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TEMAS ATUAIS EM EDUCAÇÃO Volume II · pressuposto de que a criança (ou o ser humano) é construtora de seu saber. Aprender não se resume em ter na mente um amontoado de informações,

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TEMAS ATUAIS EM EDUCAÇÃO

Volume II

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Imagens da capa: https://pixabay.com/pt/educa%C3%A7%C3%A3o-%C3%ADcones-educa%C3%A7%C3%A3o-%C3%ADcones-3551841/

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Daniela Valentini Junior Cunha

Valdenir Prandi (Organizadores)

TEMAS ATUAIS EM EDUCAÇÃO

Volume II

Primeira Edição E-book

Toledo - PR 2018

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Copyright 2018 by Organizadores EDITOR:

José Dias CONSELHO EDITORIAL:

Dr. Daniel Eduardo dos Santos – UNICESUMAR Dr. José Beluci Caporalini – UEM

Dr. Lorivaldo do Nascimento - UNIOESTE REVISÃO FINAL:

Prof. Ademir Menin CAPA, DIAGRAMAÇÃO E DESIGN:

Junior Cunha. Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)

Rosimarizy Linaris Montanhano Astolphi Bibliotecária CRB/9-1610

Todos os direitos reservados aos Organizadores.

Todos os textos aqui publicados são de exclusiva responsabilidade de seus autores.

Editora Vivens, O conhecimento a serviço da Vida! Rua Pedro Lodi, nº 566 – Jardim Coopagro

Toledo – PR – CEP: 85903-510; Fone: (45) 3056-5596 http://www.vivens.com.br; e-mail: [email protected]

Temas atuais em educação, volume II. /

organizadores

T278 Daniela Valentini, Junior Cunha, Valdenir Prandi.

– 1. ed. e-book – Toledo, PR: Vivens, 2018.

152 p.

Modo de Acesso: World Wide Web:

<http://www.vivens.com.br>

ISBN: 978-85-92670-73-3

1. Filosofia. 2. Medidas sócio educativas. 3.

Criança - adolescente. 4. Educação – Brasil –

Regime militar. 5. Castro Alves.

CDD 22. ed. 370

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ................................................................... 9

I A IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO FILOSÓFICA

NA INFÂNCIA: MATTHEW LIPMAN E SUAS

PERSPECTIVAS EDUCACIONAIS

Rosirene Aleixo dos Santos

Valdenir Prandi ............................................................................ 11

II CRIANÇA E ADOLESCENTE: O ATO

INFRACIONAS E AS MEDIDAS

SOCIOEDUCATIVAS

Yorran Oliveira Nitsche

Valdenir Prandi ............................................................................ 55

III ESCRAVIDÃO POÉTICA

Alex Sandro Da Silva

Valdenir Prandi ............................................................................ 97

IV OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

NO REGIME MILITAR

Alécio Barbosa

Valdenir Prandi .......................................................................... 133

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APRESENTAÇÃO

Com grande alegria apresentamos aos(às) estudiosos(as) de educação e ciências humanas a obra “Temas atuais em educação – Volume II” que recolhe trabalhos de diversos autores dedicados a várias frentes da Educação, tanto em sua dimensão teórica quanto naquela prática em sala de aula.

No primeiro capítulo, os professores Rosirene Aleixo dos Santos e Valdenir Prandi trabalham a importância da educação filosófica na infância: Matthew Lipman e suas perspectivas educacionais.

No segundo capítulo, os professores Yorran Oliveira Nitsche e Valdenir Prandi trabalham a criança e adolescente: o ato infracional e as medidas socioeducativas, lançando importantes luzes sobre um problema crescente.

No terceiro capítulo, os professores Alex Sandro da Silva e Valdenir Prandi trabalham a escravidão poética, dando grande contribuição ao processo educativo.

No quarto capítulo, os professores Alécio Barbosa e Valdenir Prandi trabalham os desafios da educação brasileira no regime militar, oferecendo importante reflexão sobre o período estudado.

Boa leitura!

Os Organizadores

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I

A IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO FILOSÓFICA NA INFÂNCIA: MATTHEW LIPMAN E SUAS

PERSPECTIVAS EDUCACIONAIS

Rosirene Aleixo dos Santos* Valdenir Prandi**

RESUMO: O ensino de Filosofia nas escolas tornou-se um tema em questão, pensado e estudado por pesquisadores e educadores de vários países. Desta forma, o presente projeto objetiva oferecer o conhecimento de uma ideia que, juntamente com algumas outras já existentes no Brasil sobre a presença da

* Especialista em Ensino de Filosofia para Ensino Médio - UNICENTRO; E-mail: [email protected]. ** Possui Licenciatura Plena em Filosofia pela Faculdade Padre João Bagozzi - (Registrado Ministério da Educação Universidade Federal do Paraná) (2011-2013). Atualmente é professor - Secretaria de Educação do Estado do Paraná. Possui Licenciatura Plena e Geografia pela Faculdades Integradas da Terra de Brasília - Brasília - DF (2007 - 2009). Possui Licenciatura Plena em Pedagogia (Segunda Licenciatura) pelo Centro Universitário de Jales (UNIJALES) - Jales - SP (2015 - 2016). Pós-Graduação modalidade Lato-Sensu: Centro Universitário Leonardo da Vinci (UNIASSELVI): Metodologia de Ensino de Filosofia e Sociologia - Indaial - SC (2014 - 2015). Faculdade da Aldeia de Carapicuíba (FALC) Pós-Graduação em Deficiência Intelectual, Auditiva e Visual e a Prática Educativa Inclusiva - Carapicuiba - SP (2014 - 2015). Faculdade União Cultural do Estado de São Paulo (UCESP - Faculdade) Pós-Graduação em Educação ambiental e Sustentabilidade - Araçatuba - SP. (2015-2016). Participação em Cursos e Eventos - Participou do Curso de Capacitação do Programa Qualificação Pedagógica, Secretaria Municipal de Educação de Grandes Rios - PR. (2011).

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Filosofia nas escolas, motivou tais discussões e a presença da Filosofia no currículo escolar, chegando a ser hoje uma disciplina que integra o currículo do Ensino Médio obrigatoriamente em todos os estados do Brasil. Vale ressaltar ainda que, muitas escolas também trabalham com o ensino de Filosofia no Ensino Fundamental. Tal pensamento se refere as ideias e propostas de Matthew Lipman e o seu Programa de Filosofia para crianças. Constatamos algumas contribuições oferecidas pelo Programa e pela proposta de Lipman, o qual intenta criar um ambiente na sala de aula que proporcione a discussão de temas filosóficos, a investigação e o questionamento dos problemas que afetam a vida do ser humano. Esse ambiente foi chamado por Lipman de Comunidade de Investigação. Afinal, qual a importância do estudo da filosofia na educação infantil? A filosofia para Lipman contém o ingrediente principal para levar o aluno a ser crítico no atual mundo em que vivem, e foi a partir dessa preocupação que surgiu o Programa de Filosofia para Crianças onde a educação envolveria todos os estágios da vida humana, possibilitando o pensamento crítico. Desta maneira, a metodologia utilizada está pautada diante da bibliografia ofertada pelo projeto. PALAVRAS-CHAVES: Filosofia. Crianças. Programa.

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INTRODUÇÃO

O artigo traz à tona os estudos e pesquisas desenvolvidas pelo educador e filósofo norte-americano Matthew Lipman que, preocupado com o desenvolvimento cognitivo das crianças bem como a capacidade de pensar melhor, elaborou para a melhoria da educação um Programa de Ensino pautado na educação filosófica infantil visando as contribuições da filosofia para o desenvolvimento e a formação das crianças. “O Programa Filosofia para Crianças só pode ser compreendido no contexto da filosofia do autor” (SOUZA, s/a, p. 13-14):

No final da década de 1960, Lipman fez um primeiro experimento de suas ideias, escrevendo uma história para crianças que tratava de problemas filosóficos. Para ele, a filosofia pode ter uma versão acessível à criança. A leitura compartilhada destes textos tem por meta provocar perguntas sobre os assuntos de interesse das crianças que devem ser acolhidas pelo professor como ponto de partida para filosofar (SOUZA, s/a, p. 14).

A concepção de ensino proposta por Matthew Lipman em seu programa de filosofia para crianças não se resume a uma transmissão de conhecimento, mas parte do pressuposto de que a criança (ou o ser humano) é construtora de seu saber. Aprender não se resume em ter na mente um amontoado de informações, mas em saber apreciar e usar essas informações com cuidado e sensibilidade.

Segundo Lipman, a filosofia é um instrumento primordial na formação educacional da criança, sem seus pressupostos a educação tende ao fracasso, pois é ela que possui os elementos necessários para a formação cognitiva para o desenvolvimento do pensar bem. Contudo, esse desenvolvimento cognitivo não será concebido caso a disciplina de filosofia seja vista e abordada como “mais uma

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disciplina do currículo”. O que Lipman propõe não é a disciplina de filosofia como redentora da educação, mas a filosofia, muito mais como método que disciplina, ou seja, a filosofia como método de investigação. O diálogo filosófico como método de construção do conhecimento, assim como propôs Sócrates e Platão:

Assim como os filósofos, as crianças se fazem perguntas sobre o mundo. Conseguem compreender conceitos filosóficos desde que sejam formulados em uma linguagem compreensível para elas, e são capazes de inventá-los. Em suma, as crianças têm uma afinidade natural com a filosofia (LIPMAN, 2008b, p. 18-19 apud ROSA; ATTISANO, s/a, p. 17).

O ensino de filosofia é ministrado por meio de

diálogos que possibilitam o desenvolvimento de habilidades de pensamento, capaz de levar as crianças a alcançarem o pensamento de ordem superior em uma Comunidade de Investigação, através de discussões realizadas a partir de leituras feitas das novelas filosóficas por estudantes e professores, visto que, é por meio do diálogo que as crianças fazem perguntas, expõem suas hipóteses e tiram conclusões.

Metodologicamente, essa pesquisa se pautou em algumas análises das obras de Lipman e de alguns comentadores do autor. Seu objetivo principal, é responder as seguintes questões: Qual é a perspectiva de Lipman? Qual a importância do ensino de filosofia para crianças? Como que a prática do diálogo filosófico contribui para a construção do conhecimento? Qual o perfil do educador?

Em última análise, o trabalho visa como objetivo principal fazer um levantamento metodológico do programa de filosofia para crianças de Matthew Lipman para nos aprofundarmos no conhecimento acerca da proposta de ensino que nos últimos anos vem ganhando espaço nas pesquisas sobre o ensino de filosofia no Brasil.

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1.1 MATTHEW LIPMAN E A FILOSOFIA PARA CRIANÇA NO BRASIL

Nascido em 1923 e formado em 1948, o professor norte-americano Matthew Lipman, lecionou por um período de dezoito anos, lógica na Universidade de Columbia e por vinte e dois anos na Universidade de City. Foi professor de Introdução à Lógica e de Teoria do Conhecimento. “Observando as revoltas estudantis de 1968, na qual Columbia era uma das universidades que mais militou nestas manifestações, se preocupou com o que estava acontecendo” (MARTINS, 2010, p. 13):

Ao ver os esforços desajeitados das Universidades em se reavaliar, não pôde deixar de concluir que os problemas de Columbia não podiam ser resolvidos no quadro dessa instituição. Estudantes e professores, todos tinham saído da mesma matriz da escola primária e secundária (MARTINS, 2010, p. 13).

Para Lipman

se não tínhamos recebido uma Educação boa, muito provavelmente tínhamos chegado a compartilhar as mesmas ideias errôneas que nos levariam a estropiar nossa educação posterior em feliz conluio mútuo (LIPMAN, 1998, p. 21-22 apud MARTINS, 2010, p. 13).

Lipman começou a perceber que seus alunos

possuíam grandes falhas de raciocínios, foi então, que se dá início a uma reflexão sobre a possibilidade de ensinar o pensamento crítico nas escolas por meio do ensino da lógica onde auxiliaria no desenvolvimento da cognição da criança. O objetivo de Matthew era fazer com que os aprendizes se tornassem mais racionais, mais críticos e reflexivos desde a sua infância.

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O projeto de Filosofia para crianças teve início a partir do ano de 1969, na qual, o embasamento desse projeto seria uma forma de ensino entre a conciliação da Filosofia com histórias ficcionais, narrativas e dialógicas:

A filosofia para crianças chegou ao Brasil através de Catherine Young Silva (1973-1993) em 1984 e junto com um grupo de professores difundiram o trabalho de Lipman que consiste na prática do diálogo filosófico com crianças inspirado pelos materiais e método de Matthew Lipman e seus colaboradores (MARTINS, 2010, p. 16).

Dirigido por Lipman em 1983 e 1984, Catherine fez seus estudos de mestrado em filosofia para criança na Montclair State University. Quando retornou ao Brasil, trouxe consigo o direito cedido por Lipman para traduzir e adaptar os materiais, bem como a autorização para formar professores e desenvolver o trabalho nas escolas (MARTINS, 2010, p. 16).

Catherine, percebeu através de seu trabalho que havia mais interação das crianças com os adultos, e que, o programa de Filosofia para Criança possuía grande poder no desenvolvimento da autonomia moral e intelectual infantil. Diante dessa observação, Catherine usou da modificação do material didático da Filosofia para criança para ser adaptado a realidade brasileira (MARTINS, 2010, p. 16).

Apoiada pelo filho e sua amiga de mestrado, Catherine inicia nas instalações do Yázigi em São Paulo a divulgação desta proposta nas escolas e universidades de São Paulo, Capital. Com o passar do tempo, Catherine teve o apoio de seu professor do curso de filosofia, Marcos Lorieri, e das professoras de filosofia e inglês, para a formação de professores e a implantação do trabalho nas escolas públicas da zona leste de São Paulo. Em janeiro de 1985, o mesmo grupo criou o Centro Brasileiro de Filosofia para criança (CBFC), entidade civil sem fins lucrativos que passou a se dedicar a tradução dos materiais e divulgação desta proposta

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e formação de professores para o desenvolvimento do programa nas escolas.

O movimento de filosofia para criança começou a crescer no Brasil diante das participações de Lipman em Congressos, Conferências e Palestras, sem contar com a disseminação do programa em várias escolas de São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Minas e outros Estados.

O programa teve várias críticas e rejeições vindos de alguns filósofos universitários brasileiros. Logo, o mesmo ganhou mais credibilidade na década de 90, onde depois de uma série de reportagem de jornais e revistas apresentaram o programa e seus resultados no caderno MAIS! Da folha de São Paulo de 05-05-1994, publicando uma das mais significativas reportagens sobre o tema. (MARTINS, 2010, p. 17).

Diante dos esforços de Catherine, Marcos Lorieri e da equipe do CBFC em 1992 quarenta escolas já estavam no projeto no qual a Secretaria Estadual de Educação de São Paulo garantiu a primeira tradução do material didático de Lipman.

Todo este trabalho, de acordo com Lorieri, o êxito desta experiência despertou o interesse das escolas particulares de São Paulo e outros Estados (MARTINS, 2010, p. 17).

Vale ressaltar, que o movimento realizado na década de noventa contribuiu para novas abordagens da prática de Filosofia para crianças no Brasil.

O caminho para uma retomada na educação diante das observações de Lipman estaria num olhar diferenciado nas crianças. Com isso, o ensino da lógica e da filosofia muito antes da universidade ajudaria a diminuir as falhas de raciocínios dos educandos, visto que, isto não teria um resultado precoce devido ao fato de que estudantes e professores tinham saído da mesma matriz de uma escola primária e secundária.

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Se quisermos democratizar nossas sociedades diria Lipman é preciso educar nossas crianças na filosofia e na democracia. Por que as crianças? Porque e aqui Lipman parece mais pragmatista do que nunca. – para adultos talvez seja tarde demais. Porque uma socialização pouco democrática e pouco filosófica já tenha feito estragos neles. Por isso a única esperança certa segundo Lipman está nas crianças... (KOHAN, 2000, p. 47 apud MARTINS, 2010, p.18).

De igual forma, segundo Lipman, a prática da filosofia e o fazer a filosofia é uma ferramenta indispensável no quesito educacional em relação ao desenvolvimento do raciocínio e da capacidade de julgar dos alunos.

“Lipman é o fundador do movimento por levar sistematicamente a prática de filosofia à educação das crianças [...]” (MARTINS, 2010, p. 18). Além da elaboração do Programa de Filosofia para crianças (suas novelas filosóficas e manuais) Lipman escreveu vários livros pautado diante de uma preocupação em que a educação valorizasse e priorizasse o pensar bem.

Em 1980, escreveu o livro “A filosofia na sala de aula” de coautoria com Ann Margaret Sharp e Frederick Oscanyan. Logo em 1988, escreveu “A filosofia vai à escola”. E, 1995 surgiu o livro “O pensar na educação”. “Natasha – Diálogos vygotskyanos” foi escrito em 1996. 1.2 O PROGRAMA DE MATTHEW LIPMAN E SUAS PERSPECTIVAS EDUCACIONAIS

Pautado em uma proposta pedagógica que visa o aprimoramento e o desenvolvimento da capacidade de pensar dos alunatos, o programa de filosofia para crianças surgiu pelo filosófo norte-americano (como dito anteriormente) Matthew Lipman. Este, por sua vez, acredita que a educação tradicional, cuja é baseada somente na transmissão de

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conhecimentos entre outros fatores, é incapaz de atingir esse objetivo (SILVEIRA, 2003, p. 5).

Segundo Lipman: “[...] o maior desapontamento da educação tradicional é o seu fracasso em produzir pessoas que se aproximem do ideal de racionalidade” (1990, p. 34 apud SILVEIRA, 2003, p. 5).

Daí a necessidade de substituir esse modelo pelo da educação para o pensar, segundo o qual o ensino é resultado de um processo de investigação onde o professor despido de sua infalibilidade, participa apenas como orientador ou facilitador, pois o enfoque não está mais na aquisição de informações, mas na percepção das relações contidas nos temas investigados. O que se espera é que os alunos pensem, reflitam e desenvolvam cada vez mais o uso da razão (LIPMAN, 1995, p. 29 apud SILVEIRA, 2003, p. 5-6).

O Programa de Filosofia para Crianças de Matthew Lipman, busca através da discussão em sala de aula (diálogo investigativo) o desenvolvimento da capacidade de reflexão sobre temas relacionados com o dia a dia dos alunos, desenvolvendo suas capacidades de julgamento.

Não estou afirmando que o ensino de conteúdo é inútil e que corremos o risco de transformar as crianças em sábias idiotas. Mas gostaria de colocar que a ênfase em sua aquisição de informações foi exagerada e deve passar para o segundo plano, assumindo a dianteira do aperfeiçoamento de seus pensamentos e julgamentos. (LIPMAN, 1995, p. 253 apud PEREIRA; NETO, 2009, p. 63).

Uma das perspectivas de Matthew Lipman está na inserção da filosofia na sala de aula com o intuito de fazer com que os alunos sejam capazes de desde a infância, adquirir um pensamento crítico, reflexivo e investigativo. Dessa forma, o programa de Filosofia para Crianças possui, por entremeio de

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temas filosóficos em uma linguagem acessível na infância, o desenvolvimento de habilidades cognitivas.

De acordo com Silveira (2003, p. 7) essas habilidades são classificadas em quatro tipos:

(1) Habilidades de raciocínio: possibilitam o estabelecimento de conclusões ou inferências a partir de conhecimentos anteriormente adquiridos, para assegurar a coerência interna do discurso. Envolvem capacidades tais como: “inferir”, “detectar premissas ou pressuposições subjacentes”, “formular questões, exemplificar”, “identificar similaridades e diferenças”, “construir e criticar analogias”, “comparar”, “contrastar e argumentar ou dar razões”. (2) Habilidades de formação de conceitos: permitem a análise de conceitos, identificando seus componentes, suas relações com conceitos semelhantes e diferentes para conferir-lhes sentido e torná-los instrumentos para a identificação e a compreensão das coisas, dos fatos e das situações. Por exemplo: “fazer distinções”, “fazer conexões”, “argumentar, classificar”, explicar”, “definir”, “identificar significados”, entre outras capacidades. (3) Habilidades de investigação: relacionadas aos procedimentos científicos e à ideia de busca do caminho (e não da resposta pronta) para se chegar às soluções dos problemas postos pela realidade. Incluem: “observar”, “identificar problemas/questões”, “formular questões”, “formular hipóteses”, “estimar, prever”, “verificar, medir, constatar”, “descrever, analisar”, “generalizar adequadamente”, “concluir”, “sintetizar” e “ser capaz de comportamento autocorretivo”. (4) Habilidades de tradução: permitem a compreensão de discursos (falados ou escritos) de modo que o sujeito desta compreensão possa reproduzir em sua própria linguagem o que ouviu ou leu, preservando o significado original. Englobam: “prestar atenção”, “interpretar criticamente”, “perceber implicações e suposições”, “parafrasear” e “inferir”.

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Essas habilidades nos mostram a importância delas aplicadas e desenvolvidas no cotidiano estudantil, visto que, um dos objetivos do Programa Filosofia para Crianças está em estimular o desenvolvimento da racionalidade dos alunos.

A educação envolve mais que apenas o desenvolvimento de habilidades. Podemos adquirir uma habilidade, mas podemos emprega-la mal. Podemos por exemplo, aprender a usar uma faca habilidosamente e, então, passarmos a utilizá-la anti-socialmente. (LIPMAN, 1995, p. 50 apud SILVEIRA, 2003, p. 9).

De acordo com Lipman (apud SILVEIRA, 2003, p. 9) as habilidades precisam ser trabalhadas no “contexto de uma disciplina humanística” capaz de impedir que “sejam mal empregadas”.

Embora as crianças não entendam a linguagem dos adultos, elas, por sua vez, estão sempre procurando compreendê-las. Para Lipman (apud LOPES, 2011, p. 71) o problema identificado no ambiente de estudo é que as crianças não possuem estímulos relacionados com o ato de pensar. Contudo, o filósofo norte-americano sugere uma possibilidade de, através do Programa Filosofia para Crianças, conduzir o aluno à reflexão, a pensar por si próprio. “[...] o raciocínio é uma habilidade, ele pode ser ensinado, estudado e aprendido” (LIPMAN, 1995, p. 14 apud LOPES, 2011, p. 71).

A princípio, a proposta de Lipman “Filosofia para Crianças” expande-se em um novo conceito de educação, que na visão do autor, esse novo conceito busca um olhar para uma educação que contemple novos horizontes.

Pensar na inserção da Filosofia na escola fundamental é estar disposto a olhar para as crianças, vendo nelas não adultos em miniaturas, mas crianças que são capazes de

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quando valorizadas, refletir com vistas a ter ideias próprias, o que é melhor, com grau de compreensão suficiente. (MALACARNE, 2005, p. 63 apud SOUZA, 2013, p .20).

Em virtude dessas considerações, a filosofia para crianças é um programa de Educação que busca, desde a infância, desenvolver habilidades cognitivas por meio de um processo dialógico investigativo.

O filosofar é, em suma, uma atividade de produção e de reflexão crítica de conhecimentos úteis para a vida [...] O filosofar que pretendemos está vinculado à história presente, ao cotidiano, à vida pulsante, aos interesses e motivações dos desafios atuais, em especial, aqueles vividos pelas crianças. (CUNHA, 2008, p. 13 apud BASTOS; CRUZ, 2010).

Segundo Lorieri (1998, p. 15) a proposta do Programa pretende duas coisas:

(1) Garantir a manutenção do interesse natural das crianças e jovens relativo às questões filosóficas e a ampliação de tal interesse e o acesso progressivo à rica metodologia investigativo-dialógica, própria da filosofia, no trato com tais questões; (2) Oferecer, provocativamente, nas escolas, uma forma de trabalho escolar que se preocupe com conteúdos de estudo, mas que se preocupe, acima de tudo, com o aprender a “pensar melhor”.

Para Lorieri (1998) essas duas coisas, se bem realizadas, podem provocar uma revolução no contexto escolar.

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1.3 INFLUÊNCIAS NO PENSAMENTO DE MATTHEW LIPMAN

O filósofo Matthew Lipman, através de seus estudos filosóficos, observou a importância de alguns pensadores da história da filosofia que fossem úteis para o desenvolvimento de seu programa. Dentre eles podemos citar Platão e Aristóteles, Husserl, Kuhn, George Mead, William James, Lyotard, Witgenstein, Montaigne, Russel, Piaget, Peirce, dentre outros. Contudo, os mais destacados em seus estudos são: Sócrates, John Dewey e Lev Semionovich Vygotsky.

1.3.1 A filosofia de Sócrates (método do diálogo)

A implantação do método do diálogo, na história da Filosofia, foi reconhecida como um avanço que influenciou a abertura de novas perspectivas para a educação.

Para Sócrates citado por Brocanelli (2010, p. 39), o pensar é um ofício, cada ser possui o seu pensamento individual. O método socrático traz consigo uma finalidade importantíssima para o desenvolvimento do pensar dos alunos, sendo essa finalidade de natureza ética e educativa. O diálogo com Sócrates conduzia as pessoas a reflexão, a sair de seus próprios conceitos e fazer um exame moral de sua própria vida. O diálogo Socrático era realizado em praça pública, local onde acontece várias discussões filosóficas.

Os pensadores de Sócrates e Lipman estão interligados justamente pelo fato de praticar a filosofia. Em meio a procura com muitas pessoas, Sócrates buscava conversar com elas sobre o conhecimento do homem sobre si mesmo e sobre as virtudes, bem como, sabedoria e a justiça.

O método de Sócrates é formado por dois momentos essenciais: a refutação e a maiêutica. Esses dois momentos do método Socrático faz um paralelo com o pensamento de Lipman, visto que, a refutação é o momento onde o ser

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reconhece seus erros na argumentação, levando o ser a um efeito de purificação das falsas certezas. A maiêutica Socrática nasce através do diálogo, é o aprender e sair de sua ignorância, encontrando a verdade que está escondida dentro de cada um. (BROCANELLI, 2010, p. 40-41).

De conformidade com Kohan (apud MARTINS, 2010, p. 20-21) tanto Lipman quanto Sócrates aprimoram a dimensão prática e dialógica da filosofia, ambos priorizam a filosofia como atividade filosófica, ou seja, a filosofia tem que ser algo visto, que se exerce, se cultiva e se vive em diálogo.

