TC Renato Adalberto Nagel - Final

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CENTRO UNIVERSITRIO PARA O DESENVOLVIMENTO DO ALTO VALE DO ITAJA RENATO ADALBERTO NAGEL

ASPECTOS LEGAIS DA AO REGRESSIVA PROPOSTA PELA PREVIDNCIA SOCIAL POR OCORRNCIA DE ACIDENTE DO TRABALHO

RIO DO SUL 2010

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CENTRO UNIVERSITRIO PARA O DESENVOLVIMENTO DO ALTO VALE DO ITAJA RENATO ADALBERTO NAGEL

ASPECTOS LEGAIS DA AO REGRESSIVA PROPOSTA PELA PREVIDNCIA SOCIAL POR OCORRNCIA DE ACIDENTE DO TRABALHO

Trabalho de Curso a ser apresentado ao Curso de Direito da rea de Cincias Socialmente Aplicveis do Centro Universitrio para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itaja, como requisito parcial para obteno do grau de Bacharel em Direito.

Prof. Orientadora: Fabrisia Franzoi

RIO DO SUL 2010

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CENTRO UNIVERSITRIO PARA O DESENVOLVIMENTO DO ALTO VALE DO ITAJA RENATO ADALBERTO NAGEL

ASPECTOS LEGAIS DA AO REGRESSIVA PROPOSTA PELA PREVIDNCIA SOCIAL POR OCORRNCIA DE ACIDENTE DO TRABALHO

Trabalho de Curso de Direito da rea de Cincias Socialmente Aplicveis, do Centro Universitrio para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itaja, a ser apreciado pela Banca Examinadora, formada por:

____________________________________________________ Professora Orientadora: Fabrisia Franzoi

Banca Examinadora:

__________________________________________ Prof. Clio Simo Martignago

__________________________________________ Prof. Dr. Aldemir de Oliveira

Rio do Sul, novembro de 2010.

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Deus no corao e a famlia presente o que me basta para ser feliz. Para minha famlia, por ter-me apoiado nesta busca pelo conhecimento, no tendo dado a mim a oportunidade da desistncia. In memorian Elisabet Maidel Kieser.

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AGRADECIMENTOS

Sem poder deixar de escrever estas linhas de agradecimento, eis que este trabalho representa, o final ou o incio de uma jornada, no consegui estabelecer a linha do tempo adequada, por no ter resultado exclusivamente dos meus objetivos traados, ao contrrio foram inseridos por aqueles que a nossa volta convivem. O primeiro agradecimento a Deus, este ser superior, que fomenta a nossa sensatez, fora, coragem e motivao na busca de se tornar um ser humano pleno, embora no possa ser comparado com o Ser superior que . Agradeo minha me Gisela Elisabeth Nagel e ao meu pai Renaldo Nagel por me ter dado a oportunidade da existncia e ter mostrado desde cedo a importncia da educao e da integridade moral e tica. minha irm Rosane Elisabeth Nagel pelo apoio e compreenso. minha famlia prxima de mim nas pessoas do meu sogro, Orlando Girardi, minha sogra, Ivone Odorizzi Girardi e seu irmo Orlando Odorizzi, pela compreenso constante que tem para comigo. minha tia e madrinha, Herta Kieser, pelo constante apoio em prol da educao. Aos meus amores, razo incentivadora da minha existncia, minha esposa Ana Maria Girardi Nagel e nossa filha Dbora Maria Nagel, fruto do nosso amor, pelo apoio, compreenso, pacincia e no ter dado a mim a oportunidade da desistncia. Ao meu grande amigo, Dr. Ralfino Hafemann, por ter-me obrigado a trilhar um caminho sem volta em busca do conhecimento. Silvana T. Pamplona Trierweiler, Coordenadora Educacional do SENAC Unidade de Rio do Sul, por ter compreendido o meu desligamento da instituio para realizar a presente jornada. Ao Mestre e Coordenador, Flvio Csar Segundo, que permitiu a troca de experincias para a compreenso do mundo acadmico, no medindo esforos na busca da qualidade do aprendizado. minha professora e orientadora, Fabrisia Franzoi, que com sua dedicao e sabedoria, no mediu esforos para a concretizao deste trabalho. todos os professores que ao longo do curso contriburam nesta jornada. todos aqueles citados ou no, que contriburam de alguma forma no empreendimento e concluso desta jornada, meu reconhecimento e gratido.

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No basta saber, preciso aplicar. No basta querer, preciso fazer. Johann Wolfgang Von Goethe

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RESUMO

O presente trabalho de curso analisa os aspectos legais que devem estar presentes na ao regressiva acidentria, ou seja, a pretenso que o INSS - Instituto Nacional do Seguro Social possui na busca de ressarcir os benefcios que entende ter pago desnecessariamente, somente pelo fato das empresas no terem investido em segurana do trabalho. A escolha deste tema tem por finalidade demonstrar os aspectos legais existentes que amparam a legalidade da propositura da ao regressiva acidentria. A ao regressiva acidentria se refere ao direito que o INSS Instituto Nacional do Seguro Social possui em buscar ressarcir-se dos valores pagos a ttulo de benefcio acidentrio ao segurado, devido o empregador ou responsvel ter agido com dolo ou culpa no descumprimento das normas regulamentadoras em segurana do trabalho. Esta ao objetiva, tanto o ressarcimento de valores pagos devido omisso do empregador, como tambm, alm de puni-lo pela prtica do ato ilcito, buscando sua responsabilidade civil e impor um carter pedaggico na inteno de disciplin-lo no cumprimento dos dispositivos de segurana do trabalho. Neste sentido, o empregador ao adotar os dispositivos normativos prevencionistas obrigatrios tornar o meio ambiente de trabalho mais seguro, evitando a ocorrncia de acidentes do trabalho perfeitamente previsveis. Aborda-se para a compreenso do tema a evoluo histrica do acidente do trabalho, seu conceito e as teorias da responsabilidade civil acidentria das doutrinas infortunsticas relativas ao acidente do trabalho, a relao do acidente do trabalho com a seguridade social e os argumentos utilizados para fundamentar a ao regressiva acidentria. O mtodo de abordagem utilizado foi o indutivo. O mtodo de procedimento foi o monogrfico. A coleta de dados foi realizada atravs de pesquisa bibliogrfica de fontes secundrias: livros e por meio eletrnico. O ramo de estudo selecionado o Direito do Trabalho e Previdencirio e o campo de estudo Ao Regressiva Acidentria. Nas consideraes finais esclarecido que apesar do instituto da ao regressiva acidentria estar positivada a dezenove anos, s recentemente que a mesma vem sendo utilizada pela Autarquia Previdenciria, podendo ser um importante instrumento equilbrio financeiro dos cofres pblicos alm de possuir um carter punitivo e pedaggico de forma a tornar o meio ambiente de trabalho mais saudvel e seguro para o trabalhador.

Palavras chave: ao regressiva acidentria, acidente do trabalho, responsabilidade civil, segurana do trabalho, Instituto Nacional de Seguro Social.

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ABSTRACT

This course examines the work of the legal action that must be present regressive accident, ie, the claim that the INSS - National Institute of Social Security has in seeking reparation for the benefits it claims to have paid unnecessarily, simply because companies do not have invested in safety. The choice of this theme aims to demonstrate the existing legal aspects which support the legality of the filing regressive related accidents. The action related accidents down refers to the right that INSS - National Institute of Social Security has to seek recovery from the amounts paid to benefit the insured by the accident because the employer or person responsible had acted with malice or negligence in violation of regulatory norms work safety. This action aims at both the reimbursement of amounts paid due to the omission of the employer, as well, and punish him for the practice of tort, seeking its liability and impose a pedagogical in intent to discipline him in the performance of devices safety. In this sense, the employer to adopt the regulatory provisions required preventers will make the work environment safer, preventing the occurrence of occupational accidents perfectly predictable. It addresses itself to the understanding of the historical theme of the work accident, his concept and theories of liability related accidents infortunistica of doctrines relating to the work accident, the ratio of work accidents with social security and the arguments used to support regressive action related accidents. The method used was inductive approach. The method of procedure was the monograph. Data collection was conducted through literature search of secondary sources: books and electronic media. The branch of study selected is the Labour and Welfare and the field Action Countdown related accidents. In the final consideration is clarified that although the Office of the regressive action related accidents to be positively valued nineteen, it is only recently that it has been used by the Local Authority Pension and may be an important instrument financial equilibrium of the public treasury as well as having a punitive character and pedagogical in order to make the work environment healthier and safer for workers.

Key - words: regressive action accident, work accident, liability, safety, National Institute of Social Security.

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SUMRIO

INTRODUO ..........................................................................................................................9 1 O ACIDENTE DO TRABALHO ......................................................................................... 12 1.1 A EVOLUO HISTRICA DO ACIDENTE DO TRABALHO ....................................... 12 1.2 O CONCEITO DE ACIDENTE DO TRABALHO ............................................................... 14 1.3 AS DOUTRINAS INFORTUNISTAS ................................................................................. 18 1.3.1 A Teoria da Responsabilidade Extra Contratual........................................................... 18 1.3.2 A Teoria da Responsabilidade Contratual .....................................................................19 1.3.3 A Teoria do Caso Fortuito .............................................................................................. 20 1.3.4 A Teoria da Responsabilidade Objetiva ......................................................................... 21 1.3.5 A Teoria do Risco Profissional........................................................................................ 22 1.3.6 A Teoria do Risco da Autoridade ................................................................................... 23 1.3.7 A Teoria da Responsabilidade Social ............................................................................. 24 2 O ACIDENTE DO TRABALHO E A SEGURIDADE SOCIAL ........................................ 26 2.1 AS INSTITUIES SEGURADORAS ............................................................................... 27 2.2 O SEGURO SOCIAL DO ACIDENTE DO TRABALHO ................................................... 29 2.3 A RELAO JURDICA DO SEGURO DO ACIDENTE DO TRABALHO ...................... 32 3 A AO REGRESSIVA ACIDENTRIA .......................................................................... 39 3.1 CONCEITO DE AO REGRESSIVA ACIDENTRIA ................................................... 39 3.2 AS PREVISES LEGAIS DA AO REGRESSIVA ACIDENTRIA ............................. 40 3.3 OS PRESSUPOSTOS NECESSRIOS DA AO REGRESSIVA ACIDENTRIA ......... 42 3.4 A CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 120 DA LEI 8.213/91 ........................................ 43 3.4.1 Preceitos Legais Envolvidos. ........................................................................................... 43 3.4.1.1 A Pretenso Ressarcitria sob o Argumento do Art, 7, XXVIII da CF/88 ...................... 43 3.4.1.2 O Argumento da Dupla Fonte de Custeio do Seguro do Acidente do Trabalho ................ 45 3.4.1.3 O Argumento da Fonte Adicional de Custeio do Seguro do Acidente do Trabalho .......... 46 3.5 DA COMPETNCIA JUDICIAL ........................................................................................ 47 3.6 A LEGITIMIDADE PROCESSUAL ................................................................................... 49 3.7 O PRAZO PRESCRICIONAL ............................................................................................ 49 CONSIDERAES FINAIS ...................................................................................................51 REFERNCIAS ....................................................................................................................... 54

