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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO Centro de Ciências Matemáticas e da Natureza Instituto de Geociências Departamento de Geografia Territorialidades Conflitantes: Terra Indígena Alto Tarauacá (AC) e Comunidades Ribeirinhas. Luis Lyra da Silva Bulcão Rio de Janeiro Julho / 2008

Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

Centro de Ciências Matemáticas e da Natureza

Instituto de Geociências

Departamento de Geografia

Territorialidades Conflitantes:

Terra Indígena Alto Tarauacá (AC) e

Comunidades Ribeirinhas.

Luis Lyra da Silva Bulcão

Rio de Janeiro

Julho / 2008

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Territorialidades Conflitantes:

Terra Indígena Alto Tarauacá (AC) e

Comunidade Ribeirinhas.

Luis Lyra da Silva Bulcão

MONOGRAFIA SUBMETIDA AO CORPO DOCENTE DO CURSO DE

GRADUAÇÃO EM GEOGRARIA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE

JANEIRO COMO PARTE DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A OBTENÇÃO

DO GRAU DE BACHAREL EM GEOGRAFIA.

Orientadora: Profa. Dra. Ana Maria Lima Daou

Rio de Janeiro

Julho / 2008

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Territorialidades Conflitantes:

Terra Indígena Alto Tarauacá (AC) e

Comunidade Ribeirinhas.

Luis Lyra da Silva Bulcão

DRE: 104077610

APROVADO POR:

________________________________________________

Profa. Dra. Ana Maria Lima Daou (Orientadora)

Departamento de Geografia da UFRJ

_______________________________________________

Profa Dra. Mônica Cox

Departamento de Geografia da UFF

Rio de Janeiro

Julho / 2008

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Dedico este trabalho ao Mar, glorioso Mar....

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos que me ajudaram em minha trajetória e me apoiaram na decisão de fazer um trabalho fora do comum.

Primeiramente a minha família querida que sempre me mostrou o caminho do amor e

da liberdade, junto a todos os ensinamentos.

Agradeço especialmente a minha mulher amada que me fez voltar dos sertões para realizar esta pesquisa e carrega hoje meu filho Joaquim em sua Barriga.

Agradeço a Ana Rieper, quem me incentivou a estudar Geografia e, com seus filmes, me sensibilizou a aprender a riqueza que a cultura popular pode nos ensinar sobre o

espaço, a sociedade, o ambiente.

Agradeço a todos com quem trabalhei na FUNAI/CGII, especialmente ao João do Anjo, com quem muito aprendi.

Agradeço a Fernando de Niemeyer e Paula Meirelles por terem me mostrado o

caminho deste trabalho tão forte e bonito.

Agradeço a Pedro de Niemeyer Cesarino por ter me incentivado a voltar do trabalho empírico para produzir o presente estudo.

Agradeço ao Programa de Mobilidade Acadêmica por ter me possibilitado fazer um intercâmbio acadêmico para a Universidade Federal Fluminense, onde tive muitos

bons professores, que muito me ajudaram para o embasamento teórico deste trabalho.

Agradeço especialmente aos professores Evaristo de Castro Jr., Ana Maria Lima

Daou e Mônica Cox. Professores com quem muito aprendi e criei um sincero laço de amizade.

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RESUMO

TERRITORIALIDADES CONFLITANTES: TERRA INDÍGENA

ALTO TARAUACÁ (AC) E COMUNIDADES RIBEIRINHAS

Luis Lyra da Silva Bulcão Julho/2008

Orientadora: Profa. Dra. Ana Maria Lima Daou O presente estudo trata do conflito territorial entre a demarcação de terras indígenas e o uso dessas áreas pelas comunidades do entorno. O caso a ser estudado é o da Terra Indígena Alto Tarauacá, uma área reservada para uso restrito de grupos indígenas sem contato com a sociedade nacional, classificados pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI), como índios isolados. Esta Terra Indígena se localiza no município de Jordão, AC. Durante o processo de demarcação foram removidas as populações ribeirinhas remanescentes dos extintos seringais, que ali residiam. Esta área faz parte da história social das comunidades, dando margem a um conflito entre a territorialidade da comunidade e a política de preservação da Terra Indígena. Associando os conceitos geográficos de território, fronteira, lugar e territorialidade às legislações específicas para índios isolados e para populações tradicionais, foi possível perceber que existe uma disparidade entre os sistemas de proteção aos territórios tradicionais de cada grupo, embora a legislação os legitime dos mesmos direitos. Neste caso, os principais fatores de desigualdade do direito territorial de cada povo são o conhecimento da lei e/ou a mobilização política do próprio grupo ou de um órgão exterior que o represente. No caso, dos índios isolados, a FUNAI defende seus direitos territoriais, embora os próprios índios isolados desconheçam tanto seus direitos, quanto ao grupo da FUNAI que os defendem. Já os ribeirinhos, também desconhecem as leis que defendem a ocupação de seus territórios, mas não contam com nenhum movimento social engajado politicamente e nenhum órgão público que defenda seus direitos, ou ao menos os esclareça.

PALAVRAS – CHAVE

1- Índios Isolados 2- Populações Tradicionais 3- Terra Indígena Alto Tarauacá 4- Territorialidade 5- Populações de Entorno

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ÍNDICE

1 Introdução..................................................................................................................8

1.1 Objetivo e hipótese.....................................................................................8

1.2 História do estudo e metodologia...............................................................9

1.3 Caracterização da área de estudo................................................................10

1.3.1 Localização e caracterização da área...........................................10

1.3.2 Histórico de ocupação da região..................................................16

2 Revisão Bibliográfica................................................................................................21

2.1 Território e fronteira...................................................................................21

2.2 Lugar e territorialidade...............................................................................25

2.3 Índios Isolados e a Política Indigenista......................................................28

2.4 Populações Tradicionais, Índios Isolados e Comunidades Ribeirinhas.....39

3 Considerações finais..................................................................................................45

4 Anexos.......................................................................................................................48

5.1 Fotos...........................................................................................................48

5.4 Audiovisual – Territorialidades Conflitantes no Alto Tarauacá.................55

5 Bibliografia................................................................................................................56

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Trabalho, Transformação e Representação Social

Nos remanescentes dos mais ermos escombros da floresta amazônica, vivem os índios

isolados. Por uns, considerados belos, puros, a essência da humanidade. Por outros,

feras, selvagens, traiçoeiros, dignos de massacres. Não se sabe quantos ainda

resistem, são desconhecidas suas línguas, costumes, hábitos, cultura.

Constantemente, bárbaros euro-brancos invadem suas moradias, as quentes e úmidas

florestas, para se servirem da diversa variedade dos mais fascinantes recursos que os

reinos minerais, vegetais e animais proporcionam. Estes brutos seres dilaceram,

dividem, fundem, trituram, classificam e sistematizam os recursos da mata, para

construir variada gama de instrumentos, pensando pseudofacilitar seus trabalhos. A

partir da criação de diversos pseudofacilitadores de trabalhos, a humanidade

trabalha dez, mil, milhões de vezes mais para conseguir uma destas maravilhas, para

facilitar ainda mais seu dia-a-dia.

Quando os “índios isolados” se acercam dos povoamentos euro-branco, ficam

maravilhados com objetos resistentes e super-cortantes feitos de metal, armas de

fogo, panos e panelas, bacias de todas as formas e cores. Quando estão próximos,

buscam um momento de descuido dos proprietários para adquirir estes bens que

requerem menos força nos trabalhos e têm maior poder de transformação sobre a

natureza bruta. Nos reinos da floresta, quem exerce a lei é a atenção e os impostos

são cobrados por coceiras, cortes, calor, frio, vidas.......

Na lei da cidade, os mais espertalhões quanto paspalhos, reúnem montes de

quinquilharias para demonstrar sua superioridade de facilidade nos trabalhos,

resultando na compressão do espaço/tempo e no afastamento do significado da

simbiose com a natureza. A humanidade fica cada mais vez mais densa, aumentado os

conflitos entre os indivíduos, seres sociais-individuais. Com isso, perdem-se todas as

imaginações, sensações e emoções da vida, trabalhando-se cada vez mais para se

manter o status-quo.

Jordão, 2 de Novembro de 2006. Luis Bulcão.

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1 Introdução

O presente estudo consiste em uma reflexão sobre conflitos entre territorialidades de

diferentes grupos sociais na região do Alto Rio Tarauacá, Estado do Acre. O conflito

problematizado nesta análise se deve à demarcação e às formas de proteção da Terra

Indígena (TI) Alto Tarauacá, restrita para uso exclusivo destes povos indígenas

isolados.

1.1 Objetivo e hipótese

Esta é uma reflexão ulterior à experiência do trabalho que exerci na FUNAI. O estudo

tem como objetivo analisar criticamente o conflito entre territorialidades na região do

Alto Rio Tarauacá. Entende-se por territorialidades as estratégias de conquista e

manutenção dos territórios por determinado grupo (Sack, 1986). Os principais atores

sociais da região são os ribeirinhos ex-seringueiros das comunidades do entorno da TI

Alto Tarauacá, os habitantes da pequena cidade de Jordão, os índios com contato

permanente e intermitente (principalmente os Kaxinauá, Ashaninka, Jaminawa e

Kulina), os grupos indígenas isolados e o Governo da República Federativa do Brasil,

por intermédio da FUNAI. Neste estudo será abordado o conflito entre as

territorialidades dos índios isolados, dos ribeirinhos ex-seringueiros e da FUNAI. A

FUNAI faz uma intervenção de proibição do acesso à zona de uso e ocupação dos

índios isolados para garantir a autonomia destes povos. Porém, gera um conflito com

os ribeirinhos, para quem o acesso a esta área é central para sua reprodução social.

