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1
SPIN-OFFS ACADÊMICAS E SUA IMPORTÂNCIA NO
DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO
Mariana de Oliveira Santos1
Francisco Horácio Pereira de Oliveira2
Lin Chih Cheng3
Janaine Farrane Cardoso4
Resumo
O artigo aborda o fenômeno das spin-offs acadêmicas, a partir da discussão de seu conceito e
de alguns fatores determinantes para o seu desenvolvimento. O objetivo é enfatizar o papel
central das empresas de tecnologia oriundas das universidades no posicionamento competitivo
de uma região, uma vez que sua criação sintetiza uma série de desafios culturais,
institucionais e legais que o Brasil ainda precisa superar. É feita uma revisão crítica de
literatura, e são apresentados três casos de empresas originadas na Universidade Federal de
Minas Gerais (UFMG), hoje instaladas no Parque Tecnológico de Belo Horizonte (BH-TEC).
Abstract
1 Economista, Especialista em Contabilidade Governamental e Mestre em Engenharia de Produção pela UFMG,
Gestora Executiva de Projetos do BH-TEC, Rua Prof. José Vieira de Mendonça, 770, Bairro Engenho Nogueira,
Belo Horizonte/ MG, Edifício Institucional, (31) 3401-1002, [email protected]
2 Doutor em Economia, Professor Adjunto do Departamento de Ciências Econômicas e Gerenciais da UFOP, Rua
do Catete, 166, Centro, Mariana/ MG, (31) 3557-3555, [email protected]
3 Doutor em Gestão de Sistemas pelo Department of Systems da Escola de Administraçao – University of
Lancaster e pelo Departamento de Engenharia de Produção e Sistemas (UFSC), Professor do Departemento de
Engenharia de Produção da UFMG, Av. Antônio Carlos, 6627, Escola de Engenharia, sala 3116, Pampulha, Belo
Horizonte/ MG, (31) 3409-4903, [email protected]
4 Pedagoga, Assessora Técnica do BH-TEC, Rua Prof. José Vieira de Mendonça, 770, Bairro Engenho Nogueira,
Belo Horizonte/ MG, Edifício Institucional, (31) 3401-1008, [email protected]
2
This paper discusses the academic spin-offs phenomenon, based on its conceptualization and
on some key factors for its occurrence and development. The goal is to emphasize the central
role of technology startup companies, originated from universities, for one region`s
competitive position, since their creation synthetizes several cultural, institutional and legal
challenges to be overcome in Brazil. A critical bibliographic review is presented, and then the
article shows three UFMG spin-off examples, which are nowadays tenant companies at Belo
Horizonte Technology Park (BH-TEC).
1- Introdução
O objetivo deste artigo é enfatizar o fenômeno das spin-offs de origem acadêmica, a partir da
discussão de seu conceito e de alguns fatores determinantes para seu desenvolvimento. Trata-
se de um mecanismo fundamental de capitalização e difusão do conhecimento gerado nas
universidades, cuja evolução reforça a importância e justifica em parte a existência dos
parques tecnológicos (SHANE, 2004) e demais ambientes de inovação.
O artigo está dividido em quatro partes, além desta introdução.
A próxima sessão esclarece os pilares do chamado empreendedorismo acadêmico de alta
tecnologia. Em seguida, é discutido o conceito de spin-offs acadêmicas. Na parte 4, são
descritos três casos de spin-offs da UFMG e, na última parte, são feitas breves considerações
finais.
2- O empreendedorismo acadêmico de alta tecnologia
Os dois pilares do chamado “empreendedorismo acadêmico” são os contratos de
licenciamento de tecnologias e a criação de empresas de base tecnológica (ETZKOWITZ,
1998; COLYVAS et al, 2002; PAVITT, 1998).
O licenciamento de tecnologias é possibilitado por escritórios de transferência de tecnologia,
onde profissionais ligados à universidade dão suporte – especialmente jurídico – para que os
pesquisadores, em primeiro lugar, protejam suas descobertas (via elaboração de pedidos de
3
patentes, por exemplo). Assim, os pesquisadores buscam garantir os direitos autorais sobre
determinada descoberta, com participação da instituição em que trabalham. Considerando a
legislação brasileira de patentes, a instituição de pesquisa é a proprietária do pedido de patente
e o pesquisador é o autor ou o responsável pela descoberta. Importa entender que as patentes
são ainda o principal indicador da produção tecnológica das instituições, sejam públicas ou
privadas, acadêmicas ou não. Esta é uma limitação estrutural, mas que já vem sendo
desconstruída a partir do entendimento de que uma descoberta (patente) sem valor comercial,
ou seja, que não pode ser utilizada na criação ou melhoria (transformada em) de um produto
ou serviço, não significará necessariamente maior produção tecnológica (SANTOS, 2010).
Estes escritórios de transferência de tecnologia muitas vezes se tornam uma espécie de
observatório do avanço científico da universidade, porque a princípio centralizam o
conhecimento sobre novas descobertas na instituição. Além de auxiliar na descrição de
patentes e no processo de proteção intelectual, os escritórios também auxiliam na elaboração
de contratos com empresas que desejem adquirir, por assim dizer, o direito de uso e
comercialização dessa descoberta. Uma questão central neste processo é a avaliação da nova
tecnologia e o desafio de garantir a justa distribuição dos retornos que aquela descoberta
poderá render para as partes – a universidade, o departamento de origem da descoberta, os
pesquisadores envolvidos e a empresa.
