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Pontifícia Universidade Católica do Paraná Ney Queiroz de Azevedo Sociedade da Informação: Os Limites Jurídicos da Publicidade no Brasil à Luz do Código de Defesa do Consumidor DISSERTAÇÃO DE MESTRADO CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS Programa de Pós-Graduação em Direito Curitiba, Janeiro de 2007

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Pontifícia Universidade Católica do Paraná

Ney Queiroz de Azevedo

Sociedade da Informação:

Os Limites Jurídicos da Publicidade no Brasil

à Luz do Código de Defesa do Consumidor

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS

Programa de Pós-Graduação em Direito

Curitiba, Janeiro de 2007

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Pontifícia Universidade Católica do Paraná

Ney Queiroz de Azevedo

Sociedade da Informação:

Os Limites Jurídicos da Publicidade no Brasil à Luz do

Código de Defesa do Consumidor

Dissertação de Mestrado

Dissertação apresentada ao Programa de

Pós-graduação em Direito da PUC-PR como

requisito parcial para obtenção do título de

Mestre em Direito.

Orientador: Doutor Antônio Carlos Efing

Curitiba

Janeiro de 2007

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TERMO DE APROVAÇÃO

SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO: OS LIMITES JURÍDICOS DA PUBLICIDADE NO BRASIL À LUZ DO CDC

Por

Ney Queiroz de Azevedo

DISSERTAÇÃO APROVADA COMO REQUISITO PARCIAL PARA A OBTENÇÃO DO TÍTULO DE MESTRE EM DIREITO, CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS DA PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ, PELA COMISSÃO FORMADA PELOS PROFESSORES. ORIENTADOR:________________________________________ Prof. Dr. Antônio Carlos Efing ________________________________________ Prof. Roberto Senise Lisboa ________________________________________ Profa. Fabiane Bueno Bessa CURITIBA, ______ de _______________________ de 2007.

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Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do trabalho sem autorização da universidade, do autor e do orientador.

Ney Queiroz de Azevedo

Graduado em Direito e em Comunicação Social / Jornalismo. É advogado com foco de atuação e pesquisa na área do Direito da Comunicação, da Publicidade e do Consumidor. Membro da Comissão de Direito do Consumidor da OAB/PR. Membro da Banca de Correção do Exame da OAB/PR. Professor da Escola Superior da Advocacia – ESA/PR (2006). Professor convidado da ABDCONST (2006). Diretor jurídico-administrativo de grupo empresarial do setor de comunicação e mídia.

Azevedo, Ney Queiroz de A994m Sociedade da Informação : os limites jurídicos da publicidade no Brasil à luz do 2007 Código de Defesa do Consumidor / Ney Queiroz de Azevedo ; orientador, Antônio Carlos Efing. – 2007. 117 f. : il. ; 30 cm Dissertação (mestrado) – Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, 2007 Inclui bibliografia 1. Publicidade - Legislação. 2. Marketing – Legislação. 3. Jornalismo. 4. Merchandising. 5. Defesa do consumidor. I. Efing, Antônio Carlos. II. Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Programa de Pós-Graduação em Direito. III. Título. Dóris 4. ed. – 342.277

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À minha mãe, fonte de eterna motivação, com muita saudade.

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Agradecimentos

Agradeço à minha esposa Hanna. Aos meus filhos Leonardo, Henrique e Marina, que um dia compreenderão as doses de sacrifício despendidas para a realização desse sonho. Ao meu professor orientador Dr. Antônio Carlos Efing, que acreditou desde o início na viabilidade do projeto; pelo exemplo e pela sábia orientação. Ao meu pai, pelo apoio.

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Resumo

Queiroz Azevedo, Ney. Sociedade da Informação: os limites jurídicos da

publicidade no Brasil à luz do Código de Defesa do Consumidor. Curitiba,

2007. 115 p. Dissertação de Mestrado – Programa de Pós-Graduação em Direito

da Pontifícia Universidade Católica do Paraná.

O marketing apresenta-se como ferramenta de grande relevância ao meio

empresarial, especialmente na sociedade de consumo regida pelo sistema

capitalista. Percebe-se que seus instrumentos, dentre eles a publicidade, mais do

que “tornar público” o produto ou serviço divulgado, possuem o papel de

persuadir, de convencer o público em favor dos objetivos a que se propõem. A

utilização de ferramentas de convencimento e persuasão, —permeados pelo forte

poder criativo do mercado publicitário—, em busca de novos consumidores para

seus produtos e serviços, não raramente ultrapassa os limites legais da

publicidade, principalmente à luz do Código de Defesa do Consumidor.

Vinculado à Linha de Pesquisa dos Fundamentos Jurídicos da Atividade

Econômica, o presente estudo visa a estabelecer os parâmetros de equilíbrio entre

o marketing e os meios de comunicação, destacando-se a atividade empresarial

jornalística. A constante presença e influência da imprensa na sociedade pós-

moderna, na chamada “era da informação”, evidencia a necessidade de estudos

aprofundados sobre o tema. Assim, serão focados os aspectos jurídicos da

publicidade, objetivando-se demonstrar os perigos da má utilização das

ferramentas de marketing para a sociedade, principalmente através da publicidade

disfarçada de conteúdo jornalístico, bem como a necessidade de imposição de

limites jurídicos à luz do Código de Defesa do Consumidor.

Palavras-chave

Direito do consumo; direito econômico e social; direito da comunicação;

liberdade de informação; liberdade de imprensa; publicidade; marketing;

“merchandising”.

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Summary

Queiroz Azevedo, Ney – Informatino Society: the legal limits of

publicity in Brazil based on the Consumer Defense Code. Curitiba, 2007. 108

pages. Master’s Dissertation – Pontificia Universidade Catolica Law School Post-

Graduation Program.

Marketing presents itself as a highly relevant tool in the business world,

especially in the capitalism-driven consumist society. We notice that its

instruments, such as publicity, more than “make the product or service known”,

have the role to persuade and convince the public in favor of the proposed

objectives. The utilization of tools of convincement and persuasion, which are

escalated by the strong and creative power of the publicity market, in the search of

new consumers for its products and services, almost always goes beyond the legal

limits of publicity, according to the Consumer Defense Code. Linked to the

Research Line of Legal Fundaments of the Economic Activity, this study seeks to

establish parameters of balance between marketing and the means of

communication, emphasizing the journalistic activity. The constant presence and

influence of the press in the post-modern society evidences the necessity of deeper

studies regarding this subject. Thus, the legal aspects of publicity will be focused

on, objectifying on demonstrating the dangers of the wrongful utilization of

marketing tools for the society, such as publicity disguised as journalistic content,

as well as the necessity of imposition of legal limits based on the Consumer

Defense Code.

Key Words

Consumer Law; economics and social law; communications law; freedom

of information; freedom of the press; publicity; marketing; merchandising.

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Sumário

INTRODUÇÃO .................................................................................. 12 PARTE I A ERA DA INFORMAÇÃO

Capítulo 1 – A Era da Informação

A influência dos meios de comunicação na sociedade pós-moderna .................................................................................. 14 PARTE I I DO MARKETING E DA PUBLICIDADE

Capítulo 2– Informação, Marketing, Propaganda, Publ icidade e Oferta

2.1. Necessidade de fixação de conceitos................. 20

2.1.1. Informação ................................................ 20

2.1.2. Marketing ................................................... 23

2.1.3. Oferta ........................................................ 26

2.1.4. Propaganda ............................................... 28

2.1.5. Publicidade ................................................ 29

Capítulo 3– A Publicidade no Ordenamento Jurídico B rasileiro

3.1 . Disciplina constitucional.................................... 32

3.2 . Fontes legislativas infra-constitucionais.............. 34

3.3 . Auto-regulamentação ......................................... 37

Capítulo 4 – A Publicidade no Direito das Relações de Consumo

4.1 .Princípios do Direito das Relações de Consumo . 53

4.1.1. Princípio da vulnerabilidade ....................... 54

4.1.2. Princípio da informação ............................. 55

4.1.3. Princípio da boa-fé ..................................... 57

4.2 . Princípios relativos à publicidade no CDC ........ 58

4.3 . A publicidade ilícita ............................................ 60

4.3.1. A publicidade enganosa ............................ 60

4.3.2. A publicidade abusiva ............................... 62

4.3.3. O “teaser” .................................................. 63

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4.3.4. O “puffing” ................................................... 64

4.3.5. A publicidade subliminar ........................... 65

4.3.5. O “merchandising” .................................... 68

4.3.6. Testemunhais ............................................ 70

4.4 . Publicidade e tecnologia ................................... 72

PARTE III DO JORNALISMO

Capítulo 5 – Liberdade de Informação

5.1 . Sobre a liberdade................................................. 74

5.2 . Liberdade de informação e expressão ................ 75

5.3 . Liberdade de imprensa ...................................... 76

5.4 . Liberdade de imprensa no Brasil........................ 78

Capítulo 6 – Limitações à Liberdade

6.1 . Restrições à liberdade de informação ............... 82

6.2 . A questão ética e o jornalismo responsável........ 83

6.3 . Responsabilidade civil do profissional e da

empresa de comunicação......................................... 86

6.3.1. Danos morais – breves considerações ...... 87

PARTE IV MARKETING X JORNALISMO– DA NECESSIDADE DE ADEQUAÇÃO AO SISTEMA JURÍDICO

Capítulo 7 – Conflito e busca de equilíbrio

7.1. Marketing e jornalismo no Brasil ....................... 90

7.2. Da diferenciação entre a liberdade de

imprensa e a liberdade de expressão publicitária...... 92

7.3 Necessidade de adequação ao sistema jurídico. 95

CONCLUSÃO .................................................................................. 98

BIBLIOGRAFIA ................................................................................. 103

ANEXO 1 .......................................................................................... 106

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Lista de ilustrações

Figura 01 – Campanha publicitária da Volkswagen 15

Figura 02 – Anúncio da rede Mac Donald´s na Rússia 18

Figura 03 – Exemplo de outdoor com uso do “lettering” 61

Figura 04 – Primeira mensagem do “teaser” 63

Figura 05 – Segunda mensagem do “teaser” 63

Figura 06 – Anúncio com “puffing” – empada 64

Figura 07 – Anúncio com “puffing” – UOL 65

Figura 08 – Mensagem subliminar 67

Figura 09 – Mensagem subliminar 68

Figura 10 – Merchandising nas novelas 69

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“A publicidade é um dos temas mais complexos do

Direito do Consumidor. Desafia o legislador, o

aplicador e a doutrina, seja com sua relevância e

imprescindibilidade ao funcionamento do mercado

de consumo, seja com suas múltiplas facetas, um

fato jurídico em permanente transformação.

Não seria exagero dizer que o jurista, quanto mais

se aproxima do fenômeno publicitário, quanto mais

imagina conhecê-lo e dominá-lo, mais longe está de

compreender sua real dimensão e, mais do que

tudo, os riscos variados que traz para o

consumidor, como agente econômico (o bolso),

mas, principalmente, como ser humano (a

dignidade)”.

Antônio Herman Benjamin

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Introdução

A formação de uma sociedade de consumo ávida por inovações

tecnológicas e facilidades para o dia-a-dia é decorrente das transformações

ocorridas no século XX. Segundo Mtsuro Yanaze1,

“uma nova consciência alterou os padrões de vida e de consumo vigentes no decorrer do século 19 e início do século 20, que privilegiavam projeto de vida de vida de longo prazo e valorização da poupança, com vistas à acumulação de bens a serem transmitidos aos descendentes. O novo homem pós-guerra passou a valorizar mais o conforto e o gozo imediato de vida, e encontrou no progresso tecnológico e nos produtos dele decorrentes os suportes para sua realização”.

Essas alterações contribuíram para a formação de um mercado composto

por empresas preocupadas em conhecer o comportamento de seus consumidores e

dispostas a adaptar-se conforme as necessidades impostas por este mercado.

Surge, daí, o marketing, tido como o “estudo dos movimentos do mercado e

conjunto de instrumentos para alavancar e impulsionar os negócios comerciais das

empresas”2. Decorre, então, o necessário estudo dos Fundamentos Jurídicos da

Atividade Econômica, analisando-se a atividade jornalística e a crescente presença

do marketing nos meios de comunicação. Há que se destacar, nesse sentido, a

necessidade de determinação dos limites da liberdade de expressão e da liberdade

de imprensa em face das informações de cunho comercial.

Com base no estudo do Direito Econômico e Social, o presente estudo

visa a analisar as questões jurídicas do marketing e especialmente da publicidade

à luz do Código de Defesa do Consumidor. Observa-se que a publicidade não está

disposta em capítulo exclusivo na Constituição da República, mas encontram-se

variados dispositivos direta ou indiretamente a ela relacionados. Primeiramente,

deve-se destacar o artigo 5º, IX, que determina: “É livre a expressão da atividade

intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura

ou licença”. O capítulo V, do artigo 220 ao 224, apresenta as diretrizes

constitucionais da Comunicação Social, determinando, inclusive, a criação de lei

federal para o atendimento ao disposto no inciso II do parágrafo 3º do artigo 220 e

1 YANAZE, Mitsuro Higuchi.. Líbero – Revista Acadêmica de Pós-Graduação da Faculdade de Comunicação Social Cásper Líbero, São Paulo, v. 3, n. 5, p. 88. 2 Ibid., p.88.

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do parágrafo 4º, já definida na criação da Lei 9.294/96. Ainda o artigo 22, inciso

XXIX, estabelece que compete à União legislar sobre “propaganda comercial”.

Entre os principais fundamentos do Direito das Relações de Consumo,

destaca-se o reconhecimento da vulnerabilidade. Trata-se, na verdade, da essência

da criação de um sistema de proteção do consumidor em face de sua condição. É a

vulnerabilidade que traduz a importância da regulamentação da publicidade no

sistema das relações de consumo, principalmente em vista do seu impacto e

repercussões que vem gerar na sociedade.

Assim, o presente estudo visa a estabelecer os parâmetros de equilíbrio

entre o marketing e os meios de comunicação, destacando-se a atividade

empresarial jornalística. A constante presença e influência da imprensa na

sociedade pós-moderna, na chamada “era da informação”, evidencia a necessidade

de estudos aprofundados sobre o tema. Assim, serão focados os aspectos jurídicos

da publicidade, objetivando-se demonstrar os perigos da má utilização das

ferramentas de marketing para a sociedade, principalmente através da publicidade

disfarçada de conteúdo jornalístico, bem como a necessidade de imposição de

limites jurídicos à luz do Código de Defesa do Consumidor.

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Parte I – A Era da Informação

Capítulo 1

A influência dos meios de comunicação na era pós-

moderna

“Nos arredores do Cairo, a uns cem metros da Esfinge de Gizé, ostensivamente instalado defronte a ela e já fazendo parte integrante do lugar, um restaurante da cadeia Pizza Hut monta guarda, com seu logotipo vermelho piramidóide voltado para os tetraedros funerários de Quéops, Quéfren e Miquerinos. Desta forma, dois guarda-comidas se encaram, um pela eternidade, o outro pelos trinta minutos seguintes”5.

Esse face a face citado pelo filósofo francês Dominique Quessada ilustra

uma realidade que se faz presente nos mais diversos locais do planeta no início do

século XXI. A chamada “Era da Informação” caracteriza-se pela presença cada

vez mais constante da comunicação, em todas as suas formas, no cotidiano da

sociedade pós-moderna.

A expansão de empresas e produtos, em escala mundial, encontra sintonia

no avanço da globalização. E repercute, conseqüentemente, na expansão, em igual

escala, dos grandes grupos de comunicação e agências de publicidade.

Segundo Quessada6,

“o nascimento e o crescimento desses impérios mundiais da comunicação foram acompanhados pela exploração e pela sistematização de um conceito: o de globalização, inventado nos Estados Unidos por Theodor Levitt, um professor de Harvard, diretor da Harvard Business Review. Este afirmava então, com um entusiasmo inquietante (e uma relativa insensibilidade à complexidade dos fenômenos), que as diferenças de culturas, de gostos nacionais, de ambiente institucional dos negócios são vestígios do passado. Algumas heranças morrem gradualmente, outras prosperam e se estendem porque constituem as preferências do maior número. Os mercados étnicos são um bom exemplo disso: a pizza e o jazz estão hoje em toda parte. São segmentos de mercado que existem sobre bases mundiais. Eles não contradizem a homogeneização global, mas sim a confirmam”.

5 QUESSADA, Dominique. O poder da publicidade na sociedade consumida pelas marcas. p. 11. 6 Ibid., p. 39.

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Dessa forma, tem-se que o objetivo da estratégia global é garantir a difusão

planetária dos produtos e serviços elaborados por fornecedores-anunciantes de

porte mundial, transpondo todos os obstáculos –institucionais, simbólicos,

jurídicos, políticos, sociais, culturais, etc– que possam vir a impedir sua livre

circulação além-fronteiras.

A título de ilustração e com vistas a demonstrar a proximidade do contexto

apresentado com a realidade brasileira atual, cita-se a campanha publicitária de

lançamento do “Novo Polo” (figura 01), automóvel produzido pela Volkswagen e

comercializado no Brasil. E também comercializado na Argentina, Inglaterra e em

diversos países e continentes.

Figura 01 - Campanha publicitária do anunciante Volkswagen7.

O slogan “O mundo inteiro dirige o mesmo carro” reflete os objetivos de

globalização de produtos, gostos e linguagens. No anúncio de revista, como

ilustrado acima, a campanha é reforçada com a mensagem “A globalização

chegou à sua garagem”.

7 Campanha de lançamento do automóvel Pólo, veiculada a partir do primeiro semestre de 2006 no Brasil. Trata-se, no exemplo, de reprodução do anúncio de revista, formato de duas páginas, disponível no site <http://www.novopolo.com.br. Acessado em dezembro de 2006.

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Há que se notar, ainda nesse exemplo, que o poder da imagem é explorado

ao máximo, considerando que o anúncio é “dividido”, formando um só

automóvel, mas com cenários diferentes: Rio de Janeiro, Brasil e Londres,

Inglaterra. Os modelos, com fisionomias típicas de cada um dos países, estão

vestidos com roupas do outro país, remetendo à tendência de moda, que aproxima

e os torna “próximos”.

Segundo Dominique, a essência dessa tendência mundial remete ao Império

Romano, pois

“como o Império Romano, o novo império mundial da comunicação se desenvolve exportando uma legalidade inscrita em sistema, isto é, a partir de um pensamento do direito. A ordem industrial mundial se desdobra juridicamente, sob a legalidade de um dogma, o da razão vigente, agindo universalmente em nome da verdade”8.

E, contribuindo para melhor entendimento das campanhas publicitárias de

abrangência global, como a utilizada no exemplo, complementa:

“ Para definir e impor os critérios do novo império, para conquistar, integrar e criar ordem civil, os grupos de publicidade exercem efetivamente um papel fundamental. As agências locais desses grupos mundiais devem tentar tornar os produtos globais não somente aceitáveis, mas também desejáveis nos diferentes países onde são distribuídos. Pois, na verdade, o conceito de globalização foi inventado pelas multinacionais americanas para tentar justificar a posteriori práticas de marketing banalizantes e empobrecedoras, sendo as grandes agências incapazes de compreender a cultura dos diferentes países”9.

Há que se fazer, nesse momento, observação em relação aos “grandes

grupos de agências de publicidades”, ordenados conforme pesquisa citada por

Dominique Quessada10: “Os principais grupos mundiais são: Estados Unidos:

Omnicom (BBDO, DDB Needham), Interpublic (McCann-Erickson, Lintas),

Young & Rubicam, D’Arcy Masius Benton & Bowles”.

Segundo a mesma pesquisa, no Reino Unido são as maiores: “Saatchi &

Saatchi Worldwide, WPP (Ogilvy & Mather, J. Walter Thompson). E na França:

Publicis, Havas-Eurocom”.

8 QUESSADA, Dominique. O poder da publicidade na sociedade consumida pelas marcas. p. 41. 9 Ibid., p. 41. 10 Ibid.,p. 38.

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Percebe-se, pois, que para aplicar tais conceitos de globalização, há que se

levar em conta os efeitos da disseminação da informação, principalmente em face

das novas tecnologias.

Conforme afirmam David Lewis e Darren Bridges,

“houve uma época em que tudo o que os consumidores sabiam sobre produtos e serviços era o que os fabricantes e anunciantes resolviam lhes informar. A rápida adoção da tecnologia da informação, pelos novos consumidores, tornou as informações mais amplamente disponíveis e facilmente acessíveis que em qualquer momento da história. A disponibilidade de informação disparou, não só pela internet, como também por meio de livros, revistas, televisão a cabo e vídeos, o que significa que os consumidores são quase compelidos a se tornarem mais envolvidos com o que compram”11.

Assim, as agências e seus clientes anunciantes – fornecedores encontram

resistência, especialmente pela capacidade dos homens que habitam esses

diferentes países de resistirem a um argumento publicitário, quando este não está

inserido em sua cultura. Surge, então, o desafio de encontrar formas de dirigir-se

às populações de consumidores locais.

Muitas vezes, como assevera Quessada,

“o conceito global pode ser aplicado tal qual: Coca-Cola, Mc Donald´s, Levi´s, etc. Às vezes, o conceito tem de ser adaptado à sociedade na qual deve encontrar seu lugar. Às vezes, ele é incompatível com uma determinada sociedade por razões culturais, ideológicas ou religiosas. O conceito global deve então ser abandonado e substituído localmente por outro conceito, quebrando a bela unidade mundial de comunicação. As agências de publicidade compõem então incessantemente com a realidade cultural e social dos diferentes países. Elas adaptam e aplicam os elementos “universais” da globalidade à particularidade concreta das sociedades. Elas articulam os elementos dogmáticos da comunicação global com a materialidade reativa de uma determinada sociedade”12.

Arrematando este entendimento, o filósofo francês constata que a

globalização só pode funcionar se o país onde ela se expressa tiver sido

“literalmente recomposto do ponto de vista ideológico, a fim de que não mais

exista nenhum freio cultural ou social à penetração dos produtos, dos serviços e

das idéias globais nos mercados locais”13.

11 LEWIS, David e Bridges, Darren. A alma do novo consumidor. p. 113. 12 QUESSADA, Dominique. O poder da publicidade na sociedade consumida pelas marcas. p. 42. 13 Ibid., p. 43.

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Nota-se, pois, que a “Era da Informação” é marcada pela disseminação de

todos os meios e formas de comunicação, sendo que o marketing, lato sensu, e

suas ferramentas encontram terreno fértil para disseminar, na mesma proporção,

produtos e serviços.

A comunicação e as técnicas de marketing são, como visto, sustentação para

a expansão de grandes empresas e marcas. Um dos símbolos desse movimento é a

rede americana Mac Donald´s. Com produtos padronizados e vendidos em

centenas de cidades em todo o mundo, a cadeia de restaurantes utiliza uma

linguagem universal, identificada onde quer que esteja, conforme ilustra o anúncio

abaixo:

Figura 02 – Anúncio da Rede Mac Donald´s na Rússia14.

O anúncio da famosa rede de restaurantes “fast-food” é emblemático:

padronizado (como o sanduíche e a batata-frita), pode ser facilmente “lido”, em

qualquer país do mundo.

14 Anúncio da rede Mac Donald´s em ponto de ônibus, na Rússia. Imagem disponível na internet, em <http://www.google.com/images/macdonalds1. Acessado em novembro de 2006.

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Em estudo acerca da influência das tecnologias da informação e

comunicação na sociedade globalizada atual, o documento “i2010 – Uma

sociedade da informação européia para o crescimento e o emprego” publicado

pela Comissão das Comunidades Européias, órgão da União Européia, afirma que:

“As tecnologias da informação e das comunicações são um poderoso motor de crescimento e emprego. Um quarto do crescimento do PIB da União Européia e 40% do crescimento da produtividade devem-se às TIC. As diferenças de desempenho econômico entre os países industrializados explicam-se, em grande medida, pelo nível de investimento, de investigação e de utilização das TIC e pela competitividade das empresas ligadas à sociedade da informação e aos media. Os serviços, as competências, os media e os conteúdos TIC representam uma parte crescente da economia e da sociedade”15.

Como repercussão dessa evolução da informação, caminha a evolução do

mercado publicitário, do estudo do marketing em todos os seus matizes e como

conseqüência a evolução das relações de consumo.

Destaca-se, nesse ponto, que uma das principais barreiras encontradas pelos

anunciantes-fornecedores na tarefa de imposição de padrões globais de consumo

refere-se justamente aos aspectos jurídicos de cada país. Assim, percebe-se a

importância da identificação dos limites jurídicos das ferramentas de marketing,

especialmente da publicidade, à luz da legislação brasileira.

Inicia-se, então, a partir do próximo capítulo, a fixação de conceitos

relacionados ao mercado publicitário e ao marketing, salientando-se a relevância

jurídica de suas delimitações.

15 Disponível em <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/site/pt/com/2005/com2005_0229pt01.pdf>

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Parte II – Do Marketing e da Publicidade

Capítulo 2

Informação, Marketing, Oferta, Propaganda e

Publicidade

2.1 Necessidade de fixação de conceitos

Há que fazer, primeiramente, análise dos conceitos de informação,

marketing, oferta, propaganda e publicidade. A fixação desses conceitos visa a

delimitar o entendimento de cada um dos tópicos abordados conforme os

objetivos do presente estudo e identificar suas diferenças e suas áreas de

influência com o Direito das Relações de Consumo.

