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 TEORIA DO FACTO PUNÍVEL OU TEORIA DA INFRACÇÃO  44. Introdução  É a teoria que tem por objecto o estudo do crime. O conjunto dos pressupostos de punibilidade e de punição que são comuns a todos os crimes, a todos os factos tipificados na lei como crime. Os requisitos comuns é que um facto deve ter para ser considerado criminoso e para que dele decorra uma responsabilidade jurídico-penal para o seu autor, para o agente daquela infracção. Pode-se formalmente definir crime como um comportamento humano que consiste numa acção penalmente relevante , acção essa que é típica, ilícita, culposa e punível. Esta teoria permite desde logo uma aplicação certa, segura e racional da lei penal. Passa-se dum casuísmo, de verificar caso a caso o que é crime para através da teoria da infracção, ter- se uma vocação generalizado ra de factos penalmente relevantes, de factos criminosos. E através do estudo destas categorias analíticas pode-se determinar a responsabilidade jurídico-penal duma pessoa, pode-se firmá-la ou excluía, através duma análise de subsunção progressiva.  45. Acção penalmente relevante  É todo o comportamento humano dominado ou dominável pela vontade.  Através deste conceito, já se está a excluir a responsabilidade jurídico-penal de comportamentos que provêm não de pessoas mas de animais. Ter-se-á depois de verificar o seguinte: se está em presença de um comportamento humano dominado pela vontade, tem-se de ver se esse comportame nto humano preenche ou nã o um tipo legal de crime. Tem-se de ver se essa acção preenche a tipicidade de um dos tipos previstos na parte especial do Código Penal, ou então em legislação penal lateral. Para isso é preciso verificar se essa acção é típica, isto é, é necessário verificar se estão preenchidos os elementos objectivos 1[21] e subjectivos 2[22] de um tipo legal. Como se verifica se a acção é típica?  Tem-se efectivamente de analisar esta categoria que é a tipicidade, tem-se de verificar se aquela actuação humana se subsume ao tipo normativo na previsão dos seus elementos objectivos e subjectivos. Depois, tem-se de ver se o elemento objectivo do tipo está p reenchido. O elemento subjectivo geral do tipo é o dolo. Tem-se de se ver então o que é o dolo: consiste na consciência e vontade de realizar os elementos objectivos de um tipo legal.  Estando preenchida a tipicidade, vai-se verificar que esta categoria analítica que é composta por elementos subjectivos e objectivos, estando integralmente preenchida indicia a ilicitude. 46. Ilicitude  A ilicitude num sentido formal, é a contrariedade à ordem jurídica na sua globalidade, de um facto ilícito é um facto contrário à ordem jurídica, contrário ao direito.  Mas numa óptica material, o facto ilícito consiste numa danosidade social, numa ofensa material a bens  jurídicos. Em princípio da lei penal só tipifica factos que são contrários ao direito. Mas a ilicitude indiciada pelo facto típico ou pela tipicidade pode ser excluída. Pode estar excluída pela intervenção de normas remissivas, que vêem apagar o juízo de ilicitude do facto típico, são as designadas causas de justificação que, a estarem presentes, justificam o facto típico, excluindo a ilicitude indiciada pela própria tipicidade. Mas pode acontecer, que preenchido um tipo mediante uma acção penalmente relevante e a ilicitude indiciada pelo tipo, pode ser que não se verifique nenhuma causa de justificação ou de exclusão da ilicitude. Na maior parte dos casos em que as pessoas cometem crimes não estão a actuar ao abrigo de nenhuma causa de exclusão da ilicitude. 47. Culpa  

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 TEORIA DO FACTO PUNÍVEL OU TEORIA DA INFRACÇÃO 

44. Introdução É a teoria que tem por objecto o estudo do crime. O conjunto dos pressupostos de punibilidade e de

punição que são comuns a todos os crimes, a todos os factos tipificados na lei como crime.Os requisitos comuns é que um facto deve ter para ser considerado criminoso e para que dele decorra

uma responsabilidade jurídico-penal para o seu autor, para o agente daquela infracção.Pode-se formalmente definir crime como um comportamento humano que consiste numa acção

penalmente relevante, acção essa que é típica, ilícita, culposa e punível.Esta teoria permite desde logo uma aplicação certa, segura e racional da lei penal.Passa-se dum casuísmo, de verificar caso a caso o que é crime para através da teoria da infracção, ter-

se uma vocação generalizadora de factos penalmente relevantes, de factos criminosos.E através do estudo destas categorias analíticas pode-se determinar a responsabilidade jurídico-penal

duma pessoa, pode-se firmá-la ou excluía, através duma análise de subsunção progressiva. 

