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SONETOS

SEM SENTIDO

Sadat Oliveira

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CONVERSA COM O AUTOR

O soneto nasceu na Idade Média e foi consagrado por poetas como Petrarca, Sha-kespeare e Camões. Basicamente, um poema pode ser considerado soneto se possuir ca-torze versos.

A divisão destes versos varia, mas em geral apresenta três formatos clássicos: o chamado soneto petrarquiano é dividido em dois quartetos (estrofes de quatro versos) e dois tercetos (estrofes de três versos).

O soneto shakespeariano possui três quartetos e um dístico (estrofe de dois ver-sos). E há o soneto monostrófico, com uma só estrofe de catorze versos.

Obviamente os poetas experimentaram e experimentam outras formas de dividir es-trofes, de modo que a única regra para um soneto ser soneto, no fim das contas, é o li-mite de catorze versos. Ou não.

Sim, pois existe também o chamado “soneto estrambótico” ou “soneto esquisito”, que possui um verso extra (o estrambote), somando quinze versos. Miguel de Cervantes

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e Carlos Drummond de Andrade, por exem-plo, já utilizaram este formato.

Comecei a experimentar meus primei-ros sonetos em 1998, época em que estava descobrindo Gregório de Matos, Bocage, Au-gusto dos Anjos, Olavo Bilac...

Ao longo dos quinze anos seguintes, es-creveria cerca de duzentos sonetos, muitos deles bastante experimentais ou intimistas, de modo que fui impiedoso em selecionar menos de 10% deles para compor esta pe-quena coleção.

O título da obra, “Sonetos Sem Sentido”, não tem de fato um sentido senão o de que cada soneto a seguir segue sua direção pró-pria. E também é uma expressão de meu gosto por assonâncias e aliterações (como é o caso desse parágrafo, aliás).

Tenha uma boa leitura!

Sadat Oliveira [email protected]

esfingeseminotauros.blogspot.com

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PASSADO, PRESENTE, PORVIR

Quando volto meus olhos ao passado Sinto falta de certas coisas, falta Da alegria ingênua, intensa e vasta Da qual, quando criança, fui tomado. Mas passou, sou mais sério no presente, Vendo a vida com olhos de adulto; Conheci a saudade, a dor e o luto; Já não sou mais ingênuo e inocente. Aprendi, todavia, a ver na vida Algo bom, como quem, na chuva fria, Anda agasalhado em quente capa. Vejo mais, vejo o porvir que me espera. E é bom viver de nutrir quimeras, Como infância que nunca mais acaba.

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TOURADA

O toureiro entra na arena aplaudido Como se até fosse um artista de circo, Mas o que a plateia aplaude é o destino De sangue e de morte que irá ao bovino. Logo é perfurado a fim de enfraquecer E tornar possível a farsa de poder, De virilidade e de coragem humana, E a plateia louca com tal ilusão se engana. A cena covarde, de fato, só demonstra O quão atrasada, irracional e monstra É toda pessoa que chama de cultura O que, na verdade, é sádica tortura. Quando o boi definha, sangrando e sofrido, A plateia humana, ridícula, está rindo.

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ATRAÇÃO DO CÉU

Quando olho o céu Estrelado e belo Desejo sincero Ser levado ao léu. Oh que a gravidade Dos astros solares Me puxe, me atraia, Me arraste aos ares! Que um buraco negro Por mim tenha apego, Me sugue até ele. Quero mergulhar Neste imenso mar, Mundo sideral.

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OLHO DE HÓRUS

Por que será que ela me fascina? Faz a sina servir a seu favor, Pois fadado fiquei na prima vista. A conquista foi fácil e sem labor. E agora eu só tenho cuidados E vontade de falar-lhe ao ouvido; De contar minhas melhores piadas Pra que praza-me em vê-la sorrir. Mas eu sei, pois a linguagem da mente Se entende por gestos, não palavras. E o que pode ser tão mais eloquente Do que a forma como ela me encara? Foi seu olho de Hórus que um dia Me encantou, me lançou sua magia.

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VIDA E MORTE

Temer a morte? Não, não faz sentido. Por que a morte me amedrontaria? Pois mais assustadora é a vida E os desafios dela a cada dia. No fim das contas ambas se misturam Numa teia, numa só estrutura. E o que é viver senão morrer aos poucos? Um vulto, um vento, um volátil gás. A flor que aflora e faz-se fascinante É a mesma que fenece e se desfaz. E o que é a morte senão nascimento? Um salto, um giro, um tiro, um novo ciclo. Pois, enterrando o grão de uma semente, Estamos no começo e não no fim.