Destaca-se, nesse sentido, a relevante diferenciação, sob o ponto de vista

jurídico, entre as definições de publicidade e propaganda, como se demonstrará

adiante.

2.1.1 Informação

A informação, segundo Fernando Guerardini Santos, “é a tônica do CDC e

tem como característica fundamental a educação a consumidores, prevista em seu

artigo 4º., incisos IV e VIII”27.

Assim, sugere a seguinte função bipartida da informação, conforme

disposições do Código de Defesa do Consumidor:

“a) de um lado, impõe a educação a consumidores como uma norma de

conteúdo programático, dirigido ao Estado enquanto órgão regulamentador da

educação no país;

b) de outra banda, estabelece o dever de informar – em conseqüência, o

direito à informação – ao fornecedor de produtos e serviços, de maneira

27 SANTOS, Fernando Guerardini. O Direito do Marketing. São Paulo : RT, 2000. p. 169.

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21 complementar, para que o consumidor comum, pessoa leiga e vulnerável que é,

tenha condições de atuar em condições de igualdade (ou ao menos próximo de

uma condição de igualdade) em uma relação de consumo e de manifestar sua já

citada vontade real de consumo”28.

Nessa mesma seara, Antônio Carlos Efing ensina, em relação ao princípio

da informação, que este pode ser

“interpretado de várias formas, todas elas percucientemente alentadoras da efetivação dos interesses do consumidor, podendo configurar-se a informação de cunho educacional, no sentido de conscientização dos consumidores acerca da busca de seus interesses, ou em relação à informação sobre os produtos e serviços colocados à disposição no mercado de consumo”29.

Conforme afirma Aluízio Ferreira, “a necessidade de informação é a mais

básica das necessidades humanas, constituindo-se o direito a ela num direito

fundamentalíssimo, porquanto pressuposto de todos os demais”30.

Acerca da necessidade de informação, complementa:

“Deter informação é questão de sobrevivência tanto individual (física, emocional e psíquica) quanto social e política. ...não é apenas o homem atual que se acha condicionado pela necessidade de conhecimento ou informação. O homem sempre esteve a isso condicionado e não poderá jamais deixar de assim estar. Para existir e coexistir, em qualquer lugar e época os seres humanos sempre necessitaram e continuarão necessitando orientar-se, esta necessidade será tanto mais intensa e complexa quanto mais dotadas de complexidade forem as relações intersubjetivas que tenham de manter ou os desafios ambientais que tiverem de enfrentar”31.

Jorge Xifra–Heras, em aprofundado estudo acerca do conceito de

informação, afirma que

“uma primeira visão, de caráter formal, procura definir a informação referindo-se às características que concorrem no processo informativo, em conseqüência de ampliar-se a esquematização mais simples da comunicação social, acrescentando-lhe novos fatores, como a decisão e a ação do receptor; a reação do emissor ante determinada situação; a acessibilidade do objeto ao receptor e as conseqüências da transmissão; circunstâncias de auxílio e influência”32.

28 SANTOS, Fernando Guerardini. op. cit. p. 169. 29 EFING, Antônio Carlos. Fundamentos do direito das relações de consumo. p. 106. 30 FERREIRA, Aluízio. Direito à informação, direito à comunicação. p. 80. 31 IBID., p.81. 32 XIFRA-HERAS, Jorge. A informação: análise de uma liberdade frustrada. Gastão Jacinto Gomes (Trad.). Sao Paulo: USP, 1975. 346 p.

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Daí, se chega à definição descritiva, considerando a informação como

“o conjunto das formas, condições e atuações para tornar público os elementos do saber, de fatos, de acontecimentos, de especulações, de ações e projetos, tudo isto mediante uma técnica especial, realizada em este fim e utilizando os meios de transmissão ou comunicação social”33.

A raiz etimológica de informação, que equivale a dar forma, pôr em forma,

formar, configurar e, por extensão, representar, apresentar ou criar uma idéia ou

uma noção, é valioso ponto de partida.

Ressalte-se, ainda, a observação de Fernando Guerardini34, de que “quanto

à informação, esta não pode existir isoladamente, não podendo, portanto,

configurar-se como uma modalidade equiparável à apresentação e à publicidade”.

Conclui, então, “que a informação é conteúdo tanto da apresentação e publicidade

como das outras técnicas de marketing”.

Rizzato Nunes35, sob a ótica constitucional, observa que a informação, ou

melhor, o direito de informação, pode ser contemplado sob três espécies:

a) o direito de informar;

b) o direito de se informar;

c) o direito de ser informado.

Mais adiante, tratando da liberdade de informação, tais direitos voltarão a

ser abordados com mais profundidade.

Há que se fazer, ainda, observação em relação ao vocábulo contido no

caput do artigo 30: (toda) “informação ou publicidade”. Ao tratar separadamente

informação e publicidade o legislador deixa claro que existe distinção entre

ambas. O termo publicidade é bastante amplo e pode-se dizer que “toda

publicidade veicula alguma (algum tipo de) informação, mas nem toda

33 SANTOS, Fernando Guerardini. op. cit. p. 169. 34 Ibid., p. 135. 35 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Curso de direito do consumidor. 2ed. p.49.

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23 informação é publicidade”36. As questões relativas à publicidade serão tratadas

pormenorizadamente mais adiante.

Apesar do grande leque englobado pelas formas de publicidade e sua

veiculação, como anúncios em revistas, jornais, televisão, internet, outdoor, assim

como rótulos, embalagens e pontos-de-venda, entre outros, a informação é ainda

mais ampla.

Nesse sentido, leciona Rizzatto Nunes:

“Acontece que a informação é mais ampla. Ela abrange tudo isso, mas é também a fala ou resposta do gerente do banco, do funcionário do atendimento telefônico, da administradora do cartão de crédito, o preço dado pelo feirante, “de boca” para o consumidor, do agente emissor de passagens de qualquer tipo, do maître no restaurante, do recepcionista no hotel, são os dados técnicos apresentados nas embalagens e rótulos dos produtos, enfim, é qualquer informação oferecida por todo e qualquer meio de comunicação escrita, verbal, gestual, etc que chegue ao consumidor”.

2.1.2 Marketing

Embora as atividades típicas de marketing “constituam-se em uma das

profissões mais antigas do mundo, surgindo no momento histórico em que o

homem passou a realizar trocas entre si” 37, a preocupação com o marketing e suas

repercussões para a sociedade são recentes.

Fernando Guerardini Santos, traçando evolução das relações comerciais,

afirma que:

“Com a decadência dos valores medievais e em resposta ao caos estabelecido na Idade Média, surge o mercantilismo, cuja essência era a criação de nações fortes e independentes pela proteção da indústria caseira e pela manutenção de reservas, isto é, incentivando a exportação em detrimento da importação. A partir do período histórico conhecido Era da Indústria (1730 a 1930), quando ocorreu a chamada Revolução Industrial, iniciada na Inglaterra com a indústria têxtil, o mundo teve contato com novas invenções e maquinários, os quais geraram novas relações sociais, surgindo algumas tendências como especialização, divisão de trabalho e desenvolvimento da produção em massa. Uma importante doutrina econômica predominava nesse período: o laissez-fire, pela qual o comércio era exercido

36 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. op. cit. p.390. 37 KOTLER, Philip. Administração de marketing. São Paulo : Atlas, 1988. p. 25.

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livremente, sem qualquer restrição da parte dos governos, doutrina esta que baseou os posteriores trabalhos de Adam Smith, Jeremy Bentham e john Stuart Mill, conhecidos como “Doutrina Econômica Clássica”, a qual iria predominar até meados do século XX. Assim, o mercado que hoje conhecemos é uma conseqüência da Revolução Industrial e suas posteriores especializações, como a Revolução da Automação (1930 – 1950), quando procurou-se aperfeiçoar a mecanização da indústria; e a Revolução Científica (1950 até o presente), na qual as nações, principalmente as industrializadas, começaram a dar ênfase à pesquisa científica como solução para os problemas humanos. A ferramenta básica nesta fase, obviamente, é o computador e toda tecnologia de informática que, com uma freqüência quase diária, revoluciona o mundo, tornando obsoleta a tecnologia existente com uma rapidez surpreendente”38.

Em decorrência dessas mudanças ocorridas no início do século XX,

especialmente a industrialização, surgiu a necessidade, por parte das empresas

fornecedoras de produtos e serviços, de maior estudo sobre o comportamento do

mercado, do consumidor e também de maior divulgação de produtos e serviços.

Conforme ensina Mtsuro Yanaze39,

“face a esse consumidor emergente, as empresas passaram a se preocupar em conhecê-lo melhor, investigando suas motivações de compra. As universidades americanas, percebendo essa nova demanda, incorporam em seus cursos voltados para negócios (Business Administration), disciplinas que privilegiavam a pesquisa e a análise de clientes / consumidores. Nascem, assim, as disciplinas dedicadas ao estudo do mercado, congregando-se, no seu conjunto, em uma nova especialidade, a Mercadologia. Essas transformações ocorrem no início da década de 50. Mais tarde, percebendo a limitação da expressão "Mercadologia" para significar o estudo do mercado, os acadêmicos passaram a utilizar a expressão "Marketing", mais abrangente por usar a palavra "Market" (Mercado) com o sufixo "ing" sinalizando que tudo o que pudesse ser relacionado ao Mercado estaria subsumido pelo Marketing. Esse "tudo" incluía a Pesquisa, o Desenvolvimento de Novos Produtos, a Gerência de Produtos, a Logística de Vendas, a Precificação, o Controle de Vendas, a Propaganda, etc”.

Posteriormente, no início da década de 60, o americano Jerome McCarthy40

apresentou um conceito que veio a configurar-se como um marco na definição de

marketing em todo o mundo, apresentando a teoria dos 4 Ps: Product (Produto),

Price (Preço), Place (Lugar ou Ponto de Venda) e Promotion (Promoção), para

caracterizar o "mix" de Marketing.

38 SANTOS, Fernando Guerardini. O Direito do Marketing. São Paulo : RT, 2000. pp. 18-19. 39 YANAZE, Mitsuru Higuchi.. Líbero – Revista Acadêmica de Pós-Graduação da Faculdade de Comunicação Social Cásper Líbero, São Paulo, v. 3, n. 5, p. 88-92. 40 Apud, YANAZE.

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Da consolidação dessas bases, Yanaze chega a uma adaptação mais

atualizada e mais abrangente dos 4 Ps, que passaram a ser assim definidos:

Produto, Preço, Distribuição e Comunicação. Essa adaptação, segundo afirma,

decorreu dos processos de transformação do campo sociocultural em mercado,

particularmente a partir dos anos 80, com a proposição neoliberal de Reagan e

Thatcher, que levou a um recuo das polêmicas culturais e políticas a favor dos

determinantes econômicos, com a conseqüente deriva e esvaziamento das

questões ideológicas e divisões partidárias direita / esquerda.

Há que se frisar, ainda, que a expressão “marketing” já se incorporou à

Língua Portuguesa, (motivo pelo qual não a destacamos como expressão

estrangeira neste trabalho), cujo significado apresentado pelo Dicionário

Michaellis é:

“mar.ke.ting 1 Comercialização. 2 Execução de todos os atos de comércio que sirvam para dirigir o escoamento de mercadorias e serviços do produtor ao consumidor. 3 Conjunto de operações que envolvem a vida do produto, desde a planificação de sua produção até o momento em que é adquirido pelo consumidor”41.

Nota-se, portanto, que o marketing constitui-se como poderoso instrumento

do mercado de consumo, não podendo deixar de receber uma adequada

regulamentação jurídica.

Segundo Fernando Gherardini Santos,

“não há, no Brasil, um Código do Marketing, tampouco uma lei específica sobre o tema, mas, sim, uma coletânea de normas esparsas, representadas, principalmente, pelo Código de Defesa do Consumidor e pela lei Antitruste, ambas informadas por princípios constitucionais”42.

Gherardini apresenta a definição de marketing como “o conjunto de

atividades humanas que tem por objetivo facilitar e consumar relações de troca”43.

Trata-se, segundo o autor, de uma interface entre a atividade econômica do

fornecedor e o mercado de consumo, além do marketing de pós-venda, relativo à

garantia de adequação dos produtos e serviços.

41 Dicionário Michaelis. Net, Curitiba, Nov. 2006. Disponível em http://www.uol.com.br/biblioteca/michaellis. 42 SANTOS, Fernando Guerardini. O Direito do Marketing. São Paulo : RT, 2000. 43 Ibid., p. 138.

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Complementando sua explanação, Fernando Gherardini afirma:

“O marketing qualifica-se como uma prática comercial por conexão, já que

não coincide, propriamente, com a distribuição ou comercialização de produtos

e/ou prestação de serviços – estas sim as práticas comerciais por natureza

exercidas pela empresa e disciplinadas pelo CDC -, mas lhes é anterior, ocorrendo

em um momento denominado tecnicamente (pela doutrina mercadológica) de pré-

venda. A atividade de marketing corresponde à combinação das técnicas

agrupadas sob a denominação de 4As (análise, adaptação, ativação e avaliação)

sobre os denominados 4Ps (produto, preço, ponto e promoção), segundo a

terminologia utilizada pela própria teoria do marketing”44.

Nota-se, portanto, que o marketing preocupa-se com diferentes aspectos da

administração dos negócios e, dentre eles, a propaganda e a publicidade.

2.1.3. Oferta

O artigo 30 do Código de Defesa do Consumidor dispõe que:

“Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar a integrar o contrato que vier a ser celebrado”45.

A oferta se confunde com o próprio conceito de marketing, sendo entendida

como todos os métodos, técnicas e instrumentos que aproximam o consumidor

dos produtos e serviços. Nota-se que o Código de Defesa do Consumidor,

conforme exposto no artigo 30, deu tratamento indistinto para todo tipo de

informação, de qualquer gênero, com relação a produtos e serviços.

A oferta, portanto, não pode ser entendida como uma ação isolada, mas

como conjunto de ações, envolvendo diversos aspectos da prática comercial, que

segundo Herman Benjamim envolve “os procedimentos, mecanismos, métodos e

técnicas utilizados pelos fornecedores para, mesmo indiretamente, fomentar,

44 SANTOS, Fernando Guerardini. op. cit. p. 137. 45 BRASIL. Lei 8.078/90. Código de Defesa do Consumidor.

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27 manter e garantir a circulação de seus produtos e serviços até o destinatário

final”.46

Saliente-se, aqui, a importante lição de Guerardini Santos:

“A oferta moderna, disciplinada pelo CDC, não corresponde, in totum, à vetusta figura jurídica da proposta. O Código Civil Brasileiro, a exemplo de todo o direito privado do mundo ocidental, baseado nas grandes codificações européias do século XIX, tem como base fático-axiológica a realidade de uma civilização pré-industrial, na qual é concedido tratamento jurídico idêntico a ambos os pólos das relações contratuais em geral, não se levando em conta um eventual desequilíbrio respeitante ao grande poder econômico de um em prejuízo do outro, como ocorre, modernamente, na relação de consumo, tornando a proposta, nos termos em que foi formulada, não mais condizente com a situação socioeconômica hodierna”47.

Tomando em conta as atividades do marketing nas relações de consumo,

Guerardini complementa:

“Na verdade, a proposta do Direito Civil poderia, em tese, partir de um consumidor e, freqüentemente, o marketing praticado pelo fornecedor era considerado como uma mera invitatio ad offerendum, sem vinculação de qualquer natureza para o proponente, principalmente se feito a pessoas indeterminadas. A doutrina civilista tradicional costuma distinguir a proposta propriamente dita da proposta (ou oferta) ao público. Enquanto a proposta, dirigindo-se, necessariamente, a um ou mais sujeitos, determinados, ou, no mínimo, determináveis, era obrigatória, vinculando o proponente, a oferta ao público (ou a pessoas indeterminadas), ao contrário, consistia em mera invitatio ad offerendum, ou seja, um convite a uma oferta, a qual, freqüentemente, era realizada pelo consumidor”48.

Segundo entendimento de Guerardini Santos,

“o conceito de oferta enquadra-se no conceito (metajurídico) de marketing (relativa aos 4 Ps), sendo que este último é mais abrangente. Pode-se afirmar que toda oferta expressa uma atividade de marketing, mas nem toda atividade de marketing expressa, juridicamente, uma oferta, pois, para que isso ocorra, a atividade de marketing deve conter informações “suficientemente precisas”, o que não ocorre com técnicas como o puffing ou teaser, as quais, não estando vedadas pelo sistema, não se enquadram no conceito jurídico de oferta”49.

Antônio Carlos Efing define oferta como a “declaração unilateral de vontade

que visa à propositura de um negócio, dirigida a todos os indivíduos enquanto

46 BENJAMIM , Antônio Herman. Comentários ao Código de Proteção do Consumidor, São Paulo : Saraiva, 1991. 47 SANTOS, Fernando Guerardini. O Direito do Marketing. São Paulo : RT, 2000. p. 142. 48 Ibid., p.143. 49 Ibid., p. 138.

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28 coletividade; em havendo manifestação da parte interessada, tem início a

formação do contrato”50.

Observe-se, ainda em relação à oferta, a lição do professor Efing:

“Determinou ainda o CDC que a oferta e a apresentação de produtos e serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentem à saúde e segurança dos consumidores, segundo o artigo 31. Apesar da amplitude deste dispositivo, fica claro que a intenção do legislador foi garantir ao consumidor o maior número possível de informações sobre o produto ou serviço ofertado para que, a par de todos os dados necessários, possa decidir livremente pela aquisição ou não do bem”51.

Pode-se, portanto, dizer que a oferta é um veículo, que transmite uma

mensagem, que inclui informação e publicidade. O fornecedor é o emissor da

mensagem e o consumidor é seu receptor.

Superada a delimitação dos conceitos de informação, marketing,

propaganda, publicidade e oferta, torna-se necessária a análise jurídica em que se

inserem, focando-se, em especial, a publicidade..

Apresenta-se relevante analisar os aspectos jurídicos da publicidade,

traçando, no próximo capítulo, sua regulamentação no direito brasileiro, e, no

capítulo 4, sua regulamentação à luz do Código de Defesa do Consumidor.

2.1.4. Propaganda

Os conceitos de propaganda e publicidade costumam ser confundidos,

inclusive pelo legislador e pela doutrina. Há que se fazer, entretanto, a necessária

distinção entre ambos.

50 EFING, Antônio Carlos. Fundamentos do direito das relações de consumo.2 ed. p. 185. 51 Ibid., p. 186.

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Conforme leciona Paulo Scartezzini Guimarães52, em vários países essa

distinção também é feita. Assim, nos Estados Unidos são usadas duas palavras

distintas: propaganda e advertising; na França, propagande e publicitè; na

Espanha, propaganda e publicidad; na Itália, propaganda e publicità.

O conceito de propaganda vem do latim propagare, que significa enterrar,

mergulhar, plantar. Segundo Valéria Furlan53, existe divergência na doutrina

acerca do início da utilização do termo, sendo que para alguns teria sido com o

Papa Clemente VII, em 1597 e outros com o Papa Gregório XV, em 1622. Torna-

se relevante, entretanto, perceber que sua utilização passou a significar a

transmissão de idéias religiosas e políticas.

Daí decorre, pois, a caracterização da propaganda como sendo a divulgação

de idéias, não possuindo objetivo comercial. Nesse sentido, Adalberto

Pasqualotto54 afirma que

“o que não se inclui no conceito de publicidade é a divulgação de idéias de cunho político, religioso, ideológico, filosófico, moral ou de qualquer outra natureza, enquanto manifestação de pensamento livre e a todos permitida, sem nenhum interesse direto ou indireto no complexo das relações próprias do mercado de consumo. Estas, conceituam-se como propaganda e estão excluídas da proteção do Código de Defesa do Consumidor”.

2.1.5. Publicidade

Apesar do entendimento de que a publicidade já era identificada desde a

época de Roma, sua técnica atual surgiu com a revolução industrial e comercial.

Antes disso, as negociações eram tratadas com base na confiança entre vendedor e

comprador. O crescimento das cidades e o aumento na produção de bens e

serviços tornaram cada vez mais raros os contatos pessoais, fazendo surgir uma

cadeia de intermediários.

A publicidade, então, passa a exercer, primeiramente, o papel de informar.

Com o passar dos anos e o crescimento da concorrência, passa também a 52 GUIMARÃES, Paulo Jorge Scartezzini. A Publicidade Ilícita e a Responsabilidade Civil das Celebridades que dela Participam, São Paulo : RT, 2001. 53 FURLAN, Valéria. Princípio da veracidade nas mensagens publicitárias. RDC, n.10, São Paulo: RT, 2004. 54 PASQUALOTTO, Adalberto. Os Efeitos Obrigacionais da Publicidade no Código de Defesa do Consumidor. São Paulo : RT, 1997.

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30 desempenhar outra função: persuadir os consumidores quanto à aquisição de

produtos e serviços. Cláudia Lima Marques55 leciona que a publicidade, na

sociedade de massa, possui uma dupla função: informar e estimular o consumo de

bens e serviços.

A origem da palavra publicidade vem do latim publicus, que significa tornar

público. O conceito usualmente utilizado nos meios publicitários é o constante no

Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária, em seu artigo 8º, que

define como “toda atividade destinada a estimular o consumo de bens e serviços,

bem como a promover instituições, conceitos ou idéias”. Note-se, entretanto, que

a promoção de idéias e conceitos não significa interesse comercial, aqui se

demonstrando a confusão do conceito com a propaganda.

Apesar da necessária distinção entre os termos publicidade e propaganda,

adotadas por diversos autores, como demonstrado anteriormente, registra-se a

posição do professor Rizzatto Nunes, que entende que os dois vocábulos podem

ser usados como sinônimos. Explica que “do ponto de vista das normas

infraconstitucionais, somente o uso dos termos como sinônimos resolve a

confusão”56.

Independentemente da gama de conceitos, como observa Paulo Jorge

Scartezzini Guimarães, “verifica-se que eles possuem elementos semelhantes,

como o patrocínio, a divulgação de produtos e serviços, a informação, persuasão e

a atividade dirigida ao público”57.

Como visto no início deste capítulo, na abordagem do marketing, sabe-se

que “com o avançar dos anos os estudos sobre o comportamento do consumidor

se foram aprimorando, a ponto de se poder prever qual sua reação a partir de certa

motivação ou estímulo”58.

Scartezzini observa que

55 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. São Paulo : RT, 1999. 56 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. op. cit. p.422. 57 GUIMARÃES, Paulo Jorge Scartezzini. A publicidade ilícita e a responsabilidade das celebridades que dela participam. p. 97. 58 Ibid., p. 98.

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31

“é nesse desbravamento e exploração da mente humana que os publicitários se apóiam e buscam as inspirações para seus anúncios. Criam eles necessidades e após manipulam os consumidores em direção ao produto ou serviço que irá supri-las. Criam efetivamente desejos supérfluos, que, logo em seguida, graças às suas técnicas, são transformadas em produtos imprescindíveis. Assim, estão corretos aqueles que, primeiramente, surge o produto ou serviço; depois é que se inventa a necessidade”59.

Constata-se, portanto, que tomando em conta a vulnerabilidade do

consumidor em face da publicidade é que se faz necessária a sua regulamentação

pelo direito.

59 GUIMARÃES, Paulo Jorge Scartezzini. Op. cit. p. 98.

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Capítulo 3

A Publicidade no Ordenamento Jurídico Brasileiro

3.1. Disciplina Constitucional

A publicidade não está disposta em capítulo exclusivo na Constituição da

República, mas encontram-se variados dispositivos direta ou indiretamente a ela

relacionados.

Com base no diploma constitucional brasileiro93, tem-se temas relacionados

direta e indiretamente à comunicação e publicidade, conforme segue:

Artigo 5º, IX, que determina:

“É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de

comunicação, independentemente de censura ou licença”.

O capítulo V, do artigo 220 ao 224, reproduzidos a seguir, apresenta as

diretrizes constitucionais da Comunicação Social, determinando, inclusive, a

criação de lei federal para o atendimento ao disposto no inciso II do parágrafo 3º

do artigo 220 e do parágrafo 4º, já definida na criação da Lei 9.294/96:

“Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§ 1º - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.

§ 2º - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.

§ 3º - Compete à lei federal:

I - regular as diversões e espetáculos públicos, cabendo ao Poder Público informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada;

93 BRASIL. Constituição Federal. 1988.

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33

II - estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente.

§ 4º - A propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias estará sujeita a restrições legais, nos termos do inciso II do parágrafo anterior, e conterá, sempre que necessário, advertência sobre os malefícios decorrentes de seu uso.

§ 5º - Os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio.

§ 6º - A publicação de veículo impresso de comunicação independe de licença de autoridade.

Art. 221. A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios:

I - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas;

II - promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação;

III - regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei;

IV - respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.

Art. 222. A propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e imagens é privativa de brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, aos quais caberá a responsabilidade por sua administração e orientação intelectual.

