Upload
others
View
2
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
SOLENIDADES
I
I
Tribunal Pleno
POSSE DO SR. MIN. WILLIAM PATTERSON
ATA DA SESSÃO SOLENE REALIZADA EM 3 DE AGOSTO DE 1979
Aos três dias do mês de agosto do ano de mil novecentos e setenta e nove, às dezesseis horas, na Sala de Sessões do Tribunal Federal de Recursos, presentes os Exm?s Srs. Ministros José Néri da Silveira, Presidente do Tribunal, Armando Rollemberg, Márcio Ribeiro, Peçanha Martins, Moacir Catunda, Aldir G. Passarinho, José Dantas, Lauro Leitão, Carlos Madeira, Gueiros Leite, Washington Bolívar, Carlos Mário VelloSO, Justino Ribeiro, Otto Rocha, Wilson Gonçalves e Sebastião Reis, presentes, ainda, o Exmo. Sr. Dr. Geraldo Andrade Fonteles, I? Subprocurador-Geral da República e o Secretário do Tribunal Pleno, Bel. Ronaldo Rios Albo, foi aberta a Sessão Solene, especialmente convocada para dar posse ao Doutor William Patterson, nomeado para o Cargo de ministro do Tribunal Federal de Recursos pelo Exmo. Sr. Presidente da República Federativa do Brasil. Ao início dos trabalhos, o Exmo Sr. Ministro-Presidente convidou os Exmos Srs. Ministros João de Lima Teixeira, Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Ewald Sizenando Pinheiro, Presidente do Tribunal de
Contas da União, Desembargador José Júlio Leal Fagundes, Presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, Doutor Firmino Ferreira Paz, Procurador-Geral da República e o Doutor Clóvis Ramalhete Maia, Consultor-Geral da República, para composição da Mesa. Em seguida, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente deSignou comissão composta pelos Exmos. Srs. Ministros Armando Rollemberg e Márcio Ribeiro para conduzir o Doutor William Andrade Patterson ao recinto do Plenário. Lido o Termo de posse pelo Secretário do Tribunal Pleno, o empossando prestou o juramento regimental e, juntamente com o Exmo. Sr. Ministro-Presidente. assinou o Livro de Posse. Em prosseguimento, o Exmo. Sr. MinistroPresidente declarou empossado o Exmo. Sr. Ministro William Patterson, convidando-o a tomar assento na Bancada do Tribunal Pleno. Em seguida, o Exmo. Sr. MinistroPresidente concedeu a palavra ao Exmo. Sr. Ministro Washington Bolívar para saudar o Exmo. Sr. Ministro William Patterson em nome do Tribunal.
O Exmo. Sr. Ministro Washington Bolívar: Exmo. Senhor Presidente do Tribunal Federal de Recursos e desta Solenidade; Exmo. Senhor Presidente do Tribunal Superior do Trabalho; Exmo. Senhor Presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal; Exmo. Senhor Presidente do Tri-
114 TFR - 90
bunal de Contas da União; Exmo. Senhor Procurador-Geral da República; Exm~. Senhor. Consultor-Geral da República; Exmo. Senhor Representante do Senado Federal, EXJ:llo. Senhor Procurador-Geral da República integrante deste Egrégio Tribunal como representante do Ministério Público Federal; Senhores Ministros do Supremo Tribunal Federal; Senhores Ministros dos demais Tribunais Superiores; Senhores Desembargadores; Juízes; Membros do Ministério Público, Advogados, Minhas Senhoras, Meus Senhores, Senhor Ministro William Andrade Patterson:
Manda a tradição desta Casa que se cumpra a lei da hospitalidade e um de nós seja designado para desejar boas-vindas, ainda que em breves palavras, ao companheiro que chega para desempenhar conosco a missão do julgamento colegiado.
Essa antiga lei do direito das gentes, no entanto, aqui é cumprida de forma sui generis, pois os hospedeiros também são hóspedes e nãó donos da Casa:' uns são hóspedes por algum tempo, outros por um tempo mais longo, mas todos por um tempo certo, quer determinado pela aposentadoria voluntária, quer pelo limite de idade previsto na Lei dos Homens, quer pelo fim comum de todos os homens, pela inelutável Lei de Deus. A transitoriedade de nossa passagem, embora paradoxal, somente se revela quando aqui chega novo hóspede, para a vaga do antigo, mesclando a alegria com que se recebe o novo colega com a saudade daquele que nos deixou.
Por vontade própria, manifestada em carta memorável, deixou-nos Paulo Távora, um dos mais lúcidos e brilhantes juízes que já passaram por este Tribunal, em largo e generoso gesto, por acreditar que maior
serviço prestaria à Justiça Brasileira não mais decidindo segundo a lei, mas julgando a própria lei.
Para a nossa companhia vem um dos mais estudiosos, competentes, modestos e sérios juristas da nova geração.
Interpreto o júbilo próprio e dos demais colegas pelo ingresso de Vossa Excelência nesta Casa, Sr. Ministro William Andrade Patterson, aonde chega precedido por atuáção marcante em vários órgãos da Administração, especialmente no Direito Público, culminando com o exercício do alto cargo de ConsultorGeral da República.
Sinto-me bem em tê-lo de novo como companheiro de estudos e decisões, pois a ventura de conhecê-lo vem desde os idos de 1963, precisamente na Consultoria-Geral da República, onde nos reuniu a confiança do Professor Waldir Pires, - a Vossa Excelência, a Aldo Ferro, Hermenito Dourado e a mim.
Sinto-me bem, como baiano e brasiliense, pela oportunidade de saudar outro baiano e brasiliense' em seu momento de glória. A privação do mar, da gente e das coisas da Bahia, da «curva azul de sua enseada», no dizer ensolarado de Ruy, talvez nos tenha sido menos penosa porque ambos somos sertanejos e aos sertões, cumprindo destino de origem, um dia nos adentramos, certos de que era preciso deixar as delicias do litoral para ajudar, de alguma forma, o Brasil a. crescer por dentro. Por isto foi que, desde a primeira hora, acreditamos em Brasília, onde se encontra o cérebro decindindo e o coração pulsando.
Eis que estava escrito que, nesta mesma cidade, Vossa Excelência recebesse o prêmio do seu patriotismo, da constãncia do seu amor à Ciência do Direito, nesta hora de alegria e de triunfo.
TFR - 90 115
No próprio carro daquele que entrava em triunfo em Roma, era de lei que um escravo, sustendo acima da cabeça do vencedor uma coroa de louros, lembrasse, entretanto, a cada instante, que ele era apenas um homem.
Cabe-me, agora, tarefa idêntica, menos porque Vossa Excelência, modesto e simples como sempre foi, necessite dessa lembrança, mas para que também se cumpra essa lei antiga e tão sábia, no recordar a todos aquela verdade.
Talvez por isso é que D' Aguesseau assim alertava os Juízes para a tarefa de cada dia: - «ao entrares no Tribunal, lembra-te de que és apenas um homem; ao saíres do Tribunal, não te esqueças de que és um juiz».
Quem se detiver sobre o conteúdo e a natureza do labor de cada um dos três Poderes da República verificará que o Executivo trabalha sobre a realidade palpitante do presente; o Legislativo, mediante previsões ~obre o comportamento humano no futuro; e o Judiciário, sobre acontécimentos do passado, julgando a conduta dos homens segundo leis de tempos ainda mais remotos.
«O erro de cada dia» - declama Cassiano Ricardo - é que.
«O homem da lei decreta que não haja mais fome que não haja mais frio, que sejamos irmãos uns dos outros, Datilograficamente.»
Nada mais angélico do que a sua intima convicção de que dirige o acontecimento.»
Refere Paulo Dourado de Gusmão que éossio ensina haver um plexo de valores jurídicos, integrado por sete v,alores fundamentais: a ordem, a segurança, o poder, a paz, a cooperação, a solidariedade e a justiça.
Neste plexo, ocupa a justiça uma posição central que acompanha, como uma sombra, os demais valores jurídicos, sobre os quais prevalece, pois exige a realização dos demais valores para realizar-se completamente, já que não se pode pensar em justiça senão como ordem, segurança, poder, paz, cooperação e solidariedade.
(<<O pensamento Jurídico Contemporâneo», p. 59).
E essa é a nossa missão, praticar a justiça e, por conseqüência, não praticar a injustiça, como evitar que ela seja praticada, pois se a justiça é o maior de todos os valores, a injustiça, no pensar socrático, é o maior de todos os males.
Em nosso caso, o erro de cada dia consiste em repetir-se o conceito de Justiça, tal como está expresso nas Institutas, citado sempre em I atiII]. , para lhe dar mais ênfase - JusUUa estt constans et perpetua voluntas jus isuum cUique tribuendi - ou seja, a vontade firme de dar a cada um o que lhe pertencer. Rec!ta-se uma lição aprendida numa língua morta que vigorava numa civilização há muito desaparecida.
Entretanto, já em 1944, em notável discurso de paraninfo na Faculdade de Direito da Bahia, João Mangabeira advertia e ensinava que esse velho tabu não corresponde ao direito moderno, pois «a regra da justiça deve ser: a cada qual segundo o seu trabalho, como resulta da sentença de São Paulo na carta aos Tessalonicenses, enquanto não se atinge o princípio de «a cada um segundo a sua necessidade». «Pode ser que haja nele a essência das virtudes cristãs enlouquecidas, como afirma Chesterton. Mas - continuou o grande tribuno - enlouquecidas ou não, a verdade que se consubstancia nesta regra irradia do Sermão da Montanha, enquanto a primeira brota do egoísmo de um mundo construído so-
116 TFR - 90
bre a escravidão. Aplicada em toda a sua inteireza, a velha norma é o símbolo da descaridade, num mundo de espolia dores e espoliados. Porque se a justiça consiste em dar a cada um o que é seu, dê-se ao pobre a pobreza, ao miserável a miséria e ao desgraçado a desgraça, que isso é que é deles. Nem era senão por isso que ao escravo se dava a escravidão, que era o seu, no sistema de produção em que aquela fórmula se criou. E, no entanto, já foi assim e, em parte, ainda o é». «(Oração de Paraninfo aos bacharéis de 1944», Rev. da Faculdade de Direito da Bahia, vol. XX, pág. 341.
Assim, já não basta ao jurista o «viver honestamente, não lesar a ninguém e dar a cada um o que é seu' - velhos preceitos do Direito Romano. Nem é por outro motivo que a nossa própria Lei de Introduçáo ao Código Civil ordena que o juiz, na aplicação da lei, atente aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum» (art. 5?1.
Se é certo que o juiz deve cumprir fielmente a lei, se o imperativo é claro; dar-lhe interpretação consentânea com as necessidades sociais, se é dúbia: suprir-lhe a falta, se lhe descobre lacunas, ou negar-lhe autoridade, se contrária à Constituição, segundo Mario Guimarães (<<O Juiz e a Função Jurisdicional», págs. 330/1), não menos certo é que sua tarefa mais nobre consiste em iluminar o texto às vezes sombrio da lei e soprar vida em seu corpo imóvel e frio. Há que se pôr em cada, julgamento tanto alma e sabedoria. que as decisões, embora versando sobre fatos passados e regulando conflitos do presente, se lancem, perenes, nos longes do futuro.
Eis que Vossa Excelência vem partilhar conosco a missão do julgamento colegiado. Dir-se-ia que, por ser tarefa conjunta, a angústia de julgar nossos semelhantes se dilui e
que basta mais um Cirineu a sustentar uma parte da cruz para que ela se torne mais leve. Mas, nem a missão do julgamento singular é mais pesada, nem a do cOlegiado, por ser repartida, é mais leve, pois cada uma dessas formas de julgar tem suas próprias angústias e perigos. Sendo a injustiça, em si mesma, o maior dos males, não se torna menor, se praticada por um, nem maior, se imposta por muitos. Se é certo que o juiz Singular necessita de solidão, sua incomunicabilidade constante pode levá-lo à intolerância ou ao abuso de poder, se não tiver humildade. Pelo menos esse risco é menor nos colegiados. Os Tribunais são essencialmente democráticos em sua constituição-funcionamento. Suas decisões, tomadas por maioria, resultam da lógica de um, do bomsenso de outro, da ciência de um terceiro, respeitado sempre o pensamento da minoria. E ao rever sempre os seus precedentes, muitas vezes o vencido de ontem se converte no vencedor e vice-versa.
Assim, embora Vossa Excelência chegue a este Tribunal aos 42 anos, ainda bem jovem, o mais jovem de todos nós, nem por isso possui menos ciência ou sabedoria, segundo se infere de sua atuação, até aqui, na vida pública. Aos 26 anos Seabra Fagundes foi Desembargador e Cesar Lattes descobriu o «meson»; nosso Presidente, mesmo, aqui chegou aos 36 anos e já era um jurista consagrado.
A idade, por si só, não confere ciência e, muito menos, sabedoria. A ciência se adquire pelo estudo e pela observação; a sabedoria é um dom conferido por Deus e «ela mesma vai à procura dos que são dignos dela», no dizer bíblico (<<Sabedoria», 6: 16l.
Na difícil tarefa de julgar, nós envelhecemos e rejuvenescemos todos os dias, partícipes da angústia alheia que nos atinge fundo, na sístole e
TFR - 90 117
diástole de sua pungente pulsação. Não é por mera coincidência que tantos de nós sejamos acometidos de moléstias graves, especialmente do coração, o músculo - sede dos sentimentos humanos.
Ao examinar um processo criminal, há pouco tempo, encontrei no papel timbrado de um médico o ensinamento de que.
«Um homem é tão jovem como a sua
fé, tão velho como o seu
temor tão jovem como a con
fiança que tem em si mes
mo, tão velho como a sua
dúvida, tão jovem como a sua
esperança, tão velho como o seu
desespero». É que a todos os perigos que ron
dam a sociedade moderna - desde a insofreável ganância das multinacionais ao engodO do consumismo - os juízes da Democracia têm de estar atentos para assegurar, pela prevalência da Justiça, a fraterna convivência humana. «Se o sal perder a sua força, com que se há de salgar?»
Confiemos todos na inspiração do salmista, na certeza de que o Senhor domina eternamente, julgando o universo com justiça e pronunciando sentença com eqüidade sobre os povos. «O Senhor torna-se refúgio para o oprimido, uma defesa oportuna para os tempos de perigo» (Salmos, 8: 9,10).
Seja, pois, benvindo, Sr. Ministro, certo de que este Tribunal se tem constituído num alto refúgio para o oprimido, num «alto refúgio em tempos de angústia».
A segUir, o Exmo. Sr. MinistroPresidente concedeu a palavra ao
Exmo. Sr. Dr. Geraldo Andrade Fonteles, I? Subprocurador-Geral da República, para saudar o Exmo. Sr. Ministro William Patterson, em nome do Ministério Público.
o Exmo. Sr. Dr. GeraldO Andrade Fonteles, I? Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Presidente do Egrégio Tribunal Federal de Recursos, Srs. Ministros deste Egrégio Colegiado, Exm o Sr. MinistroPresidente do Tribunal Superior do Trabalho, Sr. Presidente do Tribunal de Contas da União, Exmo. Sr. Procurador-Geral da República, Exmo. Sr. Consultor-Geral da Repú' blica: Sr. Representante do Presidente do Senado Federal, Exm?s. Srs. Ministros do Supremo Tribunal Federal, Autoridades aqui presentes dos demais Poderes e Orgãos da Administração Pública, Srs. Advogados, Srs. Funcionários da Casa, Meus Senhores, Minhas Senhoras.
Ministro William Andrade Patterson:
V. Exa. proveio de plagas fecundas da intelectualidade brasileira. Daquela unidade da Federação que, ainda nos nossos dias, alça, às mais elevadas culminanças da Nação, o vulto honroso do grande Rui Barbosa; e que, ainda mais uma vez, fornece a este Egrégio Colegiado nomes da melhor estirpe de sua prOjeção, formada no amplo cenário do Judiciário pátrio, tais sejam os dos eminentes Ministros Amarílio Benjamin, Alvaro Peçanha Martins e WaShington Bolívar de Brito.
Isto, por si só, já delinea a auréola luminosa que nos é lícito vislumbrar, no porvir da judicatura de Vossa Excelência, Sr. Ministro William Patterson.
Entre o elenco de títulos que ornam sua brilhante atuação na Administração Pública, destaquei um dos menores, mas de grande significado para mim, pois, integrante como V.
118 TFR - 90
Exa., participei do Grupo de Trabalho constituído nos termos do Aviso n? 16-c. de 23-2-78, do Gabinete Civil da Pi'esidência da República, com a incumbência de realizar estudos e oferecer proposta legislativa, visando a reformular o sistema de remuneração dos membros do Ministério Público da União e do Serviço Jurídico da União e das Autarquias, infelizmente, não concretizado.
Precisamente, ao ensejo dos trabalhos do Grupo, tive oportunidade de conhecê-lo de perto e, bem assim, aquilatar a sua personalidade. De tanto, distingui a sua capacidade, o lastreamento de conhecimentos que o credencia na formulação da melhor dialética e no equacionamento dos valores com que arma e sopesa os seus pronunciamentos.
Se isso não bastasse, eis que percebi, nos corredores desta Casa, o sussurro alviçareiro de seus ilustres Pares, ao conhecerem a acertada escolha do Governo, na eleição de seu honrado nome, para Ministro do Egrégio Tribunal Federal de Recursos.
Aqui, Sr. Ministro , V. Exa. - me relevará a ousadia de afirmar - terá oportunidade, creio eu, de repassar a sua convicção quanto à responsabilidade e o prurido de sutilezas que desnivelam as funções do Ministério Público propriamente dito, inclusive o Federal, das dos serviços Jurídicos da União, confiados aos Assistentes Jurídicos, embora se frise com linha dobrada, que não haja prevalência na qualidade dos trabalhos técnicos de uns e de outros. Afigura-se-me comparar o destaque, tal qual se pretendessemos desnivelar os juízes das instâncias judiciárias.
Seu espírito de receptividade e franquia ao diálogo, a postura de serenidade no fragor do debate e amor à análise, são atributos pessoais que lhe outorgam vocação à magistratu-
ra. Por isso, todos os que militam nas hostes do Judiciário recebem-no com os braços abertos.
Quero ainda, Sr. Ministro, considerando o adestramento de V. Exa. no encaminhamento das sõluções adequadas no âmbito da Aãininistração Pública, o que vale dizer, do Governo, que se sirva envidar o melhor dos seus esforços no sentido de intensificar sua valiosa colaboração com o eminente Ministro-Presidente, José Néri da Silveira, na consecução do seu programa de trabalho. O nosso Presidente preconizou, com muito acerto, a necessidade do melhor entrosamento entre o Poder Judiciário e o Executivo, tal como afirmado no seu notável discurso, por ocasião de sua posse na Presidência desta Casa.
Note-se que aquela incisiva fala já produziu seus efeitos, pelo decreto de anistia dos débitos fiscais inferiores a mil cruzeiros.
O Ministério Público Federal, rendendo-lhe justo preito de homenagem pelo seu auspicioso ingresso na Magistratura, rejubila-se com sua excelentissima família que, como a de nós outros, sempre soube amenizar as refregas de nossas lutas pela vida a fora, perfumando com o carinho de seu amor e solidariedade profundos, o mal odor de todas as poluições hodiernas.
Auguramos-lhe, também, que a carga de processos não lhe arrefeça o ânimo ou espírito, cuja predisposição à luta encontra melhores evidências noutros trabalhos prestados ao pOder público e órgãos associativos de interesse da coletividade.
Por fim, numa palavra pessoal e fraterna, William, amigo dileto de meu filho Cláudio Lemos Fonteles, e de meu ilustre colega, Dr. Valim Teixeira, vinculados aos julgamentos do Tribunal Desportivo de Brasília, rogo a Deus que o ilumine na prestação jurisdicional de seus
TFR - 90 119
votos para o bem de todos e manutenção do prestígio deste Tribunal, não esquecendo de arrematar esta pálida oração com os versos soberbos do grande advogado e inspirado poeta de minha terra, Quintino Cunha, no seu tocante poema intitulado «O Poder da Miséria», onde alude o personagem, seu homônimo, e com suas virtudes, e que assim começa:
«Numa deserta estrada erma e sombria transitava um senhor que a fidalguia o distintivo fez: Era William, um nobre, destes nobres que via os ricos, como via os pobres. William era um inglês». Dal1do seqüência à solenidade, o
Exmo. Sr. Ministro-Presidente concedeu a palavra ao Sr. Dr. Hermenito Dourado, para saudar o Exmo. Sr. Ministro William Patterson, pelo Conselho da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Distrito Federal.
O Exmo. Sr. Doutor Hermenito Dourado, i\dvogado: Exm? Sr. Presidente, Egrégios Ministros, Exm?s. Srs. Presidentes dos Tribunais Superiores Federais aqui "presentes, Exmo. Sr. Desembargador-Presidente do Tribunal de Jus1lça do Distrito Federal, Senhores Ministros, Juízes, Desembargadores, Advogados, Meus Senhores e Minhas Senhoras:
A ordem dos Advogados do Brasil - Seção do Distrito Federaltconcedeu-me a subida honra, em caráter excepcional - posto que reserva a seus ilustres conselheiros - de prestar, representando-a, a homenagem devida ao Dr. William Andrade Patterson, por sua investidura como Ministro deste Egrégio Tribunal Federal de Recursos.
Fê-lo, decerto, levando em conta três motivos, para os quais convoco, por um instante, a benevolente atenção do Tribunal e de quantos se fazem presentes a esta solenidade.
Primeiro, em razão dos estreitos laços funcionais que, ao longo de quase três lustros, nos mantiveram
juntos no esforço comum de assessoramento jurídico à Consultoria-Geral da República, $ob a condução de Waldir Pires, Adroaldo Mesquita da Costa, Romeo AlmeÍda Ramos e Luiz Rafael Mayer;
Segundo, por causa das vinculações profissionais decorrentes do exercício da advocacia, em conjunto, que durou alguns anos;
Terceiro, tendo em vista o esforço de que partilhamos em favor do esporte, sobretudo na qualidade 'de Juiz do Tribunal de Justiça Desportiva do Distrito Federal, que tive a honra de ser por algum tempo e, o Dr. William, por longo período, reconduzido sempre pela vontade dos clubes que integram a Federação Metropolitana.
Desta forma, sinto-me com autoridade, em virtude do labor diuturnamente compartilhado na Consultoria Geral da República, ao longo dos anos, para testemunhar, com absoluto conhecimento de causa, sobre as qualidades pessoais do Dr. William Andrade Patterson que o tornaram uma das mais gratas revelações no exercício das funções de assessoramento do Serviço Jurídico da União, tanto pelo saber jurídico, quanto pelo senso de equilíbrio, honradez e probidade, coadjuvados por sua extraordinária dedicação ao trabalho e perseverante busca do ideal de justiça.
Já se disse que a existência do direito administrativo «é, em alguma medida, fruto de um milagre» sob a consideração de que é de admirar-se «que o próprio Estado se considere vinculado pelo direito», posto que «está na natureza das coisas que um governante acredite, de boa fé, ser investido do poder de decidir discricionariamente acerca do conteúdo e das exigências do interesse geral», devendo-se «considerar pouco normal» que o Estado veja «suas decisões submetidas à censura de um
120 TFR - 90
juiz», consoante o afirmou na introdução de seu «Le Droit Administratif», Prosper Weil.
De conhecimento próprio, estou certo de que, no que depender do Dr. William Andrade Patterson, este Egrégio Tribunal operará tal milagre. As qualidades para tanto ele as possui em porção dobrada, como já o demonstrou em sua marcante passagenl pela Consultoria-Geral da República.
De outra parte, tive o privilégio de participar do escritório de advocacia que, no início da década de 60, marcava o começo do que viria a ser a promissora carrreira de advogado do Dr. Wiliam Andrade Patterson.
Com efeito, tive, então, a ventura - embora sem a qualidade de condômino do imóvel, mas tão-só do das idéias - de integrar aquele escritório em companhia do Dr. Aldo Raulino Carneiro da Cunha Ferro, também condômino das idéias, e, ainda, do imóvel.
Se na Consultoria-Geral da República revelaram-se as qualidades do jurisconsulto que todos reconhecemos, pelos trabalhos produzidos pelo Dr.William Andrade Patterson como Assistente Jurídico ou ConsultorGeral, repassados de conhecimento doutrinário acumulado pela pesquisa a que se impôs sem desfalecimentos, no exercício da advocacia revelaram-se a grandeza de sua modéstia, a dignidade e independência profissionais que o fizeram credor do respeito, consideração e distinto conceito de seus colegas advogados.
Finalmente, assinalo o esforço que, juntos, desenvolvemos em favor do esporte, quando Brasília mal iniciava os passos para afirmar-se como centro das grandes decisões nacionais, na visão profética de um de nossos maiores.
Embora a contribuição amadorística, como atleta, não mereça
destaque, é de ressaltar-se, no entanto, a J inestimável colaboração do Dr. William Andrade Patterson ao Tribunal de Justiça Desportiva do Distrito Federal, a que serviu por longos anos com inexCedível dedicação e eficiência,
Eminente Ministro William Andrade Patterson, fazendo esses registros· creio que os seus então colegas da Consultoria-Geral, Washington Bolívar de Brito, Gastão dos Santos, Aldo Ràulino Carneiro da Cunha Ferro, podem todos repetir: bons tempos! fruto da descontração e confiança que só o relacionamento em bases sólidas da amizade é capaz de gerar. Bons tempos que se vão esfumando na visão do que ficou para trás, deixando um gosto agridoce de saudade, típico da lembrança de que valeu a pena viver.
A Seção de Brasília da Ordem dos Advogados, Sr. Ministro William Andrade Patterson, sente-se orgulhosa com a investidura de Vossa Excelência, se não por outros motivos, pelo altamente expressivo de ser o primeiro advogado com inscrição originária em seu Quadro a ocupar cargo de tamanha relevância no Poder Judiciário, fato indicativo, sem dúvida, da maturidade de nossa Secional.
Por todos os motivos e, em especial, por este, a Ordem dos Advogados do Brasil - Seção do Distrito Federal -espera e confia em que Vossa Excelência, Sr. Ministro William Andrade Patterson, prosseguirá no exercício da judicatura com a mesma dedicação ao trabalho, a mesma eficiência e o mesmo brilho, revelados como integrante do Serviço Jurídico da União e na banca de advogado.
Ao Egrégio Tribunal Federal de Recursos, as congratulações da Ordem, pela investidura do Dr. William Andrade Patterson como seu Ministro. Ao Governo Federal e, de
TFR - 90 121
modo especial, ao Excelentíssimo Senhor Ministro da Justiça, os parabéns da Secional pela feliz escolha.»
Em seguida, o Exmo. Sr. MinistroPresidente concedeu . a palavra ao Exm? Sr. Ministro William Andrade Patterson.
o Exm? Sr. Ministro William Andrade Patterson: Ao ser investido no honroso cargo de Ministro deste Egrégio Tribunal Federal de Recursos, faço ingente esforço para conter a grande emoção que me envolve neste momento, a fim de poder dirigir-me aos ilustres pares, autoridades e amigos presentes nesta solenidade.
Não poderia deixar de mencionar, em primeiro lugar, e porque importante para mim, o carinho e a fraternidade com que fui recebido por todos, nesta Corte, desde os primeiros contatos.
Aqui venho sem a pretensão de ombrear-me, em saber jurídico, aos Excelentes Juízes que compõem este excelso Colegiado. Trago, tãosomente, alguma experiência da militância profissional e um mínimo de maturidade no campo dos problemas jurídicos, adquirida em quase vinte anos de exercício contínuo na Consultoria-Geral da República.
Não sou um erudito. Se alguma virtude possuo, talvez seja a da intuição jurídica, assimilada pela vivência do Direito.
Assumo a judicatura numa hora de reformulaçao e de tomada de consciência dos graves problemas que afligem o Poder Judiciário. Ficarei reconfortado se, além do desempenho das tarefas precípuas do meu cargo, puder colaborar nesse árduo trabalho que considero de capital importância para os futuros destinos da prestação jurisdicional.
A desmassificação das demandas judiciais, objetivo primordial dessa
missão, permitirá, além de outros benefícios aquilo que julgo de maior relevo, a possibilidade de reflexão do juiz, principalmente dos que como eu, se iniciam no sacerdócio da magistratura. A reflexão, repito, do sentido de justiça em todos os seus contornos, com tempo suficiente para a busca das suas razões filosóficas e teÍeológtcas - da justiça como atributo do poder divino, como virtude universal, como princípio exclusivamente social, como balizaJ7lento dos postulados de igualdade ou, finalmente, da justiça como reaÍidade que não se exaure no fato histórico ou positivo, estando sujeita a evolução ou involução -. Todas as teorias, mesmo as que encontram repúdio no atual estágio da sociedade, contribuíram, estou certo, para a concepção intelectual do juiz.
A verdade é que estamos estacionados no ponto cruciante da imagem de justiça, aquele em que o direito positivo comanda, friamente, os desígnios das suas diretrizes, como realidade social, criando, por sua massificação, empeços ao desenvolvimento do pensamento construtivo que constitui a beleza intuitiva do Direito. E dessa realidade não pode fugir o magistrado sob pena de, na aplicação da justiça, praticar a injustiça através do retardo das suas decisões. O tempo, hoje, tem significativa relevância nas relações sociais e econômicas.
De qualquer sorte, a superação dos problemas estará sempre na dedicação e na formação pragmática do juiz, porque, como assinalado por Del Velchio: «Quem verdadeiramente se consagra ao ideal de justiça, supera-se a si mesmo como indíviduo, visto identificar-se, universalmente, com os outros para além da esfera das aparências físicas; e seguindo aquela vocação íntima que lhe atesta a lei do espírito como ser racional, entra no reino do eterno e do absoluto».
122 TFR - 90
Se a todos nós é dificultado, por enquanto, o prazer de refletir filosoficamente, é-nos concedido, contudo, o privilégio do exercício dessa sagrada função - distribuir justiça -.
Vejo minha responsabilidade aumentada, não só porque sentarei ao lado de excelsas figuras, cultoras do Direito, como, também, por ter de substituir um juiz de qualidades excepcionais, o Ministro Paulo Távora, a quem rendo minhas homenagens. Deus haverá de iluminar-me para que possa corresponder às expectativas, principalmente dos que me elevaram a esta posição.
Agradeço, finalmente, aos ilustres oradores que me saudaram. As palavras elogiosas do, eminente Ministro Washington Bolívar, nascidas do enorme coração de amigo e conterrâno, do Dr. Geraldo Andrade Fonteles, preclaro Subprocurador-Geral da República, digno representante do Ministério Público Federal, a quem muito prezo, e as do representante da Ordem dos Advogados do Brasil, Dr. Hermenito Dourado, estimado colega e companheiro de tantas atividades.
Muito obrigado a todos.» Antes de declarar encerrada a Ses
são, o Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira, Presidente do Tribunal, proferiu as seguintes palavras:
«Em nome do Tribunal agradeço a presença das altas autoridades: do Sr. Ministro João de Lima Teixeira, Presidente do Tribunal Superior do Trabalho; do Sr. Desembargador José Júlio Leal Fagundes, Presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal; do Sr. Ministro Ewald Sizenando Pinheiro, Presidente do Tribunal de Contas da União; do Doutor Firmino Ferreira Paz, ProcuradorGeral da República; do Deputado Homero Santos, I? Vice-Presidente da Câmara dos Deputados; dos Srs. Ministros do Supremo Tribunal Federal dos Tribunais Superiores, do
Tribunal de Contas da União, dos Srs. Ministros aposentados deste Tribunal, dos Srs. Juízes Federais, • dos Srs. Magistrados, dos Srs. Membros do Ministério Público da União, dos Srs. representantes dos Srs. Ministros de Estado, dos Srs. Advogados, entre os quais, e acreditando a todos representar, o ilustre Dr. Adroaldo Mesquita da Costa, do Sr. Representante do Escritório do Estado do Rio Grande do Sul, Dr. Júlio Cesar de Rose, bem assim das demais autoridades presentes, das senhoras e dos senhores, dos funcionários do Tribunal, de todos que emprestaram a esta solenidade, com suas presenças, alto destaque. Está encerrada a Sessão.»
Compareceram à solenidade as seguintes autoridades: Ministros Décio Miranda e Rafael Mayer, do Supremo Tribunal Federal; Ministro Luiz Octávio Gallotti, do Tribunal de Contas da União; Dr. Manoel Ignácio Chaves de Mendonça, representante do Exmo. Sr. Vice-Presidente da República; Deputado Federal Homero Santos, I? Vice-Presidente da Cãmara dos Deputados; Doutor Adroaldo Mesquita da Costa; Dr. Walter Ramos da Costa Porto, representante do Exmo. Sr. Ministro da Justiça; Dr. Jorge Leovegildo Lopes, representante do Exmo. Sr. Ministro da Marinha; General-de-Divisão Octávio Pereira da Costa: representante do Exmo. Sr. Ministro do Exército; Ministro Alvaro da Costa Franco, representante do Exmo. Sr. Ministro das Relações Exteriores; Dr.Cid Heráclito de Queiroz, representante do Exmo. Sr. Ministro da Fazenda; Dr. Estevão Santos Pereira, representante do Exmo. Sr. Ministro dos Transportes; Dr. Igor Tenório, representante do Exmo. Sr. Ministro da Agricultura; Dr. João Guilherme Aragão, representante do Exmo. Sr. Ministro do Trabalho; Dr. Tarcísio Carlos de Almeida Cunha, representante do Exmo. Sr. Ministro da In-
TFR - 90 123
dústria e do Comércio; Deputados Federais Djalma Marinho, Alberico Cordeiro e Raimundo Diniz; Prof. João Baptista Cascudo Rodrigues, representante do Exmo. Sr. Ministro das Minas e Energia; Dl'. Hélio Estrela, representante do Exmo. Sr. Ministro das Comunicações; Dl'. Paulo Cesar Cataldo, representante do Exmo. Sr. Ministro-Chefe do Gabinete Civil da Presidência da República; Tenente-Coronel-Aviador Zeir Scherrer, representante do Exmo. Sr. Ministro-Chefe do Serviço Nacional de Informações; Dl'. Antônio Marcos Lobo, representante do Exmo. Sr. Ministro Extraordinário para Execução do Programa Nacional de Desburocratização; Ministros aposentados Moreira Rabello, Henoch Reis, Esdras Gueiros, Oscar Corrêa Pina e Paulo Távora, do Tribunal Federal de Recursos; Dl'. Maurício Corrêa, Presidente do Conselho da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Distrito Federal; Coronel Moacir Coelho, DiretorGeral do Departamento de Polícia Federal; Drs. Gildo Corrêa Ferraz, Francisco de Assis Toledo e A. Valim Teixeira, SubprocuradoresGerais da República; Dl'. Luiz Rodrigues, representante do Sr. DiretorGeral do Departamento Administrativo do Serviço Público; Desembargador Raimundo Ferreira de Macedo; Deputados Federais José Penedo e Jorge Viana, Dl'. Waldir Pires; Drs. Gustavo Teixeira Lages, Fernando Américo Veiga Damasceno, Carlos Figueireclo Salazar, Raul Moreira Pinto, Bras Henrique de Oliveira, Geralda Pedrosa, Sebastião Henato de Paiva e José Luciano de Castilho Pereira, Juízes do Trabalho; Dl'. Wilson Egipto Coelho, Consultor Jurídico do Banco Central do Brasil, Dl'. Roberto Battendieri, representante do Governo do Estado de São Paulo; Dr. Julio Cesar de Rose, representante do Governo do Estado do Rio Grande do Sul, Juízes,
Advogados, membros do Ministério Público e funcionários da Secretaria do Tribunal.
Encerrou-se a Sessão às 17h 45min ..
Tribunal Federal de Recursos, 3 de agosto de 1979 - Ministro José Néri da Silveira. Presidente - Bel. Ronaldo Rios Albo, Secretário.
POSSE DO SR. MIN. ADHEMAR RAIMUNDO DA SILVA
Palavras de saudação do Sr. Ministro Néri da Silveira, Presidente do Tribunal Federal de Recursos, pela ocasião da posse do Sr. Ministro Adhemar Raimundo da Silva.
Exmo. Sr. Dl'. Petrônio Portella, DD. Ministro de Estado dos Negócios da Justiça e representante de Sua Excelência o Sr. Presidente da República. Exmo. Sr. Dl'. Homero Santos, Primeiro Vice-Presidente da Câmara dos Deputados e representante de S. Exa. o Sr. Presidente da mesma casa do Congresso. Exmo. Sr. Ministro João de Lima Teixeira, DD. Presidente do Tribunal Superior do Trabalho. Exmo. Dl'. Antõnio Carlos Magalhães, DD. Governador do Estado da Bahia. Exmo. Sr. Ministro Pedro Gordilho, do Tribunal Eleitoral e representante de S. Exa., o Sr. Ministro Leitão de Abreu, Presidente daquela egrégia Corte. Exmo. Sr. Ministro Ruy de Lima Pessoa, do Superior Tribunal Militar e representante de S. Exa., o Sr. General Reinaldo Melo de Almeida, Ministro-Presidente desse mesmo Tribunal.
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Presidente): Srs. Ministros deste Tribunal, Exmo. Sr. Dl'. Geraldo Andrade Fontelles, mui digno Primeiro Subprocurador-Geral da República, Exmo. Sr. Dl'. Firmino Ferreira Paz, DD. Procurador-Geral da República, Exmo. Sr. Professor Clóvis
124 TFR - 90
Ramalhete, DD. Consultor-Geral da República, Exmos. Srs. Representantes de S. Exas., o Sr. VicePresidente da República e Srs. Ministros de Estado dos Negócios da Marinha, do Exército, da Fazenda, dos Transportes, da Agricultura, da Educação -e Cultura, do Trabalho, da Saúde, da Indústria e Comércio, das Minas e Energias, da Secretaria do Planejamento, do Interior e do Sr. Diretor-Geral do DASP, Exmo. Sr. Ministro Luiz Gallotti, do Tribunal de Contas da União e representante de S. Ex~, o Sr. Ministro-Presidente daquela Corte, Exmo. Sr. Desembargador Antônio Carlos Sopo, DD. Vice-Presidente do Tribunal de Justiça da Bahia e representante dessa Colenda Corte; Exmo. Sr. Senador Nelson Carneiro, Exmos. Srs. Ministros aposentados deste Tribunal, Exmos. Srs. Subprocuradores-Gerais da República, Ex~ Reverendíssima Dom Geraldo D'Avila, DD. Bispoauxiliar de Brasília e representante de S. Exa. Reverendíssimo, Dom José Newton de Almeida Batista, DD. Bispo de Brasília; Sr. Conselheiro Heitor Dias, representante do Ministro de Contas da Bahia, Sr. Dr. José Paulo Sepúlveda Pertence, Primeiro Vice-Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; Sr. Dr. Maurício José Corrêa, Presidente da Seção do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil: Sr. Dr. Thomaz Barcellar da Silva, Presidente da Seção Baiana da Ordem dos Advogados do Brasil; demais autoridades presentes ou representadas, Srs. Parlamentares, Srs. Juizes Federais, Srs. advogados, Srs. membros do Ministério Público da União e do Distrito Federal e dos Territórios e membros dos Serviços Jurídicos da União, minhas Senhoras e meus Senhores: reúne-se o Tribunal Federal de Recursos, em sessão solene e especial, para dar posse a seu novo membro, o ilustre Desembargador Adhemar Raymundo da Sil-
va, do Colendo Tribunal de Justiça da Bahia, representante nomeado por S. Ex~ o Sr. Presidente da República, na vaga ocorrida com o falecimento do saudoso Ministro Amarílio Aroldo Benjamim da Silva.
Convido os ilustres Ministros Armando Rollemberg e Márcio Ribeiro para, em comissão, introduzirem no recinto deste Plenário o Sr. Desembargador Adhemar Raymundo da Silva.
Convido o Sr. Desembargador Adhemar Raymundo da Silva a ler o termo de compromisso deste Tribunal.
O Sr. Secretário lê o Termo de Posse;
O Sr. Ministro Adhemar Raymundo da Silva, Assina o Termo de Posse;
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Presidente): Declaro empossado no cargo de Ministro do Tribunal Federal de Recursos o Desembargador Adhemar Raymundo da Silva.
Convido o Sr. Ministro Adhemar Raymundo da Silva a tomar assento na bancada, ao lado do Sr. Ministro Wilson Gonçalves.
Para falar em nome do Tribunal, concedo a palavra ao eminente Ministro Peçanha Martins.
O Sr. Ministro Peçanha Martins: Senhor Presidente, Sr. Representante da Cãmara dos Deputados, Sr. Governador da Bahia, Sr. Ministro de Estado da Justiça, demais autoridades, minhas Senhoras e meus Senhores. Serão breves as minhas palavras nesta sessão especial e solene, brevidade que venho adotando em oportunidades semelhantes, principalmente depois que Lara de Resende, no seu discurso de posse na Academia Brasileira de Letras, contou que Pedro Calmom, um componente do rol dos consagrados oradores da atualidade, definiu o discurso longo
TFR - 90 125
como o pior dos discursos. Serei, portanto, repetirei mais uma vez, breve, conciso, cabendo-me apenas apresentar o novo Ministro e expressar-lhe as nossas boas-vindas, uma incumbência que me foi dada, estou certo, porque, além de contemporâneo de faculdade - sendo eu um pouco menos jovem - nascemos na mesma cidade, a velha, mas sempre airosa Salvador da Bahia, solidária com seus filhos e sempre impulsionadora nos embates da vida pública, bastando um simples passar de olhos neste salão com muitos baianos ilustres.
Governador da Bahia, Presidente do Tribunal de Justiça, Senador, Presidente da Seção Baiana da Ordem dos Advogados, Consultor Jurídico do Ministério da Justiça, Representante da Universidade Federal e advogado dos mais conspícuos, Adhemar Raymundo da Silva, bacharel de 8 de dezembro de 1937 e Pretor de Santana dos Brejos, sete dias após a formatura, começou, faz 42 anos dentro de poucos dias, a sua vida de magistrado que nunca abandonou. Juiz de Direito em 1942, através de concurso em que obteve a média nove, quase distinta, portanto, ascendeu a todas as entrâncias por merecimento, inclusive a 4~, a da Capital, como Juiz da sua 3~ Vara Crime.
Advogados, partes da sociedade baiana, proclamavam as suas qualidades de juiz criminal de inteligência e arguto, que conseguia extrair da testemunha, por mais obtusa e relutante, qualquer gota preciosa da verdade. Inclusive o Tribunal de Justiça, que indicou o seu nome por quatro vezes sucessivas, para preencher, por merecimento, vaga de desembargador, o alto cargo que finalmente conquistou em dezembro de 1965, mas pela porta larga da antigüidade, tal como disse, alguns anos antes, o emérito Desembargador Antônio Bensabard, também admitido
em razão do mesmo direi.to adquirido naquela Casa centenária, em cujo Plenário relembro sentados nas suas cátedras: Alvaro Clemente de Oliveira, Sálvio Martins, Euvaldo Luz, Demétrio Tourinho e Torílio Benjamin, magistrados Circunspectos, cultos e atenciosos, felizmente repetidos nos gestos e atitudes pelos desembargadores da sua atual composição, dentre outros, apenas apontando alguns: Osvaldo Sentecé, Antônio Carlos Souto, Renato Mesquita, Pondécio Sobrinho e Adolfo Leitão Guerra.
Estudioso desde os tempos da faculdade, de temperamento irrequieto e vibrátil, Adhemar Raymundo da Silva não se satisfez com a sua condição exclusiva de magistrado. Pretendia subir e subiu pela perseverança no estudo, principalmente do Direfto Penal e do seu processo. Por isso mesmo, e ainda como juiz no interior do Estado, se não me engano, da Comarca de Vitória da Conquista, com a tese «O Processo Penal como Relação Jurídica», candidatou-se à docência livre na Faculdade de Direito e, plenamente aprovado na competição, passou a substituir o professor catedrático da disciplina. Depois, já como Juiz de Direito da Capital, inscreveu-se candidato à cátedra e a conquistou através de ruidoso concurso com a tese «Da Execução Penal». TodoS, lembro-me bem, aplaudiram sua indicação pela banca examinadora de que fizeram parte, além de professores baianos, Frederico Marques, Ari Franco e Xavier de Albuquerque.
Presentemente, um abalisado mestre, faz pouco tempo escolhido pela Editora Revista Forense como um dos comentadores da futura Lei Processual Penal.
