircncia da economia internacional

Ao mesmo tempo em que a dependecircncia econocircmica em relaccedilatildeo ao capital financeiro inter-nacional eacute histoacuterica haacute de se considerar tambeacutem que trouxe benefiacutecios para o desenvolvimento

de infraestrutura em atividades relacionadas ao trabalho Essa situaccedilatildeo contribuiu portantopara o financiamento e a construccedilatildeo de ferrovias portos navegaccedilatildeo e geraccedilatildeo de eletricidadefatores essenciais para o processo de desenvolvimento industrial

O urbanizaccedilatildeo do Brasil foi tardia ocorrendo apenas apoacutes a industrializaccedilatildeo generalizada no seacuteculo XX (creacutedito Imagens USP)

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16 | Cadernos de Formaccedilatildeo

De acordo com Ermiacutenia Maricato (2003) em 1890 a populaccedilatildeo urbana totalizava uma meacutediade 68 a 10 Com a emergecircncia da matildeo de obra livre ou seja a relaccedilatildeo de trabalho baseada nomodo de produccedilatildeo capitalista esses nuacutemeros se elevaram As cidades representavam o futuro

a modernidade e todas as expectativas de mudanccedila no aspecto social e cultural do paiacutes Foi so-mente depois da Revoluccedilatildeo de 1930 que esse cenaacuterio se modificou de fato ao incorporar poliacuteti-

cas puacuteblicas no processo de urbanizaccedilatildeo e industrializaccedilatildeo ultrapassando o modelo econocircmicoagroexportador e a poliacutetica do ldquocafeacute com leiterdquo (Repuacuteblica Oligaacuterquica)

No entanto o vieacutes autoritaacuterio populista e paternalista do periacuteodo possibilitou a con-tinuidade de um Estado que trabalhava aliado aos interesses da oligarquia Prosseguiu

assim a desigualdade entre as classes sociais e outras heranccedilas do periacuteodo colonial comoa concentraccedilatildeo de terra de renda e de poder expressa nas relaccedilotildees de favor mando obe-

diecircncia e arbiacutetrio nas decisotildees legais (MARICATO 2003) Essa modernizaccedilatildeo com base no de-senvolvimento do atraso deixou suas marcas nas metroacutepoles brasileiras como a segregaccedilatildeoterritorial e os danos ao meio ambiente

Esse cenaacuterio soacute pocircde ser evidenciado deacutecadas depois agrave medida que as cidades brasilei-ras foram ficando cada vez mais ldquoassociadas agrave violecircncia poluiccedilatildeo das aacuteguas e do ar crianccediladesamparada traacutefego caoacutetico enchentes entre outros inuacutemeros malesrdquo (MARICATO 2003 p152) Isso porque conforme o desenvolvimento do paiacutes extinguiram-se as oportunidades para a

populaccedilatildeo imigrante e tambeacutem migrante Cresceram as periferias de forma exorbitante assim

como a pobreza e a alta densidade de ocupaccedilatildeo do solo Esses fatores geraram uma ampla se-gregaccedilatildeo urbana eou ambiental aleacutem das dificuldades de acesso aos serviccedilos puacuteblicos comotransporte saneamento abastecimento sauacutede educaccedilatildeo creches e lazer

Curiosidades sobre a cidade de Satildeo Paulo

Sobre a populaccedilatildeo urbana em Satildeo Paulo

1872 ndash 30 mil habitantes1900 ndash 240 mil habitantesAnos 1950 ndash populaccedilatildeo passou de pouco mais de2 milhotildees de habitantes para mais de 35 milhotildees

(motivo expansatildeo do setor industrial)2000 ndash passa de 10 milhotildees2010 ndash passa de 11 milhotildees e 200 mil

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Direito agrave Cidade | 17

2Mananciais correspondem a reservas hiacutedricas ou fontes utilizadas para o abastecimento puacuteblico de aacutegua Disponiacutevel em lthttpsitesabesp

combrsiteinternaDefaultaspxsecaoId=31gt Acesso em 10 ago 2015

21 O direito agrave cidade e a Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade

O direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta que soacute recentemente ndash final doseacuteculo XX ndash passou a ter reconhecimento mundial apesar de seu significado protagonis-mo essencial para esse reconhecimento principalmente no que diz respeito agrave implemen-taccedilatildeo da reforma urbana Destaca-se assim o Movimento Nacional pela Reforma Urbanaque criado em 1985 consolidou no Brasil a luta pelo direito agrave cidade na deacutecada de 1980

Utilidade puacuteblica

O portal da prefeitura de Satildeo Paulo

disponibiliza informaccedilotildees sobre ohistoacuterico demograacutefico da cidade deSatildeo Paulo com inuacutemeras ilus-traccedilotildees antigas dos pontos maisconhecidos do municiacutepio Acessehttpsmduprefeituraspgovbr

historico_demograficoindexphp

O crescimento desordenado gerou ocupaccedilotildees em aacutereas de mananciais2 e topos de morrondash que natildeo satildeo de interesse do mercado imobiliaacuterio dada a restriccedilatildeo pela legislaccedilatildeo urbaniacutesti-ca ndash criando aacutereas residenciais propensas a enchentes desmoronamentos e deslizamentos de

terras Some-se a isso um contexto de desemprego discriminaccedilatildeo informalidade e ilegalidadedado ao grande contingente populacional Por outro lado recursos puacuteblicos e privados satildeo cadavez mais utilizados para investimentos em aacutereas concentradas que satildeo valorizadas porque pas-

sam a dispor de saneamento baacutesico asfalto transporte e seguranccedila o que soacute beneficia o capitalimobiliaacuterio a construccedilatildeo civil e o estoque de terras urbanas dentre outros interesses da burgue-sia nacional e internacional

Portanto a questatildeo urbana e habitacional deve ser compreendida com base na relaccedilatildeo poliacuteticae econocircmica da sociedade brasileira aleacutem de algumas particularidades em sua formaccedilatildeo soacutecio-his-

toacuterica uma vez que ao mesmo tempo em que a populaccedilatildeo convive com um cenaacuterio mediado poralugueacuteis altos imoacuteveis ilegais e deacuteficit habitacional bairros com infraestrutura urbana se beneficiamda especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Conclui-se que essa questatildeo eacute produto do capitalismo e expressa suascontradiccedilotildees no cotidiano vivido por seus habitantes num contexto urbano de violaccedilatildeo dos direitos

humanos como o direito agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave moradia entre outros Como resposta agraves inuacutemerascondiccedilotildees precaacuterias de vida grupos atuam em diversos setores sociais em busca de mudanccedilas nomodo de governar planejar e desenvolver as cidades isto eacute lutam pelo direito agrave cidade

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Esse periacuteodo foi marcado pela efervescecircncia de debates e manifestaccedilotildees poliacuteticas de di-ferentes segmentos da sociedade civil que reivindicavam melhorias na cidade e na democra-tizaccedilatildeo do processo poliacutetico Em 1987 com a convergecircncia desses debates assim como com a

correlaccedilatildeo de forccedilas vigente foi criado o Foacuterum Nacional pela Reforma Urbana cujo objetivoprincipal era inserir a questatildeo urbana como pauta da agenda puacuteblica Esse movimento no finaldo regime militar passou a adotar uma concepccedilatildeo de cidade na sua totalidade entendendo o

direito agrave cidade como um direito coletivo que busca alcanccedilar ldquoa cidade de todos a casa aleacutem dacasa a casa com asfalto com serviccedilos puacuteblicos com escola com transporte com direito a umavida socialrdquo (SAULE JR amp UZZO 2009)

Vale ressaltar o protagonismo desse movimento junto a outros grupos populares (or-ganizaccedilotildees da sociedade civil movimentos sociais de luta pela moradia pastorais entida-

des de profissatildeo etc) que travaram um embate com as forccedilas poliacuteticas conservadoras naAssembleia Nacional Constituinte o que culminou posteriormente na influecircncia dessesgrupos sobre a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 sobretudo em relaccedilatildeo agraves temaacuteticas do campourbano Baseando-se na compreensatildeo de certo descaso do poder puacuteblico sobre segregaccedilatildeo

territorial saneamento habitaccedilatildeo e transporte esses grupos elaboraram uma proposta delei para inserccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal com vistas a atuar nesse contexto e participar doprocesso de criaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

De acordo com Nelson Saule Jr e Karina Uzzo (2009) o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana no ano de 1986 ldquodefine o conceito de reforma urbana como uma nova eacutetica socialrdquo erepudiam ldquoa cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitosrdquo Foi inau-gurada assim de forma criacutetica e em acircmbito nacional uma proposta de reforma urbana por meioda construccedilatildeo de uma plataforma poliacutetica que reivindicava uma nova cidade e o fim dos privileacute-

A populaccedilatildeo de Satildeo Paulo apresenta algumas especificidades em termos demograacuteficos eurbanos entre as quais merecem destaque certos aspectos de gecircnero e idade assim como sua

distribuiccedilatildeo territorial (importante quando se debate direito agrave cidade como direito humanomulher idosos e regiotildees perifeacutericas)

Feminilizaccedilatildeo ao longo dos anos tem sido crescente a predominacircncia numeacuterica de mulhe-res no conjunto da populaccedilatildeo Dados do Censo de 1980 indicam naquela data uma proporccedilatildeo

de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no municiacutepio Em 2000 essa relaccedilatildeo jaacute erade 91 para 100 e estima-se que atualmente esteja em torno de 90 ou seja existem 9 homenspara cada 10 mulheres na cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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SANTOS M A urbanizaccedilatildeo brasileira Satildeo Paulo Hucitec 1993

SOUZA T C S Corticcedilos em Satildeo Paulo programasvistoriasrelatos 303f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em

Arquitetura) ndash Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Universidade de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 2011

Mateacuterias de imprensa blogs sites documentos

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Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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2 As cidades brasileiras e

seu processo de urbanizaccedilatildeo

Com base no contexto apresentado partiremos entatildeo para a realidade brasileira e seusinuacutemeros desafios Em decorrecircncia de um passado como colocircnia o processo de urbanizaccedilatildeo noBrasil eacute heranccedila do desenvolvimento tardio desigual e combinado Ocorreu somente no seacuteculoXX com a chegada das induacutestrias faacutebricas e empresas de grande porte generalizando-se pelo

territoacuterio nacional apenas a partir da deacutecada de 1970 Se o processo de urbanizaccedilatildeo e formaccedilatildeodas cidades industriais europeias como afirma Lefebvre (2001) ocorreu em fins do seacuteculo XVIIIe iniacutecio do seacuteculo XIX com a expansatildeo e desenvolvimento do modo de produccedilatildeo capitalista foisomente no seacuteculo XX que nosso paiacutes superou o modelo arcaico de organizaccedilatildeo e produccedilatildeoadotando a partir de entatildeo o modelo capitalista mas com muitas marcas desse passadoagroexportador o que explica de certo modo a dependecircncia da economia internacional

Ao mesmo tempo em que a dependecircncia econocircmica em relaccedilatildeo ao capital financeiro inter-nacional eacute histoacuterica haacute de se considerar tambeacutem que trouxe benefiacutecios para o desenvolvimento

de infraestrutura em atividades relacionadas ao trabalho Essa situaccedilatildeo contribuiu portantopara o financiamento e a construccedilatildeo de ferrovias portos navegaccedilatildeo e geraccedilatildeo de eletricidadefatores essenciais para o processo de desenvolvimento industrial

O urbanizaccedilatildeo do Brasil foi tardia ocorrendo apenas apoacutes a industrializaccedilatildeo generalizada no seacuteculo XX (creacutedito Imagens USP)

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De acordo com Ermiacutenia Maricato (2003) em 1890 a populaccedilatildeo urbana totalizava uma meacutediade 68 a 10 Com a emergecircncia da matildeo de obra livre ou seja a relaccedilatildeo de trabalho baseada nomodo de produccedilatildeo capitalista esses nuacutemeros se elevaram As cidades representavam o futuro

a modernidade e todas as expectativas de mudanccedila no aspecto social e cultural do paiacutes Foi so-mente depois da Revoluccedilatildeo de 1930 que esse cenaacuterio se modificou de fato ao incorporar poliacuteti-

cas puacuteblicas no processo de urbanizaccedilatildeo e industrializaccedilatildeo ultrapassando o modelo econocircmicoagroexportador e a poliacutetica do ldquocafeacute com leiterdquo (Repuacuteblica Oligaacuterquica)

No entanto o vieacutes autoritaacuterio populista e paternalista do periacuteodo possibilitou a con-tinuidade de um Estado que trabalhava aliado aos interesses da oligarquia Prosseguiu

assim a desigualdade entre as classes sociais e outras heranccedilas do periacuteodo colonial comoa concentraccedilatildeo de terra de renda e de poder expressa nas relaccedilotildees de favor mando obe-

diecircncia e arbiacutetrio nas decisotildees legais (MARICATO 2003) Essa modernizaccedilatildeo com base no de-senvolvimento do atraso deixou suas marcas nas metroacutepoles brasileiras como a segregaccedilatildeoterritorial e os danos ao meio ambiente

Esse cenaacuterio soacute pocircde ser evidenciado deacutecadas depois agrave medida que as cidades brasilei-ras foram ficando cada vez mais ldquoassociadas agrave violecircncia poluiccedilatildeo das aacuteguas e do ar crianccediladesamparada traacutefego caoacutetico enchentes entre outros inuacutemeros malesrdquo (MARICATO 2003 p152) Isso porque conforme o desenvolvimento do paiacutes extinguiram-se as oportunidades para a

populaccedilatildeo imigrante e tambeacutem migrante Cresceram as periferias de forma exorbitante assim

como a pobreza e a alta densidade de ocupaccedilatildeo do solo Esses fatores geraram uma ampla se-gregaccedilatildeo urbana eou ambiental aleacutem das dificuldades de acesso aos serviccedilos puacuteblicos comotransporte saneamento abastecimento sauacutede educaccedilatildeo creches e lazer

Curiosidades sobre a cidade de Satildeo Paulo

Sobre a populaccedilatildeo urbana em Satildeo Paulo

1872 ndash 30 mil habitantes1900 ndash 240 mil habitantesAnos 1950 ndash populaccedilatildeo passou de pouco mais de2 milhotildees de habitantes para mais de 35 milhotildees

(motivo expansatildeo do setor industrial)2000 ndash passa de 10 milhotildees2010 ndash passa de 11 milhotildees e 200 mil

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2Mananciais correspondem a reservas hiacutedricas ou fontes utilizadas para o abastecimento puacuteblico de aacutegua Disponiacutevel em lthttpsitesabesp

combrsiteinternaDefaultaspxsecaoId=31gt Acesso em 10 ago 2015

21 O direito agrave cidade e a Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade

O direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta que soacute recentemente ndash final doseacuteculo XX ndash passou a ter reconhecimento mundial apesar de seu significado protagonis-mo essencial para esse reconhecimento principalmente no que diz respeito agrave implemen-taccedilatildeo da reforma urbana Destaca-se assim o Movimento Nacional pela Reforma Urbanaque criado em 1985 consolidou no Brasil a luta pelo direito agrave cidade na deacutecada de 1980

Utilidade puacuteblica

O portal da prefeitura de Satildeo Paulo

disponibiliza informaccedilotildees sobre ohistoacuterico demograacutefico da cidade deSatildeo Paulo com inuacutemeras ilus-traccedilotildees antigas dos pontos maisconhecidos do municiacutepio Acessehttpsmduprefeituraspgovbr

historico_demograficoindexphp

O crescimento desordenado gerou ocupaccedilotildees em aacutereas de mananciais2 e topos de morrondash que natildeo satildeo de interesse do mercado imobiliaacuterio dada a restriccedilatildeo pela legislaccedilatildeo urbaniacutesti-ca ndash criando aacutereas residenciais propensas a enchentes desmoronamentos e deslizamentos de

terras Some-se a isso um contexto de desemprego discriminaccedilatildeo informalidade e ilegalidadedado ao grande contingente populacional Por outro lado recursos puacuteblicos e privados satildeo cadavez mais utilizados para investimentos em aacutereas concentradas que satildeo valorizadas porque pas-

sam a dispor de saneamento baacutesico asfalto transporte e seguranccedila o que soacute beneficia o capitalimobiliaacuterio a construccedilatildeo civil e o estoque de terras urbanas dentre outros interesses da burgue-sia nacional e internacional

Portanto a questatildeo urbana e habitacional deve ser compreendida com base na relaccedilatildeo poliacuteticae econocircmica da sociedade brasileira aleacutem de algumas particularidades em sua formaccedilatildeo soacutecio-his-

toacuterica uma vez que ao mesmo tempo em que a populaccedilatildeo convive com um cenaacuterio mediado poralugueacuteis altos imoacuteveis ilegais e deacuteficit habitacional bairros com infraestrutura urbana se beneficiamda especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Conclui-se que essa questatildeo eacute produto do capitalismo e expressa suascontradiccedilotildees no cotidiano vivido por seus habitantes num contexto urbano de violaccedilatildeo dos direitos

humanos como o direito agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave moradia entre outros Como resposta agraves inuacutemerascondiccedilotildees precaacuterias de vida grupos atuam em diversos setores sociais em busca de mudanccedilas nomodo de governar planejar e desenvolver as cidades isto eacute lutam pelo direito agrave cidade

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Esse periacuteodo foi marcado pela efervescecircncia de debates e manifestaccedilotildees poliacuteticas de di-ferentes segmentos da sociedade civil que reivindicavam melhorias na cidade e na democra-tizaccedilatildeo do processo poliacutetico Em 1987 com a convergecircncia desses debates assim como com a

correlaccedilatildeo de forccedilas vigente foi criado o Foacuterum Nacional pela Reforma Urbana cujo objetivoprincipal era inserir a questatildeo urbana como pauta da agenda puacuteblica Esse movimento no finaldo regime militar passou a adotar uma concepccedilatildeo de cidade na sua totalidade entendendo o

direito agrave cidade como um direito coletivo que busca alcanccedilar ldquoa cidade de todos a casa aleacutem dacasa a casa com asfalto com serviccedilos puacuteblicos com escola com transporte com direito a umavida socialrdquo (SAULE JR amp UZZO 2009)

Vale ressaltar o protagonismo desse movimento junto a outros grupos populares (or-ganizaccedilotildees da sociedade civil movimentos sociais de luta pela moradia pastorais entida-

des de profissatildeo etc) que travaram um embate com as forccedilas poliacuteticas conservadoras naAssembleia Nacional Constituinte o que culminou posteriormente na influecircncia dessesgrupos sobre a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 sobretudo em relaccedilatildeo agraves temaacuteticas do campourbano Baseando-se na compreensatildeo de certo descaso do poder puacuteblico sobre segregaccedilatildeo

territorial saneamento habitaccedilatildeo e transporte esses grupos elaboraram uma proposta delei para inserccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal com vistas a atuar nesse contexto e participar doprocesso de criaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

De acordo com Nelson Saule Jr e Karina Uzzo (2009) o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana no ano de 1986 ldquodefine o conceito de reforma urbana como uma nova eacutetica socialrdquo erepudiam ldquoa cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitosrdquo Foi inau-gurada assim de forma criacutetica e em acircmbito nacional uma proposta de reforma urbana por meioda construccedilatildeo de uma plataforma poliacutetica que reivindicava uma nova cidade e o fim dos privileacute-

A populaccedilatildeo de Satildeo Paulo apresenta algumas especificidades em termos demograacuteficos eurbanos entre as quais merecem destaque certos aspectos de gecircnero e idade assim como sua

distribuiccedilatildeo territorial (importante quando se debate direito agrave cidade como direito humanomulher idosos e regiotildees perifeacutericas)

