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Taxa de Formação de Empresas no Rio Grande do Sul: Deslocamentos espaciais e relação com o crescimento econômico Mario Duarte Canever 1 , Gabrielito Menezes 2 e Volnei Krause Kohls 3 1 Prof. Adjunto. Departamento de Ciências Sociais Agrárias, Universidade Federal de Pelotas UFPel, [email protected] 2 Doutorando Economia PPGE / UFRGS, [email protected] 3 Prof. Associado. Departamento de Ciências Sociais Agrárias, Universidade Federal de Pelotas UFPel, [email protected] Área Temática 4 Desenvolvimento Econômico Resumo O propósito deste artigo é identificar regimes espaciais ou clusters de taxas de formação de empresas e a relação destes com o crescimento econômico. Para tanto, desenvolvemos um método de estimação da taxa de formação de empresas, baseado em micro dados para os 496 municípios do estado do Rio Grande do Sul. Os resultados sugerem a presença de clusters da taxa de formação de empresas para os anos atuais, diferentemente do que ocorria em meados da década passada. Isto indica que o aspecto locacional ganhou importância para a formação de novas empresas. Observa-se que regiões tradicionalmente tidas como economicamente menos dinâmicas, atualmente apresentam maiores índices de empreendedorismo, levando a uma redução das disparidades empresariais no estado. Ademais, os resultados mostram que também nos países em desenvolvimento a formação de novas empresas tem efeitos positivos no crescimento econômico. Os efeitos são retardados, positivos e significativos para as áreas mais desenvolvidas e com menor taxa de formação de novas empresas. Em contraste, a relação é não significativa para regiões menos desenvolvidas e com altas taxas de formação de novas empresas, o que indica que o empreendedorismo destas regiões é predominantemente por necessidade. Tais resultados são interessantes, dado a escassez de estudos focados nesta relação nos países em desenvolvimento. Palavras-chaves: Crescimento econômico, Taxa de Formação de Empresas, Empreendedorismo, Rio Grande do Sul. Abstract The purpose of this paper is to identify spatial regimes or clusters of new firm formation and their relationship with economic growth. With this purpose in mind, a method for estimating the rate of new firm formation was developed based on micro data for 496 municipalities in the state of Rio Grande do Sul. The results suggest the presence of clusters of new firm formation in recent years, unlike what occurred in the middle of last decade. This indicates that the locational aspect is gaining importance for the formation of new businesses. Convergence was observed in the rate of new firm formation, reducing the disparity among regions as to the number of incumbent firms. Furthermore, our results show that even in developing country regions the formation of new firms has significantly positive effects on economic growth. The effects are lagged, positive and significant for more developed regions with lower new firm formation rate. In contrast, there is no significant effect for less developed regions with higher new firm formation rate. This is interesting as little studies have focused on this relation in developing countries context. Key words: Economic growth, rate of new firm formation, entrepreneurship, Rio Grande do Sul.

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Taxa de Formação de Empresas no Rio Grande do Sul: Deslocamentos espaciais e relação com o crescimento econômico

Mario Duarte Canever1, Gabrielito Menezes

2 e Volnei Krause Kohls

3

1Prof. Adjunto. Departamento de Ciências Sociais Agrárias, Universidade Federal de Pelotas – UFPel,

[email protected] 2Doutorando Economia – PPGE / UFRGS, [email protected]

3Prof. Associado. Departamento de Ciências Sociais Agrárias, Universidade Federal de Pelotas – UFPel,

[email protected]

Área Temática 4 – Desenvolvimento Econômico

Resumo

O propósito deste artigo é identificar regimes espaciais ou clusters de taxas de formação de

empresas e a relação destes com o crescimento econômico. Para tanto, desenvolvemos um

método de estimação da taxa de formação de empresas, baseado em micro dados para os 496

municípios do estado do Rio Grande do Sul. Os resultados sugerem a presença de clusters da

taxa de formação de empresas para os anos atuais, diferentemente do que ocorria em meados

da década passada. Isto indica que o aspecto locacional ganhou importância para a formação

de novas empresas. Observa-se que regiões tradicionalmente tidas como economicamente

menos dinâmicas, atualmente apresentam maiores índices de empreendedorismo, levando a

uma redução das disparidades empresariais no estado. Ademais, os resultados mostram que

também nos países em desenvolvimento a formação de novas empresas tem efeitos positivos

no crescimento econômico. Os efeitos são retardados, positivos e significativos para as áreas

mais desenvolvidas e com menor taxa de formação de novas empresas. Em contraste, a

relação é não significativa para regiões menos desenvolvidas e com altas taxas de formação

de novas empresas, o que indica que o empreendedorismo destas regiões é

predominantemente por necessidade. Tais resultados são interessantes, dado a escassez de

estudos focados nesta relação nos países em desenvolvimento.

Palavras-chaves: Crescimento econômico, Taxa de Formação de Empresas,

Empreendedorismo, Rio Grande do Sul.

Abstract

The purpose of this paper is to identify spatial regimes or clusters of new firm formation and

their relationship with economic growth. With this purpose in mind, a method for estimating

the rate of new firm formation was developed based on micro data for 496 municipalities in

the state of Rio Grande do Sul. The results suggest the presence of clusters of new firm

formation in recent years, unlike what occurred in the middle of last decade. This indicates

that the locational aspect is gaining importance for the formation of new businesses.

Convergence was observed in the rate of new firm formation, reducing the disparity among

regions as to the number of incumbent firms. Furthermore, our results show that even in

developing country regions the formation of new firms has significantly positive effects on

economic growth. The effects are lagged, positive and significant for more developed regions

with lower new firm formation rate. In contrast, there is no significant effect for less

developed regions with higher new firm formation rate. This is interesting as little studies

have focused on this relation in developing countries context.

Key words: Economic growth, rate of new firm formation, entrepreneurship, Rio Grande do

Sul.

