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Autor Desconhecido Teologia Contemporânea Movimentos que deram Origem à Teologia Contemporânea

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Autor

Desconhecido

Teologia

Contemporânea

Movimentos que deram Origem à Teologia

Contemporânea

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Teologia Contemporânea

Movimentos que deram Origem à Teologia Contemporânea

Renascença luterana. Quando Lutero foi descoberto, descobriu-se também o sentido

que o mesmo tinha a respeito de Deus. Isso despertou um novo olhar no reformador. Foi a

partir de Lutero que começa brotar todos os movimentos.

Realismo bíblico. Esse movimento surgiu em reação à escola ritschiniana. Assim

como Lutero, esse realismo bíblico adequava-se melhor à natureza humana.

Crítica radical. Esta crítica histórica minava os pressupostos de toda a teologia liberal

e de Harnack. Essa crítica histórica começou no Antigo Testamento e no Novo Testamento

com uma radicalidade mais profunda.

Falando um pouco de Rudolf, Bultmann, ele procurou combinar a pesquisa histórica

com certa tentativa de sistematização. Chamava-a de “demitologização”. Segundo ele a

mensagem bíblica devia se libertar da linguagem mitológica.

O método da história das religiões. Como principal crítica do ponto de vista da história

das religiões temos Hermann Gunkel. Esse movimento se encarregou de ser um método de

análise dos conteúdos dos escritos bíblicos. Procura descobrir até que ponto o antigo

Testamento e o Novo dependiam do simbolismo de outras religiões.

Ernst Troeltsch. Homem de grande visão histórica, preocupava-se com o sentido da

religião no contexto do espírito humano ou da estrutura mental humana. Criticou o livro de

Harnack – o que é cristianismo -, e se opôs á idéia de que o protestantismo acabara com o

mundo medieval. A sua filosofia da história baseia-se em uma atitude negativa diante do que

chama de “historicismo”.

Socialismo religioso. Esse movimento é a tentativa de superação das limitações do

esforço de Troeltsch de ir além do historicismo. Aqui Deus se relaciona com o universo, onde

este inclui a natureza, a história e a responsabilidade. Nesse movimento o amor de Deus

estava no mundo. Possuía uma idéia de teonomia, ou seja, o alvo desse movimento socialista

religioso era o estado teônomo da sociedade.

Karl Barth. Apesar de ter vindo desse movimento socialista religioso, ele não se uniu

ao mesmo. Via neste o abuso do socialismo religioso pelo nacionalismo religioso,

identificando a mensagem cristã com determinada idéia política ou social. Barth acabou com

a tentativa de qualquer relacionamento entre a teologia e o movimento trabalhista

revolucionário na Alemanha. Contudo, contribui para a salvação do protestantismo da

devastação e das matanças do nazismo neocoletivista e pagão.

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Para Bart, Deus não é objeto do nosso conhecimento ou ação. Em sua primeira fase de

sua carreira, ele identificava a revelação com a mensagem cristã, e negava o caráter

revelatório de tudo que não fosse mensagem.

Bart não se distanciou apenas do socialismo religioso, mas também, por algum tempo,

do lado político do poder de Hitler. Aceitava-o. Mas, logo após, Bart se tornou o líder da

resistência intraeclesiástica ao nacional-socialismo. Finalmente, reconheceu o que havia

negado, que o movimento encabeçado por Hitler era quase-religioso e apresentava sério

ataque contra o cristianismo.

Bart se tornou neutro concernente, à causa de Cristo ser identificada com a causa do

Ocidente. Em razão, recebeu muitas críticas.

Existencialismo. Tem percebido elementos no homem em contraste com a filosofia da

consciência voltada para as decisões conscientes do homem e para sua vontade. A descoberta

do inconsciente humano foi importantíssima para a teologia. Esse existencialismo juntou-se à

análise freudiana do inconsciente. Consegui mudar os tipos moralistas e idealistas. Trouxe

para o centro do pensamento teológico a questão da condição humana.

Apesar de afirmações pessimistas quanto a teologia do século passado, é possível vê-la

como o início de um novo despertar, de uma renovação, a partir de causas determinantes para

esse alvorecer. Segundo os historiadores, o surgimento das filosofias agnósticos e ateístas, que

obrigavam a teologia a buscar bases filosóficas mais seguras; a consolidação da estrutura da

Igreja e da autoridade, do papado através do Concílio Vaticano I: os pontíficos na cooperação

com o progresso teológico; a restauração tomista, que diminui o teólogo católico de uma base

filosófica; o retorno às fontes bíblicas e patrísticas, que infundiram na teologia um novo vigor;

o incremento da atividade missionária, que fez surgir o ramo teológico de missiologia; e o

desenvolvimento de questões sociais, que dos quais surgem novos problemas teológicos, a

teologia, mais também, trazer algumas características como: atitude polêmica em relação à

cultura profana, a conformidade ao magistério eclesiástico, a estrutura tomista e seus

fundamentos patrísticos.

Essa teologia do século XIX não produziu um discurso polêmico com os cristãos e sim

com os expoentes da cultura profana.

Diante de tais reações podemos perceber o avanço da teologia do século XX.

O retorno aos pobres é uma das mais importantes características da teologia desse

século, os seus motivos estavam em uma dimensão filosófica. Encontra-se na razão última de

avaliação do seu pensamento como fonte essencial da teologia cristã.

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Outro elemento que contribui para renovação a teologia contemporânea foi o estudo da

Sagrada Escritura. Esse estudo tornou-se importante, quando os erros exegéticos bíblicos

estavam ameaçando os próprios fundamentos do cristianismo.

O terceiro elemento foi o movimento litúrgico.

Todos essas movimentos (renascimento tomista, bíblico e patrístico e litúrgico)

penetraram profundamente na teologia contemporânea, elevando-a ao renascimento.

Os primeiros momentos da nova teologia se deu após a Segunda Guerra Mundial.

Durante algum tempo esses “novos teólogos” foram vistos com simpatia, mas logo começou

os conflitos com os teólogos tradicionais a partir do artigo de Danielou, acusando-o de

desvalorizar a teologia sistemática, e daí se prosseguiu.

Fundamentalismo. Corrente teológica que, apesar de lançar suas raízes no século XVI,

na Reforma Protestante, foi marcante no início do século XX, em especial a América do

Norte. O Fundamentalismo se propunha defensor da ortodoxia cristã, contra as ameaças e

subversões do liberalismo ou modernismo.

O termo fundamentalismo foi usado pela primeira vez pelo Dr. C. C. Laws, editor do

periódico batista “Watchman- Examiner”, e continha implicações para os que assim

denominavam-se, como os que firmam-se no que é mais fundamental na fé cristã, ou seja,

aquele mínimo de convicções sem as quais ninguém poderia admitir-se cristão.

Durante os vinte primeiros anos do século XX, os fundamentalistas encontravam-se

em plena atividade entre maior a parte das denominações protestantes. Encontravam-se na

ofensiva e esforçavam-se para afastar os liberais dos postos de liderança eclesiástica. Nem

sempre os fundamentalistas foram vitoriosos e, durante a década de 30 foram eles que

sentiram-se pressionados a saírem das igrejas e dos seminários. Apesar do arrefecimento da

disputa entre os liberais e fundamentalistas, e quando se pensava que o fundamentalismo

havia falecido, eis que ele ressurge com o advento da II Guerra Mundial, e em toda década de

40, o despertamento da erudição em círculos fundamentalistas fez surgir uma teologia

conservadora.

Uma das grandes figuras desse ressurgimento foi o Dr. Professor de Apologética do

Seminário Teológico de Fuller, E. J. Carnell. Em seus livros, ele empreendia uma defesa

filosófica do Cristianismo Conservador.

Dentro do movimento fundamentalista sempre houve teólogos com a disposição de

defender a ortodoxia com o que melhor tivessem em erudição. Manifestavam-se eles

suspeitosos de ataques feitos contra a ciência ou contra o criticismo bíblico, estando sempre

na defesa do cristianismo ortodoxo.

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Na sua defesa, qualquer fundamentalista entendia que o primeiro ponto nevrálgico era

a doutrina transmitida pela tradição protestante (Luterana), a doutrina que proclamava ser a

Bíblia a única autoridade infalível, palavra literal e inerrante do Deus vivo, revelação única

d’Ele ao homem. Alguns fundamentalistas fanáticos acreditam que a Versão do Rei Tiago é

infalível, e não aceitam qualquer revisão.

O ponto vital no fundamentalismo é a preocupação expressa para com os interesses da

salvação humana. Os fundamentelistas crêem na doutrina da vinda “Pré-milenial” de Cristo, e

a revelação divina da segurança de salvação aos que depositam a sua fé no Senhor.

Os fundamentalistas, diferente do pensamento iluminista que declara a bondade inata

do homem, acreditam na depravação total do ser humano. Toda a bondade que existe na

natureza humana é maculada pelo pecado, e nenhuma dimensão da vida está livre de seus

efeitos. Originalmente o homem foi criado perfeito, mas após a sua queda, o pecado entrou na

raça humana e corrompeu o homem no mais íntimo do seu ser. O pecado não é uma fraqueza

ou ignorância inerente, mas a rebelião positiva contra as leis de Deus. Mas o Filho Unigênito

de Deus, Jesus Cristo fez-se expiação pelo pecado na cruz do Calvário, quando derramou seu

próprio Sangue, redimindo, assim, o homem do poder da morte espiritual, resgatando os

pecados da humanidade, derrotando os poderes das trevas e satisfazendo as exigências da

Justiça de Deus para o perdão dos pecados.

Existe uma tendência que considera o fundamentalismo como um movimento que

relega as faculdades da razão. Alguns elementos justificam essa tendência, como por

exemplo, no posicionamento radicalmente contrário a teoria da evolução dos seres.

O fundamentalismo é visto didaticamente como:

Metodologia Filosófica: que tem a Bíblia como ponto de partida e autoridade final

para analisar e julgar todas as coisas e questões do universo;

Metodologia Teológica: que deriva diretamente da Bíblia todo conhecimento sobre

Deus, fé, prática e vida cristã, onde tudo é estabelecido e normatizado por Ela.

a) Crê na possibilidade de uma Teologia Sistemática e Dogmática criada unicamente

pelo estudo sistemático da Bíblia, cujo arcabouço doutrinário chamamos de Sã

Doutrina;

b) Não crê na honestidade e veracidade do termo “fazer teologia”, como algo

resultante das abstrações e idéias que alguém tem fora do estudo puro e simples da

Bíblia, especialmente quando esse estudo distorce, acrescenta ou contraria o seu

ensino;

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c) Acredita sim, que toda verdade é a Verdade de Deus, que qualquer ciência que

chegue a uma conclusão e/ou comprovação verdadeira, não há de contrariar a

Bíblia e pode simplesmente ajudar a melhor compreender a revelação bíblica,

porém nunca suplantá-la ou substituí-la;

Metodologia Apologética: Crer que a sã doutrina, o ensino puramente derivado da

Bíblia é o mesmo para todas as culturas e épocas da história da humanidade, de

fato é a fé que uma vez por todas é entregue aos santos; O fundamentalismo enche-

se de zelo por defender e militar por essa fé, mesmo que lhe custe a própria vida.

Metodologia Eclesiástica: Que separa-se eclesiasticamente e dependendo do caso

até fraternalmente, de qualquer indivíduo, igreja instituição e movimento que se

afastem da sã doutrina ou que promovam qualquer tipo de negativa da fé bíblica.

Metodologia Evangelística: Crer que apenas o Evangelho de Cristo, composto de

tudo o que Ele ensinou pessoalmente ou através dos escritores do Novo

Testamento é suficiente para levar uma alma perdida a uma verdadeira conversão

espiritual e conseqüente salvação. É o método teocêntrico.

Após esse breve comentário, é bom que, em teologia, se faça distinção entre

fundamentalismo e conservadorismo(evangelicalismo). Apesar do fundamentalismo ter

surgido primeiro e, apesar das muitas afinidades de pensamento com o conservadorismo, os

últimos mostram-se bastante apercebidos dos erros do ponto de vista fundamentalista em

relação a ciência e outros desenvolvimentos modernos. Portanto é bom conhecer melhor o

conservadorismo(melhor conhecido como evangelicalismo).

Evangelicalismo. O evangelicalismo pode ser definido como: “Movimento do

cristianismo moderno que transcende as fronteiras denominacionais e confessionais,

enfatizando a conformidade com as doutrinas básicas da fé e um alcance missionário de

compaixão e urgência. Quem se identifica com esse movimento é um evangélico conservador

(ou evangelical) que crê no evangelho do Jesus Cristo e o proclama.”1

O século XIX é considerado como a era evangélica. Muitos são os movimentos de

reavivamento que surgem na América do Norte e que são a marca registrada da religião

evangélica com as campanhas de Charles Finney e D. L. Moody, bem como o trabalho dos

batistas, metodistas e presbiterianos, a paisagem religiosa da nação foi alterada. Nesse

período, o evangelicalismo atinge o nível popular e fundamental dos norte-americanos

brancos, enquanto que os negros, quer livres ou escravos, congregavam-se em igrejas

separadas mas que, também mantinham uma fé evangélica profunda e pessoal.

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O pensamento que permeia a mente dos norte-americanos até os dias atuais, de que

eles são “o povo escolhido de Deus” é fruto desse evangelicalismo que se desenvolve e

contribui diretamente para a formação dos valores dessa sociedade.

O evangelicalismo torna-se a religião civil dos norte-americanos. Os líderes políticos

desse período, expressavam publicamente suas convicções evangélicas e abafavam elementos

não protestantes e estrangeiros que não estivessem de acordo com a crença da nação. A

proposta de se eliminar os males morais e sociais dá margem para a tentativa de se criar uma

república de retidão, onde se levantavam campanhas para a abolição da escravatura e a favor

dos direitos femininos.

O espírito evangelical faz com que as nações do Atlântico Norte se engajem na obra

missionária que visa levar o evangelho aos quatro cantos da terra. Não demorou muito para

que os movimentos de reavivamento começassem a surgir em países asiáticos, africanos e

latino-americanos.

O início do século XX fica marcado como um período em que o evangelicalismo fica

eclipsado pela nova maneira de se encarar a realidade. O darwinismo se dissemina fazendo

brotar, nos corações, um sentimento de individualismo que arranca a raiz principal da

solicitude social.

A com fiança na infalibilidade das Escrituras é posta em cheque, graças ao niilismo de

Nietzsche, a psicologia de Freud, ao socialismo marxista dentre outros pensamentos que nesse

período surgem como uma avalanche de novas idéias.

Com as catástrofes sociais que foram trazidas pela primeira guerra Mundial, os

homens se decepcionaram com o conceito pós-milenista que divulgava a introdução do reino

de Deus imediatamente depois da vitória sobre o domínio dos males sociais na nação onde se

cumpriria a grande missão de se levar o evangelho a todas as criaturas da terra. Nesse período,

as pessoas começam a se desinteressar pelo cristianismo. Os defensores da fé partem para um

fundamentalismo estreito que tem como missão, se opor ao liberalismo teológico e ao

evangelho social da Grã-Betanha e América do Norte.

Com o fim da Segunda Grande Guerra, houve uma reviravolta no quadro religioso de

países europeus e norte-americanos. As campanhas missionárias no estrangeiro, os ministérios

radiofônicos, a literatura bíblica e o ministério evangelístico do jovem Billy Graham causaram

uma repercussão mundial. Graham, nos primeiros anos de ministério, começa a integrar a

organização evangelística Mocidade para Cristo, e é aí que se identifica com o movimento

que passa a ser intitulado como neo-evangelicalismo. Essa é uma forma nova de ser

evangélico, mais tolerante com as diferenças denominacionais, sem com isso deixar os

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alicerces da fé evangélica. A proposta era de um ecumenismo restrito, que abrangesse todos

os evangélicos, mas que respeitasse as divergências eclesiásticas. O neo-evangelicalismo

rejeitava o legalismo e o moralismo excessivo e revelava interesse sobre a dimensão social do

evangelho. Essa forma de encarar a realidade das coisas fez com que os neo-evangélicos

travassem um duro confronto com os fundamentalistas radicais. Para Ockenga, os

fundamentalistas adotavam uma atitude incorreta quando suspeitavam daqueles que não

defendiam todas as suas doutrinas e práticas; tinham uma estratégia errada quando almejavam

uma igreja totalmente pura nos níveis local e denominacional; e obtinham resultados

inadequados pois não conseguiram reverter a maré do liberalismo, nem atingir os problemas

sociais daquele tempo com sua teologia.

Embora hajam diferenças na forma de pensar, os teólogos neo-evangélicos

compreendem e aceitam as inúmeras semelhanças com o pensamento que era defendido por

seus antepassados fundamentalistas. O que os distinguia, basicamente, era a maior atenção

que os evangelicalistas davam as questões científicas e a outros desenvolvimentos modernos .

Os evangélicos conservadores defendem uma fé racional. Nomes com o de E. J.

Carnell, figuram como grandes pensadores do movimento evangelical. O teólogo supra-citado

é detentor de um considerável conhecimento em filosofia, ciência e teologia advinda de fontes

não conservadoras. Carnell apresenta-se contrário a todo esforço que pretenda deixar a

religião afastada das reflexões científicas e filosóficas.

Ainda hoje, pode-se perceber a influência do evangelicalismo nas denominações

protestantes, principalmente pela preocupação em defender a sã doutrina bíblica contra as

diversas correntes teológicas que têm surgido no presente século.

Bibliografia

GONZÁLEZ, L. Justo. A Era Inconclusão. Editora Vida Nova; Edição – 1996. São Paulo –

SP.

MONDIM, Batista. Os Grandes Teólogos do Século Vinte. Edições Paulinas. São Paulo.

1979.

Introdução À Teologia Na América Latina No Século XX

O Cristianismo transplantado da Europa e América do Norte criou raízes no Novo

Mundo do hemisfério sul, a América Latina, de tal forma que é impossível pensar na

sociedade das Américas Espanhola e Portuguesa sem considerar a influência de cinco séculos

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da presença Católica e do Protestantismo, em suas várias matrizes, principalmente a partir do

século XIX. Segundo o teólogo Otto Maduro “a teologia não é simplesmente produzido no

seio de uma sociedade determinada. Não. A teologia é produzida no seio de uma Igreja

situada em uma “sociedade”. Sendo assim, buscaremos refletir a condição atual dos povos

latino-americanos perguntando pelo lugar que a produção teológica ocupou no delineamento

do “mundo” latino-americano.

A Teologia Católica

A Igreja Católica Apostólica Romana recebe o século XX com o modelo tridentino de

Igreja, considerada como sociedade hierárquica perfeita, tendo no clero a expressão

institucional que alcança suas últimas conseqüências na centralização do poder papal.

Todavia, o potencial conservador no seio do Catolicismo é tão presente que já nos anos 20 há

manifestações de aprovação do retorno do modelo de Cristandade, uma formulação

eclesiástica de identificação com a Igreja Medieval, tanto que na maior Igreja da América

Latina viriam a surgir grupos defendendo que o Brasil se tornasse uma nova cristandade.

As primeiras décadas do século XX testemunharam da campanha em prol do retorno do

padroado, revitalizando a posição hegemônica do Catolicismo rompida desde os processos de

contestação à colonização nos diversos paises da América Latina. No Brasil, o discurso oficial

do clero católico pode ser representado pela seguinte expressão popular: “Todo bom brasileiro

é bom católico, e todo bom católico é bom brasileiro.”

Houve uma campanha pelo estabelecimento da “nova cristandade” negando-se outras

expressões religiosas a exemplo do Espiritismo e Protestantismo. Estes dois últimos já

experimentavam grande avanço em paises como Argentina, Uruguai, Colômbia e Brasil,

sendo assim, representavam a contestação à Igreja que durante séculos foi a tradutora dos

anseios religiosos dos povos Latino americanos.

Marcante, é também o contexto da Primeira Guerra Mundial, quando profundas

mudanças são provocadas no seio do catolicismo, principalmente no pontificado de Pio XII

(1922-1939) com o estabelecimento de concordatas que ressaltavam vários aspectos da Rerum

Novarum de Leão XIII, tal como o respeito ao matrimônio e a rejeição de métodos

contraceptivos. Pio XI ficou conhecido como “o papa da ação católica”, o qual procurou

valorizar o laicato, despertando-o para a tomada de posição frente ao conflito mundial

estabelecido. Pio XI condenou o livre capitalismo e o socialismo estreito que caminhavam

para bipolizar a Europa no que tange as questões de cunho sócio político.

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Dois movimentos marcaram o revigoramento do catolicismo no século XX: a sociedade

bíblica católica, num esforço por promover a compreensão da Bíblia. E ainda, o movimento

litúrgico que procurou revalorizar elementos da Igreja Antiga com destaque para o canto

gregoriano e o aspecto comunitário da missa. Mais tarde estes, pois empreendimentos seriam

reforçados pelo Concilio Vaticano II.

Entre a crise de 1929 com a quebra da bolsa de Nova Iorque e o anuncio da convocação

do Concilio Vaticano II aconteceu um grande amadurecimento do Cristianismo na América

Latina, com as tomadas de posições políticas e o reconhecimento do papel militante esperado

pelos lideres eclesiásticos. Os paises periféricos viviam sob a pressão dos centros

desenvolvidos, e isto cedeu espaço para a emergência de nacionalismos onde o populismo

configurava-se em marca descartável e o comunismo era alvo de contundentes rejeições.

Os anos de 1930 a 1959 foram os anos de criação das várias organizações nacionais e

continentais com os maiores esforços direcionados à valorização do laicato em ações

seculares sob a supervisão da hierarquia. A “ação católica” promoveu congressos eucarísticos,

encontros episcopais de nível nacional e latino americano, organismos como a Juventude

Operária Católica (JOC), Juventude Universitária Católica (JUC), Juventude Estudantil

Católica (JEC), Juventude Agrária Católica (JAC).

A reflexão teológica promoveu uma renovação intelectual com a publicação de obras

com caráter social e político. Revistas floresceram perguntado pela ação pastoral, catequética

e espiritualidade. Destacamos a Revista Eclesiástica Brasileira (Petrópolis), Teologia e Vida

(Santiago), Stronata (Buenos Aires).

De 25 de julho a 4 de agosto de 1955, reuniu-se no Rio de Janeiro a I Conferencia do

Episcopado Latino Americano, quando foi fundado o Conselho Episcopal Latino Americano

(CELAM). Este foi um período de crise em toda a América Latina face à estagnação dos

programas de industrialização e desenvolvimento social que haviam nos anos 30 suscitando

nova esperança às populações carentes.

O subdesenvolvimento que é fruto do desenvolvimento das potencias estrangeiras

causou um caos social na América Latina dos anos 60, quando 20 a 25% de crianças com

menos de 5 anos morriam por desnutrição, 40 % de crianças nascidas nestes paises morriam

de enfermidades curáveis, os índices de desemprego e miséria superavam todas as previsões,

criando-se então, uma atmosfera propicia à luta pela libertação da dependência à economia

estrangeira, sendo Cuba o maior exemplo de esperança para a Revolução necessária na

América Latina.

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Os milhões de latinos americanos que aguardavam por uma nova visão do Cristianismo

obtiveram como resposta da conferência do CELAM em Medellín, no ano de 1968 a opção de

cristãos, sacerdotes, religiosos e leigos por compreender a salvação em termos da libertação

de tudo que impede o desenvolvimento do homem, explorando-o e submetendo-o às injustiças

que andam na contra mão do estabelecimento do Reino de Deus entre os homens.

Centenas de movimentos cristãos, declarações públicas e atividades de cristãos ligados à

conscientização e mobilização das massas apareceram. Surgia a Revista Cristianismo e

Revolução na Argentina. Foi criada a pastoral dos bispos do Terceiro Mundo, congregando

setores progressistas da hierarquia comprometidos com a Teologia da Libertação.

Seguindo o caminho de Camilo Torres, o bispo Antonio Fragoso desafia publicamente o

regime de torturas dos governos militares brasileiros. No Uruguai, o padre Zaffarone ingressa

na clandestinidade após a publicação de Sacerdócio e Revolução na América Latina. No

Panamá, o padre Perez Herrera conclama os cristãos à luta contra o imperialismo. Na

Colômbia, German Guzman continua o trabalho de Camilo. Na Bolívia, oitenta sacerdotes

organizam-se para pedir uma revolução nos seio da Igreja e ainda, vale destacar, o manifesto

dos trezentos e cinqüenta sacerdotes brasileiros que chamam o povo à consciência e mudança

revolucionária, e que conseguem reunir quase mil assinaturas de sacerdotes comprometidos

com a Revolução na América Latina.

A Teologia da Libertação reúne teólogos como Gustavo Gutierrez, Juan Luis Segundo,

Segundo Galilea, Henrique Dussel, José Oscar Beozzo, Leonardo Boff, Raúl Vidales,

Ronaldo Munoz, Severino Croatto, Riolando Azzi, Clodovis Boff, João Batista Libanio, Jon

Sobrino, Carlos Mesters, José Comblin, Jorge Piscley, Gilberto Gorgulho, Ana Flora

Anderson e Milton Schwantes. Estes nomes comprometeram-se com o processo de libertação

dos pobres na América Latina através da reflexão e construção de uma Igreja revolucionária

no seu tempo.

Essa perspectiva secular quer associar a salvação ao processo histórico de libertação,

abrindo-se para temas relacionados à realidade social e ação política. É portanto, uma ruptura

com a teologia européia e norte-americana, produzida em paises desenvolvidos e

reducionistas no entendimento da doutrina da salvação, já que postulam-na fora da história e

depois da morte.

O problema teológico levantado pelos teólogos latino americanos é a relação existente

entre libertação real, pela qual, o continente aguardava ansiosamente, o conceito bíblico-

teológico de salvação. Procuram redescobrir o caráter histórico e materialista da fé bíblica, o

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qual não combina com o pensamento antológico grego e hegeliano de caráter idealista, e que

servia para articular a teologia cristã desde o tempo dos teólogos gregos.

A Teologia da Libertação toma o evento da vitória hebréia sobre os exploradores

egípcios como modelo de compromisso e esperança pela intervenção divina na história,

promovendo libertação e a realização da justiça como condição indispensável ao

desenvolvimento do homem novo no Reino de Deus. Este Reino reúne pobres,

marginalizados e explorados, ainda na terra. Condena as injustiças das estruturas econômicas

e sócio-políticas como pecado social contrário à fé no Deus de Israel.

A extensão destes novos ventos trazidos pela luta de cristãos latino-americanos alcançou

a esfera política prática na oposição aos regimes ditatoriais que casavam direitos políticos,

torturavam opositores, negavam direitos constitucionais e impediam o pleno funcionamento

de partidos políticos. Esses governos submeteram-se a uma politica desenvolvimentista de

rendição frente ao capital financeiro internacional.

A ação da Igreja Católica Romana identificava-se nos anos 60 e 70 cada vez mais com

os setores populares da Igreja, e isto mesmo era uma conseqüência das propostas retiradas do

Concílio Vaticano II. A maior novidade foi o surgimento das CEBs (Comunidades Eclesiais

de Base) dando um perfil mais participativo à vida da Igreja e possibilitando o resgate do

trabalho leigo tão esquecido pelas hierarquias católicas.

Paralelamente o Concílio Vaticano II comentou um crescente diálogo da Igreja Católica

com cristãos de outras denominações. Isto aconteceu de forma prática no trabalho em áreas de

conceitos indígenas, rurais e religiosos. Na reflexão teológica, a abertura para o movimento

ecumênico foi uma conseqüência de outras tentativas inauguradas por setores do

Protestantismo, a exemplo da Assembléia que deu origem ao Conselho Mundial de Igrejas em

1948.

Organizações ecumênicas avançaram no diálogo entre igrejas cristãs, tal como o

CONIC (Conselho Nacional de Igrejas Cristãs) e o CIMI (Conselho Indigenista Missionário),

reunindo cristãos católicos e protestantes de Igrejas fixadas em solo brasileiro. Recentemente,

este diálogo tem sido estabelecido em relação aos cultos afros de presença significativa e

plural na América Latina, trazendo à tona questões que passam pela discussão de gênero,

etnia, cultura e tolerância religiosa.

Mesmo com toda a efervescência teológica progressista, a Igreja Católica teve nos seus

quadros, clericais setores ultra-conservadores de direita, os quais defendiam a manutenção do

modelo eclesiástico que vigorou até o século XIX na América Latina ou seja, de cooperação

entre Igreja e Estado e permanência de uma Teologia sumamente européia. Muitos dentre

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estes sacerdotes aliaram-se a regimes populistas e ditatoriais, defendendo a propriedade

privada e opondo-se aos movimentos sociais de caráter contestatório ao “Status quo” social e

ideológico.

Os conflitos no interior da Igreja foram freqüentes, não havendo como desconsiderar o

clamor por renovação e atualização da palavra da Igreja. Os conflitos sociais chamavam a

Igreja Católica à participação no processo histórico latino-americano. O crescimento

explosivo de Seitas Orientais Espíritas e de grupos Pentecostais ou Neopetencostais,

confrontavam a Igreja com a sua deficiência na ação pastoral e litúrgica.

O Catolicismo Romano ocupou um lugar fundamental para a formação sócio-cultural da

América Latina, tanto que os grupos protestantes missionários mantiveram-se numa postura

anti-católica radical no século XIX, e no século XX fazia perdurar esta distância frente ao

Catolicismo, utilizando-se do argumento de que o atraso da América devia-se ao Catolicismo,

com sua dificuldade de absolver os valores da modernidade e inserir-se na nova Ordem

Mundial em gestação.

Os países da América Latina formaram-se em meio a uma confusa relação entre Igreja

e Estado, portanto foi sempre garantindo à Igreja Católica o espaço hegemônico de guardiã

das almas no Novo Mundo. Por ser a maior e mais tradicional expressão de religiosidade a

Igreja Católica foi alvo de duras críticas por parte de grupos religiosos que instalando-se nos

países latino-americanos; tinham como prosélitos os muitos católicos, dentre os quais estava

uma parcela de seguidores nominais vulneráveis à ação de grupos com uma ação mais

agressiva e direcionada à vida das pessoas.

A teologia católica, ainda não popularizada o quanto se fazia necessário, perdia espaço

na segunda metade do século XXI para denominações evangélicas. Estas denominações

alcançaram as massas valendo-se de poderosos meios de comunicação como a televisão, o

rádio e o jornal. Seus pastores afinavam-se cada vez mais com os “suspiros” do povo humilde

e explorado, oferecendo em suas reuniões cura, exorcismal e prosperidade.

A força neopentecostal influenciava denominações protestantes históricas e a Igreja

Católica, que diante da evasão de fiéis encontrava-se preparada para aderir nos anos 70 à

Renovação Carismática Católica, oriunda de reuniões avivalistas em acampamentos jovens

dos católicos norte-americanos, e que adentraria rapidamente em inúmeras dioceses católicas

do 3º Mundo.

Por ora, é difícil fazer uma avaliação mais aprofundada da repercussão carismática no

seio do Catolicismo, no entanto, este movimento tem feito perdurar posturas conservadoras,

ao tempo em que tem trazido fiéis para suas reuniões onde há tudo o que se espera de um

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culto evangélico neopentecostal. Padres-cantores animam auditórios ávidos por curas e

manifestações extáticas; redes de televisão e rádio são ocupadas diariamente por eventos e

massas de jovens que redescobrem a razão de se declararem católicos.

É certo que este movimento tem recebido criticas de setores progressista da Igreja, os

quais alegam a pobreza teológica existente na formação dos clérigos e na condução do

rebanho, de forma que o final do século XX tem testemunhado uma ascensão do Movimento

de Renovação Carismática Católica, diferentemente das alas progressistas que após o término

da guerra-fria e a crise de modelos socialistas no planeta tem amargado declínio no interesse

por sua abordagem frente à Bíblia e à fé cristã.

A Teologia Protestante

No Brasil, o Protestantismo nos seus primórdios era visto como uma religião de

estrangeiros e brasileiros marginalizados. Perseguido pelo Catolicismo, apoiou a causa

republicana e a separação entre Igreja e Estado, porque tais iniciativas diminuíam o poder do

catolicismo. A sua consciência política limitava-se a isso, devido pertencer tanto na origem

como nas convicções e financiamento ao capitalismo liberal, que era visto como uma visão

secularizada da fé cristã. Ousou depois falar em justiça social e começou-se a elaborar uma

Teologia a partir desse pobre e injustiçado, do qual se constitui a igreja na América Latina.

A história da Igreja na América Latina é composta de três períodos distintos: começa

com a chegada dos espanhóis e portugueses ao nosso continente, trazendo consigo um

cristianismo Ibérico. O segundo período é determinado pelo capitalismo industrial, e o

terceiro período já em meados do século XX, traz consigo mudanças na área político-

ideológica. Foi o período em que evidenciou-se dentre outras coisas o Liberalismo,

Positivismo, Cientificismo, a expansão protestante e a dependência econômica . O século XX

vivenciou as duas grandes guerras cujo objetivo era determinar a hegemonia do capitalismo

mundial.

Para a América Latina era o tempo do populismo e das burguesias nacionais, tempo em

que o protestantismo passa a considerar o continente como sendo pagão, iniciando a sua

penetração com o evangelismo de missões. Aconteceram três congressos fundamentais nessa

iniciativa: o congresso do Panamá (1916) , Montevidéu (1925), e Havana (1929).

Foi o período do projeto desenvolvimentista “ Aliança para o progresso “ (1955 a 1965)

no qual o protestantismo esteve nitidamente a serviço do capitalismo que o financiava, nasce a

Teologia da Libertação, fazendo uma opção pelos pobres e apostando numa proposta da igreja

20

inserida no contexto do socialismo. Teologia esta que surgiu a partir dos anseios e dos gritos

de liberdade do continente. Em 1945, época da II guerra mundial, governos com a

complacência da igreja extraditaram judeus na América Latina. Entre 1930 e 1945 a igreja

passa a adotar um discurso populista; no Brasil um líder protestante adota o “slogan” todo

luterano é nazista. Chamava-se a atenção para o perigo que representava para o futuro das

nações Latino Americanas, os protestantes, espíritas e comunistas, enquanto os protestantes

afirmavam que a responsabilidade do subdesenvolvimento do continente devia-se a forte

presença do catolicismo.

Por volta de 1954, com a queda dos regimes populistas na América Latina, o discurso

populista foi abandonado também pelas igrejas cristãs. O período de 1930 a 1959, foi

dedicado a organização nacional e continental, sendo que foram os protestantes iniciadores

dessa organização criando: confederações evangélicas, congressos de escola dominical,

encontros de presidentes de igrejas a nível regional. Mesmo inferiorizados numericamente, os

protestantes usaram a mesma estratégia dos católicos ; criaram ligas de crianças, de jovens,

senhoras e homens, tendo cada uma suas próprias publicações. Promoveram encontros de

agricultores, comerciantes e operários, alem dos encontros de massa protestantes.

A década de 1950, foi marcada pela preocupação “social” por católicos e protestantes

referente ao perigo comunista presente no meio operário. Foram criadas também associações

de seminários Teológicos e associações de estudantes de Teologia.

O Continente Latino Americano viveu um período de turbulências entre 1959 a 1985.

No nosso país, a partir de primeiro de abril de 1964, passamos a viver um período de opressão

com o regime militar. Sucederam-se golpes militares em praticamente toda a América Latina:

Bolívia (1971 ), Uruguai (1973), Chile (1973), Peru (1975), e Argentina (1976). Toda a

miséria do continente foi exposta, e nesses anos conturbados a Teologia teve que buscar de

forma muito séria e responsável, subsídios para que o povo Cristão tivesse a sua dor

amenizada, e não perdesse as esperanças no reino de Deus.

Destacou-se como grande pensador teológico nessa época Richard Shaull, que

percebendo as tendências revolucionárias na América Latina publicou em 1966 o seu livro: “

as transformações profundas à luz de uma Teologia Evangélica”. Ao lado dele podemos citar

como autênticos representantes da Teologia da Libertação no âmbito evangélico nomes como:

Emílio Castro, Júlio de Santa Ana, José Miguez Bonino e Rubem Alves. O período

compreendido entre 1970 e 1975, foi aquele no qual a Teologia da Libertação se expandiu

livremente. Foram realizados vários congressos, sendo que o primeiro deles ocorreu em El

Salvador no período de 8 a 15 de julho de 1972. Várias publicações ocorreram também como:

21

a Fé em busca de eficácia de Bonino, e a Theology human hope de Rubem Alves, que

ostentou esse título devido a editora não concordar com o título original “Teologia da

Libertação”.

Houve uma grande influencia do desenvolvimento político da América Latina com a

Teologia da Libertação, o que levou os Teólogos latino-americanos a publicarem obras como:

Teologia a partir do cativeiro de Boff, e a Força histórica dos pobres de Gutierrez. As obras

emergentes nesse período, apresentavam a Libertação como uma luta paciente e persistente do

povo latino americano, que se encontrava vivendo em um contexto onde predominava a

opressão e a perseguição, e longe de tornar-se um entrave, esse clima de opressão e

perseguição determinados pelo Estado de Segurança Nacional existente na América Latina,

fez com que a Teologia da Libertação ganhasse força, se espalhasse e proliferasse no

movimento popular das comunidades eclesiais de base, principalmente no Brasil bem como

no México, El Salvador, Peru Chile e Bolívia. Nessa reflexão sobre a práxis dos pobres,

engajaram-se também a Revista Eclesiástica Brasileira e a revista “páginas” do Peru.

Ocorreram também muitas distribuições de folhetos, cópias de conferências e os

cânticos contribuíram bastante na divulgação da Teologia da Libertação, já que os seus

Teólogos não dispunham de grandes bibliotecas, e fora-lhes negado o acesso a cátedras

teológicas.

Pentecostalismo

Na segunda metade do século XX, o Protestantismo Latino Americano passou por

profundas mudanças, onde destacamos o grande crescimento do Pentecostalismo

permanecendo porem inalterado o número de cristãos.

Em 1986 na Argentina, Honduras, Nicarágua, Bolívia, República Dominicana e Guiana

Francesa, o índice de protestantes era de 5 a 10%. No Brasil, El Salvador, Haiti, Panamá e

Suriname era esse índice de 10% a 20% da população. Em Belize, Chile, Guatemala, Guiana e

Porto Rico 20% a 30%. Na região Andina, Paraguai, Uruguai, em Cuba e no México,

inferiores a 5%. E a maioria absoluta era de Pentecostais.

Por volta de 1910 o Protestantismo tinha se implantado no continente Latino

Americano. A sua dependência econômica particularmente advindas das sociedades

missionárias Norte Americanas, fez com que a sua presença estivesse relacionada também á

presença do capital Norte Americano. Por esse motivo, após a crise econômica mundial de

1929, os regimes nacionalistas e populistas viam o Protestantismo diretamente relacionado ao

22

Imperialismo Norte Americano. Na realidade, esses posicionamentos direcionavam-se ao

Liberalismo, porque historicamente o Protestantismo esteve ligado na América Latina ao

Liberalismo e á Maçonaria, e onde houve uma reação mais forte ao Liberalismo de igual

modo se atacou o Protestantismo, a exemplo da Colômbia e México. Nesse período é que

surge a nova tendência religiosa, o Pentecostalismo, considerado pelo Chile e pelo Brasil

como fanatismo doentio ou cerimônia de índios. Vista como uma religião popular,

menosprezada pelas elites e pelo Protestantismo liberal, surge como uma religião

independente antagônica à política Protestante.

Aos poucos foi crescendo e foi ignorada até 1960, quando o Protestantismo histórico

descobriu-se minoritário em relação ao novo movimento, apresentava-se como um

movimento efervescente popular e de tradição oral, dedicado ás massas. A partir de 1960,

houve então uma acelerada mutação no campo religioso Latino Americano, que apresentou

em algumas regiões um catolicismo antes hegemônico e agora representado por menos da

metade da população. Os pastores passaram de uma função liberal democrática ao papel de

dono da fazenda. Passaram a ser administradores religiosos, autoritários e antidemocráticos,

assumindo uma postura adequada á lógica das mentalidades religiosas populares. O

Pentecostalismo passou a fazer o papel pertencente ao Catolicismo no passado, tornando-se na

realidade em um Catolicismo popular de substituição. Criou-se um mundo popular habitado

por demônios, espíritos, revelações e curas divinas, que passou a prevalecer na história

religiosa do século XX.

No Pentecostalismo, o povo humilde e simples identificou-se, reconhecendo que sua

religião fôra relegada a segundo plano pela romanização Católica e pelo Protestantismo

histórico. Reconhece-se isso como uma aculturação que instalou-se na América Latina, como

uma continuidade do universo cultural do seu povo simples. Dentro desse cadinho de

movimentos religiosos e sincréticos Latino Americanos, podemos observar o crescente

caciquismo religioso correspondente ao tempo dos coronéis. Assim, Martin N. Dreher

assevera que “ O cristianismo assimila e se deixa assimilar no contexto Latino Americano, por

uma cultura religiosa e política autoritária que se desenvolve de acordo com a lógica da

negociação corporativa”.

O Pentecostalismo veio quebrar o esquema ou a idéia de que só era permitido a

letrados e doutores ensinar e curar. Hoje, esse movimento se constitui na grande explosão

religiosa do país, está ligado a um modelo político social que engloba um povo que vive na

periferia física, social e espiritual do nosso país, e assume uma função social ao tempo em que

ameniza o sofrimento de um povo oprimido, trazendo um discurso de resignação,

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compensando a miséria ,os conflitos sociais e a opressão, com a promessa de salvação. Traz

também um discurso de revolta e resistência, ao negar o mundo com seu sistema opressivo, e

ao afirmar que o mesmo é do diabo e a sociedade dominada pelo diabo deve ser substituída

por um sistema mais humano, realmente comunitário e compensatório.

A primeira igreja Pentecostal a surgir no Brasil é a Congregação Cristã do Brasil em

São Paulo em março de 1910. Em 1930 já contava com 30.800 membros, em 1962 com

600.000, dos quais 264.000 eram batizados. Possuía 777 prédios próprios e 993 alugados,

concentrava-se em São Paulo e Paraná.

Em novembro de 1910 chegaram em Belém do Pará os Batistas Daniel Berg e Gunnar

Vingren, e segundo eles vieram para trazer o Espírito Santo para a igreja Batista. Esses dois

irmãos se filiaram á Igreja Batista de Belém, e em 12-06-1912 foram excluídos, por pregarem

o Batismo do Espírito Santo ou Glossolalia, criando então a Assembléia de Deus. Em 1930,

havia Assembléia de Deus em todos os Estados da Federação, e já contavam com 14.000

membros. Até 1964, apresentando uma taxa de crescimento de 15% ao ano chegou a um total

de 950.000 adeptos tornando-se a maior igreja Protestante da América Latina. Em 1965 os

grupos Pentecostais cismáticos já somavam um total de 30, dos quais o maior era a igreja

Pentecostal O Brasil Para Cristo, fundada por Manoel de Melo, ex pregador da Assembléia de

Deus e colaborador da Cruzada Nacional de Evangelização. Esse grupo é também conhecido

como Igreja do Evangelho Quadrangular, de origem Norte Americana. Teve também um

grande crescimento, e em 1963 contava com 500.000 adeptos e possuía um templo em São

Paulo com capacidade para acomodar 25.000 pessoas.

Essa expansão Pentecostal aconteceu sem auxilio externo, seja de ordem financeira ou

pessoal. Os crentes de denominações Protestantes tradicionais, acolheram de bom grado os

Pentecostais que traziam consigo um Evangelho cuja doutrina era simples e descomplicada,

diferente do Cristianismo racional dos missionários Protestantes, nem sempre compreendido e

aceito pelos membros mais simples. As doutrinas confessionais eram muito complexas para

eles. O Pentecostalismo, ao contrário, viabilizava uma prática cristã mais espontânea, uma

revelação direta, calor e vibração em suas reuniões. Aliado a isso, abria a possibilidade a cada

crente de tornar-se pastor, ensinar e curar.

Atribue-se a esses fatores o seu crescimento que em 1930 representavam 10% do

Protestantismo. Em 1950, 2/3 e em 1965- 68,5% de 244.800 passaram a 2.239.000 adeptos.

Um outro fator a considerar é que a industrialização, a alteração da estrutura agrária e a

migração interna contribuíram para o aumento populacional da periferia, gerando o público

ideal ao Pentecostalismo, que direcionava a sua mensagem aos marginalizados da sociedade,

24

que viviam em insegurança social e lhes oferecia a salvação. Isso acontecia porque os

Pentecostais não eram especialistas teológicos e eram autônomos, não dependendo como os

Protestantes tradicionais e os Católicos de ingerência exterior. O Pentecostalismo era o povo

pregando para o povo, a doutrina era simples e descomplicada, era apresentada uma promessa

de cura divina para um povo onde havia carência de tratamento. De 1960 a 1970 os

Pentecostais cresceram 101% e o restante do Protestantismo 44%.

Neopentecostalismo

Dentre os diversos grupos neopentecostais destaca-se ao lado da igreja Deus é Amor, a

Igreja Universal do Reino do Deus, que tem a característica de ser uma igreja episcopal, uma

igreja de necessidades, uma igreja de mercado, uma igreja supermercado.

A diferença é que o pentecostalismo se caracteriza por uma estrutura congregacional

desde o seu ponto visto eclesiológico, a IURD se encontra estruturada em seu fundador, o

Bispo Edir Macedo que por força do estatuto detêm a direção autocrática e vitalícia da igreja.

Torna-se uma igreja de necessidades a partir do momento que busca interpretar e

responder as necessidades do individuo que podem ser religiosos emocionais e sociais. Tendo

os seus templos abertos durante todo o dia, nos seus cultos são permitidos exteriorizar todo o

tipo de emoções nas orações cantos e gestos. O que dá as pessoas um sentimento de dignidade

e respeito em detrimento de uma vida de opressão e mal tratos, uma vida dura de se viver e

além do mais, muitas vezes são ajudados através de curas, exorcismos e motivação para

abandonar as drogas e outros vícios.

Torna-se uma igreja de mercado já a partir da sua localização geográfica. Fica

construída em locais estratégicos por onde passam muitas pessoas. Utiliza-se muito da mídia

para anunciar os seus produtos, é uma igreja diferente onde a comunhão profunda

experienciada nas outras igrejas é substituída pelo encontro breve como acontece nos

SHOPPING CENTERS que possuem uma clientela flutuante e móvel estimulada pela

televisão, a comparecer de forma festiva com muita música e diversão visando o aumento do

comércio.

É semelhante ao supermercado também no sistema econômico quando oferece um

produto apetitoso por um preço adaptável ao momento econômico, usando-se a filosofia

mercantil de sempre vender mais. Prega-se então a doutrina do dízimo, mas apesar disso a

relação membro-igreja não deve se caracterizar apenas pelo cumprimento formal do dizimista

25

ao dizimar mas sim, deve vim acompanhado por ofertas voluntárias por amor, cujo valor é

fixado segundo a vontade de cada um.

É através desse proceder que o fiel terá uma vida em abundancia, paz, saúde, êxito

econômico e prosperidade. Na teologia da IURD não cabe aquilo que é fundamental para o

cristianismo: A Graça.

Mesmo identificando-se em sua teologia com alguns elementos do pentecostalismo

como: Batismo pelo Espírito Santo, glossolalia, santificação e cura divina e, de certo modo,

exagerando no exorcismo, a IURD, tem os seus pontos divergentes do pentencostalismo no

que se refere a importância que se dá ao significado da obra de Jesus com o seu slogan “Jesus

Cristo é o Senhor” afirma que é em nome de Jesus e mediante o poder do Espírito Santo que

os demônios são expulsos, daí a relação de Jesus com o homem ser de libertador e libertado e

não de redentor e redimido. A libertação a que se refere não é a pesada carga de culpas do

pecado e sim dos males espirituais, dos demônios que provocam sofrimento, não enaltecem a

graça salvadora de Jesus, que perde o seu significado.

Outra divergência vem implícita em um outro slogam “Pare de Sofrer”, entrando em

choque com os ensinos do protestantismo e pentecostalismo onde se apresenta o sofrimento

de Jesus como tendo conseqüências na vida do cristão e por conta disso se prepara o cristão

para encarar o sofrimento em tempos de provação.

No neopentecostalismo com o seu supermercado pentencostal nada mais é de graça,

pois a graça de Deus inexiste. Será o fim da sola gratia?

Bibliografia

DREHER, Martin Norberto. “A Igreja Latino-americana no Contexto Mundial”. São

Leopoldo. Sinodal. 1993. (Coleção: “História da Igreja, vol.4”).

DUSSEL, Enrique. “História da Igreja Latino-americana”. São Paulo. Paulus 1989.

Trad.Eugênia Flávian.

HOORNAET, Eduardo. “História da Igreja na América Latina e no Caribe: 1945 – 1995: O

Debate Metodológico”. 1995. (Coleção: “Cehila”). Trad. Ephroim Alves.

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TEÓLOGOS DA AMÉRICA LATINA

GEORGE V. PIXLEY

Biobibliografia

Nasceu em Chicago, nos Estados Unidos da América. Viveu a infância e a juventude

na Nicarágua, América Central. Hoje, reside em Manágua, Nicarágua. É pastor da Igreja

Batista. Doutorou-se em Estudos Bíblicos pela Faculdade de Teologia da Universidade de

Chicago. A partir do ano de 1963 a 1975 foi professor de Antigo Testamento no Seminário

Evangélico de Porto Rico. Atualmente é professor da mesma cadeira no Seminário Batista e

professor de História de Israel no Instituto Teológico de Estudos Superiores, na cidade do

México. Durante sua peregrinação, publicou diversas obras e algumas foram traduzidas para o

dialeto português. É pastor da Igreja Batista em Nicarágua. É um conceituado biblista da

América Central.

Mesmo natural dos Estados Unidos, dedicou a sua vida ao ensino da Palavra de Deus

no contexto latino-americano.

É autor de vários livros, entre os quais estão: A História de Israel a partir dos pobres

(1989); O Reino de Dios (1977); Êxodo – una lectura evangélica y popular (1983); La

resurrección de Jesus, el Cristo – una interpretación desde la lucha por la vida (1999);

Escreveu também inúmeros artigos para revistas de educação teológica, dentre elas a

Ribla – Revista de Interpretação Bíblica Latino-Americana. No momento, Pixley faz parte do

Conselho de Redação dessa revista. Pixley, também é redator da revista Nicaragüense de

Teologia: XILOTL.

Pensamento Teológico

Pixley procura fazer uma leitura dos textos bíblicos a partir dos pobres e oprimidos. E

para isso, pontua duas chaves hermenêuticas para interpretar o texto bíblico. Pois ele diz que

os “documentos deixados por qualquer história sempre existem interesses que ocultam o

sentido dos acontecimentos. Nestas circunstâncias a busca do sentido toma, às vezes,

características ‘detetivescas’”.1

1 Jorge PIXLEY. A História de Israel a partir dos pobres, p. 9

27

A sua primeira chave de leitura teológica é o êxodo. Afirma que a saída da escravidão

de Israel do Egito não é uma mera história. É na verdade, o “evento originário do povo de

Israel”,2 significando que Israel contava sua história a partir do êxodo.

Portanto, a “saída” de Israel do Egito vai legitimar num fato revelador. Israel passa a

conhecer “a Deus como Javé, o Deus que os libertou da escravidão (...). [Pois] todo Deus que

não fosse um salvador dos pobres não era o Deus verdadeiro de Israel”.3

Pixley conclui dizendo que “um Deus que legitima a opressão dos camponeses, por

mais solene que se apresente seu culto, não é o Deus verdadeiro. Pois o Deus verdadeiro é

unicamente aquele que ouve o clamor dos oprimidos e os liberta de sua opressão”.4

A última chave hermenêutica que Pixley pontua é a sociologia. O próprio Israel

reconhece que fora libertado pelo poder de Javé. Por isso se torna extremamente importante a

consciência de Israel ser um povo pobre e oprimido que, “junto com Javé, luta por sua vida”5

e conseqüentemente por sua sobrevivência e libertação.

Para caracterizar os oprimidos nas comunidades da Palestina antiga “é preciso

conhecer a dinâmica que sustentava estas sociedades”.6 Deparamos com uma relação sintética

do tipo de sociedade que prevaleceu durante o período do antigo Oriente, especificamente no

Egito.

No êxodo são apresentadas três características da sociedade: o rei, os servos do rei e o

povo.

O povo era a massa camponesa que somava a grande maioria da população. Vivia em

pequenas aldeias. As aldeias eram as unidades produtivas da sociedade. Cada aldeia tinha a

sua obrigação de produzir o suficiente para as suas próprias necessidades. “Era governada

internamente pelos conselhos de anciãos, os chefes de família”.7

O rei do Egito era o proprietário de todas as terras, de todos os animais e de todas as

pessoas do país. A quinta parte da produção de cada aldeia pertencia ao rei.

Os servos do rei eram os empregados da coroa. Que em troca de seus serviços recebiam

provisões do tesouro real.

Portanto, de algum modo todos eram subordinados/escravos ao poderio do rei. O rei

ocupava um lugar único na sociedade. Daí, Pixley conclui que

2 Idem. 3 Idem, p. 10 4 Idem. 5 Idem. 6 Idem, p. 11 7 Idem.

28

A experiência dos súditos era de que seu rei era um deus mortal. Porém esta limitação, a sua

mortalidade, revelava a fragilidade de sua posição divina e exigia um aparelho religioso que

celebrasse a grandeza da nação, e dentro dela o lugar único e indispensável do rei-deus. O

aparelho religioso dentro de uma sociedade ‘asiática’ ou tributária está diretamente vinculado

à pessoa do rei. Assim como rei é o general do exército, é também o Sumo Sacerdote que

ordena e controla toda atividade religiosa. Necessita de profetas e teólogos para elaborar uma

teologia que justifique seu domínio absoluto.8

Portanto, as chaves hermenêuticas apresentadas acima, serão extremamente

importantes para se ler toda a Bíblia.

EDUARDO HOORNAERT

Biobibliografia

Nasceu na histórica cidade de Bruges, na Bélgica (Europa), em 1930. Estudou

Filosofia e História Antiga na Universidade de Lovaina e Teologia em Bruges. Trabalhou dois

anos na África como professor. Vive no Brasil desde 1958. Lecionou História da Igreja

durante mais de trinta anos em diversos Institutos Teológicos do Nordeste, em João Pessoa,

Recife e Fortaleza. É Professor visitante no mestrado de História na Universidade Federal da

Bahia e atualmente continua estudando a história das origens cristãs. É membro fundador da

Comissão de Estudos da História da Igreja na América Latina (CEHILA). Atualmente reside

em Salvador, na Bahia.

Suas principais obras são: O cristianismo moreno no Brasil (1991); Ética e filosofia da

libertação; Formação do catolicismo brasileiro: 1550-1800 (1991); História da Igreja na

Amazônia; História da Igreja na América Latina e no Caribe; História da Igreja no Brasil (co-

autoria com Riolando Azzi); Ensaios de interpretação a partir do povo: primeira época; A

memória do povo cristão – uma história da Igreja nos três primeiros séculos; Os anjos de

Canudos; Os cristãos da terceira geração (1997); Voz do Padre Cícero e outras memórias,

colhidas junto a Maria da Conceição Lopes Campina (1985); Hermas no topo do mundo

(2002); Verdadeira e falsa religião no Nordeste (1972); Crônica das casas de caridade fundada

pelo Pe. Ibiapina (1981); O movimento de Jesus (1991); As comunidades; O modelo latino; A

8 Idem, p. 12

29

grande marcha da humanidade; Protagonistas e testemunhas da conquista (co-autoria com

Paulo Tonucci); Padre Ibiapina e a Igreja dos pobres.

Pensamento Teológico

Dá para se perceber nos escritos de Hoornaert que, sendo um pesquisador incansável e

polêmico, acompanha ativamente a experiência das comunidades Eclesiais de Base e escreve

História a partir da ótica do povo, especialmente, índios, negros, escravos, camponeses sem

terra, operários, mulheres e os pobres de um modo geral.

Ele escreve história a partir da linha da libertação. Escreve história a partir do homem.

Hoornaert diz:

Queremos partir do homem ‘como ele realmente é’. Ora, o homem é antes de tudo um ser

corporal, talvez demasiadamente corporal para os idealistas de sempre. A luta pela

sobrevivência do corpo ocupa mais de 90% da história humana, embora nem sempre os

documentos escritos reflitam fielmente esta proporção. Eis a grande verdade esquecida: a

realidade da fome e da luta pela sobrevivência estigmatiza a história da humanidade.9

Hoornaert vai dizer que o ser humano basicamente necessita de três elementos

extremamente significativos para a sua sobrevivência: o alimento, a saúde e o sonho. Estes

são os motivos de Hoornaert fazer História a partir dessa identidade corporal do homem.