Caso entendesse relacionar os trabalhos intelectuais de Adhemar Raymundo da Silva, aliás, Adhemar Raymundo, como prefere ser tratado e é conhecido, entraria em choque
126 TFR - 90
com a brevidade que antes anunciei deste modesto discurso. Mas não resisto no dizer, além das duas teses já apontadas, sobem a mais de três dezenas os estudos que realizou no campo da sua especialização e no âmbito do Processo Civil, muitos publicados na imprensa, outros em revistas juridicas do Pais. E merecem destaque especial: «Estudos de Processo Penal», obra publicada pela Universidade da Bahia; «Denúncia Inepta»; «Competência Originária» e «Liminar em Processo de Habeas CorpUS», estes últimos elaborados no curso deste ano de 1979.
Para substituir, pois, o nosso saudoso e eminente colega Amarilio Benjamim, sobre cuja personalidade me coube a honra de falar pelo Tribunal, na sua sessão especial de 11 de outubro, o Governo Federal nomeou outro Juiz baiano, do mesmo porte intelectual do substituído.
E, feita assim, em termos rápidos, a apresentação, dirijo-me a V. Exa., Sr. Ministro Adhemar Raymundo, para desejar-lhe boas-vindas a esta Casa onde impera entre seus membros a concórdia e a paz. Boasvindas e votos de felicidade extensivos à sua Excelentíssima Senhora cuja fisionomia, desde ontem reparo, revela muita alegria por mais esta vitória de seu marido.
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Presidente): Para falar em nome do Ministério Público, concedo a palavra ao Dr. Geraldo Andrade Fonteles, Subprocurador-Geral da República.
o Sr. Dr. Geraldo Andrade Fonteles (Subprocurador-Geral da República): Exmo. Sr. Presidente do Egrégio Tribunal Federal de Recursos, Exmo. Sr. Ministro da Justiça, Exmo. Sr. Governador da Bahia, Exmo. Sr. Procurador-Geral da República, Exmo. Sr. Representante da Ordem dos Advogados do Brasil,
Dignissimas autoridades CIVIS, militares e eclesiásticas, Exmos. Srs. Ministros do Tribunal Federal de Recursos, meus Senhores, minhas Senhoras, Srs. Funcionários.
Exmo. Sr. Ministro Adhemar Raymundo da Silva: ao saudar V. Exa., Sr. Ministro, tenho duplo júbilo por sabê-lo inconsumado mestre do Direito Processual Penal, o que me dá o ensejo de, também «en passant», reverenciar o meu querido, admirado e eminente professor e amigol Hélio Tornaghi, a quem coube, no Brasi), o papel pioneiro da renovação científica desse ramo do Direito, lançadO' na sua excelente obra «A Relação Processual Penal», livro em que iniciei os meus estudos acadêmicos da matéria.
Igualmente V. Exa., Sr. Ministro Adhemar, se ocupou do tema na tese apresentada para concurso de livre docência da Faculdade de Direito da Universidade da Bahia, intitulando-a «O Processo Penal como Relação Juridica», seguindo, assim, as pegadas dos precursores que vieram preencher a grande lacuna nesta parte da nossa literatura jurídica. O acendrado valor dos estudiosos nessa área do Direito coloca as letras juridicas, no particular, em posição de destaque, tão quão assimilam e expõem o conteúdo' aas obras dos grandes processualistas mundiais, como Chiovenda, Carnelutti, Calamandrei, Goltinick, Hope, Floriam, para citar os mais festejados entre nós. Divulgando as diretrizes que imprimem a nova sistemática científica do Direito Processual Penal, graças aos esforços à cultura, ao amor ao des.envolvimento científico, é que se pOde estruturá-la como disciplina autõnoma, libertando-a das amarras vetustas do Direito Penal, de que fora, no início, simples complemento.
O incremento do gosto pelo estudo e especulação desse ramo de nossa
TFR - 90 127
cultura jurídica deve-se, em grande parte, aos integrantes do magistério e da docência 'dos quais V. Exa. se consagrou arauto de notável importância na Universidade Federal da Bahia. Certamente V. Exa. tem presentes os dois princípios históricos que se interpenetraram para constituir a sistemática científica do Processo Penal, vale dizer, das concepções germânicas e os da romana: aquele declarando quem deve prover o meio de prova, deixando ao juiz a missâo de prover a prova e a sentença definitiva, um alcance amplo com vistas à coletividade; enquanto esta adota outro rumo, exigindo que a prova se dirija ao juiz para formar a sua convicção, figurando este como integrante das partes processuais para, afinal, cumprir a jurisdição tutelada pelo Estado nos limites dos vínculos processuais.
Esta breve digressão, da qual me excuso perante V. Exa. e o Egrégio Tribunal, teve em mira colimar um objetivo de ordem geral. À semelhança de como se procedia na Escola Germânica, deveria ser facultado ao Poder JUdiciário sugerir aos outros Poderes da Nação o que devem e por que meios fazer a coleta da experiência de seus misteres, a fim de bem equacionar as soluções dos ingentes problemas que afligem o Brasil. Eles repousam preponderantemente no homem, no seu comportamento perante a sociedade e o Estado e, como na Escola Romana, demonstram a relevância de seu engajamento como parte integrante do processo governamental, face à inconformidade revelada nas lides forenses que dizem seja a melhor captação de causas e efeitos que podem modificar a fisionomia do status social, indicando a normatividade mais adequada para preservar a paz e a segurança.
O descaso nacional que alheia o Poder Judiciário da participação nas soluções étnicas e sociológicas dos
mais graves problemas brasileiros é a prova de nossa inconsciência na emergência de país subdesenvolvido ao processo tumultuário de sua ascensão ao país em desenvolvimento. Esta relegação se projeta no complexo da mecânica do judiciário, Poder autônomo e independente, apenas constitucionalmente inscrito, porque as suas carências e deficiências não podem ser independentemente por ele resolvidas, senão que sujeitas às manipulações orçamentárias e às disciplinações de órgãos do Executivo, nem sempre bem assessorados e aparelhados para uma análise de visão extensiva de conformidade com a ordem .iurídica.
O Poder Judiciário no Brasil ainda se mantém de pé, tão-somente pelo amor e ciosidade de seus grandes vultos, tanto do passado, como do presente. O órgão representativo dos Três Poderes junto ao judiciário, no processo de equilíbrio dos direitos e garantias individuais - princípio basilar dps fins sociais - dia a dia é empurrado para a burocratização e dependência dos órgãos executivos que não compreendem, ou não querem compreender, que o Ministério Público, como órgão institucional, não se pode atrelar à subordinação e à vontade de formulações impróprias, conflitantes com a ordem juridica. No entanto, não é desazado proclamar-se, no momento histórico que atravessamos, que a -Justiça sempre foi, é e será o símbolo e o templo da perpetuidade de todos os valores sociológicos, inclusive da liberdade que é posta, diuturnamente, ao consenso do Judtciârio. Vemos, assim, em última analise, que a concepção estadista, considerando-a apenas no tomo das preciosidades tradicionais, esquece-se de que o enorme fluxo dos desequilíbrios sócio-econômicos é despej ado em volumes tempestuosos, no seu bojo, resultando, em conseqüência do poder jurisdicional assegurado na Carta
128 TFR - 90
Magna, a transferência de responsabilidade e obrigações enormíssimas para o futuro.
Impõe-se, data venia, a nosso' ver, um amadurecimento desta concepção teimosa em não atualizar as suas criatividades normativas com a jurisprudencial que é, também, fonte do direito e, necessariamente, deve atuar como a vontade do Estado. De que vale a preeminência dos valores utilitaristas se, posta na balança do equilíbrio entre os desajustes econômicos e sociais, há de prevalecer um dia, cedo ou tarde, a unidade humana no contexto do problema social?
Por isso, compenetro-me de ser este um momento de profunda reflexão a despedida de um varão da Justiça, nobre e altivo, do quilate de Amarílio Benj amin, e a ascendência de seu sucessor. V. Exa., Sr. Ministro Adhemar, por certo, responderá com altanaria' as esperanças que todos lhe depositam.
Finalmente, vou encerrar com uma lembrança de leituras antigas, absorvidas de uma das crônicas de Humberto de Campos, intitulada «A dádiva de Licurgo», onde o autor diz, como ora o faço, declarando o meu pesar: só lhe trouxe essas flores, Sr. Ministro, para sua vitoriosa carreira. É que a Licurgo perguntaram um dia, porque só oferecia pequenos sacrifícios aos deuses. - E respondeu, para que não me acabe a provisão e me reste sempre, em toda a minha vida, alguma coisa que lhes dê. Eis por que me justifico com o temor de não possuir, amanhã, outras flores do jardim de Licurgo para enfeitar a consagração de seu porvir e deste Egrégio Tribunal.
o Sr. Ministro José Néri da Silveira (Presidente): Para falar em nome do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e da Seção do Distrito Federal da mesma entidade, concedo a palavra ao Dr. José Paulo Sepúlveda Pertence.
o Sr. Dr. José Paulo Sepúlveda Pertence (Advogado): Exmo. Sr. Presidente e eminentes Ministros do Colendo Tribunal Federal de Recursos, Exmo. Sr. Ministro da Justiça e representante do Senhor Presidente da República, Exmo. Sr. VicePresidente e representante da Câmara dos Deputados, Exmo. Sr. Governador da Bahia, eminentes Ministros representantes do Tribunal Superior Eleitoral, do Tribunal Superior do Trabalho e do Superior Tribunal Militar;' Exmo. Sr. Dr. Subprocurador-Geral da República, eminentes autoridades, Sr. Ministro Adhemar Raymundo da Silva: <lê).
«O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e também, de modo particular, a pedido do seu ilustre Presidente da Seção do Distrito Federal, traz a V. Exa. as congratUlações e a esperança da comunidade dos advogados brasileiros, no momento de sua posse no cargo de Ministro do Tribunal Federal de Recursos.
Assumir, hoje, uma cadeira nesta Casa tem o sabor da aceitação consciente de imensos desafios. Desafios a que acresce, no caso, a responsabilidade de suceder o saudoso Ministro Amarílio Benj amin que, mercê de inteligência e operosidade, de independência e equilíbrio, de autoridade e lhaneza de trato, deixou definitivamente marcada entre nós a sua passagem por este Plenário e identificou o seu nome com o processo de constante afirmação deste Tribunal no merecido respeito da Nação.
Para responsabílidade dessa substituição pessoal e para aceitação dos desafios institucionais do cargo, V. Exa. oferece um currículo que o credencia às nossas esperanças confiantes. Intelectualmente, a obra doutrinária de V. Exa. o acredita como jurista de primeira linha. É pena que, esgotada a edição de 1962 de «Os Estudos de Direito Processual Penal».
TFR - 90 129
grande parte dos seus trabalhos se tenha confinado, antes e depois da coletânea, às páginas inacessíveis de um jornal da Bahia, em sinal manifesto de uma modéstia inexplicável. Valeu a pena, porém, o esforço da descoberta, na Revista Forense, de uns poucos estudos seus: «Pressupostos Processuais», «Sentença de Pronúncia», «Atos Processuais Penais», «Execução Penal» e «A Teoria da Relaçâo Processual - Vantagens e Aspectos Práticos», todos eles, mormente quando se atenta à época de sua publicaçâo, de 1954 a 1958, permitem verificar, embora lamentando que se trate de simples amostra, que V. Exa. se situa, por esses trabalhos, como por suas teses na mesma época em que situaram Tornaghi, Frederico Marques, Xavier de Albuquerque e uns poucos mais, entre os que deram dignidade científica e visão sistemática ao trato entre nós do direito processual Penal, elevando-o da mediocridade praxística em que vegetava.
Dos seus atributos morais, de suas qualidades pessoais de magistrado e professor, dão os testemunhos mais que suficientes a recordaçâo ouvida de ex-alunos seus e o respeito e a amizade que lhe dedicam os advogados da Bahia, bem traduzidos no empenho posto pela delegaçâo baiana, na presença do Conselho Federal da Ordem, nesta solenidade. Confiantes nessas qualificações do seu passado, nós, advogados, queremos depositar nas mãos honradas de V. Exa., como nas de seus eminentes pares, o penhor de nossa esperança em que esse Tribunal responderá vitoriosamente ao desafio que os reclames da sociedade civil lançam, hoje, ao Poder Judiciário brasileiro.
No caminho do estabelecimento de um Estado de direito democrático, a inspiração nacional de que a Ordem se tem feito intérprete e a História próxima do Brasil hão de passar ne-
cessariamente pela afirmação do Judiciário. Por isso, chamada ao diálogo com o Poder, a entidade dos advogados colocou a restauração das garantias da magistratura juntamente com o restabelecimento da plenitude do habeas corpus como os passos iniciais, pré-requisitos mínimos de confiabilidade no proclamado intento de legitimação do regime e de seu reencontro com a Nação. As garantias estão formalmente revigoradas. Outras metas parciais foram alcançadas, mas o sistema, intrinsecamente autoritário, continuará a reputá-las meras concessões conjunturais, enquanto a resistência da sociedade civil e a prática das instituições democráticas da constituição formal não as afirmarem como liberdades definitivamente conquistadas. P ara isso é desnecessário insistir no papel insubstituível de uma magistratura que se conscientize como poder legitimado pela Nação, como instrumento de proscrição do arbitriõ. Mas o desafio que o momento histórico impõe aos juízes não é apenas o da reafirmação cotidiana da independência do Poder JUdiciário entre os órgãos do Estado. O crescimento do País, somado, no que diz respeito, em particular, a esta Casa, à onipresença da Administração Pública na vida social e à absoluta predominância da União deram tons de dramática urgência ao velho reclamo pela modernização eficiente da distribuição da Justiça.
As sucessivas frustações dos ensaios de reforma vêm tornando ilusória a independência formal do Poder Judiciário. Inibida pela deficiência crônica de sua estrutura e de seus instrumentos, incapaz de atender com eficácia à demanda que lhe é endereçada, a magistratura vê-se demitida do seu papel institucional, e, com essa demissão, expande-se a descrença na aspiração de soluções conformes ao Direito para os confli-
130 TFR - 90
tos sociais e, de modo singular, para os que opõe o cidadão ao arbítrio dos poderosos do Estado.
Para os que lidam neste Tribunal, o testemunho do esforço desumano a que se entregam diuturnamente os seus juízes, é a prova maior de que o desafio não será vencido sem soluções radicais. Na sua busca confiam os advogadosl em que V. Exa., Sr. Ministro Adhemar Raymundo da Silva, há de contribuir com o saber e a esperança que o alçaram à dignidade desta Corte.
o Dr. Thomaz Bacellar da Silva (Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Estado da Bahia): Exmo. Sr. MinistroPresidente deste Tribunal; Exmo. Sr. Ministro da Justiça, mui digno representante do Exmo. Sr. Presidente da RepÚblica; Exmo. Sr. Representante da Câmàra Federal, eminente Governador Ântônio Carlos Magalhães; Sr. Ministro Rui de Lima Pessoa, representante do Tribunal Superior Militar; Sr. Ministro João de Lima Teixeira, representante do Tribunal S4perior do Trabalho; Sr. Ministro Pedro Gordilho, representante do Trib'unal Superior Eleitoral; demais autoridades aqui presentes ou representadas, Srs. Ministros deste Tribunal, Sr. Vice-Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Sr. Presidente da Seção local da mesma entidade, Srs. Deputados, Srs. representantes do Ministério Público, Srs. Advogados, Sr. Ministro Adhemar Raymundo da Silva.
Para quem acompanha há mais de duas décadas a laboriosa existência do recém-empossado Ministro, é fácil e grata a missão de saudá-lo, de traçar-lhe o perfil, ou de fazer-lhe a síntese da sua vida, sobretudo se quem assim o faz, ou tenta fazê-lo, é um antigo aluno que dele recebeu, diretamente, lições nos bancos acadêmicos e depois - na militância
advocatícia junto à barra dos Tribunais, onde atuou - houve melhor reconhecê-lo e testemunhar reações da sua nobre consciência jurídica e do seu indefectível espirito de Justiça. E compreensível, assim, que seu discípulo e admirador, ao lhe render as homenagens, em nome da Ordem dos Advogados da Bahia, que, coincidente preside, esteja neste momento com enorme carga de afetividade, com sentimentos imperativos de afeto.
Costumam, nestas horas emocionais, desfilar dadivosos encômios à figura do homenageado que, porém, não necessita, para realçar suas qualidades, de adjetivação roçagante. Poderia recatalogar os múltiplos predicados que adornam sua vida; teria motivos, particularmente até, para fazê-lo. Não saberia, nem poderia, contudo, melhorar os que aqui foram projetados com admirável maestria. Impossivel seria, entretanto, furtar-me de mencionar alguns aspectos, entre muitos, que marcaram, positivamente sua trajetória na Universidade e na Magistratura. Na atividade pública, desenvolvida na Bahia - seja atuando jurisdicionalmente, seja no mister docente -deu mostras incompulsas e sobejas de méritos irrecusáveis que galvanizaram o reconhecimento e admiração geral.
N as árduas tarefas do Magistério, notabilizou-se pelo potencial de seus recursos pessoais, pela metodologia docente, com ínvejáveis dotes de precisão e de clareza expOSitiva ao transmitir os conhecimentos teóricos e de natureza vivencial. Pertence à classe daqueles que comunicam, aos que se amestram na aprendizagem, a sua própria fé, distribuindo parte de sua riqueza amiúnica. Converteuse, por ísso mesmo, não em um mero e rotineiro expositor de uma disciplina jurídica, mas num autêntico guia da juventude universitária baiana.
TFR - 90 131
Numa época em que não andavam muito em voga os estudos processuais penais na Bahia, soube demonstrar que não era um simples hóspede nos assuntos penais e imprimiu orientação segura e de singular relevo no ensinamento da disciplina. Iniciou o acervo bibliográfico na Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, onde mais tarde conquistou brilhantemente a Cátedra, com aplaudido estudo sobre a relação processual penal, a que se seguiram teses e monografias densas enfocando temas de interesse jurídico, mormente nas áreas da execução penal, revisão criminal, nulidades e questões de prejudiciais entre outras.
E de se louvar, em toda sua reprodução jurídica, não só o brilho com fulgores próprios, como o esmero elaborativo, o estilo didático, o conteúdo científico e as premissas filosófico-epistemológicas estabelecidas.
Atuando em outro hemisfério - no da função jurisdicional - sua formação cultural não sofreu alteração e se entremostrou um magistrado que tem a intuição da justiça. Levou seus conhecimentos teoréticos à prática judicial sem descolorir a linguagem e o tom que mantivera na cátedra. A condição de professor, de mentor pedagógico, longe de deformar o magistrado, o completa e o aprimora.
o Sr. Dr. Thomaz Bacellar da Silva (Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil) - A vida real, de riqueza mais palpável, colocou o homem de estudo em íntimo contato com os mais variados problemas juridicos que escapam, ordinariamente, aos teóricos, no silencioso trabalho dos gabinetes. O direito é, por natureza, uma ciência de aplicação e o obreiro incansável da sublime missão de distribuir justiça, de assegu-
rar a ordem e de manter a paz. Deixou, na vida cotidiana, escriturado em autos de processos, em repositórios de jurisprudência, nos anais de Forenses e na memória dos assistentes, sínteses acabadas de altas virtudes profissionais. Por via dos seus julgados, vê-se quantas coisas dizem as leis quando se sabe interpretá-las. Não lhe minguaram, também, dotes de polemista, não obstante procurar movimentá-los com aquele cuidado de que falava Juan Luiz Vivus, isto é, com igual cuidado de quem corta as unhas todos os domingos.
Embora apto a bem ouvir e, conseqüentemente, a compreender, este jurista de alma limpa é dono de um temperamentó vivaz e impetuoso. Este seu caráter aguerrido e de incontida franqueza não subverteu, porém, nele o espírito escrupuloso, imparCial, discreto e sereno de verdadeiro magistrado. Habilitou-se aos golpes e aos contragolpes da dialética advocatícia. É possuidor de temperamento ardoroso, de vocação para a trincheira, de amor ao debate, mostrou desde cedo sua identidade com a classe dos advogados.
Dele também se pode dizer que, através de seus livros e votos na judicatura, se reconhece alguém que deveria formar conosco - ao lado dos advogados - porque sua vocação é muito menos para dizer o direito, sentado na coroa do juiz, do que para postulá-lo, de pé, diante dos Tribunais. E, na verdade, nunca pqjde conter, nunca deixou de ser, de certa forma, um advogado, mesmo no Tribunal. No fogo cruzado dos argumentos e dos contra-argumentos, no entrechoque dos pensamentos divergentes, do saber de experiência feito, é que pode surgir o conceito exato ou a hipótese feliz, como salta a fagulha no atrito do fuzil com a pederneira. Quando se convence do direito de um pleiteante, faz-se seu patrono sem mandato. A causa fica
132 TFR - 90
sendo sua, e, quando não prevalece seu ponto de vista, nota-se que fica a impressão de um insucesso profissional.
Eminente Ministro Adhemar Raymundo da Silva: queremos lhe dizer que festejamos, que incentivamos a exaltação de advogado que carrega dentro de si e que há de trazer para este Tribunal. Advocacia não se cimenta apenas na lucidez do gênio, mas também na retidão do caráter. Tais qualidades podem existir no juiz e no advogado, por isso que não constituem essências inconciliáveis. São manifestações estas trazidas para esta Casa por parte de quem assistiu sua passagem pela magistratura baiana na primeira e na segunda instãncias, notadamente na Cãmara Criminal. E pode, por isso mesmo, levantar a voz em louvor da sua carreira, da sua alta competência e do seu elevado padrão de moralidade. E certo que o recrutamento de juizes tem, por vezes, dado margem a in quietudes e insatisfações. Observações críticas surgem enderaçadas ao sistema adotado neste e em outros países, por derivar a nomeação do Poder Executivo. Dizse mesmo que, sendo o poder político o que faz a nomeação, pode advir certa confusão entre a política e a Justiça. Confusão que se acentua quando se admite que não faltam casos em que os homens passam por certos elevadores sociais (la política ao Tribunal e do Tribunal à política.
Com V. Exa., entretanto, razão não há para temores. Bem ao contrário, a instituição judiciária só pode estar engrandecida e a certeza de que V. Exa. continuará observando certos rigores que emanam da essência da própria função jurisdicional, permite-nos encerrar esta homenagem, que lhe prestam, por nosso intermédio, os advogados da Bahia, com a advertência velha e um tanto esquecida, saída da pena de Balzac:
«Desconfiar da magistratura é um princípio de dissolução social. Reconstruí a instituição noutras bases, pedi-lhe imensas garantias, mas confiai nela».
O Sr. Ministro Adhemar Raymundo da Silva: Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira, DD. Presidente desta Alta Corte de Justiça; Exmo. Sr. Ministro da Justiça, meu preclaro e eminente amigo, Antônio Carlos Magalhães, cuja presença me enche de muita satisfação nesta hora; ilustres Juízes dos Tribunais Superiores que fazem parte desta Mesa; meu preclaro e eminente amigo, desembargador Antônio Carlos Souto que representa o Tribunal de Justiça da Bahia onde, durante 14 anos, militei como desembargador; autoridades; meus Senhores; ilustrés Pares, também serei breve:
Tivera a grata notícia de que a solenidade de posse nesta Casa era simples, sem discursos, e alegre ficara com esta grata notícia. Mas, logo depois, fui advertido de que o eminente Ministro Peçanha Martins me saudaria, e outras saudações se ouviriam. Palavras generosas, inclusive as de Thomaz Bacellar, meu exaluno da Faculdade de Direito. E, ao escrever o meu breve discurso, tive em mente, Senhores, dois assuntos que considero palpitantes no momento presente, dois assuntos que representam, sem sombra de dúvidas, um só pensamento, porque eles convergem para um estuário comum, a grandeza da função do Juiz, o Juiz na formulação judicial do direito, na frase admirável de Tobenha, e o grande papel do juiz na administração da justiça. Esses dois assuntos, em síntese, serão desdobrados em rápidas e singelas palavras, que resolvi escrever para ser mais fiel ao meu pensamento (lê): Ao perpassar o olhar por entre os presentes, diviso os meus conterrãneos que, nesta romaria do coração - para lembrar o
TFR - 90 133
velho Rui - aqui comparecem para, destes cimos, contemplar nos longes do horizonte as figuras estelares daqueles que, em outras peregrinações festivas, elevaram bem alto o nome da Bahia. Rememoro, nesta hora, vivos e mortos que, no Pretório Excelso e nos Tribunais Superiores, com serenidade e grandeza, são e foram os semeadores da Justiça.
Com a palavra e o exemplo, o juiz se incorpora aos supremos artífices da fecundação divina do universo: o professor, o sacerdote e o lavrador. Na palavra genial de Rui: «ao sacerdote, cuja fronte se verga para o cálice consagrado; ao professor que espalha o grão de verdade para o sulco que ficou aberto nas consciências novas; ao lavrador, cuja fronte se dobra sobre a terra» - todos sacerdotes do Senhor - há de se agregar, de certo, a esses supremos ministérios e do juiz, cuja missão o aproxima da divindade, no dizer do grande pensador.
Pedro Santos e Eduardo SpÍndola, dentre os mortos, consagrados pelo respeito e pela veneração dos pósteros dos longes de sua existência fecun'da, vertem ainda às fulgurantes missões de um consagrado sacerdócio. Aliomar Baleeiro também deixou no Supremo as marcas de sua alucinante inteligência, aliada à coragem de dizer. Aqui, nesta augusta Casa, rememorar Amarílio é ato de Justiça: espírito ático, que por mais de dez anos espargiu as luzes do seu saber e da sua experiêncía. A mínha sincera homenagem a quem tenho a honra de substituir nesta Corte de Justiça.
Dentre os vivos, aqui ainda moreja a figura fidalga e brilhante de Peçanha Martins, velho companheiro do Fórum Rui Barbosa, nos idos de cinqüenta, a quem sempre me ligaram estreitos laços de estima e elevado apreço.
o juiz, na formulação judicial do Direito: Se a ordem jurídica é o conjunto de normas e princípios que disciplinam a vida comunitária, à qual se incorpora necessariamente a função de dizer do Direito, conclui-se que ela é a afirmação de um sistema de proteção.
Lógica a assertiva de que a contribuição dos juízes na formação do Direito é incontestável. E uma dessas coisas estranhas que a História do Direito registra, qual o fato de terem as decisões jurisdicionais - que no Direito Romano se incorporaram às fontes do Direito - se desvinculado sem razão de direito do ordenamento jurídico, como uma das suas vertentes. A partir da ascensão do Positivismo, criou-se a falsa idéia de que o ordenamento jurídico se esgota na norma abstrata e genérica da lei.
De outro lado, não aplaudo a idéia de que a jurisprudência seja a única fonte de Direito. Estranhável, pois, a deSfiguração desse extraordinário elemento de formulação do Direito que teve em Roma, com os honorários, o seu verdadeiro fastígio. Antes mesmo da concepção dos romanos, foi o sistema da formulação judicial do Direito que emprestou às soluções dos litígios sentido profundamente humano, mercê da eqüidade, a qual - como disse Tobéias - nas primitivas sociedades, era a única forma da atuação do Direito.
Não foi sem razão que Aristóteles dissera que o juiz é a Justiça viva, ou seja, o órgão que resume em si o espírito do Direito vigente e o expressa em novas formulações.
O pretor romano, através do uso do honorário, criou o Direito, opulentando, com as suas sábias e oportunas fórmulas, no eSforço constante do superar o jus scriptum para que triunfasse a eqüidade sobre as concepções formalistas do Direito. O silêncio da lei era suprido e o excessivo rigor do Direito era temperado
134 TFR - 90
pelO jus edicendi dos magistrados. O Direito inglês, que recebeu a influência decisiva do Direito Romano, tem no fundo similitude com este, de tal forma que 'Bodenerrain - registra em ambos ÓS sistemas júrídicos as normas rígidas e formais que foram grandemente atenuadas mediante um sistema de jurisprudência mitigada. Entre o Direito imobilizado no texto e o Direito atuante há uma diferença abissal.
Não foi sem razão que Ihering afirmou que o trabalho do Juiz é conciliação do Direito com as diligências da vida, como conceberam os romanos, servindo-se da Interpretatio, como a ponte entre o Direito escrito e a eqüidade.
As sentenças e os arestos constituem um aspecto da realidade jurídica, tanto que Cóssio afirma que elas, - como normas individualizadoras que são - constituem as únicas que refletem de forma direta e imediata essa realidade. Elas se incorporam ao ordenamento jurídico, como expressão prática e dinâmica do Direito que existe mercê da sua força, como expressão de atividade estatal necessária à manutenção e atuação daquele, vale dizer, do ordenamento jurídico.
Quer sej am denominadas normas individuadoras, quer sejam normas judiciárias, não se pode negar o seu papel valioso na prOdução do Direito, porque desta partiCipa o Juiz quando valora a conduta humana na sua interferência intersubjetiva, para usar a expressão cossiana. E que, defendendo o ordenamento jurídico, está o Juiz não só tutelando o Direito objetivo, mas todas as pOSições subjetivas que nascem do jus scriptum.
Deparius sentenciou: «A lei não é a única fonte de Direito». Uma lei chega sempre tarde, intervém quando as circunstâncias o exigem e quando os costumes o' impõem. O costume, a
jurisprudência e a eqüidade são as verdadeiras fontes do Direito. Ademais, posto o problema sob o ângulo do mecanismo da atividade cognoscitiva do Juiz, maiores subsídios vamos encontrar para a defesa do ponto de vista exposto. E que muito contribuiu para o falso entendimento da não partiCipação da jurisprudência na formação do Direito, a superada concepção de que a operação que o Juiz realiza - quandO decide - obedece exclusivamente a um juízo lógico, silogístico, sem acrescentar nada - como disse Vasquez - à declaração da vontade da lei, abstratamente formulada; ou como ensinou Montesquieu, ao proclamar que é o Juiz um instrumento mecânico a serviço da lei.
A decisão judicial é como proclamar um ato de opção, porque na formação do seu convencimento terá o Juiz de escolher uma dentre as teses expostas, ou ainda aquela que não foi objeto de apreCiação pelas partes. Mas, necessário se torna que o seu convencimento assente no munto dos fatos, porque o objeto do seu conhecimento não é o Direito em tese, mas o Direito em causa, isto é, o fato individuado.
Exatissima a observação de De Luca - já anteriormente entrevista entre nós por João Mendes - quando assinala, com propriedade, que se verifica nos dias presentes fenômeno inverso ao do passado: ao interesse pela estrutura silogística do raciocínio do Juiz, sobreleva o entendimento contempQrâneo de que a sua atividade cognoscitiva tem as suas implicações como o mundo da experiência. O ato jurisdicional é o momento culminante de todo o ciclo de prOdução do Direito e de toda a problemática da certeza do processo, porque através dessa operação é que o Direito perde o seu resíduo de abstração e penetra no mundo prático dos fatos, na observação de Caiane.
TFR - 90 135
Certeza e verdade fundem-se numa síntese que é o ato jurisdicional, apesar de o conhecimento do julgador ter caráter contigente, já que é assentado na realidade que lhe é oferecida pelas provas feitas no processo, razão por que o ordenamento jurídico criou a rescisória e a revisão criminal - remédios que justificam e comprovam o fatal limite da relatividade própria da natureza humana.
Destarte, não se poderá negar o papel do Juiz, o qual, no dizer de Sata, realiza uma contínua e imediata criação. Dele irradia a luz bendita a espelhar a santidade dos justos, luz que é inextinguível, porque vive na imensidade do existir, dando-lhe as fUlgurações do belo e a grandeza da imortalidade. Dele insurge a Justiça que acalenta o regime, sobrepairando eternamente a todas as coisas, porque ela - Justiça - é a grande esperança, o suave abrigo.
Já dizia São Paulo que boa é a lei onde se executa legitimamente. Na exegese de Rui, boa é a lei quando executada com retidão. A verdade que dimana do ensinamento apostolar põe em destaque aquilO que os homens de bom senso apregoam. Por mais aprimorado que seja o ordenamento jurídico sob o ângulo da normatividade, não se alcançarão os verdadeiros desideratos da Justiça, se os seus servidores - os Juízes -não se compenetrarem da grande responsabilidade que o Estado lhes outorga como integrantes de um Poder.
Ressoará como estupenda e sobrehumana a tarefa dos Juízes que, na esteira do ensinamento apostolar, colocarem a execução legítima da lei como seu supremo ideal, a sua decidida vocação, porque só assim, mercê da moderação, da inteireza e
da eqüidade - poderá escoimá-Ia da dureza e da maldade na frase imortal de Rui: «As reformas só atingirão os seus verdadeiros objetivos nq campo da administração da Justiça! se os Juízes, s.ob a influência única da altíssima dignidade, demonstrarem os seus sadios propósitos de executarem legitimamente a lei, ungidos do espirito da humildade, da bondade e da verdade e forem merecedores da estima e da admiração de seus jurisdicionados.
Por maiores que sejam as atribu- . lações que são constantes na vida ~ dos Juízes, há de neles existir uma vontade férrea de alçar a Justiça ao pináculo da glorificação, traduzida na frase genial de Rui: «Justiça mais alta que a coroa dos reis e Justiça tão pura quanto as coroas dos anjos».
Muito obrigado».
o Sr. Ministro Néri da Silveira (Presidente): Ao encerrar esta SessãQ. especial de posse do Sr. Ministro Adhemar R. da Silva e agradecer a presença do Senhor Ministro da Justiça, Dr. Petrõnio Portella, que representa também S. Exa. o Senhor Presidente da República e do I? Vice-Presidente da Câmara dos Deputados, Dr. Homero Santos, bem assim, dos senhores 'Presidentes dos Tribunais superiores, ou dos seus representantes, por igual membros das respectivas Cortes, e, ainda, das ilustres autoridades civis, militares e eclesiásticas inicialmente mencionadas, das Senhoras e dos Senhores, todos contribuindo para o brilho deste ato, não posso, entretanto, deixar de fazer particular menção à presença da Bahia. J!: que, em realidade, a Bahia hoje aqui está a prestigiar seu filho ilustre que ascende, após brilhante carreira jurídi-
136 TFR - 90
ca, a esta Egrégia Suprema Corte Federal na Capital da República, nas presenças significativas de seu eminente Governador, Dr. Antônio Carlos Magalhães; do culto Desembargador Antônio Carlos Souto, VicePresidente do Colendo Tribunal de Justiça do Estado e seu representante; do Sr. Conselheiro Heitor Dias, do Tribunal de Contas da Bahia; dos ilustres Deputados Estaduais, que nessa solenidade compõem a representação da Assembléia Legislativa baiana, Deputados Murilo Cavalcanti, Naomar Alcãntara, Geraldo Ramos, Gorgônio Neto e Marco Antunes; de Parlamentares Federais baianos e de seus advogados, ora representados pelo Presidente da Seção Baiana da Ordem dos Advogados do Brasil, Dr. Thomaz Bacellar da Silva e pelO Dr. Saul Quadros, Presidente da Caixa de Assistência dos Advogados da Bahia; de seus Juízes F edera'i.s , representados pelo ilustre Dr. José"'Cãndido de Carvalho Filho, e demais eminentes baianos radicados em Brasília, ou que vieram, col1).o destacou o eminente Ministro Adhemar Raymundo, numa romaria festiva.
Em nome do Tribunal, agradeço a presença de todos, convidando para o coquetel que será servido nas dependências contíguas a este salão.
ATA DA SESSÃO SOLENE REALIZADA EM 08 DE ABRIL DE 1980
Aos oito dias do mês de abril do ano de mil novecentos e oitenta, às dezesseis horas, na sala de Sessões do Tribunal Federal de Recursos, presentes os Exmos. Srs. Ministros José Néri da Silveira, Presidente do Tribunal, Armando Rollemberg, Moacir Catunda, Peçanha Martins, Jarbas Nobre, Aldir G. Passarinho,
José Dantas, Lauro Leitão, Carlos Madeira, Gueiros Leite, Washington BOlívar, Torreão Braz, Carlos Mário Velloso, Otto Rocha, Wilson Gonçalves, William Patterson, Adhemar Raymundo e Sebastião Reis; presentes, ainda, o Exmo. Sr. Dr. Hélio Pinheiro da Silva, SubprocuradorGeral da República e o Secretário do Tribunal Pleno, Bel. Jaziel Guimarães de Britto, foi aberta a Sessão Solene, especialmente convocada para dar posse ao Doutor Romildo Bueno de Souza, nomeado para o cargo de Ministro do Tribunal Federal de Recursos, pelo Exmo. Sr. Presidente da República Federativa do Brasil. A mesa integrou-se pelo Sr. Ministro-Presidente e pelos Exmos. Srs. Ministros Xavier de Albuquerque, Vice-Presidente do Supremo Tribunal Federal e representante do Presidente do Excelso Pretório; Deputado Ibrahim Abi Ackel, Ministro da Justiça; Senador Jorge Kalume, representante do Presidente do Senado Federal; Deputado Marcelo Linhares, representante do Presidente da Cãmara dos Deputados e Cel. Aimê Alcebíades Lamaison, Governador do Distrito Federal. Ao início dos trabalhos o Sr. Ministro-Preside~ proferiu as_ seguintes palavras.:
Sr. Ministro José Néri da Silveira (Presidente): Exmo. Sr. Ministro Xavier de Albuquerque, Vice-Presidente do Supremo Tribunal Federal e representante de S. Exa. o Sr. Ministro-Presidente do Alto Tribunal; Exmo. Sr. deputado Ibrahim Abi-Ackel, ilustre Ministro da Justiça; Exmo. Sr. Senador Jorge Kalume, representante de S. Exa. o Sr. Senador Luiz Viana Filho, Presidente do Senado Federal; Exmo. Sr. Deputado Marcelo Linhares, representante de S. Exa. o Sr. Deputado Flávio Marcílio, Presidente da Cãmara dos Deputados; Exmo. Sr. Cel. Aimê Alcebíades Lamaison, eminente Governador do Distrito Federal; Exmos. Srs. Minis-
TFR - 90 137
tros deste Tribunal; Exmo. Sr. Dr. Hélio Pinheiro da Silva, ilustre Subprocurador-Geral da República; Srs. representantes de S. Exas. os Srs. Ministros de Estado; Sr. Procurador-Geral da República; Sr. Diretor-Geral do Departamento de Polícia Federal; Sr. Ministro representante de S. Exa. o Sr. Presidente do Tribunal Superior Eleitoral Sr. Ministro representante de S. Exa. o Sr. Presidente do Superior Tribunal Militar; Sr. Ministro representante do Colendo Tribunal Regional Eleitoral, do Distrito Federal; Srs. Ministros aposentados deste Tribunal; Srs. Subprocuradores-Gerais da República; Srs. Desembargadores do Tribunal de Justiça do Distrito Federal; Sr. representante de S. Exa. Revma. D. José Newton de Almeida Batista, DD. Arcebispo de Brasília; Srs. Parlamentares; Srs. Juízes Federais; Srs. Juízes de Direito do Distrito Federal; Srs. Membros do Ministério Público e do Serviço Jurídico da União e do Distrito Federal; Srs. Advogados; Senhoras e Senhores.
Destina-se esta sessão especial e solene do Tribunal Federal de Recursos a dar posse ao ilustre Juiz de Direito do Distrito Federal e Professor da Universidade de Brasília, Dr. Romildo Bueno de Souza, recentemente nomeado por Sua Excelência o Senhor Presidente da República, com aprovação do Senado Federal, para o cargo de Ministro deste Tribunal, vago em decorrência da aposentadoria, por implemento de idade, do ilustre Ministro Márcio Ribeiro.
Sua Excelência encontra-se presente. Convido os eminentes Ministros Jarbas Nobre, Vice-Presidente da Corte, e Armando Rollemberg, para introduzirem, neste recinto, o ilustre empossando.
A seguir, prestado o compromisso regimental e lido o Termo de Posse pelo Secretário do Tribunal Pleno, o
qual foi assinado pelo Exmo. Sr. Ministro-Presidente, pelo Dr. Romildo Bueno de Souza e pelO Dr. Secretário, o Exmo. Sr. MinistroPresidente declarou empossado o Exmo. Sr. Ministro Romildo Bueno de Souza, convidando-o a tomar assento na Bancada do Tribunal Pleno, ao lado do Exmo. Sr. Ministro William Patterson. A seguir, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente concedeu a palavra ao Exmo. Sr. Ministro Jarbas Nobre, para saudar o Exmo. Sr. Ministro Romildo Bueno de Souza em nome do Tribunal.
o Exmo. Sr. Ministro Jarbas Nobre: Sr. Ministro José Néri da Silveira, Presidente do Tribunal Federal de Recursos, Sr. Ministro Xavier de Albuquerque, Vice-Presidente do Supremo Tribunal Federal, representando a Presidência, Sr. Ministro da Justiça, demais autoridades, minhas Senhoras e meus Senhores: É com grande alegria que cumpro com o encargo de, em nome deste Tribunal, recepcionar o nosso novo colega, o Ministro Romildo Bueno de Souza que ora se empossa.
A designação que recebi do nosso Presidente, Ministro José Néri da Silveira, se deve ao fato de eu ter vindo de São Paulo, terra de nosso homenageado, e lá termos cursado a mesma Escola, a velha e querida Faculdade de Direito do Largo de São Francisco que, em certas oportunidades, foi também Convento. Quartel e Asilo.
Convento, porque suas famos<!s e gloriosas Arcadas como que são prolongamento das não menos famosas e gloriosas Arcadas do Mosteiro de São Francisco, seu vizinho do lado, e de onde se originou.
Nos primeiros tempos, a Escola e o Convento constituiam um só todo, pois que estudantes e frades conviviam juntos, debaixo do mesmo teto.
138 TFR - 90
o tempo não conseguiu destruir esse espírito de união. A FaCUldade e o Mosteiro ainda hoje continuam como nasceram. Ambos franciscanos, embalados pelos mesmos propósitos de brasilidade, de heroísmo e de inabalável fé nos destinos da Pátria.
E porque isto é exato, a Escola que foi Convento em sua origem, em determinado período tornou-se quartel e asilo, como assinalado.
Quartel em 1932, quando a juventude que lá estudava, cansada de receber afrontas por parte da situação política então dominante, com a bênção dos monges, guardou os Códigos e, de arma em punho, foi às ruas para morrer.
A epopéia mereceu estes belos versos que lá estão gravados junto às Arcadas. a eternizar o gesto heróico:
«Quando se sente bater No peito heróico pancada Deixa-se a folha dobrada Enquanto se vai morrer».
Foi Asilo quando, perdida a luta armada, os jovens, inconformados com o Estado Novo, mantinham atitude hostil aos dominantes de então, e eram perseguidos.
Em sua fuga, recorriam à Escola que,continuamente desrespeitada, passou a ser substituída pelo Covento.
Conta-se que certa feita isto viria a acontecer com Roberto Abreu Sodré que, anos depois, seria Governador do Estado.
Refugiado no Mosteiro e sem dele poder sair porque os perseguidores estavam às suas portas, à aguarda de sua saída, outro caminhp não foi encontrado senão vestir o ,colega de frade que, desse modo disfarç~do, conseguiu ultrapassar as barreIras que impediam a sua fuga.
Em torno desse fato conta-se mais: Que outro colega, também visado,
teria se homiziado no Mosteiro e, igualmente, ganhO hábito de frade.
Não tendo tido a mesma oportunidade de fugir, e notando a presença ameaçadora de beleguins no interior do Templo, para melhor aproveitar o seu disfarce de frade, resolveu sentar-se em um confessionário em atitude piedosa, como lhe competia.
Eis que, para embaraço e constrangimento do falso religioso, um penitente dele se acercou e ajoelhando-se a seus pés, imploroulhe perdão pelos seus pecados.
A Faculdade do Ministro Romildo Bueno de Souza abriga muito da história de São Paulo, pois que é parte integrante dela.
Está ela localizada em um Largo, o Largo de São Francisco, que em dado momento perdeu essa denominação para ganhar esta outra: território livre.
Nele, na década de 40, teve destaque um homem chamado Hermenegildo, guarda de trânsito que lá servia, muito ligado aos estudantes e de tal sorte, que até em quadros de formatura figurou.
Esse homem ganhou o título de Interventor e como que perdeu o seu próprio nome.
Num 10 de novembro, num entrevero com a Polícia, no território livre, foi ferido e virou herói.
Isto é um pouco de São Paulo e do meu tempo de estudante.
Romildo Bueno de Souza é de outra geração, pois que saiu da Escola em 1953, onze anos depois de mim.
Isto entretanto, não impede que traga' enraizado consigo., o mesmo espírito que domina a juventude paulista e daqueles que um dia foram moços acadêmicos de São Paulo.