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1. Introdução

Empreendedorismo e desenvolvimento regional são fenômenos muito visíveis

atualmente, tanto entre os formuladores de políticas públicas quanto entre pesquisadores. O

empreendedorismo vem sendo estudado pelo fato de trazer benefícios para o desempenho da

economia e seu crescimento. É reconhecido que os novos entrantes (empreendedores)

estimulam a competitividade, e podem gerar e disseminar novas ideias, influenciando assim

no desenvolvimento das nações (Bruno et al., 2008). Um novo negócio, ou seja, a formação

de uma nova empresa é uma expressão importante da atividade empreendedora, a qual é tanto

dependente da dinâmica regional quanto influenciadora da mesma (Johnson, 2004).

Wennekers e Thurik (1999) relatam o impacto positivo do empreendedorismo no crescimento

do produto interno bruto (PIB) regional e na redução do desemprego. Em vista disto, fica

evidenciada a clara relação entre empreendedorismo e desenvolvimento regional.

Se por um lado esta relação é muito explorada na literatura, estudos que objetivam

compreender as variações espaciais na taxa de formação de empresas dentro de um país e suas

relações com o crescimento econômico regional ainda carecem de maiores esclarecimentos.

As variações na formação de empresas entre países são constantemente demonstradas nos

estudos do Global Entrepreneurship Monitor (GEM, 2007), os quais mostram uma ampla

concentração de empreendedores nos países em desenvolvimento, especialmente

impulsionados pela necessidade e não pela oportunidade de iniciarem um novo negócio. Já

dentro de cada país, a variação espacial também é considerável e, conforme Rocha e

Sternberg (2005) estas variações são dependentes das interações culturais, econômicas e

individuais, que convergem para criar um ambiente que facilita ou inibe o empreendedorismo.

O empreendedorismo é entendido como um fenômeno essencialmente regional ou local,

o que explica as altas variações encontradas dentro de um território nacional. Por exemplo,

nos Estados Unidos, Reynolds et al. (1994), encontraram que a razão da maior para a menor

taxa de formação de empresas entre as regiões foi de 4,1. Nesta mesma perspectiva Johnson

(2004), calculando a taxa de formação de novas empresas nas distintas regiões da Grã-

Bretanha, encontrou que a região de Londres apresenta a maior taxa, enquanto a menor taxa

está na Irlanda do Norte. Posteriormente, Ashcroft et al. (2007), também usando dados

municipais do Reino Unido, encontraram que a taxa de formação de novas empresas varia

com o tempo e espacialmente. De acordo com esses autores, a variação temporal na taxa de

formação de novas empresas reflete as alterações macroeconômicas do país. Já a variação

espacial da taxa de formação, segundo os mesmos autores, está mais associada às condições

de fatores microeconômicos de cada região.

Embora em nível internacional haja relativamente muitos estudos que relacionam a

formação de empresas com a questão espacial e com o desenvolvimento regional (Reynolds et

al.,1994; Johnson, 2004; Van Stel, 2005; Ashcroft et al., 2007), no caso brasileiro esta

temática necessita ser mais explorada. Recentes exceções são os estudos de Barros e Pereira

(2008) e Canever et al. (2010). Os primeiros, em um estudo embrionário no país, analisaram a

influência da atividade empreendedora no PIB e no desemprego para os municípios de Minas

Gerais, e encontraram que uma maior taxa de empreendedorismo leva a uma redução do

desemprego, mas não necessariamente um melhor desempenho econômico medido pelo

crescimento do PIB local. Contrariamente, Canever et al. (2010) estudando os aspectos que

antecedem a taxa de formação de empresas no Rio Grande do Sul (RS), bem como as

consequências que essa tem no desempenho municipal, encontraram relações positivas entre a

atividade empreendedora e o nível do PIB per capita em anos subsequentes. Uma

característica comum destes dois trabalhos, que limita a validade dos resultados, é a medida

da atividade empreendedora utilizada. O primeiro mede a taxa de empreendedorismo, através

da proporção de trabalhadores por conta própria, enquanto que o segundo utiliza a diferença

entre anos subsequentes do estoque per capita de empresas em relação à população adulta de

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um município como proxy da atividade empreendedora. Embora tais medidas possam estar

relacionadas com a formação de empresas, elas são indicadores da proporção de empresários

no total da população e do crescimento da estrutura empresarial, mas não da criação de novas

empresas.

No presente artigo contribui-se para a agenda de pesquisa em empreendedorismo,

desenvolvendo uma definição conceitual e operacional da taxa de formação de novas

empresas, a partir dos dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS),

disponibilizados pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Definindo o

empreendedorismo como a criação de novas organizações procuramos, neste artigo, estimar a

taxa de formação de novas empresas, além de objetivarmos responder quatro perguntas de

pesquisa: (1) se existem regimes espaciais ou clusters de taxas de formação de empresas nos

municípios do RS; (2) se há modificação intertemporal dos clusters na taxa de formação de

empresas entre 1996 e 2008 nesse mesmo estado; (3) se existe convergência na taxa de

formação de empresas no estado; (4) e se a taxa de formação de novas empresas tem

repercussão no crescimento econômico dos municípios.

A partir desses objetivos, apresenta-se uma revisão de literatura que discorre sobre o

empreendedorismo e suas relações com o crescimento econômico. Na seção seguinte, os

dados e os procedimentos metodológicos são expostos. Consecutivamente, os resultados são

descritos e discutidos, para finalmente, apresentarmos as considerações finais.

