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Teoria jurídica do delito
Culpabilidade
• “Esclarecimento é a saída do homem de sua
menoridade, da qual ele próprio é culpado. A
menoridade é a incapacidade de fazer uso de seu
entendimento se a direção de outro indivíduo” (Kant)
“Afastados os exageros e unilateralismos das chamadas
escolas antropológica e sociológica, que rivalizam no
incerto campo da criminologia, o que se pode
plausivelmente admitir é que existe em todo homem
um criminoso in potentia, cuja eclosão pode ser
favorecida, e não necessariamente determinada, por
condições pessoais e sociais. Há em cada um de nós
um pequeno diabo mais ou menos necessitado de
água-benta. Em todos os seres humanos existe, de par
com o instinto social, uma disposição ou tendência, mais
ou menos acentuada, mais ou menos capaz de efetiva
exteriorização, no sentido dessa conduta anti-social que
se convencionou chamar crime. O indivíduo mais
respeitoso das leis pode ser um delinquente de
emergência (von Hentig).
A confissão de Göethe, de que não haveria crime
algum para cuja prática não sentisse recôndita
inclinação, poderia ser repetida por qualquer
homem. Não há diferença estrutural entre
criminosos e não-criminosos. A geral potencialidade
para o crime não significa jamais proclividade inexorável
ou predisposição fatal, mas apenas que, dadas certas
circunstâncias ou situações concretas, qualquer
indivíduo pode `cair` no crime (Exner). Se a queda não
é a regra, mas a exceção, vem isso de que a
resistência psíquica ou esforço de vontade, no
sentido de conformação social da conduta, pode
vencer, e mais frequentemente vence, as tentações e
os impulsos em sentido contrário, o que exclui a
concepção puramente causalista ou determinista do
crime (Lopez-Rey)” (Nelson Hungria)
David Hume: “Seria razoável esperar que acerca das
questões que têm sido examinadas e discutidas
cuidadosamente desde os primórdios da ciência e da
filosofia houvesse, ao menos, acordo entre os
disputantes sobre o significado de todos os termos e,
transcorridos mil anos de inquirições, houvessem
passado das palavras para o objetivo verdadeiro e real
da controvérsia.
Mas se considerarmos o assunto mais de perto,
seremos obrigados a tirar uma conclusão oposta,
fundada nesta única circunstância: visto que uma
controvérsia perdura e continua ainda sem decisão,
deve-se presumir que há alguma ambiguidade
conceitual e que os adversários atribuem ideias
diferentes para os termos empregados na controvérsia.
Com efeito, supondo-se que as faculdades espirituais
são naturalmente semelhantes em todos os indivíduos -
de outro modo nada seria mais infrutífero do que
raciocinar e discutir juntos - seria impossível, se os
homens atribuíssem as mesmas ideias para os seus
termos, que continuassem por tanto tempo a formular
opiniões diferentes sobre o mesmo objeto,
especialmente se comunicam seus pareceres e cada
uma das facções busca argumentos em toda parte a fim
de obter a vitória sobre seus antagonistas.
Mas, se o problema diz respeito a qualquer objeto da
vida diária e da experiência, pensar-se-ia que nada
poderia manter o debate indecidido por tanto tempo,
exceto algumas expressões ambíguas, que mantêm
ainda os adversários à distância, impedindo-os de se
porem em íntimo contato. Esta tem sido a situação da
tão longamente questão da liberdade e da necessidade”
O problema central da culpabilidade é o problema do seu
fundamento — o chamado fundamento ontológico da
culpabilidade —, acentuado pela redefinição de
culpabilidade como reprovabilidade: a capacidade de
livre decisão do sujeito. A tese da liberdade de vontade
do conceito de culpabilidade e, por implicação, do
conceito de punição, é indemonstrável. Se pena
pressupõe culpabilidade, e a reprovação da culpabilidade
assenta em fundamento indemonstrável, então a
culpabilidade não pode servir de fundamento da pena.
