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PONTIF˝CIA UNIVERSIDADE CATLICA DE SˆO PAULO PUC/SP RODRIGO SANCHEZ MACEDO UM ESTUDO DA TEORIA DOS CONJUNTOS NO MOVIMENTO DA MATEM`TICA MODERNA MESTRADO EM EDUCA˙ˆO MATEM`TICA Sªo Paulo 2008

Sªo Paulo 2008 - PUC-SP Sanchez M… · MOVIMENTO DA MATEM`TICA MODERNA Dissertaçªo apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de Sªo Paulo, como exigŒncia

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC/SP

RODRIGO SANCHEZ MACEDO

UM ESTUDO DA TEORIA DOS CONJUNTOS NO

MOVIMENTO DA MATEMÁTICA MODERNA

MESTRADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

São Paulo

2008

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC/SP

RODRIGO SANCHEZ MACEDO

UM ESTUDO DA TEORIA DOS CONJUNTOS NO

MOVIMENTO DA MATEMÁTICA MODERNA

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como

exigência parcial para obtenção do título de MESTRE EM

EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, sob a orientação da Profa.

Dra. Cileda de Queiroz e Silva Coutinho.

São Paulo

2008

ERRATA

Página Linha Onde se lê Leia-se

8 14 ...em dissertações teses... ...em dissertações, teses...

9 6 ...foundation History Education... ...foundation of History of

Education...

9 10 ...contributes the concept... �contributes with the concept...

9 12 �and Theory of� �and the Theory of�

24 10 ...Choppin (2000)... ...Choppin (2000 apud Marques,

2005)...

30 16 ...1955 ocorrei... ...1955 ocorreu...

32 3 ...Stanford... ...Stanford, nos EUA...

35 1 ...no Brasil nas incluiu... ...no Brasil incluiu...

45 10 n - n2 n - n2 ...

52 17 ...que tratavam dos... ...que tratam dos...

58 12 ...de �slogan� do... ...de slogan do...

73 1 ... �Matemática: Curso Moderno�,

volume 2, 3ª edição de 1966 e

�Matemática: Curso Moderno�,

volume 4, de 1967, cuja edição não

é citada.

... e �Matemática: Curso Moderno�,

volume 4, de 1967, cuja edição

não é citada.

77 15 ...Diagramas de Venn... ...Diagramas de Euler/Venn...

89 15 ...funções, ele aparecem... ...funções, eles aparecem...

92 12 ...figura 21... ...figura 22...

id5612156 pdfMachine by Broadgun Software - a great PDF writer! - a great PDF creator! - http://www.pdfmachine.com http://www.broadgun.com

Banca Examinadora

________________________________________

________________________________________

________________________________________

Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta

Dissertação por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos.

Assinatura: _______________________________________ Local e Data: ______________

DEDICATÓRIA

À Roberta,

Companheira em todos os momentos e

razão do meu viver.

AGRADECIMENTO

À Deus que me deu a vida e me dá força todos os

dias.

À minha esposa, Roberta, que sempre me apoiou

em todos os momentos, mesmo nos mais difíceis e

sem a qual esse trabalho não existiria.

Aos meus pais, que me proporcionaram uma visão

do mundo e me fizeram ser quem sou hoje.

À Rafael e Heloísa, irmãos que são, sobretudo

amigos.

Aos colegas da PUC-SP, especialmente os

participantes do GHEMAT.

Ao professor Dr. Wagner Rodrigues Valente, que

contribuiu de grande forma como orientador desse

trabalho.

À professora Dra. Cileda de Queiroz e Silva

Coutinho, que me aceitou como orientando e

contribuiu excelentemente na concretização dessa

pesquisa.

Aos professores Dr. Saddo Ag Almouloud, Dra.

Cileda de Queiroz e Silva Coutinho, Dr. Wagner

Rodrigues Valente, Dra. Ana Paula Jahn, Dra.

Lulu Healy, Dra. Sônia Camargo Igliori e Dra.

Silvia Dias Alcântara Machado, que ministraram

disciplinas que formaram a base concreta do

conhecimento que hoje tenho em Educação

Matemática.

Ao professores Dra. Maria Inez Rodrigues Miguel

e Dr. Antonio Carlos Brolezzi pelas preciosas

contribuições na qualificação.

Aos meus familiares que me apoiaram em minhas

idéias e convicções.

À todos os que torceram para que esse projeto se

tornasse realidade.

RESUMO

Essa pesquisa apresenta uma análise de livros didáticos que Osvaldo

Sangiorgi publicou no período do Movimento da Matemática Moderna. Essa análise

foi centralizada na Teoria dos Conjuntos, que antes do Movimento fazia parte

apenas do Ensino Superior e durante o Movimento foi inserida nos livros didáticos,

especialmente nos de Sangiorgi, protagonista do Movimento no Brasil. Para esta

análise são utilizados os fundamentos teóricos comuns à História da Educação. O

estudo de Le Goff (1992) sobre Monumento/Documento e o estudo de

Juliá (2001) fundamentam respectivamente o tratamento que deve ser dado às

fontes de pesquisa e a História das Práticas. Chartier e Hébrard (1981) tratam das

estratégias, táticas e apropriação e Chervel (1990) contribui com o conceito de

disciplinarização, que são utilizados na análise de como o autor inseriu os

conteúdos em seus livros didáticos. Precedendo essa análise, é apresentado o

Movimento da Matemática Moderna no Brasil e a Teoria dos Conjuntos inserida

nesse Movimento, apresentação esta baseada em dissertações, teses e artigos que

tratam do tema. Também precedendo a análise, são apresentados um panorama

histórico do desenvolvimento da Teoria dos Conjuntos e livros sobre a Teoria dos

Conjuntos publicados durante o período do Movimento da Matemática Moderna no

Brasil. Os resultados obtidos na análise mostram como alguns elementos inseridos

nos livros didáticos de Osvaldo Sangiorgi surgiram a partir das tensões existentes

na cultura escolar, não se limitando apenas a uma adequação dos conteúdos antes

abordados apenas no Ensino Superior.

Palavras-Chave: Livros didáticos, Teoria dos Conjuntos, Movimento da Matemática Moderna,

Osvaldo Sangiorgi, cultura escolar.

ABSTRACT

This research provides an analysis of textbooks that Osvaldo Sangiorgi

published in the period of the Movement of Modern Mathematics. This analysis was

centered in the Theory of Sets, which before the move was part only of Higher

Education, and during the Movement was inserted in textbooks, especially in the

Sangiorgi, protagonist of the Movement in Brazil. For this analysis are used to the

common theoretical foundation of History of Education. The study by Le Goff (1992)

on Monument/Document and the study of Juliá (2001) respectively based treatment

that should be given to sources of research and the History of Practice. Chartier and

Hébrard (1981) deal with the strategies, tactics and ownership and Chervel (1990)

contributes with the concept of disciplinarization, which are used in the analysis of

how the author entered the contents of their textbooks. Preceding this analysis, it

presented the Movement of Modern Mathematics in Brazil and the Theory of Sets

included within this movement, this presentation based on dissertations, theses and

articles dealing with the issue. Also preceding the analysis, are given an overview of

the historical development of the theory of sets, and books on the Theory of Sets

published during the period of the Movement of Modern Mathematics in Brazil. The

results obtained in the analysis shows how some elements included in textbooks of

Osvaldo Sangiorgi emerged from the tensions in the school culture, not limited only

to a adequacy of the contents before addressed only in Higher Education.

Keywords: Text Books, Theory of Sets, Movement of Modern Mathematics, Osvaldo Sangiorgi,

school culture.

LISTA DE FIGURAS

Esquema 1: Organograma de teorias que fundamentam a pesquisa. ..................... 28

Figura 2: Exemplo de união e intersecção de conjuntos. ......................................... 43

Figura 3: Seqüência de números Racionais proposta por Cantor. ........................... 45

Figura 4: União de conjuntos representada pelos diagramas. ................................. 55

Figura 5: Diferença de conjuntos representada pelos diagramas. ........................... 55

Figura 6: Complementar de conjuntos representado pelos diagramas. ................... 56

Figura 7: Reunião de conjuntos representada por diagramas no livro de Castrucci

(1967). ................................................................................................................ 63

Figura 8: Intersecção de conjuntos representada por diagramas no livro de Castrucci

(1967). ................................................................................................................ 64

Figura 9: Exercícios sobre operações com conjuntos no livro de Castrucci (1967). 65

Figura 10: Exercícios sobre operações com conjuntos no livro de Castrucci (1967).

........................................................................................................................... 65

Figura 11: Diferença de conjuntos representada por diagramas no livro de Castrucci

(1967). ................................................................................................................ 66

Figura 12: Conjunto complementar representado pelos diagramas no livro de

Castrucci (1967). ................................................................................................ 67

Figura 13: Introdução aos conjuntos com utilização de diagramas no livro de

Sangiorgi (1963). ................................................................................................ 76

Figura 14: Diagramas com formato irregular no livro de Castrucci (1967). .............. 76

Figura 15: Números e numerais no livro de Sangiorgi (1963). ................................. 78

Figura 16: Símbolos das relações no livro de Sangiorgi (1968). .............................. 80

Figura 17: Exercícios sobre sistema de numeração no livro de Sangiorgi (1963).... 81

Figura 18: Adição e subtração representadas por conjuntos no livro de Sangiorgi

(1963). ................................................................................................................ 83

Figura 19: Multiplicação e divisão no livro de Sangiorgi (1963)................................ 84

Figura 20: Diagramas representando função na contracapa do livro de Sangiorgi

(1967). ................................................................................................................ 90

Figura 21: Diagramas representando função no início do capítulo 2 do livro de

Sangiorgi (1967). ................................................................................................ 90

Figura 22: Diagramas representando função no capítulo 2 do livro de Sangiorgi

(1967). ................................................................................................................ 91

11

Figura 23: Diagramas associados à geometria no livro de Sangiorgi (1967). .......... 94

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO......................................................................................................... 14

CAPÍTULO 1 CONSIDERAÇÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS ......................... 19

CAPÍTULO 2 O MOVIMENTO DA MATEMÁTICA MODERNA NO BRASIL .......... 29

2.1. A TEORIA DOS CONJUNTOS NO MMM OCORRIDO NO BRASIL .............. 35

CAPÍTULO 3 TEORIA DOS CONJUNTOS: UM PANORAMA HISTÓRICO........... 41

3.1. ANÁLISE DOS LIVROS SOBRE TEORIA DOS CONJUNTOS...................... 47

3.1.1. TEORIA INGÊNUA DOS CONJUNTOS � PAUL R. HALMOS ............... 48

3.1.2. TEORIA DOS CONJUNTOS � EDISON FARAH..................................... 53

3.1.3. ELEMENTOS DE TEORIA DOS CONJUNTOS � BENEDITO

CASTRUCCI ...................................................................................................... 58

CAPÍTULO 4 ANÁLISE DOS LIVROS DIDÁTICOS................................................ 70

4.1. MATEMÁTICA: CURSO MODERNO � VOLUME 1........................................ 74

4.2. MATEMÁTICA: CURSO MODERNO � VOLUME 4........................................ 88

CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 95

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................ 99

ANEXOS ................................................................................................................ 104

ANEXO I CAPA DO LIVRO �TEORIA INGÊNUA DOS CONJUNTOS� DE PAUL R. HALMOS.

............................................................................................................................ 105

ANEXO II CONTRACAPA DO LIVRO �TEORIA INGÊNUA DOS CONJUNTOS� DE PAUL R.

HALMOS. .............................................................................................................. 106

ANEXO III CAPA DO LIVRO �TEORIA DOS CONJUNTOS� DE EDISON FARAH. ............ 107

ANEXO IV CAPA DO LIVRO �ELEMENTOS DE TEORIA DOS CONJUNTOS� DE BENEDITO

CASTRUCCI. .......................................................................................................... 108

ANEXO V CONTRACAPA DO LIVRO �ELEMENTOS DE TEORIA DOS CONJUNTOS� DE

BENEDITO CASTRUCCI. .......................................................................................... 109

13

ANEXO VI EXERCÍCIOS SOBRE OPERAÇÕES COM CONJUNTOS DO LIVRO �ELEMENTOS

DE TEORIA DOS CONJUNTOS� DE BENEDITO CASTRUCCI. ......................................... 110

ANEXO VII EXERCÍCIOS SOBRE OPERAÇÕES COM CONJUNTOS DO LIVRO �ELEMENTOS

DE TEORIA DOS CONJUNTOS� DE BENEDITO CASTRUCCI. ......................................... 111

ANEXO VIII EXERCÍCIOS SOBRE OPERAÇÕES COM CONJUNTOS DO LIVRO �ELEMENTOS

DE TEORIA DOS CONJUNTOS� DE BENEDITO CASTRUCCI. ......................................... 112

ANEXO IX INTRODUÇÃO À COMPARAÇÃO DE NÚMEROS DO LIVRO �MATEMÁTICA:

CURSO MODERNO PARA OS CURSOS GINASIAIS � VOLUME 1� DE OSVALDO SANGIORGI.

............................................................................................................................ 113

ANEXO X INTRODUÇÃO À COMPARAÇÃO DE NÚMEROS DO LIVRO �MATEMÁTICA:

CURSO MODERNO PARA OS CURSOS GINASIAIS � VOLUME 1� DE OSVALDO SANGIORGI.

............................................................................................................................ 114

14

INTRODUÇÃO

15

No presente trabalho apresentamos uma pesquisa desenvolvida no campo do

estudo de Educação Matemática. Apresentamos os fatores que favoreceram a

escolha do problema de pesquisa e o próprio problema, as considerações teórico-

metodológicas em que a investigação se fundamenta, uma caracterização de um

movimento ocorrido no Brasil sobre o ensino de Matemática e um estudo de como a

Teoria dos Conjuntos era apresentada em uma coleção de livros didáticos de

Matemática na época.

O tema de nossa pesquisa está relacionado ao desenvolvimento histórico de

diversas áreas do conhecimento, que nos motivou a pesquisar sobre a História do

Ensino da Matemática. Durante a escolha do tema, levávamos em consideração

uma idéia que é tida pelo senso comum de que a História da Matemática é apenas

uma ferramenta, onde o uso de fatos históricos serve como um recurso didático no

Ensino de Matemática, gerando um maior interesse e compreensão por parte dos

alunos. Nossa idéia não era diferente com História do Ensino da Matemática, onde

entendíamos que esse estudo levava a comunidade científica a compreender de

maneira mais clara a forma como a Matemática é ensinada hoje e quais fatores

favoreceram a sua organização, ou seja, procurar entender os erros e acertos

realizados no passado e suas conseqüências.

Um fator que influenciou a escolha do estudo em História do Ensino da

Matemática foi um curso do qual participamos durante a graduação sobre História

da Matemática, que nos levou a utilizá-la como recurso em variados temas em sala

de aula no Ensino Fundamental e Médio, onde percebemos um maior interesse e

compreensão por parte dos alunos como citado anteriormente.

Algumas leituras que serviram de base para o desenvolvimento inicial da

pesquisa foram: Latour (2000), que deu uma ampla visão sobre pesquisa científica,

modificando a idéia do senso comum que acredita que a ciência é feita de

descoberta da verdade absoluta, sendo que é influenciada por diversos fatores

�humanos�. Pelo fato das influências serem de ordem �humana�, Geertz (1989) nos

proporcionou uma visão antropológica sobre o estudo das culturas, pois ao estudar

a Teoria dos Conjuntos nos livros didáticos fazemos uma análise de como essa

teoria foi apresentada. Esses livros eram divulgados e utilizados no contexto escolar

(que representa uma cultura) do período do Movimento da Matemática Moderna no

Brasil.

16

O tema central do nosso projeto está especificado na investigação sobre a

inserção da Teoria dos Conjuntos nos livros didáticos no Ensino Secundário1 no

período do Movimento da Matemática Moderna no Brasil, compreendido

principalmente nas décadas de 1960 e 1970, com o objetivo de entender como esse

saber matemático passou a fazer parte dos livros didáticos, considerando

especificamente as obras que veicularam a Teoria dos Conjuntos no Brasil. A

coleção �Matemática: Curso moderno para os cursos ginasiais� de Osvaldo

Sangiorgi2, que teve seu primeiro volume lançado em 1963, pela Companhia Editora

Nacional de São Paulo, é a coleção que teremos como foco de análise, já que foi

uma das principais, nas quais se apresentaram os conteúdos da Matemática

Moderna, incluindo a Teoria dos Conjuntos.

Para o desenvolvimento dessa pesquisa, apresentamos as nossas

considerações teórico-metodológicas no capítulo 1, que nos dão subsídios para o

desenvolvimento da pesquisa do ponto de vista histórico e também nos subsidia

para a análise dos livros didáticos que realizamos no capítulo 4.

A apresentação desse movimento, denominado: Movimento da Matemática

Moderna (MMM) se baseou em dissertações, teses e artigos que tratam do tema e

que podemos ver no capítulo 2. Nessa apresentação mostramos a falta de ênfase

que os autores dessas dissertações, teses e artigos deram ao assunto que

abordamos: a Teoria dos Conjuntos.

Os poucos relatos que os autores trazem sobre a Teoria dos Conjuntos, que

podemos ver ainda no capítulo 2, apresentam a idéia de que essa Teoria era

utilizada como linguagem para o ensino de todo o conteúdo Matemático do Ensino

Secundário. Nosso estudo intenta mostrar como se deu a apresentação desse

conteúdo nos livros da coleção �Matemática: Curso moderno para os cursos

ginasiais�, e se realmente a Teoria era utilizada como linguagem ou se era utilizada

como um capítulo isolado, pressuposto de críticas do Movimento.

No capítulo 3 apresentamos um panorama histórico sobre a Teoria dos

Conjuntos, tema que foi enfatizado no MMM, e como essa teoria se apresentava em

1 O Ensino Secundário na época do Movimento da Matemática Moderna se refere às sete séries escolares de

crianças na faixa etária de 11 a 17 anos, atualmente denominados Ensino Fundamental II e Ensino Médio. 2 Osvaldo Sangiorgi era autor de livros didáticos de Matemática anteriores ao MMM e lançou, durante o

movimento, uma coleção que trazia os assuntos do ideário do MMM. Também foi o presidente do GEEM

(Grupo de Estudos do Ensino de Matemática) que divulgou o MMM no Brasil.

17

alguns dos livros dedicados ao Ensino Superior e à formação de professores na

época do Movimento da Matemática Moderna no Brasil.

Por fim, no capítulo 4, com base nas teorias e metodologias apresentadas no

capítulo 1, analisamos dois volumes dos livros didáticos �Matemática: Curso

Moderno� de autoria de Osvaldo Sangiorgi. Os volumes escolhidos são o primeiro e

o quarto.

