12
1 Evolvere Scientia UNIVERSIDADE FEDERAL DO VALE DO SÃO FRANCISCO Evolvere Scientia UNIVERSIDADE FEDERAL DO VALE DO SÃO FRANCISCO TEMÁTICA DOMINANTE NAS PINTURAS RUPESTRES DO SERROTE DO MORRINHO, NO MUNICÍPIO DE SENTO SÉ - BA Morgana Cavalcante Ribeiro 1* , Celito Kestering 2 1 Universidade Federal do Vale do São Francisco, 64.770-000 São Raimundo Nonato, PI, Brasil. *Email: [email protected] Resumo: Objetiva-se com esse trabalho apresentar os resultados da pesquisa que se fez no conjunto de pinturas rupestres do Serrote do Morrinho, em Sento Sé BA, para reconhecer atributos da identidade de grupos que ocuparam a região do Submédio São Francisco no período pré-colonial. Inicialmente, caracterizou-se a área, com a descrição de aspectos geológicos, geomorfológicos e ambientais para desvendar parte do contexto com qual se relacionaram os grupos que realizaram as pinturas rupestres. Posteriormente, classificaram-se as pinturas com os parâmetros da cognoscibilidade e da temática. Pelo parâmetro da cognoscibilidade dominante, relacionada com longo tempo e amplo espaço, classificam-se conjuntos de registros rupestres em tradições. Pelo critério da temática dominante, relacionada com um espaço geográfico regional, filiam-se conjuntos de figuras rupestres em subtradições. Observações preliminares permitem propor, em nível hipotético, que as figuras do Serrote do Morrinho, por serem majoritariamente reconhecíveis e apresentarem dominância temática diferente da que compõe a Subtradição Sobradinho, pertençam à Tradição São Francisco e a uma subtradição a ser determinada. Palavras-chave: Pintura rupestre, Serrote do Morrinho, Cognoscibilidade, Temática. Abstract: We intend with this work presents the results of research that was done in the set of cave paintings of Serrote do Morrinho, in Sento Sé BA municipality, to recognize attributes of the identity of groups that occupied the region of Lower Basin of San Francisco River in the pre-colonial period. First time, we characterized the area, with the description of geological, geomorphological and environmental aspects to unravel part of the context in which related groups which performed the cave paintings. Subsequently, the paintings were classified with the parameters of knowability and thematic. The dominant parameter of knowability, related to long time and large space, classified sets of records in rock traditions. By the criterion of the dominant theme, related to a small geographical area, affiliate themselves sets of figures in rock subtraditions. Preliminary observations allow us to propose, in the hypothetical level, the figures of Serrote do Morrinho, being present mostly recognizable and different thematic dominance from composing the sub-tradition Sobradinho, belong to Tradition San Francisco and at a sub-tradition to be determined. Keywords: Rock paintings, Serrote do Morrinho, Knowability, Theme. Evolvere Scientia, V. 3, N. 1, 2014 ARTIGO

TEMPLATE PARA ELABORAÇÃO DE ARTIGOS CIENTÍFICOS … · da arqueologia brasileira e nordestina foi permeado de fantasia. A aurora de uma arqueologia acadêmica em terras brasileiras

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: TEMPLATE PARA ELABORAÇÃO DE ARTIGOS CIENTÍFICOS … · da arqueologia brasileira e nordestina foi permeado de fantasia. A aurora de uma arqueologia acadêmica em terras brasileiras

1

Evolvere ScientiaUNIVERSIDADE FEDERAL DO VALE DO SÃO FRANCISCO

Evolvere ScientiaUNIVERSIDADE FEDERAL DO VALE DO SÃO FRANCISCO

TEMÁTICA DOMINANTE NAS PINTURAS RUPESTRES DO SERROTE DO MORRINHO, NO

MUNICÍPIO DE SENTO SÉ - BA

Morgana Cavalcante Ribeiro1*

, Celito Kestering2

1Universidade Federal do Vale do São Francisco, 64.770-000 São Raimundo Nonato, PI, Brasil.