Por isso, o juízo de culpabilidade deixou de ser um juízo
ontológico, que descreveria uma qualidade do sujeito,
para ser um juízo normativo, que atribui uma qualidade
ao sujeito. (Juarez Cirino)
Franz von Liszt: “[a] voluntariedade na commissão ou
na omissão, não quer dizer livre arbitrio no sentido
metaphysico (…), mas isenção de coacção mechanica
ou psycho-physica. Não se dá acção por parte daquelle
que, em um ataque de convulsão, damnifica objectos
alheios ou que, em razão de uma syncope, não póde
cumprir o seu dever; não se dá acção por parte de quem
é coagido pelo poder physico de outrem a fazer ou deixar
de fazer alguma cousa”
“Seja como for, o vocábulo livre significa o que não é
necessário sob relação alguma, o que independe de toda
razão suficiente. Pudesse semelhante atributo convir à
vontade humana, indicaria isso que uma vontade
individual, nas suas manifestações externas, não é
determinada por nenhum motivo nem por razões de
qualquer espécie, dados que, em caso contrário, a
consequência resultante de determinada razão, seja
essa da espécie que for, intervindo sempre segundo uma
lei de necessidade absoluta, os seus atos não mais
seriam livres mas sim constrangidos por necessidade”
(Schopenhauer)
• Nos últimos tempos, contudo, o conceito de
culpabilidade “se converteu, para muitos, em uma
imprecisa categoria metafísica, supérflua e inclusive
nociva” (Antonio García-Pablos de Molina).
• Resumidamente, é possível dizer que a crise do
princípio de culpabilidade está intimamente
relacionada à impossibilidade ou dificuldade de
comprovar que o agente, no caso concreto, poderia
ter atuado de outro modo, ou seja, poderia ter
obedecido ao ordenamento jurídico, e à igual
impossibilidade de afirmar, com certeza, quais são
as condicionantes empíricas que incidem sobre a
atuação criminosa do sujeito e em que medida elas
são determinantes desta atuação. (Paulo Cesar
Busato)
• “Depois de expulsarem de si o desejo de beber
e comer, Mesáulio recolheu o pão e eles, fartos
de pão e carne, encaminharam-se para a
cama. Sobreveio uma noite ruim sem luar e
Zeus choveu a noite inteira; soprava o forte
Zéfiro, sempre chuvoso”
Antecedentes históricos
• “Hera voltou-se para Atena e falou: “Ai de mim,
filha de Zeus porta-escudo! Não vale a pena
que enfrentemos, por mortais, o Pai. Que uns
morram, que outros vivam, é coisa do acaso.
Que a Zeus, no íntimo foro, cabe dar o justo
tratamento a Troianos e Gregos”
Antecedentes históricos
• Prevaleceu remotamente a ideia da ausência de
responsabilidade individual, pois todos os
acertos e erros do indivíduo eram decorrentes
da sua determinação pelos Deuses, como se
verifica na famosa obra Ilíada.
Antecedentes históricos
Antecedentes históricos
• Por incrível que pareça, o primeiro passo
evolutivo da culpabilidade se deu no sentido da
responsabilidade objetiva.
Código de Hamurabi
• Acredita-se que foi escrito pelo rei Hamurábi,
aproximadamente em 1772 a.C. Foi encontrado por
uma expedição francesa em 1901 na região da
antiga Mesopotâmia correspondente à cidade
de Susa, no sudoeste do Irã.
• É um monumento monolítico talhado
em rocha de diorito, sobre o qual se dispõem 46
colunas de escrita cuneiforme acádica, com 282 leis
em 3600 linhas. A numeração vai até 282, mas a
cláusula 13 foi excluída por superstições da época. A
peça tem 2,25 m de altura, 1,50 metro de
circunferência na parte superior e 1,90 na base
Código de Hamurabi• XII - DELITOS E PENAS (LESÕES CORPORAIS,
TALIÃO, INDENIZAÇÃO E COMPOSIÇÃO)
• 196º - Se alguém arranca o olho a um outro, se lhe
deverá arrancar o olho.
• 197º - Se ele quebra o osso a um outro, se lhe deverá
quebrar o osso.
• 200º - Se alguém parte os dentes de um outro, de
igual condição, deverá ter partidos os seus dentes.
• 229º - Se um arquiteto constrói para alguém e não o
faz solidamente e a casa que ele construiu cai e fere
de morte o proprietário, esse arquiteto deverá ser
morto.