O Tribunal Federal de Recursos recebe em festa o novo Colega na certeza de que aqui, entre nós, prosseguirá na sua trajetória vitoriosa de Magistrado iniciada em 1966, aumentando a bagagem intelectual e
TFR - 90 139
científica acumulada nos onze anos em que exerceu a advocacia e o Ministério Público em São Paulo e em Brasília, sem esquecer o longo período em que professa o Magistério, inclusive o Superior.
Ministro Romildo Bueno de Souza, seja benvindo.
Em seguida, o Exmo. Sr. MinistroPresidente concedeu a palavra ao Exmo. Sr. Dr. Hélio Pinheiro da Silva, Subprocurador-Geral da República, para saudar o Exmo. Sr. Ministro Romildo Bueno de Souza em nome do Ministério Público Federal.
o Exm,o. Sr. Dr. Hélio Pinheiro da Silva, Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira, DD. Presidente desta Casa; Exmo. Sr. Ministro Xavier de Albuquerque, Vice-Presidente do Supremo Tribunal Federal; Exmo. Sr. Deputado Federal Ibrahim AbiAckel, DD. Ministro de Estado da Justiça; Exmo. Sr. Aimé Alcebíades Lamaison, ilustre Governador do Distrito Federal; Autoridades presentes; Magistrados; Membros do Ministério Público Federal; Juízes; Senhores e Senhoras:
Recebí, Sr. Ministro Romildo Bueno de Souza, com imensa satisfação, a sumamente honrosa incumbência de recepcioná-Io em nome do Ministério Público Federal, nesta solenidade, quando V. Exa. passa a integrar este Egrégio Tribunal, como um dos seus eminentes membros, distinguido que vem de ser, por nomeção do Sr. Presidente da República, para tão alta investidura.
Possui V. Exa., para se ter feito merecedor dessa magna distinção, as virtudes que se espera encontrar naqueles aos quais se atribui a quase divina missão de distribuir Justiça, posto que sem esta não pOde uma comunidade subsistir, nem existir o direito onde ela não se faça presente.
E o Juiz, no dizer de Calamandrei, o direito tornado homem, dele, certamente por isso, esperando-se uma vida de dedicação ao bem comum, de fidelidade à Justiça, pOis que.. esta, no dizer do mesmo autor, como todas as divindades, só se manifesta aos que nela crêem.
E essa crença na Justiça é uma constante na vida de V. Exa., desde cedo por inteiro a ela dedicado, inicialmente como advogado no Estado de São Paulo, mais tarde como membro do Ministério Público Federal e, por fim, como juiz de carreira, tendo em 1966 .. ingressado na Justiça do Distrito Federal, onde desde logo se impôs ão respeito e à admiração dos seus pares-;--e de quantos militam na Justiça de Brasília, da qual vem de se afastar para ocupar nesta Colenda Corte a vaga deixada pelo ilustre Ministro MárCio Ribeiro, recémaposentado, por limite de idade.
Em muito coincidem as carreiras de ambos; do que vem de deixar o Tribunal, cercado pela estima, respeito e veneração de quantos tiveram a felicidade de com ele conviver, e daquele que hoje, nesta solenidade vem de ser empossado.
Assim, antes de ingressarem na magistratura de carreira, foram Promotores, integraram igualmente a Justiça do Direito Federal, o Ministro Márcio Ribeiro - como Desembargador; como Desembargador convocado tendo participado do mesmo Tribunal, por longos períodos do mesmo Tribunal, por longos períodos, e continuamente, V. Exa., Sr. Ministro Romildo Bueno de Souza, numa atuação que testemunhei, quandO no exercício do cargo de Procurador-Geral da Justiça do Distrito Federal e Territórios que, por aproximadamente cinco anos, exerci.
Era com enlevo que ouvia, então, os magistrais votos por S. Exa. proferidos, a merecer de todos a maior atenção, mesmo quando vencidos.
140 TFR - 90
dentre estes últimos, por constituir estudo profundo, verdadeira monografia sobre o valor da prova indiciária no processo penal, o que lançado na apelação interposta contra sentença absolutória no processo referente à prática de crime que, pela brutalidade e selvageria na sua prática, traumatizou o país, e ainda hoje resta impune.
Era com prazer, igualmente, que vezes inúmeras, recebia em meu Gabinete de Trabalho a honrosa visita de S. Exa. ouvindo-o em tais oportunidades discorrer sobre problemas vários de diferentes ramos de direito, ciência da qual é apaixonado e mestre insigne.
Hoje, como num feliz reencontro, vejo-o participar da composição deste Egrégio Tribunal, desejando-lhe, em nome do Ministério Público Federal, e em meu, pessoal, longos anos de profícua judicatura.
Dando seqüênCia à solenidade, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente concedeu a palavra ao Dr. Wilson do Egito Coelho, representante do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.
O Exmo. Sr. Dr. Wilson do Egito Coelho: Sr. Presidente do Tribunal Federal de Recursos, Ministro José Néri da Silveira, Sr. Governador do Distrito Federal, Sr. Ministro da Justiça, Srs. Ministros, outras autoridades, I:IÍinhas Senhoras, meus Senhores, Sr. Ministro Romilao Bueno de Souza:
E com imensa honra que vos declaro representar, aqui e agora, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. E é nesta qualidade que me proponho a dizer umas poucas palavras, mas refletidas e emocionadas, de saudação ao Professor Romildo Bueno de Souza, no momento em que ele, num dia de graça para a Justiça, ascende às culminâncias desse Tribunal.
Começarei, assim, por dizer, dizer repetindo o que magistralmente já foi dito há algum tempo, que a justiça coroa a ordem jurídica, a ordem jurídica assegura a responsabilidade, a responsabilidade constitui a base das instituições livres; e sem instituições livres não. há paz, não há honestidade administrativa, não há ordem sadia. De sóite que um regime político, onde a arrogância do Poder erga a cerviz até à altura dos Tribunais, para lhe 'açoitar o rosto, com a negação de sua autoridade, é uma construção que, insustentável, vacila até aos alicerces. Mas, ainda assim, o direito é tão superior à força arbitrária, que a Justiça, mesmo desacatada, ultrajada, ferida, aparentemente oscilante no seu pedestal, continua, majestática, a projetar sua sombra sobre a ambiência e dominá-la como a cruz de uma divindade sepultada anunciando aos deicidas o castigo de sua ressurreição.
- Este é um pensamento do imenso Rui, que aqui não vai transcrito literalmente, mas que constitui o cerne de várias passagens de seu profético apostolado.
- Afortunadamente vivemos hoje um clima liberalizante, em que a presença dos Tribunais readquire densa prOjeção, redobrando-se, contudo, as responsabilidades dos Juízes.
- Nada pode haver neste mundo mais perigoso, mais humilhante, mais ignominioso - dizia ainda Rui - do que a condição de se achar um homem submetido ao arbítrio sem freio de outro homem.
- Daí, a' magistral sentença de Montesquieu, ao anunciar o princípiO dp. separação de Poderes, no Estado: E uma experiência eterna a de que todo homem que detém o poder é levado a abusar dele; caminha até que encontre limites. Para que se não abuse do pOder é preciSO que, pela dispOSição das coisas, o poder detenha o poder.
TFR - 90 141
- Na concepção política do Estado democrático, compete aos Juízes a ingente missão de deter o poder através dos ditames do Direito, porque afastados das paixões mais incisivas; distantes do Poder material mais susceptível de desvirtuar-se, vós, Juízes, estais mais próximos da Razão, já proclamava um notávellegislador contemporãneo em magnífico discurso de saudação ao Poder Judiciário.
- Vós tendes, pois, uma sagrada função, a que nós, os advogados, nos associamos, já que na missão do advogado também se desenvolve uma espécie de magistratura. O advogado exerce, juridicamente articulado ao bem comum, ministério privado na prestação de serviço público, como bem observou o Bastonário Prado Kelly. O advogado, segundo outro notável Bastonário, Nehemias Gueiros, cujo nome evoco com emoção e saudade, deixou de ser a excrescência desdenhada por alguns, ou a simples facção litigante encarada na sua parcialidade obrigatória como elemento perturbador da veneranda serenidade do Juízo. É ele, agora, com o advento do seu novo Estatuto, o próprio Juízo, numa das suas justaposições essenciais e impostergáveis, compondo e contrapondo, não apenas o contraditório processual, mas a própria jurisdição do Estado, que, sem o advogado - e só com o magistrado .- não seria a Justiça, mas o arbítrio despótico e prepotente, ou o dogma distribuído como mercê paternalista aos válidos ou favoritos das simpatias e inclinações pessoais do poder unipessoal judicante.
- Por isto é que vos disse que na missão do Advogado também se desenvolve uma espécie de magistratura, diversa nas funções, mas idêntica no objetivo: a Justiça. Com o Advogado, a Justiça militante; com o Juiz, a Justiça imperante.
- Na vossa sagrada missão de deter o pOder ditanto o direito, de harmonizar os homens distribuindo justiça, vós, Juízes, vos situais bem próximos de Deus, pois, como sentenciou o jurisconsulto Celso, vós sois os artífices do bem e da eqüidade.
- Tudo isto vem a propósito neste momento em que se soleniza a posse, nesse Tribunal, cUjo notório prestígio os Advogados proclamamos com orgulho, desse notável magistrado e professor Romildo Bueno de Souza. Homem de fulgurante talento, de cultura extensa, bem ordenada e sistematizada pelo aprimoramento que o diuturno exercício da Cátedra propicia, sobretudo às inteligências privilegiadas.
- Nós o saudamos como o Juiz exemplar que ascende, agora, a este Tribunal Superior pelo capricho de um ato humano fundado nas melhores fontes de inspiração.
- Nós, os Advogados, estamos felizes.
- Essa Corte está enriquecida.
- A Justiça brasileira engrandeci-da, pois que acaba de tomar assento num de seus Tribunais Superiores um homem que é bem a síntese daquele Juiz de cuja consciência jamais se ausentará o dever de julgar bem, com desassombro, coragem, altivez, independência e sabedoria.
- Senhor Ministro Romildo Bueno de Souza, nós, os Advogados, numa prece, só rogamos a Deus que continue a iluminá-lo.
Dando seqüência à solenidade, o Exmo. Sr. MinIstro-Presidente concedeu a palavra ao Dr. Humberto Gomes de Barros, representante da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção Distrito Federal.
O Exmo. Sr. Dr. Humberto Gomes de Barros: Sr. Presidente, Egrégio
142 TFR - 90
Tribunal; meus Senhores, minhas Senhoras, eminente Ministro Romildo Bueno de Souza:
Aqui estamos, os advogados, testemunhando o início de nova fase em sua exemplar vida de Magistrado.
Confessamo-nos possuídos de alegre satisfação.
Em verdade, tratamento elegante e jovial atenção foram constantes no relacionamento que mantivemos.
De outro lado, a Ordem dos Advogados contou sempre com sua preciosa e desinteressada atenção. Não foram poucas as palestras e conferências em que os advogados se aproveitaram das admiráveis qualidades de professor, inatas em V. Exa.
V. Exa. é, pois, um amigo do advogado!
Seus amigos alegram-se com este justo reconhecimento dos méritos que se habituaram a reverenciar.
Fosse verdadeira a máxima que define o advogado como juiz do magistrado, estaríamos aqui proferindo sentença declaratória de grandes méritos. E o conhecimento de sua atividade no Juízo de Primeiro Grau, nos habilitaria a emitir atestado no sentido de que este Colegiado Superior acaba de adquirir um de seus grandes Ministros.
Nosso júbilo tem sólido fundamento.
humanidade, sem esquecer que a consecução destes não pode ser obtida sem a boa distribuição da riqueza material.
Como precisamos de humanistas! Estamos em plena convalescença. A Nação Brasileira tenta escapar
de mais um ataque desta endemia social que tanto aflige o continente latino-americano - a ditadura.
Esta última crise gerou-se a partir de quando um grupo de convictos democratas entendeu que o sistema legal seria impotente para assegurar a legalidade.
Estes democratas - homens calejados, heróis na luta que abateu o nazismo e a ditadura do Estado Novo - no intuito de salvar a legalidade, substituíram-na por nova ordem, cuja duração seria curta.
Esqueceram-se de que o ordenamento legal é um sitema em equilíbrio. Rompido este, toda a estrutura perde estabilidade. O sistema fraturado passa a exigir mais e mais remendos e calços.
A reação em cadeia torna-se incontrolável.
Nela envolvidos, aqueles homens que pensavam salvar a democracia viram-se na contingência de implantar doutrina em que a segurança nacional foi erigida em valor máximo.
A Nação ingressou em período de Existe, porém,
potencializa o emprestando-lhe tescas.
circunstância que guerra autofágica. contentamento,
dimensões gigan-
V. Exa. não é apenas um grande técnico, um jurista dos maiores, um processualista emérito. , 'V. Exa. é um humanista.
Dono de vasto e sedimentado acervo cultural, V. Exa. se habilita a proceder, sempre, com os olhos voltados para os valores espirituais da
Instaurou-se o domínio do maniqueísmo, da tortura, da delação, da arbitrariedade. A censura isolou e aprisionou a inteligência.
Mergulhamos em escuridão profunda, tão profunda quanto aquela que nos envolveu na década dos trinta.
Aqueles homens do bem, aqueles heróis que pensavam em resgatar a democracia, viram-se reduzidos à
TFR - 90 143
condição de áulicos. Foi-lhes reservado o encargo de fazer parecerem legítimas as normas da violência.
Divorciados do povo, afundados no paradoxo que geraram, os campeões da democracia viram-se constrangidos a ocupar deprimentes cadeiras de legisladores biônicos.
Felizmente, a voz da razão se fez mais alta que o alucinante canto do aulicismo. Advogados, jornalistas, sacerdotes e outros grupos da sociedade, já quase em desespero, foram, afinal, escutados.
Fez-se a luz. Rompeu-se a treva. Os detentores do poder, à semelhança do rei, personagem da fábula. viram-se em sua nudez e descobriram, como o burguês de Moliêre, que faziam ditadura sem o saber.
Retornamos à trilha que leva ao Estado de Direito.
O caminho será árduo. A meta não será atingida com sim
ples ajustes de natureza técnica. Ao lado da recomposição do orde
namento jurídico, faz-se imprescindível o reajuste na distribuição das riquezas.
Por teimarem em manter em odiosa concentração as riquezas nacionais é que os democratas latinoamericanos parecem condenados à pena de Sísifo: lutamos perdidamente pela edificação da legalidade; no entanto, quando a julgamos consolidada, ei-la rolando pelas encostas do arbítrio.
Só o humanismo nos redimirá de tal condenação.
Precisamos firmar o convencimento de que o civismo, como dedicação paciente e constante à sociedade política, é alternativa exeqüível para os rompantes do heroísmo.
Mais eficiente que o gesto heróico de cortar o nó górdio é o trabalho inteligente de o desfazer: enquanto o
golpe brusco da espada desfaz o nó, rebentando a corda, o desatar sereno do laço elimina o problema e salva o novelo.
O respeito à lei é imprescindível. Se a regra é iníqua, ou foi superada
pelos fatos, deve ser alterada através de processo legislativo. Enquanto a reforma não ocorre, a jurisprudência, valendo-se dos recursos da hermenêutica, há que temperar o texto, ajustando-o, quanto possível, aos princípios do Direito.
O respeito à lei é fundamental. Nele se envolve o próprio conceito
do mais precioso de todos os bens: a liberdade.
A moderna ciência política chegou à conclusão de que somente é livre o homem que obedece às normas para cuja elaboração contribuiu e cuja revogação está apto a provocar.
A liberdade, como aptidão para reformar a lei, pressupõe a existência de eleições livres, imunes a artifícios casuísticos, tendentes a deformar o sentido do voto popular.
Na jornada em busca do Estado de Direito, ao Judiciário reserva-se função relevante.
Cabe-lhe corrigir os desvios, demarcando os limites da legalidade.
O doloroso incidente «Watergate» nos presta eloqüente testemunho de quanto pode um juiz sereno.
Ultimamente, na Justiça Federal, cujo vértice está nesta Corte, colhemos belo exemplO do poder moderador que emana da função judiciária: o velho prédio da U.N.E. foi salvo da destruição por um jovem magistrado, cuja energia abortou excessos de funcionários saudosos das facilidades do arbítrio.
V. Exa., dono de cultura invejável e temperamento moldado na altivez, será, nesta Corte, peça valiosíssima na consolidação definitiva de nossa Democracia.
144 TFR - 90
Firmada na convicção de que assim ocorrerá, a Ordem dos Advogados do Brasil se parabeniza pela investidura de V. Exa., a quem deseja longa e profícua magistratura.»
Em prosseguimento, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente concedeu a palavra ao Dr. Almiro Afonso, representante da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de São Paulo.
O Exmo. Sr. Dr. Almiro Afonso: Exmo. Sr. Presidente do Tribunal Federal de Recursos, Ministro José Néri da Silveira; Exmo. Sr. Ministro da Justiça, demais autoridades que integram a Mesa, Senhores Ministros, eminente amigo e querido colega Ministro Romildo Bueno de Souza:
Honrou-me a Presidência do Conselho Seccional da Ordem dos Advogados de São Paulo, ao designar-me para trazer a V. Exa. a saudação, que é de todos os advogados paulistas, neste instante que, como um orador que me precedeu acentuou, é um dia de graça para a Magistratura. Devo dizer, entretanto, que o título que com maior orgulho posso exibir nesta tarde é, precisamente, o de haver sido colega de- turma de V. Exa. Trago, também, em nome desses contemporâneos seus, nesta tarde, o abraço que é fraterno e, ao mesmo tempo, a reiteração de uma confiança que já podíamos ter daqueles anos, a velha escola do Largo de São Francisco, quando seu talento, a sua capacidade para o estudo, no sentido mais prOfundo do termo, já nos permitiam antever a grandeza de sua trajetória no rumo que aprouvesse tomar ao longo da vida. Digo que, se é um dia de graça para a Magistratura, esta tarde, para nós, de sua geração, é um dia marcante, é um dia histórico para cada um de nós, é um dia alto, de sol a pino da nossa geração. E, ao dizer isto a V. Exa., sei que não lhe faço pequena homenagem, porque, por coincidên-
cia, somos ambos de uma turma, rica em valores, de nomes consagrados já hoje na Magistratura, no Ministério Público, no ensino universitário, nomes hoje festejados nas letras jurídicas do País, nomes consagrados por suas obras, e é precisamente de uma geração assim tão rica de valores, que me permito poder dizer, com segurança, que V. Exa. é um expoente, que é honra para nós, neste instante, poder tê-lo aqui como um representante de uma geração antiga, que nasceu num instante em que a redemocratização do País nos permitia ser uma geração privilegiada.
Pois é certo, como acentuava o eminente Ministro que o saudou, Jarbas Nobre, a velha Casa do Largo de São Francisco é, em síntese, o convento, o quartel e o asilo, as três coisas unificadas numa visão histórica, a da defesa intransigente da liberdade, cUjo momento alto e único se dá num regime de plenitude democrática. Formado naquela Casa, coube estranhamente a V. Exa. um destino que vale acentuar, pois V. Exa. se encaminha para a magistra~ tura, justo no momento em que, pelas circunstâncias históricas que importa neste instante pouco recordar, as prerrogativas da magistratura eram suspensas, cerceados os Juízes em suas funções mais nobres, e eu me imagino o que há de ter sido para cada um dos magistrados, ao longo desses anos todos, cumprir a tarefa enorme de julgar quandO eles próprios tinham as mãos manietadas.
Eu indago como V. Exa., mesmo ao longo desses anos todos, pôde cumprir com serenidade, com seriedade, com fidelidade as lições que aprendeu naquela Casa - que é convento, que é quartel, que é asilo e é síntese da liberdade - as tarefas mais altas que eu posso imaginar na sociedade, que é de julgar os homens nos seus conflitos sociais.
TFR
Coincidência que agora V. Exa. chega a esta Casa no outro momento importante da evolução política e social de nossa Terra. Reabre-se a pouco e pouco o espaço político, e outra vez somos todos convocados, onde quer que estej amos, a recriar as instituições democráticas, onde possam os homens conviver com dignidade, onde possam os homens respeitarem-se mutuamente no respeito recíproco dos direitos uns dos outros. Se há tarefa de cada um dos cidadãos a ser cumprida, eu imagino que nenhuma há de ser mais alta do que, uma vez mais, a do magistrado.
Não há democracia possível onde o Direito se limite à letra dos Códigos. O Direito, a rigor, vive, emerge na plenitude de sua força, exatamente no instante do conflito social, quando os interesses individuais ou de grupos pedem ao magistrado, pedem à Justiça que dirimam estes mesmos conflitos. Eu recordo, de reminiscências de leituras antigas, algo que neste instante me permitiria fazer a imagem adequada: diz-se que a luz, para ter essa claridade que a caracteriza, necessita que entre ela e sua marcha se interponha um corpo opaco. Pela lei física dessa leitura que neste instante eu evoco, a luz paradoxalmente seria uma perene escuridão, se entre ela e sua marcha não se opusesse um corpo opaco. Pois eu diria que o Direito assim também é. A norma consagrada no Código, na letra da lei, jamais brilharia, jamais teria força presente do Direito, se em determinado instante não houvesse o conflito social, seja ao nível dos indivíduos, seja ao nível dos grupos sociais. E é justo neste instante em que o Direito emerge e ele se faz presente pela palavra, pela sentença, pela voz do magistrado, pois é justo, neste instante, que se reabre o processo político entre nós, e uma vez mais as instituições pouco a pouco se vão remontando, ainda que de maneira «capenga», que V. Exa.,
90 145
por destino, chega a esta Casa tão grave na sua sabedoria, tão importante nas suas tarefas, tão nobre na sua altitude.
Eu sei que o moço formado naquela Casa, que foi convento, quartel e asilo, como síntese de liberdade, uma vez mais saberá ser o Juiz que fora ao longo dos anos do obscurantismo e de arbítrio.
Creia, meu eminente Colega de bancos de Academia, que nesta tarde, ao trazer de São Paulo, em nome do Conselho da Ordem dos Advogados, a palavra de apreço e a saudação calorosa, sei que o faço em palavras singelas e poucas diante da enorme significação deste instante, mas sei também que através delas lhe consigo transmitir o calor de um abraço fraterno de seus velhos companheiros de Casa e o testemunho público do nosso respeito e da confiança perene em V. Exa.»
Em seguimento, o Exmo. Sr. MInistro-Presidente concedeu a palavra ao Exmo. Sr. Ministro Romildo Bueno de Souza.
O Exmo. Sr. Ministro Romildo Bueno de Souzq.: Exmo. Senhor Ministro José Néri da Silveira, DD. Presidente do Egrégio Tribunal Federal de Recursos, Senhores Ministros, Senhores Congressistas, Senhores Magistrados, Senhores Procuradores, Senhores Advogados, demais autoridades presentes ou representadas, Senhores e Senhoras:
Escreveu Manuel Bernardes, no pórtico de luz e calor, que Deus, autor de todo o bem, «até aos autores maus dá doutrina boa». E invocando palavras de São Gregório Magno, o padre esclarece o intuito de Deus: propter bonos auditores, que, muito a meu modo traduzo - por compaixão dos ouvintes.
Também confio no generoso auxílio do alto, que a ocasião por tantas razões reclama, poder expri-
146 TFR - 90
mir, na singeleza da palavra, a riqueza dos sentimentos que agora quase me confundem.
Esta austera solenidade simboliza o momento culminante de minha vid~ pública, que se estende j á por vmte anos de atividades ininterruptas. Ao assumir o cargo de Procurador do Estado de São Paulo ou ao tomar posse, em 30 de outJbro de 1964, como Defensor Público, no Ministério Público do Distrito Federal jamais poderia supor viesse um dià a integrar o Egrégio Tribunal Federal de Recursos como um de seus Ministros.
Em momento de tão rara emoção, acodem-me à memória, irreprimivelmente, as mais gratas lembranças da meninice e da juventude, do convívio do lar paterno: de meus pais, hoje no regaço divino, e de meus irmãos, quase todos aqui presentes. E: ali, decididamente, que encontro as raízes de minha atitude diante da vida e do mundo.
Descendente de gerações de fazendeiros desbravadores do sertão, revejo o cenário encantador de uma epopéia verdadeira que se desdobra das encostas paulistas da Serra da Mantiqueira pelo vale do Mogi Guaçu, itinerário de bandeirantes, até alcançar a terra roxa de Jaboticabal e Ribeirão Preto, de fertilidade' inesgotável. Quando ainda não havia estradas, nem mesmo ferrovias, era nesses sertões remotos,· tomados de assalto pelos cafezais, que se feria o contraste de que fala Sérgio Buarque de Holanda, já então entre a aventura dos pioneiros e a rotina preguiçosa das cortes do Impérito e da Primeira República, Entre os primeiros, estavam quase todos os meus antepassados.
Inteiramente alheio à tradição burocrática e urbana, senão pelo ofício público de minha mãe, desempenhado, porém, com o maior desvelo e
como verdadeiro sacerdócio, o de professora primária; e guiado, desde a mais terna idade, por ela mesma, pelOS luminosos caminhos da fé cristã, nos quais persevero, não foi difícil aceitar o desafio da vida como vocação, no seu sentido bíblico e etimológico. Aliando tenacidade retidão e severidade de meu pai à' imensa ternura e infinita bondade de minha mãe, encontrei inspiração e alento para empreendimentos tão ásperos, quanto estranhos à tradição familiar. Se não foi difíCil optar por e~te: rumo, que dizer, porém, dos epiSOdIOS de cada dia, na concepção de cada ato da vida pública como verdadeiro universo de significação?
Mas é verdade que não me achei desamparado. Em cada uma das atividades que tenho tido o privilégio de desempenhar - advogado, procurador, defensor público, professor e juiz - pude sentir bem de perto o palpitar de amizades sinceras, às vezes insuspeitadas até o instante crucial: amizades que cultivo na têmpera da lealdade recíproca, iluminadas no espelho límpido da verdade.
Ao assumir as funções do cargo honroso de Ministro do Tribunal Federal de Recursos, avalio bem as dimensões e o peso de minhas novas responsabilidades. Elas refletem o avultado número de demandas que diariamente ingressam nesta casa de justiça; a variedade imensa de questões e temas que essas demandas suscitam; as perplexidades que quase paralisam a formação do juízo decorrentes do fluxo incessante da legislação que, por sua vez, nem sempre traduz apreCiação avisada dos fatos que tipifica: legislação que freqüentemente denuncia a falta de perspectiva coerente do orden:1mento jurídico, cuja expansão advém da pressão irresistível de necessidades prementes,
De fato, o âmbito de atuação da Justiça da União abrange, predomi-
TFR - 90 147
nantemente, os conflitos de interesse decorrentes da sua atividade administrativa. Esta, desde o início do século e, principalmente após a segunda guerra mundial, entrou em processo de multiplicação e diversificação acelerada, intensa, aparentemente infinita.
O expansionismo da atividade administrativa do estado contemporâneo correspondeu, a princípio, à exigência de desenvolvimento econômico dos estados periféricos relativamente ao núcleo central da atividade econômica em escala mundial. Justa e irrecusável enquanto dirigida a garantir o acesso de povos marginalizados à higiene, saúde, alimentação, habitação, instrução e tantos outros bens da cultura, esta exigência de desenvolvimento tem degenerado em ideologia desenvolvimentista, a
. grande obsessão deste fim de século. Neste contexto, a administração
pública federal marca sua presença em todos os aspectos da vida humana, desde a assistência médica prénatal, até o auxílio-funeral. Não pode deixar de fazê-lo. E na medida em que o faz, dá ensejo à proliferação de litígios.
Esta Corte de Justiça tem aperfeiçoado e acumulado experiência extraordinária no trato desses variados conflitos.
Chego, pois, a esta casa augusta, confortado pela dedicação constante partilhada no recesso de meu lar, animado por amigos provados; advertido, é certo, quanto à surpreendente maldade do homem, mas retemperado pela fé que a todos permite ver-nos a nós mesmos, como destinatários supremos da graça e do amor de Deus, de que todos igualmente dependemos.
De todo este concurso careço ao assumir o lugar que neste recinto competia a um dos mais insignes de seus juízes, o Senhor Ministro Márcio Ribeiro, em quem tantas virtudes
se atropelam para plasmar a síntese de uma personalidade cativante por sua simplicidade autêntica, honradez, exímia capacidade profissional, constante dedicação aos deveres do cargo que tanto honrou e serena independência de magistrado. Deve-se dizer de Márcio Ribeiro que S. Exa. c.oncretiza a mais perfeita concepção do ofício de juiz, a do magistrado romano: homem probo, perito na arte de julgar.
Proponho-me, na modéstia de meus dons, no exercício da judicatura que hoje principio, honrar o legado que recebo desse nobre juiz, e que pertence a esta Corte.
Estarei atento ao relicário de saber e às respeitáveis tradições deste Tribunal que não precisou de séculos para granjear o respeito público porque, ungido nas águas lustrais da assembléia constituinte de 1946, concebido em perfil de prudência e equilíbrio, logo confraternizou com as mais autênticas instituições republicanas, com as quais matinha e mantém a mais completa coerência.
Diz Emilio Betti que os juízes vieram antes dos legisladores. Segundo sua abalizada opinião, a revelação do direito objetivo se fez, nos primórdios, especialmente para cada caso.
Pode-se, portanto, avaliar o grau de incerteza do direito, acentuandose à medida em que as comunidades humanas se expandiam e as relações jurídicas se multiplicavam, tornando-se cada vez mais complexas.
Dir-se-ia que tão grande mal - a incerteza do direito - foi cabalmente conjurado pelo advento da lei escrita que resplandece nas codificações contemporâneas, calcadas na técnica mais requintada, na sistematização da ciência e no aprimoramento das idéias políticas.
148 TFR - 90
Nossa experiência de juízes desautoriza esta supoSição, desmentida, aliás, pela espantosa multiplicação dos litígios, fazendo submergir juízes e tribunais sob catadupas de processos, reci.uzindo-os a completa insolvencia. A incerteza j á não é apenas quanto ao direito, mas também quanto à possibilidade de vê-lo, algum dia, reconhecido. Esta experiência dolorosa da justiça brasileira, resistente às tentativas de reestruturação do aparelho judiciário e às reformas das leis de processo, é também de outros povos de contexto social e cultural o mais diverso. Os escritos de Kafka denunciam a tragédia contemporânea da justiça envolta em mistério impenetrável, ela mesma absolutamente insondável, fora e acima de qualquer forma de controle social, fazendo da sociedade sua vítima indefesa.
Quando os pretores, em Roma, eram investidos de suas funções, divulgavam editos, definindo critérios que haveriam de presidir o julgamento das causas. Constituíam estes editos meio utilíssimo de comunicaçâo do poder público com os jurisdicionados, e destes com aquele. Esclareciam previamente a atuação da justiça pretoriana empenhada em corrigir e suprir os rigores e as deficiências da lei. Não é preciso insistir na importância da obra do pretor, em que esta foi a época mais puj ante da jurisprudência romana.
Naquele momento verdadeiramente épico, era visível a face dos juízes; suas feições eram patentes; nada estava oculto. Não era chegado ainda o tempo da exacerbação burocrática do baixo império. Não era ainda Bizâncio. Se, por um lado, não predominava a mania da uniformização grosseira, por outro, o litigante não podia ignorar o claro e inequívoco posicionamento de seus juízes.
Quando da reforma do processo civil da Itália, Carnelutti advertiu que de pouco aãiantaria um bom código, se faltassem mesas, cadeiras e máquinas para o funcionamento da Justiça.
Seja-me permitido acrescentar que de pouco adianta um bom código; pouco ainda será todo o séquito de equipamentos mecânicos e eletrônicos. Benvindos sejam todos estes recursos. Temos deles a maior urgência. Tudo devemos fazer para aproveitá-los ao limite de suas possibilidades e, até mesmo, para aperfeiçoá-los.
Mas instrumentos e equipamentos, recursos técnicos e materiais pouco ou nada significam, se os juízes não cultivarem a noção mais clara de sua missão constitucional.
Discernir toda a eficácia dos imperativos constitucionais; extrair deles toda a significação e atualidade; abrir espaço no foro para a efetiva atuação das diretrizes da lei maior, eis o desafio que nenhuma reforma da justiça pode dispensar, nem mesmo negligenciar.
Somente à luz dos grandes princípios que estruturam a república e a federação brasileira; somente atentos à origem e fundamento do poder político em suas bases populares, donde provém sua legitimidade, consoante os cânones constitucionais, é que poderemos superar os equívocos que já comprometem a linguagem de nosso tempo, hesitante entre conceitos tão ambíguos como os de classe política e sociedade civil, como se existisse uma sociedade militar, como se a representação do povo nas casas legislativas bastasse para erigir uma classe social de representantes do povo. Notadamente no tocante à federação, é muito propício este momento para que insista em sua extraordinária atualidade na presente conjuntura nacional.
TFR - 90 149
Não comungo com aqueles que qualificam a federação, entre nós, como importação artificial de instituição estranha.
Vejo os lineamentos da federação brasileira na descentralização autárquica da colônia e no surgimento das províncias por imposição dos regionalismos que se equilibram, complementam e enriquecem.
A realidade de nosso território, de nossa ger.te, de nossa economia é diversa e nitidamente complementadora. A idéia federativa é, portanto, realista. A centralização exacerbada é que destoa de nossa vocação geográfica, econômica e histórica e não admira que, desde a Constituição de 91, federação e república se apresentam como idéias e instituiçôes irmãs, verdadeiros pilares de nossa vocação nacional.
O desdobramento destas idéias há de revelar riquezas verdadeiramente surpreendentes em favor do harmonioso desenvolvimento econômico e social do país.
Escusai-me o abuso de vossa paciência.
Agradeço, sumamente sensibilizado, a grande honra que me concedeu o Exmo. Senhor Presidente da República, João Batista Figueiredo, ao me distinguir, dentre tantos outros nomes dos mais ilustres, nomeandome para cargo de tão grande relevo, assim me qualificando para o convívio fraterno com juízes tão ilustres e estimados; e ao Colendo Senado Federal, que tão prontamente referendou a escolha presidencial e do eminente Senhor Ministro de Estado da Justiça, Deputado Ibraim AbiAckel.
Muito me comoveram as palavras tão afetuosas, repassadas da mais pura generosidade que tão bem o caracteriza, com que me saudou o eminente Senhor Ministro Jarbas Nobre,
ilustre Vice-Presidente deste Tribunal, uma de suas mais autênticas expressões, que tanto tem a contribuir nesta hora de profunda reestruturação do Tribunal.
Peço-vos encarecidamente que relaveis os excessos em que incorreram o nobre Subprocurador-Geral, Dr. Hélio Pinheiro da Silva, os ilustres Advogados, Drs. Wilson do Egito Coelho, Humberto Gomes de Barros e Almino Afonso. Estas manifestações tangeram as cordas mais escondidas de meu afeto. Suas ressonâncias acompanharão meus passos no itinerário que este dia inaugura. Tudo farei para não desmenti-las e para manter com o Ministério Público e as classe dos advogados o convívio mais respeitoso.
As vestes talares com que compareço a este ritual serão a perene lembrança de longo e renovado convívio com meus diletos colegas da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília, aos quais tanto devo de minha formação jurídica e profiSSional. Homenagem tão comovente não há como retribuir, senão unicamente pelo compromisso que assumo de fazer desta beca legado impoluto para testemunho de minha consagração, que ora renovo, com humildade e fé inquebrantável, ao serviço da Justiça.
Agradeço a todos os colegas, amigos e familiares de Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro e outros lugares, que aqui acorreram para minha maior alegria.
Finalizando, o Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira, Presidente do Tribunal, proferiU as seguintes palavras:
O Tribunal agradece a presença das altas autoridades que compõem a Mesa e foram referidas inicialmente, bem assim agradece a presença do Exmo. Sr. Ministro Hélio Beltrão, dos prOfessores da Uni ver si-
150 TFR - 90
dade de Brasília, tendo à frente o seu ilustre Reitor, professor José Carlos Azevedo, e ainda a presença do ilustre Desembargador Waldir Meuren, representante do Sr. Presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, dos Srs. Conselheiros do Tribunal de Contas do Distrito Federal.
Antes de declarar encerrada esta sessão, convido as autoridades e pessoas, que tanto honraram o Tribunal com suas presenças, para o coquetel que será servido no «hall» contíguo a este salão.
Está encerrada a sessão. Compareceram à solenidade, além
das que compuseram a Mesa, as seguintes autoridades: Ministro Hélio Marcos Penna Beltrão, Titular da Pasta Extraordinária para a Desburocratização; Dr. Firmino Ferreira Paz, Procurador-Geral da República; Ministro Geraldo Starling Soares, Presidente do Tribunal Superior do Trabalho; Ministro Luiz Octávio Galloti, representante do Presidente do Tribunal de Contas da União; Ministro Mário Pacini, do Tribunal de Contas da União; Ministro Georgenor Acylino de Lima Torres, representante do Superior Tribunal Militar; Ministro Djalma Tavares da Cunha Mello; Ministro Esdras Gueiros; Ministro Oscar Corrêa Pina; Drs. Antônio de Pádua Ribeiro e Paulo A. F. SOllberger, SubprocuradoresGerais da República; Desembargador Jorge Duarte de Azevedo, Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal; Desembargadores Mário Dante Guerrera, Lúcio Arantes, Eduardo Andrade Ribeiro de Oliveira, Milton Sebastião Barbosa e Raimundo Macedo, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal; Dr. Emmanuel Francisco M. Lyrio, Procurador-Geral do Distrito Federal; Coronel Moacyr Coelho, DiretorGeral do Departamento de Polícia Federal; Dr. Lincoln Magalhães da Rocha, Auditor do Tribunal de Con-
tas da Uniã(); Dr. Milton Menezes da Costa Filho, Procurador-Geral da Justiça Militar; Dr. Maurício Corrêa, Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção Distrito Federal; General de Divisão Octávio Pereira da Costa, representante do Ministro do Exército; Deputados Daso de Oliveira Coimbra, Edson Vidigal e Athiê Jorge Coury; Conselheiro Raul Soares da Silveira, representante do Presidente do Tribunal de Contas do Distrito Federal; Conselheiros Amaury da Silva Ramos, Mohamad Khodr, Flávio RogériO H. Reinehr e José Rocha de Carvalho; Dr. Luiz Gonzaga Theodoro, Presidente da Junta de Recursos Fiscais do Distrito Federal; Dr. Walter Pinheiro Filho, representante do Exmo. Sr. Ministro da Saúde; Dr. Jorge Leovegildo Lopes, representante do Exmo. Sr. Ministro da Marinha; Dr. Jair Teixeira Campos, representante do Exmo. Sr. Ministro-Chefe do Estado Maior das Forças Armadas; Dr. Cid Heráclito de Queiroz, representante do Exmo. Sr. Ministro da Fazenda; Dr. Francisco das Chagas Mariano, representante do Exmo. Sr. Ministro das Minas e Energia; Dr. João Guilherme Aragão, representante do Exmo. Sr. Ministro da Educação e Cultura; Dr. Tarcísio Carlos de Almeida Cunha, representante do Exmo. Sr. Ministro da Indústria e Comércio; Dr. Geraldo Antônio Nogueira Miné, representante do Exmo. Sr. Ministro do Trabalho; Dr. Paulo César Cataldo, representante do Exmo. Sr. Ministro-Chefe do Gabinete Civil da Presidência da República; Dr. Paulo Roberto Saraiva da Costa Leite, representante do Exmo. Sr. Ministro-Chefe de Serviço Nacional de Informações; Dr. José Mário Bimbato, representante do Exmo. Sr. Ministro-Chefe da Secretaria do Planejamento; Dr. Luiz Rodrigues, representante do Sr. Diretor-Geral do Departamento Administrativo do Serviço Público; Dr. Hélio Estrella, representante do Ex-
TFR - 90 151
mo. Sr. Ministro das ComunÍcaçôes; Pe. VirgÍlio Fistarol, representante de D. José Newton de Almeida Baptista - Arcebispo de Brasília; Capitão-de-Mar e Guerra José Carlos Azevedo, Reitor da Universidade de Brasilia; Vice-Reitor da Universidade de Brasília - Professor Marco Antonio Rodrigues Dias; Professor Alberto Perez, Reitor do Centro de Ensino Unificado de Brasilia; Dr. Olavo Ferro, Diretor do Departamento de Assuntos Judiciários do Ministério da Justiça; Dra. Nadir Bispo Faria, Procuradora da Justiça Mílitar; Dr. Darcy Cunha Vasconcellos, Chefe de Divisão Jurídica da Caixa Econômica Federal; Dr. Lindberger Aziz Cury, Presidente de Assuntos Comerciais do Distrito Federal; General Dirceu Araújo Nogueira; Coronel Silvio Caracas de Moura e esposa, Drs. Benjamin Goldenberg, Edson B. Garcia, Cleto C. Meireles, João Bispo dos Santos Júnior, Gilberto ~lves Néry, Newton Egydio Rossi, WeIlington Carlos Batista, Lino Martins Pinto, Dicanor Moraes, Francisco Aguiar Carneiro, Claudio Lemos Fonteles, Celso Franco de Sá Santoro; funcionários dos Tribunais e o Rev. Samuel Martins Barbosa.
Tribunal Federal de Recursos, 8 de abril de 1980 - Ministro José Néri da Sllveira, Presidente - Bel. José Alves Paulino, Secretário do Tribunal Pleno.
POSSE CONJUNTA
ATA DA SESSÃO SOLENE REALIZADA EM 23 DE
JUNHO DE 1980
Aos vinte e três dias do mês de junho do ano de mil novecentos e oitenta, às quinze horas, na Sala de Sessões do Tribunal Federal de Recursos, presentes os Exmos. Srs. Ministros José Néri da Silveira, Presi-
dente do Tribunal, Armando Rollemberg, Moacir Catunda, Peçanha Martins, Jarbas Nobre, Aldir Guimarães Passarinho, José Dantas, Lauro Leitão, Carlos Madeira, Gueiros Leite, Washington Bolívar, Torreão Braz, Carlos Mário Velloso, Otto Rocha, Wilson Gonçalves, William Patterson, Adhemar Raymundo e Romildo Bueno de Souza, presentes, ainda, o Exmo. Sr. Dr. Geraldo Andrade Fonteles, 1? SubprocuradorGeral da República e o Secretário do Tribunal Pleno, Bel, José Alves Paulino, foi aberta a sessão solene. Ao início dos trabalhos, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente convidou os Exmos. Srs. Ministros Antonio Néder, Presidente do Supremo Tribunal Federal, o Exmo. Sr. Ministro Ibrahim Abi-Ackel, Ministro da Justiça, o Exmo. Sr. Ministro Leitão de Abreu, Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, o Exmo. Sr. General de Exérctto José Ferraz da Rocha, Ministro-Chefe do Estado Maior das Forças Armadas para composição da Mesa. Em seguida o Exmo. Sr. Ministro-Presidente, após referir-se às autoridades componentes da mesa e às demais autoridades presentes ou representadas, proferiu as seguintes palavras:
o Exmo. Sr. Ministro José Néri da Sllveira, (Presidente): Destina-se esta sessão solene do Tribunal Federal de Recursos à posse dos 8 (oito) novos Ministros, recentemente nomeados, por sua Excelência o Sr. Presidente da República, para compor este Tribunal, na conformidade da Emenda Constitucional n? 7, de 1977, e da Lei Orgãnica da Magistratura Nacional, de março de 1979. Serão empossados nesta Sessão, declinando-se os nomes pela ordem de antiguidade que terão no Colegiado, na conformidade das disposiçôes regimentais, os ilustres Juízes Federais: Dr. Hermillo Galant, da Seção Judiciária do Estado do Rio Grande
152 TFR - 90
do Sul; Dr. José Pereira de Paiva, da Seção Judiciária do Estado de Minas Gerais; Dr. Sebastião Alves dos Reis, também da Seção Judiciária do Estado de Minas Gerais; Dr. Miguel Jerônymo Ferrante, da Seção Judiciária do Estado de São Paulo; Dr. José Cândido de Carvalho Filho, da Seção Judiciária do Estado da Bahia; Dr. Pedro da Rocha Acioli, da Seção Judiciária do Estado de Alagoas; Dr. Américo Luz, da Seção Judiciária do Estado do Rio de Janeiro, e ainda um representante do
. Ministério Público Federal, na pessoa do Dr. Antônio de Pádua Ribeiro, Subprocurador-Geral da República. Suas Excelências encontram-se presentes. Proceder-se-á, de imediato, à cerimônia de posse.
