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CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA E CIÊNCIA DOS MATERIAIS, 14., 2000, São Pedro - SP. Anais 28001
CARACTERIZAÇÃO MICROESTRUTURAL DA SUPERLIGA À BASE DE FERROINCOLOY MA-956 APÓS CRESCIMENTO DIRECIONAL DE GRÃOS
Terada, M. (1), Hupalo, M. F. (1), Kliauga, A. M. (2), Padilha, A. F. (1)
(1) Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais da EPUSP
(2) Departamento de Engenharia de Materiais (DEMa) da UFSCar
Resumo
A superliga à base de ferro INCOLOY MA-956 é uma liga endurecida por dispersão de óxido
e teve sua primeira utilização comercial no início da década de 80. Sua composição química
nominal é Fe-20%Cr-5%Al-0,4%Ti-0,5%Y2O3. É produzida por mecanosíntese ("mechanical
alloying"), seguida de extrusão a quente e recozimento para crescimento direcional de grãos
("zone annealing"). Apresenta excepcionais resistências mecânica a quente, à oxidação, à
carbonetação e à corrosão a quente. Tem excelente desempenho tanto em aplicações em altas
temperaturas como na temperatura ambiente. No presente trabalho são apresentados
resultados da caracterização microestrutural da liga, após o tratamento térmico final que
antecede o uso, obtidos com auxílio de numerosas técnicas complementares de análise
microestrutural tais como microscopia óptica, microscopia eletrônica de varredura com
microanálise química, microscopia eletrônica de transmissão, extração de precipitados e
difração de raios x. Especial atenção foi dada à caracterização das partículas de óxido após o
processamento termomecânico da liga. Durante o processamento, as partículas de óxido de
ítrio incorporam elementos da liga, principalmente alumínio, mudando, portanto, de
composição química e eventualmente de estrutura cristalina. Um estudo detalhado,
envolvendo a determinação de quantidade, tamanho, distribuição, composição e estrutura
cristalina das partículas, foi realizado. Estes resultados foram interpretados com auxílio do
diagrama de fases Y2O3 – Al2O3. A matriz ferrítica foi caracterizada determinando-se a
relação de aspecto e a orientação cristalográfica (textura) dos grãos alongados na direção do
eixo da barra, resultantes do processo de recozimento para crescimento direcional ("zone
annealing").
CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA E CIÊNCIA DOS MATERIAIS, 14., 2000, São Pedro - SP. Anais 28002
Abstract
INCOLOY MA-956 is an iron-based oxide dispersion strengthened superalloy and had its
first commercial use in the early 80’s. Its nominal chemical composition is Fe-20%Cr-5%Al-
0,4%Ti-0,5%Y2O3. It is produced by mechanical alloying, followed by hot extrusion and
annealing for directional growth of grains (zone annealing). The alloy has excellent resistance
to oxidation, carburization and hot corrosion. The alloy shows also good mechanical
properties at elevated temperatures. It has excellent performance for using in both high and
low temperatures. In this work results of microstructural characterization of the alloy are
presented, after the final heat treatment that precedes its use. It was carried out by numerous
complementary techniques of microstructural analysis such as: optical microscopy; scanning
electron microscopy (SEM) equipped with chemical microanalysis (EDX); transmission
electron microscopy (TEM) equipped with electron diffraction in selected area and chemical
microanalysis, X ray diffraction analysis of extracted precipitates and metal matrix. Special
attention was paid for the characterization of oxide particles after the thermomecanical
processing of the alloy. During the processing, there is a reaction between yttrium oxide
particles and aluminum, changing their chemical composition and eventually their crystalline
structure. A detailed study, involving the determination of amount, size, distribution,
composition and crystalline structure of particles was carried out. These results had been
interpreted with aid of the Y2O3-Al2O3 phase diagram. The ferritic matrix was characterized
by determining the grain aspect ratio and the crystallographic orientation (texture) of the
grains in respect to the bar extrusion axe, as a result of the process of annealing for directional
growth (zone annealing).
