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Sumário...dos do Direito e de sua evolução temporal, fruto da cultura dinâmica de uma sociedade, sempre que ocorre diversamente. Na perfeita preleção de Teixeira Neto: “os

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Sumário1. Dos princípios do Direito e as normas jurídicas 42. Novos danos e(ou) novos direitos 103. Definições contidas nas apólices brasileiras 294. Conclusões 325. Fontes bibliográficas 40

© 2020 editora roncarati

Direitos de publicação reservados à Editora Roncarati Ltda.

capa Fabrício San Pancrazio

diagramação e arte Sergio Gzeschnik

dados internacionais de catalogação na publicação (cip) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Polido, Walter A.

O estágio atual da cobertura para danos pessoais (corporais) nos contratos de seguros de responsabilidade civil no Brasil [livro eletrônico]: novos danos e(ou) novos direitos / Walter A. Polido. – São Paulo: Editora Roncarati, 2020.

1.500 Kb; PDF

Bibliografia.ISBN: 978-65-990268-1-2

1. Danos (Direito civil) – Brasil 2. Direito de seguros 3. Seguro de responsabilidade civil 4. Seguros de acidentes – Brasil I. Título.

20-36706 cdu-347.51:368.8

índices para catálogo sistemático:1. Seguro de responsabilidade civil: Direito 347.51:368.8

Cibele Maria Dias – Bibliotecária – crb-8/9427

Editora Roncarati Ltda. Av. Nove de Julho, 5049 – sala 5D – Jardim Paulista 01407-200 – São Paulo/SP – Brasil Tel.: +55 11 3071-1086 www.editoraroncarati.com.br [email protected]

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Art. 949, Código Civil: No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até ao fim da convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido.

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1 Dos princípios do Direito e as normas jurídicas

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A doutrina jurídica acerca deste tema é ainda esparsa no Brasil, sendo que algumas poucas obras emblemáticas apresentam comentários isolados, extre-mamente importantes para a composição deste texto. Não há, assim, uma obra única e sistêmica que possa ser indicada na condição de norte para o estudo aqui empreendido, mas sim algumas delas, sendo que este texto bus-cará suprir a defasagem encontrada e especialmente em relação aos contratos de seguros de responsabilidade civil. Há descompasso entre o ordenamento jurídico pátrio e a doutrina que prestigia os princípios fundamentais da Repú-blica, mormente quando cotejados com os chamados novos danos e(ou) novos direitos. O princípio máximo da dignidade da pessoa1 (Constituição Federal, art. 1º, III), mais o princípio da indenização integral2 (Código Civil, art. 944), nem sempre têm servido de respaldo justificador nas decisões judiciais perti-nentes aos novos danos ou novos direitos3, quando estes são acolhidos, de fato, pelas Cortes de Justiça. Na composição do quantum debeatur em sede não judicial, a situação se mostra ainda mais crítica, na medida em que os parâ-metros utilizados para os cálculos são muito mais estanques ou mesmo redu-cionistas, não apresentando qualquer possibilidade de determinadas parcelas

1 “O pecado capital contra a dignidade humana consiste, justamente, em considerar e tratar o outro – um indivíduo, uma classe social, um povo – como um ser inferior, sob pretexto da diferença de etnia, gênero, costumes ou fortuna patrimonial”. in: COMPARATO, Fábio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p.226.

2 “A abertura feita na parte final do enunciado normativo do art. 949 do CC permite o reconhecimento das principais modalidades de danos à vida de relação (o prejuízo de lazer; o prejuízo sexual; o preju-ízo juvenil) e sua reparação individualizada”. in: SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Princípio da Reparação Integral. São Paulo: Saraiva, 2010, p.338.

3 “É evidente que, como resultado direto da erosão dos filtros tradicionais da reparação – ou, em outras palavras, da relativa perda de importância da culpa e do nexo causal como óbices ao ressarcimento dos danos sofridos -, um maior número de pretensões indenizatórias passou, gradativamente, a ser acolhido pelo Poder Judiciário”. in: SCHREIBER, Anderson. Novos Paradigmas da Responsabilidade Civil. Da erosão dos filtros da reparação à diluição dos danos. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2015, p.83. | BORGES, Gus-tavo. MAIA, Maurílio Casas. (orgs.) Novos danos na pós-modernidade. Belo Horizonte: D’Plácido, 2020.

serem consideradas. Os contratos de seguros de responsabilidade civil são exemplos clássicos dessa situação no Brasil. Os conceitos utilizados nas apó-lices brasileiras são ainda precários e por consequência reducionistas, sendo que eles não levam em conta a amplitude encontrada na significação com-plexa da “pessoa e sua existência temporal”4 e de acordo com a tridimensiona-lidade do Direito (vida social coexistencial – valores – normas jurídicas). A figura do “terceiro”, garantido pelo contrato de seguro RC, nada mais é do que a pessoa, o sujeito de direitos, sendo que o conceito atribuído a ele deve ser amplo, necessariamente, sob pena de ruir o mecanismo indenitário repre-sentado pelo contrato de seguro se a significação estiver minimizada na apó-lice. O seguro, sempre bom repetir, deve ser útil para quem o contrata. Com esta perspectiva, o entendimento encontrado nas Cortes de Justiça brasilei-ras acerca do objeto do seguro de responsabilidade civil, conforme preceitua o Enunciado 544, do Conselho da Justiça Federal – CJF se mostra extrema-mente coerente: “[art. 787, caput] – O seguro de responsabilidade civil facul-tativo garante dois interesses, o do segurado contra os efeitos patrimoniais da imputação de responsabilidade e o da vítima à indenização, ambos destinatá-rios da garantia, com pretensão própria e independente contra a seguradora”5. De lege ferenda, O PL 29/2017 da Câmara dos Deputados, preceitua no seu artigo art. 102 o que se segue: “O seguro de responsabilidade civil garante o interesse do segurado contra os efeitos da imputação de responsabilidade e do seu reconhecimento e o dos terceiros prejudicados à indenização”6. <<Segurado>> e <<Terceiro>> estão no mesmo patamar de proteção oferecido pelo contrato

4 Sobre a pessoa temporal, o jurista peruano Sessarego ensina com maestria e refinada doutrina: “no pode-mos definirla de antemano, ni de una vez y para siempre, en cuanto es un constante proyectar. El pasado sólo la condiciona, como un trampolín para lanzarse desde el presente hacia el futuro”. in: SESSAREGO, Carlos Fernández. Derecho y Persona. 5ª ed. Buenos Aires: Astrea, 2015, p.31.

5 Disponível em: www.cjf.jus.br/enunciados

6 Disponível em: www.ibds.com.br.

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de seguro RC, sem exceção e, como tal, o requisito indenidade deve ser o mais amplo possível, quer para um quer para o outro, sem distinção alguma. Este padrão de entendimento precisa ser acolhido pelo mercado de seguros nacional, de forma ampla, expandindo-se para todos os tipos de contratos de seguros que garantam riscos de responsabilidade civil, objetivamente. O argumento para a consideração binária do beneficiário direto dos seguros de RC, aparentemente reduzido à esfera dos seguros facultativos, na verdade dis-pensa a expressa menção aos seguros obrigatórios, na medida em que nestes o objeto direto da garantia é muito mais voltado aos terceiros, razão pela qual a sociedade atribuiu a compulsoriedade da contratação e de modo a socializar os danos, pulverizando os riscos mutualisticamente.

Quando da composição da indenização às vítimas e relativa aos danos corporais (pessoais) causados a elas pelos segurados, os elementos constituti-vos observados pelas Seguradoras têm sido os mais reduzidos possíveis e esta constatação caracteriza o descompasso existente entre a doutrina especiali-zada e a prática cotidiana, refletindo o cenário da mais completa contradição.

Necessário clivar neste ponto introdutório do texto a questão de suma importância e relativa à prerrogativa ou não que a Seguradora possui quanto a oferta de garantias em níveis inferiores àquele standard estabelecido pelo ordenamento jurídico e em face dos direitos fundamentais. Este questiona-mento, por si só, ensejaria uma pesquisa isolada e dirigida, mas será estabe-lecida, no seguimento, a ideia central contida nesta formulação. De maneira resumida, convém trazer à luz o ensinamento de Canaris, sendo que o ilustre jusfilósofo entende que os direitos fundamentais constitucionais condicionam a autonomia privada, autovinculando as partes do contrato: “sob os pontos de vista jurídico-teorético e dogmático-constitucional, desde logo, porque a vincula-ção contratual, tendo embora, na verdade, o seu fundamento primário na auto-nomia privada das partes, apenas adquire vigência no plano jurídico-positivo

mediante um ‘reconhecimento’ por parte do Estado e da ordem jurídica, sendo, além disso, garantida por estes com sanções, que vão até à execução forçada”7. Ana Prata, com esta mesma linha de orientação, determina: “os limites inter-nos e externos, que a Constituição impõe ou legitima, têm uma direta repercus-são na concepção e âmbito da autonomia negocial”8. Sob esta ótica, o direito à indenização por dano moral – constituindo este um direito fundamental pre-visto na Constituição Federal e, portanto, uma parcela componente do quan-tum debeatur em responsabilidade civil, não permite à Seguradora que opera com seguros de RC, em tese, excluir esta garantia da apólice. O contrato de seguro de responsabilidade civil deve oferecer garantia plena aos segurados, de acordo com o ordenamento jurídico vigente e, especialmente, deve acolher todos os elementos constitutivos do quantum indenizatório reconhecido pelo Direito no momento da liquidação do sinistro junto à vítima. Se isso não for observado ou se for apenas de forma parcial, a eficácia do seguro se relativi-zará, deixando de ser instrumento garantidor de fato da indenidade do segu-rado materializada pela apólice. Em sede judicial, essa realidade não pode ser diferente e tem causado perplexidade àquelas mentes mais voltadas aos estu-dos do Direito e de sua evolução temporal, fruto da cultura dinâmica de uma sociedade, sempre que ocorre diversamente. Na perfeita preleção de Teixeira Neto: “os Tribunais e a própria doutrina, por vezes, parecem viver na realidade social do século XIX, que viabilizou a sedimentação dos dogmas da codificação ainda tão caros a muitos”9. A sociedade é livre para vivenciar a solidariedade e buscar o primato da justiça para o completo atendimento às vítimas de atos

7 CANARIS, Claus-Wilhelm. Direitos Fundamentais e Direito Privado. 2ª reimp.Coimbra: Almedina, 2003, p.71.

8 PRATA, Ana. A Tutela Constitucional da Autonomia Privada. Coimbra: Almedina, 2016, p.199.

9 TEIXEIRA NETO, Felipe. Dano Moral Coletivo. A configuração e a reparação do dano extrapatrimo-nial por lesão ais interesses difusos. Curitiba: Juruá, 2014, p.251.

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injustos. Tais valores, constituem elementos diferenciadores de uma nação desenvolvida e outra não, sendo que eles são construídos no tempo.

Ainda com base nos parágrafos anteriores, necessário indicar que as Cor-tes de Justiça já avançaram no tocante ao conteúdo dos contratos de seguros, mais precisamente em relação à coerência lógica que deve existir entre aquilo que é oferecido ao consumidor, criando legítima expectativa de confiança, e a realidade dos termos e condições encontradas nos contratos. Neste aspecto, o REsp 1.635.238-SP, na condição de leading case, considerou abusivas as cláusulas limitativas da cobertura na apólice de Seguro de Acidentes Pessoais Coletivo, referentes à exclusão de acidentes relacionados à gravidez, parto ou aborto e suas consequências; perturbações e intoxicações alimentares de qualquer espécie; todas as intercorrências ou complicações consequentes da realização de exames, tratamentos clínicos ou cirúrgicos. No entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo, mantido pelo STJ, “as cláusulas contratuais acabam por inviabilizar a própria finalidade da contratação pelo consumidor, em frustração de expectativa do próprio conteúdo da proposta, em desvantagem exagerada ao aderente”. No Recurso Especial, a ministra-relatora, Nancy Andrighi, afir-mou que “inserir cláusula de exclusão de risco em contrato padrão, cuja abs-tração e generalidade abarquem até mesmo as situações de legítimo interesse do segurado quando da contratação da proposta, representa imposição de desvan-tagem exagerada ao consumidor, por confiscar-lhe justamente o conteúdo para o qual se dispôs ao pagamento do prêmio”. Este caso julgado não guarda relação direta com a matéria em discussão neste texto, na medida em que ela se refere ao conteúdo da figura compreendida pela responsabilidade civil, mais precisa-mente os elementos que compõem o quantum indenizatório. No REsp citado, a questão em litígio e julgamento se envolveu com a efetividade do contrato de seguro em face dos riscos cobertos e de determinadas situações específi-cas de riscos que foram excluídas, mas reconduzidas ao âmbito de cobertura

da apólice, uma vez que as “exclusões foram consideradas exageradas” pelas Cortes de Justiça, TJSP e STJ, uma vez que atingiram, maculando, a essência do contrato de seguro. Nessa linha de raciocínio e entendimento, poderiam ser equiparadas as questões de exclusões, por exemplo, do risco de “erro de projeto” no Seguro de RC Produtos, considerando-se que todo produto deve passar, necessariamente, pela fase de concepção e projeto; a exclusão do risco de incêndio na operação de carga e descarga para caminhões transportado-res de inflamáveis, no Seguro de RC Automóveis [ver REsp 1.660.164-SP], entre outros. O Professor Moitinho de Almeida, de Portugal, já comentou sobre a nulidade de determinadas cláusulas insertas nos contratos de segu-ros, sejam em razão da abusividade que elas apresentam intrinsicamente ou mesmo sob a condição de “cláusula-surpresa”, as quais acabam descaracteri-zando a garantia e a eficácia do contrato. O ilustre autor exemplifica10, entre outras situações, “a cláusula, num contrato de seguro multiriscos que, a seguir à cobertura dos prejuízos resultantes de tempestades, restringe a cobertura aos ‘tufões, ciclones, tornados e toda a acção directa de ventos fortes ou choque de objetos arremessados ou projectados pelos mesmos’. O seguro não garantia, pois, os danos causados por ‘nevões’ mas o Supremo entendeu que, situando-se o esta-belecimento da segurada na Guarda esta pôde crer que o conceito de tempes-tade abrangesse as tempestades de neve, de qualquer modo, a seguradora devia ter esclarecido o cliente sobre o verdadeiro sentido da cláusula”. De todo modo, relevante pontuar que o Judiciário tem se mostrado bastante atento ao con-teúdo e tem buscado a linha lógica subjacente nos diferentes tipos de contra-tos de seguros, sendo que o resultado disso tem repercutido na anulação de cláusulas mal colocadas e que atentam contra a essência do risco garantido, de modo a preservar os interesses dos consumidores-segurados. Neste ponto,

10 ALMEIDA, J. C. Moitinho de. Contrato de Seguro. Estudos. Coimbra: Coimbra, 2009, p.86.

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o disposto nos artigos 112 e 423 do CC/200211, tem guiado a hermenêutica subjacente nos contratos de seguros e sempre, necessariamente, com vistas na fiel correspondência da natureza e o objeto do contrato. Voltando à questão elementar do Seguro de RC e para os elementos que compõem, obrigatoria-mente, o quantum indenizatório, o Judiciário nacional ainda não se deu conta completamente dessa situação, a qual tem se mostrado muito mais complexa, mas certamente não permanecerá in albis, de forma perene. Quando em 1999, o STJ considerou que a expressão “danos pessoais” envolvia automaticamente os “danos morais” em relação ao cômputo indenizatório das apólices de segu-ros RC, o entendimento caminhou no sentido racional acima exposto, ou seja, o dano moral constitui elemento essencial da responsabilidade civil, devendo ser considerado no quantum indenizatório. Logo em seguida, contudo, retro-cedeu, na medida em que considerou também abrangidos os danos morais na expressão “danos corporais”, mas desde que não houvesse expressa exclusão da parcela do risco na apólice. Ora, o STJ beneficiou as Seguradoras com esta decisão majoritária, em detrimento dos segurados, mas desconsiderou, com toda a vênia, a hermenêutica contida no instituto da responsabilidade civil e nos elementos constitutivos do quantum indenizatório em face das vítimas. Se o mercado de seguros se propõe a garantir as consequências da “responsabili-dade civil” dos segurados, securitizando-as, a cobertura deve ser, necessaria-mente, tão ampla quanto o instituto e quantas forem as parcelas consideradas segundo o ordenamento jurídico vigente: danos emergentes, lucros cessantes e outras perdas financeiras consequentes, danos futuros, danos morais, danos esté-ticos, outros. Podem ocorrer limitações de ordem quantitativa sobre a conces-são da importância segurada ou ainda sobre os riscos aos quais o contrato de

11 CC, art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem. | Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente.

seguro responderá, ou seja, aqueles fatos geradores da responsabilidade civil do segurado garantidas pelo contrato de seguro12, mas não poderá existir, em tese, a exclusão de determinadas parcelas que compõem o quantum indeniza-tório relativo às consequências da responsabilidade civil (v.g., danos morais; danos estéticos; danos futuros; outros). O seguro, repise-se, deve ser útil para quem o contrata. No seguro de RC o segurado sempre estará exposto ao prin-cípio da reparação integral, assim como foi acolhido pelo ordenamento jurí-dico vigente, considerados todos os elementos constitutivos da indenização devida às vítimas. A desconstrução dessa estrutura não é exequível diante da boa técnica que deve permear toda a atividade seguradora. Os operadores do Direito, por sua vez, devem estar atentos a esta questão, a qual se reveste de importância capital neste segmento de seguro.