2. Referencial teórico

O papel do empreendedorismo nas sociedades tem mudado drasticamente na última

metade do século XX. Depois da segunda guerra mundial, a importância do

empreendedorismo e da formação de novas empresas perdeu força. Enquanto existia a

sensação que as empresas novas e a formação dessas precisavam ser preservadas e protegidas

por razões sociais e econômicas, poucos salientavam isso sob a perspectiva da eficiência

econômica, gerada pela formação de novas empresas. As empresas novas, geralmente

pequenas, eram vistas basicamente como um luxo e não raramente somente para assegurar

certo nível de descentralização das decisões econômicas, mas ao custo da diminuição da

eficiência das economias nacionais (Carree e Thurik, 2006). A visão era de que as novas e

pequenas empresas eram menos capazes de gerarem empregos e retorno do trabalho, menos

engajadas e capacitadas a exportarem e menos envolvidas em atividades inovadoras

(Audretsch e Keilbach, 2004). Embora, no Brasil, haja poucas evidências deste preconceito

em relação às novas e pequenas empresas, não parece coincidente a ênfase dada ao papel da

grande multinacional no processo de modernização industrial em meados do último século.

Entretanto esta perspectiva tem-se revertido nos últimos anos. A formação de novas

empresas agora é vista como instrumental para o crescimento econômico (Van Stel et al.,

2005), além de ter papel relevante na geração de empregos (Wennekers e Thurik, 1999). Por

exemplo, segundo os autores supracitados a atividade econômica européia moveu-se das

grandes para as pequenas empresas entre os anos 80 e 90 do último século. As grandes

empresas, em 1980, empregavam cerca de 20% dos trabalhadores, enquanto que, alguns anos

depois, em 1990, as grandes companhias possuíam apenas 8,5% dos empregados. Já

Audretsch e Thurik (1999), mostram que os países da Organização para a Cooperação e

Desenvolvimento Econômico (OCDE), tiveram mais emprego com o aumento da formação de

empresas no período de 1984 e 1994. Também no Brasil o papel da formação de empresas,

especialmente das pequenas e médias (PMEs), tem sido destacado, tanto que o orçamento do

Serviço Brasileiro de Apoio as Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), principal sistema de

suporte a esta categoria de empresas, tem crescido significativamente nos últimos anos. As

pequenas e médias empresas (menores que 250 empregados), na maioria dos estados,

respondem por mais de 50% do total de empregos, e em alguns esta cifra chega próximo de

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100% das oportunidades de trabalho, como aqueles estados da região norte do país (Cravo, et

al., 2010).

Wennekers e Thurik (1999) observaram que nos últimos anos, a atenção para o

empreendedorismo foi renovada em função do papel que ele exerce no desenvolvimento

econômico. Teece (2005) afirma que o estoque de conhecimentos úteis e a extensão de suas

aplicações constituem a essência do crescimento econômico moderno e estes se dão,

essencialmente, através das empresas. Neste sentido, Audretsch et al.(2006) testaram a

hipótese de que níveis mais altos de crescimento econômico devem resultar em maior

atividade empreendedora, uma vez que o empreendedorismo serve como mecanismo

facilitador do transbordamento e comercialização do conhecimento. A hipótese recebeu apoio

empírico em teste aplicado no universo de 327 condados da Alemanha. Muitos economistas e

políticos, então, têm agora, a percepção de que há um impacto positivo do empreendedorismo

no crescimento do PIB e do emprego. Esse interesse “restaurado”, de políticos e economistas,

coincide com o renascimento das altas taxas de empreendedorismo em muitos países, tanto

daqueles com alto padrão de desenvolvimento quanto dos emergentes (Van Stel, 2005).

Existem evidências, no entanto, que o impacto do empreendedorismo no crescimento

econômico não é o mesmo em países com diferentes estágios de desenvolvimento econômico.

Por exemplo, Van Stel et al., (2005), encontraram que uma alta taxa de formação de empresas

nos países de renda per capita alta está associada a crescimentos positivos do PIB per capita.

Já para os países pobres, eles encontraram uma relação negativa. Para estes autores, o efeito

da formação de empresas no crescimento não é trivial e pode ser entendido dentro de uma

perspectiva schumpeteriana.

Para Schumpeter (1934), o problema teórico do desenvolvimento econômico reside nas

mudanças ocorridas dentro da própria economia, as quais são destruidoras das situações

anteriores ou preexistentes de equilíbrio. Nesta obra, Schumpeter chama de empreendimento a

realização de “combinações novas” e de empresário, aquele cuja função é realizá-las. Desta

forma, o “empreendedor inovador” é quem desafia as firmas existentes, através da introdução

de invenções e/ou combinações produtivas, as quais fazem as tecnologias e produtos correntes

obsoletos. Nesta perspectiva, a condição de empresário está intrinsecamente vinculada à

função inovadora, ou seja, quando está introduzindo e/ou consolidando novos produtos e/ou

novas formas de produzir e comercializar. Este processo de “destruição criadora” é a principal

característica do empreendedor schumpeteriano, o qual ocorre com maior frequência em

regiões/países mais desenvolvidos, onde parcela considerável das empresas formadas tem

potencial de gerarem um substancial valor adicionado para a economia, ou seja, o

empreendedorismo por oportunidade. Mais tarde, Schumpeter (1942) dirige o foco às grandes

empresas, as quais, pela sua estrutura e grande poder de mercado, teriam maiores condições

de promover inovações através dos elevados investimentos em P&D.

Entretanto, em países ou regiões pobres, uma maior atividade empreendedora pode ser

resultado de elevado desemprego estrutural, o qual levaria ao empreendedorismo por

necessidade. Ou seja, nestas regiões há alta propensão das pessoas buscarem oportunidades de

negócios por conta-própria, como alternativa para a escassez de emprego, e não uma atividade

empreendedora associada à inovação, característica do empreendedor schumpeteriano.

Segundo dados do GEM (2007), a proporção dos empreendedores por necessidade no total de

empreendedores brasileiros foi de 50% no período de 2001 a 2004. Assim, altas taxas de

formação de empresas pode não levar, necessariamente, a melhor desempenho econômico.

Portanto, a lição que estes autores nos trazem é de que a relação “taxa de formação de

empresas” e “crescimento econômico” precisam ser considerados sob a perspectiva dos

diferentes estágios de desenvolvimento em que se encontram os países.