Pode-se dizer que as universidades públicas federais brasileiras estão ainda engatinhando com
seus escritórios de transferência de tecnologia – algumas delas criaram apenas muito
recentemente seus Núcleos de Inovação Tecnológica (NIT’s), induzidos por tímidos
incentivos governamentais. Isto se deve a vários fatores. Para citar algumas dificuldades,
deve-se levar em conta que muitos pesquisadores ainda não possuem a exata noção do
momento ideal para registrar uma patente e, principalmente, não buscam desdobrar as
possíveis aplicações daquela descoberta em produtos, serviços ou processos para o mercado.
Então, a noção do valor comercial daquela descoberta é no mínimo vaga para a universidade.
Isso dificulta a elaboração de contratos com empresas, porque aumenta o medo, por parte da
4
universidade, de perder financeiramente. Outra dificuldade tem a ver com a gestão da
negociação com as empresas, que ainda carece de profissionalização.
Diante das dificuldades no estabelecimento de contratos de transferência de tecnologia e da
possibilidade de maximizar os ganhos auferidos a partir de uma descoberta, os pesquisadores
se deparam com a alternativa de empreenderem eles próprios as novas tecnologias
desenvolvidas, abrindo uma empresa para ofertar produtos e serviços diretamente para o
mercado. Esta seria a segunda maneira típica de transferir tecnologias, a partir das
universidades, para a sociedade. E é para as chamadas empresas nascentes de base tecnológica
de origem acadêmica - ENBT’s de OA (ou simplesmente spin-offs acadêmicas – SOA’s) que
voltamos agora nossa atenção.
3- O conceito de spin-offs acadêmicas de tecnologia
As empresas criadas por membros da comunidade acadêmica – professores, pesquisadores e
alunos – são chamadas de start-ups ou empresas nascentes de origem acadêmica. Na maioria
das vezes, tais empresas são geradas por professores e alunos de pós-graduação. No Brasil, a
legislação não permite que professores de dedicação exclusiva das universidades públicas
federais dediquem parte do seu tempo à gestão e operacionalização das atividades cotidianas
das empresas que criam. No entanto, eles podem ser sócios-fundadores das empresas e serem,
por exemplo, autores das patentes ou de outro tipo de propriedade intelectual explorada
comercialmente pela empresa (ARRUDA et al, 2006).
Neste conceito, nem todas as empresas fundadas por alunos ou professores das universidades
serão consideradas spin-offs acadêmicas. Somente interessam as empresas de base
tecnológica, que surgem a partir da aplicação de algum tipo de conhecimento científico
produzido nas universidades, combinado com o desenvolvimento de novas tecnologias. Ou
seja, as spin-offs acadêmicas exploram comercialmente algum tipo de propriedade intelectual
criada na instituição acadêmica (SHANE, 2004; O’SHEA et al, 2008).
5
Uma característica fundamental da spin-off de origem acadêmica é que em geral, o seu
produto ou serviço de prateleira foi desenvolvido a partir de pesquisas e testes realizados em
laboratórios das universidades. Quer dizer, seu desenvolvimento dependeu da infraestrutura
laboratorial, física e até mesmo da participação de colaboradores que poderão ou não
participar do negócio, como os alunos de graduação e pós-graduação. Além disso, o
desenvolvimento da empresa se viabiliza a partir do acúmulo de conhecimento daquela
instituição e dos pesquisadores, aliado à percepção de que existe uma oportunidade de
negócio a ser explorada (SHANE, 2004; ROBERTS, 1991).
Nem todas as empresas de base tecnológica são provenientes das instituições acadêmicas.
Elas podem surgir também de laboratórios de pesquisa e desenvolvimento (P&D) das
empresas estabelecidas – são as chamadas spin-offs corporativas – ou mesmo a partir da
iniciativa de profissionais autônomos – seriam simplesmente start-ups de base tecnológica.
Essa proporção, no entanto, dependerá do locus de atuação profissional de pesquisadores em
uma determinada região.
A partir de estudos que comparam as empresas nascentes de base tecnológica (ENBT’s)
americanas e européias, MONCK et al (1990, p. 45) definem a empresa nascente de base
tecnológica como aquela: a) que foi estabelecida há menos de 25 anos; b) cujo negócio se
baseia numa invenção potencial ou possui riscos tecnológicos significativos em comparação
com um negócio tradicional; c) estabelecida por um grupo de indivíduos – e não como
subsidiária de uma empresa estabelecida; e d) estabelecida com o propósito de explorar uma
invenção ou uma inovação tecnológica.
A definição de Scott Shane, autor do livro intitulado “Academic Entrepreneurship”, de 2004,
considera uma spin-off acadêmica aquela empresa que é gerada para explorar algum tipo de
propriedade intelectual gerada na universidade, e conta com o envolvimento de pelo menos
um membro da comunidade acadêmica – professores, pesquisadores, estudantes. Assim, ele
exclui empresas fundadas por acadêmicos, mas que não exploram tecnologias desenvolvidas
nas suas instituições de origem; por outro lado, as spin-offs podem ser empresas fundadas por
6
terceiros para explorar tecnologias desenvolvidas na universidade ou instituição de pesquisa
Para efeito deste trabalho, será adotado o conceito de spin-offs acadêmicas a la SHANE
(2004), por se tratar de um modelo que implica a participação do acadêmico em atividade na
universidade.