Em suma, como teólogo e historiador da Igreja, Hoornaert diz que o ano de 1942 foi

Uma data fundamental e ao mesmo tempo paradoxal, não só para os países invadidos pelo

colonialismo europeu mas para a história do mundo cristão em geral. 1492 não foi só a data

do descobrimento, da invasão, da invenção ou do encobrimento da América, foi também a

data em que um modelo de cristianismo se expôs aos olhos do mundo, momento da exposição

universal do cristianismo ocidental.10

Portanto, o interesse maior do historiador Hoornaert é tentar descobrir às respostas que

“as culturas colonizadas deram à proposta cristã que lhes veio com a colonização, os

encontros e desencontros, as resistências e as criatividades, a originalidade e o caráter próprio

do ‘ser cristão’ em terras colonizadas”.11

9 Eduardo HOORNAERT. O movimento de Jesus, p. 10 10 Idem, p. 24 11 Idem.

30

HUGO ASSMANN

Biobibliografia

Hugo Assmann nasceu em 1933, no Brasil. Estudou filosofia e sociologia em seu país

natal e teologia em Roma. é licenciado em ciências sociais e é doutor em teologia. Deu curso

de teologia em várias universidades brasileiras. Foi visitante professor na Faculdade de

Teologia da universidade de Miinter (Alemanha Ocidental), foi secretário dos estudos de “

Iglesia e Sociedade em América Latina e desde 1974, está em São José (Costa Rica), como

professor na escola de Jornalismo da universidade de Costa Rica.

Obras principais: Todo pensamento teológico de Assmann está reunido no volume

Pensamento teologia desde la Pdascis de la libracion, Salamanca, 1973, que retoma e

desenvolve, integrando–o com outros esisais, o volume Opression – Liberacion, desafia a los

Cristianos, Montevidéude la liberacion de Montevidéu, 1970.

Pensamento Teológico

Com Gustavo Gutiérrez, Ihugo Assmann é justamente relacionado entre os fundadores da

teologia da libertação. Com efeito no ensaio teo de la liberacion, Assmann foi o primeiro a

elaborar de forma sistemática um projeto desta nova teologia, dando-lhe um método preciso

fixando-lhe tarefas específicas e suldinhando a novidade da teologia da libertação frente às

outras novas teologia (teologia da esperança, teologia política e teologia da revolução).

Em teologia de la libneracion, Assmann desenvolve, antes de tudo, um exame profundo da

linguagem da libertação e dá relevo às razões que justificam sua introdução na teologia. Na

sua opinião, o termo “libertação implica apenas um julgamento negativo global trazido “a

realidade presente e, portanto, a urgência da mudança: nada mais que isso. Em si mesma, a

apalavra pode ter um significado tanto revolucionário como reformista. Tudo depende da

análise do conteúdo.

A Justificação efetiva, real provém de uma nova tomada de consciência da própria

situação por parte dos cristãos da América latina. “trata-se de uma experiência histórica que

tem um peso determinante, pois tocou as consciências. Nós nos apercebemos que,

historicamente, não somos povos em via de desenvolvimento, por estarmos dominados o que

é muito diferente.

Passando, depois, a determinar mais exatamente o significado do termo “libertação” ,

Assmann destingue três usos deste termo: político, filosófico e teológico. A palavra

31

libertação se propõem três significados: a) a libertação política dos povos e dos estatais

sociais oprimidos; b) libertação do homem no curso da história; c)libertação do pecado, raiz

de todo o mal, com o anúncio de uma condição de mídia que é comunhão de todos os homens

com o Senhor [...] contudo, precisa Assmann, se entre os vários usos do termo se dever

privilegiar um, este é o político, pois a raiz semântica fundamental da palavra é “ a denúncia

da dominação, a tomada de consciência dos mecanismos de dependência, a crítica ao

desenvolvimento, a oposição ao sistema econômico capitalista, o rompimento com a

desordem institucionalizada.”

Do próprio estudo do termo “ libertação” emerge a orientação “ortoprática” e não a “

ortodoxa” que Assmann pretende conferir ao seu leologar: Seu objetivo não é aprofundar o

sentido da Revelação bíblica e da tradição cristã, mas compreender, criticar e guiar a práxis

cristã.

Os elementos constantes destas definições são dois: o elemento da fé e o elemento da

práxis. Mas de que nada vale ser entendidas tais princípios? Esta é uma questão de capital

importância, de cuja solução depende toda a impostação e estruturação do teólogo do nosso

autor.

Em Assmann há uma tendência em transformar a união entre fé e práxis numa sua total

identificação. exclui ele, de fato, que a fé esteja em grau de fornecer elementos próprios para a

compreensão, a análise, a verificação crítica da práxis. A fé deve ser entendida como uma

reserva de verdades na qual o teólogo possa inspirar-se para o estudo da práxis, mas “ deve

ser interpretada fundamentalmente como práxis”.

Segundo Assmann, o recurso à fé, entendida como extraordinária manancial de

conhecimento e de critérios para entender e para justificar a práxis é vão que se olhe a fé

como texto sagrado ( a Bíblia ), quer se olhe a fé como autoridade eclesiástica. Seu mundo e

sua verdade são a própria práxis. Corta-se o caminho a todo tipo de raciocínio que represente

refúgio num mundo verbalista revestido de densidade antológica. O raciocínio sobre esta

práxis eficaz e humana só é válida se emana de dentro da ação humana, que a forma a

consciência crítica, capaz de revisão e de projetos.

Mas a práxis já é objeto de análise e de crítica por parte das ciências qualificadas ( a

política, a sociologia, a economia etc.). Portanto, estas são também as disciplinas às quais

deve recorrer o teólogo da libertação, se quer obter uma compreensão adequada práxis e se

quer dar um contributo crítico e construtivo para a mais completa libertação da humanidade.

Tudo isto força a teologia a ser “ segunda palavra” não só frente à práxis como também

frente às ciências humanas. Poder-se-ia dizer que a teologia da libertação é não só o segundo

32

ato frente ao primeiro ato, que é a práxis, mas também a ultima palavra frente à primeira

palavra pronunciada pelas ciências humanas. Porém, observa Assmann, esta posição da

teologia como “ segunda palavra ou última palavra” pode ser perigosa e dar lugar a abusos,

porque “ a teologia costuma dar pouco valor às ciências humanas”.

Pelo que Assmann esteve dizendo até aqui saber as relações entre teologia e ciências

humanas, parece que a dependência da teologia frente a estas últimas é tão profunda que torna

vão qualquer contributo seu: não podendo dispor de mananciais de conhe3cimentos próprios,

a teologia não pode repetir e ratificar senão as opiniões das ciências humanas. Mas Assmann

não pensa assim. ele não para de reivindicar para a teologia uma sua especificidade que,

todavia, não parece estar em grau de esclarecer a causa da sua concepção de fé, que ele quer

totalmente imersa na práxis. De qualquer modo, eis como ele tenta explicar a especificidade

de teologia: um estudo crítico da práxis histórica dos homens é teologia na medida em obrigar

nesta práxis a presença da fé cristã. Este é o elemento distintivo entre a teologia e as outras

formas de raciocínio crítico sobre a realidade. A teologia pára de existir onde o interrogativo

sobre o sentido da fé foi totalmente eliminado pela realidade. Nesta linha, a nota distintiva do

raciocínio teológico consciente naquele a luz da fé, à luz da revelação, ainda que se pergunte

qual seja o critério desta fé e como se possa deduzi-la do conjunto das mediações históricas

etc. Fique claro que, como isto, assinalamos apenas o elemento típico da teologia, seu marco

distintivo não seu conteúdo exclusivo. Trata-se de um ponto de importância capital.

Quanto aos argumentos que devem figurar numa teologia da libertação, Assmann

assinala os seguintes:

- O mundo como campo de conflitos, para cuja eliminação

deve ser dirigida a obra da Igreja;

- A violência institucionalizada e o pecado;

- Libertação e salvação;

- Criação e salvação: processo de libertação;

- Presença libertadora em sentido político e antecipação escatológica;

- O Cristo animador da história;

- O significado do Cristianismo;

- As escolhas das Igrejas nos anos setenta;

Saber as relações com outras “novas teologia” , Assmann indica sumariamente tanto

pontos de contrato como os pontos de divergências.

Após ter observado que toda ação humana tem uma dimensão política, Assmann explica

que também a fé tem uma dimensão radicalmente política: a fé é a própria ação histórica do

33

homem ( ação que descobrimos como sendo essencialmente política) na medida em que,

radicalizando a exigência do seu sentido histórico, aprofunda o seu por que, o seu significado

humano a ponto de encontrar-se com o mistério de Deus na história e nunca fora dela.

Mas a dimensão política não está presente apenas na fé de cada um ou na meditação do

teólogo; ela acompanha sempre e necessariamente também a comunidade eclesial. Como está

no mundo e não apenas diante do mundo, a igreja sempre estará encarregada em determinados

contextos sócio-culturais com certas estruturas políticas.

No que concerne ao projeto político do qual a Igreja deve ser promotora, Assmann está

plenamente de acordo com Gutiérez: trata-se de um projeto dedicadamente revolucionário,

que compreende a luta de classe, a derrubada do domínio capitalista e a instauração do

sistema socialista.

Mas, pergunta-se justamente Assmann, a luta de classes como estratégia para libertação,

não é incompatível com a prática do amor, que constitui a própria essência do cristianismo? A

resposta de Assmann a esta interrogação é que o amor cristão não pode ser um amor

platônico, um amor cego, um amor leviano, desassociado da situação histórica, mas, isto sim,

deve estar mesclado com o tecido vivo da história. Ora, na situação concreta é preciso fazer

escolhas, tomar posições, lutar justamente para tornar possível, para criar espaço ao amor.

Nos países cristãos onde reina a exploração, a subervivencia, a opressão, os cristãos exercerão

o amor na medida em que estiverem interessados na revelação mediante uma verdadeira

identificação situacional com o estado dos exploradores. A concreta articulação e realização

dos justos interesses das oprimidas representa a concretização histórica do amor. Nos países

onde reina a exploração, a subserviência, a opressão, os cristãos exercerão o amor na medida

uma verdadeira identificação situacional com o estado dos exploradores. A concreta

articulação e realização dos justos interesses dos oprimidos representa a concretização

histórica do amor. Concluindo, a teologia da libertação propõe-se a dar atuação à densidade

política da fé cristã e, nos países dos explorados e dos oprimidos , isto não exige apenas a

criação de melhores condições de vida, mas também a luta aberta contra os poderes

constituídos, a revolução social e política, e a radical mudança das estruturas.

De tudo o que foi exposto, é fácil deduzir que as teses mais qualificastes da teologia de

Assmann são tachadas de marxistas e parecem justificar as acusações de uma total rendição

ao machismo, que são freqüentemente feito a Assmann.

Todavia, devemos reconhecer, honestamente, que o autor de teologia desde la práxis de

la liberacion não está por nada disposto a seguir Marx até o fim e que ele pretende

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salvaguardar aquele ponto de vista da fé que considera essencial para que um raciocínio possa

qualificar-se com teologia.

JOSEPH COMBLIN

Biobibliografia

Nasceu em 1923,em Brucelas. Completou seus estudos em Louvain e Malines, onde foi

ordenado sacerdote em 1947. Após ter sido vigário cooperadornuma paróquia de Bruxelas,

em 1958 se transferiu para a América Latina, onde lecionou teologia dogmática e pastoral em

numerosas instituições e universidades. De 1968 a 1973, foi professor da IPLA ( Quito) até o

fechamento deste instituto de pastoral latino-americana. Desde de 1970 é professor na

faculdade de teologia da universidade de Louvain.

A produção teológica de J. Comblin é muito vasta e abraça diversos âmbitos das

ciências teológicas. a teologia bíblica dedicou la resurrection de Jesus Cristo, Ed.

Universitaires, Paris, 2 v., 1960, 1963; Theologia de la Ville, Ed. Universitsiris, Paris, 1968;

Theologie de la revolution, ed. Universitaires, Paris 1970; Theologie de la pratique

rivolutionnaire, Ed. Universitares, Paris, 1974.

Pensamento Teológico

Na história da teologia, Comblim acha que são dois os métodos mais usados; a estes dá

o nome de “ via acidente” e “ via descendente”. a via ascendente foi seguida pelos padres; a

descendente pelos os Escolásticos. A primeira foi chamada também de exegese espiritual; seu

fim não é explicar os textos, mas reconhecer neles a via que conduz ao conhecimento de

Deus. Isto é, trata-se de descobrir as leis da revelação de Deus. é , pois, tarefa da teologia

acompanhar os vários estágios de elaboração do texto sagrado e trazer a luz os significados

cada vez mais complexos que se revelam na história do povo de Deus, para colher a palavra

definitiva.

Os Escolásticos seguem o procedimento oposto: de uma sistematização teológica

preliminar ao estudo da Bíblia ( isto é, anterior à teologia ascendente), eles avançam depois

para uma investigação das sagradas Escrituras. Esta introdução dá as linhas principais da

35

revelação divina numa exposição organizada. Faz-se, pois, um resumo que dá a impressão

que a revelação bíblica constitua um todo orgânico.

Na opinião de Comblin, nem a via ascendente nem a via descendente de per si não

suficientes. O método teológico adequado deve incluir ambas. De fato, é necessário ter um

ponto de referencia, uma doutrina provisória que sirva de orientação: ela será, depois posta de

novo em discurção e reformuladas de modo novo após a leitura da realidade da Práxis, dos

acontecimentos que interpelam constantimente o crente.

Há outro ponto importante em que o método teológico de Comblin difere do tradicional

para aproximar-se ao moderno. Este é essencialmente ascensional, indutiva, mas não flui das

Sagradas Escrituras como na teologia patrística, mas sim do homem e do mundo; não flui dos

eventos da história da salvação, mas das situações concretas da história humana. Há nele uma

história da comunicação divina, e esta começa na história comum a todos os homens. São as

realidades da história humana que serviam de matéria para as imagens sucessivas através das

quais Deus quis que os homens passarem para que chegassem a conhecê-lo. A subida para o

conhecimento de Deus parte, pois das realidades pagãs em que estão inseridas as realidades

judaicas e cristãs. O momento ascendente , portanto, tem sempre início de realidade histórica

e a luz da história da salvação tenta divisar a revelação progressiva de Deus Resulta que a

teologia não busca, em vez, colher o seu movimento, as transformações, o princípio e o

término (Deus).

Em Theologia de la Pratique revolutionarie, J. Comblin elabora um tratamento

sistemático dos problemas teológicos inerentes à Práxis revolucionária. De conformidade com

as exigências de um tratamento sistemático, propõe ele, antes de tudo, uma definição

elementar de revelação e Práxis revolucionária. a revolução “ é a ação de transformação de

toda a sociedade”; é a passagem de um modelo de sociedade para outro. Por conseguinte, a

Práxis revolucionária é aquela ação global sobre a sociedade que em pouco tempo consegue

modificar o conjunto de suas estruturas. Trata-se, como se vê, de conceitos claros, ainda que

genéricos. em todo caso, o autor tenta valida-los enxertando-os numa visão geral do homem.

O quadro antropológico em que os insere é o seguinte: o homem não deve ser concebido

como um ser submisso a natureza previamente definida, sempre igual a si mesma e idêntica

para todos os homens e não deve também ser considerado como uma essência que se

desenvolve conforme um processo orgânico de contínuo crescimento, perfeitamente regular.

Ao invés, deve-se ver no homem aquele que transforma seu ambiente natural e a sociedade e

que se opõe ao que existe para que exista algo de novo, e tudo isto para permitir que o novo

ambiente lhe consinta tornar-se mais homem. Em resumo, ele busca a realização de si mesmo

36

não na aceitação do presente, mas na sua negação e na sua superação, e tudo isto mediante

uma ação transformadora do mundo exterior .

Proposto este quadro antropológico, a revolução não é mais uma simples possibilidade

mais ou menos esporádica, mas se tornas uma realidade permanente.

A Bíblia em todos os seus livros, contém um poderosos fermento revolucionário. Além

dos grandes eventos do Antigo Testamento ( de Abraão a Moisés, dos juizes aos profetas, aos

irmãos nocabeus), este fermento está presente na vida e sobretudo na doutrina de Cristo. Jesus

instaura novas revelações com Deus e entre o homem, relações de amor antes que de Justiça,

de bondade antes que de poderio; ele subverte a escola dos valores reconhecidos por todos. O

problema principal para uma teologia da revelação é, portanto, o de esclarecer, à luz dos

feitos e dos ensinamentos revolucionários de Jesus Cristo, qual deve ser a Práxis

revolucionária da Igreja e de seus membros. Comblin observa justamente que há uma

concepção cristã da revolução e que há uma revolução cristã e anticristã da revolução, como

há uma concepção cristã e anticristã do homem e da liberdade.

Mas no que consiste precisamente a contribuição cristã para a revolução? Segundo

Comblin, consiste “ no movimento de transformação do homem e da sociedade através do

homem, que foi promovida por Cristo. a contribuição cristã é a ação de Jesus Cristo e vinte

séculos de história do cristianismo passado, a ação dos cristãos no presente (todos os

discípulos, todos os que, conscientemente ou não, sofre a influência do apelo evangélico), e o

porvir desses cristãos, suas reformas e suas transformações.

J. Comblin demonstra claramente que o específico da revolução cristã é o amor, a

caridade. Deste amor ele põe bem à luz a dimensão essencialmente social, comunitária.

Quando Jesus fala de amor e caridade, se situa no contexto social. Não tem em mira

simplesmente disposições do coração, não pretende apenas que seus discípulos cultivem bons

sentimentos, que sejam homens de bom coração; ele pensa em um mundo de relações sociais.

O homem só se torna homem na aliança com os demais. Sem esta aliança ele não pode amar.

Amar é viver numa rede de recíprocas obrigações. O amor e a caridade não são concebidos

por cristo como uma disposição de sabedoria individual. É um dom escatológico, concebido

por Deus aos que pertencem ao seu Reino. É a força que mantém presente este Reino. A

Caridade é o vínculo de uma nova sociedade, e além disso é o fermento revolucionário que,

aprendo no mundo, transforma.

No curso de sua erudita doutrina, Comblin compra freqüentemente a Práxis

revolucionária cristã com outros modelos de Práxis do mesmo gênero, especialmente com o

modelo marxista. a este último ele move críticas muito graves. Comblin rejeita a idéia de uma

37

racionalidade marxistas que absolutamente não existe e cuja ilusão impele seus partidários a

estimar exageradamente a realidade do marxismo. Nega a existência de um método de

análise rigorosamente científica e a reaviva os erros colossais que os marxistas soviéticos

cometeram em suas previsões quanto à Alemanha, à China, ao futuro do movimento

revolucionário cubano. Outra ilusão que ele denuncia diz respeito à possibilidade de que uma

síntese científica guie a Práxis. Por definição, as ciências são sempre incompleta, estão

sempre em desenvolvimento enquanto, se age na base atual. Por tanto, toda pretensão

marxista quanto a uma “ciência” da sociedade é ilusória.

Bibliografia

HOORNAERT, Eduardo. O movimento de Jesus. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994 – Coleção uma

história do Cristianismo na perspectiva do pobre.

PIXLEY, Jorge. A História de Israel a partir dos pobres [trad. Ramiro Mincato]. 2ª edição.

Petrópolis, RJ: Vozes / São Leopoldo: Sinodal, 1990 – Coleção Deus Conosco

____________. Êxodo [trad. J. Rezende Costa]. São Paulo: Paulinas, 1987 – Col. Grande

Comentário Bíblico

____________. O Sábado – festa e sinal. In: Jubileu. Ribla – Revista de Interpretação Bíblica

Latino-Americana. Petrópolis, RJ: Vozes, 1999/2 – Vol. 3

ENRIQUE DUSSEL

Biobibliografia

Enrique Dussel nasceu em 1934, na Argentina, participou no início da década de 40

da ação católica. Desde 1952, na Universidade Nacional de Cuyo cursou o programa de ética,

em sete ocasiões. Em 1957 foi para a Espanha, onde fez doutorado em Filosofia sobre o bem

comum (desde os pré-socráticos até Kelsen). Entre 1959 e 1961 residiu em Israel, onde

trabalhou como carpinteiro e pescador. Após este período retorna à Europa, primeiro para

estudar Teologia na França e depois, História na Alemanha. A partir de 1969, passa a dar

aulas de ética filosófica na Universidade de Cuyo na Argentina. Entre 1971 e 1974 publicou

mais de vinte livros e artigos. Em 1975 juntamente com sua família parte para o exílio no

México, onde reside até hoje. É um dos fundadores e ativo membro, sendo o presidente do

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CEHILA (Comissão de Estudos de História da Igreja na América Latina). Autor de vasta obra

bibliográfica é um dos principais nomes da Filosofia da Libertação.

Dentre as suas obras destacamos: a série “Caminhos de Libertação Latino-

Americana”, “Hipótesis para una historia de la Iglesia em América Latina”, “Introducción

General”, em Historia de la Iglesia en América Latina”, “Toward the origin of Myth of

Modernity”, “História da Igreja Latino-americana”, “El humanismo helênico”, “El

humanismo semita”, “Filosofia da Libertação”.

Pensamento Teológico

Seu interesse pela filosofia política, foi despertado a partir do seu doutorado com

Maritain e contra Charles de Konnick. Desde a infância descobriu a miséria em que seu povo

vivia, assim foi para a Europa e Israel. Foi ai percebendo como a América Latina se

encontrava fora da história. Era então preciso encontrar um lugar para ela na História

Mundial, partindo então de sua pobreza e descobrindo assim a sua realidade oculta.

Foi com a obre La symbolique du Mal, que toma a base do seu projeto filosófico

latino-americano.

Sua obra El humanismo helênico, foi escrito em 1962, conseguindo editar em 1975,

era uma antropologia, uma ontologia e uma ética indo-européia, onde apresentava o dualismo

corpo-alma, a solidão do contemplativo, a ética da ascese, o monismo do ser, essa era uma

crítica filosófica-hermenêutica anti helênica. A sua segunda obra, iniciada em Israel: El

humanismo semita, adotava a análise de uma antropologia carnal (a “basar” hebraica), que é

unitária, uma Metafísica criacionista e uma ética política de compromisso com a justiça.

“A experiência inicial da Filosofia da Libertação consiste em descobrir o ‘fato’

opressivo da dominação, em que sujeitos se constituem ‘senhores’ de outros sujeitos, no plano

mundial”, isso ocorreu a partir da expansão européia em 1942, dando então a origem a

Modernidade.

A Filosofia da Libertação tem como ponto de partida a realidade regional, ou seja, a

pobreza que cresce a cada dia em meio a população na América Latina. E visa o outro, ou seja

a libertação dos que estão às margens, dos oprimidos, dos excluídos.

A Filosofia da Libertação é um contra discurso, ou seja, contra a centralidade da

filosofia européia, pois é uma filosofia crítica que nasce na periferia, mas a pretensão é a nível

mundial, a filosofia é um patrimônio de todos os filósofos não apenas dos europeus.

39

O projeto de libertação dos oprimidos e dos excluídos é aberto, partindo da exclusão

do Outro e indo mais além de qualquer situação apresentada. A estruturação de alternativas

não consiste na aplicação de algum modelo ou situação ideal ou transcendental, nem também

na execução autêntica de um determinado mundo da vida, mas deverá ser uma descoberta

responsável, como resposta à interpelação do outro, dentro de um processo de prudência que

é lento, durante o qual o filósofo deve tratar com seriedade a motivações éticas da libertação

dos oprimidos e excluídos.

GUSTAVO GUTIÉRREZ

Biobibliografia

Gustavo Gutiérrez nasceu em Lima (Peru) em 1928. Completados os estudos

secundários em sua cidade natal, freqüentou durante cinco anos a Faculdade de Medicina da

Universidade Nacional de Lima. Depois, interrompeu os estudos de medicina e empreendeu o

currículo dos estudos filosóficos e teológicos para preparar-se ao sacerdócio. De 1951 a

1955, estudou filosofia e psicologia em Louvain; de 1955 a 1959, teologia em Lião. Em 1959,

foi ordenado sacerdote em Lima. Desde 1960 é professor no departamento de teologia da

Universidade Católica de Lima.

A obra principal é Teologia de la liberación, Lima, 1971 (tradução brasileira Teologia

da Libertação). Outras obras importantes são: Apuntes para una teologia de la liberación, e

“Prassi di liberazione e fede cristiana” in La nuova frontiera della teologia in America Latina.

Pensamento Teológico

Gustavo Gutiérrez é o plasmador da teologia da libertação, o formulador em

linguagem simples, expressiva sóbria das intuições fundamentais desta teologia. Foi durante

os anos 60 que abraçou a teologia do desenvolvimento, mas foi dos primeiros a abandoná-la

quando percebeu que a teoria do desenvolvimento é carente de qualquer base científica e que,

ao invés de contribuir para a solução dos problemas do Terceiro Mundo, ela só agrava

ulteriormente. Percebeu então que o caminho da libertação das populações da América Latina

das injustiças, vexames, misérias que as oprimem devem necessariamente passar pela

destruição do sistema vigente, o sistema capitalista e burguês: um sistema essencialmente

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iníquo e incompatível com a mensagem cristã, pois cria uma sociedade injusta e alienada.

Para realizar a salvação cristã necessita destruir a violência institucionalizada que impera.

A razão fundamental é que o termo libertação parece mais apropriado que o termo

desenvolvimento para exprimir a participação dos cristãos nas lutas para construir uma

sociedade justa e fraterna, onde os homens possam viver com dignidade e ser agentes de seu

próprio destino.

A tarefa fundamental é responder à pergunta quanto à relação entre salvação e

emancipação do homem no decorrer da História. A pergunta é antiga. Trata-se de impostar de

modo novo o problema clássico das relações entre fé e existência humana, entre fé e realidade

terrena e, em outras formas, entre Reino de Deus e construção do mundo, de onde surge a

relação Igreja-mundo.

O ponto de partida da teologia da libertação é a situação concreta, é a práxis de

libertação hoje em dia atuada pelas populações da América Latina e, em especial, pela

comunidade cristã latino-americana. A primeira tarefa do teólogo da libertação é, portanto, a

de obter um conhecimento profundo desta práxis, das sua motivações, dos seus objetivos,

obstáculos, movimentos. Além de um conhecimento científico da situação histórica, na base

da mediação teológica deve haver uma experiência vivida, uma participação pessoal sobre a

práxis histórica libertadora. Refletir sobre a fé como práxis libertadora significa refletir sobre

uma verdade que se atua e não apenas que se afirma.

A teologia da libertação não procura justificar cristãmente posições já tomadas, não

quer ser uma ideologia cristã revolucionária. É uma reflexão que parte da práxis histórica do

homem, que procura pensar a fé a partir dessa práxis histórica e a partir de como se vive a fé

no compromisso libertador.

Gutiérrez mostra que, partir de baixo, tomar como ponto de partida a práxis

revolucionária, compreender esta práxis com o subsídio de todos os instrumentos que as

várias ciências humanas põem à disposição, não significa absolutamente desenvolver uma

ideologia cristã revolucionária. Ao contrário, a contribuição da fé para a revolução não tem

caráter ideológico. Tudo o que pertence à esfera ideológica é confiado à pesquisa científica e

à práxis histórica, dado que a libertação política não é um messianismo religioso; tem sua

autonomia e suas leis. Supõe análises sociais e opções políticas bem determinadas.

A teologia da libertação exige uma relação direta e certa com a práxis histórica. E esta

práxis é uma práxis libertadora, identifica-se com os homens, raças, classes sociais que

sofrem miséria e espoliação, identificação com os seus interesses e com as suas lutas. É uma

inserção no processo político revolucionário, para viver interiormente e anunciar o amor

41

gratuito e libertador de Cristo. Amor que vai até à própria raiz de toda exploração e injustiça.

Amor que permite aos homens de se reconhecerem filhos do Pai e irmãos entre si. É preciso

compreender que não haverá um verdadeiro salto qualitativo para outra perspectiva teológica

senão quando os marginalizados e os explorados foram cada dia mais os artífices de sua

libertação, quando sua voz se fizer ouvir diretamente e sem mediações.

A teologia de Gutiérrez vai esbarrar num inevitável e fecundo diálogo com o

marxismo e, sob este estímulo se orienta para um raciocínio sobre o significado da

transformação do mundo e sobre a ação do homem na história.

Para desenvolver um raciocínio teológico com referência a transformação do mundo é

necessário ver a relação entre a salvação e o processo histórico da libertação do homem, e ai

Gutiérrez diz que os dois elementos, humano e divino, salvífico e secular, eclesial e mundano

se compenetram intimamente, mesmo sem identificar-se, pois há uma só história, inaugurada

na criação, início do empreendimento humano e da história salvífica de Javé. Não há duas

histórias, ou seja, uma sagrada e outra profana ou secular. A única história na qual Deus age é

a história dos homens; é nesta história que encontramos Deus. Só há uma história realizada

em Cristo.

Então a graça libertadora de Deus consiste na dádiva da comunhão com o Senhor e

com os próprios irmãos; salvar-se significa atingir a plenitude do amor, entrar no circuito de

caridade que une as pessoas na Trindade, ou seja amar como Deus ama.

Entrar na comunhão com o Senhor significa sermos postos em condição de vencer o

pecado e todas as suas conseqüências, mediante uma práxis de amor e de justiça que cria um

novo homem e uma sociedade mais fraterna.

Para Gutiérrez sobre a relação entre as duas dimensões é que a presença da salvação só

pode resultar também numa elevação da esfera humana em todos os seus aspectos, inclusive o

social e político. E, como a salvação consiste essencialmente na libertação, deve-se concluir

que ela atua sobre o plano humano realizando a libertação da subserviência política.

Entre teologia política e teologia da revolução não existe relação de identidade, mas de

implicação, pois a redenção inclui também libertação política. Libertação política, libertação

do homem ao longo da história, libertação do pecado e entrar em comunhão com Deus se

condicionam mutuamente, mas não se confundem, não se situa uma sem a outra, mas são

distintas. Em outras palavras, sem acontecimentos históricos libertadores não há crescimento

do Reino, mas o processo de libertação não terá vencido as próprias raízes da opressão, da

exploração do homem por parte do homem, senão com o advento do Reino que é um dom.

42

A atuação da ação salvífica de que o cristianismo é portador, só é possível sacudindo

os poderes políticos vigentes e fundando uma nova ordem. Não basta tentar reformar o

sistema interiormente, pois que o sistema em si mesmo é inumano e opressivo; deve-se então

desenraizá-lo das bases e substituí-lo por outro de tipo socialista. A Igreja deve ser o sinal

visível da presença do Senhor no anseio pela libertação e na luta por uma sociedade mais

humana e mais justa. Só assim a Igreja será crível, e eficaz a mensagem de amor de que é

portadora.

Na situação de opressão em que vivem atualmente as populações latino-americanas, a

revolução é a única estratégia eficaz para conseguir a libertação, e Gutiérrez é também de

opinião que a única tática revolucionária adequada é a marxista da luta de classes.

A práxis de libertação faz com que o teólogo compreenda que um amor que não passa

por uma luta de classe e que não se alinha do lado dos oprimidos contra os opressores, é um

amor ineficiente e ilusório. A práxis de libertação lhe faz também ver que somente uma ação

eficaz pode transformar a situação de opressão, a especulação, a cultura e a teologia sozinhas

não bastam.

Para Gutiérrez a Escritura não fala apenas de uma libertação interior, espiritual, como

muitos teólogos ensinaram no passado, mas também de uma libertação dos males externos,

materiais, tanto individuais como sociais. Por isso o cristão para ser fiel intérprete e executor

da Palavra de Deus, deve empenhar-se também na esfera social e política, mas não somente

com gestos caridosos e filantrópicos para com os semelhantes, mas com ações de contestação,

transformação, aperfeiçoamento face às estruturas.

Então ele afirma que toda a comunidade eclesial deve carregar a responsabilidade do

melhoramento das condições sociais e políticas da humanidade.

Os elementos seguintes tornam apropriação da parte de Gutiérrez, e todos são

componentes do marxismo:

O materialismo histórico, ele só critica o dialético; a revolução como necessidade

inelutável no continente latino-americano, nesse caso o objetivo é uma mudança radical de

estruturas; a questão da luta de classes, especialmente quando discute a teoria da

dependência, que deve ser universal; a questão da emancipação do ser humano de todo tipo de

servidão, a pessoa humana como agente do seu próprio destino e da sua própria história; e a

questão do ser humano novo.

JOSÉ MIGUEZ BONINO

43

Biobibliografia

José Miguez Bonino nasce em 1924, em Santa Fé, Argentina. Após os estudos em

Rosário, prosseguiu na Faculdade Evangélica de Teologia de Buenos Aires e no Union

Theological Seminary em Nova York. Foi ordenado presbítero na Igreja Metodista da

Argentina em 1948 e exerceu cargos pastorais na Bolívia e na Argentina. Desde 1954 é

professor da Faculdade Evangélica de Teologia, onde tem a cadeira de Teologia e de Ética;

foi reitor da mesma universidade de 1960 a 1969. Foi observador da Igreja Metodista no

Concílio Vaticano II e é membro de vários organismos do Conselho Ecumênico das Igrejas

(CEI). Ele é um teólogo metodista argentino, sendo considerado uma das personalidades mais

vivas da atual teologia sul-americana. Foi um dos teólogos da libertação que mais trabalhou a

questão do marxismo e sua relação com a teologia latino-americana.

Suas principais obras são: Concílio abierto; Integración humana y unidade cristiana;

Ama y haz lo que quieres; Doing Theology in a Revolutionary Situation; Christians and

Marxists; Fé em busca de eficácia.

Pensamento Teológico

A divisão mais simples que ele faz do marxismo é quando apresenta como passível de

ser apropriado ou como um dogma ou um método.

No seu livro Fé em Busca de Eficácia, descreve o que poderíamos chamar de origens

históricas do seu modo de fazer teologia. Ele descreve uma nova análise sócio-político-

econômica do continente latino-americano, essas análises conduzem a uma nova leitura da

história da América Latina, a partir dos dados levantados nas análises.

A nova análise do continente, reforçada por uma nova leitura da história do mesmo,

leva então a uma nova militância política, uma nova práxis, um novo compromisso com a

libertação do continente da sua opressão, detectada nas análises e na releitura da história.

Quando os envolvidos são cristãos, ele os leva a repensar também toda a sua fé a partir

dos marcos mencionados e dos compromissos históricos específicos assumidos no processo.

Surge então uma reflexão sobre a libertação na perspectiva da fé cristã. Quando são teólogos

estes passam a produzir uma reflexão teológica em torno da questão.

44

Miguez se apropria dos resultados da corrente que chama de nova sociologia latino-

americana e que mais adiante define como a sociologia da dependência em suas diversas

formulações.

O marxismo é uma grandeza constituída por vários elementos que, de uma forma ou

outra, não são separáveis facilmente. E são todos esses aspectos do marxismo que ele admite

serem indispensáveis para uma mudança revolucionária. No entender de Miguez o que o

marxismo tem de significação permanente e indispensável para um movimento revolucionário

são quatro elementos inter-relacionados:

A compreensão da história como em última análise dependente da organização pelo

homem do processo pelo qual este produz os bens para satisfazer as suas necessidades; o

reconhecimento de que homem é não o indivíduo isolado, mas uma unidade comunal como

uma formação social concreta, com suas estruturas, seus relacionamentos e sua

autocompreensão; o fato da luta de classes e do papel revolucionário do proletariado; a noção

de práxis: um conhecimento verdadeiro só pode ser adquirido iniciando pelas ações concretas

do homem; que a teoria tem sentido unicamente na medida em que leva a um curso de ação

que se comprove significativo; e que a ação se torna ela própria o teste da teoria.

Em resumo, Miguez escolhe o marxismo como a ideologia que soube melhor do que

qualquer outra revelar as constantes ou as leis para guiar a nossa práxis histórica.

Ele rejeita a clássica distinção dos dois planos, ou seja, ação histórica e a expectativa

escatológica, que ele julga dualística; mas repele também a solução monística daqueles que

reduzem a expectativa escatológica a uma simples força, uma motivação para a ação histórica,

por comportar isso a dissolução do cristianismo.

O que levou Miguez a fazer a escolha marxista foram duas circunstâncias históricas

bem determinadas: as condições de vida inumanas que prevalecem no continente latino-

americano e a constatação do fracasso de diversas soluções e tentativas reformistas para a

eliminação das condições inumanas e viu que a única estratégia eficaz é a proposta e praticada

pelo marxismo.

O cristão pode ser marxista se do marxismo só aceitar os elementos relativos à análise

sócio-política e à estratégia da libertação. Mas se acolhe os postulados metafísicos do

marxismo histórico e dialético, então ele deixa de ser cristão.

Existe dois extremos que Miguez sempre segura firmemente nas mãos sem jamais

deixá-los escapar: a fé em Jesus Cristo Senhor e Salvador e o compromisso histórico cristão.

45

Bibliografia

Epistêmê. Ano 02. Vol. 02. Nº 01. STBNe, 2000.

MUELLER, Enio R. “Teologia da Libertação e Marxismo: Uma relação em busca de

explicação”. São Leopoldo: Sinodal, 1996.

MONDIM, Batista. “Os teólogos da libertação”. [Trad. Hugo Toschi].- São Paulo: Ed.

Paulinas, 1980.

ENRIQUE, Dussel. “Filosofia da Libertação: Crítica à ideologia da exclusão”. [Trad. Georges

I. Maissiat]. – São Paulo: Paulus, 1995. – (Coleção pesquisa & projeto).

GUTIÉRREZ, Gustavo. “Teologia da Libertação”. [Trad. Jorge Soares].- Petrópolis: Editora

Vozes, 1975.

LEONARDO BOFF

Biobibliografia

Leonardo Boff nasceu em Concórdia, Santa Catarina em 14 de dezembro de 1938,

descendente de italianos, filho de um professor primário e tendo como mãe uma mulher

dinâmica, apesar de iletrada. Como sacerdote franciscano, Boff cursou Filosofia e Teologia na

cidade de Curitiba, Petrópolis e Munique, onde especializou-se nos estudos teológicos pela

Universidade de Ludwig – Maximilian.

No final da década de 50 e início de 60 sua Cristologia revelava-se moderada,

conforme a linha teológica de sua formação, tanto que sua tese sobre a natureza sacramental

da Igreja Católica Romana no mundo moderno foi bem recebida pela ala conservadora da

Igreja Católica, da qual destacamos Joseph Ratzinger.

Nos anos 70, já com o título de doutor, passou a lecionar no Instituto de Filosofia e

Teologia, em Petrópolis, onde ocupou a cadeira de Teologia Sistemática e impressionou por

sua diligência e capacidade intelectual. Ao lado do magistério teológico, Boff foi redator da

REVISTA ECLESIÁSTICA BRASILEIRA e da REVISTA CONCILIUM, coordenou o setor

de publicações teológicas da Editora Vozes e participou de várias comissões teológicas

formadas na Igreja Católica Romana do Brasil e da América Latina.

Com a publicação do clássico “Jesus Cristo Libertador” em 1972, Boff foi convocado

pelo Santo Ofício para prestar esclarecimentos acerca da Teologia da Libertação presente

naquela obra, processo este que culminou em 1984 na publicação de “Igreja, Carisma e

46

Poder”, onde é elaborada uma crítica contra a hierarquia e estrutura católicas. Dentre outras, o

Vaticano através da Sagrada Congregação Para a Doutrina da Fé acusou Boff de propagar

uma Cristologia heterodoxa, e uma eclesiologia deturpada por princípio protestantes.

Com a publicação de “E a Igreja se Fez Povo” e “A Trindade, a Sociedade e a

Libertação”, Boff foi excomungado do sacerdócio católico oficial, todavia continuou a

desenvolver sua Teologia da Libertação publicando-o em grande parte de quase 70

publicações suas e divulgando-a em encontros nos diversos continentes.

Mesmo tendo tornado-se uma celebridade, jamais deixou de militar as Comunidades

Eclesiais de Base e com o ensino, tanto que passou a lecionar Filosofia, Ética e Ecologia na

Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Continua publicando obras recordes de vendagem,

nas quais expõe-se com a Sua Criação. Recentemente publicou pela Editora Sextante “Tempo

de Transcendência” e “Espiritualidade”.

Algumas outras obras publicadas por Boff são “Teologia do Cativeiro e da

Libertação”, “Eclesiogênese”; “A vida religiosa e a Igreja no processo de libertação”; “A Fé

na Periferia do Mundo”; “O Caminho da Igreja com os Oprimidos”. “E a Igreja se Fez Povo”;

“Como Fazer Teologia da Libertação”; “Os Sacramentos da Vida e da Vida dos

Sacramentos”; “O Destino do Homem e do Mundo”; “Paixão de Cristo, paixão do Mundo”;

“A Ressurreição de Cristo e a nossa Ressurreição na Morte”; “Vida Para Além da Morte”.

Pensamento Teológico

A América Latina herdou como parte do processo de colonização a que foi submetida

a imposição da visão de mundo européia, inclusive na formação da Cristandade americana

liderada pelo clero europeu, e conseqüentemente, alinhada à ortodoxia católica ávida por

reproduzir aqui, em terras americanas, seus sistemas, seus dogmas, suas respostas. Com o

Protestantismo não era diferente, pois, a formação primeza do pensamento protestante

brasileiro está inextrincavelmente ligada à teologia trazida pelos missionários europeus e

norte-americanos, sendo que estes foram em maior número, e a partir do século XIX.

Contudo, os povos cristãos da América Latina sempre colocaram problemas concretos

da sua diária frente a fé cristã, problemas que careciam de respostas, e respostas que não

poderiam mais ser conformadas às perguntas de outrora, contempladas nas respostas

elaboradas por teólogos europeus e norte-americanos que sequer conheceram o povo latino-

americano com suas lutas e questionamentos. A Teologia da Libertação é, pois, uma tentativa

47

de resposta às condições miseráveis e aos governos opressores impostos a muitos países

latino-americanos.

É no calor dos regimes totalitários, das repressões militares e avanço do capitalismo

selvagem que a palavra libertação passa a ser usada com grande freqüência a partir de 1965,

querendo ser uma resposta concreta da Teologia ao clamor terceiro-mundista. Em 1968 a

Conferência Geral Episcopal dos bispos católicos romanos (CELAM) em Medelín, Colômbia

passou a refletir com maior interesse acerca da palavra libertação, dando origem a inúmeras

publicações. Um novo modo de se fazer teologia estava nascendo.

A obra do peruano Gustavo Gutiérrez “Teologia de la Liberation” foi a primeira

publicação comprometida com esta nascente corrente teológica, a qual também alcançou a

comunidade protestante latino-americana. A Teologia da Libertação passou a representar a

afirmação da natureza contextual da Teologia, ou seja, sua preocupação se faz presente,

pronta para refletir o seu mundo e protestar contra as injustiças e pecados que estão em

desacordo com os valores do Reino de Deus.

Leonardo Boff, o nosso teólogo em voga, afirmou que a excelência do método

utilizado pela Teologia da Libertação está em que a discussão surge sempre “... não de uma

encíclica, de uma página da Bíblia, de um credo qualquer da tradição, mas a partir dos

desafios da realidade – quais são as questões que os pobres levantam, que o Brasil suscita

hoje... Então a Teologia da Libertação se articula com quem já está dando uma caminhada, e

tenta pensar a partir da prática” (Revista “Caros Amigos”, Ano 1, nº 03; 1997; pp.31).

Dentre os teólogos católicos que optaram pela Teologia da Libertação, destacamos

aqui o Frei Franciscano Leonardo Boff, precursor da Teologia da Libertação que recebeu

variadas influências de teólogos modernos, tanto da ala católica quanto da ala protestante, o

que se pode encontrar nos seus escritos permeados de citações de Hams Küng, Karl Rahner,

Marlé Schnackenburg e Teilhard de Chardin. Cita também conceitos próprios do

existencialismo de Barth e Tillich, bem como faz referências às obras de Bultmann,

Mottmann, Pannenbrug e Harnack.

Boff afirma que a Bíblia é testemunho humano à Revelação de Deus, o que sua

atualidade é verdadeira para o homem imerso no mistério divino da fé. A partir desta

mensagem qe se torna atual Boff “indica que a fé crítica é séria e a fé tranqüila, é leviana”

(CONN: 1984, pp.90) querendo despertar o homem que busca a vontade de Deus com a

necessidade de construção do Reino de Deus aqui e agora, jamais o transportando para um

plano metafísico ou passando nossa responsabilidade de transformação do mundo a outrem.

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A Bíblia é entendida como meio para nos abrir os olhos à realidade que estamos

vivenciado, tendo como finalidade transformá-la. É um livro que indica a nossa postura neste

mundo, sem necessariamente ocupar-se com a salvação das almas que crêem, até porque Boff

é universalista, crendo que todos serão salvos por Deus. Esta é uma nítida influência neo-

ortodoxa da teologia protestante moderna.

Na obra que analisaremos ainda neste trabalho, Boff sistematiza sua cristologia crítica

cristalizando três elementos essenciais para a compreensão da pessoa de Jesus, quais sejam:

extraordinário bom senso, fantasia criadora e originalidade. Jesus é aquele que doou-se

completamente ao homem para libertá-lo, e para isso enfrentou até mesmo a morte. A

ressurreição significa a vitória final de Jesus e o religamento completo entre Criador e criação,

sem qualquer interferência do pecado.

Como parte do Reino inaugurado por Jesus, as relações entre os homens devem ser

fraternas, amorosas e sem egoísmo, pois, Jesus venceu todos os inimigos que separavam os

irmãos. Onde existe bondade, verdade e amor, existe Cristianismo, e o homem que pratica

estas virtudes é de certa forma “divinizado”, pois, passa a experimentar em larga escala a

realidade de Deus.

Jesus optou pelos pobres e oprimidos, servindo-os com solidariedade e adentrando na

histórica dos oprimidos para libertá-los de todo o mal, por isso, os seus seguidores devem

identificar-se com a mensagem libertadora que visa o estabelecimento do Reino de Justiça e

sem pecados por toda a eternidade. Este é reflexo da Graça de Deus que transforma a

condição miserável e alienada dos homens, dando-lhes entrada no novo céu e nova Terra

planejados por Deus.

O método utilizado por Boff e outros teólogos da Libertação adota o método dialético

do marxismo e bebe na sua análise da luta de classes para investigar a sociedade opulenta e

excludente da América Latina. Todavia não podemos querer encontrar o método que perpassa

toda a vasta obra de mais de 70 publicações bibliográficas deste importante teólogo brasileiro,

hoje lido em inúmeros países do Globo Terrestre. Além da temática aqui destacada, Leonardo

Boff tem ampliado sua reflexão filosófico-teológica para outros temas recorrentes do nosso

tempo, como é o caso da questão ecológico e da mística pós-moderno.

“Em Cristo, o Reino de utópico se faz tópico; de profecia se faz realização; de

promessa, cumprimento. É a ‘pequena diferença’ que vige entre teoria e prática...” (Leonardo

e Clodovis Boff).

Na obra de Leonardo Boff nós podemos nos encontrar como criação que somos, mas

também como cristãos, e mais especificamente, como latino-americanos. A Igreja de Cristo

49

deve falar da vida e ser compreendida em sua mensagem, pois, o Mestre Jesus falava da vida

e assim provocava mudança e perplexidade nos seus ouvintes. Uma teologia que não se

propõe a ser instrumento de reflexão acerca da nossa realidade estará fadada a dar respostas

pela quais ninguém se interessa, porque não parte dos questionamentos daqueles que vivem a

dor do dia-a-dia.

Em Boff podemos encontrar uma proposta radical de inserção da Igreja Cristã no

mundo atual, provocando rupturas e denunciando as estruturas desumanizadoras que querem

submeter os filhos de Deus ao pecado, injustiça, egoísmo e morte, de uma vez por todas

vencidos na cruz. É uma mensagem que parte de baixo, do contexto em que vivemos para

então elaborar-se como proposta de reflexão teológica.

No exercício da missão profética nem mesmo a Igreja – instituição escapa de uma

crítica séria e exortativa, na medida em que as mazelas e apatia do clero, das hierarquias e

concílios são denunciados. Boff chega a afirmar que a Igreja de Cristo vive de tudo aquilo que

Cristo rejeitou, pois, não raras vezes a Igreja institucionalizada tem andado de mãos dadas

com os poderes opressores, calada diante do pecado e imóvel frente aos problemas congênitos

do nosso tempo. Esta postura nos anima a rejeitarmos a vida fácil e estabilizada das estruturas

eclesiásticas em prol do compromisso árduo, porém, recompensados de aliar-se àqueles que

vivem para concretizar a realidade do Reino de Deus ainda aqui na Terra.

Na Teologia de Boff encontramos uma mensagem emancipatória, tão cara e necessária

do terceiro-mundo. Esta é a nossa paróquia! Sendo assim precisamos estar afinados com a

mensagem evangélica que visa dar pão aos famintos, água aos sedentos, agasalho aos que

vivem ao frio da miséria, palavra e ação aos excluídos do mundo presente, pois, nisto se

constitui a missão integral da Igreja e o nosso compromisso último de estabelecimento do

Reino inaugurado e pregado por Jesus.

Boff expõe com clareza e profundidade a identificação e opção de Deus pelos pobres e

marginalizados, tanto que Cristo Jesus foi o meio encontrado por Deus para nos aproximar

Dele. Espero que este ensino atual torne-se tônica da nossa mensagem e vivência, que jamais

sirvamos para criar aparelhos distanciadores de Deus em relação ao homem, mas que em

obediência e amor a Deus lutemos pela manifestação clara de um Evangelho reconciliador dos

homens para com o Deus Libertador.

Bibliografia

MONDIN, Batista. Os teólogos da Libertação. São Paulo, SP: Paulinas, 1980.

BEOZZO, José Oscar. Curso de Verão – ano II. São Paulo. Paulina, CESEP. 1988. 218p.

50

BOFF, Leonardo. Jesus Cristo Libertador: ensaio de cristologia crítica para o nosso tempo.

Petrópolis. Vozes. 1986. 240p.

______________. Igreja: Carisma e Poder. Petrópolis. Vozes. 1981.

BOFF, Clodovis. Teologia Pé-no-Chão. 2ª edição. Petrópolis. Vozes. 1984. 230p.

CONN, Harvie. Teologia da Libertação. 1ª edição. São Paulo. Mundo Cristão. 1984. 172p.

Coleção Pensadores Cristãos. Volume 7.

ENCICLOPÉDIA HISTÓRICO-TEOLÓGICA DA IGREJA CRISTÃ. Editor Walter A.

Elwell. Vida Nova. Volume 1. 1990. São Paulo.

REVISTA CAROS AMIGOS, ANO 1, NÚMERO 3, JUNHO DE 1997. Editora Casa

Amarela. São Paulo.

REVISTA SIMPÓSIO, VOLUME 6, ANO XVIII, DEZEMBRO DE 1985, nº 30. ASTE.

Resenhas Bibliográfica: “Do Lugar do Pobre”, L. Boff; “Teologia da Libertação”, D.

Guimarães.

REVISTA SIMPÓSIO, ANO V, NÚMERO 09, DEZEMBRO DE 1972. ASTE. Resenha

Bibliográfica: “Jesus Cristo Libertador”.

HELDER CÂMARA

Biobibliografia

CÂMARA, Helder, nasceu em Fortaleza, Ceará A 7 de fevereiro de 1909, de uma

família de professores, sentiu desde pequeno a vocação para o sacerdócio e entrou no

seminário de sua cidade natal, .foi ordenado sacerdote em 1931; Foi consagrado bispo em

1952 e designado como auxiliar no Rio, onde se ocupou imediatamente dos problemas da

miséria, adquirindo assim uma nova consciência da sociedade brasileira. Fundou o

movimento “Ação, Justiça e paz” para uma mudança das estruturas sociais mediante uma

pressão moral, não-violenta e libertadora. Participou ativamente no concílio Vaticano II. Após

foi enviado á diocese de Recife, Pernambuco.Câmara, Helder, foi bispo católico brasileiro, da

Arquidiocese de Olinda e Recife, no estado de Pernambuco, estudou no Seminário

Arquidiocesano do estado do Ceará, formando-se em 1931.

51

Em 1936, no Rio de Janeiro, assumiu a direção do serviço de Medidas e Programas do

Instituto de Pesquisas, da Secretaria de Educação e Cultura da prefeitura, então Distrito

Federal. Participou do movimento integralista até a década de 1940. Entre 1946 e 1962, atuou

na Ação Católica Brasileira, como assistente nacional.

Em 1952 foi nomeado auxiliar do cardeal-arcebispo da cidade de São Sebastião do Rio de

Janeiro e sagrado bispo auxiliar. Participou como membro do conselho Federal de Educação,

entre 1952 e 1964, do Supremo Conselho de Imigração e do Conselho Diretor da Conferencia

Espanhol Latino-Americana (CELAM). Nesse mesmo período criou a Conferencia Nacional

dos Bispos do Brasil (CNBB) e foi o seu primeiro secretário.

Para resolver os problemas da pobreza e das favelas no Rio de Janeiro, criou a

Cruzada São Sebastião para dar moradia aos favelados. Em 1959, fundou o Banco da

Providência, que se realiza anualmente, para angariar recursos destinados a minorar a situação

classes menos favorecidas. Participou ativamente do Concílio Ecumênico do Vaticano II,

entre 1962e1964. Chefiou a Secretaria nacional de Ação Social da CNBB. Desde 1964

assumiu o Arcebispo de Olinda e Recife e segue a Encíclica populorum progressio de 1979,

do Papa Paulo VI. Participa da vida política brasileira, preocupado, especialmente, com a

pobreza e a situação de miséria existente no nordeste no Brasil. Dom Helder Câmara, é uma

personalidade mais significativas no campo internacional pelo seu constante empenho na

promoção econômica, social e espiritual dos países do Terceiro Mundo.

Heldet Câmara não escreveu obras sistemáticas, mas deu em todos os continentes

muitíssimas conferências, que foram coletadas em vários volumes. Entre estes salientamos os

seguintes: spirale di violenza, Massimo, Milão, 1970; Fame e sete di pace com guistizia, id.,

1970; Violenza dei pacifice, id., 1974.

Pensamento Teológico

“Dom Câmara não é um teólogo de profissão, mas pastor apaixonado que está, dia e

noite a serviço do povo; um místico que desperta todos os dias ao alvorecer para rezar.” “Por

estes motivos, Dom Helder Câmara merece, sem dúvida, ser incluído no grupo daqueles que

mais contribuíram para a formação de uma consciência histórica e política entre os cristão da

América Latina. mas ele ostenta também títulos teológicos para ser incluído entre os

principais expoentes da teologia da libertação. Realmente, alguns temas específicos desta

teologia, como a estratégia da violência etc., são os que ele gosta de tratar mais amiúde nas

suas conferências”

52

Para Câmara “o ponto de partida do raciocínio teológico é a situação sócio-política do

continentesul-americano, uma situação de miséria, fome, ignorância, injustiça, opressão,

“violência institucionalizada.” Ele está “profundamente convencido de que a fé cristã situação

. quem crê na libertação de Cristo está empenhado em torná-la atual também no plano social,

político e econômico e deve, portanto, combater contra tudo o que estorva a sua realização. O

verdadeiro cristianismo rejeita todo a idéia de que alguns nasçam pobres, outros nasçam ricos,

e os pobres tenham o direito de aceitar a pobreza como a vontade de Deus; enquanto, ao

invés, a verdade é que as injustiças humanas são um problema nosso que deve ser resolvido

entre os homens, cônscios de que Deus não admite opressões e oprimidos, mas nos quer a

todos em nível humano, em infra-humanizados pela miséria nem desumanizados pela

riqueza.” O capitalismo, na opinião de Câmara, é um sistema intrinsecamente desumano,

“pois coloca o capital acima do homem e faz do lucro o seu supremo objetivo”.

Além disso, ele acha que o capitalismo é verdadeiramente perverso. “Em si mesmo, o

socialismo é um sistema profundamente humano. O socialismo autêntico supõe a socialização

do ter, do saber e do poder.” No entanto, “ por mais que possa parecer incrível, na teoria, o

socialismo é mais humano e está mais perto do evangelho”.

SAMUEL DA SILVA GOTAY

Biobibliografia

Gotay, embora seja um teólogo relativamente obscuro em comparação aos outros,

Gotay deve ser levado em conta num estudo sobre a questão do marxismo na TDL por ter

escrito de forma relativamente extensa sobre o tema. A obra em principalmente o faz é a sua

tese doutoral, publicada em 1981. Nela, procura passar em revista todo o desenvolvimento da

TDL até aquele ponto.