Enquanto é relativamente fácil, perceber que a criação de uma nova empresa para

explorar uma oportunidade de mercado tem potencial de gerar desenvolvimento é também

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visível que o empreendedorismo decorrente da necessidade – ou seja, aquele que surge pela

ausência de outras oportunidades satisfatórias de trabalho – não leva ao desenvolvimento.

Tanto um tipo de empreendedorismo (o de oportunidade), quanto outro (o de necessidade) se

fazem presentes em uma determinada região, contudo observa-se que naquelas menos

desenvolvidas, as altas taxas de formação de novas empresas ocorrem, fundamentalmente, por

necessidade (Acs e Audretsch, 2003; Van Stel et al, 2005). Assim, para estes autores, deve-se

ter cuidado ao comparar países com diferentes estágios de desenvolvimento econômico. Por

exemplo, segundo eles, altas taxas de formação de empresas em países em desenvolvimento,

não necessariamente levam ao fortalecimento econômico regional, pois uma proporção menor

delas se transformarão em organizações com substancial capacidade de geração de valor

adicionado, quando comparadas com empresas formadas nos países mais desenvolvidos.

Consequentemente, o argumento principal destes autores é o de que o impacto do

empreendedorismo no crescimento econômico varia de acordo com os diferentes estágios de

desenvolvimento do país. Muito embora existam evidências empíricas da relação negativa

entre a atividade empreendedora e as taxas de crescimento econômico para países e regiões

menos desenvolvidas, tanto em nível internacional (ver por exemplo, Van Stel et al., 2005;

Audretsch et al., 2006), quanto nacional (Barros e Pereira, 2008), Em termos gerais, a

hipótese de que níveis mais altos de crescimento econômico possam resultar de maior

atividade empreendedora não deve ser desprezada, pois os estudos realizados ainda são

restritos e, muitas vezes, têm limitações metodológicas que não permitem conclusões

definitivas.

A ideia é a de que em áreas de transição, como é o caso de algumas regiões do Rio

Grande do Sul (PIB per capita em 2009 US$ 10.000), que estejam tendo expansão

econômica, possam também estar experimentando uma maior atividade empreendedora. Estas

regiões, por apresentarem crescimento da demanda, atraem empreendedores ávidos por

ganhos econômicos que, por conseguinte, acarretam aumentos de produtividade, tanto pelas

inovações que eventualmente introduzem, quanto pela pressão sofrida pelas empresas

incumbentes para melhorarem, dadas à intensificação da concorrência (Acs e Armington,

2004). Assim, mesmo que regiões não estejam na fronteira do desenvolvimento tecnológico, o

papel do empreendedorismo no crescimento econômico pode ser positivo. É possível que os

efeitos positivos, nestas regiões, sejam menores dos que os observados nas regiões mais

próximas da fronteira tecnológica, contudo esta hipótese ainda necessita ser testada.

3. Dados e procedimentos metodológicos

3.1 Dados

Para a realização deste trabalho foi utilizada uma base de dados da Relação Anual de

Informações Sociais (RAIS), disponibilizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE),

que contempla os 496 municípios do RS, para o período de 1995 a 2008. Para que a base de

dados pudesse ser utilizada para o cálculo da taxa de formação de empresas, considerou-se o

nascimento (abertura) de uma empresa, a presença dela pela primeira vez na base de dados.

Assim, uma empresa que não declarava a RAIS em t-1, e passou a declarar em t, é tida como

uma empresa que nasceu em t, pois foi o primeiro ano em que ela aparece na base de dados.

Em se tratando de morte de empresas, considerou-se que uma firma que declarava a RAIS em

t vai ser considerada fechada no primeiro ano que esta aparecer sem dados.

Foram consideradas apenas as empresas que constavam na base de dados para anos

consecutivos, ou seja, não foram levados em consideração estabelecimentos que, na base de

dados, surgem em um determinado ano, desaparecem no próximo ano e voltam a ressurgir no

ano subsequente. Também foram filtradas aquelas que nascem em um determinado ano,

desaparecem por um tempo maior (t+2, por exemplo) e tornam a reaparecer em períodos

subsequentes. A hipótese é a mesma formulada por Souza et al. (2007):

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A hipótese levantada é a de que são estabelecimentos que não declararam a RAIS num período

e voltaram a declarar posteriormente. Contudo, como se está trabalhando as medidas a cada par

de anos, esses estabelecimentos poderiam ser tratados como tendo fechado num período e

reaberto no outro, o que não parece coerente com a ideia de nascimento (entrada na base) e

morte (saída da base) de estabelecimentos (Souza et al.,2007, p. 30).

Da mesma forma como os autores citados, optou-se por excluir os estabelecimentos

com falhas no fornecimento dos dados. Tal procedimento justifica-se para limpar a base de

dados para os cálculos das taxas de formação que, em contrário, ficariam sujeitas a vieses. De

fato, acredita-se que estas empresas, mesmo não fornecendo os dados, ainda permanecem

ativas. Com as exclusões, a população de empresas reduziu-se em cerca de 1% ao ano, fato

que não compromete a validade dos resultados em face da amostra perfazer, a cada ano, mais

de 100 mil empresas.

3.2. Taxa de formação de empresas

A taxa de formação de empresas pode ser medida de duas maneiras. A primeira é a

Taxa Ecológica (TE) de formação de empresas. Para o cálculo da TE, a partir dos dados da

RAIS, foi necessário adaptar a metodologia proposta por Johnson (2004). A Taxa ecológica

de formação de empresas (Eq. 1) expressa a relação de novos registros de empresas

(nascimento de empresas) com o estoque de empresas no ano anterior ao do registro. Ela tanto

pode ser calculada para todos os setores, como para setores específicos da economia regional.