“O atual conceito normativo de culpabilidade é o
produto inacabado de mais de um século de
controvérsia sobre sua estrutura, que começa com o
conceito psicológico de culpabilidade do século XIX,
evolui para o conceito psicológico-normativo no início
do século XX, transformando-se em conceito
exclusivamente normativo durante o século XX e, na
passagem para o século XXI, parece imerso em crise
insuperável” (Juarez Cirino dos Santos)
• A primeira grande teorização sobre a
culpabilidade é tida, por alguns, com obra do
hegeliano Christian Reinhold Köstlin com base
em sua teoria normativa exposta na obra Neue
Revision der Grundbegriffe des Criminalrechts
(Nova revisão dos conceitos fundamentais de
direito criminal), publicada em 1845.
Culpabilidade psicológica
Culpabilidade psicológica
“Hasta fines Del siglo XIX el concepto dogmático jurídico-
penal de la culpabilidad no fue claramente diferenciada del
de la antijuridicidad. En esta forma, tuvo entrada en el
sistema trimembre del delito desarrollado por v. Liszt y
Beling. Con esta distinción, se conectó primeramente el
dogma de que lo ilícito típico se fundamentaba
exclusivamente en momentos subjetivos: la culpabilidad
consiste en el reflejo anímico de la realidad (Beling, Lehre
vom Verbrechen, 1906, 10) — en la que se expresa la
misma influencia del pensamiento de las ciencias naturales
al que se refiere también el concepto causal de acción. El
concepto de culpabilidad aí entendido se designó,
consecuentemente, como psicológico" (STRATENWERTH,
Günter, p. 163)
“O pensamento naturalista do final do século
XIX, que tentava reduzir todos os conceitos
jurídicos a dados empíricos expli-cáveis pelas
ciências naturais, desenvolveu o ‘ conceito
psicológico de culpabilidade’; (...) a culpabilidade
se concebia como a relação subjetiva do sujeito
com o resultado” (Claus Roxin).
Culpabilidade psicológica
• Modelo chamado Liszt-Beling
• Culpabilidade como dimensão subjetiva
do injusto
• capacidade de culpabilidade =
imputabilidade (compreender e
querer)
• relação psicológica do autor com fato
(dolo / culpa)
Culpabilidade psicológica
• “se o conceito de culpabilidade não abarca
mais que a soma de dolo e culpa e estes
con-sistem na produção consciente ou
descuidada do resultado, segue sendo de
todo incompre-ensível como poderia ser
excluída a culpabili-dade pelo estado de
necessidade” (Frank).
• Além disso, a culpabilidade psicológica não
ex-plica a culpa inconsciente, em que “não
é cons-tatável uma relação psíquica entre
o sujeito e o resultado”(Roxin, p.765).
Culpabilidade psicológica-normativa
• Assim, segundo Frank em seu estudo
Über den Aufbau des Schuldbegriffs
(Sobre a estrutura do conceito de
culpabilidade), 1907: “ um
comportamento proibido só pode ser
atribuído à culpabilidade de alguém se
é possível reprovar-lhe sua realização”(apud Juarez Cirino, p. 202).
Culpabilidade psicológica-normativa
• Reinhard Frank, no início do século XX, já sob
o império das valorações do neokantismo,
percebe que a ideia central da culpabilidade é
a reprovabilidade, ou seja, o juízo de reproche
à conduta do autor. Ele constrói a sua teoria
psicológico-normativa da culpabilidade e da
constatação de que a culpabilidade não pode
basear-se apenas no dolo e na culpa, uma vez
que os referidos elementos são insuficientes
para dar as respostas aos problemas do Direito
Penal.
Culpabilidade psicológica-normativa
• Assim, Frank constrói a sua teoria afirmando
que a culpabilidade é um juízo de reprovação
do autor do fato pela ordem jurídica em razão
de ter ele cometido um injusto penal, quando
poderia ter agido em conformidade com o
Direito. A ideia da reprovabilidade.
Culpabilidade psicológica-normativa
• Em resumo, a culpabilidade de Frank era
constituída por: inimputabilidade, dolo, culpa e
normalidade das circunstâncias.
Culpabilidade psicológica-normativa
• Modelo Frank-Goldschmidt-Freudenthal
• capacidade de culpabilidade =
imputabilidade (compreender e querer)
• relação psicológica do autor com fato
(dolo / culpa)
• juízo de censura (ou reprovabilidade) =
exibilidade de conduta diversa (ou
conforme a norma)
Culpabilidade psicológica-normativa
• Hans Welzel e a doutrina finalista da
ação
• Deslocamento do dolo e da culpa para
a categoria do tipo subjetivo de injusto,
excluindo-os da culpabilidade.
