Sumários de Acórdãos do STJ - 1996-2012

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Responsabilidade civil extracontratual do Estado

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  • Gabinete dos Juzes Assessores - Assessoria Cvel

    A responsabilidade civil extracontratual do

    Estado na jurisprudncia das Seces Cveis do Supremo Tribunal de Justia

    (Sumrios de Acrdos de 1996 a Dezembro de 2012)

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    3 A responsabilidade civil extracontratual do Estado na jurisprudncia das Seces Cveis do Supremo Tribunal de Justia

    NOTA INTRODUTRIA

    A responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades pblicas por actos ilcitos est consagrada no artigo 22. da Constituio da Repblica Portuguesa.

    No plano ordinrio, o princpio da responsabilidade patrimonial directa do Estado encontra-se actualmente desenvolvido na Lei n. 67/2007, de 31-12, que aprovou o Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Pblicas.

    A responsabilidade civil do Estado pelos prejuzos causados ao cidado no exerccio da sua funo poltico-legislativa, jurisdicional e administrativa tem sido objecto de tratamento abundante pela jurisprudncia do Supremo Tribunal de Justia e justifica, por si s, a elaborao do presente caderno temtico, o qual condensa os sumrios dos acrdos tirados a respeito de tal questo pelas Seces Cveis do Supremo Tribunal de Justia, no perodo compreendido entre Janeiro de 1996 e Julho de 2010.

    Para facilitar a sua consulta, optou-se por compartimentar os sumrios seleccionados em trs grandes categorias, a saber:

    responsabilidade civil por danos decorrentes do exerccio da funo poltico-legislativa;

    responsabilidade civil por danos decorrentes do exerccio da funo jurisdicional; responsabilidade civil por danos decorrentes do exerccio da funo administrativa.

    Finalmente, de salientar que, no obstante todo o cuidado colocado na elaborao dos sumrios que se seguem, a utilizao destes no dispensa a consulta do texto integral da deciso a que os mesmos dizem respeito.

    Maro de 2013 Gabinete dos Juzes Assessores - Assessoria Cvel

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    5 A responsabilidade civil extracontratual do Estado na jurisprudncia das Seces Cveis do Supremo Tribunal de Justia

    Responsabilidade civil por danos decorrentes do exerccio da funo poltico-legislativa

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    7 A responsabilidade civil extracontratual do Estado na jurisprudncia das Seces Cveis do Supremo Tribunal de Justia

    Responsabilidade civil do Estado - Omisses legislativas - Direito legislao O reconhecimento de um direito legislao representaria uma violao do princpio da diviso de poderes "e uma completa subverso da relao de fora entre legislativo e judicial". Tal pretenso no poderia ser feita valer atravs dos tribunais. 30-10-1996 - Processo n. 476/96 - 2. Seco - Relator: Cons. Nascimento Costa

    Responsabilidade civil do Estado - Funo legislativa - Tribunal competente - Tribunal comum A competncia em razo da matria para conhecer de pedido de indemnizao dirigido contra o Estado por um particular destinado a estabelecer a responsabilidade do Estado pelos danos decorrentes do exerccio da funo legislativa (no caso de prolao da Lei n. 80/77, de 26-10, e DL n. 332/91, de 06-09, que fixaram critrios para determinao de indemnizao devida a antigos titulares de bens nacionalizados) cabe aos tribunais comuns e no aos administrativos (art. 4, n. 1, b), do ETAF e 66 do CPC). 30-10-1996 - Processo n. 470/96 - 2. Seco - Relator: Cons. Sousa Ins *

    Responsabilidade civil do Estado - Funo legislativa - Facto ilcito - Facto lcito - Viabilidade do pedido - Nulidade do acrdo recorrido I - De acordo com o princpio consagrado no n. 2 do art. 660, do CPC, aplicvel apelao por fora do disposto no n. 2 do art. 713, do mesmo Cdigo, se se anula um julgamento, no faz sentido conhecer de questes que, por serem elementos ou pressupostos da deciso final, so tambm abrangidas pela anulao e que, por isso, numa nova deciso consequente repetio do julgamento, podem ser decididas de diferente forma. II - Pedindo o autor uma indemnizao ao Estado com fundamento de, em virtude de legislao por este produzida, no ter podido aumentar as rendas por que traz arrendados os seus prdios, trata-se de uma questo de qualificao jurdica, saber se essa actividade do Estado - funo legislativa - lcita ou ilcita. III - A circunstncia de, na petio, o autor ter qualificado a concreta actividade legislativa do Estado como um acto ilcito e imoral, no significa que o tribunal no possa qualific-la de maneira diversa, nem esta diversa qualificao pode impedir que se no reconhea eventualmente que o Estado civilmente responsvel pelos danos da sua funo legislativa. IV - Se se parte, fundada e conscientemente, da irresponsabilidade do Estado pelos danos resultantes do exerccio da sua funo legislativa, independentemente de se poder eventualmente qualificar essa actividade, em certos casos concretos, como ilcita (v.g. lei ferida de inconstitucionalidade material) a questo no s pode ser decidida no despacho saneador, como o deve ser. V - Mas se, na deciso, se partiu do princpio de que s existe responsabilidade do Estado pela prtica de actos ilcitos, e no se analisou a hiptese da responsabilidade por factos lcitos, em termos gerais no existe propriamente nulidade por omisso de questo de que se devia conhecer, mas eventual erro de julgamento. 14-11-96 - Processo n. 156/96 - 2. Seco - Relator: Cons. Figueiredo de Sousa

    Responsabilidade civil do Estado - Funo legislativa - Processo administrativo - Nacionalizao - Indemnizao - Prescrio I - Tal como as coisas esto legisladas desde os tempos da Lei n. 80/77, o procedimento administrativo, gracioso e contencioso, posto pelo legislador ao servio da concretizao do direito de indemnizao dos atingidos pelas nacionalizaes, no comporta uma perspectiva indemnizatria fundada na produo antijurdica de danos. II - To-pouco contempla tal procedimento uma perspectiva que atribua quele direito (de indemnizao por efeito de nacionalizao) um contedo igual ao da indemnizao por acto ilcito ou pelo risco (isto , que satisfizesse o objectivo de reparao integral do dano). III - A limitao da indemnizao, nas hipteses de responsabilidade por facto lcito, constitui, alis, uma aceitvel consequncia da legalidade do acto gerador de responsabilidade, justificando, em tais circunstncias, o relativo sacrifcio do lesado.

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    8 Responsabilidade civil por danos decorrentes do exerccio da funo poltico-legislativa

    IV - S, pois, em aco de responsabilidade contra o Estado, intentada no foro comum, como a presente, ou no foro administrativo, conforme os pressupostos, que teria cabimento a discusso sobre os danos no patrimoniais, assim como a dos danos decorrentes da perda do valor de investimento, e da forada alienao da herdade, aps ter sido devolvida. V - No domnio da funo administrativa, a responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas pblicas, por actos de gesto pblica, prescreve no prazo previsto no n. 1 do art. 498 do CC. VI - A responsabilidade que ao Estado possa ser pedida pelos danos decorrentes da aplicao daquela norma situa-se, pois, no mbito daquilo a que a alnea b) do n. 1, do art. 4. do DL 129/84, de 27-04, chama de responsabilidade pelos danos decorrentes do exerccio da funo legislativa. 22-04-1999 - Revista n. 750/98 - 2. Seco - Relator: Cons. Quirino Soares

    Nacionalizao - Responsabilidade civil do Estado - Acto legislativo - Indemnizao - Reprivatizao I - A disposio contida no art. 22 da CRP tem sido considerada a matriz do regime da responsabilidade civil extra-obrigacional do Estado e demais entidades pblicas, abrangendo a decorrente quer da actividade administrativa, quer da legislativa, quer da jurisdicional. II - O reconhecimento do direito reparao dos danos causados por actos legislativos abrange quer o lcito legislativo, quer o ilcito legislativo e, quanto quele, no se circunscreve ao sacrifcio do direito de propriedade. III - Se a nacionalizao no for feita por grupos, o acto poltico que decreta a apropriao tem carcter individual, a norma no goza de abstraco e generalidade, mas ainda que se enuncie um princpio segundo o qual todo o sector ir passar para a propriedade pblica, tal no implica que necessariamente isso suceda nem que todas as empresas o tenham de ser; caso a nacionalizao de outras empresas no venha a ser efectuada, nem por isso resulta menor licitude do acto da nacionalizao ou se constitui o Estado na obrigao de motivar a no nacionalizao de outras empresas ou de ter de provar que no praticou injustia, nem na de indemnizar. IV - Os danos no patrimoniais resultantes da nacionalizao so indemnizveis, se resultarem da aplicao de uma lei ferida de inconstitucionalidade ou de ilegalidade, podendo e devendo ter sido evitada a sua aprovao, mas no se resultarem de acto legislativo lcito. V - A admisso das reprivatizaes no foi acompanhada de qualquer alterao constitucional em matria de indemnizaes aos titulares do capital das empresas nacionalizadas; continuando a indemnizao por nacionalizao a ser condicionada por factores de natureza essencialmente poltica, o valor obtido ou a obter com a reprivatizao no ir alterar a indemnizao devida, no conferindo tal acto ao ex-titular o direito a uma actualizao da indemnizao ou a uma indemnizao acrescida. VI - A reprivatizao no interfere no processo indemnizatrio nem torna injusta ou arrasta a inconstitucionalidade dos critrios legais aplicados, o que exclui a responsabilidade civil do Estado pela funo administrativa ou pelo exerccio da actividade jurisdicional. 23-09-1999 - Revista n. 540/99 - 1. Seco - Lopes Pinto (Relator), Ribeiro Coelho e Garcia Marques

    Responsabilidade por facto ilcito - Estado - Obrigao de indemnizar - Direitos fundamentais - Habitao I - O art. 22, da CRP, consagra o tipo de responsabilidade subjectiva do Estado por actos legislativos ilcitos e culposos. II - Os pressupostos da obrigao de indemnizar por banda do Estado so os enunciados na lei ordinria (art. 483, do CC), para a qual a lei constitucional necessariamente remete. III - Haver um facto ilcito legislativo sempre que a aprovao de lei inconstitucional (ou ilegal), em face da legislao em vigor nesse momento, viole direitos, liberdades e garantias ou ofenda quaisquer outros direitos ou interesses legalmente protegidos dos particulares. IV - O art. 22 da CRP no pode deixar de abranger tambm as hipteses de responsabilidade do Estado por actos legislativos lcitos, podendo apenas a lei exigir certos requisitos quanto ao prejuzo ressarcvel (ex: exigncia de um dano especial e grave). De outro modo, ficaria lesado o princpio geral da reparao dos danos causados a outrem.