45. Acção penalmente relevante É todo o comportamento humano dominado ou dominável pela vontade. Através deste conceito, já se está a excluir a responsabilidade jurídico-penal de comportamentos que

provêm não de pessoas mas de animais.

Ter-se-á depois de verificar o seguinte: se está em presença de um comportamento humano dominadopela vontade, tem-se de ver se esse comportamento humano preenche ou não um tipo legal de crime.

Tem-se de ver se essa acção preenche a tipicidade de um dos tipos previstos na parte especial doCódigo Penal, ou então em legislação penal lateral.

Para isso é preciso verificar se essa acção é típica, isto é, é necessário verificar se estão preenchidos oselementos objectivos

1[21] e subjectivos2[22] de um tipo legal.

Como se verifica se a acção é típica?  Tem-se efectivamente de analisar esta categoria que é a tipicidade, tem-se de verificar se aquela

actuação humana se subsume ao tipo normativo na previsão dos seus elementos objectivos e subjectivos.Depois, tem-se de ver se o elemento objectivo do tipo está preenchido.O elemento subjectivo geral do tipo é o dolo. Tem-se de se ver então o que é o dolo: consiste na 

consciência e vontade de realizar os elementos objectivos de um tipo legal. Estando preenchida a tipicidade, vai-se verificar que esta categoria analítica que é composta por

elementos subjectivos e objectivos, estando integralmente preenchida indicia a ilicitude.

46. Ilicitude A ilicitude num sentido formal, é a contrariedade à ordem jurídica na sua globalidade, de um facto 

ilícito é um facto contrário à ordem jurídica, contrário ao direito. Mas numa óptica material, o facto ilícito consiste numa danosidade social, numa ofensa material a bens 

 jurídicos. Em princípio da lei penal só tipifica factos que são contrários ao direito. Mas a ilicitude indiciada pelo

facto típico ou pela tipicidade pode ser excluída.Pode estar excluída pela intervenção de normas remissivas, que vêem apagar o juízo de ilicitude do

facto típico, são as designadas causas de justificação que, a estarem presentes, justificam o facto típico,excluindo a ilicitude indiciada pela própria tipicidade.

Mas pode acontecer, que preenchido um tipo mediante uma acção penalmente relevante e a ilicitude

indiciada pelo tipo, pode ser que não se verifique nenhuma causa de justificação ou de exclusão dailicitude.Na maior parte dos casos em que as pessoas cometem crimes não estão a actuar ao abrigo de nenhuma

causa de exclusão da ilicitude.

47. Culpa 

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É a categoria analítica do facto punível. Sabendo-se que só se pode formular um juízo de censura de culpa sobre um imputável, porque as

penas só se aplicam a quem seja susceptível de um juízo de censura de culpa; àquelas pessoas a quem nãofor susceptível formular um juízo de censura de culpa aplicam-se medidas de segurança, é nomeadamenteo caso dos inimputáveis e dos menores de 16 anos.

Logo, para que o juízo de culpa possa ser formulado é preciso que o agente tenha capacidade de culpa.O agente não tem capacidade de culpa se tiver menos de 16 anos, ou se for portador de uma anomaliapsíquica ou de um estado patológico equiparado.

Mas para além de ter capacidade de culpa, o agente também tem de ter consciência da ilicitude dofacto que pratica; e para além da capacidade de culpa e da consciência da ilicitude é preciso, para seformular sobre o agente um juízo de censura de culpa, que o agente não tenha actuado em circunstânciastão extraordinárias que o desculpem.

48. Punibilidade Para além de o facto ter consistido numa acção típica, ilícita e culposa, é ainda preciso que seja punível. Então chega-se à conclusão que por vezes existem determinados factos praticados no seio de acções

penalmente relevantes, típicas, ilícitas culposas, mas contudo os agentes não são punidos. E porque é quenão há punibilidade em sentido estrito?

