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8/9/2019 Sntese histrica da imprensa moambicana: Tentativa de interpretao
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ComunicaoXXXII Congresso Brasileiro de Cincias da Comunicao Curitiba, PR 4 a 7 de
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Sntese histrica da imprensa moambicana: Tentativa de interpretao1
Antonio HOHLFELDT2
James Machado dos SANTOS3
Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RGS
Resumo
O presente trabalho d seqncia pesquisa iniciada no estgio ps-doutoral, em 2008,
na Universidade Fernando Pessoa/Biblioteca Pblica Municipal, da cidade do Porto,
Portugal. Trata-se de buscar reconstituir a histria da chamada imprensa colonial
portuguesa, constituda por uma histria da imprensa colonial e uma histria comparada
da imprensa luso-brasileira. Em artigos anteriores, abordou-se um panorama geral e a
bibliografia disponvel. Posteriormente, estudou-se um jornal, especificamente. Este
paper faz uma sntese histrica da imprensa de Moambique. Depois de se fazer um
panorama da histria das conquistas portuguesas do ultramar e da chegada dos
portugueses a Moambique, desdobra-se a sntese histrica da imprensa moambicana.
Conclui-se o estudo com uma sntese de caractersticas dessa imprensa, destacando-se
algumas figuras de jornalistas e alguns dos peridicos editados.
Palavras-chave: Histria da imprensa; Imprensa em Portugal; Histria de
Moambique; Histria da imprensa de Moambique; Teoria do Jornalismo.
Uma histria necessria
Em 1894, convidado a representar Portugal no 1 Congresso
Internacional da Imprensa, em Anvers, Blgica, o decano dos jornalistas portugueses,
Brito Aranha, apresentou um Rapport de la section portugaise que fazia o primeiro
levantamento moderno e ampliado da imprensa portuguesa, a compreendida a chamada
imprensa colonial, isto , aquela publicada em idioma portugus, nas ento colnias de
1 Trabalho apresentado no GP de Histria do Jornalismo do IX Encontro de Grupos de Pesquisa emComunicao, evento componente do XXXII Congresso Brasileiro de Cincias da Comunicao,Curitiba, Universidade Positivo. 4 a 7 de setembro de 2009.2 Ps-Doutor pela Universidade Fernando Pessoa, Porto. 2008; Presidente da INTERCOM; pesquisadordo CNPq, email: [email protected] Mestrando do Programa de Ps-Graduao da PUCRS, email:[email protected]
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Portugal do Ultramar, como se costumava dizer ento4. Escrevia ele: A imprensa o
elemento civilizador por excelncia e reconhecido que de sua influncia dependem
benefcios incalculveis5. Quase um sculo depois, o historiador que, neste momento,
apresenta o estudo mais completo e mais amplo a respeito da histria da imprensa em
Moambique, de que vamos nos ocupar neste artigo, voltava a insistir sobre a
importncia desta instituio.
Para alm das datas, dos nomes e dos ttulos a que no se pode fugir, htoda uma vida que o territrio viveu a vida social do agregado, etambm a vida privada, mesquinha ou grandiosa, dos homens desseagregado (...) a imprensa continua ser a porta do maior espetculo doMundo o espetculo dos homens6.
O mesmo autor, em obra posterior, voltava ao tema, mais explicitamente,
reconhecendo que a imprensa o retrato de toda uma sociedade7.
Alis, admirvel ler-se o que, na poca, o Governador Geral da
Provncia de Moambique, Vasco Guedes de Carvalho e Menezes, escreveu, em 1854,
quando do lanamento do Boletim do Governo da Provncia de Moambique: A
Imprensa um dos melhores inventos do esprito humano. Ella tem prestado os mais
importantes servios ao Commercio, indstria, aos interesses, e civilisao duma
grande parte dos povos do universo8.
Se, ao final do sculo XIX, e ao longo do sculo XX, foi este o
pensamento, no ocorreu o mesmo ao longo daquele sculo XIX, quando esta imprensa
nasceu. Se a histria da imprensa em Moambique a mais recente, mesmo em relao
s demais colnias, como veremos logo adiante, ela das mais produtivas, tanto
quantitativa quanto qualitativamente. Contudo, como referem todos os principais
pesquisadores, h uma enorme dificuldade para se poder reconstituir essa histria.
Como disse Ildio Rocha, faltou quem colecionasse e guardasse os jornais; e, sobretudo,
inexistiu lugar onde se pudesse mant-los. Diz este ltimo:
4 HOHLFELDT, Antonio Imprensa das colnias de expresso portuguesa: Primeira aproximao,
comunicao apresentada ao XXXI Congresso Brasileiro de Cincias Interdisciplinares da Comunicao,Universidade Federal do Rio Grande do Norte/INTERCOM, Natal. Setembro de 2008.5 ARANHA, Pedro Wenceslau Brito Rapporte la section portugaise au 1er. Congrs International de laPresse, Lisboa, Imprimrie Universelle. 1894, p. 7.6 ROCHA, Ildio Contribuio para a histria da imprensa em Moambique , Loureno Marques,CODAM. 1973, p. 2.7 ROCHA, Ildio A imprensa em Moambique, Lisboa, Livros do Brasil. 2000, p. 16.8 CARVALHO E MENEZES, Vasco Guedes Apresentao do Boletim do Governo da Provncia doMoambique, transcrito por DIAS, Raul Neves A imprensa peridica em Moambique 1854 1954(Subsdios para a sua histria), Loureno Marques, Imprensa Nacional. 1957. Manteve-se a grafia dapoca.
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O primeiro [obstculo] o de no existirem em Portugal [nem emMoambique] colecionadores de jornais no h a tradio nem a taltipo de papel impresso se d grande importncia. O segundo [obstculo]e no menor, os sucessivos ataques polticos, castrenses, religiosos oumuito simplesmente policiais s redaes e aos seus produtos, comempastelamentos, atentados, apreenses, fogueiras, prises e tudo omais de que a represso capaz, que fizeram desaparecer tiragensinteiras, quanto no todos os nmeros de vrios jornais9.
Assim, as dificuldades para reconstruir esta histria so enormes, ainda
que gradualmente a tarefa venha sendo concretizada, conforme levantamento que Raul
Neves Dias realizou: se Brito Aranha foi o pioneiro, e sua lista apresentou apenas 4
ttulos: Boletim da Companhia de Moambique; Boletim Oficional do Governo da
Provncia de Moambique (40 ano de publicao); Clamor africano (3 ano de
publicao tratava-se de um jornal que substitua um outro, O Brado africano, ento
suspenso, num procedimento que analisamos mais adiante, tpico da imprensa colonial);
Correio da Beira (2 ano de publicao)10, outros autores conseguiram, gradativamente,
descobrir novos ttulos e estabelecer novos dados e segurana sobre informaes
descobertas. Assim foi com Sousa Ribeiro, que nos anos de 1908, 1917 e 1940 produziu
diferentes edies de umAnurio: comeou com 29 ttulos e chegou a 80, atualizando e
corrigindo constantemente seus dados. Antnio dos Santos Figueiredo, que escreveu
monografia a ser apresentada Exposio Colonial do Porto, em 1934, e de que tenho
um exemplar11, cita 9 jornais que, naquele momento, editavam-se na provncia, e mais
os dois que haviam iniciado aquela histria, ainda no sculo XIX, num total, portanto,
de onze peridicos. Rocha Martins, de seu lado, identificou pouco menos de uma
vintena, e Mrio Costa lembrou cerca de 120 publicaes. Filipe Gasto de Almeida de
Ea, alm de tambm recuperar diferentes peridicos, preocupou-se em definir qual
teria sido efetivamente a primeira publicao no-oficial da Provncia, estudando ttulos
como O clamor militar, que estabeleceu como tendo sido definitivamente editado no
Porto e no na frica; O baluarte, de que se tem notcias, mas do qual jamais se viu
qualquer exemplar; e O progresso, de que ele descobriu um exemplar da primeira
edio, datada de 9 de abril de 1868, hebdomadrio religioso, instructivo, commercial
9 ROCHA, Ildio A imprensa de Moambique, op. cit., p. 15.10 ARANHA, Brito Rapporte la section portugaise au 1er. Congrs International de la Presse, Lisboa,Imprimrie Universelle. 1894, ps. 44/45.11 FIGUEIREDO. Antnio dos Santos Colnia de Moambique A vida social, Loureno Marques,Imprensa Nacional de Moambique. 1934.