A seguir, o Exmo. Sr. MinistroPresidente designou comissão composta pelos Srs. Ministros Armando Rollemberg e Peçanha Martins, para introduzir o Dr. Hermillo Galant no recinto do Plenário. Prestado o compromisso regimental, lido e assinado o termo de posse, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente declarou empossado o Exmo. Sr. Ministro Hermillo Galant, convidando-o a tomar assento na bancada do Plenário, ao lado do Sr. Ministro Adhemar Raymundo. Comissão composta pelos Srs. Ministros Moacir Catunda e Jarbas Nobre introduziu o Dr. José Pereira de Paiva no recinto do Plenário. Prestado o compromisso regimental, lido e assinado o termo de posse, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente declarou empossado ó Exmo. Sr. Ministro José Pereira de Paiva, convidando-o a tomar assento na bancada do Plenário ao lado do Sr. Ministro Romildo Bueno de Souza. Comissão composta pelos Srs. Ministros Aldir Guimarães Passarinho e Lauro Leitâo, introduziu o Dr. Sebastião Alves dos Reis no recinto. Prestado o compromisso regimental, lido e assinado o termo de posse, o Exmo. Sr. MinistroPresidente declarou empossado o
Exmo. ·Sr. Ministro Sebastião Alves dos Reis, convidando-o a tomar assento na bancada do Plenário ao lado do Sr. Ministro Hermillo Galant. Comissão constituída pelos Srs. Ministros José Dantas e Carlos Madeira acompanhou o Dr. Miguel Jerônymo Ferrante até o recinto da solenidade. Prestado o compromisso regimental, lido e assinado o termo de posse, o Exmo. Sr. MinistroPresidente declarou empossado o Exmo. Sr. Ministro Miguel Jerônymo Ferrante, convidando-o a tomar assento na bancada do Plenário, ao lado do Sr. Ministro José Pereira de Paiva. Comissão integrada pelos Srs. Ministros Washington Bolívar e Carlos Mário Velloso introduziu o Dr. Pedro da Rocha Acioli no recinto do Plenário. Prestado o compromisso regimental, lido e assinado o termo de posse, o Exmo. Sr. MinistroPresidente declarou empossado o Exmo. Sr. Ministro Pedro da Rocha ACioli, convidando-o a tomar assento na bancada, ao lado do Sr. Ministro Miguel Jerônymo Ferrante. Em continuação, os Srs. Ministros Gueiros Leite e Torreão Braz, em comissão, acompanharam o Dr. José Cândido de Carvalho Filho até o recinto do Plenário. Prestado o compromisso regimental, lido e assinado o termo de posse, o Exmo. Sr. Ministro José Cândido de Carvalho Filho, convidando-o a ocupar seu lugar na bancada do Tribunal, ao lado do Sr. Ministro Sebastião Alves dos Reis. Comissão constituída pelos Srs. Ministros Wilson Gonçalves e Adhemar Raymundo introduziu o Dr. Américo Luz no recinto da Sessão. Prestado o compromisso regimental, lido e assinado o termo de posse, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente declarou empossado o Exmo. Sr. Ministro Américo Luz, convidando-o a tomar assento na bancada, ao lado do Sr. Ministro José Cândido de Carvalho Filho. Por último, em comissão, os Srs. Ministros Otto Rocha e William Patterson introduziram o Dr. Antonio de Pádua
TFR - 90 153
Ribeiro no recinto do Plenário. Prestado o compromisso regimental, lido e assinado o termo de posse, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente declarou empossado o Exmo. Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, convidandoo a tomar assento na bancada, áo lado do Sr. Ministro Pedro da Rocha ACioli. Logo a seguir, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente concedeu a palavra ao Exmo. Sr. Ministro Carlos Mário Velloso, para saudar os empossados, em nome do Tribunal.
o Exmo. Sr. Ministro Carlos Mário Velloso: A sessão solene que nesta tarde celebramos tem alto significado: recebemos oito novos Ministros, os Juízes Federais Hermillo Galant, José Pereira de Paiva, Sebastião Alves dos Reis, Miguel Jerônymo Ferrante, José Cândido de Carvalho Filho, Pedro da Rocha Acioli, Américo Luz e o Subprocurador-Geral Antônio de Pádua Ribeiro, nomeados na forma do dispositivo constitucional que consagra a reforma do Tribunal, justamente quando a Corte comemora o trigésimo terceiro aniversário de sua instalação.
Criado o Tribunal Federal de Recursos, pela Constituição de 1946, e instalado no dia 23 de junho de 1947, confiou-lhe o constituinte competência jurisdicional antes conferida à Corte Suprema. Competia-lhe, então, basicamente, processar e julgar, em grau de recurso, as causas em que fosse a União interessada como autora, ré, assistente ou opoente, ou quando se tratasse de crimes praticados em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, bem assim as decisôes de Juízes locais, denegatórias de habeas corpus, e as proferidas em mandados de segurança, se federal a autoridade apontada coatora; originariamente, julgaria os mandados de segurança impetrados contra ato de Ministro de Estado.
Composto, inicialmente, de nove Ministros, à segunda Corte Judiciária do Brasil cumpria, sobretudo, interpretar o direito público, em fase de sua elaboração, conforme lembrou o eminente Ministro Armando Rollemberg, em discurso que proferiu, como Presidente do Tribunal, ao ensejo da comemoração dos vinte e cinco anos da Corte, ao dizer que «a matéria que lhe fora reservada estava compreendida, toda ela, no âmbito do Direito Administrativo, que, se fora versado entre nós por alguns publicistas de mérito inegável, à falta de textos legais específicos, de Sistematização das regras regUladoras das relações entre o indivíduo e o Estado, apresentava, como bem acentuou Se abra Fagundes em magnífiCO trabalho, múltiplas áreas de lacunas que tornavam «indispensável a exegese criadora ou construtiva dos tribunais, para a formação de alguns dos seus preceitos mais importantes, como também para a estratificação, pela constância dos arestos, dos critérios então formulados».
Certo é que, arrostando dificuldades, o Tribunal se impôs ao respeito dos seus jurisdicionados. É expreSSivo, no particular, o testemunho de Pontes de Miranda, que foi dos maiores juristas do Brasil e que se caracterizava por ser homem de coluna dorsal invergável; e que afirmou, conforme lembrado pelo Ministro Jorge Lafayette Guimarães, no seu discurso de posse, que «em vinte anos de atividade, os serviços, que ao país tem prestado o Tribunal Federal de Recursos, são enormes». (<<Comentários à Constituição de 1967», IIII540).
O inegável crescimento do país, a nova concepção de democracia social que, a partir da 2~ Grande Guerra, 'tem-se tentado implantar na: nossa terra, em que o Estado confundese com ·a sociedade, com um mundo de competências para a realização
154 TFR - 90
do bem-estar social, propugnada a isonomia também no campo da ordem econômica e social, em que o intervencionismo estatal se manifesta, tanto de modo repressivo, como de forma positiva, com imensa repercussão no campo das relações jurídicas entre o indivíduo e o poder público, é natural que a este Tribunal, colocado no vértice dessas relações, convergissem, de forma acentuada, os grandes conflitos entre a liberdade e a igualdade, entre o indivíduo e o Estado como sujeito de direito. Cresceu, então, de forma inquietante, o volume de serviço do Tribunal.
De outro lado, certamente que em razão dos bons serviços prestados ao país, de que deu testemunho Pontes de Miranda, ampliava-se a competência do Tribunal. Com a restauração da Justiça Federal de 1~ Instância, em 1966, ao grande volume de causas trazidas ao jUlgamento da Corte, acresceram-se outras. A Constituição de 1967 e a Emenda Constitucional n? 1 de 1969 introduziram novas questões na competência do Tribunal de Recursos, tirando-lhe a feição puramente federal, para dar-lhe caráter de Tribunal nacional, Tribunal da Federação. A competêcia conferida ·ao Tribunal Federal de Recursos, para o julgamento de conflitos entre juízes subordinados a tribunais diversos, federais e estaduais, ou de jurisdição comum ou especializada, ou o julgamento, originariamente, de membros de Tribunais federais e estaduais (C.F., art. 122, I, b), comprovam a afirmativa.
E evidente que os nove Ministros da composição originária, posto terem sabido corresponder à confiança da Nação, a ponto de Pontes de Miranda ter-lhes creditado grande parte do êxito alcançado pelo Tribunal (ob. e loco cits.), não poderiam, humanamente, atender a tantos e complexos trabalhos.
Em 1965, através do Ato Institucional n? 2, ratificado pela Emenda
Constitucional n? 16, de 26-11-1965, o número de Ministros do T l'ibunal Federal de Recursos cresceu para treze. O Tribunal, a seu turno, através de emendas regimentais, procurava descongestionar os seus serviços, restringindo a competência do Plenário, transferindo para as Turmas o julgamento de certos recursos.
Em 1977, aberto o debate a respeito da reforma do Poder Judiciário, o Tribunal não se omitiu. Através de sugestão encaminhada ao Supremo Tribunal e de anteprojeto remetido ao Congresso Nacional, que teve como relator o Ministro Paulo Távora, foi proposta a criação de tribunais regionais, ficando o Tribunal Federal de Recursos como corte de recurso especial, a exemplo do que ocorre na jurisdição eleitoral e do trabalho.
Todavia, a opção política dos poderes competentes da República, através da Emenda Constitucional n? 7, de 1977, e Lei Complementar n? 35, de 1979, foi no sentido do aumento do número dos Ministros do Tribunal, de 13 para 27, preenchendo-se, de imediato, seis cargos. Concretiza-se nesta tarde, com a posse dos novos oito Ministros, a reforma que o legislador brasileiro quis. Cumpre-nos, pois, efetivá-la.
A reforma, todavia, não prOduzirá êxito, o que não passa desapercebido ao mais desatento dos observadores, com o aumento puro e simples dos Juízes do Tribunal, mesmo porque um mundo de processos, cerca de 20.000, aguardam julgamento. O seu sucesso dependerá, estamos certos, de medidas processuais paralelas, tais como as preconizadas no discurso de posse do eminente Presidente da Casa, Ministro José Néri da Silveira, que pugnou pela adoção de «imediatas medidas legislativas, colimando, desde logo, diminuir o afluxo de processos a esta Corte, bem assim «à limitação de recursos sobre determi-
TFR - 90 155
nadas matérias e à aplicação do princípio do duplo grau de jurisdição».
Com a compreensão do Poder Executivo, essas providências vêm-se viabilizando.
o Tribunal, de outro lado, tem procurado encontrar meios e formas de racionalizar os seus trabalhos, seja pela maior divulgação de sua jurisprudência, seja mediante a edição de súmulas da sua jurisprudência predominante. Tais súmulas, lembra Roberto Rosas, face ao que dispõe o art. 90, § 2?, da Lei Complementar n? 35, passaram a ter, junto com as súmulas do Supremo Tribunal Federal, natureza normativa, o que preconizara M. Waline, ao sustentar o poder normativo da jurisprudência. O Tribunal já editou mais de quarenta súmulas, e continuará editando outras, o que possibilitará aos Ministros o julgamento de recursos por despacho, com economia de tempo e aceleramento dos trabalhos.
Os cientistas políticos e os constitucionalistas contemporâneos reclamam novas garantias de independência dos tribunais, ao lado daquelas que se tornaram clássicas. Sustenta-se, por exemplo, que aos tribunais superiores deve ser conferido poder normativo no campo do Direito Processual, lembra o Professor Nelson de Souza Sampaio (<<As Constituições e a Independência do Poder Judiciário», RDP, 39/40, p. 20).
O Supremo Tribunal Federal já está investido nessa garantia (C.F., art. 119 § 3?, c) a exemplo do que ocorre, de forma mais ampla, é certo, com a Suprema Corte de Justiça da Inglaterra e a Suprema Corte dos Estados Unidos, por delegação do Congresso. Com base nessa delegação, aliás, baixou a Suprema Corte americana as «Federal Rules Of Ci-
vil Procedure» e as «Federal Rules of Criminal Procedure» (Nelson de Souza Sampaio, ob. e loco cits.).
O nosso Tribunal, não obstante balizado pelas leis processuais que reduzem os regimentos internos a simples leis materiais supletivas, procurou, todavia, no vazio daquelas leis, fiel ao que propugnava, em 1971, o eminente Ministro Armando Rollemberg, encontrar «fórmulas aptas a tornarem cada vez mais rápida, embora igualmente cuidadosa, a distribuição da Justiça». Com esse escopo, tem vigência, a partir desta data, o novo Regimento Interno do Tribunal Federal de Recursos, com 395 artigos.
Assim, meus senhores, contada a vôo de pássaro, uma pequena história do esforço que temos desenvolvido nesta Casa, com o propósito de fazer com que a reforma frutifique, quando o Tribunal se engaj a numa nova estrutura.
Oito novos Ministros passam a compartilhar conosco, a partir de hoje, dos trabalhos da Corte, das suas alegrias e das suas preocupações.
Estamos contentes, os irmãos mais velhos, quando recebemos no seio de nossa família esses irmãos mais moços.
Contentes e felizes, sobretudo, porque se incorporam ao Tribunal Juízes do melhor quilate, testados na judicatura e no Ministério Público, tanto na 1~ quanto na 2~ instãncia.
Hermillo Galant vem do Rio Grande do Sul, onde foi político, advogado, Juiz Federal e Juiz do Tribunal Regional Eleitoral. Miguel Jerônymo Ferrante nasceu no Acre. Foi em São Paulo, terra que elegeu como sua, que foi professor, escreveu livros e projetou-se na magistratura, como Juiz Federal e Juiz do Tribunal Eleitoral. José Cândido de Carvalho Filho é homem da Bahia e é
156 TFR - 90
da terra de Ruy que ele vem. Deputado à Assembléia Legislativa da Bahia, por duas legislaturas, advogado, foi Juiz Federal e Juiz do Tribunal Eleitoral daquele Estado, e é professor-titular de Direito Penal da tradicional Faculdade de Direito da Bahia. Pedro da Rocha Acioli, das Alagoas, homem do nordeste, nas Alagoas foi Juiz eminente, tanto da Justiça Estadual quanto da Justiça Federal. Integrou o Tribunal Eleitoral do seu Estado e é também professor. Traz para o Tribunal uma tradição de independência de que, a respeito de Acioli, o Senador Daniel Krieger nos dá notícia nas suas memórias, «Desde as missões ... ». Américo Luz, nascido nas Minas Gerais, teve um rio que passou em sua vida ... Pois foi na mui leal São Sebastião do Rio de Janeiro, que Américo Luz notabilizou-se como Juiz Federal, Juiz do Tribunal Eleitoral e professor Antônio de Pádua Ribeiro também nasêeu nas Gerais de Guimarães Rosa. Foi em Brasília, entretanto, que esse novo Colega estudou o Direito e, muito moço, tornouse jurista e professor afamado. Oriundo do Ministério Público, Procurador da República e Subprocurador-Geral, tendo funcionado junto ao Supremo Tribunal e junto a esta Corte, o Ministro Pádua bem conhece o nosso Tribunal. Finalmente, bem de propÓSito deixei para o final, José Pereira de Paiva e Sebastião Alves dos Reis. Ambos, meus companheiros desde os primeiros dias da Justiça Federal de Minas, são magistrados que o povo do meu Estado admira e respeita. O Ministro Pereira de Paiva que nasceu em Abre Campo, na mata mineira, onde o meu pai foi promotor PÚblico, e onde o conheci, é o mais antigo Juiz da Fazenda Pública do Brasil. Quando nomeado Juiz Federal, j á vinha ele exercendo o cargo de Juiz da Vara da Fazenda, em Belo Horizonte, há cerca de doze anos. Foi também Juiz do Tribunal Eleito-
ral de Minas. Sebastião Alves dos Reis, do Lamim, pequenina cidade do quadrilátero ferrífero de Minas, que se tornou famosa, no meu Estado, pela sua notável biblioteca pública, o Tribunal conhece bem, pois o Ministro Sebastião Reis o vem integrando de longa data, com() convocado. Juiz Federal e Juiz do Tribunal Eleitoral do Estado, é um autêntico «scholar», professor nas Universidades Federal e Católica de Minas. Os meus primeiros passos no Direito Financeiro e Tributário foram conduzidos, confesso com prazer, pelo Ministro Sebastião Reis.
Saúdo-os, Senhores Ministros que ora se empossam, em nome do Tribunal, certos, os seus Colegas mais antigos, que Vossas Excelências haverão de enriquecer as tradições de sabedoria, imparcialidade e independência do Tribunal Federal de Recursos.
Ao cabo, Senhores, quando a Corte inicia uma nova era, permitam-me que eu recorde as palavras de um grande jurista, de um notável advogado, que saudou este Tribunal por ocasião da comemoração dos seus vinte e cinco anos: Josaphat Marinho, depois de assinalar as virtudes do Tribunal Federal de Recursos, concluiu, com rara beleza, lembrando o «relato de Madison», a propósito da observação de Benjamin Franklin nos instantes finais de elaboração da Constituição dos Estados Unidos. Recorda Madison que, quando os últimos convencionais assinavam a Constituição, Franklin comentava, entre os mais próximos dele, olhando para a tela que se encontrava por detrás da Mesa Presidencial, que não sabia distinguir se o que nela estava pintado era um sol nascente ou um sol poente. Asseverou que demoradamente observara e a dúvida persistira. Mas quando os derradeiros constituintes assinavam a
TFR - 90 157
Constituição, o grande Benjamin Franklin afirmou a seus companheiros: «agora, por fim, tenho a felicidade de saber que aquele é o sol nascente e não poente». E concluiu Josaphat Marinho, celebrando a eloqüência, que «também agora podeis is dizer, Senhores Ministros, depois de 25 anos de esforços, de trabalho, de incertezas, de dúvidas, de vacilações, mas, afinal, de vontade persistente e vitoriosa, que este Tribunal é um sol nascente».
Ao invocar as palavras do notável advogado e primoroso orador, deixamos expresso, a alma carregada de otimismo e de esperança, os olhos postos nos olhos dos Colegas, dos companheiros de ontem e de hoje, que este Tribunal, para gáudio da Nação, persistirá guardião da ordem jurídica e das liberdades públicas, fortaleza dos direitos individuais, sol nascente dos sedentos de justiça.
O Exmo. Sr. Doutor Geraldo Andrade Fonteles (SubprocuradorGeral da República).
N esta sessão solene de posse dos novos integrantes da Casa, concretiza-se a determinação do Ato Constitucional n? 7, de 1977, com a ampliação do Egrégio Tribunal Federal de Recursos, incluindo na sua composição oito novos Ministros.
Saudando os ilustres empossados, tendo a satisfação de recepcioná-Ios ao sabor de calorosas boas-vindas, com grande apreço pessoal, acrescido dos aplausos do Ministério Público Federal, ao Tribunal e ao Governo pelo acerto na escolha dos eleitos.
Poderia valer-me do encaixe para tecer considerações em torno dos trabalhos e merecimentos pessoais de cada um, tal porém, em se tratando de número avultado de personalidades, que inscreveram nas lides do direito a conceituação pessoal que lhe é própria, através de suas obras e trabalhos, tornaria enfado-
nha a repetição dos qualificativos, que poderá ser expressa na síntese de que, na vivência funcional de suas vidas, se deram zelosamente aos seus misteres, na judicatura ou no Ministério Público, ou ainda em outras atividades públicas, a ponto de se verem aquinhoados em paladinos de inteligência, saber jurídico e alto espírito de cumprimento do dever.
Cumpre-me, todavia, assinalar modificações introduzidas em leis de pouco tempo, de permeio a Lei Orgânica da Magistratura e a recente edição do Novo Regimento Interno do Tribunal, bem como a inauguração do Sumulário de sua Jurisprudência, tudo convergindo para a maior celeridade dos julgamentos.
De outra parte, a introdução do sistema de computação de dados, ao que se pode prever, além de maior racionalização dos serviços, facilitará também o englobamento das matérias para uniformização de aplicação das leis, na interpretação do direito perquirido sobre cada tema.
Se isto vem ao encontro de salutar anseio do Poder Judiciário, de outro lado propiciará ao Poder Executivo, com brevídade proceder a reformulações legislativas que se impõem, a cada momento, no corretivo de elaborações distorcidas e desconformes com a ordem jurídica e a exegese dos princípios instituídos na Carta Magna.
Esses aprimoramentos, de muito acalentados, tiveram vigorosa execução, em tempo relativamente curto, iniciando-se na Presidência do preclaro Ministro Peçanha Martins, e, com redobrado esforço de entusiasmo e eficiência na consecução dos fins, pelo eminente Presidente José Néri da Silveira, cuja operosidade, dosada de sobriedade, segurança e descortino, fez realizar as diretrizes empalmadas com inteligência e objetividade.
158 TFR
Eis, senhores novos Ministros, desafio de uma luta empreendida que lhes legam seus nobres pares, à grandeza desta Corte de Justiça.
Parodiando Epíteto, eu concluirei esta parte afirmando: Vossas Excelências desejarão, por certo, dar à Magistratura, à pátria comum, uma oferta raríssima de grande valor. Dêem-se inteiramente a ela depois de se haverem convertido em modelos perfeitos de equilíbrio, de líberalidade comedida, de veneração à Justiça.
Veraz, também, é que irão pagar o frágil encanto do prazer ascencional com o peso permanente de uma sobrecarga de processos desarrazoada, dentro nos limites da tolerância do trabalho a cumprir e da capacidade humana quando voltada ao propósito de aperfeiçoamento e alcance, fins da missão a que se propõem.
A luta é, pois, de depuração dos parâmetros, frente aos quais atua o Podér Judiciário. Na contextura da concepção estatal, traçando orientação e métodos políticos, legislativos e administrativos, encontram-se as correções para satisfação dos problemas econômicos e sociais que inspiram as razões éticas do Direito, e que ao Judiciário está, assim, aquém das providências e além das carências revelados na ministração do Governo.
Derivo, agora, para ligeira reflexão sobre os tempos que correm e as mudança radícais, em toda conjuntura da vida hodierna, decorrentes dessa ânsia das conquistas humanas pelas máqUinas, pela vitória do homem sobre o Universo, transformando aquelas em seres anti-humanos, numa minúscula peça de imensurável oficina, onde se comprimem e se movem quais robôs de reqüestos puramente materiais, e condicionados às exigências de uma pura sociedade de consumo.
90
Quando assim não seja, transmudando-se em gota indefinida de matéria laboratorial para ver-se, de órgãos transplantados, a sua gênese, provinda de tubos de ensaio para implantação das provetas.
Caminhamos, enfim, pela estrada do infortúnio, sem saber o que buscamos, alheiados dos nossos destinos de criaturas feitas à semelhança de Deus. E nessa caminhada, sucumbem-se os valores da inteligência verdadeira. Portamos uma conduta incompatível com a tradição e com as instituições nobres e seculares, na prá tica cada vez mais alarmante das transgressões aos padrões sedimentados da moral e dignidade humanas.
Procuramos, tememos, mas permanecemos todos na esperança vã de defrontar, aqui ou ali, próxima ou remotamente, o holocausto de nosso desvairo ou força imponderável que há de remir todos os erros, crimes e injustiças. Aos cônscios e aos que têm o mínimo de amor ao próximo, dá-se-lhes agora o terror de uma visão que assombra.
A missão desta Colenda Corte de Justiça é, porém, mais restrita e está fora das responsabilidades mutativas, para cingir-se ao dever de acudir aos reclamos das postUlações encerradas nas lides propostas.
O Direito e a Justiça guardam afinidade através da dupla luz da razão e da paz social, tal qual a concepção de Dante Alighieri em relação à filosofia e à teologia. Se a luz variou a sua tonalidade, é recebê-la com fidelidade.
Neste Tribunal, se eleva, em grau de superior jurisdição, como Corte de Privilégio da Justiça Federal, e de quase todas as questões de interesse do Estado em sentido amplo, abrangendo as da coletividade, de molde que são e devem ser graves as reflexões.
TFR - 90 159
Ponderações integrais sobre o direito a ser ditado ascendem de meras cogitações rotineiras ou de caráter processualístico para proverem medidas urgentes, quando comprometidas graves lesões econõmicas e a ordem pública e até a dignidade da Justiça.
Transcendem considerações superiores a interesses regionais ou grupais, para a globalidade dos reflexos de problemas jurídicos nacionais.
Os autores e réus são sempre comuns, reciprocamente se demandando. Pessoas e entidades privadas contra pessoas e entidades de direito público, ou seja, lato sensu, o Estado, embora não ressumbre prevalência deste sobre aquelas. Os poucos privilégios que a este a lei conceçle de fluem de contigências naturais, inclusive de sua potestividade, refletida na sua representação que se confunde na dupla qualidade de agente de defesa judiciária e de fiscal da fiel aplicação da lei.
Por isso, este Tribunal se erige na catedral da fé no Direito e na Justiça, pois aqui se esgrimam e se decidem as textilhas do direito dos servidores públicos, dos contribuintes do Erário; dos direitos de propriedade em relação às desapropriações; dos agentes de atividades industriais e comerciais, dos importadores e exportadores; quanto aos seus compromissos com o povo e com o õnus deles decorrentes; dos direitos humanos assegurados na Constituição, preservando-se a justiça na aplicação das penas criminais ou administrativas, como na absolvição dos injustiçados perante a lei e o direito, dos benefícios e beneficiários da previdência social; na contenção dos prejudicados e dos gananciosos; todos, igualmente considerados e igualados, aqui vêm abeberar as auras insufladas do Direito e da Justiça.
Que Vossas Excelências honrem, dignifiquem, para orgulho de suas
excelentíssimas famílias e seus patrícios, a árdua e nobre missão a que se comprometeram.
O Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira (Presidente): Para falar em nome da nobre classe dos advogados brasileiros, concedo a palavra ao Dr. Eduardo Seabra Fagundes, Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.
O Exmo. Sr. Dr. Eduardo Se abra Fagundes (Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil): Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira, DD. Presidente do Tribunal Federal de Recursos; Exmo. Sr. Ministro Antõnio Néder, DD.
Presidente do Supremo Tribunal Federal; Exmo. Sr. Ministro Ibrahin Abi-Ackel, da Justiça; Exmo. Sr. Ministro Leitão de Abreu, Presidente do Superior Tribunal Eleitoral; Exmo. Sr. General José Ferraz da Rocha, Ministro-Chefe do Estado Maior das Forças Armadas; Exmo. Sr. Dr. Geraldo Andrade Fonteles, Subprocurador-Geral da República; Exmo. Sr. Ministro Xavier de Albuquerque, DD. Vice-Presidente do Supremo Tribunal Federal; Exmo. Sr. Ministro Cunha Peixoto, do Supremo Tribunal Federal; Exmo. Sr. Dr. Firmino Ferreira Paz, ProcuradorGeral da República; Senhores Magistrados; Parlamentares; Governadores; Autoridades; Membros do Egrégio Tribunal Federal de Recursos; Senhores Advogados; Minhas Senhoras e Meus Senhores.
Os advogados testemunham, nesta solenidade, mais um ato, mais uma etapa da reforma judiciária iniciada em 1977, reforma para a qual os advogados se dispuseram a colaborar, enviando ao Congresso Nacional o resultado do melhor de seus esforços, no sentido de obterem um aperfeiçoamento do Poder Judiciário à altura das necessidades da nação.
160 TFR - 90
Sua colaboração foi menosprezada, como menosprezada foi a própria palavra do Congresso Nacional, numa época marcada por excessivo autoritarismo, quando a divergência de opiniões entre o Poder Executivo e o Parlamento levava sempre a conclusão de que a verdade estava com o primeiro e não com o segundo. Os advogados desejavam uma reforma que fosse inspirada nos interesses dos jurisdicionados, nos interesses superiores da Nação, e não uma reforma engendrada em gabinetes por pessoas que - bem intencionadas, embora - não tinham a vivência dos problemas do Judiciário, como temos nós advogados e têm os Srs. Magistrados. O advogado tem sido, ao longo dos tempos, a grande vítima do mal funcionamento do Poder Judiciário, na medida em que suporta as conseqüências negativas da opinião pública e da opinião dos seus próprios clientes, toda vez que um pleito perante os Tribunais demora excessivamente a ser deslindado ou encontra desfecho afastado das palavras da Justiça e do Direito. Por isso, pensando também na classe dos advogados, pensando principalmente nos jurisdicionados, os advogados, através da Ordem, tanto do Conselho Federal como dos Conselhos Seccionais, através dos Institutos de Advogados e através de outras tantas entidades que congregam os profissionais da advocacia, procuravam soluções que envolvessem um real aperfeiçoamento do mecanismo judiciário. Naquela ocasião, este Egrégio Tribunal já se apresentava como órgão digno do respeito e da confiança dos advogados. Por isso, defendiam eles o princípio de que este Tribunal deveria ser elevado à condição de um Tribunal com jurisdição extraordinária, criando-se tribunais regionais para julgamento, em segundo grau de jurisdição, dos feitos em que a União fosse interessada em qualquer posição no processo. Entendiam os advogados, como
ainda entendem, que reformar o Judiciário, simplesmpnte aumentando o número de magistrados, é evidentemente uma solução que a todos se apresenta como a mais evidente. Mas está longe de ser a mais acertada. A idéia dos advogados é a de que a Justiça Federal precisava ser aproximada do povo. Num país de dimensões continentais como o nosso, não se pode permitir o luxo de centralizar na sua capital toda a administração da Justiça Federal, no momento em que a União Federal assume, cada vez mais, uma presença marcante na vida nacional, descendo a todos os detalhes no exercício da administração pública, interferindo fundamentalmente na vida dos indivíduos - quer no plano dos direitos individuais, no campo civil, quer no da própria liberdade individual. Cada vez mais sente-se a presença da União a exigir uma Justiça Federal capaz de exercer a sua missão nobre de controlar os atos do Poder Executivo.
A Justiça Federal tem origem muito recente em nosso País. Este Egrégio Tribunal data de apenas 33 anos, e a justiça de 1? Grau data de pouco mais de 10 anos. Mas, não obstante, logo a estrutura da Justiça Federal apresentou sinais de envelhecimento. E uma Justiça que poderia ter sido criada para atender às necessidades da Nação, por muitos e muitos anos. No entanto, sentiram os advogados e os jurisdicionados a enorme dificuldade que teriam para fazer valer seus direitos diante da poderosa União, com uma estrutura de Justiça Federal que não correspondia às necessidades do País.
E verdade que este Egrégio Tribunal está atualmente triplicado em relação ao seu número original de membros. Entretanto, sabemos todos nós que ainda pesa sobre os ombros de cada um dos compc,nentes
TFR - 90 161
da Corte uma carga extremamente pesada de trabalho, que exigirá de todos uma dedicação quase sobrehumana para não deixar os jurisdicionados sem a rápida distribuição da Justiça Federal.
Sabemos que o Egrégio Tribunal é enriquecido, neste momento, pelo ingresso de magistrados provados no exercício da advocacia, no exercício do Ministério Público e no exercício da magistratura de I? Grau. Magistrados que, todos eles, sem exceção, granjearam a confiança e o respeito das respectivas comunidades de advogados, pela forma elevada como se comportaram na distribuição da Justiça.
Sabemos que os nobres integrantes da Corte contribuirão para manter o elevado teor deste Tribunal que, ao cabo desses 33 anos, fixou perante a Nação e perante os advogados uma imagem de respeitabilidade.
Esperamos todos, advogados que não contribuimos, como se diz, para a escolha .desta via da reforma judiciária, que os frutos que sejam possíveis de colher, com o aumento do número de membros desta Corte, venham minorar as aflições dos profissionais de advocacia e dos seus clientes.
O desenvolvimento do Brasil, ao longo dessas três últimas décadas, sem dúvida, superou, e muito, o acréscimo que se fez de membros deste Colendo Tribunal. A complexidade das relações da União com seus administrados multiplicou-se muitas vezes, e não apenas três. Sabemos que continuaremos enfrentando dificuldades, até que seja possível implantar uma reforma judiciária ditada pelos verdadeiros interesses do povo brasileiro.
Muito obrigado.
o Exmo. Sr. Ministro Sebastião Alves dos Reis: Os empossados de hoje, Hermillo Galant, José Pereira de
Paiva, Miguel Jerõnymo Ferrante, José Cândido de Carvalho Filho, Pedro da Rocha Acioli, Américo Luz, Antõnio de Pádua Ribeiro e eu, neste momento altíssimo de nossas vidas, abeiramo-nos desta Egrégia Corte, comovida e respeitosamente, de corações humildes, cientes e conscientes das árduas responsabilidades que já se alteiam diante de nós, ao nos vermos integrados nesta augusta Casa, sem favor, um dos mais altos e qualificados Tribunais deste país, já enriquecido de veneráveis e venerandas tradições, e que tanto tem contribuído para o prestígio do Poder Judiciário do Brasil, mercê da independência e qualificação técnica e moral dos seus Juízes e, aqui, lembramo-nos da afirmativa de Woodrow Wilson de que os tribunais valem pelos seus Juízes; fazemo-lo, também, animados de poderosa fé no Direito, visualizado com uma projeção do espírito humano, como um momento significativo de nossa experiência social e ética, inspirados numa convicção autêntica da dignidade da missão do magistrado de amor às instituições judiciárias, de fidelidade aos elevados ideais de justiça, nos valores que encerra e persegue, ungidos da crença no valor transcendental e intrínseco do homem, enquanto valor-fonte de todos os valores.
Habita em nós aquela convicção amadurecida na experiência e vivência jurídica de que o Direito não é apenas uma intencionalidade, uma imantação para o justo; mas, visto globalmente, é um momento do jUsto, historicamente. realizado nos limites da contingência humana e que é uma atualização sempre crescente daqueles valores que possibilitam a afirmação de cada homem, segundo sua virtude, no sentido socrático do termo. Paralelamente, estamos certos de que o Direito é uma realidade universal e, onde existia o homem, aí o encontramos, e que a vida jurídica
162 TFR - 90
se desdobra, amplia, afirma e reafirma, numa tensão contínua de valores positivos e negativos, valores polares que se implicam e se exigem, num processo essencialmente dialético.
Sendo o Direito um bem cultural, um instrumento de realização e de valores de convivência social, há nele sempre uma exigência axiológica, atualizando-se na condicionalidade histórica, como leciona Miguel Reale.
Se a reflexão jurídica é sempre necessária, mais ainda se acentua nessa hora de profundas transformações políticas e sociais, quando o fator econômico irrompe avassaladoramente na ordem social, comunicando-lhe uma dinâmica até entâo desconhecida, numa reformulação dos valores tradicionais, avulta-se a responsabilidade do jurista e do aplicador da lei, pois as concepções do Direito são aspectos significativos das concepções da vida e do universo e o intérprete e aplicador da lei vê-se alçado a agente impulsor da História e a protagonista do mundo em que vive.
Correlatamente, fixemos, ainda, que só o homem inova e se transcende a si próprio, e é capaz de captar valores, hierarquizá-los e compô-los.
É, por tudo isso, que interpretar a lei é uma tarefa axiológica não simplesmente lógica, e a sentença é um trabalho estimativo, de compreensão, e não um simples silogismo.
Assinalemos, ainda, a posição institucional desta Egrégia Corte: Juiz da União, Tribunal Federal, sob certos aspectos, Tribunal Nacional, como se vê, não só de certos itens de sua competência constitucional e da sua própria compOSição, quando, ao lado de juízes e membros do Ministério Público Federal, recrutam-se juízes e componentes do Ministério Público Estadual, as suas decisões não têm a eficácia apenas de reinte-
grar o direito lesado, mas envolvem ampla responsabilidade política e social e têm acento de uma ressonância nacional, tal, tanta e tamanha a complexidade e diversificação mate~ rial dos interesses conflitantes postos perante ele, em razão do intervencionismo intenso sempre crescente do poder público federal, na área econômico-social.
A missão constitucional que lhe é reservada de dirimir os conflitos em que a União e suas instrumentalidades figurem como autora, ré, assistente ou opoente, confere a essa Egrégia Corte a alta responsabilidade política e social a que nos referimos, pois, se. de um lado, observado o princípio da eqüidistância das partes, a União deve ser julgada sob os mesmos critérios de imparcialídade e equanimidade devidos às partes, de outro reclama-se-lhe sensibilidade particular para os interesses da coletividade. comprometidos sUbjacentemente no conflito.
Este Colendo Tribunal não tem faltado aos seus deveres constitucionais, e a sua jurisprudência reflete o magnífico esforço construtivo de adequar a lei e as instituições jurídicas mais convenientemente ao bem comum, aos objetivos sociais dominantes, aos imperativos do desenvolvimento econômico do país, da autêntica convivência democrática, assegurando a pré-eminência da Constituição, o império da lei, a liberdade e os direitos fundamentais do cidadão, na linha de considerações de que o Estado de Direito não se afirma somente no princípio da legalidade dos atos do poder público, mas impõe, por igual, o contraste da legalidade respectiva exercida por um outro Poder, imparcial e independente, e que o Estado - Administração está sujeito ao Estado - Ordenamento jurídico, e que o Estado -legislador se submete ao Estado Ordenamento constitucional.
TFR - 90 163
A atividade jurisdicional reclama sempre meditação, reflexão, pesquisa, valorações e avaliações e, por isso mesmo, o seu desempenho impõe seriedade, austeridade, escrúpulo, respeito à consciência e não às conveniências pessoais, não podendo a sua eficiência ser medida em simples critérios quantitativos, meramente aritméticos, mesmo porque a justiça não pode ser sacrificada no altar de uma eficiência simplesmente mecânica, operacional, em pre-
. juízo dos valores substanciais do Direito. A conciliação entre os valores eficiência do trabalho judicial e realização dos ideais de justiça é o grande desafio da processualística moderna.
Sensível aos reclamos que partem de todos os lados para maior agilização do procedimento judicial, esta Colenda Corte, a partir da reforma do Poder Judiciário, vem trazendo ao Poder competente fórmulas e sugestões tendentes ao aprimoramento preconizado.
Ingressamos nesta augusta Casa ex orando a Deus nos dê luz e fortalezamoral e o amadurecimento do saber para que não deslustremos este Colendo Tribunal e não faltemos à confiança de todos aqueles que nos distinguiram com a indicação de nossos nomes e honraram-nos com as nomeações.
De nós, vindos das seções judiciárias do Rio Grande do Sul, Minas, São Paulo, Bahia, Alagoas e Rio de Janeiro, do Ministério Público Federal, cada qual trará para esta Egrégia Corte . o sinete da força telúrica da sua região, a marca da sociologia, da história e da cultura do seu Estado, a nota de sua formação profissional e técnica, da sua experiência e vivência do Direito, mas em todos se soma a mesma força aglutinante, acima e além desses parti cularismos, de amor à Pátria, de fé nos ideais da justiça e do Direito, e
de devoção incondicional à instituição a que serve, do compromisso único com a consciência e com o direito.
Agradecemos, extremamente sensibilizados, os votos de boas-vindas que ora nos foram endereçados por esse jovem e brilhante Juiz desta Egrégia Corte, Ministro Carlos Mário da Silva Velloso.
Recolhemos as palavras que nos foram dirigidas por S. Excia., como um poderoso estímulo, como um fecundo incentivo, e será sempre comovidamente que haveremos de evocá-las na sua espontaneidade e autenticidade.
Da mesma sorte, apresentamos nossos agradecimentos ao eminente Subprocurador-Geral da República, Dr. Geraldo Fonteles, bem como ao preclaro Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, o ilustre «battonier» Dr. Seabra Fagundes.
Agradecemos o comparecimento de todas as autoridades aqui presentes ou que se fizerem representar.
Por fim, permitam-nos uma pausa de sensibilidade, uma palavra de carinho e de amor aos nossos pais, às nossas esposas, aos filhos, aos familiares e amigos que tanto contribuíram, ao longo de nossas vidas, para a vitória deste dia.
A este Tribunal, pela sua Presidência e seus Ministros, a nossa mais alta reverência.
O Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira (Presidente) : Ao encerrar esta sessão solene de posse dos oito novos Ministros e considerar, assim, composto o Tribunal, nos termos da Emenda Constitucional n? 7, de abril de 1977, e da Lei Orgânica da Magistratura Nacional, de março de 1979, quero fazê-lo com espírito de otimismo, na certeza de que, nesta data em que o Tribunal comemora o 33?
164 TFR - 90
aniversário de instalação, uma nova fase em seus trabalhos está-se inaugurando, com o início também de vigência do Regimento Interno, recentemente aprovado, onde se consubstanciam as disposições que hão de reger o funcionamento da Corte, de acordo com áreas de especialização. Procedimentos colimando a racionalização dos serviços de apoio aos julgamentos já vêm produzindo resultados altamente positivos, máxime, no concernente ao volume da publicação dos acórdãos. As primeiras dezenas de súmulas da jurisprudência do TFR editadas têm produzido, à sua vez, efeitos plenamente satisfatórios no que concerne à possibilidade de utilização, pelos relatores, da faculdade constante do art. 90, § 2?, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional, representando, já no corrente ano, produção equivalente à de mais uma turma julgadora. Posso informar ao Tribunal, outrossim, que Sua Excelência, o Senhor Presidente da República, assinou hoje mensagem ao Congresso Nacional, com base em anteprojeto encaminhado à sua consideração, pelo Tribunal, onde se propõem normas para maior celeridade dos feitos no Tribunal Federal de Recursos e na Justiça Federal de Primeira Instância. A quantidade de processos, no Tribunal, que ultrapassa à cifra de 20.000, dos quais cerca de 10.500 se encontram na Subprocuradoria-Geral da República aguardando pronunciamento, está a demonstrar que, em verdade, o só aumento do número de Ministros não poderá significar solução definitiva à reforma da Justiça Ordinária da União, em Segunda Instância. O Tribunal propôs as medidas em referência, fiel ao entendimento de que, desencadeado como foi o processo de Reforma do Judiciário, por força da Emenda Constitucional n? 7, de 1977, e da Lei Orgânica da Magistratura Nacional, de março de 1979, incumbe, a cada Tribunal, na área de sua jurisdição, tomar a iniciativa de pro-
vidências, inclusive legislativas, destinadas a atingir a meta prioritária da celeridade dos julgamentos. O anteprojeto de lei referido está dentro dessa visualização da solução dos problemas específicos da Justiça Ordinária da União, em ambos os graus. Devo sinalar, aqui, a receptividade e atenção que o Tribunal tem merecido, nesses estudos, por parte dos Ministérios da Justiça, da Fazenda, da Desburocratização e da Previdência e Assistência Social. Estou certo de que, a médio prazo, haveremos de alcançar, com as providências legislativas indispensáveis, promissores resultados para o descongestionamento do aparelho judiciário federal que conta, a tanto, com a eficiência e a dedicação dos cultos Juízes Federais, em todo o País.
Aos eminentes colegas que acabam de se empossar quero expressar-lhes nossa alegria e nossas felicitações e dizer-lhes que, nesta Corte Superior da Nação, o fatigante ofício de julgar é suavisado pela amizade que nos une fraternalmente e pelo espírito de cooperação, certos, todos, de que uma só é nossa meta: fazer com que o Tribunal Federal de Recursos cumpra sua missão constitucional, no desate das contendas entre o poder e a liberdade, cônscio de sua independência e de sua responsabilidade perante a Nação e convencido de que as tradições do Poder Judiciário Brasileiro devem ser imperturbável e perenemente. preservadas como garantia dos direitos dos cidadãos e segurança dos objetivos permanentes da Pátria comum.
Ao declarar, desse modo, encerrada a Sessão, agradeço a presença das ilustres autoridades, de início mencionadas, e de todas as pessoas que vieram engalanar esta tarde festiva do Tribunal Federal de Recur-
TFR - 90 165
sos. Convido a todos os presentes para, juntos, confraternizarmos com os empossados e suas famílias, no coquetel que será servido no «hall» contínuo a este salão. Está encerrada a sessão.