100º

º

1t

t

TotalEmpresasN

CriadasEmpresasNTE (1)

A TE é importante para analisar a extensão com que a base empresarial está se

rejuvenescendo. Esse indicador é normalmente expresso em relação a 100 empresas já

existentes, e t representa um determinado ano.

Conforme Kangasharju (2000), a abordagem ecológica relaciona o fluxo de formação

de empresa a um estoque existente. A mesma é baseada na visão de que as novas empresas

prolongam-se das já existentes, ou seja, as empresas existentes agem como incubadoras de

empresas novas, além de promoverem um processo de aprendizagem para os novos

empresários.

O segundo método para medir a taxa de formação de empresas utiliza a população (ou

força de trabalho), como denominador (Armington e Acs, 2002). A taxa de formação relativa

à força de trabalho (TFT), ou como é conhecida em inglês Labour Market Approach, é

importante para analisar o quão empreendedora é uma população local. Neste artigo utilizou-

se como denominador o número total de empregados declarados na RAIS por cada empresa

anualmente. A TFT na região r agregada para todos os setores é apresentada na equação

abaixo:

1000º

º

t

t

EmpregadosdeTotalN

CriadasEmpresasNTFT (2)

A taxa de formação de empresas, apresentada na equação (2), utiliza a força de trabalho

ocupada em um determinado município. Esse indicador é expresso em relação a 1000

empregados, portanto um TFT= 10 denota que foram criadas dez novas empresas para cada

mil trabalhadores na região.

Em um sentido teórico, a abordagem da força de trabalho é considerada atraente, pois é

baseada na teoria da escolha empresarial proposto por Evans e Jovanovic apud Kangasharju

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(2000). Esta abordagem assume implicitamente que os empresários começam uma nova

empresa no mercado de trabalho, onde os mesmos estão acostumados a trabalhar ou procurar

por trabalho. Este enfoque, segundo Audretsch e Fritsch apud Kangasharju (2000), implica

também que o novo empresário adquiriu alguma experiência quando empregado.

Conforme estudos anteriores (Johnson, 2004; Audretsch e Fritsch, 1994), as duas

formas de mensurar a taxa de formação de empresas, embora tendo significados distintos, são

altamente correlacionadas.

3.3. Procedimentos analíticos

A análise exploratória de dados espaciais (AEDE), conhecida em inglês como

Exploratory Spatial Data Analysis (ESDA), foi usada para identificar se existe correlação

espacial e padrões distintos de formação de empresas no RS que configurem a emergência de

clusters. Esta técnica considera a auto-correlação e a heterogeneidade espacial, para descrever

o padrão espacial da distribuição dos dados (Almeida et al., 2005).

A dependência espacial ocorre em todas as direções, no entanto, se relaciona

inversamente com a distância geográfica. Logo, a heterogeneidade espacial diz respeito às

próprias características das unidades espaciais, que naturalmente diferem entre si. Foram

calculados os índices globais e locais de auto-correlação espacial, tais como o I de Moran,

Moran Scatterplot e Local Indicatorof Spatial Association (LISA) mediante a construção de

matrizes de pesos espaciais, via o padrão Rainha, com grau de vizinhança igual a um. São

consideradas vizinhas todas as unidades que compartilham qualquer tipo de fronteira com a

unidade analisada (Monasterio e Ávila, 2004; Oliveira, 2008).

Para descrever a existência de convergência na formação de empresas no RS, utilizamos

o método de convergência absoluta (ver Baumol, 1986; Barro e Sala-I-Martin, 1995 para

detalhes). A hipótese é tradicionalmente testada na literatura por meio de uma regressão do

tipo cross-section com dados de renda para países ou regiões, utilizando-se como variável

dependente a taxa de crescimento da renda per capita para o período de análise e o nível da

renda per capita inicial como variável explicativa. Para o nosso caso a variável de interesse é

a taxa de formação de empresas, como expressa a equação 3.

tii

i

tiTX

TX

TX

T,0,

0,

,lnln

1

(3)

Onde, tiTX , e 0,iTX representam, respectivamente, as taxas de formação de empresas

para o período final e inicial. T representa o número de anos entre o período inicial e final da

amostra, enquanto ti , é o erro aleatório. Para que ocorra â convergência absoluta, o

coeficiente estimado dessa regressão deve ser negativo, ou seja, deve-se encontrar uma

relação negativa entre o nível inicial de formação de empresas e sua taxa de crescimento. Um

coeficiente negativo e estatisticamente significante, portanto, indica uma redução da

disparidade empresarial no estado.

Por fim, para a realização do teste empírico da taxa de formação de empresas no

crescimento econômico testou-se o seguinte modelo:

titititititi TXTMFDENPIBPCPIBcPIB ,,,,,, (4)

Onde i representa o município e PIB a variação do Produto Interno Bruto (PIB)

municipal. Como os dados do PIB municipal não estão disponíveis para todos os anos da

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nossa série, o que inviabiliza a utilização de metodologia de dados em painel, optamos por

testar o modelo acima com dados crosssection para alguns anos. O modelo expressa, portanto,

se a taxa de formação de empresas, tiTX , em 2005, impacta o crescimento médio do PIB

municipal entre 2005 e 2007. As variáveis de controle tiPIB , e tiPIBPC , representam o

produto interno bruto e o produto interno bruto per capita para o ano de 20011, enquanto

DENit representa a densidade populacional e TMFit o tamanho médio das empresas em cada

município.

4. Resultados e discussão

A seguir são apresentados os gráficos I de Moran (Fig. 3) para os municípios gaúchos

em 1996 e 2008, primeiro e último ano da série em que é possível de se estimar a taxa de

formação de empresas. Neles, evidenciamos a correlação espacial da taxa de formação de

empresas pelos dois métodos de cálculos apresentados na seção anterior. Os dados referem-se

à taxa de formação de empresas anual dos municípios e a média dessa variável nos

municípios vizinhos.

