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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALProcuradora da República no Pará
EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA 3ª VARA DA SEÇÃO
JUDICIÁRIA DO ESTADO DO PARÁ.
Procedimento Investigatório Criminal nº 1.23.000.001196/2010-80
Inquérito Policial nº 508/2010 SR/DPF/PA
(Distribuição por dependência ao Processo nº 18802-69.2010.4.01.3900)
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por intermédio dos
Procuradores da República signatários, vem, respeitosamente, no uso de suas atribuições
constitucionais e legais, com base nos inclusos Procedimento Investigatório Criminal e
Inquérito Policial, oferecer DENÚNCIA contra:
MAILTON MARCELO SILVA FERREIRA,
SÉRGIO DE SOUZA PIMENTEL;
SANDRA MARIA DE BARAÚNA BARRETO;
Rua Domingos Marreiros, 690 – Umarizal – Belém/PA - CEP 66.055-210 - Fone: (91) 3299-0100www.prpa.mpf.gov.br
RONALDO LUIZ GONZAGA MARTINS ;
ANTONIO DOS SANTOS NETO ;
TEREZA CRISTINA CARVALHO DA ROSA;
FABIO DOS REIS PEREIRA, e
ANTÔNIO MAGALHÃES DA FONSECA, ,
pelas razões a seguir expostas.
Atendendo a pedido do Ministério Público Federal, esta r. 3ª Vara
Federal deferiu, no início do mês de junho de 2010, pedido de busca e apreensão dos
procedimentos licitatórios, contratos e documentos relacionados, vinculados à Secretaria de
Saúde do Município de Belém, relativos aos anos de 2009 e 2010. No bojo dessa medida
cautelar, cuja cópia encontra-se às fls. 23/26 do procedimento investigatório criminal anexo,
ficou consignado expressamente a ordem para se apreenderem as Concorrências Públicas nº
001/2010 – CPL/SESMA/PMB e nº 002/2010 – CPL/SESMA/PMB.
A decisão determinando a busca e apreensão desses procedimentos
deveu-se a denúncias recebidas pela Procuradoria da República, que noticiavam fraudes
abertas realizadas no bojo desses certames, em evidente prejuízo à sociedade e aos recursos
públicos, de origem federal. As notícias revelavam que as empresas interessadas nas licitações
estariam participando ativamente da elaboração dos editais das concorrências, inclusive da
fixação dos critérios que seriam observados na definição da empresa vencedora, com o que os
envolvidos na fraude já saberiam, de antemão, quem venceria o certame.
A busca e apreensão ocorreu de forma exitosa, com o auxílio da
Polícia Federal, que realizou a medida. Os autos apreendidos, dessa forma, foram acautelados
na sede da Procuradoria da República no Pará, onde se iniciou um minucioso processo de
análise dos procedimentos, com a colaboração valiosa da Controladoria-Geral da União,
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medida também autorizada por este r. Juízo, em decisão cuja cópia foi juntada à fl. 36 do PIC
1.23.000.001196/2010-80.
O resultado dessa investigação, após algumas semanas de trabalho,
revelou a existência, no bojo da Secretaria de Saúde de Belém, de uma verdadeira quadrilha,
especializada em dilapidar o patrimônio público, através de fraudes em licitações de vultosos
valores. Os elementos de informação colhidos não apenas confirmam as denúncias
inicialmente recebidas, como ampliam as ilicitudes, conforme se demonstra a seguir.
Esta ação penal cuida especificamente da Concorrência Pública nº
001/2010 – CPL/SESMA/PMB e da Concorrência Pública nº 002/2010 –
CPL/SESMA/PMB.
Registre-se, logo no princípio, o objeto dessas licitações.
A Concorrência Pública nº 001/2010 da SESMA, cujo procedimento
ocupa todo o Anexo I do PIC nº 1.23.000.001196/2010-80, tem por objeto a contratação de
empresa para implantação e implementação de infraestrutura e tecnologia do SERVIÇO DE
ATENDIMENTO MÓVEL DE EMERGÊNCIA (SAMU) em Belém. O valor estimado dos
serviços, conforme presente no Edital da Concorrência (fl. 54 do Anexo I, cláusula 4.1), é de
R$ 6.480.000,00 (seis milhões quatrocentos e oitenta mil reais), para o período de 12
meses.
Por sua vez, a Concorrência Pública nº 002/2010 da SESMA, cujo
procedimento está no Anexo II do PIC nº 1.23.000.001196/2010-80, tem por objeto a
implantação de infraestrutura e tecnologia com manutenção para atender a assistência básica
do município de Belém, através do PROGRAMA ALÔ SAÚDE – ATENÇÃO E
ASSISTÊNCIA DOMICILIAR. O valor estimado dos serviços, consoante cláusula 4.1 do
Edital dessa Concorrência (fl. 33 do Anexo II), é de R$ 4.356.000,00 (quatro milhões
trezentos e cinquenta e seis mil reais), para o período de 12 meses.
Importante assinalar, também, que tais recursos, os quais, no conjunto,
ultrapassam 10 milhões de reais, possuem origem federal, de acordo com informação
constante do relatório elaborado pela Controladoria-Geral da União, às fls. 03/05 do Anexo
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III. Nele, a CGU consigna que os recursos são provenientes do Fundo Nacional de Saúde.
Feita essa introdução, segue a descrição dos inúmeros delitos
identificados pela investigação.
O CONTEXTO FÁTICO DOS CRIMES
Na passagem do ano 2009 para 2010, houve profunda mudança nos
cargos de direção da Secretaria de Saúde de Belém. Logo no início de 2010, assumiu o cargo
de Secretário Municipal o denunciado e atual Secretário de Saúde SÉRGIO DE SOUZA
PIMENTEL. A seu lado, como Diretor Geral da SESMA, assumiu o também denunciado
MAILTON MARCELO SILVA FERREIRA.
Um das primeiras decisões tomadas pelos dois gestores foi a
desativação do setor de controle interno até então existente na Secretaria de Saúde e que tinha
a atribuição de velar pela legitimidade das licitações e contratos. Com essa desativação,
SÉRGIO PIMENTEL e MAILTON FERREIRA distribuíram os servidores que compunham o
setor de controle interno para outros órgãos e, nesse contexto, constituíram a Comissão
Permanente de Licitações da SESMA.
Consigne-se um dado relevante: até o ano de 2009, as licitações da
Secretaria de Saúde eram todas realizadas no âmbito da própria Prefeitura de Belém, por meio
de uma comissão que centralizava todas as licitações do município. Em 2010, essa sistemática
foi alterada, e as licitações da SESMA passaram a ser feitas na própria Secretaria de Saúde,
por intermédio do Núcleo de Licitações assim formado.
De acordo com a Portaria nº 0056/2010 – GABS/SESMA/PMB, de 10
de fevereiro de 2010, do Gabinete do Secretário SÉRGIO PIMENTEL (fl. 53 do Anexo I e fl.
45 do PIC 1.23.000.001196/2010-80), foi nomeada para a condição de presidente da
Comissão Permanente de Licitação da SESMA a denunciada SANDRA MARIA DE
BARAÚNA BARRETO. Como componentes e formando a equipe de apoio da comissão, a
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portaria incluiu alguns servidores, entre eles SÔNIA HELENA DE ARAÚJO PENA, MARIA
DA CONCEIÇÃO BARRA RIBEIRO e TELMA CRISTINA LIMA E SILVA.
Essas servidores foram ouvidos pelo Ministério Público Federal e
Polícia Federal, e confirmaram como ocorreu a criação da Comissão de Licitações da
SESMA, após a desativação do setor de controle interno:
MARIA DA CONCEIÇÃO BARRA RIBEIRO (fls. 47/49 do PIC):
“(...) em abril de 2009, o Dr. Antonio Carlos Vinagre foi nomeado Secretário de Saúde, e a declarante foi chamada para integrar o setor de controle interno da Secretaria; em janeiro de 2010, entrou na SESMA o novo Secretário Sérgio Pimentel, juntamente com o atual Diretor-Geral e Coordenador-Geral Mailton Ferreira; em janeiro de 2010, foi determinada a desativação do setor de controle interno; até o fim de 2009, as licitações de todas as as secretarias do município eram feitas na própria Prefeitura de Belém (…) a partir de janeiro de 2010, quando assumiram o Secretário Sérgio Pimentel e do Diretor-Geral Mailton Ferreira, os dois fizeram uma reunião desativando o controle interno da Secretaria, não documentalmente, mas na prática; nessa época (2010), as licitações não eram mais feitas na Prefeitura, mas sim no âmbito da própria Secretaria de Saúde”
SÔNIA HELENA DE ARAÚJO PENA (fls. 58/60 do PIC):
“é servidora concursada do Município de Belém, desde 1987, trabalhando, desde o início de 2010, no núcleo de licitações da Secretaria de Saúde de Belém; que, no mês de janeiro de 2010, assumiu a Secretaria de Saúde o atual Secretário SÉRGIO DE SOUSA PIMENTEL, bem como MAILTON DA SILVA FERREIRA como Diretor Geral dessa Secretaria; que, logo na primeira semana de sua gestão, o Diretor Geral MAILTON DA SILVA determinou a desativação do setor de controle interno que existia na Secretaria; que, entre os meses de janeiro e fevereiro de 2010, o Diretor Geral e o Secretário determinaram a criação de um Núcleo de Licitações e Contratos específico da Secretaria de Saúde de Belém; Que, nesse período, a declarante trabalhava no setor de contratos e convênios da SESMA e passou a fazer partes desse núcleo de licitações e contratos;”
A própria denunciada SANDRA MARIA DE BARAÚNA BARRETO,
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que foi nomeada presidente da Comissão Permanente de Licitação da SESMA, confirmou
esses fatos, às fls. 77/78 do PIC, verbis:
“é servidora do município de Belém desde 2005, exercendo cargo em comissão, mas ingressou na Secretaria de Saúde de Belém apenas em 2009, na gestão do Secretário Antonio Carlos Vinagre; inicialmente, trabalhava na homologação das licitações que eram realizadas na Prefeitura de Belém, relativamente aos serviços da SESMA; em 2009, existia na SESMA um setor de controle interno; no início de 2010, assumiu na SESMA, como Secretário o Dr. Sérgio Pimental e como Diretor-Geral Mailton Ferreira; no início de 2010, o Secretário Sérgio Pimentel e o Diretor-Geral Mailton Ferreira desativaram o setor de controle interno da SESMA, realocando os servidores para outras áreas; a declarante, em 2010, foi indicada para ser presidente do Núcleo de Licitações, assumindo essa função; no ano de 2010, as licitações não mais eram feitas na Prefeitura de Belém, mas na própria Secretaria de Saúde, mais precisamente no Núcleo de Licitações”
Extinto o controle interno e constituída a Comissão Permanente de
Licitação da Secretaria de Saúde, os dois primeiros certames que o grupo teve a atribuição de
organizar foram, precisamente, as Concorrências Públicas 001/2010 (SAMU) e 002/2010
(ALÔ SAÚDE), objetos desta ação penal.