3.1 Benefícios gerados pelas spin-offs acadêmicas de tecnologia
Existe um consenso na literatura acerca dos diversos benefícios das atividades de
empreendedorismo acadêmico na forma de criação de novas empresas. Para MONCK et al
(1990), as ENBT’s de origem acadêmica são uma grande promessa econômica especialmente
porque geram oportunidades de emprego para as gerações futuras (“incubam” tecnologias do
futuro), além de serem responsáveis por empregos mais qualificados em comparação com a
indústria tradicional. Para estes autores, o setor de alta tecnologia impulsiona a economia
como um todo, ou porque eleva os níveis de renda e consumo da população ou porque o
mesmo ambiente favorável ao surgimento e desenvolvimento de ENBT’s também induz o
crescimento dos negócios tradicionais (MONCK et al, 1990, p. 44-50).
O livro de SHANE (2004) apresenta dados no mínimo chamativos sobre a atividade do
empreendedorismo acadêmico em universidades dos Estados Unidos, Canadá e Reino Unido.
No que se refere ao impacto econômico gerado pelas spin-offs acadêmicas, por exemplo,
SHANE (2004) mostra que 72 por cento das empresas de base tecnológica criadas em Boston
no início dos anos 1980 foram baseadas em tecnologias desenvolvidas nos laboratórios do
Massachussetts Institute of Technology - MIT. Ao mesmo tempo, 40 por cento das empresas
deste tipo criadas na França entre os anos de 1987 e 1997 eram spin-offs acadêmicas, e 17 por
cento das EBT’s em Cambridge, em 1985, eram também spin-offs acadêmicas (SHANE,
2004, p. 15-20).
Não há dúvidas quanto ao fato de que a criação de empresas de base tecnológica favorece a
diversificação produtiva das regiões, contribuindo para dinamizar a economia e reduzir a
dependência de indústrias tradicionais (MONCK, 1990; SHANE, 2004; LEMOS & DINIZ,
2001). Além disso, esta prática pode resultar em ganhos financeiros significativos tanto para o
7
pesquisador, como para a instituição científica de origem. Em muitos casos, a atividade
empreendedora poderá se constituir numa importante fonte de complementação de renda para
o acadêmico, o que impedirá que ele se mude de cidade em busca de salários mais atrativos,
por exemplo.
Do ponto de vista da universidade de origem, SHANE (2004) argumenta que as spin-offs
facilitam a comercialização das tecnologias desenvolvidas ao garantir o envolvimento do
inventor no desenvolvimento tecnológico (conhecimento tácito), fundamental por se tratar
muitas vezes de tecnologias em estágio precoce de desenvolvimento. Em segundo lugar, a
criação de spin-offs contribui para que a universidade cumpra também sua missão de pesquisa
e ensino, já que atrai apoio financeiro para pesquisa, permite o treinamento de estudantes e
ainda garante suplementação salarial para os professores envolvidos (equities de suas
empresas geradas). Por fim, o autor sugere que os ganhos auferidos com a criação de spin-offs
poderão superar os ganhos advindos do licenciamento de tecnologias, como já ocorre em
algumas universidades americanas, onde a prática é mais difundida (SHANE, 2004, p. 25-36).
3.2 Processo de criação das spin-offs acadêmicas
O caminho entre a identificação de uma possível aplicação de um resultado de pesquisa,
passando pela identificação de uma real oportunidade de negócio e pelo desenvolvimento de
um produto (ou serviço), até chegar à criação e abertura de uma empresa é longo, incerto e,
em geral, dispendioso. Mesmo o empreendedorismo de base tradicional – cujo produto ou
processo é tecnologicamente maduro ou dominado – carrega em seu bojo uma série de
desafios, de naturezas variadas, tais como: formatação do modelo de negócio, gestão, correta
segmentação de mercado, desenvolvimento e diferenciação do produto, captação de recursos,
formação de equipe, entre outras.
Para empresas de base tecnológica, os riscos aumentam significativamente, em função da
incerteza inerente ao desenvolvimento da base tecnológica utilizada. Quer dizer, ao propor
uma solução tecnológica para um determinado problema, o empreendedor se vale de uma
combinação específica de conhecimento técnico e científico, carregada de conhecimento
8
tácito5, como ponto de partida para atuar no mercado. Se a solução eleita é ótima, o
empreendedor somente saberá depois de feita sua aposta (ou depois que outros, mais
“corajosos”, a fizerem).
Este contexto pode ser ilustrado com o conceito de trajetórias tecnológicas, introduzido pelo
economista Giovanni DOSI (2006), em 1983. As trajetórias tecnológicas podem ser
entendidas como o caminho típico percorrido pela indústria na aplicação de novos
conhecimentos, no sentido de esgotar as possibilidades de utilização deste conhecimento. Em
outras palavras, as trajetórias tecnológicas dizem respeito aos possíveis padrões selecionados
de desenvolvimento de novas tecnologias, desde a sua descoberta até a fase de saturação e
obsolescência. No entanto, as trajetórias não são inexoráveis e, pelo contrário, são
selecionados de acordo com critérios muitas vezes econômicos, mas somente poderão ser
validados como corretos (ou adequados ou bons) a posteriori. Ou seja, o contexto econômico-
industrial-político-institucional irá determinar a escolha de caminhos reais a serem
percorridos, a partir de um conjunto de trajetórias possíveis, o que evidentemente implica um
elevado grau de incerteza quanto aos resultados para os potenciais participantes do negócio,
sejam pesquisadores, professores, investidores ou outros parceiros.