Culpabilidade normativa
Segundo Luiz Regis Prado: no modelo welzeniano,
o estrato da personalidade desempenha o papel de
uma reserva de decisões anteriormente executadas,
convertidas em atitudes e posições internas
inconscientes da personalidade e que configuram o
caráter; entendido este tanto como resultado de ações
anteriores quanto o fundamento determinante de
futuras ações. Em realidade, a ideia base que pode ser
extraída do estudo do elemento caracteriológico é que
o ato que o agente realiza é no fundo um produto da
exteriorização de sua personalidade.
Culpabilidade normativa
• capacidade de culpabilidade =
imputabilidade (compreender e querer)
• relação psicológica do autor com fato
(dolo / culpa)
• juízo de censura (ou reprovabilidade) =
exibilidade de conduta diversa (ou
conforme a norma)
• conhecimento real ou possível do
injusto = potencial consciência da
ilicitude
Culpabilidade normativa
Em resumo:
• Causalismo
• Dolo na culpabilidade: vontade livre e
consciente
• Finalismo
• Dolo no tipo: consciência da vontade
direcionada a um fim
• Culpabilidade: liberdade da vontade
– Elementos dogmáticos da culpabilidade
Imputabilidade capacidade de culpabilidade
Elementos: - cognitivo- volitivo
Sistemas de inimputabilidade - biológico- psicológico- biopsicológico
John Eccles, “[a]té onde poderemos usar o nosso
cérebro para perceber o cérebro?” The understanding
of the brain. 2 ed. New York: McGraw Hill, 1977, p.34.
•Hipóteses de inimputabilidade:1 - menoridade (art. 27 do CP)2 - doença mental (concepção ampla)3 - desenvolvimento mental - incompleto
- retardado4 - embriaguez acidental completa (art. 28, §
1º)
- Consequências:- art. 26, caput absolvição indireta
- art. 26, parágrafo único: Culpabilidadediminuída: sistema vicariante (art. 26, parágrafoúnico c/c o art. 98 do CP)
Potencial consciência da ilicitude
- Critério para verificação: valoração paralela na esfera
do profano (Edmund Mezger): visa verificar a possibilidade
da compreensão da ilicitude da conduta por parte do sujeito
ativo no caso concreto
“Para que se possa, mediante algum esforço da
consciência, atingir o caráter injusto de uma ação é
necessário que a matéria desse injusto já tenha penetrado
anteriormente na consciência, o que só seria possível por
meio das normas de cultura, únicas acessíveis ao leigo”
(Assis Toledo)
- Exclusão: erro de proibição invencível
Potencial consciência da ilicitude
• “Como exigir-se, nesse caso, por parte do agente, que se
supõe não ser jurista, motivar-se pelo conhecimento da
norma, ou pela antisocialidade, ou pela imoralidade de
uma conduta totalmente neutra, ou, ainda, que encontre
na “consciência” profana, com algum esforço, o que nela
nunca esteve e não está” (Assis Toledo)
Exigibilidade de conduta conforme o direito
- Critério da “normalidade das circunstâncias”- Exclusão na hipótese de: coação irresistível- “vis absoluta” x “vis compulsiva”- Requisitos: 1) gravidade da ameaça; 2)generalidade da ameaça; e 3) condições decumprimento imediato
Projeto Sarney (PLS 156/2012)
PARTE GERAL
TÍTULO I
DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL
Legalidade
Art. 1º Não há crime sem lei anterior que o
defina. Não há pena sem prévia cominação legal.
Parágrafo único. Não há pena sem culpabilidade.
Estado de necessidade
Art. 27. Considera-se em estado de necessidade
quem pratica um fato para proteger bem jurídico
próprio ou alheio e desde que:
a) o bem jurídico protegido esteja exposto a
perigo de lesão atual ou iminente, não evitável de
outro modo;
b) a situação de perigo não tenha sido
dolosamente provocada pelo agente;
Projeto Sarney (PLS 156/2012)
c) o agente não tenha o dever jurídico de
enfrentar o perigo;
d) não seja razoável exigir o sacrifício do bem
jurídico levando-se em consideração sua
natureza ou valor.
