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Universidade Federal de Minas Gerais Faculdade de Educação Disciplina: História da Educação I – CAE 022 Professor: Marcus Aurélio Taborda Síntese do livro Território Plural : A pesquisa em história da educação O livro “Território Plural - A pesquisa em história da educação” foi escrito por Ana Maria Galvão e Eliane Marta Lopes, ambas pedagogas que atuam dentre outros temas com História da Educação. Trata-se de uma reescrita de um livro anteriormente lançado, que apresenta nessa edição novas abordagens sobre a temática. É destinado a alunos de graduação, pós-graduação, professores, historiadores, curiosos e quem se interesse pela área. O livro está dividido em quatro capítulos que abordam o conteúdo da pesquisa em história da educação a partir de diversas perguntas que as autoras se deparam ao longo de suas trajetórias, cuja respostas propiciaram a produção desse livro. O primeiro capítulo aborda o surgimento da disciplina história da educação e seu desenvolvimento, apresentando caraterísticas que marcaram sua trajetória e não sua cronologia. O segundo capítulo trata de explorar a ampliação no reconhecimento de novos objetos de estudos,

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Universidade Federal de Minas Gerais 

Faculdade de Educação 

Disciplina: História da Educação I – CAE 022

Professor: Marcus Aurélio Taborda

Síntese do livro Território Plural: A pesquisa em história da educação

O livro “Território Plural - A pesquisa em história da educação” foi escrito por

Ana Maria Galvão e Eliane Marta Lopes, ambas pedagogas que atuam dentre

outros temas com História da Educação. Trata-se de uma reescrita de um livro

anteriormente lançado, que apresenta nessa edição novas abordagens sobre a

temática. É destinado a alunos de graduação, pós-graduação, professores,

historiadores, curiosos e quem se interesse pela área.

O livro está dividido em quatro capítulos que abordam o conteúdo da pesquisa

em história da educação a partir de diversas perguntas que as autoras se

deparam ao longo de suas trajetórias, cuja respostas propiciaram a produção

desse livro. O primeiro capítulo aborda o surgimento da disciplina história da

educação e seu desenvolvimento, apresentando caraterísticas que marcaram

sua trajetória e não sua cronologia. O segundo capítulo trata de explorar a

ampliação no reconhecimento de novos objetos de estudos, que surge da

aproximação dessa disciplina com outras ciências e outras áreas. No terceiro

capítulo são abordadas as fontes usadas pelos pesquisadores. E no último

capítulo que veio a ser adicionado nessa nova edição, trata de uma orientação

para a elaboração de novos projetos de pesquisa no campo da historia da

educação. 

Pouco se sabe sobre o universo da educação, e ao naturalizarmos, o que fora

estranho em algum momento, acabamos por não questionar ou pouco nos

surpreender com o mundo escolar tão presente em nosso cotidiano.

As autoras afirmam que a história do ponto de vista pragmático, pode ser

considerada um saber inútil, mas o estudo da história proporciona uma

aproximação das indagações que surgem no presente, através do

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conhecimento do que foi, quem fez, como fez, por exemplo, em uma

determinada época, em uma determinada sociedade. A História nos atrai a

olhar para o passado com paciência, de forma a compreender que as

mudanças ocorrem de forma lenta e que alguns elementos se mantêm ao

longo da história.

A etimologia da palavra escola nos instiga pelo conceito do grego skholê, que

significa “ócio, lazer”, e do latim schola, que significa “ócios consagrados ao

estudo” A partir desses sentidos, é possível entender que a escola era um

negócio voltado àquele que era livre e que tinha tempo ocioso para se dedicar

aos estudos, exercitando o desejo e o gosto pelo saber.

Conforme compreendemos o tempo e os espaços escolares, podemos verificar

uma mudança em seus aspectos. A começar pela Grécia Antiga, onde o

surgimento da democracia faz com que mais pessoas reivindiquem o acesso a

técnicas e conhecimentos que antes era limitado a uma minoria da população.

No Império Romano a educação era proposta por estudos literários e

científicos, o latim, é difundido nos povos conquistados e passa a ser partilhado

por todos. Durante a Idade Média a Igreja Católica se ocupou pela educação

baseada na formação bíblica cristã, mas também preparando para o trabalho

sob influência das atividades comerciais e artesãs que se desenvolviam nos

burgos (cidades).

