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SOLUÇÃO DE CONTROVÉRSIAS NO MERCOSUL Autoras: JÉSSICA DUQUE CAMBUY ANA PAULA OLIVEIRA ALVES 1. Noções sobre solução de controvérsias A ocorrência de desavenças no âmbito internacional traz a necessidade de se constituir formas para dirimi-las. Entretanto, a solução dos conflitos, das controvérsias no âmbito do direito internacional é algo complexo e delicado, tendo em vista não haver internacionalmente uma autoridade superior que amenize os conflitos, impondo uma solução, como ocorre internamente em cada Estado Soberano. Durante muitos anos, as desordens que surgiam internacionalmente eram solucionadas através da guerra, o que, por muitas vezes, acabava por gerar desordens maiores ainda. No decorrer dos anos então, a guerra foi sendo deixada de lado como meio de solução de conflitos - inclusive devido o surgimento de outros sujeitos de direito internacional de importância relevante, como as Organizações Internacionais – e foi dando espaço a outras formas de solução de conflitos. Faz-se mister ressaltar que um dos principais objetivos da Organização das Nações Unidas (ONU), é a manutenção da paz.

Solução de Controvérsias No Mercosul

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SOLUÇÃO DE CONTROVÉRSIAS NO MERCOSUL

Autoras:JÉSSICA DUQUE CAMBUY

ANA PAULA OLIVEIRA ALVES

1. Noções sobre solução de controvérsias

A ocorrência de desavenças no âmbito internacional traz a necessidade de se

constituir formas para dirimi-las. Entretanto, a solução dos conflitos, das controvérsias

no âmbito do direito internacional é algo complexo e delicado, tendo em vista não haver

internacionalmente uma autoridade superior que amenize os conflitos, impondo uma

solução, como ocorre internamente em cada Estado Soberano.

Durante muitos anos, as desordens que surgiam internacionalmente eram

solucionadas através da guerra, o que, por muitas vezes, acabava por gerar desordens

maiores ainda. No decorrer dos anos então, a guerra foi sendo deixada de lado como

meio de solução de conflitos - inclusive devido o surgimento de outros sujeitos de

direito internacional de importância relevante, como as Organizações Internacionais – e

foi dando espaço a outras formas de solução de conflitos. Faz-se mister ressaltar que um

dos principais objetivos da Organização das Nações Unidas (ONU), é a manutenção da

paz.

Atualmente se fala então em três meios de solução de conflitos

internacionais, os diplomáticos, os políticos e os jurídicos.

1.1 Diplomáticos

A solução diplomática dos conflitos é aquela realizada por meio de acordos

entre os sujeitos em choque. Podem envolver a intervenção de um terceiro ou não.

Contudo, caso haja essa intervenção, o terceiro será apenas um mediador, propondo

soluções sem obrigar às partes.

Exemplo de solução diplomática sem a intervenção de um terceiro são as

chamadas Negociações Diplomáticas, que se tratam de soluções encontradas pelas

próprias partes. Podem ser bilaterais ou multilaterais, todavia, atualmente as

multilaterais tem sido observadas com mais freqüência.

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Já um meio em que há a intervenção de terceiro são os “Bons Ofícios”, que

não pode ser confundido com a mediação, porquanto o terceiro daquele não conheça a

matéria sobre a qual os litigantes estão discutindo, apenas proponha uma pacificação. A

oferta de bons ofícios é uma das atribuições do Secretário Geral das Nações Unidas.

1.2 Políticos

Os meios políticos normalmente surgem quando está prestes a iniciar uma

guerra. Trata-se da intervenção de órgãos políticos ou organizações, que se incumbem

de resolver o conflito.

Consta da carta da ONU a possibilidade da atuação de seus órgãos como

negociadores, sendo a intervenção do Conselho de Segurança a mais comum.

1.3 Jurídicos

Os meios jurisdicionais se diferem dos demais por obrigar as partes, sob

pena de configurar ilícito internacional. São decisões de caráter obrigatório, pautadas

nas normas de direito internacional vigentes.

Entre as formas jurídicas de solução dos conflitos estão a arbitragem, a

Corte Internacional de Justiça.

A arbitragem trata-se da intervenção de um terceiro (árbitro) escolhido pelas

partes para julgar o conflito. Para garantir o efeito da arbitragem, é realizado

previamente um acordo entre as partes, em que elas afirmam se sujeitar à decisão que

será proferida pelo árbitro. Deve-se ressaltar aqui que, presentemente, tem sido

formados verdadeiros tribunais arbitrais, posto que não é mais comum a escolha de um

único árbitro, e sim de vários, dois ou três.

Já a Corte Internacional de Justiça trata-se de órgão da ONU, composto por

15 juízes eleitos pela Assembléia Geral e pelo Conselho de Segurança da ONU para um

mandato de nove anos, com possibilidade de reeleição pelo mesmo período. Tem por

função solucionar os conflitos relacionados à interpretação e à aplicação das normas de

direito internacional que surgem entre os Estados. Importante destacar aqui que os

demais sujeitos de direito internacional não estão subordinados à CIJ. Ademais, é órgão

desvinculado de todo e qualquer Estado. Sua competência surge a partir da proposição

de uma demanda e da correspondente contestação, como na própria justiça comum

brasileira.

