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BRASÍLIA – 2019 SESSÃO SOLENE EM COMEMORAÇÃO AOS 30 ANOS DA PROMULGAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SESSÃO REALIZADA EM 4 DE OUTUBRO DE 2018

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BRASÍLIA – 2019

SESSÃO SOLENE EM COMEMORAÇÃO AOS 30 ANOS DA PROMULGAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

SESSÃO REALIZADA EM 4 DE OUTUBRO DE 2018

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SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Ministro José Antonio DIAS TOFFOLI (23-10-2009), Presidente

Ministro LUIZ FUX (3-3-2011), Vice-Presidente

Ministro José CELSO DE MELLO Filho (17-8-1989)

Ministro MARCO AURÉLIO Mendes de Farias Mello (13-6-1990)

Ministro GILMAR Ferreira MENDES (20-6-2002)

Ministro Enrique RICARDO LEWANDOWSKI (16-3-2006)

Ministra CÁRMEN LÚCIA Antunes Rocha (21-6-2006)

Ministra ROSA Maria Pires WEBER (19-12-2011)

Ministro Luís ROBERTO BARROSO (26-6-2013)

Ministro Luiz EDSON FACHIN (16-6-2015)

Ministro ALEXANDRE DE MORAES (22-3-2017)

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Secretaria-Geral da Presidência Daiane Nogueira de Lira

Secretaria de Documentação Naiara Cabeleira de Araújo Pichler

Coordenadoria de Divulgação de Jurisprudência Andreia Fernandes de Siqueira

Preparação do original Márcia Gutierrez Aben-Athar Bemerguy

Revisão e padronização Amélia Lopes Dias de Araújo, Rochelle Quito e Rosa Cecilia Freire da Rocha

Fotografias Fellipe Sampaio

Capa Lucas Ribeiro França

Projeto gráfico Eduardo Franco Dias

Diagramação Camila Penha Soares

Brasil. Supremo Tribunal Federal (STF).Sessão solene em comemoração aos 30 anos da promulgação da Constituição da

República [recurso eletrônico] : sessão realizada em 4 de outubro de 2018. – Brasília : STF, Secretaria de Documentação, 2019.

38 p. : il.

Modo de acesso: <http://portal.stf.jus.br/textos/verTexto.asp?servico=publicacaoPublicacaoInstitucionalComemoracoes>.

ISBN: 978-85-54223-11-3

1. Direito constitucional, legislação, Brasil. 2. Constituição, Brasil, 1988. 3. Emenda Constitucional, Brasil. I. Título.

CDDir-341.2481

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Supremo Tribunal Federal — Biblioteca Ministro Victor Nunes Leal

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O Ministro Dias Toffoli apresenta o Catálogo Comemorativo dos 30 anos da Constituição.

Da esquerda para a direita: Doutora Raquel Dodge, Procuradora-Geral da República; Ministro Dias

Toffoli, Presidente do Supremo Tribunal Federal; Senhor Michel Temer, Presidente da República; e

Doutor Claudio Lamachia, Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

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SUMÁRIO

Discurso do Senhor Ministro Dias Toffoli, Presidente do Supremo Tribunal Federal ................................................... 6

Discurso do Senhor Ministro Marco Aurélio .......................... 8

Palavras do Senhor Ministro Dias Toffoli, Presidente do Supremo Tribunal Federal ................................................. 15

Discurso da Doutora Raquel Dodge, Procuradora-Geral da República ......................................................................... 17

Discurso do Doutor Claudio Lamachia, Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil ................................................... 22

Discurso do Senhor Michel Temer, Presidente da República Federativa do Brasil .......................................................... 28

Palavras do Senhor Ministro Dias Toffoli, Presidente do Supremo Tribunal Federal ................................................. 35

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Discurso do Senhor MinistroDIAS TOFFOLI,

Presidente do Supremo Tribunal Federal

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O Senhor Ministro Dias Toffoli (Presidente) – Declaro aberta a sessão solene destinada à homenagem ao 30º aniversário da promulgação da Constituição da República. Convido os presentes para, em posição de respeito, celebrarem o Hino Nacional, que será executado na versão do pianista João Carlos Martins.

(Execução do Hino Nacional.)

Antes de conceder a palavra aos próximos oradores, registro que a grande autoridade presente à mesa é a Constituição da República de 1988. Portanto, os eminentes oradores podem saltar a nominata, porque este Presidente, ao final, fará o registro de todas as auto-ridades presentes.

Concedo a palavra a Sua Excelência o Senhor Ministro Marco Aurélio, que fará uso da palavra em nome do Supremo Tribunal Federal.

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Discurso do Senhor MinistroMARCO AURÉLIO

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O Senhor Ministro Marco Aurélio – Presidente Dias Toffoli, permita-me Vossa Excelência fazer a saudação às autoridades presentes, registrando a presença do Chefe de Estado, do Chefe de Governo, o Presidente Michel Temer.

Concidadãos, a Constituição Federal de 1988 surgiu com o espírito de redemocrati-zação. Foi produzida no que os cientistas políticos chamaram de “terceira onda de democra-tização”, ocorrida na segunda metade do século 20 em diferentes países da Europa, América Latina e África. Esse modelo constitucional, predominante nas democracias ocidentais, traz os direitos fundamentais como centro de gravidade. Assim o é a Lei Maior do Brasil.

Mas o que significa, exatamente, a Carta da República?

Para os clássicos gregos, a ideia de Constituição já estava presente sob a óptica democrática segundo a qual a única forma legítima de governo era a limitada pela lei. Com a Constituição de Sólon – o estadista, legislador e poeta clássico –, deu-se início, em Atenas, à busca pela racionalização do poder. Em Roma Antiga, ter uma Constituição significava respei-to à coisa pública. Durante a Idade Média, despontou triunfante, em 1215, a Magna Carta na Inglaterra de João sem Terra, com forte mensagem de primazia das liberdades, considerado o arbítrio e o abuso de poder do príncipe. Algo revolucionário à época.

A história das grandes Constituições esteve sempre atrelada à das revoluções. A americana revelou, em 1787, o primeiro modelo de Carta escrita, rígida, suprema, siste-matizada e fundamental para toda uma nação. Antes, as colônias, já então independentes da Inglaterra, tinham as próprias Constituições, que igualmente reconheciam, como veio a fazê-lo a da Federação, direitos do homem, anteriores e superiores ao Estado, a limitarem a

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autoridade do governo. Para os federalistas – Hamilton, Jay e Madison –, homens não são anjos, e os governos são feitos de homens. Por isso, deve-se controlar e limitar o poder para que a liberdade seja assegurada a todos.

