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Tribunal Pleno

POSSE DO SR. MIN. WILLIAM PATTERSON

ATA DA SESSÃO SOLENE REALI­ZADA EM 3 DE AGOSTO DE 1979

Aos três dias do mês de agosto do ano de mil novecentos e setenta e no­ve, às dezesseis horas, na Sala de Sessões do Tribunal Federal de Re­cursos, presentes os Exm?s Srs. Mi­nistros José Néri da Silveira, Presi­dente do Tribunal, Armando Rollem­berg, Márcio Ribeiro, Peçanha Mar­tins, Moacir Catunda, Aldir G. Pas­sarinho, José Dantas, Lauro Leitão, Carlos Madeira, Gueiros Leite, Was­hington Bolívar, Carlos Mário Vello­SO, Justino Ribeiro, Otto Rocha, Wil­son Gonçalves e Sebastião Reis, pre­sentes, ainda, o Exmo. Sr. Dr. Ge­raldo Andrade Fonteles, I? Subprocurador-Geral da República e o Secretário do Tribunal Pleno, Bel. Ronaldo Rios Albo, foi aberta a Ses­são Solene, especialmente convocada para dar posse ao Doutor William Patterson, nomeado para o Cargo de ministro do Tribunal Federal de Re­cursos pelo Exmo. Sr. Presidente da República Federativa do Brasil. Ao início dos trabalhos, o Exmo Sr. Ministro-Presidente convidou os Exmos Srs. Ministros João de Lima Teixeira, Presidente do Tribunal Su­perior do Trabalho, Ewald Sizenando Pinheiro, Presidente do Tribunal de

Contas da União, Desembargador José Júlio Leal Fagundes, Presiden­te do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, Doutor Firmino Ferreira Paz, Procurador-Geral da República e o Doutor Clóvis Ramalhete Maia, Consultor-Geral da República, para composição da Mesa. Em seguida, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente deSig­nou comissão composta pelos Exmos. Srs. Ministros Armando Rollemberg e Márcio Ribeiro para conduzir o Doutor William Andrade Patterson ao recinto do Plenário. Lido o Termo de posse pelo Secretário do Tribunal Pleno, o empossando prestou o jura­mento regimental e, juntamente com o Exmo. Sr. Ministro-Presidente. as­sinou o Livro de Posse. Em prosse­guimento, o Exmo. Sr. Ministro­Presidente declarou empossado o Exmo. Sr. Ministro William Patter­son, convidando-o a tomar assento na Bancada do Tribunal Pleno. Em seguida, o Exmo. Sr. Ministro­Presidente concedeu a palavra ao Exmo. Sr. Ministro Washington Bolívar para saudar o Exmo. Sr. Mi­nistro William Patterson em nome do Tribunal.

O Exmo. Sr. Ministro Washington Bolívar: Exmo. Senhor Presidente do Tribunal Federal de Recursos e des­ta Solenidade; Exmo. Senhor Presi­dente do Tribunal Superior do Tra­balho; Exmo. Senhor Presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Fede­ral; Exmo. Senhor Presidente do Tri-

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bunal de Contas da União; Exmo. Se­nhor Procurador-Geral da Repúbli­ca; Exm~. Senhor. Consultor-Geral da República; Exmo. Senhor Repre­sentante do Senado Federal, EXJ:llo. Senhor Procurador-Geral da Repú­blica integrante deste Egrégio Tribu­nal como representante do Ministé­rio Público Federal; Senhores Minis­tros do Supremo Tribunal Federal; Senhores Ministros dos demais Tri­bunais Superiores; Senhores Desem­bargadores; Juízes; Membros do Mi­nistério Público, Advogados, Minhas Senhoras, Meus Senhores, Senhor Ministro William Andrade Patterson:

Manda a tradição desta Casa que se cumpra a lei da hospitalidade e um de nós seja designado para dese­jar boas-vindas, ainda que em bre­ves palavras, ao companheiro que chega para desempenhar conosco a missão do julgamento colegiado.

Essa antiga lei do direito das gen­tes, no entanto, aqui é cumprida de forma sui generis, pois os hospedei­ros também são hóspedes e nãó do­nos da Casa:' uns são hóspedes por algum tempo, outros por um tempo mais longo, mas todos por um tempo certo, quer determinado pela apo­sentadoria voluntária, quer pelo li­mite de idade previsto na Lei dos Homens, quer pelo fim comum de to­dos os homens, pela inelutável Lei de Deus. A transitoriedade de nossa passagem, embora paradoxal, so­mente se revela quando aqui chega novo hóspede, para a vaga do antigo, mesclando a alegria com que se re­cebe o novo colega com a saudade daquele que nos deixou.

Por vontade própria, manifestada em carta memorável, deixou-nos Paulo Távora, um dos mais lúcidos e brilhantes juízes que já passaram por este Tribunal, em largo e gene­roso gesto, por acreditar que maior

serviço prestaria à Justiça Brasilei­ra não mais decidindo segundo a lei, mas julgando a própria lei.

Para a nossa companhia vem um dos mais estudiosos, competentes, modestos e sérios juristas da nova geração.

Interpreto o júbilo próprio e dos demais colegas pelo ingresso de Vos­sa Excelência nesta Casa, Sr. Minis­tro William Andrade Patterson, aon­de chega precedido por atuáção marcante em vários órgãos da Ad­ministração, especialmente no Direi­to Público, culminando com o exercício do alto cargo de Consultor­Geral da República.

Sinto-me bem em tê-lo de novo co­mo companheiro de estudos e deci­sões, pois a ventura de conhecê-lo vem desde os idos de 1963, precisa­mente na Consultoria-Geral da Re­pública, onde nos reuniu a confiança do Professor Waldir Pires, - a Vos­sa Excelência, a Aldo Ferro, Herme­nito Dourado e a mim.

Sinto-me bem, como baiano e bra­siliense, pela oportunidade de sau­dar outro baiano e brasiliense' em seu momento de glória. A privação do mar, da gente e das coisas da Ba­hia, da «curva azul de sua enseada», no dizer ensolarado de Ruy, talvez nos tenha sido menos penosa porque ambos somos sertanejos e aos ser­tões, cumprindo destino de origem, um dia nos adentramos, certos de que era preciso deixar as delicias do litoral para ajudar, de alguma for­ma, o Brasil a. crescer por dentro. Por isto foi que, desde a primeira ho­ra, acreditamos em Brasília, onde se encontra o cérebro decindindo e o coração pulsando.

Eis que estava escrito que, nesta mesma cidade, Vossa Excelência re­cebesse o prêmio do seu patriotismo, da constãncia do seu amor à Ciência do Direito, nesta hora de alegria e de triunfo.

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No próprio carro daquele que en­trava em triunfo em Roma, era de lei que um escravo, sustendo acima da cabeça do vencedor uma coroa de louros, lembrasse, entretanto, a ca­da instante, que ele era apenas um homem.

Cabe-me, agora, tarefa idêntica, menos porque Vossa Excelência, modesto e simples como sempre foi, necessite dessa lembrança, mas pa­ra que também se cumpra essa lei antiga e tão sábia, no recordar a to­dos aquela verdade.

Talvez por isso é que D' Aguesseau assim alertava os Juízes para a tare­fa de cada dia: - «ao entrares no Tribunal, lembra-te de que és ape­nas um homem; ao saíres do Tribu­nal, não te esqueças de que és um juiz».

Quem se detiver sobre o conteúdo e a natureza do labor de cada um dos três Poderes da República verifi­cará que o Executivo trabalha sobre a realidade palpitante do presente; o Legislativo, mediante previsões ~o­bre o comportamento humano no fu­turo; e o Judiciário, sobre acontéci­mentos do passado, julgando a con­duta dos homens segundo leis de tempos ainda mais remotos.

«O erro de cada dia» - declama Cassiano Ricardo - é que.

«O homem da lei decreta que não haja mais fome que não haja mais frio, que sejamos irmãos uns dos outros, Datilograficamente.»

Nada mais angélico do que a sua intima convicção de que dirige o acontecimento.»

Refere Paulo Dourado de Gusmão que éossio ensina haver um plexo de valores jurídicos, integrado por sete v,alores fundamentais: a ordem, a segurança, o poder, a paz, a coope­ração, a solidariedade e a justiça.

Neste plexo, ocupa a justiça uma po­sição central que acompanha, como uma sombra, os demais valores jurídicos, sobre os quais prevalece, pois exige a realização dos demais valores para realizar-se completa­mente, já que não se pode pensar em justiça senão como ordem, seguran­ça, poder, paz, cooperação e solida­riedade.

(<<O pensamento Jurídico Contem­porâneo», p. 59).

E essa é a nossa missão, praticar a justiça e, por conseqüência, não praticar a injustiça, como evitar que ela seja praticada, pois se a justiça é o maior de todos os valores, a injus­tiça, no pensar socrático, é o maior de todos os males.

Em nosso caso, o erro de cada dia consiste em repetir-se o conceito de Justiça, tal como está expresso nas Institutas, citado sempre em I atiII]. , para lhe dar mais ênfase - JusUUa estt constans et perpetua voluntas jus isuum cUique tribuendi - ou se­ja, a vontade firme de dar a cada um o que lhe pertencer. Rec!ta-se uma lição aprendida numa língua morta que vigorava numa civiliza­ção há muito desaparecida.

Entretanto, já em 1944, em notável discurso de paraninfo na Faculdade de Direito da Bahia, João Mangabei­ra advertia e ensinava que esse ve­lho tabu não corresponde ao direito moderno, pois «a regra da justiça deve ser: a cada qual segundo o seu trabalho, como resulta da sentença de São Paulo na carta aos Tessaloni­censes, enquanto não se atinge o princípio de «a cada um segundo a sua necessidade». «Pode ser que ha­ja nele a essência das virtudes cris­tãs enlouquecidas, como afirma Chesterton. Mas - continuou o gran­de tribuno - enlouquecidas ou não, a verdade que se consubstancia nes­ta regra irradia do Sermão da Mon­tanha, enquanto a primeira brota do egoísmo de um mundo construído so-

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bre a escravidão. Aplicada em toda a sua inteireza, a velha norma é o símbolo da descaridade, num mundo de espolia dores e espoliados. Porque se a justiça consiste em dar a cada um o que é seu, dê-se ao pobre a po­breza, ao miserável a miséria e ao desgraçado a desgraça, que isso é que é deles. Nem era senão por isso que ao escravo se dava a escravi­dão, que era o seu, no sistema de produção em que aquela fórmula se criou. E, no entanto, já foi assim e, em parte, ainda o é». «(Oração de Paraninfo aos bacharéis de 1944», Rev. da Faculdade de Direito da Ba­hia, vol. XX, pág. 341.

Assim, já não basta ao jurista o «viver honestamente, não lesar a ninguém e dar a cada um o que é seu' - velhos preceitos do Direito Romano. Nem é por outro motivo que a nossa própria Lei de Introdu­çáo ao Código Civil ordena que o juiz, na aplicação da lei, atente aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum» (art. 5?1.

Se é certo que o juiz deve cumprir fielmente a lei, se o imperativo é claro; dar-lhe interpretação consentâ­nea com as necessidades sociais, se é dúbia: suprir-lhe a falta, se lhe descobre lacunas, ou negar-lhe auto­ridade, se contrária à Constituição, segundo Mario Guimarães (<<O Juiz e a Função Jurisdicional», págs. 330/1), não menos certo é que sua ta­refa mais nobre consiste em ilumi­nar o texto às vezes sombrio da lei e soprar vida em seu corpo imóvel e frio. Há que se pôr em cada, julga­mento tanto alma e sabedoria. que as decisões, embora versando sobre fa­tos passados e regulando conflitos do presente, se lancem, perenes, nos longes do futuro.

Eis que Vossa Excelência vem partilhar conosco a missão do julga­mento colegiado. Dir-se-ia que, por ser tarefa conjunta, a angústia de julgar nossos semelhantes se dilui e

que basta mais um Cirineu a susten­tar uma parte da cruz para que ela se torne mais leve. Mas, nem a mis­são do julgamento singular é mais pesada, nem a do cOlegiado, por ser repartida, é mais leve, pois cada uma dessas formas de julgar tem suas próprias angústias e perigos. Sendo a injustiça, em si mesma, o maior dos males, não se torna me­nor, se praticada por um, nem maior, se imposta por muitos. Se é certo que o juiz Singular necessita de solidão, sua incomunicabilidade constante pode levá-lo à intolerância ou ao abuso de poder, se não tiver humildade. Pelo menos esse risco é menor nos colegiados. Os Tribunais são essencialmente democráticos em sua constituição-funcionamento. Suas decisões, tomadas por maioria, resultam da lógica de um, do bom­senso de outro, da ciência de um ter­ceiro, respeitado sempre o pensa­mento da minoria. E ao rever sem­pre os seus precedentes, muitas ve­zes o vencido de ontem se converte no vencedor e vice-versa.

Assim, embora Vossa Excelência chegue a este Tribunal aos 42 anos, ainda bem jovem, o mais jovem de todos nós, nem por isso possui menos ciência ou sabedoria, segundo se in­fere de sua atuação, até aqui, na vi­da pública. Aos 26 anos Seabra Fa­gundes foi Desembargador e Cesar Lattes descobriu o «meson»; nosso Presidente, mesmo, aqui chegou aos 36 anos e já era um jurista consagra­do.

A idade, por si só, não confere ciência e, muito menos, sabedoria. A ciência se adquire pelo estudo e pela observação; a sabedoria é um dom conferido por Deus e «ela mesma vai à procura dos que são dignos dela», no dizer bíblico (<<Sabedoria», 6: 16l.

Na difícil tarefa de julgar, nós en­velhecemos e rejuvenescemos todos os dias, partícipes da angústia alheia que nos atinge fundo, na sístole e

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diástole de sua pungente pulsação. Não é por mera coincidência que tantos de nós sejamos acometidos de moléstias graves, especialmente do coração, o músculo - sede dos senti­mentos humanos.

Ao examinar um processo crimi­nal, há pouco tempo, encontrei no papel timbrado de um médico o ensi­namento de que.

«Um homem é tão jovem como a sua

fé, tão velho como o seu

temor tão jovem como a con­

fiança que tem em si mes­

mo, tão velho como a sua

dúvida, tão jovem como a sua

esperança, tão velho como o seu

desespero». É que a todos os perigos que ron­

dam a sociedade moderna - desde a insofreável ganância das multinacio­nais ao engodO do consumismo - os juízes da Democracia têm de estar atentos para assegurar, pela preva­lência da Justiça, a fraterna convi­vência humana. «Se o sal perder a sua força, com que se há de salgar?»

Confiemos todos na inspiração do salmista, na certeza de que o Senhor domina eternamente, julgando o uni­verso com justiça e pronunciando sentença com eqüidade sobre os po­vos. «O Senhor torna-se refúgio para o oprimido, uma defesa oportuna pa­ra os tempos de perigo» (Salmos, 8: 9,10).

Seja, pois, benvindo, Sr. Ministro, certo de que este Tribunal se tem constituído num alto refúgio para o oprimido, num «alto refúgio em tem­pos de angústia».

A segUir, o Exmo. Sr. Ministro­Presidente concedeu a palavra ao

Exmo. Sr. Dr. Geraldo Andrade Fon­teles, I? Subprocurador-Geral da Re­pública, para saudar o Exmo. Sr. Mi­nistro William Patterson, em nome do Ministério Público.

o Exmo. Sr. Dr. GeraldO Andrade Fonteles, I? Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Presidente do Egrégio Tribunal Federal de Recur­sos, Srs. Ministros deste Egrégio Co­legiado, Exm o Sr. Ministro­Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Sr. Presidente do Tribunal de Contas da União, Exmo. Sr. Procurador-Geral da República, Exmo. Sr. Consultor-Geral da Repú' blica: Sr. Representante do Presi­dente do Senado Federal, Exm?s. Srs. Ministros do Supremo Tribunal Federal, Autoridades aqui presentes dos demais Poderes e Orgãos da Ad­ministração Pública, Srs. Advoga­dos, Srs. Funcionários da Casa, Meus Senhores, Minhas Senhoras.

Ministro William Andrade Patter­son:

V. Exa. proveio de plagas fecun­das da intelectualidade brasileira. Da­quela unidade da Federação que, ain­da nos nossos dias, alça, às mais ele­vadas culminanças da Nação, o vul­to honroso do grande Rui Barbosa; e que, ainda mais uma vez, fornece a este Egrégio Colegiado nomes da melhor estirpe de sua prOjeção, for­mada no amplo cenário do Judiciá­rio pátrio, tais sejam os dos eminen­tes Ministros Amarílio Benjamin, Al­varo Peçanha Martins e WaShington Bolívar de Brito.

Isto, por si só, já delinea a auréola luminosa que nos é lícito vislumbrar, no porvir da judicatura de Vossa Ex­celência, Sr. Ministro William Pat­terson.

Entre o elenco de títulos que or­nam sua brilhante atuação na Admi­nistração Pública, destaquei um dos menores, mas de grande significado para mim, pois, integrante como V.

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Exa., participei do Grupo de Traba­lho constituído nos termos do Aviso n? 16-c. de 23-2-78, do Gabinete Civil da Pi'esidência da República, com a incumbência de realizar estudos e oferecer proposta legislativa, visan­do a reformular o sistema de remu­neração dos membros do Ministério Público da União e do Serviço Jurídico da União e das Autarquias, infelizmente, não concretizado.

Precisamente, ao ensejo dos traba­lhos do Grupo, tive oportunidade de conhecê-lo de perto e, bem assim, aquilatar a sua personalidade. De tanto, distingui a sua capacidade, o lastreamento de conhecimentos que o credencia na formulação da me­lhor dialética e no equacionamento dos valores com que arma e sopesa os seus pronunciamentos.

Se isso não bastasse, eis que per­cebi, nos corredores desta Casa, o sussurro alviçareiro de seus ilustres Pares, ao conhecerem a acertada es­colha do Governo, na eleição de seu honrado nome, para Ministro do Egrégio Tribunal Federal de Recur­sos.

Aqui, Sr. Ministro , V. Exa. - me relevará a ousadia de afirmar - te­rá oportunidade, creio eu, de repas­sar a sua convicção quanto à respon­sabilidade e o prurido de sutilezas que desnivelam as funções do Minis­tério Público propriamente dito, in­clusive o Federal, das dos serviços Jurídicos da União, confiados aos Assistentes Jurídicos, embora se fri­se com linha dobrada, que não haja prevalência na qualidade dos traba­lhos técnicos de uns e de outros. Afigura-se-me comparar o destaque, tal qual se pretendessemos desnive­lar os juízes das instâncias judiciá­rias.

Seu espírito de receptividade e franquia ao diálogo, a postura de se­renidade no fragor do debate e amor à análise, são atributos pessoais que lhe outorgam vocação à magistratu-

ra. Por isso, todos os que militam nas hostes do Judiciário recebem-no com os braços abertos.

Quero ainda, Sr. Ministro, conside­rando o adestramento de V. Exa. no encaminhamento das sõluções ade­quadas no âmbito da Aãininistração Pública, o que vale dizer, do Gover­no, que se sirva envidar o melhor dos seus esforços no sentido de in­tensificar sua valiosa colaboração com o eminente Ministro-Presidente, José Néri da Silveira, na consecução do seu programa de trabalho. O nos­so Presidente preconizou, com muito acerto, a necessidade do melhor en­trosamento entre o Poder Judiciário e o Executivo, tal como afirmado no seu notável discurso, por ocasião de sua posse na Presidência desta Ca­sa.

Note-se que aquela incisiva fala já produziu seus efeitos, pelo decreto de anistia dos débitos fiscais inferio­res a mil cruzeiros.

O Ministério Público Federal, rendendo-lhe justo preito de homena­gem pelo seu auspicioso ingresso na Magistratura, rejubila-se com sua excelentissima família que, como a de nós outros, sempre soube ameni­zar as refregas de nossas lutas pela vida a fora, perfumando com o cari­nho de seu amor e solidariedade pro­fundos, o mal odor de todas as polui­ções hodiernas.

Auguramos-lhe, também, que a carga de processos não lhe arrefeça o ânimo ou espírito, cuja predisposi­ção à luta encontra melhores evidên­cias noutros trabalhos prestados ao pOder público e órgãos associativos de interesse da coletividade.

Por fim, numa palavra pessoal e fraterna, William, amigo dileto de meu filho Cláudio Lemos Fonteles, e de meu ilustre colega, Dr. Valim Teixeira, vinculados aos julgamen­tos do Tribunal Desportivo de Brasília, rogo a Deus que o ilumine na prestação jurisdicional de seus

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votos para o bem de todos e manu­tenção do prestígio deste Tribunal, não esquecendo de arrematar esta pálida oração com os versos sober­bos do grande advogado e inspirado poeta de minha terra, Quintino Cu­nha, no seu tocante poema intitulado «O Poder da Miséria», onde alude o personagem, seu homônimo, e com suas virtudes, e que assim começa:

«Numa deserta estrada erma e sombria transitava um senhor que a fidalguia o distintivo fez: Era William, um nobre, destes nobres que via os ricos, como via os po­bres. William era um inglês». Dal1do seqüência à solenidade, o

Exmo. Sr. Ministro-Presidente conce­deu a palavra ao Sr. Dr. Hermenito Dourado, para saudar o Exmo. Sr. Ministro William Patterson, pelo Conselho da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Distrito Federal.

O Exmo. Sr. Doutor Hermenito Dourado, i\dvogado: Exm? Sr. Pre­sidente, Egrégios Ministros, Exm?s. Srs. Presidentes dos Tribunais Supe­riores Federais aqui "presentes, Ex­mo. Sr. Desembargador-Presidente do Tribunal de Jus1lça do Distrito Federal, Senhores Ministros, Juízes, Desembargadores, Advogados, Meus Senhores e Minhas Senhoras:

A ordem dos Advogados do Brasil - Seção do Distrito Federal­tconcedeu-me a subida honra, em ca­ráter excepcional - posto que reser­va a seus ilustres conselheiros - de prestar, representando-a, a homena­gem devida ao Dr. William Andrade Patterson, por sua investidura como Ministro deste Egrégio Tribunal Fe­deral de Recursos.

Fê-lo, decerto, levando em conta três motivos, para os quais convoco, por um instante, a benevolente aten­ção do Tribunal e de quantos se fa­zem presentes a esta solenidade.

Primeiro, em razão dos estreitos laços funcionais que, ao longo de quase três lustros, nos mantiveram

juntos no esforço comum de assesso­ramento jurídico à Consultoria-Geral da República, $ob a condução de Wal­dir Pires, Adroaldo Mesquita da Cos­ta, Romeo AlmeÍda Ramos e Luiz Rafael Mayer;

Segundo, por causa das vincula­ções profissionais decorrentes do exercício da advocacia, em conjunto, que durou alguns anos;

Terceiro, tendo em vista o esforço de que partilhamos em favor do espor­te, sobretudo na qualidade 'de Juiz do Tribunal de Justiça Desportiva do Distrito Federal, que tive a honra de ser por algum tempo e, o Dr. Wil­liam, por longo período, reconduzido sempre pela vontade dos clubes que integram a Federação Metropolita­na.

Desta forma, sinto-me com autori­dade, em virtude do labor diuturna­mente compartilhado na Consultoria Geral da República, ao longo dos anos, para testemunhar, com absolu­to conhecimento de causa, sobre as qualidades pessoais do Dr. William Andrade Patterson que o tornaram uma das mais gratas revelações no exercício das funções de assessora­mento do Serviço Jurídico da União, tanto pelo saber jurídico, quanto pe­lo senso de equilíbrio, honradez e probidade, coadjuvados por sua ex­traordinária dedicação ao trabalho e perseverante busca do ideal de justi­ça.

Já se disse que a existência do di­reito administrativo «é, em alguma medida, fruto de um milagre» sob a consideração de que é de admirar-se «que o próprio Estado se considere vinculado pelo direito», posto que «está na natureza das coisas que um governante acredite, de boa fé, ser investido do poder de decidir discri­cionariamente acerca do conteúdo e das exigências do interesse geral», devendo-se «considerar pouco nor­mal» que o Estado veja «suas deci­sões submetidas à censura de um

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juiz», consoante o afirmou na intro­dução de seu «Le Droit Administra­tif», Prosper Weil.

De conhecimento próprio, estou certo de que, no que depender do Dr. William Andrade Patterson, este Egrégio Tribunal operará tal mila­gre. As qualidades para tanto ele as possui em porção dobrada, como já o demonstrou em sua marcante pas­sagenl pela Consultoria-Geral da Re­pública.

De outra parte, tive o privilégio de participar do escritório de advocacia que, no início da década de 60, mar­cava o começo do que viria a ser a promissora carrreira de advogado do Dr. Wiliam Andrade Patterson.

Com efeito, tive, então, a ventura - embora sem a qualidade de con­dômino do imóvel, mas tão-só do das idéias - de integrar aquele escritó­rio em companhia do Dr. Aldo Rauli­no Carneiro da Cunha Ferro, tam­bém condômino das idéias, e, ainda, do imóvel.

Se na Consultoria-Geral da Repú­blica revelaram-se as qualidades do jurisconsulto que todos reconhece­mos, pelos trabalhos produzidos pelo Dr.William Andrade Patterson co­mo Assistente Jurídico ou Consultor­Geral, repassados de conhecimento doutrinário acumulado pela pesquisa a que se impôs sem desfalecimentos, no exercício da advocacia revelaram-se a grandeza de sua mo­déstia, a dignidade e independência profissionais que o fizeram credor do respeito, consideração e distinto conceito de seus colegas advogados.

Finalmente, assinalo o esforço que, juntos, desenvolvemos em favor do esporte, quando Brasília mal inicia­va os passos para afirmar-se como centro das grandes decisões nacio­nais, na visão profética de um de nossos maiores.

Embora a contribuição ama­dorística, como atleta, não mereça

destaque, é de ressaltar-se, no entan­to, a J inestimável colaboração do Dr. William Andrade Patterson ao Tribunal de Justiça Desportiva do Distrito Federal, a que serviu por longos anos com inexCedível dedica­ção e eficiência,

Eminente Ministro William Andra­de Patterson, fazendo esses registros· creio que os seus então colegas da Consultoria-Geral, Washington Bolívar de Brito, Gastão dos San­tos, Aldo Ràulino Carneiro da Cunha Ferro, podem todos repetir: bons tempos! fruto da descontração e con­fiança que só o relacionamento em bases sólidas da amizade é capaz de gerar. Bons tempos que se vão esfu­mando na visão do que ficou para trás, deixando um gosto agridoce de saudade, típico da lembrança de que valeu a pena viver.

A Seção de Brasília da Ordem dos Advogados, Sr. Ministro William An­drade Patterson, sente-se orgulhosa com a investidura de Vossa Excelên­cia, se não por outros motivos, pelo altamente expressivo de ser o pri­meiro advogado com inscrição origi­nária em seu Quadro a ocupar cargo de tamanha relevância no Poder Ju­diciário, fato indicativo, sem dúvida, da maturidade de nossa Secional.

Por todos os motivos e, em espe­cial, por este, a Ordem dos Advoga­dos do Brasil - Seção do Distrito Federal -espera e confia em que Vossa Excelência, Sr. Ministro Wil­liam Andrade Patterson, prosseguirá no exercício da judicatura com a mesma dedicação ao trabalho, a mesma eficiência e o mesmo brilho, revelados como integrante do Servi­ço Jurídico da União e na banca de advogado.

Ao Egrégio Tribunal Federal de Recursos, as congratulações da Or­dem, pela investidura do Dr. Wil­liam Andrade Patterson como seu Ministro. Ao Governo Federal e, de

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modo especial, ao Excelentíssimo Senhor Ministro da Justiça, os para­béns da Secional pela feliz escolha.»

Em seguida, o Exmo. Sr. Ministro­Presidente concedeu . a palavra ao Exm? Sr. Ministro William Andrade Patterson.

o Exm? Sr. Ministro William An­drade Patterson: Ao ser investido no honroso cargo de Ministro deste Egrégio Tribunal Federal de Recur­sos, faço ingente esforço para conter a grande emoção que me envolve neste momento, a fim de poder dirigir-me aos ilustres pares, autori­dades e amigos presentes nesta sole­nidade.

Não poderia deixar de mencionar, em primeiro lugar, e porque impor­tante para mim, o carinho e a frater­nidade com que fui recebido por to­dos, nesta Corte, desde os primeiros contatos.

Aqui venho sem a pretensão de ombrear-me, em saber jurídico, aos Excelentes Juízes que compõem este excelso Colegiado. Trago, tão­somente, alguma experiência da mi­litância profissional e um mínimo de maturidade no campo dos problemas jurídicos, adquirida em quase vinte anos de exercício contínuo na Consultoria-Geral da República.

Não sou um erudito. Se alguma virtude possuo, talvez seja a da in­tuição jurídica, assimilada pela vi­vência do Direito.

Assumo a judicatura numa hora de reformulaçao e de tomada de consciência dos graves problemas que afligem o Poder Judiciário. Fica­rei reconfortado se, além do desem­penho das tarefas precípuas do meu cargo, puder colaborar nesse árduo trabalho que considero de capital importância para os futuros destinos da prestação jurisdicional.

A desmassificação das demandas judiciais, objetivo primordial dessa

missão, permitirá, além de outros benefícios aquilo que julgo de maior relevo, a possibilidade de reflexão do juiz, principalmente dos que como eu, se iniciam no sacerdócio da ma­gistratura. A reflexão, repito, do sentido de justiça em todos os seus contornos, com tempo suficiente pa­ra a busca das suas razões filosófi­cas e teÍeológtcas - da justiça como atributo do poder divino, como virtu­de universal, como princípio exclusi­vamente social, como balizaJ7lento dos postulados de igualdade ou, final­mente, da justiça como reaÍidade que não se exaure no fato histórico ou positivo, estando sujeita a evolu­ção ou involução -. Todas as teo­rias, mesmo as que encontram repú­dio no atual estágio da sociedade, contribuíram, estou certo, para a concepção intelectual do juiz.

A verdade é que estamos estacio­nados no ponto cruciante da imagem de justiça, aquele em que o direito positivo comanda, friamente, os desígnios das suas diretrizes, como realidade social, criando, por sua massificação, empeços ao desenvol­vimento do pensamento construtivo que constitui a beleza intuitiva do Direito. E dessa realidade não pode fugir o magistrado sob pena de, na aplicação da justiça, praticar a in­justiça através do retardo das suas decisões. O tempo, hoje, tem signifi­cativa relevância nas relações so­ciais e econômicas.

De qualquer sorte, a superação dos problemas estará sempre na de­dicação e na formação pragmática do juiz, porque, como assinalado por Del Velchio: «Quem verdadeiramen­te se consagra ao ideal de justiça, supera-se a si mesmo como indívi­duo, visto identificar-se, universal­mente, com os outros para além da esfera das aparências físicas; e se­guindo aquela vocação íntima que lhe atesta a lei do espírito como ser racional, entra no reino do eterno e do absoluto».

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Se a todos nós é dificultado, por enquanto, o prazer de refletir filoso­ficamente, é-nos concedido, contudo, o privilégio do exercício dessa sagra­da função - distribuir justiça -.

Vejo minha responsabilidade au­mentada, não só porque sentarei ao lado de excelsas figuras, cultoras do Direito, como, também, por ter de substituir um juiz de qualidades ex­cepcionais, o Ministro Paulo Távora, a quem rendo minhas homenagens. Deus haverá de iluminar-me para que possa corresponder às expectati­vas, principalmente dos que me ele­varam a esta posição.

Agradeço, finalmente, aos ilustres oradores que me saudaram. As pala­vras elogiosas do, eminente Ministro Washington Bolívar, nascidas do enorme coração de amigo e conter­râno, do Dr. Geraldo Andrade Fonte­les, preclaro Subprocurador-Geral da República, digno representante do Ministério Público Federal, a quem muito prezo, e as do represen­tante da Ordem dos Advogados do Brasil, Dr. Hermenito Dourado, esti­mado colega e companheiro de tan­tas atividades.

Muito obrigado a todos.» Antes de declarar encerrada a Ses­

são, o Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira, Presidente do Tribunal, proferiu as seguintes palavras:

«Em nome do Tribunal agradeço a presença das altas autoridades: do Sr. Ministro João de Lima Teixeira, Presidente do Tribunal Superior do Trabalho; do Sr. Desembargador Jo­sé Júlio Leal Fagundes, Presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal; do Sr. Ministro Ewald Size­nando Pinheiro, Presidente do Tribu­nal de Contas da União; do Doutor Firmino Ferreira Paz, Procurador­Geral da República; do Deputado Homero Santos, I? Vice-Presidente da Câmara dos Deputados; dos Srs. Ministros do Supremo Tribunal Fe­deral dos Tribunais Superiores, do

Tribunal de Contas da União, dos Srs. Ministros aposentados deste Tri­bunal, dos Srs. Juízes Federais, • dos Srs. Magistrados, dos Srs. Membros do Ministério Público da União, dos Srs. representantes dos Srs. Minis­tros de Estado, dos Srs. Advogados, entre os quais, e acreditando a todos representar, o ilustre Dr. Adroaldo Mesquita da Costa, do Sr. Represen­tante do Escritório do Estado do Rio Grande do Sul, Dr. Júlio Cesar de Rose, bem assim das demais autori­dades presentes, das senhoras e dos senhores, dos funcionários do Tribu­nal, de todos que emprestaram a es­ta solenidade, com suas presenças, alto destaque. Está encerrada a Ses­são.»

Compareceram à solenidade as se­guintes autoridades: Ministros Décio Miranda e Rafael Mayer, do Supre­mo Tribunal Federal; Ministro Luiz Octávio Gallotti, do Tribunal de Con­tas da União; Dr. Manoel Ignácio Chaves de Mendonça, representante do Exmo. Sr. Vice-Presidente da Re­pública; Deputado Federal Homero Santos, I? Vice-Presidente da Cãma­ra dos Deputados; Doutor Adroaldo Mesquita da Costa; Dr. Walter Ra­mos da Costa Porto, representante do Exmo. Sr. Ministro da Justiça; Dr. Jorge Leovegildo Lopes, repre­sentante do Exmo. Sr. Ministro da Marinha; General-de-Divisão Octá­vio Pereira da Costa: representante do Exmo. Sr. Ministro do Exército; Ministro Alvaro da Costa Franco, re­presentante do Exmo. Sr. Ministro das Relações Exteriores; Dr.Cid He­ráclito de Queiroz, representante do Exmo. Sr. Ministro da Fazenda; Dr. Estevão Santos Pereira, represen­tante do Exmo. Sr. Ministro dos Transportes; Dr. Igor Tenório, re­presentante do Exmo. Sr. Ministro da Agricultura; Dr. João Guilherme Aragão, representante do Exmo. Sr. Ministro do Trabalho; Dr. Tarcísio Carlos de Almeida Cunha, represen­tante do Exmo. Sr. Ministro da In-

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dústria e do Comércio; Deputados Federais Djalma Marinho, Alberico Cordeiro e Raimundo Diniz; Prof. João Baptista Cascudo Rodrigues, representante do Exmo. Sr. Ministro das Minas e Energia; Dl'. Hélio Es­trela, representante do Exmo. Sr. Ministro das Comunicações; Dl'. Paulo Cesar Cataldo, representante do Exmo. Sr. Ministro-Chefe do Ga­binete Civil da Presidência da Repú­blica; Tenente-Coronel-Aviador Zeir Scherrer, representante do Exmo. Sr. Ministro-Chefe do Serviço Nacio­nal de Informações; Dl'. Antônio Marcos Lobo, representante do Ex­mo. Sr. Ministro Extraordinário pa­ra Execução do Programa Nacional de Desburocratização; Ministros aposentados Moreira Rabello, He­noch Reis, Esdras Gueiros, Oscar Corrêa Pina e Paulo Távora, do Tri­bunal Federal de Recursos; Dl'. Maurício Corrêa, Presidente do Con­selho da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Distrito Federal; Coronel Moacir Coelho, Diretor­Geral do Departamento de Polícia Federal; Drs. Gildo Corrêa Ferraz, Francisco de Assis Toledo e A. Va­lim Teixeira, Subprocuradores­Gerais da República; Dl'. Luiz Rodri­gues, representante do Sr. Diretor­Geral do Departamento Administra­tivo do Serviço Público; Desembar­gador Raimundo Ferreira de Mace­do; Deputados Federais José Penedo e Jorge Viana, Dl'. Waldir Pires; Drs. Gustavo Teixeira Lages, Fer­nando Américo Veiga Damasceno, Carlos Figueireclo Salazar, Raul Mo­reira Pinto, Bras Henrique de Olivei­ra, Geralda Pedrosa, Sebastião He­nato de Paiva e José Luciano de Castilho Pereira, Juízes do Traba­lho; Dl'. Wilson Egipto Coelho, Con­sultor Jurídico do Banco Central do Brasil, Dl'. Roberto Battendieri, re­presentante do Governo do Estado de São Paulo; Dr. Julio Cesar de Ro­se, representante do Governo do Es­tado do Rio Grande do Sul, Juízes,

Advogados, membros do Ministério Público e funcionários da Secretaria do Tribunal.

Encerrou-se a Sessão às 17h 45min ..

Tribunal Federal de Recursos, 3 de agosto de 1979 - Ministro José Néri da Silveira. Presidente - Bel. Ronaldo Rios Albo, Secretário.

POSSE DO SR. MIN. ADHEMAR RAIMUNDO DA SILVA

Palavras de saudação do Sr. Minis­tro Néri da Silveira, Presidente do Tribunal Federal de Recursos, pela ocasião da posse do Sr. Ministro Adhemar Raimundo da Silva.

Exmo. Sr. Dl'. Petrônio Portella, DD. Ministro de Estado dos Negó­cios da Justiça e representante de Sua Excelência o Sr. Presidente da República. Exmo. Sr. Dl'. Homero Santos, Primeiro Vice-Presidente da Câmara dos Deputados e represen­tante de S. Exa. o Sr. Presidente da mesma casa do Congresso. Exmo. Sr. Ministro João de Lima Teixeira, DD. Presidente do Tribunal Superior do Trabalho. Exmo. Dl'. Antõnio Carlos Magalhães, DD. Governador do Estado da Bahia. Exmo. Sr. Mi­nistro Pedro Gordilho, do Tribunal Eleitoral e representante de S. Exa., o Sr. Ministro Leitão de Abreu, Pre­sidente daquela egrégia Corte. Ex­mo. Sr. Ministro Ruy de Lima Pes­soa, do Superior Tribunal Militar e representante de S. Exa., o Sr. Gene­ral Reinaldo Melo de Almeida, Ministro-Presidente desse mesmo Tribunal.

O Sr. Ministro Néri da Silveira (Presidente): Srs. Ministros deste Tribunal, Exmo. Sr. Dl'. Geraldo An­drade Fontelles, mui digno Primeiro Subprocurador-Geral da República, Exmo. Sr. Dl'. Firmino Ferreira Paz, DD. Procurador-Geral da Repú­blica, Exmo. Sr. Professor Clóvis

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Ramalhete, DD. Consultor-Geral da República, Exmos. Srs. Represen­tantes de S. Exas., o Sr. Vice­Presidente da República e Srs. Mi­nistros de Estado dos Negócios da Marinha, do Exército, da Fazenda, dos Transportes, da Agricultura, da Educação -e Cultura, do Trabalho, da Saúde, da Indústria e Comércio, das Minas e Energias, da Secretaria do Planejamento, do Interior e do Sr. Diretor-Geral do DASP, Exmo. Sr. Ministro Luiz Gallotti, do Tribunal de Contas da União e representante de S. Ex~, o Sr. Ministro-Presidente daquela Corte, Exmo. Sr. Desembar­gador Antônio Carlos Sopo, DD. Vice-Presidente do Tribunal de Jus­tiça da Bahia e representante dessa Colenda Corte; Exmo. Sr. Senador Nelson Carneiro, Exmos. Srs. Minis­tros aposentados deste Tribunal, Ex­mos. Srs. Subprocuradores-Gerais da República, Ex~ Reverendíssima Dom Geraldo D'Avila, DD. Bispo­auxiliar de Brasília e representante de S. Exa. Reverendíssimo, Dom Jo­sé Newton de Almeida Batista, DD. Bispo de Brasília; Sr. Conselheiro Heitor Dias, representante do Minis­tro de Contas da Bahia, Sr. Dr. José Paulo Sepúlveda Pertence, Primeiro Vice-Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; Sr. Dr. Maurício José Corrêa, Presi­dente da Seção do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil: Sr. Dr. Thomaz Barcellar da Silva, Presidente da Seção Baiana da Or­dem dos Advogados do Brasil; de­mais autoridades presentes ou repre­sentadas, Srs. Parlamentares, Srs. Juizes Federais, Srs. advogados, Srs. membros do Ministério Público da União e do Distrito Federal e dos Territórios e membros dos Serviços Jurídicos da União, minhas Senhoras e meus Senhores: reúne-se o Tribu­nal Federal de Recursos, em sessão solene e especial, para dar posse a seu novo membro, o ilustre Desem­bargador Adhemar Raymundo da Sil-

va, do Colendo Tribunal de Justiça da Bahia, representante nomeado por S. Ex~ o Sr. Presidente da Repú­blica, na vaga ocorrida com o faleci­mento do saudoso Ministro Amarílio Aroldo Benjamim da Silva.

Convido os ilustres Ministros Ar­mando Rollemberg e Márcio Ribeiro para, em comissão, introduzirem no recinto deste Plenário o Sr. Desem­bargador Adhemar Raymundo da Sil­va.

Convido o Sr. Desembargador Adhemar Raymundo da Silva a ler o termo de compromisso deste Tribu­nal.

O Sr. Secretário lê o Termo de Posse;

O Sr. Ministro Adhemar Raymun­do da Silva, Assina o Termo de Pos­se;

O Sr. Ministro Néri da Silveira (Presidente): Declaro empossado no cargo de Ministro do Tribunal Fede­ral de Recursos o Desembargador Adhemar Raymundo da Silva.

Convido o Sr. Ministro Adhemar Raymundo da Silva a tomar assento na bancada, ao lado do Sr. Ministro Wilson Gonçalves.

Para falar em nome do Tribunal, concedo a palavra ao eminente Mi­nistro Peçanha Martins.

O Sr. Ministro Peçanha Martins: Senhor Presidente, Sr. Representan­te da Cãmara dos Deputados, Sr. Go­vernador da Bahia, Sr. Ministro de Estado da Justiça, demais autorida­des, minhas Senhoras e meus Senho­res. Serão breves as minhas pala­vras nesta sessão especial e solene, brevidade que venho adotando em oportunidades semelhantes, princi­palmente depois que Lara de Resen­de, no seu discurso de posse na Aca­demia Brasileira de Letras, contou que Pedro Calmom, um componente do rol dos consagrados oradores da atualidade, definiu o discurso longo

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como o pior dos discursos. Serei, portanto, repetirei mais uma vez, breve, conciso, cabendo-me apenas apresentar o novo Ministro e expressar-lhe as nossas boas-vindas, uma incumbência que me foi dada, estou certo, porque, além de contem­porâneo de faculdade - sendo eu um pouco menos jovem - nascemos na mesma cidade, a velha, mas sempre airosa Salvador da Bahia, solidária com seus filhos e sempre impulsio­nadora nos embates da vida pública, bastando um simples passar de olhos neste salão com muitos baianos ilus­tres.

Governador da Bahia, Presidente do Tribunal de Justiça, Senador, Presidente da Seção Baiana da Or­dem dos Advogados, Consultor Jurídico do Ministério da Justiça, Representante da Universidade Fe­deral e advogado dos mais conspícuos, Adhemar Raymundo da Silva, bacharel de 8 de dezembro de 1937 e Pretor de Santana dos Brejos, sete dias após a formatura, come­çou, faz 42 anos dentro de poucos dias, a sua vida de magistrado que nunca abandonou. Juiz de Direito em 1942, através de concurso em que ob­teve a média nove, quase distinta, portanto, ascendeu a todas as en­trâncias por merecimento, inclusive a 4~, a da Capital, como Juiz da sua 3~ Vara Crime.

Advogados, partes da sociedade baiana, proclamavam as suas quali­dades de juiz criminal de inteligên­cia e arguto, que conseguia extrair da testemunha, por mais obtusa e relutante, qualquer gota preciosa da verdade. Inclusive o Tribunal de Justiça, que indicou o seu nome por quatro vezes sucessivas, para preen­cher, por merecimento, vaga de de­sembargador, o alto cargo que final­mente conquistou em dezembro de 1965, mas pela porta larga da anti­güidade, tal como disse, alguns anos antes, o emérito Desembargador An­tônio Bensabard, também admitido

em razão do mesmo direi.to adquiri­do naquela Casa centenária, em cujo Plenário relembro sentados nas suas cátedras: Alvaro Clemente de Olivei­ra, Sálvio Martins, Euvaldo Luz, De­métrio Tourinho e Torílio Benjamin, magistrados Circunspectos, cultos e atenciosos, felizmente repetidos nos gestos e atitudes pelos desembarga­dores da sua atual composição, den­tre outros, apenas apontando alguns: Osvaldo Sentecé, Antônio Carlos Sou­to, Renato Mesquita, Pondécio Sobri­nho e Adolfo Leitão Guerra.

Estudioso desde os tempos da fa­culdade, de temperamento irrequieto e vibrátil, Adhemar Raymundo da Silva não se satisfez com a sua con­dição exclusiva de magistrado. Pre­tendia subir e subiu pela perseveran­ça no estudo, principalmente do Di­refto Penal e do seu processo. Por is­so mesmo, e ainda como juiz no inte­rior do Estado, se não me engano, da Comarca de Vitória da Conquista, com a tese «O Processo Penal como Relação Jurídica», candidatou-se à docência livre na Faculdade de Di­reito e, plenamente aprovado na competição, passou a substituir o professor catedrático da disciplina. Depois, já como Juiz de Direito da Capital, inscreveu-se candidato à cá­tedra e a conquistou através de rui­doso concurso com a tese «Da Exe­cução Penal». TodoS, lembro-me bem, aplaudiram sua indicação pela banca examinadora de que fizeram parte, além de professores baianos, Frederico Marques, Ari Franco e Xavier de Albuquerque.

Presentemente, um abalisado mes­tre, faz pouco tempo escolhido pela Editora Revista Forense como um dos comentadores da futura Lei Pro­cessual Penal.

Caso entendesse relacionar os tra­balhos intelectuais de Adhemar Ray­mundo da Silva, aliás, Adhemar Raymundo, como prefere ser tratado e é conhecido, entraria em choque

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com a brevidade que antes anunciei deste modesto discurso. Mas não re­sisto no dizer, além das duas teses já apontadas, sobem a mais de três de­zenas os estudos que realizou no campo da sua especialização e no âmbito do Processo Civil, muitos pu­blicados na imprensa, outros em re­vistas juridicas do Pais. E merecem destaque especial: «Estudos de Pro­cesso Penal», obra publicada pela Universidade da Bahia; «Denúncia Inepta»; «Competência Originária» e «Liminar em Processo de Habeas CorpUS», estes últimos elaborados no curso deste ano de 1979.

