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FESP FACULDADES CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO SUELENE LÍGIA LACERDA MONTENEGRO DO EMPREGADO DOMÉSTICO JOÃO PESSOA 2009

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FESP FACULDADES

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

SUELENE LÍGIA LACERDA MONTENEGRO

DO EMPREGADO DOMÉSTICO

JOÃO PESSOA

2009

SUELENE LÍGIA LACERDA MONTENEGRO

DO EMPREGADO DOMÉSTICO

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Faculdade de Ensino Superior da Paraíba – FESP como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador:

JOÃO PESSOA 2009

M777e Montenegro, Suelene Lígia Lacerda Empregado doméstico / Suelene Lígia Lacerda

Montenegro. – João Pessoa, 2009.

56f.

Orientador:

Monografia (Graduação em Direito) Faculdade de Ensino Superior da Paraíba – FESP.

1. Direito do trabalho 2. Empregado 3. Estabilidade Vínculo I. Título.

BC/FESP CDU: 34:331(043)

SUELENE LÍGIA LACERDA MONTENEGRO

DO EMPREGADO DOMÉSTICO

Monografia apresentada ao Curso de Direito, da Faculdade de Ensino Superior da Paraíba – FESP com requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Monografia Aprovada em ______/_____/_____

BANCA EXAMINADORA

Professor Examinador

Professor Examinador

Professor Examinador

Dedico este trabalho às pedras preciosas da minha vida: meus filhos: Rouseean (meu cravo), Yanna e Fernanda (minhas rosas), meus netos: Gabriel, Josevy Neto e Rafael, e meu esposo: Tota, sem os quais a minha vida não teria o brilho que tem.

AGRADECIMENTOS

A Deus, que com sua infinita bondade concedeu-me o dom da vida e com o qual sempre contei em todos os momentos da minha existência;

Aos meus pais, Josevy e Neves, por todos os ensinamentos de fé, amor, lealdade, justiça, ética, etc;

Aos meus filhos, Rouseean, Yanna e Fernanda, que representam a minha realização, o meu mundo, a minha vida, pelo brilho nos olhos de felicidade quando passei no vestibular, pelo amor e apoio e pelas tantas vezes que suportaram meus stresses, especialmente nos últimos dias;

Aos meus netos, Gabriel, Josevy Neto e Rafael, que vieram encher de entusiasmo e alegria os meus dias, completar minha felicidade;

Ao meu marido, Tota, pelo seu amor e companheirismo;

Aos meus irmãos, José, Kalina, Kelly e Anne, por torcerem sempre por mim;

A minha nora Déborah e meu genro Kiko, filhos do coração, sou muito feliz por fazerem parte da minha família;

Às minhas colegas da Secretaria Geral da Presidência, especialmente Eline e Lourdes, pela paciência, dedicação, ombro amigo nas horas difíceis e pela sincera amizade que me dedicam;

Aos meus colegas Anália Castilho, Izabela Maia e Marcelo Teixeira, pela paciência, dedicação e pelos sábios conhecimentos, mostrando-se dispostos a ajudar sempre, obrigada pelo acolhimento nos momentos difíceis;

Às minhas colegas de curso, especialmente Anália, Ana Augusta, Érica e Rita, por todo o carinho, por tantas risadas, por tantos momentos inesquecíveis; vocês fazem parte da minha história e não esquecerei de vocês;

Aos professores e funcionários da FESP, pelos ensinamentos transmitidos;

A todos que, de alguma forma, contribuíram para a realização deste sonho.

RESUMO

A presente pesquisa tem como foco de discussão o empregado doméstico, uma vez que, mesmo ocupando um lugar de suma importância em nossas vidas, haja vista a sua participação na vida íntima da família, só veio a adquirir um mínimo de cidadania a partir da edição da Lei nº 5.859/72. Tem-se, pois, como objetivo mostrar a evolução dos direitos e garantias dessa categoria, desde o citado diploma até as mudanças trazidas pela Lei nº. 11.324/2006, e parte-se de uma visão mais ampla do trabalho e do Direito Trabalhista para a exploração do assunto em razão da análise dos Códigos referidos. De forma que, inicialmente, encontram-se disponíveis as notas introdutórias nas quais enquadramos o tema. Em seguida, no capítulo I, se tem as noções gerais sobre o trabalho e o direito trabalhista, aonde é explicitado o conceito de trabalho, assim como as noções iniciais acerca do direito do trabalho e, ainda, os princípios tradicionais do direito do trabalho. No capítulo II, tem-se o empregado doméstico, onde são dispostos assuntos como o conceito, a aquisição de direitos ao longo do tempo, direitos e deveres, assim como a estabilidade provisória da empregada doméstica gestante e a dilatação do período da licença-maternidade. Por fim, apresentam-se as considerações finais, nas quais foram explicitadas as principais idéias apresentadas pela pesquisa, assim como as referências que tornaram possível a construção destes pensamentos aqui expostos.

Palavras-chave: Direito do Trabalho. Empregado. Vínculo. Estabilidade.

LISTA DE SIGLAS

ADCT – Ato das Disposições Constitucionais Transitórias

CDH – Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa

CEF – Caixa Econômica Federal

CFEMEA – Centro Feminista de Estudos e Assessoria

CLT – Consolidação das Leis do Trabalho

CPF – Cadastro de Pessoa Física

CTPS – Carteira de Trabalho e Previdência Social

DRT – Delegacia Regional do Trabalho

FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço

GPS – Guia de Previdência Social

INSS – Instituto Nacional de Seguridade Social

OIT – Organização Internacional do Trabalho

RSDED – Requerimento do Seguro-Desemprego do Empregado Doméstico

SINE – Sistema Nacional de Empregos

SIT – Secretaria de Inspeção Trabalhista órgão do Governo Federal

STF – Superior Tribunal Federal

SUMÁRIO

CAPÍTULO I - INTRODUÇÃO.....................................................................................8

CAPÍTULO II - UMA AMPLA VISÃO SOBRE O TRABALHO E O DIREITO TRABALHISTA ..............................................................................................11

2.1 O Conceito Jurídico de Trabalho ................................................................11

2.2 A Constituição do Direito do Trabalho .......................................................13

2.2.1 As etapas constitutivas do direito do trabalho ................................................14

2.3 Os Princípios Tradicionais do Direito do Trabalho ...................................16

2.3.1 Princípio da irrenunciabilidade........................................................................19

2.3.2 Princípio da continuidade da relação de emprego..........................................20

2.3.3 Princípio da primazia da realidade .................................................................21

2.3.4 Princípio da razoabilidade ..............................................................................21

2.3.5 Princípio da boa-fé .........................................................................................22

CAPÍTULO III - O EMPREGADO DOMÉSTICO.......................................................23

3.1 Conceito de Empregado Doméstico ...........................................................23

3.1.1 Empregado doméstico X diarista...................................................................26

3.2 O Empregado Doméstico e a Aquisição de Direitos ao Longo do Tempo28

3.3 Direitos em Espécie dos Empregados Domésticos em Conformidade com a Cartilha Trabalho Doméstico – Direitos e Deveres.................................29

3.3.1 Breve análise do tema....................................................................................30

3.4 Deveres dos Empregados Domésticos ......................................................34

3.5 A Estabilidade Provisória da Empregada Doméstica Gestante ...............35

3.5.1 Da previsão legal da estabilidade...................................................................35

3.5.2 Do vínculo à garantia da estabilidade.............................................................39

3.5.3 Da proteção da estabilidade ...........................................................................41

3.6 Dilatação do Período da Licença-Maternidade ..........................................45

CAPÍTULO IV - CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................48

REFERÊNCIAS.........................................................................................................50

ANEXO A - Lei nº 11.324, de 19 de Julho de 2006 ................................................52

ANEXO B - Lei nº 11.770, de 09 de Setembro de 200 ..........................................55

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CAPÍTULO I - INTRODUÇÃO

A presente monografia tem como meta o estudo do empregado doméstico,

observando a luta pela conquista dos seus direitos, haja vista que, embora a

situação do empregado doméstico constitua um caso muito especial, uma vez que é

a ele que o patrão entrega todo seu patrimônio, seus filhos, foi a profissão que

menos teve a atenção do legislador.

Em virtude deste tema, acompanhar-se-ão a evolução e a discussão jurídica

havidas, desde a edição da Lei nº 5.859/72, que trouxe um mínimo de cidadania à

categoria doméstica, seguida pela Constituição Federal de 1988, que ampliou os

direitos dessa classe trabalhadora, até a edição da Lei nº 11.324/2006, que, dentre

outras mudanças, assegurou à empregada doméstica gestante a estabilidade no

emprego desde a confirmação da gravidez até 05 (cinco) meses após o parto.

Dessa maneira, a pesquisa tem como meta realizar uma avaliação clara, sem

preconceitos, despretensiosa e dotada de isonomia a respeito das relações

empregatícias referentes ao empregado doméstico, da luta deste pelos direitos

adquiridos sob o âmbito jurídico.

Inicialmente, a pesquisa parte do ideal de que todo ser humano tem o direito

de ter a sua dignidade como a regra mais importante da Constituição Brasileira,

sendo o respeito à dignidade humana o grande cerne de todo sistema jurídico

nacional.

Em nosso País, diante das dificuldades encontradas e das precárias

condições, somadas à baixa escolaridade, muitas pessoas são levadas a exercer a

profissão de doméstica.

Assim, esta investigação tem como foco principal o estudo do empregado

doméstico em nosso país, acompanhando a paulatina aquisição de seus direitos,

visando a demonstrar que o empregado doméstico é empregado como qualquer

outro, merecendo o mesmo tratamento dispensado aos demais empregados e que,

certamente, a concessão de tais direitos só traz benefícios, uma vez que se o

mesmo for tratado com justiça e dignidade, melhor executará suas tarefas devido ao

seu grau de satisfação. Procurar-se-á trazer à tona assuntos primordiais e

interessantes relativos ao tema acima citado.

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Na verdade, espera-se que esta pesquisa venha a contribuir não apenas

como acervo de conhecimento sobre o tema, mas que também sirva como fonte de

consulta, ajudando, ainda, no aperfeiçoamento dos conhecimentos sobre os

princípios que norteiam as leis de proteção ao trabalho do empregado doméstico.

A partir dos argumentos citados na realidade relatada acima, o presente

trabalho tem como tema específico o retrato das relações empregatícias domésticas

em função das conquistas ocorridas ao longo dos anos.

Em razão de suas metas, destacam-se determinados conceitos do direito,

através de uma análise direcionada, sem que se mascarem preconceitos, ou ainda

visões constituídas de moralismos, por entender que, de fato, existe diferenciação

entre outros prestadores de serviços e empregados domésticos, que ficam a mercê

da proteção legal do Estado.

Além disso, especificamente, a pesquisa apresenta outras observações,

como os princípios tradicionais do direito do trabalho, e demonstra a necessidade de

que se aplique a igualdade prevista na Constituição Federal de 1988.

A partir daí visou-se a analisar de forma mais esmiuçada a legislação vigente

desde 2006, onde foram previstas mudanças significativas, de maneira a construir

um texto claro, especificando a estabilidade provisória da empregada doméstica

gestante, que passou a receber um amparo jurídico, através de decisões proferidas

pelo Poder Judiciário do país, com a finalidade de que este se corrobore como um

instrumento de pesquisa para a sociedade de maneira em geral, assim como

também para a comunidade acadêmica atuante ou não na área específica do Direito

Trabalhista.

Para a elaboração da monografia, parte-se da idéia de que o operador de

Direito deve estar cada vez mais atento às mudanças ocorridas na sociedade, com a

finalidade de que este sirva de forma efetiva como um instrumento para a

transformação dessa sociedade, e não apenas um tecnicista de uma legislação que

ainda é falha. Esta pode ser uma maneira de aproximar o cidadão do Estado, a fim

de se obter uma sociedade mais igualitária e mais justa, rumo ao bem-comum.

Como forma de tornar mais compreensível a pesquisa, foram estabelecidos

procedimentos metodológicos que guiaram toda a sua elaboração. Dessa maneira, e

de acordo com Gil (2002), a presente pesquisa pode ser corroborada como estudo

monográfico, de caráter exploratório, uma vez que a mesma teve como finalidade

10

propiciar maiores informações sobre o tema determinado através da definição de

objetivos e formulação de hipótese.

Dentre as metas, destaca-se, de maneira geral, a realização de um estudo

teórico acerca do tema central, o empregado doméstico, destacando a legislação

que lhe concedeu direitos e impôs deveres, bem como a análise da estabilidade da

empregada doméstica gestante, prevista na Lei nº 11.324/2006, e as mudanças

ocasionadas por sua homologação e, ainda, o aumento da licença-maternidade de

quatro para seis meses. Por fim, foram ainda apresentadas as considerações finais,

nas quais são retomadas as principais idéias aqui relatadas, como forma de

favorecimento de uma reflexão ainda mais aprofundada sobre o tema.