Entre os meses de fevereiro e março de 2010, a presidente da CPL
SANDRA MARIA DE BARAÚNA BARRETO foi até a sala do Núcleo de Licitações, onde
comunicou que o Diretor Geral MAILTON FERREIRA havia determinado a realização das
Concorrências Pública 001/2010 e 002/2010. As servidoras que compunham a CPL, SÔNIA
HELENA DE ARAÚJO PENA, MARIA DA CONCEIÇÃO BARRA RIBEIRO e TELMA
CRISTINA LIMA E SILVA receberam, assim, ordem para elaborarem o edital dessas
concorrências, sem terem acesso a qualquer documento da fase interna das licitações, ou seja,
não tiveram conhecimento das cotações de preços e dos termos de referência respectivos.
A ordem, vinda do Diretor Geral MAILTON FERREIRA, era para que
a comissão elaborasse o edital com a máxima urgência. Na verdade, verificou-se que as fases
internas das licitações foram todas montadas, com datas retroativas, conforme informou a
servidora SONIA HELENA DE ARAÚJO PENA , à fl. 58 do PIC. MAILTON FERREIRA,
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Diretor-Geral da SESMA, passou a determinar como o edital deveria ser redigido.
Vejam-se as declarações das servidoras, nesse particular:
MARIA DA CONCEIÇÃO BARRA RIBEIRO (fls. 47/49 do PIC):
“(...) em relação às licitações do SAMU e do ALO SAÚDE, aproximadamente no fim de fevereiro de 2010, a presidente da CPL SANDRA MARIA DE BARAÚNA BARRETO chamou os membros da CPL, dizendo que o Dr. Mailton Ferreira tinha determinado a realização de duas importantes licitações, as concorrências 01/2010 e 02/2010; não sabe como surgiu a fase interna dessas duas licitações, pois nunca viu esses documentos; apenas recebeu, juntamente com TELMA CRISTINA LIMA E SILVA, a ordem para elaborar os editais, as minutas de contratos, os termos de referência e outros documentos como declarações exigidas; essa ordem foi dada pela presidente da CPL, Sandra Barreto, que apenas a repassou, pois a mesma era originada de Mailton Ferreira; a declarante passou a sentir angústia pessoal, pois os dados foram impostos por Mailton Ferreira, por meio de Sandra; por exemplo, a declarante queria colocar cláusulas de garantias no edital, tendo em vista o alto valor e a importância das licitações, mas foi impedida, também questionou quantas pessoas seriam contratadas etc.; a forma como foi feita a publicação do aviso dessas concorrências veio de Sandra e Mailton, os quais proibiram que constasse os nomes SAMU e ALO SAÚDE;”
TELMA CRISTINA LIMA E SILVA (fls. 55/57 do PIC):
“que aproximadamente no dia 23 de março de 2010, a declarante, juntamente com MARIA DA CONCEIÇÃO e SONIA PENA, foram comunicadas por SANDRA BARRETO, de uma ordem do Diretor Geral MAILTON FERREIRA, para que se desse início imediato à elaboração do edital das duas primeiras licitações de 2010 da CPL da SESMA, com a máxima urgência; tratava-se das Concorrências Públicas 01/2010 e 02/2010, do SAMU e ALO SAÚDE, que tem certeza que tal comunicação ocorreu numa terça-feira, e que a ordem era para que as publicações nos diários oficiais do Estado e da União ocorressem até a sexta-feira da mesma semana; que tinham alguns dias para fazer tudo; que a partir dessa data iniciaram diversos transtornos; que não tiveram acesso à documentação da fase interna das licitações, tendo que elaborar os editais sem conhecimento da origem; não sabiam sequer a estimativa de preços, não tiveram acesso a termo de referência, cotação, estimativas, o que deu ensejo a diversos questionamentos feitos pela declarante à presidente da CPL Sandra Barreto (…) que
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chegou a discutir, juntamente com MARIA DA CONCEIÇÃO BARRA RIBEIRO, com a presidente da comissão, SANDRA BARRETO; que SANDRA mencionou apenas que tinham que preparar o edital de qualquer jeito, pois eram ordens expressas dos gestores da Secretaria; dentre os questionamentos feitos pela declarante, pode-se mencionar que a mesma vislumbrou equívocos em relação à inexistência de cláusulas de garantias no edital, tendo em vista o alto valor e a importância das licitações, a falta de cotação e estimativa de preços, a metragem exigida das empresas nas licitações do SAMU, que parecia não ter sentido, a inexistência dos equipamentos que iam compor as ambulâncias, o edital era muito vago; que Sandra, repassando ordens, não permitiu as observações, mandando tirar as cláusulas de garantia do edital, transmitindo ordens de Mailton Ferreira; que Sandra, repassando ordens de Mailton, proibiu que constasse os nomes SAMU e ALO SAÚDE nas publicações dos editais”
SÔNIA HELENA DE ARAÚJO PENA (fls. 58/60 do PIC):
“Que, no início do mês de março de 2010 começou a movimentação, na Secretaria, para a elaboração dos editais das concorrências nº 01 e 02 de 2010, referentes aos serviços SAMU e ALÔ SAÚDE; que, antes mesmo da cotação de preços, termos de referência e dos memorandos indicando a necessidade dos serviços, os editais já estavam prontos; que aquelas etapas iniciais foram todas montadas, com datas retroativas”
Os gestores da Secretaria de Saúde, personalizados na figura do
Diretor Geral MAILTON FERREIRA, davam ordens à CPL por meio de sua presidente,
SANDRA BARAÚNA, impondo a redação dos editais das concorrências do SAMU e ALÔ
SAÚDE, sem observar a legislação. Determinaram a realização dos editais das concorrências
sem as respetivas fases internas, que foram forjadas, posteriormente, com datas retroativas;
impediram a previsão de cláusulas de garantias no edital; determinaram cláusulas imprecisas e
vagas; proibiram que as publicações feitas na imprensa contivessem os nomes SAMU e ALÔ
SAÚDE, para diminuir o interesse de empresas idôneas, tudo conforme declarado pelas
servidoras então componentes da CPL e verificado pela CGU, no relatório presente no
procedimento investigatório, que será objeto de abordagem ainda nesta ação penal.
A ousadia da quadrilha, contudo, não se esgota aqui. O sentimento de
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impunidade e o desejo de dilapidar o patrimônio público fez com que o Diretor Geral
MAILTON FERREIRA levasse até a sala da Comissão de Licitação da Secretaria os dois
empresários proprietários das empresas que posteriormente participariam das Concorrências
Públicas, como licitantes, para o quase inacreditável fim de determinar a redação do edital
das concorrências.
MAILTON FERREIRA apresentou aos membros da comissão
responsável pela elaboração dos editais das Concorrências Públicas 01/2010 e 02/2010 os
empresários RONALDO LUIZ GONZAGA MARTINS e ANTONIO DOS SANTOS NETO,
proprietários, respectivamente, das empresas licitantes ALUCAR LOCADORA DE
VEÍCULOS LTDA e RESGATE BELÉM SERVIÇOS DE UNIDADES MÓVEIS LTDA,
sob o falso argumento de que seriam pessoas experientes, que auxiliariam a comissão na
redação das cláusulas dos editais, tendo em vista sua complexidade.
A ilicitude foi tal que, durante três dias, a presidente da CPL
SANDRA MARIA DE BARAÚNA BARRETO dirigiu-se, levando consigo as servidoras
SÔNIA HELENA DE ARAÚJO PENA e MARIA DA CONCEIÇÃO BARRA RIBEIRO, até
a sede da empresa licitante ALUCAR, localizada na Travessa Rui Barbosa, nesta capital, onde
receberam dos empresários RONALDO LUIZ GONZAGA MARTINS e ANTONIO DOS
SANTOS NETO ordens sobre como as cláusulas dos editais deveriam ser redigidas. Os
empresários, nessa oportunidade, impuseram que o edital fosse vago em inúmeros pontos,
especificaram o tamanho do imóvel onde os serviços licitados deveriam funcionar, inclusive
seus compartimentos, não permitiram a previsão de caução ou outra garantia, disseram que,
nas publicações do Diário Oficial e imprensa comercial, não poderia haver referência aos
nomes SAMU e ALÔ SAÚDE, entre outras determinações.