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    9 A responsabilidade civil extracontratual do Estado na jurisprudncia das Seces Cveis do Supremo Tribunal de Justia

    V - Assim, a responsabilidade por facto das leis deve admitir-se sempre que haja violao de direitos, liberdades e garantias ou prejuzos para o cidado derivados directamente das leis. VI - Os direitos iniciativa e propriedade privada, previstos nos art.s 61, n. 1 e 62, n. 1, ambos da CRP, no so absolutos e, por vezes, devem ceder perante outros direitos, nomeadamente de natureza social e laboral. VII - o que acontece com o direito do cidado em ordem defesa da famlia, a exigir do Estado que lhe facilite a constituio de um lar independente e em condies de salubridade - art. 14 n. 1, da CRP. VIII - tambm o que sucede com o direito habitao, consagrado no art. 65, sendo certo que, nos termos do seu n. 3, incumbe ao Estado adoptar uma poltica tendente a estabelecer um sistema de renda compatvel com o rendimento familiar e de acesso habitao prpria. IX - Foi, pois, com vista materializao desse objectivo que o Estado interveio no mercado de arrendamento para habitao ao editar as leis ditas lesivas dos interesses e dos direitos de propriedade dos senhorios. X - S que, estando qualquer desses direitos (direito habitao e direito propriedade privada) consagrado na Constituio e em manifesta e frontal oposio entre si, o direito de propriedade dever ceder perante o direito habitao, dando-se prevalncia a este ltimo, no s porque o direito habitao deve ser entendido como prioritrio em relao ao direito de propriedade, mas tambm, e sobretudo, porque o direito de uso e fruio, faculdades integradas no contedo do direito de propriedade, no se mostram sequer assegurados constitucionalmente (art. 62 da CRP), bem podendo, por isso, o legislador ordinrio limitar, livremente, essas ditas faculdades. XI - Se outro fosse o entendimento, o direito habitao no teria um mnimo de garantia, ficando as pessoas sem possibilidade de conseguir habitao prpria ou de obter casa por arrendamento em condies compatveis com os rendimentos familiares. 23-09-1999 - Revista n. 324/99 - 7. Seco - Herculano Namora (Relator), Sousa Dinis e Miranda Gusmo

    Responsabilidade civil do Estado - Actos legislativos inconstitucionais - Competncia material - Sociedade annima - Administrador - Cessao do contrato de trabalho I - admissvel a responsabilidade civil do Estado por actos legislativos ilcitos, nomeadamente inconstitucionais. II - A prvia verificao da violao constitucional pressuposto da aco de indemnizao, e para esta ltima so competentes os tribunais judiciais. III - Nem sempre os efeitos lesivos e danosos da inconstitucionalidade da lei desaparecem por fora da retroactividade da declarao do vcio - h que distinguir o direito constitucional reparao dos danos resultantes do acto ilcito legislativo dos efeitos tpicos da inconstitucionalidade. IV - A existncia de dano no depende do tipo de inconstitucionalidade de que a norma esteja ferida e, por isso, no se vislumbra razo para limitar a responsabilidade do Estado aos casos de inconstitucionalidade material. V - O art. 398 do CSC determinava a cessao do contrato de trabalho existente h menos de um ano, se o trabalhador assumisse as funes de administrador da sociedade annima; na sequncia da declarao de inconstitucionalidade dessa norma, a extino de um contrato de trabalho, nela fundada, foi qualificada como despedimento sem justa causa, sendo a entidade patronal condenada no pagamento de uma indemnizao, pretendendo agora reaver do Estado aquilo que pagou: esto reunidos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Estado: o facto ilcito e culposo (negligncia grave), h dano e nexo de causalidade (embora a causalidade seja indirecta). 26-09-2000 - Revista n. 1739/00 - 1. Seco - Lopes Pinto (Relator), Ribeiro Coelho, Garcia Marques, Arago Seia (vencido) e Ferreira Ramos (vencido)

    Responsabilidade civil - Estado - Acto lcito - Inflao I - A garantia institucional em que o art. 22, da CRP, se configura, implica a responsabilidade directa do Estado pela leso de direitos, liberdades e garantias, cometida pelos titulares dos seus rgos, funcionrios ou agentes, ainda que a leso seja produzida por actos lcitos dos poderes pblicos.

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    10 Responsabilidade civil por danos decorrentes do exerccio da funo poltico-legislativa

    II - Quando militares afastados do activo por virtude do disposto no DL n. 178/74, de 30-04, pretendem ressarcir-se das quantias que no lhes foram pagas pelo Estado, o que efectivamente pretendem a reintegrao do seu patrimnio na mesma situao em que estaria se no tivessem sido objecto de saneamento. III - No reclamam uma mera obrigao pecuniria (obrigao de vencimentos), sujeita ao princpio nominalista, mas antes uma obrigao de indemnizao por danos patrimoniais, com o contedo definido pelos art.s 562 e ss., do CC, que se traduz numa dvida de valor, onde atendida a flutuao do valor da moeda. IV - Assim, nos termos do art. 566 n. 2, como elemento a atender no quantum indemnizatrio encontra-se o valor correspondente inflao. 08-02-2001 - Revista n. 3762/00 - 6. Seco - Azevedo Ramos (Relator), Pais de Sousa e Silva Salazar

    Responsabilidade civil do Estado - Responsabilidade extracontratual - Descolonizao - Prescrio I - O instituto da prescrio endereado, fundamentalmente, realizao de objectivos de convenincia ou oportunidade, tendo subjacente uma ideia de justia que leva em conta, contudo, a ponderao de uma inrcia negligente do titular do direito a exercit-lo. II - Provando-se nas instncias que os autores, radicados em Angola desde 1951, da saram em 1974, deixando a maior parte do seu patrimnio e sofrendo desgosto, inquietao e temor pela sua integridade fsica, tendo o Estado sido omisso nas medidas que se impunham para defender os direitos de personalidade e direitos patrimoniais dos seus cidados, ficou obrigado a reparar os danos, uma vez que, por fora do art. 486 do CC tinha o dever de praticar os actos omitidos. III - Remontando os factos que constituem a causa de pedir a 1974, tendo a aco sido intentada em 29-06-93 e o R. citado em 13 de Julho desse ano, ou seja 19 anos depois, no se provando factos que levem concluso do anterior reconhecimento tcito pelo Estado dos direitos dos autores, nem renncia pelo Estado do instituto da prescrio, no se demonstrando que a actuao do Estado foi criminosa, prescreveu o direito dos autores. 12-07-2001 - Revista n. 1332/01 - 1. Seco - Pinto Monteiro (Relator), Lemos Triunfante e Reis Figueira

    Responsabilidade civil do Estado - Funo legislativa - Despachante oficial I - So pressupostos ou requisitos da responsabilidade civil extracontratual do Estado por omisso de oportuno e capaz exerccio da funo legislativa, para alm da omisso em causa, a produo de danos que constituam prejuzos especiais e anormais, impostos, na prossecuo do interesse geral, a um ou alguns cidados, no decorrentes do risco normalmente suportado por todos em virtude da vida em colectividade, e inequivocamente graves, e a existncia de nexo causal entre aquela omisso e esses danos. II - ao autor, despachante oficial, que incumbe demonstrar, primeiro, a por si alegada insuficincia das medidas legislativas produzidas para obviar aos prejuzos necessariamente advenientes para os despachantes oficiais da abolio das fronteiras comunitrias decorrente da instituio do Mercado nico europeu e, depois, o necessrio nexo de causalidade adequada entre a omisso e os prejuzos arguidos. 07-02-2002 - Revista n. 3953/01 - 7. Seco - Oliveira Barros (Relator), Miranda Gusmo e Sousa Ins

    Responsabilidade civil do Estado - Funo legislativa - Omisso - Despachante oficial - nus da prova I - O art. 22 da CRP confere aos cidados o direito de fazerem valer contra o Estado uma pretenso indemnizatria por omisso de oportuno exerccio de actividade legislativa. II - Tal pretenso s pode, porm, fundamentar-se na omisso legislativa ilcita e culposa do Estado. III - Existe actuao ilcita do legislador sempre que este viole normas a que est vinculado (normas constitucionais, internacionais, comunitrias ou leis de valor reforado).

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    11 A responsabilidade civil extracontratual do Estado na jurisprudncia das Seces Cveis do Supremo Tribunal de Justia

    IV - O facto de o Estado Portugus, no obstante poder gozar de benefcios alfandegrios at 1995, haver antecipadamente, em 1993, pedido a sua supresso, insere-se na poltica estratgica global de adeso UE, inquestionvel sob o ponto de vista de omisso legislativa. V - Demonstrado que, na sequncia desse acto poltico, o Estado fez publicar diversos diplomas destinados a mitigar o impacto negativo daquela medida poltica no sector dos despachantes oficiais, h que concluir que no ocorre uma total omisso do dever de legislar. VI - A eventual insuficincia das medidas legislativas adoptadas tem que ser, nos termos do art. 342, n. 1, do CC, provada pela invocada titular da pretenso indemnizatria. 25-09-2003 - Revista n. 1944/03 - 7. Seco - Arajo de Barros (Relator) *, Oliveira Barros e Salvador da Costa

    Nacionalizao - Erro - Responsabilidade civil do Estado - Ocupao ilcita - Obrigao de indemnizar - Constitucionalidade - Tribunal competente I - O especial regime indemnizatrio previsto para os casos de nacionalizao no inconstitucional, no sendo tambm inconstitucionais as nacionalizaes operadas pelos vrios diplomas, nomeadamente, pelo DL 407-A/75, de 30 de Julho. II - Por isso, quando a indemnizao se funda na nacionalizao, em si mesma considerada, devida nos termos das respectivas leis reguladoras, nomeadamente, da Lei n. 80/77, de 26 de Outubro e DL n. 199/88, de 31 de Maio, relativamente privao indevida do uso e fruio do prdio rstico. III - Porm quando, como ocorre in casu, a Herdade foi erroneamente considerada nacionalizada, o regime indemnizatrio especificamente criado pelo legislador para as indemnizaes devidas pelas nacionalizaes, no pode ser aplicado, porque no pode verdadeiramente falar-se na existncia de nacionalizao. IV - Efectivamente, no reunindo o prdio os requisitos que a lei pressupunha para a nacionalizao e operando esta por via directa e imediata de lei que, afinal, a no abrangia, no chegou a verificar-se a nacionalizao e, consequentemente, no houve transferncia juridicamente relevante do direito de propriedade dos autores para a esfera jurdica do Estado. V - Daqui resulta que todos os actos praticados pelo Estado na Herdade consubstanciaram uma interveno ilegtima na esfera dos direitos dos ora autores, afectando-os de forma que, no estando legitimada pela sobreposio do interesse colectivo ao particular, no se compadece com a limitao da indemnizao, constitucionalmente acolhida merc, precisamente, dessa ponderao de valores. VI - O fundamento da obrigao de indemnizar por banda do Estado no pode tambm colher-se no mbito da legislao sobre reforma agrria, nomeadamente, no DL 199/88, de 31 de Maio, porque todo o esprito do sistema est fundado na existncia de nacionalizao, situao que no aconteceu no caso dos autos. VII - Sendo incontroverso que a actuao do Estado erroneamente fundada em acto legislativo lcito - a lei-medida -, ofendeu direitos dos autores, maxime, o direito de propriedade e que a mesma carecia de fundamento legal, tal actuao ilcita, gerando a obrigao de reparar as ofensas causadas aos titulares dos direitos assim violados. VIII - Tal obrigao de indemnizar no decorre da responsabilidade civil do Estado por acto legislativo ilcito e nem sequer, na nossa perspectiva, pelo menos, directamente, por acto legislativo lcito. O fundamento da obrigao de indemnizar do Estado emerge directamente do art. 22 da CRP. IX - A actuao do Estado no caso dos autos, integra, sem dvida, violao quer do art. 1, do Protocolo n. 1, Adicional Conveno Europeia da Proteco dos Direitos do Homem, quer ainda do disposto no art. 62, da CRP. X - E ainda violadora dos referidos normativos porque a demora na fixao e pagamento da indemnizao, caso seja devida, por tantos anos, integra em si mesma um dano diferente da prpria privao do direito do autor e da mora no pagamento da indemnizao. XI - Tal violao geradora da obrigao de indemnizar do Estado tanto mais evidente quando, tendo os ora autores, semelhana do que havia ocorrido em casos semelhantes, demandado o Estado Portugus junto do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, este Tribunal, afirmou a existncia de violao do citado artigo 1, do Protocolo n. 1, precisamente pela demora no pagamento da indemnizao devida.