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1. Introdução e objetivos
O Brasil já dispõe de uma indústria de equipamentos bastante desenvolvida e
competitiva. Os projetos atuais de equipamentos freqüentemente especificam, geralmente por
exigência das matrizes estrangeiras de seus clientes, materiais resistentes a altas temperaturas
e resistentes à corrosão e à oxidação que não são produzidos no país. Exemplos típicos são os
aços inoxidáveis duplex, os aços inoxidáveis superferríticos e as superligas. A produção
desses materiais no país exige a disponibilidade de equipamentos modernos, o domínio da
complexa tecnologia de processamento e, principalmente, um volume considerável de pedidos
que justifiquem o investimento. Como o número e a geometria (chapas, tubos, barras e outros
perfis) de ligas especificadas nos diferentes projetos são em geral muito diversificados e a
tonelagem necessária pequena, a maioria desses materiais acaba sendo importada. Por outro
lado, esses materiais são freqüentemente usinados, soldados e tratados termicamente no país.
Portanto, o conhecimento e o domínio da metalurgia física dessas ligas especiais acaba sendo
mais urgente para o país do que suas tecnologias de obtenção e processamento.
O presente trabalho insere-se dentro do contexto apresentado acima e tem como
objetivo principal apresentar uma caracterização detalhada da microestrutura da superliga à
base de ferro INCOLOY MA-956. Serão abordados e discutidos alguns aspectos de grande
importância, tais como a influência do tratamento térmico para crescimento direcional de
grãos (“zone annealing”) sobre a microestrutura da liga e a incorporação de elementos de liga
pelas partículas de óxido durante o processamento termomecânico.
2. Revisão da literatura
A superliga à base de ferro INCOLOY MA-956 é um material de grande interesse
tecnológico para aplicações em temperaturas elevadas, devido às suas excelentes resistências
mecânica à quente, à oxidação, à carbonetação e à corrosão à quente. Ela é produzida por
mecanosíntese (“mechanical alloying”) seguida de extrusão à quente, contém altos teores de
cromo e alumínio e é endurecida por uma fina dispersão de óxido de ítrio (Y2O3). Sua
especificação de composição química [1] pode ser vista na Tabela 1.
Tabela 1 – Composição química especificada da liga MA-956 (% em peso) [1].
C Co Cr Ni Al Cu Ti Y2O3
≤ 0,10 ≤ 0,30 18,5–21,5 ≤ 0,50 3,75-5,75 ≤ 0,15 0,20-0,60 0,30-0,60
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A liga MA-956 foi inicialmente desenvolvida e utilizada como material de alto
desempenho para componentes de turbinas a gás (câmaras de combustão) e sistemas
avançados de conversão de energia. A combinação de boas propriedades físicas e mecânicas
possibilitou, no final dos anos 80, a utilização da liga em muitas outras aplicações industriais
em temperaturas elevadas, tais como: componentes de fornos, leitos fluidizados, queimadores
e barreiras térmicas [2]. Nesta época a produção da liga pelo seu principal fabricante (Inco
Alloys International) superava 500 toneladas anuais. Em meados da década de 90 foi proposta
a utilização da liga MA-956 na confecção de implantes cirúrgicos, devido à combinação de
boas propriedades mecânicas do substrato com a biocompatibilidade da alumina [3].
Nas Tabelas 2 e 3 encontram-se, respectivamente listadas, as principais propriedades
físicas e algumas propriedades mecânicas da liga MA-956 [4].
Tabela 2 – Principais propriedades físicas da liga MA-956 [4].
Massa específica a 20oC 7,25 g/cm3
Ponto de fusão 1480oC (2700oF)
Calor específico a 0oC 469 J/kg/oC
Coeficiente de expansão a 20oC 11,3 µm/m.oC
Condutividade térmica 76 W/m.oC
Resistividade elétrica 1,31 µΩ.m
O ponto de fusão da liga MA-956 (Tabela 2) é consideravelmente maior que o das
ligas à base de níquel e seu coeficiente de expansão térmica é menor que o da maioria destas
ligas. Estes fatores contribuem para que a liga mantenha boa estabilidade dimensional em
temperaturas acima de 1100oC, requisito de grande importância para materiais estruturais
operando em temperaturas elevadas [2,5].
