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1 TEORIA GERAL DA RESPONSABILIDADE CIVIL Origem Conceito Classificação Elementos comuns e distintivos entre responsabilidade civil contratual e extracontratual Dano Ato ilícito Nexo causal Elemento distintivo da responsabilidade extracontratual Culpa O dever de reparação A responsabilidade civil contratual. Repercussões no contrato de trabalho A responsabilidade civil extracontratual Responsabilidade objetiva Teoria do risco Responsabilidade subjetiva Responsabilidade civil pré-contratual Responsabilidade civil pós-contratual Dano material Dano moral individual Dano moral coletivo Hipóteses de ocorrência A questão do ônus da prova. Princípio da aptidão para a prova. A questão da competência da Justiça do Trabalho Reparação de danos causados por acidente de trabalho A prescrição aplicável

TEORIA GERAL DA RESPONSABILIDADE CIVIL Conceitoead.csjt.gov.br/.../palestra_online/jornada_juridica/...resp_civil.pdf · A responsabilidade civil contratual, segundo preceitua Dallegrave

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1

TEORIA GERAL DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Origem

Conceito

Classificação

Elementos comuns e distintivos entre responsabilidade civil contratual e

extracontratual

Dano

Ato ilícito

Nexo causal

Elemento distintivo da responsabilidade extracontratual

Culpa

O dever de reparação

A responsabilidade civil contratual. Repercussões no contrato de trabalho

A responsabilidade civil extracontratual

Responsabilidade objetiva

Teoria do risco

Responsabilidade subjetiva

Responsabilidade civil pré-contratual

Responsabilidade civil pós-contratual

Dano material

Dano moral individual

Dano moral coletivo

Hipóteses de ocorrência

A questão do ônus da prova. Princípio da aptidão para a prova.

A questão da competência da Justiça do Trabalho

Reparação de danos causados por acidente de trabalho

A prescrição aplicável

2

Prescrição constitucional para os créditos trabalhistas

Prescrição Civil. Regra de transição.

Direito intertemporal – CCB 1916 e CCB de 2002

a) Acidente de Trabalho

b) Assedio Moral

c) Assedio Sexual

d) Atos Ilícitos isolados

TEORIA GERAL DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Aspectos gerais da responsabilidade civil:

O Código Civil de 2002 reservou o primeiro Livro da Parte Especial

ao Direito das Obrigações, que compreende os direitos pessoais e de

crédito. Está assentado no princípio da autonomia da vontade.

A responsabilidade civil surge precisamente do descumprimento de

uma obrigação. Explicita Álvaro Villaça de Azevedo: “ou o devedor deixa

de cumprir um preceito estabelecido num contrato, ou deixa de observar o

sistema normativo, que regulamenta sua vida. A responsabilidade nada

mais é do que o dever de indenizar o dano”1.

A responsabilidade civil oferece o suporte dogmático à reparação do

dano.

Origem da expressão:

Para Álvaro Vilaça de Azevedo a origem da expressão está no

“verbo latino respondere, de spondeo, primitiva obrigação de natureza

contratual do Direito romano, pela qual o devedor se vinculava ao credor

1 AZEVEDO, Álvaro Vilaça de. Teoria geral das obrigações: responsabilidade civil. 10

ª ed. São Paulo:

Atlas, 2004, p. 243.

3

nos contratos verbais por intermédio de perguntas e resposta (spondesne

mihi dare Centum? Spondeo); ou seja, prometes me dar um cento?

Prometo”2.

A responsabilidade civil fundamenta a obrigação de reparar um dano

por quem lhe deu causa, em razão de descumprimento de norma legal ou

contratual.

Conceito:

Álvaro Vilaça de Azevedo conceitua a responsabilidade civil como a

“situação de indenizar o dano moral ou patrimonial, decorrente de

inadimplemento culposo, de obrigação legal ou contratual, ou imposta por

lei, ou, ainda, decorrente do risco para os direitos de outrem”3.

Para Cláudio Brandão, “é a obrigação, genericamente considerada,

atribuída a toda pessoa, física ou jurídica, de reparar o dano causado, em

virtude de sua ação ou omissão, caracterizadora da violação de um dever

jurídico preexistente”4

Dallegrave Neto sustenta que a “responsabilidade civil, vista como

instituto jurídico, não contém definição legal, contudo, doutrinariamente,

pode ser concebida como a sistematização de regras e princípios que

objetivam a reparação do dano patrimonial ou a compensação do dano

extrapatrimonial causados diretamente por agente – ou por fato de coisas

ou pessoas que dele dependem – que agiu de forma ilícita ou assumiu o

risco da atividade causadora da lesão”5.

Sebastião Geraldo de Oliveira bem define o instituto:

2 AZEVEDO, Álvaro Vilaça de. Teoria geral das obrigações: responsabilidade civil. 10

ª ed. São Paulo:

Atlas, 2004, p. 276. 3 Op. Cit., p. 277.

4 BRANDÃO, Cláudio. Acidente do Trabalho e Responsabilidade Civil do Empregador. 2

ª ed. São Paulo:

Ed. LTr, 2006, p. 206. 5 DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho, 3ª ed., São

Paulo: Ed. LTr, 2010, p. 100.

4

“Onde houver dano ou prejuízo, a responsabilidade civil é

invocada para fundamentar a pretensão de ressarcimento por

parte daquele que sofreu as conseqüências do infortúnio. É, por

isso, instrumento de manutenção da harmonia social, na medida

em que socorre o que foi lesado, utilizando-se do patrimônio do

causador do dano para restauração do equilíbrio rompido. Com

isso, além de punir o desvio de conduta e amparar a vítima, serve

para desestimular o violador potencial, o qual pode antever e até

mensurar o peso da reposição que seu ato ou omissão poderá

acarretar.”

Regia-se pelo art. 159 do CC de 1916; hoje, pelos artigos 186, 187 e

927 do Código Civil de 2002.

Art. 186 – Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou

imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que

exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 187 – Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao

exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim

econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Art. 927- Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a

outrem, fica obrigado a repará-lo. (...)

Classificação:

A responsabilidade pede ser contratual, decorrente da inexecução

obrigacional do contrato e extracontratual, do inadimplemento obrigacional

normativo.

Responsabilidade civil contratual:

5

À época da Lei das XII Tábuas, de 450 a. C., admitia-se a execução

pessoal do devedor. Com a proibição da execução pessoal, o patrimônio do

devedor deve responder por suas dívidas.

O art. 942, caput, do CC disciplina a execução do patrimônio do

devedor.

A responsabilidade civil contratual, segundo preceitua Dallegrave

Neto, “provém da inexecução de uma obrigação mantida previamente entre

as partes (ofensor e vítima).”6.

Distingue-se da responsabilidade extracontratual não pela existência

de um contrato mas pelo fato de o dano a ser reparado decorrer da execução

do contrato mantido entre as partes.

Explicita o mesmo autor, Dallegrave Neto, que “observa-se que o

traço delimitador entre as duas espécies não é simplesmente a pre-

existência ou inexistência de um contrato entre as partes, mas que o dano a

ser reparado advenha da inexecução de obrigação contratual mantida por

elas.”7

Responsabilidade civil extracontratual:

José de Aguiar Dias afirma que a responsabilidade extracontratual,

no direito brasileiro, assenta “no princípio da culpa” e que “os princípios

fundamentais estão condensados nos art. 159 e 160 do Código Civil”, que,

“consoante a lição de Pontes de Miranda, nesses princípios se consideram

as seguintes noções: 1) ato ilícito: ação ou omissão voluntária,

compreendendo a negligência, imprudência e o dolo; 2) limites do ato

ilícito: legítima defesa e deterioração ou destruição de coisa alheia para

remover perigo iminente; 3) reparabilidade do dano”8.

6 DALLEGRAVE NETO. Idem, p. 81.

7 DALLEGRAVE NETO. Idem, p. 81.

8 AGUIAR DIAS, José de. Da Responsabilidade Civil. Vol. II, 10º ed., Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1995,

p. 373.

6

A responsabilidade extracontratual fundamenta-se na noção de ato

ilícito e na culpa.

Para Dallegrave Neto, é “aquela decorrente de violação de dever

geral previsto em lei ou na ordem jurídica; é o ato ilícito que, por si só, dá

origem à relação jurídica obrigacional, criando para o causador do dano, o

dever de indenizar a vítima”9.

Também chamada de responsabilidade aquiliana, por referência à

Lex Aquilia de damno, do século III a C, a responsabilidade

extracontratual, modernamente, abrange a responsabilidade por ato ilícito,

que resulta do descumprimento de preceito legal, baseada na idéia de culpa

e a responsabilidade sem culpa, fundada no risco.

Ato ilícito – regulado no art. 186 do CCB (art. 159 CCB de 1916).

Culpa - elemento gerador da responsabilidade, assim, do dever de reparar.

Informa Álvaro Villaça de Azevedo que, primitivamente, aplicava-se

a pena do Talião, que deixou resquícios na Lei das XII Tábuas (Tábua VII-

De delictis – „Se alguém fere a outrem, que sofra a pena do Talião, salvo se

existiu acordo‟). A Lex Aquilia, plebiscito que se fez votar por proposição

do tribuno da plebe Aquílio, introduziu um novo delito civil – o damnum

injuria datum – que regula o prejuízo causado à coisa alheia.10

Thomas Marky esclarece que “a lex Aquilia exigia que a danificação

fosse feita iniuria, isto é, contra a lei. Mais tarde, os jurisconsultos

entenderam que a palavra iniuria não significava apenas o ilícito, o

contrário à lei, mas implicava, também, a culpabilidade do autor do dano.

Exigiu-se, pois, que o dano causado o fosse dolosa ou ao menos

culposamente, sendo imputável também a mais leve negligência”.11

9 DALLEGRAVE NETO. Idem, p.81.

10 AZEVEDO, Álvaro Villaça. Idem, p. 245/6.

11 Apud AZEVEDO, Álvaro Villaça, Idem, p. 246.

7

Com o Código Napoleão, de 1804, o instituto da responsabilidade

civil foi sistematizado, fundado na idéia de que quem der causa a dano

alheio deve repará-lo.