Com a Revolução Francesa, nasceu a ideia da necessidade política de uma Constituição escrita, uma lei fundamental que representasse a expressão da vontade livre da nação. Daí o mundo ter alcançado a Declaração de Direitos moderna, mesclando ele-mentos liberais e democráticos, destacando-se a noção embrionária de poder constituinte. Sem dúvida, o Abade Sieyés, com a proposta de um poder imanente à nação e superior aos constituídos, foi o primeiro grande teórico da Constituição.

A partir desses marcos históricos e políticos, os teóricos passaram a preocupar-se com o conceito e a essência da Constituição. Muitos desenvolvimentos ocorreram! Não se pode negar: constituição é um termo plurissignificativo.

Ferdinand Lassale, em 1862, questionou “o que é uma Constituição?”; “Em que con-siste a verdadeira essência de uma Constituição?”. Recusando a utilidade de resposta fun-dada em concepções puramente formais e idealistas, o advogado e escritor alemão disse ser resultado dos fatores reais de poder atuantes em determinada sociedade. O documento que não retratasse esses fatores não seria mais que “mera folha de papel”. Esse era o realismo constitucional de Lassale.

Carl Schmitt, por sua vez, afirmava que a Constituição é a decisão política funda-mental, a manifestação concreta de um poder político supremo, “existencial”, o qual define as bases do regime que inaugura. Valeria mesmo o caráter material da decisão, e não a dimensão puramente formal ou textual. Já para Hans Kelsen, importava a supremacia for-mal, a hierarquia normativa para caracterizar uma Constituição, ou seja, a posição no ápice da pirâmide da ordem jurídica, prevalecendo o texto constitucional como fundamento de validade para a criação das normas inferiores. Foram os grandes teóricos da Constituição do período pré-Segunda Grande Guerra, e a dualidade matéria e forma, que sempre caracterizou a oposição entre os dois gigantes, faz-se presente até hoje.

Após os horrores do nazismo, passou-se a apostar na capacidade de a Constituição conformar o social, considerada a ordem e a realidade. A Constituição, tendo os direitos fundamentais no centro, seria dotada de vontade e força normativas; isso porque passou a ser, sem idealismos nem pessimismos realistas, mas combinando forma e matéria, a “ordem fundamental e jurídica da coletividade”.

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Entre tantos movimentos e desenvolvimentos idealizadores, realistas, formais e mate-riais, onde cabe situar a Constituição de 1988? A qual tipo corresponde? Ao lado da estrutu-ração do poder e da limitação diante da soberania popular, o constituinte deu especial ênfase à disciplina dos direitos fundamentais, todos gravitando em torno da dignidade da pessoa humana. Sem tanta ambição científica, é um projeto político de resgate imediato da democra-cia, de afirmação permanente da liberdade e da igualdade, de transformação social a médio e longo prazos. É uma Constituição ousada, pretensiosa, mas passível de ser concretizada. Sem romantismo, tem-se uma história de êxito. Um projeto bem-sucedido!

Ainda há muito por realizar. Existem promessas, especialmente no campo social, pendentes. Alguns compromissos e institutos foram estabelecidos. Surgiram emendas constitucionais destinadas a atualização ou aperfeiçoamento. Também houve retrocessos! Mas nada pode levar ao descrédito da Lei das leis. A realização de um “projeto constitu-cional”, em qualquer país que se lance nessa empreitada, é sempre uma trajetória, um desenrolar, uma construção contínua. Nenhuma Constituição é obra acabada. A legitimi-dade depende da crença e do empenho das instituições e da sociedade – e não apenas da qualidade do texto e do arranjo político-institucional estabelecido –, e da firmeza de propósito, de como se compreende, interpreta e observa a Lei Maior.

Diplomas dessa natureza promovem profundos reflexos sobre as estruturas de go-verno, principalmente quando considerada a autoridade para concretizar os direitos sociais e fundamentais. O Judiciário e mais especificamente os tribunais constitucionais atuam como intérpretes-guardiões dessas “cartas de direitos”. Assim, celebrar os 30 anos da Constituição significa igualmente festejar – e refletir – os 30 anos de interpretação do texto. A efetivação do Diploma Maior pelo Supremo, órgão de cúpula do Judiciário, última instância do controle difuso de constitucionalidade das leis e dos atos normativos e titular exclu- sivo do controle concentrado e abstrato, vem se mostrando um dos momentos mais relevantes da vida prática, da realização efetiva das normas constitucionais. O trabalho de interpretação desenvolvido por juízes constitucionais reunidos em colegiado, sempre físico e não virtual, tem sido essencial para a definição das fronteiras de poder do Estado, perante os cidadãos. A interpretação judicial é ponto importante dessa história de sucesso e, por isso, merece igualmente ser lembrada, comemorada e avaliada.

Não fossem as decisões paradigmáticas do Tribunal, a Constituição poderia ter falhado no propósito de consagrar a democracia e assegurar direitos fundamentais. Não cabe menos-prezar, com isso, a participação dos Poderes Legislativo e Executivo. O desenvolvimento e a complementação do texto constitucional por meio dos órgãos políticos são condições da própria

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existência do projeto constitucional como um processo democrático. Apenas incumbe ressaltar o papel de intérprete-guardião que o Supremo desempenha, em especial quanto à efetividade, a concretização dos direitos fundamentais, sendo os poderes instrumentos.

No tocante às liberdades fundamentais, direitos humanos de primeira geração, o Tribunal tem dado especial atenção à liberdade de expressão e imprensa. Declarou a inconsti-tucionalidade da Lei de Imprensa, da exigência de diploma de curso superior para o exercício da profissão de jornalista, e de restrições legais às emissoras de rádio e de televisão quanto a programas que pudessem degradar, ridicularizar ou encerrar crítica jornalística favorável ou contrária a políticos, candidatos a cargos eletivos, o que inclui manifestações de humor, charges e sátiras. Assegurou a realização de passeatas e manifestações públicas em favor da descriminalização do consumo de drogas, denominada “Marcha da Maconha”, sem que pudessem ser enquadradas como “apologia ao crime”.

Há destaque para a rica jurisprudência sobre aquele que é tido como o centro norma-tivo e axiológico do sistema constitucional de direitos fundamentais: o princípio da dignidade da pessoa humana. Visando a realização, o Tribunal reconheceu a constitucionalidade da pes-quisa com células-tronco embrionárias e assegurou a equiparação jurídica da união estável homoafetiva à heteroafetiva. Em outro julgamento, o Supremo decidiu que a interrupção da gravidez de fetos anencéfalos não é crime. Uma das mais importantes questões analisadas pelo Tribunal, que concluiu em favor da dignidade da pessoa humana e dos direitos da mulher. No voto condutor do julgamento, afastada a possibilidade de a matéria ser examinada a partir de orientações morais religiosas e afirmada a antítese entre anencefalia e vida, ficou assen-tado estarem em jogo apenas direitos de gestantes, a privacidade, a autonomia e a dignidade da mulher.