Para substituir, pois, o nosso sau­doso e eminente colega Amarilio Benjamim, sobre cuja personalidade me coube a honra de falar pelo Tri­bunal, na sua sessão especial de 11 de outubro, o Governo Federal no­meou outro Juiz baiano, do mesmo porte intelectual do substituído.

E, feita assim, em termos rápidos, a apresentação, dirijo-me a V. Exa., Sr. Ministro Adhemar Raymundo, para desejar-lhe boas-vindas a esta Casa onde impera entre seus mem­bros a concórdia e a paz. Boas­vindas e votos de felicidade extensi­vos à sua Excelentíssima Senhora cuja fisionomia, desde ontem reparo, revela muita alegria por mais esta vitória de seu marido.

O Sr. Ministro Néri da Silveira (Presidente): Para falar em nome do Ministério Público, concedo a pa­lavra ao Dr. Geraldo Andrade Fonte­les, Subprocurador-Geral da Repú­blica.

o Sr. Dr. Geraldo Andrade Fonte­les (Subprocurador-Geral da Repú­blica): Exmo. Sr. Presidente do Egrégio Tribunal Federal de Recur­sos, Exmo. Sr. Ministro da Justiça, Exmo. Sr. Governador da Bahia, Ex­mo. Sr. Procurador-Geral da Repú­blica, Exmo. Sr. Representante da Ordem dos Advogados do Brasil,

Dignissimas autoridades CIVIS, mili­tares e eclesiásticas, Exmos. Srs. Ministros do Tribunal Federal de Recursos, meus Senhores, minhas Senhoras, Srs. Funcionários.

Exmo. Sr. Ministro Adhemar Ray­mundo da Silva: ao saudar V. Exa., Sr. Ministro, tenho duplo júbilo por sabê-lo inconsumado mestre do Di­reito Processual Penal, o que me dá o ensejo de, também «en passant», re­verenciar o meu querido, admirado e eminente professor e amigol Hélio Tornaghi, a quem coube, no Brasi), o papel pioneiro da renovação científi­ca desse ramo do Direito, lançadO' na sua excelente obra «A Relação Pro­cessual Penal», livro em que iniciei os meus estudos acadêmicos da ma­téria.

Igualmente V. Exa., Sr. Ministro Adhemar, se ocupou do tema na tese apresentada para concurso de livre docência da Faculdade de Direito da Universidade da Bahia, intitulando-a «O Processo Penal como Relação Juridica», seguindo, assim, as pega­das dos precursores que vieram preencher a grande lacuna nesta parte da nossa literatura jurídica. O acendrado valor dos estudiosos nes­sa área do Direito coloca as letras juridicas, no particular, em posição de destaque, tão quão assimilam e expõem o conteúdo' aas obras dos grandes processualistas mundiais, como Chiovenda, Carnelutti, Cala­mandrei, Goltinick, Hope, Floriam, para citar os mais festejados entre nós. Divulgando as diretrizes que imprimem a nova sistemática científica do Direito Processual Pe­nal, graças aos esforços à cultura, ao amor ao des.envolvimento científi­co, é que se pOde estruturá-la como disciplina autõnoma, libertando-a das amarras vetustas do Direito Pe­nal, de que fora, no início, simples complemento.

O incremento do gosto pelo estudo e especulação desse ramo de nossa

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cultura jurídica deve-se, em grande parte, aos integrantes do magistério e da docência 'dos quais V. Exa. se consagrou arauto de notável impor­tância na Universidade Federal da Bahia. Certamente V. Exa. tem pre­sentes os dois princípios históricos que se interpenetraram para constitu­ir a sistemática científica do Proces­so Penal, vale dizer, das concepções germânicas e os da romana: aquele declarando quem deve prover o meio de prova, deixando ao juiz a missâo de prover a prova e a sentença defi­nitiva, um alcance amplo com vistas à coletividade; enquanto esta adota outro rumo, exigindo que a prova se dirija ao juiz para formar a sua con­vicção, figurando este como inte­grante das partes processuais para, afinal, cumprir a jurisdição tutelada pelo Estado nos limites dos vínculos processuais.

Esta breve digressão, da qual me excuso perante V. Exa. e o Egrégio Tribunal, teve em mira colimar um objetivo de ordem geral. À seme­lhança de como se procedia na Esco­la Germânica, deveria ser facultado ao Poder JUdiciário sugerir aos ou­tros Poderes da Nação o que devem e por que meios fazer a coleta da ex­periência de seus misteres, a fim de bem equacionar as soluções dos in­gentes problemas que afligem o Bra­sil. Eles repousam preponderante­mente no homem, no seu comporta­mento perante a sociedade e o Esta­do e, como na Escola Romana, de­monstram a relevância de seu enga­jamento como parte integrante do processo governamental, face à in­conformidade revelada nas lides fo­renses que dizem seja a melhor captação de causas e efeitos que po­dem modificar a fisionomia do status social, indicando a normativi­dade mais adequada para preservar a paz e a segurança.

O descaso nacional que alheia o Poder Judiciário da participação nas soluções étnicas e sociológicas dos

mais graves problemas brasileiros é a prova de nossa inconsciência na emergência de país subdesenvolvido ao processo tumultuário de sua as­censão ao país em desenvolvimento. Esta relegação se projeta no comple­xo da mecânica do judiciário, Poder autônomo e independente, apenas constitucionalmente inscrito, porque as suas carências e deficiências não podem ser independentemente por ele resolvidas, senão que sujeitas às manipulações orçamentárias e às disciplinações de órgãos do Executi­vo, nem sempre bem assessorados e aparelhados para uma análise de vi­são extensiva de conformidade com a ordem .iurídica.

O Poder Judiciário no Brasil ainda se mantém de pé, tão-somente pelo amor e ciosidade de seus grandes vultos, tanto do passado, como do presente. O órgão representativo dos Três Poderes junto ao judiciário, no processo de equilíbrio dos direitos e garantias individuais - princípio ba­silar dps fins sociais - dia a dia é empurrado para a burocratização e dependência dos órgãos executivos que não compreendem, ou não que­rem compreender, que o Ministério Público, como órgão institucional, não se pode atrelar à subordinação e à vontade de formulações impró­prias, conflitantes com a ordem juridica. No entanto, não é desazado proclamar-se, no momento histórico que atravessamos, que a -Justiça sempre foi, é e será o símbolo e o templo da perpetuidade de todos os valores sociológicos, inclusive da li­berdade que é posta, diuturnamente, ao consenso do Judtciârio. Vemos, assim, em última analise, que a con­cepção estadista, considerando-a apenas no tomo das preciosidades tradicionais, esquece-se de que o enorme fluxo dos desequilíbrios sócio-econômicos é despej ado em vo­lumes tempestuosos, no seu bojo, re­sultando, em conseqüência do poder jurisdicional assegurado na Carta

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Magna, a transferência de responsa­bilidade e obrigações enormíssimas para o futuro.

Impõe-se, data venia, a nosso' ver, um amadurecimento desta concep­ção teimosa em não atualizar as suas criatividades normativas com a jurisprudencial que é, também, fonte do direito e, necessariamente, deve atuar como a vontade do Estado. De que vale a preeminência dos valores utilitaristas se, posta na balança do equilíbrio entre os desajustes econô­micos e sociais, há de prevalecer um dia, cedo ou tarde, a unidade huma­na no contexto do problema social?

Por isso, compenetro-me de ser es­te um momento de profunda reflexão a despedida de um varão da Justi­ça, nobre e altivo, do quilate de Amarílio Benj amin, e a ascendência de seu sucessor. V. Exa., Sr. Minis­tro Adhemar, por certo, responderá com altanaria' as esperanças que to­dos lhe depositam.

Finalmente, vou encerrar com uma lembrança de leituras antigas, absorvidas de uma das crônicas de Humberto de Campos, intitulada «A dádiva de Licurgo», onde o autor diz, como ora o faço, declarando o meu pesar: só lhe trouxe essas flores, Sr. Ministro, para sua vitoriosa carrei­ra. É que a Licurgo perguntaram um dia, porque só oferecia pequenos sacrifícios aos deuses. - E respon­deu, para que não me acabe a provi­são e me reste sempre, em toda a minha vida, alguma coisa que lhes dê. Eis por que me justifico com o temor de não possuir, amanhã, ou­tras flores do jardim de Licurgo pa­ra enfeitar a consagração de seu porvir e deste Egrégio Tribunal.

o Sr. Ministro José Néri da Silveira (Presidente): Para falar em nome do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e da Seção do Distrito Federal da mesma enti­dade, concedo a palavra ao Dr. José Paulo Sepúlveda Pertence.

o Sr. Dr. José Paulo Sepúlveda Pertence (Advogado): Exmo. Sr. Presidente e eminentes Ministros do Colendo Tribunal Federal de Recur­sos, Exmo. Sr. Ministro da Justiça e representante do Senhor Presidente da República, Exmo. Sr. Vice­Presidente e representante da Câ­mara dos Deputados, Exmo. Sr. Go­vernador da Bahia, eminentes Minis­tros representantes do Tribunal Su­perior Eleitoral, do Tribunal Supe­rior do Trabalho e do Superior Tri­bunal Militar;' Exmo. Sr. Dr. Subprocurador-Geral da República, eminentes autoridades, Sr. Ministro Adhemar Raymundo da Silva: <lê).

«O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e também, de modo particular, a pedido do seu ilustre Presidente da Seção do Dis­trito Federal, traz a V. Exa. as con­gratUlações e a esperança da comu­nidade dos advogados brasileiros, no momento de sua posse no cargo de Ministro do Tribunal Federal de Re­cursos.

Assumir, hoje, uma cadeira nesta Casa tem o sabor da aceitação cons­ciente de imensos desafios. Desafios a que acresce, no caso, a responsabi­lidade de suceder o saudoso Ministro Amarílio Benj amin que, mercê de inteligência e operosidade, de inde­pendência e equilíbrio, de autoridade e lhaneza de trato, deixou definitiva­mente marcada entre nós a sua pas­sagem por este Plenário e identifi­cou o seu nome com o processo de constante afirmação deste Tribunal no merecido respeito da Nação.

Para responsabílidade dessa subs­tituição pessoal e para aceitação dos desafios institucionais do cargo, V. Exa. oferece um currículo que o cre­dencia às nossas esperanças confian­tes. Intelectualmente, a obra doutri­nária de V. Exa. o acredita como ju­rista de primeira linha. É pena que, esgotada a edição de 1962 de «Os Es­tudos de Direito Processual Penal».

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grande parte dos seus trabalhos se tenha confinado, antes e depois da coletânea, às páginas inacessíveis de um jornal da Bahia, em sinal mani­festo de uma modéstia inexplicável. Valeu a pena, porém, o esforço da descoberta, na Revista Forense, de uns poucos estudos seus: «Pressupos­tos Processuais», «Sentença de Pro­núncia», «Atos Processuais Penais», «Execução Penal» e «A Teoria da Relaçâo Processual - Vantagens e Aspectos Práticos», todos eles, mor­mente quando se atenta à época de sua publicaçâo, de 1954 a 1958, per­mitem verificar, embora lamentan­do que se trate de simples amostra, que V. Exa. se situa, por esses tra­balhos, como por suas teses na mes­ma época em que situaram Tornag­hi, Frederico Marques, Xavier de Al­buquerque e uns poucos mais, entre os que deram dignidade científica e visão sistemática ao trato entre nós do direito processual Penal, elevando-o da mediocridade praxísti­ca em que vegetava.

Dos seus atributos morais, de suas qualidades pessoais de magistrado e professor, dão os testemunhos mais que suficientes a recordaçâo ouvida de ex-alunos seus e o respeito e a amizade que lhe dedicam os advoga­dos da Bahia, bem traduzidos no em­penho posto pela delegaçâo baiana, na presença do Conselho Federal da Ordem, nesta solenidade. Confiantes nessas qualificações do seu passado, nós, advogados, queremos depositar nas mãos honradas de V. Exa., como nas de seus eminentes pares, o pe­nhor de nossa esperança em que es­se Tribunal responderá vitoriosa­mente ao desafio que os reclames da sociedade civil lançam, hoje, ao Po­der Judiciário brasileiro.

No caminho do estabelecimento de um Estado de direito democrático, a inspiração nacional de que a Ordem se tem feito intérprete e a História próxima do Brasil hão de passar ne-

cessariamente pela afirmação do Ju­diciário. Por isso, chamada ao diálo­go com o Poder, a entidade dos ad­vogados colocou a restauração das garantias da magistratura junta­mente com o restabelecimento da plenitude do habeas corpus como os passos iniciais, pré-requisitos míni­mos de confiabilidade no proclama­do intento de legitimação do regime e de seu reencontro com a Nação. As garantias estão formalmente revigo­radas. Outras metas parciais foram alcançadas, mas o sistema, intrinse­camente autoritário, continuará a reputá-las meras concessões conjun­turais, enquanto a resistência da so­ciedade civil e a prática das institui­ções democráticas da constituição formal não as afirmarem como liber­dades definitivamente conquistadas. P ara isso é desnecessário insistir no papel insubstituível de uma magis­tratura que se conscientize como po­der legitimado pela Nação, como instrumento de proscrição do arbitriõ. Mas o desafio que o mo­mento histórico impõe aos juízes não é apenas o da reafirmação cotidiana da independência do Poder JUdiciá­rio entre os órgãos do Estado. O crescimento do País, somado, no que diz respeito, em particular, a esta Casa, à onipresença da Administra­ção Pública na vida social e à abso­luta predominância da União deram tons de dramática urgência ao velho reclamo pela modernização eficiente da distribuição da Justiça.

As sucessivas frustações dos en­saios de reforma vêm tornando ilu­sória a independência formal do Po­der Judiciário. Inibida pela deficiên­cia crônica de sua estrutura e de seus instrumentos, incapaz de aten­der com eficácia à demanda que lhe é endereçada, a magistratura vê-se demitida do seu papel institucional, e, com essa demissão, expande-se a descrença na aspiração de soluções conformes ao Direito para os confli-

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tos sociais e, de modo singular, para os que opõe o cidadão ao arbítrio dos poderosos do Estado.

Para os que lidam neste Tribunal, o testemunho do esforço desumano a que se entregam diuturnamente os seus juízes, é a prova maior de que o desafio não será vencido sem solu­ções radicais. Na sua busca con­fiam os advogadosl em que V. Exa., Sr. Ministro Adhemar Raymundo da Silva, há de contribuir com o saber e a esperança que o alçaram à digni­dade desta Corte.

o Dr. Thomaz Bacellar da Silva (Presidente da Ordem dos Advoga­dos do Brasil, Seção do Estado da Bahia): Exmo. Sr. Ministro­Presidente deste Tribunal; Exmo. Sr. Ministro da Justiça, mui digno representante do Exmo. Sr. Presi­dente da RepÚblica; Exmo. Sr. Re­presentante da Câmàra Federal, eminente Governador Ântônio Carlos Magalhães; Sr. Ministro Rui de Li­ma Pessoa, representante do Tribu­nal Superior Militar; Sr. Ministro João de Lima Teixeira, representan­te do Tribunal S4perior do Trabalho; Sr. Ministro Pedro Gordilho, repre­sentante do Trib'unal Superior Eleito­ral; demais autoridades aqui presen­tes ou representadas, Srs. Ministros deste Tribunal, Sr. Vice-Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Sr. Presidente da Seção local da mesma entidade, Srs. Deputados, Srs. representantes do Ministério Público, Srs. Advogados, Sr. Minis­tro Adhemar Raymundo da Silva.

Para quem acompanha há mais de duas décadas a laboriosa existência do recém-empossado Ministro, é fá­cil e grata a missão de saudá-lo, de traçar-lhe o perfil, ou de fazer-lhe a síntese da sua vida, sobretudo se quem assim o faz, ou tenta fazê-lo, é um antigo aluno que dele recebeu, diretamente, lições nos bancos aca­dêmicos e depois - na militância

advocatícia junto à barra dos Tribu­nais, onde atuou - houve melhor reconhecê-lo e testemunhar reações da sua nobre consciência jurídica e do seu indefectível espirito de Justi­ça. E compreensível, assim, que seu discípulo e admirador, ao lhe render as homenagens, em nome da Ordem dos Advogados da Bahia, que, coinci­dente preside, esteja neste momento com enorme carga de afetividade, com sentimentos imperativos de afe­to.

Costumam, nestas horas emocio­nais, desfilar dadivosos encômios à figura do homenageado que, porém, não necessita, para realçar suas qualidades, de adjetivação roçagan­te. Poderia recatalogar os múltiplos predicados que adornam sua vida; teria motivos, particularmente até, para fazê-lo. Não saberia, nem pode­ria, contudo, melhorar os que aqui foram projetados com admirável maestria. Impossivel seria, entretan­to, furtar-me de mencionar alguns aspectos, entre muitos, que mar­caram, positivamente sua trajetória na Universidade e na Magistratura. Na atividade pública, desenvolvida na Bahia - seja atuando jurisdicio­nalmente, seja no mister docente -deu mostras incompulsas e sobejas de méritos irrecusáveis que galvani­zaram o reconhecimento e admira­ção geral.

N as árduas tarefas do Magistério, notabilizou-se pelo potencial de seus recursos pessoais, pela metodologia docente, com ínvejáveis dotes de precisão e de clareza expOSitiva ao transmitir os conhecimentos teóricos e de natureza vivencial. Pertence à classe daqueles que comunicam, aos que se amestram na aprendizagem, a sua própria fé, distribuindo parte de sua riqueza amiúnica. Converteu­se, por ísso mesmo, não em um me­ro e rotineiro expositor de uma disci­plina jurídica, mas num autêntico guia da juventude universitária baia­na.

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Numa época em que não andavam muito em voga os estudos proces­suais penais na Bahia, soube de­monstrar que não era um simples hóspede nos assuntos penais e impri­miu orientação segura e de singular relevo no ensinamento da disciplina. Iniciou o acervo bibliográfico na Fa­culdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, onde mais tarde conquistou brilhantemente a Cáte­dra, com aplaudido estudo sobre a relação processual penal, a que se seguiram teses e monografias den­sas enfocando temas de interesse jurídico, mormente nas áreas da execução penal, revisão criminal, nulidades e questões de prejudiciais entre outras.

E de se louvar, em toda sua repro­dução jurídica, não só o brilho com fulgores próprios, como o esmero ela­borativo, o estilo didático, o conteú­do científico e as premissas filosófico-epistemológicas estabeleci­das.

Atuando em outro hemisfério - no da função jurisdicional - sua forma­ção cultural não sofreu alteração e se entremostrou um magistrado que tem a intuição da justiça. Levou seus conhecimentos teoréticos à prá­tica judicial sem descolorir a lingua­gem e o tom que mantivera na cáte­dra. A condição de professor, de mentor pedagógico, longe de defor­mar o magistrado, o completa e o aprimora.

o Sr. Dr. Thomaz Bacellar da Sil­va (Presidente da Ordem dos Advo­gados do Brasil) - A vida real, de ri­queza mais palpável, colocou o ho­mem de estudo em íntimo contato com os mais variados problemas juridicos que escapam, ordinaria­mente, aos teóricos, no silencioso tra­balho dos gabinetes. O direito é, por natureza, uma ciência de aplicação e o obreiro incansável da sublime mis­são de distribuir justiça, de assegu-

rar a ordem e de manter a paz. Dei­xou, na vida cotidiana, escriturado em autos de processos, em repositó­rios de jurisprudência, nos anais de Forenses e na memória dos assisten­tes, sínteses acabadas de altas virtu­des profissionais. Por via dos seus julgados, vê-se quantas coisas dizem as leis quando se sabe interpretá-las. Não lhe minguaram, também, dotes de polemista, não obstante procurar movimentá-los com aquele cuidado de que falava Juan Luiz Vivus, isto é, com igual cuidado de quem corta as unhas todos os domingos.

Embora apto a bem ouvir e, conse­qüentemente, a compreender, este jurista de alma limpa é dono de um temperamentó vivaz e impetuoso. Este seu caráter aguerrido e de in­contida franqueza não subverteu, po­rém, nele o espírito escrupuloso, im­parCial, discreto e sereno de verda­deiro magistrado. Habilitou-se aos golpes e aos contragolpes da dialéti­ca advocatícia. É possuidor de tem­peramento ardoroso, de vocação pa­ra a trincheira, de amor ao debate, mostrou desde cedo sua identidade com a classe dos advogados.

Dele também se pode dizer que, através de seus livros e votos na ju­dicatura, se reconhece alguém que deveria formar conosco - ao lado dos advogados - porque sua voca­ção é muito menos para dizer o di­reito, sentado na coroa do juiz, do que para postulá-lo, de pé, diante dos Tribunais. E, na verdade, nunca pqj­de conter, nunca deixou de ser, de certa forma, um advogado, mesmo no Tribunal. No fogo cruzado dos ar­gumentos e dos contra-argumentos, no entrechoque dos pensamentos di­vergentes, do saber de experiência feito, é que pode surgir o conceito e­xato ou a hipótese feliz, como salta a fagulha no atrito do fuzil com a pe­derneira. Quando se convence do di­reito de um pleiteante, faz-se seu pa­trono sem mandato. A causa fica

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sendo sua, e, quando não prevalece seu ponto de vista, nota-se que fica a impressão de um insucesso profissio­nal.

Eminente Ministro Adhemar Ray­mundo da Silva: queremos lhe dizer que festejamos, que incentivamos a exaltação de advogado que carrega dentro de si e que há de trazer para este Tribunal. Advocacia não se ci­menta apenas na lucidez do gênio, mas também na retidão do caráter. Tais qualidades podem existir no juiz e no advogado, por isso que não constituem essências inconciliáveis. São manifestações estas trazidas pa­ra esta Casa por parte de quem as­sistiu sua passagem pela magistra­tura baiana na primeira e na segun­da instãncias, notadamente na Cã­mara Criminal. E pode, por isso mesmo, levantar a voz em louvor da sua carreira, da sua alta competên­cia e do seu elevado padrão de mo­ralidade. E certo que o recrutamen­to de juizes tem, por vezes, dado margem a in quietudes e insatisfa­ções. Observações críticas surgem enderaçadas ao sistema adotado nes­te e em outros países, por derivar a nomeação do Poder Executivo. Diz­se mesmo que, sendo o poder político o que faz a nomeação, pode advir certa confusão entre a política e a Justiça. Confusão que se acentua quando se admite que não faltam ca­sos em que os homens passam por certos elevadores sociais (la política ao Tribunal e do Tribunal à política.

Com V. Exa., entretanto, razão não há para temores. Bem ao con­trário, a instituição judiciária só po­de estar engrandecida e a certeza de que V. Exa. continuará observando certos rigores que emanam da es­sência da própria função jurisdicio­nal, permite-nos encerrar esta home­nagem, que lhe prestam, por nosso intermédio, os advogados da Bahia, com a advertência velha e um tanto esquecida, saída da pena de Balzac:

«Desconfiar da magistratura é um princípio de dissolução social. Re­construí a instituição noutras bases, pedi-lhe imensas garantias, mas con­fiai nela».

O Sr. Ministro Adhemar Raymun­do da Silva: Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira, DD. Presidente desta Alta Corte de Justiça; Exmo. Sr. Ministro da Justiça, meu precla­ro e eminente amigo, Antônio Carlos Magalhães, cuja presença me enche de muita satisfação nesta hora; ilus­tres Juízes dos Tribunais Superiores que fazem parte desta Mesa; meu preclaro e eminente amigo, desem­bargador Antônio Carlos Souto que representa o Tribunal de Justiça da Bahia onde, durante 14 anos, militei como desembargador; autoridades; meus Senhores; ilustrés Pares, tam­bém serei breve:

Tivera a grata notícia de que a so­lenidade de posse nesta Casa era simples, sem discursos, e alegre fi­cara com esta grata notícia. Mas, lo­go depois, fui advertido de que o eminente Ministro Peçanha Martins me saudaria, e outras saudações se ouviriam. Palavras generosas, inclu­sive as de Thomaz Bacellar, meu ex­aluno da Faculdade de Direito. E, ao escrever o meu breve discurso, tive em mente, Senhores, dois assuntos que considero palpitantes no momen­to presente, dois assuntos que repre­sentam, sem sombra de dúvidas, um só pensamento, porque eles conver­gem para um estuário comum, a grandeza da função do Juiz, o Juiz na formulação judicial do direito, na frase admirável de Tobenha, e o grande papel do juiz na administra­ção da justiça. Esses dois assuntos, em síntese, serão desdobrados em rápidas e singelas palavras, que re­solvi escrever para ser mais fiel ao meu pensamento (lê): Ao perpassar o olhar por entre os presentes, diviso os meus conterrãneos que, nesta ro­maria do coração - para lembrar o

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velho Rui - aqui comparecem para, destes cimos, contemplar nos longes do horizonte as figuras estelares da­queles que, em outras peregrinações festivas, elevaram bem alto o nome da Bahia. Rememoro, nesta hora, vi­vos e mortos que, no Pretório Excel­so e nos Tribunais Superiores, com serenidade e grandeza, são e foram os semeadores da Justiça.

Com a palavra e o exemplo, o juiz se incorpora aos supremos artífices da fecundação divina do universo: o professor, o sacerdote e o lavrador. Na palavra genial de Rui: «ao sacer­dote, cuja fronte se verga para o cá­lice consagrado; ao professor que es­palha o grão de verdade para o sulco que ficou aberto nas consciências no­vas; ao lavrador, cuja fronte se do­bra sobre a terra» - todos sacerdo­tes do Senhor - há de se agregar, de certo, a esses supremos ministérios e do juiz, cuja missão o aproxima da divindade, no dizer do grande pensa­dor.

Pedro Santos e Eduardo SpÍndola, dentre os mortos, consagrados pelo respeito e pela veneração dos póste­ros dos longes de sua existência fe­cun'da, vertem ainda às fulgurantes missões de um consagrado sacerdó­cio. Aliomar Baleeiro também dei­xou no Supremo as marcas de sua alucinante inteligência, aliada à co­ragem de dizer. Aqui, nesta augusta Casa, rememorar Amarílio é ato de Justiça: espírito ático, que por mais de dez anos espargiu as luzes do seu saber e da sua experiêncía. A mínha sincera homenagem a quem tenho a honra de substituir nesta Corte de Justiça.

Dentre os vivos, aqui ainda moreja a figura fidalga e brilhante de Peça­nha Martins, velho companheiro do Fórum Rui Barbosa, nos idos de cin­qüenta, a quem sempre me ligaram estreitos laços de estima e elevado apreço.

o juiz, na formulação judicial do Direito: Se a ordem jurídica é o con­junto de normas e princípios que dis­ciplinam a vida comunitária, à qual se incorpora necessariamente a fun­ção de dizer do Direito, conclui-se que ela é a afirmação de um sistema de proteção.

Lógica a assertiva de que a contri­buição dos juízes na formação do Di­reito é incontestável. E uma dessas coisas estranhas que a História do Direito registra, qual o fato de terem as decisões jurisdicionais - que no Direito Romano se incorporaram às fontes do Direito - se desvinculado sem razão de direito do ordenamento jurídico, como uma das suas verten­tes. A partir da ascensão do Positi­vismo, criou-se a falsa idéia de que o ordenamento jurídico se esgota na norma abstrata e genérica da lei.

De outro lado, não aplaudo a idéia de que a jurisprudência seja a única fonte de Direito. Estranhável, pois, a deSfiguração desse extraordinário elemento de formulação do Direito que teve em Roma, com os honorá­rios, o seu verdadeiro fastígio. Antes mesmo da concepção dos romanos, foi o sistema da formulação judicial do Direito que emprestou às soluções dos litígios sentido profundamente humano, mercê da eqüidade, a qual - como disse Tobéias - nas primiti­vas sociedades, era a única forma da atuação do Direito.

Não foi sem razão que Aristóteles dissera que o juiz é a Justiça viva, ou seja, o órgão que resume em si o espírito do Direito vigente e o ex­pressa em novas formulações.

O pretor romano, através do uso do honorário, criou o Direito, opulen­tando, com as suas sábias e oportu­nas fórmulas, no eSforço constante do superar o jus scriptum para que triunfasse a eqüidade sobre as con­cepções formalistas do Direito. O si­lêncio da lei era suprido e o excessi­vo rigor do Direito era temperado

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pelO jus edicendi dos magistrados. O Direito inglês, que recebeu a influên­cia decisiva do Direito Romano, tem no fundo similitude com este, de tal forma que 'Bodenerrain - registra em ambos ÓS sistemas júrídicos as normas rígidas e formais que foram grandemente atenuadas mediante um sistema de jurisprudência miti­gada. Entre o Direito imobilizado no texto e o Direito atuante há uma di­ferença abissal.

Não foi sem razão que Ihering afirmou que o trabalho do Juiz é conciliação do Direito com as dili­gências da vida, como concebe­ram os romanos, servindo-se da Interpretatio, como a ponte entre o Direito escrito e a eqüidade.

As sentenças e os arestos consti­tuem um aspecto da realidade jurídi­ca, tanto que Cóssio afirma que elas, - como normas individualizadoras que são - constituem as únicas que refletem de forma direta e imediata essa realidade. Elas se incorporam ao ordenamento jurídico, como ex­pressão prática e dinâmica do Direi­to que existe mercê da sua força, como expressão de atividade estatal necessária à manutenção e atuação daquele, vale dizer, do ordenamento jurídico.

Quer sej am denominadas normas individuadoras, quer sejam normas judiciárias, não se pode negar o seu papel valioso na prOdução do Direi­to, porque desta partiCipa o Juiz quando valora a conduta humana na sua interferência intersubjetiva, pa­ra usar a expressão cossiana. E que, defendendo o ordenamento jurídico, está o Juiz não só tutelando o Direito objetivo, mas todas as pOSições sub­jetivas que nascem do jus scriptum.

Deparius sentenciou: «A lei não é a única fonte de Direito». Uma lei che­ga sempre tarde, intervém quando as circunstâncias o exigem e quando os costumes o' impõem. O costume, a

jurisprudência e a eqüidade são as verdadeiras fontes do Direito. Ade­mais, posto o problema sob o ângulo do mecanismo da atividade cognosci­tiva do Juiz, maiores subsídios va­mos encontrar para a defesa do pon­to de vista exposto. E que muito con­tribuiu para o falso entendimento da não partiCipação da jurisprudência na formação do Direito, a superada concepção de que a operação que o Juiz realiza - quandO decide - obe­dece exclusivamente a um juízo lógi­co, silogístico, sem acrescentar nada - como disse Vasquez - à declara­ção da vontade da lei, abstratamente formulada; ou como ensinou Montes­quieu, ao proclamar que é o Juiz um instrumento mecânico a serviço da lei.

A decisão judicial é como procla­mar um ato de opção, porque na for­mação do seu convencimento terá o Juiz de escolher uma dentre as teses expostas, ou ainda aquela que não foi objeto de apreCiação pelas par­tes. Mas, necessário se torna que o seu convencimento assente no munto dos fatos, porque o objeto do seu co­nhecimento não é o Direito em tese, mas o Direito em causa, isto é, o fa­to individuado.

Exatissima a observação de De Luca - já anteriormente entrevista entre nós por João Mendes - quan­do assinala, com propriedade, que se verifica nos dias presentes fenômeno inverso ao do passado: ao interesse pela estrutura silogística do ra­ciocínio do Juiz, sobreleva o entendi­mento contempQrâneo de que a sua atividade cognoscitiva tem as suas implicações como o mundo da expe­riência. O ato jurisdicional é o mo­mento culminante de todo o ciclo de prOdução do Direito e de toda a pro­blemática da certeza do processo, porque através dessa operação é que o Direito perde o seu resíduo de abs­tração e penetra no mundo prático dos fatos, na observação de Caiane.

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Certeza e verdade fundem-se numa síntese que é o ato jurisdicional, apesar de o conhecimento do julga­dor ter caráter contigente, já que é assentado na realidade que lhe é ofe­recida pelas provas feitas no proces­so, razão por que o ordenamento jurídico criou a rescisória e a revi­são criminal - remédios que justifi­cam e comprovam o fatal limite da relatividade própria da natureza humana.

Destarte, não se poderá negar o papel do Juiz, o qual, no dizer de Sa­ta, realiza uma contínua e imediata criação. Dele irradia a luz bendita a espelhar a santidade dos justos, luz que é inextinguível, porque vive na imensidade do existir, dando-lhe as fUlgurações do belo e a grandeza da imortalidade. Dele insurge a Justiça que acalenta o regime, sobrepairan­do eternamente a todas as coisas, porque ela - Justiça - é a grande esperança, o suave abrigo.

Já dizia São Paulo que boa é a lei onde se executa legitimamente. Na exegese de Rui, boa é a lei quando executada com retidão. A verdade que dimana do ensinamento aposto­lar põe em destaque aquilO que os homens de bom senso apregoam. Por mais aprimorado que seja o or­denamento jurídico sob o ângulo da normatividade, não se alcançarão os verdadeiros desideratos da Justiça, se os seus servidores - os Juízes -não se compenetrarem da grande responsabilidade que o Estado lhes outorga como integrantes de um Po­der.

Ressoará como estupenda e sobre­humana a tarefa dos Juízes que, na esteira do ensinamento apostolar, colocarem a execução legítima da lei como seu supremo ideal, a sua decidida vocação, porque só assim, mercê da moderação, da inteireza e

da eqüidade - poderá escoimá-Ia da dureza e da maldade na frase imor­tal de Rui: «As reformas só atingirão os seus verdadeiros objetivos nq campo da administração da Justiça! se os Juízes, s.ob a influência única da altíssima dignidade, demonstra­rem os seus sadios propósitos de executarem legitimamente a lei, un­gidos do espirito da humildade, da bondade e da verdade e forem mere­cedores da estima e da admiração de seus jurisdicionados.

Por maiores que sejam as atribu- . lações que são constantes na vida ~ dos Juízes, há de neles existir uma vontade férrea de alçar a Justiça ao pináculo da glorificação, traduzida na frase genial de Rui: «Justiça mais alta que a coroa dos reis e Jus­tiça tão pura quanto as coroas dos anjos».

Muito obrigado».

o Sr. Ministro Néri da Silveira (Presidente): Ao encerrar esta Ses­sãQ. especial de posse do Sr. Ministro Adhemar R. da Silva e agradecer a presença do Senhor Ministro da Justiça, Dr. Petrõnio Portella, que representa também S. Exa. o Se­nhor Presidente da República e do I? Vice-Presidente da Câmara dos Deputados, Dr. Homero Santos, bem assim, dos senhores 'Presiden­tes dos Tribunais superiores, ou dos seus representantes, por igual mem­bros das respectivas Cortes, e, ain­da, das ilustres autoridades civis, militares e eclesiásticas inicialmente mencionadas, das Senhoras e dos Se­nhores, todos contribuindo para o brilho deste ato, não posso, entretan­to, deixar de fazer particular men­ção à presença da Bahia. J!: que, em realidade, a Bahia hoje aqui está a prestigiar seu filho ilustre que as­cende, após brilhante carreira jurídi-

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ca, a esta Egrégia Suprema Corte Federal na Capital da República, nas presenças significativas de seu eminente Governador, Dr. Antônio Carlos Magalhães; do culto Desem­bargador Antônio Carlos Souto, Vice­Presidente do Colendo Tribunal de Justiça do Estado e seu representan­te; do Sr. Conselheiro Heitor Dias, do Tribunal de Contas da Bahia; dos ilustres Deputados Estaduais, que nessa solenidade compõem a repre­sentação da Assembléia Legislativa baiana, Deputados Murilo Cavalcan­ti, Naomar Alcãntara, Geraldo Ra­mos, Gorgônio Neto e Marco Antu­nes; de Parlamentares Federais baianos e de seus advogados, ora re­presentados pelo Presidente da Se­ção Baiana da Ordem dos Advoga­dos do Brasil, Dr. Thomaz Bacellar da Silva e pelO Dr. Saul Quadros, Presidente da Caixa de Assistência dos Advogados da Bahia; de seus Juízes F edera'i.s , representados pelo ilustre Dr. José"'Cãndido de Carvalho Filho, e demais eminentes baianos radicados em Brasília, ou que vie­ram, col1).o destacou o eminente Mi­nistro Adhemar Raymundo, numa ro­maria festiva.

Em nome do Tribunal, agradeço a presença de todos, convidando para o coquetel que será servido nas de­pendências contíguas a este salão.

ATA DA SESSÃO SOLENE REALI­ZADA EM 08 DE ABRIL DE 1980

Aos oito dias do mês de abril do ano de mil novecentos e oitenta, às dezesseis horas, na sala de Sessões do Tribunal Federal de Recursos, presentes os Exmos. Srs. Ministros José Néri da Silveira, Presidente do Tribunal, Armando Rollemberg, Moacir Catunda, Peçanha Martins, Jarbas Nobre, Aldir G. Passarinho,

José Dantas, Lauro Leitão, Carlos Madeira, Gueiros Leite, Washington BOlívar, Torreão Braz, Carlos Mário Velloso, Otto Rocha, Wilson Gonçal­ves, William Patterson, Adhemar Raymundo e Sebastião Reis; presen­tes, ainda, o Exmo. Sr. Dr. Hélio Pi­nheiro da Silva, Subprocurador­Geral da República e o Secretário do Tribunal Pleno, Bel. Jaziel Guima­rães de Britto, foi aberta a Sessão Solene, especialmente convocada pa­ra dar posse ao Doutor Romildo Bue­no de Souza, nomeado para o cargo de Ministro do Tribunal Federal de Recursos, pelo Exmo. Sr. Presidente da República Federativa do Brasil. A mesa integrou-se pelo Sr. Ministro-Presidente e pelos Exmos. Srs. Ministros Xavier de Albuquer­que, Vice-Presidente do Supremo Tribunal Federal e representante do Presidente do Excelso Pretório; De­putado Ibrahim Abi Ackel, Ministro da Justiça; Senador Jorge Kalume, representante do Presidente do Se­nado Federal; Deputado Marcelo Li­nhares, representante do Presidente da Cãmara dos Deputados e Cel. Ai­mê Alcebíades Lamaison, Governa­dor do Distrito Federal. Ao início dos trabalhos o Sr. Ministro-Preside~ proferiu as_ seguintes palavras.:

Sr. Ministro José Néri da Sil­veira (Presidente): Exmo. Sr. Ministro Xavier de Albuquerque, Vice-Presidente do Supremo Tri­bunal Federal e representante de S. Exa. o Sr. Ministro-Presidente do Alto Tribunal; Exmo. Sr. de­putado Ibrahim Abi-Ackel, ilus­tre Ministro da Justiça; Exmo. Sr. Senador Jorge Kalume, represen­tante de S. Exa. o Sr. Senador Luiz Viana Filho, Presidente do Senado Federal; Exmo. Sr. Deputado Mar­celo Linhares, representante de S. Exa. o Sr. Deputado Flávio Marcílio, Presidente da Cãmara dos Deputa­dos; Exmo. Sr. Cel. Aimê Alcebíades Lamaison, eminente Governador do Distrito Federal; Exmos. Srs. Minis-

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tros deste Tribunal; Exmo. Sr. Dr. Hélio Pinheiro da Silva, ilustre Subprocurador-Geral da República; Srs. representantes de S. Exas. os Srs. Ministros de Estado; Sr. Procurador-Geral da República; Sr. Diretor-Geral do Departamento de Polícia Federal; Sr. Ministro repre­sentante de S. Exa. o Sr. Presidente do Tribunal Superior Eleitoral Sr. Ministro representante de S. Exa. o Sr. Presidente do Superior Tribunal Militar; Sr. Ministro representante do Colendo Tribunal Regional Eleito­ral, do Distrito Federal; Srs. Minis­tros aposentados deste Tribunal; Srs. Subprocuradores-Gerais da Repúbli­ca; Srs. Desembargadores do Tribu­nal de Justiça do Distrito Federal; Sr. representante de S. Exa. Revma. D. José Newton de Almeida Batista, DD. Arcebispo de Brasília; Srs. Par­lamentares; Srs. Juízes Federais; Srs. Juízes de Direito do Distrito Fe­deral; Srs. Membros do Ministério Público e do Serviço Jurídico da União e do Distrito Federal; Srs. Ad­vogados; Senhoras e Senhores.

Destina-se esta sessão especial e solene do Tribunal Federal de Re­cursos a dar posse ao ilustre Juiz de Direito do Distrito Federal e Profes­sor da Universidade de Brasília, Dr. Romildo Bueno de Souza, recente­mente nomeado por Sua Excelência o Senhor Presidente da República, com aprovação do Senado Federal, para o cargo de Ministro deste Tri­bunal, vago em decorrência da apo­sentadoria, por implemento de ida­de, do ilustre Ministro Márcio Ribei­ro.

Sua Excelência encontra-se pre­sente. Convido os eminentes Minis­tros Jarbas Nobre, Vice-Presidente da Corte, e Armando Rollemberg, para introduzirem, neste recinto, o ilustre empossando.

A seguir, prestado o compromisso regimental e lido o Termo de Posse pelo Secretário do Tribunal Pleno, o

qual foi assinado pelo Exmo. Sr. Ministro-Presidente, pelo Dr. Romil­do Bueno de Souza e pelO Dr. Secre­tário, o Exmo. Sr. Ministro­Presidente declarou empossado o Exmo. Sr. Ministro Romildo Bueno de Souza, convidando-o a tomar as­sento na Bancada do Tribunal Pleno, ao lado do Exmo. Sr. Ministro Wil­liam Patterson. A seguir, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente concedeu a palavra ao Exmo. Sr. Ministro Jar­bas Nobre, para saudar o Exmo. Sr. Ministro Romildo Bueno de Souza em nome do Tribunal.

o Exmo. Sr. Ministro Jarbas Nobre: Sr. Ministro José Néri da Sil­veira, Presidente do Tribunal Fede­ral de Recursos, Sr. Ministro Xavier de Albuquerque, Vice-Presidente do Supremo Tribunal Federal, repre­sentando a Presidência, Sr. Ministro da Justiça, demais autoridades, mi­nhas Senhoras e meus Senhores: É com grande alegria que cumpro com o encargo de, em nome deste Tribu­nal, recepcionar o nosso novo colega, o Ministro Romildo Bueno de Souza que ora se empossa.

A designação que recebi do nosso Presidente, Ministro José Néri da Silveira, se deve ao fato de eu ter vindo de São Paulo, terra de nosso homenageado, e lá termos cursado a mesma Escola, a velha e querida Faculdade de Direito do Largo de São Francisco que, em certas oportu­nidades, foi também Convento. Quar­tel e Asilo.

Convento, porque suas famos<!s e gloriosas Arcadas como que são pro­longamento das não menos famosas e gloriosas Arcadas do Mosteiro de São Francisco, seu vizinho do lado, e de onde se originou.

Nos primeiros tempos, a Escola e o Convento constituiam um só todo, pois que estudantes e frades convi­viam juntos, debaixo do mesmo teto.

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o tempo não conseguiu destruir es­se espírito de união. A FaCUldade e o Mosteiro ainda hoje continuam como nasceram. Ambos franciscanos, em­balados pelos mesmos propósitos de brasilidade, de heroísmo e de inaba­lável fé nos destinos da Pátria.

E porque isto é exato, a Escola que foi Convento em sua origem, em determinado período tornou-se quar­tel e asilo, como assinalado.

Quartel em 1932, quando a juventu­de que lá estudava, cansada de rece­ber afrontas por parte da situação política então dominante, com a bên­ção dos monges, guardou os Códigos e, de arma em punho, foi às ruas pa­ra morrer.

A epopéia mereceu estes belos ver­sos que lá estão gravados junto às Arcadas. a eternizar o gesto heróico:

«Quando se sente bater No peito heróico pancada Deixa-se a folha dobrada Enquanto se vai morrer».

Foi Asilo quando, perdida a luta armada, os jovens, inconformados com o Estado Novo, mantinham ati­tude hostil aos dominantes de então, e eram perseguidos.

Em sua fuga, recorriam à Escola que,continuamente desrespeitada, passou a ser substituída pelo Coven­to.

Conta-se que certa feita isto viria a acontecer com Roberto Abreu So­dré que, anos depois, seria Governa­dor do Estado.

Refugiado no Mosteiro e sem dele poder sair porque os perseguidores estavam às suas portas, à aguarda de sua saída, outro caminhp não foi encontrado senão vestir o ,colega de frade que, desse modo disfarç~do, conseguiu ultrapassar as barreIras que impediam a sua fuga.

Em torno desse fato conta-se mais: Que outro colega, também visado,

teria se homiziado no Mosteiro e, igualmente, ganhO hábito de frade.

Não tendo tido a mesma oportuni­dade de fugir, e notando a presença ameaçadora de beleguins no interior do Templo, para melhor aproveitar o seu disfarce de frade, resolveu sentar-se em um confessionário em atitude piedosa, como lhe competia.

Eis que, para embaraço e cons­trangimento do falso religioso, um penitente dele se acercou e ajoelhando-se a seus pés, implorou­lhe perdão pelos seus pecados.

A Faculdade do Ministro Romildo Bueno de Souza abriga muito da his­tória de São Paulo, pois que é parte integrante dela.

Está ela localizada em um Largo, o Largo de São Francisco, que em dado momento perdeu essa denomi­nação para ganhar esta outra: terri­tório livre.

Nele, na década de 40, teve desta­que um homem chamado Hermene­gildo, guarda de trânsito que lá ser­via, muito ligado aos estudantes e de tal sorte, que até em quadros de for­matura figurou.

Esse homem ganhou o título de In­terventor e como que perdeu o seu próprio nome.

Num 10 de novembro, num entre­vero com a Polícia, no território li­vre, foi ferido e virou herói.

Isto é um pouco de São Paulo e do meu tempo de estudante.

Romildo Bueno de Souza é de ou­tra geração, pois que saiu da Escola em 1953, onze anos depois de mim.

Isto entretanto, não impede que traga' enraizado consigo., o mesmo espírito que domina a juventude pau­lista e daqueles que um dia foram moços acadêmicos de São Paulo.

O Tribunal Federal de Recursos recebe em festa o novo Colega na certeza de que aqui, entre nós, pros­seguirá na sua trajetória vitoriosa de Magistrado iniciada em 1966, au­mentando a bagagem intelectual e

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científica acumulada nos onze anos em que exerceu a advocacia e o Mi­nistério Público em São Paulo e em Brasília, sem esquecer o longo perío­do em que professa o Magistério, in­clusive o Superior.

Ministro Romildo Bueno de Souza, seja benvindo.