Os volumes que não analisamos, como o segundo e o terceiro possuem

elementos da Teoria dos Conjuntos de forma muito semelhante ao primeiro, e nosso

objetivo não era simplesmente apresentar o conteúdo que cada volume possuía,

mas apresentar alguns elementos da Teoria dos Conjuntos que são característicos

da cultura escolar. Sendo assim mostramos que a Teoria não é simplesmente

absorvida do Ensino Superior ao Ensino Secundário, mas também desenvolvida em

sua própria cultura, a escola.

Nessa análise, também mostramos que o desenvolvimento de alguns

elementos da Teoria dos Conjuntos nos livros didáticos do Ensino Secundário

influenciou um livro destinado à formação de professores, onde podemos ver que a

Teoria não vem somente do Ensino Superior para o Secundário, mas também pode

�percorrer� o caminho oposto.

Na intenção de apresentar como um estudo de História pode ser absorvido

pelos leitores, fazemos uma analogia, utilizando uma idéia que Brolezzi (2000) traz

em seu estudo. Esse autor ressalta o uso didático da História da Matemática e

entendemos que exista uma relação análoga com a História da Educação

Matemática.

O caminho pedagógico que defendemos parece advir da consideração

da Matemática em sua fase de construção científica, e não da

Matemática pronta e sistematizada de acordo com a lógica formal. A

visão da Matemática em construção é, precisamente, a que obtemos

pelo estudo da História da Matemática, a qual surge, assim, como a

grande fonte para apreensão da organização lógica mais adequada ao

ensino da Matemática, principalmente no nível elementar, em que os

padrões lógico-formais estão ainda mais distantes dos alunos. A forte

relação da lógica com o ensino constitui, portanto, um componente

decisivo para a avaliação do uso da história da Matemática como recurso pedagógico, revelando com muita profundidade seu valor

didático. (BROLEZZI, 2000, p. 44-45)

Brolezzi (2000) trata do uso da História da Matemática no Ensino, mas

também vemos o valor da História da Educação Matemática, que se situa na

compreensão da construção das teorias sobre Educação Matemática e que o

18

professor de Matemática pode ter contato. Essas teorias poderiam, de uma forma

simplista, ter analisado apenas seu curso cronológico com levantamento de

biografias, porém, acreditamos que assim como no uso didático da História da

Matemática, na História da Educação Matemática �é necessária uma abordagem na

qual o próprio conteúdo seja influenciado.� (BROLEZZI, 2000, p. 47)

Nesse sentido abordaremos o Movimento da Matemática Moderna,

realizando uma construção de fatos históricos, no que diz respeito à forma que se

inseriu um conteúdo nos livros didáticos do Movimento, a Teoria dos Conjuntos.

Essa construção partirá dos traços deixados pelo passado (VALENTE, 2005,

p.4), sem assumirmos uma postura onde julgaremos as ações, dizendo que essas

foram fracassadas ou sucedidas, mas levantaremos as informações e as

analisaremos, procurando construir a História dos acontecimentos e suas

conseqüências.

19

CAPÍTULO 1

CONSIDERAÇÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS

20

O presente trabalho tem como temática ampla a História da Educação

Matemática, que é campo de estudo do GHEMAT (Grupo de Pesquisa de História

da Educação Matemática). Durante nossa participação em suas atividades, tivemos

contato com as teorias que apresentaremos e que nos subsidiarão nessa pesquisa.

Em nosso trabalho, analisamos a coleção de livros didáticos �Matemática:

Curso moderno para os cursos ginasiais� de Osvaldo Sangiorgi, que era utilizada no

período do Movimento da Matemática Moderna no Brasil. Temos, com essa análise,

a intenção de verificar como foi inserida, por Osvaldo Sangiorgi, a Teoria dos

Conjuntos.

Com esse objetivo delineado, entendemos que o estudo da obra de Jacques

Le Goff será fundamental para nossa análise. Le Goff (1992) estuda os conceitos de

Monumento e Documento. Esses conceitos são os representantes dos materiais

que se aplicam à forma científica da memória coletiva: a História.

Le Goff (1992) retoma, em uma citação que faz de Febvre (1949), o que é

possível considerar como elemento nuclear do trabalho do historiador:

Toda uma parte, e sem dúvida a mais apaixonante do nosso trabalho de

historiadores, não consistirá em um esforço constante para fazer falar as

coisas mudas, para fazê-las dizer o que elas por si próprias não dizem

sobre os homens, sobre as sociedades que as produziram, e para constituir, finalmente, entre elas, aquela vasta rede de solidariedade e de entreajuda que supre a ausência do documento escrito? (FEBVRE apud LE GOFF, 1992, p. 530).

Essa citação nos mostra o que, efetivamente, um historiador deve buscar em

sua pesquisa, ou seja, os materiais que utilizamos na pesquisa em história não

�falam� por si só, devemos, portanto, �fazer falar as coisas mudas� com o olhar

analítico que teremos no contato com esses materiais.

Quanto ao ofício de historiador, Valente (2005) salienta que o trabalho

histórico está entre dois grupos de profissionais: os professores e os pesquisadores

(ou historiadores), onde os professores utilizam os fatos históricos construídos pelos

historiadores. Portanto, não realizaremos uma pesquisa visando uma contribuição

imediata para a sala de aula, mas �estaremos construindo fatos históricos a partir de

traços, de rastros deixados no presente pelo passado�, afirma Valente (2005, p. 4).

Nosso trabalho será construir esses fatos históricos por meio da análise de alguns

livros didáticos do período do MMM, com enfoque nas condições em que foi inserida

21

a Teoria dos Conjuntos, para que posteriormente o segundo grupo descrito por

Valente (2005), o dos professores, utilizem esses fatos históricos.

Entendemos que os rastros deixados pelo passado ao presente são tomados

como documentos, mas a partir do momento em que o historiador os toma para

análise e construção de questionamentos e hipóteses, deve tê-los como

monumentos, pois os documentos são fabricados com uma �roupagem� que o

historiador deve desmontar. Os materiais que utilizaremos para análise, como os

livros didáticos, são reconhecidos pelo senso comum como documentos à priori,

mas Le Goff (1992) alerta para que os tomemos como monumentos:

[...] O documento não é qualquer coisa que fica por conta do passado, é um

produto da sociedade que o fabricou segundo as relações de forças que aí

detinham o poder. Só a análise do documento enquanto monumento

permite à memória coletiva recuperá-lo e ao historiador usá-lo cientificamente [...] (LE GOFF, 1992, p. 536).

Portanto esses materiais de nossa pesquisa, que são os livros didáticos,

serão tomados como monumentos, e a partir de nossos questionamentos e

investigações se tornarão fontes de pesquisa e procurando respondê-las estaremos

construindo os documentos, que é a própria análise dos livros didáticos. Esses

documentos que construiremos a partir de questionamentos e da busca por

respondê-los serão os materiais que, após a aceitação pela comunidade científica,

constituirão os fatos históricos estabelecidos em nossa pesquisa.

A análise dos livros didáticos se realizará com a crítica aos documentos, e

Valente (2005) fala sobre os procedimentos de trabalho com as fontes de pesquisa,

que são os vestígios ou traços acompanhados dos questionamentos que

levantaremos. Esse autor descreve os tipos de crítica se baseando em um curso de

História do professor e historiador Antoine Proust, que foi transformado em livro em

1996, denominado Douze leçons sur l�histoire. Segundo Valente (2005), a crítica

que um historiador deve fazer às suas fontes se resume em dois tipos: a crítica

externa e a crítica interna.

A crítica externa incide sobre as características materiais do documento: seu papel, sua tinta, sua escrita, os selos que o acompanham; a crítica

interna está ligada a coerência do texto, por exemplo sobre a compatibilidade entre a data que ele porta e os fatos a que ele faz referência. (VALENTE, 2005, p.6, grifo nosso)

22

A crítica é uma busca de respostas aos questionamentos como: a

identificação do autor, a origem do documento, a conservação e como foi a

divulgação do documento, a existência da possibilidade de ter ocorrido distorções

nos testemunhos e sua confiabilidade. Para isso analisaremos as características

materiais e a coerência do texto dos livros didáticos em relação aos outros materiais

com os quais iremos confrontá-lo, como os livros sobre a Teoria dos Conjuntos.

A análise de livros didáticos será realizada partindo-se também dos conceitos

de estratégias, táticas e apropriação que estão presentes nos estudos do historiador

Michel De Certeau (1994). Anne-Marie Chartier e Jean Hébrard (1981) fazem uma

leitura/análise do trabalho de De Certeau (1994) em seu artigo: �A invenção do

Cotidiano: uma leitura, usos.� A análise realizada por Chartier e Hébrard (1981) é

uma maneira de nos aproximar da obra complexa de De Certeau (1994), onde os

próprios autores a definem como �não-conclusiva e não definida em um gênero�.

Os conceitos de estratégia e tática têm como referência as práticas.

Estratégia é uma prática que tem um lugar próprio, definido e é estabelecida pelos

poderosos3, se enquadrando em um espaço social simbólico como: textos oficiais,

livros, cursos, etc. A tática é a especificidade de práticas cotidianas como: falar, ler,

cozinhar, comprar, etc., onde o indivíduo não-poderoso faz uso da estratégia pré-

estabelecida.

A apropriação é um conceito definido pelo consumo cultural que o indivíduo

faz de uma estratégia para desenvolver sua tática. Segundo Chartier e Hébrard

existem apropriações materiais e intelectuais:

Essa multiplicação dos objetos para ler tem como conseqüência a multiplicidade de formas de apropriação incontroladas, incontroláveis.

Primeiramente apropriações materiais: empréstimos ou compras,

organizações e conservação, apresentação e uso colocadas no quadro de

sociabilidades restritas ao foro privado. Em seguida, apropriação intelectual

por meio desses processos de leitura, em que coexistem e interferem-se mútua e constantemente as leituras normatizadas pelos guardiões da

ortodoxia e as leituras pessoais, sejam as trocadas entre grupos restritos, mas socialmente definidos, ou leituras solitárias. (CHARTIER e HÉBRARD,

1981, p. 36)

Essas apropriações que os autores destacam serão percebidas no tipo de

crítica que faremos aos livros didáticos em nosso estudo. A crítica externa, que

3 Os termos �poderosos� e �não-poderosos� são utilizados por Chartier e Hébrard para diferenciar, em um nível

hierárquico, os autores que realizam as práticas culturais.

23

incide sobre as propriedades materiais do documento, avalia a apropriação material

que o autor do livro didático realizou, onde também é verificada a existência do

fenômeno da vulgata4, pois um determinado autor, por exemplo, pode começar a

utilizar cores e figuras em um livro e levará assim (caso ocorra a vulgata) outros

autores a utilizá-la, tornando-se um padrão.

A crítica interna nos mostrará a apropriação intelectual que o autor realizou,

sendo essa a de maior interesse em nossa pesquisa, já que estamos investigando a

inserção da Teoria dos Conjuntos em livros didáticos. Isso deverá permitir que se

realize uma crítica aos livros visando entender como se deu a apropriação

intelectual do ideário do Movimento da Matemática Moderna nos livros didáticos.

A crítica é um olhar do pesquisador para a fonte de pesquisa, e as

apropriações são as realizações do consumidor cultural, como exemplo o autor de

livros didáticos. Temos a crítica como um auxiliador na compreensão das

apropriações.

Podemos ilustrar os conceitos de tática, estratégia e apropriação com o

exemplo da escrita de um livro didático: o autor do livro didático, que descrevemos

anteriormente como �não-poderoso�, se envolve com diversos fatores como a

legislação e/ou parâmetros curriculares e até mesmo com cursos em que participou.

O autor faz uma �leitura� dessas determinações curriculares, que foram escritas por

�poderosos� (nesse caso os autores dessas determinações) e, portanto, são

estratégias, possuindo assim um lugar próprio. Essa leitura é descrita por Chartier e

Hébrard (1981) como um consumo cultural:

Em primeiro lugar, a leitura, esse símbolo privilegiado do consumo cultural contemporâneo. Para Michel de Certeau ela não é recepção imposta de um

conteúdo objetivo, sujeição ao texto, passividade. Fazendo da leitura uma

arte da caça ilegal, ele a designa como uma ação que quase não deixa

traços visíveis, nem garantias contra a usura do tempo, mas ação produtora

que em cada um de seus encaminhamentos e de fazeres, ao mesmo tempo alteram e conferem existência ao texto: formas singulares de habitar o

escrito. A leitura é uma apropriação. (CHARTIER e HÉBRARD, 1981, p. 32)

Na escrita do livro didático, o autor desenvolve sua tática, fazendo uma

apropriação dessas determinações curriculares, pois escreverá seu livro baseado na

leitura que ele realizou, que depende de sua interpretação. Quando nos referimos à

4 O fenômeno da vulgata é um conceito do trabalho de André Chervel (1990), onde o autor o descreve como

uma padronização dos livros didáticos a partir de um �manual inovador� em uma dada época.

24

leitura, não falamos da simples decodificação do escrito, mas de uma adequação

que o autor faz daquelas determinações curriculares para a escrita de seu livro

didático.

O texto escrito pelo autor do livro didático pode se tornar uma estratégia se o

tomarmos como base para o preparo da aula de um professor. Nesse caso, o autor

do livro didático passa a ser o �poderoso� e o professor, que desenvolverá sua

tática, utilizando esse livro para o preparo de sua aula será o �não-poderoso�. Mas

nosso objetivo é analisar os livros didáticos como tática baseada na estratégia do

ideário do Movimento de Matemática Moderna.

Com relação à análise de livro didático teremos também como base teórica o

trabalho de Alain Choppin (2000 apud Marques, 2005) do qual encontramos pontos

principais na dissertação de Marques (2005) e que fala sobre a importância do

manual didático5 como fonte de pesquisa:

[...] O manual didático se apresenta como suporte, o depositário dos

conhecimentos e das técnicas que a juventude deve adquirir para

perpetuação de seus valores. Os programas oficiais, quando existem,

constituem a estrutura sobre a qual os manuais devem conformar-se estritamente. São vetores, meios de comunicação muito potentes cuja

eficácia repousa sobre a importância de sua difusão e sobre a

uniformidade do discurso que transmitem. (CHOPPIN, 2000 apud MARQUES, 2005, p. 15)

Outro estudo fundamental para nossa pesquisa é o artigo �História das

disciplinas escolares: reflexões sobre um campo de pesquisa� de André Chervel6

(1990). Nele, o autor fala sobre a definição e como se constitui uma disciplina

escolar e define a importância do livro didático como fonte de pesquisa histórica.

O conceito de disciplinarização que Chervel (1990) apresenta, se refere à

estruturação que é dada aos conteúdos para que possam ser ensinados, ou seja, os

conteúdos científicos, em outro momento ensinados apenas no Ensino Superior,

precisam passar por modificações e adequações para que sejam ensinados no

Ensino Secundário. Essas modificações não surgem apenas da iniciativa dos

organizadores curriculares, mas também das resistências aos novos conteúdos, que

surgem por parte dos professores, alunos e outros elementos da cultura escolar.

5 No estudo de Allain Choppin a terminologia utilizada para se referir a livro didático é manual didático, não

havendo assim diferença. 6 André Chervel era pesquisador do Service d�histoire de l�education � Institut National de Recherche

Pédagogique, Paris, França.

25

Chervel (1990) se contrapõe à afirmação de que o saber produzido

cientificamente sofre pequenas alterações por parte de grupos de pessoas

interessadas em adequar esses conteúdos, para que possam ser ensinados e

aceitos no Ensino Secundário. Chervel (1990) afirma a importância da cultura

escolar nas alterações sofridas pelos conteúdos do saber científico7.

Um conteúdo só é disciplinarizado quando tem um núcleo curricular, ou seja,

há um consenso geral, que pode ser regulado por normas como parâmetros

curriculares, onde quase que a totalidade das instituições ministra esse conteúdo de

uma mesma forma. Essa mesma forma constitui o que Chervel (1990) denomina

núcleo curricular.

O saber científico precisou ser disciplinarizado para que pudesse ser

ensinado no âmbito da cultura geral pois, para Chervel (1990), o Ensino Secundário

possui uma cultura geral, enquanto o Ensino Primário e o Ensino Superior possuem

culturas específicas.

Chervel (1990) explicita que as funções do Ensino Primário8 e do Ensino

Superior têm uma definição mais clara que a função do Ensino Secundário. No

Ensino Primário existem objetivos, dentre outros, em que o aluno aprenda a ler,

escrever e contar. No Ensino Superior, o estudante aprenderá uma profissão, mas

no Ensino Secundário há uma obscuridade quanto à definição de seu objetivo.

Segundo Chervel (1990), os livros didáticos de uma determinada época

retratam o que era esperado do ensino naquela época. O estudo histórico que

faremos com a análise dos livros didáticos é uma busca pela compreensão das

práticas escolares da época que pretendemos estudar, tendo em vista os conteúdos

que faziam parte dessas práticas. Dentro desse foco investigamos como esses

conteúdos, ora ministrados apenas no Ensino Superior, sofreram modificações,

influências e inserção de novos elementos próprios da cultura escolar, para que

pudessem ser ensinados no Ensino Secundário. Sendo assim, analisamos como se

deu o processo de disciplinarização de conteúdos como a Teoria dos Conjuntos.

7 Conteúdos da Matemática desenvolvidos no âmbito da pesquisa e no Ensino Superior. 8 O Ensino Primário na época do Movimento da Matemática Moderna no Brasil se refere às quatro séries

escolares das crianças com idades entre sete e dez anos. Atualmente esse nível de escolaridade é denominado

Ensino Fundamental I.

26

Outro importante teórico que nos dá base para o estudo da história das

práticas escolares é Dominique Juliá9 (2001) em seu artigo �A Cultura Escolar como

Objeto Histórico� 10.

Para Juliá (2001), a cultura escolar é um conjunto de normas, que são regras,

conhecimentos e condutas a ensinar e práticas escolares, que permitem a

incorporação e transmissão dessas normas. As normas e práticas mudam no passar

do tempo e, portanto, a cultura escolar também muda com o tempo. Existem

tentativas de coordenar as normas e práticas, para que as condutas e

conhecimentos que se pretende ensinar ocorram efetivamente. As finalidades

dessas tentativas de coordenação, segundo Juliá (2001), podem ser de ordem

religiosa, sócio-política ou de socialização.