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INTRODUO

Face ocorrncia de acidentes do trabalho nas empresas de todos os segmentos produtivos e comercias, sem que as empresas tomem as necessrias providncias legais de preveno de acidentes, o INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, na busca de ressarcirse dos benefcios que entende ter pago desnecessariamente, somente pelo fato das empresas no terem investido na rea prevencionista, apesar de haver normatizao para tal, busca atravs da ao regressiva acidentria contra a empresa em no conformidade com a norma reaver os valores pagos atravs dos benefcios acidentrios ao funcionrio acidentado. A relevncia do estudo reside em identificar a presena dos aspectos legais necessrios para que o INSS Instituto Nacional do Seguros Social possa promover a ao regressiva acidentria contra os responsveis, buscando reaver valores gastos com o segurado acidentado por fatores em que o culpado da ocorrncia do acidente foi a prpria empresa ou terceiro responsvel que no adotou as medidas preventivas necessrias para evitar o mesmo. O mesmo se torna relevante para a sociedade, visto que, os pagamentos desnecessrios de benefcios criam um esvaziamento de recursos dos cofres pblicos, que poderiam ter sido melhor aplicados em benefcio da sociedade, caso aquele que cabia a responsabilidade de evitar o acidente, tivesse cumprido as normas de preveno aplicveis ao caso. Esta pesquisa auxilia a compreenso dos pontos que buscam a necessria fundamentao no entendimento da legalidade existente na propositura da ao regressiva do INSS Instituto Nacional do Seguro Social contra os responsveis culpados da ocorrncia do acidente do trabalho. Possui desta forma, significativa relevncia na compreenso pelo operador de direito dos mecanismos jurdicos existentes para que o INSS Instituto Nacional do Seguro Social possa promover dentro da legalidade necessria a ao regressiva acidentria contra a empresa ou responsvel que teve a ocorrncia de acidente do trabalho sofrido pelo beneficirio segurado, buscando o ressarcimento dos prejuzos que teve com o pagamento do benefcio ao segurado, quando na verdade o verdadeiro culpado da ocorrncia do acidente foi a empresa ou responsvel que no cumpriu os mecanismos de preveno estabelecidos em lei, e no o INSS Instituto Nacional do Seguro Social, que apenas teve que pagar o benefcio face responsabilidade objetiva que possui no pagamento do mesmo para o segurado.

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No mesmo sentido o operador de direito deve compreender os mecanismos jurdicos existentes para que empresa ou responsvel que for parte do plo passivo da ao regressiva acidentria poder utilizar para se defender quando entender que a ao proposta pelo INSS Instituto Nacional do Seguro Social no for cabvel, visto ter investido suficientemente na rea preventiva, conforme positivado em lei. O objeto de pesquisa tem como tema a os aspectos legais da ao regressiva acidentria. Para estimular as pesquisas e estudos sobre a delimitao do tema, levanta-se o seguinte questionamento: At que ponto o INSS Instituto Nacional do Seguro Social poder promover a ao regressiva acidentria contra os responsveis pela ocorrncia do acidente do trabalho? Apresenta-se como hiptese bsica: Quais os aspectos legais que devem estar presentes para que o INSS Instituto Nacional do Seguro Social possa promover a ao regressiva acidentria contra os responsveis que por ao ou omisso tenham causado o acidente do trabalho? As variveis determinantes para o desenvolvimento deste estudo so as seguintes: Acidente do trabalho; Responsabilidade civil acidentria; Segurana do trabalho. O presente trabalho de curso tem por objetivo geral investigar a necessria fundamentao legal, amparado na responsabilidade civil acidentria, que deve estar presente para que o INSS - Instituto Nacional do Seguro Social possa promover a ao regressiva acidentria, contra os responsveis que no aplicaro os normas de segurana do trabalho, buscando ressarcir-se dos valores pagos ao beneficirio que sofreu o acidente do trabalho. Quanto aos objetivos especficos: a) Definir os aspectos legais necessrios que devem estar presentes na propositura da ao regressiva acidentria para que o INSS Instituto Nacional do Seguro Social possa buscar o ressarcimento dos valores pagos ao beneficirio numa ao regressiva contra a empresa empregadora do beneficirio. b) Identificar os fundamentos legais que necessariamente devem ser arrolados para fundamentar a ao regressiva acidentria contra a empresa empregadora do beneficirio acidentado na busca do ressarcimento dos valores pagos ao beneficirio.

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c) Compreender como surge o direito de regresso do INSS Instituto Nacional do Seguro Social em propor ao regressiva acidentria contra a empresa empregadora de beneficirio acidentado, para reaver os valores pagos. d) Demonstrar as possveis conseqncias que sucessivas aes regressivas propostas pelo INSS - Instituto Nacional do Seguro Social contra as empresas poderiam trazer em benefcio da sociedade brasileira. Quanto metodologia aplicada na realizao deste Trabalho de Curso foram adotados o mtodo indutivo e o procedimento o monogrfico. A tcnica utilizada se deu atravs de pesquisa bibliogrfica, com consulta a obras secundrias. Como conceito operacional doutrinrio tem-se que a ao regressiva acidentria o instrumento de preveno de novos acidentes, quando afasta a impunidade daqueles que, desprezando seu dever, negligenciam a vida e a integridade fsica do trabalhador (IGNCIO, 2007, p. 570 apud MACIEL, 2010, p. 16) A reviso bibliogrfica especfica foi compilada em obras, destacando-se os seguintes autores: Fernando Maciel, Hertz Jacinto Costa, Marco Fridolin Sommer Santos e Srgio Pardal Freudenthal, dentre outros. O estudo foi estruturado em trs captulos resumindo-se da seguinte forma: No primeiro captulo ser apresentado um estudo acerca evoluo histrica do acidente do trabalho, contando de forma resumida sua origem atravs da evoluo da sociedade humana, especificando, tambm, o seu conceito e as teorias infortunsticas da responsabilidade acidentria que se relacionam com o presente estudo. O segundo captulo abordar a relao do acidente do trabalho e a seguridade social e a sua relao jurdica com a ao regressiva acidentria. O terceiro e ltimo captulo, por sua uma vez traz especificamente o tema proposto no ttulo do presente estudo. Inicialmente destacam-se os fundamentos legais necessrios para a propositura da ao regressiva acidentria. Em seguida estudar-se- o art. 120 da Lei 8.213/91 e suas relaes com os art. 7, inciso XXVIII, art. 195, caput, inciso I, alnea a e seu pargrafo 4, todos da Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988. Ainda sero abordados a legitimidade processual do INSS Instituto Nacional do Seguro Social em propor a referida ao regressiva acidentria. Para elaborao do projeto foi consultada a obra Educar para Pesquisa: Normas Para Produo de Textos Cientficos. (BLOGOSLAWSKI; FACHINI; FVERI, 2009) e como metodologia operacionais (PASOLD, 2008).

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1. O ACIDENTE DO TRABALHO

O acidente do trabalho acompanhou o desenvolvimento do homem desde quando este iniciou a sua atividade laboral, quer seja de forma oficial, quer tenha sido de modo informal, vinculando primeiramente a ocorrncia do infortnio sofrido, uma obra do acaso ou do destino. Fato este que se modificou atravs da evoluo histrica da sociedade de forma que na atualidade a ocorrncia do acidente do trabalho, est intimamente ligado ao labor do homem, sendo meramente a falta de adoo de meios prevencionistas, quer seja no ambiente atravs da aplicao de meios tecnolgicos tornando o mesmo mais seguro, que seja no homem atravs de seu desenvolvimento comportamental para que adquira uma conscincia prevencionista frente as suas atitudes. Objetivando a compreenso do seu desenvolvimento ao longo da histria, necessrio estudar as transformaes sofridas pelo instituto ao longo da evoluo do prprio homem, quer tenha sido cultural, social ou tcnico.

1.1 A EVOLUO HISTRICA DO ACIDENTE DO TRABALHO

Em primeiro plano necessita-se entender que o termo acidente do trabalho no pode ser entendido somente no sentido daquele mal que ocorreu por mero acaso mutilando de alguma forma a integridade fsica do homem, abrangendo tambm as doenas originadas pela atividade executada durante a jornada de trabalho. Tratando da evoluo histrica do Acidente do Trabalho tem-se a obra de Hertz Jacinto Costa, que aponta de forma clara e coerente os principais acontecimentos que levaram o homem a dar importncia ao mesmo. Parafraseando o autor, este referencia que se tem notcias, apesar de muito restritas, de sua origem em tempos bem remotos, apontando as civilizaes egpcias, gregas e romanas, como marco inicial. As dificuldades na obteno de maiores informaes se prendem ao fato de nestes tempos remotos os trabalhos mais pesados eram realizados atravs da fora de trabalho escrava, e estes no possuindo proteo alguma estavam merc de seus amos que os substituam a partir do momento que sofressem algum infortnio que os deixassem invlidos para o trabalho.

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Nesta poca, inmeros escritos surgiram apontando seqelas e deformaes fsicas naquele que realizava determinado trabalho, iniciando-se neste momento uma relao entre o tipo de enfermidade, seqela ou deformao com a atividade especfica que o homem realizava, ou seja, iniciou-se o estudo da relao do acidente do trabalho com a profisso que o homem exercia. Segundo Hertz Jacinto Costa:

Desde Hipcritas (460-375 a. C.), maior mdico da antiguidade e iniciador da observao clnica, segundo lies de Ren Mendes (Patologia do Trabalho. Atheneu, p. 5), j se descrevia quadro clnico de intoxicao saturnina encontrada em trabalhador mineiro, omitindo, contudo, qualquer meno ao ambiente de trabalho e atividade em si mesma. tambm de Ren Mendes (ob. Cit., p. 5) reproduzindo lio de Ramazzini (1.700), ter sido Lucrcio, um ano antes do incio da Era Crist, quem marcou a preocupao pela patologia do trabalho, com as seguintes observaes relativas aos trabalhadores do interior das minas: no viste ou ouviste como morrem em to pouco tempo, quando ainda tinham tanta vida pela frente?. Plnio, o Velho, em latim Caius Plinius Secundus, naturista e escritor latino, escreveu Naturalis Historia, em trinta e sete livros, obra rica de informaes valiosas sobre zoologia, geografia, minerologia etc., tendo visitado galerias de minas, e descreve, com boa dose de impresso, o aspecto dos trabalhadores que ficavam expostos ao chumbo, mercrio e poeiras. Refere que os escravos, por iniciativa prpria colocavam frente do rosto, como se fossem mscaras, panos ou membranas de bexiga de carneiro, visando a diminuir a ao das poeiras minerais. (COSTA, 2009, p. 16)