Para Kohan citado por Martins (2010, p. 21) os dois autores Lipman e Sócrates, relata que uma verdadeira educação não pode deixar de ser filosófica e uma verdadeira filosofia não pode deixar de ser educativa. Não há requisitos prévios para se ter acesso a filosofia. É preciso sentir o desejo de aprender reconhecendo a necessidade diante do não saber sobre o assunto a ser investigado.

Contudo, tendo por fundamento o pensamento de Sócrates, considera-se uma diferença radical entre aplicar Filosofia e fazer Filosofia:

Para ele não se tratava de uma aquisição nem de uma profissão, mas de um modo de vida. O que Sócrates nos exemplifica não é uma filosofia conhecida nem aplicada, mas praticada. Este nos desafia a reconhecer que como obra, como forma de vida, a filosofia é algo a que qualquer um de nós pode dedicar-se. (LIPMAN, 1990, p. 28 apud BROCANELLI, 2010, p. 42).

Para o autor Lipman (apud BROCANELLI, 2010, p. 42) o método filosófico inaugurado por Sócrates é de tamanha valorização para seus estudos devido a qual se dá a investigação e a busca de novas respostas as inquietações humanas.

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1.3.2 A filosofia de John Dewey (o pensar melhor)

Dewey trouxe através de seu método educativo, grande importância para o desenvolvimento do trabalho de Lipman. A marca de Dewey é percebível nos interesses temáticos e na elaboração da proposta de Lipman em trabalhar o pensamento crítico-criativo com crianças e jovens nas escolas.

“A forma com a qual Lipman compreende a educação está fortemente vinculada a sua leitura de John Dewey (em particular, 1936, 1976)”. (KOHAN, 2008, p. 39).

[...] identificamos alguns pontos comuns entre o pensamento dos dois autores em questão: o pensar melhor ou pensamento eficiente, o pensamento reflexivo, a possibilidade de ensinar a pensar, a curiosidade do aprendiz criança, a função do professor na sala de aula, a experiência, os significados, a educação como busca de uma melhora de vida e, por fim, a lógica da investigação. (BROCANELLI, 2010, p. 42-43).

Para Dewey citado por Kohan (2008, p. 40) a escola é considerada como um espaço de construção social do pensamento e de formação e exercício da capacidade de julgar dos estudantes. O processo de ensino-aprendizagem baseada na transmissão de conteúdos é totalmente negado por Dewey, que segundo ele, tanto o pensar quanto o julgar desenvolvem capacidades ativas.

“[...] o homem pode sempre melhorar suas técnicas e habilidades para o pensamento e a reflexão através de um pensar sobre o pensar”. (BROCANELLI, 2010, p. 43).

Vale dizer que, por meio de sua visão de educação, Dewey, optou em ir mais além das propostas pedagógicas das obras dos teóricos da escola nova e tentou desenvolver os fundamentos de uma educação democrática e experimental.

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A pedagogia de Dewey está inserida dentro do conceito de educação progressiva, ou seja, a sua preocupação está voltada na educação da criança “por inteiro”, fisicamente, emocionalmente e mentalmente. Assim, há grande relevância cognitiva diante do pensamento de Dewey se a criança for capaz de pensar por si mesma, através de atividades manuais e criativas, promovendo dessa forma a autonomia intelectual. Dentro desse método a democracia ganha um grande peso, por ser a ordem política que permite o melhor desenvolvimento dos alunos. John Dewey defendia a democracia não só no campo institucional, mas também no interior das escolas.

Mas que democracia é essa? Certamente, não é nenhuma democracia existente, mas uma normatividade de forma de vida social. Dewey distingue dois sentidos do termo democracia: um sentido político e um sentido ético e social. No primeiro sentido, a democracia é uma forma de governo ou um sistema de instituições políticas. No seu segundo sentido, ela é uma forma de vida pessoal e coletiva. Dois critérios determinam o caráter democrático de uma forma de vida social: a) o modo em que estão conectadas as ações e interesses dos seus membros; b) o modo em que a livre interação entre seus membros possibilita a reacomodação, retificação e correção dos hábitos e práticas sociais. (KOHAN, 2008, p. 41).

É através de uma orientação educacional organizada que possibilita ao homem um pensamento reflexivo. A educação, por sua vez, está inserida como o principal instrumento capaz de transmitir conhecimentos aos indivíduos com a função de que eles aprendam a pensar bem. Para Dewey o pensamento é uma capacidade natural do homem. Neste caso, é possível ensinar a pensar melhor ou pensar bem através das técnicas e habilidades de pensamento. (BROCANELLI, 2010, p .45).

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O professor é aquele que guia seus alunos a grandes descobertas, levando-os ao pensamento reflexivo.

Para Dewey (apud BROCANELLI, 2010, p. 46) existem três níveis de curiosidade:

1º o da energia orgânica, a fase em que a criança se intromete em tudo e necessita do toque com os objetos para conhece-los. Para as crianças, este nível está longe do ato de pensar, porém sem ele não chegaria ao pensamento;

2º a fase das perguntas, “por quê?”, para conhecer as coisas. Nesta fase as crianças recorrem aos adultos como forma de socorro em satisfazer seus desejos de aprender sobre os objetos;

3º a criança já se sustenta com o seu nível intelectual capaz de encontrar respostas as suas perguntas e inquietações.

Dewey considera o aspecto da curiosidade sendo algo fortalecedor da aprendizagem e por isso deve ser conservado em todos os processos da nossa vida.

O ambiente educacional deve através de seus profissionais estimular e conservar o espírito de curiosidades de seus alunos, visto que, com o passar dos anos devido ao acúmulo de experiências e ao comprometimento com tantas outras coisas o homem perde esse espírito de curiosidade na qual o leva a novas descobertas. A escola precisa de educar para a vida, e não ser somente um meio onde só transmitir informações seja o seu principal conceito. Um corpo educacional não poderá fechar-se a novas descobertas, tornando o ambiente de educação em um lugar de dogmatismo que consiste somente a uma certeza já determinada.

Lipman caracteriza esse momento da curiosidade como um deslumbramento. Na visão do filósofo a criança possui um caráter importantíssimo de deslumbrar-se com as coisas, primordialmente com àquelas nas quais ainda não obteve nenhum contato. (BROCANELLI, 2010, p. 47).

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Essa vontade de conhecer as coisas, as pessoas e o mundo, deve ser aproveitada para o desenvolvimento do pensamento da criança. Na escola, a curiosidade deve ser percebida pelo professor e orientada de forma que se transforme também em motivo de discussão entre os alunos, levando-os a pensar sobre suas vidas e a sociedade em que vivem. (BROCANELLI, 2010, p. 48). [...] Lipmam diz que as escolas são educativas na medida em que facilitam a descoberta do significado da vida, pois tudo o que nos ajuda a descobrir esse significado é educativo. Ou seja, a escola deve ser aquela que ajuda a criança a encontrar um sentido para a sua vida e para suas responsabilidades atuais e futuras. E mais, os significados não são dados, eles são descobertos, sendo uma tarefa da escola estimular as crianças às descobertas.

Para Dewey é possível obter um resultado mais completo naquilo que propomos estudar diante de uma investigação que seja lógica e consistente.

“Lipman compartilha com Dewey a ideia que a educação através da filosofia na proposta de uma comunidade de questionamento e investigação filosófica contribui para ajudar a criança na sua construção de um ser social e democrático em um ambiente institucionalizado [...]. (MARTINS, 2010, p. 26).

Nesta linha de pensamento Dewey esclarece a diferença entre senso comum e investigação científica. O senso comum não possui base lógica, tudo já se encontra pronto e determinado. Não há ocupação intelectual. Já “na investigação científica existe uma inter-relação de significados e a investigação dos mesmos para que se prove sua validade”. (BROCANELLI, 2010, p. 57).

Neste momento vale lembrar que para Lipman citado por Brocanelli (2010, p. 57), no Programa de Filosofia para Crianças, a lógica apresenta três significados: é lógica formal,

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ordenando a estrutura das frases e suas conexões; é dar razões, avaliando e justificando o que é afirmado; e é ação racional, padronizando o comportamento racional.

Como se há de verificar, os pensamentos de Dewey e Lipman se inter-relacionam na função da lógica para se alcançar o pensamento consistente e correto. O Programa de Lipman busca valorizar o conteúdo filosófico e a lógica sendo estes como métodos ou instrumentos para o pensar melhor, e desta forma, sugeriu a aplicabilidade da lógica no ensino escolar para todas as idades. (BROCANELLI, 2010, p. 60). 1.3.2.1 O pensamento de ordem superior

O desenvolvimento do pensar de ordem superior bem como o seu papel dentro da comunidade de investigação é um conceito de suma importância a ser investigado na metodologia de Lipman.

Lipman adotou para si a distinção deweyana entre pensar e conhecer a importância de priorizar o pensar e o julgar na educação. Para Lipman, a educação é estéril e superficial quando essa não é capaz de reconhecer a importância do pensar como fundamento de todo o processo educativo. Lipman acredita que a filosofia pode fazer de cada aluno um investigador de espírito crítico e razoável, sendo que, de acordo com o filósofo, nenhuma outra disciplina pode proporcionar o mesmo efeito que a filosofia. (KOHAN, 2008, p. 44).

Lipman refletia maneiras para fazer com que as crianças pudessem pensar melhor, visto que, essa era a sua maior preocupação. Desta forma, faz necessário abordar os dois tipos de pensamento que foram conceituados por Lipman: o “pensar normal” e o pensar de nível superior”. Para Lipman, o pensar normal é acrítico e mecânico, ou seja, ele não reconhece categorias como a criatividade ou a

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responsabilidade. Já o pensar de nível superior é, por sua vez, complexo e inventivo. (KOHAN, 2008, p. 44).

É no aperfeiçoamento do próprio pensar que as crianças conseguem alcançar o pensamento de ordem superior.

[...] o pensar de ordem superior. Trata-se de um pensar complexo e inventivo, que põe em ação três aspectos, facetas ou modos do pensar: a criticidade, a criatividade e o cuidado. Somente a presença conjunta destes três aspectos revela um pensar complexo ou de ordem superior. (LIPMAN, 1995, p. 110 apud SILVA; SILVA, 2013 p. 3).

Conforme abordado, o pensamento de ordem superior consiste em três categorias: o pensamento crítico o pensamento criativo e o pensamento cuidadoso. Melhorar a reflexão exige cultivar todas essas dimensões do pensamento. Para Lipman, a presença conjunta desses três aspectos revela um pensamento complexo ou de nível superior.

Abordaremos a seguir o primeiro modo de pensar, o pensamento crítico. Este tem como seu grande percussor o filósofo John Dewey.

O pensamento crítico está governado por regras; ele é questionador e deliberativo, ele remete-se a emitir juízos metódicos e criteriosos. (KOHAN, 2008, p. 44).

De acordo com Lipman, a função do pensamento crítico é de levar a pessoas a pensar essencialmente de maneira crítica, sendo ela um componente essencial do pensamento. O foco principal de Lipman está pautado em poder levar as crianças a pensar sobre o seu próprio pensamento. Posta assim a questão, é de se dizer que o pensamento crítico auxilia o processo educativo da criança, ajudando-a a ir mais além, é um agente auto avaliativo onde os estudantes são mais oportunizados a descobrir profundamente os possíveis erros, enganos e falácias. (DINIS, 2011, p. 41).

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“O pensamento criativo aplica critérios, mas não necessariamente está guiado por eles; busca produzir juízos expressivos e transcendentes a si mesmo”. (KOHAN, 2008, p. 45). De igual forma, para Lipman “o pensamento criativo abraça a imaginação fundindo-se com o todo” (DINIS, 2011, p. 42), sendo um pensamento inventivo que segundo Kohan (2008) “está governado pelo contexto [...]”.

Conforme Kohan (2008) o pensamento cuidadoso (atencioso) expõe aquilo que uma pessoa considera importante ou valioso; é o pensar que aplica valores no próprio pensar. O pensamento cuidadoso reconhece ainda outros quatro modos possíveis: o pensar valorativo, o ativo, o afetivo e o normativo. Para ele, não podemos confundir a dimensão valorativa com o modo avaliativo. O modo avaliativo está em preguntar-se pelo valor daquilo que é objeto do pensar, não expressa cuidado, é analítico. Em contrapartida, o modo valorativo carrega consigo valores no próprio ato de pensar, a expressão de cuidar está muito mais forte do que analisar. A outra forma do pensar é a ativa, esta é afirmada em nossas ações, ou seja, “fala” por nós, sua característica está em mostrar o que cuidamos e para que o fazemos.

O pensar afetivo procura romper com a dicotomia razão/emoção levando em consideração que as emoções transmitam formas de pensar e emitir juízos. Em última análise, encontra-se o pensar normativo, este modo põe em ação a dimensão ideal no pensar, o deve ser, seu caráter prescritivo. Os modos do cuidar são formas de pensar, pois segundo Lipman, afirmam, entre outros valores, o preservar, restaurar, proteger, salvar, alimentar, nutrir, celebrar, respeitar, remediar, admirar, promover, cultivar e celebrar (KOHAN, 2008, p. 45, grifo nosso).

Para Kohan (2008) esta distinção proposta por Lipman em relação aos três modos do pensar de ordem superior faz um paralelo a classificação funcional dos juízos

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que é oferecida pelo filósofo pragmatista Justus Buchler. Para Buchler todos os âmbitos da vida humana, produzem juízos. Na visão de Buchler existem três modos do julgar, estes correspondem, por sua vez, ao fazer, ao produzir e ao dizer: juízo ativo, expressivo (mostrativo) e assertivo. Quando há uma relação com o verdadeiro e ao falso no dizer, os juízos cumprem aqui a função assertiva. A função ativa expressa algo com relação ao bom e ao ruim numa ação e por último, a função mostrativa está presente quando os indivíduos dão forma a materiais de todo tipo em questão do belo e do feio. (p. 46:

Lipman considera que o modo crítico do pensar corresponde à função assertiva do julgar, o modo criativo do pensar à função expressiva do julgar, e o modo do cuidado à função ativa do julgar (KOHAN, 2008, p. 46).

As crianças que desenvolvem o pensamento de ordem

superior, de acordo com Lipman, estas serão cidadãos cabalmente democráticos:

[...] o programa filosofia para crianças de Matthew Lipman tem uma normatividade sociopolítica. Não se educa apenas para o pensar, mas para o pensar de ordem superior, e não só se educa para o pensar de ordem superior, se educa para uma cidadania democrática [...] (KOHAN, 2008, p. 47).

Lipman relata que uma educação pautada em aventuras filosóficas com crianças há ganhos significativos para a sociedade. Para que as crianças sejam democráticas, é preciso que nos envolvemos em diálogos filosóficos com elas, pois a democracia é uma investigação.

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1.3.3 A psicologia de Vygotsky em Matthew Lipman (psicologia do desenvolvimento)

Em linhas gerais, apresentaremos resumidamente o pensamento de Vygotsky e suas ideias que se tornaram mais interessantes na visão de Lipman.

Vygotsky acredita que o aprendizado infantil inicia anteriormente do processo escolar. Para Vygotsky citado por Brocanelli (2010, p. 64) “aprendizado e desenvolvimento estão inter-relacionados desde o primeiro dia de vida da criança”. A escola possui a função de adquirir à vida da criança novos conhecimentos, de forma que, o novo aprendizado esteja associado de alguma maneira com o nível de desenvolvimento do infanto, pois “o aprendizado e o desenvolvimento seguem o mesmo caminho, mas o aprendizado está à frente, ou seja, o desenvolvimento depende do aprendizado”. (BROCANELLI, 2010, p. 65).

Desde os primeiros dias do desenvolvimento da criança, suas atividades adquirem um significado próprio num sistema de comportamento social e sendo dirigidas a objetivos definidos, são refratadas através do prisma do ambiente da criança. O caminho percorrido até a criança e desta até o objeto passa através de outra pessoa. Essa estrutura humana complexa é o produto de um processo de desenvolvimento profundamente enraizado nas ligações entre história individual e história social (VYGOTSKY, 1998ª, p. 40 apud ELIAS, 2005, p. 51).

Segundo Brocanelli (2010) foi por valorizar o desenvolvimento da criança a partir do meio em que ela vive, ou seja, por considerar o desenvolvimento a partir da história e cultura de maneira crescente e constante, que Lipman se interessou pelos estudos de Vygotsky. Ambos acreditam que as crianças podem avançar constantemente dentro do aspecto

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de aprendizagem que estejam inclusos nos limites de suas capacidades.

Diante de algumas observações sobre o estudo da psicologia de Vygotsky, Lipman pode afirmar que “o pensar é a interiorização da fala e que o comportamento recíproco de grupo em discussão desempenha papel importante no aprender a pensar”. (BROCANELLI, 2010, p. 66). Desta maneira, cabe dizer que o pensar se desenvolve mediante ao aprimoramento da fala, e a fala enquanto discurso se desenvolve conforme se aprende a pensar. É a partir do desenvolvimento do ser no meio em que habita que encontramos o aperfeiçoamento tanto da fala como do pensar:

[...] A origem de nosso pensamento pode ser explicada a partir das atividades externas, abertas, principalmente no que diz respeito às atividades linguísticas. Essas atividades, primordialmente sociais, passam a ser representadas mentalmente por um processo de interiorização, ou seja, os pensamentos e suas relações correspondem às nossas atividades no mundo (BROCANELLI, 2010, p. 66).

Para o homem, de acordo com Vygotsky, a linguagem é o sistema de signos mais importante, é por meio da linguagem que a criança se apropria dos objetos a sua volta.

Preciosa é a contribuição do processo educativo no desempenho do desenvolvimento do pensamento, cabe aos profissionais estimularem as crianças em conteúdos diversificados que amplie o comportamento dos alunos de modo que haja avanços intelectuais e morais. Em uma escola onde não há o questionamento, onde o professor é o dominador da discussão oferecendo respostas prontas, certamente o indivíduo permanecerá com o mesmo padrão de raciocínios durante os anos escolares. Muito provável, que em ambientes educacionais desse estilo não haverá o desenvolvimento do pensamento e nem o aperfeiçoamento

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do raciocínio, porém o que predominará será um estado de apatia intelectual.

O que pode fazer com que me liberte dessa letargia cognitiva é o discurso vivo em classe, no qual meus colegas e eu sirvamos, uns para os outros, de modelos de indivíduos animados, reflexivos e racionais, plenamente capazes de pensar por nós mesmos, ao invés de sempre ficarmos esperando para reagir às perguntas do professor (LIPMAN, 1996, p. 12 apud BROCANELLI, 2010, p. 67).

Paralelo a psicologia de Vygotsky, Lipman conceitua seu interesse em fazer que uma sala de aula seja uma “comunidade reflexiva”.

Lipman aborda através das afirmações de Vygotsky algumas necessidades naturais que as crianças apresentam: as descobertas e a busca de seus significados. Neste sentido, a criança passa do desconhecido para o conhecido, e é diante desse processo de vida que a criança torna um ser social. Não somos seres isolados do mundo, e assim não há possibilidade de viver sem haver uma interação.

De acordo com a teoria histórico-cultural de Vygotsky, é possível afirmar que o ambiente escolar é oferecido por forças externas, mas os significados são construídos coletivamente pelas crianças. Portanto, a descoberta dos significados está diretamente relacionada com a experiência que essas crianças têm e fazem na escola (BROCANELLI, 2010, p. 70).

Como se há de verificar, se a experiência escolar atrair o aluno e se nesse processo de experiências for cercado de significados, certamente a experiência será vivida intensamente, abertos para novas experiências a serem lançadas.

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1.4 CONVERSÃO DA SALA DE AULA EM UMA COMUNIDADE DE INVESTIGAÇÃO

Criado por Charles Sanders Peirce, o termo Comunidade de Investigação foi usado por grupos de cientistas e pesquisadores na qual possuíam o mesmo objeto de estudo e propósitos a serem alcançados. Em consequência disso, posterior a ideia de Peirce, o termo “Comunidade de investigação” passou também a ser utilizado por grupos que, independente de sua função científica ou não, buscavam aprofundar seus estudos em assuntos de seus interesses. Para Lipman apud Brocanelli (2010, p. 84-85) a Comunidade de Investigação é formada também pelo grupo de alunos que estudam assuntos pertinentes aos seus interesses:

Na qual os alunos dividem opiniões com respeito, desenvolvem questões a partir das ideias de outros, desafiam-se entre si para fornecer razões a opiniões até então não apoiadas, auxiliarem uns aos outros ao fazer inferência daquilo que foi afirmado e buscar identificar as suposições de cada um. Uma comunidade de investigação tenta acompanhar a investigação pelo caminho que esta conduz ao invés de ser limitada pelas linhas divisórias das disciplinas existentes. Trata-se de um diálogo que busca harmonizar-se com a lógica, seguindo adiante indiretamente como um barco navegando contra o vento, mas no processo seu progresso assemelha-se àquele do próprio pensamento. Consequentemente, quando este processo é internalizado ou introjetado pelos participantes, estes passam a pensar em movimentos que se assemelham aos procedimentos. Eles passam a pensar como o processo pensa (LIPMAN, 2008, p. 32 apud PLAPLER, 2014, p. 67).

Ao abordar o conceito do pensar na comunidade, Lipman irá defender que toda investigação é uma prática

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autocrítica, além de questionadora e exploratória, com alguns aspectos mais experimentais do que outros.

Segundo Lipman o que mantém uma comunidade unida é a prática, porém esta prática não é necessariamente autocrítica, pois embora toda investigação possa estar fundamentada na comunidade, isto, porém não dá a garantia que toda a comunidade está fundamentada na investigação. Lipman defende uma comunidade de investigação que aborda um processo dialógico, cujo objetivo está em obter um produto, mesmo que este pareça parcial ou experimental, no entanto que contenha normas de procedimentos de natureza lógica, que priorizem o desenvolvimento do pensar crítico e criativo (PLAPLER, 2014, p. 68).

Nesta linha de pensamentos, entende-se então como Comunidade de Investigação, segundo Lipman, é o ambiente educativo na qual os alunos irão discutir sobre assuntos de seus interesses pautados em seu dia a dia. Assim também, os alunos realizarão as leituras das novelas filosóficas (abordaremos mais adiante este tema) onde está presente temas filosóficos importantíssimos nas histórias. A estrutura dos argumentos contidos nas novelas filosóficas abrange um lugar primordial para que brote um pensamento bem organizado, onde esteja presente a racionalidade. A comunidade de investigação visa através do diálogo que os alunos alcancem um pensamento criativo:

A comunidade de investigação é uma sociedade deliberativa envolvida com o pensar de ordem superior. Isto significa que suas deliberações não são simples bate-papos ou conversações; são diálogos logicamente disciplinados. O fato de serem logicamente estruturados, todavia, não os impossibilita de atuarem como um estágio para o desempenho criativo (LIPMAN, 1995, p. 302 apud BROCANELLI, 2010, p. 85).

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Se desejamos estudantes competentes em habilidades primárias de raciocínio – e sem elas não pode haver competência nas habilidades cognitivas de ordem superior – não temos outra escolha senão a Filosofia (LIPMAN, 1995, p. 28 apud ELIAS, 2005, p. 91).

Lipman ressalta a importância de uma educação que

seja diferente de um modelo tradicional justamente por dar abertura e priorizar a capacidade do aluno poder pensar por si próprio, ao invés de responder a informações desprovidas de um legítimo significado. Para tanto, importante se faz lembrar, que o trabalho com a Filosofia no ambiente educacional no sentido de estimular e incentivar o pensar dos educandos só será possível mediante a transformação das tradicionais salas de aulas em comunidade de investigação.

O desenvolvimento da expressão do pensamento dentro da Comunidade de Investigação, possui uma característica importante destacada por Lipman: a comunicação (LIPMAN, 1995, p. 302 apud BROCANELLI, p. 85). É diante da Comunidade de Investigação que surge por meio da comunicação a troca de ideias e experiências entre os estudantes.

Nossas experiências acontecem em situações que envolvem ação e reação, portanto, a investigação acontece em situações, numa comunidade onde haja a comunicação, o diálogo e as interrogações (perguntas e afirmações).

Para Lipman (1995) apud Brocanelli (2010, p. 86-87) existe uma distinção entre conversa e o diálogo. Enquanto a conversa almeja o equilíbrio, o diálogo almeja o desequilíbrio. No diálogo acontece a troca de ideias, questionamentos, discordâncias entre outros e numa conversa, cada ser fala de uma vez, predominando assim, sua posição:

Uma conversa é uma troca de sentimentos, pensamentos, informações, interpretações. Um diálogo é um exame, uma investigação, um questionamento. Aqueles que conversam

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fazem-no cooperativamente, como jogadores de tênis rebatendo a bola enquanto praticam o esporte de modo cordial e indeterminável. Aqueles que se envolvem em um diálogo, fazem-no de forma colaborativa, como oficiais da justiça trabalhando juntos sobre o mesmo caso. O objetivo daqueles que rebatem a bola é estender o jogo o máximo possível. O objetivo dos oficiais da justiça é resolver o caso no menor tempo possível (LIPMAN, 1995, p. 336 apud BROCANELLI, 2010, p. 87).

Por ser uma forma pedagógica de discussão, o diálogo sempre deverá predominar em uma Comunidade de Investigação, visto que, é através do diálogo que todos podem participar e expressar os seus pensamentos. 1.4.1 A prática do diálogo filosófico para a construção do conhecimento

O diálogo para Lipman está concebido como uma fonte importantíssima para o ambiente educativo. Lipman atribui ao diálogo pontos positivos que auxiliam a reflexão e o desenvolvimento das habilidades cognitivas, do raciocínio, da capacidade de argumentação, regrada pela lógica diante da investigação sobre problemas cotidianos:

Quando as pessoas se envolvem num diálogo, são levadas a refletir, a se concentrar, a levar em conta as alternativas, a ouvir cuidadosamente, a prestar mais atenção às definições e aos significados, a reconhecer alternativas nas quais não havia pensado anteriormente e, em geral, realizar um grande número de atividades mentais nas quais não teria se envolvido se a conversação não tivesse ocorrido (LIPMAN, 1994, p. 44 apud PAPLER, 2014, p. 74).

O diálogo é um instrumento que irá desenvolver o pensar superior, na qual, possibilitará a educação para o pensar. É por meio do diálogo que, segundo Lipman, os

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alunos conseguem pensar sobre seu próprio pensamento, da mesma forma pensam sobre o pensamento do outro.