*Email: [email protected]

Resumo: Objetiva-se com esse trabalho apresentar os resultados da pesquisa que se fez no conjunto de

pinturas rupestres do Serrote do Morrinho, em Sento Sé – BA, para reconhecer atributos da identidade

de grupos que ocuparam a região do Submédio São Francisco no período pré-colonial. Inicialmente,

caracterizou-se a área, com a descrição de aspectos geológicos, geomorfológicos e ambientais para

desvendar parte do contexto com qual se relacionaram os grupos que realizaram as pinturas rupestres.

Posteriormente, classificaram-se as pinturas com os parâmetros da cognoscibilidade e da temática.

Pelo parâmetro da cognoscibilidade dominante, relacionada com longo tempo e amplo espaço,

classificam-se conjuntos de registros rupestres em tradições. Pelo critério da temática dominante,

relacionada com um espaço geográfico regional, filiam-se conjuntos de figuras rupestres em

subtradições. Observações preliminares permitem propor, em nível hipotético, que as figuras do

Serrote do Morrinho, por serem majoritariamente reconhecíveis e apresentarem dominância temática

diferente da que compõe a Subtradição Sobradinho, pertençam à Tradição São Francisco e a uma

subtradição a ser determinada.

Palavras-chave: Pintura rupestre, Serrote do Morrinho, Cognoscibilidade, Temática.

Abstract: We intend with this work presents the results of research that was done in the set of cave

paintings of Serrote do Morrinho, in Sento Sé – BA municipality, to recognize attributes of the identity

of groups that occupied the region of Lower Basin of San Francisco River in the pre-colonial period.

First time, we characterized the area, with the description of geological, geomorphological and

environmental aspects to unravel part of the context in which related groups which performed the cave

paintings. Subsequently, the paintings were classified with the parameters of knowability and

thematic. The dominant parameter of knowability, related to long time and large space, classified sets

of records in rock traditions. By the criterion of the dominant theme, related to a small geographical

area, affiliate themselves sets of figures in rock subtraditions. Preliminary observations allow us to

propose, in the hypothetical level, the figures of Serrote do Morrinho, being present mostly

recognizable and different thematic dominance from composing the sub-tradition Sobradinho, belong

to Tradition San Francisco and at a sub-tradition to be determined.

Keywords: Rock paintings, Serrote do Morrinho, Knowability, Theme.

Evolvere Scientia, V. 3, N. 1, 2014

ARTIGO

Page 2: TEMPLATE PARA ELABORAÇÃO DE ARTIGOS CIENTÍFICOS … · da arqueologia brasileira e nordestina foi permeado de fantasia. A aurora de uma arqueologia acadêmica em terras brasileiras

Evolvere Science, V. 3, N. 3, 2014

2

1 INTRODUÇÃO

Os estudos em Arqueologia procuram

resgatar e preservar os fragmentos vestigiais do

passado seja ele recente ou remoto. Para isso,

os arqueólogos utilizam a cultura material

sobrevivente à ação deletéria do tempo para

reunir o máximo de informações possíveis

acerca de grupos pretéritos.

Integrando parte dessa materialidade,

existem as pinturas rupestres que surgiram pela

primeira vez no registro arqueológico há mais

ou menos 40-30 mil anos, quando o Homo

sapiens surgiu e a mente humana começou a

florescer em meio aos novos domínios

cognitivos que passaram a fluir livremente

(MITHEN, 2002, p. 251).

Segundo Hernando (2002), com o

surgimento do Homo sapiens e a chamada

Revolução do Paleolítico Superior, os grupos

humanos desenvolveram uma ferramenta de

sobrevivência extremamente útil e versátil que

não existe em nenhuma outra espécie animal: a

capacidade de representação e utilização de

símbolos. Assim, as pinturas rupestres

serviram como um meio de comunicação para

indivíduos que viveram em condições

ambientais extremamente adversas (MITHEN,

2002, p. 255).