A hipótese que pretendo embasar teoricamente é que cada grupo social tem diferentes

maneiras de conquistar, defender e representar seus territórios, sob múltiplas escalas

de poder e identidade. Portanto, mesmo não havendo efetivamente um conflito pela

propriedade territorial no Alto Rio Tarauacá, existe um conflito entre as estratégias de

formas de uso, manutenção e representação destes espaços, efetuando-se um conflito

entre territorialidades.

Estes conflitos são oriundos das reações dos atores sociais locais às políticas públicas

nacionais, ao longo da história. A ocupação seringalista na região foi incentivada pelo

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Estado. Hoje, o Estado estimula a remoção dos ex-seringueiros para defender os

direitos dos índios isolados.

Os principais conceitos trabalhados serão: território, fronteira, lugar e territorialidade.

São também importantes as noções de espaço vivido e espaço vital e a visão

antropológica dos conceitos de etnia, cultura e tradição.

1.2 História do estudo e metodologia

Sempre tive admiração pela cultura indígena, de modo geral, a partir do contato com

imagens, livros e exposições. Na época em que eu entrei na Faculdade, no curso de

Geografia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), no ano de 2004, alguns

amigos participaram de uma seleção para trabalhar na Coordenação Geral de Índios

Isolados (CGII) da FUNAI. Quando conheci a proposta do projeto de proteção para

índios isolados, fiquei muito interessado. Identifiquei-me com a idéia de manter o

direito de isolamento dos últimos povos indígenas nesta condição. No início misturei

o deslumbramento com a causa em si, mas pude amadurecer antes de ter possibilidade

de entrar para o projeto.

Cerca de dois anos depois, em Julho de 2006, houve outra seleção, já que cinco dos

seis selecionados não se mantiveram em seus postos. Candidatei-me, fui selecionado

na primeira etapa e passei pelo 2o Curso de Capacitação para Auxiliares de

Coordenadores de Frente de Proteção Etno-Ambiental realizado parte em Brasília e

parte na Frente de Proteção Etno-Ambiental (FPEA) do Rio Guaporé, em Rondônia.

Fui selecionado para trabalhar no Estado do Acre, na FPEA do Rio Envira, Posto de

Vigilância e Proteção (PVIP) da Foz do Rio D’Ouro. Permaneci no Acre até

dezembro do mesmo ano, quando participei da Oficina de Planejamento de Ações de

Proteção para Índios Isolados em Brasília. Optei por me afastar da FPEA do Rio

Envira e fui transferido para a FPEA Massaco, quando resolvi abrir mão do meu

cargo. Voltei para o curso de Geografia da UFRJ em meados de Janeiro de 2007 e,

desde então, passei a refletir sobre a experiência deste trabalho sob forma de pesquisa

acadêmica. No segundo semestre do mesmo ano estudei na Universidade Federal

Fluminense, sob programa de mobilidade acadêmica. Este intercâmbio entre

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ambientes acadêmicos enriqueceu minha capacidade de análise da problemática em

questão.

A leitura de diversas concepções geográficas, sociológicas e antropológicas sobre

espaço, poder, representações e relações sociais me deu suporte para entender de

maneira mais clara e abrangente os conflitos existentes na região.

Iniciei o embasamento teórico desta pesquisa a partir de leituras sobre território e

fronteira, quando pude dialogar entre as concepções de diversos autores sobre estes

conceitos e escalas de análise. A comparação do conceito de fronteira para a

geografia, a partir de Bertha Becker (1990; 2001) e para a antropologia, a partir de

João Pacheco Oliveira (2007), foi para mim muito interessante.

A leitura sobre os conceitos de lugar e territorialidade foi também muito

enriquecedora. Considero a relação entre estes dois conceitos o ponto chave deste

trabalho. Esta relação se expressa sobre as formas de poder exercidas pela prática do

espaço vivido, por um grupo social. Achei muito relevantes trabalhos como o de

Rogério Hasbaert (2006), Marcelo José Lopes de Souza (2005) e, principalmente,

Robert David Sack (1986).

As leituras sobre os conceitos geográficos foram muito importantes para o

embasamento teórico dos argumentos desta pesquisa. Porém, considero a parte mais

densa deste estudo a discussão entre as categorias de populações tradicionais e as

políticas para manutenção de seus direitos.

1.3 Caracterização da área de estudo

1.3.1 Localização e caracterização da área

A região do presente estudo é situada no estado do Acre, bacia do Rio Juruá,

abrangendo os municípios de Jordão, Tarauacá e Feijó (Mapa 1). Nesta região,

existem três Terras Indígenas, em área contínua, onde é confirmada a presença de

grupos indígenas isolados: a TI Alto Tarauacá, a TI Kampa e Isolados do Rio Envira e

a TI Riozinho do Alto Envira (Mapa 1). Estas três terras indígenas somam a aérea de

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636.384 hectares e todas fazem fronteira com o Peru. Segundo José Carlos dos Reis

Meirelles Jr. (2007a), coordenador da Frente de Proteção Etno-Ambiental do Rio

Envira, nesta região vivem três povos indígenas isolados distintos. Um povo nômade,

denominado Masku-Piro e dois povos de etnia desconhecida provavelmente

pertencentes ao grupo lingüístico Pano.

O acesso às Terras Indígenas Kampa e Isolados do Rio Envira e Riozinho do Alto

Envira é feito pelo Rio Envira. A cidade mais próxima, Feijó, tem cerca de 250000

habitantes e dista aproximadamente 200 km em linha reta do limite da TI Riozinho do

Alto Envira. A área da TI Kampa e Isolados do Envira começa a cerca de 20 km, em

linha reta, a montante do início da TI Riozinho do Alto Envira.

A Frente de Contato do Rio Envira foi primeiro posto criado pela atual Frente de

Proteção Etno-Ambiental (FPEA) do Rio Envira “para tentar por fim aos conflitos

nos rios Tarauacá e Envira, envolvendo povos isolados, Kaxinauá, Kulina e

Ashaninka” (Meirelles 2007a) e fazê-los entender que, assim como eles, os índios

isolados também tinham direito a suas terras e, principalmente, o direito de

continuarem isolados (Idem). Os Ashaninka têm contato com a sociedade nacional

desde a época da exploração seringalista e eram usados como matadores de índios

isolados. Os Kulina e os Kaxinauá também tinham embates com os povos isolados.

Este posto se localiza a 50 km, em linha reta, a montante do limite entre as Terras

Indígenas Kampa e Isolados Envira e Riozinho do Alto Envira.

O acesso à TI Alto Tarauacá é feito pelo Rio Tarauacá. A cidade mais próxima é

Jordão, uma pequena cidade com cerca de 5000 habitantes, distante aproximadamente

28 km em linha reta do Posto de Vigilância e Proteção (PVIP) da Foz do Rio Douro.

A cidade de Tarauacá, com cerca de 25000 habitantes, dista aproximadamente 190Km

em linha reta, do limite coma TI Alto Tarauacá. O PVIP Douro se situa no encontro

do Rio do Ouro com o Rio Tarauacá. Este PVIP foi criado em 2005 para “evitar as

caçadas comerciais ali realizadas por moradores da sede do município de Jordão e

de seringais vizinhos e o risco de novos confrontos armados e mortes entre os índios

isolados e esses caçadores” (Machado, 2007).

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As cidades de Feijó e Tarauacá distam cerca de 50Km entre si e são ligadas por

estrada asfaltada. Esta estrada tem ligação por estrada de terra com a cidade de

Cruzeiro do Sul e com a capital, Rio Branco, somente durante a época de estiagem das

chuvas, quando é considerado o verão, entre maio e outubro. O acesso a estas cidades

pode ser feito por estradas somente durante a época de estiagem das chuvas, quando é

considerado o verão, entre maio e outubro. Durante o inverno, a ligação é possível por

via fluvial (Rio Envira e Rio Tarauacá) ou por avião. Em ambas as cidades, existe

pista de pouso para aviões de pequeno porte.

A cidade de Jordão é a mais isolada do estado do Acre. Só tem acesso por uma pista

de pouso para aviões de pequeno porte ou pelo Rio Tarauacá, que neste trecho fica

com o nível d’água muito baixo durante o verão, tornando quase impossível a

navegação. Outro agravante da acessibilidade destas regiões é que as distâncias

medidas em linha reta são duplicadas, ou até triplicadas, quando percorridas por

dentro dos rios, por estes serem extremamente meandrosos.

As terras indígenas onde ainda existem índios isolados são áreas de floresta equatorial

úmida em alto grau de preservação. Como podemos perceber pelo relato de José

Carlos Meirelles, coordenador da FPEA do Rio Envira, é uma região farta em caça e

pesca.

“No auge do verão por estas bandas, quando os tracajás e

tartarugas depositam seus ovos nas praias, as curimatãs,

matrinchãs, pacus, surubins e outros menos cotados, ficam à

vista pela translucidez das águas do rio e dos igarapés e os

queixadas vêm para os baixos chafurdar no restinho de

igapós sem água, mas com a terra úmida, boa de fuçar, e

veados, antas e porcos, depois das 10 da manhã, se refugiam

dentro dos igarapés para fugir dos enxames de mutucas, a

beira dos igarapés e rios se transformam em uma enorme

concentração de alimentos”. (Meirelles, 2007b).

O relevo da região tem uma feição bastante rugosa, pela proximidade com a

cordilheira andina. Para se atravessar de uma bacia de drenagem para outra é

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necessário cruzar morros, com encostas muito inclinadas, de até 200 a 300 metros de

altitude. As áreas baixas, na época de chuva, ficam alagadas formando igapós. Os

igarapés, com menos de um metro de profundidade, sobem de três a quatro metros em

poucas horas quando ocorrem os chamados “repiquetes”, que são as chuvas muito

fortes nas cabeceiras dos rios, viabilizando a navegação, porém com alto risco devido

à formação de “remansos”. Os “remansos” são rodamoinhos gigantes que se formam

nos meandros, capazes de afundar uma embarcação sob qualquer descuido dos pilotos

fluviais.