A presença da fina dispersão de óxido permite a retenção das propriedades mecânicas
da liga em níveis utilizáveis até elevadas temperaturas homólogas (T/Tf, onde Tf é a
temperatura absoluta de fusão em K), tal como mostrado, na Tabela 3, pelos dados de tensão
de ruptura a tração para 1000 horas. A resistência mecânica da liga não diminui
significativamente entre 870 e 1100oC. Este comportamento é típico dos materiais
endurecidos por dispersão, sendo muito benéfico no que diz respeito à confiabilidade de
componentes que operam sob condições variáveis [2].
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Tabela 3 – Algumas propriedades mecânicas da liga MA-956 [4].
Resistência a tração 650 MPa*
Tensão de escoamento 550 MPa*
Alongamento 9%*
Tensão de ruptura a tração (1000 h)
800oC 98 MPa
900oC 79 MPa
1000oC 67 MPa
1100oC 51 MPa
* Condição “recozido”, valores a 25oC.
A liga MA-956 apresenta também excelente resistência à oxidação, à carbonetação
(“carburization”) e à corrosão à quente (“hot corrosion”). Devido ao alto conteúdo de
alumínio da liga o óxido protetor formado é a alumina (Al2O3), ao contrário da maioria das
superligas onde o óxido é do tipo cromia [6,7]. Ao ser exposta ao ar em temperaturas em
torno de 1100oC, a liga MA-956 desenvolve uma camada de óxido fina e extremamente
aderente, composta basicamente de alumina pura [2]. Antes da utilização em ambientes
corrosivos estas ligas passam por um tratamento de pré-oxidação, para formação da camada
de alumina. A camada de óxido formada é termodinamicamente muito estável, protegendo o
material do ataque de atmosferas agressivas mesmo em temperaturas entre 1350 e 1400oC [8].
A resistência à oxidação da liga é favorecida ainda pela presença da fina dispersão de óxido
de ítrio. Este efeito pode ser explicado pelo aumento do transporte de oxigênio, tanto pela
formação de compostos à base de ítrio nos contornos de grão da camada de óxido, bem como
pela diminuição do tamanho dos grãos da mesma [9,10].
As excelentes resistências mecânica a quente e à oxidação em temperaturas elevadas
da liga MA-956 podem, resumidamente, ser atribuídas aos seguintes fatores:
i) estrutura de grãos grosseiros, favoravelmente orientados e com baixa densidade
transversal de contornos de grão;
ii) dispersão de óxido de ítrio homogeneamente distribuída;
iii) camada protetora de alumina extremamente aderente e estável.
Materiais endurecidos por dispersão de óxido (“ODS – Oxide Dispersion
Strengthened”), produzidos pelo processo de mecanosíntese, são consolidados através de
extrusão e/ou laminação a quente. As ligas consolidadas possuem uma microestrutura
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deformada composta de grãos de tamanho submicrométrico. A dureza nesta condição é
inaceitavelmente alta, assim sendo, essas ligas são normalmente utilizadas na condição
recristalizada [11,12]. Após os tratamentos de recristalização, esses materiais podem adquirir
microestruturas altamente anisotrópicas e com determinada orientação preferencial (textura),
ideal para aplicações em altas temperaturas.
O processo que leva ao desenvolvimento de microestruturas de grãos anisotrópicos,
em materiais deformados ou previamente recristalizados, é conhecido como crescimento
direcional de grãos ou recristalização direcional. A recristalização direcional pode ser
induzida pelo processo de “zone annealing”, o qual envolve a passagem de uma zona
aquecida ao longo do comprimento da amostra [13]. Este processo leva ao aparecimento de
uma estrutura de grãos grosseiros e colunares, com alta relação de aspecto e orientados
paralelamente à direção de extrusão/laminação. Este tipo de estrutura é responsável pela
excelente resistência à fluência, das ligas ODS em temperaturas elevadas [11,14].