11

CAPÍTULO II - UMA AMPLA VISÃO SOBRE O TRABALHO E O DIREITO

TRABALHISTA

2.1 O Conceito Jurídico de Trabalho

Para a ciência jurídica, o trabalho tem que ter um conteúdo lícito, deve

possuir um valor e ter um caráter social proveitoso, mas não necessariamente

precisa se apresentar como uma atividade produtiva.

Segundo Nascimento (2000), o Direito de Trabalho vai se ocupar do trabalho

subordinado, dependente, ou seja, daquele em que alguém põe as suas energias

em virtude do bem de outra pessoa e que exerce determinada função sob as ordens

dela.

Tem-se assim que, juridicamente, o trabalho vai corresponder a toda

atividade humana realizada licitamente, que, sob a dependência de outras, é

realizada no intuito de se obter ganhos (NASCIMENTO, 2000).

De acordo com o autor, o trabalho se apresenta sob a estrutura do serviço

efetuado por um sujeito (empregado) em favor de outro (empregador), protegido

pela legislação que o Estado apresenta. Decorre, portanto, de uma atividade

humana realizada por uma pessoa física, que se destina à criação de um bem, que

pode ser avaliado materialmente, quando do surgimento da relação pela qual o

sujeito presta, ou ainda se obriga a prestar, pela própria força de trabalho em virtude

de outro sujeito, obedecendo por conta de uma retribuição recebida em troca.

O trabalho, sob a égide do Direito do Trabalho, tem sido definido dentro de

três critérios (DELGADO, 2006):

- objetivista, que leva em consideração qual o objetivo a ser atingido com a

atividade, ou seja, a relação de trabalho (DONATO, 1982 apud DELGADO,

2006, p. 50);

- subjetivista, que leva em consideração os sujeitos pertencentes a esta

relação (HUECK; NIPPERDEY, 1963 apud DELGADO, 2006, p. 50);

- misto, que faz uma combinação entre os dois critérios (MAGNO, 1991 apud

DELGADO, 2006, p. 50).

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Essa conceituação ao direito do trabalho como sendo o conjunto dos

princípios e normas que vão regulamentar as relações jurídicas que têm origem na

prestação do serviço que é subordinado tem como conseqüência a situação

econômico-social das pessoas que o exercem.

Antes da Revolução Industrial, o trabalho tinha um caráter extremamente

servil, sendo realizado, muitas vezes, com mão de obra escrava, num ambiente

patriarcal. Essa atividade era repassada de uma geração a outra, sem que isso

criasse qualquer tipo de vínculo. Cada grupo familiar buscava a satisfação de uma

necessidade, e as regras ou normas de trabalho não eram estabelecidas, não

havendo as relações entre trabalhador e empregador (NASCIMENTO, 2000).

Nessa realidade, que envolvia o trabalho escravo, não havia liberdade, assim

como não havia a noção de direito. Conforme ilustração do mesmo autor, o direito

do trabalho é um produto com história recente na humanidade, e surgiu, apenas, a

partir das mudanças significativas ocorridas na sociedade, a partir do século XIX,

quando uma sucessão de fatos - cujo marco principal foi a Revolução Industrial, a

mecanização do trabalho humano e o desenvolvimento da economia - tornou-se o

ingrediente que fez surgir o Direito do Trabalho.

O trabalho livre era visto como uma das mais significantes comprovações da

liberdade do indivíduo. Essa liberdade, no entanto, era ceifada, uma vez que não

oferecia meios para que o operário, em situação de extrema miséria, pudesse

recusar uma jornada que se estendia, muitas vezes, por até quinze horas. A

realidade, na teoria, era de liberdade, contudo, a cada dia, o operário aumentava a

sua condição de dependência do patrão.

Ainda levando em consideração a obra de Nascimento (2000), tem-se que, no

período em que eclodiu a Revolução Industrial, a classe manufatureira partiu para o

combate da legislação mercantilista, que tinha características protecionistas e fazia

menção ao feudalismo. Passava a dominar, na época, o individualismo, como uma

nova noção ética, a qual deveria prever a liberdade não apenas na empresa, mas,

sobretudo, a liberdade do homem que vive em sociedade, e não obstante do homem

na sua vida trabalhista.

Essa realidade se dava uma vez que a liberdade da mão-de-obra se tornava

necessária para que os novos empreendimentos obtivessem prosperidade, o que

era essencial para os negócios.

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Diante disso, as novas relações passaram a ser regulamentadas através de

contrato social e não mais pelos valores que eram fixados conforme o interesse das

corporações de ofício. É importante também que se lembre que os objetivos sociais

passaram a ser entendidos como uma soma de metas individuais.

O mundo obedecia às normas pressupostas pelos filósofos liberalistas, que

afirmavam que todos os cidadãos deveriam ser vistos como partes iguais perante a

lei, realidade difícil de ser atendida, uma vez que, cada vez mais, tornava-se

impossível a separação de proprietários que detinham o capital dos não-

proprietários que detinham da mão-de-obra. Conforme ilustra Nascimento (2000, p.

39):

O individualismo levava a uma exploração do mais fraco pelo mais forte. O capitalista livremente podia impor, sem interferência do Estado, as suas condições ao trabalhador. Havia mera igualdade jurídica. Em curto tempo, estavam os mais ricos cada vez mais ricos e os mais pobres cada vez mais pobres. O mais forte subjuga o mais fraco. Aumentava a legião dos empobrecidos. Imaginava-se que as pessoas podiam auto regulamentar seus interesses pelas regras do Direito Natural. O Estado não deveria interferir, as relações econômicas se auto regulamentam. A submissão da vontade do mais fraco levou à prática de injustiças, concentração da riqueza nas mãos de poucos. A desprotegida massa operária sofria, enquanto o Estado assistia inerte, na convicção liberal de que seu papel não devia ir além da ordem pública, podendo os cidadãos conduzir-se como melhor lhes aprouvesse.

Dessa forma, o Estado não poderia servir somente às finalidades individuais.

Assim, o Legislador precisava agir de forma que viesse a garantir uma igualdade

jurídica, que diminuísse a desigualdade econômica. Ora, até mesmo a própria

dignidade humana se encontrava submissa à opressão econômica. O individualismo

precisava assumir um papel secundário, para que o interesse social e coletivo fosse

realçado.

2.2 A Constituição do Direito do Trabalho

O Estado, quando começou a legislar sobre as relações de trabalho, impôs

travas à liberdade de contratação. Em conformidade com o encontrado na obra do

mestre em direito Martins (2003), o individualismo contratual daria lugar ao dirigismo

contratual, obedecendo à intervenção jurídica do Estado e limitando a autonomia da

vontade do contratante.

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Buscou-se, através de medidas do legislador, o equilíbrio entre os sujeitos do

contrato, tanto contratante, quanto contratado, deixando este de ser mero

espectador da realidade social, para exercer um papel de impor regras aos

contratantes. Com essas normas, conforme destaca o autor, o Estado buscou

proteger economicamente o mais fraco, numa forma de compensar as

desigualdades econômicas, tornando a relação entre as partes mais igualitária. É aí

que reside a essência do Direito do Trabalho: na necessidade de tornar igual

juridicamente a diferença econômica.

A existência do intervencionismo tem por fim a promoção do bem-estar social

e a melhoria das condições de trabalho. O trabalhador passa a ter maior proteção

jurídica e econômica, sendo, a lei, um instrumento que visa o estabelecimento de

normas mínimas acerca das condições de trabalho e que devem ser respeitadas

pelo empregador.

Em consonância com o que afirma Martins (2003), o Estado passa a exercer

a sua verdadeira missão, ou seja, a de ser um órgão promovedor do equilíbrio e da

orientação da ação individual, que visa o benefício do bem e dos interesses do

coletivismo.

A formação do Direito do Trabalho, segundo Granizo e Rothvoss (apud

DELGADO, 2006) ocorreu em quatro estágios, divididos com o objetivo puramente

didático.

2.2.1 As etapas constitutivas do direito do trabalho

De acordo com Granizo e Rothvoss (apud DELGADO, 2006), a primeira fase

foi determinada como fase de formação e se deu no ano de 1802, com a publicação

da Lei Peel, que vigorou até 1848, com a publicação do Manifesto Comunista. A Lei

Peel foi elaborada por um industrial inglês, que ficou tocado com as condições

desumanas a que eram submetidos os menores, quando da Revolução Industrial, e

que passou a adotar medidas humanitárias em suas indústrias.

A Lei buscou a diminuição da exploração dos trabalhadores menores de

idade, proibindo o trabalho no período da noite e diminuindo a jornada no período

diurno. Era também condição da lei lançar os fundamentos de um direito novo e

mais humanizado.

15

Em razão do Manifesto Comunista tem-se o despertar para a consciência da

sociedade dividida em classes, assim como a maior conscientização por parte da

classe trabalhadora. Nessa época, o trabalhador passou a perceber que seu

trabalho era um fator que agregava valor ao bem produzido. Dessa forma, era justo

e razoável que o trabalhador pudesse reivindicar e resistir às duras condições de

trabalho que lhe eram impostas. O manifesto teve como principal alicerce a

resistência, que foi base para a luta dos operários contra as injustiças às quais eram

submetidos.

Já a segunda fase, de conformidade com os mesmos autores, ficou

conhecida como período de intensificação. Teve início em 1848 e durou até 1891.

Nessa fase observou-se uma intensificação do Direito Trabalhista.

Por fim, a terceira fase, segundo entendimento dos autores anteriormente

mencionados, teve seu ponto mais marcante em 1919, com o advento da

Constituição de Weimar e a criação da Organização Internacional do Trabalho –

OIT. Nessa fase foi oficializado o Direito do Trabalho, que passou a fazer parte das

ordens jurídicas dos países desenvolvidos. Foram também incorporados os

princípios, constitucionalizando-os, incluindo os que têm relação direta com a seara

trabalhista como, por exemplo, o da dignidade humana e da justiça social. Para

Delgado (2006, p. 96):

Essa fase se define como o instante histórico em que o Direito do Trabalho ganha absoluta cidadania nos países de economia central. Esse direito passa a ser um ramo jurídico absolutamente assimilado à estrutura dinâmica institucionalizadas da sociedade civil e do Estado. Forma-se a Organização Internacional do Trabalho; produz-se a constitucionalização doDireito do Trabalho; finalmente, a legislação autônoma ou heterônoma trabalhista ganha larga consistência e autonomia no universo jurídico do século XX.

Tem-se, na última fase, a denominação da autonomia do Direito Trabalhista

com a iniciação da OIT – Organização Internacional do Trabalho, mediante medidas

inseridas no Tratado de Versalhes, no ano de 1919, e que se estende por várias

décadas do século XX. Essa fase é denominada por Delgado (2005) como sendo

um momento de crise e de transição do Direito do Trabalho.

O Direito do Trabalho tinha, inicialmente, um caráter muito mais humanitário

do que jurídico, uma vez que sua meta primordial era a defesa dos trabalhadores, de

maneira mais específica e intensa de mulheres e crianças que se encontravam em

16

condições desumanas, exercendo cargas horárias de trabalho inaceitáveis, dada a

sua fragilidade física.

Num momento posterior, o Direito Trabalhista passa a se consolidar como um

produto das mudanças econômicas, sociais e políticas, alcançadas com a

implantação do Capitalismo e da Revolução Industrial. A sua hegemonia se encontra

configurada dentro da relação de trabalho, que era subordinada, devendo obedecer

à lógica política do trabalho como um dever a ser cumprido.

Dessa maneira, a origem do Direito do Trabalho se encontra fortemente

correlacionada com o capital, uma vez que o Estado e a industrialização propiciavam

aos trabalhadores um artifício da garantia na relação de trabalho, o que resultou,

como consequência, numa situação mais pacífica na sociedade da época, bem

como a diminuição de protestos reivindicatórios por parte da classe trabalhadora,

que se baseava nas idéias da doutrina socialista.

Vive-se num período de mudanças nas estruturas sociais, onde se sofrem

alterações nos estilos de vida e nas modalidades de trabalho.

O Direito do Trabalho, como parte do organismo social, não poderia ser

diferente, e vem passando por inúmeras transformações. A tendência

contemporânea das relações trabalhistas não pode ignorar a nova realidade, que se

baseia no desemprego estrutural, nas ocupações em caráter transitório, no trabalho

realizado com precariedade e com duração diminuta, que são fatores decorrentes da

predominância do setor terciário.