No Brasil, as primeiras inscrições vistas

em rochedos foram atribuídas a grandes

civilizações, tais como os fenícios, que teriam

aportado no Novo Mundo. Na concepção dos

colonos portugueses, os nativos indígenas

seriam desprovidos de aptidões intelectuais

suficientes para realizarem tais grafismos. Em

busca dessas civilizações perdidas, o prefácio

da arqueologia brasileira e nordestina foi

permeado de fantasia.

A aurora de uma arqueologia acadêmica

em terras brasileiras aconteceu com a vinda de

pesquisadores estrangeiros. Esses pioneiros

formaram uma geração de profissionais

brasileiros que prosseguiram com a pesquisa

científica.

Esta pesquisa foi desenvolvida na Área

Arqueológica de Sobradinho, no município de

Sento Sé – Bahia, com o objetivo de contribuir

para o reconhecimento de atributos de

identidade dos grupos que ocuparam a região

do Submédio São Francisco no período pré-

colonial. Quer-se levantar dados referentes aos

atributos de identidade dos grupos pré-

coloniais com o intuito de subsidiar

professores da rede pública e privada para

elevarem a autoestima coletiva da população

local, fundamental para o desenvolvimento

regional.

As pesquisas arqueológicas na área de

Sobradinho – BA começaram na década de

1970, com o Projeto Sobradinho de

Salvamento Arqueológico. Esse projeto foi

realizado em toda a área de inundação da

Barragem, num raio de 4.214 km², bem como

na área de segurança e suas adjacências. Esse

trabalho foi realizado por Valentin Calderón e

sua equipe, entendendo-se que a cultura

material da área da represa era importante para

a compreensão da vida dos grupos pré-

coloniais que habitaram a região. Os primeiros

sítios arqueológicos com registros rupestres na

região de Sobradinho foram, assim,

Page 3: TEMPLATE PARA ELABORAÇÃO DE ARTIGOS CIENTÍFICOS … · da arqueologia brasileira e nordestina foi permeado de fantasia. A aurora de uma arqueologia acadêmica em terras brasileiras

Evolvere Science, V. 3, N. 3, 2014

3

identificados durante essas atividades, sendo

caracterizados pela equipe como sítios com

arte parietal.

Mesmo o tempo sendo abreviado para as

atividades de salvamento, a equipe conseguiu

identificar e salvar um número considerável de

vestígios arqueológicos. Segundo Kestering

(2001), durante a realização dos trabalhos de

campo a equipe de Calderón visitou os locais

que poderiam apresentar fragmentos de

cerâmica e artefatos da indústria lítica em

superfície. Quando identificava vestígios

arqueológicos, a equipe realizava a

demarcação da área, gerava plantas, fazia o

registro fotográfico para coletá-los em seguida.

Confirmada a área como local de ocupação,

realizava-se a escavação de algumas

sondagens.

Finalizadas as atividades do Projeto

Sobradinho de Salvamento Arqueológico,

nenhuma outra pesquisa foi realizada na região

até Kestering (2001) iniciar o trabalho de

caracterização dos registros gráficos pré-

coloniais no Boqueirão do Riacho São

Gonçalo. Essa pesquisa culminou com a

dissertação de mestrado intitulada Registros

Rupestres na Área Arqueológica de

Sobradinho.

Kestering (2007) ampliou seu trabalho

definindo uma subtradição para os registros

rupestres dessa área arqueológica, a

Subtradição Sobradinho. Essa pesquisa rendeu

uma tese de doutorado intitulada Identidade

dos grupos pré-históricos de Sobradinho–

BA.

Em 2013, Lima Filho propôs, em nível

preliminar e hipotética, algumas fronteiras da

subtradição Sobradinho, definida por Kestering

(2007).

O presente trabalho de pesquisa foi

desenvolvido no Serrote do Morrinho,

localizado no município de Sento Sé – BA.