A microestrutura inicial da liga consiste basicamente de uma solução sólida
supersaturada, com estrutura CCC e endurecida por uma fina dispersão de óxido de ítrio
(Y2O3). Entretanto, uma caracterização detalhada da microestrutura inicial da liga não foi
encontrada na literatura. Várias referências abordam apenas aspectos gerais da microestrutura
do material na condição como recebido e são citadas a seguir.
No sistema Al2O3-Y2O3 [15], mostrado na Figura 1, três diferentes óxidos complexos
são conhecidos como sendo fases cristalinas estáveis: YAM (ítrio alumínio monoclínico,
Y4Al2O9), YAP (ítrio alumínio perovskite, YAlO3) e YAG (ítrio alumínio garnet, Y3Al5O12).
Figura 1 – Sistema Y2O3-Al2O3 [15].
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Os pós policristalinos destes óxidos são geralmente sintetizados por uma reação no
estado sólido entre a ítria e a alumina em temperaturas acima de 1600oC [16].
Dubiel et al. [17], caracterizaram a microestrutura da liga MA-956, na condição como
recebido, como sendo composta de partículas finas à base de ítrio e alumínio, algumas
partículas maiores de alumina pura e carbonitretos de titânio em uma matriz ferrítica. A
análise do tamanho das partículas de óxido revelaram que o diâmetro dominante das mesmas
encontrava-se na faixa de 3 a 60 nm. O diâmetro médio encontrado para as partículas foi de 9
nm. Elas foram identificadas como ítrio alumínio tetragonal (YAG – Y3Al5O12) ou como ítrio
alumínio monoclínico (YAM – Y4Al2O9). O estudo [17] sobre a estabilidade térmica da
dispersão de óxidos na liga INCOLOY MA-956 mostrou que as partículas não são totalmente
estáveis e sofrem coalescimento durante aquecimento em temperaturas acima de 1150oC.
Miodownik et al. [18], observaram, na microestrutura inicial da liga MA-956, uma
distribuição bimodal de partículas, composta de partículas finas, com tamanho médio da
ordem de 10 nm, uniformemente distribuídas e espaçadas de aproximadamente 100 nm, e
partículas maiores com tamanho médio da ordem de 100 nm. Alamo et al. [19], identificaram
as partículas menores como sendo essencialmente compostas de óxido de ítrio (Y2O3),
enquanto as partículas maiores seriam de YAlO3 (YAP), assim como compostos à base de
alumínio e titânio, tais como TiN, TiC e Al2O3.
3. Material e procedimento experimental
O material utilizado no presente trabalho foi gentilmente cedido pelo Dr. W. K. Reick
do Instituto de Materiais (Institut für Werkstoffe) da Universidade do Ruhr (Ruhr-Universität
Bochum) da Alemanha e encontra-se na forma de barras extrudadas com 30 mm de diâmetro
e comprimento médio de 300 mm. A composição química especificada da liga [1], em % em
peso, foi apresentada na Tabela 1.
A composição química do material utilizado foi determinada por duas técnicas
diferentes: por meio da técnica de fluorescência de raios X (realizada na empresa Açotécnica
Ltda.) e com auxílio de análise de micro-regiões pelo método de dispersão de energia (EDX),
realizada em um microscópio eletrônico de varredura (MEV) Cambridge, modelo Stereoscan
240, instalado no Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais (PMT) da EPUSP.
A caracterização microestrutural da liga foi realizada em várias etapas. Para a
observação inicial da microestrutura do material e obtenção de fotomicrografias foi utilizada a
técnica de microscopia ótica (MO). Amostras foram cortadas nos sentidos transversal e
longitudinal (paralelo à direção de extrusão) em uma cortadeira de alta velocidade (Isomet
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1000 – Buehler) e embutidas a quente em resina fenólica. Após o embutimento as amostras
foram lixadas na seguinte seqüência de granas: 320, 400, 600, 1000, 2400. O polimento foi
feito com pastas de diamante de 6, 3 e 1 µm. A revelação da microestrutura foi feita através
de ataque eletrolítico, usando uma solução de 6% em volume de H2SO4 em água, corrente de
0,5 A e tempo de ataque médio de 5 minutos.