Conforme já dito anteriormente, para Lipman, há uma distinção entre “conversa” (alternância das falas entre os participantes) e o “diálogo” (exame, investigação, questionamento das ideias). Dessa maneira, Tonieto contribui também na compreensão de diferenciar alguns modos orientadores da prática dialógica de Lipman. Para Lipman, explica Tonieto, a lógica do diálogo possui suas raízes na lógica da conversa, no entanto para atingir o pensamento de ordem superior é necessário fazer o movimento da passagem da conversa para o diálogo. Tonieto diz também que para Lipman o diálogo não pode ser definido como discussão, visto que, em ambas as situações tanto na conversa quanto em um diálogo, a discussão pode acontecer não caracterizando necessariamente uma investigação. Assim, enquanto a discussão conversacional é uma disputa de opiniões, a discussão dialógica é caracterizada pelo confronto de ideias e pensamentos (PAPLER, 2014, p. 75):

[...] o diálogo é um estágio desse difícil e árduo processo da experiência que é necessário para que a experiência bruta seja convertida em expressão acabada. Para as crianças de qualquer estágio o diálogo é uma fase indispensável do processo (LIPMAN, 1994, p. 47 apud PAPLER, 2014, p. 75).

Como se há de verificar, o diálogo necessita de uma aprendizagem. Leleux (2008, p. 39) relata que, um estudo realizado na Austrália, no México e em Quebec mostra que uma discussão entre alunos possui vários estágios, pois nem sempre essa discussão interessante é uma discussão dialógica, assim nem todo diálogo apresenta ser crítico logo de imediato.

Para Leleux uma discussão interessante entre alunos pode ser:

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(1) Anedótica: quando os alunos falam entre si de uma maneira não-estruturada de situações pessoais. Não há um processo de busca e suas opiniões são apresentadas como conclusões; (2) Monológica: os alunos iniciam um processo de busca, sobretudo orientados pela busca da resposta certa. Contudo, apresentam dificuldades de justificar suas opiniões; (3) Dialógica: os alunos começam a desenvolver uma comunidade de investigação, envolvidos em uma reflexão direcionados a um objetivo comum. Diante do processo investigativo desse estudo, os investigadores constataram que uma troca do tipo dialógico nem sempre comportava os traços de um pensamento crítico. Este tipo de discussão foi denominado pelos investigadores de diálogo não-crítico, pois os alunos tinham capacidade de dialogar, porém não conseguiam fazer avaliações críticas das perspectivas em jogo; (4) Dialógica semicrítica: é manifestado quando alguns alunos, em um contexto interdependente, conseguem ser críticos para questionar os enunciados dos seus colegas, mas esses últimos ainda não são bastante críticos para ser influenciados cognitivamente pela crítica emitida, não levando assim a mudança das perspectivas do grupo; (5) Dialógica crítica: os alunos conseguem melhorar as perspectivas do grupo e também as modificam. Esse tipo de troca supõe os seguintes critérios: a interdependência explícita entre os alunos; a busca é orientada para a construção do sentido; os alunos possuem consciência da complexidade de pontos de vista dos colegas; eles procuram as divergências e consideram que a incerteza é um estado cognitivo positivo; há a busca da crítica por si mesma sendo que, uma preocupação ética pode ser observada em suas intervenções.

Os objetivos do projeto Filosofia para Crianças está focado em alcançar o diálogo crítico através de um estágio de trocas filosóficas e construções cognitivas que se processam

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gradualmente. É diante do diálogo crítico que os alunos criam um desequilíbrio cognitivo suficiente para levá-los a um processo reflexivo capaz de conduzi-los as modificações das perspectivas. 1.4.2 O currículo: novelas e manuais filosóficos

Com o intuito de levar a filosofia as crianças, Lipman escreveu uma reconstrução em forma de novelas. As novelas filosóficas são narrativas que abordam temas filosóficos por meio de diálogos entre crianças, professores, pais, vizinhos. A maior parte das personagens são constituídas por crianças e os diálogos acontecem geralmente em uma escola que possuem a mesma idade de seus leitores. Essas crianças discutem questões significativas do seu cotidiano, representando assim modelos de investigadores. Para o auxílio dos professores, Lipman escreveu manuais que acompanhava cada novela, esses manuais, por sua vez, eram elaborados de exercícios e planos de discussão a partir das ideias principais contidas nas novelas (KOHAN, 2008, p. 51).

As crianças da história deveriam formar de alguma maneira, uma pequena comunidade de pesquisa, na qual, cada uma participasse, pelo menos em alguma medida, na busca cooperativa e na descoberta de modos mais afetivos de pensar. Minha ideia era que o grupinho de crianças, na história, servisse de modelo com o qual os alunos reais pudessem se identificar (LIPMAN, 1998, p. 22 apud ELIAS, 2005, p. 97).

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Vejamos a seguir um esquema do currículo desenvolvido por Lipman e seus colaboradores (KOHAN, 2008, p. 52).

Novela Filosófica

Ano de publicação

2. Ed. Manual Idade

Série escolar

Temas

Elfie 1988 Colocando juntos

nossos pensamentos

5-6 anos

Pré-escola

Comunidade de investigação

filosófica

Issao e Guga 1982/86 Maravilhando-se com o mundo

7-8 anos

1ª e 2ª séries

Filosofia da natureza

Pimpa 1981 Em busca do

sentido 9-10 anos

3ª e 4ª séries

Filosofia da linguagem/ ontologia

Nous 1996 Decidindo o que

fazer 11-12 anos

3ª e 4ª séries

Formação ética

A descoberta de Ari dos

Telles 1974/1982

Investigação filosófica

13-15 anos

5ª e 6ª séries

Lógica/teoria do conhecimento/

filosofia da educação

Luísa 1976/1983 Investigação ética 13-17 anos

7ª e 8ª séries

Ética

Satie 1978 Investigação

estética 13-17 anos

Ensino médio

Estética

Marcos 1980 Investigação

social 13-17 anos

Ensino médio

Filosofia social e política

Foi através dessa proposta lúdica de ensinar filosofia

que despertou nas crianças o interesse pelo ensino, sendo elas envolvidas no gosto pela leitura e pela Filosofia. E isso segundo Lipman, o programa intenciona o seguinte:

[...] ajudá-las a pensar mais, ajudá-las a terem mais consideração e serem mais razoáveis. As crianças que foram ajudadas a serem mais criteriosas não só têm um senso melhor de quando devem agir, mas também de quando não devem fazê-lo. Não só são mais discretas e ponderadas ao lidarem com os problemas que enfrentam como também se mostram capazes de decidir quando é apropriado adiar ou evitar tais problemas em vez de enfrentá-los diretamente. Assim, um dos objetivos de um programa de habilidades de pensamento deveria ser o desenvolvimento do juízo, pois ele é o vínculo entre o pensamento e a ação. As crianças que refletem estão preparadas para emitir bons juízos e crianças capazes de

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realizar bons julgamentos, dificilmente agirão de maneira inadequada ou sem consideração (LIPMAN, 1994, p. 35 apud SILVA; SILVA, 2013, p. 6-7).

Foi desenvolvido, nos últimos trinta anos, o currículo da tabela citada acima, este constituído por oito programas (com uma novela e um manual de cada programa) abarcando os três primeiros níveis de escolaridade, desde a pré-escola até o ensino médio. Cada programa está planejado para ser trabalhado durante dois anos escolares. A descoberta de Ari dos Telles (Ari), sendo este o primeiro programa escrito por Lipman, abrange questões de lógica e teoria do conhecimento, sendo este considerado por Lipman a espinha dorsal do programa. E assim, todas as outras novelas trazem consigo um suporte metodológico pautado no desenvolvimento do pensar, sendo textos que irão discorrer sobre várias áreas da filosofia, como lógica e teoria do conhecimento (já citados), ética, estética, filosofia social e política entre outros (KOHAN, 2008, p. 53).

O intuito das novelas filosóficas está em cultivar a aquisição das habilidades cognitivas, ou seja, a criança estará instrumentalizada para um pensar crítico e reflexivo, ampliando desta maneira sua visão de mundo.

Além desse currículo, há outros programas escritos por grandes colaboradores de Lipman, como por exemplo, Hospital de Bonecas criada por Ann Sharp, destinado para a pré-escola. Ronald Reed, escreveu Rebeca e tantos outros que colaboraram com o programa de Lipman (KOHAN, 2008, p. 53).

Convém ressaltar neste momento, que os romances escritos por Matthew Lipman e seus colaboradores compõem um currículo de filosofia para crianças e jovens, abordando ideias filosóficas que consolidaram a história da Filosofia ocidental, atribuindo aos romances uma linguagem acessível as crianças.

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Nessas histórias, não são utilizados os nomes reais dos filósofos, mas as suas palavras, e seus pontos de vista são apresentados na fala das personagens-crianças. [...] É como se os filósofos tivessem uma longa conversação, mesmo que tenham morrido há muito tempo atrás. Platão teve algumas ideias e logo Aristóteles gostou de algumas, mas rechaçou outras e criou novas ideias. O mesmo aconteceu com todos os filósofos. Quando as crianças leem estas histórias, descobrem estas ideias e exploram essas palavras com seus amigos, é como se elas tivessem participando da conversação (SHARP, 1998, p. 18-19 apud ELIAS, 2005, p. 97).

É possível perceber que o objetivo de Lipman em apresentar Filosofiaem forma de histórias, é o de fazer com que as crianças e professores interajam com os ideais teóricos dos filósofos clássicos, afim de que as crianças possam desenvolver a capacidade do pensar melhor pelo fato de não serem apresentados os nomes dos filósofos clássicos as crianças.

Segundo Lipman citado por Kohan (2008, p. 53-54) a prática da filosofia está vinculada como meio para o desenvolvimento de algumas habilidades de raciocínio a partir de questões essenciais ao ser humano, como por exemplo, verdade, amizade e beleza. As habilidades desenvolvidas estão interligadas ao desenvolvimento cognitivo da criança. É através do contato com as novelas e os manuais filosóficos que as crianças e os professores entram num diálogo a respeito das propostas dos filósofos da história. Esse diálogo fornece aos educandos o enriquecimento e a reflexão sobre as questões que os inquietam, não possuindo o objetivo de ensinar teorias ou doutrinas.

Kohan faz uma ilustração dessa lógica com o programa Pimpa destinado para crianças de 9-10 anos:

Algumas das principais habilidades por ele desenvolvidas são: estabelecer comparações, distinções e semelhanças,

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traçar analogias e símiles, inventar e contar histórias, levantar hipóteses, reconhecer ambiguidades, dar e pedir razões, distinguir boas e más razões, inferir significados, ser relevante, fazer boas perguntas, considerar intenções, pedir ajuda, responder a perguntas com outras perguntas e detectar problemas em raciocínios incorretos. Essas habilidades vão sendo internalizadas a partir da reflexão em torno de temas como história, amizade, nomes, linguagem, realidade, pensamento, tempo, espaço, sonhos, classes, silencio, regras, liberdade, reciprocidade, meios/fins, corpo/alma. Na novela, através do diálogo de Pimpa com seus colegas, professor e família, vão sendo apresentadas diversas possibilidades de se pensar os temas ali presentes, oferecidas pelos filósofos na história (2008, p. 54).

A seguir, será apresentado um exemplo das várias histórias que compõem o currículo do Programa de Filosofia para Crianças bem como a idade a qual se destina as tramas seguindo dos temas ali presentes e as habilidades que serão desenvolvidas por meio das leituras e discussões na comunidade de investigação.

A novela “Issão e Guga”, destinado aos estudantes de seis a oito anos (1ª e 2ª séries do Ensino Fundamental) foi escrita por Matthew Lipman. As personagens Issao e Guga nos contam sobre umas férias inesquecíveis que viveram juntos. Guga mora perto da fazenda dos avós de Issao, e assim ambos se tornam amigos. O avô de Issao, no qual já foi marinheiro, relata ao neto sobre um encontro que teve com uma baleia, demonstrando interesse em poder visitar algum lugar onde pudesse, novamente, observar as baleias. O neto o convence a fazer a viagem, levando também a família de Guga. A maneira como Issao e Guga demonstram interesse por animais, pela noção de espaço e tempo e por muitos outros aspectos da natureza, faz deste texto uma introdução ideal à investigação sobre as relações entre a linguagem, o mundo e as diferentes formas de percepção. Na novela há

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temas que permitem as crianças o contato com o espanto, que segundo Lipman dá origem ao filosofar, sendo eles, conhecimento humano, preocupações com a ecologia, a reflexão sobre o belo, o real e a verdade. Há ainda presente na novela, uma ênfase nas questões da fenomenologia da percepção. Como percebemos o mundo? Será que o mundo é tal qual vemos? Essas e outras questões tomam relevância no texto porque Guga, é cega. Lipman quem escreveu também o manual que acompanha a novela que possui o título de Maravilhando-se com o mundo (BROCANELLI, 2010, p. 26).

Segundo Kohan, os manuais são os instrumentos chave do professor:

Eles procuram traçar uma ponte entre a filosofia dos filósofos e as inquietações e possibilidades filosóficas das crianças. Eles visam oferecer modelos claros, práticos e específicos para fazer filosofia, nos moldes de Lipman, a professores sem formação acadêmica em filosofia, recuperando para eles a tradição filosófica e oferecendo-lhes possibilidades para ir além dessa tradição [...] (2008, p. 54).

1.4.3 O perfil do educador

O professor de filosofia na educação infantil deve permitir a criança condições necessárias para que ela através da conversação alcance as características de um diálogo filosófico. Por isso, cabe ao educador dispor-se de estratégias para que o diálogo filosófico aconteça.

A filosofia desenvolve várias habilidades e essas habilidades devem fazer parte das metodologias de ensino do professor, cabe a ele despertar a curiosidade, indagar a realidade e problematizar, ou seja, transformar os obstáculos em dados para reflexão.

O docente deve ser dinâmico, criativo e atualizado, capaz de manipular e contextualizar informações do dia a dia

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dos alunos com as disciplinas. Assim, caberá ao professor investigar a necessidade do alunato para que a partir da realidade crie-se situações de diálogo.

O professor precisa ser organizado em seus planos docentes em relação com os alunos, contudo precisa também estar sujeito a mudanças imediatas:

O professor não pode limitar-se a executar os procedimentos previstos em planos ou planejamentos, mesmo ciente de tê-los elaborado. O acontecimento da aula traz sempre consigo a possibilidade de que algo surpreendente ocorra, alterando o percurso daquilo que havia sido antecipado no planejamento (KOHAN, et al., 2000, p. 101 apud SOUZA, 2013. p. 24).

Nessa linha de análise, observa-se que não é possível prever caminhos. A investigação filosófica é uma característica própria do filosofar, é a abertura para o novo e com isso o professor precisa ficar atento a essas possíveis mudanças não colocando seu planejamento como o único meio que utilizará em seu processo de ensino, mas sim abrir espaços aos contextos enquanto veículo da criatividade de todos no ambiente escolar. 1.5 A INTERDISCIPLINARIDADE

A filosofia possui um papel fundamental no processo de aprendizagem dos alunos, sua contribuição para a educação acontece desde a investigação e escolha dos temas geradores até o seu desenvolvimento, provocando desta maneira a interdisciplinaridade quando se discutem e constroem conceitos acerca de temas que lhe são próprios e que estão relacionados com o tema trabalhado. Portanto, a filosofia está presente no currículo quando se tem como objetivo educar o ser humano em sua totalidade. A abordagem filosófica dos temas geradores provoca desafios

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cognitivos as crianças e estes desafios são desencadeadores do desenvolvimento de habilidades de pensamento. Essas habilidades, associadas ao exercício do diálogo e a autorreflexão geram significações que vão se aprofundando no decorrer do processo educativo. Desta forma, a filosofia coopera na articulação e reconstrução de significados quando proporciona as crianças analisar a coerência e justificação de argumentos, conhecimentos e ações (GIACOMASSI, 2009, p. 4499):

O ensino de filosofia supõe, como uma necessidade e um fim, o trabalho interdisciplinar, tanto no que diz respeito ao currículo como à prática pedagógica dos educadores. Fomentar essa interdisciplinaridade é, portanto, um compromisso que os professores de filosofia tomam para si como nuclear (São Paulo, 1992, p. 24 apud SILVEIRA, 2003, p. 106).

Para Lipman citado por Silveira (2003, p. 106) a

filosofia cumpre uma função interdisciplinar quando esta, por sua vez, propicia o desenvolvimento das habilidades cognitivas do aluno, permitindo que melhore seu desempenho nas demais disciplinas do currículo. Sendo assim, a filosofia, portanto, está a serviço dessas disciplinas atuando como fornecedora de pré-requisitos. 1.6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O trabalho referido não pretende fazer uma reflexão conclusiva e acabada sobre o tema “Filosofia para Crianças”, pois este é um assunto de grande complexidade, e exige maiores pesquisas a respeito do assunto. Porém, a pesquisa realizada permite fazer algumas considerações sobre as habilidades que o aluno tenha a adquirir quando possui contato com a filosofia, desde os primeiros anos do ensino fundamental.

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A filosofia que se pretende estabelecer na sala de aula deveria ser interdisciplinar, ou seja, estar presente em todos os conteúdos como metodologia. Mas importante também ter uma disciplina orientada somente para o assunto. Então a filosofia deve ser introduzida no currículo escolar como uma disciplina, no qual o professor tenha autonomia e espaço para reflexão e construção de um novo saber. Vale ressaltar que o ensino de filosofia para esse público, não se faz com o ensino da história da filosofia, mas através de conversas que se transformam em uma inquietação, e assim surge o diálogo.

O diálogo proporciona ao aluno ferramentas para adquirir habilidades cognitivas importantes para a construção do seu conhecimento. Através da filosofia o professor reconhece que o aluno é um sujeito autônomo, na construção de seu conhecimento. O aluno também experimenta através do diálogo, situações de respeito e de concentração.

Quando inseridas em um diálogo as crianças buscam tendências mais razoáveis pautadas em boas razões. A proposta do diálogo é a construção do conhecimento que se refaz e se complementa constantemente.

A comunidade de investigação explora e questiona o próprio processo de investigação e isso se dá pela estratégia do diálogo. A investigação é ao mesmo tempo método e objeto, pois inevitavelmente se torna parte do assunto que se entrelaça com o tema pesquisado. Desta forma, a linguagem, que é expressão do raciocínio e da inteligência, se desenvolve e juntamente com ela também a sociedade. REFERÊNCIAS BASTOS, P. Fraga; CRUZ, S. A. Belletti. Filosofia na Escola: O Pensar Reflexivo e Crítico para Mudança de Comportamento. V CINFE. Congresso Internacional de Filosofia e Educação. Caxias do Sul, RS. Maio 2010. Disponível em: <http://www.ucs.br/ucs/tplcinfe/eventos/cinfe/artigos/ar

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SILVEIRA, Renê José Trentin. Matthew Lipman e a Filosofia para Crianças: três polêmicas. Campinas: Autores Associados, 2003.

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CRIANÇA E ADOLESCENTE: O ATO INFRACIONAL E AS MEDIDAS

SOCIOEDUCATIVAS

Yorran Oliveira Nitsche* Valdenir Prandi**

RESUMO: O presente trabalho analisa os direito e garantias, de crianças e dos adolescentes, previsto no Estatuto da Criança e do

* Estudou o ensino fundamental 1 e 2 e o ensino médio todos em escola Pública. Hoje é formado em Direito (bacharel) pela Universidade do Oeste Paulista e, estudante do 6º período de filosofia (licenciatura) EAD pela UNIFRAN (Universidade de Franca) polo de Presidente Prudente SP. Atualmente é Professor de filosofia na escola Monteiro Lobato e Ensino religioso na Escola Cecilia Meireles, ambas da cidade de Colorado-PR. ** Possui Licenciatura Plena em Filosofia pela Faculdade Padre João Bagozzi - (Registrado Ministério da Educação Universidade Federal do Paraná) (2011-2013). Atualmente é professor - Secretaria de Educação do Estado do Paraná. Possui Licenciatura Plena e Geografia pela Faculdades Integradas da Terra de Brasília - Brasília - DF (2007 - 2009). Possui Licenciatura Plena em Pedagogia (Segunda Licenciatura) pelo Centro Universitário de Jales (UNIJALES) - Jales - SP (2015 - 2016). Pós-Graduação modalidade Lato-Sensu: Centro Universitário Leonardo da Vinci (UNIASSELVI): Metodologia de Ensino de Filosofia e Sociologia - Indaial - SC (2014 - 2015). Faculdade da Aldeia de Carapicuíba (FALC) Pós-Graduação em Deficiência Intelectual, Auditiva e Visual e a Prática Educativa Inclusiva - Carapicuiba - SP (2014 - 2015). Faculdade União Cultural do Estado de São Paulo (UCESP - Faculdade) Pós-Graduação em Educação ambiental e Sustentabilidade - Araçatuba - SP. (2015-2016). Participação em Cursos e Eventos - Participou do Curso de Capacitação do Programa Qualificação Pedagógica, Secretaria Municipal de Educação de Grandes Rios - PR. (2011).

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Adolescente e na Constituição Federal. Referente ao ato infracional e aplicação das medidas sócio educativas. Buscando primeiramente a conceituação de criança e do adolescente perante o Estatuto e doutrinas em seguida a conceituação das medidas sócio educativas prevista no ECA, para que possa identificar as medidas aplicadas a cada conduta infracional. Faz referências doutrinarias e a respeito da possibilidade de aplicação da medida de remissão, cumulada com a medida sócio educativa aplicadas pelo juiz. É abordado também, sobre a eficácia da aplicação dessas medidas, em caráter pedagógico e psicológico, transferindo uma visão de caráter reeducativo e ressocializador para o adolescente. É tratado sobre alguns fatores que contribuem para a pratica de ato infracional. A respeito dos direito e garantias desses menores, aquém fica o dever de executa-los, frete a constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente. Por fim chega à conclusão que deveria ser aplicado as medidas junto a um profissional especializado para trabalhar tanto com o infrator quanto com sua família que é dado com base na sua reeducação e reintegração da sociedade no futuro. PALAVRAS-CHAVES: Crianças e adolescente. Ato infracional. Medidas sócio educativas. Eficácia.

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho traz o intuito de analisa a eficácia das medidas sócio educativas e, mostrar que aplicabilidade das medidas, seguida de bons resultados é de suma importância para os interesses da legislação, pois esta não deve ter caráter punitivo, mas de ressocialização do jovem em conflito com a lei.

Com o estabelecimento do Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8.069/1990, o contexto infância e juventude começou a ter um cuidado técnico processual e estabeleceu-se um preceito dos direitos fundamentais da criança e do adolescente.

Seguindo da premissa da crença equivocada de impunidade dos jovens infratores que gira na sociedade, o trabalho em destaque tem por objetivo demonstrar algumas considerações sobre as medidas socioeducativas e os atos infracionais listados no ECA.

Com base nesse contexto, o presente trabalho traz uma abordagem sobre a importância da aplicabilidade das medidas sócio educativa ao menor infrator, junto as três esferas elencadas na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente, ou seja, a participação do Estado, comunidade e da família, no trabalho em conjunto para alcançar a finalidade de melhorar o perfil dessas crianças e adolescentes, tendo como parâmetro os artigos 4º do ECA e o 227 da CF.

Partindo desse preceito, o presente estudo se estruturara de conteúdo em torno das crianças e adolescentes, e as medidas socioeducativas e os atos infracionais.

No primeiro momento, será trazido em contexto voltado para a conceituação de criança e do adolescente, segundo o ECA e as doutrinas.

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Em seguida, será trabalhado os conceitos e naturezas jurídicas do ato infracional, medidas de proteção e das medidas socioeducativas.

No próximo capitulo, o estudo se volta para a contextualização das espécies de medidas socioeducativas.

Busca mostrar a importância do papel que a família exerce em relação a delinquência juvenil, através da prevenção, mostrando que somente através da conjugação de esforço entre família, sociedade e Estado, cada um cumprindo com seu papel, bem como a aplicação justa das medidas socioeducativas, buscando a ressocialização, conforme o que dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente, e a Constituição Federal, o fenômeno da delinquência juvenil poderá ter uma diminuição.

Por fim mostra a importância da integração do psicólogo na aplicação das medidas, mostrando de forma literária a eficácia dessa união.

2.1 CRIANÇA E ADOLESCENTE

Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, é criança a pessoa de até 12 anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre 12 e 18 anos de idade. Dentro do conceito de menor, é distinta a situação da “criança” e do “adolescente”. Por exemplo, a criança infratora fica sujeita às medidas e proteção previstas no artigo 101, que implicam um tratamento através de sua própria família ou da comunidade, sem que ocorra privação de liberdade. Por sua vez, o adolescente infrator pode ser submetido a um tratamento mais rigoroso, que pode implicar privação de liberdade. O Estatuto é aplicável aos que se encontram entre os 18 e os 21 anos nos casos expressos em lei (é o caso de, por exemplo, prolongamento da medida de internação até os 21 anos e assistência judicial).

Com forme podemos notar nos dispositivos a seguir:

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Artigo 2º: considera-se criança, para os efeitos dessa lei, a pessoa até 12 (doze) anos de idade incompleto e adolescente aquela entre 12 (doze) anos e 18 (dezoito) anos de idade. Parágrafo único. Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre 18 (dezoito) e 21 (vinte e um) anos de idade (ECA,1990).

Conforme expostos, o Estatuto da Criança e do Adolescente é destinado a todas as pessoas com menos de 18 anos de idade e, não somente destinado a menores de (dezoito) anos em situações especiais, como aduzido no parágrafo único. Está pautado nos princípios da Constituição Brasileira de 1988, expressos especialmente nos artigos 227 ao 229.

Saraiva (2006, p. 18), esclarece que: Pelo novo ideário norteador do sistema, todos aqueles com menos de 18 anos, independentemente de sua condição social, econômica ou familiar, são crianças (até doze anos incompletos) ou adolescentes (até 18 anos incompletos), nos termos do art. 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente, e passam a ostentar a condição de sujeitos de direitos, trazendo no bojo dessa conceituação a superação do paradigma da incapacidade para serem reconhecidos como sujeitos em condição peculiar de desenvolvimento (art.6º do Estatuto da Criança e do Adolescente).Oportuno lembrar que a implementação da idade se dá a zero hora do dia do correspondente nascimento, de modo que uma criança se faz adolescente a zero do dia em que completará doze anos.

Na Convenção sobre os Direitos da Criança, seu primeiro dispositivo estabelece que se entende por criança todo ser humano menor de 18 anos, a não ser que, em conformidade com a Lei aplicável à criança, a maioridade seja alcançada antes.

