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SECRETARIA DE ESTADO DE MEIO AMBIENTE DIRETORIA DE ÁREAS PROTEGIDAS COORDENADORIA DE ECOSSISTEMAS GERÊNCIA DE GESTÃO AMBIENTAL EM TERRAS INDÍGENAS SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ Desafios para elaboração de políticas de Gestão Territorial e Ambiental Claudia Maria Carneiro Kahwage Haydeé Márcia de Souza Marinho Organizadoras Belém-PA 2011

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SECRETARIA DE ESTADO DE MEIO AMBIENTEDIRETORIA DE ÁREAS PROTEGIDAS

COORDENADORIA DE ECOSSISTEMASGERÊNCIA DE GESTÃO AMBIENTAL EM TERRAS INDÍGENAS

SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ

Desafios para elaboração de políticas de Gestão Territorial e Ambiental

Claudia Maria Carneiro Kahwage

Haydeé Márcia de Souza Marinho

Organizadoras

Belém-PA2011

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Governo do Estado do Pará

Simão Robison Oliveira JateneGovernador

Teresa Mártires Cativo RosaSecretária de Estado de Meio Ambiente

Crisomar Raimundo da Silva LobatoDiretor de Áreas Protegidas

Jocilete de Almeida RibeiroCoordenadora de Ecossistemas

Claudia Maria Carneiro KahwageGerência de Gestão Ambiental de Terras IndígenasCoordenação Técnica Projeto ConBio-Indígena

Equipe TécnicaHaydeé Márcia de Souza Marinho (GEMEC/SEMA-PA)Anderson do Carmo (GE- Indígena/SEMA-PA)Ângela Kachuyana (CUC/SEMA-PA)Genardo Oliveira (GE-Indígena/SEMA-PA)

SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL / ORGANIZADORAS CLAUDIA KAHWAGE & HAYDEÉ MARINHO. BELÉM: SEMA/DIAP/CEC, 2011.

A U T O R E S

Alexandre Goulart (IEB)Almir Narayamoga Surui (METAREILA)Aloysio Guapyndaia (FUNAI)Bepunu Kayapó (A. MOIKARAKÓ)Claudia Maria Carneiro Kahwage (SEMA-PA)Cloude Correa (IEB)Crisomar Lobato (SEMA-PA)Ederson Lauri Leandro (KANINDE)Gabriel Cardoso Carrero (IDESAM)Hélcio Souza (TNC)Henyo T. Barreto Filho (IEB)Ivaneide Bandeira Cardozo (KANINDE)Iza Maria de Castro dos Santos (SEJUDH-PA)João Tiryó (ACT-Brasil)Juventino Kaxuyana (APITIKATI)Lúcio Flores (COIAB)Mariana Nogueira Pavan (IDESAM)Marta Azevedo (SEMA-AC)Nadja Havit Binda ((IEPÉ)Pascale de Roberto (IRD)Roberto de Alcântara Tavares (SEMA-AC)

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)Diretoria de Áreas Protegidas – SEMA

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Produção Editorial/Fotografi asClaudia Kahwage,

Arte da CapaAnderson Oliveira e Claudia Kahwage

Projeto Gráfi co e EditoraçãoOsimar Rodrigues Araujo

Anderson Oliveira

Fotografi as de CapaLiderança indígena da etnia Wai Wai- Terra Indígena

Trombetas Mapuera/Município de Oriximiná-PA

Elaboração do Mapa das Terras Indígenas do ParáAnderson do Carmo

Revisão FinalMarcelo Gadelha Machado

Revisão TécnicaJoão Marcelo Vieira Lima

Normalização Bibliográfi ca

Transcrição das PalestrasClaudia Kahwage, Genardo Oliveira, Haydeé Marinho

ImpressãoGráfi ca GTR

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AAICO Associação dos Amigos da Ilha de ColaresABEMOKÁ Associação Indígena do KayapóACOJUPA Associação da Comunidade Juruna do PaquiçambaACT Área de Conservação da AmazôniaADATTAR Conselho das Aldeias Tembé do Triangulo do Alto Rio GuamáAGITARGMA Associação do Grupo Indígena Tembé do alto Rio GuamáAGITASE Associação do Grupo Indígena Tembé da Aldeia SedeAIJAKG Associação Indígena Jaepya Aradu Kariwassu GuaranyAIMA Associação dos Índios Moradores de Altamira AIPAC Associação Indígena do Povo Anambé do Cairari AIPAS Associação Indígena do Povo Surui Aikewara da Aldeia SororóAIPAT Associação dos Indígenas Asurini do TocantinsAIPC Associação Indígena do Povo Kuruaya AMJIP Associação Indígena Parkatêjê Amjip Tar Kaxuwa AP Áreas Protegidas APIB Articulação dos Povos Indígenas do Brasil APIKUX Associação do Povo Indígena Juruna do Xingu km 17APIM Associação dos Povos Indígenas do MapueraAPINA Conselho das Aldeias Wajãpi APITEMBÉ Associação do Povo Indígena Tembé da Aldeia Tekohaw APITIKATXI Associação dos Povos Indígenas Tiriyó, Kaxuyana e Txik’yanaAPITU Associação dos Povos Indígenas do TumucumaqueAPOINME Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo APP Área de Preservação PermanenteARPINSUDESTE Articulação dos Povos Indígenas da Região SudesteARPIPAN Articulação dos Povos Indígenas do PantanalAS Serviços Ambientais ATESAMPA Associação Indígena Tembé de Santa Maria do Pará BPA Batalhão de Polícia Ambiental

L I S T A D E A B R E V I A T U R A S E S I G L A S

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CASAI Casa de Apoio ao Índio CEASA Central de Abastecimento do Pará CEC Coordenadoria de Ecossistemas CGDC Coordenação Geral de Desenvolvimento Comunitário CIMI Conselho Indigenista Missionário CITA Conselho Indígena Tapajós e Arapium CNPI Comissão Nacional dos Povos Indígenas CO2 Dióxido de CarbonoCOEMA Conselho Estadual de Meio AmbienteCOEMA Conselho Estadual de Meio Ambiente COIAB Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira Proj.ConBio-Indígena Projeto Conservação da Biodiversidade em Terras Indígenas do Pará COP Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas COSANPA Companhia de Saneamento do Pará CPPITA Coordenadoria de Proteção dos Direitos dos Povos Indígenas e Populações Tradicionais DIAP Diretoria de Áreas Protegidas DOCEGEO Rio Doce Geologia e MineraçãoDTDC Desenvolvimento Tecnicista de Bases Conservacionistas EGPA Escola de Governo EMATER Empresa de Assistência Técnica ETSUS Escola Técnica do SUS FCPTN Fundação Cultural do Pará Tancredo Neves.FCV Fundação Curro VelhoFOFA Fortalezas, Oportunidades, fraquezas e ameaças FUNAI Fundação Nacional do Índio FUNBIO Fundo da Biodiversidade GCI Grupo Consciência Indígena GEE Gases do Efeito Estufa GEFI Fundo para o Meio Ambiente Global GFI Iniciativa para Governança das Florestas GPS Global Positioning System GT Grupo de TrabalhoGTA Grupo de Trabalho Amazônico GTI Grupo de Trabalho Interministerial GTZ Agência de Cooperação Técnica Alemã

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HITOTI Associação das Mulheres Indígenas ParkatêjêIAP Instituto de Artes do Pará IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente ICMBIO Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade IDEFLOR Instituto de Desenvolvimento Florestal do Pará IDESAM Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas IEB Instituto Internacional de Educação do Brasil IEPÉ Instituto de Pesquisa e Formação em Educação Indígena IRF Federação Internacional dos Guardas-Parques ISA Instituto Socioambiental ITERPA Instituto de Terras do Pará MDL Mecanismo de Desenvolvimento Limpo METINDJA Associação do Povo Kayapó de RedençãoMJ Ministério da Justiça MMA Ministério do Meio Ambiente MOMEP Missão de Observadores Militares NAEA Núcleo de Altos Estudos Amazônicos OAB Ordem dos Advogados do Brasil OIT Organização Internacional do Trabalho ONGs Organizações não governamentais ONU Organização das Nações Unidas OSCIP Organização da Sociedade Civil de Interesse Público OTCA Organização do Tratado de Cooperação Amazônica PAC Programa de Aceleração do Crescimento PARATUR Companhia Paraense de Turismo PDD Project Design Document PEGTATI Programa Estadual de Gestão Territorial e Ambiental das Terras Indígenas do ParáPEGTATI-PA Programa Estadual de Gestão Territorial e Ambiental em Terras Indígenas do Pará PEOT Programa de Ordenamento Territorial do Estado do Pará PNGATI Política Nacional de Gestão Ambiental em Terras Indígenas PNGATI Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental em Terras IndígenasPPG7 Programa Piloto para a Conservação das Florestas Tropicais do Brasil PPTAL Projeto Integrado de Proteção às Populações e Terras Indígenas da Amazônia Legal PQ Protocolo de Quioto ProGATI Programa de Gestão Territorial e Ambiental em Terras Indígenas

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PUSSURU Associação Indígena do Povo Munduruku RCE Redução Certifi cada de Emissões RDS Reserva de Desenvolvimento Sustentável REDD Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação RESEX Reserva Extrativista SAGRI Secretaria de Agricultura SEANP Sistema Estadual de Áreas Naturais Protegidas SECAD Secretaria de Educação Continuada Alfabetização e Diversidade SECTAM Secretaria de Ciência e Tecnologia da Amazônia SEDES Secretaria de Estado de Assistência e Desenvolvimento Social SEJUDH Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos SEMA Secretaria de Meio Ambiente SEPAQ Secretaria de Estado de Pesca e Aquicultura SEPI Secretaria Extraordinária dos Povos Indígenas SESPA Secretaria de Estado de Saúde SNUC Sistema Nacional de Unidade de Conservação TIs Terras Indígenas TNC The Nature Conservancy TUTO POMBO Associação Indígena Tuto Pombo UC Unidade de Conservação UESA União Evangélica Sul Americana UFOPA Universidade Federal do Oeste Paraense UFPA Universidade Federal do Pará UNEGRO União de Negros Pela Igualdade UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura UNFCCC Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima WWF-Brasil World Wildlife Fund BrasilZEE Zoneamento Ecológico-Econômico

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Agradecemos às diversas instituições e pessoas que puderam contribuir para que o seminário Situação Socioambiental das Terras Indígenas do Pará: desafi os para elaboração de Políticas de Gestão Territorial e Ambiental fosse realizado e conseqüentemente contribuíram para a viabilização deste livro . Primeiramente a FUNAI administração de Brasília e regional na fi gura do Sr Jucelino Bessa que sempre esteve solidário, acompanhando e apoiando os trabalhos desta Secretaria junto aos povos indígenas. Agradecemos a Cooperação Técnica Alemã (GTZ), mas especifi camente as senhoras Katrin Marggraff e Márcia Gramkow por terem oportunizado aporte técnico, logístico e também fi nanceiro para o seminário. À Equipe de Conservação da Amazônia (ACT-Brasil) na fi gura de seu presidente Vasco Roosmalen que possibilitou a vinda de vários palestrantes para o evento e fi nalmente a diagramação e editoração do livro. Agradecemos à FAPESPA que aportou recursos fi nanceiros via seu edital de apoio a realização de eventos científi cos. Agradecemos a participação na realização e organização do evento do na ocasião Diretor de Áreas Protegidas, Rodolfo Pereira, Almires Machado, atuando na época como Assessor Indígena da SEMA, Rosemary Oliveira realizando secretariado do evento. Angela Kachuyana que levou a frente à Assessoria Indígena da SEMA e contribuiu para a viabilização deste trabalho. Agradecemos o apoio técnico da equipe do Instituto de Educação do Brasil que apostou na idéia e viabilizou a vinda dos consultores Henyo Barreto, Cloude Correia e Alexandre Goulart. Agradecemos a COIAB que enviou em meio a sua agenda comprometida um representante, Sr. Lúcio Flores para proferir palestra. Agradecemos a presença dos diversos indígenas que puderam se deslocar de suas terras para participarem ativamente das discussões do Seminário. Agradecemos a participação dos representantes de todos os órgãos de governo convidados que puderam contribuir nas discussões que foram realizadas nas plenárias e grupos de trabalho que realizamos.

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12 SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

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13SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

Estamos publicando o presente livro com os resultados e algumas discussões alcançadas na oca-sião da execução pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Estado (SEMA-PA) e seus parceiros do Seminário Situação Socioambiental das Terras Indígenas do Pará: Desafi os para Elabora-ção de Políticas de Gestão Territorial e Ambiental realizado no período de 7 a 9 de junho de 2010 em Belém.

Existem vários motivos pelos quais a SEMA-PA, por meio de sua Diretoria de Áreas Protegi-das (DIAP)/Coordenadoria de Ecossistemas (CEC) e mais recentemente sua Gerência de Gestão Ambiental em Terras Indígenas visa consolidar sua atuação junto as Terras Indígenas do Pará. Um deles está relacionado à grande dimensão territorial do conjunto das Terras Indígenas do estado, que ocupam quase 25% do território paraense. Tendo em vista que a DIAP objetiva os estudos técnicos vi-sando à organização do espaço territorial por meio do uso dos recursos naturais de forma sustentável e a preservação de ecossistemas para a evolução de todas as espécies, assim como propostas e enca-minhamentos para elaboração de políticas públicas e assistência às populações humanas, é de grande interesse estarmos iniciando a discussão no âmbito estadual, sobre a gestão territorial e ambiental das Terras Indígenas, haja vista também que estas possuem um rico e alto índice de diversidade biológica e ecossistêmica. Falam os cientistas que as Terras Indígenas abrangem uma maior variedade de ecos-sistemas do que todas as outras categorias de áreas protegidas combinadas (Peres & Terborgh, 1995; Fearnside, 2003; Nepstad et al, 2005).

Não obstante todas as atribuições positivas das Terras Indígenas relacionadas ao ordenamento territorial do estado, proteção e conservação do meio ambiente, elas estão na atualidade profunda-mente ameaçadas e pressionadas e por uma diversidade de fatores, como veremos adiante nos artigos deste livro. Ratifi casse então a necessidade de estarmos pensando no apoio a melhoria de sua gestão territorial e ambiental.

Para a atuação junto as Terras Indígenas do Estado também procuramos seguir as deliberações das Políticas Públicas Ambientais no âmbito nacional e estadual. O Plano Nacional de Áreas Prote-1 Bióloga-Antropóloga/Mestre em Agriculturas Familiares UFPA/NEAF- Doutoranda do Programa Ambiente e Sociedade NEPAM/UNICAMP- Coordenadora Técnica do Projeto ConBio-Indígena/CEC /DIAP/SEMA-PA.

2 Engenheiro Florestal, especialista em Fotointerpretação Florestal, Ecologia Florestal, Ecologia Evolutiva, Solos e Manejo de Bacias Hidrográfi cas, Diretor de Áreas Protegi-das/SEMA-PA e Coordenador Executivo do Projeto ConBio-Indigena/CEC/DIAP/SEMA-PA.

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14 SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

gidas (Decreto n°5.758,13/04/2006) estabelece inicialmente em seu princípio XIX a articulação das ações de gestão de áreas protegidas, das terras indígenas e terras ocupadas por remanescentes das co-munidades de quilombos como política pública dos três níveis de governo. Além de evidenciar como sua IX diretriz que é necessário assegurar os direitos territoriais das comunidades quilombolas e dos povos indígenas como instrumento para conservação da biodiversidade.

A lei 5.887 de 9/05/95 que dispõem sobre a Política Estadual do Meio Ambiente estabelece, em seu Artigo 2°, princípio VIII que o respeito aos povos indígenas, às formas tradicionais de organiza-ção social e às suas necessidades de reprodução física e cultural e melhoria de condições de vida, nos termo da Constituição Federal e da legislação aplicável, em consonância com os interesses da comuni-dade regional em geral são fatores indispensáveis na ordenação, proteção e defesa do meio ambiente.

A própria Constituição Estadual do Pará em seu artigo 300, defi ne como responsabilidade do Estado e dos Municípios a promoção e o incentivo à proteção aos índios e sua cultural organização social, costumes, línguas, crenças, tradições, assim como reconhecimento de seus direitos originários sobre a terra que tradicionalmente ocupam. Pensamos que cabe também ao Estado do Pará, através da SEMA e de outros órgãos de sua administração direta, não obstante a importante e histórica existência da Fundação Nacional do Índio, auxiliar os povos indígenas a viabilizarem um horizonte positivo de gestão ambiental e promoção de desenvolvimento sustentável, no sentido de agenciar a melhoria de suas condições de vida rumo ao incentivo das capacidades dos povos indígenas de protegerem, con-servarem e ainda fomentarem a biodiversidade e os recursos naturais de seus territórios.

Ao começarmos a esboçar o projeto do seminário, tivemos a oportunidade de reunir uma sé-rie de informações que nos auxiliaram no desenho da proposta do evento. Essas informações, que desejamos compartilhar aqui com o leitor, nos permitiram visualizar a clara articulação da questão ambiental com a questão indígena no Brasil, mas expressivamente na Amazônia. Fato que unifi cou estrategicamente as agendas políticas dessas questões, possibilitando que as terras indígenas pudessem fi gurar como elementos importantes das políticas nacionais de conservação da biodiversidade e dos ecossistemas brasileiro.

***

O período que compreende o meado da década de 90 até a atualidade foi importante para me-lhorar a execução dos direitos constitucionais incluindo os territoriais dos Povos Indígenas do Brasil. Foi nesse período, que o Estado Brasileiro, através da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), com

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15SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

apoio do Programa Piloto para a Conservação das Florestas Tropicais do Brasil – PPG7 (Decreto nº 2.119, 13 de janeiro de 1997), em seu Projeto Integrado de Proteção às Populações e Terras Indígenas da Amazônia Legal – PPTAL, viabilizou efetivamente a demarcação e a regularização de grande parte das Terras Indígenas da Amazônia. Essas ações possibilitaram em muito a desobstrução dos territó-rios indígenas, resguardando-os, em parte, da forte pressão de invasores não indígenas. Nesse período de demarcação e regularização das Terras Indígenas, iniciou-se no Brasil, por conta da ação política dos movimentos ambientalistas globais, uma mudança expressiva no modo com que a sociedade e seus setores representativos passaram a perceber e a se aliar aos povos indígenas. Concomitantemente a isso, ocorreu também um fortalecimento signifi cativo das organizações indígenas nacionais, que acabaram por internalizar as questões relativas à conservação do meio ambiente em suas pautas rei-vindicatórias.

Os povos indígenas, que durante muitos anos foram vistos como paradigmas de subdesenvolvi-mento, passaram a ser considerados parceiros importantes na formulação de estratégias de conserva-ção e desenvolvimento sustentável.

A ciência acabou por constatar e legitimar, a partir principalmente de seus estudos antropológi-cos, etnocientífi cos, de ecologia cultural, dentre outros, que, em função da convivência e dependência milenar dos povos indígenas com os componentes do meio biótico, estes constituíram um corpo de saberes ecológicos preciosos, cosmovisões e práticas de utilização dos recursos naturais que não só conservam a biodiversidade como a enriquecem com seu uso contínuo (POSEY; BALLÉ, 1989; PO-SEY, 1987; DIEGUES, 1993, 1996).

Estudos também comprovaram que as Terras Indígenas e as Unidades de Conservação de Prote-ção Integral (onde não é permitida a residência de populações humanas) são similares em suas capa-cidades de inibirem o desmatamento (NEPSTAD et al., 2005). Nesse sentido, a existência de Terras Indígenas é tão favorável para os efeitos de proteção da fl oresta tropical quanto são as áreas protegi-das, onde não é permitida a presença de nenhum tipo de população humana.

Os cientistas conservacionistas acreditam cada vez mais que as Terras Indígenas, dado seu tama-nho e estado de conservação, serão um fator decisivo no futuro do bioma amazônico (SCHWARZ-MAN; ZIMMERMAN, 2005 apud PERES; ZIMMERMAN, 2001; PIMM et al., 2001; SCHWARZ-MAN et al., 2002; FEARNSIDE, 2003), visto que essas e outros tipos de áreas protegidas agem como a principal barreira contra a queima e o corte da fl oresta, no assim chamado “arco do desmatamento” – a linha de frente da destruição fl orestal, que se estende de norte a sul e ao sudeste da Amazônia – onde aproximadamente 80% do desmatamento se concentra (ALVES, 2002; NEPSTAD et al., 2001; NEPSTAD et al., 2005).

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16 SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

Altos índices de desmatamento em Terras Indígenas foram geralmente associados a explorações ou invasões de populações não indígenas ocorridas antes de suas demarcações (NEPSTAD, 2006).

Neste contexto, deve-se destacar que, apesar das evidências relacionadas à efi cácia apresentada pelas Terras Indígenas no trato das questões relativas à conservação dos ecossistemas e da biodiversi-dade, os povos indígenas do Brasil ainda não possuem o domínio total das fronteiras de seus territó-rios e da exploração dos recursos naturais que ali se encontram. Soma-se a isso o fato de que, embora a legislação instituída vigente garanta posse permanente e o usufruto indígena exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes3, é grande o número de situações e confl itos de exploração indiscriminada desses recursos por invasores não indígenas.

No que se refere à questão indígena amazônica – e brasileira, como um todo –, o tema central e imperativo nos anos 90 foi a demarcação e regularização das Terras Indígenas, o desafi o da atualida-de são suas consolidações, através da salvaguarda de suas fronteiras e o uso sustentável dos recursos naturais ali existentes, haja vista que é a primeira vez na história do Brasil que estes povos têm um ter-ritório demarcado no qual, a priori, não há possibilidade de migrações alargadas. Os povos indígenas do Brasil, ao longo da história das conquistas colonialistas, foram sempre obrigados a abandonar seus territórios e a procurar áreas nas quais não se sentissem ameaçados, devendo criar hoje, condições de sustentabilidade numa área restrita com fronteiras delimitadas institucionalmente.

O desafi o apresentado exige a observância de que as TIs são cada vez mais estratégicas para o Brasil e também para fi ns de conservação dos ecossistemas e da biodiversidade mundial. Além disso, é necessário garantir a autonomia dos povos indígenas para estabelecer suas prioridades no que diz res-peito ao processo de desenvolvimento, conforme estabelece um dos princípios da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho sobre povos indígenas e tribais, da qual o Brasil é signatário.

Outro contexto importante, associado à relação das Terras Indígenas com a questão ambiental é o das problemáticas relacionadas às mudanças climáticas do planeta. Apesar da notoriedade das con-tribuições positivas dos povos indígenas na conservação da integridade dos ecossistemas no mundo inteiro e, consequentemente, na prevenção dos efeitos das mudanças climáticas. Segundo a União das Nações Unidas cerca de 370 milhões de indígenas em todo o planeta são diretamente atingidos pelos impactos perversos das mudanças climáticas sobre sua cultura e seu modo sustentável de vida. Nesse sentido, esses povos são completamente vulneráveis às alterações do clima, pois têm raízes fi ncadas na natureza e sua sobrevivência está diretamente relacionada à exploração dos recursos naturais.3 Segundo Villares (2007), procurador geral da FUNAI, o usufruto das terras indígenas também encontra restrições quanto a sua proteção ambiental. Os povos indígenas, ao usufruírem de suas terras de forma não tradicional, não podem comprometer o equilíbrio do meio ambiente, pois as atividades tradicionais estão protegidas pelo artigo 231 da Constituição, devendo ser reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas e crenças e tradições, bem como o direito sobre as terras que tradicionalmente ocupam. São legais a restrição e a proibição de atividades não tradicionais danosas ao meio ambiente dentro dessas áreas.

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17SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

No Brasil, a atuação política conjunta das organizações indígenas e dos povos da fl oresta merece atenção, pois o principal foco de reivindicação da sociedade civil brasileira para a mitigação das mu-danças climáticas é a questão do desmatamento. Este tópico está intimamente relacionado ao debate sobre essa parcela da população, que com a mudança no uso do solo se torna bastante vulnerável aos impactos das alterações climáticas.

A questão do desmatamento é hoje o assunto mais importante nas negociações internacionais sobre mudanças climáticas. Cerca de 20% das emissões globais de CO2 são causadas pelo desmata-mento. Essa descoberta colocou novamente as fl orestas tropicais e a Amazônia no foco das discussões mundiais e a preservação das fl orestas foi apontada como talvez a maneira mais fácil e mais barata para impedir que se atinja um nível perigoso de mudanças climáticas (FATHEUER, 2008).

Recentemente, as lideranças indígenas do Brasil e da Amazônia, através da publicação da “Carta de Cuiabá”, exigiram que países e a ONU priorizassem urgentemente o desenvolvimento de mecanis-mos para apoiar as estratégias indígenas de adaptação às mudanças climáticas, dando reconhecimento e valorização aos conhecimentos tradicionais dos povos indígenas como referência fundamental às novas estratégias da humanidade para adaptação às mudanças climáticas.

Exigiram também que todos os governos avaliem as consequências e reajustem os grandes proje-tos de desenvolvimento e infraestrutura que ameaçam as fl orestas, os povos e os territórios indígenas e que provocam grandes desmatamentos. Para eles, a humanidade não conseguirá conter o agravamento das mudanças climáticas sem a prática dessas medidas.

As lideranças indígenas pedem aos governos e a toda a humanidade que reconheçam a impor-tância dos serviços ambientais prestados pelos povos indígenas na proteção e conservação, evitando o desmatamento da Floresta Amazônica e outros biomas. Assim, exigem que o novo regime da Con-venção do Clima valorize e recompense os povos indígenas pelos serviços prestados a toda humani-dade, na forma que desejam receber tais benefícios, priorizando o desenvolvimento e o implemento de mecanismos para recompensar quem conserva as fl orestas.

Nessa carta, as lideranças indígenas também esclarecem que os povos indígenas e comunidades locais estão sofrendo pressões diversas para desmatar seus territórios e que inexiste apoio para prote-ger suas fl orestas. Desta forma, comunicam que estão apreensivos sobre suas condições limitadas de resistência à pressão ao desmatamento por longo período.

Em relação ao REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação), as lideranças indígenas reforçam que seus mecanismos não podem desrespeitar a autonomia indígena sobre seus territórios e que estão preocupados que os regimentos REDD pós-2012 – discutidos na COP – sejam usados para compensar aqueles que sempre desmataram suas fl orestas: os grandes produtores de soja, gado, biocombustível e outros. Dessa forma, comunicam e exigem que o REDD e qualquer outro

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18 SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

mecanismo de compensação por redução de emissões de carbono, priorizem a remuneração e a dis-tribuição de benefícios para os povos que conservam a fl oresta e têm resistido à pressão econômica do desmatamento.

Fearnside (2002) ressalta que os povos da fl oresta atualmente “necessitam desesperadamente de algo que possam vender”. A venda de mercadorias materiais vindas da fl oresta constitui o foco da maioria das tentativas de incentivo ao “desenvolvimento sustentável” para essas populações. No entanto, a fonte de valor primordial não é a mercadoria material que produzem, mas sim os serviços ambientais que eles prestam à sociedade. Para Fearnside (ibidem) converter serviços como a manuten-ção da biodiversidade, o armazenamento de carbono e a ciclagem de água em fl uxos monetários, que possam apoiar uma população de guardiões da fl oresta, exige cruzar uma série de obstáculos. Entre-tanto podem ser alternativas viáveis para incentivá-los a continuar à prestação dos serviços ambientais que milenarmente vem sendo oferecido à humanidade. Esse contexto aponta para novas possibilida-des políticas e econômicas às sociedades indígenas, na medida em que advém do reconhecimento das problemáticas enfrentadas pelos povos indígenas da Amazônia e da consciência da importância de suas práticas tradicionais e de seus conhecimentos associados à biodiversidade.

Na perspectiva, revelam-se processos de mitigação aos impactos ambientais do planeta, o que propicia vislumbrar mudanças signifi cativas na qualidade de vida das comunidades indígenas, prove-nientes de novas fontes de recursos que possibilitem, a esses já referidos povos, respostas às proble-máticas da saúde, educação, infraestrutura e exclusão, situações conhecidas ao longo da história.

***

O seminário possibilitou aos participantes indígenas e não indígenas conhecerem alguns desses vários eixos de discussões que articulam as questões ambientais e indígenas na Amazônia. No Pará, os debates sobre a gestão ambiental dos territórios indígenas ainda são embrionários. Há poucas ini-ciativas governamentais e não governamentais que tem o horizonte de viabilizar atividades que auxi-liem a gestão, principalmente com vista à geração de renda, que hoje em dia é uma das demandas de reivindicação do movimento indígena no Estado. Projetos de REDDs ou de pagamentos de serviços ambientais aos indígenas ainda são pouco discutidos no Estado e tem-se a crescente necessidade de provocar essas discussões com a realização do evento e a publicação deste livro.

O livro é então um marco fundamental na história da Secretaria de Estado de Meio Ambiente, já que a questão indígena é pela primeira vez abordada de maneira bem sucedida e oportunamente in-ternalizada e aceita na práxis da entidade, como pauta importante das políticas ambientais no Estado.

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Ele também constitui os resultados de um trabalho pioneiro e piloto que vem sendo desenvol-vido desde 2008 no âmbito da Diretoria de Áreas Protegidas, através de sua Coordenadoria de Ecos-sistemas (CEC) e seu Projeto Conservação da Biodiversidade em Terras Indígenas do Pará (Projeto ConBio-Indígena), vinculado ao cumprimento dos objetivos e metas do programa maior de governo “Ordenamento Territorial do Estado do Pará” (PEOT)4 em uma de suas ações de governo intitulada “Preservação da Biodiversidade e Uso Sustentável dos Recursos Naturais”.

O Projeto ConBio-Indígena, vigente até 2011, possui o objetivo de promover o estabelecimento de diretrizes, ações científi cas, técnicas (metodológicas) e políticas para conservação da biodiversidade e uso sustentável dos recursos naturais em Terras Indígenas do Estado do Pará, através de três sub-projetos: I) Levantamento da Situação Socioambiental das Terras Indígenas do Pará; II) Etnoconheci-mento da Biodiversidade das Terras Indígenas do Pará; III) Gestão Ambiental de Terras Indígenas do Pará: etnomapeamento, etnozoneamento, plano de gestão ambiental e manejo dos recursos naturais5.

O projeto também busca elaborar ações capazes de responder, efetivamente, às demandas da primeira reivindicação ofi cial dos povos indígenas do Pará enviada ao Governo e contida na Carta dos Povos Indígenas do Estado do Pará (2007) e em cujo teor 35 povos indígenas apresentam propostas para as áreas de etnodesenvolvimento, propriedade intelectual e proteção de seus patrimônios cultu-rais. Propõe-se, da mesma maneira, abordar e cumprir algumas determinações expressas no documen-to e plano de ação das “Diretrizes da Política Estadual para os Povos Indígenas do Pará”, elaborado pelo Comitê Intersetorial de Política Indigenista do Estado do Pará, do qual a Secretaria de Estado de Meio Ambiente (SEMA) é membro participante.

O seminário, foi uma ação do projeto ConBio-Indígena no intuito de garantir a realização de seu Subprojeto I “Levantamento da Situação Socioambiental das Terras Indígenas do Pará” e teve como meta inicial realizar um levantamento participativo das informações sobre as problemáticas e oportu-nidades socioambientais das Terras Indígenas do Pará, levando em consideração as conjunturas atuais nas quais elas estão inseridas.

Pretendíamos lançar um olhar investigativo, contando com a participação de vários indígenas convidados, principalmente os representantes do Fórum dos Povos Indígenas do Pará - entidade

4 O PEOT foi instituído pelo Decreto nº 692, de 5 de dezembro de 2007 e tem por fi nalidade a promoção do ordenamento territorial em suas dimensões fundiária, ambiental, produtiva e fl orestal, visando ao estabelecimento de princípios, diretrizes e estratégias que possibilitem a articulação institucional, bem como a viabilização de instrumentos de ordenamento, uso e ocupação racional e sustentável do território do Estado do Pará.

5 O projeto viabilizou na ocasião da abertura do Seminário o convênio técnico fi nanceiro com a Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé , Equipe de Conservação da Amazônia (ACT-Brasil) e Associação Indígena dos Povos do Mapuera para elaboração de Diagnóstico Etnoambiental e de etnozoneamento nas Terras Indígenas Trombetas e Nhamundá Mapuera e áreas dos povos Kaxuyana, localizadas na Floresta Estadual do Trombetas, viabilizando mais de seis milhões de hectares zoneados participativamente, visando ações de gestão integrada das Áreas Protegidas da Calha Norte do Estado do Pará, com vista à conservação da biodiversidade.

Estamos publicando a Carta dos Povos Indígenas (Anexo 1) no capítulo IV.

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indicada e criada pelo Governo para dialogar com o Comitê Intersetorial de Políticas Indigenistas do Estado, instituído através de Decreto (n° 2.358, de 24/06/2010) - sobre as problemáticas, potenciali-dades e construção de cenários regionais aos quais as TIs estão inseridas na atualidade. Na realidade, uma tentativa de visualizar o panorama e vislumbrar estratégias para promover a conservação dos ecossistemas e da biodiversidade nesses territórios.

Ao elaborarmos o subprojeto I no ano de 2008, observamos que as informações, dados socioam-bientais e experiências de gestão territorial e ambiental dessas Terras Indígenas do Pará, encontram-se fragmentadas nos relatórios das instituições, organismos indigenistas governamentais e não-governa-mentais, em trabalhos e publicações avulsas dos meios acadêmicos.

Haveria então o desafi o de se reunir essa multiplicidade de informações e experiências de uso sustentável dos recursos naturais dessas TIs, no sentido de nortear a elaboração de políticas públicas, programas e projetos de governo voltados para gestão desses territórios.

Além da preocupação em realizar um levantamento participativo da situação socioambiental atual das Terras Indígenas do Estado, possuíamos também a intenção de eleger áreas prioritárias para atua-ção futura da DIAP-SEMA e quem sabe de outros órgãos de governo. Também pretendíamos levan-tar subsídios para a elaboração futura de um Programa Estadual de Gestão Territorial e Ambiental em Terras Indígenas do Pará (PEGTATI-PA).

Pensamos que a elaboração participativa desses insumos poderá servir como elemento nor-teador de ações de governo junto as Terras Indígenas do Estado e para que o movimento indígena do Pará possa se apropriar das ideias produzidas no seminário, viabilizando reivindicações, diálogos interculturais e diretrizes políticas que contribuam para melhoria de sua qualidade de vida e a sua sus-tentabilidade.

Estávamos também preocupados em consolidar ou traçar um esboço do PEGTATI-PA para tentar sanar uma problemática que difi cultou a sustentabilidade das ações de estado junto aos povos indígenas do Pará.

Infelizmente, o pertinente processo desenvolvido pelo governo petista, a partir de 2007, para garantir a elaboração e aprovação de uma Política Indigenista Estadual, que continha em sua estrutu-ra elementos e ferramentas para apoiar signifi cativamente a sustentabilidade das ações de estado no auxílio à gestão territorial e ambiental das TIs, acabou por não ser fi nalizado. Isso ocorreu apesar dos esforços pioneiros e louváveis de vários representantes de organismos governamentais (integrantes do Comitê Intersetorial de Política Indigenista do Estado) e não governamentais que estiveram empenha-dos nessa tarefa.

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As instâncias partidárias governamentais superiores, encarregadas em dar diligência as suas ba-ses, estavam embasadas em frágil governança, não conseguiu impor a sua base governista um posicio-namento e ações unifi cadas relativas ao cumprimento da meta governamental de aprovar as Políticas Indigenistas do Estado. A estrutura partidária governamental era complexa e fracionada em pequenos subgrupos de poder, o que permitia que estes rivalizassem ações políticas e ideológicas diferenciadas, por vezes completamente divergentes no âmbito do Comitê Intersetorial de Políticas Indigenistas. Como não foi imposto à convergência dos interesses desses subgrupos, para que o documento das Políticas Indigenistas do Estado do Pará fosse encaminhado para aprovação na Assembléia Legislativa, o espaço de discussão do Comitê, que não estava instituto formalmente, virou arena de confl itos po-líticos entre os subgrupos governamentais rivais. Finalmente não houve tempo hábil para as políticas fossem aprovadas, fi cando os povos indígenas do Pará, mas uma vez desamparados institucionalmente no âmbito estadual.

Além disso, observou-se que o próprio movimento indígena do Pará, que acabou por ter in-tegrantes internalizados no aparato governamental, ainda carece de bases de conhecimento político relacionado ao funcionamento do aparelho de estado. Talvez, por conta disso, estes atores não con-seguissem enxergar a importância dos esforços conjuntos para impor a convergência de interesses de suas lideranças e viabilizar a aprovação das políticas indigenistas.

Por várias vezes, alguns indígenas, com funções governamentais, criaram estratégias políticas que difi cultaram essa aprovação, até o momento em que se tornou inviável, por conta dos prazos de encaminhamento das minutas de projeto de lei ao legislativo.

É importante comentar que a aprovação da política indigenista estadual garantiria também, den-tro de sua estrutura, a base de recursos orçamentários e fi nanceiros para que o Estado do Pará, inde-pendentemente do governo vigente, pudesse “auxiliar a promoção e o incentivo à proteção aos índios e sua cultura, organização social, costumes, línguas, crenças, tradições, assim como, reconhecimento de seus direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam”, como defi ne o artigo 300 da Constituição Estadual.

Além disso, vislumbramos que a elaboração participativa de um esboço do PEGTATI-PA pu-desse integrar a SEMA aos trabalhos e discussões que estão sendo desenvolvidas pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) e Fundação Nacional do Índio (FUNAI) a fi m de elaborar a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental das Terras Indígenas (PNGATI). Acreditamos que os resultados do seminário possam subsidiar a construção dessas políticas.

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Organizamos o livro, seguindo a programação do seminário. Nesse, basicamente tivemos duas atividades principais. Num primeiro dia de evento, houve a apresentação de palestras que chamamos de “Painéis Temáticos”. Tratava-se das experiências consolidadas de diversas organizações indígenas e indigenistas, governamentais e não governamentais, que informavam sobre as atividades e ferramentas que estão sendo utilizadas com efetivo sucesso, a fi m de auxiliar a gestão territorial e ambiental em algumas Terras Indígenas da Amazônia brasileira e, fi nalmente, dois grupos de trabalho. Um voltado para o levantamento participativo da situação socioambiental das TIs do Pará e outro voltado à estru-turação de insumos para a elaboração do PEGTATI-PA.

Os “Painéis Temáticos” foram concebidos para que pudessem dar conhecimento e embasar a discussão dos participantes indígenas e não indígenas na ocasião das atividades dos dois Grupos de Trabalho que se seguiram aos outros dias do evento.

Deste formato de seminário resultou este livro com oito artigos, e cinco transcrições de palestras proferidas durante a realização do seminário, pois julgamos de extrema importância manter todo o conteúdo que foi discutido durante o evento.

Sendo assim o livro foi organizado em quatro capítulos. O Capítulo I intitulado “Políticas de Go-verno para os Povos Indígenas”, constituiu-se da mesa de abertura ocorrida no primeiro dia do seminário. Começamos com o artigo da transcrição da palestra do Diretor de Desenvolvimento Sustentável da Fundação Nacional do Índio, Senhor, Aloizio Guapindaia, intitulada “Diretrizes da Construção da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental em Terras Indígenas”, onde foi possível conhecer informações sobre o processo de construção da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental em Terras Indígenas, além da nova confi guração política que a FUNAI vem tratando a questão indígena no país.

O artigo “Política Estadual dos Povos Indígenas do Pará” de Iza Tapuia, liderança indígena, que esteve à frente da Coordenação de Proteção dos Direitos dos Povos Indígenas e Populações Tradicionais da Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos do Pará trata sobre o desenvolvimento de todo o processo de elaboração e discussão da Política Indigenista do Estado do Pará, dando, ao leitor, a oportunidade de conhecer seus fundamentos, ferramentas e compreender melhor as problemáticas políticas que foram enfrentadas na ocasião, assim como a discussão das atividades que o Governo realizou para internalizar a questão indígena no Estado. Ao fi nal desta seção, tem-se o artigo do atual Diretor de Áreas Protegidas da SEMA-PA, Crisomar Lobato que informa sobre o enquadramento e importância das TIs no processo de Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE).

No capítulo II intitulado “Experiências de Gestão Territorial e Ambiental em Terras Indígenas da Amazônia”, estão os artigos enviados por indígenas e pesquisadores e as transcrições das palestras

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que foram proferidas na ocasião do seminário. Iniciamos com o artigo de Marta Azevedo e Roberto Tavares “Gestão de Terras Indígenas no Acre: estudo de caso dos Etnozoneamentos” que nos re-mete as exitosas experiências do Estado do Acre em implementar ferramentas de gestão territorial e ambiental das terras indígenas, expondo as coordenadas técnicas, políticas e metodológicas para o sucesso da internalização da questão indígena no âmbito estadual. O artigo de Almir Surui, Ivaneide Cardozo e Ederson Leandro “Mercado de Carbono: um estudo de caso do Projeto Carbono Surui” nos remete também a outra experiência exitosa de implementação das ferramentas de gestão em ter-ras indígenas, pois apresenta os passos dados pelo povo indígena Paiter (Surui de Rondônia), para a implementação do Plano de Gestão de seu território e a inserção no mercado de carbono, através da elaboração do “Projeto Carbono Surui” como mecanismo de subsídio para as atividades de educação, saúde, valorização cultural, desenvolvimento econômico, proteção ambiental e segurança alimentar. Tendo a organização indígena local como proponente e realizadora da maior parte das discussões/im-plementações do projeto, destacando se a formulação/reformulação dos novos cenários de utilização e ocupação do solo e legitimando a intenção das comunidades em práticas legais de utilização de pro-dutos fl orestais, assim como a luta pela manutenção da cultura e cumprimento dos direitos indígenas, viabilizando alternativa metodologia e passível de realização (com suas devidas adaptação) em outros territórios indígenas do Brasil.

O artigo de Gabriel Carrero e Mariana Pavan “Mecanismos de Redução de Emissão de Desma-tamento e Degradação” trata de revelar os conceitos básicos sobre mudanças climáticas e Redução de Emissões do Desmatamento e Degradação (REDD+). Iniciando com a explicação do signifi cado das palavras que são usadas sempre em conversas e discussões sobre o tema, para depois apresentar o potencial de REDD+ para a conservação fl orestal e como ele está ligado com as populações indígenas e a gestão de suas terras.

Temos também o prazer de publicar o artigo escrito pela liderança indígena João Tiryó que trata de expor todo o processo de formação dos guardas-parques indígena na TI Parque do Tumucumaque, viabilizado pela organização não governamental Equipe de Conservação da Amazônia (ACT-Brasil), tratando de nos dar o conhecimento da importância desta formação para gestão territorial e ambiental do Parque do Tumucumaque, uma das maiores reservas indígenas do país.

A partir daí o livro apresenta em forma de artigos as transcrições das palestras que nos referimos anteriormente. A primeira transcrição é a pertinente a fala de Lúcio Flores, indígena do povo Terena, assessor técnico da COIAB, que trata de comunicar a história- incluindo as conquistas e difi culdades- do engajamento político da COIAB na temática da gestão ambiental e territorial das terras indígenas

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do país. Logo a seguir temos a transcrição da palestra de Juventino Kaxuyana, também liderança in-dígena que atualmente preside a APITIKATI, organização indígena que tem realizado um expressivo trabalho, cujo seu cerne é viabilizar a gestão territorial e ambiental das terras indígenas onde vivem os povos Kaxuyana, Tiriyó,Txikuyana dentro de uma perspectiva transversal, voltada para melhoria da qualidade de vida desses povos.

Publicamos também a transcrição da palestra de Nadja Binda, antropóloga consultora do IEPÉ, organização não governamental que atua no extremo norte do Pará e oeste de Amapá implan-tando o projeto de Mosaico de Áreas Protegidas. A pesquisadora nos esclarece sobre as problemáticas jurídicas que perpassa a questão de criação de mosaicos e nos revela o processo participativo que tem dado conta de implantar o mosaico de áreas protegidas nestas regiões, assim como expõem as conquistas e problemáticas deste processo. O artigo seguinte é proveniente da transcrição das falas de Bepunu Kayapó e a pesquisadora Pascale de Robert intitulado “Mapas do Diálogo: experiência de mapeamento participativo em Moikarakô, terra indígena Kayapó, Pará”, trata de expor as várias eta-pas das experiências de mapeamentos participativos realizados numa aldeia indígena Kayapó e como os indígenas acabaram por se apropriar e utilizarem-se politicamente dos mapas produzidos por eles com ajuda de pesquisadores para realizarem uma comunicação mais efi ciente com a sociedade não indígena. Finalmente temos o artigo da transcrição da fala do antropólogo Hélcio Souza que trata de comunicar a as etapas metodológicas de viabilização da gestão territorial e ambiental em terras in-dígenas que foram sistematizadas a partir de experiências que a organização não governamental The Nature Conservancy (TNC) realizou junto a Terras Indígenas do Oiapoque e do Estado de Roraima.

O Capítulo III dedica a explorar o tema da Situação Socioambiental e os Desafi os para Elabora-ção de Políticas de Gestão Territorial das Terras Indígenas do Pará através de dois artigos. O escrito por Claudia Kahwage que visa apresentar dados secundários atuais que retratam alguns aspectos da situação fundiária e socioambiental das Terras Indígenas do Pará. O outro, artigo escrito pela equipe de consultores do Instituto de Educação do Brasil (IEB), que tiveram a tarefa de realizar a mediação e a relatoria dos dois Grupos de Trabalho formados na ocasião do seminário. O primeiro grupo de tra-balho se organizou em diversos subgrupos representativos de 06 meso regiões do Estado, viabilizou, através da implementação de metodologias participativas defi nidas pelos consultores o levantamento da situação socioambiental das terras indígenas do Pará. O segundo grupo de trabalho que também se subdividiu se encarregou de produzir as orientações para a elaboração futura de Programa de Gestão Territorial e Ambiental das Terras Indígenas do Pará.

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Esperamos que o livro possa representar uma memória positiva para nortear as futuras agendas de governo. O leitor deve ter em mente que não se trata efetivamente de uma publicação acadêmica em seu estilo rígido e normativo. Nós veiculamos e prometemos aos indígenas e aos representantes organizacionais que a publicação deveria ser encaminhada aos mesmos para que pudessem, caso seja de seu interesse, utilizá-lo como uma ferramenta política para o diálogo com os governos vindouros.

A SEMA deseja que os conteúdos aqui expostos possam auxiliar, de alguma forma, os processos de constituição de uma agenda política unifi cada entre a questão indígena e ambiental no estado, em prol da garantia da aplicabilidade dos direitos indígenas, da conservação dos ecossistemas, da socio-biodiversidade presente nesses territórios, de sua proteção e salvaguarda, da melhoria da qualidade de vida dos diversos povos indígenas que vivem no Estado Paraense. Tudo tendo em vista o alcance do tão almejado desenvolvimento sustentável, aos moldes das ancestralidades e humanidades indígenas milenares que já habitaram esta terra sem promover destruições perversas e irracionais, como as que temos visto na contemporaneidade.

REFERÊNCIAS

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29SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

A reestruturação da FUNAI foi implantada em dezembro de 2009, através de um decreto pre-sidencial que cria a Diretoria de Promoção ao Desenvolvimento Sustentável. Essa Diretoria substitui a de Assistência e cria a de Proteção Territorial. Essa última substitui a Diretoria de Assuntos Fundi-ários. Isso é importante para que seja possível entender que a FUNAI, a partir dessa nova estrutura incorpora o conceito ou os conceitos da gestão territorial e ambiental com foco não somente na pro-teção da Terra Indígena, mas na promoção ao desenvolvimento sustentável.

Os encaminhamentos, o desenvolvimento e a implantação da Política Nacional de Gestão Ter-ritorial Ambiental, possuem conceitos que estão sendo trabalhados. Não apenas os conceitos de pro-moção e de proteção da Terra Indígena, mas os conceitos de controle social e de participação efetiva das organizações indígenas e das comunidades nas decisões com o Estado Brasileiro, tendo a fi nali-dade de implementar e desenvolver as populações indígenas. Esses conceitos têm sido incorporados pela FUNAI na sua nova estrutura.

Vale ressaltar que 12% do território nacional é formado por Terras Indígenas e 23% dessas terras são localizadas na Amazônia Legal.

Diante desse fato, pode-se considerar que essas são as áreas protegidas mais bem preservadas. Apesar de todos os problemas que as TIs possuem como, por exemplo, a ocupação de não índios, exploração ilegal de madeira ou mesmo de garimpos, as TIs ainda são consideradas as terras mais bem conservadas e mais preservadas ambientalmente.

Os problemas socioambientais enfrentados pelas comunidades indígenas hoje são de grande complexidade, envolvendo saúde, educação, acesso a mercados, invasões de terras, sem falar da regu-larização fundiária. É um grande desafi o entender uma gestão ambiental sem que se considere todo o contexto socioambiental envolvido. As políticas precisam ser pensadas e desenvolvidas de forma global.

Não se pode falar em proteção ambiental ou mesmo em desenvolvimento sustentável sem consi-derar as questões de educação, saúde, saneamento, produção para o mercado, geração de renda, dentre outras. As políticas de gestão ambiental e territorial se referem justamente as ações que o Estado Bra-sileiro tem que desenvolver para enfrentar essa problemática de uma forma global.

7 Transcrição de palestra” ocorrida em 07/06/2010. 8 Diretor de Desenvolvimento Sustentável da FUNAI.

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A grande maioria das comunidades indígenas passa por fortes transformações socioeconômicas, afetando o bem estar, a situação econômica e a sustentabilidade ecológica de suas terras. A gestão ambiental e territorial é um tema transversal a essa realidade integrado a sustentabilidade econômica das comunidades indígenas.

Existe um histórico dos projetos institucionais que o Governo Brasileiro vem realizando ao longo do tempo que ajuda a refl etir e estruturar a própria Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental. Em 1996, foi criado o programa piloto para Proteção das Florestas Tropicais no Brasil, o conhecido PPG7, que teve o seu teto vencido em 2008.

As metodologias desenvolvidas por esse programa vêm sendo desenvolvidas e incorporadas dentro da estrutura regular da FUNAI. Então o PPG7, através do PPTAL, trabalhou, criou e deu oportunidades para instituições incorporarem uma série de metodologias, no sentido de trabalhar a preservação e a proteção das TIs.

O PPTAL não fi cou focado apenas, como ele é mais conhecido, na demarcação das terras indí-genas, também teve um trabalho importante, no sentido de possibilitar a auto-sustentação das TIs, realizando vários estudos e levantamentos etnoambientais. Nesse sentido, o PPTAL foi um programa extremamente importante no sentido de fazer com que a FUNAI mudasse o seu foco de percepção.

A FUNAI era voltada para a demarcação das terras indígenas e de todo o processo de regularização fundiária, mas não promovia o desenvolvimento sustentável dessas TIs. O momento hoje é de defi nição, de uma orientação do Governo Federal no sentido das terras indígenas demarcadas. Muitas delas já estão regularizadas em termos fundiários, mas não possuem uma política de gestão territorial ou ambiental que ajude a promover o desenvolvimento sustentável. O Governo Federal, através da FUNAI e do Ministério do Meio Ambiente, passa por um processo de incorporação das experiências do PPG7 com objetivo de construir uma política com um olhar para o desenvolvimento sustentável das TIs.

O objetivo geral do PDPI é melhorar as perspectivas de sustentabilidade econômica e cultural da Amazônia Legal nas suas terras e de conservação dos recursos naturais nelas existentes. Representa um mecanismo que exige grande capacitação de gerenciamento de projetos por parte dos executores e organizações indígenas, necessitando ainda de muito auxílio para melhorar sua efi cácia. O projeto é desenvolvido com a participação das organizações indígenas. É construída uma série de processos participativos e de defi nições do desenvolvimento do próprio projeto. Isso empresta um instrumen-tal importante para construção da política nacional de gestão, uma vez que um dos pressupostos é justamente a participação efetiva das representações indígenas, através das suas organizações ou das próprias comunidades.

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No cenário atual, tem-se a Comissão Nacional de Política Indigenista que foi criada pelo Pre-sidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2006 e implantada em 2007. Essa comissão tem efetivamente participado dos processos de construção dessa política. As ofi cinas são realizadas em várias regiões e a FUNAI e o MMA estão apoiando. Elas têm a participação efetiva da própria CNPI e também das organizações indígenas. É uma comissão paritária composta pelo Governo, por representantes das várias regiões do Brasil e por entidades não governamentais indígenas e indigenistas.

Elaborou então ao longo de 2009 o novo Estatuto dos Povos Indígenas. Esse Estatuto é um Projeto de lei que está tramitando no Congresso Nacional e é o instrumental jurídico necessário para que o Estado Brasileiro estabeleça uma nova relação com os povos indígenas.

O atual Estatuto é totalmente defasado. Ele não tem alinhamento com a Constituição de 1988. A Constituição assegurou direitos diferenciados aos povos indígenas e o Estatuto, anterior a Lei Magna do país de 88, apresenta muitos artigos que perderam a validade porque não foram contemplados pela Constituição de 1988. Daí a necessidade da elaboração de um novo Estatuto já então tramitando no Congresso Nacional. Se aprovado, vai estabelecer um novo instrumental jurídico que irá requalifi car efetivamente a relação do Estado Brasileiro para com as populações indígenas.

Aqui estão dois artigos da proposta do Estatuto. O artigo 50: “constitui encargo da União por in-termédio dos órgãos de meio ambiente e indigenista, a manutenção do equilíbrio ecológico das Terras Indígenas e de seu entorno”. E no artigo 51: “os povos e comunidades indígenas têm autonomia para fazer a gestão territorial de suas terras, cabendo a União apoiar e promover essas atividades, respeita-dos os usos, costumes tradições e formas de organização desses povos e comunidades”.

Esses dois artigos nos mostram o posicionamento dos órgãos de governo diante das comunida-des e como é que as mesmas precisam ter assegurada a sua autonomia para que efetivamente sejam donas dos seus próprios destinos, cabendo então aos órgãos de governo apoiar e desenvolver ativida-des para que essas comunidades possam encontrar o seu caminho no desenvolvimento sustentável.

Criada em 2009, a política nacional possui um grupo de trabalho interministerial entre Ministério da Justiça e Ministério do Meio Ambiente com representação indígena partidária para elaboração da PNGATI.

Ao fi nal de 2009 e início de 2010, foram realizadas quatro consultas regionais em Recife, Curitiba, Campo Grande e Cuiabá e uma última que vai ser realizada brevemente em Manaus. Feita a última ofi cina, essa Comissão se reúne, sistematiza todos os processos que foram discutidos para minutar um decreto que irá instituir a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental em Terras Indígenas. É um decreto do Presidente da República que irá estabelecer as diretrizes dessa política. Espera-se que

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esse documento esteja pronto em agosto de 2010 para que possa ser submetido à assinatura do atual Presidente da República. Não será interessante deixar para o próximo ano, pois será outra gestão.

Essas são as diretrizes que estamos trabalhando para elaboração da política, algumas já referidas aqui: participação e controle social dos indígenas no processo de elaboração da política nacional; for-talecimento dos sistemas indígenas de conservação ambiental; proteção dos saberes e conhecimentos tradicionais indígenas; desenvolvimento da gestão etnoambiental como instrumento de proteção dos territórios e das condições ambientais necessárias à reprodução física e cultural e ao bem estar das comunidades indígenas e, fi nalmente, valorização das identidades étnicas e suas organizações sociais.

O projeto da PNGATI foi submetido ao GEFI e aprovado, catalisando a contribuição das TIs para a conservação dos ecossistemas fl orestais brasileiros, conhecido como GFI indígena. O objetivo é consolidar a contribuição das terras indígenas como áreas essenciais à conservação da diversidade biológica e cultural nos biomas fl orestais brasileiros, realizando e fortalecendo as formas étnicas de manejo, uso sustentável e conservação dos recursos naturais nas TIs e realizando a inclusão desses povos. Fomentando assim uma Política Nacional de Gestão Ambiental em território indígena.

O GEFI foi aprovado em 2009 e o comitê diretor vai ser instalado no mês de junho. O projeto do Fundo Global é importante porque está trabalhando as diretrizes do desenvolvimento da Política Nacional de Gestão Ambiental em Terras Indígenas.

O GEFI vai trabalhar em áreas de referência e com uma rede de experiências. Somam-se 32 TIs em que o recurso do GEFI vai atuar.

Existe uma integração de objetivos entre o projeto do GEFI e a PNGATI. Esses objetivos pas-sam pela criação de um Conselho Regional. Cada região irá possuir um Conselho Regional, além de uma estrutura nacional que será implementada. Os conselhos regionais vão discutir o desenvolvimen-to dos projetos e as próprias ações da PNGATI e, também, articular-se com as conferências regionais futuras.

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O Estado do Pará estabeleceu as bases para a construção e execução de políticas públicas dirigi-das aos diversos segmentos sociais que integram a sociedade paraense, dos quais fazem parte, os povos indígenas. Essas populações secularmente estão marginalizadas e invisíveis às ações governamentais, um fl agrante desrespeito aos seus direitos como povos originários, que contribuem para o enriqueci-mento da cultura da sociedade brasileira, com a potencialidade inexplorada da sua rica sociobiodiver-sidade, que integram 57(cinquenta e sete) povos, falantes de 03(três) dezenas de idiomas, que habitam 25% do território, presentes em 52 (cinquenta e duas) Terras Indígenas.

O executivo estadual valorizando a diversidade étnica e cultural das populações indígenas do Es-tado do Pará, a partir de 2007, avançou na consolidação da política de fortalecimento dos direitos dos Povos Indígenas e reestruturou a Secretaria de Justiça e Direitos Humanos – SEJUDH (Lei º. 7.026, de 30 de julho de 2007), criando a Coordenadoria de Proteção dos Direitos dos Povos Indígenas e Po-pulações Tradicionais. O Regimento Interno art. 19 da SEJUDH, assim defi ne as atribuições: compete à Coordenadoria de Proteção dos Direitos dos Povos Indígenas e das Populações Tradicionais, como unidade de atuação programática vinculada a Diretoria de Cidadania e Direitos Humanos: coordenar, formular e executar as políticas públicas de proteção e reparação dos direitos humanos dos grupos socialmente vulneráveis, como as populações tradicionais e os povos indígenas.

A criação da CPPITA determinou responsabilidades ao gestor público, baseadas no marco legal nacional e internacional vigente, entre os quais: Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão; a Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas da ONU; a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, a Convenção sobre Diversidade Biológica; a Convenção sobre Diversida-de Cultural; no contexto nacional: a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (Artigos 231 e 232), em que expressa claramente o dever do Estado e da sociedade em respeitar a forma de organização sociocultural, a sua sustentabilidade humana e territorial e os sistemas jurídicos próprios de cada Povo Indígena.

A reestruturação da SEJUDH e a criação da CPPITA foi um passo decisivo, para dar visibilidade à problemática indígena e demandou de igual maneira a estruturação em outros órgãos de espaços específi cos para tratar da questão indígena no âmbito estadual. Nesse contexto, a Secretaria de Estado 9 Antropóloga, Coordenadora de Proteção dos Direitos dos Povos Indígenas e Populações Tradicionais – CPPITA/SEJUDH-PA.

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de Saúde do Pará (SESPA) criou a Coordenação de Saúde Indígena e das Populações Tradicionais; a Secretaria de Educação (SEDUC) reestruturou a Coordenação de Educação Escolar Indígena; a Fundação Curro Velho (FCV) e a Secretaria de Meio Ambiente (SEMA) contrataram Assessorias Indígenas, na Empresa de Assistência Técnica (EMATER) e na Secretaria de Agricultura (SAGRI). A temática indígena foi inserida nos debates da agricultura familiar, com outros segmentos sociais.

O tratamento da questão indígena ampliou-se no âmbito dos órgãos de governo graças à atuação do Comitê Intersetorial de Política Indigenista, institucionalizado através do Decreto nº 2.358, de 24 de junho de 2010, com a fi nalidade de coordenar, acompanhar e avaliar as Políticas Públicas Indige-nistas do Estado do Pará. Essa atuação colegiada garantiu as seguintes metas: a implantação de ensino médio modular em escolas indígenas; a formação de professores indígenas em magistério; curso de arte e ofícios; erradicação do sub-registro nos povos indígenas Waiwai, Tunayana, Kaxuyana, Txikana; realização de casamento civil no povo Waiwai; implantação de casas de farinha e projetos produtivos nos povos Munduruku e Tembé; apoio para a implantação das reservas de vagas para indígenas na Universidade Federal do Pará (UFPA) e Universidade Federal do Oeste Paraense (UFOPA), a partir de 2010; execução do Projeto de Etnomapeamento e Etnozoneamento nas Terras Indígenas Trombeta Mapuera e Nhamundá Mapuera e a estruturação do Fundo Kayapó de proteção ambiental.