A avaliação qualitativa da estrutura inicial (textura) do material foi feita através da
técnica de difração de raios X. A análise foi realizada na seção transversal da barra, em
amostra lixada, polida e sem ataque. Utilizou-se um equipamento Phillips modelo MPD 1880
/ PW-1720, instalado no Departamento de Engenharia de Minas (PMI) da EPUSP, com passo
angular de 0,05o, tempo de contagem de 5 segundos e radiação de Cu-Kα.
A técnica de microscopia eletrônica de transmissão (MET) foi utilizada para
identificação e caracterização de partículas dispersas na matriz metálica e observação da
densidade de discordâncias presentes no material. O polimento eletrolítico final (afinamento)
das amostras utilizadas foi feito com uma solução (eletrólito) composta de 85% de etanol e
15% de HClO4 (ácido perclórico), com voltagem de 30 V e em uma temperatura de 5oC. As
análises por MET foram realizadas em um microscópio Phillips, modelo CM120, instalado no
Departamento de Engenharia de Materiais (DEMa) da UFSCar.
A técnica de extração de precipitados foi utilizada para identificação dos constituintes
microestruturais da liga. As fases presentes em um material podem ser identificadas por
difração de raios X. Para esta finalidade, esta técnica é mais vantajosa que a difração de
elétrons e que as técnicas de determinação de composição de fase “in-situ”, análise por
comprimentos de onda (microssonda) e análise de energia dispersiva [20]. Esta técnica
envolve a dissolução da matriz, por meio químico ou eletrolítico, com posterior filtragem ou
centrifugação para separação dos precipitados. O pó obtido pode ser então analisado pelo
método do pó em uma câmara de Debye-Scherrer, ou então levado a um difratômetro. O
resíduo extraído pode ser ainda analisado quimicamente.
A dissolução da matriz da liga MA-956 foi feita pelo método químico. Utilizou-se o
reagente de Berzelius. Uma amostra da liga foi inicialmente pesada em balança analítica. Com
base na massa inicial da amostra foram feitos os cálculos estequiométricos para preparo da
solução de Berzelius necessária para completa dissolução da matriz, chegando-se à seguinte
composição mínima: 47,7 g de CuCl2.2H2O, 41,7 g de KCl, 2,9 g de ácido tartárico, 22,4 ml
de HCl e 275 ml de água destilada.
A amostra sofreu uma pré-extração de 20 minutos, realizada a 40oC e sob leve
agitação magnética, para acelerar a cinética do processo. Este procedimento tem por objetivo
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eliminar possíveis defeitos de superfície. Após a pré-extração a amostra foi novamente
pesada. A extração (dissolução da matriz) foi realizada nas mesmas condições da pré-extração
e teve duração de aproximadamente 7 horas. A solução foi então filtrada utilizando-se um
filtro de membrana de PTFE, com tamanho de poro de 0,2 µm, previamente pesado e
umedecido em etanol. O filtrado foi então lavado com uma solução 0,25 molar de HCl e em
seguida com água destilada. Após a lavagem o filtro foi colocado para secar em uma estufa a
100oC durante 6 horas, sendo novamente pesado ao final do processo.
Os resíduos da extração foram analisados em uma câmara de Debye-Scherrer Rigaku
modelo CN1111, com 114,6 mm de diâmetro, e em um difratômetro Rigaku modelo GMAX-
2000, ambos instalados no laboratório de difração de raios X da Seção de Caracterização
Física do IPEN. O resíduo extraído teve, ainda, sua composição química determinada através
da técnica de fluorescência de raios X.
4. Resultados e discussão
4.1 –Análise química
Os resultados da análise química do material pelas técnicas de fluorescência de raios X
e análise de energia dispersiva (EDX) encontram-se listados na Tabela 4.1.
Tabela 4 – Composição química da liga MA-956 (% em peso).
Elemento Fluorescência Energia dispersiva
Fe 72,35 (bal.) 74,71
Cr 21,26 20,62
Al 5,51 3,84
Ti 0,53 0,36
C 0,017 *
Co 0,11 *
Ni 0,08 0,088
Cu 0,11 0,024
S 0,03 *
Y2O3 * *
* Não quantificados.