Talvez tenha sido este o primeiro registro histrico relacionando a profisso exercida pelo homem com a doena adquirida ao longo de uma vida de trabalho, pela inteno de se proteger a sade, nem que seja de uma forma rudimentar, atravs de meios de proteo que minimizem a exposio aos riscos ambientais, sendo, portanto tambm, a primeira forma de utilizao daquilo que hoje conhecemos como equipamento de proteo individual. A ocorrncia do infortnio est relacionada a atividade produtiva dos povos, principalmente atravs do desenvolvimento industrial, sendo este dado incontroverso, aceito pela maioria dos historiadores. No direito romano verifica-se que o trabalho era atividade das classes mais baixas, no necessitando de proteo, sendo inimaginvel algum regramento dando proteo aos mesmos das seqelas resultantes do trabalho executado por estes e pelos escravos. Este fato talvez decorra de que o conceito jurdico de doena do trabalho tenha sido conhecido aps o do acidente do trabalho. Neste sentido, Costa cita:

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Como recorda Alfredo J. Ruprecht (Direito da Seguridade Social. p. 187), citando Jors-Kaskel, com a Lex Acquilia (286 a.C.) que tem incio a proteo contra os acidentes do trabalho. Menciona-se a morte injusta do escravo alheio e os danos causados por incndio, fratura ou qualquer forma de ofensa fsica. Posteriormente se amplia a proteo, pois se concede uma actio utilis s pessoas livres. Mais tarde, segundo o mesmo autor, obra j citada, escravos e homens livres constituem o collegia tecniciorum sem fins econmicos, mas que assistia, em caso de doena ou acidentes, a seus integrantes, embora alguns autores neguem tal fato, alegando que a ajuda se limitava aos funerais e s cerimnias fnebres. Ainda que o conceito claramente jurdico de doena profissional fosse conhecido aps o de acidente, sua existncia foi muito limitada em Roma, conforme referncias de Galeno e Plnio. (COSTA, 2009, p. 18)

Segundo o autor Hertz Jacinto Costa (2009), a libertao do trabalhador principiou com a Revoluo Industrial, quando surgiu o trabalho assalariado e a figura do patro, o empregador capitalista. Com o surgimento das mquinas, e pelo fato de serem muito rudimentares, no existindo idias de treinamento e aperfeioamento profissional, os riscos a que os trabalhadores estavam expostos eram constantes e com potencial para causar acidentes graves com seqelas definitivas na integridade fsica do trabalhador. A dignidade do trabalhador que at ento no era importante, comeou a ser considerada pelos industriais e caberia ao Estado nivelar o interesse da sociedade protegendo os fracos e desamparados, o que levou a surgimento de uma nova realidade econmica, gerando o surgimento de uma nova relao jurdica entre o trabalhador e o empregador da mo de obra, eliminando conceitos ultrapassados e obrigando a sociedade mundial a elaborar princpios que viessem a reger o relacionamento entre estes dois plos.

1.2 O CONCEITO DE ACIDENTE DO TRABALHO

Apesar de haver um conceito de acidente do trabalho dado pela doutrina prevencionista, citado por Vieira (2000, p. 276), o acidente do trabalho uma ocorrncia no programada, inesperada ou no, que interrompe ou interfere no processo normal de uma atividade, ocasionando perda de tempo til e / ou leses nos trabalhadores e / ou danos materiais, o conceito de acidente do trabalho que interessa para o presente estudo o conceito legal de acidente do trabalho. A existncia do conceito prevencionista somente possui valor para a implementao das medidas prevencionistas em segurana e medicina do trabalho, visto que

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conceito abrange de tal modo a ocorrncia do acidente do trabalho que mesmo aquele que no tenha gerado uma leso fsica no trabalhador, ou aquele que no tenha gerado um prejuzo material ao empregador passa a ser considerado acidente do trabalho. Neste sentido o conceito que interessa ao nosso estudo aquele que dado pelo art. 19 da Lei 8.213 de 24/07/1991, conforme segue:

Art. 19. Acidente do trabalho o que ocorre pelo exerccio do trabalho a servio da empresa ou pelo exerccio do trabalho dos segurados especiais referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, provocando leso corporal ou perturbao funcional que cause a morte ou a perda ou reduo, permanente ou temporria, da capacidade para o trabalho. (PINTO (et al), 2010, p. 1482)

Percebe-se que apesar deste conceito no possuir a amplitude do conceito prevencionista, o mesmo define que, para haver a caracterizao de acidente do trabalho deve haver no mnimo, uma leso corporal, nem que seja muito pequena, basta um pequeno arranho na pele do trabalhador, associado a uma reduo da capacidade para o trabalho, temporria ou permanente e ainda que a mesma tenha sido provocada enquanto o trabalhador envolvido estava a servio da empresa que possui o vnculo trabalhista. Para Sebastio Geraldo de Oliveira (2009, p. 42), a denominao adequada seria acidente do trabalho com dano pessoal. Nos seguros privados fala-se em acidentes pessoais. Contudo consagrou-se em infortunstica o termo acidente do trabalho, que constitui uma das categorias do dano pessoal. Exceo se d aos segurados especiais a que se refere o inciso VII do art. 11 da mesma lei:Art. 11. So segurados obrigatrios da Previdncia Social as seguintes pessoas fsicas: (...) VII como segurado especial: a pessoa fsica residente no imvel rural ou em aglomerado urbano ou rural prximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxlio eventual de terceiros, na condio de: a) produtor, seja proprietrio, usufruturio, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatrio ou arrendatrio rurais, que explore atividade: 1. agropecuria em rea de at 4 (quatro) mdulos fiscais; 2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exera suas atividades nos termos do inciso XII do caput do art. 2o da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000, e faa dessas atividades o principal meio de vida; b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faa da pesca profisso habitual ou principal meio de vida; e c) cnjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alneas a e b deste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo. (PINTO (et al), 2010, p. 1478)

A estes segurados especiais excluiremos de nosso estudo, apesar de serem

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protegidos pela Previdncia Social, os mesmos no possuem vnculo empregatcio, faltando portanto a figura do empregador, essencial para que possa haver a ao regressiva acidentria da previdncia social contra o mesmo. Alm do acidente do trabalho, considerado tpico pela doutrina e normatizado pelo art. 19 da Lei 8.213/91 tem-se ainda que analisar o art. 20 da mesma lei que equipara a doena do trabalho e a doena profissional ao acidente do trabalho:

Art. 20. Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mrbidas: I - doena profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exerccio do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relao elaborada pelo Ministrio do Trabalho e da Previdncia Social; II - doena do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em funo de condies especiais em que o trabalho realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relao mencionada no inciso I. (...) 2 Em caso excepcional, constatando-se que a doena no includa na relao prevista nos incisos I e II deste artigo resultou das condies especiais em que o trabalho executado e com ele se relaciona diretamente, a Previdncia Social deve consider-la acidente do trabalho. (PINTO (et al), 2010, p. 1482)

Importantssimo o legislador no ter esquecido, incluir na proteo do trabalhador um rol de doenas do trabalho e profissionais decorrentes das atividades laborais realizadas pelo mesmo, pois caso contrrio, estaria desamparado quando fosse acometido pela mesma. Entende desta forma Gustavo Filipe Barbosa Garcia (2010, p. 18), fazendo referncia que a legislao previdenciria equiparou as doenas do trabalho, com as diversas conseqncias da advindas. So as chamadas doenas equiparadas ao acidente do trabalho. Afirma tambm que, enquanto as doenas profissionais so decorrentes de trabalho peculiar exercido, as doenas do trabalho decorrem de condies especiais de trabalho desempenhado. Apesar de ser importantssima esta previso legal, observa-se nas estatsticas previdencirias um nmero muito pequeno de comunicados de acidentes do trabalho tendo por origem a ocorrncia de doenas do trabalho ou profissionais. Isto se deve ao fato do prprio trabalhador no associar a doena em que foi acometido com a relao do labor executado a servio do empregador. H ainda a previso legal do art. 21, inciso I, da mesma lei referida anteriormente, em que h uma equiparao de acidente do trabalho para a causa que tenha contribudo de alguma forma na produo da incapacidade do trabalhador parcial ou total, ou a sua morte, embora no tenha sido a causa nica, mas tenha contribudo diretamente para tal ocorrncia acidental, conforme pode ser analisado no referido.

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Art. 21. Equiparam-se tambm ao acidente do trabalho, para efeitos desta Lei: I - o acidente ligado ao trabalho que, embora no tenha sido a causa nica, haja contribudo diretamente para a morte do segurado, para reduo ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido leso que exija ateno mdica para a sua recuperao; (PINTO (et al), 2010, p. 1482)

Temos na seqncia os incisos, II, III e IV do mesmo artigo:

Art. 21. (...) II - o acidente sofrido pelo segurado no local e no horrio do trabalho, em conseqncia de: a) ato de agresso, sabotagem ou terrorismo praticado por terceiro ou companheiro de trabalho; b) ofensa fsica intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada ao trabalho; c) ato de imprudncia, de negligncia ou de impercia de terceiro ou de companheiro de trabalho; d) ato de pessoa privada do uso da razo; e) desabamento, inundao, incndio e outros casos fortuitos ou decorrentes de fora maior; III - a doena proveniente de contaminao acidental do empregado no exerccio de sua atividade; IV - o acidente sofrido pelo segurado ainda que fora do local e horrio de trabalho: a) na execuo de ordem ou na realizao de servio sob a autoridade da empresa; b) na prestao espontnea de qualquer servio empresa para lhe evitar prejuzo ou proporcionar proveito; c) em viagem a servio da empresa, inclusive para estudo quando financiada por esta dentro de seus planos para melhor capacitao da mode-obra, independentemente do meio de locomoo utilizado, inclusive veculo de propriedade do segurado; d) no percurso da residncia para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que seja o meio de locomoo, inclusive veculo de propriedade do segurado. (PINTO (et al), 2010, p. 1482)

Entende-se da forma prevencionista que todos os acidentes poderiam ser evitados de alguma forma, desde que tivessem sido adotadas meios eficazes que bloqueassem as causas determinantes que deflagram a ocorrncia do acidente do trabalho, cabe ao empregador no medir esforos para que tal objetivo seja efetivamente alcanado. Escreve desta forma Gustavo Filipe Barbosa Garcia (2010, p. 23), ao afirmar que, nos diversos temas pertinentes aos acidentes do trabalho e doenas profissionais, a regra de ouro est justamente na preveno. Todos os esforos devem ser direcionados preveno do infortnio, no sentido de evitar que ocorra qualquer acidente do trabalho, ou que o empregado venha a adquirir alguma doena do trabalho, sob o risco de os responsveis poderem ser responsabilizados civilmente pelas sequelas causadas a aqueles que estavam sob a sua responsabilidade, quando deveriam ter aplicado os meios prevencionistas existentes e positivados no ordenamento jurdico ptrio.