É comum se ver enormes “balseiros” descendo os rios durante os “repiquetes”.

“Balseiros” são ilhas flutuantes formadas por galhos e troncos levados pelas

correntezas. Alguns “balseiros” encalham em locais mais rasos do rio, alguns

submergem inteiros nos “remansos”, outros são depositados no fundo do rio na época

de estiagem e alguns continuam a descer os rios até os rios maiores e cada vez

maiores. É comum também se ver enormes árvores de até 20 metros descendo a

correnteza do rio, ainda com as raízes e com suas copas completas, ainda verdes.

Estas árvores são derrubadas dos barrancos das margens dos rios pela erosão causada

pela correnteza durante os “repiquetes”.

Durante a época de seca, a navegabilidade dos rios é extremamente precária (Bulcão,

2006a), o que torna necessário, inúmeras vezes em uma viagem, empurrar o barco

sobre os bancos de areia e cortar árvores caídas que impedem a passagem pelo canal.

Estas barreiras de madeira, formadas durante as cheias, compostas por trancos e

galhos de todos os tamanhos, são chamadas de “pausadas” ou “balseiros”.

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Mapa 1

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1.3.2 Histórico de ocupação da região

O território acreano, no final do século XIX, foi ocupado pela frente de exploração

dos caucheros peruanos dirigindo-se ao norte rios abaixo e pela frente de exploração

dos seringueiros brasileiros dirigindo-se ao sul rios acima (Almeida, 2004, p.36).

Segundo Meirelles:

“Nas cabeceiras dos rios Acre, Iaco, Chandless, Purús, Envira

e Juruá, nas terras firmes, que nunca alagam devido à

proximidade da Cordilheira dos Andes, antes da chegada do

homem branco, habitavam inúmeros povos indígenas, sendo a

maioria de etnia pano e aruak”.(Meirelles, 2007a)

A frente de ocupação comandada pelos caucheros usava mão-de-obra escrava

indígena (Almeida, 2004, p.36) e alguns grupos indígenas contatados, como os

Ashaninka, eram usados para matar todos os grupos indígenas isolados que iam sendo

encontrados pela frente (Meirelles, 2007a). A exploração do caucho foi passageira, já

que as árvores tinham que ser derrubadas para sua extração. Já a frente de ocupação

comandada pela extração de seringa, ao contrário da frente cauchera, se fixou e criou

territórios com as estruturas de seringais, barracões, colocações e estradas de seringa

(Almeida, 2004, p.37).

“...nos seringais do Acre, a mão-de-obra era constituída de

imigrantes nordestinos; a população indígena local foi vítima

das atrozes “correrias”, em que os índios eram aniquilados

não em função da submissão à disciplina do trabalho

forçado, mas para dar lugar aos imigrantes brasileiros. Os

territórios de floresta tinham valor elevado, porque geravam

renda e lucros especulativos, mas também a própria mão-de-

obra, trazida com alto custo, não poderia ser pura e

simplesmente trucidada como o foram os indígenas”. (Idem)

Ainda segundo Almeida (2004, p. 38), o Acre foi um dos grandes produtores de

seringa do mundo no final do século XIX e início do século XX, produzindo a

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borracha tipo acre fina, até então a de melhor qualidade do mercado mundial. A

famosa biopirataria da seringueira amazônica, realizada pelos ingleses, propiciou a

produção de seringueiras na Ásia, onde foi criado um sistema de produção em massa.

Este acontecimento resultou na redução do preço do látex, pela maior oferta no

mercado mundial. A partir de 1920 o preço da borracha caiu bruscamente. Este fator

levou os patrões seringalistas à falência, mas os seringueiros, que tinham apenas

dívidas com seus patrões, ganharam liberdade para caçar, pescar, cultivar seus

roçados e viver de sua cultura de subsistência, se transformando em “camponeses da

floresta” (idem). Estes “camponeses da floresta” foram ampliando seus

conhecimentos práticos e místicos sobre aquele habitat, criando e recriando novos

sistemas de reprodução social e de relação com a própria natureza.

Durante a Segunda Guerra Mundial, houve uma alta no preço da borracha pelo

incentivo da “batalha da borracha”, mas a partir de meados da década de 1960, a

produção de borracha foi drasticamente reduzida no Alto Rio Tarauacá, até a extinção

dos seringais. Estes seringais se transformaram em “comunidades ribeirinhas”, já os

seringueiros permaneceram nas áreas dos seringais, vivendo de caça, pesca, coleta e

roçados de subsistência. Já os patrões, se mudaram para exercer outras atividades que

lhes rendesse lucro, praticamente abandonando as terras, que já não valiam mais

quase nada devido a enorme distância de qualquer centro urbano. Uma das atividades

que os patrões ex-seringalistas passaram a exercer foi a de ocupar importantes cargos

políticos na região.

Mesmo após a frente de ocupação seringalista ter sido instaurada e, posteriormente,

desestruturada, ainda existem grupos indígenas que não travaram contato com a

sociedade nacional. José Carlos Meirelles dá a seguinte explicação para a existência

de povos indígenas isolados nesta região:

“Nas cabeceiras dos rios a seringueira vai ficando escassa ou

desaparece. Os seringais subiram os rios até onde existia

seringa, deixando entre eles e as cabeceiras dos rios, uma

região sem a presença do branco, refúgio dos povos isolados”

(2007a).

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Na região estudada existem três terras indígenas com a presença de índios isolados: a

TI Riozinho do Alto Envira, a TI Kampa e Isolados do Envira e a TI Alto Tarauacá.

Este estudo trata especificamente da TI Alto Tarauacá.

A TI Alto Tarauacá, que tem a área de 142.619 hectares, foi identificada pela FUNAI

em 1996, como zona de uso e ocupação de índios isolados. Foi fisicamente demarcada

em 2002, quando 52 famílias de agricultores que viviam no Alto Rio Tarauacá e no

Rio D’ouro foram re-alocadas e indenizadas por suas benfeitorias (casas, roçados,

pomares, etc.) (Aquino, 2007). As famílias que ali residiam faziam parte da ocupação

remanescente dos extintos seringais. Algumas destas famílias foram morar na pequena

cidade de Jordão ou nas periferias de cidades maiores, como Tarauacá, Feijó e até

mesmo Rio Branco. Outras famílias se mudaram para a antiga sede do Seringal

D’ouro, no limite da TI (cartograma 1). Estes atuais vizinhos da TI Alto Tarauacá

vivem em constante conflito com as restrições de uso das terras onde nasceram,

cresceram e conhecem cada volta do rio (Bulcão, 2006c). Em 2004, a TI Alto

Tarauacá foi homologada por decreto do Presidente da República, Luís Inácio Lula da

Silva. (Machado, 2007a).

Em abril de 2005, foi construído o Posto de Vigilância e Proteção da Foz do Rio

D’ouro, no limite da TI Alto Tarauacá. O propósito desta instalação foi de evitar as

caçadas comerciais ali realizadas por moradores da sede do município de Jordão e de

seringais vizinhos, o que possibilitava o risco de novos confrontos armados e mortes

entre os "isolados" e esses caçadores (Op. Cit.).

Segundo Meirelles (2007a), os seringais se instalaram em territórios indígenas. Desde

o final do século XIX existe o conflito entre os trabalhadores brancos dos seringais,

que hoje formam as populações ribeirinhas, e os índios isolados. As chamadas

“correrias” se consistiam em matanças organizadas e sistemáticas às aldeias

indígenas, financiadas pelas empresas seringalistas (Meirelles 2007a). Algumas etnias

indígenas, como os Ashaninka principalmente, se aliaram aos seringueiros nas

“correrias” em troca de armas de fogo e outros utensílios manufaturados. Os índios

isolados, por sua vez, defendiam seus territórios, matando seringueiros, mulheres,

crianças e saqueavam suas casas para obter facas, machados, baldes, cordas e outros

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tipos de materiais que lhes interessavam. Até pouco antes de ser demarcada a TI Alto

Tarauacá, ocorreram confrontos diretos entre ribeirinhos e índios isolados.

Hoje já não existem mais as “correrias” na região, porém, ainda existem conflitos

diretos e indiretos entre ribeirinhos e índios isolados na TI Alto Tarauacá. Mesmo

demarcada, protegida e fiscalizada pela FUNAI, as terras dos índios isolados

continuam sendo utilizadas pelos ribeirinhos para a prática de caça, pesca e coleta. Os

índios isolados, por outro lado, ainda fazem saques aos bens dos ribeirinhos. A

invasão da TI pelos ribeirinhos é motivo de conflitos com a Fundação Nacional do

Índio (FUNAI), que é responsável por vigiar, fiscalizar e proteger as Terras Indígenas

reservadas e homologadas para uso exclusivo dos índios isolados.

Ainda hoje, os ribeirinhos do Seringal D’ouro não têm posse das terras em que

moram. As terras limítrofes com a TI Alto Tarauacá, onde vivem, pertencem, de um

lado do rio, à família de Didi Farias, antigo patrão do Seringal D’ouro e do outro lado,

ao Melo, antigo patrão do Seringal Iracema, hoje Prefeito do Município de Jordão

pelo Partido dos Trabalhadores (PT). Os filhos de Didi Farias, Alto Farias e Élson

Farias, são políticos na cidade de Jordão, ligados ao Partido Comunista do Brasil

(PCdoB). Existem documentos alegando que Élson Farias já foi envolvido em um

assassinato de um índio isolado nas proximidades do Seringal Douro.