2.3 Os Princípios Tradicionais do Direito do Trabalho

Os Princípios Gerais do Direito são considerados pressupostos essenciais da

Teoria Geral e da Doutrina Clássica que envolve o Direito do Trabalho. O Código

Civil os elenca, no art. 4º de sua introdução, a exemplo do que também acontece na

CLT – Consolidação das Leis do Trabalho (art. 8º), como uma das fontes que dão

subsídio à Justiça do Trabalho e às autoridades administrativas, para que possam

recorrer e sanar omissões na área que compreende as relações trabalhistas.

Os princípios traduzem, de forma geral, a noção das proposições que são

fundamentais na formação da consciência das pessoas e dos grupos coletivos,

dotada de certa realidade e que no momento posterior a terem sido elaboradas

17

tomam direção à compreensão, reprodução ou recriação dessa realidade

(DELGADO, 2006).

Nas palavras do autor supracitado, tem-se que os princípios são linhas, ou

seja, diretrizes, que visam informar as regras e que servem de inspiração direta ou

indireta para uma série de soluções, podendo servir para a promoção, assim como

para o embasamento e a aprovação de novas normas, para a orientação e a

interpretação das existentes, como também para a resolução de casos que não se

encontrem previstos.

Para o Excelentíssimo Senhor Ministro do STF – Superior Tribunal Federal,

Eros Roberto Grau (2003), o sistema do direito é composto de três princípios, assim

aduzidos pelo mesmo:

a) Princípios explícitos, recolhidos no texto da CF – Constituição Federal ou

da lei;

b) Princípios implícitos, inferidos como efeito do conhecimento de pelo

menos um dos preceitos constitucionais ou de uma lei, um conjunto de

textos normativos da legislação infraconstitucional. O autor cita como

exemplos o princípio da motivação do ato administrativo exposto no artigo

93, X, da CF; e o princípio da imparcialidade do juiz presente no artigo 95,

parágrafo único, e 5º, XXXVII da CF;

c) Princípios gerais do direito. Também são implícitos, inclusos no direito

pressuposto, no qual o da vedação do enriquecimento sem causa.

Ressalta ainda, o mesmo autor, que os princípios são considerados como

relatos, apresentando alto índice de abstração, podendo ser aplicados de maneira

indeterminada. Além disso, salienta, o nobre jurista, que existe, no processo pela

determinação do princípio uma tensão dialética entre dois princípios: o do intérprete,

que será medido em função da dimensão do valor, e de cada um, mediante as

concessões recíprocas que se realizam.

A melhor noção acerca do assunto advém de Reale (1975, p. 57):

Um edifício tem sempre suas vigas mestres, suas colunas primeiras, que são o ponto de referência e, ao mesmo tempo, elementos que dão unidade ao todo. Uma ciência é como um grande edifício que possui também colunas mestras. A tais elementos básicos, que servem de apoio lógico ao edifício científico, é que chamamos de princípios, havendo entre eles diferenças de distinção e de índices, na estrutura geral do conhecimento humano.

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Nas idéias citadas por Martins (2003), toda a estrutura do Direito Individual é

fundamentada nas diferenças sociais, políticas e econômicas que existem entre os

sujeitos componentes da relação empregatícia, cujas desigualdades são diminuídas

através de ornamentos tutelares, que têm como meta propiciar o maior equilíbrio

entre os dois pólos envolvidos: empregador e empregado.

Nos Estados Democráticos de Direito, a valorização do trabalho corresponde

a um princípio de caráter fundamental, que expressa de maneira mais contundente a

orientação que segue o Direito Trabalhista, que é a de proteger, a partir da

aplicabilidade de uma norma mais favorável, o trabalhador.

Martins (2003) alerta para o fato de que essa implicação viola, de

sobremaneira, o tradicional Princípio da Igualdade Jurídica do Direito Comum, de

acordo com o qual a proteção dos sujeitos deve se dar de forma igualitária.

Vale lembrar que, historicamente, o Direito do Trabalho é oriundo da idéia de

que não se pode existir igualdade jurídica entre pessoas com poder e capacidade

econômica desiguais, portanto, o objetivo principal é dado em virtude da proteção e

da redução das desigualdades existentes entre as partes: empregador e empregado.

O princípio da proteção teve origem na necessidade de intervenção estatal

nas relações exercidas dentro da sociedade industrial. Esse período foi demarcado

pela autonomia da vontade nas relações de contrato, que tornavam mais facilitadas

a exploração do trabalho, principalmente em se tratando de crianças e mulheres.

Nas palavras de Silva (1999), o Direito do Trabalho, assim como as demais

áreas jurídicas, obedece a princípios gerais de direito e a princípios especiais. A

proteção dos trabalhadores teve início de maneira precisa, através de regras

relativas à segurança e à higiene. O autor indica que as razões para a busca da

proteção do trabalhador são:

A subordinação jurídica ao empregador, uma vez que no contrato de trabalho

uma das partes detém a preeminência em relação à outra que pode se expressar

por meio do Poder Diretivo do empregador, respeitando os limites no seu

exercício, com a finalidade de se evitar abusos;

A dependência econômica que tem o empregado em relação ao empregador,

contudo não devendo esta constituir um elemento caracterizador do contrato de

trabalho;

O comprometimento em realizar suas atividades, no qual a execução dos seus

serviços lhe deixa vulnerável a certas situações, a exemplo de acidente de

19

trabalho, auxílio doença, assédio moral e sexual, que são decorrentes das

relações e dos vínculos empregatícios;

A falta de conhecimentos mínimos, básicos por parte dos empregados e que

visam esclarecer as condições de trabalho e dos direitos decorrentes do baixo

nível de instrução escolar da população, principalmente em países como o Brasil,

com um índice de subdesenvolvimento ainda considerado alto em comparação a

países da Europa ou aos Estados Unidos, por exemplo.

Toda a evolução no ramo do Direito do Trabalho tem o sentido primordial de

proteger a classe trabalhadora, o que representa um resultado bastante peculiar,

pois o trabalhador depende do empregador tanto para a execução de suas tarefas

como no que tange ao seu ganho financeiro, seu sustento econômico, motivo pelo

qual se deve garantir a proteção como forma de evitar a submissão, assim como

protegê-lo de excessos ou desvios por parte do empregador que resultem na perda

da dignidade do seu prestador de serviços (MANUS, 2007).

2.3.1 Princípio da irrenunciabilidade

De acordo com o exposto na obra de Delgado (2006), o Princípio da

Irrenunciabilidade refere-se ao fato da impossibilidade jurídica do trabalhador de

renunciar a uma vantagem concedida pelo Direito Trabalhista.

Encontra guarida nos artigos 9º e 468 da CLT. Este só permite que se alterem

as condições de trabalho com o consentimento do empregado e, desde que não lhe

acarretem prejuízo, sob pena de nulidade. E aquele dispõe que é nulo todo ato

destinado a fraudar, desvirtuar ou impedir a aplicação da legislação trabalhista.

Estamos, portanto, diante de uma regra de defesa à parte hipossuficiente na relação

de trabalho, que é o empregado. Cumpre aqui ao Princípio da Irrenunciabilidade

uma forma clara de orientação à aplicação da norma jurídica, dando instrumento aos

que julgam invalidar atos contrários aos interesses do empregado, não obstante

tenham sido autorizados por ele.

Esse princípio é também denominado de Princípio da Indisponibilidade dos

Direitos Trabalhistas. Embora com outras palavras, mas dispõe, no mesmo sentido,

da impossibilidade do empregado, por sua própria vontade, de desistir de vantagem

20

e proteção que lhe assegurem o contrato de trabalho já firmado e ou de normas

previstas na ordem jurídica.

Para o mestre Delgado (2006, p. 202) essa definição última é a melhor

denominação pelas razões a seguir expostas:

A expressão irrenunciabilidade não aparece adequada a revelar a amplitude do princípio enfocado. Renúncia é ato liberal, como se sabe. Entretanto, o princípio examinado vai além do simples ato unilateral, interferindo também nos atos bilaterais de disposição de direitos (transação, portanto). Para a ordem justrabalhista, não serão válidas quer a renúncia, quer a transação que importe objetivamente em prejuízo ao trabalhador.

2.3.2 Princípio da continuidade da relação de emprego

Os contratos de trabalho podem ser assinados com prazo determinado, bem

como por prazos indeterminados. Naquele caso, há uma data final previamente

avençada e, na segunda hipótese, não há termo final estipulado, logo, o contrato

tem duração indefinida.

O princípio sob análise tem como fundamento teórico a tendência para a

conservação do contrato de trabalho, ato que se encontra expressado em quase

todas as esferas das legislações trabalhistas. Esse princípio também é um fator

capaz de gerar benefícios para o empregador, visto que este pode contar com um

empregado dotado de uma experiência maior, em razão do acúmulo de

conhecimentos adquiridos ao longo da trajetória contratual na empresa, assim como

se pode, também, evitar prejuízos na organização empresarial, o que vai significar

agregação de valor para empresa, e por conseqüência, para a sociedade, através da

diminuição dos índices de desemprego (DELGADO, 2006).

O princípio da continuidade da relação empregatícia tem sua base no

parâmetro de relacionamentos duradouros, indefinidos, que são característicos de

uma sociedade industrial e se referem aos modelos de produção fordista e

keynesiano, que tem como fundamentação a conservação do contrato de trabalho

que beneficie, de maneira específica, o trabalhador em muitos aspectos, desde a

inegável importância do trabalho como o único meio para a subsistência do

trabalhador e dos seus dependentes, bem como o trabalho sendo visto como um

fator de interação social, uma vez que, quando o sujeito se encontra desempregado,

ele apresenta instabilidade social.

21

Assim, este princípio foi idealizado para que suas diretrizes sejam aplicadas

em relações empregatícias de caráter duradouro, são típicas do estado de bem-

estar social.

2.3.3 Princípio da primazia da realidade

A relação de trabalho é baseada numa situação real em que o trabalhador se

faz presente; daí ser correto afirmar que o contrato de trabalho tem como forma um

contrato-realidade. Logo, fica prevalecido aquilo que é acordado entre ambas as

partes, pois, na relação de trabalho, deve ser pontificada sempre a veracidade dos

fatos que correspondem aos acordos formais firmados, com base nas leis.

A realidade deve ser dotada sempre e necessariamente na verdade, uma vez

que a documentação pode, também, refletir uma situação simulada, com o objetivo

de macular os reais acontecimentos praticados durante a prestação do serviço, o

que vai impedir o cumprimento das obrigações legais, e fazer com que uma das

partes obtenha algum tipo de aproveitamento ilícito. Pode ocorrer, ainda, uma

divergência entre os fatos indicados pelos sujeitos pertencentes à relação de

emprego, prevalecendo, in casu, a situação real, e não a situação formal

(DELGADO, 2006).

2.3.4 Princípio da razoabilidade

Foi inserido na Carta Magna, após a Emenda Constitucional 45/2004, pelo

inciso LXXVIII, art. 5º, que dispõe que “a todos, no âmbito judicial e administrativo,

são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a

celeridade de sua tramitação”. Cumpre-nos assinalar que o legislador quis

demonstrar a obrigação do Estado de prestar uma tutela jurisdicional efetiva,

adequada e tempestiva, mantendo uma ordem jurídica estável.

A aplicação do Princípio da Razoabilidade não é exclusiva do Direito do

Trabalho, já que ele se constitui em um traço comum entre esta área e as demais

áreas do ordenamento jurídico, as quais se estruturam em meio ao critério da razão

e da justiça, que tem origem na natureza humana e buscam a concretização de uma

22

justiça vista como ideal, na qual se presume que o homem, um ser social, deve agir

através do bom senso e não dotado de ações consideradas arbitrárias.

Esse princípio tem seu uso baseado num critério distintivo em situações

limites nas quais se deve distinguir a realidade da simulação. As práticas comerciais

e industriais são dotadas de dinamicidade, onde as relações de trabalho podem ser

fontes geradoras de inúmeras situações confusas ou limítrofes, sendo necessários

esclarecimentos da realidade dos fatores gerados da relação de trabalho,

principalmente os derivantes de hipóteses em que se busca o reconhecimento de

vínculo empregatício.

2.3.5 Princípio da boa-fé

O contrato para prestação de um serviço é fato gerador de direito e de

obrigações, que tem ordem exclusivamente patrimonial e também pessoal, resulta

numa relação estável e contínua na qual se é exigida a confiança de ambas as

partes e em todos os âmbitos, obedecendo às mesmas direções, bem como às

direções opostas e, sobretudo, permanecendo por um período duradouro.

É fundamental que haja reciprocidade entre empregador e empregado, em

razão de ambos atuarem com lealdade, honestidade, lisura e probidade, quando da

elaboração e execução do contrato, de modo que um sujeito não prejudique o outro

dentro da relação, que deve ser configurada com fundamento dentro da ética.