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Como observamos, na Convenção não há, como ocorre no Estatuto, uma distinção do termo criança e adolescente, pois ambos são considerados como criança.

Artigo 1º: Para efeitos da presente Convenção considera-se como criança todo ser humano com menos de dezoito anos de idade, a não ser que, em conformidade com a lei aplicável à criança, a maioridade seja alcançada antes. (Convenção Sobre Os Direitos Da Criança de 1990).

Frota (2006), em seu artigo explica seu ponto de vista: Uma pergunta que parece muito fácil de ser respondida, mas que traz em si uma série de reflexões profundas e de amplitude grande é: “o que é ser criança?” “O que vem a ser a adolescência?”. Para aqueles mais desavisados, ou mais rápidos nas suas respostas, ser criança “é viver um mundo de sonhos e fantasias, gostar de comer bolo de chocolates, é o melhor momento da vida”. Ao mesmo tempo, a compreensão da adolescência é permeada pela ideia de “aborrescência, rebeldia e atrevimento”. De um modo geral, existe a compreensão de que ser criança resume-se em ser feliz, alegre, despreocupado, ter condições de vida propícias ao seu desenvolvimento, ou seja, a infância é considerada o "melhor tempo da vida". Já a adolescência se configura como um momento em que, naturalmente, o indivíduo torna-se alguém, difícil de se lidar e que está sempre criando confusão e vivendo crises, pois encontra-se em estado de desenvolvimento.

Com a reflexão aduzida pelo autor pode entender melhor o que vem a ser criança, quais as melhores condições para ela ter uma vida saudável. Já os adolescentes, são pessoas que são mais difíceis de lidar, pois estes encontram-se na fase de confusões, de conhecimento do mundo diferente daquele que tinha quando criança.

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Calligaris (2000, p. 9), ao refletir sobre a adolescência, expõe:

Nossos adolescentes amam, estudam, brigam, trabalham. Batalham com seus corpos, que se esticam e se transformam. Lidam com as dificuldades de crescer no quadro complicado da família moderna. Como se diz hoje, eles se procuram e eventualmente se acham. Mas, além disso, eles precisam lutar com a adolescência, que é uma criatura um pouco monstruosa, sustentada pela imaginação de todos, adolescentes e pais.

Portanto, à adolescência torna-se fabulosa quando compreendida como um dado natural, onde adolescentes procuram se achar dentro das suas dificuldades das suas transformações.

Erikson (1972, p. 21), elenca em sua obra sobre essa mutação psíquica desses adolescentes:

Em termos psicológicos, a formação da identidade emprega um processo de reflexão e observação simultâneas, um processo que ocorre em todos os níveis do funcionamento mental, pelo qual o indivíduo se julga à luz daquilo que percebe ser a maneira como os outros o julgam, em comparação com eles próprios e com uma tipologia que é significativa para eles.

Desse modo, percebemos que, tanto a infância quanto a adolescência, deve ser compreendido como período em que tratam, pessoas especiais em fase de conhecimento e transformação múltipla devendo ter cuidados especiais conforme suas condições.

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2.2 DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS 2.2.1 Conceito

São medidas aplicadas com finalidade pedagógica em indivíduos infanto-juvenis, ou seja, crianças e adolescentes, inimputáveis que praticaram atos infracionais. Medidas de natureza jurídica repreensiva e pedagógica para inibir novos atos infracionais e promover a ressocialização (BANDEIRA, 2006).

O Estatuto da Criança e do Adolescente separa as medidas socioeducativas em dois grupos: o primeiro, das medidas em meio aberto, não privativas de liberdade (advertência, reparação do dano, prestação de serviços à comunidade e liberdade assistida) e o segundo, das medidas privativas de liberdade (semiliberdade e internação). Essas medidas estão previstas no Capítulo IV, nos artigos 112 a 130 do Estatuto.

Veja-se o artigo 112 do ECA: Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: I - advertência; II - obrigação de reparar o dano; III - prestação de serviços à comunidade; IV - liberdade assistida; V - inserção em regime de semi - liberdade; VI - internação em estabelecimento educacional; VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI

Conforme Sotto (apud CURY 2006), existe uma diferença no tratamento do adolescente com o tratamento da criança, pois o adolescente é submetido em um tratamento mais severo. Essas medidas é rol um taxativo e sua limitação decorre do princípio da legalidade, sendo vedado, portanto o

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juiz impor medidas diversas das enunciadas no artigo em tela. O autor ainda destaca que a legislação, ou seja, o ECA, ao se referir sobre o enfrentamento da delinquência infanto-juvenil, não se resume nas medidas ora apreciadas. Uma vez empregada a doutrina do princípio da proteção integral o legislador do Estatuto reconheceu que a maneira mais eficaz de prevenir a criminalidade está no objetivo de superar a situação de marginalidade.

Assim, as medidas socioeducativas aplicadas aos adolescentes em conflito com a lei, devem ter caráter pedagógico, oferecendo respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, com os meios dignos necessários à sua ressocialização, com respeito a sua dignidade como pessoa.

De acordo com Saraiva (2006, p. 65): A sanção socioeducativa tem finalidade pedagógica, em uma proposta de socioeducação. Não há, porém, sendo sanção, deixar de lhe atribuir natureza retributiva, na medida em que somente ao autor de ato infracional se lhe reconhece a aplicação.

As medidas socioeducativas tem por finalidade com que o menor infrator se coíba da prática de novos delitos, devem ser observado a capacidade desse infrator em cumprir as medidas aplicadas pelo juiz da infância e da juventude, enquadrando as medidas conforme as circunstancias da infração e sua gravidade, deve-se levar em conta também as referências familiares e a personalidade do infrator. Para que esse menor seja “punido” de maneira proporcional, deverá haver uma relação na aplicação das medidas prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente, com a gravidade da infração praticada pelo menor, para que assim traga a ressocialização.

Liberati (2010) expõe que as medidas socioeducativas possuem caráter sancionatória, impositiva e retributiva,

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porém cumprem um papel presidido pelo princípio educativo. Durante o processo de execução das medidas, utilizam-se métodos pedagógicos, psiquiátricos e psicológicos, visando à proteção integral do adolescente e à sua reinserção na sociedade. 2.2.2 Espécies 2.2.2.1 Advertência

A medida de advertência vem disciplinada no art. 115 do ECA que assim dispõe: “A advertência consistirá em admoestação verbal, que será reduzida a termo e assinada.”

Trata-se da medida mais branda aplicada ao infrator a qual apenas informa a este do cometimento do ato infracional e suas consequências. A mesma é executada por um juiz da infância e da juventude sempre que houver indícios de autoria e materialidade.

Essa medida tem como objetivo, em levar para o infrator em admoestação verbal o esclarecimento da conduta praticada, ou seja, levar para seu conhecimento o erro cometido por ele. Não há muita aplicabilidade dessa medida, por ser permitida sua aplicação somente em infrações leves, e que não tenha ocorrido da ameaça e nem violência, que muitas vezes não acontece na pratica infracional. Porem há possibilidade de aplicar somente a advertência, para os adolescentes primários quem não cometeram infrações classificadas como graves.

Comenta sobre essa medida o autor Konzen (apud Maciel 2006, p. 811/812):

A medida de advertência, muitas vezes banalizada por sua aparente simplicidade e singeleza, certamente porque confundida com as práticas disciplinares no âmbito familiar ou escolar, produz efeitos jurídicos na vida do infrator, porque passará a constar do registro dos antecedentes e

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poderá significar fator decisivo para a eleição da medida na hipótese da prática de nova infração. Não está, no entanto, nos efeitos objetivos a compreensão da natureza dessa medida, mas no seu real sentido valorativo para o destinatário, sujeito passivo da palavra determinada autoridade pública. A sensação do sujeito certamente não será outra do que a de se recolher à meditação, e, constrangido, aceitar a palavra da autoridade como promessa de não reiterar na conduta. Será provavelmente um instante de intensa aflição.

A lei não prevê quantas advertências podem ser aplicadas ao adolescente infrator, mas o entendimento é de que se aplique uma única vez. Se o adolescente vier a cometer outro ato infracional, deve-se aplicar outra medida, sendo proporcional com o delito e observando que já recebeu uma medida de advertência. Se for aplicar a medida de advertência várias vezes, que é uma medida leve, daria a impressão de impunidade, prejudicando a ressocialização do infrator.

Conforme prevê o art. 114, parágrafo único, do ECA, para a aplicação dessa medida, será necessário existir “prova da materialidade e indícios suficientes da autoria”.

Diante de tudo observa-se que esta é a medida mais branda aplicada ao adolescente em casos de infrações mais leves, pois neste caso o caráter pedagógico que traz, busca de uma forma menos traumática possível fazer com que o infrator entenda a ilicitude de sua conduta e suas consequências.

De acordo com entendimento de Nogueira (1998), observa-se que esta medida deve ser aplicada principalmente aos adolescentes primários, para que não a torne ineficaz pelo seu continuado e indevido, a qual prescinde de maiores formalidades, mesmo constituindo meio eficaz e educativo, capazes de surtir os efeitos desejados, pois o ato infracional muitas vezes decorrem de condutas impensadas, precipitadas e proveniente de atos próprios de jovens. Sustenta ainda que

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o juiz ao aplicar a medida, esta dependerá de critério e sensibilidade ao analisar o caso concreto, sem ser mais severo do que o necessário e nem muito tolerante ou benevolente, devendo sempre levar em conta a sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. 2.2.2.2 Da obrigação de reparar o dano

Prevê o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu art. 116:

Art. 116. Em se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais, a autoridade poderá determinar, se for o caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o ressarcimento do dano, ou, por outra forma, compense o prejuízo da vítima. Parágrafo único. Havendo manifesta impossibilidade, a medida poderá ser substituída por outra adequada.

De acordo com o parágrafo único do artigo 116, a medida de obrigação de reparar o dano pode ser substituída por outra adequada, caso seja evidente a manifesta impossibilidade de sua aplicação.

Entre as diversas opiniões acerca do objetivo desta medida destaca-se aquela que diz ser o de incutir no adolescente o alcance de sua conduta, ou ainda, projetar um ensinamento pedagógico da importância em cumprir a lei.

Neste mesmo sentido diz Albergaria (1995), “a obrigação de reparar o dano objetiva despertar e desenvolver no menor o senso de responsabilidade em face do outro e do que lhe pertence”.

O legislador tratou nessa medida para os atos infracionais que causem danos materiais à vítima. Nesse caso, o adolescente devera, reparar conforme suas condições, o dano através de restituição da coisa ou ressarcimento, ou também, compensar o prejuízo à vítima.

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Segundo Liberati (2003, p. 105): Tem-se que o propósito da medida é fazer com que o adolescente infrator se sinta responsável pelo ato que cometeu e intensifique os cuidados necessários, para não causar prejuízo a outrem. Por isto, há entendimento de que essa medida tem caráter personalíssimo e intransferível, devendo o adolescente ser o responsável exclusivo pela reparação do dano.

Apesar da medida de reparação do dano ter caráter personalíssimo e intransferível, o Código Civil prevê que, se adolescente infrator tiver 16 anos à época do fato, a responsabilidade em reparar o dano será exclusivamente de seus pais ou responsável.

Vejamos o artigo do Código Civil, onde prevê essa norma:

Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil: I – os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia; II – o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições; [...]

Por tanto, se o adolescente que cometeu o ato infrator que causo prejuízo, tiver menos de 16 (dezesseis) anos respondera seus pais solidariamente, e tiver entre 16 e 18 anos, responderá ele com seus pais ou responsável pela reparação do dano.

Analisando essa medida, podemos concluir que tem natureza sancionatório, punitiva, mas tem, também, um conteúdo educativo para que não volte a delinquir.

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2.2.2.3 Prestação de serviço à comunidade

A prestação de serviços à comunidade impõe ao adolescente autor de ato infracional, o cumprimento obrigatório de tarefas de caráter coletivo, visando interesses e bens comuns. Trabalhar gratuitamente, colocando o adolescente frente à possibilidade de adquirir valores sociais positivos, através da vivência de relações de solidariedade, presentes na ética comunitária.

Disciplina o Estatuto, em seu artigo 117: A prestação de serviços comunitários consiste na realização de tarefas gratuitas de interesse geral, por período não excedente a seis meses, junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos congêneres, bem como em programas comunitários ou governamentais.

Acresce o parágrafo único: As tarefas serão atribuídas conforme as aptidões do adolescente, devendo ser cumpridas durante jornada máxima de oito horas semanais, aos sábados, domingos e feriados ou em dias úteis, de modo a não prejudicas a frequência à escola ou à jornada normal de trabalho.

Sobre as eficácias dessa medida Nogueira (1998) diz que, esta medida consiste na realização de tarefas gratuitas de interesse geral, por período não excedente a seis meses, junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros. Pode também ser aplicada como forma alternativa de forma de que evite a imposição da medida privativa de liberdade. As tarefas são atribuídas conforme as aptidões do condenado, devendo ser cumpridas, durante oito horas semanais, preferencialmente aos sábados, domingos e feriados ou em

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dias úteis, de modo que não prejudique as atividades escolares ou o trabalho do adolescente.

Vale destacar, que o jovem submetido a essa medida deverá ser acompanhado e orientado por um profissional, que, no decorrer da execução da medida, deverá elaborar um relatório de atividades que será submetido à autoridade judiciária para a avaliação e a fiscalização do cumprimento da medida.

No tocante a essa medida, Shecaira (2008), entende que a medida jamais poderá consistir em tarefas que desrespeite o menor infrator. Pois sua finalidade é induzir no infrator a ideia de respeito, responsabilidade, e obediência as regras impostas pelo trabalho, para que assim produza uma ressocialização comunitária.

Conforme leciona o artigo 117 do ECA, essa medida não poderá exceder o período de 6 (seis) meses, devendo órgão responsável pela aplicação dessa medida enviar relatórios periódicos ao juiz da infância e juventude responsável pela aplicação, discriminando os comportamentos, para que possa fazer a análise de desempenho na execução da medida. 2.2.2.4 Liberdade assistida

Sobre essa medida, o Estatuto leciona, em seu artigo 118, o seguinte: “A liberdade assistida será adotada sempre que se afigurar a medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente”.

Acresce o parágrafo 1º: “A autoridade designará pessoa capacitada para acompanhar o caso, a qual poderá ser recomendada por entidade ou programa de atendimento”.

Ao aplicar essa medida, fica claro que, o adolescente é pessoa em desenvolvimento, que necessita de orientação para evoluir e se conscientizar.

Saraiva (2006, p. 160), aduz a respeito:

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A liberdade assistida constitui-se naquela que se poderia dizer "medida de ouro". De todas as medidas socioeducativas em meio aberto propostas pelo Estatuto, é aquela que guarda maior complexidade, a reclamar a existência de uma estrutura de atendimento no programa de Liberdade Assistida apta a cumprir as metas estabelecidas no art. 119 do Estatuto. Ao mesmo tempo se constitui na medida mais eficaz quando adequadamente executada, haja vista sua efetiva capacidade de intervenção na dinâmica de vida do adolescente e de sua família.

Para a aplicação, deve haver uma voluntariedade do infrator (adolescente), pois essa medida traz como finalidade que ele se conscientize através de orientações e não volte a praticar novas infrações. Sendo assim cabe ao orientador discutir novos planos, projetos que irão realizar, dando a possibilidade de escolha, auxiliando na socialização. Sobre as condições para o cumprimento dessa medida, fica ao juiz, observar as condições do menor para cumprir, não havendo disposição no ECA sobre o assunto.

A liberdade assistida assim como as outras, também busca a reinserção do adolescente na sociedade, porem o legislador não estipulou prazo Maximo para o cumprimento da medida, por isso se faz necessário um acompanhamento por orientadores sociais, que irão analisar a realidade vivida pelo adolescente, fazendo uma ligação entre essa realidade e programas sociais enquanto o adolescente necessitar de acompanhamento, orientação e auxilio (LIBERATI, 1995).

O art. 119, do ECA prevê todos os encargos do orientador, dado auxilio desde a família do adolescente até seu desenvolvimento escolar.

Essa medida será fixada no prazo mínimo de 6 (seis) meses, podendo ser substituída, conforme art. 118, § 2º, do ECA.

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2.2.2.5 Inserção do regime semiaberto

Esse regime e trato no artigo 120, do ECA, podendo ser aplicada de duas maneiras, pode-se aplicar desde o início pela autoridade judiciária; e poderá ser aplicada quando houver progressão de regime. Vejamos:

Art. 120. O regime de semiliberdade pode ser determinado desde o início, ou como forma de transição para o meio aberto, possibilita a realização de atividades externas, independentemente de autorização judicial. § 1º. São obrigatórias a escolarização e a profissionalização, devendo, sempre que possível, ser utilizados os recursos existentes na comunidade. § 2º. A medida não comporta prazo determinado, aplicando-se, no que couber, as disposições relativas à internação.

São aplicadas a adolescentes infratores que estudam e trabalham de dia e à noite serão recolhidos a uma entidade de atendimento.

Segundo Liberati (1995, p. 89): Como o próprio nome indica, a semiliberdade é um dos tratamentos tutelares que é realizado, em grande parte, em meio aberto, implicando, necessariamente, a possibilidade de realização de atividades externas, como a frequência à escola, às relações de emprego etc. Se não houver esse tipo de atividade, a medida sócio-educativa perde sua finalidade.

Shecaira (2008), afirma que essa medida é uma relação entre a internação e a meio aberto, pois há privação parcial de liberdade do adolescente infrator grave, que deverá ser recolhido à instituição especializada no período noturno, podendo frequentar a escola ou atividade profissionalizante sempre que for possível.

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Para essa medida, será necessário o acompanhamento de um técnico social, que irá orientar e auxiliar o adolescente infrator, e irá fazer um relatório sobre o andamento do caso. A cada seis meses, o juiz, com base no relatório da equipe multidisciplinar, deverá reavaliar a convivência da manutenção da semiliberdade ou decidir sua substituição pela liberdade assistida.

Deve destacar que a importância dessa medida, está no fato de que a reinserção social ocorra de forma progressiva. Coloca o adolescente em teste, analisando seu avanço no processo de socialização. 2.2.2.6 Da internação

A medida de internação, que vem prevista no artigo 121 do ECA, sendo esta considerada a medida mais grave para a ressocialização, por privar o jovem infrator de sua liberdade individual. Assim dispõe o artigo 121 do ECA:

Art. 121. A internação constitui medida privativa de liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. § 1º. Será permitida a realização de atividades externas, a critério da equipe técnica da entidade, salvo expressa determinação judicial em contrário. § 2º. A medida não comporta prazo determinado, devendo sua manutenção ser reavaliada, mediante decisão fundamentada, no máximo a cada seis meses. § 3º. Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos. § 4º. Atingido o limite estabelecido no parágrafo anterior, o adolescente deverá ser liberado, colocado em regime de semiliberdade ou de liberdade assistida. § 5º. A liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade.

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§ 6º. Em qualquer hipótese a desinternação será precedida de autorização judicial, ouvido o Ministério Público.

A medida de internação, ao privar o adolescente infrator de sua liberdade e estando ele em processo de desenvolvimento, o legislador impôs nesse artigo três princípios, de proteção aos direitos do menor, são eles: excepcionalidade, respeito ao adolescente e o da brevidade” (art.121, ECA,90).

O princípio da excepcionalidade impõe que somente poderá ser aplicada a medida de internação quando não resultar nenhum efeito das outras medidas impostas, não sendo mais viável a aplicação das outras, devera o juiz aplicar a medida de internação em último caso (art.122, §2º, do ECA,90).

A medida de internação será admissível, quando o ato for praticado com violência ou grave ameaça à pessoa, sendo a primeira com emprego de força física contra à vítima, gerando leões ou até morte, enquanto que a ameaça, é promessa de um mal sério, iminente e inevitável. Portanto, não é qualquer crime de violência ou ameaça que qualifica a internação, tem que haver uma gravidade no ato infracional (SHECAIRA, 2008).

O princípio do respeito ao adolescente, prevê que ao aplicar a medida de internação à jovem infrator em fase de desenvolvimento, “o Estado deve zelar por sua integridade física e mental, adotando as medidas adequada de controle e segurança” (art. 125, do ECA, 90).

A respeito desse princípio esclarece Liberati (1995, p. 92) que:

Ao efetuar a contenção e a segurança dos infratores internos, as autoridades encarregadas não poderão, de forma alguma, praticar abusos ou submeter a vexame ou a constrangimento não autorizado por lei. Vale dizer que

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devem observar os direitos do adolescente privado de liberdade, alinhados no art. 124 do ECA.

E por último o princípio da brevidade que diz que essa medida não poderá exceder 3 (três) anos, devendo haver sua manutenção a cada 6 (seis) meses (art.121§3º, do ECA).

Porem há exceção quanto a esse prazo previsto no artigo 122 § 1º, do ECA, onde a internação não excederá a 3 (três) meses.

Como visto a privação de liberdade do adolescente infrator não é a melhor opção para resocialização, pois trata-se de um modelo de prisão extremamente agressivo, que ao esperar por seu resultado poderá gerar reações contrária. No entanto o que espera da aplicação da medida é a reeducação, submetendo esse menor a um convívio em um ambiente mal estruturado, poderá causar problemas piores as de quando entrou na internação (SHECAIRA,2008).

Segundo Paula (apud LIBERATI 2003, p. 116): A internação tem finalidade educativa e curativa. É educativa, quando o estabelecimento escolhido reúne condições de conferir ao infrator escolaridade, profissionalização e cultura, visando a dotá-lo de instrumentos adequados, para enfrentar os desafios do convívio social. Tem finalidade curativa, quando a internação se dá em estabelecimento ocupacional, psicopedagógico, hospitalar ou psiquiátrico, ante a ideia de que o desvio de conduta seja oriundo da presença de alguma patologia, cujo tratamento, em nível terapêutico, possa reverter o potencial criminogeno do qual o menor infrator seja portador.

Sendo assim, ao aplicar a medida de internação ao menor infrator, com a esperança que tenha eficácia, é indispensável que seja cumprida em estabelecimento especializado, com profissionais qualificados nas áreas de psicologia, pedagogia, com especialização ou pelo menos

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conhecimento em criminologia, para reeducar o adolescente e colocá-lo a conviver com a sociedade

O artigo 108, do ECA, trata da chamada “internação provisória”, que ocorrerá quando: “por decisão fundamentada do juiz; por apreensão do adolescente em flagrante de ato infracional; e, por ordem escrita da autoridade judicial.

Por ser provisória, essa modalidade não poderá ser superior a 45 (quarenta e cinco) dias”. “O juiz irá analisar se estão presentes indícios suficientes de autoria e materialidade, manifestando a necessidade dessa medida” (parágrafo único do art.108, do ECA).

O adolescente infrator em cumprimento da medida de internação, que tem por finalidade pedagógica, não poderá haver a incomunicabilidade e proibição de visitas no cumprimento da medida. Porém é necessário que observe se há fundados motivos que a presença dos pais ou responsável prejudique o desenvolvimento da reeducação do adolescente (art.123, do ECA). 2.2.2.7 Das medidas protetivas

O artigo 112, inciso VII, do ECA, prevê a possibilidade de aplicação pela autoridade competente qualquer uma das medidas previstas no artigo 101, inciso I ao VI, do ECA.

São medidas especificas de proteção, são elas: o encaminhamento aos pais ou responsável, orientação, apoio e acompanhamento temporário, matricula e frequência obrigatória em estabelecimentos de ensino fundamental, inclusão em programas comunitários (art.101, do ECA,90).

Deve-se esclarecer que as medidas protetivas são aplicáveis às crianças enquanto que as medidas sócio educativa é aplicada aos adolescentes, com tratado acima. As medidas de proteção são aplicáveis sempre os delas forem

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ameaçados ou violados, por falta de ação ou omissão da sociedade, do Estado e também da família e em razão da conduta (art.98, do ECA, 90). 2.2.3 Da proteção frente à Constituição Federal de 1988

A constituição de 1988, também se destaca, por priorizar a defesa dos direitos humano, em seu extenso rol de direitos fundamentais nela inserido, incluindo os direitos civis, políticos, sociais e direitos fundamentais de crianças e adolescente.

Esclarecendo suas lições, Machado (2003, p.55), diz: […] em relação aos direitos fundamentais de crianças e adolescentes, a Constituição de 1988 superou a dicotomia entre estas “classes” de direitos fundamentais, conformando-os estruturalmente de maneira toda particular e diversa daquela pela qual vêm conformados os direitos fundamentais dos adultos, visando atingir efetivamente proteção mais abrangente aos primeiros. E essa superação deu-se justamente por conformar direitos fundamentais de crianças e adolescentes da mesma maneira, qual seja, fazendo com que produzam essencialmente obrigações de natureza comissiva, e não meramente omissiva, consubstanciadas no dever de asseguramento pelo mundo adulto (Estado, Sociedade e Família) dos direitos de crianças e adolescentes a que se refere o caput do artigo 227.

Assim a lei maior, atribui responsabilidades não só para a família/ responsável mais também, à sociedade e ao Estado, pois esses jovens atribuem alguns males causados por rompimentos psicológicos e desvio de conduta espelhado-se na sociedade em que vive, ou seja, o Estado e a sociedade tem a obrigação de manter/zelar para que estas pessoas não se torne infratores.

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A Constituição, em seu artigo 227, “Caput”, dispõe da seguinte forma:

Artigo 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Este artigo da constituição ao tratar da tutela da criança e do adolescente, esclarece que os direitos desses menores são deveres da família, do Estado e da sociedade. Devemos notar que é de suma importância a união entre esses três, para a eficácia do que vem trazer a lei, ou seja, primeiro a família responsável pelo suporte direto da criança e do adolescente sob sua guarda, atuando com harmonia nos interesses e direitos da criança e do adolescente. Nos artigos 229 e 230 da CF, ficou instituído, quanto à família, seus deveres, encarregando aos pais “o dever de assistir, criar e educar os filhos menores”.

O Estado, promover políticas públicas na orientação, profissionalização, e educação de forma ampla e direcionada. Em relação aos deveres do Estado, dispõe o artigo 227, § 1º da constituição de1988, que: “O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança e do adolescente, admitida a participação de entidades não governamentais, mediante políticas especificas [...]”.

E a sociedade, responsável ao acompanhamento e o monitoramento da efetividade das políticas públicas, acolhendo sem restrição. Pelo fato de tratarmos de pessoas em estado de desenvolvimento, com possibilidade de sequelas, encontram-se em situação priorizada a executarem esses deveres.