Ao nível da relação democrática e defi nição das políticas e diretrizes estratégicas de ações para o Governo Popular, realizou-se a I Conferência Estadual dos Povos Indígenas e a I Conferência Esta-dual e Nacional de Educação Escolar Indígena, assim como o I e o II Seminário de Direitos Indígenas e a I, II, III e IV Semana dos Povos Indígenas do Pará. Criou-se o Fórum dos Povos Indígenas do Pará e fomentou-se a participação dos seus representantes nas Conferências de Direitos Humanos, Juventude, Cultura e Mulheres, bem como no Conselho de Segurança Alimentar, Educação e de De-senvolvimento Rural Sustentável, além da Comissão Estadual de Floresta. Com a participação ativa das lideranças indígenas, elaborou-se de forma conjunta a minuta do Projeto de Lei para criar o Fun-do Estadual dos Povos Indígenas do Pará que consolida esse processo de interação e integração das Políticas Públicas Estaduais para a população indígena, a qual se encontra atualmente em processo de conclusão.

Os povos indígenas possuem um legado de humanidade importante para contribuir na constru-ção do Pará como uma Terra de Direitos e para superar os desafi os, entre eles, os confl itos fundiários, a violência física e contra o patrimônio material e imaterial, as invasões das terras, a exploração ilegal de recursos naturais, os danos ambientais e biológicos, o descumprimento da legislação. Todos esses problemas em maior ou menor proporção são vividos no cotidiano dos 50.000 mil indígenas do Estado.

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Em síntese, a construção coletiva das políticas públicas e de atividades dirigidas aos povos indí-genas é o que vamos tratar neste artigo, ou seja, os antecedentes da presença indígena no estado. Em seguida, como se deu a constituição da CPPITA e a construção da I Conferência Estadual dos Povos Indígenas, logo a defi nição dos instrumentos institucionais e a assinatura de acordos e parcerias para a execução das ações defi nidas na Conferência e fi nalmente, as conclusões, sugerindo ao Estado do Pará o caminho, para enfrentar e afrontar os desafi os, que permita saudar a dívida história com essa população milenar e ancestral, que estava e está neste território, antes da formação do Estado-Nação.

O Governo do Estado do Pará, seguindo as diretrizes éticas e políticas da transparência e demo-cracia, procurando formular e executar políticas públicas para a construção de um Pará para Todos (as), considerando a diversidade étnica e cultural da população do estado da qual fazem parte os povos indígenas, propôs a construção coletiva da Política Indigenista do Estado do Pará, em que participam atores sociais e políticos das esferas governamentais nos âmbitos municipal, estadual e federal, bem como as organizações da sociedade civil indígena, em que se consolidam os espaços e as ações de defesa, proteção e promoção dos direitos humanos e indígenas no Estado.

Desde o início deste governo, avanços signifi cativos são vistos na relação entre Estado e a so-ciedade civil indígena. A partir de abril de 2007, com a realização da Semana dos Povos Indígenas do Pará, feita em parceria com o Governo Federal e organizações indígenas locais, em que participaram representantes de 36 povos indígenas e foi possível elaborar a “Carta dos Povos Indígenas”10 , com 60 (sessenta) proposições relativas aos problemas nas áreas da educação, saúde, infraestrutura, proteção e valorização do patrimônio cultural, sustentabilidade econômica e geração de renda, proteção e gestão territorial. Assim como, criou-se o Fórum dos Povos Indígenas do Estado do Pará, composto por 14 (catorze) representações indígenas, das 08 (oito) regiões do estado, legitimadas a dialogar com o Go-verno e defi nir as questões indígenas.

Frente a essa força política, o Governo do Estado comprometeu-se imediatamente em atender as reivindicações apresentadas pelos povos indígenas. E mesmo considerando que a maior parte delas era de competência do Governo Federal determinou que se constituísse um Comitê Intersetorial para responder aos 60 pleitos suscitados na Carta Indígena. O comitê foi organizado na Câmara de Defesa Social, a qual se responsabilizou pelo mapeamento dentro da esfera administrativa de governo, os ór-gãos responsáveis para responder as demandas indígenas. A partir de reuniões, identifi caram-se e defi -

10 A Carta dos Povos Indígenas é o subsídio principal para elaboração do Plano Pará Terra de Direitos Indígenas

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niram-se os responsáveis e executores para cada uma das propostas. Quarenta e dois órgãos estaduais participam desse esforço e assumiram responder com ações os problemas apresentados. O resultado dessa ação foi entregue aos líderes indígenas na I reunião do Fórum Indígena em setembro de 2007.

O Governo consciente das responsabilidades e limitações quanto às atribuições legais do trato com as questões indígenas, criou um espaço de interlocução com os povos indígenas, no âmbito da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos, a Coordenadoria de Proteção dos Direitos dos Povos Indí-genas e Populações Tradicionais (CPPITA), com a responsabilidade de desenhar, coordenar, formular e executar as políticas públicas de proteção e reparação dos direitos humanos dos grupos socialmente vulneráveis, como os povos indígenas. Essa Coordenadoria está responsável em conjunto com os ou-tros órgãos e a sociedade civil indígena pela construção dos instrumentos legais que formam a Política Estadual dos Povos Indígenas.

Constituem-se partes integrantes do documento da Política Estadual dos Povos Indígenas os seguintes pontos: Conferência Estadual dos Povos Indígenas, como espaço político, democrático e popular de debate e defi nição das diretrizes que norteiam as Políticas do Estado dirigidas aos povos in-dígenas; O Conselho Estadual dos Povos Indígenas, órgão de acompanhamento, orientação e controle social das políticas de Estado; o Plano Estadual dos Povos Indígenas, desenho dos objetivos, metas e ações prioritárias para atenção aos indígenas em suas aldeias e comunidades; e o Fundo Estadual dos Povos Indígenas – defi nição de recursos fi nanceiros alocados para atender diretamente as ações dirigidas a essas populações.

O marco legal institucional apresentado é signifi cativo e estratégico neste cenário de completa ausência de lei que ampare os povos indígenas do nosso estado. Os instrumentos da Política de Esta-do para os povos indígenas propostos respondem à necessidade de se garantir no âmbito do Estado às condições institucionais para atender essas populações e tentar garantir dessa forma a reversão do quadro de violação e desrespeito aos seus direitos: consuetudinários, imprescritível, inalienáveis e ine-gociáveis como reza a Constituição Federal. Assim como, o Estado do Pará e a sociedade se colocam a frente para saldar a dívida histórica com essa população.

1.2.1 A Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos - SEJUDH

A promoção da justiça aos segmentos marginalizados historicamente no Estado do Pará remonta a meados do século XX, por meio da criação da Secretaria de Estado de Interior e Justiça, através da Lei nº. 400, de 30 de agosto de 1951.

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Em 1982, essa secretaria passou a ser denominada de Secretaria de Estado e Justiça, por meio da promulgação do Decreto nº. 996 de 16 de abril. E através da Lei nº. 6.178, de 30 de dezembro de 1998 passa a ser denominada de Secretaria Executiva de Justiça.

No contexto do governo popular e democrático, houve uma reformulação nas diretrizes e práti-cas dessa secretaria, ou seja, o governo petista instituiu, em sua gestão, a promoção, proteção e repa-ração dos direitos humanos no estado, atribuindo essa competência à Secretaria Executiva de Justiça, passando então a denominar-se Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos (SEJUDH), através da Lei nº. 7.029, de 30 de julho de 2007.

Desde então, coube à Diretoria de Direitos Humanos a competência básica de fomentar o es-tudo, o planejamento, a execução, o controle e a avaliação dos assuntos relativos às ações de Direitos Humanos e Cidadania, sob responsabilidade da SEJUDH, atendidas as diretrizes da Política Nacional de Direitos Humanos.

E a questão dos povos indígenas do Pará e das populações tradicionais foi direcionada para a Coordenadoria de Proteção dos Direitos dos Povos Indígenas e Populações Tradicionais – CPPITA, que tem realizado um trabalho voltado para a promoção da justiça social, da cidadania e das garantias dos direitos dos povos indígenas e populações tradicionais do Pará.

1.2.1.1 Os Povos Indígenas do Estado do Pará

a) Caracterização dos Povos Indígenas do Pará

Os povos indígenas do Pará estão localizados em vários municípios paraenses, sua presença nem sempre se identifi ca com fronteiras municipais. Secularmente as populações indígenas do Pará foram marginalizadas e inclusive invisibilizadas nas ações governamentais do Estado, consolidando um fl agrante desrespeito aos seus direitos como povos originários desta terra. Esses povos vivem em diferentes contextos: ● comunidades e povos indígenas que nunca receberam benefício social do Estado, mesmo possuindo

identidade indígena;

● aldeias se tornando cidades, cidades adentrando nas aldeias, aproximando sociedade não indígena dos povos indígenas, sobrepondo seus territórios, gerando confl itos envolvendo madeireiros, pos-

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seiros e colonos, o que vem contribuindo para a perda da diversidade de produtos, difi cultando a continuidade das atividades básicas de agricultura e coleta dos indígenas;

● povos e comunidades não contactados (autônomos), que deveriam ser protegidos através das garan-tias do acesso e conservação dos recursos naturais dos quais dependem suas vidas.

Para um detalhamento dos povos indígenas do Pará o quadro 1 mostra a listagem por represen-tação regional e municípios de abrangência.

Nesse processo de mobilidade social e territorial, a mudança de ambiente gera novas situações, entre as quais a de indígena “citadino” ou “urbano”. Essa presença no cotidiano urbano faz com que o indígena deixe de ser atendido como tal e passe a ser visto como “não indígena” e fi cando alijado das garantias institucionais e de seus direitos.

A classifi cação ofi cial distintiva no que diz respeito ao local onde os grupos e/ou os indivíduos habitam viola frontalmente as disposições legais constitucionais e de direitos humanos como o direito à liberdade de ir e vir, bem como o de autodeterminação dos povos, presentes na CF 88 e na Con-venção 169 da OIT, respectivamente, uma vez que ser indígena independe do local geográfi co que o mesmo esteja ocupando temporariamente, o que conta é a sua identidade e o povo.

Os índios não contactados como é o caso dos Zo’é, no oeste do Estado, representam uma parcela importante da população indígena, pois necessitam de proteção especial por parte dos estados, em virtude de sua fragilidade física e cultural.

Esses povos sempre existiram e, em outros tempos, não se permitiram autoidentifi car como indígena/povo e somente agora, com a abertura política, segurança jurídica, respeito à diversidade, esses grupos se apresentam com suas danças, crenças, músicas, bebidas, comidas originárias e exigem a atenção aos seus direitos, como o caso dos 13 povos do Oeste do Pará11.

11 A região Oeste do Pará ou Baixo Amazonas, em especial a região de confl uência do Rio Amazonas e Tapajós, onde se situa a cidade de Santarém, foi estrategicamente utilizada como en-treposto e controle, tanto pelos indígenas como pelos colonizadores. Da confl uência do Tapajós e Amazonas, se pode ir até aos Andes ou ao Planalto central. Nessa região, se organizaram 12(doze) missões religiosas, locais de aprisionamento para onde foram conduzidos os indígenas “resgatados” nos “descimentos” vindos dos rios Solimões, Madeira, Negro, alto tapajós entre outros. As missões foram o espaço de convivência interétnica e de miscigenação indígena. Com a expulsão dos religiosos Jesuítas e a desestruturação das missões, pelo Diretório de Pombal e o resgate e a entrega das terras das missões para as juntas paroquiais (atuais municípios). As unidades familiares constituídas tiveram dois caminhos, ou vieram morar nas vilas e servi de mão-de-obra para os colonos, ou foram viver nos morros (platô), onde fi zeram suas colônias ou sítios como são conhecidos atualmente, Outros se embrenharam na mata e foram viver den-tro da fl oresta. Essa população desestruturada socialmente, alijada do povo, e tiradas do seu território, viveram se escondendo do Estado, particularmente, depois da Cabanagem. Esse povo foi registrado na literatura como Tapuia, ou seja, outro povo, quem não era Tupinambá, era Tapuia. Povo de origem desconhecida, contudo, Povo originário, indígena herdeiro da sabedoria ancestral dos povos antigos. A Cabanagem é o colapso da identidade indígena, já que é sobre os indígenas de origem Tapuia que vai recair toda a repressão do Estado e estes povos caem de vez no anonimato e se tornam para todos os efeitos “caboclos”. Contudo, jamais deixaram de realizar suas praticas culturais e até hoje seguem fazendo dos derivados da mandioca a dieta alimentar, do Tauari sua espiritualidade e elevação ao sagrado, do puxirum sua coesão social e da putahua sua forma de estreitar relações sociais. Enfi m são indígenas.

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Quadro 1 - Relação de municípios paraenses com populações indígenas.Fonte: Coordenadoria de Proteção dos Direitos dos Povos Indígenas (2008).

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b) As Organizações indígenas no Pará

As populações indígenas estão atualmente seguindo a tendência de outros grupos sociais e for-mando organizações indígenas do tipo ocidental. O Estado conta com um número signifi cativo de organizações políticas, como associações e conselhos que representam os povos. A grande maioria é de representação de um povo ou aldeia, como podemos observar no quadro abaixo:

ORGANIZAÇÕES INDÍGENAS NO ESTADO DO PARÁ

AGITASE – Associação do Grupo Indígena Tembé da Aldeia Sede; ADATTARG – Conselho das Aldeias Tembé do Triangulo do Alto Rio Guamá; AGITARGMA – Associação do Grupo Indígena Tembé do Alto Rio Guamá; APIM - (KETAKRONOMACHO) Associação dos Povos Indígenas do Mapuera; APITIKATXI – Associação dos Povos Indígenas Tiriyó, Kaxuyana E Txik’yana; APITU – Associação dos Povos Indígenas do Tumucumaque; AIPAT – Associação dos Indígenas Asurini do Tocantins; AIPAS - Associação Indígena do Povo Surui Aikewara da Aldeia Sororó; HITOTI – Associação das Mulheres Indígenas Parkatêjê; CITA – Conselho Indígena Tapajós e Arapium; METINDJA – Associação do Povo Kayapó de Redenção; PUSSURU – Associação Indígena do Povo Munduruku; ABEMOKÁ – Associa-ção Indígena do Kayapó; AIJAKG – Associação Indígena Jaepya Aradu Kariwassu Guarany; APIKUX – Associação do Povo Indígena Juruna do Xingu Km 17; ACOJUPA – Associação da Comunidade Juruna do Paquiçamba; AMJIP – Associação Indígena Parkatêjê Amjip Tar Kaxuwa; AIMA – Associação dos Índios Moradores De Altamira; AIPC – Associação Indígena do Povo Kuruaya; INSTITUTO – União Indígena Kayapó Xiprôtikre; TUTO POMBO – Associação Indígena Tuto Pombo; AIPAC – Associa-ção Indígena do Povo Anambé do Cairari; AIPAC – Associação Indígena do Povo Anambé do Cairari; ATESAMPA – Associação Indígena Tembé de Santa Maria do Pará; APITEMBÉ – Associação do Povo Indígena Tembé da Aldeia Tekohaw; ASSOCIAÇÃO INDÍGENA – Te Mempapytarkate Akratikatêjê da Montanha; FORUM DOS POVOS INDÍGENAS DO ESTADO DO PARÁ

É importante observar que apesar de o Estado reconhecer a organização social dos Povos Indí-genas, as mesmas não são reconhecidas juridicamente como tais, ou seja, para que sejam consideradas como representantes legais e se registrem nos cartórios, precisam adotar a mesma estrutura sindical. Em outras palavras, os estatutos, atas, assembleias indígenas são todas no estilo ocidental.

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c) Situação Territorial

Aos povos indígenas “são reconhecidos sua organização social, costumes, línguas, crenças e tra-dições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”. (CF. Art. 231). Sendo permitido o usufru-to exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes. Os Direitos sobre as terras in-dígenas são: inalienáveis, indisponíveis e os direitos sobre elas imprescritíveis, de acordo ao que afi rma a Constituição Federal, Capítulo VII – “DOS ÍNDIOS” – Art. 231 e 232, “São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições”.

O Estado do Pará ocupa o segundo lugar como o estado da federação brasileira que mais con-centra terras indígenas em seu território. De acordo com os dados da Fundação Nacional do Índio12 a situação fundiária das terras indígenas no Estado do Pará, aponta a seguinte realidade: 77 (setenta e sete) terras ofi cialmente registradas. É importante ressaltar que a ausência de reconhecimento de determinadas áreas indígenas ou ainda, a morosidade nos processos de identifi cação, demarcação e homologação destas terras, torna as mesmas vulneráveis as ameaças de fazendeiros, invasores, de grandes empreendimentos e interesses políticos. Uma vez que os territórios indígenas se encontram em áreas de importante relevância biológica e recursos hídricos, faunísticos, fl orísticos e minerais, cujo valor econômico tem gerado assédio, confl itos fundiários e violações aos direitos socioculturais garantidos por lei.

Por outro lado, a exploração da riqueza existente nas Terras Indígenas não tem se revertido em benefícios para esta população, ou seja, com a ausência de serviços públicos, chegamos a encontrar situação de extrema pobreza, sem falar no aumento da violência e morte de lideranças que lutam por seus direitos, como é o atentado sofrido pelo Cacique Odair Borari do CITA do Município de Santa-rém.

As terras indígenas em área de fronteiras, também é uma situação preocupante, particularmente com a construção das unidades de vigilância próximas as aldeias, exemplo disso é a base do exercito nas proximidades da Missão Tiryó. Essas unidades devem se localizar distantes das aldeias indígenas, inclusive coibir o envolvimento de militares com as mulheres indígenas.

12 Fonte: Diretoria de Assuntos Fundiários- Fundação Nacional do Índio- FUNAI/2007.

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d) Situação Linguística

A realidade linguística vividas no país é extremamente diversa, o que se conhece é de que temos en-torno de 180 idiomas indígenas, 41 famílias, dois troncos linguísticos e 10 línguas isoladas. Essa riqueza sociolinguística e vista também no Estado do Pará, com 57 Povos indígenas, falantes de 27(vinte e sete) línguas maternas, distribuídos nos seguintes troncos linguísticas: Karib, Jê e Tupi Guarani. Com raras ex-ceções todos se comunicam também na língua portuguesa. A seguir podemos identifi car os troncos e os idiomas de cada povo.

O idioma é o diacrítico de fundamental diferença entre os povos. Portanto, é responsabilidade do Estado organizar um estudo aprofundado sobre as línguas indígenas, juntamente com as instituições científi cas como o Museu Paraense Emílio Goeldi e apoiar em defi nitivo os indígenas na manutenção desse patrimônio imaterial que servirá para essas e as futuras gerações.

1.2.2 Patrimônio Cultural Indígena

Os povos indígenas do Pará são de origem milenar e sabedoria ancestral, detêm vasto e rico patrimônio sociobiodiverso, os quais podem ser vistos nas línguas, cantos, danças, estórias, comidas, bebidas, rituais, educação indígena, saberes, técnicas, esporte, lazer, inovações e as ciências de manejo do universo material e espiritual de cada povo. Essa forma distinta de ser, é vista no cotidiano dos 57 (cinquenta e sete) povos existente no nosso estado. Esses saberes e ciências foram ensinados de forma oral de geração a geração pelos fi lhos dos netos dos antepassados indígenas.

Passados quatro séculos de colonização e desocupação dessas terras pelos povos originários, os estudos arqueológicos na região da Pedra do Ererê, em Monte Alegre, Taperinha, Vera Paz e Parahua, em Santarém, comprovam a ocupação humana milenar deste estado e nos situa na categoria de “berço da humanidade amazônica”, pois temos a maior concentração de sítios arqueológicos do país, um total de 111(cento e onze) já catalogados em todo o território paraense.

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Quadro - Tronco e Línguas dos Povos Indígenas do Pará.Fontes: Povos Indígenas no Pará - Programa Raízes; Livros: Povos Indígenas do Brasil (CEDI) e Livro; A Temática Indígena na Escola (MEC/MARI/UNESCO).

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Essa matriz de formação cultural é também étnica, as quais conectam os povos indígenas a natu-reza e ao território nos milhares de invernos e verões em que se produziram: os sambaquis do Marajó, as cerâmicas de Santarém, a domesticação da mandioca, a produção de alimentos, o uso racional do fogo; a linguagem nas fi guras rupestres desenhadas nas pedras nos diversos sítios arqueológicos a céu aberto nas terras pretas de índio; a ciência de pintar cuias em Santarém; os trançados em palha do Ara-pium e Lago Grande do Curuai; o manejo da seringa, da balata e a sabedoria do manejo do universo espiritual com o uso do Tauari, empregado para descobrir e curar as doenças do espírito e do corpo.

Com uma história de contato comum os 57 povos indígenas paraenses possuem realidades dis-tintas com relação ao seu patrimônio cultural o qual se vê ameaçado pela exploração comercial da bio-diversidade, confl itos fundiários, utilização irracional dos recursos naturais, localização das terras indí-genas junto às cidades, inserção de novos hábitos e valores diferentes nas comunidades indígenas, e a falta de alternativas econômicas contribuem para o desequilíbrio cultural de vários povos no Estado.

Apesar da clareza da lei em conferir aos povos indígenas a titularidade sobre o seu patrimônio cultural e a utilização por terceiros de seus bens culturais – imateriais ou materiais – mediante con-sentimento prévio fundamentado e repartição justa e equitativa dos benefícios, os povos indígenas do Pará vem sofrendo violações constantes em seu patrimônio cultural. As violações se dão principal-mente através do ingresso de terceiros em suas terras sem autorização, a captura de imagens e som feitos sem autorização prévia, a utilização dos grafi smos, pinturas corporais e outros elementos de forma desordenada para fi ns econômicos, sem que os donos dessas artes participem dos benefícios. Estas agressões ferem na maioria dos casos, crenças e costumes indígenas.

Reconhecendo a importância dos valores, práticas e inovações indígenas, o marco legal da política nacional e internacional busca proteger os conhecimentos coletivos indígenas, dessa forma obede-cendo ao mandamus constitucional inseridos no artigo 231 da CF 88, o Brasil é hoje parte signatária de tratados internacionais que exigem a proteção do patrimônio cultural/ambiental, entre os quais: a Convenção sobre Diversidade Biológica, a Convenção sobre Diversidade Cultural, o Convênio 169 da OIT e a Declaração dos Povos Indígenas das Nações Unidas, dando ênfase ao registro para salvaguar-dar os direitos, entre os quais o autoral.

Contudo, essa discussão sobre o que se deve ou não registrar é um debate que deve se dar direta-mente com a participação dos principais interessados, os povos indígenas, pois as ciências e os conhe-cimentos utilizados por essas gerações vieram sendo construídos e aprimorados pelas gerações passa-das. Cada um colocando a sua contribuição, portanto são bens de produção coletiva, sem uma autoria individual. Nesse sentido, quando a lei salvaguarda o direito ao registro, com forma de proteção de

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45SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

um direito, com vista especialmente a repartição de benefícios ela está buscando principalmente dar créditos sobre a autoria do bem cultural, ou da informação sobre o uso da biodiversidade, ou seja, ela busca “o dono”. No caso dos povos indígenas esse dono não é um individuo e sim uma coletividade que pode ser um Povo ou mais de um Povo. Outra questão que deve ser discutida é o caráter de “do-mínio público”, passados os anos de exclusividade do conhecimento, o bem cultural registrado passa a fazer parte dos bens da humanidade em que qualquer indivíduo pode lançar mão. Esse fetiche da lei tem que ser entendida, discutida e se os povos quiseram lançar mão desses mecanismos de proteção para os seus conhecimentos que tenham claro as implicações presentes e futuras.

Apesar de contarmos com a presença de 57 povos indígenas, o Estado do Pará ainda não ocupa po-sição de destaque no que diz respeito à proteção e valorização do patrimônio cultural dos povos indígenas.

1.2.3 Sustentabilidade humana e territorial

Os povos indígenas, ao longo do seu devir histórico, aprenderam a viver tendo a natureza como sua principal aliada, em um processo que se denominou de “Sustentabilidade Humana”, a partir do conceito de sustentabilidade, entendido como o conjunto de práticas sociais, políticas, culturais, eco-nômicas e territoriais.

Os povos indígenas participam da economia há muitos séculos. Antes da chegada dos coloni-zadores ocorriam os intercâmbios interétnicos em que se trocaram produtos da cultura material e os saberes dos manejos da biodiversidade. Um exemplo desses intercâmbios é a difusão do uso da man-dioca e seus derivados para todo o território da Amazônia Legal. Outro exemplo desse tipo de trocas é o veneno das fl echas conhecido como Curare, registrado na cultura Tupaiu, que pode ser vista tam-bém sendo usado pelos indígenas Shuar do Equador. Com a chegada do colonizador e a destruição das populações e povos diminuiu o comercio intertribal e os indígenas passaram a produzir manter o projeto colonial.

Quando as Terras Indígenas não tinham limites, os povos se autossustentavam e a segurança ali-mentar estava garantida na rede de reciprocidade. As roças, orgulho de alguns povos, atualmente têm perdido em diversidade. Os quintais, ricos e diversos, abrigavam uma variedade de frutas, deixaram de existir nas aldeias. Os canteiros de hortaliças desapareceram, a chegada dos incentivos do Governo e a entrada dos projetos com fi m social, prejudicaram o uso ancestral da produção coletiva e a segurança alimentar foi sendo comprometida.

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A introdução de manufaturados exige a geração de renda para obtê-los. Dessa forma, nas terras indígenas, onde não se tem mais a riqueza ambiental, os indígenas procuram alternativas a partir da-quilo que eles produzem como os bens da sua cultura material, o artesanato em palha, fi bra, semente, barro, plumária. Esses são os mais utilizados para a geração de renda. Alguns grupos incentivados por projetos econômicos de ONGs e até mesmo do estado iniciam a produção de Mel como é o caso dos Surui, Munduruku, Tembé, outros licores e bombons de frutas tropicais com os Borari, a confecção de adornos diversos, com penas e sementes pelos Waiwai.

Dentro desse processo de sustentabilidade humana e territorial, um ponto crucial é a efi cácia nos processos fi scalizatórios para vigilância e proteção dos territórios indígenas, já que a difi culdade em realizá-los dar-se-á por muitos motivos, dentre os quais estão: a precariedade de recursos humanos e materiais da FUNAI, a extensão territorial de algumas terras e equipes de fi scalização compostas apenas pelos indígenas sem condições de coibir a invasão de terceiros. É necessário implantar equipa-mentos de fi scalização e monitoramento via satélite e treinar os indígenas para sua utilização.

1.2.4 Elaboração das Políticas Públicas Indigenistas do Pará

a) A I Conferência Estadual dos Povos Indígenas do Pará

Em 2007, o Governo do Estado convocou através de Decreto a I Conferência Estadual dos Po-vos Indígenas do Pará, com o objetivo de construir a Política Estadual para os Povos Indígenas com a proposição de ações, entre as quais, a criação do Conselho e do Fundo Estadual dos Povos Indígenas. Para tanto foi constituída uma Comissão Organizadora formada por representantes de órgãos de go-verno e dos povos indígenas.

A I Conferência contou com a realização de 07 (sete) Encontros Indígenas Regionais, em que se discutiram temas como Organização Social, Educação, Saúde, Gestão Territorial e Ambiental, Segu-rança Alimentar, Produção e Proteção do Patrimônio Cultural e onde foram eleitos os delegados para a Conferência Estadual. Na etapa estadual, na cidade de Belém, estiveram presentes 385 participantes, sendo 258 delegados, dos quais 170 indígenas, 09 delegados de prefeituras, 59 delegados de órgãos do Governo Estadual, 20 delegados de órgãos do Governo Federal e 126 convidados. Esforço coletivo de autoridades do Governo e líderes dos povos indígenas, em que se pactuou entre outras questões o pagamento da dívida histórica do Estado para com estes Povos.

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A I Conferência Estadual dos Povos Indígenas do Pará, com o tema, “a diversidade que faz a dife-rença”, realizada nos dias 07, 08 e 09 de Agosto de 2008, no Parque dos Igarapés, em Belém, marca o encerramento do processo de mobilização dos povos indígenas do Pará e dos poderes públicos fede-ral, estadual e municipal com a aprovação das Diretrizes da Política Estadual para os Povos Indígenas deste estado, com as quais se inicia etapa de concretização e consolidação das mesmas em Lei, a partir da criação do Grupo de Trabalho interinstitucional e intergovernamental para elaborar o Projeto de Lei que instituiria a política indigenista do estado.

Portanto, a I Conferência Estadual aprovou as bases políticas para a efetivação dos instrumentos de Políticas Indigenistas, tais como: Conferência, Conselho, Fundo, Plano e a Secretaria dos Povos Indígenas, como órgão executor com maior autonomia programática e fi nanceira, ou seja, se torna, portanto, a contribuição fundamental deste governo para com estas populações que passam a ter pre-sença como atores políticos, capazes de defender seus direitos e escrever per se sua história.

A realização da Conferência se deu de forma democrática e participativa através do diálogo franco e aberto entre o Governo e os representantes e líderes indígenas, iniciando pelos encontros regionais nas aldeias. Este diálogo se deu nos meses de maio a julho de 2008, em que se percorreram as 07 regiões do estado defi nidas pelo movimento indígena como área de integração e se realizaram 10 encontros, assim organizados: Regional Santarém, Aldeia Borari de Alter do Chão; Regional Oriximi-ná/Tumucumaque, aldeia central Mapuera, Aldeia Tiryó em Macapá; Regional Altamira, aldeia Juruna do Km 17; Regional Marabá/Tucuruí, aldeia Kyikatêjê; Regional Redenção, cidade de Ourilândia do Norte; Regional Belém, aldeia Sede do Povo Tembé; e Regional Itaituba, aldeia Sai-Cinza.

Nesses encontros, através de uma abordagem participativa, oportunizou-se a discussão dos pro-blemas que afetaram de forma distinta cada povo e aldeias, assim como se discutiu problemas com abrangência estadual, como aqueles que originaram a propositura das Diretrizes gerais da Política Estadual para os povos indígenas e o fortalecimento do movimento indígena do Pará.

Os encontros nas regiões ampliaram o nível de participação, ou seja, fi zeram com que um núme-ro maior de indígenas pudesse participar, pois, quando os eventos são realizados na capital, por ques-tões fi nanceiras, a participação se limita às principais lideranças, o que não acontece quando o evento é na sede do município ou mesmo nas aldeias, em que o número de participantes é expressivo e se pode contar com a presença de homens, mulheres, jovens, idosos, pajés, parteiras, caciques, capitães, lide-ranças, agentes indígenas de saúde, professores indígenas, membros de associações indígenas, chefes de postos da Fundação Nacional do Índio e membros das equipes da Fundação Nacional de Saúde.

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A I Conferência constituiu-se num momento importante de trabalho coletivo, envolvendo di-versos segmentos representativos de organizações governamentais das esferas federal, estadual e mu-nicipal e dos povos indígenas do Pará. Alcançamos o objetivo de garantir um diálogo e acordo entre os entes federativos que tem responsabilidade em lei de cuidar dos problemas que afl igem os povos indígenas deste estado.

Foi importante, reunir indígenas e não indígenas para discutir os problemas e apontar soluções. Na Conferência estiveram presentes 38513 participantes sendo 258 eram delegados e 170 Povos Indí-genas do Pará.

A participação dos delegados, convidados e observadores foi realizada de forma democrática, permitindo que todos pudessem manifestar durante as discussões as suas opiniões sobre as proposi-ções indicadas pelos povos indígenas do Pará nos Encontros Regionais. Para tanto, foram realizados os Grupos Temáticos de Trabalho, ocasião em que foram discutidos os seguintes temas: Educação, Saúde, Gestão Ambiental e Territorial, Cultura, Segurança Alimentar e Produção e Fortalecimento do Movimento Indígena. Nos grupos os delegados tiveram a oportunidade de aprofundar as discussões sobre as proposições dos povos indígenas.

Os resultados dos grupos temáticos de trabalho foram consolidados pelo Comitê de Redação no relatório preliminar, que foi integralmente discutido em plenária. As plenárias conduzidas a partir dos temas propostos na Conferência permitiram que os delegados indígenas e não indígenas apreciassem os resultados dos grupos temáticos de trabalho, e ao mesmo tempo, aprovassem as proposições apre-sentadas.

13 Representantes dos Povos Indígenas: Akratikatêjê, Amanayé, Anambé, Apalai, Arapium, Araweté, Asurini do Koatinemo, Atikum, Arara, Borari, Cara Preta, Kumaruara, Farur’woto, Gavião, Guajajara, Guarani, Hixkaryana, Juruna, Katwena, Kaxuyana, Kayapó, Kayapó Kararaô, Kyikatêjê, Kuruaya, Maytapu, Mawayana, Munduruku, Par-katêjê, Parakanã do Xingu, Surui Aikewara, Txaruma,Tapuia, Tembé, Txik’yana, Timbira, Tiriyó, Tunayana, Tupinambá, Waiwai, Wapyxana, Wayana, Wayãpy, Xowyana, Xerew, Xikrin do Djudjekó e Kateté e Xipaya; 20 delegados do Governo Federal: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diver-sidade - SECAD, Ministério Público Federal, Ministério da Justiça, Fundação Nacional do Índio de Brasília e Pará, UBM; 59 delegados do Governo Estadual: Casa Civil, Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos - SEJUDH, Secretaria de Estado de Saúde – SESPA, Escola Técnica do SUS - ETSUS, Secretaria de Estado de Agricultura - SAGRI, Secretaria de Estado de Educação - SEDUC, Secretaria de Estado de Meio Ambiente - SEMA, Secretaria do Estado de Cultura - SECULT, Secretaria de Estado de Assistência e Desenvolvimento Social - SEDES, Secretaria de Estado de Pesca e Aquicultura - SEPAQ, Universidade Estadual do Pará - UEPA, Companhia Paraense de Turismo - PARATUR, Central de Abastecimento do Pará - CEASA, Fundação Cultural do Pará Tancredo Neves - FCPTN, Fundação Curro Velho - FCV, Instituto de Artes do Pará - IAP, Escola de Governo - EGPA, Companhia de Saneamento do Pará – COSANPA, Instituto de Desenvolvimento Florestal do Pará - IDEFLOR, Conselho Estadual de Educação, Polícia Civil – Relação Sociedade e Delegacia do Meio Ambiente; 9 delegados do Governo Municipal: prefeituras Municipais de Breves, Belém, Colares, Itaituba, Jacareacanga, Marabá, Ourilândia do Norte, Paragominas, Redenção e Santarém. Foi registrada a participação de 126 convidados, representando organizações da sociedade civil: Conselho Condição Feminina, Conselho Indigenista Missionário - CIMI, Secretaria Extraordinária dos Povos Indígenas – SEPI/AP, União Evangélica Sul Americana – UESA- Ananindeua, Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira - COIAB, Associação das Mulheres - Ananindeua, União de Negros Pela Igualdade - UNEGRO - Belém, Universidade Federal do Pará – UFPA – Núcleo de Altos Estudos Amazônicos - NAEA, Missão de Observadores Militares - MOMEP, Cooperação Técnica Alemã - GTZ, Organização do Tratado de Cooperação Amazônica - OTCA, AMIBEV, Cia Tribos Ballet Teatro, Movimento Peconheira do Acará, ASBEMA, Associação dos Amigos da Ilha de Colares - AAICO, BPA, Associação Poré Kayapó, Museu Emílio Goeldi, SBT, GCI, Instituto Vitória Régia e Ordem dos Advogados do Brasil - OAB/PA.

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As proposições aprovadas em plenária durante a Conferência estão registradas logo a seguir. No entanto, convém mencionar que durante os debates foi destacado que a implementação das Diretrizes da Política Estadual dos Povos Indígenas do Pará, requer um grande esforço dos órgãos do Governo Estadual, e deste com as esferas Federal e Municipal, onde cada qual, num esforço de trabalho cola-borativo, desempenhe adequadamente as suas atribuições orientadas pelos princípios da responsabi-lidade e legalidade.

b) As Ações de Governo e os Povos Indígenas

O Governo do Estado do Pará reconhecendo, respeitando a diversidade e compreendendo o papel estratégico dos povos indígenas do Pará, como defensores do patrimônio ambiental e herdeiros das ancestralidades humanas destas terras paraense desenvolvem ações que visam promover a justiça social e a cidadania dos povos indígenas.

Ações realizadas

No período de 16 a 21 de abril de 2007 foi realizada a Semana dos Povos Indígenas, com o tema “Nós Indígenas” (em parceria com o Governo Federal). Encontro possibilitou que os povos indí-genas tiveram a oportunidade de se conhecer e o Governo de dialogar com cada uma das etnias presentes no Parque dos Igarapés, sede do evento;

Após a Semana dos Povos Indígenas foi construída e apresentada ao Governo do Estado do Pará, a “Carta dos Povos Indígenas” contendo 60 (sessenta) demandas nas diversas áreas – território, saúde, educação, proteção do patrimônio cultural;

Constituição do Fórum dos Povos Indígenas do Estado do Pará; Formação do Comitê Intersetorial de Políticas Públicas Indigenista do Estado do Pará; Criação da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos – SEJUDH em 2007; Realização da I Conferência Estadual dos Povos Indígenas; Criação da Coordenadoria de Proteção dos Direitos dos Povos Indígenas – CPPITA – Objetivos: coordenar, formular e executar as políticas públicas de proteção e reparação dos direitos humanos dos grupos socialmente vulneráveis, como os povos indígenas e as populações tradicionais. Através de programas, entre outros o Plano Pará Indígena;

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No Plano Pará Indígena estão traçadas as seguintes ações: a) Construir a Política Estadual dos Povos Indígenas; b) Realizar a Conferencia Estadual dos Povos Indígenas; c) Elaborar o Plano Estadual de sustentabilidade humana e territorial dos Povos Indígenas; d) Constituir o Conselho Estadual dos Povos Indígenas; e) Constituir o Fundo Indigenista Estadual dos Povos Indígenas;

Fundo Estadual dos Povos Indígenas - Elaboração da Minuta do Projeto de Lei; Termo de Cooperação Técnica – Celebrado em abril de 2009 entre o Governo do Estado do Pará e a Fundação Nacional do Índio – objetivo de estabelecer cooperação técnica, visando à implementação de ações no âmbito de educação, saúde, meio ambiente, cultura e fomento ao etnodesenvolvimento previsto no âmbito do Programa de Proteção e Promoção dos Povos Indígenas 2008-2011, nas áreas de: articulação de políticas de proteção e promoção dos Povos Indígenas; fomento e valorização dos Processos Educativos dos Povos Indígenas; Gestão Ambiental e Territorial das Terras Indígenas; Gestão e Disseminação das informações acerca da Temática Indígena; Preservação do Conhecimen-to dos Povos Indígenas; Promoção do Etnodesenvolvimento; Promoção do Patrimônio Cultural dos Povos Indígenas e Proteção Social dos Povos Indígenas.

l Memorando de Entendimento – Celebrado em novembro de 2009, entre a República Bolivariana da Venezuela e o Estado do Pará, para o intercâmbio de saberes e conhecimentos da cultura da mandioca entre os Povos Indígenas. Objetivando estabelecer a cooperação entre o Ministério do Poder Popular para os Povos Indígenas e o Estado do Pará sobre a troca de saberes e conhecimen-tos no processamento da mandioca e seus derivados. A partir das seguintes ações: realizar a rota da mandioca; trocar conhecimentos e experiência sobre a plantação e processamento da mandioca; promover o intercambio dos conhecimentos ancestrais dos alimentos e derivados do processamento da mandioca.

1.2.5 As controvérsias de uma realidade

Como se consigna discutir os problemas e ver a realidade, os membros da Comissão Organizado-ra fi zeram visitas aos órgãos que prestam serviços aos povos indígenas e também aos locais onde são atendidos os mesmos, entre eles as CASAIs (Casa de Apoio ao Índio). A partir do que se observou, podemos afi rmar que a riqueza sociocultural dos povos indígenas se contrasta com a falência dos serviços públicos oferecidos, pois estes, quando existem, não permitem aos mesmos viverem com dignidade.

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É possível afi rmar que os povos indígenas deste estado foram abandonados a sua própria sorte. O que existe de assistência é o mínimo que a FUNAI pode oferecer na área previdenciária e produtiva. A saúde, que poderia ser o ponto forte, já que existe o subsistema de saúde indígena, está fortemente prejudicada pela assistência terceirizada (ONGs sem capacidade técnica instalada) que não garante os direitos indígenas à saúde diferenciada e de qualidade.

No geral, a presença do poder público é inexistente nas aldeias. Não foi possível presenciar, na ocasião, nenhum órgão público cumprindo sua obrigação como determina a Constituição Federal. Estamos preconizando uma crise de competências entre as esferas de governo, que leva à inefi ciência da ação estatal quanto à oferta de políticas públicas adequadas aos padrões culturais dos povos indí-genas. O resultado disso é a violação dos direitos, a desestruturação sociocultural e a exclusão social dessa população.

No caso especifi co dos órgãos do Governo do Estado do Pará, em que pese terem assumido compromissos estabelecidos na carta dos povos indígenas de 2007, a constatação é de que nenhuma ação tem sido desenvolvida nas aldeias. A ausência do poder público, seja municipal, estadual ou fe-deral, faz com que os problemas se agravem assustadoramente, em particular na área de proteção das Terras Indígenas, que estão demarcadas, em sua maioria, e seguem sistematicamente sendo invadidas por terceiros, entre os quais: madeireiros, garimpeiros e, atualmente, colonos sem terra.

O que vimos e ouvimos durante os encontros regionais, indica que é fundamental a organização de uma força tarefa, envolvendo os órgãos das esferas federal, estadual e municipal para que de ma-neira urgente se inicie um trabalho de atenção aos direitos dos povos indígenas. Essa atitude deveria oferecer garantias de segurança, proteção e sustentabilidade a essa população, evitando, sobretudo, entre outros problemas o êxodo dos jovens para as cidades e o envolvimento desses com o alcoolismo e outros males, assim como o afastamento dos mesmos do convívio sadio de suas aldeias.

A situação exige que se empreendam medidas duradouras, a fi m de que estes povos tenham as condições sociais e econômicas para determinar sua reprodução física e cultural de acordo aos seus processos societários. Dessa forma somente de maneira coordenada, poderemos garantir a sobrevi-vência física e cultural destes povos, herdeiros das culturas ancestrais deste estado que guardam na sua historia a memória dos primeiros habitantes desta Nação.

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1.2.6 Conclusão

No âmbito nacional a reforma do Estado implementada no governo Collor (1989-1990) criou uma política pública descentralizada para atender a demanda indígena no país. Essa política causou a fragmentação do atendimento aos Povos Indígenas que antes era concentrada na Fundação Nacional do Índio. Assim, as ações de saúde e educação passaram a ser de responsabilidade do Ministério da Saúde - MS e do Ministério da Educação – ME respectivamente.

A ausência de políticas públicas adequadas interfere diretamente na realidade social, cultural, econômica e política desses povos e agravam os problemas nas áreas de saúde, segurança, educação fundamental, média, profi ssionalizante e universitária, o abandono pelos jovens dos usos e costumes dos antepassados indígenas, como a prática dos idiomas maternos, a segurança alimentar e geração de renda, a proteção do patrimônio material, imaterial, e da biodiversidade das terras indígenas e a utilização sustentável dos recursos naturais. Concomitantes a esses problemas estão também, à falta de reconhecimento dos territórios tradicionais, de demarcação e fi scalização de terras indígenas, que propicia a invasão e exploração predatória dos recursos naturais e da biodiversidade, assim como, o aliciamento e corrupção de lideranças indígenas por agentes econômicos antagonistas e a violência àqueles que lutam por seus direitos.

Outra situação igualmente preocupante é a diminuta participação dos Povos indígenas nas dis-cussões no âmbito do Poder Público, e em outras esferas da sociedade sobre assuntos que interferem diretamente nas condições de reprodução econômica e social desses povos.

O processo de consolidação da Política Estadual para os Povos Indígenas do Pará será efetivado com esforço conjunto de vários órgãos do Governo, que podem atuar por meio de parcerias estabele-cidas. Além desse fortalecimento institucional, o Governo do Estado se pautará nas reivindicações dos povos indígenas que foram citadas na I Conferência Estadual dos Povos Indígenas do Pará.

É primordial considerar os avanços ocorridos no contexto da institucionalização das ações do Estado do Pará e garantir que os Povos Indígenas tenham um espaço institucional que respeite e pro-mova os seus direitos. A Coordenadoria de Proteção dos Direitos dos Povos Indígenas, apesar de so-frer com a falta de recursos humanos, físicos e fi nanceiros, fez diferença na atuação do Governo junto à população indígena e outros atores sociais, consolidar esse espaço institucional, dotar de condições físicas e fi nanceiras, será fundamental como instrumento de acesso aos serviços públicos por parte dos povos indígenas, bem como continuar essa relação em que trata o indígena como cidadão pleno de direitos e não como seres inertes que precisam ser tutelados.

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Para concretizar a política de institucionalização da questão indígena no âmbito no estado, cabe realizar: o fortalecimento da Coordenadoria de Proteção dos Direitos dos Povos Indígenas, deixando de forma especifi ca; fortalecer os povos e comunidades indígenas, a partir de suas estruturas de poder ancestrais e a novas demandas ocidentais; fortalecer o Comitê Intersetorial de Política Pública Indi-genista, como órgão de planejamento e execução das ações do Governo como um todo para Povos Indígenas; executar o Programa Pará Indígena, a partir do Plano de Sustentabilidade Humana e Terri-torial dos Povos Indígenas nos seguintes eixos temáticos:

• Estruturar e consolidar a Política Pública Estadual dos Povos Indígenas; • Fortalecer e promover a segurança alimentar e nutricional e de acesso ao mercado para os produtos

indígenas; • Promover, proteger e revitalizar as atividades relacionadas ás praticas culturais, utensílios domésti-

cos, grafi smos, musicas, danças, idiomas, praticas de saúde e manejo de ecossistemas e uso sustentá-vel da biodiversidade indígena;

• Fortalecer a Gestão Territorial, Ambiental das Terras Indígenas, bem como garantir a proteção do patrimônio nela existente, a partir de sistemas modernos de controle e fi scalização;

• Fomentar a articulação, interlocução e capacitação sociopolítica dos Povos Indígenas, através do fortalecimento institucional e político de suas organizações;

• Garantir a seguridade social e o acesso aos programas de governos aos povos indígenas;

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54 SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

O Seminário “Situação Socioambiental das Terras Indígenas do Pará”, realizado em Belém no mês de junho de 2010, teve como objetivo discutir vários temas relacionados à questão indígena, vi-sando subsídios técnicos para a elaboração de políticas de gestão territorial e ambiental.

Neste contexto, colocamos para discussão o tema “Zoneamento Ecológico-Econômico do Es-tado do Pará e Terras Indígenas”, visto que tal Zoneamento Ecológico-Econômico é um instrumento de política pública para o ordenamento territorial de acordo com os conhecimentos técnico-científi cos das Ciências Ecológicas, Sociais e Econômicas, com a participação dos Poderes Públicos e da Socie-dade Civil Organizada.

A estratégia do Governo Federal, que norteia os zoneamentos regionais, estaduais e municipais foi organizada em 04 (quatro) grandes linhas:

01. Ordenamento Territorial e Gestão Ambiental, defi nindo escala de 1:5.000.000 para macro-zoneamento regional, escala de 1:1.000.000 para macrozoneamento estadual e escala 1:250.000 para zoneamentos detalhados;

02. Produção Sustentável; 03. Infraestrutura para o desenvolvimento 04. Inclusão Social e Cidadania. Atendendo as determinações de Governo Federal, o Macrozoneamento Ecológico-Econômi-

co do Estado do Pará, foi executado na escala de 1:1.000.000 e por questões técnicas, publicado nas escalas de 1:2.000.000 e 1:6.000.000.

A macroestratégia estadual foi dividida em 04 (quatro) itens, a saber: 01. Consolidar a fronteira produtiva já aberta, de forma a aumentar o índice de aproveitamento

do solo e do subsolo, permitindo a consolidação dos aglomerados humanos e reduzindo a velocidade da expansão para novos territórios;

02. Estimular a formação de cadeias produtivas através da verticalização da produção mineral, agropecuária e fl orestal;

14 Engenheiro Florestal, Diretor de Áreas Protegidas da Secretaria de Estado de Meio Ambiente-PA, e-mail: [email protected].

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03. Promover o desenvolvimento do turismo, contribuindo para a geração de emprego e renda.04. Desenvolver e difundir tecnologias alternativas para exploração sustentável dos recursos na-

turais.De acordo com essa estratégia, o pressuposto para a sustentabilidade seria a área de coincidência

dos objetivos sociais, econômicos e biológicos.As iniciativas de implementar o Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE) no Estado do Pará,

datam do início da década de 90 pelo Instituto do Desenvolvimento Econômico-Social do Pará (IDESP, extinto), sendo que o arcabouço institucional do ZEE foi assegurado em dois momentos. Primeiro na Constituição do Estado promulgada em 05 de outubro de 1989, no Capítulo VI, Artigo 254. O segundo momento data-se na homologação da Lei nº 5.887, de 09 de maio de 1995, que “Dis-põe sobre a Política Estadual do Meio Ambiente e dá outras providências”.

No ano de 1996, o Plano Estadual Ambiental atribuiu ao ZEE o papel de “instrumento norte-ador das políticas públicas e da iniciativa privada”, visando a “compatibilização do desenvolvimento econômico com a preservação e/ou conservação do meio ambiente”. E, em agosto de 1999, o Go-verno do Estado enviou ao Poder Legislativo, o Plano Plurianual 2000-2003 (Avança Pará) propondo a criação do Programa Zoneamento, Monitoramento e Gestão Ambiental Integrada, com a fi nalidade de orientar “o uso racional e sustentável dos recursos naturais, bem como a implantação de ações voltadas ao controle, à fi scalização, à defesa e recuperação do meio ambiente”.

Por meio do Decreto nº 3.888, de 31 de janeiro de 2000, o Governo coloca o Programa Zonea-mento, Monitoramento e Gestão Ambiental sob a coordenação da Secretaria Especial de Produção, cabendo à Secretaria Executiva de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente a execução do ZEE. O De-creto nº 5.200/2002 que alterou o Decreto nº 662/1992, instituiu a Comissão de Coordenação e Ar-ticulação Interinstitucional do Zoneamento Ecológico-Econômico do Estado. Em 2002, o Governo do Estado encaminhou ao Legislativo o Projeto de Lei contendo as diretrizes básicas para a realização do Zoneamento, que foi aprovada e sancionada como Lei n° 6.506, de 02 de dezembro de 2002.

Com base nas premissas desta lei, a SECTAM executou o Macrozoneamento Ecológico-Eco-nômico do Estado, com o objetivo principal de análises e discussões dos diversos segmentos da so-ciedade paraense, sempre visando à atualização e o aperfeiçoamento dos trabalhos para a geração de emprego e renda por meio da verticalização da produção, refl etindo na melhoria da qualidade de vida da população paraense.

O Macrozoneamento Ecológico-Econômico do Estado do Pará foi instituído por meio da Lei nº 6.745, de 06 de maio de 2005, em que no artigo 4º diz que a área territorial do Estado do Pará fi ca

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distribuída em quatro grandes zonas, defi nidas a partir de dados atuais relativos ao grau de degradação ou preservação da qualidade ambiental e à intensidade do uso e exploração de recursos naturais, sen-do 65%, no mínimo, destinados a áreas especialmente protegidas, distribuídos em 28%, no mínimo, para Terras Indígenas e Terras de Quilombos; 27%, no mínimo, para as unidades de conservação de uso sustentável e 10%, no mínimo, para as unidades de conservação de proteção integral. Destinando 35%, no máximo, para consolidação e expansão de atividades produtivas, e áreas para recuperação.

A zona de consolidação é formada pelos povoados, vilas, cidades, rodovias, ferrovias, portos, manejo fl orestal e de produtos fl orestais, agricultura, pecuária, mineração, etc. A zona de expansão pode ser usada tanto para consolidação como para conservação. A zona de recuperação apresenta diversos estágios de alteração do meio ambiente. Finalmente, a zona de conservação envolve as terras indígenas, as terras de quilombos, as unidades de conservação da natureza e áreas das forças armadas.

Em função da necessidade de obter informações mais precisas para subsidiar as políticas públi-cas, em particular sobre a questão da reserva legal, o Governo do Estado coordenou 02 (dois) Zone-amentos Ecológico-Econômicos detalhados, ambos na escala de 1:250.000. O primeiro dispõe sobre o Zoneamento Ecológico-Econômico da Área de Infl uência das Rodovias BR-163 (Cuiabá-Santarém) e BR-230 (Transamazônica) no Estado do Pará - Zona Oeste (Lei nº 7.243, de 9 de janeiro de 2009 - “ZEE - Zona Oeste”).

No ZEE - Zona Oeste, a “Zona de Conservação”, é composta pelas diversas categorias de áreas protegidas, existentes ou propostas, de uso sustentável ou de proteção integral, terras indígenas, ter-ritórios quilombolas e áreas militares, submetidas juridicamente a regime especial de proteção, assim como aquelas que por apresentarem elevada fragilidade natural, baixa potencialidade socioeconômica ou um alto valor ecológico, necessitando ser adequadamente protegidas. E, as fl orestas em áreas prote-gidas poderão ser consideradas em iniciativas do Estado, visando captação de doações ou de créditos, públicos ou privados, destinados à compensação pela redução de emissões de carbono por desmata-mento e degradação fl orestal e demais serviços ambientais nos termos do regulamento desta Lei.

O segundo zoneamento foi instituído por meio da Lei nº 7.398, de 16 de abril de 2010, denomi-nado “Zoneamento Ecológico-Econômico da Zona Leste e Calha Norte do Estado do Pará”. Deter-mina que as áreas de usos especiais sejam legalmente protegidas, relativas às terras indígenas, de do-mínio das forças armadas, territórios quilombolas e unidades de conservação existentes e propostas.

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Cada categoria das áreas de usos especiais representa uma zona de gestão submetida juridicamen-te a um regime especial de proteção. Com base nos dados, informações e diretrizes deste ZEE e em cenários de planejamento da paisagem, o órgão ambiental poderá, mediante resolução do COEMA estabelece critérios específi cos para a regularização dos passivos fl orestais de imóveis rurais para cada unidade de gestão territorial ou sub-bacia hidrográfi ca considerando entre outros, os elementos de produtividade e capacidade de suporte do solo e contiguidade com unidades de conservação, terras indígenas ou outras áreas protegidas.

Finalmente, pode-se afi rmar que Zoneamento Ecológico-Econômico é um dos melhores instru-mentos de política pública para organizar o espaço territorial, estabelecendo direitos e deveres, assim como delimita espacialmente as atribuições sobre a questão fundiária. Ordena o território de acordo com os conhecimentos técnicos científi co das ciências ecológicas, sociais e econômicas com a partici-pação dos poderes públicos e da sociedade civil organizada.

Então, o Estado do Pará está legalmente distribuído em 10,2% de sua área territorial como uni-dades de conservação da natureza de proteção integral; 22,7% são unidades de conservação de uso sustentável, onde destacamos que a Área de Proteção Ambiental do Arquipélago do Marajó está inse-rida neste percentual com 4,7% e que, devido suas particularidades, deve ser objeto de ordenamento detalhado. As terras de Quilombos alcançam aproximadamente 0,5% e as terras das Forças Armadas 1,8% (existem dados que vão de 2,8% a 5,5%). Assentamentos de reforma agrária alcançam aproxi-madamente 5,1%. Podemos inferir percentuais de 18% de terras privadas e 16,8% de terras devolutas ou em disputas. Os dados sobre Terras Indígenas no Estado do Pará (2007) declaram 67 (sessenta e sete) unidades, das quais 25 (vinte e cinco) encontram-se em estudos e 42 (quarenta e duas) Terras Indígenas estão declaradas (05), regularizadas (30), delimitadas (03) e encaminhadas como RI (04), alcançando 24,8% do espaço territorial paraense.

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O Estado do Acre conta com alta diversidade biológica e étnica (SOUZA et. al 2003; CUNHA, 2003). No território acriano vivem pouco mais de 15 mil indígenas (ACRE EM NÚMERO, 2009) pertencentes a 15 povos e falantes de idiomas de três famílias linguísticas. 1) Família Pano: Jaminawá, Jaminawa-Arara, Katukina, Kaxinawa, Poyanawa, Yawanawá, Nawa, Shawãdawa, Nukini, Shanenawa, Apolima-Arara e Kuntanawa; 2) Família Aruák: Ashaninka/Kampa e Manchineri; 3) Família Arawá: Madija/Kukina. (CUNHA, 2009).

São 37 Terras Indígenas reconhecidas pelo Governo Federal, das quais 28 são regularizadas com extensão agregada de 2.390.112 hectares, distribuídos em 11 municípios, correspondendo a 14,6% da extensão do Acre (ZEE/AC, 2006). Outros povos indígenas considerados “isolados” habitam e têm uso garantido em três TIs, localizadas principalmente nas fronteiras internacionais com o Peru.

Junto com as unidades de conservação de uso direto e de proteção integral de jurisdição federal e estadual, as Terras Indígenas integram o Sistema Estadual de Áreas Naturais Protegidas (SEANP), criado em 2001, através da Lei n° 1.426, e que se constitui em um mosaico contínuo de 7,4 milhões de hectares, distribuído sobre 45,7% da superfície total do Acre (ZEE/AC, 2006).

Desde 1999, o Governo Estadual tem procurado incorporar as demandas dos povos indígenas ao planejamento e execução de programas que conciliem o desenvolvimento sustentável do estado com a melhoria das condições de vida nas TIs, resguardando a diversidade cultural dos povos que nelas vivem.

Os estudos do Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE I Fase) resultaram em indicativos e prioridades do Governo Estadual para com os povos indígenas, dentre elas é válido destacar: a ne-cessidade de propiciar o mapeamento e a construção participativa do ordenamento sustentável de seus territórios, centrado na formação de atores indígenas e no apoio às demandas dessas populações (SOUZA et. al., 2009, não paginado).

15 Historiadora, Chefe da Divisão de Etnozoneamento-SEMA/AC,e-mail: [email protected] Engenheiro Florestal, Técnico da Divisão de Etnozoneamento-SEMA/AC. Email: [email protected]

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Com isso, desde o ano de 2004 até o presente, o Governo Estadual tem promovido ações de “et-nozoneamento” em oito Terras Indígenas impactadas pela pavimentação das BRs 364 e 317, a saber: (i) Mamoadate, (ii) Kaxinawá do Igarapé do Caucho, (iii) Katukina/Kaxinawá, (iv) Rio Gregório, (v) Cabeceira do Rio Acre (vi), Kaxinawá da Colônia 27 (vii), Katukina/Campinas e (viii) Jaminawa do Rio Caeté, iniciativa que contou com ativa participação das organizações indígenas, lideranças e dos chefes de família.

O etnozoneamento é um instrumento de diagnóstico e planejamento dos povos indígenas para a gestão dos seus territórios, elaborado de forma participativa com o intuito de contribuir para a autonomia indígena (LITLLE, 2006). Esse instrumento procura respeitar a diversidade cultural e as especifi cidades de cada povo, desde a coleta e sistematização de informações, consideradas relevantes pelos próprios indígenas para o processo de gestão dos seus territórios.

Na fase I do Etnozoneamento, realizada no período de 2004 a 2007, dentre os principais produ-tos, foram elaborados, de cada terra trabalhada, mapas temáticos, relatórios sínteses e indicativos do plano de gestão.

Todas as TIs elaboraram oito mapas temáticos: recursos hídricos, ocupação humana, histórico, caça, pesca, vegetação, extrativismo e ameaças, demonstrando a situação dos recursos naturais exis-tentes nas terras e em seu entorno. Os mapas foram gerados a partir de informações coletadas pelos indígenas sobre as bases cartográfi cas e imagens de satélites durante as ofi cinas de etnozoneamento.

Para a coleta das informações e geração desses mapas, foram realizadas ofi cinas específi cas nas comu-nidades, segundo roteiro metodológico proposto, que prevê desde a fase preparatória à sistematização fi nal dos produtos. Inicialmente são realizadas pesquisas bibliográfi cas e estudos sobre cada etnia a ser trabalha-da, além da confecção das bases cartográfi ca em escalas de 1:50.000 e 1:80.000, dependendo da extensão do território indígena e cartas imagens de satélites. Com esses materiais, são realizadas ofi cinas nas aldeias. A primeira tem sempre o objetivo de disponibilizar informações, debater a importância do etnozoneamento e obter a anuência prévia das comunidades para realização dos etnozoneamentos. Em uma segunda ofi cina são realizada coleta de informações e elaborados os mapas.

O primeiro mapa a ser elaborado é o de recursos hídricos, por conter informações que servem de referenciais geográfi cos para os povos e TIs. A partir desse mapa são elaborados os demais: caça, pesca, extrativismo, ocupação histórica, vegetação, ocupação humana e ameaça ou vulnerabilidade da terra indígena. (CORREIA et. al., 2006, em fase de elaboração)17.

17 Etnozoneamento das Terras Indígenas Katukina/Kaxinawá, Rio Gregório, Igarapé do Caucho, Katukina/Kaxinawá, Rio Gregório, Igarapé do Caucho, Kaxinawá da Colô-nia 27 e Jaminawa do Rio Caeté. De autoria de CORREIA, C. S.; PIMENTA, José; MACIEL Ney; AQUINO, Terri; PEREIRA, Valéria, a ser editado pela SEMA/AC, 2006.