Complementarmente, PEREZ & SOETE (1988), ao discutir os elementos que influenciam a
capacidade de uma empresa (ou de um país) absorver novas tecnologias ou participar do seu
desenvolvimento, explicam que na fase inicial de uma trajetória tecnológica (ou na fase
introdutória do “ciclo de vida de uma tecnologia”), os empreendedores geralmente estão
dispostos a pagar pelo processo de erro-tentativa, a fim de dominar uma base de
conhecimento científico. Desta forma, a inovação nesta fase depende mais fortemente do
pesquisador ou cientista que atue na fronteira do conhecimento científico e seja capaz de
decodificar as características desta nova tecnologia a ponto de possibilitar o uso do novo
conhecimento na produção industrial. Neste sentido, a fase inicial requer mais fortemente a
5 Para uma definição mais cuidadosa de conhecimento tácito, ver COLLINS (2007) e RIBEIRO & COLLINS
(2007).
9
proximidade com a universidade para a escolha correta de aplicações de um novo conjunto de
conhecimentos.
Importa observar que PEREZ & SOETE (1988) discutem qualitativamente as barreiras à
entrada na produção e desenvolvimento de uma tecnologia, do ponto de vista de empresas já
existentes no mercado. Ao se analisar a importância da experiência e do conhecimento
requeridos na fase de introdução de uma nova tecnologia, visualizam-se de imediato as
possíveis vantagens de se criar uma nova empresa, voltada para a exploração daquela “janela
de oportunidade”.
NDONZUAU et al (2002) apresentam um modelo geral para a criação de spin-offs
acadêmicas, levantando as principais questões acerca da “transformação” dos resultados de
pesquisa em “valor econômico”. Para isso, eles exploram a experiência de 15 universidades
de vários países (Finlândia, Suécia, Holanda, Reino Unido, Bélgica, França, Israel, Estados
Unidos e Canadá), no que se refere a seus programas de apoio às atividades empreendedoras.
São identificados quatro estágios principais do processo de geração de spin-offs, quais sejam:
1) a geração de idéias a partir dos resultados de pesquisa; 2) a elaboração de projetos de novas
empresas a partir das idéias geradas; 3) o lançamento das spin-offs; e 4) o fortalecimento das
empresas e ampliação do valor econômico gerado pelas mesmas (NDONZUAU et al, 2002, p.
281-2). A figura abaixo resume a proposta dos autores:
FIGURA 1 – Processo de criação de spin-offs acadêmicas
FONTE: Adaptado de Ndonzuau et al (2002)
1. 2. 3. 4.
Gerar Finalizar Lançar Fortalecer
resultados de
pesquisa
ideias de
negócio
novos projetos
de empresas
spin-offs
acadêmicascriação de valor
econômico
10
Na fase de geração de ideias, os principais gargalos surgem em função da cultura acadêmica e
de possíveis dificuldades na prospecção interna de “oportunidades”. No que tange a cultura
acadêmica, os autores citam como questões-chave a pressão pelas publicações (imperativo
“publish or perish”), a relação ambígua dos pesquisadores com o dinheiro e a natureza
“desinteressada” da pesquisa acadêmica (NDONZUAU et al, 2002, p. 283-4).
No segundo estágio apontado por NDONZUAU et al (2002, p. 284-5), de finalização de
projetos de novos negócios, duas dificuldades emergem. Em primeiro lugar, está a questão da
proteção intelectual, que exige clara identificação dos “donos” dos resultados de pesquisa e,
uma vez feito isso, definição de qual a melhor maneira para proteger aqueles resultados de
cópias e imitações. O segundo desafio desta etapa consiste na elaboração de um modelo de
negócios, concomitantemente ao desenvolvimento tecnológico, para verificar possibilidades
de exploração industrial (fase onde se inicia o desenvolvimento de um protótipo)
(NDONZUAU, 2002, p. 285). Neste estágio, dois gargalos se mostram mais relevantes: 1) o
conhecimento e a experiência necessários para a gestão do processo de prototipagem e para a
elaboração do modelo de negócios; e 2) o financiamento do protótipo e até mesmo do plano
de negócios.
Dito isto, parte-se para o que seria o terceiro estágio de criação de spin-off de acordo com
NDONZUAU (2002, p. 286-7), qual seja o lançamento da spin-off. Para começar a operar, a
empresa de base tecnológica deverá equacionar a questão dos direitos de propriedade
intelectual. Esse imbróglio envolve uma negociação com os departamentos de origem e com a
universidade, e consequente abertura (disclosure) da invenção para a universidade. Além da
participação da universidade nos direitos de propriedade da (futura) empresa, outro ponto
polêmico, para o caso de pesquisadores que ainda mantém vínculos com a universidade, se
refere ao uso da estrutura institucional pelos pesquisadores, na realização de atividades da
empresa criada (NDONZUAU, 2002, p. 287).
Por fim, o quarto estágio do processo de criação de spin-offs acadêmicas consiste no seu
fortalecimento ou crescimento sustentado. Nesta fase, a atuação de mercado da empresa é
11
mais bem definida, e a empresa passa a operar com mais independência com relação à
pesquisa universitária. Para não se incorrer no risco de que a empresa se mude para outra
localidade, NDONZUAU et al (2002) reforçam o papel do governo como fonte de incentivos
para retenção dos novos empreendimentos.
3.3 Fatores determinantes
A partir do processo de criação de uma spin-off acadêmica, acima descrito, pode-se pontuar
como fatores determinantes dessa modalidade de empreendedorismo acadêmico (SANTOS,
2010): 1) questões culturais e organizacionais; 2) questões de caráter legal e/ou institucional;
3) acesso a capital; e 4) motivações e habilidades individuais dos acadêmicos. Por uma
questão de espaço, essa discussão ficará reduzida.