A moderna doutrina acerca da reparação integral dos danos em matéria de responsabilidade civil ainda se mostra claudicante no Brasil. Ela não tem sido aplicada ao Direito comum em sua plenitude e, portanto, ela se mostra relativamente ineficaz. A narrativa encontrada nas obras doutrinárias, de alto labor e dogmática, não vem sendo materializada como deveria em face dos casos levados à apreciação dos tribunais e ela esmorece, ainda mais, quando os pleitos indenitários são resolvidos em sede administrativa, diretamente nos Departamentos de Sinistros das Seguradoras. Escudando-se nas decisões pro-feridas pelas Cortes de Justiça do país, as Seguradoras sequer elevam o grau de admissão para os novos danos e(ou) novos direitos, mais precisamente ignoram a evolução natural do Direito, fazendo tábula rasa da dogmática já consagrada. A utilização de clausulados padronizados oficiais por décadas e a maioria deles com baixa qualidade técnica e jurídica, alimenta ainda mais

12 Riscos predeterminados, conforme o disposto no artigo 757 do CC.

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este quadro de desconformidade13. De todo modo, a utilização de clausulados provenientes do Estado ou aqueles homologados pelos seus agentes não isenta as Seguradoras de responsabilidade. Neste sentido, a decisão promulgada pelo STJ é clara e objetiva: “O fato de ter sido aprovada a cláusula abusiva pelo órgão estatal instituído para fiscalizar a atividade da seguradora não impede a apreciação judicial de sua abusividade – REsp 229.078-SP, j. 09.11.1999, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, Dj 07.02.2000”. A decisão deixa patenteada a responsabilidade precípua da Seguradora no trato do seu negócio, que nem mesmo a supervisão estatal pode neutralizar as exigências pressupostas de lealdade e objetividade contratual14. Apesar de se estabelecerem empresa-rialmente como tomadoras de riscos e a atividade importar em grau elevado de especialização na arte da subscrição (underwriting), a qual enseja processo analítico dos riscos de maneira qualitativa e quantitativa sob a técnica atua-rial e estatística, as Seguradoras nacionais estão atreladas a modelos de clau-sulados de coberturas desalinhados com a nova dogmática. Em outros países, representados por mercados de seguros maduros, o entendimento acerca da responsabilidade civil e dos elementos que compõem o quantum indenizató-rio está expresso nos clausulados das apólices, sendo que inexistem os mes-mos tipos de deficiências conceituais encontrados no mercado nacional. Os padrões conceituais brasileiros, técnicos e jurídicos, sob esta ótica, são rudi-mentares e as Seguradoras precisam inovar. Elas podem e devem, inclusive,

13 Práticas e Clausulados de Seguros que geram conflitos jurídicos no Mercado Segurador Brasileiro: causas, efeitos e soluções. Disponível em: www.editoraroncarati.com.br – Colunistas – Walter Polido – Último acesso em 29.02.2020.

14 Das limitações da autonomia privada empreendedora das operações de seguros: coletivização dos inte-resses – nova perspectiva social e jurídica do contrato de seguro. in: POLIDO, Walter. Contrato de Seguro: novos paradigmas. São Paulo: Roncarati, 2010, capítulo 8º, também reproduzido em TEPE-DINO, Gustavo. FACHIN, Luiz Edson (orgs). Doutrinas Essenciais: Obrigações e Contratos. v. III, São Paulo: RT, 2011, p.535.

se adiantar ao Judiciário, na medida em que não só a doutrina, mas também o ordenamento jurídico já embasam integralmente a adoção de modelos mais consistentes de coberturas e que certamente podem beneficiar todas as partes envolvidas, cumprindo de fato o objetivo dos contratos de seguros, e não só os de responsabilidade civil. Assim, o mercado de seguros tem o dever social de desenvolver novas bases de apuração para as perdas e danos garantidos pelos diferentes tipos de apólices, antes mesmo de aguardar o posicionamento do Judiciário, nem sempre consentâneo com a melhor doutrina exegética. O efeito propulsor que o mercado de seguros operaria no país, se de fato ele se antecipasse e, uma vez cumprindo a sua função garantidora de riscos sob con-ceitos não conservadores, seria significativo e auxiliaria a sociedade brasileira rumo ao desenvolvimento das relações intersubjetivas. Esta função social da atividade seguradora deve ser requerida por todos os agentes da cadeia produ-tiva e adquirente de seguros, passando também, necessariamente, pelos ope-radores do Direito, na medida em que estes estão muito mais familiarizados com as inovações legislativas, doutrinárias e jurisprudenciais. Neste aspecto, há obrigações horizontalizadas entre os agentes privados que atuam no setor, muito mais do que a verticalização muitas vezes aguardada, comodamente, advinda do Poder Público. O Estado personalista pertence ao passado e cabe aos setores produtivos privados atuarem de maneira profissional em prol de todos e de modo a buscarem o bem comum.

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Feita a introdução do tema no tópico anterior, dá-se a vez aos questiona-mentos pontuais que precisam ser considerados nos seguros de responsabi-lidade civil:

Quais são os novos danos e(ou) novos direitos que efetivamente orbitam neste

contexto? Há previsão legal para que as pretensões jurídicas sobre eles sejam de fato

acolhidas? Quais seriam as razões para o não acolhimento jurisdicional, se a tutela

de fato existir no Direito positivado? Por que as Seguradoras, tomadoras profissio-

nais de riscos e conhecedoras da arte da precificação em bases atuariais, não rom-

pem com os critérios concebidos no passado e sob outro olhar do Direito, passando a

adotar paradigmas modernos e contemporâneos em face da doutrina especializada?

Sob a rubrica dos novos danos e(ou) novos direitos, a doutrina tem apresen-tado vasta nomenclatura, concebida principalmente a partir da CF de 1988, cujo diploma certamente inaugurou nova fase conceitual do Direito pátrio e especialmente voltada à tutela da pessoa. Com este fundamento, importante buscar o esteio doutrinário sempre essencial de Canotilho: “a constitucionali-zação dos direitos revela a fundamentalidade dos direitos e reafirma a sua posi-tividade no sentido de os direitos serem posições juridicamente garantidas e não meras proclamações filosóficas, servindo ainda para legitimar a própria ordem constitucional como ordem de liberdade e de justiça”15. O professor Rosenvald, por sua vez, indica que “raras vezes encontramos referências deci-sivas ao princípio da dignidade da pessoa humana na jurisprudência brasilei-ra”16. Apesar desse quadro, a visão pós-moderna em sede contratual está hoje centrada no sistema civil-constitucional e tem galgado espaço na doutrina e

15 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Estado de Direito. Lisboa: Gradiva, 1999, p.56.

16 ROSENVALD, Nelson. Dignidade Humana e Boa-fé no Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2005, p.58.

em sede jurisprudencial, quebrando resistências. Para Nalin, “o ‘pequeno sis-tema civil-constitucional’ percorre outras fontes, que não somente aquela clássica que parte do Código Civil”, (...) e que “não mais se apresenta como mediador no debate social contemporâneo”.17 Canaris, da escola alemã, na sua preleção a respeito do pensamento sistemático, asseverou: “totalmente inconciliável com um sistema axiomático é a possibilidade de contradições de princípios”18 e, para o italiano Perlingieri: “a solução para cada controvérsia não pode mais ser encontrada levando em conta simplesmente o artigo da lei que parece contê-la e resolvê-la, mas, antes, à luz do inteiro ordenamento jurídico, e, em particular, de seus princípios fundamentais, considerados como opções de base que o carac-terizam”19. Não podendo faltar neste estudo, a visão dogmática sempre ino-vadora da professora Teresa Negreiros, ao retratar a “pessoa” no pensamento contratual passado e presente: “a codificação tornara ‘pessoa’ um substantivo ‘abstrato’, isto é, em termos literais, a pessoa estava ‘separada’ daquilo de que necessita para existir dignamente”20. A partir da perspectiva civil-constitucio-nal, resumida nos parágrafos anteriores e aliada à necessária horizontaliza-ção dos direitos fundamentais também nas relações privadas, os novos danos e(ou) novos direitos se apresentam de forma muito mais concreta e perceptí-vel para todos aqueles que propugnam pela sua aplicação máxima e de modo a fazer justiça. A doutrina avança ainda mais e, para Sarmento, a Constituição Federal “exige o reconhecimento de uma eficácia direta e imediata dos direitos

17 NALIN, Paulo. Do Contrato: conceito pós-moderno (em busca de sua formulação na perspectiva civil--constitucional). 2ª ed. Curitiba: Juruá, 2006, p.87.

18 CANARIS, Claus-Wilhelm. Pensamento Sistemático e Conceito de Sistema na Ciência do Direito. 3ª ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2002, p.101.

19 PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil. Introdução ao Direito Civil Constitucional. 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p.5.

20 NEGREIROS, Teresa. Teoria do Contrato. Novos Paradigmas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p.335.

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fundamentais na esfera privada”21. Com o mesmo propósito e enfatizando a principiologia contida no ordenamento, Alexy esclarece que “os princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, de acordo com as possibilidades fáticas e jurídicas”22. Baseado na doutrina aqui repro-duzida, não pode ser negado que o princípio fundamental da dignidade da pessoa constitui norma de aplicação máxima no ordenamento jurídico brasi-leiro, mesmo nas relações contratuais privadas – de forma horizontal, sendo que o referido princípio se apresenta de maneira conducente na aplicação da lei infraconstitucional, sem alternativa que possa desconsiderá-lo. A digni-dade da pessoa situa-se no nível máximo da hierarquia dos direitos tutelados pela CF, devendo ser respeitada sob qualquer situação, mormente quando a pessoa for vitimada por outrem, assim como ocorre no campo da respon-sabilidade civil. Menezes Cordeiro, o mestre lusitano, faz coerente preleção nesta linha de entendimento: “não vale a pena dispormos de uma Constitui-ção generosa, de uma rica e cuidada jurisprudência constitucional e de largos desenvolvimentos sobre os direitos de personalidade quando, no terreno, direitos fundamentais como a vida valham menos de € 60.000”23.

Nesta senda, protagonizam os denominados “novos danos” os quais na verdade não requerem a tutela específica através da positivação de “novos direitos”, uma vez que eles simplesmente expressam o sentir da sociedade contemporânea e se encontram perfeitamente amparados pelo princípio fun-damental da dignidade da pessoa, assim como em relação ao princípio da indenização integral. Não haveria como seccioná-los. Apenas a nomenclatura

21 SARMENTO, Daniel. Direitos Fundamentais e Relações Privadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p.245.

22 ALEXY, Robert. Epílogo a la Teoría de Los Derechos Fundamentales. Madrid: Fundación Beneficentia et Peritia Iuris, 2004, p.38.

23 CORDEIRO, António Menezes. Tratado de direito civil: direito das obrigações. v. VIII. Coimbra: Alme-dina, 2016, p.756.

utilizada para a designação dos novos danos apresenta evoluções, com o pas-sar do tempo e de modo a integrá-las de uma forma mais didática e moderna no ordenamento já existente. Os novos danos, portanto, estão fundamental-mente ligados à pessoa e cujo amálgama produz o ser humano na sua concep-ção ampla, muito além do elemento corporal, o qual representa apenas uma das partes. Desassociar a integridade psicofísica da pessoa constitui tarefa inexequível, sendo que este conceito, integridade psicofísica, “vem servindo a garantir numerosos direitos da personalidade (vida, nome, imagem, honra, pri-vacidade, corpo, identidade pessoal), instituindo, hoje, o que se poderia entender como um amplíssimo ‘direito à saúde’, compreendida como completo bem-estar psicofísico e social”24. No ordenamento jurídico brasileiro, em razão da intensa proteção outorgada à pessoa através da CF de 1988 e proveniente Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas – ONU, de 10 de dezembro de 1948, em princípio esgotaria, por si só, a abrangên-cia máxima dos direitos ressarcitórios em face da vítima que sofre dano cau-sado por outrem. O legislador, contudo, resolveu ir além, sendo que o CC de 2002 tutelou os direitos da personalidade, conforme o disposto nos artigos 11 ao 21. explicitamente. No universo da principiologia, Piovesan e Russo Júnior, já haviam determinado que “a condição humana é requisito único e exclusivo, reitere-se, para a titularidade de direitos”25. Com base nessa dou-trina, importante destacar que em razão da principiologia axiológica de natu-reza constitucional, a tutela da responsabilidade civil pelos danos causados

24 Definição dada pela OMS – Organização Mundial de Saúde, conforme MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à Pessoa Humana: uma leitura Civil-Constitucional dos Danos Morais. Rio de Janeiro: Reno-var, 2003, p.94.

25 PIOVESAN, Flávia. RUSSO JÚNIOR, Rômulo. Direitos Humanos, Dignidade Humana e Direitos da Personalidade. in: FILOMENO, José Geraldo Brito. WAGNER Júnior, Luiz Guilherme da Costa. GONÇALVES, Renato Afonso. (coords.) O Código Civil e sua Interdisciplinaridade. Os Reflexos do Código Civil nos demais ramos do Direito. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p.7.

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à pessoa – em face de sua dignidade, não se exaure nos direitos da personali-dade, conforme o rol contido nos artigos 11 ao 21 do CC. Este destaque é de suma importância neste estudo e advém de construções doutrinárias, inclu-sive do âmbito da antropologia filosófica. O jurista português Diogo Gon-çalves, na sua obra-título, apresentou as conclusões extraídas a partir de sua larga investigação a respeito do tema, podendo ser resumido o seguinte: “...a juridicidade da realidade pessoal é muito mais lata que a estreita figura dos direitos de personalidade. Tentar reconduzir tudo o que há de jurídico na reali-dade pessoal a um poder subjectivado sobre elementos da própria personalidade é profundamente redutor”26.

O antes pouco permeável Direito Civil, cujo ideal máximo sempre repou-sou no patrimonialismo, com o avançar do ideário civil-constitucional se viu impingido a olhar também para a pessoa, ao invés de tão somente tutelar e, de maneira peremptória, a propriedade. Ainda assim, o CC de 2002, embora apresentando o viés da socialidade descrita pelo supervisor da Comissão Elaboradora e Revisora do Código Civil, Prof. Miguel Reale27, manteve

26 GONÇALVES, Diogo Costa. Pessoa e Direitos de Personalidade. Fundamentação Ontológica da Tutela. Coimbra: Almedina, 2008, p.99.

27 Exposição de Motivos do Supervisor da Comissão Elaboradora e Revisora do Código Civil, Professor Miguel Reale, em 16 de outubro de 1975. (...) 13. Não procede a alegação de que uma Parte Geral, como a do Código Civil alemão, ou do nosso, de 1916, não representa mais que uma experiência acadê-mica de distínguos conceituais, como fruto tardio da pandectística do século passado. Quando a Parte Geral, além de fixar as linhas ordenadoras do sistema, firma os princípios ético-jurídicos essenciais, ela se torna instrumento indispensável e sobremaneira fecundo na tela da hermenêutica e da aplicação do Direito. Essa função positiva ainda mais se confirma quando a orientação legislativa obedece a impera-tivos de socialidade e concreção, tal como se dá no presente Anteprojeto. Não é sem motivos que reitero esses dois princípios, essencialmente complementares, pois o grande risco de tão reclamada socialização do Direito consiste na perda dos valores particulares dos indivíduos e dos grupos; e o risco não menor da concretude jurídica reside na abstração e olvido de características transpessoais ou comuns aos atos humanos, sendo indispensável, ao contrário, que o individual ou o concreto se balance e se dinamize com o serial ou o coletivo, numa unidade superior de sentido ético. [grifos do Autor] Disponível em: http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/70319 Último acesso em 02.03.2020.

a dogmática patrimonialista, conforme o retrato dela estampado no artigo 402. O desenrolar desse diagnóstico, em face não só dos avanços da legis-lação, cada vez mais explícita na proteção dos “diferentes” direitos da pes-soa e também em razão da produção jurisprudencial ascendente com vistas nesse objetivo maior – a proteção da pessoa vinculada aos princípios constitu-cionais, deixa evidenciado que o padrão de cobertura atualmente utilizado pelo mercado segurador brasileiro se mostra anacrônico e não oferece garan-tia adequada aos segurados em face dos riscos aos quais eles estão verdadei-ramente expostos. As definições insertas nas apólices dos seguros de RC e relativas aos “danos corporais” estão ultrapassadas e até mesmo sofreram retrocesso a partir de 1999 quando as Seguradoras, respaldadas pela Susep, trocaram a expressão “danos pessoais” por “danos corporais” e justamente visando a diminuição do conteúdo inerente a ela, ou seja, extraíram do con-ceito qualquer possível garantia automática para os danos extrapatrimoniais, assim como os danos morais. Esta pesquisa jurídica e suas conclusões têm por objetivo demonstrar, cientificamente, esta constatação e visa, também, sugerir mudanças de paradigmas e de modo que os seguros possam, de fato, desempenhar o papel principal a eles reservado: oferecer garantia efetiva aos segurados, na forma de instrumentos verdadeiramente úteis. A nomenclatura dos termos técnicos das apólices deve se pautar exclusivamente no ordena-mento jurídico, afastadas as justificativas de natureza meramente atuarial, sendo que a ciência dos grandes números não pode prevalecer sobre a essên-cia dos fundamentos legais, sem qualquer consequência. As assimetrias exis-tentes têm repercutido na judicialização dos contratos de seguros e não sem razão. A gestão das operações securitárias e com vistas não só na oferta dos melhores e mais adequados serviços de seguros aos consumidores-segurados, necessariamente passando pela revisão dos termos e condições utilizados pelo mercado de seguros, resultará também na melhoria dos resultados para as

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Seguradoras. Os mercados maduros encontrados nos países desenvolvidos já descobriram e obtêm resultados com essa equação há algumas décadas, o que não significa afirmar que o mercado internacional de seguros RC não possa apresentar eventualmente resultados negativos, como de fato apresenta e por várias outras razões, não atreladas a inconsistências dos clausulados. Quanto maior for o grau de coberturas oferecido pelas apólices, maior será também a incidência de sinistros reclamados e indenizados. Essa efetividade da garantia demonstrada pelos Seguros de RC, resulta no incremento da demanda pela contratação, progressivamente. As Seguradoras pagam mais sinistros, mas também recebem muito mais prêmios, equilibrando a carteira.