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FESTA

Hoje olhei para o céu ao meio-dia: Parecia um salão de dança. Em festa, Cada nuvem dançava e me sorria. Mas que tanta agitação, pois, é esta? O DJ era o vento que trazia Repertório que embalava a mente. Era tão agradável melodia. Só quem tem coração é que a sente. Dança, dança, se alegra, alegra grato. Tu que truques já inventaste um dia, Para ser mais feliz, saiba que o fato De viver é motivo pra alegria. Voa, vento, dança, nuvem, vem no céu dançar; Sol, se solte, aves, voem, deitem, rolem no ar!

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POETA

Há momentos em que desejo apenas Venerar a lua, namorar estrelas, Ver o vento vir virar meus cabelos E a noite fria eriçar meus pelos. Um momento a sós com todo o universo, Envolvê-lo, então, num imenso amplexo; Com doces canções, pássaros em festa Tocam corações num divino gesto. Então perceber que nossos apegos A certas ideias só nos deixam cegos. Assim para mim só uma coisa é certa: Eu não quero ser mestre ou cientista; Tanto faz pra mim a filosofia O que basta a mim é ser só poeta

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MEU DIREITO

Quem é que disse que eu sou obrigado A aturar tudo aquilo que não gosto... Não, obrigado. Prefiro andar pelado Do que vestir a moral dos doze apóstolos. Tenho o direito de não querer favores, Receber flores das mãos só de quem quero. Eu não preciso aguentar o lero-lero De quem só vive a contar mágoas e dores. Meu mundo é meu e quem quiser visitar Só vai poder se receber um convite, Mas os que entram serão tão bem tratados, Pois convidados por mim se tornam VIP. Não peço amor, nem presentes, peço sim Que deixem-me ser quem sou. Não é difícil.

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MUNDO DAS IDEIAS

Um dia eu sonhei que estava acordado E, por um minuto, quase despertei. E onde estaria eu hoje se, acaso, Tivesse aberto meus olhos pra ver? Será que nós somos, porventura, deuses? Será que os vermes são nossos senhores? Pois todos fadados estamos a ter Toda nossa obra reduzida a lodo. Sim, nós somos deuses, pois mundos criamos E imaginamos muitas fantasias, Então vem o verme e destrói nossos planos, Mas é um engano pensar que é o fim. Pois o pensamento, uma vez concebido, Não morre enquanto existirem ouvidos.

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PAGÃO

Eu vivo a mística dos magos: Sem céu, inferno ou pecado; Sem templo, sem sacerdote; Sem temer o além-morte, Pois o templo em que habito Sou eu, é o Infinito; E o Deus, a Deusa está em tudo, No acaso, no caos, no absurdo. Sou filho da terra, tenho um elo Com tudo de natural e belo. Evito os dogmas, busco ser eclético. Por isso corro um grande risco De ser lançado ao fogo vivo Pelos cegos que se acham certos.

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ELA

Ela chega cercada de um encanto E um espanto produz em sua presença. Só em vê-la já se esvazia a crença De que anjos na terra não encontro. Quem é essa que é dona de um sorriso E um carisma tão místico e divino? É uma sílfide, é uma deusa egípcia Com uns olhos de astuto felino. E, tão certo quanto não há destino, A não ser aos que cedem aos seus assédios, Também ela é doença sem remédio A quem bebe do seu magnetismo. O daltônico, o estrábico e o cego Logo curam-se pra vê-la de perto.

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COSMOVISÃO

Já disse Heráclito, Ovídio, idem Buda Que nesse misterioso mundo tudo muda. Tudo é efeito de uma causa e, nesse caso, A causa pode ser caos, ordem ou acaso. Quem é simplista e busca só uma explicação Pra todo evento, é evidente que não Percebe que as águas que correm no rio Não são as mesmas nem repetem seu caminho. Não sou o mesmo, minha única constância É a metamorfose de todo instante, Pois eu, você, Deus, universo, caos, vazio, Todos iguais somos às águas de um rio. Existe sim uma verdade: é a Mudança. Tudo se move no mundo. Os deuses dançam.

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ESCORPIÃO

Não entendo por que tantas pessoas Se acham donas de nossa discrição. Nos exigem que lhes prestemos contas Do que penso, o que faço e o que não. Não entendem quando eu vejo algo Com os olhos da minha intuição. E, por isso, não ouvem meus avisos E persistem rumo à decepção. Sou fiel e amigo confiável, Mas não queiram virar meus inimigos, Pois aquele em quem não tenho agrado Está mais do que morto para mim. Céu e terra, sexo e religião, Vida ou morte. Não faço distinção.