Outro conceito importante a destacar no estudo desse autor é a diferenciação

que ele faz da História das Práticas e da História das Idéias. Na História das

Práticas há uma preocupação com as resistências e tensões, com a prática na sala

de aula e também existe uma limitação quanto às fontes de pesquisa. Já na História

da Idéias, a pesquisa é realizada sobre textos normativos, onde há um poder

absoluto sobre os projetos e a cultura escolar é tida como um isolamento, não

havendo assim, uma preocupação com as resistências e tensões que um conteúdo

pode sofrer para que seja inserido no currículo.

Nossa pesquisa busca se enquadrar, dentro do possível, na História das

Práticas, que apesar de realizarmos um trabalho com livros e livros didáticos (que a

princípio parecem mais normas do que práticas), procuraremos encontrar vestígios

que nos levem a entender como se deu a prática do ensino da Teoria dos Conjuntos

no Ensino Secundário durante o Movimento da Matemática Moderna no Brasil. Os

livros didáticos analisados de maneira comparativa com os livros sobre Teoria dos

Conjuntos nos mostrarão quais foram as resistências e tensões que esse conteúdo

sofreu para ser disciplinarizado no currículo de Matemática durante o MMM.

Segundo Juliá (2001), a principal dificuldade da pesquisa no âmbito da

História das Práticas e, mais precisamente na pesquisa histórica da cultura escolar,

é a obtenção de fontes de pesquisa. As fontes são escassas, muitas vezes por falta

9 Dominique Juliá era diretor de pesquisas do CNRS (Centre National de la Recherche Scientifique), e foi professor do Instituto Universitário Europeu (Florença), e especialista em história religiosa e história da

educação na época moderna.

27

de espaço físico, destruição dos materiais ou mesmo sua ausência, pois o que é

evidente em um dado momento, nem sempre necessita que seja dito ou escrito.

O estudo das práticas não tem base só nas ações visíveis, mas também em

quais concepções estão em oculto, ou seja, se as normas não se aproximam das

práticas, é preciso utilizar a capacidade de relacionar as ligações entre os dados

que foram obtidos com as fontes, mesmo que elas se refiram às normas.

Sem dúvida, não devemos exagerar o silêncio dos arquivos escolares.

O historiador sabe fazer flechas com qualquer madeira: quanto ao século XIX, por pouco que procure e que se esforce em reuni-los, os cadernos de notas tomadas pelos alunos (mesmo sendo grande o risco de se verem conservados apenas os mais bonitos deles) e os cadernos de preparações dos educadores não são escassos e, na falta destes, pode-se tentar reconstituir, indiretamente, as práticas escolares a partir

das normas ditadas nos programas oficiais ou nos artigos das revistas pedagógicas. (JULIA, 2001, p.17, grifo nosso).

Entendemos que em nossa pesquisa, as práticas escolares são

reconstituídas indiretamente, analisando os livros didáticos.

A teoria desenvolvida por Le Goff (1992) sobre os conceitos

Monumento/Documento e a teoria desenvolvida por Juliá (2001) sobre as Práticas

escolares fundamentam o tipo de pesquisa que realizamos: a pesquisa histórica.

Os conceitos de estratégia, tática e apropriação absorvidos do texto de

Chartier e Hébrard (1981) fundamentam tanto a apresentação dos livros sobre a

Teoria dos Conjuntos, do ponto de vista das estratégias, quanto a análise da

inserção da Teoria dos Conjuntos nos livros didáticos, do ponto de vista das táticas.

O conceito de disciplinarização de Chervel (1990) é utilizado em nossa

pesquisa a partir da análise de elementos que surgiram na cultura escolar e foram

inseridos nos livros didáticos de Sangiorgi. O esquema 1 apresenta um

organograma de como as teorias apresentadas nesse capítulo fundamentam a

pesquisa.

10 O texto referido é uma tradução do artigo de Julia: �Lá culture scolaire comme objet historique�, feita por

Gizele de Souza, professora do setor de Educação da Universidade Federal do Paraná e doutoranda no Programa

de Pós-graduação em Educação: História, Política e Sociedade.

28

Esquema 1: Organograma de teorias que fundamentam a pesquisa.

29

CAPÍTULO 2

O MOVIMENTO DA MATEMÁTICA MODERNA NO BRASIL

30

Apresentaremos uma caracterização do Movimento da Matemática Moderna

(MMM) no Brasil a partir da leitura e análise de dissertações, teses e artigos que

têm como tema o Movimento.

O Movimento da Matemática Moderna no Brasil foi um movimento de grandes

mudanças curriculares e metodológicas no ensino de matemática entre os anos 60

e 70. Durante esse movimento foi fundado o GEEM (Grupo de Estudos do Ensino

da Matemática) em 31 de outubro de 1961 em São Paulo, que divulgou, com seus

cursos, o ensino da chamada �Matemática Moderna�. O término das atividades do

Grupo foi marcado em 1976 com um último curso, quando surgiram algumas

publicações de críticas ao Movimento e após a divisão de opiniões dos próprios

integrantes do GEEM (BÚRIGO, 1989, p. 201-203).

As considerações de fundação e término do GEEM têm apenas a finalidade

de nos situar sobre quais décadas realizaremos nosso estudo, não querendo limitar

o Movimento ao período mencionado.

Nos anos antecedentes às décadas de vigência do Movimento aconteceram

os primeiros Congressos Nacionais de Ensino de Matemática. Em 1955 ocorreu o

primeiro deles, em Salvador, Bahia, tendo a participação de 94 congressistas e

entre eles Osvaldo Sangiorgi, Omar Catunda, Manoel Jairo Bezerra e Ana

Averbuch. Segundo Silva (2006), nesse congresso não há evidências da introdução

de tópicos da Matemática Moderna, mas tratava dos conteúdos programáticos do

Ensino Secundário e da necessidade de reorganizá-lo para que ocorresse uma

melhora na aprendizagem.

A dissertação de Marques (2005) traz uma perspectiva desse período que

antecedeu o Movimento, fazendo menção às Reformas Campos e Capanema, 1931

e 1942 respectivamente, e apresenta o período intitulado de pré-moderno, que

aconteceu nos anos 1950 e uma breve análise de livros didáticos do período.

Marques conclui que no período referente aos anos 1950 não existiam

discussões acaloradas sobre mudanças curriculares de grande relevância e que os

professores �não clamavam� por mudanças que hipoteticamente teriam suscitado o

Movimento da Matemática Moderna que se sucederia:

[...] começamos a perceber que a matemática escolar dos tempos pré-modernos não estava passando por momentos de turbulência, o que se

confirma pela análise dos livros didáticos desse período: seus

programas eram praticamente iguais aos oficiais, com pequenas variações, e a forma com que os mesmos eram abordados também,

31

com a idéia de exemplos e aplicações dominando a organização desses

manuais. (MARQUES, 2005, p. 101)

Com isso, somos levados a acreditar que as influências para a inserção do

Movimento de Matemática Moderna no Brasil foi motivada por fatores externos, dos

quais apresentaremos indícios a seguir.

Em 4 de outubro de 1957, no Cosmódromo de Baikonur (base de lançamento

de foguetes da então URSS), em Tyuratam, Cazaquistão, foi lançado o foguete

soviético SPUTNIK, que mostrava aos EUA a potência espacial soviética e iniciava

a corrida espacial que levou a uma preocupação com a formação de cientistas e

engenheiros.

Segundo Guimarães (2007, p. 21), a idéia de que o Movimento de

Matemática Moderna tenha surgido nos EUA, em tentativa de competir com a URRS

na corrida espacial, é muito simplista e não pode se sustentar por fatos. Guimarães

relata que em 1959 a OECE (Organização Européia de Cooperação Econômica),

interessada na modernização do currículo de Matemática decidiu realizar uma

investigação de como estava se realizando o ensino de Matemática e, então,

promoveu o Cercle Culturel de Royaumont, que ficou conhecido como Sessão de

Royaumont. Segundo Guimarães, é a realização mais emblemática de todo o

movimento reformador.

Entretanto, levando-se em consideração que a Sessão de Royaumont na

Europa aconteceu em 1959 e que em 1958 foi fundado um grupo de estudos de

Matemática nos EUA, tudo leva a crer que o Movimento não surgiu simplesmente

em um país e foi levado aos outros, mas acreditamos que as dinâmicas próprias de

desenvolvimento de cada país, cada um sofrendo influências dos mais variados

tipos, os levou a se engajarem no Movimento renovador com muitas características

próprias, específicas a cada grupo ou país, e outras comuns.

Segundo Búrigo (1989, p.70), no ano de 1958 foi fundado nos EUA o SMSG

(School Mathematics Study Group), grupo que tinha o objetivo de desenvolver um

melhor ensino de Matemática, dado que a baixa qualidade do Ensino Secundário

promovia uma escassez de pesquisadores e cientistas matemáticos.

O grupo teve assistência do National Council of Teachers of Mathematics

(NCTM), da Mathematical Association of America e da American Mathematical

Society (BÚRIGO, 1989, p.70).

32

Além do SMSG, que produziu diversos textos sobre novos conteúdos para o

ensino elementar e secundário, textos para professores e alunos �mais bem

dotados�, houve outro programa de destaque na Universidade de Stanford, nos

EUA, em 1958, que foi o pioneiro na introdução de Teoria dos Conjuntos no ensino

de matemática para crianças. O programa, coordenado pelo professor Suppes, era

baseado na premissa de que as crianças podiam aprender muito mais Matemática

do que o que se considerava possível até então (BÚRIGO, 1989, p. 70).

Em 1957, aconteceu o II Congresso Nacional de Ensino de Matemática que

se realizou em Porto Alegre, Rio Grande do Sul com a presença de 400

congressistas. Segundo Búrigo, esse Congresso teve seu temário ampliado e surgiu

o tema, em algumas teses, sobre a Matemática Moderna.

A tese do professor Sangiorgi, iniciando com a questão �Matemática

clássica ou matemática moderna na elaboração dos programas do

ensino secundário?� era cautelosa e defendia a necessidade de que

�ambas� fossem levadas em conta, de que a �modelação aos tempos

novos� fosse gradativa, a �fim de serem evitados os malefícios

decorrentes de transformações radicais�. (BÚRIGO, 1989, p. 46)

Osvaldo Sangiorgi, que seria posteriormente o principal protagonista do

Movimento, ainda não defendia de maneira acentuada o ensino da Matemática

Moderna, foi cauteloso em sua tese nesse Congresso. Já o Major Professor Jorge

Emanuel Barbosa foi o mais ousado defendendo uma �modernização� do ensino da

Matemática. Entre seus argumentos estavam a necessidade de atualizar o ensino

para a formação de cientistas, principalmente matemáticos, destacando um

argumento que se apoiava na psicologia da aprendizagem:

[...] O segundo argumento era o de que a matemática moderna, pela

ênfase nas generalizações e na explicitação das conexões entre as

diversas partes da matemática, favorecia o que se denominava em psicologia da aprendizagem. [...] (BÚRIGO, 1989, p. 47).

Apenas no III Congresso Nacional do Ensino da Matemática, que se realizou

em 1959 no Rio de Janeiro, foi notável uma acentuação da discussão sobre o

ensino da Matemática Moderna. Com a presença de cerca de 500 professores,

entre os quais podemos citar Osvaldo Sangiorgi, Omar Catunda, Ary Quintela, entre

outros, o Congresso começou uma discussão sobre a �aceleração da aprendizagem

33

científica�, sendo aprovadas três resoluções de relevância sobre a Matemática

Moderna:

[...] uma, recomendando cursos de aperfeiçoamento para professores

registrados do ensino médio, de �preparação à Matemática Moderna�, a

segunda, recomendando a introdução do �espírito� da MM nas

Faculdades de Filosofia, e, finalmente, uma resolução que propunha a

realização de experiências no secundário com introdução de �noções de

MM, a serem relatadas no IV Congresso�. (SILVA, 2006, p. 54-55)

As influências para o desenvolvimento do Movimento de Matemática

Moderna no Brasil foram variadas, porém é de importante destaque um curso

realizado nos EUA, no qual professores do Brasil e da América Latina foram

convidados a participar.

Esse seminário de verão aconteceu na Universidade do Kansas, em 1960,

onde, entre professores brasileiros e latino-americanos, participou o professor

Osvaldo Sanigiorgi, que ficou nos EUA por quatro meses. Segundo Búrigo (1989,

p.104), Sangiorgi, em depoimento oral, destaca que percebeu a preocupação do

governo norte-americano em �reciclar� os professores.

Temos esse fato como um forte indício de que o Movimento norte-americano

influenciou o Movimento no Brasil, pois Sangiorgi, em 31 de outubro de 1961, um

ano após voltar dos EUA, fundou o GEEM (Grupo de Estudos do Ensino de

Matemática), que realizava cursos de formação de professores de maneira muito

semelhante ao SMSG, divulgando assim o Movimento renovador no Brasil.

O GEEM foi um grupo pioneiro e influenciou outros grupos como o NEDEM

(Núcleo de Estudos e Difusão do Ensino da Matemática), criado em 1962 e

coordenado pelo professor Osny Antônio Dacól e o GEEMPA (Grupo de Estudos

sobre o Ensino da Matemática em Porto Alegre), criado em 1971, e coordenado por

Esther Pillar Grosi. Ambos tiveram objetivos muito semelhantes aos do GEEM, ou

seja, desenvolver e divulgar o MMM no Brasil.

Muitos integrantes do GEEM, como o seu próprio presidente, Osvaldo

Sangiorgi, e outros como Benedito Castrucci, tiveram fundamental importância na

difusão do MMM no Brasil devido à autoria de livros didáticos. Vale destacar o livro

didático inovador editado em 1963 para a primeira série ginasial denominado:

�Matemática Moderna� de Osvaldo Sangiorgi.

34

Segundo Choppin (2000, p.109), os manuais didáticos são meios de

comunicação muito potentes cuja eficácia repousa sobre a importância de sua

difusão e sobre a uniformidade do discurso que transmitem. E realmente

percebemos essa potência de difusão que um livro didático pode possuir no

desenvolvimento de um Movimento, pois o grande número de exemplares vendidos,

desse livro didático de Sangiorgi, demonstra a maneira poderosa de como um livro

pôde influenciar e engajar professores de um país tão grande como o Brasil em um

Movimento Renovador como o da Matemática Moderna.

Em relação à potência dos livros didáticos como meio de difusão, Valente

destaca:

A dependência de um curso de matemática aos livros didáticos,

portanto, é algo que ocorreu desde as primeiras aulas que deram

origem à matemática hoje ensinada na escola básica. Fica assim, para a

matemática escolar, desde os seus primórdios, caracterizada a ligação

direta entre os compêndios didáticos e desenvolvimento de seu ensino

no Brasil. Talvez seja possível dizer que a matemática constitui-se na disciplina que mais tenha a sua trajetória histórica atrelada aos livros didáticos. (VALENTE, 2005, p.14).

Valente apresenta um forte argumento de que o estudo da história do ensino

da matemática no Brasil pode se aproximar daquilo que Juliá descreve como

práticas escolares, a partir da análise de livros didáticos, que atrelam em si a

trajetória da disciplina matemática.

35

2.1. A TEORIA DOS CONJUNTOS NO MMM OCORRIDO NO BRASIL

O Movimento de Matemática Moderna no Brasil incluiu novos conteúdos no

ensino de Matemática da escola secundária.

Esses conteúdos são: Teoria dos Conjuntos; conceitos de Grupo, Anel e

Corpo; Matrizes, Determinantes e Espaços Vetoriais; Álgebra de Boole, noções de

Cálculo Diferencial e Integral. Esses conteúdos até então apenas faziam parte do

currículo do Ensino Superior.

Investigamos principalmente a inserção da Teoria dos Conjuntos, pois esse

era um tema central do Movimento. Era pretendido que a Teoria dos Conjuntos

fosse linguagem para toda a Matemática e em todos os níveis de escolaridade

visando unificar a disciplina:

A ênfase nos conjuntos era fundamentada no fato de ser um conceito básico da Matemática, além de uma poderosa ferramenta para a

unificação da disciplina, que no século XIX era considerada como �as

Matemáticas�. (SOARES, 2001, p.48, itálicos do autor)

A Teoria dos Conjuntos foi um dos conteúdos novos inseridos nos livros

didáticos do Movimento da Matemática Moderna e é nosso objeto de estudo. Para

realizarmos uma análise das condições da inserção desse conteúdo nos livros

faremos um breve panorama das principais intenções dos movimentos renovadores

do ensino de Matemática, que nos propiciará a uma maior compreensão da

motivação para a análise da Teoria dos Conjuntos.

As principais buscas de mudanças no ensino de Matemática giravam em

torno de uma tentativa de aproximar a Matemática do Ensino Secundário à

Matemática do Ensino Superior, ou seja, as mudanças visavam um preparo dos

alunos para dar prosseguimento nos seus estudos.

[...] reclama-se para a Matemática, em termos das finalidades do seu

ensino, um triplo papel. Um papel formativo que, apesar de ser enunciado de um modo genérico, podemos dizer que é visto como um

meio de desenvolver as capacidades mentais e intelectuais do aluno, um papel de preparação dos alunos tendo em vista o prosseguimento

dos seus estudos, e um papel instrumental no que se refere à sua

inserção na vida quotidiana e profissional. No entanto, a encerrar as

conclusões do relatório, quando é enunciado o propósito com que os

trabalhos de reforma são encarados, a primeira das finalidades

anteriormente apresentadas não aparece, mantendo-se apenas as

outras duas que visavam a preparação dos alunos para a vida

36

quotidiana e para a continuação dos seus estudos. (GUIMARÃES,

2006, p.29, grifo nosso)

Essas tentativas de aproximação não se verificaram apenas no período do

Movimento da Matemática Moderna, mas também nas Reformas que o precederam:

Reforma Francisco Campos em 1931 e Reforma Gustavo Capanema em 1942 no

Brasil.

Essas Reformas ocorridas no Brasil foram fundamentais para a unificação

das �Matemáticas�, que antes desse período constituíam três áreas distintas:

Geometria, Álgebra e Aritmética. A unificação deveria se realizar, segundo Braga

(2003), com o conceito de função. Braga realiza uma análise de livros didáticos do

período das Reformas e constata que fora realizada uma introdução do Cálculo no

Ensino Secundário, que utilizava o conceito de função, também abordado pela

Teoria dos Conjuntos, unificaria as �Matemáticas�.

Um dos autores que Braga (2003) analisa foi Euclides Roxo, que lançou uma

coleção inovadora intitulada �Curso de Matemática Elementar�, onde interpretou as

concepções do movimento modernizador internacional, norteado por Felix Klein.