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e agrcola, a cargo de Miguel Augusto dos Santos Severino e Manuel Dias da Silva12.
Os autores mais contemporneos so justamente os j citados Raul Neves Dias e Ildio
Rocha, ambos jornalistas e participantes de boa parte desta histria, j nas primeiras
dcadas do sculo XX, alm de Lus C. Lpi, Joo Alves das Neves e Jos Jlio
Gonalves, que tm produzido diferentes obras13.
Esta bibliografia retoma as publicaes a partir de 1854 e vai
especialmente at 1975, quando a independncia da at ento colnia mudar bastante a
perspectiva, no apenas da imprensa quanto das comunicaes em geral, em
Moambique. Alis, Jos Jlio Gonalves j intentara um panorama mais diverso, no
centralizado apenas na imprensa, ainda que ela seja quantitativamente mais
significativa, em seu trabalho de que aqui tambm nos valemos14.
Deve-se acrescentar, como registra Joo Alves das Neves, o fato de que
pouco se sabe, no Brasil, acerca da imprensa dos jovens pases africanos que falam
portugus: Cabo Verde, Guin-Bissau, So Tom e Prncipe, Angola e Moambique [,
Macau e Goa]15. Por isso, foi importante que, estando o pesquisador no Brasil, fazendo
estudos de ps-graduao, tenha alcanado propor e realizar o I Encontro Luso-Afro-
Brasileiro de Jornalismo e Literatura, na Faculdade de Comunicao Social Csper
Lbero, em So Paulo, em 1984, a que se seguiu um segundo, em 198716. Infelizmente,
o projeto no teve continuidade, com o retorno do pesquisador a Portugal. Pretendemos
estar retomando a idia com este conjunto de estudos que iniciamos a publicar em
200817.
12 Referncias em DIAS, Raul Neves A imprensa peridica em Moambique, op. cit., p. 13 e ss., emespecial, sobre O Progresso, p. 49 e ss.13 Ver referncia geral a este bibliografia em HOHLFELDT, Antonio A imprensa das colnias deexpresso portuguesa: Principal bibliografia, 6 Encontro Anual da SBPJor, UNIPI, So Paulo. 2008.14 GONALVES, Jos Jlio A informao em Moambique (Contribuio para o seu estudo), Lisboa,Instituto Superior de Cincias Sociais e Poltica Ultramarina. 1965.
15 NEVES, Joo Alves Histria breve da imprensa de lngua portuguesa no mundo, Lisboa, DirecoGeral da Comunicao Social. 1989, p. 155.16 NEVES, Joo Alves Histria breve da imprensa de lngua portuguesa no mundo, idem, ibidem, ps.157 a 160.17 Graas bolsa de Estgio Ps-Doutoral concedida pela CAPES, no primeiro semestre de 2008,permaneci na cidade do Porto, em Portugal, junto Universidade Fernando Pessoa, sob a orientao doprof. Dr. Salvato Trigo. Pude pesquisar, ento, as colees de jornais da chamada imprensa colonialportuguesa que se encontram, por fora de lei, depositados no acervo da Biblioteca Pblica Municipal doPorto, de quem recebi gentilmente o apoio para a pesquisa. Assim, este estudo d continuao srie deensaios que venho publicando a respeito de tal tema, com nfase especial, no momento, imprensa deMoambique, por ser, como se disse, quantitativa e qualitativamente a mais significativa.
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Descoberta e ocupao de Moambique
Segundo alguns historiadores, o projeto de expanso ultramarina
portugus nasce da responsabilidade comum da Cruzada em que se encontravam
envolvidas todas as naes da Pennsula [Ibrica], visto que todas dela haviam nascido e
todas continuavam a considerar a luta contra os mouros como o objetivo fundamental da
sua existncia18. Assim, Portugal, depois de expulsar os mouros da Pennsula e
constituir-se em nao autnoma, manteve sua mobilizao. Desenvolvida a marinha
real e particular, criavam-se as geraes de marinheiros que permitiriam depois os
primeiros arrojos pelo oceano fora19. Depois da avanada sobre Ceuta, o esforo
portugus se ampliou e, ao longo de diferentes reinados, prosseguiu e, enfim,
concretizou-se nas descobertas de territrios africanos, asiticos e sul-americanos. O
Infanta Dom Henrique teve importante papel neste processo. E seus seguidores deram
continuidade a seus projetos. Assim, j no incio do sculo XV, os portugueses
chegavam s Canrias e, a partir da, atingiam as costas africanas. Por isso mesmo, ser
preciso aceitar que, entretanto, se realizou, impulsionado pelo Infante, um
extraordinrio esforo de adaptao das condies e dos processos de navegao, para
que fosse possvel viajar pelo mar alto20. A partir de 1458, o movimento em busca da
frica incrementado. Em agosto de 1486, Bartolomeu Dias chega ao Cabo das
Tormentas, mais tarde batizado como Cabo da Boa Esperana (atual Cidade do Cabo),
que Vasco da Gama dobrar, avanando pelo Oceano ndico, chegando Ilha de
Moambique a 1 de maro de 149821. Moambique vai se tornar praa importante para
Portugal, eis que dali partia-se para a explorao da Madagascar e de toda a costa da
frica, como se partira de Goa e de Mlaca para a explorao da costa asitica22.
Fernando de Castro Brando23 publicou obra exemplar a respeito das
conquistas portuguesas, de onde destacamos alguns dados sobre Moambique. O
primeiro contato dos portugueses com o atual territrio de Moambique ocorreu no dia
12 de janeiro de 1498, quando Vasco da Gama chega com sua frota regio do
Inharrime, ao sul do territrio, avanando pelo rio Quelimane, um pouco mais acima e,
18 MRIAS, Manuel Histria breve da colonizao portuguesa, Lisboa, tica.1940, p. 5.19 MRIAS, Manuel Histria breve da colonizao portuguesa, op. cit., p. 8.20 MRIAS, Manuel Histria breve da colonizao portuguesa, idem, ibidem, p. 22.21 MRIAS, Manuel Histria breve da colonizao portuguesa, idem, ibidem, ps. 53 e 54.22 MRIAS, Manuel Histria breve da coloinizao portuguesa, idem, ibidem, p. 87.23 BRANDO, Fernando de Castro Histria da expanso portuguesa 1367 1580 Uma cronologia,Europress, Odivelas. 1995.