Na Renascença há um resgate dos estudos da arte e da literatura, mas agora

com um olhar antropocêntrico. Com o movimento renascentista, os estudos

literários, científicos e filosóficos são vistos como partes igualmente

importantes na escola. É nesse período também, que acontece a conquista das

Américas, o que impulsiona um novo pensamento voltado para a educação de

novas raças e culturas, ou seja, é necessário um novo tipo de educação e um

novo tipo de escola.

Ao passarmos pela Idade Moderna, as proposições teológicas da Reforma e da

Contrarreforma juntamente com o surgimento da impressa, expandiu a leitura e

a escrita a um número cada vez maior de pessoas e admitiu um novo lugar

para homens e mulheres na terra, a partir de uma nova visão da ciência e da

razão. Durante essa época no Brasil, os principais responsáveis pela educação

foram os Jesuítas que educavam as crianças indígenas e os filhos de colonos.

Como consequência a educação jesuítica destruiu a cultura dos índios fazendo

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adotá-los sua cultura europeia, mas também os protegeram dos mercenários.

Foram responsáveis também pela educação da elite nos colégios secundários

e formar nos cursos superiores de teologia.

Com a Revolução Industrial e a disseminação das conquistas científicas da

Europa pelo mundo, foi possível a democratização da educação. O Marques de

Pombal expulsou os jesuítas do reino de Portugal e de suas colônias, pois

segundo ele estes só acumulavam fortunas e não propagavam as revoluções

científicas. A reforma proposta pelo Marques de Pombal tinha com objetivo se

aproximar das revoluções que ocorriam na Europa, mas como afirma Shigunov

Neto e Maciel

é preciso atentar-se para uma peculiaridade a ser destacada nesse processo de expulsão dos jesuítas e de formulação das reformas de Pombal, que tem início nesse momento histórico e que acompanhará a educação brasileira ao longo dos anos: as reformas educacionais brasileiras apresentam como característica marcante a total destruição e substituição das antigas propostas pelas novas. (SHIGUNOV NETO e MACIEL, 2008, p.184).

Alguns anos se passaram até que o Estado assumisse responsabilidade pela

instrução e promovesse as aulas régias e as classes avulsas de ensinamentos

que substituíram a lacuna deixada pelo fim da Companhia de Jesus.

A partir da Revolução Francesa começam a aparecer os primeiros conceitos de

escola pública, leiga, universal, gratuita e obrigatória. No Brasil a implantação

dessas ideias ocorre progressiva e lentamente no século XIX. 

Com a vinda da família real para o Brasil, veio junto também uma nova

possibilidade de cultura e educação. São criados cursos superiores, a

Biblioteca Nacional, o Museu Nacional e o Jardim Botânico e outras

instituições. Após a Independência, novas questões educacionais passam a ser

discutida como o acesso a educação dos negros e das meninas. Há a

instauração das escolas normais que deram lugar às mulheres para a

ocupação no magistério primário. Na República, a escola ganha materiais,

espaços, profissionais próprios e passa a ser considerada como a principal

instituição para a transmissão de saberes. O século XX traz novas discursões

sobre a educação sob influência de áreas como a psicologia e a sociologia. O

Movimento Escola Nova que tem no Brasil como marco o Manifesto dos

Pioneiros, questiona o papel dessa instituição que agora também recebe como

público as camadas populares. Esse acesso nem sempre está relacionado à

permanência desses alunos. Ao decorrer do século XXI podemos notar a forte

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presença de recursos tecnológicos no ambiente educacional e a preocupação

agora é de como estes recursos influenciam na produção do conhecimento. Há

também as práticas educativas que ocorrem fora da escola como no trabalho,

no lazer, na família, nos movimentos sociais e culturais, dentre tantos outros,

que atuam com muita força, inserindo pessoas em mundos culturais

específicos.

Para expor essa inserção das pessoas em culturas específicas como prática

educativa, recorro a Arroyo que afirma

A cultura é mais resistente do que o conhecimento escolar. Ela nos denuncia que os sujeitos humanos não são puros aprendizes de conhecimentos neutros e menos ainda que eles são cópias de um todo homogêneo. A cultura é mais rica, mais multifacetada para impregnar e inspirar a ação educativa. Reflete o rosto mais plural dos educandos, sujeitos culturais de linguagens, vivências, valores, concepções, imaginários múltiplos. Mais resistentes. Mais sujeitos. (ARROYO, 2003, p. 41 e 42).

A História da Educação: uma disciplina, um campo de pesquisas.