Segundo Braga (2006), o movimento internacional de renovação do Ensino

Secundário ocorrido no início do século XX em países como Alemanha, Inglaterra,

França e Estados Unidos teve como nome de destaque o matemático prussiano-

alemão Christian Felix Klein (1849-1925), que exerceu uma liderança no que diz

respeito à autoridade nas concepções inovadoras.

O ideário do movimento internacional de renovação tem como uma de suas

bases a preocupação já mencionada, com o Ensino Superior:

Aliás, Klein, em diversos momentos da referida obra, deixa claro a sua

grande preocupação com o ensino superior, chegando a afirmar que se preocupam muito pouco no ensino secundário de como pode o ensino

superior seguir construindo sobre a base que ele proporciona, e que no mais das vezes se conformam com definições que no momento bastam,

porém que nada significa frente ao acúmulo de necessidades do ensino superior. (BRAGA, 2006, p. 43 - 44)

Observamos esse mesmo foco no Ensino Superior no Movimento da

Matemática Moderna, pois a preocupação em preparar os estudantes norteou as

reformas e a introdução dos tópicos da Matemática Moderna, como relata Soares:

37

Um dos principais motivos que levaram a uma preocupação com o

ensino da Matemática foi o baixo conhecimento matemático dos

estudantes ao entrar na universidade. (SOARES, 2001, p.45)

Os protagonistas do Movimento se apoiaram nos trabalhos do grupo dos

Bourbaki para desenvolver uma �modernização curricular� e inserir em livros

didáticos, entre outros conteúdos, a Teoria dos Conjuntos.

Nicholas Bourbaki era um pseudônimo utilizado por integrantes de um grupo

de matemáticos que desenvolveram trabalhos voltados a revolucionar a Matemática

por meio do estudo das estruturas. O método utilizado pelo grupo era axiomático e

de uma linguagem extremamente formal e rigorosa. O grupo Bourbaki desenvolveu

seu trabalho baseado em três tipos de estruturas que fundamentam a matemática:

estruturas algébricas, estruturas de ordem e estruturas topológicas. Qualquer outro

tipo de estrutura na Matemática, segundo o grupo, pode ser gerida por meio dessas

três estruturas fundamentais.

Os protagonistas do Movimento utilizaram um ideário que acreditamos que

tendia para as idéias �Bourbakistas�, justamente enfatizar o ensino da Teoria dos

Conjuntos em todas as séries do Secundário, porém, não utilizando todo o trabalho

dos Bourbaki, dado que era focado no desenvolvimento da Matemática Superior, e

não no Ensino Elementar e Secundário.

É notável perceber em estudos de dissertações e teses a tática utilizada

pelos participantes do Movimento onde justificam a inserção curricular da

Matemática Moderna apoiados na teoria psicogenética de Piaget. Segundo

Pavanello (2002) essas justificativas surgiram de uma interpretação que os

participantes do Movimento fizeram da Teoria Piagetiana.

Assim é que, nos anos 60, o forte interesse demonstrado em várias

oportunidades por Piaget pela teoria bourbakiana das estruturas matemáticas como paradigma explicativo das estruturas operacionais da

inteligência em desenvolvimento, acabou sendo utilizados pelos

matemáticos para dar sustentação psicológica a um movimento que

ficou conhecido como �matemática moderna�. Cumpre observar que

esse movimento foi iniciado no âmbito da matemática e visava a

introduzir no ensino os resultados mais recentes da pesquisa nessa área do conhecimento, a conexão com a teoria genética sendo feita

posteriormente. (PAVANELLO, 2002, p.50)

Piaget estudou as estruturas lógico-matemáticas pois acreditava que essas

estruturas pudessem modelar a organização dos processos cognitivos do estudante.

38

Partindo dessas teorias entendemos que a base da Matemática Moderna se situava

nos trabalhos dos Bourbaki, priorizando a inserção da Teoria dos Conjuntos nos

programas e se apoiava em Piaget, com o objetivo de entrelaçar a matemática

rigorosa e baseada em estruturas matemáticas com a teoria psicológica, também

fundamentada em estruturas, nesse caso, estruturas mentais. (SOARES, 2001,

p.11)

Jean Piaget descreve os estágios do desenvolvimento em quatro grandes

categorias:

Sensório motor (de 0 a 24 meses) � onde o conhecimento começa a se

desenvolver a partir do contato físico tendo o objeto como principal fonte.

Pré-operacional (de 2 a 6 anos) � o ato de pensar baseia-se em ações

concretas e na visualização e a criança não tem a capacidade de realizar

comparações baseadas na imaginação.

Concreto (de 7 a 12 anos) � se iniciam as operações denominadas lógico-

concretas, onde as respostas estão em função da observação do mundo e

no conhecimento adquirido, sendo esta a fase da �escolarização� onde os

primeiros textos e as primeiras operações matemáticas são aprendidas.

Operações formais (acima de 12 anos) � nessa fase desenvolvem-se as

operações formais e proposicionais com raciocínio sustentado no

conhecimento físico e em hipóteses lógicas.

Há um comparativo feito desde a época do Movimento da Matemática

Moderna e ainda constatamos hoje em dissertações como SOARES (2001),

relacionando a Teoria de Jean Piaget com a Teoria de Bourbaki.

No estágio das operações concretas, que se inicia na faixa dos 7 anos

de idade, Piaget constata que as primeiras operações das quais se

serve a criança em seu desenvolvimento, e que derivam diretamente das coordenações gerais de suas ações sobre os objetos, podem se

repartir em três categorias gerais que equivalem às estruturas-mãe de

Bourbaki: as estruturas algébricas, as estruturas de ordem e as

estruturas topológicas. (SOARES, 2001, p.51)

Pavanello (2002) apresenta um embate que existiu entre o ensino da

matemática tradicional e a moderna, ressaltando alguns argumentos que

posteriormente foram utilizados para classificar a matemática moderna como

fracassada.

39

O mesmo aconteceu com suas advertências sobre a possibilidade de

fracasso em tentativas de �ensinar matemática �moderna� a crianças

pequenas usando métodos arcaicos, baseados na transmissão verbal

do professor para o aluno e com uso prematuro do formalismo�. Considerando que, se o problema com a matemática tradicional era

levar a criança a resolver uma enorme quantidade de problemas,

�muitos deles absurdos�, Piaget (1973, p.84 � 85) assinalava que, com a �moderna� o problema poderia estar num outro nível: o professor poderia ser � muitas vezes tentado a apresentar noções e operações

cedo demais, num quadro que já é muito formal�[...] (PAVANELLO,

2002, p. 52)

A teoria de Piaget pode ter sido mal interpretada durante a vigência do

Movimento da Matemática Moderna, pois acreditamos que seu uso teve muito mais

importância como propaganda do que como base teórica, afinal é uma teoria

bastante densa e o próprio Piaget alertou sobre os exageros de interpretação de

sua teoria:

[...] pode-se confundir a iniciação à Matemática com o entrar de cheio

em sua axiomática. Contudo, a única coisa que se pode axiomatizar são

os dados intuitivos prévios e, de um ponto de vista psicológico, uma

axiomática só tem sentido quando supõe uma tomada de consciência ou

reflexão retroativa, o que implica toda uma construção proativa anterior.

A criança � desde os 7 anos � e o adolescente manipulam continuamente operações de conjuntos, de grupo, de espaço vetorial,

etc., mas sem estarem absolutamente conscientes disso, posto que se trata de esquemas fundamentais de comportamento � e, depois de raciocínio � antes de poderem chegar a converterem-se em objetos de reflexão. Torna-se, pois indispensável toda uma graduação para poder

passar da ação ao pensamento representativo, e uma série não menor de transições para passar do pensamento operatório à reflexão sobre

esse pensamento; o último escalão é então a passagem desta reflexão

à axiomática (PIAGET, 1978, p.185,186 apud SOARES, 2001, p.52)

O ano do texto,1978, próximo do declínio do Movimento, leva-nos a crer que

Piaget parece fazer um balanço do Movimento. Piaget faz esse alerta pois a

Matemática Moderna procurou axiomatizar todo o ensino, entendendo que assim

aproximaria a Matemática ensinada no Ensino Secundário à Matemática do Ensino

Superior, preparando melhor os alunos que ingressariam nas Universidades.

Partindo desses fatos, procuramos investigar de que maneira foi inserida a

Teoria dos Conjuntos nos livros didáticos durante o MMM no Brasil, pois como os

livros exercem influência tão forte na difusão de um movimento, nos aproximamos

muito da compreensão da prática escolar durante a vigência do Movimento. Temos

como foco a análise da inserção desse conteúdo nos livros e se o saber científico

40

sofreu intervenções do cotidiano escolar na elaboração, inserção e desenvolvimento

do conteúdo para se tornar um elemento da disciplina escolar.

Para tal análise, faremos um breve panorama histórico do desenvolvimento

da idéia de Conjunto e sua constituição como teoria Matemática, estudaremos quais

matemáticos foram mais influentes em seu desenvolvimento e como essa Teoria

chegou aos Bourbaki no século XX. Por fim, retornaremos à análise do MMM no

Brasil, visando apresentar as características de conteúdo do Movimento, assim

como a ênfase dada à Teoria dos Conjuntos.

41

CAPÍTULO 3

TEORIA DOS CONJUNTOS: UM PANORAMA HISTÓRICO

42

Neste Capítulo temos como objetivo apresentar um panorama do

desenvolvimento da Teoria dos Conjuntos de acordo com textos de História da

Matemática.

É notável a presença da Teoria dos Conjuntos em diversos momentos do

desenvolvimento da Matemática em sua história. Destacamos como uma possível

primeira �aparição� da idéia de conjunto, ou coleção, no escrito matemático

encontrado no cetro real do Rei Menés. Boyer (1974, p. 8) relata que o cetro se

encontra em um museu em Oxford, e possui mais de 5000 anos.

O registro encontrado no cetro indica a captura de 120 000 prisioneiros e

1 422 000 cabras, números que podem, por um lado revelar um exagero e talvez

certa desconfiança pela quantidade, por outro lado nos mostra a idéia, ainda que

informalmente, de conjunto. Essa idéia informal se dá a partir do fato de que foi

relacionada uma quantidade de prisioneiros e cabras que estão separadas em

conjuntos distintos.

A idéia de Conjunto como toda Matemática, se desenvolveu passando por

diversos momentos. Descreveremos as contribuições de Boole e de Cantor, como

um marco importante no desenvolvimento desse conceito.

O estudo da Álgebra sofreu fundamentais mudanças em meados do século

XIX, quando o matemático inglês George Boole (1815 � 1864) realizou a �liberação

da Álgebra� (GARBI, 2006). Até então, a Álgebra era vista como uma área da

Matemática que relacionava regras aplicáveis às operações aritméticas, quando

Boole mostrou que a Álgebra também pode trabalhar com diversos outros entes,

como Conjuntos e proposições de Lógica.

George Boole, nascido na Inglaterra, estudava Matemática e exercia

docência desde os 16 anos no ensino primário. Durante seus estudos de

Matemática percebeu que as regras e manipulações algébricas não precisavam ser

tratadas apenas no âmbito numérico, mas também com os Conjuntos.

As manipulações ou regras estudadas por Boole e relacionadas aos

conjuntos, podem ser observadas a seguir. Suponhamos que a e b são dois

números reais que associaremos de duas maneiras, adição e multiplicação:

i. a + b (adição)

ii. ab (multiplicação)

Podemos apresentar também algumas regras e propriedades:

i. a + b = b + a

43

ii. a + (b + c) = (a + b) + c = (a + c) + b

iii. ab = ba

iv. a(bc) = (ab)c = (ac)b

v. a(b + c) = ab + ac

entre outras.

Boole desenvolveu um tipo de raciocínio similar, porém aplicado aos

conjuntos, representados por letras maiúsculas, onde definiu duas formas de

associação, uma que pode ser denominada adição, porém é popularmente mais

conhecida como União (A + B ou A B) e outra forma denominada produto ou

Intersecção (AB ou A B).

Uma forma bastante simples e de fácil compreensão das operações com

Conjuntos são os conhecidos diagramas de Venn, que não foram inventados pelo

matemático inglês John Venn (1834 � 1923), mas foram inventados um século antes

por Leonhard Euler (1707 � 1783). Podemos observar as operações com Conjuntos

ilustradas com os diagramas 1 e 2 da figura 2:

A B A B

Diagrama 1 Diagrama 2

Figura 2: Exemplo de união e intersecção de conjuntos.

A primeira forma de associação, a União, se refere a tomarmos todos os

elementos contidos no primeiro conjunto ou no segundo. Já a Intersecção se refere

a tomarmos apenas os elementos contidos em ambos os conjuntos

simultaneamente.

Utilizando a definição formal temos:

i. x A B x A ou x B

ii. x A B x A e x B

A partir dessas definições podemos verificar propriedades análogas àquelas

definidas para a adição e multiplicação de números reais:

44

i. A B = B A (comutativa)

ii. A (B C) = (A B) C = (A C) B (associativa)

iii. A B = B A (comutativa)

iv. A (B C) = (A B) C = (A C) B (associativa)

Porém, muitas propriedades de operações definidas na álgebra não são

análogas aos conjuntos, como:

i. A A = A

ii. A A = A

Sendo que na Álgebra:

i. a + a = 2a

ii. aa = a2

Boole, com essas considerações e percepções, contribuiu de forma

substancial para a Teoria dos Conjuntos, pois outros matemáticos utilizaram seu

raciocínio algébrico dos conjuntos para desenvolvimento de suas teorias.

O matemático que podemos denominar como uma figura maior no

desenvolvimento da Teoria dos Conjuntos foi Georg Cantor (1845 � 1918) nascido

em S. Petersburgo na Rússia, de pais emigrados da Dinamarca, mas passou a

maior parte da sua vida na Alemanha, pois sua família se mudara para Frankfurt

quando tinha onze anos de idade. Cantor se interessou por questões de infinito e

continuidade por influências de teólogos medievais, já que descendia de pais

cristãos, mãe católica de nascimento e pai protestante. Tais influências fizeram com

que Cantor não seguisse na �mundana� carreira de Engenheiro, como sugeria seu

pai, e se concentrasse em Física, Filosofia e Matemática.

Cantor defendeu sua tese de doutoramento em Berlim no ano de 1867, com

apenas 22 anos, onde mostrou uma atração pela análise de Weierstrass, já que sua

tese tinha como tema a Teoria dos Números. As maiores contribuições de Cantor

centram-se nas problemáticas questões de infinito.

Dedekind (1831 � 1916), amigo de Cantor e aluno de Weierstrass definiu que

�um sistema S é infinito quando é semelhante a uma parte própria dele mesmo;

caso contrário S se diz um sistema finito.� (DEDEKIND apud BOYER, 1974, p. 413).

Essa definição nos leva a compreensão da questão do infinito baseado na

correspondência biunívoca, ou seja, um conjunto se diz infinito se os elementos de

um subconjunto próprio podem ser postos em correspondência biunívoca com o

45

conjunto. Como exemplo, podemos citar o conjunto IN* e seu subconjunto A dos

quadrados perfeitos, onde cada elemento de IN* possui um único correspondente

em A:

IN* � A

1 � 1

2 � 4

3 � 9

4 � 16

...

n � n2

...

Cantor, em 1874, publicou um de seus principais artigos onde reconhece a

propriedade dos Conjuntos Infinitos, mas observou que eles não são todos iguais.

Cantor desenvolveu uma hierarquia de conjuntos infinitos onde diz que alguns deles

têm a mesma potência11 e outros têm potência maior.

Relacionado à potência dos conjuntos, pareciam os números Racionais

serem muito mais �numerosos� que os inteiros, mas Cantor também demonstrou,

por correspondência biunívoca, que o conjunto dos números Racionais também

pode ser posto em cardinalidade, ou seja, pode ter seus elementos postos em

correspondência com os Naturais. Na figura a seguir fica clara a idéia da seqüência

proposta por Cantor:

1 2 3 4 5 ........

1 1 1 1 1

1 2 3 4 .......

2 2 2 2

1 2 3 ........

3 3 3

1 2 ........

4 4

1 ........

5 Figura 3: Seqüência de números Racionais proposta por Cantor.

11 O termo potência refere-se a cardinalidade, ou à �quantidade� de elementos do conjunto.

46

Essa seqüência de números racionais pode ser colocada em

correspondência biunívoca com os números Naturais, portanto, podemos dizer que

existe a cardinalidade, ou que os números Racionais são enumeráveis.

Quanto aos números Reais, Cantor em 1874 respondeu que esses não

podem ser colocados em correspondência biunívuca com os Números Naturais, ou

seja, não podem ser enumerados. Sua demonstração se fundamentou em um

raciocínio por absurdo.

Esse panorama explicita uma parcela do desenvolvimento da Teoria dos

Conjuntos na História da Matemática. Os conceitos elucidados nessa apresentação

histórica têm o objetivo de nos aproximar do assunto abordado na análise dos livros

sobre a Teoria dos Conjuntos, dado que esses livros também são representantes de

uma parte do desenvolvimento histórico da Teoria, mostrando como ela se

apresentava nas décadas de vigência do Movimento de Matemática Moderna.

47

3.1. ANÁLISE DOS LIVROS SOBRE TEORIA DOS CONJUNTOS

Dado que os conceitos da Teoria dos Conjuntos estão entre as principais

novidades do Movimento da Matemática Moderna (MMM), também objetivamos

nesse capítulo mostrar de que maneira essa Teoria era apresentada em alguns dos

livros destinados ao Ensino Superior, para que de uma forma comparativa,

possamos estudar a teoria apresentada nos livros didáticos de Sangiorgi. Essa

comparação se insere no objetivo de mostrar como alguns elementos surgem a

partir da cultura escolar.

Para tanto, estudaremos os livros: Teoria Ingênua dos Conjuntos de Paul R.

Halmos, traduzido em português pelo Professor Irineu Bicudo e Teoria dos

Conjuntos de autoria de Edison Farah.

Também utilizaremos o livro Elementos de Teoria dos Conjuntos, publicado

pelo Grupo de Estudos do Ensino da Matemática (G.E.E.M.) e de autoria de

Benedito Castrucci. Escolhemos esse livro para análise, devido o seu uso na

preparação dos professores para a Matemática Moderna ocorrida nos cursos

promovidos pelo G.E.E.M., onde Benedito Castrucci ministrava cursos sobre Teoria

dos Conjuntos, que supomos serem baseados nesse livro.

