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SOCIOLOGIA DA RELIGIÃO Sociologia da religião busca explicar empiricamente as relações mútuas entre religião e sociedade. Os estudos fundamentam-se na dimensão social da religião e na dimensão religiosa da sociedade. Sociologia da religião no Brasil O marco referencial da consolidação da sociologia da religião como campo autônomo de pesquisa no Brasil é a publicação da obra “Católicos, Protestantes, Espíritas”, de Cândido Procópio Ferreira de Camargo, em 1973. 1 Nomes de referência no Brasil: Edison Carneiro, Beatriz Muniz de Souza, Antônio Flávio Pierucci, Reginaldo Prandi, dentre outros. Jacques Attali Do judaísmo ao cristianismo Jacques Attali argumenta em Les Juifs, le Monde et l’Argent que com a chegada de Jesus Cristo e o posterior desenvolvimento do cristianismo há uma revolução na atitude perante o dinheiro. Esta clivagem tem muito a ver com a mesma clivagem existente dentro do judaísmo ao tempo de Jesus entre Saduceus (judeus estabelecidos, conservadores) e Fariseus e Essênios (com uma atitude mais revolucionária, igualitária, ascética).

Sociologia Da Religião

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SOCIOLOGIA DA RELIGIO

Sociologia da religiobusca explicar empiricamente as relaes mtuas entrereligioe sociedade. Os estudos fundamentam-se na dimenso social dareligioe na dimensoreligiosada sociedade.

Sociologia da religio no BrasilO marco referencial da consolidao da sociologia da religiocomo campo autnomo de pesquisa no Brasil a publicao da obra Catlicos, Protestantes, Espritas, de Cndido Procpio Ferreira de Camargo, em 1973.1 Nomes de referncia no Brasil: Edison Carneiro, Beatriz Muniz de Souza, Antnio Flvio Pierucci, Reginaldo Prandi, dentre outros.Jacques AttaliDo judasmo ao cristianismoJacques Attali argumenta em Les Juifs, le Monde et lArgent que com a chegada de Jesus Cristo e o posterior desenvolvimento do cristianismoh uma revoluo na atitude perante o dinheiro. Esta clivagem tem muito a ver com a mesma clivagem existente dentro do judasmoao tempo de Jesus entre Saduceus (judeus estabelecidos, conservadores) e Fariseus e Essnios(com uma atitude mais revolucionria, igualitria, asctica).Se, para o judasmo, possuir o dinheiro uma forma de estar em posio de evitar a violncia e de resolver possveis problemas futuros, j para a nova religio nascente, o dinheiro algo de sujo e problemtico (a mesma atitude de algumas das faces do judasmo mencionadas).Nas palavras de Attali:Paralelamente aprofundam-se as diferenas entre as duas doutrinas econmicas. Quer no Judasmo como no Cristianismo acredita-se nas virtudes da caridade, da justia e das ofertas. Mas para os Judeus, desejvel ser rico, enquanto que para os Cristos recomendado ser-se pobre. Para uns, (os Judeus) a riqueza um meio para melhor servir Deus; para os outros, (os Cristos) ele impossibilita a salvao. Para uns, o dinheiro pode ser um instrumento do bem; para os outros os seus efeitos so sempre desastrosos. Para uns, qualquer pessoa pode gozar do dinheiro bem ganho; para os outros ele queima-lhe os dedos. Para uns, morrer rico uma bno, desde que o dinheiro tenha sido adquirido moralmente e que se tenha cumprido com todos os deveres para com os pobres da comunidade; para os outros, morrer pobre uma condio necessria da salvao. assim que Mateus (no episdio Jesus e o jovem rico), escreve sobre Jesus: Digo-vos mais uma vez: mais fcil a um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que a um rico entrar para o cu (19, 24). E se Lucas conclui a Parbola do Mordomo Infiel por uma frase ambgua: Faam-se amigos do dinheiro da desonestidade (16, 11), ele acrescenta ainda faam o bem e emprestem sem nada esperar em troca (6,35).De facto, como vimos, para os Judeus, receber juros do dinheiro no imoral; e se no permitido faz-lo entre Judeus por uma questo de solidariedade, e no por interdio moral. O dinheiro , como o gado, uma riqueza frtil e o tempo um espao a valorizar. Pelo contrrio, para os Cristos, como para Aristtelese os Gregos, o dinheiro, como o tempo, no produz em si qualquer riqueza, ele estril; e fazer comrcio de dinheiro um pecado mortal. Esta obsesso pela esterilidade do dinheiro reenvia tambm para o dio pela sexualidade, interdita fora do casamento. Para a nova Igreja, nada deve ser frtil que no tenha sido criado por Deus. Fazer trabalhar o dinheiro fornicar.Sem dvida preciso ver nestas diferenas o trao de um conflito muito antigo entre essnios e saduceus, e o desejo dos apstolosde ganhar o apoio dos mais pobres entre os Judeus.As ofertas dos Judeus s suas comunidades so limitadas a um quinto das suas receitas. Pelo contrrio, encoraja-se os Cristos a doar sem limites Igreja. Enquanto que as comunidades judaicas devem redistribuir integralmente estas doaes aos pobres (ver Templo de Salomo) a Igreja pode conservar o dinheiro, pelo menos em parte, para ela mesma a fim de criar pelo esplendor as condies do assombro e da salvao dos homens. Para ela, o dinheiro, que no produziria juros, pode produzir a graa se ele transitar pela Igreja. Toda a potncia eclesistica do futuro advm desta reverso da relao com o dinheiro....Mesmo se neste esprito, alguns telogos do Cristianismo antigo como Clemente de Alexandria, glorificam uma tica econmica muito semelhante da moral do Pentateuco, os primeiros Cristos encontram argumentos nestas passagens dos Evangelhos para apoiar a tese de que entre os Judeus tudo se mede em dinheiro, tudo se troca: mesmo o tempo, mesmo a carne humana, mesmo Deus! O Judeu, dizem eles, o qual vendeu o Messias por dinheiro, est pronto a tudo comprar e a tudo vender. O mercado a sua nica lei. O anti-judasmo Cristo imediatamente inseparvel da condenao econmica.

