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Universidade Federal de Minas Gerais
Faculdade de Educação
Disciplina: História da Educação I – CAE 022
Professor: Marcus Aurélio Taborda
Síntese do livro Território Plural: A pesquisa em história da educação
O livro “Território Plural - A pesquisa em história da educação” foi escrito por
Ana Maria Galvão e Eliane Marta Lopes, ambas pedagogas que atuam dentre
outros temas com História da Educação. Trata-se de uma reescrita de um livro
anteriormente lançado, que apresenta nessa edição novas abordagens sobre a
temática. É destinado a alunos de graduação, pós-graduação, professores,
historiadores, curiosos e quem se interesse pela área.
O livro está dividido em quatro capítulos que abordam o conteúdo da pesquisa
em história da educação a partir de diversas perguntas que as autoras se
deparam ao longo de suas trajetórias, cuja respostas propiciaram a produção
desse livro. O primeiro capítulo aborda o surgimento da disciplina história da
educação e seu desenvolvimento, apresentando caraterísticas que marcaram
sua trajetória e não sua cronologia. O segundo capítulo trata de explorar a
ampliação no reconhecimento de novos objetos de estudos, que surge da
aproximação dessa disciplina com outras ciências e outras áreas. No terceiro
capítulo são abordadas as fontes usadas pelos pesquisadores. E no último
capítulo que veio a ser adicionado nessa nova edição, trata de uma orientação
para a elaboração de novos projetos de pesquisa no campo da historia da
educação.
Pouco se sabe sobre o universo da educação, e ao naturalizarmos, o que fora
estranho em algum momento, acabamos por não questionar ou pouco nos
surpreender com o mundo escolar tão presente em nosso cotidiano.
As autoras afirmam que a história do ponto de vista pragmático, pode ser
considerada um saber inútil, mas o estudo da história proporciona uma
aproximação das indagações que surgem no presente, através do
conhecimento do que foi, quem fez, como fez, por exemplo, em uma
determinada época, em uma determinada sociedade. A História nos atrai a
olhar para o passado com paciência, de forma a compreender que as
mudanças ocorrem de forma lenta e que alguns elementos se mantêm ao
longo da história.
A etimologia da palavra escola nos instiga pelo conceito do grego skholê, que
significa “ócio, lazer”, e do latim schola, que significa “ócios consagrados ao
estudo” A partir desses sentidos, é possível entender que a escola era um
negócio voltado àquele que era livre e que tinha tempo ocioso para se dedicar
aos estudos, exercitando o desejo e o gosto pelo saber.
Conforme compreendemos o tempo e os espaços escolares, podemos verificar
uma mudança em seus aspectos. A começar pela Grécia Antiga, onde o
surgimento da democracia faz com que mais pessoas reivindiquem o acesso a
técnicas e conhecimentos que antes era limitado a uma minoria da população.
No Império Romano a educação era proposta por estudos literários e
científicos, o latim, é difundido nos povos conquistados e passa a ser partilhado
por todos. Durante a Idade Média a Igreja Católica se ocupou pela educação
baseada na formação bíblica cristã, mas também preparando para o trabalho
sob influência das atividades comerciais e artesãs que se desenvolviam nos
burgos (cidades).
Na Renascença há um resgate dos estudos da arte e da literatura, mas agora
com um olhar antropocêntrico. Com o movimento renascentista, os estudos
literários, científicos e filosóficos são vistos como partes igualmente
importantes na escola. É nesse período também, que acontece a conquista das
Américas, o que impulsiona um novo pensamento voltado para a educação de
novas raças e culturas, ou seja, é necessário um novo tipo de educação e um
novo tipo de escola.
Ao passarmos pela Idade Moderna, as proposições teológicas da Reforma e da
Contrarreforma juntamente com o surgimento da impressa, expandiu a leitura e
a escrita a um número cada vez maior de pessoas e admitiu um novo lugar
para homens e mulheres na terra, a partir de uma nova visão da ciência e da
razão. Durante essa época no Brasil, os principais responsáveis pela educação
foram os Jesuítas que educavam as crianças indígenas e os filhos de colonos.