Apesar do Indicador I de Moran não permitir analisar onde estão localizados os clusters

espaciais, o resultado obtido mostra a magnitude da associação espacial. Quanto mais

próximo de 1 (um) for o valor de I de Moran, mais intensa é a associação espacial observada.

Na Fig. 3, os gráficos mostram que a relação espacial foi positiva, e estatisticamente

significativa para 1996 e 2008. Desse modo, cidades com semelhantes taxas de formação de

empresas tendem a estar espacialmente associadas nos cortes temporais. Cabe ressaltar que a

magnitude da relação espacial aumenta entre 1996 e 2008 para os dois métodos de análise,

demonstrando que houve um aumento da importância da dimensão espacial em relação à taxa

de formação de empresas nos municípios gaúchos. Assim, em 2008, os municípios com

maiores taxas de formação de empresas (tanto a TE quanto a TFT) tendem a estar

espacialmente próximos de municípios igualmente com maiores taxas do que a média

estadual. Da mesma forma, municípios com menores taxas tendem a estar espacialmente

associados com municípios cuja taxa de formação de empresas é menor que a média estadual.

1996 2008

Figura 3 – I de Moran para a taxa de formação de empresas, 1996 e 2008.

1 As variáveis tiPIB , e tiPIBPC , capturam o efeito catch-up ocorrido ao longo do período.

TE

TFT

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Fonte: Elaboração dos autores.

O próximo passo foi analisar a associação espacial entre regiões, utilizando mapas de

aglomeração (LISA), identificando as regiões que se destacaram em relação à taxa de

formação de empresas. O mesmo nos fornece uma visão da distribuição espacial das

variáveis. Nos mapas da Fig. 4 estão representados os grupos estatisticamente significativos a

um p-valor = 0,05.

1996 2008

Figura 4 – LISA para as taxas de formação de empresas Ecológica (TE) e Relativa à Força de

Trabalho (TFT) para 1996 e 2008.

Fonte: Elaborado pelos autores.

Conforme os mapas, em 1996, existiam poucas concentrações de clusters espaciais para

o RS. Ou seja, para aquele período, a taxa de formação de empresas, tanto ecológica como

relativa à força de trabalho, praticamente não apresentava dependência espacial e era pouco

concentrada. O que se verificava eram clusters com baixa taxa de formação de empresas

localizados na mesorregião Noroeste Rio-grandense para a taxa ecológica, e na mesorregião

Metropolitana de Porto Alegre para a taxa relativa à força de trabalho. É interessante notar

que o cluster com baixa taxa de formação ecológica em 1996, situava-se em uma região

essencialmente agrícola de base familiar. Já para a taxa relativa à força de trabalho,

curiosamente, apareceu um cluster com baixa formação de empresas exatamente na região

mais rica do estado, a mesorregião Metropolitana de Porto Alegre.

Diferentemente de meados dos anos 90, quando os clusters eram pequenos e pouco

visíveis, em 2008 há pelo menos dois grandes clusters caracterizados pela elevada taxa de

formação de empresas, tanto pelo método ecológico quanto pelo relativo à força de trabalho.

O primeiro está localizado na região da campanha gaúcha, compreendendo uma faixa de

municípios pertencentes às mesorregiões Sudoeste, Centro Ocidental e Nordeste Rio-

grandense e o segundo, menor em extensão, no Norte do Estado, próximo da divisa de Santa

Catarina. Embora a composição destes clusters varie parcialmente, conforme o método de

estimação da taxa de formação de empresas, as suas delimitações são bem definidas e

demonstram que estas áreas geográficas empreendem mais que o restante do estado, tanto em

relação ao estoque de empresas quanto em relação aos indivíduos aptos a empreenderem. Já

no outro extremo estão os municípios que, além de apresentarem menores taxas de formação,

também estão cercados por municípios com baixas taxas de formação. Estes compõem um

TE

TFT

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cluster de municípios localizados em uma área de desenvolvimento mais consolidado do

estado, pertencente às mesorregiões Metropolitana de Porto Alegre e Centro Oriental Rio-

grandense.

Conforme lembrado por Reynolds et al. (1994), Johnson (2004) e Ashcroft et al. (2007),

as variações temporal e espacial na taxa de formação de empresas estão associadas às

variações macro e microeconômicas. Com relação às variáveis macroeconômicas cabe

ressaltar que no período de 1994 a 1998, observa-se um câmbio sobre valorizado e juros

elevados, inibindo assim a formação de empresas. Já para períodos recentes, têm-se uma

conjuntura nacional favorável (juros menores, câmbio, acesso ao crédito, etc.), além de contar

com o crescimento de economias mundiais emergentes incentivando, deste modo, um

ambiente propício à formação de novos negócios.

Além da formação de clusters, há também no estado convergência das taxas de

formação de empresas (Tab. 1). Ou seja, a razão entre o município mais ativo para o menos

ativo, tem apresentado certo decréscimo com o passar dos anos. Isto significa que está

ocorrendo uma diminuição das desigualdades empresariais no RS. Os resultados para TE -

rejuvenescimento da base empresarial - sugerem uma velocidade de convergência de 7,97%

ao ano. Neste ritmo, municípios levariam um pouco mais de 8 anos para percorrerem metade

da distância até o estado estacionário2. Já os resultados para TFT - capacidade empreendedora

da população - evidenciam uma velocidade de convergência menor, quando comparada com a

TE. Neste modelo, o período necessário para que os municípios percorram a metade da

distância até o estado estacionário é de aproximadamente 17 anos. Deste modo, podemos

verificar, com o auxílio dos mapas, uma mudança na dinâmica empresarial do RS. Regiões

consideradas menos dinâmicas, com um PIB per capita médio de R$ 8.821,00 em 2005,

atualmente, concentram os municípios com maior taxa de formação de empresas (cluster AA

na Fig. 4), enquanto que, parte daquelas consideradas mais progressistas, com um PIB per

capita médio de R$ 14.688,00 em 2005, têm menor taxa de formação de empresas (cluster

BB na Fig. 4).