No campo dos direitos dos acusados de crimes, o Tribunal assegurou a possibilidade de progressão de regime prisional em qualquer fase, mesmo nos casos de delitos graves. Proclamou a inconstitucionalidade da execução provisória de pena. E o fez ante o princípio da não culpabilidade, da inocência. Posteriormente, retrocedeu! Porém, novos dias virão, devendo haver sempre esperança para aqueles que têm direitos previstos expressamente na Carta! O Supremo declarou a inconstitucionalidade da prisão civil, considerados contratos de alienação fiduciária.

Quanto à observância do princípio da igualdade, de envergadura maior no sistema constitucional, julgou constitucionais políticas de reserva de cotas étnico-raciais para ingres-so no ensino superior público – ações afirmativas raciais. Em outro caso de alta relevância

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social, assentou a constitucionalidade da Lei Maria da Penha, a prever penas mais duras para aqueles que cometem violência doméstica contra a mulher, assentando que as ações penais relativas aos casos de lesão corporal são incondicionadas à representação da vítima, ante o fato de a dependência da manifestação de vontade da mulher agredida revelar, na maior par-te dos casos, proteção insuficiente em virtude do quadro de desigualdade e vulnerabilidade histórica perante o homem.

O Tribunal tem feito valer o projeto constitucional no campo dos direitos sociais, mor-mente quanto ao direito à saúde. O ponto alto dessa jurisprudência ocorreu com decisões mediante as quais determinada a distribuição gratuita de medicamentos para tratamento do vírus HIV, motivando políticas públicas nesse sentido.

No campo dos direitos coletivos, vem dando proteção especial à tutela do meio am-biente. Em diferentes oportunidades, enfrentou conflitos atinentes a direitos de cujas solu-ções dependia a efetividade da proteção ao meio ambiente. Em todos os casos, promoveu complexa mas segura interpretação constitucional. Assentou a valia constitucional da proi-bição de importar pneus usados ou remodelados. No campo do conflito entre o direito ao meio ambiente sadio e as manifestações culturais, concluiu inconstitucionais práticas como a “farra do boi” e a “briga de galos”. No mais importante desses processos, reconheceu a crueldade intrínseca da vaquejada, não dando prevalência ao valor cultural popular. No âmbi-to da composição dos interesses fundamentais envolvidos, sem que se mostrasse irrelevante o direito da comunidade a manifestações culturais, sobressaiu a proteção ao meio ambiente.

Em relação à idoneidade do processo político-democrático, muitas foram as deci-sões, todas voltadas a assegurar o núcleo da democracia: a igualdade de participação polí-tica como direito fundamental de todos. Democracia é um direito maior e fundante. A mais relevante dessas intervenções foi a que implicou a proibição do financiamento privado, por empresas, das campanhas eleitorais.

Em síntese, os direitos fundamentais são a parte mais importante do projeto constitu-cional de 1988, envolvidos os valores liberdade, igualdade e dignidade. A concretização desses direitos tem sido a principal missão do Supremo. Não poderia ser de outra forma. Sem inter-pretação voltada à afirmação das garantias constitucionais e à realização concreta dos direitos fundamentais, não existe Estado Democrático de Direito verdadeiro.

Há muito por fazer. Assegurar direitos é tarefa permanente, e tornar realidade uma Constituição é projeto institucional e democrático ininterrupto. Parabéns, parabéns à socie-

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dade brasileira pelos 30 anos da Constituição Federal. Que continue a ser a Carta Cidadã, a Carta da Democracia, a Carta dos Direitos Fundamentais. Que o Supremo jamais falte à nacionalidade. Que assim o seja, presente o Estado Democrático de Direito.

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Palavras do Senhor MinistroDIAS TOFFOLI,

Presidente do Supremo Tribunal Federal

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O Senhor Ministro Dias Toffoli (Presidente) – Agradeço as belas palavras do Ministro Marco Aurélio em nome da Corte.

O Maestro João Carlos Martins gostaria de dedicar uma música à Constituição brasi- leira. Dado que Sua Senhoria tem concerto em Campinas e seu voo sairá daqui a alguns minutos, quebraremos um pouco a sequência – essa música seria ao final –, e ele a apre-sentará, neste momento, acompanhado do músico e cantor Di Brasil.

O Senhor João Carlos Martins (Maestro) – Jesus, alegria dos homens e Eu sei que vou te amar, em homenagem aos 30 anos da Constituição. E o branco do velho maestro em homenagem à paz que o Brasil tanto deseja.

(Execução de número musical.)

O Senhor Ministro Dias Toffoli (Presidente) – Concedo a palavra a Sua Excelência a Senhora Procuradora-Geral da República, Doutora Raquel Dodge, que fará seu pronuncia-mento em nome do Ministério Público.

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Discurso da Doutora RAQUEL DODGE,

Procuradora-Geral da República

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A Doutora Raquel Dodge (Procuradora-Geral da República) – Senhor Presidente do Supremo Tribunal Federal, Senhor Presidente da República, Senhor Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Senhoras e Senhores Ministros do Supremo Tribunal Federal de hoje e de sempre, permitam-me saudar todas as autoridades presentes, membros do corpo diplomático e os brasileiros na pessoa do Maestro João Carlos Gandra da Silva Martins, cujo talento e sensibilidade revelam muito do caráter de nossa gente brasileira.

Saúdo o fato de o Supremo Tribunal Federal ter reservado uma de suas sessões semanais para celebrar os 30 anos da Constituição de 1988, reunindo aqui nesta sala do Plenário os que atuam no sistema de justiça – juristas, juízes, advogados, membros do Ministério Público – mas também os que precisam e contribuem com ele, como jornalistas, artistas e toda a gente, porque este ato reverencia um dos momentos mais importantes da história brasileira, lembrando à nação que este é o documento que rompeu com um regime de exceção e arbítrio e inaugurou o regime democrático que tem na centralidade de suas regras a defesa da dignidade e da liberdade humanas.

A Constituição de 1988 instituiu o governo de leis. Não é pouco, porque o governo de leis é uma das principais marcas do mundo civilizado, pois promove a paz e estimula a concórdia, que são virtudes da justiça.

Em uma nação como a nossa, de imigrantes e nativos, nossa Constituição reconhece a pluralidade étnica, linguística, de crença e de opinião. Garante liberdade de imprensa, para que a informação e a transparência saneiem o conluio e revelem os males contra o indivíduo e o bem comum. Regulamenta a convivência das diferenças sob o signo da igualdade de direi-tos, de oportunidades, de concorrência, de respeito e de tratamento. Visionária, a Constituição

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protegeu o ambiente para esta e as futuras gerações. Humanitária, protege minorias e os mais vulneráveis, para que não sejam alvos do injusto. É o documento fundante da convivência democrática.