Além das autoridades que compuseram a mesa, compareceram à solenidade as seguintes autoridades: Os Exmos. Srs. Ministros Xavier de Albuquerque, Thompson Flores e Soares Muiioz, do Supremo Tribunal Federal; Procurador-Geral da República, Dr. Firmino Ferreira Paz; Representante do Presidente do Superior Tribunal Militar, Ministro Jorge Alberto Romeiro; Procurador-Geral da Justiça Militar, Dr. Milton Menezes da Costa Filho; os Srs. Ministros Pedro Gordilho e José Maria S. Andrade, do Tribunal Superior Eleitoral; Representante do Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Ministro Carlos Alberto Barata Silva; Srs. Ministros Nelson Tapajós e Antônio A. Almeida, do Tribunal Superior do Trabalho; Representante do Presidente do Tribunal de Contas da União, Ministro Luciano Brandão A. de Souza; os Srs. Ministros Arnaldo Prieto, Ewaldo Sizinando Pinheiro e Guído Mondin, do Tribunal de Contas da União; os Srs. Ministros aposentados J. J. Moreira Rabello, Henoch da Silva Reis, Oscar Corrêa Pina, Paulo Laitano Távora e Márcio Ribeiro, do Tribunal Federal de Recursos; Representante do VicePresidente da República, Conselheiro Moacyr Martins Ferreira; Subchefe da Casa Civil da Presidência da República, Prof. João Carvalho; Representante do Sr. Ministro Chefe do Serviço Nacional de Informações, Dr. Costa Leite; Representante do Sr. Ministro Chefe do Gabinete Civil da Presidência da República, Dr. Inocêncio Mártires Coelho; Representante do Consultor Geral da República, Dr. JoaqUim Luis Bello; Governador do Estado de Alagoas, Dr. Guilherme G. Soares Palmeira; Go-
vernador do Estado de Minas Gerais, Dr. Francelino Pereira; Representante do Governo do Estado de São Paulo, Dr. Chaves Amarante; Representante do Governo do Estado do Rio Grande do Sul, Dr. Julio de Rose; Presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, Sr. Desembargador José Fernandes de Andrade; Presidente do Tribunal de Justiça Militar do Estado do Rio Grande do Sul, Cel. Odilon Camargo; Presídente do Tribunal de Contas do Distrito Federal, Conselheiro Raul Soares da Silveira; Conselheiros do Tribunal de Contas de Alagoas, Drs. José Alfredo de Mendonça, José de Melo Gomes e Geraldo Costa Sampaio; Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Estado da Bahia, Desembargador Renato Mesquita; Diretor do Departamento de Engenharia de Comunicações do Ministério do Exército, Gen. Ex. Antônio Ferreira Marques; Diretor-Geral do Departamento de Polícia Federal, Cel. Moacyr Coelho; Representante do Senado Federal, Senador Jorge Kalume; Senadores da Bancada de Alagoas, Dr. Arnon de Melo, Dr. Teotônio Vilela e Dr. Luiz Cavalcan-
,te; Representante do Presidente da Cãmara dos Deputados, Renato Azeredo, Deputado Aldo Fagundes; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Fazenda, Dr. Cid Heráclito de Queiroz - Procurador-Geral da Fazenda Nacional; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estados dos Transportes, Dr. Edson Alves; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Agricultura, Dr. Ronaldo Poletti; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Educação e Cultura, Dr. João Guilherme Aragão; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado do Trabalho, Dr. Geraldo Miné; Repre· sentante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Saúde, Dr. Edelberto Luiz da Silva; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Indústria e Comércio, Dr. Tarcísio C. Almeida
166 TFR - 90
Cunha; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado das Minas e Energia, Dr. Anibal Craveiro; Representante do Exmo. Sr. Ministro Chefe da Secretaria do Planejamento, Dr. José Maria Bimbato; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado das Comunicações, Dr. Hélio Estrella; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Previdência e Assistência Social, Dr. Alberto Allgayer; Representante do Exmo. Sr. Ministro Chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Dr. Sérvulo Coimbra Tavares; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Desburocratização, Dr. Hélio Lobo; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado do Interior, Dr. Wilson Lopes Machado; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado do Exército, Gen. Bda. Flávio Hugo Lima da Rocha; representante do Diretor-Geral do Departamento Administrativo do Serviço Público, Dr. Maurício M. Araújo Cunha; Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Dr. Eduardo Seabra Fagundes; Presidente da Seção do Distrito. Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Dr. Maurício Corrêa; Representante da Ordem dos Advogados do Estado de São Paulo, Dr. Manuel Affonso Ferreira; Representantes da Ordem dos Advogados dos Estados: do Rio Grande do Sul, do Estado da Bahia, do Estado de Minas Gerais, e do Estado de Alagoas; Membros do Ministério Público, Juízes, Advogados e funcionários do Tribunal.
Encerrou-se a Sessão às 18h.
Tribunal Federal de Recursos, 23 de junho de 1980 - Ministro José Néri da Silveira, Presidente - Bel. Jo.sé Alves Paulino., Secretário.
PLENÁRIO
Po.sse do. Sr. Min. Jarbas No.bre na Presidência do. TFR
Aos vinte e três dias do mês de junho do ano. de mil novecentos e oitenta e um, às quinze horas, na Sala de Sessões do Tribunal Federal de Recursos, presentes os Excelentíssimos Senhores Ministros Jo.sé Néri da Silveira, Presidente do Tribunal, Armando Rollemberg, Mo.acir Catunda, Jarbas Nobre, Aldir G. Passarinho, José Dantas, Lauro Leitão, Carlos Madeira, Evandro Gueiros Leite, Washington Bolívar, Torreão Braz, Carlos Mário Velloso, Justino Ribeiro, Otto Rocha, William Patterson, Adhemar Raymundo, Romildo Bueno de Souza, Pereira de Paiva, Sebastião Reis, Miguel Jerônimo Ferrante, José Cândido, Pedro Acioli, Américo Luz, Antônio de Pádua Ribeiro e Flaquer Scartezzini, presentes, ainda, o Excelentíssimo Senhor Doutor Geraldo Andrade Fo.nteles, Subprocurador-Geral da República e o Secretário do Plenário, Bel. Jo.sé Alves Paulino, foi aberta a Sessão. Ausentes, justificadamente, os Excelentíssimos Senhores Ministros Peçanha Martins e Wilso.n Gonçalves. Ao início do.s trabalho.s, o Excelentissimo Senho.r Ministro.-Presidente convido.u o. Excelentíssimo. Senhor Ministro. Xavier de Albuquerque, Presidente do Supremo Tribunal Federal; o Excelentíssimo. Senho.r Ministro. Ibrahim Abi-Ackel, Ministro. de Estado da Justiça; o Excelentíssimo Senhor Senador Passos Po.rto., representante do Presidente do. Senado Federal; o Excelentíssimo Senhor Deputado Furtado Leite, representante do Presidente da Câmara do.s Deputado.s; o Excelentíssimo. Senho.r Ministro.-Presidente do. Superio.r Tribunal Militar, Tenente-Brigadeiro.do.-Ar Faber Cintra e o. Excelentíssimo Senho.r Ministro. Pedro. Go.rdilho., representante do. Presidente do. Tri-
TFR - 90 167
bunal Superior Eleitoral para a composição da Mesa. Em seguida o Excelentissimo Senhor MinistroPresidente, após referir-se ás autoridades componentes da Mesa e ás demais autoridades presentes e representadas, proferiu as seguintes palavras:
o Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira (Presidente): Chega a seu ponto final mais um período administrativo do Tribunal Federal de Recursos. Foi um biênio de intensa atividade, judicante e administrativa, nesta Corte Superior da Nação, em que me coube o privilégio de coordenar-lhe os trabalhos, vivendo a emoção, dia a dia, das transformações que, aqui, aconteceram, com significativas conseqüências favoráveis, para a vida da instituição a que todos servimos, com induvidoso amor, sem ruga nem mácula.
Assumi a Presidência do Tribunal e do Conselho da Justiça Federal, precisamente, quando se editara, havia pouco, a Lei Orgânica da Magistratura Nacional, num clima de debates, cumprindo implementar, no Colégio Judiciário, a reforma definitiva, com o aumento de seus membros - de dezenove para vinte e sete -, implantando-se a especialização dos órgãos judicantes. Vivi a experiência, nesta Casa da Justiça, de homens independentes unidos na consecução de um objetivo comum: a Emenda Constitucional n? 7, de abril de 1977, complementada pela Lei Orgânica da Magistratura NacionaL de março de 1979, em determinando o aumento do Tribunal, de 13 para 27, e adotando fórmula não coincidente com o pensamento da sua maioria, representaram, entretanto, um desafio que no ato de minha posse, afirmei, solenemente, em nome da Corte, aceitarmos, para vêla submetida ao crivo da experiência, com o mesmo entusiasmo e o patriotismo que sempre animaram
nosso duro ofício de julgar, neste Tribunal Superior. Declarei, todavia, nesse ensejo, que o simples aumento do número de Ministros não constituía solução bastante em si para o Tribunal poder realizar o objetivo precípuo da Reforma, qual seja, dar prestação jurisdicional célere e justa, como reclamam os ideais de um convivio sob as inspirações do bem comum, ás volumosas demandas que se travam entre o poder e a liberdade, a Administração e os individuos.
Se as estatisticas de autuações, em confronto com as decisões, sempre revelavam congestionamento crescente dos trabalhos da Corte, pronta punha-se ao analista a conclusâo de que, ao lado do aumento do número de membros, cumpria, então, alterar a legiSlação processual, para diminuir o afluxo de milhares de processos desnecessários que subiam a este Tribunal Superior, a par da introdução de profundas modificações na estrutura dos serviços de apoiO administrativo. Destaquei, na posse, a necessidade inadiável para que a Reforma pudesse lograr resultados positivos de se criar novo espírito de superior compreensão entre o Executivo e o Judiciário, em ordem a que a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Federal de Recursos, acerca de questões do interesse imediato da Administração, fosse, por esta, através de seus órgãos competentes, também seguida e observada.
Nessa linha de entendimento, diversas medidas legislativas se adotaram, sendo quatro Decretos-Leis sobre anistia fiscal., que deram, como resultado imediato, no segundo semestre de 1979 e em 1980, o arquivamento de mais de 125.000 execuções fiscais de pequeno valor, na Justiça Federal de Primeira Instância; a Lei Complementar n? 37, de 13 de novembro de 1979, obstando a transferência para a Justiça Federal
168 TFR - 90
de causas de acidente do trabalho, que congestionariam o aparelho judiciário federal de primeiro grau, de forma insuportável, se houvesse de serem aplicados o art. 130 e seus parágrafos, da Lei Orgânica da Magistratura N acionaI, que entâo foram revogados: o Decreto-Lei n? 1.793, de 23 de junho de 1980, que autoriza nâo-ajuizamento, pela União, autarquias e empresas públicas, de ações de valor igualou inferior a 20 (vinte) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional e, por fim, a Lei n? 6.825, de 22 de setembro de 1980, que modificou o sistema do duplo grau obrigatório de jurisdição e o de recursos na Justiça Ordinária da União, estabelecendo o denominado recurso de alçada nas causas até 50 Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional, que assim não mais podem vir a este Tribunal, salvo em ações rescisórias das decisões dos Juizes Federais nesses feitos. A extinção da figura do devedor remisso, pelo DecretoLei n? 1.715, de 22 de novembro de 1979 (art. 5?), evitou o aforamento de centenas de mandados de segurança, para não prevalecerem as sanções administrativas conseqüentes, que antiga a pacifica jurisprudência do Alto Tribunal e desta Corte considera inconstitucionais, que tiveram a iniciativa ou a participação do Tribunal, complementaram-se, outrossim, por diversas normas jurídicas insertas em diplomas executivos, como as Portarias n?s 608, de 27-7-1979, e 188, de 23-3-80, e 375, de 18-11-1980, e ainda a Portaria n? 314, de 3-9-80, todas do Ministério da Fazenda, editadas com a esclarecida colaboração da Procuradoria-Geral da Fazenda N acionaI, que compõem um complexo de providências para não sobrecarregar a Justiça Federal de Primeira Instância, com ações de pequeno valor ou desnecessárias.
Cumpre-me ressaltar que todas essas disposições normativas lograram bom termo, mercê do alto entendi-
mento que o Tribunal manteve com os Poderes Executivo e Legislativo, sendo justo registrar a acolhida dos Ministérios da Justiça, Fazenda e sua Procuradoria-Geral, da Desburocratização, da Previdência e Assistência Social e da Casa Civil da Presidência da República às iniciativas em tal sentido adotadas por esta Corte.
Reaparelhou-se, em suas instalações, outrossim, o Tribunal, adotando-se dois sistemas de processamento de dados: um, para as causas, e outro, para sua jurisprudência, ambos funcionando com os mais promissores resultados. O primeiro possibilitou implantar a especialização, faz hoje precisamente um ano, quando, por simples listagem do computador, sem qualquer solução de continuidade nos trabalhos do Tribunal. se redistribuíram, entre os Ministros, 22.579 processos, de acordo com as áreas de especialização, incluídos mais de dez mil que aguardavam parecer na SubprocuradoriaGeral da República. Desde aí, a distribuição dos feitos e o registro de seu andamento por fases sâo processados pelo computador. A partir de 31 de março deste ano, ademais, em face do teleprocessamento implantado, entre o Tribunal e as Seções Judiciárias de Sâo Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, esta Corte, de jurisdição nacional, está mais próxima dos jurisdicionados, em qualquer desses Estados, pelo acesso fácil de que dispõem, quanto à informação de seus processos, controlando-lhes o andamento, desde o terminal do computador em qualquer das Capitais dos Estados referidos. Em breve, a esse sistema se há de integrar a operosa Seção Judiciária de Minas Gerais.
Reformulados os serviços de apoio aos julgamentos, de outra parte, acelerou-se o ritmo de divulgação dos acórdãos, hoje, em altíssima
TFR - 90 169
percentagem, publicados em menos de trinta dias após as decisões. Com a Secretaria de Informática e Documentação criada, não só se concentraram numa unidade comum os documentos legislativos, doutrinários e de jurisprudência, como os acórdãos do Tribunal analisados, catalogados, indexados, segundo metodologia própria, já em alguns milhares, se vêm armazenando no Banco de Dados do PRODASEN, com recuperação fácil e plena das informações, constituindo isso instrumento de inestimável valor a acelerar os julgamentos da Corte, possibilitando, outrossim, pelo País inteiro, a juízes e advogados acessarem a jurisprudência do TFR, por meio de qualquer terminal do sistema.
Este Tribunal, que no ano findo, julgou 13.198 processos e publicou 14.504 decisões, já no corrente ano judiciário, a esta altura, conta com cerca de 6.500 julgados e 5.800 acórdãos publicados.
Procedida como está a reorganização do Tribunal, produzindo-se, a partir do segundo semestre deste ano, conforme é plausível esperar, já os resultados da redução de afluxo dos processos, por força da Lei n? 6.825, de 22 de setembro de 1980, e mantido o ritmo crescente da produção de nossos trabalhos, por decorrência da especialização e em virtude do devotamento infatigável dos membros deste Colégio Judiciário, estou convencido de que o Tribunal Federal de Recursos possui razões bastantes a festejar, hoje, seu 34? aniversário com otimismo e certeza de que vencerá o desafio de que aceitou e verá descongestionados, a médio prazo, seus trabalhos e pautas, adotadas que ainda serão por certo, novas medidas legais e administrativas.
O eminente Ministro Jarbas dos Santos Nobre, a quem tenho a honra e a alegria de transmitir a Presidência desta Casa, dará à coordenação
de seus trabalhos o brilho de uma inteligência lúcida e a firmeza de seu caráter integérrimo. Homem do Pará, Juiz em São Paulo, Ministro deste Tribunal, faz mais de onze anos, sua presença nesta cátedra será marcada pelo dinamismo, dignidade e segurança. De sua ação e experiência todos podemos esperar, justificadamente, fecundos resultados. A seu lado, verá o Tribunal um piauiense de nascimento, maranhense de juventude e carioca de graduação universitária, também ex-Juiz Federal, o ilustre Ministro Aldir Guimarães Passarinho, cujo desempenho, na administração e na magistratura, o credencia, de forma singular, mercê de seu talento e vontade constante de servir, à investidura desta tarde.
Não posso deixar de mencionar, neste breve registro, a alegria que, no biênio ora findo, experimentei, ao contato pessoal com vinte das vinte e três Seções Judiciárias da Justiça Federal de Primeira Instância, em visitas de serviço, verificando a dedicação e o trabalho profícuo de nossos cultos e íntegros Juízes Federais, pelo País inteiro, auxiliados por servidores que com eles formam o corpo de uma instituição, cujo espírito é um só, no imenso território nacional, - formado pelo sacrifíc~o e as comuns distâncias, dos primeiros anos, inclusive de instalações, como hoje ainda sucede, especialmente, com o Rio e São Paulo, - quanto pelo amor de todos ao serviço da Justiça.
Agradeço aos Juízes Federais o apoio e as sugestões que deles sempre recebi, e testemunho, ainda uma vez, a minha profunda. admiração a esses nobres colegas, magistrados da União, que constituem, pelo Brasil inteiro, em realidade, a longa manus desta Corte Federal e a garantia dos cidadãos contra eventuais abusos ou ilegalidades de detentores de parcela do poder federal,
170 TFR - 90
quanto da União e suas entidades descentralizadas, no processamento e julgamento de suas causas.
Aos caríssimos Ministros desta Corte devo afirmar que nosso trabalho conjunto e coeso, solidário e invariavelmente fraterno, não modificou, com a Reforma, o espírito deste Tribunal, que preside a seus atos e ao convívio de seus membros. Nosso objetivo comum e permanente de servir, incondicionalmente, à causa da Justiça dá-nos a unidade de sentimentos e torna, pela cordialidade e cooperação de todos, fácil dirigir esta Casa de homens livres e independentes. Apenas coordenador de nossos trabalhos, concluo, assim, meu mandato, agradecido a todos os eminentes cOlegas, sem qualquer exceção.
Por igual. aos ilustres Subprocuradores-Gerais da República, manifesto cordial reconhecimento pela maneira independente e digna com que também serviram ao Tribunal. Aos funcionários, desde os Diretores até os mais modestos da hierarquia funcional, sou profundamente agradecido, pela colaboração inestimável que me deram, inclusive, por vezes, nas longas noites de nossas vigílias de trabalho, todos com alegria, firmes no espírito de servir, com verdadeiro amor a este Tribunal, que guardamos como um bem precioso na intimidade de nosso coração.
Perante o altar de Deus, na manhã de hoje, rendemos graças por nos haver conservado com vida e saúde e permitido servir a este Tribunal e ao povo brasileiro, que julgamos com compreensão e amor, e pedimos pelo descanoso eterno dos dois colegas que tombaram no meio da jornada/os saudosos Ministros Amarílio Benjamin e Hermillo Galant, falecidos em atividade, a 20 de agosto de 1979 e 16 de fevereiro deste ano, respectivamente. Mas, de forma espe-
cial, imploramos ao Espírito do Senhor que dê aos novos dirigentes desta Corte sabedoria e força para levarem avante, com justificado otimismo, este Tribunal, que julga causas do superior interesse da Administração Federal e da Nação, com independência e visão do bem comum, cônscios os seus membros da imensa responsabilidade que têm perante a Pátria, à qual desejamos todos servir, sem limites, e fiéis aos ideais maiores da liberdade e da democracia e aos imperativos da dignidade, da honra e de nossa consciência.
Muito obrigado.
Ditas estas palavras, convido para vir à mesa o Sr. Ministro Jarbas dos Santos Nobre, para tomar posse no cargo de Presidente do Tribunal, para o biênio 1981/1983.
A seguir, prestado o compromisso regimental, lido e assinado o Termo de Posse, o Excelentissimo Senhor Ministro José Néri da Silveira declarou empossado no cargo de Presidente do Tribunal, o Excelentíssimo Senhor Ministro Jarbas dos Santos Nobre, eleito na Sessão Plenária de 4 de junho de 1981, convidando-o a tomar a direção dos trabalhos.
O Excelentíssimo Senhor Ministro Jarbas dos Santos Nobre, ao assumir a Presidência convidou o Excelentíssimo Senhor Ministro Aldir Guimarães Passarinho à mesa para tomar posse no cargo de VicePresidente do Tribunal. Prestado o compromisso regimental, lido e assinado o Termo de Posse, o Excelentíssimo Senhor MinistroPresidente declarou empossado no cargo de Vice-Presidente do Tribunal, o Excelentíssimo Senhor Ministro Aldir Guimarães Passarinho.
Em seguida, declarou solenemente empossados os membros efetivos do Conselho da Justiça Federal, os Excelentíssimos Senhores Ministros
TFR - 90 171
Washington Bolivar, Torreão Braz e Carlos Mário Velloso; como membros suplentes, os Excelentíssimos Senhores Mínistros Justino Ribeiro, Otto Rocha e Wilson Gonçalves; como Corregedor-Geral da Justiça Federal, o Excelentíssimo Senhor Ministro Washington Bolívar e, como Diretor da Revista do Tribunal, o Excelentíssimo Senhor Ministro William Patterson.
Dando seqüência à solenidade, o Excelentíssimo Senhor MinistroPresidente concedeu a palavra ao Excelentíssimo Senhor Ministro José Dantas, para falar em nome do Tribunal.
O Exmo. Sr. Ministro José Dantas: Meus Senhores: A simplicidade é virtude; pecado é a soberba! A prudência fortalece; debilitante é a insensatez! O amor dignifica; o ódio infama! Aos simples, sublima a naturalidade do bem praticado; mas aos soberbos, pune o vazio da sua arrogância. Aos prudentes, recompensa a racionalidade dos atos; mas aos incautos, pesa o risco da sua temeridade. Aos amorosos, conforta a indulgência; mas aos rancorosos, fere o estigma do seu opróbio.
Portanto, seja simples o indivíduo, espontâneo no viver; seja prudente o cidadão, harmonioso no agir; seja amoroso o homem público, magnânimo no poder.
Meus Senhores: O dever que assumi, por ordem e a
mando de «poder mais alto», foi o da saudação oficial. Nem tão difícil cumpri-lo, porque, embora falto de «engenho e arte», supre-me a crença nesses valores, ao reputá-los lauréis mais heróicos das personalidades merecidas a louvores.
No caso, virtude, fortaleza e dignidade são os dados primeiros e mais presentes, à mão de quem incumbido do perfil.
Tracemos, pois, as linhas mestras da ficha biográfica do homem a retratar, projetado na grandeza do seu meio e do seu tempo!
Jarbas, filho de Jaime - este, o profissional músico consorciado a Izaura, e que também gerou Gentil Augusto, Maria do Céu, Odete, José e Luiz; nasceu em «o quinze» (como diria Raquel), na cidade de Santa Maria do Belém do Grão Pará - como do fino gosto amazônico seria nomear-se assim a capital paraense.
De origem humilde, foi aluno de escola gratuita e colegial de escola pública, cujo aprendizado prático da vida, se não cumpriu com a molequeira do «Ver o Peso», o fez nos folguedos da Igrej a da Trindade, nos festejos do Círio, e na vadeação dos igarapés, remando montarias furadas. ao impulso de jacumãs rachados. na vangloriosa travessia de Guajará à Ilha das Onças.
Nesse travesso desafio das águas aliadas às florestas, bem poderia sonhar o menino o sonho da sentinela do rei - guardar a foz do rio-mar, martelando nas sapopembas o quarto das horas, a dividir os turnos de vigia à porta monumental dos tesouros da Amazônia; sonho que poderia ter sonhado o menino, na dolorosa premonição do assalto à ecologia da hiléia que viu rasgadas as suas entranhas, antes de passada uma geração - ao início de uma invasão predatória protestada pelo clamor do mundo e pela inquietação dos seus nativos.
Se a infância viveu em tão fabulosa geografia, marcaram-lhe a sina as águas correntes, como em confissão de posse, neste Tribunal, havia de confidenciar:
«Um dia, partindo do Amazonas, intentei viagem para outros rios. Busquei o Parnaíba, o monge de barbas longas ... Arrumei coisas e parti com destino aos irmãos gêmeos Ca-
172 TFR - 90
pibaribe e Beberibe ... O meu chamado, porém, não estaria nesses rios. Um outro acenava-me. Iniciei nova etapa e desci até o Tietê, onde parei por 28 anos seguidos».
Deveras, ao vadear os rios, Jarbas, filho de Jaime, trilhava o itinerário de lutas desiguais e esforços insanos, até culminâncias que o embeveceram, conforme aludiria, perplexo, ao fato de o 4? Escriturário de Alfândega chegar a Ministro do Tribunal Federal de Recursos.
Dos cinco rios vagueados, o Parnaíba, primeiro a testar o paroara fora das águas lustrais, o iniciou nos segredos da burocracia fiscal, ministrando-lhe as primeiras normas do respeito à coisa pública -respeito que havia de professar ad perpetuam.
Homem das caudais, sufocou-se logo pelas minguadas dimensões do litoral piauiense. Velejou a costa; aportou ao Recife. Ali, do bracejar a dupla Beberibe - Capibaribe, saldou mais duas séries do Curso de Direito; compactou concepções jurídicas, cruzadas às noções primárias que a Faculdade do Pará fornecera ao calouro, na compreensão da arte boni et aequi, numa segunda iniciação 'que viria ser a sua acabada profissão de fé.
Por último, o roteiro do seu destino apontou-lhe o Tietê. Não regateou o preço da concorrência incruenta, não vacilou em levantar a luva, para o duelo da inteligência.
Persistente na coragem e intransigente na fé, venceu o gigantismo paulista. Arrebatou da tradicional «Arcadas» o bacharelato, com ilustrada Turma de 1942; da bem afamada Mackenzie, conquistou a cátedra de Direito Financeiro; da função pública. galgou os cargos de Delegado do Tesouro e Procurador da Fazenda; da Justiça Federal, a magistratura singular, pelo desvelo de cuja
judicatura, a justo merecer, ascendeu ao Tribunal Federal de Recursos.
Ouçamo-lhe, porém, as mágoas, segredadas ao rememorar a valente trajetória:
«A caminhada foi árdua, longa e difícil. Desconhecido e sem protetores, sofri injustiças e preterições. Superei-as, entretanto».
Do Jarbas, filho de Jaime, esse foi o seu autodizer; porque, do que dele dizem, seria um-nunca - acabar de relacionar grandezas de espírito, pois, muito é o bem-dizer dos outros.
Eu próprio já o disse, com avarentas palavras, quando da honra de sucedê-lo em cadeira da superior magistratura eleitoral - « ... o talento de jurista, aderido a tantas outras qualidades humanas, notabilizou o bom juiz singular título dos seus sobejados merecimentos.»
Com efeito, o título de bom juiz, dei-lhe, então, de consciência tranqüila, firmado em ouvi-lo as proposições da melhor justiça, das liberdades pÚblicas e dos direitos do homem.
Relembre-se a singeleza de seus juízos, nem sempre dotados do melhor tecnismo jurídico, mais de uma autenticidade que o enobrece.
Certa vez, afirmou, em proteção ao ex-combatente, contribuinte autônomo da Previdência Social: « ... para os campos da Itália, como o advogado ora impetrante, foram operários, comerciários, prOfissionais liberais, e toda uma gama de cidadãos. Seria altamente injusto e desigual que agora se fizesse uma seleção que o espírito da lei não admite ... Desde que satisfaça a condição de ter sido «pracinha», expressão carinhosa e reconhecida com que toda a N ação se refere aos que lutaram na Europa na última guerra ... todos, in-
TFR - 90 173
distintamente, podem-se aposentar após 25 anos de trabalho» - AMS número 67.495.
Doutra feita, assim concedeu pão aos famintos: «A lei, ao que se vê não criou a figura do herdeiro Civii distinta do herdeiro previdenciário. A cadeip é a mesma. . .. A mim repugnaria autorizar a versão do benefício em favor do Instituto, em detrimento da viúva e filhos de pai inválido que, sabe Deus, em que condições conseguem sobreviver ... Se necessário, aplicaria o art. 5? da Lei de Introdução». - AC-42.507.
Em julgamento de repercussão, sem se render ao moderado pronunciamento da maioria, proferido na boa ordem da técnica formal do mandado de segurança, assim mesmo persistiu na refutação veemente à censura oficial: « ... Li «O Abatjour Lilás» ... O impetrante, a exemplo do que já fizera com outra pela sua, ... se propôs a descrever cena desenrolada em um bordel. ... Encontro na peça uma mensagem sadia .... O trabalho de Plínio Marcos, a quem não conheço pessoalmente, dentro de minha sensibilidade, não agride nem os bons costumes. ... O im'petrante compôs obra de arte com material podre. Nem por isso a obra tem menos odor, pOis que dela é possível, porque não somos imorais, extrair, por contraste, beleza e algo produtivo - MS 76.935.
Finalmente, em caso recente, parecendo ouvir o canto do cisne das etnias indígenas, asseverou: « ... tenho que o Cacique Juruna, o meu ir!llão .índio, tem direito ao que pede, IStO e, de ir a Roterdam e lá se encontrar, em conclave, com seus iguais das Américas, e dizer o que pensa, e, inclusive denunciar o que eventualmente lhe parecer errado no que se vem fazendo contra os primitivos e exclusivos donos dos vários países que represéntam» - HC-4.880.
Projetado na grandeza do seu meio e do seu tempo, ainda que visto
sob color desses flagrantes recolhidos ao acaso, eis o Jarbas, filho de Jaime, o conquistador dos rios.
Ao lhe confiarmos os novos rumos, não temos conselhos a dar - pela consciência dele próprio sobre ser gloriosa a tradição da nau a dirigir. Que a receba, com o manifesto do êxito da viagem redonda que acaba de realizar sob o comando de José, filho de Severino, navegador emérito das bandas do Rio Guaíba! Não cisme o amazônico, ante as enxurradas dos igarapés, o assovio dos beiços d'água, ou o solapo do bigode das ondas: como seu imediato, estará a bordo Aldir, filho de Almir, barqueiro do Parnaíba, e cuja crônica se revela rica de sabenças, esplêndida de pendores e transbordante das qualidades humanas que o fizeram um dos nossos».
Guíado por essa carta de tão bizarra hidrografia sentimental, navegue em paz o brioso barco da Justiça Brasileira; que o acompanhe a Senhora de Nazaré, madrinha de seu novo Comandante - Jarbas, filho de Jaime, o conquistador dos rios!
Excelentíssimas Autoridades: Perdoem Vossas Excelências ao
orador a heterodoxa saudação! Não foi por hostilidade aberta ao texto estilizado, nem às normas vestidas a rigor, de recomendação para solenidades deste porte; foi por força do hábito, que fugiu da ortodoxa retórica oficial.
É que, aqui, a fraternidade do convívio é valor de primeira grandeza; e ao sê-lo, não condiz outra linguagem, que não a tropologia mais afetiva, na comunicação de sentimentos que falam ao coração.
Se assim é o falar diuturno desta Casa, mais o será em momento de tamanha significação, solenizado pela entrega da sua administração ao Ministro Jarbas dos Santos Nobre, seu Presidente, e ao Ministro Aldir
174 TFR - 90
Guimarães Passarinho, seu VicePresidente; e pela renovação dos seus conselhos administrativos, tudo com a certeza do mesmo empenho com que se ouve a gestão, ora encerrada, do Ministro José Néri da Silveira.
Por isso, se outra fosse a saudação, soaria estranha aos ouvidos dos pares da Corte a mensagem da sua confiança, sem reservas; do seu preço, sem limites; do seu concurso incondicionaL e da sua estima mais fraterna a tão eminentes condutores de destinos.
Não. Esta mensagem não tinha como escusar-se à fiel tradução de sentimentos( que, na sua essência, são a pedra-de-toque da simplicidade do nosso ser; da prudência do nosso agir; e muito mais - a pedra-detoque do amor com que este Tribunal ministra a sua justiça.
Em prosseguimento o Excelentissimo Senhor MinistroPresidente concedeu a palavra ao Doutor Geraldo Andrade Fonteles, Subprocurador-Geral da República.
O Exmo. Sr. Dr. Geraldo Andrade Fonteles (Subprocurador-Geral da República): Esta Corte de Justiça que cumpre, mais uma vez, um biênio de sua administração, em sessão solene vai homenagear aqueles a quem cabe dirigir-lhe a prÓXima etapa, ao mesmo tempo em que obseqUia a tradição de distribuir as responsabilidades dos altos encargos da Presidência e Vice-Presidência aos que integram a sua comunidade.
Assim, Sr. Ministro Jarbas dos Santos Nobre, chegou a vez de V. Exa. oferecer-lhe o quinhão de vossa inteligência, a serenidade do vosso espírito, o devotamento de vosso trabalho à Instituição, à qual já vem servindo e compondo a argamassa consistente da reafirmação de sua existência, sempre ascensional, no âmbito do Poder Judiciário.
A V. Exa., Sr. Ministro Jarbas Nobre, não falta lastro, como ainda se vos dão de endosso, em valores ínsitos, a fecundidade natural do Pará, seu Estado natal, e a opulência da grande São Paulo, onde plasmastes a têmpera do vosso caráter e a crença na supremacia da ,Justiça, tornando-vos apto o desempenho da elevada função que acabastes de receber.
Por outro lado provi estes de cargos exercidos no Ministério da Fazenda, onde, certamente, o valor pessoal que revelastes, gUindou-vos às destacadas funções de Delegado Fiscal do Tesouro Nacional e Procurador da Fazenda Nacional do Estado.
N a Justiça Federal cumpristes todos os cargos que se oferecem à jurisdição ministerial, inclusive nos Tribunais Eleitorais, e sempre com respeitosa galhardia.
Por fim, prezado e querido Ministro Jarbas Nobre, eu me valho de excerto de um discurso proferido alhures, enaltecendo a figura do sobre-eminente Ministro Hahnemann Guimarães, como diria o hoje Ministro Firmino Ferreira Paz, ambos do Supremo Tribunal, eu me valho daqueles conceitos, ali auridos, para proclamar, por mim e pelo Ministério Público Federal, o nosso sentir do vosso perfil de homem público: «a personalidade, a criatura, a limpidez do caráter, a simplicidade pessoal, a alegria interior provinda de uma consciência tranqüila e justa, a bondade que não é capaz de um gesto de impaciência ou de um olhar mais severo, a fidelidade aos amigos, e, sobretudo, a independência com que defende suas convicções nos momentos necessários», são os traços que lhe compõem a silhueta, por nós admirada.
V. Exa., Sr. Presidente, traz no nome a estirpe qualificativa do seu nobre modo de ser.
TFR - 90 175
o Ministério Público, como todo o mundo jurídico, espera e confia em que V. Exa. éontinue na estacada com a mesma disposição de vosso imediato sucessor, para o que rogamos ardentemente a Deus que lhe conserve a energia, assaz demonstrada, e revigore a vossa sáude e bem-estar pessoal.
Na Vice-Presidência empossou-se o ilustre Ministro Aldir Guimarães Passarinho, a quem me dirijo para vos dizer: sois um daqueles que o Ministério Público também se compraz em render, neste momento, subida homenagem, ante a condição que polarizou a vossa cultura, inteligência e grande sensibilidade de jurista, exegeta do Direito Público.
Juiz Federal, desde o restabelecimento da Justiça Federal, V. Exa. exerce a sua missão de ínclito magistrado, tanto em Primeira Ínstância, como nesta Egrégia Corte Revisora, com integridade e competência funcional.
Sabeis, com equilibrado senso de justiça, ponderar o alcance de vossas decisões, vendo na coletividade e nos órgãos Públicos da Administração, irrecusavelmente a serviço daquela, aplicar a filosofia teológica do Direito.
De sorte que, apreciando-vos sob este ângulo, as vossas decisões e os vossos votos, constituem algo que sobressaeri. pela significação social, sObrepondo o interesse do geral ao do particular.
Em verdade, a essência do Direito está assentada em certo pragmatismo da conduta humana, ditada pela sua destinação social. Esta acuidade vos é muito peculiar, portanto merecedora de consagração, a qual, sentimo-nos na obrigação de autenticá-la. Também não podemos deixar de emoldurá-la em suporte de destaque, pois seria o mesmo que desvalorizá-la do quanto tem de sig-
nificado e alcance, como produto do labor humano. E fazemo-lo com palavras emantadas no sabor da fantasia. inspirado no Vosso nome de família.
Às vezes têm aquela receptividade da mãe-natureza, que Deus lhes deu, para cumprir a sua missão na terra: embelezá-la, colori-la, sonorizá-Ia, e, enfim torná-la estimulante à existência dos seres racionais.
O emolduramento de suas existências é o incomparável esplendor do firmamento, que vai da alvorada renascente de todas as forças, até o arrebol antecipado dos recessos noturnos, para o rerazimento das labutas cotidianas. Constitui, enfim, o infinito das esperanças, onde voam e amam a liberdade na sua mais vasta plenitude.
Eis, Srs. Ministros Presidente e Vice-Presidente do Egrégio Tribunal Federal de Recursos, o que pude rabiscar para manifesté!r. pelo Ministério Público Federal, o associamento do «parquet» às justas homenagens, em preito de reconhecimento aos relevantes serviços prestadoí' à Justiça Federal, ao Tribunal e à Justiça do País.
Cumpre-me, por fim, endereçar algumas palavras ao eminente Ministro José Néri da Silveira que acaba de completar seu mandato presidencial:
Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira: Quem há que não vos louve a fecunda administração presidencial? Seja na área puramente administrativa, seja no impressionante cuidado e acerto em dirigir os trabalhos do Plenário, sempre atento ac aperfeiçoamento técnico na proclamação dos resultados, revelando a atualidade de vosso conhecimento jurídico e a perfeita compreensão das tendências modernas do direito, tanto que não poupou esforços para atualizar, em termos cibernéticos, a fluência dos trabalhos do Tribunal.
176 TFR - 90
De outra parte não lhe faltou o discernimento do culto à tradição da Casa, e ao respaldo do aperfeiçoamento dos quadros administrativos, dando-lhes condições de ensinamentos intelectuais e assistência social robusta, extensiva às suas respectivas famílias.
N as minhas reminiscências de testemunha presente à história deste Tribunal, como já tivera oportunidade de afirmar na sessão de inauguração da Galeria dos ex-presidentes, induvidosamente, nenhum ultrapassou a deste último biênio, sem contudo os antecedentes desmerecerem ao natural desenvolvimento e pUjança do Tribunal.
Mas, Sr. MListro José Néri da Silveira, não poderia deixar de acontecer, tendo-se em conta o conjunto de qualidades que montam a vossa personalidade, a vossa formação, a vossa índole, deixando em tudo o que faz a perfectibilidade em grau excelente.
A missão que a vida vos reservou e para a qual se há preparado pelo constante e fecundo labor, impregnam e impregnarão, por toda a parte, as marcas indeléveis de vossa passagem.
Prosseguindo, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente concedeu a palavra ao Exmo. Sr. Dr. José Bernardo Cabral, Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.
O Exmo. Sr. Dr. José Bernardo Cabral (Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil): Ministro Jarbas; Nobre, Presidente do Egrégio Tribunal Federal de Recursos; Ministro Xavier de Albuquerque, Digníssimo Presidente do Supremo Tribunal Federal, de quem tenho a honra de ser conterrâneo, tive o privilégio de ser discípulo e continuo sendo aluno; MF nistro Ibrahim Abi-Ackel, Titular da Justiça; demais autoridades que
compõem a Mesa; Ministros de Estado; Ministros do Egrégio Tribunal Federal de Recursos; membros do Ministério Público Federal, Senhores Juízes Federais; mE:US colegas advogados, tâo bem representados pelo Presidente Maurício Correia; minhas Senhoras, meus Senhores: Conf~sso que no instante em que ouvi do Sr. Ministro José Dantas, que num bailado fluvial, sem nenhuma coreografia premeditada - eu sou filho do Amazonas e sei - os rios. desde as cabeceiras, começam a cavar os seus próprios leitos, verifiquei que me encontro como numa passagem da vida de Nicolo Paganini. O mundo j amais ouvirá um violinista como Paganini! Em determinada quadra da sua vida, na cidade de Lhornes, tinha eles um concerto marcado, para o qual toda popUlação j á se encontrava no teatro, e Paganini tardava. Tardava, porque, na noite anteriorgênio, era dado ao jogo e como gênio que era, dado ao jogo, teria que ser dado às mulheres - gastara a sua fortuna e vendera o violino a troco de mais umas fichas na mesa. Portanto, não tinha o violino para tocar. Alguém lhe avisara que um certo Mr. Divon tinha um Guarnerius, tal qual o Stradivarius, da mesma lavra, do mesmo valor. Ele se dirige a Mr. Divon que não obstante ser comerciante era homem dado à música, ao bom gosto, e pede o violino emprestado para que pudesse executar o seu concerto. Mr. Divon, muito honrado, sumamente homenageado, empresta-lhe o violino, e lá se vai, para o concerto, Paganini. E, como sempre, aquela exuberante e notável execução de Paganini, arrancando aplausos de todos, ffez' com que ao final, já no seu carrrarim, quandO entregava a Mr. Divon o violino, ouvisse deste: «guardar-me-ei de tocar nestas cordas, depois de nelas ter tocado vós.»
Também eu, assim meio disfônico, quase !ifônico deveria guardar-me
TFR - 90 177
de falar nesta tribuna, depois de ter ouvido V. Exa., Ministro José Dantas.
Não fosse o privilégio - quem sabe a deferência - de eventualmente ocupar a Presidência do Conselho Federal - só por isso, pela imposição do cargo - eu, que sou avesso ao discurso por escrito, porque é sempre mal feito no meu caso, e sempre mal lido por mim, dele fujo, fúi obrigado, nesta cadeira, a redigilo, quase que numa redação improvisada. E como fico agora, na hora em que o Subprocurador-Geral da Repú~ blica traça, par e passo com V. Exa. o perfil do Jarbas, o filho de Jaime, a tocar nas nossas entranhas, a fazer com que cada um se emocione, e que aumente, nesta Casa, como disse V. Exa., a fraternidade do convívio e, portanto, foge ao parâmetro de tudo aquilo que é ortodoxo. É bom que seja assim, porque como advogado, que sempre se escora no trabalho dos outros para pOder fazer valer as suas razões, também eu agora, qual aleijado, pedindo a muleta de V. Exa., Ministro José Dantas, começo a dizer neste alinhavado que já não mais teria razâo de ser, que sempre vale a pena, quando se é obrigado, e que bom que seja uma obrigaçâo desta ordem, fazer considerações. Elas não me privam de dizer que o comparecimento do Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil se impunha num ato solene como este, e, sobretudo, na entrega da Presidência do Sr. Ministro José Néri da Silveira. É que a Ordem dos Advogados do Brasil está convicta de que o Egrégio Tribunal Federal de Recursos, ao sair das mãos de V. Exa., Sr. Ministro José Néri da Silveira, para as mãos do eminente Ministro Jarbas Nobre, continuará trilhando o seu caminho amplo em torno da administração, seriedade, dignidade, independência e amistosidade com a Classe dos advogados.
Defendendo a OAB um Poder Judiciário constitucionalmente forte e socialmente equilibradO, não mais aceita que se possa pensar hoje naquela insegurança dos precedentes históricos, diante das Revoluções Americana e Francesa, do Século XVIII, quandO o Direito era realizado e construído casuisticamente, quer pelO Executivo, quer pelo Judiciário.
Ao Juiz, como V. Exa., criador do Direito a partir de normas que emanam do Legislativo e censurado r de atos tidos como contrários à lei pela prática-- do Executivo, sempre se reserva a missão de ser mais homem, homem e quase um Deus. Não se pode esperar dele apenas o mero aplicador da lei, posto que esta não se exaure na sua interpretação, assim como a partitura não esgota a música. É por esta razão, que o Juiz há de ser sempre aquela figura admirada pelos amigos e respeitada pelos que dela discordam.
No relatório que V. Exa., Ministro José Néri da Silveira, ainda há pouco acaba de dar conhecimento ao público - como quem marca uma entrevista com a posterioridade - traça, em linhas fortes, o que é uma administração. Esta mesma administração que traz o senso moral que nasce com cada ser humano, uma vez que a vida não empresta esta qualidade, ou os cargos que se desempenham durante o seu trajeto jamais conseguem conferir a quem quer que seja. Balzac dizia, ressaltando, que o Juiz liberal era um soberano, somente submetido a sua consciência e à lei. Sei que, com V. Exa., os moleiros de Sans Sousci não teriam que duvidar da existência de bons juízes, pois jamais foi provérbiO da Justiça de Cambises.
Por igual, não me lembro, Sr. Ministro José Néri da Silveira, de ter compartilhadO a sua Presidência com a prepotência, pois, sempre se
178 TFR - 90
manteve indiferente ao medo pelos poderosos. Na hora em que V. Exa. deixa esta Presidência, não quero, e o faço em nome da Ordem dos Advogados, bancar os abissínios que atiram pedras no sol que se põe - ainda que V. Exa. continue sendo um sol, porque continuará ao lado dos seus altos pares -- mas trazer-lhe o testemunho da simpatia e do apreço da OAB.
Ao fazê-lo, já como quem abre um crédito de confiança na admiração que sempre se impôs à Classe, refiro-me ao Ministro Jarbas Nobre, que sendo do Estado do Pará, sabendo cavar o seu próprio leito, foi desaguando já cenário paulista, como substituto do Procurador da Fazenda Nacional.