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Prancha 01: Gestão de Terras Indígenas no Acre.

Mapa de Ameaças da TI Katukina Kaxinawá – Povo Indígena Shanenawa.

Lideranças Indígenas elaborando mapa do Etnozonea-mento da TI

Entrega do Plano de Gestão da TI Igarapé do Caucho ao Governo do Acre

Fonte: Divisão de Etnozoneamento da SEMA/AC, 2006-07 e 2009.

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Com o fi nal da primeira ofi cina e a coleta de informações são elaboradas as versões prelimina-res dos mapas e relatórios, com digitalização das informações levantadas pelos indígenas nos mapas temáticos. Concluída essa fase de escritório, é organizada uma segunda ofi cina nas aldeias como ativi-dade complementar e corretiva, para sanar quaisquer equívocos na digitalização e sistematização das informações.

É nessa ocasião que são realizadas as primeiras discussões sobre os Planos de Gestão Territorial e Ambiental das terras com debates conceituais e construção participativa dos indicativos do Plano. Vale ressaltar que as atividades são permeadas de apresentações e debates entre as comunidades que possibilitam o aprofundamento das questões relacionadas à gestão territorial.

Na segunda fase, ocorre o Etnozoneamento, que consiste em um aprofundamento dessas discus-sões de gestão territorial e ambiental, tendo como objetivo a elaboração do Plano de Gestão Territo-rial e Ambiental, a partir dos produtos da primeira fase.

No contexto do Acre, no ano de 2008, foram devolvidos as 8 (oito) terras indígenas aos produ-tos da I Fase do Etnozoneamento, quando cada aldeia recebeu um kit, contendo os mapas temáticos impressos em formato banner, relatórios e sínteses e CDs com imagens e depoimentos das ofi cinas. Essa etapa permitiu que as comunidades se apropriassem dessas ferramentas, tanto para mobilização interna como para as articulações com parceiros.

Em 2008, com a devolução dos mapas do etnozoneamento das Terras Indígenas, Campina/Ka-tukina, Katukina/Kaxinawa e Cabeceira do Rio Acre foram elaborados os Planos de Gestão dessas terras por uma equipe interinstitucional, composta por representantes de várias secretarias de Estado. Em 2009, com apoio de uma consultoria da GTZ, foram elaboradas diretrizes e um roteiro metodoló-gico para construção de Plano de Gestão de Terras Indígena no Acre, em uma experiência particular com ampla participação de representantes da Terra Indígena Igarapé do Caucho.

A metodologia tornou o processo mais participativo e autônomo possibilitando a inclusão de atores locais (velhos, mulheres e outros) que antes estavam de fora das grandes reuniões nas Terras Indígenas.

A nova estratégia conta com 03 (três) etapas para a conclusão do processo. Na primeira etapa, são realizadas pequenas reuniões individuais por aldeias e com a organização de representação da Terra Indígena para: debates e esclarecimentos sobre os conceitos de plano, Gestão de Territorial e de meio ambiente; esclarecimento do processo de construção do plano e defi nição de agenda, das ativi-dades; escolha dos monitores indígenas (orientadores e relatores para as atividades).

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Na segunda etapa, são realizadas reuniões internas das aldeias conforme calendário construído e sem participação de terceiros (técnicos da SEMA ou consultores). Ocorre somente o apoio da própria organização da Terra Indígena. O andamento dessas reuniões é acompanhado pela SEMA, por meio de e-mail, telefone e visitas esporádicas na TI para esclarecimentos e motivação. A terceira etapa con-siste na sistematização dos resultados das reuniões individuais das aldeias e realização de uma plenária geral da Terra Indígena para debate das propostas construídas pelas aldeias, consolidando na pactua-ção dos acordos e atividades dos Planos de Gestão Territorial e Ambiental.

Os planos de gestão resultam em documentos de registro dos acordos coletivos sobre o uso e ex-ploração econômica dos recursos naturais, do conjunto de demandas básicas de cidadania, visando o planejamento e a normatização do uso do território, para alcançar os objetivos de sustentabilidade do povo ou comunidade (MACIEL, 2010). Os Planos têm servido como instrumento para que as comu-nidades indígenas organizem suas ações de manejo e de conservação de recursos naturais, de vigilância e fi scalização dos limites e construção de diálogos com instituições de governo e outros atores sociais do entorno. Como afi rmam as lideranças indígenas:

O plano de gestão é um pensamento nosso para cuidar da nossa terra. E dos nossos recursos na-turais. É uma forma de assegurar os nossos recursos naturais para não acabar e para cuidar do espaço onde vivemos.

Também ele (Plano de Gestão) vai servir para planejarmos e encimarmos a fazer a criação e o ma-nejo dos animais silvestres. Para isso acontecer, precisa da união de nós índio e dos governos federais, estaduais e municipais e instituições não governamentais que trabalham com técnica e conhecimento na produção de alimento, apoio fi nanceiro e humano, porque acreditamos sempre se trabalha melhor com mais parceria.18

Dentre os temas tratados nos Planos constam os recursos fl orestais/fl orísticos, caça, pesca, cria-ção e manejo de animais domésticos, silvestres e piscicultura, roçados, sistemas agrofl orestais, ex-trativismo, inseridas em propósitos de conservação e geração de renda para sustentabilidade bem como ações prioritárias nas áreas de saúde, educação, transporte, formação de recursos humanos e de fortalecimento institucional das organizações de representação indígena, tendo diferentes ênfases (MACIEL, 2010).

A partir dessas iniciativas, o Governo tem estruturado a política de gestão territorial e ambiental para as TIs, baseada no fortalecimento da autonomia dessas populações. Vale salientar que a referida política incorpora uma mudança de paradigma nas relações do Estado com os povos indígenas. Na 18 Reprodução da fala de Manoel Gomes Kaxinawa, liderança da T.I. Kaxinawa da Colônia 27.

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elaboração e implementação dos projetos de gestão das comunidades, o Estado se constitui enquanto parceiro. As ações nas Terras Indígenas passam pelo princípio da gestão territorial e ambiental, arti-culadas entre si e trabalhadas em suas interfaces. Assim, quando são pensadas ações de educação, esta atua em interface com a saúde, a formação de recursos humanos, a conservação e o uso sustentável dos recursos, a fi scalização, a vigilância dos limites e o fortalecimento cultural das comunidades inse-ridas em um projeto maior das comunidades, de gestão do seu território.

Toda esta política de gestão está envolvida numa dinâmica de formação e fortalecimento de ca-pacidades para implementação dos Planos de Gestão Territorial e Ambiental, que compreende desde a contínua formação dos Agentes Agrofl orestais, principais animadores e mediadores do processo de gestão territorial, à criação de cursos para lideranças indígenas e técnicos do quadro governamental (gestão ambiental, territorial, antropologia, etc.), capacitações, seminários, intercâmbio com outras experiências de gestão territorial ambiental e estruturação de um processo didático pedagógico para formação das futuras gerações.

Atualmente as TIs, que passaram pelos processos de etnozoneamento e etnomapeamento, e que já tem seus planos de gestão elaborados vêm recebendo apoio do Programa de Integrado de Desen-volvimento Sustentável do Acre (ProAcre). Para tanto, as comunidades elaboram subprojetos dentro das diretrizes do plano de gestão que são apoiadas pelo Governo do Estado do Acre. Essas Terras Indígenas já apresentam diversos encaminhamentos para implementação dos seus planos.

Somadas às ações de “etnomapeamento19’’, promovidas pela ONG Comissão Pró-Índio do Acre (CPI-Ac), nos anos de 2004 -2006 até o presente temos ações de etnozoneamento e etnomapeamento desenvolvidas em 16 TIs. E a perspectiva futura é ampliar este número, chegando à totalidade das TIs no Estado do Acre, com os processos de mapeamentos e planos de gestão elaborados.

Entretanto, tais experiências de gestão têm enfrentado obstáculos em relação à sua transfor-mação em mecanismos efetivos de autogestão. Uma vez que para se tornarem efetivos precisam ser internalizados pelas comunidades, suas estruturas de poder e demais atores externos às aldeias, alicerçados em relações sólidas de articulação entre os atores protagonistas (Governo e povos indí-genas), investindo para que os etnozoneamentos e planos de gestão venham a constituir não apenas levantamentos, mas instrumentos efetivos de planejamento e defi nição de propostas de gestão dentro das perspectivas indígenas.

19 Paralelamente as experiências desenvolvidas pelo Estado do Acre, foram realizadas pela Comissão Pró-Índio do Acre – CPI/AC, 08 (oito) experiências de etnoma-peamento, associadas à formação dos Agentes Agrofl orestais Indígenas, nas Terras Indígenas situadas nas áreas de fronteira Brasil-Peru, com metodologias similares.

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REFERÊNCIAS

ACRE. Governo do Estado do Acre. Programa Estadual de Zoneamento Ecológico-Econômico do Estado do Acre. Zoneamento Ecológico-Econômico: indicativos para a gestão territorial do Acre: documento fi nal – 1ª fase. Rio Branco: SECTMA, v. 1, 2000.ACRE. Governo do Estado do Acre. Programa Estadual de Zoneamento Ecológico-Econômico do Estado do Acre. Zoneamento Ecológico-Econômico Fase II: documento síntese – Escala 1: 250.000. Rio Branco: SEMA, 2006.CUNHA, M. E. C. O Acre e a Educação Escolar Indígena, Intercultural, Diferenciada e Bi-língue. Dissertação (Mestrado em Letras) – Programa de Pós-Graduação em Letras: Linguagem e Identidade, área de concentração: Linguagem e Educação, 2009.CORREIA, C. S. Etnozoneamento, Etnomapeamento e Diagnóstico Etnoambiental: Repre-sentações cartográfi cas e gestão territorial em Terras Indígenas no Estado do Acre. Doutora-do – Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade de Brasília, Brasília, 2007.LITLLE, P. E. Gestão Territorial em Terras Indígenas: Defi nição de Conceitos e Propostas de Diretrizes. Relatório fi nal entregue a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Naturais – SEMA/AC, Secretaria Extraordinária dos Povos Indígenas – SEPI/AC e Agência da GTZ no Brasil – GTZ, Rio Branco/AC, 2006. MACIEL, N.B. Planos de Gestão de Terras Indígenas no Acre: Diretrizes e roteiro metodológico. Relatório fi nal entregue a Secretaria de Estado de Meio Ambiente (SEMA/AC) e Agência da GTZ no Brasil – GTZ, Rio Branco/AC, 2010. ____________. Plano de Gestão Territorial e Ambiental da Terra Indígenas Mamoadate. Po-vos Indígenas Mancineri e Jaminawa. Secretaria de Estado de Meio Ambiente. SEMA/AC, 2009.____________. Plano de Gestão Territorial e Ambiental da Terra Indígenas Colônia Vinte Sete. Povo Indígena Kaxinawa, Secretaria de Estado de Meio Ambiente – SEMA/AC, 2009.SOUZA, Conceição Marques; AZEVEDO, Marta; TAVARES, Roberto; ABREU, Renata; VALEN-TIM, Nadia. Ordenamento Territorial Local e Etnozoneamento: Estratégias de Gestão Participativa na Amazônia Ocidental, Acre. Revista Ação Ambiental, Viçosa, n.42. p. 26-34, 2009.SOUZA, A. D. et al. A biodiversidade no Estado do Acre: conhecimento atual, conservação e pers-pectivas. In: T & C Amazônia. Manaus, v. 1, n. 3, p. 45-56, 2003.

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Por diferentes razões, a Amazônia tornou-se uma questão global, mesmo permanecendo periféri-ca dentro dos próprios países que a compartilham. Governos, empresas, cientistas e pessoas demons-tram com mais intensidade suas intenções para a região, para as comunidades e principalmente para os recursos que ali estão (Aragon, 2009).

A Amazônia palco trágico de inúmeras intervenções geopolíticas integracionistas vislumbra hoje novas características, norteadas principalmente pela evolução do entendimento individual e pela gran-de pressão dos movimentos sociais, ambientais e científi cos na busca por condições mais humanas e conscientes de desenvolvimento.

Em nome dessas preocupações conciliadoras para o desenvolvimento, o que se projeta nos cená-rios amazônicos é a discussão/criação de novas metodologias e alternativas que possibilitem a preser-vação e a melhor utilização da fl oresta com o desenvolvimento econômico e social.

Atualmente, estudos envolvendo mudanças climáticas indicam que a frequência de anomalias no clima mundial tem se intensifi cado. A ação do homem sobre o ambiente é apontada como a prin-cipal causa do desequilíbrio provocado nos fl uxos de matéria e de energia ocorrentes no planeta. Tal fato tem contribuído de maneira efetiva na emissão de gases de efeito estufa. Dessa forma, a atenuação dos possíveis impactos globais advindos das mudanças climáticas passa pela criteriosa avaliação das principais fontes de emissão e pelo estabelecimento de alternativas de mitigação dos gases de efeito estufa. (SANTI, 2007, não paginado).

Tais preocupações/discussões sobre alterações climáticas e suas implicações sobre as populações não são recentes. Diante das catástrofes mundiais e informes científi cos sobre as projeções para o modelo de desenvolvimento atual, a questão ambiental vem se destacando nas principais negociações internacionais.

20 Coordenador Geral da Associação Metareilá do Povo Indígena Surui, ganhador do Prêmio REDD Plus na COP 15 em Copenhague, Dinamarca, e-mail: [email protected].

21 Graduada em História, com Especialização em Análise Ambiental. Coordenadora Geral da Kanindé – Associação de Defesa Etnoambiental, e-mail: [email protected]

22 Mestrando e Geografi a da Universidade Federal de Rondônia - UNIR e pesquisador Colaborador Kanindé – Associação de Defesa Etnoambiental.

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Delimitando nossas discussões no Estado de Rondônia, constatamos a complexa e preocupante realidade do estado, onde alternativas de gestão, combate ao desmatamento e embate frentes aos me-canismos emissores dos gases de efeito estufa são extremamente necessárias. Os dados referentes ao Estado (RO) demonstram crescimento exponencial do desmatamento e aumento da pressão antrópica sobre unidades de conservação e terras indígenas doravante TI.

A criação de Áreas Protegidas (Unidades de Conservação e Terras Indígenas) é uma das estraté-gias mais efetivas e recomendadas para conservar a fl oresta amazônica. Cerca de 33% da Amazô-nia Legal são Áreas Protegidas. Em sua maioria, essas áreas têm funcionado como uma barreira contra o avanço do desmatamento. Entretanto, em Rondônia, as Áreas Protegidas estão ameaça-das pelo desmatamento ilegal. Até 2004, o desmatamento havia atingido cerca de 6,3% do terri-tório das Áreas Protegidas, enquanto a média para a Amazônia é de apenas 1,7%. (RIBEIRO et al., 2004, não paginado).

Esses elementos são factíveis de constatação através de uma breve observação do mapa do Es-tado do Pará. A fi gura 01 demonstra claramente as unidades de conservação e Terras Indígenas pra-ticamente delineadas por áreas de desmatamento, representando com algumas exceções os únicos fragmentos de fl oresta, fato que, exemplifi cando o agravado problema de pressão sobre esses espaços, Alencar (2004) destaca que o grande desafi o imposto pela Amazônia relaciona-se diretamente no embate de práticas que repliquem na região os modelos de outras fl orestas tropicais, a “destruição fl orestal e a pobreza social”. Os 80% das fl orestas que ainda cobrem a região, nos dão, segundo ele, a oportunidade de promover o tão sonhado desenvolvimento sustentável.

Por isso, para combater o problema do desmatamento, é necessário ir além das manchetes catas-trófi cas. É preciso lidar com a complexidade dos processos de expansão da fronteira agrícola na Ama-zônia e reconhecer que não basta somente um aprimoramento técnico-científi co sobre o assunto para solucionar o problema. É fundamental a defi nição de uma política coesa e, particularmente, articulada com os governos e a sociedade civil dos Estados Amazônicos. O desmatamento deve ser, portanto, combatido de uma forma inovadora. (ALENCAR, 2004, não paginado).

Nesse sentido, no caso de Rondônia, nosso estudo destaca a contribuição inovadora e de grande relevância do povo indígena Surui, que representados pela sua organização (Metareilá), desenvolvem/discutem e buscam alternativas de geração de renda e manutenção das fl oretas através do projeto de-nominado “Carbono Surui”.

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Figura 2 – Mapa da Local-ização das aldeias da Terra

Indígena Sete de Setembro. Fonte: ACT - Brasil.

Figura 01 – Mapa do Desmata-mento e Áreas Protegidas em Rondônia (situação em 2007). Fonte: GTA (2009).

Prancha 1 - Mapas sobre Desmatamento e Localização de Aldeias Indígenas

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Figura 3 - Desmatamento e pressão antrópica no entorno e na TI Sete de Setembro. Fonte: GTA (2009).

Prancha 2 - Mapas sobre pressão antrópica e refl orestamento no entorno das aldeias indígenas.

Figura 4 - Áreas de Refl orestamento da Aldeia Lapetanha.

Fonte: Metareilá, 2009

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2.2.1 Área de estudo

Os Suruis se autodenominam paiter, que quer dizer “gente de verdade, nós mesmos”. Falam uma língua do grupo Tupi e família Mondé (Cardozo, 2000) e são conhecidos como Surui de Rondônia, com uma população de aproximadamente 1.350 pessoas. Habitam a Terra Indígena Sete de Setembro que possui 247.880 hectares demarcados e homologados conforme o Decreto 88.867 de 18 de ou-tubro de 1983, distribuídos nos seguintes municípios: Cacoal, Espigão d´Oeste (RO) e Rondolândia (MT), ver localização dessas aldeias na fi gura 02 da prancha 01.

Estão organizados em 04 (quatro) clãs, Gameb (marimbondos pretos), Gamir (marimbondos amarelos), Makor (taboca) e Kaban (mirindiba, uma fruta regional azeda). São patrilinear e praticam a poligamia.

Os primeiros contatos com a FUNAI – Fundação Nacional do Índio – ocorreram no dia 7 de Setembro de 1969. Com a demarcação em 1976, grande parte do território indígena fi cou de fora, incluindo a região onde existia a matéria prima de suas artes.

Logo após o contato, funcionários corruptos da FUNAI iniciaram a venda ilegal de madeira no território indígena, envolvendo alguns líderes nesta atividade. Como os Paiter não entendiam a língua portuguesa e desconheciam os códigos legais da sociedade brasileira, consideravam ser esta atividade algo normal para os “brancos” (CARDOZO, 2000).

Com o passar dos anos, aprendendo a língua portuguesa e alguns códigos da sociedade brasileira, alguns líderes compreenderam que esta atividade era ilegal e que estava destruindo o seu território.

A pressão antrópica nos limites da Terra Indígena Sete de Setembro é, assim como citado ante-riormente, visível (ver fi gura 3 na prancha 2). Há um número considerável de madeireiras situadas a poucos quilômetros dos limites. No interior da área são constantes os roubos de madeira e casos de aliciamento de indígenas para venda de madeira.

A ação sistemática de roubo de madeira no interior da TI por grandes grupos madeireiros, que resultou no desmatamento de cerca de 7 mil hectares nos últimos anos, ainda é um dos principais problemas enfrentados pelo povo Paiter/ Surui ao longo dos últimos anos. De acordo com os indígenas, durante o natal de 2007, saíam caminhões abarrotados de madeira de todos os pontos da terra indígena. (GTA, 2009, não paginado).

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Esses crimes ambientais ocorridos na terra indígena foram por diversas vezes denunciados no Ministério Público e em outros órgãos competentes, fato que incide sobre as lideranças que tomam tais providencias.

A impossibilidade de decisão nos direcionamentos de trato com a fl oresta (vezes impedidas pelo aliciamento e ameaças dos madeireiros), os problemas ambientais visíveis e a relação nada amistosa com os infratores locais despertou nas lideranças indígenas a necessidade de reverter essa situação e apropriar-se com total autonomia das questões relacionadas a seu território.

A forte relação com o território, a busca por alternativas de desenvolvimento sustentável e a pro-teção de seus recursos naturais incitaram a criação da Associação Metareilá do Povo Indígena Surui. Voltada para a proteção dos direitos indígenas, a associação desenvolve trabalhos/projetos há mais de 20 anos no estado.

A associação que dentre tantas atividades e projetos realizados tem hoje suas principais forças/ações voltadas para a contribuição da elaboração metodológica e implementação adequada do trato como carbono e metodologias como as Emissões por Desmatamento e Degradação - REDD para Terras Indígenas no Brasil, com enfoque pioneiro na TI Sete de Setembro.

2.2.2 Redução de Emissão de Desmatamento e Degradação (REDD)

As demandas por redução de emissão de gases prejudiciais ao planeta criaram o denominado mercado de carbono. Esse mercado é abastecido, por um lado, pela necessidade da compra de créditos de carbono e, por outro, pela oferta desses créditos. Nos últimos anos, algumas empresas e países que vem cumprindo legalmente a redução na produção de poluentes têm obtido benefícios signifi cativa-mente lucrativos e ambientais.

Dentre as novas alternativas/metodologias têm sido evidenciado a “Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação – REDD”, enquadrado dentro dos chamados pagamentos por serviços ambientais, o REDD visa contribuir para a geração de fontes rentáveis, criando valores econômicos para a fl oresta em pé ou para o desmatamento evitado. Poluidores poderão compensar suas emissões comprando os créditos de quem mantém a fl oresta.

A idéia básica por trás de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação (REDD) é simples: os países que estão dispostos e em condições de reduzir as emissões por desmatamento deveriam ser recompensados fi nanceiramente por fazê-lo. As abordagens anteriores para conter o desmatamento global até agora não tiveram sucesso e o REDD oferece um novo marco refe-rencial para permitir que os países com altos índices de desmatamento rompam esta tendência histórica. (PARKER et al., 2008, não paginado).

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Esse mercado pode de acordo com o ISA, ser divido em dois tipos: o “ofi cial” e o “voluntário”, diferenciados basicamente pelo tipo dos créditos do Carbono demandados. 1) empresas que têm a obrigação legal de diminuir emissões 2) e outras que não tem essa obrigação, mas voluntariamente assumiram essa meta.

Créditos de carbono ou Redução Certifi cada de Emissões (RCE) são certifi cados emitidos quando ocorre a redução de emissão de gases do efeito estufa (GEE). Por convenção, uma tonelada de dióxido de carbono (CO2) equivalente corresponde a um crédito de carbono. Este crédito pode ser negociado no mercado internacional. A redução da emissão de outros gases que também contribuem para o efeito estufa também pode ser convertida em créditos de carbono, utilizando o conceito de Carbono Equivalente. (INSTITUTO EDP, 2009, não paginado)

Segundo o The Little REDD+Book, as comunidades locais têm nas fl oretas fontes de combus-tível, alimento, medicamento e abrigo; tendo, portanto, nos povos da fl oresta, (indígenas, ribeirinhos, seringueiros, etc.) os prestadores de serviços ambientais (SA) ao restante da humanidade. As mudan-ças climáticas que certamente atingirão mais intensamente os pobres e o REDD como ferramenta “compensatória” ajudarão a construir a sua resistência aos impactos climáticos.

Sendo essas comunidades locais as principais afetadas pelos crescentes efeitos das mudanças climáticas e, ao mesmo tempo, as grandes mantenedoras das condições de reprodução e proteção dos ciclos ecológicos, nada mais adequado e justo que os benefi ciários prioritariamente no mercado de carbono sejam esses povos.

O desmatamento evitado e a conservação de fl orestas, além das atividades de fl orestamento e re-fl orestamento dentro de terras indígenas podem contribuir diretamente para a redução de emissão e de concentração de GEEs na atmosfera. Essas atividades podem ainda gerar certifi cados, ou créditos de carbono, tanto no âmbito do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) estabe-lecido no art. 12 do Protocolo de Quioto, como no âmbito do mercado voluntário de carbono, inclusive para atender ao futuro mecanismo de Redução de Emissões por Desmatamento e De-gradação. (YAMADA; TELLES, 2009, não paginado)

Visualizando suas possibilidades de contribuição e oportunidades de desenvolvimento conciliado a conservação da fl oresta, os Surui vêm há tempos discutindo, da forma mais participativa possível, junto com parceiros institucionais e através de inúmeras reuniões com os clãs da TI Sete de Setembro os benefícios e consequências da inserção dos indígenas no mercado de carbono global.

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2.2.3 O Caminhar do Projeto Carbono Surui

Em 1998, o líder indígena Almir Narayamoga Surui reuniu seu povo para tratar dos problemas ambientais que afetam a Terra Indígena e a busca de soluções. Decidiram realizar um diagnóstico e um Plano de Gestão dos 50 anos da TI Sete de Setembro.

Buscam o apoio da KANINDE – Associação de Defesa Etnoambiental – para a realização das pesquisas e do Plano de Gestão e conseguem recursos fi nanceiros junto ao Ministério do Meio Am-biente. Os trabalhos são realizados em 2000 e o Plano de Gestão traz uma série de programas voltados para a gestão do território indígena.

O Programa de Desenvolvimento Sustentável traz como proposta o desenvolvimento de ações voltadas para a manutenção do clima do planeta e a geração de renda para os paiter. Nesse, está inserido o Projeto Carbono Surui.

Para a realização do Projeto Carbono Surui, os paiter buscam diversas parcerias que formam uma espécie de consórcio de organizações voltadas ao desenvolvimento e a implementação do Projeto. As instituições que fazem parte são: Associação Metareilá do Povo Indígena Surui que é a proponente do projeto e responsável pela pesquisa socioeconômica, a kanindé – associação de defesa etnoambiental responsável pelo refl orestamento, diagnóstico e etnozoneamento, IDESAM – Instituto de Conserva-ção e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas, Forest Trends que busca compradores para o carbo-no, FUNBIO – Fundo da Biodiversidade que é responsável pela gestão do fundo do carbono Surui, ACT Brasil com responsabilidade do mapeamento cultural e o consentimento prévio informado.

São realizados vários estudos para subsidiar o Projeto de Carbono Surui, principalmente estudos voltados para averiguar os impactos comunitários e como a vida das famílias seriam melhoradas. Vale salientar que a metodologia adotada utilizou uma interface multidisciplinar quali-quantitativa para estimar as condições sociais, culturais e econômicas atuais, em que foram realizados levantamentos antropológicos e etnográfi cos minuciosos, com pesquisa de campo intensiva, observação participan-te, entrevistas semi-estruturadas e livres, reuniões comunitárias, registros audiovisuais e aplicação de questionários.

Com relação à conservação dos recursos naturais e a utilização sustentável do território indígena, Thiago Ávila diz:

As perspectivas de conservação e utilização sustentável da Terra Indígena Sete de Setembro são baseadas no Plano de Gestão Etnoambiental elaborado pela Associação Metareilá e instituições parceiras – da qual se destaca a Kanindé com uma relação de mais de uma década de trabalho

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com esse povo indígena. Ao adotar um olhar da conservação biocultural, entende-se que os es-forços despendidos em prol da continuidade da diversidade biológica de uma região estão intrin-secamente conectados aos processos de continuidade cultural dos povos tradicionais que vivem diretamente da fl oresta. A fl oresta, nessas situações, é muito mais do que um local econômico na natureza, com produtos comercializáveis e geração de renda. Apropriar-se dos recursos naturais da terra e ali estabelecer regimes sociais de uso e propriedade é algo muito mais complexo e, no caso dos paiter - Surui, ga-nha contornos diferenciados pela relação tradicionalmente construída por pessoas que vivenciam naquela região – e com aquela biodiversidade e suas variações ao longo do tempo – que enxergam vida na biodiversidade e, em grande medida, um olhar cuja perspectiva aponta para uma compre-ensão de um ciclo de relações – às vezes sociais e com humanidade - entre seres humanos e seres da natureza. Os mitos, os resguardos, a cosmologia e as práticas e formas sociais de criatividade - onde aparecem os conhecimentos tradicionais – são alguns exemplos dessas relações diferencia-das (ÁVILA, [20--?], não paginado.)

O Projeto Carbono Surui busca desenvolver linhas básicas voltadas à conservação de: 1 - Área de signifi cativo valor para a conservação (endemismo, espécies ameaçadas e risco de extinção,

refúgios, áreas sagradas);2 - Áreas onde a paisagem natural não foi alterada e possui espécies importantes para a conservação

tanto do ponto de vista ambiental quanto cultural;3 - Áreas de ecossistemas onde ocorrem espécies raras, ameaçadas ou em risco de extinção;4 - Áreas onde sejam garantidos os serviços ambientais (proteção das nascentes, lagos, etc.);5 - Áreas de uso da comunidade (roças, aldeias, saúde, educação, etc.); 6 - Áreas culturais, ecológicas e onde podem ser desenvolvidas ações voltadas ao desenvolvimento

econômico.A valorização da cultura Paiter é uma das linhas básicas mais importantes. Está inserida no Plano

de Gestão que está sendo desenvolvido no território indígena buscando a valorização e o fortaleci-mento da cultura.

O monitoramento do Projeto será realizado a partir da estruturação e desenvolvimento do Pro-grama de Fiscalização Territorial e Ambiental inserido no Plano de Gestão. O Programa prevê atuação nos limites da Terra Indígena com fi scalização preventiva e ostensiva, envolvendo os indígenas e os órgãos federais responsáveis pela proteção dos recursos naturais dos órgãos federais como FUNAI e IBAMA.

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As áreas das aldeias foram excluídas dos estoques totais de carbono a serem comercializados e funcionam como área de amortização, garantindo a proteção da fl oresta.

As regiões de refl orestamento serão monitoradas, garantindo a manutenção e o desenvolvimento das mudas de árvores nativas plantadas.

O monitoramento da fauna terá um programa específi co voltado para garantir a preservação das espécies endêmicas, raras e em vias de extinção.

Passos dados pelos Paiter até se chegar ao Projeto Carbono Surui:1998 - Realizado o Programa Payterei em que se discutiu as necessidades e as prioridades a serem

tratadas na Terra Indígena Sete de Setembro.1999/2000 - A Kanindé com a Metareilá realizam o Diagnóstico Agroambiental da TI com o

apoio do Ministério do Meio Ambiente e Amigos da Terra da Suécia;2001 - A Kanindé e Metareilá realizam o Plano de Gestão de 50 anos, para o desenvolvimento

sustentável na Terra Indígena Sete de Setembro.2002 - São realizadas diversas reuniões para planejamento das ações e a busca de outras institui-

ções que estivessem interessadas em apoiar a implantação do Plano de Gestão.2003 - Inicia o refl orestamento nas áreas onde o diagnóstico apontava como desmatadas. Ver fi -

gura 4 na prancha 2, o mapa já atualizado. Para esta atividade a Kanindé conseguiu o apoio da USAID e a Metareila conseguiu o apoio da Aquaverde.

2004 - Já haviam sido plantadas mais de 40 mil mudas de árvores de 17 espécies nativas.2005/2006 - É realizado o mapeamento cultural numa parceria Metareilá, Kanindé, ACT Brasil,

com o apoio da USAID.2007 - O refl orestamento prossegue e em viagem a São Francisco o Presidente da Metareilá Che-

fe indígena Almir Surui faz contato com o Google e inicia os primeiros contatos para que o gigante da informática pudesse colaborar na proteção da Terra Indígena.

– O chefe indígena Almir Surui entra em contato com a ONG americana Forest Trends e inicia as primeiras conversas para apoio ao REDD dos Surui.

2008 – Juntam-se a Metareilá e a Kanindé, as seguintes organizações: Forest Trends, USAID, Google, ACT Brasil, IDESAM, Katoomba, todas voltadas para apoiar o desenvolvimento do Progra-ma Carbono Surui.

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Durante o ano, vários estudos são feitos, vários seminários para esclarecimento sobre o que é REDD e mudanças climáticas e inicia-se o desenvolvimento do PDD - Project Design Document, fi nalizando vários estudos. No mesmo período, os indígenas elaboram o documento com o Consen-timento Prévio Informado.

2009 - É todo dedicado a construção do PDD. Várias reuniões são realizadas para esclarecimen-tos, acertos e fi nalização dos estudos.

Neste período, discuti-se o Fundo de Gestão e é convidado o FUNBIO para integrar o grupo, elaborar e administrar o Fundo.

No dia 12 de dezembro, é lançado na Conferência do Clima – COP 15 em Copenhagen o Projeto Carbono Surui, que agrega ao carbono toda a questão cultural e traz ainda a preocupação com os mu-nicípios de entorno, já que a proposta do povo Surui é, além de manter a fl oresta em pé, gerar renda e emprego para os indígenas e os “brancos”, ou seja, os não indígenas que vivem nas adjacências da TI.

Nesta proposta, os Paiter querem realizar junto aos fazendeiros, colonos, pequenos trabalhadores rurais o refl orestamento das áreas desmatadas nas propriedades particulares que estão no entorno da Terra Indígena.

Assim, além de gerar emprego, os fazendeiros e colonos terão a oportunidade de cumprir o que diz o Código Florestal que é a recomposição da reserva legal e APPs.

O projeto ganha o prêmio Maya Lin em Copenhague no dia 16 de dezembro, reconhecendo como diz o próprio Almir Surui “nossa luta para manter a fl oresta em pé”.

É importante ressaltar ainda que a luta da Associação Metareilá e das demais organizações envol-vidas nesse processo de discussão e planos para a implementação perpassam em signifi cativas vezes o exposto acima.

Participar da elaboração de uma metodologia tão complexa, atual e inovadora no trato de gestão de TIs demanda muito tempo e dedicação, além da necessidade de compreender os aparatos legais e as possibilidades de seguir com os trabalhos para que não incorra em uma expectativa frustrada prin-cipalmente por parte das comunidades que estiveram presentes e contribuíram constantemente.2.2.4 Considerações Finais

Ao formular o Projeto Carbono Surui, foi discutido pelos Paiter, em especial os 4 clãs, os indi-cadores de desempenho do processo e a construção de um Plano de Monitoramento que avalie os resultados do Projeto.

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Os Paiter sobre a liderança da Associação Metareilá do Povo Indígena Surui são responsáveis por articular e implementar o Projeto Carbono Surui. As demais instituições envolvidas ou que venham a se envolver tem e terão papel de assessorar ou de desenvolver atividades propostas pelos indígenas, que venham a fortalecer o Plano de Gestão de 50 anos do povo paiter - Surui de Rondônia.

As ações voltadas ao desenvolvimento sustentado estão inseridas no Plano de Gestão Etnoam-biental da Terra Indígena Sete de Setembro. O Projeto Carbono Surui é dentro dessa ferramenta um dos mecanismos buscados para a implementação do Plano, que prevê ações de educação, saúde, valo-rização cultural, desenvolvimento econômico, proteção ambiental e segurança alimentar.

A organização indígena, como proponente e realizadora da maior parte das discussões/imple-mentações, destaca a formulação/reformulação dos novos cenários de utilização e ocupação do solo e legitimam a intenção das comunidades em práticas legais de utilização dos produtos fl orestais, assim como a luta pela manutenção da cultura e o cumprimento pelos direitos indígenas.

Essas discussões/conquistas realizadas pelos Surui referentes ao mercado de carbono – como alternativa para aplicabilidade do Plano de Gestão das Terras Indígenas – representam uma excelente metodologia a ser desenvolvida (com suas devidas adaptações) em outros territórios indígenas do Brasil, na busca de melhores condições para o desenvolvimento sustentável.

REFERÊNCIAS

ACT-BRASIL. Aldeias terras indígenas 7 de setembro. Disponível em: <http://www.equipe.org.br/mapas_dentro.php?tipoid=5>. Acesso em: 10 dez.2010.ALENCAR, A. et al. Desmatamento na Amazônia: indo além da “Emergência Crônica”. Belém: Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, 2004.ARAGON, L. E. De quem é esta fl oresta, Afi nal? In: CAPOZZOLI, Ulisses. Amazônia: Destinos. São Paulo: Duetto Editorial, 2008.ÁVILA, Thiago. Não é do jeito que eles quer, é do jeito que nós quer. Os Krahô e a Biodiversi-dade. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social), Brasília: Universidade de Brasília, 2004.CARDOZO, I. B. Diagnóstico Agro-ambiental da Terra Indígena Sete de Setembro. Associação de Defesa Etnoambiental – Kanindé. Porto Velho, 2000.EDP. Crédito de Carbono. Disponível em: <http://www.institutoedp.com.br/institutoedp/credi-to_carbono/credito_carbono.asp.> Acesso em: 10 dez.2010.

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GRUPO DE TRABALHO AMAZÔNICO. O fi m da Floresta? A devastação das unidades de conservação e terras indígenas no Estado de Rondônia / Regional Rondônia, 2008.PADUA, S. O que é REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação) e o que pode representar para a conservação de nossas fl orestas? Disponível em: <http://www.oeco.com.br/suzana-padua/49-suzana-padua/18264-oeco_26975>. Acesso em: 10 dez. 2010.PARKER, C.; MITCHELL, A.; TRIVEDI, M.; MARDAS, N. The Little REDD+ Book, Oxford, GCP, 2008.RIBEIRO, B. et al. O Avanço do Desmatamento sobre as Áreas Protegidas em Rondônia. Ins-tituto do Homem e do Meio Ambiente, Belém. 2004.SANTI, A.; DALMAGO, G. A.; DENARDIN, J. E. Potencial de seqüestro de Carbono pela agri-cultura brasileira e a mitigação do efeito estufa. Passo Fundo: Embrapa Trigo, 2007. Disponível em: < http : //www. cnpt. embrapa. br/biblio/ do/ p_ do 78. htm >. Acesso em: 10 dez. 2010. YAMADA E. M.; TELLES do Valle, R. S. Brasil: Titularidade Indígena sobre Créditos de Car-bono gerados por Atividades Florestais em Terras Indígenas. Brasília: Instituto Sócio-Ambiental – ISA, 2009.

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2.3.1 O que é aquecimento global, efeito estufa e carbono?

Aquecimento global, como o próprio termo diz, é o aumento da temperatura do Planeta Terra, especialmente a superfície terrestre, as fl orestas, as montanhas e as cidades onde vivemos. Esse aque-cimento global é causado pelo aumento do efeito estufa. O efeito estufa é um fenômeno da natureza que conserva a temperatura da Terra de modo agradável e adequada para a vida de todos os seres, nem muito quente nem muito fria. Esse efeito estufa é gerado quando os raios do sol que chegam e aque-cem a superfície do Planeta voltam em direção ao espaço, porém são aprisionados em uma camada de gases do efeito estufa, que estão dispersos na atmosfera da Terra. Esse fato é semelhante à seguinte situação: quando colocamos um cobertor, ele não deixa que o calor do nosso corpo se dissipe, o calor gerado, portanto, é aprisionado.

Gases de efeito estufa podem ser gerados por fenômenos da natureza ou por atividades humanas. O gás de efeito estufa mais abundante é o vapor d’água, que representa de 36 a 70% da quantidade total desses gases na atmosfera (PAINEL INTERGOVERNAMENTAL DE MUDANÇAS CLIMÁ-TICAS, 2007). As nuvens cheias de vapor d’água retêm o calor que sai da superfície da Terra quando esquentada pelo sol e, assim, não permitem que o planeta esfrie muito. Existem outros gases de efeito estufa que são lançados no ar desde que a humanidade começou a usar petróleo e derrubar fl orestas para explorar minério, construir cidades e produzir alimentos. O que mais contribui é o chamado gás carbônico, o tão falado carbono, que representa até 26% dos gases de efeito estufa (PAINEL INTER-GOVERNAMENTAL DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS, 2007).

O carbono é um elemento que está presente em todos os seres vivos e não vivos, animais, plan-tas, peixes, solo, árvores, combustível e também no ser humano. Assim, a fumaça liberada com a queima de combustíveis e a queimada de fl orestas aumenta a poluição no ar, formando uma camada maior de gases de efeito estufa.

23 Pesquisador do Programa de Mudanças Climáticas e Serviços Ambientais - Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas – IDESAM. Manaus, AM. Tel: (92) 3642-5698. Contato para correspondência ([email protected]).

24 Coordenadora do Programa de Mudanças Climáticas e Serviços Ambientais – IDESAM.

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O aumento do aquecimento global pode ter efeitos perigosos para os seres vivos e para o clima do Planeta Terra. É ele o desencadeador dos acontecimentos catastrófi cos que estão acontecendo com mais frequência e com maior intensidade ao redor do mundo, ocasionando o que chamamos de efeitos das mudanças climáticas.

2.3.2 Quais são os impactos das mudanças climáticas para o mundo e para a Amazônia?

O planeta já vem enfrentando os impactos da mudança climática, considerada hoje o maior pro-blema ambiental de todos os tempos. As consequências dessas mudanças são temidas e ainda não são totalmente conhecidas. A ocorrência cada vez mais frequente de eventos naturais extremos como fu-racões, ciclones, chuvas torrenciais e secas acentuadas já afetam o modo de vida de milhões de pessoas ao redor do mundo.

A mudança climática aumenta a incidência de doenças tropicais transmissíveis e infecciosas (como cólera, malária, dengue, leptospirose e doenças parasitárias) e pode incentivar o surgimento de males que atacam o gado, as aves e as plantações podendo ameaçar também a saúde humana (Mendonça, 2003). Milhões de pessoas estariam sujeitas às ondas de calor, enchentes, secas, tempestades e incên-dios (PAINEL INTERGOVERNAMENTAL DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS, 2007). O número de desabrigados em virtude das mudanças climáticas representaria um bilhão de pessoas daqui a 40 anos (CRISTIAN AID, 2007).

Na Amazônia não é diferente. Em 2005, a região passou por uma seca que marcou profundamente a memória de todos, trazendo enormes prejuízos econômicos, sociais e ambientais. Segundo cientistas, com as mudanças climáticas, a previsão é que as secas se tornem cada vez mais frequentes, ocorrendo em inter-valos de 3 a 6 anos (COX et al., 2003). As chuvas torrenciais que elevam o nível das águas além do normal, como a cheia de 2009, a maior já registrada, provavelmente também serão mais frequentes nos próximos anos. Esses efeitos certamente afetam o ciclo das chuvas, o período de fl oração e frutifi cação das plantas e a reprodução e migração de alguns animais. (PAINEL INTERGOVERNAMENTAL DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS, 2007).

2.3.3 O ciclo do carbono, a água, o desmatamento e as fl orestas

No Planeta Terra, a liberação de gases de efeito estufa do desmatamento e queimadas das fl o-restas representa cerca de 15% de todas as emissões produzidas pelo ser humano, mais que toda a emissão de carros, caminhões, trens, aviões, barcos e navios de todo o mundo (VAN DER WERF et

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al. 2009). O Brasil abriga quase a metade de todas as fl orestas tropicais que restam no mundo. Infeliz-mente, nosso país também é o que mais desmata. Isso faz com que 59% das emissões de carbono do Brasil seja resultado da derrubada e queima das fl orestas e cerrados (MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA, 2009)., colocando o país como o quinto maior emissor mundial de gases de efeito estufa (WORLD RESOURCES INSTITUTE, 2010).

As fl orestas são importantíssimas para o ciclo do carbono e para reduzir o avanço do aqueci-mento global. As árvores absorvem o gás carbônico do ar e junto com a água armazenada guardam e transformam o carbono em glicose (açúcar), que depois é utilizada para fazer crescer os troncos, cascas, raízes, galho e folhas, e liberam o oxigênio (Figura 1).

Quando a fl oresta é desmatada, todo esse carbono é liberado junto com a fumaça na forma de gás carbônico. A fl oresta então pode ajudar a manter o carbono em suas árvores e até limpar o ar absorvendo gás carbônico e assim diminuir a liberação de gases que contribuem para a o aumentar o aquecimento global e a mudança climática.

Além do carbono, a fl oresta nos reserva muitas riquezas, um grande número de animais, plantas e fungos diversos que servem para alimentação, como materiais para construção de diferentes objetos e utensílios, casas e barcos, para remédios e para fi ns espirituais, entre outros. Ninguém melhor do que os indígenas para falar sobre a riqueza, a beleza e a dádiva que a fl oresta é para o ser humano, dos seus poderes e maravilhas e do quanto precisamos mantê-la conservada.

Um papel importante das fl orestas da Amazônia está na sua capacidade de manter o ciclo das chuvas. As fl orestas também funcionam como uma bomba de água que, ao transpirar, evaporam água para formar as nuvens e depois cair na forma de chuva. Até um terço (1/3) das chuvas é produzida na Amazônia pela evaporação e transpiração das fl orestas. Essas chuvas seriam certamente comprometi-das se as fl orestas fossem derrubadas (BRUBAKER; ENTEKHABI; EAGLESON, 1993). A fl oresta também joga no ar um componente que ajuda a formar as nuvens. O acúmulo de poluição, como as queimadas, por exemplo, atrapalha a formação das nuvens e as chuvas fi cam mais difíceis de acontecer (OZANNE et al., 2003). É importante também dizer que a Floresta Amazônica transporta umidade para outras regiões, como o sul do Brasil, e desse modo contribui para uma boa parte das chuvas que acontecem por lá (FEARNSIDE, 2004). Assim como a capacidade de guardar carbono, esse fato re-presenta outro serviço ambiental que a fl oresta amazônica tem de regular o ciclo das chuvas.

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Figura 1 - Esquema ilustrati-vo da respiração das plantas durante o dia.Fonte: IDESAM (2009)

Mapa1 - Estoques de car-bono (verde) e emissões potenciais com o des-matamento (vermelho) em Terras Indígenas da Amazônia Brasileira.Fonte: Ricketts, T. H.; B. Soares-Filho, G. A. B. da Fonseca et al. 2010. Indi-genous Lands, Protected Areas and Slowing Clima-te Change. PloS Biology 8(3):1-4.

Prancha 1 - O ciclo do carbono e mapa sobre estoques de carbono

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2.3.4 Política de mudança climática e Redução de Emissões do Desmatamento e Degradação Florestal (REDD)

Frente a todo esse problema do aquecimento global e das mudanças climáticas, diversos países do mundo se reuniram no Rio de Janeiro, em 1992, em uma convenção chamada Rio-92 e criaram a Con-venção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC, em inglês) para lidar com essa questão. O objetivo principal dessa Convenção é fazer com que os gases do efeito estufa na atmosfera sejam mantidos em um limite capaz de prevenir as mudanças drásticas do clima. Isso tam-bém deve ser feito em um período de tempo que permita que os ecossistemas do mundo consigam se adaptar a essas mudanças, sem que isso prejudique a produção de alimentos no mundo e nem impeça que os países possam se desenvolver sustentavelmente.

No ano de 1997, a criação do “Protocolo de Quioto” (PQ) foi um marco muito importante. O PQ é um acordo que obriga os países industrializados a diminuírem suas emissões de gases do efeito estufa em cerca de 5% a menos do que emitiam na década de 1990. Neste acordo, apenas os países industrializados (chamados também de desenvolvidos) têm obrigação de reduzir suas emissões, en-quanto os países em desenvolvimento (como o Brasil) não precisam reduzir suas emissões. Isso acon-tece porque o PQ é baseado no princípio das “responsabilidades comuns, porém diferenciadas”. Isto quer dizer que quando falamos do problema das mudanças climáticas todos os países têm um pouco de culpa, tendo consciência de que uns têm mais e outros menos.

É mais ou menos assim: imagine que você é convidado pra ir jantar com um grupo de muitos amigos, vamos dizer uns 20. O pessoal todo chega ao restaurante às sete horas da noite, mas você só conseguiu chegar lá às dez horas. Quando chega lá todo mundo já comeu bastante e bebeu muito e já está tomando o cafezinho pra ir embora. Você se senta à mesa, pede um cafezinho também e não come nem bebe mais nada. Aí, um deles chama a conta e diz pra dividir igualmente entre todo mundo, inclusive você.

O protocolo segue a mesma lógica, por isso só os países industrializados, que vêm emitindo há muito tempo uma quantidade grande de gases, têm uma responsabilidade maior sobre as mudanças climáticas e, por isso, devem começar a emitir menos. Também, eles conseguiram crescer e desenvol-ver suas economias às custas destas emissões. Já os países em desenvolvimento, que estão começando a emitir mais gases de efeito estufa não devem ter obrigação de reduzir, pois têm uma parcela de con-tribuição muito menor do problema e não é justo que esses países sejam impedidos de se desenvolver.

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Assim, para ajudar os países industrializados a atingir essas metas de redução, foram criados alguns mecanismos de fl exibilização como, por exemplo, o Mecanismo de Desenvolvimento Lim-po (MDL). O MDL contribui para o desenvolvimento sustentável dos países que se encontram em crescimento, ajudando assim a reduzir suas emissões. Essas iniciativas visam à geração de créditos de redução de emissões para os países desenvolvidos, que podem ser utilizadas para amortecer suas obri-gações. O MDL permite que muitas categorias de projetos sejam consideradas, incluindo as atividades de refl orestamento. No entanto, mesmo que as fl orestas tenham um papel muito importante para o clima, elas fi caram de fora do Protocolo, pois os países notaram a existência de muitas incertezas téc-nicas em torno deste tema.

2.3.5 Como surgiu o REDD?

Com a conservação de fl orestas tropicais fora do PQ, muitos estudos e propostas começaram a ser produzidos, buscando formas voluntárias para a redução das emissões causadas pelo desmatamen-to. Essas discussões ganharam força em 2005, quando foi apresentada a proposta para a criação de um “Mecanismo de Redução Compensada do Desmatamento” (SANTILLI et al., 2005). A proposta ganhou força quando um grupo de nações apresentou proposta também nesse sentido e nos anos seguintes outros países também.

Desde então, muitas reuniões aconteceram, até que em 2007, na COP13, o tema do REDD en-trou na lista de assuntos que seriam analisados num prazo de dois anos entre as conferências de Bali e Copenhagen (COP 13 e COP15). Nesse referido tempo, aconteceram muitas discussões a fi m de construir uma proposta que seria defi nida em dezembro de 2009, na COP15. No entanto, a COP15 não trouxe resultados nem decisões concretas e muitos pontos sobre como o REDD iria funcionar foram adiados para serem decididos no fi nal de 2010. Mas ainda assim algumas defi nições impor-tantes aconteceram. Uma delas é que o REDD agora fi ca sendo chamado de REDD+, que signifi ca “redução de emissões do desmatamento e degradação fl orestal, o papel da conservação fl orestal, o manejo fl orestal sustentável e o incremento dos estoques de carbono”. Outra decisão importante foi o reconhecimento formal do papel das comunidades tradicionais e povos indígenas no mecanismo. O documento cita que as atividades de REDD+ devem respeitar o direito dos povos indígenas e popu-lações tradicionais e garantir sua participação efetiva nas atividades.

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2.3.6 Mercados voluntários e regulatórios

Embora muitas vezes as negociações dentro da Convenção sejam longas, complexas e a estru-tura fi nal do REDD+ ainda esteja em construção, alguns sinais positivos dados pela convenção têm gerado uma boa resposta dos diversos atores do setor privado e inclusive de governos, que buscam se antecipar ao estabelecimento de um possível mercado em estruturação para REDD+, através da im-plantação de iniciativas-piloto. Esse mercado é chamado de voluntário, justamente por não estar ligado a nenhuma meta obrigatória de redução de emissões dos países. Ele é constituído de negociações bila-terais (entre o comprador e o vendedor dos créditos) e não serve para ajudar os países ou as indústrias a atingirem suas metas de redução, apenas para usos de imagem ou carboneutralização, entre outros. É um tipo de comércio que cresceu muito nos últimos três anos, em que os créditos de REDD+ têm tido bastante destaque, visto que esta é hoje a principal possibilidade de acesso a recursos de mercado para REDD+.

2.3.7 A conservação fl orestal conservação fl orestal e o potencial de REDD+ em Terras Indígenas no Brasil

Terras indígenas (TIs) e outras Áreas Protegidas (APs) foram criadas para assegurar direito so-bre a terra, o sustento de populações indígenas e tradicionais, a biodiversidade e outros valores. Elas guardam 56% de todo o carbono estocado e correspondem a 54% de todas as fl orestas da Amazônia brasileira (SOARES-FILHO et al., 2010). Contudo, o papel que as TIs e APs têm tido na redução das emissões de carbono do desmatamento e seus custos para o planeta ainda é incerto. Na verdade, as TIs contribuem muito mais para reduzir o desmatamento do que outras áreas protegidas porque elas somam uma área três vezes maior e estão geralmente no caminho imediato das fronteiras de expansão do desmatamento (NEPSTAD et al. 2006). TIs e APs criadas a partir de 1999 foram responsáveis pela redução de aproximadamente 37% do desmatamento entre 2004 e 2006. (SANTILLI et al., 2005). Contudo, embora elas contribuam para a conservação das fl orestas, ainda 8% de todo o desmatamen-to entre 2002 e 2007 aconteceu dentro de TIs e APs (SOARES-FILHO et al., 2009).

As TIs que estão circundadas por áreas desmatadas têm um potencial para REDD+ maior que aquelas que se encontram em áreas remotas, como mostra a fi gura 2. Entretanto, com a inclusão da conservação fl orestal fazendo parte de REDD+, áreas remotas também devem ser remuneradas por

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seus estoques de carbono. Para uma estratégia nacional de REDD+, as áreas onde as fl orestas sofrem maior pressão de desmatamento devem ser aquelas em que o dinheiro deve ser primeiro investido. Contudo, esse fato pode tirar os recursos das áreas remotas que possuem alta diversidade biológica (GRAINGER et al., 2009). Com o avanço do desmatamento, essas áreas também passariam a ser destruídas e devem contar com outros mecanismos para estruturar um sistema efi ciente de gestão do território.

Outro problema, é que se o dinheiro for apenas investido em áreas de grande pressão existe a possibilidade de migração dos agentes do desmatamento para áreas mais remotas onde não existe ges-tão nem monitoramento. Esse processo é chamado de ‘vazamento’ e deve ser contido (RICKETTS et al., 2010). Assim, o REDD+ incluiu como uma de suas preocupações a redução do ‘vazamento’ do desmatamento e passará também a canalizar recursos para ser investido em áreas remotas que possu-am fl orestas com grandes estoques de carbono.

Em resumo, TIs e APs geralmente reduzem as taxas de desmatamento se comparadas com as áreas circundantes, mas o desmatamento pode continuar acontecendo dentro delas, principalmente daquelas que não contam com recursos, capacidade de gestão e estrutura política sufi cientes. Os go-vernos e outras instituições devem fornecer aos grupos indígenas informação e capacitação necessária para a efetiva participação. E, ainda, os pagamentos ou investimentos devem premiar aqueles respon-sáveis pela redução das emissões.

REDD+ é apenas um dos mecanismos para reduzir emissões de gases de efeito estufa. Contudo, é o mecanismo que primeiro pode gerar um efeito positivo por ser mais barato se comparado com o setor de energia e construção, por exemplo, reduzindo grande quantidade das emissões com pratica-mente pouco dinheiro. Esse dinheiro deve ser investido na gestão e monitoramento das TIs e APs, para melhorar a qualidade de vida e gerar renda de forma sustentável para as comunidades indígenas e tradicionais que habitam as fl orestas. Assim, REDD+ tem potencial de ser um mecanismo determi-nante para assegurar a conservação fl orestal e a herança cultural dos povos indígenas.

2.3.8 O Cenário Nacional e Estadual de REDD em Unidades de Conservação e Terras Indígenas

O Brasil é um dos países da América Latina que mais avançou em termos de preparação para um mecanismo de REDD+. Atualmente, existem diversas iniciativas subnacionais acontecendo, tanto as governamentais como os processos de discussão e construção de políticas estaduais que se relacionam com REDD+. Ainda há projetos subnacionais em estágio bastante desenvolvido, além das iniciati-vas em escala nacional. Em escala nacional, tem-se o Fundo Amazônia, que é um fundo voluntário

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criado pelo Governo Brasileiro para receber doações de países, empresas, indivíduos e para investir o dinheiro em ações de prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento, bem como a promo-ção da conservação e do uso sustentável das fl orestas na Amazônia. O Fundo Amazônia apóia ações divididas em quatro linhas principais: (i)-Florestas Públicas e Áreas Protegidas (Gestão e Serviços Ambientais); (ii)- Atividades Produtivas Sustentáveis; (iii)- Desenvolvimento Científi co e Tecnológico e (iv)-Desenvolvimento Institucional e Aperfeiçoamento de Mecanismos de Controle.

Até julho de 2010, haviam sido submetidos 70 projetos, sendo que seis estão aprovados para rece-bimento dos recursos25. Os projetos que compõem esta primeira etapa de aprovação incluem ativida-des de combate e prevenção ao desmatamento, regularização fundiária, gestão ambiental e territorial, recuperação de áreas degradadas, geração de renda em comunidades, entre outros.

Em termos de legislação nacional, está em tramitação na Câmara dos Deputados um Projeto de Lei (PL 5.586/2009) que prevê a regulamentação das atividades de REDD+ no Brasil. Ela também prevê a possibilidade de desenvolvimento de atividades subnacionais (municipais, estaduais e outras) integradas a um sistema nacional de REDD+, ou seja, as atividades de REDD+ poderiam ser desenvolvidas pelo Es-tado ou outros, desde que estejam integrados a uma estratégia nacional. No entanto, esse PL ainda está em discussão e ainda deve passar por outras etapas de construção até sua aprovação fi nal26.

Enquanto isso, alguns estados da Amazônia também estão trabalhando na construção de suas políticas sobre mudanças climáticas, que incluam atividades de REDD+. O Estado do Amazonas foi pioneiro na construção de sua Política Estadual de Mudanças Climáticas, que regulamenta a questão do REDD+ e serviços ambientais em Unidades de Conservação. O Pará e o Mato Grosso também estão adiantados nesta discussão. Ainda, existem muitos projetos de REDD+, desenvolvidos por proprietários privados, ONGs e governos estaduais ou municipais. Um estudo recente mapeou sete projetos em situação avançada no Brasil e ainda cinco em estágio preliminar de desenvolvimento (CE-NAMO et al., 2010). Muitos deles são desenvolvidos em áreas protegidas, como é o caso do Projeto de REDD da RDS do Juma ou em terras indígenas, como é o caso do Projeto Carbono Surui.

Segundo a FUNAI, cerca de cinco povos indígenas já fi zeram contato e demonstraram interesse para iniciar a preparação para um projeto de REDD+. No entanto, deve-se ter muita cautela no pro-cesso, contar com parcerias conhecidas e de confi ança, pois o crédito de carbono, sendo um produto que tem valor de mercado, tem atraído pessoas ou entidades privadas que não tem o objetivo de ajudar os indígenas na melhoria de gestão e geração de renda, mas apenas de lucrar economicamente com as fl orestas conservadas das TIs.25 Disponível em: <www.fundoamazonia.gov.br/>. Acesso em: 10. dez. 2010.26 O projeto de lei. Disponível em: <http :// www. camara. gov. br/ sileg/ integras/ 791239. pdf>. Acesso em: 10. dez. 2010.

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2.3.9 Conclusão

Os efeitos das mudanças climáticas têm aumentado a ocorrência de eventos extremos, como tempestades, secas e furacões. Nesse cenário, os governantes dos países se uniram para tentar mitigar o efeito do aquecimento global através da redução de emissões de gases de efeito estufa das ativida-des humanas. As fl orestas têm um importante papel e podem contribuir signifi cativamente para essa redução se forem conservadas em pé. Assim, o REDD+ é um mecanismo que propõe disponibilizar recursos para evitar o desmatamento e conservar as fl orestas.

Na Amazônia, as Terras Indígenas ocupam uma porção signifi cativa de áreas fl orestadas que vêm sendo conservadas enquanto que as regiões de entorno estão sendo desmatadas. Assim, fundos volun-tários ou projetos que são negociados no mercado voluntário podem contribuir para trazer recursos fi nanceiros e implementar sistemas de gestão e geração de renda sustentável em Terras Indígenas. O Brasil tem várias iniciativas e projetos de REDD+ em desenvolvimento e também tem desenvolvido políticas para isso. A importância de incluir povos indígenas e populações tradicionais na repartição dos benefícios é reconhecida mundialmente. Contudo, é preciso ter cautela para adentrar em projetos de REDD+ e contar sempre com a ajuda de parceiros em que se confi a.

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2.4.1 O que é a ACT-Brasil?

Conservação da Amazônia (ACT Brasil) é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) voltada para proteção biocultural da Amazônia e dos povos que nela residem. Sua missão está voltada para o fortalecimento das comunidades tradicionais e para a conservação do meio ambiente.

Para isso, a ACT Brasil apóia as comunidades tradicionais e, em parceria com elas, oportuniza a capacitação das mesmas para que possam adquirir instrumentos de conservação e proteção do meio ambiente.

Dispor toda essa estratégia em campo signifi ca, antes de tudo, entender que o meio ambiente e a biodiversidade são conservados por meio da ação das próprias comunidades existentes.