23

CAPÍTULO III - O EMPREGADO DOMÉSTICO

3.1 Conceito de Empregado Doméstico

Sabe-se que inicialmente o trabalho doméstico era prestado por escravos que

vinham da África, especialmente as mulheres que cuidavam da casa, cozinhavam,

engomavam, e ainda serviam de amas de leite para os filhos dos Senhores de

engenho. Sobreveio o fim da escravidão e a situação persistiu, haja vista que, por

não possuírem nenhuma condição de sobrevivência, os ex-escravos preferiram

continuar nas fazendas. Uma vez que não tinham o que comer nem onde dormir,

faziam todos os serviços em troca de um teto e de um prato de comida,

permanecendo ano após ano na mesma submissão.

Conforme registrado por Martins (2009), somente em 1972 é que essa classe

de trabalhadores foi efetivamente reconhecida, pois a Lei nº 5.859/72 cuidou de

tratar especialmente dos direitos trabalhista do empregado doméstico, uma vez que

os diplomas até então apenas faziam menção a essa categoria.

Para melhor conceituá-lo, citaremos o texto de Valeriano (1998, p.18):

A palavra doméstico deriva do latim domesticus, referente a casa, a vida da família, ao lar. Muitas vezes também se usam outras expressões como criado ou criada, como é utilizado no art. 178, § 10, V, do Código Civil “ ... a ação de serviçais, operários e jornaleiros, pelo pagamento dos seus salários” e artigo e art. 1.521, III, também do Código Civil “ ... o patrão, amo ou comitente, por seus empregados serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou por ocasião dele.

Já com a edição da Lei da Lei n. 5.859, de 11 de dezembro de 1972

(regulamentada pelo Decreto nº 71.885 de 9 de março de 1973), essa classe de

trabalhadores passou a ter um tratamento específico, definindo em seu art. 1º o

empregado doméstico como: “aquele que presta serviços de natureza contínua e de

finalidade não lucrativa à pessoa ou à família no âmbito residencial destas”.

Portanto, podem ser aqui enquadrados os que trabalham como professores

particulares, jardineiro, cozinheira, governanta, arrumadeira, motorista, damas de

companhia, caseiro, babá, dentre outros, desde que não haja nenhuma finalidade

24

lucrativa por parte do empregador, razão por que os empregados que exercem suas

atividades em empresa não são considerados domésticos, pois tais

empreendimentos têm como meta o lucro (MARTINS, 2009).

Destarte, verifica-se que o trabalho doméstico não se limita apenas às tarefas

domésticas, podendo ser desenvolvido na área urbana ou rural, pois aquele que

trabalha em sítios, fazendas, granjas, onde não há venda de produtos e se destina

unicamente ao lazer, também são empregados domésticos, ou, se for o caso,

diaristas.

Já a orientação normativa MPS/SPS nº 02/94, especifica:

5.2 é considerado empregado doméstico aquele que exerce atividade de natureza contínua à pessoa ou família, no âmbito residencial destas, em atividades sem fins lucrativos. 5.2.1 São considerados empregados domésticos, entre outros o piloto ou o comandante de aeronave e o motorista que prestam serviços nas condições previstas no subitem anterior. 5.2.2 Não é considerado empregado doméstico aquele que exerce as atividades previstas no subitem 5.2 para o próprio cônjuge ou companheiro.”

Observando a Lei nº 5.859/72, verifica-se que há três condições especiais

para que o empregado seja considerado doméstico:

1ª - natureza contínua, ou seja, que o serviço seja contínuo, não interrompido,

o que significa dizer que aqueles que prestam serviços eventuais, alguns dias do

mês, a exemplo do diarista, poderão ou não ser considerados como doméstico, de

acordo com o caso concreto.

2ª - sem fins lucrativos, que não haja lucro com o esforço daquele trabalhador,

além do âmbito residencial daquela família, daquele lar, a exemplo da empregada

doméstica que faz salgados para sua patroa vender, a mesma está sendo desviada

da sua verdadeira função, portanto não será considerada como empregada

doméstica e sim como o empregado regido pela CLT.

3ª - à pessoa ou família verifica-se por essa condição que o trabalho

doméstico não pode ser prestado à pessoa jurídica, entretanto ele não está

vinculado apenas ao interior da residência, pode ser executado externamente, desde

que seja para pessoa ou família, onde se inclui o serviço nas casas de campo, de

veraneio e outras extensões residenciais, pois o termo "âmbito residencial" é visto de

forma ampla e não diz respeito apenas à moradia do empregador, a exemplo do

25

motorista que viaja com a família, o fato de se deslocar da residência, no exercício

das funções, não o afasta da relação de trabalho doméstico (MARTINS, 2009).

O empregado doméstico se equipara, em muitos aspectos, ao empregado

especificado no art. 3º da Consolidação das Leis do Trabalho: “considera-se

empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a

empregador, sob a dependência deste e mediante salário”. Seu tipo legal possui as

mesmas características: pessoa física, pessoalidade, onerosidade e subordinação,

entretanto, o que realmente o difere dos demais empregados é o fato de que a

atividade do doméstico deve ser exercida no âmbito familiar e sem fins lucrativo ou

seja deve restringir-se ao exclusivo interesse do empregador ou de sua família, não

produzindo, portanto, lucro, o que descaracterizaria o vínculo doméstico (MARTINS,

2009).

No mais, conforme mencionado acima, ele se enquadra nas características

previstas no art. 3º da CLT para os demais empregados:

1 - pessoa física, significa dizer que tal serviço não pode ser prestado por

pessoa jurídica.

2 - pessoalidade, é a vinculação a determinada pessoa, a uma pessoa

específica, não podendo haver contrato com um e a prestação dos serviços ser

executada por outro.

3 - onerosidade, que é o recebimento salarial pelos serviços executados.

4 - subordinação, trata-se de que o empregado deva seguir o que é

determinado pelo empregador, a exemplo do cumprimento de horário e da

obediência às regras da casa.

Portanto verifica-se que o trabalho doméstico não se limita apenas as tarefas

domésticas, podendo ser também o motorista, damas de companhia, guardas, bem

como que esse trabalho pode ser desenvolvido na área urbana ou rural, pois

aqueles que trabalham em sítios, fazendas, granjas, onde não há produção

destinada ao lucro, e se destina unicamente ao lazer, também são empregados

domésticos.

26

3.1.1 Empregado doméstico X diarista

O empregado doméstico, segundo o art. 1º da Lei 5.859/72, é: “aquele que

presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à

família no âmbito residencial destas”, ou seja, que o serviço não cesse, não seja

interrompido, não seja eventual.

Vejamos então o que diz o Delgado (2005, p. 369):”[...] o elemento da não-

eventualidade na relação de emprego doméstica deve ser compreendido como

efetiva continuidade, por força da ordem jurídica especial regente da categoria”.

Porém, acerca do assunto, especifica Martins (2009, p. 21) que:

A expressão não eventual não pode ser entendida apenas pelo fato de o trabalhador não se inserir nos fins normais de atividade da empresa, mas em razão de prestar serviços episódicos, uma vez ou outra para o empregador. São serviços ligados ao evento, como de consertar a instalação elétrica ou hidráulica da empresa, mas não ao fato de o trabalhador prestar serviços uma vez por semana em dia fixo.

No tocante a discussão a respeito do reconhecimento ou não da diarista como

empregado doméstico, há na jurisprudência decisões diversas, senão vejamos:

Doméstica – Relação de emprego. Diarista. Ainda que preste serviço em apenas alguns dias por semana, a diarista possui vínculo empregatício pois estão presentes os requisitos da pessoalidade, da subordinação jurídica, do trabalho no interesse do empregador e do salário. Enquadra-se como doméstica” (TRT-9ª Região, 3ª T., RO 1.998/90, Rel. Juiz Ricardo Sampaio, j. 10-4-91, m.v. mo mérito, DJPR 24.05.91, p.154).

Diarista-Vínculo de emprego-Inexistência: A prestação de serviços em apenas três dias por semana na execução de serviços domésticos revela a condição de diarista, cuja relação, por se ressentir dos requisitos da continuidade, subordinação e dependência econômica, não configura o liame empregatício previsto no art. 1º da Lei nº 5.859/72. Recurso provido"(TRT-10ª Região-3ª Turma-ROPS nº 00131-2006-010-10-00-3-Brasília-DF-Rel. Juiz João Luiz Rocha Sampaio-Julg. Em 19.07.2006-Pul. Boletim AASP 2509 de 05 a 11.02.2007)

No TST, há decisões no seguinte sentido:

Empregado doméstico, segundo definição do art. 1º da Lei nº 5.859/72, é aquele que presta serviços de natureza contínua, para pessoa ou família, no âmbito residencial destas. Depreende-se do texto legal, pois, que uma das exigências é o desempenho do labor de forma contínua. Trata-se de imposição rigorosa que, uma vez não caracterizada, afasta a condição do trabalhador de empregado doméstico (TST, 3ª T., RR 394603/1997, juíza convocada Deoclécia Amorelli Dias, DJU 2-2-2001, p. 634, conforme Carrion, Valentin, Nova Jurisprudência Trabalhista. São Paulo: Saraiva, 2001, 2º semestre, p, 148, nº 748). “VÍNCULO EMPREGATÍCIO DIARISTA. Consignado pelo Tribunal Regional ter a diarista liberdade na fixação de seu horário e dia de

27

atendimento, afasta-se a indicada ofensa ao art. 333, inciso II, do Código de Processo Civil. Não configuradas a subordinação e a continuidade para reconhecimento do vínculo, ou seja, não se desincumbiu a reclamante de comprovar os elementos fáticos (art. 333, inciso I, CPC) constitutivos do direito que perseguia (reconhecimento do vínculo de emprego). RR 533739/1999, j. 20-3-2002, Rel. Min. João Batista Brito Pereira, DJU 12-4-2002).

Já Martins (2009, p. 22) afirma que:

Não existe eventualidade na prestação de serviços de uma faxineira que vai toda semana, por longos anos, à residência da família, sempre nos mesmos dias da semana. Pelo contrário, há continuidade na prestação de serviços que são realizados no interesse do empregador, pois as atividades de limpeza e lavagem de roupas são necessidades normais e permanentes do empregador doméstico.

Ao analisar as normas acerca do presente assunto, verifica-se que não há em

nenhum regramento a menção à quantidade de dias para poder caracterizar a

relação existente como de doméstico ou diarista.

No tocante ao assunto, transcreve-se o seguinte acórdão:

Diarista. Caracterização. A Lei nº 5.859 não dispõe quantas vezes por semana a trabalhadora deve prestar serviços ao empregador para ser considerada empregada doméstica. Não existe previsão na lei no sentido de quem trabalha duas vezes por semana não é empregado doméstico. Um médico que trabalha uma vez por semana no hospital, com horário, é empregado do hospital, o advogado que presta serviços num dia fixo no sindicato e tem horário para trabalhar é empregado. A continuidade do contrato de trabalho restou demonstrada, diante do fato de que autora trabalhava duas vezes por semana. O trabalho da reclamante era feito toda semana, duas vezes e não uma vez ou outra. Isso caracteriza a habitualidade semanal e não que o trabalho era feito ocasionalmente. Vínculo de empregado mantido (TRT 2ª R., 2ª T., Proc. Nº 20050674034 (00367.2005.261.02.00-1), Rel. Sergio Pinto Martins).

Assim, verifica-se, que para diferenciar o empregado doméstico do diarista,

não há uma regra a seguir, devendo ser examinado cada caso concretamente para

poder dar a devida caracterização, não basta que seja observada apenas a

subordinação, mas, especialmente, se há continuidade ou eventualidade do serviço,

haja vista ser a continuidade, um dos principais elementos caracterizadores da

relação de emprego doméstico.

28

No tocante ao assunto, o Tribunal Superior do Trabalho ao julgar as

demandas acerca do reconhecimento ou não do vínculo doméstico ou diarista, tem

como foco principal a continuidade e o exercício da atividade sem fins lucrativos,

pois, segundo comenta o ministro Carlos Alberto Reis de Paula, nas notícias do dia

28/04/2009, no sítio eletrônico do TST, "A continuidade pressupõe ausência de

interrupção, de forma que o trabalho se desenvolva de maneira expressiva ao longo

da semana", enquanto a não-eventualidade significa que o executor vai apenas

alguns dias da semana e que vai receber tão logo acabe o serviço, o citado Ministro

declarou ainda:

Na ausência de uma definição precisa do que seriam "alguns dias", os juízes do Trabalho têm considerado que a prestação de serviço em um ou dois dias exclui o critério de continuidade, enquanto que os que trabalham mais de três costumam tê-la reconhecida.

3.2 O Empregado Doméstico e a Aquisição de Direitos ao Longo do Tempo

A CLT, que especifica normas protetivas ao trabalhador, não incluiu os

domésticos, os quais permaneceram por muito tempo quase sem direito algum.