Feminilizaccedilatildeo ao longo dos anos tem sido crescente a predominacircncia numeacuterica de mulhe-res no conjunto da populaccedilatildeo Dados do Censo de 1980 indicam naquela data uma proporccedilatildeo

de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no municiacutepio Em 2000 essa relaccedilatildeo jaacute erade 91 para 100 e estima-se que atualmente esteja em torno de 90 ou seja existem 9 homenspara cada 10 mulheres na cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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16 | Cadernos de Formaccedilatildeo

De acordo com Ermiacutenia Maricato (2003) em 1890 a populaccedilatildeo urbana totalizava uma meacutediade 68 a 10 Com a emergecircncia da matildeo de obra livre ou seja a relaccedilatildeo de trabalho baseada nomodo de produccedilatildeo capitalista esses nuacutemeros se elevaram As cidades representavam o futuro

a modernidade e todas as expectativas de mudanccedila no aspecto social e cultural do paiacutes Foi so-mente depois da Revoluccedilatildeo de 1930 que esse cenaacuterio se modificou de fato ao incorporar poliacuteti-

cas puacuteblicas no processo de urbanizaccedilatildeo e industrializaccedilatildeo ultrapassando o modelo econocircmicoagroexportador e a poliacutetica do ldquocafeacute com leiterdquo (Repuacuteblica Oligaacuterquica)

No entanto o vieacutes autoritaacuterio populista e paternalista do periacuteodo possibilitou a con-tinuidade de um Estado que trabalhava aliado aos interesses da oligarquia Prosseguiu

assim a desigualdade entre as classes sociais e outras heranccedilas do periacuteodo colonial comoa concentraccedilatildeo de terra de renda e de poder expressa nas relaccedilotildees de favor mando obe-

diecircncia e arbiacutetrio nas decisotildees legais (MARICATO 2003) Essa modernizaccedilatildeo com base no de-senvolvimento do atraso deixou suas marcas nas metroacutepoles brasileiras como a segregaccedilatildeoterritorial e os danos ao meio ambiente

Esse cenaacuterio soacute pocircde ser evidenciado deacutecadas depois agrave medida que as cidades brasilei-ras foram ficando cada vez mais ldquoassociadas agrave violecircncia poluiccedilatildeo das aacuteguas e do ar crianccediladesamparada traacutefego caoacutetico enchentes entre outros inuacutemeros malesrdquo (MARICATO 2003 p152) Isso porque conforme o desenvolvimento do paiacutes extinguiram-se as oportunidades para a

populaccedilatildeo imigrante e tambeacutem migrante Cresceram as periferias de forma exorbitante assim

como a pobreza e a alta densidade de ocupaccedilatildeo do solo Esses fatores geraram uma ampla se-gregaccedilatildeo urbana eou ambiental aleacutem das dificuldades de acesso aos serviccedilos puacuteblicos comotransporte saneamento abastecimento sauacutede educaccedilatildeo creches e lazer

Curiosidades sobre a cidade de Satildeo Paulo

Sobre a populaccedilatildeo urbana em Satildeo Paulo

1872 ndash 30 mil habitantes1900 ndash 240 mil habitantesAnos 1950 ndash populaccedilatildeo passou de pouco mais de2 milhotildees de habitantes para mais de 35 milhotildees

(motivo expansatildeo do setor industrial)2000 ndash passa de 10 milhotildees2010 ndash passa de 11 milhotildees e 200 mil

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2Mananciais correspondem a reservas hiacutedricas ou fontes utilizadas para o abastecimento puacuteblico de aacutegua Disponiacutevel em lthttpsitesabesp

combrsiteinternaDefaultaspxsecaoId=31gt Acesso em 10 ago 2015

21 O direito agrave cidade e a Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade

O direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta que soacute recentemente ndash final doseacuteculo XX ndash passou a ter reconhecimento mundial apesar de seu significado protagonis-mo essencial para esse reconhecimento principalmente no que diz respeito agrave implemen-taccedilatildeo da reforma urbana Destaca-se assim o Movimento Nacional pela Reforma Urbanaque criado em 1985 consolidou no Brasil a luta pelo direito agrave cidade na deacutecada de 1980

Utilidade puacuteblica

O portal da prefeitura de Satildeo Paulo

disponibiliza informaccedilotildees sobre ohistoacuterico demograacutefico da cidade deSatildeo Paulo com inuacutemeras ilus-traccedilotildees antigas dos pontos maisconhecidos do municiacutepio Acessehttpsmduprefeituraspgovbr

historico_demograficoindexphp

O crescimento desordenado gerou ocupaccedilotildees em aacutereas de mananciais2 e topos de morrondash que natildeo satildeo de interesse do mercado imobiliaacuterio dada a restriccedilatildeo pela legislaccedilatildeo urbaniacutesti-ca ndash criando aacutereas residenciais propensas a enchentes desmoronamentos e deslizamentos de

terras Some-se a isso um contexto de desemprego discriminaccedilatildeo informalidade e ilegalidadedado ao grande contingente populacional Por outro lado recursos puacuteblicos e privados satildeo cadavez mais utilizados para investimentos em aacutereas concentradas que satildeo valorizadas porque pas-

sam a dispor de saneamento baacutesico asfalto transporte e seguranccedila o que soacute beneficia o capitalimobiliaacuterio a construccedilatildeo civil e o estoque de terras urbanas dentre outros interesses da burgue-sia nacional e internacional

Portanto a questatildeo urbana e habitacional deve ser compreendida com base na relaccedilatildeo poliacuteticae econocircmica da sociedade brasileira aleacutem de algumas particularidades em sua formaccedilatildeo soacutecio-his-

toacuterica uma vez que ao mesmo tempo em que a populaccedilatildeo convive com um cenaacuterio mediado poralugueacuteis altos imoacuteveis ilegais e deacuteficit habitacional bairros com infraestrutura urbana se beneficiamda especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Conclui-se que essa questatildeo eacute produto do capitalismo e expressa suascontradiccedilotildees no cotidiano vivido por seus habitantes num contexto urbano de violaccedilatildeo dos direitos

humanos como o direito agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave moradia entre outros Como resposta agraves inuacutemerascondiccedilotildees precaacuterias de vida grupos atuam em diversos setores sociais em busca de mudanccedilas nomodo de governar planejar e desenvolver as cidades isto eacute lutam pelo direito agrave cidade

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Esse periacuteodo foi marcado pela efervescecircncia de debates e manifestaccedilotildees poliacuteticas de di-ferentes segmentos da sociedade civil que reivindicavam melhorias na cidade e na democra-tizaccedilatildeo do processo poliacutetico Em 1987 com a convergecircncia desses debates assim como com a

correlaccedilatildeo de forccedilas vigente foi criado o Foacuterum Nacional pela Reforma Urbana cujo objetivoprincipal era inserir a questatildeo urbana como pauta da agenda puacuteblica Esse movimento no finaldo regime militar passou a adotar uma concepccedilatildeo de cidade na sua totalidade entendendo o

direito agrave cidade como um direito coletivo que busca alcanccedilar ldquoa cidade de todos a casa aleacutem dacasa a casa com asfalto com serviccedilos puacuteblicos com escola com transporte com direito a umavida socialrdquo (SAULE JR amp UZZO 2009)

Vale ressaltar o protagonismo desse movimento junto a outros grupos populares (or-ganizaccedilotildees da sociedade civil movimentos sociais de luta pela moradia pastorais entida-

des de profissatildeo etc) que travaram um embate com as forccedilas poliacuteticas conservadoras naAssembleia Nacional Constituinte o que culminou posteriormente na influecircncia dessesgrupos sobre a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 sobretudo em relaccedilatildeo agraves temaacuteticas do campourbano Baseando-se na compreensatildeo de certo descaso do poder puacuteblico sobre segregaccedilatildeo

territorial saneamento habitaccedilatildeo e transporte esses grupos elaboraram uma proposta delei para inserccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal com vistas a atuar nesse contexto e participar doprocesso de criaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

De acordo com Nelson Saule Jr e Karina Uzzo (2009) o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana no ano de 1986 ldquodefine o conceito de reforma urbana como uma nova eacutetica socialrdquo erepudiam ldquoa cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitosrdquo Foi inau-gurada assim de forma criacutetica e em acircmbito nacional uma proposta de reforma urbana por meioda construccedilatildeo de uma plataforma poliacutetica que reivindicava uma nova cidade e o fim dos privileacute-

A populaccedilatildeo de Satildeo Paulo apresenta algumas especificidades em termos demograacuteficos eurbanos entre as quais merecem destaque certos aspectos de gecircnero e idade assim como sua

distribuiccedilatildeo territorial (importante quando se debate direito agrave cidade como direito humanomulher idosos e regiotildees perifeacutericas)

Feminilizaccedilatildeo ao longo dos anos tem sido crescente a predominacircncia numeacuterica de mulhe-res no conjunto da populaccedilatildeo Dados do Censo de 1980 indicam naquela data uma proporccedilatildeo

de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no municiacutepio Em 2000 essa relaccedilatildeo jaacute erade 91 para 100 e estima-se que atualmente esteja em torno de 90 ou seja existem 9 homenspara cada 10 mulheres na cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Referecircncias

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Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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21 O direito agrave cidade e a Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade

O direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta que soacute recentemente ndash final doseacuteculo XX ndash passou a ter reconhecimento mundial apesar de seu significado protagonis-mo essencial para esse reconhecimento principalmente no que diz respeito agrave implemen-taccedilatildeo da reforma urbana Destaca-se assim o Movimento Nacional pela Reforma Urbanaque criado em 1985 consolidou no Brasil a luta pelo direito agrave cidade na deacutecada de 1980

Utilidade puacuteblica

O portal da prefeitura de Satildeo Paulo

disponibiliza informaccedilotildees sobre ohistoacuterico demograacutefico da cidade deSatildeo Paulo com inuacutemeras ilus-traccedilotildees antigas dos pontos maisconhecidos do municiacutepio Acessehttpsmduprefeituraspgovbr

historico_demograficoindexphp

O crescimento desordenado gerou ocupaccedilotildees em aacutereas de mananciais2 e topos de morrondash que natildeo satildeo de interesse do mercado imobiliaacuterio dada a restriccedilatildeo pela legislaccedilatildeo urbaniacutesti-ca ndash criando aacutereas residenciais propensas a enchentes desmoronamentos e deslizamentos de

terras Some-se a isso um contexto de desemprego discriminaccedilatildeo informalidade e ilegalidadedado ao grande contingente populacional Por outro lado recursos puacuteblicos e privados satildeo cadavez mais utilizados para investimentos em aacutereas concentradas que satildeo valorizadas porque pas-

sam a dispor de saneamento baacutesico asfalto transporte e seguranccedila o que soacute beneficia o capitalimobiliaacuterio a construccedilatildeo civil e o estoque de terras urbanas dentre outros interesses da burgue-sia nacional e internacional

Portanto a questatildeo urbana e habitacional deve ser compreendida com base na relaccedilatildeo poliacuteticae econocircmica da sociedade brasileira aleacutem de algumas particularidades em sua formaccedilatildeo soacutecio-his-

toacuterica uma vez que ao mesmo tempo em que a populaccedilatildeo convive com um cenaacuterio mediado poralugueacuteis altos imoacuteveis ilegais e deacuteficit habitacional bairros com infraestrutura urbana se beneficiamda especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Conclui-se que essa questatildeo eacute produto do capitalismo e expressa suascontradiccedilotildees no cotidiano vivido por seus habitantes num contexto urbano de violaccedilatildeo dos direitos

humanos como o direito agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave moradia entre outros Como resposta agraves inuacutemerascondiccedilotildees precaacuterias de vida grupos atuam em diversos setores sociais em busca de mudanccedilas nomodo de governar planejar e desenvolver as cidades isto eacute lutam pelo direito agrave cidade

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Esse periacuteodo foi marcado pela efervescecircncia de debates e manifestaccedilotildees poliacuteticas de di-ferentes segmentos da sociedade civil que reivindicavam melhorias na cidade e na democra-tizaccedilatildeo do processo poliacutetico Em 1987 com a convergecircncia desses debates assim como com a

correlaccedilatildeo de forccedilas vigente foi criado o Foacuterum Nacional pela Reforma Urbana cujo objetivoprincipal era inserir a questatildeo urbana como pauta da agenda puacuteblica Esse movimento no finaldo regime militar passou a adotar uma concepccedilatildeo de cidade na sua totalidade entendendo o

direito agrave cidade como um direito coletivo que busca alcanccedilar ldquoa cidade de todos a casa aleacutem dacasa a casa com asfalto com serviccedilos puacuteblicos com escola com transporte com direito a umavida socialrdquo (SAULE JR amp UZZO 2009)

Vale ressaltar o protagonismo desse movimento junto a outros grupos populares (or-ganizaccedilotildees da sociedade civil movimentos sociais de luta pela moradia pastorais entida-

des de profissatildeo etc) que travaram um embate com as forccedilas poliacuteticas conservadoras naAssembleia Nacional Constituinte o que culminou posteriormente na influecircncia dessesgrupos sobre a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 sobretudo em relaccedilatildeo agraves temaacuteticas do campourbano Baseando-se na compreensatildeo de certo descaso do poder puacuteblico sobre segregaccedilatildeo

territorial saneamento habitaccedilatildeo e transporte esses grupos elaboraram uma proposta delei para inserccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal com vistas a atuar nesse contexto e participar doprocesso de criaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

De acordo com Nelson Saule Jr e Karina Uzzo (2009) o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana no ano de 1986 ldquodefine o conceito de reforma urbana como uma nova eacutetica socialrdquo erepudiam ldquoa cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitosrdquo Foi inau-gurada assim de forma criacutetica e em acircmbito nacional uma proposta de reforma urbana por meioda construccedilatildeo de uma plataforma poliacutetica que reivindicava uma nova cidade e o fim dos privileacute-

A populaccedilatildeo de Satildeo Paulo apresenta algumas especificidades em termos demograacuteficos eurbanos entre as quais merecem destaque certos aspectos de gecircnero e idade assim como sua

distribuiccedilatildeo territorial (importante quando se debate direito agrave cidade como direito humanomulher idosos e regiotildees perifeacutericas)

Feminilizaccedilatildeo ao longo dos anos tem sido crescente a predominacircncia numeacuterica de mulhe-res no conjunto da populaccedilatildeo Dados do Censo de 1980 indicam naquela data uma proporccedilatildeo

de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no municiacutepio Em 2000 essa relaccedilatildeo jaacute erade 91 para 100 e estima-se que atualmente esteja em torno de 90 ou seja existem 9 homenspara cada 10 mulheres na cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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Esse periacuteodo foi marcado pela efervescecircncia de debates e manifestaccedilotildees poliacuteticas de di-ferentes segmentos da sociedade civil que reivindicavam melhorias na cidade e na democra-tizaccedilatildeo do processo poliacutetico Em 1987 com a convergecircncia desses debates assim como com a

correlaccedilatildeo de forccedilas vigente foi criado o Foacuterum Nacional pela Reforma Urbana cujo objetivoprincipal era inserir a questatildeo urbana como pauta da agenda puacuteblica Esse movimento no finaldo regime militar passou a adotar uma concepccedilatildeo de cidade na sua totalidade entendendo o

direito agrave cidade como um direito coletivo que busca alcanccedilar ldquoa cidade de todos a casa aleacutem dacasa a casa com asfalto com serviccedilos puacuteblicos com escola com transporte com direito a umavida socialrdquo (SAULE JR amp UZZO 2009)

Vale ressaltar o protagonismo desse movimento junto a outros grupos populares (or-ganizaccedilotildees da sociedade civil movimentos sociais de luta pela moradia pastorais entida-

des de profissatildeo etc) que travaram um embate com as forccedilas poliacuteticas conservadoras naAssembleia Nacional Constituinte o que culminou posteriormente na influecircncia dessesgrupos sobre a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 sobretudo em relaccedilatildeo agraves temaacuteticas do campourbano Baseando-se na compreensatildeo de certo descaso do poder puacuteblico sobre segregaccedilatildeo

territorial saneamento habitaccedilatildeo e transporte esses grupos elaboraram uma proposta delei para inserccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal com vistas a atuar nesse contexto e participar doprocesso de criaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

De acordo com Nelson Saule Jr e Karina Uzzo (2009) o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana no ano de 1986 ldquodefine o conceito de reforma urbana como uma nova eacutetica socialrdquo erepudiam ldquoa cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitosrdquo Foi inau-gurada assim de forma criacutetica e em acircmbito nacional uma proposta de reforma urbana por meioda construccedilatildeo de uma plataforma poliacutetica que reivindicava uma nova cidade e o fim dos privileacute-

A populaccedilatildeo de Satildeo Paulo apresenta algumas especificidades em termos demograacuteficos eurbanos entre as quais merecem destaque certos aspectos de gecircnero e idade assim como sua

distribuiccedilatildeo territorial (importante quando se debate direito agrave cidade como direito humanomulher idosos e regiotildees perifeacutericas)

Feminilizaccedilatildeo ao longo dos anos tem sido crescente a predominacircncia numeacuterica de mulhe-res no conjunto da populaccedilatildeo Dados do Censo de 1980 indicam naquela data uma proporccedilatildeo

de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no municiacutepio Em 2000 essa relaccedilatildeo jaacute erade 91 para 100 e estima-se que atualmente esteja em torno de 90 ou seja existem 9 homenspara cada 10 mulheres na cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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SAULE JR N amp UZZO K ldquoA trajetoacuteria da reforma urbana no Brasilrdquo Diaacutelogos propostas histoacuteriaspara uma cidadania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche--dph-8583htmlgt Acesso em 3 ago 2015

UNFPA Relatoacuterio sobre a situaccedilatildeo da populaccedilatildeo mundial 2011 New York UNFPA 2011 Disponiacutevel emltwwwuncvfilesPT-SWOP11-WEBpdfgt Acesso em 11 ago 2015

VERIacuteSSIMO A A ldquoPorque fomos a Medelliacuten e Bogotaacuterdquo Agrave beira do urbanismo 12 mar 2012 Disponiacutevelem lthttpabeiradourbanismoblogspotcombr201203porque-fomos-medellin-e-bogotahtmlgtAcesso em 3 ago 2015

Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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bull condicionar as atividades econocircmicas e de desenvolvimento e o direito agrave propriedadeurbana a uma poliacutetica urbana que promova as funccedilotildees sociais da cidade e da propriedade

bull fortalecer a gestatildeo democraacutetica da cidade para a promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que as-segurem os direitos dos habitantes das cidades com a participaccedilatildeo popular dos segmentos emsituaccedilatildeo de desigualdade econocircmica e social

Como resultado temos

bull 1988 capiacutetulos 182 e 183 sobre poliacutetica urbana na Constituiccedilatildeo brasileira que pela pri-meira vez trata sobre a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade privada3

[hellip] participaccedilatildeo democraacutetica na gestatildeo das cidades tatildeo discriminada pela loacutegica excludente dos planostecnocraacuteticos dos anos 1960 e 1970 [que eram] apoiados apenas em saberes teacutecnicos dos quais a popu-

laccedilatildeo era considerada incapaz de saber agir e decidir (SAULE JR amp UZZO 2009)

Consolidou-se dessa forma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade Estefoi reivindicado na Assembleia Constituinte de 1988 mediante uma emenda popular que aleacutemde o reconhecer como direito fundamental das pessoas que vivem na cidade define os seguintesobjetivos (SAULE JR 2005)