Todas as servidoras da CPL ouvidas na investigação confirmam esses
fatos estarrecedores, como se vê nas seguintes transcrições:
MARIA DA CONCEIÇÃO BARRA RIBEIRO (fls. 47/49 do PIC):
“na época da elaboração do edital, o Diretor Geral Mailton Ferreira foi à sala do núcleo de licitações e apresentou dois senhores, um de nome ANTONIO NETO, advogado, e o outro RONALDO, empresário, dizendo que os mesmos iriam orientá-las
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na elaboração dos editais do SAMU e do ALO SAUDE; após esse encontro, a declarante foi designada, juntamente com Sônia Pena e Sandra Barreto, para irem a um escritório desses senhores, localizado salvo engano na Rua Rui Barbosa, sede de uma empresa de aluguel de veículos; lá chegando, encontraram ANTONIO NETO e RONALDO, os quais passaram a orientar todos os dados que deveriam constar no edital; a declarante questionou inúmeros pontos do edital com ANTONIO NETO, como a falta de estipulação de cláusulas de garantias e a falta de clareza do objeto da licitação, pois este esteva truncado, mas os empresários proibiram suas observações, impondo a falta de clareza; ANTONIO NETO e RONALDO também determinaram a inclusão no edital de vistorias técnicas nos imóveis das empresas licitantes”
SÔNIA HELENA DE ARAÚJO PENA (fls. 58/60 do PIC):
“Que a declarante, juntamente com as servidoras SANDRA MARIA DE BARAÚNA BARRETO (Presidente da CPL) e MARIA DA CONCEIÇÃO BARRA RIBEIRO, compareceram, no início de março de 2010, à sede da empresa ALUCAR LOCADORA DE VEÍCULOS LTDA EPP, localizada na Trav. Rui Barbosa, nesta cidade, por três vezes, local onde foram recebidas pelo proprietário da ALUCAR RONALDO LUIZ GONZAGA MARTINS, e por seu compadre ANTONIO DOS SANTOS NETO; que a ordem para comparecerem a esta empresa foi dada por SANDRA MARIA, presidente da CPL e que tinha contato direto com o Diretor Geral MAILTON FERREIRA, apenas transmitindo a determinação deste; que, na sede da empresa, receberam, de RONALDO e ANTONIO, orientações para a elaboração dos editais das concorrências nº 01/2010 e 02/2010; que, em relação ao edital nº 01/2010, do SAMU, receberam as seguintes orientações, entre outras de que não se recorda: especificações sobre o tamanho da área do imóvel a ser vistoriado (mínimo 1.400 metros quadrados), bem como das dimensões de suas edificações (tamanhos de salas etc.), o que restringe a participação de outras empresas; não permitiram que se exigisse caução, o que era prudente em uma concorrência desse porte para resguardar o patrimônio público; nas publicações do Diário Oficial não poderia haver referência aos termos SAMU e ALO SAÚDE, pois poderiam suscitar interesse de participantes; além disso, não permitiram que se previssem especificidades das obrigações das contratadas, como o número de computadores ou a quantidade de atendentes a serem disponibilizados”
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TELMA CRISTINA LIMA E SILVA (fls. 55/57 do PIC):
“que na mesma semana viu dois senhores, apontados por Sandra e Sonia como ANTONIO NETO e RONALDO, em uma mesa no núcleo de licitações, repassando orientações sobre a elaboração dos editais do SAMU e ALO SAÚDE; que ouviu conversas, entre os membros do núcleo, de que esses dois senhores fariam parte da empresa vencedora das concorrência; que não teve contato direto com essas pessoas, mas presenciou o contato deles sempre com a presidente da CPL, em duas ocasiões; que ficou sabendo que colegas tiveram que ir até a sede da empresa de um deles, para obtenção de informações para a redação do edital”
A própria denunciada SANDRA MARIA DE BARAÚNA BARRETO,
presidente da CPL à época, confirma essas informações às fls. 77/78:
“as duas primeiras licitações realizadas em 2010, na gestão de Sérgio Pimentel e Maiton Ferreira, foram as Concorrências Públicas 01/2010 e 02/2010, referentes ao serviços SAMU e ALO SAÚDE; o Diretor Geral Mailton Ferreira determinou que essas licitações fossem feitas com urgência; durante a elaboração dos termos de referências dessas duas concorrências, Mailton Ferreira levou ao Núcleo de Licitações dois empresários, de nomes RONALDO e ANTONIO NETO, para auxiliarem as servidoras na elaboração de suas cláusulas, alegando que o trabalho seria complexo; que foram indicadas, para a elaboração do termo de referência dessas concorrências, as servidoras Conceição, Telma, Sônia Helena e a declarante; que o termo de referência da licitação do SAMU (Concorrência Pública 01/2010) não foi feito no Departamento de Urgência e Emergência (DEUE), como consta do procedimento, mas pelas servidoras do próprio Núcleo de Licitações, com a orientação dos dois empresários citados; que nesse período, a declarante voltou ao tratamento psicológico, tendo em vista a pressão que sofria na SESMA; que, durante a elaboração do termo de referência das Concorrências Públicas 01/2010 e 02/2010, o Diretor-Geral Mailton Ferreira determinou à declarante que levasse algumas servidoras do Núcleo de Licitações à sede da empresa ALUCAR; que a declarante repassou essa ordem e foi, juntamente com as servidoras responsáveis pela elaboração dos editais e termos de referência, à sede da ALUCAR, localizada na Rua Rui Barbosa, onde continuaram a receber orientações, dos empresários RONALDO e ANTONIO NETO, sobre como deveriam redigir os termos de referência das duas licitações referidas”
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Os dois empresários citados pelas servidoras da SESMA ouvidas são
os denunciados RONALDO LUIZ GONZAGA MARTINS e ANTONIO DOS SANTOS
NETO.
RONALDO LUIZ é sócio proprietário e administrador da empresa
ALUCAR LOCADORA DE VEÍCULOS LTDA, conforme se verifica nos contratos sociais
dessa pessoa jurídica, juntados às fls. 105/111 do Anexo I (Concorrência 001/2010, SAMU) e
118/124 do Anexo II (Concorrência 002/2010, ALO SAÚDE). Além disso, é quem
pessoalmente representou a empresa ALUCAR nas duas concorrências em destaque,
consoante se verifica nas assinaturas apostas às 101/104 do Anexo I e fls. 115/117 do Anexo
II. A ALUCAR foi a única empresa que “concorreu” com a vencedora RESGATE BELÉM,
nessas duas licitações.
ANTONIO DOS SANTOS NETO é sócio proprietário e único
administrador da empresa RESGATE BELÉM – SERVIÇOS DE UNIDADES MÓVEIS
LTDA, consoante contrato social às fls. 144/147 do Anexo I e 93/96 do Anexo II.
Consequentemente, foi quem representou a empresa nas Concorrências Públicas 001/2010 e
002/2010, assinando, por exemplo, as declarações exigidas pelos editais (fls. 140/143 do
Anexo I e 88/91 do Anexo II).
A empresa RESGATE BELÉM foi a vencedora das duas
concorrências, nas quais “disputou” apenas como a empresa ALUCAR. Como se percebe, as
concorrências públicas não passaram de um engodo, pois os empresários proprietários das
pessoas jurídicas licitantes agiram conjuntamente na elaboração dos editais, ditando seus
textos à Comissão Permanente de Licitação da SESMA.
Note-se, por exemplo, que, na Ata de Recebimento e Abertura das
Documentações e Propostas Financeiras da Concorrência nº 001/2010 (fls. 163/4 do Anexo I),
ocorrida em 28 de abril de 2010, foi concedido prazo para a concorrente RESGATE BELÉM
providenciar CERTIDÃO DE REGULARIDADE FISCAL DA FAZENDA PÚBLICA
MUNICIPAL. A empresa ALUCAR LOCADORA DE VEÍCULOS LTDA, na oportunidade,
apenas “abriu mão do prazo de recurso”, sem formular qualquer impugnação à deficiência
documental de sua concorrente.
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Nova Ata de Abertura das Propostas Financeiras foi lavrada no dia 05
de maio de 2010 (fls. 173/4 do Anexo I). Nela, observa-se que a empresa RESGATE BELÉM
sagrou-se vencedora da Concorrência Pública 001/2010, apresentando proposta com menor
preço global, no valor de R$ 5.952.000,00 (cinco milhões novecentos e cinquenta e dois
mil reais).
Como dito, a empresa REGATE BELÉM também sagrou-se vencedora
da outra licitação, vencendo a mesma firma concorrente, ALUCAR LOCADORA DE
VEÍCULOS LTDA, na forma da Ata de Abertura das Propostas Financeiras da Concorrência
002/2010, às fls. 150/151 do Anexo II. Na ocasião, RESGATE BELÉM SERVIÇOS DE
UNIDADES MÓVEIS LTDA apresentou menor proposta de preço global, no importe de R$
4.362.800,00 (quatro milhões trezentos e sessenta e dois mil e oitocentos reais).
Em seguida, após a homologação do resultado, os objetos das
concorrências foram adjudicados à vencedora, seguindo-se a celebração dos contratos com a
Secretaria de Saúde de Belém. Os instrumentos contratuais estão juntados às fls. 188 e
seguintes do Anexo I (Contrato nº 085/10 SESMA/PMB, no valor de R$ 5.952.000,00) e fls.
178 e seguintes do Anexo II (Contrato nº 086/10 – SESMA/PMB, valor de R$ 4.362.800,00).
Com os dois contratos, a empresa RESGATE BELÉM habilitou-se
a receber o montante de R$ 10.314.800,00 (dez milhões, trezentos e quatorze mil e
oitocentos reais) provenientes da Saúde de Belém, em 12 meses.
Observando-se esse elevadíssimo volume de recursos, chama atenção
(INFORMAÇÃO SIGILOSA)
Tais elementos revelam que a empresa RESGATE BELÉM foi
estruturada apenas para participar das Concorrências Públicas nº 001/2010 e 002/2010, com a
certeza de que seria a vencedora. Os editais dessas licitações, aliás, foram publicados poucos
dias após as alterações cadastrais da firma, ou seja, em 29 de março de 2010 para a
Concorrência 001/2010 (fl. 66 e 94 do Anexo I) e em 31 de março de 2010 para a
Concorrência 002/2010 (fls. 45 e 80 do Anexo II).
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Consolidando as investigações, cujos dados já revelados tornam
inequívoca a atuação da quadrilha composta pelos denunciados, é necessário destacar os
principais tópicos que compõem o relatório produzido pela Controladoria-Geral da União, que
forma o Anexo III do PIC, os quais deixam ainda mais evidentes os crimes praticados.
ILICITUDES APONTADAS NO RELATÓRIO DA CGU REFERENTES À
CONCORRÊNCIA Nº 001/2010 (SAMU)
a) COTAÇÃO DE PREÇOS
No início das duas concorrências em exame, a Secretaria de Saúde
oficiou a algumas empresas que, supostamente, atuariam no ramo empresarial dos serviços
que seriam licitados, a fim de obter cotação dos preços de tais serviços, chegando, ao fim, a
um preço médio de referência para nortear toda a licitação.
No caso da Concorrência Pública 001/2010, à fl. 13 do respectivo
procedimento (Anexo I), os denunciados MAILTON M. SILVA FERREIRA e SANDRA
MARIA DE BARAÚNA BARRETO determinaram, no início de março de 2010, que a
Comissão de Licitação realizasse a respectiva cotação de preços, para, em seguida, licitar o
serviço SAMU.
Três empresas foram convidadas pela Secretaria de Saúde para
apresentarem cotação de preços: a empresa ALCABOX COM VAREJ DE EQUIP E SUPRIM
DE INF LTDA (cotação às fls. 15/21 do Anexo, orçando valor mensal, para 12 meses, de R$
538.000,00), a empresa BEST BRASIL COMÉRCIO DE PRODUTOS PARA SEGURANÇA
LTDA (fls. 22/35 do Anexo I, com valor mensal de R$ 548.000,00) e SANTOS NETO & CIA
LTDA (fls. 36/48, com valor mensal de R$ 534.000,00).
Com essas cotações, a Secretaria, à fl. 49 do Anexo I, chegou ao preço
médio da licitação: R$ 540.000,00 mensais e R$ 6.480.000,00 no total geral.
Contudo, as investigações revelaram que todo esse processo de
cotação inicial de preços foi montado pela quadrilha ora denunciada.