- Ou porque não se verificam condições objectivas de punibilidade;- Ou então porque se trata de uma isenção material, no caso de desistência;

- Ou porque se trata de uma causa pessoal de isenção de pena.Porque é que se fala numa subsunção progressiva? Porque quando se analisa a responsabilidade jurídico-penal de alguém, tem-se de analisar

detalhadamente todas estas categorias.Ainda que intuitivamente se possa dar automaticamente a resposta, tem-se de percorrer estas etapas

porque, por hipótese, se chegar à conclusão que aquele comportamento não foi dominado nem tão poucoera dominável pela vontade humana, imediatamente se nega a responsabilidade criminal do agente.

Os tipos, a não ser quando a lei expressamente o diga, são sempre dolosos.O estudo analítico do crime, da teoria da infracção , vai permitir:- Por um lado, fazer uma aplicação certa, segura e uniforme da lei penal;- Por outro lado, vai ter uma vocação de subsunção progressiva.Mas se hoje, entende-se que o crime é uma acção típica, ilícita, culposa e punível, esta tripartição entre

tipicidade, ilicitude e culpa é uma conquista dogmática da Escola Clássica. E à Escola Clássica  segue-se

cronologicamente a Escola Neo-clássica, e a esta segue-se a Escola Finalista. Todas estas escolas teorizam o crime tripartindo-o, dizendo que era uma acção típica, ilícita e culposa.Agora, o que cada uma destas escolas considerava como integrante de cada uma destas categoriasanalíticas é que diverge.

Escola Clássica: - Beling/Van Listz;  - Acção – naturalista (acção natural);- Tipicidade  – correspondência meramente externa, sem consideração por quaisquer juízos de

valor; só elementos objectivos e descritivos;- Ilicitude  – formal;- Culpa  – psicológica (inserção de todos os elementos subjectivos – dolo e negligência).- Criticas  – os factos penalmente relevantes com negligência e os comportamentos omissos.Escola Neo-clássica: 

- Prof. Figueiredo Dias;  - Acção  – negação de valores;- Tipicidade  – o tipo tem também elementos normativos e determinados crimes têm também na

sua tipicidade elementos subjectivos;- Ilicitude  – material;

a) Permite graduar-se o conceito de ilicitude;b) Permite a descoberta ou a formação de causas de justificação.

- Culpa  – censurabilidade: pressupostos da culpa – capacidade de culpa, consciência da ilicitude,exigibilidade;

- Os conceitos de acção social e a posição de Figueiredo Dias, renúncia a um particular conceito deacção e os conceitos de:

a) Tipo indiciador;b) Tipo justificador ou tipo do dolo negativo;

- A teoria dos elementos negativos do tipo.Escola finalista: - Wessel ;

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- Acção – final;- Tipicidade – o dolo é um elemento subjectivo geral dos tipos;- Ilicitude – conceito de ilicitude pessoal – o desvalor da acção e do resultado;- Culpa – normativa; elementos da culpa.Todos estes sistemas partem duma análise quadripartida do crime, como acção típica, ilícita e culposa. 

49. O sistema clássico Parte de uma concepção positiva, mecânica, mesmo naturalista, lógica da teoria da infracção.O conceito de acção  para os clássicos é visto como um conceito naturalista da acção, como um

movimento corpóreo, um esforço muscular ou nervoso que produz uma alteração objectiva do mundo real.O tipo  ou tipicidade  é a correspondência externa de um comportamento considerado acção uma

disposição legal, à discrição legal de um tipo legal de crime.Mas a tipicidade era vista do ponto de vista meramente externo ou objectivo sem nenhuma

consideração de valor.A ilicitude  é uma categoria separada. Para os Clássicos a ilicitude é vista numa óptica meramente

formal, ou seja, como contrariedade à ordem jurídica na sua globalidade. Um facto ilícito é um factocontrário à lei.

Não vem permitir uma graduação do conceito de ilicitude, porque se em sentido formal, a ilicitudesignifica contrariedade à ordem jurídica, se o facto ilícito é o facto que contraria a ordem jurídica, dondecontraria a lei, e o facto lícito é o facto que não contraria a lei, então só se pode afirmar que um

comportamento é ou não é ilícito, é ou não é contrário à ordem jurídica.Quanto à culpa, para os Clássicos, era nessa categoria dogmática do facto punível que se incluíam

todos os elementos subjectivos. Portanto, a ilicitude e a tipicidade eram meramente objectivas. Tudoquanto fossem elementos subjectivos estaria na culpa.