3 Maricato (2010) ressalta que apesar da pressatildeo constante do Foacuterum Nacional de Reforma Urbana a regulamentaccedilatildeo dos capiacutetulos 182 e 183

da Constituiccedilatildeo Federal foi aprovada no Congresso Nacional depois de 13 anos sob o Estatuto da Cidade

bull 2001 Lei Nacional sobre o Estatuto das Cidades

bull 2003 criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades e a realizaccedilatildeo da 1a Conferecircncia Nacional das Cidadesbull 2004 criaccedilatildeo do Conselho Nacional das Cidades oacutergatildeo consultivo do Ministeacuterio

das Cidades

Iacutendice de envelhecimento eacute um indicador importante uma vez que estabelece a propor-ccedilatildeo de idosos em relaccedilatildeo ao total de crianccedilas numa determinada populaccedilatildeo Na cidade deSatildeo Paulo em 1991 havia em meacutedia 18 idosos para cada grupo de 100 crianccedilas aumentando

para 25 por 100 em 2000

Ocupaccedilatildeo urbana e distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo no territoacuterio municipal durante a deacutecada de1990 a tendecircncia agrave reduccedilatildeo do nuacutemero de habitantes verificada nos anos 80 espraiou-se para

aacutereas adjacentes fazendo com que o nuacutecleo central e outros distritos de ocupaccedilatildeo jaacute consolida-da viessem a apresentar taxas negativas de crescimento intensificou-se numeacuterica e espacial-mente quando aproximadamente 60 dos distritos do municiacutepio passaram a apresentar perda

gios Nesse contexto de embate dos movimentos sociais urbanos a questatildeo urbana alcanccedilou ocampo da justiccedila social e da igualdade com destaque para a

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bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Referecircncias

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Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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bull 2005 Lei de Consoacutercios Puacuteblicos e aprovaccedilatildeo das leis federais que instituem o marcoregulatoacuterio do Saneamento Ambiental e o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo e Interesse Social4

bull 2011 Lei de Mobilidade Urbana

bull 2012 Lei de Resiacuteduos Soacutelidos

Aleacutem dessas conquistas Ermiacutenia Maricato no Seminaacuterio Internacional Cidades Rebeldes5apresentou outros elementos importantes que tambeacutem temos de considerar no que se refere agravesaccedilotildees puacuteblicas necessaacuterias para a efetivaccedilatildeo desses marcos

bull orccedilamento participativobull programas de urbanizaccedilatildeo de aacutereas degradadasbull programas de habitaccedilatildeo com participaccedilatildeo social com garantia de participaccedilatildeo social di-

reito agrave cidade e agrave arquitetura por meio de assessoria de equipe teacutecnica especializada compostapor arquitetos engenheiros advogados e assistentes sociais

Apoacutes esse processo de consolidaccedilatildeo de direitos advindos de muitas lutas sociais nas deacute-cadas de 1980 e 1990 o Brasil se tornou referecircncia em poliacutetica urbana sobretudo por inserir o

direito agrave cidade gradativamente nos foacuteruns internacionais urbanos (SAULE JR 2005)

bull Conferecircncia da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada du-

rante a conferecircncia da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre meio ambiente e desenvol-

vimento (ECO-92) no Rio de Janeiro que resultou num tratado sobre a questatildeo urbana em que o

direito agrave cidade eacute concebido como direito agrave cidadaniabull Conferecircncia Mundial sobre os Assentamentos Humanos Habitat II da ONU realizada

em 1996 na cidade de Istambul onde foi reconhecida pelas instituiccedilotildees internacionais pormeio de um documento oficial o direito agrave moradia como um direito humano aleacutem de ter sidoacordada uma seacuterie de compromissos para que os paiacuteses pudessem promover medidas rela-cionadas a essa pauta

populacional Nesse periacuteodo o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento

positivo foram aqueles situados em aacutereas mais extremas da cidade a maior parte limiacutetrofescom outros municiacutepios da regiatildeo metropolitana indicando que o processo de periferizaccedilatildeo ul-trapassou os limites de Satildeo Paulo em direccedilatildeo agraves cidades de seu entorno Entre os fatores quecertamente contribuiacuteram para esse espraiamento da ocupaccedilatildeo urbana e para a mudanccedila nopadratildeo de crescimento demograacutefico no municiacutepio merecem destaque a continuidade do pro-

cesso de desconcentraccedilatildeo industrial em direccedilatildeo a outros municiacutepios da regiatildeo metropolitanade Satildeo Paulo e interior do Estado o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere agravehabitaccedilatildeo) e a expansatildeo de atividades terciaacuterias nas aacutereas mais consolidadas do centro urbanosubstituindo o uso residencial pelo comercial e de serviccedilos

4 Nessa lei estaacute incluiacuteda a criaccedilatildeo de um fundo e de um conselho especiacutefico com participaccedilatildeo social aleacutem do condicionamento do repasse de

recursos federais agrave existecircncia de planos habitacionais conselhos e fundos estaduais e municipais

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Referecircncias

Livros artigos teses dissertaccedilotildeesBONDUKI N amp ROSSETO R ldquoO plano nacional de habitaccedilatildeo e os recursospara financiar a autogestatildeordquo Proposta vol 32 n 116 Rio de Janeiro 2008

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CARLOS AFA O espaccedilo urbano novos escritos sobre a cidade Satildeo Paulo FFLCH 2007a

______ O lugar nodo mundo Satildeo Paulo FFLCH 2007b

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SANTOS M A urbanizaccedilatildeo brasileira Satildeo Paulo Hucitec 1993

SOUZA T C S Corticcedilos em Satildeo Paulo programasvistoriasrelatos 303f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em

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FONSECA F ldquoOs grandes e poucos divulgados avanccedilos do governo Haddadrdquo Poliacutetica Carta Maior 20abr 2014 Disponiacutevel em ltwwwcartamaiorcombrEditoriaPoliticaOs-grandes-e-pouco-divulga-dos-avancos-do-governo-Haddad430759gt Acesso em 3 ago 2015

MAMANI U R ldquoO caminho do direito agrave cidade na Boliacuteviardquo Diaacutelogos propostas histoacuterias para uma cida-dania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche-dph-8586htmlgtAcesso em 3 ago 2015

ROLNIK R ldquoImobilidade na cidade de Satildeo Paulo o problema e o falso problemardquo Blog da Raquel Rol-nik 17 mar 2011 Disponiacutevel em lthttpsraquelrolnikwordpresscom20110317imobilidade-na-ci-dade-de-sao-paulo-o-problema-e-o-falso-problemagt Acesso em 3 ago 2015

ROMEIRO P GUIMARAtildeES I M S S G amp KOETZ V ldquoDerecho a la Ciudad en Ameacuterica Latinardquo In SAU-LE JR N ZAacuteRATE L amp EMANUELLI M S (coords) Avanzando en la Implementacioacuten del Derecho ala Ciudad en Ameacuterica Latina y a nivel Internacional Sl Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade sdDisponiacutevel em lthttpsderechoalaciudadflacsofileswordpresscom201401plataforma-global--por-el-derecho-a-la-ciudad-avanzando-en-la-implementacic3b3n-del-derecho-a-la-ciudad-en-am-c3a9rica-latina-y-a-nivel-internacionalpdf gt Acesso em 30 jul 2015

SAULE JR N ldquoO direito agrave cidade como paradigma da governanccedila urbanardquo Instituto Poacutelis 30 mar 2005Disponiacutevel em ltwwwpolisorgbruploads750750pdfgt Acesso em 3 ago 2015

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SAULE JR N amp UZZO K ldquoA trajetoacuteria da reforma urbana no Brasilrdquo Diaacutelogos propostas histoacuteriaspara uma cidadania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche--dph-8583htmlgt Acesso em 3 ago 2015

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Sites

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Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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Feminilizaccedilatildeo envelheci-

mento e periferizaccedilatildeo mere-cem atenccedilatildeo especial de to-dos aqueles que se dedicamagrave formulaccedilatildeo de poliacuteticas puacute-blicas pois em meacutedio e lon-

go prazos teratildeo importacircnciadecisiva na definiccedilatildeo do per-fil e distribuiccedilatildeo dos habitan-tes de nossa cidade

22 Funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

Para o Foacuterum de Reforma Urbana a funccedilatildeo social da propriedade eacute um princiacutepio que estaacutevinculado a um projeto de sociedade mais igualitaacuteria em que prevalece o interesse coletivoPortanto a propriedade urbana cumpre a sua funccedilatildeo social quando destinada para satisfazer

as necessidades dos habitantes da cidade Os paracircmetros

para a satisfaccedilatildeo de tais necessidades satildeo os componen-tes do direito agraves cidades sustentaacuteveis como o direito agrave

moradia digna ao acesso agrave terra agrave sauacutede agrave educaccedilatildeo aomeio ambiente ao transporte agrave infraestrutura ao sane-amento ambiental ao trabalho ao lazer agrave cultura etc A

propriedade passa assim a ter seu uso condicionado aobem-estar social

O Estatuto da Cidade representa em acircmbito nacio-nal uma importante conquista dos movimentos sociais

Nele se estabelecem normas de ordem puacuteblica e interesse

social que regulam o uso da propriedade urbana em prol

bull Foacuterum Social Mundial que representa um marco sobre o reconhecimento internacionaldo direito agrave cidade Deste resulta a Carta Mundial do Direito agrave Cidade elaborada com contribui-ccedilotildees de vaacuterias organizaccedilotildees populares militantes da questatildeo urbana

A Carta Mundial pelo Direito agrave Cidade6 significou um marco no acircmbito internacional Elaborada

mediante a articulaccedilatildeo de grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana essedocumento aponta compromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico eorganismos internacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo ins-

trumentos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre elesvale mencionar a Carta marco no acircmbito internacional Elaborada mediante a articulaccedilatildeo de

grupos movimentos e foacuteruns comprometidos com a questatildeo urbana esse documento apontacompromissos e medidas de responsabilidade da sociedade civil setor puacuteblico e organismosinternacionais com objetivo de garantir uma vida digna agraves pessoas nas cidades

Paralelamente governos em acircmbito nacional internacional e local foram construindo instrumen-tos juriacutedicos e normativos sobre os direitos humanos no contexto urbano Dentre eles vale mencionara Carta Europeia de Salvaguarda dos Direitos Humanos na Cidade o Estatuto da Cidade (no contextobrasileiro) a Carta de Montreal e a Carta da Cidade do Meacutexico pelo Direito agrave Cidade aleacutem da recente

inserccedilatildeo do direito agrave cidade na constituiccedilatildeo de paiacuteses como Boliacutevia e Equador

5 Evento realizado no SESC Pinheiros em Satildeo Paulo A apresentaccedilatildeo de Maricato foi parte do curso de introduccedilatildeo agrave obra de David Harvey aula 4 que

ocorreu em 12 de junho de 2015 6 Disponiacutevel em lthttpnormativosconfeaorgbrdownloadsanexo1108-10pdfgt Acesso em 11 ago 2015

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Referecircncias

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______ O lugar nodo mundo Satildeo Paulo FFLCH 2007b

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MAMANI U R ldquoO caminho do direito agrave cidade na Boliacuteviardquo Diaacutelogos propostas histoacuterias para uma cida-dania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche-dph-8586htmlgtAcesso em 3 ago 2015

ROLNIK R ldquoImobilidade na cidade de Satildeo Paulo o problema e o falso problemardquo Blog da Raquel Rol-nik 17 mar 2011 Disponiacutevel em lthttpsraquelrolnikwordpresscom20110317imobilidade-na-ci-dade-de-sao-paulo-o-problema-e-o-falso-problemagt Acesso em 3 ago 2015

ROMEIRO P GUIMARAtildeES I M S S G amp KOETZ V ldquoDerecho a la Ciudad en Ameacuterica Latinardquo In SAU-LE JR N ZAacuteRATE L amp EMANUELLI M S (coords) Avanzando en la Implementacioacuten del Derecho ala Ciudad en Ameacuterica Latina y a nivel Internacional Sl Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade sdDisponiacutevel em lthttpsderechoalaciudadflacsofileswordpresscom201401plataforma-global--por-el-derecho-a-la-ciudad-avanzando-en-la-implementacic3b3n-del-derecho-a-la-ciudad-en-am-c3a9rica-latina-y-a-nivel-internacionalpdf gt Acesso em 30 jul 2015

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Sites

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Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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De qualquer forma apesar de toda a dificuldade de implementaccedilatildeo o Estatuto da Cidade anunciaum novo futuro sendo que parte do caminho jaacute foi percorrido Resta continuar a tarefa de colocaacute-lo empraacutetica o que natildeo eacute tarefa apenas do Estado e dos teacutecnicos eacute principalmente uma tarefa da sociedade

23 Direito agrave cidade no acircmbito internacional

Conforme jaacute foi abordado a mobilizaccedilatildeo e a proacutepria discussatildeo sobre o direito agrave cidade eacute umademanda recente e latente para as cidades de todo o mundo principalmente dos paiacuteses subdesen-volvidos que nas uacuteltimas deacutecadas vecircm apresentando um aumento significativo na taxa de urbani-zaccedilatildeo De acordo com a Divisatildeo de Informaccedilotildees e Relaccedilotildees Externas do Fundo de Populaccedilotildees da ONU(UNFPA) as cidades que apresentam as maiores aglomeraccedilotildees urbanas satildeo

CIDADE PAIacuteSES POPULACcedilAtildeO (milhotildees)

Toacutequio Japatildeo 367

Nova Decircli iacutendia 22

Satildeo Paulo Brasil 20

Bombaim iacutendia 20

do bem coletivo da seguranccedila e do bem-estar dos cidadatildeos bem como do equiliacutebrio ambientalTem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e da proprie-dade urbana Suas diretrizes abordam o uso do solo a regulaccedilatildeo da posse da terra e a poliacutetica

econocircmica e tributaacuteria estipulada pela Constituiccedilatildeo

Qual entidade federativa implementa o Estatuto da Cidade

Segundo o terceiro artigo do Estatuto da Cidade a implementaccedilatildeo da poliacutetica urbana eacute atri-buiccedilatildeo dos Municiacutepios e deve estar de acordo com as normas gerais estabelecidas pela Uniatildeo

Aleacutem de definir diretrizes sobre o desenvolvimento urbano o Estatuto da Cidade fornece instru-mentos para que a propriedade urbana cumpra sua funccedilatildeo social como Plano Diretor gestatildeoorccedilamentaacuteria participativa Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) desapropriaccedilatildeo conces-satildeo de uso especial para fins de moradia usucapiatildeo983094 especial de imoacutevel urbano outorga onerosa

do direito de construir e de alteraccedilatildeo de uso e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

De acordo com Maricato (2010) a implementaccedilatildeo do Estatuto da Cidade tem deixado muitoa desejar pois o padratildeo injusto e insustentaacutevel de ocupaccedilatildeo da terra urbana como visto eacute algohistoacuterico em nosso paiacutes e mesmo com a vigecircncia de regulamentos e normativas esse cenaacuterioainda natildeo mudou Isso ocorre por conta das forccedilas contraacuterias agrave implementaccedilatildeo da funccedilatildeo social dapropriedade presentes em parcela da sociedade civil e no interior dos trecircs poderes que tecircm usado

diversos artifiacutecios para protelar sua aplicaccedilatildeo Por outro lado governos municipais e vereadoresprogressistas vecircm apoiando-se na lei para transformar a realidade em diversos pontos do paiacutes

7 Refere-se ao direito agrave posse de um imoacutevel reconhecido pelo tempo de seu uso

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Sites

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Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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tabela 1 maiores aglomeraccedilotildees urbanas mundiais (UNFPA 2011 p 77 adaptado)

Na tabela 1 podemos observar que 80 das maiores aglomeraccedilotildees mundiais estaacute localiza-da em paiacuteses subdesenvolvidos Esse aumento populacional se realiza numa velocidade impres-sionante e traz consigo inuacutemeras violaccedilotildees de direitos humanos que se explicitam na dificulda-de de acesso agrave propriedade urbana aos serviccedilos e equipamentos puacuteblicos agrave infraestrutura etc

E como anda a efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade no mundo Quais satildeo as principais experiecircn-cias Vejamos a seguir um breve panorama8

8 Parte das informaccedilotildees foi extraiacuteda de Chueca e Allegretti (sd)

Espanha eacute um dos paiacuteses europeus com maior nuacutemero de governos locais que nos uacutel-timos 15 anos de forma mais ou menos transformadora tem levado a cabo accedilotildees poliacuteticas

baseadas nos direitos humanos Conta com ampla mobilizaccedilatildeo de seus cidadatildeos dos quaisemergem muitas reivindicaccedilotildees sobre o direito agrave cidade sobretudo em relaccedilatildeo agrave habitaccedilatildeo

Itaacutelia de acordo com a Plataforma Global do Direito agrave Cidade as principais reivindicaccedilotildeesse assemelham agraves das cidades latino-americanas uma vez que o debate estaacute em torno dos

direitos coletivos e em particular de bens comuns como aacutegua e espaccedilo puacuteblico

Reino Unido (Londres) semelhante agraves cidades italianas a experiecircncia de Londres mostraque eacute possiacutevel reconhecer direitos coletivos No entanto a realidade londrina faz referecircncia

agrave propriedade da terra e agrave habitaccedilatildeo e apresenta uma proposta de terras comunitaacuterias comopossibilidade de transgredir o paradigma da propriedade individual que eacute predominante namaioria das sociedades contemporacircneas

Turquia (Istambul) o debate aqui se relaciona agraves revoltas e levantes da populaccedilatildeo em2011 que passaram a reivindicar a modernizaccedilatildeo e o desenvolvimento da cidade

Alemanha (Hamburgo) lugar em que a luta pelo direito agrave cidade parece ter-se consolida-do em maior medida com ecircnfase na mobilizaccedilatildeo da comunidade artiacutestica e do setor culturalPor isso vem sendo cenaacuterio de vaacuterios encontros mundiais vinculados agrave temaacutetica

Cidade do Meacutexico Meacutexico 195

Nova York EUA 194

Xangai China 166Calcutaacute iacutendia 155

Daca Bangladesh 147

Carachi Paquistatildeo 13

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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Chile apresenta desenvolvimento urbano associado com crescimento imobiliaacuterio Ape-sar de o Ministeacuterio de Habitaccedilatildeo e Urbanismo prever accedilotildees baseadas em princiacutepios comointegraccedilatildeo sustentabilidade e competitividade na praacutetica o planejamento urbano vem pri-

vilegiando o poder poliacutetico e econocircmico de alguns setores fazendo com que os moradoresse adaptem agraves cidades e natildeo o contraacuterio Como resultado situaccedilotildees de conflitos e descon-tentamentos satildeo constantes

Eacute importante destacar que o direito agrave cidade eacute sobretudo uma demanda dos paiacuteses subdesen-volvidos considerando o descontrolado processo de urbanizaccedilatildeo pelo qual passaram nos uacuteltimostempos aleacutem do histoacuterico de colonizaccedilatildeo regimes autoritaacuterios e dependecircncia poliacutetico-econocircmica

dos paiacuteses imperialistas Portanto a realidade das cidades desses paiacuteses eacute marcada por inuacutemerasviolaccedilotildees o que cria um cenaacuterio em que satildeo inevitaacuteveis as lutas travadas pelos movimentos sociais

cujas reivindicaccedilotildees passam direta ou indiretamente por questotildees relativas ao direito agrave cidade Valeassim apresentar o contexto de trecircs paiacuteses latino-americanos

Estados Unidos (Nova York) a resistecircncia de comunidades locais ante as investidas especu-

lativas do capital imobiliaacuterio eacute um exemplo de luta pelo direito agrave cidade Caso emblemaacutetico eacute ode Chinatown ndash uma das comunidades mais antigas e referecircncia cultural da cidade ndash que se temmobilizado contra o projeto elitista de revitalizaccedilatildeo do East River em Manhattan

O direito agrave cidade eacute uma demanda internacional natildeo se limitando agrave realidade nacional (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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Conforme podemos observar o direito agrave cidade tem adquirido reconhecimento normativo ao pas-so que grupos e movimentos seguem reivindicando com maior intensidade a justiccedila social Contudo

interesses privados continuam a comandar o crescimento urbano influenciando o debate sobre a ocu-paccedilatildeo da terra urbana e a funccedilatildeo social da propriedade