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1.3 AS DOUTRINAS INFORTUNISTAS

Segundo Costa (2009, p. 29), o acidente do trabalho dano material no corpo e no psiquismo do trabalhador vitimado, sendo que as indenizaes primitivamente se fundamentavam no cdigo Civil, mngua de normas especiais, inclusive de Direito do Trabalho. Vieram contribuir significativamente para a soluo dos conflitos vrias teorias que sedimentaram nas legislaes existentes atualmente, nos julgados dos Tribunais e posicionamento dos doutrinadores, posicionamentos diversos que passaremos a analisar a seguir.

1.3.1 A Teoria da Responsabilidade Extra Contratual

Extrai-se da doutrina de Hertz Jacinto Costa, que esta teoria foi herdada do direito romano e consagrada no Cdigo Civil da Frana e posteriormente difundida em diversos pases:

Ainda que leve ou levssima a falta cometida, desde que imputvel pessoa que, mesmo no tivesse a inteno de lesionar, deve responder por ela. Assim, a imprudncia ou negligncia praticada em relao a outrem, deve ser reparada. Logo, cada um responde por suas aes causadoras de danos a terceiros, no podendo se eximir da responsabilidade mesmo que no tivesse inteno de praticar o ato. (...) Ocorre que, segundo a teoria em exame, tornava-se ela insuficiente para o alcance do pleno ressarcimento no infortnio do trabalho, porquanto impunha a vtima a prova da culpa do empregador. (COSTA, 2009, p. 29)

Sendo o trabalhador leigo em matria prevencionista, desconhecendo as causas que pudessem estar gerando a ocorrncia do acidente do trabalho suas chances de produzir a prova da culpa ou negligncia do empregador seriam remotas, pois segundo Costa (2009, p. 30), o trabalhador desconhecendo que freqentemente so os acidentes devidos ao caso fortuito ou de fora maior e, nestes casos, o infortunado no teria qualquer proteo. Escreve no mesmo sentido Srgio Pardal Freudenthal (2007, p. 25), ao afirmar que, a teoria da culpa extra contratual ou aquiliana, tem como base a concepo civilista de

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culpa, pela qual haveria obrigao indenizatria por parte do empregador a partir da comprovao de sua culpa no sinistro. Analisando a questo percebe-se facilmente a dificuldade que o trabalhador teria ao socorrer-se no judicirio para buscar a indenizao para reparar a seqela causada por um acidente do trabalho ocorrido enquanto estava a laborar pelo empregador, visto que segundo esta teoria, haveria de provar de alguma forma a culpabilidade ou a negligncia do mesmo na ocorrncia do infortnio. Desta forma o trabalhador j considerado de classe inferior, tendo que vender a sua fora de trabalho, freqentemente se via desamparado por ocasio de algum acidente decorrente do trabalho que realizava, infortnio que inclusive agravava a sua situao quando produzia seqela definitiva, incapacitando-o para o trabalho, tirando a possibilidade de prover a sua subsistncia pessoal e de sua famlia. Neste sentido poderamos perguntar, com tal desamparo, de que forma ainda poderia provar a culpa do empregador na ocorrncia do seu infortnio ocorrido durante o labor.

1.3.2 A Teoria da Responsabilidade Contratual

Esta teoria est fundamentada simplesmente pela inverso do nus da prova, passando o empregador a responsabilidade de provar que no teve culpa do acidente ocorrido com o seu empregado. A teoria da responsabilidade contratual foi um marco histrico na evoluo do acidente do trabalho ao longo das mudanas da sociedade trabalhadora brasileira, neste sentido:Vale observar com ateno esta primeira evoluo doutrinria, pois no Direito brasileiro contemporneo utiliza-se de tal fundamento no debate sobre a responsabilidade civil do empregador em decorrncia de acidente do trabalho (...). A responsabilidade objetiva representa um marco doutrinrio da indenizao por acidente do trabalho sem a definio de culpa. (FREUDENTHAL, 2007, p. 25)

Hertz Jacinto Costa, em valorosa lio, explicita a responsabilidade do empregador em investir no ambiente de trabalho de forma a torn-lo seguro para o trabalhador realizar as suas atividades laborativas:

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(...) o contrato de trabalho impe ao empregador a obrigao de zelar pela segurana de seus trabalhadores, restituindo-os sadios sada do trabalho, a exemplo do transportador que se v obrigado a entregar perfeitos os objetos transportados. A culpa do patro, assim, seria presumida. Compete ao trabalhador apenas provar o contrato de trabalho e o acidente. (COSTA, 2009, p.31)

Apesar de ter sido um avano doutrinrio na responsabilizao da ocorrncia do acidente do trabalho, (SALEILLES citado por COSTA, 2009, p. 31) critica esta teoria, sustentando que as convenes feitas em contrato devem ser obedecidas pelas partes e, logo, bastaria estabelecer uma clusula de exonerao do empregador para colocar por terra os objetivos da teoria. Costa (2009, p. 31) ainda destaca que os juristas apontam outros defeitos da teoria contratual, tais como, os trabalhadores vitimados eram obrigados a prova, por ocorrncia do caso fortuito, outro perigo apontava para a possibilidade da renncia contratual para a reparao das sequelas causadas pelo acidente do trabalho e ainda tinha o inconveniente de no solucionar a doena profissional. Cabe ainda mencionar que se o empregador conseguisse provar que agiu com a diligncia necessria na aplicao das normatizaes existentes em segurana e medicina do trabalho, ou que o acidente ocorreu por culpa da prpria vtima, caso fortuito, fora maior ou culpa de terceiro, este acabava eximindo-se da responsabilidade de reparar e indenizar o dano sofrido pelo trabalhador infortunado pelo acidente do trabalho sofrido. Ento, apesar de ter sido um marco na evoluo doutrinria das teorias infortunsticas relativas a reparao dos danos sofridos pelo obreiro, esta tinha as suas deficincias e necessitava ser aperfeioada.

1.3.3 A Teoria do Caso Fortuito

Esta teoria cria a responsabilidade do empregador pelos casos fortuitos ocorridos no mbito do ambiente de trabalho que levassem o trabalhador a sofrer o acidente do trabalho. Para Ivan Horcaio, (2007, p. 165), caso fortuito todo acontecimento natural, cuja previsibilidade foge capacidade de percepo do homem, em virtude do que lhe impossvel evitar as conseqncias. Segundo Costa, (2009, p. 32), esta teoria fundamenta-se no sentido de que todo

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aquele que obtm utilidade de uma pessoa tem o dever de assumir os riscos que o emprego ou uso dessa pessoa origina. Portanto o empregador sendo beneficirio dos lucros de sua indstria originados pela compra da fora de trabalho de seu empregado dever tambm arcar com os nus decorrentes do acidente do trabalho sofridos pelo mesmo, no apenas nas situaes em que agisse com culpa, mas tambm naquelas em que tenha ocorrido um caso fortuito. Neste entendimento Costa, (2009, p. 32) afirma que esta teoria pelo seu cunho eminentemente civilista em que se revestia impediu que definitivamente incorporasse nas legislaes mais avanadas dos pases da Europa e Amrica.

1.3.4 A Teoria da Responsabilidade Objetiva

Segundo Wendell Lopes Barbosa de Souza, (2010, p. 32) a teoria da responsabilidade objetiva teve origem na Frana ao final do sculo XIX e incio do sculo XX, atravs dos estudos de Raymond Salleiles e Luois Josserand. Importante mencionar que:

Alm de citar a obra de Salleiles como uma de suas fontes para a adoo da responsabilidade civil pela doutrina do risco, Josserrand ainda fez uma justa homenagem a jurisprudncia, verdadeira propulsora da teoria objetiva, afirmando que a evoluo da responsabilidade se tem produzido com um mnimo de interveno legislativa: ela foi sobretudo, obra da jurisprudncia, que, na Frana, na Blgica e em outros pases, tem sabido tirar partido maravilhoso dos textos e dos princpios que tinha sua disposio e os tem acomodado, ao gosto do dia, com uma oportunidade, um senso de realidades prticas e uma engenhosidade verdadeiramente admirveis. (SOUZA, 2010, p.34)

Esta teoria foi criando volume amparado na teoria da atividade de risco do empreendimento do empregador, devendo este responder por qualquer infortnio que o seu empreendimento viesse a causar a um terceiro, inclusive o seu empregado, pois no existindo a sua atividade empresarial, o trabalhador do empreendimento no teria como sofrer o acidente do trabalho. Nas palavras de Costa, (2009, p. 33), o empregador responsvel no porque haja desatendido as regras de segurana do trabalho, seno por que suas coisas, (...), que criaram

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um risco e provocaram um dano, ainda que originrio, como dito, de caso fortuito. No mesmo sentido, Sergio pardal Freudenthal escreve:

A responsabilidade objetiva representa um marco doutrinrio da indenizao por acidente do trabalho sem a definio de culpa. a base para as teorias do risco profissional e do risco social; responsabilidade objetiva do empregador ou da sociedade; indenizao por acidente do trabalho mediante seguro obrigatrio sob a responsabilidade patronal ou por cobertura previdenciria equiparando os acidentes do trabalho e as doenas ocupacionais aos outros riscos sociais. (FREUDENTHAL, 2007, p.25)

Apesar de esta teoria ter avanado significativamente no sentido de amparar o trabalhador dos infortnios sofridos no meio ambiente de trabalho em que laborava, pois entendendo que o acidente do trabalho foi provocado por coisa perigosa, caberia ao empregador assumir a reparao do dano sofrido por seu empregado. Entretanto o acidente sofrido pelo trabalhador que tivesse sua origem em algumas enfermidades, tais como, hrnias, varizes, dentre outras, acidente de trajeto ocorrido no percurso realizado de sua residncia at o ambiente de trabalho e vice-versa, eram afastadas da responsabilidade de indenizar do empregador.

1.3.5 A Teoria do Risco Profissional

Tambm denominada por Alonso Bielsa de teoria econmico industrial que segundo Costa, (2009, p. 33), nesta teoria no se cogita do exame da culpa, em matria de acidente do trabalho. As regras do direito comum so derrogadas, visando a proteo do trabalhador. Ainda nas palavras de Costa (2009, p. 34) a aplicao da teoria do risco profissional caminhou para o seguro social obrigatrio, cujo objetivo , precisamente, proteger o trabalhador da incapacidade fsica ou de ganho, sob a proteo do Estado.