A efetiva constitucionalização do Direito Civil imantou o novo CC de 2002, indo muito além da tutela dos direitos da personalidade, conforme já foi citado retro. O art. 186, dos atos ilícitos, inovou consideravelmente quando acrescentou ao conceito de violar direito e causar dano a outrem o dano extra-patrimonial: “ainda que exclusivamente moral”. O CC anterior, de 1916, sequer trazia no seu bojo a expressão “danos morais”. O abuso de direito, contido no art. 187, complementou a transformação do direito civil, antes de índole puramente patrimonialista. Esta percepção da mudança se fez sentir ainda mais diante do artigo 949, o qual impôs as consequências para aquele que lesiona ou ofende a saúde de outrem. A expressão “... além, de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido”, contida no final do artigo 494, é de importância capital neste estudo. Ela ainda não foi explorada integral-mente pela doutrina e mesmo pela produção jurisprudencial do país, sendo que a tutela legal aqui retratada representa divisor de água e pode servir de elemento conducente para a ampliação daquelas parcelas que devem, neces-sariamente, ser consideradas quando da apuração da lesão causada à pessoa. Ora, a expressão é ampla, na medida em que oferece uma espécie de norma aberta ou em branco, cabendo aos operadores do Direito preenchê-la de acordo

com as especificidades encontradas em cada ocorrência, mais concretamente no campo dos seguros em relação a cada reclamação de sinistro apresentada. A norma não prescreve limites. Ao contrário, ela estabelece também a apli-cação, conforme está prevista no art. 951, também aos profissionais da saúde e, consequentemente, aos Seguros de Responsabilidade Civil Profissional (Erros & Omissões – Medical Malpractice Insurance) nas diferentes catego-rias dessa área. Do mesmo modo, aplica-se aos Seguros de Testes Clínicos (Clinical Trials Insurance)28.

Em sede doutrinária, importante conhecer a posição de alguns autores, os quais estabelecem verdadeiro giro conceitual do ato ilícito para o dano injusto, assim como o ilustre Orlando Gomes já propugnou em relação à responsabi-lidade civil de modo amplo, ao ensinar a todos que através dessa concepção é possível “detectar outros danos ressarcíveis que não aqueles que resultam da prá-tica de um ato ilícito. Substitui-se, em síntese, a noção de ato ilícito pela de dano injusto, mais amplo e social”29. O disposto no artigo 949 do CC, “... além, de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido”, repise-se, com base na exegese contida na teoria do “dano injusto” passa a ter entendimento muito mais amplo e facilita, de forma inconteste, o acolhimento dos novos danos no cômputo indenizatório da vítima. Em face não só do avanço tecnológico e dos novos desafios de diversas naturezas encontrados na sociedade pós-mo-derna, impossível pretender estabelecer a responsabilização de fornecedores, prestadores de serviços e de empreendedores das diferentes atividades através, tão somente, das bases clássicas do instituto da responsabilidade civil. Com base nesta conclusão preliminar, mas certamente incontestável, o mercado

28 Ver, ainda, Enunciados 192 e 460 do Conselho Federal de Justiça – CFJ; mais a Súmula 341 do STF.

29 GOMES, Orlando. Tendências modernas na teoria da responsabilidade civil. in: FRANCESCO, José Roberto Pacheco di. (org.). Estudos em homenagem ao professor Sílvio Rodrigues. São Paulo: Saraiva, 1989, p.293 e 295.

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de seguros brasileiro não tem alternativa senão a de se adaptar a este cenário e implementar maior gestão dos riscos através das ferramentas de subscrição disponíveis. A responsabilidade civil se expandiu e os antigos conceitos que serviram de base para a elaboração dos clausulados há cinquenta anos atrás não servem mais como pressupostos ou como paradigmas estruturantes. Os conceitos aplicados para “danos corporais” (“pessoais”) e “danos materiais” encontrados nas atuais apólices, não garantem os riscos na plenitude neces-sária, à qual os segurados estão expostos.

Sobre a norma aberta encontrada na parte final do artigo 949 do CC, con-vém reproduzir o entendimento de alguns doutrinadores pesquisados, sendo que não há a abordagem desse tema de maneira extensiva e particularizada na doutrina, até o momento. Tudo indica que a razão da escassez doutriná-ria repousa no fato de que a parte final do art. 949 CC foi introduzida em 2002, sendo que o dispositivo não dispõe de norma correspondente durante a vigência do CC de 1916, art. 1.538:

(a) Gustavo Tepedino, Heloisa Barboza e Maria Celina Bodin: “...o dispositivo

deixa ao arbítrio dos juízes a quantificação da indenização suplementar por

danos patrimoniais ou morais derivados da lesão sofrida pela vítima”30.

(b) Sergio Cavalieri Filho: embora o ilustre professor não tenha se referido par-

ticularmente ao artigo 949, no contexto dos comentários acerca dos critérios

para a quantificação e liquidação dos danos, ressaltando sempre o princípio

da equidade, assim se expressou: “limitar a reparação é impor à vítima que

suporte o resto dos prejuízos não indenizados”31.

30 TEPEDINO, Gustavo. BARBOZA, Heloisa Helena. MORAES, Maria Celina Bodin de. Código Civil Comentado conforme a Constituição da República. v. II, Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p.875.

31 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 11ª ed. São Paulo: Atlas, 2014, p.153.

(c) Yussef Cahali: “o dispositivo correspondente, inserido no Código (art. 949),

supera, em parte, tais dificuldades32, mas induz perplexidade, ao estabelecer

que, no caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofen-

dido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até o fim da convales-

cença, ‘além de algum outro prejuízo que prove haver sofrido’; prejuízo esse

que, agora, tanto poderia ser patrimonial como moral, sem que se tenha cui-

dado da respectiva forma de liquidação”33. Reportando-se de forma expressiva

aos ensinamentos do autor peruano Sessarego, o professor Cahali, de forma

didática e muito provavelmente o autor nacional que mais se dedicou até o

momento a discorrer sobre a inteligência contida na parte final do artigo 949

do CC, identificou as situações que se seguem, sujeitas à indenização: “a)

no caso de ferimento ou outra ofensa à saúde, ou mesmo defeito, representando

a lesão simples dano biológico, no sentido estrito, ainda que se trate de dano

à pessoa, ou dano subjetivo, a indenização terá em vista os reflexos patrimo-

niais da ofensa, representados pelas ‘despesas do tratamento e dos lucros ces-

santes até o final da convalescença’; b) se do dano biológico resulte um dano

à saúde, sem sentido amplo e específico, isto é, ‘se do ferimento resultar alei-

jão ou deformidade’ [CC/1916], ou sob a forma de defeito pelo qual o ofen-

dido não possa exercer o seu ofício ou profissão, essa ofensa aos sentimentos do

ofendido, configurado o dano estético como dano moral, determina a indeni-

zação do ‘prejuízo que o ofendido prove haver sofrido’ [CC/2002]. (...) pode

dar causa à reparação de outros danos à saúde, caracterizados no dano psico-

lógico que afeta primariamente a esfera sentimental (ou intelectual) do sujeito

ou lhe frustra o projeto de vida”34.

32 Cahali informa que a prolixidade e a hibridez do artigo 1.538 do CC/1916, ensejava interpretações desconfortantes e aplicação conflitante.

33 CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. 3ª ed. São Paulo: RT, 2005, p.196.

34 Idem, p.200-201.

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(d) Flávio Tartuce: “de acordo com o art. 949 da atual codificação civil, havendo

lesão ou outra ofensa à saúde, o agressor indenizará o ofendido das despesas

do tratamento e dos lucros cessantes até o fim da convalescença, além de outro

prejuízo que o ofendido provar ter sofrido. Esse outro prejuízo pode ser o dano

moral, mencionado no art. 186 do CC, bem como o dano estético, conforme o

atual entendimento do Superior Tribunal de Justiça (Súmula 387)”35.

(e) Paulo de Tarso Vieira Sanseverino: “a abertura feita na parte final do enun-

ciado normativo do art. 949 do CC permite o reconhecimento das principais

modalidades de danos à vida de relação (o prejuízo de lazer; o prejuízo sexual;

o prejuízo juvenil) e sua reparação individualizada”36.

2.1. Novos danos e(ou) novos direitos específicos voltados aos Seguros de Responsabilidade Civil

Os novos danos e(ou) os novos direitos mais comuns e que interessam a este estudo são os que se seguem, sendo que eles têm as mais diversas aplica-ções e nos diferentes ramos do Direito (civil, ambiental, trabalhista, etc.). Há críticas sobre a aplicação desses novos conceitos, de várias vertentes e tam-bém no tocante ao “quantum respondeatur”, ou seja, a respeito dos critérios que servem de respaldo para o cálculo das indenizações no campo dos danos imateriais ou extrapatrimoniais. Os críticos civilistas mais extremados alegam também, em teses contrárias ao reconhecimento dos novos direitos, o fato de os danos morais e estéticos já estarem pacificados e com critérios de fixação do quantum indenizatório conhecidos. O risco de colapso econômico, também

35 TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Obrigações e Responsabilidade Civil – v. 2, 14ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p.689.

36 SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Princípio da Reparação Integral. Indenização no Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2010, p.338.

alegado por alguns, certamente não é suficiente como sucedâneo para impe-dir o desenvolvimento dos critérios de fixação das indenizações provenientes da responsabilidade civil, na medida em que o movimento pode ser perfeita-mente neutralizado diante da disseminação dos seguros de responsabilidade civil, cujo estágio de desenvolvimento ainda é incipiente no Brasil, mas pode ser melhorado. Impende recordar, diante desses obstáculos que se apresen-tam, que vozes contrárias e desmedidamente conservadoras já se levantaram contra o surgimento da responsabilidade civil objetiva no século XIX, com argumentos semelhantes, e nem por isso alcançaram êxito37. O novo sempre encontra resistências.

Necessário estabelecer, antes de tudo, conforme a douta doutrina da pro-fessora Martins-Costa, que “o conceito de dano não tem <<essência>>, pois não é um <<dado>> inscrito de uma vez por todas na natureza das coisas, mas um <<construído>> e, mais ainda, é – para usar uma expressão cara aos existen-cialistas – um <<conceito situado>> no espaço cultural e no tempo axiológico”38.

Os novos danos e(ou) novos direitos que se relacionam diretamente aos Seguros de RC podem ser assim destacados:

(i) Dano gerado pela confiança não correspondida – a expectativa frustrada

por conta do promitente pode gerar danos àquele que prestaria um serviço ou

37 “Ripert proclama Seleilles e Josserand os ‘síndicos da massa falida da culpa’, e, a despeito das afirma-ções de que a teoria do risco desfaleceu no ardor de seu ataque, seus defensores persistem na tarefa, e as necessidades econômicas e sociais da vida moderna intensa obrigam o legislador a abrir brechas na concepção da teoria clássica da responsabilidade”, cf. LIMA, Alvino. Culpa e Risco. 2ª ed. São Paulo: RT, 1999, p.41. | A obra de Raymond Seleilles, Les Accidents du travail et la responsabilité civile, de 1897, inaugurou o início dos embates na França. A obra de Louis Josserand, La responsabilité de fait des choses inanimés, foi publicada logo em seguida.

38 Prefácio do capítulo de SANSEVERINO, Paulo de Tarso. Princípio da reparação integral. Indenização no Código Civil. in: MARTINS-COSTA, Judith. Modelos de Direito Privado. (org) São Paulo: Mar-cial Pons, 2014, p.420.

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venderia um produto. Macedo Jr. chama corretamente a atenção para o fato de

que “os interesses da confiança e da expectativa não se identificam completamente

com a ideia de ‘lucros cessantes’ ou ‘danos emergentes’ mais conhecidas pelo direito

brasileiro”39. Por oportuno, o mesmo autor lembra, ainda, que “a confiança desen-

volveu-se como uma fonte de responsabilidade no direito dos seguros”40, e, apesar

desse tema não constituir aparentemente o objeto direto deste texto, importante

lembrar que a ideia de confiança está pautada no fato de que aqueles segura-

dos que adquirem seguros de RC e sob a expectativa da garantia de cobertura

para os “danos pessoais” causados a terceiros, poderão demonstrar desconten-

tamento, plenamente justificável, quando do estabelecimento do quantum inde-

nizatório em face de um sinistro concretizado, por conta da limitação conceitual

da expressão “danos corporais”. Por esta razão, a categoria referente aos danos

pela quebra da confiança foi incluída no rol dos “novos danos” neste texto.

(ii) Dano existencial – “o dano existencial se consubstancia, como visto, na alte-

ração relevante da qualidade de vida, vale dizer, em um “ter que agir de outra

forma” ou em um “não poder mais fazer como antes”, suscetível de repercutir, de

maneira consistente, e, quiçá, permanente sobre a existência da pessoa”, na dic-

ção de Flaviana Soares41, precursora na doutrina desta categoria de dano no país.

Esta dimensão reflexa dos danos pessoais tem sido acolhida de forma preponde-

rante pela área trabalhista e, por aproximação, deve se estender ao Seguro de RC

Empregador, para o qual se atribui, atualmente, valores pífios em se tratando de

sinistros reclamados na esfera administrativa das Seguradoras e mesmo em sede

judicial. Se no Direito Civil ainda há forte insurgência contra a personalização,

39 MACEDO JR. Ronaldo Porto. Contratos Relacionais e Defesa do Consumidor. 2ª ed. São Paulo: RT, 2007, p.174.

40 Idem, Op.cit., p.182.

41 SOARES, Flaviana Rampazzo. Responsabilidade Civil por Dano existencial. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p.44.

prevalecendo discursos doutrinários em prol do patrimonialismo, no Direito Tra-

balhista a regra prevalecente também tem sido o fator monetário e baseado tão

somente no último salário percebido pelo empregado vitimado. O patrimônio,

apesar de sua importância para a pessoa e de forma inderrogável, não serve mais

como elemento único de verificação para a quantificação da indenização devida à

vítima por ato ilícito42. O dano existencial, na área trabalhista, apesar ainda do

pensamento vigente, vem sofrendo processo evolutivo jurisprudencial e oferece,

atualmente, campo aberto para o acolhimento de mais esta parcela de dano, sepa-

rada da esfera do dano moral. Não seria diferente também neste caso, ocorrerem

posições contrárias e sob os mais diversos argumentos, inclusive a alegação de

que o dano existencial é impróprio na medida em que ele representa mero “ati-

vismo judicial”, além do fato de não caber ao Judiciária compensar as mazelas

sociais do país. Importante, contudo, estabelecer que o dano existencial apre-

senta características distintas e autônomas em relação ao dano moral e, por este

motivo, vem sendo acolhido também pela Justiça Trabalhista, com farta produ-

ção jurisprudencial, que pode ser conferida.

(iii) Dano psíquico – “dano psíquico relaciona-se com a existência de uma dete-

rioração, disfunção, distúrbio ou transtorno, ou desenvolvimento psicogênico ou psi-

corgânico que, afetando suas esferas afetiva e/ou intelectual e/ou volitiva, limita

sua capacidade de gozo individual, familiar, atividade laborativa, social e/ou

recreativa”43. Esta categoria de dano requer perícia médica especializada para a

sua detecção e apuração.

42 POLIDO, Walter A. Contrato de Seguro de Responsabilidade Civil Empregador e a Lei nº 13.467, de 13.07.2017 (reforma trabalhista). O “quantum debeatur” referente aos Danos Corporais (Pessoais) e os procedimentos utilizados no Mercado Segurador Nacional – ensaio conceitual e crítico. in: Revista de Direito Privado nº 91. Ano 19. julho 2018, São Paulo – RT, p.158.