Em seguida, o Exmo. Sr. Ministro­Presidente concedeu a palavra ao Exmo. Sr. Dr. Hélio Pinheiro da Sil­va, Subprocurador-Geral da Repúbli­ca, para saudar o Exmo. Sr. Minis­tro Romildo Bueno de Souza em no­me do Ministério Público Federal.

o Exm,o. Sr. Dr. Hélio Pinheiro da Silva, Subprocurador-Geral da Repú­blica: Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira, DD. Presidente desta Casa; Exmo. Sr. Ministro Xavier de Albuquerque, Vice-Presidente do Su­premo Tribunal Federal; Exmo. Sr. Deputado Federal Ibrahim Abi­Ackel, DD. Ministro de Estado da Justiça; Exmo. Sr. Aimé Alcebíades Lamaison, ilustre Governador do Distrito Federal; Autoridades pre­sentes; Magistrados; Membros do Ministério Público Federal; Juízes; Senhores e Senhoras:

Recebí, Sr. Ministro Romildo Bue­no de Souza, com imensa satisfação, a sumamente honrosa incumbência de recepcioná-Io em nome do Minis­tério Público Federal, nesta soleni­dade, quando V. Exa. passa a inte­grar este Egrégio Tribunal, como um dos seus eminentes membros, distinguido que vem de ser, por no­meção do Sr. Presidente da Repúbli­ca, para tão alta investidura.

Possui V. Exa., para se ter feito merecedor dessa magna distinção, as virtudes que se espera encontrar naqueles aos quais se atribui a quase divina missão de distribuir Justiça, posto que sem esta não pOde uma co­munidade subsistir, nem existir o di­reito onde ela não se faça presente.

E o Juiz, no dizer de Calamandrei, o direito tornado homem, dele, certa­mente por isso, esperando-se uma vi­da de dedicação ao bem comum, de fidelidade à Justiça, pOis que.. esta, no dizer do mesmo autor, como to­das as divindades, só se manifesta aos que nela crêem.

E essa crença na Justiça é uma constante na vida de V. Exa., desde cedo por inteiro a ela dedicado, ini­cialmente como advogado no Estado de São Paulo, mais tarde como membro do Ministério Público Fede­ral e, por fim, como juiz de carreira, tendo em 1966 .. ingressado na Justiça do Distrito Federal, onde desde logo se impôs ão respeito e à admiração dos seus pares-;--e de quantos militam na Justiça de Brasília, da qual vem de se afastar para ocupar nesta Co­lenda Corte a vaga deixada pelo ilus­tre Ministro MárCio Ribeiro, recém­aposentado, por limite de idade.

Em muito coincidem as carreiras de ambos; do que vem de deixar o Tribunal, cercado pela estima, res­peito e veneração de quantos tive­ram a felicidade de com ele convi­ver, e daquele que hoje, nesta soleni­dade vem de ser empossado.

Assim, antes de ingressarem na magistratura de carreira, foram Promotores, integraram igualmente a Justiça do Direito Federal, o Mi­nistro Márcio Ribeiro - como De­sembargador; como Desembargador convocado tendo participado do mes­mo Tribunal, por longos períodos do mesmo Tribunal, por longos perío­dos, e continuamente, V. Exa., Sr. Ministro Romildo Bueno de Souza, numa atuação que testemunhei, quandO no exercício do cargo de Procurador-Geral da Justiça do Dis­trito Federal e Territórios que, por aproximadamente cinco anos, exer­ci.

Era com enlevo que ouvia, então, os magistrais votos por S. Exa. pro­feridos, a merecer de todos a maior atenção, mesmo quando vencidos.

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dentre estes últimos, por constituir estudo profundo, verdadeira mono­grafia sobre o valor da prova indi­ciária no processo penal, o que lan­çado na apelação interposta contra sentença absolutória no processo re­ferente à prática de crime que, pela brutalidade e selvageria na sua prá­tica, traumatizou o país, e ainda ho­je resta impune.

Era com prazer, igualmente, que vezes inúmeras, recebia em meu Ga­binete de Trabalho a honrosa visita de S. Exa. ouvindo-o em tais oportu­nidades discorrer sobre problemas vários de diferentes ramos de direi­to, ciência da qual é apaixonado e mestre insigne.

Hoje, como num feliz reencontro, vejo-o participar da composição des­te Egrégio Tribunal, desejando-lhe, em nome do Ministério Público Fe­deral, e em meu, pessoal, longos anos de profícua judicatura.

Dando seqüênCia à solenidade, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente con­cedeu a palavra ao Dr. Wilson do Egito Coelho, representante do Con­selho Federal da Ordem dos Advoga­dos do Brasil.

O Exmo. Sr. Dr. Wilson do Egito Coelho: Sr. Presidente do Tribunal Federal de Recursos, Ministro José Néri da Silveira, Sr. Governador do Distrito Federal, Sr. Ministro da Justiça, Srs. Ministros, outras auto­ridades, I:IÍinhas Senhoras, meus Se­nhores, Sr. Ministro Romilao Bueno de Souza:

E com imensa honra que vos de­claro representar, aqui e agora, o Conselho Federal da Ordem dos Ad­vogados do Brasil. E é nesta quali­dade que me proponho a dizer umas poucas palavras, mas refletidas e emocionadas, de saudação ao Pro­fessor Romildo Bueno de Souza, no momento em que ele, num dia de graça para a Justiça, ascende às culminâncias desse Tribunal.

Começarei, assim, por dizer, dizer repetindo o que magistralmente já foi dito há algum tempo, que a justi­ça coroa a ordem jurídica, a ordem jurídica assegura a responsabilida­de, a responsabilidade constitui a ba­se das instituições livres; e sem ins­tituições livres não. há paz, não há honestidade administrativa, não há ordem sadia. De sóite que um regi­me político, onde a arrogância do Po­der erga a cerviz até à altura dos Tribunais, para lhe 'açoitar o rosto, com a negação de sua autoridade, é uma construção que, insustentável, vacila até aos alicerces. Mas, ainda assim, o direito é tão superior à for­ça arbitrária, que a Justiça, mesmo desacatada, ultrajada, ferida, apa­rentemente oscilante no seu pedes­tal, continua, majestática, a projetar sua sombra sobre a ambiência e dominá-la como a cruz de uma divin­dade sepultada anunciando aos deici­das o castigo de sua ressurreição.

- Este é um pensamento do imen­so Rui, que aqui não vai transcrito literalmente, mas que constitui o cerne de várias passagens de seu profético apostolado.

- Afortunadamente vivemos hoje um clima liberalizante, em que a pre­sença dos Tribunais readquire densa prOjeção, redobrando-se, contudo, as responsabilidades dos Juízes.

- Nada pode haver neste mundo mais perigoso, mais humilhante, mais ignominioso - dizia ainda Rui - do que a condição de se achar um homem submetido ao arbítrio sem freio de outro homem.

- Daí, a' magistral sentença de Montesquieu, ao anunciar o princípiO dp. separação de Poderes, no Estado: E uma experiência eterna a de que todo homem que detém o poder é le­vado a abusar dele; caminha até que encontre limites. Para que se não abuse do pOder é preciSO que, pela dispOSição das coisas, o poder dete­nha o poder.

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- Na concepção política do Estado democrático, compete aos Juízes a ingente missão de deter o poder através dos ditames do Direito, por­que afastados das paixões mais inci­sivas; distantes do Poder material mais susceptível de desvirtuar-se, vós, Juízes, estais mais próximos da Razão, já proclamava um notávelle­gislador contemporãneo em magnífi­co discurso de saudação ao Poder Judiciário.

- Vós tendes, pois, uma sagrada função, a que nós, os advogados, nos associamos, já que na missão do ad­vogado também se desenvolve uma espécie de magistratura. O advoga­do exerce, juridicamente articulado ao bem comum, ministério privado na prestação de serviço público, co­mo bem observou o Bastonário Pra­do Kelly. O advogado, segundo outro notável Bastonário, Nehemias Guei­ros, cujo nome evoco com emoção e saudade, deixou de ser a excrescên­cia desdenhada por alguns, ou a sim­ples facção litigante encarada na sua parcialidade obrigatória como elemento perturbador da veneranda serenidade do Juízo. É ele, agora, com o advento do seu novo Estatuto, o próprio Juízo, numa das suas jus­taposições essenciais e impostergá­veis, compondo e contrapondo, não apenas o contraditório processual, mas a própria jurisdição do Estado, que, sem o advogado - e só com o magistrado .- não seria a Justiça, mas o arbítrio despótico e prepoten­te, ou o dogma distribuído como mercê paternalista aos válidos ou fa­voritos das simpatias e inclinações pessoais do poder unipessoal judican­te.

- Por isto é que vos disse que na missão do Advogado também se de­senvolve uma espécie de magistratu­ra, diversa nas funções, mas idênti­ca no objetivo: a Justiça. Com o Ad­vogado, a Justiça militante; com o Juiz, a Justiça imperante.

- Na vossa sagrada missão de de­ter o pOder ditanto o direito, de har­monizar os homens distribuindo jus­tiça, vós, Juízes, vos situais bem próximos de Deus, pois, como sen­tenciou o jurisconsulto Celso, vós sois os artífices do bem e da eqüida­de.

- Tudo isto vem a propósito neste momento em que se soleniza a posse, nesse Tribunal, cUjo notório prestígio os Advogados proclama­mos com orgulho, desse notável ma­gistrado e professor Romildo Bueno de Souza. Homem de fulgurante ta­lento, de cultura extensa, bem orde­nada e sistematizada pelo aprimora­mento que o diuturno exercício da Cátedra propicia, sobretudo às inteli­gências privilegiadas.

- Nós o saudamos como o Juiz exemplar que ascende, agora, a este Tribunal Superior pelo capricho de um ato humano fundado nas melho­res fontes de inspiração.

- Nós, os Advogados, estamos fe­lizes.

- Essa Corte está enriquecida.

- A Justiça brasileira engrandeci-da, pois que acaba de tomar assento num de seus Tribunais Superiores um homem que é bem a síntese da­quele Juiz de cuja consciência ja­mais se ausentará o dever de julgar bem, com desassombro, coragem, altivez, independência e sabedoria.

- Senhor Ministro Romildo Bueno de Souza, nós, os Advogados, numa prece, só rogamos a Deus que conti­nue a iluminá-lo.

Dando seqüência à solenidade, o Exmo. Sr. MinIstro-Presidente con­cedeu a palavra ao Dr. Humberto Gomes de Barros, representante da Ordem dos Advogados do Brasil, Se­ção Distrito Federal.

O Exmo. Sr. Dr. Humberto Gomes de Barros: Sr. Presidente, Egrégio

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Tribunal; meus Senhores, minhas Se­nhoras, eminente Ministro Romildo Bueno de Souza:

Aqui estamos, os advogados, teste­munhando o início de nova fase em sua exemplar vida de Magistrado.

Confessamo-nos possuídos de ale­gre satisfação.

Em verdade, tratamento elegante e jovial atenção foram constantes no relacionamento que mantivemos.

De outro lado, a Ordem dos Advo­gados contou sempre com sua pre­ciosa e desinteressada atenção. Não foram poucas as palestras e confe­rências em que os advogados se aproveitaram das admiráveis quali­dades de professor, inatas em V. Exa.

V. Exa. é, pois, um amigo do advo­gado!

Seus amigos alegram-se com este justo reconhecimento dos méritos que se habituaram a reverenciar.

Fosse verdadeira a máxima que define o advogado como juiz do ma­gistrado, estaríamos aqui proferin­do sentença declaratória de grandes méritos. E o conhecimento de sua atividade no Juízo de Primeiro Grau, nos habilitaria a emitir atesta­do no sentido de que este Colegiado Superior acaba de adquirir um de seus grandes Ministros.

Nosso júbilo tem sólido fundamen­to.

humanidade, sem esquecer que a consecução destes não pode ser obti­da sem a boa distribuição da riqueza material.

Como precisamos de humanistas! Estamos em plena convalescença. A Nação Brasileira tenta escapar

de mais um ataque desta endemia social que tanto aflige o continente latino-americano - a ditadura.

Esta última crise gerou-se a partir de quando um grupo de convictos de­mocratas entendeu que o sistema le­gal seria impotente para assegurar a legalidade.

Estes democratas - homens cale­jados, heróis na luta que abateu o nazismo e a ditadura do Estado No­vo - no intuito de salvar a legalida­de, substituíram-na por nova ordem, cuja duração seria curta.

Esqueceram-se de que o ordena­mento legal é um sitema em equilíbrio. Rompido este, toda a es­trutura perde estabilidade. O siste­ma fraturado passa a exigir mais e mais remendos e calços.

A reação em cadeia torna-se in­controlável.

Nela envolvidos, aqueles homens que pensavam salvar a democracia viram-se na contingência de implan­tar doutrina em que a segurança na­cional foi erigida em valor máximo.

A Nação ingressou em período de Existe, porém,

potencializa o emprestando-lhe tescas.

circunstância que guerra autofágica. contentamento,

dimensões gigan-

V. Exa. não é apenas um grande técnico, um jurista dos maiores, um processualista emérito. , 'V. Exa. é um humanista.

Dono de vasto e sedimentado acer­vo cultural, V. Exa. se habilita a pro­ceder, sempre, com os olhos volta­dos para os valores espirituais da

Instaurou-se o domínio do mani­queísmo, da tortura, da delação, da arbitrariedade. A censura isolou e aprisionou a inteligência.

Mergulhamos em escuridão pro­funda, tão profunda quanto aquela que nos envolveu na década dos trin­ta.

Aqueles homens do bem, aqueles heróis que pensavam em resgatar a democracia, viram-se reduzidos à

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condição de áulicos. Foi-lhes reser­vado o encargo de fazer parecerem legítimas as normas da violência.

Divorciados do povo, afundados no paradoxo que geraram, os campeões da democracia viram-se constrangi­dos a ocupar deprimentes cadeiras de legisladores biônicos.

Felizmente, a voz da razão se fez mais alta que o alucinante canto do aulicismo. Advogados, jornalistas, sacerdotes e outros grupos da socie­dade, já quase em desespero, foram, afinal, escutados.

Fez-se a luz. Rompeu-se a treva. Os detentores do poder, à semelhan­ça do rei, personagem da fábula. viram-se em sua nudez e descobri­ram, como o burguês de Moliêre, que faziam ditadura sem o saber.

Retornamos à trilha que leva ao Estado de Direito.

O caminho será árduo. A meta não será atingida com sim­

ples ajustes de natureza técnica. Ao lado da recomposição do orde­

namento jurídico, faz-se impres­cindível o reajuste na distribuição das riquezas.

Por teimarem em manter em odio­sa concentração as riquezas nacio­nais é que os democratas latino­americanos parecem condenados à pena de Sísifo: lutamos perdidamen­te pela edificação da legalidade; no entanto, quando a julgamos consoli­dada, ei-la rolando pelas encostas do arbítrio.

Só o humanismo nos redimirá de tal condenação.

Precisamos firmar o convencimen­to de que o civismo, como dedicação paciente e constante à sociedade política, é alternativa exeqüível para os rompantes do heroísmo.

Mais eficiente que o gesto heróico de cortar o nó górdio é o trabalho in­teligente de o desfazer: enquanto o

golpe brusco da espada desfaz o nó, rebentando a corda, o desatar sereno do laço elimina o problema e salva o novelo.

O respeito à lei é imprescindível. Se a regra é iníqua, ou foi superada

pelos fatos, deve ser alterada através de processo legislativo. Enquanto a reforma não ocorre, a jurisprudên­cia, valendo-se dos recursos da her­menêutica, há que temperar o texto, ajustando-o, quanto possível, aos princípios do Direito.

O respeito à lei é fundamental. Nele se envolve o próprio conceito

do mais precioso de todos os bens: a liberdade.

A moderna ciência política chegou à conclusão de que somente é livre o homem que obedece às normas para cuja elaboração contribuiu e cuja re­vogação está apto a provocar.

A liberdade, como aptidão para re­formar a lei, pressupõe a existência de eleições livres, imunes a artifícios casuísticos, tendentes a deformar o sentido do voto popular.

Na jornada em busca do Estado de Direito, ao Judiciário reserva-se fun­ção relevante.

Cabe-lhe corrigir os desvios, de­marcando os limites da legalidade.

O doloroso incidente «Watergate» nos presta eloqüente testemunho de quanto pode um juiz sereno.

Ultimamente, na Justiça Federal, cujo vértice está nesta Corte, colhe­mos belo exemplO do poder modera­dor que emana da função judiciária: o velho prédio da U.N.E. foi salvo da destruição por um jovem magistra­do, cuja energia abortou excessos de funcionários saudosos das facilida­des do arbítrio.

V. Exa., dono de cultura invejável e temperamento moldado na altivez, será, nesta Corte, peça valiosíssima na consolidação definitiva de nossa Democracia.

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Firmada na convicção de que as­sim ocorrerá, a Ordem dos Advoga­dos do Brasil se parabeniza pela in­vestidura de V. Exa., a quem deseja longa e profícua magistratura.»

Em prosseguimento, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente concedeu a pala­vra ao Dr. Almiro Afonso, represen­tante da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de São Paulo.

O Exmo. Sr. Dr. Almiro Afonso: Exmo. Sr. Presidente do Tribunal Federal de Recursos, Ministro José Néri da Silveira; Exmo. Sr. Ministro da Justiça, demais autoridades que integram a Mesa, Senhores Minis­tros, eminente amigo e querido cole­ga Ministro Romildo Bueno de Sou­za:

Honrou-me a Presidência do Con­selho Seccional da Ordem dos Advo­gados de São Paulo, ao designar-me para trazer a V. Exa. a saudação, que é de todos os advogados paulis­tas, neste instante que, como um orador que me precedeu acentuou, é um dia de graça para a Magistratu­ra. Devo dizer, entretanto, que o título que com maior orgulho posso exibir nesta tarde é, precisamente, o de haver sido colega de- turma de V. Exa. Trago, também, em nome des­ses contemporâneos seus, nesta tar­de, o abraço que é fraterno e, ao mesmo tempo, a reiteração de uma confiança que já podíamos ter da­queles anos, a velha escola do Largo de São Francisco, quando seu talen­to, a sua capacidade para o estudo, no sentido mais prOfundo do termo, já nos permitiam antever a grande­za de sua trajetória no rumo que aprouvesse tomar ao longo da vida. Digo que, se é um dia de graça para a Magistratura, esta tarde, para nós, de sua geração, é um dia marcante, é um dia histórico para cada um de nós, é um dia alto, de sol a pino da nossa geração. E, ao dizer isto a V. Exa., sei que não lhe faço pequena homenagem, porque, por coincidên-

cia, somos ambos de uma turma, ri­ca em valores, de nomes consagra­dos já hoje na Magistratura, no Mi­nistério Público, no ensino universi­tário, nomes hoje festejados nas le­tras jurídicas do País, nomes consa­grados por suas obras, e é precisa­mente de uma geração assim tão ri­ca de valores, que me permito poder dizer, com segurança, que V. Exa. é um expoente, que é honra para nós, neste instante, poder tê-lo aqui como um representante de uma geração antiga, que nasceu num instante em que a redemocratização do País nos permitia ser uma geração privilegia­da.

Pois é certo, como acentuava o eminente Ministro que o saudou, Jarbas Nobre, a velha Casa do Lar­go de São Francisco é, em síntese, o convento, o quartel e o asilo, as três coisas unificadas numa visão históri­ca, a da defesa intransigente da li­berdade, cUjo momento alto e único se dá num regime de plenitude de­mocrática. Formado naquela Casa, coube estranhamente a V. Exa. um destino que vale acentuar, pois V. Exa. se encaminha para a magistra~ tura, justo no momento em que, pelas circunstâncias históricas que impor­ta neste instante pouco recordar, as prerrogativas da magistratura eram suspensas, cerceados os Juízes em suas funções mais nobres, e eu me imagino o que há de ter sido para cada um dos magistrados, ao longo desses anos todos, cumprir a tarefa enorme de julgar quandO eles pró­prios tinham as mãos manietadas.

Eu indago como V. Exa., mesmo ao longo desses anos todos, pôde cumprir com serenidade, com serie­dade, com fidelidade as lições que aprendeu naquela Casa - que é con­vento, que é quartel, que é asilo e é síntese da liberdade - as tarefas mais altas que eu posso imaginar na sociedade, que é de julgar os homens nos seus conflitos sociais.

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Coincidência que agora V. Exa. chega a esta Casa no outro momento importante da evolução política e so­cial de nossa Terra. Reabre-se a pouco e pouco o espaço político, e ou­tra vez somos todos convocados, on­de quer que estej amos, a recriar as instituições democráticas, onde pos­sam os homens conviver com digni­dade, onde possam os homens respeitarem-se mutuamente no res­peito recíproco dos direitos uns dos outros. Se há tarefa de cada um dos cidadãos a ser cumprida, eu imagino que nenhuma há de ser mais alta do que, uma vez mais, a do magistrado.

Não há democracia possível onde o Direito se limite à letra dos Códigos. O Direito, a rigor, vive, emerge na plenitude de sua força, exatamente no instante do conflito social, quando os interesses individuais ou de gru­pos pedem ao magistrado, pedem à Justiça que dirimam estes mesmos conflitos. Eu recordo, de reminiscên­cias de leituras antigas, algo que neste instante me permitiria fazer a imagem adequada: diz-se que a luz, para ter essa claridade que a carac­teriza, necessita que entre ela e sua marcha se interponha um corpo opa­co. Pela lei física dessa leitura que neste instante eu evoco, a luz para­doxalmente seria uma perene escuri­dão, se entre ela e sua marcha não se opusesse um corpo opaco. Pois eu diria que o Direito assim também é. A norma consagrada no Código, na letra da lei, jamais brilharia, jamais teria força presente do Direito, se em determinado instante não hou­vesse o conflito social, seja ao nível dos indivíduos, seja ao nível dos gru­pos sociais. E é justo neste instante em que o Direito emerge e ele se faz presente pela palavra, pela senten­ça, pela voz do magistrado, pois é justo, neste instante, que se reabre o processo político entre nós, e uma vez mais as instituições pouco a pou­co se vão remontando, ainda que de maneira «capenga», que V. Exa.,

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por destino, chega a esta Casa tão grave na sua sabedoria, tão impor­tante nas suas tarefas, tão nobre na sua altitude.

Eu sei que o moço formado naque­la Casa, que foi convento, quartel e asilo, como síntese de liberdade, uma vez mais saberá ser o Juiz que fora ao longo dos anos do obscuran­tismo e de arbítrio.

Creia, meu eminente Colega de bancos de Academia, que nesta tar­de, ao trazer de São Paulo, em nome do Conselho da Ordem dos Advoga­dos, a palavra de apreço e a sauda­ção calorosa, sei que o faço em pala­vras singelas e poucas diante da enorme significação deste instante, mas sei também que através delas lhe consigo transmitir o calor de um abraço fraterno de seus velhos com­panheiros de Casa e o testemunho público do nosso respeito e da con­fiança perene em V. Exa.»

Em seguimento, o Exmo. Sr. MInistro-Presidente concedeu a pala­vra ao Exmo. Sr. Ministro Romildo Bueno de Souza.

O Exmo. Sr. Ministro Romildo Bueno de Souzq.: Exmo. Senhor Mi­nistro José Néri da Silveira, DD. Presidente do Egrégio Tribunal Fe­deral de Recursos, Senhores Minis­tros, Senhores Congressistas, Senho­res Magistrados, Senhores Procura­dores, Senhores Advogados, demais autoridades presentes ou representa­das, Senhores e Senhoras:

Escreveu Manuel Bernardes, no pórtico de luz e calor, que Deus, au­tor de todo o bem, «até aos autores maus dá doutrina boa». E invocando palavras de São Gregório Magno, o padre esclarece o intuito de Deus: propter bonos auditores, que, muito a meu modo traduzo - por compai­xão dos ouvintes.

Também confio no generoso auxílio do alto, que a ocasião por tantas razões reclama, poder expri-

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mir, na singeleza da palavra, a ri­queza dos sentimentos que agora quase me confundem.

Esta austera solenidade simboliza o momento culminante de minha vi­d~ pública, que se estende j á por vmte anos de atividades ininterrup­tas. Ao assumir o cargo de Procura­dor do Estado de São Paulo ou ao tomar posse, em 30 de outJbro de 1964, como Defensor Público, no Mi­nistério Público do Distrito Federal jamais poderia supor viesse um dià a integrar o Egrégio Tribunal Fede­ral de Recursos como um de seus Ministros.

Em momento de tão rara emoção, acodem-me à memória, irreprimi­velmente, as mais gratas lembran­ças da meninice e da juventude, do convívio do lar paterno: de meus pais, hoje no regaço divino, e de meus irmãos, quase todos aqui pre­sentes. E: ali, decididamente, que en­contro as raízes de minha atitude diante da vida e do mundo.

Descendente de gerações de fazen­deiros desbravadores do sertão, re­vejo o cenário encantador de uma epopéia verdadeira que se desdobra das encostas paulistas da Serra da Mantiqueira pelo vale do Mogi Gua­çu, itinerário de bandeirantes, até alcançar a terra roxa de Jaboticabal e Ribeirão Preto, de fertilidade' ines­gotável. Quando ainda não havia es­tradas, nem mesmo ferrovias, era nesses sertões remotos,· tomados de assalto pelos cafezais, que se feria o contraste de que fala Sérgio Buarque de Holanda, já então entre a aventu­ra dos pioneiros e a rotina preguiço­sa das cortes do Impérito e da Pri­meira República, Entre os primei­ros, estavam quase todos os meus antepassados.

Inteiramente alheio à tradição bu­rocrática e urbana, senão pelo ofício público de minha mãe, desempenha­do, porém, com o maior desvelo e

como verdadeiro sacerdócio, o de professora primária; e guiado, desde a mais terna idade, por ela mesma, pelOS luminosos caminhos da fé cris­tã, nos quais persevero, não foi difícil aceitar o desafio da vida como vocação, no seu sentido bíblico e eti­mológico. Aliando tenacidade reti­dão e severidade de meu pai à' imen­sa ternura e infinita bondade de mi­nha mãe, encontrei inspiração e alento para empreendimentos tão ás­peros, quanto estranhos à tradição familiar. Se não foi difíCil optar por e~te: rumo, que dizer, porém, dos epi­SOdIOS de cada dia, na concepção de cada ato da vida pública como ver­dadeiro universo de significação?

Mas é verdade que não me achei desamparado. Em cada uma das ati­vidades que tenho tido o privilégio de desempenhar - advogado, procu­rador, defensor público, professor e juiz - pude sentir bem de perto o palpitar de amizades sinceras, às ve­zes insuspeitadas até o instante cru­cial: amizades que cultivo na têmpe­ra da lealdade recíproca, iluminadas no espelho límpido da verdade.

Ao assumir as funções do cargo honroso de Ministro do Tribunal Fe­deral de Recursos, avalio bem as di­mensões e o peso de minhas novas responsabilidades. Elas refletem o avultado número de demandas que diariamente ingressam nesta casa de justiça; a variedade imensa de questões e temas que essas deman­das suscitam; as perplexidades que quase paralisam a formação do juízo decorrentes do fluxo incessan­te da legislação que, por sua vez, nem sempre traduz apreCiação avi­sada dos fatos que tipifica: legisla­ção que freqüentemente denuncia a falta de perspectiva coerente do or­den:1mento jurídico, cuja expansão advém da pressão irresistível de ne­cessidades prementes,

De fato, o âmbito de atuação da Justiça da União abrange, predomi-

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nantemente, os conflitos de interesse decorrentes da sua atividade admi­nistrativa. Esta, desde o início do sé­culo e, principalmente após a segun­da guerra mundial, entrou em pro­cesso de multiplicação e diversifica­ção acelerada, intensa, aparente­mente infinita.

O expansionismo da atividade ad­ministrativa do estado contemporâ­neo correspondeu, a princípio, à exi­gência de desenvolvimento econômi­co dos estados periféricos relativa­mente ao núcleo central da atividade econômica em escala mundial. Justa e irrecusável enquanto dirigida a ga­rantir o acesso de povos marginali­zados à higiene, saúde, alimentação, habitação, instrução e tantos outros bens da cultura, esta exigência de desenvolvimento tem degenerado em ideologia desenvolvimentista, a

. grande obsessão deste fim de século. Neste contexto, a administração

pública federal marca sua presença em todos os aspectos da vida huma­na, desde a assistência médica pré­natal, até o auxílio-funeral. Não pode deixar de fazê-lo. E na medida em que o faz, dá ensejo à proliferação de litígios.

Esta Corte de Justiça tem aperfei­çoado e acumulado experiência ex­traordinária no trato desses variados conflitos.

Chego, pois, a esta casa augusta, confortado pela dedicação constante partilhada no recesso de meu lar, animado por amigos provados; ad­vertido, é certo, quanto à surpreen­dente maldade do homem, mas re­temperado pela fé que a todos permite ver-nos a nós mesmos, como destinatários supremos da graça e do amor de Deus, de que todos igual­mente dependemos.

De todo este concurso careço ao assumir o lugar que neste recinto competia a um dos mais insignes de seus juízes, o Senhor Ministro Már­cio Ribeiro, em quem tantas virtudes

se atropelam para plasmar a síntese de uma personalidade cativante por sua simplicidade autêntica, honra­dez, exímia capacidade profissional, constante dedicação aos deveres do cargo que tanto honrou e serena in­dependência de magistrado. Deve-se dizer de Márcio Ribeiro que S. Exa. c.oncretiza a mais perfeita concepção do ofício de juiz, a do magistrado romano: homem probo, perito na ar­te de julgar.

Proponho-me, na modéstia de meus dons, no exercício da judicatu­ra que hoje principio, honrar o lega­do que recebo desse nobre juiz, e que pertence a esta Corte.

Estarei atento ao relicário de sa­ber e às respeitáveis tradições deste Tribunal que não precisou de sécu­los para granjear o respeito público porque, ungido nas águas lustrais da assembléia constituinte de 1946, con­cebido em perfil de prudência e equilíbrio, logo confraternizou com as mais autênticas instituições repu­blicanas, com as quais matinha e mantém a mais completa coerência.

Diz Emilio Betti que os juízes vie­ram antes dos legisladores. Segundo sua abalizada opinião, a revelação do direito objetivo se fez, nos pri­mórdios, especialmente para cada caso.

Pode-se, portanto, avaliar o grau de incerteza do direito, acentuando­se à medida em que as comunidades humanas se expandiam e as relações jurídicas se multiplicavam, tornando-se cada vez mais comple­xas.

Dir-se-ia que tão grande mal - a incerteza do direito - foi cabalmen­te conjurado pelo advento da lei es­crita que resplandece nas codifica­ções contemporâneas, calcadas na técnica mais requintada, na sistema­tização da ciência e no aprimora­mento das idéias políticas.

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Nossa experiência de juízes desau­toriza esta supoSição, desmentida, aliás, pela espantosa multiplicação dos litígios, fazendo submergir juízes e tribunais sob catadupas de proces­sos, reci.uzindo-os a completa insolven­cia. A incerteza j á não é apenas quanto ao direito, mas também quanto à possibilidade de vê-lo, al­gum dia, reconhecido. Esta expe­riência dolorosa da justiça brasilei­ra, resistente às tentativas de rees­truturação do aparelho judiciário e às reformas das leis de processo, é também de outros povos de contexto social e cultural o mais diverso. Os escritos de Kafka denunciam a tra­gédia contemporânea da justiça en­volta em mistério impenetrável, ela mesma absolutamente insondável, fora e acima de qualquer forma de controle social, fazendo da sociedade sua vítima indefesa.

Quando os pretores, em Roma, eram investidos de suas funções, di­vulgavam editos, definindo critérios que haveriam de presidir o julga­mento das causas. Constituíam estes editos meio utilíssimo de comunica­çâo do poder público com os jurisdi­cionados, e destes com aquele. Es­clareciam previamente a atuação da justiça pretoriana empenhada em corrigir e suprir os rigores e as defi­ciências da lei. Não é preciso insistir na importância da obra do pretor, em que esta foi a época mais puj an­te da jurisprudência romana.

Naquele momento verdadeiramen­te épico, era visível a face dos juízes; suas feições eram patentes; nada estava oculto. Não era chegado ainda o tempo da exacerbação buro­crática do baixo império. Não era ainda Bizâncio. Se, por um lado, não predominava a mania da uniformi­zação grosseira, por outro, o litigan­te não podia ignorar o claro e ine­quívoco posicionamento de seus juízes.

Quando da reforma do processo ci­vil da Itália, Carnelutti advertiu que de pouco aãiantaria um bom código, se faltassem mesas, cadeiras e má­quinas para o funcionamento da Jus­tiça.

Seja-me permitido acrescentar que de pouco adianta um bom código; pouco ainda será todo o séquito de equipamentos mecânicos e eletrôni­cos. Benvindos sejam todos estes re­cursos. Temos deles a maior urgên­cia. Tudo devemos fazer para aproveitá-los ao limite de suas possi­bilidades e, até mesmo, para aperfeiçoá-los.

Mas instrumentos e equipamentos, recursos técnicos e materiais pouco ou nada significam, se os juízes não cultivarem a noção mais clara de sua missão constitucional.

Discernir toda a eficácia dos impe­rativos constitucionais; extrair deles toda a significação e atualidade; abrir espaço no foro para a efetiva atuação das diretrizes da lei maior, eis o desafio que nenhuma reforma da justiça pode dispensar, nem mes­mo negligenciar.

Somente à luz dos grandes princípios que estruturam a repúbli­ca e a federação brasileira; somente atentos à origem e fundamento do poder político em suas bases popula­res, donde provém sua legitimidade, consoante os cânones constitucionais, é que poderemos superar os equívo­cos que já comprometem a lingua­gem de nosso tempo, hesitante entre conceitos tão ambíguos como os de classe política e sociedade civil, co­mo se existisse uma sociedade mili­tar, como se a representação do po­vo nas casas legislativas bastasse para erigir uma classe social de re­presentantes do povo. Notadamente no tocante à federação, é muito propício este momento para que in­sista em sua extraordinária atuali­dade na presente conjuntura nacio­nal.

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Não comungo com aqueles que qualificam a federação, entre nós, como importação artificial de insti­tuição estranha.

Vejo os lineamentos da federação brasileira na descentralização autár­quica da colônia e no surgimento das províncias por imposição dos regio­nalismos que se equilibram, comple­mentam e enriquecem.

A realidade de nosso território, de nossa ger.te, de nossa economia é di­versa e nitidamente complementado­ra. A idéia federativa é, portanto, rea­lista. A centralização exacerbada é que destoa de nossa vocação geográ­fica, econômica e histórica e não ad­mira que, desde a Constituição de 91, federação e república se apresentam como idéias e instituiçôes irmãs, verdadeiros pilares de nossa voca­ção nacional.

O desdobramento destas idéias há de revelar riquezas verdadeiramente surpreendentes em favor do harmo­nioso desenvolvimento econômico e social do país.

Escusai-me o abuso de vossa pa­ciência.

Agradeço, sumamente sensibiliza­do, a grande honra que me concedeu o Exmo. Senhor Presidente da Repú­blica, João Batista Figueiredo, ao me distinguir, dentre tantos outros nomes dos mais ilustres, nomeando­me para cargo de tão grande relevo, assim me qualificando para o convívio fraterno com juízes tão ilus­tres e estimados; e ao Colendo Sena­do Federal, que tão prontamente re­ferendou a escolha presidencial e do eminente Senhor Ministro de Estado da Justiça, Deputado Ibraim Abi­Ackel.

Muito me comoveram as palavras tão afetuosas, repassadas da mais pura generosidade que tão bem o ca­racteriza, com que me saudou o emi­nente Senhor Ministro Jarbas Nobre,

ilustre Vice-Presidente deste Tribu­nal, uma de suas mais autênticas ex­pressões, que tanto tem a contribuir nesta hora de profunda reestrutura­ção do Tribunal.

Peço-vos encarecidamente que re­laveis os excessos em que incorreram o nobre Subprocurador-Geral, Dr. Hé­lio Pinheiro da Silva, os ilustres Ad­vogados, Drs. Wilson do Egito Coe­lho, Humberto Gomes de Barros e Almino Afonso. Estas manifestações tangeram as cordas mais escondidas de meu afeto. Suas ressonâncias acompanharão meus passos no itine­rário que este dia inaugura. Tudo fa­rei para não desmenti-las e para manter com o Ministério Público e as classe dos advogados o convívio mais respeitoso.

As vestes talares com que compa­reço a este ritual serão a perene lembrança de longo e renovado convívio com meus diletos colegas da Faculdade de Direito da Universi­dade de Brasília, aos quais tanto de­vo de minha formação jurídica e profiSSional. Homenagem tão como­vente não há como retribuir, senão unicamente pelo compromisso que assumo de fazer desta beca legado impoluto para testemunho de minha consagração, que ora renovo, com humildade e fé inquebrantável, ao serviço da Justiça.

Agradeço a todos os colegas, ami­gos e familiares de Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro e outros luga­res, que aqui acorreram para minha maior alegria.

Finalizando, o Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira, Presidente do Tribunal, proferiU as seguintes palavras:

O Tribunal agradece a presença das altas autoridades que compõem a Mesa e foram referidas inicial­mente, bem assim agradece a pre­sença do Exmo. Sr. Ministro Hélio Beltrão, dos prOfessores da Uni ver si-

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dade de Brasília, tendo à frente o seu ilustre Reitor, professor José Carlos Azevedo, e ainda a presença do ilustre Desembargador Waldir Meuren, representante do Sr. Presi­dente do Tribunal de Justiça do Dis­trito Federal, dos Srs. Conselheiros do Tribunal de Contas do Distrito Federal.

Antes de declarar encerrada esta sessão, convido as autoridades e pes­soas, que tanto honraram o Tribunal com suas presenças, para o coquetel que será servido no «hall» contíguo a este salão.

Está encerrada a sessão. Compareceram à solenidade, além

das que compuseram a Mesa, as se­guintes autoridades: Ministro Hélio Marcos Penna Beltrão, Titular da Pasta Extraordinária para a Desbu­rocratização; Dr. Firmino Ferreira Paz, Procurador-Geral da Repúbli­ca; Ministro Geraldo Starling Soa­res, Presidente do Tribunal Superior do Trabalho; Ministro Luiz Octávio Galloti, representante do Presidente do Tribunal de Contas da União; Mi­nistro Mário Pacini, do Tribunal de Contas da União; Ministro George­nor Acylino de Lima Torres, repre­sentante do Superior Tribunal Mili­tar; Ministro Djalma Tavares da Cu­nha Mello; Ministro Esdras Gueiros; Ministro Oscar Corrêa Pina; Drs. Antônio de Pádua Ribeiro e Paulo A. F. SOllberger, Subprocuradores­Gerais da República; Desembarga­dor Jorge Duarte de Azevedo, Presi­dente do Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal; Desembargado­res Mário Dante Guerrera, Lúcio Arantes, Eduardo Andrade Ribeiro de Oliveira, Milton Sebastião Barbo­sa e Raimundo Macedo, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal; Dr. Emmanuel Francisco M. Lyrio, Procurador-Geral do Distrito Fede­ral; Coronel Moacyr Coelho, Diretor­Geral do Departamento de Polícia Federal; Dr. Lincoln Magalhães da Rocha, Auditor do Tribunal de Con-

tas da Uniã(); Dr. Milton Menezes da Costa Filho, Procurador-Geral da Justiça Militar; Dr. Maurício Cor­rêa, Presidente da Ordem dos Advo­gados do Brasil, Seção Distrito Fede­ral; General de Divisão Octávio Pe­reira da Costa, representante do Mi­nistro do Exército; Deputados Daso de Oliveira Coimbra, Edson Vidigal e Athiê Jorge Coury; Conselheiro Raul Soares da Silveira, represen­tante do Presidente do Tribunal de Contas do Distrito Federal; Conse­lheiros Amaury da Silva Ramos, Mo­hamad Khodr, Flávio RogériO H. Reinehr e José Rocha de Carvalho; Dr. Luiz Gonzaga Theodoro, Presi­dente da Junta de Recursos Fiscais do Distrito Federal; Dr. Walter Pi­nheiro Filho, representante do Ex­mo. Sr. Ministro da Saúde; Dr. Jorge Leovegildo Lopes, representante do Exmo. Sr. Ministro da Marinha; Dr. Jair Teixeira Campos, representante do Exmo. Sr. Ministro-Chefe do Es­tado Maior das Forças Armadas; Dr. Cid Heráclito de Queiroz, represen­tante do Exmo. Sr. Ministro da Fa­zenda; Dr. Francisco das Chagas Mariano, representante do Exmo. Sr. Ministro das Minas e Energia; Dr. João Guilherme Aragão, repre­sentante do Exmo. Sr. Ministro da Educação e Cultura; Dr. Tarcísio Carlos de Almeida Cunha, represen­tante do Exmo. Sr. Ministro da In­dústria e Comércio; Dr. Geraldo An­tônio Nogueira Miné, representante do Exmo. Sr. Ministro do Trabalho; Dr. Paulo César Cataldo, represen­tante do Exmo. Sr. Ministro-Chefe do Gabinete Civil da Presidência da República; Dr. Paulo Roberto Sarai­va da Costa Leite, representante do Exmo. Sr. Ministro-Chefe de Serviço Nacional de Informações; Dr. José Mário Bimbato, representante do Exmo. Sr. Ministro-Chefe da Secre­taria do Planejamento; Dr. Luiz Ro­drigues, representante do Sr. Diretor-Geral do Departamento Ad­ministrativo do Serviço Público; Dr. Hélio Estrella, representante do Ex-

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mo. Sr. Ministro das ComunÍcaçôes; Pe. VirgÍlio Fistarol, representante de D. José Newton de Almeida Bap­tista - Arcebispo de Brasília; Capitão-de-Mar e Guerra José Car­los Azevedo, Reitor da Universidade de Brasilia; Vice-Reitor da Universi­dade de Brasília - Professor Marco Antonio Rodrigues Dias; Professor Alberto Perez, Reitor do Centro de Ensino Unificado de Brasilia; Dr. Olavo Ferro, Diretor do Departa­mento de Assuntos Judiciários do Ministério da Justiça; Dra. Nadir Bispo Faria, Procuradora da Justiça Mílitar; Dr. Darcy Cunha Vasconcel­los, Chefe de Divisão Jurídica da Caixa Econômica Federal; Dr. Lind­berger Aziz Cury, Presidente de As­suntos Comerciais do Distrito Fede­ral; General Dirceu Araújo Noguei­ra; Coronel Silvio Caracas de Moura e esposa, Drs. Benjamin Golden­berg, Edson B. Garcia, Cleto C. Mei­reles, João Bispo dos Santos Júnior, Gilberto ~lves Néry, Newton Egydio Rossi, WeIlington Carlos Batista, Li­no Martins Pinto, Dicanor Moraes, Francisco Aguiar Carneiro, Claudio Lemos Fonteles, Celso Franco de Sá Santoro; funcionários dos Tribunais e o Rev. Samuel Martins Barbosa.

Tribunal Federal de Recursos, 8 de abril de 1980 - Ministro José Né­ri da Sllveira, Presidente - Bel. José Alves Paulino, Secretário do Tribunal Pleno.

POSSE CONJUNTA

ATA DA SESSÃO SOLENE REALIZADA EM 23 DE

JUNHO DE 1980

Aos vinte e três dias do mês de ju­nho do ano de mil novecentos e oi­tenta, às quinze horas, na Sala de Sessões do Tribunal Federal de Re­cursos, presentes os Exmos. Srs. Mi­nistros José Néri da Silveira, Presi-

dente do Tribunal, Armando Rollem­berg, Moacir Catunda, Peçanha Martins, Jarbas Nobre, Aldir Gui­marães Passarinho, José Dantas, Lauro Leitão, Carlos Madeira, Guei­ros Leite, Washington Bolívar, Tor­reão Braz, Carlos Mário Velloso, Ot­to Rocha, Wilson Gonçalves, William Patterson, Adhemar Raymundo e Romildo Bueno de Souza, presentes, ainda, o Exmo. Sr. Dr. Geraldo An­drade Fonteles, 1? Subprocurador­Geral da República e o Secretário do Tribunal Pleno, Bel, José Alves Pau­lino, foi aberta a sessão solene. Ao início dos trabalhos, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente convidou os Ex­mos. Srs. Ministros Antonio Néder, Presidente do Supremo Tribunal Fe­deral, o Exmo. Sr. Ministro Ibrahim Abi-Ackel, Ministro da Justiça, o Ex­mo. Sr. Ministro Leitão de Abreu, Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, o Exmo. Sr. General de Exérctto José Ferraz da Rocha, Mi­nistro-Chefe do Estado Maior das Forças Armadas para composição da Mesa. Em seguida o Exmo. Sr. Ministro-Presidente, após referir-se às autoridades componentes da me­sa e às demais autoridades presen­tes ou representadas, proferiu as se­guintes palavras:

o Exmo. Sr. Ministro José Néri da Sllveira, (Presidente): Destina-se es­ta sessão solene do Tribunal Federal de Recursos à posse dos 8 (oito) no­vos Ministros, recentemente nomea­dos, por sua Excelência o Sr. Presi­dente da República, para compor es­te Tribunal, na conformidade da Emenda Constitucional n? 7, de 1977, e da Lei Orgãnica da Magistratura Nacional, de março de 1979. Serão empossados nesta Sessão, declinando-se os nomes pela ordem de antiguidade que terão no Colegia­do, na conformidade das disposiçôes regimentais, os ilustres Juízes Fede­rais: Dr. Hermillo Galant, da Seção Judiciária do Estado do Rio Grande

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do Sul; Dr. José Pereira de Paiva, da Seção Judiciária do Estado de Minas Gerais; Dr. Sebastião Alves dos Reis, também da Seção Judiciá­ria do Estado de Minas Gerais; Dr. Miguel Jerônymo Ferrante, da Se­ção Judiciária do Estado de São Paulo; Dr. José Cândido de Carvalho Filho, da Seção Judiciária do Estado da Bahia; Dr. Pedro da Rocha Acio­li, da Seção Judiciária do Estado de Alagoas; Dr. Américo Luz, da Seção Judiciária do Estado do Rio de Ja­neiro, e ainda um representante do

. Ministério Público Federal, na pes­soa do Dr. Antônio de Pádua Ribei­ro, Subprocurador-Geral da Repúbli­ca. Suas Excelências encontram-se presentes. Proceder-se-á, de imedia­to, à cerimônia de posse.