Citaes crists anti-dinheiro "Todo o homem rico , ou injusto na sua pessoa, ou herdeiro da injustia e da injustia de outros" (Omnis dives aut iniquus est, aut heres iniqui) So Jernimo. "Quem quer se tornar rico tomba nas armadilhas do demnio, e se entrega a mil desejos no apenas vos, mas perniciosos, que o precipitam por fim no abismo da perdio e da condenao eterna" So Timteo, 6 "Ou tu s rico e tens o suprfluo, e nesse caso o suprfluo no para ti mas para os pobres; ou ento tu ests numa fortuna medocre, e ento que importa a ti procurar aquilo que no podes guardar?" So Bernardo "Mas a moral do evangelho vai ainda mais longe; porque ela nos ensina que quanto mais um cristo rico, mais ele deve ser penitente; ou seja, mais ele se deve deduzir das douras da vida; e que estas grandes mximas de renncia, de escrutnio, de desapego, de crucificao, to necessrias salvao, so muito maiores para ele do que para o pobre" Louis Bourdaloue, jesuta francs do sculo XVII. "E no podemos dizer tambm que quase todos os ricos so homens corruptos, ou antes, perdidos pela intemperana das paixes carnais que os dominam? Por qu? Porque tm todos os meios do ser, e que no usam as suas riquezas que no seja para saciar as suas brutais avarices. Vtimas reservadas clera de Deus, engordados dos seus prprios bens! Quantos que conheceis que no sejam assim? Quantos que vs conheceis que, na opulncia, tenham aprendido a dominar o seu corpo e a o limitar em restrio? Um rico continente ou penitente no ser uma espcie de milagre?", Louis Bourdaloue, jesuta francs do sculo XVII. "Uma virgem pode conceber, uma estril pode dar luz, um rico pode ser salvo: estes so trs milagres nos quais as escrituras sagradas no nos ensinam outra coisa que no seja que Deus onipotente. Pois verdade, rico do mundo, que a tua salvao no nada fcil, ela seria impossvel se Deus no fosse onipotente. Consequentemente, esta dificuldade passa bem distante dos nossos pensamentos, j que necessrio, para ultrapass-la, uma potncia infinita. E no me digas que estas palavras no te dizem respeito porque talvez no sejas rico. Se no s rico, tu tens vontade de o ser; e estas maldies sobre a riqueza devem cair no tanto sobre os ricos, mas, sobretudo sobre aqueles que o desejam ser. para esses que o apstolo pronuncia,que eles caem na armadilha do diabo e de muitos desejos malvados, que precipitam o homem na perdio. ... Tambm o apstolo tem razo quando diz queo desejo de riqueza a raiz de todos os males; Radix omniumm malorum est cupiditas". Jaques Bnigne Bossuet (1627-1704), bispo, telogo e escritor francs, sermo em Metz a 4 de Outubro de 1652.