43 GOMES, Celeste Leite dos Santos Pereira. SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. SANTOS, José Américo dos. Dano Psíquico. São Paulo: Oliveira Mendes, 1998, p.10.

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(iv) Prejuízo ao projeto de vida – esta novel figura jurídica tem se espraiado

também no Brasil e até mesmo no direito trabalhista, ainda que não seja adotada

a mesma nomenclatura naquela área. Precursor da discussão do tema no país,

Portugal prelecionou, assertivamente, que é “necessária a modificação da difu-

são doutrinária, até então modestíssima no Brasil, da terminologia dos “danos à

pessoa” como categoria maior e primordial para o regime jurídico dos danos com-

pensáveis”.44 Representando a expressão máxima de sua liberdade ontológica, a

pessoa elabora, em determinado momento, o seu projeto de vida e de acordo com

as suas condições e potencialidades, inclusive ambientais. Ela busca a realização

pessoal, escolhendo o destino a ser dado à sua existência temporal. De acordo

com a douta e sensível exposição de Sessarego sobre este tema, “o ‘dano ao pro-

jeto de vida’ constitui, como foi sinalizado, o mais grave dano que se pode come-

ter contra a pessoa depois da perda da vida”45. O mesmo autor informa que a lei

francesa 2005-102, de 11 de fevereiro de 2005, fez referência expressa ao “pro-

jeto de vida”, assim como a expressão foi incorporada no artigo 1738 do Código

Civil e Comercial da Argentina, em 201446.

(v) Dano sexual – de acordo com a preleção de Schreiber, “os tribunais brasi-

leiros reconhecem que a lesão a esse aspecto da condição humana gera o dever de

indenizar”47 [TJSP, Apelação Cível 339.515.5/6, Rel. Des. Gonzaga Frances-

chini, 19.08.2009]. Impendentemente da possível classificação individualizada

desta categoria de dano, o sexual pode se enquadrar em diversas outras rubri-

cas, assim como na do dano moral, na perda de chance e no dano existencial.

Para Rosário, essa espécie de dano pode ser definida “como uma perda da função

44 PORTUGAL, Carlos Giovani Pinto. Responsabilidade Civil por Dano ao Projeto de Vida. Curitiba: Juruá, 2016, p.119.

45 SESSAREGO, Carlos Fernández. Derecho y Persona. 5ª ed. Buenos Aires: Astrea, 2015, p.225.

46 Idem, Op.cit., p.253.

47 SCHREIBER, Anderson. Direitos da Personalidade. São Paulo: Atlas, 2011, p.219.

sexual que abrange a função do prazer, a fertilidade ainda qualificada de capa-

cidade de procriação ou de reprodução”48. Para Almeida, “parece surgir sim uma

nova modalidade (e não somente consequência), de dano imaterial: um dano autô-

nomo, denominado de sexual”49.

(vi) Dano futuro – difundido com maior expressão na União Europeia e tam-

bém nos EUA em razão da indenização de danos pessoais decorrentes de aci-

dentes de veículos, acidentes do trabalho e outras situações, é representado pelas

despesas decorrentes do agravamento da lesão sofrida pela vítima e que impõe

novos tipos de tratamento médico-hospitalar, alteração da medicação, troca de

próteses e afins. Assim, os danos futuros estão compreendidos na esfera dos

danos patrimoniais e dos danos pessoais. Na preleção de Peteffi, “o evento danoso

não pode servir como momento cronológico de referência para identificar o que

será classificado como dano futuro e o que receberá a classificação de dano presen-

te”50. Na quantificação dos danos pessoais e respectiva indenização, este tipo de

entendimento se apresenta como elemento nuclear, não podendo ser desprezado

de forma alguma. Aquelas lesões que sabidamente deixarão sequelas na vítima

devem ser apreciadas sob a perspectiva de danos futuros, peremptoriamente. A

propositura de acordo à vítima e sob a condição máxima de pagamento anteci-

pado e único, conforme o disposto no parágrafo único do art. 950 do CC, com

quitação integral da obrigação, se mostra repleta de possíveis problemas e lacunas

que dificilmente poderão ser solucionadas posteriormente, refletindo em novo

prejuízo à vítima, de forma sucessiva. A constituição de capital e de maneira a

proporcionar o devido pensionamento à vítima sempre se mostrou mais seguro e

48 ROSÁRIO, Grácia Cristina Moreira do. A Perda da Chance de Cura na responsabilidade Civil Médica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p.63.

49 ALMEIDA, Felipe Cunha de. Responsabilidade Civil e o dano sexual. in: BORGES, Gustavo. MAIA, Maurilio Casas. Novos Danos na pós-modernidade. Belo Horizonte: D’Plácido, 2020, p.295.

50 SILVA, Rafael Peteffi da. Responsabilidade Civil pela Perda de uma Chance. São Paulo: Atlas, 2007, p.107.

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razoável, com ampla possibilidade de ser revisitado e reajustado de acordo com

a situação de saúde atual do prejudicado. O Código de Processo Civil de 2015,

através do art. 533, trata da constituição de capital para o pagamento do valor

mensal e apresenta também outros modelos garantidores das obrigações que se

protraem no tempo, inclusive sob a condição de patrimônio de afetação quando

o capital for representado por imóveis ou por direitos reais sobre imóveis, com a

possibilidade, também, de a cláusula rebus sic stantibus incidir sobre o pensiona-

mento decorrente de atos ilícitos. A partir da promulgação da Diretiva 2005/14/

CE do Parlamento Europeu, em 11.05.200551, a qual buscou harmonizar as dife-

rentes posições encontradas nos Estados-Membros em relação à circulação de

veículos automotores e os critérios de indenizações utilizados por eles, os refe-

ridos países transpuseram as ditas normas aos respectivos ordenamentos jurí-

dicos. Naquela ocasião, Portugal sancionou o Decreto-Lei 352/2007, de 23 de

outubro, o qual publicou a “Tabela Nacional para Avaliação de Incapacidades

Permanentes em Direito Civil”. Outros diplomas e normas administrativas se

sucederam em relação ao DL, assim como o Decreto-Lei 291/2007, de 21 de

51 A Diretiva 2005/14/CE foi revogada e substituída pela Diretiva 2009/103/CE, de 16.09.2009, sem prejuízo do Decreto-Lei nº 291/2007 de Portugal, também relativa ao seguro de responsabilidade civil que resulta da circulação de veículos automóveis e à fiscalização do cumprimento da obrigação de segu-rar esta responsabilidade. A referida Diretiva, de acordo com os “considerandos” justificadores, traz no seu item “(30) O direito de exigir diretamente à empresa de seguros o cumprimento do contrato de seguro assume uma importância significativa na proteção das vítimas de acidentes rodoviários. A fim de facilitar a regularização rápida e eficaz de sinistros, e evitar, tanto quanto possível, processos judi-ciais dispendiosos, deverá ser previsto um direito de ação direta contra a empresa de seguros que cobre a responsabilidade civil do causador do acidente, para qualquer pessoa vítima de acidentes rodoviá-rios”. O artigo 9º da mesma Diretiva – Montantes mínimos, estabelece relativamente a danos pessoais, o mínimo de 1.000.000 EUR por vítima ou de 5.000.000 EUR por sinistro, independentemente do número de vítimas. Relativamente a dano materiais, 1.000.000 EUR por sinistro, independentemente do número de vítimas. Os Estados-Membros podem estabelecer garantias superiores. O art. 10º, indica que “os termos em que os danos pessoais devem ser considerados como significativos são determina-dos de acordo com a legislação ou as disposições administrativas do Estado-Membro em que o sinis-tro tiver tido lugar. Nesta matéria, os Estados-Membros podem ter em conta, nomeadamente, se os danos sofridos exigiram ou não a prestação de cuidados hospitalares”.

agosto, o qual determinou o regime jurídico do procedimento de oferta razoável,

da qual consta a avaliação do dano corporal, com regulamentações feitas pelas

Portarias 377/2008 e 679/2009, da Secretaria de Estado do Tesouro e Finanças.

Com essas medidas, as Seguradoras oferecerem oferta de indenização com inter-

valo de valores, de modo a iniciar as discussões e possível feitura de acordo com as

partes. As referidas Portarias trazem a composição dos danos havidos nos casos

de morte da vítima e no caso de incapacidade permanente, discriminando nomi-

nalmente as diferentes parcelas a serem consideradas no cômputo geral: dano à

vida; danos patrimoniais emergentes; danos patrimoniais futuros; danos não patri-

moniais; dano biológico; danos morais; danos estéticos; o quantum doloris (dano da

dor); sequelas funcionais; etc. Com base nesses novos paradigmas estabelecidos

pela UE para os acidentes automobilísticos e transpostos para a realidade jurí-

dica portuguesa, a inovação acabou imantando outros setores do Direito, con-

forme a indicação de Gaspar e Ramalho: “abandonou-se definitivamente a Tabela

Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais pri-

vativa do direito laboral”52 53. O mercado de seguros brasileiro, em relação aos

novos direitos e os critérios de indenização aplicáveis, deverá dispor de mecanis-

mos semelhantes a esta tabela portuguesa e, ainda que a determinação possa ser

considerada inconstitucional uma vez que a CF acolhe o princípio da reparação

integral da vítima, assim como em relação ao disposto na Lei nº 14.467/2017

(reforma trabalhista), artigos 223-A e 223-G, a qual pretendeu “tabelar” os danos

extrapatrimoniais, neste caso os parâmetros deverão ser estabelecidos de forma

individualizada, de acordo a experiência de cada Seguradora. Não se trata de

52 GASPAR, Cátia Marisa. RAMALHO, Maria Manuela. A Valoração do Dano Corporal. Coimbra: Almedina, 2012, p.43.

53 Leia mais: Contrato de Seguro de Responsabilidade Civil Empregador e a Lei nº 13.467, de 13.07.2017 (reforma trabalhista). O “quantum debeatur” referente aos Danos Corporais (Pessoais) e os procedi-mentos utilizados no Mercado Segurador Nacional – ensaio conceitual e crítico. POLIDO, Walter A. in: Revista de Direito Privado n. 91. Ano 19. julho 2018, São Paulo – RT, p.101-164.

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advogar pela publicação “oficial” de tabelas, menos ainda pela elaboração desse

mecanismo por órgãos do Poder Público, assim como a Susep.As Seguradoras

privadas precisam estabelecer os seus próprios padrões mínimos de cálculos,

construídos a partir das estatísticas dos casos acumulados, assim como soe acon-

tecer em matéria securitária em todos os níveis, notadamente para a precificação

dos riscos. Os parâmetros, desta forma construídos, propiciarão a base primária

das discussões acerca do quantum a ser definitivamente indenizado, interferindo

nessas negociações, necessariamente, os operadores do Direito nos casos mais

significativos. Ainda a respeito da exegese referente aos danos futuros, faz per-

feita colocação o ministro Sanseverino, devendo ser reproduzida aqui: “a classifi-

cação de danos emergentes e lucros cessantes não se confunde com a sua catalogação

em danos presentes e futuros, pois o critério distintivo passa a ser o momento da

prolação da sentença na demanda indenizatória, podendo ocorrer lucros cessantes

que se enquadrem como prejuízos atuais (v.g., incapacidade laboral do lesado ante-

rior à sentença) e danos emergentes considerados como futuros (v.g., continuação do

tratamento da vítima após a sentença)”54. A questão dos danos futuros, indubita-

velmente, constitui um dos pontos nevrálgicos na matéria pertinente ao cálculo

do quantum debeatur em face de indenizações por lesões a vítimas e nem sempre

este ponto tem sido considerado de forma cabal como deveria ser por ocasião da

liquidação dos sinistros de RC. A medida ressarcitória se protrai no tempo e,

deste modo, não há como prevalecer a simplificação dos critérios de apuração

e de pagamento dos sinistros. Os Corretores de Seguros têm especial responsa-

bilidade sobre esta questão em face dos serviços profissionais que prestam aos

seus clientes. Eles devem conhecer e acompanhar todos os procedimentos de apu-

rações com o objetivo de a Seguradora prestar a melhor assistência possível aos

segurados e evitar, com essa medida, possíveis questionamentos futuros por parte

54 SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Princípio da Reparação Integral, Op.cit., p.336.

dos terceiros que foram prejudicados em razão do sinistro acontecido. Sinistros

envolvendo lesões graves nas vítimas não podem ser regulados e liquidados de

maneira açodada e, menos ainda, com a indução de procedimentos simplificados

na aplicação dos critérios de apuração dos danos, presentes e futuros. O Depar-

tamento de Sinistros das Seguradoras deve dispor de pessoal especializado para

este tipo de apuração e, necessariamente, com a devida assessoria de profissio-

nais médicos. A redução dos custos administrativos e a celeridade no tratamento

dos casos de sinistros, não podem justificar o empobrecimento na concessão de

coberturas e na utilização de procedimentos padronizados.

(vii) Perda de uma chance ou de oportunidade – para Peteffi, “a importância

e a utilidade da teoria da perda de uma chance fizeram com que o instituto pene-

trasse os portões da Common Law e se fizesse fortemente presente em todos os orde-

namentos participantes desta grande família jurídica”55. Savi, discorrendo sobre

o mesmo tema em sua obra-título, indica que “a perda de uma chance, por sua

vez, na grande maioria dos casos será considerada um dano injusto e, assim, passí-

vel de indenização. Ou seja, a modificação do foco da responsabilidade civil, para

a vítima do dano injusto, decorrente da evolução da responsabilidade civil, acaba

por servir como mais um fundamento para a indenização desta espécie de dano”56.

Voltada com ênfase para a atividade da advocacia – “o advogado exerce uma obri-

gação de meios e não de resultado. Não é responsável pelo resultado da demanda.

Contudo, é responsável pela melhor utilização dos meios legais que estiverem ao seu

alcance para convencer o julgador de que o Direito protege seu cliente”57 – a teoria

se espraiou por diversas áreas e especialmente na atividade médica, cuja situação

55 SILVA, Rafael Peteffi da. Responsabilidade Civil pela Perda de uma Chance. Op.cit., p.11.

56 SAVI, Sérgio. Responsabilidade Civil por Perda de uma Chance. São Paulo: Atlas, 2006, p.99.

57 DIAS, Sérgio Novais. Responsabilidade Civil do Advogado. Perda de uma chance. São Paulo: LTr, 1999, p.92.

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deve ser devidamente apreciada no cômputo indenizatório, podendo ser atrelada

a outras parcelas referentes aos danos produzidos no paciente.

(viii) Risco do desenvolvimento – a temática sobre esta parcela de risco, ainda

pouco explorada no Brasil, encontra a devida responsabilização dos fornecedo-

res no ordenamento pátrio, inclusive no Código de Defesa do Consumidor. As

externalidades negativas já registradas na história securitária são conhecidas de

todos, especialmente em razão de sinistros espetaculares envolvendo medica-

mentos e que inauguraram os denominados “sinistros em série”, cujos reflexos

motivaram mudanças drásticas no modo de subscrever os Seguros de RC Pro-

dutos, inicialmente nos EUA nos anos 198058 e na sequência nos demais países.

Sinistros envolvendo a talidomida (com reclamações em vários países, incluindo

o Brasil) são emblemáticos em face dessa temática. Também o amianto contri-

buiu e muito para a revisão dos conceitos utilizados nas apólices RC, incluindo

a questão do trigger (gatinho) disparador do mecanismo indenizatório, do tradi-

cional modelo à base de ocorrências, para a apólice à base de reclamações (claims

made), inaugurada em 1986 nos EUA. Na Alemanha, em razão dos sinistros em

série envolvendo a talidomida (contergan como foi denominada naquele país), a

legislação evoluiu para a securitização dos riscos relativos à produção e distri-

buição de produtos farmacêuticos, sendo que o país criou fundo específico para

a gestão dos riscos e provisão de garantias, envolvendo seguradoras e ressegu-

radoras (Pharmapool)59. Na mesma linha de riscos, o referido Fundo garante as

58 “Si hacemos un resumen a este capítulo, tal vez podamos indicar que el celebre principio del <<Cash Flow Underwriting>>, es decir, hacer Caja para Invertir, que desde mediados de la década de los 70 produjo, como saben ustedes, una caída vertiginosa de las primas, ha sufrido la bancarrota más espec-tacular”. FIDALGO, J. Alarcón. Ultima tendencias del Seguro de Responsabilidad Civil de Productos en Estados Unidos. in: Seguridad y Responsabilidad de Productos. Temas de Seguros. Madrid: Editorial Mapfre, 1986, p.144.

