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 MIRIAM CORTEZ DA (IR)REVERSIBILID ADE DAS TUTELAS DE URGÊNCIA Telêmaco Borba - PR 2013

TCC tutelas de urgência

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Trabalho de Conclusão de Curso - Direito - FATEB - Faculdade de Telêmaco Borba - área de Processo Civil - tema: Da (ir)reversibilidade das tutelas de urgência.

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MIRIAM CORTEZda (ir)reversibilidade das tutelas de urgncia

Telmaco Borba - PR

2013miriam cortezDA (IR)REVERSIBILIDADE DAS TUTELAS DE URGNCIAMonografia apresentada ao Curso de Direito, da Faculdade de Telmaco Borba, como requisito parcial de concluso de curso.Orientador: Prof. Esp. Ren Francisco HellmanTelmaco Borba - PR

2013Cortez, Miriam

COR

Da (ir)reversibilidade das tutelas de urgncia /Miriam Cortez. Telmaco Borba, PR : [s.n], 2013.

76f.

Orientador: Esp. Ren Francisco Hellman.

Monografia (TCC) Faculdade de Telmaco Borba.

Bibliografia: 76f.

1. Tutelas de urgncia. 2.Tutela Antecipada 3. reversibilidade 4. Direitos fundamentais. I.Hellman, Ren F.. II. Faculdade de Telmaco Borba.

CDD 347.2

MIRIAM CORTEZDA (IR)REVERSIBILIDADE DAS TUTELAS DE URGNCIAMonografia apresentada ao Curso de Direito, da Faculdade de Telmaco Borba, como requisito parcial de concluso de curso.COMISSO EXAMINADORA

______________________________________Prof. Esp. Ren Francisco Hellman

Faculdade de Telmaco Borba______________________________________Prof. Giuliano Tramontim Lacerda

Faculdade de Telmaco Borba______________________________________Prof.Cludia Haas Faculdade de Telmaco BorbaTelmaco Borba, ____ de___________ de 20__A Deus, aos meus pais, meu esposo e filhos,

companheiros de todas as horas... AGRADECIMENTOSAgradeo primeiramente a Deus pelo dom da vida e por ter me proporcionado a oportunidade de concluir mais um curso de graduao, com xito.

A minha famlia, meu esposo Joo de Jesus Carneiro Neto e meus filhos Pedro Lucas Cortez Carneiro e Pietra Cortez Carneiro, pela pacincia, compreenso, confiana e motivao que me dedicaram ao longo desses cinco anos de batalha.Ao Prof. Orientador Ren Francisco Hellman, mestre dedicado, brao amigo de todas as etapas deste trabalho, sempre com pacincia, dedicao, empenho, cuidado e, principalmente, com confiana no produto de nossos esforos conjuntos.Aos meus pais Elizeu Cortez e Ruteli Maria Banks Cortez pelas oraes e palavras de incentivo, assim como os meus segundos pais (sogros) Joo Carneiro Jnior e Ivanilda Costa Carneiro por terem acreditado no meu sonho e me incentivado a lutar por ele.

Aos amigos e colegas, pelo companheirismo, lutas, desentendimentos e momentos felizes que passamos juntos ao longo desta caminhada. Pela fora e pela vibrao em relao a esta jornada.

Aos professores e colegas de Curso, os quais contriburam significativamente para o meu crescimento pessoal e profissional, pois juntos trilhamos uma etapa importante de nossas vidas.

A todos que, com boa inteno, colaboraram para a realizao e finalizao deste trabalho.

Bendize, minha alma, ao SENHOR, e tudo o que h em mim bendiga o seu santo nome.Bendize, minha alma, ao Senhor, e no te esqueas de nenhum de seus benefcios.Ele o que perdoa todas as tuas iniquidades, que sara todas as tuas enfermidades,Que redime a tua vida da perdio; que te coroa de benignidade e de misericrdia,Que farta a tua boca de bens, de sorte que a tua mocidade se renova como a da guia.O Senhor faz justia e juzo a todos os oprimidos.Salmos 103:1-6.

CORTEZ, Miriam. Da (ir)reversibilidade das tutelas de urgncia. 2013.Monografia (Trabalho de Concluso de Curso) Faculdade de Telmaco Borba.

RESUMOO presente trabalho tem como tema central a anlise do instituto da antecipao de tutela, mais especificamente acerca da problemtica que envolve a irreversibilidade do provimento, bice concesso da medida, previsto no 2 do artigo 273 do Cdigo de Processo Civil, e que causa grandes discusses doutrinrias e jurisprudenciais acerca do conflito de interesses que tal dispositivo gera. Para tanto sero analisados os conceitos e distines entre normas, regras e princpios, os eventuais conflitos que podem surgir entre eles e, os mtodos de soluo destes. Da mesma forma sero abordados os conceitos dos novos direitos fundamentais no processo civil como a efetividade, celeridade e acesso justia, investigando-se como estes so tratados em relao ao tema em questo e, com base neles verificar a aplicao do instituto em comento, ainda que irreversveis os seus efeitos. A origem e evoluo histrica do instituto sero expostos, assim como os seus fundamentos e requisitos, e seus desdobramentos para concesso. E, por fim as diferenas entre a revogabilidade do provimento e a irreversibilidade de seus efeitos. O objetivo do presente estudo verificar se a irreversibilidade do provimento antecipado deve realmente ser bice concesso da medida considerando-se os princpios constitucionais do acesso justia, da celeridade e da efetividade. Sendo assim, sero expostos os posicionamentos doutrinrios acerca do tema.Palavras-chave: tutelas de urgncia; tutela antecipada; reversibilidade; direitos fundamentais.

CORTEZ, Miriam. The (ir)reversibility of urgency tutelages. 2013. Monograph (Course Conclusion Report) Telmaco Borba College.

ABSTRACTThe present report has as theme the analysis about the institute of tutelages anticipation, more exactly about the problematic relating to the irreversibility of providing which is an obstacle to grant the judicial order, as provided in the article 273, 2nd, of Civil Procedure Code, and what causes great doctrinarian and jurisprudential discussions about the conflict of interesting which is produced by this legal rule. For this, it will be analyzed the concepts and differences among norms, rules and principles, the occasional conflicts which may rise among them and the methods of resolving. Likewise it will be talked about the concepts of new fundamental rights, as like effectiveness, celerity and access to the justice, researching how these ones are treated relating to this subject and based on them to verify the applying of that institute even irreversible its effects. The origin and historic evolution of this institute will be exposed, besides the fundaments and requisites and its range for granting. And, in the end, it will be talked about the differences between the providing and irreversibility of its effects. The aim of present study is verify whether the irreversibility of the anticipated providing is an obstacle for granting the judicial order, considering the constitutional principles of access to the justice, of celerity and of effectiveness. Therefore, it will be exposed the doctrinarian positioning about the theme.

Keywords: tutelage of urgency; anticipated tutelage; reversibility; fundamental rights.

SUMRIO

1. INTRODUO.........................................................................................11

2. NORMAS, REGRAS E PRINCPIOS.......................................................13

2.1. Conceituao........................................................................................13

2.2. Importncia da distino entre normas, regras e princpios.................15

2.3. Coliso entre normas e critrios de soluo de conflitos.....................19

3. NOVAS LINHAS DO PROCESSO CIVIL: CELERIDADE, EFETIVIDADE E O ACESSO JUSTIA..................................................29

3.1. Acesso justia como direito fundamental...........................................29

3.2. Celeridade como fundamento de efetividade do acesso justia........33

3.3. O conflito entre direitos fundamentais..................................................39

4. DO INSTITUTO DA TUTELA ANTECIPADA..........................................44

4.1. Do surgimento da Tutela Antecipada no ordenamento jurdico brasileiro.......................................................................................................44

4.2. Da evoluo histrica da Tutela Antecipada no ordenamento jurdico estrangeiro...................................................................................................47

4.3. Requisitos necessrios para a concesso da atual Tutela Antecipada art. 273 do CPC........................................................................................54

4.4. Da revogabilidade do provimento e da irreversibilidade dos seus efeitos..........................................................................................................61

CONSIDERAES FINAIS.........................................................................66

REFERNCIAS............................................................................................68

1. INTRODUO

O processo o meio pelo qual se busca a satisfao de um direito lesado ou que sofre ameaa de leso. Sendo assim, desde que o Estado assumiu para si a responsabilidade de resolver os conflitos de interesses entre os homens, iniciou-se a busca pela efetividade da prestao jurisdicional.

E nessa busca os legisladores vm criando institutos com o intuito de prestar, de forma clere e efetiva, a tutela aos jurisdicionados. Dentro deste processo de evoluo histrica do direito que surgiu o instituto em questo, o qual passou por algumas alteraes at se chegar redao atual.

A grande preocupao da processualstica moderna tem se voltado para a efetividade do processo e, quando se fala em efetividade, no se est falando somente de uma deciso justa, mas uma deciso justa, em um processo clere, e isso tem sido motivo de preocupao devido a muitos fatores, e um deles e, no presente caso o mais importante, o da morosidade da justia.

Neste trabalho se far um estudo acerca do instituto da antecipao de tutela, mais especificamente acerca da problemtica da irreversibilidade do provimento pressuposto negativo da antecipao de tutela - o qual causou muitas discusses doutrinrias, devido ao conflito entre direitos fundamentais que surge em decorrncia de sua aplicao.

A inteno do legislador com a criao do referido instituto no foi a de obstar ou violar o princpio do acesso justia, mas atender a outro princpio constitucional da efetividade da prestao jurisdicional. No entanto, h que se ressaltar que o conflito aparente entre os princpios pode ser resolvido pelo magistrado no momento da deciso utilizando-se de outros princpios como o princpio da proporcionalidade e da razoabilidade.

Considerando que a irreversibilidade se descortinou como bice concesso da tutela antecipada quando pe em conflito, alm dos interesses divergentes das partes, tambm direitos fundamentais como o acesso justia e a segurana jurdica, ou ainda entre o acesso justia e a efetividade e celeridade do processo que se busca, atravs deste trabalho, verificar se h possibilidade de ser concedida a tutela antecipada mesmo sendo irreversveis seus efeitos.

O mtodo de pesquisa utilizado foi o indutivo qualitativo, desta forma, a fim de melhor entender o tema, o trabalho ser dividido em trs captulos, sendo que no primeiro sero abordadas as diferenas entre norma, regra e princpios ou direitos fundamentais e quais so os mtodos de soluo de conflitos existentes.

No segundo captulo sero abordados temas importantes e fundamentais para o estudo da antecipao de tutela que so os novos paradigmas da processualstica moderna, ou seja, os novos direitos fundamentais como o acesso justia, a efetividade e a celeridade do provimento jurisdicional.

No terceiro captulo adentrar-se- s questes relativas ao instituto em questo, pontuando seu conceito, sua evoluo histrica no Brasil e no mundo, como tambm e, principalmente, seus requisitos, dentre eles o da revogabilidade do provimento e a irreversibilidade dos seus efeitos.