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    12 Responsabilidade civil por danos decorrentes do exerccio da funo poltico-legislativa

    XII - Em face de uma situao de via de facto, o juiz do tribunal comum competente no s para proceder sua apreciao mas tambm para condenar a Administrao ao pagamento de uma indemnizao pelos prejuzos directos e indirectos suportados pelo particular. XIII - Tal indemnizao, porque no est sujeita s limitaes do direito impostas pelo regime especial da Reforma Agrria, no sofre qualquer limitao, sendo devida nos termos dos artigos 562 e segs. do CC. 15-03-2005 - Revista n. 2890/04 - 6. Seco - Ponce de Leo (Relator), Ribeiro de Almeida e Nuno Cameira

    Nacionalizao - Indemnizao - Inconstitucionalidade - Responsabilidade civil do Estado - Omisso legislativa I - No sendo irrisrio e desproporcionado o montante das indemnizaes que o ru Estado pagou pela nacionalizao de aces, em relao ao valor dos bens nacionalizados, no so inconstitucionais as normas que disciplinam as condies de pagamento de tais indemnizaes nem h que sujeitar estas ltimas a actualizao monetria ou proceder correco das respectivas taxas de juros. II - O art. 22 da CRP abrange tanto os actos da Administrao, como os legislativos e os judiciais, e no caso concreto da responsabilidade do Estado por omisso legislativa exigido que esta seja ilcita e culposa, dado que assenta na responsabilidade extracontratual por facto ilcito (art. 483 do CC). III - A nacionalizao no , em si, um acto ilcito; por outro lado, o arrastamento no tempo da publicao legislativa com os critrios legais tendentes fixao das indemnizaes decorrentes das nacionalizaes e forma do seu pagamento ficou a dever-se grande complexidade da matria, no compaginvel com prazos curtos, antes exigindo aturado estudo e forte ponderao. IV - Donde se deve concluir que, alegando to-somente as recorrentes o arrastamento no tempo da publicao legislativa sobre o processo indemnizatrio em causa nos autos e a violao do mencionado art. 22 da CRP, e nada sustentando acerca da ilicitude e da culpa do Estado na omisso legislativa em apreo, no pode proceder o seu pedido de condenao do Estado a tal ttulo. V - A admisso das reprivatizaes no foi acompanhada de qualquer alterao constitucional em matria de indemnizaes aos titulares do capital das empresas nacionalizadas. VI - A reprivatizao no interfere no processo indemnizatrio nem torna injusta ou arrasta a inconstitucionalidade dos critrios legais aplicados, o que exclui a responsabilidade civil do Estado pela funo administrativa ou pelo exerccio da actividade jurisdicional. 07-12-2005 - Revista n. 2453/05 - 2. Seco - Ferreira Giro (Relator), Loureiro da Fonseca e Bettencourt de Faria

    Responsabilidade pelo risco - Limite da responsabilidade - Directiva comunitria - Responsabilidade civil do Estado - Omisso legislativa I - A 2. Directiva 84/5/CEE do Conselho, de 30-12-1983, relativa aproximao das legislaes dos Estados-Membros respeitantes ao seguro de responsabilidade civil que resulta da circulao de veculos automveis, no foi transposta completamente para o direito nacional at 31-12-1995. II - O Estado Portugus no cumpriu, pois, o disposto nos art.s 5, n. 3, da sobredita Directiva e 249 e 10 do Tratado CEE, sendo que a obrigao de um Estado-Membro adoptar todas as medidas necessrias para alcanar o resultado imposto por uma directiva uma obrigao coerciva (de resultado). III - Tornou-se assim o Estado Portugus responsvel pelos prejuzos causados a particulares motivados pela violao (por omisso legislativa) da sobredita Directiva. 07-12-2005 - Revista n. 3063/05 - 2. Seco - Ferreira Giro (Relator), Loureiro da Fonseca e Bettencourt de Faria

    Responsabilidade civil do Estado - Nacionalizao - Aces - Indemnizao - Actualizao da indemnizao - Constitucionalidade - Poderes do Supremo Tribunal de Justia I - A indemnizao devida pela nacionalizao no total, no obedece aos valores de mercado, at porque a nacionalizao traduz uma censura a esses valores de mercado, traduz uma radical mudana nos objectivos e preocupaes da unidade produtiva nacionalizada.

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    13 A responsabilidade civil extracontratual do Estado na jurisprudncia das Seces Cveis do Supremo Tribunal de Justia

    II - A CRP apenas exige que a lei ordinria defina critrios que conduzam a uma indemnizao equitativa, reflexo daquela censura, mas no to exgua que possa ser considerada ridcula, irrisria, ofendendo os princpios de justia, igualdade e proporcionalidade. III - O STJ no pode exercer a fiscalizao concreta da constitucionalidade das normas que definiram os critrios de fixao da indemnizao devida pelas nacionalizaes, na medida em que no tem que as aplicar, no lhe cabendo fixar a indemnizao concreta devida ao autor e ao interveniente principal pela nacionalizao das respectivas aces. IV - O que foi pedido ao tribunal foi a condenao do R. a ressarcir os AA. dos prejuzos que lhes causou por fazer leis inconstitucionais, a que a Administrao deu cumprimento ao indemniz-los pelas aces que lhes foram nacionalizadas em 1975. Trata-se de responsabilidade civil do Estado pelos danos causados aos cidados pela sua aco legislativa ou falta dela. V - Esta pretenso dos AA. tem como pressuposto uma declarao de inconstitucionalidade material das normas em causa e no uma simples recusa da sua aplicao a uma situao concreta a decidir. VI - A fiscalizao abstracta da constitucionalidade no cabe a este Tribunal, mas sim ao Tribunal Constitucional (art. 281. da CRP), que no declarou a inconstitucionalidade material das normas que fixaram os critrios de fixao da indemnizao, apesar de expressamente solicitado para o efeito pelo Provedor de Justia. VII - O Estado tinha a obrigao de determinar os critrios de fixao da indemnizao correspondente s nacionalizaes (art. 83. da CRP) e foi o que fez com a publicao dos DL n. 528/76, Lei n. 80/77, DL n. 213/79 e DL n. 332/91. As leis que foram sendo publicadas sobre a matria nunca previram a correco monetria do valor das aces cuja nacionalizao se pretendia indemnizar. No se tratou de omisso, mas de opo legislativa. VIII - No havendo inconstitucionalidade por omisso e no tendo a lei optado pela correco monetria do valor encontrado para as aces nacionalizadas, no se pode concordar com a correco monetria feita pelo Tribunal da Relao. 24-10-2006 - Revista n. 2643/06 - 6. Seco - Salreta Pereira (Relator), Joo Camilo e Fernandes Magalhes

    Estabelecimento de ensino - Responsabilidade extracontratual - Responsabilidade civil do Estado - Funo legislativa - Seguro escolar - Danos no patrimoniais I - Em 25-01-1985, data da exploso de gs ocorrida na escola secundria frequentada pelo Autor, o seguro escolar abrangia apenas a cobertura de danos patrimoniais. Tratava-se de um seguro social destinado a garantir alguma indemnizao, ao menos pagando assistncia mdica, medicamentosa e de prteses, despesas de deslocao e hospedagem. II - S mais tarde, com o DL n. 35/90, de 25-01, e Portaria n. 413/99, de 08-06, que o legislador consagrou a indemnizabilidade de danos no patrimoniais. III - No possvel recorrer ao regime geral do Cdigo Civil para colher a o que no resultava da legislao especial. Com efeito, o art. 496. do CC prev a indemnizao por danos no patrimoniais apenas na responsabilidade por factos ilcitos, como resulta da sua colocao sistemtica na subseco I da seco V da responsabilidade civil. IV - Como no caso em apreo, no se assacou ao Estado nenhuma responsabilidade por facto ilcito (ou pelo risco), de concluir que o Autor s tem direito s indemnizaes previstas na lei do seguro escolar em vigor ao tempo do acidente. 31-10-2006 - Revista n. 2498/06 - 6. Seco - Afonso Correia (Relator), Ribeiro de Almeida e Nuno Cameira

    Responsabilidade civil do Estado - Responsabilidade extracontratual - Funo legislativa - Directiva comunitria - Omisso - Competncia material - Tribunal administrativo - Tribunal comum - Despacho saneador - Caso julgado formal I - Como resulta do disposto no art. 510., n. 3, do CPC, a questo da competncia material apreciada apenas em termos tabelares no despacho saneador no faz caso julgado formal. II - data da instaurao do processo vigorava j a Lei n. 13/2002, de 19-02 (alterada pelas Leis n. 4-A/2003, de 19-02, e n. 107-D/2003, de 31-12) que aprovou o novo Estatuto dos Tribunais

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    14 Responsabilidade civil por danos decorrentes do exerccio da funo poltico-legislativa

    Administrativos e Fiscais, o qual entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2004 - art. 4., n. 2 - e no se aplicava aos processos pendentes data da sua entrada em vigor - art. 2., n. 1). III - Estando em causa a responsabilidade extracontratual do Estado por omisso legislativa (transposio de Directiva Comunitria), estamos perante um caso ntido de competncia material dos tribunais administrativos. IV - O STJ materialmente incompetente para conhecer do pedido, determinando-se, em consequncia, a absolvio do Estado da instncia. 24-05-2007 - Revista n. 581/07 - 1. Seco - Paulo S (Relator), Sebastio Pvoas e Faria Antunes

    Responsabilidade civil do Estado - Funo legislativa - Municpio - Nexo de causalidade - Danos patrimoniais I - Admitindo-se a responsabilidade civil do Estado decorrente da sua actividade legislativa - art. 22. da CRP -, no pressuposto de que esta se traduziu numa ilicitude decorrente da violao de normas com valor reforado, no pode deixar de concordar-se com o entendimento das instncias quanto necessidade da existncia de um nexo de causalidade entre essa actividade legislativa ilcita e os prejuzos causados ao municpio de origem. II - Da que, no obstante a inobservncia de todos os pressupostos previstos na Lei-quadro da Criao de Municpios - Lei n. 142/85, de 18-11 - a quase totalidade dos prejuzos invocados pelo autor Municpio de Santo Tirso - perda de receitas provenientes de impostos e taxas municipais, perda de transferncia de capitais e de rendimentos no obtidos, menor capacidade de endividamento, todo o equipamento social ligado rea do novo municpio, bem como a perda de terrenos e mobilirio urbano correspondente mesma rea - constituem diminuies patrimoniais que o municpio de origem no deixaria de ter ainda que fossem rigorosamente observados todos os requisitos que a lei-quadro impe. III - J assim no sucede com os prejuzos que teve de suportar em consequncia do sobredimensionamento dos quadros de funcionrios e servios que teve de manter, aps a criao - Lei n. 83/98, de 14/12 - e instalao do Municpio da Trofa e no obstante a substancial diminuio quer da populao quer da rea do Municpio de Santo Tirso. 14-06-2007 - Revista n. 190/07 - 2. Seco - Duarte Soares (Relator), Bettencourt de Faria e Pereira da Silva