Dano:

Como expõe José de Aguiar Dias:

“O dano é, dos elementos necessários á configuração da

responsabilidade civil, o que suscita menos controvérsia. Com

efeito, a unanimidade dos autores convém em que não pode

haver responsabilidade sem a existência de um dano, e é

verdadeiro truísmo sustentar esse princípio, porque, resultando a

responsabilidade civil em obrigação de ressarcir, logicamente não

pode concretizar-se onde nada há a reparar.”12

O dano que interessa ao estudo da responsabilidade civil é o que

constitui requisito da obrigação de indenizar e se classifica em: danos

patrimoniais e danos morais.

Ato ilícito:

Conceituado no Código Civil, nos artigos 186 e 187.

Nexo de causalidade:

A responsabilidade civil só se configura se houver relação causal

entre o fato e o dano.

O Código Civil adotou a „teoria dos danos diretos e imediatos”, no

art. 403 do CC vigente (art. 1060 do CC de 1916), que dispõe: “Ainda que

a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os

12

AGUIAR DIAS, José de. Da Responsabilidade Civil, vol II, 10ª ed., Rio de janeiro: Forense, 1995, p.

713.

8

prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato,

sem prejuízo do disposto na lei processual”.

Excludentes de responsabilidade:

A culpa concorrente admite a distribuição dos prejuízos.

O fato de terceiro só exclui a responsabilidade do agente se for

constatada a culpa exclusiva do terceiro e o ato por ele causado for um ato

ilícito.

Cláudio Brandão elenca, como excludentes de responsabilidade:

a) Fato exclusivo da vítima

Sustenta que, “relativamente ao contrato de trabalho, é a atitude do

empregado que faz desaparecer o elemento de ligação entre o dano que

lhe foi propiciado e o fato que o originou, supostamente atribuído à

pessoa do empregador, como ocorre, por exemplo, com o ato proposital

de desativar, sem o conhecimento do empregador, mecanismo de

proteção existente em máquina desfibradora de sisal, destinado a

impedir a lesão nas mãos, mas que torna a produção mais lenta,

impedindo ganhos maiores, para os que percebem salário por obra.”13

A excludente só ocorre quando demonstrado que o ato que gerou o

dano foi exclusivo da vítima.

b) Fato exclusivo de terceiro

Explicita Cláudio Brandão que “a hipótese versada diz respeito ao ato

de terceiro que seja causa única e exclusiva do evento gerador do dano,

o qual equivale ao „caso fortuito ou força maior, por ser causa estranha à

conduta do agente aparente, imprevisível e inevitável e faz desaparecer

a relação de causalidade necessária para a configuração do dever de

reparação a unir o dano àquele a quem se busca imputá-la.”14

13

BRANDÃO, Cláudio. Idem, p. 253. 14

BRANDÃO, Cláudio. Idem, p. 254.

9

A disciplina existente é a do art. 930 do CC vigente (anterior art.

1520), que atribui o direito de regresso ao autor do dano, para receber a

indenização que houver pago.

c) Caso fortuito e força maior

São situações controvertidas. Caracteriza a força maior a inevitabilidade

e o caso fortuito a imprevisibilidade.

d) Cláusula de não indenizar

A cláusula é considerada inválida pela jurisprudência trabalhista, se

inserida no contrato de trabalho.

O dever de reparação:

O dever de reparar está positivado no art. 927, caput, do CC, por ato

ilícito e abuso de direito.

O parágrafo único do art. 927 do CC estabelece a obrigação de

indenizar sem culpa, instituindo a teoria do risco, fundada na

responsabilidade objetiva.

No que interessa ao direito do trabalho, dispõe o art. 932, III, CCB:

“São também responsáveis pela reparação civil: (...) o empregador ou

comitente, por seus empregados, no exercício do trabalho que lhes

competir, ou em razão dele”.

A responsabilidade civil contratual. Repercussões no contrato de trabalho:

Como visto, a responsabilidade civil contratual provém de uma

obrigação mantida previamente entre as partes, que pode se manifestar de

forma objetiva quando o dano do empregado decorrer da regular, ordinária

execução do contrato de trabalho.

A responsabilidade civil extracontratual:

10

Na responsabilidade civil extracontratual, do tipo subjetiva, o ônus

da prova da existência do ato ilícito é da vítima.

Efeitos diversos resultam da opção por uma ou outra modalidade de

responsabilidade civil na apuração do dever de indenizar. A teoria da

responsabilidade objetiva, cujos elementos identificados são o dano, a

conduta e o nexo causal, prescinde da comprovação da culpa. Desse modo,

simples demonstração do nexo entre a conduta ilícita do empregador e o

dano sofrido pelo empregado é suficiente para que surja o dever de

indenizar.

Por sua vez, a teoria da responsabilidade subjetiva, além dos

elementos inerentes à anterior, requer a comprovação da culpa –

negligência, imprudência ou imperícia – na conduta causadora do eventus

damni. Nessa hipótese, v.g., o acidente de trabalho apenas enseja a

responsabilização do empregador se devidamente demonstrada sua conduta

culposa.

É inegável que, em atividade de alto risco à saúde e segurança dos

trabalhadores, deve o empregador providenciar alto padrão de segurança,

incluindo treinamento especializado para os empregados.

Ônus da prova:

É dever do empregador promover gestão racional das condições de

segurança e saúde do trabalho, adequadas ao risco da atividade exercida.

Ao deixar de providenciar essas medidas, o empregador viola o dever

objetivo de cuidado exigido em serviço de alto risco, configurando-se a

conduta culposa.

Nesse sentido, a apuração da culpa no acidente de trabalho deve

adequar-se à especial proteção conferida pelo ordenamento jurídico ao

trabalhador. Essa proteção concretiza-se, dentre outras formas, pela

11

inversão do ônus da prova, quando verificada a impossibilidade de sua

produção pelo empregado e a maior facilidade probatória do empregador.

Se o empregador não providencia as condições adequadas à

proteção do trabalhador, viola dever objetivo de cuidado, configurando-se a

conduta culposa.

Nesse sentido, a apuração da culpa no acidente de trabalho, v.g.,

deve adequar-se à especial proteção conferida pelo ordenamento jurídico ao

trabalhador. Essa proteção se concretiza, dentre outras formas, pela

inversão do ônus da prova, quando verificada a impossibilidade de sua

produção pelo empregado e a maior facilidade probatória do empregador.

A regra do artigo 333 do CPC, segundo o qual compete à parte que

alega comprovar fato constitutivo de direito, enquanto à parte contrária

compete provar fato modificativo, extintivo ou impeditivo, deve ser

aplicada subsidiariamente na esfera trabalhista. Aqui, vige o princípio da

aptidão para a prova, determinando que esta seja produzida pela parte que a

ela tem acesso, quando estiver fora do alcance da parte contrária.

Assim, infere-se na apuração da responsabilidade civil em

decorrência do acidente de trabalho que o ônus da prova também recai

sobre o empregador, que deve comprovar a inexistência da conduta

culposa. Se não se desonera do ônus que milita em seu desfavor, presume-

se a culpa, surgindo o conseqüente dever de indenizar os trabalhadores pelo

prejuízo sofrido.

Responsabilidade subjetiva.

Depende da comprovação da culpa, como visto.

Responsabilidade objetiva.

Teoria do risco

12

Trata-se de afirmar a responsabilidade objetiva do empregador pelos

danos causados ao empregado em virtude de acidente do trabalho nas

atividades de risco acentuado ou em outras de igual natureza.

Esse novo paradigma tem como marco, além da criação da OIT em

1919, a aprovação, em 10/12/1948, da Declaração Universal dos Direitos

Humanos, da ONU, na medida em que incorporou o princípio da dignidade

da pessoa humana, como fundamento dos direitos humanos.

No plano do direito constitucional interno, a Carta Magna de 1946

instituiu o seguro contra acidentes do trabalho, não estatal, com custeio a

cargo do empregador (art. 157, XVII), como direito social do segurado,

além de assegurar higiene e segurança do trabalho (art. 157, VIII).

A Constituição da República de 1988 estabelece a proteção à saúde

do trabalhador em diversos dispositivos.

A teoria da responsabilidade objetiva, ou doutrina do risco, que

prescinde da prova da culpa e suas primeiras manifestações ocorreram no

final do século XIX.

Responsabilidade civil pré-contratual e pós-contratual.

Dallegrave Neto sustenta que “tanto o dano pré quanto pós-

contratual não decorrem da violação de obrigação principal do contrato,

mas da ofensa a um dever de conduta imanente à figura dos sujeitos do

contrato, pautado no princípio da boa-fé.”15

Dispõe o art. 422CC:

“Os contratantes são obrigados guardar, assim na conclusão do

contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e

boa-fé.”

15

DALLEGRAVE NETO. Idem, p. 106.

13

A indenização não considera o valor do contrato futuro ou pretérito,

mas as despesas e prejuízos daquele que ficou frustrado pela não

celebração do contrato.

Responsabilidade civil pré-contratual.

Diz-se da responsabilidade quando o vínculo jurídico ainda não se

formou.

O Código Civil de Portugal adotou a culpa in contrahendo, culpa

presumida pelo inadimplemento, no art. 227:

“Quem negocia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nas

preliminares como na formação dele, proceder segundo às regras da boa-fé,

sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte.”

A reparação do dano pré-contratual atende aos interesses negativos,

assim, as despesas e prejuízos relativos à frustração da formação do

contrato.

Dallegrave Neto afirma que “o fundamento para a responsabilidade

civil pré-contratual é a tutela da confiança negocial que propugna pela

harmonia do comportamento das partes, solucionando eventual conflito

entre a vontade e a declaração manifestada”.16

Dallegrave Neto, com Antonio Junqueira Azevedo, ao contrário,

conclui que “a responsabilidade civil, nesse momento, resulta da quebra de

um dever específico de boa-fé negocial, motivo pelo qual o dano daí

emergente se enquadra na responsabilidade contratual”.

O dever de boa-fé dirige-se a todos os integrantes da relação jurídica.

Assim, o dever de não lesar, se absoluto, enquadra-se no conceito de

responsabilidade civil extracontratual; se relativo, como parte integrante de

16

DALLEGRAVE NETO. Idem, p. 108.

14

um contrato ou negócio, o dano resultante será reparado por violação ao

princípio da boa-fé, ensejando a responsabilidade civil do tipo contratual.

Responsabilidade civil pós-contratual.