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2.3 DA APLICABILIDADE DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS 2.3.1 Do ato infracional

A definição dada por Aquino (2012), que ato infracional é a conduta exposta nas hipóteses prevista em lei que determine sanções, por desrespeito à lei, a ordem pública, aos direitos do cidadão e ao patrimônio, com ação condenável, cometida por crianças e adolescentes. Ressalta ainda que o ECA em seu artigo 103 define esta conduta, assim: “Art. 103 (ECA) Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal”. Sendo assim, ato infracional é fato típico, considerado crime ou contravenção penal. Não se diz que o adolescente é autor de um crime ou contravenção penal, mas que ele é autor de ato infracional. Considera esta lei, autores de infração apenas os adolescentes 12 (doze) a 18 (dezoito) anos e os jovens de 18 (dezoito) a 21 (vinte e um) anos, nos casos expressos em lei (art. 2° do ECA).

Diante disto, todos os atos infracionais praticados por adolescente são equiparados aos crimes tipificados no Código Penal e nas leis extravagantes, bem como na Lei de Contravenções Penais.

Conforme expões o Código Penal, em seu artigo 27, “os menores de 18 anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial”. A legislação especial a que se refere este artigo, é o Estatuto da Criança e do Adolescente.

Assim com a definição do código penal, crianças e adolescentes que cometem alguma conduta infracional, não podem elas responderem penalmente, pois são inimputáveis. As consideradas crianças irão receber medidas de proteção, já os à adolescentes, serão atribuídas as medidas socioeducativas, tento em vista que ambas se encontram em

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condições peculiar de desenvolvimento, não podendo atribuir responsabilidade penais e punitivas perante o ato cometido.

Souza (2004) afirma que as medidas socioeducativas “são medidas legais adequadas a pessoas em desenvolvimento e que estão sujeitas aos princípios da proteção integral”. Os atos praticados pela criança e pelo adolescente não serão configurados como maus antecedentes.

Atendendo aos princípios da proporcionalidade, individualização e da necessidade, haverá uma medida socioeducativa correspondente, para cada ato infracional, se esse jovem cometer mais de uma infração, respondera este cumulativamente.

De acordo com Meneses (2008), no tocante princípio da individualização expõe que: “está relacionada ao próprio adolescente, ou seja, qual a medida socioeducativa mais adequada ao infrator, conforme sua personalidade, sua conduta social, o grau de reprovabilidade que ele atribui a sua conduta”. 2.3.2 Da apuração do ato infracional

De acordo com o referido acima, essas pessoas que pratica ato infracional, que se encontram em condições especiais de desenvolvimento, estão submetidas a medidas prevista no ECA, e as soluções dos problemas devem ser rápidas, pois podem produzir danos irreparáveis com a demora, por terem a sensação de impunidade podendo acarretar uma sequência desses atos infracionais.

Se valendo no que diz o artigo 106, do ECA, esse infrator pode ser apreendido em flagrante delito, com fundamentação escrita da autoridade judiciária competente, vejamos: “nenhum adolescente será privado de sua liberdade senão em flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente”.

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Em caso de fragrante de ato infracional mediante violência ou grave ameaça à pessoa, deverá ser lavrado o auto de apreensão pela autoridade policial, sendo ouvido as testemunhas e o adolescente, os produtos e os instrumentos do ato deve ser apreendido e solicitar os exames e perecias necessárias para comprovação da materialidade e autoria da infração. (art. 173 do ECA)

Esse infrator poderá ser liberado pela autoridade policial, com fulcro no artigo 174 do ECA, com o comparecimento dos pais ou responsável, sendo esse menor infrator submetido a assinar um termo de compromisso e responsabilidade de sua apresentação ao representante do Ministério Público no mesmo dia, sendo impossível no mesmo dia, no próximo dia útil. Porém, para os atos infracionais mais graves, o adolescente deverá permanecer sob internação com o intuito de garantir sua segurança pessoal ou manutenção de ordem pública.

Sendo esse infrator liberado, fica conferido aos pais ou responsável deste a apresentação ao Ministério Público, assim não o agindo o promotor de justiça notificara estes para a apresentação, podendo impor força policial para a realização deste ato, a competência para essa medida cabe somente ao órgão do Ministério Público. (Parágrafo único do art. 179, do ECA)

Podendo o Ministério Público com força no artigo 180 do ECA, decidir pelo arquivamento dos autos, conceder a remissão ou apresenta-lo à autoridade judiciária para a aplicação das medidas socioeducativas.

Se decidir por apresenta a autoridade judiciária, o juiz solicitara por citação que o adolescente se apresente, com seus pais ou responsável acompanhado de advogado. Se esse adolescente infrator não for encontrado, o juiz expedira mandado de busca e apreensão, ficando suspenso ate que seja encontrado e apresentado. Vejamos:

De acordo com o artigo 184 do ECA:

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Oferecida a representação, a autoridade judiciária designará audiência de apresentação do adolescente, decidindo, desde logo, sobre a decretação ou manutenção da internação, observado o disposto no art. 108 e parágrafo. § 1º O adolescente e seus pais ou responsável serão cientificados do teor da representação, e notificados a comparecer à audiência, acompanhados de advogado. § 2º Se os pais ou responsável não forem localizados, a autoridade judiciária dará curador especial ao adolescente. § 3º Não sendo localizado o adolescente, a autoridade judiciária expedirá mandado de busca e apreensão, determinando o sobrestamento do feito, até a efetiva apresentação. § 4º Estando o adolescente internado, será requisitada a sua apresentação, sem prejuízo da notificação dos pais ou responsável.

Nessa fase de apuração do ato infracional o adolescente pode ser liberado do internamento pelo juiz, se este decidir pelo mantimento do internamento provisório, não poderá ultrapassar 45 (quarenta e cinco) dias, conforme o art. 183, do ECA, devendo ser realizado em lugar especializado.

Na falta desde lugar que muitas vezes não existe em algumas cidades, acabam ficando na delegacia, separados dos outros presos, com prazo de 5 (cinco) dias, podendo a autoridade policial após esse prazo liberar, por não ser lugar adequado para essa internação. (Art. 185, § 2º, ECA,90)

Apresentado ao judiciário o advogado terá um prazo de 3 (três) dias para apresentar a defesa previa (Art. 186, § 3º, ECA, 90).

Sendo apresentado em juízo, será marcado audiência, onde será feito o interrogatório, sendo ouvido os pais ou responsável se apreciar a aplicação de remissão, coso contrário a esta aplicação, o processo continuará com apresentação de defesa previa e rol de testemunhas, podendo

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o juiz determinar execução, neste caso será designada nova audiência (ELIZEU, 2010).

De acordo com o artigo. 186, parágrafo 4º, do ECA: Na audiência em continuação, ouvidas as testemunhas arroladas na representação e na defesa prévia, cumpridas as diligências e juntado o relatório da equipe interprofissional, será dada a palavra ao representante do Ministério Público e ao defensor, sucessivamente, pelo tempo de vinte minutos para cada um, prorrogável por mais dez, a critério da autoridade judiciária, que em seguida proferirá decisão.

Nessa audiência serão produzidas as provas, ouvindo as testemunhas, é dada a palavra ao Ministério Público e em seguida ao defensor. Ocorrerão debates, podendo ser substituída a acusação e defesa por escrito, dentro dos preceitos legais, e então, será produzida as alegações finais, o juiz decidira a sentença, determinando a aplicação de uma das medidas socioeducativa, relacionada no artigo 112 do ECA. 2.3.3 Da remissão

A remissão é uma espécie de perdão concedida pela autoridade competente, sendo suspenso ou extinto o processo.

O ECA trata sobre remissão em seu artigo 126, vejamos:

Antes de iniciado o procedimento judicial para a apuração de ato infracional, o representante do Ministério Público poderá conceder remissão, como forma de exclusão do processo, atendendo às circunstâncias e consequências do fato, ao contexto social, bem como à personalidade do adolescente e sua maior ou menor participação no ato infracional. Acresce o parágrafo único: Iniciado o procedimento, a concessão da remissão pela autoridade judiciária importará na suspensão ou extinção do processo.

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Conforme o artigo supracitado, pode o promotor de justiças decidir pela remissão, devendo obrigatoriamente remeter ao juiz, para que homologue ou não. Havendo a homologação será extinto o processo. Se decidir o juiz pela não homologação, o caso será remetido ao Procurador-Geral de Justiça, com força no artigo 181 § 2º do ECA.

Segundo Mirabetti (apud LIBERATI, 2010, p.144): O perdão judicial “é um instituto através do qual o juiz, embora reconhecendo a coexistência dos elementos objetivos e subjetivos que constituem o delito, deixa de aplicar a pena, desde que presentes determinados circunstâncias previstas na lei e que tornam desnecessária a imposição de sanção. Trata-se de uma faculdade do magistrado, que pode concedê-lo ou não segundo seu critério, e não de direito do réu.

Verifica-se que, na remissão existe a possibilidade da autoridade judiciária extingui ou suspender o processo, ou de conceder a remissão acompanhado de uma medida sócio educativa, salvo as de semiliberdade e de internação que neste caso não pode ser aplicada.

Prevê o artigo 127, do ECA: Art. 127. A remissão não implica necessariamente o reconhecimento ou comprovação da responsabilidade, nem prevalece para efeito de antecedentes, podendo incluir eventualmente a aplicação de qualquer das medidas previstas em lei, exceto a colocação em regime de semiliberdade e a internação.

A medida imposta junto a remissão dada por esse artigo poderá ser revista a qualquer tempo, como estabelece o artigo 128 do ECA, desde que haja pedido expresso do adolescente ou pelo seus pais ou responsável ou até mesmo pelo representante do Ministério Público.

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Por ser facultativo o pedido de revisão a qualquer tempo como está disciplinado no artigo 128, não devemos considera-lo inconstitucional.

Havendo a concessão da remissão, haverá a extinção ou suspensão, do ato infracional, não poderá ser utilizada como antecedentes ou para efeitos de reincidência. 2.3.4 A eficácia das medidas sócio educativa

Como explanado no presente trabalho, aos adolescentes infratores serão impostas medidas sócio educativas, que são designadas à formação, com a finalidade de reestruturar o adolescente para colocá-lo na sociedade (ALVES,2006).

É de suma importância, os estudos da aplicabilidade das medidas alcançado o resultado, pois é por meio da eficácia delas que saberemos de sua eficiência para recuperar esse infrator, na proporção de chances de persistir no mundo do crime.

Ramidoffi (2010, p. 101), explica que: Toda e qualquer medida legal que se estabeleça aos jovens, consoante mesmo restou determinado normativamente tanto pela Constituição da República de 1988, quanto pela Lei Federal 8.069, de 13.07.1990 e, também, sobremodo, material e fundamentalmente, pela Doutrina da Proteção Integral, deve favorecer a maturidade pessoal (educação), a afetividade (valores humanos) e a própria humanidade (Direitos Humanos: respeito e solidariedade) dessas pessoas que se encontram na condição peculiar de pessoa em desenvolvimento de suas personalidades.

Levando em conta o que diz o autor, nos leva apensar na extrema importância de estabelecer na aplicabilidade dessas medidas a orientação pedagógica, psicológica e profissionalizante, assim tento uma melhor garantia ao

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alcançar a finalidade, devendo-se trabalhar no desenvolvimento humano destes menores infratores, favorecendo educação social, orientação de direitos e deveres, profissionalização dando oportunidades de emprego e reinserindo na sociedade.

Neste sentido, o ECA em seu artigo 208 e incisos deixa claro da necessidade de escolarização e profissionalização, não importar se estão cumprindo medidas socioeducativa, sendo determinação taxativa.

Para se ter uma garantia na eficácia das medidas socioeducativas, é necessário um trabalho em rede, havendo harmonia no conjunto dos setores: jurídicos, o social e o educativo. (MENESES 2008, p. 121)

Deboni expõe em sua entrevista que: Por esses menores estar em fase de desenvolvimento tem grades chances e grandes oportunidades sim, até por uma questão interna do indivíduo de poder ser não só ressocializado, reeducado, mas que podem sim ser inserido em um contexto social sadio, talvez não oferecido antes por falta de oportunidades, mas que uma vez bem ofertado poder dar um bom resultado.

Vale refletirmos que a intenção do ECA no que diz respeito da aplicação das medidas socioeducativa, não é de caráter sancionatório, mas de caráter psicopedagógico protetivo. Muitas vezes não é o que ocorre na pratica, por falta de estruturas no Brasil. Ficando claro que a falha não vem da normatização dos sistemas, mas na falta de preparação para sua execução.

Comprometendo a eficácia esperada na aplicação destas, na elaboração de projetos específicos, para cada medida impostas a cada infrator, separadamente tratados pela gravidade do ato cometido, sexo e idade.

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2.4 OS AUTORES DOS ATOS INFRACIONAIS E OS DESAFIOS PARA A FAMILIA 2.4.1 Para quem fica o dever de reeducar, o estado ou o responsável?

Como já mencionado no presente trabalho as previsões Constitucionais, no que diz respeito a proteção desses menores. Em seu art. 227 estabelece os deveres de ambos os responsáveis por estes, ou seja, é dever da família, da sociedade e do Estado, assegurar os direitos e deveres com absoluta prioridade das crianças e adolescentes, todos embasados na doutrina da proteção integral.

Sobre a responsabilidade da família, esta cumpre com o papel inicial, e mais “importante”, em transmitir para as crianças e adolescentes que dela participam, os valores e características de desenvolvimento de comportamento para a convivência na sociedade, pois é onde inicia seu processo de desenvolvimento, através de lições, exemplos das pessoas de seu grupo familiar, tornando assim a família sua base para seu crescimento. Que atualmente há uma falha nesses valores familiares, abrindo portas para aumentar cada vez mais os atos infracionais, por haver a omissão dos pais ou responsável na imposição de limites, bons exemplos e lições.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu Art. 22 diz que, “Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.”

Assim nos esclarece Luiz Angelo Dourado (1969, p. 114):

Quando se estabelece firme e duradouro laço entre pais, o desenvolvimento psicológico do filho se efetuará bem, seu superego será normal e a criança tornar-se-á um indivíduo moral e socialmente independente. Mas, se os pais,

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principalmente as mães se satisfazerem em permanecer como personagens alheios e impessoais ou agem de forma que seja impossível uma inclinação permanente filhos-pais, a educação dos filhos será um fracasso, o desenvolvimento do caráter far-se-á mal, a adaptação social poderá ser superficial e o futuro da criança correrá o risco de ficar exposto a todos os perigos possíveis de um desenvolvimento anti social.

Podemos entender através desta citação, que muitas vezes os atos infracionais é um fato gerado por omissão de valores familiares, como por exemplo: as lições, castigos moderados, limites, a necessidade de carinho, amor, tendo pois, um vínculo afetivo de pais para filhos, que na ausência pode prejudicar o desenvolvimento da personalidade, e abrindo espaço para que ele seja um menor infrator.

Com essa ideia não podemos então, generalizar que esses atos infracionais advêm somente do fator econômico, ou só do psicológico, pois cada um desse fatores tem sua parcela na contribuição do desenvolvimento da personalidade deles.

Assim o ECA expõe sobre os direitos: Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Com do estatuto, a família não é revestia de caráter absoluto no compromisso do desenvolvimento, pois o Estado também tem um papel a ser cumprido, que cabe somente a ele a garantir esses direitos, tais como a educação, esporte, saúde, lazer, cultura, profissionalização, que são de suma importância no desenvolvimento das crianças e adolescentes (RAMIDOFF 2012).

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Havendo uma união desses agentes, cada um cumprindo com suas funções aplicadas, desde o início do crescimento desde menores, cria-se condições adequada para que cheguem na vida adulta dignamente, sem entra na vida do crime. 2.5 A INSERÇÃO DE UM PSICOLOGO NO CONTEXTO DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS 2.5.1 O atendimento a família

Em uma visão geral, sabemos que na maioria das vezes o que leva esses jovens a cometer atos infracionais é a falta de uma estrutura familiar e a participação dos pais ou responsável na vida social destes.

Com este importante papel na participação da vida desces jovens, onde faz-se necessário uma atenção sob a perspectiva de transformação voltada sobre as relações dentro do âmbito familiar e também em outras esferas da sociedade, com o objetivo de resgatar o vínculo.

Mioto (2001, p.116), nos esclarece assim: O processo de atenção direta às famílias tem como objetivo principal identificar as fontes de dificuldades familiares, as possibilidades de mudanças e os recursos disponíveis (não apenas os materiais e nem apenas os da família) para que as famílias consigam articular respostas compatíveis com uma melhor qualidade de vida. Isto implica no desenvolvimento da capacidade de discernimento entre as mudanças possíveis de serem realizadas no âmbito dos grupos familiares e de suas redes e aquelas que exigem o engajamento deles em processos sociais mais amplos para que transformações de ordem estrutural possam acontecer.

A ideia de família deve centrar a organização de serviços como um lugar de cuidado, com a necessidade de

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propor políticas sociais que deem a elas a sustentabilidade, incentivadora para pôr em pratica os projetos de vida.

Sobre esta proteção o ECA em seu artigo 208, inciso IX, diz que:

Art. 208. Regem-se pelas disposições desta Lei as ações de responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados à criança e ao adolescente, referentes ao não oferecimento ou oferta irregular: IX - de ações, serviços e programas de orientação, apoio e promoção social de famílias e destinados ao pleno exercício do direito à convivência familiar por crianças e adolescentes.

Quando chega ao ponto do adolescente comete um ato infracional, deve de início buscar o contexto familiar desse infrator, onde muitas vezes encontra uma fragilidade de lidar com a situação. Deve assim iniciar um trabalho com essa família ao aplicar a medida cabível ao infrator, ou seja, orientação, apoio, promoção social, para que a base de menor tenha um ambiente acolhedor e educativo.

Muitas vezes esse artigo não é aplicado na pratica, não dando muita importância a família, não inserindo um psicólogo para orientar o grupo familiar onde esse menor irá voltar conviver, após aplicação disciplinar, que na maioria dos casos mostra-se pouca eficiência na aplicação das medidas.

Podemos afirmar que, o lar para as crianças e adolescentes, é o um espaço de aprendizado, seus pais são as figuras para transmitir bons exemplos, lições de comportamento e imposição de limites, onde percebe-se a necessidade de orientação para estes pais, pois onde há pais desorientados podemos dizer que haverá filhos mal-educados.

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2.5.2 Atendimento individual

Como dito no presente trabalho, o ECA traz uma diferença na imposição das medidas, sendo ao adolescente medidas mais severas e para as crianças medidas mais brandas. Assim, o atendimento individual desses infratores, também deverá ser diferente entre eles, devendo esse profissional especializado, atender as necessidades particulares, e buscar a origem que levou esse menor a praticar a conduta infracional.

O art.101 do ECA prevê: “[...] a autoridade competente poderá determinar[...]. V- requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatório”.

A importância de inserir o psicólogo neste contexto, é por este ser um profissional especializado para ouvir o adolescente ou a criança, e buscar as questões individuais que levou essas pessoas a entrar em conflito com a lei. Não podendo descarta o atendimento do médico, conforme a necessidade.

Bar (2005), em seu artigo, esclarece o trabalho do psicólogo junto ao menor infrator, aduzindo:

O Objetivo do trabalho psicológico junto ao menor infrator é trabalhar autoestima, autoimagem, a questão da culpa; passar noções de limites e respeito ao próximo; resgatar sonhos e projetos para o futuro; entre outros. Faz-se também identificação de distúrbios emocionais e/ou comportamentais maiores, que exijam a avaliação de especialistas, como por exemplo, um psiquiatra. Importa ressaltar que o trabalho psicológico não se desenvolve de forma isolada. É necessário que haja trocas constantes de informações e ideias com outros membros da equipe, que a família participe do processo de recuperação e principalmente, que acreditemos que é possível a recuperação do menor infrator.

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Fica claro a importância da aplicação desse profissional, junto as medidas sócio educativas, medidas estas, que não deverá ter caráter de punição, mas de reeducação, onde faz-se necessário que o infrator faça uma auto reflexão, do que ele está sendo na sociedade e o que deveria ser, buscando também suprir suas necessidade, evitando que busque soluções no mundo do crime.

Que estas medidas elencadas no artigo acima, não fique somente em lei, mas que o Estado faça valer esse direito, dado capacitação especializada a esses profissionais e aplicando dentro de um plano educativo esse direito que muitas vezes não é dado a esses menores. 2.6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Através do presente trabalho, consistiu na análise de que o Estatuto da Criança e do Adolescente visa proporcionar condições especiais para pessoas em desenvolvimento, em natureza pedagógica, levando a reflexão do ato infracional, reeducando, para inserir na sociedade de maneira digna.

A importância da aplicação das medidas sócio educativas, que quando bem executadas seja qual for o regime, contribui para ajudar na diminuição das práticas de atos infracionais, evitando a reincidência desses atos. É respaldado também a possibilidade de perdão disciplinada pelo ECA, dando uma nova oportunidade a este jovem infrator, não sendo considerado como maus antecedentes e nem surgir efeitos de reincidência.

Respalda também, direitos e garantias constitucionais das crianças e dos adolescentes, que servem como ferramentas para a eficácia das medidas, não transferindo responsabilidade absolutas somente à família, mas impondo obrigações ao Estado e a sociedade. Que deve ser exigido seu efetivo cumprimento.

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A reflexão sobre a constituição dos atos infracionais, que por muitas vezes ocorre por causa do meio em que vivem esses menores, por existem fatores que contribuem na ocorrência de atos, fatores como psicológicos, econômicos e morais. Que para mudar faz-se necessário políticas sociais, para os adolescentes terem oportunidades de um futuro melhor.

A necessidade de um psicólogo na aplicação das medidas sócio educativas, para que faça uma análise da conduta praticada, e as medidas a serem tomadas, colocando o infrator e a família em reflexões, pois não basta que somente à execução das medidas, é necessário também que esse grupo familiar tenhas novos planos de vida, para que assim possa valer todo o trabalho, e esse menor não volte no futuro ao mundo do crime. REFERÊNCIAS ALBERGARIA, Jason. Direito do Menor. Rio de Janeiro: Aide, 1991.

ALVES, Franciele Caroline. Eficácia das medidas socioeducativas segundo a doutrina brasileira. Itajaí, 2006.

BANDEIRA, Marcos. Atos Infracionais E Medidas Socioeducativas: Uma leitura dogmática, crítica e constitucional. Ilhéus, Bahia, 2006.

BAR, Erika de Lacerda. Centro de Integração e Apoio ao Adolescente de Patrocínio: A importância da psicologia nas medidas Sócio-Educativas aplicadas ao menor infrator de Patrocínio. Minas Gerais, v.1, 26, jan. 2005. Disponível em:

<http://www.ciaap.org.br/artigos/headline.php?n_id=5&u=1%5C>. Acesso em: 10/05/2016.

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Criança e adolescente... 95

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III

ESCRAVIDÃO POÉTICA

Alex Sandro da Silva* Valdenir Prandi*

RESUMO: O poema começa identificando os quilombos com águias, aves de rapina que são símbolo de bravura, e o próprio quilombo é identificado com um ninho de águias, onde os bravos guerreiros. Com seus poemas abolicionistas Castro

* Graduado em História pela Faculdade de Filosofia Ciência e Letras de Presidente Venceslau; Graduado em Geografia pela Faculdade da Terra de Brasília; Graduado em Pedagogia pelo Instituto Superior de Educação Alvorada Plus e Graduado em Sociologia pelo Centro Universitário de Araras Dr. Edmundo Ulson. Currículo lattes http://lattes.cnpq.br/8760388775061930 * Possui Licenciatura Plena em Filosofia pela Faculdade Padre João Bagozzi - (Registrado Ministério da Educação Universidade Federal do Paraná) (2011-2013). Atualmente é professor - Secretaria de Educação do Estado do Paraná. Possui Licenciatura Plena e Geografia pela Faculdades Integradas da Terra de Brasília - Brasília - DF (2007 - 2009). Possui Licenciatura Plena em Pedagogia (Segunda Licenciatura) pelo Centro Universitário de Jales (UNIJALES) - Jales - SP (2015 - 2016). Pós-Graduação modalidade Lato-Sensu: Centro Universitário Leonardo da Vinci (UNIASSELVI): Metodologia de Ensino de Filosofia e Sociologia - Indaial - SC (2014 - 2015). Faculdade da Aldeia de Carapicuíba (FALC) Pós-Graduação em Deficiência Intelectual, Auditiva e Visual e a Prática Educativa Inclusiva - Carapicuiba - SP (2014 - 2015). Faculdade União Cultural do Estado de São Paulo (UCESP - Faculdade) Pós-Graduação em Educação ambiental e Sustentabilidade - Araçatuba - SP. (2015-2016). Participação em Cursos e Eventos - Participou do Curso de Capacitação do Programa Qualificação Pedagógica, Secretaria Municipal de Educação de Grandes Rios - PR. (2011).