Como consequência a educação jesuítica destruiu a cultura dos índios fazendo
adotá-los sua cultura europeia, mas também os protegeram dos mercenários.
Foram responsáveis também pela educação da elite nos colégios secundários
e formar nos cursos superiores de teologia.
Com a Revolução Industrial e a disseminação das conquistas científicas da
Europa pelo mundo, foi possível a democratização da educação. O Marques de
Pombal expulsou os jesuítas do reino de Portugal e de suas colônias, pois
segundo ele estes só acumulavam fortunas e não propagavam as revoluções
científicas. A reforma proposta pelo Marques de Pombal tinha com objetivo se
aproximar das revoluções que ocorriam na Europa, mas como afirma Shigunov
Neto e Maciel
é preciso atentar-se para uma peculiaridade a ser destacada nesse processo de expulsão dos jesuítas e de formulação das reformas de Pombal, que tem início nesse momento histórico e que acompanhará a educação brasileira ao longo dos anos: as reformas educacionais brasileiras apresentam como característica marcante a total destruição e substituição das antigas propostas pelas novas. (SHIGUNOV NETO e MACIEL, 2008, p.184).
Alguns anos se passaram até que o Estado assumisse responsabilidade pela
instrução e promovesse as aulas régias e as classes avulsas de ensinamentos
que substituíram a lacuna deixada pelo fim da Companhia de Jesus.
A partir da Revolução Francesa começam a aparecer os primeiros conceitos de
escola pública, leiga, universal, gratuita e obrigatória. No Brasil a implantação
dessas ideias ocorre progressiva e lentamente no século XIX.
Com a vinda da família real para o Brasil, veio junto também uma nova
possibilidade de cultura e educação. São criados cursos superiores, a
Biblioteca Nacional, o Museu Nacional e o Jardim Botânico e outras
instituições. Após a Independência, novas questões educacionais passam a ser
discutida como o acesso a educação dos negros e das meninas. Há a
instauração das escolas normais que deram lugar às mulheres para a
ocupação no magistério primário. Na República, a escola ganha materiais,
espaços, profissionais próprios e passa a ser considerada como a principal
instituição para a transmissão de saberes. O século XX traz novas discursões
sobre a educação sob influência de áreas como a psicologia e a sociologia. O
Movimento Escola Nova que tem no Brasil como marco o Manifesto dos
Pioneiros, questiona o papel dessa instituição que agora também recebe como
público as camadas populares. Esse acesso nem sempre está relacionado à
permanência desses alunos. Ao decorrer do século XXI podemos notar a forte
presença de recursos tecnológicos no ambiente educacional e a preocupação
agora é de como estes recursos influenciam na produção do conhecimento. Há
também as práticas educativas que ocorrem fora da escola como no trabalho,
no lazer, na família, nos movimentos sociais e culturais, dentre tantos outros,
que atuam com muita força, inserindo pessoas em mundos culturais
específicos.
Para expor essa inserção das pessoas em culturas específicas como prática
educativa, recorro a Arroyo que afirma
A cultura é mais resistente do que o conhecimento escolar. Ela nos denuncia que os sujeitos humanos não são puros aprendizes de conhecimentos neutros e menos ainda que eles são cópias de um todo homogêneo. A cultura é mais rica, mais multifacetada para impregnar e inspirar a ação educativa. Reflete o rosto mais plural dos educandos, sujeitos culturais de linguagens, vivências, valores, concepções, imaginários múltiplos. Mais resistentes. Mais sujeitos. (ARROYO, 2003, p. 41 e 42).
A História da Educação: uma disciplina, um campo de pesquisas.
Para entendermos as características que marcaram a história da educação é
necessários recorrermos ao passado o que propícia compreender a forma atual
como essa apresenta. A História e a Pedagogia estão intrinsecamente ligadas
em suas trajetórias. Na educação, é comum tentar encontrar uma utilidade para
o conhecimento adquirido que chega a pensar em uma compreensão do
presente com possibilidade de intervenção no futuro através do estudo do
passado, de forma a não cometer os mesmo erros e reafirmar o que é tido
como sucesso. Porém essa busca de utilidade é inserta já que o processo
histórico não ocorre de forma linear e como ser impessoal e não considerar
nossos valores atuais sem ter vivenciado as mesmas circunstâncias.