    Responsabilidade civil do Estado - Funo legislativa - Acto administrativo - Reserva Ecolgica Nacional I - O Estado e as demais pessoas colectivas pblicas devem indemnizar os particulares a quem, no interesse geral, mediante actos administrativos legais ou actos materiais lcitos, tenham imposto encargos ou causado prejuzos especiais e anormais (art. 9., n. 1, do DL n. 48051, de 21-11-1967). II - A especialidade e a anormalidade do risco e do dano subsequente tm lugar quando elas ultrapassam a medida das contingncias, transtornos e prejuzos que so inerentes vida colectiva, devendo cada um suport-los sem indemnizao como contrapartida das inestimveis vantagens que a mesma lhes proporciona. 28-06-2007 - Revista n. 3331/06 - 2. Seco - Rodrigues dos Santos (Relator), Joo Bernardo e Oliveira Rocha

    Reforma agrria - Nacionalizao - Responsabilidade civil do Estado I - Com a nacionalizao extingue-se o direito de propriedade, constituindo-se na esfera jurdica do Estado Portugus um novo direito, qualitativamente diverso. II - Com a posterior constituio do direito de reserva surge um direito ex novo na titularidade do reservatrio. III - O direito de reserva tem por objecto uma rea ou pontuao de terra, no uma concreta ou especfica terra nacionalizada de que o titular daquele direito era proprietrio antes da nacionalizao, pelo que o direito de reserva pode ser preenchido mediante a atribuio de terreno noutra propriedade da mesma zona. 23-10-2007 - Revista n. 3018/07 - 1. Seco - Faria Antunes (Relator) *, Moreira Alves e Alves Velho

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    15 A responsabilidade civil extracontratual do Estado na jurisprudncia das Seces Cveis do Supremo Tribunal de Justia

    Responsabilidade civil do Estado - Prescrio - Funo legislativa - Ex-colnia portuguesa - Nacionalizao - Constitucionalidade I - Estando em causa a pretenso de exerccio de um direito a indemnizao, seja por acto ilcito, seja por acto lcito do Estado Portugus, determinante de danos patrimoniais e no patrimoniais decorrentes do alegado no acautelamento da perda de bens que os Autores, retornados da ex-colnia de Moambique, tinham data da independncia deste territrio, antes sob administrao portuguesa, no se pode considerar que o reconhecimento da prescrio desse direito viole os princpios nsitos nos arts. 62., 8., 14. e 22. da CRP. II - O acto de confisco dos bens dos Autores foi da responsabilidade das autoridades de Moambique, um Estado independente e soberano aps o Acordo de Lusaka, celebrado entre as delegaes da Frente de Libertao de Moambique (FRELIMO) e o Estado portugus, em Setembro de 1974. III - Tambm no se pode considerar violado o princpio da igualdade do art. 13. da CRP, por respeitarem a situaes completamente diferentes, o caso do ouro de Judeus, em que estava em causa o ressarcimento dos proprietrios de ouro recebido pelo Estado Portugus da Alemanha Nazi em pleno holocausto, ou ainda o caso dos retornados do Zaire, em que, no Acordo entre a Repblica Portuguesa e a Repblica do Zaire, assinado em Kinshasa em 5 de Fevereiro de 1998 e aprovado para ratificao pelo artigo nico do Decreto n. 3/89, de 07-01, se salvaguardou a responsabilidade daquele Estado pelo pagamento de indemnizaes aos nacionais portugueses retornados do mesmo, que viram os seus bens naquele pas serem nacionalizados. 23-10-2007 - Revista n. 2962/07 - 1. Seco - Moreira Camilo (Relator), Urbano Dias e Paulo S

    Responsabilidade civil do Estado - Funo legislativa - Cdigo Penal - Cdigo de Processo Penal - Interrupo da prescrio I - O legislador no fez acompanhar as alteraes processuais contidas no Cdigo de Processo Penal de 1987 das necessrias adaptaes lei substantiva, designadamente quanto aos factores interruptivos da prescrio. II - Tal omisso criou dificuldades de interpretao e originou decises contraditrias relativamente problemtica da interrupo da prescrio do procedimento criminal referente a crimes cometidos no mbito do Cdigo de Processo Penal de 1987, mas antes de 01-10-1995, data da entrada em vigor do Cdigo Penal revisto pelo DL n. 48/95, que alterou o Cdigo Penal de 1982, e no qual se legislou no sentido de harmonizar as disposies legais substantivas e processuais. III - Para sanar tais divergncias foi proferido o Assento n. 12/2000 (hoje com o valor de acrdo uniformizador de jurisprudncia), de 16-11-2000. IV - A falta de previso do Estado-legislador na compatibilizao dos regimes de interrupo da prescrio entre o Cdigo Penal de 1982 e o Cdigo de Processo Penal de 1987 no constitui violao de qualquer direito fundamental do recorrente, nomeadamente o de acesso ao direito e aos tribunais e realizao da justia, consagrados nos arts. 9. e 20. da CRP. V - No incorre, pois, o Estado, em face da apontada omisso, em responsabilidade civil nos termos do art. 22. da CRP. 15-11-2007 - Revista n. 3684/07 - 7. Seco - Ferreira de Sousa (Relator), Armindo Lus e Pires da Rosa

    Acidente de viao - Limite da indemnizao - Responsabilidade civil do Estado - Funo legislativa - Directiva comunitria - Transposio de Directiva - Omisso - Obrigao de indemnizar I - A Jurisprudncia portuguesa dominante, quando chamada a pronunciar-se sobre a questo da revogao tcita do art. 508., n. 1, pelo art. 6. do DL n. 522/85, pronunciou-se no sentido dessa no revogao e, do mesmo passo considerou, na generalidade, que a 2. Directiva, por no ter sido transposta para o direito interno portugus no podia ser invocada como fonte de direito. II - O Estado deveria ter transposto a 2. Directiva at 31-12-1995 e s o fez atravs do DL n. 59/2004, de 19-03.

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    16 Responsabilidade civil por danos decorrentes do exerccio da funo poltico-legislativa

    III - Incumbia ao Estado - para quem entende que as Directivas no so imediatamente aplicveis - proceder rpida transposio - sob pena de violao do princpio da igualdade - art. 13. da CRP - e da tutela efectiva e acesso ao direito - art. 20. da Lei Fundamental. IV - Os Estados-membros esto obrigados a reparar os prejuzos causados s partes pela violao do direito comunitrio e essa violao pode resultar da no aplicao na ordem jurdica interna das normas e princpios comunitrios - por omisso - ou quando desrespeite Acrdos do TJCE. V - A responsabilidade assacada ao Estado resulta de um comportamento omissivo violador do Tratado, omisso que tico-juridicamente censurvel, o que exprime culpa. VI - Tratando-se de responsabilidade civil extracontratual aquela que os AA. pretendem actuar com a aco, alegaram e provaram factos integradores da causa de pedir, no caso: o facto ilcito, a culpa, o dano, e o nexo de causalidade entre o facto e o dano - art. 483. do CC e arts. 2. e 6. do DL n. 48.051, de 21-11-1967 - pelo que a condenao do Ru Estado no merece censura. 27-11-2007 - Revista n. 3954/07 - 6. Seco - Fonseca Ramos (Relator) *, Rui Maurcio e Cardoso de Albuquerque

    Responsabilidade civil do Estado - Funo legislativa - Directiva comunitria - Transposio de Directiva - Seguro automvel - Limite da indemnizao - Competncia material - Tribunal administrativo I - A autora, ao fundamentar o pedido indemnizatrio, aduz factos tendentes a demonstrar que essa sua pretenso dimana do facto de o Estado, na sua funo de legislar, ter omitido a correcta transposio para o direito interno da Directiva n. 84/5/CEE, de 30-12-1983, por forma a que deixasse de subsistir, no direito interno, a limitao da indemnizao do art. 508., n. 1, do CC, inferior aos limites mnimos do seguro obrigatrio fixados na referida Directiva, o que apenas veio a fazer com o DL n. 59/2004, de 19-03, muito depois do limite temporal mximo a que estava obrigado - 31-12-1995. II - Dessa omisso resultaram-lhe os danos que especifica pelo facto de nos tribunais nacionais lhe terem reduzido a indemnizao quele limite mximo, apesar de ser ter demonstrado serem de valor muito mais elevado os danos que sofreu. III - Portanto, tal como a autora configura a aco, fundamenta a responsabilidade extracontratual do Estado num acto legislativo omissivo. IV - Assim configurada a aco, outra concluso no resta que dar cumprimento ao disposto no art. 4., n. 1, al. g), do ETAF, considerando-se ser incompetente em razo da matria o tribunal comum, sendo competente a jurisdio administrativa. 10-07-2008 - Revista n. 740/08 - 7. Seco - Custdio Montes (Relator), Mota Miranda e Alberto Sobrinho

    Responsabilidade civil do Estado - Funo legislativa - Militar - Foras Armadas - Reforma - Danos patrimoniais - Danos no patrimoniais I - O Estado, no exerccio da sua funo legislativa, ao revogar a Lei n. 15/92, de 05-08, por intermdio pelo DL n. 236/99, de 25-06, actuou de modo ilcito e culposo. II - Ao agir deste modo, o Estado ficou incurso na obrigao de indemnizar os danos patrimoniais e no patrimoniais sofridos pelos militares das Foras Armadas que, por fora da sua sujeio ao regime preconizado pelo citado Decreto-Lei, passaram prematura e irreversivelmente reforma e, por isso, viram cair a possibilidade de regresso ao servio com o escopo de alcanarem um escalo remuneratrio superior e de reflectirem este no clculo da sua penso de reforma. 31-03-2009 - Revista n. 2421/08 - 2. Seco - Serra Baptista (Relator), Santos Bernardino e lvaro Rodrigues

    Responsabilidade civil do Estado - Pressupostos - Responsabilidade extracontratual - Funo legislativa - Omisso - Directiva comunitria - Funo jurisdicional - Nexo de causalidade - Culpa I - O art. 22. da CRP estatui o princpio da responsabilidade patrimonial directa das entidades pblicas por danos causados aos cidados, sendo pressupostos do dever de indemnizar, semelhana do que acontece no direito civil, o facto ilcito, a culpa, o prejuzo e o nexo de causalidade.