§ 1º - É vedada a participação de pessoa jurídica no capital social de empresa jornalística ou de radiodifusão, exceto a de partido político e de sociedades cujo capital pertença exclusiva e nominalmente a brasileiros.

§ 2º - A participação referida no parágrafo anterior só se efetuará através de capital sem direito a voto e não poderá exceder a trinta por cento do capital social.

Nova redação: A propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e imagens é privativa de brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, ou de pessoas jurídicas constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sede no País. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 36, de 2002)

§ 1º Em qualquer caso, pelo menos setenta por cento do capital total e do capital votante das empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens deverá pertencer, direta ou indiretamente, a brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, que exercerão obrigatoriamente a gestão das atividades e estabelecerão o conteúdo da programação. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 36, de 2002)

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34

§ 2º A responsabilidade editorial e as atividades de seleção e direção da programação veiculada são privativas de brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, em qualquer meio de comunicação social. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 36, de 2002)

§ 3º Os meios de comunicação social eletrônica, independentemente da tecnologia utilizada para a prestação do serviço, deverão observar os princípios enunciados no art. 221, na forma de lei específica, que também garantirá a prioridade de profissionais brasileiros na execução de produções nacionais. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 36, de 2002)

§ 4º Lei disciplinará a participação de capital estrangeiro nas empresas de que trata o § 1º. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 36, de 2002)

§ 5º As alterações de controle societário das empresas de que trata o § 1º serão comunicadas ao Congresso Nacional. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 36, de 2002)

Art. 223. Compete ao Poder Executivo outorgar e renovar concessão, permissão e autorização para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens, observado o princípio da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal.

§ 1º - O Congresso Nacional apreciará o ato no prazo do art. 64, § 2º e § 4º, a contar do recebimento da mensagem.

§ 2º - A não renovação da concessão ou permissão dependerá de aprovação de, no mínimo, dois quintos do Congresso Nacional, em votação nominal.

§ 3º - O ato de outorga ou renovação somente produzirá efeitos legais após deliberação do Congresso Nacional, na forma dos parágrafos anteriores.

§ 4º - O cancelamento da concessão ou permissão, antes de vencido o prazo, depende de decisão judicial.

§ 5º - O prazo da concessão ou permissão será de dez anos para as emissoras de rádio e de quinze para as de televisão.

Art. 224. Para os efeitos do disposto neste capítulo, o Congresso Nacional instituirá, como seu órgão auxiliar, o Conselho de Comunicação Social, na forma da lei”.

Ainda o artigo 22, inciso XXIX, estabelece que compete à União legislar

sobre “propaganda comercial” (sic).

3.2. Fontes legislativas infra-constitucionais

Ao contrário de muitos países, o Brasil não possui legislação própria sobre a

publicidade. As normas relacionadas à matéria encontram-se esparsas em diversos

diplomas, inclusive no Código de Defesa do Consumidor.

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35

Além das normas do CONAR, que serão tratadas posteriormente, existem

diversas leis que regulamentam a publicidade de determinadas matérias e temas

relacionados à atividade publicitária, conforme apresentado a seguir:

Anúncios de meios abortivos

Os anúncios de meios abortivos são punidos através da previsão específica

contida na Lei das Contravenções Penais (Decreto Lei 3.688 de 03/10/1941), que

dispõe sobre o tema na Parte Especial, Capítulo I - das contravenções referentes à

pessoa, em seu artigo 20: “Anúncio de meio abortivo”.

Armas de fogo

A publicidade ilícita de armas de fogo é punida com base no Decreto 3.665,

de 20/11/2000, artigo 268 e na Lei nº 10.826, de 22/12/2003.

Uso do nome e imagem

Os temas que dizem respeito ao uso do nome e apelido das pessoas, bem

como uso de imagem estão previstos no Novo Código Civil - Lei nº 10.406, de

10/01/2002, em seus artigos 18 e 19 (uso do nome e apelido) e artigo 20 (uso de

imagem).

Direitos autorais

A legislação específica sobre Direitos Autorais está disposta na Lei 9.610,

de 22/02/98, que altera, atualiza e consolida a legislação sobre direitos autorais.

Profissão de publicitário

O exercício da profissão de publicitário está prevista na Lei 4.680, de

18/06/65. regulamentada ainda pelos decretos 57.690 de 01/02/66, 2.262 de

26/06/97 e 4.567, de 31/12/02.

Animais

A utilização de animais da fauna silvestre em anúncios publicitários é

regulamentada através da Lei Federal nº 5.197, de 03/01/1967.

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Liberdade de manifestação

A Liberdade de Manifestação tem sua previsão na Constituição da

República Federativa do Brasil, no art. 22, inciso XXIX (competência para

legislar sobre propaganda comercial) e no art. 220, que trata da liberdade de

manifestação, proibição de censura, restrições admitidas a programações e

propaganda.

Loterias

A divulgação de loterias está prevista na Lei das Contravenções Penais.

(Decreto Lei nº 3.688, de 03/10/1941), em sua parte especial, capítulo VII - das

contravenções relativas à polícia de costumes. Impressão de bilhetes, lista ou

anúncios - artigo 55. Distribuição ou Transporte de lista ou avisos - artigo 56.

Publicidade de sorteio - artigo 57.

Medicamentos

A publicidade sobre medicamentos está prevista na Lei 6.360/76 - Título X

e na Resolução da Anvisa - RDC 102/00.

Moeda

A utilização de moeda em anúncios encontra amparo na Lei das

Contravenções Penais (Decreto Lei nº 3.688, de 03/10/1941). Especificamente na

Parte Especial - Capítulo V, das contravenções referentes à fé pública. Imitação de

moeda para propaganda, artigo 44 - Decreto nº 2/81, de 21/03/1977. Portaria do

Código do Consumidor: Proibição de anúncios que divulguem pagamento em

moeda estrangeira. Regulamenta o Código de Defesa do Consumidor - art. 22,

XVIII.

Cigarros, bebidas alcoólicas e medicamentos

A Lei 9.294, de 15/07/96, dispõe sobre as restrições ao uso e à

“propaganda” de produtos fumígeros, bebidas alcoólicas, medicamentos, terapias

e defensivos agrícolas. É regulamentada pelo decreto 2.018, de 1°.10.96. As leis

10.167, de 27/12/2000 e 10.702, de 14/07/2003 alteram dispositivos da Lei 9.294.

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Sorteios e prêmios

As promoções comerciais e sorteios, prêmios e brindes são regulamentas

pela Lei nº 5.768, de 20/12/1971 e pelo Decreto nº 70.951, de 09/08/1972.

Símbolos nacionais

A forma e a apresentação dos símbolos nacionais são previstas na Lei n°

5.700 de 1/09/1971.

Vendas a prazo

Condições para varejo e vendas a prazo estão previstas na Lei 8.979, de

13/01/95 - Altera a redação do art. 1º da Lei nº 6.463, de 9 de novembro de 1977.

A Lei 6.463, de 09/11/77 torna obrigatória a declaração de preço total nas vendas

a prestação e dá outras providências.

Propriedade industrial

A Lei 9.279, de 14/05/96 regula direitos e obrigações relativos à

propriedade industrial.

3.3. Auto-Regulamentação

A despeito do Brasil possuir o sistema de controle de publicidade estatal, há

que considerar a atuação do auto-controle do mercado publicitário, especialmente

sob a coordenação de um órgão privado, criado para regulamentar a publicidade

no país, denominado CONAR, Conselho Nacional de Auto-Regulamentação

Publicitária.

Conforme dados históricos do CONAR94, o

“Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária nasceu de uma ameaça ao setor: no final dos anos 70, o governo federal pensava em sancionar uma lei criando uma espécie de censura prévia à propaganda. Se a lei fosse implantada, nenhum anúncio poderia ser veiculado sem que antes recebesse um carimbo “De Acordo” ou algo parecido. A criação do departamento para controle da publicidade exigiria a contratação de algumas centenas de funcionários. As implicações burocráticas

94 CONAR. Conselho de Auto-Regulamentação Publicitária. <http://www.conar.org.br>

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seriam inimagináveis ainda assim desprezíveis diante do retrocesso que tal controle representaria para um país que reconquistava a duras penas seu direito à liberdade de expressão. Diante dessa ameaça, uma resposta inspirada: auto-regulamentação, sintetizada num Código, que teria a função de zelar pela liberdade de expressão comercial e defender os interesses das partes envolvidas no mercado publicitário, inclusive os do consumidor. A idéia brotou naturalmente a partir do modelo inglês e ganhou força pelas mãos de alguns dos maiores nomes da publicidade brasileira”.

A criação do CONAR, Conselho Nacional de Auto-Regulamentação

Publicitária, foi fundamentada na necessidade de criação de um órgão

independente, composto por representantes de todos os meios de comunicação,

para fiscalizar o mercado e fazer cumprir o Código de Ética estabelecido no III

Congresso Brasileiro de Propaganda, ocorrido em 1978. São órgãos fundadores do

CONAR:

• ABA - Associação Brasileira de Anunciantes

• ABAP - Associação Brasileira de Agências de Publicidade

• ABERT - Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV

• ANER - Associação Nacional de Editoras de Revistas

• ANJ - Associação Nacional de Jornais

• Central de Outdoor

O CONAR possui procedimentos próprios para recebimento de reclamações

e julgamentos, que privilegiam a celeridade e a informalidade.

Apesar dos aspectos positivos do CONAR, muitas críticas se fazem95,

principalmente em relação a seu caráter “corporativista”, pois é composto por

entidades que realizam o julgamento de suas afiliadas, além de seu caráter

extrajudicial, não executivo.

Além da legislação infra-constitucional que trata de temas específicos, o

Conar, através do Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária,

estabelece normas para determinados anúncios.

Apresenta-se, com destaque, os seguintes temas:

95 EFING, Antônio Carlos. [Informação verbal] Opinião expressada em aulas e palestras ministradas sobre o tema.

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a) Publicidade de bebidas alcoólicas

O Código de Auto-Regulamentação Publicitária considera bebida alcoólica

aquela que como tal for classificada perante as normas e regulamentos oficiais a

que se subordina o seu licenciamento. O Código, no entanto, estabelece distinção

entre três categorias de bebidas: as normalmente consumidas durante as refeições,

por isso ditas de mesa (as cervejas e os vinhos); demais bebidas alcoólicas, sejam

elas fermentadas, destiladas, retificadas ou obtidas por mistura (normalmente

servidas em doses, cuja publicidade é disciplinada pelo Anexo "A"; e a categoria

dos "ices", "coolers", "álcool pop", "ready to drink", "malternatives", e produtos a

eles assemelhados, em que a bebida alcoólica é apresentada em mistura com água,

suco ou refrigerante, enquadrada em Anexo próprio (Anexo "T"), e no Anexo

"A", ambos do CBAP, quando couber.

As normas éticas que se seguem complementam as recomendações gerais

do próprio Código, do Código de Defesa do Consumidor e, obviamente, não

excluem o atendimento das exigências contidas na legislação específica.

A publicidade de bebidas alcoólicas, segundo o CBAP96, deverá ser

estruturada com a finalidade precípua de difundir a marca do produto e suas

características de maneira socialmente responsável. Assim, aconselha que o

respectivo slogan não empregue apelo de consumo em seu enunciado.

O Código auto-regulador prevê proteção específica para crianças e

adolescentes. Afirma que a publicidade não será dirigida a crianças e

adolescentes, em razão da legislação em vigor e do dever ético de proteger esse

público. Crianças e adolescentes não devem figurar, de qualquer forma, em

anúncios; qualquer pessoa que neles apareça deverá ser e parecer maior de 25

(vinte e cinco) anos de idade. Dispõe, ainda, que os anúncios de bebidas

alcoólicas :

a. não deverão favorecer a aceitação do produto como apropriado para

menores;

b. deverão evitar a exploração do erotismo;

96 Código de Auto-Regulamentação Publicitária. CONAR. <www.conar.org.br>

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c. não deverão usar linguagem, recursos gráficos e audiovisuais

pertencentes ao universo infantil, tais como animais "humanizados",

bonecos ou animações que possam despertar a curiosidade ou a atenção de

menores e contribuir para a adoção de valores morais ou hábitos

incompatíveis com sua condição;

d. não conterão cena, ilustração, áudio ou vídeo, que apresente a ingestão

imoderada do produto;

O legislador dispõe que o planejamento de mídia levará em consideração

que o anúncio se destina a público adulto, devendo, portanto, refletir as restrições

técnica e eticamente recomendáveis. Assim, o anúncio deverá ser inserido em

programação, publicação ou web site dirigidos predominantemente a maiores de

idade.

A auto-regulamentação preocupou-se também com o consumo

responsável: “a publicidade não deverá induzir, de qualquer forma, ao consumo

abusivo e irresponsável de bebidas alcoólicas. Assim, os anúncios:

a. não devem tornar o consumo do produto um desafio nem tampouco

menosprezar aqueles que não bebem;

b. não devem dar a impressão de que o produto está sendo recomendado

ou sugerido em razão de seu efeito sobre os sentidos;

c. não devem utilizar o teor alcoólico do produto como apelo principal;

referências específicas sobre a redução do teor alcoólico de um produto são

aceitáveis, desde que não haja implicações ou conclusões sobre a segurança ou

quantidade que possa ser consumida em razão de tal redução;

d. não devem associar positivamente o consumo do produto à condução de

veículos;

e. não devem encorajar o consumo em situações impróprias, ilegais,

perigosas ou socialmente condenáveis;

f. não associarão os produtos ao desempenho de qualquer atividade

profissional;

g. não associarão os produtos a situações que sugiram agressividade, uso

de armas e alterações de equilíbrio emocional;

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h. não se utilizarão de imagens, linguagem ou idéias que sugiram ser o

consumo do produto sinal de maturidade ou que contribua para o êxito

profissional, social ou sexual;

i. não se utilizarão de uniformes de esportes olímpicos como suporte à

divulgação de suas marcas”.

Os horários de veiculação em rádio e TV, inclusive por assinatura,

submetem-se à seguinte disciplina imposta pelo CONAR:

a. quanto à programação regular ou de linha: comerciais, spots, inserts de

vídeo, textos-foguete, caracterizações de patrocínio, vinhetas de passagem e

mensagens de outra natureza, inclusive o merchandising ou publicidade indireta,

publicidade virtual e as chamadas para os respectivos programas só serão

veiculados no período compreendido entre 21h:30 (vinte e uma horas e trinta

minutos) e 06h:00 (seis horas) (horário local);

b. quanto à transmissão patrocinada de eventos alheios à programação

normal ou rotineira: as respectivas chamadas e caracterizações de patrocínio

limitar-se-ão à identificação da marca e/ou fabricante, slogan ou frase

promocional, sem recomendação de consumo do produto. As chamadas assim

configuradas serão admitidas em qualquer horário.

Todo anúncio, qualquer que seja o meio empregado para sua veiculação,

deverá conter "cláusula de advertência" a ser adotada em resolução específica do

CONAR97, a qual refletirá a responsabilidade social da publicidade e a

consideração de anunciantes, agências de publicidade e veículos de comunicação

para com o público em geral. Diante de tais compromissos e da necessidade de

conferir-lhes plena eficácia, a resolução levará em conta as peculiaridades de cada

meio de comunicação e indicará, quanto a cada um deles, dizeres, formato, tempo

e espaço de veiculação da cláusula. Integrada ao anúncio, a "cláusula de

advertência" não invadirá o conteúdo editorial do veículo; será ostensiva e

enunciada de forma legível e destacada. Deverá, ainda:

97 Código de Auto-Regulamentação Publicitária. CONAR. <www.conar.org.br>

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a. em Rádio ser inserida antes do encerramento da mensagem publicitária;

b. em TV, inclusive por assinatura e em Cinema ser inserida

imediatamente antes do encerramento da mensagem publicitária. A mesma regra

aplicar-se-á às mensagens publicitárias veiculadas em teatros, casas de espetáculo

e assemelhado;

c. em jornais, revistas e qualquer outro meio impresso, em painéis e

cartazes, e nos "pop up" pela Internet ser escrita na forma adotada em resolução;

d. nos "bumpers" de vídeo pela Internet observar as mesmas prescrições

adotadas para o meio TV;

e. nas embalagens e nos rótulos reiterar que a venda e o consumo do

produto são indicados apenas para maiores de 18 anos.

Segundo o CBAP, estarão desobrigados da inserção de "cláusula de

advertência" os formatos abaixo especificados que não contiverem apelo de

consumo do produto:

a. a publicidade estática em estádios, sambódromos, ginásios e outras

arenas desportivas que somente poderão identificar o produto, sua marca e slogan;

b. a simples expressão da marca, seu slogan ou a exposição do produto que

se utiliza de veículos de competição como suporte;

c. as "chamadas" para programação patrocinada em rádio e TV, inclusive

por assinatura;

d. os textos-foguete, caracterizações de patrocínio, vinhetas de passagem e

assemelhados.

O CONAR98 ainda impõe que, por alcançarem todas as faixas etárias, sem

possibilidade técnica de segmentação, as mensagens de bebidas alcoólicas

veiculadas em mídia exterior, sejam "outdoors", painéis eletrônicos, "back e front

lights", painéis em empenas de edificações, "busdoors", envelopamentos de

veículos de transporte coletivo e assemelhados, quaisquer que sejam os meios de

comunicação e o suporte empregados, limitar-se-ão à exibição do produto, sua

98 Código de Auto-Regulamentação Publicitária. CONAR. <www.conar.org.br>

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43 marca e slogan, sem apelo de consumo, mantida a necessidade de inclusão da

cláusula de advertência.

Em relação ao comércio, o CBAP dispõe que sempre que mencionar

produto cuja publicidade seja regida pelo Código, o anúncio assinado por

atacadista, importador, distribuidor, estabelecimento varejista, bar, restaurante e

assemelhado estará sujeito às normas nele previstas.

Em cinemas, teatros e salões os anúncios serão veiculados a partir das

21h:30 (vinte e uma horas e trinta minutos) (horário local); não estarão sujeitos a

restrições de horário quando o espetáculo for classificado apenas para maiores de

idade.

O CONAR, através do seu Código99, ordena que a publicidade em pontos

de venda deverá ser estruturada de forma a não influenciar crianças e adolescentes

e conterá a advertência de que o produto se destina exclusivamente a público

adulto, bem como apelo de consumo moderado. Os equipamentos de serviço,

assim compreendidos as mesas, cadeiras, refrigeradores, luminosos, etc., ficam

dispensados das "cláusulas de advertência", se não contiverem apelo de consumo.

O Código encoraja as iniciativas destinadas a reforçar a proibição do

consumo por menores, bem como aquelas que promovam condutas socialmente

responsáveis.

O Conselho Superior do CONAR resolveu, regulamentando a questão da

“cláusula de advertência” prevista no item 6 do Anexo "A", informando que a

publicidade conterá uma das seguintes frases:

- "EVITE O CONSUMO EXCESSIVO DE ÁLCOOL"

- "BEBA COM MODERAÇÃO"

- "APRECIE COM MODERAÇÃO"

- "SE BEBER NÃO DIRIJA”

99 Código de Auto-Regulamentação Publicitária. CONAR. <www.conar.org.br>

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- “ESTE PRODUTO É DESTINADO A ADULTOS”

- “BEBA SEM EXAGEROS”

- “BEBA COM RESPONSABILIDADE”

- ou outras que reflitam a responsabilidade social da publicidade.

b) Publicidade de cursos, ensino e educação

A publicidade deverá atender, segundo o Código de Auto-Regulamentação

Publicitária100, as seguintes determinações:

“1. Não deverá afirmar ou induzir o público a crer que um estabelecimento

ou curso é oficializado, reconhecido, autorizado, aprovado, ou que tenha sua

situação legal definida, a menos que o Anunciante esteja em condição de

comprová-lo.

2. Tendo em vista que nem todos os estabelecimentos e cursos que podem

ser anunciados estão sujeitos a autorização de funcionamento e fiscalização das

autoridades de ensino, recomenda-se aos Anunciantes que tenham a sua situação

legal definida, que facilitem a sua identificação, informando em sua publicidade o

nome da escola ou curso e o respectivo ato oficial de autorização ou

reconhecimento.

3. Para ser aceito como documento válido capaz de possibilitar ao seu

portador o prosseguimento de seus estudos, a legislação em vigor estabelece

determinados requisitos a serem atendidos pelo estabelecimento ou curso para a

emissão de diplomas ou certificados. Assim sendo, os anúncios não deverão

insinuar, sugerir ou afirmar que os diplomas ou certificados prometidos tenham

valor mais amplo do que efetivamente tiverem. De igual forma deverá ficar claro

no anúncio quando o aluno estiver obrigado a submeter-se a exame de avaliação

e/ou prova de assiduidade para validar o curso.

100 Código de Auto-Regulamentação Publicitária. CONAR. <www.conar.org.br>

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4. Não deverá afirmar ou induzir o Consumidor a crer que a inscrição ou

matrícula no curso lhe proporcionará um emprego, a menos que o Anunciante

assuma, no mesmo anúncio e com clareza, total responsabilidade.

5. Não se permitirá que o anúncio prometa benefícios exagerados quanto à

conquista de títulos, tais como promessas de "doutoramento", quando na verdade

o curso é de "bacharelado".

6. Não se permitirão promessas de sucesso ou promoção garantida na

carreira profissional do aluno, a não ser que tais fatos sejam comprováveis.

7. Não se admitirão alegações inverídicas sobre o nível do curso anunciado,

como é o caso da frase "em nível de pós-graduação" para designar simples cursos

de extensão cultural.

8. O anúncio de curso ou cursinho que exigir freqüência do aluno deverá

explicitar o tempo de sua duração.

9. O anúncio que fizer menção a preço, deverá indicar claramente o total a

ser pago pelo aluno.

10. A utilização de testemunhas e a publicação de listas de aprovação em

concursos e exames vestibulares estão sujeitas à comprovação, de acordo com as

provisões do Código, no que toca a "testemunhais" (Capítulo II, Seção 5, Artigo

27, § 9º).

11. O anúncio de curso de instrução ou de preparação para o aprendizado de

ofícios ou matérias que conduzam a exames profissionais ou técnicos não poderá

oferecer empregos ou oportunidades irreais de remuneração, a menos que o

anunciante assuma, no mesmo anúncio e com clareza, total responsabilidade.

12. O anúncio de curso de instrução ou preparação para concursos públicos

ou exames vestibulares não poderá prometer a aprovação do candidato nos

concursos ou exames.

13. O anúncio de curso por correspondência ou à distância, além das

recomendações contidas nos itens anteriores, atenderá ao seguinte:

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a. tornará explícito que o curso é ministrado por correspondência ou à

distância e de nenhum modo procurará confundi-lo com curso por freqüência;

b. deverá divulgar nos anúncios impressos o nome do Anunciante (ou o

título do estabelecimento) e o respectivo endereço completo, que não poderá se

restringir ao número da caixa postal. Quando contiver cupom ou similar, o

endereço completo deverá figurar também no corpo do anúncio”.

c) Publicidade de empregos e oportunidades

Os anúncios referentes a empregos e oportunidades, geralmente publicados

pela imprensa diária na forma de "classificados", obedecerão às normas gerais do

Código de Auto-Regulamentação Publicitária, com especial atenção para os

seguintes aspectos específicos:

“1. Não deverão enganar o consumidor com alegações exageradas quanto à

natureza do serviço, ao nível de remuneração e às condições do ambiente de

trabalho.

2. Não deverão fornecer descrições e títulos falsos para a ocupação

oferecida (exemplo: não se deve anunciar o cargo de "relações públicas" quando o

que se oferece, na realidade, é um emprego de vendedor).

3. Não deverão conter qualquer restrição quanto a sexo, idade, estado civil,

nacionalidade, raça, cor ou religião.

4. Não deverão utilizar títulos de profissões devidamente reconhecidas

como engodo para esconder a verdadeira condição de trabalho”101.

d) Publicidade de Investimentos, Empréstimos e Mercados de Capitais

101 Código de Auto-Regulamentação Publicitária. CONAR. <www.conar.org.br>

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Além de obedecer às normas gerais do Código de Defesa do Consumidor, os

anúncios que versem sobre Investimentos, Empréstimos e Mercado de Capitais

deverão obedecer as seguintes disposições específicas disciplinadas pelo CONAR:

“1. Direito de Informação

Respeitar o direito de informação dos investidores, acionistas, aplicadores

individuais e institucionais, terceiros que negociam com valores mobiliários,

instituições públicas e organismos internacionais - observando escrupulosamente

a necessidade de lhes serem oferecidos todos os esclarecimentos para uma decisão

criteriosa e consciente -, conforme preceitua a legislação sobre a matéria.

2. Sigilo

Resguardar, sem prejuízo do item anterior, o sigilo inerente à coisa

financeira, cuidando para que não seja violada a privacidade dos investidores.

3. Projeções ou Estimativas de Resultados

Caso os anúncios contenham projeção ou estimativa de resultados futuros

(rendimentos, rentabilidade, valorização ou quaisquer outros), sob a forma de

índice ou percentual, deverão:

a. esclarecer em que bases foi realizada a projeção ou estimativa;

b. explicitar se foi considerada ou não a tributação ou impostos pertinentes,

se houve ou não reaproveitamento de lucros gerados no período analisado, se

foram ou não deduzidos incentivos fiscais e, principalmente, se a projeção ou

estimativa foi feita a partir de resultados pretéritos cuja repetição possa ser incerta

ou improvável no futuro.