Parágrafo único. Se for razoável o sacrifício do
bem jurídico, poderá ser afastada a culpabilidade
ou ser a pena diminuída de um a dois terços.
Projeto Sarney (PLS 156/2012)
Exclusão da culpabilidade
Art. 29. Não há culpabilidade quando o agente pratica o
fato:
I – na condição de inimputável;
II – por erro inevitável sobre a ilicitude do fato; ou
III – nos casos de coação moral irresistível, obediência
hierárquica a ordem não manifestamente ilegal, excesso
exculpante por justificada confusão mental ou medo ou
outras hipóteses de inexigibilidade de conduta diversa.
Projeto Sarney (PLS 156/2012)
Inimputabilidade
Art. 30. Considera-se inimputável o agente que:
I – por doença mental ou desenvolvimento mental
incompleto, era, ao tempo da ação ou da omissão,
inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato
ou de determinar-se de acordo com esse entendimento;
ou
II – por embriaguez completa ou outro estado análogo,
proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao
tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de
entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de
acordo com esse entendimento.
Projeto Sarney (PLS 156/2012)
Imputável com pena reduzida
Parágrafo único. A pena pode ser reduzida de um a dois
terços, se o agente:
I – em virtude de perturbação de saúde mental ou por
desenvolvimento mental incompleto não era inteiramente
capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de
determinar-se de acordo com esse entendimento; ou
II – por embriaguez ou outro estado análogo, proveniente
de caso fortuito ou força maior, não possuía, ao tempo da
ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o
caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com
esse entendimento.
Projeto Sarney (PLS 156/2012)
Emoção, paixão e embriaguez
Art. 31. Não há exclusão da imputabilidade penal se o
agente praticar o fato:
I – sob a emoção ou a paixão; ou
II – em estado de embriaguez, sob o efeito de droga ou
situações análogas, produzidos por vontade ou culpa.
Projeto Sarney (PLS 156/2012)
Menores de dezoito anos
Art. 32. São penalmente inimputáveis os menores de
dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial.
Parágrafo único. Responde pelo fato o agente que coage,
instiga, induz, determina ou, por qualquer meio, faz com
que o menor de dezoito anos o pratique, com a pena
aumentada de metade a dois terços.
Projeto Sarney (PLS 156/2012)
Erro sobre a ilicitude do fato
Art. 33. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável,
exclui a culpabilidade.
§1º Se o erro sobre a ilicitude for evitável, o agente
responderá pelo crime, devendo o juiz diminuir a pena de
um sexto a um terço.
§2º Considera-se evitável o erro se o agente atua ou se
omite sem a consciência da ilicitude do fato, quando lhe
era possível, nas circunstâncias, ter ou atingir essa
consciência.
§3º Aplica-se o disposto neste artigo às hipóteses em
que o agente supõe situação de fato que, se existisse,
tornaria a ação legítima.
Projeto Sarney (PLS 156/2012)
Índios
Art. 34. Aplicam-se as regras do erro sobre a ilicitude do
fato ao índio, quando este o pratica agindo de acordo
com os costumes, crenças e tradições de seu povo,
podendo o juiz levar em consideração, para esse fim,
laudo de exame antropológico.
§1º A pena será reduzida de um sexto a um terço se, em
razão dos referidos costumes, crenças e tradições, o
indígena tiver dificuldade de compreender ou internalizar
o valor do bem jurídico protegido pela norma ou o
desvalor de sua conduta.
Projeto Sarney (PLS 156/2012)
§2º A pena de prisão será cumprida na unidade mais
próxima do local de habitação do índio ou do local de
funcionamento do órgão federal de assistência.
§3º Na medida em que for compatível com o sistema
jurídico nacional e com os direitos humanos
internacionalmente reconhecidos, deverão ser
respeitados os métodos aos quais os povos indígenas
recorrem tradicionalmente para a repressão dos delitos
cometidos pelos seus membros, podendo o juiz,
conforme a gravidade do fato, a culpabilidade e as
sanções impostas pela respectiva comunidade indígena,
deixar de aplicar a pena ou reduzi-la em até dois terços.
Projeto Sarney (PLS 156/2012)
Coação moral irresistível e obediência hierárquica
Art. 35. Se o fato é cometido sob coação moral irresistível
ou em estrita obediência a ordem, não manifestamente
ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da
coação ou da ordem.