A seguir, o Exmo. Sr. Ministro­Presidente designou comissão com­posta pelos Srs. Ministros Armando Rollemberg e Peçanha Martins, pa­ra introduzir o Dr. Hermillo Galant no recinto do Plenário. Prestado o compromisso regimental, lido e assi­nado o termo de posse, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente declarou empos­sado o Exmo. Sr. Ministro Hermillo Galant, convidando-o a tomar assen­to na bancada do Plenário, ao lado do Sr. Ministro Adhemar Raymundo. Comissão composta pelos Srs. Minis­tros Moacir Catunda e Jarbas Nobre introduziu o Dr. José Pereira de Pai­va no recinto do Plenário. Prestado o compromisso regimental, lido e as­sinado o termo de posse, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente declarou empos­sado ó Exmo. Sr. Ministro José Pe­reira de Paiva, convidando-o a to­mar assento na bancada do Plenário ao lado do Sr. Ministro Romildo Bue­no de Souza. Comissão composta pe­los Srs. Ministros Aldir Guimarães Passarinho e Lauro Leitâo, introdu­ziu o Dr. Sebastião Alves dos Reis no recinto. Prestado o compromisso re­gimental, lido e assinado o termo de posse, o Exmo. Sr. Ministro­Presidente declarou empossado o

Exmo. ·Sr. Ministro Sebastião Alves dos Reis, convidando-o a tomar as­sento na bancada do Plenário ao la­do do Sr. Ministro Hermillo Galant. Comissão constituída pelos Srs. Mi­nistros José Dantas e Carlos Madei­ra acompanhou o Dr. Miguel Jerôny­mo Ferrante até o recinto da soleni­dade. Prestado o compromisso regi­mental, lido e assinado o termo de posse, o Exmo. Sr. Ministro­Presidente declarou empossado o Exmo. Sr. Ministro Miguel Jerôny­mo Ferrante, convidando-o a tomar assento na bancada do Plenário, ao lado do Sr. Ministro José Pereira de Paiva. Comissão integrada pelos Srs. Ministros Washington Bolívar e Carlos Mário Velloso introduziu o Dr. Pedro da Rocha Acioli no recinto do Plenário. Prestado o compromis­so regimental, lido e assinado o ter­mo de posse, o Exmo. Sr. Ministro­Presidente declarou empossado o Exmo. Sr. Ministro Pedro da Rocha ACioli, convidando-o a tomar assento na bancada, ao lado do Sr. Ministro Miguel Jerônymo Ferrante. Em con­tinuação, os Srs. Ministros Gueiros Leite e Torreão Braz, em comissão, acompanharam o Dr. José Cândido de Carvalho Filho até o recinto do Plenário. Prestado o compromisso regimental, lido e assinado o termo de posse, o Exmo. Sr. Ministro José Cândido de Carvalho Filho, convidando-o a ocupar seu lugar na bancada do Tribunal, ao lado do Sr. Ministro Sebastião Alves dos Reis. Comissão constituída pelos Srs. Mi­nistros Wilson Gonçalves e Adhemar Raymundo introduziu o Dr. Américo Luz no recinto da Sessão. Prestado o compromisso regimental, lido e assi­nado o termo de posse, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente declarou empos­sado o Exmo. Sr. Ministro Américo Luz, convidando-o a tomar assento na bancada, ao lado do Sr. Ministro José Cândido de Carvalho Filho. Por último, em comissão, os Srs. Minis­tros Otto Rocha e William Patterson introduziram o Dr. Antonio de Pádua

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Ribeiro no recinto do Plenário. Pres­tado o compromisso regimental, lido e assinado o termo de posse, o Ex­mo. Sr. Ministro-Presidente declarou empossado o Exmo. Sr. Ministro An­tônio de Pádua Ribeiro, convidando­o a tomar assento na bancada, áo la­do do Sr. Ministro Pedro da Rocha ACioli. Logo a seguir, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente concedeu a pala­vra ao Exmo. Sr. Ministro Carlos Mário Velloso, para saudar os em­possados, em nome do Tribunal.

o Exmo. Sr. Ministro Carlos Mário Velloso: A sessão solene que nesta tarde celebramos tem alto significa­do: recebemos oito novos Ministros, os Juízes Federais Hermillo Galant, José Pereira de Paiva, Sebastião Al­ves dos Reis, Miguel Jerônymo Fer­rante, José Cândido de Carvalho Fi­lho, Pedro da Rocha Acioli, Américo Luz e o Subprocurador-Geral Antô­nio de Pádua Ribeiro, nomeados na forma do dispositivo constitucional que consagra a reforma do Tribunal, justamente quando a Corte comemo­ra o trigésimo terceiro aniversário de sua instalação.

Criado o Tribunal Federal de Re­cursos, pela Constituição de 1946, e instalado no dia 23 de junho de 1947, confiou-lhe o constituinte competên­cia jurisdicional antes conferida à Corte Suprema. Competia-lhe, então, basicamente, processar e julgar, em grau de recurso, as causas em que fosse a União interessada como auto­ra, ré, assistente ou opoente, ou quando se tratasse de crimes prati­cados em detrimento de bens, servi­ços ou interesses da União, bem as­sim as decisôes de Juízes locais, de­negatórias de habeas corpus, e as proferidas em mandados de seguran­ça, se federal a autoridade apontada coatora; originariamente, julgaria os mandados de segurança impetrados contra ato de Ministro de Estado.

Composto, inicialmente, de nove Ministros, à segunda Corte Judiciá­ria do Brasil cumpria, sobretudo, in­terpretar o direito público, em fase de sua elaboração, conforme lem­brou o eminente Ministro Armando Rollemberg, em discurso que profe­riu, como Presidente do Tribunal, ao ensejo da comemoração dos vinte e cinco anos da Corte, ao dizer que «a matéria que lhe fora reservada esta­va compreendida, toda ela, no âmbi­to do Direito Administrativo, que, se fora versado entre nós por alguns publicistas de mérito inegável, à fal­ta de textos legais específicos, de Sistematização das regras regUlado­ras das relações entre o indivíduo e o Estado, apresentava, como bem acentuou Se abra Fagundes em magnífiCO trabalho, múltiplas áreas de lacunas que tornavam «indispen­sável a exegese criadora ou constru­tiva dos tribunais, para a formação de alguns dos seus preceitos mais importantes, como também para a estratificação, pela constância dos arestos, dos critérios então formula­dos».

Certo é que, arrostando dificulda­des, o Tribunal se impôs ao respeito dos seus jurisdicionados. É expreSSi­vo, no particular, o testemunho de Pontes de Miranda, que foi dos maiores juristas do Brasil e que se caracterizava por ser homem de co­luna dorsal invergável; e que afir­mou, conforme lembrado pelo Minis­tro Jorge Lafayette Guimarães, no seu discurso de posse, que «em vinte anos de atividade, os serviços, que ao país tem prestado o Tribunal Fe­deral de Recursos, são enormes». (<<Comentários à Constituição de 1967», IIII540).

O inegável crescimento do país, a nova concepção de democracia so­cial que, a partir da 2~ Grande Guer­ra, 'tem-se tentado implantar na: nos­sa terra, em que o Estado confunde­se com ·a sociedade, com um mundo de competências para a realização

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do bem-estar social, propugnada a isonomia também no campo da or­dem econômica e social, em que o intervencionismo estatal se manifes­ta, tanto de modo repressivo, como de forma positiva, com imensa reper­cussão no campo das relações jurídi­cas entre o indivíduo e o poder públi­co, é natural que a este Tribunal, co­locado no vértice dessas relações, convergissem, de forma acentuada, os grandes conflitos entre a liberda­de e a igualdade, entre o indivíduo e o Estado como sujeito de direito. Cresceu, então, de forma inquietan­te, o volume de serviço do Tribunal.

De outro lado, certamente que em razão dos bons serviços prestados ao país, de que deu testemunho Pontes de Miranda, ampliava-se a competên­cia do Tribunal. Com a restauração da Justiça Federal de 1~ Instância, em 1966, ao grande volume de cau­sas trazidas ao jUlgamento da Corte, acresceram-se outras. A Constitui­ção de 1967 e a Emenda Constitucio­nal n? 1 de 1969 introduziram novas questões na competência do Tribunal de Recursos, tirando-lhe a feição pu­ramente federal, para dar-lhe cará­ter de Tribunal nacional, Tribunal da Federação. A competêcia confe­rida ·ao Tribunal Federal de Recur­sos, para o julgamento de conflitos entre juízes subordinados a tribunais diversos, federais e estaduais, ou de jurisdição comum ou especializada, ou o julgamento, originariamente, de membros de Tribunais federais e es­taduais (C.F., art. 122, I, b), compro­vam a afirmativa.

E evidente que os nove Ministros da composição originária, posto te­rem sabido corresponder à confiança da Nação, a ponto de Pontes de Mi­randa ter-lhes creditado grande par­te do êxito alcançado pelo Tribunal (ob. e loco cits.), não poderiam, hu­manamente, atender a tantos e com­plexos trabalhos.

Em 1965, através do Ato Institucio­nal n? 2, ratificado pela Emenda

Constitucional n? 16, de 26-11-1965, o número de Ministros do T l'ibunal Fe­deral de Recursos cresceu para tre­ze. O Tribunal, a seu turno, através de emendas regimentais, procurava descongestionar os seus serviços, restringindo a competência do Ple­nário, transferindo para as Turmas o julgamento de certos recursos.

Em 1977, aberto o debate a respei­to da reforma do Poder Judiciário, o Tribunal não se omitiu. Através de sugestão encaminhada ao Supremo Tribunal e de anteprojeto remetido ao Congresso Nacional, que teve co­mo relator o Ministro Paulo Távora, foi proposta a criação de tribunais regionais, ficando o Tribunal Fede­ral de Recursos como corte de recur­so especial, a exemplo do que ocorre na jurisdição eleitoral e do trabalho.

Todavia, a opção política dos pode­res competentes da República, atra­vés da Emenda Constitucional n? 7, de 1977, e Lei Complementar n? 35, de 1979, foi no sentido do aumento do número dos Ministros do Tribunal, de 13 para 27, preenchendo-se, de imediato, seis cargos. Concretiza-se nesta tarde, com a posse dos novos oito Ministros, a reforma que o legis­lador brasileiro quis. Cumpre-nos, pois, efetivá-la.

A reforma, todavia, não prOduzirá êxito, o que não passa desapercebido ao mais desatento dos observadores, com o aumento puro e simples dos Juízes do Tribunal, mesmo porque um mundo de processos, cerca de 20.000, aguardam julgamento. O seu sucesso dependerá, estamos certos, de medidas processuais paralelas, ta­is como as preconizadas no discurso de posse do eminente Presidente da Casa, Ministro José Néri da Silveira, que pugnou pela adoção de «imedia­tas medidas legislativas, colimando, desde logo, diminuir o afluxo de pro­cessos a esta Corte, bem assim «à li­mitação de recursos sobre determi-

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nadas matérias e à aplicação do princípio do duplo grau de jurisdi­ção».

Com a compreensão do Poder Exe­cutivo, essas providências vêm-se viabilizando.

o Tribunal, de outro lado, tem pro­curado encontrar meios e formas de racionalizar os seus trabalhos, seja pela maior divulgação de sua juris­prudência, seja mediante a edição de súmulas da sua jurisprudência predominante. Tais súmulas, lembra Roberto Rosas, face ao que dispõe o art. 90, § 2?, da Lei Complementar n? 35, passaram a ter, junto com as sú­mulas do Supremo Tribunal Federal, natureza normativa, o que preconi­zara M. Waline, ao sustentar o poder normativo da jurisprudência. O Tri­bunal já editou mais de quarenta sú­mulas, e continuará editando outras, o que possibilitará aos Ministros o julgamento de recursos por despa­cho, com economia de tempo e ace­leramento dos trabalhos.

Os cientistas políticos e os consti­tucionalistas contemporâneos recla­mam novas garantias de indepen­dência dos tribunais, ao lado daque­las que se tornaram clássicas. Sustenta-se, por exemplo, que aos tribunais superiores deve ser confe­rido poder normativo no campo do Direito Processual, lembra o Profes­sor Nelson de Souza Sampaio (<<As Constituições e a Independência do Poder Judiciário», RDP, 39/40, p. 20).

O Supremo Tribunal Federal já es­tá investido nessa garantia (C.F., art. 119 § 3?, c) a exemplo do que ocorre, de forma mais ampla, é cer­to, com a Suprema Corte de Justiça da Inglaterra e a Suprema Corte dos Estados Unidos, por delegação do Congresso. Com base nessa delega­ção, aliás, baixou a Suprema Corte americana as «Federal Rules Of Ci-

vil Procedure» e as «Federal Rules of Criminal Procedure» (Nelson de Souza Sampaio, ob. e loco cits.).

O nosso Tribunal, não obstante ba­lizado pelas leis processuais que re­duzem os regimentos internos a sim­ples leis materiais supletivas, procu­rou, todavia, no vazio daquelas leis, fiel ao que propugnava, em 1971, o eminente Ministro Armando Rollem­berg, encontrar «fórmulas aptas a tornarem cada vez mais rápida, em­bora igualmente cuidadosa, a distri­buição da Justiça». Com esse esco­po, tem vigência, a partir desta da­ta, o novo Regimento Interno do Tri­bunal Federal de Recursos, com 395 artigos.

Assim, meus senhores, contada a vôo de pássaro, uma pequena histó­ria do esforço que temos desenvolvi­do nesta Casa, com o propósito de fazer com que a reforma frutifique, quando o Tribunal se engaj a numa nova estrutura.

Oito novos Ministros passam a compartilhar conosco, a partir de hoje, dos trabalhos da Corte, das suas alegrias e das suas preocupa­ções.

Estamos contentes, os irmãos mais velhos, quando recebemos no seio de nossa família esses irmãos mais moços.

Contentes e felizes, sobretudo, por­que se incorporam ao Tribunal Juízes do melhor quilate, testados na judicatura e no Ministério Público, tanto na 1~ quanto na 2~ instãncia.

Hermillo Galant vem do Rio Gran­de do Sul, onde foi político, advoga­do, Juiz Federal e Juiz do Tribunal Regional Eleitoral. Miguel Jerônymo Ferrante nasceu no Acre. Foi em São Paulo, terra que elegeu como sua, que foi professor, escreveu li­vros e projetou-se na magistratura, como Juiz Federal e Juiz do Tribu­nal Eleitoral. José Cândido de Car­valho Filho é homem da Bahia e é

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da terra de Ruy que ele vem. Depu­tado à Assembléia Legislativa da Bahia, por duas legislaturas, advo­gado, foi Juiz Federal e Juiz do Tri­bunal Eleitoral daquele Estado, e é professor-titular de Direito Penal da tradicional Faculdade de Direito da Bahia. Pedro da Rocha Acioli, das Alagoas, homem do nordeste, nas Alagoas foi Juiz eminente, tanto da Justiça Estadual quanto da Justiça Federal. Integrou o Tribunal Eleito­ral do seu Estado e é também pro­fessor. Traz para o Tribunal uma tradição de independência de que, a respeito de Acioli, o Senador Daniel Krieger nos dá notícia nas suas me­mórias, «Desde as missões ... ». Amé­rico Luz, nascido nas Minas Gerais, teve um rio que passou em sua vi­da ... Pois foi na mui leal São Sebas­tião do Rio de Janeiro, que Américo Luz notabilizou-se como Juiz Fede­ral, Juiz do Tribunal Eleitoral e pro­fessor Antônio de Pádua Ribeiro também nasêeu nas Gerais de Gui­marães Rosa. Foi em Brasília, en­tretanto, que esse novo Colega estu­dou o Direito e, muito moço, tornou­se jurista e professor afamado. Oriundo do Ministério Público, Pro­curador da República e Subprocurador-Geral, tendo funcio­nado junto ao Supremo Tribunal e junto a esta Corte, o Ministro Pádua bem conhece o nosso Tribunal. Fi­nalmente, bem de propÓSito deixei para o final, José Pereira de Paiva e Sebastião Alves dos Reis. Ambos, meus companheiros desde os primei­ros dias da Justiça Federal de Mi­nas, são magistrados que o povo do meu Estado admira e respeita. O Ministro Pereira de Paiva que nas­ceu em Abre Campo, na mata minei­ra, onde o meu pai foi promotor PÚ­blico, e onde o conheci, é o mais an­tigo Juiz da Fazenda Pública do Bra­sil. Quando nomeado Juiz Federal, j á vinha ele exercendo o cargo de Juiz da Vara da Fazenda, em Belo Horizonte, há cerca de doze anos. Foi também Juiz do Tribunal Eleito-

ral de Minas. Sebastião Alves dos Reis, do Lamim, pequenina cidade do quadrilátero ferrífero de Minas, que se tornou famosa, no meu Esta­do, pela sua notável biblioteca públi­ca, o Tribunal conhece bem, pois o Ministro Sebastião Reis o vem inte­grando de longa data, com() convoca­do. Juiz Federal e Juiz do Tribunal Eleitoral do Estado, é um autêntico «scholar», professor nas Universida­des Federal e Católica de Minas. Os meus primeiros passos no Direito Fi­nanceiro e Tributário foram conduzi­dos, confesso com prazer, pelo Mi­nistro Sebastião Reis.

Saúdo-os, Senhores Ministros que ora se empossam, em nome do Tri­bunal, certos, os seus Colegas mais antigos, que Vossas Excelências ha­verão de enriquecer as tradições de sabedoria, imparcialidade e indepen­dência do Tribunal Federal de Re­cursos.

Ao cabo, Senhores, quando a Corte inicia uma nova era, permitam-me que eu recorde as palavras de um grande jurista, de um notável advo­gado, que saudou este Tribunal por ocasião da comemoração dos seus vinte e cinco anos: Josaphat Mari­nho, depois de assinalar as virtudes do Tribunal Federal de Recursos, concluiu, com rara beleza, lembran­do o «relato de Madison», a propósi­to da observação de Benjamin Franklin nos instantes finais de ela­boração da Constituição dos Estados Unidos. Recorda Madison que, quan­do os últimos convencionais assina­vam a Constituição, Franklin comen­tava, entre os mais próximos dele, olhando para a tela que se encontra­va por detrás da Mesa Presidencial, que não sabia distinguir se o que ne­la estava pintado era um sol nascen­te ou um sol poente. Asseverou que demoradamente observara e a dúvi­da persistira. Mas quando os derra­deiros constituintes assinavam a

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Constituição, o grande Benjamin Franklin afirmou a seus companhei­ros: «agora, por fim, tenho a felici­dade de saber que aquele é o sol nas­cente e não poente». E concluiu Jo­saphat Marinho, celebrando a elo­qüência, que «também agora podeis is dizer, Senhores Ministros, depois de 25 anos de esforços, de trabalho, de incertezas, de dúvidas, de vacila­ções, mas, afinal, de vontade persis­tente e vitoriosa, que este Tribunal é um sol nascente».

Ao invocar as palavras do notável advogado e primoroso orador, deixa­mos expresso, a alma carregada de otimismo e de esperança, os olhos postos nos olhos dos Colegas, dos companheiros de ontem e de hoje, que este Tribunal, para gáudio da Nação, persistirá guardião da ordem jurídica e das liberdades públicas, fortaleza dos direitos individuais, sol nascente dos sedentos de justiça.

O Exmo. Sr. Doutor Geraldo An­drade Fonteles (Subprocurador­Geral da República).

N esta sessão solene de posse dos novos integrantes da Casa, concretiza-se a determinação do Ato Constitucional n? 7, de 1977, com a ampliação do Egrégio Tribunal Fe­deral de Recursos, incluindo na sua composição oito novos Ministros.

Saudando os ilustres empossados, tendo a satisfação de recepcioná-Ios ao sabor de calorosas boas-vindas, com grande apreço pessoal, acresci­do dos aplausos do Ministério Públi­co Federal, ao Tribunal e ao Gover­no pelo acerto na escolha dos eleitos.

Poderia valer-me do encaixe para tecer considerações em torno dos trabalhos e merecimentos pessoais de cada um, tal porém, em se tra­tando de número avultado de perso­nalidades, que inscreveram nas lides do direito a conceituação pessoal que lhe é própria, através de suas obras e trabalhos, tornaria enfado-

nha a repetição dos qualificativos, que poderá ser expressa na síntese de que, na vivência funcional de suas vidas, se deram zelosamente aos seus misteres, na judicatura ou no Minis­tério Público, ou ainda em outras atividades públicas, a ponto de se verem aquinhoados em paladinos de inteligência, saber jurídico e alto espírito de cumprimento do dever.

Cumpre-me, todavia, assinalar modificações introduzidas em leis de pouco tempo, de permeio a Lei Orgâ­nica da Magistratura e a recente edição do Novo Regimento Interno do Tribunal, bem como a inaugura­ção do Sumulário de sua Jurispru­dência, tudo convergindo para a maior celeridade dos julgamentos.

De outra parte, a introdução do sistema de computação de dados, ao que se pode prever, além de maior racionalização dos serviços, facilita­rá também o englobamento das ma­térias para uniformização de aplica­ção das leis, na interpretação do di­reito perquirido sobre cada tema.

Se isto vem ao encontro de salutar anseio do Poder Judiciário, de outro lado propiciará ao Poder Executivo, com brevídade proceder a reformu­lações legislativas que se impõem, a cada momento, no corretivo de ela­borações distorcidas e desconformes com a ordem jurídica e a exegese dos princípios instituídos na Carta Magna.

Esses aprimoramentos, de muito acalentados, tiveram vigorosa exe­cução, em tempo relativamente cur­to, iniciando-se na Presidência do preclaro Ministro Peçanha Martins, e, com redobrado esforço de entu­siasmo e eficiência na consecução dos fins, pelo eminente Presidente José Néri da Silveira, cuja operosi­dade, dosada de sobriedade, segu­rança e descortino, fez realizar as diretrizes empalmadas com inteli­gência e objetividade.

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Eis, senhores novos Ministros, de­safio de uma luta empreendida que lhes legam seus nobres pares, à grandeza desta Corte de Justiça.

Parodiando Epíteto, eu concluirei esta parte afirmando: Vossas Exce­lências desejarão, por certo, dar à Magistratura, à pátria comum, uma oferta raríssima de grande valor. Dêem-se inteiramente a ela depois de se haverem convertido em mode­los perfeitos de equilíbrio, de líbera­lidade comedida, de veneração à Justiça.

Veraz, também, é que irão pagar o frágil encanto do prazer ascencional com o peso permanente de uma so­brecarga de processos desarrazoa­da, dentro nos limites da tolerância do trabalho a cumprir e da capaci­dade humana quando voltada ao propósito de aperfeiçoamento e al­cance, fins da missão a que se pro­põem.

A luta é, pois, de depuração dos parâmetros, frente aos quais atua o Podér Judiciário. Na contextura da concepção estatal, traçando orienta­ção e métodos políticos, legislativos e administrativos, encontram-se as correções para satisfação dos pro­blemas econômicos e sociais que ins­piram as razões éticas do Direito, e que ao Judiciário está, assim, aquém das providências e além das carências revelados na ministração do Governo.

Derivo, agora, para ligeira refle­xão sobre os tempos que correm e as mudança radícais, em toda conjun­tura da vida hodierna, decorrentes dessa ânsia das conquistas humanas pelas máqUinas, pela vitória do ho­mem sobre o Universo, transforman­do aquelas em seres anti-humanos, numa minúscula peça de imensurá­vel oficina, onde se comprimem e se movem quais robôs de reqüestos pu­ramente materiais, e condicionados às exigências de uma pura sociedade de consumo.

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Quando assim não seja, trans­mudando-se em gota indefinida de matéria laboratorial para ver-se, de órgãos transplantados, a sua gênese, provinda de tubos de ensaio para im­plantação das provetas.

Caminhamos, enfim, pela estrada do infortúnio, sem saber o que buscamos, alheiados dos nossos des­tinos de criaturas feitas à semelhan­ça de Deus. E nessa caminhada, sucumbem-se os valores da inteli­gência verdadeira. Portamos uma conduta incompatível com a tradição e com as instituições nobres e secu­lares, na prá tica cada vez mais alar­mante das transgressões aos pa­drões sedimentados da moral e dig­nidade humanas.

Procuramos, tememos, mas per­manecemos todos na esperança vã de defrontar, aqui ou ali, próxi­ma ou remotamente, o holocausto de nosso desvairo ou força imponderá­vel que há de remir todos os erros, crimes e injustiças. Aos cônscios e aos que têm o mínimo de amor ao próximo, dá-se-lhes agora o terror de uma visão que assombra.

A missão desta Colenda Corte de Justiça é, porém, mais restrita e es­tá fora das responsabilidades muta­tivas, para cingir-se ao dever de acudir aos reclamos das postUlações encerradas nas lides propostas.

O Direito e a Justiça guardam afi­nidade através da dupla luz da razão e da paz social, tal qual a concepção de Dante Alighieri em relação à filo­sofia e à teologia. Se a luz variou a sua tonalidade, é recebê-la com fide­lidade.

Neste Tribunal, se eleva, em grau de superior jurisdição, como Corte de Privilégio da Justiça Federal, e de quase todas as questões de inte­resse do Estado em sentido amplo, abrangendo as da coletividade, de molde que são e devem ser graves as reflexões.

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Ponderações integrais sobre o di­reito a ser ditado ascendem de me­ras cogitações rotineiras ou de cará­ter processualístico para proverem medidas urgentes, quando compro­metidas graves lesões econõmicas e a ordem pública e até a dignidade da Justiça.

Transcendem considerações supe­riores a interesses regionais ou gru­pais, para a globalidade dos reflexos de problemas jurídicos nacionais.

Os autores e réus são sempre co­muns, reciprocamente se demandan­do. Pessoas e entidades privadas contra pessoas e entidades de direito público, ou seja, lato sensu, o Esta­do, embora não ressumbre prevalên­cia deste sobre aquelas. Os poucos privilégios que a este a lei conceçle de fluem de contigências naturais, in­clusive de sua potestividade, refleti­da na sua representação que se con­funde na dupla qualidade de agente de defesa judiciária e de fiscal da fiel aplicação da lei.

Por isso, este Tribunal se erige na catedral da fé no Direito e na Justi­ça, pois aqui se esgrimam e se deci­dem as textilhas do direito dos servi­dores públicos, dos contribuintes do Erário; dos direitos de propriedade em relação às desapropriações; dos agentes de atividades industriais e comerciais, dos importadores e ex­portadores; quanto aos seus compro­missos com o povo e com o õnus de­les decorrentes; dos direitos huma­nos assegurados na Constituição, preservando-se a justiça na aplica­ção das penas criminais ou adminis­trativas, como na absolvição dos in­justiçados perante a lei e o direito, dos benefícios e beneficiários da pre­vidência social; na contenção dos prejudicados e dos gananciosos; to­dos, igualmente considerados e igua­lados, aqui vêm abeberar as auras insufladas do Direito e da Justiça.

Que Vossas Excelências honrem, dignifiquem, para orgulho de suas

excelentíssimas famílias e seus patrícios, a árdua e nobre missão a que se comprometeram.

O Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira (Presidente): Para falar em nome da nobre classe dos advogados brasileiros, concedo a palavra ao Dr. Eduardo Seabra Fagundes, Presi­dente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

O Exmo. Sr. Dr. Eduardo Se abra Fagundes (Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil): Exmo. Sr. Ministro José Né­ri da Silveira, DD. Presidente do Tribunal Federal de Recursos; Ex­mo. Sr. Ministro Antõnio Néder, DD.

Presidente do Supremo Tribunal Federal; Exmo. Sr. Ministro Ibrahin Abi-Ackel, da Justiça; Exmo. Sr. Mi­nistro Leitão de Abreu, Presidente do Superior Tribunal Eleitoral; Ex­mo. Sr. General José Ferraz da Ro­cha, Ministro-Chefe do Estado Maior das Forças Armadas; Exmo. Sr. Dr. Geraldo Andrade Fonteles, Subprocurador-Geral da República; Exmo. Sr. Ministro Xavier de Albu­querque, DD. Vice-Presidente do Su­premo Tribunal Federal; Exmo. Sr. Ministro Cunha Peixoto, do Supremo Tribunal Federal; Exmo. Sr. Dr. Fir­mino Ferreira Paz, Procurador­Geral da República; Senhores Magis­trados; Parlamentares; Governado­res; Autoridades; Membros do Egré­gio Tribunal Federal de Recursos; Senhores Advogados; Minhas Senho­ras e Meus Senhores.

Os advogados testemunham, nesta solenidade, mais um ato, mais uma etapa da reforma judiciária iniciada em 1977, reforma para a qual os ad­vogados se dispuseram a colaborar, enviando ao Congresso Nacional o resultado do melhor de seus esfor­ços, no sentido de obterem um aper­feiçoamento do Poder Judiciário à altura das necessidades da nação.

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Sua colaboração foi menospreza­da, como menosprezada foi a pró­pria palavra do Congresso Nacional, numa época marcada por excessivo autoritarismo, quando a divergência de opiniões entre o Poder Executivo e o Parlamento levava sempre a conclusão de que a verdade estava com o primeiro e não com o segun­do. Os advogados desejavam uma reforma que fosse inspirada nos inte­resses dos jurisdicionados, nos inte­resses superiores da Nação, e não uma reforma engendrada em gabi­netes por pessoas que - bem inten­cionadas, embora - não tinham a vivência dos problemas do Judiciá­rio, como temos nós advogados e têm os Srs. Magistrados. O advoga­do tem sido, ao longo dos tempos, a grande vítima do mal funcionamento do Poder Judiciário, na medida em que suporta as conseqüências negati­vas da opinião pública e da opinião dos seus próprios clientes, toda vez que um pleito perante os Tribunais demora excessivamente a ser deslin­dado ou encontra desfecho afastado das palavras da Justiça e do Direito. Por isso, pensando também na clas­se dos advogados, pensando princi­palmente nos jurisdicionados, os ad­vogados, através da Ordem, tanto do Conselho Federal como dos Conse­lhos Seccionais, através dos Institu­tos de Advogados e através de ou­tras tantas entidades que congregam os profissionais da advocacia, procu­ravam soluções que envolvessem um real aperfeiçoamento do mecanismo judiciário. Naquela ocasião, este Egrégio Tribunal já se apresentava como órgão digno do respeito e da confiança dos advogados. Por isso, defendiam eles o princípio de que es­te Tribunal deveria ser elevado à condição de um Tribunal com juris­dição extraordinária, criando-se tri­bunais regionais para julgamento, em segundo grau de jurisdição, dos feitos em que a União fosse interes­sada em qualquer posição no proces­so. Entendiam os advogados, como

ainda entendem, que reformar o Ju­diciário, simplesmpnte aumentando o número de magistrados, é eviden­temente uma solução que a todos se apresenta como a mais evidente. Mas está longe de ser a mais acerta­da. A idéia dos advogados é a de que a Justiça Federal precisava ser aproximada do povo. Num país de dimensões continentais como o nos­so, não se pode permitir o luxo de centralizar na sua capital toda a ad­ministração da Justiça Federal, no momento em que a União Federal assume, cada vez mais, uma presen­ça marcante na vida nacional, des­cendo a todos os detalhes no exercício da administração pública, interferindo fundamentalmente na vida dos indivíduos - quer no plano dos direitos individuais, no campo ci­vil, quer no da própria liberdade in­dividual. Cada vez mais sente-se a presença da União a exigir uma Jus­tiça Federal capaz de exercer a sua missão nobre de controlar os atos do Poder Executivo.

A Justiça Federal tem origem muito recente em nosso País. Este Egrégio Tribunal data de apenas 33 anos, e a justiça de 1? Grau data de pouco mais de 10 anos. Mas, não obs­tante, logo a estrutura da Justiça Federal apresentou sinais de enve­lhecimento. E uma Justiça que pode­ria ter sido criada para atender às necessidades da Nação, por muitos e muitos anos. No entanto, sentiram os advogados e os jurisdicionados a enorme dificuldade que teriam para fazer valer seus direitos diante da poderosa União, com uma estrutura de Justiça Federal que não corres­pondia às necessidades do País.

E verdade que este Egrégio Tribu­nal está atualmente triplicado em relação ao seu número original de membros. Entretanto, sabemos to­dos nós que ainda pesa sobre os om­bros de cada um dos compc,nentes

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da Corte uma carga extremamente pesada de trabalho, que exigirá de todos uma dedicação quase sobre­humana para não deixar os jurisdi­cionados sem a rápida distribuição da Justiça Federal.

Sabemos que o Egrégio Tribunal é enriquecido, neste momento, pelo in­gresso de magistrados provados no exercício da advocacia, no exercício do Ministério Público e no exercício da magistratura de I? Grau. Magis­trados que, todos eles, sem exceção, granjearam a confiança e o respeito das respectivas comunidades de ad­vogados, pela forma elevada como se comportaram na distribuição da Justiça.

Sabemos que os nobres integrantes da Corte contribuirão para manter o elevado teor deste Tribunal que, ao cabo desses 33 anos, fixou perante a Nação e perante os advogados uma imagem de respeitabilidade.

Esperamos todos, advogados que não contribuimos, como se diz, para a escolha .desta via da reforma judi­ciária, que os frutos que sejam possíveis de colher, com o au­mento do número de membros desta Corte, venham minorar as aflições dos profissionais de advocacia e dos seus clientes.

O desenvolvimento do Brasil, ao longo dessas três últimas décadas, sem dúvida, superou, e muito, o acréscimo que se fez de membros deste Colendo Tribunal. A complexi­dade das relações da União com seus administrados multiplicou-se muitas vezes, e não apenas três. Sa­bemos que continuaremos enfrentan­do dificuldades, até que seja possível implantar uma reforma judiciária ditada pelos verdadeiros interesses do povo brasileiro.

Muito obrigado.

o Exmo. Sr. Ministro Sebastião Al­ves dos Reis: Os empossados de ho­je, Hermillo Galant, José Pereira de

Paiva, Miguel Jerõnymo Ferrante, José Cândido de Carvalho Filho, Pe­dro da Rocha Acioli, Américo Luz, Antõnio de Pádua Ribeiro e eu, neste momento altíssimo de nossas vidas, abeiramo-nos desta Egrégia Corte, comovida e respeitosamente, de co­rações humildes, cientes e conscien­tes das árduas responsabilidades que já se alteiam diante de nós, ao nos vermos integrados nesta augusta Casa, sem favor, um dos mais altos e qualificados Tribunais deste país, já enriquecido de veneráveis e vene­randas tradições, e que tanto tem contribuído para o prestígio do Po­der Judiciário do Brasil, mercê da independência e qualificação técnica e moral dos seus Juízes e, aqui, lembramo-nos da afirmativa de Woodrow Wilson de que os tribunais valem pelos seus Juízes; fazemo-lo, também, animados de poderosa fé no Direito, visualizado com uma pro­jeção do espírito humano, como um momento significativo de nossa ex­periência social e ética, inspirados numa convicção autêntica da digni­dade da missão do magistrado de amor às instituições judiciárias, de fidelidade aos elevados ideais de justiça, nos valores que encerra e persegue, ungidos da crença no va­lor transcendental e intrínseco do ho­mem, enquanto valor-fonte de todos os valores.

Habita em nós aquela convicção amadurecida na experiência e vivên­cia jurídica de que o Direito não é apenas uma intencionalidade, uma imantação para o justo; mas, visto globalmente, é um momento do jUs­to, historicamente. realizado nos li­mites da contingência humana e que é uma atualização sempre crescente daqueles valores que possibilitam a afirmação de cada homem, segundo sua virtude, no sentido socrático do termo. Paralelamente, estamos cer­tos de que o Direito é uma realidade universal e, onde existia o homem, aí o encontramos, e que a vida jurídica

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se desdobra, amplia, afirma e reafir­ma, numa tensão contínua de valo­res positivos e negativos, valores po­lares que se implicam e se exigem, num processo essencialmente dialé­tico.

Sendo o Direito um bem cultural, um instrumento de realização e de valores de convivência social, há ne­le sempre uma exigência axiológica, atualizando-se na condicionalidade histórica, como leciona Miguel Rea­le.

Se a reflexão jurídica é sempre ne­cessária, mais ainda se acentua nes­sa hora de profundas transforma­ções políticas e sociais, quando o fa­tor econômico irrompe avassalado­ramente na ordem social, comunicando-lhe uma dinâmica até entâo desconhecida, numa reformu­lação dos valores tradicionais, avulta-se a responsabilidade do ju­rista e do aplicador da lei, pois as concepções do Direito são aspectos significativos das concepções da vi­da e do universo e o intérprete e aplicador da lei vê-se alçado a agen­te impulsor da História e a protago­nista do mundo em que vive.

Correlatamente, fixemos, ainda, que só o homem inova e se transcen­de a si próprio, e é capaz de captar valores, hierarquizá-los e compô-los.

É, por tudo isso, que interpretar a lei é uma tarefa axiológica não sim­plesmente lógica, e a sentença é um trabalho estimativo, de compreensão, e não um simples silogismo.

Assinalemos, ainda, a posição ins­titucional desta Egrégia Corte: Juiz da União, Tribunal Federal, sob cer­tos aspectos, Tribunal Nacional, co­mo se vê, não só de certos itens de sua competência constitucional e da sua própria compOSição, quando, ao lado de juízes e membros do Ministé­rio Público Federal, recrutam-se juízes e componentes do Ministério Público Estadual, as suas decisões não têm a eficácia apenas de reinte-

grar o direito lesado, mas envolvem ampla responsabilidade política e so­cial e têm acento de uma ressonân­cia nacional, tal, tanta e tamanha a complexidade e diversificação mate~ rial dos interesses conflitantes pos­tos perante ele, em razão do inter­vencionismo intenso sempre cres­cente do poder público federal, na área econômico-social.

A missão constitucional que lhe é reservada de dirimir os conflitos em que a União e suas instrumentalida­des figurem como autora, ré, assis­tente ou opoente, confere a essa Egré­gia Corte a alta responsabilidade política e social a que nos referimos, pois, se. de um lado, observado o princípio da eqüidistância das par­tes, a União deve ser julgada sob os mesmos critérios de imparcialídade e equanimidade devidos às partes, de outro reclama-se-lhe sensibilidade particular para os interesses da cole­tividade. comprometidos sUbjacente­mente no conflito.

Este Colendo Tribunal não tem fal­tado aos seus deveres constitucio­nais, e a sua jurisprudência reflete o magnífico esforço construtivo de adequar a lei e as instituições jurídi­cas mais convenientemente ao bem comum, aos objetivos sociais domi­nantes, aos imperativos do desenvol­vimento econômico do país, da au­têntica convivência democrática, as­segurando a pré-eminência da Cons­tituição, o império da lei, a liberdade e os direitos fundamentais do cida­dão, na linha de considerações de que o Estado de Direito não se afir­ma somente no princípio da legalida­de dos atos do poder público, mas impõe, por igual, o contraste da le­galidade respectiva exercida por um outro Poder, imparcial e indepen­dente, e que o Estado - Administra­ção está sujeito ao Estado - Orde­namento jurídico, e que o Estado -legislador se submete ao Estado Ordenamento constitucional.

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A atividade jurisdicional reclama sempre meditação, reflexão, pesqui­sa, valorações e avaliações e, por is­so mesmo, o seu desempenho impõe seriedade, austeridade, escrúpulo, respeito à consciência e não às con­veniências pessoais, não podendo a sua eficiência ser medida em sim­ples critérios quantitativos, mera­mente aritméticos, mesmo porque a justiça não pode ser sacrificada no altar de uma eficiência simplesmen­te mecânica, operacional, em pre-

. juízo dos valores substanciais do Di­reito. A conciliação entre os valores eficiência do trabalho judicial e rea­lização dos ideais de justiça é o grande desafio da processualística moderna.

Sensível aos reclamos que partem de todos os lados para maior agiliza­ção do procedimento judicial, esta Colenda Corte, a partir da reforma do Poder Judiciário, vem trazendo ao Poder competente fórmulas e su­gestões tendentes ao aprimoramento preconizado.

Ingressamos nesta augusta Casa ex orando a Deus nos dê luz e fortale­zamoral e o amadurecimento do sa­ber para que não deslustremos este Colendo Tribunal e não faltemos à confiança de todos aqueles que nos distinguiram com a indicação de nossos nomes e honraram-nos com as nomeações.

De nós, vindos das seções judiciá­rias do Rio Grande do Sul, Minas, São Paulo, Bahia, Alagoas e Rio de Janeiro, do Ministério Público Fede­ral, cada qual trará para esta Egré­gia Corte . o sinete da força telúrica da sua região, a marca da sociolo­gia, da história e da cultura do seu Estado, a nota de sua formação pro­fissional e técnica, da sua experiên­cia e vivência do Direito, mas em to­dos se soma a mesma força agluti­nante, acima e além desses parti cu­larismos, de amor à Pátria, de fé nos ideais da justiça e do Direito, e

de devoção incondicional à institui­ção a que serve, do compromisso único com a consciência e com o di­reito.

Agradecemos, extremamente sen­sibilizados, os votos de boas-vindas que ora nos foram endereçados por esse jovem e brilhante Juiz desta Egrégia Corte, Ministro Carlos Má­rio da Silva Velloso.

Recolhemos as palavras que nos foram dirigidas por S. Excia., como um poderoso estímulo, como um fe­cundo incentivo, e será sempre co­movidamente que haveremos de evocá-las na sua espontaneidade e autenticidade.

Da mesma sorte, apresentamos nossos agradecimentos ao eminente Subprocurador-Geral da República, Dr. Geraldo Fonteles, bem como ao preclaro Presidente do Conselho Fe­deral da Ordem dos Advogados do Brasil, o ilustre «battonier» Dr. Sea­bra Fagundes.

Agradecemos o comparecimento de todas as autoridades aqui presen­tes ou que se fizerem representar.

Por fim, permitam-nos uma pausa de sensibilidade, uma palavra de ca­rinho e de amor aos nossos pais, às nossas esposas, aos filhos, aos fami­liares e amigos que tanto contri­buíram, ao longo de nossas vidas, pa­ra a vitória deste dia.

A este Tribunal, pela sua Presidên­cia e seus Ministros, a nossa mais alta reverência.

O Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira (Presidente) : Ao encerrar esta sessão solene de posse dos oito novos Ministros e considerar, assim, composto o Tribunal, nos termos da Emenda Constitucional n? 7, de abril de 1977, e da Lei Orgânica da Magis­tratura Nacional, de março de 1979, quero fazê-lo com espírito de otimis­mo, na certeza de que, nesta data em que o Tribunal comemora o 33?

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aniversário de instalação, uma nova fase em seus trabalhos está-se inau­gurando, com o início também de vi­gência do Regimento Interno, recen­temente aprovado, onde se consubs­tanciam as disposições que hão de reger o funcionamento da Corte, de acordo com áreas de especialização. Procedimentos colimando a raciona­lização dos serviços de apoio aos jul­gamentos já vêm produzindo resulta­dos altamente positivos, máxime, no concernente ao volume da publica­ção dos acórdãos. As primeiras deze­nas de súmulas da jurisprudência do TFR editadas têm produzido, à sua vez, efeitos plenamente satisfatórios no que concerne à possibilidade de utilização, pelos relatores, da facul­dade constante do art. 90, § 2?, da Lei Orgânica da Magistratura Nacio­nal, representando, já no corrente ano, produção equivalente à de mais uma turma julgadora. Posso infor­mar ao Tribunal, outrossim, que Sua Excelência, o Senhor Presidente da República, assinou hoje mensagem ao Congresso Nacional, com base em anteprojeto encaminhado à sua con­sideração, pelo Tribunal, onde se propõem normas para maior celeri­dade dos feitos no Tribunal Federal de Recursos e na Justiça Federal de Primeira Instância. A quantidade de processos, no Tribunal, que ultrapas­sa à cifra de 20.000, dos quais cerca de 10.500 se encontram na Subprocuradoria-Geral da República aguardando pronunciamento, está a demonstrar que, em verdade, o só aumento do número de Ministros não poderá significar solução definitiva à reforma da Justiça Ordinária da União, em Segunda Instância. O Tri­bunal propôs as medidas em referên­cia, fiel ao entendimento de que, de­sencadeado como foi o processo de Reforma do Judiciário, por força da Emenda Constitucional n? 7, de 1977, e da Lei Orgânica da Magistratura Nacional, de março de 1979, incum­be, a cada Tribunal, na área de sua jurisdição, tomar a iniciativa de pro-

vidências, inclusive legislativas, des­tinadas a atingir a meta prioritária da celeridade dos julgamentos. O an­teprojeto de lei referido está dentro dessa visualização da solução dos problemas específicos da Justiça Ordinária da União, em ambos os graus. Devo sinalar, aqui, a recepti­vidade e atenção que o Tribunal tem merecido, nesses estudos, por parte dos Ministérios da Justiça, da Fa­zenda, da Desburocratização e da Previdência e Assistência Social. Es­tou certo de que, a médio prazo, ha­veremos de alcançar, com as provi­dências legislativas indispensáveis, promissores resultados para o des­congestionamento do aparelho judi­ciário federal que conta, a tanto, com a eficiência e a dedicação dos cultos Juízes Federais, em todo o País.

Aos eminentes colegas que aca­bam de se empossar quero ex­pressar-lhes nossa alegria e nos­sas felicitações e dizer-lhes que, nes­ta Corte Superior da Nação, o fati­gante ofício de julgar é suavisado pela amizade que nos une fraternal­mente e pelo espírito de cooperação, certos, todos, de que uma só é nossa meta: fazer com que o Tribunal Fe­deral de Recursos cumpra sua mis­são constitucional, no desate das contendas entre o poder e a liberda­de, cônscio de sua independência e de sua responsabilidade perante a Nação e convencido de que as tradi­ções do Poder Judiciário Brasileiro devem ser imperturbável e perene­mente. preservadas como garantia dos direitos dos cidadãos e seguran­ça dos objetivos permanentes da Pá­tria comum.

Ao declarar, desse modo, encerra­da a Sessão, agradeço a presença das ilustres autoridades, de início mencionadas, e de todas as pessoas que vieram engalanar esta tarde fes­tiva do Tribunal Federal de Recur-

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sos. Convido a todos os presentes pa­ra, juntos, confraternizarmos com os empossados e suas famílias, no co­quetel que será servido no «hall» contínuo a este salão. Está encerra­da a sessão.