O trabalho foi desenvolvido mediante pesquisa bibliogrfica, tendo sido consultados todo tipo de material disponvel sobre o tema como livros, artigos, monografias, peridicos, etc.2. Normas: regras e princpios2.1 Conceituao

O sistema jurdico brasileiro composto por normas, princpios e regras, sendo estes espcies do gnero norma. No raramente estes termos so confundidos em seus significados, portanto, de extrema importncia que se proceda respectiva distino.

O conceito de regra, encontrado em Canotilho, dispe que se trata de norma imperativa que prescreve uma exigncia que deve ou no ser cumprida e, considerando tratar-se de norma de aplicao especfica, no comporta excees, ou se aplica completamente ou no se aplica.

Para Amaral Jnior, as regras so prescries especficas que estabelecem pressupostos e consequncias determinadas, ou seja, a regra formulada para ser aplicada a uma situao especfica, diferentemente dos princpios.

Os princpios, por sua vez, tratam-se de normas com um mbito maior de generalidade, ou seja, no h uma aplicao especfica. Segundo Abbagnano, a palavra princpio significa ponto de partida e fundamento de um processo qualquer.

Sundfeld define os princpios como ideias centrais de um sistema, ao qual do sentido lgico, harmnico e racional, permitindo a compreenso de seu modo de se organizar.

Segundo os ensinamentos de Bertoncini, o carter normativo dos princpios passou por um lento processo de evoluo na doutrina, passando por trs fases, a saber: a fase jusnaturalista, juspositivista e ps-positivista.

Na primeira fase, jusnaturalista, os princpios, embora fossem considerados como mximas fundamentais, com uma importante dimenso tico-valorativa, sua normatividade era quase nula, ou seja, no integravam o direito como normas jurdicas.

J na segunda fase, a juspositivista, os princpios passam a ser vistos como fontes secundrias e subsidirias das leis, conferindo-lhes maior eficcia e delas so derivados. No entanto, embora j inseridos no ordenamento jurdico, ainda no so considerados norma jurdica, portanto, sem qualquer relevncia jurdica.

Na terceira fase, conhecida como a fase do ps-positivismo, que foi atribuda normatividade aos princpios, tendo como precursor Crisafulli, em 1952, o qual conferia aos princpios dupla eficcia, imediata e mediata. Assim, poderiam vir expressos no ordenamento jurdico ou ainda de forma implcita, desempenhando papel fundamental na interpretao do direito, devido ao seu carter axiolgico.

Robert Alexy baseia a diferena entre regras e princpios em trs teses: a primeira defende que nenhum dos critrios existentes suficiente para a distino, haja vista a existncia de muitas diferenas e semelhanas, as quais impossibilitam uma distino em apenas duas classes.

A segunda tese tem como argumento de seus seguidores que o grau de generalidade critrio suficiente para a distino entre princpios e regras. Para Alexy esta tese frgil, pois considera que somente o critrio de generalizao insuficiente para distinguir as regras levando-se em conta que ambas prescrevem o que devido, logo, outros critrios devem ser utilizados.

A terceira tese, tida como correta por Alexy, defende que devem ser adotados os critrios de grau de generalidade e grau qualitativo para a distino precisa entre princpios e regras, sendo insuficiente somente um deles.

Bertoncinni leciona acerca da importncia da organizao do sistema jurdico em princpios e regras no limitado somente a um ou a outro. Ressalta que se a organizao do sistema fosse pautada somente em regras, haveria, com certeza, um caos, pois o ordenamento seria extremamente rgido e fechado e no acompanharia as exigncias de uma sociedade dinmica, em constante evoluo.

Continua Bertoncinni, citando Canotilho, que, da mesma forma haveria problemas se o ordenamento jurdico fosse composto somente por princpios, pois considerado o seu elevado grau de abstrao, isso geraria grande insegurana jurdica, j que so voltados a um modo secundrio de prescrio de comportamentos.2.2 Importncia da distino entre os conceitos de normas, regras e princpios:

Segundo Robert Alexy, a confuso de significados entre normas, regras e princpios se d pelo fato de que os princpios e as regras, enquanto espcies do gnero norma, desempenham o mesmo papel, ou seja, todos prescrevem o que devido.

Mello ensina que atravs dos princpios que se pode compreender a lgica e a racionalidade do sistema normativo e das diferentes partes que compem o sistema jurdico positivo. Para tanto, divide os princpios em trs espcies, a saber: os princpios gerais do direito, os princpios constitucionais e os princpios infraconstitucionais.

Enquanto para Mello os princpios gerais do direito so inspirados no sentido de equidade, correspondendo s normas de direito natural e verdades jurdicas universais e imutveis, para Streck estes somente adquirem um significado quando considerados em conjunto com o restante do sistema jurdico.

Em relao aos princpios constitucionais, Mello ensina que so aquelas normas contidas na Constituio, as quais visam garantir Direitos Fundamentais ou Direitos Humanos. J Streck acredita na existncia destes deduzida pela coerncia e contexto das normas explcitas.

Por fim, os princpios infraconstitucionais, segundo Mello, so aqueles positivados e implcitos na legislao infraconstitucional.

importante que se faa a distino entre os termos por ser comum a ocorrncia de conflito entre regras, entre regras e princpios e entre princpios, para que, valendo-se dos instrumentos colocados disposio do intrprete seja pela doutrina de Dworkin, ou a teoria de Hart, seja possvel a busca pela soluo mais justa e adequada para o caso em concreto.

Primeiramente, de extrema importncia que o intrprete do direito construa o seu marco terico, com sustentao em uma das duas teorias existentes acerca da aplicao do direito, ou seja, na teoria positivista de Hart ou na teoria ps-positivista de Dworkin.

A concepo ou teoria defendida por Dworkin, aquela que visualiza o direito como um sistema formado tanto por princpios como por regras, e pela qual os princpios passam a ter aplicao obrigatria para os juzes, de tal modo que eles incorrem em erro ao no aplic-los quando pertinente.

E a outra concepo a teoria defendida por Hart, segundo a qual se reconhece um poder discricionrio ao julgador, ou seja, este deve ir alm do direito, fazendo-se valer dos princpios extralegais, criando um novo item de legislao, na hiptese de uma situao no estar coberta por uma regra.

No entanto, quando a regra preexiste, aplica-se a mesma concepo do ps-positivismo jurdico de Dworkin, ou seja, no h que se falar em poder discricionrio do juiz se h regra disponvel a ser enquadrada no caso concreto.

Para Robert Alexy, a distino entre regras e princpios est baseada primeiramente no critrio da generalidade, ou seja, enquanto os princpios so normas dotadas de alto grau de generalidade, as regras possuem um baixo grau de generalizao.

Na viso de Alexy, o critrio da generalizao no suficiente para a distino entre regras e princpios, pois no se resume somente na diferenciao de grau, mas parte para os critrios de distino utilizados por Dworkin, ou seja, uma diferenciao de tipo qualitativo.

J na viso de Dworkin, o critrio da generalizao no deve ser utilizado de forma absoluta, uma vez que existem regras que trazem em seu bojo termos com conceitos indeterminados, aproximando-as dos princpios.

Para o jus filsofo americano, a aplicao das regras baseia-se no tudo ou nada, ou seja, ou uma regra serve para ser aplicada ou no, se aplicada, devem ser suportadas as consequncias trazidas por esta deciso, enquanto que os princpios so aplicados em razo de uma deciso e no a determinam, necessariamente.

Para Canotilho, as regras podem ser distinguidas dos princpios utilizando-se de cinco critrios, a saber: o grau de abstrao, grau de determinabilidade, carter de fundamentabilidade, proximidade da ideia de direito e natureza normogentica.

Quanto ao primeiro critrio que o grau de abstrao, leciona o jurista que os princpios so normas com um grau mais elevado de abstrao do que as regras, compartilhando da mesma viso de Alexy quando trata do critrio da generalidade.

J o grau de determinabilidade, o segundo critrio, dispe que os princpios, por serem vagos e indeterminados, necessitam, no caso concreto de mediaes dos operadores do direito para que se concretizem, enquanto que as normas, pela sua especificidade, podem ser aplicadas diretamente.

O terceiro critrio, o carter de fundamentabilidade refere-se aos princpios por sua natureza e hierarquia dentro do ordenamento jurdico, os quais desempenham um papel fundamental no sistema das fontes por sua importncia estruturante.

Quanto proximidade da ideia de direito, o quarto critrio, tem-se que os princpios so enraizados nas exigncias de justia (Dworkin) ou na ideia de direito (Larenz) como padres ou modelos juridicamente vinculantes, enquanto que as regras igualmente so normas vinculantes, porm com contedo meramente funcional.

Por fim, o ltimo critrio, da natureza normogentica, traz como funo dos princpios esta sua natureza, ou seja, como sendo a base, o fundamento das regras jurdicas.

Em se tratando, portanto, da unicidade do sistema composto por normas, divididas em regras e princpios, h que se considerar o fato de ocorrerem, no raramente, conflitos entre estas normas. E sendo assim, deve-se fazer uma anlise do caso concreto para se aferir qual ser a soluo para tais colises ou conflitos, conforme se ver no prximo tpico.2.3 Coliso entre normas e critrios de soluo de conflitos

Considerando o exposto acima, podem ocorrer, em determinados casos, conflitos entre regras ou ainda coliso entre princpios, para tanto, faz-se necessria uma breve explanao dos critrios a serem utilizados para a soluo dos referidos conflitos ou colises.

Acerca do conceito de antinomia assevera Diniz:

Antinomia o conflito entre duas normas, dois princpios, ou de uma norma e um princpio geral de direito em sua aplicao prtica a um caso particular. a presena de duas normas conflitantes, sem que se possa saber qual delas dever ser aplicada ao caso singular.

Quando isso ocorre, o aplicador do direito deve levar em considerao alguns pontos para solucionar o conflito ou a coliso, levando-se em considerao a estrutura e organizao do ordenamento jurdico brasileiro.

Acerca do tema leciona Vilanova que, diante de uma viso formal-jurdica, cada Estado um sistema com interdependncia e unicidade. Logo, a norma fundamental hipottica de um determinado sistema no excede um outro.

Considerando os ensinamentos de Hans Kelsen acerca da estrutura universal, escalonada e hierrquica do ordenamento jurdico, esta hierarquizao de normas se encontra em uma dicotomia de norma superior-fundante e a norma inferior-fundada, sendo que a primeira regula e institui a criao e os mtodos utilizados na segunda, direcionando-as.

Assim, inevitavelmente surge a indagao: qual norma orienta a prpria norma superior-fundante? Existe uma norma superior norma superior-fundante? Que norma a originou, a orientou? Segundo Kelsen nesse momento que nasce a norma hipottica fundamental, a princpio, com a funo de desvincular o direito das dedues, dos pensamentos metafsicos.