Com relação ao tema TDL, o trabalho de Gotay é importante, por um lado, porque de

modo explícito e duma forma razoavelmente sistemática das relações e TDL, e, por outro, por

sua liberdade em explicitar seus próprios pressupostos teóricos dentro de uma moldura

claramente marxista.

O marxismo permeia de forma tão nítida suas explorações em cada campo, que uma

avaliação que lhe faça completa justiça teria que ir perseguindo e interpretando lentamente o

seu trabalho como um todo. Como isto não é possível aqui, tenta-se encontrar naquelas partes

53

em que ele lida explicitamente com a questão do estatuto teórico e do modo de apropriação

do marxismo pela TDL. Gotay trata especialmente das relações entre teologia e marxismo, Fé

e Ideologia.

Gotay conceitua ideologia, em parte ao menos, em relação com a ciência. “Ciência” é

para ele, sempre citando Arce, a teoria que convalida objetivamente, conformando melhor, a

ideologia. Como para ele só a ideologia proletária pode ser considerada verdadeira.”( p81)

Essa ideologia, segundo Gotay, tem duas dimensões. A primeira é constituída pelo projeto

histórico socialista em que governam, de um lado a crítica científica das relações de produção

e as forças produtivas, e, de outro, um projeto histórico – econômico, social e político – que

constitui a teoria estratégica a ser verificada historicamente. A Segunda dimensão é

constituída por uma reflexão filosófica e epistemológica, oposta a visão idealista do mundo,

que se compõe também de dois elementos. Um afirma as mudanças dialéticas na matéria

como o fundamento dos processos naturais e históricos.

ELZA TAMEZ

Biobibliografia

TAMEZ, Elsa, nasceu no México, atualmente ela mora em San José, na Costa Rica.

Doutora em teologia pela Universidade de Lausanne (Suíça). É professora no Seminário

Bíblico Latino-americano. Autor de vários livros e artigos sobre temas bíblicos e sobre a

mulher. É mãe de dois filhos.

Obras - Obra Un Nuevo Acercamiento al Cantar de los Cantares / tese apresentada

naUniversidade Nacional ( Costa Rica), 1985, inédita

TAMEZ, Elza. Para uma leitura lúdica do Cânticos dos Cânticos. IN. Religião e

Erotismo- Quando o Verbo se fez carne. Petrópolis / São Leopoldo, Editora Vozes / Sinodal,

2001 nº 38-2001/1. Tamez faz parte do Conselho de Redação da RIBLA- Revista de

Interpretação Bíblica Latina-americana

54

Pensamento Teológico

O pano de fundo no seu pensamento teológico é a justificação somente pela fé. A

justificação pela fé vem sendo entendida , no fundo, como perdão dos pecados ao pecador ou

libertação da culpa (pelo sangue de Cristo derramado na cruz) , reconciliação com Deus ou

estar em paz com Deus.

RUBEM ALVES

Biobibliografia

Mineiro de Boa Esperança, Rubem Alves (1933) estudou no Seminário Presbiteriano de

Campinas (SP), foi pastor em Lavras (MG), morou nos Estados Unidos de 65 a 68 onde fez

mestrado em Teologia e doutorado em Filosofia (Princeton). Professor da Unicamp, estudou

música e é poeta. Afirma que gosta dos teólogos clássicos, especialmente Lutero e Agostinho,

pois os teólogos hodiernos, diz Rubem, não contribuem muito para o seu pensamento. Afirma

gostar mais dos livros que escreveu para crianças, daí porque assumiu a psicanalista por

profissão. Enquanto estudante nos Estadus Unidos foi discípulo de Rarvey Cox, de quem

recebeu muitos elogios por seu destaque como pensador, e apesar de influências de Cox,

Chardin, Moltmann, Metz e Lemmann comportou-se sempre como um teólogo marginal.

Obras- Publicou, como tese, A Teologia da Esperança Humana, e mais, Variações

Sobre a Vida e a Morte, O que é Religião, Filosofia da Ciência, Sobre o tempo e a Eternidade,

Pai nosso, Lições de Feitiçaria, Gandhi, Suspiro dos Oprimidos, Enigma da Religião,

Protestantismo e Repressão, Transparência da Eternidade, O Retorno e Terno, O Quarto do

Mistério, Navegando, Concerto para o corpo e a alma, E Ai?, A Menina e o Passaro

Encantado, O Gato que gostava de cenouras, Entre a Ciência e a Sapiência- dilema da

educação, Creio na Ressurreição do Corpo, etc.

Pensamento Teológico

Rubem Alves é um dos precursores da teologia da libertação. Em seus escritos

primeiros sobre a teologia da libertação começou denunciando a situação de opressão em que

se debatiam as populações pobres e fazendo emergir a instância de um novo homem.

55

Também, examinado e criticando as tentativas de satisfazer as expectativas do novo homem

feitas por vários messianismos humanisticos especialmente marxistas e, evidenciando os erros

e as lacunas das novas teologias, cuja culpa mais grave, na sua opinião, é a de espozar as

ideologias seculares, limitando-se a traduzi-las em linguagem cristã.

Em seu pensamento teológico, Teologia não é apenas objeto de racionalização e

conceituação, daí porque ele escolheu a teopoética como linguagem teológica. Seu caminho é

considerado original de pressupostos específicos, ele acredita que teologia antes de ser objeto

acadêmico, ela faz parte do cotidiano e está intrinsecamente entrelaçada na teia simbólica

construindo relações que nos formam. Tais relações são perceptíveis por meio dos símbolos

que dão sustento à vida. Os temas teológicos residem nos corpos das pessoas: Tudo é feito

pelo corpo, e a partir do corpo. O corpo é uma grande razão. A teologia é uma função natural.

A religião deve ser entendida dentro da relação com o imaginário humano, com os desejos

mais profundos, como forma de estabelecer dignidade da vida humana, defender o amor,

procurar novas formas de poder: Teia de símbolos, redes formada pelos desejos, confissão

daquilo que se espera, da saudade. A igreja e a tradição não podem estabelecer padrão

segundo o seu mundo conceitual para a experiência religiosa.

Bibliografia

MAGALHÃES, Antônio. Deus no Espelho das Palavras. São Paulo, SP: Paulinas, 2000

ALVES, Rubem. Lições de Feitiçaria. São Paulo, SP: Loyola. 2000

_____________. Variações sobre a vida e a morte. São Paulo, SP: Paulinas, 1985.

MONDIN, Batista. Os teólogos da Libertação. São Paulo, SP: Paulinas, 1980.

JUAN L. SEGUNDO

Biobibliografia

Juan L. Segundo nasceu em Montevidéu em 1925. Cursou a Faculdade jesuíta de

teologia de St. Albert em Lovaina obtendo a licenciatura em teologia em 1956, e a faculdade

de Letras da Universidade em Paris onde obteve o grau de Docteu és Lettres em 1963”.

Teólogo da Libertação é especializado em pesquisa da sociologia da religião.

Principais obras: Berdiaeff, une reflexion chretienne sur la personne Aubier, Paris,

1963; Teologia para el laico adulto, em cinco volumes; La cristiandad una utopia?, 1963; La

56

liberacion dela teologia, 1975; O homem de hoje diante de Jesus de Nazaré, 1972; Teologia

da libertação: uma advertência à Igreja, 1975; Teologia y ciencias sociales, 1973.

Pensamento Teológico

Segundo é considerado um dos teólogos mais preparados e representativos da

Teologia da Libertação. Sua teologia tenta apresentar de forma atualizada as verdades do

cristianismo. O pensamento dele parti de dois pressuposto: 1º. O mundo onde vive o homem

contemporâneo fala uma linguagem profundamente diversa daquela do mundo tradicional. 2º.

Também os crentes estão envolvidos numa situação de crise muito séria.

Como conseqüência destes dois pressuposto, o objetivo teológico de Segundo torna-se

dúplice: a) exprimir a fé numa linguagem compreensível pelo homem moderno; b) aplicar as

verdades de fé aos problemas sentidos e vividos pelo homem moderno. Assim, obtêm ele uma

atualização substancial que não diz respeito só a forma , mas também aos conteúdos da

mensagem, pois estes são registrados conforme os problemas, os anseios, as expectativas, as

perspectivas do homem do nosso tempo.

Segundo usa o evolucionismo de Teilhard de Chardin e o personalismo de Berdiaeff

como instrumentos hermenêuticos para atualizar o kerygma evangélico; do primeiro, ele se

serve na exposição dos mistérios da graça, do pecado e da redenção; enquanto utiliza o

segundo na elaboração de um novo conceito de Deus e dos sacramentos.

Juan não condena a metafísica como um procedimento da mentalidade pré-científica,

definitivamente superado com o advento da ciência, como fizera Marx, Comte e outros

filósofos e teólogos. Até um certo ponto, ele julga legítima a validade da hermenêutica do

mundo, porquê este mundo não tem um fundamento em si mesmo nem pelo que concerne sua

dimensão física nem pelo que diz respeito à sua dimensão histórica. O que ele não aceita é

adotar linguagem metafísica para exprimir a imagem de Deus. Assim Deus se torna uma

realidade infinita, eterna, inacessível, feliz. Estudioso da filosofia personalista de N.

Berdiaeff, Segundo adota as categorias desta filosofia para propor uma nova imagem de Deus,

assim apresenta um Deus-Sociedade. Deus não é uma pessoa, mas uma sociedade. também

Deus se revela no seu agir, isso significa que Deus se nos manifesta, sua pessoa na história da

salvação.

Em sua obra, liberacion dela teologia, ele tenta renovar a própria teologia, ele é o

primeiro a escrever uma obra tão vasta e sistemática sobre o tema da libertação da teologia.

Ele considera que a teologia deve ser completamente livre. Assim cria uma teoria dos

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conteúdos da revelação que lhe consente manter firme os seus pensamentos. Ele tenta

estabelecer a tarefa essencial do teólogo que é a de ver Deus, imagem de nossa fé ligado ao

nosso cotidiano, a nossa história e suas mudanças. Assim estabelece a forma mais radical de

demitização da sagrada escritura; o N.T. é tido como ideologia.

Bibliografia

MONDIN, Batista. “Os Teólogos da Libertação”. São Paulo, SP: Paulinas, 1980.

TEOLOGIA AFRICANA

Uma Cristologia Africana

A teologia negra sul-africana se voltou para o Jesus histórico dos evangelhos sinóticos (Mateus, Marcos e Lucas) – como outras teologias da libertação –, descobrindo nele o libertador dos oprimidos.

Junto com essa imagem de Jesus Libertador, porém, incorpora influências do Movimento de Consciência Negra, que convida negros e negras a acolher a beleza de sua raça.

É fundamental, para isso, fazer valer a própria história e tradição. Foi-se o tempo da história contada por conquistadores holandeses e ingleses sobre "negros pagãos". Agora é a vez da história dos mártires negros que lutaram pela justiça. Não é uma história de exclusão ou submissão, mas de inclusão e libertação.

Essa teologia defende que Jesus passou a vida restituindo aos oprimidos e oprimidas a história e as tradições que lhes estavam sendo negadas.

Curados, os leprosos podem agora apresentar aos sacerdotes as oferendas prescritas. Os aleijados podem guardar o sábado. Os cegos, os coxos e as crianças podem acompanhar Jesus ao templo. As prostitutas podem reclamar sua entrada no Reino de Deus. Os cobradores de impostos podem ser chamados "filhos de Abraão".

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A todos eles e elas, doentes e pecadores, todos os excluídos, Jesus restitui sua história e suas tradições.12

São conhecidos os efeitos devastadores do colonialismo sobre costumes e práticas africanas.

No campo religioso, segundo o líder cristão sul-africano Desmond Tutu – bispo anglicano e Prêmio Nobel da Paz –, existe uma esquizofrenia na alma africana, entre a cultura tradicional do continente e o cristianismo ocidental.

A cultura ocidental chegou junto com o Evangelho. Com freqüência, por exemplo, música, ritmos e danças africanos foram substituídos por cânticos ocidentais acompanhados por um órgão importado. Face à herança perversa do colonialismo, tanto no campo cultural quanto no político, não é de se estranhar que os teólogos africanos, quando se esforçam em ler o Evangelho nos diferentes contextos locais, caminhem em duas direções. Uns dão prioridade às questões políticas (teólogos da libertação), enquanto outros consideram prioritárias as questões ligadas à cultura africana (teólogos da inculturação).

Até pouco tempo atrás, a maioria dos teólogos da libertação provinha da África do Sul. Ali, a teologia negra relacionava a mensagem libertadora do Evangelho com as situações de opressão provocadas pelo apartheid. Para esses teólogos, Jesus é um libertador.

Sem dúvida, porém, para a maior parte da África ao sul do Saara, a forma dominante é a teologia da inculturação. A meta é integrar o cristianismo na vida e na cultura dos povos africanos. Os principais representantes dessa teologia definem Jesus como o Irmão mais Velho, o Antepassado, o Chefe ou Aquele que cura. São imagens familiares à cultura africana. – J.R.L./P.P-L.

Outra figura-chave da vida tribal africana é a pessoa encarregada de restabelecer a plenitude e a salvação. É o nganga, o curandeiro-médico tradicional. Um teólogo congolês explica que o curandeiro é a pessoa mais poderosa e complexa da sociedade. De fato, a palavra "nganga" pode ser traduzida por sacerdote, químico, mago, profeta e vidente.

Qualquer nome que se use, o importante na cura africana é seu caráter holístico, isto é, leva-se em conta a totalidade da pessoa, matéria e espírito. Busca-se tanto detectar as prováveis causas espirituais quanto sociais do sofrimento físico ou das tensões na comunidade.

Uma vez diagnosticada a doença, o nganga receita remédios que vão desde sacrifícios até danças pelo restabelecimento das relações sociais.

Os evangelhos de Mateus, Marcos e Lucas estão cheios de histórias que mostram Jesus curando. São três as semelhanças entre Jesus como Aquele que cura e o nganga africano:

Em primeiro lugar, Jesus reconhece a ligação entre corpo e espírito. Junto com a cura física, ele perdoa a culpa: "Os teus pecados estão perdoados" (Mc 2,5). E elogia a fé dos doentes: "A tua fé te curou" (Mc 10,52).

Em segundo lugar, Jesus coloca a doença no contexto da reintegração social. Os portadores de lepra – hoje conhecida como hanseníase – têm que avisar os sacerdotes (Mc 1,44; Lc 17,14). O possuído pelo demônio, de Gerasa, tem que voltar para casa e para junto de seus amigos (Mc 5,19). A sogra de Pedro tem que voltar a cuidar da casa depois de curada (Mc 1,31). Até mesmo as palavras "vão em paz" contêm o sentido da totalidade social e do restabelecimento da saúde (Mc 5,34).

12 Trechos de matéria publicada pelo boletim "Dei Verbum", da Federação Bíblica Católica (Nº 42, 1/97).

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Finalmente, os métodos de cura de Jesus se aproximam aos dos nganga africanos. Ele aplica saliva ou mistura de saliva e barro sobre o corpo do enfermo (Mc 8,23), cospe nos dedos e toca a língua do surdo-mudo (Mc 7,33), faz sinais e geme (Mc 7,34).

O POVO NEGRO E A BÍBLIA: CAMINHOS DE APROXIMAÇÃO

Heitor FRISOTTI O que quer dizer interpretar como negro?

Em primeiro lugar, acho que significa do lugar onde o negro se encontra hoje. Um lugar social, um lugar cultural e um lugar de fé. Uma leitura negra da Bíblia está principalmente preocupada em dar uma resposta às situações conflitivas de hoje que atravess am a vida da maioria da população negra.

Isso obriga, naturalmente, a uma mudança de lugar, a um tomar partido, a sair da própria casa para se encontrar na casa dos outros. É uma verdadeira conversão para um outro olhar. Muito mais para brancos do que para negros, para homens do que para mulh eres, para sacerdotes, religiosos/as e pastores/as do que para leigos, para remediados do que para pobres, para os que participam de alguma forma de poder do que para despossuídos. Mas é tarefa que não exclui ninguém, porque na situação de dominação em qu e vivemos também um negro deve continuamente tornar-se negro, uma mulher tornar-se mulher, um pobre optar pelos pobres, e um branco... tornar-se gente (o que só é possível na medida em que deixa o poder e se identifica com os últimos). Vamos tentar descre ver esses lugares que nos esperam. O LUGAR DA DOR: a ótica de quem sofre pelo racismo.

Não saberia caracterizar com uma palavra melhor do que dor a situação que reúne todo tipo de humilhação sofrida pelo povo negro: econômica, política, afetiva, psicológica, racial...

É a humilhação pela «discriminação racial» (dimensão econômica do racismo) que se manifesta principalmente no mundo do acesso ao trabalho. O racismo tem sua base econômica própria: um negro pobre é preterido ao branco pobre quando, em i gualdade de condições, procura trabalho ou deve ser promovido, e é o principal alvo dos salários mais baixos, da repressão às reivindicações sindicais, ou nas demissões. A mulher negra sofre mais do que o homem negro ou a mulher não-negra esta discriminaç ão.

À discriminação econômica, que favorece a manutenção na situação de pobreza, somam-se outras discriminações sociais: no acesso aos lugares reservados aos brancos, na opção de moradia, no acesso a estudos melhores, na possibilidade de uma relação afetiv a duradoura, nos cargos de poder, até na religião.

É a humilhação pelo «preconceito racial» (dimensão ideológica do racismo) ou pela violência à identidade pessoal. Construiu-se no Brasil, como adaptação do racismo científico de origem européia, a ideologia e a política do branqueamento .

Ideologicamente, o branqueamento é a associação do negro a tudo o que é ruim e feio e, por outro lado, a associação do branco a tudo o que é bom e bonito. Assim o cabelo do/a negro/a é ruim, a cor da pele é uma sina, a beleza (segundo o padrão branco) é impossível para o homem e a mulher negra. Mas a caracterização é também moral: o negro é suspeito, o branco é confiável; o negro suja, o branco que erra é coisa normal; a religião do negro é inferior ou demoníaca, a do branco é superior e divina.

Politicamente, o branqueamento se caracterizou por uma legislação favorável à imigração de europeus; à oferta de condições econômicas, de educação e de trabalho melhores para os europeus e seus descendentes, e ao mesmo tempo, por uma ausência de atençõ es para com a população negra. Em 1911, o diretor do Museu Nacional, João Batista de Lacerda, que

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representava o Brasil no 1º Congresso Universal de Raças, em Londres, apresentava a política brasileira afirmando que "já que se viram filhos de mestiços apr esentarem, na terceira geração, todos os caracteres físicos da raça branca, (...) é lógico esperar que, no curso de mais um século, os mestiços tenham desaparecido do Brasil"; isso iria coincidir com "a extinção paralela da raça negra em nosso meio " pois, desde a Abolição, os negros tinham ficado "expostos a toda espécie de agentes de destruição e sem recursos suficienciais para se manter".1

Variação ideológica do branqueamento foi a ideologia da mestiçagem ou miscigenação, que promoveu a imagem do mestiço ou mulata, associada à descrição do país como uma verdadeira democracia racial, de relações cordiais entre as raças. Segundo esse modo de pensar, o mestiço reuniria o melhor do branco e do negro (e do índio), e é favorecido na ascensão social, sendo o mais apto para viver no Brasil. Num país em que as raças são diluídas e há uma notável variação de cores, num país que prestigia o mestiço, e ste não poderá ser "o cúmplice do branco contra o preto" e tampouco "o cúmplice do negro contra o branco", afirmava o sociólogo Gilberto Freyre,2 esperando aliviar assim as tensões sócio-raciais.

Na realidade, o mestiço vive uma crise de identidade, pois não é nem um, nem outro: não é mais negro, não chega a ser branco, não sabe que sangue de índio tem. É um ser sem identificação de origem e, por isso, sem história, pois dificilmente pode ident ificar-se com um dos grupos étnicos que fizeram esse país. Pode identificar-se com alguns personagens históricos, mas raramente com comunidades: vive solitário.

Na sociedade, é a elite dominante branca que determina quando ele é parecido com o branco - e tem livre acesso - e quando é parecido com um negro - e é discriminado. Assim, a mesma pessoa, é branca na Bahia e negra no Rio Grande do Sul, é branca demais para trabalhar na limpeza das ruas e é negra demais para ser gerente de banco. Quem decide sobre sua 'boa aparência' (uma forma sutil para discriminar, pois uma mulher ou homem negro nunca terão 'boa aparência', mesmo que sejam mais bonitos do que muitos homens e mulheres brancas) é o branco patrão.

O resultado desse processo de branqueamento é a identidade negra negada e uma ideologia introjetada difícil de erradicar: as crianças negras acham que nasceram na família errada ou com a pele errada; os adolescentes a juventude negra se acham mais feio s e não gostam do seu corpo; os trabalhadores não têm como competir com aqueles que nasceram para vencer. Nos livros de escola e nos meios de comunicação o passado do negro é para esconder ou, quando é lembrado, é para mostrar que era escravo; a família d o negro não existe; o trabalho do negro é o pior; o futuro do negro é o crime ou a pobreza; a mulher negra fica na cozinha e a mulata esbanja sensualidade: contudo, será desejada, mas nunca amada.

É a humilhação, comum a muitos pobres, pela «situação de opressão e exclusão», que acaba se tornando uma verdadeira segregação ou apartheid social (dimensão sócio-política): mesmo que não existam leis a respeito, é fácil identificar casa e bairro de negro, escola de negro, trabalho de negro, doença e médico de negro, supermercado de negro, praia de negro, carro de negro, etc.

Não só isso, pois a exclusão atinge os direitos humanos, sociais e civis. A polícia e os tribunais tratam de maneira diferente brancos, mestiços e negros, mulheres brancas e mulheres negras, crianças brancas e crianças negras. O mundo da política reser va lugares diferentes aos brancos e aos negros. E, apesar de estar continuamente se organizando, em associações de moradores, clubes, movimentos, times de futebol, blocos de Carnaval, comunidades e terreiros, o negro é considerado a-social e sem direitos.

Tudo isso é vivido por cada pessoa negra com profunda dor, que vem de longe, que atinge irmãos e pessoas conhecidas, que parece aguardar na próxima esquina. E mostra um

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mundo diferente daquele que é propagandado na sociedade ou ensinado nas escolas. Ma s é o mundo real que se mostra com toda a sua dramaticidade a quem sofre.

Quem domina, quem se reserva o exercício do poder, tem outra imagem: um salário baixo, que faz a família de um trabalhador passar fome, é uma necessidade da produção ou da estabilização da economia; um negro que reivindica direitos iguais ou específico s promove o racismo ou não tem paciência histórica; uma mulher se prostitui porque gosta; uma criança negra na rua é sempre um menor, que não quer trabalhar (infrator) ou que é um coitadinho que precisa da assistência dos brancos (carente); um poli cial que mata um negro correndo preserva a segurança da sociedade; as violências do poder na história - e a omissão das Igrejas - foram devidas à 'consciência possível' daquele tempo que impedia enxergar melhor. É a visão de quem fere. Outros se desculpam dizendo que foi sem querer, que não têm culpa. Mas a ferida existe, que a facada tenha sido voluntária ou não.

A dor torna-se, então, um dos princípios hermenêuticos fundamentais ao ponto de podermos afirmar que quem não sofre, não entende. A dor vivida é o primeiro passo para entender as práticas e as falas que legitimam o poder e a violência, e as nece ssidades e os sonhos de quem está jogado no chão (cf. Lc 10,25-37). Não há outra maneira de se aproximar da verdade numa sociedade atravessada por conflitos.

Pilatos estava impossibilitado de saber qual era a verdade sobre Jesus e sobre o povo, pois encarnava e defendia a dominação e o poder institucionalizados (Jo 18,38). Moisés estava impossibilitado de conhecer o Deus da vida enquanto residia no palácio de Faraó; teve que sair do saber dominante e encontrar-se no deserto, desamparado do poder, da religião e da cultura oficial do Egito, para que uma sarça ardendo pudesse lhe revelar a dor e a força de Deus (Ex 3). Jesus teve que se encontrar diante do sof rimento de uma mulher siro-fenícia (Mc 7,24-30), vítima de maldição - pois excluída da bênção de Deus por ser estrangeira, 'idólatra' e mulher -, para poder anunciar a Boa Notícia de um Deus que se aproxima dos últimos e discriminados superando barreiras.

A identificação com os excluídos da sociedade é tal que Jesus acaba assumindo em sua carne a condição de maldito, ao morrer na cruz e fora da Cidade Santa (Gl 3,13). É a nova verdade, a dos 'vencidos', que enfrenta a do poder constituído; é o novo cami nho, o da solidariedade, que contrasta com as práticas da exclusão, próprias de quem detém o poder; é a oferta da vida, diante dos poderes de morte. O que faz dessa opção "o caminho, a verdade e a vida" para todos (Jo 14,6).

Acredito que partilhar a dor dos últimos e excluídos é o caminho para se aproximar da verdade que se faz justiça. Encerrada nesta dor está a melhor radiografia da sociedade, mas também a possibilidade de superação das discriminações e injustiças, pois, na convivência, na solidariedade, no compromisso pela mesma luta encontra-se a possibilidade de achar outra resposta às questões postas pelas ciências: como entender a alteridade, como partilhar de outra cultura, como perceber a revelação de outra religi ão. O LUGAR DO SER NEGRO ou o lugar da identidade-comunhão.

Identidade negra não é só o que o branco diz e reserva para o povo negro na nossa sociedade. O negro se reconhece enquanto tal também a partir de outras relações, de outras vivências, de outras realidades e não só pelo racismo que o atinge e pelas imagens que a elite branca projeta sobre sua vida.

Muitas destas relações e vivências estão na família: nas pessoas amadas, que muitas vezes vão além das fronteiras de sangue ou de parentesco; na organização do tempo e dos serviços; na maneira de celebrar e fazer festa; no modo de socorrer quem precisa de ajuda ou de cuidar de um doente; nas referências plurais de autoridade; na maneira de preparar, distribuir e consumir a comida; no contar, cantar e dançar as histórias; nas pessoas lembradas que já se foram; nas solidariedades e também no modo de orga nizar o lazer, de receber e

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fazer carinhos, de pentear o cabelo, de afagar no peito ou ninar no colo e, naturalmente, na maneira de rezar e falar de Deus.

Nos terreiros, famílias amplas ao redor de um parentesco espiritual, descobrimos que identidade é um processo, mais do que algo que se tem. Ela se constitui ao longo do tempo como um caminho de identificação em que, ao sangue e à raça, acrescentam-se o utros elementos que fazem das pessoas comunhão.

Identidade, então, se (re)constitui a partir das relações de família - repetimos, não restritas à linhagem de sangue, mas amplas, ao redor de quem acolheu, de quem ensinou, de quem curou, de quem amou, de quem castigou ou ajudou, etc.; é saber c orrer no tempo para reconhecer-se na vivência dos antepassados, os mortos que souberam fazer de sua vida uma contínua doação, um ensinamento a recolher e praticar, uma memória que vive nos filhos; e também se constitui pelo sonho em comum pa ra se manter vivo, recuperar forças e ânimo, lutar para defender os irmãos e transformar as vitórias em direitos reconhecidos e comunidades organizadas.3

Resumindo, identidade se faz respondendo às perguntas: de onde eu venho? com quem estou? para onde vou? Nas comunidades religiosas de candomblé, isso se transforma em respeito e cultivo pelos antepassados e ancestrais, dos quais vem a Tradição e a voca ção, eles que estão à origem da família-comunidade e dos serviços para preservá-la e fazê-la crescer e afirmar; respeito e cultivo da comunidade, feita de tudo o que vive e existe: não só pessoas, mas também animais, plantas e toda a natureza, pois todo s er fala de Deus, nos ensina coisas da vida, é para a comunidade e, por isso, tem que ser preservado, alimentado e promovido; respeito e cultivo também pelos filhos e toda pessoa que chega à porta de casa: são o futuro a zelar e trazem também vida (e confl itos, e problemas, e dores, mas também alegrias, esperanças, ajuda, riquezas espirituais e materiais). Tudo isso, a memória, a comunhão, o viver bem, são Axé, força viva de Deus.

Identidade é identificação e por isso é luta. Dito assim esquematicamente, pode parecer pouco lógico, mas ao pensar que identificação é criar laços de solidariedade e afetos, é comunhão de interesses e sonhos, é fazer uma só carne com as pessoas amadas , entende-se melhor porque é luta: pois, se luta para defender quem se ama e o que se ama, muito mais do que por uma idéia ou uma motivação moral.

Por isso, a dimensão afetiva ergue-se também como possibilidade hermenêutica: ela supera barreiras e permite entender com a dor e os sonhos dos outros. Inclusive faz do destino dos outros o próprio destino. Estamos lembrando neste momento algumas reali dades que poderíamos considerar símbolos do que afirmamos: as madres de la Plaza de Mayo argentinas que desafiaram a ditadura, à procura de uma resposta sobre seus filhos desaparecidos e vítimas dos militares.4 Em 1992, ainda desafiavam o poder d emocrático, opondo-se a receber uma indenização para os ex-presos políticos no período entre 1972 e 1983, pois a única compensação que queriam era a punição dos responsáveis pelos crimes.5

Como elas, as viúvas dos mártires da terra no Maranhão, e em todo o Brasil, exigem justiça. Vinte e cinco delas, vestidas de luto e tendo na cabeça tiras de pano com os nomes dos maridos mortos, fizeram disso motivo para desafiar autoridades e pedir ju stiça também a João Paulo II, durante sua visita ao Brasil em 1991.6 "A gente não pode enterrar marido e filho e se enterrar também", declarou naquele dia Maria das Graças Machado, uma das líderes do movimento; a ela fez eco Terezinha Rodríguez: "O que pedimos é justiça. Queremos que acabe a impunidade dos assassinos, executores e mandantes, a maioria dos quais é bem conhecida".7

Seu grito de dor incomoda, assim como incomodam as mães de Acari, na Baixada Fluminense, que lutam contra os esquadrões da morte, que matam suas crianças, e chegam a se tornar vítimas, como seus filhos e filhas, dos mesmos assassinos. É o caso de Edméi a da Silva Eusébio e Sheila da Conceição, assassinadas em 15 de janeiro de 1993, após denunciar

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que policiais eram responsáveis pelo desaparecimento das crianças. "Eu não aceito que digam que não tem solução - dizia Edméia. Vou continuar cobrando, nem que eu saia daqui agora e eles me matem ali".8

Para muitos, e para a sociedade, estes filhos e esposos estão mortos e não há nada a fazer: são lutas inúteis. Para estas mulheres, a dor ainda está no ventre e só acabará quando esta sociedade mudar e trilhar caminhos de justiça, para evitar que outro s morram. Elas estão com a verdade e o saber que liberta. O LUGAR DA FÉ DO POVO NEGRO, fé plural e própria, diferente e forte.

O terceiro lugar é a fé, entendida como fé de comunidades e fé na história. É preciso voltar-se ecumenicamente para essa fonte de vida: olhar para comunidades de fé - familiares ou amplas, católicas ou protestantes, populares e devocionais, ao redor de pe ssoas carismáticas ou organizadas em irmandades, terreiros e aldeias, CEBs ou grupos - que possam nos lembrar o que é viver a fé em comunhão e não sozinhos, como Deus marca sua presença na comunidade e como esta presença é celebrada, de modos diferentes, mas que sempre é alimento para viver e viver melhor, agradecendo e pedindo força, se protegendo e sendo jogados para fazer coisas novas.

Não só no hoje, mas no tempo também. Cada uma dessas comunidades tem sua história de fé, sabe narrar e celebrar como Deus se manifestou na sua história e na história dos homens, tem suas 'pedras' assentadas (usando a imagem bíblica de Js 24,26s) para l embrar como Deus interveio, como foi saudado e celebrado, como os lugares por onde passamos se tornaram lugares santos e dignos de respeito. Sobretudo, como as pessoas se tornaram dignas de respeito, porque amadas e salvas por Deus. Nossos pais nos lembra m disso, nossos irmãos e irmãs nos lembram disso, nossas humilhações e sonhos nos fazem desejar isso para nós e para muitos e muitas.

É uma história de salvação brasileira, que tem que ser resgatada porque foi, e continua sendo, palavra de Deus. Por ela, chegamos também à história dos outros, à história dos grupos oprimidos e discriminados em Israel, à história de Jesus e nos reconhecemos nelas como num espelho. É por isso que falamos, talvez escandalizando alguns, que a Bíblia é a terceira palavra de Deus: ela vem após a primeira palavra, que é presença de Deus em nossa vida, e a segunda palavra, que é a presença de Deus em n ossa comunidade de fé e na história dessa comunidade. Sob pena de, em lugar de ser espelho, a Bíblia tornar-se cenário artificial: ao sair do teatro, o mundo é outro e esta palavra é vazia, quando não violenta.

Convidamos, pois a mudar de lugar e tomar partido. É o caminho da solidariedade, condição necessária de leitura, interpretação e transformação da Bíblia (e da vida de todos nós). Solidariedade que se apóia na partilha da dor, na partilha da identidade e dos caminhos, na partilha da fé. Pois, solidariedade não é sinônimo de compromisso em algumas lutas ou em alguns momentos, mas de vivência de comunhão. Solidariedade é o caminhar juntos, carregando o peso dos outros, partilhando das dores e também das f estas, da visão do mundo, inclusive da leitura de fé de outra comunidade de fé. Quem a vive, não idealiza o outro, mas carrega também seus limites, compreende seu pecado, pois a queda do outro é vivida como a própria queda.

Solidariedade não é, então, uma atitude guerreiro-intervencionista, mas uma comunhão na afetividade e na dor, para sempre. É como gravidez: é carregar e ser carregado. Neste sentido, é também alimentar-se juntos, um(a) dando sua carne e seu sangue como alimento para o outro. Não foi por acaso que o Senhor falou em 'comer da sua carne e do seu sangue', em fazer-se alimento para a vida dos irmãos (cf. Jo 6,35-58). Por isso, é comunhão de destino que sabe respeitar as identidades distintas. Assim como "qu em ama nasceu de Deus e conhece a Deus" (1Jo 4,7), só quem ama os mais pobres de um povo pode nascer de novo,

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com eles, pode conhecê-lo de dentro e entender a alteridade dos grupos oprimidos - em sua etnia, raça, sexo e religião - como manifestação de Deu s.

É fundamental, pois, viver em comunidade esta 'solidariedade étnica' junto aos oprimidos e aos últimos da sociedade para fazer uma leitura étnico-racial da Bíblia: trata-se de "estar solidário com essas etnias na busca da sua identidade. (...) É sentir como experimentam Deus na sua condição de marginalizados e como, através de seus símbolos, cultos e manifestações religiosas, denunciam as injustiças e opressões existentes e anunciam a justiça de Deus".9

A leitura negra da Bíblia se mostra como: • uma leitura comunitária. Se a experiência fundamental de resgate da identidade

negra é a família ampla, a comunidade organizada, então o caminho melhor é o de uma leitura feita em comum e de uma produção feita em comum. A prática ociden tal privilegia o texto escrito e produzido individualmente. Acredito que uma leitura negra possa oferecer produções comunitárias (mais do que coletivas) em que a experiência do grupo tenha mais peso do que o teólogo que assina o artigo, em que o destaque vai mais para a comunidade do que para uma pessoa, e também produções mais típicas da tradição oral: contos, cantos, danças, histórias simbólicas, poesias, dramatizações, celebrações, etc. Até na hora de ler ou proclamar trechos bíblicos poderia se dar ma is destaque a um texto narrado, dramatizado ou cantado, do que a um texto escrito e lido.10

• uma leitura feita a partir da própria história. À medida em que se relê e se resgata a própria história - história de dor e solidariedades, de presença e revelação de Deus -, é possível se abrir a outras histórias que aos poucos se torn am também próprias. Conhecer a história das pessoas e de uma comunidade é o passo melhor para entender o que ela está celebrando e o que está por trás do que está sendo anunciado ou vivido. É uma experiência que muitos de nós têm feito nas comunidades cri stãs e também no encontro com comunidades-terreiro. Desse modo, também conhecer histórias contadas na Bíblia abre a possibilidade de que se tornem próprias, mesmo que diferentes ou pertencentes a um povo que celebrava Deus de outros jeito.

• uma leitura feita com outro olhar e a partir das próprias raízes culturais, comunitárias e de fé. É nesse momento que se percebe que, mais do que temas, é outra maneira de se aproximar, de ler, de perguntar, de viver, de se relacionar c om a fé das comunidades bíblicas. A leitura negra não vai poder evitar a referência contínua à palavra dos antepassados, revivida como comunhão no tempo e vocação; à tradição oral como momento de memória e de educação comunitária e simbólica; ao resgate d a relação com a natureza, manifestação de Deus que vive, que cria continuamente e tem poder de vida e morte; à mãe que mantém a identidade e a diferença da vida no ventre, que torna-se alimento, ou à vida que nasce do ventre, que passa pela dor, que preci sa de cuidados; à partilha dos dons e das oferendas, à vida que se troca, ao alimentar-se uns aos outros, ao sacrifício como doação; e também à festa que celebra a vida reafirmada no meio de tanta dor, o canto e a dança que acompanham nascimento e morte, paz e guerra, seca e abundância, doença e cura, amor e solidão.

O teólogo anglicano John Mbiti, do Quênia, tem afirmado, entre outros teólogos e biblistas africanos, que na África a Bíblia é um livro vivido pela comunidade e vivo através da comunidade e para a comunidade, cujo fundamento e objetivo é Deus: "A África vive na Bíblia e a Bíblia é viva na África".11 Essa experiência é também a dos cristãos negros nas Américas. Para ser mais corretos, deveríamos dizer que o é já, mas ainda não. Estamos a caminho para que se torne sempre mais exper iência de comunhão na dor, nos afetos, no tempo, com tudo o que vive, e comunhão também de fé, para que a Bíblia deixe de ser palavra violenta para os outros e seja água viva para muitos e muitas.

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Quero também trazer aqui algumas afirmações de Sílvia Regina, anotadas no Seminário de setembro de 1993, que acho mais iluminadoras daquilo que eu acabei gaguejando: "quero ligar mulher, negritude, Igreja e sociedade, e ler a Bíblia a partir dos meus i rmãos e minhas irmãs". "Não se trata de trabalhar textos avulsos, mas de um jeito de ler toda a Bíblia: não podemos reduzir o negro a pedacinhos de Bíblia. Entrar na história do povo negro não é trabalhar um tema a mais: é Aliança, um pacto, uma experiênc ia religiosa". "Quem é capaz de suar conosco quando celebramos, é capaz de se aproximar da experiência de Deus que fazemos; quem sofre conosco a dor da discriminação, é capaz de entender o nosso pranto e o nosso grito". "Conhecer tem a ver com intimidade, o que falta aos investigadores e leitores de livro. Conhecer é saber que não conhecemos, é saber estar diante do mistério, é silenciar".

E também: "algumas pessoas são chamadas a aprofundar-se no conhecimento: isso significa partilhar de tudo, da vida, do destino, das dores e risos do nosso povo; para muitos de nós, negros e negras, isso é voltar para casa, é re-adquirir a herança, é re -fazer-se, re-constituir-se: guardamos a saudade de uma experiência de Deus diferente". "A vida do povo negro é terra santa... há que tirar as sandálias!". "Possivelmente, o grande mistério vivido pelo povo negro, o segredo de sua hermenêutica bíblica, fo i ter descoberto que esta mesma Bíblia não é a palavra de Deus, mas «uma» Palavra de Deus; este mesmo Deus nos dirigiu outra Palavra, nos falou e nos fala pelos Orixás, pela tradição de nossos Antepassados"; "negar meus antepassados é trair-me; neg ar a Bíblia é trair-me: são minhas heranças".12

Notas: 1 . Apud Thomas SKIDMORE, Preto no Branco, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1976, p. 81-83 (grifos meus). 2 . Gilberto FREYRE, Sobrados e Mucambos, t. II, (1936), 6ª ed., Rio de Janeiro, José Olympio, 1981, p. 650. 3 . Na África é comum falar nessa comunhão ampla com todos os seres vivos: comunhão vertical, com os antepassados, e horizontal, com a família, as pessoas em geral e a natureza. Cf. Vincent MULAGO, Elements fondamentaux de la religion africaine. In: CERA, Religions africaines et christianisme. Colloque International de Kinshasa, 9-14 janvier 1978, Kinshasa/Limete (Zaire), 1979, p. 43-63; em português: Gabriel Molehe SETILOANE, Teologia africana. Uma introdução, São Bernardo do Campo, EDITEO, 1992, p. 23-36; André LUKAMBA, Nova etapa missionária em África. Redescobrir para repropor, São Paulo, Loyola, 1992, p. 45-67. Veja também: Franziska C. REHBEIN, Candomblé e salvação. A salvação na religião nagô à luz da teologia cristã, São Paulo, Loyola, 1985, p. 40-53. 4 . Cf. Mães de desaparecidos. In: Sem Fronteiras, nº 185, dez. 1990, p. 25s. 5 . Cf. Indenização para ex-presos políticos. In: Sem Fronteiras, nº 203, out. 1992, p. 31. Após a ditadura, os familiares dos desaparecidos continuavam registrando seus filhos no censo argentino. "Mesmo que não estejam conosco, não os consideraremos nunca mortos. Por isso os registramos como pertencentes às nossas famílias" declarou Hebe de Bonafini, presidente das Mães da Praça de Maio (Continuam vivos. In: Sem Fronteiras, nº 196, jan-fev. 1992, p. 35). Cf. também Mary E. HUNT, Mortos mas ainda desa parecidos. As mães da Praça de Maio transformam a Argentina. In: Concilium 247, 1993/3, p. 96-105. 6 . Cf. Tarcísio PRAND, Viúvas vão à luta. In: Sem Fronteiras, nº 197, março 1992, p. 14. Na ocasião, declararam à imprensa também sua decepção por "ver as onças perto do Papa e nós longe - segundo denunciou Ardenora Mendes da Silva -. Lá estava o che fão da UDR de Bacabal e outros companheiros... E nós, tocadas para longe pela segurança" (ibid.). 7 . Ibid., p. 13.

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8 . Kátia MEDEIROS e Elza Maria GHELLER, As mães de Acari, datilografado distribuído pelo "Projeto Sofia: Mulher, Teologia e Cidadania" do Instituto de Estudos da Religião (ISER), Rio de Janeiro, abr. 1993, p. 5. 9 . Maria C. de FREITAS, Profetismo na Nova Evangelização. In: AA. VV., Dimensão Profética da Vida Religiosa na Nova Evangelização, Rio de Janeiro, CRB, 1990, p. 64s. 10 . Além de ser experiência e constatação de muitas comunidades cristãs, essa é também uma das observações do teólogo queniano John MBITI: "À Bíblia dever-se-ia conceder a liberdade de circular oralmente, assim como aconteceu nos estágios iniciais do seu desenvolvimento. A Igreja deveria facilitar e aproveitar a tradição oral nessas maneiras: incentivando a leitura pública da Bíblia, insistindo mais em narrar os fatos bíblicos, facilitando a memorização de trechos e versículos, utilizando mais textos bíblicos e cânticos e hinos neles inspirados, dramatizando sagradas representações de inspiração bíblica e, naturalmente, aprofundando em nível científico a confrontação entre a tradição oral na Bíblia e a literatura oral africana" (cf. La Bibbia nella c ultura africana. In: Rosino GIBELLINI (ed.), Percorsi di teologia africana, Brescia, Queriniana, 1994, p. 47). 11 . La Bibbia nella cultura africana, p. 60. 12 . Algumas dessas frases estão no texto que citamos anteriormente; outras fazem parte de minhas anotações na hora da exposição.

TEÓLOGOS DA ÁFRICA

Arcebispo Desmond Tutu

Biobibligrafia

Desmond Msilo Tutu nasceu no dia 7 de outubro de 1931, em Klesksdorp na Província

Noroeste (North West Provinde), antes chamada de West Transvoal, na África do Sul. Seu pai

era professor, e Tutu foi educado na joannesburg Bantu High School (Escola Bantu de

Johannesburgo). Após concluir sua educação secundária, Tutu foi para a Pretoria Bantu

Normal College onde obteve a formação de professor em 1953.m 1954 ele graduou-se pela

University q South África com o grau de Bacharel em Artes (correspondente a Bacharel em

Letras e Artes). Correspondente a Bacharel em Letras e Artes no sistema de educação

67

brasileiro. No ano seguinte (1955) Tutu casou-se com Leah Nomaliso, com quem teve quatro

filhos.

Por três anos ele trabalhou como professor do ensino médio na localidade de

Krungersdorp, em seguida iniciou seus estudos teológicos na St.Peter’s Theological College,

tornando-se diácono em 1960, servindo na localidade Benoni, e sacerdote em 1961, quando

foi ordenado.

A família Tutu viveu na Inglaterra nos anos de 1962 a 1966. Durante esse período

Tutu trabalhou como cura e graduou-se Bacharel em Divindade e Mestre em Teologia. Entre

1967 e 1972 ele ensinou no Federal Theological Seminary no Cabo e na University of

Botswana, Lesotho e Swaziland, antes de retornar à Inglaterra onde permaneceu por três anos

como diretor assistente de um Instituto Teológico em Londres; Em 1975, Tutu esteve mais

uma vez na Inglaterra, quando trabalhou pra o Conselho Mundial de Igrejas (World Council

of Chuirches). No mesmo ano ele foi iniciado para a posição na Igreja Anglicana da África do

Sul nos anos de 1975 e 1976. Ainda em 1976, Tutu foi consagrado Bispo de Lesotho, onde

permaneceu até 1978, ano no qual passou a ocupar a função de Secretário Geral do Conselho

de Igrejas da África do Sul.

Em 1979, Desmond Tutu recebeu o título de Doutor Honores causa em Direito da

Universidade de Harvard, EUA. Tutu também recebeu o título de Doutor Honoris causa de

várias universidades proeminentes dos Estados Unidos da América, Grã-bretanha e

Alemanha.

Em 1980, Desmond Tutu teve seu passaporte confiscado pelo governo sul-africano em

represália a sua convocação de um boicote internacional ao carvão mineral produzido naquele

país. Em 1984, ele foi contemplado com o prêmio Nobel da Paz, em reconhecimento a sua

companhia não violenta to limitar o comércio e investimentos internacionais na África do Sul.

Com os recursos do Prêmio da Paz tentou estabelecer a Bolsa Sub-Africana de Refugiados,

permitindo que estudantes pobres pudessem dar segmento a seus estudos.

Desmond Tutu tornou-se Bispo de Johannesburgo no ano de 1985, e logo no ano

(1988) seguinte foi nomeado Arcebispo da Cidade do Cabo e chefe da Igreja Anglicana no

Sul da África (Igrejas de Confissão Anglicana na África do Sul e outros países localizados na

região sul do continente africano).

O africano Desmond Tutu publicou vários trabalhos, dos quais infelizmente não

conseguimos referências em língua portuguesa. Entre seus trabalhos publicanos podemos citar

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os seguintes Crying in the Wilderness (∗Clamando no Deserto); Hope and Suffering

(Esperança e Sofrimento), que se trata de uma coletânea de sermões e discursos seus; e The

Raimbow People of God (O Povo Arco-íres de Deus), o qual inclui material biográfico e

notas narrativas escritas por John Allen.

Tutu aposentou-se após o exercício por dez anos (1986 a 1996) na posição de

Arcebispo e tornou-se presidente da Comissão da Verdade e Reconciliação que trabalha para

a revelação traumática das injustiças e segredos do regime do “apartheid” a África do Sul.

Após sua aposentadoria, Tutu ocupou uma posição de professor visitante na Candler School

of Theology na Universidade Emory nos Estados Unidos da América.

Pensamento Teológico

Desmond Tutu desenvolveu um pensamento teológico que toma o corpo de uma

teologia libertadora. Em seus sermões, discursos e declarações, Tutu demonstra sua

preocupação com os caminhos tomados pela sociedade Sul-Africana, marcada por injustiças.

Por esta razão Tutu formula seu objetivo como “uma sociedade democrática e justa, sem

divisos raciais”. Ele coloca a Igreja deve ser “uma Igreja em movimento, um instrumento na

mão de Deus, proclamando a Boa Nova, ensinando os novos convertidos, ... instrumentos de

paz e reconciliação e justiça nas mãos de Deus. Somos (Igreja) o instrumento e para curar

feridas, para construir a comunidade e alimentar os famintos. Somos uma comunidade cúltica

cheia de Espírito, que sabe que podemos fazer o trabalho de Deus somente por seus caminhos

e Seus meios, e deste modo temos uma espiritualidade engajada que põe as coisas mais

importantes em primeiro lugar”. (Arcebispo Desmond Tutu, sínodo 1992).

Em sua teologia, Tutu percebe a comunidade cristã com parceria de Deus, seus agentes

na transformação do ódio, hostilidades, ciúmes, fome, pobreza, injustiça, opressão, alienação,

solidão, rivalidade, competição, ganância, doença, daquilo que torna o mundo feio e seus

opostos glorioso. A Igreja é agente de Deus na consturção do Reino onde haverão riso e

jubilo, cuidado e partilha, justiça, paz e reconciliação, e compaixão. São esses suas posição

em relação à teologia e sua visão da comunidade cristã e seu papel no mundo que o levaram a

tomar parte ativa, com campo político em seu país. Sua atuação no processo que levou ao fim

do regime do Apartheid na África do Sul deve uma dimensão profética ao proclamar o Reino

∗ As traduções dos títulos são, possivelmente, diferentes dos encontrados em alguma publicação em língua portuguesa. São traduções livres nossas.

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de Deus e sua justiça e ao denunciar a injustiça do sistema de dominação e opressão imposto

pelos Boers sobre o povo negro sul-africano.

Suas contribuições como líder religioso foram essenciais para a formação de uma

consciência negra de resistência não-violenta á injustiça do Apartheid.

Em seus escritos, sermões e discursos, Tutu também aborda temas profundamente

polêmicos e assume posições de vanguarda em relação à ordenação feminina ao ministério e

à presença homossexual na Igreja cristã. Segundo Tutu, a “opressão corta como uma faca de

dois gumes. Por trás de nossas barreiras “seguras” de retidão, nós nos privamos dos ricos dons

que gays e lésbicas têm para contribuir todo o corpo de Cristo”.

TEOLOGIA ASIÁTICA

Uma Breve História das Colonizações em Solo Asiático.

Várias nações européias, desde o fim do século XV começaram seu processo de

colonização do resto do mundo. Como sabemos, as duas nações desencadeadoras do processo

de expansão colonizadora e missionária foram Portugal e Espanha. Já em meados do século

XVI, os dois países mencionados foram perdendo sua hegemonia sobre os mares, sendo que a

sua expansão colonial se deteve. Entraram então no cenário das colonizações, além da

Inglaterra, países como França, Holanda e Dinamarca. Sendo assim, principalmente durante

os séculos XVII e XVIII, houve uma afirmação colonizadora dessas potências em diversas

regiões do globo. Uma nota importante seria a de que o processo de globalização começara,

desde a “Era dos Descobrimentos” liderada pelos países ibéricos a quinhentos anos atrás.

Portanto, poderíamos admitir que já houve outros tipos de globalização.

As antigas civilizações do oriente, durante séculos, sempre chamavam a atenção dos

europeus. Isto porque, em vários livros medievos, existiam alusões acerca de monstros

marinhos e estranhos costumes que diziam existir por aqueles mares e plagas orientais. Marco

Pólo e tantos outros navegadores em suas viagens, diziam ter tido contato com cortes de

imensas riquezas na China e na Índia. Por volta do século XVI, os portugueses mantiveram

um contato comercial permanente com o oriente, o que abriu as portas deste continente para a

Europa. Com a concorrência comercial, logo muitos países europeus tiveram a necessidade de

firmar colônias, embora o seu objetivo não fosse o de realizar ali conquistas entre o povo

70

asiático. Mas a necessidade de conseguir ou manter concessões ou vantagens comerciais

levaram algumas potências européias a intervirem militarmente, estabelecendo o regime de

domínio colonial. Nessa marcha de conquista e exploração militar, política e econômica,

caminharam também os missionários muitas vezes lado a lado com os exploradores ou

também separados deles (não podemos generalizar, apesar de serem poucos os que não

estavam do lado do poder). Por volta do século XIX muitas regiões da Ásia, conheciam uma

espécie de mensagem superficial acerca do Cristo.

A Índia (correspondente hoje a territórios como a Índia propriamente dita, Paquistão,

Bangladesh e Sri-Lanka) foi o primeiro território a sofrer grande impacto colonial e

missionário. Segundo tradições antigas, já existira ali desde muito tempo, uma igreja cristã

que afirmavam ter sido fundada pelo apóstolo Tomé. Em meados do século XVI, católicos

procuraram forçar a conversão da geração dos “antigos cristãos de São Tomé” a conseqüência

disso foi que alguns indianos se tornaram católicos e outros deram continuidade as suas

antigas tradições de fé. Este pequeno grupo, mais tarde alcançado pelo cristianismo anglicano,

se separou da antiga igreja de São Tomé e formaram a igreja de Mar Thoma, que era

protestante em suas doutrinas, ao mesmo tempo em que guardavam a sua liturgia e costumes

tradicionais. Hoje, a Igreja de Mar Thoma é bem forte no sul da Índia, onde é conhecida pelo

seu aspecto evangelístico.

Os católicos que chegaram no século XVI, sob a bandeira portuguesa, em 1833

romperam, por ordem do governo português, com Roma, sendo que esta imediatamente para

não ficar para trás mandou um grande contingente de missionários, o que causou grandes

conflitos com os católicos portugueses, pois todos eles acusavam-se mutuamente de hereges e

cismáticos. Por esta causa, houve um grande declínio no avanço do catolicismo na Índia.

Principalmente no século XIX. Enquanto durava o cisma entre católicos e católicos, os

protestantes começaram a se instaurar em solo indiano. Mas sua intenção não era a de

propagar o evangelho, pois estes protestantes achavam que haveria um grande choque

(conflitos e motins) entre o Cristo pregado e as tradições religiosas daquele continente, o que

acarretaria em prejuízo para os seus comércios. Este lamentável fato se deu porque era o

comercio que havia embalado alguns protestantes para estarem em solo hindu. Entretanto, no

século XVIII, com o advento do pietismo na Europa, o forte ardor missionário desse

movimento embalou vários evangelistas para a pregação do evangelho aos hindus.

Dinamarqueses, alemães e britânicos deram sua parcela de contribuição para o movimento

missionário na Índia. Uma das grades referências missionárias em solo hindu é o missionário

William Carey que é apelidado de fundador das missões modernas.

71

O impacto colonizador também se fez sentir no sudeste da Ásia. Onde no centro

existia o famoso reino de Sião. A leste de Sião, os franceses colonizaram a região que hoje é

conhecida como Vietnã, Laos e Camboja, enquanto que a Birmânia, a oeste, ficou sob a

administração britânica da Índia. Vale ressaltar que na zona colonizada pelos franceses foram

os missionários que provocaram o avanço do colonialismo.

Em si tratando de Ásia, não podemos deixar de fazer referência ao cristianismo na

China, apesar de que é muito difícil discorrer sobre o cristianismo desta região. Tal

dificuldade se dá, porque o cristianismo na China, ora desapareceu sem deixar rastros, ora

reapareceu; o que nos parece uma história um tanto que nebulosa para se rastrear. Sabe-se que

os primeiros a levar o cristianismo para os chineses foram os nestorianos, mas sabemos

também que seus vestígios desapareceram no século IX. Os franciscanos também estiveram

entre os chineses, em missões, mas devido a perseguições e a falta de estrutura dos primeiros

a missão não pode ir muito longe. A única semente que não malogrou foi a de Mateus Ricci e

seus correligionários que atuaram em Pequim, conseguindo assim, estender a bandeira

missionária católica entre os chineses. É importante fazer alusão ao missionário protestante J.

Hudson Taylor que evangelizou o interior da China, sem introduzir no país as divisões que

existiam entre os protestantes no ocidente.

Feita esta breve introdução histórica - colonial/missionária – asiática, gostaríamos de

tratar no próximo bloco sobre o contexto sócio-político-econômico-cultural asiático e sua

respectiva relação com as religiões locais e estrangeiras, numa perspectiva

contemporaneizada.

Contexto: Sócio-Político- Econômico -Cultural Asiático, e Religião.

Não é a intenção nossa, a de fazer uma explanação aprofundada do que seja o contexto

asiático em toda a sua plenitude, pois o contexto asiático é por demais variado e rico, no que

diz respeito a sua economia, política, cultura, sociedade e religião. Faremos sim, alguns

recortes sobre uma Ásia “descolonizada” que tenta reafirmar os seus valores, sob a tensão do

capitalismo moderno que, por suas vez, tenta subverter-los e destruí-los para a implantação

completa de suas ideologias mercadológicas.