4. Publicidade Comparativa

Respeitar as mesmas bases e condições de comparação quanto a prazos,

garantias, liquidez, resgate e critérios de cálculo de rentabilidade ou outros

benefícios produzidos pelos bens ou serviços anunciados.

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5. Educação e Orientação do Investidor

Considerando a necessidade do contínuo aprimoramento do mercado

financeiro e de capitais mediante a melhoria dos níveis de informação e a

educação dos investidores, os anúncios deverão:

a. valorizar o conteúdo informativo e educacional de suas mensagens;

b. evitar proposições que ajam no sentido da desinformação ou da confusão

dos investidores.

6. Regulamentações Específicas

Sem embargo das disposições do CONAR, as empresas integrantes do

Sistema Financeiro Nacional poderão atender a recomendações sobre atividades

publicitárias emanadas de seus órgãos de representação institucional, se e quando

as campanhas específicas recomendarem procedimentos comuns e uniformidade

no processo de comunicação em benefício da melhor orientação e informação do

público investidor.

e) Publicidade de Médicos, Dentistas, Veterinários, Parteiras,

Massagistas, Enfermeiros, Serviços Hospitalares, Paramédicos, Para-

hospitalares, Produtos Protéticos e Tratamentos

Demonstrando preocupação com as informações veiculadas acerca de

assuntos da área médica, o CONAR determina que a publicidade submetida a

estes temas não poderá anunciar:

“a. a cura de doenças para as quais ainda não exista tratamento apropriado,

de acordo com os conhecimentos científicos comprovados;

b. métodos de tratamentos e diagnósticos ainda não consagrados

cientificamente;

c. especialidade ainda não admitida para o respectivo ensino profissional;

d. a oferta de diagnóstico e/ou tratamento à distância;

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e. produtos protéticos que requeiram exames e diagnósticos de médicos

especialistas.

A publicidade dos profissionais a que se refere este tópico não pode

anunciar:

a. o exercício de mais de duas especialidades;

b. atividades proibidas nos respectivos códigos de ética profissional.

A publicidade de serviços hospitalares e assemelhados deve,

obrigatoriamente, mencionar a direção responsável.

A publicidade de tratamentos clínicos e cirúrgicos (p. ex. emagrecimento,

plástica) será regida pelos seguintes princípios:

a. deve, antes de mais nada, estar de acordo com a disciplina dos órgãos de

fiscalização profissional e governamentais competentes;

b. precisa mencionar a direção médica responsável;

c. deve dar uma descrição clara e adequada do caráter do tratamento;

d. não pode conter testemunhais prestados por leigos;

e. não pode conter promessa de cura ou de recompensa para aqueles que não

obtiverem êxito com a utilização do tratamento”.

Com vistas a ilustrar a atuação do CONAR102, exemplificando julgamentos

ocorridos em suas Câmaras, apresenta-se a seguir casos reais julgados no ano de

2006. Embora pautadas em princípios do Código de Defesa do Consumidor e

legislação brasileira aplicável, as decisões do CONAR fundamentam-se no

Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária, reproduzido no Anexo 1

do presente trabalho.

102 Exemplos reproduzidos a partir de decisões publicadas no site do CONAR:<http://www.conar.org.br. Acessado em Dezembro de 2006.

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Exemplo 01:

“Anúncio: “Bohemia — A primeira e melhor cerveja do Brasil”

Representação n° 164/06, em recurso ordinário, tendo como autora a Kaiser e anunciante Ambev.

Decisão: Arquivamento e Alteração

Fundamento: Artigo 27, n° I, letra “a” do Rice e Artigos 1º, 4º, 23, 27 "caput" e parágrafos 1º, 32 letras "b", "c" e "f" e 50 letra “b” do Código.

A Kaiser protestou contra comercial de TV da Ambev que afirmava que a Bohemia era a primeira cerveja do Brasil. De acordo com a denúncia, a primeira cerveja do País foi fabricada 17 anos antes da Bohemia. Além disso, a Kaiser também considera inadequada a trilha musical da peça por entender que o refrão "se todos fossem iguais a você" induz ao entendimento indevido de que todas as outras cervejas do mercado não teriam as mesmas qualidades da Bohemia e que, para dizer ser "a primeira e melhor", a empresa teria que comprovar a afirmação.

A defesa apresentou dados comprovando ser a primeira fabricada no Brasil e destacou uma pesquisa entre sommeliers realizada pela revista Playboy na qual a Bohemia ficou em primeiro lugar.

A decisão do recurso ordinário seguiu por unanimidade o determinado em primeira instância: arquivamento em relação ao ponto da Bohemia ser a primeira cerveja do Brasil e alteração sobre a afirmação dela ser "a melhor", citando a pesquisa publicada pela revista Playboy como fonte, necessariamente”103.

Em outro caso, peça publicitária do anunciante Casas Bahia teve que ser alterada, conforme segue:

Exemplo 02:

“Anúncio: “Casas Bahia — 1º pagamento só em novembro”

Representação n° 195/06

Autor: Conar, a partir de queixa de consumidor.

Anunciante e agência: Casas Bahia e Young & Rubicam

Decisão: Alteração.

Fundamento: Artigos 1º, 3º, 27 e 50 letra “b” do Código, seu Anexo "F" e na Súmula de Jurisprudência nº 07 do Conar

Com base em queixa de consumidor paulistano, o diretor-executivo do Conar ofereceu representação contra comercial de TV das Casas Bahia, alegando que a peça pode levar o consumidor ao erro por não esclarecer adequadamente o preço e as condições de parcelamento. A reclamação se refere especialmente ao valor

103 www.conar.org.br, Decisões e casos. Novembro de 2006.

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oferecido no final do comercial, em que o número de parcelas e as demais condições de pagamento são de difícil leitura.

A defesa afirmou que a peça segue o formato de comercial-padrão de 30 segundos, com freqüentes reduções para 15 segundos, e que é fisicamente impossível exibir todas as informações detalhadas da oferta com exatidão nesse período. Por isso, optou por destacar as ofertas especiais, explicando suas condições tanto na narração quanto no lettering.

O relator lembrou que no letreiro informativo devem constar, de forma clara e com absoluta facilidade para o consumidor ler, todas as informações sobre o preço e o pagamento dos produtos — dados que estão ilegíveis na peça em questão. Seu parecer pela alteração do comercial foi aceito por unanimidade”104.

Há que se incluir, aqui, exemplo de decisão envolvendo as empresas de

telefonia, que costumam dar origem a grande volume de reclamações por parte de

consumidores e ocupar diversas pautas de julgamento nos principais tribunais

brasileiros:

Exemplo 03:

“Anúncio: “Até R$ 1.000 todo mês para falar por conta da Vivo”

Representação n° 179/06, em recurso ordinário

Autora: Tim Celular

Anunciante: Telesp Celular (Vivo)

Decisão: Alteração

Fundamento: Artigos 1º, 17, 23 e 50 letra “b” do Código

A Vivo recorreu da decisão que determinou a alteração de seu comercial de TV que oferecia bônus de até R$ 1.000 para o consumidor que adquirisse aparelho de determinada marca. A denúncia foi realizada pela Tim, que alegou que a peça deixava de apresentar ao consumidor restrições e informações essenciais ao seu pleno entendimento. Para a defesa, as regras da promoção são apresentadas de forma clara, tanto na locução quanto nos detalhes fornecidos em lettering e nas informações disponíveis no site da empresa.

O relator do recurso não viu motivos que justificassem a reforma da decisão de primeira instância e manteve o voto pela alteração, aceito unanimemente”105.

104 www.conar.org.br, Decisões e casos. Novembro de 2006. 105 www.conar.org.br, Decisões e casos. Novembro de 2006.

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Possuindo normas específicas para cada tipo de publicidade, o Código de

Auto-Regulamentação apenas detalha normas gerais já previstas no Código de

Defesa do Consumidor.

O julgamento apresentado a seguir vem a ilustrar tal situação:

“Anúncio: “Claro — V3 Black”

Representação n° 194/06

Autor : Conar, a partir de queixa de consumidor

Anunciante e agência: Claro Empresas e F/Nazca

Relatora: Renata Garrido

Sexta Câmara

Decisão: Alteração

Fundamento: Artigos 1º, 3º, 6º, 33, 37 e 50 letra “b” do Código

Com base em queixa de consumidor carioca, o Conar ofereceu representação contra comercial de TV da Claro que mostra uma criança gravando no celular o som de água fervendo em uma chaleira no fogão, alegando que a cena apresenta comportamento de risco, que poderia servir de exemplo deseducativo e perigoso.

A defesa ressalta que, seguindo as normas de segurança doméstica, tomou o cuidado de colocar a alça da chaleira para o lado de dentro do fogão, a fim de que a cena não representasse a exposição da criança a uma situação de perigo. Também afirma que, em função da pouca idade da criança, apesar do filme não mostrar, a menina não estaria sozinha em casa, ou seja, o fogão estaria sendo supervisionado por um adulto.

Ao recomendar a alteração da peça, voto aceito unanimemente, a relatora ponderou que crianças podem tentar repetir a cena da gravação utilizando um celular ou qualquer outro tipo de gravador e que isso poderia causar sérios acidentes”106.

106 www.conar.org.br. Decisãoes e casos. Novembro de 2006.

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Capítulo 4

A Publicidade no Direito das Relações de Consumo

4.1. Princípios do Direito das Relações de Consumo

O artigo 4º. do Código de Defesa do Consumidor, tratando da política

nacional de relações de consumo, estabelece os princípios a serem atendidos,

conforme segue:

“I – reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;

II - ação governamental no sentido de proteger efetivamente o consumidor:

a) por iniciativa direta;

b) por incentivos à criação e desenvolvimento de associações representativas;

c) pela presença do Estado no mercado de consumo;

d) pela garantia dos produtos e serviços com padrões adequados de qualidade, segurança, durabilidade e desempenho;

III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;

IV - educação e informação de fornecedores e consumidores, quanto aos seus direitos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de consumo;

V - incentivo à criação, pelos fornecedores, de meios eficientes de controle de qualidade e segurança de produtos e serviços, assim como de mecanismos alternativos de solução de conflitos de consumo;

VI - coibição e repressão eficientes de todos os abusos praticados no mercado de consumo, inclusive a concorrência desleal e utilização indevida de inventos e criações industriais das marcas e nomes comerciais e signos distintivos, que possam causar prejuízos aos consumidores;

VII - racionalização e melhoria dos serviços públicos;

VIII - estudo constante das modificações do mercado de consumo”121.

121 BRASIL, Lei 8.078/90. Código de Proteção e Defesa do Consumidor.16 ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

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Pode-se, então, consolidar os seguintes princípios basilares do Direito das

Relações de Consumo:

4.1.1. Princípio da Vulnerabilidade

O inciso I do artigo 4º. do Código de Defesa do Consumidor reconhece: o

consumidor é vulnerável. O desembargador Rizzatto Nunes afirma que

“tal reconhecimento é uma primeira medida de realização da isonomia garantida na Constituição Federal. Significa ele que o consumidor é a parte fraca da relação jurídica de consumo. Essa fraqueza, essa fragilidade, é real, concreta, e decorre de dois aspectos: um de ordem técnica e outro de cunho econômico. O primeiro está ligado aos meios de produção, cujo conhecimento é monopólio do fornecedor. E quando se fala em meios de produção não se está apenas referindo aos aspectos técnicos e administrativos para a fabricação e distribuição de produtos e prestação de serviços que o fornecedor detém, mas também ao elemento fundamental da decisão: é o fornecedor que escolhe o que, quando e de que maneira produzir, de sorte que o consumidor está à mercê daquilo que é produzido”122.

É a vulnerabilidade que traduz a importância da regulamentação da

publicidade no sistema das relações de consumo, principalmente em vista do seu

impacto e repercussões na sociedade.

Com propriedade, Antônio Carlos Efing123 ensina:

“Primeiramente, sobre a importância do princípio da vulnerabilidade, devemos analisar o contexto em que se insere o consumidor nas relações de consumo. É bem entendido que o consumidor, na sua acepção ampla, é aquele que se utiliza do fornecimento de produtos ou da prestação de serviços pelo fornecedor. Fica claro portanto, com base nesta assertiva, que a situação do consumidor é a de submissão ao poder dos fornecedores, uma vez que sua escolha de bens de consumo não poderá exceder aquilo que é oferecido no mercado. Esta submissão é a responsável pela fundamentação do princípio da vulnerabilidade que, partindo do pressuposto de que o consumidor depende dos empresários, fornecedores pessoas físicas ou entes despersonalizados para a manifestação de sua vontade, conclui ser o consumidor imprescindivelmente a parte mais frágil da relação de consumo.”

Denota-se, daí, que a vulnerabilidade se configura pelo simples fato de a

pessoa se encontrar na condição de consumidor, não dependendo ou influindo

variáveis como fatores culturais, econômicos, políticos, ou outros. Segundo

122 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Curso de direito do consumidor. p. 125, 126. 123 EFING, Antônio Carlos. Fundamentos do direito das relações de consumo. 2 ed. Curitiba: Juruá, 2004.

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55 Antônio Herman Benjamin124, “a vulnerabilidade do consumidor justifica a

existência do Código”.

Rizzatto Nunes ainda arremata:

“...quando se fala em “escolha” do consumidor, ela já nasce reduzida. O consumidor só pode optar por aquilo que existe e foi oferecido no mercado. E essa oferta foi decidida unilateralmente pelo fornecedor, visando seus interesses empresariais, que são, por evidente, os da obtenção de lucro. O aspecto econômico diz respeito à maior capacidade econômica que, por via de regra, o fornecedor tem em relação ao consumidor. É fato que haverá consumidores individuais com boa capacidade econômica e às vezes até superior à de pequenos fornecedores. Mas essa é a exceção da regra geral”125.

4.1.2. Princípio da Informação

Segundo o professor Efing, o princípio da informação “pode ser considerado

a mais importante baliza norteadora das regras inerentes à Política Nacional das

Relações de Consumo”126.

Nesse sentido, Scartezzini Guimarães afirma:

“Visando à melhoria do mercado de consumo, o Estado, por meio de seus órgãos, e os fornecedores, pela técnica do marketing, deverão educar e informar os consumidores dos direitos e deveres que possuem. Somente com o desenvolvimento da capacidade física, intelectual e moral do ser humano haverá uma sociedade equilibrada e justa, livre dos abusos praticados pelos detentores do poder”127.

Conforme já explanado no Capítulo 2 deste trabalho, Aluízio Ferreira

entende que “a necessidade de informação é a mais básica das necessidades

humanas, constituindo-se o direito a ela num direito fundamentalíssimo,

porquanto pressuposto de todos os demais”128.

124 BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcelos e. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor – comentado pelos autores do anteprojeto. 5 ed. Rio de janeiro : Forense, 1998. 125 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Curso de direito do consumidor. p.126. 126 EFING, Antônio Carlos. op. cit., p. 106. 127 GUIMARÃES, Paulo Jorge Scartezzini. A Publicidade Ilícita e a Responsabilidade Civil das Celebridades que dela Participam, São Paulo : RT, 2001. p. 77 128 FERREIRA, A. Direito à informação, direito à comunicação. São Paulo: IBDC, 1997, p. 80.

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A sistemática imposta pelo CDC obriga o fornecedor a prestar todas as

informações acerca do produto e do serviço, suas características, qualidades,

riscos e outras, sendo que a informação deve ser clara e precisa, não admitindo

falhas ou omissões.

O Superior Tribunal de Justiça expressou manifestação no sentido de

garantir direitos do consumidor em face do princípio da informação, conforme

decisão publicada em dezembro de 2005129, cujo trecho relevante é reproduzido a

seguir:

“AÇÃO COLETIVA DE CONSUMO. PUBLICIDADE DE PRODUTOS ALIMENTARES MODIFICADOS, DIRIGIDOS A LACTENTES, SEM A ADVERTÊNCIA DE DANOS POTENCIAIS À SAÚDE. ART. 9º DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. NEGATIVA DA PARTE DEMANDADA EM FIRMAR COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO. INFORMES PUBLICITÁRIOS QUE DEVEM PROPICIAR O MÁXIMO ESCLARECIMENTO POSSÍVEL, NÃO BASTANDO REFERÊNCIAS GENÉRICAS. AÇÃO PROCEDENTE. MULTA FIXADA COM BASE NO ART. 84, § 4º, DO CDC. A PUBLICIDADE QUE ENVOLVE PRODUTOS NOCIVOS À SAÚDE DO CONSUMIDOR DEVE PROPORCIONAR INFORMAÇÃO AMPLA E DETALHADA, DE MODO A EFETIVAR A PROTEÇÃO BUSCADA PELA LEI. SE A PARTE DEMANDADA SE NEGA A FIRMAR COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO OU COMPOSIÇÃO EM AUDIÊNCIA, EVIDENTE O INTERESSE DO MINISTÉRIO PÚBLICO EM CRIAR UM TÍTULO COM EFICÁCIA COGENTE PARA CONCRETIZAR O CUMPRIMENTO DAS NORMAS TÉCNICAS ESPECÍFICAS. EFICÁCIA CONDENATÓRIA DAS SENTENÇAS PROFERIDAS EM AÇÕES QUE VISAM À DEFESA DE INTERESSES DIFUSOS. ART. 95 DO CDC.” (grifos nossos).

No caso em tela, realce se faz à imposição acerca da informação ampla e

detalhada. Nesse sentido, ensina Roberto Senise Lisboa:

“A preocupação em se conferir ao consumidor a informação relevante sobre o produto e o serviço é global, encontrando-se avançada a disciplinação dada ao tema pelo direito europeu. E a razão é simples: a realidade demonstra, em todo o mundo, uma diferenciação cultural, social e econômica substancial entre o fornecedor e o consumidor médio, que, ademais, não possui o mesmo conhecimento das técnicas alusivas ao produto”130.

129 AG 562478. Publicado em 02/12/2005. 130 LISBOA, Roberto Senise. Responsabilidade civil nas relações de consumo. p. 232.

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Note-se, assim, que os princípios da vulnerabilidade e da informação

configuram-se como princípios norteadores do sistema de proteção do

consumidor, dos quais se podem extrair todos os demais princípios.

4.1.3. Princípio da boa-fé

De forma precursora no direito pátrio, o Código de Defesa do Consumidor

previu a boa-fé objetiva como princípio, sendo que em duas oportunidades de

forma expressa e em diversas outras de forma implícita.

Leciona Scartezzini Guimarães:

“Trouxe assim duas cláusulas gerais sobre esse princípio (da boa-fé): a

primeira, prevista no art. 4º., III, seria uma cláusula geral de conduta em toda a

relação de consumo, impondo aos participantes um comportamento correto nas

fases pré-contratual, de execução e pós-contratual; a segunda, prevista no art. 51,

IV, espelharia a função interpretativa da boa-fé nos contratos, dando como válidas

ou inválidas as cláusulas existentes”131.

Apresenta-se, a seguir, as disposições citadas por Scartezzini, constantes do

Código de Defesa do Consumidor132:

Artigo 4º., III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;

Art. 51 - São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

...

IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade.

131 GUIMARÃES, Paulo Jorge Scartezzini. op. cit., p. 69. 132 BRASIL, Lei 8.078/90. Código de Proteção e Defesa do Consumidor.16 ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

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Há que se ressaltar, ainda, que a boa-fé apresenta-se como pressuposto de

todas as relações humanas, não podendo ser diferente no tocante às relações de

consumo, nas quais sua manifestação reveste-se de ainda mais relevância.

4.2. Princípios Relativos à Publicidade no CDC

Entre os princípios do CDC, destacam-se:

1. Princípio da Vinculação (artigo 30 e 35);

2. Princípio da Identificação (artigo 36);

3. Princípio da Veracidade e não abusividade (artigo 37);

4.2.1. Princípio da Vinculação

O artigo 30 do Código de Defesa do Consumidor, regulando a oferta,

dispõe:

“Art. 30- Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa,

veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e

serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou

dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado” 133.

Da análise desse dispositivo, tem-se que oferecida a mensagem, fica o

fornecedor a ela vinculado, podendo o consumidor exigir seu cumprimento

forçado nos termos do artigo 35134 do CDC.

Surge, então, o questionamento acerca de possíveis erros na oferta e a

eventual recusa do fornecedor em cumprir oferta veiculada de forma equivocada.

Respondendo a tal questão, Rizzatto Nunes apresenta o seguinte posicionamento:

133 BRASIL. Lei 8.078/90. Código de Defesa do Consumidor. 134 Artigo 35 do CDC: Se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá, alternativamente e à sua livre escolha: I - exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade; II - aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente; III - rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos.

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“A resposta à pergunta acima é não, com uma única exceção: é de aceitar o erro como escusa do cumprimento da oferta, se a mensagem, ela própria, deixar patente o erro, pois, caso contrário, o fornecedor sempre poderia alegar que agiu em erro para negar-se a cumprir a oferta”135.

O professor Antônio Carlos Efing136 ainda destaca os princípios da inversão

do ônus da prova, da correção do desvio publicitário e princípio da

regulamentação penal da publicidade.

4.2.2. Princípio da Identificação

Princípio de importância fundamental para o presente estudo. A publicidade

clandestina, dissimulada, é proibida pelo Código de Defesa do Consumidor. O

artigo 36, caput, determina que “A publicidade deve ser veiculada de tal forma

que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal”137.

Antonio Carlos Efing afirma que

“Este artigo proibiu a publicidade clandestina, encoberta por reportagens,

programas televisivos ou informativos impressos que impedem a imediata

visualização do produto ou serviço que está sendo veiculado, técnica conhecida

por merchandising. Assim, restou vedada a publicidade implícita, que confunde o

consumidor e dificulta a identificação do bem ofertado”138.

Com clara sintonia com os princípios da informação, da transparência, da

boa-fé, o princípio da identificação reforça a necessidade de informação clara e

adequada por parte do fornecedor.

4.2.3. Princípio da veracidade e não abusividade

O princípio da veracidade não abusividade vem a reforçar os princípios da

informação, da identificação e da boa-fé, entre outros, vedando a publicidade falsa

e a abusiva, que serão tratadas detalhadamente nos próximos tópicos.

135 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Curso de direito do consumidor. p.392. 136 EFING, Antônio Carlos. Fundamentos do Direito das relações de Consumo. 2 ed. Curitiba : Juruá, 2004. 137 BRASIL. Lei 8.078/90. Código de Defesa do Consumidor. 138 EFING, Antônio Carlos. op. cit. p. 190.

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4.3. A Publicidade Ilícita

Conforme já explanado, as pressões do mercado após a Segunda Grande

Guerra fizeram com que muitas empresas utilizassem de maneira impiedosa as

técnicas publicitárias, muitas vezes de forma abusiva, criando a necessidade de

regulamentação específica.

Nesse sentido, o Código de Defesa do Consumidor veio a discriminar as

formas de publicidade ilícita, especificando-as como abusiva e enganosa.

4.3.1 Publicidade Enganosa

O Código de Defesa do Consumidor traz em seu artigo 37, parágrafo 1º, a

definição de publicidade enganosa:

“É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços”.

A publicidade enganosa, portanto, vicia a vontade do consumidor e

conforme ensina o professor Efing139, “não é necessário que se configure o erro de

fato, que o consumidor, enganado, adquira determinado bem; basta que exista a

possibilidade de ser o consumidor induzido a erro para que se configure a

publicidade enganosa”.

No entendimento de Rizzato Nunes140, a publicidade enganosa pode ser

detectada diariamente, nas ruas, nos conhecidos outdoors das empresas de

telefonia, conforme exemplo trazido na ilustração 03, reproduzido abaixo:

139 EFING, Antônio Carlos. Fundamentos do Direito das relações de Consumo. Curitiba : Juruá, 2004. 140 Em palestra proferida no II Painel Paranaense de Direito do Consumidor, realizado em outubro de 2005 em Curitiba, o professor Rizzato Nunes citou caso

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Figura 03: Exemplo de outdoor com uso do chamado “lettering”.

Analisada à luz do princípio da informação, tal publicidade pode ser

caracterizada como enganosa, segundo o professor, por não oferecer informações

claras e adequadas, induzindo o consumidor em erro.

As informações prestadas pelo anunciante estão em letras minúsculas, em

texto denominado “lettering” pelo mercado publicitário. Tal técnica é combatida

por Rizzatto Nunes, por não cumprir a função informativa.

A enganosidade também pode ocorrer por omissão, conforme parágrafo 3º

do artigo citado, vindo a ser caracterizada quando deixar de informar sobre dado

essencial do produto ou serviço.

Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça já manifestou-se no sentido de

reconhecer a enganosidade por omissão, conforme reproduzido a seguir:

“Há relação de consumo entre o adquirente de refrigerante cujas tampinhas contém impressões gráficas que dão direito a concorrer a prêmios e o fornecedor do produto. A ausência de informação sobre a existência de tampinhas com defeito na impressão, capaz de retirar o direito ao prêmio, configura-se como publicidade enganosa por omissão, regida pelo Código de Defesa do Consumidor”141.

