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1 XXXVI CONGRESSO NACIONAL DOS PROCURADORES DE ESTADO MACEIÓ - ALAGOAS DIREITO FINANCEIRO Gestão Social das Finanças Públicas. Tese: A ADMINISTRAÇÃO ORÇAMENTÁRIA E FINANCEIRA COMO INSTRUMENTO PROMOTOR DO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO-SOCIAL. 2010

Tese: A ADMINISTRAÇÃO ORÇAMENTÁRIA E FINANCEIRA … · A Administração Orçamentária e Financeira como instrumento promotor do desenvolvimento econômico-social: Gestão Social

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Page 1: Tese: A ADMINISTRAÇÃO ORÇAMENTÁRIA E FINANCEIRA … · A Administração Orçamentária e Financeira como instrumento promotor do desenvolvimento econômico-social: Gestão Social

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XXXVI CONGRESSO NACIONAL DOS PROCURADORES DE ESTADO

MACEIÓ - ALAGOAS

DIREITO FINANCEIRO

Gestão Social das Finanças Públicas.

Tese: A ADMINISTRAÇÃO ORÇAMENTÁRIA E FINANCEIRA

COMO INSTRUMENTO PROMOTOR DO DESENVOLVIMENTO

ECONÔMICO-SOCIAL.

2010

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A ADMINISTRAÇÃO ORÇAMENTÁRIA E FINANCEIRA COMO

INSTRUMENTO PROMOTOR DO DESENVOLVIMENTO

ECONÔMICO-SOCIAL

A tese apresenta tema relacionado à Advocacia Pública

Estadual atinente ao direito financeiro a ser submetida à

Comissão de Avaliação de Teses e, se aprovada, encaminhada

à Comissão Temática para apresentação no XXXVI Congresso

Nacional de Procuradores de Estado em Maceió – Alagoas.

2010

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Resumo

O trabalho versa sobre as dificuldades práticas para a concretização das normas constitucionais concessoras dos direitos fundamentais sociais. Narra a crise internacional do modelo de Estado Social e os reflexos na triste realidade brasileira caracterizada por abismos entre as classes sociais. Considera a escassez dos recursos públicos para fazer frente às muitas despesas públicas necessárias à erradicação da miséria e a redução das desigualdades social. Preconiza sejam priorizadas as políticas públicas sociais a serem executadas com ampla participação popular como forma de lhe conferir legitimidade. E discorre sobre as fases da atividade pública orçamentária e financeira, deste a elaboração das propostas das leis orçamentárias passando pela gestão da receita e despesa públicas até o controle e avaliação das metas, com o objetivo de buscar meios para viabilizar que o Estado possa bem cumprir o dever constitucional de assegurar o mínimo existencial indispensável à vida digna. Trata-se de uma provocação aos Procuradores dos Estados da Federação para que fortaleçam sua atuação como agentes promotores da Justiça Social.

Palavras-chave: Direitos sociais, finanças públicas, participação popular, desenvolvimento

econômico-social, justiça social.

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SUMÁRIO

1- INTRODUÇÃO...........................................................................................................05

2- A CRISE DO ESTADO SOCIAL DE DIREITO.....................................................06

3- A REALIDADE BRASILEIRA.................................................................................07

4- OS RECURSOS PÚBLICOS E SUAS LIMITAÇÕES CONSTITUCIONAIS,

LEGAIS E FÁTICAS.................................................................................................10

5- O DESENVOLVIMENTO ECONOMICO-SOCIAL.............................................13

6- A ADMINISTRAÇÃO DAS FINANÇAS PÚBLICAS............................................14

6.1. AS LEIS ORÇAMENTÁRIAS - O planejamento a longo, médio e curto prazo na

gestão dos recursos públicos.............................................................................................16

6.2. AS RECEITAS VINCULADAS: a expressão material da priorização

constitucional dos direitos sociais....................................................................................24

6.3. A EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA PARTICIPATIVA: a participação popular

como elemento legitimador da gestão financeira...........................................................26

7.CONCLUSÃO................................................................................................................29

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A Administração Orçamentária e Financeira como instrumento promotor

do desenvolvimento econômico-social: Gestão Social das Finanças Públicas.

1. Introdução

No início do Século XX a concepção de justiça evoluiu

humanizando-se. A noção do que é justo fluiu em movimento antropocêntrico provocando o

crescimento dos direitos sociais e ocasionando a transformação dos entes públicos com o

surgimento do denominado Estado Social. Tal mutação teórica caracterizada pela consagração

do pensamento igualitário provocou grande alteração no sistema normativo brasileiro, com a

inclusão de normas assecuratórias dos direitos sociais; todavia, não houve proporcional

concreção fática, ou seja, as mudanças não foram suficientes para transmutar a realidade

brasileira que padece com grandes desigualdades sociais.

A previsão constitucional dos direitos sociais na nossa Carta Magna

não teve o condão de, por si só, reduzir a pobreza e a desigualdade social. A concreção da

teoria encontra muitos obstáculos, inclusive de prosaica natureza orçamentária e financeira.

A presente tese visa analisar, de modo pragmático, algumas das

questões peculiares ao direito financeiro com o escopo de enfrentar as dificuldades

operacionais na prestação dos direitos sociais, tudo com o firme propósito de preconizar pela

gestão social das finanças públicas. Pautado por esse desiderato, o trabalho inicia com sucinto

relato da crise que assola o modelo de Estado Social para, após, reportar a triste realidade

brasileira, com foco nas dificuldades da prestação dos direitos sociais. Por fim, preconiza pela

gestão social das finanças públicas ao propugnar pela participação popular, na atividade

financeira dos entes públicos, como fator promotor da justiça social. Tudo com o firme

propósito de fomentar o desenvolvimento econômico-social.

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2. A crise do estado social de direito

O Estado Social de Direito, também denominado Estado Providência,

Estado de Bem-Estar-Social, Estado-social, Estado Social Democrático de Direito, Estado do

Bem-Estar encontra-se em crise histórica. Os juristas não atribuem idêntico significado a

essas denominações; todavia, a maioria partilha do entendimento de que a este modelo de

Estado se caracteriza por certo grau de inserção do Estado na ordem econômica visando

garantir as condições materiais mínimas à existência digna.

A crise deste modelo de Estado afeta sobremaneira a sociedade; a

qual, neste momento, vivencia profundas mudanças das relações de trabalho, insuficiência das

prestações sociais, sucessivo incremento de exigências para obtenção do direito ao benefício

previdenciário, tudo a provocar insegurança na maioria da população.