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2. Noções sobre o MERCOSUL

O MERCOSUL trata-se de um bloco econômico que s urgiu a partir da

consolidação da democracia no Brasil e na Argentina, que favoreceu a relação de

cooperação entre os países. Seu marco inicial se deu com a assinatura do Tratado de

Assunção em 26 de março de 1991 por Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai.

O objetivo da criação deste bloco é a cooperação entre os países membros

através da facilitação circulação de bens e serviços e da adoção de uma política

comercial comum. Existe também no MERCOSUL a união aduaneira, consistente na

cobrança de mesmas tarifas aos demais países, ou seja, consistente em uma tarifa

externa comum.

Para que o objetivo do MERCOSUL seja alcançado, é necessária não só a

cooperação entre os países, como também o consenso na tomada das decisões.

Entretanto, nem sempre as idéias são homogêneas, e é justamente para manter a

harmonia e o equilíbrio do bloco que existem os métodos de solução de controvérsias no

MERCOSUL, objeto do presente trabalho.

3. Solução de Controvérsias no MERCOSUL

Logo do surgimento do MERCOSUL, foi apontado no anexo III do Tratado

de Assunção como seria feita a solução de controvérsias entre tais países. Segundo tal

dispositivo, as conseqüências decorrentes do Tratado de Assunção seriam solucionadas

através de negociações diretas. Caso isso não fosse possível, a controvérsia seria

submetida pelos Estados Partes à apreciação do Grupo Mercado Comum e, se ainda

assim não fosse solucionado o conflito, seria submetido ao Conselho do Mercado

Comum para que tomasse as devidas providências.

Tal anexo previa que em cento e vinte dias deveria ser criada uma proposta

provisória de solução de controvérsias e até o final do ano de 1994 deveria ser criado o

Sistema Permanente de Solução de Controvérsias.

Alguns tratados então, vieram estabelecer modificações neste sistema. O

que seria a proposta de solução provisória sofreu apenas algumas alterações e se tornou

o método definitivo. Dentre os tratados sobre tal tema, merecem destaque os Protocolos

de Brasília, de Ouro Preto e de Olivos.

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3.1 Protocolo de Brasília

O Protocolo de Brasília foi assinado em 1991 e estabeleceu a solução de

controvérsias por mecanismos extrajudiciais como negociação, conciliação e

arbitragem.

Segundo este Protocolo, seria de sua competência a solução dos litígios

relacionados ao Tratado de Assunção, tanto sobre interpretação e aplicação quanto sobre

os acordos supervenientes a ele relacionados, além das controvérsias decorrentes dos

atos dos órgãos do MERCOSUL.

Para tal solução, haveria três fases. A primeira seria de negociações entre as

próprias partes, as chamadas Negociações Diretas. Se dela não resultasse nenhuma

solução, poderia ser o conflito encaminhado ao chamado Grupo Mercado Comum(órgão

decisório executivo do MERCOSUL), que atuaria como mediador, apresentando

possíveis soluções, sem, contudo, vincular as partes. No caso das partes não entrarem

em acordo em um prazo de 30 (trinta) dias, passaria o conflito para a terceira fase, a

Arbitragem. Nesta terceira fase, os três árbitros do Tribunal Ad hoc (que são escolhidos

dentre uma lista com dez possíveis árbitros apresentados por cada Estado) decidiriam a

desavença com base em legislações internacionais elencadas no próprio Protocolo de

Brasília. A decisão dos árbitros deve ser apresentada por escrito e leva o nome de Laudo

Arbitral. Necessário observar aqui que o Laudo arbitral, apesar de possuir força

obrigatória, não possui força executória.

3.2 Protocolo de Ouro Preto

O Protocolo de Ouro Preto data de 17 de dezembro de 1994, foi um

adicional ao Tratado de Assunção. Seu principal ponto foi, em seus artigos 34 a 36, ter

atribuído personalidade jurídica ao MERCOSUL, fazendo assim com que se tornasse

possível a relação deste com outros blocos econômicos, outros países e outros

organismos internacionais.

No que tange à solução de controvérsias, o Protocolo de Ouro Preto, deu à

Comissão de Comércio do MERCOSUL, nos termos que seguem, a função de

“considerar reclamações apresentadas pelas Seções Nacionais da Comissão de

Comércio do Mercosul, originadas pelos Estados partes ou em demandas particulares –

pessoas físicas ou jurídicas -, relacionadas com as situações previstas nos artigos 1 ou

25 do Protocolo e Brasília, quando estiverem em sua área de competência”.

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Criou também a possibilidade de, em caso de não haver decisão por parte da

Comissão de Comércio, haver a remessa do litígio a um Comitê Técnico. Neste caso,

determinou que o Comitê elaborará um parecer técnico e enviará para a Comissão para

que decida o litígio. No entanto, se ainda assim não foi possível decidir o conflito, a

Comissão poderá encaminhar o parecer ao Grupo Mercado Comum. E, se ainda assim,

não houver conformidade com a decisão, as partes em conflito deverão recorrer ao

mecanismo arbitral, que é aquele previsto no Protocolo de Brasília.