Há que se registrar, ainda, decisão do Superior Tribunal de Justiça em caso

envolvendo publicidade enganosa por ser capaz de induzir consumidor a erro,

através do slogan aposto em rótulo de água mineral “Diet por Natureza”,

conforme segue:

141 REsp 327257 / SP ; julgado em 22/06/2004.

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“SLOGAN PUBLICITÁRIO APOSTO EM RÓTULO DE ÁGUA MINERAL. EXPRESSÃO “DIET POR NATUREZA”. INDUÇÃO DO CONSUMIDOR A ERRO.

1. A definição sobre ser o slogan "diet por natureza" aposto em rótulo de Água Mineral inerente à própria água mineral ou à sua fonte, demanda o reexame de matéria fático-probatória insindicável por esta Corte Superior em sede de recurso especial, ante a incidência do verbete sumular n.° 07/STJ.

2. É assente que "não poderão constar da rotulagem denominações, designações, nomes geográficos, símbolos, figuras, desenhos ou indicações que possibilitem interpretação falsa, erro ou confusão quanto à origem, procedência, natureza, composição ou qualidade do alimento, ou que lhe atribuam qualidades ou características nutritivas superiores àquelas que realmente possuem.” (art. 21, do Decreto-lei n.° 986/69)

3. Na redação do art. 2°, inciso V, do Decreto-lei n.° 986/69, considera-se dietético “todo alimento elaborado para regimes alimentares especiais destinado a ser ingerido por pessoas sãs;”

4. Somente os produtos modificado em relação ao produto natural podem receber a qualificação de diet o que não significa, apenas, produto destinado à dieta para emagrecimento, mas, também a dietas determinadas por prescrição médica, motivo pelo qual a água mineral, que é comercializada naturalmente, sem alterações em sua substância, não pode ser assim qualificada porquanto não podem ser retirados os elementos que a compõem.

5. In casu, o aumento das vendas do produto noticiado pelo recorrido caracteriza a possibilidade de o slogan publicitário encerrar publicidade enganosa capaz de induzir o consumidor a erro.

6. Legalidade da autuação imputada à empresa recorrida.

7. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, provido”142.

4.3.2. Publicidade Abusiva

Artigo 37, parágrafo 2º: “É abusiva, dentre outras, a publicidade

discriminatória de qualquer natureza, a que incite a violência, explore o medo ou a

superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança,

desrespeite valores ambientais, ou seja capaz de induzir o consumidor a se

comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança”.Conforme

142 REsp 447303 / RS. Publicado em 02/10/2003.

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63 Cláudia Lima Marques143, “abusiva é a publicidade anti-ética, que fere a

vulnerabilidade do consumidor,...que fere a própria sociedade como um todo”.

Assim como a publicidade enganosa, em relação à publicidade abusiva não

existe a obrigatoriedade do dano real, bastando que haja perigo e a possibilidade

de ocorrência de um dano.

4.3.3 O “teaser”

“Teaser” são as mensagens que buscam criar expectativa ou curiosidade,

sobretudo em torno de produtos e serviços. Apesar da não identificação imediata

de determinadas informações, o “teaser” não significa, necessariamente, atentado

ao princípio da identificação da publicidade, isto porque as informações são

apresentadas posteriormente ao consumidor. Além disso, mesmo sem todas as

informações, pode o consumidor imediatamente identificá-la como publicidade.

Exemplo:

Figura 04: Primeira mensagem do “teaser”: cria expectativa.

143 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. São Paulo : RT, 1999.

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64 Figura 05: Segunda mensagem do “teaser”: desvenda o mistério.

4.3.4 O “puffing” – técnica do exagero

Ainda sem tradução para a língua portuguesa, a técnica do “puffing” ou

“puffery” utiliza-se de expressões de exagero para evidenciar as qualidades do

anunciante.

Sua definição em inglês é:

“Puffing, or puffery, is claims that are either so vague or exaggerated that a

consumer basically ignores them. Claims like “number one,” “best,” or

“greatest” are puffery. Puffing is considered “sales talk.”” 144.

Utilizando expressões como “número um”, “melhor” ou “o maior”, é

considerado por publicitários (conforme definição citada), como “conversa de

vendedor”, algo identificável pelo consumidor.

Entretanto, à luz do Código de Defesa do Consumidor, especialmente à luz

dos princípios da informação e da boa-fé, tais afirmações merecem melhor

análise.

Dois exemplos ilustram a necessidade de diferenciação da técnica do

“puffing” , com vistas a identificação da licitude da mensagem publicitária:

Figura 06: Anúncio com clara utilização de exagero, típico do “puffing”.

144 Definição de “puffing” segundo o site americano “About False Advertising, disponível em http://www.aboutfalseadvertising.com. Acessado em outubro de 2006.

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No exemplo representado na figura 06, mostra-se claramente o típico

exagero do “puffing” , que é identificado pelo consumidor como mensagem

publicitária lícita.

Mostra-se, a seguir, outro exemplo:

Figura 07: Utilização da expressão “o melhor”, com necessidade de embasamento.

No segundo exemplo (figura 07), utiliza-se a expressão “o melhor

conteúdo”. Nesse caso, com reclamação protocolada no CONAR145, concorrentes

questionaram a veracidade da afirmação veiculada. O anunciante UOL apresentou

defesa, fundamentada em pesquisas que embasaram tal declaração.

Rizzatto Nunes146 afirma que “a utilização de adjetivações exageradas pode

causar enganosidade ou não”. Entende que este tipo de anúncio não está proibido

apenas para as hipóteses em que o exagero é evidente e inofensivo e

simultaneamente não possa enganar o consumidor.

Nesse sentido entende Nelson Nery Junior que o puffing não está proibido

“quando apresentado como publicidade espalhafatosa, cujo caráter subjetivo ou

jocoso não permite que seja objetivamente encarada como vinculante”147.

4.3.5 A publicidade subliminar

A publicidade subliminar, por sua vez, encontra-se totalmente vedada pelo

Código de Defesa do Consumidor, vez que não pode ser identificada como tal.

145 CONAR. <http://www.conar.org.br - casos e decisões> 146 NUNES. Luiz Antonio Rizzatto. Curso de direito do consumidor. p. 471. 147 NERY JÚNIOR, Nelson. Os princípios gerais do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Revista Direito do Consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, v.3, 1992.

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Por definição, “subliminar é qualquer estímulo não captado a nível de

consciência por estar abaixo dos limites sensoriais receptores.”148.

Tratam-se de mensagens utilizadas normalmente através de imagens em

vídeo ou impressas, com duração tão curta que se tornam quase imperceptíveis ao

estado de consciência, porém atuam de forma poderosa no subconsciente,

influenciando o comportamento do indivíduo.

Segundo estudos da ONG Mensagem Subliminar, a primeira experiência

com publicidade subliminar aconteceu nos Estados Unidos, conforme segue:

“Jim Vicary instalou em um cinema de Nova Jersey um segundo projetor especial, taquicógrafo, o qual projetava intermitentemente na tela frases como DRINK COKE e EAT POP CORN. O taquicógrafo pode ser comparado a um tipo de projetor de slides que projeta um único slide na velocidade de 1/3.000 de segundo. No cinema é colocado ao lado do projetor do filme - cuja projeção é ao ritmo de 24 fotogramas por segundo - e fica repetindo a imagem ( sobreposta ao filme) a cada cinco segundos para dar a ilusão de movimento. Durante o filme Picnic, com Kim Novac, no Brasil Férias de Amor, o segundo projetor emitia um slide com a frase Drink Coke numa velocidade de 1/3.000 de segundo. O slide era projetado sobreposto ao filme, rápido demais para ser percebido conscientemente, mas a repetição do sinal subliminar causava efeitos no subconsciente do público, aumentando as vendas da Coca-Cola em 57,7%. Segundo Ronnie Cuperfain e Keith Clarke, os resultados seriam otimizados caso fossem imagens, ícones, no lugar de textos verbais. Ambos comprovaram que o emprego de mensagens subliminares projetadas no campo visual esquerdo (direcionadas assim ao hemisfério direito do cérebro) são mais eficazes quando são empregadas imagens. Wilson Brain Key descreve uma técnica de edição de imagem que gera um mosaico de impressões visuais, chamado efeito Mc Luhan ou Perceptual Overload, e cita os comerciais de TV da Coca-Cola, nos quais até quatro tomadas são mostradas em um só frame, mostrando pessoas e cenários diferentes o que satura o consciente que não consegue forçar um sentido, aceitando a cachoeira de imagens inconscientemente”149.

Observa-se, ainda, que além da publicidade, as mensagens subliminares

atuam de diversas formas, muitas vezes carregadas de imagens que remetem à

morte e à sexualidade, atingindo níveis do subconsciente humano.

148 Definição apresentada no site <http://www.mensagemsubliminar.com.br> 149 Disponível em http://www.mensagemsubliminar.com.br. Acessado em dezembro de 2006.

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67

Figura 08: Cena da animação “Rei Leão”.

Na figura 01 é retratada imagem da animação “Rei Leão”, dos Estúdios

Disney. Na próxima imagem, fica evidenciada a inscrição “sex”.

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Figura 09: Inscrição “sex” na animação infantil.

4.3.5 O “merchandising”

O “merchandising” é a técnica publicitária comumente utilizada em novelas

e filmes, nos quais, sem mencionar que se trata de publicidade, os atores

apresentam, comentam ou utilizam determinados produtos ou serviços.

Conforme Scartezzini150, citando Rizzato Nunes, “a proibição do

merchandising não está ligada a sua enganosidade ou abusividade, que pode até

inexistir, mas sim ao fato de ele não permitir ao consumidor uma imediata

identificação da publicidade”.

De acordo com o Princípio da Identificação, a publicidade deve ser fácil e

imediatamente identificada como tal. O “merchandising”, a priori, fere tal

princípio.

150 GUIMARÃES, Paulo Jorge Scartezzini. A Publicidade Ilícita e a Responsabilidade Civil das Celebridades que dela Participam, São Paulo : RT, 2001.

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69

Em busca de solução para tal problema, Antônio Herman Benjamim,

Cláudia Lima Marques, Nelson Nery Junior e Rizzato Nunes151 entendem como

solução fazer constar antes de cada novela ou filme uma informação de que nele

haverá publicidade na forma de “merchandising”.

Scartezzini apresenta como solução a inserção de informação no momento

do “merchandising”, incluindo, por exemplo, o termo “publicidade”.

Figura 10: O merchandising tornou-se técnica usual em novelas brasileiras.

Para a finalidade do presente estudo, serão apresentados estes aspectos

iniciais da técnica do “merchandising”, ciente, entretanto, de que muitos outros

aspectos relevantes englobam a matéria, sobretudo tendo em vista a influência dos

meios de comunicação e da publicidade na sociedade de consumo.

151 Apud, GUIMARÃES, Paulo Jorge Scartezzini.op. cit. p. 93.

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70

4.3.6. Testemunhais

Segundo Rizzatto Nunes152, “testemunhal é o depoimento, endosso ou

atestado através do qual pessoa ou entidade diferente do anunciante exprime

opinião, ou reflete observação e experiência própria a respeito de um produto”153.

Este é, na verdade, o conceito trazido pelo Código Brasileiro de Auto-

Regulamentação Publicitária154. De acordo com esta definição, o CONAR

disciplina que o testemunhal pode ser classificado como:

“Testemunhal de especialista/perito: é o prestado por depoente que

domina conhecimento específico ou possui formação profissional ou experiência

superior ao da média das pessoas.

Testemunhal de pessoa famosa: é o prestado por pessoa cuja imagem, voz

ou qualquer outra peculiaridade a torne facilmente reconhecida pelo público.

Testemunhal de pessoa comum ou consumidor: é o prestado por quem

não possua conhecimentos especiais ou técnicos a respeito do produto anunciado.

Atestado ou endosso: é o emitido por pessoa jurídica, refletindo a sua

posição oficial.

Por se reconhecer no testemunhal, em qualquer de suas modalidades,

técnica capaz de conferir maior força de comunicação, persuasão e credibilidade à

mensagem publicitária, o CONAR, através do Anexo Q do seu Código, introduz

as seguintes recomendações especiais, além das já instituídas no corpo do Código

(Artigo 27, § 9º):

Testemunhal de Especialista/Perito

O anúncio deverá sempre nomear o depoente e apresentar com fidelidade a

sua qualificação profissional ou técnica.

152 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Curso de direito do consumidor. p. 438. 153 Ibid., p. 438. 154 Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária. Anexo Q. CONAR. <www.conar.org.br>

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71

O produto anunciado deverá ter estrita correlação com a especialidade do

depoente;

O anúncio que se apoiar em testemunho isolado de especialista ou perito

não deverá causar a impressão de que ele reflita o consenso da categoria

profissional, da entidade ou da associação a que, eventualmente, pertença.

O testemunho prestado por profissional estará limitado pelas normas legais

e éticas que disciplinam a respectiva categoria.

Testemunhal de Pessoa Famosa

O anúncio que abrigar o depoimento de pessoa famosa deverá, mais do que

qualquer outro, observar rigorosamente as recomendações do Código.

O anúncio apoiado em testemunhal de pessoa famosa não deverá ser

estruturado de forma a inibir o senso crítico do consumidor em relação ao

produto.

Não será aceito o anúncio que atribuir o sucesso ou fama da testemunha ao

uso do produto, a menos que isso possa ser comprovado.

O Anunciante que recorrer ao testemunhal de pessoa famosa deverá, sob

pena de ver-se privado da presunção de boa-fé, ter presente a sua responsabilidade

para com o público.

Testemunhal de Pessoa Comum ou Consumidor

Sempre que um consumidor for identificado, seu nome e sobrenome devem

ser verdadeiros.

Os modelos profissionais, os empregados do Anunciante ou das Agências de

Propaganda não deverão se fazer passar por Consumidor comum.

O testemunho de Consumidor ficará limitado à experiência pessoal com o

produto, não podendo alcançar assuntos de natureza técnica ou científica a

respeito dos quais não possua capacitação ou habilitação profissional compatível.

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72

Atestado ou Endosso

O atestado ou endosso emitido por pessoa jurídica deverá refletir a sua

posição oficial a respeito do assunto.

Aplicam-se ao atestado ou endosso as recomendações deste Anexo, em

especial as atinentes ao testemunhal de especialistas/peritos.

Normas Relacionadas com a Obtenção e Validade dos Testemunhais

Todo anunciante, ou sua agência, estará obrigado a comprovar/demonstrar a

veracidade do testemunhal, sempre que isto lhe for solicitado.

O testemunhal obtido mediante câmera oculta só poderá ser veiculado com a

autorização expressa da testemunha ou de seus responsáveis. É aceitável que essa

autorização seja obtida através de remuneração.

Normas Relacionadas com a Divulgação de Testemunhos e Atestados

O Anunciante, ou a sua Agência de Propaganda, deverá obter autorização

escrita da testemunha antes de proceder à veiculação. Essa autorização poderá ser

exigida pelos veículos.

Anunciantes concorrentes deverão abster-se da utilização do testemunhal de

uma mesma pessoa ou entidade, sempre que dela possa redundar confusão para o

Consumidor”.

4.4. Publicidade e tecnologia

Conforme demonstrado desde a parte introdutória deste trabalho, a

tecnologia tem sido propulsora da disseminação das formas de comunicação, de

marketing e especialmente da publicidade.

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Há que se observar que existem diversos aspectos relacionados à

publicidade e tecnologia, desde novos meios de comunicação, novas mídias,

novos formatos e novas técnicas.

Para o fim a que se destina o presente estudo, não é focada a tecnologia em

um tópico específico, mas como parte integrante de diversos tópicos e temas

abordados ao longo do estudo.

Note-se, nesse sentido, as questões referentes à globalização e disseminação

de produtos e serviços por meio de novas tecnologias, como internet, tv a cabo e

outros, e a aplicabilidade de todas as normas relativas à publicidade,

independentemente do veículo utilizado para sua comunicação.

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Parte III – Do Jornalismo

Capítulo 5

Liberdade de informação

5.1 Sobre a liberdade

Conceituar liberdade é tarefa das mais árduas, considerando que diversos

estudos da ciência, como a filosofia, sociologia, antropologia e ciências políticas

têm-se preocupado, desde a Antigüidade, com a questão.

Ao tratar do tema, José Cretella Júnior ensina: “O vocábulo liberdade, tomado aqui em seu mais amplo sentido jurídico, é materialmente derivado do latim libertate, acusativo do nome libertas, libertatis, equivalente ao grego eleuthería, incluindo-se entre as palavras mais ricas em significados, de tal modo que não pode, numa simples anotação, ser analisada, em todos os complexos matizes em que se desdobra”189.

Assim, em campo tão complexo e instigante, nota-se que tem sido o

Estado o organizador dos meios mais eficientes de coerção e é através da busca do

exercício da liberdade que o povo tem aprendido a se defender da interferência

estatal. Nesse sentido, no que concerne às prerrogativas do cidadão em face do

Estado, Celso Ribeiro Bastos as denomina liberdades públicas, direitos humanos

ou individuais, assim tratando da relação entre indivíduo e o poder estatal:

“Há como que uma repartição da tutela que a ordem jurídica oferece: de um lado

ela guarnece o Estado com instrumentos necessários à sua ação, e de outro

protege uma área de interesse do indivíduo contra qualquer intromissão do

aparato oficial”190.

Objetivamente, para os fins a que se destina o presente estudo, toma-se a

definição dos romanos, num claro enfoque do âmbito jurídico da liberdade:

“Libertas est naturalis facultas quod cuique facere libet, nisi id quod vi aut jure

prohibetur”191. (Liberdade é a faculdade natural de alguém fazer o que lhe apraz, a

menos que seja impedido pela violência ou pelo direito).

189 CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários à Constituição brasileira. p.85. 190 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito constitucional. p. 165. 191 RODRIGUES, Dirceu. Brocardos jurídicos. p. 232.

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5.2 Liberdade de informação e expressão

A liberdade de informação está intimamente relacionada à liberdade de

pensamento (que dela decorre) e à liberdade de expressão. Encontram-se, ambas,

no rol das liberdades públicas.

A liberdade de expressão nada mais é do que a exteriorização da liberdade

de pensamento. A Declaração de Direitos do Homem de 1789, em seu artigo 11,

reforça essa idéia: “A livre comunicação dos pensamentos e das opiniões é um

dos direitos mais preciosos do homem; todo cidadão pode, pois falar, escrever,

exprimir-se livremente, sujeito a responder pelo abuso desta liberdade nos casos

determinados pela lei”.

Solidificado e arraigado no seio da humanidade, o princípio da liberdade

tornou-se difundido internacionalmente através das sociedades políticas

internacionais, verificado através da Declaração Americana de Direitos e Deveres

do Homem, aprovada pela IX Conferência Interamericana em Bogotá, na

Colômbia e na Convenção Européia para a Proteção dos Direitos Humanos e das

Liberdades Fundamentais.

Sucede que se a liberdade de pensamento é direito inato ao homem e a sua

expressão mera concretização desse direito, há que existir uma ordem jurídica que

lhe garanta o exercício dessa prerrogativa; há que existir, pois, regulamentações.

Rousseau, em O Contrato Social, sabiamente assevera:

“Uma vez que homem nenhum possui uma autoridade natural sobre seu

semelhante, e pois que a força não produz nenhum direito, restam as convenções

como base de toda autoridade legítima entre os homens”192.

Deste modo, tem-se que a liberdade de expressão necessita da proteção

jurídica, exemplarmente demonstrada por Celso Ribeiro Bastos:

“Para que possa exercitar a liberdade de expressão de seu pensamento, o homem,

como visto, depende do direito. É preciso, pois, que a ordem jurídica lhe assegure

esta prerrogativa e, mais ainda, que regule os meios para que se viabilize esta

transmissão. Assim, estão intimamente conectados com o direito ora em estudo o

192 ROUSSEAU, Jean-Jaques. O contrato social. p. 25.

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estatuto jurídico dos meios de comunicação, da imprensa, das telecomunicações e

até da correspondência”193.

Vale ressaltar, entretanto, que embora pareçam ter o mesmo significado,

liberdade de expressão e de informação não significam a mesma coisa. A

Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso IX, assim dispõe: “É livre a

manifestação da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação,

independentemente de censura e licença”194.

Dessa análise decorre a diferenciação, conforme ensina Vidal Serrano:

“A atividade intelectual se refere a qualquer forma de manifestação criativa do

pensamento. E a crítica, na medida em que contém um juízo de valor, apontando

qualidades e defeitos da obra dissecada, implica uma criação intelectual. Por via

de conseqüência, tutelando-se o direito à livre atividade intelectual, tutela-se a

crítica jornalística”195.

Oduvaldo e Rogério Donnini, nessa seara, bem resumem a diferenciação,

afirmando que:

“A liberdade de expressão tem um significado mais abrangente, pois diz respeito

à expressão de idéias, pensamentos, enquanto que a liberdade de informação é o

direito de informar e receber informação sobre acontecimentos que são objeto de

divulgação, considerados notícia”196.

Daí, tem-se evidenciada a liberdade de informação exercida pelos meios

de comunicação, foco central desse estudo, que se convencionou chamar liberdade

de imprensa.

5.3 Liberdade de Imprensa

John Adams, presidente dos Estados Unidos de 1797 a 1801, acerca da

dificuldade de regulamentação da imprensa, afirmou:

193 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito constitucional. p. 187. 194 BRASIL. Constituição Federal. Art. 5º, IX. 195 NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. A proteção constitucional da informação e o direito à crítica jornalística. p. 77. 196 DONNINI, Oduvaldo e Rogério Ferraz. Imprensa livre, dano moral, dano à imagem e sua quantificação à luz do novo Código Civil. p.40.

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“Caso, algum dia, venha a ocorrer um aperfeiçoamento do gênero humano, os

filósofos, teólogos, legisladores, políticos e moralistas descobrirão que a

regulamentação da imprensa é o problema mais importante, difícil e perigoso que

eles terão de resolver197”.

A frase de John Adams, presidente dos Estados Unidos de 1797 a

1801 mostra-se atual e muito bem poderia ser proferida por um político

brasileiro no início do século XXI .

A origem etimológica de imprensa é latina e vem de impressa, impressu,

que significa prensa das artes gráficas. Embora existam diversas correntes acerca

da origem do jornalismo, como afirmam Oduvaldo e Rogério Donnini, da maneira

como é conhecido atualmente, “só se pode conceber seu início na Idade

Contemporânea, numa sociedade industrializada, com máquinas de impressão,

num Estado liberal”.9

Vale frisar que por imprensa, atualmente, subentende-se toda atividade

jornalística, não apenas impressa, mas aquela veiculada através de qualquer meio

(rádio, televisão, internet, etc).

Como, então, regulamentar a liberdade de imprensa sem feri-la? Tal

questão tem proporcionado exaustivo debate, com destaque para a discussão nos

Estados Unidos, onde o tema esbarra na aplicação da 1ª Emenda Constitucional,

que afirma: “O Congresso não promulgará nenhuma lei que reduza a liberdade de

expressão e de imprensa”. Esse dispositivo, que claramente veda a criação de

regulamentações que limitem a livre expressão, proporcionou o desenvolvimento

de uma imprensa extremamente atuante e participativa. Segundo Jane E. Kirtley,

professora de ética e legislação da mídia da Faculdade de Jornalismo e

Comunicação de Massa da Universidade de Minnesota, nos Estados Unidos, a

opinião dos americanos em relação à mídia é de que existe liberdade demais.

Kirtley atesta a constante batalha travada nos tribunais, onde a liberdade de

informação não raramente colide com direitos individuais, concluindo que

“não é fácil viver com uma imprensa livre. Significa ser desafiado, desanimado,

despedaçado, transtornado e enfurecido - todos os dias. E há ocasiões em que os

197 Apud, Kirtley, Jane E. Cardozo Law Review, p.133. 2000, disponível em <http://www.cardozo.yu.edu/cardlrev/v22n1/lewis.pedf>

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cidadãos dos EUA não têm certeza que os fundadores da nação tomaram a

decisão certa 200 anos atrás quando apoiaram uma imprensa livre”198.

Deve-se observar, pois, que a liberdade de imprensa não pertence aos

veículos de comunicação, aos donos de jornais, tampouco aos jornalistas; é na

verdade um valor democrático da sociedade.

Lutar por uma imprensa livre é quesito básico de uma sociedade

democrática; entretanto, imprensa livre não significa que haja um poder ilimitado

no direito de informar. Nesse sentido, mais uma vez Oduvaldo e Rogério Donnini

bem descrevem a relação de equilíbrio de direitos:

“Em verdade, essa limitação a esse direito (de informar) advém, como dissemos,

da própria Constituição Federal e leis federais, na medida em que outros bens,

também considerados fundamentais (liberdade, honra, imagem, vida privada,

intimidade) são igualmente relevantes e indispensáveis numa democracia. A

liberdade de imprensa, assim, não é um direito que transcende outros da mesma

natureza constitucional, mas subsiste com estes, desde que não os viole”199.

5.4 Liberdade de Imprensa no Brasil

Discorrer sobre liberdade de imprensa, ou sobre a busca da liberdade de

imprensa no Brasil é tratar de um tema recente. Até o século XVII, não houve

nenhuma tentativa tipográfica no país, sendo que a própria entrada de livros era

dificultada. A abertura no campo da comunicação só começou a mudar no século

XIX, com a chegada da Corte ao Brasil.