A urbanizaccedilatildeo alcanccedilou seu estaacutegio global e eacute tratada como um negoacutecio lucrativo sendo coman-

dada sobretudo por Estados Unidos e China Este uacuteltimo inclusive vem apresentando mudanccedilas inter-nas significativas quanto ao processo de urbanizaccedilatildeo com o surgimento de grandes metroacutepoles (maisde cem cidades passaram da marca de 1 milhatildeo de habitantes a partir do ano 2000) o que possibilita aefetivaccedilatildeo de grandes projetos de infraestrutura (barragens e autoestradas)

No caso da Ameacuterica Latina vimos que as histoacutericas violaccedilotildees aos direitos humanos associadascom poliacuteticas puacuteblicas descontiacutenuas e descompassadas tecircm causado uma expansatildeo urbana desorde-nada com segregaccedilatildeo territorial e baseada em relaccedilotildees mercantis o que revela um contexto de desu-

manizaccedilatildeo e de estilos de vida marcados pelo consumismo individualismo e competitividade

O debate sobre o direito agrave cidade no mundo mostra que a questatildeo urbana natildeo eacute uma peculiaridade

brasileira e sim uma demanda internacional Os paracircmetros legais e normativos estabelecidos satildeo fun-damentais para legitimar possibilidades de transformaccedilatildeo dos territoacuterios vividos pois a cidade ainda eacuteum espaccedilo gerador de exploraccedilatildeo e desigualdade que permite a acumulaccedilatildeo de excedentes para unsem detrimento da pobreza de outros O direito agrave cidade deve ser concebido como direito coletivo e impli-

ca um processo de transformaccedilotildees que envolve ldquoo exerciacutecio de um poder coletivo de moldar o processode urbanizaccedilatildeo [e a] liberdade de construir e reconstruir a cidade e a noacutes mesmos (HARVEY 2012 p 74)Esse pode ser um pontapeacute inicial para alcanccedilarmos um mundo mais justo

Boliacutevia encontra-se num verdadeiro processo de reforma urbana Dentre as principais lutasestatildeo o direito agrave moradia o acesso seguro ao solo e melhor qualidade de vida Algumas mudan-

ccedilas foram conquistadas com a chegada de Evo Morales agrave Presidecircncia da Repuacuteblica especial-mente a nova Constituiccedilatildeo Poliacutetica do Estado boliviano que reconhece como direito humano amoradia adequada e serviccedilos baacutesicos como aacutegua potaacutevel esgoto e saneamento Aleacutem disso

com a nova Constituiccedilatildeo haacute o reconhecimento da propriedade coletiva da terra e a participaccedilatildeoda sociedade civil organizada no planejamento das poliacuteticas puacuteblicas (MAMANI 2009)

Colocircmbia a discussatildeo sobre o direito agrave cidade na Colocircmbia ndash segundo paiacutes mais po-puloso da Ameacuterica do Sul ndash se iniciou na deacutecada de 1960 por meio de debates entre urba-nistas representantes do mercado imobiliaacuterio e da construccedilatildeo civil e movimentos sociaiscujas principais reivindicaccedilotildees eram controle estatal da terra regulaccedilatildeo urbana na adoccedilatildeo

de mecanismos para combater a retenccedilatildeo dos terrenos urbanizados pelo setor imobiliaacuterioformulaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo mecanismos de financiamento e de recuperaccedilatildeoda mais-valia urbana Tais pautas foram contempladas quase 30 anos depois com baseem leis baacutesicas que definem o direito urbaniacutestico e combinam reforma urbana com fortale-cimento do planejamento territorial buscando conciliar poliacuteticas urbanas e sociais

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Referecircncias

Livros artigos teses dissertaccedilotildeesBONDUKI N amp ROSSETO R ldquoO plano nacional de habitaccedilatildeo e os recursospara financiar a autogestatildeordquo Proposta vol 32 n 116 Rio de Janeiro 2008

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CARLOS AFA O espaccedilo urbano novos escritos sobre a cidade Satildeo Paulo FFLCH 2007a

______ O lugar nodo mundo Satildeo Paulo FFLCH 2007b

DEGENSZAJN R R ldquoProcessos de articulaccedilatildeo na perspectiva socioterritorialrdquo In ARREGUI C C amp BLA-NES D N (orgs) Metodologia de Trabalho Social Satildeo Paulo IEEPUC-SP 2008

GOHN M G M ldquoO futuro das cidadesrdquo Nas Redes da Educaccedilatildeo vol 1 sl 2000 p 1-7 Disponiacutevel emltwwwlitefeunicampbrrevistagohnhtmlgt Acesso em 30 jul 2015

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HARVEY D ldquoO direito agrave cidaderdquo Lutas Sociais n 29 Satildeo Paulo juldez 2012 p 73-89

KOWARICK L Escritos urbanos Satildeo Paulo Editora 34 2000

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LI B Y LEONG A VITIELLO D amp ACOCA A Chinatown Then and Now Gentrification in Boston NewYork and Philadelphia New York AALDEF 2013

MARICATO E ldquoMetroacutepole legislaccedilatildeo e desigualdaderdquo Estudos Avanccedilados vol 17 n 48 Satildeo Paulomaiago 2003 p 150-167

______ ldquoO Estatuto da cidade perifeacutericardquo In CARVALHO C S amp ROSSBACH A (orgs) O estatuto dacidade comentado Satildeo Paulo Ministeacuterio das CidadesAlianccedila das Cidades 2010

ROLNIK R O que eacute cidade Satildeo Paulo Brasiliense 1995

SANTORO P F ldquoO desafio de planejar e produzir expansatildeo urbana com qualidade a experiecircncia colom-biana dos Planos Parciais em Bogotaacute Colocircmbiardquo Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionaisvol 13 n 1 Recife mai 2011 p 91-115

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SANTOS M A urbanizaccedilatildeo brasileira Satildeo Paulo Hucitec 1993

SOUZA T C S Corticcedilos em Satildeo Paulo programasvistoriasrelatos 303f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em

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Mateacuterias de imprensa blogs sites documentos

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CODHES ldquoLa crisis humanitaria en Colombia persiste El Paciacutefico en disputa Informe de desplazia-mento forzado en 2012rdquo Documentos CODHES n 26 Bogotaacute 2013 Disponiacutevel em ltwwwlwfcolom-biaorgcositesdefaultfilesimage31051320Informe2020desplazamiento202012pdfgt

Acesso em 3 ago 2015

FONSECA F ldquoOs grandes e poucos divulgados avanccedilos do governo Haddadrdquo Poliacutetica Carta Maior 20abr 2014 Disponiacutevel em ltwwwcartamaiorcombrEditoriaPoliticaOs-grandes-e-pouco-divulga-dos-avancos-do-governo-Haddad430759gt Acesso em 3 ago 2015

MAMANI U R ldquoO caminho do direito agrave cidade na Boliacuteviardquo Diaacutelogos propostas histoacuterias para uma cida-dania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche-dph-8586htmlgtAcesso em 3 ago 2015

ROLNIK R ldquoImobilidade na cidade de Satildeo Paulo o problema e o falso problemardquo Blog da Raquel Rol-nik 17 mar 2011 Disponiacutevel em lthttpsraquelrolnikwordpresscom20110317imobilidade-na-ci-dade-de-sao-paulo-o-problema-e-o-falso-problemagt Acesso em 3 ago 2015

ROMEIRO P GUIMARAtildeES I M S S G amp KOETZ V ldquoDerecho a la Ciudad en Ameacuterica Latinardquo In SAU-LE JR N ZAacuteRATE L amp EMANUELLI M S (coords) Avanzando en la Implementacioacuten del Derecho ala Ciudad en Ameacuterica Latina y a nivel Internacional Sl Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade sdDisponiacutevel em lthttpsderechoalaciudadflacsofileswordpresscom201401plataforma-global--por-el-derecho-a-la-ciudad-avanzando-en-la-implementacic3b3n-del-derecho-a-la-ciudad-en-am-c3a9rica-latina-y-a-nivel-internacionalpdf gt Acesso em 30 jul 2015

SAULE JR N ldquoO direito agrave cidade como paradigma da governanccedila urbanardquo Instituto Poacutelis 30 mar 2005Disponiacutevel em ltwwwpolisorgbruploads750750pdfgt Acesso em 3 ago 2015

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SAULE JR N amp UZZO K ldquoA trajetoacuteria da reforma urbana no Brasilrdquo Diaacutelogos propostas histoacuteriaspara uma cidadania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche--dph-8583htmlgt Acesso em 3 ago 2015

UNFPA Relatoacuterio sobre a situaccedilatildeo da populaccedilatildeo mundial 2011 New York UNFPA 2011 Disponiacutevel emltwwwuncvfilesPT-SWOP11-WEBpdfgt Acesso em 11 ago 2015

VERIacuteSSIMO A A ldquoPorque fomos a Medelliacuten e Bogotaacuterdquo Agrave beira do urbanismo 12 mar 2012 Disponiacutevelem lthttpabeiradourbanismoblogspotcombr201203porque-fomos-medellin-e-bogotahtmlgtAcesso em 3 ago 2015

Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) na Avenida Paulista (creacutedito Rafael NeddermeyerFotos Puacuteblicas)

Museu do Ipiranga (creacutedito Joseacute RosaelUSP Imagens)

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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SAULE JR N amp UZZO K ldquoA trajetoacuteria da reforma urbana no Brasilrdquo Diaacutelogos propostas histoacuteriaspara uma cidadania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche--dph-8583htmlgt Acesso em 3 ago 2015

UNFPA Relatoacuterio sobre a situaccedilatildeo da populaccedilatildeo mundial 2011 New York UNFPA 2011 Disponiacutevel emltwwwuncvfilesPT-SWOP11-WEBpdfgt Acesso em 11 ago 2015

VERIacuteSSIMO A A ldquoPorque fomos a Medelliacuten e Bogotaacuterdquo Agrave beira do urbanismo 12 mar 2012 Disponiacutevelem lthttpabeiradourbanismoblogspotcombr201203porque-fomos-medellin-e-bogotahtmlgtAcesso em 3 ago 2015

Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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3 Implementaccedilatildeo do direito

agrave cidade no municiacutepiode Satildeo Paulo

Dentre as diversas experiecircncias municipais que vecircm buscando contemplar o

direito agrave cidade verifica-se a predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacuteticaexpressos na construccedilatildeo de conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas (comofoacuteruns e outros espaccedilos de consulta popular) Haacute tambeacutem o Orccedilamento Participati-

vo (OP) e o uso da tecnologia social implementado inicialmente na cidade de PortoAlegre e posteriormente em Belo Horizonte Recife Porto Alegre Diadema Santo

Andreacute e outras prefeituras brasileiras

Em Satildeo Paulo as questotildees relativas ao direito agrave cidade partiram inicialmente da gestatildeode Luiza Erundina (1989-1992) considerada a primeira administraccedilatildeo democraacutetica popular da

cidade Entretanto eacute importante salientar que o exerciacutecio desse direito compreende um parado-xo realiza-se entre avanccedilos e retrocessos o que torna impossiacutevel a definiccedilatildeo de uma trajetoacuteria

cronoloacutegica ou associaccedilatildeo direta com cada uma das gestotildees que estiveram na administraccedilatildeo dacidade De fato todo territoacuterio apresenta disputas e interesses poliacuteticos e econocircmicos conflitan-tes Assim revela-se mobilizaccedilotildees de diversos setores sobretudo daqueles ligados agrave utilizaccedilatildeo

As ocupaccedilotildees representam a luta dos movimentos por moradia por um direito baacutesico a habitaccedilatildeo (creacutedito Marcelo

CamargoAgecircncia Brasil)

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Referecircncias

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______ O lugar nodo mundo Satildeo Paulo FFLCH 2007b

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MAMANI U R ldquoO caminho do direito agrave cidade na Boliacuteviardquo Diaacutelogos propostas histoacuterias para uma cida-dania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche-dph-8586htmlgtAcesso em 3 ago 2015

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ROMEIRO P GUIMARAtildeES I M S S G amp KOETZ V ldquoDerecho a la Ciudad en Ameacuterica Latinardquo In SAU-LE JR N ZAacuteRATE L amp EMANUELLI M S (coords) Avanzando en la Implementacioacuten del Derecho ala Ciudad en Ameacuterica Latina y a nivel Internacional Sl Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade sdDisponiacutevel em lthttpsderechoalaciudadflacsofileswordpresscom201401plataforma-global--por-el-derecho-a-la-ciudad-avanzando-en-la-implementacic3b3n-del-derecho-a-la-ciudad-en-am-c3a9rica-latina-y-a-nivel-internacionalpdf gt Acesso em 30 jul 2015

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SAULE JR N amp UZZO K ldquoA trajetoacuteria da reforma urbana no Brasilrdquo Diaacutelogos propostas histoacuteriaspara uma cidadania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche--dph-8583htmlgt Acesso em 3 ago 2015

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VERIacuteSSIMO A A ldquoPorque fomos a Medelliacuten e Bogotaacuterdquo Agrave beira do urbanismo 12 mar 2012 Disponiacutevelem lthttpabeiradourbanismoblogspotcombr201203porque-fomos-medellin-e-bogotahtmlgtAcesso em 3 ago 2015

Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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9 Com recursos do orccedilamento municipal 10 Segundo a Prefeitura de Satildeo Paulo 900 das 1570 favelas da cidade (2 do territoacuterio do municiacutepio ou

1500 quilocircmetros quadrados) satildeo aacutereas puacuteblicas municipais

31 A poliacutetica habitacional no municiacutepio

Em termos de poliacutetica habitacional destaca-se em Satildeo Paulo a tentativa de regularizaccedilatildeo

de favelas na gestatildeo de Luiza Erundina Em 1990 por meio do Projeto de Lei no 51 foi indicadaa concessatildeo de uso para aacutereas ocupadas por favelas que na eacutepoca somavam 135 nuacutecleos com31 mil famiacutelias em 253 hectares De acordo com Patriacutecia Cardoso (2010) essa iniciativa de for-

ma pioneira buscava implementar uma mudanccedila de paradigma no papel do municiacutepio ante oproblema das irregularidades no uso do solo urbano No entanto o projeto natildeo foi aprovado eas iniciativas de regularizaccedilatildeo foram retomadas apenas nos anos 2000 apoacutes a aprovaccedilatildeo doEstatuto da Cidade por meio da Lei no 13514 de 16 de janeiro de 2003 que implementou a con-cessatildeo de uso especial para fins de moradia

Apesar dessa derrota o governo de Erundina conseguiu conduzir a poliacutetica habitacional combase na parceria com movimentos de moradia Desse modo foi viabilizada a criaccedilatildeo do Fundo deAtendimento agrave Populaccedilatildeo Moradora em Habitaccedilatildeo Subnormal (FUNAPS)983097 destinado ao finan-ciamento de programas ineacuteditos como os mutirotildees autogeridos a produccedilatildeo de moradia social

nas aacutereas centrais e a assistecircncia juriacutedica gratuita agrave moradia popular (BONDUKI amp ROSSETO2008 p 34) Essa experiecircncia resultou no Programa de Regularizaccedilatildeo Urbaniacutestica e Fundiaacuteria deFavelas em aacutereas puacuteblicas municipais sendo integrado ao Programa Bairro Legal desenvolvidopela Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Conforme Cardoso (2010 p 217) as accedilotildees em aacutereas puacuteblicas municipais compreenderam a ur-banizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo de favelas O objetivo do programa era reconhecer a funccedilatildeo social dapropriedade de 160 aacutereas puacuteblicas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda assegurando agraves 46 milfamiacutelias o direito agrave posse por meio dos Termos de Concessatildeo de Uso para Fins de Moradia e de Con-cessatildeo de Direito Real de Uso O programa teve continuidade em gestotildees seguintes sendo ampliado

em 2008 na gestatildeo de Kassab983089983088 A primeira etapa (Lei no 135412003) tratou da desafetaccedilatildeo e regu-larizaccedilatildeo de 160 aacutereas puacuteblicas a segunda (Lei no 146652008) de outras 108 aacutereas puacuteblicas

Entretanto a consolidaccedilatildeo de uma poliacutetica de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria na cidade de Satildeo Pau-lo natildeo impediu uma seacuterie de accedilotildees higienistas que resultaram na expulsatildeo dos pobres do centro

da cidade como negoacutecio lucrativo cenaacuterio de megaprojetos como as grandes obras viaacuterias eimobiliaacuterias que geram um imenso impacto socioterritorial

Especialmente na deacutecada de 1990 a regiatildeo sudoeste da cidade foi beneficiada com abun-dantes investimentos puacuteblicos e privados enquanto outras regiotildees ficaram distantes de umahabitaccedilatildeo de qualidade saneamento baacutesico e transporte puacuteblico eficientes Com base nessecenaacuterio de desigualdade haacute inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pelasociedade para fazer valer o direito agrave cidade como um direito humano reconhecendo o espaccedilo

puacuteblico como bem coletivo justo e democraacutetico

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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VERIacuteSSIMO A A ldquoPorque fomos a Medelliacuten e Bogotaacuterdquo Agrave beira do urbanismo 12 mar 2012 Disponiacutevelem lthttpabeiradourbanismoblogspotcombr201203porque-fomos-medellin-e-bogotahtmlgtAcesso em 3 ago 2015

Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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Ainda eacute um desafio efetivar em niacutevel municipal uma discussatildeo consistente com possibilidadede mudanccedilas nos rumos da poliacutetica de habitaccedilatildeo Eacute um desafio desvincular esse debate do acesso agrave

propriedade privada individual em virtude do jogo de forccedilas e interesses poliacuteticos e econocircmicos quepermeiam tal relaccedilatildeo em acircmbito internacional Estamos falando da era do capital financeiro e dapoliacutetica de orientaccedilatildeo neoliberal Haacute um contexto em que territoacuterios e modelos de cidade estatildeo emdisputa Assim apesar de uma seacuterie de accedilotildees do poder puacuteblico municipal oriunda de pressotildees exer-

cidas pelos movimentos populares que buscavam a implementaccedilatildeo do direito agrave cidade Satildeo Pauloconvive com o avanccedilo do mercado imobiliaacuterio inclusive apoiado por accedilotildees estatais Estas culminam

diariamente no despejo de famiacutelias sob o pretexto de ocuparem aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo am-biental ou com base em alguma intervenccedilatildeo urbana11 Parte importante na disputa pelo territoacuterio eacuterealizada via regulamentaccedilatildeo de ordenamento territorial

Desde o iniacutecio dos anos 1980 segundo Paulo Romeiro Irene Guimaratildees e Vanessa Koetz(sd) os movimentos populares por habitaccedilatildeo em cidades como Recife Belo Horizonte e Porto

Alegre adotaram a mesma estrateacutegia do mercado imobiliaacuterio ou seja utilizar o instrumento dezoneamento para reservar aacutereas para moradia social mediante demarcaccedilatildeo das chamadas Zo-nas Especiais de Interesse Social (ZEIS) Em Satildeo Paulo a despeito dos experimentos pioneirosde demarcaccedilatildeo de aacutereas da cidade que tiveram iniacutecio nos anos 1980 somente apoacutes 20 anos amobilizaccedilatildeo popular conseguiu garantir a delimitaccedilatildeo de ZEIS no zoneamento municipal pormeio do Plano Diretor Estrateacutegico (PDE) de 2002

Na praacutetica apesar da implementaccedilatildeo das ZEIS 2 e 3 que prevecirc aacutereas para moradias deinteresse social e para o comeacutercio popular essa reserva tem sido apropriada pelo mercado imo-

biliaacuterio Por serem destinados a quem recebe mais de cinco salaacuterios miacutenimos impede o acessoagrave moradia por aqueles que recebem ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos que satildeo os que mais demandam

essa poliacutetica Nesse sentido o movimento popular de moradia e as entidades que lutam pelareforma urbana no municiacutepio tecircm feito propostas para o Plano Diretor para que as ZEIS possam

de Satildeo Paulo e outras aacutereas de interesse do mercado imobiliaacuterio (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KO-ETZ sd) Cabe mencionar a luta dos movimentos de moradia do centro da cidade pela melhoriadas condiccedilotildees de vida nos corticcedilos e pela implementaccedilatildeo de uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e serviccedilos

sociais para pessoas de baixa renda na aacuterea central de Satildeo Paulo onde estatildeo concentrados em-pregos e infraestrutura urbana