Flix Faure quem iniciou a doutrina perante o Parlamento de Frana, em 1882. Segundo o mestre, assim como o empregador suporta o desgaste e a destruio de seu material, bem como os gastos de amortizao do que lhe til, como os riscos de incndio, responsabilidade civil, etc., deve arcar com a responsabilidade pelos

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acidentes ocorridos no trabalho realizado em seu proveito. Todo aquele que tem por misso dirigir um trabalho que lhe confere benefcios , a priori, responsvel pelos acidentes que possam resultar no curso de sua execuo. (COSTA, 2009, p.34)

Estas afirmaes leva a refletir que no sentido que esta teoria poderia ser um marco na histria em amparar o trabalhador considerando-o hipossuficiente frente aos infortnios que sofria no ambiente de trabalho, sendo ento essencial ampar-lo, no somente pelo empregador, mas tambm pelo Estado, considerando a ocorrncia do acidente do trabalho no mais ocorrncia causada pela mquina e sim pelo prprio empreendimento empresarial do empregador. Percebe-se o surgimento da necessidade de adoo de medidas preventivas que pudessem neutralizar ou eliminar os riscos do meio ambiente de trabalho em que o trabalhador laborava, pois se o acidente do trabalho previsvel, este pode ser evitado e se poderia ser evitado cabe perfeitamente a obrigao do empregador em reparar ou indenizar as seqelas ocorridas com o trabalhador que estava subordinado aos seus mandos.

1.3.6 A Teoria do Risco da Autoridade

Abordado por Costa, (2009, p. 36), afirma que:

Deve-se essa teoria a Rouast e Durand estabelecendo que o empregador responsvel no apenas pela existncia da mquina, seno que o exerccio de direitos e deveres de organizar e dirigir geram a obrigao de responder por danos originrios daquelas faculdades. Logo, o princpio da autoridade e seu exerccio so os que podem levar determinado sujeito a ser vtima de uma leso. (COSTA, 2009, p.36)

Percebe-se que continua nesta teoria prevalecendo a base do risco profissional, mas no somente pela fato da atividade empresarial representar perigo ao trabalhador e portanto deve ser amparado pelo empregador, mas tambm pelo fato de estar subordinado ao mesmo atravs do contrato de trabalho em que se comprometeu vender parte de sua mo de obra em troca de um salrio. Havendo a autoridade do empregador e a subordinao do empregado no cumprimento das ordens recebidas, percebe-se que o acidente de trajeto poderia ser includo

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na proteo do trabalhador atravs dos fundamentos que norteiam a teoria do risco da autoridade. Sabiamente, Costa escreveu:

H pondervel corrente doutrinria que entende residir na teoria do risco da autoridade a explicao do ressarcimento dos acidentes in itenire, porquanto a autoridade do patro comea e termina no mbito de seu estabelecimento, ou, ainda, quando a atividade laboral se estende, fisicamente, fora do mesmo (ex.: viajantes comerciais, trabalhadores a domiclio, etc.) Ao exemplo podem-se acrescentar os infortnios sofridos a caminho ou no retorno do trabalho. (COSTA, 2009, p.37)

Entendimento idntico tem Freudenthal, (2007, p. 25), ao afirmar que, o risco da autoridade ampliaria a cobertura para alm da atividade industrial, tambm para os trabalhadores no comrcio e na agricultura. Desta forma o trabalhador estando subordinado s ordens do empregador, inclusive por aquelas dadas pelo seu preposto, a esta caberia indenizar ou reparar o dano sofrido pelo obreiro acidentado, pois fundamenta-se esta teoria que o risco originado pela autoridade exercida pelo empregador sobre o seu contratado. Logo se percebe que os pressupostos necessrios para caracteriz-lo so a existncia de um contrato de trabalho, o nexo de causalidade entre este e o acidente e a autoridade exercida pelo empregador sobre o empregado.

1.3.7 A Teoria do Responsabilidade Social

Hertz Jacinto Costa (2009):A teoria em exame avana no sentido de que toda a sociedade, como um todo, que deve dar assistncia queles que so vitimados, porquanto a prpria sociedade que, de uma forma ou de outra, se beneficia com os bens e servios criados pelo trabalhador. (...), no se cogita de culpa do patro ou do empregado no uso do maquinrio ou forma de execuo da atividade laborativa. (COSTA, 2009, p.38)

Ora, se toda a sociedade se beneficia dos bens produzidos pela fora laboral do trabalhador, seria lgico pensar que cabe ao Estado criar meios para amparar o trabalhador quando este sofresse o infortnio do acidente do trabalho, pois estando ele desamparado e no

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tendo conseguido provar a culpa do empregador, ou o empregador provou que o acidente no ocorreu por culpa exclusiva do trabalhador, criar problemas para a sociedade em que vive, havendo a possibilidade de aumento da criminalidade e outros conflitos sociais. No entendimento de Freudenthal, (2007, p. 27), a idia de incluso dos acidentes do trabalho na seguridade social, teoria do risco social, forma ento o fundamento bastante utilizado em altercaes na atualidade. Portanto, esta teoria conduz a cobertura do acidente do trabalho amparando o trabalhador infortunado atravs de um seguro social. No Brasil, atualmente o regramento da legislao acidentria trabalhista encontrase disposta na Lei 8.213/91 que dispe sobre os planos e benefcios da previdncia social, estando amparado constitucionalmente na Constituio da Repblica Federativa do Brasil no 10 do art. 201, conforme segue:

Art. 201. A previdncia social ser organizada sob a forma de regime geral, de carter contributivo e de filiao obrigatria, observados critrios que preservem o equilbrio financeiro e atuarial, e atender, nos termos da lei, a: (...) 10. Lei disciplinar a cobertura do risco de acidente do trabalho, a ser atendida concorrentemente pelo regime geral de previdncia social e pelo setor privado. (PINTO (et al), 2010, p. 66)

Esta insero constitucional nos leva a crer que no Brasil o risco infortunstico acerca da ocorrncia do acidente do trabalho deve ter a proteo da sociedade atravs dos braos ptrios do Estado. Neste momento inicia-se o questionamento que originou o presente estudo, apesar de estar constitucionalmente previsto o amparo ao trabalhador vitimado pelo acidente do trabalho, cabe ao Estado arcar com todos os nus decorrentes de seu infortnio, mesmo que o culpado do acidente possa ter sido o empregador por no ter colocado a disposio de seu trabalhador um meio ambiente de trabalho seguro. Buscando novos subsdios para esta questo analisaremos no prximo captulo a relao do acidente do trabalho com a seguridade social, para retornar a este questionamento no ltimo captulo do presente estudo.

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2. O ACIDENTE DO TRABALHO E A SEGURIDADE SOCIAL

Observa-se no ordenamento jurdico brasileiro que a seguridade social abrange trs campos distintos, sendo: 1) os direitos sade, sendo colocados disposio de todos os indivduos da sociedade brasileira, sem distino alguma, tampouco exigindo uma contrapartida em forma de contribuio; 2) os direitos a assistncia social, tambm de forma a no exigir contribuio por parte do indivduo, mas disponveis somente para aqueles que preencherem determinados requisitos de extrema necessidade assistencial e 3) no campo do nosso estudo a previdncia social disponvel para aqueles que estabeleceram a condio de contribuintes da previdncia social atravs de um regramento prprio. O Direito da Seguridade Social, nas palavras de Srgio Pinto Martins, refere-se a um:

(...) conjunto de regras e de instituies destinado a estabelecer um sistema de proteo social aos indivduos contra contingncias que os impeam de prover as suas necessidades e de suas famlias, integrado por aes de iniciativa dos Poderes Pblicos e da sociedade, visando assegurar os direitos relativos sade, previdncia e assistncia social. (MARTINS, 2009, p. 20)

Sendo, portanto o campo da previdncia social inserido na seguridade social ainda bastante amplo, delimitar-se- mais uma vez o campo de estudo, focando o mesmo na questo da previdncia acidentria, motivo central desse trabalho. Neste sentido, a nossa atual Constituio da Republica Federativa do Brasil positiva um regime especial para o acidente do trabalho em seu artigo 7, incisos XXII e XXVIII, protegendo de forma especial o trabalhador por consider-lo hipossuficiente frente ao sistema capitalista existente no nosso pas. Neste sentido, positiva-se:

Art. 7 So direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, alm de outros que visem melhoria de sua condio social: (...) XXII - reduo dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de sade, higiene e segurana; XXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenizao a que este est obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa; (PINTO (et al), 2010, p. 12)

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Tratando da relao do sistema constitucional da seguridade social tem-se na obra de Marco Fridolin Sommer Santos apontamentos que levam compreenso que a implementao do sistema de seguridade social na Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988, caracteriza o Brasil como um Estado social de direito. Sabiamente afirma:Sob o fundamento da solidariedade, o Estado intervm nas relaes jurdicas dos particulares, implementando medidas com objetivo de tutelar a dignidade da pessoa humana, o bem-estar e a justia social, positivados nos arts. 1, III, 170 e 193 da constituio. O direito seguridade social, garantindo a liberdade da necessidade, caracteriza-se como direito social fundamental, conferindo aos particulares direitos a prestaes positivas. No Estado social, a seguridade representa o principal instrumento de que se dispe para a consecuo desses objetivos. O Art. 194 da Constituio Federal define a seguridade social como o conjunto integrado de aes de iniciativa dos Poderes Pblicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos sade, a previdncia e assistncia social. (SANTOS, 2008, p. 122)

Percebe-se com esta positivao legislativa um amparo social ao trabalhador infortunado pela ocorrncia de um acidente do trabalho, doena do trabalho ou profissional, sendo o ponto de partida em relao aos acidentes de trabalho o art. 7, incisos XII e XXVIII, da Constituio Federal, permitindo entender a coincidncia de regimes e o cmulo de indenizaes atravs do seguro contra acidentes do trabalho e a indenizao devida pelo empregador em caso de dolo ou culpa. Entretanto, acredita-se que o elemento mais importante acrescentado foi o inciso XII que se refere preveno de acidentes. Sendo direitos dos trabalhadores para a melhoria de sua condio social a reduo dos riscos inerentes ao trabalho, atravs do cumprimento de normas de sade e higiene do trabalho, esta normatizao j estava positiva pela Lei 6.614 de 22/12/1977. imperativo desde aquele momento que o empregador deveria reduzir os riscos que pudessem infortunar o trabalhador atravs da adoo dos meios preventivos positivados pelas normas regulamentadoras de segurana e medicina do trabalho. No menos importncia dever ser dado ao inciso XXVIII positivando a responsabilidade objetiva e o seguro de acidentes com responsabilidade obrigatria.