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Inicie-se esse exame com a retomada dos depoimentos colhidos, nesse
particular. Na Polícia Federal, às fls. 77/78 do incluso IPL nº 508/2010, foi ouvida CHISTINA
CANDIDA FALCÃO DE MENEZES, servidora pública que trabalhava precisamente no
Setor de Compras da SESMA, responsável pela realização das cotações de preços dos
processos licitatórios da Secretaria de Saúde. Em relação às Concorrências 001/2010 e
002/2010, a servidora foi enfática ao dizer que as cotações já chegaram prontas ao setor que
deveria fazê-las, verbis:
“QUE mesmo com a saída de VINAGRE a declarante manteve seu cargo em Comissão como Chefe, no Setor de Compras, com o ingresso do novo Secretário, Sr. Pimentel; QUE o setor de compras avalia todos os processos para realizar quotação de preços para qualquer aquisição de bens / serviços efetivados por meio de procedimentos licitatórios; QUE normalmente chega o procedimento licitatório em seu início para o próprio setor de compras realizar quotações perante as empresas; QUE em relação às quotações referentes à Concorrência 01/2010 e 02/2010, licitações do Alô Saúde e Samu, o procedimento licitatório já chegou com as quotações das empresas, sendo determinado à declarante que apenas realizasse o mapa e datasse; QUE não conhece a empresa ALCABOX TECNOLOGIA, BEST BRASIL e SANTOS NETO E CIA, nem mesmo seus representantes; QUE quem trouxe a documentação já pronta foi a presidente da comissão de licitação, SANDRA MARIA DE BARAÚNA BARRETO; QUE após questionou a MAILTON FERREIRA, Diretor Geral, sobre tal procedimento, uma vez que destoava do procedimento normalmente adotado, mas nada foi alterado (…) QUE há mais procedimentos referentes a licitações em trâmite no ano de 2010 que também chegaram ao Setor de Compras para apenas montar o mapa”.
A montagem na cotação de preços é extraída dos outros depoimentos
colhidos e já transcritos, todos de servidoras da CPL:
MARIA DA CONCEIÇÃO BARRA RIBEIRO (fls. 47/49 do PIC):
“(...) em relação às licitações do SAMU e do ALO SAÚDE, aproximadamente no fim de fevereiro de 2010, a presidente da CPL SANDRA MARIA DE BARAÚNA BARRETO chamou os membros da CPL, dizendo que o Dr. Mailton Ferreira tinha determinado a realização de duas importantes licitações, as concorrências 01/2010 e 02/2010; não sabe como surgiu a fase interna dessas duas
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licitações, pois nunca viu esses documentos;”
TELMA CRISTINA LIMA E SILVA (fls. 55/57 do PIC):
“tratava-se das Concorrências Públicas 01/2010 e 02/2010, do SAMU e ALO SAÚDE, que tem certeza que tal comunicação ocorreu numa terça-feira, e que a ordem era para que as publicações nos diários oficiais do Estado e da União ocorressem até a sexta-feira da mesma semana; que tinham alguns dias para fazer tudo; que a partir dessa data iniciaram diversos transtornos; que não tiveram acesso à documentação da fase interna das licitações, tendo que elaborar os editais sem conhecimento da origem; não sabiam sequer a estimativa de preços, não tiveram acesso a termo de referência, cotação, estimativas, o que deu ensejo a diversos questionamentos feitos pela declarante à presidente da CPL Sandra Barreto (…) ”
SÔNIA HELENA DE ARAÚJO PENA (fls. 58/60 do PIC):
“Que, no início do mês de março de 2010 começou a movimentação, na Secretaria, para a elaboração dos editais das concorrências nº 01 e 02 de 2010, referentes aos serviços SAMU e ALÔ SAÚDE; que, antes mesmo da cotação de preços, termos de referência e dos memorandos indicando a necessidade dos serviços, os editais já estavam prontos; que aquelas etapas iniciais foram todas montadas, com datas retroativas”
A análise feita pela auditoria da CGU confirma essa montagem na
cotação.
Inicialmente, o relatório da CGU observa que uma das empresas que
participou da cotação de preços pertence ao mesmo representante da pessoa jurídica
vencedora da Concorrência. De efeito, os sócios ANTONIO DOS SANTOS NETO
(denunciado) e ANDREA LIMA LOPES DOS SANTOS, da empresa SANTOS NETO & CIA
LTDA, são os mesmos sócios da empresa vencedora RESGATE BELÉM SERVIÇOS DE
UNIDADES MÓVEIS LTDA. Isso é confirmado pelos extratos da JUCEPA juntados às fls.
102 e 105 do PIC nº 1.23.000.001196/2010-80.
O relatório da CGU também destaca que, após analisar as três
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cotações de preços apresentadas, comparando-as entre si, perceberam-se fortes indícios de
simulação e de que foram produzidas pela mesma matriz. Nesse sentido, aponta as seguintes
coincidências detectadas (fls. 06/07 do Anexo III):
– Nas três propostas, o item “1.1 – Salas” apresenta-se incompleto,
diferente do termo de referência (fls. 15, 22/23 e 37 do Anexo I);
– Nas três propostas, a palavra “de manutenção” aparece escrita dessa
forma: “demanutenção” (fls. 15, 22 e 37 do Anexo I);
– No item “2.2 – Características Gerais”, o item “a” foi negritado e
sublinhado: a (fls. 16, 24 e 38 do Anexo I);
– No item 2.6, 65dB @ 12.5 Khz está sublinhado (fls. 17, 27 e 40 do
Anexo I);
Todos esse dados denotam o relacionamento existente entre os
responsáveis pelas cotações, revelando a burla à competitividade que marcou o procedimento
e a falsidade ideológica presente nas cotações.
Finalmente, a CGU verificou que as cotações apresentaram apenas o
valor global mensal dos serviços pretendidos, violando o art. 7º, § 2º da Lei 8.666/93, que
exige um orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os custos
unitários. Apenas como exemplo, a auditoria apontou 04 itens dos serviços cotados que,
embora presentes nas propostas, não foram orçados individualmente: 1) prédio com
infraestrutura para abrigar a sede do SAMU-192; 2) CALL-CENTER; 3) Manutenção
preventiva e corretiva dos veículos e equipamentos; 4) Mão-de-obra.
A aceitação desses orçamentos globais, sem a indicação dos preços
unitários, torna impossível conferir a adequação da cotação aos preços do mercado,
multiplicando o risco de inadequação dos valores e comprometendo a credibilidade da
pesquisa.
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b) VISTORIAS FALSAS
No item VIII, 8.1, do Edital da Concorrência Pública 001/2010, foi
prevista uma fase de pré-qualificação das empresas interessadas, consistente em uma vistoria
técnica prévia nos respectivos imóveis, a fim de verificar se os mesmos atendiam às condições
mínimas estabelecidas na concorrência. Essas condições estão encartadas no Anexo I do
referido edital (fl. 67 do Anexo I), no qual foram previstas áreas mínimas para o imóvel em
que seria instalada a sede do SAMU (1.400 m2) e para seus compartimentos (tamanho da
coordenação geral, da sala de estar-médico, dos dormitórios etc.).
A servidora componente da CPL SÔNIA HELENA DE ARAÚJO
PENA, ouvida às fls. 58/60 do PIC, declarou que essas áreas das instalações foram ditadas
pelos empresários denunciados RONALDO LUIZ GONZAGA MARTINS e ANTONIO DOS
SANTOS NETO, quando as servidoras da SESMA foram levadas à sede da empresa
ALUCAR, para restringir a participação de outras concorrentes, conforme descrição já feita.
Segundo SÔNIA:
“que, na sede da empresa, receberam, de RONALDO e ANTONIO, orientações para a elaboração dos editais das concorrências nº 01/2010 e 02/2010; que, em relação ao edital nº 01/2010, do SAMU, receberam as seguintes orientações, entre outras de que não se recorda: especificações sobre o tamanho da área do imóvel a ser vistoriado (mínimo 1.400 metros quadrados), bem como das dimensões de suas edificações (tamanhos de salas etc.), o que restringe a participação de outras empresas;”
As vistorias foram realizadas nas empresas licitantes, ALUCAR
LOCADORA DE VEÍCULOS LTDA e RESGATE BELÉM. Às fls. 99 e 100 do Anexo I
estão os Atestados de Vistoria Técnica Prévia supostamente efetuados na sede dessas
empresas (ALUCAR localizada na Rui Rui Barbosa, nº 341, e RESGATE BELÉM na Rua
dos Mundurucus, nº 1110, Jurunas), ambos assinados pelo Técnico da Área de Engenharia
FÁBIO DOS REIS PEREIRA e pela Técnica da Área de Saúde TEREZA CRISTINA
CARVALHO DA ROSA.
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A investigação comprovou, contudo, que essas vistorias são falsas.
Ouvida na Polícia Federal (fls. 72/73 do IPL nº 508/2010), TEREZA
CRISTINA CARVALHO DA ROSA confessou que nunca esteve nos imóveis para realização
das vistorias:
“QUE mesmo afirmando que não participou do procedimento licitatório, foi indicada para realizar o atestado de vistoria técnica prévia, conforme consta em fls. 100 do apenso I volume I (Concorr. 001/2010 – SESMA), a declarante aduz que nunca esteve no local, tendo indicado que estivesse no local, alguém da coordenação do SAMU, que teria mais condições de avaliação.”