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    17 A responsabilidade civil extracontratual do Estado na jurisprudncia das Seces Cveis do Supremo Tribunal de Justia

    II - A responsabilizao indemnizatria do Estado por omisso legislativa s surge quando o legislador viole normas constitucionais, internacionais, comunitrias ou leis de valor reforado ou, ainda, quando o Estado viola o princpio da confiana que ele mesmo criara. III - No existe omisso legislativa do Estado relativamente ao art. 20. do DL n. 522/85 - referente ao certificado provisrio de seguro - na medida em que este diploma no encerra o cumprimento de qualquer imposio de directivas comunitrias, nem a necessidade de dar sequncia a qualquer norma ou princpio constitucional. IV - O direito a um processo sem dilaes indevidas pode e deve ser considerado como um direito fundamental constitucionalmente consagrado, com uma dimenso constitutiva do direito proteco jurisdicional. V - A responsabilidade do Estado por facto da funo jurisdicional no dispensa a anlise dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Estado por factos ilcitos, razo pela qual, para que um dano seja reparvel, necessrio que o acto tenha actuado como condio do dano, segundo regras da experincia comum ou conhecidas do lesante e de um critrio de normalidade. VI - Tendo o autor intentado, em 14-04-1994, aco de condenao baseada em responsabilidade civil por acidente de viao contra o ru, sendo que em 26-06-2000 foi proferido saneador-sentena no qual se decidiu pela ilegitimidade do ru, preterio de litisconsrcio necessrio passivo, bem como julgada procedente a excepo peremptria de prescrio invocada pelos intervenientes Companhia de Seguros e FGA, constata-se que, no obstante o atraso processual que flui dos autos, este no foi causal para o desfecho da aco, mas sim a incria e o descuido cautelar do autor que no intentou a aco ab initio contra o FGA, por entender que o responsvel civil tinha meios suficientes para solver as suas obrigaes. 14-01-2010 - Revista n. 2452/03.8TBBCL.G1.S1 - 2. Seco - Oliveira Rocha (Relator), Oliveira Vasconcelos e Joo Bernardo

    Responsabilidade civil do Estado - Responsabilidade extracontratual Omisso - Funo legislativa - Princpio da confiana - Uniformizao de jurisprudncia - Interpretao

    I - A aplicao directa do art. 22. da CRP abre caminho responsabilidade civil do Estado por omisso legislativa.

    II - A norma constitucional deixa, porm, lei ordinria um espao de liberdade, de sorte que s se alcana tal responsabilidade se se verificarem os pressupostos da responsabilidade civil.

    III - Os casos em que sobre o Estado impende o dever de legislar surgem quando normas constitucionais ou internacionais (nomeadamente comunitrias) ou leis de valor reforado impem ao Estado a legiferao, incluindo-se naquelas, concretamente no art. 2. da CRP, o princpio da confiana.

    IV - No se est perante um desses casos s porque determinada norma levanta dvidas de interpretao, com diviso inerente da jurisprudncia a ponto de ser lavrado acrdo uniformizador.

    V - Num quadro em que, legislando, o Estado tanto o poderia fazer no sentido de serem tutelados os interesses prosseguidos pelos autores, como no sentido de no serem, no pode ter lugar responsabilidade daquele por omisso legislativa.

    02-06-2011 - Revista n. 680/03.5TVLSB.L1 - 2. seco - Joo Bernardo (Relator) *, Oliveira Vasconcelos e Serra Batista

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    19 A responsabilidade civil extracontratual do Estado na jurisprudncia das Seces Cveis do Supremo Tribunal de Justia

    Responsabilidade civil por danos decorrentes do exerccio da funo jurisdicional

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    21 A responsabilidade civil extracontratual do Estado na jurisprudncia das Seces Cveis do Supremo Tribunal de Justia

    Responsabilidade civil do Estado - Acto de gesto pblica - Direito de regresso - Contencioso administrativo - Acto judicial - Interpretao da lei I - O regime de direito de regresso do Estado sobre os seus funcionrios constante do DL n. 48051, de 21-11-67, respeitante responsabilidade civil por actos de gesto pblica, est actualmente ultrapassado por, no tocante ampla iseno de responsabilidade do titular ou agente face ao lesado, contrariar a regra geral da solidariedade estabelecida no art. 22 da CRP. II - Integra a actividade de gesto pblica a prolao de uma sentena por um juiz. III - A jurisdio administrativa apenas concebida, pela CRP, para dirimir conflitos emergentes de relaes administrativas, pelo que a meno que no art. 51, al. h), do DL n. 129/84, de 27-04 - Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais - se faz a actos de gesto pblica apenas pode abranger os que se desenvolvem no mbito de relaes jurdicas deste ltimo tipo. IV - A ele escapam, naturalmente, os actos judiciais, assente, como , a distino entre Administrao e Jurisdio. V - Regendo o DL 48051 quanto responsabilidade do servidor do Estado em geral, e tendo o art.. 1083, do CPC, uma incidncia subjectiva especial bem marcada, no foi este preceito revogado por aquele diploma, pois a lei especial no revogada pela lei geral posterior, a no ser que outra fosse a inequvoca inteno do legislador. VI - A responsabilidade civil dos juzes continua a ser regulada pelo art. 1083, do CPC, que no afectado pelo regime geral previsto no art. 22, da CRP, atento o constante do seu art. 218, n. 2. VII - Para alm do disposto nos art.s 27, n. 5, e 29, n. 6, da CRP, tambm o seu art. 22 d fundamento responsabilidade civil do Estado por facto do exerccio do poder jurisdicional, ainda que em concreto se no verifique responsabilidade civil do juiz. VIII - Apontam neste sentido os termos amplos em que a norma est redigida - designadamente por se no referir actividade administrativa tout court - e a sua insero num Ttulo definidor de princpios gerais, assim como a circunstncia de tambm os juzes poderem ser, em alguns casos, responsabilizados, no se compreendendo que com eles o no seja o Estado. IX - Neste campo da responsabilidade civil do Estado por facto do exerccio do poder jurisdicional pode aceitar-se uma que seja emergente da m organizao do sistema judicial, estruturado em moldes insuficientes para a satisfao das necessidades do sector, a par de uma outra que tem a sua origem no mau desempenho das suas funes por parte de agentes judicirios estaduais. X - O art. 22, da CRP, no est includo no Ttulo II - Direitos, Liberdades e Garantias, mas tem uma natureza anloga aos direitos que deste Ttulo constam, pelo que lhe deve ser estendido o regime ditado pelo art. 18, n. 3 - designadamente, a sua aplicao directa, independentemente da existncia de lei ordinria que o concretize. XI - Impe-se, porm, complementar o princpio assim constitucionalmente garantido com os princpios gerais da responsabilidade civil, o que nos obriga a identificar o ilcito e a conduta culposa do juiz, embora esta no condicionada verificao da responsabilidade efectiva deste. XII - E no se v que possam ser aqui directamente aplicados os art.s 4, n. 1, e 6, do DL 48051, dado o seu desajustamento face s realidades em presena. XIII - Visto que as suas caractersticas de generalidade e abstraco distanciam cada vez mais a lei dos casos da vida, e considerando a multiplicidade de factores, endgenos e exgenos, determinantes da opo final que o juiz toma, bem se compreende que seja com grande frequncia que se manifestam sobre a mesma questo opinies diversas, cada uma delas capaz de polarizar larga adeso, e com isso se formando correntes jurisprudenciais das quais, se se pode ter a certeza de que no esto ambas certas, j difcil ou impossvel ser assentar em qual est errada. XIV - Dentro deste quadro, a culpa do juiz s pode ser reconhecida, no tocante ao contedo da deciso que proferiu, quando esta de todo desrazovel, evidenciando um desconhecimento do Direito ou uma falta de cuidado ao percorrer o iter decisrio que a levem para fora do campo dentro do qual natural a incerteza sobre qual vai ser o comando emitido. XV - No sindicvel a actividade de interpretao de normas jurdicas. XVI - Se a deciso judicial examinou cuidada e aprofundadamente a questo e os elementos doutrinrios e jurisprudenciais a ela atinentes e chegou a uma concluso que no pode facilmente ser apodada de errada, e nem sequer de lhe haver dado origem uma atitude negligente dos julgadores, e,

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    22 Responsabilidade civil por danos decorrentes do exerccio da funo jurisdicional

    ainda muito menos, de provir de uma negligncia indesculpvel e intolervel, no h actividade culposa relevante para o efeito. XVII - No pode um juiz ser criticado como gravemente negligente se, aps considerar com cuidado uma questo que lhe posta, segue uma orientao que, no sendo indiscutvel, tem a seu favor o apoio que lhe do outras j proferidas no mesmo sentido. XVIII - O art. 23, do CExp de 1991, no tem natureza interpretativa, que nem este diploma afirma, nem o respectivo prembulo d conta dessa inteno, nem sequer se conhece que houvesse, na prtica judiciria, divergncia sobre esse ponto que justificasse ter o legislador sentido necessidade de a ela obviar, no s para o futuro, mas tambm quanto a casos passados. XIX - Para o reconhecimento, em concreto, de uma obrigao de indemnizar, por parte do Estado, por facto do exerccio da funo jurisdicional no basta a discordncia da parte que se diz lesada, nem sequer a convico, a que se chegue, de que no foi justa ou a melhor a soluo encontrada no julgamento que vier questionado. XX - Impe-se que haja a certeza de que um juiz normal e exigivelmente preparado e cuidadoso no teria nunca julgado pela forma que tiver tido lugar, sendo esta inadmissvel e fora dos cnones minimamente aceitveis. 08-07-1997 - Processo n. 774/96 - 1. Seco - Relator: Cons. Ribeiro Coelho *

    Responsabilidade civil do Estado - Privao da liberdade - Obrigao de indemnizar - Interpretao conforme a CRP - Analogia I - Muito embora lcita quanto aos cnones processuais cabveis, a perdurao de uma situao de privao de liberdade pelo perodo de cinco meses, que a final do processo instrutor se veio a revelar injustificada, , de per si, em abstracto, e segundo qualquer padro aferidor de carcter objectivo, particularmente grave e de especial danosidade para a esfera jurdico-pessoal de qualquer cidado mdio em termos de comportamento cvico, isto , para o cidado que suposto ser o querido pela ordem jurdica. II - Tal situao de leso grave da esfera individual e subjectiva dos cidados encontra guarida tutelar, desde logo na previso do art. 22 do texto constitucional, cabendo aos juzes criar uma norma de deciso (aplicao dos princpios gerais da responsabilidade da administrao, observncia dos critrios gerais da indemnizao e reparao de danos), tendente a assegurar a reparao de danos resultantes de actos lesivos de direitos, liberdades e garantias ou dos interesses juridicamente protegidos dos cidados. III - No h assim incompatibilidade mas complementaridade entre a previso genrica do art. 22 e a previso especfica do art. 27, n. 5, ambos da CRP, j que este ltimo inciso constitucional representa um alargamento (um majus) da responsabilidade civil do Estado j consagrada naquele anterior normativo. IV - Para tal no se torna necessrio criar a aludida norma de deciso, pois que o ordenamento positivo vigente contempla j o princpio geral da obrigao de indemnizao dos cidados pelo Estado por actos materialmente lcitos no art. 9, do DL 48.051, de 21-11-67. certo que este preceito se reporta expressamente a actos administrativos legais ou actos materiais lcitos, desde que os mesmos hajam imposto encargos ou causado prejuzos especiais e anormais. Mas numa interpretao conforme a Constituio - tendo em conta a unidade do sistema jurdico e os demais cnones interpretativos constantes do art. 9, do CC - no de afastar a incluso da hiptese vertente no mbito da previso daquele preceito legal. V - Norma que sempre seria de aplicar com recurso analogia da responsabilidade por actos administrativos e/ou materiais lcitos, embora lesivos, j que procederiam as razes justificativas do caso previsto na lei. VI - No mbito da norma em apreo no cabem somente os actos lesivos praticados, por ex., no seio de um procedimento ablatrio do Estado, abrangendo tambm, por maioria de razo (argumento a fortiori) as violaes graves dos direitos de personalidade (entre estes o direito liberdade) advenientes de actos lcitos emitidos por rgos inseridos em algum dos poderes do Estado. 12-11-1998 - Revista n. 795/98 - 2. Seco - Relator: Cons. Ferreira de Almeida