2.1 AS INSTITUIES SEGURADORAS

Apesar da atividade de seguro ser exercida desde a sua origem por instituies

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formadas por pessoas jurdicas, o seguro do acidente do trabalho face ao seu carter social foi exercido ao longo da histria por pessoas jurdicas de direito pblico e por pessoas jurdicas de direito privado inclusive concorrendo entre si. Segundo, Santos, (2008, p. 58) a primeira lei de acidentes do trabalho brasileira foi estabelecida pelo regulamento 13.498 em 1919, mantendo a autorizao para sindicatos e companhias seguradoras operarem o seguro de responsabilidade civil por acidentes do trabalho. Continuando a parafrasear Santos, tem-se que em 1922 atravs do Decreto 22872 foi criado o primeiro seguro estatal contra acidentes de trabalho denominado Instituto dos Martimos, sendo obrigatrio para esta categoria profissional. J pela fora do Decreto-Lei 1355 em 1939 os demais IAPS Institutos de Aposentadoria e Penses puderam estabelecer um regime de livre concorrncia entre as seguradoras privadas e os institutos de previdncia social. A terceira lei de acidentes do trabalho, em 1944, atravs do Decreto-Lei 7036, positivava que os seguros de acidentes de trabalho deveriam ser administrados pela instituio da previdncia social a que o empregado estivesse filiado, em face da natureza de sua categoria profissional. J em 1945 o Decreto-Lei props pela primeira vez uma unificao da previdncia social no Brasil, porm esta lei nunca foi regulamentada. Apenas em 1967, atravs da Lei 5.31,6 com a extino do seguro de acidentes do trabalho privado, a referida lei atraiu o regime especial de acidentes do trabalho para dentro do sistema de previdncia social no recm-criado INPS Instituto Nacional da Previdncia Social, encerrando a discusso acerca do seguro do acidente do trabalho sendo pblico ou privado. A questo voltou ao debate recentemente atravs da publicao da emenda Constitucional n 20 em 1998, que acrescentou o art. 201 10, j citado no captulo anterior deste trabalho, prescrevendo uma gesto concorrente entre a iniciativa pblica e privada, porm at o momento o dispositivo no teve regulamentao infra-constitucional. Nestes termos, Freudenthal escreve que:

Na prtica estava estabelecida a incluso dos acidentes do trabalho no conjunto de riscos sociais, restando como diferencial entre benefcios previdencirios e acidentrios meramente o ttulo. Vale destacar que o auxlio-doena acidentrio ainda contm garantias trabalhistas importantes: a manuteno do emprego pelo prazo mnimo de doze meses aps a cesso do benefcio conforme o art. 118 da Lei

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8.213/91; e o depsito na conta do Fundo de Garantia por Tempo de servio, em razo do disposto na CLT, art. 4, pargrafo nico. (FREUDENTHAL, 2007, p. 93)

Importantssima esta garantia da manuteno do emprego do trabalhador aps o retorno do afastamento do benefcio acidentrio, visto que quando do retorno ao labor no meio ambiente de trabalho, este normalmente ainda poderia estar fragilizado pelo infortnio sofrido, no possuindo a mesma capacidade produtiva que tinha antes da ocorrncia do acidente, necessitando de um perodo de adaptao at restabelecer a sua capacidade laboral plena. Este dispositivo foi muito criticado pela classe empresarial, pois representava um nus para a mesma, visto que por ocasio do afastamento contratava-se um novo trabalhador para desempenhar as funes do acidentado e quando este retornava no tinha a sua vaga disponvel em face da existncia do trabalhador que tinha sido contratado para substitu-lo. Outro pretexto utilizado na sua defesa que o presente dispositivo iria fomentar a auto mutilao do trabalhador objetivando a manuteno do emprego em pocas de crise no mercado de trabalho, o que no prosperou. Freudenthal (2008, p. 93), ainda referencia que entre a integrao dos acidentes do trabalho nas responsabilidades da previdncia social, acompanhando a teoria do risco social, e a responsabilidade patronal por um seguro especfico, conforme a teoria do risco profissional, surge a privatizao do seguro do acidentes. Ocorre que a privatizao do seguro de acidentes de trabalho ainda est pendente de regulamentao, apesar de haver inmeras seguradoras privadas interessadas no mesmo, face ao vultoso montante financeiro envolvido. preocupante esta questo da privatizao do seguro do acidente do trabalho, por poder representar um retrocesso na matria infortunstica, podendo deixar desamparado o segurado por questes de segurana financeira da seguradora ou perdendo o carter social do seguro do acidente do trabalho de modo a interferir nos investimentos na rea prevencionista, mitigando os mesmos.

2.2 O SEGURO SOCIAL DO ACIDENTE DO TRABALHO

Com a criao do seguro do acidente do trabalho, desenvolvido por meio obrigatrio, segundo Santos (2008, p. 144), o seguro contra acidentes de trabalho tornou-se a ferramenta mais importante de garantia da efetiva reparao dos danos, em favor dos

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trabalhadores acidentados. Sabiamente, Santos referencia:

Os trs princpios responsabilidade objetiva, seguro obrigatrio e preveno de acidentes colocam o regime especial de acidentes do trabalho numa condio muito particular dentro do sistema jurdico, outorgando-lhe a necessria autonomia em relao aso sistemas de responsabilidade civil e seguridade social. Por um lado, o regime especial um subsistema do sistema de seguridade social, pois, nos termos das Leis ns. 8.212/91 e 8.213/91, o seguro obrigatrio contra acidentes do trabalho gerido exclusivamente pelo INSS. Por outro, o fato de ser custeado pelo empregador o caracteriza como um tpico seguro de responsabilidade civil. (SANTOS, 2008, p. 140)

Este seguro obrigatrio est positivado no art. 22 da Lei 8.212/91:

Art. 22. A contribuio a cargo da empresa, destinada Seguridade Social, alm do disposto no art. 23, de: (...) II - para o financiamento do benefcio previsto nos arts. 57 e 58 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, e daqueles concedidos em razo do grau de incidncia de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, sobre o total das remuneraes pagas ou creditadas, no decorrer do ms, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos: a) 1% (um por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado leve; b) 2% (dois por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado mdio; c) 3% (trs por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado grave. (PINTO (et al), 2010, p. 1463)

Cabe mencionar, que recentemente, pelo art. 10 da Lei 10.666, de 08/05/2003, a alquota de contribuio de um, dois ou trs por cento, em razo do grau de incidncia da incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, de que trata este inciso, poder ser reduzida em at cinqenta por cento, ou aumentada, em at cem por cento, conforme dispuser o regulamento, em razo do desempenho da empresa em relao respectiva atividade econmica apurada em conformidade com os resultados obtidos a partir dos ndices de freqncia, gravidade e custo calculados segundo metodologia aprovada pelo Conselho Nacional da Previdncia Social. Deste modo caso o desempenho da empresa em segurana do trabalho for superior a mdia nacional da atividade econmica a que pertence poder ter a alquota do seguro de acidente do trabalho reduzida em at 50%, porm se o seu desempenho for inferior a mdia

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nacional da atividade econmica a que pertence poder ter a sua alquota majorada em at 100%. De modo geral isto desencadeou inicialmente entre os empresrios

descontentamentos dos mais diversos, face ao desinteresse no investimento na rea preventiva, porm ao analisar a questo mais atentamente, ao realizar o devido investimento, objetivando a reduo de acidentes de trabalho e os afastamentos devidos a estes, ao invs de arcar com prejuzo a questo poder representar lucros na cadeia produtiva. Em sua obra, Santos afirma tambm, que o empresrio deve ser incentivado a adotar meios preventivos para evitar o infortnio da ocorrncia do acidente do trabalho:

Alm do estmulo preveno dos acidentes por parte da empresa o INSS, na qualidade de gestor do seguro contra acidentes do trabalho, tem condies de fomentar a poltica de investimentos em medidas de preveno. O INSS tambm tem interesse em reduzir os custos com o pagamento de benefcios acidentrios, o que trona possvel na medida em que ele financie polticas de gesto e preveno dos riscos naquelas empresas em que os ndices de acidentes so mais elevados. (SANTOS, 2008, p. 151)

Segundo Santos (2008, p. 150), o seguro social, reassumindo a sua condio de seguro de responsabilidade, diminui a restrio do custo de acidentes do trabalho liberdade de iniciativa econmica. Deste modo, o seguro de acidente do trabalho permite que a coletividade das empresas contribuintes socialize o pagamento da indenizao devida ao trabalhador segurado acidentado. Outrossim, os custos deste seguro so repassados ao consumidor atravs da incluso destes custos no preo final do produto fabricado ou comercializado, afinal, o consumidor que deve sustentar os custos da produo. Poder-se-ia afirmar que a instituio deste seguro diminui o impacto das indenizaes que por ventura a empresa teria que arcar com o pagamento de indenizaes, ao mesmo tempo que, d uma certeza ao trabalhador em no ficar desamparado por ocasio do sofrimento de um acidente do trabalho. Sabiamente, Santos (2008, p. 153), afirma que, a possibilidade de combinar os objetivos da compensao de danos e a reduo dos acidentes que faz com que se justifique na atualidade a revitalizao de um regime especial de acidentes do trabalho, distinto do regime geral da previdncia social.

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2.3 A RELAO JURDICA DO SEGURO DO ACIDENTE DO TRABALHO

No incio do sculo XX, o seguro de acidente do trabalho era um seguro de responsabilidade civil, pelo qual o empregador realizava o pagamento de um determinado valor para assegurar-se contra o risco profissional, ou seja, o risco a que a sua atividade econmica desenvolvia perante o empregado contratado. Nestes termos a seguradora obrigava-se perante o empregador impedindo o empregado de demandar ao diretamente contra a seguradora, fosse esta uma instituio pblica ou privada, permitida naquela poca. As palavras de Santos explicam muito bem a questo:

Diante dessa relao jurdica bilateral, a Seguradora somente poderia ser acionada pelo empregado, aps o reconhecimento da responsabilidade civil do empregador. Ainda que a demanda tivesse sido proposta contra ambos, garantia-se na sentena apenas o direito de regresso do empregador conta a Seguradora, em razo do que, antes da Seguradora, cabia ao empregador indenizar o empregado para, somente aps, reembolsar-se. Ou seja: verificado o acidente, o empregado segurado deveria denunciar lide a Seguradora. Sob esse regime especial, a responsabilidade civil da seguradora decorria do contrato de seguro. O sistema garantia a certeza da reparao, mas deixava a desejar quanto a celeridade. (SANTOS, 2008, p. 61)

Desta forma o trabalhador infortunado pelo sofrimento de um acidente do trabalho deveria primeiramente demandar contra o empregador, objetivando o reconhecimento de sua responsabilidade civil perante o acidente do trabalho ocorrido para depois demandar a ao contra a seguradora contratada pelo empregador. A partir da Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988, precisamente devido ao inciso XXVIII do art. 7, segundo Humberto Theodoro Jnior, citado por Santos em sua obra:(...) a responsabilidade civil por acidentes do trabalho caiu totalmente no regime do Cdigo Civil. Isso por que no seu entender, a Constituio de 1988, alm de manter o regime de seguro previdencirio para ao acidentes do trabalho, deu o passo final para separar, total e definitivamente, o regime da infortunstica do regime de responsabilidade civil. (SANTOS, 2008, p. 67)