Kelsen a considera como:

(...) um pensamento, uma pressuposio situada em um plano superior e inacessvel, estando alm do ordenamento jurdico, mas, ela quem confere, segundo o autor, validade a todo o ordenamento jurdico, sendo assim, o ponto de partida do processo de criao do direito positivado. Deste modo a norma posta tem sua validade embasada em uma norma que no pertence ao direito positivo, estando aquela funcionando como critrios e limites impostos ao positivismo jurdico.

Assim, na clssica formulao deKelsen, adotada tambm no ordenamento jurdico brasileiro, ou seja, um sistema aberto e hierrquico, no qual existem normasde diferentes valores, ocupando cada norma uma posio intersistemtica, formando um todo harmnico, com interdependncia de funes e diferentes nveis normativos de forma que: uma norma para ser vlida preciso que busque seu fundamento de validade em uma norma superior, e assim por diante, de tal forma que todas asnormascuja validade pode ser reconduzida a uma mesma norma fundamental formam um sistema denormas, uma ordem normativa.

Kelsen justifica a existncia da norma hipottica fundamental pela diviso do mundo humano em reino das leis natureza e reino das leis culturais, na qual a norma hipottica fundamental seria o arbtrio do homem frente s leis naturais, para com isso demonstrar sua importncia como pressuposto fundamental lgico de todo sistema jurdico posto, pois o direito sempre hipottico e tem sempre como pressuposto a capacidade de liberdade do ser humano.

Assim, na viso de Vilanova, anorma fundamental uma proposio de metalinguagem, que no est ao lado das outras proposies do Direito positivo, no proveio de nenhuma fonte tcnica e, carece de contedo concreto e,relativamente matria das normas positivas, forma condicionante delas (forma cognoscente, hiptese epistemolgica).

Nesse sentido insta salientar que, sendo o direito um ato de vontade, ele tem como finalidade disciplinar condutas, e no caso da norma hipottica, isso ocorre no atravs de uma vontade particular, mas atravs de sua prpria condio de essencialidade - ser um juzo hipottico puro, possvel para todos os sujeitos por ele abarcados, colocado acima das normas postas -, somente assim h a possibilidade das proposies de cunho normativo.

Aps esta breve explanao acerca da estrutura do ordenamento jurdico e, retornando ao tema das antinomias e, com base na Teoria Geral do Direito, Marcus Cludio Acquaviva aponta a origem da palavra Antinomia como sendo do gregoAnti = oposio + nomos = norma,conceituando-a, assim como "Conflito entre duas normas jurdicas, cuja soluo no se acha prevista na ordem jurdica."

Bobbiomenciona que esta se configura quando, no mesmo ordenamento jurdico, haja duas normas na mesma hierarquia e com o mesmo mbito de abrangncia, em confronto.

Pode-se dizer assim que, para haver conflito normativo, as duas normas devem ser vlidas, pois se uma delas no o for, no haver qualquer coliso. O aplicador do direito ficar num dilema, j que ter de escolher e sua opo por uma das normas conflitantes implicaria a violao da outra.

A jurisprudncia prev algumas regras para a soluo das antinomias; mas vale ressaltar que nem todas as antinomias so solveis. Costuma-se denominar as antinomias solveis de aparentes, e as insolveis de reais.Investigao criminal (incio). Delao (falta de assinatura). Anonimato (vedao). Identificao posterior (irrelevncia). Incompatibilidade de normas (antinomia).1. Em nosso conjunto de regras jurdicas, normas existem sobre sigilo, bem como sobre informao; enfim, normas sobre segurana e normas sobre liberdade.2. Havendo normas de opostas inspiraes ideolgicas -antinomia de princpio -, a soluo do conflito (aparente) h de privilegiar a liberdade, porque a liberdade anda frente dos outros bens da vida, salvo frente da prpria vida.3. " livre a manifestao do pensamento, sendo vedado o anonimato" (Constituio, art. 5, IV). vista disso, delao no assinada no pode dar incio a investigao criminal. Requer o ordenamento jurdico brasileiro -e bom que assim requeira -que tambm o processo preliminar -preparatrio da ao penal -seja iniciado sem mcula.Constituio5IV4. Tampouco se admite, em razo de posterior identificao do autor, venha baila a figura da ressurreio, porque, se admissvel fosse, estar-se-ia admitindo o comportamento de quem se escondeu para acusar.5. Agravo regimental improvido

(100 TO 2006/0244327-9, Relator: Ministro NILSON NAVES, Data de Julgamento: 04/03/2009, CE - CORTE ESPECIAL, Data de Publicao: DJe 30/04/2009)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. SOLUO IMEDIATA. AGRAVO LEGAL. DECISO AGRAVADA. POSSIBILIDADE. EXECUO FISCAL. CUSTAS PROCESSUAIS. COMPETNCIA DELEGADA. DISTINO ENTRE VALORES RESTRITOS TAXA JUDICIRIA E RELATIVOS A OUTRAS DESPESAS. LEIS 6.830/80 E 9.289/96. PREQUESTIONAMENTO..6.8309.289 So compatveis as eficcias das disposies do artigo 39 da LEF e do artigo 1, 1, da Lei n 9.289/96, conforme revelam os critrios de hierarquia, de especialidade e temporal de soluo de aparente antinomia entre as normas jurdicas.. A Fazenda Pblica, embora sucumbente, isenta do pagamento de custas processuais, compreendidas como taxa judiciria, quando a execuo fiscal foi processada perante a Justia Estadual, nos termos do artigo 39 da LEF.. Nos termos do artigo 1, 1, da Lei n 9.289/96 e do artigo 39, segunda parte, da LEF, as demais despesas processuais so devidas pela Unio quando sucumbente, sendo o pagamento diferido para o final da demanda e o seu quantum indicado pela legislao estadual do local da prestao jurisdicional.. Vivel solver a lide mediante deciso monocrtica quando o inconformismo manifestamente inadmissvel ou improcedente, est prejudicado o seu objeto ou, ainda, estiver ele em confronto com smula ou jurisprudncia dominante do Tribunal ou de Corte superior.. Agravo legal parcialmente provido.39LEF1 19.28939LEF1 19.28939LEF

(0 RS 0035109-77.2010.404.0000, Relator: MARIA CRISTINA SARAIVA FERREIRA E SILVA, Data de Julgamento: 02/03/2011, QUARTA TURMA, Data de Publicao: D.E. 16/03/2011.

Considerando as antinomias seja entre regras ou entre regras e princpios ou ainda entre princpios, alguns doutrinadores, entre eles Bobbio, apontam trs critrios clssicos de soluo de conflitos, os quais so aceitos quase que universalmente.

No caso de conflito entre duas regras aplica-se um desses trs critrios, na forma do tudo ou nada (no all or nothing termo de Dwokin), o cronolgico (lex posterior derogat priori), o critrio hierrquico (lex superior derogat inferiori) e, por ltimo, o critrio da especialidade (lex specialis derogat generali).

O critrio hierrquico divide-se em duas concepes, uma esttica e uma dinmica, sendo que na hierarquia esttica, quando duas normas colidirem, aquela que se encontra em estatura inferior - considerando-se a hierarquia das normas representada na pirmide de Kelsen - dever ser eliminada, descartada do sistema jurdico.

A hierarquia dinmica s acontece quando, no caso concreto, ocorrer conflito entre normas que esto no mesmo patamar de hierarquia. Neste caso, deve-se utilizar a ponderao entre as normas, pois ambas tm o mesmo valor, o mesmo peso, no se admitindo a excluso de uma delas, pelo contrrio, uma delas se sobressair, porm as demais permanecero intactas.

O critrio cronolgico enfatiza que o conflito entre normas pode ser resolvido de acordo com o momento de sua edio, ou seja, a norma mais recente revoga a mais antiga, prevalecendo-se no momento de sua aplicao no caso concreto. Segue-se aqui o princpio da Lex posterior derogat priori.

Por fim, o critrio da especialidade tem por finalidade dirimir os conflitos existentes entre uma norma geral e uma especfica, nestes casos, prevalece a norma especfica.

H que ressaltar que no h hierarquia entre normas constitucionais e infraconstitucionais, nesse sentido, assim se manifesta Geraldo Ataliba: O sistema jurdico (...) se estabelece mediante uma hierarquia segundo a qual algumas normas descansam em outras, as quais, por sua vez, repousam em princpios que, de seu lado, se assentam em outros princpios mais importantes. Dessa hierarquia decorre que os princpios maiores fixam as diretrizes gerais do sistema e subordinam os princpios menores. Estes subordinam certas regras que, sua vez, submetem outras (...)

Frise-se que no h hierarquia jurdica entre princpios e regras constitucionais se levado em considerao o princpio da unicidade do sistema jurdico. Existe hierarquia entre normas constitucionais e infraconstitucionais, e quando h conflito entre estas ltimas, os critrios adotados so aqueles elencados por Bobbio e j mencionados anteriormente.

A hierarquia existente entre normas constitucionais se d to somente no campo axiolgico, ou seja, leva-se em considerao o valor atribudo a cada uma no momento de sua aplicao.

Considerando o escalonamento axiolgico entre normas constitucionais, os eventuais conflitos entre elas existentes no seriam passveis de resoluo pelos critrios elencados por Bobbio, estes no seriam suficientes e eficazes para a resoluo do conflito. Sendo assim, a doutrina estrangeira desenvolveu duas solues, as quais so amplamente utilizadas pelos Tribunais ptrios, a saber, o critrio da concordncia prtica e o critrio da dimenso de peso ou importncia.

Diante de ambos os critrios o princpio da proporcionalidade desponta como um meta-princpio para resoluo destes conflitos. Devem tais critrios ser aplicados sucessivamente, ou seja, primeiramente aplica-se o critrio da concordncia prtica e, no sendo possvel a concordncia, sacrifica-se, minimamente, o princpio com peso menor aps dimensionar o peso e a importncia entre os princpios em questo.

O princpio da concordncia prtica ou harmonizao, segundo seu idealizador Hesse, visa a harmonizao dos direitos fundamentais em conflito pelo juzo de ponderao, a fim de preserv-los e concretiz-los ao mximo.

Acerca do tema, leciona Lerche que, havendo coliso entre normas jurdicas de hierarquia constitucional, deve-se buscar a otimizao entre direitos e valores em jogo, estabelecendo uma concordncia prtica, ou seja, buscando o melhor equilbrio possvel entre os princpios colidentes.

H, portanto, na lio do referido doutrinador, um processo de ponderao pelo qual no se busca a prevalncia absoluta de um valor sobre outro, mas sim uma tentativa de aplicao simultnea e compatibilizada de normas, ainda que uma delas tenha que ser atenuada no caso concreto.

O segundo critrio de dimenso de peso e importncia, fornecido por Dworkin, se funda no argumento de que os princpios possuem uma dimenso de peso e importncia que as regras no possuem.