A primeira lei que trata da possibilidade de intervenccedilatildeo do poder puacuteblico nos corticcedilos em Satildeo

Paulo eacute a Lei no 10928 de 1991 conhecida como Lei Moura De acordo com Thais Souza (2011 p 68)nas gestotildees de Paulo Maluf e Celso Pitta (1993-2001) houve interrupccedilatildeo de programas habitacionaispara a populaccedilatildeo de corticcedilos e de obras iniciadas anteriormente Tal descaso teve como contrapartidainuacutemeras manifestaccedilotildees destinadas a pressionar o governo municipal para que fosse retomada aquestatildeo da habitaccedilatildeo nos corticcedilos e para que o governo estadual iniciasse um programa que resol-

vesse essa situaccedilatildeo Contudo as accedilotildees de manejo realizadas durante 1989-1992 soacute foram retomadasna gestatildeo de 2001-2004 da entatildeo prefeita Marta Suplicy

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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atender exclusivamente a populaccedilatildeo que recebe ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos assegurando umaporcentagem para as famiacutelias que ganham na faixa de ateacute dois salaacuterios miacutenimos

De fato Romeiro Guimaratildees e Koetz (sd) afirmam que a demarcaccedilatildeo de ZEIS natildeogarante a reserva de terras para moradia popular 12 Assim num contexto de disputa peloterritoacuterio e de uma poliacutetica urbana que natildeo enfrenta a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria nem reduz odeacuteficit habitacional as ocupaccedilotildees dos imoacuteveis vazios tendem a crescer em Satildeo Paulo Essenatildeo eacute um fenocircmeno novo em Satildeo Paulo jaacute que vem ocorrendo haacute deacutecadas como estrateacutegia

de luta pelo direito agrave cidade O aumento dessa forma de luta pode ser compreendido comoconscientizaccedilatildeo da populaccedilatildeo sobre o direito agrave cidade que deve ser reivindicado quando natildeoeacute garantido pelo Estado

Em decorrecircncia desse quadro a gestatildeo de Fernando Haddad assumiu a administraccedilatildeomunicipal em 2013 com um deacuteficit de 670 mil domiciacutelios e se baseia nas seguintes estrateacute-gias para revertecirc-lo

bull tentativa de implementar o IPTU progressivobull realizaccedilatildeo de Parcerias Puacuteblicos Privadas (PPP) para a construccedilatildeo de moradias populares

no centro de Satildeo Paulobull definiccedilatildeo de ZEIS para implantaccedilatildeo de projetos habitacionais populares

11As accedilotildees de higienizaccedilatildeo realizadas pela Prefeitura de Satildeo Paulo na gestatildeo Joseacute SerraGilberto Kassab (2005-2008) na regiatildeo central da cidade signi-

ficaram a violaccedilatildeo dos direitos humanos em suas vaacuterias dimensotildees e estatildeo identificadas detalhadamente em um dossiecirc produzido pelo Foacuterum Centro

Vivo intitulado Violaccedilotildees dos direitos humanos no centro de Satildeo Paulo propostas e reinvindicaccedilotildees para poliacuteticas puacuteblicas 12 No processo de revisatildeo

do Plano Diretor realizado em 2013 houve grandes reclamaccedilotildees de ZEIS apropriadas pelo mercado imobiliaacuterio para empreendimentos de finalidade

distinta da prevista

Vereadores debatem com moradores demarcaccedilatildeo de ZEIS - Zona Especial de Interesse Social (creacutedito Faacutebio LazzariCacircmara

Municipal de Satildeo Paulo)

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32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Referecircncias

Livros artigos teses dissertaccedilotildeesBONDUKI N amp ROSSETO R ldquoO plano nacional de habitaccedilatildeo e os recursospara financiar a autogestatildeordquo Proposta vol 32 n 116 Rio de Janeiro 2008

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CARLOS AFA O espaccedilo urbano novos escritos sobre a cidade Satildeo Paulo FFLCH 2007a

______ O lugar nodo mundo Satildeo Paulo FFLCH 2007b

DEGENSZAJN R R ldquoProcessos de articulaccedilatildeo na perspectiva socioterritorialrdquo In ARREGUI C C amp BLA-NES D N (orgs) Metodologia de Trabalho Social Satildeo Paulo IEEPUC-SP 2008

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KOWARICK L Escritos urbanos Satildeo Paulo Editora 34 2000

LEFEBVRE H O direito agrave cidade Trad de Rubens Eduardo Frias Satildeo Paulo Centauro 2001

LI B Y LEONG A VITIELLO D amp ACOCA A Chinatown Then and Now Gentrification in Boston NewYork and Philadelphia New York AALDEF 2013

MARICATO E ldquoMetroacutepole legislaccedilatildeo e desigualdaderdquo Estudos Avanccedilados vol 17 n 48 Satildeo Paulomaiago 2003 p 150-167

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ROLNIK R O que eacute cidade Satildeo Paulo Brasiliense 1995

SANTORO P F ldquoO desafio de planejar e produzir expansatildeo urbana com qualidade a experiecircncia colom-biana dos Planos Parciais em Bogotaacute Colocircmbiardquo Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionaisvol 13 n 1 Recife mai 2011 p 91-115

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SANTOS M A urbanizaccedilatildeo brasileira Satildeo Paulo Hucitec 1993

SOUZA T C S Corticcedilos em Satildeo Paulo programasvistoriasrelatos 303f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em

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Mateacuterias de imprensa blogs sites documentos

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CODHES ldquoLa crisis humanitaria en Colombia persiste El Paciacutefico en disputa Informe de desplazia-mento forzado en 2012rdquo Documentos CODHES n 26 Bogotaacute 2013 Disponiacutevel em ltwwwlwfcolom-biaorgcositesdefaultfilesimage31051320Informe2020desplazamiento202012pdfgt

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FONSECA F ldquoOs grandes e poucos divulgados avanccedilos do governo Haddadrdquo Poliacutetica Carta Maior 20abr 2014 Disponiacutevel em ltwwwcartamaiorcombrEditoriaPoliticaOs-grandes-e-pouco-divulga-dos-avancos-do-governo-Haddad430759gt Acesso em 3 ago 2015

MAMANI U R ldquoO caminho do direito agrave cidade na Boliacuteviardquo Diaacutelogos propostas histoacuterias para uma cida-dania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche-dph-8586htmlgtAcesso em 3 ago 2015

ROLNIK R ldquoImobilidade na cidade de Satildeo Paulo o problema e o falso problemardquo Blog da Raquel Rol-nik 17 mar 2011 Disponiacutevel em lthttpsraquelrolnikwordpresscom20110317imobilidade-na-ci-dade-de-sao-paulo-o-problema-e-o-falso-problemagt Acesso em 3 ago 2015

ROMEIRO P GUIMARAtildeES I M S S G amp KOETZ V ldquoDerecho a la Ciudad en Ameacuterica Latinardquo In SAU-LE JR N ZAacuteRATE L amp EMANUELLI M S (coords) Avanzando en la Implementacioacuten del Derecho ala Ciudad en Ameacuterica Latina y a nivel Internacional Sl Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade sdDisponiacutevel em lthttpsderechoalaciudadflacsofileswordpresscom201401plataforma-global--por-el-derecho-a-la-ciudad-avanzando-en-la-implementacic3b3n-del-derecho-a-la-ciudad-en-am-c3a9rica-latina-y-a-nivel-internacionalpdf gt Acesso em 30 jul 2015

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Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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Direito agrave Cidade | 31

32 Nova agenda de direitos humanos na cidade de Satildeo Paulo

A Prefeitura de Satildeo Paulo ao implementar uma nova agenda de direitos humanos na gestatildeo2012-201613 entende que a promoccedilatildeo das liberdades e o exerciacutecio da cidadania satildeo princiacutepios fun-

damentais para a desconstruccedilatildeo da cultura de violaccedilotildees Com esse intuito a criaccedilatildeo da Coordena-ccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade ndash que deve ser compreendida no contexto das grandes ma-nifestaccedilotildees de junho de 2013 sobre a mobilidade urbana ndash representa uma resposta da SecretariaMunicipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) agraves diversas formas de violaccedilatildeo dos direitoshumanos e de cerceamento da cidadania e da liberdade promovidas pelas uacuteltimas gestotildees bemcomo adota uma poliacutetica de incentivo agrave ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico

Assim possui os seguintes objetivosbull estabelecer uma poliacutetica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico urbano voltada para a promoccedilatildeo

de uma cultura de afirmaccedilatildeo de garantia dos direitos humanos e da cidadania nas ruasbull promover a mobilizaccedilatildeo e a territorializaccedilatildeo da poliacutetica de direitos humanos e de partici-

paccedilatildeo social na cidade de Satildeo Paulo pela ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadaniabull favorecer a ressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico compreendido como espaccedilo de encontro

dos diferentes e da explicitaccedilatildeo dos conflitos

bull responder agraves demandas de coletivos movimentos e pessoas que organizam iniciativasde intervenccedilatildeo urbana

bull fortalecer as diferentes iniciativas de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania enten-didas como forma inovadora e natildeo institucionalizada de participaccedilatildeo social

bull fomentar a retomada do sentido puacuteblico da cidade do espaccedilo de encontro e conviacuteviogarantindo a promoccedilatildeo da pluralidade e da diversidade

bull apoiar a construccedilatildeo do sentimento de pertencimento agrave cidade

O anseio poliacutetico desta gestatildeo puacuteblica municipal eacute colaborar para a construccedilatildeo de respostas

plurais criativas e soacutelidas de forma a partilhar a riqueza da cidade mais igualitariamente su-gerindo como alternativa concreta o desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas intersetoriais como apoio do governo federal e do setor privado Nesse sentido o direito agrave cidade compreendidohistoricamente como acesso aos bens e serviccedilos puacuteblicos amplia e soma-se ao desafio de ga-

rantir os direitos humanos

A SMDHC ao estabelecer o direito agrave cidade como diretriz reconhece que a poliacutetica de direitoshumanos em Satildeo Paulo passa necessariamente por assumir nos termos de Lefebvre e Harvey ascontradiccedilotildees do modo de produzir e pensar nos grandes centros urbanos Por isso prioriza poliacuteticaspuacuteblicas de combate agrave cultura privatista e agraves violaccedilotildees de direitos humanos Mais do que o direito

aos bens puacuteblicos produzidos pelas cidades a concepccedilatildeo aqui apresentada reivindica o direito agravecidade por meio daquilo que sintetiza o Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico Pela Cidadania odireito de estar e criar a cidade a ocupar os espaccedilos puacuteblicos e reinventar formas de usos e fluxosno espaccedilo urbano

13 As informaccedilotildees foram extraiacutedas do site da Prefeitura Municipal de Satildeo Paulo (PMSP) Disponiacutevel em ltwwwprefeituraspgovbrcidade

secretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadecoordenacaoindexphpp=165799gt Acesso em 13 ago 2015

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Referecircncias

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CARLOS AFA O espaccedilo urbano novos escritos sobre a cidade Satildeo Paulo FFLCH 2007a

______ O lugar nodo mundo Satildeo Paulo FFLCH 2007b

DEGENSZAJN R R ldquoProcessos de articulaccedilatildeo na perspectiva socioterritorialrdquo In ARREGUI C C amp BLA-NES D N (orgs) Metodologia de Trabalho Social Satildeo Paulo IEEPUC-SP 2008

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KOWARICK L Escritos urbanos Satildeo Paulo Editora 34 2000

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LI B Y LEONG A VITIELLO D amp ACOCA A Chinatown Then and Now Gentrification in Boston NewYork and Philadelphia New York AALDEF 2013

MARICATO E ldquoMetroacutepole legislaccedilatildeo e desigualdaderdquo Estudos Avanccedilados vol 17 n 48 Satildeo Paulomaiago 2003 p 150-167

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SANTORO P F ldquoO desafio de planejar e produzir expansatildeo urbana com qualidade a experiecircncia colom-biana dos Planos Parciais em Bogotaacute Colocircmbiardquo Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionaisvol 13 n 1 Recife mai 2011 p 91-115

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SANTOS M A urbanizaccedilatildeo brasileira Satildeo Paulo Hucitec 1993

SOUZA T C S Corticcedilos em Satildeo Paulo programasvistoriasrelatos 303f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em

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MAMANI U R ldquoO caminho do direito agrave cidade na Boliacuteviardquo Diaacutelogos propostas histoacuterias para uma cida-dania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche-dph-8586htmlgtAcesso em 3 ago 2015

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ROMEIRO P GUIMARAtildeES I M S S G amp KOETZ V ldquoDerecho a la Ciudad en Ameacuterica Latinardquo In SAU-LE JR N ZAacuteRATE L amp EMANUELLI M S (coords) Avanzando en la Implementacioacuten del Derecho ala Ciudad en Ameacuterica Latina y a nivel Internacional Sl Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade sdDisponiacutevel em lthttpsderechoalaciudadflacsofileswordpresscom201401plataforma-global--por-el-derecho-a-la-ciudad-avanzando-en-la-implementacic3b3n-del-derecho-a-la-ciudad-en-am-c3a9rica-latina-y-a-nivel-internacionalpdf gt Acesso em 30 jul 2015

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Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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33 Gestatildeo democraacutetica da cidade

Considerada um dos pilares para efetivaccedilatildeo do direito agrave cidade a gestatildeo democraacutetica eacuteestabelecida no Estatuto da Cidade como a ldquo[] participaccedilatildeo da populaccedilatildeo e das associaccedilotildeesrepresentativas dos vaacuterios segmentos da comunidade na formulaccedilatildeo execuccedilatildeo e acompanha-mento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbanordquo (BRASIL 2001) Sua reali-zaccedilatildeo se daacute por meio dos seguintes instrumentos baacutesicos oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano ini-ciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Compotildeem a gestatildeo democraacutetica

bull Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo (CMH) criado em 2002 pela Lei no 13425 tem caraacuteterconsultivo fiscalizador e deliberativo Eacute norteado pela ideia de paridade em relaccedilatildeo agrave representa-ccedilatildeo do poder puacuteblico movimentos populares por moradia e sociedade civil Satildeo eleitos 16 repre-

sentantes de entidades populares de moradia 16 da sociedade civil (universidades e sindicatospor exemplo) e 16 representantes do poder puacuteblico (municipal estadual e federal) Os conselheirosinfluenciam as accedilotildees da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Podem decidir por exemplosobre a destinaccedilatildeo de recursos para construccedilotildees de mutirotildees conjuntos habitacionais regulariza-ccedilotildees fundiaacuterias e programa de urbanizaccedilatildeo de favelas O CMH se estabeleceu efetivamente entre

2003 e 2011 e foi um importante espaccedilo de debate e resoluccedilatildeo sobre a poliacutetica de habitaccedilatildeo Em2012 deixou de funcionar devido agrave decisatildeo judicial que suspendeu seu processo eleitoral conside-

rado irregular Voltou agraves atividades em 2014

bull Conselho Municipal de Poliacutetica Urbana (CMPU) oacutergatildeo de controle social e participaccedilatildeopopular no desenvolvimento urbano e tem caraacuteter consultivo Era composto desde a uacuteltima ges-tatildeo por representantes da sociedade civil mediante eleiccedilatildeo e por indicaccedilatildeo do governo Atualmen-te a escolha dos representantes eacute feita somente por eleiccedilatildeo

bull Conselho da Cidade de Satildeo Paulo criado pelo Governo Haddad eacute um oacutergatildeo consultivo etem como objetivo o cumprimento de compromissos legitimados democraticamente pelos paulis-

tanos Com essa iniciativa a gestatildeo atual busca construir novos canais de diaacutelogo e participaccedilatildeosocial e estabelecer relaccedilotildees baseadas nos princiacutepios republicanos Suas accedilotildees devem ampliar acapacidade do poder puacuteblico de atender aos interesses da populaccedilatildeo melhorar a qualidade de vidano presente e antecipar as condiccedilotildees para um futuro compatiacutevel com as necessidades da metroacute-pole O conselho assessora o prefeito na formulaccedilatildeo de poliacuteticas e diretrizes especiacuteficas aleacutem deapresentar propostas de poliacuteticas puacuteblicas e reformas estruturais para tornar Satildeo Paulo uma cida-

de mais humana justa e igualitaacuteria

Conselho da Cidade de Satildeo Paulo

httpconselhodacidadeprefeituraspgovbrindexphpsobre-o-conselho

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Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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34 | Cadernos de Formaccedilatildeo

Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Referecircncias

Livros artigos teses dissertaccedilotildeesBONDUKI N amp ROSSETO R ldquoO plano nacional de habitaccedilatildeo e os recursospara financiar a autogestatildeordquo Proposta vol 32 n 116 Rio de Janeiro 2008

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CARLOS AFA O espaccedilo urbano novos escritos sobre a cidade Satildeo Paulo FFLCH 2007a

______ O lugar nodo mundo Satildeo Paulo FFLCH 2007b

DEGENSZAJN R R ldquoProcessos de articulaccedilatildeo na perspectiva socioterritorialrdquo In ARREGUI C C amp BLA-NES D N (orgs) Metodologia de Trabalho Social Satildeo Paulo IEEPUC-SP 2008

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KOWARICK L Escritos urbanos Satildeo Paulo Editora 34 2000

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MARICATO E ldquoMetroacutepole legislaccedilatildeo e desigualdaderdquo Estudos Avanccedilados vol 17 n 48 Satildeo Paulomaiago 2003 p 150-167

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ROLNIK R O que eacute cidade Satildeo Paulo Brasiliense 1995

SANTORO P F ldquoO desafio de planejar e produzir expansatildeo urbana com qualidade a experiecircncia colom-biana dos Planos Parciais em Bogotaacute Colocircmbiardquo Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionaisvol 13 n 1 Recife mai 2011 p 91-115

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SANTOS M A urbanizaccedilatildeo brasileira Satildeo Paulo Hucitec 1993

SOUZA T C S Corticcedilos em Satildeo Paulo programasvistoriasrelatos 303f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em

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Mateacuterias de imprensa blogs sites documentos

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CODHES ldquoLa crisis humanitaria en Colombia persiste El Paciacutefico en disputa Informe de desplazia-mento forzado en 2012rdquo Documentos CODHES n 26 Bogotaacute 2013 Disponiacutevel em ltwwwlwfcolom-biaorgcositesdefaultfilesimage31051320Informe2020desplazamiento202012pdfgt

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FONSECA F ldquoOs grandes e poucos divulgados avanccedilos do governo Haddadrdquo Poliacutetica Carta Maior 20abr 2014 Disponiacutevel em ltwwwcartamaiorcombrEditoriaPoliticaOs-grandes-e-pouco-divulga-dos-avancos-do-governo-Haddad430759gt Acesso em 3 ago 2015

MAMANI U R ldquoO caminho do direito agrave cidade na Boliacuteviardquo Diaacutelogos propostas histoacuterias para uma cida-dania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche-dph-8586htmlgtAcesso em 3 ago 2015

ROLNIK R ldquoImobilidade na cidade de Satildeo Paulo o problema e o falso problemardquo Blog da Raquel Rol-nik 17 mar 2011 Disponiacutevel em lthttpsraquelrolnikwordpresscom20110317imobilidade-na-ci-dade-de-sao-paulo-o-problema-e-o-falso-problemagt Acesso em 3 ago 2015