Nessa feição de relevo, foram identificados

três sítios arqueológicos, um desses sítios, um

matacão1, possui pinturas rupestres, dispostas

em quatro painéis. O matacão está sofrendo

desplacamento causado pela oscilação térmica

que decorre, principalmente das mudanças de

temperatura entre o dia e a noite. As pinturas

estão bastante desgastadas por causa da sua

exposição ao sol, ao vento e à chuva. Além

disso, há raízes de xiquexique (Cephalocereux

gounellei), urina e fezes de mocó (Kerodon

rupestris) muito próximas às pinturas.

A relevância dessa pesquisa reside na

importância de complementar e enriquecer o

banco de dados acerca do período pré-colonial

do Vale do São Francisco além de contribuir

no reconhecimento da identidade dos grupos

que habitavam o Submédio São Francisco em

períodos anteriores à colonização.

2 PROCEDIMENTOS TEÓRICOS E

METODOLÓGICOS

Iniciou-se a pesquisa com estudo

bibliográfico referente aos conceitos de

1 De acordo com a escala granulométrica de

Wentworth, matacão é a maior dimensão de

fragmentos de rocha.

Page 4: TEMPLATE PARA ELABORAÇÃO DE ARTIGOS CIENTÍFICOS … · da arqueologia brasileira e nordestina foi permeado de fantasia. A aurora de uma arqueologia acadêmica em terras brasileiras

Evolvere Science, V. 3, N. 3, 2014

4

atributos, tradição e subtradição,

cognoscibilidade e temática com vistas à

adoção de parâmetros para o reconhecimento

dos grupos pré-coloniais que ocuparam o

Submédio São Francisco.

2.1 Conceitos

Entende-se como cognoscibilidade a

qualidade do que é cognoscível. A

cognoscibilidade depende da relação dialógica

entre o sujeito cognoscente e o objeto

cognoscível. Existem objetos que, por sua

natureza (essência ou estrutura) e por seus

atributos (aparência) são facilmente

identificados. Outros dependem do conjunto de

conhecimentos, da capacidade de percepção ou

do grau de aprimoramento técnico do sujeito

cognoscente.

Todo o conhecimento envolve a relação

direta do sujeito cognoscente com algum

objeto (a relação de conhecer diretamente

ou, conversamente, de apresentação de um

objeto a um sujeito cognoscente), mesmo

que esse conhecimento seja por descrição de

outro objeto (HUSSELL, 1964).

Pelo parâmetro da cognoscibilidade

dominante, relacionada com longo tempo e

amplo espaço, classificam-se conjuntos de

pinturas em tradições. Identifica-se a

cognoscibilidade dominante pela segregação

qualitativa e quantitativa de figuras

conhecíveis e reconhecíveis. São conhecíveis

as figuras que representam realidades do

mundo conhecido pelo pesquisador. Para a

identificação de grafismos reconhecíveis, que

não representam realidades conhecidas,

considera-se unidade gráfica um signo ou todo

o conjunto de signos e espaços vazios de um

painel, enquanto não são identificadas

ocorrências de figuras semelhantes em outros

painéis. Eles são reconhecíveis, por isso, nas

recorrências.

Temática é o germe a partir do qual se

podem desenvolver diferentes composições

para representar realidades pertencentes ao

mundo material ou imaginário. Seu

reconhecimento é possível na peculiaridade

das formas. As temáticas das figuras

conhecíveis caracterizam-se pela representação

de expressões corporais ou atributos de

identidade, como ornamentação, forma e

tamanho. Nas figuras reconhecíveis,

caracterizam-se pela presença de elementos

básicos (signos e significantes, geométricos ou

não) e seu agenciamento nas unidades gráficas.

Pelo critério da temática dominante,

relacionada com um espaço geográfico

regional, filiam-se conjuntos de figuras

rupestres em subtradições. A temática refere-se

a preferências nas formas que os autores de

uma sociedade utilizavam para pintar

diferentes arranjos que compõem os painéis.

2.2 Metodologia

Fez-se uma pesquisa imagética com base

nas pesquisas anteriores realizadas na região.