Não existe uma Ásia, mas muitas. Isto se dá pela variedade dos contextos asiáticos. A

Ásia é um grande e rico complexo de línguas, religiões, culturas e formas sócio-políticas. As

grandes religiões brotaram em solo asiático. Como exemplo, temos na Ásia ocidental, o grupo

72

das grandes religiões monoteístas como o judaísmo, o cristianismo e o islamismo. Já na Ásia

meridional temos os grupos das religiões que são voltadas para a mística introspectiva como o

hinduismo, o budismo, o jainismo e o zoroastrismo. Na Ásia oriental temos as religiões da

mística da ação: o confucionismo, o taoísmo, o xintoísmo, etc. Um dado importante de ser

enfocado é o de que: a Ásia como berço do cristianismo se mostra como o continente menos

cristão, pois o cristianismo representa apenas 2% da população. Depois de séculos de missão,

o cristianismo continua a ser ali “uma religião estranha”. Por isso, está havendo hoje na Ásia a

urgência de se começar um processo de descolonização da Igreja cristã. A pergunta da vez é:

Porque na Ásia esta havendo a necessidade de uma radicalização de tais proporções? Talvez a

descristianização asiática esteja ligada intimamente ao processo de descolonização dos

valores ocidentais estranhos àquela cultura. É o que vamos tratar a seguir.

Após a “era dos descobrimentos” liderada pelos países ibéricos há quinhentos anos

atrás, (onde até certo ponto, podemos admitir algumas formas de globalização) estamos a

viver uma nova fase de globalização que se iniciou naquele período. Pois se não fosse por

uma determinada forma de globalização colonial iniciada a quinhentos anos atrás, então como

o Islã, o Budismo, o Cristianismo, ou ainda o Hinduismo, poderiam ter chegado às regiões

bem distantes do seu solo de origens. O colonialismo europeu conseguiu substituir essa

globalização com novos métodos de produção e estruturação das sociedades. Junto com as

“empresas colonizadoras” a ação missionária participou ativamente na vertente cultural e

social da reestruturação das sociedades colonizadas.

Dessa forma, quase todas as estruturas eclesiásticas implantadas no Oriente,

continuam a ser comandadas e mantidas pelo Ocidente, sendo assim, nenhumas delas estão

desvinculadas dos interesses econômicos e políticos do capitalismo moderno.

Após a libertação das colônias orientais na segunda metade deste século, foi criada

uma nova forma de estrutura eclesiástica teológica-política, que camufla por detrás do

discurso teológico, fins políticos. E é através do diálogo aberto com as outras religiões, que

são inseridas idéias de reconhecimento das “igrejas locais” para um posterior reconhecimento

da autonomia das antigas missões no Terceiro Mundo descolonizado. É interessante notar que

idéias como essas de diálogo com outras religiões não foram nem de longe difundidas na

época das colonizações. Houve casos de adaptação estratégica como a de Matteo Ricci na

China e a de Roberto de Nobili na Índia. “A estratégia “dialogante” foi adaptada no caso do

imperador Akbar, no Sul da Índia, na China e no Japão. A sobrevivência comercial e política

dos portugueses dependiam das boas relações com os poderes dominantes dessas regiões, ou

73

como no caso de Madurai no sul da Índia, foi apoiada uma secção marginalizada da sociedade

local, os Paravas, mas com atenção à sua potencialidade de servirem de apoio estratégico para

o controle do Golfo de Manar e do comercio português no Golfo de Bengala e mar de

China”13. Geralmente, grupos religiosos e políticos constituídos entre os nativos das colônias

ou ex-colônias, servem muitas vezes, apenas para apoiar os interesses das grandes potências

européias ou americanas, que se utilizam desses pequenos grupos como meios para alcançar

os seus fins, ou melhor, seus objetivos político-econômicos.

Partindo de todos os pressupostos discorridos até aqui, as elites nacionais não-cristãs

da Ásia, desconfiam que os elementos cristãos de qualquer ação missionária que queira

adentrar em seu solo ou que já estejam lá (cristãos nativos), tragam escondidos em suas malas

novos modelos de mercado e economia ocidental que têm tentado subverter os seus

próprios mercados e economias estabelecidas. Sendo assim, “qualquer nova presença

missionária deverá assumir a missão de Cristo, buscando meios para reforçar, e não

enfraquecer as forças anti-sistêmicas na sociedade internacional. Caso contrário, e como tem

acontecido com mais freqüência, a ação missionária é instrumentalizada pelas forças de

globalização para destruir as forças resistentes, particularmente nas sociedades do Terceiro

Mundo”14.

Observamos na Ásia pós-colonial um crescente empobrecimento das populações

como resultado das políticas de desenvolvimento e empréstimos das agências do capitalismo

financeiro. A promoção do consumerismo para as elites privilegiadas do Terceiro Mundo e

uma destruição sistemática do ambiente e de biodiversidade vai reduzindo cada vez mais a

qualidade de vida das grandes maiorias asiáticas. Essa situação alarmante tem tido reações

populares violentas contra as forças de opressão capitalista. Alguns grupos de cristãos,

inspirados pela leitura “libertadora” da Bíblia, têm se empenhado a lutarem contra o sistema

capitalista de valores. Vale ressaltar que muito desses cristãos de posição anti-sistêmicas, não

fazem parte das grandes estruturas oficiais das igrejas, que teme pela segurança de seus

interesses institucionais, na sua grande maioria, ou melhor, minoria esses grupos anti-

sistêmicos de cristãos estão a margem do clero institucional oficializado.

Qualquer discurso imbuído de elementos do sistema arquiquetônico ocidental (que

regula e coordena através dos pressupostos da democracia e dos direitos humanos) aplicados à

13 SOUZA, Teotônio R. “De Colonialismo à Globalização: Nova Ação Missionária ou Nova Estratégia?” p. 1 14 SOUZA, Teotônio R. “De Colonialismo à Globalização: Nova Ação Missionária ou Nova Estratégia?” p. 3

74

“nova presença” missionária, corre o risco de continuar a ignorar a matriz cultural asiática e a

perpetuar os erros do passado colonial e do neocolonialismo em curso.

Formas de se Fazer Teologia na Ásia

As igrejas cristãs asiáticas, por muitas vezes, se contentaram com as respostas prontas

e acabadas fornecidas pela teologia ou pelas confissões ocidentais. Mas, hoje este quadro está

mudando e a Ásia está passando por um processo de uma autêntica e viva teologia que foi

amadurecendo paulatinamente, a partir de um olhar crítico e responsável dos vários contextos

asiáticos feitos pelos seus teólogos. Charles Forman constatava, como conclusão do livro O

Cristianismo no mundo não-ocidental (Christian in they nom-western world - 1967): “O

cristianismo rompeu de uma vez por todas com a idéia de que ele se apóia sobre base

ocidental e agora já afirmou sua identidade oriental. (...) O cristianismo não-ocidental chegou

à maioridade” (A Teologia do Século XX, pág. 475).

TEÓLOGOS ASIÁTICOS

Paul Younggi Cho

O Dr. Paul Young, é coreano, convertido do budismo quando jovem, é pastor da

Igreja central do evangelho pleno há mais de 30 anos. Antes de entrar para o pastorado, o Dr.

Cho fez alguns cursos como: medicina e direito. Seus livros publicados em português,

incluem: a quarta Dimensão, soluções para os problemas da vida, muito mais do que números,

grupo familiares e crescimento da Igreja.

Pensamento Teológico:

Toda a Coréia é influenciada pelo pensamento do Dr. Cho. O País é conhecido como

um país cristão, graças ao trabalho do pastor Paul Young Cho.

75

Um dos questionamentos que o Dr. Cho sempre está se propondo a responder é o

entendimento do termo evangélico. Entende o termo como sendo uma posição básica quanto a

teologia e quanto ao estilo de vida.

Sua definição de Deus é: “Creio em um Deus trino e uno, Pai, Filho e Espírito Santo”.

Crê na Bíblia como sendo com seu texto original, inspirada, Palavra de Deus, autoridade final

e infalível de fé e metodologia. Como cristão evangélico também crê que se deve viver uma

vida moralmente reta que manifesta o fruto do Espírito Santo. Crê na realidade do novo

nascimento que produz mudança do estilo de vida e gera um desejo autêntico de ver outras

almas salvas do pecado. Embora haja no presente algumas divergências entre os evangélicos

quanto á manifestação dos dons do Espírito Santo, crê que, como cristão comprometidos com

a causa, devemos esforçar-nos por manter a unidade do Espírito Santo no vínculo da paz.

Sua teologia sempre gira em torno do crescimento de igreja que afeta a congregação

leal. Usando sempre como exemplo o crescimento explosivo de sua comunidade, a este

respeito escreve: ‘Durante muito tempo tenho orado pedindo a Deus a capacidade de falar

com autoridade sobre crescimento da Igreja. Lembro-me de, há alguns anos, fazer a seguinte

oração: ‘Senhor, minha igreja possui apenas 50.000 membros. Quem me dará ouvidos quando

falar de crescimento da igreja? Então, quando Deus me deu 100.000 membros, senti-me como

se ainda não pudesse falar sobre o assunto com um verdadeiro senso de autoridade”. Paul

Younggi Cho em 1883 atinge o marco de em uma só congregação funcionar com 200.000

pessoas.

ALBERT MOLAN

Albert Molan nasceu na África do Sul, em 1934. Aos 20 anos ingressou na ordem

Dominicana. Em 1983 foi eleito mestre geral dos dominicanos, imediatamente, porém,

apresentou sua renúncia, aceita depois que ele deixou claro seu compromisso prioritário com

a luta por uma África do Sul livre, justa, sem discriminação entre brancos e negros.

Atualmente é membro da comissão justiça e paz, professor de teologia e assistente nacional

dos estudantes católicos, na África do sul.

Albert Molan é autor do livro “Jesus Antes do Cristianismo”. Por lutar por uma África

do Sul justa e por querer ver seu povo liberto, Albert Nolan tem sido perseguido pela polícia

da África do Sul e tem que viver na clandestinidade.

76

Watchaman Nee

Liderou um movimento evangélico sem nome, que começou com apenas três membros

em 1922, passando para mais de 70.000 membros em 1949. foi preso pelos comunistas em

1952, junto com 2.000 outros líderes do movimento, um forte comunista admitiu que os

membros de todas as denominações evangélicas tradicionais.

Escreveu suas últimas orientações aos seus liderados que estão reunidas em seu livro

“A vida cristã normal publicado no Brasil pela editora fiel.”

A vida normal da Igreja Cristã, Editora Fiel, 1938. O ministério de Oração da Igreja,

vida 1979. Família Cristã normal, Fiel 1974.

ORLANDO P. CARVAJAL

Entre as contribuições mais notáveis para uma teologia da inculturação e da

contextualização da fé cristã na Ásia, temos a figura do teólogo filipino Orlando P.

Carvajal. Carvajal entende a teologia como “uma compreensão da nossa fé em Deus e suas

repercussões em nossa atual experiência de vida” (Evangelho Emergente, cap. IX, pág. 129).

Isto significa dizer, que a teologia está condicionada ao contexto em que ela está inserida,

pois, segundo Carvajal “O fator determinante variável [da teologia] é a condição histórica de

nossa vida material, no contexto do qual formulamos os nossos problemas teológicos.

Condições materiais e históricas diferentes são azo a cosmovisões diferentes, que se tornam o

arcabouço da reflexão teológica, e determina assim, de modo significativo, o método e o

conteúdo dessa reflexão” (Evangelho Emergente, pág. 131). Seria então, a teologia cristã,

apenas um aspecto de uma anterior e mais fundamental cosmovisão, material e historicamente

determinada. De acordo com Carvajal “a teologia cristã ao invés, portanto, de determinar a

nossa visão, é determinada por ela. Nossas cosmovisões materialmente baseadas é que

determinam a nossa teologia” (O Evangelho Emergente, pág. 131). Esta seria a resposta de

Carvajal para o problema das variadas cosmovisões em relação à fé cristã. Segundo ele,

divergimos em nossa cosmovisão porque trabalhamos sob condições materiais/históricas

diferentes. É o que está na raiz dos nossos modos radicalmente contratantes de integrar a fé

em Deus em nossa realidade social. Muitas vezes, os valores do cristianismo que me servem

muito bem em minha cultura, podem não ser tão válidos para outros povos de outras culturas.

Não existe, portanto, um conjunto uniforme de categorias cristãs que sirva para todos em

77

todos os contextos. Querer fazer dos meus valores cristãos, padrão universal de fé e prática

para outros, é transformar a teologia (que deve ser interpretada a partir da realidade em que

estamos inseridos) em “teoideologia” o que seria uma desvirtualização do que seja fazer

teologia.

A teologia de Carvajal serve de desmascaramento, a certos tipos de fazer teológico,

que vêem sobrecarregados de ideologias opressoras que, por suas vez, aprisionam e impõem

os seus modos produtivos, com os pressupostos da democracia e dos direitos humanos,

transformando em neocolônias o que outrora eram colônias militarmente governadas e

exploradas. Por isso, a urgência da Ásia cristã de hoje, é a urgência de uma descolonização do

pensamento e valores ocidentais, tendo como conseqüência, como já está havendo, o nascer

de uma teologia que corresponda às necessidades e valores do próprio povo asiático em seus

contextos específicos.

DURAISAMY SIMON AMALORPAVADASS

Outro teólogo levou a sério à questão teológica da inculturação e contextualização da

teologia asiática foi o jesuíta indiano Duraisamy Simon Amalorpavadass (1932 – 1990).

Depois de estudos em Paris, cujo fruto são A Índia ao Encontro do Senhor (1964) e Destino

da Igreja na Índia de Hoje (1976), Amalorpavadass, como diretor do Centro Nacional Bíblico-

Catequético-Litúrgico de Banglore, foi um dos teólogos católicos mais representativos e

influentes da Índia contemporânea. Em sua obra Evangelho e Cultura, Evangelização e

Inculturação (1978), ele desenvolve as linhas de uma verdadeira teologia da inculturação.

Segundo ele, ao delinear a relação entre evangelho e cultura, devemos evitar dois

perigos: o primeiro seria o de opor o Evangelho à cultura, o que provocaria uma sensação de

estranheza da própria cultura e da própria história; o segundo seria o de efetuar um perigoso

sincretismo, ocultando o Evangelho por trás da cultura. Para ele, Evangelho e cultura são

distintos, mas devem entrar em uma relação dinâmica entre si. Na Índia, o processo de

inculturação significa aprender com as grandes religiões. Se a evangelização é um movimento

voltado para o exterior, a inculturação é um movimento voltado em direção ao interior,

mediante o qual os elementos culturais e religiosos que se encontram fora da Igreja são

integrados na comunhão católica. A inculturação teorizada por Amalorpavadass não se

desenvolve somente no plano litúrgico e missiológico, mas deve realizar-se também no plano

teológico. Ora, o jesuíta indiano deu uma notável contribuição no plano litúrgico e

78

missiológico, mas no campo teológico não foi além da justificação da necessidade de uma

inculturação.

Convém notar que a inculturação de que fala Amalorpavadass está atenta também à

realidade social, tornando a evangelização, num instrumento para o desenvolvimento e

libertação social da cultura. Segundo ele, “Se quisermos falar de um novo enfoque teológico e

de uma nova visão da Igreja da Índia, temos que compreender a realidade da Índia e dentro

dessa realidade interpretar o papel e a função da igreja”15.

“É a Índia o berço de grandes religiões que são antigas, vivas e contam numerosos

seguidores. (...) A Índia se acha num processo de libertação e desenvolvimento, ansiando por

caldear esta vasta população numa ação bem integrada e criar uma sociedade justa e humana.

(...) Conseqüentemente, ao falarmos de uma nova teologia precisamos fazer um inventário do

universo indiano em termos de antigas tradições religiosas e do empenho moderno pelo

desenvolvimento.”16

Em Amalorpavadass, vemos que tanto o âmbito da asiaticidade (inculturação e

contextualização da teologia da Ásia) quanto o âmbito da Terceira Mundialidade (libertação

social, ou seja, justiça para o povo) andam de mãos dadas. Apesar do segundo aspecto não ser

tão agudo nele, quanto o primeiro.

KOSUKE KOYAMA

O teólogo japonês Kosuke Koyama – autor de uma Teologia entre os búfalos (1974),

fruto de sua missão e ensinamento na Tailândia rural, e de Monte

Fuji e Monte Sinai (1985), onde ele insiste na necessidade de um diálogo criativo entre

espiritualidade asiática (simbolizada no Monte Fuji) e espiritualidade bíblica (representada

pelo Monte Sinai) – várias vezes chamou a atenção da teologia da contextualização para as

mudanças por que está passando o contexto asiático.

Segundo Koyama, na Ásia, uma teologia da contextualização deve perguntar-se: “Qual

deveria ser a relação entre tecnologia e a nossa aproximação do sagrado? Pode-se por

criativamente a tecnologia a serviço de quem vive da graça da busca de Deus?” (A Teologia

do Século XX, pág 479). A pergunta de Koyama surge do seguinte fato: o que o Ocidente

precisou de três séculos ou mais para atravessar, desde a Revolução Industrial até a era do

15 Torres, Sérgio e outros. “O Evangelho Emergente”, ed., Paulinas, S. Paulo – 1982, pág. 172. 16 Ibid., pág, 173

79

computador, dos modernos estados democráticos à legislação do bem-estar social, está

cumprindo em três décadas ou menos para as nações asiáticas. Mas vale ressaltar que os

novos desenvolvimentos buscados pelas nações asiáticas não foram desenvolvidos de suas

próprias civilizações antigas, mas foram transportados de outras terras. Significa isto que o

conflito de culturas é mais agudo do que foi no Ocidente durante os últimos dois ou três

séculos. A forma parlamentar de governo é francamente nova para os asiáticos. A ciência

moderna não é um produto nativo de solo asiático. Não admira, pois que a nova forma de

governo, como também o desenvolvimento cientifico e tecnológico tenham, em muitos casos,

esbarrados em obstáculos. Deve-se então, de acordo com esse contexto, fazer uma teologia

que interprete a realidade concreta e espiritual do povo asiático, traçando um equilíbrio entre

ciência, espiritualidade e sociedade.

CHOANG-SENG SONG

O teólogo presbiteriano chinês de Taiwan, Choang-Seng Song, descreveu a

teologia cristã em fase de formação na Ásia como “teologia do terceiro-olho”. O terceiro olho

é o olho asiático da tradição budista, o olho do coração que transcende a razão e sabe olhar em

direção do mistério: O Zem. Song percebe que a teologia cristã na Ásia sofreu uma

“escravidão ocidental”, da qual deve ser libertada, pois, para ele, só assim pode nascer uma

teologia no seio da Ásia. Uma teologia desprovida da natureza ocidental. Song também é

defensor de uma teologia ecumênica na Ásia que envolva as mais variadas histórias, culturas e

religiões, pois para ele, esse deve ser o sujeito do compromisso teológico asiático.

Enfim, existem outros nomes importantes na teologia do contexto asiático que fizeram

ou fazem uma leitura teológica responsável das suas devidas, realidades, como o do teólogo

católico filipino Carlos Abesamis; do teólogo cingalês Alovsius Pieris; de Shoki Coe, teólogo

chinês de Taiwan; do teólogo protestante filipino Emérito P. Nacpil e tantos outros que não

podemos discorrer nesta pesquisa mas que vale conferir.

A teologia asiática ainda tem sido enfocada de forma muito tímida por nossos teólogos

ocidentais. Este fato se dá, pelo pouco material que chega nas mãos dos estudantes de teologia

e interessados. Vários compêndios de história da igreja, ou de teologia protestante

contemporânea têm sido editados, onde a alusão à teologia asiática quando é feita, se mostra

80

bem escassa no seu conteúdo. Se muito conseguimos são recortes do que poderia ser uma

teologia feita por asiáticos. Se bem que em muitas partes da Ásia a teologia é mais

pragmática, isto é, mais litúrgica do que sistemática. Mas este fato não pode se tornar uma

desculpa para falta de interesse, visível no nosso meio teológico que só agora começa a

despertar para esta dimensão da teologia.

A teologia asiática que na sua maioria de contextos se mostra como uma teologia de

terceiro mundo, assim como sua proposta de “descolonização” de todos os caracteres

imprimidos pelos países colonizadores, tem muito a contribuir e a ensinar para os países

ocidentais que sofrem também, embora em contextos diferentes, dos mesmos fatores como o

da terceira mundialidade e o da contextualização teológica dos valores intrínsecos de cada

cultura. Tanto a teologia oriental pode enriquecer a nossa teologia marcada muitas vezes pelo

individualismo e racionalismo, como também podemos dar nossa contribuição aos nossos

irmãos asiáticos numa reciprocidade saudável de idéias e ideais.

Bibliografia TORRES, Sérgio e outros. “O Evangelho Emergente”, edições Paulinas, tradução de

Alexandre Mancintyre, São Paulo – SP, 1982. LAWRENCE, Carl. “A Igreja na China”, ed. Vida, tradução de João Barbosa Batista, 1987. GONZALEZ, Justo L. “A Era dos Novos Horizontes”, vol. IX, tradução: Adiel Almeida

de Oliveira, Edições Vida Nova, São Paulo – SP, 1991. ROCINI, Gibelino. “A Teologia do Século XX”, Editora Paulus. GONZALEZ, Justo L. “A Era Inconclusa”, vol. X, tradução: Adiel Almeida de

Oliveira, Edições Vida Nova, São Paulo – SP, 1991. SOUZA, Teotônio R. de. “De Colonialismo à Globalização: Nova Ação Missionária, ou

Nova Estratégia?” Ensaios. Teologia Européia

As agitações sociopolíticas, meado do século XX, foram sentidas intensamente na

Europa – berço da grande parte da filosofia e teologia otimista do século XIX.

O continente europeu sonhava que sob sua liderança, a humanidade despertaria para

uma Nova Era. Achava que suas investidas coloniais era uma iniciativa altruísta visando ao

bem do mundo. Nesta ilusão o protestantismo se envolveu mais do que o catolicismo, pois

este – catolicismo – reagiria ao mundo moderno com uma atitude de condenação

indiscriminada, enquanto o liberalismo protestante havia capitulado ante a nova era. Com o

estouro das duas guerras e seus desdobramentos que vieram desmentir os sonhos do século

81

XIX, o liberalismo protestante sofreu um grande abalo. O secularismo e o ceticismo na França

tornaram-se comuns durante o século XIX, em parte, por causa da reação do catolicismo ao

mundo moderno, já no século XX em razão do fracasso do liberalismo. No meado desse

século XX a Europa setentrional já não era mais o reduto protestante.

Com o romper da guerra mundial, 1914, os líderes cristãos, pelo menos muitos deles,

tinham consciência da tensão na Europa; em conseqüência, procuravam as relações

internacionais das Igrejas para evitar a guerra; essa tentativa não teve sucesso, logo alguns

desses cristãos preferiram fazer da Igreja um instrumento de reconciliação do que ser levados

por impulsos nacionalistas.

O liberalismo nesse momento nada podia fazer, portanto, o protestantismo foi o que se

preocupou em fazer uma teologia que respondesse a esses acontecimentos.

A teologia mais significativa para as respostas aos desafios da época foi o de Karl

Barth.

Enquanto se desenvolvia a teologia de Barth, na Alemanha Hitler e o nazismo

assediam ao poder. Em 1933, o Vaticano e o terceiro Reich assinaram uma concordata. O

protestantismo liberal nada podia fazer frente a esse desafio. Surgiu inclusive o partido dos

“cristãos alemães”. Esse grupo apoiava as mediadas de Hitler; em conseqüência de tais

atitudes alguns líderes cristãos reuniram-se em oposição ás medidas hitlinianas em nome do

evangelho (sínodo do testemunho).

Todos se recusaram apoiar Hitler foram presos. Outros, como os partores foram

recrutados pelo exército para a batalha.

Bonhoeffer foi o que mais teve problemas em oposição a Hitler.

Após a guerra vamos ter imensas territórios europeus submissas ao domínio soviético.

Mesmo a doutrina marxista tendo o cristianismo como inimigo, outros tinham a fé

religiosa como uma questão do passado, ou seja, logo desapareceria. Na antiga

Checoslováquia e na Hungria, manteve-se o apoio ás Igrejas. Já na ex-Alemanha Oriental, os

cristãos foram submissos á limitações civis, não podiam exercer posições significativas nos

estados.

Em outros lugares da Europa ocorriam um diálogo intenso entre marxistas e cristãos.

Desse diálogo temos Bloch, filósofo marxista que dá uma certa contribuição em sua

reinterpretação das doutrinas bíblicas considerando ter elas valor positivo. Para ele esse valor

encontra-se na mensagem da esperança. Tanto esta quanto outras idéias de revisionistas,

trouxeram contribuições significativas para a teologia protestante no século XX. Nessa

dimensão da esperança vamos ter Moltmann, entendendo essa esperança não como

82

individualista, mas como a esperança de uma nova ordem. Assim a teologia da esperança,

leva os fiéis a se unirem às lutas que apontam para o futuro de Deus: contra a pobreza e a

opressão.

Apesar do secularismo ter se estalado fortemente em muitas regiões européias, o

protestantismo não se tornou inerte. Apesar de ter se reduzido, permaneceu ativo na

sociedade.

TEÓLOGOS EUROPEUS

EDWARD SHILLEBEECKX

Na historia, o século XX, fôra aquele período fértil no qual, mentes brilhantes

puderam repensar, de modo aprofundado, o homem e o seu mundo. No campo da teologia, o

desenvolvimento do pensamento teve em Schillebeeckx, um expoente.

Schillebeeckx, sacerdote católico atuante, produziu seu pensamento teológico a partir

da necessidade visível de tornar relevante ao homem moderno, a mensagem do cristianismo.

Biobibliografia

Edward Schillebeeckx nasceu em Anvers (Bélgica), em 12 de novembro de 1914.

Depois de concluir seus estudos humanísticos no colégio dos padres jesuítas de Tournhout,

em 1934, ingressou na Ordem Dominicana. Estudou filosofia e teologia em Gand e Louvain,

sob direção do filosofo dominicano D de Petter, que muito o influenciou, introduziu-o no

estudo de Tomaz de Aquino. Em 1941, foi ordenado sacerdote. Após a Segunda Guerra,

retornou seus estudos de teologia em Le Saulchoir, França. Em 1951, conseguiu o doutorado

em teologia em Le Saulchoir e em 1954, obtém, em Roma o titulo de Magister em teologia e

dois anos depois é nomeado professor de dogmática no Instituto Superior de Ciências

Religiosas da Universidade de Louvain. Em 1957, obtém a cátedra de dogmática e historia da

teologia na Universidade Católica de Nijmegen na Holanda. Em 1956, também, obtém a

cátedra de antropologia cristã na Faculdade de Medicina da mesma cidade. Em 1965,

juntamente com Karl Rahner, fundou a revista internacional de teologia “Concilium”. Tornou-

se um dos mais renomados conferencistas desde o inicio do Concilio Vaticano II.

83

Schillebeeckx produziu inúmeras obras. Em português, entre muitas outras,

destacamos as seguintes: Cristo Sacramento do encontro com Deus; Deus e o Homem;

Historia humana: Revelação de Deus; Igreja e Humanidade; Jesus e o fracasso na vida

humana; Maria mãe da redenção; O Matrimonio. Realidade terrestre e mistério da salvação;

O Mundo e a Igreja; Por uma Igreja mais humana; Revelação e Teologia.

Contexto do Desenvolvimento de sua Teologia

Schillebeeckx é possuidor de uma percepção aguçada da realidade do homem

moderno; entende que este, é dotado, agora de um espirito secularizado, em suas próprias

palavras destaca: “ hoje, mais do que no passado, o homem dá-se conta do seu lugar no

mundo, e sente-se plenamente autônomo nesse domínio. Por isso, com freqüência a religião se

lhe afigura uma hipótese desleal e inútil...”17. Percebe-se aqui que Schillebeeckx está

nitidamente preocupado com o secularismo dominante na mentalidade do homem do século

XX. Não menos grave é a necessidade de tornar a mensagem cristã relevante a este homem

ateu. Nisto, o teólogo-sacerdote, enxerga a necessidade de que a Igreja, como comunidade de

fé, reflita sobre seu modo de viver a fé, vez que, este mesmo modo de vida em fé, contribuiu

na formação da mentalidade secularista e ateia do homem hodierno. “... não foram os próprios

crentes que provocaram o ateísmo? Certamente, não foi pela sua fé, foi pela sua desajeitada

maneira de viver a fé: foram suas deformadas representações de Deus que principalmente

contribuíram para o sucesso do ateísmo”. Conclui.18 Neste ponto Schillebeeckx, faz um

elogio consistente a Robson, expoente da teologia secular.

Em período posterior, o padre-teólogo holandês assume para si, cada vez mais, uma

aproximação com a Teologia da Esperança, formulada pelo alemão Jügen Moltmann. Neste

contexto, Schilebeeckx, enfatiza o papel dos sacramentos na comunicação eficaz da

mensagem cristã. Sacramento aqui deve ser entendido como: “o Dom divino da salvação na e

com a forma exteriormente captável, constatável que concretiza este Dom: um Dom de

salvação na visibilidade histórica”.

Pensamento Teológico

17 Schillebeeckx, Deus e o homem, pag 9 18 Idem, pag 14

84

Podemos afirmar que os seguintes pontos centrais norteiam a teologia do sacerdote-

teólogo, holandês, Schillebeeckx :

Nova expressão à Revelação Cristã.

Interpretação da Revelação. por meio de categorias existências e mentalidade

moderna.

Reação ao processo de secularização do cristianismo.

A teologia sacramental e a secularização formam o eixo de sua reflexão teológica.

Utiliza a Filosofia Tomista para interpretar a Revelação.

1. Deus é: “terceiro transcendente presente em todos os nossos encontros com o próximo

neste mundo” Schillebeeckx aproxima-se do conceito secularista de Deus, tomado por

Robinson19. “A nossa existência, a contingência da nossa existência pessoal com os

outros neste mundo, é a fonte do nosso conhecimento de Deus, porque aquele caráter

ek-stático não é senão o jorrar do mistério de Deus na nossa existência. Portanto, a

afirmação da existência de Deus é inseparável da afirmação da nossa presença ek-

stática aos outros neste mundo... Assim... deve afirmar que, como fundamento

absoluto do ser, Deus é o Terceiro transcendente em todas as nossas experiências

humana, e principalmente nas nossas relações inter-humanas.”20

Nestes termos, acima, identificamos o modo especial com que Schillebeeckx concebe

Deus. O conceito de “fundamento do ser”, parece ser tomado de empréstimo da

teologia de correlação de Paul Tillich. Isto no entanto, não ofusca o mérito do Teólogo

holandês,

2. A Igreja e refletida em Schillebeeckx de modo singular. Em sua obra: “por uma Igreja

mais humana”, ele trata com sensibilidade sacerdotal da problemática que envolve a

compreensão do papel das comunidades cristãs católicas na atualidade. Começa

fazendo uma analise teológica e sociológica, na historia, do papel da Ekklesia.

3. Em tempos recentes, Schillebeeckx concebeu uma entrevista que, foi publicada em

forma de livro; onde expõe, sucintamente, sobre assuntos antes não abordados em

suas obras. Estes são alguns dos destaques:

Trindade – “É o mesmo Deus: Deus no AT, Deus em Jesus Cristo, Deus no

Espirito Santo; porem, são modos de existência de Deus na historia... Dizendo que

Deus é três pessoas, temo cair num espécie de triteismo: três deuses, três pessoas,

como uma espécie de família. Não digo explicitamente três pessoas porque é

19 John A T Robinson:”Honest to God” 1963 20 Schillebeeckx, Deus e o Homem, pag. 183

85

ambíguo... Falar de três pessoas pode por em perigo a Trindade como tal... Em

verdade no compreendo a especulação sobre a Trindade. Respeito as especulações

de Tomaz de Aquino, por exemplo, porem não me dizem nada a minha

espiritualidade... Deus é Trindade – isto é dogma! Porem, não e três pessoas. Seria

triteismo. Não escrevi sobre este tema porque tenho medo... Os grandes tratados de

Agostinho, Boaventura e Tomaz de Aquino, e, mais recente de Rahner, de

Schoonenberg são, afinal de contas, tratados que pecam de imodéstia com relação

ao mistério da Trindade. Sou, portanto muito modesto, quase agnóstico com

relação a uma teologia trinitária”21.

A moral crista – “Não existe uma Ética cristã... quando se busca unidos uma

solução, por exemplo, para o aborto a eutanásia, se alegam argumentos e, ao final,

se chega a um ‘consenso’; isto para a sua vida teologal... por isso estou contra de

certas posturas éticas da Igreja oficial, que se faz passar por cristã, porem que, de

fato, não o são, porque pertencem a uma filosofia determinada. Pensemos no

exasperado fixismo respeito a sexualidade e ao matrimonio... Não há revelação

com respeito a Ética; esta e um processo humano.. não é Deus quem diz ‘isto é

eticamente permitido ou proibido’. É o homem quem, com suas reflexões e suas

experiências, deve decidi-lo e estabelece-lo. Não existe, pois, uma Ética cristã...

Para o cristão, nem a revelação nem a fé impõem normas éticas, mas que que delas

possam vir inspirações e orientações”22.

PIERRE TEILHARD DE CHARDIN

Pierre Teilhard de Chardin figura entre os teólogos mais importantes teólogos do

século XX. Considerado apologista23, contribuiu, significantemente, com a construção do

pensamento teológico vigente na atualidade. Sua preocupação em tornar viva e atual a

mensagem do Evangelho, qualifica-o como um grande missionários moderno.

Teilhard de Chardin desafia o teólogo a raciocinar em termos científicos, sem contudo,

perder-se nos labirintos da falsa premissa cientifica, que reivindica ser a única via absoluta do

conhecimento e da verdade. Suas experiências de vida alternavam-se entre estudos científicos

21 Schillebeeckx, um teólogo feliz, pag 84-87 22 Idem, pag 108

86

especializados e experiências religiosas místicas. Só isto bastaria para merecer da parte do

estudante atento, um cuidadoso exame de suas obras na busca, em profundidade, do dialogo

necessário entre Fé e Ciência. Nisto Chardin é singular. Sendo um paleontólogo de renome,

ele remonta as categorias cientifica a consegue descobrir campos férteis na ciência onde é

possível germinar numa mesma arvore, verdades da fé e verdades científicas.

Biobibliografia

Pierre-Marie-Joseph Teilhard de Chardin, nasceu em Sarcenar, França, em 01 de maio

de 1881, sendo o quarto dentre os onze filhos que teve seu pai Emmanuel Teilhard de Chardin

com sua mãe Berthe-Adèle de Dompierre d’Hornoy. Sobrinho-neto de Voltaire por parte de

mãe; logo cedo interessou-se pela Geologia, influenciado pelo gosto paterno que colecionava

pedras.

Realizou seus estudos ginasiais e licenciais em um colégio de padres jesuítas. Cursou

Teologia em Hastings, Inglaterra, de onde partiu para realizar significativas excursões

geológicas, no Egito. Em 1897, bacharelou-se em Filosofia; em 1898, bacharelou-se em

matemática. Em 1899, ingressou-se em um noviciado da Companhia de Jesus. Foi ordenado

sacerdote em 14 de agosto de 1911. Em 1912 começa seu estagio no Museu Nacional de

Historia Natural, em Paris. Em 1913 realizou excursões cientificas com Abbé Breuil e

Obermeier e G Boussac.

Interrompeu seus estudos acadêmicos em 1914 com a eclosão da 1ª Guerra mundial,

onde prestou serviços em destacamento de saúde. Esta experiência militar exerceu uma

notável influencia na maturação intelectual e espiritual de Teilhard. “Um homem que tomou

parte da vida inumana, ou sub-humana, de milhares de seus semelhantes, que foi tocado de

tão perto por suas mortes, não mais poderá se ocupar do homem fóssil sem pensar no homem

de seu tempo e naquele do amanha. Não será mais um colecionador de ossos, mas um

apaixonado pela humanidade e um devoto da matéria matriz da humanidade.” – concluiu.

Em 1922, laureou-se em ciências naturais na Sorborne, reintegrando-se, deste modo,

na vida acadêmica. A partir daí produz as seguintes obras nos anos seguintes:

1916 – “A vida cósmica” e “Três contos como Benson”

1917 – “O meio místico”

1918 – “A grande Monada” , “Meu universo” , “O Padre” e “A Fé que Opera”

23 Mondin, Batista, Os grandes Teólogos do Século XX, pag. 49

87

1919 – “Nota para servir à evangelização dos novos tempos”.

1919 – “A potência espiritual da matéria”

1920 – “Nota sobre o progresso”

1921 – “Ciência e Cristo”

1923 – “A missa sobre o mundo”

1925 – “O meio Divino”.

1929 – “O sentido humano”

1937 – “ O fenômeno Espiritual”

1942 – “ O Cristo Evolutor”

1946 – “Reflexões sobre a ressonância espiritual da bomba atômica

1947 – “ Salto humano da Evolução”

1948 – Publicação do “Fenômeno humano” e “Meio Divino”

1949 – “Uma Nova Questão de Galileu”

1950 – “O Fenômeno Cristão”

1951 – “O Problema maior para a Antropologia”

1952 – “O que o mundo espera da Igreja de Deus”

1953 – “O Deus da Evolução”

1955 – “Barreira da morte” e “Pesquisa, Trabalho, Adoração”

Na maioria estas obras de Teilhard, trata-se da divulgação de suas duas principais. “O

Fenômeno humano” e “O Meio Divino”.

Contexto do Desenvolvimento de sua Teologia

Envolvido num mundo em que a ciência era completamente adversa a Religião e a Fé,

Teilhard de Chardin, formula seu pensamento tomando a via oposta da escola Barthiana.

Enquanto Karl Barth proclama a clara separação entre Fé e Ciência, Chardin denuncia a

invalidade de tal caminho, julgando inoquo e propõem fazer ver ao mundo cientifico que não

há nenhuma incompatibilidade entre a religião cristã e ciência moderna, mas sim uma

maravilhosa correspondência, porque o cristianismo vem de encontro as mais intimas

exigências da ciência.

Pensamento Teológico

A Conjugação Ciência-Religião

88

“... Após quase dois séculos de lutas apaixonadas, nem a Ciência nem a Fé

conseguiram apoucar-se uma à outra; mas muito pelo contrario, torna-se evidente que não

poderiam desenvolver-se normalmente uma sem a outra: e isto pela simples razão de que uma

mesma vida as anima a ambas... O homem só continuará a trabalhar e a investigar se por tal

mantiver um gosto apaixonado. Ora este gosto está inteiramente pendente da convicção,

estritamente indemostrável para a Ciencia, de que o Universo tem um sentido e de que pode,

ou até de que deve chegar, se formos fieis, a qualquer irreversível perfeição. Fé no

progresso.”24

Com tais constatações, Chardin denuncia a inutilidade do divorcio entre Ciência e

Religião acusando que uma única causa motiva a ambas - a Vida. E que elas partem de um

pressuposto comum.

A Cosmologia de Teilhard

Chardin não ignora que sua tentativa harmonizadora, também foram proposta por

Clemente de Alexandria e Tomas de Aquino em épocas remotas. Mas, agora, ele está

convencido de que a proposta de numa visão de mundo única que venha abarcar tanto Fé

quanto Razão, tem que superar a fracassada teoria tomista que afirmava ser o “Espirito

justaposto à matéria” tornando-se assim numa cosmologia anticientífica.

Para construir uma visão cósmica abrangente, Teilhard vale-se de alguns axiomas

fundamentais. O primeiro é o axioma referente a Evolução. Para ele, o desenvolvimento é um

movimento cuja orbita, ultrapassa a Química, a Física, a Sociologia, a Matemática e a História

das Religiões. A Evolução é uma condição geral à todas as teorias, todas as hipóteses, todos

os sistemas. A Evolução é a maior descoberta do século passado e de todos os tempos. Para

Chardin a evolução não está em conflito com o cristianismo; ao contrario é um argumento

muito forte a seu favor, porque a evolução deve passar através do cristianismo. Também, não

está em conflito com o criacionismo, porque este não comporta uma certa configuração do

mundo material, mas apenas a sua dependência de Deus.

MARTIN KAHLER

Biobibliografia

24 Teilhard de Chardin, O Fenômeno Humano” pagina 313

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Teólogo protestante alemão, nasceu em Königsberg, na Prussia Oriental, filho de

pastor luterano. Estudou teologia nas Universidades de Heidelberg, Tübingen e Halle. Toda

sua carreira acadêmica como professor de Teologia Sistemática foi desenvolvida na

Universidade de Halle.

Sua principal obra teológica, um volume sobre dogmática chamado “A ciência do

ensino cristão” de 1883, tinha a doutrina da justificação como seu tema básico. Suas preleções

sobre teologia protestante “Historia da dogmática protestante do Século XIX” formaram uma

publicação póstuma, 1962. Porem sua obra de maior envergadura foi “O suposto Jesus

histórico e o Cristo bíblico com fundamento na historia”, - 1892.

Contexto do Desenvolvimento de sua Teologia

O século XIX é considerado na historia do pensamento humano, como a “era das

luzes”. Foi assim, em todas as áreas do conhecimento. A teologia, podemos assim dizer, pode

ser divida em antes do iluminismo e depois do iluminismo. Nesta era, se realizou as grandes

descobertas, na aplicação de métodos científicos no campo da religião. O cristianismo sofreu

neste período as mais graves criticas que nenhuma outra religião, em outra época sofrera.

Teve seus dogmas analisados racionalmente, sua literatura sagrada, dissecada,

cientificamente.

A questão básica que prevaleceu naquele período era: o problema do Jesus Histórico. É,

exatamente dentre dessa discussão que se insere o pensamento de Martin Kahler.

Pensamento Teológico

Martin Kahler criticou violentamente o pressuposto fundamental de alguns eruditos

liberais, de que o Jesus histórico foi o Jesus real. Sua obra: “O chamado Jesus Histórico e o

Cristo Bíblico Histórico”, contem o seu argumento essencial. Para ele, o que é histórico

refere-se àquilo que podemos aprender através dos métodos seguidos pelos historiadores, os

quais sempre podem ser defeituosos, ou, pelo menos, parcialmente erroneos. Por outro lado,

uma pessoa ou acontecimento seria histórico por causa do poder e dos efeitos produzidos

sobre os homens e sobre o futuro deles. Dadas as alternativas entre o chamado Jesus histórico,

e o Cristo histórico, Kahler preferia este ultimo. O Cristo histórico é o Cristo Real. Para ele a

90

busca pelo Jesus histórico não passaria de uma ruela sem saída, como tantas outras questões

históricas. Chegara ao extremo de declarar que essa inquirição pode até mesmo obscurecer a

nossa compreensão sobro o Cristo vivo. Ele cria que Jesus era diferente de nos quanto à

espécie, e que todos os metodos que podem ser usados para revelá-lo tem sido e continuarão

sendo fracos. O cristo histórico transpareceria muito bem no NT sem precisar das armadilhas

da historicidade.

No pensamento de Kähler, não há separação entre o Cristo do Kerygma e a figura

histórica de Jesus, nem era a base e o conteúdo do Kerygma cristão primitivo. Pelo contrario,

Jesus era a base e o conteúdo do Kerygma e, portanto, o objetivo da fé. As opiniões de Kähler

anteciparam as de J Weiss, Schweitzer e Bultmann.

ALBRECHT RITSCHL

Biobibliografia

Seu período de existência aconteceu no século XIX, entre 1822 – 1889. Nasceu em

Berlim, Alemanha. Filho de pregador, e veio a tornar-se bispo. Foi um importante teólogo

alemão. Estudou teologia em Bonn e em Halle. Tornou-se professor particular em Bonn, onde

ensinou muitos anos. Foi professor de teologia também em Gottingen. A princípio foi

influenciado por Hegel, mas acabou rompendo com ele. Depois foi influenciado por Kant e

por Schleiermacher, e alguns o considera como um neokantianao. Sua influência foi grande na

teologia protestante liberal alemã e ânglo-americana.

Os pensamentos como: a fé – foi influenciado por Lutero; o primato à razão prática em

relação à fé religiosa – por Kant; o homem como cidadão de dois mundos também por Kant; a

ênfase histórica e social – por Hegel; e o teísmo – por Lolze.

Pensamento Teológico

Jesus Cristo é o fundador do reino de Deus. O reino e a redenção são os dois

grandes eixos da fé cristã. Com a exceção única de Schleiermacher, ninguém tem exercido

maior influência sobre a teologia atual do que Ritschl. Em sua cristologia ele parte da obra de

Cristo, e não de sua Pessoa, enfatizando muito mais a primeira do que a Segunda. A obra de

Cristo é que teria determinado a dignidade de sua Pessoa. Cristo seria mero homem,

91

entretanto, face à obra por Ele realizada e ao serviço por Ele prestado, atribuímo-lhe com

justiça o predicado de Deidade. Aquele que realiza a obra de Deus pode ser apropriadamente

descrito em termos de Deus. Cristo, ao revelar Deus em sua graça, verdade e poder remidor,

para o homem tem o valor de Deus,tendo assim o direito de receber honras divinas. Ritschl

não fala sobre a preexistência, a encarnação e o nascimento virginal de Cristo.

Ritschl repelia a autoridade das tradições dogmáticas quanto às crenças

religiosas, aos costumes sociais e às práticas éticas, e pensava que a comunidade religiosa

deve formar uma unidade só.

Ele ressaltava a importância dos julgamentos de valor, como fonte do

conhecimento religioso. Ele criou um pragmatismo quase religioso, com base na fé-

conhecimento, alicerçado sobre julgamento de valores. Ritschl foi uma das figuras principais

da axiologia (teoria do valor), à qual deu um lugar importante na teologia e na filosofia.

Para ele, a experiência religiosa é mais fundamental para o homem bom do que

a doutrina. Essa experiência é promovida segundo moldes empíricos. Ele frisava mais os

aspectos histórico, ético e social da experiência cristã, diminuindo a importância do aspecto

místico.

Suas idéias têm sido uma das forças por detrás do desenvolvimento do

evangelho social. Ele enfatizava essa expressão da vida religiosa, suspeitando muito das

fantasias e do subjetivismo do misticismo.

Para ele, a teologia não deveria alicerçar-se sobre a metafísica, mas sobre as

experiências religiosas positivas. Em seus primeiros escritos, seus preconceitos contra a

metafísica aparecem tão fortes que ele parece ser virtualmente um positivista. Entretanto, ele

não abandonou o teísmo, posto que fundamentava-o sobre os julgamentos de valores.

Ele distinguia claramente entre a razão e a fé, dando preferência e salientando a

fé. Essa fé repousaria sobre as experiências autônomas. Importantes aspectos de4ssa fé seriam

o sentimento de impotência e a dependência a Deus. Ele pensava que a filosofia é por demais

remota e superficial para interpretar e orientar na experiência religiosa. No entanto, ele

mesmo foi fortemente influenciado por certos filósofos.

A fé religiosa é autônoma, estando segura aos ataques das siências, as quais

também seriam autônomas em seus respectivos campos.

Ele pensava que o universalismo é possível, embora isso não fosse

dogmaticamente ensinado por ele.

Desenvolvimento do seu Pensamento Teológico

92

Uma teologia liberal, até certo ponto nova e original, surgiu em fins do século XIX e

nos primeiros anos de nosso século, tendo como propugnadores Albrecht Ritschl e seus

seguidores.

Ritschl fora influenciado tanto por Kant como por Schleiermacher. Localizava a

essência da religião não no sentido de dependência absoluta mas nas idéias específicas da

comunhão religiosa, que se referem à modificação da vontade e à promoção da salvação ou

bem-aventurança humana. Ritschl não aceitava a revelação no sentido real do termo.

Revelação, em sua opinião, é o mesmo que religião positiva. A religião cristã tem seu ponto

de referência na congregação cristã e na pessoa de Jesus. A única tarefa da teologia, segundo

ele, é a de desenvolver a comunhão do homem com Deus como esta se expressa no

cristianismo histórico.

Ele pretendia lançar um fundamento sólido de erudição para a teologia, e procurava

garantir sua posição contra os ataques da ciência natural materialista. Assim fazendo, recorria

à religião positiva e a considerava foto histórico. A dogmática era empregada para descrever

historicamente a fé.

Em oposição aos que dizem ocupar-se o cristianismo só com a salvação obtida através

de Jesus Cristo, Ritschl enfatizava que temos de lidar com duas idéias básicas dominantes: O

cristianismo pode ser comparado a uma elipse que é controlada por dois focos. Segundo ele, o

cristianismo ocupa-se tanto com o alvo ético comum, o reino de Deus, como com a salvação

do indivíduo.

A função da religião é especialmente a de promover e trazer à existência o reino de

Deus – o destino do homem concebido em categorias éticas.

Ele define salvação como justificação ou perdão dos pecados, restaura a liberdade

ética criada pelo pecado. Com isso, o homem reconhece, no seu interior, a vontade de Deus e

deste modo se predispõe a fazer o bem. Pode-se que o elemento religioso é subordinado ao

ético, embora ambos estejam incluídos como os dois focos no que Ritschl denomina a religião

cristã.

As doutrinas tradicionais foram podadas consideravelmente ou reinterpretada para

harmonizá-las com as idéias básicas éticas ou espirituais, que segundo ele continham o

significado essencial da salvação. Ele não concebia o pecado como corrupção universal

perante Deus; o considerava desvios isolados do bem, que resultam de conhecimento

insuficiente do bem comum, que simutaneamente é o bem ético. Através da nova relação com

Deus que se torna acessível ao homem pela fé em Cristo e sua salvação.

93

Cristo pode ser chamado Deus só em sentido figurado: sua divindade existe na

unidade de sua vontade com Deus, na perfeita comunhão com Deus que manifestou em

obediência ao chamado de Deus. O sofrimento e a morte de Cristo são simplesmente a prova

final e decisiva dessa obediência. Segundo Ritschl Deus é amor, ponto final; ira, vingança ou

juízo são alheios a sua natureza. Punição e disciplina só são empregadas para educar o

homem.

A tarefa da teologia, tal como Ritschl a via, consiste em harmonizar o cristianismo

tradicional com a conscientização do mundo do homem contemporâneo. A religião não se

destina a explicar o mundo, ou a fazer pronunciamentos teóricos, metafísicos; pode apenas

prazer juízos de valor. O alvo é uma filosofia cristã, que satisfaça plenamente a exigência de

uma religião moral e espiritual perfeita.

HANS KÜNG

Biobibliografia

Teólogo católico suíço, nascido em Sursee em 1928, na Suíça, recebeu variada

educação na Itália, Holanda e Espanha. Foi ordenado em 1955, servindo como pároco, para

em 1960 ser nomeado professor de Teologia em Tubingem. Entre os teólogos do século XX

que mais empenharam no campo ecumênico, deve-se mencionar Hans Küng: seu itinerário é

um exemplo da ampliação da Teologia Ecumênica em teologia das religiões.

A trajetória da Teologia ecumênica de Küng começa com a obra A justificação (1957),

na qual se confrontava a perspectiva barthiana, entendida como a formulação mais expressiva

do protestantismo, da doutrina da justificação com a doutrina católica de Trento.

Na vasta síntese A Igreja (1967), Küng pretende remontar à fonte original do Novo

Testamento, estudado porém não segundo estreitas exigências “católicas” conciliadoras, mas

com método histórico-crítico, diferenciado, de acordo com os resultados da moderno exegese.

Em Uma pergunta (1970), Küng levantava a questão: um magistério eclesiástico

infalível se justifica? Ou ainda: a infabilidade da igreja está ligada a proposições infalíveis?

Ensaio conclusivo do livro Falível? Um balanço (1973) – a igreja poderá cristalizar-se,

porque encontra fundamento na mensagem originária de Jesus.

94

Küng explica com obras eclesiológicas, numa revisitação e revisão crítica ecumênica

dos temas clássicos de teologia sistemática, tais como a cristologia em Ser cristãos (1978), a

questão a respeito de Deus em Deus existe? ( 1978), e a escatologia em Vida eterna? (1982).

Ele passa da teologia ecumênica cristã a uma teologia ecumênica global. Nesta sua

nova fase de reflexão, em que ele introduz o ecúmeno eclesial como parte integrante de

ecúmeno mundial, desenvolveu também uma reflexão epstemológica, na qual procurou

definir o que é uma teologia ecumênica, que se abre ao diálogo com as religiões, introduzindo

em teologia a “teoria dos paradigmas”.

Apresenta em Teologia a caminho (1987), o conceito de paradigma como modelo

interpretativo ou modelo de compreensão possibilita uma nova leitura da história da teologia.

Projeto para um ethos (ética) mundial (1990) – teologia ecumênica da paz: “Não pode

haver convivência humana sem um ethos mundial das nações; não pode haver paz entre as

nações sem a paz entre as religiões; não pode haver paz entre as religiões sem o diálogo entre

essas mesmas religiões”. Ou seja: A teologia não pode deixar de estar a serviço da

humanidade; mas uma teologia a serviço da humanidade deve pôr-se a serviço do

entendimento e da colaboração entre as religiões, favorecendo e praticando o diálogo inter-

religioso tendo em vista a fundação de um ethos mundial.

Desenvolvimento do seu Pensamento Teológico

Ecumenismo AD INTRA (entre os cristãos):

Com a obra A Justificação Estabelece um diálogo entre as formulações do

Concílio de Trento e o pensamento de Karl Barth no tocante a justificação, igualando-

os em conteúdo, e diferenciando-os apenas na linguagem e fontes;

Critica os pontos basilares da Teologia católica-romana, com vistas a uma

flexibilidade que proporcione uma estrutura ecumênica: afirmando a perda do carisma

em detrimento da rigidez absolutista da estrutura eclesiástica, relativizando o primado

petrino, sua existência, continuidade, romanidade e autoridade de poder, relativizando

o dogma da infalibilidade do ministério eclesiástico, da própria estrutura e de todo o

magistério;

Através de um método ecumênico pautado nas mais recentes pesquisas exegéticas,

quer voltar às tradições originárias do N. T., assumindo como imprescindível para o

Cristanismo e para o cristão em si, as premissas de católico e evangélico.

95

Ecumenismo AD EXTRA (global entre as religiões)

Na década de 80, a partir do diálogo com especialistas de outras religiões, seu

ecumenismo passa do diálogo interconfessional-cristão, para o diálogo inter-religioso-

global;

Aplica a teoria epistemológica dos paradigmas de Thomas Kuhn à Teologia até

desenbocar no novo paradigma contemporâneo de um ecumenismo-crítico, que

dialoga sem negar as próprias tradições;

Oferece como alternativas à questão da “verdade” três propostas ineficazes, mas

verificáveis hoje, que são fortaleza, harmonia e abraço

Propõe que a paz no mundo seja uma tarefa das religiões, que por meio do diálogo

proporcionarão a construção de uma “ética mundial”, já que apenas essa ética

resolverá a questão da paz, não alcançada pela filosofia, nem pela ciência.

Resumo sobre Controle de sua Obra: “Veracidade”

Enfrentando uma situação da Igreja católica que, não raro se caracteriza pela

perplexidade, resignação e revolta, o autor foi convidado a pronunciar na TV suíça uma

palestra no programa "Wort zum Sonntag".

Somente hoje ao meio dia recebi o convite de pronunciar uma palestra no programa

"Wort zum Sonntag", em caráter excepcional. As manchetes da grande imprensa foram

tomadas pelo noticiário sobre a luta cruel do povo tcheco-eslovaco pela liberdade. Ao lado

desse noticiário, a encíclica do papa Paulo VI sobre o controle da natalidade representa outro

fato a empolgar a opinião pública mundial: não é possível silenciar em um momento assim, e

será ela o assunto do nosso programa.

Não é possível dizer muita coisa em cinco minutos. Certamente não se pode pesar os

prós e os contras. Nem mesmo se conseguiria estudar a situação. Os debates já havidos

esclareceram alguma coisa:

1. A encíclica representa uma autêntica, ou seja, oficial tomada de posição do papa,

após longa reflexão, Seria ilusão pensar que ela será retirada ou corrigida dentro de um lapso

de tempo muito breve.

2. Trata-se de uma decisão falível, como também se admite em Roma.

3. Com espanto de Roma, a encíclica encontrou uma recusa geral na opinião pública

fora da Igreja católica e criou na Igreja católica a mais séria crise dos últimos decênios.