Além das autoridades que compu­seram a mesa, compareceram à so­lenidade as seguintes autoridades: Os Exmos. Srs. Ministros Xavier de Albuquerque, Thompson Flores e Soares Muiioz, do Supremo Tribunal Federal; Procurador-Geral da Repú­blica, Dr. Firmino Ferreira Paz; Re­presentante do Presidente do Supe­rior Tribunal Militar, Ministro Jorge Alberto Romeiro; Procurador-Geral da Justiça Militar, Dr. Milton Mene­zes da Costa Filho; os Srs. Ministros Pedro Gordilho e José Maria S. An­drade, do Tribunal Superior Eleito­ral; Representante do Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Mi­nistro Carlos Alberto Barata Silva; Srs. Ministros Nelson Tapajós e An­tônio A. Almeida, do Tribunal Supe­rior do Trabalho; Representante do Presidente do Tribunal de Contas da União, Ministro Luciano Brandão A. de Souza; os Srs. Ministros Arnaldo Prieto, Ewaldo Sizinando Pinheiro e Guído Mondin, do Tribunal de Con­tas da União; os Srs. Ministros apo­sentados J. J. Moreira Rabello, He­noch da Silva Reis, Oscar Corrêa Pi­na, Paulo Laitano Távora e Márcio Ribeiro, do Tribunal Federal de Re­cursos; Representante do Vice­Presidente da República, Conselheiro Moacyr Martins Ferreira; Subchefe da Casa Civil da Presidência da Re­pública, Prof. João Carvalho; Repre­sentante do Sr. Ministro Chefe do Serviço Nacional de Informações, Dr. Costa Leite; Representante do Sr. Ministro Chefe do Gabinete Civil da Presidência da República, Dr. Inocêncio Mártires Coelho; Repre­sentante do Consultor Geral da Re­pública, Dr. JoaqUim Luis Bello; Go­vernador do Estado de Alagoas, Dr. Guilherme G. Soares Palmeira; Go-

vernador do Estado de Minas Ge­rais, Dr. Francelino Pereira; Repre­sentante do Governo do Estado de São Paulo, Dr. Chaves Amarante; Representante do Governo do Estado do Rio Grande do Sul, Dr. Julio de Rose; Presidente do Tribunal de Jus­tiça do Distrito Federal, Sr. Desem­bargador José Fernandes de Andra­de; Presidente do Tribunal de Justi­ça Militar do Estado do Rio Grande do Sul, Cel. Odilon Camargo; Presí­dente do Tribunal de Contas do Dis­trito Federal, Conselheiro Raul Soa­res da Silveira; Conselheiros do Tri­bunal de Contas de Alagoas, Drs. Jo­sé Alfredo de Mendonça, José de Me­lo Gomes e Geraldo Costa Sampaio; Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Estado da Bahia, De­sembargador Renato Mesquita; Di­retor do Departamento de Enge­nharia de Comunicações do Ministé­rio do Exército, Gen. Ex. Antônio Ferreira Marques; Diretor-Geral do Departamento de Polícia Federal, Cel. Moacyr Coelho; Representante do Senado Federal, Senador Jorge Kalume; Senadores da Bancada de Alagoas, Dr. Arnon de Melo, Dr. Teotônio Vilela e Dr. Luiz Cavalcan-

,te; Representante do Presidente da Cãmara dos Deputados, Renato Aze­redo, Deputado Aldo Fagundes; Re­presentante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Fazenda, Dr. Cid Herá­clito de Queiroz - Procurador-Geral da Fazenda Nacional; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estados dos Transportes, Dr. Edson Alves; Representante do Exmo. Sr. Minis­tro de Estado da Agricultura, Dr. Ronaldo Poletti; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Educação e Cultura, Dr. João Gui­lherme Aragão; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado do Trabalho, Dr. Geraldo Miné; Repre· sentante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Saúde, Dr. Edelberto Luiz da Silva; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Indústria e Comércio, Dr. Tarcísio C. Almeida

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Cunha; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado das Minas e Energia, Dr. Anibal Craveiro; Re­presentante do Exmo. Sr. Ministro Chefe da Secretaria do Planejamen­to, Dr. José Maria Bimbato; Repre­sentante do Exmo. Sr. Ministro de Estado das Comunicações, Dr. Hélio Estrella; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Previdên­cia e Assistência Social, Dr. Alberto Allgayer; Representante do Exmo. Sr. Ministro Chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Dr. Sérvulo Coimbra Tavares; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Desburo­cratização, Dr. Hélio Lobo; Repre­sentante do Exmo. Sr. Ministro de Estado do Interior, Dr. Wilson Lopes Machado; Representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado do Exército, Gen. Bda. Flávio Hugo Lima da Ro­cha; representante do Diretor-Geral do Departamento Administrativo do Serviço Público, Dr. Maurício M. Araújo Cunha; Presidente do Conse­lho Federal da Ordem dos Advoga­dos do Brasil, Dr. Eduardo Seabra Fagundes; Presidente da Seção do Distrito. Federal da Ordem dos Advo­gados do Brasil, Dr. Maurício Cor­rêa; Representante da Ordem dos Advogados do Estado de São Paulo, Dr. Manuel Affonso Ferreira; Repre­sentantes da Ordem dos Advogados dos Estados: do Rio Grande do Sul, do Estado da Bahia, do Estado de Minas Gerais, e do Estado de Ala­goas; Membros do Ministério Públi­co, Juízes, Advogados e funcionários do Tribunal.

Encerrou-se a Sessão às 18h.

Tribunal Federal de Recursos, 23 de junho de 1980 - Ministro José Né­ri da Silveira, Presidente - Bel. Jo.sé Alves Paulino., Secretário.

PLENÁRIO

Po.sse do. Sr. Min. Jarbas No.bre na Presidência do. TFR

Aos vinte e três dias do mês de ju­nho do ano. de mil novecentos e oi­tenta e um, às quinze horas, na Sala de Sessões do Tribunal Federal de Recursos, presentes os Excelentíssi­mos Senhores Ministros Jo.sé Néri da Silveira, Presidente do Tribunal, Ar­mando Rollemberg, Mo.acir Catunda, Jarbas Nobre, Aldir G. Passarinho, José Dantas, Lauro Leitão, Carlos Madeira, Evandro Gueiros Leite, Washington Bolívar, Torreão Braz, Carlos Mário Velloso, Justino Ribei­ro, Otto Rocha, William Patterson, Adhemar Raymundo, Romildo Bue­no de Souza, Pereira de Paiva, Se­bastião Reis, Miguel Jerônimo Fer­rante, José Cândido, Pedro Acioli, Américo Luz, Antônio de Pádua Ri­beiro e Flaquer Scartezzini, presen­tes, ainda, o Excelentíssimo Senhor Doutor Geraldo Andrade Fo.nteles, Subprocurador-Geral da República e o Secretário do Plenário, Bel. Jo.sé Alves Paulino, foi aberta a Sessão. Ausentes, justificadamente, os Exce­lentíssimos Senhores Ministros Peça­nha Martins e Wilso.n Gonçalves. Ao início do.s trabalho.s, o Excelentissi­mo Senho.r Ministro.-Presidente con­vido.u o. Excelentíssimo. Senhor Mi­nistro. Xavier de Albuquerque, Presi­dente do Supremo Tribunal Federal; o Excelentíssimo. Senho.r Ministro. Ibrahim Abi-Ackel, Ministro. de Es­tado da Justiça; o Excelentíssimo Senhor Senador Passos Po.rto., repre­sentante do Presidente do. Senado Federal; o Excelentíssimo Senhor Deputado Furtado Leite, represen­tante do Presidente da Câmara do.s Deputado.s; o Excelentíssimo. Senho.r Ministro.-Presidente do. Superio.r Tri­bunal Militar, Tenente-Brigadeiro.­do.-Ar Faber Cintra e o. Excelentíssi­mo Senho.r Ministro. Pedro. Go.rdilho., representante do. Presidente do. Tri-

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bunal Superior Eleitoral para a com­posição da Mesa. Em seguida o Ex­celentissimo Senhor Ministro­Presidente, após referir-se ás autori­dades componentes da Mesa e ás de­mais autoridades presentes e repre­sentadas, proferiu as seguintes pala­vras:

o Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira (Presidente): Chega a seu ponto final mais um período admi­nistrativo do Tribunal Federal de Recursos. Foi um biênio de intensa atividade, judicante e administrati­va, nesta Corte Superior da Nação, em que me coube o privilégio de coordenar-lhe os trabalhos, vivendo a emoção, dia a dia, das transforma­ções que, aqui, aconteceram, com significativas conseqüências favorá­veis, para a vida da instituição a que todos servimos, com induvidoso amor, sem ruga nem mácula.

Assumi a Presidência do Tribunal e do Conselho da Justiça Federal, precisamente, quando se editara, ha­via pouco, a Lei Orgânica da Magis­tratura Nacional, num clima de de­bates, cumprindo implementar, no Colégio Judiciário, a reforma defini­tiva, com o aumento de seus mem­bros - de dezenove para vinte e sete -, implantando-se a especialização dos órgãos judicantes. Vivi a expe­riência, nesta Casa da Justiça, de homens independentes unidos na consecução de um objetivo comum: a Emenda Constitucional n? 7, de abril de 1977, complementada pela Lei Orgânica da Magistratura Nacio­naL de março de 1979, em determi­nando o aumento do Tribunal, de 13 para 27, e adotando fórmula não coincidente com o pensamento da sua maioria, representaram, entre­tanto, um desafio que no ato de mi­nha posse, afirmei, solenemente, em nome da Corte, aceitarmos, para vê­la submetida ao crivo da experiên­cia, com o mesmo entusiasmo e o patriotismo que sempre animaram

nosso duro ofício de julgar, neste Tribunal Superior. Declarei, todavia, nesse ensejo, que o simples aumento do número de Ministros não consti­tuía solução bastante em si para o Tribunal poder realizar o objetivo precípuo da Reforma, qual seja, dar prestação jurisdicional célere e jus­ta, como reclamam os ideais de um convivio sob as inspirações do bem comum, ás volumosas demandas que se travam entre o poder e a liberda­de, a Administração e os individuos.

Se as estatisticas de autuações, em confronto com as decisões, sempre revelavam congestionamento cres­cente dos trabalhos da Corte, pronta punha-se ao analista a conclusâo de que, ao lado do aumento do número de membros, cumpria, então, alterar a legiSlação processual, para dimi­nuir o afluxo de milhares de proces­sos desnecessários que subiam a es­te Tribunal Superior, a par da intro­dução de profundas modificações na estrutura dos serviços de apoiO ad­ministrativo. Destaquei, na posse, a necessidade inadiável para que a Reforma pudesse lograr resultados positivos de se criar novo espírito de superior compreensão entre o Executivo e o Judiciário, em ordem a que a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Federal de Recursos, acer­ca de questões do interesse imediato da Administração, fosse, por esta, através de seus órgãos competentes, também seguida e observada.

Nessa linha de entendimento, di­versas medidas legislativas se ado­taram, sendo quatro Decretos-Leis sobre anistia fiscal., que deram, co­mo resultado imediato, no segundo semestre de 1979 e em 1980, o arqui­vamento de mais de 125.000 execu­ções fiscais de pequeno valor, na Justiça Federal de Primeira Instân­cia; a Lei Complementar n? 37, de 13 de novembro de 1979, obstando a transferência para a Justiça Federal

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de causas de acidente do trabalho, que congestionariam o aparelho judi­ciário federal de primeiro grau, de forma insuportável, se houvesse de serem aplicados o art. 130 e seus pa­rágrafos, da Lei Orgânica da Magis­tratura N acionaI, que entâo foram revogados: o Decreto-Lei n? 1.793, de 23 de junho de 1980, que autoriza nâo-ajuizamento, pela União, autar­quias e empresas públicas, de ações de valor igualou inferior a 20 (vinte) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional e, por fim, a Lei n? 6.825, de 22 de setembro de 1980, que modi­ficou o sistema do duplo grau obriga­tório de jurisdição e o de recursos na Justiça Ordinária da União, estabe­lecendo o denominado recurso de al­çada nas causas até 50 Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional, que assim não mais podem vir a este Tribunal, salvo em ações rescisórias das decisões dos Juizes Federais nesses feitos. A extinção da figura do devedor remisso, pelo Decreto­Lei n? 1.715, de 22 de novembro de 1979 (art. 5?), evitou o aforamento de centenas de mandados de segurança, para não prevalecerem as sanções administrativas conseqüentes, que antiga a pacifica jurisprudência do Alto Tribunal e desta Corte conside­ra inconstitucionais, que tiveram a iniciativa ou a participação do Tri­bunal, complementaram-se, outros­sim, por diversas normas jurídicas insertas em diplomas executivos, co­mo as Portarias n?s 608, de 27-7-1979, e 188, de 23-3-80, e 375, de 18-11-1980, e ainda a Portaria n? 314, de 3-9-80, todas do Ministério da Fazenda, edi­tadas com a esclarecida colaboração da Procuradoria-Geral da Fazenda N acionaI, que compõem um comple­xo de providências para não sobre­carregar a Justiça Federal de Pri­meira Instância, com ações de pe­queno valor ou desnecessárias.

Cumpre-me ressaltar que todas es­sas disposições normativas lograram bom termo, mercê do alto entendi-

mento que o Tribunal manteve com os Poderes Executivo e Legislativo, sendo justo registrar a acolhida dos Ministérios da Justiça, Fazenda e sua Procuradoria-Geral, da Desburo­cratização, da Previdência e Assis­tência Social e da Casa Civil da Pre­sidência da República às iniciativas em tal sentido adotadas por esta Corte.

Reaparelhou-se, em suas instala­ções, outrossim, o Tribunal, adotando-se dois sistemas de proces­samento de dados: um, para as cau­sas, e outro, para sua jurisprudên­cia, ambos funcionando com os mais promissores resultados. O primeiro possibilitou implantar a especializa­ção, faz hoje precisamente um ano, quando, por simples listagem do computador, sem qualquer solução de continuidade nos trabalhos do Tri­bunal. se redistribuíram, entre os Ministros, 22.579 processos, de acor­do com as áreas de especialização, incluídos mais de dez mil que aguar­davam parecer na Subprocuradoria­Geral da República. Desde aí, a dis­tribuição dos feitos e o registro de seu andamento por fases sâo proces­sados pelo computador. A partir de 31 de março deste ano, ademais, em face do teleprocessamento implanta­do, entre o Tribunal e as Seções Ju­diciárias de Sâo Paulo, Rio de Janei­ro e Rio Grande do Sul, esta Corte, de jurisdição nacional, está mais próxima dos jurisdicionados, em qualquer desses Estados, pelo acesso fácil de que dispõem, quanto à infor­mação de seus processos, controlando-lhes o andamento, desde o terminal do computador em qual­quer das Capitais dos Estados referi­dos. Em breve, a esse sistema se há de integrar a operosa Seção Judiciá­ria de Minas Gerais.

Reformulados os serviços de apoio aos julgamentos, de outra parte, acelerou-se o ritmo de divulgação dos acórdãos, hoje, em altíssima

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percentagem, publicados em menos de trinta dias após as decisões. Com a Secretaria de Informática e Docu­mentação criada, não só se concen­traram numa unidade comum os do­cumentos legislativos, doutrinários e de jurisprudência, como os acórdãos do Tribunal analisados, catalogados, indexados, segundo metodologia pró­pria, já em alguns milhares, se vêm armazenando no Banco de Dados do PRODASEN, com recuperação fácil e plena das informações, constituin­do isso instrumento de inestimável valor a acelerar os julgamentos da Corte, possibilitando, outrossim, pelo País inteiro, a juízes e advogados acessarem a jurisprudência do TFR, por meio de qualquer terminal do sistema.

Este Tribunal, que no ano findo, julgou 13.198 processos e publicou 14.504 decisões, já no corrente ano judiciário, a esta altura, conta com cerca de 6.500 julgados e 5.800 acór­dãos publicados.

Procedida como está a reorganiza­ção do Tribunal, produzindo-se, a partir do segundo semestre deste ano, conforme é plausível esperar, já os resultados da redução de aflu­xo dos processos, por força da Lei n? 6.825, de 22 de setembro de 1980, e mantido o ritmo crescente da produ­ção de nossos trabalhos, por decor­rência da especialização e em virtu­de do devotamento infatigável dos membros deste Colégio Judiciário, estou convencido de que o Tribunal Federal de Recursos possui razões bastantes a festejar, hoje, seu 34? aniversário com otimismo e certeza de que vencerá o desafio de que aceitou e verá descongestionados, a médio prazo, seus trabalhos e pau­tas, adotadas que ainda serão por certo, novas medidas legais e admi­nistrativas.

O eminente Ministro Jarbas dos Santos Nobre, a quem tenho a honra e a alegria de transmitir a Presidên­cia desta Casa, dará à coordenação

de seus trabalhos o brilho de uma in­teligência lúcida e a firmeza de seu caráter integérrimo. Homem do Pa­rá, Juiz em São Paulo, Ministro des­te Tribunal, faz mais de onze anos, sua presença nesta cátedra será marcada pelo dinamismo, dignidade e segurança. De sua ação e expe­riência todos podemos esperar, justi­ficadamente, fecundos resultados. A seu lado, verá o Tribunal um piauiense de nascimento, maranhen­se de juventude e carioca de gradua­ção universitária, também ex-Juiz Federal, o ilustre Ministro Aldir Gui­marães Passarinho, cujo desempe­nho, na administração e na magis­tratura, o credencia, de forma singu­lar, mercê de seu talento e vontade constante de servir, à investidura desta tarde.

Não posso deixar de mencionar, neste breve registro, a alegria que, no biênio ora findo, experimentei, ao contato pessoal com vinte das vinte e três Seções Judiciárias da Justiça Federal de Primeira Instância, em visitas de serviço, verificando a de­dicação e o trabalho profícuo de nos­sos cultos e íntegros Juízes Federais, pelo País inteiro, auxiliados por ser­vidores que com eles formam o cor­po de uma instituição, cujo espírito é um só, no imenso território nacional, - formado pelo sacrifíc~o e as co­muns distâncias, dos primeiros anos, inclusive de instalações, como hoje ainda sucede, especialmente, com o Rio e São Paulo, - quanto pelo amor de todos ao serviço da Justiça.

Agradeço aos Juízes Federais o apoio e as sugestões que deles sempre recebi, e testemunho, ainda uma vez, a minha profunda. admira­ção a esses nobres colegas, magis­trados da União, que constituem, pe­lo Brasil inteiro, em realidade, a longa manus desta Corte Federal e a garantia dos cidadãos contra even­tuais abusos ou ilegalidades de de­tentores de parcela do poder federal,

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quanto da União e suas entidades descentralizadas, no processamento e julgamento de suas causas.

Aos caríssimos Ministros desta Corte devo afirmar que nosso traba­lho conjunto e coeso, solidário e in­variavelmente fraterno, não modifi­cou, com a Reforma, o espírito deste Tribunal, que preside a seus atos e ao convívio de seus membros. Nosso objetivo comum e permanente de servir, incondicionalmente, à causa da Justiça dá-nos a unidade de senti­mentos e torna, pela cordialidade e cooperação de todos, fácil dirigir es­ta Casa de homens livres e indepen­dentes. Apenas coordenador de nos­sos trabalhos, concluo, assim, meu mandato, agradecido a todos os emi­nentes cOlegas, sem qualquer exce­ção.

Por igual. aos ilustres Subprocuradores-Gerais da Repúbli­ca, manifesto cordial reconhecimen­to pela maneira independente e dig­na com que também serviram ao Tribunal. Aos funcionários, desde os Diretores até os mais modestos da hierarquia funcional, sou profunda­mente agradecido, pela colaboração inestimável que me deram, inclusi­ve, por vezes, nas longas noites de nossas vigílias de trabalho, todos com alegria, firmes no espírito de servir, com verdadeiro amor a este Tribunal, que guardamos como um bem precioso na intimidade de nosso coração.

Perante o altar de Deus, na manhã de hoje, rendemos graças por nos haver conservado com vida e saúde e permitido servir a este Tribunal e ao povo brasileiro, que julgamos com compreensão e amor, e pedimos pelo descanoso eterno dos dois cole­gas que tombaram no meio da jorna­da/os saudosos Ministros Amarílio Benjamin e Hermillo Galant, faleci­dos em atividade, a 20 de agosto de 1979 e 16 de fevereiro deste ano, res­pectivamente. Mas, de forma espe-

cial, imploramos ao Espírito do Se­nhor que dê aos novos dirigentes desta Corte sabedoria e força para levarem avante, com justificado oti­mismo, este Tribunal, que julga cau­sas do superior interesse da Admi­nistração Federal e da Nação, com independência e visão do bem co­mum, cônscios os seus membros da imensa responsabilidade que têm pe­rante a Pátria, à qual desejamos to­dos servir, sem limites, e fiéis aos ideais maiores da liberdade e da de­mocracia e aos imperativos da digni­dade, da honra e de nossa consciên­cia.

Muito obrigado.

Ditas estas palavras, convido para vir à mesa o Sr. Ministro Jarbas dos Santos Nobre, para tomar posse no cargo de Presidente do Tribunal, pa­ra o biênio 1981/1983.

A seguir, prestado o compromisso regimental, lido e assinado o Termo de Posse, o Excelentissimo Senhor Ministro José Néri da Silveira decla­rou empossado no cargo de Presi­dente do Tribunal, o Excelentíssimo Senhor Ministro Jarbas dos Santos Nobre, eleito na Sessão Plenária de 4 de junho de 1981, convidando-o a tomar a direção dos trabalhos.

O Excelentíssimo Senhor Ministro Jarbas dos Santos Nobre, ao assumir a Presidência convidou o Exce­lentíssimo Senhor Ministro Aldir Guimarães Passarinho à mesa para tomar posse no cargo de Vice­Presidente do Tribunal. Prestado o compromisso regimental, lido e assi­nado o Termo de Posse, o Exce­lentíssimo Senhor Ministro­Presidente declarou empossado no cargo de Vice-Presidente do Tribu­nal, o Excelentíssimo Senhor Minis­tro Aldir Guimarães Passarinho.

Em seguida, declarou solenemente empossados os membros efetivos do Conselho da Justiça Federal, os Ex­celentíssimos Senhores Ministros

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Washington Bolivar, Torreão Braz e Carlos Mário Velloso; como mem­bros suplentes, os Excelentíssimos Senhores Mínistros Justino Ribeiro, Otto Rocha e Wilson Gonçalves; co­mo Corregedor-Geral da Justiça Fe­deral, o Excelentíssimo Senhor Mi­nistro Washington Bolívar e, como Diretor da Revista do Tribunal, o Ex­celentíssimo Senhor Ministro Wil­liam Patterson.

Dando seqüência à solenidade, o Excelentíssimo Senhor Ministro­Presidente concedeu a palavra ao Excelentíssimo Senhor Ministro José Dantas, para falar em nome do Tri­bunal.

O Exmo. Sr. Ministro José Dantas: Meus Senhores: A simplicidade é vir­tude; pecado é a soberba! A prudên­cia fortalece; debilitante é a insensa­tez! O amor dignifica; o ódio infa­ma! Aos simples, sublima a natura­lidade do bem praticado; mas aos so­berbos, pune o vazio da sua arrogân­cia. Aos prudentes, recompensa a racionalidade dos atos; mas aos in­cautos, pesa o risco da sua temerida­de. Aos amorosos, conforta a indul­gência; mas aos rancorosos, fere o estigma do seu opróbio.

Portanto, seja simples o indivíduo, espontâneo no viver; seja prudente o cidadão, harmonioso no agir; seja amoroso o homem público, magnâni­mo no poder.

Meus Senhores: O dever que assumi, por ordem e a

mando de «poder mais alto», foi o da saudação oficial. Nem tão difícil cumpri-lo, porque, embora falto de «engenho e arte», supre-me a crença nesses valores, ao reputá-los lauréis mais heróicos das personalidades merecidas a louvores.

No caso, virtude, fortaleza e digni­dade são os dados primeiros e mais presentes, à mão de quem incumbi­do do perfil.

Tracemos, pois, as linhas mestras da ficha biográfica do homem a re­tratar, projetado na grandeza do seu meio e do seu tempo!

Jarbas, filho de Jaime - este, o profissional músico consorciado a Izaura, e que também gerou Gentil Augusto, Maria do Céu, Odete, José e Luiz; nasceu em «o quinze» (como diria Raquel), na cidade de Santa Maria do Belém do Grão Pará - co­mo do fino gosto amazônico seria nomear-se assim a capital paraense.

De origem humilde, foi aluno de escola gratuita e colegial de escola pública, cujo aprendizado prático da vida, se não cumpriu com a mole­queira do «Ver o Peso», o fez nos fol­guedos da Igrej a da Trindade, nos festejos do Círio, e na vadeação dos igarapés, remando montarias fura­das. ao impulso de jacumãs racha­dos. na vangloriosa travessia de Guajará à Ilha das Onças.

Nesse travesso desafio das águas aliadas às florestas, bem poderia so­nhar o menino o sonho da sentinela do rei - guardar a foz do rio-mar, martelando nas sapopembas o quar­to das horas, a dividir os turnos de vigia à porta monumental dos tesou­ros da Amazônia; sonho que poderia ter sonhado o menino, na dolorosa premonição do assalto à ecologia da hiléia que viu rasgadas as suas en­tranhas, antes de passada uma gera­ção - ao início de uma invasão pre­datória protestada pelo clamor do mundo e pela inquietação dos seus nativos.

Se a infância viveu em tão fabulo­sa geografia, marcaram-lhe a sina as águas correntes, como em confis­são de posse, neste Tribunal, havia de confidenciar:

«Um dia, partindo do Amazonas, intentei viagem para outros rios. Busquei o Parnaíba, o monge de bar­bas longas ... Arrumei coisas e parti com destino aos irmãos gêmeos Ca-

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pibaribe e Beberibe ... O meu cha­mado, porém, não estaria nesses rios. Um outro acenava-me. Iniciei nova etapa e desci até o Tietê, onde parei por 28 anos seguidos».

Deveras, ao vadear os rios, Jar­bas, filho de Jaime, trilhava o itine­rário de lutas desiguais e esforços insanos, até culminâncias que o em­beveceram, conforme aludiria, per­plexo, ao fato de o 4? Escriturário de Alfândega chegar a Ministro do Tri­bunal Federal de Recursos.

Dos cinco rios vagueados, o Par­naíba, primeiro a testar o paroara fora das águas lustrais, o iniciou nos segredos da burocracia fiscal, ministrando-lhe as primeiras nor­mas do respeito à coisa pública -respeito que havia de professar ad perpetuam.

Homem das caudais, sufocou-se lo­go pelas minguadas dimensões do li­toral piauiense. Velejou a costa; aportou ao Recife. Ali, do bracejar a dupla Beberibe - Capibaribe, saldou mais duas séries do Curso de Direi­to; compactou concepções jurídicas, cruzadas às noções primárias que a Faculdade do Pará fornecera ao ca­louro, na compreensão da arte boni et aequi, numa segunda inicia­ção 'que viria ser a sua acabada pro­fissão de fé.

Por último, o roteiro do seu desti­no apontou-lhe o Tietê. Não regateou o preço da concorrência incruenta, não vacilou em levantar a luva, para o duelo da inteligência.

Persistente na coragem e intransi­gente na fé, venceu o gigantismo paulista. Arrebatou da tradicional «Arcadas» o bacharelato, com ilus­trada Turma de 1942; da bem afama­da Mackenzie, conquistou a cátedra de Direito Financeiro; da função pú­blica. galgou os cargos de Delegado do Tesouro e Procurador da Fazen­da; da Justiça Federal, a magistra­tura singular, pelo desvelo de cuja

judicatura, a justo merecer, ascen­deu ao Tribunal Federal de Recur­sos.

Ouçamo-lhe, porém, as mágoas, segredadas ao rememorar a valente trajetória:

«A caminhada foi árdua, longa e difícil. Desconhecido e sem proteto­res, sofri injustiças e preterições. Superei-as, entretanto».

Do Jarbas, filho de Jaime, esse foi o seu autodizer; porque, do que dele dizem, seria um-nunca - acabar de relacionar grandezas de espírito, pois, muito é o bem-dizer dos outros.

Eu próprio já o disse, com avaren­tas palavras, quando da honra de sucedê-lo em cadeira da superior magistratura eleitoral - « ... o talen­to de jurista, aderido a tantas outras qualidades humanas, notabilizou o bom juiz singular título dos seus so­bejados merecimentos.»

Com efeito, o título de bom juiz, dei-lhe, então, de consciência tran­qüila, firmado em ouvi-lo as proposi­ções da melhor justiça, das liberda­des pÚblicas e dos direitos do ho­mem.

Relembre-se a singeleza de seus juízos, nem sempre dotados do me­lhor tecnismo jurídico, mais de uma autenticidade que o enobrece.

Certa vez, afirmou, em proteção ao ex-combatente, contribuinte autô­nomo da Previdência Social: « ... pa­ra os campos da Itália, como o advo­gado ora impetrante, foram operá­rios, comerciários, prOfissionais libe­rais, e toda uma gama de cidadãos. Seria altamente injusto e desigual que agora se fizesse uma seleção que o espírito da lei não admite ... Desde que satisfaça a condição de ter sido «pracinha», expressão cari­nhosa e reconhecida com que toda a N ação se refere aos que lutaram na Europa na última guerra ... todos, in-

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distintamente, podem-se aposentar após 25 anos de trabalho» - AMS número 67.495.

Doutra feita, assim concedeu pão aos famintos: «A lei, ao que se vê não criou a figura do herdeiro Civii distinta do herdeiro previdenciário. A cadeip é a mesma. . .. A mim re­pugnaria autorizar a versão do be­nefício em favor do Instituto, em de­trimento da viúva e filhos de pai in­válido que, sabe Deus, em que condi­ções conseguem sobreviver ... Se ne­cessário, aplicaria o art. 5? da Lei de Introdução». - AC-42.507.

Em julgamento de repercussão, sem se render ao moderado pronun­ciamento da maioria, proferido na boa ordem da técnica formal do mandado de segurança, assim mes­mo persistiu na refutação veemente à censura oficial: « ... Li «O Abat­jour Lilás» ... O impetrante, a exem­plo do que já fizera com outra pela sua, ... se propôs a descrever cena desenrolada em um bordel. ... En­contro na peça uma mensagem sa­dia .... O trabalho de Plínio Marcos, a quem não conheço pessoalmente, dentro de minha sensibilidade, não agride nem os bons costumes. ... O im'petrante compôs obra de arte com material podre. Nem por isso a obra tem menos odor, pOis que dela é possível, porque não somos imorais, extrair, por contraste, beleza e algo produtivo - MS 76.935.

Finalmente, em caso recente, pa­recendo ouvir o canto do cisne das etnias indígenas, asseverou: « ... te­nho que o Cacique Juruna, o meu ir­!llão .índio, tem direito ao que pede, IStO e, de ir a Roterdam e lá se en­contrar, em conclave, com seus iguais das Américas, e dizer o que pensa, e, inclusive denunciar o que eventualmente lhe parecer errado no que se vem fazendo contra os primi­tivos e exclusivos donos dos vários países que represéntam» - HC-4.880.

Projetado na grandeza do seu meio e do seu tempo, ainda que visto

sob color desses flagrantes recolhi­dos ao acaso, eis o Jarbas, filho de Jaime, o conquistador dos rios.

Ao lhe confiarmos os novos rumos, não temos conselhos a dar - pela consciência dele próprio sobre ser gloriosa a tradição da nau a dirigir. Que a receba, com o manifesto do êxito da viagem redonda que acaba de realizar sob o comando de José, filho de Severino, navegador emérito das bandas do Rio Guaíba! Não cis­me o amazônico, ante as enxurradas dos igarapés, o assovio dos beiços d'água, ou o solapo do bigode das on­das: como seu imediato, estará a bordo Aldir, filho de Almir, barquei­ro do Parnaíba, e cuja crônica se re­vela rica de sabenças, esplêndida de pendores e transbordante das quali­dades humanas que o fizeram um dos nossos».

Guíado por essa carta de tão bizar­ra hidrografia sentimental, navegue em paz o brioso barco da Justiça Brasileira; que o acompanhe a Se­nhora de Nazaré, madrinha de seu novo Comandante - Jarbas, filho de Jaime, o conquistador dos rios!

Excelentíssimas Autoridades: Perdoem Vossas Excelências ao

orador a heterodoxa saudação! Não foi por hostilidade aberta ao texto estilizado, nem às normas vestidas a rigor, de recomendação para soleni­dades deste porte; foi por força do hábito, que fugiu da ortodoxa retóri­ca oficial.

É que, aqui, a fraternidade do convívio é valor de primeira grande­za; e ao sê-lo, não condiz outra lin­guagem, que não a tropologia mais afetiva, na comunicação de senti­mentos que falam ao coração.

Se assim é o falar diuturno desta Casa, mais o será em momento de tamanha significação, solenizado pe­la entrega da sua administração ao Ministro Jarbas dos Santos Nobre, seu Presidente, e ao Ministro Aldir

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Guimarães Passarinho, seu Vice­Presidente; e pela renovação dos seus conselhos administrativos, tudo com a certeza do mesmo empenho com que se ouve a gestão, ora en­cerrada, do Ministro José Néri da Silveira.

Por isso, se outra fosse a sauda­ção, soaria estranha aos ouvidos dos pares da Corte a mensagem da sua confiança, sem reservas; do seu pre­ço, sem limites; do seu concurso in­condicionaL e da sua estima mais fraterna a tão eminentes condutores de destinos.

Não. Esta mensagem não tinha co­mo escusar-se à fiel tradução de sen­timentos( que, na sua essência, são a pedra-de-toque da simplicidade do nosso ser; da prudência do nosso agir; e muito mais - a pedra-de­toque do amor com que este Tribu­nal ministra a sua justiça.

Em prosseguimento o Exce­lentissimo Senhor Ministro­Presidente concedeu a palavra ao Doutor Geraldo Andrade Fonteles, Subprocurador-Geral da República.

O Exmo. Sr. Dr. Geraldo Andrade Fonteles (Subprocurador-Geral da República): Esta Corte de Justiça que cumpre, mais uma vez, um biê­nio de sua administração, em sessão solene vai homenagear aqueles a quem cabe dirigir-lhe a prÓXima eta­pa, ao mesmo tempo em que obse­qUia a tradição de distribuir as res­ponsabilidades dos altos encargos da Presidência e Vice-Presidência aos que integram a sua comunidade.

Assim, Sr. Ministro Jarbas dos Santos Nobre, chegou a vez de V. Exa. oferecer-lhe o quinhão de vossa inteligência, a serenidade do vosso espírito, o devotamento de vosso tra­balho à Instituição, à qual já vem servindo e compondo a argamassa consistente da reafirmação de sua existência, sempre ascensional, no âmbito do Poder Judiciário.

A V. Exa., Sr. Ministro Jarbas No­bre, não falta lastro, como ainda se vos dão de endosso, em valores ínsi­tos, a fecundidade natural do Pará, seu Estado natal, e a opulência da grande São Paulo, onde plasmastes a têmpera do vosso caráter e a cren­ça na supremacia da ,Justiça, tornando-vos apto o desempenho da elevada função que acabastes de re­ceber.

Por outro lado provi estes de car­gos exercidos no Ministério da Fa­zenda, onde, certamente, o valor pessoal que revelastes, gUindou-vos às destacadas funções de Delegado Fiscal do Tesouro Nacional e Procu­rador da Fazenda Nacional do Esta­do.

N a Justiça Federal cumpristes to­dos os cargos que se oferecem à ju­risdição ministerial, inclusive nos Tribunais Eleitorais, e sempre com respeitosa galhardia.

Por fim, prezado e querido Minis­tro Jarbas Nobre, eu me valho de excerto de um discurso proferido alhures, enaltecendo a figura do sobre-eminente Ministro Hahne­mann Guimarães, como diria o hoje Ministro Firmino Ferreira Paz, am­bos do Supremo Tribunal, eu me va­lho daqueles conceitos, ali auridos, para proclamar, por mim e pelo Mi­nistério Público Federal, o nosso sentir do vosso perfil de homem pú­blico: «a personalidade, a criatura, a limpidez do caráter, a simplicidade pessoal, a alegria interior provinda de uma consciência tranqüila e justa, a bondade que não é capaz de um gesto de impaciência ou de um olhar mais severo, a fidelidade aos ami­gos, e, sobretudo, a independência com que defende suas convicções nos momentos necessários», são os traços que lhe compõem a silhueta, por nós admirada.

V. Exa., Sr. Presidente, traz no no­me a estirpe qualificativa do seu no­bre modo de ser.

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o Ministério Público, como todo o mundo jurídico, espera e confia em que V. Exa. éontinue na estacada com a mesma disposição de vosso imediato sucessor, para o que roga­mos ardentemente a Deus que lhe conserve a energia, assaz demons­trada, e revigore a vossa sáude e bem-estar pessoal.

Na Vice-Presidência empossou-se o ilustre Ministro Aldir Guimarães Passarinho, a quem me dirijo para vos dizer: sois um daqueles que o Ministério Público também se com­praz em render, neste momento, su­bida homenagem, ante a condição que polarizou a vossa cultura, inteli­gência e grande sensibilidade de ju­rista, exegeta do Direito Público.

Juiz Federal, desde o restabeleci­mento da Justiça Federal, V. Exa. exerce a sua missão de ínclito ma­gistrado, tanto em Primeira Ínstân­cia, como nesta Egrégia Corte Revi­sora, com integridade e competência funcional.

Sabeis, com equilibrado senso de justiça, ponderar o alcance de vos­sas decisões, vendo na coletividade e nos órgãos Públicos da Administra­ção, irrecusavelmente a serviço da­quela, aplicar a filosofia teológica do Direito.

De sorte que, apreciando-vos sob este ângulo, as vossas decisões e os vossos votos, constituem algo que so­bressaeri. pela significação social, sObrepondo o interesse do geral ao do particular.

Em verdade, a essência do Direito está assentada em certo pragmatis­mo da conduta humana, ditada pela sua destinação social. Esta acuidade vos é muito peculiar, portanto mere­cedora de consagração, a qual, sentimo-nos na obrigação de autenticá-la. Também não podemos deixar de emoldurá-la em suporte de destaque, pois seria o mesmo que desvalorizá-la do quanto tem de sig-

nificado e alcance, como produto do labor humano. E fazemo-lo com palavras emantadas no sabor da fan­tasia. inspirado no Vosso nome de família.

Às vezes têm aquela receptividade da mãe-natureza, que Deus lhes deu, para cumprir a sua missão na terra: embelezá-la, colori-la, sonorizá-Ia, e, enfim torná-la estimulante à existên­cia dos seres racionais.

O emolduramento de suas existên­cias é o incomparável esplendor do firmamento, que vai da alvorada re­nascente de todas as forças, até o ar­rebol antecipado dos recessos no­turnos, para o rerazimento das labu­tas cotidianas. Constitui, enfim, o infinito das esperanças, onde voam e amam a liberdade na sua mais vasta plenitude.

Eis, Srs. Ministros Presidente e Vice-Presidente do Egrégio Tribunal Federal de Recursos, o que pude ra­biscar para manifesté!r. pelo Minis­tério Público Federal, o associamen­to do «parquet» às justas homena­gens, em preito de reconhecimento aos relevantes serviços prestadoí' à Justiça Federal, ao Tribunal e à Jus­tiça do País.

Cumpre-me, por fim, endereçar al­gumas palavras ao eminente Minis­tro José Néri da Silveira que acaba de completar seu mandato presiden­cial:

Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira: Quem há que não vos louve a fecunda administração presiden­cial? Seja na área puramente admi­nistrativa, seja no impressionante cuidado e acerto em dirigir os traba­lhos do Plenário, sempre atento ac aperfeiçoamento técnico na procla­mação dos resultados, revelando a atualidade de vosso conhecimento jurídico e a perfeita compreensão das tendências modernas do direito, tanto que não poupou esforços para atualizar, em termos cibernéticos, a fluência dos trabalhos do Tribunal.

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De outra parte não lhe faltou o dis­cernimento do culto à tradição da Casa, e ao respaldo do aperfeiçoa­mento dos quadros administrativos, dando-lhes condições de ensinamen­tos intelectuais e assistência social robusta, extensiva às suas respecti­vas famílias.

N as minhas reminiscências de tes­temunha presente à história deste Tribunal, como já tivera oportunida­de de afirmar na sessão de inaugu­ração da Galeria dos ex-presidentes, induvidosamente, nenhum ultrapas­sou a deste último biênio, sem contu­do os antecedentes desmerecerem ao natural desenvolvimento e pUjança do Tribunal.

Mas, Sr. MListro José Néri da Sil­veira, não poderia deixar de aconte­cer, tendo-se em conta o conjunto de qualidades que montam a vossa per­sonalidade, a vossa formação, a vos­sa índole, deixando em tudo o que faz a perfectibilidade em grau exce­lente.

A missão que a vida vos reservou e para a qual se há preparado pelo constante e fecundo labor, impreg­nam e impregnarão, por toda a par­te, as marcas indeléveis de vossa passagem.

Prosseguindo, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente concedeu a pala­vra ao Exmo. Sr. Dr. José Bernardo Cabral, Presidente do Conselho Fe­deral da Ordem dos Advogados do Brasil.

O Exmo. Sr. Dr. José Bernardo Cabral (Presidente do Conselho Fe­deral da Ordem dos Advogados do Brasil): Ministro Jarbas; Nobre, Presidente do Egrégio Tribunal Fe­deral de Recursos; Ministro Xavier de Albuquerque, Digníssimo Presi­dente do Supremo Tribunal Federal, de quem tenho a honra de ser con­terrâneo, tive o privilégio de ser discípulo e continuo sendo aluno; MF nistro Ibrahim Abi-Ackel, Titular da Justiça; demais autoridades que

compõem a Mesa; Ministros de Esta­do; Ministros do Egrégio Tribunal Federal de Recursos; membros do Ministério Público Federal, Senhores Juízes Federais; mE:US colegas advo­gados, tâo bem representados pelo Presidente Maurício Correia; minhas Senhoras, meus Senhores: Conf~sso que no instante em que ouvi do Sr. Ministro José Dantas, que num bai­lado fluvial, sem nenhuma coreogra­fia premeditada - eu sou filho do Amazonas e sei - os rios. desde as cabeceiras, começam a cavar os seus próprios leitos, verifiquei que me encontro como numa passagem da vida de Nicolo Paganini. O mun­do j amais ouvirá um violinista como Paganini! Em determinada quadra da sua vida, na cidade de Lhornes, tinha eles um concerto marcado, pa­ra o qual toda popUlação j á se encon­trava no teatro, e Paganini tardava. Tardava, porque, na noite anterior­gênio, era dado ao jogo e como gênio que era, dado ao jogo, teria que ser dado às mulheres - gastara a sua fortuna e vendera o violino a troco de mais umas fichas na mesa. Por­tanto, não tinha o violino para tocar. Alguém lhe avisara que um certo Mr. Divon tinha um Guarnerius, tal qual o Stradivarius, da mesma la­vra, do mesmo valor. Ele se dirige a Mr. Divon que não obstante ser co­merciante era homem dado à músi­ca, ao bom gosto, e pede o violino emprestado para que pudesse execu­tar o seu concerto. Mr. Divon, muito honrado, sumamente homenageado, empresta-lhe o violino, e lá se vai, para o concerto, Paganini. E, como sempre, aquela exuberante e notável execução de Paganini, arrancando aplausos de todos, ffez' com que ao fi­nal, já no seu carrrarim, quandO en­tregava a Mr. Divon o violino, ouvis­se deste: «guardar-me-ei de tocar nestas cordas, depois de nelas ter to­cado vós.»

Também eu, assim meio disfônico, quase !ifônico deveria guardar-me

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de falar nesta tribuna, depois de ter ouvido V. Exa., Ministro José Dan­tas.

Não fosse o privilégio - quem sa­be a deferência - de eventualmente ocupar a Presidência do Conselho Federal - só por isso, pela imposi­ção do cargo - eu, que sou avesso ao discurso por escrito, porque é sempre mal feito no meu caso, e sempre mal lido por mim, dele fujo, fúi obrigado, nesta cadeira, a redigi­lo, quase que numa redação improvi­sada. E como fico agora, na hora em que o Subprocurador-Geral da Repú~ blica traça, par e passo com V. Exa. o perfil do Jarbas, o filho de Jaime, a tocar nas nossas entranhas, a fazer com que cada um se emocione, e que aumente, nesta Casa, como disse V. Exa., a fraternidade do convívio e, portanto, foge ao parâmetro de tudo aquilo que é ortodoxo. É bom que se­ja assim, porque como advogado, que sempre se escora no trabalho dos outros para pOder fazer valer as suas razões, também eu agora, qual aleijado, pedindo a muleta de V. Exa., Ministro José Dantas, começo a dizer neste alinhavado que já não mais teria razâo de ser, que sempre vale a pena, quando se é obrigado, e que bom que seja uma obrigaçâo desta ordem, fazer considerações. Elas não me privam de dizer que o comparecimento do Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil se impunha num ato solene como este, e, sobretudo, na entrega da Presi­dência do Sr. Ministro José Néri da Silveira. É que a Ordem dos Advoga­dos do Brasil está convicta de que o Egrégio Tribunal Federal de Recur­sos, ao sair das mãos de V. Exa., Sr. Ministro José Néri da Silveira, para as mãos do eminente Ministro Jar­bas Nobre, continuará trilhando o seu caminho amplo em torno da ad­ministração, seriedade, dignidade, independência e amistosidade com a Classe dos advogados.

Defendendo a OAB um Poder Ju­diciário constitucionalmente forte e socialmente equilibradO, não mais aceita que se possa pensar hoje na­quela insegurança dos precedentes históricos, diante das Revoluções Americana e Francesa, do Século XVIII, quandO o Direito era realiza­do e construído casuisticamente, quer pelO Executivo, quer pelo Judi­ciário.

Ao Juiz, como V. Exa., criador do Direito a partir de normas que ema­nam do Legislativo e censurado r de atos tidos como contrários à lei pela prática-- do Executivo, sempre se re­serva a missão de ser mais homem, homem e quase um Deus. Não se po­de esperar dele apenas o mero apli­cador da lei, posto que esta não se exaure na sua interpretação, assim como a partitura não esgota a músi­ca. É por esta razão, que o Juiz há de ser sempre aquela figura admira­da pelos amigos e respeitada pelos que dela discordam.

No relatório que V. Exa., Ministro José Néri da Silveira, ainda há pou­co acaba de dar conhecimento ao pú­blico - como quem marca uma en­trevista com a posterioridade - traça, em linhas fortes, o que é uma admi­nistração. Esta mesma administra­ção que traz o senso moral que nas­ce com cada ser humano, uma vez que a vida não empresta esta qualidade, ou os cargos que se desempenham durante o seu trajeto jamais conse­guem conferir a quem quer que seja. Balzac dizia, ressaltando, que o Juiz liberal era um soberano, somente submetido a sua consciência e à lei. Sei que, com V. Exa., os moleiros de Sans Sousci não teriam que duvidar da existência de bons juízes, pois ja­mais foi provérbiO da Justiça de Cambises.

Por igual, não me lembro, Sr. Mi­nistro José Néri da Silveira, de ter compartilhadO a sua Presidência com a prepotência, pois, sempre se

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manteve indiferente ao medo pelos poderosos. Na hora em que V. Exa. deixa esta Presidência, não quero, e o faço em nome da Ordem dos Advo­gados, bancar os abissínios que ati­ram pedras no sol que se põe - ain­da que V. Exa. continue sendo um sol, porque continuará ao lado dos seus altos pares -- mas trazer-lhe o testemunho da simpatia e do apreço da OAB.