ROMEIRO P GUIMARAtildeES I M S S G amp KOETZ V ldquoDerecho a la Ciudad en Ameacuterica Latinardquo In SAU-LE JR N ZAacuteRATE L amp EMANUELLI M S (coords) Avanzando en la Implementacioacuten del Derecho ala Ciudad en Ameacuterica Latina y a nivel Internacional Sl Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade sdDisponiacutevel em lthttpsderechoalaciudadflacsofileswordpresscom201401plataforma-global--por-el-derecho-a-la-ciudad-avanzando-en-la-implementacic3b3n-del-derecho-a-la-ciudad-en-am-c3a9rica-latina-y-a-nivel-internacionalpdf gt Acesso em 30 jul 2015

SAULE JR N ldquoO direito agrave cidade como paradigma da governanccedila urbanardquo Instituto Poacutelis 30 mar 2005Disponiacutevel em ltwwwpolisorgbruploads750750pdfgt Acesso em 3 ago 2015

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SAULE JR N amp UZZO K ldquoA trajetoacuteria da reforma urbana no Brasilrdquo Diaacutelogos propostas histoacuteriaspara uma cidadania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche--dph-8583htmlgt Acesso em 3 ago 2015

UNFPA Relatoacuterio sobre a situaccedilatildeo da populaccedilatildeo mundial 2011 New York UNFPA 2011 Disponiacutevel emltwwwuncvfilesPT-SWOP11-WEBpdfgt Acesso em 11 ago 2015

VERIacuteSSIMO A A ldquoPorque fomos a Medelliacuten e Bogotaacuterdquo Agrave beira do urbanismo 12 mar 2012 Disponiacutevelem lthttpabeiradourbanismoblogspotcombr201203porque-fomos-medellin-e-bogotahtmlgtAcesso em 3 ago 2015

Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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Direito agrave Cidade | 33

Aleacutem do CMH do CMPU e do Conselho da Cidade de Satildeo Paulo fazem parte da gestatildeo democraacute-tica as accedilotildees do Plano Diretor Participativo e sua revisatildeo participativa O Plano Diretor eacute um instru-mento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana e tornou-se obrigatoacuterio a partir

da Constituiccedilatildeo de 1988 para os municiacutepios com mais de 20 mil habitantes Posteriormente coma promulgaccedilatildeo do Estatuto da Cidade em 2001 sua efetivaccedilatildeo tambeacutem foi exigida nos municiacutepiossituados em regiotildees metropolitanas ou aglomeraccedilotildees urbanas em aacutereas de interesse turiacutestico ou em

aacuterea sob influecircncia de empreendimento de grande impacto ambiental Aleacutem disso foi estabelecido ocaraacuteter participativo do processo de desenvolvimento do Plano Diretor

Na cidade de Satildeo Paulo o PDE aprovado em 2002 na gestatildeo de Marta Suplicy (2001-2004)

contemplava diversas pautas da reforma urbana como criaccedilatildeo de ZEIS aacutereas destinadas agrave re-gularizaccedilatildeo fundiaacuteria para construccedilatildeo de moradias de interesse social e comeacutercio popular regu-

laccedilatildeo da construccedilatildeo de edifiacutecios por meio do estabelecimento da Outorga Onerosa do Direito deConstruir conforme diretrizes de planejamento urbano a fim de se redistribuir agrave coletividade avalorizaccedilatildeo imobiliaacuteria gerada pela concessatildeo desse direito previsatildeo de poliacutetica de moradia parao centro da cidade institucionalizaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo democraacutetica revisatildeo do Estudo

de Impacto de Vizinhanccedila (EIV)

Com a mudanccedila de gestatildeo contudo tais compromissos foram colocados a prova O poderexecutivo em 2006 enviou agrave Cacircmara um projeto de lei que alterava significativamente o Plano

Diretor vigente sem que houvesse a participaccedilatildeo da sociedade Depois de vaacuterias tentativas em

participar do processo de revisatildeo do Plano Diretor diversas entidades se organizaram e entraramcom uma accedilatildeo na justiccedila que impediu a tramitaccedilatildeo do projeto

Por fim com uma revisatildeo efetivamente participativa ndash 114 audiecircncias puacuteblicas mais de

25 mil participantes e 10 mil contribuiccedilotildees ndash o novo Plano Diretor de Satildeo Paulo foi sancionadopelo prefeito Fernando Haddad em 31 de julho de 2014 por meio da Lei no 16050 O objetivo eacutemelhorar a qualidade de vida das pessoas mediante a reorganizaccedilatildeo das dinacircmicas da cidadePara isso instrumentos satildeo concebidos para auxiliar a implantaccedilatildeo de poliacutetica habitacionala socializaccedilatildeo dos ganhos da produccedilatildeo imobiliaacuteria a melhoria da mobilidade urbana a apro-

ximaccedilatildeo do emprego e moradia a valorizaccedilatildeo do meio ambiente a promoccedilatildeo do desenvolvi-

mento econocircmico a preservaccedilatildeo do patrimocircnio cultural e o fortalecimento da participaccedilatildeopopular nos rumos da cidade Um conjunto de estrateacutegias para tornar Satildeo Paulo uma cidademais humana e equilibrada

34 Apropriaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pela cidadania e novas formas de participaccedilatildeo social

Segundo Raquel Rolnik (2011) a populaccedilatildeo de Satildeo Paulo fica presa cerca de 27 dias por ano e

diariamente duas horas e 42 minutos nos congestionamentos da cidade Essa eacute realidade enfren-tada haacute anos pelos paulistanos resultado do modelo de (i)mobilidade urbana adotado pelas ges-

totildees anteriores ao escolher o transporte individual em detrimento do coletivo o que fica evidentenos vultuosos investimentos em ampliaccedilatildeo da malha viaacuteria incentivos fiscais para aquisiccedilatildeo deveiacuteculos e em contraposiccedilatildeo baixo investimento no transporte coletivo

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34 | Cadernos de Formaccedilatildeo

Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Referecircncias

Livros artigos teses dissertaccedilotildeesBONDUKI N amp ROSSETO R ldquoO plano nacional de habitaccedilatildeo e os recursospara financiar a autogestatildeordquo Proposta vol 32 n 116 Rio de Janeiro 2008

CARDOSO P M Democratizaccedilatildeo do acesso agrave propriedade puacuteblica no Brasil funccedilatildeo social e regu-larizaccedilatildeo fundiaacuteria 260f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Direito) ndash Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica deSatildeo Paulo Satildeo Paulo 2010

CARLOS AFA O espaccedilo urbano novos escritos sobre a cidade Satildeo Paulo FFLCH 2007a

______ O lugar nodo mundo Satildeo Paulo FFLCH 2007b

DEGENSZAJN R R ldquoProcessos de articulaccedilatildeo na perspectiva socioterritorialrdquo In ARREGUI C C amp BLA-NES D N (orgs) Metodologia de Trabalho Social Satildeo Paulo IEEPUC-SP 2008

GOHN M G M ldquoO futuro das cidadesrdquo Nas Redes da Educaccedilatildeo vol 1 sl 2000 p 1-7 Disponiacutevel emltwwwlitefeunicampbrrevistagohnhtmlgt Acesso em 30 jul 2015

_ ldquoMovimentos sociais e a construccedilatildeo da cidadaniardquo Revista de Educaccedilatildeo Puacuteblica vol 19 Cuiabaacute 2002p 147-162 Disponiacutevel em ltwwwufmtbrrevistaarquivorev19gohn_1htmgt Acesso em 30 jul 2015

HARVEY D ldquoO direito agrave cidaderdquo Lutas Sociais n 29 Satildeo Paulo juldez 2012 p 73-89

KOWARICK L Escritos urbanos Satildeo Paulo Editora 34 2000

LEFEBVRE H O direito agrave cidade Trad de Rubens Eduardo Frias Satildeo Paulo Centauro 2001

LI B Y LEONG A VITIELLO D amp ACOCA A Chinatown Then and Now Gentrification in Boston NewYork and Philadelphia New York AALDEF 2013

MARICATO E ldquoMetroacutepole legislaccedilatildeo e desigualdaderdquo Estudos Avanccedilados vol 17 n 48 Satildeo Paulomaiago 2003 p 150-167

______ ldquoO Estatuto da cidade perifeacutericardquo In CARVALHO C S amp ROSSBACH A (orgs) O estatuto dacidade comentado Satildeo Paulo Ministeacuterio das CidadesAlianccedila das Cidades 2010

ROLNIK R O que eacute cidade Satildeo Paulo Brasiliense 1995

SANTORO P F ldquoO desafio de planejar e produzir expansatildeo urbana com qualidade a experiecircncia colom-biana dos Planos Parciais em Bogotaacute Colocircmbiardquo Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionaisvol 13 n 1 Recife mai 2011 p 91-115

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SANTOS M A urbanizaccedilatildeo brasileira Satildeo Paulo Hucitec 1993

SOUZA T C S Corticcedilos em Satildeo Paulo programasvistoriasrelatos 303f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em

Arquitetura) ndash Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Universidade de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 2011

Mateacuterias de imprensa blogs sites documentos

BONDUKI N ldquoSP Plano Diretor e desigualdades urbanasrdquo Sociedade CartaCapital 12 jul 2013 Dispo-niacutevel em ltwwwcartacapitalcombrsociedaderever-o-plano-diretor-para-reduzir-as-desigualdades--urbanas-3549html Acesso em 3 ago 2015

BRASIL Estatuto da Cidade (Lei no 10257 de 10 de julho de 2001) Brasiacutelia Casa Civil 2001 Dispo-niacutevel em ltwwwplanaltogovbrccivil_03leisLEIS_2001L10257htmgt Acesso em 13 ago 2015

CHUECA E G amp ALLEGRETTI G ldquoEl Derecho a la Ciudad en Europardquo In SAULE JR N ZAacuteRATE Lamp EMANUELLI M S (coords) Avanzando en la Implementacioacuten del Derecho a la Ciudad en AmeacutericaLatina y a nivel Internacional Sl Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade sd Disponiacutevel em lthttpsderechoalaciudadflacsofileswordpresscom201401plataforma-global-por-el-derecho-a-la-ciuda-d-avanzando-en-la-implementacic3b3n-del-derecho-a-la-ciudad-en-amc3a9rica-latina-y-a-nivel-in-ternacionalpdf gt Acesso em 30 jul 2015

CODHES ldquoLa crisis humanitaria en Colombia persiste El Paciacutefico en disputa Informe de desplazia-mento forzado en 2012rdquo Documentos CODHES n 26 Bogotaacute 2013 Disponiacutevel em ltwwwlwfcolom-biaorgcositesdefaultfilesimage31051320Informe2020desplazamiento202012pdfgt

Acesso em 3 ago 2015

FONSECA F ldquoOs grandes e poucos divulgados avanccedilos do governo Haddadrdquo Poliacutetica Carta Maior 20abr 2014 Disponiacutevel em ltwwwcartamaiorcombrEditoriaPoliticaOs-grandes-e-pouco-divulga-dos-avancos-do-governo-Haddad430759gt Acesso em 3 ago 2015

MAMANI U R ldquoO caminho do direito agrave cidade na Boliacuteviardquo Diaacutelogos propostas histoacuterias para uma cida-dania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche-dph-8586htmlgtAcesso em 3 ago 2015

ROLNIK R ldquoImobilidade na cidade de Satildeo Paulo o problema e o falso problemardquo Blog da Raquel Rol-nik 17 mar 2011 Disponiacutevel em lthttpsraquelrolnikwordpresscom20110317imobilidade-na-ci-dade-de-sao-paulo-o-problema-e-o-falso-problemagt Acesso em 3 ago 2015

ROMEIRO P GUIMARAtildeES I M S S G amp KOETZ V ldquoDerecho a la Ciudad en Ameacuterica Latinardquo In SAU-LE JR N ZAacuteRATE L amp EMANUELLI M S (coords) Avanzando en la Implementacioacuten del Derecho ala Ciudad en Ameacuterica Latina y a nivel Internacional Sl Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade sdDisponiacutevel em lthttpsderechoalaciudadflacsofileswordpresscom201401plataforma-global--por-el-derecho-a-la-ciudad-avanzando-en-la-implementacic3b3n-del-derecho-a-la-ciudad-en-am-c3a9rica-latina-y-a-nivel-internacionalpdf gt Acesso em 30 jul 2015

SAULE JR N ldquoO direito agrave cidade como paradigma da governanccedila urbanardquo Instituto Poacutelis 30 mar 2005Disponiacutevel em ltwwwpolisorgbruploads750750pdfgt Acesso em 3 ago 2015

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SAULE JR N amp UZZO K ldquoA trajetoacuteria da reforma urbana no Brasilrdquo Diaacutelogos propostas histoacuteriaspara uma cidadania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche--dph-8583htmlgt Acesso em 3 ago 2015

UNFPA Relatoacuterio sobre a situaccedilatildeo da populaccedilatildeo mundial 2011 New York UNFPA 2011 Disponiacutevel emltwwwuncvfilesPT-SWOP11-WEBpdfgt Acesso em 11 ago 2015

VERIacuteSSIMO A A ldquoPorque fomos a Medelliacuten e Bogotaacuterdquo Agrave beira do urbanismo 12 mar 2012 Disponiacutevelem lthttpabeiradourbanismoblogspotcombr201203porque-fomos-medellin-e-bogotahtmlgtAcesso em 3 ago 2015

Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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34 | Cadernos de Formaccedilatildeo

Essa questatildeo ganhou projeccedilatildeo nacional em junho de 2013 com a mobilizaccedilatildeo realizadapelo Movimento Passe Livre (MPL) que apoacutes o aumento de passagens de ocircnibus e de me-trocirc na cidade de Satildeo Paulo organizou manifestaccedilotildees em diversos pontos da regiatildeo central

colocando o transporte puacuteblico no plano dos direitos dos cidadatildeos A gestatildeo de Haddad estaacutedando atenccedilatildeo especial ao tema inclusive estabelecendo um novo paradigma de mobilida-de urbana na cidade baseado no transporte coletivo e no deslocamento natildeo motorizado

que se expressa em

bull expansatildeo das faixas exclusivas para ocircnibus

bull construccedilatildeo de ciclovias e ciclofaixasbull criaccedilatildeo do passe livre estudantilbull instituiccedilatildeo do bilhete uacutenico mensal semanal e diaacuteriobull Projeto CET no Seu Bairro983089983091

13 Trata-se de um conjunto de intervenccedilotildees que vatildeo desde a instalaccedilatildeo de faixas exclusivas de ocircnibus ateacute intervenccedilotildees urbaniacutesticas nas aacutereas de

transporte tracircnsito acessibilidade sinalizaccedilatildeo e mobilidade o que demarca a presenccedila do governo municipal em aacutereas perifeacutericas

A Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade na atual gestatildeo municipal como es-

timulo ao exerciacutecio da cidadania agrave cultura ao lazer ao esporte e agrave economia propotildee umaressignificaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico por meio de iniciativas da gestatildeo puacuteblica articuladas agravesintervenccedilotildees da sociedade civil Como exemplo podemos mencionar a experiecircncia das ciclo-vias e ciclofaixas que prevecirc a ligaccedilatildeo de bairros e parques puacuteblicos com centros comerciaise vice-versa de modo a facilitar a mobilidade urbana no municiacutepio aleacutem de fomentar uma

discussatildeo coletiva sobre as accedilotildees prioritaacuterias Outras accedilotildees que vem sendo realizada pelaCoordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade

bull Plano de Ocupaccedilatildeo do Espaccedilo Puacuteblico pela Cidadaniabull Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas

bull Edital Redes e Ruasbull Projetos Pilotos de Ressignificaccedilatildeo de territoacuterios simboacutelicos para direitos humanosbull Projeto RUA

Corredores de ocircnibus e ciclovias estatildeo alterando o paradigma de mobilidade urbana em Satildeo Paulo (creacutedito Fernando Pereira e

Heloisa BallariniSECOM)

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Direito agrave Cidade | 35

Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Referecircncias

Livros artigos teses dissertaccedilotildeesBONDUKI N amp ROSSETO R ldquoO plano nacional de habitaccedilatildeo e os recursospara financiar a autogestatildeordquo Proposta vol 32 n 116 Rio de Janeiro 2008

CARDOSO P M Democratizaccedilatildeo do acesso agrave propriedade puacuteblica no Brasil funccedilatildeo social e regu-larizaccedilatildeo fundiaacuteria 260f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Direito) ndash Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica deSatildeo Paulo Satildeo Paulo 2010

CARLOS AFA O espaccedilo urbano novos escritos sobre a cidade Satildeo Paulo FFLCH 2007a

______ O lugar nodo mundo Satildeo Paulo FFLCH 2007b

DEGENSZAJN R R ldquoProcessos de articulaccedilatildeo na perspectiva socioterritorialrdquo In ARREGUI C C amp BLA-NES D N (orgs) Metodologia de Trabalho Social Satildeo Paulo IEEPUC-SP 2008

GOHN M G M ldquoO futuro das cidadesrdquo Nas Redes da Educaccedilatildeo vol 1 sl 2000 p 1-7 Disponiacutevel emltwwwlitefeunicampbrrevistagohnhtmlgt Acesso em 30 jul 2015

_ ldquoMovimentos sociais e a construccedilatildeo da cidadaniardquo Revista de Educaccedilatildeo Puacuteblica vol 19 Cuiabaacute 2002p 147-162 Disponiacutevel em ltwwwufmtbrrevistaarquivorev19gohn_1htmgt Acesso em 30 jul 2015

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KOWARICK L Escritos urbanos Satildeo Paulo Editora 34 2000

LEFEBVRE H O direito agrave cidade Trad de Rubens Eduardo Frias Satildeo Paulo Centauro 2001

LI B Y LEONG A VITIELLO D amp ACOCA A Chinatown Then and Now Gentrification in Boston NewYork and Philadelphia New York AALDEF 2013

MARICATO E ldquoMetroacutepole legislaccedilatildeo e desigualdaderdquo Estudos Avanccedilados vol 17 n 48 Satildeo Paulomaiago 2003 p 150-167

______ ldquoO Estatuto da cidade perifeacutericardquo In CARVALHO C S amp ROSSBACH A (orgs) O estatuto dacidade comentado Satildeo Paulo Ministeacuterio das CidadesAlianccedila das Cidades 2010

ROLNIK R O que eacute cidade Satildeo Paulo Brasiliense 1995

SANTORO P F ldquoO desafio de planejar e produzir expansatildeo urbana com qualidade a experiecircncia colom-biana dos Planos Parciais em Bogotaacute Colocircmbiardquo Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionaisvol 13 n 1 Recife mai 2011 p 91-115

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8162019 Seacuterie Cadernos de Formaccedilatildeo Direito agrave Cidade

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Direito agrave Cidade | 39

SANTOS M A urbanizaccedilatildeo brasileira Satildeo Paulo Hucitec 1993

SOUZA T C S Corticcedilos em Satildeo Paulo programasvistoriasrelatos 303f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em

Arquitetura) ndash Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Universidade de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 2011

Mateacuterias de imprensa blogs sites documentos

BONDUKI N ldquoSP Plano Diretor e desigualdades urbanasrdquo Sociedade CartaCapital 12 jul 2013 Dispo-niacutevel em ltwwwcartacapitalcombrsociedaderever-o-plano-diretor-para-reduzir-as-desigualdades--urbanas-3549html Acesso em 3 ago 2015

BRASIL Estatuto da Cidade (Lei no 10257 de 10 de julho de 2001) Brasiacutelia Casa Civil 2001 Dispo-niacutevel em ltwwwplanaltogovbrccivil_03leisLEIS_2001L10257htmgt Acesso em 13 ago 2015

CHUECA E G amp ALLEGRETTI G ldquoEl Derecho a la Ciudad en Europardquo In SAULE JR N ZAacuteRATE Lamp EMANUELLI M S (coords) Avanzando en la Implementacioacuten del Derecho a la Ciudad en AmeacutericaLatina y a nivel Internacional Sl Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade sd Disponiacutevel em lthttpsderechoalaciudadflacsofileswordpresscom201401plataforma-global-por-el-derecho-a-la-ciuda-d-avanzando-en-la-implementacic3b3n-del-derecho-a-la-ciudad-en-amc3a9rica-latina-y-a-nivel-in-ternacionalpdf gt Acesso em 30 jul 2015