A família Farias tem uma relação de confiança com a comunidade habitante do

seringal D’ouro. Os ribeirinhos vivem e cultivam seus roçados nestas terras e prestam

serviços para os irmãos Farias quando estes vão ao seringal D’ouro, para aumentar as

áreas de pastagem de gado, ou até mesmo para fazer comícios políticos em época de

eleição. Nas terras de Melo há apenas duas famílias, que vivem também por

concessão do proprietário, sem direito à posse da terra.

Recentemente, outra frente de ocupação se aproxima pela fronteira com o Peru, pondo

em risco os povos indígenas isolados. Existem muitos povos indígenas isolados

vivendo na faixa de fronteira Brasil-Peru, porém, para o índio isolado, não existe

diferença entre um país e outro. As explorações de madeireiras crescem cada vez mais

no território peruano e já foram coletadas diversas pranchas serradas de mogno

descendo o Rio Envira, paralelo ao Rio Tarauacá. O Rio Envira nasce no Peru,

Page 20: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

20

portanto, quando há “repiquetes” as pranchas serradas em território peruano, deixadas

nas margens do rio, são carregadas pela cheia e podem ser vistas descendo o rio, ao

passar pelo PVIP Envira, outro posto da FPERE Envira.1 Esta pressão feita pelos

madeireiros do lado peruano podem gerar uma migração dos povos isolados do lado

peruano para o Brasil, já que no Peru a exploração madeireira está desenfreada e no

Brasil existe um sistema de proteção para áreas de Índios Isolados.

Cartograma 1

Posto de Vigilância e Proteção da Foz do Rio Douro e a comunidade ribeirinha do Seringal Douro

1 Estas pranchas de mogno, chamado localmente de “aguano”, têm altíssimo valor no mercado internacional. O preço de eu metro cúbico de mogno, no mercado internacional, pode chegar a cinco mil Dólares (U$5.000).

Page 21: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

21

2 Revisão Bibliográfica

Esta pesquisa foi iniciada por uma vivência local e por observação empírica. A

vivência e o empirismo nos ensinam muito, porém, criam posições e concepções

viciadas pela relação muito próxima com interesses particulares. Considero muito

importante o conhecimento profundo da realidade do objeto de estudo, adquirido pela

vivência. Porém, o distanciamento é fundamental. Observando o objeto de fora, é

possível sair dos ciclos viciosos do vivido. A partir da conjunção do vivido com a

análise posterior, é possível refletir para criar novas concepções. Para fazer esta

recriação das concepções, foi muito importante uma revisão bibliográfica aprofundada

e bem embasada.

2.1 Território e fronteira

Partindo do pressuposto de que “O território (...) é fundamentalmente um espaço

definido e delimitado por e a partir de relações de poder” (Souza 2005, p.78), é

possível tecer um diálogo entre diferentes concepções e “viagens” em torno do

território e das territorialidades, como propõe Bonnemaison (2002). Para analisar o

conflito entre territorialidades no Alto Rio Tarauacá, é necessária a compreensão da

multiplicidade de escalas e concepções do que pode ser entendido como um território

(Hasbaert 2006, p. 121).

O conceito de território foi inicialmente formulado nos estudos de ciências da

natureza como a Botânica e a Zoologia (Moraes, 1989). Para a Geografia, o conceito

de território aparece como idéia central da Geografia Política, marcada pela obra

Politische Geographie, de Friedrich Ratzel, publicada em 1897 (Souza, 2005, p.85).

Ratzel concebe o território “essencialmente fixado no referencial político do Estado”

(op. cit.). Esta abordagem continua sendo extremamente importante para as análises

contemporâneas, porém, outras abordagens mais amplas foram construídas desde a

época de Ratzel.

Segundo a socióloga Edna Castro, “O território é o espaço ao qual um certo grupo

garante aos seus membros direitos estáveis de acesso, de uso e de controle dos

recursos e sua disponibilidade no tempo” (1997 p.166). Esta concepção está ligada à

Page 22: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

22

noção de apropriação do espaço, antagônica à noção de dominação do território

nacional, como propõe Ratzel. Milton Santos, a partir de uma concepção da geografia

crítica, tem uma postura similar à de Edna Castro.

“O território não é apenas o conjunto dos sistemas naturais e de

sistemas de coisas superpostas. O território tem que ser entendido

como o território usado, não o território em si. O território usado é

o chão mais a identidade. A identidade é o sentimento de pertencer

àquilo que nos pertence. O território é o fundamento do trabalho, o

lugar da residência, das trocas materiais e espirituais e do exercício

da vida” (Santos 2007, p.14).2

Acredito que não há apenas uma concepção de território apropriada para esta análise,

já que marcos de referência e controle do espaço são perpassados por múltiplas

escalas de poder e identidade, o que “resulta em uma geografia complexa, uma

realidade multiterritorial (ou mesmo transterritorial)” (Haesbaert, 2006, p.121).

Concordando com Saquet (2006, p.65), considero muito importante o estudo de

Robert Sack (1986), pois “compreende o território, principalmente, sob o aspecto

político, como uma área com fronteiras e com influência de uma ou mais pessoas

sobre outras” (Saquet, 2006, p.65), o que generaliza bastante o conceito de território,

entendendo sua configuração a partir de territorialidades.

Estas territorialidades podem ser caracterizadas por relações de poder a partir da

apropriação ou da dominação do espaço. Lefebvre (apud Hasbaert 2006, p. 120-1),

faz uma clara distinção entre apropriação e dominação do espaço. Rogério Hasbaert

resume sua concepção da seguinte maneira:

“Temos, assim, no conceito de apropriação definido por Lefebvre,

um processo efetivo de territorialização, que reúne uma dimensão

concreta, de caráter predominantemente ‘funcional’, e uma

dimensão simbólica e afetiva. A dominação tende a originar

territórios puramente utilitários e funcionais, sem que um verdadeiro

2 Aula Inaugural do Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal Fluminense, registrada no Livro território territórios. de 2002.

Page 23: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

23

sentido socialmente compartilhado e/ou uma relação de identidade

com o espaço possa ter lugar”. (Hasbaert 2006, p. 120-1).

O território, portanto, pode ser considerado a resultante de uma relação desigual de

forças, que envolve o domínio ou controle político-econômico do espaço e sua

apropriação simbólica (Idem). O domínio e a apropriação do território se configuram

ora conjugados e mutuamente reforçados, ora desconectados e contraditoriamente

articulados. É possível perceber esta característica comparando as relações territoriais

de cada grupo na TI Alto Tarauacá (tabela 1). A FUNAI exerce uma relação de

dominação, a partir de um sistema de proteção à este território. Os índios isolados

estabelecem uma relação de apropriação, a partir do uso, associada a uma relação de

dominação, a partir de furtos e ataques às populações vizinhas. Já os ribeirinhos,

estabelecem uma relação de apropriação, a partir da caça, coleta e pesca, mas não

lutam diretamente pelo domínio deste território.

Dominação Apropriação

Índios Isolados X X

Ribeirinhos X

FUNAI X

Tabela 1- relações de poder de cada grupo social em relação ao território da Terra Indígena Alto Tarauacá

A fronteira está diretamente ligada ao território. Para o senso comum, a fronteira é

apenas um limite demarcado e estabelecido entre diferentes Territórios Nacionais.

Porém o conceito de fronteira não está aprisionado a apenas este limite jurídico ou a

uma linha imaginária. A fronteira pode ser entendida como frente pioneira, “uma

linha móvel de contato entre diferentes tipos de assentamentos e uso do espaço”

(Reboratti, 1990, p. 6 apud Silva, 2007, p. 287). Segundo Silva, “ (...) a fronteira é

conflito, instabilidade, conquista e resistência” (2007, p. 287).

Há diversos trabalhos sobre a “Fronteira Amazônica”. Em 1990, a geógrafa Bertha K.

Becker, juntamente com Lia Osório Machado e Maria Helena P. de Miranda, publicou

um livro intitulado “Fronteira Amazônica: questões sobre a gestão do território”,

tratando a fronteira amazônica como o avanço nacional capitalista sobre a região

Page 24: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

24

amazônica. Em 2001, a publicação “Amazônia”, de Bertha Becker, ainda fala da

fronteira amazônica com o mesmo enfoque. João Pacheco de Oliveira (2007), em sua

apresentação “A fronteira e seus cenários: narrativas e imagens sobre a Amazônia3”,

embora tratando do mesmo assunto, tem uma abordagem diferente de Bertha Becker.

Para João Pacheco de Oliveira (op cit) a fronteira amazônica é caracterizada por ser

“o lugar onde o capitalismo chegou mais fraco”. Bertha Becker (op cit), caracteriza a

fronteira amazônica como um espaço onde o capitalismo e a urbanização estão

chegando. Estas duas visões são antagônicas apesar de tratarem de uma mesma

questão: o avanço do “desenvolvimento” capitalista sobre as formas tradicionais de

ocupação da Amazônia. Uma diferença é que Oliveira (op cit) retrata este avanço a

partir dos exemplos das formas tradicionais de ocupação e reprodução social ainda

existentes na Amazônia, principalmente das populações indígenas. Becker (op cit)

retrata este avanço a partir dos núcleos urbanos já consolidados ou em fase de

consolidação. A grande diferença entre as duas abordagens é que para Bertha Becker

(op cit), existe apenas uma fronteira amazônica, a fronteira do avanço urbano-

capitalista. Para Oliveira (op cit), na Amazônia atual existem três tipos de fronteiras, a

“fronteira dos índios”, a “fronteira do branco local” e a “fronteira do branco

externo”. Para Oliveira (op cit) a fronteira é “o lugar sobretudo das diferenças”.