(KESTERING, 2007 e LIMA FILHO, 2013).

Complementaram-se os estudos com atividades

Page 5: TEMPLATE PARA ELABORAÇÃO DE ARTIGOS CIENTÍFICOS … · da arqueologia brasileira e nordestina foi permeado de fantasia. A aurora de uma arqueologia acadêmica em terras brasileiras

Evolvere Science, V. 3, N. 3, 2014

5

de campo, oportunidade em que se fez

prospecção2 intensiva e sistemática no Serrote

do Morrinho, para identificação de sítios

arqueológicos. Na oportunidade, fez-se um

levantamento fotográfico das pinturas e de

aspectos relevantes do ambiente para se

desvendar a paisagem com a qual conviveram

os grupos pré-coloniais que as realizaram.

As imagens das pinturas e do contexto

ambiental foram feitas com câmaras digitais e

a localização geográfica dos sítios

arqueológicos foi definida com a utilização de

GPS Garmin Etrex. Para facilitar a

visualização e análise das pinturas, fez-se a

vetorização das imagens no software

GIMPPortable.

Em laboratório, fez-se o reconhecimento

do padrão de cognoscibilidade e das temáticas

dominantes para aferir se correspondiam à da

Subtradição Sobradinho (Fig. 1). Na

oportunidade, sistematizaram-se os dados para

que outros estudantes do Curso de Arqueologia

e Preservação Patrimonial possam utilizá-los

na elaboração de monografias e outros

trabalhos acadêmicos de pesquisa.

Figura 1 – Temática dominante da Subtradição

Sobradinho

2 Segundo Bicho (2006) prospecção arqueológica

constitui-se como uma atividade executada em

campo com o objetivo de reconhecer e ∕ ou

localizar sítios arqueológicos.

Fonte: Kestering, 2007, p. 86

Durante esta pesquisa buscou-se segregar

atributos da identidade dos grupos pré-

coloniais do Vale do São Francisco pela

identificação do padrão de cognoscibilidade e

da temática dominante no Serrote do

Morrinho, no município de Sento Sé – BA.

Em toda extensão do Vale do Rio São

Francisco, existem vestígios que comprovam

intensa ocupação humana no período pré-

colonial. Em muitos suportes de rochas

existem painéis de pintura e de gravura

rupestre e, nos terraços fluviais antigos,

encontram-se vestígios arqueológicos da

indústria lítica e cerâmica. Expostos à

degradação física, química e biológica, as

pinturas e gravuras deterioram-se e dispersam-

se os outros vestígios arqueológicos. Perdem-

se, assim, muitas informações básicas que

poderiam contribuir para a construção do

Page 6: TEMPLATE PARA ELABORAÇÃO DE ARTIGOS CIENTÍFICOS … · da arqueologia brasileira e nordestina foi permeado de fantasia. A aurora de uma arqueologia acadêmica em terras brasileiras

Evolvere Science, V. 3, N. 3, 2014

6

conhecimento científico a respeito do período

pré-colonial do Submédio São Francisco.

3 O SERROTE DO MORRINHO

O Serrote do Morrinho está localizado

junto ao povoado de Morrinhos, no município

de Sento Sé – BA, região Noroeste do Estado

da Bahia, Submédio São Francisco (Fig. 2 e 3).

Está a, aproximadamente, 7 km a sudoeste

povoado de Piçarrão, a 58 km a oeste da cidade

de Sobradinho e a 100 km da atual sede do

Município de Sento Sé. Fica a 15 km a

sudoeste da unidade de pesquisa de Kestering

(2007) e a 5 km a oeste da unidade de pesquisa

de Lima Filho (2013) (Fig. 4).