A Lei nº 5.859/72 foi o primeiro diploma a contemplar a categoria dos

empregados domésticos com alguns direitos, quais sejam: férias anuais

remuneradas (20 dias úteis - adquiridas após 12 meses de exercício); anotação da

CTPS e inscrição do empregado como segurado obrigatório da Previdência Oficial.

Concedeu ao empregado, portanto, um mínimo de cidadania.

A Constituição Federal de 1988, no capítulo denominado de “Direitos Sociais”,

mais especificadamente no art. 7º, parágrafo único, agraciou a categoria doméstica

com os seguintes títulos: salário mínimo; irredutibilidade de salário; 13º salário;

repouso semanal remunerado (preferencialmente aos domingos); férias anuais

remuneradas, mais 1/3; licença à gestante, com salário normal; licença paternidade;

aviso prévio, aposentadoria e integração à previdência social.

Por meio das Leis 7.418/85 e 7.619/87, regulamentadas pelo Decreto Lei n.

95.247/87, estendeu-se à categoria doméstica o vale-transporte.

Sendo concedido, ainda, por ato voluntário do empregador, o FGTS, o que,

consequentemente, gera direito ao seguro-desemprego (esse direito, na verdade, já

29

havia sido concedido através da Medida Provisória nº 1.986/1999, convertida na Lei

nº 10.208/2001).

E, com a Lei nº 11.324/2006, o direito às férias anuais remuneradas passou

de 20 dias (úteis) para 30 dias, foi regulamentado o direito aos feriados civis e

religiosos, além da proibição de descontos de moradia, alimentação e produtos de

higiene pessoal utilizados no local de trabalho.

A Lei nº 11.324/2006 estendeu às empregadas domésticas gestante a

estabilidade provisória, assegurando a elas o retorno satisfatório ao ambiente de

trabalho e a garantia provisória do emprego, que influi diretamente na possibilidade

de dar ao recém-nascido maior assistência emocional e financeira.

Destaca-se, ainda, outra mudança relevante, que vem a incrementar a

formalização de vínculos entre os empregados domésticos. Trata-se da dedução, no

Imposto de Renda Pessoa Física, do percentual de 12% pago pelo empregador,

junto ao INSS – Instituto Nacional de Seguridade Social. Essa dedução se baseia no

valor de recolhimento referente a um salário mínimo mensal do trabalhador

doméstico, sendo inclusos, no cálculo desse valor, a parcela pertinente ao décimo

terceiro salário e ao terço constitucional de férias. Também foi permitido ao

empregador o recolhimento da contribuição referente à competência de novembro

de cada ano, até o vigésimo dia do mês de dezembro, juntamente com a

contribuição concernente ao 13º salário, fazendo-se uso de um único documento de

arrecadação, o GPS – Guia de Previdência Social.

3.3 Direitos em Espécie dos Empregados Domésticos em Conformidade com

a Cartilha Trabalho Doméstico – Direitos e Deveres

De acordo com as observações contidas na Cartilha Trabalho Doméstico –

Direitos e Deveres – publicada conforme as alterações trazidas pela Lei n. 11.324,

de 19 de julho de 2006 e publicadas pela SIT – Secretaria de Inspeção Trabalhista,

órgão do Governo Federal – são direitos garantidos aos empregados domésticos:

1. Carteira de Trabalho e Previdência Social, devidamente anotada;

2. Salário mínimo fixado em lei;

3. Irredutibilidade salarial;

4. 13º (décimo terceiro) salário;

30

5. Repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos;

6. Feriados civis e religiosos;

7. Férias de 30 (trinta) dias remuneradas;

8. Férias proporcionais, no término do contrato de trabalho;

9. Estabilidade no emprego em razão da gravidez;

10. Licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário;

11. Licença-paternidade de 5 dias corridos;

12. Auxílio-doença pago pelo INSS;

13. Aviso prévio de, no mínimo, 30 dias;

14. Aposentadoria;

15. Integração à Previdência Social;

16. Vale-Transporte;

17. Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), benefício opcional;

18. Seguro-Desemprego concedido, exclusivamente, ao (à) empregado (a)

incluído (a) no FGTS.

A concessão desses direitos será minuciosamente analisada.

3.3.1 Breve análise do tema

Ao admitir-se um empregado doméstico, devem, de imediato, ser anotadas

em sua Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS todas as condições do

contrato de trabalho e as peculiaridades que lhes são atinentes. É obrigação do

empregador o registro na CTPS do empregado em seu primeiro dia de trabalho, não

devendo deixar para fazê-lo em outra oportunidade. E, ainda, deve haver a

integração à Previdência Social do empregado doméstico.

Caso o empregador não faça o devido registro na CTPS do empregado,

responderá administrativa, criminal e civilmente, conforme, respectivamente os

ditames legais: arts. 47, da CLT; 297, § 4º, do CP; 186 e 927 do CC.

Veja-se decisão do TRT da 15ª Região acerca do dano moral, ante a inércia

do empregador:

31

REPARAÇÃO DO DANO MORAL DECORRENTE DE ATO ILÍCITO PRATICADO PELO EMPREGADOR. DEVIDO. A desobediência a normas de ordem pública, a saber, anotação do contrato em inserção do trabalhador no sistema de previdência social, certamente se constitui em desrespeito à lei que causam danos morais ao trabalhador, presumíveis, inclusive, porque o obreiro não registrado está alheio ao sistema de proteção já indicado" (TRT 15ª R. – 2ª T. – 9.637/03 – Ac. 34.403/03-PATR – Rel. Juíza Maria Inês Corrêa de Cerqueira César Targa – DOE 31.10.03 – p. 55)

Vejamos abaixo os direitos dos empregados domésticos:

O salário mínimo já se encontra previsto e fixado conforme texto localizado no

artigo 7º, parágrafo único da CF – Constituição Federal. A irredutibilidade salarial

também se encontra prevista no mesmo artigo. Não pode o empregador pagar ao

empregado doméstico menos que o salário mínimo. Não obstante isso, o empregado

doméstico não tem piso salarial, pois não há previsão na legislação. Quanto à

previsão de prazo, pode ser pago conforme acordado entre as partes. Se optar por

pagamento mensal, deverá ser feito até o 5º dia útil subseqüente ao mês vencido,

conforme preceitua o § 1º do art. 459 da CLT.

O 13º salário, também conhecido como gratificação de natal, é uma verba

concedida anualmente em duas parcelas: a primeira entre os meses de fevereiro e

novembro, no valor correspondente à metade do salário do mês anterior; já a

segunda deve ser paga até o dia 20 de dezembro, tomando por base o salário do

mês de dezembro, descontando-se o valor já pago da primeira metade. Tem como

base a remuneração integral ou o valor de aposentadoria. Podendo ser calculado de

forma proporcional sobre a remuneração de dezembro, na hipótese dos empregados

domésticos que não trabalharam todos os meses do ano ou quando dispensados

sem justa causa, e, ainda, nos casos de rescisão indireta de contrato por culpa do

empregador. É de verificar-se que deve haver o recolhimento da contribuição

previdenciária do 13º salário até o dia 20 de dezembro. Pode o empregado

doméstico requerer, no mês de janeiro de cada ano, a primeira parcela do 13º

salário por ocasião de suas férias (MARTINS, 2009).

Quanto ao repouso semanal remunerado, deve ele ocorrer,

preferencialmente, aos domingos, conforme previsto no artigo 7º, parágrafo único da

CF. Assim como devem ser resguardados os feriados civis e religiosos que foram

assegurados com a publicação da Lei nº. 11324/2006, que revogou a alínea “a” do

artigo 5º da Lei 605/49.

32

A partir desse fato, os trabalhadores domésticos passaram a ter direito aos

feriados civis e religiosos. Desde 20 de julho de 2006, data da publicação da Lei nº.

11.324/06, é direito do empregado doméstico o gozo de folga nos feriados civis e

religiosos. Quando houver necessidade de convocar o empregado doméstico para

trabalhar em dia feriado civil ou religioso, deve o empregador efetuar o pagamento

do dia em dobro ou conceder uma folga compensatória em outro dia da semana,

conforme exposto no artigo 9º da Lei n.º 605/49.

Outra questão prevista em razão dos direitos do empregado doméstico se dá

em função das suas férias. Essas devem corresponder a um período de 30 dias,

remuneradas com acréscimo de pelo menos 1/3 do salário normal, após o tempo de

12 meses de serviços prestados a mesma família ou pessoa. Esse período deve ser

contado desde o primeiro dia da admissão do empregado.

Em razão da Convenção nº 132 da OIT, promulgada pelo Decreto

Presidencial nº 3.197, de 5 de outubro de 1999, que tem força de lei, restou

assegurado a todos os empregados, inclusive aos domésticos, o direito a férias

proporcionais, independentemente da forma de desligamento, previstas nos artigos

146 a 148 da CLT, ainda que incompleto o período aquisitivo de 12 meses. Assim, o

empregado que pede demissão antes de completar 12 meses de serviço tem direito

a férias proporcionais.

No tocante à estabilidade no emprego em função da gravidez, com fulcro na

Lei nº 11324/2006, foi estendida às trabalhadoras domésticas a estabilidade à

gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, e,

também, dentre os direitos com que foram contempladas as empregadas

domésticas, na Carta Magna, encontra-se o direito a licença-maternidade, onde a

doméstica/mãe é beneficiada, em virtude do nascimento do filho, recebendo o seu

salário pelo INSS – Instituto Nacional de Seguridade Nacional, durante 120 (cento e

vinte) dias.

Fica prevista, ainda, a licença paternidade correspondente a um tempo de

cinco dias corridos, a ser contado do dia do nascimento do filho, conforme previsto

no artigo 7º, parágrafo único, da CF e no artigo 10, parágrafo único, das Disposições

Constitucionais Transitórias.

Quanto ao auxílio doença, este deve ser de responsabilidade do INSS, sendo

contado desde o primeiro dia de afastamento. Esse benefício deve ser requerido

num prazo máximo de até 30 dias do início da incapacidade, e, quando realizado de

33

outra maneira, o auxílio deve ser pago conforme a data do requerimento, sendo

contados 30 dias da data de entrada do documento, conforme se encontra previsto

no artigo 72 do Decreto nº. 3.048 de 06 de maio de 1999.

Fica previsto, também no artigo 7º, parágrafo único, da CF, o aviso prévio,

que deve corresponder a um período mínimo de 30 dias. Assim, no momento em

que uma das partes quiser rescindir o contrato de trabalho, deve comunicar a outra

parte sua tomada de decisão, com o prazo mínimo de antecedência de 30 dias. Nos

casos em que haja a dispensa imediata, o empregador tem como obrigação o

pagamento de 30 dias do aviso prévio, devendo ser computados, como tempo de

serviço, para efeito de férias e para o 13º salário, de acordo com o artigo 487,

parágrafo 1º, da CLT.

A aposentadoria é prevista no artigo 7º, parágrafo único, da Constituição

Federal. Quando motivada por invalidez, dependerá da verificação das condições de

incapacidade do requerente, mediante exame médico-pericial, a cargo do INSS e

será devida a contar da data do início da incapacidade ou da data do requerimento,

caso exista, entre essas datas, o decurso de mais de 30 dias.

A aposentadoria por idade será devida ao segurado que completar 65 anos e

à segurada com 60 anos, uma vez cumprida a carência de 180 contribuições

mensais, de acordo com os artigos 48 e 49 da Lei 8.213/91.

Em relação ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS, trata-se de

um benefício opcional, instituído no dia 23 de março de 2001, por meio do artigo 1º

da Lei nº 10.208, e resulta de uma negociação realizada entre empregador e

empregado.

É facultada a inclusão do empregado doméstico no FGTS, desde que o

requeira o empregador. Não se trata de obrigação legal, é mera faculdade. Portanto,

não há sanção ao empregador doméstico, pois se trata de obrigação voluntária.

Ainda é muito incipiente o assunto e por demais polêmico. Embora se queira pensar

em inconstitucionalidade da extensão do FGTS ao empregado doméstico, a nosso

ver, não é o caso. Senão vejamos: se os direitos constitucionais previstos no art. 7º

da Carta Magna são meramente exemplificativos, não se vislumbra a sobredita

inconstitucionalidade, pois é permitido que a lei ordinária estabeleça outros direitos

ao empregado doméstico.

Embora haja a previsão da irretratabilidade com relação ao respectivo vínculo

contratual, e sujeitando o empregador às obrigações e penalidades previstas na Lei

34

nº 8.036, de 1990, a doutrina não compactua desse entendimento. É o que defende

Martins (2009, p. 61):

Não se pode dizer que a inclusão do empregado doméstico no FGTS é irretratável, pois o depósito do FGTS é facultativo e não obrigatório. Assim, nada impede que o empregador deixe de pagar o FGTS no curso do contrato de trabalho, pois a lei não determina penalidades, que só podem ser fixadas por lei e não por decreto.