Neste cenário a globalização econômica fortalece a dominação dos

mercados financeiros favorecendo o poder econômico supranacional, cujas injunções

repercutem na economia interna gerando o fenômeno da desterritorização da política

econômica. Assim, a econômica do país abala-se, freqüentemente, devido à especulação do

mercado financeiro mundial, o que afeta e enfraquece a soberania e a territorialidade e

fortalece o poder do capital financeiro, tornando instável a economia real interna do país. Este

poder volátil e virtual do capital internacional ao submeter a soberania e o território estatal

rompe com dogmas tradicionais, acirrando a intranqüilidade social e comprometendo a figura

do Estado.

O nível da crise estatal é diretamente proporcional aos efeitos da

globalização econômica refletindo-se no grau de atendimento dos direitos fundamentais,

provocando o reducionismo da prestação dos direitos sociais básicos (saúde, educação,

previdência e assistência social) e causando a denominada flexibilização dos direitos

trabalhistas e previdenciários.

Os direitos fundamentais mais afetados com a decadência do Estado

podem ser divididos em direitos de defesa que se caracterizam pela obrigação de abstenção do

Estado que, no plano jurídico subjetivo, corresponde ao direito à conduta omissa dos entes

públicos, com fulcro em normas de natureza negativa, que coíbem o poder público de ingerir

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na esfera individual. Esses caracterizam as denominadas liberdades sociais cujo respectivo

direito de defesa serve a proteção dos direitos fundamentais de primeira geração.

Os direitos fundamentais sociais prestacionais, geralmente,

positivados de forma ampla, por intermédio de redação vaga e aberta, apresentam cunho

positivo vinculados à disponibilidade de meios materiais. Eles exigem conduta comissiva e

postura ativa do Estado para prestação jurídica material, tais como: a criação, destinação e

distribuição e redistribuição de serviços e bens materiais. Assim, sua prestação repercute

economicamente dado que sua efetivação exige a realização de despesa pública e, portanto, é

limitado por questões de ordem orçamentária e financeira. Estes são objeto do presente

exame.

Os direitos fundamentais de defesa e de prestação diferem quanto sua

estrutura jurídico-normativa.

A regra geral determina que as normas definidoras de direitos e

garantias fundamentais tem aplicação imediata (art. 5°, parágrafo segundo, da CF\88).

Todavia, este preceito constitucional não tem condições de gerar plenos efeitos sem a

conjunção de vários fatores. Assim sendo, no âmbito dos direitos fundamentais encontramos

normas de conteúdo eminentemente programático.

Cumpre aos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário a atribuição

constitucional de garantir plena eficácia aos direitos fundamentais promovendo as condições

para concretizar tais direitos e garantias. No exercício desta competência constitucional

devem planejar, inserir nas suas leis orçamentárias (plano plurinanual, lei de diretrizes

orçamentárias e lei orçamentária anual) ações, projetos e programas sociais, com as

respectivas fontes de receita, as correlatas dotações orçamentárias para, por fim, bem executar

as políticas públicas voltadas aos direitos sociais.

3. A realidade brasileira.

A constituição de 1934 inaugurou a inserção dos direitos sociais no

constitucionalismo brasileiro e a constituição de 1988 fortaleceu estes direitos outorgando ao

Estado o poder de intervir da iniciativa privada como agente normativo e regulador com

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fundamento na prevalência do direito social e quando mediante situações caracterizadoras de

abuso do poder econômico. E, estipula que os princípios da liberdade de iniciativa e da livre

concorrência, típicas do regime capitalista, estão limitados pelo objetivo de promoção da

justiça social.

O nosso país, além de sofrer as mencionadas influências externas,

ainda, padece das incongruências internas.

O país retratado na Constituição Brasileira não é o Brasil. Muitas das

normas constitucionais positivadas não se concretizaram até agora e, por si só, o texto não

terá o condão de transformar nossa realidade.

Atualmente, o Brasil continua apresentando graves problemas de

desigualdades sociais. Existe uma legião de brasileiros miseráveis padecendo com a fome,

com o desemprego, com a falta de medicamentos, com a carência de atendimento médico-

hospitalar e com as deficiências educacionais. Estamos bem distantes das metas fixadas pela

Organização das Nações Unidas quanto aos índices de mortalidade infantil, embora estejamos

evoluindo positivamente como a maioria dos países.

A taxa de mortalidade infantil é um índice muito representativo por

refletir as carências estruturais que comprometem a sobrevida. O alto índice de mortalidade

infantil é um problema comum a muitos países, acirrado naqueles países em desenvolvimento

e nos subdesenvolvidos.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE acompanha a

evolução e o desempenho nacional, apontando para a redução dos índices de mortalidade

infantil no Brasil. No ano de 1998 atingimos o índice de 33,2 crianças mortas antes de

completar um ano para mil crianças nascidas vivas. Mesma fonte indica1 que no ano de 2008

este índice chegou a 23,3/1000. Entretanto, a meta fixada pela UNO corresponde a uma média

de óbitos infantis na proporção de 15 mortes para 1000 nascidas vivas.

1 http://www.ibge.gov.br/series_estatisticas/exibedados.php?idnivel=BR&idserie=POP324. Em 26/09/2010.

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O desatendimento ou o atendimento parcial dos direitos sociais

propicia sofrimento individual do cidadão desrespeitado e gera a sensação desamparo e

grande desgaste emocional dos integrantes da sociedade, com o compartilhamento do

sentimento de impotência e de insegurança coletiva cuja contabilidade financeira não

conseguiria traduzir em números. Este relevante custo, que não passível de expressão

numérica, deve ser sopesado.

A prestação insatisfatória dos direitos sociais por parte do Poder

Executivo, o desatendimento do direito à saúde, a assistência, a educação, a previdência

social, a segurança, ao meio ambiente sustentável tem provocado o acesso ao Poder

Judiciário, por intermédio de inúmeras, diversificadas e, por vezes, abusivas demandas

ajuizadas em busca da prestação jurisdicional dos direitos sociais. Tal meio empregado

resolve a lide e oferta solução ao conflito nos estreitos limites do processo julgado, atingindo

o interessado ou ao grupo de interessados postulantes; aliás, nem poderia ser de outra forma.

O magistrado garante a prestação jurisdicional em relações

específicas e em dimensões deveras restritas e, assim fazendo, não atende a questão social. O

administrador público, ao cumprir decisão judicial desta natureza, destina recursos e realiza

despesa pública em favor de solução pontual, de modo pessoal e casuístico.

Conclui-se, com segurança, que a prestação jurisdicional do direito

social não é a melhor via para seu atendimento, até por ser mais onerosa, pois, além do custo

da prestação do direito social agrega-se todo o custo da prestação jurisdicional.