Muitos na Igreja, incluindo-se bispos, teólogos, vigários, homens e mulheres, sacodem a

96

cabeça, sem saber o que dizer, duvidam, e estão perplexos. Alguns resistem publicamente. O

papa viu-se obrigado a sair em campo em defesa da sua encíclica logo após a sua publicação.

Em alguns países as conferências episcopais reúnem-se procurando uma saída.

Nesta hora difícil para a Igreja católica, quando também contamos com a compreensão

e a ajuda dos cristãos evangélicos, tentarei apresentar uma palavra orientadora: Que fazer?

Poderá a Igreja sair do impasse?

Primeiramente: há de ir adiante; hão de sair do impasse a Igreja católica, sua

renovação, a aproximação ecumênica! Não nos enganemos! Não percamos a esperança!

Venceremos esta crise, como o fizemos com outras muitas, e, se não me engano, até sairemos

ganhando! O argumento decisivo do papa foi que se sentia comprometido com a doutrina

oficial e considerada definitiva, dos seus antecessores e do episcopado da primeira metade do

século. Isso conduzirá a Igreja a um re-exame crítico dos seus conceitos sobre: autoridade,

magistério, formulações da doutrina, dogma e, sobretudo, infalibilidade. A partir da Escritura,

não deveria a infalibilidade eclesiástica ser considerada não tanto em determinadas

proposições e doutrinas, mas muito mais na convicção da fé de que a Igreja, conservada pelo

Espírito de Deus, é incessantemente renovada, apesar de todos os erros, através de todos os

erros de papas, bispos, teólogos, vigários, homens e mulheres? Tais e semelhantes perguntas

hão de ser feitas por nós, juntamente com os cristãos evangélicos, pelos quais, devido às

contradições doutrinais no próprio campo, as mesmas questões serão formuladas, embora sob

um outro ponto de vista. O que muito contribuirá para a nossa mútua aproximação. Portanto,

há de ir adiante.

E, que é que devemos fazer? Três pontos resumem a minha resposta:

1. Tomaremos a sério e respeitaremos a decisão de consciência do papa.

2. Pesaremos e debateremos honestamente os seus argumentos. Não recalcaremos

nossas dúvidas, mas expô-las-emos, a fim de alcançar clareza para nós mesmos e para

a Igreja. E não nos condenaremos mutuamente, mas procuraremos compreender-nos.

3. Aqueles que, após séria e madura reflexão consigo, com o cônjuge e diante de Deus,

chegarem à conclusão de que, no interesse de guardar o amor mútuo, de consolidar e

tornar feliz seu matrimônio, devem agir de modo diverso do indicado pela encíclica:

estão obrigados a seguir a própria consciência, conforme o ensinam os papas e a

doutrina tradicional. Portanto, não se acusarão de pecado, quando tiverem agido

conforme os ditames da própria consciência, continuando tranqüilos a participar da

vida e dos sacramentos da Igreja. E seguramente poderão contar com a compreensão

dos seus pastores.

97

Em resumo: dependerá de cada um arrancar da crise a Igreja, tornando-a novamente

emancipada e mais responsável. E é exatamente isto que há de ajudar, não Somente a nós,

mas a todas as igrejas.

HEINRICH EMIL BRUNNER.

Biobibliografia

Nasceu em 23 de dezembro de 1899 em Winterthur, na Suíça e morreu em 1966. Foi

um teólogo protestante suíço, sendo que sua formação acadêmica foi em Berlim e Zurique. De

1926 foi professor também em Zurique, até sua morte. Transcorreu grande parte de sua

existência na pátria, mas também viveu no exterior: na Alemanha, Inglaterra, Estados Unidos

e Japão.

Realizou seus estudos liceais em Zurique, formando-se em 1908. Depois dedicou-se

aos estudos teológicos, primeiro em Zurique, depois em Berlim e Nova York e finalmente

retornou a Zurique, onde obteve o doutorado em teologia em 1913.

Em parceria com Barth, fundou o movimento da Teologia Dialética logo depois da

Primeira Guerra Mundial. O movimento se dissolveu na década de trinta, quando Barth aderiu

ao método da analogia da fé e Tillich ao método da cprrelação.

Suas obras foram: The Symbolical in Religious Knowledge; The Mystic and The

Word; The Fhilosophy of Religion of Evangelical Theology; The Mediator; The Divine

Imperative; Man in Revolt; Chritianity and Civilization.

Pensamento Teológico

Brunner ocupava posição a meio caminho entre o protestantismo liberal e a neo-

ortodoxia (e a teologia da crise) de Barth. Asseverava que apesar do homem não poder prover

sua própria salvação, possui determinados poderes naturais para corresponder a Deus, estando

na obrigação de utilizar os mesmos. Em outras palavras, o livre-arbítrio é uma realidade.

A razão não pode solucionar todos os problemas humanos, motivo pelo qual

inevitavelmente surgem contradições na filosofia e na teologia. Isso, porém, meramente

98

mostra que a revelação encerra mistérios que, por enquanto, não cedem diante do nosso

conhecimento. Uma teologia sem contradições seria uma teologia falsa, porquanto teria a

presunção de resolver os grandes mistérios.

A tecnologia e a política tendem a despersonalizar o homem. A revelação cristã visa às

pessoas, provendo uma chave que abre a verdadeira natureza do homem e de sua comunidade.

Brunner eliminava de sua discussão todos os tópicos que, para ele, não dissessem

respeito imediato à inquirição espiritual do indivíduo, como o nascimento virginal e a maioria

dos relatos de milagres do Novo Testamento. Mais tarde, ele simplifica a ortodoxia, em prol

da espiritualidade prática.

Ele se opunha ao intelectualismo teológico, e punha a pessoa de Cristo no centro da

teologia.

Dentro do campo da ética, ele combinava a crítica de Kant com o realismo da Bíblia e

do luteranismo moderno. Mostrava-se sempre interessado pelo aspecto prático da ética. Em

seu livro, Homem em Revolta, ele via o homem como um ser estranhamente pessoal.

Empregava as categorias e discernimentos de Kierkegaard, bem como o personalismo de

Ebner e Buber, filósofos que enfatizavam a relação com Deus, expressa pela forma eu-tu. O

homem é um pecador, responsável diante de Deus, mas revoltado contra Deus, mediante seu

pecado. Porém, o homem pode agir favoravelmente, e então o Espírito faz dele uma nova

criatura. A vontade de Deus opera através das ordenanças da criação, como a família, o

trabalho, a Igreja, o estado e a cultura geral. O diálogo com todos os níveis da sociedade

ajuda-nos a definir como a vontade de Deus opera através dessas instituíções.

Desenvolvimento de sua Teologia

Brunner não se encaixava no liberalismo protestante e também não se encaixava

totalmente na neo-ortodoxia e teologia da crise, ficando assim num estágio “transitório” entre

as duas correntes. Defendia que, o livre arbítrio é uma verdade soteriológica, porém não é o

homem que provê a si próprio a salvação, ou seja, a salvação é dada por Deus, mas o homem

possui características naturais para corresponder a Deus, isso em nível soteriológico. Ele,

assim como Barth, rejeitou o misticismo cristão, porém afirmava que a razão não pode

solucionar todos os problemas da vida, idéia que vai(bate) de encontro a muitos filósofos

racionalistas. Afirmava também que, há no mundo muitos mistérios e que a teologia não têm

o poder de resolver todas as questões, por isso ela possui tantas contradições e seria presunção

dela querer resolver esses mistérios. Abordou algo importante para a sociologia ao dizer que a

99

política e a tecnologia podem despersonalizar o homem, e é nesse ponto que entra a teologia,

pregando que a revelação cristã visa o homem. Brunner afirmava que, a revelação não é

proposicional, ou seja, a bíblia é simplesmente o registro da revelação de Deus aos homens e

não foi ditado por Deus no processo de escrituração. Brunner era um homem que não discutia

tópicos que diziam respeito a milagres ou nascimento virginal, mas seu conceito de

espiritualidade era mais em nível de práxis e não de experiências místicas. Sua teologia era

formada tendo Cristo como centro de qualquer idéia, assim sendo opôs-se ao intelectualismo

teológico. A ética era um assunto a ser vivido no cotidiano, ou seja, combinava a crítica de

Kant com o realismo do luteranismo. Apoiou idéias de filósofos como Ebner e Buber que

enfatizavam a relação entre o homem e Deus. Apesar de defender o livre arbítrio

indiretamente , dizia que o homem é pecador e sempre se revoltará contra Deus, porém se o

homem reagir a essa revolta, ele terá o auxílio do Espírito Santo que o tornará uma “nova

criatura”. Um dos pontos mais interessante de sua teologia é que ele ensinava que à vontade

de Deus se manifesta através da família, do trabalho, da igreja, da cultura, do estado..., sendo

assim o relacionamento com a sociedade nos ajuda a identificar como a vontade de Deus

opera.

RUDOLF KARL BULTMANN

Biobibliografia

Nasceu no dia 20 de agosto de 1884, em Wiefelstede, próximo a Oldenburg na

Alemanha. Filho de pastor e neto de avós, materno e paterno luteranos. Em 1903 iniciou seus

estudos teológicos em Tubigen, seguidos de Berlin e Marburg, onde em 1910, doutorou-se,

defendendo uma tese acerca da retorcia paulina. Era exegeta, teólogo bíblico protestante,

historiador e filosofo. Foi influenciado pelo filosofo alemão Martin Heidegger, que professava

o existencialismo, e pela teologia de Karl Barth. Lecionou NT em Marburgo, Alemanha de

1921 a 1951, quando se aposentou. Todos os seus escritos levam a marca de um estudioso

consciente, atento, agudo, profundo e genial, dotado de uma bagagem critica, filosófica

incomum. Foi considerado como o mais prestigioso dos teólogos contemporâneos, chegando a

ser classificado como um dos mais importantes teólogos do século XX. É bem perceptível sua

marca sobre os teólogos da “morte de Deus”. A sua influencia foi bem mais notória após o

ano de sua aposentadoria em 1951. Bultmann foi o pioneiro em estudar os evangelhos

100

valendo-se da critica da forma que buscava descobrir pronunciamentos e fatos da Igreja

primitiva, subjacentes à forma do texto dos evangelhos. Veio a falecer no dia 30 de julho de

1976, em Marburgo.

Sua época de formação teológica se deu no período anterior à primeira guerra mundial,

ainda no clima de otimismo quanto ao futuro da humanidade, característico do século XIX. A

influencia dominante era da chamada teologia liberal, com parte componente antropológico, e

da pesquisa da historia das relógios. A partir de meados da década de 20 do século XX,

Bultmann assumiu uma concepção teológica próxima à de Karl Barth, Friedrich Gogarten e

Emil Brunen, iniciadores da teologia dialética, caminho aberto pelo comentário de Barth à

Epistola aos Romanos, de 1919, que rompera com o enfoque Antropocentrico, característico

da época anterior, reflexão criteriosa em termos da Palavra de Deus e Revelação.

Pensamento Teológico

Um dos teólogos mais influentes do século XX, Rudolf Bultmann (1884-1976) se

destacou com seus escritos históricos e interpretativos sobre o Novo Testamento. Ele foi,

durante muitos anos, catedrático da Universidade de Marburg, na Alemanha.

Segundo Bultmann, a tarefa da teologia é a de descobrir um "conceptualismo", cujos

termos pudessem aproximar a mensagem do Novo Testamento a cosmovisão moderna. Em

correspondência pessoal, ele sempre afirmou sua intenção proclamar uma mensagem

contextualizada, ele se referiu certa vez a uma senhora que retornou à Igreja, depois de muito

tempo afastada, por causa da leitura de um de seus livros.

Apoiando-se num esquema interpretativo existencialista, bastante influenciado pôr

Martin Heidegger, seu colega na Universidade de Marburg, Bultmann passou sua vida lendo o

Novo Testamento, como se fosse um documento heideggeriano, e se valendo de métodos

histórico-críticos para eliminar do texto os elementos resistentes ao sistema filosófico

existencialista.

Bultmann fez uma palestra em 1941 numa conferência para pastores, que

posteriormente foi publicada, "O Novo Testamento e a Mitologia". A tese de Bultmann: a

humanidade contemporânea, que se acostumou com os avanços da ciência, não pode aceitar o

conceito mitológico do mundo expresso nos escritos bíblicos.

De acordo com Bultmann, "a concepção do universo do Novo Testamento é mítica. O

universo é considerado como dividido em três andares. No meio se encontra a terra, sobre ela

o céu, abaixo dela o mundo inferior. O céu é a morada de Deus e das figuras celestes, os

101

anjos; o mundo inferior é o inferno, lugar de tormento. Mas também a terra não é o só o lugar

do acontecer natural e cotidiano, da previdência e do trabalho, que conta com ordem e lei; é

também cenário do atuar de poderes sobrenaturais, de Deus e de seus anjos, de Satã e de seus

demônios. Os poderes sobrenaturais interferem nos acontecimentos naturais e no pensar,

querer e agir do ser humano; milagres não são nada raros. Satã pode lhe incutir pensamentos

malignos. Mas Deus pode dirigir seu pensar e querer, pode fá-lo ter visões celestiais, fá-lo

ouvir a sua palavra exportadora e consolidara, pode presentear-lhe a força sobrenatural de seu

espírito.

A história não percorre seu caminho constante e estabelecido pôr suas próprias leis,

mas obtêm seu movimento e direção dos poderes sobrenaturais. Este eón encontra-se sob o

poder de Satã, do pecado e da morte (que precisamente são considerados "poderes").

Rapidamente ela se encaminha para seu fim, mais explicitamente um fim próximo, que

ocorrerá numa catástrofe cósmica. São eminentes as "dores de parto" do tempo final, a vinda

do juiz celestial, a ressurreição dos mortos, o julgamento para a salvação e perdição.

A concepção mítica do universo corresponde a exposição do acontecimento salvífico,

que constitui o conteúdo verdadeiro da proclamação neotestamentária. A proclamação

emprega linguagem mitológica: eis que é chegado agora o tempo final; "vindo a plenitude do

tempo", Deus enviou seu filho. Este um ser divino preexistente, aparece na terra como um ser

humano, sua morte na cruz, a qual ele sofre como um pecador, propicia expiação para os

pecados dos seres humanos. Sua ressurreição é o começo da catástrofe cósmica, através da

qual será aniquilada a morte, trazida ao mundo pôr Adão: os poderes demoníacos universais

perderam seu poder. O ressurrecto foi elevado ao céu, à direita de Deus; ele foi transformado

em "senhor" e "rei". Retornará sobre as nuvens do céu, a fim de consumar sua obra de

salvação; então ocorrerá a ressurreição dos mortos e o juízo; então terão sido aniquilados o

pecado, a morte e todo o sofrimento. Tudo isto acontecerá em breve; Paulo é de opinião que

ainda há de experimentar pessoalmente este evento.

Quem pertence a comunidade de Cristo, está ligado ao seu Senhor, através do batismo

e da ceia do Senhor, e pode estar seguro de sua ressurreição para a salvação, se não se

comportar indignadamente. Os crentes já possuem o "penhor", a saber, o Espírito, que age

neles e testifica sua filiação de Deus e garante sua ressurreição.

A estes temas acima mencionados, que apresentam um formulação ortodoxa e

evangélica, Bultmann responde dizendo que "tudo isto é linguagem mitológica... Em se

tratando de linguagem mitológica, ela é inverossímil para o ser humano hoje". Ele se propõe

102

para a teologia a tarefa de desmitologizar a proclamação cristã, descobrindo a verdade que

está inserida na concepção mítica do universo do Novo Testamento.

A preocupação de Bultmann não era a eliminação dos mitos, pelo contrário, ele

procurou uma reinterpretação da linguagem mitológica da Bíblia. "É bem possível que numa

concepção mítica passado do universo possam ser descobertas de novo verdades que foram

perdidas numa época de iluminismo". "O sentido do mito não é o de proporcionar uma

concepção objetiva do universo. Ao contrário, nele se expressa como o ser humano se

compreende em seu mundo. O mito não pretende ser interpretado cosmologicamente, mas

antropologicamente melhor; de um modo existencialista".

O alvo de Bultmann ao interpretar os mitos bíblicos era ressaltar a natureza da fé.

Nesta ênfase à fé, manteve-se firme nas tradições de Paulo e de Lutero.

Bultmann crê que o Novo Testamento contém a Kerigma salvadora de Cristo. A

desmitologização concite em desnudar o mito do Novo Testamento e descobrir a Kerigma

original.

Parte importante da interpretação de Bultmann é o seu modo de entender a história. Ao

contrário do idioma português, a língua alemã fornecia a Bultmann duas palavras

correspondentes a "história". A primeira, Historie, é usada em relação aos fatos da história. A

segunda, Geschichte, é o termo que subentende o significado ou relevância de um evento na

história. Com o uso destas duas palavras, é possível diferenciar entre o significado do evento e

um fato real.

Sendo assim, ponderai-se dizer que Jesus morreu na Historie, mas sua real ressurreição

se deu na Geschichte. Ou seja, ele não nega a existência do Jesus histórico, como fez a antiga

teologia liberal alemã, mas nega a realidade dos eventos sobrenaturais que o envolveram.

A erudição de Bultmann tende a transformar o pensamento cristão em um mero

comentário a cosmovisão moderna. Toda a mensagem do Novo Testamento tem de ser

repensada em categorias existenciais. E nisto o evangelho perde o seu valor e sua força, e

passa a ser mais uma boa filosofia de vida.

Segundo Gilbert Durand, "as idéias de Bultmann são típicas do círculo em que

mergulha todo pensamento que busca um sentido enquanto se satisfaz em dar voltas lineares,

prisioneiro da temporalidade histórica; em que a tradição passada remete à existência presente

e vice versa, indefinidamente".

O conceito do Deus objetivo e pessoal apresentado na Bíblia se rende ao pensamento

moderno. Em Bultmann, Deus não mais se relaciona objetivamente com o homem, pois o

conhecimento de Deus está perdido em meio aos mitos descritos no Novo Testamento.

103

A diferenciação entre Historie e Geschichte, retira a ação de Deus na história. Cristo é

o Senhor, diria Bultmann, mas não o Senhor de nossa história e sim de uma história

existencial e subjetiva. Assim define George E. Ladd; "a realidade histórica deve ser

compreendida em termos de uma imutável casualidade histórica. Se Deus é compreendido

como tendo a possibilidade de agir na história, a ação deve estar sempre oculta nos eventos

históricos, sendo evidentes apenas aos olhos da fé".

Embora a mensagem do cristianismo seja, sem dúvida alguma, existencial e

contemporânea no sentido mais verídico, e exija a resposta subjetiva da fé. A fé que ele requer

é a fé numa realidade objetiva.

Quando o cristianismo é privado de sua objetividade, cujo fundamento é a intervenção

livre e sobrenatural de Deus na história, essa religião se torna uma idéia vaga, uma abstração,

um idealismo sem raízes, e nunca será o vibrante cristianismo bíblico.

Bultmann eliminava de sua teologia, pelo processo de demitização pois achava que

muitos dos relatos neotestamentarios são frutos da imaginação do homem ou de elementos

mitológicos presentes na cultura; questões como o nascimento virginal de Cristo, os milagres

do Novo Testamento, a ressurreição e a ascensão de Cristo, a existência de demônios, anjos,

as intervenções divinas e a expiação do pecado através do sangue de Cristo. Ele dizia que a

Bíblia fora escrita em linguagem mitológica, que é obseleta para os nossos dias. O teólogo

moderno tem enato a tarefa de demitizar a bíblia despindo-a de seus trajes lendários,

mitológicos e tentando descobrir as verdades existenciais que se encontram nos textos.

Eticamente ele se declarava um existencialista. Para ele a existência humana pede e

pode ser considerada à parte da fé. O homem torna-se escravo daquilo que deveria dominar. O

imperativo de toda Ética é o amor. A verdadeira vida de fé baseia-se sobre realidades

invisíveis, intangíveis. Ele explica que o homem pode ser dominado por questões carnais, isso

gera uma angustia que oprime o homem e o torna escravo, de forma totalmente

existencialista. Apesar dessas idéias existencialistas, bultmann afirma que Deus falou ao

mundo através de cristo e continua falando até hoje. A fé também em certo sentido foi

defendida por esse teólogo ao dizer que ela liberta os indivíduos do passado, trazendo

liberdade para viver um bom futuro.

Bultmann redefiniu as idéias primitivas de “pecado” como existência inautêntica e

“salvação” como existência autentica.

A Bíblia é essencialmente uma obra de mentalidade mítica, faz-se necessário uma

reinterpretação das figuras de linguagem nela contida, de modo que haja compreensão para a

mente cientifica do sueco XX. Como Comte, considerava a religião um resultado da

104

mentalidade ingênua, imatura da humanidade antiga, a qual, ignorando a verdadeira causa,

pensou toda uma serie de sobrenaturais: acima de nós, um céu povoado por uma hierarquia de

anjos, sob o domínio direto de Deus; abaixo de nós, um inferno repleto de espíritos malignos.

Jesus é um homem, Cristo é virtualmente o Deus encontro pessoal. Para Bultmann,

tanto o túmulo vazio como o nascimento divinal são mera lendas. Segundo ele o “Jesus

histórico” à exceção do evento da cruz, é irrelevante para a fé, que se apega à palavra

proclamada acerca da ação salvifica de Deus em Cristo. Ou seja: o queriam a respeito do

Cristo da fé pressupõe necessariamente o fato de Jesus Ter vivido e morrido na cruz, mas o

desdobramento dos detalhes da vida de Jesus lhe é irrelevante.

Para Bultmann, nenhuma analise filosófica do mundo resultará em conhecimento de

Deus. A revelação não pode ser descoberta por inteiro, deve ser contemplada com os olhos da

fé. Deus não é nenhum objeto que possa ser apreciado pelo pensamento humano, e nós não

podemos falar de Deus em termos objetivos. A vida humana é limitada como criatura, no

tempo e na capacidade e cada ser humano é responsável pelo que é. Alguns teólogos

consideravam as duvidas lentadas pela critica da forma como meios de inutilização da fé

cristã. Na concepção de Bultmann, a verdadeira historia impõe ao historiador que procure

travar uma forma de dialogo com a historia, que ele esteja considerando, a historia deverá ser

revivida para o historiador. A fé cristã não limita Jesus a um mero acontecimento da historia.

Apara que o homem possa existir de fato deve compreender a sua própria existência. A

liberdade humana reside na faculdade exclusiva do homem em escolher o que intente ser.

Bultmann, diferentemente de outros teólogos, nunca participou direta e ativamente em

questões políticas. Totalmente dedicado a pesquisa teológica, considerou o trabalho cientifico

livre e manteve seu lugar adequado em face das tendências reacionárias.

No entender de Bultmann, a mensagem neotestamentaria jamais pode ser apreendida

de forma definitiva, pois, enquanto elaboração conceptual, é sempre uma exposição teológica.

Bibliografia

BULTMANN, Rudolf, “Demitologização: Coletânea de Ensaios”, Tradução de Walter

Altmann e Luís Marcos Sander, São Leopoldo: Sinodal, 1999.

________________, “Crer e Compreender: Ensaios selecionados”, edição revista e ampliada /

tradução de Walter Schlupp, Walter Altmann e N´rlio Schncider, São Leopoldo: Sinodal,

2001.

MONDIN, Batista, “Os grandes teólogos do século XX”, Volume 2, 2ª edição, traduzido por

José Fernandes, São Paulo: Paulinas, 1979.

105

______________, “Quem é Deus?: Elementos de Teologia e Filosofia”, tradução de José

Maria de Almeida, São Paulo: Paulus, 1997.

HAGGLUND, Bengt, “História da Teologia”, tradução de Mário L. Rehfeldt & Gladis Knak

Rehfeldt, 6ª edição, Porto Alegre: Concórdia, 1999.

HORDERN, William E., ”Teologia Protestante ao alcance de todos”, tradução de Roque

Monteiro de Andrade, 3ª edição, Rio de Janeiro: JUERP, 1986.

CHAMPLIN, Russell Normam, “Enciclopédia de Bíblia Teologia e Filosofia”, Volume 1, São

Paulo: Candeia, 1995.

TILLICH, Paul, “Perspectivas da Teologia Protestante nos Séculos XIX e XX”, tradução de

Jaci Maraschin, 2ª edição, São Paulo: ASTE, 1999.

GIBELLINI, Rosino, “A Teologia do Século XX, São Paulo: LOYOLA, 1998.

KARL BARTH

Biobibliografia

Nasceu em 1886, em Basel, na Suíça. Era um teólogo reformado, também pastor. Em

1911 pastoreou em Safenwyl. Em 1921 foi professor de teologia reformada em Goettingen,

em 1925 em Muenster-in-Westphalia e em 1930 em Bonn. Em 1935 os nazistas o exilaram, e

então ele foi professor em Basel até 1968, ano de seu falecimento. Foi aluno de Harnack, e foi

influenciado pelo neokantianismo e por Kierkegaard e também pelo socialismo de Ragaz e

Kutter. Quando a teologia liberal estava no auge, ele se rebelou contra seus professores e em

1919 escreveu seu comentário sobre o livro de Romanos, onde praticamente começou a surgir

uma nova ortodoxia. Teve influência do reformador Calvino, principalmente por volta de

1925. Enfatizava a teologia bíblica, porém com conclusões racionais. Era um homem de

caráter forte e de propósitos e entrou em conflito contra a igreja do estado nazista. Muitos

acham que Karl Barth era liberal, mas na realidade ele não gostava do liberalismo religioso e

até se manifestava contra. Ele tinha o desejo de retornar a teologia à bíblia e aos princípios

reformados. Rejeitava o misticismo cristão, e dizia que os liberais falharam, sendo a solução

para o mundo o retorno aos antigos princípios religiosos. Barth foi treinado no liberalismo

alemão, talvez isso fez ele desapontar com o nazismo.

106

Numa palestra em 31 de janeiro de 1931, Barth afirmou profeticamente em "A

necessidade da igreja evangélica", pois a igreja evangélica é uma igreja sob a cruz, e afirmou

ser insalubre uma teologia que parece estar, na verdade, com vergonha do evangelho,

disfarçando-o com enfeites, dando por ele desculpas e explicações, e assimilando as

categorias contemporâneas da filosofia e das ciências humanas, um caminho que Barth mais

tarde, perto do Sínodo de referência deste resumo, acusaria ter sido parcialmente responsável

por Ter levado a igreja alemã ao seu apoio às políticas de guerra do governo Nazista de Hitler.

Barth tinha certeza de que devíamos temer apenas a Deus e não o homem, por isso foi

verdadeiro em suas declarações contra o partido nazista, sabia que a igreja estava vendida

para satanás e o "lobista" era o Hitler. Junto com Bonhoeffer, Barth sabia que prestaria conta

apenas a Deus e não aos homens. A única coisa que o Nazismo poderia fazer era matá-los.

Barth chegou a usar até o texto do Vaticano II com sua antropologia de valorização do

homem para que o povo alemão não aceitassem tanto o Hitler como o salvador.

Barth pregava que a revelação de Deus era de Cima para Baixo e não de Baixo para

Cima, ou seja, provém da Graça de Deus. Ele deixou claro que a Graça de Deus não vinha

pelas obras de Deus e nem pela dos homens. Com isso, o duelo contra o Nazismo ficou forte,

pois o Reich era a implantação do Reino de Deus na terra, as obras do partido nacional-

socialista e a nova igreja nazista era a própria manifestação de Deus.

Talvez, o principal motivo para que Barth escrevesse seu livro a "Carta aos Romanos"

era, não apenas por aparentemente ter sido feito antes dos evangelhos, mas, para provar que

não poderíamos levar o capítulo 13 do livro de Romanos ao pé da letra... O intelecto humano

é suficiente para entender Deus como um todo (desespero existencial e fé num Deus diferente

dos homens). Se trouxermos Deus ao reducionismo - desmembramos de sua complexidade

para entendê-lo numa simplicidade – Aí, Deus não é Deus, é objeto da ciência e vira objeto

analisado.

Barth é sem dúvida o teólogo de maior influência do século XX. O Papa Pio XII disse

que Barth é “o maior teólogo depois de Tomás de Aquino”. Sendo admirado por protestantes,

por católicos e por intelectuais não cristãos, já foi denominado de o “Alberto Einstein da

Teologia”. Mas é também criticado tanto por “fundamentalistas” como por “modernistas”.

Pensamento Teológico

107

Enfatizou a transcendência de Deus e a realidade do pecado, como também a soberania

de Deus, a graça e a revelação. Reconhecia que as escrituras têm imperfeições, mas que a

bíblia é a fonte da revelação de Deus como também veículo.

Ele foi um grande expoente da teologia da crise, pregando que a Palavra de Deus é o

registro da revelação do Transcendente. Sua teologia propriamente dita é interessante, pois ele

achava que as idéias humanas sobre Deus eram meras especulações. A verdade se manifesta

pela graça e não pela razão como era defendido por muitos na época. Dizia que a religião têm

tendências idólatras, ou seja, revelação era diferente de religião. As experiências místicas

devem ser apoiadas nas escrituras e na tradição cristã. O ponto de partida da teologia de Barth

era Deus e não o homem, sendo assim aceitava a cristologia clássica e o dogma da trindade,

ou seja, suas análises teológicas partia de cima, da trindade, da revelação, da graça, e não das

necessidades do homem. Suas principais obras foram: Epistle to the Romans,1919; Word of

God and Word of Man, 1928; Anselm, 1931; Church Dogmatics, 4 volumes, 1923-1935;

Credo,1935; Dogmatics in Outiline,1947; Evangelical Theology, an Introduction,1962.

Esboço dos Principais Pontos da Teologia de Barth:

A Transcendência de Deus:

a) Barth combate a teologia da iminência.

b) Deus é o “Totaliter aliter”, o Totalmente Outro.

c) Deus é soberano, livre e surpreendente.

A Inabilidade total do Homem:

a) Há um abismo entre Deus e o Homem.

b) Não há caminho do Homem para Deus, mas só de Deus para o Homem.

c) O “homem é homem e não é um gato”.

d) Barth é contra a “Analogia Entis” da teologia católica, é contra a Teologia Natural, é

contra o “Ponto de Contacto” defendido por Bruner, é contra a “bondade da

natureza humana” ensinada pelo liberalismo, é contra o moralismo dos pietistas.

A Revelação de Deus:

a) O Deus das “maiores alturas” é o Deus das maiores profundezas. Ele desce.

b) “Deus é o não do nosso sim e o sim do nosso não.”

c) A Revelação é Deus agindo e mostrando o que Ele é.

d) A Religião desaparece onde há Revelação, porque a religião é esforço humano.

108

A Centralidade de Jesus Cristo:

a) A Revelação de Deus é Jesus Cristo.

b) Deus é Jesus Cristo.

c) A trindade é:

• Deus Revelador – O Pai.

• Deus Revelação – O Filho.

• Deus Revelado – O Espírito Santo.

A Bíblia é a Palavra de Deus:

a) A Bíblia é um livro – Documento humano.

b) Como documento humano pode ser estudado cientificamente pela Crítica.

c) Mas é através desse livro que Deus fala.

d) O documento bíblico é uma oportunidade para Deus falar.

e) O evento da manifestação de Deus acontece através da Bíblia.

f) Jesus é Superior à Bíblia.

A Importância da Igreja:

a) A Igreja é o “locus” da manifestação do Espírito Santo.

b) Pelo Espírito a igreja se reconhece pecadora. O Espírito renova a igreja.

c) A igreja continua a obra redentora de Cristo.

d) Fora da igreja não há salvação.

Diferença Qualitativa entre o tempo e a eternidade:

a) A Revelação é qualitativamente diferente da Razão.

b) O Cristianismo não é Religião.

c) A vida eterna não é vida sem fim, mas vida com Deus.

d) A Ressurreição do Corpo é qualitativamente diversa da imortalidade da Alma.

e) A Eternidade invade o Tempo, julgando-o. É a Crise.

Barth fez uma reformulação das principais doutrinas da teologia reformada:

A Soberania e a Liberdade de Deus:

a) Nada pode limitar Deus. Ele é imprevisível e surpreendente.

109

b) Deus nunca é objeto de conhecimento, mas sempre Sujeito.

“Sola Fide”:

a) Ter fé é render-se, capitular, sujeitar-se a Deus.

b) Ter fé não é aceitar um conjunto de dogmas.

c) Fé é a afirmação de que não podemos decidir por nós mesmos, e deixarmos que

Deus decida por nós.

d) A Justificação pela fé pode se tornar justificação pelas obras se confiarmos em nossa

fé humana.

Supremacia da Palavra de Deus:

a) A Palavra de Deus sobrepuja a Bíblia.

b) Deus ainda fala hoje pela Bíblia e pela Pregação da Igreja.

Sacerdócio Universal dos Crentes:

a) Todos os crentes são pecadores salvos para testemunhar.

b) Não deve haver distinção entre clero e laicato.

c) O Instituicionalismo é um grande pecado da igreja

FRIEDERICH GOGARTEN

Biobibliografia

Friederich Gogarten, famoso teólogo evangélico alemão, viveu de 1887 à 1967, formou-

se na Universidade de Iena. Foi discípulo de Barth, vindo mais tarde a divergir do mestre.

Friedrich Gogarten, aderiu por volta do final do verão de 1933 ao movimento religioso

da Igreja evangélica dos “Cristãos Alemães”, fundado na Turíngia em 1927 para promover o

cristianismo popular, mas não tardou em abandoná-lo com um documento de protesto de 14

110

de novembro do mesmo ano, logo após o discurso pronunciado no dia anterior, em Berlim,

pelo líder dos Cristãos Alemãs, Dr. Reinhold Krauser, que propunha desjudaizar o

cristianismo, eliminando o Antigo Testamento, a moral judaica e a teologia do rabino Paulo .

Gogarten foi acusado de ter sido o teórico dos Cristãos Alemãs, mas tal acusação é

infundada: sua adesão – coerente com os princípios formulados em numerosos escritos do

período dialético (teologia de Barthiana), que o levava a soldar teologia e política e a

privilegiar o tema autoridade – durou no máximo três meses e foi prontamente retirada assim

que ficou claro que o movimento, em nome do nacional-socialismo alemão, estava

abandonando o fundamento bíblico em que se baseia a igreja.

Pensamento Teológico

Golgarten deu grande contribuição no campo da epistemologia. Concordou com

Brunner na idéia de haver revelação de Deus fora da Bíblia.

Gogarten é conhecido como o teólogo da secularização. O processo de secularização da

época moderna não se poderia negar que contribuiu positivamente para superar uma visão

sacral do mundo e da natureza que por tanto tempo prevaleceu na mentalidade do homem de

épocas passadas. Fr. Gogarten, ao menos em parte, tinha razão de chamar a atenção para o

aspecto positivo da secularização, distinguindo-o claramente de seus aspectos negativos que

culminaram no secularismo moderno.

A obra de Friedrich Gogarten constitui uma das reinterpretações mais desafiantes da

modernidade no marco do pensamento protestante. Essa reinterpretação descortina intuições

relevantes também para a filosofia da religião, como fica demonstrado pelo trabalho, entre

outros, de pensadores italianos recentes como Giorgio Penzo e mesmo Gianni Vattimo. O

eixo da análise gogartiana da modernidade é o conceito de secularização. Conforme Gogarten,

entre a secularização originária, intínseca à fé cristã, e o que ele denomina de secularismo,

encontram-se simultaneamente a fatalidade e a esperança da modernidade. A abordagem

gogartiana da secularização tem como base uma apreciação empática e afirmativa da

historicidade pertinente ao discurso moderno sobre si mesmo e a religião, sem deixar de

buscar sua origens essenciais, como descoberta da mundaneidade do mundo, no cristianismo.

Assim, não se trata em primeiro lugar da mensuração de fatos sociológicos, mas de uma

investigação interpretativa-hermenêutica da secularização contendo matizes teológicos e

desdobramentos ontológicos peculiares.

111

MARIE-DOMINIQUE CHENU

Biobibliografia

Nasceu em Soisy-sur-Seine, nas proximidades de Paris, aos 7 de janeiro de 1895.

Concluída a escola elementar, ingressou no seminário. Depois de alguns anos, sentiu-se

chamado à vida religiosa e tornou-se dominicano. Seu ingresso na Ordem dos Pregadores

ocorre em 1913.

O noviciado, obviamente, contribuiu para reforçar ainda mais essa concepção de vida

contemplativa como vida de separação do mundo. Mas o jovem Chenu não tardou a perceber

a falta de atualidade de tal concepção. “Concluído o noviciado”, confidenciou-nos ele mesmo,

“...quando tive o mesmo sentimento de uma missão a cumprir pelo mundo. Assim, hoje

compreendo melhor essa interação da vida contemplativa, que me protegeu do tumulto e da

dispersão, com a presença no mundo, sem a qual o teólogo não poderia realizar sua missão.

Se, em algumas circunstâncias de minha vida, mantive-me firme e suportei certas coisas, não

o fiz tanto devido à minha perfeição pessoal quanto pela aspiração, o desejo de realizar essa

missão por aqueles que estavam à espera dos seus benefícios.” Esse testemunho é suficiente

para entendermos a progressiva mudança de postura de Chenu em relação ao mundo e

especialmente ao homem.

Concluído o noviciado, depois de uma breve estadia em sua pátria, Chenu foi enviado a

Roma, ao Colégio Angélico, para realizar seus estudos filosóficos e teológicos. Lá teve por

mestre o célebre Garrigou-Lagrange, que o introduziu no estudo aprofundado de são Tomás

de Aquino.

Concluiu seus estudos teológicos em 1920, obtendo o doutorado em teologia. No

mesmo ano, foi nomeado professor da faculdade de teologia de Le Saulchoir (nas

proximidades de Paris). Em 1932 foi nomeado reitor do convento, vindo porém a abandonar o

cargo de reitor e professor em 1942, após ser condenado pela Igreja, por causa da sua obra

“Une école de théologie” (1937). Ademais, Chenu teve também que deixar Le Saulchoir e

tomar o caminho do exílio. Ficou por muitos anos forçado à inatividade. Iniciou a sua

reabilitação a partir de 1953, porém esta nunca foi completa. Por isso podemos constatar que

de 1940 a 1950, encontramos pouquíssimas publicações e assim mesmo todas de modestas

dimensões.

112

Pensamento Teológico

Naqueles anos, estava em curso por toda parte, mas especialmente na França, na Itália e

na Alemanha, uma grande retomada dos estudos sobre a Idade Média. Um dos centros

propulsores desse despertar era exatamente o convento em que Chenu ensinava. Em Le

Saulchoir estavam na época alguns dos melhores medievalistas e tomistas daquele tempo:

Gardeil, Héris, Mandonnet, Roland-Gosselin. Com eles, Chenu empreendeu a renovação do

estudo de são Tomás e dos demais mestres do pensamento medieval. Chenu tornou-se uma

grande celebridade graças aos seus estudos sobre a história da teologia medieval.

Mas o interesse de Chenu não estava voltado apenas para o passado. Sua vocação, como

já vimos, levava-o a se ocupar dos problemas atuais da humanidade. Inclusive seus estudos

históricos eram colocados a serviço dessa causa, pois forneciam-lhe preciosos ensinamentos

de como a teologia deve enfrentar as tarefas que lhe são impostas pela situação presente.

No campo da teologia sistemática Chenu ocupa um lugar na primeira fileira entre os

teólogos do século vinte, por seus estudos sobre a natureza da teologia e, sobretudo, pela

elaboração de uma teologia das realidades terrestres. Ele é considerado um dos teólogos mais

comprometidos de nossa época. Sua vocação é a de interpretar os acontecimentos e problemas

do nosso século à luz do Evangelho. Um dia chegou a declarar: “O acontecimento é o meu

local de trabalho”. E acrencentou que aquilo que mais o apaixona é “a história da salvação na

história humana”.

“Sinais dos tempos” é uma das categorias às quais Chenu deu cidadania em teologia.

Atento na observação dos “sinais” do nosso tempo, ele esteve presente em todos os grandes

acontecimentos que caracterizaram os últimos quarenta anos: da JOC à guerra de libertação,

do movimento missionário à renovação litúrgica, das primeiras tentativas de socialização ao

aparecimento dos novos povos na ribalta da história, dos padres operários ao movimento

ecumênico, dos problemas sacerdotais aos estudos bíblicos, da “nova teologia” ao Concílio

Vaticano II. Do exame de alguns sinais do nosso tempo (comunismo, socialização, trabalho,

etc.) é que saiu a parte mais conspícua de sua empresa teológica: a teologia das realidades

terrestres.

M.-D. Chenu não é um teólogo sistemático: ele não construiu nenhum sistema.

Entretanto, também ele deve sua grandeza como teólogo à descoberta de um modo de leitura

particularmente eficaz e clarificador. O seu não é um modo filosófico (como o de Teilhard de

Chardin, Guardini, Rahner, Tillich), mas sim teológico: é o mistério da encarnação. Tudo

113

aquilo que Chenu produziu, trabalhos, estudos, reflexões tanto teóricas quanto práticas, tudo

desenvolveu em torno deste eixo: a encarnação.

Na construção de Chenu, a parte mais importante e original é a teologia do trabalho.

Chenu inspira-se em uma visão cristã que apresenta muitas afinidades com a de Teilharde de

Chardin. Isso pode ser notado sobretudo nas doutrinas da evolução, da socialização e da

espiritualidade do trabalho.

Procuremos sintetizar o pensamento do nosso teólogo sobre esses pontos tão

importantes, não só para o conhecimento do seu pensamento, mas também para uma melhor

compreensão da verdadeira natureza da teologia.

1- “A teologia funda-se na fé” – Chenu afirma decididamente que “a ciência

teológica não pode nascer e se construir a não ser no âmbito da fé”. A teologia “é um

conhecimento fundado em um testemunho: eu creio na palavra de Deus e é essa palavra

que constitui o objeto da teologia. Portanto, “fora da fé, no sentido mais sobrenatural do

termo, a teologia não tem consistência; literalmente se despedaça”.

2- “A teologia não se resolve na fé” – Chenu defende que a fé é um fator essencial

da teologia, mas não é a teologia. Esta não pode prescindir da fé, mas não se identifica

com ela. A fé é o primeiro acolhimento da palavra de Deus; mas o crente não pode ficar

em uma aceitação passiva, cega, de tal comunicação. A teologia corresponde a esse

esforço de penetração do lado percebido pela fé. Portanto, a fé se desenvolve

espontaneamente na teologia. Fé e teologia, porém, permanecem duas coisas distintas,

como são distintos o dado revelado e a construção teológica.

3- Relações entre dado revelado e construção teológica – Chenu admite a estreita

dependência da teologia à fé. Em tal concepção, há um laço vital entre dado revelado e

construção teológica, pelo qual “a ‘razão’ teológica não encontra apetite e não tem direito

ao seu exercício, a não ser na medida em que, à luz da fé, entra melhor: entra

incessantemente, na posse religiosa do dado revelado, da ‘palavra de Deus’.

4- Algumas características da teologia – Chenu concebe algumas características

da teologia. Ela deve ser bíblica, histórica, científica e, ademais, afetiva (“volitivo, um ato

de vontade”), litúrgica (“na oração, na adoração, na devoção se nasce e vive a teologia”),

mística (“atmosfera sacral e sacra do mistério”. – Diógenes: “o teólogo é um mistagogo”).

5- Pluralismo teológico – Chenu sustenta a legitimidade e mesmo a necessidade

do pluralismo, devido à diferença insuperável que existe entre o dado revelado e a

construção especulativa, mas também justifica o privilégio dado pela Igreja à teologia de

114

são Tomás, afirmando que com efeito, alguns sistemas traduzem o dado revelado melhor

do que outros.

A produção científica de M.-D. Chenu compreende quase quatrocentos escritos, entre os

quais doze livros, sem contar as resenhas literárias.

Esse notável complexo literário pode ser facilmente dividido em duas partes: uma

abrange os escritos de caráter histórico, e a outra os de caráter especulativo. Ao primeiro

grupo pertencem as obras: “Introduction à l’étude de saint Thomas d’Aquin”; La théolgie

comme science ao XIIIe siècle”; “La théologie au XIIe siècle”.

Ao grupode caráter teorético pertencem as obras que asseguraram a Chenu uma posição

de proeminência entre os teólogos do nosso século. Nesse grupo, as obras mais significativas

são: “Pour une théologie du travail”; “La parole de Dieu”, em dois volumes intitulados

respectivamente “La foi dans I’intelligence”, o primeiro, “L’evangille dans le temps”, o

segundo.

Também pertencem ao segundo grupo (de caráter teorético) as seguintes obras: “La

Théologie est-elle une science?”; “Peuple de Dieu dans le monde”.

Um primeiro olahr aos escritos de Chenu pode dar a impressão de haver um certo

dualismo em sua obra: parece que de um lado está o historiador, de outro o teólogo, mas na

realidade há um só e idêntico Chenu; nele, o historiador da Idade Média e o teólogo moderno

constituem uma só coisa. Foi o historiador que ensinou ao teólogo, a distinguir nas coisas,

aquilo que é perene daquilo que é mutável, e que tornou sensível aos sinais dos tempos.

Somente um profundo conhecedor da história da Igreja, da humanidade e da teologia, poderia

delinear as soluções que ele elaborou para os difíceis problemas da natureza e das tarefas da

teologia, das missão da Igreja no momento presente, do valor da matéria, das realidades

terrestres, do trabalho, da socialização e de outros aspectos típicos do nosso tempo.

JURGEN MOLTMANN

Biobibliografia

Nasceu em 18 de abril de 1926 em Hamburgo. Com 17 anos foi convocado pelo

exército alemão. Iniciou seus estudos teológicos no campo de concentração na Inglaterra,

onde foi prisioneiro, indo para Göttingen ficando ali até 1952 onde concluiu o seu curso. De

1953 a 1958 foi Pastor e professor em Bremen,; o qual foi chamado de professor da cátedra

de Teologia Sistemática da Universidade de Bonn. Desde 1957 é professor de Teologia

115

Sistemática na Universidade de Tübingen e em 1967-1968 na “Due University” (Estados

Unidos). É casado e tem quatro filhos. Pertence a paternidade de dois movimentos teológicos:

a teologia da esperança e a teologia da cruz. Sensível às exigências culturais de nossa época, e

sempre obediente antes de mais nada às exigências da Palavra; sua preocupação foi de sempre

fazer a mensagem de Cristo passar primeiro pela faixa das expectativas utópicas e depois das

exigências críticas e contestadoras do homem contemporâneo.

Sua produção teológica é muito vasta, citarei aqui apenas algumas das mais importantes:

Protestantismo e Esperança; Teologia da Esperança; O Deus Crucificado; Trindade e Reino

de Deus; O Caminho de Jesus Cristo; Deus na Criação; Quem é Jesus Cristo para nós hoje?

Pensamento Teológico

Cristologia

O eixo central da reflexão teológica de Moltmann é constituído pela figura de Cristo.

Nos primeiros dois ensaios de sua trilogia propõe uma leitura geral da mensagem cristã a

partir dos dois ministérios principais da vida de Cristo, a crucifixão e a ressurreição ; o

segundo depois que se deu conta das interpretações aberrantes a que ele dera lugar, passou a

analisar mais a teologia da cruz ao invés da esperança. Sendo ela parte de todo o nosso

sofrimento, dos nossos desprazeres e das nossas frustrações. Sendo isso o que o levou à

teologia da cruz que por sua vez o levou a teologia da trindade.

Moltmann interpreta a figura de Cristo em termos escatológicos. Enquanto a Igreja

antiga realizou grave distorção em relação à figura de Cristo e à sua mensagem quando as

interpretou à luz da filosofia grega; na opinião de Moltmann, somente um quadro

escatológico, é o que condiz com a esperança corresponde justamente à história de Cristo e à

sua mensagem. Portanto enquanto a cristologia tradicional está voltada para o passado, a

cristologia de Moltmann está orientada para o futuro; ela fala de Jesus e do seu futuro.

Sem renunciar à perspectiva escatológica, Moltmann efetua uma importante integração,

que enriquece a sua cristologia, dando grande relevo, além do ministério da ressurreição,

também ao mistério da cruz. Porque a ressurreição não diz respeito a um homem qualquer,

mas sim àquele homem que morreu na cruz, Jesus de Nazaré. Ele morreu por nós, par nos

tornar, mortos afim de que sejamos partícipes de sua nova vida de ressurreição e do seu futuro

de vida eterna. Sua ressurreição contém o significado de uma morte na cruz ‘por nós’, porque

o Ressuscitado outro não é que o Crucificado. Nesse ponto Moltmann ressalta um aspecto

muito importante pois assim como a cruz e a ressurreição não podem ser separados na pessoa

116

de Cristo, da mesma forma elas não podem ser dissociadas em nossa vida. Para ressuscitar

com Cristo, devemos participar de sua paixão e de sua crucifixão.

Eclesiologia

Em sua obra mais sistemática Moltmann estuda a Igreja em sua natureza, suas funções,

seus ministérios e suas relações com o mundo e com Reino de Deus. Sendo este ensaio

articulado em sete partes. Na primeira, define a natureza e as funções da eclesiologia, a qual

deve ser entrelaçada de quatro dimensões: cristologia, missionária, ecumênica e política. E a

partir daí Moltman expõe os objetivos a que se propõe esse ensaio, afirmando que quer

promover “uma comunidade eclesial do povo no povo”, uma comunidade de fé, esperança e

fraternidade que se torna fermento de vida para todo o mundo. Enquanto a eclesiologia do

passado, segundo Moltmann, foi elaborada à luz da tradição, dentro de um horizonte estreito,

ele se propõe a elaborar uma eclesiologia à luz da vocação da igreja, que é uma vocação

universal. Quer apresentar uma igreja aberta a todos.

Quanto a difícil questão das relações entre Igreja e Reino de Deus ele propõe uma

solução, Sua tese é que “A Igreja, na força do Espírito, é a antecipação do reino de Deus na

história. Com sua missão e ressurreição, Jesus trouxe o reino de Deus para a história. Como

realidade histórica, a Igreja possui um passado, um presente e um futuro. Esclarecendo suas

relações com o Reino de Deus, Moltmann lançou luz sobre o momento futuro da Igreja. Ao

passado da Igreja pertence antes de mais nada a história de Cristo, que e o fundador da Igreja

pertencendo também a história da Trindade. Já o presente da igreja pertence a história do

Espírito divino, com sua presença vivificante nos meios de salvação e nos ministérios.

Estudando o fundamento da Igreja na pessoa de Cristo, Moltmann desenvolve em síntese toda

a cristologia gerada por Cristo, a Igreja é a continuação de sua presença no mundo, como o

seu fundador ela é uma realidade profética régia sacerdotal, “estaurológica”, eleutérica”,

“doxológica”, “pneumática”, “escatológica”.

Moltmann situa a origem da Igreja na cruz, vive sob o signo da cruz e se solidariza com

aqueles que vivem à sombra da cruz. Da Origem “estaurológica” da Igreja, ele deriva claras

relações da Igreja Especialmente com o mundo político e econômico. Aqui Ela tenderá a

dessacralizar o poder político e democratizá-lo. e difundirá um novo tipo de relações,

marcadas pela liberdade na solidariedade. Baseando na dimensão escatológica de Jesus Cristo,

Moltmann mostra que a Igreja deve ser entendida como prolongamento e continuação de

Cristo, e também como antecipação da pessoa escatológica de Cristo. À Igreja consiste na

117

missão da esperança no mundo, para que o mundo se converta ao futuro de Deus e com tal

conversão se torne livre.

Quanto ao delicado problema da função soteriológica das religiões não-cristãs, o

discurso de Moltmann é que essas relações da Igreja com essas religiões, devem manter um

diálogo, sem nada sacrificar daquilo que as outras religiões e culturas têm de bom, verdadeiro

e belo.

Moltmann vê os sacramentos: a Palavra de Deus, o batismo, a Ceia e a oração, no

movimento e na presença do Espírito Santo. Também se dedica ao estudo dos ministérios e

das funções da Igreja, bem como elabora num texto peneumatológico; depois é forçado a

reconhecer a necessidade de pregadores, presbíteros e diáconos sendo que é a comunidade

que designa para o exercício dessas funções, porém o poder carismática vem de Cristo por

meio do Espirito Santo, da comunidade. E assim Moltman considera essenciais para a

comunidade quatro mandamentos ou ministérios: O de anunciar o Evangelho; de batizar e

celebrar a ceia do Senhor; de presidir as assembléias comunitárias; de exercer uma atividade

diaconal. O Kerygma, a Koinonia e a diakonia.

Moltman estuda as quatro características essenciais da Igreja que é una, santa, católica,

e apostólica, em relação a Jesus Cristo e mediante a força do Espírito Santo. E após esse

estudo faz uma análise das características da Igreja em que além de proposições de fé, e

proposições da esperança, elas também são proposições de ação; as quais induzem a igreja a

agir de maneira unificadora, santificante, evangelizadora, pela libertação do mundo. A

unidade é em primeiro lugar a unidade de Cristo que age sobre seus membros em todos os

tempos e em todos os lugares. A santidade é a santidade daquele Cristo que age sobre os

pecadores. Moltmann usa a mesma argumentação em relação a catolicidade e à

apostolicidade. A Igreja é santa na medida em que é a comunidade dos últimos tempos. O

apostolado da Igreja e os apóstolos também estão indissoluvelmente ligados ao início da era

messiânica.

Moltmann resolve o problema da localização da Igreja afirmando justamente que a

verdadeira Igreja está lá onde Cristo está presente; pois é Cristo quem unifica, santifica e

envia a Igreja e quem a constitui sacramento de reconciliação para todos. O objetivo que

Moltmann propõe em A Igreja na Força do Espírito não é só de atualizar a eclesiologia,

elaborando-a em termos escatológicos, e também o de renovar a própria Igreja. Sobre o

aspecto de estarmos caminhando para uma comunidade mundial, com estruturas políticas

democráticas e supranacionais, Moltmann propõe que se transforme a Igreja de clerical,

ministerial e institucional em Igreja carismática. Mas Moltmann não chega à proposta de uma

118

renovação da Igreja em sentido carismáticos por razões de fidelidade à ortodoxia protestante.

Moltmann defende a tese de que todos os membros da igreja são iguais porque todos estão de

posse dos dons do Espírito Santo, e que o componente ministerial é tão essencial quanto o

carismático, porque o primeiro é a condição necessária e essencial para o exercício do

segundo. Portanto a pretensão de dissociar a Igreja carismática da Igreja Ministerial, além de

antinômica e anti-histórica, é também uma pretensão utópica.

YVES CONGAR

Biobibliografia

Nasceu em 13 de abril de 1904 em Sedan, nas Ardenas. Desde pequeno sentira a

vocação sacerdotal e esta dominicana. Durante seus cursos filosóficos aprofundou no

pensamento Aquiniense. Em 1925 deixou o seminário e fez-se dominicano. Após retomou os

estudos e teve novos professores dentre os quais se destaca Chenu, Paulo Couturie, uns eram

tomistas, outros aderiam ao ecumenismo. Yves Congar foi ordenado sacerdote em 25 de julho

de 1930. Sua vocação pessoal está no estudo da teologia principalmente a eclesiologia e o

ecumenismo. E nesse desejo defendeu uma tese. Foi professor, e em 1937 fundou a célebre

coleção de eclesiologia e ecumenismo “Unam Sanctam”, foi prisioneiro durante cinco anos

pelos alemães devido os seus princípio anti - nazistas. depois da libertação, Congar conheceu

os anos mais fecundos de sua vida e a partir dali escreveu algumas obras, diante da renovação

geral da Igreja, o qual não foi bem recebido pelos teólogos tradicionais devidos as afirmações

acerca desses no mesmo. Portanto como aconteceu com Lubac e chenu, Yves Congar foi

também envolvido na condenação da “nova teologia” e por esse motivo esta obra, foi

impedida de publicar certos assuntos nela contido. Em 1956, a convite do bispo Strasburf faz

uma intensa atividade pastoral: retiros, conferências pregações, mas só se reabilita

completamente no Concílio Vaticano II. Depois foi nomeado pelo papa João XXIII como

consultor da comissão preparatória e depois perito oficial da comissão teológica. E Em 1964,

foi nomeado como mestre de teologia tradicional. Para alguns ele era um mestre, para outros

uma voz profética, mas para todos um modelo sublime de sacerdote católico.

O Fruto do seu trabalho foi tão longo e a sua produção imensa, superando milhares de

escritos. Sendo um deles traduzido em português: “Situação e Tarefas Atuais da Teologia.

1969, Editora Paulinas. Cristãos desunidos, 1937; 3º volume da coleção seria Catolicismo,

119

1938; O mistério do Templo, 1958. “Pode-se definir a Igreja?” 1961; Santa Igreja 1963;

Esboços do mistério da Igreja, 1941; A eclesiologia em devir 1940; A teologia da Igreja

segundo Paulo, 1942.Um povo messiânico 1975; Pontos Fundamentais para uma teologia do

Laicato 1953;Ministérios e comunhão eclesial 1971; Contribuições católicas para o

Ecumenismo 1964. Diversidade e comunhão 1982.