Ao fazê-lo, já como quem abre um crédito de confiança na admiração que sempre se impôs à Classe, refiro-me ao Ministro Jarbas Nobre, que sendo do Estado do Pará, saben­do cavar o seu próprio leito, foi desa­guando já cenário paulista, como substituto do Procurador da Fazenda Nacional.

Seria repetitivo se eu trouxesse aqui as qualidades tão bem alinha­das como a de Professor-titular do Instituto Mackenzie, na cadeira de Direito Financeiro. Mas eu não pode­ria deixar de registrar que, Juiz em 1967, logo após decorridos dois anos, eis que se encontra neste Tribunal, não apenas a ditar sentenças, que is­to é pouco, mas a dar um exemplo, pelo convívio, pela retidão, como quem sabe ir adiante, confiando na fé que Deus lhe impõe.

V. Exa., Sr. Presidente, Ministro Jarbas Nobre, que em determinada quadra da sua vida - e isto para mim é muito confortador, para não dizer motivo de alegria - no ano de 1974 era eleito Corregedor-Geral da Justiça Federal para completar o mandato do meu velho e querido mestre Henoch Reis, que, então, saía deste Tribunal para Governador do Estado do Amazonas, que não abria lacuna, porque logo após V. Exa., complementava, que não deixava vaga, porque V. Exa. preenchia, co­mo preenche qualquer vaga. Logo após, em 1975, era V. Exa. eleito Corregedor-Geral da Justiça Federal da 1~ Instância; em 1978, Juiz efetivo

do Tribunal Superior Eleitoral; em 1979, Vice-Presidente desta Casa e, agora, em 1981, nesta consagração que não só a vida lhe dá, que os seus pares lhe confortam, que o mundo se abre como perspectiva a perder de vista, mas porque o passado de V. Exa. lhe permite, olhando para o fu­turo sem nenhuma sombra de dúvi­da, eis que o passado como ponto de partida para o futuro lhe entrega es­ta Presidência, e ao entregar faz com que V. Exa. tenha o privilégio da companhia de um Vice­Presidente, Aldir Passarinho.

A Universidade Federal do Rio de Janeiro o encontra se diplomando no ano de 1950 e de 1950 a 1964 - me perdoem os que são juízes de carrei­ra - mas de 1950 a 1964 como advo­gado, advogado em que lhe conferi­ria, senão a excepcional capacidade de ser um bom juiz, mas a garantia de ser tão bom quanto aqueles que vêm da carreira da magistratura.

Sub-Chefe da Casa Civil do Presi­dente Castelo Branco, em 1967, de onde vem para a Justiça Federal, Ministro do Tribunal Federal de Re­cursos, em 1974.

Não vou, Ministro Aldir Passari­nho, relatar-lhe a personalidade, os contornos, os quadros vivos que ela encerra, até nas condecorações que recebeu, porque entre todas elas, permita-me que ressalte uma, a meu ver, a maior que V. Exa. dispõe, porque todos nós advogados apren­demos com Eduardo Couturre que é bom que se ame a profissão, que se estude, que se leia, mas é muito mais bonito, para darmos prova de que dela gostamos, que um dia pos­samos indicar a um filho que seja advogado, e V. Exa. tem um filho que é advogado. Neste passo, apenas neste, lhe sigo, é com imenso prazer que lhe digo que tenho um filho ad­vogado.

Receba, portanto, os cumprimen­tos da Ordem dos Advogados do Bra-

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sil na hora em que concluo, eminen­te Presidente Jarbas Nobre, e o fa­ço, ressaltando que, talvez no con­teúdo interno que esta solenidade reúne, a festa poderia ser do Tribu­nal, da Ordem dos Advogados do Brasil pelo seu Conselho Federal, de todos os Conselhos Seccionais, mas no valor histórico, neste ninguém po­de tirar de dois lugares: de V. Exa., do Estado do Pará, tão bem retrata­do pela magnífica peça oratória do Ministro José Dantas, e do Ministro Aldir Passarinho, Estado do Piauí. Que estranha coincidência, dois Es­tados que começam com a letra P, a mesma letra do poder, como se neste instante o representante da Or­dem dos Advogados do Brasil tivesse que dizer nesta Casa: poder que das mãos de V. Exa. há de emanar, não como quem conquista e o empal­ma por um instante - que nada dis­to vale na mão de um homem - ou pela riqueza que conseguiu amea­lhar, mas poder, aquele que se dis­tribui em favor de uma coletividade, marcando o passo da seriedade na administração. Este poder, que é o do Piauí, que é o do Estado do Pará, leva a mensagem da OAB na sua mais alta satisfação, pedindo que Deus os ilumine, e os faça, sobretu­do, uma gestão profícua e cheia de felicidade.»

Em seqüência, o Exmo. Sr. Ministro-Presidente proferiu as se­gUintes palavras:

O Exmo. Sr. Ministro Jarbas Nobre (Presidente): Nesta Casa, o respeito ao princípio da antigüidade constitui tradição.

Este é o motivo pelo qual fui esco­lhido para exercer a sua Presidên­cia.

Dos quatro Ministros nomeados em 1969 pelo Presidente Médici, Pe­çanha Martins, Décio Miranda, José Néri da Silveira e eu, excluído o se­gundo que não chegou a ser Presi-

dente por ter sido nomeado Ministro do Supremo Tribunal Federal, sou o último a assumir a direção deste Tribunal. Porque tomei posse no dia 11 de dezembro de 1969, dois dias de­pois do M.inistro Néri da Silveira, só . agora recebo a investidura.

Daí dizer: chegou a minha vez no sacrifício.

Sucedo a um homem excepcional que levou a bom termo a difícil tare­fa que recebeu há exatamente dois anos atrás.

Sei dos momentos difíceis por que passou, prinCipalmente ante os devi­dos à adaptação do Tribunal ao gi­gantismo a que chegou em conse­qüênCia da Reforma do Poder Judi­ciário.

Foi a construção do edifício anexo, além dos 14 novos Gabinetes de Mi­nistros e de dependências outras in­dispensáveis.

Tudo isto transformou esta Casa em autêntico canteiro de obras.

A luta foi grande, mas o resultado aí está.

Minha responsabilidade nesse su­ceder é imensa. Para vencer os obs­táculos espero, antes de tudo, que Deus me ajude. E também, porque não enfatizar, o Governo, meus ilus­tres pares e o funcionalismo da Ca­sa.

Neste labutar, tenho a ventura de poder contar com os trabalhos e de­dicação dos Vice-Presidente e Corregedor-Geral, meus diletos ami­gos e companheiros, Ministros Aldir Passarinho e Washington Bolívar, além dos novos componentes do Con­selho da Justiça Federal, Ministros Torreão Braz e Carlos Mário Vello­so.

Grande é, na verdade, o trabalho que se está a impor a um homem que logo mais será um septuagená­rio e que gastou perto de 50 anos no desempenho de funções públicas. Es-

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pero, porém, que forças e disposição não me abandonem e que eu possa vencer mais esta etapa de lutas.

Sumamente honrado com o cargo que me é entregue, destaco que o re­ceio de que sou possuido pelos ~ncar­gos que lhe são próprios e conse­qüentes, como que faz desaparecer toda a alegria do acontecimento.

E de fato muito árdua a tarefa que ora recebo, a de dirigir este Tribunal e o Conselho da Justiça Federal com as 56 Seções Judiciárias espalhadas pelo território nacional, cada qual com os seus problemas peculiares.

Observemos esta realidade.

Em 1979, na P instância, foram au­tuados 83.304 processos (757 por Juiz). No ano seguinte, esse número se elevou para 88.855 (818 por Juiz).

Em 1981, a autuaçâo poderá ser de 129.568 feitos se a Fazenda Nacional enviar à distribuição cerca de 60.000 execuções fiscais que estâo prontas para isto. A média por Juiz será, então, de 1.156 processos.

A situação da Justiça Federal em alguns Estados, como por exemplo o de Goiás, é muito séria, pois só no biênio 1979/1980, a média de autos para cada Juiz chegou a 1.066, de­vendo ser ressaltado que parte dessa elevada cifra se refere a questões fundiárias de repercussão social e da maior importância.

Na Seção do Rio de Janeiro, no mesmo biênio, a média, por Juiz, foi de 898 (1. 003 em 79 e 794 em 1980),

Na 1~ Região, o Estado do Pará vem em terceiro lugar, com a média per caplta de 804 processos nesse biênio.

Na 2~ Região, o quadro mais sério é o de São Paulo, onde a média no biênio, por Juiz, atingiu ao número impressionante de 1.305 processos.

As duas Seções mais importantes da Justiça Federal de 1~ instância, é de todos sabido, são as do Rio e de São Paulo.

A sobrecarga de trabalho numa e noutra, como visto, é invencível, pOis está acima da capacidade humana.

A acrescer a gravidade desse qua­dro, há a enfatizar a precariedade de suas instalações.

O prédio que ocupamos em São Paulo, de apartamentos que era, é impróprio e acanhado.

Não suportaria, desse modo, qual­quer aumento de Varas.

O do Rio de Janeiro chega a ser inacreditável. Além de velho, é ina­dequado e perigoso. Todos os adjeti­vos depreciativos que existem no vernáculo, podem ser empregados com absoluta propriedade para des­crever ó que é a sede dessa Seção Judiciária.

O prédio tem história, isto é certo, pois foi ocupado pelO Supremo Tribu­nal Federal até a mudança da Capi­tal para Brasília.

Nesse quase escombro se acotove­lam Juízes, Procuradores da Repú­blica, advogados, partes e funcioná­rios.

O espetáculo chega a ser depri­mente e inacreditável.

Lá estive outro dia na tentativa de vir a realizar o quase milagre de po­der transferir as duas Varas que continuam a funcionar em Niterói, apesar da extinção do antigo Estado do Rio.

No períOdO 78/80, a média anual dos processos encaminhados a este Tribunal foi de 7.500, cerca de 9% do volume do ajuizamento na Justiça Federal de 1~ Instância.

Se em 1981, como previsto, forem distribuídos em São Paulo os anun­ciados 129.568 processos, quase

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12.000 processos deverão subir a esta 2~ instãncia, cabendo a cada Minis­tro 488 novos casos.

Daí a perspectiva de logo mais perderem significação os resultados conseguidos em 1980 e primeiro se­mestre de 1981 em que houve um certo equilíbrio entre os processos recebidos e julgados.

Se este Tribunal ainda tem condi­ções de bem servir, isto se deve principalmente ao represamento de processos na primeira instância.

Se o dique fosse rompido, o caos aqui estaria entre nós.

A solução para tal estado de coisas está na implantação de uma estrutu­ra compatível com o seu volume de trabalho, a saber, aumento de núme­ro de Varas, de Juízes, de funcioná­rios, além de maior espaço físico nas nossas instalações, na maioria, pre­cárias.

O atual estado da Justiça Federal resulta em grande prejuízo para a União Federal e suas autarquias na consideração de que do ajuizamento de feitos, 60% são constituídos de execuções fiscais.

A arrecadação feita por esse meio desde a instalação da Justiça Fede­ral, em 1967, é superior aos valores consignados em seus orçamentos.

Sentindo tais dificuldades, na ad­ministração Moacir Catunda. e du­rante ela fui Corregedor-Geral, nos­sa Justiça começou a utilizar serviço de processamento de dados. Hoje, esse sistema está implantado aqui no Tribunal e nas Seções Judiciárias de São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, através de convênio com á DATAPREV, empresa da Previdência Social.

De lá para cá, ele teve rápido de­senvolvimento.

Para que se tenha uma pálida idéia do que foi feito nesse setor,

basta que se diga que nossos arqui­vos de memória, em fitas e em dis­cos, atingem a 279.000 processos.

Como a média de cada um é de 50 itens, pode-se assegurar que o núme­ro de elementos registrados já se eleva a 27.900.000 processos.

Com tais números, fácil é concluir que chegamos à beira da saturação.

Porque já adquirimos a experiên­cia necessária e possuimos estudos e programas a serem postos em prá­tica, o caminho que a prudência aconselha é no sentido de que pos­suamos serviço próprio.

Sou grato aos Colegas pela mani­festação de confiança em terem me elegido Presidente da Casa.

Como toda gente, eu também vim ao mundo num certo momento e em determinado lugar.

Nasci numa terra linda que, como canta o poeta, até os sinos repetem: belém, belém; «que palpita por de­trás da floresta, em namoro com o rio, em carícias com as mangueiras, em lua de mel com a natureza», na observação feliz de Leandro Tocan­tins que canta a «Belém de todas as graças, do céu, dos ares, das águas, das cores, das terras, dos rios, do mato».

E também das graças divinas: «Nossa Senhora da Graça», escreve o cronista, «foi o orago de sua pri­meira ermida».

«Belém do Pará ... beleza eterna de paisagem,» no poema de Manuel Bandeira.

Por contingências da vida, de lá saí e deambulei por este Brasil a fo­ra, fazendo amigos.

Até que cheguei a São Paulo para onde pretendo voltar ao término da longa caminhada de quase meio sé­culo.

Foi de lá que vim para Brasília, exatamente por ser de São Paulo, on­de sou minima parcela entre os mi-

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lhões de migrantes que no lado dos imigrantes, constituem a força de trabalho que dele fez o primeiro Es­tado da Federação.

E porque sou profundamente grato a São Paulo pelo que me deu, a ele transfiro a honra de ter sido escolhi­do para desempenhar as funções de Presidente deste Tribunal, numa re­petição do que a tal respeito disse o nosso poeta maior, o qual apesar de desaparecido, nunca deixou de ser o Príncipe, o insuperável Guilherme de Almeida:

«São Paulo do verbo «dar», es­creveu o imortal, «Desde quando? - Desde sempre. Desde a areia de uma praia Dada a uma onda de naufrágio. Que em certa crista de espuma Veio trazer João Ramalho. E São Paulo deu-lhe tudo: Santo André, Piratininga; Deu aos seus pés andarilhos, Serra-abaixo, serra-acima, Nove léguas para andar; E deu-lhe cinco mil arcos E, flor das flores da tribo, Flor-de-altura do Planalto Uma princesa: Bartira ... »

Dar a São Paulo? - Ilusão! Pois que ele tudo nos deu, Se ele nos deu até mesmo O próprio amor que lhe temos, O que a São Paulo lhe der -Seja quem for, e porque, E onde, e quanto, e como, e quan­do-Será tudo, será sempre. Será só restituição!»

Antes de declarar encerrada a Ses­são, tenho a honra de convidar todos

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os presentes às dependências contíguas a este Salão, que o Tribu­nal tem o prazer de oferecer um co­quetel.

Declaro encerrada a Sessão.»

Compareceram à solenidade, além das que compuseram a Mesa, as se­guintes autoridades: o Exmo. Sr. Delfim Neto, Ministro-Chefe da Se­cretaria do Planejamento da Presi­dência da República; o Exmo. Sr. Luciano Brandão, Ministro­Presidente do Tribunal de Contas da União; Exmo. Sr. Syed Murad Ah­med Khairi, Embaixador da Repú­blica do Paquistão; Exmo. Sr. Paulo César Cataldo, Consultor-Geral da República; Exmo. Sr. Ministro Pe­dro Gordilho, representante do Ex­mo. Sr. Ministro-Presidente do Tri­bunal Superior Eleitoral; Exmo. Sr. Ministro Mário Pacini, Vice­Presidente do Tribunal de Contas da União; Exmo. Sr. General de Exérci­to José Ferraz da Rocha, Ministro­Chefe do Estado Maior das Forças Armadas; Exmos. Srs. Ministros aposentados do Tribunal Federal de Recursos, Djalma da Cunha Melo, GOdoy Ilha, Márcio Ribeiro, Moreira Rabello, Esdras Gueiros, Enoch Reis, Paulo Távora e Oscar Correa Pina; Exmo. Sr. Cel. José Saldanha Fábrega Loureiro, representante do Exmo. Sr. Ministro-Chefe do Gabine­te Militar da Presidência da Repú­blica; Exmo. Sr. Desembargador An­tônio Honório Pires de Oliveira, Pre­sidente do Tribunal Regional Eleito­ral do Distrito Federal; Exmo. Sr. Desembargador Helládio Toledo Monteiro, Vice-Presidente do Tribu­nal de Justiça do Distrito Federal; Exmo. Sr. Milton Menezes da Costa Filho, Procurador-Geral da Justiça Militar; Exmo. Sr. Cid Heráclito de Queiróz, Procurador-Geral da Fa­zenda Nacional, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Fa­zenda; Exmos. Srs. Subprocuradores-Gerais da Repúbli-

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ca, Paulo Sollberger, Hélio Pinheiro da Silva, Josêo Boabaid de Oliveira Itapary, José Francisco Rezek e Jo­sé Arnaldo Gonçalves de Oliveira; Exmo. Sr. Desembargador Moacyr Sipaúba da Rocha, Presidente do Tribunal de Justiça do Maranhão; Exmo. Sr. Desembargador Jesus de Oliveira Sobrinho, Presidente do Tri­bunal de Justiça do Mato Grosso do Sul; Exmo. Sr. Desembargador Jor­ge Andriguetto, representante do Presidente do Tribunal de Justiça do Paraná; Exmo. Sr. Desembargador HeIí Ferreira Sobral, Presidente do Tribunal de Justiça do Piauí; Ex­mos. Srs. Juízes Federais, Jacy Gar­cia Vieira, Costa Filho, lImar Nasci­mento Galvão, Dario Abranches Viotti, Jesus Costa Lima, José Alves de Lima, Luiz Rondon Teixeira de Magalhães, José Kallas, Laurindo Dias Minhoto Neto, Fleury Antônio Pires, Jorge Tadeo Flaquer Scar­tezzini, Sebastião de Oliveira Lima, Anna Maria Pimentel Trístão, Paulo Pimentel Portugal, Homar Cais, Cló­vis de Mello, Márcio José de Mo­raes, Caio Plínio Barreto, José An­chieta Santos Sobreira, Hércules Quasímodo da Mota Diás, Genival Matias de Oliveira, Orlando Caval­canti Neves, Adaucto José de Mello, Jatir Batista da Cunha, Geraldo Bar­reto Sobral, Alberto José T. Vieira da Silva, José Anselmo de Figueire­do Santiago, Aristides Porto de Me­deiros, Heraldo da Costa VaI, José de Castro Meira, Vicente Leal de Araújo, Araken Maris de Faria, Dionísio Rodrigues Nunes, Hervandil Fagundes, Agustinho Fernandes Dias da Silva, João Batista de Oli­veira Rocha, Milton Luiz Pereira, Oswaldo Horta Aguirre, José de Je­sus Filho, Manuel Lauro Volkmer de Castilho; llmo. Sr. Maurício Correa, ·Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção Distrito Federal; lImo. Sr. Américo Lacombe, repre­sentante do Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção do Estado de São Paulo; lImo. Sr.

Contra-Almirante Eduardo de Olivei­ra Rodrigues, representante do Ex­mo. Sr. Ministro de Estado da Mari­nha; Ilmo. Sr. Raimundo Antônio Es­pinheira Mesquita, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado dos Transportes; lImo. Sr. Luiz Cássio dos Santos Werneck, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Agricultura; lIma. Sra. Dóris Quei­roz de Carvalho, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Educação; Ilmo. Sr. Geraldo Antônio Nogueira Miné, representante do Ex­mo. Sr. Ministro de Estado do Tra­balho; lImo. Sr. Edelberto Luiz da Silva, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Saúde; Ilmo. Sr. Pedro Carrano, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da In­dústria e Comércio; lImo. Sr. Aníbal Craveiro, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado das Minas e Energia; lImo. Sr. Wilton Lopes Ma­chado. repreSentante do Exmo. Sr. Ministro de Estado do Interior; Ilmo. Sr. Hélio Estrela, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado das Comunicaçôes; Ilmo. Sr. Francisco de Paula Salzano Vieira da Cunha, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Previdência e Assistên­cia Social; Ilmo. Sr. Luiz Assumpção Paranhos Velloso, representante do Exmo. Sr. Ministro de Estado para o Programa Nacional de Desburocrati­zação; lIma. Dra. Zeila de Castro Andrade Ribeiro de Mendonça, re­presentante do Presidente da Asso­ciação Comercial de São PaulO; lI­mo. Sr. João Batista Morelo Neto, Presidente da Junta Comercial do Estado de São Paulo; Ilmo. Sr. Alci­des Jorge Costa, Professor da Facul­dade de Direito da Universidade de São Paulo; lImo. Sr. Geraldo Atali­ba, Professor da Faculdade de Direi­to da Pontifícia Universidade Católi­ca de São Paulo; Ilmo. Sr. José An­chieta Falleiros, Juiz do Tribunal Re­gional do Trabalho de São Paulo; Il­mos. Srs. Joaquim Antônio Bittencou­rt Couto e Leon Frejda Szklarowsky,

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Conselheiros do Instituto dos Advo­gados de São Paulo, Ilmos. Srs. Jef­ferson de Aguiar, Rubens de Barros Brizola, Henrique Fonseca de Araú­jo, Luiz Carlos Bettiol, José Luiz Cle­rot e outros advogados militantes no Distrito Federal, funcionários e membros da família.

Tribunal Federal de Recursos, 23 de junho de 1981 - Ministro Jarbas Nobre, Presidente - Bel. José Alves Paulino, Secretário do Plenário.

TRIBUNAL PLENO ATA DA 18? SESSÃO

ORDINÁRIA Homenagem póstuma ao Exmo. Se­nhor Ministro Afrânio Antônio da

Costa Em 28 de junho de 1979

Presidência do Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira

Aos vinte e oito dias do mês de ju­nho do ano de mil novecentos e se­tenta e nove, às treze e trinta horas, presentes os Exmos. Senhores Minis­tros Armando Rollemberg, Márcio Ribeiro, Moacir Catunda, Peçanha Martins, Aldir G. Passarinho, José Dantas, Lauro Leitão, Carlos Madei­ra, Evandro Gueiros Leite, Washing­ton Bolívar de Brito, Torreão Braz, Carlos Mário Velloso, Justino Ribei­ro, Otto Rocha, Wilson Gonçalves e Sebastião Reis, Juiz Federal convo­cado, presente, ainda, o Dr. Secretá­rio do Tribunal Pleno.

Ausentes, por se acharem licencia­dos para tratamento de saúde, os Exmos. Senhores Ministros Amarílio Benjamin e Jarbas Nobre.

OSr. Ministro José Néri da Silveira (Presidente): Srs. Ministros: Sendo esta a primeira Sessão do Tri­bunal, que tenho a honra de presidir, depois de empossado na Presidência da Corte, deveria proferir palavras inaugurais, naturalmente, de júbilo,

próprias de quem inicia, com otimis­mo, uma nova etapa de atividades. Tal, entretanto, não quis a Providên­cia Divina ora ocorresse. Minhas pa­lavras são para comunicar ao Tri­bunal um evento que muito o entris­tece, enlutando-o. Faleceu, ontem, no Rio de Janeiro, o primeiro Presi­dente do Tribunal Federal de Recur­sos, o ilustre Ministro Afrânio Antô­nio da Costa, aos 87 anos de idade. Recebi a comunicação da morte de S. Exa, quase às 12 horas de hoje. O sepultamento ocorrerá às 16 horas.

Adotei providências para que o Tribunal seja representado nos atos fúnebres, prestando-se ao ilustre morto nossas homenagens. Nesse sentido, solicitei ao eminente colega, Sr. Ministro Moreira Rabello, que, a todos nós associe às últimas home­nagens ao saudoso magistrado, que tão grandes serviços prestou ao Tri­bunal Federal de Recursos e à Na­ção, transmitindo, pessoalmente, à família enlutada as manifestações de nosso pesar.

O Sr. Ministro Afrânio Antônio da Costa presidiu esta Corte, no período de 27-6-1947 a 30-6-1949. Foi durante essa primeira administração que efetivamente se instalou o Tribunal no Rio de Janeiro, havendo S. Exa. tratado da escolha da sede, que se fez definitiva, à Av. Presidente Wil­son, 231, ocorrendo a inauguração a 28-6-1948, em ato solene' que contou com a presença do então Presidente da República, o eminente General de Exército Eurico Gaspar Dutra. Tam­bém, nessa gestão inaugural, a Corte teve aprovada a sua organização in­terna, definindo-se a estrutura de seus serviços. Muito contribuíram, assim, indiscutivelmente, a energia, a lucidez e a segurança com que di­rigiu o Ministro Afrânio Antônio da Costa o Tribunal, nos seus momentos iniciais, para o prestígio de que, logo após, já passou, em realidade, este Colégio de Juízes a gozar, nos meios

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judiciários do país. Posteriormente, S. Exa. foi eleito para outro biênio que começou em 2-4-1959, findando em 3-6-1961. Coube-lhe, então, missao semelhante à que tivera no primeiro mandato. Nesse segundo período, deu-se a transferência do Tribunal Federal de Recursos, do Rio de Ja­neiro para a nova Capital da Repú­blica. Em Brasília, os serviços do Tribunal instalaram-se sob a segura e inteligente direção do saudoso Mi­nistro Afrãnio Antônio da Costa.

Os magníficos discursos que profe­riu,ao ensejo de sua posse na Presi­dência do Tribunal, a 27 de junho de 1947, e da instalação da Corte, em sua sede definitiva, no Rio de Janei­ro, a 28 de junho de 1948, esta na presença do Excelentíssimo Senhor Presidente da República, General de Exército Eurico Gaspar Dutra, bem positivam a estatura intelectual e moral, o descortino administrativo e a energia de empreendimentos do' primeiro presidente do Tribunal Fe­deral de Recursos. Ao encerrar esse segundO pronunciamento, asseverou:

«Quis um feliz desígnio da Provi­dência que no pórtico deste Tribu­nal se inscrevessem as palavras «Dieu et mon droit» - síntese da harmonia entre os homens, da se­rena confiança na justiça e naque­les que a distribuem. Não é apenas o lema de um povo que tem prodi­galizado a todas as naçôes os mais notáveis exemplos de perseveran­ça e resistência ao despotismo, mas, principalmente, um incentivo aos tímidos e aos fracos para que defendam seu Deus e seu direito.

Quem ama ao seu Deus e ao seu direito possui aquela fé que arras­ta irresistivelmente montanhas, que torna o sofrimento mais suave e a vida mais cheia de encanta­mentos; que contém os fortes; que dá força aos humildes na defesa de sua crença, de sua liberdade, de sua família, de seu lar; de todas

essas belezas imponderáveis que constituem a alegria de viver e que fazem da prudência e da mode.ra­ção a base do equilíbrio e da tran­qüilidade social.

Este será, por certo, Senhores, o ideal dos magistrados que inte­gram este Tribunal.» Ao término de seu primeiro man­

dato presidencial, dele afirmou o en­tão juiz convocado, Artur de Souza Marinho:

« ... durante perto de dois anos. tanto quanto este Tribunal tem de vida judicante, nosso Presidente, que ora se retira, foi o dínamo ge­rador de energias construtivas. E sobretudo no dia-a-dia de nossos trabalhos, como homem aparente­mente rígido e às vezes empederni­do, era a bondade que compreende e a amizade que perdoa, como um coração, às vezes comovido até às lágrimas, revela a exata personali­dade que se esconde na austerida­de. O dirigente de escol foi tam­bém o companheiro afetuoso com quem podíamos confidenciar.» Ao ensejo da sessão solene de ins­

talação do Tribunal, em Brasília. a 22 de abril de 1960, evidenciando a sensatez e a firmeza do administra­dor, o amor à causa da justiça, sina­lou:

«Não nos cabe apreciar a conve­niência da data da mudança: sim­plesmente observar o preceito le­gal que a fixou para 21 de abril.

O aesconforto, os incômodos, os transtornos materiais, são proble­mas de ordem individual que. fe­rindo cada qual, não podem ser es­tendidos a qualquer das unidades do Poder Judiciário.

Em relação a estas, há considerar-lhes o funcionamento perfeito, dentro da dignidade que lhes deve ser atribuída e esta sem­pre foi, é e será rigorosamente cui­dada pelos Membros desta Casa.

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Por benevolência dos meus colegas, pus em movimento este Colégio Ju­diciário em 1947. O açodamento de alguns e a impaciência de outros não me perturbaram, nem impedi­ram que os trabalhos fossem ini­ciados no momento próprio e exato para corresponder, com precisão, à sua finalidade julgadora.

Em 1960, essa mesma benignida­de confiou-me a transferência para Brasília. Não é tarefa de execução rápida e fácíl, mas há de ser venci­da em forma apropriada, sem sa­crifícios inúteis.»

Bacharel em Direito em 1912, por dezoito anos advogou no Rio de Ja­neiro. Vocação de magistrado, ele próprio o revela, ao explicar, em sua despedida do Tribunal, que, «apesar do êxito feliz que nela (advocacia) experimentei, os sedutores encantos da magistratura irresistivelmente me dominavam». Juiz de Direito, Juiz do Tribunal Regional Eleitoral do antigo Distrito Federal, Desem­bargador do Tribunal de Justiça do ex-Distrito Federal, Ministro desta Corte, havendo, por largos períodos como convocado, exercido o nobre ofício no Supremo Tribunal Federal, o Ministro Afrânio Antônio da Costa, em todos os momentos, foi um ma­gistrado de escol, íntegro, lúcido, culto e inteiramente dedicado aos deveres de juiz, consoante se de­preende de seus votos e dos anais desta Corte e do Alto Tribunal. Suas administrações foram marcadas pe­la dignidade, honradez e inexcedível espírito público.

Em 1962, em virtude da idade, atingido pela compulsória, S. Exa. deixou este Tribunal. Na oportunida­de, homenageandO-O, em nome dos seus pares, dele disse o saudoso Mi­nistro Cunha Vasconcellos: «O senti­do humano, a influência do coração eram e nunca deixaram de ser a marca constante de todos os seus atos, de todas as suas resoluções.»

Juiz culto, trabalhador, probo, S. Exa. deixou seu nome ligado ao Tri­bunal, de forma indelével, com o respeito e a saudade de todos os que o conheceram e acompanharam sua ação.

Após a aposentadoria, o sentido humano de sua vida projetou-se, de forma ainda mais assinalada, sendo certo que, desprezando as possibili­dades que teria de realizar ativida­des advocatícias e jurídicas, com o sucesso decorrente do brilho de sua inteligência e de sua imensa capaci­dade de trabalho, o Ministro Afrânio Costa dedicou-se a atividades benefi­centes, presidindo, por muitos anos, a Provedoria da Santa Casa de Mise­ricórdia do Rio de Janeiro e também se dedicando a outras atividades de assistência social, na antiga Capital da República.

Ao fazer, dessa maneira, o presen­te registro, perante o Tribunal, do infausto evento, anoto, com emoção d'alma, que hoje desaparece um in­signe juiz da Nação, que honrou so­bremaneira esta Casa. Nos fastos do Tribunal Federal de Recursos, o Mi­nistro Afrânio Antônio da Costa há de ser, permanentemente, figura bri­lhante e sua vida de magistrado um exemplo a seguir, pelas virtudes ex­celsas que exornaram seu espírito e pelo amor com que soube adminis­trar a Justiça e servir à causa da Pátria.

Esta a comunicação que, com pe­sar, me cumpre fazer ao Tribunal.

O Dr. Gildo Corrêa Ferraz (Subprocurador-Geral da RepÚbli­ca): Eminentes Ministros. o Ministé­rio Público se associa às homena­gens póstumas ora prestadas ao ilus­tre Ministro Afrânio Costa que du­rante muitos anos honrou com sua presença, este Egrégio Tribunal e o Colendo Supremo Tribunal, onde es­teve em substituição muitas vezes, demonstrando sua vasta cultura jurídica.

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Ainda no Rio de Janeiro e nos pri­meiros anos em Brasília, mantive convívio agradável com o ilustre Mi­nistro, homem de arraigada forma­ção humanitária.

A família enlutada pedimos a esta Egrégia Presidência transmita as condolências do Ministério Público.

O Sr. Dr. Alcino Guedes da Silva (Advogado): Sr. Presidente, Srs. Mi­nistros, estamos diante desse in­fausto passamento.

Como bem traduziu V. Exa., emi­nente Presidente, também os advo­gados de Brasília, e, porque não di­zer, do Estado do Rio de Janeiro, nesta hora, estão abalados com esse passamento.

S. Exa. o Sr. Ministro Afrânio Antônio da Costa, que deixou marcas indeléveis, não só neste Tribunal, mas por onde passou traduziu aquele espírito humanista, e, como bem dis­se o eminente Procurador da Repú­blica, todos o admiravam, era ho­mem cumpridor de suas obrigações, portador de dotes inigualáveis, espe­cialmente para o desempenho da Magistratura.

Em meu nome e em nome dos ad­vogados de Brasília, estamos sensi­bilizados por esse passamento e pedi­mos a V. Exa. que, nesta oportunida­de, faça chegar às mãos ou ao pen­samento dos familiares as nossas condolências.

O Sr. Ministro José Néri da Silveira (Presidente): As palavras proferidas acerca da personalidade do Sr. Ministro Afrânio Antônio da Costa constarão da ata e serão co­munciadas à família enlutada.

Senhores Ministros, embora ainda amanhã o Tribunal se reúna em Tur­mas para julgar, esta, antes do re­cesso, é a nossa última sessão plená­ria. Quero, pois, formular a todos os colegas votos de férias, no mês de julho, muito agradáveis, de plena re-

cuperação de tantos eSforços despen­didos, para que no segundo semestre possamos todos prosseguir no nosso trabalho fecundo.

Desejo, assim, felizes férias aos eminentes colegas e ao ilustre Dr. Subprocurador-Geral da República, ao lado de suas excelentíssimas famílias.

Está encerrada a sessão. Tribunal Federal de Recursos, 28

de junho de 1979 - Ministro José Né­ri da Silveira, Presidente - Bel. José Alves Paulino, Secretário do Tribunal Pleno

TRIBUNAL PLENO

Homenagem alusiva à aposentadoria do Sr. Min. Márcio Ribeiro ATA DA SESSAO SOLENE

REALIZADA EM 18 DE DEZEMBRO DE 1979

As dezesseis horas do dia dezoito de dezembro do ano de mil novecen­tos e setenta e nove, na Sala de Ses­sões do Tribunal Federal de Recur­sos, presentes os Exmos. Srs. Minis­tros José Néri da Silveira, Presiden­te, Armando Rollemberg, Márcio Ri­beiro, Moacir Catunda, Peçanha Martins, Jarbas Nobre, Aldir G. Passarinho, José Dantas, Lauro Lei­tão, Carlos Madeira, Gueiros Leite, Washington Bolívar, Torreão Braz, Carlos Mário Velloso, Justino Ribei­ro, Otto Rocha, Wilson Gonçalves, William Patterson e Adhemar Ray­mundo, presentes, ainda, o Exmo. Sr. Doutor Geraldo Andrade Fonte­les, Subprocurador-Geral da Repú­blica e o Bel.: Ronaldo Rios Albo, Se­cretário do Tribunal Pleno, foi aber­ta a Sessão, especialmente convoca­da em homenagem ao Exmo. Sr. Mi­nistro Márcio Ribeiro, em virtude de sua aposentadoria, por implemento de idade, a ocorrer no dia 25 de ja­neiro de 1980.

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Palavras de abertura proferidas pelo Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira - Presidente: O Exmo. Senhor Ministro José Néri da Silvei­ra (Presidente): Quando este fecun­do ano judiciário vai chegando a seu término, o Tribunal Federal de Re­cursos reúne-se, hoje, em sessão so­lene, para prestar homenagem justa, afetuosa e especial ao eminente Mi­nistro Márcio Ribeiro.

Após mais de meio século de servi­ços públicos reíevantes. Sua Exce­lência deixará de concelebrar conos­co, nesta Corte, cada dia, o sagrado ofício da administração da justiça, que exerce, com amor, dedicação exclusiva e inexcedível, ininterrupta­mente, há mais de quatro decênios.

Ao reiniciarmos os trabalhos judi­cantes, a 1? de fevereiro de 1980, a cátedra deste Tribunal, que o Minis­tro Márcio Ribeiro provê, desde 9 de junho de 1965, estará vaga, em virtu­de de sua aposentadoria, por imple­mento de idade, a acontecer no pró­ximo 25 de janeiro.

A fim de interpretar os sentimen­tos de profunda admiração e carinho que todos, neste Tribunal, devota­mos ao eminente Ministro Márcio Ribeiro, concedo a palavra ao ilustre Ministro José Fernandes Dantas.

Discurso proferido pelo Exmo. Sr. Ministro José Dantas.

Meus Senhores: A maior honraria devida aos jus­

tos é a da crença, sem reservas, nos seus juízos. Duvidar da sua justiça humilha e martiriza, como maldosa­mente se fez ao Crucificado!

Então, tratando-se de juízos emiti­dos por dever de ofício, o prêmiO es­tará em proclamar-se, alto e bom som, a confiança dos jurisdiciona­dos.

A boa fama, porém, requer tempo e experiência. No curso dos anos é que se vai lastreando, sem equívoco,

o prestigio do justo, investigada em cada gesto de sua vivência a razão maior da justiça praticada.

Donde dever-se, para compreensão da fama, repassar a trilha de sua fluência.

Na magistratura profissional, me­lhor conselho é lembrar como os grandes juízes se formaram nos per­calços dos pequenos meios; na al­deia, onde a sentença solve as con­tendas dos seus própriOS vizinhos; onde as partes são pessoas do seu próprio dia a dia; onde as causas en­volvem interesses imediatos do seu meio social, assim julgados os co­nhecidos e não os estranhos.

Testado desse modo, perante au­tor, réu, causa e interesse familiari­zados numa semidoméstica aferição de valores, tranqüilize-se o juiz da roça de que o seu progresso na car­reira não guardará surpresas, pOis a justiça mais difícil ali foi aprendida, no mais sofrido aprendizado humano - o de julgar, aí, sim, os verdadei­ros semelhantes!

Meus Senhores: Iniciando-se na Comarca de Tupa·

ciguara - topônimo mineiro que, nos idos de 1938, parecia anunciar por si mesmo a correspondente mo­déstia do meio -, certamente que, na passagem ascensional por Bon­fim, Uberlândia, e Ouro Preto, esta­va a se diplomar o Juiz de Belo Hori­zonte, de Varas Fazendárias, cuja importante jurisdição viria titular o Desembargador de 1953.

. Dali, ao recém criado Tribunal de Justiça da nova Capital Federal, o caminho já foi o da consolidada boa fama, tantas vezes testemunhada pe­los jurisdicionados, diversifícados na escala da ambiência social de cada um daqueles estágios de vivência.

Daí porque, já em 1965, o ingresso no Tribunal Federal de Recurssos se deu ao magistrado amadurecido no trato das causas mais relevantes,

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conforme experiência mais completa das técnicas de julgamento e a com­preensão mais responsável dos fins do Direito; em suma, deu-se ingresso ao magistrado, realizado na percep­ção mais aguda do alcance das leis.

Portanto, não foi por menos que, ao solenizar-se a posse, assim recitou as suas credenciais:

«Se a tecedura das leis cobrisse o campo dos fatos, prevendo todas as possíveis contingências futuras, ba~taria ao Juiz aplicar a norma cabível, sem medo ou sem favor. Mas isto não ocorre. Resta sempre grande margem ao arbítrio judi­cial, ao reconhecimento do direito, não pela legalidade estrita, mas pela aplicação dos grandes princípios que informam o pensa­mento jurídico, a superlegalidade, que fortalece e imanta a consciên­cia do julgador.

Esta a nossa mais elevada mis­são: a de interpretar as relações jurídicas, iluminando, alargando o pensamento da lei, de maneira a que possa corresponder à evolução social e às novas necessidades do bem comum.

Não se exagere, porém, o alcan­ce da jurisprudência, como atua li­zadora e vivificadora do direito.

O juiz não atinge nunca o nível do legislador.

Se não está satisfeito com a orientação traçada pela lei, não lhe compete torcê-la, mas sim esperar ou propugnar para que os repre­sentantes do povo a modifiquem.»

A partir dessa profissão de fé, o Tribunal Federal de Recursos havia de habituar-se à prédica de tão no­bres convicções, vendo-o praticá-las a molde de uma devoção, isenta do fanatismo acadêmico, pois nos deba­tes mais acirrados a que fosse tenta­do, o pregador não intervinha, senão que na exata medida da correção de

um equívoco, do reparo de uma alu­são, ou da retificação de um ponto de vista, da qual fosse convencido.

Nenhuma palavra a mais do que a necessária para a definição do direi­to em causa, ou para a obtenção do juízo sobre a relação jurídica exami­nada, deslindando-a, porém, em to­das as nuanças interessadas ao vere­aicto e a perfeita concreção da justi­ça suplica da.

Vejam-se-lhe os enunciados do pensamento, exsurgidos à face dos casos apresentados e no único fito de ajustar a sentença à dimensão hu­mana e social do fato considerado; descubra-se-lhe o inato talento de pinçar a proposição básica ao desen­volvimento do discurso sentencial, afastando-o do abstrato para aproximá-lo da materialidade mais palpável do direito a proclamar. Confiram-se-lhe os votos, mesmo ao acaso, porque à exemplificação da excelência do conteúdo se prestará qualquer dos milhares que aqui pro­feriu.

Embevecido se satisfará o pesqui­sador, ainda que cingido ao moderno processo das amostragens, método assim mesmo suficiente ao enfoque da sabedoria das «Sentenças de Már­cio» - a trescalar justiça pelas vir­tudes sugeridas, pela prudência da amoridade exercida, pela culta re­missão aos principios, pelo domínio da humanização dos textos; tudo is­so, na inspiração de uma doutrina sócio-juridica aplicada a seu modo de simplificar as coisas, e compreen­dida na asserção de que: no conflito das relações indíviduo-Estado, o con­trapeso mais fiel é a justiça da sen­tença.

Ver-se-ia que essa súmula não se contruíra de formulação meramente teórica; frutificara, sim, de uma pe­nosa objetividade, experimentada no manuseiQ de autos cujas folhas, na dor famélica dos carentes das pres-

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tações alimentícias ou dos sonegados salariais dos órgãos públicos, supli­cam amparo, como gritam, de ou­tras vezes, o protesto dos persegui­dos do poder, violados os seus direi­tos e liberdades por abusivas práti­cas da autoridade; autos que, enfim, rogam a mercê da solidariedade so­cial, narrando histórias infamantes da dignidade humana e pedindo res­peito a valores espirituais que nem sempre restam protegidos na fria le­tra da lei.

Somente o bom juiz, tal como Már­cio procedeu, há de indicar lenitivo a tantas angústias, prevenindo-se, po­rém, contra os embusteiros, indivi­dualistas misturados aos desvalidos para se dizerem vítimas, quando al­gozes verdadeiramente o são do inte­resse público - valor que a lei pro­tege a nível da mesma importância do bem comum.

Senhor Minístro Márcio Ribeiro: Em se honrando os justos pelo

confiar-se na emissão de seus juízos, foi para conferir-lhe a honraria que reservamos esta reunião da Corte.

No cometimento, é tal a alegria de proclamar a provada confiança na jurisdição do agraciado, que até re­movemos para depois a pena de imi­nente perda do seu convívio funcio­nal; pena que se exacerba pelas apreensões do momento em que se dá a jubilação etária de V. Exa., ao cabo de mais de meio século de ser­viço pÚblico e quarenta anos de ma­gistratura.

Deveras, pesam as preocupações do momento. De um lado. por ema­narem do evolver da massificação de tensões sociais acumuladas, e de anseios nacionais em ebulição. sob perspectivas agravadas até mesmo pelas conotações polí ticas de origem internacional. O indiscutível declínio do petróleo, causa primária desse sombrio quadro sócio-econômico, fa­talmente lançará reflexos nas barras

deste Trihunal, consoante a sua com­petência institucional para pacificar o envolvimento da Administração Pública Federal no torvelinho daque­las tensões conseqüentes.

De outro lado, o próprio Tribunal se apresta a recompor-se. pela reno­vação de um terço dos seus integran­tes. Natural, portanto, é o receio dos ajustamentos, conforme a dificulda­de maior ou menor da absorção de suas técnicas de julgamento, realça­das como ponto de referência das orientações mais cristalizadas, e co­mo fato que importa, sobremodo. ;:J.O

resguardo da sua gloriosa tradição. Em ambos os planos, pois.

prenuncia-se ainda mais sensível a ausência de V. Excia., primus inter pares na paciente elaboração de uma crônica jurisprudencial tonifi­cada de independência, integridade e coragem, e assim cultuada pelo Tri­bunal. sem jactâncias.

Em tais circunstâncias, Senhor Ministro, esta nossa homenagem. an­tes de marcar a despedida - do companheiro de afável trato. do ami­go de pródiga lealdade. do cidadão de inigualável conduta. predicados tão necessários à manutenção da proverbial harmonia da nossa convi­vência. - antes disso. na verdade, esta homenagem tem o cunho de uma revigoração de propósitos.

Endereçando-a ao juiz, o que que­rem os eminentes pares é reafirmarem-se como discípulos da grandiosa judicatura que V. Excia. exerceu nesta Casa; o que celebram é o ritual de fé no Direito e na Justi­ça, numa cerimõnia iluminada pelo exemplo de V. Excia .. como figura­ção da última ceia que o Nazareno presidiu. pactuando-se ali a eterniza­ção da sagrada mensagem que os Evangelhos haveriam de remeter para os séculos sem fim.

Noutro recurso ao simbolismo. a gosto da nossa carinhosa amizade.

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tenha certeza V. Excia. de que, no espaldar da cadeira que honrou e que em breve deixará vaga, havere­mos de ler, gravando-a na memória do Tribunal, a inscrição que o nosso respeito insculpiu, a legenda que a nossa admiração consagrou; havere· mos de ler o epíteto que o seu mere· cimento inspirou: Márcio, o Justo!

Discurso proferido pelo Exmo. Sr. Doutor Geraldo Andrade Fonteles, Subprocurador-Geral da República. Por imperativo constitucional, atin­ge V. Exa. o fim da sua carreira na magistratura. Por isso, encontramos-nos, nesta sessão sole­ne, para apresentar-lhe merecida ho­menagem, à qual, como represen­tante do Ministério Público Federal, nos associamos. e, particularmente, com repassada emoção, só por esta, - ditada pelo íntimo do sentimento. - me considero capacitado para, fa-lando, prestar acerca de sua perso­nalidade. o testemunho pessoal, fiel e enternecido que o seu modo de ser impôs à minha profunda admiração e respeito.

Gostaria de não ter tido dias tão atribulados, pelOS enormes encargos na Subprocuradoria-Geral da Repú­blica. neste fim de exercícío, para tecer, com melhor exaltação, os fios deste pano que desfraldo, qual lenço branco de despedida, no alvoroço de tantos pensamentos e recordações, onde se sobrelevam os traços carac­terístícos de sua humildade e Simpli­cidade que a todos encantam.