O Poder Judiciário ao ordenar a prestação destes direitos

fundamentais responde a função jurisdicional; todavia, as funções finalísticas deste Poder

poderiam melhor servir a sociedade. Da mesma forma suas atribuições administrativas

também podem propiciar este atendimento. Atualmente, o Poder Judiciário contribui para a

justiça social pressionando e exigindo dos gestores públicos o atendimento àqueles que

postulam a prestação jurisdicional.

O Administrador Público ao cumprir decisão judicial deste jaez e

realizar a respectiva despesa pública responde, com exclusividade, pela execução do gasto

efetuado independentemente de previsão orçamentária, de suficiência de recurso financeiro,

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da apreciação da conveniência e da oportunidade, e, ainda, de modo alijado ao princípio da

economicidade, ou seja, a despeito do binômio custo-benefício. Desta maneira, o Estado tem

destinado volumosas receitas públicas para o atendimento de poucos enquanto muitos

padecem, dando margem à distribuição injusta dos recursos públicos e agravando a

desigualdade existente. Por outro lado, a busca da via judicial é justificada pela inoperância

das vias administrativas, em círculo vicioso e nefasto a resolução do problema e a efetiva

redução das desigualdades.

Desta forma os recursos públicos inicialmente alocados no orçamento

para programas ou projetos sociais são redirecionados para atendimento de casos específicos e

individuais em destinação alheia à visão do todo e de forma independente das políticas

públicas. Por conseqüência, a despesa pública realizada em cumprimento desse tipo de

decisão judicial deve ser contabilizada para atingir os percentuais constitucionais das

respectivas receitas públicas vinculadas, conforme o direito social material atendido.

A prestação dos direitos de primeira geração ou primeira dimensão,

em especial o direito a vida, pode dar margem e vazão à quebra de vários dogmas e

paradigmas jurídicos, tais como: a ordem dos precatórios judiciais, a impenhorabilidade dos

bens públicos, o seqüestro do dinheiro público e tantas outras inovações de cunho

jurisprudencial. Contudo, nenhuma dessas construções teóricas e mesmo práticas teve força

para melhorar nossa realidade de país em desenvolvimento com uma multidão de miseráveis

sem as mínimas condições de vida digna.

O enfrentamento das questões sociais exige visão e atuação ampla e

conjunta dos Poderes Estatais, em prol de vias menos onerosas e mais expeditas que otimizem

os resultados, abrangendo maior volume de beneficiados, para que o Estado possa fazer mais

com o mesmo volume de recursos públicos o que, certamente, seria mais profícuo para a

sociedade.

4. Os recursos públicos e suas limitações constitucionais, legais e fáticas.

Os direitos sociais prestacionais estão sujeitos a previsão

orçamentária e disponibilidade financeira, ou seja, sua concreção sujeita-se a reserva do

orçamento que representa um limitador inafastável.

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O jurista Ricardo Lobo Torres2 defende a necessidade de observância

da reserva do orçamento que limita, inclusive, ao Poder Judiciário que poderia compelir aos

demais Poderes a praticar os atos necessários ao ajuste orçamentário para garantir o mínimo

existencial. Acresce, com maestria, o doutrinador que a previsão orçamentária deve ser

somada a viabilidade financeira, como expõe nos seguintes termos:

No Brasil, portanto (a reserva do possível), passou a ser reserva fática, ou seja, a

possibilidade de adjudicação de direitos prestacionais se houver disponibilidade

financeira que pode compreender a existência de dinheiro somente no caixa do

Tesouro, ainda que destinado a outras dotações orçamentárias.

A afirmação transcrita prevê que a limitação da dotação orçamentária

ou de recursos financeiros não constituem óbices oponíveis a realização da despesa pública. E

o texto avança apresentando as seguintes justificativas:

Como o dinheiro público é inesgotável, pois o Estado sempre pode extrair mais

recursos da sociedade, segue-se que há permanentemente a possibilidade fática de

garantia de direitos, inclusive na via do seqüestro da renda pública!

Com todo o respeito que o nobre doutrinador faz por merecer é

possível discordar da afirmativa referente ao volume infinito dos recursos públicos seja

porque existem limitações constitucionais ao poder de tributar, seja porque há restrições

operacionais na arrecadação ou, ainda, porque existem várias despesas compromissadas em

virtude de contratos e/ou convênios, receitas vinculadas pelo texto constitucional, despesas de

pessoal, dívida pública e, ainda, as despesas correntes destinadas ao atendimento dos

interesses secundários de manutenção da máquina administrativa, indispensável à prestação

dos serviços públicos. i

Consigno, ainda, a divergência do entendimento de que as limitações

orçamentárias e financeiras não constituem óbices à realização da despesa pública por

compreender que esses são pressupostos inarredáveis a realização da receita e da despesa

públicas por força das normas que vinculam a gestão dos recursos públicos. O gestor público

tem a obrigação de obedecer aos princípios da legalidade, da prudência, do equilíbrio, da

economicidade, da impessoalidade, entre outros. Enfim, os recursos públicos são finitos e sua 2 TORRES, Ricardo Lobo. O direito ao mínimo existencial. Rio de Janeiro: Renovar, p.100, 2009.

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disponibilidade requer o atendimento dos ritos legais necessários à segurança e controle do

erário.

Neste sentido me louvo do pensamento desenvolvido pelo Procurador

do Estado do Rio de Janeiro Dr. Ricardo Amaral que esclarece, in verbis:

Nada que custe dinheiro pode ser absoluto. Nenhum direito cuja efetividade

pressupõe um gasto seletivo dos valores arrecadados dos contribuintes pode,

enfim, ser protegido de maneira unilateral pelo judiciário sem considerações às

conseqüências orçamentárias pelas quais, em última instância, os outros dois

poderes são responsáveis.3

Partindo da compreensão da limitação dos recursos públicos cumpre

eleger e definir as prioridades e critérios para sua alocação.

A prestação dos direitos sociais pode atender o caso individual

(objeto da demanda judicial) ou a situação global (objeto das políticas públicas). O segundo

modo é mais abrangente atingindo a coletividade, apresentando-se mais adequada aos fins que

se destina. A individualização da prestação gera vantagem pessoal e, acarreta a diminuição

dos recursos que seriam destinados a muitos, prejudicando a universalidade peculiar a

prestação destes direitos. O planejamento destinado a otimizar a execução e a atingir ao maior

número de beneficiados, com a redução das desigualdades, em busca do tratamento isonômico

dos administrados pode assegurar solução mais eficiente e justa.