Isso se explica pelo fato de que havendo conflito entre as regras, aplica-se uma e exclui-se a outra, ou seja, no h valorao de uma em detrimento da outra para que ambas permaneam.

Logo, tem-se que os princpios, quando colidentes, permanecem ambos, enquanto que as regras colidentes ou antinmicas excluem-se. insustentvel a existncia simultnea de regras contraditrias, por este motivo o critrio de soluo de conflito o tudo ou nada.

Conforme a lio de CANOTILHO:

a especificidade, contedo, extenso e alcance prprios de cada princpio no exigem nem admitem o sacrifcio unilateral de um princpio em relao aos outros, antes reclamam a harmonizao dos mesmos, de modo a obter-se a mxima efetividade de todos eles.

Assim, atentando-se para o princpio da unicidade do sistema jurdico que se buscam os critrios para soluo de conflitos. Conforme se viu nos tpicos acima, quando ocorre conflito entre princpios, nasce para o aplicador/intrprete do direito um poder discricionrio de ponderao, o qual no se encontra insculpido em qualquer tese ou lei, seno na subjetividade do julgador.

Esta uma crtica ferrenha feita a este mtodo de soluo de conflito chamado de dimenso de peso e importncia, o qual leva em considerao a ponderao no momento da valorao dos princpios sub judice, sob o argumento de que esta discricionariedade conferida ao julgador gera insegurana jurdica.

No entanto, considera-se que este argumento frgil, no havendo que se falar em insegurana jurdica se considerado o fato de que toda deciso deve ser fundamentada.

Critica-se ainda o fato de que os tribunais tm se utilizado erroneamente da ponderao na soluo de conflitos entre princpios quando fundamentam suas decises somente neste meta-princpio, deixando de lado outras fontes. Neste ponto a crtica merece ser acolhida, haja vista ser este princpio apenas um critrio de soluo de conflitos e no fundamento de uma deciso.

Nesse sentido so os ensinamentos de Lnio Luiz Streck, concordando com Habermas em relao ponderao, sobre o uso discricionrio da ponderao, pois segundo Habermas no se deve ponderar valores, nem em abstrato, nem em concreto. Para Streck, neste caso, a proporcionalidade seria o nome a ser dado necessidade de coerncia e integridade de qualquer deciso (...).

Para Alexy, a ponderao no constitui um mtodo que permita um controle racional, abrindo espao para um subjetivismo judicial. Sob esse argumento, por no oferecer critrios que determinem qual princpio tem maior peso ou importncia, a ponderao no impe parmetros racionais e objetivos que vinculem a deciso e previnam o arbtrio, conferindo discricionariedade exacerbada aos juzes.

Acerca da irracionalidade e subjetivismo da ponderao leciona Friederich Mller que:

Tal procedimento no satisfaz as exigncias, imperativas no Estado de Direito e nele efetivamente satisfactveis, a uma formao da deciso e representao da fundamentao, controlvel em termos de objetividade da cincia jurdica no quadro da concretizao da constituio e do ordenamento jurdico infraconstitucional. O teor material normativo de prescries constitucionais cumprido muito mais e de forma mais condizente com o Estado de Direito com a ajuda dos pontos de vista da hermenutica e metodicamente diferenciadores e estruturantes da anlise do mbito da norma e com uma formulao substancialmente mais precisa dos elementos de concretizao do processo prtico de gerao do direito, a ser efetuada, do que com representaes necessariamente formais de ponderao, que consequentemente insinuam no fundo uma reserva de juzo [Urteilsvorbehalt] em todas as normas constitucionais, do que com categorias de valores, sistemas de valores e valorao, necessariamente vagas e conducentes a insinuaes ideolgicas.

Nessa esteira, cabe ressaltar que a ponderao deve ser operacionalizada mediante o princpio da proporcionalidade, pois nas palavras de Sarmento a ponderao de interesses no representa uma forma de decisionismo judicial disfarado, j que seu mtodo pauta-se pelo princpio da proporcionalidade, cujos critrios podem ser aferidos com certa objetividade.

O mesmo autor afirma a importncia do princpio da proporcionalidade, ao dizer que as restries devem ser arbitradas mediante o emprego do princpio da proporcionalidade em sua trplice dimenso- adequao, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.

Estes subprincpios intrinsecamente ligados ao princpio da proporcionalidade so os prprios critrios objetivos desta quando utilizada na ponderao de valores. O primeiro deles, a adequao, deve ser utilizada para aferir se as medidas adotadas so apropriadas ao alcance da finalidade prevista no mandamento.

O subprincpio da necessidade impe ao julgador que se observe da deciso a ser tomada, se dentre todas quelas aptas obteno do fim pretendido a menos gravosa, a que trar menor prejuzo s partes envolvidas, aquela que restrinja ou limite menos possvel os direitos e garantias fundamentais do cidado.

Na lio de Suzana de Toledo Barros:

O pressuposto do princpio da necessidade que a medida restritiva seja indispensvel para a consecuo do prprio ou de outro direito fundamental e que no possa ser substituda por outra igualmente eficaz, mas menos gravosa.

O princpio da proporcionalidade tem grande importncia quando da soluo da coliso entre princpios constitucionais, pois segundo leciona o professor Paulo Bonavides, lembrando os ensinamentos de Pierre Muller:

o princpio daproporcionalidade a regra fundamental a que devem obedecer tanto os que exercem quanto os que padecem o poder."Suafuno primordial estabelecer critrios para as limitaes liberdade individual. O princpio daproporcionalidade, em ultima anlise, uma limitao restrio dos direitos e garantias fundamentais.

Segundo Robert Alexy, o fundamento ao princpio da ponderao reside nos princpios de direito fundamental, sem que se exclua, contudo, outras fundamentaescomoos princpios do Estado de Direito, a prtica jurisprudencial e o conceito de justia.

Tem-se, portanto, que o princpio da proporcionalidade quando utilizado no momento da ponderao entre princpios constitucionais em coliso, limita o poder de atuao, ou seja, limita a discricionariedade e subjetivismo do julgador quanto ao contedo da deciso, pois enquanto a ponderao d lugar ao subjetivismo exacerbado, a proporcionalidade impe critrios objetivos para a ponderao.

3 NOVAS LINHAS DO PROCESSO CIVIL: CELERIDADE, EFETIVIDADE e o acesso justia

3.1 Acesso justia como direito fundamental

O processo civil brasileiro tem incorporado, ao longo da histria, as grandes ideias nascidas na Europa, obviamente que no com o mesmo compasso devido s diferenas de civilizao e grau de desenvolvimento.

No entanto, devido civilizao lusitana, o processo permaneceu durante os primeiros quarenta anos da Repblica com formalismo exacerbado, excees e recursos numerosos, sujeito a nulidades em grande escala.

O cdigo de processo civil brasileiro, editado em 1973 e vigente at os dias atuais, tinha como objetivos principais a administrao da justia, fidelidade finalidade do processo que a ordem pblica e a satisfao do interesse pblico na composio dos conflitos.

Dentre os dispositivos acerca da prestao jurisdicional, foi conferida essencialidade celeridade processual, este era o ideal entre todos os mecanismos e propsitos do CPC de 1973.

Todavia esse ideal ainda no pode ser atingido e o clamor por um processo clere tomou tamanha proporo que levou o legislador a inovar criando remdios processuais em legislao extravagante e editando alteraes no cdigo de processo civil.

Desde ento todas as alteraes feitas no referido codex tm se voltado para a celeridade da tutela jurisdicional, por meio da simplificao dos procedimentos, com o intuito de conferir maior efetividade prestao jurisdicional.

Dentre as mais importantes alteraes e inovaes est a generalizao das medidas de antecipao de tutela previstas nos artigos 273 e 461 do CPC, as quais so objeto de estudo do presente trabalho, e sero tratadas em captulo prprio.

Todas estas alteraes conduziram o processo civil brasileiro, com base no processo civil europeu, a conferir ao litigante ampla tutela de urgncia, definindo direitos controvertidos dentro do prprio processo de conhecimento (ordinrio), ato no mais reservado ao processo de execuo, seja por meio do poder geral de cautela, da fungibilidade das medidas de urgncia, da antecipao dos efeitos da tutela jurisdicional de cunho satisfativo ou das medidas cautelares de carter conservativo etc.

Mesmo em meio a tantas alteraes e inovaes no mbito do processo civil buscando dar celeridade soluo de litgios, a crise no sistema processual universal. As crticas so sempre as mesmas, a lentido da prestao jurisdicional, at mesmo daqueles que saem vitoriosos, pois muitas vezes a tutela tardia no traz mais os efeitos desejados.

O acesso justia antigamente, era apenas formal, sem efetividade, ou seja, o Estado Liberal restringia-se a declarar os direitos humanos, permanecia inerte em relao efetividade da tutela jurisdicional, prevalecendo o sistema de justia denominado laissez-faire.

A partir do sculo XX o que o acesso justia despontava como uma questo de interesse pblico, pois o Estado Social de Direito reconheceu novos direitos sociais, no mais somente declarando-os, mas efetivando-os como direitos fundamentais, criando mecanismos operacionais.

Nesse sentido, aduz Armelin que o que passa, portanto, a ter salutar importncia o reconhecimento do acesso justia como um instrumento capaz de garantir os novos direitos individuais e sociais, j que a titularidade desses, sem os mecanismos adequados de reivindicao, se tornaria uma prerrogativa incua.

Na mesma linha de pensamento, Dinamarco, leciona que o cidado, muito alm do acesso ao Poder Judicirio, deva ter um acesso efetivo justia:o acesso justia , mais do que o ingresso no processo e aos meios que ele oferece, modo de buscar eficientemente, na medida da razo de cada um, situaes e bens da vida que por outro caminho no se poderiam obter. Seja porque a lei veda a satisfao voluntria de dadas pretenses (v.g., anulao de casamento), seja porque a pessoa de quem se poderia esperar a satisfao no satisfez (inadimplemento), quem no vier a juzo ou no puder faz-lo, renunciar quilo que aspira. Em outras palavras, no ter acesso ordem jurdica justa nos casos em que, por fs ou por nefas, sem o processo no possa sequer chegar at o processo.

Ressalte-se que o acesso justia se inseriu como princpio constitucional no sistema jurdico brasileiro quando o homem viu a necessidade de se proteger contra o prprio Estado Liberal, ento o constitucionalismo moderno, com a separao dos poderes e a limitao do Estado a questes de ordem pblica e mnima interveno na esfera privada, inseriu em seu bojo tal previso.

O acesso justia tem se feito presente nas Constituies brasileiras desde a Carta de 1946, quando em seu texto foi includo o seguinte dispositivo: A lei no poder excluir da apreciao do Poder Judicirio qualquer leso de direito individual.