Diz-se da responsabilidade em decorrência de contrato já extinto. A

responsabilidade persiste mesmo findo o contrato de trabalho. Exemplo

típico é o item II da Súmula 378 do TST:

“Súmula 378 (...)

II – São pressupostos para a concessão da estabilidade o afastamento

superior a 15 dias e a conseqüente percepção do auxílio-doença acidentário,

salvo se constatada, após a despedida, doença profissional que guarde

relação de causalidade com a execução do contrato de emprego.”

Também fundamenta-se na boa-fé objetiva e a competência persiste

da Justiça do Trabalho

O DANO NO CONTRATO DE TRABALHO

O contrato de trabalho.

O contrato de trabalho é um negócio jurídico celebrado entre duas

pessoas, capazes, sujeitos de direitos e deveres, com o objetivo de

prestação dos serviços contratados, mediante remuneração e subordinação.

Está protegido pela lei.

O art. 104 do CC dispõe que todo negócio jurídico deve ter agente

capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável e forma

prescrita ou não defesa em lei.

Definição: “contrato de trabalho stricto sensu é o negócio jurídico pelo qual

uma pessoa física (empregado) se obriga, mediante o pagamento de uma

15

contraprestação (salário), a prestar trabalho não eventual em proveito de

outra pessoa, física ou jurídica (empregador), a quem fica juridicamente

subordinada” (Délio Maranhão)17

As obrigações principais já foram vistas. Outros deveres decorrentes

do contrato de trabalho:

Probidade

Lealdade

Informação

Proteção

Fidelidade

Respeito

Danos. Tipificação.

O dano é a própria essência da responsabilidade civil, sem ele não há

que se falar nesta.

Dallegrave Neto conceitua dano:

“como a lesão a interesses juridicamente tuteláveis. Quando o dano

repercute sobre o patrimônio da vítima, entendido como aquele suscetível

de aferição em dinheiro, denominar-se-á dano patrimonial. Ao revés,

quando a implicação do dano violar direito geral de personalidade,

atingindo interesse sem expressão econômica, dir-se-á, então, dano

extrapatrimonial.”18

Dano material ou patrimonial.

17

Instituições de Direito do Trabalho, Ed. LTr, São Paulo, 1999, p. 245-246. 18

DALLEGRAVE NETO. Idem, p. 138.

16

Compreende as perdas e danos, assim, os danos emergentes e os

lucros cessantes – art. 402 CC – que devem ser provados pela vítima,

concretamente. Enseja precisa e integral reparação.

Nos termos do art. 950 do Código Civil, a indenização a título de dano

material engloba: (i) o dano emergente, (ii) o lucro cessante e (iii) pensão

proporcional à importância do trabalho para o qual se inabilitou ou à

depreciação que sofreu.

O dano emergente deve corresponder ao valor das despesas gastas

com o tratamento (médico, psicológico) até a recuperação.

O lucro cessante diz respeito aos valores que os trabalhadores

concretamente deixarem de auferir até o fim da convalescença.

O pensionamento, por sua vez, é devido se, após a convalescença,

restarem seqüelas que reduzam a capacidade laborativa dos trabalhadores.

“Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não

possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de

trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes

até o fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância

do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu.”

“Parágrafo único. O prejudicado, se preferir, poderá exigir que a

indenização seja arbitrada e paga de uma só vez.”

Dano moral individual.

O dano moral tem natureza imaterial e, por isso mesmo, é

compensado com o pagamento de uma indenização, não no seu sentido

literal, pois esta tem pertinência com o ato lícito, mas com uma reparação

pecuniária que a jurisprudência tem convencionado estabelecer para

compensar o dano moral, objetivando atenuar os prejuízos decorrentes da

lesão a uma esfera que não é patrimonial, que é personalíssima da pessoa e

17

que atinge, ou pode atingir, direitos da personalidade como está na

Constituição: à honra, à intimidade, à vida privada, à imagem, à saúde,

especialmente a saúde mental, à própria dignidade da pessoa humana e a

sua integridade física e moral. E secundariamente constitui um desestímulo

à prática de condutas lesivas dessa natureza. O pagamento tem a natureza

jurídica, portanto, de sanção pela prática de um ato ilícito.

O que gera a obrigação de indenizar é a prática do ato ilícito que

provocou o dano moral, freqüentemente acompanhado de um dano

material, daí a concomitância das duas indenizações, via de regra.

Dano moral coletivo.

No dano moral coletivo, o sujeito passivo atingido é uma

coletividade e a reparação reverte em favor dela.

Acentua o Prof. Arion Sayão Romita que “o dano moral coletivo

tanto pode afetar o interesse dos indivíduos considerados como membros

do grupo quanto o direito cujo titular seja o próprio grupo. Neste sentido, a

Lei nº 7.347, de 1985, que regula a ação civil pública, prevê expressamente

a possibilidade do reconhecimento de dano moral coletivo, ao incluir, no

art. 1º, IV, a referência a responsabilidade por danos morais e coletivos

causados “a qualquer outro interesse difuso ou coletivo”. Pode-se, então,

entender por dano moral coletivo aquele que decorre da violação de direitos

de certa coletividade ou a ofensa a valores próprios dessa mesma

coletividade, como sucede, por exemplo, com a crença religiosa, o

sentimento de solidariedade que vincula os respectivos membros, a repulsa

a atos de discriminação contra membros da coletividade ou do próprio

grupo, como tal. Cabe lembrar, a propósito, disposição expressa de lei

vigente no Brasil (art. 81, parágrafo único, do Código de Defesa do

Consumidor – Lei nº 8.078, de 1990), em cujos termos entende-se por

18

interesses ou direitos coletivos os transindividuais de natureza indivisível

de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou

com a parte contrária por uma relação jurídica base.”

A valorização dos direito humanos, dos direitos de terceira geração

(à solidariedade, à paz, ao meio ambiente adequado, ao patrimônio comum

da humanidade), assim, da dignidade da pessoa humana e dos direitos da

personalidade, propiciou a consideração da coletividade de pessoas como

titulares de direitos.

Para Xisto Tiago de Medeiros Neto:

“como nota característica do desenvolvimento do instituto da

responsabilidade civil observa-se a crescente ampliação do elenco dos

danos passíveis de ressarcimento, o que trouxe como conseqüência a

abrangência da obrigação de reparar lesões a bens e valores jurídicos

titularizados por coletividades de pessoas.”19

Para Carlos Alberto Bittar Filho:

“Quando se fala em dano moral coletivo, está-se fazendo

menção ao fato de que o patrimônio valorativo de uma certa comunidade

(maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira

absolutamente injustificável do ponto de vista jurídico.”20

Na jurisprudência do TST destacam-se os seguintes acórdãos:

RR 391/2001-024-01-00.6; RR 1156/2004-004-03-00.9; AIRR

561/2004-096-03-40.2; RR 146070/2004-900-01-00.7; RR 1557/2004-020-

05-00.7; RR 98921/2004-014-09-00.0; RR 1776/2003-003-06-40.9.

Xisto de Medeiros Neto conceitua dano moral coletivo: “corresponde

à lesão injusta e intolerável a interesses ou direitos titularizados pela

coletividade (considerada em seu todo ou em qualquer de suas expressões –

grupos, classes ou categorias de pessoas), os quais possuem natureza

19

MEDEIROS NETO, Xisto Tiago. Dano Moral Coletivo. 2ª ed. São Paulo: LTr, 2007, p. 123.

20 Apud MEDEIROS NETO, Xisto Tiago. Idem, p. 128.

19

extrapatrimonial, refletindo valores e bens fundamentais para a

sociedade.”21

Reparação de danos advindos da relação de trabalho.

É paradoxal o valor da indenização fixada nas hipóteses de dano

moral. Nos dissídios individuais, observamos que essas indenizações

flutuam entre 2 mil, 20 mil, 250 mil, 435 mil, como houve uma que foi

reduzida pela 5ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho de 435 para 50

mil. Nas hipóteses de dano moral coletivo temos acórdão importante da 6º

Turma do TST, da lavra do Ministro Aloysio Corrêa da Veiga, onde essa

questão foi examinada. Foi configurado dano moral coletivo pela utilização

da Justiça do Trabalho para homologar rescisões contratuais com mais de

um ano de casa sem que houvesse conflito, apenas para liberar o

empregador e o empregado de comparecerem ao sindicato. Foi considerado

ato atentatório à dignidade da Justiça, e se estabeleceu um valor de 30 mil

reais a ser recolhido ao PAT. Já no Rio Grande do Norte o Tribunal

Regional do Trabalho, em decisão pioneira, muito citada, manteve a

sentença e fixou condenação de 1 milhão de reais, por dano moral coletivo

decorrente de assédio moral contra empregados que não obtinham ou não

atingiam metas de venda, cotas de vendas pré-estabelecidas, e por isso

eram punidos com obrigação de fantasiar-se, de fazer flexões de braço,

assistir reuniões em pé, dançar na boquinha da garrafa e outras prendas. O

Tribunal impôs o pagamento de 1 milhão de reais ao Fundo de Amparo ao

Trabalhador. Isso apenas para verificar a grande diferença de valores

atribuídos e a riqueza das hipóteses. Já o TRT da 10ª Região, para inibir a

contratação de professores por estabelecimento de ensino por meio de

cooperativas, atribuiu 100 mil reais também a título de dano moral coletivo.

21

MEDEIROS NETO, Xisto Tiago. Idem, p. 137.

20

Em outra situação, onde identificou trabalho em condição análoga à de

escravo, fixou valor de 30 mil reais. Já a Primeira Vara de Paulínia em

sentença condenou a pagar 2 milhões de reais por dano moral coletivo,

porque a empresa não autorizava, ou proibia por resolução, o afastamento

de empregados acidentados do trabalho.

O arbitramento do dano moral, pelas próprias circunstâncias que o

definem, tem ocorrido de forma preponderantemente subjetiva, como já

referido, segundo critérios de justiça e eqüidade, ainda que, em cada

situação específica, seja dada ao magistrado a oportunidade de fixar

parâmetros à apreciação do dano sofrido.

Os juizes, muitas vezes, adotam, para fixar as indenizações por danos

morais, critérios de proporcionalidade e de razoabilidade. Considera-se o

tamanho da dor, do sofrimento, da humilhação, o grau de culpa do lesante,

a sua condição econômica de suportar o pagamento, o tempo de serviço do

empregado.