E prossegue TEREZA CRISTINA, alegando que indicou o funcionário
HELENO, do SAMU, para realizar as vistorias em seu lugar:
“QUE indicou o HELENO, do SAMU, para realizar a vistoria como seu representante; QUE não sabe dizer porque o próprio HELENO não assinou o atestado de vistoria técnica prévia, já que o mesmo é técnico da área de saúde; QUE o próprio HELENO afirmou que o local vistoriado, da empresa RESGATE BELÉM SERVIÇOS DE UNIDADES MÓVEIS, na rua dos mundurucus, estava dentro dos padrões exigidos e por este motivo assinou o atestado de vistoria técnica prévia; QUE no período do procedimento licitatório nunca esteve na empresa RESGATE; (…) QUE nunca esteve na empresa ALUCAR LOCADORA DE VEÍCULOS nem conhece seus representantes”
Ocorre que, ouvido também na Polícia Federal (fls. 70/71 do IPL nº
508/2010), o funcionário do SAMU Luiz HELENO Mendes de Oliveira negou que estivesse
nas vistorias representando TEREZA CRISTINA e informou que os imóveis visitados não
estavam em condições para receber os serviços objetos das licitações, como se vê de suas
declarações:
“QUE se recorda que no início do ano, não sabendo precisar o mês, uma pessoa da comissão de licitação, que não sabe dizer o nome, mas mencionado o nome SANDRA, o mesmo se recordou, que se trata da presidente da comissão de licitação, que efetivamente ligou para o declarante solicitando que o mesmo visitasse alguns prédios que poderiam funcionar o SAMU, para verificar as adequações; QUE não sabendo precisar a data, esteve no começo do ano em dois prédios
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juntamente com SANDRA e um outro funcionário, FÁBIO DOS REIS PEREIRA; QUE o primeiro prédio visitado é localizado na RUA RUI BARBOSA, constando no imóvel uma placa com a menção ALUCAR; QUE na visita foram recebidos por um representante da ALUCAR, que não se recorda do nome; QUE observou que o imóvel para funcionamento do SAMU dependia de várias adaptações, com reforma para construir salas e divisórias; QUE o segundo prédio visitado é localizado na rua dos mundurucus, sendo que o declarante, SANDRA e FÁBIO foram recebidos pelo representante do local, de nome NETO; QUE observou neste prédio, que apesar de precisar também de adaptações, considerou que tinha uma melhor estrutura do que o prédio da rua RUI BARBOSA; QUE não chegou a assinar nenhum documento referente às vistorias realizadas; QUE afirmou que não assinaria o termo de vistoria pois não constava do mesmo a necessidade de adaptações que o declarante vislumbrou, mesmo no prédio da RUA DOS MUNDURUCUS, já que este também precisava de reformas e no termo de vistoria não constavam as observações de necessidade de reforma mencionadas pelo declarante; QUE chegou a colocar observações num laudo de vistoria; QUE não sabe dizer porque este laudo não se encontra acostado aos autos da Concorrência 001/2010; QUE no dia seguinte a TEREZA CRISTINA ligou para o declarante para saber sobre as vistorias realizadas, dizendo o declarante para a mesma que o primeiro prédio, da ALUCAR, precisava de muita reforma e que o segundo prédio visitado, apesar de ser melhor, também dependia de adaptações; QUE mencionou a TEREZA CRISTINA que em relação ao segundo prédio o espaço era adequado, mas precisava de mais salas; QUE como não constou do laudo de vistoria que foi apresentado para o declarante assinar as ressalvas referentes à necessidade de reforma e mais salas, preferiu não assinar mencionado laudo; QUE apresentado o Atestado de Vistoria de fls. 100, apenso I, volume I, referente a Conc. 001/2010 da SESMA, o declarante afirmou que deixou de assinar o mesmo em virtude da ausência de observações referentes a necessidade de mais salas; QUE não sabia que TEREZA CRISTINA iria assinar pelo declarante o atestado de vistoria; QUE em nenhum momento o declarante estava como representante de TEREZA CRISTINA; QUE o declarante sabia que estava realizando as vistorias como representante do SAMU; QUE não sabe dizer porque TEREZA CRISTINA assinou o Atestado de Vistoria de fls. 100 da Conc. 001/2010;”
O técnico FÁBIO DOS REIS PEREIRA também assinou os atestados
de vistoria consignando que os imóveis possuíam as dimensões exigidas pelo edital, mas,
ouvido na Polícia, assinalou que o espaço necessitava de reformas, mais salas e, inclusive, da
construção de um segundo pavimento. Confirmou, ainda, que TEREZA CRISTINA não
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acompanhou as vistorias. Suas declarações foram juntadas às 68/69 do IPL 508/2010, ocasião
em que disse:
“QUE se recorda que começo do ano, não sabendo precisar o mês, recebeu uma ligação da SANDRA, presidente de comissão de licitação, para realizar uma vistoria técnica para implementação de um local para o SAMU; QUE foram visitados dois locais, sendo que estavam presentes a SANDRA, o declarante e HELENO, que trabalha no SAMU; QUE foi visitado um imóvel na RUA RUI BARBOSA, que tem uma placa com identificação de ALUCAR, sendo verificado que o espaço físico não era viável; QUE no referido imóvel havia um representante da ALUCAR, mas não se recorda do nome; QUE foi visitado também pelo declarante, SANDRA e HELENO um outro imóvel localizado na rua mundurucus, sendo recebido pelo representante da empresa RESGATE BELEM, de nome NETO; QUE considerou o imóvel localizado na MUNDURUCUS adequado pelo espaço físico existente, mas que o mesmo precisava de reformas e mais salas, inclusive com a necessidade de construção de um segundo pavimento; QUE confirma que assinou o atestado de vistoria constante em fls. 100 da Conc. 001/2010 (apenso I volume I), considerando que inexistia a necessidade de realizar observações quanto a reformas e salas; QUE assinou o atestado de vistoria já na sede da Prefeitura, tendo o mesmo sido entregue ao declarante pela SANDRA; QUE não sabe dizer porque TEREZA CRISTINA assinou o mencionado atestado uma vez que quem acompanhou a vistoria foram apenas a SANDRA, o declarante e HELENO;”
É fácil perceber, assim, que os resultados das vistorias técnicas foram
completamente forjados, pois os imóveis visitados não possuíam as dimensões exigidas no
edital, donde a falsidade ideológica dos atestados.
A CGU, conforme fls. 17/18 do Anexo III, efetuou circularização no
imóvel da empresa vencedora RESGATE BELÉM. A circularização, com visita in loco, foi
feita no período de 28 a 30 de junho de 2010, e constatou, inclusive por meio de fotografias,
que o prédio estava em reforma, sem dispor de instalações prontas para uso. Trata-se de um
galpão, em processo de adaptação. Aliás, como se viu, (INFORMAÇÃO SIGILOSA).
Nada obstante, muito antes da circularização da CGU, no dia 01 de
junho de 2010, o contrato decorrente da Concorrência Pública nº 01/2010 já havia sido
assinado pelo Secretário de Saúde de Belém, SÉRGIO PIMENTEL, conforme fls. 188 e
21
seguintes do Anexo I.
c) RESTRIÇÃO À COMPETITIVIDADE NAS PUBLICAÇÕES DO AVISO DE
LICITAÇÃO
Além dos vários elementos já relacionados, que demonstram a
montagem do processo licitatório da Concorrência 001/2010, com o objetivo claro de
direcionar o certame para a vitória da empresa RESGATE BELÉM, a investigação ainda
identificou outros pontos em que se patenteia a restrição à competitividade na concorrência.
Um dos pontos relevantes está na forma como foi feita a publicidade
dos editais.
Como se percebe, às 93/96 do Anexo I, foram juntadas as publicações
dos avisos de licitação da Concorrência Pública 001/2010, no Diário Oficial da União, no
Diário Oficial do Estado do Pará, no Jornal O Liberal e no Jornal Diário do Pará. A
publicidade, contudo, consigna, no campo do objeto, uma referência genérica a “Contratação
de Serviços Administrativos com Implantação e Implementação de Infraestrutura e
Tecnologia, com obrigatoriedade de Manutenção”, sem fazer qualquer menção ao objeto
SAMU, que é o ponto central da licitação que seria realizada.
O mesmo ocorre com a Concorrência Pública nº 002/2010, cujo
processo será melhor apreciado a seguir. Compulsando-se os autos dessa segunda
concorrência, às fls. 79/82 do Anexo II, nota-se que, no campo objeto, foi publicada expressão
semelhante à da Concorrência 01/2010, é dizer, a genérica “Contratação de Serviços
Administrativos de Implantação de Infraestrutura e Tecnologia com manutenção para atender
a Assistência Básica do Município”, sem fazer referência ao objeto central ALÔ SAÚDE.
Essa voluntária omissão objetivou afastar provável interesse de outras
empresas que poderiam acorrer às concorrências e frustrar os planos da quadrilha em
adjudicar os serviços à firma RESGATE BELÉM, a qual, (INFORMAÇÃO SIGILOSA),
acabou por vencer essas milionárias licitações.
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As testemunhas ouvidas foram explícitas ao dizerem que a CPL estava
proibida de mencionar os nomes SAMU e ALO SAÚDE nas publicações dos avisos das
concorrências:
SÔNIA HELENA DE ARAÚJO PENA (fls. 58/60 do PIC):
“que, na sede da empresa, receberam, de RONALDO e ANTONIO, orientações para a elaboração dos editais das concorrências nº 01/2010 e 02/2010; que, em relação ao edital nº 01/2010, do SAMU, receberam as seguintes orientações, entre outras de que não se recorda: especificações sobre o tamanho da área do imóvel a ser vistoriado (mínimo 1.400 metros quadrados), bem como das dimensões de suas edificações (tamanhos de salas etc.), o que restringe a participação de outras empresas; não permitiram que se exigisse caução, o que era prudente em uma concorrência desse porte para resguardar o patrimônio público; nas publicações do Diário Oficial não poderia haver referência aos termos SAMU e ALO SAÚDE, pois poderiam suscitar interesse de participantes;”
TELMA CRISTINA LIMA E SILVA (fls. 55/57 do PIC):
“que Sandra, repassando ordens de Mailton, proibiu que constasse os nomes SAMU e ALO SAÚDE nas publicações dos editais”
ILICITUDES APONTADAS NO RELATÓRIO DA CGU REFERENTES À
CONCORRÊNCIA Nº 002/2010 (ALÔ SAÚDE)
a) COTAÇÃO DE PREÇOS:
Já foi esclarecido, há pouco, com base nos depoimentos colhidos na
fase investigatória, que a cotação de preços das duas concorrências foi forjada, não tendo
seguido o trâmite normal pelos setores responsáveis da Secretaria de Saúde.
Em relação à Concorrência Pública 002/2010, dos serviços ALÔ
SAÚDE, o relatório da CGU percebeu que dessa cotação participou a própria empresa
ALUCAR LOCADORA DE VEÍCULOS LTDA, que viria a concorrer posteriormente na
qualidade de licitante, donde se intensifica a ausência de idoneidade dos preços adotados pela
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SESMA como preço médio dos serviços.
Além disso, a CGU verificou que todas as três cotações apresentadas
(cotação da empresa ALUCAR LOCADORA DE VEÍCULOS LTDA às fls. 22/23, da
empresa INTER BRASIL RENT A CAR às fls. 24/25 e da empresa CARLOS V LOPES ME
às fls. 26/28, todas do Anexo II) foram feitas de forma sintética, apenas com valor global dos
serviços, demonstrando, assim, sua imprestabilidade para a aferição da compatibilidade dos
orçamentos com o preço real do mercado, e a consequente ofensa ao art. 7º, §2º, II, da Lei
8.666/93.