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enfim, atingindo a Ilha de Moambique. Em 1502, cria-se a feitoria de Moambique,
naquela ilha, a que se seguir a criao de outra feitoria, em 1505, j no interior do
territrio, na regio de Sofala que ser, a partir de ento, o centro de colonizao
portuguesa da regio, sobretudo porque ali se espera encontrar grandes quantidades de
ouro. A partir de 1511, o degredado Antnio Fernandes vai desdobrar uma srie de
expedies em torno daquela regio, ao longo do Monomotapa24, cujos reis, nos sculos
seguintes, depois de firmarem as pazes com os portugueses, vo desenvolver constantes
ataques aos colonizadores, sobretudo ao longo dos sculos XVIII e XIX.
Alis, nesta regio que o sacerdote Gonalo da Silveira, em 1561,
tentando catequizar e batizar os nativos, terminou sendo assassinado25. Atravs de
diferentes movimentos, os portugueses vo ocupando o territrio, desbravando-o mas
no necessariamente o explorando economicamente.
importante citar-se que, na origem, esta regio africana era ocupada por
pigmeus. Em constantes migraes da sia, chegam quela costa oriental os
bosqumanos, que com eles se miscigenam, em torno dos sculos III e II a.C. 26. Quando
os portugueses atingem regio, no sculo XV, a maior parte dela est ocupada por
bantus, resultantes de toda aquela miscigenao. Boa parte da populao tem inclusive a
influncia rabe, graas presena islamita, iniciada em torno do ano 100027.
A expanso da presena portuguesa foi rpida, mas a decadncia tambm
veio ligeiro, e a partir do sculo XVII, mas especialmente ao longo do sculo XVIII,
graas corrupo, sobretudo, crise na regio do Monomotapa e chegada de outros
grupos estrangeiros europeus, como holandeses, franceses e ingleses, Portugal comeou
a perder terreno. Tudo o que os portugueses que l se encontravam queriam riquezas e
roubo, gerando extrema imoralidade28. Ao mesmo tempo, Portugal fortemente
pressionado por esses governos, que vo ocupando o territrio a partir de diferentes
24 Toda esta regio, rica em ouro, foi considerada por cronistas da poca como a bblica Ofir, mencionada
por Salomo e que, justamente pela sua produo aurfera, havia despertado o interesse dos rabes, que adominaram, ainda ao tempo da decadncia do Imprio Romano.25 VIEIRA, A. da E. Santos Colnia de Moambique Histria da expanso do domnio portugus,Loureno Marques, Imprensa Nacional de Moambique. 1934, p. 10 e ss.26 VIEIRA, A. da E. Santos - Colnia de Moambique Histria da expanso do domnio portugus,Loureno Marques, Imprensa Nacional de Moambique. 1934, p. 10 e ss.27 GONALVES, Jos Jlio A informao em Moambique (Contribuio para o seu estudo), op. cit.,p. 22.28 VIEIRA, A. da E. Santos - Colnia de Moambique Histria da expanso do domnio portugus,Loureno Marques, Imprensa Nacional de Moambique. 1934, p. 23 e ss.
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pontos. As crises de agravam: em 1894, na regio prxima atual cidade de Loureno
Marques, ocorre uma grande rebelio liderada por um chefe nativo, Gungunhana, que
vai ser derrotado e preso por Mousinho de Albuquerque, posteriormente enviado a
Portugal e exilado nos Aores. Mas mesmo com sua morte, a rebelio prossegue. De
outro lado, Alemanha e Inglaterra vo-se apossando crescentemente de antigos
territrios pretendidos pelos portugueses. Portugal obrigado a assinar acordos com a
Alemanha, em 1886, fixando novas fronteiras ao norte. E em seguida, pressionado por
Cecil Rhodes, representando a Inglaterra, firma outro acordo em 1890, que elimina por
completo o antigo sonho de ligar os territrios de Angola e Moambique, formando o
chamado mapa cor-de-rosa africano29. S no incio do sculo XX exploradores
portugueses vo tentar seguir o modelo ingls de David Livingstone e atingir a regio
do Niassa, ao norte, o que, alis, vai garantir a Portugal algumas vitrias em arbitragens
internacionais. Os projetos portugueses haviam se desenvolvido, no passado, graas ao
Conselho Ultramarino30. Na modernidade, foi o surgimento da Sociedade de Geografia
de Lisboa, ao final do sculo XIX, que passou a pressionar o governo portugus para
que a falta de continuidade dos projetos africanos no provocasse a total derrocada de
Portugal naquele continente. A ecloso da I Grande Guerra ajudou esses planos, e
Portugal pode consolidar seus espaos coloniais. A ascenso de Antonio de Oliveira
Salazar, aps 1926, quando ele se torna Ministro das Colnias e faz aprovar,
sucessivamente o Ato Colonial, depois integrado Constituio portuguesa do Estado
Novo; a Carta Orgnica das Colnias e a Reforma Administrativa Ultramarina em que
pesem as imensas crticas que recebeu nas prprias colnias, no apenas pela maneira
aodada com que se procederam as votaes, sem qualquer tempo para debates, quanto
pelos conceitos que ali se apresentavam, teve como conseqncia principal, de qualquer
modo, a plena retomada de alguns territrios moambicanos por parte do governo
portugus. Refiro-nos, especialmente, regio do Niassa, entregue a uma companhia
majesttica desde o sculo XIX e que retorna autonomia da administrao
exclusivamente portuguesa a partir de 1933, e a regio de Sofala e Manica, que a partir
29 VIEIRA, A. da E. Santos - VIEIRA, A. da E. Santos - Colnia de Moambique Histria da expansodo domnio portugus, Loureno Marques, Imprensa Nacional de Moambique. 1934, p. 23 e ss., ps. 43,48 e 50. Ver, tambm, MRIAS, Manuel Histria breve da colonizao portuguesa, op. cit., p. 143.30 VIEIRA, A. da E. Santos - VIEIRA, A. da E. Santos - Colnia de Moambique Histria da expansodo domnio portugus, Loureno Marques, Imprensa Nacional de Moambique. 1934, p. 23 e ss., ps. 127e 128.
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de 1942 retomada plenamente por Portugal. Se levarmos em conta que essas
administraes que provocavam as maiores reaes dos moradores das colnias, quer
por seus pssimos servios, quer pela maneira autoritria com que agiam, conforme a
farta documentao que encontramos nos jornais pesquisados, pode-se bem
compreender o sucesso de Salazar com a poltica desenvolvida em face das antigas
colnias. Marcelo Caetano, que tambm foi Ministro das Colnias, vai inclusive visit-
las, coisa que nenhum Ministro jamais o fizera. Isso no impediu a ecloso dos
movimentos independentistas, a partir dos anos 1960, mas por certo amainou,
parcialmente, as crticas dos coloniais metrpole. Tanto que as independncias s
ocorreram, de fato, a partir das mudanas polticas sofridas pela prpria metrpole, a
partir de 1974-1975.
, portanto, sob interesses contraditrios que a imprensa dever se
desenvolver neste territrio. importante lembrar que a administrao portuguesa, ao
contrrio da espanhola, no admitira a imprensa nos domnios de seu imprio. Os
jesutas, que a haviam levado at a China e a ndia, desde o sculo XVI, tardiamente se
estabeleceram em terras africanas. E em Goa, mesmo, perderam seus direitos a partir do
sculo XVIII.