A obrigação de redução das desigualdades sociais é imposta ao

Estado, a sociedade e o mercado abrangendo a atividade financeira, em geral, seja estatal ou

privada, ambas, devem fomentar o desenvolvimento econômico e social. A redução das

desigualdades no mercado implica eliminação da pobreza com a distribuição eqüitativa da

riqueza produzida, como bem destaca Alexandrino4.

No âmbito privado a restrição da liberdade de iniciativa econômica,

com o escopo de garantir o atendimento dos ditames da justiça social, encontra amparo no 3 AMARAL, Gustavo. Direto Escassez & Escolha - Critérios jurídicos para lidar com a escassez de recursos e as decisões trágicas. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2° edição, p. 42, 2010. 4ALEXANDRINO, Marcelo et al..Direito constitucional descomplicado, São Paulo: Método, 4° Edição, p. 933, 2009.

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disposto no inciso VII, do artigo 170 da CF/885. Desta forma, a economia privada encontra-se

limitada pelos princípios constitucionais norteadores da ordem econômica e financeira,

previstos no artigo 170 da CF\88; o que não se verifica na prática. Ademais, o Estado não

exige tal atendimento embora pudesse, excepcionalmente, fazê-lo por via da intervenção

estatal no domínio econômico para reprimir o abuso do poder econômico que resulte ou possa

resultar a dominação dos mercados, a eliminação da concorrência ou o aumento arbitrário do

lucro (art. 173, parágrafo 4°, da CF\88).

Melhor sorte não se vislumbra no setor público, no denominado

Estado Social Fiscal, onde a gestão da atividade financeira estatal exige que o manejo dos

recursos públicos fomente o desenvolvimento econômico-social, o que na prática não tem se

mostrado satisfatório.

5. O desenvolvimento econômico-social

O desenvolvimento econômico-social é objeto de diversas definições

que variam conforme o enfoque abordado. Considerando que essa celeuma não contribuiria

para o enfrentamento do tema proposto não se adentrará no exame. No entanto, cumpre

reportar o conceito de economia definida como sendo a ciência do abastecimento que trata da

arte da aquisição, consoante Aristóteles. A definição clássica de economia foi traçada por

Robbins, segundo RAMOS6, ao explicar que se trata da ciência que estuda o comportamento

humano como um relacionamento entre fins e meios escassos que tem usos alternativos.

Assim, a economia está imbricada com a sociedade, pois, se trata de ciência social voltada a

gestão de recursos limitados.

Tratar de recursos limitados para fazer frente a necessidades

ilimitadas é versar sobre econômica, em especial, sobre a microeconomia que se dedica às

limitações e se propõe a retirar o máximo de proveito dos recursos escassos7.

5 O Supremo Tribunal Federal exarou elucidativo julgamento que tratou das limitações constitucionais da atividade econômica em favor da justiça social. Adin n° 319. Rel. Min. Moreira Alves. D.J. 10.03.1993. 6 RAMOS, José Maria Rodriguez. Lionel Robbins: Contribuição para a metodologia da economia. São Paulo: Editora USP, – Econ 4, pág. 161, 1993. 7 PINDYCK, Robert S. et al. Microeconomia, tradução Eleutério Prado e Thelma Guimarães, São Paulo: Person – Prentice Hall, sexta edição, p. 4,2005.

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Considerando ser a economia a “ciência da escassez” na esteira do

pensamento de Clarissa Ferreira Macedo D`Isep8 comungo do entendimento de serem as

finanças públicas entranhadas da ciência econômica que cuida da produção, circulação e

distribuição de bens e serviços e como tal indissociável do exame da prestação dos direitos

sociais.

Não há como praticar a justiça social sem abordar a questão da

alocação dos recursos públicos já que muitas são as teorias que se revelam sucessivas cartas

de intenções sem expressão fática. A singela noção geral da economia, com foco no binômio:

limitação de recursos e necessidades ilimitadas, é pressuposto para a boa gestão dos recursos

públicos em prol do desenvolvimento da economia, com enfoque na sociedade.

O desenvolvimento econômico-social é aqui considerado como sendo

o crescimento econômico qualificado pelo propósito de redução das desigualdades e dos

níveis de segregação social. Tal finalidade está contemplada na Constituição Federal onde a

República Federativa do Brasil erigiu como princípio fundamental a dignidade da pessoa

humana e, dentre seus objetivos fundamentais, a erradicação da pobreza e da marginalização e

a redução das desigualdades sociais e regionais.

A forma de promover a redução das desigualdades via crescimento

econômico também é controversa. O economista Priest defende que o crescimento econômico

consiste no crescimento do valor econômico dos recursos, inclusive dos recursos humanos e

sustenta que o crescimento é maximizado quando o cidadão tem oportunidades de melhor

contribuir na economia, aumentando sua capacidade de geração de renda.9 A presente

proposta propugna pela promoção da redução da desigualdade, em cada etapa da gestão das

finanças públicas para que, conjuntamente, seja assegurado o mínimo para a existência digna

e a capacitação do cidadão para inseri-lo no processo econômico.

6. A administração das finanças públicas

8 D`ISEP, Clarissa Ferreira Macedo. Direito Ambiental e Econômico e a ISSO 14000. São Paulo: editora Revista dos Tribunais, 2005. 9 PRIEST, George L. Pobreza, desigualdade e crescimento econômico: princípios básicos. Belo Horizonte:Revista de Direito Público da Economia, RDPE, vol. 08,abril/junho, p. 139/151, 2010.

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No final da época do feudalismo e na fase do Estado Patrimonial e

Absolutista surge a necessidade de periódica autorização para lançar tributos e efetuar gastos

(Inglaterra CM 1215/França, Espanha, Portugal). Com o Liberalismo e as grandes revoluções

constitui-se o Estado Orçamentário, caracterizado pelo incremento das receitas e despesas

públicas e pela constitucionalização do orçamento, tal como na França, nos EUA e no Brasil

(constituição de 1824, art. 172). Assim, o denominado Estado Orçamentário adveio com o

Estado Moderno.

Atualmente, as normas constitucionais financeiras compreendem três

grandes grupos: normas orçamentárias, normas financeiras e normas monetárias. As normas

orçamentárias, por sua vez, estão formalmente subdivididas em quatro tópicos, quais sejam:

os orçamentos (arts. 165 a 169 CF\88), as normas de execução orçamentária (arts. 70 a 75

CF\88), o orçamento e o Poder Judiciário (art. 99 CF\88) e, por fim, a fiscalização dos

Municípios (art.31 CF\88).

O Estado Orçamentário é uma dimensão do Estado Democrático de

Direito alicerçado, principalmente, nas receitas de natureza tributária que são a principal fonte

de recursos públicos. Ele fixa no orçamento as receitas tributárias e patrimoniais que farão

frente às despesas públicas.