Do catolicismo para o protestantismo - nova reverso

Jacques Attali v com o advento da Reforma Protestante uma nova reverso na relao para com o dinheiro, repondo entre os protestantesdo mundo ocidental (norte e oeste da Europa) o entendimento que os Judeus faziam do dinheiro. Este regresso aos princpios econmicos do Judasmo caracteriza a sociedade moderna.Attali acusa Max Weberde no ter reconhecido na tica que possibilitou o novo mundo dos negcios capitalistas, a tica judaica. Attali escreve: "Weber no v que os Judeus inventaram a tica bem antes dos Gregos ou dos puritanos..." "e que para eles (os Judeus) a atividade econmica um meio essencial de ir ter com Deus".Bertrand RusselConfirmando algumas destas ideias de Attali, encontramos um trecho de Bertrand Russel, em "Filosofia do Mundo Ocidental", no captulo "A poltica de Aristteles":Desde o tempo dos gregos at hoje, a Humanidade, ou pelo menos a parte economicamente mais desenvolvida dela se divide entre devedores e credores; os devedores so contra os juros e os credores so a favor. Quase sempre, os detentores de terras so devedores, enquanto que os comerciantes so credores.Os filsofos, com poucas excees, concordam com os interesses financeiros da sua classe. Os filsofos Gregos pertencem classe dos proprietrios de terra ou trabalhavam ao seu servio. Por isso, eles recusavam os juros.Os filsofos da Idade Mdia eram homens da Igreja; o patrimnio da Igreja constitua-se, sobretudo de terras; eles no viam pois razo para rever as ideias de Aristteles.A sua antipatia contra a usura foi ainda reforada pelo Anti-semitismo, j que o capital fluido (ou seja em dinheiro, facilmente transmissvel) estava em grande parte na posse de Judeus...Com a Reforma Protestante, a situao muda. Muitos dos protestantes mais convictos eram comerciantes, para quem o emprstimo de dinheiro a juros era muito importante... Por isso, os juros foram aceites, primeiro por Calvino e depois por outros protestantes. Finalmente, a Igreja Catlica viu-se forada a seguir o exemplo deles, j que as velhas proibies j no se enquadram no mundo moderno.Referncias1. Encontro temtico discutiu a obra de Cndido Procpio Ferreira de Camargo.Bibliografia CAMARGO, Cndido Procpio Ferreira de. Catlicos, Protestantes, Espritas, Petrpolis: Vozes, 1973. HOUTART, Franois. Sociologia da religio. So Paulo: tica, 1994. JARDILINO, Jose Rubens Lima; SOUZA, Beatriz Muniz de; GOUVEIA, Eliane Hojaij. Sociologia da religio no Brasil. Educ, 1999. PIERUCCI, Antnio Flvio. Igreja: contradies e acomodao. So Paulo: Brasiliense / CEBRAP, 1978. 188 p. PIERUCCI, Antnio Flvio; PRANDI, R. A realidade social das religies no Brasil. So Paulo: Hucitec, 1996. 294 p. SOUZA, Beatriz Muniz de; MARTINO, Lus Mauro S. Sociologia da religio e mudana social So Paulo: Paulus, 2004. TEIXEIRA, Faustino. Sociologia da religio. Petrpolis: VOZES, 2003. WACH, Joachim; CANCIAN, Attilio. Sociologia da religio. So Paulo: Paulinas, 1990. PRANDI, Reginaldo, Os Candombls de So Paulo, Hucitec, 1991.