Para entendermos as características que marcaram a história da educação é

necessários recorrermos ao passado o que propícia compreender a forma atual

como essa apresenta. A História e a Pedagogia estão intrinsecamente ligadas

em suas trajetórias. Na educação, é comum tentar encontrar uma utilidade para

o conhecimento adquirido que chega a pensar em uma compreensão do

presente com possibilidade de intervenção no futuro através do estudo do

passado, de forma a não cometer os mesmo erros e reafirmar o que é tido

como sucesso. Porém essa busca de utilidade é inserta já que o processo

histórico não ocorre de forma linear e como ser impessoal e não considerar

nossos valores atuais sem ter vivenciado as mesmas circunstâncias. 

Uma característica importante que marca o campo de pesquisa da educação é

a ligação dessa com outras áreas como a filosofia, a psicologia, a biologia, a

sociologia e outras, o que dificulta o reconhecimento da história da educação

como campo de pesquisa próprio. 

A partir dos anos 70 e 80, a área da educação foi fortemente marcada pela

influência do Marxismo. A busca por novos objetos, novas fontes e novas

abordagens colocaram a educação situando-a em relação aos aspectos

econômicos, sociais e políticos da sociedade. Isso possibilitou uma análise

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macroscópica de forma que se passou a considerar não mais o sujeito, mas

todo um grupo social responsável pelo fato educativo.

Nas últimas décadas três fortes tendências influenciaram e modificaram o

campo da história da educação. São eles: a história cultural, a história social e

a micro história.

Talvez a mais importante seja a história cultural que tem como principal

objetivo compreender como determinadas visões de mundo formam produzidas

e disseminadas por diferentes grupos sociais. A história social busca entender

como os sujeitos coletivos vivenciam e experienciam o mundo. Já a micro-

história trata-se de uma prática histográfica, com referências teóricas variadas.

Segundo Levi, o estudo se baseia “na redução da escala de observação, em

uma análise microscópica e em um estudo intensivo do material documental”

(Levi, 1992, p. 136 apud Galvão e Lopes, 2010, p.34). Essa observação

microscopia pode mostrar o que antes não era observado bem como o que

provoca mudanças na seleção de objetos e na forma de abordá-los. 

A história da educação vem ganhando cada vez mais espaço, tem sido

incorporada em várias áreas das ciências humanas, o que é imprescindível

para a compreensão do passado dos fenômenos educativos.

Histórias da Educação: Novos Objetivos 

Atualmente, a compreensão da Historia do ensino não se limita apenas ao

histórico das instituições escolares, a aproximação com outras áreas contribuiu

para que as crianças, os livros, a leitura, as mulheres e outros passassem a

serem objetos de estudo da disciplina. Atualmente, a compreensão da historia

do ensino não se limita apenas ao histórico das instituições escolares, mas

abrange todas as práticas cotidianas de aspecto educativo. É preciso investigar

o dia a dia da escola, bem como os sujeitos e as relações entre eles o que vem

configurando o que alguns escritores vêm nomear de cultura escolar.

A história do livro e da leitura também é um forte pilar que sustenta a pesquisa

em história da educação, sendo considerado tanto a produção, circulação e

apropriação dos materiais que podem ser desde objetos de leitura consagrados

pela tradição erudita, quanto escrita popular, tais como cordel, quadrinhos,

revistas e jornais, literatura pornográfica, materiais religiosos, novelas entre

outros. Sob forte influência de Ariès, passou a considerar a infância e suas

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características, por ser a fase que constitui o principal alvo dos processos

educativos, como dado importante para a composição do campo de pesquisa.

A concepção de criança tem mudado bastante visto que a infância não é

apenas uma fase biológica, mas cultural e histórica, sendo assim a criança não

é mais vista como um adulto em miniatura, mas como um ser humano de

identidade própria que requer cuidados e atenção especial. As pesquisas mais

recentes consideram importante compreender a inserção de mulheres tanto

como alunas como professoras nos sistemas de ensino. Essa inserção resulta

de uma luta contra preceitos que impunham proibições e vigilâncias sobre a

mulher, que serviu de inicio para que hoje seja possível não estranharmos

mulheres ocupando cargos no mundo político, social, financeiro e, sobretudo

nos cargos no âmbito da educação.