48

3.1.1. TEORIA INGÊNUA DOS CONJUNTOS � PAUL R. HALMOS

O livro Teoria Ingênua dos Conjuntos de Paul R. Halmos, que tem como

nome original Naive Set Theory, foi traduzido pelo professor Irineu Bicudo, um dos

integrantes do G.E.E.M. e participante do Movimento da Matemática Moderna no

Brasil. Na nota do tradutor, Irineu Bicudo relata que em 1963, ao cursar a cadeira de

Análise Superior, ministrada pelo professor Dr. Edison Farah, na Faculdade de

Filosofia, Ciências e Letras da USP, veio a conhecer livros que tratavam sobre

Teoria dos Conjuntos, tema que, acompanhado de Topologia Geral, era ministrado

por Farah.

Dessa maneira, o professor Bicudo tomou conhecimento do livro Naive Set

Theory de Halmos, e iniciou sua tradução em 1964, sendo essa sua primeira

experiência como tradutor. (HALMOS, 1970, Nota do Tradutor).

A denominação �ingênua� para essa obra não se remete ao sentido de

simples ou banal, pois o próprio autor, no Prefácio, deixa claro que se trata de uma

�teoria axiomática dos conjuntos do ponto de vista ingênuo�, ou seja, é axiomática,

pois alguns axiomas são enunciados e usados como base, e é ingênua na

linguagem e notação, que Halmos descreve como uma linguagem da �Matemática

Ordinária Informal�, mas ele mesmo admite, entre parênteses, que seria

formalizável.

No Prefácio do livro fica muito clara a preocupação do autor em prevenir o

leitor de que o livro foi escrito de maneira informal e chegando até o ponto de ser

coloquial. Porém, ele admite que ainda assim os leitores podem ter uma dificuldade

na leitura em função da complexidade do assunto.

No primeiro capítulo do livro, Halmos mostra o quão axiomática é sua obra,

enunciando o Axioma da Extensão. Para chegar ao enunciado do axioma, Halmos

descreve, de maneira pragmática, os conjuntos, como conceito primitivo e

comparando-o com coleções de frutas/animais:

Uma matilha de lôbos, um cacho de uvas ou um bando de pombos são

todos exemplos de conjuntos de coisas. O conceito matemático de

conjunto pode ser usado como fundamento para toda a matemática

conhecida. (HALMOS, 1970, p.1)

Nessa frase de Halmos, percebemos a essência do uso da Teoria dos

Conjuntos no MMM, que é admiti-la como base ou �fundamento� para toda a

Matemática, ou seja, Halmos afirma que a Matemática pode ser estruturada pela

49

Teoria dos Conjuntos e no MMM os protagonistas se apropriam dessa idéia.

Ainda precedendo o enunciado do Axioma da Extensão, o conceito de

pertinência é citado como o principal conceito da Teoria dos Conjuntos. Relativo a

esse conceito, Halmos apresenta o símbolo �� e afirma que �essa versão da letra

grega épsilon é tão freqüentemente usada para denotar pertinência que seu uso

para denotar tudo o mais é quase proibido.� (HALMOS, 1970, p. 2). Essa frase de

Halmos salienta rigor na linguagem, característico da Teoria dos Conjuntos e, que

parece ter sido absorvido pelo MMM.

Outra relação citada é a igualdade entre conjuntos. Essa relação é dada pelo

Axioma da Extensão que diz que dois conjuntos são iguais se, e somente se, têm os

mesmos elementos e, por fim, a relação de inclusão e seu símbolo �� são

apresentados ainda no primeiro capítulo do livro.

No capítulo 2, Halmos enuncia o Axioma da Especificação que diz que toda

afirmação feita sobre os elementos de um conjunto especifica um subconjunto.

Também apresenta uma pequena lista com sete operadores lógicos:

e, ou (no sentido de �_ ou _ ou ambos�), não, se _ então _ (ou implica), se e somente se, para alguns (ou existe), para todo. (HALMOS, 1970, p. 6)

No desenvolvimento do Axioma da Especificação, o autor apresenta uma

prova12 mostrando que não há um conjunto universo ou, em outras palavras, que

nada contém tudo.

Segue que, qualquer que o conjunto A possa ser, se B = {x A: x x}, então, para todo y, (*) y B se e somente se (y A e y y). Pode acontecer B A? Vamos proceder à prova de que a resposta é

não. De fato, se B A, então ou B B também (improvável, mas não

obviamente impossível), ou B B. Se B B, então, por (*), a hipótese B

A dá B B � uma contradição. Se B B então, por (*) outra vez a

hipótese B A dá B B � uma contradição de novo. Isto completa a

prova de que B A é impossível e então devemos ter B A. A parte mais interessante desta conclusão é que existe algo (a saber, B) que

não pertence a A. O conjunto A neste argumento era inteiramente

12 O conceito de prova no âmbito do ensino e aprendizagem tem uma amplitude maior, levando-se em consideração provas que vão do mais pragmático ao mais formal, até que se atinja o nível formal de uma

demonstração. Nesse contexto, o conceito de prova utilizado pelo autor deve ser compreendido como demonstração formal.

50

arbitrário. Nós provamos, em outras palavras, que nada contém tudo, ou, mais espetacularmente, não há universo. (HALMOS, 1970, p.7 � 8)

O quarto capítulo trata das reuniões e intersecções de conjuntos. Halmos

apresenta uma analogia entre estas operações e os operadores lógicos ou e e

respectivamente:

i. A B = { x ; x A ou x B }

ii. A B = { x ; x A e x B }

Também são apresentadas nesse capítulo algumas operações de reunião e

intersecção de pares de conjuntos, onde se observa muita proximidade com as

propriedades da Álgebra Booleana apresentadas no 3º Capítulo:

i. A = A

ii. A B = B A (comutatividade)

iii. A (B C) = (A B) C (associatividade)

iv. A A = A (idempotência)

v. A B se e somente se A B = B

vi. A =

vii. A B = B A (comutatividade)

viii. A (B C) = (A B) C (associatividade)

ix. A A = A (idempotência)

x. A B se e somente se A B = A

No quinto capítulo são apresentados o complemento e a potência de

conjuntos. Complemento, também chamado de diferença, é uma operação que,

assim como reunião e intersecção, foi utilizada no ensino de Matemática no

Ensino Secundário da época do MMM. O Complemento é definido por

A � B = { x A ; x B }.

O Axioma das Potências é enunciado no 5º capítulo e diz: �para cada

conjunto existe uma coleção de conjuntos que contém entre seus elementos todos

os subconjuntos do conjunto dado.� (HALMOS, 1970, p.20). Nesse axioma, o autor

utiliza o termo coleção em substituição à palavra conjunto, pois já havia mencionado

no primeiro capítulo que em determinados momentos ele utilizaria coleção ou classe

51

para evitar uma �monotonia terminológica�. Essa terminologia também se observa

nos livros didáticos do MMM de autoria de Sangiorgi.

Na definição do conjunto potência, Halmos utiliza uma letra maiúscula P em

um estilo diferente de fonte: , certamente para diferenciar um �conjunto comum�

de um conjunto de conjuntos. Ele apresenta a notação: = {X : X E} e afirma que

se E é um conjunto, então existe um conjunto tal que se X E, então X .

Como exemplo, temos o conjunto E = {a, b} e (E) = {, {a}, {b}, {a, b}}. Esse

conjunto é também conhecido por outros autores como �conjunto das partes�.

O sexto capítulo, que trata dos pares ordenados, inicia com uma noção

básica sobre arranjo dos elementos de um conjunto em uma determinada ordem. O

autor considera o conceito de ordem como ainda indefinido. Em seguida é dado um

exemplo utilizando um conjunto A = {a, b, c, d} e é considerado um conjunto

C = {{a, b, c, d}, {b, c}, {b, c, d}, {c}} e então Halmos define ordem como um novo

arranjo dos subconjuntos que são elementos de C. Esse novo arranjo é feito do

menor para o maior, ou seja, o subconjunto que está contido em todos os outros é o

{c}, portanto será o primeiro, e assim por diante, formando: C = {{c}, {b, c}, {b, c, d},

{a, b, c, d}}. O autor define como �menor� o conjunto que está contido em todos os

outros, no caso {c}.

Halmos prossegue com as definições de par ordenado e, em seguida, a

definição de produto cartesiano:

O produto cartesiano de dois conjuntos é um conjunto de pares

ordenados (isto é, um conjunto cujos elementos são, cada um, um par

ordenado), e o mesmo é verdade para todo subconjunto de um produto

cartesiano. É de importância técnica saber que podemos caminhar

também na direção oposta: todo conjunto de pares ordenados é um

subconjunto do produto cartesiano de dois conjuntos. Em outras palavras: se R é um conjunto tal que todo elemento de R é um par

ordenado, então existem dois conjuntos A e B tais que R A X B. (HALMOS, 1970, p. 25).

O sétimo capítulo, que trata das relações, tem em seu início uma noção geral

de relação, trazendo exemplos cotidianos como casamento entre homens e

mulheres e exemplos na Teoria dos Conjuntos como a pertinência entre elementos

e conjuntos. Em seguida, Halmos define relação como um conjunto de pares

ordenados e, por meio de exemplos, mostra que relação é um subconjunto do

produto cartesiano entre dois conjuntos.

52

Ainda neste capítulo são apresentadas as definições de domínio e

contradomínio de uma relação, fazendo um preparo para o capítulo seguinte que

trata das funções.

No início do oitavo capítulo, que apresenta o conceito de função, aparece a

definição: �Se X e Y são conjuntos, uma função de X em Y é uma relação tal que

dom = X e para cada x X há um único elemento y em Y com (x, y) .�

(HALMOS, 1970, p. 32). Nessa definição está clara a necessidade das definições

anteriores sobre pertinência, pares ordenados, relação e domínio, conceitos

necessários para que se estruturasse o conceito de função.

A simbologia também é apresentada: : X Y e Halmos cita um exemplo

de função como um catálogo telefônico de uma cidade onde o que ele chama de

�argumentos� da função são os habitantes da cidade e seus �valores� são seus

endereços. (HALMOS, 1970, p. 33). Os argumentos citados são os elementos do

conjunto domínio da função e os valores são os elementos do conjunto imagem, que

ainda não havia sido definido, mas em seguida Halmos dá sua definição como um

subconjunto do contradomínio.

Esses foram os capítulos que tratam dos conteúdos relativos à Teoria dos

Conjuntos que objetivamos analisar. Não tivemos a pretensão de uma análise total

da obra de Halmos, uma vez que só nos serão necessários os conteúdos

compatíveis com os conteúdos que eram pretendidos no Ensino Secundário da

época do MMM.

53

3.1.2. TEORIA DOS CONJUNTOS � EDISON FARAH

O livro Teoria dos Conjuntos escrito pelo professor Edison Farah (1961),

então catedrático da cadeira de Análise Superior da Faculdade de Filosofia,

Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, é mais um objeto de análise de

como se apresentou a Teoria dos Conjuntos nos livros destinados ao Ensino

Superior e que podem ter influenciado na constituição do ideário do Movimento da

Matemática Moderna no Brasil.

Assim como na obra de Halmos, começamos nossa análise do livro de

Edison Farah, observando suas considerações no Prefácio.

Farah começa o Prefácio com justificativas da produção do livro, afirmando

que atendeu à sugestão de alunos, colegas e amigos e iniciou com Teoria dos

Conjuntos uma série de publicações para interessados no assunto. Ainda no

Prefácio, esse autor diz que não foi sua intenção desenvolver uma Teoria

Axiomática dos Conjuntos. Assim como observamos no livro de Halmos, os autores

se preocupam em alertar o leitor para a �informalidade� de suas obras, apesar de

não serem tão informais em seu desenvolvimento.

O livro de Farah é composto de três capítulos, onde o primeiro trata de uma

�Parte Geral da Teoria dos Conjuntos�, o segundo trata dos �Conjuntos Ordenados�

e o terceiro dos �Números Transfinitos�.

Desses capítulos, ao primeiro será dada uma maior atenção na análise, pois

trata justamente de noções gerais da Teoria dos Conjuntos e, são essas noções que

encontraremos nos livros didáticos que estudaremos. O primeiro capítulo está

dividido em nove partes que o autor classificou como parágrafos e inclusive utiliza o

símbolo § para denotá-los.

O primeiro parágrafo trata das noções primitivas como: objeto (ou elemento),

conjunto (ou classe), pertinência e igualdade. Farah afirma que adotou as

definições, notações e terminologia do livro Théorie des Énsembles de Nicolas

Bourbaki. (FARAH, 1961, p.1)

As noções primitivas são apresentadas de uma forma intuitiva e utilizando

exemplos desde concretos aos mais abstratos. Conjunto é considerado como uma

coleção de objetos e os elementos são os �objetos� que constituem os conjuntos. Os

exemplos dados por Farah para conjuntos são: �o conjunto das páginas de um livro,

54

o conjunto dos pontos de uma reta, o conjunto das funções contínuas num

intervalo.� (FARAH, 1961, p. 2)

Após a definição intuitiva de conjunto e elemento, Farah trata dos conceitos

de pertinência e de igualdade, inclusive estabelecendo que as letras minúsculas são

utilizadas preferencialmente para denotar elementos e as maiúsculas para

conjuntos, pois os conceitos de pertinência e igualdade introduziriam a simbologia.

O símbolo �� é estabelecido como representante da pertinência e o símbolo �=�

como representante da igualdade.

O conceito de igualdade é interpretado por Farah como a expressão de que

por exemplo, se x = y, então x e y designam o mesmo elemento. A esse conceito

são apresentadas três características: a reflexão, a simetria e a transitividade. Assim

como foram apresentados os símbolos �� para pertinência e �=� para igualdade,

também foram apresentados �� para a não pertinência e �� para desigualdade.

A pertinência, igualdade, negação, conjunção e quantificador existencial com

seus símbolos �, =, ~, , � respectivamente, são utilizados nas �frases� da Teoria

dos Conjuntos. Segundo Farah: �As chamadas frases da Teoria dos Conjuntos (da

teoria a ser desenvolvida aqui) são certas asserções sobre os elementos, feitas

através de símbolos que os representam.� (FARAH, 1961, p. 2, grifo do autor).

Essa primeira parte (ou parágrafo) do primeiro capítulo se destina a definir

alguns conceitos iniciais da Teoria dos Conjuntos e atribuir símbolos a esses

conceitos.

A segunda parte tem como título: �Noções básicas sobre conjuntos� e trata de

conceitos como relação de inclusão, igualdade de conjuntos, conjunto vazio,

conjuntos binários e unitários e conjunto das partes de um conjunto dado.

A exposição desses conceitos acontece de maneira similar à primeira parte,

onde Farah desenvolve o conceito introduzindo sua simbologia. A relação de

inclusão é definida primeiro e, em seguida, é utilizada para que seja definida a

igualdade entre conjuntos.

Dados os conjuntos A e B, diremos que A está contido em B (ou que B contém A) e escrevemos A B (ou B A) se todo elemento de A fôr

também elemento de B. Em outras palavras, �A B� significa: ( x) (x A x B). (FARAH, 1961, p.13, grifos do autor).

55

A noção de conjunto vazio é introduzida com uma demonstração de que só

existe um conjunto sem elementos, ou seja, o conjunto vazio é único.

Figura 4: União de conjuntos representada pelos diagramas.

Figura 5: Diferença de conjuntos representada pelos diagramas.

Ainda no § 2º, do item 10 ao 16 são apresentadas as operações Reunião,

Intersecção e Complementar (conforme figuras 4, 5 e 6) seguidas de suas

características simbólicas e propriedades operacionais como comutatividade,

associatividade e distributividade.

56

Neste item observamos a primeira aparição dos Diagramas de Euler/Venn

com o objetivo de exemplificar as operações, porém, Farah não os introduz com a

denominação de diagrama.

A figura 4 mostra a primeira aparição dos diagramas para elucidar a reunião

de conjuntos, porém o termo diagrama ainda não é empregado, sendo utilizada a

palavra círculo em seu lugar.

Nas figuras 5 na página 55 e 6 é notável a preocupação de Farah em não

utilizar a terminologia de diagrama. Ele usa o termo disco no lugar de diagrama,

quando realiza a apresentação dos conceitos de diferença de conjuntos e

complementar. Esse é um indício da preocupação com a formalidade de não utilizar

um conceito, ou termo sem antes defini-lo, o que fortalece a caracterização de que

seu livro traz uma apresentação focada na formalidade da Teoria dos Conjuntos.

Figura 6: Complementar de conjuntos representado pelos diagramas.

O § 3º tem como foco, introduzir os números naturais apresentando suas

características com proposições, demonstrações, definições e teoremas de uma

maneira abstrata e rigorosamente formal. Nas páginas 39 e 40 ele propõe alguns

exercícios utilizando a mesma formalidade anterior.

O § 4º trata das relações, funções e conjuntos equipotentes, finitos, infinitos e

enumeráveis. Para que esses conceitos fossem definidos, Farah inicia com a

definição de Par Ordenado e em seguida define o conceito de relação determinada

por frases, uma maneira diferente de apresentar esse conceito, que em outras obras

57

é apresentado após a definição de produto cartesiano sendo introduzido como

subconjunto do produto cartesiano.

O conceito de função é apresentado em seguida:

Seja f uma classe de pares ordenados cujos primeiros elementos formem um conjunto não vazio E. Se, então, para cada x E existir um e somente um y verificando {{x}, {x, y}} f, diremos que f é uma função

definida em E. O elemento y para o qual {{x}, {x, y}} f é o valor da função f para o elemento x E, e se designa por f(x). O elemento f(x) se diz também o correspondente ou a imagem de x pela função f, a qual

associa ao elemento x o elemento f(x). O conjunto E é o campo de definição de f, enquanto que o conjunto dos valores de f é a classe dos

f(x) com x E, isto é, precisamente o conjunto dos segundos elementos

dos pares pertencentes a f. (FARAH, 1961, p.44, grifos do autor).

Produto Cartesiano só é definido no § 5º após o desenvolvimento de famílias

e seqüências.

58

3.1.3. ELEMENTOS DE TEORIA DOS CONJUNTOS � BENEDITO

CASTRUCCI

O livro Elementos de Teoria dos Conjuntos de Benedito Castrucci, editado

pelo GEEM em 1967, foi um livro de grande importância na preparação dos

professores para a introdução dos tópicos da Matemática Moderna. Esse livro foi

utilizado nos cursos promovidos pelo GEEM.

Na introdução de seu livro, Castrucci justifica a ênfase dada à Teoria dos

Conjuntos utilizando argumentos históricos, comparando a importância de conjunto

com a importância do número: �A noção intuitiva de conjunto é provavelmente tão

primitiva quanto à de número.� (CASTRUCCI, 1967, introdução).

Entre os argumentos utilizados por Castrucci para dar justificativa e força ao

uso da Teoria dos Conjuntos é o de que a Teoria seria como uma base, abrangendo

todos os ramos da Matemática. Esse argumento também foi utilizado por Halmos.