Ulisses Guimarães, ao se referir a ela, advertiu com clareza: “A persistência da Constituição é a sobrevivência da democracia”.

É feliz a coincidência, Senhor Presidente, de, nesta data, celebrarmos a memória de Francisco de Assis, que também foi arauto da paz, defensor da dignidade humana e amigo do meio ambiente. Que essa coincidência seja o prenúncio de que uma era de paz e concórdia continuará a trazer ao Brasil o elevado desenvolvimento humano que tanto almejamos, a erradicação da pobreza, a dissipação das diferenças regionais, a preservação das florestas, da água, do ambiente, do patrimônio cultural e do bem comum, prometidos pela Constituição.

A Constituição de 1988 expressa a vontade do povo. Como em nenhuma outra oca-sião, a sociedade civil manteve contato direto com os constituintes e influenciou na elabo-ração de suas normas. Mais do que isso, o povo viu-se reconhecer em sua pluralidade de línguas, opiniões, direitos, com proteção de minorias. Anseios de dignidade foram acolhidos, para que todos sejam tratados como pessoas humanas e que práticas de escravidão sejam abolidas. Desejos de igualdade foram contemplados na Carta, repudiando toda a forma de discriminação, seja de nacionais, seja de estrangeiros. Expectativas de respeito à intimidade pessoal foram garantidas. A separação da coisa pública e da coisa privada foi delimitada e permite hoje o enfrentamento da corrupção de verbas públicas, a punição da improbidade e a preservação do bem comum.

O regime de respeito às leis passou a vicejar em solo nacional e tornou-se prioridade dos brasileiros, que querem para si a mesma regra que vale para todos os demais. Essa ideia de igualdade parece simples, mas encontrou tantas resistências ao longo de nossa história que só veio a vigorar com longevidade a partir de 1988.

Muito se avançou desde a Constituição de 1988 e, por isso, é importante celebrá-la, para que se mantenha viva, aderente aos fatos, fazendo justiça e correspondendo à vida real da nação. Para tanto é preciso guardá-la. Não basta reverenciá-la, em uma atitude contemplativa.

Pela Carta de 1988, o Supremo Tribunal Federal é guardião da Constituição, dever também entregue ao Ministério Público, como fiscal da lei, defensor da justiça e do inte-resse público.

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Esta Corte honrou sua missão de modo inequívoco nestes trinta anos. Por essa razão, toda a Nação acompanha o que decidem os Ministros, ansiosa por conhecer a decisão que interessa ao seu cotidiano e ao País. O Supremo Tribunal faz um esforço permanente na obra de interpretar e aplicar a Constituição. É defensor da ordem jurídica do regime democrático. É o Tribunal da democracia. É importante lembrar que a democracia no Brasil não é um ca-minho. A democracia é o caminho.

O Ministro Celso de Mello, o decano desta Corte, vê na Constituição o estatuto “que rejeita o poder que oculta e não tolera o poder que se oculta” e aponta a ordem democrática como o “regime do poder visível”, com raízes na liberdade de manifestação do pensamento, de reunião e de imprensa.

O Ministério Público, que deve à Constituição sua independência e garantias de atua-ção, também tem sido seu guardião, atuando contra o crime que afronta direitos e corrompe a coisa pública, defendendo os bens comuns da sociedade, preservando os valores fundan-tes da vida em sociedade, defendendo o patrimônio público e eleições justas e livres, como lhe foi determinado.

Temos consciência da importância dessa missão e da firmeza e serenidade que nos é reclamada para exercer com coragem e prontidão tais funções, com base na Constituição.

O legado destes trinta anos é imenso, e o papel das instituições e do Supremo Tribunal Federal é de relevância singular. Cada Ministro desta Corte, de hoje e de sempre, tem contri-buído para esta obra coletiva de construir o País. Finalmente terras indígenas e quilombolas têm sido demarcadas, florestas nacionais e unidades de conservação têm sido preservadas, a liberdade de imprensa e de expressão têm sido garantidas, o analfabetismo retrocedeu, a saúde pública foi instituída, há competição e liberdade nos negócios, a propriedade e os bens comuns estão preservados, direitos individuais têm tido proteção judicial. Há muito a avançar, porque a violência, a insegurança pública, a corrupção e a desigualdade ainda reclamam uma atuação vigorosa e firme das instituições públicas, que não podem retroceder nem ter seus instrumentos de atuação revogados.

Não há possibilidade de retrocesso, porque a ordem constitucional é de avanço a partir do que vamos alcançando e solidificando. É necessário, por isso, que cada cidadão compreenda que a Constituição tem a norma que preside a solução dos problemas que ele enfrenta. A Constituição é cidadã.

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Cada cidadão é, nesse sentido, guardião da Constituição e defensor de sua integrali-dade. Pode invocá-la não apenas em juízo, mas sobretudo fora dele, para prevenir conflitos e também para resolvê-los. Preservar seus preceitos é promover sua aplicação. Este também é um dos sentidos da Constituição cidadã: a que é do cidadão. Para cada cidadão, é um traba-lho de Sísifo fazer valer as regras da Constituição, a democracia e os direitos humanos, como um bloco de mármore empurrado montanha acima, todos os dias. Pode parecer difícil, mas não é uma tarefa infrutífera. Muito ao contrário, é o exemplo, a esperança e a compreensão de que a democracia e o regime de leis exigem cuidados permanentes que nos torna cida-dãos ativos e construtores da sociedade justa, livre e solidária que a Constituição garante.

Os direitos individuais reclamam proteção diária. É preciso estar de prontidão para reconhecê-los, para invocá-los e identificar quando são afrontados. É uma atitude cívica e inteiramente constitucional compartilhar esse conhecimento, transmiti-lo em nossas rela-ções pessoais, na família, na escola e no local de trabalho.

Gosto de interpretar esse mito grego do trabalho de Sísifo, na acepção esperançosa de Cora Coralina, que se apresentava como a pessoa que, na escalada da vida, remove pedras e planta flores. Que sejam tais flores a esperança de justiça prometida com clareza pela Constituição.

A Constituição de 1988 é respeitada por sua premissa estruturante de respeito às liberdades essenciais e aos seus objetivos de justiça social, que lhe informam o núcleo axiológico. Não obstante os desafios com que os diversos momentos de crises políticas, econômicas e morais pontilharam as três décadas de vigência da Constituição, deve-se também credenciar a sua eficácia, além do apoio popular que colhe, às instituições fortale-cidas que engendrou.

Persistamos na Constituição. Perseveremos na democracia. Continuemos os esforços de cumprir todas as promessas do constituinte de 1988. Sigamos juntos, todos, cidadão e instituições, no caminho que conduz a uma sociedade justa, fraterna, pluralista, solidária e sem preconceitos. Sigamos juntos na construção do Estado Democrático de Direito e da Justiça Social. De todos. Com todos. Por todos. E para todos.