Fontes para uma história da Educação 

Foram abordadas tantas possibilidades na história da educação. Para

podermos analisar e discutir sobre a história da educação, tal como vemos

hoje, foram e são necessárias fontes para que os pesquisadores analisem. A

fonte é a matéria prima da pesquisa usada, imprescindível e necessariamente,

para reconstruir o passado. Por mais que essas fontes nos apontem

fragmentos da história passada, nunca chegaremos à verdade absoluta dos

fatos.

A escolha das fontes inicialmente, até as primeiras três décadas do século XX,

se dava a partir de documentos oficiais, exclusivamente escritos. Isso criava a

ideia de uma verdade imutável, vista apenas sobre uma perspectiva, sem

explorar as diversas facetas do objeto de estudo e seu contexto. Hoje em dia,

em busca de uma maior riqueza de informações, os pesquisadores lançam

mão de fontes alternativas, tais como os objetos escolares, o espaço físico,

arquitetura e mobiliário, as produções artísticas, diários, jornais e revistas e

tudo aquilo que tange o campo da educação de alguma forma explicando o

contexto da época e do local. A história oral também deve ser levada em

consideração, e esta exige muito cuidado por parte do pesquisador, pois requer

uma habilidade para a escuta necessária à operação historiográfica. Não é

possível ter domínio sobre todas as fontes, pois não se pode ter certeza se

todas foram usadas ou se todas foram perdidas. De qualquer forma, em

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história da educação, a exploração destas fontes alternativas tem sido bem

aproveitada de modo a propiciar conhecimentos acerca do cotidiano nas

escolas, formas de socialização, maneiras de se vestir e se comportar e tudo

isso que diz respeito à vida do ser humano.

Embora seja muito rico, este novo olhar sobre as fontes impõe sobre o

historiador uma série de exigências ao lidar com uma diversidade de

informações, e este deve então ter conhecimento tanto da metodologia e

historiografia próprios do seu campo de pesquisa, quanto das metodologias

dos tipos de fontes às quais recorre. O trabalho se torna mais verdadeiro

conforme o pesquisador se dedica a buscar novas fontes e se utiliza de maior o

rigor para verificar a autenticidade delas. O cruzamento e confronto das fontes

é um excelente artifício para controlar a subjetividade das informações obtidas.

A riqueza do uso de fontes plurais está ligado ao fato da historia ser

apresentada de forma menos coesa, cheia de contradições e incoerências pois

considera várias vertentes, vários pontos de vista. Isso é a melhor forma de se

aproximar da realidade, se esquivando da visão unilateral das coisas. 

O projeto de pesquisa em História da Educação 

Ao fim do livro, as autoras propõem algumas dicas para ajudar o futuro

pesquisador, o orientando a lidar de forma rigorosa e comprometida com essas

novas possibilidades de fontes, como objetos, história oral e literatura. O mais

importante é que os pesquisadores busquem sistematizar aquilo que já sabe e

buscar respostas a partir daquilo que deseja descobrir. A pesquisa se divide

em módulos, o primeiro dele deve ser a definição do objeto da pesquisa, ou em

outras palavras, “o que” será pesquisado. Em seguida deve-se pensar no “por

que” desta pesquisa, levantas dúvidas e possíveis respostas, problematizar

situações e propor ou instigar mudanças nas práticas escolares. É fundamental

também que o pesquisador defina suas fontes e autores em que irá se basear

para desenvolver sua pesquisa, e criar uma metodologia. Por fim chama a

atenção para a importância da criação e aplicação de categorias de análise por

parte do historiador. 

Há ainda um apêndice com um poema de Ascenso Ferreira, chamado “Minha

Escola” que trata da vida cotidiana de um aluno e é analisado trecho por

trecho.

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Referências

 

ARROYO, Miguel G. Pedagogias em movimento – o que temos a aprender dos

movimentos sociais? Currículo sem fronteiras, v.3, n.1, p. 28-49, Jan/Jun,

2003.

GALVÃO, Ana Maria de Oliveira; LOPES, Eliane Marta Teixeira. Território

Plural: a pesquisa em história da educação. São Paulo: Ática, 2010. 

LEVI, Giovanni. Sobre a micro-história. In. BURKE, Peter (org.). A escrita da

história: novas perspectivas. São Paulo: Ed. Unesp, 1992, p. 133-161. 3ª.

Ed., 2001.

SHIGUNOV NETO, Alexandre; MACIEL, Lizete Shizue Bomura O ensino

jesuítico no período colonial brasileiro: algumas discussões. Educ. Rev., 2008,

no.31, p.169-189.