É por isso que, anualmente, a ACT Brasil, em parceira com inúmeras organizações governamen-tais e não governamentais, destaca seus melhores profi ssionais para promover o Curso de Capacitação de Guardas-Parques Indígenas e Não-Indígenas. Nós entendemos que a conservação ambiental de-pende de pessoas que estejam capacitadas e, principalmente, interessadas em fazer do Planeta Terra um lugar melhor e mais habitável. Essa atitude ajuda a reduzir a poluição e a degradação das fl orestas e garante a saúde dos rios e a riqueza biológica de todos os ecossistemas. 2.4.2 Histórico do Programa

A idéia de formar capacidades de proteção surgiu em 2003, no Estado do Amapá. A iniciativa partiu

do IBAMA e de organizações parceiras que apresentaram, anteriormente, uma proposta para a criação do Curso de Guardas-Parques. A proposta foi apresentada durante o IV Congresso Brasileiro de Unidades de Conservação, sediado em Curitiba.

27 Liderança Indígena Tiriyó, Assessor Técnico da Equipe de Conservação da Amazônia-Macapá, e-mail: [email protected]

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a) Parque Indígena do Tumucumaque

A idéia originou-se de uma antiga demanda das comunidades indígenas em proteger os recursos na-turais e culturais de suas terras para trazer harmonia e bem-estar aos seus povos. No começo, a formação de Guardas-Parques tinha como meta apenas o fortalecimento do programa de vigilância nas Terras Indí-genas. Hoje, entretanto, ele é visto como uma ferramenta muito importante para a capacitação, gestão e a sustentabilidade local.

O projeto se estendeu pelas demais Unidades de Conservação no Estado do Amapá e, atualmen-te, está sendo realizado em outros estados do país. O programa de capacitação de Guardas-Parques já treinou mais de 400 pessoas entre indígenas, não-indígenas e até representantes de outros estados e países. A ACT-Brasil vem trabalhando durante inúmeras conferências nacionais e internacionais para divulgar esse trabalho. O objetivo dessas reuniões é alavancar o desenvolvimento econômico ambientalmente sustentável que abrange, hoje, grande parte do Estado Amapaense e outros estados brasileiros.

b) Capacitação e Treinamento de Guardas-Parques Indígenas

Os cursos são elaborados com base nas necessidades locais levam em conta os conceitos e mode-los nacionais e internacionais de capacitação de pessoas para atuarem na conservação das áreas prote-gidas. Esses cursos contam com o reconhecimento da Federação Internacional dos Guardas-Parques (IRF). Com uma grade curricular diversifi cada, os alunos têm a oportunidade de entrar em contato com as diferentes disciplinas aplicadas à conservação e à preservação do meio ambiente.

Entre os módulos, estão disciplinas como: Valores Culturais, Ecologia, Fauna, Flora, Biodiversi-dade, Legislação Indígena e Ambiental, Combate e Manejo do Fogo, Primeiros Socorros, Ecoturismo, Cartografi a, Radiocomunicação, GPS, Relacionamento Público, Manutenção de Trilhas, Educação Ambiental e outras. Os cursos oferecem elementos técnicos e práticos que preparam os indígenas para atuarem na proteção efetiva dos valores naturais e culturais.

Com dez módulos, o curso possui carga de 160 horas divididas em conteúdo teórico e prático. Ajustada para atender a realidade dos indígenas, a capacitação apresenta uma estrutura fl exível, dinâ-mica e introdutória com grande ênfase nas atividades práticas e didáticas. Essas atividades são alter-nadas nas instruções teóricas em grande proporção, procurando sempre aproximar os participantes

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da realidade através das simulações de situações corriqueiras no seu cotidiano profi ssional. Dinâmicas grupais, interação entre os alunos, refl exão, iniciativa individual, trabalho em equipe e segurança são alguns dos itens característicos deste curso.

Desta forma, os alunos são preparados para enfrentar as situações em campo da melhor forma possível. Eles passam a conhecer os caminhos para superar as difi culdades tanto sozinhos quanto em equipe, utilizando os meios operativos, institucionais e legais para sua pronta solução.

Durante o treinamento, também são oferecidas uma série de atividades de campo como: expedi-ções diurnas e noturnas de monitoramento, vigilância de setores, desenhos e limpezas de trilha, ma-nutenção de equipamentos e estrutura do local onde é realizado o curso e as atividades de educação ambiental. Toda a capacitação é realizada em um período de 20 dias de forma intensiva e em regime de internato. Ao todo, são mais de oito horas diárias de atividades.

c) IV curso de Guardas-Parques Indígenas

Durante o processo, os indígenas se vêem integrados às realidades que as áreas de conservação ambiental enfrentam no que diz respeito às agressões antrópicas. Além disso, eles aprendem a revitali-zar áreas desmatadas ou, ainda, desenvolver ações sustentáveis que possam gerar renda para as comu-nidades da região. Técnicas modernas de resgate e salvamento em territórios de difícil acesso também fazem parte das atividades teóricas e práticas que o curso proporciona.

Público-Alvo:

A atividade é voltada para todas as pessoas que se sentem sensibilizadas pela proteção e con-

servação ambiental, amam a fauna e a fl ora e reconhecem sua importância para o bem-estar de sua comunidade. Os participantes são selecionados pelas lideranças indígenas.

O curso pretende incorporar os indígenas que atuam na área da conservação e preservação am-biental reconhecendo o saber empírico, valorizando e validando o conhecimento tradicional. Desta forma, o curso persegue um fi m altamente ambiental e social, preparando os indígenas de diversas localidades, promovendo a conservação da natureza e gerando renda e condições de sobrevivência às comunidades indígenas.

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d) O que é um Guarda-Parque Indígena?

Os Guardas-Parques Indígenas são os muros de contenção contra os impactos ambientais. Eles protegem e asseguram os recursos naturais e culturais nas áreas protegidas em concordância com as leis vigentes e a sua realidade local. Parte de sua missão é valorizar e fortalecer a cultura e a comuni-dade local, auxiliar os visitantes, participar ativamente dos processos de educação ambiental e monito-ramento, assim como administrar o patrimônio físico presente nas áreas.

A Federação Internacional de Guardas-Parques oferece várias defi nições para trabalho do Guarda--Parque Indígena. Dentre elas pode-se destacar:

“A pessoa envolvida nas práticas de preservação e proteção de todos os aspectos das áreas selvagens, históricas ou sítios culturais”; “Os Guardas-Parques promovem oportunidades recreativas e interpretação de sítios, enquanto promovem relações entre as comunidades locais, as áreas protegidas e a administração da área”; “São os guardiães e os custódios da área”; “O pessoal que enfrenta os problemas em campo e procura soluções”.

e) Como os Guardas-Parques são Identifi cados no Mundo?

● Agente Ambiental Indígena ou Guardas-Parques Indígenas (Regiões do Brasil).● Agentes da Natureza (Portugal).● Guarda-fl orestal (alguns países hispânicos).● Guarda-bosque, Guarda-fl orestal, Agentes de Meio Ambiente (Espanha).● Agente de Vigilância Ambiental (Itália).● Guarda-Parque (Uruguai).● Guarda-recurso (alguns países de Centro-América).● Park Rangers, Rangers ou Park Wardens (Estados Unidos, Inglaterra, Austrália, África do Sul, etc.).

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Reunião com as comunidades indígenas Aula de resgate terrestre e aquático

Aula de Expedição diurna para monitoramento de área Atividade de educação ambiental

Aula de combate e manejo do fogo Aula de Manutenção de equipamento e estrutura local

Prancha 1: Capacitação e Treinamento de Guardas-Parques Indígenas

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f) Porque Treinar Guardas-Parques Indígenas?

Para atuarem de forma ética e efi ciente em áreas protegidas públicas ou privadas, desenvolvendo ações de proteção e conservação dos valores naturais, culturais e patrimoniais. O treinamento forma e instrumentaliza indígenas do Parque Indígena do Tumucumaque e outros para:● Combate a pequenos incêndios;● Vigilância da área;● Realizar palestras sobre educação ambiental nas comunidades, nas escolas, postos de saúde, etc.● Marcar pontos de áreas de invasões, pistas de pousos ou garimpos;● Prestar atendimento de primeiros-socorros;

2.4.3 Resultados

As Terras Indígenas possuem um imenso território, mas como são de difícil acesso e possuem muitas riquezas, tornam-se vulneráveis para os garimpeiros, caçadores, madeireiros e outros explora-dores. Os Guardas-Parques Indígenas querem apenas sua terra para sobreviver. No entanto, com tan-tos problemas afetando o meio ambiente, eles decidiram buscar alternativas para combater e prevenir as ações do branco (karaiwa). Esses exploradores não pensam nas vidas dos que dependem da fl oresta ou das pessoas que estão na fl oresta. Simplesmente pensam no lucro, no dinheiro e na sua vida. Para esses infratores, a natureza é nada. Para os indígenas, é tudo.

Atualmente, os Guardas-Parques Indígenas fazem a própria proteção da sua terra, em virtude dos conhecimentos adquiridos e aperfeiçoados no Curso de Guarda-Parque Indígena. Eles aplicam todas as técnicas e habilidades para desenvolver atividades tanto no programa de vigilância de seus territó-rios, quanto na proteção e na permanência de seus valores naturais e culturais. Os Guardas-Parques Indígenas desenvolvem suas atividades com os equipamentos que têm disponíveis. Muitos utilizam os recursos da própria natureza, outros aguardam por doações para desenvolver essas atividades.

O Guarda-Parque Indígena, Reginaldo Kaxuyana conhece a importância deste trabalho. Em suas palavras: “Nós sabemos fazer do nosso jeito e sempre usamos como os nossos pais têm nos ensinado. Só que a capacitação me deu mais força para proteger nossa terra, utilizando apenas meus conheci-mentos e adaptando-o a realidade atual”.

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Fonte: ACT-Brasil, 2009.

Hoje existem 112 indígenas capacitados em diversas áreas protegidas, aplicando os conhe-cimentos adquiridos e utilizando seu conhecimento tradicional. Eles agem de acordo com suas experiências para monitorar, educar e transmitir o conhecimento cultural dos mais velhos para os mais novos. Dessa forma, é possível manter um ambiente cuidado para sua existência.

No início, o curso atendeu a demanda de algumas TIs. No ano seguinte, vários caciques e líderes indígenas enviaram seus representantes para participar do referido curso, sendo que, hoje, ele é visto como uma alternativa para sua existência e uma forma de prevenir e preservar o seu recurso natural e cultural.

No Brasil, as áreas protegidas estão sendo afetadas por desmatamentos, queimadas, caça, pesca, exploração ilegal da fauna, fl ora e recursos minerais. Gerar capacidade nas comunidades locais, favorecendo a autogestão e possibilitando o manejo sustentável de territórios e recursos signifi cam em grande parte, garantir a conservação do meio ambiente. O curso visa capacitar pessoas que trabalham/moram dentro ou no entorno das áreas protegidas, contribuindo com a própria existência, permanência e valor desses territórios.

Quadro 1 – Cursos Realizados I

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Fonte: ACT-Brasil, 2010.

Nas palavras do Guarda-Parque Indígena Kaxuyana é possível perceber a importância desse tipo de serviço para as TIs: “Os Guardas-Parques Indígenas têm uma grande importância, que nem as abelhas para sua colmeia, pois nós somos vistos pelas comunidades como protetor do território e que temos que zelar pelo patrimônio maior que é seus valores naturais e culturais, independentemente de sua região e localidade. Dessa forma, preservamos a fl oresta em pé, só quem deve aprender e cuidar do meio ambiente, seriam os não índios, não ao contrário, mas precisamos também aprender certas técnicas como usar as ferramentas do homem branco, pois não devemos fi car fora dessa tecnologia que está causando tantas mudanças na nossa terra.” Guarda-Parque Indígena do Apalai.

Disse um Guarda-Parque Indígena Tiriyó: “Temos estilo de vida próprio, na nossa experiência na pintura, dança e língua, e preservamos tudo isso, pois é nossa cultura, portanto devemos preservar para que permaneça intacta na veia dos indígenas. Nós garantimos essa belíssima cultura e mostramos que temos persistência em preservar essa herança dentro dos povos Tiriyó, até então, para espantar os espíritos maus.”

Quadro 2: Cursos Realizados II

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De acordo com relatos de Guardas-Parques Indígenas dessa localidade e da própria comunidade, Amauri Umuke Tiriyó tem aplicado sua experiência e realizado um bom trabalho dentro da sua comu-nidade, na aldeia Boca do Marapi. Amauri realizou atividades juntamente com a comunidade, fazendo sensibilização das crianças, catando lixo e ensinando-as a jogar no lugar certo. Também construiu lixeiras em vários pontos da aldeia. Essa foi a experiência do segundo Guarda-Parque Indígena da área do Tumucumaque Oeste, no sul do limite da reserva.

Desde 2005, as expedições no Parque Indígena Tumucumaque fazem parte do calendário de atividades da ACT Brasil. Em parceria com a ACT, a APITIKATXI e APITU, os Guardas-Parques Indígenas desenvolvem essas viagens por boa parte dos rios Marapi, Paru de Oeste e Paru de Leste, os três principais rios da região. As expedições percorrem aproximadamente 500 km de áreas bem preservadas e visitam mais de 30 aldeias.

No período de inverno, o passeio dura aproximadamente 15 dias e durante o verão o trajeto é feito em 25 dias. Nesse período, os Guardas-Parques têm a oportunidade de se reunir com as comu-nidades e lideranças indígenas para discutir ações que promovam a melhoria da comunicação. Na oportunidade, também discutem questões ligadas à proteção e ao planejamento de atividades futuras. Juventino Kaxuiana, um Guarda Parque Indígena atuante disse: “Através da expedição podemos con-versar pessoalmente com as lideranças e comunidades, pois somente dessa forma podemos ter uma certeza das problemáticas que acontecem dentro das comunidades e discutir várias formas de resolver e além de discutir a busca de parceria”.

É de suma importância para os Guardas-Parques fi car mais próximos e observar os problemas das comunidades. Proteger uma área tão imensa e intensa não é tarefa fácil, pois muitos deles possuem difi culdades de equipamentos. Segundo Cacique Pedra da Onça, Arentina Tiriyó, disse: “Os Guardas-

Fonte: ACT-Brasil (2010).

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-Parques da minha aldeia têm a responsabilidade de repassar todos os conhecimentos que eles apren-deram no curso para seus fi lhos e seus netos, mas pra eles desenvolverem melhor seus trabalhos tem que ter equipamentos, porque muita vontade eles têm, mas não têm equipamentos”.

Discutir e debater temas relacionados ao meio ambiente e proteção de animais silvestres, fi cou mais frequente dentro das aldeias. Graças ao curso, os alunos participantes, adquirem outra visão, uma sensibilidade maior sobre o assunto. Hoje em dia, já podemos encontrar lixo mais tratado nas aldeias, alguns até reciclados como: garrafas pet, pilhas e baterias usadas, descartadas e armazenadas em ca-rotes de 50 litros. Todas essas instruções são repassadas durante aulas do curso de Guardas-Parques. Com mais sensibilidade, esses guardas também desenvolvem pequenas ações junto comunidade, entre elas os “mutirões”, contando com a participação de todos na limpeza das aldeias.

Com quase quatro milhões de hectares, os indígenas sempre tiveram uma perspectiva de fartura. Em todos os comentários e observações, eles mencionam que a natureza sempre se encarrega de re-por aquilo que foi tirado. De fato, a natureza faz sua parte, mas é preciso lembrar que tudo o que se retira e não se repõe, um dia pode acabar. Essa frase foi repassada aos alunos por um instrutor durante o Curso de Guardas-Parques. Notou-se, o afl oramento da sensibilidade, mudando totalmente os seus conceitos.

Nas palavras de João Evangelista, Guarda Parque Indígena atuante: “Antigamente eu não me preocupava com a minha terra, achava que toda essa fartura nunca iria acabar, porque era muito gran-de e tinha muito animais, mas depois do curso eu tive outra visão e agora eu sei. Se eu não proteger minha terra, um dia isso tudo vai acabar e meus fi lhos não terão a oportunidades de presenciar o que presenciei”.

Durante a expedição, os Guardas-Parques e lideranças se reúnem por vários dias em reuniões dentro das aldeias. Lá eles discutem formas e alternativas de melhoria da proteção e do bem-estar dos povos indígenas daquela região. “Hoje sabemos que muitos dos nossos jovens são guardas-parques capacitados e sempre se reunimos e os ensinamos a importância de proteger nossas fl orestas, para que eles possam repassar para seus fi lhos”, diz Pedro Ashefo – Cacique Pedra da Onça.

Pedro sempre se preocupa com a proteção do meio ambiente e garante que faz o controle da caça e pesca de sua aldeia. Ele continuou: “Sempre ensino o povo da minha aldeia a matar somente o necessário pra sua família e hoje esses ensinamento já faz parte da rotina dos Guardas-Parques que sempre estão passando isso para minha comunidade”.

O controle da caça de animais silvestres se tornou um meio de proteção e controle da matança. Hoje em dia, os indígenas já sabem que se eles não cuidarem de suas terras e não evitarem a mortan-

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dade exagerada de animais, esses recursos fi carão escassos e a comunidade fi cará com fome. Hoje, pode-se dizer que o Parque Indígena do Tumucumaque Paru de Leste e Oeste está bem preservado. Áreas muito densas e intocadas pelo homem, animais que, em outros locais, estão ameaçados de ex-tinção, rios limpos, madeiras de lei e árvores centenárias ainda fazem parte do cenário daquela região. Disse Makwapoty Apalai, Guarda-Parque Indígena atuante: “Sempre penso no futuro dos meus fi lhos e dos fi lhos dos meus fi lhos. Quero morrer e deixar uma natureza preservada, onde futuramente eles possam usufruir do que hoje eu usufruo hoje”.

A Equipe de Conservação da Amazônia (ACT Brasil) foi uma das instituições pioneiras no País a desenvolver cursos de treinamento de Guardas-Parques, capacitando profi ssionais para atuarem em uma atividade tão específi ca e importante como esta. Para a Equipe de Conservação da Amazônia, o fortalecimento das comunidades tradicionais dentro e no entorno das Áreas Protegidas é uma das principais formas de perpetuar os valores ambientais e culturais.

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28 Transcrição da palestra ocorrida durante o Seminário em 07/06/2010.29 Assessor Técnico da COIAB no escritório de Manaus, e-mail: lfl [email protected]

Primeiro quero cumprimentar a todos que estão promovendo este evento. O pessoal daqui do Governo do Estado, as associações, as lideranças indígenas. Eu sou Lúcio Flores, sou do povo Terena, sou assessor técnico da COIAB, não estar nenhum dos coordenadores aqui devido às suas agendas, mas eu estou assessorando constantemente a COIAB ali em Manaus, a partir do Centro de Informa-ção e também nesse tema ambiental.

Quero em nome da COIAB agradecer ao convite que foi direcionado a nós, e também aqui estra-nhando um pouco a pequena participação indígena. Isso a gente sente muito por causa da situação das agendas do Estado, mas, seria legal que tivesse mais parentes aqui, não? Bastante, para gente conversar muito. Um estado que tem muitos povos indígenas, talvez um número maior seria bastante interessan-te, mas esta é um constatação a partir, como eu disse, do meu desconhecimento da situação no Estado.

Nós estamos atuando há algum tempo dentro dessa questão ambiental e também como a FUNAI fez eu vou fazer um pequeno resgate histórico para que a gente tenha compreensão de por que nós estamos bastante envolvidos neste tema de meio ambiente hoje.

Ela fi ca em Manaus em termo de informação para todos e gostaria em nome da COIAB agra-decer o convite feito para nós podermos explanar as condições indígenas e gostaria que pudessem ter números maiores de parentes para participar e seria melhor para nós a sua presença. Nós estamos atuando por um tempo na questão ambiental.

Estamos tão envolvidos no meio ambiente e nas questões relacionadas sobre o tema ambiental e agora territorial também. Primeiro aqui tem um mapa, que mostra como foi discutido a reunião no Maranhão e em Imperatriz inicialmente. Tratamos de assuntos ambientais e constatações conhecidas no estado e em outras federações. Farei agora um apanhado histórico sobre a atuação da COIAB.

Aqui está o mapa das regiões de atuação da COIAB que vocês podem ver as áreas onde tem as Terras Indígenas, e onde estão as regiões. Desde a última assembléia da COIAB que ocorreu lá no Maranhão, em Imperatriz, nós já temos uma confi guração nova com outras regiões que ainda não es-tão nesse mapa, mas é um número bastante elevado de regiões ou de organizações indígenas que estão ligadas à COIAB e onde a COIAB tem atuação mais forte com as organizações.

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Figura1: Mapa das Regiões de Atuação da COIAB.

Fonte: COIAB (2010).

Havia no início um vácuo na questão ambiental, tanto na discussão do movimento indígena como na discussão com o próprio Governo no tratamento quanto às terras indígenas. Por um longo tempo nós tínhamos outras prioridades como demarcação, educação, saúde. Esses temas continuam, no entanto, nós indígenas a gente sempre diz, nós cuidamos muito bem do meio ambiente sempre afi rmamos isso e é verdade. Sempre tratamos muito bem o meio ambiente. Mas, nós não tínhamos ainda um trabalho mais técnico, com ferramentas para fazer isso e até com outras parcerias. E, neste sentido é que alguns fatos foram interessantes quando nós passamos a entender que a questão am-biental, deveria continuar mantendo as nossas tradições, a nossa história de respeito ao meio ambiente, mas que nós deveríamos buscar também algumas ferramentas, alguns instrumentos técnicos e tecno-lógicos para que a gente pudesse fazer uma boa gestão dos nossos territórios, como nós vimos aí, em torno de 12 % do território nacional.

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E aqui alguns fatos que foram marcantes nessa fase. Dois fatos que foram importantes na COIAB especifi camente: o Departamento Etnoambiental criado em 2004 com apoio de alguns parceiros. A COIAB fi nalmente criou seu Departamento Ambiental e nós estávamos no começo pela necessidade do começo para o estudo e alguns fatos marcantes nesta fase, onde nós éramos três 3 pessoas que trabalhavam nesta proposta, eu e um outro parente já falecido chamado Jorge Terena e também um outro assessor Manoel que estávamos tentando montar uma proposta de gestão ambiental em Terras Indígenas e como funcionaria um Departamento Ambiental na COIAB, numa época em que a gente não discutia ainda isso tecnicamente, então foi um período assim porque também, nós não estávamos diretamente indo para as áreas técnicas do meio ambiente.

E, também, no ano de 2006, foi criado no caso o Centro Amazônico de Formação Indígena a que tem um representante nosso lá. Já temos formado algumas turmas pra toda a Amazônia, onde o foco é a questão ambiental, é a gestão dos territórios e são os projetos de sustentabilidade para as Terras Indígenas. E aí no nível do governo nós vemos questões agora a pouco que as coisas também estavam caminhando paralelamente, nós temos o trabalho entre o Governo e as lideranças indígenas e parceiros e organizações indígenas, como já vimos anteriormente, PPTAL, PDPI e Carteira Indígena mais recentemente.

A atuação política da COIAB a partir de 2003, numa primeira reunião com o Governo, nesse período a COIAB naquela época, ainda com a política com o horizonte do PNGATI, com os planos indígenas do PNGATI e algumas lideranças de outras regiões do país, buscou uma reunião com o Governo para discutir a questão da gestão ambiental. Uma vez que ainda não havia nada de muito concreto nessa área.

Então a demanda levada foi exatamente isso a gestão ambiental nas terras indígenas. Uma vez que se começava ou se intensifi cava a questão das mudanças climáticas e havia os primeiros sinais dos me-canismos de REEDs que a gente provavelmente vai ver aqui alguma coisa e, também onde se procurava entender mais algumas propostas de grandes projetos e também uma análise de como esses projetos impactaram as Terras Indígenas, como hidrelétricas, rodovias. Então, havia essa preocupação muito forte e essa primeira equipe se reuniu com, setores do Governo para discutir a questão da gestão ambiental.

Aí foi criado então um GT, um Grupo de Trabalho, o GEF Indígena e houve a construção da primeira proposta do projeto. E nesse momento estavam a COIAB, a APOINME (Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e espírito Santo) e as lideranças indígenas de todo o Brasil. A princípio era uma proposta para a Amazônia depois se estendeu para uma proposta para o Brasil todo e, esse foi um projeto que foi construído em conjunto, as lideranças indígenas, esse GT e os setores do Governo, parceiros que tiveram sempre apoiando a construção dessa proposta.

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Vejam que neste período tem o surgimento de outras organizações indígenas que na época inicial era apenas COIAB e APOINME aqui surge já a ARPINSUL (Articulação dos Povos Indígenas do Sul), ARPIPAN (Articulação dos Povos Indígenas do Pantanal) e ARPINSUDESTE (Articulação dos Po-vos Indígenas do Sudeste) são organizações de outras regiões, a ARPINSUL é uma organização dos estados do Sul, ARPIPAN é do Pantanal e região e a ARPINSUDESTE é da região sudeste do Brasil mesmo.

O nascimento destas organizações nasce no contexto da gestão ambiental, isso é interessante, porque elas entram para fortalecer exatamente a luta política, mas a partir desse tema do meio am-biente. E isso foi importante porque as organizações começaram a se fortalecer não apenas na questão ambiental, mas politicamente nas regiões elas começaram a se fortalecer.

Daí se criou o “Abril Indígena” que muitos parentes aqui devem ter participado já, que é o acam-pamento Terra Verde que acontece anualmente lá em Brasília com 800 lideranças a 1000 lideranças, quase um grande Fórum Indígena, e a COIAB sempre esteve à frente dessas discussões, por quê? Porque a COIAB desde o início era a organizações indígenas com mais força política a nível nacional e, quem conseguia de fato envolver essas instituições assim como os setores do Governo para fazer essa discussão.

E hoje nós temos a APIBI que é uma articulação dos povos de todo o Brasil e algumas possibilidades de criação de outras organizações regionais que foi aqui, lá no Mato Grosso, em Cuiabá na reunião da PN-GATI nacional alguns dias atrás, temos acompanhado a discussão dos povos da região que estão também criando uma grande organização indígena no estado, e acho que esta aqui é a camiseta deles.

E isso é muito simbólico porque o Megaron o Tukaramon fez, né? Ele tava com essa camisa e ele amostrou assim e disse: “leiam nas minhas costas aqui os nomes. Aqui. Aí tem a APOINME, a AR-PIPAN, a ARPINSUL, a COIAB, a ARPINSUDESTE, aí Megaron disse assim: “onde nós estamos aqui, cadê o nosso nome?”Nós já somos uma organização para estar nessa camiseta também. Nossas organizações eram para estar nessa camiseta aqui também.

Então isso é uma tendência de fortalecimento e crescimento do potencial do movimento indíge-na através das organizações. E ai dentro desse processo todo: Governo, organizações indígena há essa aprovação do projeto GEF em 2008, que semana que vem vamos estar lá em Brasília, já instalando o conselho diretor e levando já uma proposta porque sempre é importante entender isso as organizações indígenas sempre fi zeram o papel de trazer o Governo para discussão e nesse momento o Governo estava desarticulado, sem muitos ministérios vários pensamentos, então os indígenas sempre que iam

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se reunir com o Governo tinha uma reunião antes para se preparar levar uma proposta e apresentar ao Governo. Semana que vem nós vamos nós fazer isso de novo, lá em Brasília. A gente se reúne só movimento indígena faz uma proposta e vamos apresentar quinta e sexta ao Governo. Então esse é um processo que vai ter continuidade.

Ocorre então a criação da GTI da PNGAT através da portaria 278/2008. Aqui é as fotos das reuniões preparatórias com o Governo que nós vamos ter de novo ano que vem e esse grupo, esse GT é que fez a construção do documento base, e ai esse documento base vem inserido o termo gestão territorial, que não havia antes era só gestão ambiental, tanto que PNGATI não tem o T de territorial. Então foi uma luta muito grande que as lideranças discutiram muito e conseguiram colocar dentro do tema agora de gestão territorial, porque as lideranças diziam assim também: “pra nós não é só o meio ambiente, a questão é territorial também” então foi muito importante essa discussão que ocorreu durante esse longo período.

E aí as consultas regionais que já fi zemos em Recife, Curitiba, Campo grande, Cuiabá, além de reuniões prévias. Nós teremos ainda nesse mês, antes da reunião em Manaus vamos ter uma em Ma-capá, uma em Boa Vista e outra em Porto Velho. São reuniões prévias antes de irem para uma reunião grande. As lideranças se reúnem discutem e conhecem o documento já analisam o documento e já chegam um pouco mais preparadas para a grande reunião.

E aí o compromisso político da COIAB com a gestão ambiental e territorial das terras indígenas da Amazônia. A COIAB fez historicamente isso e deve continuar fazendo a defesa dos direitos. Esta-vam recentemente os coordenadores nesta reunião de Altamira no fi nal de semana na questão de Belo Monte que é um tema bastante quente que deve ser feita em alguns momentos a discussão aqui. Mas a COIAB tem feito a defesa dos territórios através da sua força política que está sempre em diálogo com o Governo, através de reuniões diretas ou através de documentos, mas a COIAB tem uma parti-cipação muito forte neste momento e deve continuar o seu compromisso.

Os instrumentos que a COIAB tem: primeiro é o Departamento Etnoambiental que tem um volume de informações já acumuladas que podem ser utilizadas e também o Centro Amazônico de Formação Indígena que é um centro que está na cidade de Manaus, a gente recebe anualmente 15 a 20 estudantes indígenas de todo Amazônia. Daqui do Pará já foram vários pra lá, e nós trabalhamos ali dois cursos: um de Gestão de projetos e outros de gestão etnoambiental e uma das coisas que estão inseridas neste curso, a partir do ano passado de 2009 é a questão do carbono.

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108 SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

Nossos alunos foram para a fl oresta medir árvores e calcular para saber quanto de carbono tem de estoque em suas fl orestas. Essa foi uma das atividades muito interessante que nós começamos a partir do ano passado e devemos continuar, mas exatamente para que os alunos saiam do centro de formação da COIAB, possam ter esse nível de informação também para discutir em suas comunida-des. Além do curso de projetos que ajuda no gerenciamento das instituições e também gerenciamento dos projetos, mas sempre direcionados para área ambiental.

Eu também coloco os membros da GTI que são o Paulo Manchineri que é lá do Acre e o Lau-reço Kricati do Maranhão e também eu, Lúcio e Chico Apurinã que estamos na assessoria. O Chico Apurinã é representante da COIAB em Brasília, tem um escritório de representação lá e eu que faço a assessoria da COIAB para apoiar em Manaus e também através do conselho diretor do GEF que será instalado e o Chico Apurinã e a Sonia Guajajara que é a vice-coordenadora da COIAB que estarão trabalhando diretamente na implementação do GEF Indígena que esse ano deve ser iniciado.

A COIAB busca a criação de uma política de Estado para a gestão territorial e ambiental em ter-ras indígenas e depois os projetos bem sucedidos até como nós vimos o PPTAL o PDPI e o próprio GEF que ainda não está concluído, mas tem um tempo de início e fi nalização.

A discussão do movimento indígena como um todo e sempre a COIAB esteve a frente dessa dis-cussão é de como se criar uma política permanente de Estado para gestão de terras indígenas. Nesse sentido, eu vejo que há uma aproximação com o Governo do Pará e com as instituições parceiras aqui que é exatamente a criação de um mecanismo permanente e nós entendemos que a PNGATI deve fazer já esse primeiro documento que uma vez assinado vai se tornar essa política permanente, então esse é o papel que a COIAB tem feito neste período.

Aí estão os Coordenadores da COIAB: Marcos Apurinã (Coordenador Geral), Sônia Guajajara do Maranhão (Vice Coordenadora), Cleyton Javaé que é o secretário que vêm do Estado do Tocantins e o Cleber Karipuna que é tesoureiro que vem do Estado do Amapá.

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109SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

Bom dia minha gente. Sou Juventino da etnia Kaxuyana do Parque Indígena do Tumucumaque no norte do Pará, só que a jurisdição dos povos do Tumucumaque é na cidade de Macapá. Como o nosso tempo é muito curto, vou fazer uma breve apresentação do que estamos fazendo hoje para me-lhoria do nosso meio ambiente.

A associação dos povos indígenas Tiriyó, Kaxuyana e Txikuyana tem como sigla a APITIKATI. Na foto, podemos ver Marapi e a pedrinha que vocês estão vendo no meio do rio ali, tem uma história.

As associações dos povos indígenas Tiriyó, Kaxuyana e Txikuyana é uma entidade civil de direito civil, privados sem fi ns lucrativos, sem vínculos políticos partidários com sede na cidade de Maca-pá, com prazo de duração indeterminado tendo representação situada na Avenida Mão Luzia 1083, Macapá-AP.

A APITIKATI foi criada em outubro de 2004 com fi nalidade de congregar pessoas, profi ssionais indígenas para desenvolver, elaborar e executar projetos que visem melhorar a qualidade de vida das etnias Tiriyós, Kaxuyanas e Txikuyanas, as quais habitam a Terra Indígena - Parque Indígena do Tu-mucumaque, lado oeste.

A contextualização geográfi ca na terra indígena compreende em uma área de 3.71 milhões de hectares. Possui uma pequena parte da sua área na região noroeste do Estado do Amapá. As etnias Tiriyó, Kaxuyana e Txikuyana concentram se na parte ocidental da terra indígena parque do Tumu-cumaque ao longo do rio Tucharé e Farol do Oeste. A referida região é a principal área de atuação da APITIKATI.

A fi gura 01, onde vocês estão vendo, a seguir, temos o mapa, essa faixa vermelha temos duas áreas: uma é representada pela APITU, que é essa região lá do oeste e o lado leste que é representado pela APITIKATI, nessa faixa a qual eu citei nesse momento.

30 Transcrição da palestra ocorrida durante o Seminário em 07/06/2010.31 Liderança Indígena Kaxuyana, presidente da APITIKATI, e-mail: [email protected]

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Figura 1: Mapa das Terras Indígenas no Amapá e Pará

A situação atual da população indígena na terra do Tumucumaque, apesar de algumas conquistas com a demarcação e homologação de nossas terras, ainda temos grandes desafi os que exigem ações urgentes, sobre tudo para garantia dos direitos constitucionais e fundamentais como o direito de ir e vir e uma boa atenção à saúde e educação para a população que possui hoje aproximadamente 1300 indígenas distribuídos em 28 aldeias.

As organizações indígenas têm um papel importante na gestão ambiental e territorial, pois estão sendo importantes executoras ou coexecutoras de política que deveriam ser geridas pelo Estado. Rea-lizando essas atividades através de gerenciamento de recursos sob forma de projetos e convênios. As organizações indígenas também auxiliam na articulação de políticas, ações e projetos entre as orga-nizações governamentais e não governamentais junto às comunidades. Assim como na participação de indígenas em diversos segmentos para encontrar novas alternativas socioeconômicas e ambientais para uso mais racional dos recursos das terras indígenas.

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111SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

Temos realizado as seguintes ações ambientais: curso de guardas-parques indígenas e tendo como parceiro a ACT Brasil.

Temos realizado as seguintes ações ambientais: curso de guarda parques indígenas e tendo como parceiro a ACT Brasil.

A APITIKATI realizou, em março de 2010, o Seminário Pagamento de Serviços ambientais (PSA), uma proposta para Terra Indígena parque do Tumucumaque tendo como resultando a pactua-ção com uma parceria a METARELA e também a realização do curso específi co para indígena sobre REDDS e PSA, que será realizado agora a partir de sexta-feira dia 11 de junho em Macapá. Também estamos procurando possibilidade de novas parcerias. Também promovemos o intercâmbio com indí-genas do Tumucumaque do lado oeste e indígenas do Xingu através da parceria com o IEPÉ.

Temos como principal difi culdade à falta de implementação do plano de fi scalização e gestão por parte dos órgãos competentes. O acesso ao parque indígena do Tumucumaque, somente é possível via aérea o que onera qualquer ação. Outras questões importantes de serem comentadas aqui são o for-talecimento dos conselhos; o apoio técnico dos projetos implementados por órgãos governamentais; a regulamentação das pistas de pousos do Parque Indígena do Tumucumaque, porque o único acesso que nós temos para o parque é via aérea.

Tem aqui algumas fotos (Prancha 01) para mostrar a vocês. A primeira é uma escola. Infelizmente como foi colocado quando falam em ações urgentes, em construção e ação do Governo infelizmente aqui no parque não funciona. Nesta outra foto aqui é uma escola dentro do parque. Nesta outra é uma pista de pouso e todas elas são irregulares, bem aqui perto é a aldeia, é aqui estão pousando e, aqui os indígenas estão embarcando para daqui a pouco sair. A única pista que hoje está homologada é a pista de Tiriyós, porque lá o exército e a Aeronáutica usam a pista e é usado somente por eles.

Os projetos a serem desenvolvidos pela APITIKATI são: projeto fortalecendo novas aldeias do Tumucumaque lado leste, fi nanciadas pelo recurso do PDPI, o segundo é curso de formação de gestores indígenas e projetos indígenas do Amapá e norte do Pará, também fi nanciado pelo PDPI, complementam o projeto curso de gestores também a parceria fi nanciada também pela ACT Brasil e Banco do Brasil. Projeto fortalecendo novas aldeias do parque do Tumucumaque lado oeste fi nancia-dos pelo PDPI e projetos demonstrativos dos povos indígenas MMA, KFW-Alemanha.

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Principais atividades do projeto: curso de construção de canoas que foi o primeiro projeto pelo PDPI, criação de abelhas, expedição do parque do Tumucumaque para ver a viabilidade de escoamen-to de produtos e também o curso de noções de administração de projetos. E a gente ia lá na aldeia e fazia a prestação de conta. O saldo e tudo isso a gente mostrava pra eles neste projeto.

Na foto, já estão fazendo a expedição do parque em destino da cidade de Oriximiná. Aqui na outra foto é a criação de abelhas, aqui é a administração, esse aqui (foto) é a cachoeira saindo do par-que e já começa muita cachoeira aqui estão descendo e puxando a canoa para seguir a viajem e aqui a prestação de contas que a gente está fazendo. Tem o curso de gestores indígenas de projetos indígenas do Amazonas e do Pará também fi nanciado pelo PDPI, MMA e GTZ da Alemanha com comple-mentação desse recurso também a Fundação Banco do Brasil, APIUWATÁ e parceiros que são uma organização integrada de ação social da Amazônia Oriental, com objetivos de formar um quadro de recursos humanos indígenas para atuarem junto a suas respectivas comunidades no sentido de elabo-rarem, executarem ou gerenciarem projetos que ajudem as referidas comunidades em suas demandas locais, diminuindo assim as suas dependências aos não índios.

Bem, aqui na foto (na Prancha 01 acima) já são os alunos do projeto indígena do Amapá e do Pará que estão fazendo uma apresentação. Também temos a foto (Prancha 01) do curso de guarda parques indígenas que são cursos que são fi nanciados pela Fundação Moore execução de Coordenação da Rosane que é da ACT Brasil em parceria com a APITIKATI.

Objetivo do curso é formar, instrumentalizar indígenas do parque e indígenas do Tumucuma-que para atuarem em combate de pequenos incêndios da área, vigilância da área, marcar pontos de invasões ou garimpos, prestar atendimento de primeiros socorros, realizar palestra sobre educação ambiental, enfi m. Aqui nesta outra foto são cursos que foram realizados em Macapá. Nessa outra foto aqui, eu estou dando palestras para os alunos. Aqui o procurador do Estado. Aqui já estão os alunos indígenas e aqui um dos instrutores de jovens indigenistas. Temos também a estação digital fi nanciada pela Fundação Banco do Brasil execução do APITIKATI, apoio do IEPÉ parceiro ACT Brasil.

O objetivo é promover a inclusão digital para as populações indígenas, principalmente as quais APITIKATI representa. O projeto foi conseguido com a parceria com a Fundação Banco do Brasil através Deputada Janete e aqui a convidamos no dia da inauguração que estava aberta ao público de Macapá. Aqui são os primeiros alunos no dia da inauguração.

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113SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

Atividades e Capacitações desenvolvidas pela APITIKATI

Escolas da Aldeia Boca do Marapi Curso de Guardas-Parques Indígena

Pista de Pouso Aldeia Stº Antonio Pista de Pouso Missão Tiriyó

Curso de Construção de Canoas Curso de Criação de Abelhas

Curso de Gestores Indígenas, alunos do Pará e do Amapá Curso de Gerenciamento de Projetos

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A perspectiva da APITIKATI para o futura é continuar defendendo os direitos dos povos indí-genas, os quais representam e desenvolvem projetos sociais ou econômicos sustentáveis para as comu-nidades indígenas do Parque do Tumucumaque, fortalecendo a cultura, resgatando e aprimorando o artesanato, a arte indígena Tiriyó e Kaxuyana. Fortalecer as atividades dos guardas parques indígenas na área do Tumucumaque e formalizar uma proposta de PSA (Pagamento de Serviços Ambientais). Obrigado, aqui está o nosso contato!

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115SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

30 Transcrição da palestra ocorrida durante o Seminário em 07/06/2010.31 Liderança Indígena Kaxuyana, presidente da APITIKATI, e-mail: [email protected]

No período entre 2007 e 2010, um conjunto de organizações da sociedade civil e instituições públicas no Amapá atuou em parceria para criar o Mosaico de Áreas Protegidas do Oeste do Amapá e Norte do Pará, por meio de projeto fi nanciado pelo Fundo Nacional de Meio Ambiente (FNMA) do Ministério do Meio Ambiente (MMA). O trabalho foi coordenado pelo Iepé - Instituto de Pesquisa e Formação Indígena e mobilizou diferentes grupos populacionais, entre indígenas, ribeirinhos, extrati-vistas e agricultores familiares ocupantes das áreas que formam o Mosaico.

A experiência de criação desse território de ação e os desafi os que agora se colocam para sua consolidação institucional e operacional serão tratados aqui, com objetivo de divulgar o trabalho rea-lizado e indicar pontos que possam contribuir para o debate sobre instrumentos de gestão territorial integrada e participativa.

2.7.1 Histórico e contexto do Projeto Mosaico

O Art. 26 da Lei Nº 9.985/2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), prevê:

“Art. 26. Quando existir um conjunto de unidades de conservação de categorias diferentes ou não, próximas, justapostas ou sobrepostas, e outras áreas protegidas públicas ou privadas, constituindo um mosaico, a gestão do conjunto deverá ser feita de forma integrada e participativa, considerando-se os seus distintos objetivos de conservação, de forma a compatibilizar a presença da biodiversidade, a valorização da sociodiversidade e o desenvolvimento sustentável no contexto regional.

Parágrafo único. O regulamento desta Lei disporá sobre a forma de gestão integrada do conjunto das unidades.”

Posteriormente, o Decreto Nº 4.340/2002, que regulamenta a Lei do SNUC, dispõe:

“Capítulo III - Do Mosaico de Unidades de Conservação Art. 8o O mosaico de unidades de conservação será reconhecido em ato do Ministério do Meio Ambiente, a pedido dos órgãos gestores das unidades de conservação.

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Art.9o O mosaico deverá dispor de um conselho de mosaico com caráter consultivo e a função de atuar como instância de gestão integrada das unidades de conservação que o compõem.”

De modo geral, o que a legislação prevê é: ocorrendo uma certa confi guração espacial – isto é, unidades de conservação e outras áreas protegidas próximas, vizinhas ou sobrepostas – fi ca indicado que se faça a gestão dessa dada confi guração de forma integrada e participativa, com cada parte pre-servando seus objetivos de conservação ambiental e da biodiversidade.Com base na legislação acima citada, em 2005, o Fundo Nacional de Meio Ambiente (FNMA), em cooperação com a Diretoria de Áreas Protegidas do Ministério do Meio Ambiente, lançou o Edital “Mosaicos de Áreas Protegidas: Uma Estratégia de Desenvolvimento Territorial com Base Conser-vacionista” (Edital Nº 01/2005), no qual abriu processo de seleção pública de projetos voltados à “formação de mosaicos de unidades de conservação e outras áreas legalmente protegidas”. No pró-prio Edital, o FNMA esclarece que, em consonância com a Lei do SNUC, para fi ns daquele processo seletivo, estavam sendo consideradas áreas legalmente protegidas:

• aquelas previstas no Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC);• aquelas previstas no Código Florestal Brasileiro;• Terras Indígenas e;• Terras de Quilombo reconhecidas pelo poder público.A proposta do FNMA para processo público de seleção dos projetos de mosaico contemplou

diferencial relevante: uma concepção de proteção que valoriza as terras indígenas e o modo de vida indígena como importantes (e exemplares) para a preservação ambiental e alternativa de vida sustentável. Por extensão, a proposta leva à integração dos grupos indígenas no processo regional de gestão das unida-des de conservação ao tratar claramente as terras indígenas e quilombolas como “áreas protegidas”. Assim, as terras indígenas compõem mosaicos como cooperantes na preservação, respeitadas suas especifi cidades.

Do ponto de vista dos grupos indígenas, esse diferencial não passou despercebido, uma vez que lideranças Tiriyó, Kaxuyana, Wayana e Aparai afi rmaram que não aceitariam aderir ao Mosaico de Áreas Protegidas do Oeste do Amapá e Norte do Pará se as terras indígenas que ocupam passassem a ser tratadas como unidades de conservação ou se o Mosaico fosse uma nova área, englobando e subordinando suas áreas de composição a uma gestão central.

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117SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

Além de prever a formação de mosaicos não compostos exclusivamente por unidades de con-servação, o Edital FNMA Nº 01/2005 trouxe outro elemento diferencial, quando incorporou ao processo a abordagem do Desenvolvimento Territorial em Base Conservacionista (DTBC). Por essa via, a garantia da sustentabilidade e qualidade de vida das populações envolvidas se vincula a ações de proteção e conservação por essas mesmas populações. Formalmente, a obtenção desse resultado fi cou defi nida na obrigatoriedade de elaboração e apresentação de um plano de DTBC como produto do projeto aprovado. De acordo com o FNMA, o objetivo da iniciativa foi:

“(...) integrar e fortalecer os diversos programas e projetos inseridos no SNUC, internos e externos ao MMA, orientados à articulação de iniciativas promotoras da gestão ecossistêmica do território, com intui-to de compatibilizar a conservação da biodiversidade, o desenvolvimento de atividades econômicas e a melho-ria da qualidade de vida das populações dos diferentes biomas brasileiros.” (Edital FNMA Nº 01/2005, pg 07)

Ainda segundo os termos do Edital FNMA Nº 01/2005, a abordagem de DTBC, acrescentada à título de orientação para gestão de mosaico, consiste em:

“(...) estabelecer formas de associação entre desenvolvimento e conservação, estabelecendo e fortalecendo cadeias produtivas/econômicas que têm como base, os produtos e serviços gerados pelas atividades conservacionistas.” (pg. 06)

Com a divulgação do Edital na Amapá, algumas organizações não governamentais e gestores de unidades de conservação estaduais e federais se articularam para participar da seleção, o que resul-tou no envio ao FNMA do projeto “Unidades de Conservação e Terras Indígenas: uma proposta de mosaico para o oeste do Amapá e norte do Pará”, tendo o Iepé - Instituto de Pesquisa e Formação Indígena como proponente e executor.

A parceria para execução do chamado Projeto Mosaico contou com a participação das seguintes instituições, além do Iepé: • Projeto Perimetral Norte (PPN), executado pela Agência de Cooperação Alemã (GTZ);• Associação dos Povos Indígenas Tiriyó, Kaxuyana e Txikuyana (APITIKATXI);• Conselho das Aldeias Wajãpi (Apina);

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• Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Amapá (SEMA-AP);

• Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA)34;

• WWF-Brasil

A Fundação Nacional do Índio (FUNAI) formalizou seu apoio ao Projeto na etapa inicial de adesão, efetivando posteriormente sua parceria por intermédio de sua Coordenação Regional em Ma-capá. O projeto contou ainda com a colaboração de outras instituições para realização de atividades, como The Nature Conservancy (TNC), Associação do Povos Indígenas do Tumucumaque (APITU).

2.7.2 Composição e localização do Mosaico

O processo de defi nição da composição do Mosaico refl ete o próprio processo de mobilização das populações e instituições ao longo da execução do Projeto apresentado ao FNMA. No início, o arranjo incluía áreas de atuação direta ou de jurisdição dos parceiros no Projeto, no caso:

• a porção oeste da Terra Indígena Parque do Tumucumaque e a Terra Indígena Waiãpi, com atuação do Iepé, APITIKATXI e Apina, e sob jurisdição da FUNAI-Macapá;

• a Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Rio Iratapuru, sob jurisdição da SEMA-AP e onde a Secretaria conta com parceria do WWF-Brasil;

• o Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque, sob jurisdição do IBAMA até a criação do ICM-Bio.

A composição inicial contemplava também a população de colonos e ribeirinhos estabelecida em as-sentamentos, regularizados ou espontâneos, próximos à Rodovia Perimetral Norte (BR-210).

Esse arranjo preliminar revela que o processo de adesão ao Mosaico foi também um percurso de aprimoramento na compreensão desse instrumento de gestão por parte de todos os envolvidos, inclusive as instituições parceiras: no início da execução do Projeto, a fi gura de mosaico era abordada de modo não muito claro como uma nova área, que seria objeto de gestão integrada e participativa; ao longo da segunda etapa, quando foram trabalhados a composição do Conselho Consultivo e o Plano

34 Com a criação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), que assumiu a gestão do Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque (PNMT), a parceria no Projeto Mosaico foi conduzida pelo ICMBio, por meio da equipe gestora do Parque.

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119SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

de DTBC, consolidou-se o entendimento do Mosaico como instância de articulação política e parti-cipação, voltada para a promoção e o fortalecimento da integração da gestão das diferentes áreas, por meio da atuação de seu Conselho Consultivo.

Esse processo foi favorecido, a partir de 2007, por algumas oportunidades, como a criação da Floresta Estadual do Amapá, do Parque Natural Municipal do Cancão em Serra do Navio e a Reserva Extrativista Beija Flor Brilho de Fogo em Pedra Branca do Amapari (estes dois, municípios amapa-enses), bem como a retomada da consolidação e implementação da Floresta Nacional do Amapá. Os gestores dessas unidades de conservação se engajaram gradativamente nas atividades para formação do Mosaico a partir de 2008, e se comprometeram a formalizar sua adesão junto ao Ministério do Meio Ambiente.

Durante a segunda etapa do Projeto foi revista a proposição do mesmo em relação à porção leste da Terra Indígena Parque do Tumucumaque e Terra Indígena Paru D’Este. A população indígena na região foi plenamente inserida no debate, tendo, inclusive, tomado a iniciativa de sugerir a inclusão no Mosaico de mais duas unidades de conservação.

Embora as terras indígenas Parque do Tumucumaque e Rio Paru D’Este tenham suas áreas quase ou integralmente situadas em território paraense, não foi prevista no Projeto Mosaico a mobilização de órgãos do Governo do Estado do Pará, pelo fato de todas as relações externas mantidas pelos grupos indígenas do Complexo Tumucumaque ocorrerem no Amapá, inclusive prestação de serviços de saúde e educação.

A confi guração atual do Mosaico, avaliada e validada em plenária do Conselho Consultivo, está assim defi nida:

2.7.3 Metodologia e procedimentos adotados na formação do Mosaico

A mobilização e sensibilização das populações e instituições que deverão assumir a implementa-ção do Mosaico e seu Conselho Consultivo ocorreram da seguinte forma:• ofi cinas direcionadas à participação local, com foco na divulgação do Mosaico durante a primeira

etapa e na defi nição do Conselho Consultivo e do Plano de DTBC durante a segunda etapa;• intercâmbios, com trocas de visitas entre representantes comunitários;• seminários, para consolidação de resultados, com a presença de representantes comunitários;• reuniões com os futuros conselheiros para validação fi nal de encaminhamentos (composição do

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zQuadro 1: Áreas que formam o Mosaico de Áreas Protegidas do Oeste do Amapá e Norte do Pará * Criada em 4 módulos, a Flota do Amapá tem 36.542,14 hectares sobrepostos à RDS do Rio Iratapuru; ** A Resex Beija-Flor Brilho de Fogo tem toda sua extensão sobreposta ao Módulo 1 da Flota do Amapá.Fonte: FUNAI, PNMT, SEMA-AP, PM de Serra do Navio e PM de Pedra Branca do Amapá.

Conselho Consultivo, Regimento Interno do Conselho, Plano de DTBC).

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121SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

Figura 1 – Mapa sobre o Mosaico oeste do Amapá e norte do Pará

2.7.3.1Primeira etapa – divulgação da proposta de Mosaico

Essa etapa teve como objetivos:• Realizar os levantamentos necessários à caracterização do Mosaico, com vistas ao pedido para seu

reconhecimento junto ao Ministério do Meio Ambiente. As informações foram levantadas por meio de metodologias de diagnóstico participativo junto às populações envolvidas e consultas a documentos e estudos sobre a região;

• Difundir e divulgar em nível local a proposta de gestão territorial integrada e participativa, o papel do Conselho Consultivo e a proposta de formular um plano de desenvolvimento de alcance regional e com base conservacionista;

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122 SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

• Criar canais de comunicação e articulação entre as diferentes populações e as condições para que emergisse daí uma identidade territorial referida ao Mosaico e ao desenvolvimento em base conser-vacionista;

• Disseminação de informações sobre legislação ambiental e indigenista.As atividades iniciais de mobilização encontraram muita abertura nas comunidades procuradas.

A região em que se localiza o Mosaico apresenta alto grau de conservação dos ambientes naturais, mas também falta de estrutura. Toda e qualquer proposta potencialmente capaz de operar como canal entre as populações e as instâncias de tomada de decisão são imediatamente acolhidas pelas comuni-dades, suas lideranças e representantes.

2.7.3.2 Segunda etapa – composição do Conselho Consultivo, elaboração do Regimento Inter-no do Conselho e elaboração do Plano de DTBC

Os trabalhos da segunda etapa também foram realizados por meio de ofi cinas, seminários e reuniões. Os objetivos, tal como mencionado acima eram: a defi nição da composição do Conselho Consultivo, a elaboração de seu Regimento Interno e a elaboração do Plano de DTBC.

Confi rmando o entendimento sobre o forte engajamento dos representantes comunitários no processo de formação do Mosaico, o seminário que resultou na defi nição da composição do Conselho Consultivo foi marcado por debates intensos e disputa em torno dos assentos defi nidos. O empenho de algumas lideranças e representantes sinaliza também para um desafi o permanente do Conselho e de todos os envolvidos na implementação do Mosaico: fortalecer os mecanismos de representação e participação, de modo a constituir e consolidar canais de comunicação e informação entre as co-munidades e o Conselho. As grandes distâncias envolvidas, as difi culdades de comunicação e outros problemas de infraestrutura são fatores que contribuem para a perda de legitimidade de lideranças comunitárias, associações e organizações que se veem obrigadas a convergir para os centros de tomada de decisão e acabam por se afastar de suas bases. Ao mesmo tempo, esses fatores também impõem obstáculos à articulação intercomunitária, o que favorece a pulverização da representação.

Para a elaboração do Regimento Interno, o empenho dos representantes comunitários somou-se à maior participação institucional, no geral bastante precária ao longo de toda a execução do Projeto Mosaico. Durante os debates fi cou evidente a importância de um instrumento como o mosaico para a gestão de confl itos intercomunitários. No caso do Amapá, o acesso à terra por parte de pequenos produtores ainda não se faz livre de confl itos, sendo também frequentes os entraves à regularização fundiária. Como consequência, registram-se muitas situações de confl itos localizados envolvendo o

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acesso não autorizado a terras e recursos nas terras indígenas e unidades de conservação, bem como difi culdades para implementação de regras de uso nas zonas de amortecimento.

Na elaboração do Plano de Desenvolvimento Territorial em Base Conservacionista (Plano de DTBC), a estratégia adotada envolveu dois momentos – um de dispersão, realizado localmente; e ou-tro de concentração, reunindo representantes para deliberações fi nais.

Para as ofi cinas realizadas nas comunidades, a elaboração do Plano de DTBC mostrou-se impor-tante em dois sentidos:

• trouxe novas oportunidades de divulgação do Mosaico e suas diretrizes, inclusive a identidade terri-torial referida ao Mosaico;

• permitiu o exercício da representação e a cobrança direta, pelas lideranças locais, quanto ao papel de seus representantes externos no Mosaico e outras situações em que é fundamental a manutenção do fl uxo de informação.

Nessas ofi cinas foram trabalhadas pautas coletivas direcionadas para o desenvolvimento e a sus-tentabilidade como elementos indissociáveis para a proteção e a conservação dos territórios, do am-biente e da biodiversidade. Ao longo dos trabalhos foi possível verifi car como as comunidades vin-culam a geração de renda – tema central na proposta do FNMA para o Plano de DTBC – ao acesso a novas tecnologias em comunicação, à energia renovável e a mecanismos de controle de resíduos sólidos nas áreas protegidas e áreas de assentamento rural.

As propostas para o Plano de DTBC elaboradas nas ofi cinas locais foram apresentadas e deba-tidas em reunião de representantes defi nidos para o Conselho Consultivo. Conforme acordado com as comunidades, as propostas elaboradas localmente poderiam sofrer adequações na etapa de conso-lidação do documento.

Com base nos resultados obtidos nas ofi cinas e na reunião de consolidação, o Plano de DTBC para o Mosaico de Áreas Protegidas do Oeste do Amapá e Norte do Pará está composto por sete ei-xos temáticos: meio ambiente; atividades econômicas sustentáveis; território, fi scalização e vigilância; organização e articulação; comunicação e divulgação; infraestrutura; formação e capacitação.

Para cada um desses eixos foram defi nidas linhas de ação prioritárias comuns a todo o Mosaico. O Plano detalhado para cada área que compõe o Mosaico parte dessa estrutura básica defi nindo den-tro de cada linha de ação os projetos e atividades, de modo que a estrutura básica se multiplica em de-zenas de propostas por área (unidade de conservação ou terra indígena), contemplando as populações que ocupam o entorno a as zonas de amortecimento das diferentes unidades territoriais.

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2.7.4 Conclusão – ganhos e desafi os

Encerrados os trabalhos voltados à composição e formalização do Mosaico de Áreas Protegidas do Oeste do Amapá e Norte do Pará, as atenções se voltam agora para a construção de meios para dar continuidade e assegurar a implementação do instrumento de gestão.

Analisando-se os resultados alcançados, não resta dúvida de que o ponto alto do Projeto foi o interesse das populações locais envolvidas e as diferentes motivações que levaram a esse engajamento. Não resta dúvida, tampouco, da convicção dos diversos grupos sociais envolvidos sobre o valor e a ne-cessidade da manutenção das áreas protegidas, da conservação ambiental e da proteção e valorização da biodiversidade, bem como da urgência na promoção da qualidade de vida aliada à sustentabilidade. Tal convicção acompanhada sempre da expectativa e da demanda pela participação qualifi cada na defi -nição dos caminhos que serão adotados para viabilizar essa pauta.

Há, ainda, muita clareza por parte das populações da região do Mosaico proposto quanto a entra-ves tecnológicos e de infraestrutura. Entretanto, as difi culdades enfrentadas para envolver e integrar as instituições são comparáveis às difi culdades de ordem material. É como se tivéssemos desenvolvido conceitual e teoricamente o instrumental sem termos conseguido colocá-lo em prática. No cotidiano, essa difi culdade opera mais ou menos assim: concordamos, mas não sabemos como encaixar nos or-çamentos; ou é importante, mas não sabemos como adequar às nossas estruturas funcionais.

Concretamente, para o Mosaico de Áreas Protegidas do Oeste do Amapá e Norte do Pará, as difi culdades das instituições resultou num Plano de DTBC elaborado sem o componente institucional. Resta, portanto, para os representantes comunitários no Conselho e para as comunidades do Mosaico, iniciar as gestões para que a adesão ao Mosaico e ao Plano de DTBC ultrapasse a esfera da formalidade para se converter em ações efetivas, atividades e projetos, formulados e executados de modo integrado e participativo. Poucos avanços foram dados nesse sentido, como é o caso das iniciativas do Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque.

De parte das populações envolvidas, os desafi os não são menores: também enfrentam difi culda-des na articulação intercomunitária que precisam ser vencidas de modo a tornar o Conselho do Mosai-co um instrumento forte e efetivo, com infl uência nas decisões sobre a região. Apesar do entusiasmo com a criação do Mosaico, há necessidade de fortalecimento da identidade territorial mais ampla, sem que isso represente riscos à autonomia local que caracteriza toda a região.

Apesar das difi culdades identifi cadas, a expectativa das populações envolvidas é pela implementa-ção do Mosaico e de sua pauta inicial de trabalho que é o Plano de DTBC. Todo o seu engajamento se deu no sentido de fortalecer as áreas protegidas e de promover o desenvolvimento e a melhoria da qua-lidade de vida em consonância com a agenda da conservação ambiental e valorização da biodiversidade.

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Durante vários anos, os indígenas Mebêngôkre-Kayapó da aldeia Moikarakô na TIK (Terra Indí-gena Kayapó, Estado do Pará) fi zeram trabalhos de cartografi a em colaboração com antropólogos e geógrafos do IRD (um instituto de pesquisa científi ca Francês) e do MPEG (Museu Paraense Emílio Goeldi, de Belém)37.