Denota-se, da análise do aprofundado estudo de Felipe Chiarello200 acerca

da origem do direito de expressão no Brasil, que a Constituição Política do

Império marcou o primeiro registro constitucional da liberdade de expressão no

país. Somente em 24 de fevereiro de 1891 foi promulgada a primeira Constituição

da República dos Estados Unidos do Brazil, que trazia em seu artigo 72, parágrafo

12, o seguinte texto: “Em qualquer assunpto é livre a manifestação do pensamento

pela imprensa, ou pela tribuna, sem dependência de censura, respondendo cada

198 KIRTLEY, Jane E. Cardozo Law Review, p.133. 2000, disponível em <http://www.cardozo.yu.edu/cardlrev/v22n1/lewis.pedf> 199 DONNINI, Oduvaldo e Rogério Ferraz. Imprensa livre, dano moral, dano à imagem e sua quantificação à luz do novo Código Civil. p.49. 200 PINTO, Felipe Chiarello de Souza. Os símbolos nacionais e a liberdade de expressão. p. 85.

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um pelos abusos que commetter nos casos e pela fórma que a lei determinar. Não

é permitido o anonymato”.

A partir de então, o princípio da liberdade de expressão sedimentou-se nas

constituições brasileiras, até consolidar-se na Carta Magna de 1988,

configurando-se como a mais ampla garantia ao cidadão, norteando todas as

demais diretrizes acerca do tema.

Entretanto, em pleno século XXI, liberdade de imprensa plena ainda é um

objetivo a ser alcançado. As limitações à livre expressão jornalística, que segundo

Silvio Barbosa ainda mantêm a censura viva no Brasil, mesmo após o regime

militar, sempre existiram:

“O fim oficial da censura política não significou, porém, que a tesoura do censor

também tenha se aposentado. A censura se mantém viva, afetando nossa imprensa

de duas formas: pela ação da censura judicial, a autorizada por um juiz, e também

pela menos conhecida das censuras, a econômica, que define o que pode ou não

ser divulgado, de acordo com o interesse de anunciantes e proprietários dos

veículos de comunicação”201.

O fim do regime militar, todavia, foi um marco de libertação para a livre

expressão do pensamento. Há que se frisar, entretanto, que foi durante o período

de ditadura que o Brasil teve publicada a Lei de Imprensa, que até os dias de hoje

disciplina a matéria, tendo recebido poucas alterações. Apesar de reconhecidas

falhas e das distorções interpretativas, a Lei de Imprensa foi durante os anos de

repressão o caminho para a defesa dos profissionais de comunicação. Vale dizer

que a mesma lei que serviu como fonte para censurar, serviu também para que se

buscasse a garantia do direito de informação. Publicada em 9 de fevereiro de

1967, a Lei 5.250, que regula a liberdade de manifestação do pensamento e de

informação, dispõe em seu capítulo 1o: “É livre a manifestação do pensamento e a

procura, o recebimento e a difusão de informações ou idéias, por qualquer meio, e

sem dependência ou censura, respondendo cada um, nos termos da lei, pelos

abusos que cometer”202.

201 BARBOSA, Silvio. A imprensa e as diferentes formas de censura. p.1. 202 BRASIL. Lei 5.250/67. Lei de imprensa.

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Discutindo a lei de imprensa, boletim publicado pelo Instituto Gutenberg

traçou os principais tópicos, abordando com profundidade as questões polêmicas.

Sobre os objetivos da legislação, o estudo é bastante claro:

“Leis de imprensa devem ter um único e exclusivo objetivo: regular as relações

da sociedade com a mídia de notícias, ou seja, assegurar os direitos

constitucionais dos cidadãos e das instituições no campo da informação pública.

Esses direitos estão no mesmo campo e têm a mesma estatura democrática da

liberdade de imprensa”203.

Nesse sentido, trata do cidadão a quem se destinam as informações

jornalísticas de forma moderna, colocando-o no patamar de consumidor de

informações e aborda a função da lei, além de resguardar o direito de liberdade de

informação, o de resguardar o direito de ser bem informado:

“A lei deve garantir irrestrita liberdade de imprensa, e, para que essa liberdade

seja de fato efetiva, garantir simultaneamente a reação pronta e eficaz contra o

mau jornalismo, e com ele a calúnia, a injúria, a difamação, a imprecisão, a falta

de ética, a falta de checagem das versões e dos fatos, a deficiente apuração, a

distorção, o boato profissionalizado, o truque, a montagem, a manipulação, a

chantagem, a extorsão, os linchamentos morais e a corriqueira negação do direito

de resposta. Se os cidadãos (os consumidores-leitores) não puderem combater

esses desatinos, a liberdade de imprensa deixa de ser um valor democrático de

mão dupla, para estreitar-se em pista única onde a mídia passeia a última

palavra”204.

Constata-se, pois, que o direito de informação e expressão encontra-se

amplamente resguardado pela legislação pátria. Há que se buscar, então,

instrumentos que permitam delimitar até onde vai o exercício de um direito e onde

começa o abuso. A respeito, destaca-se decisão do Tribunal de Alçada Criminal

de São Paulo, que teve como relator o Juiz Silva Rico, em 1990, em que dando

provimento ao apelo de um político e conseqüentemente condenando um

jornalista, asseverou:

“a liberdade de criticar é uma liberdade natural. Mas criticar não é destruir,

ofender, injuriar, difamar, violentar a dignidade alheia. Embora exprimir opinião

203 Instituto Gutenberg. Boletim n.8, p.2. 204 Ibid., p.2-3.

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seja um dos direitos mais nobres do homem no seio da sociedade, constituindo

direito fundamental e elemento essencial democrático que garante a livre

discussão das idéias, constitui crime a crítica veemente e ofensiva contra alguém,

principalmente quando tem em mira uma campanha de cunho pessoal, visando a

vítima determinada e dolosamente”205.

Desta forma, a limitação da liberdade de imprensa surge como necessidade

não apenas da sociedade, mas da própria imprensa; seja através de lei, de

regulamentações, ou da própria auto-fiscalização, o controle da liberdade de

informação é vital para a sobrevivência do direito, impedindo que prosperem

meios externos repressores. Há que se descobrir, pois, quais os instrumentos

legítimos para a limitação da liberdade de informação, sem que haja agressão a

seus princípios básicos.

205 Tribunal de Alçada Criminal /SP. Apelação no. 577.455/0, 1990.

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Capítulo 6

Limitações à Liberdade

6.1. Restrições à liberdade de informação

Como visto, a liberdade de informação não é um direito absoluto. Há que

existir, pois, meios que ofereçam limites a essa liberdade com vistas a delimitar

sua atuação, principalmente em relação aos direitos da personalidade.

Além da tutela jurisdicional e da ampla coleção de diplomas legais acerca

do tema, já abordados anteriormente, deve-se atentar, também, às outras formas de

restrições à liberdade de informação. Em relação a estas restrições, de maneira

contundente, Silvio Barbosa, assevera que a “censura” ainda ocorre no Brasil de

duas maneiras: “pela ação da censura judicial, a autorizada por um juiz, e também

pela menos conhecida das censuras, a econômica”223 . A questão referente às

decisões judiciais merece extremo cuidado em sua abordagem, pois sabe-se que a

independência e autonomia do poder judiciário são fundamentos essenciais de um

estado democrático de direito.

Os juízes, entretanto, não são infalíveis e erros e distorções, infelizmente,

podem ser observados na jurisprudência brasileira. Nesse ponto, Rodrigo Haidar

responsabiliza as pesadas condenações a veículos de comunicação como a

causadora de inibições às redações e o conseqüente prejuízo do jornalismo

investigativo:

“A golpes de pena, com pesadas condenações, o Judiciário está traçando novas

fronteiras para a imprensa brasileira. A ameaça das indenizações por dano moral

tornou as edições mais cautelosas. Já não se pode fazer notícia como antigamente.

O sinal verde de um advogado tornou-se tão decisivo quanto o dos censores da

ditadura militar. A coragem do jornalismo combativo e a irresponsabilidade das

pessoas que usam a imprensa para prejudicar pessoas injustamente foram

igualmente refreadas”224.

223 BARBOSA, Silvio. A imprensa e as diferentes formas de censura. p.3. 224 Apud, BARBOSA, Silvio.op. cit. p.3.

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Percebe-se, portanto, a preocupação em avaliar os reais abusos e

usurpações do direito de informar em face de abusos do direito da personalidade,

evitando o crescimento da “indústria da indenização” contra meios de

comunicação, a exemplo do que ocorre nos Estados Unidos, como já informado.

Haidar salienta que em São Paulo um único escritório de advocacia especializado

patrocina mais de 400 processos contra órgãos de imprensa. Como desfecho na

busca de harmonização entre direitos, Haidar afirma: “Entre a doutrina e a

Constituição, resta a esperança de que a liberdade de expressão seja respeitada em

sua boa fé. E que o direito à proteção da honra seja dado a quem a tenha”225.

Ao tratar do envolvimento de fatores externos influenciadores das

redações de empresas jornalísticas, mais uma vez o advogado e jornalista Silvio

Barbosa aponta características que levam ao que chama de “autocensura”:

“O interesse público, que deveria pautar o dia-a-dia da imprensa, acaba ficando

em segundo plano frente aos interesses econômicos das empresas de

comunicação social. Há uma divisão clara dentro de uma empresa jornalística:

tem-se uma sala de redação, onde, teoricamente, se busca a verdade para

transmiti-la, e um departamento comercial interessado nos balanços financeiros,

no lucro....

... O poder de um grande anunciante é suficiente para manter ou tirar do ar um

programa ou mesmo o veículo de comunicação inteiro”226.

6.2. A questão ética e o jornalismo responsável

Além das limitações externas, abordadas na seção anterior, observa-se a

importância do controle interno a ser praticado por veículos de comunicação.

Trata-se, em verdade, da prática profissional responsável e que configura-se como

premissa básica à atividade jornalística.

Segundo o professor Luiz Martins da Silva, o jornalismo brasileiro

“terá de abandonar uma certa Idade do Ouro, um estágio primitivo caracterizado

pela boa preguiça, em troca de novos hábitos, o principal deles, a apuração. Até

recentemente, predominava a impunidade e a certeza de que nada aconteceria aos

detratores, mesmo porque não havia uma cultura de reação e de proteção às

225 Apud, BARBOSA, Silvio, op. cit., p.2 226 BARBOSA, Silvio. A imprensa e as diferentes formas de censura. p.3.

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vítimas, nem a atuação de mecanismos de crítica, fiscalização e controle, a

exemplo dos observatórios e institutos de imprensa, duas das modalidades dos

chamados“cães-de-guarda” da imprensa, uma cultura que começa a se formar no

Brasil”227.

Ressalte-se, ainda, que a responsabilidade dos meios de comunicação

extrapola o âmbito jurídico e engloba a responsabilidade social da atividade. Não

atentando a esta realidade, uma empresa jornalística estará fadada ao fracasso,

senão pela condenação judicial, ao menos pela condenação pública da sociedade.

Ética e responsabilidade apresentam-se ao jornalista como instrumentos

básicos de atuação, tornando-se características que a sociedade tem aprendido a

exigir cada vez mais dos profissionais e das empresas. Luiz Martins entende que,

entre os fatores que levam a estas exigências, destacam-se: primeiramente,

“a ressonância encontrada na opinião pública brasileira por grandes erros da imprensa, notadamente os casos Jorge Mirândola, Escola Base e Bar Bodega. Um segundo diz respeito à freqüência com que os veículos de imprensa têm sido sentenciados a pagar multas pesadas em dinheiro, em função de danos morais praticados, ou seja, as vítimas estão aprendendo que as vias legais podem ser efetivas, embora, muitas vezes, sejam desproporcionais”228.

Há que se observar, portanto, a característica de função social dos meios

de comunicação, conforme explanação do professor Guilherme Cunha Pereira:

“O reconhecimento da função social dos meios de comunicação não é importante apenas para o fim de disciplinar as sanções ao seu abuso. Igualmente relevante é a consideração dessa função para disciplinar as garantias que se devem assegurar à imprensa para o escorreito desempenho dos seus fins”229.

Cunha Pereira ressalta que algumas garantias decorrem da própria

Constituição Federal, observando o relevante reconhecimento específico da

função social dos meios de comunicação e conclui:

“A função social de uma empresa não é nunca algo acrescentado, como algo

forâneo ao fim desta mesma empresa. Integra esse mesmo fim e corresponde à

lógica da sua própria natureza, enquanto agrupamento humano de pessoas em

227 SILVA, Luiz Martins. op. cit. p. 1. 228 Ibid.,p.1. 229 PEREIRA, Guilherme D. Cunha. Liberdade e Responsabilidade dos Meios de Comunicação. RT: SP, 2002.

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contato com outras pessoas e ao serviço delas. A função social das empresas

informativas é, se assim se pode dizer, ainda mais evidente e mais intensa do que

aquela que compete a outras empresas. O correto e adequado exercício da

atividade informativa contribui com peso considerável para o incremento do bem

comum”230.

Abordando com profundidade o tema da responsabilidade social das

empresas, Fabiane Lopes Bueno Netto Bessa231 afirma que “o refletir sobre a

sociedade e a participação social não pode prescindir do contexto econômico, mas

também não pode abstrair o conteúdo humano que permeia o agir econômico,

político e social”.

E, ilustrando sua abordagem acerca da ética na atividade empresarial, cita

trecho de “O medo à liberdade”, de Erich Fromm, publicado no Brasil em 1965,

reproduzido a seguir:

“A notícia do bombardeio de uma cidade e da morte de centenas de pessoas é imprudentemente seguida ou interrompida por um anúncio de sabonete ou de vinho. (...) Os jornais descrevem as idéias frívolas ou os hábitos alimentares de uma debutante, gastando o mesmo espaço e empregando a mesma seriedade que dedicam ao relato de acontecimentos de importância científica ou artística”232.

Analisando tal citação, Fabiane Bessa afirma que “é constrangedor pensar

que a falta de referências traduzida nas palavras de Fromm talvez seja um dos

grandes laços que unem os seres humanos”233.

Na esteira deste pensamento, trazendo à baila a questão da

responsabilidade social das empresas de comunicação, denota-se que essa função

social não significa que o reconhecimento ético-social da função social dessas

empresas não tenha uma dimensão jurídica. Do ponto de vista jurídico, mostra-se

fundamental a disciplina, de caráter sancionatório, do conteúdo da informação

prestada por veículos de comunicação, a fim de reprimir da forma mais adequada

os abusos e agressões. No mesmo tópico, Cunha Pereira frisa a importância da

existência de uma adequada disciplina concorrencial dos meios de comunicação,

com vistas a atender à dicção do parágrafo 5º do artigo 220 da Constituição 230 PEREIRA, Guilherme Doring Cunha. Liberdade e responsabilidade dos meios de comunicação. p.93. 231 BESSA, Fabiane L. B. N.. Responsabilidade social das empresas – práticas sociais e regulação jurídica. p. 221. 232 Ibid, p. 222. 233 Ibid, p.222.

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Federal e, fundamentalmente, para atender ao interesse da mais ampla difusão da

informação, estabelecido pela Constituição no inciso XIV do artigo 5º.

Ainda nesse compasso, Pereira afirma:

“A natureza mesma do bem que é prestado pelos meios de comunicação, isto é, a

informação, ilumina a realidade do que se disse. A informação relevante para a

sociedade tem caráter genético imediatamente pessoal, na medida em que procede

sempre do engenho pessoal e mediatamente social. Por outro lado, tem uma

destinação social evidente, tanto por ser devida pelo membro da sociedade

enquanto membro, quanto pelo seu conteúdo, tudo isso facilitado mediante a sua

difundibilidade, em razão da natureza imaterial que lhe é própria”234.

Com base nas implicações desse papel social e da responsabilidade ética

dos profissionais e empresas de comunicação surge a inafastável discussão acerca

da responsabilidade civil que permeia essa questão.

6.3. Responsabilidade civil do profissional e da e mpresa de

comunicação

Em face da diversidade e complexidade de desdobramentos da

responsabilidade civil, tratar-se-á, especificamente, da responsabilidade civil do

jornalista e da empresa de comunicação, que encontra, inclusive, parâmetros

estipulados na Lei de Imprensa.

O artigo 49 da referida lei assim dispõe em seu parágrafo 2º: “Se a

violação de direito ou o prejuízo ocorre mediante publicação ou transmissão em

jornal, periódico ou serviço de radiodifusão, ou de agência noticiosa, responde

pela reparação do dano a pessoa natural ou jurídica que explora o meio de

informação ou divulgação”. O parágrafo 3º, por sua vez, estabelece: “Se a

violação ocorre mediante publicação de impresso não periódico, responde pela

reparação do dano: a) o autor do escrito, se nele indicado; ou b) a pessoa natural

ou jurídica que explora a oficina impressora, se do impresso não consta o nome do

autor”.

234 Ibid., p. 94.

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Percebe-se, pois, que a intenção do legislador foi a de responsabilizar as

empresas jornalísticas que, provavelmente, possuem muito mais condições de

arcar com a reparação de danos do que os jornalistas. Entretanto, a jurisprudência

caminhou em entendimento diverso, aceitando a responsabilização tanto do autor

como do veículo, a exemplo do acórdão235 publicado pela Superior Tribunal de

Justiça, através de sua Terceira Turma, que entendeu que o autor do escrito

ofensivo responde diretamente perante o lesado, pelos danos causados, sem

prejuízo da responsabilidade da empresa jornalística.

Com amparo na obra de Donnnini, nota-se que

“há quem sustente ser a empresa jornalística a responsável pela reparação do dano em função de seu dever de fiscalização, ou seja, deveria ela realizar a seleção de seus articulistas, jornalistas e suas respectivas matérias, antes de publicá-los e divulgá-los. Entretanto, além de, na prática, ser inviável esse controle interno, seja pela rapidez da informação, seja pela interpretação do que seria ou não ofensivo, essa não é a questão primacial, visto que a responsabilidade da empresa não se discute. Esse argumento apenas reforça ser ela um dos responsáveis, juntamente com o autor do escrito”236.

Embora ainda continuem a ser encontrados julgados com decisões

conflitantes acerca da responsabilidade civil, a Súmula 221 do Superior Tribunal

de Justiça vem estabelecer o seguinte: “São civilmente responsáveis pelo

ressarcimento de dano, decorrente de publicação pela imprensa, tanto o autor do

escrito quanto o proprietário do veículo de comunicação”.

Denota-se, portanto, em face da Súmula 221 do STJ, que tanto o autor da

publicação como a empresa que explora a atividade podem figurar no pólo

passivo da ação de reparação de danos proposta pelo ofendido.

6.3.1. Danos morais – breves considerações

Estabelecidos os critérios para definição da responsabilidade civil,

enfrenta-se, então, a questão da quantificação das indenizações fundadas nas

demandas de danos morais em virtude dos abusos do exercício da liberdade de

expressão.

235 STJ. Resp. 57.033-RS. Acórdão da Terceira Turma. Publicado no Diário da Justiça em 20/04/1998. 236 DONNINI, Oduvaldo e Rogério Ferraz. Imprensa livre, dano moral, dano à imagem e sua quantificação à luz do novo Código Civil. p.141

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A Lei de Imprensa, em seus artigos 51, 52 e 56, estipula limites

indenizatórios (a chamada indenização tarifada), diferenciando limites para o

profissional: até 20 salários mínimos e para a empresa: até dez vezes esse valor.

Em seu profundo estudo acerca da liberdade de imprensa, e valendo-se de sua

experiência como magistrado, Cláudio Luiz Bueno de Godoy237 mostra a

incongruência entre a citada lei e a Constituição Federal, conforme exposto a

seguir: “Veja-se que, coerente com a proteção e elevação mesmo da dignidade

como valor fundamental, a Constituição, em seu próprio texto, tratou de tutelar, de

forma integral, direitos da personalidade, como visto emanação da condição

humana”. E, mais adiante, sustenta:

“Por último, diga-se, quanto à fixação do dano moral, que ela se dá por

arbitramento judicial, nos termos do Código Civil Brasileiro. Nesse passo,

superada, como se viu, a disposição dos artigos 51 e 52 da Lei nº 5.250/67, não se

considera haja hipótese outra de máxima reparação possível da ofensa provocada,

na esteira do que pretendeu a Constituição Federal, sem quaisquer limitações

especiais preestabelecidas, de valor ou tempo diferenciado, conforme igualmente

expendido”238.

Em relação a esse poder do juiz de analisar o caso concreto e ponderar

acerca da justa reparação com clareza Oduvaldo e Rogério Donnini asseveram:

“A palavra moderação, do latim “moderatione”, significa diminuição, minoração,

redução. Esse sentido não exprime, com precisão, o que deve fazer o magistrado

no momento da fixação da importância indenizatória. Sem dúvida que deve haver

moderação, prudência, cautela, desde que não exista proporcionalidade no pedido

ou em decisões anteriores, nos juízos inferiores. Seria impróprio afirmar-se que

um determinado valor, por ser moderado e, portanto, não exagerado, reparasse de

maneira mais adequada um dano moral, por evitar o enriquecimento sem

causa”239.

Nos valores fixados nas demandas de indenizações por danos morais e à

imagem, o Superior Tribunal de Justiça tem exercido o que se chama “controle”

237 GODOY, Cláudio Luiz Bueno. A liberdade de imprensa e os direitos da personalidade. p.118. 238 Ibid., p.119. 239 DONNINI, Oduvaldo e Rogério Ferraz. Imprensa livre, dano moral, dano à imagem e sua quantificação à luz do novo Código Civil. p.162.

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de valores, ora reduzindo importâncias excessivas, ora aumentando indenizações

consideradas irrisórias.

Percebe-se, pois, que ao realizar essa tarefa o STJ corrige eventuais

distorções, evitando, assim, que o ofendido não seja reparado satisfatoriamente da

lesão que sofreu, ou ainda que seja evitado um enriquecimento injusto.

Um dos grandes assuntos que tem preocupado a imprensa e envolve o

poder judiciário diz respeito ao risco de surgir o que se chama “indústria da

indenização”, a exemplo do que ocorre nos Estados Unidos, conforme bem

exemplifica o professor Silvio Barbosa:

“Nos Estados Unidos, a indústria da indenização levou meios de comunicação a

criarem um outro profissional que cuida das notícias, além do jornalista: o

advogado de redação. É pelas mãos dele que textos e reportagens mais polêmicos

devem passar, sendo publicado somente depois de analisadas as questões legais

relacionadas à matéria jornalística. Porém, num país onde a liberdade de imprensa

é sacralizada e respeitada por todos os poderes, o risco de uma punição milionária

não interfere na capacidade investigativa do jornalismo”240.

Barbosa destaca ainda que no Brasil já existem precedentes recentes em

que órgãos de imprensa foram condenados a pagar grandes indenizações para

reparar danos morais e materiais. A realidade nacional ainda é muito diversa da

Inglaterra e Estados Unidos, conta o professor, onde grandes jornais e televisões

fazem seguros para não correrem o risco de “quebrar” em caso de processos. “A

respeitada BBC, de Londres, utiliza esse expediente há mais de quinze anos, além

de contar com um departamento jurídico e um orçamento específico de quase um

milhão de dólares para acordos”241, cita Barbosa.

240 BARBOSA, Silvio. A imprensa e as diferentes formas de censura. p.8. 241 BARBOSA, Silvio. Op. cit. p.9.

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Parte IV

Marketing X Jornalismo – Da necessidade de adequaçã o ao sistema jurídico

Capítulo 7 - Conflito e busca de equilíbrio

7.1. Marketing e jornalismo no Brasil

Conforme tratado anteriormente261, especialmente na análise do princípio

da identificação da publicidade previsto no artigo 36 do Código de Defesa do

Consumidor, é proibida no Brasil a publicidade disfarçada.

Ressalta-se, entretanto, com base nos exemplos estudados262, em especial

os casos de merchandising, que publicitários e anunciantes têm utilizado tal

técnica com profusão, especialmente nas novelas brasileiras, infringindo

claramente às disposições do CDC.

Ainda mais relevante, mostra-se a análise da crescente difusão da técnica

de merchandising nos veículos de informação jornalística, potencializando

sobremaneira os malefícios de tal artifício.

Há que se recordar, então, que toda publicidade deve ser facilmente

identificada como tal pelo consumidor, conforme disposto no artigo 36 do CDC:

“A publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e

imediatamente, a identifique como tal”263.

Conforme afirma Rizzatto Nunes264,

“Uma boa tática para enganar consumidores é a de plantar publicidade nos veículos de comunicação (especialmente mídia impressa – jornais e revistas -, mas também rádio e tv) travestida de matéria jornalística. É que, como o

261 Cf. item 4.2 e seguintes. 262 Cf. item 4.3.5., acerca do merchandising. 263 BRASIL. Lei 8.078/90. Código de Defesa do Consumidor. Artigo 36. 264 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. op. cit. p.441.

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consumidor tende a acreditar na peça jornalística como que apresentando um evento verdadeiro, toma a ficção como realidade e é enganado”.