Uma característica importante que marca o campo de pesquisa da educação é
a ligação dessa com outras áreas como a filosofia, a psicologia, a biologia, a
sociologia e outras, o que dificulta o reconhecimento da história da educação
como campo de pesquisa próprio.
A partir dos anos 70 e 80, a área da educação foi fortemente marcada pela
influência do Marxismo. A busca por novos objetos, novas fontes e novas
abordagens colocaram a educação situando-a em relação aos aspectos
econômicos, sociais e políticos da sociedade. Isso possibilitou uma análise
macroscópica de forma que se passou a considerar não mais o sujeito, mas
todo um grupo social responsável pelo fato educativo.
Nas últimas décadas três fortes tendências influenciaram e modificaram o
campo da história da educação. São eles: a história cultural, a história social e
a micro história.
Talvez a mais importante seja a história cultural que tem como principal
objetivo compreender como determinadas visões de mundo formam produzidas
e disseminadas por diferentes grupos sociais. A história social busca entender
como os sujeitos coletivos vivenciam e experienciam o mundo. Já a micro-
história trata-se de uma prática histográfica, com referências teóricas variadas.
Segundo Levi, o estudo se baseia “na redução da escala de observação, em
uma análise microscópica e em um estudo intensivo do material documental”
(Levi, 1992, p. 136 apud Galvão e Lopes, 2010, p.34). Essa observação
microscopia pode mostrar o que antes não era observado bem como o que
provoca mudanças na seleção de objetos e na forma de abordá-los.
A história da educação vem ganhando cada vez mais espaço, tem sido
incorporada em várias áreas das ciências humanas, o que é imprescindível
para a compreensão do passado dos fenômenos educativos.
Histórias da Educação: Novos Objetivos
Atualmente, a compreensão da Historia do ensino não se limita apenas ao
histórico das instituições escolares, a aproximação com outras áreas contribuiu
para que as crianças, os livros, a leitura, as mulheres e outros passassem a
serem objetos de estudo da disciplina. Atualmente, a compreensão da historia
do ensino não se limita apenas ao histórico das instituições escolares, mas
abrange todas as práticas cotidianas de aspecto educativo. É preciso investigar
o dia a dia da escola, bem como os sujeitos e as relações entre eles o que vem
configurando o que alguns escritores vêm nomear de cultura escolar.
A história do livro e da leitura também é um forte pilar que sustenta a pesquisa
em história da educação, sendo considerado tanto a produção, circulação e
apropriação dos materiais que podem ser desde objetos de leitura consagrados
pela tradição erudita, quanto escrita popular, tais como cordel, quadrinhos,
revistas e jornais, literatura pornográfica, materiais religiosos, novelas entre
outros. Sob forte influência de Ariès, passou a considerar a infância e suas
características, por ser a fase que constitui o principal alvo dos processos
educativos, como dado importante para a composição do campo de pesquisa.
A concepção de criança tem mudado bastante visto que a infância não é
apenas uma fase biológica, mas cultural e histórica, sendo assim a criança não
é mais vista como um adulto em miniatura, mas como um ser humano de
identidade própria que requer cuidados e atenção especial. As pesquisas mais
recentes consideram importante compreender a inserção de mulheres tanto
como alunas como professoras nos sistemas de ensino. Essa inserção resulta
de uma luta contra preceitos que impunham proibições e vigilâncias sobre a
mulher, que serviu de inicio para que hoje seja possível não estranharmos
mulheres ocupando cargos no mundo político, social, financeiro e, sobretudo
nos cargos no âmbito da educação.
Fontes para uma história da Educação
Foram abordadas tantas possibilidades na história da educação. Para
podermos analisar e discutir sobre a história da educação, tal como vemos
hoje, foram e são necessárias fontes para que os pesquisadores analisem. A
fonte é a matéria prima da pesquisa usada, imprescindível e necessariamente,
para reconstruir o passado. Por mais que essas fontes nos apontem
fragmentos da história passada, nunca chegaremos à verdade absoluta dos
fatos.