Pensamento Teológico

Congar serviu-se constantemente da filosofia tomista para construir a sua teologia. Para

a cristologia e a teologia trinitária, para a teologia dos sacramentos e da Igreja; para a teologia

da graça; para a teologia moral; bem como para resolver as questões e os problemas do

ecumenismo, as estruturas da Igreja, o laicato, o episcopado, o valor da cultura, o significado

da historia, e afim de resolvê-los ele interroga a Revelação e para responder serve-se da

linguagem de São Tomás.

Segundo Congar, a situação atual exige uma profunda renovação da teologia. No que

diz respeito a consciência da mudança das relações entre igreja e mundo. Pois no passado, a

teologia propunha teses elaboradas, as quais não levavam absolutamente em conta as

realidades humanas nem os fatos concretos da história e da experiência; Porém Congar

concentrou todos os seus esforços nos pontos fundamentais tais como: a teologia da moral, a

teologia das realidades terrestres, a teologia da história, a teologia do laicato, a teologia da

revelação e a teologia ecumênica, afim de atualizar a teologia. A revisão da ética exige que

sejam melhor consideradas, na linha de uma antropologia do ser cristão. O título de homem

cristão é o produto da interiorização e da personalização da moral evangélica. A renovação da

teologia no que diz respeito à temática, e também à metodologia. A metodologia deve mudar

também por parte da Igreja. Portanto é preciso desenvolver na teologia a teologia do Verbo

encarnado, dos sacramentos, da escatologia e também do mistério das três pessoa.

Eclesiologia – Para Yves Congar a eclesiologia constitui o problema número um.

Ocupando assim o centro de suas preocupações teológicas, e através de sua colaboração bem

como a de Lubac e outros, dá-se início a renovação eclesiológica. Os quais procuraram

compreender o mistério da igreja partindo do seu aspecto sacramental, do seu aspecto de

realidade teândrica, humano-divina, do corpo de Cristo. E procurando esclarecê-lo aborda

vários pontos de vista tais como: a Igreja é vista como extensão da vida divina; como

participação na ação mediadora e salvífica de Cristo; como sociedade com determinadas

estruturas.

120

A sua investigação tem como ponto de partida, a distinção entre instituição e comunidade

sendo a primeira a estrutura é dada por Cristo e permanece inalterada, santa, sem mistura de

pecado; e a comunidade é contrário desta. Congar desenvolveu duas teorias eclesiológicas,

propiciou progressos à eclesiologia: na definição das notas da Igreja e na definição das

posições e das tarefas dos membros da Igreja, especialmente dos leigos. Dai procurou

determinar mais precisamente o sentido dessas quatro propriedades afim de chegar a uma

compreensão mais profunda da natureza da Igreja Sendo:

Santidade- é o lugar da presença de Deus neste mundo, o seu templo;

Unidade- Deus é a razão última da unidade da Igreja. Porque há um só Deus é que há

uma só Igreja, una pela própria unidade de Deus, fora da qual ela não existe. Congar conclui

três coisas que se existem e se incluem em um Deus, um Cristo, uma fé, um batismo, uma

Igreja institucional e societária. Catolicidade- Congar lhe dá um sentido, qualitativo e define

como “universalidade dinâmica da unidade”. Apostolicidade assegura a identidade do

ministério atual da Igreja com aquele dos apóstolos, consequentemente, com aquele de Cristo.

A Igreja portanto é um organismo de graça, que daquilo que o Senhor fez por nossa

Salvação, a qual consiste de doutrina, tradição, nos sacramentos, sacerdócio hierárquico,

formando o conteúdo e a matéria da apostolicidade.

A Igreja, Sagrada Escritura e Tradição – O estudo da Igreja levaram Congar a examinar

as relações da Igreja com as Escrituras e a tradição. ele colocou sobre novas bases a questão

das relações. Ele acolhe o princípio protestante do primado da Escritura. Assim, a Igreja e a

tradição aparecem submetidas à Escritura. Depois aceita também o princípio protestante da

sola Escritura, as quais contém todas as verdades necessárias à salvação. Ora, o caráter

soberano da Escritura não a impede de comportar também a Igreja e a tradição. A Escritura

não pode prescindir da Igreja, porque sozinha ela não manifestará inteiramente o seu sentido.

E tão pouco da tradição; sozinha, a Escritura não constitui a palavra e a comunicação.

A Teologia do Laicato – um exame completo da Igreja exige que se estude, de sua

natureza geral, a natureza e as funções de suas partes em particular. E quer elaborar uma

teologia sistemática completa, eis o porque de ter tratado do papado, do episcopado e do

sacerdócio. A primeira tarefa da teologia do laicato é dar uma definição adequada do leigo.

Estes não vivem exclusivamente para as realidades sobrenaturais; tem competência limitada

no que ser refere propriamente eclesiais da vida em Cristo. A função dos tais, é necessária à

missão da Igreja e ao programa da economia da graça.

121

Congar também trata do tema das realidades terrestres tais como: o mundo da cultura,

da ciência, da arte, da política e da técnica. E propõe à concepção tradicional, mostrar que

mesmo havendo necessidade de homens eu se dediquem completamente ao serviço de Deus,

deve ir a ele através das coisas do mundo e da história. É baseado nessa nova concepção das

realidades terrestres que Congar edifica a sua teologia do laicato.

O Ecumenismo – Além dos problemas eclesiológicos referentes a natureza e às

estruturas da Igreja, há outros que se referem a sua história que é o problema da divisão da

Igreja. A qual começou com a separação da Igreja do Oriente, depois com a separação das

Igrejas do Norte; e a partir da questão: Como reconstruir a unidade da Igreja? É que o

ecumenismo se propõe a responder, pretendendo resolver a questão da união das igrejas

mediante o diálogo. Foi através dos seus escritos e múltiplas iniciativas que Congar contribuiu

determinantemente para fazer a Igreja Católica mudar de atitude e induzi-la a ingressar no

movimento ecumênico. Foi fazendo ver as repercussões negativas que as divisões tiveram

sobre o desenvolvimento da mesma na qual desenvolveu ao longo de linhas que a afastaram

sempre mais das outras igrejas, empobreceram-na e a expuseram a novas acusações. Segundo

Congar o objetivo do ecumenismo é fazer coincidir a unidade visível com a unidade invisível.

Como meios concretos para o restabelecimento da unidade visível da Igreja, Congar

recomenda os seguinte: superação dos preconceitos que uns tenham contra outros, retorno Às

Fontes e a uma vida profundamente cristã, integração à Igreja católica dos valores espirituais

presentes nas outras igrejas reforma , diálogo.

HENRI DE LUBAC

Biobibliografia

Nasceu em Cambrai, na França, em 20 de fevereiro de 1896. Foi ordenado sacerdote em

1927. Em 1929, foi lhe confiado ensino de historia das religiões na faculdade teológica de

Lyon-Fourviére bem como aos estudos. Ao qual dedicou De 1929 até a Segunda guerra

mundial. Em 1937, publicou sua primeira obra importante, Catholicisme. Juntamente com o

padre Daniélou, fundou e dirigiu “Sources Chrétiennes”. Tornou-se colaborador da coleção

“Théologie” em 19423 Durante o período de Resistência, soube manter-se fiel às suas tarefas

122

de sacerdote e teólogo, prodigalizou-se pelos seus compatriotas, sem distinção de raça,

religião ou partido. Em 1946, publicou Surnaturel uma obra controvertida que ao mesmo

tempo lhe trouxe fama e grandes desprazeres por parte dos maiores teólogos católicos da

época. Era um tomista. Com a condenação da “nova teologia”, perdeu a cátedra e se retirou

para Terra Santa. Porém continuou com suas investigações e a publicação de suas obras,

retornando ao ensino quando João XXIII manifestou-lhe sinais de estima e amizade.

Participou ativamente dos trabalhos do Concílio Vaticano II, como consultor da comissão

teológica para a preparação do concílio e depois como perito oficial. È membro do Institut de

France, através da Académie des sciences morales et politiques.

Sua bibliografia recente registra vinte e quatro livros e mais de cem artigos. Sendo a sua

produção literária menor do que as de Congar e Rahner. A encíclica Humani Generis 1950;

Corpus Mysticum 1944; História e espírito 1950; Pico della Mirandola 1970; O drama do

humanismo ateu 1944; Uma de suas obras traduzidas em português: A Igreja na Crise

Atual,1972. Editora Paulinas. A Essência do Catolicismo 1924; ; O fundamento das Missões

1946; O pensamento religioso do padre Teilhard Chardim 1962; Asdpectos do Budismo

(I,1951;II,1956); Budismo e Ocidente 1952; Sobrenatural 1946; Agostinismo e teologia

moderna 1965; O mistério do sobrenatural 1965. Algumas obras referem-se à eclesiologia:

Outras tratam do problema do ateísmo ou então a questão das religiões não-cristãs: Cinco

obras referem-se a Teilhar Chardin. Por fim, há também duas coletâneas de pensamentos à

maneira dos Pensées de Pascal:. Seus temas preferidos são: relações entre natural e

sobrenatural, a Igreja, a tradição, o humanismo cristão e as religiões orientais, sendo assim

dedicou diversas monografias a cada um desses temas e proferiu-os nos títulos de suas obras.

Pensamento Teológico

O Método Teológico – Histórico

O método de de Lubac é radicalmente diverso do método tradicional, sendo o método

teológico – histórico. Segundo ele cada vez que se recorre a procedimentos abstratos, não se

conclui nada de concreto. Ele censura o uso do método especulativo por acarretar

conseqüências desastrosas para a teologia. Segundo de Lubac o modo adequado para entender

o mistério é proceder historicamente, porque na realidade histórica é que se concretizam as

realidades divinas, eclesiais e espirituais.

123

Já com relação a Bíblia, ele não interroga como um documento sobre o passado, mas

perscruta as Escrituras para nelas descobrir o pensamento e os desafios de Deus sobre ele.

Assumiu o pesado encargo de reabilitar e reconduzir à corrente viva da teologia

contemporânea a doutrina patrística e escolástica sobre o fim sobrenatural do homem. De

Lubac obviamente, sustenta que as conclusões que ele quer chegar com tal método, mas sim

no sentido de que ele pode nos colocar em contato com a realidade viva da Revelação mais

facilmente do que o método especulativo.

O Objeto da Teologia: o Mistério

O objeto da teologia, reside nos mistérios revelados por Deus. Somente a Relação

cristã permitirá interpretar corretamente seus sinais e a ele mesmo. Com a Revelação

sobrevirá uma ordem superior de verdade que vem agregar-se às verdades descobertas da

razão natural; as características paradoxais do mistério: por um lado, está em conformidade

com as exigências das “profundezas ontológicas” do homem; por outro, encontra-se

absolutamente além de qualquer pretensão.

De Lubac observa que “ os diversos protestantismo eram mais das vezes religiões de

antítese: autoridade ou liberdade? A única resposta adequada consiste então em recorrer à

própria idéia de mistério. Entretanto, o mistério permanece sempre mistério; como de Lubac

gosta de dizer, permanece sempre um “paradoxo”. O que é paradoxo? O paradoxo é

exatamente a busca ou espera da síntese. O paradoxo em toda parte, está na realidade antes de

estar no pensamento. Cada verdade é melhor reconhecida, abrindo uma nova possibilidade ao

paradoxo. Quanto mais a vida se eleva, se enriquece, se interioriza, tanto mais o paradoxo

ganha terreno. A vida mística, então, é o seu triunfo. O âmbito onde o paradoxo reina

incontestável é dos mistérios.

O Ministério do Sobrenatural

Quando de Lubac escreveu Surnaturel, deu assim uma primeira contribuição ao

debate sobre a essência do sobrenatural. apresentando algumas notas históricas que poderiam

facilitar seu entendimento e sua solução. A tese de Lubac é que são Tomás ensina a presença

no homem de um desejo natural pela visão beatífica. A obtenção da ordem sobrenatural

permanece sempre um Dom gratuito de Deus. Em Agostinho e teologia moderna. O padre de

Lubac procura provar a validade de sua concepção do sobrenatural com uma documentação

histórica impressionante e com argumentos teológicos de notável peso. Portanto de Lubac

estuda nos terrenos histórico e teológico se a natureza humana enquanto tal comporta um

124

desejo da visão de Deus, ou não e, se é uma natureza fechada ou aberta. A partir daí não se

contentou em provar a sustentabilidade da concepção unitária do sobrenatural, mas também

indicou os seus limites e perigos.

A doutrina dos dois planos. Serviu para salvaguardar, a liberdade de Deus e a

gratuidade do sobrenatural; e procurar garantir, o caráter misterioso de nossa destinação e,

exprimir o caráter heterogêneo e incomensurável da religião em relação à moral., afirma de

Lubac que Essa teoria levava, por vezes, a fazer do sobrenatural um simples acidente, que se

pode compreender algo superficial. Enquanto que a doutrina da unidade da ordem

sobrenatural – ele ressalta razões desfavoráveis, tais como: a de o risco de não salvaguardar

suficientemente nem a gratuidade da graça nem a liberdade de Deus. E as razões favoráveis

ele coloca a razão histórica.

A seu favor, porém, há também importantes razões de ordem teológica. A primeira é

que a doutrina da unidade evita colocar o apelo ao sobrenatural e a oferta da graça em ordem

cronológica e a Segunda é que a concepção unitária barra caminho a todo dualismo

propriamente dito, rejeitando a idéia de uma beatitude natural fechada e estática; O que de

Lubac na concepção unitária conclui que o sobrenatural, longe de ser um desenvolvimento

lógico espontâneo do natural, é um Dom divino que exige a morte da tendência do natural a

fechar-se em si mesmo. E somente através da revelação que o homem toma consciência do

desejo da visão beatífica e é só mediante uma conversão propiciada pela graça divina que ele

o segue.

De Lubac examina a tese desenvolvida por Feuerbach, Comte e Nietzsche e

compreende que o ateísmo impele a humanidade para longe de Deus, e “a obriga assim a

entrar nos caminhos de uma dupla escravidão, social e espiritual”; e chega a uma conclusão,

que o humanismo não pode adquirir valor efetivo fora de Deus, porque só ele pode dar-lhe

dignidade e valor autêntico. O humanismo cristão dever ser um humanismo convertido pois o

verdadeiro humanismo torna-se hipocrisia e contrafação da dignidade individual. O

humanismo autêntico exige o cristianismo e o cristianismo implica um verdadeiro

humanismo.

O humanismo ateu foi incapaz de resolver o problema do homem, e da história, o

cristianismo ao Contrario das religiões orientais e pagãs, dá valor histórico aos seus próprios

fundamentos. Enquanto na concepção oriental e pagã o desenrolar dos tempos não passa de

um devir sem substância , no cristianismo, ao contrário, a duração é algo muito real. Não uma

dispersão estéril, mas uma densidade ontológica e uma fecundidade. Há uma gênese. Uma

criação mantida e continuada. Pois a raça humana inteira é sustentada pelas mãos de Deus, o

125

verbo e o Espírito, os quais nunca abandonaram completamente, encaminha-se em direção ao

seu Pai. A vontade divina, que tudo guia, a conduz infalivelmente ao porto.

Eclesiologia

De Lubac se aplica e dá uma contribuição válida ao aprofundamento atualmente ao

mistério da Igreja centro de sua reflexão teológica, mas também o centro dos seus afetos. A

primeira é que aos erros do passado, recentemente se acrescentaram outros erros, razão pela

qual aparece que a igreja funda-se em princípios humanos. A Segunda é o movimento

ecumênico, cujo objetivo é restabelecer a unidade da Igreja. do mistério da Igreja; onde

através de suas obras ele ilustra sobretudo os aspectos social, histórico, teândrico, místico e

sacramental da Igreja, que é o corpo de Cristo é aquela sociedade fortemente hierarquizada e

disciplinada, sendo ela o sacramento de Cristo. E sua função sacramental abrange o homem se

estende a todo o universo, espiritualizado pelo homem e o homem consagrado pela Igreja; ela

não rejeita nada do que existe de bom no homem e nas coisas.

O mistério da Devido a esse vivo amor, enquanto outros teólogos tratam deste ou

daquele aspecto da Igreja de modo perspícuo, Lubac tratou de maneira singular da sua

maternidade. Contra protestos, as críticas, das religiões que surgiram contra a Igreja, Lubac

repetiu para ela as mesmas expressões de amor que fará descobrir nela, com muita veracidade,

as forças escondidas, as atividades silenciosas, que lhe dão uma perpétua juventude; acontece

agora de ela ser abandonada e escarnecida por aqueles que tanto receberam dela, bem como

por aqueles que ela continua a nutrir tornados cegos em relação a esses dons.

A Exegese

Depois do sobrenatural e da Igreja, o terceiro problema teológico ao qual de Lubac

prestou maior atenção foi a exegese da Sagrada Escritura. Em que a teologia é essencialmente

exegese do texto sacro. O que de Lubac quer provar é que essa identificação não foi fortuita,

mas necessária, porque exegese e teologia são a mesma coisa. A exegese é teologia própria e

verdadeira. Dado que a exegese se identifica com a teologia, a renovação desta exige a

renovação daquela. Isso é o que de Lubac quer provar com seus estudos de exegese. Ele

sustenta que o esplendor da grande teologia medieval teve três causas: a exegese, a mística e a

escolástica. A decadência da teologia foi conseqüência da decadência da exegese, da mística e

da escolástica. Por isso, a teologia só poderá readquirir seu antigo prestígio com a renovação

daquelas três matizes. De Lubac serve-se da história desenvolve uma tese notável ao tratar da

126

exegese medieval ,e que nada mais é do que um corolário de sua concepção do sobrenatural, é

relativa à subordinação da letra e da filosofia à teologia na Idade Média.

Bibliografia

MONDIM, Batista 1926, os grandes teólogos do século XX, São Paulo, Edições Paulinas

1979.

GIBELINE, Rosino. Teologia do século XX, Edições Loyola.

REALE, Anti Seri. Coleção História da Filosofia. (v.3).

Teologia Contemporânea na Europa

As agitações sociopolíticas, meado do século XX, foram sentidas intensamente na

Europa – berço da grande parte da filosofia e teologia otimista do século XIX.

O continente europeu sonhava que sob sua liderança, a humanidade despertaria para

uma Nova Era. Achava que suas investidas coloniais era uma iniciativa altruísta visando ao

bem do mundo. Nesta ilusão o protestantismo se envolveu mais do que o catolicismo, pois

este – catolicismo – reagiria ao mundo moderno com uma atitude de condenação

indiscriminada, enquanto o liberalismo protestante havia capitulado ante a nova era. Com o

estouro das duas guerras e seus desdobramentos que vieram desmentir os sonhos do século

XIX, o liberalismo protestante sofreu um grande abalo. O secularismo e o ceticismo na França

tornaram-se comuns durante o século XIX, em parte, por causa da reação do catolicismo ao

mundo moderno, já no século XX em razão do fracasso do liberalismo. No meado desse

século XX a Europa setentrional já não era mais o reduto protestante.

Com o romper da guerra mundial, 1914, os líderes cristãos, pelo menos muitos deles,

tinham consciência da tensão na Europa; em conseqüência, procuravam as relações

internacionais das Igrejas para evitar a guerra; essa tentativa não teve sucesso, logo alguns

desses cristãos preferiram fazer da Igreja um instrumento de reconciliação do que ser levados

por impulsos nacionalistas.

O liberalismo nesse momento nada podia fazer, portanto, o protestantismo foi o que se

preocupou em fazer uma teologia que respondesse a esses acontecimentos.

A teologia mais significativa para as respostas aos desafios da época foi o de Karl

Barth.

127

Enquanto se desenvolvia a teologia de Barth, na Alemanha Hitler e o nazismo

assediam ao poder. Em 1933, o Vaticano e o terceiro Reich assinaram uma concordata. O

protestantismo liberal nada podia fazer frente a esse desafio. Surgiu inclusive o partido dos

“cristãos alemães”. Esse grupo apoiava as mediadas de Hitler; em conseqüência de tais

atitudes alguns líderes cristãos reuniram-se em oposição ás medidas hitlinianas em nome do

evangelho (sínodo do testemunho).

Todos se recusaram apoiar Hitler foram presos. Outros, como os partores foram

recrutados pelo exército para a batalha.

Bonhoeffer foi o que mais teve problemas em oposição a Hitler.

Após a guerra vamos ter imensas territórios europeus submissas ao domínio soviético.

Mesmo a doutrina marxista tendo o cristianismo como inimigo, outros tinham a fé

religiosa como uma questão do passado, ou seja, logo desapareceria. Na antiga

Checoslováquia e na Hungria, manteve-se o apoio ás Igrejas. Já na ex-Alemanha Oriental, os

cristãos foram submissos á limitações civis, não podiam exercer posições significativas nos

estados.

Em outros lugares da Europa ocorriam um diálogo intenso entre marxistas e cristãos.

Desse diálogo temos Bloch, filósofo marxista que dá uma certa contribuição em sua

reinterpretação das doutrinas bíblicas considerando ter elas valor positivo. Para ele esse valor

encontra-se na mensagem da esperança. Tanto esta quanto outras idéias de revisionistas,

trouxeram contribuições significativas para a teologia protestante no século XX. Nessa

dimensão da esperança vamos ter Moltmann, entendendo essa esperança não como

individualista, mas como a esperança de uma nova ordem. Assim a teologia da esperança,

leva os fiéis a se unirem às lutas que apontam para o futuro de Deus: contra a pobreza e a

opressão.

Apesar do secularismo ter se estalado fortemente em muitas regiões européias, o

protestantismo não se tornou inerte. Apesar de ter se reduzido, permaneceu ativo na

sociedade.

História da Teologia Contemporânea na Europa, um Esboço

Pretende-se com abordar ritmos e desenvolvimentos da teologia européia

contemporânea, destacando sua formação a partir da Ortodoxia, do Pietismo e da Ilustração.

Percorrendo o século longo (XIX), notar-se-á como se oRganiza entre a revolução e a

restauração. E sobre as correntes e discursos da teologia deste século, o acento recai sobre

128

Liberalismo Teológico ou Protestantismo cultural. Por último, sobre a teologia do século XX,

nos seus movimentos e caminhos, destacamos a relação entre Igreja e teologia desde a I

Guerra Mundial às expressões em seu curso.

I. Ritmos e Desenvolvimentos da Teologia Européia: Ortodoxia, Pietismo e Ilustração;

Num primeiro momento, pretende-se relacionar as elaborações teológicas ortodoxos,

pietistas e ilustrados com as demandas da Modernidade.

Pietismo e Ilustração são as duas faces de uma mesma moeda, cunhada para um novo

período da história do cristianismo no Ocidente, a Modernidade, constituídas de numerosos

indicadores religiosos, políticos, sociais e intelectuais, sinalizando um novo espírito25.

Os pietistas surgiram no século XVII e explodiram como movimento no século XIX.

Acentuava-se a individualização e acelerava-se a internacionalização da vida religiosa,

desenvolvendo novas formas de piedade pessoal e de vida em sociedade e provocando

mudanças na teologia e na Igreja.

De caráter transconfessional, lutava por uma teologia experiencial contra a teologia

cognitiva da ortodoxia. Preocupava-se com o homem interior e sua santificação. A doutrina

fora reformada, era preciso continuar a Reforma e reforma a vida. Daí decorrem uma ética

individualista e subjetiva da qual dependia a renovação da sociedade e um caráter separatista,

com o conceito de Igreja como associação de regenerados e renovas que formariam a

“eclesiologia eclesiae”.

Com o tempo, porém, torna-se-ia clara a relação entre o pietismo e as raízes do

Racionalismo. E para Dreher, “lutando contra o que designava de deturpação do verdadeiro

cristianismo, o pietismo foi o maior dos preparadores da modernidade”. (p.122)

O teólogo alemão Schleiermacher, denominado de “pai do “protestantismo Liberal”,

baseou sua teologia no “sentimento de dependência absoluta”, acento herdado do Pietismo.26

Deve-se observar que o mundo católico-romano viveu a influência deste sentimento

pietista com o culto ao “Sagrado Coração de Jesus” de grande expressão na América Latina

Analisando o desenvolvimento da Teologia Protestante desde a Reforma, Paul Tillich

27 examinou as várias correntes e discursos considerando a Ortodoxia como grande teologia

ou “escolástica protestante”. Refere-se assim à maneira como a Reforma estabeleceu-se

enquanto forma eclesiástica de vida e pensamento, depois que o movimento dinâmico dos

25 DREHER, Martin. A Igreja latino-americana no contexto atual.São Leopoldo, Sinodal, 1999. 26 DREHER, Martin. A Igreja latino-americana no contexto atual, p.122. 27 TILLICH, Paul. História do Pensamento Cristão. São Paulo, ASTE, 2000, p. 272.

129

reformadores terminou. E a sistematização e a consolidação das idéias desenvolvidas em

contraste com a Contra Reforma.

Os desenvolvimentos posteriores tais como a teologia liberal ou a teologia do

evangelho social, partiram dos fundamentos da ortodoxia ou para combatê-la ou na intenção

de restaurá-la.

A Ilustração funcionou como eco e acentuação de muitas ênfases pietistas: orientação

para o futuro, cristianismo não dogmático, centralidade da experiência, leitura histórica da

Bíblia.

Na economia, o desenvolvimento das cidades incentivava a reflexão pragmática e

racional. A experiência prática era acentuada possibilitava o avanço da ciência e de tecnologia

frente a natureza. – As conseqüências políticas e sociais eram imediatas. Em um clima de

liberdade crescente, o homem autônomo frente ao sobrenatural, caminhava livre orientado

pela razão.

A Filosofia deixava de ser “serva da Teologia” para fundamentar-se autonomamente

sobre o empirismo e os princípios racionais. Da Holanda escoava o som do autoconhecimento

na forma do “cogito ergo sum” de René Descartes. Da Inglaterra aparecia novos modelos de

relacionamento entre Deus e liberdade moral com o deísmo. E no diálogo entre razão e

revelação, a Bíblia era submetida á crítica histórica, o mistério e o milagre do cristianismo

eram contrastados com a rigidez da argumentação empirista. As verdades metafísicas e

teológicas eram expostas ao teste da experiência. Da França, a luta por direitos humanos e

liberdade de opinião eclodia da inimizade entre religião e ilustração. Voltaire rivalizava com

os novos pensadores e afirmava: “Se Deus não existisse, seria necessário inventá-lo”. O

racionalismo imprimia um estado de otimismo no progresso e na educação em direção ao

mundo perfeito.

Na Alemanha, Pietismo e Ilustração surgiram simultaneamente e a relação entre

revelação e razão não está prenhe de tensões e de oposições como no restante da Europa. Os

ataques do Pietismo, a Ortodoxia prepararam o caminho par as sugestões práticas de reforma

que seriam feitas pelas Ilustrações. O Cristianismo chegaria do limiar da ética e da moralidade

os princípios básicos da Reforma, Cristo, fé, graça e Escritura tinham o seu fim.

A Teologia Católico-Romana pouco se abriu à Ilustração que era considerada como

destruição do Cristianismo e da Religião. A Igreja de Roma experimentou retrocessos na

influência política e teológica, no auge da crise provocada pela ilustração. Todavia, no seio do

povo, a piedade tradicional continuava presente.

130

II. O Século longo, revolução e restauração

A designação “século longo” é uma convenção tanto na História quanto na Teologia

para o século XIX. 28 Inicia-se com a Revolução Francesa em 1789 e com a publicação de

“Sobre a RELIGIÃO: discursos dirigidos a seus cultos depreciadores” de Friedrich D.

Schleiermacher. Concluiu-se com a Primeira Guerra Mundial, em 1914 e a obra publicada por

Karl Barth, “Comentário aos Romanos” de 1919. Estas duas datas assinalam acontecimentos

decisivos para a cultura Ocidental e são acompanhadas na da Igreja e da Teologia pelas obras

destes teólogos protestantes.

Na da Teologia, o século XIX é formado por uma série de movimentos teológicos

decisivos, apologéticos e reacionários. A Revolução Francesa e a Revolução Industrial

acompanharam a Ilustração na função de elaborar perguntas e desafios à Revelação bíblica.

As questões sociais oriundas das revoluções problematizaram a importância da Igreja para a

sociedade e a cultura.

Enquanto o catolicismo trancava todas as portas e janelas aos ataques da Modernidade,

o mundo protestante preocupava-se com a essência do cristianismo e desenvolvia uma

teologia apologética.

Todo o século XIX está entre revolução e restauração. As conseqüências violentas da

Revolução Francesa levaram à reações contrárias que não pretendia exterminar a Igreja, mas,

adequá-la á razão do Estado.

Uma nova leitura da história foi legada ás gerações posteriores com o advento do

historicismo que via os fatos a partir do seu desenvolvimento histórico. A Igreja passou a ser

entendida como fenômeno cultural e não mais como mediadora da revelação.

III. A Teologia do Século XIX, Correntes e Discursos

1. Liberalismo ou Protestantismo Cultural.

Principalmente na Alemanha, ao longo do séc XIX, variantes da Ortadoxia, Pietismo e

Ilustração competiram com uma nova corrente que se convencionou chamar de liberalismo

(ou Protestantismo Cultural).

A figura teológica dominante foi Scheleimacher. Descendia de Teólogos reformadores

e calvinistas e foi influenciado pelo pietismo do conde Zinzendorf. Apologista, procurou

28 DREHER, Martin. A Igreja latino-americana no contexto atual, p.138.

131

(defender) apresentar a verdade do Evangelho de modo compreensível aos seus

contemporâneos. Ao invés de Acentuar a liberdade, falou acerca da “dependência humana”.

A voz isolada de Shceermacher encontrou ego nas vozes do que se chama de

Reavivamento. Movimento religioso trasconfessional, pluriforme e multifacelado.

Impulsionados pelo pietismo e rivilizadando contra a Ilustração concretizavam-se reações a

mudanças na vida eclesial e da sociedade, afirmando-se contra o liberalismo teológico. Na

Inglaterra, o reavivamento alcançou seu auge no metodismo.

Para entender as correntes teológicas do Protestantismo do século XIX ainda se torna

essencial lembrar da influência do sistema filósofo Hegeliano.

W. Friedrich Hegel, destaca-se no Idealismo alemão pela elaboração de um sistema de

pensamento a partir do qual poderia compreender toda a história e realidade. A vida passava a

ser vista como um processo dialético. Tudo o que é real é racional e tudo que é racional é real.

O conhecimento do todo seria alcançado pela parte numa evolução até o cumprimento. A

verdade é o todo”.29 Uma tese levaria a uma antítese eu culminaria na síntese.

Para os teólogos, o desafio seria aplicar este sistema ao problema da tradicéia e da

superação do abismo existente entre razão e revelação. A relação entre fé e história tornava-se

dificultada com os resultados das pesquisas científicas empíricas.

A Teologia Liberal tem suas raízes na Ilustração. No século XIX, porém, ela centrou-

se na temática de fé e história. Como garantir a continuidade do Cristianismo frente diante da

afirmação das bases racionalistas e empiristas da modernidade? Deus não poderia ser

estudado pelo microscópio ou observado pelo telescópio. Os estudos históricos formaram as

bases nas quais os teólogos liberais concentraram-se para responder a perguntas e desafios dos

seus contemporâneos e da vida de seu tempo.

Com os estudos histórico-críticos da figura de Jesus e do Novo Testamento, a fé cristã

foi reduzida à mensagem do Cristo sobre o reino de um Deus do amor. Jesus era um fanático

religioso que esperava pelo fim iminente do humano, esta visão do estudo historicistas da

Bíblia levou à destruição da Teologia Liberal.

Abbrecht Ritschl, Adolg von Harnack e Ernest Troeltsch são precursors do movimento

liberal na teologia do século XIX. Sob a influência de Kant e Scheiermacher, compreendia-se

o cristianismo como um fato histórico mediado pela experiência pessoal do crer. “O histórico

mediado pela experiência pessoal do crer. “O Novo Testamento da testemunho a respeito da

29 DREHER, Martin. A Igreja latino-americana no contexto atual. p. 151.

132

revelação que Jesus fez do Reino de Deus, como sendo o alvo ético de todo o gênero humano.

Jesus é o arquétipo da humanidade reconciliada com o Reino de Deus”.30

A redenção pessoal e a formação de comunidade no Reino de Deus são conseqüência

da transformação e do retorno da vontade humana à vontade de Deus. Temas clássicos da

dogmática como pecado, juízo, ira de Deus, trindade e cristologia, expressões dos credos e

confissões são cascas que encobrem o cerne do Evangelho.

O liberal cria e defendia um cristianismo não dogmático; um Deus sem ira, um homem

sem pecado e um Cristo sem Cruz. O esforço pela recuperação do pensamento da Igreja

Antiga acompanhava uma proposta maior de se viver a religião de Jesus, o Reino do Amor de

Deus em oposição à religião sobre Jesus que é doutrinária e apresenta um ser preexistente que

expia vicariamente o pecado. “O cerne do cristianismo está envolto em lixo metafísico,”31 A

casca helenista trás do dogma cristão.

A intenção era apresentar a essência do cristianismo como resposta as demandas do

pensamento moderno. E a mensagem cristã seria plausível se reduzisse a fé à paternidade de

Deus, à fraternidade do gênero humano e o valor infinito da alma humana. Tudo isso num

otimismo confiante progresso.

Na relação entre cristianismo e cultura, revelação e história, liberdade pessoal e

condicionamento historicizava-se tudo e qualquer pensamento, tudo o que existia persistia em

condições históricas. A Teologia teria que repensar e reiniciar sua reflexão.

IV. A Teologia do Século XX: movimentos e caminhos32.

Enquanto o século XIX assistiu ao rompimento definitivo entre o secular e o sagrado,

o Estado e a Igreja, instaurava-se um quadro de exclusão do negro, do índio, da mulher, do

operário, em direção aos quais a teologia produzida a partir da Segunda Guerra Mundial

deveria caminhar.

1. Igreja e Teologia desde a Primeira Grande Guerra.

30 DREHER, Martin. A Igreja latino-americana no contexto atual. p. 153. 31 Id., ibid., p. 154. 32 GONZÁLEZ, L. Justo. A Era Inconclusão. Editora Vida Nova; Edição – 1996. São Paulo,

SP/MONDIM, Batista. Os Grandes Teólogos do Século Vinte. Edições Paulinas. São Paulo. 1979.

133

A primeira das Grandes Guerras Mundiais afetou globalmente a vida européia. Diante

do caos instaurado, o otimismo da Teologia liberal era inaceitável para o jovem geração de

teólogos.

As novas possibilidades na teologia tiveram prelúdio na obra de Rudolf Otto “A idéia

do Sagrado” que apresentava uma nova compreensão de Deus, não mais como extensão da

humanidade, mas, como o “totalmente outro”. A partir deste início, a teologia da Reforma,

começava a ser relida.

Enquanto isso, a Igreja, ainda envolvida por uma ideologia que ligava o trono ao altar,

dividia-se entre a defesa do nacionalismo e o combate mortal ao mesmo.

2. Sociedade e Teologia no entre-guerras Renascença luterana. Quando Lutero foi descoberto, descobriu-se também o sentido

que o mesmo tinha a respeito de Deus. Isso despertou um novo olhar no reformador. Foi a

partir de Lutero que começa brotar todos os movimentos.

Realismo bíblico. Esse movimento surgiu em reação à escola ritschiniana. Assim

como Lutero, esse realismo bíblico adequava-se melhor à natureza humana.

Crítica radical. Esta crítica histórica minava os pressupostos de toda a teologia liberal

e de Harnack. Essa crítica histórica começou no Antigo Testamento e no Novo Testamento

com uma radicalidade mais profunda.

Falando um pouco de Rudolf, Bultmann, ele procurou combinar a pesquisa histórica

com certa tentativa de sistematização. Chamava-a de “demitologização”. Segundo ele a

mensagem bíblica devia se libertar da linguagem mitológica.

O método da história das religiões. Como principal crítica do ponto de vista da história

das religiões temos Hermann Gunkel. Esse movimento se encarregou de ser um método de

análise dos conteúdos dos escritos bíblicos. Procura descobrir até que ponto o antigo

Testamento e o Novo dependiam do simbolismo de outras religiões.

Ernst Troeltsch. Homem de grande visão histórica, preocupava-se com o sentido da

religião no contexto do espírito humano ou da estrutura mental humana. Criticou o livro de

Harnack – o que é cristianismo -, e se opôs á idéia de que o protestantismo acabara com o

mundo medieval. A sua filosofia da história baseia-se em uma atitude negativa diante do que

chama de “historicismo”.

Socialismo religioso. Esse movimento é a tentativa de superação das limitações do

esforço de Troeltsch de ir além do historicismo. Aqui Deus se relaciona com o universo, onde

este inclui a natureza, a história e a responsabilidade. Nesse movimento o amor de Deus

134

estava no mundo. Possuía uma idéia de teonomia, ou seja, o alvo desse movimento socialista

religioso era o estado teônomo da sociedade.

Karl Barth. Apesar de ter vindo desse movimento socialista religioso, ele não se uniu

ao mesmo. Via neste o abuso do socialismo religioso pelo nacionalismo religioso,

identificando a mensagem cristã com determinada idéia política ou social. Barth acabou com

a tentativa de qualquer relacionamento entre a teologia e o movimento trabalhista

revolucionário na Alemanha. Contudo, contribui para a salvação do protestantismo da

devastação e das matanças do nazismo neocoletivista e pagão.

Para Bart, Deus não é objeto do nosso conhecimento ou ação. Em sua primeira fase de

sua carreira, ele identificava a revelação com a mensagem cristã, e negava o caráter

revelatório de tudo que não fosse mensagem.

Bart não se distanciou apenas do socialismo religioso, mas também, por algum tempo,

do lado político do poder de Hitler. Aceitava-o. Mas, logo após, Bart se tornou o líder da

resistência intraeclesiástica ao nacional-socialismo. Finalmente, reconheceu o que havia

negado, que o movimento encabeçado por Hitler era quase-religioso e apresentava sério

ataque contra o cristianismo.

Bart se tornou neutro concernente, à causa de Cristo ser identificada com a causa do

Ocidente. Em razão, recebeu muitas críticas.

Existencialismo. Tem percebido elementos no homem em contraste com a filosofia da

consciência voltada para as decisões conscientes do homem e para sua vontade. A descoberta

do inconsciente humano foi importantíssima para a teologia. Esse existencialismo juntou-se à

análise freudiana do inconsciente. Consegui mudar os tipos moralistas e idealistas. Trouxe

para o centro do pensamento teológico a questão da condição humana.

3. Reações no Protestantismo

As agitações sociopolíticas, meado do século XX, foram sentidas intensamente na

Europa – berço da grande parte da filosofia e teologia otimista do século XIX.

O continente europeu sonhava que sob sua liderança, a humanidade despertaria para

uma Nova Era. Achava que suas investidas coloniais era uma iniciativa altruísta visando ao

bem do mundo. Nesta ilusão o protestantismo se envolveu mais do que o catolicismo, pois

este – catolicismo – reagiria ao mundo moderno com uma atitude de condenação

indiscriminada, enquanto o liberalismo protestante havia capitulado ante a nova era. Com o

estouro das duas guerras e seus desdobramentos que vieram desmentir os sonhos do século

XIX, o liberalismo protestante sofreu um grande abalo. O secularismo e o ceticismo na França

135

tornaram-se comuns durante o século XIX, em parte, por causa da reação do catolicismo ao

mundo moderno, já no século XX em razão do fracasso do liberalismo. No meado desse

século XX a Europa setentrional já não era mais o reduto protestante.

Com o romper da guerra mundial, 1914, os líderes cristãos, pelo menos muitos deles,

tinham consciência da tensão na Europa; em conseqüência, procuravam as relações

internacionais das Igrejas para evitar a guerra; essa tentativa não teve sucesso, logo alguns

desses cristãos preferiram fazer da Igreja um instrumento de reconciliação do que ser levados

por impulsos nacionalistas.

O liberalismo nesse momento nada podia fazer, portanto, o protestantismo foi o que se

preocupou em fazer uma teologia que respondesse a esses acontecimentos.

A teologia mais significativa para as respostas aos desafios da época foi o de Karl

Barth.

Enquanto se desenvolvia a teologia de Barth, na Alemanha Hitler e o nazismo

assediam ao poder. Em 1933, o Vaticano e o terceiro Reich assinaram uma concordata. O

protestantismo liberal nada podia fazer frente a esse desafio. Surgiu inclusive o partido dos

“cristãos alemães”. Esse grupo apoiava as mediadas de Hitler; em conseqüência de tais

atitudes alguns líderes cristãos reuniram-se em oposição ás medidas hitlinianas em nome do

evangelho (sínodo do testemunho).

Todos se recusaram apoiar Hitler foram presos. Outros, como os partores foram

recrutados pelo exército para a batalha.

Bonhoeffer foi o que mais teve problemas em oposição a Hitler.

Após a guerra vamos ter imensas territórios europeus submissas ao domínio soviético.

Mesmo a doutrina marxista tendo o cristianismo como inimigo, outros tinham a fé

religiosa como uma questão do passado, ou seja, logo desapareceria. Na antiga

Checoslováquia e na Hungria, manteve-se o apoio ás Igrejas. Já na ex-Alemanha Oriental, os

cristãos foram submissos á limitações civis, não podiam exercer posições significativas nos

estados.

Em outros lugares da Europa ocorriam um diálogo intenso entre marxistas e cristãos.

Desse diálogo temos Bloch, filósofo marxista que dá uma certa contribuição em sua

reinterpretação das doutrinas bíblicas considerando ter elas valor positivo. Para ele esse valor

encontra-se na mensagem da esperança. Tanto esta quanto outras idéias de revisionistas,

trouxeram contribuições significativas para a teologia protestante no século XX. Nessa

dimensão da esperança vamos ter Moltmann, entendendo essa esperança não como

individualista, mas como a esperança de uma nova ordem. Assim a teologia da esperança,

136

leva os fiéis a se unirem às lutas que apontam para o futuro de Deus: contra a pobreza e a

opressão.

Apesar do secularismo ter se estalado fortemente em muitas regiões européias, o

protestantismo não se tornou inerte. Apesar de ter se reduzido, permaneceu ativo na

sociedade.

4. Reações no Catolicismo

Apesar de afirmações pessimistas quanto a teologia do século passado, é possível vê-la

como o início de um novo despertar, de uma renovação, a partir de causas determinantes para

esse alvorecer. Segundo os historiadores, o surgimento das filosofias agnósticos e ateístas, que

obrigavam a teologia a buscar bases filosóficas mais seguras; a consolidação da estrutura da

Igreja e da autoridade, do papado através do Concílio Vaticano I: os pontíficos na cooperação

com o progresso teológico; a restauração tomista, que diminui o teólogo católico de uma base

filosófica; o retorno às fontes bíblicas e patrísticas, que infundiram na teologia um novo vigor;

o incremento da atividade missionária, que fez surgir o ramo teológico de missiologia; e o

desenvolvimento de questões sociais, que dos quais surgem novos problemas teológicos, a

teologia, mais também, trazer algumas características como: atitude polêmica em relação à

cultura profana, a conformidade ao magistério eclesiástico, a estrutura tomista e seus

fundamentos patrísticos.

Essa teologia do século XIX não produziu um discurso polêmico com os cristãos e sim

com os expoentes da cultura profana.

Diante de tais reações podemos perceber o avanço da teologia do século XX.

O retorno aos pobres é uma das mais importantes características da teologia desse

século, os seus motivos estavam em uma dimensão filosófica. Encontra-se na razão última de

avaliação do seu pensamento como fonte essencial da teologia cristã.

Outro elemento que contribui para renovação a teologia contemporânea foi o estudo da

Sagrada Escritura. Esse estudo tornou-se importante, quando os erros exegéticos bíblicos

estavam ameaçando os próprios fundamentos do cristianismo.

O terceiro elemento foi o movimento litúrgico.

Todos essas movimentos (renascimento tomista, bíblico e patrístico e litúrgico)

penetraram profundamente na teologia contemporânea, elevando-a ao renascimento.

Os primeiros momentos da nova teologia se deu após a Segunda Guerra Mundial.

Durante algum tempo esses “novos teólogos” foram vistos com simpatia, mas logo começou

137

os conflitos com os teólogos tradicionais a partir do artigo de Danielou, acusando-o de

desvalorizar a teologia sistemática, e daí se prosseguiu.

V. Movimentos e Caminhos da Teologia na Europa do Século XX.

No percurso da teologia da Europa no século XX, Rosino Gibellini33 apresenta três

movimentos numa possível reconstrução de seus caminhos.

O primeiro se afirma com a teologia Dialética relacionada diretamente com a teologia

da palavra de Barth, encontrando correspondência formal com o tema da Palavra.

O segundo movimento, caracterizado como reviravolta antropológica na teologia,

exprime-se com a teologia existencial de Bultmann, hermenêutica de Fuchs e de Ebeling, da

cultura de Tillich e transcendental de Rahner. Tem-se assim início a uma maneira de fazer

teologia atenta à historicidade do sujeito, às perguntas existenciais, à estrutura apriórica do

espírito-no-mundo, ao ouvinte da palavra.

Nos anos 60, no debate em torno do cristianismo-modernidade e secularização, aberto

por Bonhoeffer e Gogarten vai surgindo um terceiro movimento, que leva a teologia a assumir

uma consciência política. Isto se dá com as teologias da esperança, política e libertação (em

suas primeiras formas).

BONHOEFFER, DIETRICH

Biobibliografia

Um tema básico da teologia de Bonhoeffer era como manter a fé num mundo sem

religião. Engajado contra o nazismo, combateu Hitler com palavras e ações. Dietrich

Bonhoeffer nasceu em Breslau, Prússia (depois Wroclaw, na Polônia), a 04 de fevereiro de

1906. Educado em Tubigem e Berlim, tornou-se pastor luterano e trabalhou em Barcelona e

Nova York. Em 1931, assumiu a cátedra de Teologia Sistemática na Universidade de Berlim.

Quando Hitler subiu ao poder em 1933, Bonhoeffer estava em Londres e decidiu lutar

contra o nazismo. Em 1935 foi chamado à assumir a direção de um seminário clandestino em

Finkenwald, na Pomerânia. O problema central de sua teologia era como ser cristão num

33 GIBELLINI, 521-22

138

mundo secularizado e ateu. Propunha como ma das soluções a interpretação não religiosa dos

conceitos bíblicos, o que sugeria possibilidade de haver cristãos arreligiosos.

Retomando o pensamento de Karl Barth, de quem se considerava discípulo dizia que

os valores sempre relacionados com o evangelho eram agora entendidos como puramente

profanos. Para ele, os cristãos deveriam reconhecer que o mundo passara da adolescência para

maturidade, e que, em vez de se insistirem retorno as bases religiosas do passado, dever-se-ia

tentar uma nova interpretação do historia intelectual do ocidente, a partir do século XIII.

Bonhoeffer introduziu elementos importantes para o movimento teológico da “morte

de Deus”, desenvolvido sobretudo nos Estados Unidos. Como Deus foi imposto pelo

cristianismo às artes, à política e à cultura em geral, a festa comprometida e mimada na

medida em que o mundo se transforma e se torna autônomo. Entretanto, ao aprovar a

secularização e o afastamento de Deus por motivos teológicos, Bonhoeffer condenava a idéia

da religião como salva-vidas. Entre outras obras, escreveu Sanctorom Communio, Eine

Dogmatisch, Untrsuchung Zur, Soziologie De Kirche (1930; a Comunhão dos Santos; Um

estudo dogmático sobre a sociologia da igreja; Akt Und Sein (1931; Ato e Ser); e

Geminsames Leben (1939; Vida Comunitária). Em Ethik (1949; Ética) que ficou incompleta,

refletiu sobre o niilismo). O teólogo via no nazismo a condução dos valores humanos para a

morte e julgava que aos cristãos caberia ocuparem-se desses valores, não para condená-los,

mas para salvá-los. Convencido de que sua oposição ao nazismo deveria expressar-se em

outros termos, participou de atentado contra Hitler em 1943, ano em que foi preso. Dois anos

depois, em 09 de abril de 1945, foi enforcado num campo de concentração em Flossemberg,

15 dias antes da morte de Hitler.

Pensamento Teológico

Bonhoeffer é um barthiano sensível às perguntas levantadas pela teologia liberal, que

Bultman nunca cessou de fazer, e, Destarte, é o homem chave para tratar com a situação

teológica atual. O que é o mundo que atingiu a maioridade? O que significa a interpretação

não religiosa? O que se deve entender por positivismo da revelação?, mas até hoje não se sabe

ao certo o que o próprio Bonhoeffer quis dizer com isso, e alguns teólogos perguntavam se

aquele jovem tinha um ponto de vista sistemático. Ele concordava com Barth que Deus se

revela somente através de Jesus Cristo. Nada poderia ser mais explicito do que a resposta a

pergunta: Quem é Deus?

139

Não em primeiro lugar ma crença abstrata em Deus na sua onipotência etc. a

experiência de que uma transformação da totalidade da vida humana é dada no fato de que

Jesus está presente apenas em prol doutras pessoas. Bonhoeffer também concorda com Barth

no sentido de que a auto revelação de Deus deve controlar nosso entendimento da ontologia e

da epistemologia. Enfatiza Deus não conforme Ele é em Si, mas conforme entra livremente

em relacionamento com o homem. Na revelação, trata de ma questão de liberdade de Deus no

lado dele que fica longe de nós. Seus escritos mostram que ele empurra esta doutrina

“material” da Encarnação numa direção cada vez mais concreta com paixão e rigor criadores.

Esta é a chave para a totalidade do método para totalidade do método de Bonhoeffer,

inclusive a interpretação não religiosa dos conceitos bíblicos que finalmente fez: Deus é Deus

que se tornou homem, o homem Jesus Cristo, e é somente com isso que podemos nos

preocupar como homens. Com relação a igreja, ela somente é quando existe em prol de

outros, aos necessitados. A igreja deve participar dos problemas seculares da vida humana.

Outro conceito de Bonhoeffer é aquele do cristianismo sem religião, essa sua atitude ante

religiosa, num entanto, existe simultaneamente com sua própria disciplina profundamente

devotado a leitura da Escritura e de orações, seu amor a liturgia, especialmente aos hinos.

Para ele uma vida no mundanismo era ainda outro dos conceitos controvertidos que coloca em

justaposição, uma vida num mundanismo genuíno é possível somente mediante a

proclamação de Cristo crucificado. Uma dessas idéias é que o mundo em nosso século XX,

chegou a maioridade; entende-se que o mundo está filosoficamente e teologicamente maduro

e adulto, e o homem tornou-se autônomo, não necessita da graça e verdade divina. Todo

cientista certamente deve colocar diante de si o alvo de tornar a hipótese de Deus supérflua no

seu campo. O mundo que atingiu a maioridade, Bonhoeffer chega a reconhecer um mundo

sem Deus, revela niilista, é um mundo sem ídolos, não adora a nada e desposado de religião.

KARL RAHNER

Biobibliografia

Alemão da Floresta Negra, discípulo de Heidegger em Friburgo, inicia sua carreira

acadêmica na faculdade de Teologia de Innsbruck em 1937, onde lecionou, com exceção do

longo parêntese da guerra e do imediato pós-guerra, até ser chamado para universidade de

München. Nos primeiros anos de ensino, a faculdade Innsbruck está empenhada na

140

elaboração do projeto de uma teologia querigmática que estivesse a serviço da pregação e da

pastoral, formalmente distinta da teologia cientifica.

Em 1939, ele publica Espírito no Mundo, sua tese para o doutorado em filosofia sobre

A Metafísica do Conhecimento Finito em Santo Tomás de Aquino que a universidade de

Friburgo recusara em 1936. Ele desejava escrever um trabalho teorético ao passo que o

orientador da tese, queria dele um trabalho histórico. Na verdade o que ele visava era

principalmente era isso: deixar de lado em grande parte o que se chama “neo escolastica” para

voltar ao próprio santo Tomás, aproximando-se justamente dos problemas formulados a

filosofia do nosso tempo. Durante a guerra, publica-se, em 1941 o livro “Ouvintes da

Palavra”. Nelas o teólogo alemão desenvolve as linhas de uma filosofia da religião numa

perspectiva teológica como antropologia teologial fundamental.

Ouvintes da palavra continua o discurso iniciado por “Espirito no Mundo”. O homem

é o ouvinte possível revelação histórica de Deus, onde homem e história se concebem

mutuamente.

Em 1954 Rahner reúne principais artigos e ensaios que havia escrito e publicado e

dado inicio a série de seus escritos teológicos, que mesmo em sua variedade e

descontinuidade representam ma verdadeira biblioteca teológica, em trinta anos (1954-1984).

Em 1959, reúne os escritos teológicos de Teologia Pratica no volume Missão e Graça que é

uma contribuição a respeito do debate sobre secularização intitulado “Significado Teológico

da Posição do Cristão num Mundo Moderno”. Ele relata também a minoria de cristãos em

cada nação e que tal situação deve ser assumida como imperativo histórico de salvação e

enfrentada como ma renovação dos métodos de práxis eclesial.

Em 1964, tenta formular ma síntese de seu itinerário teológico onde se transforma no

curso de introdução ao conceito de cristianismo que se tornará o curso fundamental sobre a fé.

Entre os cursos ministrados na cidade de Bávara, ele retoma a teologia dogmática na

cidade de Münter, que conclui carreira acadêmica. Vale ressaltar a cristologia pelo método

indisciplinar, no qual a sistemática é confrontada com a perspectiva exegética.

Pensamento Teológico

Método Antropológico Transcendental

Rahner distingui três elementos característicos:

141

a) Vivemos numa sociedade secular e pluralista na qual os enunciados da fé perderam

sua obviedade e na qual o pluralismo das convicções e das mudividências próprio

de uma sociedade aberta torna-se mais difícil transmitir a vida cristã.

b) O pluralismo precisa registrar um aumento dos conhecimentos em todos os

campos do saber que torna particularmente difícil fazer síntese embora o teólogo

sistemático deva tentar a síntese a propósito das questões ultimas e fundamentais

da teologia.

c) A essas dificuldades do anuncio cristão e do fazer teologia deve se acrescentar uma

espécie de endurecimento e incrustação dos conceitos teológicos, que

permanecendo imutáveis ao longo dos séculos não correspondem mais a situações

completamente mudadas da vida e da cultura do homem moderno. Ele está

profundamente persuadido da insuficiência do método escolástico praticado na

tradicional teologia de escola.

Do método escolástico, que procede do alto das formulações e opera por doutrinação,

deve-se pensar o método antropológico, que vem de baixo e realiza ma correspondência entre

vida e verdade, experiência e conceito. Essa abordagem antropológica deve partir da

experiência pessoal do homem e se interrogue a maneira como a verdade cristã pode

corresponder a ela. É um método objetivo e não comporta em ma redução subjetiva da fé.

Mas o método antropológico tem uma orientação própria que tem o nome de antropológico

transcendental.

Ele explica que o mundo da experiência humana, a posteriori, que é adquirido, e

categorial, refletido, tematizado e passível de diferentes classificações. Também se mostra sub

entendido por ma priori, não adquirido, mas sempre dado de maneira refletida e atemática que

é o único a tornar passível a realidade categorial, ou seja, o conhecimento a ação e as demais

experiências humanas. É a condição da possibilidade do conhecimento da ação da experiência

categorial que o transcendental diz respeito, pois na experiência humana é a posteriori e

categorial; a condição da possibilidade de tais experiências é a dimensão a priori e

transcendental, ela é constituída pela estrutura do espirito finito no mundo. Na verdade, a

transcendentalidade não é a transcendência, mas a estrutura apriorica, que não é adquirida,

mas sempre dada com a existência humana. Essa transcendentalidade é a estrutura do espírito

humano.

Se a transcendência é a mesma realidade objetiva de Deus, a transcendentalidade é a

estrutura e como condição da possibilidade da experiência em sua variedade categorial, é a

estrutura apriorica do espírito humano, abertura radical para o mistério, orientação dinâmica

142

para o infinito, horizonte de compreensão dentro do qual se inscrevem as varias experiências

originária que acompanha todas as outras.

A filosofia transcendental é moderna em seu enfoque do problema gnosiologico, mas

ao mesmo tempo recupera a via metafísica da filosofia clássica. A originalidade de seu

pensamento não consiste na elaboração da filosofia transcendental, e sim em ter introduzido

em teologia o método antropológico transcendental.

Bibliografia

MONDIM, Batista 1926, os grandes teólogos do século XX, São Paulo, Edições Paulinas

1979.