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Alves se tornou o “poeta dos escravos” esse iria ser pseudônimo mais conhecido que iria consagra-lo como o humanitário da poesia, por ter vivenciado em seu versos as dores sentidas pelos escravos, o poeta dos escravos também era o “poeta da abolição”, um outro pseudônimo que o consagraria, que o destacaria entre os outros poetas, pois houve outros poetas abolicionistas como ele porem, Castro Alves foi uma arma e a apontou para a escravidão com isso conseguiu nos trazer um dilema, pois a poesia é beleza, é harmoniosa, é romântica, enquanto que a escravidão é desumana, é humilhante, e opressora. Enquanto a poesia traz primitivismo, enquanto a poesia eleva os sentimentos, a escravidão os deprime; enfim é um dilema antológico através dos seus poemas, consequentemente a poesia se tornou feia com a escravidão, e a escravidão se tornou bonita com a poesia, ou será ao contrário a poesia foi embelezada com o horrível tema da escravidão, e a escravidão ficou ainda mais horrível com a beleza da poesia a criticada? A verdade é que quem lê os poemas abolicionistas de Castro Alves não se sente bem ao lê-las, portanto, a escravidão poética não é nenhum tema prazeroso se ler ou escrever mais é um tem que nos faz refletir sobre as origens do povo brasileiro, sobre uma sociedade mais igual e menos discriminadora, sobre uma humildade mais humana, e tolerante. É mergulhar no mundo dos versos que iremos nos aprofundar no submundo da escravidão conhecer, suas mazelas, os seus crimes e muitas vezes as suas incoerências que tanto constrangem os versos do poeta dos escravos, esse que viria a ser o poeta mais popular que a literatura brasileira já conheceu por dois motivos por ser até hoje o poeta mais lido dentre todos e principalmente por ter canalizado uma dor que não era sua, mas que a tomou para si. Castro Alves foi um homem branco que lutou pelo interesse dos negros que sempre foram discriminados e escravizados, sua vida foi épica, pois foi uma mistura de nacionalismo, pois lutou a favor da república; de

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patriotismo, pois lutou a favor do povo; e heroísmo, pois promover uma verdadeira “revolução” com protagonistas que podemos chamá-los de vilões, os senhores e comerciantes de escravos; com vítimas os escravos, e com heróis os abolicionistas onde Castro Alves foi o principal herói. PALAVRAS-CHAVES: Missionário. Herói. Revolucionário NOTA: O tema abordado procura de uma forma crítica, mostrar por um outro ângulo os últimos anos da escravidão no Brasil. Não pense que a escravidão foi abordada de uma maneira “romântica”, ou harmoniosa, ao contrário, o objetivo é mostrar o quanto foi importante as obras de um poeta para a igualdade da sociedade brasileira, uma sociedade que injustamente consagra heróis pelo que não fez como no exemplo de Tiradentes e inexplicavelmente não consagra aquele que com justiça merece estar no panteon dos heróis pelo muito que fez como no exemplo de Castro Aves. Apesar da sua curta vida foi um abolicionista que busca a todo instante o fim da escravidão. Escrevendo poemas que criticavam o sistema escravocrata e acima de tudo denunciava a desumanidade expondo a humilhante situação que os escravos viviam, trabalhavam, se alimentavam, se relacionavam, eram transformados ou vendidos.

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INTRODUÇÃO

A escravidão poética não visa fazer comentários sobre as obras abolicionistas de Castro Alves, o poeta de abolição ou poeta dos escravos, mas sim visa contar a história da escravidão por um outro ângulo misturando abolição, biografia e poesia. Abolição, com o movimento abolicionista e suas etapas até sua conclusão total no dia 13 de maio de 1888. Biografia sobre a vida de Castro Alves, bem como sua importância para a literatura brasileira e para o movimento abolicionista. E por fim a poesia, abordando as obras de Castro Aves, poeta que fez de seu dom literário uma arma contra a escravidão. Suas poesias abolicionistas foram reunidas em livro chamado “Os escravos”, e publicado em 1885 quatorze anos depois da morte do poeta, mas o seu legado fez uma revolução na sociedade pois seus versos tinham o caráter de denunciar e repugnar a escravidão e ao mesmo tempo exaltar a liberdade. OBJETIVO

Visamos enobrecer ainda mais a vida de um erudito que nasceu no estado da Bahia, no dia 14 de março de 1847, alguém tão importante para a literatura brasileira que o dia do seu nascimento iria se tornar o dia nacional da poesia. Castro Alves foi um erudito que lutou por um povo primitivo, com isso podemos tirar lições que muito têm a nos ensinar. Através dos seus versos podemos aprender muitos sobre o período histórico da escravidão que terminou apenas em 1888 como disse Castro Alves em o século: “o século é grande”, com essa frase o poeta tenta nos avisar de que a escravidão irá se agonizar ao longo do século XIX. Em vários de seus poemas o poeta descreve mães escravas em várias situações constrangedoras como em “tragédia no lar” onde é descrito uma mãe desesperada prestes a ver seu filho vendido e levado

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pra longe, em “o navio negreiro” é descrito mulheres desgraçadas com suas crianças; em “ a canção do africano” é descrito uma mãe cantando para o filho dormir e em vários outros poemas é descrito a agonia das mãe pelos filhos diante da situação desesperadora da escravidão “mater dolorosa”, “a criança”, “o órfã na sepultura” são exemplos desse tipo de poesia, dentre outras citações em outros poemas, é descrito o desespero das mães e a danosa consequência da escravidão na vida familiar dos escravos, porém, nenhum desses poemas abordou o assunto de forma tão emocionante como em “a mãe do cativo”, onde uma mãe escrava tenta levar uma vida normal, mesmo sendo escrava, lhe ensinado lições como honra e virtudes, para o poeta seriam lições muito nobres que a criança poderia receber da sua mãe ser educado, ser honroso, virtuoso e como disse o próprio poeta em verso do poeta “ que seja brioso”, mas para o poeta estas lições estão contração com a realidade em que vivem e numa aparente incoerência o poeta parece tentar corrigir e ensinar como e o quê se deve ensinar ao filho: dores miseráveis, desonras, crimes, fome, frio, exaustão e dessa forma a sensibilidade do leitor é muito tocado pois pra que ensinar virtudes a quem iria viver como escravo, melhor seria aprender ser um criminoso, insubordinado às algemas da escravidão, eram como se a mãe estivesse ensinando o filho a ser gente, e o poeta quisesse mostra-la que melhor seria ensinar-lhe a ser um animal como diz em verso: “depois adormeça com o sono de um cão, para o poeta não havia sentido e ensinar ser homem uma criança que iria crescer sendo humilhado por ser escravo. Este é um exemplo fraternal de um poema que tem muito a nos ensinar juntamente com suas outras obras abolicionistas, portanto o objetivo do tema é aprender com quem muito tem a nos ensinar, é aprender ser mais humano, aprender ser mais fraternal e ainda poder enxergar a escravidão por um outro ângulo onde os versos ao invés de dar-lhe beleza acaba por denunciar e mostrar a face mais feia e obscura de uma prática

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tão perversa e desumana, preparar-se para mergulhar no mundo dos versos onde a poesia nos faz se sentir mal perante tanta desumanidade, esses são os poemas abolicionistas de Castro Alves, essa é a escravidão e essa é a escravidão poética. METODOLOGIA

O trabalho de conclusão de curso será realizado buscando contar a escravidão, um período obscuro da nossa história, se utilizando das obras abolicionistas de Castro Alves, o poeta dos escravos, por vezes iremos citar versos de seus poemas analisando minuciosamente algumas poesias, iremos dessa forma tão literária aprender história de uma maneira mais crítica e com mais profundidade, passando pelo submundo das senzalas iremos nos admirar com as glorias de um herói, um homem que usava couros na sua fronte; como disse o poeta em laço de fita. A vida heroica de Castro Alves já se justificaria como um nobre tema para a obra desse trabalho, porém, sua biografia irá tornar mais rico o conteúdo do trabalho, pois o que visamos é falar sobre a escravidão de um outro ângulo partindo dos seus versos, assim sua vida também entra nesse contexto como um enriquecimento da obra. 3.1 O NASCIMENTO DO POETA

Leitor imagine-se no dia 14 de março de 1847, o Brasil era bem diferente do que é hoje não havia carros, trens ou motos circulando, não havia indústrias poluindo a atmosfera, o modo de vida das pessoas era bem diferente do que hoje é falavam de outra maneira (mais europeia), se vestiam de outra forma, imitando a moda europeia, e se alimentavam também de uma forma distinta do atual, pois não havia nenhum produto industrializado. O Brasil era um país recém–liberto do jugo opressor do colonialismo português e apesar dos

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demais países latino-americanos que também conquistaram a independência recentemente terem adotado o sistema republicano de governo, o Brasil manteve o sistema monárquico de governo, esse era o Brasil do dia 14 de março de 1847 e esse seria o Brasil em que nasceria o poeta Castro Aves no fazendo Cabaceiras no município de Curvalinho na Bahia, seu pai era Antonio José Alves um fazendeiro abastado e homem muito ligado às artes, foi um dos fundadores da academia baiana de artes, sua mãe Clélia Brasília da Silva Castro, era uma mulher doce e frágil que iria falecer quando o poeta ainda era um menino, possuía um irmão mais velho do que eles, e mais três irmãs onde a mais nova Adelaide era a preferida na vida do poeta, aos nove anos o poeta foi morar na capital baiana Salvador no solar da Boa Vista, um lugar que iria se imortalizar em seus versos, palco de vários de seus poemas. Além de Salvador, também morou no Recife onde escreveu seu poema lírico “aves de arribação” onde descreve a alegria de estar neste lugar, morou ainda em São Paulo, Santa Isabel e no Rio de Janeiro, mas apesar da sua personalidade nômade o dia 14 de março de 1847 marcaria pra sempre o nascimento de um herói, esse marco nem o próprio poeta poderia mudar. 3.2 A ESCRAVIDÃO

A escravidão no Brasil foi um sistema de produção agrícola ou mineradora que se utilizava da mão-de-obra negra provenientes do continente africano onde já havia sido montado um articulado sistema de aprisionamento e renda dessas máquinas humanas. No Brasil a escravidão se inicia a partir do momento em que os portugueses obrigam os indígenas a trabalharem na retirada do pau-brasil quando estes se negam a trabalharem em troca de espelhos, facas... Quinquilharias que pouco valor tinha entre os nativos. Quando Portugal decide então colonizar o Brasil é trazido

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para as terras brasileiras o primeiro grupo de negros escravos começava aí o drama das terras brasileiras chamando escravidão cerca de 4 milhões aproximadamente de negros escravos foram trazidos para o Brasil o maior parte para o estado da Bahia, principalmente para a cidade de Salvador que na época da colonização era a capital do Brasil e capital do estado onde no século XIX iria resplandecer uma luz em um país de escuridão: o nascimento do poeta Antonio Frederico de Castro Alves ou simplesmente Castro Alves, o homem que exaltou a liberdade num país que aprisionava seus filhos.

A escravidão dos negros africanos tinha o consentimento das autoridades jurídicas e políticas, também convém lembrar que a Igreja Católica afirmava que os negros não possuíam espírito e por esse motivo a escravidão tinha autorização de Deus, sendo assim praticada por todos os ramos da sociedade e consentida por todos os tipos de influência: jurídica, política e religiosa. A escravidão foi para o Brasil um a época histórica muito importante para a economia, porem ao mesmo tempo ela foi também muito danosa para a sociedade. Para a economia ela foi muito importante, pois se dizia que os escravos eram os “pés e mãos” dos seus senhores, isso porque eram eles quem fazia movimentar a economia tanto da minas, quanto das fazendas ou mesmo das cidades, pois nenhuma atividade braçal era feita se não fosse pelas mãos dos escravos que eram vistos e tratados como simples maquinas humanas com a exclusiva função de fazer produzir riquezas dos seus senhores não lhes cabendo direito algum e em quase todos os casos eram submetidos a diversas formas de tortura, vivendo senzalas em condições sub-humanas, trabalham para seus senhores de segunda à sábado, mas não pense que nos domingos descansavam pois este era o dia que deveriam trabalhar para o seu próprio sustento caso não quisesse passar fome, caso se recusassem a trabalhar, a humilhação, a reclusos e a chibata resolviam esse problema, o pelourinho, um tronco grosso

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fixado no chão ereto, era visto pela sociedade opressora como um símbolo de justiça, pois era lá que se amarrava qualquer escravo desobediente para que pudesse ser punido, a punição era sempre variadas, chibatas no lombo ou queimava-se os lábios com um ferro avermelhado pelo fogo e misturado com muita humilhação pois era assistidas por uma plateia que adorava ver negros apanhando, às vezes, as surras eram fatais pois muitos não resistiam aos ferimentos e acabaram morrendo, se não morria no pelourinho, morria se curando devido a infecção nos ferimentos assim não resistiam e morriam, quando não morriam por causa das punições, e doenças morriam suicídio pois para muitos negros era preferível morrer do que viver tendo uma vida miserável, sub-humana, sem liberdade, ou uma alimentação digna de um ser- humano. 3.3 A TRAVESSIA DO ATLÂNTICO

Quem não morria nas terras do Brasil, morria em auto mar sem jamais pisar em solo brasileiro pois a viagem dos maiores que transportavam os negros da África para o Brasil era demorada e os negros eram sempre mal alimentados e mal alojados, amontoados nos portões dos navios Castro Alves retrata todo esse drama da travessia em o “navio negreiro” seu poema mais conhecido em um trecho dele afirma:

Ontem a Serra Leoa, A guerra, a caça ao leão, O sono dormido à toa Sob a tenda d’amplidão Hoje...o porão negro, fundo, Infecto, apertado, imundo Tendo as pestes por jaguar... E o sono sempre cortado Pelo arranco de um finado, E o baque de um corpo ao mar...

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Nessa estrofe do poema o poeta retrata essa terrível viagem, se utilizando de antítese, compara o ontem com o hoje, um sono dormido à toa com um sono sempre cortado; como tenda a amplidão com a peste por jaguar. De fato não era nada fácil deixar a liberdade e a vida que levavam por uma miséria vida escrava, ter de encarar o porão dos navios, infectos, apertados e imundos essa era a travessia onde os porões e qualquer espaço de um navio onde poderia caber uma pessoa se amontoava escravos e mesmo as perdas, que às vezes chegava a 40% da carga, era compensados pelos lucros que obteriam com o lucrativo comércio de escravos.

O transporte dos negros da África para o Brasil era demorado, por isso, resistir a uma travessia tão longa era mérito de poucos, esses navios que faziam o transporte, ou melhor, o tráfico de escravos era chamado tumbeiros devido ao grande número de mortes que acontecia em alto-mar nos navios. Os tumbeiros eram navios especializados no tráfico de escravos, toda uma estrutura era montada no navio para transportar escravos, os negros eram amontoados em fétidos porões, ali mesmo faziam suas necessidades fisiológicas, sem ventilação, bebendo pouca água, e quase sem nenhuma comida, onde as pessoas sem costume de navegar como os africanos acabavam adoecendo e morrendo e diante de tantas adversidades era difícil chegar vivo ao Brasil, os corpos eram lançados em alto-mar e ao chegar em, terra firme, muitos deles já tinham um destino para ir, quando já estavam vendidos e já possuíam um dono, os que ainda não tinham um dono eram expostos no mercado de escravos, não faltava compradores, e ali fossem vendidos. Essa era organização da escravidão. Hoje nos parece ser muito belo termos uma sociedade composta por negros e afrodescendentes, porém, eles vieram das maneiras mais desumanas, chegaram como simples mercadorias, trabalhavam como potentes máquinas e eram tratados e sempre morriam como animais essa situação de

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tantos horrores veio a influenciar o poeta Castro Alves em seus escritos, pertencentes ao período literatura que caracterizou o século XIX o Romantismo, sua vida foi marcadas por grandes lutas e frustrações, onde a poesia se tornou sua principal arma, o navio negreiro veio a se tornar seu poema mais famoso, aqui o poeta faz um retrato de um tumbeiro, mostrando todas as maldades sofridas pelos negros em alto-mar, faz no final do poema, uma crítica implacável ao Brasil que os escraviza e coloca os escravos na posição de desgraçados para evidenciar a condição desumana que se encontravam o trecho que faz critica diz:

Existe um povo que a bandeira empresta Pra cobrir tanta infâmia e covardia! E deixa-a transformar-se nessa festa Em manta impura de bacante fria!... Meu Deus! Meu Deus! Mas que bandeira é esta, Que impredente na gávea tribunal?!... Silencio!...Musa! chora, chora tanto Que o pavilhão se lave no seu pranto...

Em um outro trecho o poeta faz algumas dramáticas descrições:

“Quem são estes desgraçados” ... “hoje míseros escravos Sem ar sem luz, sem razão.

No continente africano esses desgraçados eram felizes, tinham seu modo de vida, mas tudo foi anulado quando passaram a ser escravos, por isso o navio negreiro é o mais dramática descrição da travessia do atlântico, que causava um grande impacto na mente de qualquer um que o contasse fosse lendo ou ouvindo o poema que sempre o poeta declarava em praças publica, comícios abolicionistas teatros, ou em qualquer lugar que tivesse a oportunidade pois possuía

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o dom de falar em público e além de bom poeta também era um bom orador, era como se o poeta buscasse fazer uma lavagem cerebral numa sociedade conservadora o que nos impressiona é que parece ter conseguido é uma “arma” muito poderosa foi a religiosidade, isso tem explicação pois a sociedade da época era extremamente religiosa, essa sociedade religiosa era a mesma que escravizava portanto não é de se estranhar que a religiosidade fosse usada como aliada nessa desesperada tarefa de pôr fim à escravidão e parecendo visualizar as atrocidades um verso exclamas: “Meu Deus! Meu Deus! Que horror!”

O poeta parece nos mostrar o quanto é horrível a escravidão, despertando a curiosidade do leitor, descreve uma cena infame e vil: “mas que vejo eu ali... que quadro de amarguras!”

Quando Castro Alves escreveu esse poema que retrata o tráfico negreiro, em 1864, esse tráfico já tinha sido proibido, havia 14 anos com a chamada lei Eusébio de Queirós, portanto, esse foi um poema fictício, Castro Alves nunca esteve as bordas de um tumbeiro, e com essa informação podemos deduzir que indiretamente o poeta expressa uma outra mensagem: que a travessia do oceano Atlântico da África para o Brasil era apenas o começo do sofrimento, pois ao chegar a vida dos escravos seria muito pior.

Em o navio negreiro o poeta descreve uma cena muito humilhante, onde os negros são forçados a dançar no convés do navio provocando gargalhadas na tripulação:

“Legião de homens negros como a noite”, “Horrendos a dançar...” “E ri-se a orquestra irônica, estridente...”

Também é descrito pessoas dançando até cair e quando alguém caia era à vez de o chicote funcionar, então concluem que o chicote funcionava sempre, pois as quedas eram comuns e constantes, assim é descrito em um verso:

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Se o velho arqueja... se no chão resvalo, Ouvem-se gritos... o chicote estala. E voam mais e mais...

Outro verso diz: “A multidão faminta cambaleia”, o poeta descreve uma cena de uma dança para alegrar a tripulação, uma dança em que seus dançarinos dançam descontes, forçados e famintos contra sua própria vontade.

Em uma outra estrofe o poeta descreve mulheres com suas crianças, mulheres com seios nus, e moças jovens, a bordo para satisfazer o apetite sexual dos marujos do tumbeiro, assim é descrito em uma outra estrofe:

Negras mulheres suspendendo as testas Magras crianças, cujas bocas pretas Rega o sangue das mães: Outras, moças... mas nuas, espantadas, No turbilhão de espectadores arrastadas, Em ânsia e magoa vãs.

Nessa estrofe são descritas crianças que ainda estavam sendo amamentadas, podemos perceber o quanto era sofrido para essas crianças chegarem vivas ao Brasil, pois se a mãe de uma das crianças que estava sendo amamentada morresse estava decretada sua sentença de morte e mesmo para os que não perdiam suas mães era difícil, pois se para um adulto viajar tamanha distancia, com cheiro da maresia incomodando o tempo todo, os porões imundos e abafados e sendo sempre castigados por enfermidades já era difícil para uma criança então era uma missão quase que impossível. Quando Castro Alves iniciou sua carreira de poeta a abolição era uma tendência que caminhava para a sua total consolidação, e que cada vez mais ganhava novos descontentes que exigia o fim da escravidão, por isso os poemas abolicionistas de Castro Alves tiveram grande difusão entre abolicionistas era como se

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lançasse a semente em um solo fértil e devidamente preparado para que ali pudesse germinar. Para o poeta Castro Alves a escravidão não representava apenas um atraso para a sociedade ou para a economia, mas era também sinônimo de horror. Um outro trecho de o navio negreiro:

Senhor Deus dos desgraçados! Dizei-me vós Senhor Deus! Se é loucura se é verdade Tanto horror perante os céus.

Vemos nessa estrofe do poema, que baseado naquilo que o poeta via de desumano na escravidão, ele interroga a Deus sobre tanta maldade, o poeta parecia não acreditar que Deus permita que pessoas adoradora dele praticasse a escravidão de seus irmãos, ou seja, “tanto horror perante os céus”, certamente o poeta duvidava que a escravidão tivesse a autorização divina para a sua pratica, pois se assim fosse Deus estaria autorizando “tanto horror perante os céus”, e porque o poeta afirma ser a situação dos escravos perante a sociedade, numa situação desgraçada, inferiorizada, onde a única posição que lhes cabia era a posição de escravos, e se são desgraçados perante a sociedade, são também desgraçados perante Deus, e porque o poeta parece não acreditar “se é loucura se é verdade, tanto horror perante os céus?” Devido a sua formação intelectual pois era um estudante de direito o que certamente o influenciou quanto a sua posição contraria a escravidão, talvez tivesse pensado: “Como seria bom se todas as pessoas tivessem o mesmo direito de liberdade independente da sua origem, etnia ou cor da pele.” Então o poeta observa a sociedade a sua volta a vê que a realidade não é bem esta como diz numa antítese de outra estrofe:

Ontem plena liberdade, A vontade por poder...

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Hoje ...cum’ lo de maldade Nem são livres pra... morrer...

Nessa estrofe o poeta fala do passado exaltando a liberdade e mostrando que os escravos já foram livres para fazer aquilo que queriam, pois tinham “ontem plenas liberdade, a vontade por poder”... Porem contrastando com essa antiga realidade, vemos na estrofe a nova realidade que não lhes dava nenhum direito, o poeta parece não acreditar haver no mundo algo tão cruel a maldade “cumulo de maldade.” Castro Alves o “revolucionário” que declarou guerra à escravidão e em seu “arsenal” de guerra o navio negreiro constituiu a sua “arma” mais poderosa nesse poema vemos o desespero de um homem empenhado em evidenciar e denunciar os horrores da escravidão em um outro trecho diz: “Meu Deus! Que horror!“ Eis um verso com um profundo sentimento melancolia e revolta, eis um verso que podemos perceber dois aspectos: o religioso e o criminoso, ou desumano, a horrível sena a qual o poeta deixa transparecer parece não agradar em nada o próprio poeta e consequentemente quem tivesse contato com o poema e chocar as pessoas descrevendo as cenas de tantas humilhações e crises, era o principal objetivo do poeta para que toda a sociedade, incluísse os mais conservadores se revoltassem e se pusessem contra a escravidão exigindo seu fim definitivo repare no tom de tristeza de outro verso:

Lá nas areis infindas, Das palmeiras no país, Nasceram crianças lindas, Viveram moças gentis... Passa um dia a caravana, Quando a virgem na cabana Cisma da noite nos véus... ...adeus! ó choça do monte! ...adeus! palmeiras da fonte!

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...adeus! amores...adeus!...

Essa é uma estrofe com um elevado grau de melancolia, até podemos visualizar a personagem nessa cena triste recordando da sua terra natal, da onde foi tirada à força para trabalhar como escravo nas terras brasileiras, essa tristeza é aumentada ainda mais ao recordar desse passado como um momento feliz, a evidência dessa felicidade esta no verso que falam de areias infindas, o que mostra liberdade, de palmeira no país, o que mostra beleza do lugar, de criança lindas, que mostra a felicidade fraternal, moças gentis e virgens na cabana, o que mostra uma feliz vida social, essa tristeza aumenta ainda mais quando vemos na estrofe a personagem falando da choça, da fonte, e de amores, porém, são sempre antecedidos pela palavra “adeus”, era um adeus à sua terra de origem, deixariam a África para viver no Brasil, deixaria a choça para viver na senzala, deixaria a liberdade tão valorizada para viver cativos, essa com certeza não era uma troca vantajosa e o pior de tudo é que essa troca por imposição obrigatoriamente se trocava a liberdade tão valorizada pela escravidão tão horrorizada, esse tipo de troca desvantajosa era imposta a todos os africanos “convocados” para trabalhar no Brasil, esses novos trabalhadores “convocados” não poderiam esperar muito coisa no seu novo lar a senzala, a não ser uma vida muito sofrida, tanto que ao final do poema Castro Alves escreveu na última estrofe: “mas é infâmia de mais”, essa era a visão infame que o poeta quis passar para a sociedade com relação à escravidão que era infamai de mais, adquirindo esta visão a sociedade se perguntaria: “porque não findar algo tão infame?” Veja como poeta termina a última estrofe do poema:

Mas é infâmia de mais...Da etérea plaga Levantai-vos, heróis do Novo Mundo... Andrada! Arranca este pendão dos ares! Colombo! Fecho a porto de teus mares!

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Com essas palavras Castro Alves finda seu poema mais conhecido, nesse final ele deixa transparecer abolição como sendo um grande desafio, uma quimera, um grande problema longe de uma solução, talvez uma utopia vemos isto quando o poeta recorre aos heróis do novo mundo: José Bonifácio e Cristóvão Colombo, pioneiro do descobrimento. O navio negreiro é considerado um poema épico, escrito por autentico herói.

3.4 O POETA VISIONÁRIO

Castro Alves foi um poeta que lutou em uma luta muito adversa, pois a sociedade necessitava do trabalho dos escravos, mas a partir da Revolução Industrial na Inglaterra em meados do século XVIII a escravidão passou a ser vista como um atraso para a economia, pois a própria Inglaterra era tida como um exemplo de desenvolvimento e onde não se praticava mais a escravidão, portanto, a abolição era um avanço para o Brasil e essa visão de progresso com a abolição colocou Castro Alves como um visionário, que fundou uma sociedade secreta de abolicionistas juntamente com Rui Barbosa e conviveu com célebres nomes da literatura como José de Alencar e Fagundes Varela, escritor e poeta romântico respectivamente. O movimento Romântico foi o que pertenceu a Castro Alves, um movimento completo, bem diversificado onde Castro Alves de tornou a voz mais retumbante. Por pertencer ao Romantismo seus poemas refletem a influência do byranismo e do spleen, porem, elaborar um estilo próprio na poesia que o identifica com a Condor, ave nativa da cordilheira dos Andes e símbolo da liberdade. Também escreveu poesia lírica com um estilo todo peculiar, o chamado lirismo-erótico, estilo no qual se descreve sempre sua amada destacando suas partes intimas como seios, espáduas, cabelos, lábios, etc. demonstrando muita sensualidade, oi destacando ações ou situações de intimidade.

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Castro Alves foi um grande defensor das coisas relacionadas com o povo como, por exemplo, a Republica em seu poema o sibarita romano o poeta coloca a monarquia imperial numa situação de muita opressão, tenta mostrar através de seus versos que esse sistema político é sanguinário por ser sinônimo de escravidão. A República era vista na época como a solução dos problemas do Brasil, uma utopia é claro, mas o certo é que a República era um avanço necessário para a época.