Para tornar mais claro a imprestabilidade dessa cotação genérica, o
relatório da CGU lista inúmeros itens dentre os serviços pretendidos com a licitação, que
deveriam receber uma cotação individualizada, podendo-se citar os seguintes (fl. 28 do Anexo
III):
“Para tornar mais claro o assunto, listaremos a seguir os itens dos serviços pretendidos, constantes nas especificações (fls. 02 a 20) e que deveriam ter sido cotados individualmente para que o somatório apontasse, de fato, o valor global:
CALL CENTER1- Sala com no mínimo 45m² (deve ser disponibilizada)2- Sistema de vigilância acompanhamento e gerenciamento on line de frota e viaturas3- Expansor/extensão para rádio transceptor4- Estação repetidora VHF/FM5- Sala de plantão/regulação/call center com os seguintes equipamentos; 5.1- Central telefônica digital;5.2- Equipamento console;5.3- Computadores: falta a quantidade do equipamento5.4- Um (01) telão colorido de TV de 42”.
SERVIÇO DE LOCAÇÃO DE VEÍCULOS PARA O PROGRAMA “ALÔ SAÚDE” – ATENÇÃO E ASSISTÊNCIA DOMICILIAR DO MUNICÍPIO DE BELÉM.1- Veículo tipo Van Minibus: 04 unidades2- Veículo Ambulância: 08 unidades3- Motocicletas: 08 unidades
MANUTENÇÃO PREVENTIVA E CORRETIVA DOS VEÍCULOS E EQUIPAMENTOSMÃO DE OBRA
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1- Motoristas: falta a quantidade”
A aceitação desses orçamentos globais, sem a indicação dos preços
unitários, torna impossível conferir a adequação da cotação aos preços do mercado,
multiplicando o risco de inadequação dos valores e comprometendo a credibilidade da
pesquisa.
b) RESTRIÇÃO À COMPETITIVIDADE NAS PUBLICAÇÕES DO AVISO DE
LICITAÇÃO
Como já se registrou quando do exame da Concorrência 001/2010,
também na Concorrência Pública 002/2010, do programa ALO SAÚDE, as publicações dos
avisos da licitação foram todas feitas omitindo-se a denominação principal. A intenção da
quadrilha, como ficou bem claro nos depoimentos já transcritos, foi inibir qualquer
possibilidade de suscitar interesse em empresas concorrentes.
Às fls. 79/82 do Anexo II, no campo objeto, foi publicada expressão
semelhante à da Concorrência 01/2010, é dizer, a genérica “Contratação de Serviços
Administrativos de Implantação de Infraestrutura e Tecnologia com manutenção para atender
a Assistência Básica do Município”, sem fazer referência ao objeto central ALÔ SAÚDE.
Como dito, essa voluntária omissão objetivou afastar interesse de
outras empresas que poderiam acorrer às concorrências e frustrar os planos da quadrilha em
adjudicar os serviços à firma RESGASTE BELÉM, a qual, (INFORMAÇÃO
SIGILOSA), acabou por vencer essas milionárias licitações.
c) MONTAGEM DO PROCESSO LICITATÓRIO
A CGU também realçou alguns indícios que apenas consolidam que
todo o processo da Concorrência do Programa ALO SAÚDE foi falsamente montado.
Entre os indícios, a CGU identificou a existência de três atas de
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aberturas de propostas, referentes a sessões que teriam sido realizadas na mesma data e
horário, com informações conflitantes. Segundo a CGU (fl. 29 do Anexo III):
Empreendendo exame no processo licitatório de Concorrência Pública n.º 002/2010, verificamos que consta nos autos 03 (três) atas. Para melhor entendimento, passemos aos fatos, conforme a ordem crescente de numeração das folhas nos autos:
a) Na leitura da “Ata do recebimento e abertura das documentações e propostas financeiras da concorrência n.º 002/1010-CPL/SESMA/PMB” (fls. 86 e 87), verifica-se que a abertura da CP n.º 002/2010 ocorreu às 10:00hs, do dia 30 de abril de 2010, e a CPL designada pela Portaria nº 0056/2010-GABSESMA/PMB, de 10/02/2010, presidida pela Sra. Sandra Maria de Baraúna Barreto (Assessora do Gabinete do Prefeito e Presidente da CPL), CPF 064.788.672-34, julgou habilitada as duas únicas empresas que compareceram à sessão:
EMPRESAS CNPJALUCAR LOCADORA DE VEÍCULOS LTDA. - EPP
83.732.172/0001-87
RESGATE BELÉM SERVIÇOS DE UNIDADES MÓVEIS LTDA. - EPP
05.604.512/0001-80
Contudo, na mesma ata a CPL, contraditoriamente, solicita que a empresa RESGATE BELÉM SERVIÇOS DE UNIDADES MÓVEIS LTDA. apresente a Certidão de Regularidade Fiscal da Fazenda Pública Municipal. Chama atenção o fato de que esse impasse ocorreu por ocasião da CP n.º 001/2010, deflagrada às 10:00hs do dia 28/04/2010, ocasião em que, como já relatado, foi concedido prazo de 48 horas para a empresa apresentar Certidão de Regularidade Fiscal da Fazenda Pública Municipal.
b) adiante, na “Ata do recebimento e abertura das documentações e propostas financeiras da concorrência n.º 002/1010-CPL/SESMA/PMB” (fls. 148 e 149), verificamos que foi retirado o registro de solicitação para que a empresa RESGATE BELÉM Serviços de Unidades Móveis Ltda. - EPP apresentasse a Certidão de Regularidade Fiscal da Fazenda Pública Municipal. Contudo, não consta nenhum registro de que a mesma saneou a situação. Também não consta na Ata as assinaturas das duas licitantes.
c) depois, na “Ata de abertura das propostas financeiras da concorrência n.º 002/1010-CPL/SESMA/PMB” (fls. 150 e 151), a CPL solicitou os envelopes contendo as propostas financeiras, e após
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exame declarou vencedora a empresa RESGATE BELÉM Serviços de Unidades Móveis Ltda. - EPP.
Interessante notar que as três atas referidas pelo relatório da CGU
consignam o mesmo horário da sessão, isto é, as 10 horas do dia 30 de abril de 2010, com
informações contraditórias, em especial no que se refere à obrigação, imposta à empresa
RESGATE BELÉM, de apresentação da CERTIDÃO DE REGULARIDADE FISCAL DA
FAZENDA MUNICIPAL. Na ata de fls. 86/87, consta essa obrigação, que desaparece, sem
explicação, na ata de fls. 148/149.
O PARECER JURÍDICO NAS CONCORRÊNCIAS 001/2010 E 002/2010
Nos dois processos licitatórios ora analisados, foram juntados
pareceres da lavra do Assessor Jurídico da SESMA ANTONIO MAGALHÃES FONSECA.
Na Concorrência Pública 01/2010 o parecer está juntado às fls. 91/92 (Anexo I) e, na
Concorrência Pública, está às fls. 77/78 do Anexo II.
Uma breve leitura dessas peças demonstra que o Assessor Jurídico
ANTONIO MAGALHÃES FONSECA estava integrado à cadeia dos crimes praticados, pois
não realizou mínima análise das flagrantes ilegalidades presentes nos procedimentos.
Apresentou, ao contrário, pareceres com o mesmo texto, apenas afirmando que os processos
estavam de acordo com o ordenamento jurídico.
Voluntariamente omitiu-se em observar elementos de evidente
ilegitimidade, como os orçamentos genéricos nas cotações de preços, sem definição de preços
unitários dos serviços cotados; inúmeras cláusulas vagas e imprecisas nos editais; a restrição à
publicidade nos avisos de licitação publicados na imprensa oficial, sem referência aos objetos
SAMU e ALÔ SAÚDE; a ausência de cláusulas de garantias nas concorrências; a proibição
de contratação de consórcios de empresas, entre outras várias ilegalidades, conforme já
apontado.
Aliás, o primeiro exame que se faz dos pareceres jurídicos é suficiente
27
para que se perceba sua vinculação com a quadrilha. Ambos foram redigidos no mesmo
contexto e para o mesmo fim de dar aparência de legalidade aos procedimentos. Note-se,
nesse sentido, no primeiro parágrafo do parecer juntado na Concorrência 001/2010, que o
assessor ANTONIO MAGALHÃES DA FONSECA afirma que estava a analisar o edital e
contrato administrativo “da licitação nº 002/2010, na modalidade da concorrência
pública”, donde se verifica que não se deu ao trabalho sequer de mudar o número das
licitações.
A PARTICIPAÇÃO DE CADA DENUNCIADO E OS TIPO PENAIS
O primeiro denunciado MAILTON MARCELO SILVA FERREIRA
é o atual Diretor Geral da Secretaria de Saúde de Belém, função que exerce desde o início de
2010. É responsável por organizar e coordenar os procedimentos licitatórios realizados na
Secretaria e foi o principal articulador dos crimes ora narrados.
MAILTON FERREIRA ocupa função de destaque na organização
criminosa denunciada. As testemunhas ouvidas, como se viu, foram enfáticas ao pôr em
relevo o Diretor Geral como a pessoa que determinou a deflagração dos processos das
Concorrências 001/2010 e 002/2010, determinando urgência em sua tramitação. Dava ordens
à Comissão de Licitação, por meio de sua presidente, SANDRA BARAÚNA, sobre como os
editais deveriam ser redigidos.
MAILTON também apresentou à CPL os empresários RONALDO
LUIZ GONZAGA MARTINS e ANTONIO DOS SANTOS NETO, proprietários das
empresas licitantes, ordenando que a CPL obedecesse as orientações destes na redação das
cláusulas editalícias.
Como servidor público que é, ao promover o desvio dos recursos
federais em favor da empresa RESGATE BELÉM, vencedora da licitação fraudulenta,
MAILTON FERREIRA praticou o crime de PECULATO, descrito no art. 312 do Código
Penal, em continuidade delitiva, tendo em vista que os desvios ocorreram para os
28
recursos das duas licitações referidas (art. 71 do CP). Note-se que MAILTON FERREIRA,
à fl. 50 da Concorrência Pública 01/2010 (Anexo I) e fl. 29 da Concorrência 02/2010 (Anexo
II), determina a realização das respectivas dotações orçamentárias.
Por outro lado, ao impor a redação de cláusulas editalícias restritivas
das concorrências, a exemplo das vistorias prévias falsas e a restrição à publicidade das
licitações, em conluio com os próprios empresários que viriam a licitar e vencer os certames,
MAILTON FERREIRA praticou, também de forma continuada (art. 71 do CP), o crime
previsto no art. 90 da Lei nº 8.666/93, pois frustou, dolosamente, mediante ajuste e
combinação, o caráter competitivo das licitações Concorrências Públicas 001/2010 e
002/2010 da SESMA.