Muito obrigada.

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Discurso do Doutor CLAUDIO LAMACHIA,

Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil

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O Doutor Claudio Lamachia (Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil) – Boa tarde a todos. Permita-me, Ministro Dias Toffoli, Presidente do Supremo Tribunal Federal, cumprimentá-lo e, na sua pessoa, cumprimentar todos os Ministros de hoje, de ontem e de sempre, deste Supremo Tribunal Federal, assim como todos os membros do Poder Judiciário. Permita-me também saudar o Presidente da República, Michel Temer, e na sua pessoa sau-dar todos os membros do Poder Executivo; saudar a Doutora Raquel Dodge e, na sua pessoa, saudar todos os membros do Ministério Público; cumprimentar os meus colegas advogados e advogadas, indispensáveis à administração da Justiça, na forma do artigo 136 do Texto Constitucional.

Senhoras e senhores, o Brasil vive hoje um dos períodos mais turbulentos, controversos e complexos de toda a sua história republicana. Dois presidentes depostos por impeachment, numerosos agentes públicos e empresários graduados presos, denunciados ou processados. Entre eles, ex-parlamentares, ex-ministros, ex-governadores e um ex-presidente da República.

Jamais se viu nada igual, a não ser em regimes de exceção. A diferença, porém, é exatamente esta: tudo isso, ainda que admitamos que há alguns excessos – e há –, se dá sob a égide do Estado Democrático de Direito, sob o escudo da Constituição Federal.

Mesmo os excessos podem – e são – cobrados na forma da lei.

As instituições funcionam, ainda que, em alguns casos, sejam – e têm sido – cobra-das, criticadas ou mesmo contestadas.

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O debate, porém, se desenrola, sem que ninguém o impeça. Estão aí as mídias convencionais e as mídias sociais.

O advento da internet expôs o Estado e suas instituições a um nível de cobrança e a um grau de vigilância sem precedentes – muitas vezes em linguagem inadequada e até insultuosa.

O que disso se deduz é que a sociedade quer tomar posse do Estado, impor-lhe trans-parência e cobrar-lhe a contrapartida dos pesados impostos com que o sustenta. Quer, em suma, um país melhor. Muito melhor.

A travessia é turbulenta, problemática, mas pode conduzir a um cenário de futuro promissor, em que o Estado, como queriam os gregos do Século de Péricles, seja a expressão efetiva da cidadania.

Isso, porém, só é possível dentro da lei, em que a Constituição seja efetivamente a bússola. Não há outro caminho.

Mas, como disse, estamos em plena travessia. E o que daí deriva é uma circunstância inédita com que ambas as partes – sociedade e Estado – são obrigadas a lidar, sem que haja referências prévias similares que possam orientá-las. Aprende-se enquanto se caminha. É a democracia em transe, em movimento.

O fenômeno é mundial e responde em parte pelo desconcerto que, em graus varia-dos, afeta todas as democracias do planeta.

A falsa paz é a das tiranias – a paz dos cemitérios. As democracias, sim, fazem baru-lho – bendito o barulho que a democracia faz! Mas isso não exclui, muito pelo contrário, o zelo constante pela moderação.

Sem ela, não há democracia, que é, acima de tudo, o regime da lei. É ela, a modera-ção, que contém os excessos, dá ordem, lógica e civilidade ao processo.

Permite que todos se expressem. Garante a voz da maioria e das minorias.

Se me perguntam qual o insumo fundamental para que cumpramos com êxito a presente travessia, não hesito em afirmar: moderação, equilíbrio, serenidade, mas com a firmeza necessária.

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Nesses termos, não podemos, como alguns tentam fazê-lo – de maneira ligeira e superficial –, condenar a Constituição de 1988, que, neste mês de outubro, completa os seus 30 anos.

Não é ela, com as imperfeições que certamente tem – e para cuja correção ela própria indica os meios, via emendas a seu texto –, a responsável pelas turbulências da atual conjuntura.

Pelo contrário, tem funcionado, com todas as suas limitações, como um anteparo aos excessos e às ameaças à ordem institucional.

O que alguns não compreendem, repito, é que a democracia está longe de ser um regime passivo, de unanimidade.

A democracia é exatamente o oposto: nutre-se do conflito de interesses e de ideias, que a enriquece, permitindo que os contrários exponham seus pontos de vista, suas propos-tas e projetos. Enfim, incentiva, de fato, o diálogo. Permite também – e aí está sua sabedo-ria – que até os extremos se manifestem.

Eles, porém, só triunfam quando os agentes políticos – os canais da moderação – fra-cassam; quando, pela conduta ilícita de alguns – sobretudo dos líderes mais destacados –, compromete-se a credibilidade das instituições.

Aí, passa a circular a ideia de solução pela força, pelo golpe – e pelo fim da ordem constitucional.

A presente campanha eleitoral é um retrato preocupante desse estado de coisas. Mais do que nunca, é necessário que se busquem na Constituição os remédios para sanear a política.

Política, como sabemos, só se cura com política.

E as eleições são – precisam ser – um momento de renovação, de oxigenação do ambiente político. Seja quem for o vencedor, nosso socorro estará sempre na Constituição.

Ela existe exatamente para garantir direitos à sociedade e para limitar os poderes dos que governam.

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O lugar que a OAB ocupa nesta solenidade, no Plenário do Supremo Tribunal Federal, reveste-se de forte simbolismo: fomos nós, advogados e advogadas, alçados pela Constituição como indispensáveis à administração da Justiça.

Nesta semana, na OAB, realizamos, na abertura da sessão ordinária do Conselho Federal, uma homenagem à Constituição Cidadã e tivemos a honra de receber, na casa da advocacia, algumas das Senhoras e dos Senhores Ministros do Supremo Tribunal Federal e também o ex-deputado e ex-presidente da OAB, o advogado Bernardo Cabral, relator da Constituinte, figura central daquela Assembleia.

Também esteve conosco o advogado, professor e jurista José Afonso da Silva, que tanta contribuição tem dado ao aperfeiçoamento de nossa democracia.

Aqui estamos para celebrar um monumento civilizatório que nos é comum: a Carta Magna do País – sua carteira de identidade.

O STF tem a missão constitucional de guardião da Constituição. A advocacia tem missão correlata – e não menos nobre: de guardiã da sociedade, de seus direitos e garantias, zelando, nos termos de seu Estatuto, pela boa aplicação das leis.

A Constituição existe em função da sociedade – e esta se organiza em função da Constituição. Formam – precisam formar – uma unidade indissociável.

A Constituição da República Federativa do Brasil completará trinta anos de vigência no próximo dia 5 de outubro, amanhã.

O marco não é trivial, como demonstrado pela história brasileira. Ao longo de nossa experiência republicana, apenas a Carta de 1891 superou esse feito.