O crescimento da ciência matemática de 1900 até nossos dias deu à

teoria um papel proeminente. É ela hoje base para todos os ramos da

Matemática; êstes são sempre em última análise estudos de um

conjunto de entes de alguma espécie, (CASTRUCCI, 1967, introdução).

Uma frase que se torna uma espécie de slogan do Movimento é: �É uma

teoria unificadora, na linguagem e na Matemática.� (CASTRUCCI, 1967,

Introdução). Em seguida, Castrucci se alicerça em autoridade utilizando o nome do

grupo Bourbaki como um aliado às tendências modernistas.

Castrucci ressalta que seu livro propõe um estudo elementar e intuitivo, e que

somente após um estudo intuitivo é que deve-se realizar um estudo rigoroso,

utilizando-se de outras obras que o apresentam.

O primeiro capítulo trata de noções de lógica e funciona como um capítulo

�extra� do livro, pois é denominado § 0 e intitulado de �Noções Sucintas de Lógica

Matemática�. Na Introdução, Castrucci informa que o GEEM publicaria uma obra

com noções detalhadas de lógica, denominada: Introdução à Lógica Matemática, de

sua própria autoria e com a primeira edição em 1973.

Neste parágrafo inicial, Castrucci apresenta as proposições ou sentenças de

lógica e define o princípio do terceiro excluído:

Por outro lado, as proposições consideradas são somente as bem

definidas, isto é, aquelas que podem ser decididas se falsas ou verdadeiras. Toda proposição tem um dos dois valores �falso� ou

59

�verdadeiro�, excluindo-se qualquer outro. (CASTRUCCI, 1967, p. 1, grifo nosso)

Os conectivos lógicos que Castrucci define são: e, ou, se...então..., se e

somente se e não, com seus respectivos símbolos , , , , ~. São

apresentadas proposições utilizando-se dos conectivos e em seguida são definidas

as propriedades e utilizadas tabelas-verdade para quantificar os casos de

verdadeiro e falso dos conectivos.

Nas tabelas-verdade, Castrucci utiliza os valores V para indicar que uma

proposição é verdadeira e F para falsa como se seguem alguns exemplos:

a) É claro que para o modificador, temos a tabela abaixo para p e ~p,

indicando-se �falso� e �verdade� respectivamente por F e V: p ~p V F F V

b) Admitindo-se que �p q� é verdade se e somente se p e q são

verdadeiros, vem a tabela: p q Pq V V V V F F F V F F F F

c) � p q� (�ou� inclusivo) é falso se e somente se p e q são falsos,

donde a tabela: p q Pq V V V V F V F V V F F F

d) p q é falso se e somente se p é verdade e q é falso, donde a

tabela: p q Pq V V V V F F F V V F F V

Observe-se que a tabela acima é a mesma que a de ~ p q. e) Como p q é o mesmo que (p q) (q p) então a tabela de p q é a que se segue, utilizando-se os casos d) e b):

p q pq qp (pq) (qp) V V V V V V F F V F F V V F F F F V V V

(CASTRUCCI, 1967, p. 3 � 4)

60

Ainda no § 0 são definidos os quantificadores, sendo o quantificador universal

com significado de �qualquer que seja� ou �para todo� e com símbolo e o

quantificador existencial, que significa �existe� e é indicado pelo símbolo .

Nessa breve apresentação de noções de lógica, podemos observar uma

ênfase na utilização e aplicabilidade da simbologia, procurando universalizar a

linguagem:

Nota: Outras maneiras de ler <<p q>> são: <<p é condição suficiente

para q>> e <<q é condição necessária proveniente de p>>. Deste modo

<<p q>> pode ser lido: <<p é condição necessária e suficiente para

q>> ou <<q é condição necessária e suficiente para q>>. (CASTRUCCI, 1967, p. 2).

Só após essa introdução das noções sucintas de lógica é que Castrucci traz o

título da obra e começa o § 1º que é denominado �Primeiros Conceitos�. De uma

forma similar à apresentação de Halmos (1970), Castrucci enuncia os conceitos

primitivos que são: conjunto, elemento e relação de pertinência. Ainda semelhante

ao livro de Halmos, ele define conjunto de forma intuitiva e ressalta que para o

significado de conjunto também são utilizados os termos coleção, classe ou sistema.

Não diferente do § 0 do livro, Castrucci novamente apresenta a simbologia

para esses conceitos, determinando que para conjunto seriam utilizadas letras

maiúsculas do alfabeto latino, para elemento, letras minúsculas do mesmo alfabeto

e a relação de pertinência seria simbolicamente representada por e sua negação

por .

Duas formas de escrita de conjuntos são expostas: conjunto determinado

pela designação de seus elementos e conjunto determinado pela propriedade de

seus elementos. Ambas as maneiras foram seguidas por exemplos desde abstratos

como �{x | x é real e x > 2}� até concretos �{x | x é aluna desta classe e x tem blusa

vermelha}�.

Na apresentação dos conjuntos unitário, vazio e universo podemos observar

a forma intuitiva que Castrucci utilizou em seu livro:

Para evitar o aparecimento de paradoxos, admitimos a existência de um

conjunto ao qual pertencem todos os elementos com os quais estamos trabalhando. Êste conjunto é denominado conjunto-universo e, salvo casos específicos, será indicado por U. Êste conjunto aparece

espontaneamente quando estamos num ramo de Matemática. Assim, se

estudamos Geometria Plana, o conjunto-universo é o conjunto dos

61

pontos de um plano; se pesquisamos máximo divisor comum ou mínimo

múltiplo comum, o conjunto é, em geral, o dos números naturais.

(CASTRUCCI, 1967, p. 24).

A ausência de demonstrações formais em definições como essa mostram

uma falta de preocupação com a formalidade, que pode ter se dado em função do

público para o qual Castrucci destinava seu livro, tanto na preocupação de não

causar um impacto forte, quanto ao nível de conhecimento, pois ele mesmo alertou

na introdução que seu livro traz um estudo elementar e intuitivo.

Diferente do livro de Halmos, que realiza uma demonstração de que não

existe um conjunto-universo, ou em outras palavras, algo que contenha tudo,

admite-se aqui a existência desse conjunto com o objetivo de �evitar o aparecimento

de paradoxos�. (CASTRUCCI, 1967, p.24)

Outro ponto que chama a atenção é que Castrucci utiliza a relação de

inclusão antes de defini-la. Essa utilização da relação de inclusão acontece na

definição de conjunto-universo, que também se dá de forma pragmática, com

exemplos e sem demonstrações.

A relação de inclusão é definida em seguida, de uma forma muito semelhante

à forma que Halmos e Farah definiram em seus livros.

Ainda no § 1º, Castrucci define a igualdade de conjuntos, conjuntos das

partes de um conjunto e os conjuntos numéricos, ou como ele denomina: �alguns

conjuntos importantes�.

Indicaremos como usuais conjuntos de números como se segue: a)

Conjunto dos números inteiros não negativos, N. b) Conjunto dos

números naturais, isto é, inteiros maiores que zero, N*. c) Conjunto dos

números inteiros, Z. d) Conjunto dos números racionais, Q. e) Conjunto dos números reais, R. f) Conjunto dos números complexos, C.

(CASTRUCCI, 1967, p. 28).

No final do § 1º são propostos exercícios e são apresentadas as notas

complementares com definições e provas relacionadas ao conjunto vazio e ao

conjunto das partes de um conjunto, e P(A), respectivamente.

As operações entre conjuntos, denominadas reunião e intersecção, são

introduzidas no 2º capítulo. Na definição dessas operações, Castrucci utiliza

conjuntos de forma abstrata, apenas denominando-os A e B e preocupando-se em

inseri-los em um conjunto maior denominado universo.

62

Os exemplos iniciais das duas operações contêm diagramas semelhantes

aos de Euler/Venn, porém ainda não introduzidos. Ainda na introdução das

operações, Castrucci dá exemplos utilizando conjuntos numéricos finitos, unindo em

um mesmo texto a linguagem formal e rigorosa e os exemplos concretos.

As figuras 7 e 8, nas páginas 63 e 64, apresentam a preocupação de

Castrucci em utilizar diagramas nas operações com conjuntos. Esses diagramas

são apresentados sem que tenham sido definidos e com forma irregular,

diferenciando-os dos diagramas utilizados no livro de Farah (1961). Castrucci não

utiliza a terminologia diagrama, em seu lugar usa a palavra figura.

Como sugestão para a utilização das operações, Castrucci utiliza a

determinação do M.D.C., M.M.C., resolução de sistemas de equações ou de

inequações e aplicação à linguagem geométrica. Essas sugestões têm uma grande

importância em nossa análise, dado que investigaremos as apropriações

intelectuais, definidas por Chartier e Hébrard (1981) como �processos de leitura�,

onde a partir de uma estratégia definida Osvaldo Sangiorgi desenvolverá sua tática.

Estamos analisando esses livros do ponto de vista das estratégias e a coleção

didática de Sangiorgi será analisada do ponto de vista das táticas.

As figuras 9 e 10, na página 65, apresentam alguns dos exercícios que

Castrucci propõe para utilização das operações. Os demais exercícios podem ser

encontrados nos anexos.

Da mesma maneira que foram apresentadas a reunião e intersecção,

Castrucci introduz as operações: diferença e complementar. A utilização de figuras

semelhantes aos diagramas é novamente percebida e ele também utiliza a mescla

entre linguagem rigorosa e exemplos numéricos que podem ser observadas nas

figuras 11 e 12, nas páginas 66 e 67.

O capítulo 2 apresenta em suas notas complementares uma contextualização

histórica dos Diagramas de Euler/Venn. Nessas notas também aparece a

enumeração de elementos de conjuntos finitos, onde pela primeira vez no livro

observamos exemplos e exercícios com situações reais, diferente dos anteriores,

onde os exemplos se limitavam a conteúdos matemáticos em suas diferentes áreas,

como Geometria, Álgebra e Aritmética. Esses exemplos e exercícios envolvendo as

diferentes áreas mostram indício de uma busca pela unificação da disciplina

Matemática, que era proposta no ideário do MMM, onde a Teoria dos Conjuntos

deveria ser a linguagem unificadora dessas áreas.

63

Figura 7: Reunião de conjuntos representada por diagramas no livro de Castrucci (1967).

64

Figura 8: Intersecção de conjuntos representada por diagramas no livro de Castrucci (1967).

65

Figura 9: Exercícios sobre operações com conjuntos no livro de Castrucci (1967).

Figura 10: Exercícios sobre operações com conjuntos no livro de Castrucci (1967).

66

Figura 11: Diferença de conjuntos representada por diagramas no livro de Castrucci (1967).

67

Figura 12: Conjunto complementar representado pelos diagramas no livro de Castrucci (1967).

O 3º capítulo, intitulado �Propriedades das operações� define, de maneira

intuitiva, as propriedades das operações definidas no 2º capítulo. No final do

capítulo, Castrucci demonstra �algumas das propriedades já verificadas

intuitivamente� (CASTRUCCI, 1967, p.56), e também propõe exercícios, ainda que

em pouca quantidade, relacionados às demonstrações de propriedades.

68

No 4º capítulo são expostos os conceitos de par ordenado e produto

cartesiano. O enfoque inicial remete à Geometria Analítica, com o uso da

representação gráfica. Como nos capítulos anteriores, Castrucci inseriu nas notas

complementares, uma definição mais rigorosa de par ordenado, semelhante à

maneira que Halmos apresentou e simbolizou o conceito em seu livro.

Em lugar de introduzir par ordenado como um conceito não definido,

pode-se usar a seguinte DEFINIÇÃO: Chama-se par ordenado (a, b) ao conjunto {{a}, {a, b}}. Prova-se que (a, b) = (c, d) a = c e b = d. Com efeito, se a = c, então {a} = {c} e se a = c e b = d, então, {a, b} =

{c, d}. Daí, {{a}, {a, b}} = {{c}, {c, d}}, donde (a, b) = (c, d). (CASTRUCCI, 1967, p.64)

Em seguida, Castrucci utiliza exemplos para apresentar a noção de relação.

A definição de relação é exposta com a expressão x < y, onde x são elementos de

um conjunto A e y elementos de um conjunto B e ainda, os pares (x, y) são

elementos do produto cartesiano A X B. Sendo assim, Castrucci denomina A X B de

universo e R (relação de A em B) como um subconjunto de A X B.

Utilizando a linguagem dos conjuntos, representação gráfica e simbologia

algébrica, Castrucci ainda apresenta a definição de Domínio, Imagem e Contra-

Domínio.

Os capítulos 5 e 6, que tratam respectivamente das relações e das funções,

são apresentados de maneira semelhante aos anteriores, mas um ponto que

devemos destacar são os exercícios propostos, onde, utilizando a linguagem da

Teoria dos Conjuntos, Castrucci procura reunir os ramos da Matemática, permeando

por tabelas, gráficos, geometria, álgebra, etc.

Ainda restando os capítulos 7 e 8, notamos a apresentação de conceitos

como Semigrupo e Monóide, Grupo, Corpo, Espaço Vetorial, Anéis, suas

propriedades e homomorfismos e isomorfismos entre grupos e entre anéis.

Em uma visão geral, o livro de Castrucci é o que mais se aproxima de uma

orientação ou proposta para o Movimento de Matemática Moderna. A análise que

faremos da coleção didática de Sangiorgi nos mostrará como se deu a apropriação

dos conteúdos apresentados por Castrucci, ou seja, a �leitura� que Sangiorgi fez

desses conteúdos e como se deu a disciplinarização desses conteúdos inseridos

em sua coleção didática.

69

Devido ao ano da publicação do livro de Castrucci (1967), pode parecer

equivocada a idéia de que Sangiorgi seria influenciado ou influenciaria o livro de

Castrucci, porém, segundo Lima (2006), Castrucci ministrava cursos sobre a Teoria

dos Conjuntos no início do MMM, concomitante com o lançamento da coleção

didática de Sangiorgi.

70

CAPÍTULO 4

ANÁLISE DOS LIVROS DIDÁTICOS

71

A escolha da coleção de livros didáticos que analisaremos neste capítulo se

deu pela importância de seu autor no Movimento de Matemática Moderna e pelo

seu sucesso em vendas. Osvaldo Sangiorgi, como já citado, foi um dos principais

precursores do MMM no Brasil, senão o maior. Escreveu a coleção intitulada

�Matemática: Curso Moderno para os Cursos Ginasiais� com quatro volumes para

as primeiras séries do Ensino Secundário, sendo o lançamento dos volumes feito de

modo gradativo, de forma a acompanhar o avanço dos alunos na seriação.

O sucesso que a coleção didática de Osvaldo Sangiorgi fez nos remete ao

fato de que houve uma grande divulgação do Movimento modernizador:

Desde o início, o GEEM procurou divulgar as idéias da Matemática

Moderna. Osvaldo Sangiorgi era o presidente e porta-voz do grupo e dava inúmeros depoimentos à imprensa e escrevia artigos nos principais

jornais de São Paulo. A imprensa paulista acompanhou de perto todas

as atividades do grupo noticiando a realização de cursos, palestras,

publicações, eventos e reuniões, além de publicar vários artigos de

divulgação sobre o ensino da Matemática. (SOARES, 2001, p. 81 � 82)

As mídias impressas e televisivas tiveram um papel extremamente importante

para que a coleção didática inovadora de Osvaldo Sangiorgi não sofresse os efeitos

da vulgata percebidos no movimento anterior à Matemática Moderna. Esse

movimento anterior ao MMM, denominado Reforma Francisco Campos, teve como

inovação a coleção de livros de Euclides Roxo, coleção que não teve muita

aceitação por parte do público, especialmente dos professores, o que a levou a um

insucesso de vendas.

Os didáticos de Euclides Roxo lançados para atender aos programas da

nova disciplina matemática haviam se tornado alvo de muitas críticas.

Esta ocorrência fez com que algumas editoras procurassem colocar no

mercado livros que se apresentassem como alternativa aos redigidos pelo principal mentor da reforma. Esses novos manuais deveriam abdicar de uma metodologia revolucionária e procurar conciliar os novos

programas com as práticas e concepções dominantes no meio docente

da época. Foi nesse quadro que emergiu a coleção de Stávale.

(BRAGA, 2006, p.119)

Como principal crítico de Euclides Roxo, citamos o professor do Instituto

Caetano de Campos de São Paulo, Jacomo Stávale. Sem dúvida alguma, é bela e útil a nova orientação dada ao ensino da

Matemática pela douta Congregação do Colégio Pedro II. Os quatro

ramos da Matemática Elementar, convém que sejam ensinados

paralelamente, desde o primeiro ano do curso ginasial. Mas o ensino simultâneo desses quatro ramos não pode ser feito atabalhoadamente,

como pretendem alguns autores. (STÁVALE, 1942 apud BRAGA, 2006, p.119)

72

A vulgata é um conceito do trabalho de Chervel (1990), que se refere à

padronização que ocorre no livros didáticos de uma dada época. Essa padronização

ocorre a partir de um manual inovador, que em geral não é bem sucedido em

vendas, e em seguida, os outros livros seguem uma padronização baseada no

manual inovador. A coleção de Sangiorgi não sofreu o efeito do insucesso em

vendas, devido às diversas formas de divulgação de suas características

�modernas�, dentre essas formas, a imprensa.

A coleção didática de Osvaldo Sangiorgi, e de forma mais abrangente, o

Movimento de Matemática Moderna, tiveram como alguns dos processos de

divulgação, cursos promovidos aos professores do ensino secundário e primário e

reportagens jornalísticas, que promoveu uma aceitação inicial e um sucesso de

vendas.

A primeira forma foi realizada com aulas presenciais. Ocorreram a partir do ano de 1960, antes mesmo do GEEM ser fundado. A partir de 1961, os cursos foram promovidos pelo Grupo de Estudos do Ensino de Matemática (GEEM) em convênio com o Ministério da Educação e

Cultura (MEC), a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo

(SEESP) e o Instituto Brasileiro de Educação e Cultura (IBECC). Esses cursos, em geral, foram realizados em período de férias

escolares e, por isso, tinham a denominação de cursos de férias.