Cultura organizacional
Este item se refere, grosso modo, a aspectos da cultura empreendedora nas universidades e à
(in)existência de incentivos para que os acadêmicos empreendam novos negócios. A ascensão
do professor ou pesquisador em sua carreira dependerá em grande medida da quantidade (e
qualidade) de suas publicações, atividade que consome tempo e energia. Ademais, se o
acadêmico tem acesso a recursos suficientes para realizar os experimentos que deseja, e está
satisfeito com sua renda, dificilmente vai desejar incorrer nos custos e riscos inerentes à
abertura de um negócio.
Um elemento central na cultura organizacional tem a ver com a proximidade com empresas
privadas, e consequente diversificação da fonte de recursos para a pesquisa acadêmica.
SHANE (2004) sustenta que as universidades que possuem pesquisas financiadas por
empresas privadas estão mais propensas à criação de novas spin-offs, seja porque empresas
privadas tendem a investir mais em pesquisa voltada para a aplicação comercial e satisfação
de necessidades imediatas do mercado, seja porque a prática da pesquisa financiada pelo setor
industrial capacita pesquisadores para as necessidades do mercado e sinaliza para potenciais
financiadores das spin-offs geradas sobre a viabilidade econômica destas novas empresas.
12
As regras tácitas (COLLINS, 2004), culturais, do ambiente acadêmico refletem as normas da
universidade – que regulamentam a prática da pesquisa científica, a comercialização de
tecnologias e a interação com o setor privado (indústrias, investidores, bancos, etc.) -, ao
mesmo tempo em que são realimentadas por estas. No fundo, a cultura da não interação e a
cultura da interação são ambas condizentes com o contexto da academia, desde que tenha
“sido sempre assim” (SANTOS, 2010).
Marco Legal
SHANE (2004) explora a evolução histórica da comercialização de tecnologia pelas
universidades norte-americanas desde fins do século XIX. Em especial, descreve as mudanças
ocorridas na segunda metade do século XX que culminaram no padrão atual das atividades de
spin-off. Destacam-se, nesse período: (i) a criação do “Northeast Council”, em 1925, com
ajuda do MI; (ii) a fundação da “Research Corporation”, por um professor da Universidade da
Califórnia (Berkeley); (iii) a criação de fundos de capital de risco ligados às universidades,
tendo sido o primeiro deles o “Community Technology Fund”, ligado à Universidade de
Boston, em 1974 (SHANE, 2004, p. 49); e (iv) o “Bayh-Dole Act”, de 1980, que previa que
as universidades passariam a deter direitos de propriedade sobre invenções originadas de
pesquisa financiada pelo governo.
O Brasil e todos os outros países do mundo emulam a experiência americana e tentam replicar
seus instrumentos bem-sucedidos de fomento ao empreendedorismo. No entanto, diferenças
culturais gritantes e mesmo a imitação incompleta (e incompetente) dos modelos e programas
americanos não fazem mais do que ampliar a distância entre as dicotômicas realidades.
Financiamento
Um dos principais gargalos com que se depara o empreendedor reside no financiamento de
suas atividades, ao menos até o momento em que a empresa se torne sustentável
financeiramente. Esse fato é particularmente verdade para os empreendedores de base
tecnológica, pois as ENBT’s possuem requisitos importantes em termos de capital para
13
desenvolvimento do seu produto, antes de ingressar efetivamente no mercado. Então, além do
investimento em capital fixo, os recursos necessários para a fase de prototipagem e scale-up
da produção podem ser um impeditivo para a entrada em operação da empresa.6
Motivações do empreendedor
O “empreendedor” é aquele que está disposto a incorrer nos custos (pessoais e financeiros) de
abrir uma empresa, aquele que visualiza uma oportunidade de negócio e trabalha para
consolidar este novo negócio em função da oportunidade visualizada. Mais especificamente, o
empreendedor neste trabalho é um membro da academia (professor, pesquisador ou estudante)
que resolve abrir um negócio, seja por iniciativa própria ou de terceiros (que podem ser do
setor industrial ou da administração da universidade ou instituto de pesquisa de origem).
Para Joseph Schumpeter, que pode ser considerado o pai do empreendedorismo, o empresário
e o empreendedor são, no fundo, a mesma figura, o “entrepreneur”. Isso porque o
“entrepreneur” schumpeteriano é por hipótese inovador e empreendedor (SCHUMPETER,
1982).
Além do ambiente institucional e das regras prevalecentes na instituição de pesquisa, importa
lembrar que a personalidade, as habilidades e a vivência pessoal dos pesquisadores serão
fatores decisivos para a qualidade e quantidade das atividades ligadas ao empreendedorismo
acadêmico. Entre estas, pode-se mencionar a ambição pessoal (“need for achievement”), que
está relacionada com questões de inserção social, de satisfação pessoal, entre outros aspectos
(O’SHEA et al, 2008).
ROBERTS (1991, cap. 3) reúne a análise de diversos aspectos que juntos caracterizam o
empreendedor tecnológico, argumentando que sua formação é prévia à sua atividade de
empreender. Assim, o autor analisa: a) o background familiar; b) a idade e a formação do
6 Ver SANTOS (2010), EMRICH & BAETA (2000), ROBERTS (1991), LIMA (2008)
14
empreendedor; c) experiência profissional anterior; e d) a personalidade ou motivações
pessoais do empreendedor (SANTOS, 2010).
4- Exemplos de spin-offs de tecnologia de origem acadêmica
Delimitado o conceito de spin-offs acadêmicas, esta sessão descreve três casos reais de
empresas residentes do Parque Tecnológico de Belo Horizonte (BH-TEC), a saber: a
ECOVEC, a Zunnit Technologies e a ENACOM, já consideradas “role models” no
ecossistema mineiro de inovação.