A escolha das fontes inicialmente, até as primeiras três décadas do século XX,
se dava a partir de documentos oficiais, exclusivamente escritos. Isso criava a
ideia de uma verdade imutável, vista apenas sobre uma perspectiva, sem
explorar as diversas facetas do objeto de estudo e seu contexto. Hoje em dia,
em busca de uma maior riqueza de informações, os pesquisadores lançam
mão de fontes alternativas, tais como os objetos escolares, o espaço físico,
arquitetura e mobiliário, as produções artísticas, diários, jornais e revistas e
tudo aquilo que tange o campo da educação de alguma forma explicando o
contexto da época e do local. A história oral também deve ser levada em
consideração, e esta exige muito cuidado por parte do pesquisador, pois requer
uma habilidade para a escuta necessária à operação historiográfica. Não é
possível ter domínio sobre todas as fontes, pois não se pode ter certeza se
todas foram usadas ou se todas foram perdidas. De qualquer forma, em
história da educação, a exploração destas fontes alternativas tem sido bem
aproveitada de modo a propiciar conhecimentos acerca do cotidiano nas
escolas, formas de socialização, maneiras de se vestir e se comportar e tudo
isso que diz respeito à vida do ser humano.
Embora seja muito rico, este novo olhar sobre as fontes impõe sobre o
historiador uma série de exigências ao lidar com uma diversidade de
informações, e este deve então ter conhecimento tanto da metodologia e
historiografia próprios do seu campo de pesquisa, quanto das metodologias
dos tipos de fontes às quais recorre. O trabalho se torna mais verdadeiro
conforme o pesquisador se dedica a buscar novas fontes e se utiliza de maior o
rigor para verificar a autenticidade delas. O cruzamento e confronto das fontes
é um excelente artifício para controlar a subjetividade das informações obtidas.
A riqueza do uso de fontes plurais está ligado ao fato da historia ser
apresentada de forma menos coesa, cheia de contradições e incoerências pois
considera várias vertentes, vários pontos de vista. Isso é a melhor forma de se
aproximar da realidade, se esquivando da visão unilateral das coisas.
O projeto de pesquisa em História da Educação
Ao fim do livro, as autoras propõem algumas dicas para ajudar o futuro
pesquisador, o orientando a lidar de forma rigorosa e comprometida com essas
novas possibilidades de fontes, como objetos, história oral e literatura. O mais
importante é que os pesquisadores busquem sistematizar aquilo que já sabe e
buscar respostas a partir daquilo que deseja descobrir. A pesquisa se divide
em módulos, o primeiro dele deve ser a definição do objeto da pesquisa, ou em
outras palavras, “o que” será pesquisado. Em seguida deve-se pensar no “por
que” desta pesquisa, levantas dúvidas e possíveis respostas, problematizar
situações e propor ou instigar mudanças nas práticas escolares. É fundamental
também que o pesquisador defina suas fontes e autores em que irá se basear
para desenvolver sua pesquisa, e criar uma metodologia. Por fim chama a
atenção para a importância da criação e aplicação de categorias de análise por
parte do historiador.
Há ainda um apêndice com um poema de Ascenso Ferreira, chamado “Minha
Escola” que trata da vida cotidiana de um aluno e é analisado trecho por
trecho.
Referências
ARROYO, Miguel G. Pedagogias em movimento – o que temos a aprender dos
movimentos sociais? Currículo sem fronteiras, v.3, n.1, p. 28-49, Jan/Jun,
2003.
GALVÃO, Ana Maria de Oliveira; LOPES, Eliane Marta Teixeira. Território
Plural: a pesquisa em história da educação. São Paulo: Ática, 2010.
LEVI, Giovanni. Sobre a micro-história. In. BURKE, Peter (org.). A escrita da
história: novas perspectivas. São Paulo: Ed. Unesp, 1992, p. 133-161. 3ª.
Ed., 2001.
SHIGUNOV NETO, Alexandre; MACIEL, Lizete Shizue Bomura O ensino
jesuítico no período colonial brasileiro: algumas discussões. Educ. Rev., 2008,
no.31, p.169-189.