Quando eram realizados em período letivo, os professores da rede

estadual de ensino eram dispensados oficialmente pela SEESP de suas atividades, em seus respectivos estabelecimentos. (NAKASHIMA, 2007, p. 45)

Esses indícios nos levam a crer que a coleção didática de Sangiorgi teve os

�privilégios� do Movimento da Matemática Moderna no que tange à divulgação. Os

cursos e reportagens, que atribuímos o título de divulgadores do Movimento,

ocorreram a partir do ano de 1960, antes até da fundação do GEEM (outubro de

1961). Entre 1960 e 1963 já eram editadas 13 reportagens sobre a Matemática

Moderna (NAKASHIMA, 2007, p.58) e divulgados por 41 vezes os cursos da

Matemática Moderna (NAKASHIMA, 2007, p.48). Os jornais investigados por

Nakashima foram de uma grande diversidade, e em especial a Folha de São Paulo,

jornal com maior incidência de notas sobre a Matemática Moderna.

Os livros que analisaremos na coleção de Osvaldo Sangiorgi são:

�Matemática: Curso Moderno� volume 1 em duas edições: a primeira de 1963 e a

11ª de 1968 onde já ocorreram modificações, principalmente na Teoria dos

73

Conjuntos; �Matemática: Curso Moderno� volume 2, 3ª edição de 1966 e

�Matemática: Curso Moderno� volume 4, de 1967, cuja edição não é citada.

Os volumes 2 e 3 que não analisaremos trazem a Teoria dos Conjuntos de

forma muito semelhante ao primeiro volume, sendo desnecessária uma

apresentação repetitiva, apenas mostrando os conteúdos.

74

4.1. MATEMÁTICA: CURSO MODERNO � VOLUME 1

O primeiro volume do livro �Matemática: Curso Moderno� tem em suas

primeiras páginas, como muitos livros, um espaço para agradecimentos, onde

encontramos os agradecimentos de Osvaldo Sangiorgi, com ênfase especial ao

GEEM que segundo ele, prestaram �magníficas sugestões e discussões de certos

tópicos aqui presentes�. Esses agradecimentos já não aparecem na 11ª edição

desse mesmo volume.

O livro foi publicado pela Companhia Editora Nacional13, que era situada na

Rua dos Gusmões, 639 em São Paulo, capital.

Nas páginas iniciais também encontramos uma indicação ilustrando a

obtenção do �Prêmio Jabuti � 1963 em Ciências Exatas, outorgado pela Câmara

Brasileira do Livro�. Esse prêmio consta nos arquivos eletrônicos históricos14 da

Câmara Brasileira do Livro, porém a data que referencia o prêmio é de 1964.

Sangiorgi referencia também o que regulamentou a edição de seu livro,

enunciando que atendeu as especificações dos �vinte e quatro itens que compõem

os Assuntos Mínimos para um Moderno Programa de Matemática para os Ginásios�.

Ele também cita a aprovação no IV Congresso Brasileiro do Ensino da Matemática e

a readaptação feita no Curso de Treinamento Básico para Professores Secundários,

que se realizou em Brasília de 25 a 30 de novembro de 1963. Esses indícios nos

mostram que o livro foi editado no final do ano de 1963 e, portanto, só foi realmente

utilizado nos cursos secundários em 1964.

O prefácio dos livros traz uma orientação/propaganda aos estudantes, onde

entre outras, informa que a Matemática �na maioria das vezes, era um �exagero de

cálculos�, �problemas complicados, trabalhosos e fora da realidade� que a tornavam,

quase sempre, um fantasma!� (SANGIORGI, 1963, p. xiii).

Sangiorgi procurava apresentar a Matemática Moderna como uma matéria

menos traumática e mais prazerosa, onde se assemelharia às outras matérias do

currículo do Ensino Secundário no que tange ao modo de raciocinar.

O livro é dividido em quatro capítulos onde o primeiro trata das noções

básicas sobre conjuntos, número, numeral, sistemas de numeração e bases. No

13 Hoje a Companhia Editora Nacional é denominada IBEP � Instituto Brasileiro de Edições Pedagógicas. 14 As informações sobre o prêmio jabuti do livro de Osvaldo Sangiorgi se encontram no endereço eletrônico:

<http://www.cbl.org.br/modules/jabuti.php?ano=1964>

75

segundo são apresentadas as quatro operações básicas da aritmética, a

potenciação e a radiciação. No terceiro, são introduzidos os números fracionários,

bem como as operações relativas a esses números e, finalmente, no quarto

capítulo, Sangiorgi apresenta os sistemas de medidas, as figuras geométricas

planas, o cálculo de áreas, os principais sólidos e o cálculo do volume destes.

O primeiro capítulo é dividido em duas partes. A primeira parte contém os

assuntos: número, numeral, sucessão de números, estrutura de ordem e

comparação de números. A segunda apresenta os sistemas de numeração e bases,

o sistema de numeração decimal, os sistemas de numeração antigos e modernos e

experimentos sobre contagens em diversas bases.

Essa divisão mostra claramente a intenção de destinar uma parte

exclusivamente para a introdução da Teoria dos Conjuntos. Mais claro ainda fica

quando, na 11ª edição, Sangiorgi divide o capítulo em três partes, onde a primeira

trata exclusivamente dos Conjuntos, desde noções básicas até operações e

aplicações.

O título �número� traz em seu primeiro subtítulo: �Noção de conjunto�, onde

Sangiorgi apresenta diagramas semelhantes aos de Euler/Venn, porém, com

ilustrações, desenhos de crianças como elementos de um conjunto.

Esses diagramas utilizados por Sangiorgi têm uma característica peculiar,

como podemos observar na figura 13 na página 76, pois os desenhos conhecidos

como diagramas de Euler/Venn não têm um formato circular como nos mesmos

desenhos observados no livro de Farah (1961). Os desenhos utilizados no livro

didático de Sangiorgi têm um formato irregular, se assemelhando a uma mancha de

tinta.

Ao realizarmos uma crítica externa, notamos que essa característica de

desenhar diagramas de forma irregular surge na cultura escolar. Os livros sobre

Teoria dos Conjuntos de Farah (1961) e Halmos (1966) não possuem desenhos

como os do livro de Sangiorgi. Farah (1961) até utiliza os diagramas, porém, como

já citado, sem utilizar a denominação de diagrama, e utilizando círculos de mesmo

tamanho ao representar as operações com conjuntos.

76

Figura 13: Introdução aos conjuntos com utilização de diagramas no livro de Sangiorgi (1963).

Essa forma irregular dos diagramas é um elemento que surge na cultura

escolar e, em seguida, passa a se tornar matéria de formação de professores, pois

no livro de Castrucci (1967), destinado a formação de professores, também

aparecem esses diagramas de forma irregular, como na figura 14.

Figura 14: Diagramas com formato irregular no livro de Castrucci (1967).

A partir desses indícios, podemos observar que houve um processo de

disciplinarização da Teoria dos Conjuntos como parte da disciplina Matemática. A

Teoria não foi simplesmente alterada e adequada para que se ensinasse na escola

77

Secundária, mas também observamos que nos livros didáticos, essa Teoria possui

elementos próprios da cultura escolar.

A definição que Sangiorgi traz para o conceito primitivo que é o conjunto é a

seguinte: �Toda coleção de objetos constitui um conjunto.� (SANGIORGI, 1963, p.5).

Em seguida Sangiorgi define sutilmente o conceito de pertinência, apresenta com

ilustrações de estrelas, flores e pássaros os conjuntos unitário, vazio e infinitos.

Esses indícios levam a crer que Sangiorgi tenha se inspirado em alguns

elementos das obras de Halmos (1970), Farah (1961), analisadas anteriormente,

quando define conjunto, elemento, bem como a relação de pertinência, que apesar

do rigor na apresentação da Teoria, utilizam exemplos concretos. Mas Sangiorgi ao

se inspirar nessas obras, realizou uma apropriação, onde a cultura escolar foi

observada, não impondo o conteúdo vindo do Ensino Superior, mas se apropriando

dele e incluindo as características de seu próprio âmbito cultural.

Ainda na primeira parte desse capítulo inicial, Sangiorgi apresenta as

operações com conjuntos iniciando com a explicação dos Diagramas de Euler/Venn

e a partir de então, passa a utilizar círculos em substituição às formas irregulares de

diagramas citadas anteriormente. Essas operações com conjuntos só aparecem na

11ª edição, que possui a primeira parte do capítulo 1 destinada aos conjuntos.

Em ambas as edições analisadas, o autor utiliza a comparação entre

conjuntos, definindo número como uma idéia e preparando o leitor para o título

seguinte: �numeral�, onde distingue os dois conceitos, enfatizando que �número é

uma idéia, numeral é qualquer símbolo ou nome que usamos para exprimir o

número, e portanto, a idéia que ele representa.� (SANGIORGI, 1963, p.15, grifos do

autor).

O rigor começa a surgir em uma nota onde o autor destaca: �Você pode

escrever, apagar, pintar, desenhar ou falar alto somente os numerais e nunca os

números!� (SANGIORGI, 1963, p.16). E para institucionalizar essa advertência, que

inclusive é feita em um quadro destacado do texto, Sangiorgi apresenta

�curiosidades� sobre os numerais onde coloca situações das quais

matematicamente são equívocos, mas artisticamente seriam corretas.

Exemplificando, podemos citar uma delas, onde é pedido que o aluno mostre que a

metade de 8 é 3. Ele segue dizendo que é muito fácil e mostra o desenho do

algarismo indu-arábico 8, que em seguida é dividido com uma linha vertical, fazendo

78

assim com que o símbolo resultante se pareça com o algarismo 3, conforme a figura

15.

Figura 15: Números e numerais no livro de Sangiorgi (1963).

Na 11ª edição, o rigor matemático fica muito mais evidente que na 1ª edição,

pois Sangiorgi, ao apresentar o Conjunto dos Números Naturais, realiza uma

introdução utilizando o conceito de função. O título �Correspondência biunívoca,

conjuntos equipotentes� apresenta o conceito de função e volta a utilizar diagramas

irregulares, porém agora com as flechas, sendo este mais um elemento

característico da cultura escolar.

Esses �Diagramas de flechas� aparentam ser utilizados para que o leitor

tenha uma melhor visualização da correspondência biunívoca, idéia esta que

permeia o conceito de função.

Ainda nessa edição, na 2ª parte do capítulo 1, são apresentadas proriedades

estruturais dos conjuntos equipotentes, sendo elas: reflexiva, simétrica e transitiva.

Essas propriedades aproximam o livro didático de Sangiorgi aos livros sobre a

Teoria dos Conjuntos analisados anteriormente, onde notamos que, no processo de

79

disciplinarização dessa Teoria, muitos de seus elementos não foram inseridos na

primeira edição do livro didático, entretanto em edições posteriores, como na 11ª, já

surgem esses conceitos e propriedades.

No título �Sucessão de números e estrutura de ordem� da 1ª edição,

Sangiorgi apresenta a sucessão de números naturais, tomando sempre o cuidado

de atribuir aos símbolos a denominação de numeral, sendo essa sucessão

denominada primeira estrutura. Para estabelecer essa estrutura, o autor utiliza o

símbolo de menor ( ) separando os números da seguinte forma:

1 2 3 4 5 6 7 8 9 .....

Em seguida explica o significado do símbolo de menor ( ) e de seu

simétrico, o símbolo de maior ( ).

Ainda constando desse título, é apresentada a sucessão dos números

inteiros, onde simplesmente é acrescido à sucessão dos números naturais, o

número zero, definido pelo autor como a representação da idéia de vazio.

Finalizando a primeira parte do capítulo 1, são definidas as relações de

igualdade, desigualdade e de ordem geral, com seus respectivos símbolos. Essas

definições se encontram no título �comparação de números�. Nessas relações,

Sangiorgi utiliza exemplos com �numerais� representados pelos símbolos numéricos

e por letras, introduzindo a idéia de incógnita: �Indicando pelo numeral a (que pode

ser qualquer dos símbolos já conhecidos) o número de elementos do primeiro

conjunto e por b o número de elementos do segundo conjunto [...] (SANGIORGI,

1963, p.19, grifo nosso).

A figura 16, na página 80, apresenta os símbolos das relações, utilizados por

Sangiorgi.

O primeiro capítulo ainda contém uma segunda parte que apresenta os

Sistemas de Numeração com suas respectivas bases e os sistemas, pelo autor

denominados antigos e modernos.

Na introdução do Sistema de Numeração Decimal, Sangiorgi se preocupa

principalmente em estabelecer que o sistema assim é chamado por ter a base dez e

também enfatiza o fato de que os algarismos utilizados são os numerais hindu-

arábicos. Somente em seguida ele apresenta as classes e as ordens que organizam

esse sistema.

80

Figura 16: Símbolos das relações no livro de Sangiorgi (1968).

Para apresentar o �Princípio da Posição Decimal�, o autor destaca: �Todo

algarismo escrito à esquerda de outro representa unidades dez vezes maiores que

as desse outro.� (SANGIORGI, 1963, p.26). Procurando assim, ao que tudo indica,

preparar os alunos para a compreensão da escrita dos numerais, que obedece esse

sistema posicional.

Vale destacar que os exercícios de fixação dessa parte do Sistema de

Numeração Decimal voltam a relacionar os Conjuntos com a teoria que está sendo

apresentada, porém, apenas no primeiro exercício. Essa utilização dos conjuntos,

que pode ser observada na figura 17 na página 81, parece uma questão de

obrigatoriedade da inserção de problemas contendo a idéia de Conjunto, mesmo

que ficando fora de contexto e propósito.

81

Figura 17: Exercícios sobre sistema de numeração no livro de Sangiorgi (1963).

Na continuação dessa parte do primeiro capítulo, Sangiorgi apresenta os

sistemas de numeração egípcio, babilônio e romano como antigos e os sistemas

82

quinário (base cinco) e o binário (base dois) enfatizando neste o seu emprego

moderno dos computadores eletrônicos. (SANGIORGI, 1963, p.32).

Essa parte final do capítulo 1 já nos dá uma amostra de que a ênfase

pregada pelo Movimento de Matemática Moderna pelo uso da Teoria dos Conjuntos

como linguagem para todo o Ensino Secundário não acontece fielmente. Os

sistemas de numeração antigos e modernos apresentados por Sangiorgi

mencionam a Teoria dos Conjuntos modestamente nos exercícios de fixação com

poucos problemas envolvendo conjuntos de pontos para que sejam estabelecidas

bases para suas contagens, sem utilizar a Teoria dos Conjuntos como linguagem,

mas como inserção artificial.

O segundo capítulo retorna à utilização enfática da Teoria dos Conjuntos.

Esse capítulo tem como objetivo apresentar as operações aritméticas, desde Adição

até Radiciação. Paralelamente à operação Adição, o autor estabelece a operação

de conjuntos União. Já na multiplicação, Sangiorgi não tenta fazer a mesma

analogia feita com a adição, pois a multiplicação, que poderia ser comparada com a

intersecção, não tem sua analogia estabelecida.

A figura 18 na página 83 apresenta a analogia entre as operações União de

conjuntos e Adição, referidas anteriormente, e a figura 19 na página 84 apresenta a

introdução à multiplicação, onde não aparece analogia com operações entre

conjuntos.

As operações também trazem as estruturas algébricas em sua apresentação,

definindo suas propriedades comutativas, associativas, distributivas, o elemento

neutro e o inverso operacional, características do MMM.

83

Figura 18: Adição e subtração representadas por conjuntos no livro de Sangiorgi (1963).

84

Figura 19: Multiplicação e divisão no livro de Sangiorgi (1963).

85

A parte final desse capítulo inicia em questões de divisibilidade e finaliza no

desenvolvimento dos algoritmos do m.d.c. e m.m.c. onde são apresentados os

símbolos �, , . e � para que fossem utilizados na definição de divisibilidade.

Na parte final, sobre m.m.c. e m.d.c. a operação intersecção é sutilmente

apresentada, juntamente com seu símbolo para a fundamentação dessas

operações. Somente no final do capítulo, são apresentadas as técnicas de

resolução, ou algoritmos do m.m.c. e m.d.c. procurando assim dar pouca

importância ao, já citado na introdução do livro, �exagero de cálculos�.

O terceiro capítulo dedica-se exclusivamente ao tratamento dos números

fracionários e decimais. Para que não sejamos radicais em dizer que não há Teoria

dos Conjuntos em momento algum deste capítulo, observamos que Sangiorgi utiliza

uma terminologia própria da Teoria para definir número fracionário: �Número

fracionário é um par ordenado de números inteiros, com o segundo diferente de

zero� (SANGIORGI, 1963, p.168).

Também é notável a diferenciação entre número e numeral, que o autor

mantém desde o primeiro capítulo e novamente a faz quando fala das frações

equivalentes e das diferentes formas de representação de um número fracionário ou

de uma divisão entre dois números inteiros.

As operações com frações são apresentadas seguidas de suas propriedades

estruturais, com ênfase na linguagem formal e somente depois ele apresenta a

técnica de cálculo da adição e subtração. A multiplicação e divisão de frações

seguem o mesmo padrão da adição e subtração, ênfase nas propriedades

estruturais e finalizando com técnicas de resolução.

Em um lembrete nesse capítulo, Sangiorgi volta a utilizar a terminologia de

conjunto para falar sobre a divisão:

Enquanto que a divisão com os números inteiros só era possível quando o dividendo fosse múltiplo do divisor, agora, com os números

fracionários, a divisão é sempre possível (desde que o divisor seja diferente de zero). Então o conjunto dos números fracionários é �mais amplo� que o

conjunto dos números inteiros (recorde-se que o número inteiro é um

número fracionário de denominador 1) e como tal possibilita �ampliar� as

operações. O conjunto de todos os números inteiros e fracionários recebe uma

única denominação de CONJUNTO DOS NÚMEROS RACIONAIS, que você estudará mais tarde. (SANGIORGI, 1963, p.199, itálicos do autor,

negritos nossos)

86

Ainda nesse mesmo capítulo, o autor apresenta alguns conceitos sobre

números decimais, como as operações com essa representação de números e

também traz a maneira de converter uma dízima periódica em fração.

Essa parte do capítulo não tem, em nenhum momento, conceitos ou

linguagem da Teoria dos Conjuntos, tendo apenas a apresentação de frações

decimais como números decimais, propriedades e operações com números

decimais, enfatizando sempre a conexão entre número decimal e fração decimal.

Novamente Sangiorgi apresenta um �Lembrete amigo� que demonstra essa ênfase:

Os �números decimais� não constituem uma nova categoria de números;

eles são as frações decimais escritas de outra maneira. Portanto: 25/100; 0,25; ¼ são numerais diferentes do MESMO NÚMERO

FRACIONÁRIO!! (SANGIORGI, 1963, p.216)

Essa parte final do capítulo 3 enfatiza as técnicas e algoritmos de resolução

das operações com números decimais e da conversão de dízimas periódicas em

frações geratrizes, contrastando fortemente com o prefácio do próprio livro, onde

Sangiorgi rechaça o �exagêro de cálculos� que deveriam ser exclusividade da

realização dos �fabulosos computadores electrônicos de que tanto falam os jornais�

(SANGIORGI, 1963, p. xiii).