A atividade financeira estatal abrange a capacidade arrecadatória, a

gestão da receita pública, a administração e conservação do patrimônio público e o gasto

público, ou seja, a aplicação dos recursos públicos em prol das finalidades legais. E todas

estas fases da atividade financeira devem ser desenvolvidas de modo a promover o bem

comum.

As metas prioritárias devem ser voltadas ao atendimento dos direitos

fundamentais e sua restrição somente se justifica caso atendido o mínimo assecuratório da

dignidade da pessoa humana. O gestor público deve buscar a visão global observando o

princípio da impessoalidade e assegurando o tratamento isonômico dos administrados,

alinhado às diretrizes de redução das desigualdades. As metas dirigidas a atender mais e

melhor aos mais carentes, garantindo-lhes o mínimo indispensável à vida digna, devem pautar

os atos peculiares à gestão financeira.

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O fortalecimento dos direitos sociais, positivados na Constituição

Federal de 1988, impôs aos entes públicos deveres estatais, cujo atendimento importa

acréscimo de despesa pública; todavia, a Carta Magna nada propôs quanto ao incremento das

receitas públicas para fazer frente às inovadoras despesas. Assim sendo, cumpre ao gestor a

árdua tarefa de bem gerir as receitas públicas para prestar os direitos sociais não excedendo as

verbas públicas disponíveis e mantendo o equilíbrio entre as receitas e despesas públicas.

As políticas públicas sociais traçam as diretrizes contidas nas

propostas orçamentárias que geram as respectivas leis que prevêem as receitas e fixam as

despesas públicas necessárias a realização dos deveres estatais sociais.

6.1. As leis orçamentárias – O planejamento a longo, médio e curto prazo da gestão dos

recursos públicos.

As normas gerais que disciplinam as finanças públicas são objeto da

Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar n° 101\2000), exaradas pela União, no

exercício de sua competência legislativa concorrente, subsistindo a competência suplementar

aos Estados da Federação.

A questão da natureza da lei orçamentária é controversa e existem

três principais correntes doutrinárias que defendem posições distintas.

A teoria da natureza formal do orçamento sustenta que a lei

orçamentária não estabelece direitos subjetivos, tipificando-se como lei formal que prevê

receitas e autoriza gastos, sem criar ou modificar direitos subjetivos, consistindo mera

autorização do parlamento para prática de atos administrativos.

A teoria da natureza material do orçamento, por sua vez, compreende

que a lei orçamentária tem natureza material criadora de diretos. Originária da Itália esta

teoria defende ser o orçamento um instrumento jurídico para atuação administrativa.

Por fim, mas não menos relevante, a terceira corrente parte da

concepção de que a lei orçamentária não é lei material ou formal é lei sui generis.

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Duguit segundo CAMPOS10 assevera que a lei orçamentária é ato

administrativo na despesa e lei quanto a receita e nesta linha toma o orçamento como ato-

condição quanto a despesa e lei material quanto a autorização de cobrança de tributos.

A doutrina majoritária conclui que o orçamento é lei somente do

ponto de vista formal, pois, tem natureza de ato-condição por se circunscrever a autorizar a

realização de despesa e prescrever o montante da receita sem criar diretos subjetivos.

As leis orçamentárias anuais são deveras peculiares. Considero

adequada a posição que enquadra a LOA como lei em sentido material por possuir caráter de

generalidade e abstração. Trata-se de lei geral por alcançar uma série ou classe de pessoas e

abstrata por se repetir sem exaurimento. Dito em outras palavras, as leis orçamentárias anuais

contem a previsão legal da denominada ação-tipo e a cada ocorrência fática do tipo legal

opera-se a subsunção e concretiza-se a hipótese da incidência da norma, sem esgotar o seu

conteúdo. A aplicação da norma ao evento típico se repete tantas e quantas vezes o fato

ocorrer.

.

A luz desta compreensão sustenta-se que o diploma orçamentário

inova no mundo jurídico ao produzir efeitos na realidade, criando, transformando direitos ou

obrigações, ou seja, ele intervém na realidade à medida que contém carga de eficácia.

O STF ao examinar a natureza da lei orçamentária concluiu que ela é

passível de controle de constitucionalidade por tratar-se de norma típica com caráter geral e

abstrato. A lei de diretrizes orçamentárias, contrariamente, caracteriza-se como uma típica

norma concreta, ou seja, uma lei que prevê uma ação historicamente determinada.

O orçamento público, ou lei de meios, é um instrumento juspolítico

que contém as diretrizes e as decisões oriundas das políticas públicas cumprindo função

jurídico-normativa. E a medida que especifica os valores pecuniários das tarefas que a

sociedade incumbiu ao Estado reflete a democracia substantiva.

10 CAMPOS, Marco Aurélio Morais at al..Transparência dos gastos federais: o controle externo sobre os recursos aplicado por meio de suprimento defundos. http://portal2.tcu.gov.br/portal/pls/portal/docs/1190777. PDF. acesso em 15/09/2010.

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O poder estatal de gerir os recursos públicos é limitado formalmente

e materialmente pelas normas constitucionais e leis orçamentárias.

A constituição de 1988 tornou o processo de elaboração da norma

orçamentária mais democrática ao ampliar a participação do legislativo e facultando a

apresentação de emendas parlamentares às leis orçamentárias. Entretanto, o poder de

iniciativa do processo de formação das leis é exclusivo do Poder Executivo que, em regra,

recebe as propostas do Poder Legislativo, Judiciário, Ministério Público, Procuradoria-Geral

do Estado, Defensoria Pública e as compila. Nesta fase cumpre sejam realizadas audiências

públicas para que haja ampla participação popular de modo a legitimar as escolhas e as

decisões a serem consignadas na proposta legislativa elaborada o que, atualmente e em regra,

não ocorre.

O Poder Legislativo detém o poder de emendar os projetos de lei

orçamentária exercendo prerrogativa de ordem político-jurídica, inerente ao exercício da

atividade legislativa. Os membros desse Poder podem apresentar emendas parlamentares que

não importem em aumento da despesa, propor relocação de recursos e apresentar supressões,

de modo a priorizar os projetos sociais participando ativamente da elaboração da lei, desde

que a emenda apresentada guarde afinidade lógica (relação de pertinência) com a proposição

original e que emendas observem as restrições fixadas no art. 166, §§ 3º e 4º da Carta

Política.11

O Chefe do Poder Executivo pode vetar eventuais emendas

legislativas reaproveitando as possíveis receitas disponíveis em decorrência do veto para

outras finalidades, como créditos especiais ou suplementares, desde que com prévia

autorização legislativa. Neste caso cumpre sejam acompanhadas as justificativas de veto e a

respectiva destinação a ser conferida aos recursos decorrentes da emenda vetada, tudo em

vigilante controle social.