Não obstante, Senhoras e Senhores, ainda mais notável do que sua longevidade é o significado da nossa Lei Maior, que, por obra dos constituintes, representou o triunfo da liberdade sobre a repressão, dos direitos humanos sobre o arbítrio, da cidadania sobre a opressão.

Elaborada após mais de vinte anos de ditadura militar, a Constituição de 1988 re-sultou de intensa luta da sociedade em favor do retorno ao Estado Democrático de Direito.

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Sua promulgação fundou uma nova era na história do País, alicerçada no pluralismo político e na promoção universal dos direitos individuais e coletivos, consagrando a dignidade da pessoa humana como núcleo da ordem constitucional vigente.

A Constituição da redemocratização pode padecer das imperfeições inerentes ao mo-mento em que foi promulgada, marcado pela queda do Muro de Berlim e de expectativas de uma nova ordem constitucional e mundial que não se consumou. Isso explica, em parte, as mais de uma centena de emendas que já lhe foram apostas.

Mas é suficientemente robusta e consistente para absorver essas transformações, previstas em seu próprio texto, sem que sua essência – os Princípios Fundamentais e o capítulo dos Direitos e Garantias Fundamentais – tenha envelhecido.

Nesse aspecto, tem sido reconhecida como uma das mais modernas no mundo contemporâneo. E o é de fato.

Penso que o universo institucional aqui representado nesta solenidade deve avaliar, com serenidade e moderação, a conjuntura que se inaugurará com o resultado eleitoral.

Estas são as mais importantes eleições desde a redemocratização. É uma das mais importantes de toda a nossa história. Temo exatamente o ambiente de extremismo que al-guns querem lhe infundir. Mas o antídoto ao extremismo, venha de onde vier, é – e sempre será – a nossa Constituição e a lei.

Ao tempo em que celebramos o seu 30º aniversário, não podemos perder de vista o papel estabilizador e civilizatório que ela representa. Exatamente, a partir de todos os percal-ços desta quadra histórica, tem ela cumprido sua missão.

Com essas palavras, em nome da advocacia brasileira, cumprimento o Supremo Tribunal Federal na pessoa de seu Presidente, Ministro Dias Toffoli, pela justa, oportuna e necessária celebração desta tarde.

Muito obrigado.

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Discurso do Senhor MICHEL TEMER,

Presidente da República Federativa do Brasil

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O Senhor Michel Temer (Presidente da República Federativa do Brasil) – Eu quero começar agradecendo a delicadeza da concessão da palavra.

E, agradecendo-a, cumprimentar o Senhor Presidente Dias Toffoli, tomando a liber-dade também, sem embargo da velocidade que Vossa Excelência exigiu, de cumprimentar a Senhora Procuradora-Geral da República, o Senhor Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil e o Ministro Marco Aurélio, em nome de quem saúdo todos os demais componentes desta Casa, os atuais e os do passado.

E quero inauguramente dizer, Senhor Presidente, que eu ouvi aqui lições, na verdade, de direito constitucional amalgamadas com aspectos políticos.

E quero também dizer da oportunidade extraordinária desta sessão, porque, quando o Supremo Tribunal Federal, a Corte Constitucional, se reúne para fazer uma homenagem à Constituição de 1988, isso tem muito significado. Diferentemente, talvez, se apenas o Executivo ou o Legislativo fizessem esta homenagem, porque a palavra de referência, de amparo, de aval que o Supremo, a Corte Suprema, dá à Constituição de 1988 é importan-tíssima neste momento. Especialmente no momento histórico conturbado, como aqui foi relatado, em que muitos e muitos desejam uma nova ordem constitucional, ou seja, um novo Estado. Para nós outros da área jurídica, o Estado apenas nasce no momento em que nasce a Constituição Federal.

E é curioso que nós temos, minhas Senhoras e meus Senhores, uma compulsão que eu poderia chamar de politicamente perversa, porque nós temos historicamente esta neces-sidade extraordinária de, a cada 20, 25, 30 anos, ou menos até, achar que nós precisamos

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de um novo Estado. Então, a todo momento, se postulam constituintes que possam inaugurar uma nova ordem estatal.

E eu me baseio na história constitucional brasileira. Os Senhores apanham de 1891 a 1930, 1934 a 1937, 1937 a 1945/1946, 1946 a 1964, 1964 a 1988. Parece que nós temos a necessidade de, a cada 25 ou 30 anos, divulgarmos que nós estamos numa crise política, numa crise econômica, numa crise moral, numa crise institucional e, portanto, impõe-se a elaboração de uma nova Constituição, de um novo Estado, ao fundamento – a meu ver, equi-vocado – de que um novo Estado resolve todos os assuntos.

Eu me recordo – constituinte que fui ao lado do nosso prezado ex-Ministro Nelson Jobim – que, naquela oportunidade, o que os brasileiros todos diziam era o seguinte: “Muito bem! Quando a Constituição for promulgada, o céu será azul, tudo vai se modificar, não ha-verá inflação, não haverá desemprego, não haverá absolutamente nada no País”.

E isso é um equívoco muito grande. E eu vejo que, muitas e muitas vezes, se alardeia a necessidade de um novo Estado e, por isso, volto a dizer a oportunidade extraordinária desta homenagem à Constituição de 1988.

Eu creio mesmo que Vossa Excelência, Senhor Presidente do Supremo Tribunal, a advocacia privada e a Procuradoria-Geral da República estão neste momento enaltecendo a Constituição de 1988. Isso é que deve ser divulgado, isso que deve ser alardeado. E porque alardeado, deve ser enaltecido e ressaltado.

Eu confesso – até se me permite uma brevíssima recordação, com o aval do nosso Jobim, nosso Ministro Jobim –, eu me recordo, quando cheguei à Constituinte, eu fui logo destinado à Comissão de Separação de Poderes, que tinha, na verdade, subcomissões, entre elas a Subcomissão do Poder Judiciário e do Ministério Público. E para lá fui encaminhado, até optei por essa Comissão. E tive a alegria – alegria cívica, democrática – de trabalhar muitíssimo para que o Ministério Público de hoje tivesse as prerrogativas que hoje detém e que, por isso mesmo, pode produzir um efeito extraordinário na concepção democrática do nosso País.

Tive oportunidade também de salientar a grandeza do Poder Judiciário. Eu diria que, àquela época, já não era preciso até registrá-la, tendo em vista que o Judiciário historica-mente sempre teve uma presença significativa e fortíssima, fosse no meio jurídico, fosse no meio político do País. Mas tive a oportunidade de trabalhar nessa área.

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Na advocacia, eminente Presidente, tive o prazer de ser o autor do artigo 133, ao fundamento de que o advogado é indispensável à administração da Justiça. Então, na verdade, eu acabei cuidando daquilo que cuida da administração da Justiça no nosso País.