Seria repetitivo se eu trouxesse aqui as qualidades tão bem alinhadas como a de Professor-titular do Instituto Mackenzie, na cadeira de Direito Financeiro. Mas eu não poderia deixar de registrar que, Juiz em 1967, logo após decorridos dois anos, eis que se encontra neste Tribunal, não apenas a ditar sentenças, que isto é pouco, mas a dar um exemplo, pelo convívio, pela retidão, como quem sabe ir adiante, confiando na fé que Deus lhe impõe.
V. Exa., Sr. Presidente, Ministro Jarbas Nobre, que em determinada quadra da sua vida - e isto para mim é muito confortador, para não dizer motivo de alegria - no ano de 1974 era eleito Corregedor-Geral da Justiça Federal para completar o mandato do meu velho e querido mestre Henoch Reis, que, então, saía deste Tribunal para Governador do Estado do Amazonas, que não abria lacuna, porque logo após V. Exa., complementava, que não deixava vaga, porque V. Exa. preenchia, como preenche qualquer vaga. Logo após, em 1975, era V. Exa. eleito Corregedor-Geral da Justiça Federal da 1~ Instância; em 1978, Juiz efetivo
do Tribunal Superior Eleitoral; em 1979, Vice-Presidente desta Casa e, agora, em 1981, nesta consagração que não só a vida lhe dá, que os seus pares lhe confortam, que o mundo se abre como perspectiva a perder de vista, mas porque o passado de V. Exa. lhe permite, olhando para o futuro sem nenhuma sombra de dúvida, eis que o passado como ponto de partida para o futuro lhe entrega esta Presidência, e ao entregar faz com que V. Exa. tenha o privilégio da companhia de um VicePresidente, Aldir Passarinho.
A Universidade Federal do Rio de Janeiro o encontra se diplomando no ano de 1950 e de 1950 a 1964 - me perdoem os que são juízes de carreira - mas de 1950 a 1964 como advogado, advogado em que lhe conferiria, senão a excepcional capacidade de ser um bom juiz, mas a garantia de ser tão bom quanto aqueles que vêm da carreira da magistratura.
Sub-Chefe da Casa Civil do Presidente Castelo Branco, em 1967, de onde vem para a Justiça Federal, Ministro do Tribunal Federal de Recursos, em 1974.
Não vou, Ministro Aldir Passarinho, relatar-lhe a personalidade, os contornos, os quadros vivos que ela encerra, até nas condecorações que recebeu, porque entre todas elas, permita-me que ressalte uma, a meu ver, a maior que V. Exa. dispõe, porque todos nós advogados aprendemos com Eduardo Couturre que é bom que se ame a profissão, que se estude, que se leia, mas é muito mais bonito, para darmos prova de que dela gostamos, que um dia possamos indicar a um filho que seja advogado, e V. Exa. tem um filho que é advogado. Neste passo, apenas neste, lhe sigo, é com imenso prazer que lhe digo que tenho um filho advogado.
Receba, portanto, os cumprimentos da Ordem dos Advogados do Bra-
TFR - 90 179
sil na hora em que concluo, eminente Presidente Jarbas Nobre, e o faço, ressaltando que, talvez no conteúdo interno que esta solenidade reúne, a festa poderia ser do Tribunal, da Ordem dos Advogados do Brasil pelo seu Conselho Federal, de todos os Conselhos Seccionais, mas no valor histórico, neste ninguém pode tirar de dois lugares: de V. Exa., do Estado do Pará, tão bem retratado pela magnífica peça oratória do Ministro José Dantas, e do Ministro Aldir Passarinho, Estado do Piauí. Que estranha coincidência, dois Estados que começam com a letra P, a mesma letra do poder, como se neste instante o representante da Ordem dos Advogados do Brasil tivesse que dizer nesta Casa: poder que das mãos de V. Exa. há de emanar, não como quem conquista e o empalma por um instante - que nada disto vale na mão de um homem - ou pela riqueza que conseguiu amealhar, mas poder, aquele que se distribui em favor de uma coletividade, marcando o passo da seriedade na administração. Este poder, que é o do Piauí, que é o do Estado do Pará, leva a mensagem da OAB na sua mais alta satisfação, pedindo que Deus os ilumine, e os faça, sobretudo, uma gestão profícua e cheia de felicidade.»
Em seqüência, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente proferiu as segUintes palavras:
O Exmo. Sr. Ministro Jarbas Nobre (Presidente): Nesta Casa, o respeito ao princípio da antigüidade constitui tradição.
Este é o motivo pelo qual fui escolhido para exercer a sua Presidência.
Dos quatro Ministros nomeados em 1969 pelo Presidente Médici, Peçanha Martins, Décio Miranda, José Néri da Silveira e eu, excluído o segundo que não chegou a ser Presi-
dente por ter sido nomeado Ministro do Supremo Tribunal Federal, sou o último a assumir a direção deste Tribunal. Porque tomei posse no dia 11 de dezembro de 1969, dois dias depois do M.inistro Néri da Silveira, só . agora recebo a investidura.
Daí dizer: chegou a minha vez no sacrifício.
Sucedo a um homem excepcional que levou a bom termo a difícil tarefa que recebeu há exatamente dois anos atrás.
Sei dos momentos difíceis por que passou, prinCipalmente ante os devidos à adaptação do Tribunal ao gigantismo a que chegou em conseqüênCia da Reforma do Poder Judiciário.
Foi a construção do edifício anexo, além dos 14 novos Gabinetes de Ministros e de dependências outras indispensáveis.
Tudo isto transformou esta Casa em autêntico canteiro de obras.
A luta foi grande, mas o resultado aí está.
Minha responsabilidade nesse suceder é imensa. Para vencer os obstáculos espero, antes de tudo, que Deus me ajude. E também, porque não enfatizar, o Governo, meus ilustres pares e o funcionalismo da Casa.
Neste labutar, tenho a ventura de poder contar com os trabalhos e dedicação dos Vice-Presidente e Corregedor-Geral, meus diletos amigos e companheiros, Ministros Aldir Passarinho e Washington Bolívar, além dos novos componentes do Conselho da Justiça Federal, Ministros Torreão Braz e Carlos Mário Velloso.
Grande é, na verdade, o trabalho que se está a impor a um homem que logo mais será um septuagenário e que gastou perto de 50 anos no desempenho de funções públicas. Es-
180 TFR - 90
pero, porém, que forças e disposição não me abandonem e que eu possa vencer mais esta etapa de lutas.
Sumamente honrado com o cargo que me é entregue, destaco que o receio de que sou possuido pelos ~ncargos que lhe são próprios e conseqüentes, como que faz desaparecer toda a alegria do acontecimento.
E de fato muito árdua a tarefa que ora recebo, a de dirigir este Tribunal e o Conselho da Justiça Federal com as 56 Seções Judiciárias espalhadas pelo território nacional, cada qual com os seus problemas peculiares.
Observemos esta realidade.
Em 1979, na P instância, foram autuados 83.304 processos (757 por Juiz). No ano seguinte, esse número se elevou para 88.855 (818 por Juiz).
Em 1981, a autuaçâo poderá ser de 129.568 feitos se a Fazenda Nacional enviar à distribuição cerca de 60.000 execuções fiscais que estâo prontas para isto. A média por Juiz será, então, de 1.156 processos.
A situação da Justiça Federal em alguns Estados, como por exemplo o de Goiás, é muito séria, pois só no biênio 1979/1980, a média de autos para cada Juiz chegou a 1.066, devendo ser ressaltado que parte dessa elevada cifra se refere a questões fundiárias de repercussão social e da maior importância.
Na Seção do Rio de Janeiro, no mesmo biênio, a média, por Juiz, foi de 898 (1. 003 em 79 e 794 em 1980),
Na 1~ Região, o Estado do Pará vem em terceiro lugar, com a média per caplta de 804 processos nesse biênio.
Na 2~ Região, o quadro mais sério é o de São Paulo, onde a média no biênio, por Juiz, atingiu ao número impressionante de 1.305 processos.
As duas Seções mais importantes da Justiça Federal de 1~ instância, é de todos sabido, são as do Rio e de São Paulo.
A sobrecarga de trabalho numa e noutra, como visto, é invencível, pOis está acima da capacidade humana.
A acrescer a gravidade desse quadro, há a enfatizar a precariedade de suas instalações.
O prédio que ocupamos em São Paulo, de apartamentos que era, é impróprio e acanhado.
Não suportaria, desse modo, qualquer aumento de Varas.
O do Rio de Janeiro chega a ser inacreditável. Além de velho, é inadequado e perigoso. Todos os adjetivos depreciativos que existem no vernáculo, podem ser empregados com absoluta propriedade para descrever ó que é a sede dessa Seção Judiciária.
O prédio tem história, isto é certo, pois foi ocupado pelO Supremo Tribunal Federal até a mudança da Capital para Brasília.
Nesse quase escombro se acotovelam Juízes, Procuradores da República, advogados, partes e funcionários.
O espetáculo chega a ser deprimente e inacreditável.
Lá estive outro dia na tentativa de vir a realizar o quase milagre de poder transferir as duas Varas que continuam a funcionar em Niterói, apesar da extinção do antigo Estado do Rio.
No períOdO 78/80, a média anual dos processos encaminhados a este Tribunal foi de 7.500, cerca de 9% do volume do ajuizamento na Justiça Federal de 1~ Instância.
Se em 1981, como previsto, forem distribuídos em São Paulo os anunciados 129.568 processos, quase
TFR - 90 181
12.000 processos deverão subir a esta 2~ instãncia, cabendo a cada Ministro 488 novos casos.
Daí a perspectiva de logo mais perderem significação os resultados conseguidos em 1980 e primeiro semestre de 1981 em que houve um certo equilíbrio entre os processos recebidos e julgados.
Se este Tribunal ainda tem condições de bem servir, isto se deve principalmente ao represamento de processos na primeira instância.
Se o dique fosse rompido, o caos aqui estaria entre nós.
A solução para tal estado de coisas está na implantação de uma estrutura compatível com o seu volume de trabalho, a saber, aumento de número de Varas, de Juízes, de funcionários, além de maior espaço físico nas nossas instalações, na maioria, precárias.
O atual estado da Justiça Federal resulta em grande prejuízo para a União Federal e suas autarquias na consideração de que do ajuizamento de feitos, 60% são constituídos de execuções fiscais.
A arrecadação feita por esse meio desde a instalação da Justiça Federal, em 1967, é superior aos valores consignados em seus orçamentos.
Sentindo tais dificuldades, na administração Moacir Catunda. e durante ela fui Corregedor-Geral, nossa Justiça começou a utilizar serviço de processamento de dados. Hoje, esse sistema está implantado aqui no Tribunal e nas Seções Judiciárias de São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, através de convênio com á DATAPREV, empresa da Previdência Social.
De lá para cá, ele teve rápido desenvolvimento.
Para que se tenha uma pálida idéia do que foi feito nesse setor,
basta que se diga que nossos arquivos de memória, em fitas e em discos, atingem a 279.000 processos.
Como a média de cada um é de 50 itens, pode-se assegurar que o número de elementos registrados já se eleva a 27.900.000 processos.
Com tais números, fácil é concluir que chegamos à beira da saturação.
Porque já adquirimos a experiência necessária e possuimos estudos e programas a serem postos em prática, o caminho que a prudência aconselha é no sentido de que possuamos serviço próprio.
Sou grato aos Colegas pela manifestação de confiança em terem me elegido Presidente da Casa.
Como toda gente, eu também vim ao mundo num certo momento e em determinado lugar.
Nasci numa terra linda que, como canta o poeta, até os sinos repetem: belém, belém; «que palpita por detrás da floresta, em namoro com o rio, em carícias com as mangueiras, em lua de mel com a natureza», na observação feliz de Leandro Tocantins que canta a «Belém de todas as graças, do céu, dos ares, das águas, das cores, das terras, dos rios, do mato».
E também das graças divinas: «Nossa Senhora da Graça», escreve o cronista, «foi o orago de sua primeira ermida».
«Belém do Pará ... beleza eterna de paisagem,» no poema de Manuel Bandeira.
Por contingências da vida, de lá saí e deambulei por este Brasil a fora, fazendo amigos.
Até que cheguei a São Paulo para onde pretendo voltar ao término da longa caminhada de quase meio século.
Foi de lá que vim para Brasília, exatamente por ser de São Paulo, onde sou minima parcela entre os mi-
182 TFR
lhões de migrantes que no lado dos imigrantes, constituem a força de trabalho que dele fez o primeiro Estado da Federação.
E porque sou profundamente grato a São Paulo pelo que me deu, a ele transfiro a honra de ter sido escolhido para desempenhar as funções de Presidente deste Tribunal, numa repetição do que a tal respeito disse o nosso poeta maior, o qual apesar de desaparecido, nunca deixou de ser o Príncipe, o insuperável Guilherme de Almeida:
«São Paulo do verbo «dar», escreveu o imortal, «Desde quando? - Desde sempre. Desde a areia de uma praia Dada a uma onda de naufrágio. Que em certa crista de espuma Veio trazer João Ramalho. E São Paulo deu-lhe tudo: Santo André, Piratininga; Deu aos seus pés andarilhos, Serra-abaixo, serra-acima, Nove léguas para andar; E deu-lhe cinco mil arcos E, flor das flores da tribo, Flor-de-altura do Planalto Uma princesa: Bartira ... »
Dar a São Paulo? - Ilusão! Pois que ele tudo nos deu, Se ele nos deu até mesmo O próprio amor que lhe temos, O que a São Paulo lhe der -Seja quem for, e porque, E onde, e quanto, e como, e quando-Será tudo, será sempre. Será só restituição!»
Antes de declarar encerrada a Sessão, tenho a honra de convidar todos
90
os presentes às dependências contíguas a este Salão, que o Tribunal tem o prazer de oferecer um coquetel.
Declaro encerrada a Sessão.»
Compareceram à solenidade, além das que compuseram a Mesa, as seguintes autoridades: o Exmo. Sr. Delfim Neto, Ministro-Chefe da Secretaria do Planejamento da Presidência da República; o Exmo. Sr. Luciano Brandão, MinistroPresidente do Tribunal de Contas da União; Exmo. Sr. Syed Murad Ahmed Khairi, Embaixador da República do Paquistão; Exmo. Sr. Paulo César Cataldo, Consultor-Geral da República; Exmo. Sr. Ministro Pedro Gordilho, representante do Exmo. Sr. Ministro-Presidente do Tribunal Superior Eleitoral; Exmo. Sr. Ministro Mário Pacini, VicePresidente do Tribunal de Contas da União; Exmo. Sr. General de Exército José Ferraz da Rocha, MinistroChefe do Estado Maior das Forças Armadas; Exmos. Srs. Ministros aposentados do Tribunal Federal de Recursos, Djalma da Cunha Melo, GOdoy Ilha, Márcio Ribeiro, Moreira Rabello, Esdras Gueiros, Enoch Reis, Paulo Távora e Oscar Correa Pina; Exmo. Sr. Cel. José Saldanha Fábrega Loureiro, representante do Exmo. Sr. Ministro-Chefe do Gabinete Militar da Presidência da República; Exmo. Sr. Desembargador Antônio Honório Pires de Oliveira, Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal; Exmo. Sr. Desembargador Helládio Toledo Monteiro, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal; Exmo. Sr. Milton Menezes da Costa Filho, Procurador-Geral da Justiça Militar; Exmo. Sr. Cid Heráclito de Queiróz, Procurador-Geral da Fazenda Nacional, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Fazenda; Exmos. Srs. Subprocuradores-Gerais da Repúbli-
TFR - 90
ca, Paulo Sollberger, Hélio Pinheiro da Silva, Josêo Boabaid de Oliveira Itapary, José Francisco Rezek e José Arnaldo Gonçalves de Oliveira; Exmo. Sr. Desembargador Moacyr Sipaúba da Rocha, Presidente do Tribunal de Justiça do Maranhão; Exmo. Sr. Desembargador Jesus de Oliveira Sobrinho, Presidente do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul; Exmo. Sr. Desembargador Jorge Andriguetto, representante do Presidente do Tribunal de Justiça do Paraná; Exmo. Sr. Desembargador HeIí Ferreira Sobral, Presidente do Tribunal de Justiça do Piauí; Exmos. Srs. Juízes Federais, Jacy Garcia Vieira, Costa Filho, lImar Nascimento Galvão, Dario Abranches Viotti, Jesus Costa Lima, José Alves de Lima, Luiz Rondon Teixeira de Magalhães, José Kallas, Laurindo Dias Minhoto Neto, Fleury Antônio Pires, Jorge Tadeo Flaquer Scartezzini, Sebastião de Oliveira Lima, Anna Maria Pimentel Trístão, Paulo Pimentel Portugal, Homar Cais, Clóvis de Mello, Márcio José de Moraes, Caio Plínio Barreto, José Anchieta Santos Sobreira, Hércules Quasímodo da Mota Diás, Genival Matias de Oliveira, Orlando Cavalcanti Neves, Adaucto José de Mello, Jatir Batista da Cunha, Geraldo Barreto Sobral, Alberto José T. Vieira da Silva, José Anselmo de Figueiredo Santiago, Aristides Porto de Medeiros, Heraldo da Costa VaI, José de Castro Meira, Vicente Leal de Araújo, Araken Maris de Faria, Dionísio Rodrigues Nunes, Hervandil Fagundes, Agustinho Fernandes Dias da Silva, João Batista de Oliveira Rocha, Milton Luiz Pereira, Oswaldo Horta Aguirre, José de Jesus Filho, Manuel Lauro Volkmer de Castilho; llmo. Sr. Maurício Correa, ·Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção Distrito Federal; lImo. Sr. Américo Lacombe, representante do Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção do Estado de São Paulo; lImo. Sr.
Contra-Almirante Eduardo de Oliveira Rodrigues, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Marinha; Ilmo. Sr. Raimundo Antônio Espinheira Mesquita, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado dos Transportes; lImo. Sr. Luiz Cássio dos Santos Werneck, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Agricultura; lIma. Sra. Dóris Queiroz de Carvalho, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Educação; Ilmo. Sr. Geraldo Antônio Nogueira Miné, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado do Trabalho; lImo. Sr. Edelberto Luiz da Silva, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Saúde; Ilmo. Sr. Pedro Carrano, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Indústria e Comércio; lImo. Sr. Aníbal Craveiro, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado das Minas e Energia; lImo. Sr. Wilton Lopes Machado. repreSentante do Exmo. Sr. Ministro de Estado do Interior; Ilmo. Sr. Hélio Estrela, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado das Comunicaçôes; Ilmo. Sr. Francisco de Paula Salzano Vieira da Cunha, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Previdência e Assistência Social; Ilmo. Sr. Luiz Assumpção Paranhos Velloso, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado para o Programa Nacional de Desburocratização; lIma. Dra. Zeila de Castro Andrade Ribeiro de Mendonça, representante do Presidente da Associação Comercial de São PaulO; lImo. Sr. João Batista Morelo Neto, Presidente da Junta Comercial do Estado de São Paulo; Ilmo. Sr. Alcides Jorge Costa, Professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo; lImo. Sr. Geraldo Ataliba, Professor da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; Ilmo. Sr. José Anchieta Falleiros, Juiz do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo; Ilmos. Srs. Joaquim Antônio Bittencourt Couto e Leon Frejda Szklarowsky,
184 TFR - 90
Conselheiros do Instituto dos Advogados de São Paulo, Ilmos. Srs. Jefferson de Aguiar, Rubens de Barros Brizola, Henrique Fonseca de Araújo, Luiz Carlos Bettiol, José Luiz Clerot e outros advogados militantes no Distrito Federal, funcionários e membros da família.
Tribunal Federal de Recursos, 23 de junho de 1981 - Ministro Jarbas Nobre, Presidente - Bel. José Alves Paulino, Secretário do Plenário.
TRIBUNAL PLENO ATA DA 18? SESSÃO
ORDINÁRIA Homenagem póstuma ao Exmo. Senhor Ministro Afrânio Antônio da
Costa Em 28 de junho de 1979
Presidência do Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira
Aos vinte e oito dias do mês de junho do ano de mil novecentos e setenta e nove, às treze e trinta horas, presentes os Exmos. Senhores Ministros Armando Rollemberg, Márcio Ribeiro, Moacir Catunda, Peçanha Martins, Aldir G. Passarinho, José Dantas, Lauro Leitão, Carlos Madeira, Evandro Gueiros Leite, Washington Bolívar de Brito, Torreão Braz, Carlos Mário Velloso, Justino Ribeiro, Otto Rocha, Wilson Gonçalves e Sebastião Reis, Juiz Federal convocado, presente, ainda, o Dr. Secretário do Tribunal Pleno.
Ausentes, por se acharem licenciados para tratamento de saúde, os Exmos. Senhores Ministros Amarílio Benjamin e Jarbas Nobre.
OSr. Ministro José Néri da Silveira (Presidente): Srs. Ministros: Sendo esta a primeira Sessão do Tribunal, que tenho a honra de presidir, depois de empossado na Presidência da Corte, deveria proferir palavras inaugurais, naturalmente, de júbilo,
próprias de quem inicia, com otimismo, uma nova etapa de atividades. Tal, entretanto, não quis a Providência Divina ora ocorresse. Minhas palavras são para comunicar ao Tribunal um evento que muito o entristece, enlutando-o. Faleceu, ontem, no Rio de Janeiro, o primeiro Presidente do Tribunal Federal de Recursos, o ilustre Ministro Afrânio Antônio da Costa, aos 87 anos de idade. Recebi a comunicação da morte de S. Exa, quase às 12 horas de hoje. O sepultamento ocorrerá às 16 horas.
Adotei providências para que o Tribunal seja representado nos atos fúnebres, prestando-se ao ilustre morto nossas homenagens. Nesse sentido, solicitei ao eminente colega, Sr. Ministro Moreira Rabello, que, a todos nós associe às últimas homenagens ao saudoso magistrado, que tão grandes serviços prestou ao Tribunal Federal de Recursos e à Nação, transmitindo, pessoalmente, à família enlutada as manifestações de nosso pesar.
O Sr. Ministro Afrânio Antônio da Costa presidiu esta Corte, no período de 27-6-1947 a 30-6-1949. Foi durante essa primeira administração que efetivamente se instalou o Tribunal no Rio de Janeiro, havendo S. Exa. tratado da escolha da sede, que se fez definitiva, à Av. Presidente Wilson, 231, ocorrendo a inauguração a 28-6-1948, em ato solene' que contou com a presença do então Presidente da República, o eminente General de Exército Eurico Gaspar Dutra. Também, nessa gestão inaugural, a Corte teve aprovada a sua organização interna, definindo-se a estrutura de seus serviços. Muito contribuíram, assim, indiscutivelmente, a energia, a lucidez e a segurança com que dirigiu o Ministro Afrânio Antônio da Costa o Tribunal, nos seus momentos iniciais, para o prestígio de que, logo após, já passou, em realidade, este Colégio de Juízes a gozar, nos meios
TFR - 90 185
judiciários do país. Posteriormente, S. Exa. foi eleito para outro biênio que começou em 2-4-1959, findando em 3-6-1961. Coube-lhe, então, missao semelhante à que tivera no primeiro mandato. Nesse segundo período, deu-se a transferência do Tribunal Federal de Recursos, do Rio de Janeiro para a nova Capital da República. Em Brasília, os serviços do Tribunal instalaram-se sob a segura e inteligente direção do saudoso Ministro Afrãnio Antônio da Costa.
Os magníficos discursos que proferiu,ao ensejo de sua posse na Presidência do Tribunal, a 27 de junho de 1947, e da instalação da Corte, em sua sede definitiva, no Rio de Janeiro, a 28 de junho de 1948, esta na presença do Excelentíssimo Senhor Presidente da República, General de Exército Eurico Gaspar Dutra, bem positivam a estatura intelectual e moral, o descortino administrativo e a energia de empreendimentos do' primeiro presidente do Tribunal Federal de Recursos. Ao encerrar esse segundO pronunciamento, asseverou:
«Quis um feliz desígnio da Providência que no pórtico deste Tribunal se inscrevessem as palavras «Dieu et mon droit» - síntese da harmonia entre os homens, da serena confiança na justiça e naqueles que a distribuem. Não é apenas o lema de um povo que tem prodigalizado a todas as naçôes os mais notáveis exemplos de perseverança e resistência ao despotismo, mas, principalmente, um incentivo aos tímidos e aos fracos para que defendam seu Deus e seu direito.
Quem ama ao seu Deus e ao seu direito possui aquela fé que arrasta irresistivelmente montanhas, que torna o sofrimento mais suave e a vida mais cheia de encantamentos; que contém os fortes; que dá força aos humildes na defesa de sua crença, de sua liberdade, de sua família, de seu lar; de todas
essas belezas imponderáveis que constituem a alegria de viver e que fazem da prudência e da mode.ração a base do equilíbrio e da tranqüilidade social.
Este será, por certo, Senhores, o ideal dos magistrados que integram este Tribunal.» Ao término de seu primeiro man
dato presidencial, dele afirmou o então juiz convocado, Artur de Souza Marinho:
« ... durante perto de dois anos. tanto quanto este Tribunal tem de vida judicante, nosso Presidente, que ora se retira, foi o dínamo gerador de energias construtivas. E sobretudo no dia-a-dia de nossos trabalhos, como homem aparentemente rígido e às vezes empedernido, era a bondade que compreende e a amizade que perdoa, como um coração, às vezes comovido até às lágrimas, revela a exata personalidade que se esconde na austeridade. O dirigente de escol foi também o companheiro afetuoso com quem podíamos confidenciar.» Ao ensejo da sessão solene de ins
talação do Tribunal, em Brasília. a 22 de abril de 1960, evidenciando a sensatez e a firmeza do administrador, o amor à causa da justiça, sinalou:
«Não nos cabe apreciar a conveniência da data da mudança: simplesmente observar o preceito legal que a fixou para 21 de abril.
O aesconforto, os incômodos, os transtornos materiais, são problemas de ordem individual que. ferindo cada qual, não podem ser estendidos a qualquer das unidades do Poder Judiciário.
Em relação a estas, há considerar-lhes o funcionamento perfeito, dentro da dignidade que lhes deve ser atribuída e esta sempre foi, é e será rigorosamente cuidada pelos Membros desta Casa.
186 TFR - 90
Por benevolência dos meus colegas, pus em movimento este Colégio Judiciário em 1947. O açodamento de alguns e a impaciência de outros não me perturbaram, nem impediram que os trabalhos fossem iniciados no momento próprio e exato para corresponder, com precisão, à sua finalidade julgadora.
Em 1960, essa mesma benignidade confiou-me a transferência para Brasília. Não é tarefa de execução rápida e fácíl, mas há de ser vencida em forma apropriada, sem sacrifícios inúteis.»
Bacharel em Direito em 1912, por dezoito anos advogou no Rio de Janeiro. Vocação de magistrado, ele próprio o revela, ao explicar, em sua despedida do Tribunal, que, «apesar do êxito feliz que nela (advocacia) experimentei, os sedutores encantos da magistratura irresistivelmente me dominavam». Juiz de Direito, Juiz do Tribunal Regional Eleitoral do antigo Distrito Federal, Desembargador do Tribunal de Justiça do ex-Distrito Federal, Ministro desta Corte, havendo, por largos períodos como convocado, exercido o nobre ofício no Supremo Tribunal Federal, o Ministro Afrânio Antônio da Costa, em todos os momentos, foi um magistrado de escol, íntegro, lúcido, culto e inteiramente dedicado aos deveres de juiz, consoante se depreende de seus votos e dos anais desta Corte e do Alto Tribunal. Suas administrações foram marcadas pela dignidade, honradez e inexcedível espírito público.
Em 1962, em virtude da idade, atingido pela compulsória, S. Exa. deixou este Tribunal. Na oportunidade, homenageandO-O, em nome dos seus pares, dele disse o saudoso Ministro Cunha Vasconcellos: «O sentido humano, a influência do coração eram e nunca deixaram de ser a marca constante de todos os seus atos, de todas as suas resoluções.»
Juiz culto, trabalhador, probo, S. Exa. deixou seu nome ligado ao Tribunal, de forma indelével, com o respeito e a saudade de todos os que o conheceram e acompanharam sua ação.
Após a aposentadoria, o sentido humano de sua vida projetou-se, de forma ainda mais assinalada, sendo certo que, desprezando as possibilidades que teria de realizar atividades advocatícias e jurídicas, com o sucesso decorrente do brilho de sua inteligência e de sua imensa capacidade de trabalho, o Ministro Afrânio Costa dedicou-se a atividades beneficentes, presidindo, por muitos anos, a Provedoria da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro e também se dedicando a outras atividades de assistência social, na antiga Capital da República.
Ao fazer, dessa maneira, o presente registro, perante o Tribunal, do infausto evento, anoto, com emoção d'alma, que hoje desaparece um insigne juiz da Nação, que honrou sobremaneira esta Casa. Nos fastos do Tribunal Federal de Recursos, o Ministro Afrânio Antônio da Costa há de ser, permanentemente, figura brilhante e sua vida de magistrado um exemplo a seguir, pelas virtudes excelsas que exornaram seu espírito e pelo amor com que soube administrar a Justiça e servir à causa da Pátria.
Esta a comunicação que, com pesar, me cumpre fazer ao Tribunal.
O Dr. Gildo Corrêa Ferraz (Subprocurador-Geral da RepÚblica): Eminentes Ministros. o Ministério Público se associa às homenagens póstumas ora prestadas ao ilustre Ministro Afrânio Costa que durante muitos anos honrou com sua presença, este Egrégio Tribunal e o Colendo Supremo Tribunal, onde esteve em substituição muitas vezes, demonstrando sua vasta cultura jurídica.
TFR - 90 187
Ainda no Rio de Janeiro e nos primeiros anos em Brasília, mantive convívio agradável com o ilustre Ministro, homem de arraigada formação humanitária.
A família enlutada pedimos a esta Egrégia Presidência transmita as condolências do Ministério Público.
O Sr. Dr. Alcino Guedes da Silva (Advogado): Sr. Presidente, Srs. Ministros, estamos diante desse infausto passamento.
Como bem traduziu V. Exa., eminente Presidente, também os advogados de Brasília, e, porque não dizer, do Estado do Rio de Janeiro, nesta hora, estão abalados com esse passamento.
S. Exa. o Sr. Ministro Afrânio Antônio da Costa, que deixou marcas indeléveis, não só neste Tribunal, mas por onde passou traduziu aquele espírito humanista, e, como bem disse o eminente Procurador da República, todos o admiravam, era homem cumpridor de suas obrigações, portador de dotes inigualáveis, especialmente para o desempenho da Magistratura.
Em meu nome e em nome dos advogados de Brasília, estamos sensibilizados por esse passamento e pedimos a V. Exa. que, nesta oportunidade, faça chegar às mãos ou ao pensamento dos familiares as nossas condolências.
O Sr. Ministro José Néri da Silveira (Presidente): As palavras proferidas acerca da personalidade do Sr. Ministro Afrânio Antônio da Costa constarão da ata e serão comunciadas à família enlutada.
Senhores Ministros, embora ainda amanhã o Tribunal se reúna em Turmas para julgar, esta, antes do recesso, é a nossa última sessão plenária. Quero, pois, formular a todos os colegas votos de férias, no mês de julho, muito agradáveis, de plena re-
cuperação de tantos eSforços despendidos, para que no segundo semestre possamos todos prosseguir no nosso trabalho fecundo.
Desejo, assim, felizes férias aos eminentes colegas e ao ilustre Dr. Subprocurador-Geral da República, ao lado de suas excelentíssimas famílias.
Está encerrada a sessão. Tribunal Federal de Recursos, 28
de junho de 1979 - Ministro José Néri da Silveira, Presidente - Bel. José Alves Paulino, Secretário do Tribunal Pleno
TRIBUNAL PLENO
Homenagem alusiva à aposentadoria do Sr. Min. Márcio Ribeiro ATA DA SESSAO SOLENE
REALIZADA EM 18 DE DEZEMBRO DE 1979
As dezesseis horas do dia dezoito de dezembro do ano de mil novecentos e setenta e nove, na Sala de Sessões do Tribunal Federal de Recursos, presentes os Exmos. Srs. Ministros José Néri da Silveira, Presidente, Armando Rollemberg, Márcio Ribeiro, Moacir Catunda, Peçanha Martins, Jarbas Nobre, Aldir G. Passarinho, José Dantas, Lauro Leitão, Carlos Madeira, Gueiros Leite, Washington Bolívar, Torreão Braz, Carlos Mário Velloso, Justino Ribeiro, Otto Rocha, Wilson Gonçalves, William Patterson e Adhemar Raymundo, presentes, ainda, o Exmo. Sr. Doutor Geraldo Andrade Fonteles, Subprocurador-Geral da República e o Bel.: Ronaldo Rios Albo, Secretário do Tribunal Pleno, foi aberta a Sessão, especialmente convocada em homenagem ao Exmo. Sr. Ministro Márcio Ribeiro, em virtude de sua aposentadoria, por implemento de idade, a ocorrer no dia 25 de janeiro de 1980.
188 TFR - 90
Palavras de abertura proferidas pelo Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira - Presidente: O Exmo. Senhor Ministro José Néri da Silveira (Presidente): Quando este fecundo ano judiciário vai chegando a seu término, o Tribunal Federal de Recursos reúne-se, hoje, em sessão solene, para prestar homenagem justa, afetuosa e especial ao eminente Ministro Márcio Ribeiro.
Após mais de meio século de serviços públicos reíevantes. Sua Excelência deixará de concelebrar conosco, nesta Corte, cada dia, o sagrado ofício da administração da justiça, que exerce, com amor, dedicação exclusiva e inexcedível, ininterruptamente, há mais de quatro decênios.
Ao reiniciarmos os trabalhos judicantes, a 1? de fevereiro de 1980, a cátedra deste Tribunal, que o Ministro Márcio Ribeiro provê, desde 9 de junho de 1965, estará vaga, em virtude de sua aposentadoria, por implemento de idade, a acontecer no próximo 25 de janeiro.
A fim de interpretar os sentimentos de profunda admiração e carinho que todos, neste Tribunal, devotamos ao eminente Ministro Márcio Ribeiro, concedo a palavra ao ilustre Ministro José Fernandes Dantas.
Discurso proferido pelo Exmo. Sr. Ministro José Dantas.
Meus Senhores: A maior honraria devida aos jus
tos é a da crença, sem reservas, nos seus juízos. Duvidar da sua justiça humilha e martiriza, como maldosamente se fez ao Crucificado!
Então, tratando-se de juízos emitidos por dever de ofício, o prêmiO estará em proclamar-se, alto e bom som, a confiança dos jurisdicionados.
A boa fama, porém, requer tempo e experiência. No curso dos anos é que se vai lastreando, sem equívoco,
o prestigio do justo, investigada em cada gesto de sua vivência a razão maior da justiça praticada.
Donde dever-se, para compreensão da fama, repassar a trilha de sua fluência.
Na magistratura profissional, melhor conselho é lembrar como os grandes juízes se formaram nos percalços dos pequenos meios; na aldeia, onde a sentença solve as contendas dos seus própriOS vizinhos; onde as partes são pessoas do seu próprio dia a dia; onde as causas envolvem interesses imediatos do seu meio social, assim julgados os conhecidos e não os estranhos.
Testado desse modo, perante autor, réu, causa e interesse familiarizados numa semidoméstica aferição de valores, tranqüilize-se o juiz da roça de que o seu progresso na carreira não guardará surpresas, pOis a justiça mais difícil ali foi aprendida, no mais sofrido aprendizado humano - o de julgar, aí, sim, os verdadeiros semelhantes!
Meus Senhores: Iniciando-se na Comarca de Tupa·
ciguara - topônimo mineiro que, nos idos de 1938, parecia anunciar por si mesmo a correspondente modéstia do meio -, certamente que, na passagem ascensional por Bonfim, Uberlândia, e Ouro Preto, estava a se diplomar o Juiz de Belo Horizonte, de Varas Fazendárias, cuja importante jurisdição viria titular o Desembargador de 1953.
. Dali, ao recém criado Tribunal de Justiça da nova Capital Federal, o caminho já foi o da consolidada boa fama, tantas vezes testemunhada pelos jurisdicionados, diversifícados na escala da ambiência social de cada um daqueles estágios de vivência.
Daí porque, já em 1965, o ingresso no Tribunal Federal de Recurssos se deu ao magistrado amadurecido no trato das causas mais relevantes,
TFR - 90 189
conforme experiência mais completa das técnicas de julgamento e a compreensão mais responsável dos fins do Direito; em suma, deu-se ingresso ao magistrado, realizado na percepção mais aguda do alcance das leis.
Portanto, não foi por menos que, ao solenizar-se a posse, assim recitou as suas credenciais:
«Se a tecedura das leis cobrisse o campo dos fatos, prevendo todas as possíveis contingências futuras, ba~taria ao Juiz aplicar a norma cabível, sem medo ou sem favor. Mas isto não ocorre. Resta sempre grande margem ao arbítrio judicial, ao reconhecimento do direito, não pela legalidade estrita, mas pela aplicação dos grandes princípios que informam o pensamento jurídico, a superlegalidade, que fortalece e imanta a consciência do julgador.
Esta a nossa mais elevada missão: a de interpretar as relações jurídicas, iluminando, alargando o pensamento da lei, de maneira a que possa corresponder à evolução social e às novas necessidades do bem comum.
Não se exagere, porém, o alcance da jurisprudência, como atua lizadora e vivificadora do direito.
O juiz não atinge nunca o nível do legislador.
Se não está satisfeito com a orientação traçada pela lei, não lhe compete torcê-la, mas sim esperar ou propugnar para que os representantes do povo a modifiquem.»
A partir dessa profissão de fé, o Tribunal Federal de Recursos havia de habituar-se à prédica de tão nobres convicções, vendo-o praticá-las a molde de uma devoção, isenta do fanatismo acadêmico, pois nos debates mais acirrados a que fosse tentado, o pregador não intervinha, senão que na exata medida da correção de
um equívoco, do reparo de uma alusão, ou da retificação de um ponto de vista, da qual fosse convencido.
Nenhuma palavra a mais do que a necessária para a definição do direito em causa, ou para a obtenção do juízo sobre a relação jurídica examinada, deslindando-a, porém, em todas as nuanças interessadas ao vereaicto e a perfeita concreção da justiça suplica da.
Vejam-se-lhe os enunciados do pensamento, exsurgidos à face dos casos apresentados e no único fito de ajustar a sentença à dimensão humana e social do fato considerado; descubra-se-lhe o inato talento de pinçar a proposição básica ao desenvolvimento do discurso sentencial, afastando-o do abstrato para aproximá-lo da materialidade mais palpável do direito a proclamar. Confiram-se-lhe os votos, mesmo ao acaso, porque à exemplificação da excelência do conteúdo se prestará qualquer dos milhares que aqui proferiu.
Embevecido se satisfará o pesquisador, ainda que cingido ao moderno processo das amostragens, método assim mesmo suficiente ao enfoque da sabedoria das «Sentenças de Márcio» - a trescalar justiça pelas virtudes sugeridas, pela prudência da amoridade exercida, pela culta remissão aos principios, pelo domínio da humanização dos textos; tudo isso, na inspiração de uma doutrina sócio-juridica aplicada a seu modo de simplificar as coisas, e compreendida na asserção de que: no conflito das relações indíviduo-Estado, o contrapeso mais fiel é a justiça da sentença.
Ver-se-ia que essa súmula não se contruíra de formulação meramente teórica; frutificara, sim, de uma penosa objetividade, experimentada no manuseiQ de autos cujas folhas, na dor famélica dos carentes das pres-
190 TFR - 90
tações alimentícias ou dos sonegados salariais dos órgãos públicos, suplicam amparo, como gritam, de outras vezes, o protesto dos perseguidos do poder, violados os seus direitos e liberdades por abusivas práticas da autoridade; autos que, enfim, rogam a mercê da solidariedade social, narrando histórias infamantes da dignidade humana e pedindo respeito a valores espirituais que nem sempre restam protegidos na fria letra da lei.
Somente o bom juiz, tal como Márcio procedeu, há de indicar lenitivo a tantas angústias, prevenindo-se, porém, contra os embusteiros, individualistas misturados aos desvalidos para se dizerem vítimas, quando algozes verdadeiramente o são do interesse público - valor que a lei protege a nível da mesma importância do bem comum.
Senhor Minístro Márcio Ribeiro: Em se honrando os justos pelo
confiar-se na emissão de seus juízos, foi para conferir-lhe a honraria que reservamos esta reunião da Corte.
No cometimento, é tal a alegria de proclamar a provada confiança na jurisdição do agraciado, que até removemos para depois a pena de iminente perda do seu convívio funcional; pena que se exacerba pelas apreensões do momento em que se dá a jubilação etária de V. Exa., ao cabo de mais de meio século de serviço pÚblico e quarenta anos de magistratura.
Deveras, pesam as preocupações do momento. De um lado. por emanarem do evolver da massificação de tensões sociais acumuladas, e de anseios nacionais em ebulição. sob perspectivas agravadas até mesmo pelas conotações polí ticas de origem internacional. O indiscutível declínio do petróleo, causa primária desse sombrio quadro sócio-econômico, fatalmente lançará reflexos nas barras
deste Trihunal, consoante a sua competência institucional para pacificar o envolvimento da Administração Pública Federal no torvelinho daquelas tensões conseqüentes.
De outro lado, o próprio Tribunal se apresta a recompor-se. pela renovação de um terço dos seus integrantes. Natural, portanto, é o receio dos ajustamentos, conforme a dificuldade maior ou menor da absorção de suas técnicas de julgamento, realçadas como ponto de referência das orientações mais cristalizadas, e como fato que importa, sobremodo. ;:J.O
resguardo da sua gloriosa tradição. Em ambos os planos, pois.
prenuncia-se ainda mais sensível a ausência de V. Excia., primus inter pares na paciente elaboração de uma crônica jurisprudencial tonificada de independência, integridade e coragem, e assim cultuada pelo Tribunal. sem jactâncias.
Em tais circunstâncias, Senhor Ministro, esta nossa homenagem. antes de marcar a despedida - do companheiro de afável trato. do amigo de pródiga lealdade. do cidadão de inigualável conduta. predicados tão necessários à manutenção da proverbial harmonia da nossa convivência. - antes disso. na verdade, esta homenagem tem o cunho de uma revigoração de propósitos.
Endereçando-a ao juiz, o que querem os eminentes pares é reafirmarem-se como discípulos da grandiosa judicatura que V. Excia. exerceu nesta Casa; o que celebram é o ritual de fé no Direito e na Justiça, numa cerimõnia iluminada pelo exemplo de V. Excia .. como figuração da última ceia que o Nazareno presidiu. pactuando-se ali a eternização da sagrada mensagem que os Evangelhos haveriam de remeter para os séculos sem fim.
Noutro recurso ao simbolismo. a gosto da nossa carinhosa amizade.
TFR - 90 191
tenha certeza V. Excia. de que, no espaldar da cadeira que honrou e que em breve deixará vaga, haveremos de ler, gravando-a na memória do Tribunal, a inscrição que o nosso respeito insculpiu, a legenda que a nossa admiração consagrou; havere· mos de ler o epíteto que o seu mere· cimento inspirou: Márcio, o Justo!
Discurso proferido pelo Exmo. Sr. Doutor Geraldo Andrade Fonteles, Subprocurador-Geral da República. Por imperativo constitucional, atinge V. Exa. o fim da sua carreira na magistratura. Por isso, encontramos-nos, nesta sessão solene, para apresentar-lhe merecida homenagem, à qual, como representante do Ministério Público Federal, nos associamos. e, particularmente, com repassada emoção, só por esta, - ditada pelo íntimo do sentimento. - me considero capacitado para, fa-lando, prestar acerca de sua personalidade. o testemunho pessoal, fiel e enternecido que o seu modo de ser impôs à minha profunda admiração e respeito.
Gostaria de não ter tido dias tão atribulados, pelOS enormes encargos na Subprocuradoria-Geral da República. neste fim de exercícío, para tecer, com melhor exaltação, os fios deste pano que desfraldo, qual lenço branco de despedida, no alvoroço de tantos pensamentos e recordações, onde se sobrelevam os traços característícos de sua humildade e Simplicidade que a todos encantam.
Quero imprimir a este discurso um tom peculiar, não como dirigido da nobre tribuna do foro, porém, figurado, como se proferido de um púlpito, porque desejo realçar, mais as virtudes do homem do que as qualidades cio jurista. embora no aferir dos dois valores a amálgama se dose em perfeita sintonia, na destinação do fim almejado. No caso, o instrumento de realização da judicatura, em busca do prImadO do Direito e da Justiça.