Primeiros jornais de Moambique
A invaso francsa de 1808, que culmina na sada da Famlia Real para o
Brasil e, posteriormente, os movimentos liberais de 1820 e, enfim, a independncia do
Brasil, em 1822, acabaram produzindo frutos. Em 1836, Portugal decide no apenas
liberar quanto tornar obrigatria a publicao de um boletim oficial em suas colnias.
No obstante, Moambique foi das ltimas colnias a receber uma imprensa e a adotar
tal iniciativa, at porque a metrpole desenvolvia polticas contraditrias, sucedendo-se,
quele decreto de 1836, inmeros outros, nos anos seguintes, que ao mesmo tempo
tolhiam e mandavam desenvolver a imprensa nas colnias, dependendo dos humores de
Lisboa, em tempos polticos muito difceis.
S em 1799 criou-se uma primeira escola primria para os filhos dos
colonos31. Provavelmente apenas em 1847 foi organizado o primeiro censo da
31 GONALVES, Jos Jlio A informao em Moambique (Contribuio para o seu estudo), op. cit.,p. 50.
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populao moambicana, com muito poucos alfabetizados32. O surgimento da imprensa
era, independentemente da questo poltica, tal como refere Jos Marques de Melo a
propsito do Brasil33, dificultado por questes como o referido analfabetismo, as
barreiras lingsticas, o condicionamento econmico-social, a falta absoluta de
transportes, o poder aquisitivo da populao, a escassez de publicidade que viabilizasse
economicamente um empreendimento, e, claro, a censura, se no diretamente das
autoridades metropolitanas, com toda a certeza das autoridades locais, fossem aquelas
formalmente empossadas, como um Governador Geral, fossem aquelas de planto,
como juzes, delegados de polcia e at os mais simples administradores civis ou
militares que se sentissem eventualmente incomodados por alguma coisa que se
publicasse em qualquer jornal.
Assim, portanto, evidente que as tiragens seriam mnimas34, ainda que
muitos jornais fossem inclusive bilnges, dependendo da regio em que se
publicassem, sendo impressos em portugus e ingls, ou mesmo em portugus e algum
idioma nativo35. Houve, contudo, alguns acontecimentos significativos, que
contriburam para o desenvolvimento das colnias em geral, e para Moambique, em
especial. Das iniciativas gerais, pode-se citar a criao do Banco Nacional Ultramarino
que, apesar do nome, no estava constitudo de capitais portugueses, mas sim,
ingleses36. Tambm foi importante o final da escravido em Portugal e nas colnias,
alis, muito antes de o mesmo ocorrer no Brasil37. A criao de um servio de correios
bi-semanal, entre Inhambane e Loureno Marques, que levava de quinze a vinte dias
para cumprir seu trajeto38, e que na maioria das vezes atrasava (basta ler os jornais da
poca), quando no perdia ou demorava ainda mais do que o normal a entrega dos
jornais que eventualmente criticassem seus servios, foi, de qualquer modo, outro
avano. Bem ou mal, Moambique ganhava foros europeus e civilizados: em 31 de
maio de 1885, por iniciativa dos maons, que alis contriburam fortemente, ao longo
dos sculos, para a implantao da civilizao branca na frica e para um significativo
32 GONALVES, Jos Jlio -A informao em Moambique (Contribuio para o seu estudo), op. cit.,,p. 37.33 MELO, Jos Marques de Sociologia da imprensa brasileira, Petrpolis, Vozes. 1973.34 FIGUEIREDO, A. dos Santos Colnia de Moambique Vida social, op. cit., p. 26.35 FIGUEIREDO, A. dos Santos Colnia de Moambique Vida social, op. cit., p. 26.36 ROCHA, Ildio A imprensa em Moambique, op. cit., p. 24.37 ROCHA, Ildio A imprensa em Moambique, op. cit., p. 25.38 ROCHA, Ildio A imprensa em Moambique, op. cit., p. 25.
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conjunto de idias modernas e democrticas no continente, tendo sido o grupo de
presso mais importante da colnia39, Loureno Marques ganhava o primeiro Jardim
Botnico de toda a frica40. maonaria no apenas pertenciam muitos dos jornalistas
que chegaram colnia, enviados desde a metrpole, compulsoriamente, quanto
maonaria coube a abertura de escolas de primeiras letras e mesmo escolas tcnicas. Da
que, em Moambique, tenha se formado um segmento social de mestios, sobretudo,
fortemente intelectualizados, bem informados poltica e claramente vinculados
militncia social, o que se reflete no grande nmero de jornais, criados ao longo do
sculo de sua imprensa, entre 1854 e 1954, ou mesmo de escritores, advogados e
mdicos que se notabilizaram, tanto na colnia quanto inclusive na metrpole41.
Uma sntese histrica da imprensa moambicana, portanto, inicia-se em
1854, com a chegada da fragata Dom Fernando, que traz no apenas o novo Governador
Geral, Vasco Guedes de Carvalho e Meneses, quanto alguns caixotes com um prelo e
algumas caixas de tipos e outros utenslios tipogrficos42. provavel que no mesmo
navio, segundo o autor de que nos valemos, tenha viajado ainda o primeiro impressor,
Antonio Joaquim de Carvalho. Partida de Lisboa a 31 de dezembro de 1853, a
embarcao atingiu a Ilha de Moambique a 19 de abril de 1854, e j a 13 de maio do
mesmo ano tirava-se a primeira edio doBoletim Oficial do Governo da Provncia de
Moambique. A tipografia fora instalada muito perto do hospital, onde permaneceu at
novembro de 1856. No mesmo ano, a tipografia deu ainda luz o Regulamento Geral
das Alfndegas da Provncia de Moambique, folheto de esmerada apresentao, ao
gosto da poca.
A primeira tipografia particular, conta-nos ainda Ildio Rocha, teria sido a
de Francisco Paula de Carvalho e Joo Sinfrnio de Carvalho, a partir de 1876,
imprimindo o semanrio frica Oriental, sendo seu diretor o primeiro, e seu editor, o
segundo. Joo era tipgrafo e trabalhara na Imprensa Nacional local, segundo Raul
Neves Dias; e Francisco era professor da Escola Principal, advogado de proviso e
tambm Diretor da Imprensa Nacional, em substituio ao primeiro. Mas Francisco
viria a ser igualmente demitido, ao que parece, por prevaricao, cuidando mais de sua
tipografia pessoal do que daquela oficial.
39 ROCHA, Ildio A imprensa em Moambique, op. cit., p. 1640 ROCHA, Ildio A imprensa em Moambique, op. cit., p. 1641 ROCHA, Ildio A imprensa em Moambique, op. cit., p. 80.42 ROCHA, Ildio A imprensa em Moambique, idem, ibidem, p. 30.
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O Boletim era uma publicao de quatro pginas, em tamanho pequeno
(menor que nosso atual tablide). Comeou semanal, mas reservava parte de seu espao
aos interesses do Commercio, e publicao dartigos de convenincia publica. Alm
disso a typographia est habilitada para dar ao prelo quaes quer outras obras que se
convencionem (texto original)43.
Em 1898, quando a capital de Moambique deslocou-se da Ilha do
mesmo nome para Loureno Marques, a grfica oficial sofreu o mesmo destino. Com
pequeninas modificaes, ao longo das dcadas, a publicao chegou at 1975, quando
Moambique independentizou-se de Portugal. Na verdade, at 1870, foi o nico jornal a
circular em todo o territrio, constituindo-se, por isso mesmo, na fonte de informao
fundamental para toda aquela sociedade.