As informações foram coletadas pelos autores, e em seguida foram realizadas entrevistas
semi-estruturadas de validação com os empreendedores. As empresas serão brevemente
descritas, a fim de identificar suas características de diferenciação, a configuração da
propriedade da empresa, os desafios que enfrentam para crescimento e consolidação e os
retornos que as mesmas propiciam para a sociedade, bem como para a universidade de
origem.
4.1 ZUNNIT (www.zunnit.com)
Os empreendedores:
A Zunnit Technologies foi fundada em 2009 pelos professores do Departamento de Ciência
da Computação (DCC) da UFMG Nivio Ziviani – Ph.D. em Ciência da Computação pela
Universidade de Waterloo, Canadá, Professor Emérito do DCC/UFMG – e Alberto Laender –
Doutor em Computação pela University of East Anglia, Inglaterra, professor Titular do
DCC/UFMG. Ambos foram co-fundadores da Miner Technology Group, vendida para o
Grupo Folha / UOL em junho de 1999; e da Akwan Information Technologies, vendida para a
Google Inc. em julho de 2005.
Negócio da empresa
A empresa desenvolve ferramentas de apoio à decisão e análise preditiva para segmentação de
usuários e análise de comportamento, usando avançados recursos de Inteligência Artificial
(em especial Deep Learning) no tratamento de grande quantidade de dados complexos (Big
Data).
15
Envolvimento direto de staff da universidade
=> A empresa conta com um Conselho de Tecnologia (informal), cujos membros, voluntários
e não-remunerados, são professores da UFMG (Adriano Veloso, Rodrygo Santos, Renato
Assunção, Alberto Laender e Nívio Ziviani (presidente))
=> O CTO da empresa é graduado pelo DCC/ UFMG
=> A empresa contrata estagiários do DCC/UFMG, onde há excelência em sua área de
atuação.
Características únicas
1- Conselho de Tecnologia: característica inovadora de gestão, a exemplo da relação que a
Google tem com a Universidade de Stanford, garantindo a atuação da empresa na fronteira do
conhecimento.
2- A UFMG é sócia usufrutuária da Zunnit (possui 5% na forma de ações), o que acreditamos
ser ainda um caso único no Brasil (em que uma universidade federal, além de transferir know-
how de um departamento e de um professor para que o mesmo possa abrir uma empresa,
ainda adota uma modalidade de remuneração baseada no risco). Como a criação de spin-offs
de tecnologia da informação dificilmente requer processos de patenteamento, muitas vezes o
professor envolvido sequer formaliza a relação da empresa com a universidade de origem.
Outro desafio superado pelo caso da Zunnit foi de negociar com a procuradoria jurídica da
UFMG um contrato único, fixando uma remuneração para o Departamento.
3- Vasta experiência no tratamento de dados não-estruturados (como texto livre).
4- Capacidade de exibir os perfis de clientes em plataforma própria ou integrado aos seus
sistemas atuais, garantindo uma completa compreensão de cada perfil.
5- Ao invés de utilizar um pequeno conjunto de regras definidas previamente por seres
humanos, o Deep Learning cria centenas ou milhares de regras diferentes, garantindo
melhores resultados e ignorando automaticamente fatores que não são importantes
(permitindo resultados contra-intuitivos, que também poderão se mostrar estratégicos para os
clientes).7
7 Outras vantagens técnicas das soluções providas pela empresa são: Ações personalizadas automatizadas, como
mailing e promoções, de acordo com os perfis detectados pela ferramenta; baixo custo; integração direta com os
sistemas atuais, através de APIs; proximidade do desenvolvimento, com sede no Brasil e entrega rápida de
16
Retorno para a sociedade
=> Geração de empregos qualificados para mestres e doutores, em área normalmente ofertada
primordialmente em países desenvolvidos.
=> Geração de produtos de alto valor agregado e, consequentemente, geração de riqueza.
=> Potencial de atração de empresas de tecnologia sofisticadas, a exemplo do Centro de
Tecnologia do Google, instalado em BH há 10 anos, em função da aquisição da Akwan.
=> Empreendedorismo em série (professores universitários como “serial entrepreneurs”).
Retorno para a universidade de origem
=> Modelo inédito no Brasil de transferência de tecnologia
=> Pagamento de royalties
=> Orientações de trabalhos de graduação e de pós-graduação, publicações, formação e
desenvolvimento de pessoas para o mercado de trabalho, num setor extremamente
competitivo.
Concorrência: Existem grandes empresas trabalhando com o chamado BI (Business
Inteligence), mas sem a capacidade de refinamento e simplicidade fornecidos pela ferramenta
desenvolvida pela Zunnit.
Principais clientes atuais:
Estadão, Operadoras de Planos de Saúde, Sites de venda coletiva
4.2 ENACOM Handcrafted Technologies (www.enacom.com.br)
Os empreendedores:
Fundada em 2009 por Douglas A. G. Vieira – Ph.D. em Engenharia pelo Imperial College
London (Inglaterra) – e Adriano C. Lisboa – Ph.D. em Engenharia pela UFMG – ambos
oriundos do Departamento de Engenharia Elétrica da UFMG. Além de relevante produção
científica, os empreendedores possuem uma patente no exterior.
personalizações; possibilidade de instalação do sistema em infraestrutura própria do cliente, protegendo dados
sensíveis e confidenciais.
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Negócio da empresa
A empresa vende e licencia P&D para terceiros, sendo os principais setores de atuação:
Energia, Mineração e Telecomunicações.