Ocorre que, a despeito da flagrante ilegalidade, anunciantes-fornecedores,

amparados por astutas agências de publicidade têm utilizado (impunemente)

diversas técnicas de publicidade disfarçada de conteúdo editorial265.

Em aprofundado estudo sobre os limites da separação entre comercial e

editorial, Wagner Belmonte afirma que

“uma técnica em voga na publicidade gera forte polêmica. É a criação de anúncios que, de tão integrados ao contexto gráfico e conceitual do veículo, acabam por misturar-se ao editorial de forma sub-reptícia”266.

Belmonte complementa:

“Na língua favorita do ambiente publicitário, advertainment é um neologismo que apadrinha a fusão entre advertising (publicidade) e entertainment (entretenimento). O mote é mais uma das aparentemente incontáveis formas de interatividade do mundo contemporâneo. Para aproximar tanto quanto possível a mensagem publicitária da jornalística, as agências estudam o “ambiente editorial” da mídia e encaixam a mensagem de forma simbiótica”267.

Trata-se, na verdade, da formalização de técnicas ilícitas, com claros

objetivos de potencializar o impacto da publicidade por meio da “adaptação” do

anúncio ao conteúdo editorial.

Tais técnicas surgem, segundo o jornalista Otavio Frias Filho268, devido às

dificuldades financeiras que atravessam diversos veículos de comunicação, que

acabam por ceder às tentações meramente financeiras, deixando de lado os

princípios da ética e da liberdade de imprensa.

Resta evidenciado, portanto, o conflito entre a liberdade de expressão

jornalística, a liberdade de expressão praticada pelos publicitários e a Lei

8.078/90, no que concerne à identificação da publicidade.

265 BELMONTE, Wagner. Entre a sobrevivência e a credibilidade. p. 40. 266 Ibid., p. 40. 267 Ibid., p.41. 268 Apud. BELMONTE, Wagner. op. cit. p.40.

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7.2. Da diferenciação entre a liberdade de imprensa e a

liberdade de expressão publicitária

Há que se fazer, nesse momento, a necessária diferenciação entre a

liberdade de expressão jornalística, tida como liberdade de imprensa269, exercida

por profissionais e empresas jornalísticas, e a liberdade de expressão publicitária,

desenvolvida, conforme sua essência270, com fins comerciais.

Ambas as liberdade abordadas têm origem na liberdade de expressão e

encontram amparo constitucional. A Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso

IX, explicita: “É livre a manifestação da atividade intelectual, artística, científica e

de comunicação, independentemente de censura e licença”271.

Ocorre que, devido às especificidades de suas atuações e repercussões na

sociedade, mereceram tratamento distinto do legislador infra-constitucional. Tal

tratamento tem origem, especialmente, na análise de suas funções e seus

objetivos.

As diversas possibilidades de conteúdo de um ato comunicativo ensejam

classificação segundo critérios igualmente diversos. Obedecendo ao critério que

distingue as mensagens quanto à função ou efeito pretendido, Guilherme Cunha

Pereira272 propõe “num primeiro plano, a informação jornalística propriamente

dita (atualizadora e pedagógica ou instrutiva), a informação publicitária ou

propagandística e a recreativa ou de entretenimento”.

Para os fins a que se destina o presente estudo, se aterá à análise da

informação jornalística e da publicitária.

No que concerne à atividade da imprensa, sabiamente Bueno de Godoy

observa que

269 Ver itens 5.2 e 5.3. deste trabalho. 270 Ver itens 2.1.4 e 2.1.5, que tratam dos conceitos de publicidade e sua diferenciação para a propaganda. 271 BRASIL. Constituição Federal. Art. 5º, IX. 272 PEREIRA, Guilherme D. Cunha. Liberdade e responsabilidade dos meios de comunicação. p 53.

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“a função jornalística, não se pode negar, cumpre mais que uma finalidade informativa. Forma, a rigor, a consciência de uma comunidade. Quando menos, a tanto concorre, de forma decisiva. Forja valores culturais e sociais, divulgando e estimulando a produção artística, literária, econômica, fomentando a relação entre povos e países. Não vão longe os exemplos, em nosso país, da importância da atividade jornalística. Não há como negar o decisivo papel dos meios de comunicação no desdobramento de acontecimentos recentes, de depuração política e moral, que mostra bem a relevância social, mais que garantia da expressão de direitos individuais e constitucionais, que o pleno exercício da liberdade de imprensa representa, alicerçando regime que se pretenda democrático”.

Seguindo esse raciocínio, Oduvaldo e Rogério Donnini atestam que a

imprensa, atualmente, não possui apenas a função de informar e criticar,

afirmando que

“além desses atributos, os meios de comunicação agregaram outras atividades que, teoricamente, não seriam propriamente de seu âmbito de atuação, tais como investigar, denunciar (no sentido jornalístico e não jurídico) e fiscalizar. No Brasil, essa atividade jornalística tem superado, em muito, a função que seria das autoridades policiais e administrativas. Diante da inércia ou ineficiência do poder público, a imprensa tem investigado, com eficiência, casos relacionados a atividades ilícitas (civis e penais) e apontado os infratores, que integram os mais elevados postos dos poderes legislativo, executivo e judiciário, além de empresários e membros da sociedade de todas as classes”273.

Percebe-se, assim, que a atividade jornalística configura-se como suporte

fundamental ao sistema democrático. A existência de uma imprensa livre,

independente é garantia da defesa dos valores essenciais da sociedade. Mereceu,

no sistema jurídico brasileiro, tratamento especial, mesmo durante o período de

regime militar.

Embora já narrado anteriormente274, há que se frisar, mais uma vez, que

foi durante o período de ditadura que o Brasil teve publicada a Lei de Imprensa,

que até os dias de hoje disciplina a matéria, tendo recebido poucas alterações.

Como dito, apesar de reconhecidas falhas e das distorções interpretativas, a Lei de

Imprensa foi durante os anos de repressão o caminho para a defesa dos

profissionais de comunicação. Vale dizer que a mesma lei que serviu como fonte

para censurar, serviu também para que se buscasse a garantia do direito de

informação. Publicada em 9 de fevereiro de 1967, a Lei 5.250, que regula a

liberdade de manifestação do pensamento e de informação, dispõe em seu capítulo

273 DONNINI, Oduvaldo e Rogério Ferraz. Imprensa livre, dano moral, dano à imagem e sua quantificação à luz do novo Código Civil. p. 51,52. 274 Ver item 5.4.

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1o: “É livre a manifestação do pensamento e a procura, o recebimento e a difusão

de informações ou idéias, por qualquer meio, e sem dependência ou censura,

respondendo cada um, nos termos da lei, pelos abusos que cometer”275.

Salienta-se, em relação à publicidade, a conveniência de se estabelecer

perfeito entendimento em relação à sua conceituação.

Com base no Dicionário Enciclopédico de Jornalismo, o site especializado

no mercado publicitário www.alavip.com.br apresenta as seguintes definições:

“Anúncios. 1. Os anúncios constituem espécie do gênero “Matéria Ineditorial”. Constituem propaganda direta que, com propaganda indireta, formam um outro gênero - a publicidade."

Publicidade. 1. Arte de despertar no público o desejo de compra, levando-o à ação. Conjunto de técnicas de ação coletiva, utilizadas no sentido de promover o lucro de uma atividade comercial, conquistando, aumentando ou mantendo clientes." (Dicionário de Propaganda e Jornalismo, 1986)”276.

A liberdade de expressão publicitária, conforme explanado no início desse

tópico, encontra amparo na carta Constitucional.

Entretanto, a legislação infra-constitucional cuidou de regulamentar,

muitas vezes detalhadamente, os limites da liberdade de expressão publicitária.

Nesse sentido, destacam-se as leis específicas para determinadas matérias,

exemplificadas no Capítulo 3 desta obra. Somam-se, ainda, as normas

regulamentadoras do Conselho de Auto-Regulamentação Publicitária – CONAR,

tratadas no item 3.3.. E, por óbvio, destaca-se a regulamentação geral e

principiológica do Código de Defesa do Consumidor.

A diferenciação de tratamento jurídico da publicidade em comparação ao

jornalismo reside na essência dos objetivos de regulação. Enquanto se busca

preservar ao máximo a liberdade de conteúdo e forma da expressão jornalística,

objetiva-se limitar cuidadosamente a atuação, tanto na forma quanto no conteúdo

da publicidade. Mostra-se, então, explícita a vontade do legislador, impondo

tratamento diferenciado para a atividade jornalística e para a publicitária.

275 BRASIL. Lei 5.250/67. Lei de imprensa. 276 http://www.alavip.com.br .Acessado em dezembro de 2006.

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Nota-se, conforme exposto, que uma das características marcantes da

liberdade de imprensa encontra-se no caráter imparcial da informação veiculada.

Mesmo que permita o posicionamento do jornalista ou do veículo de

comunicação, contém em sua essência a busca dos fatos, disponibilizando o

contraditório e buscando efetivamente o exercício da informação.

Por outro lado, a liberdade de expressão publicitária é marcada pela total

parcialidade. Tem objetivo, como demonstrado anteriormente, além do informar:

persuadir e convencer seu público-alvo em favor de quem a patrocina. Óbvio,

então, que recebam tratamento jurídico diverso.

Constata-se, assim, que a liberdade de expressão publicitária encontra

guarida enquanto liberdade de expressão artística, intelectual, cujo conteúdo tem a

finalidade comercial. Seu conteúdo, pois, é disciplinado por leis específicas

(conforme o tema veiculado), normas auto-regulamentadoras do CONAR e pelo

Código de Defesa do Consumidor. Não se aplica, portanto, a mesma tutela da

liberdade de informação jornalística, especialmente a Lei de Imprensa.

Em face dos conflitos apresentados entre mensagem publicitária e

conteúdo editorial, percebe-se que o Código de Defesa do Consumidor impõe

limites à publicidade, incluindo padrões quanto à sua forma de apresentação nos

meios de comunicação. Há que se buscar, pois, instrumentos que propiciem a

adequação de tais técnicas publicitárias ao sistema jurídico brasileiro.

7.3 Necessidade de adequação ao sistema jurídico

Apresentados os conflitos entre a publicidade, especialmente a publicidade

dissimulada e o jornalismo, restou evidenciada a necessidade de conformação

jurídica de tais atividades, especialmente à luz do Código de Defesa do

Consumidor.

Conforme visto, com base na lição de Rizzatto Nunes, a técnica do

“merchandising” afronta diretamente a norma disposta no artigo 36 do Código de

Defesa do Consumidor.

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O citado autor277 define “merchandising” como

“a técnica utilizada para veicular produtos e serviços de forma indireta por meio de inserções em programas e filmes. Dessa maneira, muitos produtos são veiculados sem que os consumidores se dêem conta de que o que eles estão assistindo significa uma prática publicitária, mesmo nos casos mais evidentes. De fato, quando uma personagem importante da novela das 8 entra num bar e pede uma Coca-Cola, o telespectador-consumidor não sabe se aquela demonstração específica é ou não publicidade do produto veiculado. Nem tudo é, mas muitas são”.

Ressaltando que muitas vezes fica claro para o consumidor que se trata de

publicidade, Rizzatto Nunes278 afirma que o problema está no “merchandising”

típico da clandestinidade, uma vez que a finalidade dessa técnica é exatamente

não aparecer como publicidade. E afirma que, ao se deparar com uma

publicidade disfarçada, “o consumidor toma a ficção por realidade, perde o

senso crítico e a capacidade de escolha. E, assim, sem liberdade de escolha, o

CDC acaba sendo contrariado como um todo em sua filosofia, que pressupõe a

avaliação crítica do consumidor”.

Considerando, então, a credibilidade que pressupõe o jornalismo, no

exercício legítimo da liberdade de imprensa, a publicidade clandestina disfarçada

de conteúdo editorial apresenta-se como afronta não apenas ao CDC, mas aos

princípios da liberdade de informação e aos princípios basilares da sociedade

democrática.

Necessária se faz, pois, a identificação de instrumentos que propiciem a

conformação da atividade publicitária, em especial dos anúncios em veículos de

comunicação de cunho editorial, sobretudo sob o ponto de vista do princípio da

identificação, previsto no Código de Defesa do Consumidor.

Há que se registrar, nesse momento, que a doutrina tem se preocupado

com a questão da publicidade clandestina nos programas de entretenimento, como

novelas, filmes e programas de auditório. A publicidade travestida de conteúdo

editorial não tem sido enfrentada, no meio jurídico279, restando apenas as análises

277 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. op. cit. p.461. 278 Ibid., p.462. 279 Nesse sentido, Paulo Jorge Scartezzini aborda, em poucas palavras, a “publicidade redacional”. Rizzato Nunes trata exclusivamente do “merchandising” nos filmes, novelas e programas de entretenimento. No mesmo sentido, Nelson Nery Junior, op. cit. p. 67.

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97 dos meios jornalísticos e publicitários que, por óbvio, limitam-se às questões

éticas do fenômeno.

Socorrendo-se, então, das proposições apresentadas para os casos de

publicidade clandestina nas novelas, filmes e programas de entretenimento,

tomam-se tais propostas como orientação para os casos relacionados ao

jornalismo. Nesse sentido, Rizzatto Nunes afirma que

“uma alternativa de solução que permite, ainda que com algum embaraço, a continuidade de utilização dessa técnica parece ser a inclusão, antes da exibição do filme, programa ou novela, de um aviso de que na programação que se seguirá estará sendo usado o “merchandising””.

Assim, note-se que Antônio Herman Benjamin, Cláudia Lima Marques,

Nelson Nery Junior e Luiz Antonio Rizzatto Nunes280 apontam para a mesma

solução ao problema, qual seja fazer constar antes de cada novela ou filme uma

informação de que nele haverá uma publicidade na forma de “merchandising”.

Paulo Jorge Scartezzini Guimarães, por sua vez, entende que

“talvez a solução seja obrigar a inclusão no momento efetivo do “merchandising” de informação ou do termo “publicidade”. Essa solução não é perfeita, pois em um país onde grande parte da população é analfabeta, a identificação da publicidade não existirá; todavia, até o momento, é a solução que nos parece mais eficaz”281.

Nota-se, pois, que as proposições apontam para a inserção de aviso,

(informe publicitário, publicidade, ou similar), sendo que tal solução pode ser

aproveitada para a publicidade em veículos editoriais.

Constata-se, portanto, que a solução proposta objetiva resguardar os

direitos do consumidor contra a publicidade ilícita, nesse caso a publicidade

disfarçada de matéria jornalística, destacando-se nesse sentido o Princípio da

Identificação da publicidade.

280 Apud, GUIMARÃES. Paulo Jorge Scartezzini, op. cit. p. 110. 281 GUIMARÃES. Paulo Jorge Scartezzini, op. cit. p. 112.

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Conclusão

Os temas abordados nesse trabalho são apresentados, em síntese, visando a

traçar a seqüência teórica que conduz às seguintes conclusões.

Primeiramente, constata-se que a chamada “Era da Informação” caracteriza-

se pela presença cada vez mais constante da comunicação, em todas as suas

formas, no cotidiano da sociedade pós-moderna. A expansão de empresas e

produtos, em escala mundial, encontra sintonia no avanço da globalização. E

repercute, conseqüentemente, na expansão, em igual escala, dos grandes grupos

de comunicação e agências de publicidade.

As agências e seus clientes anunciantes encontram resistência,

especialmente pela capacidade das pessoas de diferentes países de cederem a um

argumento publicitário, quando este não está inserido em sua cultura. Destaca-se,

nesse ponto, que uma das principais barreiras encontradas pelos anunciantes-

fornecedores na tarefa de imposição de padrões globais de consumo refere-se

justamente aos aspectos jurídicos de cada país. Assim, percebe-se a importância

da identificação dos limites jurídicos das ferramentas de marketing, especialmente

da publicidade, à luz da legislação brasileira.

Fundamental, para a busca do melhor entendimento dos aspectos jurídicos

do fenômeno publicitário, a fixação de conceitos de informação, marketing,

oferta, propaganda e publicidade. Destaca-se, nesse ponto, a relevante

diferenciação, sob o ponto de vista jurídico, entre as definições de publicidade e

propaganda. A propaganda diz respeito à divulgação de idéias de cunho político,

religioso, ideológico, filosófico, moral ou de qualquer outra natureza, enquanto

manifestação de pensamento livre e a todos permitida, sem nenhum interesse

direto ou indireto no complexo das relações próprias do mercado de consumo,

estando excluída da proteção do Código de Defesa do Consumidor. Cuida, pois, o

CDC, da publicidade, definida como toda atividade destinada a estimular o

consumo de bens e serviços, bem como a promover instituições, com fins

comerciais.

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Embora a publicidade não esteja disposta em capítulo exclusivo na

Constituição da República, encontram-se variados dispositivos direta ou

indiretamente a ela relacionados. Além da previsão constitucional, leis específicas

normatizam a matéria, existindo ainda a auto-regulamentação do CONAR e as

normas gerais e principiológicas do Código de Defesa do Consumidor.

O Código de Defesa do Consumidor, especialmente, regulamenta a

publicidade no Brasil de forma pública, estatal, possuindo poder coercitivo. Entre

os princípios relativos à publicidade, destacam-se: Princípio da Vinculação (artigo

30 e 35); Princípio da Identificação (artigo 36); Princípio da Veracidade e não

abusividade (artigo 37).

Com importância fundamental para o presente estudo, o Princípio da

Identificação dispõe que a publicidade clandestina, dissimulada, é proibida pelo

Código de Defesa do Consumidor. Nesse sentido, o artigo 36, “caput”, determina

que “A publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e

imediatamente, a identifique como tal”282.

Com clara sintonia com os princípios da informação, da transparência, da

boa-fé, o princípio da identificação reforça a necessidade de informação clara e

adequada por parte do fornecedor.

Conforme estudado, as pressões do mercado após a Segunda Grande Guerra

fizeram com que muitas empresas utilizassem de maneira impiedosa as técnicas

publicitárias, muitas vezes de forma abusiva, criando a necessidade de

regulamentação específica. Nesse sentido, o Código de Defesa do Consumidor

veio a discriminar as formas de publicidade ilícita, especificando-as como abusiva

e enganosa.

O Código de Defesa do Consumidor traz em seu artigo 37, parágrafo 1º, a

definição de publicidade enganosa:

“É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza,

282 BRASIL. Lei 8.078/90. Código de Defesa do Consumidor.

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características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços”.

O artigo 37, parágrafo 2º do CDC dispõe: “É abusiva, dentre outras, a

publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite a violência, explore

o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência

da criança, desrespeite valores ambientais, ou seja capaz de induzir o consumidor

a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança”.

Constata-se, então, da análise da técnicas publicitárias, que algumas delas

são permitidas pela lei, a exemplo do “teaser” e do “puffing” (observados alguns

requisitos). Outras, entretanto, mostram-se vedadas, como a publicidade

subliminar e o “merchandising”, no conceito de publicidade clandestina.

Sob o ponto de vista do jornalismo, destaca-se a questão da liberdade de

informação e especialmente da liberdade de imprensa. Lembrando que a liberdade

de informação é o direito de informar e receber informação sobre acontecimentos

que são objeto de divulgação, considerados notícia. Daí, tem-se evidenciada a

liberdade de informação exercida pelos meios de comunicação, foco desse estudo,

que se convencionou chamar liberdade de imprensa.

Constata-se que a limitação da liberdade de imprensa surge como

necessidade não apenas da sociedade, mas da própria imprensa; seja através de lei,

de regulamentações, ou da própria auto-fiscalização, o controle da liberdade de

informação é vital para a sobrevivência do direito, impedindo que prosperem

meios externos repressores. Necessários, pois, instrumentos legítimos para a

limitação da liberdade de informação, sem que haja agressão a seus princípios

básicos.

Conclui-se, então, que é de grande relevância a análise da crescente

difusão da técnica de merchandising nos veículos de informação jornalística,

potencializando sobremaneira os malefícios de tal artifício. Esse encontro

evidencia, portanto, o conflito entre a liberdade de expressão jornalística, a

liberdade de expressão praticada pelos publicitários e a Lei 8.078/90, no que

concerne à identificação da publicidade.

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Nesse sentido, percebe-se que as diversas possibilidades de conteúdo de

um ato comunicativo ensejam classificação segundo critérios igualmente diversos.

Obedecendo ao critério que distingue as mensagens quanto à função ou efeito

pretendido, tem-se num primeiro plano, a informação jornalística propriamente

dita (atualizadora e pedagógica ou instrutiva), a informação publicitária ou

propagandística e a recreativa ou de entretenimento.

Constata-se, assim, que a liberdade de expressão publicitária encontra

guarida enquanto liberdade de expressão artística, intelectual, cujo conteúdo tem a

finalidade comercial. Seu conteúdo, pois, é disciplinado por leis específicas

(conforme o tema veiculado), normas auto-regulamentadoras do CONAR e pelo

Código de Defesa do Consumidor. Não se aplica, portanto, a mesma tutela da

liberdade de informação jornalística, especialmente a Lei de Imprensa.

Em face dos conflitos apresentados entre mensagem publicitária e

conteúdo editorial, percebe-se que o Código de Defesa do Consumidor impõe

limites à publicidade, incluindo padrões quanto à sua forma de apresentação nos

meios de comunicação.

Com base na pesquisa realizada, percebe-se que ao se deparar com uma

publicidade disfarçada, o consumidor toma a ficção por realidade, perde o senso

crítico e a capacidade de escolha. E, assim, sem liberdade de escolha, o CDC

acaba sendo contrariado como um todo em sua filosofia, que pressupõe a

avaliação crítica do consumidor.

Considerando, então, a credibilidade que pressupõe o jornalismo, no

exercício legítimo da liberdade de imprensa, a publicidade clandestina disfarçada

de conteúdo editorial apresenta-se como afronta não apenas ao CDC, mas aos

princípios da liberdade de informação e aos princípios basilares da sociedade

democrática.

Nota-se, à luz da análise doutrinária, que as proposições apresentadas

apontam para a inserção de aviso, (informe publicitário, publicidade, ou similar),

sendo que tal solução pode ser aproveitada para a publicidade em veículos

editoriais.

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Nesse caso, resta comprovada a ilictude das chamadas “matérias-pagas”,

das “reportagens publicitárias” e anúncios que tentam fundir-se com o conteúdo

jornalístico. E observa-se a necessidade de explícita identificação dos anúncios

publicitários, destacando-os das matérias e reportagens, com vistas a não

confundir o consumidor.

Constata-se, portanto, que a solução proposta objetiva resguardar os

direitos do consumidor contra a publicidade ilícita, especialmente a publicidade

disfarçada de matéria jornalística, destacando-se nesse sentido o Princípio da

Identificação.

Conclui-se, por fim, que a despeito dos aparentes conflitos entre a

publicidade e o jornalismo, as soluções residem na aplicação conjugada das

normas éticas da imprensa e da publicidade e, juridicamente, da aplicação do

Código de Defesa do Consumidor. É o CDC, pois, que vai tutelar direitos básicos

do cidadão em face da publicidade veiculada em meios de comunicação.

O verdadeiro Estado democrático de direito deve ser permeado pela

liberdade responsável, que só é alcançada com o amadurecimento da democracia e

o pleno gozo de direitos por parte dos cidadãos. Cabe ao Código de Defesa do

Consumidor combater a publicidade ilícita e, conseqüentemente, resguardar

direitos indispensáveis ao exercício da cidadania e ao fortalecimento da

democracia no Brasil.

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Anexo 1

Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitár ia.

(Não inclui anexos).

CAPÍTULO I - INTRODUÇÃO Considerando: - as diretrizes da legislação publicitária do País, especialmente capituladas na Lei nº 4.680, de 18 de junho de 1965, e no Decreto nº 57.690, de 1º de fevereiro de 1966; - as recomendações das Câmaras de Comércio Internacionais (ICC - International Chamber of Commerce) e as diretrizes do Código Internacional da Prática Publicitária, editado originalmente em 1937 e revisto em 1949, 1955 e 1966 e, finalmente, em 1973 durante o Congresso realizado no Rio de Janeiro e cujos termos foram adotados pelo Brasil e 250 entidades de mais de 40 países; - as diretrizes da Associação Internacional de Propaganda (IAA - International Advertising Association) e seus Congressos Mundiais, especialmente as que constam de seu estudo "Effective Advertising Self Regulation", publicado em 1974, e as recomendações do XXV Congresso Mundial de Propaganda realizado em Buenos Aires em 1976; - as diretrizes do I Congresso Brasileiro de Propaganda (Rio de Janeiro, outubro de 1957), e as normas consubstanciadas no Código de Ética dos Profissionais de Propaganda então aprovadas; - os termos da instrução nº 1 da Febrasp, assinada em 23 de abril de 1968, recomendando a criação de Comissões de Ética nas entidades publicitárias; - as recomendações do II Congresso Brasileiro de Propaganda (São Paulo, fevereiro de 1969), especialmente no que toca ao autopoliciamento das agências e anunciantes; - as recomendações do I Encontro Nacional de Anunciantes, promovido pela ABA - Associação Brasileira de Anunciantes (São Paulo, dezembro de 1974); - as recomendações feitas na I Conferência Internacional de Anunciantes (Rio de Janeiro, maio de 1975); - as recomendações do simpósio realizado pela Comissão de Comunicações da Câmara dos Deputados (Brasília, junho/julho 75); - os caminhos apontados pelas lideranças do setor publicitário e pelas autoridades nos debates do II Encontro Brasileiro de Mídia, realizado em São Paulo em setembro de 1976; e - as sugestões do I Seminário Brasileiro de Propaganda (Gramado, outubro de 1976); Considerando que a publicidade deve ser confiável no conteúdo e honesta na apresentação, pois é da confiança pública que depende o seu êxito; Considerando, ainda, que as peças de publicidade e, de forma geral, a atividade publicitária se acham naturalmente subordinadas ao império da lei e devem reger-se pelo princípio da legalidade; Considerando, finalmente, que as repercussões sociais da atividade publicitária reclamam a espontânea adoção de normas éticas mais específicas, as entidades abaixo assinadas, representativas do mercado brasileiro de publicidade, instituem pelo presente instrumento, este Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária. São Paulo, 05 de maio de 1980. ABAP - Associação Brasileira das Agências de Propaganda. (a) Petrônio Cunha Corrêa. ABA - Associação Brasileira de Anunciantes. (a) Luiz Fernando Furquim de Campos.