Afirma, entretanto, que pode o empregado doméstico alegar o prejuízo, em

razão de o empregador ter suspendido os depósitos do FGTS.

Para efetuar o recolhimento do FGTS, o empregador apresenta a guia de

Recolhimento do FGTS numa agência da CEF – Caixa Econômica Federal ou da

rede bancária conveniada. A alíquota é de 8% e incide sobre a remuneração do

empregado, devendo o depósito ser feito até o dia 7 do mês seguinte ao vencido.

Não obstante se apresente como um diferencial para o empregador

doméstico que inscreva seu empregado doméstico no FGTS, observa-se que, na

realidade do âmbito trabalhista brasileiro, a norma ainda não se aplica. Infelizmente,

o que temos ainda é a contratação do empregado doméstico sem registro na CTPS

e até mesmo com o pagamento de salário inferior ao mínimo.

3.4 Deveres dos Empregados Domésticos

Quando da admissão no emprego, é dever do empregado doméstico a

apresentação de alguns documentos. Dentre eles:

Carteira de Trabalho e Previdência Social – Para obter a CTPS, o

trabalhador, com mais de 16 anos de idade, deverá se dirigir, portando uma

foto 3x4 e qualquer documento de identidade (Carteira de Identidade,

Certidão de Nascimento ou Casamento, Cadastro de Pessoa Física (CPF),

Título Eleitoral, etc.), à Delegacia Regional do Trabalho (DRT), às

Subdelegacias ou às Agências de Atendimento ao Trabalhador, ou, ainda, ao

Sistema Nacional de Empregos (SINE), sindicatos, prefeituras ou outros

órgãos conveniados conforme previstos nos artigos 13 e seguintes da

Consolidação das Leis do Trabalho.

35

Comprovante de inscrição no INSS – caso já o possua. Não o possuindo,

poderá efetuar seu cadastramento nas Agências do INSS, apresentando o

CPF, Certidão de Nascimento ou Casamento, Carteira de Identidade e CTPS

devidamente anotada.

Atestado de saúde fornecido por médico – caso o empregador julgue

necessário.

São também obrigações do empregado doméstico exercer sua função da

melhor maneira possível, bem como procurar ser assíduo ao seu trabalho,

desempenhando suas tarefas de acordo com as instruções repassadas pelo seu

empregador.

Quando do recebimento de seu salário, o mesmo tem a obrigação de assinar

o recibo da quitação do valor recebido.

Em caso do mesmo ser desligado da função exercida em função de ser

demitido, ou ainda tendo, o mesmo, pedido dispensa, o empregado tem o dever de

apresentar a sua carteira de trabalho, com a finalidade de que o empregador possa

fazer as devidas anotações. Se a hipótese for de pedido de dispensa, o empregado

deverá comunicar ao empregador a sua intenção com uma antecedência de no

mínimo trinta dias.

3.5 A Estabilidade Provisória da Empregada Doméstica Gestante

3.5.1 Da previsão legal da estabilidade

No tocante à estabilidade garantida pelo art. 10, II, “b”, ADCT da CF/88,

houve uma grande celeuma, haja vista o fato de o parágrafo único do art. 7º da

mencionada norma constitucional não mencionar o seu inciso I, razão por que não

era reconhecida a estabilidade à empregada doméstica gestante. Entretanto a não-

extensão dessa estabilidade às gestantes domésticas feria princípios basilares do

citado regramento: igualdade, dignidade da pessoa humana, proteção à criança,

dentre outros.

36

Não estender à categoria a garantia de emprego seria diferenciar a doméstica

das demais trabalhadoras, pois conferiria certos direitos a uma classe e excluiria a

outra, e, na verdade, todas merecem a mesma proteção, pois a empregada

doméstica é tão mãe quanto a empregada que trabalha em escritório, em loja, no

comércio.

Há orientação dos professores Bastos e Pinheiro Neto (1996, p. 41) acerca do

tema:

[...] os argumentos utilizados para negar estabilidade provisória à gestante doméstica, baseados na interpretação isolada da norma contida no art. 7º, I, e parágrafo único, da CF, mostram-se equivocados. A boa hermenêutica jurídica nos ensina que, em primeiro lugar, deve-se buscar a razão de ser do direito e de seus princípios, conjugando-os com a interpretação sistemática das normas que se mostram consentâneas com os institutos em estudo. Assim, data máxima vênia, daqueles que entendem divergentemente, pensamos que o reconhecimento da garantia no emprego da gestante doméstica, ao contrário que possa parecer, encontra asilo dentro da própria Constituição Federal e está em consonância com os princípios protetivos do Direito do Trabalho.

O art. 10, II, “b” do ADCT da nossa Carta Magna é claro ao especificar que fica

vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a

confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, portanto, ao estabelecer a

referida garantia, o constituinte o fez visando a proteger a empregada e o recém-

nascido, uma vez que, ao lhe assegurar o mencionado direito, tendo a segurança de

que não será demitida, poderá dar ao nascituro maior assistência financeira e

afetiva, razão por que não se justificava a exclusão da mãe doméstica de tal

benefício.

Encontramos raras decisões referentes ao tema:

GESTANTE – EMPREGADA DOMÉSTICA – ESTABILIDADE PROVISÓRIA – APLICAÇÃO DO ART. 10, INCISO II, ALÍNEA B DO ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS. À gestante despedida sem justa causa, mesmo na condição de doméstica são devidos os salários e vantagens correspondentes ao período estabilitário, aplicando-se-lhes a norma constante do art. 10, inciso II, alínea b do ADCT (Acórdão por unanimidade da 2ª Turma do TRT – 12ª Região, Recurso Ordinário 2064/98 – Rel. Juiz João Cardoso, J. 10.8.1998 – DJ/SC, de 19.8.1998, p. 181);

EMPREGADA DOMÉSTICA – GESTANTE – GARANTIA DE EMPREGO. Constituição negou à empregada doméstica a proteção da relação de emprego contra despedida arbitrária ou sem justa causa como especifica o parágrafo único do art. 7º. Todavia, o dispositivo contempla, dentre os direitos reservados às doméstica, o inc. XVIII e esse assegura à gestante a

37

licença-maternidade de cento e vinte dias sem prejuízo do emprego e do salário. O art. 10 do ADCT, no inc. II, alínea b, veda a dispensa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, sem discriminar a empregada doméstica. (TRT – 2ª Região – 8ª T.; RO nº 029.901.606-76 (20000259033); rel. Juiz José Carlos Arouca; DOESP 4/7/2000 ST 137/65);

GESTANTE – EMPREGADA DOMÉSTICA. A licença de 120 dias à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, constitui direito e garantida fundamental expressamente conferidos à categoria dos trabalhadores domésticos pelos incs. XVIII e XXXIV, parágrafo único, do art. 7º, da CF. Assim, a norma contida no art. 10, b, do ADCT, não pode ser interpretada de forma a contrariar o próprio texto da CF. Dispensada injustamente se encontra sob o manto da proteção constitucional a reclamante, doméstica, faz jus à indenização correspondente ao período estabilitário. (TRT – 3ª Região – 5ª T.; RO nº 5.080/00; Rela. Juíza Maria A Duarte de Las Casas; DJMG 16/9/2000) ST 138/84).

Verifica-se que a tão falada estabilidade não poderia ser gozada apenas por

uma classe de trabalhadores; com certeza esse não foi o objetivo do constituinte,

uma vez que, assim agindo, estaria discriminando a empregada doméstica e

contrariando o preâmbulo da própria Carta Magna que reza:

[...] instituir um Estado Democrático, destinado à assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social [...].

A partir do próprio texto constitucional, verifica-se que a mãe doméstica

merecia ter o mesmo tratamento dispensado às demais.

Observa-se, também, que o legislador teve a preocupação de ressaltar, no

art. 5º da mesma Carta, que "todos são iguais perante a lei", portanto a palavra

"todos" é vista de forma ampla, abrangendo a coletividade de um modo geral, o que

tornaria sem nexo a exclusão da empregada doméstica desse contexto.

Nota-se que todos os regramentos que disciplinam os direitos da gestante

têm como objetivo peculiar:

a) garantir o trabalho da mulher, haja vista, por inúmeros fatores, ser comum

a dispensa de empregadas gestantes, uma vez que neste período as elas ficam

mais limitadas fisicamente, não podendo executar alguns serviços;

b) dar segurança emocional e econômica no período gestacional;

c) permitir que a mãe passe mais tempo em casa, podendo alimentar seu

filho, assegurando-lhe mais saúde e equilíbrio emocional.

38

Portanto, a trabalhadora doméstica gestante encontra-se na mesma situação

de qualquer outra trabalhadora, não tendo como justificar que a mesma não deva

gozar dos mesmos benefícios concedidos pelos preceitos jurídicos aplicados às

demais empregadas gestantes, uma vez que nada justifica entendimentos que

venham a prejudicar a gestante e o seu bebê.

Com a edição da Lei nº 11.324/2006, que acrescentou à Lei nº 5.859/1972 o

artigo 4º-A, resolveu-se a polêmica, haja vista o texto claro e preciso da referida

norma, não necessitando mais de nenhuma interpretação, acabando com as

injustiças.

Veja a sua redação: “É vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da

empregada doméstica gestante desde a confirmação da gravidez até 5 (cinco)

meses após o parto.”

Não se concebia que um tema com imenso caráter social como este que, em

conjunto a várias disposições constitucionais constantes na nossa Carta Mãe e em

leis infraconstitucionais, no Estatuto da Criança e do Adolescente, e que envolve,

além da doméstica gestante, a preocupação com a criança e o adolescente, não

fosse olhado com mais atenção, pois se trata de cidadãos que já tinham seus

direitos assegurados e não estava sendo aplicado por questões meramente

interpretativas.

Vejamos o que diz o art. 227 da Carta Magna:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Portanto, há de se reconhecer que realmente estão sendo cumpridas as

garantias estabelecidas na Constituição acerca da igualdade entre as pessoas e a

preocupação com o bem-estar da família, da criança e do adolescente, ao confirmar

a estabilidade provisória a toda trabalhadora gestante, doméstica ou não.

Tais medidas constituem uma forma de retribuir à categoria a dedicação pelas

atividades executadas, uma vez que o trabalho doméstico requer um clima de estrita

fidúcia, haja vista a participação do mesmo na vida íntima da família.

39

Na verdade foi um grande avanço, entretanto novos caminhos devem ser

percorridos a fim de que a estabilidade contida na mencionada norma seja

realmente cumprida, haja vista sabermos que uma grande parte das empregadas

domésticas não recebem nem mesmo o salário-mínimo legal.

3.5.2 Do vínculo à garantia da estabilidade

A relação de dependência entre empregado e empregador é levada em

consideração quando da análise da estabilidade da empregada doméstica gestante,

eis que se sabe que a mesma é jurídica, onde se verifica a subordinação do

empregado ao cumprir as ordens do seu patrão ou daqueles que ele assim

determine.

Dessa maneira, ao efetuar suas tarefas e de acordo com o contrato mantido

entre as partes, haja vista representar a vontade das mesmas, deve o empregador,

obrigatoriamente, realizar o pagamento do valor convencionado. Tem-se que

destacar, também, que do contrato decorre a continuidade das obrigações

assumidas, as quais devem ser prestadas de forma ininterrupta.

Na verdade, a empregada grávida tinha a proteção do legislador antes

mesmo da edição da CLT, uma vez que no parágrafo 1, artigo 121 da Constituição

de 1934, assim como no artigo 157, X da Carta de 1946, e na emenda nº.1 de 1969,

já havia menção de alguns direitos.

É papel do legislador promover, em razão da defesa da mulher e de sua

gestação - dentro da legislação que protege de forma especial o trabalho da mulher,

respeitando as suas diferenças e acúmulo de atividades – garantindo a mesma

especial atenção, conforme exposto nos artigos 391 a 400 da CLT (Hinz, 2006).

Até o momento, somente a mulher é capaz de gestar outro ser, razão por que

foi a mesma cautelosamente protegida por normas que visam a assegurar mais

conforto e tranqüilidade à mãe e ao recém-nascido, desde o início da gestação, ou

seja, da fecundação e fixação do embrião no ventre materno, até o nascimento do

bebê.

Quanto aos antecedentes históricos do trabalho feminino, tem-se expresso

que, na maioria das sociedades, a mulher sempre auxiliou o homem, cuidando

pessoalmente das tarefas domésticas e da educação dos filhos.

40

Entretanto, devido à necessidade de melhores condições de vida para si e

para sua família, foi obrigada a dividir seu tempo entre as tarefas do lar e o trabalho

remunerado, razão por que, mesmo grávida, submetem-se a situações nem sempre

adequadas para o seu estado.