No bojo dos autos, há evidências inequívocas da participação do
denunciado no delito de falsidade ideológica presente nos atestados de vistoria prévia, na
medida em que esses atestados de vistoria dos imóveis pertencentes às empresas ALUCAR e
RESGATE BELÉM, juntados às fls. 99 e 100 do Anexo I, afirmam a satisfação dos itens
previstos no Edital da Concorrência 001/2010 (SAMU), quando se comprovou, ao contrário,
que os imóveis não atendiam a tais condições. Embora MAILTON não tenha assinado os
atestados, tinha o domínio também desse fato, tanto que, no momento das vistorias, estava
presente SANDRA BARAÚNA, presidente da CPL, que acompanhou o ato por ordem do
denunciado MAILTON FERREIRA, seu chefe. Desse modo, o denunciado também participou
do crime de FALSIDADE IDEOLÓGICA, previsto no art. 299 do Código Penal, em
continuidade delitiva (duas vistorias)
Por fim, ficou claro que o grupo denunciado constituiu verdadeira
quadrilha, pois se organizou, de forma continuada e perene, para fraudar as licitações da
Secretaria. A reunião dos servidores da Secretaria de Saúde não foi episódica, tanto que os
autos comprovam fraude nas duas primeiras Concorrências Públicas realizadas na gestão do
Secretário SÉRGIO PIMENTEL e do Diretor Geral MAILTON FERREIRA, dando a entender
que essas pessoas assumiram a Secretaria com o fim designado de desviar recursos por meio
de processos fraudulentos.
Assim, está evidenciado um forte vínculo subjetivo entre as condutas
29
de todos os denunciados, que figuram como elos de uma sólida organização criminosa,
instalada no Poder Público municipal e especializada em fraudar licitações, cada membro do
grupo realizando funções específicas. Praticou o Diretor Geral MAILTON FERREIRA,
juntamente com os outros denunciados, o crime de QUADRILHA, previsto no art. 288 do
Código Penal, em concurso material com os demais ilícitos (art. 69 do CP) .
A autoria de MAILTON FERREIRA também se consolida pela
verificação de suas assinaturas em vários momentos dos processos licitatórios, como às fls.
13, 50 e 187 do Anexo I, e fls. 29 e 179 do Anexo II.
O segundo denunciado é SÉRGIO DE SOUZA PIMENTEL,
Secretário de Saúde Belém. Nessa condição, SÉRGIO PIMENTEL estava ciente da realização
dos dois procedimentos e das ilegalidades que os marcavam. Integrando a quadrilha, o
Secretário de Saúde homologou as licitações, confirmando a empresa RESGATE BELÉM
como vencedora e, em seguida, celebrou com ela os contratos derivados das Concorrências
001/2010 e 002/2010, qualificando-a ao recebimento de mais de dez milhões de reais no prazo
de 12 meses.
Note-se, a propósito, a assinatura de SÉRGIO PIMENTEL na
homologação e no contrato celebrado relativamente à Concorrência do Serviço SAMU, às fls.
186 e 188 e seguintes do Anexo I. Na licitação do programa ALÔ SAÚDE, assinou a
homologação à fl. 178 e o contrato às fls. 180 e seguintes do Anexo II.
Alguns depoimentos colhidos na investigação revelam a ciência e
participação do Secretário SÉRGIO PIMENTEL nos delitos apurados:
MARIA DA CONCEIÇÃO BARRA RIBEIRO (fls. 47/49 do PIC):
“(…) a partir de janeiro de 2010, quando assumiram o Secretário Sérgio Pimentel e do Diretor-Geral Mailton Ferreira, os dois fizeram uma reunião desativando o controle interno da Secretaria, não documentalmente, mas na prática”
SANDRA MARIA DE BARAÚNA BARRETO (fls. 77/78 do PIC):
“no início de 2010, o Secretário Sérgio Pimentel e o Diretor-Geral Mailton Ferreira desativaram o setor de controle interno da
30
SESMA, realocando os servidores para outras áreas”
TEREZA CRISTINA CARVALHO DA ROSA (fl. 72 do IPL):
“QUE confirma que por meio do memorando 189/2010 - DEUE/SESMA, solicitou a contratação de empresa para desenvolvimento de serviços administrativos para atendimento pré-hospitar - SAMU, em virtude da evidente necessidade de implementação de tal serviço, que resultou na Concorrência 001/2010 da SESMA, não sendo resultado de pedido de qualquer outro órgão / chefia; (...) QUE para realizar este pedido a declarante conversou diretamente com o secretário, Sr. Pimentel; QUE apenas realizou o pedido, mas não acompanhou o procedimento licitatório”
SANDRA MARIA DE BARAÚNA BARRETO (fls. 77/8 do PIC):
“QUE a sala do Diretor Geral Mailton Ferreira fica bem próxima à sala do Secretário Sérgio Pimentel, e Mailton sempre tratava dos assuntos da Secretaria diretamente com o Secretário, mas sem a presença da declarante (..)”
SÉRGIO PIMENTEL atuou na supervisão dos crimes, que eram
operacionalizados pelo Diretor Geral MAILTON FERREIRA e pela Presidente da Comissão
de Licitação SANDRA BARAÚNA. Por isso, tinha o domínio dos fatos, personalizando, com
MAILTON, a autoria intelectual das fraudes, que culminaram com a homologação dos
certames e com a celebração dos contratos pessoalmente por ele, o Secretário SÉRGIO
PIMENTEL.
Dessa forma, além de integrar a quadrilha, praticando o crime previsto
no art. 288 do CP, foi autor, ainda, conforme descrição fática já feita quanto a MAILTON
FERREIRA, dos delitos descritos nos art. 312 e 299 do CP, bem como no art. 90 da Lei
8.666/93, cada um na forma continuada (art. 71 do CP) e as diferentes espécies em
concurso material (art. 69 do CP).
A terceira denunciada é SANDRA MARIA DE BARAÚNA
BARRETO. Presidente da Comissão Permanente de Licitação (conforme Portaria nº
31
0056/2010 GABS/SESMA/PMB, cópia à fl. 53 do Anexo I), SANDRA BARAÚNA era a
pessoa que levava as ordens de MAILTON FERREIRA e SÉRGIO PIMENTEL às servidoras
componentes da Comissão, coordenando a elaboração dos editais direcionados. Como se viu,
quando questionada pelas servidoras sobre alguma inconsistência do edital, SANDRA
determinava que se cumprissem as ordens de MAILTON, sem indagações.
SANDRA BARAÚNA esteve presente em grande parte dos atos
fraudulentos. Acompanhou as servidoras da CPL até a sede da empresa ALUCAR onde,
recebidas pelos empresários RONALDO LUIZ GONZAGA MARTINS e ANTONIO DOS
SANTOS NETO, passaram a redigir as cláusulas dos editais das concorrências de acordo com
as determinações destes. Também acompanhou os técnicos nas falsas vistorias efetuadas nos
imóveis dessas empresas. Determinou, conforme fl. 13 do Anexo I, as falsas cotações de
preços para as licitações.
A assinatura de SANDRA está presente em inúmeros momentos dos
processos licitatórios, como às fls. 13, 50 e 187 do Anexo I, e fls. 29 e 179 do Anexo II
Esta denunciada integrou a quadrilha de forma ativa, sendo braço
direito de seus principais dirigentes (Diretor Geral e Secretário), praticando o crime previsto
no art. 288 do CP. Além disso, contribuiu para o desvio de recursos públicos; trabalhou para
a elaboração do edital com restrição da concorrência, mediante combinação com os
empresários beneficiados; além de acompanhar as vistorias falsas, com o que também
cometeu os delitos descritos nos arts. 312 e 299 do CP, e art. 90 da Lei 8.666/93, cada um na
forma continuada (art. 71 do CP) e as diferentes espécies em concurso material (art. 69
do CP).
O denunciado RONALDO LUIZ GONZAGA MARTINS é o
proprietário e administrador da empresa ALUCAR LOCADORA DE VEÍCULOS LTDA,
sendo ele quem representou a empresa assinando todos os atos do procedimento das duas
concorrências públicas sob exame.
RONALDO LUIZ atuou ao lado do outro empresário ANTONIO DOS
SANTOS NETO durante a elaboração do edital das concorrências, inclusive determinando a
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redação de suas cláusulas às servidoras componentes da Comissão de Licitação da SESMA.
Aliás, três das reuniões realizadas para redigir os editais ocorreram na sede de sua empresa,
ALUCAR, localizada na Rua Rui Barbosa, como confirmaram as testemunhas ouvidas.
RONALDO e ANTÔNIO NETO foram apresentados à Comissão de
Licitação pelo Diretor Geral MAILTON FERREIRA, que orientou a presidente SANDRA
BARAÚNA a seguir as determinações dos dois empresários. O vínculo deles com MAILTON
é evidente e sua atuação na quadrilha tem posição bem definida, em vários momentos da
licitação.
Ao determinar a redação das cláusulas editalícias restritivas da
concorrência, em combinação com o outro licitante ANTONIO NETO e com os diretores da
Secretaria de Saúde de Belém, RONALDO LUIZ GONZAGA MARTINS praticou o crime
previsto no art. 90 da Lei 8.666/93, em continuidade delitiva.
Do mesmo modo, participou do desvio dos recursos públicos efetuado
por MAILTON FERREIRA e pelo Secretário SÉRGIO PIMENTEL. Anote-se, mais uma vez,
que a empresa ALUCAR, embora concorrendo nas duas licitações, também apresentou falsa e
lacônica cotação de preços na Concorrência 002/2010, ocupando posição meramente
figurativa nas licitações, apenas para legitimar o repasse da verba contratual à firma
RESGATE BELÉM. Aliás, nesse ponto, como já positivou o TRF da 1ª Região, “Não há que
se falar em ausência de indícios de participação no fato delituoso, quando o paciente, como
sócio gerente de uma das empresas envolvidas na licitação eventualmente fraudulenta,
apresentou cotação de preços de máquinas de costura e acessórios” (RCHC
200037000052610, DJ 21/09/2001).
Por isso, também cometeu, na condição de partícipe, o crime de
peculato, previsto no art. 312 c/c 71 do CP. Registre-se que, na forma do art. 30 do CP, a
circunstância de não ser servidor público não impede a prática do peculato, quando em
concurso com servidor, o que ocorreu na espécie.