A culpa era vista de uma óptica psicológica, porque a culpa corresponde à ligação psicológica entreuma pessoa e o seu comportamento, e essa ligação poderia ser uma ligação dolosa ou uma ligaçãonegligente.

Logo, o dolo e a negligência são meras formas de culpa.A tipicidade é meramente objectiva. É depois em sede de culpa que se terá de verificar que relação

existe entre o agente e o seu facto, para se poder afirmar uma culpa meramente psicológica.

50. Criticas ao sistema Clássico A primeira crítica diz respeito ao conceito de acção. Este conceito de acção como movimento corpóreo

que produz a alteração objectiva no mundo exterior é um conceito criticável por várias razões.Mas talvez a crítica mais forte que se pode tecer ao conceito de acção dos clássicos é precisamente aomissão porque a responsabilidade penal é afirmada por factos cometidos por acção, mas também poromissões penalmente relevantes.

O conceito de acção dos clássicos deixa de fora as omissões, ou os crimes omissivos.Daí que os clássicos tenham reformulado um pouco esta noção, dizendo então que a acção homicida é

a acção que se esperava que o agente tivesse.Em relação à ilicitude, sendo uma ilicitude meramente formal, só nos permite afirmar se um

comportamento, se um facto, se uma acção, é ou não ilícita, não nos permitindo graduar o conceito deilicitude.

Em relação à culpa. Sendo a culpa vista numa óptica meramente psicológica, pergunta-se como é que os Clássicos

explicam a culpa negligente, mormente os casos de negligência inconsciente.

Nos comportamentos dolosos, o agente conhece e quer empreendida com determinado resultadotípico, ou assumir uma determinada conduta consubstanciada num tipo legal de crime.

51. Sistema Neo-clássico É desenvolvido na Alemanha a partir dos anos 20, procurando “limar”  alguns defeitos ou arestas do

sistema clássico.A acção para os Neo-clássicos:Vêem dizer que não é importante verificar se ouve ou não um movimento corpóreo que produziu uma

alteração objectiva no mundo exterior, porque as actuações humanas são pautadas por determinadasvalorações.

O que interessa é efectivamente o valor que está subjacente a um determinado comportamento. Assim,os Neo-clássicos passam a ver a acção (o crime) como a negação de valores através de um comportamento.Portanto, o crime é todo aquele comportamento que nega valores.

Klaus Roxin entende que o que é importante em sede de Direito Penal, em sede comportamental sãotão só os factos ou as acções voluntárias, isto é, aqueles comportamentos dominados ou domináveis pelavontade.

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Dentro da vertente Neo-clássica surge outro conceito de acção, que é a acção social, desenvolvida porSmith. 

Este autor defende que mais importante que tudo para afirmar a existência duma acção penalmenterelevante é verificar se aquele comportamento, se aquela actuação deve ser tido como uma acção emtermos sociais. Isto é, se socialmente aquele comportamento merece a qualificação de acção.

E isto porque, desde logo, há acções que à prática, podem parecer negar valores, mas que não devemser acções penalmente relevantes de harmonia com a própria concepção social de acção.

A tipicidade, os Neo-clássicos vêm dizer que a tipicidade é composta por uma série de elementos, e otipo não é valorativamente neutro, implica já um juízo de valor para quem preenche a tipicidade. Referemque o tipo tem também elementos normativos, elementos que, descrevendo entidades do mundo real,carecem duma interpretação complementar pelo recurso a normas.

Para estes autores, o tipo é composto por elementos positivos e por elementos negativos:- Elementos positivos: aqueles que fundam positivamente a responsabilidade penal do agente;- Elementos negativos:  são as causas de justificação que, quando relevantes, justificam o facto

típico.A culpa para os Neo-clássicos, não é uma culpa psicológica, como pretendiam os Clássicos, mas é antes

um conceito que é integrado já por um critério de censurabilidade assente na existência de determinadospressupostos, nomeadamente a capacidade de culpa e a consciência da ilicitude.

A culpa é já uma culpa com ingredientes normativos e implica um juízo de censurabilidade pela práticade um facto.