Figura 2 – Serrote do Morrinho

Fonte: Acervo pessoal dos autores

Figura 3 – Localização do Serrote do Morrinho

Fonte: Google Earth (2013), modificado pelos

autores

Figura 4 – Definição preliminar e hipotética do

território ocupado pelos autores das

figuras da Subtradição Sobradinho

Fonte: Lima Filho (2013, p. 141)

As rochas que compõem o Serrote do

Morrinho pertencem ao grupo geológico

Metagranitóides de Regime Transcorrente da

Tectogênese Transamazônica (Fig. 5). As

rochas Metagranitóides jazem sobre o conjunto

de rochas plutônicas e metaplutônicas muito

antigas de origem ígnea, magmática ou

eruptiva. A Tectogênese Transamazônica

ocorreu no Proterozóico Inferior, há,

aproximadamente, dois bilhões de anos,

quando começavam a parecer no planeta as

primeiras formas de vida unicelular avançada e

multicelular.

Figura 5 – Esboço geológico do Serrote do

Morrinho

Fonte: Angelim (1997), modificado pelos autores

Nessa feição de relevo, identificaram-se

três sítios arqueológicos, quais sejam:

Morrinho 1 (código 028.1), Morrinho 2

(código 028.2) e Morrinho 3 (código 028.3).

Page 7: TEMPLATE PARA ELABORAÇÃO DE ARTIGOS CIENTÍFICOS … · da arqueologia brasileira e nordestina foi permeado de fantasia. A aurora de uma arqueologia acadêmica em terras brasileiras

Evolvere Science, V. 3, N. 3, 2014

7

3.1 Sítio arqueológico Morrinho 1

O sítio Morrinho 1 é um lugar plano, com

solo arenoso e vegetação rala. Nele houve uma

roça onde se plantava mandioca, feijão,

melancia e milho. É multicomponencial, ou

seja, possui vestígios pré-coloniais (artefatos

líticos e pinturas rupestres) (Fig. 6 e 7),

coloniais e/ou pós-coloniais (fragmentos de

louça, cerâmica, vidro e metal) (Fig. 8 a 11).

Figura 6 – Artefato lítico pré-colonial (núcleo)

Foto: Acervo pessoal dos autores

Figura 7 – Pilão em matacão e percutor

Foto: Acervo pessoal dos autores

Figura 8 – Fragmento de louça

Foto: Acervo pessoal dos autores

Figura 9 – Fragmento de cerâmica

Foto: Acervo pessoal dos autores

Figura 10 – Fragmento de vidro

Foto: Acervo pessoal dos autores

Figura 11 – Fragmento de metal

Foto: Acervo pessoal dos autores

3.2 Sítio arqueológico Morrinho 2

Page 8: TEMPLATE PARA ELABORAÇÃO DE ARTIGOS CIENTÍFICOS … · da arqueologia brasileira e nordestina foi permeado de fantasia. A aurora de uma arqueologia acadêmica em terras brasileiras

Evolvere Science, V. 3, N. 3, 2014

8

O sítio Morrinho 2 é um afloramento de

metagranito porfirítico onde se esculpiu e se

utilizou uma base fixa de pilão em rocha (Fig.

12 e 13).

Figura 12 – Sítio arqueológico Morrinho 2

Foto: Acervo pessoal dos autores

Figura 13 – Pilão em rocha

Foto: Acervo pessoal dos autores

No município de Sento Sé é comum

encontrarem-se bases de pilão, esculpidas em

matacões ou fixas em afloramentos rochosos.

Normalmente eles situam-se próximo a fontes

de água ou no leito dos riachos, junto a solos

agricultáveis onde, no período pré-colonial,

entre outras culturas se plantava milho.

Calderón et al. (1977, p. 35) afirmaram que

“este cereal, como base alimentar, era pilado,

moído ou triturado e utilizado de diversas

maneiras na alimentação”.

3.3 Sítio arqueológico Morrinho 3

O sítio Morrinho 3 é constituído de um

matacão em que se identificaram quatro

painéis de pinturas rupestres, com um total de

nove figuras de temáticas variadas (Fig. 14).