Projeto Sarney (PLS 156/2012)
Avanços da neurociência e o
problema da culpabilidade
Reedição: livre arbítrio x
detereminismo?
“Chegará o tempo em que a questão da
responsabilidade humana, em termos
morais gerais e nos assuntos da justiça e
sua aplicação, levará em conta a ciência
da consciência que hoje se desenvolve.
Talvez essa hora tenha chegado” (Antonio
Damásio)
• “En 1965, dos neurólogos alemanes,
Kornhuber y Deecke, registraron la
actividad eléctrica de la corteza cerebral
(electroencefalografía) de sujetos
normales de manera continua mientras
realizaban movimientos simples de los
dedos (flexión) de manera libre,
espontánea, autoiniciada. Observaran
que aproximadamente un segundo (mil
milisegundos) antes del movimiento se
registraba un potencial negativo al que
llamaron potencial motor preparatorio.
• En 1983, esos resultados movieran a
Benjamin Libet y sus colaboradores de
la Universidad de California, en San
Francisco, a preguntarse en qué
momento previo al movimiento los
sujetos tenían la impresión subjetiva de
que iban a mover el dedo, con la firme
convicción de que esta impresión
subjetiva, reflejo de la voluntad libre de
los sujetos, era la causa tanto de la
actividad cerebral como del movimiento”
(Francisco Rubia)
• Benjamin Libet: “The experimental
findings led us to the conclusion that
voluntary acts can be initiated by
unconscious cerebral processes
before conscious intention appears
but that conscious control over the actual
motor performance of the acts remains
possible”.
• “Os penalistas não ansiaram pelas
sereias, a maioria de nós não é,
tampouco, viciada em suas canções,
mas seu canto atualmente é tão inflado,
que nós não podemos mais fechar os
ouvidos diante dele. Tanto em termos de
conteúdo, quanto estratégia e
retoricamente, o canto me lembra a
duas ondas que alcançaram o direito
penal, e sobretudo a sua ciência, no
passado recente: os antropometristas
italianos, como Lombroso e Ferri (...)
• combates a culpabilidade e o livre
arbítrio como leões, mas são
comportados como carneiros ou se
calam completamente no que tange às
consequências de um direito penal que
consiste exatamente no fardo do livre
arbítrio e na censura à culpabilidade.
Por que em realidade não arriscamos
também as belas moções de liberdade
de conduta e de persecução penal, após
libertarmos o direito penal do livre-
arbítrio? Qual é exatamente a razão a
justificar a contínua persecução penal e
a privação de liberdade de pessoas que
não podem ser culpáveis?” (Hassemer)
“As reduções explanatórias aqui sugeridas não são
do complexo ao simples, mas do extremamente
complexo ao ligeiramente menos complicado”(Damásio, p.31)
“Vem crescendo o temor de que os dados
revelados pela ciência sobre o funcionamento do
cérebro, ao se tornarem mais amplamente
conhecidos, possam solapar a aplicação das leis,
coisa que em geral os sistemas legais têm
evitado, deixando de levar esses dados em
consideração. Mas o necessário, na verdade, é
uma análise mais criteriosa desses dados na
hora de aplicar a justiça. O fato de que qualquer
pessoa capaz de conhecimento é responsável
por suas ações não significa que a neurobiologia
da consciência seja irrelevante ...
... para o processo da justiça e para o processo
de educação destinado a preparar os futuros
adultos para a existência adaptativa em
sociedade. Ao contrário, advogados, juízes,
legisladores, planejadores e educadores
precisam familiarizar-se com a neurobiologia da
consciência e da tomada de decisão. Isso é
importante para promover a elaboração de leis
realistas e preparar as futuras gerações para o
controle responsável de suas ações” (Damásio,
p. 344-345)
• “Vivemos em números, falamos em números e
assistimos a números para nos entreter. Números
governam nossas vidas, nos acordam, nos dizem
aonde ir, como chegar lá e quando partir. Números
são juízes de tudo, avaliam e comparam com
completa autoridade e desapaixonadamente. Mas
números também mentem; podem significar
qualquer coisa, menos a verdade. Podem salvar
nossas vidas, e o amor pelo tipo errado de número
talvez leve à ruína. Números podem ser nossos
amigos, nossos salva-vidas e talismãs. Números
também podem matar. Você é feito de números. Eu
também.” (BENTLEY, Peter. O livro dos números)
A liberdade de vontade
“Recentemente um grupo de neurobiólogos
alemães (Gerthard Roth, Wolfgang Prinz e Wolf
Singer) tem levantado um grande desafio para a
Ciência penal”, afirmando que “a liberdade da
vontade é um artifício inexistente, não porque não
se possa provar, mas porque se pode provar que
não existe” (Eduardo Demetrio-Crespo)
Wolfgang Priz “entende a liberdade de vontade
como uma instituição social que não se
corresponde com a realidade científica
demonstrável desde o ponto de vista psíquico”.