Castro Alves foi sinônimo de povo, no poema o povo ao poder ele afirmou: “a praça é do povo”, hoje depois de mais de um século da sua morte o seu legado literário e cultural ainda é visível, hoje sabemos que Castro Alves foi o erudito mais popular da nossa história, um abolicionista exaltado que deu às suas poesias esse tom exaltado, retórico, era poesia pra serem gritados no comício. Talvez lhe doesse viver num país que tanto amava, mas que ao mesmo tempo dava manutenção ao sistema escravocrata, sua personalidade era muito radical, pois sendo tão nacionalista não se limitou a apenas falar bem da sua pátria, demonstrando apenas as belezas que o Brasil possuía como fez Gonçalves Dias um outro poeta do Romantismo que pertence à primeira geração romântica, ao contrário, Castro Alves pôs as belezas da natureza como cenário, mas sem deixar de pôr em foco as mazelas da nação, num nacionalismo bem radical, pois não bastava para Castro Alves apenas falar bem do Brasil, pois o país passava longe do perfeito, do ideal, para o poeta apenas falar bem da pátria era uma posição ingênua em se tratando de política, contraria a sua visai crítica na sociedade da época. Posicionou-se contra a guerra, sendo solidário a alguns conflitos de sua época como a guerra do Paraguai e aos refugiados de guerra franco-prussiana, ou seja, o poeta da liberdade foi também o poeta da paz, mas foi como o poeta dos escravos que Castro Alves se destacou sendo seu nome citado também como um pré-realista, pois sendo pertencente

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do Romantismo um movimento que idealiza, tenta expressar perfeição e exaltar as emoções, o Realismo se opôs ao Romantismo por expressar uma sociedade não como deveria ser, ou como sendo perfeito, mas o Realismo se preocupou mostrar como realmente a sociedade era como todas as suas mazelas, defeitos, desigualdades. O Realismo não mostrou a sociedade voltada à um mundo erudito, das elites, dos palacetes, mas para a sociedade periférica um mundo de impureza de imundices, se diz que o realismos foi a expressão da real sociedade com suas imperfeições, Castro Alves foi um pré-realista, um precursor do Realismo por ter escrito sobre a grande mazela da sociedade chamada escravidão. Além do dom literário voltado para a poesia, Castro Alves também tinha outros dons como a pintura e o teatro, pinta várias telas sendo sua obra-prima mais conhecida e para o teatro deixa a obra: Gonzaga e a Revolução de Minas que lhe valeu uma homenagem em Salvador, sendo dado seu nome em um teatro da capital baiana.

Como poeta dos escravos escreveu quarenta e dois poemas abolicionistas, estilo no qual fez seu nome ser muito conhecido, e se tornou um visionário ao escrever poemas como o século que diz: “o século é grande”, em alusão à agonia da abolição que caminhava em passos lentos até seu fim definitivo em 1888 quando princesa Isabel iria assinar a Lei Áurea, a lei mais conhecida na História do Brasil e quer definitivamente colocaria fim a escravidão, há quem pense que a princesa Isabel foi a grande heroína da abolição por ter assinado essa lei; porém, se considerassem essa hipótese estaremos ocultando uma página muito bonita e importante na nossa história, pois a escravidão poética não é apenas uma força de expressão, ela pôde e hoje ainda pode ser vista por quem a pesquisa. A escravidão poética foi uma luta na qual os poemas abolicionistas de Castro Alves, o grande herói da abolição, foram usados como uma “arma” para se vencer a guerra, simbolicamente falando é como se Castro Alves

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tivesse excitado a sociedade à escravidão organizada um exército popular, abastecendo-o com armas, munição e mantimentos, liderado as tropas como comandante revolucionário e por fim elaborado a estratégia em campo de batalha, e então nos cabe uma pergunta: se Castro Alves fez tudo isso onde então aparece a princesa Isabel, qual foi sua importância? O papel dela foi simbolicamente falando foi apenas representar o Brasil, assinar um tratado de paz pondo fim à guerra, 17 anos depois da grande herói Castro Alves já ter falecido, porém, a princesa Isabel não teve um papel tão importante no processo da abolição quando Castro Alves, pois ela apenas obedeceu a vontade de uma sociedade que pedia pelo fim da escravidão; enquanto que castro Alves lutou por uma causa nobre, mas também muito adversa, isso porque em sua época a sociedade ainda desejava a manutenção do sistema escravocrata, a causa era nobre mas a luta era desigual: de um lado estavam os ex-escravos alforriados, os mulatos livres, os intelectuais e alguns poucos que eram contra a escravidão do outro lado estavam os grandes latifundiários, senhores de escravos, empresários, comerciantes, políticos e autoridades; esse segundo grupo era o grupo que detinha o poder e a influência, portanto, era o grupo mais forte, aqueles que desejavam a manutenção da escravidão, por certo os diversos ramos da economia necessitava da mão – de –obra escrava, esses eram os primeiros que se opuseram à abolição, porém, os poetas abolicionistas de Castro Alves eram obras cultas, escritos geralmente para leitores cultos e os filhos fazendeiros, de comerciantes, de autoridade e políticos eram esses leitores, pois eram eles que tinha condições de buscar uma formação mais ampla, mais ampla então foram de filhos dos conservadores escravocratas que tinham o papel de quebrar esse elo de perpetuação do sistema escravocrata, é claro que esse elo não se quebrou de um hora pra outra, mas uma vez quebrado em uma família, conservadora, era extinto pra sempre, e uma vez germinada essa semente da abolição

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esse novo abolicionista passava essa semente adiante trazendo baixas no lado conservador. Em seu poema o século em que Castro Alves afirma: “o século é grande”, vemos o seu lado visionário em que expressa a agonia da escravidão pelo século XVIII, em 1850, cedendo às pressões internas, por parte dos abolicionistas, e principalmente às pressões externas por parte da Inglaterra o império brasileiro aprovou a lei Eusébio de Queiros, com a promulgação dessa lei estava proibido o tráfico de escravos da África para o Brasil, o pesadelo da travessia do atlântico chegar ao fim, essa lei assinada devido ao fato de que em 1845 foi assinado no parlamento inglês a lei chamada de Bill Aberdeen, por essa lei a marinha inglesa torna-se a política dos mares, com direitos totais para prender qualquer embarcação que fosse flagrada traficando escravos seja no mar, ou mesmo nas portas. A lei Eusébio de Queirós acabou oficialmente com o tráfico de escravos, mas não com a própria escravidão, a partir da data de promulgação dessa lei o negro não viria mais da África para o Brasil, mas essa necessidade seria suprida quando se passou a estimular a natalidade entre os escravos forçando as moça desde muito cedo engravidar, escolhendo reprodutores entre os mais fortes e saudáveis ou concedendo regalias aos casais que tivessem um número grande de filhos que iriam se tornar escravos, como se vê a partir dessa lei os escravos passariam a ver “produzidos” nas próprias terras brasileiras, mas essa baixa entre conservadores não seria suficiente para conter os ânimos dos abolicionistas, por isso em 1854, quatro anos após se proibir a exportação de escravos para o Brasil, o império brasileiro promulga outra lei dando mais um golpe na luta contra a escravidão, era a lei Nabuco de Araújo, essa lei dava amplos poderes à marinha brasileira para impedir o tráfico clandestino de escravos, prendendo até mesmo navios estrangeiros que ousasse traficar escravos para o Brasil. Essas leis não foram suficientes para calar a voz dos abolicionistas nem tampouco as pressões provenientes da Inglaterra assim

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foi promulgada, em 1871, a lei do Ventre Livre, essa lei declarava livre todo filho de escravo nascido a partir da data de sua promulgação, toda criança filho de escravo nasceria livre mas a liberdade só era conquistada na teoria, porque na prática ainda continuavam tendo muita dependência dos senhores de seus pais, pois sendo ainda criança não poderiam deixar de viver com seus pais que moravam na senzala.

A Lei do Ventre Livre para se celebrar a vida, mas ironicamente essa lei seria promulgada no mesmo ano que o grande herói da abolição conheceria a morte no ano de uma lei que exaltava a vida o poeta Castro Alves iria exaltar a sua própria morte, era a consolidação do spleen daquele que recebeu influência do byronismo mas os seus ideais não seriam levados para i seu tumulo em sua morte. Castro Alves sabia todas essas leis que pode presenciar coem paliativas, eram “leis pra inglês ver” por isso as lutas das suas épocas foram sempre tratadas com seriedade e inconformismo, com um teor tão radical a ponto de se tornar um fora da lei, não que tenha cometido algum crime, mas porque a escravidão tinha o consentimento das autoridades da época, portanto, lutar contra a escravidão era ir contra as autoridades estando sujeito a uma repreensão legal ou mesmo a ser preso. Isso foi só um pouco da vida de um homem que gritou alto pra reprovar a escravidão, um herói que morreu antes de ver seu sonho de liberdade realizado, e que além de poeta tornou-se um visionário, sendo essa visão futurista confirmada em um outro poema também muito conhecido: “O Vidente”. 3.5 UM CULTO A LIBERDADE

O poema a vidente é um poema que mistura religiosidade e abolição por isso também podemos chamá-lo de culto à liberdade, talvez nesse poema Castro Alves tenta nos mostrar que nada no mundo é mais importante do que a liberdade por isso ele a mostra como sendo segredo.

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Esse poema é uma visão que o poema tem do futuro, onde ele se descreve num lugar isolado, onde começa então citar coisas relacionadas com o futuro e assim num santo êxtases traz o futuro diante dos seus olhos:

Tudo me diz que o Eterno, na idade prometida, Há de beijar na face a terra arrependida. E, desse beijo santo, desse ósculo sublime. Que lava a iniqüidade, a escravidão e o crime, Hão de nascer virentes nos campos das idades, Amores, esperanças, glorias e liberdades!

Esse é um trecho do poema que legitima o poeta Castro Alves como um visionário, que iria no poema ao mesmo tempo endeusar a liberdade e fazer previsões furas, por várias vezes cita Deus no poema, no trecho o chama de Eterno, também faz alusão a Judas Iscariotes, o famoso traidor de Jesus, identificando-o com o Brasil e citando a ocasião em que Judas trai Jesus com um beijo, numa verdadeira traição da terra arrependida, chamada Brasil escravizando seus irmãos, parece que para o poeta tudo iria se consumar quando a abolição realmente chegasse até as terras brasileiras assim a abolição veio a ser “o beijo santo, o ósculo sublime que lava a iniquidade, a escravidão e o crime”, e mais do que isso a escravidão é posta numa condição pior do que qualquer crime que a sociedade possa ter cometido e assim “hão de nascer viventes nos campos das idades”, pois o crime não era da sociedade que praticava a escravidão mas das autoridades que a legitimava e que era contra qualquer lei que pudesse fim à escravidão evitando o Brasil de ter “amores, esperanças, glorias e liberdades”, ou seja, o tempo da abolição viria a ser o tempo de uma pátria perfeita o que era uma utopia e Castro Alves sabia disso como atesta nesse verso:

“E, ouvindo nos espaços as louras utopias Do futuro cantarem as doces melodias,...”

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Certamente o poeta não via a abolição como uma utopia, como a solução dos problemas dos problemas do Brasil, mas era necessidade e que sua manutenção era um grande atraso para o país que buscava avançar, progredir, por isso o poeta se descreve viajando até uma época de liberdade:

Então me arrojo ousado das eras através, Deixando, estrelas, séculos, volverem-se a meus pés... Porque em minha alma sinto ferver enorme grito, Antes o estupendo quadro das telas do infinito...

Quando ousadia tinha na pessoa de Castro Alves! Repare na ousadia nessa parte do poema ele se coloca como um privilegiado por ser livre, mas ao mesmo tempo inconformado, sentia em “sua alma ferver enorme grito”, que protestava contra a escravidão. Em sua visão o poeta cita ver um “estupendo quadro”, diante dele que quadro é este? Em outro verso o poeta responde o que vê: “eu vejo a terra livre”. Essa liberdade que o poeta ali contemplava é misturada com a tristeza, é uma “triste liberdade” onde o poeta cita Madalena “curvada aos pés da cruz”, logo após essa citação triste o poeta faz um quadro coletivo:

No mundo-tenda imensa da humanidade inteira Que o espaço tem por teto, o sol tem por lareira, Feliz se aquece unida a universal família Oh! Dia sacrossanto em que a justiça brilha,

Talvez nesses versos esteja a mais perfeita descrição da humanidade já feita pelo poeta Castro Alves onde ele relata a humanidade inteira compartilhada de uma mesma tenda: o mundo, de um mesmo texto: o espaço, de uma mesma lareira: o sol, e a humanidade é descrita como a universal família feliz e unida, esta é a visão de um dia sacrossanto em que a escravidão terminou, e que a justiça brilhou. Em seguida o poeta relata um aparente dualismo entre a fé e a razão:

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Não mais inunda o templo a vil superstição A fé a pomba mística - e a águia da razão, Unidas se infinito voando em noite calma.

Porém podemos ver que não ocorre um dualismo, e sim, uma parceria ente a fé e a razão “que unidas se levantam (...) voando em noite calma”. E a escravidão coube apenas a horrível posição de vil superstição, não lhe cabendo espaço entre a fé, ou entre a razão. Apesar do nome do poeta ser o vidente de culta à liberdade, onde o poeta atua também como profeta e faz várias citações simbólicas do cristianismo e ao final do poema diz:

Enfim a terra é livre! Enfim lá do Calvário A águia da liberdade, no imenso itinerário. (...) Quebraram-se as cadeias, é livre a terra inteira, A humanidade marcha com a Bíblia por bandeira; São livres os escravos... quero empunhar a lira, Quero que esta alma ardente um canto audaz desfira, (...).

Na previsão de ver findada a escravidão o poeta se vê comemorando este momento glorioso fazendo aquilo que mais gostava declamando poesia, é o “empunhar a lira” que o poeta tanto desejava fazer pra se comemorar a fim da escravidão. Mas acordando desta previsão futurista o poeta se retrata na triste realidade do presente escravocrata, com atesta na última estrofe do poema:

Mas, ai! Longos gemidos de míseros cativos, Tinidos de mil ferros, solução convulsivos, Tem-me bradar nas sombras, como fatal vedeta: “Que pensas, moço triste? Que sonhas tu, poeta?” Então curvo a cabeça de raios carregados, E, atando brônzea corda à lira amargurada, O conto de agonia arrojo à terra, aos céus E ao vácuo povoado de tua sombra, ó Deus!

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Esse é o relato mais triste que o poeta faz de si mesmo em seus poemas abolicionistas, onde vê a abolição como um sonho, onde “curva a cabeça de raios carregada”, pois parece ver este sonho longe da sua realização, e se entristece ao ver a poesia sendo amarrada pela escravidão que está “atando brônzea corda a lira amargurada”, a brônzea corda era assim como o pelourinho, um dos símbolos máximo da poesia, mas ao invés de versos de comemoração pela abolição, o que “consola” o poeta é um “canto de agonia que arroja à terra, aos céus” e finda o poema sendo o espaço sendo preenchido pela escravidão sombria, é “o vácuo provocado da sombra de Deus, esta é uma alusão de uma citação bíblica, mas que é mostrada contraria às sagradas escrituras que afirma “que Deus é luz, e não nele treva nenhuma.” (1º João: 1: 5)

Esses foram apenas alguns fragmentos de um poema que atesta ao poeta Castro Alves como um visionário, o vivente o coloca como um sacerdote promovendo um culto à liberdade, reprovando a escravidão, e exaltando a abolição.

Porém é impossível falarmos de escravidão e liberdade sem falarmos dos quilombos, onde o de Palmares se destacou. 3.6 OS REDUTOS DA LIBERDADE

Os quilombos eram os locais em que na época da escravidão reunia os negros que fugiam da opressão e dos maus tratos contidos na escravidão. A palavra quilombo é de origem africana, na África essa expressão seria para designar um acompanhamento de guerreiros, no Brasil ganhou um novo significado, passou a significar um aglomerado de escravos onde os negros organizam-se economicamente, sócio e politicamente. Os quilombos espalhavam-se por todo o país, sendo o lugar onde os escravos, que fugiam dos maus tratos, depositavam suas esperanças de levar uma vida com

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liberdade. Essa luta pela liberdade veio a impressionar o poeta Castro Alves que fez uma homenagem ao quilombo dos Palmares com o título:

Saudação a Palmares, um poema na qual Castro Alves faz um relato da vida heroica desses guerreiros que viveram no quilombo dos Palmares:

Nos altos cerros erguidos Ninho d’águias atrevido, Salve-País do bandido! Salve-Pátria do jaguar Verde serra onde os palmares Como indianos cocares No azul dos colúmbios ares Defraudam-se em mole arfar!...

Ergueram suas choças e se atreveram viver com liberdade, por isso o poeta saúda o quilombo como sendo o país do bandido e a pátria do jaguar, o jaguar (onça pintada) por ser um animal predador e muito robusto é posto como um símbolo da bandidagem e foi ali na “verde serra onde os palmares (...) desfraldaram-se em mole arfa!...” provando enfim a liberdade. Em outra estrofe o poeta faz um relato sobre a luta pela defesa do quilombo:

Palmares! A ti meu grito! A ti baça de granito. Que no soçobro infinito Abriste as velas ao trovão. E provocaste a rajada, Solta a flâmulas agitadas Aos ruivos da marujada Nas ondas da escravidão!

Aqui nesta parte do poema o poeta deixa de identificar Palmares com um ninho de águias para identificá-lo com uma “barca de granito abrindo a vela ao trovão,” isso era o mesmo

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que dizer que o quilombo estava partindo para a guerra. Ao final do poema o poeta retrata o quilombo de Palmares descansando após a vitória heróica:

Salve, Amazona guerreira! Que na rocha da clareira, Aos urros da cachoeira Saber bater e lutar... Salva-se! Nos cerros erguidos Ninho, onde em sono atravido, Dorme o condor... e o bandido!... A liberdade... e o jaguar

Essa foi a estrofe onde Castro Alves conclui sua homenagem ao quilombo de Palmares, um lugar onde se ousou sonhar com a liberdade, onde se atreveu dormir como guerreiros rudes e heróis. 3.7 O GRITO DOS OPRIMIDOS

Como poeta dos escravos Castro Alves foi um literato perfeito, pois só ele conseguiu transformar a senzala em poesia, só ele retratou de forma trágica a viagem da África para o Brasil, ele também atuou como um visionário prevendo o dia em que seriam livres os escravos, também fez bela homenagem aos heróis guerreiros do quilombo dos Palmares; e também as dores das mães e das crianças escravas em vários de seus poemas; mas para Castro Alves ser realmente perfeito como literato, como poeta dos escravos; faltava mostrar a dor de todo um continente escravizado, faltava mostrar que a África era um lugar de sonhos e felicidade, faltava mostrar que o continente africano sofria as dores de toda uma população discriminada pelo braço opressor da escravidão, ao escrever um outro poema abolicionista também de grande divulgação chamado Vozes D’África já não falta mais nada a Castro Alves, tornar-se um perfeito poeta abolicionista.

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Vozes D’África é um poema que mostra o continente africano discriminado, numa posição subversiva dos demais continentes e a América é mostrada como uma traidora e não é de se estranhar que para o poeta assim seja, pois era um grande patriota, a independência do Brasil era um fato recente e para um país que recém se libertara dos laços coloniais com Portugal era inaceitável que escravizasse uma população.

Vozes D’África é o grito de um continente ao qual ninguém jamais inclinara seus ouvidos, nem o próprio Deus como diz a primeira estrofe do poema:

Deus! Ó Deus! onde estas que não respondes? Em que mundo, em que estrela tu t’escondes Embuçado nos céus? Há dois mil anos te mandei meu grito, Que embalde desde então corre o infinito... Onde estas, Senhor Deus?...

Na primeira estrofe vemos o poeta interrogando a Deus sobre a sua localização e não sobre sua existência, o poeta coloca Deus como estando escondido nos céus a pondo de não ouvir o grito lançado há dois mil anos, numa referência da escravidão praticando pelo império romano, e que em vão corre o infinito sem que ninguém o ouça.

Vejamos algumas estrofes onde o poeta descreve os continentes colocando todos os outros em posição privilegiada em relação à África:

Ásia: Minhas irmãs são belas, são ditosas... Dorme a Ásia nas sombras voluptosas Dos havens do sultão Ou no dorso dos brancos elefantes Embala-se coberta de brilhantes Nas plagas do Hindustão (...) Europa: A Europa é sempre Europa, a gloriosa!... A mulher deslumbrante e caprichosa,

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Rainha e cortesã, Artista-corta o mármor de Carrara; Poetisa-tauge os hinos de Ferrara No glorioso afã!... América: Hoje em meu peito a América se nutre Condor que transformara-se em abutre, Ave da escravidão, Ela juntou-se às mais... irmã traidora Qual de José os vis irmãos outrora Venderam seus irmãos. (...) África: Como o profeta em cinza a fronte envolve, Vela a cabeça no areal que volve O siroco feroz... Quando eu eu passo na Saara amortalhada... Ai! Dizem: lá vai África embuçada No seu branco abornoz

Antes de fazer qualquer descrição sobre a África o poeta fala dos demais continentes como sendo irmãos da África, mas em situação totalmente contraria a situação do continente africano, são as irmãs belas e ditosas da África onde a Ásia é descrita como um continente cheio de rolúpio devido a poligamia praticada pelos árabes e pregada pelo islamismo, essa poligamia transformou a Ásia num continente sinônimo de prazer, em contraste com a África sinônimo de sofrimento, Ásia também é mostrada como um continente cheio de riquezas “coberta de bilhetes”, situação contraria a da África cheio de pobrezas.

A Europa é apresentada de forma especial diante dos demais continentes, cheia de qualidades “é sempre a Europa, a gloriosa, deslumbrante, caprichosa, rainha, cortesã, artista, poetisa” (...), um continente cheio de pompa e formalidades.

A América é apresentada como “a irmã traidora que se juntaram as mais...”, estranhamente o poeta não aponta qualidades para o continente americano, mas como um lugar

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que retrocedeu onde o “condor transforma-se em abutre” e onde ao invés de voar o símbolo da liberdade (o condor) voa a “ave da escravidão (o abutre). Por fim o poeta faz na estrofe uma citação bíblica sobre a história de José, filho de Jacó que tivera doze filhos sendo um deles, José, vendido como escravo pelos próprios irmãos a um oficial do Faraó egípcio (Gen. 37: 1- 36).

Por fim o poeta faz um retrato da África, mostrando-a numa situação fúnebre, passando “no Saara amortalhados”, exclamando um “ai” de dor, e ouvindo comentários sobre sua situação, percebe-se que o mundo a fora a vê de forma disfarçadas, escondida, escondida “no seu branco abornaz” , uma roupa típica dos povos nômades do Saara, uma visão distorcida do continente se lermos a estrofe seguinte:

Nem vêem que o deserto é meu sudário, Que o silêncio campeia solitário Por sobre o peito meu Lá no solo onde o cardo apenas medra Boceja a Esfinge colossal de pedra Fitando o morno céu.

Essa é a real imagem do cotidiano africano descrito pelo poeta, em sua visão o deserto do Saara era o sudário na qual o silêncio campeia, o sudário é um pano usado para envolver cadáveres, campear é navegar à procura, assim vemos um quadro “ultra desértico” onde o silencio solitário vaga é procura numa região de cadáveres, nada poderia ser mais, nada poderá ser mais desolador do que uma imagem como está para caracterizar o continente africano, um continente que não tinha se quer o direito de chorar, como diz este verso:

Mas meio das areias esgarrada, Perdias marcha em vão! Se choro! Bebe o pranto a areia ardente;

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Não descubras no chão...

Sentindo as mesmas dores de todo um continente, o poeta se coloca como sendo a própria África triste e abandonada, um continente sem vez, lançado a própria sorte perdida a marchar em vão. E nem era menos, pois afinal a África ainda é hoje um continente vítima da exploração, opressão e discriminação por parte dos países desenvolvidos, na época em que o poema foi escrito, no século XVIII, a escravidão era sinônimo de tudo isso e de mais um pouco, era sinônimo de desgraça, era um continente que quando chorava “bebia o pranto a areia ardente” de forma que Deus não a percebesse. Toda essa desgraçada vivenciada pelo continente africano era resultado da crueldade de outro continente, como comprova o poema em outro verso:

Vi a ciência desertar do Egito... Vi meu povo seguir – Judeu maldito – Trilho de perdição. Depois vi minha prole desgraçada Pelas garras d’Europa – arrebatada – Amestrado falcão!

A Europa, nessa estrofe é identificada com a facção, uma ave de rapina que vem piedade captura suas presas no ar, sem nenhuma piedade os europeus também capturavam os africanos e os levaram do seu continente para se tornarem escravos durante várias gerações, é a “prole desgraçada” levados por um “amestrado falcão”. O poeta faz também um relato histórico de épocas importantes da história em que se passou no continente africano como quando o Egito foi um lugar de avançada ciência e de quando os judeus foram escravizados também n Egito pelo Faraó.

Castro Alves não foi sequer um descendente de escravos, ainda assim foi um convicto abolicionista isso fez dele um homem notável, um jovem com um espírito

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revolucionário borbulhando dentro de si, alguém que mesmo sem jamais ter ido ao continente africano tomou as dores de toda uma raça oprimida e discriminada, assim, Vozes D’África é, não somente o grito de lamentos de um continente sem voz, mas também o desabafar de um poeta revolucionário que igualmente sofreu suas dores e a canalizou com todas as suas forças na causa abolicionista. No livro poesia completa de Castro Alves, com preferência de Manoel Bandeiras, intitulado: Noticia Sobre o Poeta por Manoel Bandeira é dito: (Vozes D’África) “é uma soberba apostrofe do continente escravizado, a implorar justiça de Deus. O que indignava o poeta era ver que o Novo Mundo, “trabalho para as grandezas, para crescer, criar subir”, a América, que conquistara a liberdade com formidável heroísmo, se manchava no mesmo crime da Europa.” 3.8 UMA TRISTE MELODIA

Quando Castro Aves faleceu em 1871, muita coisa no processo abolicionista ainda estava por acontecer, em 1885 foi publicado o livro Os escravos, uma “arma literária” na luta abolicionista como afirmou Manoel Bandeira em seu já referido prefacio: “Vulgarmente melodramática na desgraça, simples e graciosa nas venturas, e que constituía o genuíno clima poético de Castro Alves era o entusiasmo da mocidade apaixonada pelas grandes causas da liberdade e da justiça.” Em 18 foi promulgada no parlamento a lei Saraiva de Categipe ou a lei dos Sexagenários, talvez a lei antiescravista mais paliativa assinada pelo parlamento pois só alforriava os escravos que atingissem a idade de 60 anos o que praticamente impossível para um escravo que tanto trabalhava e quando ultrapassava os 60 anos ainda tinha de trabalhar por mais três até pagar sua liberdade, vendido esse o dono do escravo recebia uma indenização do governo central, o que era um ótimo negócio pois em idade avançada o escravo ancião já não

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tinha mais condição físicas para trabalhar, e assim seu dono livre de qualquer obrigação como vestimentas, alimentação ou vigilância. Esses acontecimentos se passaram após a morte do poeta como a publicação do seu livro abolicionista “os escravos”, e a promulgação da lei dos sexagenários, porém, antes de sua “apoteose” escreveu um poema que iria concluir o seu livro abolicionista. 3.9 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Brasil é um país que na atualidade busca acabar com o racismo, numa sociedade onde negros e afro–descendentes constituem boa parcela da população se torna inadmissível que haja racismo no Brasil, portanto, acabar com o racismo se torna uma necessidade e por tudo que fez Castro Aves com suas obras é um ótimo exemplo pra chegar a este objetivo, este trabalho visa contribuir pra isso, mostrando como foi a luta de toda nação brasileira para dar liberdade aos escravos e como o papel de Castro Aves nessa luta, certamente sua contribuição foi valiosíssima, tendo seu legado chegado até os nossos dias analisando suas obras chegamos a seguinte conclusão de que os escravos de ontem os negros de hoje como também o poeta Castro Alves e seus leitores abolicionistas de ontem os admiradores de hoje são todos brasileiros e esse feito está acima de quer fisionomia de hierarquia.