59 POLIDO, Walter A. Seguros de Responsabilidade Civil. Manual prático e teórico. Curitiba: Juruá, 2013, p.662.

pesquisas e testes de medicamentos, procedimentos e afins (clinical trials). O

risco de desenvolvimento se relaciona com vasta gama de produtos e atividades,

assim como a indústria farmacêutica, indústria química, agricultura, alimenta-

ção, derivados do sangue, riscos ambientais, entre outros. Conforme o ensina-

mento de Calixto, “os riscos, desconhecidos pela ciência, são, com maior razão,

desconhecidos pelo consumidor, mas a proteção de sua pessoa, de sua integridade

psicofísica, deve prevalecer sobre a proteção econômica dispensada aos fornecedo-

res”60. O risco do desenvolvimento envolve várias outras questões sublimina-

res e que não comportam comentários extensivos neste texto, mas que devem

ser pesquisadas por todos aqueles que se envolvem com a subscrição de riscos

e também pelos operadores do Direito de forma geral: a análise econômica do

direito é uma delas, cujo critério, antijurídico nesta seara, pode contribuir para o

estabelecimento de regras de gestão dos referidos riscos, estabelecendo também

balizas para a responsabilização dos fornecedores de produtos. Neste contexto,

exsurge também a questão da “responsabilidade civil sem dano”, cuja teoria se

assenta primordialmente na obrigação de informar ínsita em relação aos moder-

nos produtos que contêm elementos tecnológicos de última geração, assim como

a nanotecnologia e os organismos geneticamente modificados – ogm e biotecnologia.

Para Engelmann, Borjes e Gomes “a responsabilidade decorrente das nanotecno-

logias, tanto em momentos de precaução, que antecedem a ocorrência de um dano,

quanto em sua efetiva ocorrência, deverá observar se foi atendido o direito funda-

mental à informação, previsto no artigo 5º, inciso XIV: “é assegurado a todos o

acesso à informação [...]”, bem como previsto no Código de Defesa do Consumidor,

artigo 6º, inciso III, e artigo 31”61. Neste campo surge também, necessariamente,

60 CALIXTO, Marcelo Junqueira. A Responsabilidade Civil do Fornecedor de Produtos pelos Riscos do Desenvolvimento. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p.245.

61 BORJES, Isabel Cristina Porto. GOMES, Taís Ferraz. ENGELMANN, Wilson. Responsabilidade Civil e Nanotecnologias. São Paulo: Atlas, 2014, p.76.

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a questão da causalidade, sendo que a prova repousa, segundo Patrícia Costa,

em “um facto (hipotético) cuja valoração está submetida a pautas racionais que,

baseadas na probabilidade, tendem a garantir que quem seja condenado a repa-

rar um dano seja quem efetivamente o causou”62. Com a ruína da culpa e não só

em face da responsabilidade objetiva – “a culpa está morta”63 – aliada ao fato de

que o próprio dano se tornou elemento prescindível para a responsabilização de

alguém, a causalidade tem sido o elo mais firme no campo da responsabilidade

civil, sendo que também ele se torna fluido em se tratando de danos difusos,

assim como são classificados determinados danos ambientais: “a pesquisa do nexo

de causalidade é flexibilizada (inclusive com a utilização da ferramenta da inversão

do ônus da prova) para possibilitar a responsabilização dos sujeitos indeterminados

(porém determináveis) virtuais causadores dos danos”64. Gisela Sampaio, em per-

feita preleção, afirma: “nos últimos tempos. acompanhando as transformações da

responsabilidade civil, o conceito nexo causal foi flexibilizado, com vistas a permi-

tir a efetivação do princípio da reparação integral”65, sendo esta a ideia nuclear

deste texto, ou seja, demonstrar a evolução dos conceitos e de modo a deixar bas-

tante claro que o mercado de seguros precisa evoluir em relação à determinação

nas apólices dos seguros de RC no tocante aos danos pessoais e, mais precisa-

mente, em relação aos elementos diversificados que necessariamente a expres-

são contém para o estabelecimento do “quantum” indenizatório adequado. A

doutrina contemporânea propugna pela pressuposição da responsabilidade civil

e especialmente em razão da modernidade e dos diferentes produtos, serviços e

62 COSTA, Patrícia Cordeiro da. Causalidade, Dano e Prova. A incerteza na Responsabilidade Civil. Coimbra: Almedina, 2016, p.39.

63 CATALAN, Marcos. A morte da culpa na responsabilidade contratual. São Paulo: RT, 2013, p.254.

64 MULHOLLAND, Caitlin Sampaio. A Responsabilidade Civil por Presunção de Causalidade. Rio de Janeiro: GZ, 2009, p.311.

65 CRUZ, Gisela Sampaio da. O Problema do Nexo Causal na Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p.347.

atividades propulsoras de possíveis danos, dos quais a sociedade pós-moderna,

extremamente consumista66, não abre mão e aceita a existência dos perigos ine-

rentes. Observa-se, neste campo, espécie de escambo: a sociedade usufrui dos

bens permitindo a produção e a lucratividade empresarial e, em troca, pressupõe a

responsabilidade civil pelos danos havidos67. Deveria ser utilizado, então, um “cri-

tério-padrão de imputação”68de responsabilidade sem culpa, nas palavras da pro-

fessora Hironaka, o qual se baseia na solidariedade social e na dignidade da pessoa.

Diante de tamanho desafio, o instituto jurídico da responsabilidade civil não

pode ficar preso ao passado e tampouco ao conservadorismo muitas vezes ine-

rente ao Direito Civil, especialmente no Brasil que adota o sistema da Civil Law.

Há, inclusive, necessária transdisciplinaridade nos estudos de todas as questões

que envolvem os temas. O solidarismo social é o que importa e, neste ponto, mais

uma vez a visão espetacular e sempre atual de Orlando Gomes, já referido neste

texto, socorre a todos os operadores do Direito que precisam apresentar resposta

às inquietudes hodiernas: o giro conceitual do ato ilícito para o dano injusto. As

vítimas precisam ser acolhidas e indenizadas, sempre. O mercado de seguros é

especializado na arte de tomar riscos e não combina a aversão a eles, sendo que

este sentimento é exclusivo dos fornecedores e empreendedores, os quais dese-

jam transferir esta parcela inerente aos seus negócios às Seguradoras, tornando-se

66 “A cultura consumista é marcada por uma pressão constante para que sejamos alguém mais”, cf. BAU-MAN, Zygmunt. Vida para Consumo. A transformação das pessoas em mercadorias. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008, p.128.

67 “Em 2006, a Consumer Product Safety Commission (Comissão de Segurança de Produtos aos Consu-midores) aprovou um novo índice de inflamabilidade para colchões baseada no fato de que isso salva-ria 1,08 vida e impediria 5,23 ferimentos por milhão de colchões. Avaliando cada vida em 5 milhões de dólares e cada ferimento em 150 mil dólares, ela concluiu que os benefícios chegariam a 51,25 dólares por colchão. O custo para a indústria em consequência da alteração chegaria a apenas 15,07 dólares, de modo que valia a despesa”, cf. PORTER, Eduardo. O preço de Todas as Coisas. Porque pagamos o que pagamos. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011, p.48.

68 HIRONAKA, Giselda Maria F. Novaes. Responsabilidade Pressuposta. Belo Horizonte: Del Rey, 2005, p.351-352.

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segurados. No estudo detalhado do tema risco do desenvolvimento e suas diver-

sas vertentes, Souza André, assim resume as questões em face da multidiscipli-

naridade jurídica na gestão dos riscos: “nesse viés, embora a aplicação possa ser

conjunta, as inovações científicas parecem ficar mais a cargo, mesmo, do direito

administrativo, que se situa em liame de escopo entre o direito penal (bens jurídicos

essenciais) e o direito civil (tutela reparatória complementar e proteção exclusiva a

bens jurídicos previstos como digno de resguardo, mas sem gravidade da pena pri-

vativa da liberdade)”69. Para Catalan, “... o Direito brasileiro optou, ainda que

implicitamente, por imputar tais consequências àquele que introduz o produto ou

serviço no mercado”70, referindo-se ao risco de desenvolvimento encontrado nos

mais diversos tipos. No vasto campo da responsabilidade civil, dinâmico e, assim,

em constante evolução, não há como estagnar no tempo e sob conceitos já ultra-

passados, construídos em outro momento da história da sociedade e do próprio

Direito que se mostra como resultado das necessidades temporais dos cidadãos.

Também sob esta perspectiva, a preleção de Hans Jonas, “o medo que faz parte

da responsabilidade não é aquele que nos aconselha a não agir, mas aquele que nos

convida a agir”71.

(ix) Danos morais – no cômputo geral dos diferentes direitos que integram os

chamados direitos da personalidade, alguns deles são acolhidos sem maior esforço,

assim como os Dados Morais e os Danos Estéticos. O primeiro deles, os danos

69 ANDRÉ, Diego Brainer de Souza. O Papel da Responsabilidade Civil na Regulação dos Riscos: uma análise do chamado risco do desenvolvimento. in: SOUZA, Eduardo Nunes de. SILVA, Rodrigo da Guia. (coords.) Controvérsias Atuais em Responsabilidade Civil. Estudos de Direito Civil-Constitucional. São Paulo: Almedina, 2018, 311.

70 CATALAN, Marcos. Estado da arte, riscos do desenvolvimento e proteção do consumidor frente às incertezas contidas no porvir. in: MIRAGEM, Bruno. MARQUES, Cláudia Lima. OLIVEIRA, Amanda Flávio de. 25 Anos do Código de Defesa do Consumidor. Trajetória e Perspectivas. São Paulo: RT, 2016, p.195.

71 JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade. Ensaio de uma ética para a civilização tecnológica. Rio de Janeiro: Contraponto-PUC-Rio, 2006, p.351.

morais, apresenta farta literatura doutrinária a respeito e convém seja pesqui-

sada por todos os operadores do Direito. No âmbito dos seguros de RC, repi-

se-se, a postura das Seguradoras nacionais ainda é subdimensionada em termos

de subscrição e alocação da cobertura desta parcela de risco, sendo que tanto no

ramo RCG, assim como no ramo RC Automóveis, o risco é usualmente excluído

taxativamente, podendo ser garantido de forma adicional, usualmente com

sublimitação em relação à cobertura básica ou principal da apólice. Do mesmo

modo, dificilmente as Seguradoras oferecem liberdade de escolha para os pro-

ponentes quando ao sublimite da cobertura, o qual vem determinado através de

percentual do limite da básica, na maioria das vezes bem inferior àquele. Algu-

mas Seguradoras, por sua vez, garantem automaticamente a parcela do risco de

danos morais no âmbito das apólices RC, especialmente no ramo RCG. Além

da limitação do valor da garantia, a cobertura fica restrita ao terceiro diretamente

prejudicado, ou seja, as Seguradoras não oferecem a cobertura de danos morais

reflexos ou indiretos72, assim como elas também determinam nos clausulados

que a garantia somente poderá ser requerida uma vez decorrente de danos cor-

porais efetivamente ocorridos e cobertos pela apólice, sem qualquer possibili-

dade de serem acolhidas as reclamações provenientes de “danos morais puros”,

ou seja, não decorrentes de danos corporais. Essa determinação não só desconsi-

dera a possibilidade de o segurado ser efetivamente responsabilizado por danos

morais puros e conforme vem preceituado no artigo 186 do CC, como também

determina que o afastamento da cobertura deixa o segurado sem a garantia do

seguro, devendo arcar com os eventuais prejuízos nessa área. Raras exceções

acabam sendo admitidas pelas Seguradoras do país, notadamente em seguros

72 Através do REsp 1.734.536-RS, julgado em 06.08.2019, foram determinadas premissas teóricas rele-vantes sobre o dano reflexo ou por ricochete. Ver: STJ reforça caráter autônomo do dano reflexo ou por ricochete, por Rafael Peteffi da Silva. in: Consultor Jurídico, 17 de fevereiro de 2020. Disponível em: www.conjur.com.br Último aceso em 29.02.2020.

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de E&O (Erros ou Omissões – Riscos Profissionais), os quais podem apresen-

tar de maneira muito mais acentuada a possibilidade de ocorrer os danos morais

puros [erros e(ou) omissões provenientes de clínicas de exames de patologias,

por exemplo]. Sob a regência da Lei nº 13.709/2018 – Lei Geral de Proteção de

Dados Pessoais, novo caminho para a incidência de reclamações a título de danos

morais puro se abriu no país e o mercado de seguros deve apresentar resposta

propositiva aos segurados das apólices de RC, mesmo porque a nova norma já se

encontra em vigor. Esta vertente, de inovação tecnológica, se acopla aos “riscos

cibernéticos”, para os quais também deve existir clara identificação de cobertura

para as consequências advindas de ataques, por exemplo, nos diferentes tipos de

apólices dos seguros RC, sem pretender que os segurados, todos eles, contratem

seguros específicos a esse título. Exclusões genéricas para esses novos riscos não

podem ser toleradas e sequer pode ser incentivado este tipo de procedimento,

na medida em que o estágio atual de desenvolvimento do mercado de seguros

brasileiro requer postura mais profissional e técnica diante dos novos desafios.

As seguradoras que operaram no Brasil, grande parte com capital estrangeiro,

já observam outros protocolos procedimentais nos seus respectivos países de

origem e devem, portanto, nacionalizá-los e de modo a atenderem os interesses

locais, com o mesmo grau de garantia ofertado lá fora. Este tipo de advertência

se aplica também para os outros ramos de seguros, com a mesma intensidade.

Os riscos cibernéticos, na atualidade, já são classificados sob a rubrica <<mega-

-risks>>, em face do potencial para causarem significativos danos nos sistemas

e nas infraestruturas, das quais depende tanto a nossa sociedade, assim como a

economia global73.

73 MUÑOZ, Jesús Jimeno. La Responsabilidad Civil en el Ámbito de los Ciberriesgos. Madrid: Fundación Mapfre, 2017, p.71.

No tocante à aferição do dano moral e sua quantificação, a doutrina é complexa e nem sempre convergente. Há, em sede judicial, toda a sorte de comportamento e tendências, muitas vezes motivadas ainda pelos princípios patrimonialistas na era oitocentista das grandes codificações, sem o rasgo da modernidade e o olhar para a pessoa como o núcleo do ordenamento jurídico. Catalan, em relação à decisão determinativa constante do REsp 1.424.164/SC (publicado no DJe. 16.04.2015), através da qual o STJ reduziu a quantia a título de danos morais aos pais da criança que perdeu a audição pela inges-tão de remédio defeituoso, apresenta comentário crítico a esse respeito, assim resumido: “Enfim, o Tribunal da Cidadania, curiosamente, (a) além de afastar o dever imposto ao fabricante de pensionar os alimentos estipulados em razão da perda auditiva sofrida pelo menor, (b) reduziu em 2/374 a verba extrapa-trimonial deferida em favor da infante e, em 5/675 o valor atribuído – sob a mesma rubrica – aos seus pais”.76 (...) “Um problema, em parte, imantado à inclinação da doutrina pátria em resumir o conteúdo das lesões imateriais ao dano moral e (ou) aos danos estéticos e que, em alguma medida, não per-mite afastar a imprecisão e ambiguidade que impregnam as reflexões dog-máticas acerca dos danos extrapatrimoniais”.77 (...) “Enfim, a redução do quantum debeatur é despida de mínimo fundamento lógico, pois, após afirmar que ‘no que concerne ao valor indenizatório [...], verifica-se a impossibilidade de ser estabelecido [algum] juízo de valor acerca da semelhança dos pressupostos fáticos dos acórdãos confrontados’, apontando não ser possível, encontrar, em outras decisões, o parâmetro que viria a informar a quantificação dos danos

74 De R$ 900.000,00 para R$ 300.000,00.

75 De R$ 600.000,00 para R$ 100.000,00.

76 CATALAN, Marcos. O direito do consumidor em movimento: diálogos com tribunais brasileiros. Canoas: Unilasalle, 2017, p.46.