Sucessivamente, novas publicaes se fundaram, na prpria ilha, em
1868, como se disse, e em 1870; em Quelimane (1877), e em Loureno Marques (1888),
mas o Boletim continuou sendo a grande fonte de informao, tanto oficial quanto
social. Foi noBoletim Oficial que nasceram os primeiros jornalistas de Moambique,
afirma Rocha, citando Toms Antnio Gonzaga de Magalhes e Jos Vicente da Gama.
O primeiro lembra, pelo nome, o poeta mineiro exilado em Angola; o segundo era um
brmane nascido em Bardez, na ndia, mas que fixou residncia em Moambique at
sua morte. Jos Vicente foi autor, alis, do Almanaque Civil Eclesistico Histrico-
Administrativo da Provncia de Moambique: 1859, que levou tanto tempo para ser
impresso que acabou sendo publicado quase no ano seguinte; editou, ainda, uma
Folhinha Civil e Eclesistica, a partir de 1861 at 1864.
Tudo se imprimia na Imprensa Oficial, e isso valeu a primeira crise da
histria da imprensa moambicana. Estudo de Filipe Almeida de Ea conseguiu resgatar
e que repetida por Ildio Rocha em suas obras. Sucintamente, o primeiro jornal no-
oficial da provncia comeou a ser publicado a 9 de abril de 1868, editado por Miguel
Augusto dos Santos Severino e Manuel Dias da Silva. Chamou-se O Progresso e, assim
que saiu, inaugurou a censura prvia, provocada por aquela mesma primeira edio.
Ocorre que, nesta poca, era Governador Geral o tenente-coronelAntnio Augusto de Almeida Correia de Lacerda. Um escrivo da comarca, no muitoescrupuloso, havia surrupiado 55 libras que haviam sido depositadas a seus cuidados,em um processo. Quando assumiu seu posto, o juiz da comarca Vicente Mximo daSilveira logo se deu conta do desvio e citou o escrivo para devolver a quantia. Chegou
43 ROCHA, Ildio A imprensa em Moambique, idem, ibidem, p. 32.
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mesmo a oficiar ao Governador. Neste meio tempo, Santos Severino resolveu defendera autoridade maior e mandou publicar um panfleto contra o juiz, impresso,naturalmente, na Imprensa Oficial, e que circulou no dia 24 de maro de 1868. O Juiz,que no gostou, oficiou metrpole. O Governador Geral, do mesmo modo, defendeu-
se autoridade suprema. Sobretudo porque o prprio Governador havia lido o panfleto eo liberara. Indagado pela Metrpole, ele defendeu-se:V. Exa. sabe perfeitamente quais tm sido as minhas idias comodeputado, e como jornalista, a favor da livre emisso do pensamento(...)Contra mim mesmo que fosse o aludido artigo, eu o mandava publicar,porque enquanto me for confiado o governo desta provncia, no hei-detolher a livre manifestao do pensamento (...)44.
No dia 9 de abril foi lanado o jornal O Progresso, e para desgosto do
juiz, o peridico, dirigido pelo mesmo Santos Severino, reiterava os termos do panfleto
ainda mais calorosamente. O jornal tambm dependia da Imprensa Nacional. Novas
reclamaes se sucederam e o resultado foi que, no dia 11 de abril, a Ordem 243, do
Governador, determinava que no jornal O Progresso, que se imprime na referida
oficina [da Imprensa Nacional], se no devem inserir artigos, ou correspondncia de
natureza poltica ou de agresso pessoal, e como tais estranhos ndole de um jornal
puramente literrio; devendo outro sim, o referido encarregado, remeter secretaria
geral: antes da tiragem do referido jornal, uma prova de prelo, a fim de se lhe lanar o
competente visto, sem o qual se no poder imprimir o mencionado jornal.
Nenhum historiador sabe se mais de uma edio de O Progresso chegou
a funcionar...
Como se disse, Ildio Rocha, na obra de que tanto nos valemos, levantou
mais do que um milhar de diferentes ttulos de peridicos que se publicaram desde ento
at 1975, identificando cada um deles, na medida do possvel, pelo ttulo, sede, nmero
de pginas, incio e final de circulao, responsveis, etc.
Podemos, assim, o surgimento de uma imprensa catlica, esportiva, uma
imprensa operria, algumas publicaes dirigidas ao pblico infantil, jornais tcnicos
especializados como aquele que vai acompanhar o surgimento da primeira emissora
de rdio de Moambique a imprensa humorstica, etc.Alguns talvez a maioria dessas publicaes tiveram vida breve.
Outros, contudo, sobreviveram a todas as dificuldades e circularam, ao longo dos anos.
Enfrentaram a falta de papel, a raridade dos tipos variados, a perseguio poltica, a
legislao sempre restritiva, sobretudo depois de 1927, com a chamada Lei Joo Belo,
44 ROCHA, Ildio Contribuio para a histria da imprensa em Moambique, op. cit., p. 3.
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o atraso de entrega pelos correios ou atravs do transporte ferrovirio; as perseguies
aos entregadores residenciais, quando na prpria sede de edio; a escassa publicidade;
os assinantes caloteiros que, tendo recebido o jornal ao longo das semanas, quando
deveriam pagar o boleto, simplesmente se recusavam de faz-lo; os leitores que
pilhavam os jornais de seus verdadeiros assinantes e os liam nas ruas e nas praas
pblicas, sem os pagar, e assim por diante. Cada historiador destaca este ou aquele
profissional; esta ou aquela personalidade.
Reunindo os dados levantados por esses estudiosos e mais as observaes
que fizemos na leitura atenta dos jornais consultados no acervo da Biblioteca do Porto,
queremos aqui, a ttulo de referncia rpida, pois cada um deles merece estudo parte,
identificar alguns deles.
Um jornal: O Emancipador
J escrevemos a respeito de um jornal, O emancipador45. Vida nova, de
1907, foi, provavelmente, o primeiro jornal operrio a circular, publicado em Loureno
Marques, bi-semanal; mais adiante, surgiram Os simples (1911 a 1913), publicado por
integrantes de um conjunto musical(!!!) e Germinal, da empresa do mesmo nome, e que
circulou entre 1914 e 1918, justamente durante um perodo difcil, graas I Grande
Guerra, com forte presso da censura prvia. Sucedendo-lhe, mas sob outra perspectiva
editorial, em 1919 surgiu O emancipador, que circulou at 1924. Semanal, teve seu
diretor afastado e, assim, segundo a legislao, viu-se impedido de continuar a circular.
Seus responsveis lanaram mo, ento, da alternativa legal de que dispunham:
passaram a editar nmeros nicos, semanais, que mantinham inclusive a numerao
de ordem da publicao, mas que no exigiam a existncia de um diretor. Assim,
sucederam-se, ao longo de 1925, O emancipado, A voz do emancipador, A voz do
emancipado e Emancipador. Encontrado e registrado um novo diretor, o jornal voltou a
circular. Quando, numa segunda ocasio, em 1926, aps uma greve de ferrovirios que
a publicao apoiou, o jornal voltou a ser suspenso, inclusive com tentativa de
empastelamento da oficina prpria, torna a publicar nmeros nicos, sob os ttulos
sucessivos e semanais de O emancipador dos assalariados, O emancipador dos
45 HOHLFELDT, Antonio Comunicao e cidadania: O caso exemplar de O emancipador deMoambique, Comunicao, mdia e consumo, So Paulo, ESPM, Ano 5, Vol. 5, N 14, novembro de2008, ps. 13-32.