Com efeito, tal como dito alhures, por Chateaubriand, V. Exa. foi dentre os grandes juízes dos Tribunais Superiores com os quais privei, quase o único a se parecer com as próprias obras.
O que sempre deu vida. força e retidão às suas decisões é a sinceridade com que foram proferidas e que. sem dúvida, constituíram a razão impoluta do direito nelas declarado.
V. Exa. sempre pautou as diretrizes dos seus julgamentos numa sistemática jurídica. anuindo à essência da legalidade, e jamais se inclinando à substituição do arbítrio pela regra: do sofisma pelo título jurídico: da argumentação empolada ou acadêmica. pela realidade dos fatos subsumidos às normas; das falsas estórias e pretextos que se invocam. pela verdade dos propósitos:. das falsas ciências que se exploram, pela realidade dos fins.
V. Exa. pode ostentar a austeridade de Catão, sem, todavia, vestir-lhe as vestes da retórica ou da eloqüência, porque dele mais se lhe adaptam o manto da moralidade e da tradição. V. Exa. menos comunica, porque sua ação mais irradia.
Quisera eu que, o quanto tenho dissertado sobre nomes ilustres com vivência nesta Casa, pudesse contribuir para a sua história e então, qual Plutarco da intelectualidade grega, tornaria este registro, em índice de colaboração, à maneira de como se utilizava o polígrafo da Grécia, para ~xtrair ensinamentos do mais alto teor de moralidade, da judiciária, de que V. Exa. - pessoa ou Juiz -se fez varão impertérrito, a insculpir um perfil ímpar.
Em suas sentenças ou votos se encontram gemas preciosas, não tão grandes que absorvam, no conjunto, o adereço capaz de atrair a cobiça elos ególatras, mas tão valiosas, tão impregnadas de equilíbrio na mensuração de seus fins, que comovem os
192 TFR - 90
puros e se alçam em flocos de luz, como a servir de auréola à sua imagem imorredoüra. Ela, se não perpetuada pelo cinzel,)lo bronze ou nos materiais imarcescíveis do reino mineral, há de ficar, pelo sinete nobre do sentimento, gravado, idelevelmente, no coração de seus pares, contemporâneos, amigos e familiares.
É que, todas essas peças de jurisdição se oferecem à análise dos probos à maneira cristalina, polida ao . sopro do amor e do senso de justiça.
A compulsória lhe bate à porta, encontrando-o rijo e altivo. Higidez cunhada na temperança, de que extraiu todo o vigor pela missão cum· prida galhardÇl.mente. Altivez fórjada na oficina do trabalho, onde se conjugam as várias atuaçÕeS de quantas participam do seu mister, recebendo de sua presença o trato ameno que conforta na procela, e bem assim a serenidade que dá segurança na tormenta.
Essas facetas de sua individualid.ade lhe dão aquela característica de timoneiro, que sabe governar com firmeza e descortíno a nau onae navegam os conflitos de todos os matizes.
Pilotando o veículo do direito, em busca da justiça, V. Exa., Sr. Ministro Márcio Ribeiro, sempre foi aquele trabalhador solitário como convém ao Juiz, já o disseram - recolhido na intimidade de sua consciência, para bem lastrear o caminho percorrido, deixando uma esteira aberta e bem delimitada na jurisprudência de suas decisões, que servirão de modelo à orientação dos que desejam bem alcançar a meta do caminho traçado.
Hoje, ecoam neste areópago da justiça, uníssonos, todos os cânticos de louvor que engalam a solenidade.
. No íntimo de todos os presentes, percute melodia sinfônica, cujos sons
marcam a recordação de sua vida exemplar entre estas paredes, estas bancadas de auditório, na Cruz da magistratura e, no. sufoco de suas imobilidades retêm, nesta despedida, a soturna indefinição dos inanimados, da mesma forma por que, nós outros guardamos, com emoção compungida, a saudade emocional do vulto queridO e admirado que parte.
Deus abençõe a continuidade de suas virtudes.
Discurso proferido pelo Exmo. Sr . Doutor José Paulo Sepúlveda Pertence, Vice-Presidente do Conselho' Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.
Tendo discursado na última solenidade judiciária aqui realizada, talvez devesse entregar a outro colega a missão de representar o Conselho Federal da Ordem dos Advogados nas homenagens de despedida do eminente Mímstro Márcio Ribeiro. Escusem-me o Tribunal e os colegas se não o fiz. E mais, se não pude fazê-lo por razões de ordem marcadamente pessoal: uso hoje esta tribuna, menos para trazer a justa saudação dos advogados brasileiros ao grande jUiz que se retira, que para expressar a emoção do j á distante ginasiano belorizontino que fui e para quem - freqüentando-lhe a casa, pela amizade com os seus filhos - o Dr. Márcio constituiu a primeira e inesquec.Ível encarnação da imagem de um magistrado. Serenidade-imperturbável a dar idéia de mansa tranqüilidade de consciência; poucas palavras, bastantes, porém, para transmitir bondade e tolerância; dignidade natural, avessa a todas as pompas estéreis do poder, tudo nele compunha com harmonia a figura humana adequada à.legenda, jamais desmentida, do juiz visceralmeme probo e mdependente, já entao re~peitada sem dissidência, por um Forum, predominantemente udenista, onde, a princípio - - contaramme ~epois - se havia posto olhos de
TFR - 90 193
maledicência na ascensão do jovem magistrado, porque sobrinho do onipotente governador do Estado Novo. Guardei comigo aquela primetra imagem revelada do adolescente, dE. um juiz exemplar e, . à distância, a venerei, como um dos estímulos ao estudante de Direito que me fiz, até o imprevisto reencontro na recém nascida Brasília.
Hoje, trinta anos se passaram. O advogado, já veterano, revive, com saudade comovida, o tempo corrido. E relembra, com tristeza, as muitas ilusões do adolescente de então que a caminhada desfez. Mas, em meio aos destroços de tanto~, mitos caídos, aflora uma emoção confortadora: é a de verificar que a experiência de hoje nada tem a corrigir na intuição do menino que pressentiu estar conhecendo em Márcio Ribeiro, não apenas o que era, mas o que deveria ser um juiz.
Reli, nos últimos dias, dezenas de acórdãos seus. Colhi o testemunho de colegas assíduos às salas de sua judicatura. Recordei-o Desembargador, Ministro e Presidente deste Tribunal, em sessões de rotina e em honras memoráveis. Sempre o mesmo. A m~sma calma, ainda auando em melO à exaltação; a mesma SerIe· dade sem empáfia, de raro em raro dando lugar a traços de finíssima ironia, incapaz de ferir; a mesma clareza de raciocínio, em cada um dos seus votos modelares, não obstante a síntese e o despoj amento de mostras de erudição, imperativos de sua confessada timidez e de sua modéstia invencível. Tudo isso dando forma a uma judicatura marcada por. extrema coerência de métodos e de convicções sobre a função judio clal, à qual dá força invencível em sentido de independência natural, que é talvez o marco dominante da vida de juiz de Márcio Ribeiro: nele, a independência não é uma qualidade, não é um compromisso declara-
do em arroubos retóricos, é a essência mesma. do seu modo de viver a magu::~n:llura.
Sr. Ministro Márcio Ribeiro, em discurso de 1949, recordado quandO de sua posse na presidência deste Tribunal, refletindo sobre as dificuldades do magistrado em meio às mutações de nossa época, acentuou Vossa Excelência:
«Nada existe de estável, e o Juiz, para não fracassar entre as seduções das doutrinas da moda ou sob a pressão de tremendos interesses em jogo, só encontra refúgio nas velhas virtudes morais de independência, de serena energia e de imparcialidade, esclarecido pela perspicácia de espírito e alertado pelo sentimento de solidariedade humana».
HOje, na sua despedida, honra-me ser o intérprete de todos os advogados que, tendo postulado perante V. Exa., podem e querem dizer-lhe que a sua longa carreira judicial foi, toda ela, um testemunho permanente dessas velhas virtudes morais e que a Nação, reverentemente, lhe agradece o exemplo deixado aos juízes do futuro.
Discurso proferido pelo Exmo. Sr. Doutor Galba Menegale, representante da Ordem dos Advogados do Brasil.
A Ordem dos Advogados do Brasil saúda em Vossa Excelência, Senhor Ministro Márcio Ribeiro, os valores imperecíveis da honra, do saber e da simplicidade.
Consigna Montaigne, em seus Ensaios, que as grandes virtudes não são perceptíveis senão quandO ponteadas, infladas e cheias de artifícios. As que se escondem sob a pureza e a modéstia, facilmente escapam a uma vista grosseira como a do comum dos homens. «Sua beleza é delicada e oculta», assinala com sutileza o filósofo, para aduzir que
194 TFR - 90
somente a visão perspicaz e límpida pode captar-lhe a luminosidade secreta.
Vindo de Minas, como Vossa Excelência, do «pedaço da terra em que o amor à liberdade e o culto da ordem fazem de cada homem um político e um jurista», armou-se, por certo, o Ministro Décio Miranda da ótica mais propícia a conhecê-lo melhor do que muitos.
Daí, haver asseverado a seu respeito, que foram as qualidades morais e, particularmente, a mais rude independência, que fizeram o Magistrado, depois que a investigação paciente e o estudo diário modelaram a consciência do jurista, tão cedo quanto lhe delinearam a devoção ao Direito.
Cedo, alías, lhe sugeriria o pai o estimulo à sua inclinação, como comovidamente vinha Vossa Excelênc.ia a invocar, ao ingressar nesta Corte: - «A lei deve ser para os povos - e certamente para os indivíduos - uma espécie de divindade»
Não suspeitava o antigo tribuno mineiro, nos idos de 35, que a vivacidade do filho, ainda moço, se aguçava na enumeração dos exemplos:
«Os romanos nunca revogaram a sua primeira lei, ou a lei das doze tábuas. Os ingleses mantêm em vigor as leis do tempo de João Sem Terra, e a já secular Constituição da Filadélfia vigora ainda neste momento, nos Estados Unidos».
Trinta anos depois, cabia a Vossa Excelência glosar o ensinamento paterno:
«O juiz não atinge nunca o nível do legislador. Se não o satisfaz a OrIentação traçada na lei, não lhe compete torcê-la, mas apenas esperar ou propugnar que os representantes do povo a modifiquem».
Ser vivo que é, suscetível de modificar-se, como qualquer orga-
nismo, e assim evoluir, a sociedade se depara a cada passo do seu desenvolvimento com uma necessidade nova e peculiar a atender. A transformação asfixia indivíduos e povos, as fórmulas de convivência e de sobrevivência parecem desaparecer.
Assinala Vossa Excelência, nessa constatação, que há os que não podem ou não sabem aceitar a própria condição existencial do homem. A esses, pondera Vossa Excelência, lhe ocorreria a resposta de George Sand a Flaubert:
- «Muitos espinhos há nas moitas, e isto não impede de ali alcançar as mãos e buscar as flores. Certo, se não levamos a coisa deste modo, não podemos levá-la de modo algum».
Para Vossa Excelência, o que enseja aceitar a condição existencial é a perSistência cristã, que ativa a solidariedade, proporciona o amor e resulta na caridade.
No ato mesmo da sua posse nesta Casa, acresceria ainda a observação de que as freqüentes reformas legislativas não conseguem acompanhar o ritmo de uma época de intensa e inusitada renovação. O espírito atilado e arguto do conhecedor do Direito compreende, porém, como corresponder à evolução social e às necessidades do bem comum:
- «Se a tecedura das leis - aduz Vossa Excelência - cobrisse o campo dos fatos, prevendO todas contingências futuras, bastaria ao juiz aplicar a norma cabível, sem medo ou favor. Mas isto não ocorre. Resta sempre grande margem ao arbítrio judicial, ao reconhecimento do direito e não pela legalidade escrita, mas pela aplicação dos grandes princípios que informam o pensamento jurídico, que fortalece e imanta a consciência do julgador».
Sereno e austero, coube-lhe questionar, numa das assentadas deste
TFR - 90 195
Tribunal, sob as sombras do regime que obscurecia o país, a validade da aplicação de uma pena restritiva da liberdade, imposta ao impulso de um processo sumário, do qual se extirpara o direito de defesa plena, tal como pobre e retrogradamente se reconheceu facultar a uma das leis de emergência.
Razões de Estado foram invocadas para decretar-se o domicílio determinado de pUjante Jornalista, com base no art. 16, inciso IV, do Ato Institucional n? 2. O Delito era tipicamente de opinião, numa pUblicação datada de 19 de julho de 1967, considerada ofensiva ou inconveQ..iente ao regime militar vigorante.
Com firmeza, lucidez e destemor, recusou-se Vossa Excelência a convalidar a medida punitiva que a isso equivalia e que lhe pareceu calcada em norma revolucionária não mais incidente, a partir da vigência da Constituição de 1967.
«E basta que pena tão grave tenha sido imposta em conseqüência de processo sumário, sem plena garantia de defesa, para que se considere tal medida nula, por manifesta incompatibilidade com os §§ 15 e 16 do art. 150 da nova Constituição, decretada e promulgada a 24 de janeiro último. E, na atual emergência -sentenciava, ainda, Vossa Excelência - ofende claramente o art. 154, § 2?, do mesmo diploma, onde a pena ficava dependendo da declaração do estado de sítio».
De Vossa Excelência, em outra oportunidade, se conheceu também manifestação contrária à censura prévia que este Tribunal pusera a pique, mas que a tempo um decreto, sem pUblicação regular, alçou à tona, para infestar por mais tempo as águas turvas daquele período trevoso da História.
Mais recentemente, o discernimento e a isenção de Vossa Excelência
continham os desmandos da censura vesga que negara autorização para a encenação de uma peça teatral, a pretexto de que se punha em risco a Segurança Nacional. E não se contentando com a simples referência e críticas dos censores ao texto decidiu-se a lê-lo por inteiro. De pronto firmou a convicção divergente dos juristas oficiais e restituiu ao grupo teatral postulante o direito de encenar «O rei morreu, viva o rei», assegurando nada ter visto na obra de César Vieira contrário ao interesse naciorral, ao prestígio das Forças Armadas, ou capaz de alimentar preconceito racial, como pressurosamente afirmara a Censura.
Deploram os advogados brasileiros que a contingência constitucional o prive da Toga, no instante em que se cede espaço para a cristalização dos anseios da Nação, e particularmente da sua perseverante e altiva entidade de classe, em favor da volta ao Estado democrático. Fora da Democracia - já se fez jargão dos juristas -não há salvação.
Para alcançá-la, plena e incontroversa, recomendam os advogados a convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte. A Constituição de 67, posto que sucessivamente emendada ao sabor da sorte revolucionária, recebeu, já, o estigma implacável do mais sábio dos nossos jUristas. Nela viu Pontes de Miranda mais subversividade do que revolucionariedade.
«O que importa - disse ele -, para o futuro merecido do Brasil, é que os governantes tenham os olhos fixos nos direitos do homem, nos interesses nacionais, no que se precisa de ciência e de técnica. Para isso, o essencial é que se corrija a falsificação de valores, que se implantou desde 1930, se agravou em 1937 e chegou ao auge em 1964/1969».
Tal como estamos, é ainda atual o libelo que Sampaio Dória escreveu
196 TFR - 90
em 1924: «A Nação é soberana, mas não decide. O povo é livre, mas vive debaixo de governos que não escolhe».
Quando se restaurar a plenitude do Estado democrático, talvez se faça, efetivamente, a reforma do Poder Judiciário, aquela de que seriamente tratou no adendo à proposição governamental encaminhada ao Congresso em 1977, este Egrégio Tribunal Federal de Recursos, afinal lograda pela obstinação de um uni co homem.
Senhor Ministro Márcio Ribeiro.
O tempo, relicário das múltiplas emoções que se sucedem no espírito dos homens, é, no dizer dos poetas e dos filósofos do Romantismo, a oscilação contínua entre a esperança e a saudade. Expressões díspares da sensibilidade humana, que se opõem entre si e se repelem, antagônicas por natureza, na essência e na forma, não podem, por isto, subsistir a um só tempo e sob a mesma inspiração.
Nesta hora em que o Tribunal Federal de Recursos recebe de volta, das suas mãos probas, a Toga que o seu espírito engalanou, os advogados do Brasil querem, tão-somente, trazer o testemunho de que Vossa Excelência jamais faltou à Justiça, com a sua honra, com o seu saber e com a sua simpliCidade.
Discurso proferido pela Dra. Thereza Helena Miranda Lima, representante dos Funcionários do Tribunal. Trago, aqui, neste momento, uma palavra singela, mas plena de amizade, respeito e gratidão: a palavra dos que, nesta Egrégia Corte, serviram com Márcio Ribeiro. Permito-me dizer, apenas Márcio Ribeiro, porque os grandes homens não carecem de títulos: apresentam-se por si mesmos.
Sobre os méritos profissionais do homenageado, bem como sobre a figura do Juiz excepcional, vocacionado, reconhecida e aplaudida em todo o Brasil, já disseram os ilustres oradores ouvidos neste Plenário.
Desejo, portanto, em nome de meus colegas e em nome da equipe que teve a honra, o privilégio de assessorá-lo por dez anos, dizer da figura humana do nosso Ministro Márcio, chefe, apoio, exemplo, e às vezes, porque não dizê-lo, quase pai, nos momentos difíceis.
Os exemplos diuturnos, de honradez, de dignidade, de firmeza, de amor à coisa pública, de simplicidade, que recebemos do Ministro Márcio Ribeiro, não deixarão nossas memórias; seguirão conosco, a nos guiar, vida afora.
A modéstia desse Chefe excepcional, modéstia digna que só os homens de prol podem ostentar, sua boncade espontânea com os humildes, seu amor ao próximo, seu profundo senso de justiça, seu equilíbrio, marcaram nossa juventude eomo, estou certa, marcaram todos quantos neste Tribunal com ele serviram.
Márcio Ribeiro nos ensinou, ao longo desses anos, que a fortaleza de ânimo e de opinião. podem conviver com a doçura e a compreensão: que a dignidade dos cargos pode e deve conviver com a simplicidade de seu ocupante. Principalmente, mostrounos que são os homens que engrandecem as posições a eles confiadas: ele emprestou, com suas qualidades pessoais, grandeza ao cargo de cujo exercício hoje de despede, para tristeza de todos nós.
Foi uma lição de imensurável valor. Ministro Márcio, e não será esquecida.
Não me alongarei: a emoção, realmente, não me permitiria. Mas, antes de concluir, devo dizer que esta
TFR - 90 197
laIa não estaria completa sem lembrarmos~ aqui, a mulher admirável, a esposa amada de Márcio Ribeiro: Dona Diva Paraíso Ribeiro, a sua companheira de quarenta e três anos percorridos em amor cristão, quarenta e três anos de apoio, de carinho, nos quais construíram uma sólida e invejável família.
Nosso profundo respeito a ambos, respeito mesclado de amizade e gratidão imensas.
Ao Chefe admiráveL ao homem exemplar, ao admirável Juiz, nosso comovido muito obrigado.
Discurso proferido pelo Exmo. Sr. Ministro Márcio Ribeiro. Sr. Presidente, Srs. Ministros: ilustres autoridades componentes da Mesa, minhas senhoras e meus senhores:
E quase com surpresa que chego ao limite de idade, ao termo de minha vida como Juiz.
No gosto pela profissão, identificar-me-ia ainda com aquele que, há mais de 40 anos, desde 1937, exerceu a judicatura estadual, em comarcas do interior mineiro. Tupaciguara, Bonfim, Uberlãndia, Ouro Preto e, por uma decada, na Capital do Estado. Por pouco tempo, havia sido, antes, Promotor de Justiça de Três Corações (933) e Oliveira e Procurador da 6~ Região (Minas e GOiás), do antigo IAPC. Em 1953 vi-me investido comu Desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, onde estive perto de 8 anos, passando, em 1960, com a criação de Brasília, ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal. A 9 de julho de 1965, já lá vão 14 anos, tive a honra de ser nomeado para este Tribunal, no governo do saudoso Presidente Humberto de Alencar Castelo Branco, a cuja memória, rendo, neste momento, minha reverente homenagem.
Neste Tribunal. de que passei a participar, como disse, há 14 anos,
completou-se o período mais agradável de minha profissão, pelo ambiente de gentileza e afinidades espirituais entre seus componentes, os antigos e os modernos. todos sob a mesma aura de entendimento e compreensão a fim de levar avante a pesadíssima tarefa que ainda vos incumbe. O ambiente -desta casa, o convívio entre colegas irmanados em torno do mesmo ideal ameniza a solidão que é própria da profissão de Juiz, obrigado ao recolhimento da intimidade de sua consciência.
Foi um privilégio, no final de minha carreira, já enfraquecida a capacidade de trabalho e de discernimento, fazer parte de um colegiado de importãncia e valor inconstestáveis. no cenário jurídico do País, sem dúvida «um dos órgãos mais prestigiosos e acatados do Poder Judiciário brasileiro».
Por mim, dentro de minhas limitações, que são muitas, procurei não desmerecer da honrosa companhia de Juízes paradigmas de honradez, competência e dedicação ao trabalho.
Relembro, neste ensejo, o nom(c daqueles que conheci, com os quaiS convivi e que já desapareceram do número dos vivos: os saudosos Ministros Sampaio Costa, Cunha Vasconcelos, Oscar Saraiva, Afrãnio Costa e Amarílio Benjamin.
A Justiça, já tive ocasião de dizer, é, sobretudo, um ideal, uma meta, exigindo esforço diuturno para sua realização que depende de minudente eSforço, de cultura e intuição: a capacidade de sentir e viver um a um os dramas sujeitos à apreciação de cada julgador.
Carlos Maximiliano, citando Jellinek e Gnür, consegue realçar as duras lutas do Juiz como aplicador do Direito. fazendo este confronto:
«Comparável seria o magistrado ao violinista de talento que procu-
198 TFR - 90
ra compreender bem a partitura, imprime á execução cunho pessoal, em brilho particular, decorrente da própria virtuosidade; porém não se afasta dos sinais impressos; intepreta-os com inteligência e invejável maestria; não inventa coisa alguma». Entretanto, acrescenta aquele
grande autor, em sua conhecida Hermenêutica:
«Ninguém ousará dizer que a música escrita, ou o drama impresso, dispensem o talento e o preparo do intérprete. Este não se afasta da letra, porém dá ao seu trabalho cunho pessoal, e faz ressaltarem belezas imprevistas. Assim o Juiz: introduz pequenas e oportunas gradações, matizes vários no texto expresso, e, sob a aparp.ncia de o observar á risca, em verdade o melhora, adapta às circunstâncias do fato concreto, aproxima do ideal do verdadeiro Direito. Deste modo ele desempenha, á maravilha, o seu papel de intermediário inteligente entre a lei e a vida».
Essa a verdadeira e difícil missão do Juiz.
No plano político, por um imperativo de isenção judicante o Poder Judiciário deve ser colocado em nível superior, é algo de exterior ao próprio Estado, na expressão de Burke, lembrada pelo saudoso Ministro Oscar Saraiva. ao inaugurar este edifício.
Interessa ao Judiciário sobremodo a preservação do estado de Direito.
Nesta época de conturbação social quisera pOder ter o otimismo d~ Aquilino Ribeiro, neste desabafo de sua agitada vida:
«Vi a liberdade afogada, aqui e além, ás mãos de Galiban, mas tamoem vi essa planta, que tem
um poder incoercivel de vivificaCão como a Fénix, reverdecer aqui e além.
Ouvi o «Sputinik», como todos vós, cantar no céu a glória do homem conquistando o espaço sidéreo e, com mais essa conquista do homem, as idéias de igualdade humana ganharem tanta altura, que não há machado que as derrube».
Nem a proeza do Apolo II, a con-quista de um mundo morto fora de nossa biosfera, nenhum aperfeiçoamento técnico desse tipo, poderia levar o mundo á compreensão dos três caminhos necessários á felicidade do homem: Democracia, Liberdade, Igualdade.
Além do aperfeiçoamento das almas, o caminho está em fazer a explicitação dos princípios, transformando-os em instituições jurídicas que possam ser observadas por todos.
Srs. Ministros, na perspectiva de aumento deste Tribunal, solução que. a meu ver, não bastará á avalanche de seus trabalhos, possam estes dipor sempre da mesma ambiência ,a ~im de que v. Exas. prossigam, de ammo desperto, na imensa tarefa jamais concluída pelos indíviduos ou pelas gerações, a Justiça que é, menos realidade do que sentimento, eterna procura dos homens.
. O meu agradecimento sem limite, as palavras do Ministro José Fern~ndes Dantas que se revelou admiravel vocação de magistrado, continuando neste Tribunal a justa fama - de sua cultura jurídica, capacidade de trabalho e equilíbrio - conqUistada em brilhante carreira, notadamente no Ministério Público do Distrito Federal e da União; ao Subprocurador-Geral, Dr. Geraldo Andrade Fonteles, um dos mais destacados elementos do Ministério Público da União, sempre cônscio de
TFR - 90 199
seus deveres, aliando à alta competência a plena consciência de suas responsabilidades.
À classe dos advogados sempre devotei o apreço e a simpatia que merece essa nossa inestimável colaboradora. São os advogados as «antenas da Justiça», como já os ouvi chamar, quando da saudação a um grande Juiz, o Dr. Newton Luz e nunca me esqueci dessa classificação que exprime, vivamente, como a classe é indispensável à pesquisa da verdade jurídica.
Ela se acha aqui excelentemente representada pelo Dr. Galba Menegale, cuja perfeição na defesa das causas que lhe são afetas, configura modelo do bom profissional, perfeitamente identificado com a nobilidade e difícil profissão.
A minha profunda gratidão também a V. Exa., Sr. Presidente, e a toaos os meus eminentes e estimados colegas.
Agradeço, ainda, a presença, nesta solenidade de despedida, dos Juízes Federais, Desembargadores, Juízes, Subprocuradores e Procuradores da República, membros do Ministério Público, advogados e a todos os amigos que muito me honraram nesta hora, e especialmente aos funcionários da Casa, incluídos os do Conselho,dos mais graduados aos mais modestos. De mim, repito, ao termo da jornada, nada encontro que justifique tanta bondade.
Mas as agradáveis palavras ouvidas tornarão mais suave a minha saudade deste recinto, ao qual espero retornar freqüentemente como amigo de todos.
tas e formosas palavras se proferiram sobre a personalidade de um juiz insigne da Nação, membro de seis Tribunais, a dois havendo presidido, Corregedor-Geral da Justiça Eleitoral e da Justiça Federal, não posso deixar de asseverar, com emoção - testemunha que fui durante dez anos das atividades judicantes do Ministro Márcio Ribeiro nesta Casa, que ele realizou o pensamento do Grande Ruy, ao proclamar: «só há uma glória verdadeiramente digna deste nome: é a de ser bom». O eminente Ministro Márcio Ribeiro que é portador de todas as excelsas virtudes do magistrado e as pratica inexcedivelmente· com a lucidez de sua inteligência, com a integridade de caráter e independência no desempenho do difícil múnus de julgar, soube, verdadeiramente, ser justo e bom, e, na aplicação da lei, comprovar o que Carnelutti escreveu: «o Direito é uma das formas que toma o amor para obrar entre os homens», ou o que disse Santo Ambrósio: «não há justiça sem misericórdia».
Estou seguro, assim, nos anos do futuro; de que a Divina Providência lhe há de reservar, longos e também 'muito fecundos, no seío de sua dileta família, na companhia de sua adorável esposa, dona Diva Paraíso Ribeiro, de seus filhos e netos, o Ministro Márcio Ribeiro poderá prosseguir, com o coração pleno de felicidade, contemplando a beleza eterna da Justiça e do Amor, na certeza da indefectível promessa. que está no livro dos Provérbios (20, 21):
«O que exerce a justiça e misericordia encontrará a vida e a glória».
Palavras de encerramento proferi- Cumpre-me, ainda, informar ao das pelo Exmo. Sr, Ministro José '. Tribunal que, por motivo de força Néri da Silveira - Presidente. O Ex- maior, não foi possível realizar-se mo. Sr. Ministro José Néri da nesta solenidade a complementação Silveira (Presidente): Ao encerrar da honrosa homenagem que a Nação esta sessão especial em que tão jus- tributou ao ilustre Ministro Márcio
200 TFR - 90
Ribeiro, por ato de Sua Excelência o Senhor Presidente da República, ao conferir-lhe, em Decreto de 11 do mês em curso, a Medalha-Prêmio, em virtude de haver inteirado cinqüenta anos de relevantes serviços públicos. A entrega da merecida insígnia será feita pelo Tribunal, em ato solene, após o recesso e logo se ultime na Casa da Moeda a cunhagem da medalha de ouro que lhe conferiu o eminente Chefe do Poder Executivo.
Agradeço a presença das ilustres autoridades, familiares e amigos que vieram a este Tribunal se associar ao preito de admiração e reconhecimento da Corte ao provecto Ministro Márcio Ribeiro.
Declarando encerrada a sessão, convido a todos os presentes para o coquetel de confraternização, pelo término do ano judiciário, dos membros do Tribunal, dos funcionários e suas famílias, o que, tudo, neste dia, se faz em torno do ilustre e caríssimo Ministro Márcio Ribeiro.
Compareceram à solenidade as seguintes autoridades: Exmo. Sr. Deputado Wilson Braga, I? Secretário da Mesa da Câmara dos Deputados e representante de S. Exa. o Sr. Deputado Flávio Marcílio, Presidente daquela Casa do Congresso Nacional: o Exmo. Sr.Ministro Geraldo Starling Soares, Presidente do Tribunal Superior do Trabalho; o Exmo. Sr. Ministro Jacy Guimarâes Pinheiro, representante do Exmo. Sr. Ministro-Presidente do Superior Tribunal Militar: o Exmo. Sr. Dr. Firmino Ferreira Paz, Procurador-Geral da República; o Exmo. Sr. Dr. Clóvis Ramalhete Maia, Consultor-Geral da República; o Exmo. Sr. Desembargador Agostinho de Oliveira Júnior, representante do Exmo. Sr. Presidente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais; o Exmo. Sr. Dr. Orlando ROdrigues Sette, representante do Exmo. Sr. Presidente do Tribunal Regi-
onal do Trabalho da 3~ Região o Exmo. Sr. Dr. Cid Herácito Queiroz, Procurador-Geral da Fazenda NélCional e representante de S. Exa. o Sr. Ministro da Fazenda: o Exmo. Sr. Dr. Maurício Correia, Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Distrito Federal: Ministros aposentados Henoch Reis, Esdras Gueiros, Cunha Mello e Oscar Correa Pina, do Tribunal Federal de Recursos: Juízes, Advogados, membros do Ministério Público; membros da família do Sr. Ministro Márcio Ribeiro e funcionários do Tribunal.
Encerrou-se a sessao às 17h45min.
Tribunal Federal de Recursos, 18 de dezembro de 1979 - Ministro José Néri da Silveira, Presidente Ronaldo Rios Albo, Secretário.
PLENARIO
ATA DA 7~ SESSAO ORDINARIA HOMENAGEM PÚSTUMA AO
EXMO. SR. MINISTRO HERMILLO GALLANT, EM 19 DE MARÇO
DE 1981
Aos dezenove dias do mês de março de mil novecentos e oitenta e um, às treze horas e trinta minutos, na Sala de Sessões do Tribunal Federal de Recursos, presentes os Exmos. Srs. Ministro José Néri da Silveira, Presidente do Tribunal, Armando Rollemberg, Moacir Catunda, Peçanha Martins, Jarbas Nobre, Aldir G. Passarinho, José Dantas, Lauro Leitão, Carlos Madeira, Gueiros Leite, Washington Bolívar, Torreão Braz, Carlos Mário Velloso, Justino Eibeiro, Otto Rocha, Wilson Gonçalves, William Patterson, Adhemar Raymundo, Romildo Bueno de Souza, Pereira de Paiva, Sebastiâo Reis, Miguel Jerônymo Ferrante, José Cândido, Pedro ACioli, Américo Luz e Antônio de Pádua Ribeiro, presentes ainda, o Exmo. Sr. Geraldo An-
TFR - 90 201
drade Fonteles, SubprocuradorGeral da República e o Bacharel José Alves Paulino, Secretário do Plenário, após a composição da Mesa pelo Exmo. Sr. Ministro Henrique La Roque, representante do Exmo. Sr. Ministro-Presidente do Tribunal de Contas da União e do Sr. Ministro (;arlos Alberto Barata Silva, VicePresidente do Tribunal Superior do Trabalho, foi aberta a Sessão convocada em homenagem á memória do Exmo. Sr. Ministro Hermillo Galant, recentemente falecido.
A seguir, o Exmo. Sr. MinistroPresidente assim se pronunciou:
«Srs. Ministros, Sr. SubprocuradorGeral da República, Srs. Ministros aposentados deste Tribunal, Srs. Juízes Federais do Rio Grande do Sul e do Distrito Federal, Sr. Subprocurador-Geral da República, também presente, Srs. Advogados, Exma. Sra. D. Danieta Hosmann Galant, Exma. Sra. D. Nara Galant Mazzi, lImo. Sr. Dr. João Carlos Galant e Exma. esposa, Exmo. Sr. Heitor Galant. minhas senhoras, meus senhores, Srs. funcionários:
E com profunda emoção que declaro aberta esta sessão plenària, cuja primeira parte se destina á homenagem que, reverentes diante do mistério da morte, os membros e funcionários deste Tribunal queremos render ao pranteado Ministro Hermillo Galant.
Na tarde de 16 de fevereiro, a inesperada notícia de seu passamento comoveu e consternou esta Casa de Justiça e, desde aí, o recordamos com carinho e saudade, na sua figura digna e austera, de transparente integridade que irradiava a amável confiança, própria dos bons.
Reminiscências afloram-me ao espírito, neste instante, e emocionam-me. Conheci o Ministro Hermillo Gôlant p.m 1967, quando ambos, juntamente com o ilustre
Juiz Federal Dr. João César Leitão Krieger, tivemos o duro encargo de instalar a Justiça Federal, em nosso Rio Grande do Sul. Desde então, os constantes gestos de grandeza humana, de vocação permanente para servir com amor, de franqueza e sinceridade, tão do feitio do gaúcho da Fronteira, de sábios e prudentes conselhos, fizeram nascer e frutificar, em meu coração, sentimentos de profunda admiração e respeito ao colega e amigo, Ministro Hermillo Galant. Quis a bondade de Deus que a mim coubesse, depois, a ventura de presidir á solenidade de sua merecida posse, em 23 de junho de 1980, em uma das cátedras desta Corte e receber, assim, a renovação de sua promessa de fidelidade á Justiça. que cumpriu, pontualmente, cada dia, até a derradeira hora, não obstante o secreto sofrimento e o ingente sacrifício, que só os verdadeiramente fortes podem suportar.
Para falar em nome do TribunaL concedo a palavra ao ilustre Ministro Américo Luz».
O Exmo. Sr. Ministro Américo Luz: Hermillo Galant foi. dos juízes nomeados á primeira hora, para a Justiça Federal restaurada no final do Governo Castello Branco, sem dúvida, uma feliz escolha.
Conheci-o nas plagas do Rio Grande, em férias que lá passei em julho de 1969. Ofereceram-me um churrasco, em Santa Tereza, nosso atual Presidente, Ministro José Néri da Silveira, José Sperb Sanseverino. João César Leitão Krieger e Hervandyl Fagundes. Todos predestinados a representarem na República a história do Sul, na Magistratura nacional.
Hermillo Galant impressionou-me, sobremaneira, naquela noite. E que ele, em tempo frio, no alto da ladeira, vestia sobretudo, cachecol e boina. Robusto, alegre, autêntico no seu
202 TFR - 90
gauchismo inconfundível, desbordava na figura o amor pela vida. tão saudável era, então.
O destino marca a vida das criaturas.
Como sabemos, bem mais tarde Galant adoeceu. Suas energias começaram a esvaecer. Acometou-Ihe a terrível enfermidade de definhamento orgânico progressivo, talvez não diagnosticável, ainda, pela Medicina.
Lutou por sobreviver e trabalhou denodadamente na Seção Judiciária de sua terra e neste Tribunal, enquanto suas combalidas forças lhe permitiram.
Imagem e semelhança de Deus, o homem é a tríade Inteligência, Espírito e Matéria.
Seja qual for a religião que professemos, creio estarmos de acordo nessa premissa fundamental.
E crendo-a, afirmo que Galant permanece, embora em diversa dimensão, vivo, como estão nossos queridos antepassados.
Certo de que a morte do corpo não é o fim das criaturas, nem a destruição de quanto construímos numa vida, a decomposição da nossa atual matéria constitui-se em abertura para nova expressão, mais vital, e para uma eterna e mais efetiva atuação no Plano Divino do Universo. Tal convicção não é somente fruto de religiosidade, mas da própria experiência científico-filosófica. Ouso dizer jurídica, como percebeu o imortal Carnelutti:
«Nós não podemos pensar o infinito, mas podemos pensar que a realidade ultrapassa os limites do nosso pensamento, sendo certo que ultrapassar ela tais limites é a mais certa entre as verdades. Donde que, se nos falta, em verdade, a compreensão do infinito, compreendemos no entanto a insufi-
ciência do finito para compre~p.der a realidade. Tal é a insolubilidade do problema, e, por isso mesmo, o drama do conhecimento: a realidade, para ser realidade, deve ser, ou pelo menos poder ser, pensada: mas, por outro lado, no próprio ato em que a pensamos, nós pensamos que a não podemos pensar. De forma que, aquilo que podemos pensar é finito, mas sabemos que o que deveríamos pensar é infinito» (In "Teoria Geral do Direito). Sem pretender abalar a discrição,
a humildade e a autoridade do nosso Presidente José Néri da Silveira, peço licença para dizer de S. Exa., com franqueza, haver sido oriunda de sua aguçada visão e conhecido espírito de fraternidade a idéia feliz de trazer Hermillo Galant para ocupar o alto cargo de Ministro do Egrégio Tribunal Federal de Recursos. Ligado a ele, por estreitíssimos laços de coleguismo e amizade, a atilada intuição do nosso atual dirigente pretendeu, promovendo o amigo, dignificar a nossa Corte, nela integrandO um valoroso Magistrado. Fez justiça, protegendo-o, sem, entanto, afetar com a sua atitude a posição dos demais pleiteantes. Colhi em Gabinetes Ministeriais, à época, a notícia de que Galant seria nomeado e, foi-me dito, por altas fontes governamentais, que o Excelentíssimo Senhor Presidente da República estava imbuído do justo propósito de atender, dentro das perspectivas que a lista lhe dava, ao critério de investir candidatos de variados Estados do País.
Confesso que fiquei exultante com a escolha de Hermillo Galant.
A minha felicidade rememora -e se projeta à nossa convivência desde o primeiro encontro no alto de Santa Tereza, na gloriosa Capital Gaúcha, às visitas que ele me fez na Seção Judiciária do Rio de Janeiro, até o momento emocionante da nossa posse
TFR - 90 203
neste Pretório. Foi honroso partilhar com S. Exa. das sessões do Tribunal Pleno, ouvir seus votos, simples mas firmes e ornados da sabedoria dos que exercem, por vocação, a difícil missão de julgar. Os verdadeiros juízes, a par da cultura, honestidade e visão dos fatos juridicos, sofrem, por vezes silentes, os dramas e as {:>erplexidades que antecedem ao seu pronunciamento definitivo. Noites em claro, contrastes idênticos, emoções violentas, a custo controladas, e pOdem chegar até mesmo às lágrimas fecundas em seus solilóquios.
Hermillo Galant foi um excelente Juiz e um portentoso ser humano. Em seu curriculum vitae retrata-se a grandeza de uma vida eminentemente profícua, vitoriosa / sob todos os aspectos, conforme fez ressair .de seu magistral discurso de pesar pelo falecimento do nosso homenageado, o insigne Ministro-Presidente José Néri da Silveira (Sessão de 19 de fevereiro último).
«Varão que encarnava o autêntico espirito do homem do Rio Grande do Sul, franco e sincero, de coração transparente, o pranteado Ministro Hemillo GaIant foi político: militante no Partido Libertador, aovogadó na Capital e no interior do Rio Grande do Sul, DiretorGeral da Corte de Apelação da Justiça Militar do Estado, Juiz Federal e, por fim, Ministro desta Corte. Em todos os momentos de sua vida pública, soube manter fidelidade às mais excelsas virtudes do homem públiCO dos pampas. Como juiz, tinha a alma aberta e sensível às aflições dos pobres que, tão numerosos, pedem o amparo da Justiça Federal. Integro e independente, lúcido, austero e seguro em suas decisões, o Ministro Hermillo Galant sabia também impor, com moderação, aos corruptos e arbitrários a merecida sançao que a lei contempla. Perde a Nação um
JUIZ que soube exercer o dignificante ofício, com inteligência e coração, com amor à Pátria e límpida visão de seus Objetivos permanentes. Pranteamos nós a morte de um colega que foi, além de um exemplar chefe de família, de um amigo muito agradável, um homem bom e justo.
Por sua vida, estou certo de que o Senhor já o recebeu na mansão dos eleitos, entregando-lhe a palma da glória que Ele reserva aos retos de coração, aos misericordiosos e aos justOS}).
Naquela mesma Sessão, falou o nosso insigne colega, Ministro Miguel Jerônymo Ferrante, deixando transbordar do íntimo de seu coração afetuoso, de poeta e escritor, as seguintes inspiradas expressões:
«Sempre entre os primeiros a chegar a este Plenário, trôpego, amparado pelo funcionário que o assistia, sentava-se na bancada, à nossa frente, quieto, dominando a dor, sobrepondo-se ao sofrimento que sabíamos cruel. Sem queixas, sem demonstrar fadiga, sem desfalecimento. Nunca o ouvimos lamentar-se da doença pertinaz, mas algumas vezes vimo-lo angustiado por não poder;' a. seu juízo, dedicar-se plenamente ao exercício de suas funções. Certa feita, confessou-nos sentir-se constrangido diante de seus pares pelo rendimento de seu trabalho que, apesar de seus ingentes esforços, nunca lhe parecia suficiente. Era como se pedisse deSCUlpas por se encontrar doente. A moléstia perturbava-o mais por impedir algumas vezes o desempenho de suas tarefas, do que pelO sofrimento que lhe causava.
Essa aguda consciência do dever deixou uma indelével marca em nossos espíritos. Guardamos dele uma lição magnífica de coragem,
204 TFR - 90
de otimismo e de esperança; um exemplo de resignação e de civismo. Fica-nos dele a lembrança reconfortante do Magistrado sereno, dedicado, simples e de homem lhano e cordial, a quem as vicissitudes não abatiam, firme em sua fé e cujo coração estava, na expressão maior do Salmista, «sempre disposto a esperar o Senhor». Repito nesta oportunidade os even-
tos da carreira do Ministro Hermillo Galant. Seu currículo foi neste Plenário lembrado pelo nosso ilustre Presidente e lido na missa celebrada por sua boníssima alma, no Santuário Dom Bosco, em 20 de fevereiro transacto. Ei-lo:
1) Natural de Alegrete, Estado do Rio Grande do Sul, onde nasceu a 1::; de janeiro de 1913. Filho de João Galant e Maria Schumann Galant.
2) Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, onde colou grau a 27 de dezembro de 1939.
3) Diretor-Geral da Secretaria da Corte de Apelação da Justiça Militar do Estado do Rio Grande do Sul, cargo em que se empossou em fevereiro de 1966.
4) Secretário da Prefeitura Municipal de Venâncio Aires, no períOdo de março de 1939 a janeiro de 1946.
5) Vereador da Câmara Municipal de Venãncio Aires, pelo Partido Libertador, único em que militou, até sua extincão, exercendo a verel'mça nos de 1956, 1957, 1958 e 1959.
6) Presidente da Câmara de Vereadores de Venâncio Aires/RS.
7) Advogado militante nas Comarcas de Venâncio Aires, Santa Cruz do Sul, Rio Pardo e Lajeado, desde 1939.
8) Presidente do Rotary Club de Venâncio Aires, em dois períodos.
9) Presidente do Gabinete Executivo da Comissão Diretora Municipal de Venâncio Aires, da Aliança Renovadora Nacional - ARENA -eleito em maio de 1967.
10) Nomeado para o cargo de Juiz Federal Substituto da Seção Judicária do Estado do Rio Grande do Sul, em 13-3-67, tendo tomado posse em 9-5-67.
11) Nomeado para o cargo de Juiz Federal da Seção Judiciária do Estado do Rio Grande do Sul em 10-7-72, tendo tomado posse em 10-7-72.
12) Eleito Suplente do Tribunal Regional Eleitoral no perído de 1971 a 1973.