77 Idem, p.51.

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infligidos à infante e seus pais, o Superior Tribunal de Justiça relatou que a atividade exigiria resolver matéria fática e, paradoxalmente, buscou, nos seus alfarrábios os referenciais utilizados para atribuir à vida um preço, artificial-mente, indicado pelo Mercado”.78 Sobre este caso, não único, fica evidente o quanto o pensamento jurídico nacional ainda está pautado no “ter”, ao invés de protagonizar a “pessoa” como núcleo do Direito. Paradoxalmente, o minis-tro Sanseverino, da mesma corte jurisdicional, afirmou na sua obra-título: “a dignidade da pessoa (art. 1º, III, da CF), na perspectiva do postulado nor-mativo da existência digna (art. 170 da CF), afasta a incidência da cláusula geral de redução em relação aos danos pessoais ou corporais, em face da absoluta relevância dos bens jurídicos tutelados (vida e integridade físico-psíquica), que transcendem aos interesses patrimoniais do agente responsável”79. Desse modo, repise-se, a jurisprudência oscila e muitas vezes se mostra injusta e comple-tamente desatrelada da doutrina mais refinada e até mesmo do ordenamento jurídico, se analisado sob o viés da hierarquia das normas, conquanto a digni-dade da pessoa se localiza no topo dos fundamentos erigidos pela República, na sua carta maior (art. 1º, inciso III). O enriquecimento injusto, por sua vez, acolhido pelo ordenamento, deveria permanecer circunscrito ao plano con-tratual simplesmente ou apenas em relação aos danos patrimoniais, excluída qualquer possibilidade em face dos danos pessoais, com raríssimas exceções, uma vez que o instituto se mostra incompatível com esta categoria de danos. As exceções, quando suscitadas, deveriam passar por grivo apertado, diante de pressupostos com igual resistência. Assim como define Nanni, “a pre-tensão de enriquecimento atua na esfera do enriquecido, pugnando restituir ao empobrecido a vantagem obtida, ao passo que na responsabilidade civil a

78 Ibidem, p.53-55.

79 SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Princípio da Reparação Integral. São Paulo: Saraiva, 2010, p.335.

preocupação é com a reposição ao estado anterior do patrimônio do lesado”80. O mesmo autor afirma em relação aos danos extrapatrimoniais: “... não sendo possível estabelecer a priori as circunstâncias que sustentam a liquidação do dano, deve ser observada a cláusula geral da dignidade da pessoa humana e os direitos da personalidade, os quais nortearão a fixação do dano extrapa-trimonial, sem olvidar a proibição do enriquecimento sem causa, impedindo que a indenização leve o ofensor à insolvência e proporcione ganhos despro-positados ao ofendido, alterando substancialmente o seu padrão de vida”81. Ora, as posições do professor Nanni não invalidam, de forma alguma, a posi-ção relativa ao quadro reduzido de aplicação do vetusto instituto civilista do “enriquecimento injusto ou sem causa”, conforme foi propugnado retro, ou seja, aplicação exclusiva no campo contratual e, de forma residual, em relação aos danos puramente patrimoniais. A aplicação é incompatível, repise-se, nos danos pessoais, cujo quantum indenizatório passa por outros paradigmas e vol-tados essencialmente à dignidade da pessoa e o quanto este elemento funda-mental foi atingido pelo dano injusto perpetrado à vítima. Nessa mesma linha de entendimento, o fato de o disposto no art. 944 do CC, permitir ao judi-ciário a relativização da reparação integral mesmo em relação aos direitos da personalidade, muitas vozes doutrinárias se insurgiram contra essa prerroga-tiva e sob a alegação da inconstitucionalidade do referido artigo. Se o direito à propriedade foi elevado à categoria de direito fundamental pela CF (cf. art. 5º, inciso XXII), “não poderia ter a sua ampla proteção mitiga por lei ordi-nária, uma vez que se insere, como direito individual, à condição de cláusula pétrea”82. Desse modo, razão maior para ser arguida a inconstitucionalidade

80 NANNI, Giovanni Ettore. Enriquecimento sem causa. São Paulo: Saraiva, 2004, p.411.

81 Idem, p.415.

82 OLIVEIRA, Gustavo Henrique de. Responsabilidade Civil. Do seu abrandamento à luz da Nova Sis-temática Brasileira. Curitiba: Juruá, 2017, p.391.

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em face dos danos extrapatrimoniais, que em princípio também estão sob o manto da norma contida no art. 944 do CC, sendo que, antes deste ordena-mento, foram tutelados pela CF sob a condição de direito fundamental.

No REsp 1.424.164/SC, já comentado anteriormente, cujo dano injusto culminou na surdez integral e perene da criança, não haveria como evo-car a teoria do “enriquecimento sem causa”. Ora, a vida daquela pessoa foi peremptoriamente afetada para todo o sempre, retirando dela toda e qualquer possibilidade de mudança em relação à saúde física e psicológica. O projeto de vida da vítima certamente foi afetado; há, ainda, dano existencial perene, entre outras intercorrências. O que seria catalogado sob a rubrica de “ganhos despropositados ao ofendido” em face da doutrina reproduzida retro? Qual seria o risco de insolvência da empresa ofensora? Qual cifra poderia materializar, afirmativamente, a “alteração substancial do padrão de vida” da vítima em face do quantum indenizatório eventualmente arbitrado com base na digni-dade plena da pessoa? No campo da pretensão jurídica, qual seria o montante capaz de determinar o acolhimento jurisdicional e voltado para a devolução da quantia paga injustamente à empresa fabricante de produto alimentício que se tornou “empobrecida”? Em qual medida a vítima teria enriquecido, nos termos do art. 884, do CC? Na hipótese de a vítima ser desprovida de recursos finan-ceiros e sofrer lesão irreversível que poderá deixa-la inválida para sempre, o fato de ser arbitrada a instalação de melhorias em sua residência de modo a lhe proporcionar mobilidade adequada, pode ser considerado enriquecimento ilícito, sendo que aquela pessoa, sem sofrer o dano injusto a ela perpetrado, poderia se locomover livremente? A mesma vítima, com base nessas balizas de índole puramente patrimonialistas, e com a pretensão única de preservar a dogmática civilista contida na figura do enriquecimento sem causa, positivado que foi no CC, artigos 884-886, tornar-se-ia, então, “um desprovido de recur-sos financeiros, agora inválido permanentemente e sob o beneplácito da lei”?

Essa retórica contém, na sua concretude, elementos compatíveis com aquilo que a doutrina acadêmica convencionou chamar de “justo”, “digno”, “razoá-vel”, “impregnado de socialidade”, “ético”, “com eficácia legal”, entre outros tantos? As respostas a este questionamento são bastante óbvias, sendo que a produção de defesa com base nesses argumentos e justificativas, ainda que respaldados no ordenamento civil, certamente não condizem com a realidade e os efetivos interesses sociais contemporâneos. Há injustiça inconteste nes-sas argumentações quando advogadas a favor dos ofensores e o desprezo, com consequente aviltamento, da dignidade da pessoa. Se puderem ser acolhidas como verdades contidas no ordenamento, então ocorrerá verdadeiro “déjà vu” em razão do teor positivista desse mesmo Direito, numa visão tipicamente kelseniana, desprovida de qualquer valor em relação à referida norma. Se as posições jusfilosóficas em prol da pessoa permanecerem apenas nos textos doutrinários e acadêmicos, todo o acervo estará eivado de completa nulidade, inocuidade e obsolescência. Há que existir e ser incentivada a completa des-patrimonialização da reparação83 nesta órbita da responsabilidade civil. Na mesma senda, Venturi propugna, assertivamente, por um novo olhar sobre a promessa do “restitutio in integrum”, uma vez que “emerge, por outro lado, uma garantia muito mais apropriada e justificada sobretudo para a tutela dos direi-tos da personalidade, a que se poderia denominar, com a permissão da mutação de locução, ‘manutentio in integrum’”84. Considerando-se, ainda, a crescente securitização dos riscos das mais diversas atividades empresariais, mesmo no Brasil, em cujo país o seguro ainda é tido como um “ilustre desconhecido”, as questões aqui suscitadas se tornam ainda mais relevantes. Ora, a transferência

83 SCHREIBER, Anderson. Novos Paradigmas da Responsabilidade Civil. Da Erosão dos filtros da repa-ração à diluição dos danos. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2015, p.198.

84 VENTURI, Thaís Goveia Pascoaloto. Responsabilidade Civil Preventiva. A proteção contra a violação dos direitos e a tutela inibitória material. São Paulo: Malheiros, 2014, p.83.

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dos riscos à atividade seguradora, no mais autêntico modelo mutualístico, tem essa prerrogativa: produção acentuada de produtos e consequentes riscos, com a garantia de indenizações aos consumidores, uma vez sobrevindo os danos. Esta situação é patente na sociedade moderna e desconstrói todo e qualquer argumento voltado ao possível enfraquecimento do produtor, mais ainda em relação ao seu possível empobrecimento, quando da imputação de sua respon-sabilidade e diante do arbitramento de quantias adequadas e razoáveis para as indenizações das vítimas. Este é o mundo novo, pós-moderno, que tem o olhar voltado muito mais para as vítimas. As Seguradoras, inclusive, se esta-belecem licitamente visando o retorno financeiro aos investidores, mas a ati-vidade consiste em “tomar riscos”. Não uma parte ínfima apenas, mas de forma integral de acordo com os interesses atuais da sociedade.

Para concluir este tópico sobre os Danos Morais, necessário indicar, pri-meiramente, que os tribunais se utilizam das mais diversas metodologias para o estabelecimento do quantum, certamente vedado qualquer tipo de tabelamento legal, até mesmo porque ele seria inconstitucional em face do direito da garantia fundamental prevista na Constituição Federal. Segundo Cianci, “são notórias as dificuldades para o acertamento dos critérios de ava-liação do dano moral, dada a dificuldade de equivalência entre a indenização e a perda moral, razão que conduz o ressarcimento a regras de mera compen-sação”85. Em derradeiro, o fato de que o dano moral alcançou novos patama-res, assim como em relação ao dano moral ambiental, de natureza coletiva ou difusa, sendo que antes mesmo já havia sido acolhido em sede jurisprudencial pertinente a danos morais coletivos, de natureza trabalhista e civil. Medei-ros Neto, em dicção perfeita com a realidade do tema, asseverou que “estes interesses e direitos, não se confinando em um rol preestabelecido, são relevados

85 CIANCI, Mirna. O Valor da Reparação Moral. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p.95.

historicamente, valorizados e assimilados como fundamentais, passando a refle-tir e a compor as diversas órbitas de projeção da dignidade humana”86. Antes disso, o ordenamento nacional já equiparara as pessoas jurídicas às naturais no tocante aos danos da personalidade, no que couber, assim como preceituou o artigo 52 do CC, também com decisão sumular do STJ, 227: “A pessoa jurí-dica pode sofrer dano moral”. No âmbito dos riscos ambientais, a preleção de Morato Leite e Ayala, “trata-se de jurisprudência pós-moderna que contribui para a efetividade do dano moral ambiental” [STJ: REsp 1.367.923-RJ, publi-cado em 06.09.2013; REsp 1.198.727-MG, publicado em 09.05.2013; REsp 1.145.083-MG, publicado em 04.09.2012; REsp 1.180.078-MG, publicado em 28.02.2012]87.

(x) Danos estéticos – conforme o ensinamento da professora Teresa Ancona,

são definidos “como qualquer modificação duradoura ou permanente na aparên-

cia externa de uma pessoa, modificação esta que lhe acarreta um ‘enfeamento’ e

lhe causa humilhações e desgostos, dano origem, portanto, a uma dor moral”88. A

mesma autora discorre, na sua obra-título, sobre os critérios de aferição para

fins de indenização. Nesta análise, importante ressaltar o fato de que apesar

de existir o acolhimento dos danos estéticos para fins indenizatórios de forma

usual pelas Cortes de Justiça brasileiras, o mercado de seguros é bastante refra-

tário à concessão de cobertura para esta parcela de risco, a qual se mostra cru-

cial nos seguros voltados à circulação de veículos, principalmente. Seguradoras

têm excluído taxativamente os danos estéticos da cobertura das apólices e sequer

admitem a possibilidade de o proponente contratá-la de forma adicional, assim

86 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano Moral Coletivo. 2ª ed. São Paulo: Ltr, 2007, p.119.

87 LEITE, José Rubens Morato. AYALA, Patryck de Araújo. Dano Ambiental. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p.352-353.

88 LOPEZ, Teresa Ancona. O Dano Estético. Responsabilidade Civil. 3ª ed. São Paulo: RT, 2004, p.46.

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como é oferecida para o risco de danos morais, também excluídos nas mesmas

apólices. Juridicamente, essa distinção limitativa é inexplicável, até porque a

doutrina determina que os danos estéticos são espécie do gênero danos morais,

apesar de a jurisprudência dominante admitir e determinar a acumulação de

indenizações para as duas categorias89. São encontradas apólices que garantem os

referidos riscos, ao menos adicionalmente, sendo mais rara a admissão automá-

tica da cobertura nos clausulados brasileiros. Este procedimento é injustificável

nos dias atuais, sendo que em nenhum outro país ele é praticado desta forma.

Qualquer apólice de seguro de RC estrangeira traz no seu bojo a garantia auto-

mática para os danos extrapatrimoniais, sem exceção. A não admissão da cober-

tura para essas parcelas tornam o seguro RC um produto incompleto, ineficaz e

com grande margem de inutilidade para os consumidores, os quais não encon-

tram alternativa senão a assunção dos riscos individualmente, quando na verdade

desejariam transferi-los para o seguro. Não subscrevê-los e sob o argumento da

dificuldade de apuração que eles ensejam, mormente no campo administrativo

das Seguradoras, constitui postura indesculpável em se tratando de empresas que

se estabeleceram justamente com a finalidade de tomarem riscos e de maneira

tal que os seguros se convertessem, realisticamente, em instrumentos úteis para

os consumidores-segurados. Não há paliativo para essa premissa fundamental.

No repertório jurisprudencial nacional, não tem sido raro os magistrados acolherem teses anacrônicas, desmedidamente, assim como a do “enriqueci-mento sem causa ou ilícito” diminuindo, consideravelmente, o quantum inde-nizatório das vítimas e com base também na última remuneração recebida

89 Súmula 37 do STJ: [arts. 186 e 927] – São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato (1992). | Súmula 387 do STJ: [art. 186] – É lícita a cumulação das indeniza-ções de dano estético e dano moral (2009).

e como se a pessoa pudesse, repise-se, ser apreciada apenas sob o viés labo-ral.90 Tem sido muito usual também, em sede administrativa, as Segurado-ras aplicarem um desconto considerável no montante dos prejuízos apurados por elas quando da liquidação de indenizações de sinistros de seguros RC e envolvendo danos corporais, especialmente quando o pagamento é realizado de uma única vez. Descontam sob o título de “valor presente” e alegando que a vítima se locupletaria de forma injusta se recebesse a verba integral desde logo, sendo que ela poderia aplicar o valor, em produtos financeiros, obtendo lucratividade. Ainda que o dano resulte em tetraplegia da vítima, por exem-plo, o entendimento é exatamente o mesmo, sem qualquer tipo de considera-ção a respeito do estado incapacitante da pessoa. Para completar este cenário e de modo a estabelecer liame com o cerne do estudo empreendido neste texto, necessário indicar que os clausulados utilizados atualmente pelo mer-cado nacional nos seguros de responsabilidade civil, sendo a grande maioria deles proveniente da padronização efetivada pela Circular Susep-437/2012, se apresentam inadequados técnica e juridicamente, na medida em que eles se mostram extremamente desajustados aos efetivos interesses seguráveis, necessitando passar por processo de revisão integral. Cabe a cada Segura-dora, que efetivamente opera no segmento, elaborar os respectivos clausula-dos, sem a ingerência do Estado, assim como preconiza a Lei nº 13.874/2019 (da liberdade econômica)91.

90 GASPAR, Cátia Marisa. RAMALHO, Maria Manuela. A Valoração do Dano Corporal. Coimbra: Almedina, 2012, p.7.

91 Ver: Declaração de Direitos de Liberdade Econômica: as novas regras se aplicam ao Mercado de Segu-ros regulado? Quando terão início as mudanças? O que esperar de 2020? in: www.editoraroncarati.com.br – Colunistas – Walter A. Polido – 15.01.2020 – Último acesso em 28.02.2020.

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Necessário indicar, permitindo visão ampla do tema e da sua evolução no mercado de seguros brasileiro, os conceitos que foram e que são utilizados pelas Seguradoras, na linha do tempo:

(a) Circular Susep nº 2, de 31 de janeiro de 1974

Aprovou as Condições Gerais para os Seguros de Responsabilidade Civil

Geral, e utilizava a nomenclatura “danos pessoais”, sem, contudo, apresen-

tar qualquer tipo de definição no referido clausulado. Nessa mesma oca-

sião, havia uma Tarifa para Seguros de Responsabilidade Civil, elaborada

pela Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados e Capitaliza-

ção, em vigor desde 1º07.1960, a qual expressava “danos corporais”, sem

também apresentar definição a respeito. Nos casos omissos à referida Tarifa

e dependendo também do valor da importância segurada, as Seguradoras

submetiam cada pedido ao Instituto de Resseguros do Brasil – IRB, para a

cotação, em razão do monopólio do resseguro que vigia no período.

(b) Circular Susep nº 57, de 04 de novembro de 1981

Aprovou apólice, proposta, questionário, Condições Gerais, Condições

Especiais e Disposições Tarifárias para os Seguros de RCG e utilizava a

expressão “danos pessoais”, nas Condições Gerais, sem definir a expressão.

(c) Circular Susep nº 106, de 22 de setembro de 1999 – Seguros RCVF e Cir-

cular Susep nº 107, mesma data – Seguro RCG

Alterou a nomenclatura “danos pessoais” para “danos corporais”, sem defi-

nição, assim como excluiu taxativamente a cobertura para os danos morais,

liberando as Seguradoras para concedê-la de forma adicional, com sublimi-

tação e sobreprêmio.

Basicamente o mercado de seguros nacional utiliza o mesmo critério esta-belecido pelas Circulares 106 e 107/1999 da Susep, até os dias atuais, para os dois ramos de seguros.

O entendimento sobre a abrangência contida nas expressões “danos pes-soais” e “danos corporais”, assim como já foi reproduzido neste texto, e especialmente voltada para a questão dos danos morais, teve a primeira mani-festação jurisprudencial do STJ em 1999, quando aquela corte entendeu que os danos pessoais compreendiam também os danos morais. Por este motivo, o mercado de seguros se movimentou e pleiteou que a Superintendência de Seguros Privados regulasse a situação, assim como de fato aconteceu através das Circulares 106 e 107/1999 daquela Autarquia.