O estudo de Bertha Becker é muito importante para a governabilidade da Amazônia,

porém, o seu método não se adapta a esta análise, principalmente pelo fator da escala

de análise. Seus estudos abordam principalmente a escala regional e o presente estudo

se concentra em escala local. Becker (1990), na apresentação de sua publicação “A

Fronteira Amazônica”, diz que sua pesquisa empírica “(...) permite identificar

localmente o processo de rápida transformação regional, os diferentes contextos

sociais em formação e, assim, rever criticamente a teoria”. Esta metodologia de

identificação de processos de transformação em uma vasta região traz uma riqueza de

dados e informações para o planejamento regional da Amazônia. Porém, como minha

pesquisa empírica foi muito extensa e concentrada em uma área restrita, pretendo

analisar um processo de transformação específico. 3 Este trabalho foi apresentado em 30 de março de 2007, mesa redonda “Territórios, governos, populações”, no auditório do Horto – Quinta da Boa Vista, durante o Seminário Roberto Cardoso de Oliveira. Transformações Sociais e Culturais no Brasil Contemporâneo: perspectivas antropológicas, organizado pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Page 25: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

25

A definição de fronteira mais apropriada para este estudo (embora cheia de “toques

antropológicos”) é a do geógrafo Carlos Aberto Silva. Para o autor, “A dimensão do

simbólico se afirma na fronteira, ao mesmo tempo que a fronteira se projeta de forma

simbólica” (Silva, 2007, p. 286). Silva diz, ainda, que “Na fronteira todos que chegam

parecem ecoar a frase célebre de Rousseau: ‘isto é meu’” (Op. Cit., p. 288). A

fronteira, não sendo apenas um limite jurídico, implica no encontro entre

territorialidades e tempos distintos e conflitantes (Idem). Podemos então perceber que

no encontro de fronteiras distintas existe um conflito entre territorialidades, como no

Alto Rio Tarauacá.

No caso do Alto Rio Tarauacá, é possível identificar diferentes “fronteiras

amazônicas” como propõe Oliveira (op cit). Porém estas fronteiras se confundem,

pelas formas das territorialidades exercidas pelos diferentes grupos sociais. A

“fronteira dos índios” é dividida entre a dos índios assimilados, com contato

permanente, e a dos índios isolados, autóctones. A “fronteira do branco local” é

representada pelos ribeirinhos ex-seringueiros, mas, às vezes, as territorialidades dos

índios assimilados se aproximam mais da dos brancos locais do que da dos índios

isolados. A “fronteira do branco externo” é representada pela Frente de Proteção

Etno-Ambiental da FUNAI.

Embora a FUNAI defenda um território reservado aos índios isolados, estes índios,

por serem isolados, não sabem que a FUNAI está ali para protegê-los. Portanto, os

índios isolados se comportam perante a FUNAI igualmente a qualquer outro

povoamento de homens brancos. Assim sendo, a FUNAI representa uma fronteira dos

“territórios legais” dos índios isolados, mas com estratégias de territorialidade

equivalente a de brancos externos, que segundo Oliveira (op cit), são os brancos que

expressam valores diferentes dos da comunidade local.

2.2 Lugar e territorialidade

Os conceitos de lugar e territorialidade são importantes para este estudo. A partir

destes dois conceitos é possível compreender o conflito existente no Alto Rio

Page 26: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

26

Tarauacá. As noções de apropriação e dominação do espaço e a relação com os

sistemas de representações sociais são os pontos essenciais.

O conceito de lugar foi constituído pela corrente da geografia humanística na década

de 1970. Este conceito reflete a relação afetiva do indivíduo ou de um grupo social

com o espaço a partir da experiência, do vivido. Pelas palavras de Yi-Fu-Tuan (1975),

“lugar é um centro de significados construído pela experiência”.

Ana Fani Alessandri Carlos (1996) atribui ao conceito de lugar, uma vertente ligada

aos modos de produção social e à relação homem/ meio natural, a partir de uma

perspectiva da geografia crítica. Esta abordagem é muito restrita aos pressupostos do

materialismo histórico e dialético, o que dificulta a percepção das particularidades de

cada grupo social na região estudada. O método de análise marxista trabalha a partir

de uma concepção evolucionista baseada na sociedade industrial. Porém, a noção de

construção social do espaço a partir do vivido, como na citação abaixo pode ser útil

para esta análise.

“O lugar é produto das relações humanas, entre homem e

natureza, tecidos por relações sociais que se realizam no

plano do vivido, o que garante a construção de uma rede de

significados e sentidos que são tecidos pela história e cultura

civilizadora produzindo a identidade, posto que é aí que o

homem se reconhece porque é o lugar da vida” (Carlos,

1996, p.29).

Segundo João Baptista Ferreira Mello (1990, p. 92), a geografia humanista, a partir da

escala de análise do lugar,

“…centraliza o homem como ser pensante, uma importância

vital, visando a compreender e interpretar os seus

sentimentos e entendimentos do espaço e, até mesmo, como a

simbologia e o significado dos lugares podem afetar a

organização espacial”.

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27

Cada índio e cada ribeirinho tem uma relação simbólica e muito particular com o

espaço. Os lugares onde nasceram e aprenderam a praticar atividades de pesca, caça,

plantio e coleta são representados por uma relação de afetividade e de apropriação.

Estas referências de simbologias, significados e representações dos lugares para cada

grupo afetam a própria materialidade, ou seja, a organização espacial da região

estudada. O pensamento de Bernard Poche (1984, apud Raffestin, 1995, p. 185)

resume a essência desta questão.

“la <localitè> est un pur phénomène de représentacion, un

processus mental par lequel les groupes humains pensent

leur rapport à la matérialité” (Idem). (a localidade [ou lugar]

é um puro fenômeno de representação, um processo mental

para que os grupos humanos se reportem à materialidade).

O conceito de territorialidade se aproxima do conceito de lugar quando Raffestin

(1993, p.158) diz que a territorialidade “reflete a multidimensionalidade do ‘vivido’

territorial pelos membros de uma coletividade”. O pressuposto do “vivido” é

essencial tanto para o conceito de lugar quanto para o conceito de territorialidade.

Considero que a distinção entre um e outro é que o “vivido” do lugar é a ‘experiência’

como referência do indivíduo inserido em uma coletividade e o “vivido” da

territorialidade é o ‘vivido compartilhado’ mutuamente por todo um grupo social.

Soja diz que a territorialidade é composta de três elementos: “senso de identidade

espacial, senso de exclusividade e compartimentação da interação humana do espaço”

(Soja, 197 , apud Raffestin, 1993, p.162), porém, Raffestin (1993, p.162) discorda que

o senso de identidade componha a territorialidade. Para o caso a ser discutido neste

estudo, é impossível conceber a territorialidade separada do senso de identidade

espacial.

A peculiaridade maior do conceito de territorialidade é a dimensão da relação de

poder sobre o espaço. Segundo Raffestin, “quer se trate de relações existenciais ou

produtivistas, todas são relações de poder” (op. cit. p.158). Para o autor, “A

territorialidade ... é a “face vivida” da “face agida” do poder” (op. cit. p.161 e 162).

Page 28: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

28

Para Sack (1986), a territorialidade humana é a estratégia de um indivíduo ou grupo

social para influenciar, controlar ou afetar pessoas, recursos, fenômenos e relações,

delimitando e efetivando o controle sobre uma determinada área geográfica. Para o

autor, a territorialidade é uma expressão geográfica do exercício do poder em uma

certa área. Esta área é o território.

Considero que a partir do conceito de territorialidade, como definido por Sack (1986),

juntamente com a noção de lugar trazida pela geografia humanística, é possível

entender o conflito existente na região do Alto Rio Tarauacá. Cada grupo social

existente na região tem diferentes estratégias para influenciar, controlar ou afetar

pessoas, recursos, fenômenos e relações, delimitando e efetivando o controle sobre

determinada área, sejam estas estratégias regidas por relações de apropriação ou

dominação do espaço geográfico.

O que o conceito de lugar traz para complementar é que para os índios e ribeirinhos a

experiência, o uso e a apropriação do espaço para atividades como pesca, caça, coleta

e agricultura fazem parte das próprias estratégias de territorialidade. Para a FUNAI, as

estratégias de territorialidade não são regidas pela experiência e apropriação do

espaço, mas sim por meios coercitivos de dominação, através da legislação e do uso

da força.

2.3 Os Índios Isolados e a Política Indigenista

Segundo Darcy Ribeiro (1996, p. 488), as populações indígenas do Brasil são

classificáveis em quatro categorias referentes aos graus de contato com a sociedade

nacional: isolados, contato intermitente, contato permanente e integrados. Ainda hoje,

no Brasil, existem grupos de índios isolados, principalmente na região amazônica. Os

índios isolados são também chamados de “índios arredios”, “índios autóctones” e

“índios silvícolas”. No Alto Tarauacá, são chamados pela população local de

“caboclos brabos”. Para os ribeirinhos da região, existe uma distinção entre o brabo,

que é o selvagem e o manso, que é o domesticado. Segundo o linguajar local, “De

tudo nesse mundo tem o brabo e tem o manso: tem a anta e tem a vaca, tem o veado e

tem o cabrito, tem o quatipuru e tam o rato, tem a nambu e tem a galinha. Até com

gente tem os mansos e tem os brabos, que são os caboclos” (Seu Lico, apud CUNHA

et. al., 2000, p. 191).

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29

No mapa 2, elaborado por Darcy Ribeiro, na década de 1960, podemos observar a

indicação de áreas de existência provável de tribos isoladas na área cultural indígena

Juruá-Purus.

Mapa 2 – Extraído do livro “Os Índios e a Civilização” de Darcy Ribeiro (1996)

Com base na legislação brasileira, Lei no 6001 de 19/12/73,4 Gilberto Azanha

denomina índios isolados como:

4 Art.3º Para os efeitos de lei, ficam estabelecidas as definições a seguir discriminadas: I – Índio Silvícola: É todo indivíduo de origem e ascendência pré-colombiana que se identifica e é identificado como pertencente a um grupo étnico cujas características culturais o distinguem da sociedade nacional; e II – Comunidade Indígena ou Grupo Tribal – É um conjunto de famílias ou comunidades índias, quer vivendo em completo estado de isolamento em relação aos outros setores da comunhão nacional, que em contatos intermitentes ou permanentes, sem contudo estarem neles integrados.