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humildes, O emancipador dos produtores, O emancipador dos proletrios, O
emancipador dos oprimidos, O emancipador dos trabalhadores, O emancipador dos
desprotegidos, O emancipador amordaado, retomando sua circulao normal at 1937,
quando foi suspenso por fora de ato do Estado Novo portugus.
Editado por uma espcie de confederao de sindicatos de trabalhadores,
O emancipador no caso nico que uma publicao que trocou de nome, quando
proibida de circular, seja por que motivo fosse, mas a mais referencial pela obviedade
da alternativa buscada e pelo verdadeiro desafio s autoridades que significou, o que
leva-nos a pensar, dado o poder discricionrio que tais autoridades possuam e que, se
quisessem, poderiam t-lo usado efetivamente contra os responsveis pelo peridico,
que, na verdade, tomavam-se medidas mais formais e administrativas do que
propriamente polticas. Tudo mudou, claro, com a chegada do Estado Novo. Aps
1975, conta Ildio Rocha, foi ele intermedirio, a pedido das novas autoridades, junto
aos descendentes daqueles militantes sindicalistas e alguns dos redatores e diretores da
publicao, no sentido de resgat-la escondida que fora para que pudesse ser melhor
conhecida e valorizada46.
Alguns jornalistas pioneiros
Neste mesmo sentido, uma figura pioneira foi o alferes Alfredo de
Aguiar, mestio angolano que se fixou em Moambique. Em 1885, comeou sua
carreira jornalstica com um jornal chamado O imparcial; dois anos depois, publicou
O correio da Zambsia; em 1891, fez circular um jornal demolidor, Gazeta do Sul, a
que se seguiria, em 1892, Clamor africano, semanal, que sobreviveu at 189447.
Na mesma linha andar Clemente Nunes de Carvalho e Silva. A 20 de
outubro de 1900, este surpreendente redator de requerimentos embaraosos e de
folhetos de radical liberdade de expresso, ao lado de Manuel de Morais dos Santos e
Jos Benigno Ribeiro Garrido faz editar O Portuguez, que viver at a dcima primeira
edio, quando suprimido por uma portaria provincial, a 30 de novembro do mesmo
ano. Sem interromper a periodicidade da publicao, Clemente Nunes imediatamente
publica Portuguez, que estria no dia 8 de dezembro. O jornal suprimido a 28 de
agosto de 1901, durando, pois, um pouco mais do que o anterior. Clemente Nunes no
46 Ildio Rocha estuda detidamente a publicao, emA imprensa de Moambique, op. cit., p. 123 e ss.47 ROCHA, Ildio - Contribuio para a histria da imprensa em Moambique, op. cit., p. 6.
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se intimida e lana, em 26 de janeiro de 1902, O Progresso de Loureno Marques,
escrevendo, no cabealho, que se trata do sucessor dos dois peridicos anteriores. Esta
nova publicao circular at a edio 169, quando, em 5 de abril de 1905 ainda uma
vez suprimido. Sucede-se o quarto jornal, A portugueza, cujas datas se desconhecem.
Deve ter circulado entre fins de abril e princpios de maio de 1905, mas durou muito
pouco. Clemente Nunes continua sua jornada, e volta, no mesmo ano, ao Progresso de
Loureno Marques, que estampa, no cabealho, explicitamente: Semanrio sucessor de
O Portuguez, Portuguez, O Progresso de Loureno Marques e A portugueza, todos
suprimidos. Desta vez, alcanou 110 edies e foi ainda uma vez suprimido, em 27 de
dezembro de 1906. Clemente Nunes editou, ainda em 1905, panfleto de 16 pginas em
que historiava e protestava publicamente contra as sucessivas supresses de seus
jornais, atacando especialmente o Governador Geral Joo de Azevedo Coutinho.
Outra figura impressionante de jornalista militante foi Manuel
Nascimento Ornelas. A exemplo de Clemente Nunes de Carvalho, tambm ele
republicano e lana, em 29 de maro de 1904, um primeiro jornal destinado a difundir
tais princpios. Trata-se do O distrito, de Loureno Marques, peridico dirio, que foi
suprimido um ano depois, em 15 de maro de 1905. Em seguida, Ornelas inicia a
circulao doDirio de notcias, a 1 de abril de 1905, interrompido em sua circulao
em 1907.
Ainda destacvel a figura do capito Manuel Simes Vaz. Em 15 de
abril de 1926, ele d incio publicao do jornal Notcias, que poca em que Ildio
Rocha editou a monografia Contribuio para a histria da imprensa de Moambique
ainda circulava, em Loureno Marques. Notcias substitua O correio de Loureno
Marques, de Eduardo Saldanha, que deixara de circular, e do qual Simes Vaz era o
principal redator. Simes Vaz funda a Empresa Tipogrfica, sendo seus scios aquele
mesmo Eduardo Saldanha, Jos Joaquim de Morais e Paulino dos Santos Gil, outro
nome de importncia na histria da imprensa moambicana. Nas primeiras 151 edies
do jornal, o capito era seu editor e redator, mas com a nova lei de imprensa, de 1926
(Lei Joo Belo, nome do administrador que a idealizou, valendo o princpio apenas para
a imprensa colonial), ele foi substitudo, sucessivamente, por diferentes figuras ilustres
da cidade, portadoras de ttulo universitrio, que ele no possua, mas que era exigido
pela nova lei, independentemente de vinculao (do ttulo) ou no com a prpria
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atividade editorial. Enquanto isso, Simes Vaz mantinha um processo na rea jurdica,
que acabou vencendo, podendo retornar funo de diretor do jornal, que manteve, at
vend-lo, em 1963.
A publicao iniciou com dificuldades. Nas primeiras semanas, tinha
apenas 36 assinantes! Mas graas explorao de notcias defait divers, e com o golpe
militar que instuiria o Estado Novo, a 28 de maio de 1926, logo alcanou 900 assinantes
e se firmou, financeiramente, de sorte que, em 1967, tornou-se uma sociedade annima,
com um excelente capital social e sede prpria. O capito dirigiu o jornal entre 1926 e
1957. Seus filhos lhe continuaram a obra. Rocha acusa o jornal de, neste perodo, ter
evidenciado simpatias para com os aliados, ao longo da II Grande Guerra, e chega
mesmo a contar que, ao abrir um armrio da redao, encontrou farto material enviado
pelo governo ingls como propaganda oficial48.
Segundo Ildio Rocha, Notcias teve pelo menos trs iniciativas
importantes para a histria da imprensa local: em 1933 fez editar uma revista ilustrada
quinzenal, dirigida por Sobral Campos, chamada O ilustrado; ela circulou exatamente
durante um ano, conforme havia sido antecipado, com excelente apresentao grfica49.
Simes Vaz passou a publicar uma edio extraordinria do Notcias aos domingos, dia
em que, na poca, no circulavam jornais. Esta edio tinha carter mais recreativo e
literrio, sendo preparada ao longo da semana50. Esta edio circulou entre 24 de
outubro de 1943 e 26 de maio de 1946, quando o jornal suprimiu a publicao
extraordinria, porque passou a circular sete dias na semana. Por fim, a 15 de abril de
1952,Notcias lanou uma edio vespertina, que adotou o ttulo de Notcias da tarde,
publicando-se at 6 de dezembro de 1969, quando foi substitudo pelo Tribuna, que
poca da pesquisa de Ildio Rocha, ainda circulava51.