A lei de diretrizes orçamentárias estabelece as metas, elege as

prioridades e as despesas de capital para o próximo exercício financeiro fixando as

11RTJ 36/382,385. RTJ 37/113. RDA 102/261.ADI 865/MA, Rel. Min. Celso de Mello. ADI 1.050-MC, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 23/04/04.

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orientações para a elaboração da lei orçamentária anual que se divide em três orçamentos: o

fiscal, o de investimento das estatais e o de seguridade social.

As leis orçamentárias tendem a tecnoburocratização, dado o emprego

de terminologia própria e peculiar; assim, sua interpretação exige conhecimentos gerais de

contabilidade pública, de administração e de econômica. Em regra, a compreensão das leis

orçamentárias é acessível apenas aos iniciados, como bem expressa Ana Amorim Valente12.

Entretanto, a linguagem utilizada nestes diplomas legais pode ser aclarada para facilitar o

conhecimento da sociedade, transparecendo a destinação dos recursos públicos, permitindo

maior participação e engajamento popular nesse processo, em prol da promoção da justiça

social.

O orçamento possibilita o controle da atividade financeira pública, na

medida em que estabelece como serão gerenciados os recursos públicos e, desempenha

funções políticas e econômicas. O orçamento é político por conter a tradução numérica das

políticas públicas viabilizando seu controle, inclusive político a ser exercido pelo parlamento

que julga as contas dos administradores. A função econômica do orçamento decorre de seu

objeto, qual seja: a dotação13 dos recursos financeiros, perfeitamente identificados e

quantificados, mantido o equilíbrio entre receita e despesa.

As prioridades sociais, os programas, os projetos e as atividades

devem ser contemplados no orçamento de modo a atender aos interesses sociais da maioria;

tudo de maneira democrática.

Os princípios orçamentários tem por propósito reforçar a utilização

do orçamento como instrumento de controle parlamentar e servem para orientar a elaboração,

aprovação e execução do orçamento.

O princípio da exclusividade, previsto no artigo 165, parágrafo 8°, da

CF\88, estabelece limites ao conteúdo programático que deve ser restringir a receita e despesa

12 VALENTE, Ana Paola de Morais Amorim, Transparência e opacidade do SIAFI no acesso à informação orçamentária. Belo Horizonte.p. 153,2010. 13 Dotação em sentido amplo é o recurso fixado no orçamento para atender às necessidades de determinado

órgão, fundo ou despesa.conforme define Hely Lopes Meireles, Finanças municipais, p. 183.

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consignadas.A exceção reside nos casos de autorização para abertura de crédito suplementar e

contratação de operação de crédito quando a lei poderá conter dispositivos de outra natureza.

O princípio da programação orçamentária refere-se ao orçamento

como elemento da estrutura de planejamento. Os objetivos (especificação dos bens ou

serviços com os quais as entidades públicas pretendem satisfazer as necessidades públicas,

assim atingindo as metas estabelecidas) são vinculados aos meios que devem consistir em

instrumentos suficientemente hábeis para atingir os objetivos sociais eleitos. O programa de

trabalho social consiste no conjunto de projetos e atividades a serem executados por uma

unidade orçamentária ou órgão, em determinado exercício financeiro.

O Princípio do equilíbrio orçamentário14 exige que a peça

orçamentária e sua execução primem pelo equilíbrio entre as receitas e despesas públicas.

Trata-se de relevante princípio contemplado desde a CF/67, tendo sido retirado pela emenda

constitucional de 69 que permitia o desequilíbrio; mas, limitava o endividamento. Este

princípio fundamenta a vedação das operações de crédito que excedam as despesas de capital

visando, desta maneira, limitar os investimentos e operações de capital.

A lei orçamentária tem sua vigência marcada no tempo em virtude do

princípio da anualidade ou periodicidade que estabelece um período de tempo orçamentário15.

O.princípio da unidade orçamentária coíbe a elaboração de mais de

um orçamento no âmbito de cada ente público federado e impõe que todas as contas

orçamentárias (receitas e despesas) constem em um único documento, de um único caixa. E, o

princípio da universalidade preconiza que todas despesas e receitas constem no orçamento

14 A constituição Federal estabelece no art. 167 que são vedadas a realização de despesas ou a assunção de obrigações diretas que excedam os créditos orçamentários ou adicionai. E regulamentando a transição no artigo 37 do ADCT dispõe que o déficit excedente às despesas de capital que configure despesas de manutenção –operacionais, deve ser reduzido em 05 anos, na base mínima de 1/5 por ano. Assim, no momento atual, o déficit público deve estar zerado, sendo exigível o equilíbrio por ter passado a fase de transição. Acresça-se que a Lei de responsabilidade fiscal no art. 1°, parágrafo primeiro, veio a reforçar este princípio constitucional. 15 A CF\88, no art. 166, III determina que a vigência do orçamento fica limitada a um ano (orçamento anual). O Dec. 200/67 já fixava tal periodicidade e a Lei Federal n° 4.320/67 estabelece que no âmbito público o exercício financeiro coincidirá com o ano civil. Significando dizer que o orçamento brasileiro terá vigência de 1° de janeiro até 31 de dezembro.

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pelos seus totais. Ambos possibilitam a visão total da gestão dos recursos no ano financeiro,

de modo a permitir sejam vislumbradas todas as ações voltadas à redução das desigualdades.16

O princípio da legalidade é próprio do Estado de Direito e foi

reafirmado no artigo 165 da CF que exige legislação para o plano plurianual, a lei de

diretrizes orçamentárias e a lei orçamentária anual e determina que toda e qualquer despesa

deve estar escudada em prévia previsão legal autorizativa. Desde forma viabilizando a

discussão parlamentar de toda a gestão financeira.

O principio da transparência fiscal é consabidamente mais amplo que

o princípio da publicidade e, portanto, melhor adequado às exigências da efetividade.

Enquanto o atendimento da publicidade se satisfaz mediante mera publicação, a observância

da transparência fiscal exige seja disponibilizado amplo conhecimento dos motivos e das

finalidades dos atos fiscais, possibilitando seu efetivo controle. E, para assegurar o

conhecimento do ato pelo administrado é necessário mais do que a mera publicação formal,

ou seja, é preciso que se viabilize, ao leigo, a plena compreensão dos motivos e fundamentos

do ato.