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    23 A responsabilidade civil extracontratual do Estado na jurisprudncia das Seces Cveis do Supremo Tribunal de Justia

    Responsabilidade civil - Responsabilidade civil do Estado - Negligncia grosseira - Petio inicial - Indeferimento liminar da petio - Execuo I - Se a execuo prosseguiu nos termos do n. 2 do art. 920 do CPC, porque o MP assim requereu sem que estivessem verificados os requisitos exigidos por este preceito legal, houve violao grave da lei processual, prima facie por negligncia grosseira. II - O facto de a autora e ento exequente no ter recorrido da deciso, na perspectiva de que normalmente seria revogada, pode eventualmente ser relevante nos termos do art. 570 do CC, mas no deve servir prematuramente de fundamento do despacho de indeferimento liminar. 03-12-1998 - Agravo n. 644/98 - 1. Seco - Relator: Cons. Afonso de Melo

    Responsabilidade civil - Responsabilidade civil do Estado - Indemnizao - Privao da liberdade - Aplicao da lei no tempo I - O art. 225, do CPP de 1987, quanto s detenes ou prises preventivas ilegais, constitui legislao nos termos previstos no n. 5 do art. 27 da CRP e, quanto s prises preventivas apenas injustificadas ampliou a responsabilidade civil do Estado. II - Tal norma, no tem natureza processual, pois no se relaciona com o tipo de processo em que se insere. norma de direito material que passou a vigorar com a entrada do respectivo Cdigo, aplicando-se mesmo s prises ordenadas nos processos que nos termos do art. 7, n. 1, do DL 78/87, de 17-02, continuaram a reger-se pelo CPP de 1929. Assim, a priso apenas injustificada, ordenada no abrigo deste Cdigo aps 01-01-88, obriga o Estado a indemnizar. 03-12-1998 - Revista n. 1018/98 - 1. Seco - Relator: Cons. Afonso de Melo

    Responsabilidade civil do Estado - Priso preventiva I - Ao referir-se ao erro grosseiro na apreciao dos pressupostos de facto da aplicao da medida de priso preventiva, como requisito da indemnizao, a lei pretendeu afastar da respectiva previso os casos em que haja sido cometido qualquer erro de direito, em qualquer das suas modalidades de erro na aplicao, erro na interpretao ou erro na qualificao. II - E isto, sem dvida, com o objectivo de preservar a independncia dos juzes na administrao da justia, os quais se encontram, no exerccio da sua competncia funcional, apenas limitados pelo dever de obedincia Constituio e Lei e pelo respeito pelos juzos de valor legais, no podendo porm ser penalizados pelos juzos tcnicos emitidos nas respectivas decises, ainda que estas possam, em via de recurso, ser alteradas por tribunais de hierarquia superior - art.s: 205 e 208 da CRP revista em 1989 (art.s 202 a 294 do texto actual) e 4 e 5 do EMJ aprovado pela Lei n. 21/85, de 30 de Julho. III - Obviamente que - muito embora lcita face aos cnones processuais cabveis - a perdurao de uma situao de privao de liberdade pelo perodo de cinco meses, que a final do processo instrutor se veio a revelar realmente injustificada - , de per si, em abstracto, e segundo qualquer padro aferidor de carcter objectivo, como particularmente grave e de especial danosidade para a esfera jurdico-pessoal de qualquer cidado mdio em termos de comportamento cvico, isto para o cidado que suposto ser o querido pela ordem jurdica. 03-12-1998 - Revista n. 795/98 - 2. Seco - Relator: Cons. Ferreira de Almeida

    Responsabilidade civil do Estado - Priso preventiva - Indemnizao - Pressupostos I - No n. 1 do art. 225 do CPP de 1987 prev-se indemnizao por prises preventivas manifestamente ilegais - v. g. as levadas a cabo por entidades administrativas ou policiais. II - Nesta mesma previso legal incluem-se tambm as situaes em que tais medidas de coaco sejam aplicadas por magistrados judiciais agindo desprovidos da necessria competncia legal, ou fora do exerccio do seu mnus ou sem utilizao do processo devido, ou mesmo quando, embora investidos da autoridade prpria do cargo, se hajam determinado margem dos princpios deontolgicos e estatutrios que regem o exerccio da funo judicial ou, ainda, impulsionados por motivaes de relevncia criminal, v. g. por peita, suborno, concesso, concusso, abuso do poder ou prevaricao. 03-12-1998 - Revista n. 864/98 - 2. Seco - Relator: Cons. Costa Soares

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    24 Responsabilidade civil por danos decorrentes do exerccio da funo jurisdicional

    Responsabilidade civil do Estado - Priso preventiva I - O art. 22 da CRP respeita genericamente defesa dos direitos liberdades e garantias das pessoas, sendo a sua directa aplicao realizada por uma norma de deciso a criar pelos prprios tribunais, se necessrio. II - O art. 27, n. 5, da CRP, com uma aplicao especfica, respeita a casos de privao da liberdade das pessoas, e a esfera por ele propugnada esgota-se no art. 225 do CPP. III - So vlidas as restries dos direitos contempladas no art. 225 do CPP, especificadamente os referentes aos art.s 5, n. 3, da CEDH, 9 PIDCP, 7, 483 e 562 do CC, alm do direito presuno de inocncia. 11-11-1999 - Revista n. 743/99 - 2. Seco - Peixe Pelica (Relator), Noronha Nascimento e Ferreira de Almeida

    Priso preventiva - Indemnizao - Caducidade Tendo o autor sido julgado e absolvido do crime de que estava pronunciado, por deciso de 17-01-91 e, nessa mesma data libertado, no tendo a acusao interposto recurso no prazo de 10 dias a contar da prolao da deciso absolutria do autor, essa deciso transitou em julgado e tornou-se definitiva a partir de 28-01-1991, data em que o processo penal respeitante ao autor ficou definitivamente decidido, pelo que o autor tinha o prazo de um ano previsto no art. 226 n. 1, do CPP, para propor aco de indemnizao contra o Estado Portugus, prazo que expirara quando a presente aco entrou em juzo. 09-12-1999 - Revista n. 831/99 - 6. Seco - Pais de Sousa (Relator), Afonso de Melo e Machado Soares

    Priso preventiva - Indemnizao - Caducidade I - O art. 27, da CRP, consagra a responsabilidade directa do Estado por actos da funo jurisdicional por leso grave do direito da liberdade. II - Tal preceito, por fora do determinado no art. 18 n. 1, da CRP, directamente aplicvel no s s relaes entre os particulares e o Estado, mas tambm s relaes entre particulares. III - O art. 226, do CPP, veio regulamentar os termos em que o direito de indemnizao deve ser exercido tal como estabelecido no art. 27, n. 5 da CRP. 09-12-1999 - Revista n. 762/99 - 1. Seco - Pinto Monteiro (Relator), Lemos Triunfante e Torres Paulo

    Estado - Priso ilegal - Indemnizao I - O art. 225, do CPP de 1987, a consagrao legislativa correcta do princpio constitucional estabelecido no n. 5 do art. 27 da CRP. II - Nos termos do art. 225 do CPP de 1987, est prevista a indemnizao por parte do Estado por privao da liberdade em dois casos: por deteno ou priso preventiva manifestamente ilegal e por priso preventiva legal mas injustificada por erro grosseiro na apreciao dos pressupostos de facto, exigindo-se prejuzos anmalos e de particular gravidade, sem concurso de conduta dolosa ou negligente do arguido para a formao do erro. 06-01-2000 - Revista n. 1004/99 - 7. Seco - Miranda Gusmo (Relator) *, Sousa Ins e Nascimento Costa

    Estado - Obrigao de indemnizar - Nexo de causalidade - Matria de facto I - A obrigao de indemnizar, por parte do Estado, relacionada com os atrasos injustificados na administrao da justia, s o poder ser no respeitante aos danos que tenham com esse ilcito, consubstanciado na morosidade do processo, uma relao de causalidade adequada. II - O estabelecimento do nexo causal entre o facto ilcito e o dano, por constituir questo de facto, no pode ser objecto do recurso de revista pois a tal obsta o disposto no n. 2 do art. 722, do CC. 17-02-2000 - Revista n. 1207/99 - 2. Seco - Duarte Soares (Relator), Simes Freire e Roger Lopes

    Responsabilidade extracontratual - Estado - Apreenso de veculo

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    25 A responsabilidade civil extracontratual do Estado na jurisprudncia das Seces Cveis do Supremo Tribunal de Justia

    I - O art. 22 da CRP consagra o princpio da responsabilidade patrimonial directa das entidades pblicas por danos causados aos cidados pelos seus rgos, funcionrios ou agentes no exerccio das suas funes e por causa das mesmas, e compreende a responsabilidade por actos jurisdicionais. II - Provando-se nas instncias que certo veculo automvel foi apreendido ordem de um inqurito aberto em processo-crime, por ordem do Ministrio Pblico, sendo o veculo objecto de crime, e estando a sua apreenso consentida pelo art. 178, n. 1 do CPP, designadamente para exame, tendo o Magistrado do Ministrio Pblico ordenado, depois, o levantamento da apreenso, ao ora recorrido, estando o despacho devidamente fundamentado, no sentido de o veculo ser entregue ao denunciante, seu previsvel proprietrio real, em detrimento do proprietrio registral, tal deciso aceitvel face aos elementos disponveis na altura, uma vez que tudo apontava para que a compra e venda efectuado pelo recorrido e terceiro era nula. 06-06-2000 - Revista n. 363/00 - 6. Seco - Francisco Loureno (Relator), Armando Loureno e Martins da Costa

    Estado - Priso ilegal - Indemnizao I - O art. 225 do CPP ancora-se no art. 27, n. 5, da Lei Fundamental, e reporta-se responsabilidade por facto ilcito e por erro grosseiro; mas bem possvel conceber casos que constituem o Estado no dever de indemnizar, quando esto em causa graves efeitos danosos por factos lcitos advenientes da funo jurisdicional, atravs da qual se decretou uma priso preventiva legal e sem erro grosseiro. II - A previso do referido art. 225 comporta tambm o acto temerrio, ou seja, aquele que - perante a factualidade exposta aos olhos do jurista e contendo uma duplicidade to grande no seu significado, uma ambiguidade to saliente no seu lastro probatrio indicirio - no justificava uma medida gravosa de privao de liberdade, mas sim uma outra mais consentnea com aquela duplicidade ambgua. III - Com a aplicao analgica sustentada pelas normas similares do DL n. 48.051, de 21-11-67, ou com a aplicao directa dos princpios gerais de direito que responsabilizam a Administrao e seus rgos e fixam os critrios indemnizatrios de ressarcimento por danos, o certo que nos casos referidos (priso preventiva ordenada sem qualquer erro, mas qual no corresponde factualidade nenhuma, conforme prova posteriormente obtida), a norma matriz que alicera o direito indemnizatrio do lesado a do art. 22 da Lei Fundamental, e no a do art. 27 n. 5. Com a correco evidente de no ser, aqui, pensvel uma responsabilidade solidria do Estado com os titulares dos rgos em causa. 12-10-2000 - Revista n. 2321/00 - 2. Seco - Noronha Nascimento (Relator), Ferreira de Almeida e Moura Cruz