52. Criticas ao sistema Neo-clássico O conceito de acção: um comportamento humano que nega valores. Ora, na negação de valores cabe

não só o comportamento activo, como existem também omissões que podem de igual modo lesar valores.Portanto, aqui neste conceito de crime como comportamento socialmente relevante que lesa valores,

já se pode enquadrar de alguma forma o comportamento omissivo ou a omissão, coisa que ficava de forado conceito meramente causal e naturalístico de acção dos Clássicos.

Há determinados comportamentos cuja apreensão da negação ou de valores só pode ser dada pelafinalidade do comportamento, ou da acção.

Os Neo-clássicos não incluíam o dolo em sede de tipo ou de tipicidade.O dolo é um elemento da culpa, ou uma forma de culpa, porque só excepcionalmente a tipicidade é

integrada por elementos subjetivos, chamados elementos subjetivos específicos, com a intenção deapropriação no crime de furto, etc.

Também os Neo-clássicos não resolvem correctamente problema da negligência e doscomportamentos negligentes.

53. Sistema finalista Os finalistas propõem um conceito de acção que é um conceito de acção final. Chagam à conclusão

que o direito, a realidade normativa, não pode aparecer totalmente divorciada e desligada da realidadeôntica, da realidade do ser que é anterior à realidade normativa.

Se o direito visa regular comportamentos humanos, estabelecer regras de conduta, então o direito, sobpena de ser uma falácia, tem de respeitar a natureza ôntica, a natureza do ser, e o que é próprio do serhumano para os finalistas, dentro de um conceito de acção, é o agir com vista à obtenção de um fimservindo-se de conhecimentos objectivos e causais que permitem essa obtenção, este conceito de acçãodeve ser respeitado em sede de tipicidade.

Portanto, a intenção que preside a uma determinada acção, que é a sua finalidade, deve ser espelhada

no tipo. Logo, o dolo que é a intenção, o fim da actuação, deve ser um elemento subjectivo do tipo.Quanto ao conceito de ilicitude: começa a falar-se de um conceito de ilicitude pessoal.Actuar ilicitamente já não é tanto actuar contrariamente à ordem jurídica na sua globalidade, como

pretendiam os Clássicos (ilicitude formal). Já não interessará tanto actuar lesando bens jurídicosfundamentais, como pretendiam os Neo-clássicos (ilicitude material).

Interessará mais, verificar se aquela pessoa que actua de determinada forma actua ilicitamente, se selhe pode atacar um juízo de desvalor na acção ou no facto que pratica. Existe aqui uma certa concepçãoética do direito.

Dentro deste conceito de ilicitude pessoal de se poder reprovar uma pessoa por adoptar umdeterminado comportamento, podem-se distinguir dois desvalores:

1) O desvalor da acção, da conduta empreendida pelo agente;2) O desvalor do resultado, em que se traduz o comportamento ou a conduta do agente.

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A acção, embora no âmbito dos crimes negligentes seja também desvaliosa 3[23], por comparação doscrimes dolosos em que o agente actua querendo e conhecendo um determinado resultado, o desvalor daacção nos crimes dolosos é muito superior.

Quanto à culpa. Os finalistas têm um conceito de culpa puramente normativo.A consciência da ilicitude, a capacidade de culpa e a exigibilidade dos comportamentos passam a ser

elementos da culpa. Faltando um destes elementos da culpa, já não é possível formular sobre uma pessoaum juízo de culpa.

A capacidade de culpa  consiste no fundo em a pessoa ter capacidade para avaliar as exigências. Sãoincapazes de culpa:

a) Os inimputáveis em razão da idade (menores de 16 anos);b) Os portadores de anomalias psíquicas, que são inimputáveis em razão da anomalia psíquica.A consciência da ilicitude é um elemento autónomo da culpa.

54. Criticas ao sistema finalista O conceito de acção, é um conceito de acção final e os finalistas nunca conseguiram com este conceito

justificar muito bem os crimes de negligentes. Sendo assim também para as omissões.Daí que quem segue a sistemática finalista opte por uma quadripartição do facto punível, em que se

distingue:- Crime doloso por acção;

- Crime doloso por omissão;- Crime por acção negligente;- Crime por omissão negligente.-

55. Acção Acção penalmente relevante é todo o comportamento humano, com relevância no mundo exterior,

que é dominado ou dominável pela vontade. Fica logo excluído os comportamentos ou as acções dascoisas, das forças da natureza e dos animais irracionais.