Assim, “falar de liberdade de vontade do ponto
de vista da Psicologia é como, desde o ponto de
vista da Zoologia, falar do unicórnio, ou seja, algo
que não existe na ontologia da disciplina. Tanto o
unicórnio em si mesmo como a ideia do unicórnio
são construções teóricas, uma produção cultural,
e o mesmo acontece com a liberdade de
vontade”.
• Right Orbitofrontal Tumor With Pedophilia
Symptom and Constructional Apraxia Sign
• Jeffrey M. Burns, MD; Russell H. Swerdlow,
MD
• http://archneur.jamanetwork.com/article.aspx?a
rticleid=783830
criminoso ou doente?
pena, medida de
segurança ou
tratamento?
A vontade consciente
• “o passo decisivo para o surgimento da
consciência não é a produção de
imagens e a criação de uma mente. O
passo decisivo é tornar nossas essas
imagens, fazer com que pertençam a
seu legítimo dono, o organismo singular
e perfeitamente delimitado em que elas
surgem” ... “Quando o cérebro
consegue introduzir um conhecedor na
mente, ocorre a subjetividade”(Damasio, p.24).
Dificuldade para definir a consciência
“Vista de cima, a mente parece não apenas muito
complexa, coisa que ela certamente é, mas também
um fenômeno diferente daquele encontrado nos
tecidos biológicos e nas funções do organismo que a
gera. Na prática, adotamos dois tipos de perspectiva
quando nos observamos: vemos a mente com os
olhos voltados para dentro, e vemos os tecidos
biológicos com os olhos voltados para fora. (E ainda
por cima usamos o microscópio para ampliar nossa
visão.
Nessas circunstâncias, não é de surpreender que
a mente dê a impressão de não possuir uma
natureza física e que seus fenômenos pareçam
pertencer a outra categoria. Ver a mente como
um fenômeno não físico, separado da biologia
que a cria e a sustenta, é a razão pela qual certos
autores apartam a mente das leis da física. (...)
A mais assombrosa manifestação dessa
singularidade é a tentativa de relacionar a mente
consciente a propriedades da matéria até agora
não descritas - por exemplo, explicar a
consciência com relação aos fenômenos
quânticos. O raciocínio por trás dessa ideia
parece ser o seguinte: a mente consciente
parece misteriosa; uma vez que a física quântica
permanece misteriosa, talvez esses dois
mistérios estejam ligados” (Antonio Damásio)
• “A mente consciente resulta da
articulação fluente de vários,
frequentemente numerosos, locais do
cérebro. As principais estruturas
cerebrais responsáveis por implementar
os passos funcionais necessários
incluem setores específicos do tronco
cerebral superior, um conjunto de
núcleos em uma região conhecida
como tálamo e regiões específicas
porém dispersas do córtex cerebral.
• O produto final da consciência provém
desses numerosos locais do cérebro ao
mesmo tempo, e não de um local
específico, do mesmo modo que a
execução de uma obra sinfônica não
resulta do trabalho de um único músico
e nem mesmo de toda uma seção da
orquestra.
• O mais curioso nos aspectos superiores
da consciência é a notável ausência de
um maestro antes de a execução ter
início, embora surja um regente
conforme a execução acontece. Para
todos os efeitos, o maestro passa então
a reger a orquestra, ainda que a
execução tenha criado o maestro (...), e
não o contrário. O maestro é gerado
pela junção de sentimentos a um
mecanismo de narrativa cerebral,
embora nem por isso o maestro seja
menos real” (Damásio)
Culpabilidade funcionalista
de Claus Roxin
• O conceito de culpabilidade é
substituído pela responsabilidade penal,
que se subdivide em culpabilidade e
necessidade de prevenção, sendo a
primeira o limite da segunda.