Page 30: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

30

“...o um conceito legal que define as populações humanas de

cultura pré-colombiana que se mantiveram geográfica e

culturalmente distanciadas da população ocidental que

constituiu posteriormente a maioria populacional do país.

Este isolamento se dá em tal grau que se desconhece sua

composição demográfica, registrando-se apenas algumas

evidências de sua existência e nenhum ou parcos indícios de

sua cultura material, costumes e línguas”. (Azanha, 2006)

Segundo Darcy Ribeiro (1996, p. 491), as formas de expansão da sociedade nacional

(extrativa, agrícola ou pastoril) apresentam características distintas quanto à

integração dos povos indígenas, não podendo ser tratadas como uma constante. Seus

estudos apontaram que a sociedade nacional,

“...avançando inexoravelmente sobre as poucas faixas

inexploradas do território brasileiro onde ainda sobrevivem

grupos isolados, atua dizimadoramente sobre eles e, à

medida que consolida a ocupação e ascende a maiores

concentrações demográficas, envolve a todos os grupos,

fazendo baixar o número de tribos e seu montante

populacional” (1996, p.493).

Segundo Ribeiro (1996, p. 147), nos primeiros vinte anos da Republica Brasileira,

foram abertas ferrovias através da mata, os rios navegados por barcos a vapor e os

sertões foram atravessados por linhas telegráficas, o que levou a abertura de muitas

frentes de luta contra os índios. Porém, nada se fez para regulamentar as relações com

os povos indígenas.

Art 4º: Os índios são considerados: I – Isolados – Quando vivem em grupos desconhecidos ou de que se possuem poucos e vagos informes através de contatos eventuais com elementos da comunhão nacional; II – Em vias de integração – Quando, em contato intermitente ou permanente com grupos estranhos, conservem menos ou maior parte das condições de sua vida nativa, mas aceitam algumas práticas e modos de existência comuns aos demais setores da comunhão nacional, da qual vão necessitando cada vez mais para o próprio sustento; e III – Integrados – Quando incorporados à comunhão nacional e reconhecidos o pleno exercício dos direitos civis, ainda que conservem usos, costumes e tradições característicos da sua cultura. (Magalhães, 2005, p.29),

Page 31: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

31

Em 1910 foi criado o Sistema de Proteção aos Índios (SPI), comandado pelo

Marechal Cândido Rondon, com o intuito de contatar os povos indígenas e assessorá-

los no convívio com a sociedade nacional. O famoso lema de Rondon era: “morrer, se

for preciso, matar nunca”. Em 15 de dezembro de 1911, o decreto número 9214

estatuía “o respeito às tribos indígenas como povos que tinham o direito de ser eles

próprios, de professar suas crenças de viver segundo o único modo que sabiam fazê-

lo: aquele que aprenderam com seus antepassados e que só lentamente podia mudar”

(Ribeiro, 1996, p. 158). Esta foi a primeira iniciativa legal do governo brasileiro para

proteger os direitos dos povos indígenas. Porém, como se pode perceber na própria

lei, o SPI, mesmo tendo a preocupação em respeitar os direitos indígenas, tinha a

intenção de assimilar estes povos à sociedade nacional. O resultado das assimilações

das populações indígenas pelo SPI não foi satisfatório. Entre diversos fatores, o

principal foi que os índios não tinham resistência às doenças do “homem branco”

causando altas taxas de mortalidade entre as populações indígenas (Ribeiro, 1996).

Como podemos ver na tabela 2, mesmo com o SPI instaurado em 1910, foram

contatados dois terços dos povos indígenas isolados que até então se tinham

informações (72 de 105) através da expansão da sociedade nacional, entre 1900 e

1957. Mais da metade dos povos indígenas isolados que foram contatados neste

período foram extintos (33 de 72 grupos indígenas isolados). Ou seja, em pouco mais

de cinqüenta anos, de 105 povos isolados, menos de um terço (33 de 105) se

mantiveram isolados.

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32

Tabela 2 – extraída do livro “Os Índios e a Civilização” de Darcy Ribeiro (1996, p. 269).

Em 1969 foi extinto o SPI. No mesmo ano foi criada a Fundação Nacional do Índio

(FUNAI) que se torna o órgão do governo responsável pelas questões indígenas do

Brasil. A década de 1970 foi um momento de reestruturação da política indigenista. A

partir de 1987, após o 1º Encontro de Sertanistas, foram estabelecidas novas diretrizes

para o trabalho de localização, vigilância e contato com os índios isolados, o que

resultou na criação de um Sistema de Proteção aos Índios Isolados (informação obtida

por documentos informais da FUNAI). Pouco mais de dez anos depois, a portaria No

290/PRES, de 20 de abril de 2000, em seu artigo 2º, estabelece que “a execução da

política de localização e proteção de índios isolados seja efetuada por equipes de

campo denominadas FRENTE DE PROTEÇÃO ETNO-AMBIENTAL” (FPEA).

Hoje existem 6 FPEAs, a FPEA Cuminapanema, FPEA Envira, FPEAGuaporé, FPEA

Madeirinha, FPEA Purus e a FPEA Vale do Javari (Mapa 3).

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33

Mapa 3 – Áreas de atuação das Frentes de Proteção Etno-Ambiental

Page 34: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

34

Também no dia 20 de abril de 2000, foi publicada a portaria No 281/PRES, que

estabelece, em seu artigo 1º, as seguintes diretrizes para o Departamento de Índios

Isolados, atual Coordenação Geral de Índios Isolados (CGII):

“1.1 Garantir aos índios isolados o pleno exercício de sua

liberdade, e de suas atividades tradicionais;

1.2 A constatação da existência de índios isolados não

determina, necessariamente, a obrigatoriedade de contatá-

los;

1.3 Promover ações sistemáticas de campo destinadas a

localizar geograficamente e obter informações sobre índios

isolados;

1.4 As terras habitadas por índios isolados, serão garantidas,

asseguradas e protegidas em seus limites físicos, riquezas

naturais, na fauna, flora e mananciais;

1.5 A saúde dos índios isolados, considerada prioritária, será

objeto de especial atenção decorrentes de sua especificidade;

1.6 A cultura dos índios isolados nas suas diversas formas e

manifestação será protegida e preservada;

1.7 Proibir no interior da área habitada por índios isolados,

toda e qualquer atividade econômica e comercial”

(FUNAI, 2000a, No 281).

Sintetizando, desde 1987 a política da FUNAI, quanto aos índios isolados, é de

manter seus territórios protegidos e não fazer contato enquanto os próprios índios não

se aproximarem para fazer contato. Para isso suas terras são demarcadas e protegidas

para que não haja invasões de outros grupos e para que não haja explorações

comerciais dos recursos naturais das terras indígenas. Segundo Meirelles, no caso dos

índios isolados do Acre:

“Não foi nada fácil convencer o Estado Brasileiro a admitir

cidadãos que ele não pode controlar principalmente cidadãos

que não respeitam nem a fronteira internacional Brasil –

Page 35: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

35

Peru, vivendo lá e cá, sem dar satisfações a ninguém”.

(2007a)

Em Dezembro de 2006 foi realizada, em Brasília, com apoio do Programa Piloto de

Proteção às Populações Indígenas e Terras Indígenas da Amazônia Legal (PPTAL),

uma Oficina de Planejamento de Ações para Índios Isolados. Nesta oficina se

reuniram com a CGII, os coordenadores das Frentes de Proteção Etno-Ambiental,

seus auxiliares, o Conselho Indígena Missionário (CIMI), a ONG Kanindé e outras

entidades que auxiliam o trabalho de proteção aos índios isolados. Foram atualizados

os cadastros das referências de índios isolados, formuladas convenções para a

sistematização das referências e definidas prioridades de ação (Mapa 4) para a CGII,

com doze metas para serem atingidas até 2010. Foram registradas 67 referências de

índios isolados sob responsabilidade da CGII no Brasil (Mapas 3, 4 e 5). 38 Não

confirmadas, 24 confirmadas e 5 recém contatadas (Mapa 5). Existem também, seis

Terras Indígenas demarcadas exclusivamente para os índios isolados e quatro Terras

Indígenas onde existem grupos indígenas isolados com proteção da CGII (Mapas 3, 4

e 5). Existem ainda dez Terras Indígenas onde existem referências de grupos

indígenas isolados, mas a FUNAI não tem capacidade de atuar por falta de recursos

(Mapa 3).

Podemos perceber, desde 2000, um estágio muito acelerado de ação da FUNAI

quanto aos índios isolados, porém, a defasagem é imensa, já que se trata de um órgão

público que, como muitos outros, estão sendo sucateados. Em 2000 o então

coordenador geral da CGII, Sidney Possuelo, firmou uma cooperação com a União

Européia que dispôs de recursos financeiros para criar as Frentes de Proteção Etno-

Ambiental. Em 2004 foi firmado um termo de cooperação entre a ONG CTI (Centro

de Trabalho Indigenista) e a FUNAI, financiado pela Fundação Moore (Gordon and

Betty Moore Foundation), Fundo de investimento privado de origem dos Estados

Unidos da América. Três Frentes de Proteção Etno-Ambiental (FPEA) foram

contempladas por este projeto: A FPEA do Rio Guaporé, no Estado de Rondônia, a

FPEA do Vale do Javari, no Estado do Amazonas e a FPEA do Rio Envira, no Estado

do Acre.