Dentro do ponto de vista dos fins das penais, quer numa óptica retributiva, quer numa ópticapreventiva, não faz sentido criminalizar comportamentos que não sejam dominados pela vontade.

Uma acção penalmente relevante pode consistir:- Num comportamento positivo – num “facere”;  - Num comportamento negativo – num “non facere”. 

A acção tem relevância quer consista num comportamento positivo, quer numa omissão. A nossa leiequipara a omissão à acção; essa equiparação é dada pelo art. 10º CP.Há duas formas de comportamento omissivo penalmente relevante, que se diferenciam: são

designadas omissões puras (ou impróprias) e as omissões impuras (ou impróprias).Quando o legislador descreve as incriminações, através de normas proibitivas e de normas que

pressupõem um determinado resultado típico do tipo, para estar preenchido, para ser consumado exigeuma conduta e um resultado.

No caso das omissões impuras nem toda a gente pode incorrer em responsabilidade jurídico-penal poromissão impura, porque o legislador só responsabiliza pelas omissões impuras aqueles sobre quem recaíaou impendia um dever jurídico que pessoalmente o obrigasse a evitar a produção do resultado típico.

Os clássicos consideravam por acção penalmente relevante todo o movimento corpóreo, esforçonervoso ou muscular, que produz uma alteração objectiva no mundo real.

O conceito de acção causal é criticável, isto porque:

- Torna-se mais difícil de explicar como é que nestes casos das omissões impuras pode haver aacção omissiva;- Crime de injúria: este crime só é concebível a partir de uma certa ponderação social daquele

comportamento como negação de um determinado valor, só é crime porque socialmente seconvenciona que aquele comportamento é uma acção relevante;

- Este conceito de acção causal não afasta, de per si, comportamentos dominados pela vontade.Só através de um critério exterior ao próprio conceito de acção causal é que se consegue delimitar os

comportamentos com relevância penal e os comportamentos que não têm essa relevância.Para os Neo-clássicos, o conceito de acção é todo o comportamento que nega valores – é uma negação

de valores.

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Smith vem com um conceito social de acção, dizendo que acção penalmente relevante é aquilo que ésocialmente adequado a ser acção.

Mas este conceito não explica de  per si  porque é que algumas omissões negam valores não é dadatanto pela acção, mas pela ordem jurídica.

Muitas vezes também, a relevância social da acção não pode estar desligada daquilo que o agente quis.Por outro lado, não há dúvida que o mesmo comportamento pode ter vária e diferente relevância

social, consoante a intenção do agente.Finalmente o conceito de acção final para os finalistas.É todo o comportamento em que a pessoa se serve dos conhecimentos objectivos e causais para atingir

uma determinada finalidade.O processo causal nos crimes omissivos representa especialidades face aos crimes activos. Essas

especialidades fazem com que os próprios finalistas tivessem de chegar a uma análise quadripartida dofacto punível (ou da infracção):

- Crimes dolosos por acção;- Crimes dolosos por omissão;- Crimes negligentes por acção;- Crimes negligentes por omissão.Este conceito de acção final não é compreensível para abarcar todas as realidades e comportamentos

que podem dar origem à responsabilidade jurídico-penal.Há autores que, em relação ao conceito de acção penalmente relevante, como categoria autónoma da

punibilidade, porque não é um conceito isento de críticas em qualquer formulação, dizem que nósdevemos renunciar a um particular conceito de acção e é própria tipicidade que englobamos oscomportamentos por acção e por omissão (Prof. Figueiredo Dias ).

Há outros autores que discordam e que dizem que o conceito de acção penalmente relevante eefectivamente uma categoria que não se deve descurar, porque o conceito de acção tem um determinadorendimento em sede de dogmática jurídico-penal.

56. Tipo ou tipicidade Por detrás de cada tipo incriminador, o legislador há-de pretender sempre a tutela de um ou mais bens

jurídicos, porque o direito penal encontra a sua justificação na tutela de bens jurídicos fundamentais.O bem jurídico é algo distinto do chamado objecto do facto ou objecto da acção. Enquanto que o be m é aquela realidade que não é uma realidade palpável, é um valor, um interesse.O objecto do facto ou da acção é o “quid”  concreto sobre o qual incide a actividade criminosa do

agente.