À falta de parâmetros definidos, fica aberta a possibilidade à adoção

de critérios subjetivos na fixação da indenização, de modo que um Juiz,

considerando a dor provocada por determinada lesão que considere grande,

fixe em 1 milhão o valor da indenização. Outro pode não considerá-la tão

grande, fixando-a em 500 mil. O Tribunal poderá reduzir o valor para 300

mil. A adoção da argumentação valorativa contém elementos de conteúdo

individualizante que podem retirar a importância histórica e institucional do

princípio que ampara a pretensão reparatória assim como a sua própria

normatividade. Essa, a delicadeza da matéria, uma vez que o dano moral

não tem valor fixo.

“Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano.

Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade

da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização.”

21

Em Tribunais Superiores, para tentar uniformizar esses valores, há

barreiras, como as das Súmulas 126 do TST, no STJ nº 7, 279 do STF, que

consideram insuscetível de revisão matéria de fato. Mas, o que está

ocorrendo é que tanto o Tribunal Superior do Trabalho quanto o Superior

Tribunal de Justiça, quando consideram exorbitantes ou irrisórios os

valores, reformam as decisões recorridas, para buscar uma uniformização

entre as hipóteses ocorrentes.

É necessário que a segurança jurídica, princípio fundamental, seja

efetivamente implementado, que o Poder Judiciário tome decisões que

satisfaçam a um só tempo a exigência de segurança jurídica, de certeza do

Direito, de justiça e eqüidade. A argumentação valorativa parece

inadequada. A teoria do balanceamento dos princípios, desenvolvida na

Alemanha por Robert Alexy, que tem inspirado a adoção dos critérios da

proporcionalidade e da razoabilidade, requer a adoção de um meta

princípio que regula como se desenvolve a coesão entre os demais

princípios. Esse meta princípio é o da proporcionalidade, que se divide em

três outros subprincípios, o da adequação, da necessidade e da

proporcionalidade em sentido estrito. Os argumentos que têm sido

utilizados, na jurisprudência em torno desta matéria, para priorizar um

princípio ou outro são individuais, dizem com o pensamento do juiz, de

modo que a decisão para que lado a balança vai pesar depende do

pronunciamento da pessoa que vai julgar. O subjetivismo, entretanto,

parece inadmissível num sistema jurídico em que se pretende uma

aplicação íntegra e coerente do Direito.

O que o Magistrado deve postular e buscar ao interpretar e aplicar o

Direito? A coerência, ele deve levar em consideração a história da

comunidade, que revela os princípios constitucionais, o que garante a

compreensão de que a sociedade está estruturada no ideal da igual

consideração e respeito; o texto legal, a intenção do legislador, o conteúdo

22

das decisões pretéritas, no contexto em que foram produzidas, buscando, a

partir do caso concreto, observar e verificar como se poderia manter íntegro

o desenvolvimento do Direito, como ensina Ronald Dworkin. E isso,

sempre na concepção de que não se pode igualar princípios e valores. O

juiz deve levar em consideração os elementos assinalados - o conteúdo dos

precedentes, quem os formulou, em que circunstâncias, - e, nessa

perspectiva, compreender a justificativa daquela decisão e aplicar de forma

coerente o direito, considerando o caráter normativo do princípio, evitando-

se assim disparidades que podem ocasionar o aumento da litigiosidade, sem

qualquer proveito para o desenvolvimento do instituto.

O estudo passa pela questão da influência dos direitos fundamentais

sobre a legislação do direito privado. São princípios constitucionais que

estão dando sustentação e fundamento à reparação. Nessa perspectiva,

constitui imperativo da lógica normativa que a legislação no campo do

direito privado esteja vinculada aos direitos fundamentais e segundo o

princípio da primazia da Lei Superior. As normas do direito privado

representam, simultaneamente, uma intervenção nos direitos fundamentais;

garantia de proteção dos direitos fundamentais e, assim, concretização de

direitos fundamentais.

Reparação de danos causados por acidente de trabalho.

O constituinte, ao estabelecer os direitos dos trabalhadores, previu

duas indenizações, autônomas e cumuláveis: a acidentária, a ser exigida do

INSS, lastreada na responsabilidade objetiva; e a de natureza civil, a ser

paga pelo empregador, quando incorrer em dolo ou culpa.

É o que se observa, dos termos do art. 7º, inciso XXVIII, da

Constituição da República, que dispõe serem direitos dos trabalhadores (i)

o seguro contra acidentes de trabalho, além da (ii) indenização pelos

23

danos sofridos, quando o empregador incorrer em dolo ou culpa. Observe-

se:

“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de

outros que visem à melhoria de sua condição social:

(...)

XXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do

empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando

incorrer em dolo ou culpa;”

A primeira proteção, de natureza previdenciária, é exigível do INSS

por meio da Justiça Comum. Essa proteção, no entanto, não se vincula a

uma segunda, que decorre diretamente da relação de trabalho e consiste na

indenização pelos danos material e moral. A competência para apreciação e

julgamento dessa segunda pretensão é da Justiça do Trabalho.

Nos termos do artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição da República,

sede material da obrigação de indenizar, o dano por acidente de trabalho dá

ensejo a dupla esfera protetiva. A primeira proteção é o seguro social, de

natureza previdenciária, da competência da Justiça Comum. A segunda

decorre diretamente da relação de trabalho e consiste na indenização pelos

danos material e moral. A competência para apreciação e julgamento dessa

segunda pretensão é da Justiça do Trabalho.

A questão da competência da Justiça do Trabalho.

A Emenda Constitucional nº 45/2004 dispôs expressamente, no Art.

114, Inciso VI, que “compete à Justiça do Trabalho processar e julgar as

ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação

de trabalho.” No mesmo sentido, dispõe a Súmula nº 736, do Supremo

Tribunal Federal.

24

Até a entrada em vigor da Constituição da República de 1988, a

orientação jurisprudencial assentava-se na impossibilidade de

ressarcimento do dano moral. O advento da Carta Magna estabeleceu, entre

os direitos fundamentais, a indenização por dano moral, encerrando as

discussões doutrinárias e jurisprudenciais sobre sua existência. Nesse

sentido, observe-se o disposto no artigo 5º, incisos V e X, da Constituição:

“V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da

indenização por dano material, moral ou à imagem;”

“X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das

pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral

decorrente de sua violação;”

Com base no entendimento de que o dano moral se configura com a

caracterização do ato ilícito, o Código Civil de 2002 atualizou a previsão

normativa sobre o assunto, no artigo 186.

Na esfera trabalhista, a reparação dos danos morais visa à proteção

da dignidade do trabalhador.

A competência material da Justiça do Trabalho para o julgamento

das ações de indenização por dano moral ou patrimonial decorrente da

relação de trabalho, antes mesmo da EC 45/2004, já era afirmada pelo

Tribunal Superior do Trabalho, em jurisprudência sumulada.22

O acidente

de trabalho, contudo, não integrava necessariamente tais hipóteses, sendo

controvertido o tema da competência material, em especial considerando o

entendimento do Superior Tribunal de Justiça, pela competência da Justiça

Estadual, consagrado na então

Súmula 15/STJ: “Compete à Justiça Estadual processar e julgar os litígios

decorrentes de Acidente do Trabalho.”

22

Súmula nº 392 do TST – DANO MORAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO

(conversão da OJ nº 327 da SBDI1). Nos termos do art. 114 da CF/1988, a Justiça do Trabalho é

competente para dirimir controvérsias referentes à indenização por dano moral, quando decorrente da

relação de trabalho.”

25

Posteriormente à EC 45/04, em célebre decisão, o Supremo Tribunal

Federal, no julgamento do CC 7207-1, alterou entendimento – que se

compatibilizava com o do STJ – concluindo pela competência da Justiça do

Trabalho, também quando a indenização postulada decorrer de dano

causado por acidente de trabalho, em acórdão assim ementado:

“EMENTA: CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA

JUDICANTE EM RAZÃO DA MATÉRIA. AÇÃO DE

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PATRIMONIAIS

DECORRENTES DE ACIDENTE DO TRABALHO,

PROPOSTA PELO EMPREGADO EM FACE DE SEU (EX-)

EMPREGADOR. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO

TRABALHO. ART. 114 DA MAGNA CARTA. REDAÇÃO

ANTERIOR E POSTERIOR À EMENDA CONSTITUCIONAL

Nº 45/04. EVOLUÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PROCESSOS EM CURSO

NA JUSTIÇA COMUM DOS ESTADOS. IMPERATIVO DE

POLÍTICA JUDICIÁRIA.

1. Numa primeira interpretação do inciso I do art. 109 da Carta

de Outubro, o Supremo Tribunal Federal entendeu que as ações

de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de

acidente do trabalho, ainda que movidas pelo empregado contra

seu (ex-)empregador, eram da competência da Justiça comum

dos Estados-Membros.

2. Revisando a matéria, porém, o Plenário concluiu que a Lei

Republicana de 1988 conferiu tal competência à Justiça do

Trabalho. Seja porque o art. 114, já em sua redação originária,

assim deixava transparecer, seja porque aquela primeira

interpretação do mencionado inciso I do art. 109 estava, em boa

26

verdade, influenciada pela jurisprudência que se firmou na Corte

sob a égide das Constituições anteriores.

3. Nada obstante, como imperativo de política judiciária -- haja

vista o significativo número de ações que já tramitaram e ainda

tramitam nas instâncias ordinárias, bem como o relevante

interesse social em causa --, o Plenário decidiu, por maioria, que

o marco temporal da competência da Justiça trabalhista é o

advento da EC 45/04. Emenda que explicitou a competência da

Justiça Laboral na matéria em apreço.

4. A nova orientação alcança os processos em trâmite pela Justiça

comum estadual, desde que pendentes de julgamento de mérito.

É dizer: as ações que tramitam perante a Justiça comum dos

Estados, com sentença de mérito anterior à promulgação da EC

45/04, lá continuam até o trânsito em julgado e correspondente

execução. Quanto àquelas cujo mérito ainda não foi apreciado,

hão de ser remetidas à Justiça do Trabalho, no estado em que se

encontram, com total aproveitamento dos atos praticados até

então. A medida se impõe, em razão das características que

distinguem a Justiça comum estadual e a Justiça do Trabalho,

cujos sistemas recursais, órgãos e instâncias não guardam exata

correlação.