Encontro temtico discutiu a obra de Cndido Procpio Ferreira de Camargo. Evento realizado na PUC-SP entre 26 e 28 de agosto discutiu os principais pontos do livro "Catlicos, protestantes, espritas", publicado em 1973.Lus Mauro S Martino[*]Quando o primeiro exemplar de "Catlicos, Protestantes, Espritas", de Cndido Procpio Ferreira de Camargo, saiu da grfica, em 1973[1], a Sociologia da Religio consolidou-se como campo autnomo de pesquisa no Brasil. Seus estudos anteriores, "Kardecismo e Umbanda" (1961) e "Igreja e Desenvolvimento" (1971), j anunciavam a paisagem terica que viria a se delinear no novo trabalho. Como o ano de publicao de "Catlicos, Protestantes, Espritas" foi o mesmo de criao do Programa de Ps-Graduao em Cincias Sociais da Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo, pensou-se que uma reflexo sobre o livro seria o caminho natural para celebrar o aniversrio do Programa. Com esse propsito foi realizado, entre os dias 26 a 28 de agosto na PUC-SP, o encontro temtico "Catlicos, Protestantes, Espritas 30 anos depois".O evento reuniu pesquisadores e estudiosos da religio no Brasil, dentre eles vrios ex-alunos de Camargo, como Beatriz Muniz de Souza, uma das organizadoras, Antnio Flvio Pierucci e Reginaldo Prandi, alm de estudantes de graduao e ps-graduao interessados nas relaes entre religio e mudana social, foco da obra de Camargo. A tese do livro audaciosa: a pluralidade religiosa no um sinal de reavivamento da religio; pelo contrrio, a disperso das instituies religiosas e sua contnua adaptao s exigncias da vida cotidiana ameaam a existncia da religio, ao menos nas formas em que a conhecemos. A fragmentao do universo institucional "dessacraliza a prpria instituio religiosa"[2].E foi esse o tema da mesa de abertura do evento, composta por Prandi e Pierucci. Pesquisadores do Ncleo de Sociologia da Religio do Centro Brasileiro de Anlise e Planejamento (CEBRAP), do qual Procpio era coordenador, os professores fizeram um balano terico da secularizao no Brasil. Prandi, em particular, explicou alguns dos mtodos de trabalho de Camargo e do prprio CEBRAP, procurando colocar a obra no contexto de acordo com referenciais nacionais e internacionais da Sociologia contempornea.Seguindo a proposta do livro, o segundo dia do evento foi dedicado aos evanglicos. Os professores Antnio Gouvea de Mendona, Jos Rubens Jardilino e Leonildo Campos mostraram at que ponto as denominaes evanglicas crescem em uma sociedade particularmente secularizada, adotando para tanto estratgias de modernizao mais ou menos conservadoras, conforme o caso. Mendona enfatizou a histria do Protestantismo no Brasil, ressaltando a presena de protestantes nas invases francesas e holandesas a influncia, sobretudo nesta ltima, foi mais duradoura. Jardilino e Campos, comentando a exposio, reforaram o sentido do crescimento pentecostal e das inmeras formas novas de participao na sociedade brasileira, sobretudo no campo educacional e poltico.O ltimo dia do evento foi dividido em duas etapas. Na parte da tarde, Regina Novaes, Maria Jos Fontelas Rosado Nunes e nio Jos da Costa Britto debateram as novas formas e possibilidades do Catolicismo no Brasil. Retomando algumas das idias de Camargo em "Catlicos, Protestantes, Espritas" - sobretudo a distino entre o Catolicismo "internalizado" e o "tradicional" - os pesquisadores avaliaram a situao da Igreja no Brasil. Conforme explicou Pierucci no primeiro dia do evento, "toda a Sociologia da Religio no Brasil uma Sociologia do declnio do catolicismo". Essa discusso foi retomada pelos debatedores quando consideraram as formas de atuao e desenvolvimento da Igreja. O tema era bastante caro a Camargo."Catlicos, Protestantes, Espritas" traz uma discusso sobre o processo de secularizao, apontando para uma inevitvel perda de terreno das religies. Isso em uma poca em que o censo registrava o Brasil ainda como "o maior pas catlico do mundo". Os dados do Censo 2000, exibidos em primeira mo por vrios pesquisadores, mostraram uma modificao sensvel nessas condies. Praticamente hegemnicos em 1940, os catlicos somam atualmente pouco mais do que 73% dos brasileiros, competindo com um impressionante avano do Pentecostalismo e, a par de um crescimento vegetativo dos espritas, com uma ascendncia impressionante dos que se declaram "sem religio".No encerramento do evento, Leila Marrach Basto de Albuquerque, da Universidade Estadual Paulista (UNESP), debateu com Silas Guerriero e Eliane Gouveia, ambos da PUC-SP, os chamados "Novos Movimentos Religiosos". Em sua exposio, Leila enfatizou a importncia do corpo nas novas doutrinas e religies. Guerriero e Eliane, por sua vez, discutiram as relaes possveis entre formas efetivamente "religiosas" desses movimentos e sua desvinculao com "religies", no sentido em que estas so tradicionalmente compreendidas. Guerriero chamou a ateno para a dificuldade de estabelecer de maneira definitiva o que se entende por "novos movimentos religiosos", na medida em que muitos deles se orientam em situaes de fronteira entre a mstica, o ocultismo, a ecologia e as religies propriamente ditas.H muito fora dos catlogos, esse "Catlicos, Protestantes, Espritas" praticamente inaugurou a moderna Sociologia da Religio no Brasil. Conquanto no tenha sido o primeiro estudo nessa rea, reuniu pela primeira vez uma teoria sociolgica de peso uma importante contribuio para a metodologia weberiana com o estudo concreto de casos em larga escala.Notas[*]Doutorando em Cincias Sociais, PUC-SP.[1]Camargo, Cndido Procpio Ferreira de: Catlicos, Protestantes, Espritas, Petrpolis, Vozes, 1973.[2]Ibid., p.10.