As figuras mais significativas, contudo, inclusive com suas contradies,
de todas as que se destacam nesta sucesso do que podemos denominar verdadeiramente
de apstolos da imprensa so os irmos Jos e Joo Albasini. Netos de Joo Albasini,
48 ROCHA, Ildio -A imprensa de Moambique, op. cit., p. 147, nota 13.49 Tivemos a oportunidade de compulsar a coleo completa da revista, quando de nossa pesquisa naBiblioteca Pblica Municipal do Porto, e que ser motivo de estudo individualizado, em breve.50 Note-se que a prtica perdura hoje nos grandes jornais de referncia, que acrescentam ediocotidiana do domingo uma revista ou um caderno complementar com artigos variados.51 Todos os dados foram compilados do livro de Ildio Rocha antes mencionado, Contribuio para ahistria da imprensa em Moambique, op. cit., p. 12, mas so confirmados por nossas pesquisas, j que,sendo publicaes mais recentes, encontram-se em bom estado e arquivados na Biblioteca PblicaMunicipal do Porto.
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portugus (1813-1888), que foi caador, negociante, chefe tribal (!!!), alto funcionrio
do governo da repblica ber, at sua derrocada, e cnsul de Portugal no Transvaal.
figura destacada no livro de Diocleciano Fernandes das Neves, Itinerrio de uma
viagem caa do elefante52. Em 1909, seus dois netos, Jos e Joo, criam um jornal
chamado O africano. Trata-se da primeira publicao dirigida a uma classe social que
surge em Moambique, a dos mulatos ou mestios, resultado da miscigenao de
homens brancos, europeus na maioria, nas no s (poderiam ser hindus ou rabes),
chegados ao continente africano e que se casam e procriam com mulheres africanas
negras. O jornal dirigido, assim, populao no branca alfabetizada. Joo Albasini,
na poca, era empregado do porto de Loureno Marques, como chefe de pessoal do cais;
e seu irmo Jos tambm trabalhava ali, como despachante oficial. Uma das grandes
novidades da publicao era uma sesso em lngua quironga, editada desde um chamado
nmero programa do jornal, publicado no dia 25 de dezembro de 190853. Se levarmos
em conta que, em sentido estrito, tais lnguas no eram escritas, isso significa que j se
havia desenvolvido, em tais territrios, um sistema de grafia de idiomas eminentemente
orais, o que nos traz interessantes questes para estudos lingsticos, ocupao de quem
tenha tal competncia e capacidade54.
A partir de 1 se maro de 1909 o jornal se torna semanrio, sob o
slogan, no cabealho, de Nmero de propaganda a favor da instruo. Jos Albasini
foi o editor e Joo Albasini o diretor do jornal. O africano tinha tipografia prpria, e
teve sempre despesas razoavelmente altas, o que significa: no era cobertas pelas
assinaturas. No entanto, registra Ildio Rocha, depoimento de um dos antigos
proprietrios do jornal, ao pesquisador Raul Neves Dias, esclarece seu financiamento:
52 Referncia de Ildio Rocha, emA imprensa de Moambique, op. cit., p. 98, nota 28.53 Era uma prtica, no muito comum, mas presente em jornais que se pretendiam de maior porte eseriedade, a edio de um nmero programa de jornal que se pretendesse editar. Servia para divulgar anova publicao. Esta primeira edio era enviada gratuitamente a potenciais assinantes, e combinava-se
com uma prtica, essa sim, absolutamente generalizada, de um pedido e alerta para que, quem no seinteressasse pela mesma, deveria devolv-la redao. A no devoluo implicaria em aceitar serassinante do jornal e, portanto, ao final de um determinado perodo, em geral mensal, pagar a devidaassinatura. Ou seja, repassava-se o nus da devoluo ao prprio assinante. O risco do editor e isso severifica nos avisos e queixas de diferentes publicaes que muita gente no devolvia o jornal, mastambm no pagava a assinatura. Nas pesquisas desenvolvidas, pode-se verificar, inclusive, que muitojornal acabou deixando de circular graas a esses chamados caloteiros (?).54 O bilinguismo do jornalismo moambicano, assim, no era apenas de portugus-ingls, j queMoambique estava rodeado de colnias ocupadas pela Inglaterra, como a Zambzia, Transvaal, etc., mastambm em relao a lnguas nativas. O mesmo processo vai se verificar na imprensa de Goa, na ndia,em que a diversidade lingstica to grande ou maior que a de Moambique.
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era a maonaria e seus adeptos quem o financiava, com excelentes resultados. O jornal
cresceu e chamou a ateno de muitos, inclusive de um sacerdote missionrio, padre
Jos Vicente do Sacramento. O sacerdote, que vivia praticamente na misria, na regio
do Transvaal, tornou-se correspondente do jornal. Recebia, como paga, exemplares que
deveria vender, podendo ficar com o dinheiro. Contudo, acaba expulso da regio, uma
vez que o jornal denunciava constantemente a espoliao a que eram submetidos os
trabalhadores moambicanos nas empresas locais. De retorno a Loureno Marques,
torna-se funcionrio do jornal: redige, traduz, auxilia na rea administrativa.
Em 1912, a maonaria decide indicar um secretrio de redao, Jos dos
Santos Rufino, que logo se torna grande amigo do religioso, ainda que este, a essas
alturas, j explorasse a agricultura em uns campos prximos. No deixara, contudo, de
colaborar com o peridico.
Durante a I Grande Guerra, Santos Rufino se torna correspondente da
agncia Havas, em Moambique. Com isso, O africano recebe um servio telegrfico
exclusivo com informaes do front, a que soma informaes telegrficas da Reuters,
at ento exclusividade do The Loureno Marques Guardian, em lngua inglesa.
Tudo isso alarga o pblico dO africano, que comea a atingir tambm o
leitor branco. Sem deixar de publicar a sesso em lngua ronga, torna-se em breve um
simples jornal noticioso, ampliando, inclusive, a circulao para bi-semanal.
O sacerdote, enquanto isso, associa-se com um judeu estabelecido na
frica do Sul e torna-se concessionrio da loteria de Moambique. Em breve, adquire O
africano, de que se torna ento diretor, incluindo ainda uma seo em lngua inglesa,
dirigida especialmente ao leitor da frica do Sul. O africano deixou de ser editado em
1920.
Os irmos Albasini, contudo, com o dinheiro recebido, fundaram outro
semanrio, nos mesmos moldes, O brado africano, comeando tudo de novo, a partir de
24 de dezembro de 1918, em associao com Estcio Dias, outro mestio funcionrio da
Fazenda.
Ildio Rocha bastante duro na avaliao que faz da histria deste jornal.Semanal, a princpio, vale-se da mesma frmula do peridico anterior, dirigindo-se,pois, essencialmente, aos mulatos. Mas para Rocha, ele demasiadamente europeu emsua ideologia, e profundamente racista em relao aos negros. Tambm bilinge, sobreele escreve Ildio Rocha:
A verdade que, enquanto dirigido, de fato, por mulatos, teve sempreum ponto de vista que em nada diferia do dos brancos ali radicados ou
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em vias de se radicarem, ou seja, um ponto de vista colonial, comoaqueles pugnando pelo desenvolvimento econmico e social doterritrio, mas sempre numa perspectiva eurocentrista55.