5. O Supremo Tribunal Federal, guardião-mor da Constituição

Republicana, pode e deve, em prol da segurança jurídica, atribuir

eficácia prospectiva às suas decisões, com a delimitação precisa

dos respectivos efeitos, toda vez que proceder a revisões de

jurisprudência definidora de competência ex ratione materiae. O

escopo é preservar os jurisdicionados de alterações

jurisprudenciais que ocorram sem mudança formal do Magno

Texto.

27

6. Aplicação do precedente consubstanciado no julgamento do

Inquérito 687, Sessão Plenária de 25.08.99, ocasião em que foi

cancelada a Súmula 394 do STF, por incompatível com a

Constituição de 1988, ressalvadas as decisões proferidas na

vigência do verbete.

7. Conflito de competência que se resolve, no caso, com o

retorno dos autos ao Tribunal Superior do Trabalho” (STF-CC-

7.204/MG, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Britto, DJ

09.12.2005)

A conclusão é no sentido de que a alteração da competência prevista

no inciso VI, do artigo 114, decorrente da Emenda Constitucional, limitou-

se à questão do acidente de trabalho. Anteriormente a ela, já se reconhecia

a competência da Justiça do Trabalho para o processamento de demandas

cuja causa de pedir remota (legislação aplicável) se reportava à legislação

civil – v.g., indenização por danos morais em decorrência de despedida por

justa causa vexatória ou assédio moral.

Após o advento da Lei nº 9.032/95 os benefícios acidentários foram

equiparados aos previdenciários. As prestações têm o mesmo valor. O

segurado não tem mais interesse em discutir o enquadramento como

acidente na Justiça Comum para fins de percepção do benefício

previdenciário.

Corrobora esse entendimento a Súmula nº 736, editada recentemente

pelo Supremo Tribunal Federal, que dispõe sobre a competência desta

Justiça Especializada.

A prescrição aplicável.

Prescrição constitucional para os créditos trabalhistas

Prescrição Civil. Regra de transição.

28

Direito intertemporal – CCB 1916 e CCB de 2002

Considere-se que a natureza da pretensão define a prescrição

aplicável.

a) Prevalência da tese da prescrição própria dos créditos trabalhistas:

A SDI-1, do Tribunal Superior do Trabalho, em sessão realizada no

dia 21/11/2006, acórdão publicado no D.J. de 02/02/2007, decidiu pela

aplicação da prescrição constitucional-trabalhista, prevista no art. 7º,

XXIX, da Constituição da República, como se depreende da ementa:

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DECORRENTE DA

RELAÇÃO DE EMPREGO. APLICAÇÃO. PRAZO

PRESCRICIONAL PREVISTO NO ARTIGO 7º, XXIX, DA

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. MATÉRIA DE DIREITO. MÁ-

APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº 126/TST. VIOLAÇÃO DO

ARTIGO 896 DA CLT. RETORNO DO PROCESSO AO TRT DE

ORIGEM. A Turma, ao definir que o prazo prescricional para postular

indenização por dano moral decorrente de vínculo empregatício é de

dois anos, nos termos do artigos 7º, XXIX, da Lei Maior, deveria ter

determinado o retorno do processo ao TRT de origem, ao invés de não

ter conhecido da Revista com suporte na Súmula nº 126/TST. Isto

porque o debate da questão tem contornos jurídicos e não fáticos, pois

ficou definido que, na hipótese de indenização por danos morais

decorrente da relação de emprego, a prescrição a ser aplicável é a

prevista na Constituição da República, e não a do artigo 205, do atual

Código Civil. Recurso de Embargos provido. (TST-E-RR-333/2005-

29

002-20-00.5, SBDI-1, rel. Min. Carlos Alberto Reis de Paula, D.J.

02/02/2007)

Essa corrente, que prevaleceu, considera que a prescrição aplicável

tem pertinência com a natureza do vínculo estabelecido.

b) Prevalência da tese da prescrição própria dos créditos civis: essa tese se

baseia na concepção de que a prescrição, instituto de direito material, não

guarda relação com o órgão incumbido de apreciar o litígio. Assim, se o

pedido basear-se em regra de direito civil, será aplicável a prescrição

indicada no Código Civil.

O TST passou a proclamar, quando ajuizada a ação anteriormente à

decisão do STF na Justiça Estadual, excepcionalmente, a incidência da

prescrição civil, nestes termos:

RECURSO DE EMBARGOS. ACIDENTE DE TRABALHO. DANOS

MORAIS E MATERIAIS. AÇÃO AJUIZADA NA JUSTIÇA COMUM E

REMETIDA À JUSTIÇA DO TRABALHO APÓS A EMENDA

CONSTITUCIONAL Nº 45/2004. DIREITO INTERTEMPORAL.

SEGURANÇA JURÍDICA. REGRA DE TRANSIÇÃO. APLICAÇÃO DA

PRESCRIÇÃO CÍVEL.

A prescrição de dois anos, para ajuizamento de ação na Justiça do

Trabalho, como determina o art. 7º, XXIX, da Constituição Federal, não

alcança ações cuja data da lesão já transcorrera em mais da metade pela

regra da prescrição de vinte anos, conforme determina o art. 2028 do

Código Civil de 2002. A alteração da competência para o julgamento das

ações relativas a acidente de trabalho, conforme EC 45/2004, não

possibilita a aplicação imediata da regra de prescrição trabalhista, pois

30

quando da redução dos prazos prescricionais (arts. 205 e inc. V do art.

206), estabeleceu-se a regra de transição, com o objetivo de assegurar o

princípio da segurança jurídica. Considerando que a ação foi interposta

após janeiro de 2003 (data da vigência do Código Civil de 2002) e que já

havia transcorrido mais de dez anos da ciência do dano, o prazo aplicável

ao caso sob exame é o de vinte anos, razão por que não se encontra

prescrita a pretensão ao pagamento da indenização correspondente.

Proposta a ação em 2004, antes da vigência da EC n.º 45/2004, na Justiça

Comum em relação a contrato extinto em 1988, com a aposentadoria do

reclamante em virtude de acidente de trabalho, e apenas e tão-somente

declinada a competência para a Justiça do Trabalho em 2005, não pode o

autor ser surpreendido pela mudança da competência, adotando prazo

prescricional de dois anos, pois já tinha adquirido o direito a ver a sua

pretensão julgada sob a regra de prescrição anterior.

Embargos conhecidos e providos.” (TST-E-RR-2917/2005-342-01-00.2,

SBDI-1, Rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, DJ 16.05.2008).

Mais recentemente, em sessão da SDI1 de 21/05/2009, afirmou-se a

incidência da prescrição civil à ação ajuizada na Justiça do Trabalho após a

decisão do STF e da EC 45/2004 objetivando reparação por danos morais,

ao fundamento de que o acidente ocorrera em 1997, antes da afirmação da

competência material da Justiça do Trabalho (ERR 406/2006-153-00.8).

O fundamento foi o de que “as partes não podem ser surpreendidas

pela alteração do prazo prescricional mais restrito, especialmente quando

essa alteração foi motivada pela transmudação da competência material e

não pela legislação que define os prazos prescricionais.

iii) a prescrição civil e a regra de transição do Código Civil de 2002:

31

Considerando a hipótese de utilização da regra de prescrição civil, é

importante salientar a regra de transição prevista no novo Código:

a) regra do Código Civil de 1916: previa o artigo 177, do Código

Civil revogado, que a prescrição para ações pessoais, aí inclusas as ações

para reparação de danos, seria de 20 (vinte anos):

Art. 177 – As ações pessoais prescrevem, ordinariamente, em 20

(vinte) anos, as reais em 10 (dez), entre presentes, e entre ausentes em

15 (quinze), contados da data em que poderiam ter sido propostas.

b) regra do Código Civil de 2002: na atual sistemática, a prescrição

para reparação de danos foi contemplada, especificamente, com norma

própria, que prevê um prazo de 3 (três) anos:

Art. 206. Prescreve:

(...)

§ 3º Em três anos:

(...)

V – a pretensão de reparação civil.

c) regra de transição estabelecida no novo código: para a pretensão

cujo prazo prescricional se iniciou na vigência do Código Civil de 1916

mas foi surpreendido com o novo tratamento legal ainda em curso, foi

estabelecida a seguinte regra de transição:

Art. 2.028. Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por

este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver

transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.

32

Segundo a regra de transição, portanto, deverá ser considerado o

prazo prescricional anterior, no particular de 20 anos, quando, no momento

da entrada em vigor do novo Código já houver transcorrido mais da metade

de seu prazo, ou seja, de 10 anos. Segundo o artigo 2.044, a vigência se deu

um ano após sua publicação, em 10 de janeiro de 2003.

Assim, para as demandas cuja causa de pedir remota – a violação do

direito – se deu até a data de 9 de janeiro de 1993, será aplicada a regra da

prescrição de vinte anos.

Por outro lado, se a causa de pedir remota for posterior a 9 de janeiro

de 1993, e, portanto, tendo transcorrido ao menos a sua metade, quando da

data de vigência do novo Código, a prescrição a contar será a nele

estabelecida – três anos.

Há jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho sustentando que

esse prazo começa a fluir da data de vigência do novo Código Civil. Assim,

só as ações ajuizadas após 10/01/2006 estarão prescritas. Veja-se:

RR - 2820/2005-342-01-00 PUBLICAÇÃO: DJ - 23/05/2008 AC. 1ª

TURMA – Rel. Min. Walmir Oliveira da Costa.

RECURSO DE REVISTA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO

MORAL DECORRENTE DE ACIDENTE DE TRABALHO.

AJUIZAMENTO PERANTE A JUSTIÇA ESTADUAL ANTERIOR À

EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004. PRESCRIÇÃO. PRAZO.