Envolvimento direto de staff da universidade
=> Prática de desenvolvimento de projetos conjuntos com pesquisadores do Programa de Pós-
Graduação em Engenharia Elétrica da UFMG (Nível 7 da CAPES);
=> Embora os sócios não sejam professores da Universidade, coordenam projetos com
envolvimento direto da UFMG. Um exemplo é que atualmente um dos sócios coordena um
projeto de pesquisa que terá a colaboração de professor da Universidade de Conventry/
Inglaterra, tendo como host a UFMG, via Newton Fund;
=> Tem como colaboradores 5 doutorandos e 2 mestrandos da UFMG, 1 mestrando do
CEFET/MG e 2 mestrandos de uma Universidade do Canadá, que colaboram à distância.
Características únicas
1- Os dois sócios são pesquisadores colaboradores do Programa de Pós-Graduação em
Engenharia Elétrica da UFMG (Nota 7 na Capes);
2- Ambos são Bolsistas de Produtividade em Pesquisa do CNPq - Nível 2 - CA EE -
Engenharia Elétrica e Biomédica. Nessa categoria, só existem 3 bolsistas fora das
universidades no Brasil, sendo que o terceiro trabalha em uma multinacional em SP;
2- A empresa faz gestão sistemática de atividades de inovação, com 100% de entrega dos
projetos; conseguiram implantar práticas de gestão para tornar eficientes atividades de
pesquisa, desenvolvimento e inovação, o que lhes rendeu o Prêmio de Melhores Práticas de
Empresas ligadas a ambientes de inovação da ANPROTEC, no Seminário de 2014
(http://seminarionacional.com.br/seminario2014/2014/09/melhores-artigos-sao-premiados-
durante-sessao-de-encerramento);
3- Alto nível de escolaridade da equipe.
Retorno para a sociedade
=> Os projetos de inovação na área de eficiência energética são o carro-chefe da empresa,
visando a otimização do uso de recursos naturais
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=> Substituição de importações, a partir dos produtos gerados e serviços prestados (e.g.
software desenvolvido para a LIGHT e placa desenvolvida para a VALID), em decorrência do
trabalho de customização e adequação à legislação brasileira.
=> Formação de recursos humanos e retenção de cérebros (inclusive com baixo índice de
turnover, de 3,5 anos)
=> Contribuição em programas de intercâmbio, visando trazer estrangeiros para o país.
Retorno para a universidade de origem
=> Projeto coordenado pela ENACOM foi o ganhador do Prêmio Mineiro de Inovação 2015,
na Categoria Intangível, envolvendo a CEMIG, a UFMG e a UFVJM (Universidade Federal
do Vale do Jequitinhonha e Mucuri).
=> Em cinco anos de atuação, a empresa já captou via projetos R$ 3 milhões para a UFMG,
convertidos em melhoria infraestrutura laboratorial, complementação de remuneração para
professores e pesquisadores, formação de pessoas, publicações, etc.
=> Além das publicações e recursos para as universidades envolvidas em seus projetos, os
sócios da empresa acumulam em seu currículo um número relevante de orientação e co-
orientação de alunos de pós-graduação.
Concorrência: Concorre por projetos de P&D com a Universidade, além de ter mais duas
empresas nacionais que fazem apenas parte do trabalho da Enacom (Daimon Energia e PSR).
Principais clientes atuais:
CEMIG, Light, Vale, Valid.
4.3 ECOVEC: Inteligência para prevenção da dengue (www.ecovec.com)
Os empreendedores:
A Ecovec foi criada em 2002, a partir de tecnologia desenvolvida pelo professor da UFMG
Álvaro Eiras – Ph.D em Entomologia pela Universidade de Southampton e Professor
Associado II da UFMG – e um grupo de investidores.
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No ano 2000, o professor Álvaro coordenou o I Workshop da Plataforma FeroBio - Saúde
Humana e Animal, que resultou numa grande mostra de tecnologias selecionadas,
desenvolvidas pelas universidades brasileiras, com potencial de comercialização pela
indústria. Além da criação da Ecovec, um dos resultados da FeroBio foi a criação do Fundo
Verde-Amarelo da FINEP.
Ao longo de 10 anos, Álvaro Eiras acumula 10 patentes, 8 licenças, responde por
aproximadamente 10% do valor pago em royalties para a UFMG. Os royalties pagos pela
ECOVEC para a UFMG e para a Fapemig, correspondem a 2% e 0,55%, respectivamente, do
lucro auferido trimestralmente dos produtos MI-Dengue e MI-Vírus.
Negócio da empresa
A empresa desenvolve produtos e serviços de informação e suas aplicações para o
monitoramento e controle de vetores dentro da área de gestão em saúde pública, sobretudo
para a prevenção da dengue.
Características únicas
1- Tecnologia inovadora no mercado mundial, mesmo comparado a países como Cingapura e
Estados Unidos.
2- Pragmatismo e assertividade no desenvolvimento, a partir da adoção de premissas de
desenvolvimento “lean”, buscando agregar o máximo de conhecimento possível, em soluções
simples e úteis.
3- Preocupação com a usabilidade dos sistemas desenvolvidos, com a criação de ferramentas
amigáveis para os usuários da plataforma, seja ele um agente de saúde ou um gestor público.
4- Álvaro Eiras foi o primeiro professor da UFMG a licenciar a própria patente, em 2002.
Retorno para a sociedade
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=> Geração de empregos e pagamento de impostos, com resultados relevantes para contornar
um grande problema de saúde pública.
Retorno para a universidade de origem
=> Ampliação do recurso captado para a pesquisa em dengue na UFMG, após criação da
empresa;
Pagamento trimestral de royalties para a UFMG, sendo que os recursos são reinvestidos pela
Universidade em atividades de transferência de tecnologia, para fomento da Coordenadoria de
Transferência e Inovação Tecnológica (CTIT/UFMG), que é o “NIT” da UFMG.