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REFERÊNCIAS ALVES, Castro. Poemas completos. São Paulo, Ediouro, 1995.

BÍBLIA. A Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 1985.

PEIXOTO, Afrânio. Castro Alves: o poeta e o poema. 5. ed. São Paulo, ed. Brasília, 1976.

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IV

OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA NO REGIME MILITAR

Alécio Barbosa*

Valdenir Prandi** RESUMO: A intensão desse artigo é explorar a educação no Brasil no período do regime militar. Começando com uma contextualização histórica da educação brasileira. O golpe teve apoio principalmente da classe dominante, das grandes empresas e também de quem governava os Estados Unidos

* Tem experiência na área de Geografia, com ênfase em Geografia, atuando principalmente nos seguintes temas: ensino agrícola, monitoramento ambiental e processo erosivo. E-mail: [email protected]. ** Possui Licenciatura Plena em Filosofia pela Faculdade Padre João Bagozzi - (Registrado Ministério da Educação Universidade Federal do Paraná) (2011-2013). Atualmente é professor - Secretaria de Educação do Estado do Paraná. Possui Licenciatura Plena e Geografia pela Faculdades Integradas da Terra de Brasília - Brasília - DF (2007 - 2009). Possui Licenciatura Plena em Pedagogia (Segunda Licenciatura) pelo Centro Universitário de Jales (UNIJALES) - Jales - SP (2015 - 2016). Pós-Graduação modalidade Lato-Sensu: Centro Universitário Leonardo da Vinci (UNIASSELVI): Metodologia de Ensino de Filosofia e Sociologia - Indaial - SC (2014 - 2015). Faculdade da Aldeia de Carapicuíba (FALC) Pós-Graduação em Deficiência Intelectual, Auditiva e Visual e a Prática Educativa Inclusiva - Carapicuiba - SP (2014 - 2015). Faculdade União Cultural do Estado de São Paulo (UCESP - Faculdade) Pós-Graduação em Educação ambiental e Sustentabilidade - Araçatuba - SP. (2015-2016). Participação em Cursos e Eventos - Participou do Curso de Capacitação do Programa Qualificação Pedagógica, Secretaria Municipal de Educação de Grandes Rios - PR. (2011).

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na época. Nesse período algumas palavras eram comuns em destaque, autoritarismo, exclusão da classe popular. Nesse período a educação privada se expandiu, as empresas particulares que diz respeito a educação, tiveram legal ordem, e a educação virou um grande negócio. Os governos militares deixaram de subsidiar a educação pública que é gratuita para o povo de classe mais baixas e passarem a transferir recursos que era público para o privado. Esse foi um dos legados que o regime autoritário deixou para todos nós que somo brasileiros. PALAVRAS-CHAVE: Educação. Regime militar.

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INTRODUÇÃO

A educação no Brasil passou por vários períodos de instabilidade, mas o que ficou marcado na história e que se comenta até os dias hoje, foi sinceramente o período da ditadura militar, os anos que o Brasil foi governado pelos militares e que esse período deixou marcas na sociedade em que vivemos até hoje. Época onde as pessoas não tinham direito de se expressarem, colocar suas opiniões ou ter a sua liberdade de expressão.

A metodologia desse artigo procura analisar referências bibliográficas, suas fontes durante esse período da educação. A justificativa desse artigo é mostrar de que forma a educação pode ser tratada no período da ditadura militar, principalmente pelos governantes da época onde foi parar palavras como liberdade de expressão, que não tinha essa época.

O objetivo geral desse artigo foi fazer uma análise da educação no período da ditadura militar. Já o especifico foi procurar trazer e analisar, um histórico da educação desde os primórdios do descobrimento do Brasil pelos Português e relatar como as pessoas foram discriminadas nesse período, que tem uma página manchada em nossa história e análise da ditadura por conta de um golpe apoiado por frente de várias classes da sociedade brasileira.

O período militar ocorreu no ano de 1964 até 1985 essa época foi assinalada interferência dos militares no poder e também o papel que a educação passou nesse período sem precedente. Quando os professores e alunos não tinham direito de falar e expressar as suas opiniões não tinham valor, sendo conduzidos como maquinas, um período de represaria do ensino só repassando conhecimento e não poderiam ser críticos conduzindo e fazendo a sua própria história.

Qualquer uma que se levantava contra o regime político que se instaurou nessa época era violentamente

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conduzido como represaria por parte de quem fazia e comandavam os movimentos. Ninguém poderiam expressar seus pensamentos, as pessoas tinham de ser neutras no campo das ideias e principalmente na área da educação. Foi quando algumas disciplinas foram tidas como desnecessárias e quase algumas veio se extinguir nesse período.

A década de 50 e 60 o País passou por uma grande transformação no que diz respeito na área da economia, passou por uma mudança de industrialização e ao mesmo tempo se urbanizou, onde teve incentivo do capital estrangeiro, tornado o Brasil com uma economia internacionalizada, voltada para o capital de fora. Com incentivos de multinacionais e os lucros vindo do trabalho desenvolvido com grandes tecnologias, e sem falar no congelamento dos salarias das classes mais populares da época. E a classe que tinha a riqueza nas mãos desenvolvia, o acumulo do lucro gerado pelo capital, a fim de expandir mais e mais a suas economias, para que seja garantida os seus lucros conforme os seus próprios gosto.

Hammel (2011 apud COUTO 1999) “aponta que foi mais precisamente em 31 de março de 1964 que os militares derrubam o então presidente João Goulart e assumem o poder, num regime que iria permanecer até 1985”. A sustentação veio com a base de algumas áreas como a imprensa, da classe média da sociedade e também dos Estados Unidos da Américas e até a igreja apoiou. O golpe se deu com uma mensagem de que precisava resgatar a democracia de estado, que existia indicio de que o comunismo iria prevalecer e que precisava, acabar com a bagunça, a deturpação na política e estruturar o que se diz a economia do país. Essa foi uma das muitas justificativa para permanecer no poder.

Diante do que vinha acontecendo com golpe os militares tiveram apoio de alguns setores da sociedade se fizeram compromisso com o corpo social de que iria trazer

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emprego, também avanço tecnológico, no que diz respeito as indústrias e outros setores e renovação, fazendo com que as pessoas ficassem com entusiasmo e colocasse esperança nesse sistema que presidiu o país por 21 anos. E a maioria da população foi quem custeou a essa conta com muito massacre, ouve morte e vários espancamentos por parte dos militares. Segundo Hammel (2011 p.2 apud CONY; 2004, p. 33):

Afinal, empossou-se o presidente da República. Temos o homem, um homem que – segundo a voz geral – é honrado, e, segundo alguns, é até inteligente. Acredito na sua honradez, mas continuo a pensar mal da inteligência militar. Coisa cá minha, que em nada subverte ou mutila as sadias instituições pátrias. Temos o homem. Desde 31 de março, a violência impera no País com a conivência do Alto Comando Militar – entidade abstrata, fluida, sem contornos, sem definições. Por trás da abstração, advinha-se o concreto apetite da vingança e do ódio de alguns. [...] Sobre esse homem pesam, agora, as responsabilidades, os deveres, e, sobretudo, as imposições de todas as sedes e fomes que pretendem devorar o País, devorando primeiro a sua liberdade e a sua vergonha.

4.1 HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Para entendermos melhor história da educação no Brasil é necessário voltarmos um pouco no tempo o Brasil foi desde os primórdios do seu descobrimento expressamente no dia 22 de abril de 1500 que Pedro Alvares Cabral descobriu o nosso pais, ele chega com toda tripulação e avista a terra , com pessoas nus que já moravam aqui e que eram os nativos da região chamados de “os índios “.

No ano de 1549 veio para o Brasil uma ordem religiosa católica educar os índios a chamada Companhia de Jesus que foi fundada por Inácio de Loyola e que ficou por aqui até os anos de 1759. Essa Companhia liderava a educação

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com conteúdos e métodos do Ratio Studiorum cuja o teor era um conjunto de normas para regulamentar os ensinos nos colégios jesuítas, nesse primeiro momento foi o que tinha em mãos para passar em relação a educação no nosso país.

Os jesuítas chegaram na Bahia especialmente e Salvador e se dissipara por todo o país, para o norte e sul, ainda hoje existem algumas reduções dos jesuítas em alguns estados da nossa federação. Porem eles tiveram de ir embora por conta do governo de Marquês de Pombal, Primeiro-ministro de Portugal (1750-1777), que queria legitimar a educação principalmente a escola púbica no Brasil. Foram expulsos como forma de que se tratava de políticas. Os jesuítas foram expulsos, sustentavam no Brasil 36 missões, 25 residências, 18 estabelecimentos de ensino secundário, que estavam inseridos nos pontos mais importantes do país.

Com a chegada da família real em 1808 fugindo das mãos de Napoleão Bonaparte, nessa época a educação eram voltada para um classe elitista como diz Gadott, (1997 p,2) “a criação do curso de Cirurgia e Anatomia (1808), a criação da Academia Real da Marinha (1808), a criação da Biblioteca Pública (1810), a criação de cursos técnicos e de ensino de artes com a contratação de artistas franceses”.

Os Portugueses ricos que aqui começaram a dominar a nossa pátria com o poder político e após a independência especialmente nos anos de 1827, foi criada no mínimo duas faculdade de direito com uma no estado de São Paulo e outra em Recife que constituíram as elites para compor os cargos púbicos ou que seja na advocacia ,na administração pública , no jornalismo e na política. Nessa época ainda existia a escravidão e que só foi abolida em 1888 pela então princesa Isabel.

Vale lembra que embora que exista naquela época defendida na constituição imperial um princípio de ensino primaria gratuito para todas as pessoas, ensino básico ou fundamental, isso na prática não foi colocado, mas deixado de

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lado e com um número alto de analfabetismo no país. Rui Barbosa fez um levantamento de que em relação aos outros países com da velha europeia estava muito atrasado em relação a questão da educação.

Ainda fazendo um desfecho da educação no Brasil a Republica de 1889 a 1930) pode fazer uma reflexão no que se diz o padrão deixado da educação pelos impérios. Foi criado vários ministérios como Correios e Telégrafos, Ministérios das Instrução Publica, logo foi extinto e veio a existir Ministério da Justiça e Negocio Interiores. Ja nos anos de 1920 os governos infundiam os ideais do liberalismo criaram as escolas normais para professores do primário. Nesse ínterim surgem também o movimento cívico-patriótico ligado a Bilac que procurava combater o analfabetismo no País.

Já em 1924 foi criado Associação Brasileira de Educação, que tinha alguns nomes de destaque como o de Fernando de Azevedo a Paschoal Lemme. A instituição tinha o interesse de melhorar no que diz respeito a educação brasileira e que chegou a "Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova" (1932) tinha como tema um ensino público, civil e obrigatório. Isso pode acontecer em 1934 com a constituição. Conforme Gadotti (1997 p. 3):

Esse período é também marcado por numerosas reformas educacionais que procuravam estabelecer a estrutura e o funcionamento do ensino básico e superior: a Reforma Benjamin Constant (1890), a Reforma Epitácio Pessoas (1901), a Reforma Rivadávia Correia (1911), a Reforma Carlos Maximiliano (1915) e a Reformia João Luís Alves (1925). Os Estados também realizaram várias reformas, destacando-se a de Sampaio Dória, em São Paulo (1920), a de Lourenço Filho, no Ceará (1923), a de Anísio Teixeira, na Bahia (1925), a de Francisco Campos, em Minas Gerais (1927) e a de Fernando de Azevedo, no Distrito Federal (1928).

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O revolucionamento da década de 1930 conseguiu provocar uma series de melhoras no que diz respeito a educação, poder ser citado a criação do Ministério da educação e coube um capítulo inteiro na constituição de 1934 só sobre a educação. Nesse ínterim foi criado a Universidade de São Paulo. Em 1937 com a nova constituição veio o ensino profissionalizante, ou seja, o técnico. De 1930 a 1945 pode ser um período lembrado pelo desenvolvimento do ensino fundamental.

Passa a era Varga e em 1946 tem outra constituição que cria uma regra que a União deveria repassar não menos de dez por cento para educação e fica aos Estados e o Distrito Federal não menos de vinte por cento, dinheiro esse que sairia dos impostos pagos pela população, para a sustentação do progresso do ensino no mínimo com qualidade. Para complementar ainda mais a um embate de criar a lei das Diretrizes de ensino (LDB) e que só saiu do papel e pode ser aprovada em especialmente no ano de 1961, depois discussões sobre o ensino privado e o público. O que ouve foi uma reconciliação dos dois e aprovada:

No período de redemocratização da vida nacional, que vai de 1946 a 1964, desenvolveram-se vários movimentos populares em defesa da educação que motivaram sucessivas campanhas: a Campanha de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino Secundário, a de Erradicação do Analfabetismo, a de Educação de Adultos, a de Educação Rural, a de Educação do Surdo, a de Reabilitação dos Deficientes Visuais, a de Merenda Escolar e a de Material de Ensino. No final da década de 50 e início da década de 60 o debate educacional intensificou-se. O sucesso alcançado pela aplicação do "método Paulo Freire" despertou a atenção do presidente João Goulart (1963 que tentou expandi-lo para todo o território nacional. O golpe militar de 1964 interrompeu esse ambicioso projeto e o seu autor foi exilado (GADOTTI, 1997 p. 3).

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4.2 A EDUCAÇÃO E A DITADURA MILITAR

A educação no período dos anos de chumbos foi marcada por ter o incentivo que diz respeito a educação privada e também da educação pública, a privada foi incentivada pelo regime que via nessa situação uma oportunidade de benefício com o capitalismo em ascensão o estado nessa época que pode investir na educação privada, na qual ficou especialmente no ensino superior. A publica veio de encontro ao da linguagem técnica processual. Era obrigatório a Educação Moral e Cívica em todos os níveis de ensino, foi criada a Diretório Nacional dos Estudantes.

A ditadura militar, ancorada no pensamento tecnocrático e autoritário que acentuou o papel da escola como aparelho ideológico de Estado, editou um rol de medidas consubstanciadas, basicamente, em duas reformas educacionais que mudaram a face da educação brasileira (BITTAR, 2002, p. 162).

Nesse período foi ignorado por parte dos militares com relação a prejulgamento e desconfiança foi rejeitada matérias como a geografia, história a língua portuguesa e a questão das artes que ficou no esquecimento por parte da ditadura nesse período de 21 anos que ficaram no poder. Nessa época os docentes foram penalizados com baixos salários na justificativa do governo para uma flexibilidade na questão do orçamento.

No período militar ouve um aumento significativo do número de alunos nas escolas pública, veio a ter uma escola de poucas qualidades em uma categoria inferior. Porque uma coisa é qualidade a outra é quantidade que diz respeito a educação. Nesse tempo a questão que se dizia democrática passou a proporção de totalmente com a exclusão da liberdade de expressão, ninguém poderia se expressar contra

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o governo e a educação era mais relacionada a quantidade de que a qualidade.

Ouve a criação do MOBRAL (Movimento Brasileiro de Alfabetização), para erradicar os analfabetismos no país, porém não aconteceu na pratica.

No período da ditatura surgiram os chamados movimentos estudantis (ME) eram Movimentos da esquerda que tinha coragem de enfrentar o governo que estava no poder martirizando as pessoas. Esse movimento atuava contra a ditadura que impunha suas forças para as camadas menos favorecidas. Eram através de protestos. Santos (2009, p.101 “afirma que nessa época Líderes estudantis e partidários foram perseguidos, muitos foram presos e torturados e alguns até foram mortos”.

Em um regime autoritário, que tinha coragem de dar o rosto para bater, muitos destes estudantes foram as ruas e aclamarem para um país mais digno de liberdade. Porque naquela época não tinha as redes sociais que tem hoje abertamente para as pessoas manifestarem. Onde as pessoas podem se expressarem, falar o que querem ou deixar os seus comentários.

Um episódio que ficou marcado foi o Massacre da Praia Vermelha, na Faculdade Nacional de Medicina, no Rio de Janeiro, onde seiscentos estudantes foram massacrados pela polícia. Os estudantes protestavam contra uma reforma do ensino na educação, que o plano eram privatizar as Universidades Pública do país, isso aconteceu em 1966. Os estudantes foram tratados como cachorros por parte da polícia que adentraram no prédio para impedir os protestos.

Nesse período as universidades eram monitoradas os professores não poderiam expressar suas opiniões. A educação ficou a mercê do estado onde a represália era a doutrina do regime colocando por torturas e apreensão de todos aqueles que se opunha contra o regime que estava no poder. Nesse interim a educação que algo é importante para

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todo ser humano, foi tratada com desprezo por parte das autoridades competentes daquele período.

Logo que se instaurou o golpe militar, a Universidade de Brasília (UNB) foi invadida. Muitos professores universitários – da Universidade de São Paulo (USP) também – foram exilados, tiveram sua aposentadoria forçada. A UNE foi posta na ilegalidade e o ME começou a ser perseguido pelos agentes da repressão como o DEOPS (Departamento da Ordem Política e Social), pois para a ditadura o ME estava sendo corrompido por agentes considerados subversivos (SANTOS,2009, p. 104).

4.3 PAULO FREIRE E A DITADURA MILITAR

Antes de fala de Freire quem foi esse homem tão importante para educação? Paulo Freire é um educador brasileira que nasceu no Pernambuco em 1921 se formou em Direito, porém nunca exerceu a profissão. Paulo buscou interagir com as pessoas mais humildes, buscando um caminho de pesquisa e estudos relacionado ao nosso povo brasileiro. Freire procurava estudar as classes sociais de pessoas mais populares.

Em uma de suas frases celebre ele diz acime gostaria de ser lembrado como alguém que amou o mundo, as pessoas, os bichos, as árvores, a terra, avida. (Paulo Freire). Foi um dos maiores pensadores da educação brasileira, a sua linha de pensar vinha do marxismo. Uma linha crítica ou um meio de ensinar critico aproveitando a fala, o conhecimento dos alunos.

Como tudo na vida tem um preço por expor suas ideias Paulo Freire foi um dos que tiveram de ser exilados para fora do país porque pregava a liberdade. E no sistema político em que encontra impedia dele expressar suas ideias, porque os seus pensamentos eram contra a política que estava

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imperando. Freire ficou dezesseis anos fora do Brasil por conta que pensava diferente das pessoas da época.

Freire trabalhou nesse período em outros países como nos Chilenos países da África, Suíça, países da américa central. Paulo deixou uma educação para classe mais humildes. Escreveu uma obra que até hoje é o marco na educação a “pedagogia dos oprimidos”. Em que coloca a sociedade com a fundamentação no machismo e a sociedade está nessa situação dividida em classes sociais. A maioria que vivem sobre o domínio de poder que sobre uma classe que está comandando a sociedade. a minoria manda e a maioria tem que obedecer.

Freire vem trazer uma Pedagogia libertadora cuja as suas características não podem serem neutra e têm de ser crítica, com consciência e sobressair. Cujo o objetivo é por meio de lutas e esforços as classes mais oprimidas podem sobressair. Não ficando na inercia da vida, cujo o desejo dos que mandam querem que acontecem no meio das sociedades.

Freire afirma que a educação e o ambiente escolar têm um papel transformador daqueles que estão subordinados possam ter condições críticas para desempenhar um papel na sociedade na batalha de para transformar a sociedade em que vivemos. Porem esse modo de pensar incomoda principalmente a classe dominante. Foi o que aconteceu com Freire o período da ditadura militar no Brasil. 4.4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esse artigo procurou fazer um recorte da educação brasileira especialmente no período militar, fazendo uma recapitulação da educação desde a chegada dos portugueses aqui em nossa pátria até o período da ditadura militar que foi conhecido como os anos de chumbo, em que as pessoas não tinham direito de expressão e nem vez e voz e aqueles que falavam contra já era torturado. Quantas pessoas naquela

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época não sumiram e sofreram grande tortura só porque eram contra o regime que perdurou vinte e um ano em nosso país.

A ditadura foi também um período de 21 anos no brasil que ficara lembrado por uma mudança econômica, política e social que aconteceu em nossa sociedade, mudança essa que até hoje reflete nas vidas e nas famílias que viveram e sofreram e foram atacadas brutalmente por esse sistema que ocorreu em nosso país.

O Brasil ainda hoje tem sérios problemas em relação a educação brasileira, problemas este que entra governo e vem alguns que não são resolvidos. Apesar de que existe na constituição de 1988 o direito dos na educação de qualidade, mas as vezes na pratica não acontecem de ter os benefícios sociais e políticos que são assegurados pela legislação.

O que ocorreu nesse período da ditadura foi uma educação pautada mais em quantidade do que em qualidade para os cidadãos de boa-fé que é a maioria a classe trabalhado, ordeira e honesta na sociedade. O que ocorre até hoje muitas das vezes em nosso país. O modela tecnicista ocorrido lá existe e está em vigor. REFERÊNCIAS BITTA, Marisa; Mariluce Bitta. História da Educação no Brasil: a escola pública no processo de democratização da sociedade. In: Acta Scientiarum education. Maringá, v. 34, n. 2, p. 157-168, July-Dec., 2012.

CONY, Carlos Heitor. O ato e o fato: o som e a fúria das crônicas contra o golpe de 1964. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004.

COUTO, Ronaldo Costa. Memórias vivas do regime militar – Brasil: 1964-1985. Rio de Janeiro: Record, 1999.

GADOTTI, Moarcir. Educação brasileira contemporânea: desafios do ensino básico. São Paulo. crpf ,1997.

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HAMMEL, A. C.; COSTA, G. K.; MEZNEK, I. A ditadura milita brasileira e a política educacional: leis nº 5.540/68 e nº 5.692/71. In: Políticas sociais transcrições lationoaamericanas no século XXI: tendências e desafios. 5º.2011.Cascavel. Anais ...

SANTOS, Jordana de Souza. A repressão ao movimento estudantil na ditadura militar. In: Aurora, São Paulo v.3, n.1, p.101-108. 2009.

SCHWARTZMAN, Simon Os desafios da educação no Brasil, Brock, Colin e Simon Schwartzman, editores. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005

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OS ORGANIZADORES

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DANIELA VALENTINI Italiana, nascida na cidade de Scontrone, Província de L'Aquila - Itália. Desde 2009 atua entre Brasil e Itália, no ramo editorial. Atuou também como Correspondente Internacional para a língua italiana, na redação da Revista Ecclesia, de distribuição nacional, ISSN: 2178-3101. Publicou suas entrevistas a Pe. Gabriele Amorth, no livro Os demônios existem e estão entre nós, ISBN: 978-85-61837-53-2. Graduanda em Letras “Português”, pela Universidade Paranaense. Atualmente é professora de língua italiana na Polys Idiomas e na Casa Cultural Itália.

E-mail: [email protected] Lattes: http://lattes.cnpq.br/0438038006154792

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JUNIOR CUNHA Graduando do curso de Licenciatura em Filosofia pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Toledo-PR. É estagiário da Biblioteca Universitária da UNIOESTE-Campus Toledo. Bolsista – no período de 01 de junho de 2016 a 31 de março de 2017 – do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID), vinculado a CAPES/MEC. Bolsista – no período de 1 de abril de 2017 até 31 de março de 2018 – do Projeto de Extensão Teatro em Ação, vinculado ao Programa Universidade Sem Fronteiras-USF, financiado com recursos do Fundo Paraná. Atualmente desenvolve pesquisa nas áreas de Teatro e Filosofia com enfoque em William Shakespeare.

E-mail: [email protected] Lattes: http://lattes.cnpq.br/7824455868007103

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VALDENIR PRANDI Possui Licenciatura Plena em Filosofia pela Faculdade Padre João Bagozzi - (Registrado Ministério da Educação Universidade Federal do Paraná) (2011-2013). Atualmente é professor - Secretaria de Educação do Estado do Paraná. Possui Licenciatura Plena e Geografia pela Faculdades Integradas da Terra de Brasília - Brasília - DF (2007 - 2009). Possui Licenciatura Plena em Pedagogia (Segunda Licenciatura) pelo Centro Universitário de Jales (UNIJALES) - Jales - SP (2015 - 2016). Pós-Graduação modalidade Lato-Sensu: Centro Universitário Leonardo da Vinci (UNIASSELVI): Metodologia de Ensino de Filosofia e Sociologia - Indaial - SC (2014 - 2015). Faculdade da Aldeia de Carapicuíba (FALC) Pós-Graduação em Deficiência Intelectual, Auditiva e Visual e a Prática Educativa Inclusiva - Carapicuiba - SP (2014 - 2015). Faculdade União Cultural do Estado de São Paulo (UCESP - Faculdade) Pós-Graduação em Educação ambiental e Sustentabilidade - Araçatuba - SP. (2015-2016). Participação em Cursos e Eventos - Participou do Curso de Capacitação do Programa Qualificação Pedagógica, Secretaria Municipal de Educação de Grandes Rios - PR. (2011).

E-mail: [email protected] Lattes: http://lattes.cnpq.br/1471897487879813

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