E é interessante, eu sempre digo com muita frequência que é importantíssimo pre-servar a Constituição. Aliás, como aqui disseram: não há caminho fora da Constituição ao fundamento de que é preciso manter a regração jurídico-institucional para manter a estabi-lidade do nosso País.

Até comento que, tempos depois, em face de invasões que se davam em escritórios de advocacia, em São Paulo e em todo o Brasil, a OAB, na época, solicitou-me que apresen-tasse um projeto de lei que garantisse a inviolabilidade do local de trabalho do advogado. E eu até confesso que fui obrigado a apresentá-lo, embora tivesse a convicção de que, na interpretação sistêmica do texto constitucional, o próprio artigo 133 já garantia essa invio-labilidade. Tanto que, na justificativa para esse projeto, eu disse: “Olha, com extraordinário, com grande pudor intelectual que eu apresento este projeto, porque, na verdade, isso já está contido no texto constitucional”.

E por que eu digo isso, Senhoras e Senhores Ministros e todos? Eu digo porque, repetindo, o Supremo é o guarda da Constituição.

Uma ocasião, neste mesmo Plenário, eu tive que dizer: “Interessante, o Legislativo produz a lei, mas, se controvérsia houver, quem ao final diz se é lei ou não é o Supremo Tribunal Federal, por meio ou do controle concentrado ou do controle difuso da Constituição”.

Mas acho que o Supremo tem uma missão ainda maior, porque o constituinte de 1988 quis que a Constituição tivesse aplicabilidade plena, ou seja, que todas as suas normas fossem eficazes. E, portanto, não ficou apenas no controle da constitucionalidade por ação, mas também introduziu o fenômeno, que é um avanço extraordinário, do controle da incons-titucionalidade por omissão. E não entregou apenas às figuras do artigo 103 da Constituição, mas entregou a cada cidadão brasileiro, por meio do mandado de injunção. Portanto, o Supremo é quem faz a Constituição, é quem completa, por assim dizer, por meio do manda-do de injunção e do controle da inconstitucionalidade por omissão, o trabalho do constituinte.

Quantas e quantas vezes, nas Constituições anteriores, aquelas regras demandantes de legislação integrativa – tudo isso depende de lei ou de lei complementar, o que seja – não ganharam eficácia plena porque não havia um instrumento capaz de obrigar, por assim dizer, ou sugerir ao Poder Legislativo que pudesse implementar aquela vontade constituinte.

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Então, o Supremo tem feito muito aqui, os Senhores têm trabalhado enormemente no controle da inconstitucionalidade por omissão e, de alguma maneira, nos mandados de injunção.

Os avanços foram inegáveis.

Até interessante, como se falou aqui do princípio da igualdade, é muito razoável invocar uma diferença entre a regra da igualdade, hoje vigente no texto constitucional, e a regra da igualdade vigente nos anteriores textos constitucionais. Os anteriores textos cons-titucionais diziam que todos são iguais perante a lei. Hoje, em face da presença da mulher, extraordinariamente participante da sociedade brasileira, o constituinte, já em 1988, disse que homens e mulheres são iguais em direitos e deveres. É uma palavra, mas que tem, eminente Ministro Celso de Mello, uma significação extraordinária sob o foco jurídico e sob o foco político.

E aqui, se me permitem, não quero me estender muito, agradecendo mais uma vez a palavra, mas dizer que é interessante como essa Constituição conseguiu amalgamar os princípios do liberalismo com os princípios do socialismo.

Quando os Senhores pegam teses como prestigiamento da propriedade, da iniciativa privada, a liberdade de imprensa, que está muito conectada a um valor maior que é a liberda-de de informação; porque é interessante, as pessoas falam muito da liberdade de imprensa como se fosse uma coisa em favor da imprensa. Não é! É em favor do povo.

A imprensa livre significa informação livre. Portanto, o critério, o valor chamado infor-mação, que a Constituição trouxe para o seu interior, está acima da liberdade de imprensa, tanto que, nos dias atuais, as Senhoras e os Senhores percebem que, quando há uma notícia qualquer, a imprensa cuida do “outro lado”, que é exata e precisamente para que a infor-mação se complete. Ou ainda, se eu quiser cingir-me ao texto constitucional para invocar Kelsen, eu diria que o direito de resposta é um direito para completar a informação, porque, se você se sente agredido por uma informação, por uma notícia, você tem o direito de pleitear a resposta. Para quê? Para completar a informação. Portanto, digamos, a liberdade de infor-mação é o complemento da liberdade de imprensa. Isso foi trazido pelo texto constitucional.

Quando você pega os direitos sociais, é um longo capítulo; os direitos trabalhistas; até direitos que, em um primeiro momento, foram ridicularizados, como direito à alimen-tação, direito à moradia, que são normas programáticas, mas que, sendo programáticas, impedem qualquer política pública divergente daquela norma programática.

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Então, esses fatores todos foram trazidos pela Constituição de 1988. E, de vez em quando, nós ouvimos “interessante essa Constituição é muito detalhada, pormenori-zada”. E é verdade! Ela, sendo pormenorizada, ela restringe a área discricionária do Poder Legislativo e, talvez, do Poder Judiciário, porque quase tudo está literalmente expresso no texto constitucional.

Mas sem embargo disso, como salientou o Ministro Marco Aurélio, é interessante quando nós vamos ao capítulo de Direitos e Garantias Individuais, eles não se encerram numa numeração exemplificativa, porque, logo no § 1º, está dito que os direitos ali elencados não impedem que se invoquem outros decorrentes do texto constitucional. E, logo no § 2º, ainda diz que os tratados internacionais referentes aos direitos humanos, conectados aos direitos individuais, eles, se aprovados pelo mesmo critério da emenda, incorporam-se ao texto constitucional. Portanto, a relação do artigo 5º da Constituição é uma relação protetora dos direitos individuais, como aqui foi dito.

Estou dando, aqui, brevíssimos exemplos, secundando, portanto, as palavras que aqui foram ditas, para dizer da importância da nossa Constituição. Digo eu, ela talvez diminua a margem discricionária do Poder Judiciário, da escolha, mas não impede a interpretação. E a interpretação que o Senhores têm dado aqui – o Ministro Marco Aurélio elencou uma série de medidas que talvez não estejam literalmente colocadas no texto constitucional –, a interpretação sistêmica do texto permitiu que as Senhoras e os Senhores, aqui, do Supremo Tribunal Federal, pudessem avançar enormemente na consolidação da democracia que o constituinte de 1988 estabeleceu.