Quero imprimir a este discurso um tom peculiar, não como dirigido da nobre tribuna do foro, porém, figura­do, como se proferido de um púlpito, porque desejo realçar, mais as virtu­des do homem do que as qualidades cio jurista. embora no aferir dos dois valores a amálgama se dose em per­feita sintonia, na destinação do fim almejado. No caso, o instrumento de realização da judicatura, em busca do prImadO do Direito e da Justiça.

Com efeito, tal como dito alhures, por Chateaubriand, V. Exa. foi den­tre os grandes juízes dos Tribunais Superiores com os quais privei, qua­se o único a se parecer com as pró­prias obras.

O que sempre deu vida. força e re­tidão às suas decisões é a sincerida­de com que foram proferidas e que. sem dúvida, constituíram a razão impoluta do direito nelas declarado.

V. Exa. sempre pautou as diretri­zes dos seus julgamentos numa siste­mática jurídica. anuindo à essência da legalidade, e jamais se inclinando à substituição do arbítrio pela regra: do sofisma pelo título jurídico: da ar­gumentação empolada ou acadêmi­ca. pela realidade dos fatos subsumi­dos às normas; das falsas estórias e pretextos que se invocam. pela ver­dade dos propósitos:. das falsas ciên­cias que se exploram, pela realidade dos fins.

V. Exa. pode ostentar a austerida­de de Catão, sem, todavia, vestir-lhe as vestes da retórica ou da eloqüên­cia, porque dele mais se lhe adap­tam o manto da moralidade e da tra­dição. V. Exa. menos comunica, por­que sua ação mais irradia.

Quisera eu que, o quanto tenho dis­sertado sobre nomes ilustres com vi­vência nesta Casa, pudesse contri­buir para a sua história e então, qual Plutarco da intelectualidade grega, tornaria este registro, em índice de colaboração, à maneira de como se utilizava o polígrafo da Grécia, para ~xtrair ensinamentos do mais alto teor de moralidade, da judiciária, de que V. Exa. - pessoa ou Juiz -se fez varão impertérrito, a insculpir um perfil ímpar.

Em suas sentenças ou votos se en­contram gemas preciosas, não tão grandes que absorvam, no conjunto, o adereço capaz de atrair a cobiça elos ególatras, mas tão valiosas, tão impregnadas de equilíbrio na men­suração de seus fins, que comovem os

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puros e se alçam em flocos de luz, como a servir de auréola à sua ima­gem imorredoüra. Ela, se não perpe­tuada pelo cinzel,)lo bronze ou nos materiais imarcescíveis do reino mi­neral, há de ficar, pelo sinete nobre do sentimento, gravado, idelevel­mente, no coração de seus pares, contemporâneos, amigos e familia­res.

É que, todas essas peças de juris­dição se oferecem à análise dos pro­bos à maneira cristalina, polida ao . sopro do amor e do senso de justiça.

A compulsória lhe bate à porta, encontrando-o rijo e altivo. Higidez cunhada na temperança, de que ex­traiu todo o vigor pela missão cum· prida galhardÇl.mente. Altivez fórja­da na oficina do trabalho, onde se conjugam as várias atuaçÕeS de quantas participam do seu mister, re­cebendo de sua presença o trato ameno que conforta na procela, e bem assim a serenidade que dá se­gurança na tormenta.

Essas facetas de sua individuali­d.ade lhe dão aquela característica de timoneiro, que sabe governar com firmeza e descortíno a nau on­ae navegam os conflitos de todos os matizes.

Pilotando o veículo do direito, em busca da justiça, V. Exa., Sr. Minis­tro Márcio Ribeiro, sempre foi aquele trabalhador solitário como convém ao Juiz, já o disseram - recolhido na intimidade de sua consciência, para bem lastrear o caminho percor­rido, deixando uma esteira aberta e bem delimitada na jurisprudência de suas decisões, que servirão de mode­lo à orientação dos que desejam bem alcançar a meta do caminho traça­do.

Hoje, ecoam neste areópago da justiça, uníssonos, todos os cânticos de louvor que engalam a solenidade.

. No íntimo de todos os presentes, per­cute melodia sinfônica, cujos sons

marcam a recordação de sua vida exemplar entre estas paredes, estas bancadas de auditório, na Cruz da magistratura e, no. sufoco de suas imobilidades retêm, nesta despedi­da, a soturna indefinição dos inani­mados, da mesma forma por que, nós outros guardamos, com emoção compungida, a saudade emocional do vulto queridO e admirado que parte.

Deus abençõe a continuidade de suas virtudes.

Discurso proferido pelo Exmo. Sr . Doutor José Paulo Sepúlveda Per­tence, Vice-Presidente do Conselho' Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

Tendo discursado na última sole­nidade judiciária aqui realizada, talvez devesse entregar a outro cole­ga a missão de representar o Conse­lho Federal da Ordem dos Advoga­dos nas homenagens de despedida do eminente Mímstro Márcio Ribeiro. Escusem-me o Tribunal e os colegas se não o fiz. E mais, se não pude fazê-lo por razões de ordem marca­damente pessoal: uso hoje esta tribu­na, menos para trazer a justa sauda­ção dos advogados brasileiros ao grande jUiz que se retira, que para expressar a emoção do j á distante ginasiano belorizontino que fui e pa­ra quem - freqüentando-lhe a casa, pela amizade com os seus filhos - o Dr. Márcio constituiu a primeira e inesquec.Ível encarnação da imagem de um magistrado. Serenidade-imper­turbável a dar idéia de mansa tran­qüilidade de consciência; poucas pa­lavras, bastantes, porém, para transmitir bondade e tolerância; dig­nidade natural, avessa a todas as pompas estéreis do poder, tudo nele compunha com harmonia a figura humana adequada à.legenda, jamais desmentida, do juiz visceralmeme probo e mdependente, já entao re~­peitada sem dissidência, por um Forum, predominantemente udenis­ta, onde, a princípio - - contaram­me ~epois - se havia posto olhos de

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maledicência na ascensão do jovem magistrado, porque sobrinho do oni­potente governador do Estado Novo. Guardei comigo aquela primetra imagem revelada do adolescente, dE. um juiz exemplar e, . à distância, a venerei, como um dos estímulos ao estudante de Direito que me fiz, até o imprevisto reencontro na recém nascida Brasília.

Hoje, trinta anos se passaram. O advogado, já veterano, revive, com saudade comovida, o tempo corrido. E relembra, com tristeza, as muitas ilusões do adolescente de então que a caminhada desfez. Mas, em meio aos destroços de tanto~, mitos caídos, aflora uma emoção confortadora: é a de verificar que a experiência de ho­je nada tem a corrigir na intuição do menino que pressentiu estar conhe­cendo em Márcio Ribeiro, não ape­nas o que era, mas o que deveria ser um juiz.

Reli, nos últimos dias, dezenas de acórdãos seus. Colhi o testemunho de colegas assíduos às salas de sua judicatura. Recordei-o Desembarga­dor, Ministro e Presidente deste Tri­bunal, em sessões de rotina e em honras memoráveis. Sempre o mes­mo. A m~sma calma, ainda auando em melO à exaltação; a mesma SerIe· dade sem empáfia, de raro em raro dando lugar a traços de finíssima ironia, incapaz de ferir; a mesma clareza de raciocínio, em cada um dos seus votos modelares, não obs­tante a síntese e o despoj amento de mostras de erudição, imperativos de sua confessada timidez e de sua mo­déstia invencível. Tudo isso dando forma a uma judicatura marcada por. extrema coerência de métodos e de convicções sobre a função judio clal, à qual dá força invencível em sentido de independência natural, que é talvez o marco dominante da vida de juiz de Márcio Ribeiro: nele, a independência não é uma qualida­de, não é um compromisso declara-

do em arroubos retóricos, é a es­sência mesma. do seu modo de vi­ver a magu::~n:llura.

Sr. Ministro Márcio Ribeiro, em discurso de 1949, recordado quandO de sua posse na presidência deste Tribunal, refletindo sobre as dificul­dades do magistrado em meio às mutações de nossa época, acentuou Vossa Excelência:

«Nada existe de estável, e o Juiz, para não fracassar entre as sedu­ções das doutrinas da moda ou sob a pressão de tremendos interesses em jogo, só encontra refúgio nas velhas virtudes morais de indepen­dência, de serena energia e de im­parcialidade, esclarecido pela perspicácia de espírito e alertado pelo sentimento de solidariedade humana».

HOje, na sua despedida, honra-me ser o intérprete de todos os advoga­dos que, tendo postulado perante V. Exa., podem e querem dizer-lhe que a sua longa carreira judicial foi, to­da ela, um testemunho permanente dessas velhas virtudes morais e que a Nação, reverentemente, lhe agra­dece o exemplo deixado aos juízes do futuro.

Discurso proferido pelo Exmo. Sr. Doutor Galba Menegale, represen­tante da Ordem dos Advogados do Brasil.

A Ordem dos Advogados do Bra­sil saúda em Vossa Excelência, Senhor Ministro Márcio Ribeiro, os valores imperecíveis da honra, do saber e da simplicidade.

Consigna Montaigne, em seus En­saios, que as grandes virtudes não são perceptíveis senão quandO pon­teadas, infladas e cheias de ar­tifícios. As que se escondem sob a pureza e a modéstia, facilmente es­capam a uma vista grosseira como a do comum dos homens. «Sua beleza é delicada e oculta», assinala com sutileza o filósofo, para aduzir que

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somente a visão perspicaz e límpida pode captar-lhe a luminosidade se­creta.

Vindo de Minas, como Vossa Exce­lência, do «pedaço da terra em que o amor à liberdade e o culto da ordem fazem de cada homem um político e um jurista», armou-se, por certo, o Ministro Décio Miranda da ótica mais propícia a conhecê-lo melhor do que muitos.

Daí, haver asseverado a seu respei­to, que foram as qualidades morais e, particularmente, a mais rude inde­pendência, que fizeram o Magistra­do, depois que a investigação pacien­te e o estudo diário modelaram a consciência do jurista, tão cedo quanto lhe delinearam a devoção ao Direito.

Cedo, alías, lhe sugeriria o pai o estimulo à sua inclinação, como co­movidamente vinha Vossa Excelên­c.ia a invocar, ao ingressar nesta Corte: - «A lei deve ser para os po­vos - e certamente para os in­divíduos - uma espécie de divinda­de»

Não suspeitava o antigo tribuno mineiro, nos idos de 35, que a vivaci­dade do filho, ainda moço, se aguça­va na enumeração dos exemplos:

«Os romanos nunca revogaram a sua primeira lei, ou a lei das doze tá­buas. Os ingleses mantêm em vigor as leis do tempo de João Sem Terra, e a já secular Constituição da Fila­délfia vigora ainda neste momento, nos Estados Unidos».

Trinta anos depois, cabia a Vossa Excelência glosar o ensinamento pa­terno:

«O juiz não atinge nunca o nível do legislador. Se não o satisfaz a OrIen­tação traçada na lei, não lhe compe­te torcê-la, mas apenas esperar ou propugnar que os representantes do povo a modifiquem».

Ser vivo que é, suscetível de modificar-se, como qualquer orga-

nismo, e assim evoluir, a sociedade se depara a cada passo do seu desen­volvimento com uma necessidade nova e peculiar a atender. A trans­formação asfixia indivíduos e povos, as fórmulas de convivência e de so­brevivência parecem desaparecer.

Assinala Vossa Excelência, nessa constatação, que há os que não po­dem ou não sabem aceitar a própria condição existencial do homem. A esses, pondera Vossa Excelência, lhe ocorreria a resposta de George Sand a Flaubert:

- «Muitos espinhos há nas moi­tas, e isto não impede de ali alcan­çar as mãos e buscar as flores. Cer­to, se não levamos a coisa deste mo­do, não podemos levá-la de modo al­gum».

Para Vossa Excelência, o que en­seja aceitar a condição existencial é a perSistência cristã, que ativa a so­lidariedade, proporciona o amor e resulta na caridade.

No ato mesmo da sua posse nesta Casa, acresceria ainda a observação de que as freqüentes reformas legis­lativas não conseguem acompanhar o ritmo de uma época de intensa e inusitada renovação. O espírito atila­do e arguto do conhecedor do Direito compreende, porém, como corres­ponder à evolução social e às neces­sidades do bem comum:

- «Se a tecedura das leis - aduz Vossa Excelência - cobrisse o campo dos fatos, prevendO todas contingências futuras, bastaria ao juiz aplicar a norma cabível, sem medo ou favor. Mas isto não ocorre. Resta sempre grande margem ao arbítrio judicial, ao reconhecimento do direito e não pela legalidade es­crita, mas pela aplicação dos gran­des princípios que informam o pen­samento jurídico, que fortalece e imanta a consciência do julgador».

Sereno e austero, coube-lhe ques­tionar, numa das assentadas deste

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Tribunal, sob as sombras do regime que obscurecia o país, a validade da aplicação de uma pena restritiva da liberdade, imposta ao impulso de um processo sumário, do qual se extir­para o direito de defesa plena, tal como pobre e retrogradamente se reconheceu facultar a uma das leis de emergência.

Razões de Estado foram invocadas para decretar-se o domicílio deter­minado de pUjante Jornalista, com base no art. 16, inciso IV, do Ato Ins­titucional n? 2. O Delito era tipica­mente de opinião, numa pUblicação datada de 19 de julho de 1967, consi­derada ofensiva ou inconveQ..iente ao regime militar vigorante.

Com firmeza, lucidez e destemor, recusou-se Vossa Excelência a con­validar a medida punitiva que a isso equivalia e que lhe pareceu calcada em norma revolucionária não mais incidente, a partir da vigência da Constituição de 1967.

«E basta que pena tão grave tenha sido imposta em conseqüência de processo sumário, sem plena garan­tia de defesa, para que se considere tal medida nula, por manifesta in­compatibilidade com os §§ 15 e 16 do art. 150 da nova Constituição, decre­tada e promulgada a 24 de janeiro último. E, na atual emergência -sentenciava, ainda, Vossa Excelên­cia - ofende claramente o art. 154, § 2?, do mesmo diploma, onde a pena ficava dependendo da declaração do estado de sítio».

De Vossa Excelência, em outra oportunidade, se conheceu também manifestação contrária à censura prévia que este Tribunal pusera a pique, mas que a tempo um decreto, sem pUblicação regular, alçou à to­na, para infestar por mais tempo as águas turvas daquele período trevo­so da História.

Mais recentemente, o discernimen­to e a isenção de Vossa Excelência

continham os desmandos da censura vesga que negara autorização para a encenação de uma peça teatral, a pretexto de que se punha em risco a Segurança Nacional. E não se con­tentando com a simples referência e críticas dos censores ao texto de­cidiu-se a lê-lo por inteiro. De pron­to firmou a convicção divergente dos juristas oficiais e restituiu ao grupo teatral postulante o direito de ence­nar «O rei morreu, viva o rei», asse­gurando nada ter visto na obra de César Vieira contrário ao interesse naciorral, ao prestígio das Forças Ar­madas, ou capaz de alimentar pre­conceito racial, como pressurosa­mente afirmara a Censura.

Deploram os advogados brasileiros que a contingência constitucional o prive da Toga, no instante em que se cede espaço para a cristalização dos anseios da Nação, e particularmente da sua perseverante e altiva entida­de de classe, em favor da volta ao Estado democrático. Fora da Demo­cracia - já se fez jargão dos juris­tas -não há salvação.

Para alcançá-la, plena e incontro­versa, recomendam os advogados a convocação de uma Assembléia Na­cional Constituinte. A Constituição de 67, posto que sucessivamente emendada ao sabor da sorte revolu­cionária, recebeu, já, o estigma im­placável do mais sábio dos nossos jU­ristas. Nela viu Pontes de Miranda mais subversividade do que revolu­cionariedade.

«O que importa - disse ele -, pa­ra o futuro merecido do Brasil, é que os governantes tenham os olhos fixos nos direitos do homem, nos interes­ses nacionais, no que se precisa de ciência e de técnica. Para isso, o essencial é que se corrija a falsifica­ção de valores, que se implantou desde 1930, se agravou em 1937 e chegou ao auge em 1964/1969».

Tal como estamos, é ainda atual o libelo que Sampaio Dória escreveu

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em 1924: «A Nação é soberana, mas não decide. O povo é livre, mas vive debaixo de governos que não esco­lhe».

Quando se restaurar a plenitude do Estado democrático, talvez se faça, efetivamente, a reforma do Poder Judiciário, aquela de que seriamente tratou no adendo à proposição go­vernamental encaminhada ao Con­gresso em 1977, este Egrégio Tribu­nal Federal de Recursos, afinal lo­grada pela obstinação de um uni co homem.

Senhor Ministro Márcio Ribeiro.

O tempo, relicário das múltiplas emoções que se sucedem no espírito dos homens, é, no dizer dos poetas e dos filósofos do Romantismo, a osci­lação contínua entre a esperança e a saudade. Expressões díspares da sensibilidade humana, que se opõem entre si e se repelem, antagô­nicas por natureza, na essência e na forma, não podem, por isto, subsistir a um só tempo e sob a mesma inspi­ração.

Nesta hora em que o Tribunal Fe­deral de Recursos recebe de volta, das suas mãos probas, a Toga que o seu espírito engalanou, os advogados do Brasil querem, tão-somente, trazer o testemunho de que Vossa Excelên­cia jamais faltou à Justiça, com a sua honra, com o seu saber e com a sua simpliCidade.

Discurso proferido pela Dra. The­reza Helena Miranda Lima, repre­sentante dos Funcionários do Tribunal. Trago, aqui, neste momen­to, uma palavra singela, mas plena de amizade, respeito e grati­dão: a palavra dos que, nesta Egré­gia Corte, serviram com Márcio Ri­beiro. Permito-me dizer, apenas Márcio Ribeiro, porque os grandes homens não carecem de títulos: apresentam-se por si mesmos.

Sobre os méritos profissionais do homenageado, bem como sobre a fi­gura do Juiz excepcional, vocaciona­do, reconhecida e aplaudida em todo o Brasil, já disseram os ilustres ora­dores ouvidos neste Plenário.

Desejo, portanto, em nome de meus colegas e em nome da equipe que teve a honra, o privilégio de assessorá-lo por dez anos, dizer da figura humana do nosso Ministro Márcio, chefe, apoio, exemplo, e às vezes, porque não dizê-lo, quase pai, nos momentos difíceis.

Os exemplos diuturnos, de honra­dez, de dignidade, de firmeza, de amor à coisa pública, de simplicida­de, que recebemos do Ministro Már­cio Ribeiro, não deixarão nossas me­mórias; seguirão conosco, a nos guiar, vida afora.

A modéstia desse Chefe excepcio­nal, modéstia digna que só os ho­mens de prol podem ostentar, sua boncade espontânea com os humil­des, seu amor ao próximo, seu pro­fundo senso de justiça, seu equilíbrio, marcaram nossa juventu­de eomo, estou certa, marcaram to­dos quantos neste Tribunal com ele serviram.

Márcio Ribeiro nos ensinou, ao longo desses anos, que a fortaleza de ânimo e de opinião. podem conviver com a doçura e a compreensão: que a dignidade dos cargos pode e deve conviver com a simplicidade de seu ocupante. Principalmente, mostrou­nos que são os homens que engran­decem as posições a eles confiadas: ele emprestou, com suas qualidades pessoais, grandeza ao cargo de cujo exercício hoje de despede, para tris­teza de todos nós.

Foi uma lição de imensurável va­lor. Ministro Márcio, e não será es­quecida.

Não me alongarei: a emoção, real­mente, não me permitiria. Mas, an­tes de concluir, devo dizer que esta

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laIa não estaria completa sem lem­brarmos~ aqui, a mulher admirável, a esposa amada de Márcio Ribeiro: Dona Diva Paraíso Ribeiro, a sua companheira de quarenta e três anos percorridos em amor cristão, qua­renta e três anos de apoio, de cari­nho, nos quais construíram uma só­lida e invejável família.

Nosso profundo respeito a ambos, respeito mesclado de amizade e gra­tidão imensas.

Ao Chefe admiráveL ao homem exemplar, ao admirável Juiz, nosso comovido muito obrigado.

Discurso proferido pelo Exmo. Sr. Ministro Márcio Ribeiro. Sr. Presi­dente, Srs. Ministros: ilustres autori­dades componentes da Mesa, minhas senhoras e meus senhores:

E quase com surpresa que chego ao limite de idade, ao termo de mi­nha vida como Juiz.

No gosto pela profissão, identificar-me-ia ainda com aquele que, há mais de 40 anos, desde 1937, exerceu a judicatura estadual, em comarcas do interior mineiro. Tupaciguara, Bonfim, Uberlãndia, Ouro Preto e, por uma decada, na Capital do Estado. Por pouco tempo, havia sido, antes, Promotor de Justi­ça de Três Corações (933) e Olivei­ra e Procurador da 6~ Região (Minas e GOiás), do antigo IAPC. Em 1953 vi-me investido comu Desembarga­dor do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, onde estive perto de 8 anos, passando, em 1960, com a criação de Brasília, ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal. A 9 de julho de 1965, já lá vão 14 anos, tive a honra de ser nomeado para este Tribunal, no governo do saudoso Presidente Humberto de Alencar Castelo Bran­co, a cuja memória, rendo, neste momento, minha reverente homena­gem.

Neste Tribunal. de que passei a participar, como disse, há 14 anos,

completou-se o período mais agradá­vel de minha profissão, pelo ambien­te de gentileza e afinidades espiri­tuais entre seus componentes, os an­tigos e os modernos. todos sob a mesma aura de entendimento e com­preensão a fim de levar avante a pe­sadíssima tarefa que ainda vos in­cumbe. O ambiente -desta casa, o convívio entre colegas irmanados em torno do mesmo ideal ameniza a solidão que é própria da profissão de Juiz, obrigado ao recolhimento da in­timidade de sua consciência.

Foi um privilégio, no final de mi­nha carreira, já enfraquecida a ca­pacidade de trabalho e de discerni­mento, fazer parte de um colegiado de importãncia e valor inconstestá­veis. no cenário jurídico do País, sem dúvida «um dos órgãos mais prestigiosos e acatados do Poder Ju­diciário brasileiro».

Por mim, dentro de minhas limita­ções, que são muitas, procurei não desmerecer da honrosa companhia de Juízes paradigmas de honradez, competência e dedicação ao traba­lho.

Relembro, neste ensejo, o nom(c daqueles que conheci, com os quaiS convivi e que já desapareceram do número dos vivos: os saudosos Mi­nistros Sampaio Costa, Cunha Vas­concelos, Oscar Saraiva, Afrãnio Costa e Amarílio Benjamin.

A Justiça, já tive ocasião de dizer, é, sobretudo, um ideal, uma meta, exigindo esforço diuturno para sua realização que depende de minuden­te eSforço, de cultura e intuição: a capacidade de sentir e viver um a um os dramas sujeitos à aprecia­ção de cada julgador.

Carlos Maximiliano, citando Jelli­nek e Gnür, consegue realçar as du­ras lutas do Juiz como aplicador do Direito. fazendo este confronto:

«Comparável seria o magistrado ao violinista de talento que procu-

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ra compreender bem a partitura, imprime á execução cunho pes­soal, em brilho particular, decor­rente da própria virtuosidade; po­rém não se afasta dos sinais im­pressos; intepreta-os com inteligên­cia e invejável maestria; não in­venta coisa alguma». Entretanto, acrescenta aquele

grande autor, em sua conhecida Her­menêutica:

«Ninguém ousará dizer que a música escrita, ou o drama im­presso, dispensem o talento e o preparo do intérprete. Este não se afasta da letra, porém dá ao seu trabalho cunho pessoal, e faz res­saltarem belezas imprevistas. As­sim o Juiz: introduz pequenas e oportunas gradações, matizes vá­rios no texto expresso, e, sob a aparp.ncia de o observar á risca, em verdade o melhora, adapta às circunstâncias do fato concreto, aproxima do ideal do verdadeiro Direito. Deste modo ele desempe­nha, á maravilha, o seu papel de intermediário inteligente entre a lei e a vida».

Essa a verdadeira e difícil missão do Juiz.

No plano político, por um impera­tivo de isenção judicante o Poder Ju­diciário deve ser colocado em nível superior, é algo de exterior ao pró­prio Estado, na expressão de Burke, lembrada pelo saudoso Ministro Os­car Saraiva. ao inaugurar este edifício.

Interessa ao Judiciário sobremodo a preservação do estado de Direito.

Nesta época de conturbação social quisera pOder ter o otimismo d~ Aquilino Ribeiro, neste desabafo de sua agitada vida:

«Vi a liberdade afogada, aqui e além, ás mãos de Galiban, mas tamoem vi essa planta, que tem

um poder incoercivel de vivifica­Cão como a Fénix, reverdecer aqui e além.

Ouvi o «Sputinik», como todos vós, cantar no céu a glória do ho­mem conquistando o espaço sidé­reo e, com mais essa conquista do homem, as idéias de igualdade hu­mana ganharem tanta altura, que não há machado que as derrube».

Nem a proeza do Apolo II, a con-quista de um mundo morto fora de nossa biosfera, nenhum aperfeiçoa­mento técnico desse tipo, poderia le­var o mundo á compreensão dos três caminhos necessários á felicidade do homem: Democracia, Liberdade, Igualdade.

Além do aperfeiçoamento das al­mas, o caminho está em fazer a ex­plicitação dos princípios, transformando-os em instituições jurídicas que possam ser observa­das por todos.

Srs. Ministros, na perspectiva de aumento deste Tribunal, solução que. a meu ver, não bastará á ava­lanche de seus trabalhos, possam es­tes dipor sempre da mesma ambiên­cia ,a ~im de que v. Exas. prossigam, de ammo desperto, na imensa tarefa jamais concluída pelos indíviduos ou pelas gerações, a Justiça que é, me­nos realidade do que sentimento, eterna procura dos homens.

. O meu agradecimento sem limite, as palavras do Ministro José Fer­n~ndes Dantas que se revelou admi­ravel vocação de magistrado, conti­nuando neste Tribunal a justa fama - de sua cultura jurídica, capacida­de de trabalho e equilíbrio - con­qUistada em brilhante carreira, no­tadamente no Ministério Público do Distrito Federal e da União; ao Subprocurador-Geral, Dr. Geraldo Andrade Fonteles, um dos mais des­tacados elementos do Ministério Pú­blico da União, sempre cônscio de

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seus deveres, aliando à alta compe­tência a plena consciência de suas responsabilidades.

À classe dos advogados sempre de­votei o apreço e a simpatia que me­rece essa nossa inestimável colabo­radora. São os advogados as «ante­nas da Justiça», como já os ouvi chamar, quando da saudação a um grande Juiz, o Dr. Newton Luz e nunca me esqueci dessa classifica­ção que exprime, vivamente, como a classe é indispensável à pesquisa da verdade jurídica.

Ela se acha aqui excelentemente representada pelo Dr. Galba Mene­gale, cuja perfeição na defesa das causas que lhe são afetas, configura modelo do bom profissional, perfei­tamente identificado com a nobilida­de e difícil profissão.

A minha profunda gratidão tam­bém a V. Exa., Sr. Presidente, e a to­aos os meus eminentes e estimados colegas.

Agradeço, ainda, a presença, nesta solenidade de despedida, dos Juízes Federais, Desembargadores, Juízes, Subprocuradores e Procuradores da República, membros do Ministério Público, advogados e a todos os ami­gos que muito me honraram nesta hora, e especialmente aos funcioná­rios da Casa, incluídos os do Conse­lho,dos mais graduados aos mais modestos. De mim, repito, ao termo da jornada, nada encontro que justifi­que tanta bondade.

Mas as agradáveis palavras ouvi­das tornarão mais suave a minha saudade deste recinto, ao qual espe­ro retornar freqüentemente como amigo de todos.

tas e formosas palavras se proferi­ram sobre a personalidade de um juiz insigne da Nação, membro de seis Tribunais, a dois havendo presi­dido, Corregedor-Geral da Justiça Eleitoral e da Justiça Federal, não posso deixar de asseverar, com emo­ção - testemunha que fui durante dez anos das atividades judicantes do Ministro Márcio Ribeiro nesta Ca­sa, que ele realizou o pensamento do Grande Ruy, ao proclamar: «só há uma glória verdadeiramente digna deste nome: é a de ser bom». O emi­nente Ministro Márcio Ribeiro que é portador de todas as excelsas virtu­des do magistrado e as pratica inex­cedivelmente· com a lucidez de sua inteligência, com a integridade de caráter e independência no desempe­nho do difícil múnus de julgar, sou­be, verdadeiramente, ser justo e bom, e, na aplicação da lei, compro­var o que Carnelutti escreveu: «o Di­reito é uma das formas que toma o amor para obrar entre os homens», ou o que disse Santo Ambrósio: «não há justiça sem misericórdia».

Estou seguro, assim, nos anos do futuro; de que a Divina Providência lhe há de reservar, longos e também 'muito fecundos, no seío de sua dileta família, na companhia de sua adorá­vel esposa, dona Diva Paraíso Ribei­ro, de seus filhos e netos, o Ministro Márcio Ribeiro poderá prosseguir, com o coração pleno de felicidade, contemplando a beleza eterna da Justiça e do Amor, na certeza da in­defectível promessa. que está no li­vro dos Provérbios (20, 21):

«O que exerce a justiça e mise­ricordia encontrará a vida e a gló­ria».

Palavras de encerramento proferi- Cumpre-me, ainda, informar ao das pelo Exmo. Sr, Ministro José '. Tribunal que, por motivo de força Néri da Silveira - Presidente. O Ex- maior, não foi possível realizar-se mo. Sr. Ministro José Néri da nesta solenidade a complementação Silveira (Presidente): Ao encerrar da honrosa homenagem que a Nação esta sessão especial em que tão jus- tributou ao ilustre Ministro Márcio

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Ribeiro, por ato de Sua Excelência o Senhor Presidente da República, ao conferir-lhe, em Decreto de 11 do mês em curso, a Medalha-Prêmio, em virtude de haver inteirado cin­qüenta anos de relevantes serviços públicos. A entrega da merecida insígnia será feita pelo Tribunal, em ato solene, após o recesso e logo se ultime na Casa da Moeda a cunha­gem da medalha de ouro que lhe conferiu o eminente Chefe do Poder Executivo.

Agradeço a presença das ilustres autoridades, familiares e amigos que vieram a este Tribunal se associar ao preito de admiração e reconheci­mento da Corte ao provecto Ministro Márcio Ribeiro.

Declarando encerrada a sessão, convido a todos os presentes para o coquetel de confraternização, pelo término do ano judiciário, dos mem­bros do Tribunal, dos funcionários e suas famílias, o que, tudo, neste dia, se faz em torno do ilustre e caríssi­mo Ministro Márcio Ribeiro.

Compareceram à solenidade as se­guintes autoridades: Exmo. Sr. De­putado Wilson Braga, I? Secretário da Mesa da Câmara dos Deputados e representante de S. Exa. o Sr. De­putado Flávio Marcílio, Presidente daquela Casa do Congresso Nacio­nal: o Exmo. Sr.Ministro Geraldo Starling Soares, Presidente do Tribu­nal Superior do Trabalho; o Exmo. Sr. Ministro Jacy Guimarâes Pinhei­ro, representante do Exmo. Sr. Mi­nistro-Presidente do Superior Tribu­nal Militar: o Exmo. Sr. Dr. Firmino Ferreira Paz, Procurador-Geral da República; o Exmo. Sr. Dr. Clóvis Ramalhete Maia, Consultor-Geral da República; o Exmo. Sr. Desembarga­dor Agostinho de Oliveira Júnior, representante do Exmo. Sr. Presi­dente do Tribunal de Justiça de Mi­nas Gerais; o Exmo. Sr. Dr. Orlando ROdrigues Sette, representante do Ex­mo. Sr. Presidente do Tribunal Regi-

onal do Trabalho da 3~ Região o Exmo. Sr. Dr. Cid Herácito Queiroz, Procurador-Geral da Fazenda NélCio­nal e representante de S. Exa. o Sr. Ministro da Fazenda: o Exmo. Sr. Dr. Maurício Correia, Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Distrito Federal: Ministros aposentados Henoch Reis, Esdras Gueiros, Cunha Mello e Oscar Cor­rea Pina, do Tribunal Federal de Re­cursos: Juízes, Advogados, membros do Ministério Público; membros da família do Sr. Ministro Márcio Ribei­ro e funcionários do Tribunal.

Encerrou-se a sessao às 17h45min.

Tribunal Federal de Recursos, 18 de dezembro de 1979 - Ministro José Néri da Silveira, Presidente Ronaldo Rios Albo, Secretário.

PLENARIO

ATA DA 7~ SESSAO ORDINARIA HOMENAGEM PÚSTUMA AO

EXMO. SR. MINISTRO HERMILLO GALLANT, EM 19 DE MARÇO

DE 1981

Aos dezenove dias do mês de mar­ço de mil novecentos e oitenta e um, às treze horas e trinta minutos, na Sala de Sessões do Tribunal Federal de Recursos, presentes os Exmos. Srs. Ministro José Néri da Silveira, Presidente do Tribunal, Armando Rollemberg, Moacir Catunda, Peça­nha Martins, Jarbas Nobre, Aldir G. Passarinho, José Dantas, Lauro Lei­tão, Carlos Madeira, Gueiros Leite, Washington Bolívar, Torreão Braz, Carlos Mário Velloso, Justino Eibei­ro, Otto Rocha, Wilson Gonçalves, William Patterson, Adhemar Ray­mundo, Romildo Bueno de Souza, Pereira de Paiva, Sebastiâo Reis, Miguel Jerônymo Ferrante, José Cândido, Pedro ACioli, Américo Luz e Antônio de Pádua Ribeiro, presen­tes ainda, o Exmo. Sr. Geraldo An-

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drade Fonteles, Subprocurador­Geral da República e o Bacharel Jo­sé Alves Paulino, Secretário do Ple­nário, após a composição da Mesa pelo Exmo. Sr. Ministro Henrique La Roque, representante do Exmo. Sr. Ministro-Presidente do Tribunal de Contas da União e do Sr. Ministro (;arlos Alberto Barata Silva, Vice­Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, foi aberta a Sessão convo­cada em homenagem á memória do Exmo. Sr. Ministro Hermillo Galant, recentemente falecido.

A seguir, o Exmo. Sr. Ministro­Presidente assim se pronunciou:

«Srs. Ministros, Sr. Subprocurador­Geral da República, Srs. Ministros aposentados deste Tribunal, Srs. Juízes Federais do Rio Grande do Sul e do Distrito Federal, Sr. Subprocurador-Geral da República, também presente, Srs. Advogados, Exma. Sra. D. Danieta Hosmann Galant, Exma. Sra. D. Nara Galant Mazzi, lImo. Sr. Dr. João Carlos Ga­lant e Exma. esposa, Exmo. Sr. Hei­tor Galant. minhas senhoras, meus senhores, Srs. funcionários:

E com profunda emoção que de­claro aberta esta sessão plenària, cuja primeira parte se desti­na á homenagem que, reveren­tes diante do mistério da morte, os membros e funcionários deste Tribu­nal queremos render ao pranteado Ministro Hermillo Galant.

Na tarde de 16 de fevereiro, a ines­perada notícia de seu passamento comoveu e consternou esta Casa de Justiça e, desde aí, o recordamos com carinho e saudade, na sua figu­ra digna e austera, de transparente integridade que irradiava a amável confiança, própria dos bons.

Reminiscências afloram-me ao espírito, neste instante, e emocionam-me. Conheci o Ministro Hermillo Gôlant p.m 1967, quando ambos, juntamente com o ilustre

Juiz Federal Dr. João César Leitão Krieger, tivemos o duro encargo de instalar a Justiça Federal, em nosso Rio Grande do Sul. Desde então, os constantes gestos de grandeza huma­na, de vocação permanente para servir com amor, de franqueza e sincerida­de, tão do feitio do gaúcho da Fron­teira, de sábios e prudentes conse­lhos, fizeram nascer e frutificar, em meu coração, sentimentos de profun­da admiração e respeito ao colega e amigo, Ministro Hermillo Galant. Quis a bondade de Deus que a mim coubesse, depois, a ventura de presi­dir á solenidade de sua merecida posse, em 23 de junho de 1980, em uma das cátedras desta Corte e re­ceber, assim, a renovação de sua promessa de fidelidade á Justiça. que cumpriu, pontualmente, cada dia, até a derradeira hora, não obs­tante o secreto sofrimento e o ingente sacrifício, que só os verdadeiramen­te fortes podem suportar.

Para falar em nome do TribunaL concedo a palavra ao ilustre Minis­tro Américo Luz».

O Exmo. Sr. Ministro Américo Luz: Hermillo Galant foi. dos juízes nomeados á primeira hora, para a Justiça Federal restaurada no final do Governo Castello Branco, sem dú­vida, uma feliz escolha.

Conheci-o nas plagas do Rio Gran­de, em férias que lá passei em julho de 1969. Ofereceram-me um churras­co, em Santa Tereza, nosso atual Presidente, Ministro José Néri da Silveira, José Sperb Sanseverino. João César Leitão Krieger e Her­vandyl Fagundes. Todos predestina­dos a representarem na República a história do Sul, na Magistratura na­cional.

Hermillo Galant impressionou-me, sobremaneira, naquela noite. E que ele, em tempo frio, no alto da ladei­ra, vestia sobretudo, cachecol e boi­na. Robusto, alegre, autêntico no seu

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gauchismo inconfundível, desborda­va na figura o amor pela vida. tão saudável era, então.

O destino marca a vida das criatu­ras.

Como sabemos, bem mais tarde Galant adoeceu. Suas energias co­meçaram a esvaecer. Acometou-Ihe a terrível enfermidade de definha­mento orgânico progressivo, talvez não diagnosticável, ainda, pela Me­dicina.

Lutou por sobreviver e trabalhou denodadamente na Seção Judiciária de sua terra e neste Tribunal, en­quanto suas combalidas forças lhe permitiram.

Imagem e semelhança de Deus, o homem é a tríade Inteligência, Espírito e Matéria.

Seja qual for a religião que profes­semos, creio estarmos de acordo nessa premissa fundamental.

E crendo-a, afirmo que Galant permanece, embora em diversa di­mensão, vivo, como estão nossos queridos antepassados.

Certo de que a morte do corpo não é o fim das criaturas, nem a destrui­ção de quanto construímos numa vi­da, a decomposição da nossa atual matéria constitui-se em abertura pa­ra nova expressão, mais vital, e pa­ra uma eterna e mais efetiva atua­ção no Plano Divino do Universo. Tal convicção não é somente fru­to de religiosidade, mas da própria experiência científico-filosófica. Ou­so dizer jurídica, como percebeu o imortal Carnelutti:

«Nós não podemos pensar o infi­nito, mas podemos pensar que a realidade ultrapassa os limites do nosso pensamento, sendo certo que ultrapassar ela tais limites é a mais certa entre as verdades. Don­de que, se nos falta, em verdade, a compreensão do infinito, com­preendemos no entanto a insufi-

ciência do finito para compre~p.der a realidade. Tal é a insolubilidade do problema, e, por isso mesmo, o drama do conhecimento: a realida­de, para ser realidade, deve ser, ou pelo menos poder ser, pensada: mas, por outro lado, no próprio ato em que a pensamos, nós pensamos que a não podemos pensar. De for­ma que, aquilo que podemos pen­sar é finito, mas sabemos que o que deveríamos pensar é infinito» (In "Teoria Geral do Direito). Sem pretender abalar a discrição,

a humildade e a autoridade do nosso Presidente José Néri da Silveira, pe­ço licença para dizer de S. Exa., com franqueza, haver sido oriunda de sua aguçada visão e conhecido espírito de fraternidade a idéia feliz de trazer Hermillo Galant para ocu­par o alto cargo de Ministro do Egrégio Tribunal Federal de Recur­sos. Ligado a ele, por estreitíssimos laços de coleguismo e amizade, a atilada intuição do nosso atual diri­gente pretendeu, promovendo o ami­go, dignificar a nossa Corte, nela in­tegrandO um valoroso Magistrado. Fez justiça, protegendo-o, sem, entanto, afetar com a sua atitude a posição dos demais pleiteantes. Colhi em Gabinetes Ministeriais, à época, a notícia de que Galant seria nomea­do e, foi-me dito, por altas fontes go­vernamentais, que o Excelentíssimo Senhor Presidente da República es­tava imbuído do justo propósito de atender, dentro das perspectivas que a lista lhe dava, ao critério de inves­tir candidatos de variados Estados do País.

Confesso que fiquei exultante com a escolha de Hermillo Galant.

A minha felicidade rememora -e se projeta à nossa convivência desde o primeiro encontro no alto de Santa Tereza, na gloriosa Capital Gaúcha, às visitas que ele me fez na Seção Judiciária do Rio de Janeiro, até o momento emocionante da nossa posse

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neste Pretório. Foi honroso partilhar com S. Exa. das sessões do Tribunal Pleno, ouvir seus votos, simples mas firmes e ornados da sabedoria dos que exercem, por vocação, a difícil missão de julgar. Os verdadeiros juízes, a par da cultura, honestidade e visão dos fatos juridicos, sofrem, por vezes silentes, os dramas e as {:>erplexidades que antecedem ao seu pronunciamento definitivo. Noi­tes em claro, contrastes idênticos, emoções violentas, a custo controla­das, e pOdem chegar até mesmo às lágrimas fecundas em seus soliló­quios.

Hermillo Galant foi um excelente Juiz e um portentoso ser humano. Em seu curriculum vitae retrata-se a grandeza de uma vida eminente­mente profícua, vitoriosa / sob todos os aspectos, conforme fez ressair .de seu magistral discurso de pesar pelo falecimento do nosso homenageado, o insigne Ministro-Presidente José Néri da Silveira (Sessão de 19 de fe­vereiro último).

«Varão que encarnava o autênti­co espirito do homem do Rio Gran­de do Sul, franco e sincero, de co­ração transparente, o pranteado Ministro Hemillo GaIant foi políti­co: militante no Partido Liberta­dor, aovogadó na Capital e no inte­rior do Rio Grande do Sul, Diretor­Geral da Corte de Apelação da Justiça Militar do Estado, Juiz Fe­deral e, por fim, Ministro desta Corte. Em todos os momentos de sua vida pública, soube manter fi­delidade às mais excelsas virtudes do homem públiCO dos pampas. Co­mo juiz, tinha a alma aberta e sensível às aflições dos pobres que, tão numerosos, pedem o amparo da Justiça Federal. Integro e indepen­dente, lúcido, austero e seguro em suas decisões, o Ministro Hermillo Galant sabia também impor, com moderação, aos corruptos e arbi­trários a merecida sançao que a lei contempla. Perde a Nação um

JUIZ que soube exercer o dignifi­cante ofício, com inteligência e co­ração, com amor à Pátria e límpi­da visão de seus Objetivos perma­nentes. Pranteamos nós a morte de um colega que foi, além de um exemplar chefe de família, de um amigo muito agradável, um ho­mem bom e justo.

Por sua vida, estou certo de que o Senhor já o recebeu na mansão dos eleitos, entregando-lhe a palma da glória que Ele reserva aos retos de coração, aos misericordiosos e aos justOS}).

Naquela mesma Sessão, falou o nosso insigne colega, Ministro Mi­guel Jerônymo Ferrante, deixando transbordar do íntimo de seu co­ração afetuoso, de poeta e escritor, as seguintes inspiradas expressões:

«Sempre entre os primeiros a chegar a este Plenário, trôpego, amparado pelo funcionário que o assistia, sentava-se na bancada, à nossa frente, quieto, dominando a dor, sobrepondo-se ao sofrimen­to que sabíamos cruel. Sem quei­xas, sem demonstrar fadiga, sem desfalecimento. Nunca o ouvimos lamentar-se da doença pertinaz, mas algumas vezes vimo-lo angus­tiado por não poder;' a. seu juízo, dedicar-se plenamente ao exercício de suas funções. Certa feita, confessou-nos sentir-se constrangi­do diante de seus pares pelo rendi­mento de seu trabalho que, apesar de seus ingentes esforços, nunca lhe parecia suficiente. Era como se pedisse deSCUlpas por se encon­trar doente. A moléstia perturbava-o mais por impedir algumas vezes o desempenho de suas tarefas, do que pelO sofrimento que lhe causa­va.

Essa aguda consciência do dever deixou uma indelével marca em nossos espíritos. Guardamos dele uma lição magnífica de coragem,

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de otimismo e de esperança; um exemplo de resignação e de civis­mo. Fica-nos dele a lembrança re­confortante do Magistrado sereno, dedicado, simples e de homem lha­no e cordial, a quem as vicissitu­des não abatiam, firme em sua fé e cujo coração estava, na expres­são maior do Salmista, «sempre disposto a esperar o Senhor». Repito nesta oportunidade os even-

tos da carreira do Ministro Hermillo Galant. Seu currículo foi neste Ple­nário lembrado pelo nosso ilustre Presidente e lido na missa celebra­da por sua boníssima alma, no San­tuário Dom Bosco, em 20 de feverei­ro transacto. Ei-lo:

1) Natural de Alegrete, Estado do Rio Grande do Sul, onde nasceu a 1::; de janeiro de 1913. Filho de João Ga­lant e Maria Schumann Galant.

2) Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, onde colou grau a 27 de dezembro de 1939.

3) Diretor-Geral da Secretaria da Corte de Apelação da Justiça Militar do Estado do Rio Grande do Sul, car­go em que se empossou em fevereiro de 1966.

4) Secretário da Prefeitura Muni­cipal de Venâncio Aires, no períOdo de março de 1939 a janeiro de 1946.

5) Vereador da Câmara Municipal de Venãncio Aires, pelo Partido Li­bertador, único em que militou, até sua extincão, exercendo a verel'mça nos de 1956, 1957, 1958 e 1959.

6) Presidente da Câmara de Ve­readores de Venâncio Aires/RS.

7) Advogado militante nas Comar­cas de Venâncio Aires, Santa Cruz do Sul, Rio Pardo e Lajeado, desde 1939.

8) Presidente do Rotary Club de Venâncio Aires, em dois períodos.

9) Presidente do Gabinete Executi­vo da Comissão Diretora Municipal de Venâncio Aires, da Aliança Re­novadora Nacional - ARENA -eleito em maio de 1967.

10) Nomeado para o cargo de Juiz Federal Substituto da Seção Judicá­ria do Estado do Rio Grande do Sul, em 13-3-67, tendo tomado posse em 9-5-67.

11) Nomeado para o cargo de Juiz Federal da Seção Judiciária do Esta­do do Rio Grande do Sul em 10-7-72, tendo tomado posse em 10-7-72.