Hipótese em que a ação de indenização por acidente do trabalho foi

ajuizada perante o Juízo de Direito da Comarca de Volta Redonda RJ, que,

em razão do advento da Emenda Constitucional nº 45/2004, declinou da

competência à Justiça do Trabalho em face do disposto no art. 114, VI, da

Constituição Federal. Assim, ocorrendo o ajuizamento da ação ordinária

junto à Justiça Estadual, anteriormente ao advento da Emenda

33

Constitucional nº 45/2004, não há falar em prescrição trabalhista. Nesse

caso, a alteração da competência em razão da matéria (art. 87 do CPC) não

tem o condão de operar a incidência da prescrição trabalhista regulada pelo

art. 7º, XXIX, da Constituição Federal, porque aplicável à situação

preexistente o prazo de prescrição previsto no art. 206, § 3º, V, do Código

Civil. Consoante jurisprudência e doutrina, atentas aos princípios da

segurança jurídica, do direito adquirido e da irretroatividade da lei, firmada

a posição segundo a qual se aplica o prazo prescricional de três anos,

contados a partir da vigência do novo Código Civil, ou seja, 11 de janeiro

de 2003, e não da data da ocorrência do fato danoso. No caso em questão, a

pretensão do Reclamante não se encontra prescrita, pois o ajuizamento da

ação ocorreu em 22/11/2004, antes, portanto, do decurso do prazo

prescricional de três anos previsto na vigente legislação civil. Recurso de

revista conhecido e provido.

RR - 969/2006-101-03-00 PUBLICAÇÃO: DJ - 20/03/2009 ACÓRDÂO

8ª TURMA- Rel. Min. Maria Cristina Peduzzi

RECURSO DE REVISTA PRELIMINAR DE NULIDADE POR

NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL Aplica-se o art. 249, §

2º, do CPC. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS

PRESCRIÇÃO CIVIL 1. A C. Subseção I Especializada em Dissídios

Individuais recentemente decidiu que devem ser adotadas as regras de

prescrição civil para as ações de dano moral ajuizadas na Justiça Comum

anteriormente à vigência da Emenda Constitucional nº 45/2004, por

aplicação do princípio da segurança jurídica. Precedentes. 2. No caso

vertente, a decisão regional registrou que a comprovação da lesão ocorreu

em 19/10/1994, não havendo transcorrido mais da metade do prazo de vinte

anos previsto pelo Código Civil de 1916 quando da entrada em vigor do

Código Civil, em 11/1/2003. 3. Transcorridos menos de dez anos (metade

34

do tempo estabelecido na lei revogada), é forçoso reconhecer que o direito

sobre o qual se controverte é sujeito ao prazo prescricional previsto no art.

206, § 3º, V, do Código Civil de 2002. 4. Considerando o princípio da

Segurança Jurídica, cumpre ressaltar que esses três anos devem ser

contados a partir da vigência do novo Código, ou seja, 11 de janeiro de

2003, e não da data da ocorrência do fato gerador do direito. Precedente.

Recurso de Revista conhecido e provido.

ASSÉDIO MORAL

1. Conceito

Em exaustiva monografia sobre o tema, os Professores Sergio

Gamonal Contreras e Pamela Prado López definem o assédio moral:

“processo constituído por um conjunto de ações ou omissões, no âmbito

das relações de trabalho públicas e privadas, em virtude do qual um ou

mais sujeitos assediadores criam um ambiente laboral hostil e intimidatório

em relação a um ou mais assediados, afetando gravemente sua dignidade

pessoal e causando danos à saúde dos afetados com vistas a obter distintos

fins de tipo persecutório.”23

A figura jurídica é recente. Atribui-se sua descoberta ao psicólogo

alemão Heinz Leymann, que “nos anos oitenta descreveu e analisou os

distintos comportamentos hostis que se apresentam nas organizações,

particularmente nas relações de trabalho e mais especificamente ainda na

empresa em relação a seus empregados”24

.

A teoria do assédio moral tem assento no princípio da dignidade da

pessoa humana, que, no Brasil, constitui fundamento da República, como

prevê o artigo 1º, inciso III, da Constituição. Decorre também do direito à

saúde, mais especificamente, à saúde mental, abrangida na proteção

23

Gamonal, 2006, pág. 23, tradução livre. 24

Apud Gamonal, 2006, pág. 9, tradução livre.

35

conferida pelo artigo 6º e o direito à honra, previsto no artigo 5º, inciso X,

ambos da Carta Magna.

A amplitude das hipóteses possíveis de serem enquadradas como

assédio moral dificulta a precisão conceitual, desde que pode alcançar

situações de ressentimento justificado que acabam por desestabilizar

emocionalmente o trabalhador em decorrência da continuidade de

procedimento incômodo e injustificado causador do constrangimento no

ambiente de trabalho.

2. Características.

O assédio moral diz respeito a um tipo específico de dano ao

patrimônio moral. É uma a) violência pessoal; b) necessariamente moral e

psicológica; c) multilateral (pode ser horizontal: entre colegas de mesma

hierarquia; vertical descendente: do superior hierárquico ao seu

subordinado; ou mesmo vertical ascendente: que parte do grupo

subordinado e se dirige ao seu superior direto); d) individual ou

coletivamente sentida.

Encontra, na doutrina internacional, expressões sinônimas:

“mobbing”, “harcèlement”, “bullying”, „harassment”. Em português,

também, terror psicológico.

Tem caráter interdisciplinar: envolve as áreas da psicologia,

medicina, medicina do trabalho, administração de empresas e outras afins.

O assédio moral se configura pela insistência impertinente, com

propostas, perguntas ou pretensões indevidas. Resulta de um conjunto de

atos, não perceptíveis pelo lesado como importantes em um primeiro

momento, mas que, na seqüência, unidos, destinam-se a expor a vítima a

situações incômodas, humilhantes e constrangedoras. Identifica-se na

ocorrência de comportamentos comissivos ou omissivos que humilham,

36

constrangem e desestabilizam o trabalhador, afetam a auto-estima e a

própria segurança psicológica, causando estresse ou outras enfermidades.

São exemplos de procedimentos omissivos: a) a indiferença em

relação ao outro; b) ignorar a vítima; c) atitudes de desprezo; d) silêncio. E

de atos concretos: a) rigor excessivo no trato com o trabalhador; b)

exigência de cumprimento de tarefas desnecessárias ou exorbitantes; c)

tratamento desrespeitoso, humilhante; d) imposição de isolamento ao

empregado; e) ausência de atribuição de serviços, inação compulsória; f)

constranger, ameaçar; g) expor, a terceiros, a intimidade da vítima; h)

cercear o exercício de mister habitual; i) restringir a atuação profissional; j)

impor jogo de prendas, que resultam em exposição ao ridículo; entre tantas

outras modalidades.

Tem por finalidade: a) desestimular; b) desacreditar; c) deprimir; d)

isolar; e) fragilizar a auto-estima do assediado. No âmbito do Direito do

Trabalho, tais fins se dirigem, na maior parte das vezes, à extinção contrato

de trabalho por iniciativa do trabalhador.

3. Assédio moral x assédio sexual.

São figuras afins que, entretanto, não se confundem. No assédio

sexual, a violência tem direção vertical e sentido descendente, ou seja,

ocorre no âmbito de uma relação de sujeição hierárquica, onde a

subordinação jurídica é utilizada como instrumento de obtenção de favores

de ordem sexual. Nesse contexto, o assédio sexual é de mais fácil

percepção e combate do que o assédio moral.

O assédio sexual foi tipificado como crime, pela Lei nº 10.224/2001,

que acresceu o item A ao artigo 216 do Código Penal:

37

Art. 216-A. Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou

favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de

superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de

emprego, cargo ou função."

Pena - detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos.

4. Disciplina do assédio moral.

No Brasil, não há previsão em lei federal acerca do assédio moral.

Há diversos projetos de lei atualmente tramitando no Congresso Nacional

sobre o tema.

No âmbito municipal, há leis coibindo a prática do assédio moral,

aplicáveis aos servidores da administração pública local, como é o caso de

São Paulo, Campinas, Iracemápolis e Guarulhos, no Estado de São Paulo, e

de Natal (RN). No plano estadual, a Lei nº 3.921/2002, do Rio de Janeiro,

proíbe, no âmbito dos três Poderes do Estado, da administração direta,

autárquica, fundacional, e indireta, o exercício de qualquer atitude ou

postura que se possa caracterizar como assédio moral no trabalho.

No plano infra legal, o Decreto nº 3.048/1999 (Regulamento da

Previdência Social), em seu Anexo II, considera como agente etiológico ou

fator de risco de natureza ocupacional condições difíceis de trabalho e o

desacordo com patrão ou colegas de trabalho, o que pode vir a caracterizar,

para fins previdenciário, doença ou acidente do trabalho que devem ser

combatidos pela empresa, com a utilização dos meios para a adoção das

medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do

trabalhador; cumprimento das normas de segurança e higiene do trabalho;

prestação de informações pormenorizadas, às autoridades competentes, dos

riscos da operação a executar e do produto a manipular; bem como se

sujeitar à fiscalização do Ministério da Previdência e Assistência Social e

38

dos sindicatos obreiros, nos termos do artigo 19, parágrafos, e seguintes, da

Lei nº 8.213/1991. É possível inserir, na previsão legal, hipóteses de

assédio moral.

Destaca-se a existência de cláusulas em convenções e acordos

coletivos de trabalho dispondo sobre prevenção à prática de assédio moral

nas dependências das empresas.

5. A visão da jurisprudência.

Destaca-se o seguinte acórdão do TRT da 3ª Região (jurisdição no

Estado de Minas Gerais), relatado pela Juíza e Professora Alice Monteiro

de Barros, pela abordagem teórica e analítica da figura em estudo:

“ASSÉDIO MORAL. CARACTERIZAÇÃO.