Portanto, apresentaremos neste artigo alguns resultados de uma experiência bastante extensa, em que realizamos atividades de mapeamento participativo a partir de imagens de satélite, com objetivos que foram evoluindo ao passar do tempo em função das demandas da comunidade, das possibilidades dos pesquisadores e dos objetivos de ambos.

É importante especifi car que apresentamos aqui o resultado de um trabalho coletivo para o qual participaram muitas pessoas que estiveram dentro ou fora da aldeia e também em um trabalho que está ainda inacabado, em virtude de continuarmos a melhorar ainda hoje os nossos mapas.

Atualmente, velhos e jovens concordam com a ideia de que é muito importante fazer mapas, pois, no começo da experiência, nós observamos que não sabíamos ler no papel, nem ler os mapas que já existiam, nem fazer os mapas que precisávamos. Foi possível perceber o poder dos mapas, também para apoiar as lutas do povo Mebêngôkre. Agora, nós jovens, já começamos a fazer, ou seja, a apren-der e utilizar sozinhos esse instrumento que antes era exclusivo dos kuben, “brancos” ou não índios.

A aldeia Moikarakô é habitada pelo povo indígena Mebêngôkre, também chamado Kayapó, e conta com cerca de 300 habitantes (fi gura 1). Faz dez anos, que a aldeia se encontra na beira do Riozi-nho, um afl uente do rio Xingu que atravessa a Terra Indígena Kayapó (TIK). Este importante territó-rio indígena homologado em 1991 depois de muita luta se estende sobre 32.840 km2, essencialmente cobertos de fl oresta. Moikarakô pertence ao Distrito de São Félix do Xingu, no sul do Estado do Pará.

35 Pesquisador Indígena Kayapó, Aldeia Moikarakô.36 Antropóloga, Pesquisadora do IRD-Francês, e-mail: [email protected] As nossas pesquisas com mapeamento participativo como ferramenta metodológica foram realizadas nos programas “As Cidades como Lócus do Desenvolvim-ento Sustentável do Território na Amazônia” do CNPq-UFRJ/IRD, “Manejo Atual da Agrobiodiversidade Mebengokre (Pará)” do CNPq-MPEG/IRD, “Aprimoramento das estratégias de vigilância para a fronteira norte da Terra Indígena Kayapó” do PDPI-AFP/IRD e “Outil d’aide à la gestion d’Aires Protégées amazoniennes par les populations locales” do SEAS/IRD. Agradecemos as instituições aqui citadas, os colegas que participaram dos trabalhos e sobre todo a comunidade de Moikarakô.

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Tivemos a ideia de trabalhar com mapeamento nesta aldeia a partir de desenhos feitos no chão, quando os idosos de Moikarakô explicavam para os pesquisadores a história dos Mebêngôkre, dese-nhando as localizações das aldeias antigas e novas, contando as guerras, as cisões e as fundações de aldeias, traçando na terra os caminhos e os rios da “nossa terra”. Dessa maneira, eles faziam compre-ender as dinâmicas sociais e os usos tradicionais do território revelando “os mapas que temos na cabe-ça” que também são os mapas que os permitem andar no mato sem se perder nunca. Finalmente, nos entendemos que mapas podem ser muitas coisas, podem ser, por exemplo, desenhos no chão, podem ser também aqueles que nós já estamos mais acostumados a ver no papel.

Desde então, realizamos vários trabalhos de cartografi a participativa. Para este apresentação, de-cidimos mostrar três tipos de resultados, relativos às três etapas principais da nossa experiência na aldeia Moikarakô e que correspondem também, na verdade, aos diferentes objetivos - e portando diferentes métodos - que executamos ao longo dos anos. Assim, nosso primeiro objetivo geral foi de mostrar o nosso território. Depois fi camos preocupados em registrar os nossos conhecimentos e agora queremos mais resultados para proteger a nossa fl oresta.

Na hora de começar um trabalho, sempre nos perguntamos para quê? E para quem queremos fazer o mapa? Pois, como foi possível constatar durante essas experiências de mapeamento participa-tivo na aldeia, os mapas podem servir para vários objetivos. Podem ser utilizados para mostrar alguma coisa, mas também podem esconder objetos e informações. Dessa maneira, os mapas são um instru-mento de comunicação que é possível utilizar para melhorar o diálogo entre as pessoas, as gerações, as aldeias, as instituições e entre os povos.

2.8.1 Mapas para mostrar o nosso território

Porque e como começamos a trabalhar com mapas? Nós começamos observando os mapas que foram comprados nas livrarias e bancas de jornal das cidades vizinhas. Ficamos muito surpreendidos de constatar que no mapa do Estado do Pará não apareciam os territórios dos indígenas. No lugar da TIK (Terra Indígena Kayapó), nós vimos um espaço que parecia vazio com pouquíssima informação. Constatamos também que não se podiam visualizar corretamente os nomes das aldeias e que as suas localizações eram muito aproximativas ou errôneas, nem os nomes dos rios estavam sempre certos.

Então a primeira demanda da Comunidade Kayapó de Moikarakô foi de fazer um mapa que não possuísse as informações erradas. Contudo, quando os Kayapó perceberam o poder dos mapas, eles quiseram construir outros tipos de documentos que representassem todo o território indígena. “Eles

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dizem que a nossa terra é vazia? Vamos, então, fazer o nosso mapa”. Os primeiros mapas tinham o objetivo de mostrar o nosso território aos que pareciam desconhecê-lo, de fazer reconhecer a sua exis-tência e, sobretudo, os seus limites legais.

Trabalhamos a partir de imagens de satélite Lansat, que são mais facilmente acessíveis. Foi elabo-rado um mosaico de quatro imagens que permite contemplar uma parte signifi cativa da TIK e seu en-torno imediato e iniciar dessa maneira um trabalho de reconhecimento do território de forma global.

Todo mundo na aldeia fi cou impressionado de constatar, nas imagens, o contraste entre a parte de cor verde que é de fl oresta que está na Terra Indígena e a parte rosa que são as áreas das fazendas e áreas desmatadas no entorno da TIK.

Os confl itos relativos à apropriação de terras são extremamente violentos no noroeste da terra Kayapó e se intensifi caram numa frente de desmatamento recente. Através dessas imagens de satélite, podemos observar facilmente o avanço do desmatamento ao redor da TI dos Kayapó. Ao norte e a leste, a TIK está completamente rodeada por áreas de pastagens que pertencem a grandes fazendas e áreas de pastagens menores, plantadas por pequenos produtores migrantes. No sul e no oeste, se expandem progressivamente as frentes da soja. Finalmente, a TIK se parece com uma ilha de fl oresta verde num mar rosa de pastagens e estradas.

Dessa maneira, as imagens permitiram visualizar na aldeia as ameaças atuais sobre o território indígena. Por tudo isso, foi decidido que era importante marcar as fronteiras territoriais que não constavam nos mapas comprados na cidade, desenhando os limites da TIK (com base no mapa e documentos da FUNAI) em cima do mosaico de imagens e afi rmando o contraste entre fl orestas e áreas desmatadas.

Nesse processo e durante uma festa tradicional, quando pessoas de muitas aldeias foram a Moi-karakô 2, os Kayapó decidiram que deveriam deixar de marcar os limites territoriais internos (que mostram as separações entre aldeias) e as diferentes categorias de fl orestas (para evitar a facilitação da exploração ilegal de madeira).

O primeiro resultado cartográfi co teve fi nalmente uma orientação política marcante; o mapa devia representar todo o território, com as aldeias, os rios e os limites corretos da TIK, mas não os conhecimentos botânicos e também não as divisões internas do povo Kayapó.

Trabalhamos muito as legendas: inventamos uma bandeira para nossa aldeia e também quisemos afi rmar que nós mesmos, junto com o nosso território, éramos também parte do Estado do Pará, do Brasil, da América Latina e do mundo.

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Experiência de Mapeamento Participativo

Reunião sobre mapas em Moikarakô O Jovem Bepunu Kayapó e seu tio Pàt’hi, trabalham

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Figura 1: Mapa Mebengokre nhõ pyka,. A Terra Indígena Kayapó e o seu entorno.As imagens de satélite permitem perceber as ameaças territoriais. Fonte: IRD

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O mapa resultante (mapa 1) pode então ser um instrumento de diálogo com os “outros”, os kuben (não índios),, e foi utilizado durante reuniões fora da aldeia para mostrar os limites da TIK, a conservação da fl oresta e a união do povo Mebengôkrê.

2.8.2 Mapas para registrar os nossos conhecimentos

Numa segunda etapa, fi cou evidente que o mapeamento participativo podia também ser utilizado numa perspectiva mais local. Assim como os mapas podem apoiar o reconhecimento do nosso territó-rio pelos outros (não índios), eles também podem constituir um suporte interessante para informações que interessam, em primeiro lugar, aos Mebêngôkre.

Nessa fase, foram fortalecidos os processos de apropriação das técnicas de mapeamento. Na aldeia, às pessoas que desejavam participar tinham a possibilidade de desenhar (objetos, caminhos, lugares,) em cima da base cartográfi ca “vazia” que foi elaborada na primeira fase.

Os jovens mais interessados, como Bepunu Kayapó, organizaram o trabalho em parceria com seus tios mestres (Figura 3). Juntos, fi zemos um registro dos nomes de lugares (toponímia) e dos caminhos, no transcurso da história de uma vida que conta também parte da história do nosso povo. Porque normalmente são os velhos que sabem andar no mato, que conhecem o lugar onde acampar, o lugar para pescar, o lugar para tirar a castanha, o lugar para caçar. Dessa maneira, fi zemos mapas para registrar o conhecimento dos mebenguet (anciões) que são os que sabem muito: os mebenguet conhecem todos os lugares e contam as histórias de nossa terra e as andanças do grupo. Ao mesmo tempo, os jovens procuram os lugares e os caminhos de antigamente nas imagens de satélite e escrevem os no-mes na língua Mebêngôkre.

Essa atividade promoveu o diálogo e transmissão de conhecimento entre gerações. Para fazer esse mapa (Mapa 2), pegamos todos os nomes dos lugares com os velhos Apex Kayapó, Mote Kaya-pó, Pan-i Kayapó, Kapotkamiure Kayapó e colocamos no mapa. Porém, isso foi um resultado que será melhorado futuramente, pois a nossa ideia é de levar o mapa base nas outras aldeias para encher todo o mapa da TIK com nomes de lugares.

A metodologia escolhida para esse próximo trabalho de mapeamento será de distribuir em cada aldeia um ou vários exemplares de mapas “vazios” que serão preenchidos e coloridos com nomes de lugares para depois criar outro mapa juntando todas as informações recolhidas em todas as aldeias.

O nosso objetivo é de mostrar que todo lugar tem um nome e que também pode ter uma história particular. Isso é importante porque os anciãos sabem muitas coisas que os jovens não sabem e que precisaremos ensinar as novas gerações. Nós temos menos oportunidades de andar no mato e de co-

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nhecer o território que no passado, pois a vida dos indígenas na atualidade é mais sedentária. Também é importante registrar a toponímia porque alguns não índios que veem o mato como se fosse tudo fechado podem pensar que aqui não tem índios.

Nós, indígenas, conhecemos os lugares, incluindo os lugares que estão fora da Terra Indígena, pois os lugares chamados hoje São Félix do Xingu, Redenção, Ourilândia tinham outros nomes e eram habitados por indígenas que tiveram que deixar seus territórios para mudar para aldeias como, por exemplo, Gorotire.

Outro trabalho de mapa que fi zemos para registrar conhecimentos tradicionais, foi realizado mais especifi camente com as mulheres de Moikarakô. Os mapas das roças (mapa 3) foram elaborados numa pesquisa sobre agricultura Mebêngôkre, com o objetivo de registrar e valorizar a diversidade das plantas cultivadas a nível de espécies e também de variedades. Para trabalhar na escala da roça cultivada por cada família, fi zemos croquis in situ (no lugar) com ajuda de GPS conjuntamente com as mulheres, para representar a diversidade dos cultivos e a sua distribuição no espaço da roça e do território da aldeia.

Como aconteceu com os mapas dos caminhos, os pesquisadores são solicitados para acompanhar os jovens que querem continuar o trabalho de mapeamento participativo das roças em outras aldeias, onde se registrou as principais variedades de plantas cultivadas (batata doce, inhame, mandioca e, mi-lho), que são muito importantes para a alimentação dos Mebêngôkre.

2.8.3 Mapas para proteger a nossa fl oresta

Como podemos constatar, os mapas foram rapidamente apropriados pelos Mebêngôkre como uma nova ferramenta para a realização dos seus objetivos próprios. Hoje, para muitas pessoas no Bra-sil, os Kayapó ainda são famosos pelo seu caráter guerreiro igualmente como eram considerados no passado. E de fato, os mapas podem constituir uma arma suplementar nas lutas para o reconhecimen-to dos direitos indígenas, para a valorização e a proteção dos conhecimentos tradicionais e também para a proteção da fl oresta e do território.

A fronteira norte da nossa Terra Indígena Kayapó é chamada “linha seca” porque não segue o traçado de um rio, sendo marcada de forma pouca visível na fl oresta e situada ao sul do Município de São Félix do Xingu, onde existem grandes fazendas. A “linha seca” é regularmente atravessada de forma ilegal pelos não índios. Alguns anos atrás, nós fi camos muito preocupados de constatar uma invasão onde existia a presença de grandes áreas desmatadas perto da “linha seca”. Mais tarde, foi pos-

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sível constatar o estrago feito pelos invasores na imagem de satélite. Essa invasão mobilizou as pessoas da comunidade que estavam preocupadas que acabaram por solicitar aos pesquisadores para terem formações em curso de GPS e cartografi a. Nós entendemos que os mapas também poderiam ser uma arma para vigilância e fi scalização e também para planifi car a proteção e o manejo dos nossos recursos.

A partir deste momento que se constatou a invasão e houve a mobilização dos Kayapó para terem formações específi cas em instrumentos cartográfi cos, a gente começou a trabalhar uma escala melhor, com imagens Spot com melhor defi nição que foi adquirida para um dos projetos de pesquisa com o IRD.

Com a Associação Floresta Protegida, associação indígena dos Mebêngôkre do Pará, montamos junto com as outras aldeias da TIK um projeto voltado para vigilância participativa nas áreas protegi-das, onde a gente trabalha com o PDPI, a FUNAI e os pesquisadores. Dessa maneira, foi possível par-ticipar de um curso de agente ambiental em Tucumã e depois na aldeia Pykararãkre, onde nós jovens também aprendemos como reconhecer uma invasão realizada por pescadores ou fazendeiros e como trabalhar como agentes ambientais.

Finalmente, vemos que os mapas podem ajudar na vigilância territorial e também foi nessa oportuni-dade de encontro com as outras aldeias que surgiu a idéia de ampliar o trabalho de mapeamento dos nomes de lugares começado em Moikarakô.

Desde o momento que estamos aprendendo a utilizar o GPS e imagens em defi nição maior, foi possível realizar outros tipos de mapas pensando também no manejo dos recursos para a subsistência e para a geração de rendas no futuro. Por exemplo, os jovens mapearam alguns dos castanhais que se encontram perto da aldeia, com seus caminhos principais (mapa 4). Nesse caso, fomos andando no mato marcando os pontos com GPS e depois colocamos no computador para fazer o mapa do cami-nho em cima da imagem. Esse trabalho foi iniciado com os castanhais. Em conjunto com a nossa As-sociação AFP e as aldeias vizinhas de A’Ukre e Kikretum, trabalhamos recentemente para obter uma certifi cação da castanha, pois hoje ela é a nossa principal fonte de renda que necessitamos comercia-lizar melhor. Nessa perspectiva, a cartografi a dos castanhais (atualmente em processo de elaboração) é um passo determinante. Também realizamos os mapas individuais como, por exemplo, o mapa do Bari’y Kayapó que quis fazer o seu próprio mapa de caça com GPS (Mapa 5).

Agora queríamos falar do mapa das fl orestas feito pelos jovens durante uma formação de car-tografi a em Moikarakô (Figura 4). A primeira atividade que nós fi zemos foi escolher quatro grupos, quatro turmas para cada uma delas trabalhar numa parte do mapa de Moikarakô. Começamos traba-lhando no ngobe, ou seja, a casa dos homens no centro da aldeia, para desenhar na imagem de satélite,

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Figura 2: Mapa dos caminhos e dos lugares de Apex, Pat-i, Kapotkamjure e Mote.Fonte: IRD

escolhendo uma cor diferente para cada tipo de coisa que podíamos ver na imagem e que queríamos mostrar no mapa. Por exemplo, podemos fazer de azul o mato fechado e a lagoa de vermelho. Pode-mos ver uma roça que chamamos de puru tum, quer dizer roça velha e pintar ela de uma cor diferente do que a puru ny que é uma roça nova e assim por diante. É importante fazer a legenda juntos para decidir o que queremos mostrar com o mapa, que cores e desenhos vamos utilizar, pois essas coisas que colocamos aqui são as informações que irão aparecer no mapa fi nal. Aí fi camos curiosos para irmos aos lugares que estão desenhados no mapa.

Então, os quatro grupos andaram no mato para tirar os pontos do GPS de tudo o que está na legenda: da fl oresta batuk, da fl oresta vermelha, das roças, das aldeias, de uma serra e um rio que se chama rio teporen, o Riozinho onde nos moramos. Depois colocamos os resultados no computador e com os pesquisadores, conseguimos fazer um mapa, juntando o trabalho das 4 turmas (Mapa 6).

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Mapas produzidos pelos Kayapó de Moikarakô

Os mapas das roças tiveram o objetivo de registrar a diversidade agrícolaFotos: Pascale de Robert.

Mapas de castanhais e caminhos de acessoFonte: IRD

Mapa dos caminhos de caça Crédito: Bari’y Kayapó

Mapa das FlorestasFonte: IRD.

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Nesse mapa fi nal, essas partes coloridas que vocês agora também podem ver foram as coisas que nós jovens conhecemos um pouco. O mapa das turmas é um mapa sobre a variedade das coisas. Nós temos vários tipos de mato/vegetação. Aí no mapa podemos ver uma lagoa (imo), uma roça velha, uma fazenda (mry nhõ kapót), um tipo de cerrado pintado de amarelo, um açaizal, uma pedra de montanha. Mas, os velhos têm ensinado todos os lugares e falam que ainda tem muita coisa para colocarmos no mapa.

Tem muitos lugares que nós não sabemos. Nós jovens agora fi camos curiosos para conhecer mais outros lugares e andar na nossa terra, marcando o ponto com o GPS. Faremos outros mapas, juntos.

Achamos importante, para terminar, lembrar o que aprendemos no transcurso dessas nossas ex-periências em Moikarakô, que é importante lembrar para todo mundo que trabalha com mapeamento participativo.

Um mapa pode servir para mostrar ou para esconder algum objeto ou informação. O mapa pode legitimar valorizar, servir para reivindicar território, afi rmar identidade étnica, registrar história e conhecimentos, planifi car o manejo sustentável dos recursos e marcar as fronteiras. Na verdade, é uma ferramenta de luta. O mapa também revela diversas representações do mundo.

Então queremos comunicar que nesta experiência em Moikarakô, junto aos Kayapó, os mapas foram e ainda são instrumentos de diálogo entre os kuben (os não indíos) e os indígenas, isto é, entre quem conhece e quem não conhece um lugar, entre quem sabe ler e quem não sabe. Também vimos que podem ser instrumentos de diálogo entre velhos e jovens, entre os Kayapó a sociedade civil e até mesmo com os poderes públicos.

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Boa tarde pessoal. Eu vou falar um pouco da experiência da TNC. Não foi a TNC que fez sozi-nha todas essas coisas que eu vou contar. Foi a TNC junto com vários povos indígenas e várias outras organizações.

Primeiro quero falar sobre a TNC. Não sei se todo mundo conhece. TNC é a abreviação de um nome em inglês, The Nature Conservancy, que é uma organização não governamental ambientalista fundada em 1950 nos Estados Unidos que atua em mais de trinta e dois países, mas sendo aqui na Amazônia que a TNC aprendeu a importância dos povos indígenas para a conservação das fl orestas.

Até pouco tempo atrás, a TNC trabalhava muito com a parte de conservação das fl orestas, dos rios, dos lagos; não entendia muito o papel das pessoas. Foi aqui na Amazônia que a TNC entendeu como é importante a participação das pessoas, dos povos tradicionais, dos povos indígenas, para fazer a proteção da fl oresta. Foi uma lição que a gente aprendeu com os povos indígenas, e por isso, a gente começou a trabalhar com povos indígenas, porque antes não trabalhava. Isso foi de 2003/2004 para cá que a TNC começou a fazer isso.

É bom saber também que a TNC não trabalha somente com Terras Indígenas, mas também trabalha com terras privadas. No Pará mesmo, a gente tem alguns projetos na região de São Félix do Xingu; e em Paragominas temos trabalho com produtores rurais para ajudá-los a fazer o cadastro am-biental, para que eles aprendam a cumprir a lei ambiental e também ajudar a identifi car fi nanciamentos para REDD.

A experiência com Terras Indígenas que eu vou contar aqui, a gente aprendeu em dois lugares, principalmente com os povos indígenas do Oiapoque, e também, em Roraima, com a região da Terra Indígena Raposa Terra do Sol. É onde a TNC tem projeto junto com as comunidades, nesses dois lugares. É ali que temos nossa experiência. Também temos projetos com a COIAB. Apoiamos tanto a parte de formação, o CAFI - Centro Amazônico de Formação Indígena, e também o escritório de representação da COIAB que trabalha em Brasília com política pública. De todos esses projetos é que vem nossa experiência com os povos indígenas em parceria com órgãos de governo e outras ONGs que trabalham nessas regiões.

38 Agrônomo e antropólogo, Coordenador da Estratégia indígena da TNC/ e-mail: [email protected]

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Quando a TNC começou a trabalhar com os povos indígenas, ela descobriu três coisas que orientam o jeito da TNC trabalhar; a primeira é fortalecer a gestão territorial e ambiental das Terras Indígenas. Eu vou falar em cada uma dessas três coisas, mas é bom vocês entenderem que essas três coisas foram lições que a gente aprendeu com a implementação de nossas experiências. As três coisas têm que andar juntas e se essas três coisas não andam juntas uma fi ca fraca e não dá resultado.

Construir: i) processos locais de promoção da gestão territorial e ambiental das terras indígenas é uma coisa fundamental; a segunda coisa, além da gestão da Terra Indígena que aprendemos, é sobre a necessidade de ii) apoiar as capacidades dos povos e das organizações indígenas, porque eles de fato são os responsáveis, os sujeitos que têm que fazer acontecer. Então a gente tem que apoiar este for-talecimento deles; e a terceira coisa é que também iii) o Governo tem que ser fortalecido. Tem muita coisa da gestão ambiental que é obrigação do Governo, e se o Governo não faz fi ca fraco o outro lado. Então tem que trabalhar com as três pernas. Esta três linhas têm que andar juntas porque é isso que permite fortalecer a própria Terra Indígena.

A primeira linha que é a promoção da gestão ambiental na TI, que eu vou falar mais, porque este seminário aqui é sobre gestão ambiental de terra indígena. Então eu vou falar um pouco mais sobre o que a gente está aprendendo sobre gestão ambiental em Terra Indígena, nestes dois lugares que a gente atua principalmente: Oiapoque e Roraima.

A primeira coisa que a gente aprendeu lá é que tem que desenvolver ferramentas. Assim como para fazer uma roça tem que ter enxada, tem que ter o machado, tem que ter a foice, então para fazer gestão ambiental tem que ter a ferramenta certa. Se você usa a ferramenta certa fi ca mais fácil. Se a ferramenta não é boa é mais difícil fazer o trabalho. Então a primeira coisa é justamente desenvolver e usar uma boa ferramenta para fazer a gestão da Terra Indígena. Também aprendemos que não adianta só trabalhar dentro da Terra Indígena. Tem que fazer a gestão da Terra Indígena, mas se os vizinhos estão destruindo tudo, ou se não tem uma conversa bem feita com os vizinhos, às vezes, o vizinho de fora, seja um fazendeiro, seja uma cidade, atrapalha a gestão da Terra Indígena. Então se precisa ter também uma estratégia para reduzir as ameaças que estão no entorno da Terra Indígena.

Agora eu vou mostrar aqui as ferramentas principais que a gente desenvolveu para fazer a gestão da Terra Indígena. Isso aqui, a gente está fazendo junto com os povos indígenas do Oiapoque, tam-bém junto com a FUNAI. Todo esse processo que a gente está vendo aqui também tem a participação da antiga administração regional do Oiapoque, e também a FUNAI-Brasília tem acompanhado esse processo que a gente está desenvolvendo aqui.

A primeira ferramenta é o Etnomapeamento. Para planejar a gestão tem que conhecer o territó-rio. É por isso que o pessoal já mostrou como o Kayapó está fazendo. Já falou antes que tem que ter o etnomapeamento. É olhar o território com o mapa para poder identifi car o que tem nele. Com o mapa, identifi cando os recursos que têm na terra, identifi cando onde é que está mais destruído. Onde é que

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fi ca a caça. Onde é que tem a madeira boa. Onde é que está o invasor que está entrando. Se fi zermos isso no mapeamento, dá para fazer o etnozoneamento.

E o que é o Etnozoneamento? É planejar. Se você já sabe o que tem de bom, o que tem de ruim, o que tem que ser enfrentado, aí o povo tem que planejar para ver como vai atuar naquilo. Aí o ma-peamento e o etnozoneamento andam juntos. Atrás do etnomapeamento, usando o mapa que já foi feito, permite identifi car e mostrar onde é que estão as áreas de uso, onde é que são as áreas de ameaça. Uma coisa vem depois da outra. Com isso, aí sim, já dá para começar a planejar a gestão territorial e ambiental.

O planejamento é defi nir como que vai ser a administração da sua terra, porque gestão territorial e administração do próprio território é quase a mesma coisa. Então tem uma discussão de como a Terra Indígena é coletiva, todos têm que fazer juntos. Não é o indivíduo que faz, não é só uma aldeia sozinha que faz, mas tem que discutir com o conjunto, porque a terra é de todos e a decisão sobre o uso dos recursos é de todos também.

E você começa a fazer a gestão territorial. Depois que você começar a fazer a gestão territorial você tem que avaliar para ver se está dando certo. Se você planejou trabalhar naquela região e que nela não podia caçar mais, porque tinha que deixar a caça recuperar, mas vai que entra um branco naquela área?! Então, tem que ter um monitoramento. Você tem que acompanhar o território, passo a passo, para ver se aquele plano de gestão que você fez está dando certo, para ver se a gestão está funcionando. Então faz parte do plano de gestão saber se a comunidade está fi scalizando, monitorando para ver se aquela decisão que ela fez está certa ou se ela tem que mudar um pouco.

Com isso tudo, a própria comunidade vai ter que discutir isso com o Governo Federal, estadu-al, municipal. Cada um tem alguma responsabilidade aí e, por isso, que é importante as lideranças das comunidades participarem da política pública. A política pública faz parte do plano de gestão.

E tudo isso é permanente. Depois que você faz o plano de gestão, você tem que refazer ele, reavaliar ele, mas isso é o assunto que está se falando o tempo todo aqui, mas a outra coisa que eu vou falar agora, é que a gente aprendeu também com os povos indígenas do Oiapoque, e também de Roraima outra coisa. Não dá para olhar só a gestão ambiental e a gestão territorial, tem outras coisas que infl uenciam na vida da comunidade. A parte econômica, o desenvolvimento infl uencia. A parte da saúde infl uencia a vida da comunidade. A parte da educação, se não está andando bem, se tem muito invasor; a gente não pode só olhar a parte ambiental porque tem outros problemas que estão infl uen-ciando a vida da comunidade. Tem outras coisas que ela precisa, que ela tem necessidade.

Foi aí que começou uma discussão lá no Oiapoque, pois percebemos que para trabalhar a ges-tão territorial, o povo tem que defi nir o que ele quer da vida dele. O que o povo está pensando que ele quer fazer daqui a vinte, trinta anos. Quais são os problemas que o povo está enfrentando e que não

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adianta esconder, não adianta olhar só o ambiental, porque se aquele problema está acontecendo na comunidade, a própria gestão ambiental vai fi car atrapalhando.

Aconteceu uma discussão lá no Oiapoque que a gente quer passar para vocês. Isso que a gente quer passar para vocês da experiência da TNC. Esse assunto do Plano de Vida que para poder fazer gestão territorial, o povo daquela terra tem que pensar o que ele vai fazer do futuro dele, porque isso vai infl uenciar no plano de vida. Então o plano de vida é uma outra ferramenta importante. É uma forma do povo discutir entre ele, e defi nir o que ele acha que tem que ser enfrentado. Às vezes não é nem plano de gestão territorial que é o mais importante, pode ser que o povo decida que tem outra coisa mais importante para fazer. Então tem que ter essa discussão do plano de vida.

Como o pessoal do Oiapoque fez o plano de vida?

Os povos do Oiapoque fi zeram o plano de vida deles para eles mesmos. Não é uma coisa para o branco ver. É uma coisa para eles discutirem nas comunidades. É uma coisa para eles discutirem com os governos. Então, é um documento deles, em que fi zeram várias reuniões para fechá-lo. Primeira coisa que eles fi zeram para elaborar o plano de vida; eles chamaram todo mundo para ajudar eles. Falaram: “Olha pessoal! Vocês têm o plano de vocês. A FUNAI tem um plano, o Governo do Estado tem um plano. De vez em quando, ele quer discutir o plano dele, mas nós queremos que vocês apoiem o nosso plano agora. Se vocês querem nos ajudar, então ajudem o nosso plano de vida. Nós vamos construir um plano. Vamos convidar vocês. Vocês vêm aqui acompanhar nossa discussão, mas nós queremos que o plano federal e o plano estadual se articulem para apoiar nosso plano de vida, e nós vamos fazer uma discussão do nosso plano de vida e queremos que vocês venham!”

E aconteceu isso. O pessoal, ao mesmo tempo em que eles discutiram para fora com o Governo, com as ONGs para fora, eles discutiram para dentro. Fizeram um acordo entre eles. Disseram: “Olha! Nós vamos fazer uma discussão para decidir o que é importante para nós e nós vamos fazer um acor-do, e os projetos nossos, daqui para frente, vão procurar seguir esse plano que a gente está fazendo de futuro. Este plano de vida!”.

Então rapidamente como eles fi zeram, depois que eles fi zeram este acordo com os parceiros e fi zeram este acordo para dentro entre eles, houve uma série de reuniões, e aí teve um apoio que foi de metodologia de ferramenta. A TNC colaborou com isso, a FUNAI participou, outras ONGs partici-param, numa série de reuniões para ajudar eles a fazerem este acordo.

Primeira coisa que eles tiveram que fazer foi identifi car os problemas; a situação que eles estavam vivendo hoje; identifi car os problemas não só ambientais, mas da saúde, da educação, de atividade produtiva, de várias coisas. Depois que eles identifi caram os problemas, eles viram que não dava para

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atacar todos os problemas de uma vez só, tinha muita coisa para ser resolvida. Então eles tinham que priorizar qual era o problema mais importante que eles tinham que enfrentar. Aí eles fi zeram uma discussão, realizaram reuniões em várias aldeias para priorizar o problema. Aí depois que eles identi-fi caram o problema, eles fi zeram uma discussão aonde eles queriam chegar para resolver o problema, que é a discussão da situação futura, porque o plano de vida é um plano para o futuro.

Depois que eles identifi caram e viram qual eram os problemas mais importantes para serem en-frentados, rolou a discussão do que eles queriam para o futuro. “Nós queremos que todos se tornem médicos? Nós queremos que tenha uma universidade na terra indígena? Queremos todos fi car ricos? Ou tem muita ameaça e a gente vai fazer um acordo com os invasores?” Aí rolou a discussão que era para buscar ver a situação que eles estavam vivendo e tentar enfrentar os problemas. Então eles olha-ram para frente. Não olharam um ano, dois anos; olharam vinte, trinta anos. Eles começaram a pensar longe. E aí, isso é a visão de futuro deles. Aí que começou a discussão de projetos; eles viram a situação atual; viram o futuro, e aí foi a discussão do que precisava ser feito para resolver estes problemas, que foi a própria discussão que vai orientar o próprio plano de gestão.

Depois que o pessoal fez essa discussão toda, o que aconteceu? Teve uma assembleia para tomar a decisão se era aquilo mesmo. Então tem um momento que tem que ter um pacto mesmo, um acordo, onde foram identifi cadas as questões principais. Teve uma assembleia que foi um momento que eles acabaram de fechar o plano e chamaram também as autoridades para discutir, falando: “Olha! Vocês têm o plano de vocês; nós também temos o nosso; vocês querem ajudar? Vamos ajudar nosso plano de forma articulada?!”

Agora o pessoal do Oiapoque está preparando o programa de gestão territorial deles, mas eles não estão usando só a ferramenta do etnozoneamento, eles também estão usando o plano de vida como uma ferramenta que está ajudando eles no Plano de Gestão. Então isso foi interessante, porque ajuda a fazer os acordos.

Aqui são fotos (Prancha 1: Fotos 1 e 2) do mapeamento participativo parecido com o dos Kayapó. O pessoal usa fotos de satélite, vai desenhando e chega na discussão do mapa fi nal. Este é o mapa das Terras Indígenas lá do Oiapoque, que também é fruto do mapeamento. Onde eles defi niram: áreas de caça e pesca; áreas para extração de madeira; e as áreas de invasão, que é perto da estrada onde está passando.

Então isto tudo são as ferramentas que a gente viu, daquela estratégia que a gente viu no início da TNC. Das três estratégias, uma é apoiar o Plano de Gestão Territorial, e a segunda?

Não dá para falar de gestão territorial sem falar no fortalecimento dos povos indígenas e suas or-ganizações. Então isso é uma coisa que a gente aprendeu. Se a comunidade está discutindo sua forma de se organizar, ter já uma organização que está fortalecendo o trabalho facilita porque eles que vão ser os responsáveis. Esta foto (Prancha 1: Foto 3) aqui já tem uns três anos. É o pessoal que tava construindo o projeto GEF indígena. É o mesmo grupo que o Aluísio disse, hoje de manhã, que faz

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parte do Comitê Gestor da PNGATI. Aqui nesta foto tem indígena de todo Brasil, da Amazônia, do Nordeste, tem Guarani do Sul, tem do Pantanal. Está todo mundo aqui reunido.

A gente aprendeu que organização indígena, associação ou a própria articulação, não precisa ter nem uma organização, mas ter uma articulação entre as comunidades, isto também é organização. Não precisa ter registrado; esta articulação tem que ser fortalecida. Não é só fortalecimento da boca para fora não, tem que ter fortalecimento técnico. Vai ter que identifi car alguns técnicos indígenas que vão se preparar para implementar o plano, para poder discutir esse plano, e também tem que ter fortaleci-mento institucional.

O próprio povo indígena vai ter que ter organização para poder gerenciar seus projetos. Então junto com o plano de vida, junto com o plano de gestão territorial, tem que caminhar junto o for-talecimento técnico e institucional da organização indígena, seja organização local, seja organização estadual, seja organização nacional ou regional. Por exemplo, um trabalho que a TNC tem feito desde o início: apoiar a COIAB; porque tem algumas negociações em Brasília que envolvem uma discussão muito grande, não é assunto de uma terra ou um estado. É um assunto que envolve a Amazônia toda, então tem que ter articulação indígena para discutir assunto grande, tem que ter articulação para dis-cutir assunto do Estado, e tem que ter articulação para discutir assunto do Município.

Para a gente que trabalha com política pública, as ONGs ou Governo; quando a organização indígena está fortalecida para sentar na mesa para negociação junto com as autoridades, a coisa anda mais rápido. Então, junto com o plano de gestão, tem que andar o fortalecimento, e para isso, precisa de apoio a capacitação indígena, tanto dos gestores que estão atuando na Terra Indígena como pelos gestores de projeto.

Isso que a gente aprendeu também; não dá para construir política pública nacional de Terra Indígena se não der as condições para os índios se reunirem para discutir entre eles. Então antes que tenha reunião grande, tem que dar condições. Isto custa recurso, então o pessoal que vai fazer política estadual, política nacional tem que se organizar para garantir que os indígenas tenham condições de ter uma qualifi cação prévia antes. Antes de chegar na reunião grande com o Governo, tem que ter a preparação dele, entre eles. Tem que estar informado para poder negociar com o Governo. Fazer isso não é um desperdício, um prejuízo, pelo contrário, quando o Governo Estadual, federal investe nisso, a coisa anda mais rápido porque os índios chegam mais fortes e preparados para conversar.

Outro assunto que aos poucos a gente está descobrindo é que o plano de gestão, muitas vezes, na maioria das terras, vai signifi car um projeto econômico, e às vezes, não é a associação indígena que defende os direitos, que vai também ajudar na parte econômica. Aí tem uma discussão começando em algumas regiões da Amazônia sobre empresas indígenas, ou cooperativas indígenas. Como que os povos indígenas vão se organizar economicamente para fazer a gestão do seu recurso? Isso faz parte da construção do plano de gestão.

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Lembra que eu falei das três prioridades? Já falamos da gestão ambiental, já falamos do fortale-cimento dos povos e das organizações, e agora o fortalecimento das capacidades governamentais que é fundamental.

Fortalecimento das capacidades governamentais, que é fundamental e algumas coisas estão co-meçando a andar nesse rumo. A própria construção da Política Nacional de Gestão Territorial e Am-biental de Terra Indígena - PNGATI vai nesse rumo, também a própria discussão da Política Estadual de Gestão de Terra Indígena. Então isso são avanços que estão andando; vai depender disso para poder fazer a gestão da Terra Indígena; depende da fi scalização, depende da proteção do entorno. O Governo tem responsabilidades disso, então ele tem que andar junto e se preparar para cumprir a sua parte no apoio à implementação dos programas indígenas.

Então é muito bom que esteja surgindo o PNGATI. Agora uma coisa importante aqui que a gente aprendeu que é o Sistema Integrado de Gestão de Terras Indígenas. Sistema integrado é assim: o Governo Federal tem que dialogar com Governo Estadual e tem que dialogar com o Governo Mu-nicipal. Eles têm responsabilidades diferentes, mas na hora da construção e apoiar a implementação de um plano de gestão das Terras Indígenas e de uma política eles têm que dialogar, porque têm coisas que dependem dos governos federal, estadual e municipal trabalharem juntos. Exemplo: proteção do entorno de Terras Indígenas, se o Governo do Estado faz um licenciamento de uma hidroelétrica es-tadual sem discutir com a FUNAI o impacto deste projeto, atrapalha a gestão da Terra Indígena. Se a prefeitura resolve fazer uma estrada rasgando o limite da terra indígena, dá problema. Então tem que ter uma responsabilidade que é compartilhada entre os governos federal, estadual e municipal para poder promover a gestão das Terras Indígenas.

O último assunto que eu quero puxar é justamente a questão da sustentabilidade fi nanceira. Por-que tudo bem falar que tem que fazer plano de gestão, que tem que fazer política, mas tem que ter o recurso, porque são necessários recursos para implementar as ações.

Então quando vai discutir o plano de gestão da Terra Indígena de vocês, tem que pensar de onde vem o recurso para implementar esse plano de gestão. O Governo Federal quando vai discutir o PNGATI, ele também tem que identifi car as fontes de recursos, que é responsabilidade dele. Então quanto custa a gestão da Terra Indígena? De onde vai vir os recursos para implementar os projetos que vão ser discutidos? Isto faz parte do próprio plano.

Tendo o recurso, é preciso ter mecanismos fi nanceiros que façam os recursos chegarem de fato nas terras indígenas. Uma difi culdade que a gente viu é que hoje existem alguns recursos, mas não tem como o recurso chegar à terra indígena. Então será que a solução é a criação de um fundo? Algumas regiões estão discutindo; o PNGATI está discutindo o Fundo Nacional dos Povos Indígenas; o Pessoal do Estado falou do Fundo Kayapó.

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Mapeamento Participativo

Fotos 1 e 2: Mapeamento participativo no Acre

Foto 3: Participantes do projeto GEF Indígena

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Figura 1 - Mapa dos locais de atuação da TNC na execução de projetos de gestão territorial e ambiental em terras indígenas.

Então essa coisa do mecanismo fi nanceiro é outra ferramenta. A ferramenta que faz o dinheiro que vai apoiar o plano de gestão para chegar à ponta. A gente já ouviu falar que têm os recursos dos serviços ambientais; têm os recursos de REDD; têm as compensações ambientais; têm a questão das grandes obras que estão gerando a compensação. A gente já aprendeu que a compensação, se não entrar no plano de vida, se não entrar no plano de gestão da Terra Indígena, às vezes é um dinheiro jogado fora que dá mais trabalho do que ajuda. Então, os recursos orçamentários e o próprio recurso da FUNAI e do MMA vão entrar no plano de gestão territorial? Devem entrar! Porque aí fortalece o plano. Não é uma decisão de alguém separado. Todo recurso tem que entrar junto, de forma articulada para fortalecer e apoiar os planos de gestão das Terras Indígenas. Ok gente. Obrigado! Muitas lições...

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39 Bióloga/Antropóloga- Gerente de Gestão Ambiental das Terras Indígenas do Pará- Coordenadora Técnica do Projeto Conservação da Biodiversidade das Terras Indíge-nas do Pará/ email: claudiakahwage @yahoo.com.br/[email protected]

3.1.1 Introdução

No Brasil, independentemente da realização da demarcação física dos territórios indígenas, as variadas determinações legais que vigoram no país garantem em si o reconhecimento dos direitos sobre as terras que os indígenas tradicionalmente ocupam. No entanto, o processo demarcatório é necessário e fundamental enquanto ato governamental de reconhecimento de domínio territorial, e visa precisar a real extensão da posse indígena, a fi m de assegurar os limites demarcados e permitir o ordenamento territorial do país. O processo de demarcação é, então, o meio administrativo para expli-citar e defi nir os limites das terras tradicionalmente ocupadas pelos povos indígenas.

O poder público federal possui a atribuição legal de identifi car, delimitar e realizar a demarcação física dos limites, além de registrar em cartório de registros de imóveis as Terras Indígenas que forem requisitadas por direito pelas comunidades indígenas, nos termos do § 1º do Artigo 231 da Constituição.

A demarcação das Terras Indígenas também possui um valor fundamental para a sobrevivência física e cultural dos vários povos indígenas que vivem no Brasil. A demarcação possibilita o controle que poderá ser realizado pelos povos indígenas sobre os acontecimentos que os afetam e às suas terras, territórios e recursos. Permitirá manter e reforçar suas instituições, cultura e tradições para dar opor-tunidade de estabelecer processos de desenvolvimento sustentável e equitativo baseados na gestão adequada do meio ambiente.

A defesa dos territórios indígenas, através de sua demarcação legal, também permite a preserva-ção de um vasto e diversifi cado patrimônio biológico, assim como o próprio conhecimento milenar acumulado pelas populações indígenas sobre as dinâmicas ecológicas deste patrimônio.

A assinatura pelo Brasil da Convenção sobre Diversidade Biológica durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992, estabelece o compromisso da nação brasileira em estabelecer estratégias, políticas, planos e programas nacionais para áreas protegi-das. Tendo a proteção das Terras Indígenas como uma medida estratégica para o país e para o planeta: porque garante os meios de sobrevivência física e cultural dos povos indígenas; e porque assegura a proteção da biodiversidade brasileira e do conhecimento que permite seu uso racional.

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Frente aos diversifi cados fatores de ameaças e pressões que historicamente afl igem os territórios indígenas, a demarcação em si, assegura que os indígenas tenham força política para fazer valer seus direitos constitucionalmente estabelecidos de usufruto exclusivo dos recursos naturais que garantem sua sobrevivência, mas ela não é a segurança total da inesgotabilidade desses recursos. É necessário partir para promoção de atividade de gestão sustentável desses recursos. A gestão territorial e ambien-tal das Terras Indígenas é atualmente uma atividade eminentemente necessária para garantir o futuro dos povos indígenas e da biodiversidade que se encontra em seus territórios.

São vários os procedimentos administrativos necessários para demarcação das TIs. O processo é em geral lento e depende da disponibilidade de recursos da União para ser completado até o fi nal. O Decreto nº 1.775, de 8/01/1996 institui as setes fases necessárias para homologação da demarcação de Terras Indígenas no Brasil. A sucessão dessas fases resulta normalmente em diferentes graus de classifi -cação das TIs que são: em estudo, identifi cada/delimitada, demarcada/declarada, e homologada.

Nos últimos 15 anos, no Pará como em todo o Brasil, houve avanços signifi cativos nos proces-sos de regularização fundiária das Terras Indígenas, ao mesmo tempo em que houve um expressivo e positivo crescimento demográfi co da população indígena no estado.

Em 1989, 14% da superfície territorial paraense (17.278.573,0471 ha) achavam-se ofi cialmente destinada aos 14 mil indígenas (IDESP, 1989) sobreviventes dos lamentáveis e vergonhosos confl itos provocados pela chegada das várias frentes de expansão agropecuárias que se instalaram em diversas regiões do estado, a partir principalmente dos anos 60, com a construção pelo Governo Militar, das principais rodovias que conectaram a Amazônia ao restante do país.

Já no ano presente de 2010, temos 24,6% do território paraense ofi cialmente demarcado como Terras Indígenas, distribuídas em 52 municípios e sendo ocupadas por uma população já ascendente de aproximadamente 32.840 indígenas40. Temos ainda a possibilidade de aumentar a extensão dos territórios indígenas do estado, pois vinte novas áreas indígenas estão em estudo para sua futura de-marcação (Gráfi co 1).

As Terras Indígenas do Pará acham-se distribuídas em seis mesoetnorregiões41 (Belém, Altamira, Itaituba/Santarém, Marabá/Tucuruí, Redenção, Tumucumaque/ Oriximiná). Cada mesorregião apre-senta um cenário socioambiental específi co no qual as terras e povos indígenas estão inseridos.

40 Os dados populacionais aqui expostos foram coletados de sites do Instituto Socioambiental que contêm informações de cada terra indígena (Caracterização das Ter-ras Indígenas) de cada povo indígena do país (Povos Indígenas no Brasil). No entanto, os dados populacionais desses sites incluem informações atualizadas de 2010 e outras informações menos atualizadas como de 1996, por exemplo. Aqui não consideramos a população indígena urbana do Pará. O censo demográfi co do IBGE de 2000 contabiliza a população indígena do Pará em 37.681 indivíduos, e a Secretaria de Justiça e Diretos Humanos do Estado/Coordenadoria de Proteção aos direitos dos povos indígenas e populações tradicionais contabiliza, em 2008, uma população de 50.000 indígenas, ambos incluíram os indígenas que habitam áreas urbanas.

41 Neste artigo trabalhamos com a classifi cação das mesorregiões que foram estabelecidas pelo Fórum dos Povos Indígenas do Pará. Achamos prudente, para fi ns de análise, reunir as etnorregiões de Oriximiná, Tumucumaque, Santarém e Tucuruí.

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Neste artigo, procuramos enfocar alguns aspectos e características de cada etnomesorregião, jus-tamente com vista a dar um panorama global desses cenários, incluindo suas problemáticas e poten-cialidades relativas às terras e aos povos indígenas que aí vivem.

Os dados e informações aqui apresentados sobre as Terras Indígenas do Pará foram extraídos em, sua grande maioria, de fontes secundárias. Os dados e informações sobre a situação fundiária das Terras Indígenas do Pará foram cedidos pela administração regional da FUNAI-Belém e reorganiza-dos de acordo com a perspectiva das etnomesorregiões que aqui serão exploradas. A grande maioria dos dados e informações sobre a situação socioambiental das Terras Indígenas do Pará foi compilada de dois sites mantidos pelo Instituto Socioambiental (ISA) que expõem as características de todas as terras e povos indígenas do Brasil42. De outro lado, também realizamos pesquisa bibliográfi ca em livros e em artigos da internet que estão citados oportunamente no texto.

3.1.2. Situação das Terras Indígenas do Pará segundo fases do processo demarcatório

Até novembro de 2010, a FUNAI registrou sessenta e nove (69) Terras Indígenas reconhecidas ofi cialmente no Pará (Tabela 1), ocupando uma extensão total de 29.572.982 hectares. Do total das 69 TIs reconhecidas pela FUNAI, 47% (33) estão homologadas, 12% (8) estão identifi cadas e delimitadas; 29% (20) estão em estudo para demarcação; 6% (4) estão somente demarcadas; o restante 6% (4) está em situação especial (Gráfi co 2), das quais, a TI Arara da Volta Grande do Xingu localizada no Município de Senador José Porfírio que se encontra declarada por portaria ministerial como posse permanente dos índios Arara; a TI Amanayé localizada nos municípios de Goianésia e Paragominas, criada por decreto em 1945 e que se encontra atualmente em situação de realização de novos estudos para nova demarca-ção defi nitiva; a TI Turé Mariquita II no município de Tomé-Açu é uma área adquirida pelos índios Tembé se encontra em processo de regularização Fundiária. Finalmente a TI Nova Jacundá, localiza-da no Município de Rondon do Pará que foi regula-rizada como área dominial da etnia Guarani M’byá, grupo migrante do Estado do Mato Grosso do Sul, que comprou uma área de 425 hectares de terra no município, tendo o reconhecimento dominial desta área pela FUNAI (Gráfi co 1). Gráfi co 1 - Situação Fundiária das Terras Indígenas do Pará.

Fonte: FUNAI (2010).42 Características das Terras Indígenas. Disponível em: <http:// pib.socioambiental. org/ caracterizacao.php> e Povos Indígenas do Brasil. Disponível em: <http://pib.

socioambiental.org/pt>. Acesso em: 10 dez. 2010.

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3.1.3 Cenários Socioambientais e Terras Indígenas do Pará

a) Mesorregião Belém

A região denominada Belém, localizada no nordeste paraense, possui cinco Terras Indígenas (Alto Rio Guamá, Turé-Mariquitá I e II, Tembé e Maracaxi) ofi cialmente reconhecidas pela FUNAI. A somatória de suas extensões é da ordem de 282.426 hectares (duzentos e oitenta e dois mil, quatro-centos e vinte seis), representando apenas 1% do total territorial de Terras Indígenas do Pará. As TIs desta mesorregião ocupam os municípios paraenses de Nova Esperança do Piriá, Paragominas, Santa Luzia do Pará, Aurora do Pará e Tomé-Açu.

Essa região é habitada, em sua maioria, pelos índios da etnia Tembé, e também por poucas fa-mílias das etnias Ka’apor e Guajá (grupo seminômade), num total populacional de 1.425 indígenas que em sua maioria falam português. O Tenetehara, da família linguística Tupi-Guarani era a língua indígena falada pelos índios Tembé. No entanto, atualmente, somente as famílias Tembé que ocupam a margem direita do Rio Gurupi falam sua língua materna e também conhecem a língua dos Ka’apor (VALADÃO, 2001)43 . Ka’apor também é uma língua da família Tupi-Guarani, e não é falada por ne-nhum outro grupo conhecido. E mais, esta língua não se aproxima às da família Tupi-Guarani faladas pelos grupos mais próximos geografi camente, Tembé (Tenetehara) e Guajá, apesar de que a língua deste último seja ligeiramente mais parecida, léxica e foneticamente (ibidem).

O bioma presente nas Terras Indígenas dessa mesorregião é o amazônico, constituído em maio-ria de fl oresta ombrófi la densa (74,1%) e com média de 25,9% de formação pioneira44. Essas Terras Indígenas são banhadas por três bacias hidrográfi cas do Pará: a do Gurupi e Litoral Paraense banham somente TI Alto Rio Guamá; e a do Marajó que banha o restante das TIs dessa região.

Atualmente, é região de fronteira agrícola consolidada, mas no passado foi uma das primeiras portas de abertura da Região Amazônica para atividades produtivas do grande capital comercial. Nela, foram construídas bem próximo às Terras Indígenas, várias importantes rodovias federais e estaduais, tais como a BR-010 (rodovia Belém-Brasília) e a BR-316 (rodovia Pará-Maranhão), PA-124, PA-253, PA-140, PA-252, dentre outras, que impactaram de forma intensa a vida dos povos que aí viviam ancestralmente. Talvez seja por isso que as Terras Indígenas da região sejam historicamente as mais ameaçadas e as que mais sofrem pressões dentre as TIs do estado.

43 Disponível em <http://pib.socioambiental.org/pt/povo/Tembé/1022>. Acesso em: 10 dez. 2010.44 É um tipo de vegetação que ocorre nas áreas de acumulação dos cursos dos rios, lagoas ou assemelhados; a fi sionomia vegetal pode ser arbórea, arbustiva ou herbá-

cea, formando ao longo dos cursos dos rios as Matas-Galerias. A vegetação que se instala varia de acordo com a intensidade e duração da inundação.

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Também podemos encontrar na mesorregião de Belém a maioria das espécies ameaçadas de extinção do Pará (ALBERNAZ E ÁVILA-PIRES, 2009), uma vez que as estradas são vetores de ca-nalização das variadas atividades que oferecem ameaças e fazem fortes pressões sobre ecossistemas, fauna e fl ora regionais.

Essas poucas TIs confi guram-se espacialmente de forma bastante fragmentada, formando pequenas e diminutas ilhas de fl oresta cercadas por imensidões de pastagens que foram sendo instaladas com o desen-volvimento de atividades produtivas na região. (Prancha de Imagens 1: Figuras 1a, 1b e 1c).

A Terra Indígena Alto Rio Guamá é a única que tem continuidade com outras TIs. No entanto, essas estão localizadas no Estado do Maranhão. A conexão da TI Alto Rio Guamá (PA) com as TIs Alto Turiacú (MA), Acuá (MA) e Carú (MA) forma uma espécie de “corredor” indígena socioambien-tal com cerca de 1,1 milhão de hectares. No entanto, em solo paraense, não está articulado a nenhuma Unidade de Conservação da Natureza, seja estadual ou federal. No Maranhão, esse “corredor” se conecta à UC federal de Proteção Integral Reserva Biológica do Gurupi.

Localizadas entre o Pará e o Maranhão, essas Terras Indígenas estão em meio a um dos polos ma-deireiros mais tradicionais da Amazônia, onde 18% de todo este território já foi desmatado. Segundo a FUNAI, e relatos da imprensa, milhares de metros cúbicos de madeira foram retirados ilegalmente dessas áreas nos últimos anos. (CARNEIRO FILHO E SOUZA, 2009)

Na mesorregião Belém, apesar de existir algum projeto nessa direção, ainda não houve demarcação de Unidades de Conservação da Natureza, por ser uma área onde não mais se encontram grandes por-ções remanescentes de fl orestas primárias que estejam atualmente localizadas apenas em territórios in-dígenas. Isto difi culta a criação dessas almejadas áreas protegidas, principalmente de proteção integral.

Mesmo diante dessa situação histórica e caótica, – característica de frentes de expansão agro-pastoris –, as populações indígenas remanescentes se mostram resistentes por tentarem manter suas tradições e costumes frente ao contato com os não indígenas e à violação dos direitos indígenas pro-veniente destes.

A Terra Indígena Alto Rio Guamá, habitada pelos índios Tembé, é uma das mais expressivas da mesorregião Belém, tanto em área dominial, população indígena, quanto em problemáticas socioam-bientais. Talvez por estar localizada na fronteira entre os estados do Pará e Maranhão, e por ter ainda parte de seu patrimônio natural preservado. É uma das Terras Indígenas do Pará que mais sofrem pressões, invasões e ameaças. Ao longo de mais de vinte anos, os indígenas têm vivido situações de confl itos vindas de todas as direções provocadas por populações não indígenas, que estão em busca de vários recursos naturais já escassos na região, por conta da dinâmica destrutiva das principais ativi-dades produtivas: indústria madeireira e pecuária extensiva.

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A Terra Indígena Alto Rio Guamá se caracteriza por possuir esse histórico variado, sucessivo e ininterrupto de confl itos fundiários e socioambientais que se intensifi caram na década de 70, quando houve a invasão da reserva. Houve a abertura de uma estrada dentro da TI que ligava a BR-316 ao povoado Garrafão, e da estrada que liga a fazenda de Meyer Karaczinick à Vila de Pau do Remo, atual Município de Nova Esperança do Piriá (IDESP, 1989).

A construção dessas estradas dentro dessa TI, realizada pelo proprietário da gigantesca Fazen-da Meyer, foi embargada em 1988 pela 2ª delegacia da FUNAI. Entretanto, uma ordem de Brasília permitiu sua conclusão no mesmo ano, desde que o proprietário se responsabilizasse por fi scalizar a entrada de pessoas estranhas à área. A fi scalização não ocorreu, e desde então, as invasões continu-aram a acontecer em proporções maiores, facilitadas pelos acessos criados. A área citada sofreu acesso durante anos pelos limites norte, leste e oeste, estando resguardada apenas no limite Sul, onde passa o Rio Guamá. Ao norte, encontrava-se invadida por posseiros que formaram povoados, e a leste por fazendas, destacando-se a do Sr. Meyer Kabaznick, que avançou seus domínios para o território indí-gena em cerca de 4.000 hectares.

A disputa judicial de mais de 20 anos - nove deles apenas no âmbito da Justiça Federal, entre os índios da tribo Tembé, as mais de mil famílias de invasores e o empresário Samuel Meyer Kabacsnik -, felizmente chegou ao fi m neste ano de 2010. Um juiz federal da 9ª Vara, especializada no julgamento de ações de natureza ambiental, proferiu sentença condenando a empresa Indústria de Sabões e Óleos Santa Izabel do Pará Ltda., de propriedade dos Meyers, a indenizar por danos morais e materiais a comunidade indígena Tembé. A decisão judicial também atribuiu aos réus a obrigação de recomporem a área da estrada que corta boa parte da TI Alto Rio Guamá (Diário do Pará 02/09/2010).

A indenização, a título de danos morais coletivos praticados em detrimento dos índios e da coleti-vidade em geral, foi fi xada na sentença no valor de R$ 70 mil. Mas o valor total da indenização a título de danos materiais pode chegar a milhões de reais, uma vez que deverá corresponder, durante mais de uma década, o total de 2 mil toras de madeiras extraídas ilegalmente da TI, além de mais de 20 (vinte) quilômetros de desmatamento que foram realizados para construir estradas. Segundo a sentença, o valor será apurado de acordo com cada espécie de madeira e sobre ele deverão incidir juros de 0,5% ao mês, além de correção monetária (Diário do Pará 02/09/2010).

Na ocasião, a Justiça Federal chegou também a conceder liminar que suspendeu todas as ativida-des madeireiras e as demais de natureza econômica desenvolvidas na área indígena. A mesma decisão mandou apreender todos os equipamentos dos réus empregados na exploração ilícita, lacrar serrarias e proibir o acesso à reserva.

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O problema das invasões por não indígenas da TI Alto Rio Guamá promove uma avalanche de outros problemas relacionais que trazem ameaças e pressionam os recursos naturais que constitucio-nalmente devem ser de uso exclusivo dos índios Tembé.

Constantemente, a área da reserva é utilizada por bandidos e trafi cantes de drogas para o plantio de maconha e desmanche de carros roubados (O Liberal, 17/09/2010). No dia 13/12/2010 uma reportagem do Jornal “O Liberal” intitulada “Tensão Ronda a Aldeia Tembé” publicou a situação de revolta dos índios pelo descaso dos órgãos de fi scalização em resolver a questão das invasões provoca-das pelos trafi cantes e bandidos ao território demarcado. Os índios acabam por comunicar que estarão realizando, com ajuda da FUNAI, a fi scalização das fronteiras invadidas da Terra Indígena.

De outro lado, as pressões sobre os recursos naturais, principalmente o madeireiro, da TI Alto Rio Guamá, continuam com toda força, apesar da recente decisão da Vara de Justiça Ambiental em favor dos índios Tembé. Estudos do IMAZON, divulgados em agosto de 2010, identifi caram que, entre agosto de 2008 e julho de 2009, a exploração ilegal de madeira no Pará atingiu 5.286 hectares de fl oresta em TIs (Terras Indígenas). A grande maioria (90%) dessa exploração em TIs ocorreu na TI do Alto Rio Guamá.

Entre março de 1998 e março de 2008, o Pará foi responsável por 28% das multas emitidas pelo IBAMA em Áreas Protegidas na Amazônia Legal. Das 46 ocorrências de crimes ambientais analisados pela equipe do IMAZON, 41% ocorreram em onze TIs. A Terra Indígena que apresentou maior inci-dência de crimes ambientais foi a Alto Rio Guamá, com 11% das incidências totalizando 15 processos de crimes ambientais (BARRETO; ARAÚJO; BRITO, 2009).

De maneira geral, o cenário no qual estão inseridas as Terras Indígenas da mesorregião Belém não é um cenário propício para conservação, já que não há a presença das UCs, apesar deste ser um centro considerável de endemismo de espécies e ser reconhecido como região prioritária para conser-vação da natureza. A região é zona de consolidação de atividades produtivas e historicamente tem passado por diversifi cados confl itos fundiários de grande magnitude, relacionados à problemática da grilagem de terra por grandes empresas e fazendeiros.