O princpio pressupe a possibilidade de que todos, indistintamente, possam pleitear as suas demandas junto aos rgos do Poder Judicirio, desde que obedecidas as regras estabelecidas pela legislao processual para o exerccio do direito.

Para o doutrinador Alexandre Cesar, o acesso justia um direito fundamental e essencial consolidao da cidadania, primordial efetividade dos direitos humanos, considerando-se que o cidado tem necessidade de mecanismos prprios e adequados para a efetivao de seus direitos.

Por haver previso expressa na Constituio Federal de 1988 e, em decorrncia da hermenutica constitucional encabeada por Dworkin e Alexy, Norberto Bobbio, um dos nomes mais importantes na hermenutica moderna, classifica o acesso justia como princpio constitucional.

No Brasil, dentre todas as constituies existentes a que mais se preocupou com o acesso justia foi a Constituio de 1988, mais especificamente em seu artigo 5.

O legislador constituinte colocou disposio dos indivduos uma srie de instrumentos ou, para alguns doutrinadores, remdios que visam a garantia dos direitos fundamentais atravs da provocao da atividade jurisdicional do Estado, denominados aes constitucionais.

Nas lies de Nelson Nery Jnior acerca do tema [...] todos tm acesso justia para postular tutela jurisdicional preventiva ou reparatria relativamente a um direito. Esto aqui contemplados no s os direitos individuais, como tambm os difusos e coletivos.

Como pode se observar a preocupao central da processualstica moderna tem sido o ideal de acesso justia, e para que o processo cumpra seu papel neste ideal, deve se apresentar como instrumento de efetividade.

Assim, pode-se conceituar o direito fundamental de acesso justia como a proclamao dos direitos de todos bem como o acesso ao judicirio, efetivado com sua plena funcionalidade, ratificando o exerccio da cidadania.

Segundo Cappelletti e Garth:A expresso acesso justia reconhecidamente de difcil definio, mas serve para determinar duas finalidades bsicas do sistema jurdico o sistema pelo qual as pessoas podem reivindicar seus direitos e/ou resolver seus litgios sob os auspcios do Estado. Primeiro, o sistema deve ser igualmente acessvel a todos; segundo, ele deve produzir resultados que sejam individualmente e justos.

Em sentido mais amplo, utiliza-se o termo acesso justia tambm como assistncia jurdica, como uma justia eficaz, acessvel a todos. Assim, Cappelletti e Garth definem:O acesso justia pode, portanto, ser encarado como o requisito fundamental - o mais bsico dos direitos humanos - de um sistema jurdico moderno e igualitrio que pretende garantir, e no apenas proclamar os direitos de todos.

O enfoque da doutrina em relao ao acesso justia o acesso ao Poder Judicirio como instrumento de realizao da justia, porm alguns doutrinadores como Andr Ramos Tavares e Fernando Pagani Mattos, afirmam que o conceito muito mais amplo e abrangente, envolvendo, alm do acesso ao Poder Judicirio, tambm a assistncia judiciria, a inafastabilidade do Poder Judicirio, a celeridade processual e o devido processo legal.

A busca da igualdade e da justia pelo Estado Democrtico de Direito tem se pautado na garantia de vias de acesso efetivo, porm tem encontrado entraves que obstam a efetividade do acesso como, por exemplo, a efetiva desigualdade das partes, a insuficincia de informaes para reconhecimento e guarda de direitos, o fator tempo, o fator psicolgico, o desconhecimento sobre a estrutura burocrtica do Estado, o respeito s formalidades processuais e aos prprios entraves provenientes da estrutura do Poder Judicirio, ainda o alto valor dos servios judiciais e uma legislao a respeito do tema defasada e lacunosa, dentre outros.

3.2 Celeridade como fundamento de efetividade do acesso justia

Atualmente, em que pese haver previso constitucional de celeridade do processo, insculpida no art. 5, inciso LXXVIII a todos, no mbito judicial e administrativo, so assegurados a razovel durao do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitao. o descompasso entre a demanda e a oferta dos servios judicirios frustra a garantia constitucional de acesso justia.

Acerca deste princpio da celeridade processual insculpido na Carta Magna leciona o professor Candido Rangel Dinamarco em relao incluso da tutela antecipada no cdigo de processo civil:Constitui objetivo daReformaa ampliao de acesso justia, naquele significado generoso de acesso ordem jurdica justa.O legislador, consciente de inmeros bices ilegtimos plenitude da promessa constitucional de tutela jurisdicional efetiva, vem procurando elimina-los ou minimiza-los, de modo a oferecer aos usurios do sistema processual um processo mais aderente s necessidades atuais da populao. [...] Da porque, o objetivo central daReforma oacesso justia.

O titular do direito, no entanto, devido crise enfrentada pelo judicirio, encontra dificuldade de chegar s suas portas e obter os meios capazes de lhe proporcionar a entrega da prestao jurisdicional de forma justa, clere e eficiente.

A lentido na tramitao do feito era entendida no passado como uma garantia de que a deciso seria efetivamente justa, por ter o processo seguido todos os trmites legais, ou seja, sem que pudessem ser antecipados os efeitos da deciso, como ocorre atualmente por meio de institutos como a antecipao de tutela, sem pular qualquer etapa do processo, ainda que provisoriamente. Todavia, essa lentido com o passar do tempo e com a evoluo tecnolgica, industrial, dos meios de comunicao, dos sistemas financeiros e da economia, tornou-se um dos maiores problemas ao acesso justia, por no trazer efetividade tutela jurisdicional j que o nmero e a diversidade de demandas aumentaram, assim como o nmero de recursos processuais.Sendo assim, cumpre salientar o fato de que, atualmente, a lentido do processo deixou de ser garantia de deciso justa, mas se tornou um entrave garantia de efetividade da tutela jurisdicional, no somente por passar por todas as etapas do processo, mas por ser tardia, muitas vezes, dando mais importncia s formas processuais que aos direitos fundamentais.Desta forma, a celeridade, que outrora era apenas exceo, agora se torna o ponto crucial, pois a lentido do processo tornou-se o maior inimigo da efetividade e do acesso justia atualmente, uma vez que quanto mais demorado for o processo, menor ser a utilidade do vencedor de poder usufruir o bem da vida.

Para Watanabe necessrio que o processo tenha plena e total aderncia realidade scio jurdica a que se destina, cumprindo sua primordial vocao que a de servir de instrumento efetiva realizao dos direitos.

Pode-se perceber nitidamente que a celeridade e efetividade esto intimamente ligadas, atreladas ao princpio constitucional de acesso justia. Da mesma forma, em termos gerais, o conceito de efetividade est ligado capacidade de realizar algo de forma apropriada, com o intuito de se obter o fim almejado reunindo, concomitantemente, a eficcia e a eficincia que, embora sejam termos semelhantes tm conceitos distintos.

A distino, portanto entre os conceitos de eficincia e eficcia que a aquela se trata da capacidade de produzir algo ou um efeito desejado, enquanto que a esta ltima trata de se preocupar com o efeito produzido, que ele seja o adequado, til para aquilo que se pretendeu, pois algo pode ser eficiente, porm, no necessariamente eficaz.

Na lio de Canotilho, a justia tardia equivale a uma denegao da justia, ou seja, a prestao jurisdicional em tempo adequado no se trata de justia acelerada, esta se d quando h diminuio de garantias materiais que podem conduzir a uma justia pronta, mas materialmente injusta.

Diante disso, cabe trazer baila a lio de Guagliariello, o qual pondera que os direitos ao processo clere e o contraditrio no devem conflitar-se entre si, mas buscar a harmonia com o fito de atingir a efetivao da tutela jurisdicional.

Analisando-se a ligao entre os conceitos de eficincia e eficcia em consonncia com o princpio constitucional da efetividade, conclui-se que se faz necessrio busca pelaefetividadee essa busca nada mais do que colocar no plano da realidadeo fato, o direito material tutelado (pretenso) em sincronismo como meio, o direito formal (processo) hbil a tornar real a pretenso deduzida em juzo.

Em outras palavras, simplificando toda a celeuma acima tratada, o legislador ptrio, ento, inseriu no Cdigo de Processo Civil o instituto da antecipao de tutela, como um poderoso instrumento de efetividade processual, reunindo em si tudo o que se espera da tutela jurisdicional, ou seja, a efetividade, celeridade, eficcia, eficincia, acessibilidade e segurana jurdica.

Em apropriada sntese sobre o tema a lio de Bedaque:A efetividade significa que todos devem ter pleno acesso atividade estatal, sem qualquer bice (effettivit soggettiva); tm a seu dispor meios adequados (effettivit tcnica) para a obteno de um resultado til (effettivit qualitativa), isto , suficiente para assegurar aquela determinada situao da vida pelo ordenamento jurdico material (effettivit oggettiva).

neste mesmo sentido que o professor Kazuo Watanabe comenta que a tutela jurisdicional atualmente dever se basear no trinmio adequao-tempestividade-efetividade, pois somente assim o processo ser capaz de produzir o efeito mais justo e atender aos anseios do povo a uma ordem jurdica justa e efetiva.

Da mesma ideia coaduna Aurlio Spina: atravs de uma processualstica audaz e tenazque se alcanar a to almejada efetividade jurisdicional de fato, tempestiva, adequada, eficaz e justa.

Nas lies do processualista Mitidiero, a efetividade da tutela jurisdicional traduz uma preocupao com a especificidade e a tempestividade da proteo judicial.

Segundo Mitidiero, dever constitucional do Estado a oferta de meios, atravs do processo, para a outorga da proteo efetiva e tempestiva das partes, pois quanto mais demorada a tutela, maior ser o dano experimentado pela parte que tem razo. Deve, portanto, o resultado da demanda ser o mais aderente possvel ao direito material, em tempo razovel s partes.

A prestao jurisdicional efetiva aquela que reclama uma prestao jurisdicional tempestiva, sem deixar de lado o ideal de justia e do devido processo legal, pois segundo Mitidiero consiste no vnculo teleolgico entre meio e fim, entre o instrumento processual e a tutela prometida pela Constituio ao direito material. Embora o Estado seja responsvel por permitir aos jurisdicionados obterem uma resposta jurisdicional tempestiva e efetiva, mediante tcnicas processuais (meios e procedimentos), isso se torna difcil na medida em que a necessidade de tempestividade se modifica de acordo com as mudanas ocorridas na sociedade e dos prprios direitos, como tambm o fato de que o Estado apresenta dificuldades em se estruturar de modo a atender a todos de forma efetiva.

Assim, tem-se que a efetividade processual uma garantia constitucional prevista no Artigo 5, inciso XXXV, o qual proclama o princpio da inafastabilidade da jurisdio, assim como seu adjunto, mas no menos importante, princpio do livre acesso justia, que garante o direito tutela jurisdicionalefetiva, tempestiva e adequada.

Em relao ao direito tutela antecipada, os professores Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero afirmam que est compreendido no direito fundamental tutela jurisdicional adequada e efetiva, disposta no art. 5, XXXV, da CRFB.