O entendimento sofreu algum tipo de evolução e retrocesso também, em sede jurisprudencial, na medida em que evoluiu no sentido de entender tam-bém abrangidos os danos morais na expressão “danos corporais”, salvo se os danos morais estiverem taxativamente excluídos da apólice. O acórdão a seguir reproduzido retrata objetivamente esta situação:

TJRJ – Sétima Câmara Cível – Apelação Cível nº 40.323/2009 – Des. Cae-

tano E. da Fonseca Costa. A jurisprudência do C. Superior Tribunal de Jus-

tiça já se posicionou no sentido de que a cláusula relativa aos danos pessoais e/

ou corporais engloba a verba referente ao dano moral, salvo se houver cláusula

expressa de exclusão desta cobertura. Apólice de Seguro que aponta os valores a

serem indenizados, estando o campo referente ao dano moral em branco. Não se

pode interpretar tão somente da leitura desta apólice que o dano imaterial esta-

ria excluído da cobertura, pois não cumpriu a Seguradora o dever de informar

de forma clara, expressa e inequívoca sobre as cláusulas restritivas de direitos,

como exige a legislação consumerista.

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De outra perspectiva, o entendimento sofreu revés na medida em que a Súmula 402 do STJ, de outubro de 2009, parece ter retrocedido no tema: “O contrato de seguro por danos pessoais compreende danos morais, salvo cláu-sula expressa de exclusão”. Ora, em 1999, o mesmo STJ julgara no sentido de que os “danos pessoais” compreendiam os danos morais, mesmo sem condi-cionar a exceção contida numa eventual exclusão prevista na apólice.

De ser notado, também, que a discussão jurisprudencial se baseia exclu-sivamente nos danos morais e não de forma ampla, na medida em que seria muito mais producente se as questões pautassem os danos extrapatrimoniais. Nessa mesma linha reducionista, tampouco são cogitados os chamados novos danos, apesar de já serem consagrados pela doutrina especializada há um bom tempo. Existe um caminho a ser pavimentado, doutrinariamente, sendo que este texto representa um dos primeiros passos já iniciados com este objetivo. O mercado de seguros, por sua vez, tem o dever de se atualizar nesta seara, na medida em que o Judiciário tem mostrado que está aberto às inovações, e sempre que existir a possibilidade, as Cortes de Justiça modificam as posi-ções já obsoletas e desconformes com os anseios da sociedade pós-moderna. As Seguradoras devem, portanto, se antecipar, projetando os novos danos no âmbito de suas operações e, assim, poderão se organizar redigindo adequada-mente os clausulados, compilando os dados estatísticos e precificando ade-quadamente os riscos, antes mesmo de serem surpreendidas pelas decisões dos tribunais, as quais solaparão os velhos conceitos e procedimentos também anacrônicos. O movimento deve ser proativo portanto e não simplesmente reativo a partir das decisões que fatalmente serão tomadas pelos magistrados, uma vez mantido o atual estado de inércia do mercado privado. Os tribunais buscarão, cada vez mais progressivamente, por soluções melhoradas aos con-sumidores de seguros em face dos novos anseios da sociedade. Assim como já foi visto neste texto, não se trata tão somente de novos danos e(ou) de

novos direitos, e tampouco da necessidade de previsão legislativa para eles poderem ser alcançados. Eles já estão alocados no ordenamento jurídico e carecem, tão somente, de um novo olhar sobre os atuais con-ceitos, assim como o da dignidade da pessoa, enquanto fundamento máximo da República, sendo que várias situações, aparentemente novas, podem ser subsumidas no velho princípio já consagrado desde 1988.

Para finalizar este tópico, necessário indicar que o PL nº 8.338, de 2017, o qual dispõe sobre o Seguro Obrigatório de Acidentes de Trânsito (SOAT), em tramitação no Congresso Nacional, e na condição de proposta substitutiva ao Seguro Obrigatório de Danos Pessoais Causados por Veículos Automoto-res de Vias Terrestres, DPVAT, este já com farta demonstração da completa obsolescência do modelo, requer seja revisto na origem, uma vez que, ao pretender inovar, o PL apenas reproduziu o modelo anacrônico do DPVAT em relação às garantias de coberturas a serem oferecidas. O art. 5º da refe-rida proposta legislativa trata apenas da indenização por “morte”, “indeniza-ção por invalidez permanente, total ou parcial”, e “reembolso de despesas de assistência médica e suplementares”. No art. 9º, II, § 1º, o PL trata do tema invalidez permanente sob a mesma condição de um Seguro de Acidentes Pes-soais, com tabelamento “oficial” dos percentuais de indenização, sendo que a proposta do SOAT repousa, paradoxalmente, sob a categoria de seguro de responsabilidade civil, muito mais abrangente e como deve acontecer de fato também no Brasil. Desse modo, o referido PL carece de reformulação na sua base conceitual, se houver realmente o objetivo de apresentar um substitu-tivo eficaz ao já combalido e anacrônico seguro DPVAT92.

92 Leia mais: SOAT – Seguro Obrigatório de Acidentes de Trânsito – PL nº 8.338/2017 – é razoável a proposta legislativa na forma que ela se apresenta ou não? Disponível em: www.ibds.com.br – Textos – Walter Polido. Último acesso em 06.03.2020.

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Este texto analisou o tema referente a abrangência contida na expressão “danos pessoais” ou “danos corporais” encontrada nos contratos de seguros que garantem o risco da responsabilidade civil. Conclui-se, desde logo, que a utilização de uma ou outra nomenclatura pouco ou nada altera na concep-ção do seguro, sendo muito mais importante a definição que é oferecida para elas. De todo modo, a utilização da terminologia “danos pessoais” se mos-tra, em princípio, mais adequada e reflete a ideia de maior abrangência se comparada a de danos corporais. Investigou o termo “dano” e a sua natureza enquanto um elemento construído ao longo do tempo na sociedade e mutante dinamicamente segundo os valores, as pretensões e (ou) os interesses con-temporâneos. Não se submete, portanto, a conceitos estanques e impermeá-veis. Por este motivo, ao longo da evolução da sociedade tem surgido novos contornos para a noção de danos, ainda que a Constituição Federal tutele a dignidade da pessoa na condição de fundamento basilar da República e certa-mente completo sob todos os aspectos. O movimento renovador visa, então, não a criação propriamente dita de “novos direitos”, mas sim subsumi-los às normas gerais e de modo a complementar ou, mais precisamente, ampliar a noção do Direito já existente e aceito por todos. Quando se advoga, por exemplo, pela aceitação da responsabilidade civil em face do “tempo útil perdido” pelos consumidores que são lesados por fabricantes ou fornecedo-res de produtos ou serviços defeituosos, na verdade não se está criando uma nova categoria de dano ou de prejuízo, mas sim e tão somente se está bus-cando ampliar o conceito já existente da responsabilidade civil do fornece-dor. Determinadas situações acabam sendo guindadas para um patamar de observação e exigência que antes não refletiam o interesse dos consumidores e por vários motivos, considerando-se que algumas sempre existiram, mas não eram observadas de maneira mais atenta. Com o advento do Código de Defesa do Consumidor, não resta dúvida de que uma grande porta se abriu

com esta perspectiva. A principiologia ínsita no referido códex deu margem para que determinadas situações, antes despercebidas da grande maioria dos consumidores e consequentemente incólumes, passassem a ser observadas e sob o olhar bastante atento dos cidadãos, exigindo direitos. Ora, o direito dos consumidores em relação à distribuição de produtos e serviços perfeitos sem-pre existiu, mas aqueles prejuízos consequentes da busca da materialização deste mesmo direito passavam incólumes para os fornecedores, sendo que os consumidores assumiam todos eles. Contemporaneamente, os consumido-res começam a pleitear o ressarcimento das eventuais despesas: idas e vindas ao estabelecimento onde adquiriu o produto com defeito e(ou) na assistência téc-nica; tempo perdido com os serviços de atendimento ao consumidor; transportes; perda do uso do produto; etc.

Nesta senda, os diversos outros tipos ou categorias de danos que foram analisados neste texto apresentam, por aproximação, os mesmos contornos expressos nos parágrafos anteriores.

O fato primordial de que a dignidade da pessoa constitui princípio fun-damental constitucional, assim como o direito que todo cidadão tem de ser indenizado por danos patrimoniais e morais decorrentes de danos injustos a ele impingidos por outrem, corroboram a ideia de que a reparação da vítima deve ser integral. Sobre este aspecto, já comentado neste texto, o fato de que em princípio o mercado de seguros não tem a prerrogativa de limitar o alcance da cobertura relativa aos danos pessoais na apólice e excluindo, por exemplo, as parcelas relativas aos danos morais e estéticos. Há, de fato, limitação obje-tiva das prerrogativas da iniciativa privada em sede de direitos fundamentais, cabendo observá-los também na esfera horizontal das avenças de natureza privada, notadamente no campo contratual, assim como é o de seguros. As Seguradoras que operam com seguros de responsabilidade civil devem garan-tir a reparação integral das pessoas vitimadas por danos, podendo limitar,

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nessa esfera privada, a importância segurada das apólices, mas em princípio não poderiam seccionar as garantias compreendidas pelos termos “danos pes-soais” ou “danos corporais”, limitando-as ou não garantindo expressamente determinadas parcelas constitutivas (dano moral ou estético, por exemplo).

Ainda sob a ótica da limitação objetiva da inciativa privada que o orde-namento jurídico impõe, notadamente em sede dos direitos fundamentais, se mostra emblemático o REsp 1.836.823-SP, representativo da controvérsia entre uma operadora de plano de saúde, a qual recorreu da decisão do TJSP que manteve um ex-empregado como beneficiário, após transcorridos 24 meses da rescisão do seu contrato de trabalho, em razão de ele estar em trata-mento de doença grave93. A Lei nº 9.656/98, art. 30, § 1º, conforme as circuns-tâncias do caso, justificou o direito de o consumidor-segurado permanecer no plano de saúde nas mesmas condições de quando ele estava empregado, pelo prazo de dois anos, arcando com o pagamento integral da mensalidade. O ministro do STJ, Paulo de Tarso Sanseverino, presidente da Comissão Gestora de Precedentes, formulou juízo preliminar admitindo a proposta de afetação do recurso especial, com fundamento no Código de Processo Civil vigente94. O ministro-relator do ProAfR no REsp, Moura Ribeiro, ressaltou

93 Fundamentos do TJSP para conceder a extensão do período da cobertura: “Parte hipossuficiente que não pode ser surpreendida com a abrupta ruptura da cobertura securitária. Negativa de continuidade da apólice, ademais, que restringe obrigação inerente à natureza do contrato (art. 51, IV, e §1º, II, do CDC). Abusividade evidenciada. Conduta que implica na concreta inutilidade do negócio protetivo. Quebra do dever de lealdade. Malferimento dos princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato (arts. 421 e 422 do Cód. Civil)”.

94 PROPOSTA DE AFETAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS. PLANO DE SAÚDE. EX-EMPREGADO EM TRATAMENTO MÉDICO. CONTROVÉRSIA ACERCA DA POSSIBILIDADE, OU NÃO, DE PRORROGAÇÃO DO PRAZO PREVISTO NO ART. 30, § 1º, DA LEI Nº 9.656/98. 1. Delimitação da controvérsia: Definir a (im)possibilidade de prorrogação do prazo de cobertura previsto no § 1º do art. 30 da Lei nº 9.656/98 na hipótese de o beneficiário continuar precisando de constante tratamento médico para a moléstia que o acomete. 2. Recurso especial afetado ao rito do art. 1.036 NCPC. ProAfR no RECURSO ESPECIAL Nº 1.836.823 – SP (2019/0144163-7) RELATOR : MINISTRO MOURA RIBEIRO

a importância do tema e, diante da multiplicidade de recursos sobre a mesma questão jurídica já decididos, a necessidade de definir posição representativa da controvérsia. A jurisprudência do STJ já reconheceu que a resilição uni-lateral pela operadora de plano de saúde, mediante prévia notificação, “não obstante seja em regra válida, revela-se abusiva quando realizada durante o tratamento médico que possibilite a sobrevivência ou a manutenção da incolu-midade física do beneficiário” [AgInt no REsp 1.791.755-RS, Rel. Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 30/09/2019, DJe 03/10/2019]. Esta decisão da Corte Superior de Justiça brasileira identifica, peremptoria-mente, que “o ordenamento jurídico muda de um panorama essencialmente individualista (egoísta) a uma compreensão social do fenômeno jurídico, como forma de viabilizar a coexistência de liberdades”95. Nem por isso, contudo, a questão deixa de ser controversa, sendo que a doutrina se digladia e com dife-rentes argumentos justificadores, sendo que por este mesmo motivo a matéria foi submetida à Comissão Gestora de Precedentes do STJ, para julgamento. A decisão é aguardada por muitos agentes interessados, também do mercado de Seguros Saúde. Sobre a temática que envolve o caso, e trazida para este texto que trata especificamente da abrangência da expressão “danos pessoais” nos seguros de RC, o intuito foi apenas de aproximar as possíveis simetrias existentes entre os dois assuntos, mais precisamente a visão do Direito con-temporâneo voltada à pessoa como centro de imputação jurídica. No embate doutrinário, importante conhecer as diversas posições, de modo a avaliá-las e com mais robustez poder conceber a própria linha de atuação. Na preleção

RECORRENTE : AMIL ASSISTÊNCIA MÉDICA INTERNACIONAL S.A ADVOGADOS : GUSTAVO GONÇALVES GOMES E OUTRO(S) – SP266894 HENRIQUE FONTANA DE OLIVEIRA – SP324913 SOC. de ADV. : SIQUEIRA CASTRO ADVOGADOS RECORRIDO : ALFREDO CARVALHO DIAS ADVOGADOS : ROSANA CHIAVASSA – SP079117 SILVANA CHIAVASSA E OUTRO(S) – SP097755

95 RODOVALHO, Thiago. Abuso de Derechos y Derechos Subjetivos. Lima: ARA, 2014, p.226.

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de Timm, “a ineficiência do ambiente institucional Judiciário, influenciado pela ótica solidarista em maximizar a resolução das demandas da sociedade por meio do direito privado pode acarretar mais prejuízos do que benefícios”96. De outro lado, Lima Marques e Miragem lembram que “muitas vezes para pro-teger um direito privado é necessário distinguir, assegurar direitos especiais ao vulnerável, tratar de forma especial o mais fraco: diferenciar para proteger!”97. Também Schimitt assevera: “o processo de valorização dos direitos fundamen-tais como normas de direito objetivo possibilitou, por meio da hermenêutica, a incorporação de novos conteúdos ao programa normativo dos direitos fundamen-tais, equalizando a norma jurídica à realidade”98. Difícil é encontrar o ponto de equilíbrio para a situação em julgamento no ProAfR no REsp 1.836.823-SP e que certamente transborda em diferentes tipos de sinistros no dia a dia, cada qual com suas especificidades. O padrão único inexiste. Não há dúvida de que o conflito não pode ser analisado apenas e sempre sobre o prisma da lucratividade das operadoras de saúde, na medida em que a atividade exer-cida por elas é sim capitalista e o lucro constitui o resultado esperado, lici-tamente. Ao mesmo tempo, há a questão de fundo, sempre presente, do não cumprimento do dever constitucional do Estado quanto a oferta do atendi-mento à saúde para todos. Com base neste raciocínio taxativo e extremamente conveniente, as mentes de índole mais liberal simplesmente propugnam pela isenção da iniciativa privada, desobrigando as operadoras de saúde a oferece-rem a tutela subsidiária aos desassistidos pelo Poder Público nacional. Deci-são simples e até mesmo cartesiana, se todas os demais contornos e mesmo

96 TIMM, Luciano Benetti. O Novo Direito Civil. Ensaios sobre o mercado, a reprivatização do direito civil e a privatização do direito público. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008, p.129.

97 MARQUES, Cláudia Lima. MIRAGEM, Bruno. O Novo Direito Privado e a Proteção dos Vulnerá-veis. São Paulo: RT, 2012, p.111.

98 SCHMITT, Cristiano Heineck. Consumidores Hipervulneráveis. São Paulo: Atlas, 2014, p.262.

as mazelas da sociedade brasileira puderem ser desconsideradas. Não podem e, a partir dessa premissa, alinhada ao fato de que o Direito é o resultado da cultura de um povo e que devem ser consideradas todas as nuances encontra-das na sociedade contemporânea, as questões conflituosas que ocorrem den-tro deste mesmo contexto devem ser analisadas sob este viés e não somente através de teorias acadêmicas sem concretude fática. Na preleção de Alf Ross, “a ciência do direito tem que ser, em última análise, um estudo dos fenômenos sociais, a vida de uma comunidade humana”99. A sustentação retórica com base em enunciados encontrados em outros países e com realidades sócio--econômico-jurídicas diferentes das do Brasil, não merece o acolhimento, sequer a consideração dos argumentos, se recepcionada à luz de um padrão mínimo de racionalidade. No aspecto específico do acesso à saúde, parece ser voz uníssona a necessidade de “resgatar o debate político sobre o uso de recur-sos públicos, sobre a organização da sociedade, sobre a ética em uma sociedade de consumidores que privilegia o individualismo, e esse debate precisa se reali-zar fora da dimensão judicial até para que a efetividade da cidadania no Brasil não se limite a uma decisão judicial procedente”100. Por essas razões e pecu-liaridades o tema foi trazido para este contexto de discussão, na medida em que ele guarda alguma similitude com as questões que envolvem os novos danos e(ou) os novos direitos em matéria de seguros de RC, todos eles voltados essencialmente à pessoa no campo de sua dignidade e como padrão máximo erigido pelo ordenamento jurídico pátrio. Então, no tocante aos seguros de responsabilidade civil e a inserção de mais parcelas indenizatórias a título de “novos danos”, não há o que debater com mais veemência e de modo a buscar por mais justificativas hermenêuticas, até porque os “novos direitos”

99 ROSS, Alf. Direito e Justiça. Bauru: Edipro, 2003, p.94.

100 CARLINI, Angélica. Judicialização da Saúde Pública e Privada. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2014, p.176.