    Apreenso de veculo - Indemnizao - Danos O regime da indemnizao a satisfazer ao lesado quando, por qualquer motivo, vem a ser ordenada a restituio de veculos apreendidos em processo-crime ou de contra-ordenao, previsto no DL n. 31/85, de 25-01, aplica-se no apenas quando os danos invocados se prendem com a utilizao do veculo pelo Estado, mas tambm quando tm como origem o decurso do tempo durante o qual aquele se encontrou indevidamente apreendido. 23-01-2001 - Revista n. 2907/00 - 2. Seco - Moitinho de Almeida (Relator), Noronha Nascimento e Ferreira de Almeida

    Priso ilegal - Indemnizao I - A lei (quer a actualmente em vigor, quer aquela, mais restritiva na concesso do direito indemnizao, que vigorava antes da alterao introduzida ao art. 225 do CPP pela Lei n. 59/98, de 25-08) no vai ao ponto de aceitar, em nome de um direito fundamental liberdade, que, a simples privao dela preventivamente, leve automaticamente ao direito a uma indemnizao contra o Estado-Juiz. II - A circunstncia de algum ser sujeito a priso preventiva, legal e judicialmente estabelecida, e vir depois a ser absolvido em julgamento, e nessa altura libertado, por no se considerarem provados os factos que lhe eram imputados e que basearam aquela priso, s por si, no possibilita, automaticamente, o direito indemnizao.

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    26 Responsabilidade civil por danos decorrentes do exerccio da funo jurisdicional

    19-09-2002 - Revista n. 2282/02 - 7. Seco - Neves Ribeiro (Relator), Arajo de Barros e Oliveira Barros

    Responsabilidade civil do Estado - Priso preventiva - Indemnizao I - Do disposto no art. 27 da CRP e no art. 225, do CPP, resulta que a liberdade um direito fundamental do cidado. II - Mantida a priso preventiva por erro grosseiro na avaliao, apreciao dos pressupostos de facto, que a determinam ou a determinaram inicialmente, fica justificado o dever de indemnizar os danos causados personalidade moral do lesado. III - A indemnizao por danos morais destina-se a proporcionar ao lesado uma compensao para compensar ou pelo menos minorar o mal sofrido. 13-05-2003 - Revista n. 1018/03 - 6. Seco - Ribeiro de Almeida (Relator) *, Afonso de Melo e Nuno Cameira

    Chamamento autoria - Aco de regresso - Mandado de despejo - Obrigao de indemnizar - Responsabilidade civil do Estado I - No incidente de chamamento autoria, ento regulado no art. 325 do CPC 67, tornava-se necessrio que o requerente do chamamento alegasse a existncia de conexo entre o direito invocado e a relao jurdica controvertida pela qual o chamado pudesse vir a ser responsabilizado, em aco de regresso. II - E da que esse chamamento facultativo apenas se justificasse quando, em virtude dessa relao jurdica conexa, o chamado devesse responder pelo dano resultante da sucumbncia para com o chamante. III - Aco de regresso aquela cuja consistncia prtico-jurdica deveria emergir e ser aferida em funo da alegao/substanciao de um nexo de causalidade adequada entre o prejuzo invocado (com a consequente aco de regresso) e a perda da demanda. IV - A execuo de um mandado judicial de despejo, como corolrio lgico e natural do desfecho final de uma lide dirimida atravs de um meio processual estritamente regulado na lei (art. 55 e segs. do RAU 90) e com escrupulosa observncia do princpio da igualdade das partes e da facultao, tambm igualitria, dos meios recursais, representa um acto praticado na exercitao de um poder soberano do Estado - a funo de julgar - constitucionalmente cometida, em exclusividade, aos tribunais - no podendo, por isso, constituir a se fonte da obrigao de indemnizar as partes prejudicadas com as respectivas decises transitadas em julgado. V - Tornar-se-ia, em tal hiptese, indispensvel a alegao de factos demonstrativos da responsabilidade (delitual) do Estado pelos prejuzos que a aco lhe pudesse (a si chamante) acarretar, neles includos os factos integradores da obrigao de indemnizao, nos termos e para os efeitos do art. 22 da Constituio da Repblica e demais preceitos do DL n. 48051, de 21-11-67. 27-05-2003 - Agravo n. 1483/03 - 2. Seco - Ferreira de Almeida (Relator) *, Ablio de Vasconcelos e Duarte Soares

    Responsabilidade civil do Estado - Prescrio do procedimento criminal - nus da prova I - Segundo o n. 4 do art. 20 da CRP, todos tm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de deciso em prazo razovel e mediante processo equitativo. II - No conceito de prazo razovel, deve atender-se natureza do processo e suas dificuldades, s instncias de recurso e as diligncias a efectuar nesse processo. III - Ultrapassado tal prazo razovel, competir ao Estado alegar e provar que a demora na prolao da deciso no imputvel ao titular do rgo ou ao deficiente funcionamento dos servios, para afastar a sua responsabilidade. IV - Se bem que, em princpio, os juzes no possam ser responsabilizados pelas suas decises - art. 216, n. 2, da CRP -, nada obsta a que se opere a responsabilizao do Estado pelos prejuzos causados aos particulares no exerccio da sua funo jurisdicional, nos termos do art. 22 do mesmo diploma. V - Sendo assim, tendo ocorrido a prescrio do procedimento criminal pelo facto de o processo-crime ter estado parado mais de dois anos e meio no Tribunal da Relao, onde aguardava deciso sobre o

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    27 A responsabilidade civil extracontratual do Estado na jurisprudncia das Seces Cveis do Supremo Tribunal de Justia

    recurso apresentado por arguida que havia sido condenada, dever o Estado ser condenado a pagar uma indemnizao ao assistente (e filhos) a ttulo de responsabilidade extra-contratual. 17-06-2003 - Revista n. 4032/02 - 1. Seco - Moreira Camilo (Relator) *, Lopes Pinto e Pinto Monteiro

    Responsabilidade civil do Estado - Funo judicial - Priso preventiva - In dubio pro reo I - O art. 27, n. 5, da Constituio constitui historicamente alargamento do princpio geral de directa responsabilidade civil do Estado a factos ligados ao exerccio da funo jurisdicional para alm do clssico erro judicirio, isto , para alm do caso de condenao injusta. II - Em cumprimento da injuno final do art. 27, n. 5, da Constituio, o art. 225 CPP 87, dispositivo inovador de natureza substantiva, prev, a par da deteno ou priso preventiva manifestamente ilegal, isto , de modo flagrante efectuada aquela ou ordenada e executada esta fora ou sem a presena dos requisitos ou condies em que a lei a autoriza, caso em que ocorre erro de direito na interpretao e aplicao dos pressupostos ou requisitos legais dessa medida de coaco, a priso preventiva formalmente legal, mas patentemente injustificada, dado revelar-se assente em erro grosseiro na apreciao dos seus pressupostos materiais ou de facto, ou seja, em erro de facto grave, relativo aos factos invocados para fundamentar a deciso de determinar ou manter a priso preventiva, por no existirem ou no corresponderem verdade. III - O n. 2 do art. 225 CPP dirige-se a um erro qualificado - um erro crasso, contra manifesta evidncia, de todo desrazovel, e que, por conseguinte, envolver falta ou culpa funcional em que profissionais de normal capacidade ou mediana competncia, actuando com o conhecimento e a diligncia exigveis, no incorreriam. IV - A priso preventiva legal e justificadamente efectuada e mantida a que se siga absolvio expressamente referida ao princpio in dubio pro reo no confere direito a indemnizao. 27-11-2003 - Revista n. 3341/03 - 7. Seco - Oliveira Barros (Relator) *, Salvador da Costa e Ferreira de Sousa

    Responsabilidade do Estado - Responsabilidade extracontratual - Apreenso de veculo - Processo penal - Perda a favor do Estado I - Apreendido um veculo automvel em processo-crime, por fazer o transporte de produto estupefaciente para entrega aos consumidores, deve ser logo requisitada e junta certido do registo automvel, a fim de que, aps notificao dos titulares que se encontrem inscritos no registo, estes possam defender os seus direitos como terceiros de boa f, nos termos do art. 36-A do DL n. 15/93, de 22-01, aditado pelo art. 2 da Lei n. 45/96, de 03-09. II - Estando um veculo automvel registado em nome da firma compradora, mas com o nus da reserva da propriedade inscrito a favor da firma vendedora, esta a verdadeira proprietria at integral pagamento do preo, condio suspensiva da transferncia da propriedade. III - Se esse veculo foi apreendido em processo-crime por transportar droga para ser entregue aos consumidores, e depois foi declarado perdido a favor do Estado Portugus sem conhecimento da firma vendedora, que no foi notificada da apreenso por no ter sido junta certido do registo automvel, pode esta firma demandar o Estado Portugus com base em responsabilidade aquiliana ou extracontratual, por se verificarem todos os pressupostos dessa responsabilidade, inclusive a culpa uma vez que houve uma negligente instruo do processo por no ter sido junta atempadamente a certido do registo automvel que possibilitaria a notificao daquela firma para que pudesse defender os seus direitos, enquanto terceira de boa f, antes da declarao de perda do veculo a favor do Estado. 02-12-2003 - Revista n. 3065/03 - 1. Seco - Faria Antunes (Relator) *, Moreira Alves e Alves Velho

    Responsabilidade civil do Estado - Funo jurisdicional - Independncia dos Tribunais - Recurso - Denegao de justia I - O art. 22 da Constituio, na redaco emergente da 1. Reviso (1982), consagra em termos gerais a responsabilidade civil do Estado pelas denominadas fautes de service praticadas no exerccio da funo jurisdicional.