CODHES ldquoLa crisis humanitaria en Colombia persiste El Paciacutefico en disputa Informe de desplazia-mento forzado en 2012rdquo Documentos CODHES n 26 Bogotaacute 2013 Disponiacutevel em ltwwwlwfcolom-biaorgcositesdefaultfilesimage31051320Informe2020desplazamiento202012pdfgt

Acesso em 3 ago 2015

FONSECA F ldquoOs grandes e poucos divulgados avanccedilos do governo Haddadrdquo Poliacutetica Carta Maior 20abr 2014 Disponiacutevel em ltwwwcartamaiorcombrEditoriaPoliticaOs-grandes-e-pouco-divulga-dos-avancos-do-governo-Haddad430759gt Acesso em 3 ago 2015

MAMANI U R ldquoO caminho do direito agrave cidade na Boliacuteviardquo Diaacutelogos propostas histoacuterias para uma cida-dania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche-dph-8586htmlgtAcesso em 3 ago 2015

ROLNIK R ldquoImobilidade na cidade de Satildeo Paulo o problema e o falso problemardquo Blog da Raquel Rol-nik 17 mar 2011 Disponiacutevel em lthttpsraquelrolnikwordpresscom20110317imobilidade-na-ci-dade-de-sao-paulo-o-problema-e-o-falso-problemagt Acesso em 3 ago 2015

ROMEIRO P GUIMARAtildeES I M S S G amp KOETZ V ldquoDerecho a la Ciudad en Ameacuterica Latinardquo In SAU-LE JR N ZAacuteRATE L amp EMANUELLI M S (coords) Avanzando en la Implementacioacuten del Derecho ala Ciudad en Ameacuterica Latina y a nivel Internacional Sl Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade sdDisponiacutevel em lthttpsderechoalaciudadflacsofileswordpresscom201401plataforma-global--por-el-derecho-a-la-ciudad-avanzando-en-la-implementacic3b3n-del-derecho-a-la-ciudad-en-am-c3a9rica-latina-y-a-nivel-internacionalpdf gt Acesso em 30 jul 2015

SAULE JR N ldquoO direito agrave cidade como paradigma da governanccedila urbanardquo Instituto Poacutelis 30 mar 2005Disponiacutevel em ltwwwpolisorgbruploads750750pdfgt Acesso em 3 ago 2015

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SAULE JR N amp UZZO K ldquoA trajetoacuteria da reforma urbana no Brasilrdquo Diaacutelogos propostas histoacuteriaspara uma cidadania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche--dph-8583htmlgt Acesso em 3 ago 2015

UNFPA Relatoacuterio sobre a situaccedilatildeo da populaccedilatildeo mundial 2011 New York UNFPA 2011 Disponiacutevel emltwwwuncvfilesPT-SWOP11-WEBpdfgt Acesso em 11 ago 2015

VERIacuteSSIMO A A ldquoPorque fomos a Medelliacuten e Bogotaacuterdquo Agrave beira do urbanismo 12 mar 2012 Disponiacutevelem lthttpabeiradourbanismoblogspotcombr201203porque-fomos-medellin-e-bogotahtmlgtAcesso em 3 ago 2015

Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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Direito agrave Cidade | 35

Vale dizer que as accedilotildees apontadas se-guem a diretriz adotada pelo Governo Haddadque pode ser verificada e vivenciada em diver-

sas realizaccedilotildees de outras secretarias comoinstalaccedilatildeo de parklets [em itaacutelico] implemen-taccedilatildeo de praccedilas com Wi-Fi autorizaccedilatildeo para o

funcionamento de food trucks [em itaacutelico] nasruas da cidade debates para regularizar a rea-lizaccedilatildeo de bailes funk [em itaacutelico] autorizaccedilatildeopara a apresentaccedilatildeo de artistas de rua (Lei no

15776 sancionada em junho de 2013 e regula-mentada em 2014) e a aquisiccedilatildeo da Chaacutecara

do Jockey para a criaccedilatildeo de parque puacuteblico

Como vimos Satildeo Paulo estaacute experimen-tando novas formas de participaccedilatildeo socialDesde 2014 o municiacutepio adota medidas paraampliar participaccedilatildeo de seus cidadatildeos Essaproposta eacute norteada por uma nova concepccedilatildeo

de gestatildeo puacuteblica baseada em accedilotildees de ino-vaccedilatildeo tecnoloacutegica participaccedilatildeo social trans-

parecircncia e integridade que satildeo integradaspor sua coordenadoria a Satildeo Paulo Aberta eseu conselho As experiecircncias que vem sendo

consolidadas na gestatildeo incorporam e viabili-zam a participaccedilatildeo da sociedade por meio de inuacutemeros canais de diaacutelogos como redes sociaischat e foacuteruns digitais

Ainda existem muitos desafios a serem enfrentados no que tange agrave participaccedilatildeo pois alguns dos

conselhos municipais satildeo apenas de caraacuteter consultivo enquanto a demanda eacute para que se tornemespaccedilos deliberativos de poliacuteticas puacuteblicas Entretanto os dados demonstram que a iniciativa de am-

pliar os canais de participaccedilatildeo coloca a gestatildeo puacuteblica mais proacutexima da sociedade tornando as relaccedilotildeessociais na cidade mais humanas Por esse motivo compreende-se que o direito agrave cidade estaacute vincula-do aos direitos humanos o que explica a SMDHC como mediadora transversal da gestatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas em Satildeo Paulo do mesmo modo que esclarece a necessidade de os direitos humanos seremcontemplados intersetorialmente em todos os segmentos das poliacuteticas

Parklets e wi-fi disponiacutevel em praccedilas satildeo accedilotildees para que os

habitantes da cidade se apropriem do espaccedilo puacuteblico (creacutedito FabioArantes e Heloisa BalleriniSECOM)

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36 | Cadernos de Formaccedilatildeo

Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Referecircncias

Livros artigos teses dissertaccedilotildeesBONDUKI N amp ROSSETO R ldquoO plano nacional de habitaccedilatildeo e os recursospara financiar a autogestatildeordquo Proposta vol 32 n 116 Rio de Janeiro 2008

CARDOSO P M Democratizaccedilatildeo do acesso agrave propriedade puacuteblica no Brasil funccedilatildeo social e regu-larizaccedilatildeo fundiaacuteria 260f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Direito) ndash Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica deSatildeo Paulo Satildeo Paulo 2010

CARLOS AFA O espaccedilo urbano novos escritos sobre a cidade Satildeo Paulo FFLCH 2007a

______ O lugar nodo mundo Satildeo Paulo FFLCH 2007b

DEGENSZAJN R R ldquoProcessos de articulaccedilatildeo na perspectiva socioterritorialrdquo In ARREGUI C C amp BLA-NES D N (orgs) Metodologia de Trabalho Social Satildeo Paulo IEEPUC-SP 2008

GOHN M G M ldquoO futuro das cidadesrdquo Nas Redes da Educaccedilatildeo vol 1 sl 2000 p 1-7 Disponiacutevel emltwwwlitefeunicampbrrevistagohnhtmlgt Acesso em 30 jul 2015

_ ldquoMovimentos sociais e a construccedilatildeo da cidadaniardquo Revista de Educaccedilatildeo Puacuteblica vol 19 Cuiabaacute 2002p 147-162 Disponiacutevel em ltwwwufmtbrrevistaarquivorev19gohn_1htmgt Acesso em 30 jul 2015

HARVEY D ldquoO direito agrave cidaderdquo Lutas Sociais n 29 Satildeo Paulo juldez 2012 p 73-89

KOWARICK L Escritos urbanos Satildeo Paulo Editora 34 2000

LEFEBVRE H O direito agrave cidade Trad de Rubens Eduardo Frias Satildeo Paulo Centauro 2001

LI B Y LEONG A VITIELLO D amp ACOCA A Chinatown Then and Now Gentrification in Boston NewYork and Philadelphia New York AALDEF 2013

MARICATO E ldquoMetroacutepole legislaccedilatildeo e desigualdaderdquo Estudos Avanccedilados vol 17 n 48 Satildeo Paulomaiago 2003 p 150-167

______ ldquoO Estatuto da cidade perifeacutericardquo In CARVALHO C S amp ROSSBACH A (orgs) O estatuto dacidade comentado Satildeo Paulo Ministeacuterio das CidadesAlianccedila das Cidades 2010

ROLNIK R O que eacute cidade Satildeo Paulo Brasiliense 1995

SANTORO P F ldquoO desafio de planejar e produzir expansatildeo urbana com qualidade a experiecircncia colom-biana dos Planos Parciais em Bogotaacute Colocircmbiardquo Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionaisvol 13 n 1 Recife mai 2011 p 91-115

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SANTOS M A urbanizaccedilatildeo brasileira Satildeo Paulo Hucitec 1993

SOUZA T C S Corticcedilos em Satildeo Paulo programasvistoriasrelatos 303f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em

Arquitetura) ndash Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Universidade de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 2011

Mateacuterias de imprensa blogs sites documentos

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BRASIL Estatuto da Cidade (Lei no 10257 de 10 de julho de 2001) Brasiacutelia Casa Civil 2001 Dispo-niacutevel em ltwwwplanaltogovbrccivil_03leisLEIS_2001L10257htmgt Acesso em 13 ago 2015

CHUECA E G amp ALLEGRETTI G ldquoEl Derecho a la Ciudad en Europardquo In SAULE JR N ZAacuteRATE Lamp EMANUELLI M S (coords) Avanzando en la Implementacioacuten del Derecho a la Ciudad en AmeacutericaLatina y a nivel Internacional Sl Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade sd Disponiacutevel em lthttpsderechoalaciudadflacsofileswordpresscom201401plataforma-global-por-el-derecho-a-la-ciuda-d-avanzando-en-la-implementacic3b3n-del-derecho-a-la-ciudad-en-amc3a9rica-latina-y-a-nivel-in-ternacionalpdf gt Acesso em 30 jul 2015

CODHES ldquoLa crisis humanitaria en Colombia persiste El Paciacutefico en disputa Informe de desplazia-mento forzado en 2012rdquo Documentos CODHES n 26 Bogotaacute 2013 Disponiacutevel em ltwwwlwfcolom-biaorgcositesdefaultfilesimage31051320Informe2020desplazamiento202012pdfgt

Acesso em 3 ago 2015

FONSECA F ldquoOs grandes e poucos divulgados avanccedilos do governo Haddadrdquo Poliacutetica Carta Maior 20abr 2014 Disponiacutevel em ltwwwcartamaiorcombrEditoriaPoliticaOs-grandes-e-pouco-divulga-dos-avancos-do-governo-Haddad430759gt Acesso em 3 ago 2015

MAMANI U R ldquoO caminho do direito agrave cidade na Boliacuteviardquo Diaacutelogos propostas histoacuterias para uma cida-dania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche-dph-8586htmlgtAcesso em 3 ago 2015

ROLNIK R ldquoImobilidade na cidade de Satildeo Paulo o problema e o falso problemardquo Blog da Raquel Rol-nik 17 mar 2011 Disponiacutevel em lthttpsraquelrolnikwordpresscom20110317imobilidade-na-ci-dade-de-sao-paulo-o-problema-e-o-falso-problemagt Acesso em 3 ago 2015

ROMEIRO P GUIMARAtildeES I M S S G amp KOETZ V ldquoDerecho a la Ciudad en Ameacuterica Latinardquo In SAU-LE JR N ZAacuteRATE L amp EMANUELLI M S (coords) Avanzando en la Implementacioacuten del Derecho ala Ciudad en Ameacuterica Latina y a nivel Internacional Sl Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade sdDisponiacutevel em lthttpsderechoalaciudadflacsofileswordpresscom201401plataforma-global--por-el-derecho-a-la-ciudad-avanzando-en-la-implementacic3b3n-del-derecho-a-la-ciudad-en-am-c3a9rica-latina-y-a-nivel-internacionalpdf gt Acesso em 30 jul 2015

SAULE JR N ldquoO direito agrave cidade como paradigma da governanccedila urbanardquo Instituto Poacutelis 30 mar 2005Disponiacutevel em ltwwwpolisorgbruploads750750pdfgt Acesso em 3 ago 2015

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SAULE JR N amp UZZO K ldquoA trajetoacuteria da reforma urbana no Brasilrdquo Diaacutelogos propostas histoacuteriaspara uma cidadania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche--dph-8583htmlgt Acesso em 3 ago 2015

UNFPA Relatoacuterio sobre a situaccedilatildeo da populaccedilatildeo mundial 2011 New York UNFPA 2011 Disponiacutevel emltwwwuncvfilesPT-SWOP11-WEBpdfgt Acesso em 11 ago 2015

VERIacuteSSIMO A A ldquoPorque fomos a Medelliacuten e Bogotaacuterdquo Agrave beira do urbanismo 12 mar 2012 Disponiacutevelem lthttpabeiradourbanismoblogspotcombr201203porque-fomos-medellin-e-bogotahtmlgtAcesso em 3 ago 2015

Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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Conclusatildeo

Vimos no decorrer deste caderno que a defesa do direito agrave cidade pressupotildee novas for-

mas gestatildeo e de ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico com ressignificaccedilatildeo da relaccedilatildeo da populaccedilatildeocom a cidade em que vive Trata-se pois de uma reflexatildeo permanente sobre nosso estilode vida e nossas praacuteticas no espaccedilo urbano bem como de uma nova concepccedilatildeo de gestatildeo

puacuteblica com novas formas de participaccedilatildeo social

A cidade molda a vida urbana em sua estrutura e forma de organizaccedilatildeo por meio doarranjo territorial e administrativo do comeacutercio da divisatildeo social do trabalho e da proacutepriaurbanizaccedilatildeo que coloca em evidecircncia tanto a criatividade humana como as contradiccedilotildees pre-sentes nas relaccedilotildees de forccedila e interesses poliacutetico-econocircmicos Disso decorrem os inuacutemerosdesafios da cidade contemporacircnea pois conforme pudemos verificar em Lefebvre (2001) e

Harvey (2012) ela eacute determinada por seu valor de troca Isso gera vaacuterios conflitos na medidaem que regulamenta a divisatildeo da vida do trabalho e das relaccedilotildees no espaccedilo urbano ou seja

provoca a divisatildeo e a diferenccedila entre classes sociais e territoacuterios

Apesar das singularidades presentes em cada cidade estas apresentam semelhanccedilas no

que diz respeito ao processo de urbanizaccedilatildeo especialmente quanto aos aglomerados urbanosque em sua maioria estatildeo localizados em aacutereas afastadas do centro urbano e da oferta de ser-viccedilos puacuteblicos bem como satildeo constituiacutedos de imoacuteveis em situaccedilatildeo precaacuteria de construccedilatildeo Essesaglomerados urbanos satildeo produtos de accedilotildees poliacuteticas e econocircmicas promovidas pelo Estadoe por diferentes segmentos do capital (industrial financeiro imobiliaacuterio e comercial) Assim

podemos verificar expressotildees de demandas relativas agrave moradia agrave mobilidade urbana e a outrosserviccedilos que se materializam em lutas sociais e formas de resistecircncias A organizaccedilatildeo de mo-vimentos sociais urbanos tem repercutido significativamente a questatildeo urbana bem como temgerado reivindicaccedilotildees de maior participaccedilatildeo social na gestatildeo das cidades Consolida-se dessaforma a principal bandeira da reforma urbana o direito agrave cidade

Tal questatildeo eacute uma expressatildeo das cidades contemporacircneas em todo o mundo sobretudo empaiacuteses capitalistas que promovem contradiccedilotildees e segregaccedilotildees Com base nesse contexto fica pa-tente que o direito agrave cidade como direito humano eacute uma pauta internacional e seu reconhecimen-to eacute resultado da articulaccedilatildeo de grupos e movimentos sociais populares que aos poucos foram

inserindo essa demanda nos foacuteruns internacionais urbanos Contudo eacute importante destacar que

essa pauta eacute fundamental nos paiacuteses subdesenvolvidos devido ao descontrolado processo de ur-banizaccedilatildeo decorrente por sua vez de um histoacuterico de colonizaccedilatildeo e regimes autoritaacuterios que pro-duziu desenvolvimento desigual e dependente poliacutetica e economicamente de paiacuteses imperialistas

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

8162019 Seacuterie Cadernos de Formaccedilatildeo Direito agrave Cidade

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Referecircncias

Livros artigos teses dissertaccedilotildeesBONDUKI N amp ROSSETO R ldquoO plano nacional de habitaccedilatildeo e os recursospara financiar a autogestatildeordquo Proposta vol 32 n 116 Rio de Janeiro 2008

CARDOSO P M Democratizaccedilatildeo do acesso agrave propriedade puacuteblica no Brasil funccedilatildeo social e regu-larizaccedilatildeo fundiaacuteria 260f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Direito) ndash Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica deSatildeo Paulo Satildeo Paulo 2010

CARLOS AFA O espaccedilo urbano novos escritos sobre a cidade Satildeo Paulo FFLCH 2007a

______ O lugar nodo mundo Satildeo Paulo FFLCH 2007b

DEGENSZAJN R R ldquoProcessos de articulaccedilatildeo na perspectiva socioterritorialrdquo In ARREGUI C C amp BLA-NES D N (orgs) Metodologia de Trabalho Social Satildeo Paulo IEEPUC-SP 2008

GOHN M G M ldquoO futuro das cidadesrdquo Nas Redes da Educaccedilatildeo vol 1 sl 2000 p 1-7 Disponiacutevel emltwwwlitefeunicampbrrevistagohnhtmlgt Acesso em 30 jul 2015

_ ldquoMovimentos sociais e a construccedilatildeo da cidadaniardquo Revista de Educaccedilatildeo Puacuteblica vol 19 Cuiabaacute 2002p 147-162 Disponiacutevel em ltwwwufmtbrrevistaarquivorev19gohn_1htmgt Acesso em 30 jul 2015

HARVEY D ldquoO direito agrave cidaderdquo Lutas Sociais n 29 Satildeo Paulo juldez 2012 p 73-89

KOWARICK L Escritos urbanos Satildeo Paulo Editora 34 2000

LEFEBVRE H O direito agrave cidade Trad de Rubens Eduardo Frias Satildeo Paulo Centauro 2001

LI B Y LEONG A VITIELLO D amp ACOCA A Chinatown Then and Now Gentrification in Boston NewYork and Philadelphia New York AALDEF 2013

MARICATO E ldquoMetroacutepole legislaccedilatildeo e desigualdaderdquo Estudos Avanccedilados vol 17 n 48 Satildeo Paulomaiago 2003 p 150-167

______ ldquoO Estatuto da cidade perifeacutericardquo In CARVALHO C S amp ROSSBACH A (orgs) O estatuto dacidade comentado Satildeo Paulo Ministeacuterio das CidadesAlianccedila das Cidades 2010

ROLNIK R O que eacute cidade Satildeo Paulo Brasiliense 1995

SANTORO P F ldquoO desafio de planejar e produzir expansatildeo urbana com qualidade a experiecircncia colom-biana dos Planos Parciais em Bogotaacute Colocircmbiardquo Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionaisvol 13 n 1 Recife mai 2011 p 91-115

38 | Cadernos de Formaccedilatildeo

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SANTOS M A urbanizaccedilatildeo brasileira Satildeo Paulo Hucitec 1993

SOUZA T C S Corticcedilos em Satildeo Paulo programasvistoriasrelatos 303f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em

Arquitetura) ndash Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Universidade de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 2011

Mateacuterias de imprensa blogs sites documentos

BONDUKI N ldquoSP Plano Diretor e desigualdades urbanasrdquo Sociedade CartaCapital 12 jul 2013 Dispo-niacutevel em ltwwwcartacapitalcombrsociedaderever-o-plano-diretor-para-reduzir-as-desigualdades--urbanas-3549html Acesso em 3 ago 2015