Tabela 1 – Convergência da taxa de formação de empresas no RS

Variáveis Convergência

TE TFT* c 0,276629***

(29,3076)

0,156733*** (14,9341)

0,iTX

-0,0797935*** (-24,2607)

-0,0396034*** (-10,6594)

R² 0,567263 0,201594 Estatística F 588,5809 113,6232

Fonte: elaborado pelos autores. * Heterocedasticidade corrigida pelo método mínimos quadrados ponderados; *** significativo a 1%.

Os resultados das regressões obtidas da estimativa da Eq. 4, a qual relaciona a taxa de

formação de empresas com o crescimento econômico regional, são apresentados na Tab. 2.

Em função de que se observou a existência de dois regimes espaciais distintos de formação de

2 A fórmula que permite o cálculo da meia vida é )2ln( , a mesma mede o tempo necessário para

que a desigualdades na taxa de formação de empresas dos municípios da amostra sejam reduzidas pela metade. Detalhes podem ser conferidos em Barro e Sala-i-Martin (1995).

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empresas, as análises foram realizadas de modo a verificar se o impacto da taxa de formação

de empresas no crescimento econômico varia para estes dois grupos de municípios ou é

similar àquele apresentado para o estado como um todo. Primeiramente, no entanto, nas

colunas 1 e 2, reportamos os resultados da estimativa do modelo para o estado como um todo.

Tabela 2 – Efeito da taxa de formação de empresas (2005) no crescimento econômico (média

2005-2007).

Variáveis Estado Cluster AA Cluster BB

TE TFT TE TFT TE TFT

C -,04

(-,18)

-,04

(-,14)

-3,13*

(-2,65)

-3,54**

(-3,42)

,42

(1,37)

,40

(1,17)

PIB01 -,19**

(-8,42)

-,20**

(-8,44)

-,28**

(-3,22)

-,31**

(-3,93)

-,07*

(-2,27)

-,06

(-1,59)

PIBPC0101 ,38**

(5,33)

,39**

(5,35)

1,34**

(5,00)

1,48**

(6,41)

,06

(,58)

-,02

(-,20)

DEN -,00

(-,78)

-,00

(-,79)

-,001*

(-2,47)

-,00**

(-2,77)

,00

(1,02)

,00

(,48)

TME -,01**

(-4,95)

-,01**

(-4,54)

-,01

(-0,59)

-,01

(-,44)

-,01**

(-3,55)

,00

(,53)

Taxa de

formação

-,00

(-,11)

-,00

(-,26)

,00

(0,23)

,00

(,17)

,004*

(2,39)

,01**

(2,58)

R² ,19 ,19 ,44 ,54 ,28 ,16

F-statistic 24,95 24,96 8,53 12,91 6,79 3,97

No. obs. 494 494 48 51 76 75

Fonte: elaborado pelos autores.

N.B. 1: ** significativo a 1%, * significativo a 5%

N.B. 2: resultados em Log.

Para o estado como um todo a taxa de formação de novas empresas em 2005 não

apresentou impactos no crescimento econômico para os anos subsequentes. Este resultado

também foi encontrado para o cluster AA, porém com sinal positivo. Já para o cluster BB a

taxa de formação apresentou coeficiente significativo e positivo, o que demonstra que para

este cluster a formação de novas empresas favorece o crescimento econômico. Como o efeito

da formação de novas empresas no crescimento econômico é sabidamente defasado no tempo

(Audretsch and Fritsch, 2002; Carree and Thurik, 2006), na Tab. 3 são apresentados os

coeficientes (padronizados) da formação de novas empresas no crescimento econômico para

os anos de 2002 a 2004. Como esperado, para o estado como um todo, a taxa de formação

mostrou um efeito defasado e positivo no crescimento econômico. O impacto é mais defasado

quando as estimativas são realizadas pelo método ecológico, o que indica que altas taxas de

rejuvenescimento empresarial não favorecem o crescimento econômico no curto prazo. Se o

rejuvenescimento é alto, os ganhos de produtividade da economia não acontecem no curto

prazo. Isto é, somente após um determinado período de tempo é que as empresas entrantes

poderão influenciar no desempenho econômico regional com a introdução bem-sucedida de

novas soluções, novos métodos, processos e produtos.

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Tabela 3 – Efeitos defasados da taxa de formação de empresas (2002, 2003 e 2004) no

crescimento econômico (média 2005-2007)

Year

Estado Cluster AA Cluster BB

TE TFT TE TFT TE TFT

2002 ,09(2,18)** ,12(2,76)*** ,19(1,52) -,12(-,94) -,04(-,36) ,10(,62)

2003 ,07(1,66)* ,13(2,81)*** ,27(1,81)* ,15(1,44) ,21(2,13)** ,36(2,37)**

2004 ,05(1,17) ,15(3,23)*** ,13(1,01) -,06(-,36) ,30(2,99)*** ,36(2,51)**

Fonte: elaborado pelos autores.

*** Significativo a 1%, ** Significativo a 5%, * Significativo a 10%.

O Efeito da taxa de formação de novas empresas para as defasagens apresentadas na

Tab. 3 foram consistentemente não significativos para o cluster AA. As altas taxas de

formação de empresas nesta região podem ser um indicador da não existência de indústrias e

setores consolidados ou ainda da falta de políticas indústriais que guiem os novos

investimentos. Além disso, é provável que parte considerável destas novas empresas seja

consequência do empreendedorismo por necessidade. Este resultado é prova irrefutável da

complexa relação entre empreendedorismo e crescimento econômico como já bem indicado

por Van Stel et al., (2005). Estes municípios, embora tenham ultimamente apresentado altas

taxas de formação de empresas, em geral, têm suas economias baseadas na agropecuária e em

pequenas empresas do setor de serviços. Esta área geográfica do RS é coincidente com o G14

(14 Coredes) predominantemente agrícola, identificado por Porsse et al. (2008), onde a

demanda pelos produtos dessa região está muito atrelada à evolução do emprego e,

principalmente, do emprego nas atividades mais tradicionais, ou seja, ao emprego não

qualificado.