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36

Com recursos da FUNAI é impossível realizar espécie alguma de trabalho de

qualidade. A burocracia para se conseguir diversos tipos de recursos e a extinção de

cargos do quadro de funcionários da FUNAI, como motorista fluvial, mecânico, etc.,

importantíssimos para o trabalho de campo, são os maiores problemas. Desta forma, a

proteção dos índios isolados no Brasil, que, pela constituição brasileira, é uma

obrigação do Estado Nacional, depende de iniciativas da sociedade civil e de capital

estrangeiro para se concretizar.

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37

Mapa 4 – Prioridades de Ação da CGII.

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38

Mapa 5 – Situação das referências da CGII.

Page 39: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

39

2.4 Populações Tradicionais, Índios Isolados e Comunidades Ribeirinhas.

O surgimento do conceito de populações, povos ou comunidades tradicionais é

resultado de um processo de reflexão relativo à atual crise ambiental. As populações

tradicionais assim foram intituladas como parceiras para a conservação da natureza. A

preocupação em se proteger a natureza não é recente, porém, há historicamente uma

mudança no método e no paradigma da conservação.

Desde meados do século XIX já existia nos Estados Unidos um modelo de criação de

áreas naturais protegidas (Diegues, 2004, p. 11). Segundo o autor, este modelo surgiu

a partir de uma noção de mundo selvagem, “wilderness”, que considerava o homem

como necessariamente destruidor da natureza. Este modelo propunha a criação de

“...’ilhas’ de conservação ambiental, de grande beleza cênica, onde o homem da

cidade pudesse apreciar e reverenciar a natureza selvagem” (idem).

Ao serem criadas estas unidades de preservação ambiental, a legislação obrigava a

remoção de inúmeros povos habitantes dessas áreas naturais que tinham modos de

produção simbióticos com a natureza, causando baixíssimos impactos sobre o

ambiente natural. Este fato gerou uma série de problemas de caráter ético, social,

político, econômico, político e cultural (op. cit., p. 14).

A hipótese de aquecimento global e a visível transformação que o homem produz na

paisagem natural geram um medo de que cheguem ao fim os estoques de recursos

renováveis e do mundo se tornar inabitável para os seres humanos. A Conferência

sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, Rio-92 foi um marco da emergência do

debate “no qual são confrontados saberes das populações tradicionais com as

mudanças globais de ordem econômica e tecnológica...” (Castro, 2000, p. 166).

A partir dos inúmeros conflitos entre a criação de unidades de proteção integral com

as populações nativas, surgiram diversos movimentos políticos e sociais, para a

proteção do direito das populações tradicionais se manterem em seus territórios

tradicionais. Após a Conferência Rio-92, estes movimentos sociais ganharam força

política, chegando à criação de uma legislação específica em defesa aos povos

tradicionais, publicada em fevereiro de 2007.

Page 40: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

40

Em 27 de dezembro de 2004 foi criada a Comissão Nacional de Desenvolvimento

Sustentável das Comunidades Tradicionais por decreto da mesma data. Esta comissão

desenvolveu a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e

Comunidades Tradicionais (PNCPT), promulgada pelo decreto de número 6.040 de 7

de fevereiro de 2007, que define em seu artigo 3, inciso I, Povos e Comunidades

Tradicionais como:

“Grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem

como tais, que possuem formas próprias de organização

social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais

como condição para sua reprodução cultural, social,

religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos,

inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição”

(PNPCT, 2007).

Em seu inciso II, define Territórios Tradicionais como:

“Espaços necessários a reprodução cultural, social e

econômica dos povos e comunidades tradicionais, sejam eles

utilizados de forma permanente ou temporária” (idem).

Manuela Carneiro Cunha e Mauro Almeida relacionam o surgimento da categoria

populações tradicionais à disputa jurídica pelos direitos de acesso à terra e não

somente ao mérito por causarem baixo impacto ambiental, ou serem ecologicamente

sustentáveis. Desta maneira, definem populações tradicionais tais como:

“Grupos que conquistaram ou estão lutando para conquistar

(por meio de meios práticos e simbólicos) uma identidade

pública que inclui algumas e não necessariamente todas as

seguintes características: o uso de técnicas ambientais de

baixo impacto, formas equitativas de organização social, a

presença de instituições com legitimidade para fazer cumprir

suas leis, liderança local e, por fim, traços culturais que são

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41

seletivamente reafirmados e reelaborados” (Cunha, 2001,

p.192).

São institucionalmente considerados povos e populações tradicionais, seringueiros,

castanheiros, quebradoras de coco-de-babaçu, ribeirinhos, barranqueiros, indígenas,

quilombolas, pescadores, atingidos por barragens, fundo de pasto, Faxinal, entre

outros.

Os ribeirinhos do Alto Tarauacá não se auto denominam como ribeirinhos, nem como

seringueiros. Embora todos tenham sido seringueiros, há anos já não se extrai seringa,

portanto já não são mais especificamente seringueiros. Eles não se auto denominam

como nenhuma categoria de população tradicional, porém, têm as características e os

costumes citados na lei que os define como uma população tradicional. Os ribeirinhos

do Alto Tarauacá são “grupos culturalmente diferenciados,..., que possuem formas

próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais

como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e

econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos

pela tradição” (PNPCT, 2007). Estes ribeirinhos somente não se enquadram

exatamente na especificação de populações tradicionais como explicitado na lei

porquê que não “se reconhecem como tais” (idem).

Estes ribeirinhos praticam caça, pesca, coleta, agricultura de subsistência e têm o rio

como fonte para tudo. Transporte, alimento, abastecimento de água. Todos vivem na

beira do rio, têm laços afetivos com suas terras e estes laços influem nos sistemas de

representação de todo grupo social.

Segundo a CNPCT (2006, p. 12), os povos indígenas são historicamente a primeira

população diferenciada marcada no cenário político e social brasileiro. Por isso têm o

reconhecimento formal dos seus direitos mais estabelecidos e consistentes,

consubstanciados nos Artigos 231 e 232 da Constituição Federal de 1988.

A categoria ‘populações tradicionais’ basicamente define grupos culturalmente

diferenciados das populações urbano-industriais. Tanto os ribeirinhos quanto os índios

isolados do Alto Tarauacá são explicitamente populações tradicionais, porém, não se

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42

auto-denominam como tais. Tanto os índios isolados quanto os ribeirinhos não se

definem como grupos culturalmente diferenciados às populações urbano-rurais porquê

estão muitíssimo distanciados geograficamente de grandes centros urbanos. De certa

forma, eles são mais ‘distanciados’ do que propriamente ‘diferenciados’. Por isso não

têm acesso aos movimentos sociais em defesa das populações tradicionais nem à

legislação que os defende. Acontece que o Governo Federal exerce a lei que defende

os índios isolados, através da FUNAI, enquanto os ribeirinhos, não têm conhecimento

das leis que defendem seus direitos e nem um órgão público que defenda seus direitos.

Em um encontro da CNPCT foram definidas 35 demandas para a proteção dos direitos

das populações tradicionais. As 12 demandas seguintes foram consideradas as

principais:

“1. Regulamentação fundiária e garantia de acesso aos recursos

naturais;

2. Educação diferenciada, de acordo com as características

próprias a cada um dos povos tradicionais;

3. Reconhecimento, fortalecimento e formalização da cidadania

(exemplo: documentação civil);

4. Não criar mais UCs de proteção integral sobre territórios dos

povos tradicionais;

5. Resolução de conflitos decorrentes da criação de UCs de

proteção integral sobre territórios de povos tradicionais;

6. Dotação de infra-estrutura básica;

7. Atenção à saúde diferenciada, reconhecendo suas

características próprias, valorizando suas práticas e saberes;

8. Reconhecimento e fortalecimento de suas instituições e formas

de organização social;

9. Fomento e implementação de projetos de produção

sustentável;

10. Garantia de acesso às políticas públicas de inclusão social;

11. Garantia de segurança às comunidades tradicionais e seus

territórios;

Page 43: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

43

12. Evitar os grandes projetos com impactos diretos e/ou

indiretos sobre territórios de povos tradicionais e quando

inevitáveis, garantir o controle e gestão social em todas as suas

fases de implementação, minimizando impactos sociais e

ambientais” (CNPCT, 2006, p.7).

O que é muito interessante é que dentre as principais demandas, definidas pela

CNPCT (2006, p. 7), algumas se assemelham, às atribuições da CGII para a proteção

de índios isolados, definidas pela Portaria N.281/PRES, de 20 de abril de 2000, Artigo

1º (FUNAI, 2000a). As principais demandas são relativas à garantia de acesso à terra,

aos recursos naturais e a atenção à saúde e organização social diferenciadas.

Enquanto a FUNAI (Op. Cit.) estabelece que é necessário “garantir aos índios

isolados o pleno exercício de sua liberdade, e de suas atividades tradicionais”, a

CNPCT (Op. Cit), reconhece a necessidade do “reconhecimento e fortalecimento de

suas instituições e formas de organização social”. A FUNAI (Op. Cit.) estabelece que

“as terras habitadas por índios isolados, serão garantidas, asseguradas e protegidas em

seus limites físicos, riquezas naturais, na fauna, flora e mananciais” e a CNPCT

(Op.Cit.) requer a “regulamentação fundiária e garantia de acesso aos recursos

naturais”. Para a FUNAI (Op. Cit.), “a saúde dos índios isolados, considerada

prioritária, será objeto de especial atenção decorrentes de sua especificidade” e a

CNPCT (Op. Cit.) ressalta a “atenção à saúde diferenciada, reconhecendo suas

características próprias, valorizando suas práticas e saberes”.

Estas metas semelhantes em relação aos índios isolados e as populações tradicionais

em geral demonstram como os problemas dos índios isolados são semelhantes aos dos

ribeirinhos. O fato de na região estudada haver um órgão para proteger os direitos dos

índios isolados e não haver outro que defenda os direitos dos ribeirinhos eu considero

um dos principais motivos dos conflitos dos ribeirinhos com ss restrições em relação à

Terra indígena Alto Tarauacá.