Ainda, Santos citando agora Srgio Cavalieri Filho ...temos, por fora do dispositivo constitucional, duas indenizaes autnomas e cumulveis: a acidentria, fundada

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no risco integral que deve ser exigida do INSS - Instituto Nacional de Seguro Social, e a do patro, fundada na culpa, ainda que leve (CAVALIERI FILHO citado por SANTOS, 2008, p. 67). Apesar de no se justificar a compensao de dois sistemas para solucionar a reparao de um mesmo dano sofrido pelo trabalhador, Santos defende a tese:

(...) segundo a qual a prestao previdenciria ao conceder assistncia ao trabalhador, com base na teoria do risco social, no poderia ser confundida com a indenizao devida pelo empregador, cuja funo seria no a satisfao das necessidades do trabalhador acidentado, mas uma simples reparao do dano causado por ato ilcito do empregador. (SANTOS, 2008, p. 71)

Neste sentido a interpretao dominante existente atualmente na doutrina brasileira vislumbra no dispositivo constitucional do inciso XXVIII do art. 7 a positivao de dois regimes para compensar os danos por acidente do trabalho, defendendo-se desde a Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988 a coincidncia de regimes e o cmulo das indenizaes. Poderia entender-se que o trabalhador beneficirio da Previdncia Social teria o direito do recebimento de duas indenizaes quando tivesse o infortnio de se acidentar, o que de fato no ocorre, conforme a frase muito bem colocada por Sebastio Geraldo de Oliveira, em sua obra:[...] o seguro de acidente do trabalho no Brasil, apesar da denominao, no tem natureza jurdica nem contedo de seguro privado. Apesar do nome de seguro, s garante um benefcio estrito de cunho alimentar. Sua regulamentao no contempla indenizao alguma, nem determina reparao dos prejuzos sofridos; apenas concede benefcios previdencirios para garantir a sobrevivncia da vtima e/ou seus dependentes, como ocorre com todos os demais segurados da Previdncia Social. Dentro dessa perspectiva, asseverou Rui Stoco: Esse seguro-acidente, pelas suas caractersticas, no tem natureza propriamente indenizatria, mas de benefcio social ou seguro social, de natureza previdenciria. (OLIVEIRA, 2006, p. 111).

H desta forma duas questes a serem analisadas no art. 7, XXVII, primeiramente, na questo de seguro de acidente do trabalho a cargo do empregador, referemse a princpio a um seguro custeado pelo empregador que a princpio seria contratado no setor privado, no sendo aquele que institudo pelo setor previdencirio, j em segundo lugar o dispositivo faz referncia a indenizao que o trabalhador teria direito quando o empregador incorrer em dolo ou culpa, que este ter que buscar judicialmente atravs de uma ao contra

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o empregador, se assim o quiser. H necessidade de mencionar que esta ltima s ocorrer se o mesmo ajuizar a ao competente. Da mesma forma Marco Fridolin Sommer Santos interpreta sob sua tica e reescreve o artigo 7 da Constituio Federal:

[...] pode se ler tambm seguro de acidentes de trabalho, a cargo do empregador, incluindo a indenizao a que este est obrigado em caso de culpa ou dolo, ao invs de, seguro de acidentes do trabalho, a cargo do empregador, cumulando a indenizao a que este est obrigado em caso de culpa ou dolo. (SANTOS, 2008, p. 79).

Comea-se a compreender, para que o empregador possa ser responsabilizado face ocorrncia de algum acidente do trabalho o mesmo deve concorrer de alguma forma, qual seja, omitir-se voluntariamente, agir com negligncia ou imprudncia, violando dessa forma o direito de outrem, devendo neste caso reparar o dano que causou. Porm, isso s ocorrer se aquele que se sentir lesado de alguma forma buscar os respectivos remdios judiciais atravs da ao competente. Nesse sentido Srgio Pinto Martins esclarece:

No exatamente o risco da atividade do empregador que ensejar o pagamento da indenizao por responsabilidade civil, mas a no-observncia de normas de preveno de acidentes que o empregador no cumpriu ou o seu intuito deliberativo em causar o acidente. (MARTINS, 2009, p. 436).

Entendimento anlogo poder ser dado ento no ressarcimento aos cofres pblicos por benefcios pagos pela Previdncia Social, quando concorreu atravs de alguma das formas destacadas no pargrafo anterior na ocorrncia do acidente do trabalho sofrido por seu empregado. Pois, caso no tivesse agido por omisso, negligncia ou impercia o seu empregado no teria se acidentado. Desta forma o empregador mesmo realizando o pagamento do seguro de acidente do trabalho, no pode se eximir da responsabilidade de cumprir as normas de segurana e higiene ocupacional, impostas pela legislao especfica. Silveira entende neste sentido:Nem se tente argumentar que o simples pagamento do SAT (Seguro Acidente do trabalho) exime a empresa de se preocupar com a segurana do trabalhador.

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Se assim fosse aceito pelo direito, estar-se-ia, ao criar o SAT, estipulando um alvar do Poder Pblico para que as empresas fossem displicentes e despreocupadas com a segurana no trabalho. Neste absurdo caso, estaria estipulada a seguinte regra para as empresas: ou pague o SAT ou coloque os equipamentos de segurana que a lei determina. Por bvio que o legislador jamais tomaria esta atitude. O Direito exige que (1) as empresas recolham o SAT e (2) providenciem os equipamentos de segurana para os trabalhadores. O descumprimento de qualquer um acarreta os nus que lhe so particulares. (SILVEIRA, 2003).

Entendimento idntico possui Sergio Pinto Martins:A responsabilidade civil decorrente do acidente do trabalho independe da responsabilidade previdenciria. possvel a acumulao de ambas as hipteses desde que haja dolo ou culpa do empregador. [...] O benefcio previdencirio decorre da teoria do seguro social, sendo pago pelo INSS. A responsabilidade civil decorrente da culpa do empregador, por meio de seu preposto. So reparaes distintas, com sujeitos passivos diversos. (MARTINS, 2009, p. 435).

Conforme exposto, aquele que causar dano a outrem caber o dever de indenizar, nesse sentido so legitimamente capazes de buscar o ressarcimento pelo prejuzo sofrido, tanto o trabalhador lesado pelo acidente ou doena decorrente pelo trabalho realizado, bem como, a instituio da previdncia social, que teve que arcar com os pagamentos, realizados antecipadamente, sem a respectiva contribuio realizada pelos pagamentos do prprio trabalhador e respectivo empregador, resultando em prejuzos pela ocorrncia do esvaziamento dos cofres pblicos. O que realmente est em pauta a proteo do trabalhador considerado hipossuficiente em relao ao capitalismo existente no atual cenrio globalizado, no no sentido de proteger somente o trabalhador fragilizado no sentido puro da palavra, ou seja, aquele que teve o infortnio de se acidentar, mas sim todos os trabalhadores inseridos no contexto da relao de emprego, que igualmente so beneficirios da previdncia social, visto que o resgate antecipado no pagamento de benefcios previdencirios gerar prejuzos de ordem financeira ao respectivo instituto. Neste contexto Cludio Brando afirma:

O que importa , na linha da sustentao doutrinria da prevalncia do princpio constitucional da dignidade da pessoa humana, diretriz maior de todo o sistema jurdico, afirm-lo cotidianamente, passando da retrica adoo de medidas

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concretas, baseadas na interpretao do arcabouo legislativo existente, para tornlo efetivo, real, atingindo, dessa forma, a finalidade de sua prpria insero no ordenamento. (BRANDO, 2006, p. 331).

Por outro ngulo Marco Fridolin Sommer Santos vislumbra que:

Tratando-se de acidentes de trabalho, conforme Aguiar Dias, na maior parte dos casos (...) no existe culpa, quer do operrio, quer do patro. Na contratao do trabalho em massa, desaparece, por exemplo, a superviso pessoal do empregador, transferindo-se a eventual responsabilidade subjetiva aos seus proposto. Pior, segundo Luis Josserand, os danos havidos no contexto da atividade industrial, se tornaram annimos. Na mesma linha Stefano Rodot afirma que, os danos esto coligados diretamente a dados industriais ou tcnicos, caracterizando-se por serem causados anonimamente. (SANTOS, 2008, p. 77).

Estas palavras poderiam levar ao entendimento que a ocorrncia do acidente do trabalho seria um acontecimento ocasional, que no seria consequncia da falta de implantao de meios preventivos por parte do empregador na busca de evitar a ocorrncia do mesmo. Isto derrubaria por terra a afirmao muito utilizada por profissionais prevencionistas de que todo acidente pode ser evitado, desde que as devidas medidas prevencionistas sejam aplicadas a contento. Neste sentido, Marco Fridolin Sommer Santos esclarece:

A grande justificativa para se defender a tese de que, alm de custear o seguro de acidentes de trabalho deve o empregador indenizar de novo o empregado em caso de culpa ou dolo, repousa sobre o animus punitivo-preventivo da conduta ilcita, em nome da incolumidade psico-fsica do trabalhador. (Santos, 2008, p. 76).

Entendendo que a importncia do presente dispositivo constitucional seja de valor inestimvel para o trabalhador hipossuficiente na sua essncia, na condio de necessitar submeter-se a venda de sua fora de trabalho em troca do salrio para sustentar-se a si mesmo e sua famlia, a mesma viso jurdica-prevencionista deveria ser entendida pelo empregador quando contrata a mo de obra do mesmo. Desta forma, tratando-se de um dispositivo constitucional, o referido inciso de suma importncia para o trabalhador, em face de proteger o que este tem de mais precioso, que a sua sade, que diretamente relacionada a sua capacidade de trabalho, fato este dificilmente compreendido pelo mesmo. Pois, obrigando o empregador a reduzir os riscos ocupacionais do ambiente laboral, busca-se obter um ambiente de trabalho mais seguro e com

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menor incidncia de acidentes e doenas no trabalho, melhorando a qualidade dos trabalhadores que laboram na empresa. Portanto, o cumprimento integral deste dispositivo trar benefcios diretos para o empregador na forma de aumento de produtividade em face, da no ocorrncia de afastamentos do trabalho, motivao em alta dos trabalhadores, desnecessidade de treinar trabalhadores novos para substituir o trabalhador afastado. Deste modo a promoo da sade e da qualidade de vida no ambiente de trabalho minimizar o aparecimento e o agravo de doenas, evitando sofrimentos e gastos desnecessrios para as empresas, inclusive na esfera judicial, bem como, para o instituto previdencirio. De outra forma, a no aplicao efetiva do dispositivo constitucional deixa o empregador e seu capital diretamente exposto aos efeitos das decises judiciais que eventuais empregados seus buscarem sua tutela perante o Estado, bem como, a vontade do instituto previdencirio em buscar o devido ressarcimento com os pagamentos beneficirios gerados antecipadamente face responsabilidade objetiva que possui. Desta forma, afirma-se que o cumprimento do inciso XXII do art. 7 da Constituio Federal de suma importncia, no s para o trabalhador e seu empregador, mas tambm para toda a sociedade brasileira, visto que implicaria diretamente em diminuio de custos pagos para a manuteno da sade do trabalhador, bem como, economia com os benefcios no pagos pela previdncia social, cujos valores poderiam ter melhor aplicabilidade em outras reas de interesse social. Ora, isso poderia levar a crer que no haveria muita importncia por parte do empregador investir na preveno de acidentes, pois independente das medidas prevencionistas adotadas, caberia indenizar o funcionrio acidentado, independente da presena da ilicitude do fato, com a culpa ou dolo do empregador. S que este entendimento totalmente equivocado, pois j em seguida Santos afirma que o sistema de responsabilidade objetiva estimula a preveno de acidentes nas empresas:

Neste contexto, errneo imaginar que a imposio da pena privativa possa contribuir para a preveno de acidentes. Muito pelo contrrio, a busca do culpado inibe a preveno, pois com o objetivo de escapar da punio, ele agir procurando ocultar as causas do acidente, prejudicando tanto a eliminao ou reduo do riscos futuros, quanto o direito indenizao da vtima, diante da excludente de culpabilidade. Sob um sistema de responsabilidade objetiva, a preveno de acidentes estimulada, para fim de evitar o pagamento de futuras indenizaes (Santos, 2008, p. 78).