Alguns doutrinadores afirmam que o art. 273 do CPC uma resposta do legislador infraconstitucional ao seu imperativo de organizar um processo civil capaz de outorgar a tutela jurisdicional e efetiva aos direitos.

Cabe salientar, portanto que a efetividade do processo dependente, segundo os desgnios do legislador, da aderncia dos procedimentos causa. Porm muitos so os obstculos efetividade da tutela jurisdicional, os quais criam um estorvo ordem jurdica justa.

Nesse sentido vale salientar que se deve privilegiar a efetividade da tutela jurisdicional, da qual a tutela antecipada um poderoso instrumento de auxlio e concretizao de uma ordem jurdica justa (adequada, eficaz e tempestiva).

Acerca do tema so as lies do notvel processualista Ovdio A. Baptista:Se suprssemos de um determinado ordenamento jurdico a tutela de aparncia, impondo ao julgador o dever de julgar somente depois de ouvir ambas as partes, permitindo-lhes a produo de todas as provas que cada uma delas fosse capaz de trazer ao processo, certamente correramos o risco de obter, no final da demanda, uma sentena primorosa no aspecto formal e assentada num juzo de veracidade do mais elevado grau, que, no entanto, poderia ser intil, sob o ponto de vista daefetividade do direitoreclamado pelo autor vitorioso [...].

Em apertada sntese, finaliza o autor seu raciocnio com a sbia frase: O que ganhssemos em segurana teramos perdido em efetividade do direito.

Deve-se ressaltar que surge nesse contexto uma indagao em relao segurana jurdica de se conceder a tutela antecipada, em juzo de cognio sumria, se isso no traria prejuzos parte adversa. No entanto, no obstante, o aparente prejuzo segurana jurdica no encontra apoio frente necessidade de se alcanar a efetiva prestao da tutela jurisdicional, sendo que, a verdadeira segurana jurdica ser efetivamente alcanada se a prestao jurisdicional for adequada, tempestiva e eficaz, sem o longo caminho percorrido no rito moroso que precede a cognio plena e exauriente.

neste mesmo sentido o entendimento do professor Ovdio A. Baptista:

[...] a tendncia moderna orienta-se no sentido de dar maior relevncia efetividade dos direitos reconhecidos pela ordem jurdica, com o correspondente sacrifcio da segurana obtida com o processo ordinrio de cognio plena.

Conforme j restou devidamente evidenciado o instituto da antecipao de tutela despontou como instrumento processual capaz de conferir tutela jurisdicional celeridade e efetividade tanto almejadas pelas partes como tambm pelo legislador.

No entanto, no se olvide que se est diante de um conflito aparente de normas, de um lado o direito constitucional de acesso justia e de outro o direito antecipao de tutela, complicando ainda mais a situao quando se fala em reversibilidade da tutela antecipada.

Diante dessa problemtica, necessrio relembrar os critrios de soluo de conflito entre normas, j tratados no captulo anterior, para que seja resolvido o impasse que se d quando, no momento de decidir pela concesso ou no da antecipao da tutela, diante de sua reversibilidade ou irreversibilidade, o magistrado decida de forma justa e efetiva.3.3 O conflito entre direitos fundamentais

Com relao s situaes que envolvem tutela antecipada, comum haver conflitos de direitos fundamentais, e estes ocorrem, na lio de Canotilho (...) quando o exerccio de um direito fundamental por parte de seu titular colide com o exerccio do direito fundamental por parte de outro titular, vez que o contraditrio e ampla defesa so mitigados em favor de outros direitos, notadamente da efetividade da prestao jurisdicional.

Em busca da efetividade da prestao da tutela jurisdicional, a reforma do sistema processual em 13 de dezembro de 1994, pela lei 8.952, incluiu o 2 no art. 273 do Cdigo de Processo Cvel que diz: ... no se conceder a antecipao da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado, conciliando a exigncia da rapidez com a segurana jurdica. Este instituto foi, sem sombra de dvidas, uma das modificaes mais importantes introduzidas pela reforma do Cdigo de Processo Civil de 1994.

Isso se explica pelo fato de que se rompeu a ideia do passado de que a tutela antecipada no se compatibilizava com a cautela do juzo. Com a regulamentao da tutela antecipatria, colocou-se um fim resistncia, pelo no acautelamento, concesso de provimentos que adiantam efeitos de futuras sentenas declaratrias, constitutivas ou condenatrias.

Ainda que como pressuposto negativo da tutela antecipada, o legislador criou a irreversibilidade da tutela antecipada para que esta providncia fosse deferida pelos magistrados. E por se tratar de um requisito da tutela antecipada, a reversibilidade necessita de flexibilizao da norma para atender a situaes excepcionais, quando sua aplicao rgida seria sacrificante para a prpria tutela jurisdicional.

H de se reconhecer que o problema da irreversibilidade est ligado a um direito fundamental das partes interessadas na lide, a segurana jurdica, porm o que no pode tambm ser ignorado pelo Poder Judicirio o fato de que o autor sofre ameaa de um dano irreparvel. Desta forma, de acordo com princpio da proporcionalidade, ante o conflito levado aos autos pelas partes, deve-se proceder avaliao dos interesses em jogo e dar prevalncia aquele que ostentar maior relevncia e expresso.

Partindo da premissa de que os atos legislativos devem respeitar o princpio da proporcionalidade, resta saber se o indeferimento em caso de irreversibilidade resiste ao teste da proporcionalidade.

Canotilho, acerca da coliso dos direitos fundamentais, ressalta que deve haver harmonizao entre as regras do direito constitucional em conflito, com a consequente prevalncia de um em face de outro, quando necessrio. Segue dizendo ainda, todavia, que esta relao de prevalncia s pode ser aplicada em situaes concretas, pois s nestas condies legtimo dizer que um direito tem mais peso que outro (...).

Isso no quer dizer que est se desrespeitando ou desmerecendo direitos, ou sacrificando um em detrimento de outro, mas sim dosando a razoabilidade dos interesses em jogo, pois, em se tratando de direitos fundamentais, h maior proporo de irrenunciabilidade, imprescritibilidade e indisponibilidade.

Deve-se levar ainda em considerao o fato de que o juiz no pode desconsiderar as diretrizes da Constituio Federal, com base na literalidade da norma processual, nesse sentido o princpio da proporcionalidade funciona como um instrumento de inibio do arbtrio ou abuso de poder.

Faz-se necessrio, portanto, saber se, no havendo possibilidade de retornar ao status quo ante, o juiz estar sempre impedido de antecipar os efeitos da tutela, ou se existem critrios que devem ser levados em considerao na ponderao de interesses quando as tutelas forem irreversveis.

So as perguntas que se levantam: O requisito da irreversibilidade da tutela pode ou no ser aplicado de forma absoluta? H no indeferimento do pedido de antecipao de tutela, quando for esta irreversvel, algum excesso legislativo? H possibilidade do Judicirio, num Estado Democrtico de Direito, desconsiderar dogmas legais, uma vez que no se pode simplesmente desobedecer as escolhas do legislador sem passar pelo crivo da Constituio?

Como tornar, ento, as decises racionalmente justificantes, ou como devem ser sopesados os interesses divergentes? Nesses casos faz-se imprescindvel buscar nos princpios da proporcionalidade, razoabilidade e a tcnica da ponderao a resoluo da questo da irreversibilidade, haja vista que, dentro desta questo, tais princpios e tcnica completam-se, alm de que, para ponderar interesses necessrio identificar quais so os interesses em conflito, valor-los conforme o caso concreto e decidir, fundamentadamente, sobre a prevalncia de um deles sobre o outro.

Acerca da regra da proporcionalidade como mtodo de soluo de conflitos leciona Luiz Guilherme Marinoni:a regra da proporcionalidade constitui um mtodo para a soluo de conflitos entre direitos que contm uma limitao imanente diante de direitos de igual porte e, dessa forma, tambm pode auxiliar na soluo de conflitos de bens diante da tutela antecipatria. Diversos so os posicionamentos acerca do tema, alguns doutrinadores entendem que este pressuposto negativo da irreversibilidade no deveria existir, outros entendem que deveria se fazer um tipo de filtragem constitucional no podendo ser aplicado de modo absoluto.

Tais posicionamentos referem-se ao fato de que, em alguns casos concretos, o indeferimento da tutela antecipada pela irreversibilidade da medida poderia trazer mais desvantagens do que vantagens, alm do que parece afrontar o art. 5, XXXV da Constituio Federal, como tambm a garantia fundamental da prestao jurisdicional.

Nesses casos, por exemplo, o dano para o autor seria igualmente irreversvel e o seu prejuzo maior do que o prejuzo do ru, assim estaria sendo negado ao autor o direito fundamental a uma tutela jurisdicional tempestiva, mesmo que no tivesse razo.

No entanto, h que se reconhecer que o fim almejado pelo legislador legtimo, pois antecipar irreversivelmente a tutela seria antecipar a sucumbncia do ru sem lhe assegurar o exerccio do seu direito fundamental de se defender, tornando assim, intil o prosseguimento do processo. Desta forma, o entendimento do legislador, por certo, foi que o equilbrio entre a antecipao da tutela seria lcita somente quando ela prpria no deixasse nascer a possibilidade de um dano irreparvel.Deve, portanto, a regra insculpida no 2 do art. 273 do Cdigo de Processo Civil ser interpretada luz da Constituio Federal, para que no sejam afetadas as garantias constitucionais, da qual a tutela jurisdicional efetiva e tempestiva faz parte, assim sendo no ser necessria a declarao de inconstitucionalidade da norma j que ser aproveitada pela interpretao em sintonia com a Constituio.

A resposta para a indagao acerca da aplicao ou no da irreversibilidade que, como j observado, no pode ser interpretada de forma absoluta, pois, na prtica, o juiz valendo-se dos princpios acima mencionados e da tcnica da ponderao, mesmo diante da irreversibilidade, poder antecipar os efeitos da tutela, atentando-se para o bem jurdico a ser protegido, sob pena de perecimento de direitos.

4. DO INSTITUTO DA TUTELA ANTECIPADA

4.1 Do surgimento da Tutela Antecipada no ordenamento jurdico brasileiro

Desde que existe a sociedade existem conflitos, dentre eles a busca por conforto, segurana e melhores condies de vida aos familiares, dentre outros e, nessa busca incessante, o homem, por vezes, acaba encontrando resistncia em outro homem, que tambm busca seus ideais, nesse momento, nasce o conflito de interesses.

Surgindo o conflito, busca-se, ento, a soluo atravs de uma composio amigvel, ou quando isso no possvel, sacrifica-se o direito de um em detrimento do outro.

No incio da sociedade, quando no havia ainda a figura do Estado, ou se existisse no tinha capacidade de solucionar os conflitos havidos entre seus membros, os conflitos eram resolvidos pelos prprios litigantes, por meio da autocomposio.