13) Eleito membro efetivo do Tribunal RegioIlal Eleitoral no períOdO de 1973 a 1975.
14) Designado pelo Conselho de Justiça Federal para Diretor do Foro da Seção Judiciária do Estado do Rio Grande do Sul, nos exercícios de 1973, 1976, 1977 e 1978.
15) Nomeado Ministro do Tribunal Federal de Recursos por Decreto de 28-5-80, empossado em 23-6-80, tendo sido um dos mais ilustres integrantes desta Corte.
Intento levar ao ilustre COlega os nossos corações confrangidos por sua temporária separação do nosso meio e abraçar, com a mais pura sinceridade, os seus familiares: esposa, D. Danieta Hosmann Galant, filhos, netos, irmãos e amigos, que sofrem com a sua partida. Restanos, todavia, a todos nós, o consolo da verdade contida na oração que proferiu em sessão de 18 de fevereiro, na 6~ Turma desta Corte, o ilustrado Subprocurador-Geral da República, Doutor José Arnaldo Gonçalves de Oliveira, a propósito do evento:
«... espero que ele tenha aquela paz, aquela tranqüilidade que é o ideal de todos nós que temos espe-
TFR - 90 205
rança e vivemos nela. Que ele, um dia, possa nos encontrar, porque a morte é uma fatalidade, e que nós, lá, possamos fazer um grande plenário onde conheçamos a nós mesmos e a todas as coisas, que é aquilo que resulta da visão de Deus. Que ele tenha muita paz». Na mesma sessão, expressaram-se,
em sentidas e memoráveis palavras, os eminentes Ministros José Dantas e Wilson Gonçalves.
Afinal, direi sobre Hermillo Galant o que disse o Cristo a respeito de Natanael (S. João, capo 1, verso 47):
Eis um verdadeiro homem em quem não há dolo. Que Hermillo Galant seja sempre,
para nós. o modelo da virtude. da pertinácia e, principalmente, da importãncia do reto juiz do exemplar chefe de família, do companheiro e amigo leal.
A S. Exa. a nossa prece de saudade imorredoura. Que eus o guarde em sua glória, queridO Ministro Hermillo Galant.
O Exmo. Sr. Doutor Geraldo Andrade Fonteles - SubprocuradorGeral da República - Exmo. Sr. Presidente, Srs. Ministros, Exmas. autoridades aqui presentes, Exmo. Sr. representante da Ordem dos Advogados do Brasil, Exma. família do eminente Ministro Hermillo Galant. As minhas plavras são mais de complementação àquelas que proferi por ocasião em que se prestaram homenagens póstumas ao eminente Ministro, aqui neste Plenário.
Em complementação, digo:
O Ministério Público Federal, por mim representado, associa-se a este singelo mas altamente signficativo preito de homenagem póstuma ao ínclito Ministro Hermillo Galant. E associa-se não só como gesto de adesão, mas para sufragar, com os votos de seu pesar, a memória pran-
teada, depositando-lhe uma coroa de louros à eleição que, sem generosidade dos governantes, alçou um nobre vulto à acendrada admiração de seus pares, ao ensejar-lhe o lugar de Ministro desta Egrégia Corte.
Não obstante sua breve passagem pelo Tribunal Federal de Recursos, as instituições da Magistratura e do Ministério Público já haviam, desde a sua atuação na Justiça Federal, em seus glorioso Estado, aprendido a admirá-lo, a respeitá-lo pelo acerto e solidez de seus julgamentos.
Ocorre registrar um episódio que se passou neste mesmo auditório, em Sessão Plenária.
Apreciava-se, então. causa de evidenciada percussão nas lides forense, pela intensa pUbliCidade dos periódicos de toda a Nação, dando ensejo à prolação de votos entusiastas, alguns até engalanados de retóricas juridicas e literárias, pela preponderãncia do lado simpático à opinião pública. E, sem embargos à embalagem do resultado fascinante que vinha acalentando a caudal do seu acolhimento, eis que S. Exa., com as caracteristicas da maior autenticidade de Juiz, pela serenidade, segurança e discernimento do processo cognitivo, dentro das paralelas do Direito formal e material, com tranqüilidade e independência, optou pela boa dicção do Direito, materializada, no caminho percorrido para o alcance do desiderato, com observãncia da melhor técnica judicante. Ali, quando do pronunciamento do Ministério Público, já esmaecido no seu ofício, contagiou-nos aquele voto, incisivo e de plácida convicção de quem buscou, nos meandros das normas, a essência vigorante do Direito. Emocionou-nos.
Posteriormente, quando, nos próximos dias do seu passamento, neste mesmo Plenário, o eminente Presidente, seu ilustre co-estaduano, traçou-lhe o curriculum vitae, dando
206 TFR - 90
noticias de sua atuação variada e sempre honesta na vida pÚblica do pais, pude, já então aquilatar o imenso crédito acumulado no curso de sua vida. Daí porque, hoje, a sentida perda de sua atuação nos vários setores de atividade, inclusive e principalmente no Judiciário, é tão marcada pelo sentimento de saudade de sua família, seus colegas, amigos e admiradores.
Não tendo tido a oportunidade de uma convivência mais duradoura, mais íntima, privando-me, lamentavelmente, de tão sublime fruição, que muito me honraria, quero tampém compor esta homenagem que, pálida e deficiente, somente leva a valia de um preito justo da instituição, a qual sobressai em relevo pelo merecimento tão-só do pranteado Ministro Hermillo Galant.
Devo acrescentar que busquei em pessoas a ele mais chegadas a confirmação de seus méritos, fosse na vida social, familiar, fosse na vida profissional ou funcional. De todos, sem discrepãncia, só ouvi louvor ao trabalho, à dedicação e também às diretrizes que imprimia, conforme o cargo que perlustrasse.
O eminente homenageado ostentava uma silhueta imutável na sombra ou na luz incandescente dos cargos, na vida familiar ou na vida social, de onde se tirara a lição de um mestre incomparável da didática administrada em seu exemplo cotidiano tão enobrecedor à sedimentação da paz e da tranqüilidade social. Espírito original, inteligência experimentada e grave, um homem que possuía idéias próprias, que pensava por si mesmo, capaz de reagir com serenidade contra os ímpetos instintivos das paixões.
Oportuno, pois, se engajar, neste momento, às razões destas leais manifestações.
O país inteiro, que mergUlha sob a ameaça de amargos dias, tem, a
nosso ver, no Poder Judiciário, a bóia que flutua no dilúvio, graças aos homens superiores da têmpera do saudoso Ministro.
Por fim, todas a notas harmoniosas que ornavam a sua personalidade, davam de sobejo para compor, por mãos mais hábeis e conhecedoras de seu procedimento e conduta, uma bela sinfonia, restando-me a mim, apenas, o recurso de uma singela paródia aos versos do poeta, aduzindo que um verdadeiro sentimento pipila em cada coração, numa saudade imorredoura.
Muito Obrigado. O Exmo. Sr. Doutor Dácio Vieira
- Representante da Ordem dos Advogados do Brasil: Quis o egrégio Tribunal Federal de Recursos, nesta Sessão Plenária Especial, prestar merecida homenagem póstuma ao grande juiz, o saudoso Ministro Hermillo Galant.
Quer a Ordem dos Advogados do Brasil solidarizar-se com este acontecimento, triste pela própria natureza do ato, breve e memorável pelas razões que se justificam, de maneira a tornar inesquecível este Sodalício, com um registro indelével nas páginas de tempo dessa Alta Corte de Justiça, para gravar um testemunho de coerente reconhecimento aos feitos de um homem que se destacou em nossa história, de maneira ímpar e exemplar, como magistrado, cidadão, como pessoa humana, como chefe de família.
Aqui prestamos nosso tributo a tão ilustre personagem que soube, por evidentes e notórias qualidades, merecer o respeito e a amizade de todos os advogados, na difícil missão de imprimir e resguardar a dignidade da Justiça.
Amigo, sereno. equilibrado, culto, sábio no decidir, notabilizou-se como Juiz ávido em impor o ideal da Justiça, no amparo ao sagrado direito de
TFR - 90 207
seus semelhantes, quase que impotentes e inseguros, pequeninos na luta contra o gigante da União.
Missão difícil, árdua e penosa, soube, com distinção e coragem, perto de 13 anos de judicatura e de abnegação, sopesar indeclináveis direitos e valores parà imprimir sábias e justas decisões que se refletiram em tantos julgamentos que tiveram feliz desfecho com a habilidade de sua pena que, com traços de ouro, marcou os anais da vida forense e do cotidiano.
Mais do que nós, também defensores e administradores da Justiça, em nosso ministério privado, na condição de vigilantes na vanguarda dos verdadeiros princípios e ideais democráticos que ainda hão de instar plenamente em nosso país, o ilustre Presidente desta Augusta Casa pode aquilatar a sinceridade deste nosso grato e oportuno pronunciamento, como garantia deste atestado, dando-lhe fé, já que com o saudoso magistrado conviveu por bons e longos anos em terraslgaúchas,desfrutando, invejavelmente, de tão boa companhia, sendo inconteste que ambos companheiros foram responsáveis, por longo período de tempo, pelo comando da Justiça de I? grau no extremo sul de nossa Pátria.
Diante desta convicção, para nós insuperável, podemos tranqüilamente afirmar que o homem, Hermillo Galant, nasceu predestinado com o dom, com o talento de juiz, e agiu com acerto ao empenhar-se na carreira de Julgador, à qual, inegavelmente, dedicou por completo seus úl-timos e melhores anos. '
Cristão católico, emprestou sempre seu peculiar descortino aos conceitos e convicções que o definiram como personagem de nossa história, desenvolvendo e relevando aspectos sociais e humanos em suas decisões.
Cultor incansável do Direito, aprimorou-se como fervoroso intér-
prete e aplicador das leis, com rara habilidade; - sempre dísposto à luta, almejada e exigida por nossa classe para impor julgamentos céleres ãos processos,' mas, nem por isso, deixando de dar prontas e salutares decisões.
Carregou, em sua bagagem de trabalho, a solução de centenas de processos, dirimindo conflitos je toda a espécie, pacificando ques-" tões simples e complexas pendentes que afligiam" seus semelhantes e concidadãos.
Não temos dúvidas ao aqui expressar que foi um escolhido e que Deus guiou seus passos na trilha da difícil caminhada do Direito.
Na famosa Parábola dos Talentos - e que agora nos seja permitido relembrar - ficou dito que um senhor a três homens deu a oportunidade para enriquecer suas vidas.
Para tanto, a cada qual foi ofertada uma quantia, segundo a sua capacidade.
Após um decurso de tempo, o doador entendeu de saber como empregaram os beneficiários a «benesse» e a capacidade.
O primeiro, que recebera mais, aplicou e dobrou o seu ganho.
O segundo, que recebera quantia menor, também conseguira aumentar a sua furtuna.
O terceiro, por temor, havia escondido o seu valor de modo a não correr risco, não perdendo e nem ganhando nada.
Revoltado o senhor com a conduta do último pela preguiça e inoperãncia, tomou de volta a sua oferta que fora guardada e depreciada e a deu ao primeiro, que soube aproveitar a oportunidade concedida, demonstrando o seu talento e responsabilidade e o cobriu de glórias, dizendo: «sobre o pouco foste fiel, sobre o muito te colocarei».
208 TFR - 90
Este ensinamento ilustrativo 'procurou demonstrar que a felicidade, o sucesso, o êxito da carreira, são inerentes àqueles que conseguem a vitória aplicando a sua capacidade de maneira inteligente, leal e correta, com o esforço do trabalho, fiéis aos justos propósitos.
Nosso querido e saudoso homenageado também recebeu seus talentos e bem os usou no curso de 67 anos de existência.
Bem cedo, recebeu o primoroso dom de ser um defensor e estudioso da Justiça.
Recebendo aos poucos as oportunidades que lhe surgiram em vida, nunca as desperdiçou e, mesmo sonhando, como apregoam os poetas e concertistas do pensar, soube transformar sonhos em realidade.
Assim, nos idos de 1939 já era bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais.
Exerceu a posição de DiretorGeral da Secretaria da Corte de Apelação da Justiça Militar do Estado do Rio Grande do SuL
Chamado ao dever cívico, não se declinou a tal reclamo. No Município de Venâncio Aires foi Secretário da Prefeitura Municipal, Vereador por vários mandatos, e Presidente de sua Câmara.
Não fugindo de prestar serviços à sociedade, galgou a Presidência do Rotary Club daquela distante comarca, preocupando-se com melhores soluções de vida para as classes menos favorecidas.
Por chamamento partidário, chegou à Presidência da Aliança Renovadora Nacional daquele rincão gaúcho, já em 1967, em época de verdadeira crise política nacionaL
Inspirado nos ideais nunca esquecidos de homem sempre dedicado ao Direito, tomou posse como magistrado federal, em Porto Alegre, na ins-
talação das Seções Judiciárias por todo o país, tornando-se um pioneiro como Juiz Federal, com contribuições inestimáveis para a formação e desenvolvimento da seção de sua jurisdição.
E, no ano passado, ao ser ampliado o número de membros desta Alta e Nobre Corte de Justiça, certamente não seria olvidado o nome do nosso homenageado, cuja folha de serviços exigia a sua indicação como Ministro do Tribunal Federal de Recursos.
Acometido de enfermidade, o en· tão incansável batalhador da Justiça, mesmo assim laborou, julgou e freqüentou esta Casa, até quanto pôde, nas Sessões e Plenário, até ver esgotadas todas as suas forças e energias, privando-se da carreira que tanto amava, obrigado que estava a repouso inexoráveL
Obrigou-se, damos o nosso testemunho desta tribuna, ao afastamento da Corte, dos companheiros, amigos e funcionários por um reclamo maior que a sua vontade.
Por esta razão foi até o fim um imbatível, deixando, para nossa total tristeza, por imposição de uma lei da natureza, à qual também se curvou e obedeceu, uma vaga, um vazio entre nós que jamais será esquecido, sej a pelos cultos e não menos dignos pares, como pelos advogados, pelo Ministério Público e pelos funcionários.
O saudoso Ministro Hermillo Galant, como descrito na parábola cristã, soube usar o dom que Deus lhe deu e, com talento e responsabilidade, cumpriu os deveres que a Pátria lhe confiou.
E a vida o recompensou pela sua potencial capacidade, recebendo por merecimento os cargos mais proeminentes que o tornaram, para nós, um exemplo de homem, de cidadão, de magistrado, um modelo de chefe de família.
TFR - 90 209
Um tipo de personalidade notável, de magna dignidade que se torna difícil, hoje em dia, neste mundo de incompreensão, de violência, a que se determinou de «Sinal dos Tempos».
o perfil do nosso homenageado pode ser encontrado em uma passagem do grande Chateaubriand que bem predizia ao afirmar, para sua imortalidade, que:
«Há justos cuja consciência é tão tranqüila, que deles não nos podemos acercar sem que participemos da paz que emana, por assim dizer, do seu coração e das suas palavras».
Sua Excelência, estamos convencidos, e damos o nosso inteiro testemunho, representava o ideal do juiz, como definiu Calamandrei, ao concluir que a conduta de um magistrado «é fixada por aquela misteriosa e clarividente intuição que se chama o sentimento da justiça».
E tal pressuposto, que para nós é insuperável, lhering foi mais longe ao elevar a condição e requisito à maior amplitude, dizendo que «A força dum povo equivale à força do seu sentimento de justiça».
E o nosso imortal Rui Barbosa ministrou como advertência: «Não há nada mais relevante para a vida social que a formação do sentimento da justiça».
Exmos. Srs. Ministros.
N a nossa solene missão profissional, em luta incessante pelo aperfeiçoamento das nossas instituições jurídicas, pela rápida administração da Justiça, pela total restauração da vida democrática de nosso país, pela sagrada segurança dos direitos e garantias individuais, pela vigília diuturna dos direitos humanos, podemos garantir que o saudoso e sempre queridO homenageado tinha, por
formação, o predicado que o distinguiu em sua vida de magistrado, que se chama de sentimento de justiça.
Damos o testemunho de que, cedo ainda, caminhou para a eternidade, saindo da vida para a posteridade, deixando, como perda imensurável, um saldo de quase três anos de ensinamentos jurídicos que contribuíram para a grandeza e soberania desta Casa, sendo também incontroverso que este Tribunal, na composição de seus membros, tem demonstrado, mesmo no confronto das repetidas vicissitudes, que se tem feito Justiça no Brasil, para a glória e honra da magistratura federal.
Nosso homenageado, se aqui pudesse estar, em breve instante conosco, certamente diria em despedida final, como preconizava o Apóstolo São Paulo:
«Combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a fé».
O Exmo. Sr. Doutor Heitor Galant: E com profunda emoção que uso da palavra, neste recinto augusto, para agradecer, em nome da família de meu falecido irmão, Ministro Hermillo Galant, as eloqüentes homenagens que este Egrégio Tribunal, do qual ele fez parte, está prestando à sua memória. E esta uma tarefa difícil para mim, não só pela modéstia da minha oratória, como pelas perturbações do meu espírito, causadas pela dor e pelas amarguras que sofro pelo desaparecimento daquele que era meu irmão e amigo, talvez mais amigo do que irmão.
Dos 13 filhos que a minha querida mãe legou ao mundo, o Hermillo era um espelho da sua bondade, do carinho e da dedicação com que ela os criou e educou, no ambiente salutar de um lar modesto, acolhedor e honrado.
Srs. Ministros: O colega de Vossas Excelências, falecido em Porto Alegre, no dia 16 de fevereiro do corren-
210 TFR - 90
te ano, exerceu as funções de Juiz Federal naquela Capital, nomeado pelo eminente Presidente Humberto de Alencar Castello Branco, no período de 1967 até sua promoção para este Egrégio Tribunal, em junho de 1980. Como exerceu aquelas funções? Quem poderia responder a esta pergunta, melhor do que eu, seria o preclaro Ministro José Néri da Silveira, que foi seu colega na Justiça Federal do Rio Grande do Sul, durante vários anos e, na verdade, já se pronunciou a respeito, no ato do sepultamento de Hermillo, em Porto Alegre, quando proferiu uma emocionante e bela oração, em que traçou, com discrição e segurança, o perfil do colega morto. Como sou advogado em Porto Alegre, já há muitos anos, mantenho relações com vários colegas, alguns dos quais atendiam causas na Justiça Federal de Porto Alegre. Nos encontros que tinha com alguns deles, nas ruas da cidade, seguidamente conversávamos, quase sempre sobre assuntos da profissão e, nessas oportunidades, ouvi muitas referências, desses colegas, elogiosas ao Hermillo. Diziam os advogados que ele os atendia muito bem, era um Juíz acolhedor e compreensivo no seu trato com os profissionais do Foro. Eu então respondia que isso talvez fosse motivado pelo fato de Hermillo ter sído advogado por mais de 20 anos e que assim conhecia bem as dificuldades que os advogados enfrentam no exercício de sua profissão.
Na verdade, o fato de ele ter exercido a advocacia, por longo tempo, deveria influir no trato acolhedor que costumava proporcionar aos bacharéis que o procuravam, no Foro de Porto Alegre, para lhe falar sobre suas causas, mas acho que essa sua conduta era fruto, também, do seu temperamento bondoso e afetivo.
O Hermillo era realmente, para definHo, singelamente, um homem bom e correto e um bom .juiz. E era
um bom Juiz provavelmente por ter sido um bom advogado. Foi, precisamente, um juiz, jUiz e escritor ilustre, que disse, com muita propriedade, que não «há, entre a majestade dos Juízes e a dos advogados' outra diferença que não seja a decorrente da diversidade das nossas funções sociais, porque vós também, senhores advogados, sois magistrados na mais remontada significação do termo. Foi colocando-se nesse ponto de vista, prossegue o magistrado que estou citando, que G. Ranson, Juiz do Tribunal do Sena, disse em seu ensaio sobre a «Arte de Julgar» que os bons advogados é que fazem os bons juízes.
Creio estar contido nesse paralelo, entre as funções do Juiz e do advogado, o segredo do êxito com que Hermillo Galant, depois de um longo período de exercício da advocacia, pôde ser um bom Juiz. Ele soube substituir, adequadamente, a toga do advogado pela toga do Juiz.
Envergando a toga, exercendo a magistratura, o Juiz torna-se, para bem cumprir o seu dever, um exigente executor da lei, inspirado na jurisprudência, sem esquecer o salutar princípio definido no art. 5? da Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro, segundo o qual «na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum».
Já afirmara Jean Cruet: «A negação da jurisprudência, como força ativa da evolução do direito, tem sempre e por toda a parte recebido desmentido ruidoso dos fatos; essa tendência para reduzir o Juiz a uma função puramente automática, 'apesar da infinita diversidade dos casos submetidos ao seu diagnóstico, tem sempre e por toda a parte sobrado, ante a fecundidade perSIstente da prática judicial».
«Juiz, esse ente inanimado de que falava Montesquieu, tem .sidO, na
TFR - 90 211
realidade, a alma do progresso jurídico, o artífice laborioso do direito novo, contra as fórmulas caducas do direito tradicional».
Superando o período do arbítrio e posse violenta, o homem, pelo dom superior da inteligência, estabeleceu o conjunto de normas e condições existenciais da vida em comum, normas que evoluem com o organismo social, mas imperativas, na sua vigência, para a manutenção e disciplina da coletividade.
Sempre que há desequilíbrio nas relações sociais, surge o magistrado, sereno no seu alto mister, como fator soberano de harmonia, a restabelecer a ordem, a impedir a desagregação, e a contribuir, decisivamente, para o aperfeiçoamento das relações entre os homens.
Estou certo de que meu irmão, que teve a suprema honra de integrar este augusto Tribunal, como magistrado da Justiça Federal, exerceu as funções de Juiz segundo aqueles princípios e a isso sou levado a crer em face das expressivas homenagens e manifestações de apreço e simpatia à sua memória, manifestadas com tanta eloqüência neste Pretório Excelso, embora houvesse servido aqui, como Ministro, somente durante 6 meses.
A minha missão, neste instante, é agradecer, em nome de toda a família de Hermillo Galant, às homenagens que lhe têm sido prestadas por Vossas Excelências, a começar pelo eminente Presidente José Néri da Silveira, que assim que soube do falecimento do colega, em Porto Alegre, para lá se dirigiu imediatamente, a fim de assistir ao sepultamento e confortar a família atingida por tão grande infelicidade, e o fez de maneira exemplar, inclusive proferindo, no ato do sepultamento, a oração a que já me referi.
Quero tambem exprimir a nossa gratidão à Egrégia Turma de que
fazia parte o Ministro Hermillo Galant, presidida pelo. eminente Ministro Carlos Madeira e que na primeira sessão após o triste evento, proferiu expressiva e sentida oraçãô, deplorando o desparecimento do colega e exaltando os seus méritos.
Estendo o nosso reconhecimento ao Sr. representante da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Distrito Federal, Dr. Aquiles Rodrigues de Oliveira, e Dr. Hélio Pinheiro da Silva, Subprocurador-Geral da República, ilustres figuras da vida forense de Brasília e que, presentes à sessão da Turma a que me referi, expressaram o seu pesar de maneira significativa.
E, por fim, impõe-se ressaltar esta nobre e imponente manifestação de apreço que o Egrégio Tribunal Federal de Recursos, em reunião plenaria e pública, está prestando à memória de Hermillo Galant, o que realmente me convence e a sua família de que ele, nos 6 meses em que aqui viveu, soube conquistar, por seu trato ameno e sua conduta ilibada, as simpatias e a amizade dos seus eminentes colegas. Honrados com tal atitude desta Alta Corte, aqui estamos para agradecer, comovidos, a presente homenagem ao excolega, certos de que ela será um dos melhores títulos que ele soube conquistar na sua árdua e fecunda existência.
Muito gratos a Vossas Excelências e a todos os que tiveram a bondade de comparecer a esta emocionante solenidade.
O Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira (Presidente): O Tribunal Federal de Recusos recebeu dezenas de mensagens de pesar, de todas as partes do País, em virtude da morte do Sr. Ministro Hermillo Galant. Dentre elas, destaco as seguintes: Exmo. Sr. Vice-Presidente da República, Dr. Antônio Aureliano Chaves de Mendonça; Exmo. Sr. Presidente
212 TFR - 90
do Supremo Tribunal Federal, Ministro Xavier de Albuquerque; Exmo. Sr. Ministro-General de Exército, Reinaldo Melo de Almeida, exPresidente do Superior Tribunal Militar; Exmo. Sr. Ministro Luciano Brandão Alves de Souza, Presidente do Tribunal de Contas da União; Exmo. Sr. Deputado Nelson Marchezan, Presidente da Cãmara dos Deputados; Exmo. Sr. Dr. Murillo Macêdo, Ministro de Estado do Trabalho; Ilmo. Sr. Dr. Gil Gouveia Macieira, Presidente da Caixa Econômica Federal; de diversos Procuradores-Gerais de autarquias e de Juízes Federais de todas as Seçôes Judiciárias; de Tribunais do País que refiro: Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco, Tribunal Regional do Trabalho da 4~ Região, Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande -do Norte, Tribunal de Contas do Distrito Federal. Ainda, em virtude de motivo de força maior que os ímpossibilitou de comparecer a esta solenidade, na manhã de hoje, a Presidência do Tribunal recebeu mensagens, associando-se a esta homenagem e manifestando a impOSSibilidade da presença do Exmo. Sr. Ministro Xavier de Albuquerque, Presidente do Supremo Tribunal Federal; do Exmo. Sr. Ministro Ibrahim AbiAckel, Ministro da Justiça; do Exmo. Sr. Ministro Jair Soares, da Previdência e Assistência Social; do Exmo. Sr. Dr. Antônio Salgado Martins, Presidente do Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul. As palavras dos oradores, proferidas na simplicidade desta Sessão, constituem flores imarcesciveis da nossa admiração e do nosso carinho ao colega e amigo Que nos deixou tanta s"audade, Ministro Hermillo Galant. Queremos confiá-las, definitivamente, à guarda daquela que foi inexcedível em dedicação e amor a seu esposo, a Excelentíssima Senhora, Dona Danieta Hosmann Galant, para que lhe sej am, pela suavidade, um pouco de consolo e a expressão
de nossa constante solidariedade e proclamem perenenente o nosso testemunho de que Hermillo Galant, como um meteoro, cruzou os céus desta Corte, deixando, porém, o rasto luminoso da sua bondade, amor à Justiça, de lúcida inteligência e de cativante personalidade. O Tribunal Federal de Recursos não esquecerá o gaúcho e magistrado :.: autêntico que era o Ministro Hermillo Galant.
Agradeço a presença de S. Exa. o Sr. Ministro Carlos Alberto Barata Silva, Digníssimo Vice-Presidente do Tribunal Superior do Trabalho; de S. Exa. o Sr. Ministro Henrique La Roque, Ministro do Tribunal de Contas da União e representante da Presidência da mesma colenda Corte; do Dr. Jayro Camargo Ramos, representante de S. Exa., o Sr. Governador do Estado do Rio Grande do Sul, Dr. José Augusto Amaral de Souza; dos Srs. Ministros aposentados deste Tribunal; dos Srs. Juízes Federais do Rio Grande do Sul e do Distrito Federal; dos Srs. SubprocuradoresGerais da República; dos Srs. A adve gados e, em particular, do ilustre representante do Conselho Seccional do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Agradeço a presença das demais autoridades. Agradeço, especialmente, a presença da Excelentíssima Sra. Dona Danieta Hosmann Galant, de seus caríssimos filhos e nora; do Dr. Heitor Galant. Também agradeço a presença dos funcionários desta Corte.
SuspendO a Sessão, para que todos possamos cumprimentar a família do saudoso homenageado.
Encerrou-se a Sessão às 16:30 horas.
Tribunal Federal de Recursos, 19 de março de 1981 - Ministro José Néri da Silveira, Presidente - Bel. José Alves Paulino, Secretário do Plenário.
TFR - 90 213
HOMENAGEM AO SR. MIN. JOSÉ NÉRI DA SILVEIRA POR OCASIÃO
DE SUA NOMEAÇÃO PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
O Senhor Ministro Carlos Mário Velloso: Na Sessão Plenária da última 5~ feira, ao cabo de um magnífico voto proferido pelo Ministro José Néri da Silveira, declarou o Ministro José Dantas, sem conter as lágrimas, que tínhamos acabado de ouvir o último pronunciamento, neste Tribunal, desse eminente colega que vinha de ser nomeado para a Corte Suprema. E disse o Ministro Dantas que não iríamos contar, daqui para frente, nas horas difíceis e nos momentos graves, com os conselhos e a palavra sempre autorizada do Ministro José Néri da Silveira.
Isto é verdade. E é'por essa razão, Senhor Ministro José Néri da Silveira. que a alegria de que somos possUldos, ao ser Vossa Excelência investido na mais alta cátedra do Judiciário brasileiro, é uma alegria que chora - e aqui vale invocar Guimarães Rosa - porque é «uma alegria judiada, que ficou triste de repen· te ... » É que, de repente, quandO fes· tejávamos a vitória do Colega, percebemos que a sua ascensão significava perdê-lo do convívio diário. Nas Gerais se diz, com sabedoria, é ainda Guimarães Rosa quem nô-Io diz, que chorar sério faz bem. Por isso, aqui estamos, Senhor Ministro José Néri, os seus irmãos, reunidos em sua homenagem, em sessão especial, oara as despedidas e para expressar-lhe que grande foi a honra que a Nação conferiu a este Tribunal e a cada um de nós, ao convocar Vossa Excelência para o exercício da suprema magistratura nacionaL
Vossa Excelência, Senhor Ministro José Néri da Silveira, é um homem que madrugou no trabalho e n? estudo sério; por isso mesmo, esta sempre em véspera de vitória e de sucesso pessoaL Aos 23 anos, eHo Bacharel em Direito pela Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul, com a distinção universitária de Aluno Laureado. No ano seguinte, um novo título universitário é conquistado por José Néri, o de Bacharel em Filosofia, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e em 1957, o de Licenciatura em Filosofia. na PUC do Rio Grande. Por concurso, ingressou no serviço público do seu Estado natal. E assim, antes dos 30 anos, já era o advogado José Néri da Silveira integrante do serviço jurídico do Rio Grande. Aos 31 anos, mediante aprovação em novo concurso, José Néri é Consultor Jurídico do Estado; aos 33 anos, ascende ao alto cargo de ConsultorGeral, que corresponde ao de Procurador-Geral do Estado. Nesse período, laboriosa foi a sua carreira: a partir de 1960, assim aos 28 anos de idade, em meio a uma intensa atividade de advogado, passa a integrar o corpo docente da PUC-RS, como professor de Direito Civil, e da UFRS, como professor de Introdução à Ciência do Direito. Juiz Federal em 1967, dois anos depois, em novembro de 1969, aos 37 anos, é nomeado para o c·argo de Ministro do Tribunal Federal de Recursos. Exigindo a Constituição a idade mínima de 35 anos para ingresso nos Tribunais superiores, nâo conheço outro que tivesse ingressado neste Tribunal com menos de 37 anos. Tive a honra c!p saudrlr o nosso homenageado, quandO de sua posse na r'residéncia deste Tribunal, em 25 ele junhO de 1979. Disse eu, então, que não imaginava o adolecente de 16 anos, «que, em outubro de 1948, um ano após a instalação desta Corte, pregava, em Bajé. que «o amor é um fogo que se extingue, quando nâo se comunica a outros» - repito as palavras do menino - ou jovem político de 20 anos, presidente da ala moça da UDN de Porto Alegre que, em 1953, em atitude cívica - o termo é bem este, como costumava dizer o grande Milton Campos - conclamava a
214 TFR - 90
união de «todos os corações gaúchos, amantes do Direito e da Justiça», em favor da democracia, que, bem antes dos 40 anos, viesse a se tornar um dos maiores juízes de sua terra e. na casa dos quarenta, &Scendesse à Presidência" da 2~ Corte Judiciária do BrasiL» Na linha desses fatos fica fácil compreender, Senhor Ministro José Néri da Silveira, a razão por que Vossa Excelência, ainda na casa dos 40 anos, é chamado a exercer a suprema magistratura nacional.
Em verdade, a nomeação do Ministro José Néri da Silveira para o Supremo Tribunal significa que a Nação 'lhe reconheceu os méritos. Observemos a sua carreira nesta Corte: Ministro do Tribunal Federal de Recursos, empossado em dezembro de 1969, depois de ter exercido o cargo de Juiz Federal e de Juiz do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul, integrou o Conselho da Justiça Federal de 1971 a 1973. Em 1970 e 1975, participou, como Ministro convocado, de julgamentos no Supremo Tribunal. Ainda em 1975, presidiu a Comissão Examinadora do II Concurso para provimento de cargos de Juiz Federal Substituto, além de ter integrado e presidido a Comissão de Regimento e Jurisprudência do Tribunal. Eleito, pelo Tribunal Federal de Recursos, Ministro-Substituto do Tribunal Superior Eleitoral, em 1975, foi Ministro efetivo da mesma Corte em 1976, nela tomando posse em setembro de 1976, sendo reconduzido para o 2? biênio, em setembro de 1978. No Tribunal Superior Eleitoral, foi eleito Corregedor-Geral Eleitoral, tendo desempenhado as funções desse cargo, juntamente com as de Ministro do TSE e do TFR.
Eleito Presidente do Tribunal, para o biênio 1979/1981, empossada no
cargo em junho de 1979, realizou o Ministro José Néri da Silveira profícua administração que há de ficar registrada nos fastos do Tribunal. - Nela, não sabemos o que mais aplaudir, se o administrador criterioso que soube prever e prover, ou se o bom varão que exerceu com alta dignidade e justiça a direção da Casa. Essa magnífica obra administrativa de José Néri da Silveira só não é maior que a sua própria obra de juiz, tanto como Juiz Federal, Juiz do Tribunal' Eleitoral do Rio Grande, quanto Ministro do Tribunal Superior Eleitoral e Ministro desta Corte. Nesses quase 12 anos de judicatura no Tribunal Federal de Recursos, Vossa Excelência, Senhor Ministro José Néri da Silveira, granjeou a admiração dos seus pares e o respeito dos seus jurisdicionados. Aqui, entre os seus pares, Vossa Excelência foi conselheiro e, nas horas mais graves, sua palavra sempre foi requestada para ser ouvida.
É fácil compreender, de conseguinte, porque recaiu no Ministro José Néri da Silveira a convocação para o exercício da suprema magistratura nacional. Ao Supremo Tribunal é gUindado um juiz experimentado, um juiz de verdade, um grande juiz. É bom que assim seja e seria excelente que sempre fosse assim, porque o Supremo Tribunal é a «voz viva da Constituição», no dizer de Lorde Bryce, ao referir-se à Corte Suprema americana, e ele é, o Supremo Tribunal Federal, tal qual tem sido, nos Estados Unidos, a Corte que lhe serve de modelo, «a consciência do País», (Henry Abraham, «A Corte Suprema no Evolutivo Processo Político», In «Ensaios sobre a Constituição dos Estados Unidos», Forense, p. 106, 1978). As instituições valem por si, mas a sua grandeza depende das pessoas que as fazem funcionar. A Corte Suprema americana, modelo do Supremo Tribunal do Brasil, tem sabido ser, em verda-
TFR - 90 215
de, a consclencia da Nação, demonstra-nos Henry Abraham (Ob. e loco cits.), seja liderando o País (a corte de Marshall), ou estimulando o progresso social e econômico (a Corte de pós-1937), seja colocando-se em posição de observadora, ou mesmo desestimulando certas posições afoitas no campo político-social (a Corte de Chaise-Waite e a Corte de Fuller), seja desafiando o sentimento da maioria e estimulando a tomada de posições no campo das «liberdades civis no período 1956/57», seja nas decisões da Corte de Warren na década de 1960. No caso Dred Scott, de 1857, em que o Tribunal, sob o ponto de( vista legal, estava certo, mas que, politicamente cometeu erro fragoso, não deixou de refletir, de certa forma, uma tendência de setores da vida nacional. Foi caro, todavia, o preço que pagou pelo erro. Nos casos de segregação racial de 1954, 1955, 1969 e 1971, o Tribunal assume posição a mais alta, só igualável com as «memoráveis decisões nos casos Marbury, McCulloch, Martin e Gibbons e as diversas decisões da década de 1960 sobre repartilha e redivisão distrital.» li: que a Corte Suprema, lá como cá, não é estuário de tranqüilidade. Ao contrário, bem disse o «Justice» Holmes: «Estamos muito tranqüilOs ali, mas ali é o centro de uma tempestade, como todos sabemos.»
Se é verdade que «observadores mais severos», conforme dá notícia Baleeiro, «sublinham que o STF não alcançou, no regime político-jurídico brasileiro, o papel eminente desempenhado pela Corte Suprema na história político-constitucional dos Estados Unidos, pela obra da «construction» pretoriana, ora acelerando a evolução do Direito e substituindo-se ao legislador tímido ou tardo, ora freiando-a, se impulsivo e precipitado,» (A. Baleeiro, «O Supremo Tribunal Federal», Revista Brasileira de Estudos Políticos, Belo Horizonte,
MG, n? 34, juiho/72, p. 35), certo é, a Suprema Corte Brasileira jamais falhou. A teoria brasileira do habeas corpus, que teve em Ruy e em Pedro Lessa os seus maiores impulsionado.res, demonstra a preocupação do Supremo Tribunal na proteção dos direitos e garantias individuais. Os atritos do Supremo com Floriano, com Prudente de Morais e com Hermes da Fonseca, noutros tempos, e a posição altaneira do Ministro Ribei· ro da Costa, mais recentemente, os embates em que se viu envolvida a Corte, em seguida a 1964, suas posições liberais, em momento crítico, revelam um Tribunal destemido, cônscio de sua missão. A obra de Edgard Costa, «Os grandes julgamentos do Supremo Tribunal Federal», que Baleeiro chama de «benemérita iniciativa», comprova o afir~ mado e os dois primeiros volumes da «História do Supremo Tribunal Federal», de Leda Boechat Rodrigues, que cuidam dos períodos de 1891/1898 e 1899/1910, deixam bem o Supremo Tribunal na defesa das liberdades civis e do federalismo. li: pena que, no Brasil, os historiadores, as universidades e os juristas de modo geral não se preocupam com a pesquisa e o estudo da vida dos Tribunais, ao contrário do que acontece nos Estados Unidos. Em discurso que aqui proferiu, na homenagem que o TFR prestou ao Supremo Tribunal Federal, pela passagem do seu sesquicentenário, o saudoso Ministro Amarílio Benj amin ressaltou que nos acórdãos do Supremo «está o direito brasileiro. As «Súmulas», que tanto ajudam na SOlução das controvérsias, não dizem tudo. porquanto o que o Supremo realiza e muito mais. Se houvesse publicidade permanente e esclarecida em torno de seus atos, o grande público retribuir-lhe-ia o esforço com estimulante entusiasmo. Se os juristas mantivessem trabalho desinteressado de análise de seus acórdãos sobre temas fundamentais, a colaboração fora do Pretório
216 TFR - 90
não poderia ser melhor, e se os editores decidissem organizar comentários dos diversos ramos do nosso direito, assunto por assunto, calcados em decisões do Supremo Tribunal, com explicativos e referência cabíveis, a cargo de profissionais competentes, o repertóriO representaria o importante di gesto da cultura jurídica nacional que nos falta.» (<<Rev. TFR», 6],·247).
Guarda maior da Constituição, tem o Supremo Tribunal, bem por isso, função política que decorre da própria Lei Fundamental. Aliomar Baleeiro, que foi dos maiores juízes do Supremo e foi homem do nosso tempo, lecionou que esse Tribunal «carrega por precípua missão a de fazer prevalecer a filosofia política da Constituição Federal sobre todos os desvios em que o Congresso e o Presidente da República, Estados, Municípios e P",1";;}ulares se tresmalhem, quer po}S .""s sancionadas ou promulgadas, quer pela execução delas ou pelOS atos naquela área indefinida do discricionarismo facultado, dentro de certos limites, a ambos aqueles Poderes. O traçado desses limites, quer quanto ao legislador quer quanto ao executQr, nunca foi, não é, nem será nunca uma linha firme, clara e inconfundível. Há uma terra de ninguém nesta faixa fronteiriça.» (<<O Supremo Tribunal Federal, esse outro desconhecido», Forense, 1968, p. 103).
Nessa atividade, que é política, política no sentido grego, assim na sua verdadeira acepção, reside a missão mais nobre dos Tribunais, missão que é ainda maior e muito mais significativa quando exercida pelo Supremo, seja porque ele a exerce comumente como revisor de decisão tomada por outro Tribunal, seja porque, quando a exerce, o faz em termos definitivos. Alex'ander Hamilton, no nÍlmero 78 do «The Fe-
deralist», escrito em favor da Constituição, põe em relevo essa atividade dos tribunais, no caso de uma Constituição restritiva, vale dizer, a Constituição i que impõe determinadas restrições à autoridade legislativa. Por exemplo, acentua Hamilton, a Constituição que não aprove leis de confisco, ou leis ex post facto, etc. «Restrições como essas não pOdem ser preservadas, na prática, a não ser mediante os Tribunais de Justiça, cujo dever será declarar qualquer ato contrário ao manifesto teor da Constituição, nulo. Sem isto, todas as defesas dos direitos ou privilégios individuais nada valem.» (Ap. Charles A. Beard, «A Suprema Corte e a Constituição», Forense, Tradução de Paulo Moreira da Silva, 1~ ed., pág. 58).
Por isso mesmo, só os granclp~t~11-ristas - e daí a sabedoria d cons 1-
tuinte em exigir o requisito do notável saber jurídico - podem ser juízes do Supremo Tribunal Federal. Mas não é somente isto que basta. Ao lado do notável saber jurídico, reclama a Constituição a reputação ilibada. Na reputação ilibada compreende-se, em verdade, a coragem moral e o caráter independente do homem, j á que é da mais baixa reputação o cidadão de coluna dorsal vergável.
Um Tribunal de homens assim, sábios e independentes, há de ser, evidentemente, um Tribunal ilustre, que reflete uma Nação ilustre, realizando-se, com ele, o ideal que Milton Campos pregava: «onde haja a certeza da reta distribuição da Justiça, aí os cidadãos repousam e confiam. A estabilidade social se implanta. A paz pÚblica se firma.»
Vossa Excelência, Senhor Ministro José Néri da Silvelra, que madrugou no trabalho e no estudo sério, comprovadamente testado como juiz, assim juiz de verdade, sábio, justo e independente, homem de idéias e de
TFR - 90 217
espírito aberto, haverá de honrar, ilustrar, engrandecer e dignificar a Corte Suprema do Brasil, do modo como a visualizamos e como deve ser: a consciência do País, desta forma representativa, na concepção de Rousseau, da «volonté générale» da Nação.
Vossa Excelência agora vai partir. A sua cadeira vai ficar vaga e nos nossos corações ficará a saudade do companheiro, do orientador, do conselheiro, do irmão. Mas quando compreendemos que a Corte Suprema do BrasiJ á ser dignificada por Vossa Excelência, isso nos faz contentes. E nos honra sobremaneira o fato de que Vossa Excelência saiu daqui, deste Tribunal Federal de Recursos, que Vossa Excelência muito amou e por ele tanto fez. Vossa Excelência será um de nós, sempre e sempre.
Os gaúchos, esses homens altivos, dos Quais Vossa Excelência é lídimo representante, devem estar, neste momento, jubilosos.
No Céu, o Sr. Severino Silveira, seu pai, e D. Maria Rosa Machado Silveira, sua mãe, estão sorrindo.
D. Use Maria Dresch da Silveira, sua esposa e companheira de todas as horas, está feliz, é fácil perceber. E orgulhosos do pai estão os filhos, a Thêmis Maria, o Domingos Sávio, que já estuda o Direito, a Maria Teresa, o Paulo de Tarso, a Maria Cecília, o Felipe Néri e o pequeno Francisco de Sales. O Sr. Alexandre Silveira, seu irmão mais velho, que aos demais irmãos representa, não cabe em si de contentamento.
Receba, Senhor Ministro José Néri da Silveira, com D. Use Maria e com os seus filhos, os cumprimentos dos juízes e servidores do seu Tribunal Federal de Recursos. Seja feliz, Ministro José Néri. Que Deus o guarde, inspire e proteja, por toda a vida.
Discurso pronunciado pelo Ministro Carlos Mário Velloso na Sessão Especial do Tribunal Federal de Recursos, realizada no dia 31-8-81, em homenagem ao Ministro José Néri da Silveira, por motivo de sua nomeação para o cargo de Ministro do Supremo Tribunal Federal.