BRASIL Estatuto da Cidade (Lei no 10257 de 10 de julho de 2001) Brasiacutelia Casa Civil 2001 Dispo-niacutevel em ltwwwplanaltogovbrccivil_03leisLEIS_2001L10257htmgt Acesso em 13 ago 2015

CHUECA E G amp ALLEGRETTI G ldquoEl Derecho a la Ciudad en Europardquo In SAULE JR N ZAacuteRATE Lamp EMANUELLI M S (coords) Avanzando en la Implementacioacuten del Derecho a la Ciudad en AmeacutericaLatina y a nivel Internacional Sl Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade sd Disponiacutevel em lthttpsderechoalaciudadflacsofileswordpresscom201401plataforma-global-por-el-derecho-a-la-ciuda-d-avanzando-en-la-implementacic3b3n-del-derecho-a-la-ciudad-en-amc3a9rica-latina-y-a-nivel-in-ternacionalpdf gt Acesso em 30 jul 2015

CODHES ldquoLa crisis humanitaria en Colombia persiste El Paciacutefico en disputa Informe de desplazia-mento forzado en 2012rdquo Documentos CODHES n 26 Bogotaacute 2013 Disponiacutevel em ltwwwlwfcolom-biaorgcositesdefaultfilesimage31051320Informe2020desplazamiento202012pdfgt

Acesso em 3 ago 2015

FONSECA F ldquoOs grandes e poucos divulgados avanccedilos do governo Haddadrdquo Poliacutetica Carta Maior 20abr 2014 Disponiacutevel em ltwwwcartamaiorcombrEditoriaPoliticaOs-grandes-e-pouco-divulga-dos-avancos-do-governo-Haddad430759gt Acesso em 3 ago 2015

MAMANI U R ldquoO caminho do direito agrave cidade na Boliacuteviardquo Diaacutelogos propostas histoacuterias para uma cida-dania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche-dph-8586htmlgtAcesso em 3 ago 2015

ROLNIK R ldquoImobilidade na cidade de Satildeo Paulo o problema e o falso problemardquo Blog da Raquel Rol-nik 17 mar 2011 Disponiacutevel em lthttpsraquelrolnikwordpresscom20110317imobilidade-na-ci-dade-de-sao-paulo-o-problema-e-o-falso-problemagt Acesso em 3 ago 2015

ROMEIRO P GUIMARAtildeES I M S S G amp KOETZ V ldquoDerecho a la Ciudad en Ameacuterica Latinardquo In SAU-LE JR N ZAacuteRATE L amp EMANUELLI M S (coords) Avanzando en la Implementacioacuten del Derecho ala Ciudad en Ameacuterica Latina y a nivel Internacional Sl Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade sdDisponiacutevel em lthttpsderechoalaciudadflacsofileswordpresscom201401plataforma-global--por-el-derecho-a-la-ciudad-avanzando-en-la-implementacic3b3n-del-derecho-a-la-ciudad-en-am-c3a9rica-latina-y-a-nivel-internacionalpdf gt Acesso em 30 jul 2015

SAULE JR N ldquoO direito agrave cidade como paradigma da governanccedila urbanardquo Instituto Poacutelis 30 mar 2005Disponiacutevel em ltwwwpolisorgbruploads750750pdfgt Acesso em 3 ago 2015

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SAULE JR N amp UZZO K ldquoA trajetoacuteria da reforma urbana no Brasilrdquo Diaacutelogos propostas histoacuteriaspara uma cidadania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche--dph-8583htmlgt Acesso em 3 ago 2015

UNFPA Relatoacuterio sobre a situaccedilatildeo da populaccedilatildeo mundial 2011 New York UNFPA 2011 Disponiacutevel emltwwwuncvfilesPT-SWOP11-WEBpdfgt Acesso em 11 ago 2015

VERIacuteSSIMO A A ldquoPorque fomos a Medelliacuten e Bogotaacuterdquo Agrave beira do urbanismo 12 mar 2012 Disponiacutevelem lthttpabeiradourbanismoblogspotcombr201203porque-fomos-medellin-e-bogotahtmlgtAcesso em 3 ago 2015

Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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No Brasil a consolidaccedilatildeo de direitos advindos de lutas sociais na deacutecada de 1980 e 1990se tornou referecircncia na poliacutetica urbana no mundo todo Entretanto o direito agrave cidade apesarde fundamental alcanccedila um paradoxo na medida em que se realiza de forma simultacircnea

entre avanccedilos e retrocessos convive-se com accedilotildees que afirmam e ao mesmo tempo violam odireito agrave cidade (ROMEIRO GUIMARAtildeES amp KOETZ sd) Dessa forma pensar a gestatildeo puacutebli-ca especialmente na cidade de Satildeo Paulo exige compreender que esse territoacuterio se encontra

em constante disputa por parte de interesses poliacuteticos e econocircmicos Isso mobiliza diversossetores que resistem agrave utilizaccedilatildeo da cidade como negoacutecio lucrativo

Considerada a principal metroacutepole brasileira abrigando o maior centro financeiro do

paiacutes Satildeo Paulo convive com a contradiccedilatildeo de ter a maior concentraccedilatildeo de Produto InternoBruto (PIB) per capita da Ameacuterica Latina e paradoxalmente uma concentraccedilatildeo de ma-

crorregiotildees perifeacutericas que congregam todo tipo de violaccedilatildeo de direitos Assim Satildeo Pauloapresenta inuacutemeros desafios a serem enfrentados pela gestatildeo puacuteblica e pela sociedadequanto agrave defesa do direito agrave cidade como um direito humano Por outro lado diversasexperiecircncias municipais vecircm buscando contemplar o direito agrave cidade o que pode ser ve-

rificado pela predominacircncia de estiacutemulos agrave gestatildeo democraacutetica expressa na construccedilatildeode conselhos e na promoccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas foacuteruns e outros espaccedilos de consultapopular Destaca-se tambeacutem o uso da tecnologia social para viabilizar o fornecimento deinformaccedilatildeo e a comunicaccedilatildeo a fim de alcanccedilar novas formas de participaccedilatildeo social e criaruma nova relaccedilatildeo entre gestatildeo puacuteblica e sociedade Nesse sentido temas como mobili-

dade urbana direito agrave cidade e democratizaccedilatildeo do processo de elaboraccedilatildeo de poliacuteticaspuacuteblicas fazem parte da construccedilatildeo de uma agenda que se baseia nos direitos humanospara a promoccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania

Para isso foi criada a Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidade (integrada agrave SMDHC)com objetivo de construir respostas criativas e inovadoras Baseia-se na perspectiva de que odireito agrave cidade eacute um direito humano e deve perpassar as demais poliacuteticas puacuteblicas A Coor-denaccedilatildeo eacute uma estrateacutegia poliacutetica para estabelecer canais de diaacutelogos relativos agraves demandasespecialmente dos movimentos sociais e de novos atores da sociedade civil que vecircm cobran-

do accedilotildees da prefeitura (como nas manifestaccedilotildees de junho) Contudo a poliacutetica puacuteblica seefetiva intersetorialmente com accedilotildees intersecretariais na medida em que demandas sobremoradia transporte puacuteblico mobilidade e meio ambiente entre outras satildeo contempladaspor um conjunto de setores e secretarias diferentes

A ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico e a efetivaccedilatildeo de direitos satildeo sem duacutevida fundamentaispara uma gestatildeo puacuteblica popular que valoriza e trabalha na perspectiva do direito agrave cidadecomo eacute o caso da cidade de Satildeo Paulo Se por um lado ainda haacute problemas e viacutecios histoacutericospor outro haacute o acircnimo de superar esses desafios e continuar firmes na busca da garantia aodireito agrave cidade Eacute por isso que estamos trabalhando de forma estrateacutegica pensando o futuro

e ao mesmo tempo buscando solucionar os problemas do momento presente Ao reconhecero direito agrave cidade como um direito humano nossa perspectiva eacute romper com a concepccedilatildeo deespaccedilo puacuteblico proibido e provocar novos usos para a construccedilatildeo de uma cidade democraacutetica

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Referecircncias

Livros artigos teses dissertaccedilotildeesBONDUKI N amp ROSSETO R ldquoO plano nacional de habitaccedilatildeo e os recursospara financiar a autogestatildeordquo Proposta vol 32 n 116 Rio de Janeiro 2008

CARDOSO P M Democratizaccedilatildeo do acesso agrave propriedade puacuteblica no Brasil funccedilatildeo social e regu-larizaccedilatildeo fundiaacuteria 260f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Direito) ndash Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica deSatildeo Paulo Satildeo Paulo 2010

CARLOS AFA O espaccedilo urbano novos escritos sobre a cidade Satildeo Paulo FFLCH 2007a

______ O lugar nodo mundo Satildeo Paulo FFLCH 2007b

DEGENSZAJN R R ldquoProcessos de articulaccedilatildeo na perspectiva socioterritorialrdquo In ARREGUI C C amp BLA-NES D N (orgs) Metodologia de Trabalho Social Satildeo Paulo IEEPUC-SP 2008

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KOWARICK L Escritos urbanos Satildeo Paulo Editora 34 2000

LEFEBVRE H O direito agrave cidade Trad de Rubens Eduardo Frias Satildeo Paulo Centauro 2001

LI B Y LEONG A VITIELLO D amp ACOCA A Chinatown Then and Now Gentrification in Boston NewYork and Philadelphia New York AALDEF 2013

MARICATO E ldquoMetroacutepole legislaccedilatildeo e desigualdaderdquo Estudos Avanccedilados vol 17 n 48 Satildeo Paulomaiago 2003 p 150-167

______ ldquoO Estatuto da cidade perifeacutericardquo In CARVALHO C S amp ROSSBACH A (orgs) O estatuto dacidade comentado Satildeo Paulo Ministeacuterio das CidadesAlianccedila das Cidades 2010

ROLNIK R O que eacute cidade Satildeo Paulo Brasiliense 1995

SANTORO P F ldquoO desafio de planejar e produzir expansatildeo urbana com qualidade a experiecircncia colom-biana dos Planos Parciais em Bogotaacute Colocircmbiardquo Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionaisvol 13 n 1 Recife mai 2011 p 91-115

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SANTOS M A urbanizaccedilatildeo brasileira Satildeo Paulo Hucitec 1993

SOUZA T C S Corticcedilos em Satildeo Paulo programasvistoriasrelatos 303f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em

Arquitetura) ndash Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Universidade de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 2011

Mateacuterias de imprensa blogs sites documentos

BONDUKI N ldquoSP Plano Diretor e desigualdades urbanasrdquo Sociedade CartaCapital 12 jul 2013 Dispo-niacutevel em ltwwwcartacapitalcombrsociedaderever-o-plano-diretor-para-reduzir-as-desigualdades--urbanas-3549html Acesso em 3 ago 2015

BRASIL Estatuto da Cidade (Lei no 10257 de 10 de julho de 2001) Brasiacutelia Casa Civil 2001 Dispo-niacutevel em ltwwwplanaltogovbrccivil_03leisLEIS_2001L10257htmgt Acesso em 13 ago 2015

CHUECA E G amp ALLEGRETTI G ldquoEl Derecho a la Ciudad en Europardquo In SAULE JR N ZAacuteRATE Lamp EMANUELLI M S (coords) Avanzando en la Implementacioacuten del Derecho a la Ciudad en AmeacutericaLatina y a nivel Internacional Sl Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade sd Disponiacutevel em lthttpsderechoalaciudadflacsofileswordpresscom201401plataforma-global-por-el-derecho-a-la-ciuda-d-avanzando-en-la-implementacic3b3n-del-derecho-a-la-ciudad-en-amc3a9rica-latina-y-a-nivel-in-ternacionalpdf gt Acesso em 30 jul 2015

CODHES ldquoLa crisis humanitaria en Colombia persiste El Paciacutefico en disputa Informe de desplazia-mento forzado en 2012rdquo Documentos CODHES n 26 Bogotaacute 2013 Disponiacutevel em ltwwwlwfcolom-biaorgcositesdefaultfilesimage31051320Informe2020desplazamiento202012pdfgt

Acesso em 3 ago 2015

FONSECA F ldquoOs grandes e poucos divulgados avanccedilos do governo Haddadrdquo Poliacutetica Carta Maior 20abr 2014 Disponiacutevel em ltwwwcartamaiorcombrEditoriaPoliticaOs-grandes-e-pouco-divulga-dos-avancos-do-governo-Haddad430759gt Acesso em 3 ago 2015

MAMANI U R ldquoO caminho do direito agrave cidade na Boliacuteviardquo Diaacutelogos propostas histoacuterias para uma cida-dania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche-dph-8586htmlgtAcesso em 3 ago 2015

ROLNIK R ldquoImobilidade na cidade de Satildeo Paulo o problema e o falso problemardquo Blog da Raquel Rol-nik 17 mar 2011 Disponiacutevel em lthttpsraquelrolnikwordpresscom20110317imobilidade-na-ci-dade-de-sao-paulo-o-problema-e-o-falso-problemagt Acesso em 3 ago 2015

ROMEIRO P GUIMARAtildeES I M S S G amp KOETZ V ldquoDerecho a la Ciudad en Ameacuterica Latinardquo In SAU-LE JR N ZAacuteRATE L amp EMANUELLI M S (coords) Avanzando en la Implementacioacuten del Derecho ala Ciudad en Ameacuterica Latina y a nivel Internacional Sl Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade sdDisponiacutevel em lthttpsderechoalaciudadflacsofileswordpresscom201401plataforma-global--por-el-derecho-a-la-ciudad-avanzando-en-la-implementacic3b3n-del-derecho-a-la-ciudad-en-am-c3a9rica-latina-y-a-nivel-internacionalpdf gt Acesso em 30 jul 2015

SAULE JR N ldquoO direito agrave cidade como paradigma da governanccedila urbanardquo Instituto Poacutelis 30 mar 2005Disponiacutevel em ltwwwpolisorgbruploads750750pdfgt Acesso em 3 ago 2015

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SAULE JR N amp UZZO K ldquoA trajetoacuteria da reforma urbana no Brasilrdquo Diaacutelogos propostas histoacuteriaspara uma cidadania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche--dph-8583htmlgt Acesso em 3 ago 2015

UNFPA Relatoacuterio sobre a situaccedilatildeo da populaccedilatildeo mundial 2011 New York UNFPA 2011 Disponiacutevel emltwwwuncvfilesPT-SWOP11-WEBpdfgt Acesso em 11 ago 2015

VERIacuteSSIMO A A ldquoPorque fomos a Medelliacuten e Bogotaacuterdquo Agrave beira do urbanismo 12 mar 2012 Disponiacutevelem lthttpabeiradourbanismoblogspotcombr201203porque-fomos-medellin-e-bogotahtmlgtAcesso em 3 ago 2015

Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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Referecircncias

Livros artigos teses dissertaccedilotildeesBONDUKI N amp ROSSETO R ldquoO plano nacional de habitaccedilatildeo e os recursospara financiar a autogestatildeordquo Proposta vol 32 n 116 Rio de Janeiro 2008

CARDOSO P M Democratizaccedilatildeo do acesso agrave propriedade puacuteblica no Brasil funccedilatildeo social e regu-larizaccedilatildeo fundiaacuteria 260f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Direito) ndash Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica deSatildeo Paulo Satildeo Paulo 2010

CARLOS AFA O espaccedilo urbano novos escritos sobre a cidade Satildeo Paulo FFLCH 2007a

______ O lugar nodo mundo Satildeo Paulo FFLCH 2007b

DEGENSZAJN R R ldquoProcessos de articulaccedilatildeo na perspectiva socioterritorialrdquo In ARREGUI C C amp BLA-NES D N (orgs) Metodologia de Trabalho Social Satildeo Paulo IEEPUC-SP 2008

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HARVEY D ldquoO direito agrave cidaderdquo Lutas Sociais n 29 Satildeo Paulo juldez 2012 p 73-89

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LI B Y LEONG A VITIELLO D amp ACOCA A Chinatown Then and Now Gentrification in Boston NewYork and Philadelphia New York AALDEF 2013

MARICATO E ldquoMetroacutepole legislaccedilatildeo e desigualdaderdquo Estudos Avanccedilados vol 17 n 48 Satildeo Paulomaiago 2003 p 150-167

______ ldquoO Estatuto da cidade perifeacutericardquo In CARVALHO C S amp ROSSBACH A (orgs) O estatuto dacidade comentado Satildeo Paulo Ministeacuterio das CidadesAlianccedila das Cidades 2010

ROLNIK R O que eacute cidade Satildeo Paulo Brasiliense 1995

SANTORO P F ldquoO desafio de planejar e produzir expansatildeo urbana com qualidade a experiecircncia colom-biana dos Planos Parciais em Bogotaacute Colocircmbiardquo Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionaisvol 13 n 1 Recife mai 2011 p 91-115

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SOUZA T C S Corticcedilos em Satildeo Paulo programasvistoriasrelatos 303f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em

Arquitetura) ndash Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Universidade de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 2011

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BONDUKI N ldquoSP Plano Diretor e desigualdades urbanasrdquo Sociedade CartaCapital 12 jul 2013 Dispo-niacutevel em ltwwwcartacapitalcombrsociedaderever-o-plano-diretor-para-reduzir-as-desigualdades--urbanas-3549html Acesso em 3 ago 2015

BRASIL Estatuto da Cidade (Lei no 10257 de 10 de julho de 2001) Brasiacutelia Casa Civil 2001 Dispo-niacutevel em ltwwwplanaltogovbrccivil_03leisLEIS_2001L10257htmgt Acesso em 13 ago 2015

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Acesso em 3 ago 2015

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8162019 Seacuterie Cadernos de Formaccedilatildeo Direito agrave Cidade

httpslidepdfcomreaderfullserie-cadernos-de-formacao-direito-a-cidade 4141

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Sites

Coordenaccedilatildeo de Promoccedilatildeo do Direito agrave Cidadeltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanospromocao_do_direito_a_cidadegt

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadanialtwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdireitos_humanosgt

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasdesenvolvimento_urbanogt

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambienteltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasmeio_ambientegt

Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

Cidades para que(m)lthttpcidadesparaquemorggt

Plataforma Global pelo Direito agrave Cidade

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httpslidepdfcomreaderfullserie-cadernos-de-formacao-direito-a-cidade 4041

Direito agrave Cidade | 39

SANTOS M A urbanizaccedilatildeo brasileira Satildeo Paulo Hucitec 1993

SOUZA T C S Corticcedilos em Satildeo Paulo programasvistoriasrelatos 303f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em

Arquitetura) ndash Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Universidade de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 2011

Mateacuterias de imprensa blogs sites documentos

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Secretaria Municipal de Esportes Lazer e Recreaccedilatildeoltwwwprefeituraspgovbrcidadesecretariasesportesgt

Companhia de Engenharia de Traacutefego (CET)ltwwwcetspcombrgt

Rede Nossa Satildeo Pauloltwwwnossasaopauloorgbrgt

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Conselho da Cidadelthttpconselhodacidadeprefeituraspgovbrgt

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8162019 Seacuterie Cadernos de Formaccedilatildeo Direito agrave Cidade

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SAULE JR N amp UZZO K ldquoA trajetoacuteria da reforma urbana no Brasilrdquo Diaacutelogos propostas histoacuteriaspara uma cidadania mundial 2009 Disponiacutevel em lthttpbased-p-hinfoptfichesdphfiche--dph-8583htmlgt Acesso em 3 ago 2015

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VERIacuteSSIMO A A ldquoPorque fomos a Medelliacuten e Bogotaacuterdquo Agrave beira do urbanismo 12 mar 2012 Disponiacutevelem lthttpabeiradourbanismoblogspotcombr201203porque-fomos-medellin-e-bogotahtmlgtAcesso em 3 ago 2015

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Gestatildeo Urbana SPlthttpgestaourbanaprefeituraspgovbrgt

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