RONALDO LUIZ esteve presente nas vistorias realizadas na empresa
ALUCAR, imóvel da Rua Rui Barbosa, e confirmou, falsamente, que o mesmo possuía as
33
condições de infraestrutura física prevista no edital da Concorrência 001/2010, consoante
atestado de fl. 99 do Anexo I. O atestado é falso, como já se viu, e o denunciado, por isso,
também cometeu o crime descrito no art. 299 do CP.
Por fim, à vista de todas as condutas descritas, é notório que
RONALDO LUIZ integra, com atos muito bem definidos, a quadrilha montada para fraudar
as licitações da SESMA, razão pela qual também praticou o delito do art. 288 do CP.
O denunciado ANTÔNIO DOS SANTOS NETO ocupou posição
semelhante ao denunciado RONALDO LUIZ GONZAGA MARTINS. Foi o representante da
empresa RESGATE BELÉM em todos os atos da licitação e assinou os respectivos contratos
com a Secretaria de Saúde, beneficiando-se das verbas federais destinadas à implantação dos
serviços SAMU e ALÔ SAÚDE.
Atuou, em conluio com RONALDO LUIZ e os diretores da SESMA,
durante a elaboração dos editais das concorrências examinadas, inclusive determinando a
redação de suas cláusulas às servidoras componentes da Comissão de Licitação da SESMA.
ANTÔNIO NETO foi levado à CPL, junto com RONALDO, pelo Diretor Geral MAILTON
FERREIRA, e passou a ditar as cláusulas restritivas, amplas e vagas dos editais.
Ao determinar a redação das cláusulas editalícias restritivas da
concorrência, em combinação com o outro licitante RONALDO LUIZ e com os diretores da
Secretaria de Saúde de Belém, ANTONIO DOS SANTOS NETO praticou o crime previsto no
art. 90 da Lei 8.666/93, em continuidade delitiva.
Do mesmo modo, participou do desvio dos recursos públicos efetuado
por MAILTON FERREIRA e pelo Secretário SÉRGIO PIMENTEL. Anote-se que ANTONIO
DOS SANTOS NETO é proprietário de outra empresa, a firma SANTOS NETO & CIA
LTDA, que participou da cotação de preços da Concorrência Pública do SAMU (001/2010),
ou seja, a mesma licitação em que foi vencedor com a empresa RESGATE BELÉM. Cotou
preços falsamente com outra empresa e, ao fim, beneficiou-se dos recursos, pois venceu a
licitação.
Assim, cometeu, na condição de partícipe, o crime de peculato,
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previsto no art. 312 c/c 71 do CP. Registre-se novamente que, na forma do art. 30 do CP, a
circunstância de não ser servidor público não impede a prática do peculato, quando em
concurso com servidor, o que ocorreu na espécie.
ANTONIO NETO esteve presente nas vistorias realizadas na empresa
RESGATE BELÉM, imóvel da Rua dos Mundurucus, e confirmou, falsamente, que o mesmo
possuía as condições de infraestrutura física prevista no edital da Concorrência 001/2010,
consoante atestado de fl. 100 do Anexo I. O atestado é falso, como já se viu, e o denunciado,
por isso, também cometeu o crime descrito no art. 299 do CP.
Por fim, à vista de todas as condutas descritas, é notório que
ANTONIO NETO integra, com atos bem definidos, a quadrilha montada para fraudar as
licitações da SESMA, razão pela qual também praticou o delito do art. 288 do CP.
A denunciada TEREZA CRISTINA CARVALHO DA ROSA
solicitou, conforme fl. 01 do Anexo I, a contratação de empresa para implantação do
programa SAMU em Belém, iniciando o processo licitatório fraudulento da Concorrência
Pública 001/2010.
No bojo do procedimento, TEREZA CRISTINA integrou a quadrilha
na lavratura dos falsos atestados de vistoria. Embora TEREZA tenha assinado os atestados de
fls. 99 e 100 do Anexo I, as testemunhas ouvidas, bem como a própria denunciada,
assinalaram que ela nunca estivera nos imóveis, bem como que os mesmos não possuíam as
dimensões exigidas pelo edital.
Dessa maneira, integrou a quadrilha com função definida, praticando o
delito previsto no art. 288 do CP, bem como cometeu falsidade ideológica nos atestados de
vistoria técnica prévia, com o que realizou também o tipo penal do art. 299 c/c 71 do CP.
Posição semelhante na quadrilha é a do denunciado FÁBIO DOS
REIS PEREIRA, que assinou os atestados de vistoria nos imóveis, atestando que os mesmos
possuíam as dimensões exigidas pelo edital e assinaladas às fls. 99 e 100. Contudo, ele
próprio, como outras testemunhas ouvidas, confirmaram que os imóveis vistoriados não
atendiam às exigências do edital, necessitando até mesmo da construção de outro pavimento,
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donde a falsidade dos atestados.
De consequência, nota-se que FÁBIO DOS REIS PEREIRA integrou
a quadrilha através de atos preordenados à realização dos crimes, praticando o delito previsto
no art. 288 do CP, bem como cometeu falsidade ideológica nos atestados de vistoria técnica
prévia, com o que praticou o tipo penal do art. 299 c/c 71 do CP.
Finalmente, também está sendo denunciado o Assessor Jurídico da
SESMA ANTÔNIO MAGALHÃES DA FONSECA . Como já se registrou, ANTÔNIO DA
FONSECA exerceu função importante na atividade da quadrilha, nos processos das duas
concorrências públicas, ao emitir pareceres declarando a legalidade dos procedimentos,
embora deles avultassem elementos de inequívoca ilicitude.
Conforme se disse, nos dois processos licitatórios ora analisados,
foram juntados pareceres jurídicos da lavra do Assessor Jurídico da SESMA ANTONIO
MAGALHÃES FONSECA. Na Concorrência Pública 01/2010 o parecer está juntado às fls.
91/92 (Anexo I) e, na Concorrência Pública, está às fls. 77/78 do Anexo II.
Uma breve leitura desses pareceres revela que o Assessor Jurídico
ANTONIO MAGALHÃES FONSECA estava integrado à cadeia dos crimes praticados, pois
não realizou mínima análise das flagrantes ilegalidades presentes nos procedimentos.
Apresentou, ao contrário, pareceres com o mesmo texto, apenas afirmando que os processos
estavam de acordo com o ordenamento jurídico.
Voluntariamente omitiu-se em observar elementos de evidente
ilegalidade, como os orçamentos genéricos nas cotações de preços, sem definição de preços
unitários dos serviços cotados; inúmeras cláusulas vagas e imprecisas nos editais; a restrição à
publicidade nos avisos de licitação publicados na imprensa oficial, sem referência aos objetos
SAMU e ALÔ SAÚDE; a ausência de cláusulas de garantias nas concorrências; a proibição
de contratação de consórcios de empresas, entre outras várias ilegalidades, conforme já
apontado.
Indicativo de que os pareceres foram elaborados voluntariamente para
a montagem dos processos fraudulentos, basta ver, no primeiro parágrafo do parecer juntado
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na Concorrência 001/2010, que ANTONIO MAGALHÃES DA FONSECA refere-se à
análise do edital e contrato administrativo “da licitação nº 002/2010, na modalidade da
concorrência pública”, donde se verifica que não se deu ao trabalho sequer de mudar o
número das licitações, quando montava os idênticos pareceres.
Nesse plano, como já assinalou o TRF da 1ª Região, “O assessor
jurídico que examina a minuta do edital da licitação pode responder por possíveis
ilegalidades decorrentes de seu pronunciamento, se há indícios de conduta suspeita na
elaboração do parecer” (MS 200001000422503, DJ 03/03/2004).
Desse modo, ANTONIO MAGALHÃES DA FONSECA,
emprestando ares de legalidade às fraudes perpetradas pelos gestores da SESMA, participou
tanto dos desvios dos recursos, quanto da frustração ao caráter competitivo das licitações,
cometendo os delitos previstos no art. 312 do CP e art. 90 da Lei 8.666/93 c/c art. 71 e 69
do CP.
Além disso, integrou o grupo criminoso com posição definida e
estável, cometendo o delito de quadrilha, descrito no art. 288 do CP.
DA CONCLUSÃO E DOS PEDIDOS
A autoria dos delitos, que foram praticados com dolo intenso, bem
como sua materialidade, encontram-se devidamente demonstradas, havendo forte base
empírica conducente à responsabilização penal dos acusados.
Ante o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL requer o
recebimento da presente denúncia, em razão da prática, pelos denunciados MAILTON
MARCELO SILVA FERREIRA, SÉRGIO DE SOUZA PIMENTEL, SANDRA MARIA
DE BARAÚNA BARRETO, RONALDO LUIZ GONZAGA MARTINS e ANTÔNIO
DOS SANTOS NETO dos crimes previsto nos arts. 312, 299 e 288 Código Penal, e art. 90 da
Lei nº 8.666/93, c/c art. 71 e art. 69 do CP; pelos denunciados TEREZA CRISTINA
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CARVALHO DA ROSA e FÁBIO DOS REIS PEREIRA dos crimes previstos nos arts. 288
e 299 (art. 71, duas vezes) c/c art 69, todos do CP; e pelo denunciado ANTÔNIO
MAGALHÃES DA FONSECA dos delitos previstos nos arts. 312 e 288 do CP e art. 90 da
Lei 8.666/93 c/c art. 71 e 69 do CP, seguindo-se notificação e citação dos acusados, com o
regular curso do processo em seus ulteriores termos, até sentença final condenatória.
Requer, também, a oitiva das seguintes testemunhas:
1. MARIA DA CONCEIÇÃO BARRA RIBEIRO, qualificada à fl. 47 do PIC nº
1.23.000.001196/2010/80;
2. SÔNIA HELENA DE ARAÚJO PENA, qualificada à fl. 58 do referido PIC;
3. TELMA CRISTINA LIMA E SILVA, qualificada à fl. 55 do referido PIC;
4. LUIZ HELENO MENDES DE OLIVEIRA, qualificado à fl. 70 do IPL nº 508/2010;
5. CHRISTINA CANDIDA FALCÃO DE MENEZES, qualificada à fl. 77 do citado IPL;
6. TANIA MARIA PENNA DA GAMA GIESTAS, analista de finanças e controle da
CGU, lotada na unidade da CGU em Belém/PA.
Nesses termos, pede deferimento.
Belém/PA, 18 de agosto de 2010.
IGOR NERY FIGUEIREDO ALAN ROGÉRIO MANSUR SILVA Procurador da República Procurador da República
UBIRATAN CAZETTAProcurador da República
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