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Os resultados encontrados por ambas as técnicas de análise química são comparáveis e
mostram que a liga MA-956 utilizada neste trabalho atende à especificação de composição
química (Tabela 2.1) encontrada na literatura [1].
4.2 – Microestruturas observadas
As microestruturas das seções transversal e longitudinal da liga são mostradas nas
Figuras 2, 3 e 4. O material apresentou tamanho médio de grão de aproximadamente 4 mm na
seção transversal, caracterizada pela presença de grãos com aspecto serrilhado, tal como
mostrado nas Figuras 2 e 3. Na seção longitudinal, Figura 4, observa-se a presença de grãos
grosseiros e colunares, com alta relação de aspecto e orientados paralelamente à direção de
extrusão da barra.
Figura 2 – Seção transversal de uma das barras da liga MA-956 (MO).
Figura 3 – Microestrutura na seção transversal da barra (MO).
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Figura 4 – Microestrutura da seção longitudinal da barra (MO).
Este tipo de estrutura, obtido pelo processo de crescimento direcional de grãos, é ideal
para aplicações em temperaturas elevadas, pois pode ser orientada favoravelmente à direção
de solicitação e possui baixa densidade transversal de contornos de grão, o que confere ao
material excelente resistência à fluência. A presença de grãos com formato serrilhado na
seção transversal das amostras pode ser atribuída à interferência das partículas sobre os
contornos de grão em migração.
4.3 – Difração de raios X
A análise por difração de raios X da seção transversal da liga MA-956 resultou no
difratograma mostrado na Figura 5.
Figura 5 – Difratograma da seção transversal da liga MA-956.
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Observa-se a presença de um único e intenso pico referente ao plano (222). Um pico
menor, provavelmente referente ao plano (110), praticamente confunde-se com o background.
Estes dados indicam que os planos (111), paralelos aos planos (222), encontram-se
predominantemente orientados paralelamente à seção transversal da amostra. Como a direção
[111] é perpendicular ao plano (111) e a amostra é uma barra (e não uma chapa), pode-se
supor que o material possui uma acentuada textura de fibra do tipo <111>, orientada
paralelamente ao eixo da barra.
Os dados resultantes da análise por difração de raios X e a observação das
microestruturas presentes nas seções transversal e longitudinal da barra permitem classificar a
liga MA-956 como sendo um material tipicamente oligocristalino.
4.4 – Microscopia eletrônica de transmissão
A análise do material por microscopia eletrônica de transmissão (MET) permitiu
identificar uma dispersão de partículas muito finas no interior da amostra e observar a
densidade de discordâncias presentes no material “como recebido”. Imagens obtidas por essa
técnica são mostradas nas Figuras 6 e 7. Na Figura 6 observa-se a presença de uma
distribuição bimodal de partículas muito finas, dispersas na matriz metálica da liga. O
diâmetro médio das partículas encontra-se em torno de aproximadamente 20 nm.
Figura 6 – Dispersão de partículas na liga
MA-956 (MET).
Figura 7 – Discordâncias presentes no
material “como recebido” (MET).
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A densidade de discordâncias observada no material na condição “como recebido”
(Figura 4.6) é superior à normalmente encontrada em metais recozidos. Uma investigação
complementar seria necessária para definir se tal fato pode ser atribuído, por exemplo, à
preparação da lâmina fina.
4.5 – Extração de precipitados
A amostra utilizada para a extração de precipitados possuía massa inicial de 5,9995 g.
Após a pré-extração a amostra teve sua massa reduzida para 5,1924 g. As massas inicial e
final do filtro de PTFE utilizado foram, respectivamente, 0,0993 g e 0,1464 g. A diferença de
massa de 0,0471 g representa, em relação à massa inicial da amostra, a presença de 0,78%
(em peso) de precipitados.