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44

Mapa 6

Page 45: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

45

3 Considerações Finais

É possível observar que no Alto Tarauacá existe uma diversidade de povos,

comunidades e populações tradicionais, entre ribeirinhos, e povos indígenas. Porém,

existe uma disparidade entre os sistemas de proteção aos territórios tradicionais de

cada grupo. O principal fator de desigualdade no direito territorial de cada povo é o

desconhecimento da lei e a ausência de um movimento social a favor dos ribeirinhos.

Os índios kaxinauá, habitantes do Rio Tarauacá, Rio Jordão e do Rio Humaitá, são

politicamente ativos e contam com diversos programas, projetos e têm até um

representante indígena como vice-prefeito do Município de Jordão. Os índios isolados

têm a FUNAI como uma instituição que defende seus territórios. Os ribeirinhos (ex-

seringueiros), do mesmo modo que foram empurrados para o meio do mato durante o

boom da borracha, foram removidos de seus territórios, de onde tiravam seu sustento

e tinham estabelecidos seus sistemas de reprodução social. Diversos grupos de ex-

seringueiros, como Chico Mendes, Chico Ginu e Antônio Macedo (Almeida, 2004,

p.3), de outras regiões se articularam com entidades externas e conseguiram apoio

político. Os poucos que continuam vivendo no entorno da TI Alto Tarauacá são muito

“isolados” do resto do mundo. Eles têm contato apenas com a pequena cidade de

Jordão e raramente com a cidade de Tarauacá. O único meio de comunicação a que

têm acesso é o rádio de pilha que só pega a Rádio Nacional. Eles não têm energia

elétrica, muito menos televisão. Na pequena escola da comunidade existia um gerador

a óleo diesel e uma antena parabólica, mas não tem televisão, o gerador foi levado

embora, e a antena parabólica não funciona. Não existe nenhum movimento social ou

instituição que defenda os direitos destes ribeirinhos. Acredito que eles não se

articulam porque estão acostumados com o sistema social do seringal, onde o

seringueiro deve obedecer ao patrão.

Voltando à hipótese inicial desta pesquisa, de que cada grupo social tem diferentes

maneiras de conquistar, defender e representar seus territórios, sob múltiplas escalas

de poder e identidade, é possível perceber nitidamente a diferença das formas de

territorialidade que cada grupo exerce. Os índios isolados, primeiros habitantes da

região, são povos guerreiros, porém seus arcos e flechas não podem competir com as

armas de fogo dos brancos. O que diferencia a astúcia dos guerreiros indígenas é o

Page 46: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

46

conhecimento sobre a floresta. É muito fácil um índio passar por um branco na mata

sem ser percebido, mas para um branco, é quase impossível que um índio não perceba

sua presença. Os índios isolados da região exercem sua territorialidade a partir de

malocas sedentárias ou nômades em lugares muito escondidos e longínquos nas

matas. Porém, transitam por uma área muito extensa para exercer o domínio sobre o

território. Nestas andanças também caçam pescam, coletam frutos, raízes, folhas,

cipós e, ocasionalmente, furtam bens dos povos brancos ou de outros índios, quando

deixam as casas vazias. Os materiais que costumam furtar são cordas, baldes, pano,

panelas, facas, facões, machados, enxadas e outras coisas mais que lhes interesse.

A FUNAI exerce uma territorialidade “em nome dos índios isolados”, ou seja, visa

defender, com estratégias militares, o território de uso dos índios isolados. Para

assegurar-lhes o direito constitucional de viverem segundo seus costumes e práticas

tradicionais, em seus territórios tradicionais.

Os ribeirinhos, embora não sejam engajados politicamente, exercem sua

territorialidade na prática do cotidiano, a partir da própria experiência social com o

espaço. Eles não reivindicam o direito de uso do território da TI Alto Tarauacá. Eles

apenas o utilizam, mesmo sem ter direito, já que é muito difícil para a FUNAI,

impedir a passagem para dentro da TI. Constantemente, os ribeirinhos da comunidade

do D’ouro entram na TI Alto Tarauacá para caçar, pescar, coletar frutos, visitar

túmulos de parentes, pagar promessas em lugares sagrados... Os ribeirinhos têm

estreitos laços afetivos com o território demarcado para uso exclusivo dos índios

isolados. Os ribeirinhos conhecem cada volta do rio, cada pé de abacate, plantado por

eles mesmos ou por seus parentes e amigos, cada limoeiro, cada bananal, cada

mamoeiro.... Na terra em que vivem não têm tantas coisas plantadas. Para se colher de

um pé plantado leva tempo.

Da mesma forma que são pressionados pela FUNAI para não penetrarem em território

indígena, os ribeirinhos desconsideram a lei e continuam exercendo suas práticas

“tradicionais”. Repetindo o que fora previamente levantado, mesmo não havendo

efetivamente um conflito pela propriedade territorial no Alto Rio Tarauacá, existe um

conflito entre as estratégias (formas) de uso, manutenção e representação destes

Page 47: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

47

espaços, efetuando-se um conflito entre territorialidades na região do Alto Rio

Tarauacá.

Como consideração final, faço a análise de que a FUNAI exerce uma territorialidade

por um “espaço vital”, como proposto por Ratzel (1897 apud Souza, 2005), em

defesa do solo de uma nação, a partir de uma noção de dominação do território.

Enquanto isto, os ribeirinhos e os próprios índios isolados exercem uma

territorialidade sobre um “espaço vivido”, como proposto por Frèmont (1976), a

partir de uma noção de apropriação do território para a garantia de sua reprodução

social, cultural e material.

O ápice da questão é a necessidade de preservar os direitos territoriais das populações

tradicionais a partir do respeito ao uso que cada grupo faz de seus territórios. Porém,

quando há um conflito de territorialidades entre duas ou mais populações tradicionais,

quem tem mais direito? Quem for mais tradicional? Como medir quem é mais

tradicional? Quem tem mais direito sobre o território? Quem pode julgar quem tem

mais direito?

Efetivamente, a comunidade ribeirinha do Alto Tarauacá é uma população tradicional

que não é afetada diretamente pelo avanço do “desenvolvimento” e da fronteira

capitalista, como a maior parte das populações tradicionais. Os ribeirinhos são

afetados pelo sistema de proteção dos direitos de outra população tradicional. O que

acontece é que se não houver um sistema de proteção para os índios isolados, eles

serão simplesmente dizimados. Agora, se é valido ou não este privilégio dos índios

isolados sobre os ribeirinhos, não sou eu quem vai julgar.

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48

4 Anexos 4.1 Fotos

Foto 1 – Instalações do Posto de Vigilância e Proteção da Foz do Rio Douro

Foto: Arquivo pessoal

Foto 2 – Instalações do Posto de Vigilância e Proteção do Rio Envira

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49

Foto 3 – Dificuldade de navegação durante períodos de estiagem

Foto 4 – Seringueira com cortes antigos, após a decadência dos seringais da região

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50

Foto 5 – Encontro dos Rios Douro e Tarauacá

Em primeiro plano, as instalações do Posto de Vigilância e Proteção da Foz do Rio Douro, em segundo plano, roçados dos ribeirinhos.

Foto 6 – Comunidade ribeirinha do antigo Seringal Douro

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51

Foto 7 – Rastros deixados por índios isolados no Rio do Ouro

Foto 8 – Flecha disparada pelos índios isolados contra um trabalhador da FUNAI no PVIP Douro

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52

Foto 9 – Índios Kampa Ashaninka do Rio Envira

Foto 10 – Índios Kulina do Rio Envira

Page 53: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

53

Foto 11 – Índios Kaxinauá do Rio Jordão

Foto 12 – Articulação política dos Índios Kaxinauá

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54

Foto 13 – Visão de toda a frente da pequena cidade de Jordão

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55

4.2 Audiovisual

Índios Isolados no Alto Tarauacá, 2007.

É interessante observar o que o material áudio-visual tem a complementar para o

entendimento dos conflitos entre territorialidades no Alto Tarauacá. É possível retratar

confrontos diretos entre os povos e como os ribeirinhos se referem aos índios

isolados, demonstrando uma relação de estranhamento, desconfiança ou de raiva. O

curta metragem apresta depoimentos de ribeirinhos habitantes do entorno da TI Alto

Tarauacá. Os entrevistados são:

Seu Zé Sena: um senhor ribeirinho, ex-seringueiro. Conta da história de quando ele

liderou um grupo que matou um índio isolado, no tempo dos seringais. Segundo ele, o

Índio do Pezão, como os seringueiros o chamavam por causa do tamanho do seu

rastro, havia matado a mulher de um seringueiro que estava grávida e o índio havia

cortado sua barriga e levado o feto com ele. É interessante observar como o senhor se

refere ao índio isolado: “olha o peito do monstro, deste tamanho”.

Seu Raimundo Alves: um senhor ribeirinho, também ex-seringueiro, que trabalha no

Posto de Vigilância e Proteção da Foz do Rio Douro. Conta o caso acontecido em

outubro de 2006, quando ele estava sozinho no posto e foi atacado por um grupo

indígena isolado que atirou duas flechas contra ele.

Dona Araci: É uma senhora moradora da cidade de Jordão e dona da única pensão

existente na cidade. Ela exprime suas opiniões a respeito dos índios isolados e diz que

os brancos devem se afastar dos índios isolados porquê eles são muito agressivos.

Segundo ela, “caboco brabo é um bicho como cobra, traiçoeiro”.

Duração: 4’ min.

Câmera e edição: Luis Bulcão

Entrevistas: Luis Bulcão e Danilo Guerra

Page 56: Territorialidades Conflitantes no Alto Rio Tarauacá V2

56

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