O termo "assédio moral" foi utilizado pela primeira vez pelos

psicólogos e não faz muito tempo que entrou para o mundo jurídico. O

que se denomina assédio moral, também conhecido como mobbing

(Itália, Alemanha e Escandinávia), harcèlement moral (França), acoso

moral (Espanha), terror psicológico ou assédio moral entre nós, além

de outras denominações, são, a rigor, atentados contra a dignidade

humana. De início, os doutrinadores o definiam como "a situação em

que uma pessoa ou um grupo de pessoas exercem uma violência

psicológica extrema, de forma sistemática e freqüente (em média uma

vez por semana) e durante um tempo prolongado (em torno de uns 6

meses) sobre outra pessoa, a respeito da qual mantém uma relação

assimétrica de poder no local de trabalho, com o objetivo de destruir

as redes de comunicação da vítima, destruir sua reputação, perturbar o

exercício de seus trabalhos e conseguir, finalmente, que essa pessoa

acabe deixando o emprego" (cf. Heinz Leymann, médico alemão e

39

pesquisador na área de psicologia do trabalho, na Suécia, falecido em

1999, mas cujos textos foram compilados na obra de Noa Davenport e

outras, intitulada Mobbing: Emotional "Abuse in The American Work

Place"). O conceito é criticado por ser muito rigoroso. Esse

comportamento ocorre não só entre chefes e subordinados, mas

também na via contrária, e entre colegas de trabalho com vários

objetivos, entre eles o de forçar a demissão da vítima, o seu pedido de

aposentadoria precoce, uma licença para tratamento de saúde, uma

remoção ou transferência. Não se confunde com outros conflitos que

são esporádicos ou mesmo com más condições de trabalho, pois o

assédio moral pressupõe o comportamento (ação ou omissão) por um

período prolongado, premeditado, que desestabiliza psicologicamente

a vítima. Se a hipótese dos autos revela violência psicológica intensa

sobre o empregado, prolongada no tempo, que acabou por ocasionar,

intencionalmente, dano psíquico (depressão e síndrome do pânico),

marginalizando-o no ambiente de trabalho, procede a indenização por

dano moral advindo do assédio em questão” (TRT-RO-01292-2003-

057-03-00-3, 2ª Turma, Relª Juíza Alice Monteiro de Barros, DJ

11.08.2004)

Os fatos mais recorrentes são a inação compulsória, humilhações

verbais por parte de superiores – inclusive pela utilização de palavras de

baixo calão –, coações psicológicas com a finalidade de adesão do

empregado a PDV ou à demissão, atribuição de tarefas estranhas ou

incompatíveis com o cargo ou com o tempo em que são exigidas,

divulgação de comentários maliciosos visando a subestimar esforços, com

prejuízos à saúde mental do trabalhador. A regularidade dos atos punitivos

deve se prolongar no tempo.

40

Do Tribunal Superior do Trabalho, destaca-se:

RECURSO DE REVISTA - ASSÉDIO MORAL – CARACTERIZAÇÃO

O Eg. Tribunal Regional consignou a ocorrência de assédio moral, uma vez

que a Ré submeteu o Autor a situações constrangedoras, como danças

vexatórias, obrigação de utilização de fantasias, nomes pejorativos e

proibição de ida aos banheiros quando não cumpridas as cotas de

venda. Incidência da Súmula nº 126. (...) (RR-332700-51.2007.5.12.0001,

Relatora Ministra: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, 8ª Turma, Data de

Publicação: 26/02/2010)

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DO

RECLAMADO - ASSÉDIO MORAL - VALOR ARBITRADO A

TÍTULO DE INDENIZAÇÃO - NÃO OCORRÊNCIA DE VIOLAÇÃO

DIRETA DO ART. 944 DO CC. 1. Consoante o disposto no art. 944 do

CC, a indenização mede-se pela extensão do dano. 2. -In casu-, o Regional

impôs a indenização de R$ 100.000,00 em face da comprovação do assédio

moral sofrido pela Reclamante que, ocupante do cargo de gerência, ao ser

reintegrada no emprego por força de antecipação de tutela, passou a ser

perseguida e humilhada, com a designação para o exercício de tarefas

muito abaixo de sua formação profissional (separar e contar

documentos velhos, além de cortar papéis para servir de brochura) em

local inóspito, sem ventilação, no subsolo do prédio da agência

bancária, em condições precárias de higiene (com ratos na tubulação e

baratas no ambiente). 3. Nesse contexto, não se vislumbra violação do

dispositivo legal supramencionado, tendo em vista que o valor devido

como indenização por dano moral decorre da livre persuasão racional do

juiz, prevalecendo a avaliação do referido dano por seu arbitramento, nos

exatos termos da diretriz do -caput- do comando legal em comento. 4. Por

fim, não restaram violados, igualmente, os arts. 5º, II, e 93, IX, da CF, já

que, para se concluir pela violação do art. 5º, II, da CF, seria necessário

verificar prévia vulneração às normas infraconstitucionais que regem a

matéria, restando ainda ileso o art. 93, IX, CF, uma vez que devidamente

explicitados os fundamentos pelos quais o Regional atribui o valor da

indenização. Agravo de instrumento desprovido. (AIRR-112940-

65.2006.5.01.0026, Relatora Juíza Convocada: Maria Doralice Novaes, 7ª

Turma, Data de Publicação: 09/10/2009)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. PEDIDO

DE INDENIZAÇÃO POR ASSÉDIO MORAL. DEFERIMENTO DE

INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. JULGAMENTO ‘EXTRA

PETITA’ NÃO CARACTERIZADO. O Tribunal Regional concluiu não

41

ter sido caracterizado o assédio moral, na medida em que as agressões

verbais ofensivas à honra e dignidade da reclamante não foram praticadas

com a reiteração necessária para caracterizar assédio moral. Ao valorar os

fatos e provas, a Corte de origem inferiu tratar-se de hipótese ensejadora de

indenização por dano moral, porquanto as expressões de baixo calão foram

direcionadas à reclamante, em público, enquanto encontrava-se grávida,

caracterizando nítida tratamento discriminatório e humilhante. Não se

configura julgamento -extra petita-, porquanto o Tribunal apenas procedeu

ao adequado enquadramento jurídico dos fatos, não se divisando ofensa aos

arts. 128, 293 e 460 do CPC. Agravo de instrumento a que se nega

provimento. (AIRR-61840-61.2007.5.03.0097, Relator Ministro: Walmir

Oliveira da Costa, 1ª Turma, Data de Publicação: 11/09/2009)

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA.

INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. ASSÉDIO MORAL.

CONFIGURAÇÃO. EFEITOS. Decisão de Tribunal Regional do Trabalho

mantendo a sentença que condenara o reclamado a pagar ao reclamante

indenização por dano moral, haja vista a configuração de assédio moral.

Hipótese em que ficou constatado que o reclamante, posteriormente ao

tratamento de saúde a que foi submetido por LER e às eleições em que

se sagrou vitoriosa a chapa que integrou como dirigente sindical, foi

rebaixado da função de gerente, ocupando uma mesa no meio do

recinto do trabalho e com suas tarefas minimizadas, porquanto cumpria

funções que não executava há vinte anos. Particularidade em que a Corte

Regional também destacou a existência de situações a corroborar o assédio

moral no caso em exame. Manutença dessa decisão à míngua de recurso de

revista que não preenche os pressupostos de admissibilidade do artigo 896

da CLT. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (AIRR-15740-

85.2006.5.24.0004, Relator Ministro: Horácio Raymundo de Senna Pires,

6ª Turma, Data de Publicação: 05/06/2009)

RECURSO DE REVISTA. 1. ASSÉDIO MORAL. INDENIZAÇÃO.

CABIMENTO. 1. A produtividade do empregado está vinculada ao

ambiente de trabalho saudável e à sua satisfação. 2. A construção de um

ambiente de trabalho propício ao crescimento pessoal e profissional

depende do modo de atuação do empregador na condução e direção da

atividade econômica. 3. Adoção de prendas e castigos como justificativa

para aumento da produtividade implica violação do dever de respeito à

dignidade da pessoa humana. 4. Tal procedimento configura assédio

moral e autoriza a reparação pelo dano sofrido. Recurso de revista

conhecido e provido. (RR-98500-13.2006.5.03.0025, Relator Ministro:

Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, 3ª Turma, Data de Publicação:

22/05/2009)

42

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - PRESSÃO PSICOLÓGICA

PARA O ATINGIMENTO DE METAS DE PRODUÇÃO - RESTRIÇÃO

DE UTILIZAÇÃO DO SANITÁRIO E DO BEBEDOURO - EXPOSIÇÃO

A SITUAÇÕES CONSTRANGEDORAS - CONDUTA IMPRÓPRIA DO

RECLAMADO - MEDIDAS INCOMPATÍVEIS COM OS DIREITOS DA

PERSONALIDADE CONSTITUCIONALMENTE PROTEGIDOS -

DECISÃO REGIONAL PROFERIDA À LUZ DO ART. 5º, X, DA

CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. Conforme estabelece o art. 5º, X, da CF,

o dano moral passível de indenização diz respeito à violação da imagem,

honra, vida privada e intimidade da pessoa. 2. Na hipótese dos autos, o

Regional consignou que o Reclamado, com o intuito de controlar as suas

metas de produção, adotava para seus empregados condutas claramente

constrangedoras. Nesse contexto, registrou o TRT que a Empresa

restringia a ida de seus funcionários ao sanitário a apenas duas ou três

vezes ao dia, com duração de cinco minutos cada uma delas, e com a

sujeição, em algumas ocasiões, a autorização do superior hierárquico,

o qual poderia, inclusive, ir buscar o funcionário que demorasse mais

do que cinco minutos no sanitário, havendo, ainda, determinação para

que o empregado que fosse ao toalete deixasse seu crachá pendurado

nas vassouras. Por outro lado, as saídas para beber água também eram

controladas. Ademais, havia no Reclamado diretriz, constante do seu

regulamento, para a medição da produtividade, sendo utilizado para

tanto um cronômetro, que calculava o tempo de trabalho dos

funcionários quando a produtividade não era satisfatória, ocasião em

que algum funcionário do Reclamado, com o aparelho na mão, se

posicionava na frente do empregado cujo tempo de trabalho estava

sendo contado, o que causava bastante nervosismo em alguns deles.