12) Eleito Suplente do Tribunal Re­gional Eleitoral no perído de 1971 a 1973.

13) Eleito membro efetivo do Tri­bunal RegioIlal Eleitoral no períOdO de 1973 a 1975.

14) Designado pelo Conselho de Justiça Federal para Diretor do Fo­ro da Seção Judiciária do Estado do Rio Grande do Sul, nos exercícios de 1973, 1976, 1977 e 1978.

15) Nomeado Ministro do Tribunal Federal de Recursos por Decreto de 28-5-80, empossado em 23-6-80, tendo sido um dos mais ilustres integran­tes desta Corte.

Intento levar ao ilustre COlega os nossos corações confrangidos por sua temporária separação do nosso meio e abraçar, com a mais pura sinceridade, os seus familiares: es­posa, D. Danieta Hosmann Galant, filhos, netos, irmãos e amigos, que sofrem com a sua partida. Resta­nos, todavia, a todos nós, o consolo da verdade contida na oração que proferiu em sessão de 18 de feverei­ro, na 6~ Turma desta Corte, o ilus­trado Subprocurador-Geral da Repú­blica, Doutor José Arnaldo Gonçal­ves de Oliveira, a propósito do even­to:

«... espero que ele tenha aquela paz, aquela tranqüilidade que é o ideal de todos nós que temos espe-

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rança e vivemos nela. Que ele, um dia, possa nos encontrar, porque a morte é uma fatalidade, e que nós, lá, possamos fazer um grande plenário onde conheçamos a nós mesmos e a todas as coisas, que é aquilo que resulta da visão de Deus. Que ele tenha muita paz». Na mesma sessão, expressaram-se,

em sentidas e memoráveis palavras, os eminentes Ministros José Dantas e Wilson Gonçalves.

Afinal, direi sobre Hermillo Galant o que disse o Cristo a respeito de Na­tanael (S. João, capo 1, verso 47):

Eis um verdadeiro homem em quem não há dolo. Que Hermillo Galant seja sempre,

para nós. o modelo da virtude. da pertinácia e, principalmente, da im­portãncia do reto juiz do exemplar chefe de família, do companheiro e amigo leal.

A S. Exa. a nossa prece de sauda­de imorredoura. Que eus o guarde em sua glória, queridO Ministro Her­millo Galant.

O Exmo. Sr. Doutor Geraldo An­drade Fonteles - Subprocurador­Geral da República - Exmo. Sr. Presidente, Srs. Ministros, Exmas. autoridades aqui presentes, Exmo. Sr. representante da Ordem dos Ad­vogados do Brasil, Exma. família do eminente Ministro Hermillo Galant. As minhas plavras são mais de com­plementação àquelas que proferi por ocasião em que se prestaram home­nagens póstumas ao eminente Minis­tro, aqui neste Plenário.

Em complementação, digo:

O Ministério Público Federal, por mim representado, associa-se a este singelo mas altamente signficativo preito de homenagem póstuma ao ínclito Ministro Hermillo Galant. E associa-se não só como gesto de ade­são, mas para sufragar, com os vo­tos de seu pesar, a memória pran-

teada, depositando-lhe uma coroa de louros à eleição que, sem generosi­dade dos governantes, alçou um no­bre vulto à acendrada admiração de seus pares, ao ensejar-lhe o lugar de Ministro desta Egrégia Corte.

Não obstante sua breve passagem pelo Tribunal Federal de Recursos, as instituições da Magistratura e do Ministério Público já haviam, desde a sua atuação na Justiça Federal, em seus glorioso Estado, aprendido a admirá-lo, a respeitá-lo pelo acerto e solidez de seus julgamentos.

Ocorre registrar um episódio que se passou neste mesmo auditório, em Sessão Plenária.

Apreciava-se, então. causa de evi­denciada percussão nas lides foren­se, pela intensa pUbliCidade dos pe­riódicos de toda a Nação, dando en­sejo à prolação de votos entusiastas, alguns até engalanados de retóricas juridicas e literárias, pela preponde­rãncia do lado simpático à opinião pública. E, sem embargos à embala­gem do resultado fascinante que vi­nha acalentando a caudal do seu acolhimento, eis que S. Exa., com as caracteristicas da maior autenticida­de de Juiz, pela serenidade, seguran­ça e discernimento do processo cog­nitivo, dentro das paralelas do Direi­to formal e material, com tranqüili­dade e independência, optou pela boa dicção do Direito, materializa­da, no caminho percorrido para o al­cance do desiderato, com observãn­cia da melhor técnica judicante. Ali, quando do pronunciamento do Minis­tério Público, já esmaecido no seu ofício, contagiou-nos aquele voto, in­cisivo e de plácida convicção de quem buscou, nos meandros das nor­mas, a essência vigorante do Direito. Emocionou-nos.

Posteriormente, quando, nos próxi­mos dias do seu passamento, neste mesmo Plenário, o eminente Presi­dente, seu ilustre co-estaduano, traçou-lhe o curriculum vitae, dando

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noticias de sua atuação variada e sempre honesta na vida pÚblica do pais, pude, já então aquilatar o imenso crédito acumulado no curso de sua vida. Daí porque, hoje, a sen­tida perda de sua atuação nos vários setores de atividade, inclusive e principalmente no Judiciário, é tão marcada pelo sentimento de saudade de sua família, seus colegas, amigos e admiradores.

Não tendo tido a oportunidade de uma convivência mais duradoura, mais íntima, privando-me, lamenta­velmente, de tão sublime fruição, que muito me honraria, quero tam­pém compor esta homenagem que, pálida e deficiente, somente leva a valia de um preito justo da institui­ção, a qual sobressai em relevo pelo merecimento tão-só do pranteado Ministro Hermillo Galant.

Devo acrescentar que busquei em pessoas a ele mais chegadas a con­firmação de seus méritos, fosse na vida social, familiar, fosse na vida profissional ou funcional. De todos, sem discrepãncia, só ouvi louvor ao trabalho, à dedicação e também às diretrizes que imprimia, conforme o cargo que perlustrasse.

O eminente homenageado ostenta­va uma silhueta imutável na sombra ou na luz incandescente dos cargos, na vida familiar ou na vida social, de onde se tirara a lição de um mes­tre incomparável da didática admi­nistrada em seu exemplo cotidiano tão enobrecedor à sedimentação da paz e da tranqüilidade social. Espíri­to original, inteligência experimenta­da e grave, um homem que possuía idéias próprias, que pensava por si mesmo, capaz de reagir com sereni­dade contra os ímpetos instintivos das paixões.

Oportuno, pois, se engajar, neste momento, às razões destas leais ma­nifestações.

O país inteiro, que mergUlha sob a ameaça de amargos dias, tem, a

nosso ver, no Poder Judiciário, a bóia que flutua no dilúvio, graças aos homens superiores da têmpera do saudoso Ministro.

Por fim, todas a notas harmonio­sas que ornavam a sua personalida­de, davam de sobejo para compor, por mãos mais hábeis e conhecedo­ras de seu procedimento e conduta, uma bela sinfonia, restando-me a mim, apenas, o recurso de uma sin­gela paródia aos versos do poeta, aduzindo que um verdadeiro senti­mento pipila em cada coração, numa saudade imorredoura.

Muito Obrigado. O Exmo. Sr. Doutor Dácio Vieira

- Representante da Ordem dos Ad­vogados do Brasil: Quis o egrégio Tribunal Federal de Recursos, nesta Sessão Plenária Especial, prestar merecida homenagem póstuma ao grande juiz, o saudoso Ministro Her­millo Galant.

Quer a Ordem dos Advogados do Brasil solidarizar-se com este acon­tecimento, triste pela própria natu­reza do ato, breve e memorável pe­las razões que se justificam, de ma­neira a tornar inesquecível este So­dalício, com um registro indelével nas páginas de tempo dessa Alta Corte de Justiça, para gravar um testemunho de coerente reconheci­mento aos feitos de um homem que se destacou em nossa história, de maneira ímpar e exemplar, como magistrado, cidadão, como pessoa humana, como chefe de família.

Aqui prestamos nosso tributo a tão ilustre personagem que soube, por evidentes e notórias qualidades, me­recer o respeito e a amizade de to­dos os advogados, na difícil missão de imprimir e resguardar a dignida­de da Justiça.

Amigo, sereno. equilibrado, culto, sábio no decidir, notabilizou-se como Juiz ávido em impor o ideal da Justi­ça, no amparo ao sagrado direito de

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seus semelhantes, quase que impo­tentes e inseguros, pequeninos na lu­ta contra o gigante da União.

Missão difícil, árdua e penosa, sou­be, com distinção e coragem, perto de 13 anos de judicatura e de abne­gação, sopesar indeclináveis direitos e valores parà imprimir sábias e justas decisões que se refletiram em tantos julgamentos que tiveram feliz desfecho com a habilidade de sua pena que, com traços de ouro, mar­cou os anais da vida forense e do co­tidiano.

Mais do que nós, também defenso­res e administradores da Justiça, em nosso ministério privado, na con­dição de vigilantes na vanguarda dos verdadeiros princípios e ideais de­mocráticos que ainda hão de instar plenamente em nosso país, o ilustre Presidente desta Augusta Casa pode aquilatar a sinceridade deste nosso grato e oportuno pronunciamento, como garantia deste atestado, dando-lhe fé, já que com o saudoso magistrado conviveu por bons e lon­gos anos em terraslgaúchas,desfru­tando, invejavelmente, de tão boa companhia, sendo inconteste que ambos companheiros foram respon­sáveis, por longo período de tempo, pelo comando da Justiça de I? grau no extremo sul de nossa Pátria.

Diante desta convicção, para nós insuperável, podemos tranqüilamen­te afirmar que o homem, Hermillo Galant, nasceu predestinado com o dom, com o talento de juiz, e agiu com acerto ao empenhar-se na car­reira de Julgador, à qual, inegavel­mente, dedicou por completo seus úl-timos e melhores anos. '

Cristão católico, emprestou sem­pre seu peculiar descortino aos con­ceitos e convicções que o definiram como personagem de nossa história, desenvolvendo e relevando aspectos sociais e humanos em suas decisões.

Cultor incansável do Direito, aprimorou-se como fervoroso intér-

prete e aplicador das leis, com rara habilidade; - sempre dísposto à lu­ta, almejada e exigida por nossa classe para impor julgamentos céle­res ãos processos,' mas, nem por is­so, deixando de dar prontas e saluta­res decisões.

Carregou, em sua bagagem de tra­balho, a solução de centenas de processos, dirimindo conflitos je toda a espécie, pacificando ques-" tões simples e complexas pendentes que afligiam" seus semelhantes e con­cidadãos.

Não temos dúvidas ao aqui expres­sar que foi um escolhido e que Deus guiou seus passos na trilha da difícil caminhada do Direito.

Na famosa Parábola dos Talentos - e que agora nos seja permitido re­lembrar - ficou dito que um senhor a três homens deu a oportunidade para enriquecer suas vidas.

Para tanto, a cada qual foi oferta­da uma quantia, segundo a sua capa­cidade.

Após um decurso de tempo, o doa­dor entendeu de saber como empre­garam os beneficiários a «benesse» e a capacidade.

O primeiro, que recebera mais, aplicou e dobrou o seu ganho.

O segundo, que recebera quantia menor, também conseguira aumen­tar a sua furtuna.

O terceiro, por temor, havia escon­dido o seu valor de modo a não cor­rer risco, não perdendo e nem ga­nhando nada.

Revoltado o senhor com a conduta do último pela preguiça e inoperãn­cia, tomou de volta a sua oferta que fora guardada e depreciada e a deu ao primeiro, que soube aproveitar a oportunidade concedida, demons­trando o seu talento e responsabili­dade e o cobriu de glórias, dizendo: «sobre o pouco foste fiel, sobre o muito te colocarei».

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Este ensinamento ilustrativo 'pro­curou demonstrar que a felicidade, o sucesso, o êxito da carreira, são ine­rentes àqueles que conseguem a vi­tória aplicando a sua capacidade de maneira inteligente, leal e correta, com o esforço do trabalho, fiéis aos justos propósitos.

Nosso querido e saudoso homena­geado também recebeu seus talentos e bem os usou no curso de 67 anos de existência.

Bem cedo, recebeu o primoroso dom de ser um defensor e estudioso da Justiça.

Recebendo aos poucos as oportuni­dades que lhe surgiram em vida, nunca as desperdiçou e, mesmo so­nhando, como apregoam os poetas e concertistas do pensar, soube trans­formar sonhos em realidade.

Assim, nos idos de 1939 já era ba­charel em Ciências Jurídicas e So­ciais.

Exerceu a posição de Diretor­Geral da Secretaria da Corte de Ape­lação da Justiça Militar do Estado do Rio Grande do SuL

Chamado ao dever cívico, não se declinou a tal reclamo. No Município de Venâncio Aires foi Secretário da Prefeitura Municipal, Vereador por vários mandatos, e Presidente de sua Câmara.

Não fugindo de prestar serviços à sociedade, galgou a Presidência do Rotary Club daquela distante comar­ca, preocupando-se com melhores soluções de vida para as classes me­nos favorecidas.

Por chamamento partidário, che­gou à Presidência da Aliança Reno­vadora Nacional daquele rincão gaú­cho, já em 1967, em época de verda­deira crise política nacionaL

Inspirado nos ideais nunca esque­cidos de homem sempre dedicado ao Direito, tomou posse como magistra­do federal, em Porto Alegre, na ins-

talação das Seções Judiciárias por todo o país, tornando-se um pioneiro como Juiz Federal, com contribui­ções inestimáveis para a formação e desenvolvimento da seção de sua ju­risdição.

E, no ano passado, ao ser amplia­do o número de membros desta Alta e Nobre Corte de Justiça, certamen­te não seria olvidado o nome do nos­so homenageado, cuja folha de servi­ços exigia a sua indicação como Mi­nistro do Tribunal Federal de Recur­sos.

Acometido de enfermidade, o en· tão incansável batalhador da Justi­ça, mesmo assim laborou, julgou e freqüentou esta Casa, até quanto pô­de, nas Sessões e Plenário, até ver esgotadas todas as suas forças e energias, privando-se da carreira que tanto amava, obrigado que esta­va a repouso inexoráveL

Obrigou-se, damos o nosso teste­munho desta tribuna, ao afastamen­to da Corte, dos companheiros, ami­gos e funcionários por um reclamo maior que a sua vontade.

Por esta razão foi até o fim um imbatível, deixando, para nossa total tristeza, por imposição de uma lei da natureza, à qual também se curvou e obedeceu, uma vaga, um vazio en­tre nós que jamais será esquecido, sej a pelos cultos e não menos dignos pares, como pelos advogados, pelo Ministério Público e pelos funcioná­rios.

O saudoso Ministro Hermillo Ga­lant, como descrito na parábola cris­tã, soube usar o dom que Deus lhe deu e, com talento e responsabilida­de, cumpriu os deveres que a Pátria lhe confiou.

E a vida o recompensou pela sua potencial capacidade, recebendo por merecimento os cargos mais proemi­nentes que o tornaram, para nós, um exemplo de homem, de cidadão, de magistrado, um modelo de chefe de família.

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Um tipo de personalidade notável, de magna dignidade que se torna difícil, hoje em dia, neste mundo de incompreensão, de violência, a que se determinou de «Sinal dos Tem­pos».

o perfil do nosso homenageado po­de ser encontrado em uma passagem do grande Chateaubriand que bem predizia ao afirmar, para sua imor­talidade, que:

«Há justos cuja consciência é tão tranqüila, que deles não nos pode­mos acercar sem que participemos da paz que emana, por assim di­zer, do seu coração e das suas pa­lavras».

Sua Excelência, estamos convenci­dos, e damos o nosso inteiro teste­munho, representava o ideal do juiz, como definiu Calamandrei, ao con­cluir que a conduta de um magistra­do «é fixada por aquela misteriosa e clarividente intuição que se chama o sentimento da justiça».

E tal pressuposto, que para nós é insuperável, lhering foi mais longe ao elevar a condição e requisito à maior amplitude, dizendo que «A força dum povo equivale à força do seu sentimento de justiça».

E o nosso imortal Rui Barbosa mi­nistrou como advertência: «Não há nada mais relevante para a vida so­cial que a formação do sentimento da justiça».

Exmos. Srs. Ministros.

N a nossa solene missão profissio­nal, em luta incessante pelo aperfei­çoamento das nossas instituições jurí­dicas, pela rápida administração da Justiça, pela total restauração da vi­da democrática de nosso país, pela sagrada segurança dos direitos e ga­rantias individuais, pela vigília diu­turna dos direitos humanos, pode­mos garantir que o saudoso e sem­pre queridO homenageado tinha, por

formação, o predicado que o distin­guiu em sua vida de magistrado, que se chama de sentimento de justiça.

Damos o testemunho de que, cedo ainda, caminhou para a eternidade, saindo da vida para a posteridade, deixando, como perda imensurável, um saldo de quase três anos de ensi­namentos jurídicos que contribuíram para a grandeza e soberania desta Casa, sendo também incontroverso que este Tribunal, na composição de seus membros, tem demonstrado, mesmo no confronto das repetidas vicissitudes, que se tem feito Justiça no Brasil, para a glória e honra da magistratura federal.

Nosso homenageado, se aqui pu­desse estar, em breve instante co­nosco, certamente diria em despedi­da final, como preconizava o Apósto­lo São Paulo:

«Combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a fé».

O Exmo. Sr. Doutor Heitor Galant: E com profunda emoção que uso da palavra, neste recinto augusto, para agradecer, em nome da família de meu falecido irmão, Ministro Her­millo Galant, as eloqüentes homena­gens que este Egrégio Tribunal, do qual ele fez parte, está prestando à sua memória. E esta uma tarefa difícil para mim, não só pela modés­tia da minha oratória, como pelas perturbações do meu espírito, causa­das pela dor e pelas amarguras que sofro pelo desaparecimento daquele que era meu irmão e amigo, talvez mais amigo do que irmão.

Dos 13 filhos que a minha querida mãe legou ao mundo, o Hermillo era um espelho da sua bondade, do cari­nho e da dedicação com que ela os criou e educou, no ambiente salutar de um lar modesto, acolhedor e hon­rado.

Srs. Ministros: O colega de Vossas Excelências, falecido em Porto Ale­gre, no dia 16 de fevereiro do corren-

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te ano, exerceu as funções de Juiz Federal naquela Capital, nomeado pelo eminente Presidente Humberto de Alencar Castello Branco, no período de 1967 até sua promoção pa­ra este Egrégio Tribunal, em junho de 1980. Como exerceu aquelas fun­ções? Quem poderia responder a es­ta pergunta, melhor do que eu, seria o preclaro Ministro José Néri da Sil­veira, que foi seu colega na Justiça Federal do Rio Grande do Sul, du­rante vários anos e, na verdade, já se pronunciou a respeito, no ato do sepultamento de Hermillo, em Porto Alegre, quando proferiu uma emo­cionante e bela oração, em que tra­çou, com discrição e segurança, o perfil do colega morto. Como sou ad­vogado em Porto Alegre, já há mui­tos anos, mantenho relações com vá­rios colegas, alguns dos quais aten­diam causas na Justiça Federal de Porto Alegre. Nos encontros que ti­nha com alguns deles, nas ruas da cidade, seguidamente conversáva­mos, quase sempre sobre assuntos da profissão e, nessas oportunidades, ouvi muitas referências, desses cole­gas, elogiosas ao Hermillo. Diziam os advogados que ele os atendia mui­to bem, era um Juíz acolhedor e compreensivo no seu trato com os profissionais do Foro. Eu então res­pondia que isso talvez fosse motiva­do pelo fato de Hermillo ter sído ad­vogado por mais de 20 anos e que as­sim conhecia bem as dificuldades que os advogados enfrentam no exercício de sua profissão.

Na verdade, o fato de ele ter exer­cido a advocacia, por longo tempo, deveria influir no trato acolhedor que costumava proporcionar aos bacha­réis que o procuravam, no Foro de Porto Alegre, para lhe falar sobre suas causas, mas acho que essa sua conduta era fruto, também, do seu temperamento bondoso e afetivo.

O Hermillo era realmente, para definHo, singelamente, um homem bom e correto e um bom .juiz. E era

um bom Juiz provavelmente por ter sido um bom advogado. Foi, precisa­mente, um juiz, jUiz e escritor ilus­tre, que disse, com muita proprieda­de, que não «há, entre a majestade dos Juízes e a dos advogados' outra diferença que não seja a decorrente da diversidade das nossas funções sociais, porque vós também, senho­res advogados, sois magistrados na mais remontada significação do ter­mo. Foi colocando-se nesse ponto de vista, prossegue o magistrado que estou citando, que G. Ranson, Juiz do Tribunal do Sena, disse em seu en­saio sobre a «Arte de Julgar» que os bons advogados é que fazem os bons juízes.

Creio estar contido nesse paralelo, entre as funções do Juiz e do advo­gado, o segredo do êxito com que Hermillo Galant, depois de um longo período de exercício da advocacia, pôde ser um bom Juiz. Ele soube substituir, adequadamente, a toga do advogado pela toga do Juiz.

Envergando a toga, exercendo a magistratura, o Juiz torna-se, para bem cumprir o seu dever, um exi­gente executor da lei, inspirado na jurisprudência, sem esquecer o salu­tar princípio definido no art. 5? da Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro, segundo o qual «na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum».

Já afirmara Jean Cruet: «A nega­ção da jurisprudência, como força ativa da evolução do direito, tem sempre e por toda a parte recebido desmentido ruidoso dos fatos; essa tendência para reduzir o Juiz a uma função puramente automática, 'ape­sar da infinita diversidade dos casos submetidos ao seu diagnóstico, tem sempre e por toda a parte sobra­do, ante a fecundidade perSIstente da prática judicial».

«Juiz, esse ente inanimado de que falava Montesquieu, tem .sidO, na

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realidade, a alma do progresso jurídico, o artífice laborioso do direi­to novo, contra as fórmulas caducas do direito tradicional».

Superando o período do arbítrio e posse violenta, o homem, pelo dom superior da inteligência, estabeleceu o conjunto de normas e condições existenciais da vida em comum, nor­mas que evoluem com o organismo social, mas imperativas, na sua vi­gência, para a manutenção e disci­plina da coletividade.

Sempre que há desequilíbrio nas relações sociais, surge o magistrado, sereno no seu alto mister, como fa­tor soberano de harmonia, a res­tabelecer a ordem, a impedir a desa­gregação, e a contribuir, decisiva­mente, para o aperfeiçoamento das relações entre os homens.

Estou certo de que meu irmão, que teve a suprema honra de integrar es­te augusto Tribunal, como magistra­do da Justiça Federal, exerceu as funções de Juiz segundo aqueles princípios e a isso sou levado a crer em face das expressivas homena­gens e manifestações de apreço e simpatia à sua memória, manifesta­das com tanta eloqüência neste Pre­tório Excelso, embora houvesse ser­vido aqui, como Ministro, somente durante 6 meses.

A minha missão, neste instante, é agradecer, em nome de toda a família de Hermillo Galant, às ho­menagens que lhe têm sido presta­das por Vossas Excelências, a come­çar pelo eminente Presidente José Néri da Silveira, que assim que sou­be do falecimento do colega, em Porto Alegre, para lá se dirigiu ime­diatamente, a fim de assistir ao se­pultamento e confortar a família atingida por tão grande infelicidade, e o fez de maneira exemplar, inclusi­ve proferindo, no ato do sepultamen­to, a oração a que já me referi.

Quero tambem exprimir a nossa gratidão à Egrégia Turma de que

fazia parte o Ministro Hermillo Ga­lant, presidida pelo. eminente Minis­tro Carlos Madeira e que na primei­ra sessão após o triste evento, profe­riu expressiva e sentida oraçãô, de­plorando o desparecimento do colega e exaltando os seus méritos.

Estendo o nosso reconhecimento ao Sr. representante da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Dis­trito Federal, Dr. Aquiles Rodrigues de Oliveira, e Dr. Hélio Pinheiro da Silva, Subprocurador-Geral da Repú­blica, ilustres figuras da vida foren­se de Brasília e que, presentes à ses­são da Turma a que me referi, ex­pressaram o seu pesar de maneira significativa.

E, por fim, impõe-se ressaltar esta nobre e imponente manifestação de apreço que o Egrégio Tribunal Fede­ral de Recursos, em reunião plena­ria e pública, está prestando à me­mória de Hermillo Galant, o que realmente me convence e a sua família de que ele, nos 6 meses em que aqui viveu, soube conquistar, por seu trato ameno e sua conduta ilibada, as simpatias e a amizade dos seus eminentes colegas. Honra­dos com tal atitude desta Alta Corte, aqui estamos para agradecer, como­vidos, a presente homenagem ao ex­colega, certos de que ela será um dos melhores títulos que ele soube conquistar na sua árdua e fecunda existência.

Muito gratos a Vossas Excelências e a todos os que tiveram a bondade de comparecer a esta emocionante solenidade.

O Exmo. Sr. Ministro José Néri da Silveira (Presidente): O Tribunal Federal de Recusos recebeu dezenas de mensagens de pesar, de todas as partes do País, em virtude da morte do Sr. Ministro Hermillo Galant. Dentre elas, destaco as seguintes: Exmo. Sr. Vice-Presidente da Repú­blica, Dr. Antônio Aureliano Chaves de Mendonça; Exmo. Sr. Presidente

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do Supremo Tribunal Federal, Minis­tro Xavier de Albuquerque; Exmo. Sr. Ministro-General de Exército, Reinaldo Melo de Almeida, ex­Presidente do Superior Tribunal Mi­litar; Exmo. Sr. Ministro Luciano Brandão Alves de Souza, Presidente do Tribunal de Contas da União; Ex­mo. Sr. Deputado Nelson Marche­zan, Presidente da Cãmara dos De­putados; Exmo. Sr. Dr. Murillo Ma­cêdo, Ministro de Estado do Traba­lho; Ilmo. Sr. Dr. Gil Gouveia Ma­cieira, Presidente da Caixa Econô­mica Federal; de diversos Procuradores-Gerais de autarquias e de Juízes Federais de todas as Se­çôes Judiciárias; de Tribunais do País que refiro: Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco, Tribunal Regional do Trabalho da 4~ Região, Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande -do Norte, Tribunal de Contas do Distrito Federal. Ainda, em virtu­de de motivo de força maior que os ímpossibilitou de comparecer a esta solenidade, na manhã de hoje, a Pre­sidência do Tribunal recebeu mensa­gens, associando-se a esta homena­gem e manifestando a impOSSibilida­de da presença do Exmo. Sr. Minis­tro Xavier de Albuquerque, Presi­dente do Supremo Tribunal Federal; do Exmo. Sr. Ministro Ibrahim Abi­Ackel, Ministro da Justiça; do Ex­mo. Sr. Ministro Jair Soares, da Pre­vidência e Assistência Social; do Ex­mo. Sr. Dr. Antônio Salgado Mar­tins, Presidente do Tribunal Regio­nal do Trabalho do Rio Grande do Sul. As palavras dos oradores, profe­ridas na simplicidade desta Sessão, constituem flores imarcesciveis da nossa admiração e do nosso carinho ao colega e amigo Que nos deixou tanta s"audade, Ministro Hermillo Galant. Queremos confiá-las, defini­tivamente, à guarda daquela que foi inexcedível em dedicação e amor a seu esposo, a Excelentíssima Senho­ra, Dona Danieta Hosmann Galant, para que lhe sej am, pela suavidade, um pouco de consolo e a expressão

de nossa constante solidariedade e proclamem perenenente o nosso tes­temunho de que Hermillo Galant, co­mo um meteoro, cruzou os céus des­ta Corte, deixando, porém, o rasto luminoso da sua bondade, amor à Justiça, de lúcida inteligência e de cativante personalidade. O Tribunal Federal de Recursos não esquecerá o gaúcho e magistrado :.: autêntico que era o Ministro Hermillo Galant.

Agradeço a presença de S. Exa. o Sr. Ministro Carlos Alberto Barata Silva, Digníssimo Vice-Presidente do Tribunal Superior do Trabalho; de S. Exa. o Sr. Ministro Henrique La Ro­que, Ministro do Tribunal de Contas da União e representante da Presi­dência da mesma colenda Corte; do Dr. Jayro Camargo Ramos, repre­sentante de S. Exa., o Sr. Governador do Estado do Rio Grande do Sul, Dr. José Augusto Amaral de Souza; dos Srs. Ministros aposentados deste Tri­bunal; dos Srs. Juízes Federais do Rio Grande do Sul e do Distrito Fe­deral; dos Srs. Subprocuradores­Gerais da República; dos Srs. A adve gados e, em particular, do ilustre re­presentante do Conselho Seccional do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Agradeço a presença das demais autoridades. Agradeço, especialmente, a presen­ça da Excelentíssima Sra. Dona Da­nieta Hosmann Galant, de seus caríssimos filhos e nora; do Dr. Hei­tor Galant. Também agradeço a pre­sença dos funcionários desta Corte.

SuspendO a Sessão, para que todos possamos cumprimentar a família do saudoso homenageado.

Encerrou-se a Sessão às 16:30 ho­ras.

Tribunal Federal de Recursos, 19 de março de 1981 - Ministro José Néri da Silveira, Presidente - Bel. José Alves Paulino, Secretário do Plenário.

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HOMENAGEM AO SR. MIN. JOSÉ NÉRI DA SILVEIRA POR OCASIÃO

DE SUA NOMEAÇÃO PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

O Senhor Ministro Carlos Mário Velloso: Na Sessão Plenária da últi­ma 5~ feira, ao cabo de um magnífi­co voto proferido pelo Ministro José Néri da Silveira, declarou o Ministro José Dantas, sem conter as lágri­mas, que tínhamos acabado de ouvir o último pronunciamento, neste Tri­bunal, desse eminente colega que vi­nha de ser nomeado para a Corte Su­prema. E disse o Ministro Dantas que não iríamos contar, daqui para frente, nas horas difíceis e nos mo­mentos graves, com os conselhos e a palavra sempre autorizada do Minis­tro José Néri da Silveira.

Isto é verdade. E é'por essa razão, Senhor Ministro José Néri da Silvei­ra. que a alegria de que somos pos­sUldos, ao ser Vossa Excelência in­vestido na mais alta cátedra do Judi­ciário brasileiro, é uma alegria que chora - e aqui vale invocar Guima­rães Rosa - porque é «uma alegria judiada, que ficou triste de repen· te ... » É que, de repente, quandO fes· tejávamos a vitória do Colega, per­cebemos que a sua ascensão signifi­cava perdê-lo do convívio diário. Nas Gerais se diz, com sabedoria, é ain­da Guimarães Rosa quem nô-Io diz, que chorar sério faz bem. Por isso, aqui estamos, Senhor Ministro José Néri, os seus irmãos, reunidos em sua homenagem, em sessão especial, oara as despedidas e para expressar-lhe que grande foi a honra que a Nação conferiu a este Tribunal e a cada um de nós, ao convocar Vossa Excelência para o exercício da suprema magistratura nacionaL

Vossa Excelência, Senhor Ministro José Néri da Silveira, é um homem que madrugou no trabalho e n? estu­do sério; por isso mesmo, esta sem­pre em véspera de vitória e de su­cesso pessoaL Aos 23 anos, eHo Ba­charel em Direito pela Pontifícia

Universidade Católica do Rio Gran­de do Sul, com a distinção universi­tária de Aluno Laureado. No ano se­guinte, um novo título universitário é conquistado por José Néri, o de Ba­charel em Filosofia, pela Universi­dade Federal do Rio Grande do Sul, e em 1957, o de Licenciatura em Fi­losofia. na PUC do Rio Grande. Por concurso, ingressou no serviço públi­co do seu Estado natal. E assim, an­tes dos 30 anos, já era o advogado José Néri da Silveira integrante do serviço jurídico do Rio Grande. Aos 31 anos, mediante aprovação em no­vo concurso, José Néri é Consultor Jurídico do Estado; aos 33 anos, as­cende ao alto cargo de Consultor­Geral, que corresponde ao de Procurador-Geral do Estado. Nesse período, laboriosa foi a sua carreira: a partir de 1960, assim aos 28 anos de idade, em meio a uma intensa ati­vidade de advogado, passa a inte­grar o corpo docente da PUC-RS, co­mo professor de Direito Civil, e da UFRS, como professor de Introdução à Ciência do Direito. Juiz Federal em 1967, dois anos depois, em no­vembro de 1969, aos 37 anos, é no­meado para o c·argo de Ministro do Tribunal Federal de Recursos. Exi­gindo a Constituição a idade mínima de 35 anos para ingresso nos Tribu­nais superiores, nâo conheço outro que tivesse ingressado neste Tribu­nal com menos de 37 anos. Tive a honra c!p saudrlr o nosso homenagea­do, quandO de sua posse na r'residén­cia deste Tribunal, em 25 ele junhO de 1979. Disse eu, então, que não imaginava o adolecente de 16 anos, «que, em outubro de 1948, um ano após a instalação desta Corte, prega­va, em Bajé. que «o amor é um fogo que se extingue, quando nâo se comu­nica a outros» - repito as palavras do menino - ou jovem político de 20 anos, presidente da ala moça da UDN de Porto Alegre que, em 1953, em atitude cívica - o termo é bem este, como costumava dizer o grande Milton Campos - conclamava a

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união de «todos os corações gaú­chos, amantes do Direito e da Justi­ça», em favor da democracia, que, bem antes dos 40 anos, viesse a se tornar um dos maiores juízes de sua terra e. na casa dos quarenta, &S­cendesse à Presidência" da 2~ Corte Judiciária do BrasiL» Na linha des­ses fatos fica fácil compreender, Senhor Ministro José Néri da Silvei­ra, a razão por que Vossa Excelên­cia, ainda na casa dos 40 anos, é chamado a exercer a suprema ma­gistratura nacional.

Em verdade, a nomeação do Mi­nistro José Néri da Silveira para o Supremo Tribunal significa que a Nação 'lhe reconheceu os méritos. Observemos a sua carreira nesta Corte: Ministro do Tribunal Federal de Recursos, empossado em dezem­bro de 1969, depois de ter exercido o cargo de Juiz Federal e de Juiz do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul, integrou o Conselho da Justiça Federal de 1971 a 1973. Em 1970 e 1975, participou, como Mi­nistro convocado, de julgamentos no Supremo Tribunal. Ainda em 1975, presidiu a Comissão Examinadora do II Concurso para provimento de cargos de Juiz Federal Substituto, além de ter integrado e presidido a Comissão de Regimento e Jurispru­dência do Tribunal. Eleito, pelo Tri­bunal Federal de Recursos, Ministro-Substituto do Tribunal Su­perior Eleitoral, em 1975, foi Minis­tro efetivo da mesma Corte em 1976, nela tomando posse em setembro de 1976, sendo reconduzido para o 2? biênio, em setembro de 1978. No Tri­bunal Superior Eleitoral, foi eleito Corregedor-Geral Eleitoral, tendo desempenhado as funções desse car­go, juntamente com as de Ministro do TSE e do TFR.

Eleito Presidente do Tribunal, pa­ra o biênio 1979/1981, empossada no

cargo em junho de 1979, realizou o Ministro José Néri da Silveira profícua administração que há de fi­car registrada nos fastos do Tribunal. - Nela, não sabemos o que mais aplaudir, se o administrador crite­rioso que soube prever e prover, ou se o bom varão que exerceu com al­ta dignidade e justiça a direção da Casa. Essa magnífica obra adminis­trativa de José Néri da Silveira só não é maior que a sua própria obra de juiz, tanto como Juiz Federal, Juiz do Tribunal' Eleitoral do Rio Grande, quanto Ministro do Tribunal Superior Eleitoral e Ministro desta Corte. Nesses quase 12 anos de judi­catura no Tribunal Federal de Re­cursos, Vossa Excelência, Senhor Ministro José Néri da Silveira, gran­jeou a admiração dos seus pares e o respeito dos seus jurisdicionados. Aqui, entre os seus pares, Vossa Ex­celência foi conselheiro e, nas horas mais graves, sua palavra sempre foi requestada para ser ouvida.

É fácil compreender, de conse­guinte, porque recaiu no Ministro Jo­sé Néri da Silveira a convocação pa­ra o exercício da suprema magistra­tura nacional. Ao Supremo Tribunal é gUindado um juiz experimentado, um juiz de verdade, um grande juiz. É bom que assim seja e seria exce­lente que sempre fosse assim, por­que o Supremo Tribunal é a «voz vi­va da Constituição», no dizer de Lor­de Bryce, ao referir-se à Corte Su­prema americana, e ele é, o Supre­mo Tribunal Federal, tal qual tem sido, nos Estados Unidos, a Corte que lhe serve de modelo, «a cons­ciência do País», (Henry Abraham, «A Corte Suprema no Evolutivo Pro­cesso Político», In «Ensaios sobre a Constituição dos Estados Unidos», Forense, p. 106, 1978). As instituições valem por si, mas a sua grandeza depende das pessoas que as fazem funcionar. A Corte Suprema ameri­cana, modelo do Supremo Tribunal do Brasil, tem sabido ser, em verda-

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de, a consclencia da Nação, demonstra-nos Henry Abraham (Ob. e loco cits.), seja liderando o País (a corte de Marshall), ou estimulando o progresso social e econômico (a Cor­te de pós-1937), seja colocando-se em posição de observadora, ou mesmo desestimulando certas posições afoi­tas no campo político-social (a Corte de Chaise-Waite e a Corte de Ful­ler), seja desafiando o sentimento da maioria e estimulando a tomada de posições no campo das «liberdades civis no período 1956/57», seja nas decisões da Corte de Warren na dé­cada de 1960. No caso Dred Scott, de 1857, em que o Tribunal, sob o ponto de( vista legal, estava certo, mas que, politicamente cometeu erro fra­goso, não deixou de refletir, de certa forma, uma tendência de setores da vida nacional. Foi caro, todavia, o preço que pagou pelo erro. Nos casos de segregação racial de 1954, 1955, 1969 e 1971, o Tribunal assume posi­ção a mais alta, só igualável com as «memoráveis decisões nos casos Marbury, McCulloch, Martin e Gib­bons e as diversas decisões da déca­da de 1960 sobre repartilha e redivi­são distrital.» li: que a Corte Supre­ma, lá como cá, não é estuário de tranqüilidade. Ao contrário, bem dis­se o «Justice» Holmes: «Estamos muito tranqüilOs ali, mas ali é o cen­tro de uma tempestade, como todos sabemos.»

Se é verdade que «observadores mais severos», conforme dá notícia Baleeiro, «sublinham que o STF não alcançou, no regime político-jurídico brasileiro, o papel eminente desem­penhado pela Corte Suprema na his­tória político-constitucional dos Esta­dos Unidos, pela obra da «construc­tion» pretoriana, ora acelerando a evolução do Direito e substituindo-se ao legislador tímido ou tardo, ora freiando-a, se impulsivo e precipita­do,» (A. Baleeiro, «O Supremo Tri­bunal Federal», Revista Brasileira de Estudos Políticos, Belo Horizonte,

MG, n? 34, juiho/72, p. 35), certo é, a Suprema Corte Brasileira jamais fa­lhou. A teoria brasileira do habeas corpus, que teve em Ruy e em Pedro Lessa os seus maiores impulsionado­.res, demonstra a preocupação do Su­premo Tribunal na proteção dos di­reitos e garantias individuais. Os atritos do Supremo com Floriano, com Prudente de Morais e com Her­mes da Fonseca, noutros tempos, e a posição altaneira do Ministro Ribei· ro da Costa, mais recentemente, os embates em que se viu envolvida a Corte, em seguida a 1964, suas posi­ções liberais, em momento crítico, revelam um Tribunal destemido, cônscio de sua missão. A obra de Edgard Costa, «Os grandes julga­mentos do Supremo Tribunal Fede­ral», que Baleeiro chama de «bene­mérita iniciativa», comprova o afir~ mado e os dois primeiros volumes da «História do Supremo Tribunal Fe­deral», de Leda Boechat Rodrigues, que cuidam dos períodos de 1891/1898 e 1899/1910, deixam bem o Supremo Tribunal na defesa das liberdades ci­vis e do federalismo. li: pena que, no Brasil, os historiadores, as universi­dades e os juristas de modo geral não se preocupam com a pesquisa e o estudo da vida dos Tribunais, ao contrário do que acontece nos Esta­dos Unidos. Em discurso que aqui proferiu, na homenagem que o TFR prestou ao Supremo Tribunal Fede­ral, pela passagem do seu sesquicen­tenário, o saudoso Ministro Amarílio Benj amin ressaltou que nos acór­dãos do Supremo «está o direito bra­sileiro. As «Súmulas», que tanto aju­dam na SOlução das controvérsias, não dizem tudo. porquanto o que o Supremo realiza e muito mais. Se houvesse publicidade permanente e esclarecida em torno de seus atos, o grande público retribuir-lhe-ia o es­forço com estimulante entusiasmo. Se os juristas mantivessem trabalho desinteressado de análise de seus acórdãos sobre temas fundamen­tais, a colaboração fora do Pretório

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não poderia ser melhor, e se os edi­tores decidissem organizar comentá­rios dos diversos ramos do nosso di­reito, assunto por assunto, calcados em decisões do Supremo Tribunal, com explicativos e referência cabíveis, a cargo de profissionais competentes, o repertóriO represen­taria o importante di gesto da cultura jurídica nacional que nos falta.» (<<Rev. TFR», 6],·247).

Guarda maior da Constituição, tem o Supremo Tribunal, bem por is­so, função política que decorre da própria Lei Fundamental. Aliomar Baleeiro, que foi dos maiores juízes do Supremo e foi homem do nosso tempo, lecionou que esse Tribunal «carrega por precípua missão a de fazer prevalecer a filosofia política da Constituição Federal sobre todos os desvios em que o Congresso e o Presidente da República, Estados, Municípios e P",1";;}ulares se tresma­lhem, quer po}S .""s sancionadas ou promulgadas, quer pela execução delas ou pelOS atos naquela área in­definida do discricionarismo faculta­do, dentro de certos limites, a ambos aqueles Poderes. O traçado desses li­mites, quer quanto ao legislador quer quanto ao executQr, nunca foi, não é, nem será nunca uma linha fir­me, clara e inconfundível. Há uma terra de ninguém nesta faixa frontei­riça.» (<<O Supremo Tribunal Fede­ral, esse outro desconhecido», Foren­se, 1968, p. 103).

Nessa atividade, que é política, política no sentido grego, assim na sua verdadeira acepção, reside a missão mais nobre dos Tribunais, missão que é ainda maior e muito mais significativa quando exercida pelo Supremo, seja porque ele a exerce comumente como revisor de decisão tomada por outro Tribunal, seja porque, quando a exerce, o faz em termos definitivos. Alex'ander Hamilton, no nÍlmero 78 do «The Fe-

deralist», escrito em favor da Consti­tuição, põe em relevo essa atividade dos tribunais, no caso de uma Cons­tituição restritiva, vale dizer, a Constituição i que impõe determina­das restrições à autoridade legislati­va. Por exemplo, acentua Hamilton, a Constituição que não aprove leis de confisco, ou leis ex post facto, etc. «Restrições como essas não pOdem ser preservadas, na prática, a não ser mediante os Tribunais de Justiça, cujo dever será declarar qualquer ato contrário ao manifesto teor da Constituição, nulo. Sem isto, todas as defesas dos direitos ou privilégios in­dividuais nada valem.» (Ap. Charles A. Beard, «A Suprema Corte e a Constituição», Forense, Tradução de Paulo Moreira da Silva, 1~ ed., pág. 58).

Por isso mesmo, só os granclp~t~11-ristas - e daí a sabedoria d cons 1-

tuinte em exigir o requisito do notá­vel saber jurídico - podem ser juízes do Supremo Tribunal Federal. Mas não é somente isto que basta. Ao lado do notável saber jurídico, re­clama a Constituição a reputação ili­bada. Na reputação ilibada compreende-se, em verdade, a cora­gem moral e o caráter independente do homem, j á que é da mais baixa reputação o cidadão de coluna dorsal vergável.

Um Tribunal de homens assim, sá­bios e independentes, há de ser, evi­dentemente, um Tribunal ilustre, que reflete uma Nação ilustre, realizando-se, com ele, o ideal que Milton Campos pregava: «onde haja a certeza da reta distribuição da Jus­tiça, aí os cidadãos repousam e con­fiam. A estabilidade social se im­planta. A paz pÚblica se firma.»

Vossa Excelência, Senhor Ministro José Néri da Silvelra, que madrugou no trabalho e no estudo sério, com­provadamente testado como juiz, as­sim juiz de verdade, sábio, justo e independente, homem de idéias e de

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espírito aberto, haverá de honrar, ilustrar, engrandecer e dignificar a Corte Suprema do Brasil, do modo como a visualizamos e como deve ser: a consciência do País, desta for­ma representativa, na concepção de Rousseau, da «volonté générale» da Nação.

Vossa Excelência agora vai partir. A sua cadeira vai ficar vaga e nos nossos corações ficará a saudade do companheiro, do orientador, do con­selheiro, do irmão. Mas quando com­preendemos que a Corte Suprema do BrasiJ á ser dignificada por Vossa Excelência, isso nos faz contentes. E nos honra sobremaneira o fato de que Vossa Excelência saiu daqui, deste Tribunal Federal de Recursos, que Vossa Excelência muito amou e por ele tanto fez. Vossa Excelência será um de nós, sempre e sempre.

Os gaúchos, esses homens altivos, dos Quais Vossa Excelência é lídimo representante, devem estar, neste momento, jubilosos.

No Céu, o Sr. Severino Silveira, seu pai, e D. Maria Rosa Machado Silveira, sua mãe, estão sorrindo.

D. Use Maria Dresch da Silveira, sua esposa e companheira de todas as horas, está feliz, é fácil perceber. E orgulhosos do pai estão os filhos, a Thêmis Maria, o Domingos Sávio, que já estuda o Direito, a Maria Te­resa, o Paulo de Tarso, a Maria Cecília, o Felipe Néri e o pequeno Francisco de Sales. O Sr. Alexandre Silveira, seu irmão mais velho, que aos demais irmãos representa, não cabe em si de contentamento.

Receba, Senhor Ministro José Néri da Silveira, com D. Use Maria e com os seus filhos, os cumprimentos dos juízes e servidores do seu Tribunal Federal de Recursos. Seja feliz, Mi­nistro José Néri. Que Deus o guarde, inspire e proteja, por toda a vida.

Discurso pronunciado pelo Mi­nistro Carlos Mário Velloso na Sessão Especial do Tribunal Fe­deral de Recursos, realizada no dia 31-8-81, em homenagem ao Ministro José Néri da Silveira, por motivo de sua nomeação pa­ra o cargo de Ministro do Supre­mo Tribunal Federal.