Tal princípio agregou valores ao princípio da publicidade, somando

conteúdo à forma, emprestando eficiência à eficácia. Assim, a Constituição Federal introduziu

um novo princípio, também expressamente contemplado na lei de responsabilidade fiscal.17

16 O Art.165, parágrafo 5° respalda a universalidade ao reunir os orçamentos e proceder uma interligação com os mesmos por intermédio do PPA. A Lei n° 4320/67, artigo 2° dispõe que a lei do orçamento conterá a

discriminação da receita e da despesa, de forma a evidenciar a política econômico – financeira.

17 Art. 48 da LRF dispõe sobre os instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos. Parágrafo único. A transparência será assegurada também mediante incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração e de discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos. Art. 49. As contas apresentadas pelo Chefe do Poder Executivo ficarão disponíveis, durante todo o exercício, no

respectivo Poder Legislativo e no órgão técnico responsável pela sua elaboração, para consulta e apreciação

pelos cidadãos e instituições da sociedade.

Parágrafo único. A prestação de contas da União conterá demonstrativos do Tesouro Nacional e das agências

financeiras oficiais de fomento, incluído o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social,

especificando os empréstimos e financiamentos concedidos com recursos oriundos dos orçamentos fiscal e da

seguridade social e, no caso das agências financeiras,avaliação circunstanciada do impacto fiscal de suas

atividades no exercício.

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A lei orçamentária possui peculiaridades em seu processo legislativo

dado o prazo peremptório para encaminhamento da proposta legislativa do executivo ao

legislativo (art. 35, parágrafo 2°, do ADCT) e garantias de controle prévio legislativo, uma

vez que não pode ser objeto de lei delegada (art. 68, par.1 inc. III, da CF\88). A iniciativa

exclusiva compete ao Poder Executivo (art. 84, XXIII, da CF\88); porém, a respectiva matéria

é limitada em seu mérito (art. 167 da CF\88). Em contrapartida, a constituição garante a

autonomia do Executivo ao limitar o poder de emendas parlamentares (art. 166, parágrafo 3°,

da CF\88) e ao impor responsabilidade em caso de descumprimento (art. 85, VI, da CF).

O ciclo das leis orçamentárias começa com o Plano Plurianual que

prevê programas de duração continuada com diretrizes programáticas das políticas de governo

para um período de 04 (quatro) anos.

O chefe do executivo tem o dever de encaminhar à assembléia

legislativa, no prazo de, até 04 meses antes do encerramento do primeiro exercício financeiro

do mandato, na data limite de 31 de agosto, a proposta legislativa do PPA que deve ser

devolvido ao Poder Executivo até o encerramento da sessão legislativa (dia 05 de dezembro).

O PPA começa a viger no início do segundo ano de mandato do

Chefe do Executivo e perdura até o final do primeiro ano do mandato subseqüente. Assim, no

primeiro ano da gestão o Chefe do Executivo Federal, Estadual ou Municipal executa o PPA,

cuja proposta foi gerada pelo administrador anterior e, a partir de então, no segundo ano o

administrador estará a cumprir o PPA originário de sua proposta legislativa. Desta forma esta

lei propicia a continuidade da administração pública uma vez que sua execução perdura entre

diferentes ordenadores.

O Plano Plurianual tem por finalidade traçar as diretrizes, os

objetivos e as metas da administração pública, de modo regionalizado contendo os programas

de duração continuada e despesas de capital (investimentos, inversões financeiras e

transferência). Caracteriza-se como instrumento técnico de planejamento que orienta os

demais planos e programas de governo e orçamentos subseqüentes e serve para retratar os

objetivos constantes do plano de governo, podendo ser ajustado e revisado, anualmente.

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A característica regionalizada do plano plurianual serve para

demonstrar os programas de longo prazo para redução das desigualdades regionais, as

medidas a serem executadas para propiciar o nivelamento das regiões e os índices adotados

para avaliar e medir a diminuição do nível de disparidade.

O investimento público cuja execução ultrapasse o exercício

financeiro só pode ser executado se previamente incluído no PPA. Assim, as grandes ações

dos três Poderes do Estado devem estar contidas neste planejamento de longo prazo; o qual

deve ser amplamente debatido pela sociedade.

As normas definitivas da elaboração e organização do PPA deveriam

estar regradas em lei complementar conforme previsão do art.165, parágrafo. 9°, inc. I, da

CF\88. Na ausência desta aplica-se o art. 35, parágrafo 2°, inciso I do ADCT aos Estados e

Municípios, embora esse dispositivo refira, expressamente, o mandato presidencial; mas, por

simetria é estendido aos demais entes públicos da Federação.

A lei de diretrizes orçamentárias foi introduzida na Constituição

Federal (art. 165, parágrafo 2°, CF/88) servindo como instrumento de planejamento à médio

prazo e como tal deve fixar metas e prioridades da administração pública (incluindo as

despesas de capital) para o exercício financeiro subseqüente, estabelecendo os ditames para

elaboração da lei orçamentária anual. Tal diploma legal deve especificar as políticas sociais a

serem executadas no ano porvir, dispondo, inclusive, sobre eventuais alterações na legislação

tributária, além de estabelecer as políticas de aplicação das agências oficiais de fomento.

A LDO garantirá o equilíbrio orçamentário de modo que a

programação das despesas estime o correlato suporte financeiro, estipulará os critérios e

formas de limitação de empenho e conterá ferramentas de gestão que possibilitarão a

fiscalização da gestão via controle de custos e avaliação dos resultados dos programas sociais.

Ela estabelece as condições e exigências para transferências de recursos a entidades públicas e

privadas, no que deve ser regiamente fiscalizada para assegurar sejam destinatárias aquelas

que efetivamente tenham fins sociais.

O Poder Judiciário, o Legislativo, o Tribunal de Contas, o Ministério

Público, a Procuradoria e a Defensoria no exercício de sua autonomia orgânico-administrativa

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e financeira encaminham suas propostas orçamentárias ao Poder Executivo obedecidos os

limites fixados na LDO. Os anexos da lei de diretrizes orçamentárias contém dados de

relevância para o desenvolvimento da gestão financeira, tais como o Anexo de Metas Fiscais

(LFR, § 1°, do art. 4°) que trata das metas anuais, em valores correntes e constantes, relativas

a receitas, despesas, resultados nominal e primário e montante da dívida pública, para o

exercício a que se referirem e para os dois seguintes.

O planejamento de curto prazo consta no orçamento anual, o qual é

composto por três espécies por três orçamentos e compreenderá (art. 165, § 5º, CF\88): o

orçamento fiscal referente aos Poderes da União, seus fundos, órgãos e entidades da

administração direta e indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público.