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Neste contexto o empregador na sua necessidade de se proteger poderia pensar em se proteger inserindo no contrato de trabalho clusula de excluso do dever de indenizar em caso de inadimplemento da obrigao. Esta possibilidade logo afastada pelo princpio de proteo vigente no direito do trabalho existente no ordenamento jurdico brasileiro. Tanto que, Cludio Brando, muito bem explicita isto em sua obra:

Os pressupostos de afastamento da validade de tal ajuste no direito do consumidor so os mesmos presentes na legislao obreira: a inexistncia de igualdade entre as partes, tal como assinalado por Pablo Gagliano e Pamplona Filho, que apontam ainda a no infringncia de preceitos de ordem pblica, compatvel, alis, com o dispositivo da legislao consolidada. (BRANDO, 2006, p. 301).

Portanto os fundamentos jurdicos analisados servem para garantir quele que arcou com o nus o direito de regresso em ao competente contra aquele que agiu com dolo, culpa ou negligncia, cabendo perfeitamente previdncia social a utilizao deste remdio jurdico em ao de regresso face ocorrncia de acidente do trabalho com trabalhador empregado de empresa que no cumpriu as normatizaes especficas estabelecidas no que se refere preveno laboral. Assim chega-se ao tema que motivou o incio deste estudo apesar de vrios fundamentos jurdicos j terem sido apresentados cabe analisar os aspectos legais que levam a interpretar os dispositivos que levam a constitucionalidade ou no da possibilidade de se mover a ao regressiva acidentria contra a empresa que j pagou pelo seguro do acidente do trabalho e at j indenizou civilmente o empregado infortunado pelo acidente do trabalho sofrido sob a culpa do empregador no ter investido na preveno de acidentes. Procede-se ento a partir deste ltimo captulo a anlise da constitucionalidade ou no do artigo 120 da Lei 8.213/91 em consonncia ao disposto no Cdigo Civil de 2002.

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3. A AO REGRESSIVA ACIDENTRIA

Foco principal do estudo a ao regressiva acidentria consiste basicamente em fazer retornar aos cofres pblicos os valores monetrios pagos indevidamente pela previdncia social ao beneficirio acidentado, pela falta de condies mnimas de segurana encontradas em seu ambiente de trabalho devido a no aplicabilidade do seu empregador das normatizaes em segurana do trabalho existentes no ordenamento jurdico nacional e internacional quando previsto no mesmo.

3.1 CONCEITO DE AO REGRESSIVA ACIDENTRIA

Em primeira anlise estas aes poderiam ser conceituadas como o meio processual utilizado pelo INSS - Instituto Nacional do Seguro Social objetivando obter o ressarcimento de valores pagos a ttulo de benefcio acidentrio ocorridos por culpa do empregador que descumpriu as normas de segurana e medicina do trabalho. Entretanto Fernando Maciel entende que:

(...) esse instituto deveria ser reconhecido no apenas como uma ao de cobrana pela qual o INSS visa o ressarcimento dos gastos suportados por culpa dos empregadores, mas, principalmente, por representar um relevante instrumento punitivo-pedaggico de concretizao da poltica pblica de preveno de acidentes. (MACIEL, 2010, p. 16).

Com efeito, sob este prisma, os empregadores estaro sujeitos, no mais somente ao pagamento do seguro do acidente do trabalho, a indenizao civil para a reparao da seqela do trabalhador, mas tambm ao pagamento dos gastos que o instituto previdencirio teve que realizar desnecessariamente quando do pagamento do auxlio-doena por acidente do trabalho ou antecipadamente quando da ocorrncia do pagamento da aposentadoria por invalidez por acidente do trabalho. imprescindvel registrar o conceito de ao regressiva dado por Adriana Carla Morais Igncio, citado por Fernando Maciel em sua obra afirmado que a ao regressiva acidentria o instrumento de preveno de novos acidentes, quando afasta a impunidade daqueles que, desprezando seu dever, negligenciam a vida e a integridade fsica do trabalhador (IGNCIO, 2007, p. 570 apud MACIEL, 2010, p. 16)

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Percebe-se, neste sentido, que a existncia da ao regressiva acidentria pode ser instrumento til punitivo e pedaggico para obrigar os empregadores e demais responsveis a darem maior ateno ao meio ambiente de trabalho em que seu empregado exerce as suas tarefas laborais dirias.

3.2 AS PREVISES LEGAIS DA AO REGRESSIVA ACIDENTRIA

A ao regressiva acidentria amparando-se no art. 120 da Lei 8.213/1991, possui um carter imperativo, conforme pode ser observada na positivao que segue:

Art. 120. Nos casos de negligncia quanto s normas padro de segurana e higiene do trabalho indicados para a proteo individual e coletiva, a Previdncia Social propor ao regressiva contra os responsveis. (PINTO (et al), 2009, p. 1494).

Encontra-se tambm positivado na Lei 10.406, de 10/01/2002, Cdigo Civil brasileiro nos seus artigos, 186, 187, 927, e 934 o que seguem:

Art. 186. Aquele que, por ao ou omisso voluntria, negligncia ou imprudncia, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilcito. Art. 187. Tambm comete ato ilcito o titular de um direito que, ao exerc-lo, excede manifestadamente os limites impostos pelo seu fim econmico ou social, pela boa-f ou pelos bons costumes. (PINTO (et al), 2009, p. 161).

Art. 927. Aquele que, por ato ilcito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repar-lo. (...) Art. 934. Aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que houver pago daquele por quem pagou, salvo se o causador do dano for descendente seu, absoluta ou relativamente incapaz. (PINTO (et al), 2009, p. 212 e 213).

Isto posto, percebe-se que o presente instituto estabelece que a Previdncia Social, no s poder, mas sim dever, buscar o ressarcimento de valores pagos a beneficirios junto aos responsveis que deixaram de adotar medidas preventivas bsicas em matria de

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segurana e higiene do trabalho, previstas em normatizao especfica prevista nos art. 154 200 da Consolidao das Leis do Trabalho (CLT) e da Portaria n. 3.214, de 08/06/1978, que instituiu as Normas Regulamentadoras (NR) em segurana e medicina do trabalho. Pelo fato da previdncia possuir responsabilidade objetiva, no que se refere a suportar os custos do pagamento do benefcio ao acidentado, esta tem que arcar com o nus da ocorrncia de tal fato, logo aps o infortunado por acidente do trabalho ingressar com o pedido do benefcio acidentrio, no deixando o beneficirio segurado desamparado socialmente no momento em que se encontra fragilizado pelo acidente sofrido. Ora, se o empregador deixou de atender os dispositivos preventivos obrigatrios previstos em legislao especfica e este fato motivou a ocorrncia do acidente do trabalho, certo que est cometendo um ato ilcito previsto nos artigos 186 e 187 do Cdigo Civil de 2002 e dever repar-lo conforme dispe o artigo 927 do mesmo cdigo. Continuando o raciocnio, uma vez que o trabalhador acidentado por ato ilcito, busca o benefcio previdencirio, o Instituto Previdencirio dever objetivamente pagar o benefcio a que o trabalhador fizer jus, neste caso o amparo legal encontra-se no art. 934 em que aquele que ressarcir um dano causado a outrem pode reaver o que houver pago daquele por quem pagou. Entretanto a Instituto Previdencirio no necessita lanar mo deste dispositivo legal, apesar de perfeitamente aplicvel ao caso, pois se encontra positivado o art. 120 de Lei 8.213/91 em que no d apenas a opo de poder ou no buscar o respectivo ressarcimento, mas sim, condiciona ao Instituto Previdencirio obrigatoriamente atravs do verbo propor a estabelecer a ao regressiva acidentria contra os responsveis que motivaram a ocorrncia do acidente do trabalho. Destarte, Claudio Mascarenhas Brando, citado por Fernando Maciel em sua obra:

(...) tambm corrobora o entendimento de que a deciso de ingressar com a ao, portanto, no permanece no plano da convenincia da Previdncia Social, isto por que: Como se no bastasse, o legislador preocupou-se em reforar no apenas o dever de ressarcimento, mas o carter compulsrio da postura a ser adotada pele previdncia, quando a previu e at mesmo orientou a atuao em Juzo, ao definir que no seriam compensveis o benefcio por ela pago e a indenizao a cargo do empregador (art. 120 e 121 da Lei n. 8.213/91). Com efeito, a primeira concluso que se deve extrair do art. 120 da Lei n. 8.213/91 no sentido de que esse preceito no criou qualquer direito em prol do INSS, mas sim um dever de agir. (MACIEL, 2010, p. 17).

Objetiva-se com este procedimento no somente o ressarcimento dos gastos suportados pelo INSS Instituto Nacional do Seguro Social por culpa dos empregadores, mas

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tambm punir e disciplin-los de forma a adotarem os preceitos preventivos previstos na normatizao especfica em segurana e medicina do trabalho.

3.3 OS PRESSUPOSTOS NECESSRIOS DA AO REGRESSIVA ACIDENTRIA

Raciocinando-se no sentido de que o interesse do INSS Instituto Nacional do Seguro Social a busca de valores pagos ao beneficirio por culpa do empregador no ter adotado os meios preventivos necessrios, os pressupostos necessrios concorrentes que devem estar presente para fundamentar a presente ao so: 1) a ocorrncia do acidente do trabalho ocorrido com um segurado do INSS Instituto Nacional do Seguro Social, abrangendo alm do acidente do trabalho em si a doena profissional e do trabalho, conforme estabelecido pelo conceito legal no art. 19 e seguintes da Lei 8.213/91; 2) a realizao de um pagamen