A sociedade evoluiu e com ela aumentaram a diversidade e quantidade de conflitos at que o Estado assumiu a funo de soluciona-los. Frise-se que esta funo j estava intrnseca, a funo de proteo do grupo contra agresses externas.

O processo de soluo de conflitos experimentou vrias fases ao longo da histria, desde quando o juiz era um lder de tribo e, com autoridade moral, solucionava verbalmente as desavenas entre seus membros, at chegar s cortes modernas.

Com o intuito de oferecer maior segurana composio de conflitos, foi institudo um processo formal e criada uma estrutura hierrquica sofisticada. Com isso a funo jurisdicional foi burocratizada, e o fator tempo foi se tornando, ao longo da histria, preponderante j que os objetivos do processo so a segurana e a eficincia.

Pois bem, conforme os anos foram se passando, foram aumentando os litgios e a demanda tomou tamanha proporo, dentre outros fatores, que a estrutura judiciria j no mais suficientemente eficiente na composio de litgios.

Nesse momento, o legislador se atenta para o fato de que a Justia Civil havia se tornado uma justia elitista, afastada da grande populao, a qual evitava recorrer ao judicirio por no cumprir este o que prometia em razo de sua lentido, dentre outros fatores.

O direito a uma prestao jurisdicional, conforme a lio de Almeida, Talamini e Wambier, o direito a uma proteo efetiva e eficaz, que tanto poder ser concedida por meio de sentena transitada em julgado, quanto por outro tipo de deciso judicial, desde que apta e capaz de dar rendimento efetivo norma constitucional.

Pode-se afirmar, portanto, que a antecipao de tutela consiste em um fenmeno processual de razes constitucionais, se considerado o fato de que a aplicao do princpio da inafastabilidade do controle jurisdicional depende da efetividade e eficcia da tutela prestada.

Conforme j foi mencionado no segundo captulo, o drama da processualstica moderna a morosidade do judicirio, que tem muitas vezes causado prejuzo s partes. Assim, o legislador ptrio, busca criar medidas alternativas e diferenciadas de proteo a interesses em litgio, conferindo s partes o mximo de celeridade, efetividade e segurana na concesso da tutela jurisdicional.Dentre as tentativas do legislador em buscar meios para conferir ao processo e tutela jurisdicional maior celeridade e efetividade, em 1994, atravs da Lei 8.952, o Cdigo Civil sofreu uma importante alterao, mais especificamente em seu artigo 273, o qual passou a ter a seguinte redao:

Art. 273. O juiz poder, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequvoca, se convena da verossimilhana da alegao e:

I - haja fundado receio de dano irreparvel ou de difcil reparao; ou

II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propsito protelatrio do ru.

1 Na deciso que antecipar a tutela, o juiz indicar, de modo claro e preciso, as razes do seu convencimento.

2 No se conceder a antecipao da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado.

3 A execuo da tutela antecipada observar, no que couber, o disposto nos incisos II e III do art. 588.

4 A tutela antecipada poder ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em deciso fundamentada.

5 Concedida ou no a antecipao da tutela, prosseguir o processo at final julgamento.

O mesmo artigo sofreu nova alterao em 2002, com a Lei 10.444, alterando o pargrafo 3 e incluindo dois pargrafos.

Estas alteraes introduzidas no Cdigo de Processo Civil pela reforma de 1994, segundo ensinamentos de Almeida, Talamini e Wambier, envolveram, sem dvida, certa dose de risco que precisava ser corrido, em prol de um processo apto a gerar resultados mais adequados.

Para os processualistas, o risco maior era o de se cometer injustias derivadas de uma resposta jurisdicional intempestiva, e menor o risco de injustias advindo da incorreta antecipao de tutela e, para dirimir este ltimo risco que foram estabelecidos requisitos para a concesso da tutela antecipada, os quais sero analisados posteriormente.

Para Marinoni e Arenhart, no h efetividade sem riscos, e o que a antecipao de tutela permite perceber que no somente a ao pode causar prejuzos, mas tambm a omisso. E arrematam lecionando que o remdio surgiu para eliminar um mal que j est instalado, uma vez que o tempo do processo sempre prejudicou o autor que tem razo.

Estes foram os motivos pelos quais o legislador criou o instituto da tutela antecipada, com o fito de proporcionar parte efetividade na prestao jurisdicional, por meio da celeridade, sem ferir, no entanto, os direitos da parte adversa.

Pode-se dizer, ento, que o instituto da antecipao de tutela tem amparo constitucional j que intimamente ligado ao princpio da razovel durao do processo, dentre outros, como tambm fora criado com bases constitucionais a fim de garantir segurana, proteo, efetividade, eficincia, eficcia e celeridade parte que recorre ao judicirio para buscar a tutela de seus direitos.

4.2 Da evoluo histrica da tutela antecipada no ordenamento jurdico estrangeiroA atual tutela antecipada se assemelhava tutela interdital romana, j que a figura do pretor antecipava a execuo ou o mandamento no prprio processo cognitivo, independentemente de processo autnomo, mediante uma ordem liminar, com uma cognio sumria das afirmaes do autor, se feitas conforme o dito.

Esta descoberta romana dos interditos se deu no final da Idade Mdia e incio do perodo renascentista e, em boa parte deveu-se ao aparecimento de novas relaes jurdicas, com novas modalidades de conflitos de interesses, principalmente mercantis, como tambm pela necessidade de que fossem supridas as recentes peculiaridades do direito substancial, ou seja, o surgimento dos ttulos executivos. So indicados, portanto, como antecedentes da tutela cautelar, pois semelhantes s liminares atuais, contendo ordem de tutela provisria.

O interdito se caracterizava como sendo uma forma de tutela de urgncia de cunho satisfativo e carter provisrio, baseado em juzo de verossimilhana e probabilidade, para a obteno da pretenso inicial do autor de forma imediata. O procedimento do interdito era sumrio, clere, realizado somente in iure, firmando sua deciso provisoriamente sobre um juzo de verossimilhana e probabilidade das alegaes do autor. Tais mandados germnicos j albergavam em si noes a respeito do "periculum in mora" e "fumus boni iuris", e podiam ser expedidos com ou sem clusula justificativa, constituindo-se assim, como fundamento principal das atuais medidas cautelares, e do prprio mandado de segurana.

A Igreja Catlica marcou presena atravs dos glosadores com o advento do processo romano-cannico ("processo comum"), porm viu-se que o mesmo era moroso, excessivamente formal e complicado. Assim, o procedimento sumrio surge mais simplificado por influncia da Decretal de Clemente V, de 1306, alcunhada Clementina Saepe, pela regra decretal in procedendo, atuava-se simpliciter et de plano ac sine strepita et figura judiciis.

Na Frana o processo civil tambm foi simplificado com o surgimento do absolutismo monrquico, as ordennance (ordenaes rgias), aboliam as formalidades do processo romano-cannico, tendo como caractersticas marcantes a simplicidade, a oralidade, a publicidade e a ampla dispositividade. No novo Cdigo de Processo Civil foram adotadas as denominadas Ordonnances de rfrs, consideradas uma regulamentao de urgncia que permite ao juiz no encarregado da ao principal, levar a efeito medidas necessrias sua efetividade, dispostas no artigo 484.

Em 1807 o Code de Procedure Civile praticamente transcreveu a famosa Ordonnance de 1667 de Lus XIV e, influenciou os Cdigos da Blgica, Rssia, Holanda, e, indiretamente, o Cdigo Italiano de 1865, a Zivilprocessordnung alem de 1877 e o Regulamento Processual Austraco de 1895.

Um caso tpico de antecipao de tutela encontrado tambm no artigo 940 do ZPO Cdigo de Processo Civil da Alemanha, que regula temporariamente uma relao jurdica. No uma garantia da pretenso, mas sim, da relao jurdica litigiosa.

O mesmo diploma legal alemo tambm prev, em seu 935, verdadeira medida cautelar atpica, de fim conservativo, pois pretende evitar qualquer forma de alterao ou modificao do objeto da chamada Individualleistungen, ou em outras palavras, das prestaes dirigidas dao ou consignao de um determinado bem ou a um certo fazer ou no fazer do devedor.

Por fora das diversas invases, at por rabes, um extrato do sistema romano, o processo civil foi influenciado pelo Cdigo de Alarico de 506 (Breviarum Aalaricianum ou Aniani) na pennsula Ibrica e, depois pelo Cdigo visigtico, tambm conhecido como Fuero Juzgo ou Forum Judicum, de 693,este diploma de fundo romano-gtico.

O Cdigo Visigtico, tambm conhecido como Fuero Juzgo, como outras Cartas Forais foram substitudas, em Portugal, pelas Ordenaes Afonsinas de 1446, que foram revogadas em 1521 pelas Ordenaes Manuelinas e, posteriormente, j influenciando o perodo colonial brasileiro, vieram as Ordenaes Filipinas, as quais tratavam da parte processual em seu livro III.

Na ustria, assim como na Alemanha, o sistema processual caracterizava-se pelo poder de cautela do juiz diante das vrias exigncias de forma de tutela preventiva dos direitos, no havendo limitao concesso da tutela antecipatria, exceto se o caso sub judice admitisse a execuo forada.

Nos Estados Unidos e na Inglaterra pode o juiz, no caso concreto, ditar provimentos que previnam ou reprimam qualquer ameaa tutela jurisdicional, como tambm estabelecer remdios processuais que melhor previnam o direito das partes em litgio, com o objetivo de garantir a efetividade processual.

Na Itlia, somente a partir de 1942 com a reforma processual que foi introduzido um captulo prprio para tratar das medidas cautelares, depois de grande presso e insatisfao doutrinria e jurisprudencial que foram tratadas, mas at ento no havia previso de medidas cautelares atpicas.

O artigo 700 do Codex Italiano traz em seu bojo evidentemente a celeridade dos provimentos cautelares como um remdio til e eficaz para assegurar a medida definitiva e combater a morosidade processual e, aps inmeras discusses sobre o alcance da tutela antecipada, entendeu a jurisprudncia italiana que o referido artigo compatvel com a antecipao total dos efeitos da sentena.

No ordenamento jurdico brasileiro as medidas cautelares fora introduzidas, primeiramente, segundo disposies das Ordenaes do Reino de Portugal at o ano de 1850, quando surgiu o Regulamento n. 137.

Em 1939, j com o advento da Repblica, o Cdigo de Processo Civil, em seu artigo 675 disciplinava sobre as medidas cautelares, as quais foram substitudas somente em 1973, com o advento do atual diploma processual, que trata da matria nos artigos 798 e 799.

neste Cdigo de Processo Civil de 1973 e, vigente at os dias atuais, que foi introduzida uma forma especial de tutela antecipatria, disposta no artigo 330, o julgamento antecipado da lide. Foi neste ambiente de aperfeioamento e evoluo das medidas cautelares, verificado com a reforma do Cdigo de Processo Civil em 1994, que surgiu a tutela antecipada prevista nos artigos 273 e 461, 3, no sistema processual ptrio.