O quarto capítulo, que é o último, se dedica às medidas, tanto no sistema

métrico decimal, quanto em sistemas não decimais. Novamente é notável a

ausência da linguagem da Teoria dos Conjuntos em praticamente todo o capítulo.

O início do capítulo apresenta como título: �Sistemas de medidas usuais�,

onde explora muito sutilmente a linguagem dos conjuntos ao destacar a diferença

entre medidas de quantidades discretas e de quantidades contínuas. Também,

nesse início há alguns indícios de estruturas algébricas, quando o autor explicita

�Operação: medir; resultado: medida (número)� em um subtítulo.

Na segunda parte desse capítulo, o autor apresenta o sistema métrico

decimal, e explora o cálculo de perímetro e área de figuras planas como os

polígonos e circunferência. Também apresenta as medidas de volume no sistema

métrico e de capacidade como o litro, estabelecendo a relação existente entre

ambos. Em seguida apresenta-se o cálculo de volume de prismas, pirâmides,

cones, cilindros e esferas.

A parte final desse capítulo se destina aos sistemas de medidas não-

decimais, como o S. I. M. (Sistema Inglês de Medidas) com suas medidas em

87

jardas, pés, entre outros e os sistemas para medição de tempo e ângulos. As

operações com essas medidas não-decimais são apresentadas ainda nessa parte

do capítulo com a mesma ênfase algorítmica do capítulo anterior e finaliza com uma

tabela de �Prefixos dos múltiplos e submúltiplos decimais das unidades

internacionais de medida� (SANGIORGI, 1963, p.327).

88

4.2. MATEMÁTICA: CURSO MODERNO � VOLUME 4

O exemplar do quarto volume da coleção �Matemática: Curso Moderno� data

de 1967 e não apresenta número de edição, o que nos leva a crer que deve ter sido

uma das primeiras edições desse volume, senão a primeira, pois o lançamento das

obras foi gradativo, e como o primeiro volume foi editado em 1963 para utilização

em 1964, entendemos que 1967 foi o quarto ano de uso dessa coleção e portanto

seria conveniente o lançamento do quarto volume.

Outro indício de que essa obra seja a primeira edição é a �Palavra ao

estudante�, onde Osvaldo Sangiorgi parabeniza os estudantes que eram os

primeiros a completarem o curso ginasial:

Ao final deste volume, você ficará de posse dos assuntos de Matemática

relativos aos quatro anos de estudos do Ginásio. E não se esqueça:

você estará incluído no primeiro grupo de jovens brasileiros que

completa seu curso ginasial conhecendo as belas estruturas da Matemática Moderna, a exemplo do que vem ocorrendo nos grandes países civilizados de nossa época. (SANGIORGI, 1967, grifos nosso e

itálicos do autor)

Ainda nesse prefácio, Sangiorgi novamente enfatiza o objetivo da unificação

das diferentes áreas da Matemática através da Matemática Moderna com a

introdução da Geometria Analítica no Ensino Secundário:

Haverá um �introito� à Geometria Analítica, principal responsável pela

primeira tentativa da unidade da Matemática, desde o tempo de Descartes. [...] (SANGIORGI, 1967, grifo nosso)

A escolha de análise deste volume se deu em função de alguns elementos da

Teorias dos Conjuntos que encontramos apresentados para os alunos da 4ª série

do ginásio15 que reforçam a hipótese de que alguns elementos apresentados na

Teoria dos Conjuntos nos livros didáticos do MMM não são provenientes

exclusivamente do desenvolvimento científico do saber e do Ensino Superior, mas

surgem da própria cultura escolar.

O conteúdo que consta nesse volume inicia com um primeiro capítulo

tratando dos números reais, dividido em três partes:

1ª Parte - Técnicas operatórias com números irracionais (radicais); 2ª

Parte � Equações do segundo grau; relações entre os coeficientes e as

raízes; 3ª Parte � Equações biquadradas; equações irracionais. � Sistemas simples do segundo grau. � Problemas do segundo grau (SANGIORGI, 1967, p. 2).

15 Equivalente à atual 8ª série do Ensino Fundamental.

89

A primeira parte objetiva capacitar o aluno a realizar operações com números

irracionais, trazendo propriedades e operações com radicais. Na segunda e terceira

partes, Sangiorgi apresenta o estudo das equações segundo grau. Esse estudo é

apresentado de uma forma que consideramos tradicional, no sentido de que

apresenta definições e em seguida, técnicas de resolução das equações, contendo

também a demonstração da fórmula resolutiva, porém não dando ênfase na prática

dessa demonstração. Em seguida são apresentados exercícios e problemas

envolvendo as equações.

O segundo capítulo, cujo título é: �Funções� é aquele que possui os

elementos da Teoria dos Conjuntos citados anteriormente.

Assim como no primeiro volume da coleção de Osvaldo Sangiorgi, aparecem

os diagramas semelhantes aos de Euler/Venn, porém, com a mesma característica

observada anteriormente, os diagramas, que nem são chamados de diagramas pelo

autor, são desenhados de maneira irregular e, agora com a introdução do assunto

que trata das funções, eles aparecem com algumas flechas desenhadas,

representando, assim, a função.

Existe uma ênfase tão grande nesses diagramas, que eles aparecem na

primeira página do livro, na primeira página que referencia o início do capítulo de

funções e até mesmo sobre o texto que inicia o capítulo como mostram as figuras

20, 21 e 22.

90

Figura 20: Diagramas representando função na contracapa do livro de Sangiorgi (1967).

Figura 21: Diagramas representando função no início do capítulo 2 do livro de Sangiorgi (1967).

91

Figura 22: Diagramas representando função no capítulo 2 do livro de Sangiorgi (1967).

92

Esse segundo capítulo do livro dedica-se exclusivamente às funções, desde

seus conceitos gerais como domínio e imagem, sistemas de coordenadas e

gráficos, até casos específicos como funções lineares e funções do trinômio do

segundo grau.

Sangiorgi utiliza uma abordagem no início do estudo que o seu livro propõe

sobre função e, como ele mesmo ressalta também chamada de aplicação ou

transformação. Essa abordagem mostra a função como a designação de �uma

relação especial entre dois conjuntos, mediante certa correspondência entre os seus

elementos.� (SANGIORGI, 1967, p. 67).

O primeiro exemplo de função que é apresentado é o da relação onde os

elementos do primeiro conjunto são denominados x e os elementos do segundo

conjunto 2x, que também podem ser observados na figura 22.

O segundo exemplo já traz uma idéia que se assemelha ao livro de Halmos

(1970), que utiliza um exemplo para função onde a relação estabelecida é entre os

habitantes de uma cidade e seus endereços. Sangiorgi exemplifica de uma forma

também pragmática, denominando o primeiro conjunto (A) da função como de

crianças e o segundo conjunto (B) como de homens e a relação que ele propõe

entre esses conjuntos é a de que cada criança deve ser associada ao seu pai.

Seguindo novamente com os diagramas irregulares, o autor mostra e em seguida

conclui que a relação proposta também é uma função, pois �a cada elemento

(criança) do conjunto A está associado um único elemento (pai) do conjunto B�

(SANGIORGI, 1967, p. 68, grifos do autor).

Essa primeira parte do capítulo 2, que se dedica a introduzir os conceitos

sobre funções, dá uma forte ênfase nos desenhos semelhantes aos diagramas com

as flechas, que ele inicia na página 64 e termina na página 84 e dessas 21 páginas,

apenas quatro não possuem desenhos de diagramas irregulares com flechas. Ainda

dessas quatro páginas que não contém esses diagramas, duas contém exercícios

que, por sua vez, solicitam que se desenhem diagramas para representar a função

dada.

Segundo Chervel (1990), os conteúdos ora ensinados apenas no Ensino

Superior, sofrem resistências e tensões para que possam ser ensinados no âmbito

da cultura escolar. Essas resistências podem gerar elementos dentro dos

conteúdos, que não fazem parte desses e, portanto, surgiram na cultura escolar, no

93

processo de disciplinarização desses conteúdos para a constituição da disciplina

escolar: Matemática.

Podemos observar que, nos livros de autoria de Osvaldo Sangiorgi,

presidente do GEEM e principal precursor do MMM no Brasil, surgem novos

elementos na Teoria dos Conjuntos, como podemos observar nesse segundo

capítulo que contém esses desenhos semelhantes aos diagramas de Euler/Venn,

porém da mesma forma irregular que encontramos no primeiro volume e agora, para

representar funções, utilizando flechas. Esses diagramas não aparecem nos livros

analisados, que tratam da Teoria dos Conjuntos e destinados ao Ensino Superior.

O único livro sobre Teoria dos Conjuntos, que analisamos e contém

diagramas semelhantes aos dos livros de Sangiorgi (1963) é o livro de Castrucci

(1967), porém por fazer parte do GEEM, Castrucci (1967) pode ter sido influenciado

por esses elementos que surgiram na cultura escolar.

Caracteriza-se, portanto, uma dinâmica onde os conteúdos não somente

partem do Ensino Superior e são inseridos na cultura escolar, mas também torna

possível o caminho inverso. Esses elementos que surgem na cultura escolar, que

podem ter sido uma forma que professores, e até mesmo o autor do livro didático

encontrou para facilitar a compreensão por parte dos alunos sobre o conteúdo,

podem aparecer posteriormente em livros sobre o conteúdo, mostrando assim que o

conteúdo não se desenvolve apenas no meio do saber científico, mas também, na

cultura escolar.

O terceiro e último capítulo do quarto volume do livro de Osvaldo Sangiorgi

dedica-se a um estudo sobre Geometria. Esse estudo inicia com a razão e

proporção de segmentos, que introduz o Teorema de Tales no feixe de paralelas.

Na segunda parte há um estudo de semelhança de triângulos e polígonos, seguidos

das razões trigonométricas de ângulos agudos. A terceira parte é dedicada ao

estudo das relações métricas nos triângulos retângulos e em triângulos quaisquer,

introduzindo assim, o Teorema de Pitágoras. A quarta parte trata dos polígonos

regulares e das relações métricas nestes, bem como a medida da circunferência e o

cálculo do .

A expectativa de que o MMM tivesse elementos através da Teoria dos

Conjuntos, que unificassem a disciplina Matemática não se observa nesse volume.

A Teoria dos Conjuntos é reservada ao capítulo destinado às funções, que só são

lembradas no último capítulo num pequeno trecho que intenta associar função ao

94

estudo das relações métricas nos triângulos, especialmente na parte que trata das

projeções ortogonais.

Figura 23: Diagramas associados à geometria no livro de Sangiorgi (1967).

95

CONSIDERAÇÕES FINAIS

96

A partir da análise dos livros didáticos realizada no capítulo 4,

apresentaremos algumas considerações a respeito do estudo abordado em nossa

pesquisa.

No capítulo 2, onde foi apresentada uma caracterização do Movimento da

Matemática Moderna no Brasil e também a Teoria dos Conjuntos nesse movimento,

observamos uma falta de ênfase no conteúdo Teoria dos Conjuntos. Nos poucos

trechos que encontramos relatos sobre a Teoria, ela é apresentada como um

conteúdo que deveria ter sido utilizado como a linguagem que unificaria a disciplina

Matemática para todo o ensino Secundário.

A falta de ênfase dos estudos anteriores sobre a Teoria dos Conjuntos no

MMM nos levou a procurar entender como esse conteúdo, que anteriormente não

era tema do Ensino Secundário, se tornou parte do currículo de Matemática sendo

inserido nos livros didáticos. Para que tivéssemos essa compreensão,

apresentamos, no capítulo 3, três livros que tratavam da Teoria dos Conjuntos e

eram, na época do MMM, livros destinados à formação superior em Matemática e

na formação e aperfeiçoamento de professores atuantes no Ensino Secundário.

O primeiro ponto que destacamos em nossa análise dos livros didáticos de

Osvaldo Sangiorgi é a inserção da Teoria dos Conjuntos de uma forma diferente da

que se propunha no ideário do MMM, onde a mesma seria utilizada como

linguagem. Nos livros de Osvaldo Sangiorgi, essa Teoria aparece mais como um

capítulo isolado do que como uma linguagem unificadora dos ramos da Matemática.

No primeiro volume da coleção de Sangiorgi, observamos que houve

modificações entre a primeira e a 11ª edições, publicadas respectivamente em 1963

e 1968, porém, essas modificações não alteraram a essência do que consideramos

como um isolamento da Teoria dos Conjuntos. Em ambas as edições, a Teoria se

concentra no primeiro capítulo, sendo mais explorada na 11ª edição, porém nos

capítulos seguintes ela aparece de maneira tímida, sem ênfase, ou nem aparece.

O mesmo acontece no quarto volume dessa mesma coleção didática. O

volume analisado é dividido em três capítulos. Um destinado ao estudo das

equações dos segundo grau, outro destinado à uma introdução do estudo de

funções e alguns tipos de funções e o último destinado ao estudo da geometria

através da semelhança de figuras e terminando com uma ênfase na trigonometria.

Quando dizemos que o mesmo acontece nesse volume, nos referimos ao

isolamento da Teoria os Conjuntos em apenas um capítulo, que é o que trata das

97

funções. A ênfase dada à Teoria dos Conjuntos é tanta que destoa dos outros dois

capítulos, parecendo que se inicia a leitura de outro livro, diferente daquele que se

estava lendo inicialmente. Ao chegar ao final da leitura do livro, parece que voltamos

a ler o livro anterior, o do primeiro capítulo.

Essas considerações fortalecem a idéia de que a Teoria dos Conjuntos não

foi utilizada como linguagem para o Ensino Secundário, como era proposto, mas foi

utilizada como capítulo isolado nos livros didáticos dessa coleção de Sangiorgi.

A inserção da Teoria dos Conjuntos nos livros didáticos não se deu apenas

com uma absorção que o autor fez da Teoria como era apresentada no Ensino

Superior, a adequando ao Ensino Secundário, mas a própria cultura escolar

influenciou nessa inserção. Essa influência da cultura escolar é observada em

nossa pesquisa em dois tópicos: o uso de diagramas irregulares e diferentes dos

diagramas de Euler/Venn e o uso de uma representação figural para a apresentação

do conceito de função, onde Sangiorgi (1963) utiliza diagramas semelhantes aos de

Euler/Venn, porém, com algumas flechas que servem para representar a função.

A primeira situação foi observada no primeiro volume da coleção didática de

Sangiorgi, onde ele utiliza figuras semelhantes aos diagramas de Euler/Venn, porém

sem assim nomeá-los. Esses diagramas irregulares usados por Sangiorgi (1963)

são elementos que não encontramos nos livros sobre a Teoria dos Conjuntos para o

Ensino Superior. Esse indício nos leva a crer que esses elementos, como os

diagramas irregulares, são �criação� da cultura escolar. Essa �criação� da cultura

escolar até mesmo influenciou autores de livros destinados a professores, como

observamos o livro de Castrucci (1967) que contém esses mesmos diagramas

utilizados por Sangiorgi (1963).

Outros elementos também encontrados na coleção de Sangiorgi (1967), no

quarto volume, foram os diagramas que exemplificavam o conceito de função.

Esses diagramas eram desenhados com flechas que representavam a relação entre

os elementos dos conjuntos, esses, por sua vez, representados por diagramas. Os

diagramas com flechas também não foram encontrados nos livros sobre a Teoria

dos Conjuntos para o Ensino Superior e para a formação dos professores, sendo

este outro indício de que existem elementos que não são provenientes do Ensino

Superior, mas têm sua origem na própria cultura escolar.

Nossa pesquisa tinha como foco uma análise de como foi inserida a Teoria

dos Conjuntos nos livros didáticos de Osvaldo Sangiorgi no Movimento da

98

Matemática moderna no Brasil. Nessa análise concluímos que nem todos os

conteúdos dessa teoria que fazem parte dos livros didáticos e, portanto do currículo

escolar, são provenientes de uma absorção e adequação de conteúdos ora

ensinados no Ensino Superior, mas também têm sua criação própria da cultura

escolar.

Em nossa investigação existem algumas questões que suscitam novas

pesquisas, como: Porquê determinados conteúdos são rechaçados e praticamente

banidos do currículo? Que influências um Movimento internacional pode ter sobre

uma renovação curricular? Como os livros didáticos podem influenciar na

propagação de um ideário e de que maneira são absorvidas essas idéias pelos

autores dos livros? Estas questões são formuladas a partir de nossa reflexão sobre

o que aconteceu com os conteúdos relativos à Teoria dos Conjuntos: alguns pontos

aqui levantados nos provocam novos questionamentos ainda sobre a Teoria dos

Conjuntos e, de forma mais abrangente, com outros conteúdos da Matemática.

O objetivo de uma pesquisa em História da Educação Matemática deve ser,

como foi o nosso, de construir fatos históricos a partir das heranças deixadas pelo

passado, sem nos colocarmos na postura de juízes de valores, dizendo que

determinada atitude tomada foi fracassada ou sucedida, mas levantando

informações, procurando, da forma mais fiel possível, construir a História dos

acontecimentos e suas conseqüências.

99

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104

ANEXOS

105

ANEXO I

Capa do livro �Teoria Ingênua dos Conjuntos� de Paul R. Halmos.

106

ANEXO II

Contracapa do livro �Teoria Ingênua dos Conjuntos� de Paul R. Halmos.

107

ANEXO III

Capa do livro �Teoria dos Conjuntos� de Edison Farah.

108

ANEXO IV

Capa do livro �Elementos de Teoria dos Conjuntos� de Benedito Castrucci.

109

ANEXO V

Contracapa do livro �Elementos de Teoria dos Conjuntos� de Benedito

Castrucci.

110

ANEXO VI

Exercícios sobre operações com conjuntos do livro �Elementos de Teoria dos

Conjuntos� de Benedito Castrucci.

111

ANEXO VII

Exercícios sobre operações com conjuntos do livro �Elementos de Teoria dos

Conjuntos� de Benedito Castrucci.

112

ANEXO VIII

Exercícios sobre operações com conjuntos do livro �Elementos de Teoria dos

Conjuntos� de Benedito Castrucci.

113

ANEXO IX

Introdução à comparação de números do livro �Matemática: Curso Moderno

para os Cursos Ginasiais � Volume 1� de Osvaldo Sangiorgi.

114

ANEXO X

Introdução à comparação de números do livro �Matemática: Curso Moderno

para os Cursos Ginasiais � Volume 1� de Osvaldo Sangiorgi.