Por fim, quando as metas de produção não eram alcançadas, havia

muita pressão por parte do Reclamado, que cobrava dos empregados o

seu alcance sob pena de terem que trabalhar além do normal ao longo

da jornada. 3. Assim, concluiu o Regional que havia nos autos farto

conjunto fático-probatório caracterizando o assédio moral e o terror

psicológico vivenciados pelos Obreiros no ambiente de trabalho, o que lhes

causava verdadeira angústia quanto à manutenção de seus empregos e ao

sustento de suas famílias. 4. Neste contexto fático e à luz do que estabelece

o art. 5º, X, da CF, segundo o qual são invioláveis a intimidade, a vida

privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a

indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação,

revela-se acertada a conclusão a que chegou a Corte de origem, pois,

independentemente dos motivos que justificariam o zelo pela

produtividade, o Reclamado deveria observar critérios de razoabilidade,

devendo o Empregador, que é responsável direto pela qualidade das

43

relações e do ambiente de trabalho, adotar medidas compatíveis com os

direitos da personalidade constitucionalmente protegidos. Recurso de

revista não conhecido. (RR-118600-44.2007.5.20.0004, Relator Ministro:

Ives Gandra Martins Filho, 7ª Turma, Data de Publicação: 15/05/2009)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. INDENIZAÇÃO POR DANOS

MORAIS. ASSÉDIO MORAL. DESPROVIMENTO. Não demonstrada

divergência jurisprudencial no caso dos autos em que há condenação em

dano moral no importe de R$200.000,00 contra o Banco, em razão de

assédio moral, quando da aquisição do BBV pelo Banco Bradesco, visto

que o autor que era o gerente da agência passou a não mais ter mesa de

trabalho, sentando-se na cadeira dos clientes, trabalhando em pé,

mesmo com costelas fraturadas, caracterizando-se a figura intitulada

mobbing. Agravo de instrumento desprovido. (AIRR-29440-

93.2004.5.01.0019, Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga, 6ª Turma,

Data de Publicação: 21/11/2008)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. ASSÉDIO

MORAL. SÚMULA 126/TST. O e. TRT condenou a Reclamada ao

pagamento de danos morais em face da caracterização de discriminação

operada no curso do contrato de trabalho, em que a empregadora não só

deixou o empregado sem desenvolver as atividades para as quais fora

contratado, como também proibiu seu acesso às dependências da

empresa, humilhando-o e ferindo o seu decoro profissional, vero

procedimento que se convencionou denominar de psicoterror,

flagrante assédio moral. Eloqüentes as palavras do texto decisório

regional: -(...) Ao não lhe oferecer trabalho, a empresa feriu a dignidade e a

auto-estima do empregado, visto que é extremamente constrangedor para

uma pessoa acostumada a laborar, ser colocada à margem da cadeia

produtiva. Como se sabe, o trabalho dignifica o homem e é através dele que

o ser humano se sente participante da coletividade, ciente de que está

contribuindo para o progresso do país. Nada mais dignificante do que se

sentir merecedor do salário auferido, razão pela qual a mera percepção de

remuneração sem a contraprestação laboral, embora não lhe traga prejuízos

de ordem financeira, indubitavelmente atinge seu psicológico (...)-. Nesse

contexto, o artigo 4º da CLT não viabiliza a admissibilidade do recurso de

revista da Reclamada, pois o argumento de que o empregado ficara -à

disposição- não se evidencia diante dos fatos consignados pelo e. TRT. E

para se chegar à conclusão distinta, necessário seria o reexame de fatos e

provas, procedimento vedado nesta instância extraordinária, a teor da

Súmula 126/TST. Agravo de Instrumento a que se nega provimento.

(AIRR-70940-86.2006.5.13.0003, Relator Ministro: Horácio Raymundo de

Senna Pires, 6ª Turma, Data de Publicação: 06/06/2008)

44

7. Reparações devidas.

7.1. Rescisão indireta: em qualquer hipótese de terror psicológico, caberá,

nos termos do artigo 483, principalmente pelas alíneas “a”, “b”, “e” e “g”,

da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o pleito de que reste

caracterizada a rescisão indireta do contrato de trabalho, com as

conseqüências previstas pela legislação trabalhista: saldo de salário, aviso

prévio, férias vencidas e proporcionais, o adicional de 1/3, os depósitos do

Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), a multa fundiária de

40%, a gratificação natalina, como se o contrato de trabalho tivesse sido

extinto sem justa causa.

Há de se considerar também a possibilidade de a nulidade absoluta

do ato de dispensa gerar direito à reintegração, fundada na garantia

constitucional da não discriminação, que tem ensejado outras hipóteses de

reintegração, como é o caso dos aidéticos, grevistas etc.

7.2. Indenização por danos morais: conseqüência do reconhecimento do

assédio moral é a condenação do agressor em reparação por danos morais.

7.3. Indenização por danos materiais: também é possível divisar a

reparação por danos materiais, nas hipóteses, v.g., em que do assédio moral

decorram prejuízos de ordem psicológica em gravidade tal que importem

em gastos ao trabalhador, como remédios e tratamentos.

8. O combate ao assédio moral.

45

A moderna doutrina laboral prioriza as relações humanas no

trabalho, com a adoção de medidas de prevenção a acidentes e

enfermidades, assecuratórias de plenas condições de segurança e saúde para

o exercício do trabalho.

O empregador de hoje, ciente da função social da empresa e da sua

responsabilidade em assegurá-la, deve implementar programas de

prevenção e proteção contra práticas viabilizadoras de assédio moral.

ACIDENTES DO TRABALHO

A terceira lei acidentária brasileira, o Decreto 7036, de 10/11/1944, é

que, primeiro, ampliou o conceito de acidente do trabalho, abrangendo as

concausas, o acidente in itinere e a possibilidade de acumular a ação

acidentário com a responsabilidade civil. Outras leis foram editadas

(Decreto-lei 293, de 28/02/1967, Leis 5316, de 14/09/1967 e 6367, de

19/10/1976.

A disciplina, hoje, está na Lei 8213, de 24/07/1991, nos artigos 19 a

23, regulamentada pelo Decreto 3048, de 06/05/1999.

Alexandre Agra Belmonte aponta os aspectos centrais:

“conceito de acidente do trabalho abrangendo lesão corporal,

perturbação funcional ou doença que cause a morte ou a perda ou redução,

permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho, incorporação das

concausas, previsão do acidente in itinere, seguro obrigatório, plano

específico de benefícios previdenciários acidentários e responsabilização

do empregador pelos acidentes causados por sua culpa ou dolo.”25

Como já visto, combinados os arts. 114, VI e 7º, XXVIII, da

Constituição da República, a competência para o julgamento da ação

25

BELMONTE, Alexandre Agra. Curso de Responsabilidade Trabalhista: Danos Morais e Patrimoniais

nas Relações de Trabalho. 2ª ed., São Paulo: LTr, 2009, p.171.

46

fundada na responsabilidade civil do empregador, objetivando reparação

pelo dano material e moral decorrente do acidente do trabalho é da Justiça

do Trabalho. A ação acidentária, promovida contra o Estado, que discute a

relação de custeio e benefício, é da competência da Justiça Comum

(enquadramento, valor do benefício etc.).

Como acentua Alexandre Agra Belmonte:

“são considerados acidentes do trabalho quaisquer lesões à vida ou à

integridade física do empregado como decorrência do exercício do trabalho

a serviço da empresa durante o horário de trabalho ou in itinere, que cause

a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade

para o trabalho, bem como as doenças profissionais, as doenças do

trabalho, os atos de agressão e de imprudência provindos de terceiros,

companheiro de trabalho ou pessoa privada do uso da razão, e as

concausas.”26

O mesmo Autor define Concausa:

“é outra causa que, juntando-se à causa principal, contribui para o

resultado ou agravamento do dano. A concausa é uma circunstância que

vem a reforçar a causa principal.

As concausas podem ser preexistentes e supervenientes (ou

concomitantes).

São preexistentes as constituídas por circunstâncias já existentes

quando da conduta do agente, caso da diabetes da vítima, enquanto as

supervenientes são constituídas por novas circunstâncias, como ocorre

quando o socorro da vítima atropelada demora a chegar. Nenhuma delas

influi no resultado final; apenas o reforça.”27

A reparação acidentária, a cargo da previdência, proveniente do

seguro obrigatório, fundamenta-se na teoria do risco integral, de natureza

26

BELMONTE, Alexandre Agra. Idem, p. 172. 27

BELMONTE, Alexandre Agra. Idem, p. 37.

47

objetiva, sendo devida mesmo havendo culpa da vítima e independe da

reparação a cargo do empregador, fundada na responsabilidade civil deste

e, assim, da conjugação do ato ilícito, do dano, do nexo de causalidade e da

culpa.

OUTRAS HIPÓTESES DE DANO MORAL DECORRENTES DA

RELAÇÃO DE TRABALHO

Atos isolados ou não, ocorrentes no âmbito da relação de trabalho, se

considerados ilícitos, podem geral a obrigação de reparação:

“DANO MORAL. PRESENÇA DE SUPERVISOR NOS

VESTIÁRIOS DA EMPRESA PARA ACOMPANHAMENTO DA

TROCA DE ROUPAS DOS EMPREGADOS. REVISTA VISUAL.

1. Equivale à revista pessoal de controle e, portanto, ofende o direito à

intimidade do empregado a conduta do empregador que, excedendo os

limites do poder diretivo e fiscalizador, impõe a presença de

supervisor, ainda que do mesmo sexo, para acompanhar a troca de

roupa dos empregados no vestiário.

2. O poder de direção patronal está sujeito a limites inderrogáveis,

como o respeito à dignidade do empregado e à liberdade que lhe é

reconhecida no plano constitucional.

3. Irrelevante a circunstância de a supervisão ser empreendida por

pessoa do mesmo sexo, uma vez que o constrangimento persiste, ainda

que em menor grau. A mera exposição, quer parcial, quer total, do

corpo do empregado, caracteriza grave invasão à sua intimidade,

traduzindo incursão em domínio para o qual a lei franqueia o acesso

somente em raríssimos casos e com severas restrições, tal como se

48

verifica até mesmo no âmbito do direito penal (art. 5º, XI e XII, da

CF).

4. Despiciendo, igualmente, o fato de inexistir contato físico entre o

supervisor e os empregados, pois a simples visualização de partes do

corpo humano, pela supervisora, evidencia a agressão à intimidade da

Empregada.

5. Tese que se impõe à luz dos princípios consagrados na Constituição

da República, sobretudo os da dignidade da pessoa, erigida como um

dos fundamentos do Estado Democrático de Direito (art. 1º, inciso

III), da proibição de tratamento desumano e degradante (art. 5º, inciso

III) e da inviolabilidade da intimidade e da honra (art. 5º, inciso X).

6. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento para

julgar procedente o pedido de indenização por dano moral” (TST-

2195/1999-009-05-00.6, 1ª Turma, Rel. Min. João Oreste Dalazen, DJ

09.07.2004)

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