3.2. Mesorregião Santarém/Itaituba

As oito Terras Indígenas ofi cialmente reconhecidas e delimitadas pela FUNAI (Praia do Man-gue, Praia do Índio, Munduruku, Sai Cinza, Andirá-Marau, Kaybi, Bragança-Marituba e Munduruku--Taquara) da mesorregião Santarém/Itaituba não possuem grandes extensões territoriais quando comparadas a outras TIs das mesorregiões Redenção e Oriximiná/Tumucumaque. Sua área totaliza

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2.386.443 (dois milhões, trezentos e oitenta e seis mil, quatrocentos e quarenta e três) hectares, repre-sentando 8% da extensão territorial das TIs do Pará.

Essas Terras Indígenas estão localizadas nos municípios de Aveiro, Barreirinha (AM), Itaituba, Jacareacanga, Santarém, Distrito de Alter do Chão, Belterra e Trairão. A população das oito TIs perfaz um total de 14.327 indígenas, o maior agregado populacional indígena do estado (Gráfi co 4).

A microrregião de Itaituba é habitada por índios das etnias Sateré Mawé, Kayabi, Apiaká e Mun-duruku; e a de Santarém habitada pelas etnias Arara Vermelha, Arapium Borari, Tapajó, Tupaiu, Ta-puia, Kumaruara, Munduruku-Taquara, Apiaká, Jaraqui e Tupinambá.

O bioma presente em todas as Terras Indígenas desta mesorregião é o amazônico, constituído em sua maioria por fl oresta ombrófi la densa (74,2%). As TIs Munduruku e Kaybi, situadas na fronteira dos estados do Pará e Mato Grosso são as únicas que abrigam uma considerável diversidade de tipos de vegetação, tais como: fl oresta ombrófi la aberta (24%), fl oresta estacional decidual (5,2%), áreas de savana (2,5%), e áreas de contato entre fl oresta, cerrado e outros tipos de fl oresta, a saber: contato savana-fl oresta estacional (32,7%), contato fl oresta ombrófi la-fl oresta estacional, contato savana-for-mações pioneiras.

Todas as Terras Indígenas aí localizadas são banhadas integralmente pela grande Bacia do Rio Tapajós, de valioso potencial energético e de memorável beleza cênica, portanto possuindo potencial imenso para o ecoturismo.

A distribuição espacial das TIs dessa região é diversifi cada. Podemos encontrar terras indígenas de diminuta e mediana extensão territorial onde a maioria se encontra dispersa em forma de fragmen-tos territoriais, como na microrregião de Santarém. Além de outras poucas contíguas, tais quais às da microrregião de Itaituba na fronteira Pará/Mato Grosso. Já as TIs Praia do Mangue e Praia do Índio ( Ver Prancha de Imagens 1: fi gura 2) possuem pequenas dimensões territoriais e estão situadas no perímetro urbano da cidade de Itaituba, sendo que os indígenas aí se fi xaram após terem se afastado do seu hábitat natural, distante 400 km do Rio Tapajós, estando sob infl uência direta dos impactos e pressões da Rodovia Federal BR-163.

Todas TIs desta região estão cercadas por diversifi cados tipos de Unidades de Conservação da Natureza, de responsabilidade administrativa federal,45 confi gurando um mosaico signifi cativo de áre-as protegidas, onde as Terras Indígenas, neste caso, são componentes importantes, contudo, não sen-do os elementos centrais, já que sua extensão territorial é bem diminuta em comparação a outros tipos de áreas protegidas aí presentes.

A criação deste mosaico de áreas protegidas nesta mesorregião acabou por propiciar várias situ-ações de sobreposição das TIs às áreas das UCs federais. Este fato não deixa de gerar circunstâncias

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confl itantes e até inusitadas, necessitando de resolução para que os indígenas possam ter acesso aos seus direitos constitucionais que garantam o usufruto exclusivo das riquezas da superfície da terra que habitam ancestralmente.

As Terras Indígenas Bragança-Marituba e Munduruku-Takaquara possuem 100% de seus territó-rios sobrepostos à FLONA-Tapajós46. A Terra Indígena Andirau-Maurau tem 12% de sua área sobre-posta à área do Parque Nacional47 da Amazônia, UC de uso integral, onde não é permitida a habitação de populações humanas, e 3% sobreposta à FLONA Pau-Rosa.

A implantação das Unidades de Conservação, e suas consequentes sobreposições às Tis, também acarretou outros processos inusitados, tais como o de reafi rmação étnica/identitária dos povos indí-genas habitantes das comunidades Munduruku de Taquara, Marituba e Bragança, que se localizam na região do Baixo Tapajós, e cujos territórios, ainda não demarcados, também foram sobrepostos pelos da FLONA-Tapajós, criada em 1974.

Segundo Loris (2006), esse movimento de reafi rmação étnica teve início em fi ns da década de 1990, surpreendendo a história ofi cial que afi rmava a extinção de grupos etnicamente organizados na região desde meados do século XIX. O movimento foi desencadeado, como forma de reação dos indígenas à categoria de “população tradicional”, que lhes passou a ser ofi cialmente atribuída a partir da década de 1990 com a criação das UCs na região. Esta categoria foi incorporada na nova legislação do SNUC (Sistema Nacional de Unidades de Conservação), sancionada em 2000, para identifi car as populações residentes em reservas ambientais, como as Reservas Extrativistas (RESEXs), Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDSs) e Florestas Nacionais (FLONAS) (LORIS, 2006).

As comunidades indígenas citadas realizaram então, o requerimento formal da demarcação física de seus territórios e o resgate propício de suas tradições indígenas. Atualmente, somente nesta região, existem 14 Terras Indígenas reconhecidas pela FUNAI que estão em estudo, esperando um encami-nhamento para serem fi nalmente demarcadas.

As Terras Indígenas de Kaybi e Munduruku estão ameaçadas pela possível implantação de pro-jeto de um grande complexo hidrelétrico (Teles Pires), a ser implementado na divisa dos estados do Pará e Mato Grosso, afetando diretamente os municípios de Paranaíta, Jacareacanga e Alta Floresta. A área alagada de Teles Pires será de 333 (trezentos e trinta e três) quilômetros quadrados (infl uência 45 Parque Nacional da Amazônia, Parque Nacional do Jamanxim, Parque Nacional do Rio Novo, Reserva Biológica do Tapirapé, Reserva Biológica Nascente da Serra

do Cachimbo, Estação Ecológica do Jari, Floresta Nacional do Tapajós, Floresta Nacional de Itaituba I e II, Floresta Nacional de Altamira, Floresta Nacional do Crepori, Floresta Nacional do Jamanxim, Floresta Nacional do Trairão, Reserva Extrativista Riozinho do Anfrísio, Área Protegida do Tapajós.

46 Floresta Nacional é estabelecida com objetivos de promover o uso múltiplo sustentável recursos naturais, garantir a proteção das belezas cênicas e dos sítios históri-cos e arqueológicos, assim como fomentar o desenvolvimento da pesquisa científi ca básica e aplicada, da educação ambiental e das atividades de recreação, lazer e turismo. As populações tradicionais que habitavam uma FLONA à época de sua criação podem permanecer nela e suas situações fundiárias podem ser regularizadas através de contratos de concessão de uso. A visitação pública é permitida, condicionada ao Plano de Manejo da área.

47 Parque Nacional tem como objetivo básico a preservação de ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica, possibilitando a realização de pesquisa científi ca e o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza e de turismo.

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indireta em 3.149 quilômetros quadrados nas duas TIs) para produzir 1.820 MW (mil oitocentos e vinte megawatts de potência) instalada e 911 (novecentos e onze) de energia fi xa. A região de imple-mentação do projeto, muito pouco povoada, abrange grande parte de fl oresta amazônica intocada, povos tradicionais e rica biodiversidade, pontos pouco enfatizados nos estudos de impacto ambiental.

Os primeiros estudos de inventário da bacia hidrográfi ca de Teles Pires foram iniciados em 1980, nos quais foram planejados seis projetos hidrelétricos, depois abandonados até 2001. Em 2005, os pla-nos para seis hidrelétricas (cinco no rio Teles Pires e uma na foz do rio Apiakás, um de seus afl uentes) foram retomados pelas empresas Eletrobrás, Furnas e Eletronorte. Já em outubro de 2010, o IBAMA aceitou o Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) da hidrelétrica Teles Pires, legitimando o processo de licenciamento ambiental do empreendimento.

Felizmente o Ministério Público Federal, logo após a publicação da Licença Prévia dada pelo IBAMA para participação do projeto no Leilão de Energia Nova A-5/2010, a ser realizado pelo Go-verno Federal no dia 17 dezembro de 2010, obteve decisão liminar que impediu, pelo menos momen-taneamente, a participação do empreendimento no leilão48.

3.4 Mesorregião de Altamira

Na mesorregião Altamira, localizada no noroeste do estado, podemos encontrar 11 (onze) TIs ofi cialmente reconhecidas (Trincheira-Bacajá, Kararaô, Cachoeira Seca do Iriri, Arara, Pakiçamba, Apyterewa, Koatinemo, Araweté, Kuruáia, Xipaya, Arara da Volta Grande do Xingu), estando apenas uma delas em estudo para sua futura demarcação (TI Juruna do Km-17). A soma das extensões dessas Terras Indígenas é de 5.487.350 (cinco milhões, quatrocentos e oitenta e sete mil, trezentos e cinquen-ta) hectares, o que equivale a 19% da extensão territorial total das TIs do estado. Estas TIs se localizam nos municípios paraenses de Anapu, Altamira, Placas, Uruará, Medicilândia, Brasil Novo, São Félix do Xingu, Senador José Porfírio e Vitória do Xingu.

Sete Terras Indígenas desta mesorregião são contíguas formando uma espécie de corredor consi-derável de proteção socioambiental (Ver Prancha de Imagens 2: Figura 3). As Terras Indígenas Xipai e Kuruáia de pequenas proporções também são contíguas, mas estão afastadas do “corredor” com-posto pelas TIs Cachoeira Seca do Iriri, Arara, Kararaô, Koatinemo, Araweté, Apyterewa e Trincheira--Bacajá. O restante das TIs está isolado das outras Terras Indígenas, consolidando grandes fragmentos fl orestais circundados por áreas de pastagem.

48 Disponível em: <http://www.oeco.com.br/salada-verde/24653-ibama-libera-mas-justica-barra-teles-pires>. Acesso em 10 dez. 2010.

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Figura 1a - Terras Indígenas da Mesorregião Belém impactadas por rodovias e cercadas por áreas desmatadas. Figura 1b e 1c - TI Turé- Mariquita I (1a) e TI Tembé, pequena extensão territorial, cercada de fazendas. Fonte: ISA (2010).

Figura 2 – MESO REGIAO SANTARÈM ITAITUBA - TIs Praia do Índio e Praia do Mangue (marcadas em seta laranja), situadas na cidade de Itaituba, sobre infl uencia da BR-163. Fonte:

Imagens Terras Indígenas das Meso Região Belém e Santarém/Marituba.

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A população indígena da mesorregião de Altamira é de 2.666 (dois mil seiscentos e sessenta e seis) indígenas de diversifi cados povos tais quais: Kayapó Kararaô, Kayapó, Xikrin Kayapó (Bacajá), Xikrin Kayapó, Arara, Yudjá, Parakanã, Asurini do Xingu, Araweté, Kuruaya, Xipaya, falantes de línguas de famí-lias linguísticas também diversifi cadas como Tupi, Tupi-Guarani, Jê e Karib.

O bioma que compõe o conjunto dessas Terras Indígenas também é o Amazônico, com 68,7% de sua vegetação composta de fl oresta ombrófi la aberta e o restante, de fl oresta ombrófi la densa (31,3%). Quanto à hidrografi a: cerca de 96% das Terras Indígenas desta mesorregião são banhadas pela Bacia do Rio Xingu; 3,7% das TIs pela Bacia do Rio Tapajós; e apenas 0,3% é banhada pela Bacia do Rio Pará.

A colonização desta região é bastante antiga, estabelecendo-se primeiramente pelos ciclos econô-micos de exploração da borracha, peles de animais e outros produtos fl orestais, e posteriormente pela construção de importantes rodovias federais no período do Governo Militar, tendo como exemplo a Transamazônica.

A construção da Transamazônica impactou terminantemente a face socioambiental da região e consequentemente a vida dos povos indígenas que aí viviam em contato já confl ituoso com po-pulações não indígenas pioneiras que estavam ali atraídas pelos ciclos econômicos da borracha e da exploração de peles de animais.

A rodovia trouxe consigo os principais vetores de impactos socioambientais que põem em ris-co a vida das populações indígenas. Foi pernicioso o impacto do próprio processo de construção da rodovia. Depois vieram com ela primeiramente os grandes empreendimentos agropecuários e de mineração, incentivados fi nanceiramente pelo Governo Militar a desbravar a fl oresta em nome do progresso. O governo inclusive desconsiderava a presença dos povos indígenas na região, pois o lema da campanha para colonização da região empreendida pelos militares era “terra sem homens para homens sem terra”. De modo que os diversifi cados povos indígenas que tinham a ocupação ancestral da área permaneceram então a mercê deste projeto de colonização mal conduzido, que poucos anos depois da inauguração foi abandonado pelos militares, e tanto as populações camponesas migrantes que foram atraídas por ele, quanto os indígenas que tiveram a chance de sobreviver a ele, foram forte-mente abalados e desrespeitados em seus direitos.

Atualmente, a área da maioria das Terras Indígenas desta região é paralela à própria rodovia Tran-samazônica, a outras rodovias federais e estaduais, ou a centenas de estradas vicinais que foram pos-teriormente sendo construídas paralelamente à área demarcada dessas TIs, todas constituindo portas de acesso aos seus recursos naturais e ameaças aos direitos indígenas.

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As Terras Indígenas da mesorregião de Altamira são as mais ameaçadas de todas as terras indí-genas por projetos de mineração e garimpo (Ver gráfi co 2). Das onze TIs demarcadas, dez possuem projetos de pretensão minerária e cinco possuem atividades de garimpo sendo executadas em seus territórios. A mineração e o garimpo provocam impactos socioambientais profundos e irreversíveis às terras indígenas, além de trazerem consequências desastrosas para as integridades física e cultural dos povos indígenas.

Também por serem banhadas pela preciosa Bacia do Rio Xingu, todas as Terras Indígenas desta região estão ameaçadas por empreendimentos hidroelétricos. Oito delas, as Terras Indígenas: Trin-cheira-Bacajá, Cachoeira Seca, Kararaô, Arara, Arara da Volta Grande do Xingu, Apytereua, Koati-nemo, Araweté, vão sofrer diretamente ou indiretamente impactos socioambientais perversos pela construção quase irreversível da polêmica hidrelétrica de Belo Monte, considerada a maior obra do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do Governo Federal. O lago da usina terá uma área de 516 km² pertencente a terras dos municípios de Vitória do Xingu (248 km²), Brasil Novo (0,5 km²) e Altamira (267 km²).

Apesar de pretensamente ser um projeto voltado para o desenvolvimento energético do país, propiciando a geração inicial de 11.233 MW (megawatts) com a geração média anual de 4.796 MW, o projeto de acordo com estudos, terá consequências socioambientais desastrosas que nenhum recurso de compensação poderá dar conta de sanar tais como: as Terras Indígenas Paquiçamba e Arara da Volta Grande serão diretamen-te afetadas pela diminuição da vazão do Rio Xingu; a Área In-dígena Juruna do km-17 da PA-415 será afetada pelo aumento do tráfego na estrada; 1982 in-dígenas de 7 TIs serão afetados indiretamente pela provável di-minuição da pesca e impactos sobre a caça; o desmatamento da região também aumentará; e as populações migrantes, ribei-rinhas e quilombolas também serão afetadas pelos impactos da obra. Gráfi co: Pretensão de Mineração e Garimpos em Terras Indígenas do Pará

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Os confl itos protagonizados pelo indígenas que serão afetados pela construção da hidrelétrica acabaram por criar um foco poderoso e positivo de organização indígena voltado para proteção so-cioambiental, nunca antes visto no estado. Os povos indígenas que serão afetados pela construção de Belo Monte também se unifi caram com outros setores, que em muitos casos historicamente eram antagônicos aos indígenas e que também serão prejudicados, criando o momento “Xingu Vivo para Sempre”. Do ponto de vista político, a reação dos indígenas à construção da Hidroelétrica de Belo Monte é positiva justamente porque há a convergência e articulação positiva de seus movimentos so-ciais, que antes eram enfraquecidos por movimentos sociais diversifi cados. Uma práxis política salutar que prepara e dá aos indígenas experiência política nunca antes experimentada por estes ao longo de suas histórias.

3.3 Mesorregião de Redenção

A mesorregião Redenção, localizada no Sul do Pará, possui sete Terras Indígenas (Kayapó, Baú, Xikrin do Kateté, Las Casas, Menkragnoti, Panará, Badjônkôre) ofi cialmente reconhecidas pela FU-NAI. A somatória de suas extensões territoriais é de 10.693.457 (dez milhões, seiscentos e noventa três mil, quatrocentos e cinquenta e sete) hectares, o que equivale a 35% da extensão territorial das TIs do Pará, compreendendo o maior complexo territorial indígena do estado. Além das TIs reconhecidas existe ainda uma em estudo, Kapotnhinore.

Essas Terras Indígenas ocupam, em sua grande maioria, os municípios paraenses de Ourilândia do Norte, São Félix do Xingu, Cumaru do Norte, Bannach, Altamira, Água Azul do Norte, Paraua-pebas, Floresta do Araguaia, Redenção, Pau d’Arco e em minoria os municípios do Estado de Mato Grosso: Matupá, Peixoto de Azevedo, Guarantã do Norte e Vila Rica.

Todas as sete Terras Indígenas ofi cialmente reconhecidas são ocupadas por 5.620 (cinco mil seiscentos e vinte) indígenas de variados grupos da etnia Kayapó49, falantes de língua pertencente à família linguística Jê, do tronco Jê e ainda há presença de índios isolados nas TIs Kayapó, Xikrin do Cateté e Menkragnoti. Segundo Verswijver (2002), existem diferenças dialetais entre os vários grupos Kayapó, decorrentes das cisões que os originam, mas em todos eles a língua é uma característica de maior abrangência étnica, levando ao reconhecimento de que participam de uma cultura comum.

49 Kayapó Gorotire, Kayapó Kuben Kran Ken, Kayapó Kokraimoro, Kayapó Mekragnoti, Xikrin e Kayapó (Kateté).

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O vasto território dos Kayapó está situado sobre o Planalto do Brasil Central, aproximadamente a 300 ou 400 metros acima do nível do mar. É banhado principalmente pela Bacia do Rio Xingu, e somente o território da TI Las Casas é banhado integralmente pela Bacia do Rio Araguaia. Trata-se de uma região preenchida por vales. Pequenas colinas com altitude máxima de 400 metros, frequen-temente isoladas e dispersas sobre todo o território, espalham-se pelo planalto. Os grandes rios são alimentados por inúmeras calhetas e igarapés que, de tão pequenos, alguns sequer foram descobertos pelos brasileiros e tampouco receberam nomes (VERSWIJVER, ISA, 200250).

O bioma imperante em 100% nesta mesorregião é o Amazônico, com predominância vege-tacional de 44,9% de fl oresta ombrófi la aberta, apresentando 23,1% de áreas de savana, 14,9% de vegetação de contato entre savana e fl oresta ombrófi la, e 6,5% de vegetação de contato entre savana e formação pioneira.

O território Kayapó também está localizado no meio do chamado “Arco do Desmatamento”, dentro da fronteira sudeste amazônica (Prancha de Imagens 2: Figura 4). Região caracterizada pelos mais elevados índices de desmatamento no Brasil e pelos violentos confl itos de terra. Desde que a fronteira de colonização alcançou os territórios Kayapó no início dos anos 80, os governos têm se mostrado pouco efi cazes na proteção destes contra invasões, perda e exploração predatória de recursos naturais por terceiros. Fazendeiros, colonos, madeireiros, garimpeiros e grileiros violam no-toriamente os direitos sobre os territórios indígenas nos estados do Pará e do Mato Grosso. Hoje os Kayapó enfrentam uma segunda frente de desmatamento e invasões, tanto nas regiões nordeste como ao longo da sua fronteira ocidental, próxima à rodovia que liga Santarém a Cuiabá (BR-163) (CON-SERVAÇÃO INTERNACIONAL, 2010).

Apesar da maior parte da vegetação nativa entre as bacias dos rios Xingu e Araguaia ter sido desmatada, como resultado da ocupação humana desta região e estimulada pela abertura de rodovias nas décadas de 60 e 70 (GASCON ET AL., 2001), os Kayapó conseguiram proteger suas fl orestas e cerrados através da defesa ativa de seus territórios e de uma forte liderança e atividade política. Porém, com o esgotamento dos estoques de mogno nas áreas do sul do Pará localizadas fora das TIs (RO-DAN ET AL., 1992; VERÍSSIMO ET AL., 1995), a pressão de madeireiras sobre os territórios Kaya-pó aumentou. Como resultado, na década de 90 e nos primeiros anos do novo milênio, a maioria das comunidades Kayapó se envolveu com a venda ilegal de mogno de seus territórios (ISA, 2000), que foi interrompida apenas em 2002. Entretanto, enquanto dentro da maioria dos territórios Kayapó apenas uma espécie de árvore foi explorada comercialmente com a estrutura da fl oresta permanecendo pouco

50 Disponível em <http://pib.socioambiental.org/pt/povo/Kayapó/179>. Acesso em: 10 dez. 2010.

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alterada, nas áreas do sul e do leste do Pará, fora das TIs, a maioria das fl orestas foi completamente destruída, o que criou um acentuado contraste na paisagem (ZIMMERMAN et al., 2001; SCHWART-ZMAN, ZIMMERMAN, 2005).

Segundo Araújo e Barreto (2010) do IMAZON, a Terra Indígena Baú sofreu redução. O Mi-nistério da Justiça cedeu às pressões de ocupantes e utilizou portarias para reduzir a TI Baú e a TI Apyterewa da Mesorregião de Altamira, cujos limites legais deveriam ser defi nidos tão somente por es-tudos antropológicos. Essas reduções foram ratifi cadas pelos decretos presidenciais de homologação. A redução da TI Baú desrespeitou a regra constitucional de que TIs são inegociáveis. Houve acordo fi rmado entre o MPF (Ministério Público Federal) de Santarém (PA), Prefeitura de Novo Progresso (PA), FUNAI, Polícia Federal e associação de fazendeiros, posseiros e mineradores, para excluir 3.470 km2 da área indígena. Em troca, a Prefeitura de Novo Progresso (PA) receberia R$ 120 mil anuais, por um período de dez anos, para investir em benefícios para a aldeia.

As Terras Indígenas Paraná, Menkragnoti e Baú são impactadas pela construção da Rodovida BR-163 e são assistidas pelas atividades e recursos do Plano BR-163 sustentável. A Terra Indígena Kayapó também será afetada pela construção da Hidroelétrica de Belo Monte, estando os kayapó engajados politicamente na luta pela reversão do processo, sendo que esta TI também está ameaçada pela construção planejada da BR-158 que ligará a cidade de Redenção no sul do Pará à cidade de Al-tamira no noroeste.

A Terra Indígena Xikrin do Cateté sofre impactos pela construção da Estrada de Ferro de Carajás e está ameaçada pela construção planejada da Hidroelétrica Itacaiúnas I e a construção da Rodovia BR-158.

Por apresentar um cenário de devastação e de sérios confl itos ambientais e fundiários, esta região onde estão localizadas as Terras Indígenas Kayapó, necessitou de projetos voltados para sua proteção. A partir de 2005, os governos federal e estadual pressionados pelos movimentos sociais, iniciaram a demarcação de várias categorias de unidades de conservação da natureza, para implementação de um mosaico de áreas protegidas na região chamado Terra do Meio, tendo também as TIs Kayapó como componentes importantes deste projeto.

Atualmente, as Unidades de Conservação que compõem o mosaico de áreas protegidas da Terra do Meio são: Reserva Extrativista do Rio Iriri, Estação Ecológica da Terra do Meio, Parque Nacional da Serra do Pardo, Reserva Extrativista Riozinho do Anfrísio, Floresta Estadual do Iriri, Reserva Ex-trativista do Rio Xingu, Área de Proteção Ambiental Triunfo do Xingu, Floresta Nacional de Altamira, Floresta Nacional do Trairão e Parque Nacional do Jamanxim.

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A criação deste mosaico de áreas protegidas da terra do meio, também considerada uma área cha-ve de biodiversidade (Key Biodiversity Area - KBA), tem em vista a consolidação de um corredor de biodiversidade da Amazônia Meridional (Corredor de Biodiversidade dos Ecótonos Sul-Amazônicos). Trata-se de um dos maiores corredores de biodiversidade do mundo e o segundo maior do Brasil, ainda mais importante para a conservação por se tratar de uma via de ligação entre os dois maiores biomas nacionais - o Amazônico e o Cerrado - fundamental para a manutenção das populações de várias espécies, algumas endêmicas (SOUZA, 2005).

Esse corredor formará um grande conjunto de 19 (dezenove) TIs e dez UCs contíguas, ao longo da Bacia do Rio Xingu, desde o nordeste do Mato Grosso até o centro do Pará totalizando 28 milhões de hectares - o equivalente ao território do Equador - com uma população de mais de 12 mil pessoas, entre não indígenas e 25 etnias indígenas (ibidem).

3.5 Mesorregião Marabá/Tucuruí

Na mesorregião Marabá/Tucuruí, localizada a centro-oeste e a sudoeste do estado, são encon-tradas 13 terras indígenas ofi cialmente reconhecidas pela FUNAI: Amanayé, Anambé, Barreirinha, Mãe Maria, Parakanã, Sarauá, Sororó, Pacajá/Konomitinga, Trocará, Karajá/Santana do Araguaia, Maramanduba e Nova Jacundá. Somente a TI Sororó/Gleba Tuapekuakau está em estudo e por isso ainda não possui área territorial delimitada.

Essas TIs ocupam os municípios paraenses de Goianésia do Pará, Moju, Paragominas, Bom Jesus do Tocantins, Itupiranga, Novo Repartimento, Ipixuna do Pará, Marabá, São Domingos do Araguaia, Brejo Grande do Araguaia, São Geraldo do Araguaia, Tucuruí, Baião, Portel, Santa Maria das Barrei-ras, Rondon do Pará e o município tocantinense Araguacema.

A somatória das áreas dessas Terras Indígenas da mesorregião Marabá/Tucuruí é de 762.037 (sete-centos e sessenta e dois mil e trinta e sete) hectares, o que corresponde a 3% da superfície total das Terras Indígenas do Estado do Pará.

Essas 13 TIs são habitadas por uma população de 3.878 (três mil oitocentos e setenta e oito) indígenas de vários povos, tais como: Amanayé, Anambé, Gavião Parkatêjê, Parakanã, Asurini do Tocantins, Karajá e Guarani M’byá, falantes de várias línguas, principalmente as do tronco linguístico Tupi-Guarani, e em sua minoria as dos troncos, Jê (Gaviões) e Karajá (Karajá).

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Essas Terras Indígenas são banhadas em suas extensões pelas Bacias do Marajó, do Rio Pará, Rio Tocantins e Rio Araguaia. Alojando em sua superfície o Bioma Amazônico, composto por fl oresta ombrófi la densa (82,3%), vegetação de contato entre fl oresta ombrófi la densa e savana (16,7%), e por fl oresta ombrófi la aberta (1,0%).

Essas 13 Terras Indígenas não possuem grandes extensões territoriais e também não são con-tíguas. Como na mesorregião Belém, elas formam fragmentos absolutamente dispersos de fl oresta, localizados entre áreas já desmatadas e ocupadas por pastagens. Desta forma, não há conectividade entre as três poucas unidades de conservação estaduais51 que existem na região e essas Terras Indíge-nas, não confi gurando um cenário adequado de conservação socioambiental, tanto pela falta da insti-tuição de Unidades de Conservação na região, quanto pela própria dinâmica histórica e econômica que esta apresenta ao longo do tempo.

A região é também uma área de colonização antiga, cuja história do contato entre índios e não índios data dos tempos das missões jesuítas, onde posteriormente estes contatos se intensifi caram em vultosos e violentos confl itos com o desenvolvimento das atividades econômicas relacionadas aos ciclos de exploração do extrativismo vegetal.

No início do século XX, a exploração da castanha-do-pará, modifi cou a estrutura econômica da região e terminantemente a vida dos indígenas que ali viviam. Nesta ocasião, as populações indígenas da região foram sujeitas a se integrarem nestes processos econômicos, principalmente na extração e comércio da castanha, já que a área ocupada pelos indígenas era rica em preciosos castanhais.

Posteriormente, as Terras Indígenas dessa região foram profunda e irreversivelmente impactadas do ponto de vista ambiental e social pelos grandes projetos do Governo Militar para colonização da Amazônia, tais como construções de rodovias federais e estaduais, mais tarde a construção da Usina Hidrelétrica de Tucuruí inundando uma área de 11 (onze) quilômetros, para gerar atualmente cerca de 8.000 MW de energia. Ainda em 1980, a Companhia Vale do Rio Doce implantou na região o Projeto Grande Carajás para construção da maior mina de exploração de ferro a céu aberto do mundo, loca-lizada no Município de Parauapebas, necessitando da construção da ferrovia que liga Serra de Carajás ao Porto de Itaqui no Maranhão para escoar o minério.

Em 1967, uma extensão de 22 (vinte e dois) quilômetros, no sentido norte-sul, de um castanhal da TI Mãe Maria habitada pelos índios Gaviões, foi cortada para dar lugar à rodovia PA-70 que faz a ligação do Município de Marabá com a Rodovia Belém-Brasília. Segundo Ferraz (2000) em 1977, o limite sudoeste desta mesma TI foi tocado pela construção de outra rodovia, a PA-150, que parte de

51Área de Proteção Ambiental (APA) do Triunfo APA do Lago de Tucuruí, Reserva de Desenvolvimento Sustentável Alcobaca, APA de São Geraldo do Araguaia.

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Morada Nova - km-12 da PA-70 - em direção a Castanhal, município já próximo a Belém (Ver Pran-cha de Imagens 2: Figura 5). Ferraz (ibidem) também comenta que a construção destas duas rodovias acelerou a ocupação efetiva e desordenada daquela porção oriental do estado, favorecendo a invasão sistemática e crescente da terra dos Gaviões, tanto por posseiros como por obras estatais de infraes-trutura dos projetos que viriam a se instalar na região. Mais tarde, a Terra Indígena foi ainda cortada pela linha de transmissão da Eletronorte, originada na Usina Hidroelétrica de Tucuruí, e pela Estrada de Ferro Carajás, em 1982.

Em novembro de 1998, a BR-222 que corta integralmente a Terra Indígena Mãe Maria foi pavi-mentada. Sua própria construção produziu grande degradação à TI com o corte de 22 km na fl oresta nativa dos Gaviões, o que se estendeu por mais 100 m de largura. Apesar da recente retomada da pro-dução de castanha-do-pará, ela foi reduzida em mais de 70% nestes últimos 30 anos, o que signifi ca que os Gaviões deixaram de ganhar anualmente o correspondente a 2.000 hectolitros de castanha.

A TI Parakanã tem seus limites perpassados pela Rodovia Transamazônica (BR-230), situação que gera impactos profundos sobre o modo de vida dos Parakãnã. Desde 1980, esta TI também recebe a assistência do “Programa Parakanã”, fruto de um convênio, entre a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a Eletronorte, que estabelece compensação pelo impactos gerados pela construção da Usina de Tucuruí e seus linhões.

A TI Sororó tem também seu território cortado pela BR-153. A TI Trocará tem também seu território cortado pela PA-156. Segundo reportagem do jornal “Diário do Pará” de 2/12/2010, o Ministério Público Federal abriu processo contra a Eletronorte para obrigar a empresa a compensar e mitigar os danos causados aos índios Asurini pela construção da hidrelétrica de Tucuruí. A Terra Indígena Trocará vem sofrendo desde então inúmeras invasões e outros impactos diretamente rela-cionados com a usina e com o aumento populacional decorrente do empreendimento. Em relatório de impacto ambiental, elaborado pela própria Eletronorte e enviado ao Ministério Público Federal, foram listados 51 impactos socioambientais, mas nenhuma medida de compensação foi tomada pela Eletronorte52 (Diário do Pará, 2/12/2010).

Os índios Gaviões, chefi ados pelo líder do grupo Krohokrenhum, por diversas vezes ao longo de seu contato com as frentes de expansão da sociedade nacional, conduziram fortes embates políticos com a FUNAI, Eletronorte e Companhia Vale do Rio Doce para serem compensados pelos danos causados pelos empreendimentos que impactaram seu povo e os recursos ambientais que garantem sua subsistência.

52Disponível em <http://diariodopara.diarioonline.com.br/n-121031-pf + processa +eletronorte+ por+ danos + aos + indios. html >. Acesso em: 10 dez. 2010.

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Figura 3: TIs da Meso Altamira. Sete Terras Indígenas formam uma espécie de cor-redor socioambiental indígena margeado pelo norte pela Rodo-via Transamazônica.

Fonte: TerraMetrics

Figura 4 - Evolução do des-matamento no entorno das TIs Kayapó. 1a (esquerda):

1990 e 1b (direita): 2003.

Fonte: Conservação Interna-cional do Brasil (2010).

Figura 5 -Na Meso região Marabá-Tucuruí aTI Mãe Maria é cortada pela rodovia BR 222. Fonte: TerraMetrics (2010).

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Esse processo garantiu recursos de compensação, no entanto abalou profundamente o modo de vida da população Gavião, que hoje sobrevive em meio ao mundo “moderno” tentando a reconfi gu-ração de suas tradições ancestrais a esta realidade. O mesmo processo é também observado para os outros povos indígenas que habitam essa região, caracterizada pela intensa movimentação de grandes empreendimentos.

O que se pode arguir é que, frente às pressões e ameaças provocadas pelos inúmeros vetores de impactos ambientais, os indígenas são as populações mais vulneráveis e prejudicadas, por seu modo de vida e sua subsistência necessitarem dos recursos naturais que normalmente são roubados pelas atividades produtivas levadas pelos grandes empreendimentos.

No caso da mesorregião Marabá/Tucuruí, mesmo sendo compensados fi nanceiramente, seu modo de vida foi e continua sendo alterado, e suas tradições são reformuladas para pautar a adaptação às novas realidades impostas pelas mudanças.

Frente às ameaças e pressões que constantemente os assolam, os povos indígenas se veem for-çados a se protegerem e tentarem seu empoderamento político através de mobilizações, pressão e até mesmo com violência. Os índios Amanayé, por exemplo, em janeiro de 2005 reagiram à bala contra a presença de invasores armados em suas terras, matando um homem e expulsando os outros. Eles de-nunciavam à imprensa a invasão de suas terras por madeireiras e fazendeiros, que estavam derrubando a mata para a retirada de toras e usando a área para a criação de gado (CB, 18/01/2005, Brasil, p. 15).

Como comentamos, a região não apresenta um cenário propício para a conservação fl orestal, pois não existem Mosaicos de UCs instituídos e planejados para serem criados na área. Estudos mos-tram que as taxas de desmatamento nesta região são muito maiores fora das terras indígenas do que dentro delas, isto é, o desmatamento acontece muito mais no entorno das Terras Indígenas, como po-demos observar nas fi guras 6a e 7b (Prancha de imagens 3) que mostram o desmatamento no entorno das TIs Sororó e Sarauá.

A região Marabá/Tucuruí está cotada pelo ZEE do estado como zona de consolidação de ativi-dades produtivas, com os indígenas devendo ser incentivados no âmbito deste cenário a continuarem protegendo suas fl orestas, pois sem a presença da demarcação dos territórios indígenas, a região está fadada e perder seus poucos remanescentes fl orestais.

3.6 Mesorregião de Tumucumaque/ Oriximiná

Na mesorregião Tumucumaque/ Oriximiná, localizada no extremo norte do Pará, podemos en-contrar 5 (cinco) Terras Indígenas: Trombetas-Mapuera, Nhamundá-Mapuera, Parque do Tumucuma-

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que, Zo’é e Paru de Este) com grandes dimensões territoriais, perfazendo um total 9.961,269 (nove milhões, novecentos e sessenta e um mil, duzentos e sessenta e nove) hectares, representando aproxi-madamente 34% do total dos territórios indígenas do Estado do Pará.

A população compreende 4.924 indígenas, sendo formada por diversifi cados povos, tais quais: Aparai, Akuriyó, Kaxuyana, Tiriyó, Wayana, Hixkaryana, Waiwai, Katuena, Zo’e, Mawayana e Xerew Wapyxana, os Tiriyó, Tunayana e índios isolados, em sua grande maioria falantes de línguas e dialetos pertencentes à família linguística Karib, com exceção dos Zo’é, falantes de uma língua da família Tupi--Guarani do tronco Tupi.

A maior porção dessas Terras Indígenas está localizada nos municípios paraenses de Oriximiná, Almeirim, Óbidos, Monte Alegre, Alenquer, Faro, e uma pequena porção em municípios de outros estados, tais como: Caroebe (RR), São João da Baliza (RR) Urucará (AM), Nhamundá (AM).

O bioma Amazônico reina também nas Terras Indígenas desta região do Pará, banhadas em suas extensões pelas bacias dos rios Jari, Paru, Trombetas, Jatapú e Negro. As aldeias indígenas que aí se localizam são de difícil acesso, pois estão instaladas em locais onde o relevo é acidentado, e por isso os rios, em sua maioria, são encachoeirados e, portanto de difícil navegação. Há predominância vegetacional de fl oresta ombrófi la densa (91,6%) na maioria das terras Indígenas, com exceção da TI Tumucumaque que apresenta em sua extensão: 1,2% de savana, 20,3%, de vegetação de contato fl o-resta ombrófi la-savana e 17,8% de áreas de vegetação de contato entre savana e formações pioneiras. A Terra Indígena Zo’é apresenta 0,5% de áreas de contato entre savana e formações pioneiras.

As TIs dessa região também formam um grande mosaico de áreas protegidas (Mosaico da Ca-lha Norte) estando articuladas a Terras de Quilombos e Unidades de Conservação de diversifi cadas categorias, e sendo administradas em sua maioria pelo Governo Estadual (Ver Prancha de Imagens 3: Figura 7).

As UCs estaduais: Florestas Estaduais de Faro, Trombetas e Paru, Estação Ecológica (ESEC) do Grão Pará e Reserva Biológica (REBIO) Maicuru totalizam mais de 12 milhões de hectares de áreas protegidas no bioma amazônico (Quadro 1). Estas UCs estaduais somadas às UCs federais e às Terras Indígenas existentes nessa região, formam o maior bloco de fl orestas protegidas do mundo, área que corresponde a 22 milhões de hectares.

Esse mosaico de áreas protegidas da Calha Norte liga o Corredor Central da Amazônia ao Cor-redor de Biodiversidade do Amapá, formando o maior corredor de biodiversidade do planeta. Desta forma, estas Terras Indígenas estão inseridas num vasto projeto político de conservação, que incluem a interface e os relacionamentos entre diferentes corredores ecológicos, proporcionando o intercâm-bio ecossistêmico e possibilitando o fl uxo gênico entre espécies animais e vegetais.

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A criação de UCs nessa região também criou a problemática de sobreposição de unidade de con-servação a áreas indígenas. Povos indígenas, como os Kaxuyana e Tunayana, que têm suas histórias ligadas a migrações provocadas pelo processo de evangelização ao qual foram submetidos a partir da década de 60, requerem atualmente o direito de demarcação de suas terras, pois hoje se encontram ha-bitando a Floresta Estadual do Trombetas. Para eles, esta situação de viverem habitando uma FLOTA, representa ameaça aos seus direitos exclusivos de uso dos recursos naturais existentes neste território. Desta forma, houve implantação de um Grupo de Trabalho para demarcação da Terra Indígena dos Kaxuyanas. Também 1,0% da terra indígena Zo’é está sobreposta à área da FLOTA Trombetas.

Não obstante o cenário bastante positivo para conservação dos recursos naturais da região, estas terras indígenas também sofrem pressões e ameaças provindas de grandes empreendimentos, prin-cipalmente relacionados à implantação de projetos hidroelétricos, tais como as construções já pla-nejadas pelo Governo Federal das hidrelétricas de Cachoeira/Porteira, Carona e Nhamundá na TI Nhamundá-Mapuera e Hidrelétricas do Armazém, Paciência, Carapanã, e do Mel na TI Zo’é.

Caso haja a construção futura da hidroelétrica de Cachoeira Porteira pela Eletronorte, ela afetará direta e indiretamente um contingente expressivo de indígenas de diferentes grupos tribais e em di-versas situações de contato. Sua construção faz parte do programa energético da Eletronorte e sua localização está prevista no Médio Trombetas, próximo à foz do Mapuera. A área do reservatório está avaliada em 1.079 km2 e terá uma potência instalada de 700 MW.

De acordo com Santos e Nacke (1998), serão atingidos diretamente os índios localizados na al-deia Mapuera, e também os indígenas localizados na aldeia denominada Cassauá.

Uma terceira aldeia denominada Porteira é composta por população Kaxuyana. De acordo com Almeida (1981a, 1981b), em 1981 apresentava uma população de 24 indivíduos. Além disso, duas ou-tras aldeias localizadas na parte norte do Parque Indígena do Tumucumaque também são formadas por população Kaxuyana. Diferentes fontes (CEDI, 1983, p. 226-228) indicam ainda, a existência na região de grupos “isolados”. Dentre estes, existem registros de cinco aldeias Karafawyána (denominadas Yowa, Tiwyní-ru, Sua-Suarú, Awanãma e Kakayoniru), dos Tumotayana e dos Parukwotho. Finalmente, há indícios de grupos “isolados” nos rios Tutumo, Aracoo, Tauriní, Urucurina, cabeceiras do Mapuera, no rio Novo, no Curapati (afl uentes do Jatapu), Cachorro e Erepecuru. Sobre estes contingentes não existem dados populacionais.

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Figura 6: Desmatamento no entorno nas TI Sororó e Sarauá que continuam com seus estoques fl orestas conservados. Fonte: COIAB (2010).

Figura 7. Terras Indí-genas da meso região Oriximiná-Tumucumaque ingeridas no Mosaico da Calha Norte – Cinco Unidades de Conservação Estaduais, Três Federais e Cinco Terras Indígenas, Compondo 22 Milhões de Hectares.

Fonte: SEMA-PA

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Várias empresas já obtiveram concessões de pesquisas na área. Entre elas: a Docegeo (subsidiária da Companhia Vale do Rio Doce) no Mapuera, autorizada pela 2.ª DR/FUNAI; Mineração e Comér-cio Anauá Ltda. no Rio Mapuera; e Jatapu Mineração Indústria e Comércio Ltda. no Rio Mapuera (CEDI, 1983a, p. 247, 249). Há ainda informações sobre a existência de garimpeiros e castanheiros nas proximidades da aldeia Kaxuyana.

3.1.4 Considerações Finais

Neste artigo, fi zemos uma tentativa de esboçar seis cenários correspondentes às seis etnorregiões no âmbito do território paraense, onde estão inseridas as Terras Indígenas. Procuramos ao longo do texto fazer uma descrição que contenha: os atores, informação por trás deles, informações sobre o seu ambiente, seus objetivos e as sequências de ações e eventos que criem obstáculos, contingências e êxitos desses atores, principalmente no que diz respeito aos processos de gestão territorial e ambiental das Terras Indígenas.

Ao nos propor em realizar este exercício de construção de cenários socioambientais, tínhamos a intenção de viabilizar aos gestores e ao próprio movimento indígena paraense um conhecimento sistematizado da diversidade de situação, incluindo as problemáticas que dizem respeito às questões social e ambiental pelas quais passam as terras indígenas do Pará.

Acabamos por visualizar que nesses cenários, os conjuntos de terras indígenas do Pará possuem uma confi guração diferenciada em relação à conservação socioambiental para cada região.

O horizonte promissor de efetivação da gestão territorial e ambiental das Terras Indígenas que possuímos e acreditamos, atualmente, é o da gestão integrada de áreas protegidas. Defendemos que a gestão integrada pode propiciar o fl uxo aumentado de recursos fi nanceiros, técnicos e humanos em nível governamental e em não governamental entre as diferentes categorias de áreas protegidas exis-tentes no estado. Neste sentido nós fundamentamos nossas considerações fi nais, principalmente na análise dos potenciais das cinco mesorregiões aqui exploradas, para implementação de atividades de gestão integrada das áreas protegidas do Estado do Pará.

As mesorregiões de Redenção e Tumucumaque/Oriximiná apresentam as maiores extensões territoriais de Terras Indígenas demarcadas e contíguas (ver gráfi co 2), também possuem incidência de povos isolados que requerem segundo a legislação, um regime de proteção especial por parte dos governos (ver gráfi co 3). Essas terras estão fundamentalmente inseridas em projetos de conservação, tais como a implementação dos Mosaicos de UCs (Calha Norte e Terra do Meio), e Corredores de Biodi-versidade viabilizados pelo Governo Federal e apoiados pelo Governo Estadual, tendo no atual momento,

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um horizonte positivo para o apoio à gestão territorial e ambiental integrada destas Terras Indígenas. Este horizonte somente se consolidará no futuro com a real e efetiva implantação deste mosaico e do grande corredor de biodiversidade projetados para esta região, fato que depende da capacidade política de viabilizar infraestrutura, recursos humanos e implementação de plano de manejos para UCs, e da implantação de sistemas de proteção e vigilância nas UCs e Terras Indígenas, dentre outros.

As TIs Kayapó, pela grande pressão que sofrem proveniente de atividades produtivas, como extração ilegal de madeira e pecuária extensiva, merecem um programa ou plano integrado de proteção e vigilância, pois esta pressão é realmente muito intensa e os índios Kayapó não possuem estruturas de governança e institucionais propícias para segurá-la por muito tempo sobre seus territórios fl orestados.

As mesorregiões que apresentam maior contingente populacional indígena: Santarém/Itaituba e Altamira (gráfi co 4), ainda que sofrendo ameaças pela implementação de grandes projetos, tais como a construção da hidroelétrica de Belo Monte, também estão inseridas num contexto de conservação, já que suas Terras Indígenas, mesmo não tendo grandes dimensões territoriais e nem formando corredores de sociobiodiversidade extensos, são acopladas a um mosaico de UCs presente na região e também estão, em parte, dentro do projeto de implementação do grande corredor de biodiversidade que tem a intenção de conectar os biomas Amazônico e do Cerrado.

Neste sentido, a gestão territorial e ambiental dessas terras indígenas também enfrenta os mes-mos desafi os para implementação de sua gestão integrada. As TIs destas mesorregiões são adjacentes à zona de consolidação de atividades produtivas proposta pelo ZEE do estado, assim seria interessante realizar um planejamento de atividades de mitigação dos impactos provocados pelos projetos que irão ser implantados no futuro para desenvolver esta zona.

A articulação das dife-rentes instituições envolvidas nos projetos de conservação das regiões em pauta, deve também tentar consolidar o apoio as atividades produtivas que já são desenvolvidas pe-los indígenas das regiões, com vista a elaborar estratégias de comercialização dos produ-tos da sociobiodiversidade indígenas, através de suas va- Gráfi co 3 - Superfície territorial das terras indígenas do Pará por Etnorregiões.

Fonte: FUNAI (2010).

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lorizações via diferencial mercadológico, como criação de selos para comercialização dos produtos indígenas, dentre outras estratégias criativas que podem ser viabilizadas para venda destes produtos.

As regiões Belém e Marabá/Tucuruí apresentam um cenário de grande redução e fragmentação dos territórios indígenas, viabilizado pelos processos históricos de avanço das frentes de expansão da sociedade nacional. Este processo colocou os territórios indígenas em cheque para os grandes empre-endimentos viabilizados, em parte, pelos governos militares.

Estas Terras Indígenas estão no âmbito da zona de consolidação de atividades produtivas do Macro Zone-amento Ecológico-Econômico realizado pelo Estado. Sendo que o estoque fl orestal e consequentemente o esto-que de carbono destas regiões estão realmente concentrados nas terras indígenas, pois os territórios não indígenas foram desmatados principalmente para exploração de madeira e implementação de pastagens, e estão em parte degradados pelas pressões das atividades produtivas que se desenvolvem nessas áreas.

Não existindo alternativas para promover a criação de Unidades de Conservação nestas mesor-regiões, e tendo o intuito de provocar atividades de gestão integrada, seria interessante incentivar os povos indígenas a viabilizarem projetos de REDDs, com a fi nalidade de facilitar a geração de recursos fi nanceiros (geração de renda) para benefício das comunidades. A geração de renda atualmente é um das reivindicações de todos os povos indígenas do Pará, e a inserção dos créditos de carbono indígenas nas negociações do talvez promissor mercado internacional de carbono possa ser uma iniciativa viável, já que estas regiões possuem perfi l adequado para realização de projetos de REDDs. De outro lado, é importante realizar uma tentativa de articulação institucional dos governos nas esferas federal, estadual e municipal, para também apoiar as atividades produtivas e ecologicamente sustentáveis que inclusive já são realizadas, mes-mo sem muito apoio institucional pelos po-vos dessas mesorre-giões, além da viabili-zação dos sistemas de vigilância e proteção dessas terras indígenas a serem realizados pelos próprios indígenas que deverão ser formados para tais tarefas.

Gráfi co 4 - Contingente populacional indígena do Estado do Pará por Mesoetnorregião.

Fonte: ISA (2010).

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Dados atualizados – Novembro 2010/ Resp. Antonio Abrahão/FUNAI CR. BELÉM

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53Nononononoononononon54Nononononoononononon55Nononononoononononon

Nas últimas quatro décadas, diversas mudanças ocorreram na relação entre o Estado Brasileiro e os povos indígenas habitantes do território nacional. De uma política desenvolvimentista caracterizada pelo assimilacionismo, chegou-se à demarcação dos territórios indígenas. Nesse processo, os povos indígenas saíram da condição de tutelados para serem capazes de se representar juridicamente por meio de suas associações. Eles podem ser considerados, agora, povos com autonomia e com diversas demandas por sustentabilidade e desenvolvimento, por projetos e parcerias. Nesse cenário, o prota-gonismo indígena passou a ser a moeda corrente do momento (LIMA, 2010). Concomitantemente a essas mudanças, a preocupação com a gestão ambiental e territorial das TIs tem ocupado cada vez mais a atenção dos movimentos indígenas e indigenistas e tem se constituído em foco de atuação dos governos federal, estadual e municipal.

Essa preocupação, no entanto, nem sempre foi fácil de ser notada pelos próprios povos indíge-nas, pelo poder público, pelas agências bilaterais e multilaterais de fi nanciamento, pela cooperação técnica e fi nanceira internacional e pelas entidades ambientalistas e de apoio ao movimento indígena. Trata-se, portanto, de uma questão socialmente produzida, que se tornou visível – em especial para os atores dos campos indigenistas e ambientais – por meio de um processo lento, com vários fatores implicados e entrecruzados, dentre eles: (i) a emergência, principalmente a partir dos anos 1980, do movimento indígena como ator político de direito próprio, com a proliferação de associações indíge-nas pelo país; (ii) as transformações da política indigenista brasileira, com mudanças na regulamenta-ção, na organização institucional e na rotina da administração e dos serviços públicos voltados para os povos indígenas, suas terras e os recursos de que são usufrutuários; (iii) a revisão das idéias sobre a história ecológica e cultural da Amazônia, que passou a enfatizar a complexidade das organizações sociais indígenas e a diversidade ecológica do bioma; (iv) o debate e as soluções propostas para gerir os confl itos causados pela presença humana, em especial indígena, em unidades de conservação de proteção integral e (v) o apoio mais expressivo da cooperação técnica e fi nanceira internacional e de organizações internacionais religiosas ou não com recursos para projetos e iniciativas relacionadas a povos indígenas e ecossistemas de valor global (BARRETTO; CORREIA, 2009).

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Com uma maior visibilidade das questões relacionadas à gestão ambiental e territorial das TIs, proliferaram-se pelo país ações dessa natureza estimuladas por organizações não governamentais, associações indígenas, governos estadual e federal, cooperação internacional e agências bilaterais e multilaterais. Em levantamento realizado no ano de 2006, identifi cou-se um vasto conjunto de expe-riências desenvolvidas em vários estados da federação: Acre, Pará, Roraima, Rondônia, Amazonas, Maranhão, Tocantins, Amapá, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraíba, Minas Gerais, Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná (LITTLE, 2006). Mais recentemente, o Governo Federal por meio da Portaria Interministerial nº 276, de 12 de setembro de 2008, instituiu Grupo de Trabalho Inter-ministerial (GTI) com a fi nalidade de elaborar proposta de Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental em Terras Indígenas (PNGATI), o que mostra a relevância da questão como foco de uma política pública, elaborada participativamente. Entre 2009 e 2010, foram realizadas consultas regionais junto aos povos indígenas em todo o país com o intuito de construir a política, estando ela agora em sua fase fi nal de consolidação56.

Nesse contexto de discussões e ações crescentes em torno da gestão ambiental e territorial das TIS, o Governo do Estado do Pará teve a iniciativa de realizar o Seminário “Situação Socioambiental das Terras Indígenas do Pará: Desafi os para Elaboração de Políticas de Gestão Ambiental”, em Belém, de 07 a 09 de junho de 2010, como atividade do Subprojeto 1 (“Levantamento da Situação Socioam-biental das Terras Indígenas do Pará”), do Projeto Piloto “Conservação da Biodiversidade em Terras Indígenas do Pará” (ConBio Indígena), executado pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Pará (SEMA/PA), por meio de sua Diretoria de Áreas Protegidas (DIAP), em especial a sua Coorde-nadoria de Ecossistemas (CEC) e a sua Assessoria dos Povos Indígenas. O princípio fundamental que orienta o alcance dos objetivos do ConBio Indígena é “a valorização da cultura e do modo de vida dos povos indígenas como elementos fundamentais para a conservação do meio ambiente”. Já o objetivo do Subprojeto 1 é caracterizar e diagnosticar os cenários de confl itos e potencialidades socioambien-tais das TIs e as áreas prioritárias de atuação junto aos povos indígenas do estado.

Este texto integra o conjunto de atribuições assumidas pelo Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB) ao aceitar o convite da SEMA para facilitar a condução e a comunicação dialógica du-rante o Seminário, que incluiu também as seguintes atividades: (i) planejar e defi nir a metodologia do Seminário com técnicas e estratégias de trabalho de condução, considerando o objetivo/produto do seminário; (ii) estruturar os materiais necessários ao Seminário e (iii) elaborar o relatório com registros da produção do Seminário, enquanto texto base de divulgação.

56 PNGATI. Disponível em: <http://sites.google.com/site/pngati>. Acesso em: 10 dez. 2010

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Após esta breve introdução, este artigo encontra-se dividido em quatro partes. A primeira apre-senta o histórico e os antecedentes que justifi cam e explicam a convocação e a realização do referido Seminário da perspectiva da SEMA, tendo como fonte os documentos que nos foram fornecidos por esta secretaria e as conversas mantidas com a equipe técnica do projeto ConBio Indígena. Nessa parte, tentamos recuperar e fazer sentido os investimentos anteriores do Governo e do movimento indígena do Estado do Pará. A segunda parte apresenta os objetivos, os resultados e a metodologia propostos para a realização do Seminário. A terceira descreve, em linhas gerais, o que ocorreu, com destaque para a sistematização dos principais pontos trazidos pelas apresentações e os resultados dos “trabalhos de grupos”. Esses constituem a contribuição substantiva do Seminário para a formulação do Programa de Gestão Ambiental e Territorial em Terras Indígenas do Pará (doravante Programa), visto que abor-daram as seguintes dimensões ao longo de dois dias: (1) a situação socioambiental das TIs do Pará e (2) os insumos para o referido Programa. A quarta e última parte apresenta as considerações fi nais, nas quais propomos alguns encaminhamentos.

3.2.1 Histórico e Antecedentes do Seminário

Para a SEMA, a realização do Seminário vincula-se à necessidade de sistematizar e publicar infor-mações sobre os problemas e oportunidades socioambientais das TIs do Pará, tendo como horizonte a elaboração participativa de políticas públicas, programas e projetos que apóiem os povos indígenas na gestão territorial e ambiental, considerando o importante papel das Terras Indígenas para o orde-namento territorial e como componentes fundamentais da conservação da biodiversidade no Estado do Pará. Nesse sentido, o Seminário vincula-se a um conjunto de iniciativas anteriores do próprio Governo e do movimento indígena do Pará, ao longo do qual tanto a própria política indigenista do Estado (seu arranjo institucional e seus instrumentos de implementação) foi se delineando, quanto o próprio projeto ConBio Indígena foi se estruturando em seus três subprojetos.

Esse conjunto de iniciativas, por sua vez, vincula-se aos objetivos e metas estabelecidos no Pro-grama de Ordenamento Territorial do Estado do Pará (PEOT), instituído pelo Decreto nº 692, de 05 de dezembro de 2007, como expressão do que foi defi nido no Macrozoneamento Ecológico--Econômico do Estado do Pará (SECTAM, 2004). Dentre as várias ações previstas no PEOT estão aquelas direcionadas à preservação da biodiversidade e uso sustentável dos recursos naturais57. Entre as iniciativas promovidas pelo Governo do Estado e pelo movimento indígena, seja em parceria, seja autonomamente, destacam-se as mais signifi cativas que pavimentaram o caminho para o Seminário.

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a) O Processo da I Conferência Estadual dos Povos Indígenas

Esse tem como ponto de infl exão inicial a I Semana dos Povos Indígenas, por ocasião da qual representantes de cerca de 36 povos indígenas58 se reuniram no Fórum das Questões Indígenas, nos dias 16 e 17 de abril de 2007, no Parque dos Igarapés, em Belém e como ponto culminante a própria Conferência, convocada com o objetivo de construir a Política Estadual para os Povos Indígenas. A Conferência foi precedida por sete Encontros Indígenas Regionais, nos quais se discutiram temas como Organização Social, Educação, Saúde, Gestão Territorial e Ambiental, Segurança Alimentar, Produção e Proteção do Patrimônio. Ela ocorreu de 07 a 09 de agosto de 2008, em Belém, no mesmo Parque dos Igarapés, contando com 385 participantes, sendo 258 delegados - dos quais 170 indígenas, 9 delegados de prefeituras, 59 de órgãos do Governo Estadual, 20 de órgãos do Governo Federal e 126 convidados.

Por ocasião da I Semana dos Povos Indígenas, 91 lideranças indígenas fi rmaram um documento denominado “Carta dos Povos Indígenas”, dirigido “aos órgãos federais, estaduais e municipais que trabalham nas terras e aldeias indígenas”, no qual observavam que “os governos [estaduais] anteriores sequer trataram com dignidade os 36 povos e mais de 40 mil indígenas do Estado do Pará” (CARTA DOS POVOS INDÍGENAS DO PARÁ, 2007). Sensibilizado, o Governo se viu na obrigação de responder as “demandas, necessidades e interesses” (idem) explicitados na Carta. A Coordenação da Câmara da Política Setorial de Defesa Social do Estado do Pará, considerando suas atribuições relacionadas aos direitos humanos e à justiça e em acordo com outros entes da administração pública estadual e federal presentes, articulou a instalação do Comitê Intersetorial de Política Indigenista do Estado do Pará. Este envolveu cerca de 42 órgãos e secretarias de toda a estrutura administrativa do Estado, os quais estudaram e procuraram responder aos 60 pleitos da referida Carta, organizando-as em cinco eixos. Nessa Carta, a sexta demanda para a Casa Civil pleiteava o apoio – com recursos – para a realização do primeiro encontro dos povos indígenas do Pará, ainda em agosto daquele ano de 2007.