Figura 14 – Sítio arqueológico Morrinho 3

Foto: Acervo pessoal dos autores

Por se constatar que todas as figuras

rupestres identificadas eram reconhecíveis,

concluiu-se que elas foram feitas por membros

de um grupo pré-colonial diferente daquele que

realizou as pinturas da Tradição Nordeste,

dominantes na região Sudeste do Piauí. Lévi-

Strauss (1989) caracterizaria o grupo autor

como membros de uma sociedade quente.

Hernando (2002) reconhecê-los-ia como

membros de uma sociedade metafórica. Por ser

dominante no Vale do Rio São Francisco,

classifica-se, preliminar e hipoteticamente,

esse grupo de pinturas na Tradição São

Francisco.

As pinturas rupestres do Morrinho 3

representam temáticas variadas. Foram

pintadas com tinta vermelha e com pincéis de

largura média.

4 ANÁLISE DAS PINTURAS

Page 9: TEMPLATE PARA ELABORAÇÃO DE ARTIGOS CIENTÍFICOS … · da arqueologia brasileira e nordestina foi permeado de fantasia. A aurora de uma arqueologia acadêmica em terras brasileiras

Evolvere Science, V. 3, N. 3, 2014

9

Das nove figuras que compõem os quatro

painéis do sítio arqueológico Morrinho 3 (Fig.

15 a 18), 7 (77,78%) representam temáticas

recorrentes e 2 (22,22%), não-recorrentes. São

distribuídas as figuras de recorrência temática

(RT) em cinco conjuntos (Fig. 19 a 24). Foram

constatadas duas temáticas não recorrentes

NR-57 e NR-583.

Figura 15 – Painel 1

Fonte: Kestering, 2011, p. 144

Figura 16 – Painel 2

Foto: Acervo pessoal dos autores

Figura 17 – Painel 3

3 As duas figuras não recorrentes (NR-57 e NR-58)

não foram identificadas nas pesquisas de

Kestering (2007) e Lima Filho (2013).

Fonte: Acervo pessoal dos autores

Figura 18 – Painel 04

Fonte: Acervo pessoal dos autores

Figura 19 - Temáticas recorrentes

Fonte: Os autores

Figura 20 – Temática dominante (RT-16) com base

em Kestering (2007) e Lima Filho

(2013)

Fonte: Os autores

Figura 21 – Temática dominante (RT-21) com base

em Kestering (2007) e Lima Filho

(2013)

Page 10: TEMPLATE PARA ELABORAÇÃO DE ARTIGOS CIENTÍFICOS … · da arqueologia brasileira e nordestina foi permeado de fantasia. A aurora de uma arqueologia acadêmica em terras brasileiras

Evolvere Science, V. 3, N. 3, 2014

10

Fonte: Os autores

Figura 22 – Recorrência temática (RT-17), com

base em Kestering (2007) e Lima

Filho (2013)

Fonte: Os autores

Figura 23 – Recorrência temática (RT-22) com base

em Kestering (2007) e Lima Filho

(2013)

Fonte: Os autores

Figura 24 - Recorrência temática (RT-75) com base

Lima Filho (2013)

Fonte: Os autores

Figura 25 – Figura não recorrente (NR-57)

Fonte: Os autores

Figura 26 – Figura não recorrente (NR-58)

Fonte: Os autores

4.1 Discussão

Page 11: TEMPLATE PARA ELABORAÇÃO DE ARTIGOS CIENTÍFICOS … · da arqueologia brasileira e nordestina foi permeado de fantasia. A aurora de uma arqueologia acadêmica em terras brasileiras

Evolvere Science, V. 3, N. 3, 2014

11

Não se constatou predominância da

temática representada por traços contínuos, em

diagonal ascendente e descendente, quando

horizontais, ou da esquerda para a direita e

vice-versa, quando verticais, logo, as pinturas

rupestres do Serrote do Morrinho não

pertencem a Subtradição Sobradinho.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados da pesquisa permitem propor,

em nível hipotético e preliminar, que as

pinturas do Serrote do Morrinho, por serem

majoritariamente reconhecíveis, pertençam à

Tradição São Francisco e, por apresentarem

dominância temática diferente da que compõe

a Subtradição Sobradinho, pertençam a uma

subtradição a ser definida.