No todo, os resultados corroboram com as conclusões de estudos anteriores para os

países desenvolvidos (Van Stel et al., 2005; Wennekers et al., 2005), no sentido de que o

empreendedorismo importa para o crescimento econômico. É conveniente notar que a

associação entre a TFT e o crescimento do PIB nos municípios do cluster AA não é

estatisticamente significativo, o que pode evidenciar que a qualidade do empreendedor desta

região é menor quando comparada com o empreendedor do cluster BB ou daquele do estado

como um todo. No cluster BB – onde sabidamente há mais emprego e indústrias no estado – a

formação de novas empresas é mais produtiva para a economia, pois somente empreendedores

mais qualificados optam por empreender conforme preconiza a teoria da escolha

empreendedora (Evan e Jovanovic apud Kangasharju, 2000), visto que nele há mais

probabilidade de ocupação no mercado formal de trabalho. Embora não se possa identificar o

nível do capital humano dos empreendedores com os dados da RAIS – o que pode relativizar

a nossa interpretação – é provável que o efeito positivo e significativo reflita empreendedores

inovadores e mais qualificados no cluster BB do que no AA. O argumento é muito similar

àquele apresentado por Van Stel et al., (2005) para distinguir o efeito do empreendedorismo

em países em diferentes estágios de desenvolvimento.

5. Considerações finais

Este artigo buscou calcular a taxa de formação de empresas relativa ao estoque de

empresas existentes e ao montante da força de trabalho apta a empreender, através de um

novo método desenvolvido a partir dos dados da RAIS. Também se objetivou identificar o

comportamento destas taxas, no período compreendido entre meados da década passada até os

dias atuais, e a relação destas com o crescimento econômico dos 496 municípios do estado do

Rio Grande do Sul.

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Os resultados evidenciaram que em 1996, existiam poucas concentrações de clusters

espaciais para o estado gaúcho. No entanto, a magnitude da relação espacial aumentou

significativamente de 1996 para 2008, indicando que houve uma ampliação da importância da

dimensão espacial em relação à taxa de formação de empresas nos municípios gaúchos.

A partir da variável taxa de formação de empresas, foi possível verificar o padrão de

distribuição geográfica dos clusters no RS, de 1996 a 2008, e concluir que no estado está

ocorrendo uma mudança na dinâmica empresarial. As regiões mais industrializadas têm

menores taxas de formação de empresas do que as regiões tradicionalmente menos dinâmicas.

As possíveis causas deste fato devem ser ainda investigadas, mas podemos levantar pelo

menos duas hipóteses: a primeira está associada à convergência empresarial no RS, onde

regiões tradicionalmente menos dinâmicas vêm ganhando espaço no cenário empresarial;

enquanto que a segunda tem conexão com o fato do alto empreendedorismo das regiões

menos dinâmicas da metade sul do estado ser de menor qualidade por estar vinculado ao

empreendedorismo por necessidade. Ou seja, os indivíduos que residem nestas áreas, dada a

falta de alternativas ocupacionais, acabam por empreender, o que ampliaria a taxa de

formação destas regiões vis-à-vis ao resto do estado. Esta hipótese parece ser a mais plausível,

dado que a formação de empresas relativa à força de trabalho, nestes municípios, não impacta

significativamente o crescimento econômico futuro dos mesmos.

Assim, as regiões menos dinâmicas do RS (principalmente aquelas da metade sul,

tradicionalmente conhecidas como mais pobres) estão convergindo para a média estadual,

pelo menos no que diz respeito à formação de empresas. Se este resultado já é interessante do

ponto de vista do desenvolvimento regional, mais intrigante é o fato de termos encontrado

para os municípios do RS uma relação positiva entre a taxa de formação de empresas e o

crescimento econômico, quando a formação de empresas é calculada em relação à força de

trabalho regional. Este resultado corrobora àqueles obtidos por outros autores para países

desenvolvidos (Van Stel et al., 2005: Wennekers et al., 2005).

Isto demonstra que para países em transição como é o caso do Brasil e, em especial para

o RS, o empreendedorismo é importante para o progresso econômico. Teoricamente o estudo

contribui para dirimir a ambiguidade existente na literatura, a qual apontava que para países

pobres e em desenvolvimento, mais empreendedorismo não significava maior crescimento

econômico.

Mesmo levando em consideração as limitações que possam ser feitas aos dados e a

técnica econométrica utilizada, acredita-se que os resultados obtidos aqui fornecem uma ideia

geral e uma aproximação robusta de como a taxa de formação de empresas, ou seja, o

empreendedorismo, afeta o desenvolvimento no Rio Grande do Sul. Acredita-se que o

presente artigo contribui nesta temática, dado a escassez de estudos que abordam o tema no

Brasil. Um próximo passo desta análise compreende o estudo da formação de empresas

estratificando os setores da economia, no intuito de identificar como os mesmos estão

distribuídos no território gaúcho, reafirmando ou não as principais conclusões encontradas

nesse artigo. Um segundo elemento é lidar com a causalidade dual no relacionamento entre a

atividade empreendedora e o crescimento econômico. Estudos futuros também podem

contribuir na compreensão da variação espacial da formação de empresas, para melhor

especificar os determinantes que influenciam a taxa de formação de empresas.

Uma das metas centrais das políticas públicas é a geração de crescimento e a criação de

empregos. Muito do debate que envolve estes dois elementos tem sido baseado no referencial

macroeconômico e focado nos instrumentos macroeconômicos tradicionais. Os resultados

deste trabalho sugerem que um instrumento diferente e menos tradicional para a geração de

crescimento e emprego tem um papel importante – políticas que geram e promovem o

empreendedorismo.

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