• Culpabilidade como garantia da
liberdade.
• “A capacidade de livre autodeterminação é já há muito
epistemologicamente controversa. Do ponto de vista
sociopsicológico pode afirmar-se que a maioria das
pessoas tem a sensação de poder, ao menos em reagir
segundo sua livre vontade. Tal não prova muito; pois da
mesma forma que nossos olhos, para os quais o sol
gira em torno da terra, nos enganam, também nos pode
enganar esta nossa sensação de liberdade. Mas a
consciência de liberdade fundamenta, ainda assim,
uma convenção social, segundo a qual se reconhece
às pessoas que, em princípio, podem orientar-se
segundo normas, a capacidade de decidir contra ou a
favor de seu comportamento.
Culpabilidade funcionalista
de Claus Roxin
• Este reconhecimento recíproco de liberdade de
decisão, que domina não só o ordenamento jurídico,
como também nossa vida social e privada, é como eu
digo, uma regra de jogo social, uma postulação
normativa, mas não um fato comprovável. A idoneidade
para ser destinatário de normas pode, enquanto dado
empírico, ser verificado na psique do agente. O poder-
de-agir-de-outro-modo daí decorrente — enquanto não
se admitir a perspectiva de um indeterminismo estrito,
que considera também a liberdade de decisão do
homem algo realmente comprovável — é um atribuição
normativa, ainda que fundada socio-psicologicamente.
Culpabilidade funcionalista
de Claus Roxin
• Acabo por seguir a opção hoje dominante, segundo a
qual a discussão jurídico-penal pode abstrair do
problema epistemológico e científico do livre-arbítrio. A
base real da verificação da culpabilidade continua
sendo, assim, sempre a idoneidade para ser
destinatário de normas, não a liberdade de ação
humana” (Claus Roxin)
Culpabilidade funcionalista
de Claus Roxin
Princípio da alteridade
• “o homem é responsável por suas ações porque
vive em sociedade, um lugar marcado pela
existência do outro, em que o sujeito é, ao mesmo
tempo, ego e alter, de modo que a sobrevivência
do ego só ‘s possível pelo respeito ao alter e não
por causa do atributo da liberdade da vontade: o
princípio da alteridade - e não a presunção de
liberdade - deve ser o fundamento material da
responsabilidade social e, portanto, de qualquer
juízo de reprovação pessoal pelo comportamento
anti-social” (Juarez Cirino)
Conceito ontoantropocêntrico
• Base da culpabilidade na relação do
cuidado-de-perigo (Fábula de Higino)
• Faria Costa (Coimbra) e Fábio D’ávila
(Brasil).
• “Certo dia, ao atravessar um rio, Cuidado
viu um pedaço de barro. Logo teve uma
ideia inspirada. Tomou um pouco do barro
e começou a dar-lhe forma. Enquanto
contemplava o que havia feito, apareceu
Júpiter. Cuidado pediu-lhe que soprasse
espírito nele. O que Júpiter fez de bom
grado.
Conceito ontoantropocêntrico
• Quando, porém, Cuidado quis dar nome á
criatura que havia moldado, Júpiter o
proibiu. Exigiu que fosse imposto o seu
nome. Enquanto Júpiter e o Cuidado
discutiam, surgiu, de repente, a terra. Quis
também ela conferir o seu nome à criatura,
pois fora feita de barro, material do corpo
da terra. Originou-se então uma discussão
generalizada. De comum acordo pediram a
Saturno que funcionasse como árbitro.
Conceito ontoantropocêntrico
• Este tomou a seguinte decisão que
pareceu justa: Você, Júpiter, deu-lhe o
espírito; receberá, pois, de volta este
espírito por ocasião da morte dessa
criatura. Você, terra, deu-lhe o corpo;
receberá, portanto, também de volta o seu
corpo quando essa criatura morrer.
Conceito ontoantropocêntrico
• Mas como você, Cuidado, foi quem, por
primeiro, moldou a criatura, ficará sob seus
cuidados enquanto ela viver. E uma vez
que entre vocês há acalorada discussão
acerca do nome, decido eu: essa criatura
será chamada Homem, isto é, feita de
húmus, que significa terra fértil”.
Conceito ontoantropocêntrico