Pondera-se que a pesquisa limitou-se a uma

única feição de relevo onde as rochas que

serviram de suporte para a realização das

pinturas rupestres são constituídas de

metagranitos da Tectogênese Transamazônica,

diferentes das rochas metassedimentares da

Chapada Diamantina, Formação Tombador,

onde Kestering (2007) identificou a temática

dominante da Subtradição Sobradinho. A

identificação de dominâncias temáticas

diferentes, relacionadas com suportes de

estrutura geológica também diferente sugere a

ocorrência de uma subtradição que não a de

Sobradinho. Para que essa se comprove

demandam-se outras pesquisas na região.

Recomenda-se que se analisem as pinturas e

gravuras de todos os sítios arqueológicos que

se localizam ao sul do povoado de Piçarrão, no

Município de Sento Sé – BA, onde se

estendem os metagranitos da Tectogênese

Transamazônica, relacionando-as com os

registros gráficos abundantes nas rochas

metassedimentares da Chapada Diamantina do

entorno.

Com esta pesquisa quis-se sensibilizar a

sociedade na visualização do papel social do

arqueólogo, pois na busca da identidade de

grupos pré-coloniais, esses profissionais têm a

tarefa de resgatar a autoestima coletiva dos

sertanejos para edificar com eles o futuro da

região Nordeste do Brasil (KESTERING).

REFERÊNCIAS

ANGELIM. Luiz Alberto de Aquino.

Programa Levantamentos Geológicos

Básicos do Brasil Petrolina: Folha SC. 24-V-

C. Escala 1/250.000. Brasília: CPRM, 1997.

BICHO, Nuno Ferreira. Manual de

arqueologia pré-histórica. Lisboa, Portugal:

70 Compêndio, 2006.

CALDERÓN, Valentim; JÁCOME, Yara

Dulce Bandeira de Ataíde; SOARES, Ivan

Dorea Cancio. Relatório das atividades de

campo do Projeto Sobradinho de

Salvamento Arqueológico, 1977.

GOOGLE EARTH. US Depto State

Geographer. Maplink / Tele Atlas. 2013.

Acesso: 20 Jan 2013.

Page 12: TEMPLATE PARA ELABORAÇÃO DE ARTIGOS CIENTÍFICOS … · da arqueologia brasileira e nordestina foi permeado de fantasia. A aurora de uma arqueologia acadêmica em terras brasileiras

Evolvere Science, V. 3, N. 3, 2014

12

HERNANDO, Almudena. Arqueología de la

Identidad. Madrid: Akal, 2002.

HUSSELL, Beltrand. Nosso Conhecimento

do Mundo Exterior. São Paulo: Nacional,

1964.

KESTERING, Celito. Registros Rupestres na

Área Arqueológica de Sobradinho. Recife:

UFPE (Dissertação de Mestrado), 2001.

______. Patrimônio Arqueológico de Sento Sé

– BA. 2011 (Prelo).

______. Identidade dos grupos pré-

históricos de Sobradinho-BA. Recife: UFPE,

2007. Tese (Doutorado em Arqueologia) –

Programa de Pós-Graduação em Arqueologia,

Universidade Federal de Pernambuco, Recife.

2007.

LÉVI-STRAUSS, Claude. O Pensamento

Selvagem. Campinas, SP: Papirus, 1989.

LIMA FILHO, Sebastião Lacerda de. Pintura

Rupestre: definição das fronteiras da

Subtradição Sobradinho – BA. Laranjeiras:

UFS, 2013. Dissertação (Mestrado em

Arqueologia) – Programa de Pós-Graduação

em Arqueologia e Interfaces Disciplinares,

Universidade Federal de Sergipe, Laranjeiras,

2013.

MITHEN, Steven J. A pré-história da mente:

uma busca das origens da arte, da religião e

da ciência. São Paulo: Editora UNESP, 2002.