4.5.1 – Análise do resíduo extraído
A composição química do resíduo extraído foi determinada pela técnica de
fluorescência de raios X e encontra-se listada na Tabela 5. Observa-se que o resíduo extraído
apresentou, como esperado, elevados teores de ítrio, alumínio e titânio, elementos
constituintes de compostos encontrados nos trabalhos que fazem menção à microestrutura do
material na condição “como recebido” [17-19]. Os elevados teores de Cu, Cl e K encontrados
podem ser atribuídos à presença de resíduos da solução de Berzelius utilizada na dissolução
da matriz da liga.
Tabela 5 – Composição química do resíduo extraído.
Elemento % em peso Elemento % em peso
Y 13,6 Cu 1,8
Al 4,4 K 2,0
Ti 10,8 Cl 5,1
Fe 0,4 S 0,1
Cr 0,2 Mg < 0,1
As fases presentes no resíduo extraído foram identificadas por difração de raios X. O
difratograma resultante é mostrado na Figura 8. Observa-se que os picos referentes à fase
AlYO3 (YAP, ítrio alumínio perovskite), de estrutura ortorrômbica, predominam. Foram
encontrados também, picos relativos à fase Y3Al5O12 (YAG, ítrio alumínio garnet). Ambas
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são consideradas fases cristalinas estáveis no sistema Y2O3-Al2O3 (Figura 1) [15,16].
Resultados semelhantes foram obtidos em trabalhos [17-19] que fazem menção à
microestrutura inicial da liga MA-956.
Figura 4.7 – Difratograma do resíduo extraído.
A análise do resíduo extraído em uma câmara de Debye-Scherrer resultou em sete
pares de linhas nitidamente visíveis. Os resultados obtidos por esta técnica confirmaram a
presença da fase AlYO3.
Os resultados da análise do resíduo extraído indicam que as partículas dispersas na
matriz da liga MA-956 são, em sua maioria, compostos formados por alumínio e óxido de
ítrio. Tal fato pode ser atribuído às colisões mecânicas que ocorrem durante o processo de
mecanosíntese. A fase cristalina do composto AlYO3, por exemplo, pode ser obtida através da
mistura do alumínio e da ítria em um moinho de bolas de alta energia, onde suas estruturas
cristalinas são fraturadas e passam por um processo de fusão a frio [16]. Este processo
envolve não só uma mudança de composição química, como também de estrutura cristalina
das partículas.
5. Conclusões
• A composição química dos elementos metálicos presentes no material utilizado neste
trabalho atende à especificação encontrada na literatura. A quantidade de Y2O3,
determinada pela extração de precipitados, também é compatível com a especificação
e uma análise química quantitativa deste óxido encontra-se em andamento.
CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA E CIÊNCIA DOS MATERIAIS, 14., 2000, São Pedro - SP. Anais 28015
• A superliga à base de ferro INCOLOY MA-956 pode ser classificada como sendo um
material tipicamente oligocristalino, possuindo uma microestrutura caracterizada pela
presença de grãos grosseiros e alongados, com alta relação de aspecto e orientados
paralelamente à direção de extrusão. As análises por difração de raios X evidenciaram
a presença de uma forte textura do tipo <111>. Estes grãos são resultantes do
tratamento térmico para crescimento direcional de grãos (“zone annealing”). Um
estudo detalhado de microtextura e mesotextura, por meio da técnica de EBSD, está
sendo realizado.
• As análises por meio de MET revelaram a presença de uma dispersão fina e
homogênea de partículas, predominantemente do tipo AlYO3, com estrutura cristalina
ortorrômbica, a qual é estável no sistema Y2O3 – Al2O3. As análises por difração de
raios X do resíduo extraído confirmaram a presença desta fase.
• Durante o processamento termomecânico, as partículas de óxido de ítrio dissolvem
elementos de liga, principalmente alumínio, e mudam de estrutura cristalina (cúbica de
corpo centrado → ortorrômbica).
Agradecimentos
Os autores agradecem ao Dr. W. K. Reick pela cessão do material utilizado neste
trabalho. M. F. Hupalo agradece à Fapesp pela concessão da bolsa de doutorado (processo no
99/06458-0).
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