É muito difícil que se defina com exatidão o início da fecundação, o que

muitas vezes obstaculiza a garantia da estabilidade, bem como faz com que, mesmo

grávida, muitas mulheres sejam expostas a sérios riscos.

A respeito do assunto, Silva (2009, p. 167) assevera que:

São duas as formas mais utilizadas para o cálculo do início da gestação, uma de modo prospectivo, mirando-se o futuro, e outra de modo retrospectivo, voltando-se para o passado. Nos primeiros meses de gestação, é comum se procurar a data do ultimo ciclo feminino, descartando-se a hipótese de a gravidez ter começado antes e firmando-se a data logo após o ciclo, com uma pequena variação estimativa. Na parte final da gravidez, podem-se acrescentar alguns dados a essa estimativa com base nas dimensões do feto e do ventre materno, igualmente sem precisão exata. Após o parto, porém, é possível fazer a conta inversa, chegando-se por exclusão a uma data aproximada da concepção nove meses antes.

Entretanto, verifica-se que os cálculos não são feitos de forma tão simples,

haja vista saber-se que cada gestação funciona de uma forma totalmente diferente

da outra, dependendo de fatores fisiológicos da gestante e do próprio feto gerado,

tendo cada uma sua peculiaridade, o que faz parte da própria natureza humana.

Devido a diversos fatores, pois muitas vezes as próprias gestantes só descobrem a

gravidez alguns meses depois do seu início. Outrossim, embora se saiba que

normalmente os partos ocorram entre a 39ª ou 40ª semana da gestação, existem

partos com grande variação de datas, às vezes antecipados (prematuros) ou uma ou

duas semanas depois (SILVA, 2009).

É de suma importância para a empregada que a gravidez seja detectada, haja

vista daí surgirem alguns direitos, dentre eles, a garantia de emprego, desde a

confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, o que deve ser devidamente

observado pelo empregador.

Acerca da garantia, vejamos o que diz Silva (2009, p. 185):

As garantias de emprego se inserem no contexto maior das políticas publicas de fomento a geração de emprego e renda, bem como de realização da dignidade do ser humano. Sem a existência de trabalho, concreto ou potencial, dificilmente o ser humano obteria sua realização pessoal e profissional, via expressa para a manutenção de um grau mínimo de dignidade.

41

Contudo essa garantia é provisória, servindo apenas para que mãe e filho

possam transcorrer normalmente o período gestacional e de aleitamento. Uma vez

findo este prazo, poderá a empregada ser dispensada pelo empregador sem infringir

essa garantia, uma vez que a mesma foi cumprida integralmente.

Segundo Silva (2009), nem toda gravidez assegura a garantia da estabilidade

provisória, pois a mesma só é assegurada aquelas gestantes que efetivamente

derem a luz, uma vez que o período gestacional normalmente se encerra com o

parto, a partir do qual serão computados os cinco meses adicionais, lembrando,

porém, que, nos casos de aborto não criminoso, inclusive o aborto retido, a mulher

tem direito a quinze dias de repouso remunerado, contudo, não jus à garantia de

emprego.

3.5.3 Da proteção da estabilidade

À categoria doméstica é assegurada a licença à gestante e a estabilidade,

conforme especifica a Constituição Federal e a Lei 11.324/2006, razão por que, se o

empregador despedir a grávida doméstica, deverá o mesmo arcar com o respectivo

pagamento, uma vez que foi o mesmo o responsável pelo não-recebimento, pela

trabalhadora, do respectivo benefício previdenciário, senão vejamos o que informa

Barros (2002, p. 62):

É sabido que o pagamento do salário maternidade, pela Previdência Social, só persiste quando em vigor o contrato de trabalho (art. 95 da Lei 8.213/91). Logo dispensado a empregada doméstica sem justa causa, deverá o empregador arcar com o pagamento do período correspondente à licença, mesmo que desconheça o estado de gestação da empregada.

A segurança da estabilidade da gestante encontra-se prevista no artigo 10,

inciso II, "b", do ADCT – Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, cuja

proteção lhe é assegurada: “desde a confirmação da gravidez até cinco meses após

o parto”, ficando, portanto, protegida contra dispensa arbitrária ou sem justa causa, o

que muitos denominam de “estabilidade provisória” e outros de “período de garantia

de emprego”, o que, além de contribuir para um período gestacional tranquilo,

poderá dar ao recém-nascido maior assistência.

No entanto, para que a mesma goze da citada estabilidade, necessário se faz

que seja observado o contrato avençado entre as partes, uma vez que a CLT

42

estabelece um tipo de critério para o contrato de trabalho com prazo indeterminado e

outro para o determinado.

Vejamos, então o que preceitua a CLT em seus arts. 477 e 478, acerca do

contrato de trabalho com prazo indeterminado:

“Art. 477. É assegurado a todo empregado, não existindo prazo estipulado para a terminação do respectivo contrato, e quando não haja ele dado motivo para cessação das relações de trabalho, o direito de haver do empregador uma indenização, paga na base da maior remuneração que tenha percebido na mesma empresa”.

“Art. 478. A indenização devida pela rescisão do contrato por prazo indeterminado será de um mês de remuneração por ano de serviço efetivo, ou por ano e fração igual ou superior a 6(seis) meses”.

§ 1º O primeiro ano de duração do contato por prazo indeterminado é considerado como período de experiência, e, antes que se complete, nenhuma indenização será devida.

Tem-se no presente caso que só terá direito a indenização a empregada que,

por iniciativa do empregador, venha a ser demitido injustamente e que não tenha

provocado esse rompimento.

No tocante ao contrato de trabalho com prazo determinado, o art. 479 da CLT

dispõe o seguinte: “Art. 479. Nos contratos que tenham termo estipulado, o

empregador que sem justa causa, despedir o empregado, será obrigado a pagar-lhe,

a título de indenização, e por metade, a remuneração a que teria direito até o termo

do contrato”.

Sabe-se entretanto que o contrato com prazo determinado só é permitido nos

casos especificados no art. 433, § 2º, da CLT, caso em que, sendo o mencionado

prazo integralmente cumprido, não há que se falar de direito a indenização, haja

vista o cumprimento do acordado entre as partes.

A CLT, em seu artigo 482, especifica as práticas constitutiva da justa causa,

para que o empregador possa dispensar o empregado sem indenizá-lo:

“Art. 482 – Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador:

a) ato de improbidade;

b) incontinência de conduta ou mau procedimento;

c) negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador, e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço;

43

d) condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso não tenha havido suspensão da execução da pena;

e) desídia no desempenho das respectivas funções;

f) embriaguez habitual ou em serviço;

g) violação de segredo da empresa;

h) ato de indisciplina ou de insubordinação;

i) abandono de emprego;

j) ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;

k) ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;

l) prática constante de jogos de azar.

Parágrafo único. Constitui igualmente justa causa para dispensa de empregado a prática, devidamente comprovada em inquérito administrativo, de atos atentatórios contra a segurança nacional.

Apenas nas hipóteses acima mencionadas é que se justifica a rescisão do

contrato de trabalho pelo empregador, não se admitindo nenhum outro. No entanto,

a demissão só pode ocorre avaliando-se o ato cometido, o qual deverá ser apurado

por meio de processo judicial (MANUS, 2007)

A estabilidade prevista no art. 4ºA da Lei nº 11.324/2006 assegurou as

empregadas domésticas gestante a garantia no emprego desde a confirmação da

gravidez até cinco meses após o parto, razão por que, nesse período, não pode a

mesma ser demitida, a menos que cometa alguma falta grave que justifique a sua

dispensa por justa causa (MANUS,2007)

Acerca da comunicação da empregada da sua gravidez, assevera Manus

(2007, p.185):

Discute-se ainda hoje sobre a necessidade de a empregada comunicar oficialmente o empregador de sua gravidez, para que se beneficie da cláusula coletiva. Todavia, corrente que começa a predominar nos tribunais é aquela que afirma ser devida a proteção a maternidade, como fato objetivo, independentemente da comunicação pela empregada, antes da dispensa. Assim, constatada a gravidez e tendo a categoria tal garantia de emprego, há de ser reintegrada a empregada ao serviço.

Através da Súmula nº 244, o Tribunal Superior do Trabalho firmou

entendimento no sentido de que o desconhecimento do estado gravídico da

trabalhadora pelo seu empregador não afasta o direito daquela ao pagamento da

indenização decorrente da estabilidade.

44

Veja a seguir o teor da mesma :

“TST Súmula nº 244 – Gestante. Estabilidade Provisória I - O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade (art. 10, II, "b" do ADCT).II - A garantia de emprego à gestante só autoriza a reintegração se esta se der durante o período de estabilidade. Do contrário, a garantia restringe-se aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade. III - Não há direito da empregada gestante à estabilidade provisória na hipótese de admissão mediante contrato de experiência, visto que a extinção da relação de emprego, em face do término do prazo, não constitui dispensa arbitrária ou sem justa causa.”

Já Martins (2009, p. 100) assevera:

Entendo que o com o empregado doméstico não pode ser celebrado contrato de experiência, pois a ele não se aplica a CLT (art. 7º ,a, da CLT). Entretanto, se entender de forma contrária, aplica-se o inciso III da Súmula 244 do TST, no sentido de que não há direito da empregada gestante à garantia de emprego na hipótese de admissão mediante contrato de experiência, visto que a cessação da relação de emprego, em razão do término do prazo do pacto, não constitui dispensa arbitrária ou sem justa causa.”

Segundo o entendimento do citado autor, o correto seria a reintegração da

empregada no emprego e não a indenização, pois, ao ser indenizada a empregada

somente tem garantidos os salários e demais direitos correspondentes ao período

de estabilidade.

Se por acaso esta garantia constitucional for violada, deverá a empregada

gestante, ser reintegrada no emprego, sendo-lhe garantido o direito ao recebimento

dos salários e demais direitos trabalhistas e previdenciários referentes ao

afastamento.

Caso não seja possível a reintegração, já que, no caso da empregada

doméstica, esta relação de trabalho possui características peculiares, especialmente

pelo trato íntimo familiar, ou porque, quando da decisão judicial, o interregno já

tenha se esgotado, faz jus a empregada a todos os direitos como se demitida não

tivesse sido, bem como à indenização salarial em substituição ao salário-

maternidade.

45

Segundo Silva (2009. p.189):

Existem situações em que a mulher engravida ainda na amamentação do recém-nascido, razão pela qual pode acontecer de ela já ter seu emprego garantido por nova gestação sem que se tenha escoado o prazo de cinco meses pós-parto anterior. Não há como obstar a essa segunda garantia de emprego. Para cada cenário, uma proteção. Para cada panorama, uma apreciação da norma. Aliás, a gravidez consecutiva não deveria ser causa de nenhuma celeuma jurídica, pois a entidade familiar é soberana neste assunto.

É de bom alvitre lembrar que, independentemente da causa da dispensa,

serão devidos, sempre, os salários dos dias trabalhados e eventuais férias vencidas

ainda não gozadas.

Por outro lado, se a ruptura contratual se der por iniciativa do empregado,

deve ser verificado se o mesmo agiu por decisão própria ou se o pedido de

afastamento foi provocado pelo empregador. Constatada a atuação do empregador

para o término do contrato, o empregado fará jus a todos os direitos como se

houvesse ocorrido a dispensa imotivada, uma vez que se trata de despedida

indireta.

Sabe-se que o empregado está subordinado hierarquicamente ao

empregador, razão por que se denota que a relação é desigual. Uma vez que o

empregado depende da determinação do empregador para execução das tarefas

bem como para o recebimento do seu salário, vê-se, de plano, a subordinação do

trabalhador ao patrão, o qual tem o poder de comando. Daí surge a necessidade de

um instrumento que possa intervir para controlar essa desigualdade, o qual se

materializa no direito do trabalho, que se caracteriza como um ramo do direito de

natureza marcadamente protetivo, em que esse fator de proteção serve para

equilibrar a relação (MANUS, 2007)

Sabe-se que a mulher gestante tem garantias previstas tanto na Constituição

como na CLT, bem como nas leis infraconstitucionais. Entretanto, necessário se faz

que as mesmas sejam cumpridas, pois comumente ocorre a dispensa da mesma

quando grávidas, justamente no momento de maior necessidade.

3.6 Dilatação do Período da Licença-Maternidade

Em setembro de 2008, foi aprovada a Lei nº. 11.770, que ampliou a licença-

maternidade para seis meses, sendo estendida às funcionárias públicas federais em

46

dezembro do mesmo ano. Entretanto, a aplicação às empregadas da iniciativa

privada só se dará em 2010, em virtude do impacto da isenção fiscal a que terão

direito às empresas que aderirem ao regramento.