3.3 Protocolo de Olivos

O Protocolo de Olivos entrou em vigor no ano de 2004 e é o que regula a

Solução de Controvérsias no Mercosul atualmente. Este manteve os métodos de

negociação e arbitragem previstos nos protocolos anteriores. Todavia, ocorreram

algumas mudanças, como na escolha dos árbitros para o Tribunal Ad hoc.

Atualmente, a para solucionar controvérsias nascidas no MERCOSUL é

preciso inicialmente que haja a negociação direta entre os Estados em conflito. Esta

primeira fase trata-se de mecanismo diplomático de solução de controvérsia. Em caso

de falha da negociação direta, qualquer um dos Estados pode recorrer ao método arbitral

e submeter a lide à apreciação dos juízes arbitrais. Os juízes arbitrais agora são

escolhidos da seguinte forma: dois deles são nacionais dos Estados do MERCOSUL

escolhidos em uma lista com 48 nomes, sendo 12 de cada estado. O outro é escolhido

em uma lista composta desta maneira: cada estado indica quatro candidatos de outros

Estados, devendo pelo menos um deles ser de um Estado que não seja membro do

bloco.

Merece destaque a possibilidade do juízo arbitral aplicar medidas

provisórias e o prazo de 60 dias, prorrogáveis por mais 30, para a emissão do Laudo

Arbitral.

Mais uma inovação trazida pelo Protocolo de Olivos foi a criação do

Tribunal Permanente de Revisão, uma espécie de segunda instância na solução de

controvérsias do MERCOSUL. Tal Tribunal é composto por cinco árbitros, sendo pelo

menos um nacional de cada Estado. Cada árbitro, entre os quatro nacionais de cada

Estado, fica no posto por um período de dois anos, podendo ser prorrogado por mais

dois. Já o quinto árbitro fica no posto por três anos sem possibilidade de renovação.

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Quando a controvérsia for entre dois Estados, será julgada por três árbitros

do TPR, quando for entre mais de dois, será julgada pelos cinco árbitros. O TPR pode

confirmar, revogar ou modificar a decisão do Tribunal Ad hoc.

“Os laudos do Tribunal Permanente de Revisão são inapeláveis e

obrigatórios para os Estados partes na controvérsia, possuindo, com relação a eles, força

de coisa julgada. (...) Se um Estado não cumprir total ou parcialmente o laudo, faculta-

se à outra parte, no prazo de um ano, iniciar a aplicação de medidas compensatórias

temporárias, tais como suspensão de concessões ou outras obrigações equivalentes, com

vistas a obter o cumprimento do laudo.”

Por fim, com relação ao foro para solução do litígio, o Protocolo de Oliva

faculta às partes à eleição do foro. Já quanto às sedes dos Tribunais, a do TPR está

localizada em Assunção, enquanto os Tribunais Ad hoc tem a liberdade de se reunir em

quaisquer cidades dos países membros do bloco.

4. Considerações finais

Observa-se então que, nas circunstâncias atuais de soluções de

controvérsias, o MERCOSUL tem optado inicialmente pelo método diplomático, tendo

em vista as vantagens deste no que diz respeito à manutenção da harmonia e da boa

convivência de países que buscam a união para progredir em conjunto.

Entretanto, podem surgir situações em que o simples acordo negocial se

torne inviável, trazendo assim a necessidade de um terceiro - órgão composto por

membros de todos os países em conflito e, portanto, neutro - intervir para buscar a

melhor forma de manter o equilíbrio do bloco, ou seja, trazendo assim a necessidade de

aplicação do método jurisdicional de solução de conflitos.

REFERÊNCIAS

AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Curso de Direito internacional público. 2ª Ed. São Paulo: Atlas, 2011.

BARRAL, Welber. Direito Internacional: normas e práticas. Florianópolis: Boiteux, 2006.

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BARRETO, Renata Nassar. Meios pacíficos de solucionar conflitos internacionais. In: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=1680 . Acesso em 14 de novembro de 2011 às 15h.

FRIEDRICH, Tatyana Scheila. Os meios de solução de controvérsias do Direito Internacional Público. In: http://www.parana-online.com.br/canal/direito-e-justica/news/67526/ . Acesso em 14 de novembro de 2011 às 15:30h.

MARTINS, Eliane M. Octaviano. Sistemática de Solução de Controvérsias do Mercosul: o Protocolo de Brasília e o Protocolo de Olivos. In: http://www.usp.br/prolam/downloads/2006_1_4.pdf . Acesso em 14 de novembro de 2011 às 9h.

REZEK, José Francisco; SETEE CÂMARA, José. Direito Internacional Público: curso elementar. 8ª Ed. São Paulo, Saraiva, 2000.

Sites:

http://www.mercosur.int/index.jsp

http://www.mercosul.gov.br/