57. Estrutura do tipo Por detrás de cada tipo legal encontra-se sempre a tutela de um ou mais bens jurídicos.Os tipos têm na sua descrição elementos descritivos, predominantemente, mas também é concebível

que nalguns tipos apareçam elementos normativos. Aliás foram os Neo-clássicos que chamaram à atençãopara a existência destes elementos normativos do tipo.

Os elementos descritivos são aqueles elementos que expressam entidades do mundo real, quer no foroexterior quer interior, quer para a sua cabal compreensão, não necessitam de nenhuma valoraçãosuplementar feita pelo recurso a uma norma.

Os elementos normativos são aqueles que, expressando também entidades do mundo real, para seucabal entendimento carecem do recurso a uma valoração suplementar, do recurso por exemplo a outranorma.

Há quem diga, como Ihering, que não existem elementos puramente descritivos: todos eles são mais oumenos normativos; postulam sempre, para seu cabal entendimento e compreensão, uma valoraçãosuplementar, seja ética, seja de ordem jurídica.

O tipo é integrado sobretudo a partir duma abordagem finalista, por uma estrutura mista: é compostopor elementos objectivos e por elementos subjectivos.

Referindo, agora, tão só ao crime comissivo por acção, ou crime doloso por acção, pode-se encontraros seguintes elementos objectivos do tipo: 

a) O agente;b) A conduta ou descrição da acção típica;c) O resultado;4[24] 

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Este dever de garante pode resultar fundamentalmente de três pontos: ou directamente da lei, ou decontrato, ou de uma situação de imergência.

e) Circunstâncias que rodeiam a conduta  As circunstâncias podem ser, para a nossa lei, ou crimes autónomos, ou então elementos que integram

qualificações ou priviligiamentos de tipos legais de crimes.

59. Acepções em que se utiliza a palavra tipo a) Tipo de garantia, total, ou em sentido amplo  Pretende abranger todos os elementos que concorrem para fundamentar uma responsabilidade

criminal, abrangendo simultaneamente não só a categoria analítica da tipicidade mas também as outrascategorias dogmáticas como a ilicitude a culpa e a própria punibilidade.O tipo garantia corresponde ao conjunto de pressupostos de punibilidade e de punição de um tipo legal,de um crime.

b) Tipo iniciador ou tipo em sentido restrito  O tipo abrange tão só a categoria da tipicidade, com a estrutura somente de elementos objectivos e

subjectivos.Podendo-se dizer assim que, tipo indiciador ou tipo em sentido restrito é a correspondência objectiva e

subjectiva à definição de um tipo legal de crime. Ou, por outras palavras, com a expressão tipo indiciador, tipo em sentido restrito ou tipo de injusto, visa-se a delimitação de um comportamento proibido ouexigido, ao qual se comina uma sanção penal geral e abstractamente estabelecida.

Tipo em sentido restrito, porquê?Porque o facto de preencher um tipo neste sentido restrito não significa de  per si que a pessoa vá ser

punida, porque a pessoa pode ter actuado tipicamente, todos os elementos objectivos e subjectivos dotipo podem estar preenchidos mas a pessoa não ter responsabilidade jurídico-criminal porque, porhipótese, naquele caso actuou em legítima defesa.

E designa-se também tipo indiciador porquê?Porque uma vez preenchida integralmente a tipicidade, preenchidos integralmente os elementos

constitutivo do tipo de crime, formula-se um juízo de valor sobre essa pessoa no sentido de que atipicidade indicia a ilicitude, a qual pode ser excluída pela intervenção das causas de justificação.

c) Tipo intermédio  Pretende-se significar que a um comportamento típico acresce simultaneamente um juízo de

equidade.Significa pois, a situação de que alguém cometeu um facto típico em sentido estrito, que é

simultaneamente ilícito, ou seja, uma pessoa cometeu um facto que corresponde à descrição objectiva esubjectiva de uma norma legal, não actuando ao abrigo de nenhuma causa de exclusão da ilicitude, ou nãoactuando ao abrigo de nenhuma causa de justificação.