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sempre existiram e estão contidos no ordenamento nacional, mormente em sede constitucional sob a luz dos direitos fundamentais.

Os ramos de Seguros de Responsabilidade Civil, nas suas diversas cate-gorias, não se confundem com os Seguros de Pessoas (Vida e Acidentes Pessoais), de forma alguma, até porque têm objeto e interesses segurados diferentes. No ramo Seguros de Pessoas os riscos podem ser nomeados e limitados, desde que seja obedecido o critério de não atentarem contra o objeto essencial do contrato (por exemplo, no Seguro de Vida não pode haver a exclusão da cobertura na apólice do risco de morte decorrente de choque anafilático por ingestão de medicamentos; intercorrências no parto; intoxica-ção alimentar, entre outros, conforme REsp nº 1.635.238-SP). Nos seguros de RC, por sua vez, a natureza da cobertura é outra e, na medida em que a Seguradora se propõe a justamente garantir o risco da responsabilidade civil do segurado em relação à obrigação de indenizar que este for obrigado, por força legal, causando danos a terceiros, não há como limitar a abrangência do conteúdo referente à compreensão jurídica para os riscos cobertos referentes aos “danos pessoais” ou “danos corporais”. Esta constatação é essencial para o entendimento deste texto.

As Seguradoras precisam se antecipar, até porque o tempo já passou, promovendo a refeitura das bases de atuação, começando pela elaboração de novos clausulados de coberturas, todos eles concebidos em bases cientifica-mente conformes, técnica e juridicamente. Os conceitos devem estar alinha-dos aos novos estamentos jurídicos e de modo a não só estabelecerem bases de coberturas objetivas para os interesses segurados, como também para pro-piciarem segurança jurídica à atividade seguradora, atualmente em cheque devido aos problemas conhecidos, alguns deles comentados neste texto.

Quando são observados determinados textos de apólices estrangeiras, de país desenvolvido, todas as questões retratadas neste texto se tornam bastante

visíveis, se comparadas aos modelos de apólices brasileiras. Numa apólice de RC Auto de Portugal, para exemplificar, a definição dada para “dano cor-poral” se mostra bastante singela e, ao mesmo tempo, apresenta ampla sig-nificação. Cotejá-la com os modelos nacionais, traz à luz vários tipos de questionamentos. Inclusive, causa perplexidade o fato de não se multipli-carem ainda mais as demandas judiciais no país, apesar dos milhares (ou milhões) de processos já existentes, cujo cenário materializa definitivamente o fenômeno da “judicialização”. A definição da apólice portuguesa: “Dano corporal, prejuízo resultante de lesão da saúde física ou mental”. O texto usual-mente encontrado no Brasil, por sua vez: “Dano Corporal, lesão física, inva-lidez ou morte, causada a Pessoa(s), por acidente(s) cobertos(s)”. Destas duas curtas definições origina-se série de conceitos, interpretações e, todas elas, a favor ou contra os segurados das respectivas apólices. Não há espaço, de toda a forma, para qualquer tipo de dúvida sobre qual delas oferece o maior grau de garantia de cobertura para quem contrata o seguro e também com rela-ção às mais diversas categorias ou elementos que podem compor o quantum indenizatório, uma vez sobrevindo o sinistro. Está é a função do seguro: ser útil aos consumidores.

No ramo RC Geral, no Brasil, as definições encontradas ao longo das déca-das passadas sempre se mostraram reduzidas: “dano pessoal: qualquer doença ou dano corporal sofrido por pessoa, inclusive morte ou invalidez”; “dano cor-poral: qualquer doença ou dano corporal sofrido por pessoa, inclusive morte ou invalidez”; as definições trazidas ao mercado através da Circular Susep-437, de 14.06.2012, não podem passar sem crítica, na medida em que elas impri-miram tamanho grau de complexidade e seccionamento nos conceitos, que certamente não há a mínima possibilidade de o modelo ser acolhido seja sob o viés técnico ou jurídico e, menos ainda, ele não pode ser recomendado para qualquer tipo de contrato de seguro: dano; dano corporal; dano estético; dano

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físico à pessoa; dano moral; dano patrimonial; dano pessoal, lesão corporal; prejuízo; prejuízo financeiro; perda, perdas e danos; perdas financeiras. Este modelo da Susep é impraticável e jamais encontraria qualquer semelhança com os modelos internacionais, dos mercados maduros. A partir da vigência da Lei nº 13.874, de 20.09.2019, da liberdade econômica, todos esses concei-tos e definições deverão ser revisitados, passado por processo de modernização e sem a ingerência conducente do Estado, mesmo porque a intervenção não se mostrou, de modo algum, benéfica para o mercado de seguros e, menos ainda, para os consumidores de seguros do país.

A tarefa primordial da elaboração da nomenclatura técnico-jurídica e res-pectiva definição dos termos não pode se circunscrever à alçada dos atuários, tampouco do técnico de subscrição, quando não versados em conhecimentos de Direito. O modelo deve ser multidisciplinar, ou seja, cada profissional, na sua área de atuação, contribui para o aperfeiçoamento do termo, do seu con-teúdo, mas passando, necessariamente, pelo olhar do operador de Direito. Sem essa visão múltipla o resultado não será bom, tampouco estará conforme às reais necessidades das partes atuantes nos contratos de seguros. No campo específico da nomenclatura para os “danos pessoais”, necessária a atuação conjunta do médico, do profissional da saúde, pois que somente ele poderá imprimir conformidade e racionalidade nas definições pertinentes. No mer-cado norte-americano, o mais desenvolvido em matéria de seguros de respon-sabilidade civil e por várias razões – o regime da common law que imprime maior dinâmica ao Direito, adequando-o rapidamente ao caso concreto em litígio, a maior conscientização da população e a efetividade das coberturas encontradas nas apólices de RC -, a definição para danos pessoais é prati-camente a mesma ao longo de décadas, a qual se apresenta de maneira bem ampla: “Bodily Injury – means physical injury, illness, disease, mental anguish, emotional distress, or shock, sustained by any person, including death resulting

therefrom”. Tradução livre: “Lesão Corporal – significa lesão física, doença, angústia mental, angústia emocional ou choque, sofridos por qualquer pes-soa, incluindo morte daí resultante”. Os lucros cessantes, as perdas financei-ras de maneira ampla, assim como a impossibilidade de fruição ou gozo da vida e de suas possibilidades sempre estarão garantidas no cômputo indeni-zatório da apólice RC, sem exceção, e automaticamente. Jamais essa parcela de garantia poderá ser objeto de exclusão, ainda que a Seguradora apresente a possibilidade de ela ser contratada de forma adicional. O padrão internacio-nal, para os seguros de RC é este, com cobertura automática e ampla, assim como também já foi no mercado de seguros no Brasil em parte, até a edição da Circular Susep-437/2012, a qual retrocedeu ao indicar as coberturas para as despesas com a “defesa do segurado”, assim como para os “lucros ces-santes e perdas financeiras” de forma adicional. Este padrão restritivo não é encontrado em nenhum outro país, notadamente daqueles desenvolvidos101. O mercado de seguros nacional precisa revisitar também esta prática impró-pria, remodelando-a.

Para concluir este texto, a reprodução dos conceitos apresentados pelo médico Brandimiller, cuja obra-título102 contribuiu de maneira extremamente

101 No exterior, no tocante à cobertura para a parcela referente as “despesas com a defesa do segurado”, de concessão automática no contexto das apólices RC, fica aberto apenas o fato de a garantia estar contida no limite de indenização da apólice (including defense costs) ou se será estipulado limite isolado, de livre negociação entre as partes contratantes. No Brasil, anterior à divulgação da Circular Susep-437/2012, a referida parcela de cobertura sempre esteve presente nos contratos de seguros RCG, automaticamente e considerada como parte integrante da importância segurada da apólice. De lege ferenda, o PL da Câmara nº 29/2017, prevê no seu artigo 103, § 2º, o seguinte: “serão garantidos os gastos com a defesa do segu-rado contra a imputação de responsabilidade, mediante a fixação de valor específico e diversos daquele destinado à indenização dos prejudicados”. Leia mais: Despesas de Defesa do Segurado: procedimentos sobre a abrangência de cobertura. 08.05.2018. >> www.editoraroncarati.com.br – Colunistas – Walter A. Polido. Último acesso em 13.03.2020.

102 BRANDIMILLER, Primo Alfredo. Conceitos Médico-Legais para a Indenização do Dano Corporal. Responsabilidade Civil. Seguro de Acidentes do Trabalho. Seguros Privados de Pessoas. São Paulo: Thom-son Reuters Brasil, 2018.

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profissional para o aperfeiçoamento das bases contratuais dos diferentes ramos de seguros que envolvem coberturas de danos a pessoas. Todo o livro merece a leitura acurada e atenciosa, por parte dos técnicos de seguros, sendo que para exemplificar a discussão apresentada neste texto, foram seleciona-dos alguns poucos conceitos, entre os muitos existentes na obra:

“O dano corporal pode causar:

• prejuízo funcional incapacitante103 (incapacidade temporária/permanente),

que inclui a incapacidade para as atividades básicas da vida diária, a incapa-

cidade para o trabalho e incapacidades para outras atividades do indivíduo;

• prejuízo funcional não incapacitante104;

• Despesas decorrentes direta ou indiretamente de tratamentos, inclusive

transporte, reabilitação, próteses, apoio técnico, cuidados em domicílio; ou

da necessidade de assistência de outra pessoa; temporária ou permanente;

• morte;

• dano estético;

• sofrimento psíquico/moral, transtornos psíquicos e constrangimentos cau-

sados ao indivíduo e seus familiares”105.

103 “Prejuízo funcional incapacitante: é o que acarreta comprometimento da interação do indivíduo com o seu ambiente físico e social, impedindo ou dificultando a realização de atividades”. Idem, p.53.

104 “a remoção ou perda funcional de um dos rins (nefrectomia), estando o outro são; a remoção de seg-mento do intestino grosso (colecistectomia parcial); a perda do baço (esplenectomia) em razão de trau-matismo abdominal; a remoção cirúrgica do útero (histerectomia), por exemplo, a imposta pela evolução de cesárea com atonia uterina. Nessas quatro hipóteses, a supressão desses órgãos, ou parte deles, ine-vitavelmente tem consequências fisiológicas desfavoráveis, que se manifestam a médio ou longo prazo. (...) Em outros termos, habitualmente não acarretam deficiência nem incapacidade de imediato. Assim, a ocorrência ou não de limitação da funcionalidade permite classificar o prejuízo funcional como inca-pacitante ou não incapacitante”. Idem, p.52-53.

105 Idem, p.40.

Este texto pode ser concluído com a afirmação de que é necessário inovar no mercado de seguros brasileiro. As bases conceituais dos seguros de respon-sabilidade civil não se sustentam mais e devido à obsolescência das estruturas jurídicas e técnicas dentro das quais elas foram construídas e ainda repousam, desde o século passado e sob o pensamento axiológico do século XIX. Não são mais adequadas no século XXI. Não era de fácil construção e quantificação o “preço da dor e do sofrimento” no passado recente, assim como valorar as incapacidades da vítima para muito além da sua função laborativa. Em prin-cípio, apenas um magistrado poderia entrar nessa seara, arbitrando. Acompa-nhar o dano estético, até a sua comprovada materialização duradoura, também podia ensejar o afastamento liminar da possibilidade de cobertura por parte das Seguradoras, sempre muito ciosas com a simplificação operacional dos seus departamentos de análise de sinistros, com a celeridade das posições e, principalmente, com a redução dos custos. A mensuração, então, daquilo que podia compreender de fato o prejuízo “ao projeto de vida da pessoa”, sequer passou um dia pelo pensamento do analista de sinistro e em razão mesmo dos procedimentos administrativos preestabelecidos pelas Seguradoras, de índole bastante reducionista. Nem mesmo os segurados questionavam essa possibi-lidade e tampouco os seus intermediários, profissionais comissionados para lhes oferecer o melhor atendimento especializado possível, os Corretores de Seguros. Neste campo dos chamados novos danos e(ou) novos direitos, muita mudança comportamental ainda será requerida, apesar de já se encontrar em marcha, em que pese o descrédito proveniente daquelas mentes apegadas ao passado. A sociedade consumidora se renova, a cada dia. Os jovens são muito mais informados sobre os “modismos” e o cotidiano deles é invadido pela internet, não só para adquirir bens e serviços, mas também para buscar por atendimento quando não são atendidos da forma como tiveram a expec-tativa de ser. Os contratos de seguros não estão à margem dessa realidade.

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Os novos direitos tampouco. A dignidade da pessoa, ou qualquer outra desig-nação que venha a ser dada pelos jovens para este princípio fundamental, é fonte inconteste de direitos e deveres. A sociedade pós-moderna tem atomi-zado este princípio nas relações, até mesmo como fator de sobrevivência glo-bal. O mercado de seguros nacional deve realizar a sua transposição para o século XXI. Neste sentido, as ferramentas de subscrição e as bases contra-tuais devem ser revisitadas e reformuladas: as Seguradoras devem estabelecer procedimentos que determinem se ocorreu concretamente o dano pessoal e qual a quantia a ser indenizada. Neste cenário, a personalização do Direito de Danos visa priorizar a tutela da pessoa e não mais e tão somente o seu patrimônio. Os novos danos personificam essa realidade.

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WALTER A. POLIDO

Mestre em Direitos Difusos e Coletivos pela Pontifícia Universidade Católica – PUCSão Paulo (2008). Professor--convidado de diversos centros universitários: Cogeae-PUC-SP; GVLaw-Rio e São Paulo; Faculdade de Direito da USP; UFRJ; UFRS; Escola Nacional de Seguros, Escola Superior da Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil – ESA-OAB-SP; Universidade Positivo – PR; Escola da Magistratura em SP com IBDS; FESMP – Fundação Supe-rior do Ministério Público de Porto Alegre; Centro de Estudos Jurídicos da Procuradoria do Rio de Janeiro]; Profes-sor-Emérito da Escola Superior da Magistratura Federal da 1ª Região (2018- 2020). Foi Coordenador acadêmico do MBA Gestão Jurídica do Seguro e Resseguro da Escola Nacional de Seguros (sete turmas, desde a primeira em São Paulo – 2012-2019, uma em Goiânia-GO e uma em Porto Alegre – RS). Membro do Conselho Diretor e Diretor de Atividades Docentes do IBDS – Instituto Brasileiro de Direito do Seguro. Fundador e ex-presidente do Grupo Nacional de Trabalho em Meio Ambiente da AIDA – Associação Internacional de Direito do Seguro. Árbitro ins-crito na Câmara de Mediação, Conciliação e Arbitragem CIESP/FIESP, no Centro Latinoamericano de Mediación y Arbitraje del Seguro y del Reaseguro – AIDA – ARIAS LatinoAmérica, Chile, na Câmara de Mediação e Arbi-tragem Especializada – CAMES, na Câmara de Arbitragem e Mediação do Oeste da Bahia – CAMOB e na Câmara de Mediação e Arbitragem Empresarial – CAMARB – Atuação como árbitro em seguros e resseguros em diversas outras Câmaras: BrasilCanadá, FGV-Rio, Amcham. Foi o mentor e Coordenador Acadêmico dos Cursos de Exten-são em Resseguro Avançado; de Fundamentos dos Seguros de Responsabilidade Civil, Riscos Profissionais e Riscos Ambientais; Riscos e Seguros Cibernéticos; Seguros de Financial Lines da Escola Nacional de Seguros (São Paulo e demais Estados do Sul). Ex-Superintendente de Operações Nacionais e Membro do Conselho Técnico do IRB-Bra-sil Re (1975-1998). Ex-Diretor Técnico e Jurídico da Munich Re do Brasil Resseguradora S.A (1998-2008). Autor de livros de seguros e resseguro [www.polidoconsultoria.com.br]; Consultor da Polido e Carvalho Consultoria em Seguros e Resseguros Ltda. (desde 2008); Diretor Técnico-jurídico da Associação Brasileira de Gerência de Riscos – ABGR; Sócio da Conhecer Seguros [www.unisincor.com.br]; Cocoordenador Acadêmico do Curso de Especiali-zação em Direito do Seguro e Resseguro, da ESA-OAB-SP; Membro titular do Instituto Brasileiro de Estudos de Responsabilidade Civil – IBERC; Parecerista. http://lattes.cnpq.br/1585404610846349.

ISBN: 978-65-990268-1-2

9 786599 026812