E, aqui, se me permitem uma brevíssima palavra final, é interessante como – é claro que nós, quem trabalha na área jurídica cinge-se apenas ao que está na área jurídica – ela tem o nascedouro de natureza política, porque a Constituinte não é um fenômeno jurídico, a Constituinte é um fenômeno político. Então, quando a Constituinte estabelece um texto posi-tivado, e daí as palavras de Kelsen quando pretende distinguir entre as normas postas e uma norma suposta, as normas postas são aquelas positivadas, postas pelo constituinte, estão na Constituição. E essa pirâmide, a que o Ministro aludia, ela diz: a Constituição é o fundamento da lei; a lei é fundamento do decreto; decreto é fundamento da portaria; é aquela tal pirâmi-de. Mas quem sustenta a Constituição? Aí você sai do plano posto para o plano suposto. E, no plano suposto, você vai para a norma hipotética chamada fundamental; obedece a tudo aquilo que está na Constituição.

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Então, Presidente, em palavras finais, em nome do Poder Executivo Nacional, em nome da União Federal, eu quero cumprimentá-lo e todos por este ato; que ele sirva, na verdade, para dizer que nós aqui estamos exercendo a soberania que não é nossa, a sobe-rania é do povo. Isso tenho dito, é uma trivialidade quase, porque nós somos autoridades constituídas, o único titular do poder, no nosso sistema, é o povo. E o povo vai manifestar-se agora, no dia 7, e, ao manifestar-se, como alguém aqui mencionou, ele elege a situação, os que ganham, e elege a oposição, porque os que não foram eleitos foram votados pelo povo, portanto pelo único titular da soberania. E é isto que revela a soberania, esse poder incontrastável de mando, essa capacidade de querer coercitivamente e a capacidade de fixar competências. O povo vai lá e diz: “Eu quero isto, estou te dando procuração para tanto”. E isso tudo ancorado no texto constitucional. Como bem disse o nosso Presidente da OAB, fora da Constituição não há caminho.

Portanto, mais uma vez, meus cumprimentos por esta solenidade. Espero que toda a nossa imprensa que esteja aí seja capaz de registrar a grandeza deste ato do Supremo Tribunal Federal, e que este ato marque a preservação da Constituição. Se Deus quiser, Ministro Toffoli, daqui a 50 anos, nós estaremos todos aqui comemorando o 80º aniversário da Constituição.

Meu aplauso à Constituição de 1988.

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Palavras do Senhor Ministro DIAS TOFFOLI,

Presidente do Supremo Tribunal Federal

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O Senhor Ministro Dias Toffoli (Presidente) – Agradeço as palavras do Presidente da República. Todos os discursos ora proferidos, que honram o Poder Judiciário da Nação, integrarão a história e os anais do Supremo Tribunal Federal.

Antes de finalizar, gostaria de dirigir, como Chefe do Poder Judiciário nacional, algumas palavras ao Poder Judiciário neste momento comemorativo da Constituição da República brasileira.

Lembro que o Poder Judiciário está presente em todo este País continental, com seus dedicados magistrados e servidores nos milhares de comarcas, varas, tribunais, órgãos de Justiça e, é claro, zonas eleitorais (já que estamos próximos das eleições).

A Carta de 1988 dotou este Poder de novas estruturas e encargos, garantindo-lhe, assim, tanto a independência como a autonomia necessárias para o exercício de seu inde-clinável ofício jurisdicional.

Não fosse por isso, o Judiciário – e esta Corte Suprema em particular – não disporia dos instrumentos para promover e manter a paz na sociedade brasileira, quer entre as pes-soas, quer entre as instituições.

No entanto, nenhum outro ator constitucional é mais efetivo na progressiva concre-tização do Texto Magno do que o próprio cidadão, do que o próprio povo, a quem se destina, ao fim e ao cabo, a Constituição.

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É essa percepção que deve conduzir seu intérprete na constante evolução de sua aplicação, de modo a assegurar que as conquistas até aqui obtidas sempre vigorem, não admitindo involuções, especialmente quanto à democracia estabelecida, à cidadania con-quistada e à pluralidade até aqui construída.

É bom que se reproduza, neste Plenário, a missão da Constituição tal como delineada ainda ontem, na biblioteca do Supremo Tribunal Federal, pelo Professor Gomes Canotilho, que aqui se faz presente.

Naquela oportunidade, disse esse emérito professor:

É função primária de uma Constituição Cidadã fazer ecoar os gritos do nunca mais:

Nunca mais a escravatura. Nunca mais a ditadura. Nunca mais o fascismo e o nazismo.

Nunca mais o comunismo. Nunca mais o racismo. Nunca mais a discriminação.

Os desafios existem e sempre existirão. Como disse em meu discurso de posse como Presidente desta Corte, o jogo democrático traz incertezas. A grandeza de uma nação é exa-tamente se inserir neste jogo democrático e ter a coragem de viver a democracia.

Temos como guia, como farol, este nosso Pacto Fundante – a aniversariante de 1988. E nós, o Supremo, cada um de nós, somos e seremos os garantes desse Pacto!

Como nos versos entoados pelo Maestro João Carlos Martins agora há pouco, sofren-do e, muitas vezes, até chorando, a amaremos para sempre!

Registro e agradeço a presença de suas Excelências as Senhoras e os Senhores. Excelentíssimo Senhor Presidente da República, Michel Temer; Senhora Procuradora-Geral da República, Doutora Raquel Dodge, na pessoa de quem cumprimento os membros do Ministério Público; Senhor Presidente do Superior Tribunal de Justiça, querido amigo Ministro João Otávio de Noronha, na pessoa de quem cumprimento os Senhores Ministros de Tribunais Superiores; Presidente do Superior Tribunal Militar, Ministro José Coelho Ferreira; Vice- -Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Ministro Renato de Lacerda Paiva; Corregedor Nacional de Justiça, querido amigo Ministro Humberto Martins, na pessoa de quem cum-primento todos os Senhores Conselheiros do Conselho Nacional de Justiça; Ministro de Estado da Justiça, também querido amigo de tantos anos, Torquato Jardim, na pessoa de quem cumprimento os Senhores Ministros de Estado; Ministros de Estado presentes: Eliseu Padilha, da Casa Civil; Valter Casimiro, dos Transportes, Portos e Aviação Civil; Gustavo Rocha, dos Direitos Humanos; Ronaldo Fonseca, da Secretaria-Geral da Presidência da República;

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Senhor Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Doutor Claudio Lamachia, na pessoa de quem cumprimento os advogados presentes; Desembargadora Sandra de Santis Mendes de Faria Melo, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios; Vice-Presidente da Associação dos Juízes Federais (AJUFE), Doutor Nilton Ramos, na pessoa de quem cumprimento os presidentes de associações e institu-tos da magistratura; Senhores Magistrados; Maestro João Carlos Martins; Músico Di Brasil; Senhores Jornalistas; Senhores Servidores; Senhoras e Senhores; imprensa aqui presente. Agradeço a todos.