DIETRICH, Bonhoeffer. Biografia e Contexto.

GIBELINE, Rosino. Teologia do século XX, Edições Loyola.

GUNDRY, Stanley. Uma análise dos pensamentos de alguns dos principais teólogos do

mundo hodierno, Editora Mundo Cristão, tradução de Gordon Chown. Teologia

Contemporânea.

GARRIGOU-LAGRANGE

Biobibliografia

A New Catholic Encyclopedia, monumental enciclopédia católica norte-americana

saída recentemente, reserva um amplo espaço à figura e à obra Garrigou-Lagrange, ao passo

que nem sequer leva em conta teólogos da estatura de Rahner, von Balthasar, Congar,

Daniélou, Guardini, Chenu, de Lubac. O fato poderá parecer surpreendente para a maior parte

dos leitores, que talvez nem mesmo recordem o nome de Garrigou. E, no entanto, por quase

meio século, ele dominou a cena teologia católica como nenhum outro autor. Até pouco antes

Concílio Vaticano II, dizer Garrigou era o mesmo que dizer teologia católica. Ele era o mestre

indiscutível. É sabido que seu parecer teve um peso determinante na condenação da “nova

teologia”.

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Isso explica porque a New Catholic Encyclopedia dedicou-lhe três colunas, como

também basta para justificar sua inclusão na série dos grandes teólogos do século XX.

Ademais a razão pela qual o apresentamos em primeiro lugar aqui, é que seu

pensamento é a expressão típica daquela teologia escolástica tradicional, que predominou na

Igreja católica durante grande parte da época contemporânea, e da qual é necessário partir

para poder entender os mais recentes desenvolvimentos da teologia.

A produção literária de Garrigou tem a medida da vastidão. Da acurada bibliografia de

B. Zorcolo constam nada menos de 772 escritos, dos quais cerca de quinhentos artigos e trinta

livros. Os livros podem ser divididos em três grupos: filosóficos, teológicos e ascéticos.

Obras filosóficas. — Le sens commun, la philosophie de l’être et les formules

dogmatiques (Beauchesne, Paris, 1909); Dieu, son existence et sa nature (Beauchesne, Paris,

1914); Le réalisme du principe de finalité (Desclée de Brouwer, Paris, 1932); Le sens du

mystère et le clair-obscur intellectuel (Desclée de Brouwer, Paris, 1934); La synthèse

thomiste (Desclée de Brouwer, Paris, 1946).

Nesse grupo, distinguem-se as duas primeiras obras, a primeira ainda mais que a

segunda. Entre os escritos de Garrigou, Le sens commun ocupa, se me é permitido o paralelo,

o mesmo lugar ocupado pelo Discurso sobre o método entre os escritos de Descartes, o Breve

tratado de Deus, do homem e de sua beatitude entre os de Spinoza ou o Tratado sobre os

princípios do conhecimento humano entre os de Berkeley. É sua obra juvenil, na qual se

respira o frescor da inspiração, sente-se o entusiasmo da intuição e da grande visão que

aparece em sua mente como um lampejo. Nas obras posteriores, mais maduras, já se notará o

cansaço de uma visão que se tornou habitual, desaparecendo o verniz original.

Obras teológicas. — Le sauveur et son amour pour nous (Du Cerf, Juvisy, 1933); La

prédestination des saints et la gráce. Doctrine dc S. Thomas com parée aux autres systèmes

théologiques (Desclée de Brouwer, Paris, 1936); La synthèse thomiste (Desclée de Brouxver,

Paris, 1946); De Revelatione per Ecclesiam cal holicam proposita (Ferrari-Gabala, Roma-

Paris, 1918); De Deo Uno. Comrnentarium in primam partem S. Tomae (Desclée de Brouwer,

Paris, 1938); De Deo trino et creatore (Marietti-Desclée, Turim-Paris, 1943); De Christo

Salvatore (Marietti-Desclée, Turim-Paris, 1945); De gratia (Berrutti, Turim, 1946); De

virtutibus theologicis (Berrutti, Turim, 1948); De beatitudine et de actibus humanis (Berrutti,

Turim, 1951).

Afora as três obras em francês e o De Revelatíone, todas as outras são comentários à

Summa Theologiae de são Tomás. A que possui maior originalidade é o De Revelatione.

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Obras ascéticas. — Perfection chrétienne selon St. Thomas et St. Jean de la Croix

(Ed. de La Vie Spirituelle, Saint-Maximim, 1923); L’amour de Dieu ei la Croix de Jésus (Du

Cerf, Juvisy, 1929); La providence ei la confiance en Dieu: /idelité et abandon (Desclée de

Brouwer, Paris, 1932); Les trois conversions et les trois voies (Du Cerf, Juvisy, 1933); Les

trois áges de la vie intérieure (Du Cerf, Paris, 1938); L’eternelle vie et la prol ondeur de

l’dme (Desclée de Brouwer, Paris, 1950); De sancti/icatione sacerdotis secundum nostri tem

poris exigentias (Angelicum, Roma, 1946); De unione sacerdotis cum Christo sacerdote ei

victima (Marietti, Turim-Roma, 1948).

Neste grupo, a primeira é a obra fundamental. As outras apenas desenvolvem e aperfeiçoam,

ou então simplificam e divulgam, a doutrina espiritual que Garrigou já formulara claramente

em Perfection chrétienne et contemplation.

OSCAR CULLMANN

Oscar Cullmann é uma das figuras mais eminentes do protestantismo atual. Grande

estudioso da Sagrada Escritura e dos problemas da história da Igreja primitiva e apaixonado

pela causa ecumênica, ele ocupa um lugar de primeiríssimo plano entre os teólogos

contemporâneos por sua contribuição à constituição de uma nova forma de teologia: a

teologia bíblica.

Esse novo tipo de teologia já tivera um mestre excepcional em Rudolf Bultmann, que

edificou o seu sistema sobre dois princípios: a) exclusão da história da essência da Revelação;

b) interpretação da Revelação através de uma filosofia (no seu caso, o existencialismo).

Em polêmica com o teólogo de Marburg, Cullmann desenvolveu uma teologia bíblica

que é exatamente o oposto da teologia bultmanniana; com efeito, coloca em sua base

justamente a negação dos dois princípios cardeais da filosofia de Bultmann, ou seja: a) exclui

a filosofia da interpretação da Revelação; b) inclui a história na essência da mensagem do

Novo Testamento.

Devido à inclusão da história entre os elementos essenciais da Revelação, Cullmann

denominou justamente o seu sistema de “teologia da história da salvação”, não se contentando

de chamá-lo simplesmente “teologia bíblica”.

Biobibliografia

145

Oscar Cullmann nasceu em Strasbourg em 25 de fevereiro de 1902. Sua cidade natal

encontrava-se então sob o domínio alemão há três décadas, mas continuava mantendo o seu

caráter francês. A família Cullmann vivia na Alsácia setentrional, que é metade protestante e

metade católica. Os pais de Oscar pertenciam à religião luterana e foi nela que educaram o

filho.

Cullmann recebeu sua primeira educação escolar em Strasbourg. Com apenas

dezesseis anos de idade, leu os célebres Discursos sobre a Religião de Schleiermacher,

assimilando as doutrinas do liberalismo teológico, que na época ainda continuava dominando

a cena.

Durante seus estudos teológicos, permaneceu sob a influência da teologia liberal até

ler a obra-prima de Albert Schweitzer, A Busca do Jesus Histórico. “A leitura dessa obra”,

confessa Cullmann, “abriu-me os olhos, fazendo-me ver que o estudo histórico-exegético da

Bíblia foi traído não só pela Ortodoxia, mas também, ainda mais gravemente, em época

recente, pelas correntes filosóficas em voga. Por isso, recebi o surgimento da Formgeschichte

como uma libertação. Os estudiosos anteriores haviam tentado fazer distinções entre

elementos essenciais e não-essenciais, genuínos e espúrios, recorrendo amiúde a critérios

deduzidos de diversas filosofias. Ora, a arbitrariedade dessas tentativas foi colocada em

evidência e a investigação foi endereçada para ‘as leis das formas’ (Formgesetzen) e para ‘os

motivos da fé’ (Glaubensmotiven) que estão por trás da tradição

Obtido o bacharelado em teologia, em 1924 torna-se instrutor de grego e latim na

“École de Batignolles”, em Paris. Ao mesmo tempo, prossegue seus estudos teológicos, em

parte na Sorbonne, com Goguel, Lods e Guignebert, e em parte na “École des Hautes-

Études”, com Loisy. “Aquele ano passado naquele centro de estudos tão altamente

estimulante foi o mais fecundo de todo o meu período de preparação”.

Em 1926, retornou a Strasbourg para assumir a direção dos estudos no seminário

teológico daquela cidade, o célebre “Thomasstift”. Durante esse período, começou suas

pesquisas sobre as cartas pseudoclementinas; seus estudos se concluíram em 1930, com a

publicação de um ensaio bastante importante. No mesmo ano, foi nomeado professor de Novo

Testamento no “Thomasstift”.

Em 1938, devido à reputação que obtivera como estudioso do Novo Testamento e da

história da Igreja primitiva, foi convidado a suceder E. Vischer na Universidade de Basiléia.

Apesar de seu apego à cidade natal, Cullmann aceitou o convite, considerando a importância

da cátedra que lhe era oferecida e as vantagens culturais que a cidade de Basiléia lhe oferecia.

146

Mais tarde, assumiu três postos acadêmicos também em Paris: em 1949, a cátedra de

História da Igreja Primitiva na “École des Hautes-Études”; em 1950, a cátedra de Novo

Testamento na “Faculté Libre de Théologie Protestant”; por fim, em 1953, a cátedra de

Cristianismo Primitivo da Faculdade de Filosofia da Sorbonne. Em seguida, leciona também

no “Seminário Valdese”, de Roma. Tanto em Paris como em Roma, trava contato com

muitos estudiosos católicos, com os quais empreendeu um fecundo diálogo ecumênico. Sua

atividade ecumênica chegou ao ápice durante o Concílio Vaticano II, do qual participou na

qualidade de observador. Sua contribuição ao Concílio foi das mais apreciadas. Tanto João

XXIII como Paulo VI expressaram-lhe seu vivo reconhecimento. De sua parte, Cullmann

dedicou o seu último livro, O Mistério da Redenção na História, ao Secretariado para a

Unidade dos Cristãos, “em sinal de gratidão pelo Convite para participar, na qualidade de

hóspede e observador, do Concílio Vaticano II, e como contribuição ao diálogo entre os

cristãos das várias confissões, na fé e na esperança de que mesmo aquilo que nos divide

contribua para o prosseguimento da história da salvação, 'ondulante' e cheia de desvios”.

Desde 1941, Oscar Cullmann é diretor do “Theologisches Aligemeine” de Basiléia,

onde anualmente são hospedados 25 estudantes de teologia provenientes do exterior. Exerce

suas funções com o maior agrado e dedicação. Cullmann é considerado um excelente

formador de mentes teológicas, sabendo dirigir as jovens mentes dos seus estudantes para

aqueles campos para os quais são mais dotadas.

A estima, o respeito e o afeto de que goza Cullmann junto aos seus colegas são

evidenciados pela publicação de um Freundesgabe, organizado por W. C. van Unnik,

intitulado Neotestamentica et Patristica, que reúne 29 ensaios de tema patrístico e

neotestamentário compilados por estudiosos católicos e protestantes da Europa e dos Estados

Unidos. O livro foi oferecido a Cullmann por motivo do seu sexagésimo aniversário.

A primeira publicação de Oscar Cullmann foi um artigo de 1925 intitulado “Les

Récentes Études sur la Formation de la Tradition Ëvangélique” (na Revue d’Histoire et de

Philosophie Religieuse, 1925, pp. 459-477; 564-579). A esse ensaio, com o qual penetrava

imediatamente em seu terreno preferido, seguiu-se um crescente número de artigos,

monografias e livros sobre os mais variados temas de teologia neotestamentária, história, da

Igreja primitiva e liturgia.

Os escritos que deram a Cullmann sua celebridade inicial pertencem ao campo

litúrgico. Entre eles, os mais dignos de nota são: “La Signification de la Sainte Cène dans le

Christianisme Primitif” (na Revue d’histoire et de Philosophie Religieuse, 1936, pp. 1-22);

Urchristentum und Gottesdienst (Zwingli, Zurique, 1944); Die Tauflebre des Neuen

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Testaments, Erwachsenen und Kindertaufe (A doutrina do Batismo no Novo Testamento —

Batismo das Crianças e dos Adultos, Zwingli, Zurique, 1948).

Ao campo dos estudos sobre a história da Igreja primitiva pertencem, entre outros: sua

tese de doutorado, Le Problême Littéraire ei Historique du Roman Pseudo-Clémentin (Alcan,

Paris, 1930), que, como diz o subtítulo, é precipuamente um estudo sobre relações entre

gnosticismo e cristianismo judaico; e o famosíssimo Petrus —Jünger, Apostei, Martyrer

(Zwingli, Zurique, 1952).

Ao campo da teologia neotestamentária pertencem quatro grandes obras-primas: Les

Premières Con/essions de Foi Chrétiennes (P.U.F., Paris, 1943); Christus und die Zeit

(Evangelischer Verlag, Zurique, 1946; Die Christologie des Neuen Testaments (Mohr,

Tübingen, 1957); Heil ais Geschichte. Heilsgeschichtliche Exislenz im Neuen Testament

(idem, 1965). Os últimos três livros formam uma trilogia que tem por tema a essência do

cristianismo. Já o primeiro representa uma confirmação da tese da trilogia, através da

investigação das primeiras confissões cristãs.

Em Les premièrs Con/essions de Foi Chrétiennes, Cullmann estabelece que o primeiro

Credo da Igreja era exclusivamente cristológico e que nele Cristo era representado como

centro da história, tanto em relação ao passado (Criação) como em relação ao futuro (Fim do

Mundo).

O tema de Christus und die Zeit é a busca do elemento central da mensagem cristã. O

resultado de seu estudo é que o elemento central é Jesus Cristo: nele está centrada e

recapitulada toda a obra soteriológica. “Irradiando-se desse centro, a luz ilumina o tempo

anterior à criação e a própria criação, remontando assim a um passado ainda mais remoto. A

história completa da salvação, que constitui o desígnio de Deus, está virtualmente contida

nesse único evento: todo o passado dessa história da salvação tende a essa intervenção, dele se

origina todo o presente e ele representa na sua realização universal e permanente todo o futuro

da redenção”.

Em Die Christologie des Neuen Testaments, Cullmann examina os principais títulos

dados a Jesus no Novo Testamento. E insiste na importância cristológica dos títulos de

“Profeta” e “Sumo Sacerdote”. Examinando os títulos de “Servo de Deus” e “Filho do

Homem aborda também o problema da “autoconsciência” de Cristo. Através dos títulos de

“Messias” e “Filho do Homem”, ilustra a obra futura de Cristo; através dos títulos de

“Senhor” e “Salvador”, ilustra sua obra presente; através dos títulos de “Logos” e “Filho de

Deus”, esclarece a sua preexistência. Vez por outra, localiza as fontes gregas dos nomes e

examina criticamente cada texto bíblico em que o título aparece.

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Em Heil ais Geschichte, sua atenção volta-se do centro, ou seja, de Cristo, para toda a

história da salvação, para provar, contra Bultmann, que toda ela faz parte do núcleo essencial

da mensagem cristã e não é de modo algum um elemento de superestrutura mística, como

sustenta o teólogo de Marburg. Cuilmann insiste em que a existência cristã e a história da

salvação (Heilsgeschichte) são inseparáveis.

O chamado à fé e a nova autocompreensão sobrevêm porque ocorreram fatos

históricos completamente fora do homem e estranhos a ele. A “fé” nada mais é do que a

disposição a deixar que minha existência seja julgada e plasmada por tais fatos: é testemunho

para a história da salvação. Tanto para a Igreja como para o mundo, a história da salvação

permanece como a norma. Heil als Geschichte tem cerca de 350 páginas e passa em revista

toda a discussão recente sobre os temas da escatologia, da apocalíptica, do mito e da história.

Contém ademais capítulos sobre os Evangelhos, a Igreja primitiva, São Paulo e São João. A

parte conclusiva, intitulada “Mirada à História dos Dogmas e à Sistemática: a História da

Salvação e a Época Pós-bíblica”, estuda as implicações teológicas e sistemáticas da doutrina

da história da salvação.

Às relações de Jesus com os ambientes políticos e religiosos de sua época são

dedicados os ensaios: Jesus und die Revolutionären Seiner Zeit, de 1970 (trad. bras.: Jesus e

os Revolucionários de seu Tempo, Vozes, Petrópolis, 1972) e Der Johannische Kreis, de

1975.

Nos dados biográficos, já falamos da ação desenvolvida por Cullmann no campo

ecumênico. Mais ou menos diretamente, contribuiu com todos os seus escritos para a causa da

união dos cristãos. Entretanto, no opúsculo Katholiken und Protestanten. Em Vorschlag zur

Verwirklichung Christlicher Solidaritãt (Reinhardt, Basiléia, 1968), propôs-se especialmente

uma finalidade especificamente ecumênica. Nessas páginas, pede o encontro entre os cristãos

no terreno da caridade e os convida a restabelecerem a coleta para os pobres que existia na

Igreja primitiva, uma coleta a ser feita indistintamente entre católicos e protestantes e para ser

utilizada tanto em benefício de uns como de outros.

W. PANNENBERG

“a prioridade pertence à fé, mas o primado à esperança”

A ação da esperança cristã sobre o mundo histórico em sentido contestatório é

concepção que também pode ser encontrada em Wolfhardt Pannenberg (nascido em Stétin em

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1928, professor de teologia em Munique). Nos Fundamentos da cristologia (1964), embora

centrando sua atenção no estudo do Cristo histórico como fundamento da fé cristã,

Pannenberg já sustentava que a cristologia não se encerra no passado, mas se abre para o

futuro.

Escreve ele: “É preciso ser claro sobre o que está em jogo quando discutimos sobre a

verdade da espera apocalíptica de juízo futuro e da ressurreição dos mortos: encontramo-nos

diante dos fundamentos da fé cristã. Sem o horizonte da espera apocalíptica, não

conseguiremos compreender por que Jesus deveria ser a revelação final de Deus, por que

Deus se teria manifestado nele e só nele. (...) Se esse horizonte desaparece, reduz-se a base da

fé, a cristologia torna-se mitologia e deixa de haver qualquer continuidade com Jesus e o

testemunho dos apóstolos”.

Como se pode bem ver, portanto, a cristologia de Pannenberg põe desde o início a

esperança como o seu fulcro. E esse fato aparece em toda a sua explicitude no seu ensaio

intitulado O Deus da esperança (1967). Afirma Pannenberg que o deus do teísmo tradicional

é “um ser ao lado dos outros seres” e que, por isso, a crítica filosófica, de Nietzsche a Sartre,

ataca a finitude e o antropomorfismo do Deus dos filósofos. Entretanto, essa crítica não ataca

em nada o conceito bíblico de Deus, isto é, “o Deus das promessas, que leva a novo futuro na

história, Deus do Reino futuro que cunhou a experiência do mundo e a situação humana”.

Substancialmente, para Pannenberg, “se o regnuin venturum for biblicamente

caracterizado como reino de Deus, então teremos esse primado ontológico do futuro do reino

sobre todo o real presente e também sobre o presente psíquico. Com efeito, biblicamente o ser

de Deus e o ser do reino são idênticos, porque o ser de Deus é o seu poder”.

Deus, portanto, é a potência do futuro. E, “seja como for, não é mais concebível um

absoluto em forma de realidade presente, pelo fato de que tudo o que existe já é e, em

princípio, pode ser superado”. Estamos, pois, às voltas com um Deus e “com um futuro como

o seu modo de ser constitutivo”; por isso, não podemos voltar à concepção do teísmo

tradicional, do Deus afastado da história humana, posto que não se podem isolar as

manifestações de Deus do próprio Deus. Escreve Pannenberg: “O Deus da Bíblia é Deus

somente enquanto se revela como Deus: ele não seria Deus do universo se não fosse senhor

do universo. Ora, para a expectativa de Israel e do Novo Testamento, essa senhoria é coisa do

futuro (...). E, como potência do futuro, o Deus da Bíblia é e será superior a todo discurso

sobre ele, já tendo superado todo conceito de Deus.

O importante, continua Pannenberg, é que “a potência do futuro tem precisamente a

característica de libertar o homem dos laços do presente para o seu futuro e para a sua

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liberdade. Somente a potência do futuro pode ser objeto da esperança e da fé. Porque o futuro

produz as forças aptas a superá-lo”. Em substância, na opinião de Pannenberg, “a fé diz

respeito ao futuro. E, em sua essência, o futuro é confiança: a confiança volta-se

essencialmente para o futuro, sendo justificada ou frustrada pelo futuro. Mas não se tem

confiança cegamente e sim com base em algo de tangível no qual consideramos poder confiar.

A verdadeira fé não é cega credulidade. Os profetas puderam conclamar Israel a ter confiança

nas promessas de Javé porque Israel já havia experimentado, durante longa história, que podia

confiar nesse seu Deus. E o cristão empenha a sua confiança, a sua vida e o seu futuro pelo

fato de que Deus se revelou na sorte de Jesus”.

Desse modo, o cristão toma-se partícipe da glória de Deus “somente se deixar atrás de

si o que já é e o que encontra como condição do seu mundo, não através da fuga do mundo, e

sim através da mudança ativa do mundo, que é expressão do amor divino, do poder do seu

futuro sobre o presente, através da sua mudança para a glória de Deus”.

TEOLOGIA NORTE AMERICANA

Teologia – em grego, significa “Discurso sobre Deus”.

Discorrer sobre Deus, como claramente atesta a história do pensamento humano, é uma

atividade conatural ao homem. Este, em todo o tempo e lugar, procurou explorar a realidade4

divina e definir a relação do próprio ser com o de Deus.

Porém, o discurso sobre Deus conquistou uma expressão nova mais rica e profunda no

cristianismo. Aqui a Teologia já não parte como no pensamento grego e nas outras culturas

pagãs, de proposições elaboradas pela inteligência humana, mas de verdades recebidas da

revelação divina. Por isso, no cristianismo, a Teologia, mais do que um discurso sobre Deus,

torna-se um discurso sobre a Palavra de Deus. O seu objetivo é compreender e aprofundar o

sentido de tal palavra, valendo-se dos instrumentos de auto compreensão de que o homem

dispõe. Mas, dado que tais instrumentos mudam de uma época para outra e de um continente

para outro, segue-se logicamente a formação de uma grande variedade de discurso sobre

Deus, isto é, de Teologias.

Um dos mais surpreendentes fenômenos dos últimos anos é o interesse sempre mais

vivo que os leigos vêm demonstrando pelas questões religiosas e teológicas, não apenas da

própria igreja, mas também de todas as igrejas. E religiões, indistintamente. Hoje, não só os

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sacerdotes e teólogos de profissão, mas também os literatos, os jornalistas, os universitários,

os operários e as donas-de-casa tratam de assuntos com Deus, Cristo, a eucaristia, o

sacerdócio, o celibato-eclesiástico, o ecumenismo e as condições de salvação dos não cristãos.

Tais assuntos são tratados e discutidos, muitas vezes animadamente, não apenas nas igrejas e

nos seminários mas também nos salões, nos trens e nas praças, diversas são causas que se

situam na origem desse singular fenômeno.

No século XX, a teologia esta atravessando um momento propício em todas as igrejas

cristãs. A Teologia Norte Americana, possui várias correntes teológicas, como por exemplo:

O Fundamentalismo, Teológica Empírica, teológica da esperança, Teologia Ortodoxa,

Teologia Liberal, Teologia da Morte de Deus. Essas são algumas vertentes de destaque, na

Teologia Norte Americana.

A necessidade, de um conceito claro de fundamentalismo é urgente como se constata

nos últimos anos. O termo, fundamentalismo vem sendo prodigamente empregado em

situações variadíssimas, tanto no campo religioso como no político. Fundamentalismo

aparece. Às vezes, como sinônimo de conservadorismo, sectarismo e fanatismo, como

movimento ou corrente amarrados a modelos culturais e religiosos do passado, fechados aos

valores do mundo moderno e até mesmo às ciências. Tanto se fala fundamentalismo que esse

termo já está infeccionado. Em geral, carrega uma carga negativa e conotação pejorativa.

Fundamentalista seria o fanático, o sectário, o intolerante, o conservador, o autoritário, o

totalitário, e sempre são os “outros”. Por causa disso até os clássicos representantes desse

movimento no protestantismo de hoje preferem o título de envangélico-conservador, ao de

fundamentalista. H. King e J. Moltmann, discorrendo sobre o termo, afirmam que

originariamente, fundamentalismo designava ‘determinada corrente do protestantismo

americano que se opunha a qualquer adaptação moderna e liberada, igreja inovando os

fundamentos bíblicos da fé cristã: fundamentos da fé interpretados de maneira bem

arbritário”. Mas, admitem que, analogamente, “... encontram-se sintomas e desdobramentos

fundamentalistas. Também no âmbito do catolicismo e da ortodoxa oriental e que o termo “...

foi aplicado também a correntes reacionárias no islamismo e no judaísmo.”

Há quem prefira falar em famílias fundamentalistas daquilo que até hoje foi afirmado

sobre o fundamentalismo, muito o relaciona com o processo da modernidade, sobretudo como

uma reação religiosa a todo e qualquer tipo de modernização. Entretanto, afirmar que o

fundamentalismo surgiu na estira da modernidade e muito pouco. Quase tudo o que existe

atualmente no mundo cultural e social foi gerado na modernidade, ou produzido por ela

diretamente ou gerado indiretamente, talvez como reação a ela.

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Sendo um movimento globalizante, a modernidade contagia a sociedade inteira, as

formas de vida social, as mentalidades e o campo rigorosamente religioso.

O fundamentalismo vem associado também com a Era da Pós-modernidade. À

Nostalgia Religiosa da época pós-moderna será oferecida uma solução que, para alguns pode

ser chamada de polifundamentalismo.

Buscando uma experiência religiosa vivida intensa, o polifundamentalista, aberto e

disponível a todas as opções, identifica a seriedade com a brincadeira. Assustado com as

conseqüências da modernidade, o homem pós-moderno procura a unidade com a natureza,

tentando “curar as feridas que a modernidade causou ao corpo e a alma do mundo,

perseguindo uma nova totalidade, dando um salto livre em direção a outras culturas e novas

épocas. Moltmann, entende que os fundamentalistas “não reagem às crises do mundo

moderno, mas às crises que o mundo moderno provoca em sua comunidade de fé e em suas

convicções básicas.”

Seu grande inimigo é o liberalismo/ pluralismo diante da moderna subjetividade do

homem e das liberdades individuais, os fundamentalistas colocam na autoridade divina a

segurança de sua fé além disso, não suportando a secularização do estado, da educação e das

ciências, “buscam restabelecer o estado confessional homogêneo”. E se resgatar as

identidades tradicionais”.

“A identidade fundamentalista é uma identidade ameaçada, amedrontada, cheia de

incertezas e por isso, uma identidade que reage agressivamente, identidade definida pela

delimitação ou negação de inimigos reais ou supostos, atesta Moltmann.

Alguns autores preconizam que o fundamentalismo é negação da modernidade só na

retórica. Outros afirmam que o fundamentalismo é diferente do tradicionalismo, o

fundamentalismo é um fenômeno moderno pois rejeitam alguns aspectos da cosmovisão

moderna, como o pluralismo, o cosmopolitismo, a racionalidade, o progressismo e o

secularismo, mas beneficiam e se apropriam dos instrumentos técnicos modernos.

Portanto, o fundamentalismo entende-se comumente, o movimento ultraconservador e

autoritário, surgido em certos meios protestantes, que em reação ao modernismo teológico e

religioso prega como fundamentos inabaláveis da fé verdades tradicionais de sua confissão. A

designação “fundamentalismo”, deriva da preocupação em manter como absolutos os

fundamentos doutrinais confessionais, aos quais se agarram inteiramente, excluindo toda

interpretação crítica do texto. Esse movimento irrompeu nos EUA, no início deste século.

O liberalismo teológico tem levado os homens a pensarem sobre as questões religiosas

em termos diferentes do que quando se pensa nelas através de textos de prova bíblicos. Esse

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modo de pensar já vinha sendo experimentado na teologia, quanto as suas possibilidades, em

outras palavras, foi demonstrado que há certos aspectos da Teologia que ultrapassam e até

contradizem a Teologia Bíblica, visto que a busca pela autoridade não cessa com a Bíblia.

Dentro desse contexto, a Teologia Empírica foi capaz de surgir em cena, no começo do século

XX, a base do pensamento teológico liberal e empírico, encontra-se a crença de que a

revelação embora seja uma maneira possível de se tomar conhecimento das coisas, em si

mesma é imperfeita, por ser incompleta e que nossas maneiras de tomar conhecimento das

coisas precisam ser completas, porquanto a própria verdade é complexa. Para extrair a

verdade de toda essa complexidade precisa de experimentação, de exame e de um longo

processo de separação entre o bem e o mal. E, quanto a muitos pontos, chegar a certas

conclusões tentativas e temos de dar prosseguimento às nossas experimentações. Portanto, a

Teologia tranforma-se em uma outra ciência, ao invés de ser a rainha dogmática, perfeita,

inquestionável das ciências.

Os teólogos empíricos estavam ocupados em uma nobre inquirição, apesar dos erros que

porventura tenham feito. Estavam tentando responder às perguntas feitas pelo ateísmo e pelo

humanismo. Empregavam métodos históricos críticos e sistemático construtivos e mostravam-

se essencialmente apologéticos. A tarefa deles consistia em interpretar o cristianismo de tal

modo que viesse a tornar-se inteligível e eficaz em uma época científica-industrial. Todas as

tentativas nesse sentido, sem importar o bem nelas embutido, terminaram em exageros e

pontos débeis em primeiro lugar, não há como submeter uma pessoa extraordinária e poderosa

como Jesus Cristo a teste de laboratório. Ele está acima da ciência porque existem poderes

espirituais que zombam da infalibilidade do nosso conhecimento científico.

Um dos principais centros de teologia empírica foi a Diviwity School da Universidade

de Chicago, nos Estados Unidos da América do Norte, encabeçada por Shailer Matthews, ele

formou-se no Colby College e no Wewtow Theological Institute e Deu Prosseguimentos de

história e de economia política na Alemanha. Foram várias as escolas empíricas nos EUA,

esse movimento influenciou a maneira de pensar de muitos estudiosos que não aceitavam

plenamente os pontos que ele defendia geralmente. Esse é o uso que emerge de novos

movimentos e maneiras de pensar. Alguns pensadores, assim influenciados, penderam para

idéias neo-ortodoxas Reinhol e R. Richard Niebulfr, atacaram as bases da Teologia empírica,

enfatizando a fé pura como a base do pensamento e da ação religiosa.

A Teologia da esperança tem sido articulada nos Estados Unidos por dois teólogos

luteranos: Carl Braatem e Robert Jensow, cujas obras muita coisa tem feito para popularizar o

novo movimento. A teologia da esperança, com sua chamada eventual por uma ética ativista,

154

talvez provasse finalmente ser mais bem sucedida na disposição mental utilitariana. A

teologia americana do pensamento refletido na Europa onde foi engendada. A tradução de

muitos dos escritos Alemães para o inglês ainda não está completa de modo que o impacto

total sobre a Teologia dos Estados Unidos ainda há de ser sentido.

Sua base filosófica-Teológica talvez se revele por demais etérea. Mas sua chamada à

ação talvez venha a ser ouvida.

Diferentemente de outros movimentos teológicos que podem ser analisados e divididos

nas categorias tradicionais da Teologia exegética, dogmática e histórica, a Teologia da

esperança abrange mais do que geralmente se reconhece como sendo Teologia, falando a rigor

sua orientação secular permite que seja combinada com qualquer número de matérias,

inclusive a política e a biologia no coração da Teologia da esperança, há uma instabilidade

filosófica básica que não semente procura, como também requer, a satisfação futura num

número indefinido de combinações futuras. O futuro sem definição é uma das suas “marcas

registradas”. Por exemplo, a Teologia da Esperança já se expressou em termos políticos como

sendo a Teologia da Revolução. Realmente não há aspecto da vida secular que seria excluído

do seu plano nos impactos.

Escatológicos do Antigo e Novo Testamentos, e procura torná-los aplicáveis ao modo

da igreja entender a si mesma e sua missão ao mundo. Porque entender a realidade a partir da

perspectiva da escatologia, o movimento também é chamado Teologia futurista, com seu

poderoso avanço para o futuro na sua busca da realidade, vê-se como reação imediata ao

subjetivismo melancólico e pessoal da Neo-ortodoxia. Que dominada a Alemanha desde que

Karl Barth chegou a uma posição de destaque nos dias após a primeira guerra mundial, e que

paulatinamente se apoderou dos Estados Unidos. A Teologia não é tão estreita que se limite a

um relacionamento eu-tu. Para o mundo religioso, a Teologia da Esperança é a recusa do

público a aceitar como definitiva o veredito dos teólogos de Deus-esta-morto da década de 60.

A Qualidade irrevogável naquele veredito, declarado de modo tão positivo e dogmático, era

simplesmente inaceitável para os teólogos que ainda se viam desempenhando um papel na

igreja e no mundo. Os teólogos futuristas deixaram para trás o sepulcro cavado para Deus e

fecharam seus ouvidos a ewdecha funérea. O crepe preto foi guardado numa gaveta. Não é

que os teólogos da esperança desconhecessem as evidências dos enterradores de Deus, nem

que negassem que uma era secular realmente chegara, mas esperavam que pudessem utilizar

as evidências negativas para produzir resultados mais esperançosos e positivos. O humanismo

dos teólogos de Deus-está-morto veio a ser a sementeira em que a Teologia da Esperança

deitaria raízes.

155

O século vinte foi a grande explosão na Teologia América, que fez teologias, das mais

diversas interpretações. O surgimento da Teologia Radical se deus durante a metade do

século XX, teve como causa principal a tomada de consciencia por parte dos estudiosos do

fato de que os instrumentos hermenêuticos de que se tinham valido os teólogos dos séculos

anteriores, e os católicos descobriram um instrumento hermenêutico apropriado.

No Neotomismo ao passo que os protestantes o encontraram no existencialismo,

grandes teólogos católicos optaram pela hermenêutica neotomismo enquanto os grandes

expoentes teólogos protestantes encontraram no existencialismo, e durante algum tempo essas

interpretações pareceram corresponder às exigências do homem hodierno, precisamente

porque lhe propunham a mensagem cristã por meio das categorias de que ele normalmente se

servia na compreensão de si mesmo e do mundo.

Mas apartir dos anos cinqüenta tanto o neotomismo como o existencialismo começaram

a acusar uma grave crise já nem um nem outro correspondiam a situação social, a visão das

coisas, à experiência de si e da realidade que o homem do nosso tempo estava fazendo assim

novos sistemas filosóficos, como o neopositivismo, o marxismo, esotérico, o estruturalismo,

suplantavam rapidamente os sistemas que tinham estado no auge durante a primeira metade

do século.

A mudança de clima cultural impôs aos teólogos um novo e comprometedor arabasto de

renovação. Realizaram-no excogitando novas interpretações da mensagem cristã valendo-se

de uma ou de outra das citadas filosofias mais recentes, e várias foram as idéias e tentativas

ousadas nesse sentido, uma delas foi feita pelos teólogos da “morte de Deus”. Teve lugar nos

EUA nos anos sessenta com a expressão, “Teologia da morte de Deus”. Costuma-se designar

um movimento de pensamento que se desenvolveu nos Estados Unidos, e que teve larga

ressonância e considerável influxo. Também na Europa, durante os anos sessenta outras

expressões empregadas para denominar o mesmo movimento são, teologia radical, teologia

secular, ateísmo cristão, neo-arawismo, teologia sem Deus, cristianismo não religioso. Não há

dúvida que entre tantos, agora numeráveis movimentos teológicos do nosso século o que

despertou maior sensação nos EUA e atingiu mais velozmente altos índices de notoriedade foi

a teologia da morte de Deus.

Embora o movimento tenha tido uma origem repentina e aparentemente por acaso, mas

em conseqüência de causas bem determinadas, algumas das quais provêm do campo

filosófico, outras do campo teológico. Do campo filosófico, o que mais contribuiu para o

desenvolvimento da teologia da morde de Deus foi o positivismo lógico, uma filosofia da

156

linguagem que teve larga aceitação nos países anglo-saxãos durante os anos cinqüenta e

sessenta.

No campo teológico, a teologia da morte de Deus foi preparada por algumas doutrinas dos

maiores teólogos protestantes do nosso tempo, Barth, Bultmann, Tillch, e Bowhoeffer..

A teologia radical também teve Harvey, americano brilhante, mas irrequieto,

fortemente sensível aos sinais do nosso tempo, o qual considerava a teologia não como um

saber absoluto dogmático, que se pode definir de uma vez para sempre, mas como um saber

contínuo movimento, quanto deve constantemente apartar a palavra de Deus às situações.

Cambiantes da cultura humana em um de seus livros Cox defende a tese que “a

civilização urbana e a religião tradicional declinaram ao mesmo tempo.” O homem

contemporâneo é o habitante da tecnópole para quem a cidade é o mundo e o mundo a cidade,

e no que a religião é a metafísica estão a desaparecer para sempre.

“A secularização é a ruptura de todos os mitos sobrenaturais e símbolos sagrados

representa a desfatalização da história; a descoberta pelo homem de que foi deixado com o

mundo nas mão, e de que não pode mais culpar a fortuna ou as fúrias pelo que faz. A

secularização ocorre quando o homem desvia a sua atenção dos mundo do além e a volta para

este mundo e este tempo”. Segundo Cox, a secularização não tem por efeito a morte de Deus

mas antes a purificação da nossa fé. Por isso teólogo não deve combater, mas antes favorecê-

la, para ele o teólogo deve falar de Deus de maneira secular e encontrar uma interpretação não

religiosa dos conceitos bíblicos.

Mas de todos os teólogos americanos não poderia deixar de falar de Dr. Martin Luther King.

Pastor batista, prémio Nobel da Paz, um dos principais líderes do movimento americano pelos

diretos civis e defensor da resistência não violenta contra a opressão racial.

Lutou por um tratamento igualitário e fraterno para todos os brancos e negros. Ensinou

a teologia do amor – teologia da solidariedade nos EUA. Como no mundo, deixando para

todos os teólogos o exemplo de um comprometido com Deus e que nunca podemos deixar de

sonhar.

Bibliografia:

1. KING, Hans, “Contra o Fundamentalismo Romano. Catolicismo Hodierno”/ In Concilum,

241 (l992)- 149-160

2. (IBLD)

157

3. MOLTMANN, Jurgen, “fundamentalismo e Modernidade”. In Concilium, 141 (1992/3)

141-148

4. Id. 145

5. Id. 146

6. Campliw, 490 Teologia e filosofia

7. H, Cox a Cidade do Homem, Paz e Terra . Rio, 1968, p 12.

8. Ib,dem p.14

TEÓLOGOS NORTE-AMERICANOS

GABRIEL VAHANIAN

158

Biobibliografia

Gabriel Vahanian professor da Siracuse University (N.Y) sempre protestou contra

aqueles que quiseram fazer dele um teólogo da morte de Deus. E, contudo, contribuiu

notavelmente para a publicidade e para a difusão do movimento da Teologia Radical

com o livro A Morte de Deus e por esse motivo os estudiosos têm razão em associa-lo aos

ateus cristãos. Contudo, é preciso reconhecer que ele não é, de modo nenhum um

defensor dessa teologia, sendo antes um crítico severo. Em seu livro descrevia um

fenômeno cultural que a civilização do século passado estava vivendo, o eclipse de Deus.

Isto devido ao processo de imanentização do mundo moderno e à cultura que deste

nasceu. É a noção de Deus que está morta; para que readquira significado é preciso uma

revolução cultural que restitua a Deus o primado que a Sagrada Escritura lhe atribui.

Contra quem tenta transformar o fenômeno cultural da ‘morte de Deus’ num princípio

dogmático, ele declara: “A morte de Deus tem sentido e constitui um acontecimento

libertador só se for considerada como um fenômeno cultural. Mas afirmar que um fato

histórico, melhor dizendo, um fenômeno cultural, como tal, isto é, em si mesmo e por si

mesmo, exija de modo total e exclusivo a minha existência total, equivale a transforma-

lo num novo absoluto, um ídolo... Não vejo como, transformando um acontecimento

cultural num artigo de fé, nos colocar numa atitude que seja diversa, um pouco sequer,

do antigo creio porque absurdo”.34

Contra o dogma fundamental dos teólogos da morte de Deus, segundo os quais para

salvar o cristianismo é preciso renunciar a Deus, Vahanian defende que não pode haver

autêntica fé cristã se não em quem crê no Deus da Sagrada Escritura. Portanto, a sua

tese não é que Deus esteja morto, mas sim a cultura cristã: de há séculos a cultura

afastou-se do cristianismo e tornaram-se vãs todas as tentativas de liga-la a ele. Por isso,

hoje, encontramo-nos, numa era pós-cristã. Tal situação, porém, fazendo sua uma tese

capital de Karl Barth, não tem nada de dramático ou de censurável, porque a fé é

essencialmente estranha à cultura, mais, é-lhe naturalmente contrária.

Na sua obra Não Terás Outro Deus (1966) esclarece que no próprio título retifica as

ambigüidades do título de 1961, A Morte de Deus. Ao contrário, assumia o fenômeno cultural

da morte de Deus, aceitando-o como artigo de fé; isto porque a tarefa da teologia não é

34 MONDIN, Battista. As Teologias do Nosso Tempo. 47 p.

159

declarar a “morte de Deus”, mas ela tem uma função iconoclasta contra as infinitas e

freqüentes idolatrias que se escondem sob o nome de Deus e por trás do rótulo cristão.

HARVEY G. COX

Biobibliografia

Harvey G. Cox nasceu em Boston, em 1929, foi um jovem teólogo brilhante, mas

irrequieto, fortemente sensível aos sinais culturais do nosso tempo, o qual considera a teologia

não como um saber absoluto dogmático, que se pode definir de uma só vez para sempre, mas

como um saber em contínuo movimento, enquanto deve constantemente adaptar a Palavra de

Deus ás situações cambiantes da cultura humana. Em virtude de tal conceito da teologia é

fácil compreender como Cox em menos de um decênio pôde tornar-se promotor de quatro

orientações teológicas tendo muito pouco de comum: teologia radical, teologia da esperança,

teologia cômica (lúdica) e teologia popular.

Ele propõe o retorno da discussão sobre a secularização, através de um intenso debate

com o seu livro A Cidade Secular (1965), em que o mundo tornou-se não apenas tarefa, mas

também responsabilidade do homem. Isto porque o homem tornou-se cosmopolita.

A Teologia da morte de Deus, em Cox, está representada pelos livros A Cidade do

Homem e O Cristão como Rebelde. Cox defende neles a tese de que a civilização urbana e a

religião tradicional declinaram ao mesmo tempo; o homem contemporâneo é o habitante da

tecnópole, para quem a cidade é o mundo e o mundo a cidade, e no que a religião e a

metafísica estão a desaparecer para sempre. O homem moderno está essencialmente

secularizado; é um homem “livre do controle religioso e metafísico sobre a sua mente e sobre

a sua linguagem, mas não é um homem ateu.”35

Com efeito, a secularização, segundo Cox, tornando o homem mais adulto, mais

consciente de suas capacidades, do seu papel neste mundo, não o afastou de Deus, mas fê-lo

compreender melhor quais são suas relações com ele. A secularização é a ruptura de todos os

mitos sobrenaturais e símbolos sagrados, representa a ‘desfatalização da história’, a

descoberta pelo homem de que foi deixado com o mundo nas mãos, e de que não pode mais

culpar a fortuna ou as fúrias pelo que faz. A secularização ocorre quando o homem desvia a

35 MONDIN, Battista. As Teologias do Nosso Tempo. 48 p

160

sua atenção dos mundos do além e a volta para este mundo e este mundo (saeculum = esta era

presente).

Segundo Cox, a secularização não tem por efeito a morte de Deus, mas antes a

purificação da nossa fé. Por isso o teólogo não a deve combater, mas antes favorece-la. Deve

aprender a falar de Deus de maneira secular e encontrar uma interpretação não religiosa dos

conceitos bíblicos. “De nada valerá o apego às nossas versões religiosas e metafísicas do

cristianismo, na vã esperança de que um dia a religião ou a metafísica reconquistem, uma vez

mais, a sua centralidade. Antes, se tornarão até mais periféricas, o que significa que podemos,

agora, nos libertar e nos envolver no novo mundo da cidade secular.”36

A teologia da Cidade do Homem tem como primeiro objetivo a busca de um novo

conceito de Deus. Cox, inspirado na Escritura, não concebe Deus como ser absoluto, imóvel,

perfeitíssimo, como verdade perene e imutável, como bondade suprema e infinita, mas como

pessoa viva, como verdade que se realiza, como bondade que se comunica. O Deus da Bíblia

não é o Deus abstrato e sem nome, mas o Deus com quem se pode contar, que não mortifica

as possibilidades humanas, mas que reforça e anima a sua criatividade e a sua capacidade de

dar ordem ao mundo.

O segundo objetivo da teologia de A Cidade do Homem é fornecer critérios de ação ao

cristão que esteja no mundo. Também estes critérios lhe são fornecidos pela Escritura. Esta

lhe ensina a não se acomodar ao viver tranqüilo, na resignação supina às situações cômodas

ou então de opressão. O Deus da Bíblia é um Deus revolucionário que quer do seu povo

gestos revolucionários. Isto explica porque é que o cristão se apresenta como um rebelde: é o

homem chegado à maioridade, que não se deixa determinar pelo mundo, antes assume a

responsabilidade de governa-lo, consciente de que isto é a missão que Deus espera dele. A

teologia da cidade secular deve despertar no homem este sentido perdido da responsabilidade.

Nesta mesma obra, Cox declara que é passado o tempo de apresentar a mensagem

cristã em categorias metafísicas ou em categorias existenciais e personalistas. Em vez da

metafísica clássica e do existencialismo moderno, para interpretar a mensagem cristã sugere a

linguagem política, porque na sociedade secular é a política que dá unidade e significado a

vida e ao pensamento humanos.

Sendo um dos mais coloridos teólogos contemporâneos, lançou-se a um modo

totalmente diferente de falar teologicamente, a Teologia Popular. Em A Festa dos Foliões

trabalhou de modo apaixonado a fantasia, o sentimento e as manifestações culturais como o

36 Idem, 49 p.

161

simbolismo, a festa, o jogo, a dança que, numa sociedade secularizada, tomada pela ciência e

tecnologia, ou não encontram reconhecimento ou são completamente sufocadas. Dar vazão a

semelhantes manifestações implica dar sentido a religião, porque esta se exprime naquelas.

Mas foi apenas em A Sedução do Espírito que ele tratou desse tema com relação a religião,

fazendo uma análise das principais manifestações religiosas da sociedade moderna. Ele

intenciona com isso mostrar a importância capital reservada à religião na cultura de qualquer

sociedade, defender a religião autêntica, que para ele é a religião popular, narração coletiva de

um povo inteiro, não só a religião da gente comum, mas todos e quaisquer rituais e liturgias

espontâneas, atacar e desmascarar as formas religiosas inautênticas e opressivas da sociedade.

Importa-se com este tema, porque nota que a religião é retomada em toda parte. “Da

astrologia ao Zen, do misticismo aos curandeirismos pentecostais, das danças estáticas às

salmodias, estamos a assistir um vasto renascimento de energia espiritual, mesmo que este

renascimento, a mais das vezes, suceda fora das igrejas institucionais.”37 Ele a define como

“um entrelaçado de memoriais e mitos, esperanças e imagens, ritos e hábitos que levam a vida

inteira de uma pessoa ou de um grupo a ser um todo significante... Dá coerência a vida,

fornece um substrato de significados, confere unidade aos acontecimentos humanos e orientas

as pessoas no plano da decisão.”38 Nesta obra ele registra a conversão da secularização para a

religião, mais precisamente do cristianismo secular para a religião popular. Cox tinha

abraçado o cristianismo secular durante a última fase de seus estudos acadêmicos na

universidade de Havard, sendo o seu mais famoso representante.

Ele também foi o primeiro autor importante a apoiar a teologia da esperança nos

Estados Unidos numa série de ensaios reunidos no volume Que a Serpente não decida por

nós. Mas a sua adesão foi de pouca duração, pois apenas dois anos mais tarde lançou-se a uma

nova aventura teológica, apresentando uma interpretação da mensagem cristã em forma

lúdica.

PAUL M. VAN BUREN

Biobibliografia

Paul M. van Buren, nascido em Norfolk, Virgínia, (1924 - ), foi aluno de Barth na

Basiléia, atualmente bispo e professor em filosofia na Temple University (Filadélfia), é um

37 Idem, 180 p. 38 Id., 181 p.

162

teólogo episcopaliano. Em O Significado Secular do Evangelho, realiza uma redução do

discurso teológico ao discurso cristológico, para depois descrever a confissão cristológica em

termos puramente históricos e éticos. Foi o primeiro a defender em forma teológica a doutrina

da “morte de Deus”. Partindo dos cânones do positivismo lógico, segundo o qual, podem ter

significado cognoscitivo só as proposições de caráter experimental, verificáveis, em última

análise, pelos sentidos, Ele conclui que termos como “Deus”, “sobrenatural”, “encarnação”,

“ressurreição” e conseqüentemente todas as proposições em que eles figuram, carecem de

significado: “não sabemos o que é Deus, e não conseguimos compreender de que modo é

empregada a palavra Deus”39. Portanto, se se quiser salvar a mensagem cristã, é preciso

expurgar o evangelho de tudo o que se refere a Deus e ao outro mundo. O cristianismo não

considera Deus mas Jesus Cristo e, naturalmente, não Jesus Cristo enquanto Deus mas

enquanto homem, enquanto encarna uma forma de vida de sacrifício, de amor para com o

próximo, de liberdade do ódio e das paixões. Querendo precisar o sentido do seu pensamento

teológico, van Buren exprimiu-se assim: “Procuro levantar uma questão importantíssima: se o

cristianismo é ou não fundamentalmente relativo a Deus ou relativo ao homem. E procuro

provar que é fundamentalmente relativo ao homem, que a sua mensagem relativa a Deus é

uma maneira antiga de dizer o que o cristianismo quer dizer do homem, da vida e da história

humana... E, se compreendo bem a natureza e o desenvolvimento do cristianismo, parece-me

justo defender que considera sobretudo uma certa forma de vida: modelos de existência

humana, normas de atitudes humanas e de conduta moral”40.

Abandona a teologia secular voltando para a transcendência radial, a qual interpela o

homem e exige dele uma resposta. Destarte uma teologia que seja ao mesmo tempo política

poderá ser uma teologia hoje.

WILLIAM HAMILTON

Biobibliografia

William Hamilton (1924 - ), docente em Theological Seminary de Colgate-Rochester

(N.Y.), mais do que uma teologia elaborou uma ética para os cristãos sem Deus. No ensaio A

Nova Essência do Cristianismo, Hamilton sonda com muito tato os problemas que ameaçam a

nossa fé em Deus, sobretudo o problema da dor, que na sua opinião constitui o maior

39 Id., 50 p. 40 Idem, 51 p.

163

obstáculo à aceitação da imagem tradicional de Deus. Afirma, repetindo quase à letra uma

famosa sentença de Dietrich Bonhoeffer: visto terem sido os cristãos a mancharem-se com os

horrendos crimes de Auschwitz e Bauchenwald, “quando a sua obra foi terminada, o seu Deus

tornou-se impossível”41.

A teologia de Hamilton nasce, portanto, como uma espécie de ‘fragmentos teológicos’,

empenhada em consolar o homem no sofrimento e em apresentar uma ética do cristianismo

ateu. Trata-se, porém, de uma reflexão que não suscita angústia, porque leva o homem a

descobrir o seu lugar no mundo sem Deus, oferecendo-lhe a possibilidade de uma ética

caritativa, de uma perspectiva otimista, que tende a transfigurar as vicissitudes humanas,

como o sexo e a morte, porque vê nelas a possibilidade de realizar uma troca recíproca de

fraternidade e de amor entre os homens. É uma ética fundada na imitação de Cristo: perdido

Deus, fica-nos a figura de Jesus, assumida também por Hamilton, como por van Buren, como

exemplo e símbolo de solidariedade humana.

Segundo Hamilton, se a teologia reconhece a morte de Deus, a fé transforma-se em

amor e a teologia em ética da responsabilidade que se orienta para figura de Jesus, que indica

um lugar onde ficar. O ateísmo cristão se distingue do ateísmo filosófico pelo fato de se

apoiar na tradição cristã, principalmente por considerar paradigmática a exemplaridade de

Jesus por sua plenitude de humanidade.

Hamilton fez algumas considerações a respeito da Cruz. Ele entende que o mistério da

cruz está hoje mais denso que nunca, penetrando profundamente todo o aspecto da fé e da

práxis cristã, a respeito disso tortura-nos o acúmulo de dores e sofrimentos que pesa sobre a

humanidade atual. O que pode induzir-nos a pensar que “Deus se retirou do mundo e dos seus

sofrimentos e isto leva-nos a acusa-lo ou de indiferença ou de crueldade. Mas em outro

sentido, ele é experimentado como um peso e uma ferida de que desejaríamos ser livres. Para

muitos de nós, que nos chamamos cristãos, por isso, acreditar no tempo da ‘morte de Deus’

significa que ele está presente quando não o queremos, ao passo que pelo contrario não esta

presente quando o queremos”42.

THOMAS ALTIZER

Biobibliografia

41 Id. 42 Idem, 155 p.

164

Thomas Altizer nasceu em 1927 e é professor na Emory University (Atlanta), a quem

se devem as exposições de O Evangelho de Ateísmo Cristão (1966) e Descida ao Inferno

(1970).

É o teórico mais decidido, poder-se-ia até dizer fanático, da teologia da morte de Deus.

Desta compôs uma súmula que leva o título O Evangelho do Ateísmo Cristão, título

decididamente bastante eloqüente. Como fundamento da sua teologia sem Deus, Altizer não

põe motivações lingüísticas como van Buren e nem éticas como Hamilton, mas um tipo de

argumentação dialética: a necessidade do desaparecimento de Deus para que o homem possa

atingir a perfeita maturidade, possa assumir todas as responsabilidades, possa tornar-se

efetivamente rei do universo. Para tornar possível tudo isso, para deixar espaço ao homem,

para lhe conceder a maior autonomia, segundo Altizer, Deus teria decidido aniquilar-se, e ter-

se-ia de fato aniquilado mediante a paixão e morte de Jesus na cruz. Por este motivo o ateísmo

não teria se tornado só legítimo, mas constituiria a própria essência do cristianismo.

De tais premissas ele tira duas conclusões. Primeira: os ateus do século passado e do

nosso são os representantes mais qualificados da fé cristã autêntica. Segunda: só o claro

reconhecimento da morte real de Deus torna possível o diálogo com o homem moderno: “Se

há uma porta de entrada para o século XX, esta é a passagem através da morte de Deus, do

colapso de todo significado ou realidade posta para além da imanência radical do homem

moderno recentemente descoberta, que faz desaparecer até a memória ou a sombra da

transcendência”43.

Quanto à aplicação do principio da cruz às questões relativas a Deus, aponta que ali

ele não só se humilhou, mas aniquilou-se completamente. “Morreu efetivamente por nós,

morreu como Deus para criar espaço à nossa liberdade para nos permitir tornamo-nos

autônomos e perfeitamente adultos”.44

Para Altizer o termo “o verbo se fez carne” é a tarefa que a teologia radical assume e

por isso precisa ser interpretada dialeticamente, neste caso significa que o Deus transcendente

desceu à carne do processo do mundo e morreu como transcendência vazia e isolada. Com

isso, a transcendência se inverte em imanência; o verbo se exprime, completamente, na

realidade do mundo e da história. A figura histórica de Cristo é um evento que perenemente

acontece num processo histórico, mas nesse caso a fé no Cristo torna-se fé num movimento

progressivo do verbo na história.