Pagamento trimestral de royalties para a Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais
(FAPEMIG).
=> Aumento da produtividade acadêmica (publicações, orientações, resultados de pesquisa)
após criação da empresa.
Concorrência:
A principal concorrência que a Ecovec enfrenta no mercado nacional é indireta, referente a
métodos alternativos de combate à dengue (mas não de prevenção da doença, que é o foco da
empresa). De acordo com o sócio-fundador da empresa entrevistado, de fato existem
plataformas com propósitos similares, mas não com as funcionalidades e vantagens que a
Ecovec consegue ofertar.
Principais clientes atuais:
Municípios de Porto Alegre (RS), Santos (SP), Goiânia (GO), Uberaba (MG), e recentemente
uma cidade na Flórida/ EUA.
4.4 Quadro-síntese de características das spin-offs analisadas
Para facilitar a visualização, o quadro abaixo resume as principais características mostradas
das empresas pesquisadas. Nota-se que são empresas de diferentes áreas de atuação e com
bases tecnológicas bastante diversas.
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É possível perceber características comuns às três empresas analisadas, tais como: (a)
conciliação de interesses mais propriamente “acadêmicos” com interesses mais próprios do
“mercado” e a forte sinergia entre as atividades comumente vistas como mutuamente
excludentes; (b) comercialização de produtos/serviços/soluções estratégicos para a sociedade
e de alto valor agregado; (c) emprego de mão-de-obra qualificada, em atividades ainda raras
para a indústria brasileira, onde normalmente mestres e doutores não são absorvidos; (d)
ECOVEC ENACOM ZUNNITÁrea de atuação Saúde/ biotecnologia Engenharia TI
Propriedade/ sócios-
fundadores
Professor da UFMG, fundo
de investimento e
pesquisadores
Ex-alunos da UFMG Professores UFMG e
UFMG
Origem
Transferência de
tecnologia patenteada
pela UFMG
Aplicação de
conhecimentos
adquiridos na Escola de
Engenharia da UFMG
Transferência de know-
how do Depto de Ciência
da Computação da UFMG
Envolvimento staff
universidade
Professor empreendedor,
ex-alunos
Projetos conjuntos,
contratação de alunos
Professores, alunos e
pesquisadores, além de
Conselho de Tecnologia
Características únicas
Tecnologia única;
pioneirismo; adoção do
conceito de "lean startup"
e "lean launchpad", há 13
anos atrás.
Empreendedores são
Bolsistas de
Produtividade CNPq,
pesquisadores
colaboradores do
PPGEE/UFMG; capacidade
de gestão de P&D,
visando a flexibilidade e a
"auto-gestão"
Negócio de fronteira (big
data), fortes barreiras à
entrada, soluções de
baixo custo, Professor
Emérito como CEO,
modelo de transferência
de tecnologia
Retornos sociedade
Empregos qualificados,
solução importante para a
saúde pública.
Eficiência energética,
substituição de
importações, formação e
retenção de talentos
Empregos qualificados e
atração de investimentos
Retornos universidade
Royalties, recursos para
pesquisa, retorno para a
FAPEMIG, ampliação de
atividades acadêmicas
Recursos projetos de
pesquisa, Prêmios,
doações, publicações,
orientações e co-
orientações.
Royalties, publicações,
fomação de pessoas,
grande contribuição para
a pesquisa de fronteira
ConcorrênciaNão há concorrentes
diretos
Grandes empresas Grandes empresas
multinacionais
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efeito retroalimentador das atividades de inovação, seja pelos retornos financeiros para a
pesquisa aliados à geração e comercialização de novos produtos e serviços, seja pelo efeito-
demonstração que estes pesquisadores realizam nos ambientes em que circulam; (e)
pioneirismo e arrojo da UFMG na realização de contratos de transferência de tecnologia,
envolvendo membros da comunidade acadêmica; (f) surgimento de um novo tipo de
empresário, que se dedica a gerar intervenções de impacto nos setores em que atua, a partir da
aplicação direta de conhecimento no desenvolvimento de soluções de nítido valor para a
sociedade.
5- Considerações Finais
O artigo apresentado abordou um tema central no empreendedorismo de alta tecnologia: a
geração de spin-offs acadêmicas. A discussão realizada, ainda que breve, trouxe importantes
reflexões, visando ampliar a visão geral sobre o fomento ao desenvolvimento econômico,
considerando o contexto da economia do conhecimento. Partiu-se da premissa de que as spin-
offs acadêmicas - conforme conceito de Scott Shane (2004) - são motores para o
desenvolvimento de regiões e ampliação de sua competitividade frente ao mercado global.
O processo de criação de uma spin-off acadêmica, desde a geração da nova ideia de negócio
até a comercialização de um novo produto ou serviço resultante, carrega em seu bojo
complexas controvérsias culturais, legais e institucionais. Por isso, o olhar acurado para esse
processo faz-se absolutamente útil e prioritário.
Além da resenha crítica baseada numa ampla revisão de literatura, o trabalho apresentou três
casos de spin-offs da UFMG, que hoje residem no Parque Tecnológico de Belo Horizonte
(BH-TEC). Cada uma das empresas foi originada de uma forma diferente, mas todas
sintetizam algum grau de ineditismo e pioneirismo, envolvendo quebras de paradigmas e,
consequentemente, contribuindo para as mudanças estruturais necessárias no cenário de
inovação brasileiro.
23
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