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107 ANJ - Associação Nacional de Jornais. (a) Roberto Marinho. ABERT - Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão. (a) Carlos Cordeiro de Mello. ANER - Associação Nacional de Editores de Revistas. (a) Pedro Jack Kapeller. Central de Outdoor. (a) Carlos Alberto Nanô. Desde então, várias outras associações representativas de novos veículos de comunicação publicitária, tais como emissoras de TV por assinatura, internet e marketing direto, aderiram ao Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária. SEÇÃO 1 - Preâmbulo Artigo 1º Todo anúncio deve ser respeitador e conformar-se às leis do país; deve, ainda, ser honesto e verdadeiro. Artigo 2º Todo anúncio deve ser preparado com o devido senso de responsabilidade social, evitando acentuar, de forma depreciativa, diferenciações sociais decorrentes do maior ou menor poder aquisitivo dos grupos a que se destina ou que possa eventualmente atingir. Artigo 3º Todo anúncio deve ter presente a responsabilidade do Anunciante, da Agência de Publicidade e do Veículo de Divulgação junto ao Consumidor. Artigo 4º Todo anúncio deve respeitar os princípios de leal concorrência geralmente aceitos no mundo dos negócios. Artigo 5º Nenhum anúncio deve denegrir a atividade publicitária ou desmerecer a confiança do público nos serviços que a publicidade presta à economia como um todo e ao público em particular. Artigo 6º Toda publicidade deve estar em consonância com os objetivos do desenvolvimento econômico, da educação e da cultura nacionais. Artigo 7º De vez que a publicidade exerce forte influência de ordem cultural sobre grandes massas da população, este Código recomenda que os anúncios sejam criados e produzidos por Agências e Profissionais sediados no país - salvo impossibilidade devidamente comprovada e, ainda, que toda publicidade seja agenciada por empresa aqui estabelecida. SEÇÃO 2 - Objetivos Artigo 8º O principal objetivo deste Código é a regulamentação das normas éticas aplicáveis à publicidade e propaganda, assim entendidas como atividades destinadas a estimular o consumo de bens e serviços, bem como promover instituições, conceitos ou idéias. Parágrafo único – Não são capituladas neste Código as atividades de Relações Públicas e “Publicity”, por serem ambas distintas tanto da publicidade quanto da propaganda. Artigo 9º A atividade publicitária de que trata este Código será sempre ostensiva. § 1o – A alusão à marca de produto ou serviço, razão social do anunciante ou emprego de elementos reconhecidamente a ele associados atende ao princípio da ostensividade. § 2o – O “teaser”, assim entendida a mensagem que visa a criar expectativa ou curiosidade no público, poderá prescindir da identificação do anunciante, do produto ou do serviço.

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108 Artigo 10 - A publicidade indireta ou “merchandising” submeter-se-á igualmente a todas as normas dispostas neste Código, em especial os princípios de ostensividade (art. 9o) e identificação publicitária (artigo 28). Artigo 11 - A propaganda política e a político-partidária não são capituladas neste Código. Artigo 12 A publicidade governamental, bem como a de empresas subsidiárias, autarquias, empresas públicas, departamentos, entidades paraestatais, sociedades de economia mista e agentes oficiais da União, dos Estados, dos Territórios, dos Municípios e do Distrito Federal, salvo proibição legal, deve se conformar a este Código da mesma forma que a publicidade realizada pela iniciativa privada. Artigo 13 A publicidade de causas, instituições sociais, fundações ou de quaisquer outras atividades ou entidades sem fins lucrativos também será regida por este Código, em tudo que lhe couber. SEÇÃO 3 - Interpretação Artigo 14 Este Código deve ser aplicado no espírito tanto quanto na letra. Artigo 15 Os padrões éticos de conduta estabelecidos neste Código devem ser respeitados por quantos estão envolvidos na atividade publicitária, sejam Anunciantes, Agências de Publicidade, Veículos de Divulgação, sejam Publicitários, Jornalistas e outros Profissionais de Comunicação participantes do processo publicitário. Artigo 16 Embora concebido essencialmente como instrumento de autodisciplina da atividade publicitária, este Código é também destinado ao uso das autoridades e Tribunais como documento de referência e fonte subsidiária no contexto da legislação da propaganda e de outras leis, decretos, portarias, normas ou instruções que direta ou indiretamente afetem ou sejam afetadas pelo anúncio. Artigo 17 Ao aferir a conformidade de uma campanha ou anúncio aos termos deste Código, o teste primordial deve ser o impacto provável do anúncio, como um todo, sobre aqueles que irão vê-lo ou ouvi-lo. A partir dessa análise global é que se examinará detalhadamente cada parte do conteúdo visual, verbal ou oral do anúncio, bem como a natureza do meio utilizado para sua veiculação. Artigo 18 Para os efeitos deste Código: a. a palavra anúncio é aplicada em seu sentido lato, abrangendo qualquer espécie de publicidade, seja qual for o meio que a veicule. Embalagens, rótulos, folhetos e material de ponto-de-venda são, para esse efeito, formas de publicidade. A palavra anúncio só abrange, todavia, a publicidade realizada em espaço ou tempo pagos pelo Anunciante; b. a palavra produto inclui bens, serviços, facilidades, instituições, conceitos ou idéias que sejam promovidos pela publicidade; c. a palavra consumidor refere-se a toda pessoa que possa ser atingida pelo anúncio, seja como consumidor final, público intermediário ou usuário. CAPÍTULO II - PRINCÍPIOS GERAIS SEÇÃO 1 - Respeitabilidade

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109 Artigo 19 Toda atividade publicitária deve caracterizar-se pelo respeito à dignidade da pessoa humana, à intimidade, ao interesse social, às instituições e símbolos nacionais, às autoridades constituídas e ao núcleo familiar. Artigo 20 Nenhum anúncio deve favorecer ou estimular qualquer espécie de ofensa ou discriminação racial, social, política, religiosa ou de nacionalidade. Artigo 21 Os anúncios não devem conter nada que possa induzir a atividades criminosas ou ilegais - ou que pareça favorecer, enaltecer ou estimular tais atividades. SEÇÃO 2 - Decência Artigo 22 Os anúncios não devem conter afirmações ou apresentações visuais ou auditivas que ofendam os padrões de decência que prevaleçam entre aqueles que a publicidade poderá atingir. SEÇÃO 3 - Honestidade Artigo 23 Os anúncios devem ser realizados de forma a não abusar da confiança do consumidor, não explorar sua falta de experiência ou de conhecimento e não se beneficiar de sua credulidade. SEÇÃO 4 - Medo, Superstição, Violência Artigo 24 Os anúncios não devem apoiar-se no medo sem que haja motivo socialmente relevante ou razão plausível. Artigo 25 Os anúncios não devem explorar qualquer espécie de superstição. Artigo 26 Os anúncios não devem conter nada que possa conduzir à violência. SEÇÃO 5 - Apresentação Verdadeira Artigo 27 O anúncio deve conter uma apresentação verdadeira do produto oferecido, conforme disposto nos artigos seguintes desta Seção, onde estão enumerados alguns aspectos que merecem especial atenção. § 1º - Descrições No anúncio, todas as descrições, alegações e comparações que se relacionem com fatos ou dados objetivos devem ser comprobatórias, cabendo aos Anunciantes e Agências fornecer as comprovações, quando solicitadas. § 2º - Alegações O anúncio não deverá conter informação de texto ou apresentação visual que direta ou indiretamente, por implicação, omissão, exagero ou ambigüidade, leve o Consumidor a engano quanto ao produto anunciado, quanto ao Anunciante ou seus concorrentes, nem tampouco quanto à: a. natureza do produto (natural ou artificial); b. procedência (nacional ou estrangeira); c. composição; d. finalidade. § 3º - Valor, Preço, Condições O anúncio deverá ser claro quanto a:

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110 a. valor ou preço total a ser pago pelo produto, evitando comparações irrealistas ou exageradas com outros produtos ou outros preços: alegada a sua redução, o Anunciante deverá poder comprová-la mediante anúncio ou documento que evidencie o preço anterior; b. entrada, prestações, peculiaridades do crédito, taxas ou despesas previstas nas operações a prazo; c. condições de entrega, troca ou eventual reposição do produto; d. condições e limitações da garantia oferecida. § 4º - Uso da Palavra "Grátis" a. O uso da palavra "grátis" ou expressão de idêntico significado só será admitido no anúncio quando não houver realmente nenhum custo para o Consumidor com relação ao prometido gratuitamente; b. nos casos que envolverem pagamento de qualquer quantia ou despesas postais, de frete ou de entrega ou, ainda, algum imposto, é indispensável que o Consumidor seja esclarecido. § 5º - Uso de Expressões Vendedoras O uso de expressões como "direto do fabricante", "preço de atacado", "sem entrada" e outras de igual teor não devem levar o consumidor a engano e só serão admitidas quando o Anunciante ou a Agência puderem comprovar a alegação. § 6º - Nomenclatura, Linguagem, "Clima" a. O anúncio adotará o vernáculo gramaticalmente correto, limitando o uso de gíria e de palavras e expressões estrangeiras, salvo quando absolutamente necessárias para transmitir a informação ou o "clima" pretendido. Todavia, esta recomendação não invalida certos conceitos universalmente adotados na criação dos anúncios e campanhas. O primeiro deles é que a publicidade não se faz apenas com fatos e idéias, mas também com palavras e imagens; logo, as liberdades semânticas da criação publicitária são fundamentais. O segundo é que a publicidade, para se comunicar com o público, tem que fazer uso daquela linguagem que o poeta já qualificou como " Língua errada do povo / Língua certa do povo / Porque ele é que fala gostoso / O português no Brasil"; b. na publicidade veiculada pelo Rádio e pela Televisão, devem os Anunciantes, Agências e Veículos zelar pela boa pronúncia da língua portuguesa, evitando agravar os vícios de prosódia que tanto já estão contribuindo para desfigurar o legado que recebemos de nossos antepassados; c. todo anúncio deve ser criado em função do contexto sociocultural brasileiro, limitando-se o mais possível a utilização ou transposição de contextos culturais estrangeiros; d. o anúncio não utilizará o calão; e. nas descrições técnicas do produto, o anúncio adotará a nomenclatura oficial do setor respectivo e, sempre que possível, seguirá os preceitos e as diretrizes da Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT e do Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial - INMETRO. § 7º - Pesquisas e Estatísticas

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111 a. o anúncio não se referirá a pesquisa ou estatística que não tenha fonte identificável e responsável; b. o uso de dados parciais de pesquisa ou estatística não deve levar a conclusões distorcidas ou opostas àquelas a que se chegaria pelo exame do total da referência. § 8º - Informação Científica O anúncio só utilizará informação científica pertinente e defensável, expressa de forma clara até para leigos. § 9º - Testemunhais a. O anúncio abrigará apenas depoimentos personalizados e genuínos, ligados à experiência passada ou presente de quem presta o depoimento, ou daquele a quem o depoente personificar; b. o testemunho utilizado deve ser sempre comprovável; c. quando se usam modelos sem personalização, permite-se o depoimento como "licença publicitária" que, em nenhuma hipótese, se procurará confundir com um testemunhal; d. o uso de modelos trajados com uniformes, fardas ou vestimentas características de uma profissão não deverá induzir o Consumidor a erro e será sempre limitado pelas normas éticas da profissão retratada; e. o uso de sósias depende de autorização da pessoa retratada ou imitada e não deverá induzir a confusão. SEÇÃO 6 - Identificação Publicitária Artigo 28 O anúncio deve ser claramente distinguido como tal, seja qual for a sua forma ou meio de veiculação. Artigo 29 - Este Código não se ocupa da chamada “propaganda subliminar”, por não se tratar de técnica comprovada, jamais detectada de forma juridicamente inconteste. São condenadas, no entanto, quaisquer tentativas destinadas a produzir efeitos “subliminares” em publicidade ou propaganda. Parágrafo único - Este Código encoraja os Veículos de Comunicação a adotarem medidas ao seu alcance destinadas a facilitar a apreensão da natureza publicitária da ação de “merchandising”. Artigo 30 A peça jornalística sob a forma de reportagem, artigo, nota, texto-legenda ou qualquer outra que se veicule mediante pagamento, deve ser apropriadamente identificada para que se distinga das matérias editoriais e não confunda o Consumidor. Artigo 31 Este Código condena os proveitos publicitários indevidos e ilegítimos, obtidos por meio de "carona" e/ou "emboscada", mediante invasão do espaço editorial ou comercial de veículo de comunicação. Parágrafo único Consideram-se indevidos e ilegítimos os proveitos publicitários obtidos: a. mediante o emprego de qualquer artifício ou ardil;

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112 b. sem amparo em contrato regular celebrado entre partes legítimas, dispondo sobre objeto lícito; c. sem a prévia concordância do Veículo de comunicação e dos demais titulares dos direitos envolvidos. SEÇÃO 7 - Propaganda Comparativa Artigo 32 Tendo em vista as modernas tendências mundiais - e atendidas as normas pertinentes do Código da Propriedade Industrial, a publicidade comparativa será aceita, contanto que respeite os seguintes princípios e limites: a. seu objetivo maior seja o esclarecimento, se não mesmo a defesa do consumidor; b. tenha por princípio básico a objetividade na comparação, posto que dados subjetivos, de fundo psicológico ou emocional, não constituem uma base válida de comparação perante o Consumidor; c. a comparação alegada ou realizada seja passível de comprovação; d. em se tratando de bens de consumo a comparação seja feita com modelos fabricados no mesmo ano, sendo condenável o confronto entre produtos de épocas diferentes, a menos que se trate de referência para demonstrar evolução, o que, nesse caso, deve ser caracterizado; e. não se estabeleça confusão entre produtos e marcas concorrentes; f. não se caracterize concorrência desleal, denegrimento à imagem do produto ou à marca de outra empresa; g. não se utilize injustificadamente a imagem corporativa ou o prestígio de terceiros; h. quando se fizer uma comparação entre produtos cujo preço não é de igual nível, tal circunstância deve ser claramente indicada pelo anúncio. SEÇÃO 8 - Segurança e Acidentes Artigo 33 Este Código condena os anúncios que: a. manifestem descaso pela segurança, sobretudo quando neles figurarem jovens e crianças ou quando a estes for endereçada a mensagem; b. estimulem o uso perigoso do produto oferecido; c. deixem de mencionar cuidados especiais para a prevenção de acidentes, quando tais cuidados forem essenciais ao uso do produto; d. deixem de mencionar a responsabilidade de terceiros, quando tal menção for essencial; e. deixem de especificar cuidados especiais no tocante ao uso do produto por crianças, velhos e pessoas doentes, caso tais cuidados sejam essenciais. SEÇÃO 9 - Proteção da Intimidade

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113 Artigo 34 Este Código condena a publicidade que: a. faça uso de imagens ou citações de pessoas vivas, a menos que tenha sido obtida a sua prévia e expressa autorização; b. ofenda as convicções religiosas e outras suscetibilidades daqueles que descendam ou sejam de qualquer outra forma relacionados com pessoas já falecidas cuja imagem ou referência figure no anúncio; c. revele desrespeito à dignidade da pessoa humana e à instituição da família; d. desrespeite a propriedade privada e seus limites. Artigo 35 As normas acima não se aplicam: a. a fotografias de grandes grupos ou multidões em que os indivíduos possam ser reconhecidos mas não envolvam um contexto difamatório, ofensivo ou humilhante; b. à propaganda de livros, filmes, programas de Rádio e Televisão e atividades semelhantes em que as pessoas retratadas sejam autores ou participantes. SEÇÃO 10 - Poluição e Ecologia Artigo 36 Não podendo a publicidade ficar alheia às atuais e prementes preocupações de toda a humanidade com os problemas relacionados com qualidade de vida e a proteção do meio ambiente, serão vigorosamente combatidos os anúncios que direta ou indiretamente estimulem: a. a poluição do ar, das águas, das matas e dos demais recursos naturais; b. a poluição do ambiente urbano; c. a depredação da fauna, da flora e dos demais recursos naturais; d. a poluição visual dos campos e da cidade; e. a poluição sonora; f. o desperdício de recursos naturais. SEÇÃO 11 - Crianças e Jovens Artigo 37 No anúncio dirigido à criança e ao jovem: a. dar-se-á sempre atenção especial às características psicológicas da audiência-alvo; b. respeitar-se-á especialmente a ingenuidade e a credulidade, a inexperiência e o sentimento de lealdade dos menores; c. não se ofenderá moralmente o menor;

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114 d. não se admitirá que o anúncio torne implícita uma inferioridade do menor, caso este não consuma o produto oferecido; e. não se permitirá que a influência do menor, estimulada pelo anúncio, leve-o a constranger seus responsáveis ou importunar terceiros ou o arraste a uma posição socialmente condenável; f. o uso de menores em anúncios obedecerá sempre a cuidados especiais que evitem distorções psicológicas nos modelos e impeçam a promoção de comportamentos socialmente condenáveis; g. qualquer situação publicitária que envolva a presença de menores deve ter a segurança como primeira preocupação e as boas maneiras como segunda preocupação. SEÇÃO 12 - Direito Autoral e Plágio Artigo 38 Em toda a atividade publicitária serão respeitados os direitos autorais nela envolvidos, inclusive os dos intérpretes e os de reprodução. Artigo 39 O anúncio não utilizará música de fundo, "vinhetas", ou trechos de composições de autores nacionais ou estrangeiros sem o devido respeito aos respectivos direitos autorais, a não ser no caso de músicas que sejam ou se tenham tornado de domínio público, de acordo com a legislação específica, respeitados os direitos de gravação. Artigo 40 É condenado o uso desrespeitoso da música folclórica, dos folguedos e temas populares que constituem parte integrante do patrimônio cultural do país. Artigo 41 Este Código protege a criatividade e a originalidade e condena o anúncio que tenha por base o plágio ou imitação, ressalvados os casos em que a imitação é comprovadamente um deliberado e evidente artifício criativo. Artigo 42 Será igualmente condenado o anúncio que configure uma confusão proposital com qualquer peça de criação anterior. Artigo 43 O anúncio não poderá infringir as marcas, apelos, conceitos e direitos de terceiros, mesmo aqueles empregados fora do país, reconhecidamente relacionados ou associados a outro Anunciante. Parágrafo único Este Código condena a publicidade que faça uso do símbolo oficial e do nome do Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária - CONAR, exceto em anúncios da própria entidade. CAPÍTULO III - CATEGORIAS ESPECIAIS DE ANÚNCIOS Artigo 44 Pela sua importância econômica ou social, pelo seu volume, pelas suas repercussões no indivíduo ou na sociedade, determinadas categorias de anúncios devem estar sujeitas a cuidados especiais e regras específicas, além das normas gerais previstas neste Código. Essas regras específicas figuram mais adiante como "Anexos" a este Código e, alguns casos, resultaram de valiosa colaboração de Associações de Classe que prontamente se identificaram com o espírito do presente Código. São eles, pela ordem: Anexo A - Bebidas Alcoólicas;

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115 Anexo B - Educação, Cursos, Ensino; Anexo C - Empregos e Oportunidades; Anexo D - Imóveis: Venda e Aluguel; Anexo E - Investimentos, Empréstimos e Mercado de Capitais; Anexo F - Lojas e Varejo; Anexo G - Médicos, Dentistas, Veterinários, Parteiras, Massagistas, Enfermeiros, Serviços Hospitalares, Paramédicos, Para-hospitalares, Produtos Protéticos e Tratamentos; Anexo H - Produtos Alimentícios; Anexo I - Produtos Farmacêuticos Isentos de Prescrição; Anexo J - Produtos de Fumo; Anexo K - Produtos Inibidores de Fumo; Anexo L - Profissionais Liberais; Anexo M - Reembolso Postal ou Vendas pelo Correio; Anexo N - Turismo, Viagens, Excursões, Hotelaria; Anexo O - Veículos Motorizados; Anexo P - Cervejas e Vinhos; Anexo Q - Testemunhais, Atestados, Endossos; Anexo R - Defensivos Agrícolas; Anexo S - Armas de Fogo. Anexo T - Ices e Bebidas Assemelhadas. Parágrafo único - Pretendendo ser este Código um instrumento dinâmico e permanentemente atualizado, essas categorias especiais poderão ser ampliadas mediante o acréscimento de novos Anexos. CAPÍTULO IV - AS RESPONSABILIDADES Artigo 45 - A responsabilidade pela observância das normas de conduta estabelecidas neste Código cabe ao Anunciante e a sua Agência, bem como ao Veículo, ressalvadas no caso deste último as circunstâncias específicas que serão abordadas mais adiante, neste Artigo: a. o Anunciante assumirá responsabilidade total por sua publicidade; b. a Agência deve ter o máximo cuidado na elaboração do anúncio, de modo a habilitar o Cliente Anunciante a cumprir sua responsabilidade, com ele respondendo solidariamente pela obediência aos preceitos deste Código; c. este Código recomenda aos Veículos que, como medida preventiva, estabeleçam um sistema de controle na recepção de anúncios. Poderá o veículo: c.1) recusar o anúncio, independentemente de decisão do Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária - CONAR, quando entender que o seu conteúdo fere, flagrantemente, princípios deste Código, devendo, nesta hipótese, comunicar sua decisão ao Conselho Superior do CONAR que, se for o caso, determinará a instauração de processo ético; c.2) recusar anúncio que fira a sua linha editorial, jornalística ou de programação; c.3) recusar anúncio sem identificação do patrocinador, salvo o caso de campanha que se enquadre no parágrafo único do Artigo 9º ("teaser"); c.4) recusar anúncio de polêmica ou denúncia sem expressa autorização de fonte conhecida que responda pela autoria da peça; d. o controle na recepção de anúncios, preconizado na letra "c" deste artigo, deverá adotar maiores precauções em relação à peça apresentada sem a intermediação de Agência, que por ignorância ou má-fé do Anunciante, poderá transgredir princípios deste Código; e. a responsabilidade do Veículo será equiparada à do Anunciante sempre que a veiculação do anúncio contrariar os termos de recomendação que lhe tenha sido comunicada oficialmente pelo Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária - CONAR. Artigo 46 - Os diretores e qualquer pessoa empregada numa firma, companhia ou instituição que tomem parte no planejamento, criação, execução e veiculação de um

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116 anúncio, respondem, perante as normas deste Código, na medida de seus respectivos poderes decisórios. Artigo 47 - A responsabilidade na observância das normas deste Código abrange o anúncio no seu conteúdo e forma totais, inclusive testemunhos e declarações ou apresentações visuais que tenham origem em outras fontes. O fato de o conteúdo ou forma serem originários, no todo ou em parte, de outras fontes, não desobriga da observância deste Código. Artigo 48 - Um anúncio enganador não pode ser defendido com base no fato de o Anunciante, ou alguém agindo por ele, ter posteriormente fornecido ao Consumidor as informações corretas. O Anunciante terá, entretanto, "a priori", o crédito de boa-fé. Artigo 49 - Nenhum Anunciante, Agência, Editor, proprietário ou agente de um veículo publicitário deve promover a publicação de qualquer anúncio que tenha sido reprovado pelo Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária - CONAR, criado para o funcionamento deste Código. CAPÍTULO V - INFRAÇÕES E PENALIDADES Artigo 50 - Os infratores das normas estabelecidas neste Código e seus anexos estarão sujeitos às seguintes penalidades: a. advertência; b. recomendação de alteração ou correção do Anúncio; c. recomendação aos Veículos no sentido de que sustem a divulgação do anúncio; d. divulgação da posição do CONAR com relação ao Anunciante, à Agência e ao Veículo, através de Veículos de comunicação, em face do não acatamento das medidas e providências preconizadas. § 1º - Compete privativamente ao Conselho de Ética do CONAR apreciar e julgar as infrações aos dispositivos deste Código e seus Anexos e, ao Conselho Superior do CONAR, cumprir e fazer cumprir as decisões emanadas do Conselho de Ética em processo regular. § 2º - Compete privativamente ao Conselho Superior do CONAR alterar as disposições deste Código, bem como alterar, suprimir e acrescentar-lhe Anexos.