43 Id., 52 p. 44 Id., 156 p.

165

REINHOLD NIEBUHR

Biobibliografia

Reinhold Niebuhr nasceu em Wright City, Missouri (E.U.A), no dia 21 de Junho de

1892. Seu pai se chamava Gustav Niebuhr, que era um emigrante alemão que exercia as

funções de pastor numa paróquia de conterrâneos seus. Seu pai bem como a comunidade de

imigrados em que cresceu, o fez assimilar as tradições e a cultura da Alemanha. O fato de que

o pai era pastor da Igreja Luterana, o qualificou na sua futura vocação teológica. Por

influência do pai Niebuhr encaminhou-se para a vida pastoral. Realizou seus estudos no

Elmhurst College e no Eden Theological Seminary, que eram instituições pertencentes à

Igreja Luterana. Depois de ter se diplomado, foi fazer seus estudos universitãrios em Yale,

que era uma universidade de Divindades.

Em Yale, Niebuhr foi influenciado pelo teólogo norte-americano Macintosh que lhe

escancarou o mundo do saber filosófico e teológico. Com dez anos de estudos, conseguiu o

título de Master’s Degree em filosofia. Depois disso, interrompeu os estudos por razões

econômicas e porque a Epistemologia o aborrecia.

Em 1915 é ordenado ministro do evangelho numa igreja Luterana. Tornando-se pastor

de uma igreja de Detroit, onde trabalhou ininterruptamente até 1928. Foi principalmente a

experiência pastoral a grande importância para a formação do pensamento de Niebuhr.

Segundo suas palavras, o ministério pastoral o desenvolveu mais do que qualquer livro que

tenha lido.

Vivenciou uma perturbadora experiência em Detroit, durante seus treze anos de vida

pastoral, quando essa cidade teve uma explosão demográfica passando de meio milhão para

um milhão e meio de habitantes. Essa violenta explosão demográfica foi causada por uma

expansão industrial, tendo por conseqüência todas as “injustiças sociais que uma

industrialização sem critérios comporta: salários de fome, falta de moradias, ausências das

166

mais elementares condições higiênicas, analfabetismo, ódio, vinganças, criminalidade,

banditismo, etc”. 1

Diante desse quadro, os seus deveres paroquiais colocaram-no diariamente em contato

e Niebuhr percebeu que o ingênuo idealismo em que a fé cristã se dissolvera era irrelevante

nas crises da vida pessoal bem como nas complexas questões sociais de uma cidade industrial.

Os sofrimentos e incômodos em que viviam os operários de sua paróquia forneceram a

Niebuhr a inspiração para as suas primeiras obras. Em 1927, iniciou suas atividades de

escritor com um livro entitulado A Civilização Necessita de Religião? Suas obras iniciais,

eram inspiradas nos reformadores, em Santo Agostinho, em São Paulo, no Evangelho e no

Antigo Testamento, e mostrava a grave contradição existente entre os princípios do

liberalismo e as doutrinas da Sagrada Escritura, tornando-se o sustentáculo mais decidido do

realismo bíblico contra a simplista fé no progresso que tomara conta de todos, Igreja e

Universidade, governo e indústrias.

Em 1928, Reinhold Nibuhr é nomeado Associate Professor de Filosofia da religião no

“Union Theological Seminary” de Nova York. O ensino o forçou a estudar. Então, dirigiu

suas investigações para as fontes do cristianismo. As fontes eram Lutero, Calvino, Barth e

Brunner, mas principalmente, São Paulo e Santo Agostinho. Com eles, queria respostas que

viesse libertar finalmente da noção de que fé cristã fosse de algum modo idêntica ao idealismo

moral do século passado.

Da cátedra, Niebuhr lutou contra os santuários seculares das tradições do

protestantismo liberal norte-americano. Ensinava, pregava e escrevia que o homem e a

sociedade moderna estão profundamente enfermos; porque a tendência para o mal está

inscrita na própria natureza do homem.

Durante muito tempo, Niebuhr foi tratado comoKierkegaard, sendo acusado de

iconoclasta e subversivo. Porém, quando a teologia dialética começou a fazer ouvir seus ecos

nos Estados Unidos, ele começou a encontrar admiradores e seguidores, foi conquistando

prestígio sempre maior, ao ponto de ser considerado o maior teólogo produzido pelo Novo

Continente.

Em 1928, Niebuhr seguiu um curso ministrado por Brunner no Union Theological

Seminary sobre a teologia da crise. Em 1933 convidou Paul Tillich a deixar a Alemanha e se

1 Battista Mondin – Os grandes Teólogos doSéculo XX – p. 91

167

instalar no Union Theological Seminary, e durante vários anos foi um dos mais assíduos

acompanhantes de Tillich, sendo um dos mais hábeis divulgadores de suas doutrinas junto ao

público norte-americano; mas não totalmente, ao ponto de fazer mudanças ou até mesmo

refutar escritos de Brunner e Tillich.

Desenvolveu um tipo de teologia dialética nova e original, transplantando seus

conceitos do discurso teológico para o discurso da filosofia da cultura e da crítica social e

animando-os com seu espírito profético. Desse modo, ele esclareceu tanto a essência do

mundo atual como a da fé cristã. Com Niebuhr, a teologia irrompeu no mundo; saiu do

período de quarentena e literatos, filósofos, sociólogos, historiadores e até mesmo homens

políticos começam a prestar-lhe atenção. Com ele a teologia tornou-se novamente uma das

forças espirituais a serem levadas em conta.

Bastante ativo também no plano político, ingressou no Partido Socialista Norte-

americano, do qual saiu em 1940 para ingressar nas fileiras dos liberais. Em 1960, deixou o

ensino no Union Theological Seminary. Mas continuou escrevendo e pronunciando

conferências, até poucas semanas antes de sua morte, que ocorreu em 1o de Junho de 1971.

Escreveu uma vasta produção teológica mas emergem três obras maiores: Moral Man

and Immoral Society – aborda o problema da licitude da revolução. Segundo ele, o que é

condenável sempre e em toda parte é a vontade má e não a violência.

Em The Nature and Destiny of Man e em Faith and History, confronta as concepções

clássicas e modernas da natureza e do destino do homem e da história com a concepção

bíblica.

Além dessas três obras fundamentais, temos: Does Civilization Need Religion? Leaves

fron the Notebook of a Tamed Cynic; The Contributions of Religion to Social Work; Na the

Christian Interpretation of Christian Ethics; Beyond Tragedy: Essays on the Christian

Iterpretation of History; Christianily and Power Politics, idem; Reclections on the End of an

Era; Discerning the Signs of the Times: Sermons for Today and Tomorrow; The Irony of

American History; Christian Realism and Political Problems; The Self and the Dramas of

History; Structure of Nations and Empires: The Children of Light and the Children of

Darkness: Pious and Secular America.

Pensamento Teológico

Tornou-se conhecido por seu pensamento original no campo da ética, da apologética e

por sua participação em atividades públicas. São três as principais características que

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contribuem para um melhor entendimento do seu pensamento: seu caráter assistemático, o

existencialismo e o equilíbrio.

Niebuhr afirmava não ser nem pretender ser teólogo, por não ser um especialista em

delicadas questões de teologia pura. Partindo da Palavra de Deus como fonte de luz e

inspiração, ele visa compreender o acontecimento pessoal do indivíduo e o acontecimento

global da humanidade, mas sem se preocupar em construir uma dogmática em que os

princípios essenciais da fé sejam dispostos em ordem lógica e coerente.

O existencialismo é uma marca que Niebuhr te em comum com todos os teólogos

dialéticos. Só que nele é ainda mais justificada, em virtude do sentido histórico de sua

reflexão teológica.

A forma do seu pensamento deriva de sua vontade de colocar a fé em contato com a

vida, com a existência e com tudo aquilo que a vida e a existência do homem desenvolveram:

psicologia, sociologia, história, política, ciência, etc.

A outra característica, o equilíbrio é um esforço constante para manter-se numa

posição intermediaria entre todos os extremismos, entre o marxismo e o liberalismo em

política, entre o naturalismo e o idealismo em filosofia, entre o fundamentalismo e o

racionalismo em teologia.

Niebuhr se define como um apologista. Ele vai dizer que a sua vocação dirigiu seu

interesse para a defesa e a justificação da fé cristã numa era secular, especialmente entre os

depreciadores intelectuais do cristianismo.

Segundo Niebuhr, “todas as tentativas para salvar a religião suavizando a

irracionalidade do seu dogma fundamental, o da intervenção de Deus na História, são

ineficazes”. 1

A verdadeira apologética procura mostrar a validade do cristianismo sem sacrificar

nada do paradoxo cristão. Não esconde o paradoxo cristão nem o reduz a proposições

abstratas, mas sim vive cotidianamente este paradoxo. E é exatamente através da prática da fé,

por meio da expressão visível do encontro com Deus que ela procura tornar crível o

cristianismo. “As conseqüências criativas de tal encontro, a humanidade e a caridade do

verdadeiro arrependimento, a ausência de orgulho e de pretensões deve ser as provas de que

ouve um encontro com o único Deus verdadeiro e não com um ídolo da nossa fantasia,

inventado para sustentar alguns de nossos interesses e tão pouco com o vasto oceano do tudo

e do nada, que condena a nossa individualidade e particularidade num juízo em que toda a

nossa vida é também aniquilada”. 2

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A segunda propriedade da verdadeira apologética é a específica da apologética

teorética, que consiste em validar a visão cristã diante de qualquer outra visão. Segundo

Niebuhr, só há um caminho possível de efetuar a validação: “Na medida em que é possível

provar que as explicações que se colocam como alternativas à ela não conseguem explicar

todos os aspectos da existência humana e em que os pressupostos basilares da fé cristã,

mesmo transcendendo a razão, permitem dar uma explicação da vida e da história em que

podem ser compreendidos todos os fato e antinômias da história”. 3

“A terceira característica da autêntica apologética é a consciência crítica, que submete

a visão cristã a um constante exame, para identificar os erros que estão misturados a ela”. 4

“A quarta característica é a incorporação daquilo que há de verdadeiro nas outras

visões à verdade suprema do evangelho”. 5

Para Niebuhr, são três os maiores perigos aos quais está exposto o apologista:

obscurantismo, idolatria e legalismo. A fé cristã sofre as conseqüências do esforço

obscurantista no sentido de preservar as suas verdades na época da ciência darwiana,

desafiando as evidências incontestáveis adotadas por cientistas honrados e honestos. O

apologista está também exposto ao perigo da idolatria. Ele pode ser tentado ao utilizar o seu

conhecimento da verdade para reclamar uma aliança especial com Deus contra os inimigos da

igreja. o legalismo é o terceiro perigo. Em princípio, o cristianismo é mais uma religião do

espírito do que da lei: firmes na liberdade de que Cristo nos fez livres. Mas os formalismos

exercivos de que se revestiu o cristianismo histórico estão em flagrantes contrastes com amor,

alegria e a paz que caracterizam uma conversão genuína e não suportam um confronto com a

liberdade dos melhores idealistas seculares. Com isso Niebuhr quer dizer uma apologética

cristã genuína deve estar pronta a levar o juízo de Deus, com o mesmo rigor tanto ao edifício

da fé como ao mundo secular e pagão.

No contexto da antropologia cristã e da teologia da história, introduziu com habilidade

os dogmas do cristianismo: Deus, Cristo, pecado, graça, Revelação, Igreja, Sacramentos.

Tratando do homem, trata também do pecado, a dura verdade que a teologia liberal esquecera;

trata da graça, que é o remédio do pecado.

Outra característica importante, é que o homem é compreendido primeiramente a

partir do ângulo de Deus, ao invés do ângulo da unicidade, de suas faculdades racionais ou de

suas relações com a natureza: ele é concedido como imagem de Deus.

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A terceira característica da visão cristã do homem é que ele é pecador. O homem é um

pecador. O seu pecado é definido como uma rebelião contra Deus. O pecado consiste no uso

errado da liberdade e na destruição que daí deriva.45

Niebuhr referia-se a Deus como o inteiramente outro; frisava o pecado original e

trágica posição do ser humano por perceber o ideal da perfeição.

O homem é livre e responsável, embora afetado por um elemento demoníaco que

arruina a tudo. Assim sendo o conflito interno e externo de um homem vai além de um

simples processo histórico.

Falava sobre Jesus como a chave do mistério da existência humana, o símbolo de um

poder e de amor constante.

Na política, evitava as teorias utópicas, mas promovia uma espécie de realismo liberal,

capaz de reconhecer as irracionalidades do homem a fim de dar-lhes uma nova direção

racional. As mudanças institucionais são essenciais e mais importantes que as transformações

do coração humano.

O liberalismo religioso era demasiadamente ingênuo, no tocante ao verdadeiro estado

ético do homem.

Via na Bíblia uma dramática apresentação da verdade e não uma apresentação

metafísica.

BILLY GRAHAM

Biobibliografia

Cerca de 50 milhões de pessoas já assistiam as reuniões em que Billy Graham

pessoalmente. Incontáveis milhões ouviram-no ou viram-no através do rádio, televisão ou

filmes. Aproximadamente um milhão “ vieram á frente” durante as campanhas de Billy

Graham. Ele é o confidente de estadistas e governantes e suas opiniões são citadas em todo o

mundo. Seus atos, motivos e conquistas têm sido debatidos, atacados e defendidos como os de

poucos líderes religiosos contemporâneos.

Na infância de Billy Graham, a derrota de 1865 e a época da Reconstrução, de que

apenas os mais idosos se lembravam, prevaleciam no sul dos Estados Unidos. Havia muita

45 - Idem – p. 100 5 – ibid – p. 100

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pobreza, e alastrava-se o ressentimento surgido da idéia de que os antigos Estados

Confederados inda sofriam discriminação e punição por parte do norte, que não sabia perdoar.

A instrução primaria de Billy Graham foi quase tão pobre quanto a de Abraham

Lincoln. Uma das principais razões foi o baixo nível do ensino em geral. Na Escola Ginasial

Sharon, bem no interior do país, dois ou mais três professores nunca tinham freqüentado

Universidade. Mesmo que o ensino fosse melhor, ele pouco teria aproveitado, pois com a

idade de dez ou doze anos já julgava ter o conhecimento e o bom senso suficientes para um

futuro fazendeiro, atitude esta que foi levemente encorajada pelo pai, mas firmemente

combatida pela mãe.

A única característica notável da vida intelectual de Billy, nos primeiros anos, foi um

excepcional amor à leitura de livros de História. Quando completou quatorze anos já havia

lido cerca de cem.

Depois, que Billy tinha mais ou menos quinze anos, uma sucessão de acontecimento o

levou diretamente à mais profunda experiência de sua meninice.

Em 1933, a Sra. Graham começou a participar de um grupo de estudos da Bíblia,

devido à insistência de sua irmã, Lil Barker, e então aprendeu “ que o Senhor entrou e vive

dentro de nossos corações. Eu nunca havia conhecido essa verdade antes.” Seu marido

permaneceu indiferente. Suas energias eram absorvidas pelo sítio, especialmente desde que

havia perdido todas as economias numa recente onda de falências bancárias.

Três semanas depois que a Sra. Graham começou a participar da classe bíblica, Frank

Graham fraturou a cabeça, atingido por um pedaço de madeira que voou da cerra mecânica.

Os cirurgiões achavam que ele morreria. A Sra. Graham, depois de chamar os seus amigos

cristãos para orar, subiu ao seu quarto e, diz ela: “ Literalmente me agarrei ao Senhor.

Levantei-me com a certeza de que Deus ouvira a minha oração”. Tanto ela como o marido

chegaram à conclusão de que através do acidente de Frank, e seu completo restabelecimento,

“o Senhor realmente falou conosco”, e que deviam encontrar mais tempo mais tempo para o

estudo da Bíblia e para a oração.

A batalha interior continuou: no banco escolar, jogando basquetebol no ginásio,

ordenhando no estábulo. Nada revelou aos pais (“nós suspeitávamos, e estávamos confiando e

orando”), mas conversou com um primo, Crook Stafford, que o encorajou a ir à frente,

embora ele mesmo não o tivesse feito até então. Na noite seguinte, Billy mudou de lugar

outra vez, e assentou-se nos primeiros bancos. O sorriso de Ham parecia ser-lhe diretamente

dirigido; Billy, erradamente, estava certo de que Ham sabia algo a seu respeito e que suas

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citações eram especialmente para ele: “ Mas Deus prova o seu próprio amor para conosco,

pelo fato de ter Cristo morrido por nós,sendo nós ainda pecadores”.

Ham fez o apelo. Billy ouvio o couro cantando “Tal qual estou” verso por verso,

enquanto pessoas se foram reunindo ao redor do púlpito. Billy permaneceu sentado, a

consciência lutando contra a vontade. O coro começou: “Quase induzido a crer em Jesus”.

Billy não pode resistir mais e foi à frente.

“Não se tratava apenas de um ato mecânico de ir a frente, no estilo de uma campanha

de avivamento sulista. Era Cristo. Eu estava plenamente consciente dele”.

Um homem baixo, de cabelos e olhos negros, aproximou-se do jovem, Billy o

conhecia e gostava dele: J. D. Prevatt, um inglês, dono de uma alfaiataria. Eles conversaram e

oraram juntos. Billy experimentou um “profundo sentimento de paz e alegria”, enquanto ao

seu redor muitos estavam em lágrimas; ele preocupou-se um pouco com isso, por não sentir

tanta emoção. Seu pai, todavia, como McMakin bem recorda, “atravessou o recinto para

abraçá-lo fortemente, e agradecer a Deus pela sua decisão”.

Naquela noite, Billy Graham subiu as escadas de casa, passou junto ao velho relógio

da família, que marcava ruidosamente as horas, noite e dia, e trocou-se no escuro, porque

Melvin já estava dormindo. A lua ia alta no firmamento, e Billy olhou demoradamente as

terras de seu pai, depois deitou-se, permanecendo acordado por horas, sem sentir emoção

alguma, passando em revista, no contexto do seu mundo de adolescente, quais deveriam ser as

atitudes de um indivíduo que pertencesse a Cristo. Caiu no sono, contente e em paz, com uma

pequena dúvida: “Será que isto vai durar muito?”

Nos que se seguiram, era mais evidente para o próprio Billy Graham do que para

qualquer outra pessoa, que “algo tremendo” havia acontecido em seu intimo.O diretor da sua

escola, Connor Hutchinson, notou-o, bem como sua mãe: “Billy tornou-se mais pensativo,

muito amável, mais quieto... Nas menores coisas, essa mudança era muito clara.” Billy sentia

no mais profundo do seu ser que uma comunhão que dificilmente podia ser compreedida

pelos outros, e que nem ele mesmo sabia formular, pois estava alèm dos sentidos, havia

começado com alguém tão real como as pessoas de carne e osso ao seu redor, e por isso

estava cônscio de novos interesses, novos padrões. O mundo inteiro parecia diferente e ele

não teve duvidas de que era a isto que a Bíblia chamava “o novo nascimento”.

Em princípios de 1936, Jimmie Johnson, jovem evangelista do Alabama, de boa

aparência, olhos brilhantes e voz forte, levou o jovem Blly Graham, que agora tinha 17 anos,

para um culto na cadeia de Monroe, a uma distancia de 50 quilômetros de Charlote. No meio

da pregação, Johnson disse, de repente, num impulso: “Eis aqui um rapaz que poderá dizer o

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que a gente sente quando se converte.”Um Billy surpreso e horrorizado, começou gaguejando

e, de acordo com as suas memórias , “ o que consegui dizer foram só três ou quatro frases”.

Johnson recorda de maneira diferente: “Todos nós ficamos surpreendidos pela sua humildade

em falar. Ele fez um bom trabalho naquela prisão”.

Nem remotamente, Jimmie Johnson considerou Billy como um candidato à fama ,

mas, simplesmente um “jovem alto, desajeitado, imprevisível”, embora tivesse “muita

personalidade. Era uma pessoa muito simpática.

De vez em quando, Billy testificava, juntamente com outros membros do seu Clube

Bíblico, quando realizava cultos improvisados nas calçadas. Na memória de Grady, contudo,

ele era “apenas confuso. Ficava ali, em pé, amarfanhando o paletó, nervosamente.Para mim,

não passava de alguém terrivelmente acanhado e tímido”.

Um contemporâneo seu na escola, cuja religião, segundo a sua própria definição, é

nominal, jamais esqueceu como Billy “tinha sentimentos tão maravilhosos intensos a respeito

de tudo, que desejava reparti-los com todos nós”. O treinados de beisebol, Clinton Eudy, que

agora é advogado na cidade de Salisbury, em Carolina do Norte, recorda Billy em seus

últimos anos de escola, como uma interessante, contraditória e inspiradora mistura de santo e

demônio, predominando o se lado santo”.

Depois de 1934, Billy Graham dedicou-se aos estudos, mas precisaria trabalhar muito

para ganhar o tempo que perderá , e na Escola Sharon não conseguiram ensinar-lhe a

importante disciplina de estudar com diligência. Ele preferia estudar sozinho, o que mais lhe

interessasse. Antes de formar-se, já havia lido no começo ao fim O DECLÍNIO E A QUEDA

DO IMPÉRIO ROMANO, de Gibbon, bem como os primeiros trabalhos acerca da civilização

americana, escritos por Charles e Mary Beard. Ele ainda não tinha idéia de qual a carreira a

seguir, exceto a decisão de não sr lavrador. Desejava entrar na Universidade de Carolina do

Norte. Sua mãe, no entanto, sentia tal admiração por Jimmie Jhnson, que escolheu a sua

escola, a Faculdade Bob Jones, em Cleveland, no Tennessee, por ser instituição de sólidos

princípios cristãos.

Dentro das suas dificuldades de saúde retornou para Charlotte: “Billy”, disse Jones,

“se você sair e for desperdiçar a sua vida em um pequeno instituto bíblico de roça, o que pode

acontecer é que ninguém jamais ouvirá falar de você. No máximo, poderá chegar a ser um

pobre pregador batista, no interior.”

Nos primeiros meses de 1938, quando Graham completou uma no em Temple Terrace,

e tinha dezenove anos de idade, continuava sendo ainda um indisciplinado. “Eu ainda não

tinha um propósito , mas estava interessado na Bíblia; tinha-me convertido, desejava conhecer

174

a Bíblia. Porém era ainda descuidado, irresponsável.”Para empregar uma frase que ele mesmo

usava muito naquela época: “Eu não valia muita coisa”.

Três fatos importante fizeram dele um homem de propósito inabalável e de intensa

convicção.

Dois cristão a quem Billy Graham admirava, e de quem muito aprendera, foram

acusados de sérias falhas morais, e ele ficou profundamente abalado. Aprendeu que um

homem podia falar piedosamente, ajudar aos outros, e, apesar disso, ser ele mesmo um

réprobo. Graham decidiu que jamais em sua vida iria permitir algo que ofendesse o nome de

Cristo. Chegou, também, à conclusão de que tal coisa poderia acontecer, a menos que tomasse

sua vocação a sério. Os escândalos “fizeram-me olhar para Deus, invés de olhar para o

homem. Compreendi que qualquer homem pode ter pés de barro. Paulo disse: “ Não

confiemos na carne”. Isto foi uma lição precoce que me ajudou tremendamente através dos

anos”.

O evangelista Billy Graham: o qual, quase meio século, tem pregado com base na

Bíblia para ouvintes ao redor do globo. Na realidade, ele é um evangelista itinerante, no

sentido que tem buscado almas ao redor do mundo. Viajando de avião, trem e navio ele tem

dirigido cruzadas por todo os Estados Unidos da América e na maioria das capitais européias,

na América do Sul e na África do Sul, bem como no Extremo Oriente. Mais de dois milhões

de pessoas tem aceitado o seu convite de aceitar publicamente a Jesus Cristo como seu Senhor

e Salvador.

O “grande fracasso”de Billy Graham em sua vida de acordo com uma entrevista por

ele cedida à revista Time, por ocasião de seu septuagésimo quinto aniversário em 1993, foi de

natureza intelectual. Ele sentia que não tinha devotado tempo e energia suficiente ao estudo

acadêmico de teologia e das Escrituras, mesmo quando teve oportunidade para fazê-lo. Em

lugar disso, reconhecendo a sua própria falta de intelecto, e, de fato, falta de apetite quanto à

teologia, ele resolveu fazer da Bíblia o seu texto, apegando-se ao mesmo.

A pregação de Billy Graham tem sido a exposição da Bíblia inteira, do começo ao fim,

do Gênesis ao Apocalipse. Ele fez uma certa variedade de referência tópicas, ao longo do

caminho , dúzias delas em qualquer de seus sermões. Se o grande Dwight L. Moody pôde

inserir quatorze histórias ilustrativas em um só sermão, assim também Billy Graham pôde

ilustra os seus sermões com um redemoinho de muitas crônicas anedotas e títulos. Mas à parte

de cada referência transitória, que tinha apenas a finalidade de ilustrar algum ponto que ele

estava salientando, a sua pregação continua tendo por centro Jesus, o verbo da Palavra de

Deus , a Bíblia.

175

Não-atravancado, e, na verdade, sem estar tolhido, por alguma agenda social ou

teológica, que pode estar na moda um dia, mas ultrapassada já no dia seguinte, a pregação

dele sempre teve uma certa pureza de tom. Ela leva os seus ouvinte até o passado distante, até

os dias dos apóstolos, onde eles tem a impressão de estarem ouvindo a algum evangelista

norte-americano contemporâneo, com um senso de urgência na voz,mas, sim,a Paulo,Pedro

ou Timóteo, falando com um entusiasmo irresistível acerca do homem chamado Jesus.

Obtemos a mesma impressão quando lemos o livro de Billy Graham. Isso não quer

dizer que Billy Graham seja como ler os evangelhos. Mas é a mesma coisa que dizer que esta

coletânea de extratos das obras publicadas de Graham, o cristão fiel, contém os pensamentos

do evangelista sobre os mesmos tópicos escolhidos pelos autores dos quatros evangelhos e das

epístolas do Novo Testamento.

Billy Graham freqüentou o Bob Jones College, o Florida Bible Institute, e,

finalmente, o Wheaton College, no stado de Illinois. Foi ali que conheceu a Ruth Bell, filha de

missionárias que tinha trabalhado na China. Ela mesma desejava fazer grandes coisas em

favor do Senhor, como converter o Tibete; em lugar disso, ela aceitou a proposta de noivado

do jovem, com elevadas esperanças, e acabou por casar-se com ele.

Pensamento Teológico

Está voltado em torno das cruzadas evangelística aonde em suas mensagens Billy

Graham discute e responde algumas das perguntas básicas em relação à terceira pessoa da

Trindade sobre a qual muito se fala hoje em dia, às vezes sem o conhecimento adequado:

Quem é o Espírito santo? O que ele faz? De onde ele veio? O que ele está fazendo mundo

hoje em dia? O que é blasfemar contra o Espírito Santo? Como ele se comunica com sua

criatura? Porque ele veio ao mundo? O que é o batismo do Espírito?

Além de tudo isso Billy Graham afirma que o Espírito Santo está ativo em nosso

mundo. Ele não é uma influência longínqua nem uma força misteriosa. Não há nada que Deus

seja e o Espírito não! Apesar de não podermos compreende-lo completamente, ainda

podemos experimentar. Sua realidade e seu poder cada dia.

Observamos que a Teologia de Billy Graham da ênfase –O Espírito Santo, aonde ele

conta uma história: Uma velha lenda indígena conta de um índio que desceu das montanhas e

pela primeira vez viu o oceano. Maravilhado com o que via, ele pediu um balde. Depois

entrou pouco mar a dentro e encheu o balde. Quando lhe perguntaram o que estava fazendo

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ele respondeu: Lá nas montanhas meu povo nunca viu as Grande Äguas. Vou levar este balde

cheio para eles, para que possam ver com que elas se parecem.

Billy Graham fala sobre este assunto tenta escrever um livro sobre um assunto tão

vasto como é o Espírito Santo é como tentar pôr o oceano em um balde. O assunto não tem

limites – e as nossas mentes são tão limitadas.

Billy Graham expressa a sua preocupação em visualizar o que a Bíblia tem a dizer

sobre o Espírito Santo. A Bíblia- inspirada pelo Espírito Santo é nossa única fonte de

informação digna de confiança , e toda ánalise bem fundamentada da pessoa e da obra do

Espírito Santo tem de ser baseada biblicamente. Entendi, como nunca antes, que há algumas

coisas que nunca compreederemos totalmente, e que alguns assuntos permitem interpretação

diferentes por cristão sinceros. Em áreas onde há diferenças honestas entre cristãos eu tentei

não se dogmático.

O ponto Teológico cristã de Blilly Graham não é nada mais nada menos do que uma

tentativa por mudar-se o pensamento dos homens d modo que se convertam a Cristo Jesus.

Billy Graham o evangelista cristão mais renomado em todo mundo, tendo proclamado o

evangelho de Cristo a muitos milhões de pessoas. É autor de diversos livros sobre a vida cristã

e as doutrinas bíblicas. O cristianismo é doutrina que se propõe a ser vivida.

Bibliografia:

GRAHAM, Billy. “O Cristão Fiel”. Ed. Proclamação. SP.

______________. Biografia Autorizada. Ed. Betânia.

______________. “O Espírito Santo”. Ed. Vida Nova. 1988.

MARTIN LUTHER KING JR.

A história está repleta de casos de violações dos direitos humanos. Contra tais

injustiças, lutaram homens e mulheres que, em comum, tiveram a disposição de combater

destemidamente a desigualdade. Martin Luther King Jr. era uma dessas pessoas. A exemplo

do pai da independência da Índia, Mahatma Gandhi, Luther King tornou-se defensor da

filosofia da não-violência e liderou, a partir de 1955, uma campanha pacífica pela justiça para

o povo negro americano. A idéia era derrubar os preconceitos que a abolição da escravatura

conseguida por Abraham Lincoln em 1863, durante a Guerra Civil Americana, não havia sido

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capaz de destruir. A liberdade obtida pela nova Constituição não livrou os negros da

discriminação, especialmente nos estados do sul dos EUA, onde a divisão racial era amparada

pela lei. Naquela época, nenhum negro podia freqüentar um restaurante reservado a brancos

ou sentar em lugares reservados a eles.

Após a Guerra Civil americana, a situação piorou. Todas as terras eram de propriedade

dos brancos e, na prática, embora livre, a população negra manteve-se pobre e perseguida.

Seis décadas depois, nascia Martin Luther King Jr. (15 de janeiro de 1929, em Atlanta, no

estado da Geórgia, cidade do extremo sul dos EUA). O pai era pastor da Igreja Batista

Ebenezer. Por isso, Luther King Jr. passou a infância memorizando versículos da Bíblia e

cantando gospels para a congregação. E, como toda criança negra, cresceu marcado pelo

preconceito racial. Antes dos treze anos de idade, tentou o suicídio duas vezes, tomado pelos

fantasmas de sua condição de negro em uma sociedade que não admite tal fato. A primeira

tentativa deu-se quando sua avó, Jannie Williams, sofreu um acidente que fez com que

perdesse a consciência. Julgando-a morta, Martin saltou da janela do primeiro andar sob os

olhares atônitos da família. Quando, em1941, sua avó realmente morreu, Martin tornou a

saltar do primeiro andar, e mais uma vez não sofreu mais do que pequenos arranhões.

Em 1935, Martin entrou na escola pública, passando, passando, em seguida para uma

instituição privada, a Escola Experimental da Universidade de Atlanta, freqüentando depois a

Escola Secundária Booker T. Washington.

A esta altura, a família King muda-se para uma rua bem mais rica, ocupando uma bela

casa. Martin já é então um pastor influente, ocupando importantes cargos junto a todos os

conselhos de direção dos mais variados movimentos em favor dos negros da Atlanta, o que

provocava o recebimento de cartas anônimas e constantes telefonemas injuriando-o e

ameaçando-o de morte. Este clima de ameaças serviu para despertar em Martin a real

consciência do mundo em que vivia, levando-o a meditar sobre as terríveis contradições

sociais que geravam tanto ódio, tanta violência, tanta desumanidade.

Em setembro de 1944, Martin entra para o Morehouse College. Optando pela

sociologia, mostrou ser um ótimo estudante. Em junho de 1948, recebe o seu diploma,

deixando assim o campus universitário, onde foram plantadas as sementes intelectuais no

espírito sensível e emotivo do jovem futuro líder que viria a se projetar no mundo inteiro.

178

No outono de 1948, Martin Luther King Jr. Sai de Atlanta e dirige-se para a cidade de

Chester, Pensilvânia, ingressando na Faculdade de Teologia Crozer.

Martin já se encontrava plenamente consciente da explosiva situação mundial,

semeada de conflitos sociais de toda espécie, que permaneceram latentes até o término da

Segunda Grande Guerra Mundial.

Em junho de 1951 recebe o seu diploma de Teologia. Quase que imediatamente,

inscreve-se no curso de Filosofia da Universidade de Boston, para onde segue no outono

seguinte. É nesse período que conhece Coretta Scott, a bela e inteligente moça que viria a ser

a sua esposa, a companheira nos dias luminosos e também nos trágicos. O casamento se

realizou a 18 de junho de 1953. em setembro de 1954, Martin torna-se pastor da Igreja

Batista da Avenida Dexter,em Montgomery, Alabama, dando início à sua cruzada pelos

direitos civis.

Na primavera de 1955, Martin recebeu seu diploma de doutor em Filosofia. Nessa

época, entre todos os aspectos do segregacionismo em Montgomery, o mais degradante era o

regulamento da Companhia de Ônibus da Cidade de Montgomery.

No dia 1º de dezembro de 1955, a srª Rosa Parks, uma costureira negra de quarenta e

dois anos, fatigada por um dia de trabalho, entrou num ônibus super lotado para voltar para

casa. Assentou-se num lugar vago, na sessão reservada aos negros. Quando o ônibus lotou, o

motorista ordenou aos negros que se levantassem para que os brancos pudessem sentar-se, e a

srª Parks, mais por cansaço que por espírito revolucionário, negou-se a ceder seu lugar. Foi

imediatamente presa e levada para o Palácio da Justiça. Rosa foi libertada sob fiança por E. D.

Nixon, homem que sempre se dedicou à luta pelos direito civis; e foi ele quem, cheio de tantas

injustiças, entrou em contato com todas as associações e movimentos dos negros. A idéia do

Conselho Político Feminino de realizar um dia de boicote aos ônibus logo começou a

germinar e foi tão bem aceita que durou trezentos e oitenta e dois dias.

No dia seguinte, 2 de setembro, Martin foi chamado por Nixon, para uma assembléia

com mais quarenta representantes de todas as sessões negras da cidade, onde foi decidido por

unanimidade o boicote, que teria lugar no dia 5 de dezembro. O movimento foi um sucesso

total, tendo 99% de eficiência, e estendendo-se até meados de janeiro de 1956, quando a

polícia resolveu prender Martin Luther King Jr., alegando excesso de velocidade. Com sua

prisão, mais unidos ainda ficaram os negros.

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No dia 30 de janeiro de 1956, Martin proferia um discurso em uma das reuniões ,

quando lhe deram a notícia de um ataque a bomba em sua residência. Uma multidão de negros

enfurecidos formou-se em frente à casa de Martin, querendo fazer justiça com as próprias

mãos aos que tão injustamente o perseguiam. Martin, usando sempre da sua política de não-

violência, pediu que depusessem as armas e voltassem para as sua casas, usando para

encerrar: “Devemos responder ao ódio com amor.”

A 20 de dezembro de 1956, chegou a Montgomery a ordem da Suprema Corte,

declarando ilegal a segregação nos ônibus. Era o fim do boicote que durara mais de um ano, e

uma grande vitória para Martin Luther King Jr., que nessa ocasião tornou-se mundialmente

famoso.

Posteriormente à sua campanha pela integração racial, Martin foi mundialmente

reconhecido com a consagração do Prêmio Nobel da Paz, que lhe foi concedido em 1964, cujo

valor, cerca de cinqüenta mil dólares ele destinou aos movimentos em prol dos direitos civis.

Ao receber o prêmio em Oslo, perante numerosa assembléia, King afirmou que o

recebia em nome de milhões de negros americanos que lutam “para dar fim à longa noite de

injustiças raciais.”

Nos Estados Unidos sua ação foi reconhecida pelo presidente John F. Kennedy que

antes de ter um destino semelhante ao seu, deu extraordinário impulso à legislação destinada a

pôr fim “a maior chaga interna dos Estados Unidos”, como já foi qualificada a discriminação

racial que vigorava e ainda vigora, especialmente nos Estados do Sul.

No início de 1965, na luta pelos direitos reais dos votos dos negros no Estado do

Alabama, Martin foi preso pela décima vez. Mas sua campanha de não-violência conseguiu

impor-se, apesar de terem sido detidos na ocasião, juntamente com seu líder, cerca de três mil

negros.

Em 4 de abril de 1967, o pastor Martin Luther King Jr. levantou-se na igreja de

Riverside, em Nova York e proferiu a mais violenta investida contra a ação dos Estados

Unidos no Vietname, concitando os negros americanos a se recusarem no serviço militar “por

motivos de consciência”. Com essa atitude ele atraiu para si grandes críticas, pois estava

levantando dúvidas sobre a lealdade do negro à sua pátria, mas de qualquer maneira estava

dentro de sua política de não-violência, fosse qual fosse a sua situação.

180

Suas campanhas fizeram com que fosse constantemente ameaçado de morte.

Telefonemas e cartas prometiam-lhe o pior. King conservava certa resignação a respeito,

pronunciando em 1962 frases que seriam proféticas se consideradas à luz do seu trágico

desaparecimento: “Podem crucificar-me. Posso mesmo morrer. Mas mesmo que isso me

aconteça quero que digam: ele morreu para libertar os homens.”

Em um de seus discursos mais famosos, “I Have a Dream”(Eu tive um sonho), Martin

declarou: “Nunca estarei satisfeito até que a segregação racial desapareça da América. Eu

sonhei que algum dia sobre as colinas da Geórgia os filhos de escravos e os filhos de velhos

senhores estarão prontos para sentarem-se à mesa da fraternidade. Eu sonhei que o estado do

Mississípe, hoje dominado pela injustiça e pela opressão tornar-se-á algum dia um oásis de

liberdade e justiça. Eu sonhei que meus bisnetos viverão em uma nação em que não serão

julgados pela cor da pele mas por seu caráter.”

Orador apaixonado e persuasivo, considerado por muitos como o melhor dos Estados

Unidos, Luther King tornou-se capa da Revista Times, de 3 de agosto de 1964, recebendo o

título de “Homem do Ano”, em 1963.

Martin Luther King Jr., o guerreiro pacífico, revelou ao povo seu poder latente; o

protesto não-violento de massas, firmemente disciplinado, capacitou-o a avançar contra seus

opressores num combate eficiente e sem derramamento de sangue. Ele revelou à nação quem

era o oprimido e quem era o opressor.

Ele foi, sem dúvida, um dos líderes negros preeminentes da História. No entanto, foi

igualmente um líder para milhares de brancos que com ele aprenderam que, apoiando a

libertação dos negros, eles se engrandeciam.

No lançamento de seu livro “A Caminho da Liberdade”, sofreu um atentado durante

uma sessão de autógrafos. Uma mulher branca, de meia-idade, com passagens em vários

hospitais psiquiátricos, cravou um abridor de cartas em seu peito. Levado às pressas para o

hospital, King sofreu uma cirurgia extremamente delicada e sobreviveu.

Os atentados a bomba, as execuções de negros e outros atos de violência continuaram,

mas a história tomou um rumo sem volta. No dia 2 de julho de 1964, o presidente americano

Lyndon Johnson assinou o Ato dos Direitos Civis e foi à televisão. "Aqueles que antes eram

iguais perante Deus serão agora iguais nas seções eleitorais, nas salas de aula, nas fábricas e

181

nos hotéis, nos restaurantes, cinemas e outros lugares que prestem serviços ao público", disse

Johnson.

No dia 3 de abril, na véspera do protesto, ele proferiu seu último discurso, profético –

"I see the promise land" ("Eu vejo a terra prometida") – na Igreja Ebenezer, Atlanta,da qual

era pastor:

“Freqüentemente eu penso naquilo que é o denominador comum e derradeiro da vida:

nessa alguma coisa que costumamos chamar de ‘morte’. Freqüentemente penso em minha

própria morte e em meu funeral, mas não em sentido angustiante. Freqüentemente pergunto a

mim mesmo o que gostaria que fosse dito então e deixo aqui com vocês, esta manhã, a

resposta...

...Se vocês estiverem ao meu lado, quando eu encontrar o meu dia, lembrem-se que

não quero um longo funeral. E se conseguirem alguém para fazer o ‘discurso fúnebre’, digam-

lhe para não falar muito. Digam-lhe para não mencionar que tenho um Prêmio Nobel da Paz:

isso não é importante. Digam-lhe para não mencionar que eu tenho trezentos ou quatrocentos

prêmios: isto não é importante!

...Eu gostaria que alguém mencionasse aquele dia em Martin Luther King tentou dar a

vida em serviço dos outros.

...Eu gostaria que alguém mencionasse o dia em que Martin Luther King tentou amar

alguém.

...Quero que digam que eu tentei ser direito e caminhar ao lado do próximo. (...)

...Todas as outras coisas triviais não têm importância. Não quero deixar atrás nenhum

dinheiro.

...Eu só quero deixar atrás uma vida de dedicação!

...É isto tudo que tenho a dizer:

...Se eu puder ajudar alguém a chegar adiante

...Se eu puder animar alguém com uma canção

...Se eu puder mostrar a alguém o caminho certo

182

...Se eu puder cumprir meu dever cristão

...Se eu puder levar a salvação para alguém

...Se eu puder divulgar a mensagem que o Senhor deixou

...então, minha vida não terá sido em vão.”

No dia 4 de abril de 1968, à noite, King estava no terraço do hotel, quando foi atingido

no pescoço por um tiro disparado do telhado de um prédio vizinho. Gravemente ferido e

levado às pressas para o hospital, Martin Luther King, aos 39 anos, morreu uma hora depois.

Seu funeral, realizado no dia 8 de abril, foi acompanhado por sua mulher e seus quatro filhos,

e assistido pela TV por 120 milhões de americanos. Sobre a sepultura, gravadas na lápide de

mármore, as palavras de uma velha canção de escravos: "Free at last, free at last/Thank God

Almighty/I´m free at last" ("Finalmente livre, finalmente livre/Obrigado Deus Todo-

Poderoso/Finalmente sou livre).

Bibliografia:

“Vidas Notáveis”, editora Globo, vol. V

Consultas feitas à internet:

”ichtus.com.br”

“estudosbíblicos.com.br”

“sive.com.br”

“consuladoamericano-rio.org.br”

“uol.com.br/bibliaworldnet”

“libreopinion.com.br”

“neoanarquia.hpg.ig”

“orgulhoblack.hpg.ig”

“rainhadapaz.org”

183

“solaescriptura-tt.org”

“unicamp.com.br”

“ultimato.com.br.”

“students.si.fct.unl.pt”

PAUL TILLICH

Biobibliografia

Paul Johannes Tillich nasceu a 20 de Agosto de 1886 em Starzeddel, um pequeno

povoado da Alemanha setentrional, filho de pais protestantes; o pai aliás, era pastor da Igreja

Luterana. Realizou seus primeiros estudos até sua formação educacional na Alemanha, em

Schenfliess – Neumark, para onde o pai se transferira, nomeado que fora superintendente

diocesano; e com doze anos de idade, no Gymnsium da vizinha cidade de Königbberg. Em

1900 sua família transferiu-se para Berlim.

Em Berlim, Tillich concluiu seus estudos liceais e iniciou os universitários, que

tiveram prosseguimentos em tübungen para a laurea em filosofia e em Halle para a laurea em

teologia. Estudou os filósofos alemãs; se interessou por Schelling, que despertou seu interesse

por sua fundação em que a filosofia cristã era contraste com a filosofia humanista da essência

de Hegel.

Concluiu os seus estudos universitários em 1912. Entretanto, nem as freqüentes

transferências nem os estudos tinham até então contribuído para modificar os ideais

religiosos, políticos e culturais profundamente conservadores de Tillich.

Sempre confessou pertencer à Igreja Luterana, por nascimento, educação, experiência

religiosa e reflexão teológica, mas as diferentes formas de luteranismo nunca o deixou à

vontade. Sua teologia era de estilo transconfessional e isso dificultou a muitos luteranos

contemporâneos a o reconhecerem como membro da família. Lia os “grandes homens e

grandes idéias do passado, com os pais da Igreja Antiga, gregos e latinos, com os escolásticos

e místicos da Idade Média, com os humanistas da renascença e com os reformadores

protestantes, e com os teólogos liberais e seus críticos neo-ortodoxos”.1

Alistou-se como capelão militar; dedicou-se à cura de almas até o desenvolvimento da

segunda guerra. “O encontro com as classes sociais baixas, a qual tinha o primeiro contato, o

fez refletir sobre a sua exploração por parte de autoridades que até então ele tinha

184

reverenciado, a aristocracia fundiária, o exército, a Igreja e o Estado”.2 O ataque noturno em

1915, e durante toda a noite Tillich andou entre filas de gente que morria; diante desse

acontecimento, sua filosofia clássica ruiu aos pedaços. Esse imprevisto encontro transformou-

o completamente. Não só pela experiência do socialismo religioso, mas, principalmente, pela

maturação em sua mente de idéias, princípios e doutrinas originais, ou seja, sua futura

construção teológica.46

Mesmo educado na Alemanha, a maior parte de sua vida profissional passou no

Estados Unidos da América, no Seminário Teológico União, em Harvard e na Universidade

de Chicago. Tudo começou em 1933 quando o norte-americano, famoso teólogo, Richar

Niebuhr achava-se na Alemanha, convidou Tillich a ir co ele para os Estados Unidos. Aceitou

o convite, e no mesmo ano, em Novembro emigrou com sua família para os Estados Unidos.

Com o apoio de Niebuhr, logo encontrou um lugar entre os professores do Seminário

Teológico de Nova York. Sua entrada para esse seminário foi de extrema importância para

Tilich, pois facilitou sua inserção no novo mundo, tendo a possibilidade de conhecer o

ambiente cultural e sócio norte-americano e descobrir novas perspectivas para o seu

pensamento.

Ele não mudou o seu pensamento, mas o adaptou às novas circunstâncias. Pregou a

necessidade de se ocupar da cultura e do proletariado, nos Estados Unidos percebeu que lá era

necessário protestar contra a confusão muito fácil entre o divino e o humano. Tillich retomou

a sua obra de renovação da mensagem cristã, dando grande importância a parte apologética, e

que apesar do bem-estar, o norte-americano vivencia o estado de alienação, desespero, crise e

malogro, evidenciado pelo homem moderno.

Tillich foi um dos principais representantes do existencialismo religioso. Ao lado de

Karl Barth e Schleiermacher, é um dos principais teólogos do século XX. Não tentou

construir uma teologia sistemática ou racionalmente dedutiva, e mesmo vendo o campo

teológico através de olhos filosóficos, ele foi claro quando falou sobre cada questão teológica.

Assim, seu método de correlação era o abordado, procurava unir questões humanas,

correlacionando-as com respostas divinas propostas. Também sua linguagem era teológica

simbólica.

A carreira de Tillich teve início no período que a teologia liberal perdia terreno,

chegou até a ser reavivamento do liberalismo. Se voltava para a questão do futuro da teologia.

Não via nenhum futuro numa teologia exclusivamente neo-ortodoxa nem voltava para a

1- Paul Tillich – Perspectivas da Teologia Protestante dos séculosXIX e XX p. 19 2- Os Grandes Teólogos do século XX – Battista Mondin – VII P. 67

185

“morte de deus”. Achava que a teologia precisava enfrentar novos desafios. Dizia que os

teólogos precisavam derrubar duas barreiras que se opõem à história das religiões: a

excusivista ortodoxa e a secularizada com todas as suas rejeições.

Depois da segunda guerra, o pensamento de Tillich cresceu tanto, que fez dele o

teólogo mais admirado e influente dos Estados Unidos. Em 1955 a Universidade de Harvard

ofereceu-lhe um lugar entre os estudiosos que trabalham nas fronteiras da ciência. Depois de

vinte anos de ensino no Union Seminary, assumiu a cátedra mais ambicionada dos estados

Unidos. Deixando de ensinar em Harvard por limite de idade, ensinou pela última vez alguns

meses em Chicago. Em 23 de Setembro de 1962, recebeu o prêmio da Paz das mãos do

presidente da Associação dos Editores Alemães.

Morreu em 22 de outubro de 1965 em Chicago, deixando sua mulher, Hannah, uma

filha, Erduthe Farris, e um filho, René Stephen.

A produção literária de Tillich é de mais de quatrocentos escritos, dividida em dois

grupos: alemão e norte-americano. As obras mais importantes do período alemão são: Die

Regiöse Lage der Gegenwart e Das Dämonische.

Ein Beitrag Zur Sinndeutung der Geschichte. São dois escritos significativos. O

primeiro é uma análise da crise espiritual que golpeou a sociedade no primeiro pós-guerra.

Tillich propõe o restabelecimento dum ideal no qual o elemento humano seja constantemente

moderado pelo elemento religioso. A isso ele dá o nome de realismo confiante. O segundo é

um ensaio sobre filosofia da história, em que trata essencialmente do problema do mal.

Já na produção do período norte-americano, de forma muita fecunda, ele abarca dois

gêneros de escritos: alguns dirigidos aos especialistas, outros ao grande público.

Ao grande público destinou as seguintes obras: The Protestant Era; The Shaking of the

Foudations; The Courage Te Be (Tradução brasileira: A Coragem do Ser, paz e Terra); The

New Being;Biblical Religion and The Search for Ultimate Reality; Dynamics of Faith;

Morality and Beyond; Christianity and the Encounter of world Religions; The Eternal Now;

My Search for Absolutes.

Nesses escritos Tillich procurou, com uma linguagem simples e imediata, tornar sua

mensagem religiosa compreensível mesmo para o público profano, aquele público que

habitualmente se considera por fora das questões teológicas. Dentre essas obras, as que

tiveram maior sucesso e exerceram maior influência, foram The Shaking of Foundations e

The New Being. Serviram de inspiração para o bispo Robinson, escrevendo o célebre livro

Honest To God; e os teólogos da morte de Deus para as suas doutrinas.

186

Em Love, Power and Justice, Tillich opera uma terceira transmitização: esta tem por

objetivo o Espírito Santo. no poder do Amor se resolvem todas as expressões humanas do

amor: libido, eros, philia e agape.

Elaborou o monumental Systematic Theology, obra que custou-lhe quarenta anos de

esforços. O primeiro volume foi publicado em 1951, dividido em duas partes, tratando

respectivamente da razão e da Revelação e do Ser e Deus. O segundo em 1957, trata da

existência e de Cristo. o terceiro e último em 1963, também dividido em duas partes, estuda a

vida e o Espírito e a história e o Reino de Deus; todas publicadas pela Universidade of

Chicago Press.

Para alguns especialistas em assuntos teológicos foram elaborados os dois livros

publicados postumamente: Perspectivas on 19 th and 20 th Century Protestant Theology e A

History of Christian Thougth. Falam as lições de História que Tillich ministrou durante vários

anos no Union Theological Seminary e na Harvard University.

Pensamento Teológico

Tillich defendeu o conceito de Logos dos primeiros pais gregos integrando essa

doutrina em seu sistema teológico, e isso o tornou o teólogo apologético, a doutrina do Logos

era o princípio universal da auto-manifestação divina; a presença do Logos era além das

fronteiras da Igreja. essa compreensão possibilita aos adeptos de outras religiões e culturas

uma parcial participação na verdade, amor pela beleza e sensibilidade moral. Com isso Tillich

conseguiu situar-se na “fronteira entre teologia e filosofia, Igreja e sociedade, religião e

cultura, porque o Logos que se fizera carne era o mesmo Logos agindo universalmente na

estrutura da existência humana”.3

Achava que o homem moderno era incapaz de entender a justificação. Por causa disso

substituiu o imaginário legal relacionado com as cortes de justiças por novas expressões

tomadas situação psicanalítica em que47 o terapeuta aceita o paciente como ele é. Logo a

justificação pela graça por meio a fé é interpretada como a aceitação apesar de sermos

inaceitáveis. Justificação é o paradoxo que diz ao pecador que ele se tornou justo, que sendo

indigno, se tornou digno, que não era santo, mas agora se tornou santo; tudo isso como graça

de Deus que não se baseia em nenhuma conquista humana, mas apenas na graça divina, que

aceita o homem como ele é.

3 – Idem 1 – p. 23

187

Percebeu que nos Estados Unidos a pregação protestante tendia a tornar a graça de

Deus para com o homem dependente da disposição moral dos indivíduos, de sua devoção

religiosa e da crença correta. Entendeu que a fórmula justificação pela fé havia sido

conservada, mas a fé se transformava numa obra exigida do homem a ser realizada por um ato

consciente de decisão pessoal. Então sugeriu que ao invés de dizer justificação pela fé, se

dissesse justificação por meio da fé. A justificação é mediada pela graça de Deus. O que

Tillich passou a escrever (Dinâmica da Fé) foi para corrigir as deformações do conceito de fé,

pois esta se distorce quando concebida intelectualmente, moralmente e emocionalmente.

Tillich define que a fé é um estado do ser tomado pela preocupação suprema, queria sugerir

que a fé envolve tanto as profundezas como a totalidade do ser, não sendo, pois mera função

da faculdade particular da mente.

A teologia conservadora correlaciona-se praticamente a nada, exceto aquilo que ela

considera revelação divina. É necessário correlacionar a teologia à ciência, à política, à ética,

à estética, à sociologia, à antropologia, etc. A teologia sistemática precisa ser contrabalançada

pela teologia apologética.

Precisamos usar símbolos. O símbolo pode ser mais poderoso do que as declarações

diretas. As declarações, embora santificadas por serem entendidas como inspiradas, podem

ser apenas débeis esforços humanos para dizer algo significativo. Os símbolos são palavras ou

grupos de palavras que apontam para a realidade, mas nunca são perfeitos, nunca são

completos, nunca finais.

O que se chama de vida e de morte pode ser correlacionado ao Ser e ao Nada

platônicos. A queda no pecado, segundo os existencialistas, é chamada de ansiedade e

individualização. A fé é coragem de existir. A redenção, um novo ser.

Deus é o Grande Último e o Grande Mistério na direção do qual sempre nos devemos

esforçar, embora nunca o atinjamos de qualquer maneira definitiva. Deus é s Conquista

Eterna. Ao falarmos acerca de Deus, somos forçados a usar palavras. Por isso mesmo é que O

chamamos de “Senhor”, “Pai”. Porém, todas as nossas palavras e expressões são meros

símbolos daquilo que sentimos no tocante ao Mistério Tremendo.

A medida que avança o nosso conhecimento, os símbolos acabam morrendo, nossos

conceitos de Deus vão sendo continuamente revisados.

O princípio protestante protesta contra o mau hábito dos homens que identificam a

divindade com qualquer criação humana, sem importar se tal criação acha-se nos escritos

bíblicos ou na teologia da Igreja.

188

A fé é o estado de quem se empenha extremamente. Esse estado é comum a todos os

homens. Mas a fé cristã só pertence a quem escolheu Jesus Cristo como motivo do seu

empenho supremo. A fé é essencialmente dom de Deus. A fé é a resposta de Deus à questão

existencial. Enquanto esta questão não é colocada, Deus não responde. A pergunta é condição,

não causa de resposta. A resposta é absolutamente gratuita, porém só é dada a quem a

procurou e está em condição de apreciá-la. Logo, a resposta divina constitui a Revelação.

A revelação é concedida por Deus a todos os homens de fé. São dois os elementos

constitutivos da teologia: a mensagem revelada e a reflexão filosófica.

Bibliografia:

BISHOP, Jourdain. Os Teólogos da Morte de Deus. São Paulo: Editora Herder, 1969.

HORDERN, William E. Teologia Protestante ao Alcance de Todos. [Tradução de Roque

Monteiro de Andrade]. Rio de Janeiro: JUERP, 1974.

MONDIN, Battista. As Teologias do Nosso Tempo. São Paulo: Edições Paulinas, 1979.

MCCLENDON, James William. Teologos Destacados del Siglo XX: Creencias Distintivas y

Contribuciones de Barth, Niebuhr, Temple, Carnell, Brunner, Tillich, Bultmann,

Conner, Farrer. Sl: Casa Bautista Publicaciones, 1972.

GIBELLINI, Rosino. A Teologia do Século XX. São Paulo: Edições Loyola, 1998.

GUNDRY, Stanley. Teologia Contemporânea: Uma Análise dos Pensamentos de Alguns dos

Principais Teólogos do Mundo Hodierno. [Tradução de Gordon Chown]. São Paulo:

Editora Mundo Cristão, 1983. 116 – 141pp. (Coleção Pensadores Cristãos – 6).

REALE, Giovanni & ANTISERI, Dario. História da Filosofia: Do Romantismo até nossos

Dias. 3ª ed. Vol III. São Paulo: Editora Paulus, 1991.741 – 765pp.