Tal encontro, na forma da 1ª Conferência Estadual dos Povos Indígenas ocorreu em agosto do ano subsequente, em Belém. Defi nida como um “esforço coletivo de autoridades do Governo e líderes dos povos indígenas” nela se “pactuou entre outras questões o pagamento da dívida histórica do Estado” para com os povos indígenas (SEJUDH/PA, 2008). A 1ª Conferência se constituiu “num momento importante de trabalho coletivo, envolvendo diversos segmentos representativos de organi-zações governamentais das esferas federal, estadual e municipal e dos povos indígenas do Pará”, com “o objetivo de garantir um diálogo e um acordo entre os entes federativos que tem responsabilidade em lei de cuidar dos problemas que afl igem os Povos Indígenas” do estado. As proposições aprovadas

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em plenária durante a I Conferência confi guraram as Diretrizes da Política Estadual para os Povos Indígenas do Pará e um conjunto de instrumentos de políticas públicas que se esperava poder implementar desde então:

– A Conferência Estadual dos Povos Indígenas do Pará, a realizar-se a cada dois anos;– O Plano Estadual de Sustentabilidade Humana e Territorial dos Povos Indígenas do Pará;– O Conselho Estadual dos Povos Indígenas do Pará, como instância deliberativa;– O Fundo Estadual dos Povos Indígenas e a Secretaria Estadual dos Povos Indígenas, como

órgão executor com maior autonomia programática e fi nanceira.Ao fi nal da Conferência, encaminhou-se a criação pelo Governo do Estado, mediante Decreto,

de um grupo de trabalho com a participação dos povos indígenas para elaborar, no prazo de 60 dias, um Projeto de Lei que instituísse as referidas Diretrizes e os seus instrumentos.

b) Reuniões de trabalho da SEMA em 2008

Essas ocorreram ao tempo da I Conferência (08 de agosto) e pouco tempo depois (1º de setem-bro de 2008). A primeira contou com a participação da FUNAI (incluindo o Presidente, coordenado-res da CGPIMA e da CGDC e Administradores Regionais de Redenção/Gorotire, Belém e Altamira), de representantes indígenas do Pará no CNPI (Akiaboro Kayapó), de ONGs (CI e TNC) e da GTZ, além do então Secretário de Estado de Meio Ambiente e tratou de inúmeros assuntos entre os quais a participação dos povos indígenas no “Programa de 1 Bilhão de Árvores” do Governo do Estado do Pará, cujo objetivo é viabilizar a recuperação de áreas degradadas. Nessa reunião, enfatizou-se que a agenda pós-demarcação consiste em trabalhar uma política de gestão ambiental para as TIs no Pará (por meio da gestão territorial, do fortalecimento institucional e do etnodesenvolvimento) e destacou--se a importância da 1a Conferência a partir das múltiplas perspectivas dos povos indígenas, pensando de baixo para cima a condução de agendas de conservação. A segunda foi uma reunião interna que es-boçou a visão programática da Política de Gestão Territorial e Ambiental em TIs nos marcos do Pro-jeto ConBio Indígena. As três diretrizes então levantadas e que vieram a constituir os três subprojetos do ConBio Indígena foram: macro-diagnóstico das TIs, com base em fontes secundárias; etnoconhe-cimento associado à biodiversidade, visando a elaboração de material didático para ações de educação ambiental, por meio da Secretaria da Educação e uso sustentável dos recursos naturais, que incluía os componentes de fortalecimento das organizações indígenas e de etnozoneamento e etnomapeamento, por meio das Secretarias de Produção e Assistência Técnica/Extensão Rural.

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c) O I Encontro para Conservação da Biodiversidade em Terras Indígenas no Estado do Pará

Realizado em 30 de outubro de 2008, na SEMA/PA, teve como objetivos: articular entidades do estado que compõem o Comitê Intersetorial de Política Indigenista, instituições e ONGs que traba-lham com a questão indígena, para discutir ações e projetos que se destinem à promoção da conser-vação da biodiversidade a partir da gestão ambiental participativa em TIs e realizar encaminhamento para a formação – no Fórum Social Mundial – do Grupo de Trabalho e da Rede Organizacional para a Conservação da Biodiversidade e o Uso Sustentável dos Recursos Naturais em TIs no Estado do Pará. A primeira mesa redonda do encontro versou exatamente sobre a “A Situação Atual das Terras Indígenas do Pará e a Sustentabilidade Ambiental”.

d) Uma reunião de trabalho da SEMA

Realizada em 20 de maio de 2009, na Sala de Conselho da SEMA, teve o intuito de (i) nivelar as informações sobre o processo de implementação do Projeto ConBio Indígena, em especial o Sub-projeto 3 (Gestão ambiental em Terras Indígenas: etnomapeamento, etnozoneamento e manejo sustentável dos recursos naturais)59 e as informações sobre o processo de elaboração da política indigenista do Estado do Pará; (ii) apresentar os termos de referência da contratação pela GTZ da consultoria e gerenciamento de serviços para apoiar os processos de articulação institucional na temática indígena na atuação da Cooperação Alemã no Pará; e (iii) defi nir o desenho metodológico para a realização da “Ofi cina de Trabalho para o Etnozoneamento e Etnomapeamento em Terras Indígenas do Pará: Ferramentas de Gestão Ambiental”. Desde abril de 2008 a GTZ vinha apoiando o processo de elaboração da Política Indigenista do Estado do Pará, coordenado pela Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos (SEJUDH), por meio da Coordenadoria de Proteção dos Direitos dos Povos Indígenas e Populações Tradicionais. No momento dessa reunião de trabalho, o Grupo de Trabalho instituído pelo Governo do Estado havia concluído os trabalhos de elaboração da minuta do projeto de lei, que instituiria a Política Indigenista do Estado do Pará, integrada pelos já referidos instrumentos básicos (ver página anterior).

59 O Subprojeto 3 tinha três objetivos: (1) executar o etnozoneamento e o etnomapeamento em três TIs do estado, no intuito de promover ações e projetos inovadores de gestão e manejo sustentável dos recursos naturais que melhorem a qualidade de vida dos povos indígenas; (2) promover o fortalecimento das organizações indígenas e indigenistas para atuarem ativamente na conservação da biodiversidade e uso dos recursos naturais em TIs do Pará; e (3) implementar metodologias para conheci-mento do potencial de manejo dos recursos naturais em TIs e para a execução de ações e projetos para uso sustentável desses recursos, no intuito de contribuir para a melhoria da qualidade de vida das populações indígenas em questão.

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e) Ofi cina de Trabalho Etnomapeamento/Etnozoneamento em Terras Indígenas do Estado do Pará

Realizada de 04 a 06 de agosto de 2009 como atividade do Subprojeto 3 do Projeto ConBio Indí-gena60, teve como objetivos: (i) apresentar e discutir experiências de etnomapeamento e etnozoneamento como ferramentas para a gestão ambiental em TIs; (ii) defi nir o arranjo institucional de entidades governa-mentais, não governamentais indígenas e indigenistas para viabilizar a execução do etnozoneamento e etno-mapeamento nas TIs onde a SEMA/PA irá atuar; e (iii) defi nir a metodologia apropriada de mapeamentos e zoneamento participativos na TI Trombetas/Mapuera.

Esperavam-se os seguintes resultados: formar o grupo de trabalho para o etnozoneamento e etnomapeamento nas TIs do Pará; desenhar a metodologia apropriada para o etnozoneamento e etno-mapeamento da TI Trombetas/ Mapuera; e articular mais os órgãos de governo com ONGs indíge-nas e indigenistas que atuam na referida TI. Ao fi nal, logrou-se elaborar o desenho metodológico do etnozoneamento da TI Trombetas/Mapuera em uma matriz de planejamento e defi nir (a) o arranjo institucional para o desenvolvimento das atividades previstas (com as instituições, suas atribuições e os recursos a serem disponibilizados), (b) os mecanismos de acompanhamento das atividades e (c) os próximos passos para a implementação destas.

* * *Assim caminhavam a formulação da política indigenista do Estado do Pará e a execução dos

subprojetos do ConBio-Indígena, quando a SEMA convocou o Seminário, com o objetivo de iniciar a sistematização de informações dispersas e nunca antes publicadas sobre a situação socioambiental das TIs do Pará, impulsionando, desse modo, o Subprojeto 1 do ConBio Indígena. Para tanto, convidou lideranças indígenas, representantes de organismos governamentais e não governamentais, e pesquisa-dores acadêmicos da esfera regional, nacional e internacional, que atuam junto aos povos indígenas do estado, para trazerem informações preliminares sobre as TIs nas quais atuam. Por meio do seminário, portanto, foi dado mais um passo no trabalho de parceria que vem sendo paulatinamente construído pelo Governo do Estado com os povos indígenas, neste caso específi co, visando produzir insumos para se estabelecer diretrizes e um conjunto de ações para a conservação e o uso sustentável da biodi-versidade nas TIs no Estado do Pará.

60 Para alcançar o primeiro objetivo do Subprojeto 3 (ver nota de rodapé anterior), uma das atividades seria a realização de três experiências piloto de mapeamento partici-pativo, denominadas de etnozoneamento e etnomapeamento, em três TIs do Estado, na expectativa de que o etnozoneamento e o etnomapeamento se constituíssem em importantes instrumentos de gestão ambiental em TIs.

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3.2.2 Objetivos e Metodologia

Partindo de uma proposta preliminar elaborada pela SEMA e após intensas trocas entre as equipe

desta e do IEB, defi nimos conjuntamente os objetivos e os resultados esperados do Seminário, e o conteúdo programático, cronograma e metodologia. Assim sendo, o Seminário foi convocado com os seguintes objetivos explícitos.

Levantar de modo participativo informações preliminares sobre a situação socioambiental das TIs do Pará; identifi car os principais problemas e potencialidades socioambientais das TIs do Pará, dentre outros; produzir insumos para a estruturação de um “Programa de Gestão Territorial e Am-biental em Terras Indígenas do Pará” (ProGATI); e fortalecer lideranças indígenas do Pará no trato das questões relativas à gestão territorial e ambiental.

Entre os produtos específi cos que contávamos gerar, estavam: a sistematização, de forma geral, das informações produzidas sobre os recursos naturais e as potencialidades econômicas e ecológicas das TIs do Pará, que constituam reais oportunidades de conservação da biodiversidade e desenvolvi-mento sustentável dos povos indígenas do estado; e a publicação de um livro com os artigos e/ou as comunicações transcritas dos palestrantes e os painéis elaboradas nos grupos de trabalho, sobre: (a) situação socioambiental das TIs do Pará e os (b) insumos norteadores do ProGATI.

Para lograr isso, estruturamos o Seminário em torno de dois eixos: uma série de painéis temáticos visando dar a conhecer e socializar distintas experiências de gestão ambiental e territorial indígena capitaneadas por organizações de diferentes setores (academia, Governo, movimento indígena e so-ciedade civil) por meio de comunicações orais de especialistas e representantes de ONGs indígenas e indigenistas; e grupos de trabalho (GTs) que teriam a atribuição de dar conta das duas principais di-mensões pré defi nidas do Seminário, quais sejam – levantar a situação socioambiental atual das TIs do Pará, identifi cando seus principais problemas e potencialidades, e gerar insumos para a estruturação de um futuro “Programa de Gestão Territorial e Ambiental em Terras Indígenas do Pará”.

No primeiro dia, com as dez apresentações orais nos painéis temáticos, visamos ampliar o conhe-cimento dos participantes sobre o tema do Seminário e oferecer insumos - na forma de experiências, idéias e propostas - para os trabalhos dos GTs. Para fi ltrar e sistematizar as principais contribuições das apresentações, iniciarmos a refl exão sobre os objetivos do próprio Seminário, propondo a construção – tendo como insumos os debates com a plenária – de dois painéis intitulados, respectivamente: “Princi-pais Idéias e Propostas” e “Dúvidas e Questões”. A idéia foi sistematizar os registros feitos nesses painéis ao fi nal do primeiro dia de trabalho do seminário e pôr esse material à disposição dos GTs.

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Os dois dias seguintes foram reservados ao trabalho dos GTs, cada qual sobre uma das dimen-sões do Seminário, seguindo uma metodologia e uma divisão em grupos distintos. Ambos iniciaram com exposições informativas e motivadoras com objetivo de enquadrar, oferecer subsídios e preparar os participantes para os trabalhos dos GTs.

Assim sendo, começamos o primeiro dia de trabalho dos GTs assistindo à apresentação do Coor-denador de Ecossistemas da SEMA sobre as TIs no contexto do Zoneamento Ecológico-Econômico do Estado do Pará. Após o debate em torno da apresentação, a plenária foi dividida em sete grupos correspondentes às sub-regiões / etnozonas / regionais nas quais se articula a representação do Fórum dos Povos Indígenas: Altamira, Belém, Oriximiná/Tumucumaque, Marabá/Tucuruí, Redenção/Sul e Sudeste do Pará, Itaituba e Santarém61. Cada grupo foi instruído a elaborar uma matriz FOFA (ou seja, de fortalezas e oportunidades, fraquezas e ameaças) sobre a situação socioambiental dos povos e terras indígenas daquela região. Foram enfatizados os dois passos principais na elaboração da matriz: (1º) ter claro qual a situação que está sendo analisada e quem está analisando essa situação, no caso a situação socioambiental das TIs do Pará e o conjunto variado de atores que está na e/ou conhece as TIs e as regiões onde elas se encontram, e que estavam presentes no Seminário; e (2º) identifi car os fatores positivos e negativos que interferem nas terras indígenas das respectivas regiões, classifi cando esses fatores em internos e externos – tendo se explicado e exemplifi cado o que seriam fatores internos e externos, bem como positivos e negativos. Tais matrizes foram socializadas pelos respectivos grupos na plenária ao fi nal do dia, fi nda a qual foi distribuído um questionário para as lideranças indígenas presentes preencherem com o apoio da equipe da SEMA. O objetivo do questionário era detalhar ao nível das terras e aldeias indígenas as informações reunidas nas matrizes para cada região.

É importante observar que desde o início havíamos proposto empregar a metodologia da matriz FOFA não em sua integralidade, dada a expectativa de um público bastante diverso. Ou seja, a ela-boração das matrizes FOFA não levou os grupos a realizar um posterior exercício de priorização dos elementos a serem enfrentados mais urgentemente, como seria o caso na aplicação padrão da metodo-logia. Assim sendo, os grupos se limitaram a elaborar amplos painéis sobre a situação socioambiental

61 A composição do Fórum dos Povos Indígenas com esse desenho e a representação de duas lideranças por cada região, totalizando 14 representantes, foi articulada na I Semana dos Povos Indígenas em 2007. Não obstante, os encontros regionais preparatórios para a 1ª Conferência se deram em nove regiões. Nesse contexto, ocorreram encontros distintos em Tumucumaque e Oriximiná, tendo ocorrido também uma consulta em Macapá. Os encontros regionais de Ourilândia do Norte e Capitão Poço, por sua vez, equivaleriam, respectivamente, às regionais de Redenção/Sul e Sudeste do Pará e de Belém no Fórum. Por sua vez, as regionais do Fórum também não coincidem integralmente com os sete espaços geoeconômicos defi nidos por região hidrográfi ca no ZEE do estado: Calha Norte, Tapajós, Baixo Amazonas, Portel-Marajó, Xingu, Tocantins-Araguaia e Costa Atlântica-Nordeste. Por fi m, importa informar que no Seminário o grupo de Altamira não se viabilizou devido a ausência de represent-antes indígenas daquela região, que não puderam participar por estarem envolvidos com outro evento relacionado a Belo Monte. Já o grupo de Belém incorporou um contingente expressivo de indígenas Ka’apor do Maranhão, que se encontravam na cidade e decidiram acompanhar o Seminário.

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de cada região tal como a percebiam a partir de seus pontos de vista idiossincráticos e plurais. Como se sabe, a principal vantagem dessa ferramenta é sua simplicidade para gerar informações e critérios que guiam a tomada de decisões e sistematizam o planejamento de ações. Tal simplicidade também é sua principal desvantagem, pois não permite uma análise profunda dos problemas identifi cados por quem planeja, gerando uma matriz superfi cial. De todo modo, como veremos na próxima parte, logramos produzir uma contribuição preliminar para um futuro processo de planejamento à escala regional a partir das perspectivas dos múltiplos atores presentes.

No segundo dia de trabalho dos GTs, para gerar os insumos desejáveis para o ProGATI, come-çamos o dia assistindo: o vídeo documentário sobre processo da 1ª Conferência Estadual dos Povos Indígenas; uma apresentação da Coordenadora de Proteção dos Direitos dos Povos Indígenas e Po-pulações Tradicionais da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos (SEJUDH), historiando o processo de formulação da política indigenista do Estado desde então; e uma exposição do facilitador sobre conceitos importantes para gerar os referidos insumos (políticas, planos, programas e projetos; princípios, diretrizes e objetivos).

Após o debate em torno das apresentações, a plenária foi dividida em três grupos amplamente defi nidos conforme os diferentes setores presentes ao Seminário: indígenas, Governo e academia/pesquisadores62. Partindo do entendimento de que o movimento indígena já tinha formulado insu-mos que poderiam compor o ProGATI, tanto na Carta dos Povos Indígenas quanto nas deliberações aprovadas na I Conferência (agosto de 2008), e de que era importante valorizar essas formulações, distribuímos um documento com uma síntese dessas propostas e deliberações no eixo gestão ambien-tal e territorial, e demos as seguintes orientações para os GTs: (i) ler coletivamente esse documento síntese e (ii) responder as seguintes perguntas, registrando as respostas em painéis: (a) se todas ou a maioria daquelas propostas fossem implementadas, que objetivos seriam alcançados? (b) há propostas parecidas umas com as outras? Em caso afi rmativo, que grandes conjuntos ou linhas de ação é possível reconhecer? e (c) as propostas de atividades listadas no documento síntese são sufi cientes para o Pro-GATI? Em caso negativo, que outras propostas de atividades são importantes de acrescentar? Cada grupo deveria, assim, com base nos subsídios sistematizados pela facilitação e seguindo as perguntas orientadoras, elaborar um painel tríptico propondo objetivos, linhas de ação e propostas de atividades

62 A proposta era dividir em um conjunto maior de grupos por setores, incluindo “ONGs e sociedade civil” e “cooperação internacional”. Devido, contudo, às vicissitudes inerentes a eventos dessa natureza, nos vimos obrigados a enxugar o número de GTs nesse dia.

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do referido Programa. Esperava-se, ao fi nal do dia, socializar os resultados dos GTs e elaborar um painel sintetizando as contribuições de todos o GTs63 .

Desse modo, desenhamos uma abordagem relativamente simples, considerando tanto o público multisetorial que teríamos, quanto à necessidade de estimular o interesse e a ativa participação dos representantes indígenas, e valorizando formulações indígenas anteriores. Por meio da visualização em painéis, como forma de permitir o registro visual e a sistematização paulatina do processo de discussão, e da problematização, como modo de estimular as discussões entre os participantes e per-mitir registrar e fi ltrar as ideias e os conhecimentos necessários para pensar soluções, buscávamos um enfoque participativo, propiciando o debate e a troca de experiências entre as diferentes categorias de participantes no Seminário.Foi assim que a facilitação tentou conduzir a programação e o processo metodológico, desde os momentos de apresentação de conteúdos e insumos (experiências, idéias e propostas), até as plenárias dialogadas. Com essa metodologia e programação, obtivemos ao fi nal do Seminário uma análise muito preliminar da situação socioambiental das TIs em seis das sete regiões do estado e um conjunto de subsídios para nortear discussões futuras sobre como pode vir a se estruturar o ProGATI, fruto de uma construção coletiva participativa e mais ampla.

Os resultados obtidos com o Seminário podem ser considerados satisfatórios, dado o estágio relativa-mente inicial do processo de discussão sobre gestão ambiental e territorial no Estado do Pará. Obviamente, há ainda um caminho longo a ser percorrido para se ter um levantamento completo da situação socioam-biental das TIs no estado, bem como um ProGATI consolidado e implementado. Diversos outros mo-mentos de refl exão, discussão e produção de informações podem ser desenvolvidos de modo participativo, contando inclusive com consultas regionais para se chegar a um estágio mais avançado do processo.

a) Produtos do Seminário: contribuições para o ProGATI

Apresentamos a seguir os principais produtos do Seminário, sintetizando: (i) as principais idéias, propostas, dúvidas e questões suscitadas pelas apresentações, tal como as sistematizamos nas sessões de debates dos painéis temáticos e (ii) os resultados dos trabalhos dos GTs, tanto no que concerne ao levantamento da situação socioambiental das TIs do PA, quando no que se refere aos insumos para a formulação do ProGATI. Para alguns destes, acrescentamos elementos adicionais de qualifi cação.

63 Devido a diversos fatores, entre eles tempo limitado e participação oscilante dos presentes não foi possível fazer a integração dos painéis produzidos pelos três GTs no segundo dia, sintetizando as contribuições em um grande esboço do que poderia vir a ser o desenho inicial do ProGATI.

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b) Síntese dos Principais Pontos dos Painéis Temáticos64

Principais Idéias e Propostas:

– Participação efetiva dos povos indígenas na elaboração de políticas públicas (pressuposto).– A autonomia dos povos indígenas para fazer a gestão de suas terras com apoio do Estado.– Sistema de comunicação, monitoramento e vigilância a serviço da gestão das terras indígenas.– Potencial de etnodesenvolvimento X impactos negativos e pressão sobre os recursos naturais.– Política de povos isolados e semicontactados com ênfase em proteção ambiental e social.– Formação / capacitação de agentes indígenas (ex. guardas-parques, agentes ambientais indígenas,

etc.).– Novo sistema de fi scalização, vigilância e monitoramento (gestão) das TIs.– Sobreposição de TIs e UCs: necessidade de gestão integrada.– FUNAI atuando de modo pró-ativo e coordenado junto aos órgãos com competência de fi scaliza-

ção e vigilância das TIs.– Esforço de ampliar a participação indígena (logística de acesso VS. participação).– Inclusão digital indígena e ampliação da rede de cobertura nas aldeias.– Ação integrada entre órgãos de segurança pública e as comunidades, visando autonomia na gestão.– A visão global de gestão ambiental e territorial, que envolve várias dimensões.– Política de educação indígena geral (saúde, educação, etc.) na perspectiva de melhorar a gestão ter-

ritorial e ambiental.– As metodologias são parecidas; mas muitas vezes para atingir fi ns diferentes em momentos diferentes.– Aprender as ferramentas dos brancos (mapas e outros).– A importância de fortalecer as associações indígenas.– Pequenos projetos para a política pública: instrumentos de gestão.– Favorecer trocas de experiências em escalas menores entre grupos / aldeias.

64 Os textos com as apresentações feitas nos painéis temáticos, elaborados pelos próprios expositores, serão editados em publicação específi ca, recuperando, assim, as contribuições que deram e as experiências que relataram. No limitamos aqui a pontuar os elementos mais evidentes que surgiram e foram registrados durante os debates.

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65 É importante sinalizar que algumas dessas questões, as mais específi cas, diretas e dirigidas, foram respondidas pelos próprios expositores dos painéis temáticos. Decidi-mos, contudo, deixá-las aqui, a título de registro das dúvidas que emergiram durantes as sessões de debates.

– O plano de gestão ambiental e territorial é uma “normatização do uso do território”.– A maioria dos planos de vida e de gestão são resultados de processos longos e demorados, de cerca

de dez anos, e olham bem para o futuro – daqui a 30 ou 50 anos para frente.– Dinheiro é bom, desde que a gente saiba usar e onde ele pode dar resultado.– É importante muita cautela/cuidado e embasamento.

c) Dúvidas e Questões65

– O que fazer após a demarcação?– A COIAB foi convidada a participara da discussão do novo Estatuto dos Povos Indígenas?– Os indígenas contribuíram de fato? De que modo?– Como FUNAI pensa e executa a sua agenda de gestão integrada?– Autonomia dos povos indígenas e ausência do Estado. Como aproximar a ação política das deman-

das e ações das comunidades?– Como a FUNAI atua no sentido de mitigar / evitar impactos negativos nas TIs (ex. rios poluídos)?– Preocupação dos Kaapor: será que há projetos econômicos que de fato geram renda para o povo

indígena? Quais projetos e quanto à renda?– Como garantir o meio de sobrevivência (caça, pesca e roça) sem desmatar?– Terras Indígenas são áreas protegidas ou não? (Questão envolve ICMBio e PNAP)– Como está prevista a gestão de TIs na PNGATI em áreas que se encontram destinadas para projetos

do PAC (ex. UHE Belo Monte)?– O desafi o da ampliação e da revisão de limites de terras pequenas e ainda não demarcadas (ex.:

Guarani de Jacundá).– E a gestão das Terras Indígenas que ainda estão em processo de demarcação?– A busca por respostas às diversas dúvidas e questões serve de estímulo para outros debates e even-

tos sobre o tema da gestão ambiental e territorial. Por hora, tecemos alguns comentários sobre as principais idéias e propostas surgidas durante o seminário.

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– Destaque especial pode ser dado à preocupação dos presentes com a efetiva participação dos povos indígenas na elaboração das políticas públicas. Diversas iniciativas de gestão ambiental e territorial no país estão fundamentadas em uma base dita participativa, mas assegurar o pleno envolvimento dos povos indígenas na discussão, elaboração e implementação de políticas e ações dessa natureza confi gura-se como um desafi o a ser superado. Como sugerido por Paul Little, a participação não implica que os povos indígenas fi zeram parte do processo como um todo. Em geral, eles são con-vidados para participar na elaboração de instrumentos previamente defi nidos. Eles tomam parte no processo, mas não são os seus idealizadores. A noção de “agência étnica” seria muito mais signifi ca-tiva (LITTLE, 2006). Por meio dela, entende-se que os povos indígenas estiveram presentes desde o momento da concepção das políticas ou da própria gestão ambiental e territorial das TIs.

Outro ponto signifi cativo diz respeito à autonomia dos povos indígenas para gerirem suas terras. Como dito por uma expressiva liderança indígena, Gersem Baniwa: um dos elementos centrais nessa direção “é o início de vários projetos coletivos de autogestão territorial em curso, que deverão im-pulsionar e subsidiar o processo de reconstrução da autonomia desejada” (LUCIANO, 2006). Esses projetos coletivos estão fundamentados em grande medida no conhecimento tradicional dos povos indígenas, que tem permitido a eles gerirem secularmente seus territórios. Cada vez mais, contudo, frente ao processo de contato interétnico, apoios externos têm sido apontados como necessários. Por este motivo, um programa da gestão ambiental e territorial das TIs deve minimamente contemplar aspectos inerentes ao conhecimento indígena e vislumbrar apoios governamentais conforme as neces-sidades específi cas de cada povo.

Exemplos de apoios externos, especialmente governamentais, podem ser pensados a partir de al-gumas idéias e propostas apresentadas no Seminário, como a necessidade de sistemas de comunicação, monitoramento, vigilância e fi scalização das TIs. A formação/capacitação de agentes indígenas tam-bém pode ser incluída aqui, juntamente com levantamentos do potencial de etnodesenvolvimento e da pressão sobre as TIs. Ações dessa natureza apontam para uma maior interação entre o conhecimento tradicional indígena e o conhecimento científi co não indígena, ambos extremamente importantes para a gestão ambiental e territorial das TIs. Na perspectiva de algumas lideranças indígenas: “o processo de apropriação das tecnologias e de outros conhecimentos próprios da modernidade está possibilitan-do que esses povos reorientem e planejem seus futuros, reafi rmando e fortalecendo os seus próprios conhecimentos” (LUCIANO, 2006).

Essa interação entre conhecimentos, quando bem dosada, pode contribuir enormemente para a formulação de planos de gestão das terras indígenas, ressaltados pelos participantes como uma normatização do uso do território com diversas dimensões, devendo ser entendidos a partir de uma

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visão global e não fragmentada. Estes planos foram sinalizados como ferramentas importantes para se pensar o futuro dos povos e terras indígenas nas próximas décadas, sendo seu processo de elaboração considerado longo e demorado, devendo ser desenvolvido com cautela e cuidado.

Para a efi cácia desses planos – considerados como processos longos, cautelosos e globais – é preciso contar com ações integradas por parte dos órgãos governamentais, sejam eles federais, esta-duais ou municipais. Nessa direção, políticas que possuem interface com a gestão do território, como educação e saúde, e questões polêmicas, como a sobreposição de TIs e UCs e a política para povos isolados e semicontatados, poderiam ser mais efetivas.

Não se pode perder de vista, ainda, outra questão sinalizada pelos participantes do Seminário, a necessidade de propiciar o fortalecimento das associações indígenas, inclusive com um maior apoio para pequenos projetos. Por meio das associações e com os devidos apoios, inúmeras ações de gestão ambiental e territorial podem ser desenvolvidas. Não se deve esquecer, entretanto, que o associativis-mo indígena, estimulado consideravelmente após a Constituição Federal de 1988, possui “amplitudes de ações muito distintas – desde as que representam aldeias ou de corte étnico, representando um povo, até as de âmbito regional, passando por grandes redes de organizações” (LIMA, 2010).

3.2.3 Levantamento da Situação Socioambiental das TIs do PA

As matrizes a seguir resultam do trabalho realizado pelos GTs no segundo dia do seminário. Como já relatamos, a proposta era, com base em uma ferramenta de planejamento simples (matriz FOFA), fazer um levantamento preliminar da situação socioambiental das TIs do Pará tal como per-cebida pelos pontos de vista idiossincráticos e plurais dos participantes presentes no Seminário e conforme as sete regiões do estado em que se articula o Fórum dos Povos Indígenas. Pelas razões já apontadas, não compareceram indígenas da região de Altamira, motivo pelo qual não há uma matriz para esta região. Ademais, reunimos o contingente de indígenas Kaapor - que se juntou de última hora ao seminário por estar na cidade para outros fi ns - ao grupo Belém – o que inchou um pouco o seu tamanho e se expressa na matriz mais apinhada. Tais matrizes foram socializadas pelos seis grupos na plenária ao fi nal do dia e devem ser compreendidas em conjunto com o resultado da tabulação dos questionários preenchidos pelas lideranças indígenas presentes com o apoio da equipe da SEMA. Ao lado do nome grupo, incluímos o nome do relator do grupo em plenária __sempre um indígena.

Cabe ressaltar, que houve difi culdades no emprego adequado das tarjetas e na distinção entre o que é interno e/ou externo, positivo e/ou negativo. Isso explica tanto algumas repetições que se verifi cam nos quadrantes de fraquezas (internas) e ameaças (externas) em alguns grupos, quanto às

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formulações aparentemente positivas nos quadrantes que abarcam as dimensões negativas (fraquezas e ameaças). Nesses casos, sugerimos ao leitor acrescentar, em sua leitura, “falta de”, “carência de”, “ausência de”, para recuperar o espírito da formulação.

Além disso, como muitos já articulavam em termos de comentários adicionais, críticas e propos-tas, demos a liberdade para que os GTs elaborem painéis paralelos com esses elementos – cujas formu-lações se encontram registradas abaixo das matrizes. Em alguns casos, editamos as matrizes, retirando dos quadrantes o que eram propostas evidentes. Nesses casos, os trechos retirados dos quadrantes estão realçados em cinza nas listas de propostas apresentadas.

Apesar de todas essas qualifi cações, decidimos reduzir ao mínimo a edição das matrizes, limi-tando-nos a uma revisão de redação. Fizemos pouquíssimos ajustes em termos de seus conteúdos e optamos por deixar as inconsistências de conteúdo visíveis, como expressão do modo como os parti-cipantes entenderam o exercício. Isso porque avaliamos que, a despeito disso, logramos produzir uma contribuição preliminar que pode ser recuperada em um futuro processo de planejamento à escala regional a partir das perspectivas dos múltiplos atores presentes. Após a apresentação das matrizes, fazemos uma breve análise das mesmas em linhas gerais, em termos de seu conteúdo.

a) Grupo: Oriximiná/Tumucumaque - Juventino Kaxuyana

Forças:

– Regularização fundiária;– Preservação dos recursos naturais pelos indígenas;– Importância das associações como mediadoras;– Fortalecimento das associações indígenas;– Extensão dos territórios Tumucumaque e Nhamundá/Mapuera;– Ocupação do território e terras indígenas;– Existência e preservação de bens materiais e imateriais tradicionais na região;– A preservação da língua;

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Fraquezas:

– Falta de consenso entre a comunidade sobre ações externas;– Descentralização das aldeias;– Ausência de ações em todas as aldeias, educação, saúde;– Não regularização das pistas de pouso das aldeias da região;– Falta de fi scalização das terras indígenas;– Falta de apoio e logística para fi scalização;– Difícil acesso ao território;– Valorização dos serviços dos pesquisadores indígenas;– Valorização da educação escolar indígena e saúde indígena;– Falta de ferramenta para gestão ambiental e territorial para as TIs.

Oportunidades:

– Ingresso de indígenas nas universidades; – Potencialidade dos recursos naturais (bacaba, açaí, madeira...);– Capacitação dos membros das associações indígenas;– Pagamentos por serviços ambientais;– Inclusão de indígenas como co-autores do processo de construção do conhecimento; científi co

sobre a região;– Intercambio entre povos indígenas;– Garantia de participação de povos indígenas no processo de etnozoneamento das TIs;– Capacitação e treinamento no monitoramento territorial das TIs;– Formação entre indígenas como guardas-parques;– Acordos internos para criação de áreas de preservação;– Existência do manejo de quelônios e peixes na TI Trombetas.

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198 SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

Ameaças:

– Presença das forças armadas nas aldeias;– Aprovação da lei de livre acesso nas terras por parte das forças armadas;– Caça ilegal pelos militares;– Focos de incêndio nas TIs;– Uso da mão de obra indígena não remunerada no Tumucumaque;– Presença de madeireiras nas TI e entorno;– Presença de garimpeiros nas TI e entorno;– O não retorno dos estudantes a sua base;– Falta de saneamento básico nas aldeias;– Construção de hidrelétricas nas proximidades de Cachoeira Porteira;– Aliciamento de mulheres indígenas no Tumucumaque por militares e outros;– Presença das mineradoras próximas a TI;– Exploração de minérios na TI Tumucumaque;– Poluição dos rios por produtos utilizados por não indígenas.Proposta: criação de uma organização indígena estadual.

b) Grupo: Marabá/Tucuruí - Urubatã Sompré.

Forças:

– Associação Jaepya Aradu Kariwassú – Guarani;– Cultura;– União da comunidade;– Associação Porekrô Xikrin do Kateté;– Agricultura para consumo da comunidade – Guarani;– Extrativismo;

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– Língua e Cultura;– Artesanato;– Conservação dos recursos naturais;– Forte presença indígena no estado.

Fraquezas:

– Áreas não demarcadas e não constando no mapa da SECTAM;– Falta de fi scalização da terra - FUNAI – Surui;– Associação não existente - Guajanaíra – Guajajara;– Não há assistência da FUNAI;– Território pequeno;– Projetos: hidrelétrica, mineração, siderurgia;– Venda ilegal de madeira;– Falta de política para implementar REDD;– Sonegação de informações sobre os programas do Governo;– Extinção de administrações da FUNAI;– Falta de divulgação do artesanato;– Falta de atuação de órgãos: MPF, PF, FUNAI e IBAMA;– Falta de articulação entre os povos;– Difícil acesso a reservas indígenas isoladas;– Manipulação da participação indígena para legitimar os eventos;– Corte nas falas dos indígenas.

Oportunidades:

– Proteção aos direitos indígenas pela Lei;– Força do Ministério Público;

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– Cotas nas universidades;– Programas em geral;– REDD – recursos para manter a fl oresta em pé;– A parceria com o CIMI – Guarani.

Ameaças:

– Área pequena rodeada de fazendeiros;– Projetos: hidrelétrica, mineração, siderurgia;– Políticos oportunistas;– Ocupação desordenada das cidades;– Extinção da língua – Guajajara;– Cobiça pelos recursos das TI: caça, madeira, coleta (castanha), roubados por invasores;– Manipulação da participação indígena para legitimar os eventos;– Violação sistemática dos direitos indígenas;– Desmatamento do entorno;– Programa Terra Legal (grilada);– Expansão agropecuária;– Lixo: falta de política para destinação;– Infraestrutura e saneamento básico defi ciente/inexistente.

Propostas: programa de custeio de estudante indígena na cidade; cotas na UEPA; bolsas para es-tudo nas universidades privadas; criar Secretaria Indígena; criação de um fórum indígena permanente custeado pelo Governo.

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c) Grupo: Sul e Sudeste do Pará - Bepunu Kayapó

Forças:

– Capacidade de articulação do povo Kayapó;– Liderança tradicional forte;– Ausência de fraqueza;– Abundância de recursos naturais;– Associação Floresta Protegida do povo Kayapó;– Cultura;– Forte relação com a terra;– Tem língua cultura e cantos.

Fraquezas:

– Falta de apoio à saúde indígena;– Educação escolarizada não adequada à cultura Kayapó - faltam livros em Mebêngôkre.

Oportunidades:

– Ofertas de capacitação: professores indígenas, agentes ambientais, agentes de saúde e saneamento;– Parceira com Governo Federal, estadual e municipal;– Educação intercultural, multilíngue;– Escutar e aprender com os velhos;– Geração de renda com as coisas do mato: castanha, artesanato, farinha.

Ameaças:

– O Governo Federal está nos ameaçando com Belo Monte;– Desmatamento;

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– Ameaças da integridade física, assassinatos na cidade;– Invasão das terras indígenas;– Área desmatada pelos fazendeiros e madeireiros – Guarani.

Comentários e preocupações:

Fazer com que as crianças aprendam as coisas do branco, sem esquecer a cultura, para defender seu povo; pouca participação de lideranças indígenas Kayapó no Seminário; o mato tem que fi car saudável (conservação); isso é só um documento? Não teve informações sufi cientes nas comunida-des sobre as políticas do Estado para as TIs; insatisfação com o Governo Federal (faz coisas que não presta - Belo Monte).

d) Grupo: Itaituba - Waldelírio Munduruku.

Forças:

– Politicamente em ascensão;– Capacidade de sedução;– Produção agrícola sustentável;– Manejo sustentável dos recursos naturais;– Organização tradicional;– Conhecimentos ancestrais;– União para lutar para defender os direitos indígenas;– Patrimônio natural e cultural conservado.

Fraquezas:

– Desvalorização cultural;– Partidarismo;– Falta de articulação entre os povos indígenas;

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– Perda de identidade cultural;– Disputa de poder;– Infl uencia de não índios;– Cargo político;– Envolvimento indígena em atividades ilegais;–Falta de diálogo do cacique com a comunidade.

Oportunidades:

– Formar índios na universidade para ajudar a elaborar projetos; – Instrução;– Capacitação de recurso pela manutenção dos serviços ambientais e REDD;– Geração de renda através do artesanato, conhecimento tradicional;– Estrutura nas organizações;– Geração de emprego, venda de produtos naturais e artesanatos;– Aprofundamento cultural.

Ameaças:

– Mordomia, alcoolismo; – Drogas;– Alcoolismo e prostituição;– Manipulação de trabalho escravo;– Exploração de riquezas pelos não indígenas como: garimpo, madeira, fazendeiro, barragem de rio;– Sedução do mundo dos não índios;– Dos garimpeiros, madeireiros, pescadores e palmiteiros;– Os direitos autorais para não índios.

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Propostas:

– Fazer que FUNAI e Ministério Público defendam nossa causa; – Criar Escola Técnica para os índios se desenvolver no trabalho.

e) Grupo: Santarém - Graça Tapajós

Forças:

– Militância social e política nas bases;– Potencialidade da ciência (conhecimento indígena) – saber milenar ancestral;– Presença indígena milenar e ancestral na região do Baixo Tapajós;– Povos indígenas milenares: Tapuia, Tupinambá, Borari, Arapium, Tapajó, Maytapu, Cara –Preta,

Munduruku, Apiaká, Jaraqui, Cumaruará, Tupaiu, Arara Vermelha;– Produção extrativista abundante: castanhal, seringal, madeira de lei, caça;– Cultura milenar do trato com a palha do tucumã, cestarias, cipós - paneiros, peneiras, barro - panelas,

música sairé - marambire - gambá - mandioca - farinha, beiju, tapioca, tucupi– Segurança alimentar;– Recursos naturais diversos, fauna, fl ora, rios, savana, fl oresta, pescados, várzea dentro das TIs;– Organização política e social em defesa dos povos indígenas;– Autonomia dos povos indígenas na gestão de suas terras (demarcação ou não);– Indígenas com formação acadêmica e em processo de formação nas distintas áreas do conhecimen-

to;– Refl exão que existe sobre a valorização da cultural.

Fraquezas:

– Falta de plano de proteção e fi scalização das terras indígenas;– Garantia da participação nas defi nições dos programas e ações de governo das lideranças indígenas

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e atenção as suas reivindicações e direitos;– Falta de atenção à saúde indígena diferenciada com a criação dos DSEI (Distrito Sanitário-Especial

Indígena) e o acesso aos indígenas no Subsistema Clínico de Saúde Indígena;– Falta de organização indígena geral do Estado do Pará;– Ausência de sustentabilidade econômica;– Defi nição de uma política de exploração sustentável dos recursos naturais;– Processo de demarcação muito lento;– Ausência de respeito à identidade indígena da região do Tapajós (Convenção 169);– Ausência de recursos fi nanceiros para garantir as atividades das organizações/aldeias e TIs;– Ausência de ação integrada entre órgãos de segurança pública e as comunidades, visando autonomia

de gestão. Oportunidades

– Frutas: bacaba, açaí, buriti, caju, goiaba, manga, entre outras. Possibilidade de comercializar;– Área apropriada para atividades de ecoturismo; ou modalidade do gênero que não agrida a cultura

dos povos indígenas;– Leis que protegem/garantem os direitos dos povos indígenas;– Inclusão digital e ampliação da rede de cobertura nas aldeias;– Estudos sobre a realidade indígena social, cultural, econômica, espiritual, por parte das universidades

e outros;– Potencial cultural com os festivais: Borari, Sairé, Cambá, Cabanos;– Movimento social não indígena apoiando as lutas indígenas;– Políticas públicas de garantia dos direitos indígenas:1) escolas indígenas de Ensino Fundamental, Médio e Universitário (reserva);2) reconhecimento pelo Governo Municipal e estadual dos povos indígenas do Baixo Tapajós.

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Ameaças

– Violência contra as nossas lideranças indígenas;– Compensação aos povos Munduruku e Borari que serão impactados pela BR-163;– Existência de racismo, discriminação e preconceito contra povos indígenas da região do Baixo Tapajós;– Descaso dos órgãos do Estado para inibir queimada, desmatamento, retirada de madeira, pesca pre-

datória nas TIs que estão em demarcação;– Ausência de apoio do Governo para autonomia e gestão das terras;– Questionamento do IBAMA e ICMBio aos relatórios antropológicos das TIs do Baixo Tapajós;

Evolução do olhar e fazer por parte de funcionários públicos, federais, estaduais e municipais na questão indígena - resistência dos funcionários;– Exploração do agronegócio e exploração ilegal de madeira no entorno das TIs;–Tráfi co de drogas nas estradas (PA e BR) das TIs – Baixo Tapajós;– Opositores dos povos indígenas da região do Tapajós;– Grandes projetos planejados no Alto Tapajós (hidroelétricas eclusas);– Publicação (racismo, preconceito, discriminação) contra a identidade indígena é crime – Baixo Ta-

pajós (Convenção 169 - OIT).Proposta: Facilitar a visão global da gestão territorial que envolve várias dimensões; fazer aconte-

cer as políticas públicas com qualidade e respeito aos povos indígenas e as TIs que estão em processo de demarcação sejam contempladas no mapa da SEMA.

f) Grupo: Belém/Kaapor - Waldeci Tembé.

Forças:

– Conhecimento territorial e ambiental sobre a terra;– A cultura e os costumes;– Os índios mantêm seu ritual indígena;– Conhecimento ambiental, preservação, cultura, organização;– Indígenas organizados na gestão e administração de projetos e recursos públicos;

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– As comunidades unidas é força para os povos indígenas;– As culturas dos povos indígenas devem prevalecer;– As organizações indígenas que são as associações. Conhecimento tradicional e ambiental. A biodi-

versidade existente na fl oresta;– Cultura, articulações políticas;– Criação da associação AITESAIPA para lutar pelos direitos (2001);– O conhecimento sobre a medicina tradicional;– Participação em debates que acontecem em eventos.

Fraquezas:

– Não conhecimento da história indígena nos municípios em que as aldeias se encontram;– Aliciamento de fazendeiros, madeireiros, mineradoras, empreiteiras às lideranças indígenas na venda

de seus bens/riquezas naturais;– Falta de articulação interna entre as organizações indígenas;– Falta de políticas públicas;– Não tem estudo antropológico na área;– Falta articulação política em nível estadual e federal;– Confl itos internos entre lideranças criados por não indígenas;– Não existem mais matas, somente nas cabeceiras dos rios;– Falta de capacitação;– Falta de fi nanciamento bancário para os indígenas;– Nós sempre concordamos com a proposta do Governo e outras;– Desarticulação das retaguardas do Estado na defesa e proteção dos territórios indígenas;– Não tem como caçar e pescar. Difi culdade de se alimentar;– Não tem reconhecimento do território (regularização de TI);– Desmatamento. Falta de GTs nas áreas indígenas;– As instituições não cumprem suas responsabilidades e obrigações na desintrusão da TIs;– Falta de capacitação ambiental para as comunidades.

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Oportunidades:

– Turismo desde que organizado e negociado com as comunidades;– Compensação fi nanceira para os índios por preservar a biodiversidade;– Interesse por parte dos parceiros;– Produtos da fl oresta;– Tem muito açaizal;– Estão resgatando a cultura dos ancestrais;– Melhor oportunidade de ensino;– Capacitação de recursos para suas atividades;– Indígenas participando de fóruns representativos de garantia de políticas públicas para Meio Am-

biente;– Participação na gestão territorial e ambiental em TIs;– Presença de açaizais para exploração.

Ameaças:

– Picaretas;– Desmatamento descontrolado no entorno da TI;– Técnica agrícola indígena não é boa para cultivar a terra que vivem;– Ausência de retaguardas do Estado na defesa, proteção, às reservas e TIs e demais UCs;– Ocupação de terras indígenas por não índios versus confl itos políticos e territoriais/agrários;– Mandioca morrendo. Não tem muita produção porque a terra está degradada/enfraquecida;– Projetos de capacitação de carbono sem esclarecimentos devidos para a comunidade indígena, cau-

sando confl itos e divisões entre o povo– Fazendeiros devastaram as matas;– Comunidade indígena não usufrui do açaí nativo. Branco vem e tira;– Madeiras;– Evasão, as políticas, alguém falando para índios, desmatamento;

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– Ameaças das madeireiras na TI;– Discriminação que traz falta de conhecimento;– Cidades e vilas, invasões;– Desmatamento das cabeceiras dos rios pelos não indígenas;– Problema dos curtumes que são jogados no rio. Balneário nos rios;– O poder econômico/político dos ricos: fazendeiros, madeireiros, agronegócios, mineradoras e em-

presas de energia elétrica que se utilizam de “lobby” (infl uência de grupo) para demandar políticas em seu favor e contra o interesse dos povos indígenas;

– Manter a fl oresta em pé versus Belo Monte;– Desmatamento das grandes fazendas nas reservas Nós temos ameaças na TI Alto Turi-Açu;– As TIs estão sendo desmatada pelos madeireiros de fora;– Poluição dos rios e nascentes dentro e fora da TI;– ONGs desviando recursos públicos para defesa/projetos de meio ambiente em TI;– Língua materna está acomodada;– Não dá para viver do extrativismo, sendo obrigado a trabalhar para fazendeiro;– Não tem educação, saúde, assistência técnica.

Propostas: facilitar o contato com os centros de monitoramento da Amazônia; garantir recursos fi nanceiros através de leis, convênios, contratos, políticas públicas e ONGs; incentivar a educação indígena a fi m de “conhecer o regulamento dos brancos” e exigir direitos e acesso à cidadania com professores indígenas formados; fortalecer o nosso trabalho em conjunto com um olhar transparente; capacitação e formação de agentes ambientais; articular com estados, municípios e outras organiza-ções; organização em associações; criar e fortalecer as organizações indígenas; alfabetização política dentro e fora das aldeias; fortalecimento de lideranças; proteção dos saberes através das instituições jurídicas (leis); autonomia indígena para anunciar o que se quer de fato e de direito para o povo/aldeia, por consenso; melhor organização dos povos indígenas; conhecimento para trazer os parceiros res-ponsáveis; capacitação para que possam gerir os recursos que lhes são destinados; capacitação, forma-ção e participação na gestão; inovação das técnicas agrícolas, implantação de piscicultura, criação, aves; fazer estudo antropológico e regularização da Terra Indígena Areal Jeju – Sta. Maria; buscar parcerias políticas institucionais (Município, Estado, FUNAI).

Críticas: os índios merecem aquilo que é melhor para todos; desmobilização política por falta de recursos para deslocamento/viagens em que o Estado é o principal gestor e, deveria ser, facilitador

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desses repasses; não existe mais fl oresta na terra indígena porque a maior parte já está desmatada; indígenas não possuem apoio político por parte do Município.

Uma análise geral das matrizes elaboradas pelos grupos permite dizer de modo resumido o seguinte. Para o grupo de Oriximiná/Tumucumaque, suas fortalezas centram-se no território regularizado, no uso dos recursos naturais e na cultura do povo. A extensão das TIs Tumucumaque e Nhamundá/Mapuera tam-bém veio a ser considerada uma fortaleza, bem com as associações indígenas da região.

As principais oportunidades ressaltadas dizem respeito à formação/capacitação em diversas áre-as, pagamentos por serviços ambientais e acordos internos de uso dos recursos, com a realização do etnozoneamento das TIs e o manejo de recursos importantes em andamento. Entre as fraquezas da região foram mencionadas as difi culdades de acesso e de fi scalização das TIs, e as fragilidades inter-nas, como falta de consenso entre a comunidade para algumas ações e a descentralização das aldeias. Todas as aldeias da região padecem de ações de educação e saúde, sendo importante ainda valorizar a educação escolar indígena e os pesquisadores indígenas. As ameaças sinalizadas foram em número considerável, apontando problemas nas relações interétnicas, com militares, madeireiros e garimpei-ros, bem como com projetos de desenvolvimento por meio da construção de hidrelétricas. Esses pro-blemas resultam no aliciamento das mulheres indígenas, caçadas ilegais, invasões, uso não remunerado da mão-de-obra indígena e a poluição dos rios.

O grupo de Marabá/Tucuruí, por sua vez, indicou como forças da região a existência de associa-ções indígenas, a união da comunidade indígena e aspectos da cultura indígena, bem como a conserva-ção dos recursos naturais e atividades de extrativismo e produção de artesanato. Outra força na região é a presença indígena no estado. Dentre as oportunidades, constam a proteção aos direitos indígenas, a presença do Ministério Público, as cotas nas universidades, a parceria com o CIMI e o potencial para REDD. As fraquezas, em número mais elevado, estão associadas às terras não demarcadas, à falta de fi scalização, a projetos de desenvolvimento, a ausência de associações e ao difícil acesso às terras. Es-sas fraquezas são agravadas pela falta de uma atuação adequada por parte de vários órgãos: FUNAI, MPF, PF e IBAMA. O grupo ainda apontou como uma fraqueza a falta de políticas para REDD e artesanato, bem como a pouca articulação entre os povos e a manipulação da participação indígena em eventos, inclusive com cortes nas falas dos indígenas. Em relação às ameaças, nota-se a presença de fazendeiros, expansão da agropecuária, desmatamento do entorno das TIs, projetos de desenvol-vimento, violação dos direitos indígenas e cobiça pelos recursos naturais nas TIs. A manipulação da participação indígena, apontada como uma fraqueza, também foi ressaltada como uma ameaça, junta-mente com políticos oportunistas.

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No grupo Sul e Sudeste do Pará, os participantes sinalizaram como fortalezas a capacidade de articulação do povo Kayapó, a existência de liderança tradicional forte, a cultura, a abundância de recursos naturais, a relação forte com a terra, a presença de associação indígena e a própria ausência de fraquezas. As oportunidades, por sua vez, referem-se a ofertas de capacitação em diversas áreas, a parcerias governamentais, a educação intercultural, ao ensinamento dos mais velhos e a geração de renda por meio dos recursos naturais. As fraquezas apontadas foram em número muito reduzido, ape-nas a falta de apoio à saúde indígena e a educação escolarizada não adequada à cultura Kayapó (faltam livros em Mebêngôkre). As ameaças também não são em grande monta, mas de grande intensidade, como o apoio do Governo à hidrelétrica de Belo Monte, o desmatamento gerado por madeireiros e fazendeiros e as ameaças a integridade física dos indígenas.

No grupo de Itaituba, as forças destacadas incluem a produção agrícola sustentável, o manejo dos recursos naturais e o patrimônio natural e cultural conservado. Soma-se a esses pontos, os co-nhecimentos ancestrais e a organização tradicional dos povos, expressas em uma união para lutar pela defesa dos direitos indígenas. Quanto às oportunidades, vale destacar a formação universitária, a capacitação para serviços ambientais e REDD, a geração de renda por meio de produtos fl orestais e a estrutura das organizações. Já dentre as fraquezas encontram-se a desvalorização cultural, a falta de articulação entre os povos e a perda da identidade. Acrescenta-se como fraquezas o partidarismo, a disputa pelo poder, a infl uência de não índios e o envolvimento de indígenas com atividades ilegais. Entre as ameaças, o grupo mencionou o alcoolismo, as drogas, a prostituição, o trabalho escravo e a sedução do mundo dos não índios. Os territórios estão ameaçados por garimpeiros, madeireiros, pes-cadores e palmiteiros, os quais exploram os recursos naturais da região.

O grupo de Santarém ressaltou como força da região a presença indígena milenar, a cultura, o conhecimento indígena, o artesanato, a segurança alimentar e os recursos naturais diversos. No campo da política, destacaram a militância e o envolvimento das bases, a organização em prol da defesa dos direitos e a autonomia na gestão dos territórios. Assim como em outras regiões, os indígenas com formação acadêmica e em processo de formação também foram tidos como uma fortaleza. Nas diver-sas oportunidades apontadas, nota-se no campo econômico a possibilidade de comercializar diversas espécies de frutas e o desenvolvimento de atividades de ecoturismo.

No campo político, destaque foi dado para a legislação indigenista, as políticas públicas e o apoio do movimento social às lutas indígenas. A inclusão digital e a sua ampliação nas aldeias também foram tidas como uma oportunidade, assim como o potencial cultural dos festivais indígenas (Borari, Sairé, Cambá e Cabanos) e a realização de estudos sobre a realidade indígena social, cultural, econômica e espiritual. Como contraponto, as fraquezas mencionadas foram a falta de planos de proteção e fi sca-lização das TIs e o lento processo de regularização fundiária. A falta de organização do movimento

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indígena no Estado do Pará, a ausência de ação integrada entre órgãos de segurança pública e as co-munidades e a precária garantia da participação indígena na defi nição de programas e ações governa-mentais formam outro bloco de fraquezas.

A ausência de sustentabilidade econômica e de políticas, a falta de atenção à saúde indígena dife-renciada, a ausência de respeito às identidades indígenas na região do Tapajós e a ausência de recursos fi nanceiros para garantir as atividades das organizações/aldeias e TIs vieram a ser considerados con-juntos de fraquezas. No que tange às ameaças, o grupo destacou os projetos de desenvolvimento, a violência e discriminação sofridas pelos indígenas, o descaso dos órgãos governamentais para impedir ações impactantes sobre as TIs, a ausência de apoio governamental para a autonomia indígena e a ges-tão das TIs, a resistência do IBAMA e ICMBio frente ao processo de regularização das TIs do Baixo Tapajós e o tráfi co de drogas nas estradas estaduais e federais.

O grupo Belém/Kaapor enfatizou como fortalezas o conhecimento dos indígenas sobre o ter-ritório, os recursos naturais, a cultura e os costumes. Acrescentaram, também, a existência de asso-ciações, a organização dos indígenas na gestão e administração de projetos e recursos públicos e a união das comunidades. Somam-se a estas, o conhecimento sobre a medicina tradicional e sobre a biodiversidade na fl oresta. Em relação às oportunidades, de modo geral, o grupo apontou a possibi-lidade de desenvolver atividades de turismo, pagamentos por serviços ambientais, parcerias, produtos da fl oresta, capacitação e participação na gestão territorial e ambiental das TIs. As principais fraquezas identifi cadas são o não conhecimento da história indígena nos municípios, o aliciamento dos indíge-nas, o desmatamento, a falta de políticas públicas, a desarticulação política em nível estadual e federal e a não regularização das TIs.

Há ainda, dentre as fraquezas, uma desarticulação interna entre as organizações indígenas, con-fl itos internos entre as lideranças criadas por não indígenas e a falta de capacitação em áreas prioritá-rias. Quanto às ameaças, o grupo apontou o desmatamento do entorno das TIs, a invasão das TIs, os impactos ambientais diversos, a discriminação para com os indígenas, a ausência de atuação do Estado na defesa e proteção das TIs, a precariedade das técnicas agrícolas utilizadas para o cultivo e os grupos de interesse que demandam políticas a seu favor em detrimento dos povos indígenas.

Olhando as matrizes comparativamente, podemos destacar alguns aspectos dignos de nota, que mostram como o Pará comunga dos muitos aspectos que marcam a conjuntura socioambiental atual dos povos e territórios indígenas na Amazônia:

Os GTs, em sua linguagem própria, enfatizaram a conversão de habitat e a degradação ambiental dos territórios indígenas e seu entorno, frutos de pressões externas – a expansão da fronteira agrícola e de atividades ilegais conexas, que literalmente “invadem” as TIs, o incremento de obras de infra--estrutura (hidrelétricas e estradas) e o avanço das indústrias extrativas (mineração) – com os conse-

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213SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

qüentes efeitos de isolamento e perda de biodiversidade e conectividade dos territórios indígenas em seus vínculos sociais e ecológicos com outros territórios especialmente protegidas pelo poder público. Em quase todos os GTs as ameaças aos povos e terras indígenas estão ligadas a esses processos.

Verifi ca-se no Pará, também, o avanço do protagonismo político dos povos indígenas e do reconhecimento dos seus direitos coletivos, em especial os territoriais, sinalizado nas menções que alguns GTs fazem da organização política e o associativismo como uma fortaleza. Nesse contexto, compreende-se a transição que os movimentos indígenas amazônicos vivem da exclusiva luta pela terra para a consolidação do controle territorial. Isso ajuda a entender a demanda que se verifi ca em quase todos os GTs de ampliar suas competências e habilidades – “capacitação” – para lidar com o de manejo de seus recursos, com a gestão de associações indígenas e de projetos.

A agenda da regularização fundiária das TIs no Pará, contudo, não está concluída, como indicam os GTs das regiões de Belém e Santarém. Isso sinaliza a necessidade de articulação do movimento indígena com o Governo do Estado no sentido de pressionar o governo Federal para tomar as provi-dências necessárias para superar esse gargalo. Os GTs apontam, assim, que a consolidação e a seguran-ça territoriais são condições indispensáveis para a gestão autônoma das TIs e o gozo manso e pacífi co dos recursos naturais – o que se verifi ca em distintos graus nas diferentes regiões.

As matrizes refl etem as distintas ênfases culturais, dos processos de territorialização e das situa-ções históricas característicos de cada região. Como os Kayapó não concebem haver fraquezas entre eles, é natural que o quadrante correspondente na matriz do grupo Redenção / Sul e Sudeste do Pará seja lacônica. De modo inverso, como formulado na matriz, uma das forças dos povos e terras indí-genas nessa região seria exatamente a “ausência de fraqueza”. Por sua vez, a matriz do grupo Belém / Kaapor não é a mais apinhada pelo simples fato de um número considerável de Kaapor terem se juntado ao grupo, mas também pelo fato dos Tembé serem especialmente enérgicos, pró-ativos e vo-cais em seus posicionamentos.

Os dados agrupados geram uma noção considerável sobre a situação socioambiental das TIs do Pará, mas poderiam ser complementados por meio de um trabalho ainda mais meticuloso para reunir informações mais detalhadas. Uma forma de complementar as informações produzidas durante o seminário poderia ser por meio da sistematização e análise de informações secundárias sobre as terras e povos indígenas do Pará. Esse conjunto de informações poderia ser enriquecido por meio de en-trevistas com representantes de associações indígenas, organizações não governamentais e governos estadual e federal. Após reunidas, uma forma de facilitar o acesso e a disseminação seria por meio da elaboração de um banco de dados, ou de materiais específi cos. Esta futura complementação é neces-sária para a elaboração de um programa estadual de gestão territorial e ambiental fundado em uma base sólida de informações.

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214 SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

3.2.4 Insumos Norteadores para a Estruturação do ProGATI

A tabela a seguir sistematiza o resultado do trabalho realizado pelos GTs no terceiro e último dia do seminário, organizados conforme os diferentes setores presentes ao Seminário (indígenas, Go-verno e academia/pesquisadores). Como já dissemos, os grupos trabalharam com dois insumos: (i) a sistematização das principais idéias e propostas que emergiram dos painéis temáticos; e (ii) um do-cumento síntese das propostas e deliberações do movimento indígena na Carta dos Povos Indígenas e na I Conferência (agosto de 2008). A proposta era cada grupo esboçar os objetivos, linhas de ação e propostas de atividades a partir de respostas a três perguntas orientadoras, a serem registradas em painéis: (a) se todas ou a maioria daquelas propostas fossem implementadas, que objetivos seriam alcançados? (b) há propostas parecidas umas com as outras? em caso afi rmativo, que grandes conjun-tos ou linhas de ação é possível reconhecer? e (c) as propostas de atividades listadas no documento síntese são sufi cientes para o ProGATI? Em caso negativo, que outras propostas de atividades são importantes de acrescentar? Esperava-se, ao fi nal do dia, socializar os resultados dos GTs e elaborar um painel sistematizando as contribuições de todos os GTs em um único painel.

Não obstante, além das difi culdades de ordem estritamente metodológica (redação inadequada dos objetivos, linhas de ação e propostas de atividade; e mudança da forma de trabalho dos GTs de um dia para o outro) durante o Seminário, questões mais importantes emergiram que impediram a plena realização do previsto – com a montagem do painel de síntese fi nal. No grupo dos indígenas, que foi coordenado pelo facilitador, emergiram fortes questionamentos sobre os objetivos do Seminário e a representatividade da participação indígena no evento.