Entretanto, algumas empresas, mesmo sem receber o benefício fiscal do

governo, estão concedendo a licença, uma vez que a mesma foi incluída em

acordos coletivos de trabalho assinados com os sindicatos, a exemplo de empresas

do setor de produtos químicos e de petróleo da Bahia e de metalurgia do ABC

paulista.

Segundo dados da Sociedade Brasileira de Pediatria, até o Distrito Federal e

vários municípios e estados brasileiros já aderiram, estendendo, através de leis

locais, o benefício as suas servidoras.

No entanto, mais uma vez as empregadas domésticas foram excluídas,

senão vejamos o que diz o § 1º, do artigo 1º, da mencionada lei:

§ 1o A prorrogação será garantida à empregada da pessoa jurídica que aderir ao Programa, desde que a empregada a requeira até o final do primeiro mês após o parto, e concedida imediatamente após a fruição da licença-maternidade de que trata o inciso XVIII do caput do art. 7º da Constituição Federal. (Grifo nosso)

Pela leitura do texto acima, fica claro que a empregada doméstica não foi

agraciada pela mesma, pois sua vinculação não se dá com pessoa jurídica, mas,

sim, física, o que volta a causar nova desigualdade, provocando, mais uma vez, um

verdadeiro choque com as normas e princípios contidos no nosso sistema jurídico.

Para que a categoria doméstica tivesse direito a estabilidade da gestante,

passaram-se 18 anos. Espera-se que desta vez a desigualdade seja o mais rápido

possível solucionada, seja por meio de interpretação da nova lei em conformidade

com o princípio da igualdade, seja mediante nova atuação do Poder Legislativo. Isto

porque os laços que ligam mãe/filho independem a qual categoria a mãe pertença.

Recentemente foi aprovado pela Comissão de Trabalho, de Administração e

Serviço Público da Câmara, o Projeto de Lei nº 2932/08, de autoria do Senado, que

aumenta a licença-maternidade de 120 para 180 dias nos casos de nascimento

múltiplo, prematuro ou nos casos de portador de doença ou malformação grave,

uma vez que os mesmos necessitam de cuidados especiais.

47

Por todas as interpretações da Lei Maior, verifica-se que é cristalina a

preocupação com o ser humano, não sendo em vão que a mesma ficou conhecida

como constituição-cidadã, motivo pelo qual não poderá a empregada doméstica

permanecer excluída da extensão da licença-maternidade.

48

CAPÍTULO IV - CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir das análises aqui realizadas e dos argumentos apresentados, faz-se

necessário afirmar que existe uma realidade positiva em razão das medidas

tomadas pelo Legislador, no que tange ao empregado doméstico, pois, ao longo dos

anos, verifica-se que os mesmos foram agraciados com vários direitos,

possibilitando a busca da proteção judiciária sempre que tiverem seus direitos

solapados.

A Carta Magna de 1988 fez consagrar, como valor social, a proteção à

maternidade, através de seu artigo sexto o que impõe à Previdência Social,

obrigatoriamente, estabelecer a eficácia da garantia desses direitos, conforme o

artigo 201, parágrafo II e artigo 203, parágrafo I, da norma em comento.

Fica explicitado, na Carta da República, o estabelecimento do benefício à

gestante, com prazo determinado no artigo 7º, XVIII, que visa a assegurar a

estabilidade no emprego, desde que seja comprovado o período gestacional, até

cinco meses posteriores ao parto realizado.

De uma maneira mais específica, torna-se necessário que se destitua das

ações moralistas que perpassam as práticas sociais, que embutem uma condição de

submissão moral aos empregados domésticos, e faça-se cumprir a legislação que

vem dar apoio a esses cidadãos, no cumprimento de suas atividades trabalhistas.

Trata-se da necessidade contundente de que o legislador possa se fazer mais

atento às transformações que decorrem das mudanças sociais, com a finalidade de

se ter, de forma mais efetiva, um instrumento de transformação social, e não apenas

o exercício de um papel tecnicista em legislação dos códigos, de maneira a reduzir o

abismo existente entre o cidadão comum e o Estado de Direito, e com isso, ser

possível alcançar uma sociedade dotada de mais igualdade e justiça e promovedora

do bem social.

Dessa maneira, foi possível corroborar a hipótese inicial deste estudo no

sentido de que a legislação vigente no Brasil, quando da análise do tema proposto,

ajunta, de maneira ponderada, as sinuosidades que o tema abriga, de forma que o

empregado doméstico é reconhecido e amparado por lei, o que provoca, na prática,

uma situação de conforto e de seguridade do vínculo empregatício.

49

Em última instância se faz necessário afirmar que denominar as relações

entre pessoas contratantes e contratadas é um caminho árduo e cheio de

sinuosidades as quais devem ser levadas em consideração, para que ambas as

partes possam ser ouvidas e não sejam injustamente prejudicadas, não devendo

apenas o empregador obter vantagens sobre o empregado, o que corrobora uma

ação ilegal que fere o princípio de igualdade, e , como consequência, fragiliza, de

sobremaneira, o Direito numa esfera maior.

Retornando à História do Brasil verifica-se que, na época escravagista, os

escravos faziam todos os serviços para os seus Senhores, lucrativos ou não. Ao

serem libertados muitos continuaram nas fazendas, pois não tinham o que comer

nem onde dormir; eram livres mas não tinham condições de sobreviver; continuavam

então escravos em troca da comida e da dormida sendo tratados como coisa, objeto.

Valeriano (1998, p. 87) defende que: "[...] no transcorrer da História não se

dava importância ao trabalho doméstico a ponto de merecer uma legislação que o

disciplinasse."

Atualmente a realidade é diferente, pois todas precisam ter a mesma

oportunidade e os direitos são iguais, independente de qualquer diferença. E as

recentes modificações legislativas brasileiras vem demonstrando essa evolução.

50

REFERÊNCIAS

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AMPLIAÇÃO da licença- maternidade – sociedade brasileira de pediatria. Disponível em:<http://www.aleitamento.com/a_artigos.asp?id=7&id_artigo=1807&id_subcategoria=12>. Acesso em: 25 fev. 2009.

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PAMPLONA FILHO, Rodolpho. Direito do trabalho doméstico. 2. ed. São Paulo: LTr.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2005.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2006.

51

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MORAES FILHO, Evaristo de. Introdução ao direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 1982.

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REALE, Miguel. Filosofia do direito. São Paulo: Saraiva. 1975.

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VALERIANO, Sebastião Saulo. Trabalhador doméstico. São Paulo: Direito Ltda., 1998.

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ANEXO A - Lei nº 11.324, de 19 de Julho de 2006

(Publicado no D.O.U. de 20.7.2006)

Altera dispositivos das Leis nºs 9.250, de 26 de dezembro de 1995, 8.212, de 24 de julho de 1991, 8.213, de 24 de julho de 1991, e 5.859, de 11 de dezembro de 1972; e revoga dispositivo da Lei nº 605, de 5 de janeiro de 1949.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º O art. 12 da Lei nº 9.250, de 26 de dezembro de 1995, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 12. ...................................................

...................................................

VII - até o exercício de 2012, ano-calendário de 2011, a contribuição patronal paga à Previdência Social pelo empregador doméstico incidente sobre o valor da remuneração do empregado.

§ 3º A dedução de que trata o inciso VII do caput deste artigo:

I - está limitada:

a) a 1 (um) empregado doméstico por declaração, inclusive no caso da declaração em conjunto;

b) ao valor recolhido no ano-calendário a que se referir a declaração;

II - aplica-se somente ao modelo completo de Declaração de Ajuste Anual;

III - não poderá exceder:

a) ao valor da contribuição patronal calculada sobre 1 (um) salário mínimo mensal, sobre o 13º (décimo terceiro) salário e sobre a remuneração adicional de férias, referidos também a 1 (um) salário mínimo;

b) ao valor do imposto apurado na forma do art. 11 desta Lei, deduzidos os valores de que tratam os incisos I a III do caput deste artigo;

IV - fica condicionada à comprovação da regularidade do empregador doméstico perante o regime geral de previdência social quando se tratar de contribuinte individual." (NR)

53

Art. 2º O art. 30 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, passa a vigorar acrescido do seguinte § 6º:

"Art. 30. ...................................................

...................................................

§ 6º O empregador doméstico poderá recolher a contribuição do segurado empregado a seu serviço e a parcela a seu cargo relativas à competência novembro até o dia 20 de dezembro, juntamente com a contribuição referente ao 13º (décimo terceiro) salário, utilizando-se de um único documento de arrecadação." (NR)

Art. 3º (VETADO)

Art. 4º A Lei nº 5.859, de 11 de dezembro de 1972, que dispõe sobre a profissão de empregado doméstico, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 2º-A. É vedado ao empregador doméstico efetuar descontos no salário do empregado por fornecimento de alimentação, vestuário, higiene ou moradia.

§ 1º Poderão ser descontadas as despesas com moradia de que trata o caput deste artigo quando essa se referir a local diverso da residência em que ocorrer a prestação de serviço, e desde que essa possibilidade tenha sido expressamente acordada entre as partes.

§ 2º As despesas referidas no caput deste artigo não têm natureza salarial nem se incorporam à remuneração para quaisquer efeitos."

"Art. 3º O empregado doméstico terá direito a férias anuais remuneradas de 30 (trinta) dias com, pelo menos, 1/3 (um terço) a mais que o salário normal, após cada período de 12 (doze) meses de trabalho, prestado à mesma pessoa ou família." (NR)

“Art. 3º-A. (VETADO)”

"Art. 4º-A. É vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada doméstica gestante desde a confirmação da gravidez até 5 (cinco) meses após o parto."

“Art. 6º-A. (VETADO)”

“Art. 6º-B. (VETADO)”

Art. 5º O disposto no art. 3º da Lei nº 5.859, de 11 de dezembro de 1972, com a redação dada por esta Lei, aplica-se aos períodos aquisitivos iniciados após a data de publicação desta Lei.

Art. 6º (VETADO)

Art. 7º (VETADO)

54

Art. 8º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos em relação às contribuições patronais pagas a partir do mês de janeiro de 2006.

Art. 9º Fica revogada a alínea a do art. 5º da Lei nº 605, de 5 de janeiro de 1949.

Brasília, 19 de julho de 2006; 185º da Independência e 118º da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA Guido MantegaLuiz Marinho

Nelson Machado

55

ANEXO B - Lei nº 11.770, de 09 de Setembro de 200

(DOU de 10.9.2008)

Cria o Programa Empresa Cidadã, destinado à prorrogação da licença-maternidade mediante concessão de incentivo fiscal, e altera a Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o É instituído o Programa Empresa Cidadã, destinado a prorrogar por 60 (sessenta) dias a duração da licença-maternidade prevista no inciso XVIII do caput do art. 7o da Constituição Federal.

§ 1o A prorrogação será garantida à empregada da pessoa jurídica que aderir ao Programa, desde que a empregada a requeira até o final do primeiro mês após o parto, e concedida imediatamente após a fruição da licença-maternidade de que trata o inciso XVIII do caput do art. 7º da Constituição Federal.

§ 2o A prorrogação será garantida, na mesma proporção, também à empregada que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança.

Art. 2o É a administração pública, direta, indireta e fundacional, autorizada a instituir programa que garanta prorrogação da licença-maternidade para suas servidoras, nos termos do que prevê o art. 1o desta Lei.

Art. 3o Durante o período de prorrogação da licença-maternidade, a empregada terá direito à sua remuneração integral, nos mesmos moldes devidos no período de percepção do salário-maternidade pago pelo regime geral de previdência social.

Art. 4o No período de prorrogação da licença-maternidade de que trata esta Lei, a empregada não poderá exercer qualquer atividade remunerada e a criança não poderá ser mantida em creche ou organização similar.

Parágrafo único. Em caso de descumprimento do disposto no caput deste artigo, a empregada perderá o direito à prorrogação.

Art. 5o A pessoa jurídica tributada com base no lucro real poderá deduzir do imposto devido, em cada período de apuração, o total da remuneração integral da empregada pago nos 60 (sessenta) dias de prorrogação de sua licença-maternidade, vedada a dedução como despesa operacional.

Parágrafo único. (VETADO)

Art. 6o (VETADO)

Art. 7o O Poder Executivo, com vistas no cumprimento do disposto no inciso II do caput do art. 5o e nos arts. 12 e 14 da Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000, estimará o montante da renúncia fiscal decorrente do disposto nesta Lei e o incluirá no demonstrativo a que se refere o § 6º do art. 165

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da Constituição Federal, que acompanhará o projeto de lei orçamentária cuja apresentação se der após decorridos 60 (sessenta) dias da publicação desta Lei.

Art. 8o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos a partir do primeiro dia do exercício subseqüente àquele em que for implementado o disposto no seu art. 7o.

Brasília, 9 de setembro de 2008; 187o da Independência e 120o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA

Guido Mantega

Carlos Lupi

José Pimentel