As pesquisas realizadas no indicam esta tendncia to radical. Se o
jornal se coloca s vezes crtico em relao aos negros, defendendo sobretudo aosmulatos, torna-se um eficiente porta-voz da colnia junto metrpole, o que ultrapassa
qualquer questo racista. De qualquer maneira, ambos os irmos Albasini foram
militantes de uma causa objetiva, a defesa do interesse dos coloniais, como chamavam
os mestios nativos de Moambique, e neste sentido inclusive participaram da fundao,
dirigiram e vincularam inclusive o jornal ao Grmio Africano, instituio que, ao longo
de muitos anos, defendeu a causa dos mestios. Tanto isso verdade que, quando da
morte de Joo Albasini, e nos anos subseqentes, enormes homenagens e constantes
artigos de fundo e rememoraes buscaram sempre valorizar a figura, especialmente, de
Joo Albasini.
O que se deve reconhecer que, sobretudo a partir de 1958, e j sem o
concurso dos irmos, o jornal (e o Grmio Africano), de que ele era porta-voz, recebe
apoio formal do Ministro das Colnias, Marcelo Caetano, e torna-se, at seu
desaparecimento, em 1974, por fora da injuno poltica de ento, apoiador explcito
da ditadura salazarista. O Grmio Africano alcana, inclusive, receber um terreno do
governo, e financiamento para a construo de sua sede, luta que mantivera ao longo
dos anos56.
Muito mais se pode escrever, com detalhes, a respeito de personalidades
e de publicaes. Tanto as fontes bibliogrficas quanto nossas pesquisas nos levam,
contudo, a planejar ensaios especficos para cada caso.
Algumas generalizaes
A ttulo de concluso, queremos resumir algumas caractersticas dessa
imprensa, algumas das quais tpicas da imprensa da poca, inclusive a colonial; outras,
especficas da imprensa colonial; e algumas poucas, enfim, diretamente vinculadas
realidade do entorno em que circulava, o territrio de Moambique.
55 ROCHA, Ildio -A imprensa de Moambique, op. cit., ps. 120 e SS.56 O Grmio Africano, mais tarde Associao Africana de Loureno Marques, teve seguidores em outrascolnias, como Angola. Seus estatutos foram aprovados em 7 de julho de 1920, e constitua-se emassociao de mestios nascidos em Moambique. Ver ROCHA, Ildio - A imprensa de Moambique, op.cit., p. 145, nota 3.
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J identifiquei algumas dessas tendncias em artigo anterior57:
1. envio dos exemplares das primeiras edies a um determinado
conjunto de habitantes, provavelmente aqueles que constam como alfabetizados, mais
ou menos possuidores de bens e capazes de se interessar por um jornal. Quem no
quiser assinar o peridico, dever devolv-lo redao;
2. registro do aparecimento de congneres, no apenas na prpria colnia
quanto nas demais colnias. Isso significa que os jornais de ento mantm forte
intercmbio, o que se confirma pela observao do ponto seguinte. Os jornais
igualmente noticiam a suspenso de circulao dos colegas e, por vezes, at a existncia
de processos (policiais, administrativos ou censoriais), condenaes ou absolvies;
essa prtica auxilia na reconstruo da histria de cada peridico;
3. forte trnsito dos jornais entre as colnias e destas com a metrpole:
comum a citao e a transcrio de artigos de uns jornais pelos outros, o que significa
que os jornais se lem entre si;
4. isso implica, tambm, na constituio de um campo especifico de
circulao, para aqum do crculo de leitores leigos e gerais, ou especficos mas no
campo da poltica partidria ou dos grupos administrativos, por exemplo que a
publicao busca alcanar. Pode-se mesmo dizer que o jornal que no mantiver uma
constante polmica com outras publicaes um jornal de menor importncia no
contexto de imprensa de ento;
5. todos os jornais coloniais so obrigatoriamente enviados, para
depsito, s bibliotecas do Porto e de Lisboa, advindo da a possibilidade de se fazer
consulta a essas publicaes;
6. comum o lanamento de novos ttulos em substituio aos
anteriormente suspensos ou proibidos. Assim, quando um jornal impedido de circular,
imediatamente a instituio editorial lana um novo ttulo; e este novo ttulo assume
assinantes, compromissos financeiros e linha editorial do jornal anterior;
7. menos que oposio condio colonial em si, os jornais das colnias,
de modo geral, exercem uma constante crtica s companhias de administrao a quem a
Metrpole entregava as colnias, especialmente no caso de Moambique;
57 HOHLFELDT, Antonio Imprensa das colnias de expresso portuguesa: Primeira aproximao,comunicao apresentada ao XXXI Congresso Brasileiro de Cincias Interdisciplinares da Comunicao,Universidade Federal do Rio Grande do Norte/INTERCOM, Natal. Setembro de 2008.
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8. multiplicam-se os perodos de censura ao longo da histria desses
jornais, na maior parte das vezes por questes absolutamente externas ao prprio
contexto colonial; essa censura no interfere diretamente nas questes locais ou
regionais, de modo que falar mal da limpeza da cidade; criticar a companhia de
administrao; cobrar melhor desempenho dos servios postais no obrigatoriamente
motivo para a interveno da censura, nem mesmo depois de 1926;
9. as dimenses dos peridicos em geral a do tablide, tal como o
conhecemos hoje, mas com infinitas variaes nas dimenses exatas, dependendo do
papel recebido; os jornais em geral circulam com quatro pginas, sendo que a ltima
sempre de publicidade; de modo geral, os jornais so semanais, definem-se como
informativos e noticiosos (embora haja aqueles que sejam polticos, e neste caso ligam-
se claramente a um partido e quase sempre so fundados pouco antes de uma campanha
eleitoral, desaparecendo em seguida, sobretudo se o candidato no se elege;
10. h exigncias de registro prvio da publicao, identificao do seu
administrador e do seu editor e, a partir de um determinado momento, exige-se mesmo
um ttulo universitrio para o responsvel pelo jornal, ou um depsito prvio, de valor
bastante alto, que s poder ser levantado alguns meses depois do encerramento de
circulao do jornal; isso serve para pagamento de eventuais multas em casos de
processos sofridos pela publicao, o que gerar inmeros problemas para muitas
folhas.
Especificamente sobre Moambique, pode-se dizer, para concluir que,
embora tendo iniciado sua vida bastante recentemente, em 1854, como se viu,
desenvolveu-se muito rapidamente, alcanou diversificao e teve algumas experincias
no mnimo curiosas, como publicaes dedicadas ao cinema (Cine-frica 1933) ou
estreitamente vinculado ao surgimento do rdio, comoRdio Moambique (1935-1973),
vinculado ao Grmio dos Radifilos da Colnia de Moambique/Rdio Clube de
Moambique; ou Q.R.V (1937-1963), pertence Liga dos Rdio-Emissores de
Moambique58. Ou seja, nos anos mais recentes, pode-se verificar uma articulao
crescente entre a imprensa e outros meios de informao e de comunicao,
constituindo o que denominar-se-ia uma indstria cultural, mesmo que insipiente.
58 Informa Ildio Rocha, em A imprensa de Moambique, op. cit., p. 347, que Rdio Moambiquepertencia primeira agncia de publicidade do territrio, a Agncia Colonial de Moambique. Tivemos aoportunidade de compilar alguns desses exemplares e mesmo de copi-los, junto Biblioteca PblicaMunicipal do Porto.
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