Durante o trabalho do GT dos indígenas, estes passaram a questionar os propósitos do seminá-rio, o curto espaço de tempo do evento para a discussão de questões complexas, a representatividade das lideranças presentes para falar em nome de todo o movimento indígena do estado, o uso que será feito pelo Governo das informações produzidas no Seminário, as limitações das informações produ-zidas para se gerar diretrizes para uma política estadual e a necessidade de outras lideranças indígenas do estado serem consultadas para se consolidar uma política estadual. Isso tomou muito tempo, cerca de duas horas, impedindo que o grupo trabalhasse as linhas de ação; mas oportunizou um importante aprendizado para todos os envolvidos no processo do Seminário e sinalizou para pontos importantes de serem considerados em eventos futuros voltados para a elaboração de uma política de gestão am-biental e territorial no Estado do Pará.

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Depois de esclarecido pelos facilitadores e pela Coordenadora do ConBio que, apesar de ser pu-blicado, o documento serviria apenas como uma base, uma orientação e um subsídio para ser usado ainda neste governo e nos próximos, sendo um modo das palavras não serem perdidas. Chegou-se a conclusão que o grupo continuaria trabalhando na dinâmica proposta, mas que algumas salvaguardas seriam tomadas: (i) o relatório fi nal do Seminário deveria qualifi car o contexto de produção das infor-mações, ressaltando o caráter preliminar das discussões e a necessidade de um momento mais adequa-do com um conjunto maior e mais expressivo de lideranças para se detalhar de modo mais qualifi cado as diretrizes do referido Programa; (ii) não se justifi caria montar um painel de síntese, pois seria bom diferenciar o que indígenas, o Governo e os demais setores presentes pensam sobre e propõem para tal Programa e (iii) o documento publicado deveria trazer como anexos os documentos anteriores, que serviram de base para o exercício e de referência para o Seminário.

Feitos esses acordos, apresentamos a seguir a tabela com a sistematização dos painéis produzidos pelos três GTs. Além de acatarmos a orientação emanada do GT dos indígenas – de não sintetizar as contribuições em único painel; preservamos as formulações em seus conteúdos, tendo feito ligeiras re-visões de forma na redação dos objetivos, linhas de ação e propostas de atividade, como nas matrizes apresentadas no item anterior. Após a tabela, seguem comentários adicionais que podem contribuir para uma percepção mais geral das informações produzidas.

Como fi ca evidente, os pontos elencados acima representam uma contribuição a mais ao proces-so de discussão sobre um programa de gestão ambiental e territorial no Estado do Pará. Eles podem ser entendidos como subsídios para próximos eventos, sendo importante aprofundar e detalhar as muitas questões que cada um deles possa suscitar. Dentre os muitos pontos mencionados, enquanto objetivos, atividades ou linhas de ação, percebe-se que um programa estadual de gestão territorial e ambiental das TIs deve contemplar minimamente questões associadas a regularização fundiária, vigilância e fi scalização, desmatamento, diagnósticos e estudos, capacitação, fortalecimento institucio-nal, participação e autonomia indígenas, respeito à identidade indígena, invasões, impacto de grandes obras, saúde, educação, novas tecnologias, etnodesenvolvimento, ações institucionais integradas e a criação de uma secretaria dos povos indígenas. Cabem aqui, algumas breves ponderações acerca de cada um destes aspectos.

Regularização fundiária – Um programa de gestão territorial e ambiental do estado precisa considerar essa dimensão, tendo clareza de ser o procedimento de demarcação de TIs de responsabi-lidade do Governo Federal. Ainda assim, é possível ao Governo do Pará disponibilizar seu apoio para avançar nessa frente.

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Vigilância e fi scalização – Esta ação cabe não apenas para as TIs regularizadas, mas também para as que estão em fase de regularização. A dimensão de um programa de gestão territorial e ambien-tal deveria minimamente considerar ações conjuntas como Governo Federal com lideranças indígenas previamente capacitadas para atuar nesse campo.

Invasões – As muitas pressões externas aos recursos naturais das TIs tornam esta uma questão fundamental a ser tratada no programa, podendo as ações de vigilância e fi scalização contribuir para a redução das invasões nas TIs.

Impacto de grandes obras – Os impactos de projetos de desenvolvimento sobre as TIs são de diversas ordens e uma possibilidade de minimizá-los pode ser por meio de adequadas consultas pré-vias aos povos indígenas, conforme garantido na Convenção 169 da OIT.

Desmatamento – A preocupação dos grupos com atividades degradantes diz respeito ao inte-rior e entorno das TIs. O aumento da fi scalização e ações de recuperação de áreas degradadas parece ser um dos caminhos para se enfrentar esse problema.

Diagnósticos e estudos – Em linhas gerais os grupos focaram a necessidade de realizar diag-nósticos e estudos socioambientais das TIs e entorno. Como existem muitas metodologias para fazer levantamentos dessa natureza, seria interessante discutir com os povos indígenas qual a melhor a ser adotada.

Capacitação – A demanda por esta ação esteve presente ao longo das várias atividades desenvol-vidas nos seminários e está voltada para várias áreas, dentre elas: de agentes ambientais, de vigilância e fi scalização e de gestão de associações.

Fortalecimento institucional – Essa dimensão esteve focada principalmente nas associações indígenas, mas para desenvolver um programa de gestão territorial e ambiental seria relevante con-templar também determinados setores do Governo que estarão lidando diretamente com a questão.

Participação e autonomia indígenas – Essa demanda despontou no seminário para além de um programa de gestão territorial e ambiental, sendo importante frisar que a participação indígena precisa ser considerada nas várias etapas de um programa, desde a sua concepção até sua execução. Desse modo, é possível contribuir para o processo de autonomia indígena no estado.

Respeito à identidade indígena – O combate a discriminação sofrida por alguns povos indí-genas no estado parece ser um caminho fundamental para o desenvolvimento do programa de gestão territorial e ambiental, que para ser bem sucedido, precisa desenvolver ações com populações residen-tes no entorno das TIs.

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Saúde e educação – Esse aspecto da realidade indígena possui estreito vínculo com a gestão territorial e ambiental das TIs. Os grupos indígenas destacam a necessidade de ampliar o acesso de seus povos em todos os níveis a essas duas áreas.

Novas tecnologias – Um conjunto de tecnologias exógenas às culturas indígenas foram apon-tadas como importantes no processo de gestão das TIs, especialmente aquelas associadas a vigilância, fi scalização, monitoramento e produção de alimentos.

Etnodesenvolvimento – Mesmo sem ter ocorrido durante o seminário uma defi nição consen-sual sobre esse termo, fi cou evidente que o programa a ser desenvolvido deve dedicar atenção especial para um conjunto de atividades produtivas sustentáveis e de geração de renda. Ações institucionais integradas – Como a gestão dos territórios indígenas inclui ações em diversas áreas, requerendo a participação de múltiplas instituições, as ações integradas entre essas são essenciais para o sucesso do programa.

Secretaria dos povos indígenas – A criação dessa secretaria foi consenso entre os grupos organi-zados durante o seminário, merecendo destacar aqui a possibilidade do programa de gestão territorial e ambiental das TIs do Estado do Pará contar com o apoio desse setor do Governo para sua concep-ção, implementação e execução.

3.2.5 Considerações Finais

O Seminário com seus subsídios para a elaboração de um programa estadual de gestão territorial e ambiental possui grande interface com o processo de elaboração da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental das Terras Indígenas (PNGATI). Durante o período do Seminário estavam ocorrendo consultas regionais para a elaboração da PNGATI, sendo utilizado para tanto um docu-mento de apoio. Nesse, consta um conjunto de questões importantes a serem resgatadas para que as futuras discussões sobre o tema no Estado do Pará não percam a conexão com a política nacional a ser criada e implementada.

No documento de apoio para as consultas regionais, intitulado “Construindo a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental das Terras Indígenas”, datado de 201066, observa-se vários aspec-tos legais norteadores do processo de elaboração da PNGATI. Eles poderiam ser apropriados nas

66 Este documento foi utilizado como base para as consultas regionais, como forma de estimular as discussões junto aos povos indígenas das diversas regiões do país. Os conceitos, diretrizes, objetivos, arranjo institucional e demais informações presentes no documento não podem ser, portanto, considerados pontos consolidados de uma política nacional. As informações retiradas deste documento para o presente texto, nesse sentido, são apenas referencias para as futuras discussões estaduais.

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discussões para o programa estadual. Ou seja, para a construção de um programa estadual de gestão territorial e ambiental das TIs do Pará seria fundamental considerar o disposto nos seguintes marcos legais: a) Constituição Federal, em especial os Artigos 225 e 231; b) o Decreto 1.141, de 19 de maio de 1994; c) o Decreto 5.758, de 13 de abril de 2006; d) o Decreto 6.101, de 26 de abril de 2007 (em seus Artigos 27 e 28 do Anexo I); e) a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT); f) a Declaração das Nações Unidas (ONU) sobre os direitos dos povos indígenas; g) o projeto de lei do novo Estatuto dos Povos Indígenas, elaborado pela CNPI e h) a Portaria Interministerial 276/2008.

Outros aspectos importantes presentes no estágio atual de elaboração da PNGATI e que podem contribuir para o programa estadual dizem respeito aos conceitos, diretrizes e objetivos. Esses itens da PNGATI podem ser complementados por meio de ações do Governo Estadual, evitando-se a duplicação de esforços. Para se consolidar um programa estadual é extremamente importante haver consenso entre os diversos atores envolvidos e a defi nição de conceitos básicos como terra indígena, gestão territorial e ambiental de terras indígenas. Além disso, pode-se avançar com a criação de um glossário com defi nição de termos recorrentes, como desenvolvimento sustentável, etnodesenvolvi-mento, ecoturismo, etnomapeamento, etonozoneamento, plano de gestão, áreas protegidas, ecossiste-ma, bioma e muitos outros utilizados nas discussões. As defi nições existentes no documento de apoio as consultas regionais da PNGATI pode constituir uma base para a formulação estadual.

Ainda considerando o constante no documento em tela, cabe observar que as dez diretrizes submetidas para discussão nas consultas regionais possuem grande interface com questões apontadas durante o Seminário, em especial nas matrizes FOFA e nos insumos para a elaboração do programa estadual. São elas:

I - respeito às crenças, aos usos, aos costumes e às tradições de cada povo indígena;II - valorização das identidades étnicas e das organizações sociais indígenas; e a necessidade de

garantir suas expressões;III – assegurar o protagonismo, e garantia da participação e do controle social dos povos indí-

genas no processo de elaboração e implementação das políticas públicas que os afetam, assegurado o respeito às suas especifi cidades e às instâncias de representação dos povos indígenas;

IV - garantia dos recursos naturais imprescindíveis à reprodução física e cultural das presentes e futuras gerações dos povos indígenas, contribuindo para a manutenção dos processos ecossistêmicos dos biomas onde se situam as terras indígenas;

V - proteção e fortalecimento dos saberes, fazeres e conhecimentos indígenas, e dos sistemas indígenas de conservação ambiental;

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VI - reconhecimento do direito dos povos indígenas à contraprestação pelos serviços ambientais das suas terras, em função da conservação e uso sustentável dos recursos naturais, assegurando a ges-tão dos recursos pelas comunidades indígenas e suas organizações;

VII - desenvolvimento da gestão etnoambiental como instrumento de proteção dos territórios e das condições ambientais necessárias à reprodução física e cultural e ao bem estar das comunidades indígenas,

VIII – priorização de ações de recuperação de áreas degradadas e restauração das condições ambientais das terras indígenas;

IX – garantir a proteção territorial e ambiental e melhoria da qualidade de vida nas áreas ocupadas por povos indígenas, regularizadas ou não; e

X – assegurar a aplicação dos objetivos da Política para comunidades indígenas residentes nas cidades, no que couber [MMA&MJ, 2010: 9-10].

Dos 27 objetivos apresentados no documento de apoio para as consultas regionais, pelo menos 17 são bastante relevantes para as futuras discussões sobre a temática da gestão territorial e ambiental no Estado do Pará por terem emergido como questões centrais durante o Seminário. Os principais objetivos que podem contribuir para o debate estadual, resguardadas as devidas atribuições do Gover-no Federal, são:

1. Assegurar a proteção, a fi scalização, a vigilância e o monitoramento ambiental das terras indí-genas e das faixas de segurança etnoambiental.

2. Fortalecer as iniciativas produtivas indígenas a partir do apoio à adoção de tecnologias susten-táveis, respeitados os usos, costumes e tradições de cada povo, e considerando as realidades regionais.

3. Promover a remuneração dos serviços ambientais prestados pelos povos indígenas em suas terras, respeitada a organização social e econômica de cada povo.

4. Promover a recuperação de áreas degradadas nas terras indígenas e no seu entorno.5. Garantir a formação, a capacitação e a sensibilização dos agentes governamentais, das comuni-

dades indígenas e da sociedade civil no que se refere à gestão territorial e ambiental indígena.6. Promover a recuperação e conservação da agrobiodiversidade e demais recursos naturais es-

senciais à soberania alimentar e nutricional dos povos indígenas. [...]8. Contribuir para manter a integridade dos recursos naturais das terras indígenas reivindicadas e

em processo de regularização fundiária, garantindo ações de proteção e melhoria da qualidade de vida nas áreas ocupadas por povos indígenas, regularizadas ou não.

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9. Promover o etnozoneamento das terras indígenas.10. Estabelecer no entorno das terras indígenas uma faixa de segurança etnoambiental, com foco

nas ações de fi scalização, monitoramento e educação ambiental. [...]15. Contribuir para o reconhecimento, a proteção e a promoção dos direitos dos povos indígenas

sobre os seus conhecimentos, práticas e usos tradicionais associados à biodiversidade.16. Efetivar a prevenção, a mitigação, a compensação e o controle de impactos de empreendi-

mentos que afetam povos e terras indígenas.17. Promover a produção, a sistematização e a divulgação de informações sobre a situação etno-

ambiental dos territórios indígenas.18. Garantir a governança indígena por meio da participação indígena na decisão e implementa-

ção das políticas relacionadas à gestão territorial e ao meio ambiente que afetem os Povos Indígenas. [...]

20. Controlar a poluição e promover a qualidade ambiental nas terras indígenas e no seu entorno.21. Monitorar as transformações nos ecossistemas das terras indígenas e do entorno, em especial

aquelas decorrentes das mudanças climáticas, e adotar medidas de adaptação, compensação e mitiga-ção. [...]

24. Promover, apoiar e regulamentar as iniciativas indígenas de desenvolvimento de etnoturismo e do ecoturismo sustentáveis em suas terras. [...]

26. Fortalecer, capacitar e instrumentalizar as organizações indígenas para exercer a governança sobre a PNGATI e demais políticas relacionadas ao desenvolvimento local e regional [MMA&MJ, 2010: 10-12].

Por estarem esses objetivos em grande medida associados às atribuições do Governo Fe-deral é importante frisar que o programa estadual deveria emergir de forma complementar. Para tanto, um diálogo estreito com a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e o Ministério do Meio Ambiente parece ser fundamental ao planejamento das atividades e linhas de ação do programa do Estado do Pará.

Por fi m, é importante retomar – e enfatizar a necessidade de implementar – o encaminhamento sugerido pelo GT dos indígenas no último dia do Seminário, na perspectiva de consolidar o desenho fi nal do que pode vir a ser o ProGATI: propiciar um momento mais adequado com um conjunto maior e mais expressivo de lideranças indígenas – e só destas – para detalhar de modo mais qualifi cado as diretrizes do referido Programa, a partir dos insumos aqui já consolidados, precedida da necessária articulação prévia, ou seja, pactuação política e preparação ativa anteriores. Este texto e seus anexos constituem um passo nessa direção.

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REFERÊNCIAS

BARRETTO F.; TRINDADE Henyo; CORREIA, Cloude de Souza. Gestão Ambiental e/ou Terri-torial de/em Terras Indígenas: subsídios para a construção da Política Nacional de Gestão Ambiental em Terras Indígenas conforme Portaria Interministerial nº 276/2008. Brasília: MMA, MJ e GTZ, 2009.CARTA DOS POVOS INDÍGENAS DO PARÁ. Belém, Mimeo, 2007.LIMA, Antônio Carlos de Souza. Povos Indígenas no Brasil Contemporâneo: de tutelados a “organi-zados”? In: SOUSA, Cássio N. I; ALMEIDA, Fábio V. R; LIMA, Antônio C. S; MATOS, Maria He-lena O. (Org.) Povos indígenas: projetos de desenvolvimento II. Brasília: Paralelo 15; Rio de Janeiro: Laced, 2010LITTLE, Paul E. Gestão Territorial em Terras Indígenas: defi nição de conceitos e proposta de diretri-zes. Relatório fi nal entregue a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Naturais – SEMA--AC, Secretaria Extraordinária dos Povos Indígenas – SEPI-AC e Agência da GTZ no Brasil – GTZ. Rio Branco, Acre, 2006.LUCIANO, Gersem dos Santos. O Índio Brasileiro: o que você precisa saber sobre os povos indí-genas no Brasil de hoje. Brasília: Ministério da Educação; UNESCO; Fundação Ford e Laced, 2006.MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE & MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Documento de Apoio para as Consultas Regionais: Construindo a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental das Terras Indígenas. Mimeo, 2010.SECTAM (Secretaria Executiva de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente). Macrozoneamento Eco-lógico-Econômico do Estado do Pará. Proposta para Discussão. Belém, PA: Mimeo, 2004SEJUDH/PA (Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos do PA). Relatório da 1ª Confe-rência Estadual dos Povos Indígenas. Belém, PA: Mimeo, 2008SEMA/PA (Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Pará). Ofi cina de Trabalho “O Etnozone-amento em Terras Indígenas do Pará: Ferramentas de Gestão Ambiental”. Belém, PA: Mimeo, 2009._____, 2010. Seminário Situação Socioambiental das Terras Indígenas do Pará: Desafi os para elaboração de políticas de gestão ambiental e territorial. Belém: Mimeo, 2010.

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226 SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL L L LLL L L DDDDDDDADADADAADDAASSSS TTERERERE RARARARR SS S SS ININNINNNININDÍDÍDÍDÍDÍDÍÍÍÍÍDÍGEGEGEGGEGGENANANANAAANAN SS S S DODODODOOODODOOD PPPPPPPARARRA Á: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTTTITICTICTICICAACCATTICTIC SS DDDEESS GESGESSTÃO TÃOTÃO TÃOTÃO ÃÃ TERRTERRTERRRRERRTERRERRITORITORITORTOITOROROTORTORTO IAL IAL IALIALIAALALIAL ALALALIAL E AME AME AMEE AME AME AMAMBBIEBIENBBIENBIENBII TAALLLTAALTA

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ANEXO ICARTA DOS POVOS INDÍGENAS

DO PARÁ

SEMANA DOS POVOS INDÍGENAS FÓRUM DAS QUESTÕES INDÍGENAS

PARQUE DOS IGARAPÉSPERÍODO: 16 e 17 de abril de 2007

BELÉM – PARÁ

Nós os Povos Indígenas do Estado do Pará, Akratikatêjê, Amanayé, Anambé, Arara, Arawe-té, Asurini Do Tocantins, Asurini Do Xingu, Atikum, Borari, Guajajara, Guarani, Hixkarya-na, Juruna, Karafawyána, Katwena, Kuxuyana, Kayapó, Kyikatêjê, Kuruaim, Mawayãna, Mun-duruku, Parakanã, Parkatêjê. Surui Aikewara, Ta-puia, Tembé, Tiriyó, Tunayana, Waiwai, Wayana, Wapyxana, Xerew, Xikrin do Cateté E Bacajá, Xi-kyana e Xipaya, reunidos no fórum das questões indígenas, nos dias 16 e 17 de abril do ano 2007, por ocasião da realização da semana dos povos indígenas na cidade de Belém, vimos, através desta, dirigir algumas orientações aos órgãos fe-derais, estaduais e municipais que trabalham nas terras e aldeias indígenas, a fi m de que a atenção pública aos nossos direitos reconheçam a nossa diversidade e fortaleçam as nossas identidades como povos que somos.

A realização da semana dos povos indígenas e dentro dela a garantia de um espaço de debate e defi nições de propostas dos povos indígenas, as-sim como, a presença das autoridades do Estado

neste encontro, sinaliza para nós, a vontade polí-tica da governadora Ana Júlia Carepa de tratar de maneira adequada os nossos problemas e junto conosco buscar as soluções;

Nossa presença neste encontro é o sinal de que estamos apostando que o governo de cunho democrático popular, assegure aos povos indíge-nas os direitos consuetudinários, constitucionais e internacionais que nos assistem. Já que, os go-vernos anteriores sequer trataram com dignidade os 37 povos e mais de 40 mil indígenas deste Es-tado Paraense.

Dessa forma, apresentamos para a senhora governadora e as demais autoridades dos órgãos federais e outros interessados nossas principais demandas, necessidades e interesses, para os quais exigimos atenção e cumprimento:

Propostas para Casa Civil:

1 Criação da secretaria dos povos indígenas do para;

2 Criação do programa de desenvolvimento dos povos indígenas do Estado do Pará – PDPI--PA;

3 Implantação do programa “luz para todas as aldeias do Estado do Pará”;

4 Estabelecimento em Belém de um centro de cultura dos povos indígenas do para, com es-paço para comercialização das artes indígenas;

5 Criar o projeto “raízes” diferenciado e inde-pendente para os povos indígenas.

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6 Apoiar com recursos a realização do 1º encon-tro dos povos indígenas do Pará, em agosto.

7 Que o Governo do Estado contrate e mante-nha na sua estrutura e nos órgãos funcionais, técnicos indígenas, a fi m de que possamos vi-sibilizar e ampliar as discussões sobre as nossas demandas; 8 Garantir a presença dos povos indígenas do Pará nas discussões nacionais e in-ternacionais sobre seus direitos em obediência aos preceitos legais de autodeterminação dos povos indígenas e a existência de mecanismos de participação como prevê a convenção 169 da organização internacional do trabalho;

9 Que seja garantida a proteção dos conhecimen-tos tradicionais dos povos indígenas ligados ou não a biodiversidade previsto na convenção so-bre diversidade biológica;

10 Criação de uma casa de apoio para estudantes indígenas;

11 Garantir bolsa de estudo para estudantes indí-genas para formação superior.

12 Demarcação da terra indígena do povo Borari e Arapium da Gleba Nova Olinda de responsa-bilidade do ITERPA no Município de Santarém;

Propostas para o etno-desenvolvimento, proprie-dade intelectual e proteção do patrimônio cultu-ral dos povos indígenas;

13 Assegurar a presença dos povos indígenas nas atividades que incluam temas indígenas, custe-ando os gastos para deslocamento e retorno de suas áreas, em obediência as previsões legais e

internacionais as quais o Brasil é signatário. 14 Que o Governo do Estado do Pará promova em parceria com o Governo Federal, a qualifi -cação dos povos indígenas do Pará no que diz respeito à:

A) - Gestão de suas associações; B) - Elaboração de projetos de inclusão di-

gital e tecnológica;

C) - Valorização, importância e proteção dos conhecimentos tradicionais e a proteção dos direitos intelectuais dos povos indígenas; 15 Apóie e execute projetos de segurança alimen-tar que contemplem as diversidades e as neces-sidades específi cas de cada povo indígena;

16 Promovam o benefi ciamento pelos próprios povos indígenas dos recursos naturais existentes dentro de seus territórios como frutas, semen-tes (a castanha, por exemplo) com o objetivo de geração de renda, evitando assim, que os recur-sos naturais sejam vendidos a preço inferior no mercado, prejudicando a comunidade;

17 Incentivem e apóiem o plantio de culturas tra-dicionais e não-tradicionais nas terras indígenas;

18 Promovam cursos de qualifi cação para os po-vos indígenas na área de plantio e cultivo de cul-turas perenes e sazonais;

19 Elaborem e executem projetos junto com os povos indígenas referente ao aproveitamento dos solos, apicultura, piscicultura com a preser-vação adequada da biodiversidade com a qual se relacionam;

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229SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

Proposta para área da educação:

20 Criação do conselho estadual de educação es-colar indígena;

21 Providenciar o reconhecimento das escolas indígenas do Estado e do Município para ga-rantir o repasse de verbas.

22 Que seja garantida às comunidades indígenas e suas escolas o retorno para o Estado, caso o Município não contemplem as suas demandas na área da educação escolar indígena;

23 Implantação de cursos de formação de pro-fessores indígenas para as aldeias ainda não atendidas;

24 Garantir que nas escolas das aldeias os profes-sores sejam indígenas;

25 Garantir cursos de formação para os profes-sores não indígenas antes de irem atuar nas escolas, para garantir o ensino diferenciado;

26 Contratar professores indígenas para o ensino da língua materna;

27 Que as secretárias municipais de educação ga-rantam o funcionamento das escolas indíge-nas de acordo com a legislação em vigor;

28 Que a secretaria estadual assegure o curso de formação de professores indígenas pelo me-nos 3 vezes ao ano, para a redução do tempo desta formação;

29 Construir e ampliar as escolas indígenas res-peitando o padrão regional e a realidade de cada povo, consultando as comunidades indí-genas;

30 Construir “escolas de referencia indígena” nas regiões para a oferta de ensino médio e supe-rior”;

31 Assegurar o transporte escolar para os alunos indígenas tanto do ensino fundamental, como do ensino médio;

32 Garantir o material escolar pelas secretarias estaduais e municipais;

33 Garantir na merenda escolar um cardápio re-gional diferenciado;

34 Garantir o ensino médio nas escolas indíge-nas;

35 Equipar as escolas e salas de aulas com: com-putador, televisão, DVD, internet, conjuntos escolares, quadra de esporte, parque infantil, para a melhoria da qualidade do ensino.

36 Garantir material pedagógico para os profes-sores ministrarem suas aulas;

37 Garantir o acompanhamento pedagógico nas aldeias indígenas.

38 Garantir que nas secretarias municipais e URES sejam contratados técnicos indígenas para garantir o ensino diferenciado;

39 Viabilizar concurso público para os professo-res indígenas;

40 Garantir as cotas nas universidades públicas para os indígenas egressos do ensino médio;

41 Garantir a alocação de recurso para a produ-ção de material didático específi co de cada povo;

42 Garantir oferta de cursos técnicos profi ssio-nalizantes para os alunos indígenas;

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230 SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

Propostas para saúde indígena:

43 Ampliação das CASAI(s) Icoaraci e Oriximiná 44 Criação do DSEI do baixo tapajós 45 Forta-

lecimento da medicina indígena e realização de encontros com pajés e parteiras;

46 Que nos DSEI e casai tenham intérpretes in-dígenas dos idiomas dos povos usuários;

47 Implantação de poços artesianos nas aldeias 48 Implantação do programa de saneamento bá-

sico em 100% das famílias indígenas do Esta-do do Pará. 49 garantir a formação especiali-zada dos agentes de saúde indígenas;

50 Priorizar o atendimento especializado nos hospitais, tanto no Estado como nos municí-pios;

51 Melhorar a condição de deslocamento fl uvial e terrestre; controle de malaria em áreas endê-micas, oferta de medicamentos e equipamen-tos de proteção individual;

52 Garantir treinamento para microscopistas e técnico de laboratório indígenas;

53 Que os recursos sejam disponibilizados para atenção nas casas;

54 Construir, equipar e garantir a manutenção dos postos de saúde nas aldeias;

55 Que seja garantido uma lei estadual de saúde indígena;

56 Formação de técnicos indígenas em saúde pú-blica;

57 Que seja garantida e executada a visita médica em todas as aldeias com equipes multiprofi s-sionais pelo menos à cada três meses;

58 Que seja oferecido alimentação nos hospitais para os acompanhantes indígenas;

59 Implantar rádiofonia e módulo solar nas al-deias por parte da FUNASA.

60 Que a funasa realize um concurso público específi co para profi ssionais indígenas desta área.

Frente a todas essas questões, neste mo-mento em que inauguramos um novo governo, nós os povos indígenas do Pará esperamos que sejam promovidos e ampliados os direitos huma-nos e indígenas, que se fortaleça o diálogo com as nossas lideranças, que se ampliem as políticas públicas voltada para atender as nossas neces-sidades e que as mesmas sejam de qualidade e efi cientes. Fazendo com que sejamos mais fortes nas nossas identidades e coletividades que aqui assinam estas propostas.

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231SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

ANEXO II

PROPOSIÇÕES APROVADAS NA I CONFE-RÊNCIA ESTADUAL DOS POVOS INDÍGENAS DO PARÁ

3.1 – As Diretrizes da Política Estadual para os Povos Indígenas do Pará

3.1.1 – Realizar Conferência Estadual dos Povos Indígenas do Pará.

a) Realizar a Conferência de 02 em 02 anos.b) Realizar Conferência Regional a cada ano.c) As Conferências Regionais devem ser rea-

lizadas preferencialmente nas Aldeias, com o ob-jetivo de fazer o acompanhamento e a avaliação da implementação das políticas para os Povos Indígenas;

3.1.2 – Elaborar o Plano Estadual de Sustentabili-dade Humana e Territorial dos Povos In-dígenas do Pará.

Educação

01- Criar a Câmara Setorial de Educação Escolar Indígena no âmbito do Conselho Esta-dual de Educação, garantindo a participação dos Povos Indígenas do Pará.

02 - Reconhecer as escolas indígenas do Es-tado e dos municípios para garantir o repasse de verbas federais.

03 - Atribuir a cada povo indígena a decisão sobre a esfera administrativa (municipal/estadu-al) que será responsável pela gestão das Escolas Indígenas, de acordo com a Lei vigente no Con-selho Estadual de Educação.

04 - Garantir o ensino bilíngüe, específi co e de qualidade nas Escolas Indígenas.

05 - Garantir na grade curricular o ensino da língua materna, específi co e de qualidade, em to-dos os níveis da educação nas escolas indígenas.

06 - Implantar cursos de formação de pro-fessores indígenas (magistério indígena) para os povos ainda não atendidos, garantindo a conclu-são do curso no prazo máximo de 04 anos.

07 - Garantir a conclusão dos cursos de for-mação (Magistério Indígena) já iniciada no prazo previsto em Lei, com acompanhamento nas eta-pas não presenciais.

08 - Garantir o acesso dos indígenas ao En-sino Superior na UEPA.

09 - Constituir uma Comissão na UEPA para implantar as políticas afi rmativas para os povos indígenas do Pará, com a participação de indígenas.

10 - Garantir o processo seletivo diferencia-do para indígenas na UEPA.

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232 SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

11- Garantir a licenciatura intercultural para indígenas na UEPA.

12- Garantir cursos de formação continua-da específi ca para os professores não indígenas.

13 - Garantir que nas escolas das aldeias os professores sejam indígenas, principalmente para o ensino da língua materna.

14 - Garantir a contratação de educadores/professores da educação básica indígena e de-mais profi ssionais da educação experientes para as atividades.

15 - Garantir a contratação de pessoal de apoio para as escolas indígenas, considerando a indicação de cada comunidade indígena.

16 - Garantir vagas para indígenas nos Con-selhos Municipais e Estaduais de Educação.

17 - Contratar profi ssionais indígenas para atuar nas Secretarias Estadual e Municipais.

18 - Viabilizar concurso público específi co para os povos indígenas do estado.

19 - Garantir meios de transporte para o deslocamento de professores indígenas e não in-dígenas para as Aldeias.

20 - Implantar ensino fundamental e médio completos nas Aldeias.

21 - Realizar acompanhamento técnico e pedagógico nas escolas indígenas.

22- Elaborar o calendário técnico de moni-toramento e assessoramento dos professores e educadores indígenas e não indígenas dentro das Secretarias estadual e municipais de educação.

23 - Implantar currículos e calendários ela-borados de acordo com o projeto político peda-gógico, e com o perfi l e as especifi cidades dos Povos Indígenas.

24 - Construir “escola de referência indíge-na” para a oferta de ensino básico, médio e su-perior de acordo com a realidade étnico-cultural conforme a deliberação de cada Povo.

25 - Construir, ampliar e reformar as escolas indígenas respeitando o padrão regional e a rea-lidade de cada povo (costumes e tradição), con-sultando previamente as comunidades indígenas.

26 - Garantir a instalação de equipamentos nas escolas indígenas para o funcionamento de (laboratórios de informática, bibliotecas).

27 - Assegurar o transporte, material, me-renda escolar para os alunos indígenas do ensino médio.

28 - Garantir merenda escolar de qualidade e adequada às especifi cidades de cada Povo Indí-gena, considerando a produção da comunidade.

29 - Criar uma casa de apoio para estudantes indígenas do ensino médio e superior.

30 – Que o Governo do Estado estabeleça parcerias e convênios com as universidades fede-rais e particulares para o ingresso dos indígenas no ensino superior.

31 – Garantir bolsa de estudos para os alu-nos indígenas do ensino superior.

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233SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

Saúde

A - Garantir a Política Estadual de Saúde In-dígena:

01 – Que o Governo do Estado recomende que a FUNASA contrate através de concurso pú-blico equipes de saúde indígena, comprometidas e qualifi cadas para atuar nas aldeias.

02 – Que o Governo do Estado recomende que a FUNASA em convênio com a SESPA e Secretarias Municipais de Saúde, formem e man-tenham capacitados os Agentes Indígenas de Saúde.

03 – Que o Governo do Estado recomende que a FUNASA disponibilize recursos para am-pliação e reforma das CASAI´s, bem como para as atividades lá desenvolvidas.

04 – Que o Governo do Estado recomende que a FUNASA contrate para DSEI´s e CASAI´s interpretes indígenas dos idiomas dos povos usu-ários, bem como o Estado para os hospitais.

05 - Que o Governo do Estado recomen-de que a FUNASA discuta a regionalização da CASAI-Belém com os Conselhos Distritais.

06 – Que o Governo do Estado recomen-de que FUNASA em parceria com a SESPA e a FUNAI e as Secretarias Municipais de Saúde for-taleçam a medicina indígena através da realização de encontros com pajés e parteiras.

07 – Que o Governo do Estado atue em parceria com a FUNASA na construção, refor-ma, equipagem e a garantia da manutenção dos postos de saúde nas aldeias.

08 - Que seja priorizado o atendimento es-pecializado nos hospitais, tanto no Estado como nos municípios bem como garantido o forne-cimento de alimentação nos hospitais para os acompanhantes indígenas.

09 – Construção de alas próprias para a re-cepção nos hospitais de competência estadual para pacientes indígenas.

10 - Melhorar as condições de acesso e de atendimento dos indígenas aos serviços de saúde prestados no Estado e nos Municípios.

11- Que a FUNASA, SESPA Secretarias Municipais da Saúde e Forças Armadas melho-rem as condições de transporte dos pacientes indígenas, respeitando as especifi cidades loco re-gionais de deslocamento.

12 - Que o Governo do Estado, a FUNASA e municípios garantam em regime de colaboração o abastecimento de medicamentos nas Aldeias.

13 - Que a FUNASA, Estado e Municípios garantam o cumprimento das metas de vacinação nas Aldeias.

14 - Que a FUNASA, Estado e Municípios melhorem o controle de malária e outras doenças endêmicas em áreas endêmicas, oferta de medi-camentos e aquisição de equipamentos de prote-ção individual.

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234 SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

15 - Implantar e implementar o Programa de saneamento básico em 100% das famílias in-dígenas do Estado do Pará, consultando as co-munidades indígenas, incluindo a implantação de poços artesianos nas aldeias e programa piloto de captação de água.

16 - Que a FUNAI e a FUNASA Implan-tem radiofonia e módulo solar nas Aldeias e ga-rantam sua manutenção permanente.

17 - Recomendamos que a FUNASA resol-va os problemas de inadimplência das organiza-ções indígenas junto à FUNASA.

18 - Que o Estado (SESPA e SEDUC) pro-mova um seminário para discutir a implantação do curso de técnico em enfermagem indígena, considerando o currículo complementado.

19 - Implantar o curso técnico de enferma-gem indígena, considerando conhecimento pré-vio adquirido.

20 - Que o Estado através da ETSUS/SES-PA analise o acúmulo de conteúdo para certifi car os agentes indígenas de saúde que já concluíram os módulos oferecidos pela FUNASA.

21 – Que a SESPA oriente os municípios e a FUNASA para a capacitação dos Agentes Comu-nitários de Saúde e Agentes Indígenas de Saúde para atender as especifi cidades indígenas de sua área de atuação (não aldeados).

22 – Recomendar que a FUNASA garanta a criação de um DSEI na região de Santarém, Bel-terra e Aveiro.

23 – Ampliar a CASAI de Santarém para o atendimento dos Povos Indígenas da região.

24 – Capacitar os profi ssionais de saúde para o atendimento humanizado dos Povos Indígenas.

Gestão Ambiental e Territorial

01 – Recomendar à FUNAI que conclua os processos de regularização fundiária das Terras Indígenas do Pará.

02 – Que o Estado realize parceria e/ou convênio com a FUNAI e o INCRA e cumpra as ações de desintrusão das Terras Indígenas do Pará;

03 – Que o Governo do Estado apoie a lo-gística nas operações relacionadas à demarcação, desintrusão proteção e defesa das Terras Indíge-nas do Pará.

04 - Estabelecer interlocução ITERPA/FUNAI para discussão e encaminhamentos dos processos de regularização fundiária das Terras Indígenas do Pará;

05 - Realizar Inventário dos confl itos exis-tentes nas Terras Indígenas do Estado, em face dos trabalhos já desenvolvidos pelo Comitê de Confl itos Agrários, e informar posteriormente a FUNAI os seus resultados.

06 – Que o Governo do Estado atue em re-gime de colaboração no Sistema de Vigilância das

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235SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

Terras Indígenas do Pará, mediante os seguintes mecanismos:

a) Articular os Sistemas de vigilância exis-tentes com as Terras

Indígenas.b) Formar agentes ambientais indígenas.c) Articular junto à FUNAI e comunidades

indígenas a criação e/ou realocação de postos in-dígenas nas Aldeias.

d) Apoiar a elaboração e implementação de Planos de Gestão Ambiental e Territorial das Terras Indígenas do Pará.

e) Melhorar os meios de comunicações nas Aldeias através da implantação de radiofonia, te-lefonia rural e INTERNET.

f) Que o Sistema de Vigilância das Terras Indígenas inclua o transporte aéreo, terrestre e fl uvial.

07 - Criar e implementar um programa es-pecífi co de recuperação de áreas degradadas nas terras indígenas e seus entorno.

a) Fazer um levantamento para identifi car as áreas degradadas das Terras Indígenas do Pará, mediante a consulta a documentos (Ex. FUNAI).

08 – Que os órgãos competentes das três esferas de governo regularizem e garantam à ma-nutenção e a conservação das pistas de pouso das Aldeias Indígenas do Pará.

09 – Que o Estado crie mecanismos para o pagamento de serviços ambientais dos povos indígenas.

10 – Que o Estado regulamente o Fundo Estadual de Meio Ambiente para que este possa contemplar projetos e pagamentos de serviços ambientais.

Cultura

01 - Garantir e discutir formas de proteção e defesa dos conhecimentos tradicionais dos Po-vos Indígenas ligados ou não a biodiversidade prevista nas convenções sobre diversidade bio-lógica e cultural.

02 - Revitalizar as tradições culturais dos po-vos indígenas do Pará.

03 - Garantir meios para a produção de bens culturais elaborados pelos próprios Povos Indígenas como: Livros didáticos, CD´s, DVD´s e outras formas de produtos culturais incluindo ações de qualifi cação profi ssional nas Aldeias e garantindo o retorno integral dos recursos anga-riados para as próprias comunidades indígenas.

04 - Pesquisar, registrar e difundir as histó-rias dos Povos Indígenas ressaltando a sua im-portância para a formação histórica e cultural dos Municípios e do Estado, garantindo o retorno dos resultados das pesquisas para as comunida-des indígenas.

05 - Incentivar os estudos sobre todos os troncos lingüísticos em especial para os que estão em risco de desaparecer, visando à preservação

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236 SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

das línguas maternas indígenas. É fundamental a participação e o reconhecimento dos indígenas na condição de pesquisadores e produtores

de conhecimentos e a participação das or-ganizações e instituições científi cas com trabalho nessa área.

06 - Pesquisar, registrar e difundir as mani-festações culturais dos Povos Indígenas em to-das as linguagens com a participação dos índios ao longo do processo, garantindo a propriedade intelectual exclusiva dos Povos Indígenas envol-vidos.

07 - Participação dos Povos Indígenas na formulação e execução do inventário cultural do Estado.

08 - Ações no campo da educação e da co-municação voltadas para a valorização da ima-gem dos Povos Indígenas entre os não indígenas.

09 - Criar mecanismos que garantam a co-mercialização do artesanato indígena incluindo:

a) A criação de espaços permanentes e nas feiras do calendário dos produtos.

b) A Qualifi cação profi ssional para cadeia produtiva e incentivo ao empreendedorismo in-dígena.

10 - Incentivar estudos sobre a cadeia pro-dutiva do artesanato indígena.

11 - Criar mecanismos para a valorização, incentivo e proteção intelectual da cultura dos pajés, parteiras e medicina tradicional indígena

como um todo, incluindo a qualifi cação de agen-tes indígenas de saúde.

12 – Criar Centros Culturais Indígenas nas cidades-polos do Estado e nos Municípios que possuam população indígena, para a divulgação da cultura e comercialização do artesanato in-dígena ao nível do mercado local, regional e no mercado justo e solidário internacional, a partir de discussões com as populações indígenas nas Aldeias.

13 – Criar novos Museus dos Índios e forta-lecer os já existentes em todo o Estado do Pará.

Segurança Alimentar e Produção

01 - Capacitar os indígenas para a constru-ção de uma estratégia alimentar com efi cácia.

02 - Capacitar os indígenas para a valoriza-ção dos seus alimentos tradicionais.

03 - Capacitar os agentes de governo para compreender não somente as especifi cidades ali-mentares dos indígenas, mas também suas singu-laridades culturais.

04 - Realizar diagnóstico geral dos “Arranjos Produtivos Locais” APL´s da produção Indíge-na.

05 – Que o Governo do Estado fortaleça as iniciativas dos Povos Indígenas com a implanta-ção e execução de projetos e ações voltadas para o aproveitamento dos solos, com o incentivo da

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237SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

apicultura, piscicultura, aqüicultura e a biodiver-sidade com os quais se relacionam.

06 - Elaborar programas de benefi ciamento para a produção indígena, com

base na agroecologia.07 - Promover e capacitar representantes

das organizações indígenas e aldeias para o de-senvolvimento de projetos tecnológicos e de be-nefi ciamento nas Aldeias indígenas.

08 - Promover o benefi ciamento pelos pró-prios Povos Indígenas dos recursos naturais exis-tentes dentro de seus territórios, como frutas, sementes (a castanha, por exemplo), com o obje-tivo de geração de renda, evitando assim que os recursos naturais sejam vendidos a preço inferior no mercado, prejudicando a comunidade.

09 - Identifi car os alimentos que podem ser considerados de natureza emergencial e de uso rotineiro para auxiliar no desenvolvimento des-sas culturas de modo sustentável pelos povos in-dígenas.

10 - Promover cursos de capacitação para os Povos Indígenas na área de plantio e cultivo de culturas perenes e sazonais através de unidades demonstrativas.

11 - Promover o resgate de sementes criou-las nas aldeias.

Fortalecimento do Movimento Indígena

01 – Que o Governo do Estado, crie as con-dições, inclusive de ordem fi nanceira, para o for-talecimento e união dos povos indígenas do Pará.

02 – Apoiar a criação de organizações indí-genas no Pará para articular as lutas dos Povos Indígenas pela garantia e proteção dos seus di-reitos e acompanhar o processo de elaboração, implementação, monitoramento e avaliação da Política Indigenista do Pará.

03 – Acompanhar, apoiar e participar do de-senvolvimento das políticas indigenistas.

04 – Apoiar a promoção de fóruns, encon-tros e reuniões dos Povos Indígenas.

05 - Assegurar a presença dos Povos Indíge-nas nas atividades que incluam temas indígenas custeando os gastos para deslocamento e retorno de suas áreas, em obediência as previsões legais e internacionais as quais o Brasil é signatário.

06 - Inserir ajuda de custo para as lideranças.07 - Garantir que as articulações sejam con-

fi rmadas com antecedência para garantir a mo-bilização e participação de um número maior de lideranças

08 - Realizar ofi cinas para os Povos Indíge-nas acerca dos seus direitos defi nidos na nossa Carta Magna e nas nossas leis específi cas à te-mática.

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238 SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

09 - Promover a qualifi cação dos Povos In-dígenas do Pará no que diz respeito a:

a) Gestão de suas associações.b) Elaboração de projetos de inclusão digital

e tecnológica.c) Valorização, importância e proteção dos

conhecimentos tradicionais e a proteção dos direitos intelectuais de acordo com a cultura de cada um dos Povos Indígenas.

10 - Apoiar as ações do Fórum dos Povos Indígenas do Pará.

11- Apoiar a divulgação das atividades do movimento indígena.

12- Apoiar o registro e a documentação da luta dos Povos Indígenas do Pará.

13- Apoiar os Projetos de fortalecimento institucionais das associações indígenas.

14- Garantir recursos para a legalização das associações.

15- Criar fundo de apoio institucional para as Organizações Indígenas.

16- Apoiar a criação de mecanismos pró-prios dos Povos Indígenas para a geração de ren-da do movimento.

17 – Que o Governo do Estado estabeleça convênios com as organizações indígenas para apoiar iniciativas do movimento social desses Povos Indígenas.

18 - Garantir que os projetos voltados para os Povos Indígenas sejam menos burocráticos e que tenham técnicos disponíveis para acompa-nhar a sua elaboração.

19 - Implantar programas pilotos de inclu-são digital nas Aldeias Indígenas.

20 – Apoiar a implantação de programas específi cos para trabalhar a questão de gênero e infanto-juvenil.

3.1.3 - Constituir o Conselho Estadual dos Povos Indígenas do Pará

a) Ser consultivo e deliberativo.b) O Conselho será formado por 2/3 (dois

terços) de representantes indígenas.i. Os representantes do Governo devem

pertencer aos órgãos que desenvolvem ações junto aos povos indígenas.

ii. Os 1/3 de representantes não-indígenas serão escolhidos entre os órgãos de Governo Es-tadual e federal.

iii. Deverá conter um representante de cada uma das etnias indígenas do Estado do Pará.

iv. Os representantes indígenas devem ser indicados por suas bases.

v. Os representantes indígenas serão refe-rendados durante as Conferências Estaduais e terão mandato de dois anos.

vi. O Conselho deverá realizar no mínimo uma reunião a cada seis meses.

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239SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

vii. A Presidência do Conselho será exercida por um representante indígena;

viii. O Presidente do Conselho, em caso de empate, decidirá a votação.

ix. Que o Governo do Estado recomende aos municípios que possuam povos indígenas, a criação de Conselhos Municipais dos Povos In-dígenas:

ix.i - Serão criados Conselhos Municipais dos Povos Indígenas nos moldes do Conselho Estadual, nos municípios onde existam povos in-dígenas. Estes Conselhos serão compostos por 1/3 (um terço) de representantes dos órgãos de governo nas esferas municipal, estadual e

federal e 2/3 de representantes dos Povos Indígenas dos municípios.

3.1.4 - Constituir o Fundo Estadual dos Povos Indígenas

a) Que o Conselho Estadual dos Povos In-dígenas do Pará discuta com o Governo, o per-centual do orçamento do Estado que integrará os recursos do fundo.

b) Recomendar aos municípios onde habi-tam povos indígenas, que contribuam com 1% do Fundo de Participação dos Municípios para o fundo estadual.

c) Que seja destinado 1% dos tributos arre-cadados pelas empresas de extrativismo mineral para o fundo.

d) A gestão dos recursos do fundo será feita pelo Conselho Estadual dos Povos indígenas.

e) Os recursos do fundo serão aplicados prioritariamente na execução das ações do Plano Estadual para os Povos Indígenas.

3.1.5 - Criar a Secretaria Estadual dos Povos Indígenas

04- Constituir uma Comissão na Assembléia Legislativa para provocar debates e para monito-rar as leis que favoreçam os direitos dos povos indígenas.

05 – Que o Governo do Estado crie um Grupo de Trabalho, mediante Decreto para a elaboração, no prazo de 60 dias, com a participa-ção dos povos indígenas, do Projeto de Lei que institui as Diretrizes da Política Estadual dos Po-vos Indígenas e seus instrumentos: Conferência, Conselho Estadual, Plano e Fundo.

06 - Encaminhamentos Gerais da Confe-rência:1 - Encaminhar para a FUNAI documento solici-

tando revisão da demarcação da Terra Indíge-na Maracaxi, de Tome-Açú, do Povo Tembé.

2 - Enviar o relatório fi nal de Conferência Esta-dual dos Povos Indígenas do Pará para todos os (as) participantes.

3 - Sugerir que na próxima Conferência sejam garantidos equipamentos para a tradução si-multânea para os indígenas que não falam português.

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240 SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

ANEXO III

PROGRAMAÇÃO

SEMINÁRIO SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESA-FIOS PARA A ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

Organização Projeto ConBio - Indígena67

PRIMEIRO DIA – 7 de Junho

9h - Mesa de Abertura do Seminário e cele-bração do convênio entre SEMA/PA, Associa-ção de Defesa Etnoambiental Kanindé e Asso-ciação dos Povos Indígenas de Mapuera (APIM) visando o Etnozoneamento das TIs Trombetas Mapuera, Nhamundá Mapuera e aldeias na Flo-resta Estadual do Trombetas.

09h30minh - Apresentação dos participan-tes, dos objetivos e da metodologia do Seminário, e dos acordos de convivência.

10h - Intervalo10h15minh - Painéis Temáticos

* Diretrizes da Construção da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental em Terras Indígenas – Aloísio Guapindaia /FUNAI.

* O Papel e a Atuação da Coordenação das Or-ganizações Indígenas da Amazônia Brasileira

(COIAB) na Gestão Ambiental e Territorial – Lucio Flores Terena (TNC representando a COIAB)

* Papel das Associações Indígenas na Gestão Ambiental e Territorial – Juventino Kaxuyana (APITIKATXI)

11h45min - Debate em plenária12h30min - Almoço14h - Painéis Temáticos* Agentes Ambientais Indígenas – João Tiriyó

(ACT-Brasil)* Unidades de Conservação e Terras Indígenas:

uma proposta de mosaico para o oeste do Amapá e norte do Pará – Nadja Havit Binda (representando a direção do Iepé)

* Etnomapeamento e Sensoriamento Remoto Kayapó – Pascale de Robert (MPEG/IRD) Bepunu Kayapó

* Experiências de Gestão Territorial e Ambien-tal em Terras Indígenas – Hélcio Marcelo de Souza (TNC)

16h - Debate em plenária16h30min - Intervalo16h45min - Painéis Temáticos* Experiências de Gestão em Terras Indígenas

no Acre – Marta Azevedo (SEMA/AC)* REDD e Terras Indígenas: a experiência na

Terra Indígena Sete de Setembro, em Rondô-

67 Este documento foi utilizado como base para as consultas regionais, como forma de estimular as discussões junto aos povos indígenas das diversas regiões do país. Os conceitos, diretrizes, objetivos, arranjo institucional e demais informações presentes no documento não podem ser, portanto, considerados pontos consolidados de uma política nacional. As informações retiradas deste documento para o presente texto, nesse sentido, são apenas referencias para as futuras discussões estaduais.

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241SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

nia – Almir Surui (Associação Metareilá)* Mecanismos de REDD e Comunidades indíge-

nas –- Gabriel Cardoso Carreiro (IDESAM)18h15min - Debate em plenária

SEGUNDO DIA – 8 de Junho

9h - Exposições para subsidiar os GTs 1: Levantamento da Situação Socioambiental em Terras Indígenas do Pará

* Zoneamento Ecológico-Econômico do Estado do Pará e Terras Indígenas – Crisomar Lobato (SEMA/PA)

09h30min - Orientações para os trabalhos em grupos: divisão da plenária em sete grupos correspondentes às sete regionais nas quais se articula a representação do Fórum dos Povos Indígenas do Estado do Pará para a elaboração de matriz FOFA (fortalezas e oportunidades, fra-quezas e ameaças) para cada uma.

10h - Intervalo10h15min - Grupos de Trabalho 1: Levanta-

mento e refl exões sobre a situação socioambien-tal das Terras Indígenas no Pará - elaboração de matriz FOFA

12h - Intervalo Almoço14h - Grupos de Trabalho 1 (continua)16h- Intervalo Lanche16h15min - Apresentação dos Grupos de

Trabalho em Plenária: apresentação, sistematiza-

ção e validação em plenária das matrizes FOFA elaboradas pelos Grupos de Trabalho 1 (Levan-tamento da Situação Socioambiental em Terras Indígenas do Pará).

TERCEIRO DIA – 9 de Junho

9:00 - Exposições para subsidiar os GTs 2: Insumos para o Programa de Gestão Ambiental e Territorial em Terras Indígenas do Pará.

* Vídeo documentário sobre a 1ª Conferên-cia Estadual dos Povos Indígenas

* Histórico da elaboração da política indi-genista do Estado do Pará - Isa Tapuia (Coorde-nadora de Proteção dos Direitos dos Povos Indí-genas e Populações Tradicionais da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos)

* Políticas, Planos, Programas e Projetos; Princípios, Diretrizes e Objetivos: conceitos im-portantes para gerar os insumos para o Programa de Gestão Ambiental e Territorial em Terras In-dígenas do Pará - Henyo T. Barretto Filho (IEB)

9h30min - Orientações para os trabalhos em grupos:

(i) apresentação do documento síntese das propostas feitas pelo movimento indígena no Pará: Carta dos Povos Indígenas (abril de 2007) e Proposições Aprovadas na I Conferência Esta-dual dos Povos Indígenas (agosto de 2008);

(ii) divisão da plenária em grupos por se-tores [indígenas, governos (federal e estadual), ONGs e consultores, acadêmicos e pesquisado-

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242 SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

res, outros] para trabalhar em cima do documen-to síntese e dele: (i) derivar objetivos; (ii) identifi -car linhas de atuação e (iii) sistematizar propostas e/ou apresentar novas.

10h - Intervalo10h15min - Grupos de Trabalho 2: Insumos

para o Programa de Gestão Ambiental e Territo-rial em Terras Indígenas do Pará

12h - Intervalo Almoço14h - Grupos de Trabalho 2 (continuação)16h - Intervalo Lanche16h15min - Apresentação, sistematização,

síntese e validação em plenária dos painéis elabo-rados pelos grupos de trabalho. Insumos para o Programa de Gestão Ambiental e Territorial em Terras Indígenas do Pará.

ANEXO IV

Documento síntese de apoio aos Grupos de Trabalhos do Seminário Situação Socioambiental das Terras Indígenas do Estado do Pará

Documento síntese com as propostas feitas pelo movimento indígena no Pará na Carta dos Povos Indígenas (abril de 2007) e as Proposições Aprovadas na I Conferência Estadual dos Povos Indígenas (agosto de 2008); Subsídios para os Grupos de Trabalho 2; Demandas da Carta dos Povos Indígenas (abril/2007)

EIXO 1 – GARANTIA E GESTÃO

TERRITORIAL

Demanda n.° 12 – Demarcação da terra in-dígena do povo Borari e Arapium da gleba Nova Olinda de responsabilidade do ITERPA no Mu-nicípio de Santarém.

Demanda n.º 16 - Promova o benefi ciamen-to pelos próprios povos indígenas dos recursos naturais existentes dentro de seus territórios como frutas, sementes (a castanha, por exemplo) com o objetivo de geração de renda, evitando assim, que os recursos naturais sejam vendidos a preço inferior no mercado, prejudicando a co-munidade.

Demanda n.º 19 - Elabore e execute proje-tos junto com os povos indígenas referente ao aproveitamento dos solos, apicultura, piscicultu-ra com a preservação adequada da biodiversidade com a qual se relacionam.

EIXO 2 – POLÍTICAS ÉTNICAS

(Políticas Públicas)

Demanda n.º 18 - Promova cursos de quali-fi cação para os povos indígenas na área de plan-tio e cultivo de culturas perenes e sazonais.

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243SITUAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DAS TERRAS INDÍGENAS DO PARÁ: DESAFIOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS DE GESTÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL

EIXO 3 – DEFESA DO PATRIMÔNIO ÉTNICO

Demanda n.º 09 - Que seja garantida a pro-teção dos conhecimentos tradicionais dos povos indígenas ligados ou não a biodiversidade previs-to na convenção sobre diversidade biológica.

Demanda n.º 15 – Apóie e execute proje-tos de segurança alimentar que contemplem as diversidades e as necessidades específi cas de cada povo indígena.

EIXO 4 – DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO E INFRA-ESTRUTURA

Demanda n.º 14 - Que o Governo do Es-tado do Pará promova em parceria com o Go-verno Federal, a qualifi cação dos povos indígenas do Pará no que diz respeito: a) gestão de suas associações; b) elaboração de projetos de inclu-são digital e tecnológica; c) valorização, impor-tância e proteção dos conhecimentos tradicionais e a proteção dos direitos intelectuais dos povos indígenas.

EIXO 5 – ARTICULAÇÃO, INTERLOCUÇÃO E APOIO

Demanda n.º 01 - Criação da secretaria dos povos indígenas do Pará.

Demanda n.º 02 - Criação do programa de desenvolvimento dos povos indígenas do Estado do Pará – PDPI-PA.

Demanda n.º 05 - Criar o projeto “raízes” diferenciado e independente para os povos indí-genas.

Proposições Aprovadas na I Conferência Estadual dos Povos Indígenas (agosto/2008)

3.1 – As Diretrizes da Política Estadual para os Povos Indígenas do Pará

3.1.2 – Elaborar o Plano Estadual de Sus-tentabilidade Humana e Territorial dos Povos In-dígenas do Pará. [...]

Gestão Ambiental e Territorial

01 – Recomendar à FUNAI que conclua os processos de regularização fundiária das Terras Indígenas do Pará.

02 – Que o Estado realize parceria e/ou convênio com a FUNAI e o INCRA e cumpra as ações de desintrusão das Terras Indígenas do Pará.

03 – Que o Governo do Estado apóie a lo-gística nas operações relacionadas à demarcação, desintrusão proteção e defesa das Terras Indíge-nas do Pará.

04 - Estabelecer interlocução ITERPA/FUNAI para discussão e encaminhamentos dos processos de regularização fundiária das Terras Indígenas do Pará.

05 - Realizar Inventário dos confl itos exis-tentes nas Terras Indígenas do Estado, em face dos trabalhos já desenvolvidos pelo Comitê de Confl itos Agrários, e informar posteriormente a FUNAI os seus resultados.

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06 – Que o Governo do Estado atue em re-gime de colaboração no Sistema de Vigilância das Terras Indígenas do Pará, mediante os seguintes mecanismos:

a) Articular os Sistemas de vigilância existen-tes com as Terras Indígenas.

b) Formar agentes ambientais indígenas.c) Articular junto à FUNAI e comunidades

indígenas a criação e/ou realocação de postos in-dígenas nas Aldeias.

d) Apoiar a elaboração e implementação de Planos de Gestão Ambiental e Territorial das Ter-ras Indígenas do Pará.

e) Melhorar os meios de comunicações nas Aldeias através da implantação de radiofonia, te-lefonia rural e INTERNET.

f) Que o Sistema de Vigilância das Terras Indígenas inclua o transporte aéreo, terrestre e fl uvial.

07 - Criar e implementar um programa es-pecífi co de recuperação de áreas degradadas nas terras indígenas e seus entorno.

a) Fazer um levantamento para identifi car as áreas degradadas das Terras Indígenas do Pará, mediante a consulta a documentos (Ex:. FUNAI).

08 – Que os órgãos competentes das três esferas de governo regularizem e garantam à ma-nutenção e a conservação das pistas de pouso das Aldeias Indígenas do Pará.

09 – Que o Estado crie mecanismos para o pagamento de serviços ambientais dos povos in-dígenas.

10 – Que o Estado regulamente o Fundo Estadual de Meio Ambiente para que este pos-sa contemplar projetos e pagamentos de serviços ambientais.

Fortalecimento do Movimento Indígena08 - Realizar ofi cinas para os Povos Indíge-

nas acerca dos seus direitos defi nidos na nossa Carta Magna e nas nossas leis específi cas à temá-tica.

09 - Promover a qualifi cação dos Povos Indí-genas do Pará no que diz respeito a:

a) Gestão de suas associações.b) Elaboração de projetos de inclusão digital

e tecnológica.c) Valorização, importância e proteção dos

conhecimentos tradicionais e a proteção dos di-reitos intelectuais de acordo com a cultura de cada um dos Povos Indígenas.

3.1.3 - Constituir o Conselho Estadual dos Po-vos Indígenas do Pará.

3.1.4 - Constituir o Fundo Estadual dos Povos Indígenas.

3.1.5 - Criar a Secretaria Estadual dos Povos In-dígenas.