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    28 Responsabilidade civil por danos decorrentes do exerccio da funo jurisdicional

    II - Tratando-se a da previso de direitos de natureza anloga a direitos fundamentais, desfruta o art. 22 da lei fundamental, sombra do art. 18, n. 1, de aplicabilidade directa, independente de mediao normativa infraconstitucional, nesta medida pressupondo, todavia, complementar recurso aos princpios gerais da responsabilidade civil, envolvendo peculiaridades concernentes ilicitude e culpa que vo implicadas na especfica natureza da funo jurisdicional. III - Assume efectivamente proeminncia no exerccio desta funo o parmetro da independncia dos tribunais e da subordinao do juiz Constituio, lei e aos juzos de valor legais que brota do art. 203 do diploma fundamental e do art. 4 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, propiciando compreensivelmente divergncias de interpretao e aplicao aos casos da vida. IV - E podendo similares assintonias emergir no exerccio da garantia de reapreciao das decises judiciais, em via de recurso, quando o tribunal hierarquicamente superior sobrepe um diverso julgamento da questo ao tribunal inferior, no s por isso que pode legitimar-se um juzo material de verdade a respeito daquele e de erro quanto a este outro plo da relao de supra-ordenao. V - Os pressupostos da ilicitude e da culpa, no exerccio da funo jurisdicional susceptvel de importar responsabilidade civil do Estado, conforme o art. 22 da Constituio, s podem dar-se como verificados nos casos de mais gritante denegao da justia, tais como a demora na sua administrao, a manifesta falta de razoabilidade da deciso, o dolo do juiz, o erro grosseiro em grave violao da lei, a afirmao ou negao de factos incontestavelmente no provados ou assentes nos autos, por culpa grave indesculpvel do julgador. VI - Em aco tendente a fazer valer a responsabilidade contratual - incumprimento de contrato de prestao de servio -, compete ao credor, alm do mais, a prova do facto ilcito do no cumprimento. VII - S a falta absoluta de fundamentao, e no apenas uma motivao deficiente, errada ou incompleta, constitui a nulidade tipificada na alnea b) do n. 1 do art. 668 do Cdigo de Processo Civil. 19-02-2004 - Revista n. 4170/03 - 2. Seco - Lucas Coelho (Relator), Santos Bernardino e Bettencourt de Faria

    Responsabilidade civil do Estado - Funo jurisdicional - Juiz - Erro I - A diligncia no exerccio da judicatura o cumprimento, em termos de cidado mdio e em conformidade com as capacidades pessoais, dos deveres da profisso, definidos de acordo com o padro comum de actuao do corpo judicial. II - Atentas as condies de trabalho dos juzes, um erro de contas num processo no demonstra s por si uma quebra de cuidado. 31-03-2004 - Revista n. 3887/03 - 2. Seco - Bettencourt de Faria (Relator), Moitinho de Almeida e Ferreira de Almeida (declarao de voto)

    Responsabilidade civil do Estado - Funo jurisdicional - Juiz - Erro notrio I - Para alm dos dois casos especficos expressamente mencionados nos art.s 27, n. 5, e 29, n. 6 (priso ilegal e condenao penal injusta), o art. 22 da CRP abrange na sua previso a responsabilidade civil extra-contratual do Estado decorrente da actividade jurisdicional. II - Independentemente da existncia de lei ordinria que o concretize, o direito reconhecido pelo art. 22 da CRP beneficia do regime estabelecido no seu art. 18 para os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias, designadamente quanto sua aplicao directa. III - A autonomia na interpretao do direito e a sujeio exclusiva s fontes de direito jurdico-constitucionalmente reconhecidas so manifestaes essenciais do princpio da independncia dos juzes. IV - Os actos jurisdicionais de interpretao de normas de direito e de valorao jurdica dos factos e das provas, ncleo da funo jurisdicional, so insindicveis. V - O erro de direito praticado pelo juiz s poder constituir fundamento de responsabilidade civil na jurisdio cvel quando, salvaguardada a essncia da funo jurisdicional referida no ponto IV, seja grosseiro, evidente, crasso, palmar, indiscutvel, e de tal modo grave que torne a deciso judicial numa deciso claramente arbitrria, assente em concluses absurdas. 31-03-2004 - Revista n. 51/04 - 6. Seco - Nuno Cameira (Relator), Sousa Leite e Afonso de Melo

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    29 A responsabilidade civil extracontratual do Estado na jurisprudncia das Seces Cveis do Supremo Tribunal de Justia

    Responsabilidade civil do Estado - Priso ilegal - Erro grosseiro - Indemnizao I - A priso ou deteno que seja manifestamente ilegal e a priso preventiva que, no sendo ilegal, venha a revelar-se, por erro grosseiro na apreciao dos pressupostos que a determinaram, injustificvel, do lugar a indemnizao quando: exista manifesta ilegalidade na privao da liberdade ou a mesma seja injustificada; ocorram prejuzos que devam ser reparados e exista nexo de causalidade entre a conduta e o resultado do dano - art. 225 do CP. II - No caso dos autos o autor ficou privado da liberdade durante um dia. Porm, no se pode deixar de ter em ateno que a medida de coaco - priso preventiva - resultou de condenao do autor da qual foi interposto recurso que veio a obter vencimento; que ao Tribunal, entidade de onde provinham os mandados de deteno nada lhe foi comunicado; que o autor tinha conhecimento da medida de coaco j que dela recorreu para a Relao e para o Supremo, s obtendo vencimento neste Tribunal; que o autor nada fez para obstar sua captura apesar de ter conhecimento desde Novembro de 1998 de que no teria que se sujeitar quela medida de coaco. III - A priso no pode ser considerada ilegal, no resultou de erro grosseiro pelo que no existe direito indemnizao que o Autor pretende. 27-05-2004 - Revista n. 1168/04 - 6. Seco - Ribeiro de Almeida (Relator), Fernandes Magalhes, Nuno Cameira e Sousa Leite (vencido)

    Responsabilidade civil do Estado - Funo judicial - Priso preventiva - Absolvio I - O art. 22 da CRP estabelece um princpio geral de directa responsabilidade civil do Estado. II - Em alargamento dessa responsabilidade a factos ligados ao exerccio da funo jurisdicional, para alm do clssico erro judicirio, o art. 27, n. 5, da Constituio da Repblica impe ao Estado, de modo especial, o dever de indemnizar quem for lesado por privao ilegal da liberdade, nos termos que a lei estabelecer. III - Em cumprimento do preceituado no art. 27, n. 5, da Constituio, o art. 225 do CPP veio regular as situaes conducentes a indemnizao, por privao da liberdade, ilegal ou injustificada. IV - A previso do art. 225, n. 2, do CPP, comporta tambm o acto manifestamente temerrio. V - A priso no injustificada, e muito menos por erro grosseiro, s porque o interessado vem a ser absolvido. VI - A circunstncia de algum ser sujeito a priso preventiva, legal e judicialmente estabelecida, e depois vir a ser absolvido em julgamento, sendo ento libertado, por no se considerarem provados os factos que lhe eram imputados e que basearam aquela priso, s por si, no possibilita o direito a indemnizao. VII - O julgamento realizado em prazo razovel, quando efectuado em prazo consentneo com a gravidade, a complexidade dos factos e a observncia dos prazos legais, sem dilaes temporais indevidas. 01-06-2004 - Revista n. 1572/04 - 6. Seco - Azevedo Ramos (Relator) *, Silva Salazar e Ponce de Leo

    Priso preventiva - Priso ilegal - Privao da liberdade - Indemnizao I - O art. 22 da Constituio consagra genericamente um direito indemnizatrio por leso de direitos, liberdades e garantias, no se limitando, por isso, a abranger a responsabilidade do Estado por actos ilcitos, sejam eles de natureza legislativa ou jurisdicional. II - O art. 27 consagra expressamente o princpio da indemnizao por danos nos casos de privao inconstitucional ou ilegal da liberdade, o que constitui historicamente o alargamento da responsabilidade civil do Estado a factos ligados ao exerccio da actividade jurisdicional para alm do clssico erro judicirio, isto , para alm do caso de condenao injusta. III - Assim, o n. 5 do art. 27 tem um campo especfico de aplicao, reportando-se, em alargamento dessa responsabilidade, aos casos de privao de liberdade do cidado, "nos termos em que a lei a estabelecer". IV - Em cumprimento do preceituado no art. 27, n. 5, da Constituio, o art. 225 do CPP, dispositivo inovador e de natureza substantiva, veio regular as situaes conducentes a indemnizao, por privao da liberdade, ilegal ou injustificada.

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    30 Responsabilidade civil por danos decorrentes do exerccio da funo jurisdicional

    V - No ocorre a situao referida na ltima parte do referido n. 2 (o preso ter concorrido para aquele erro com dolo ou negligncia) apenas por este no ter reagido impugnando a deciso que decretou ou manteve a priso preventiva. VI - O n. 2 do art. 225 do CPP dirige-se a um erro grosseiro - erro indesculpvel, crasso ou palmar, cometido contra todas as evidncias e no qual s incorre quem decide sem os necessrios conhecimentos ou a diligncia medianamente exigvel - abrangendo tambm o acto temerrio, no qual, devido a ambiguidade da situao, se corre o risco evidente de provocar um resultado injusto e no querido. VII - A apreciao e qualificao do erro grosseiro ou temerrio, de que resultou a priso preventiva posteriormente revelada como injustificada, h-de ser feita tendo por base os factos, elementos e circunstncias que ocorriam na altura em que a priso foi decretada ou mantida, sendo, por isso, em princpio, irrelevante, para tal constatao, o facto de, mais tarde, o detido ter vindo a ser absolvido ou mesmo no submetido a julgamento por, entretanto, haverem surgido novas provas que afastaram a sua anterior indiciao. VIII - A priso preventiva legal e justificadamente efectuada e mantida por mais ou menos tempo, no obstante as ulteriores vicissitudes processuais, no confere direito a indemnizao. 19-10-2004 - Revista n. 2543/04 - 7. Seco - Arajo de Barros (Relator) *, Oliveira Barros e Salvador da Costa

    Prescrio - Interrupo da prescrio - Responsabilidade civil - Responsabilidade civil conexa com a criminal - Estado I - O facto de o autor ter ido ao processo de inqurito (crime) afirmar a sua vontade de, na reivindicada condio de ofendido/lesado, se constituir parte civil e deduzir oportunamente o respectivo pedido (de indemnizao civil) tem a eficcia interruptiva da prescrio. II - O Estado responde no lugar dos seus agentes, em vez dos seus agentes, em substituio ou solidariamente com os seus agentes; e, consequentemente, qualquer facto interruptivo que se possa opor ao lesante stricto sensu pode ser oposto ao Estado, em nome (e no interesse) de quem estava a agir e praticou o acto provocador do dano. 27-01-2005 - Revista n. 1514/04 - 7. Seco - Pires da Rosa (Relator), Custdio Montes e Neves Ribeiro

    Responsabilidade civil do Estado - Privao da liberdade - Priso preventiva - Indemnizao - Legitimidade - Caducidade - Inconstitucionalidade I - Tendo o Autor instaurado aco contra o Estado e outro Ru (um Banco) pedindo a condenao solidria destes a pagarem-lhe indemnizao no inferior a 30.000.000$00 destinada a compensar os danos no patrimoniais por si sofridos e resultantes da sua priso preventiva, arbitrria e injustificada, determinada pela participao feita pelo Banco Ru, em que lhe imputava a autoria de um crime de abuso de confiana que sabia no ter o Autor cometido, deve absolver-se este ltimo Ru da instncia, por ser parte ilegtima. II - Na verdade, o Banco Ru no tem interesse em contradizer, na medida em que a conduta que lhe imputada, mesmo a provar-se, no conduz procedncia do pedido contra si deduzido. III - Sendo requisito da obrigao de indemnizar por parte do Estado a existncia de erro grosseiro na apreciao dos pressupostos de facto de que dependia a priso preventiva, no pode existir responsabilidade civil por parte do denunciante, na medida em que a sua actuao no causa adequada do despacho injustificado. IV - Havendo erro grosseiro de quem decide a priso, no h nexo de causalidade adequada entre a aco do denunciante e a priso sofrida (art. 563