Cumpre esclarecer que antes da reforma de 1994 o ordenamento jurdico j previa mecanismos processuais especficos que viabilizavam a antecipao dos efeitos executivos da tutela, ainda que de forma esparsa como, por exemplo, as aes possessrias, alimentos provisionais e em mandado de segurana.

Todavia, somente com a referida reforma processual pelo advento da Lei 8952/1994 que o legislador deu uma nova redao ao artigo 273 do CPC e consagrou a possibilidade ao juiz de antecipar, genericamente, os efeitos da tutela definitiva de mrito em qualquer processo de conhecimento, eliminando-se todas as controvrsias acerca do real alcance do poder geral de cautela.

No projeto do Novo Cdigo de Processo Civil uma das principais mudanas est no tratamento dispensado tutela antecipada e a tutela cautelar, j que trata dos dois tipos de tutela como tutelas de urgncia, no mais em um livro destinado ao processo cautelar como tambm os procedimentos cautelares especficos, ambas so tratadas no mesmo ttulo juntamente com a nova tutela de evidncia.

Este tratamento semelhante entre as duas espcies de tutela foi apenas consolidado no projeto, pois j estava previsto, atravs do 7, do artigo 273, do CPC, em 2002, a fungibilidade das tutelas de urgncia. o que se pode observar na leitura do art. 283 do Projeto, abaixo transcrito:

Art. 283. Para a concesso de tutela de urgncia, sero exigidos elementos que evidenciem a plausibilidade do direito, bem como a demonstrao de risco de dano irreparvel ou de difcil reparao.

Arruda Alvimassim distingue a tutela de urgncia da tutela da evidncia:

Em suma, a principal diferena entre a tutela de urgncia e a tutela da evidncia reside no fato de que, em relao tutela da evidncia no h a necessidade de demonstrar o periculum in mora, tal como ocorre na tutela de urgncia, pois se trata de situaes em que a evidncia do direito j se encontra configurada nos autos. Tambm no se h que falar, propriamente, em fumus boni iuris, porquanto a ausncia de defesa consistente (CPC, art. 273, II) ou de controvrsia sobre o pedido ou parte dele (CPC, art. 273, 6), denotam, mais que a plausibilidade do direito autorizada por cognio superficial ou sumria , a prpria verificao de sua existncia, fundada em cognio judicial exauriente.

Em relao aos procedimentos, embora tenha o projeto do novo CPC abolido o livro sobre as medidas cautelares, h no livro das tutelas de urgncia dois tipos de procedimentos para elas, a saber, o das medidas requeridas em carter antecedente (semelhante ao processo cautelar preparatrio), com algumas alteraes e, o das medidas requeridas em carter incidental.

Dentre as modificaes em relao s tutelas requeridas em carter antecedente, transcreve-se o artigo 288 e seus pargrafos do Projeto:

Art. 288. No sendo contestado o pedido, os fatos alegados pelo requerente presumir-se-o aceitos pelo requerido como verdadeiros, caso em que o juiz decidir dentro de cinco dias.

1 Contestada a medida no prazo legal, o juiz designar audincia de instruo e julgamento, caso haja prova a ser nela produzida.

2 Concedida a medida em carter liminar e no havendo impugnao, aps sua efetivao integral, o juiz extinguir o processo, conservando a sua eficcia.

Observa-se da redao do referido artigo que foi conferida maior fora e estabilidade da tutela concedida quando o requerido deixar de impugnar, aps a efetivao integral da liminar, podendo ser extinto o processo antecedente, porm mantida a eficcia da medida deferida.

No entanto, o pargrafo segundo do artigo seguinte (299) do Projeto dispe que a liminar deferida no ter fora de coisa julgada material, apenas formal, podendo ser revogada por outra deciso proferida em processo a ser posteriormente instaurado por qualquer das partes.

2 Nas hipteses previstas no art. 289, 2 e 3, as medidas de urgncia conservaro seus efeitos enquanto no revogadas por deciso de mrito proferida em ao ajuizada por qualquer das partes.

O artigo 285 do Projeto estabelece as hipteses de concesso da chamada tutela da evidncia que, apesar de ser tratada como um novo instituto trata-se, na verdade, da tutela antecipada que no fundada na urgncia, mas sim na maior evidncia do direito veiculado por uma das partes.

Como j mencionado, o artigo 285 estabelece as hipteses de concesso da tutela de evidncia, quando dispensada a demonstrao da urgncia para a concesso da tutela antecipada:

Art. 285. Ser dispensada a demonstrao de risco de dano irreparvel ou de difcil reparao quando:

I - ficar caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propsito protelatrio do requerido;

II - um ou mais dos pedidos cumulados ou parcela deles mostrar-se incontroverso, caso em que a soluo ser definitiva;

III - a inicial for instruda com prova documental irrefutvel do direito alegado pelo autor a que o ru no oponha prova inequvoca; ou

IV - a matria for unicamente de direito e houver jurisprudncia firmada em julgamento de casos repetitivos ou smula vinculante.

Pargrafo nico. Independer igualmente de prvia comprovao de risco de dano a ordem liminar, sob cominao de multa diria, de entrega do objeto custodiado, sempre que o autor fundar seu pedido reipersecutrio em prova documental adequada do depsito legal ou convencional.

Em se tratando de irreversibilidade do provimento antecipado, irreversibilidade ftica, conforme aduzem os doutrinadores, o projeto do novo CPC no faz qualquer meno a este pressuposto negativo, assim como ocorre no artigo 461, 3 do atual CPC.

No havendo previso textual deste requisito da reversibilidade e, conforme j mencionado nos captulos anteriores, devero ser ponderados os valores em jogo atravs dos princpios da razoabilidade e proporcionalidade para que o juiz possa conceder ou denegar as medidas urgentes.

4.3 Requisitos necessrios para a concesso da atual Tutela Antecipada Art. 273, do CPC

Antes de adentrar aos requisitos necessrios para a concesso da tutela antecipada, impende distinguir as tutelas de urgncia, pois so trs as espcies delas, a saber, a tutela cautelar, a tutela antecipada e a tutela inibitria. Cada uma delas tem seus requisitos especficos, sem contar os requisitos gerais, exigidos para a concesso de qualquer tutela de urgncia, ou seja, o fumus boni iuris e o periculum in mora.

Segundo leciona Marinoni, a tutela cautelar pode ser incidental ou preparatria, sendo que no primeiro ajuizada nos autos de um processo principal, apensada a este e, o segundo caso ajuizada para assegurar alguma situao imprescindvel para a propositura da ao principal competente. Este tipo vem tratado em livro prprio no CPC e sua existncia est intimamente ligada existncia, presente ou futura, de um processo principal.

Enquanto a tutela cautelar visa garantir o bem da vida em discusso, a tutela antecipada, ao contrrio, representa verdadeira antecipao do mrito da demanda, efetivo gozo do bem da vida solicitado na inicial, total ou parcialmente.

Assim, nas lies de Almeida, Talamini e Wambier, a distino que predomina est na finalidade das tutelas, ou seja, enquanto a tutela cautelar evita ou minimiza o risco de eficcia do provimento final, a tutela antecipada pressupe direito que, desde logo, aparece evidente e, desde logo deve ser especialmente tutelado pelo sistema, embora esta, frequentemente, tenha tambm a funo de preservar a eficcia do provimento final.

Devidamente feitas as devidas distines, prossegue-se, ento analisando os requisitos para a antecipao de tutela, os quais a doutrina, didaticamente, divide em pressupostos positivos e pressupostos negativos e, alguns ainda em pressupostos alternativos.

Da simples interpretao do artigo 273, caput, do CPC pode-se inferir que dois so os requisitos indispensveis e cumulativos para que seja concedida a antecipao da tutela, quais sejam, a prova inequvoca e a verossimilhana, e ainda da urgncia ou da evidncia.

Na tutela antecipada com base na urgncia, os fundamentos de sua concesso so o perigo de dano irreparvel ou de difcil reparao e o perigo de ilcito, enquanto que na tutela de evidncia a concesso justifica-se pelo abuso do direito de defesa ou manifesto propsito protelatrio do ru, ou ainda pela inexistncia de parte incontroversa na demanda.

Na lio de Didier Jr. e Braga, existe uma grande diferena entre os requisitos da tutela antecipada e da tutela cautelar, ou seja, entre o requisito da prova inequvoca para a concesso da tutela antecipada e o requisito da fumaa do bom direito (fumus boni iuris) para concesso da tutela cautelar, pois a prova inequvoca no deve dar margem dubiedade, deve estar apoiada em prova preexistente, clara e evidente no sentido de realmente convencer o juiz da verossimilhana das alegaes, enquanto que a fumaa do bom direito trata-se de sombra ou contornos de um possvel direito.

Na lio de Zavaschi, a prova inequvoca deve ser entendida como uma prova robusta que, embora no mbito da cognio sumria, aproxime, seguramente, o juzo de probabilidade, do juzo de verdade.

Continua Zavaschi, agora em relao ao requisito da verossimilhana, lecionando que em decorrncia do requisito da prova inequvoca o julgador deve convencer-se da verossimilhana que se refere ao fundamento de direito para que possa conceder ou no a tutela antecipada, pois o juzo de verossimilhana aquele que permite chegar a uma verdade provvel sobre os fatos apresentados pelo autor.

No entendimento de Humberto Theodoro Jnior a verossimilhana refere-se no apenas existncia do direito subjetivo material, mas tambm e, principalmente, a todo o quadro ftico invocado pela parte que pretende a antecipao da tutela, portanto, a verossimilhana se configurar somente quando apontar para uma probabilidade muito grande de que as alegaes do autor so verdadeiras.

Marinoni e Arenhart vo ainda mais longe, para eles o juiz deve levar em considerao, quando da exigncia da verossimilhana, o valor do bem jurdico ameaado, a dificuldade do autor em provar sua alegao, a credibilidade desta, de acordo com as regras de experincia e, a prpria urgncia.

Seguem ainda lecionando que no se deve pensar na tutela antecipada como aquela tutela concedida em tempo inferior ao necessrio para o trmino do processo, mas levando-se em conta o fato de que a produo de provas a principal responsvel pelo gasto de tempo no processo, na antecipao de tutela admite-se sua concesso antes que as provas requeridas pelas partes tenham sido produzidas.

nestes casos que se observa ainda mais a profundidade do requisito da prova inequvoca, pois esta deve significar prova formalmente perfeita, cujo tempo de produo e imediatidade da concesso da tutela so compatveis.

Alm dos requisitos fundamentais e cumulativos, dispostos no caput do artigo 273 do CPC, para a concesso da tutela antecipada existem os requisitos denominados pela doutrina alternativos, ou seja, aqueles dispostos nos incisos I e