O orçamento de investimento das empresas em que a União, direta ou indiretamente, detenha

a maioria do capital social com direito a voto e, por fim, o orçamento da seguridade social,

abrangendo todas as entidades e órgãos a ela vinculados, da administração direta ou indireta;

bem como, os fundos e fundações instituídos e mantidos pelo Poder Público (art. 165, § 5º,

CF\88).

6.2. As receitas públicas vinculadas – a expressão material da priorização constitucional

dos direitos sociais.

As receitas vinculadas visam assegurar a destinação de recursos

públicos aos serviços públicos eleitos como prioritários (art. 167, inc. IV, da CF\88).

A regra é a proibição de vinculação de receita de impostos a órgão,

fundo ou despesa; todavia, existem receitas que são vinculadas a determinados objetivos.

Destacam-se: a repartição das receitas tributárias, também denominada repartição do

produto da arrecadação dos impostos (arts. 158 e 159); os recursos para as ações e serviços

públicos de saúde (art. 198), os recursos para manutenção e desenvolvimento do ensino (§

2º, art 212), os recursos para realização de atividades da administração tributária (art 37,

XXII), os recursos para a prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de

receita (art. 165, § 8º), os recursos de receitas próprias geradas pelos impostos a que se

referem os artigos 155 e 156 , e dos recursos de que tratam os artigos 157, 158, 159, I, a e b,

e II , para prestação de garantia ou contragarantia à União e para pagamentos de débitos para

com esta (§ 4º, artigo 167), todos os dispositivos citados são constitucionais.

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Estas vinculações constitucionais obrigatórias de receita pública

constituem exceções ao princípio constitucional da não afetação da receita e restringem a

atividade financeira do Poder Público.

Os direitos sociais prioritários são contemplados com receitas

vinculadas na Constituição Federal, como forma de assegurar o mínimo de destinação de

recursos públicos para a manutenção e desenvolvimento do ensino, para as ações e serviços da

saúde, para o ensino estadual superior e para o amparo à pesquisa.

A constituição federal estabelece critério numérico correspondente ao

percentual da receita corrente líquida. A esse critério objetivo devem ser agregados outros

elementos inclusive de natureza subjetiva, tudo para que possamos avaliar os aspectos

substanciais do dispêndio e com isto aquilatar a qualidade do gasto público.

Não basta garantir o volume de gasto fixado no texto constitucional é

preciso que seja agregada a esta análise numérico-formal da despesa a avaliação de

efetividade do gasto, ou seja, se o emprego dos recursos logrou o êxito atingindo o fim

proposto e, principalmente, se foi efetivamente beneficiado seu destinatário.

A vinculação da receita tem o objetivo de assegurar a melhoria da

respectiva prestação do direito social e seu atendimento passa pela avaliação do bom emprego

dos recursos públicos, desde a efetividade da arrecadação, pois, o processo começa pela

receita pública.

As despesas decorrentes das receitas vinculadas não são passíveis de

contingenciamento. Tal vinculação tem por objetivo assegurar o emprego dos recursos

mínimos para o financiamento das ações e serviços públicos primordiais. As leis

orçamentárias devem observar e atender estas prioridades, de modo a reservar os meios

suficientes ao atendimento privilegiado por estas vinculações.

O Programa orçamentário é um conjunto organizado de atividades

que objetivam a realização de uma meta ou prioridade governamental. Na seara do direito

financeiro o termo programa possui duas acepções.

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No âmbito orçamentário, programa é a categoria de programação

orçamentária apropriada para fazer a ligação entre os planos de médio e longo prazo e os

orçamentos anuais. Representa o segundo nível de detalhamento das funções na

classificação funcional programática, utilizada nos orçamentos públicos, destinado a

expressar a magnitude de uma ação, e busca consolidar ações e iniciativas de mesma

natureza, em regra, se divide em subprogramas. A análise da despesa consolidada por

programas permite que se verifiquem as prioridades do Governo.

De outra parte, a luz do planejamento, programa é uma categoria de

estruturação racional de ações planejadas. O artigo 2°, da lei n°. 4320/64 ao definir o

orçamento dispõe que a lei orçamentária conterá a discriminação da receita e despesa de

forma a evidenciar a política econômico-financeira e o programa de trabalho do governo,

obedecidos os princípios da unidade, universalidade e anualidade. Tal conceito legal é

compatível com o orçamento-programa que se caracteriza por conter o programa de

operações de governo e os meios de financiamento deste programa.

As decisões democráticas, expostas nos orçamentos, devem ser

cumpridas pelo administrador na sua forma e fundo e devem responder pela adequada

execução orçamentária: formalmente pela adequação a lei e materialmente pelo respeito aos

objetivos nela contidos.

O orçamento, que dantes era denominado peça de ficção, hoje é visto

como um programa de governo, o qual demonstra a elaboração financeira e a orientação

governamental, do que decorre seu caráter de político.

6.3. A execução orçamentária participativa – a participação popular como elemento

legitimador da gestão financeira.

A execução orçamentária permite que se verifique a adequação das

leis orçamentárias. Quando há excesso de contingenciamento conclui-se que a receita foi

superestimada e quando são abertos sucessivos créditos adicionais geralmente houve uma

estimativa modesta da receita a ser auferida.

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A adoção da política econômico-fiscal distributiva que propicie a

justiça social pode agregar aos tributos a finalidade extrafiscal de redução da desigualdade por

intermédio da aplicação de alíquotas diferenciadas, mormente nos tributos incidentes sobre o

consumo, a renda ou o patrimônio. Desta forma a própria exação servirá para intervir na

ordem econômica via redução ou majoração de alíquota, isenções ou aplicação de crédito

presumido. Ressalta-se que os benefícios de natureza financeira ou de crédito deverão ser

projetados para que seja averiguado o efetivo reflexo no volume da receita pública e, acima de

tudo, deve haver firme atrelamento da receita à despesa, tudo para assegurar a aplicação legal

do recurso arrecadado.

A boa gestão dos recursos públicos parte da efetividade da

arrecadação, pois, o processo começa pela obtenção da integralidade da receita pública

devida. Assim, é indispensável o acompanhamento de todas as fases da arrecadação, desde a

fixação orçamentária, o rito, as ações fiscais administrativas, as autuações, o processo

administrativo tributário, o volume de pagamento voluntário e a efetividade da cobrança

administrativa e judicial do crédito público. A composição de toda a formação da receita

pública deve ser transparecida, porque o volume, o fluxo, as formas de arrecadação, o custo

da máquina arrecadatória – da administração tributária, sua efetividade, são elementos a

serem ponderados para que se possa avaliar a gestão da receita pública.

Impõe-se amplo e claro debate dos critérios e objetivos da

desoneração fiscal, com imposição de rigorosos procedimentos, sujeitos de modo vinculado à

ampla discussão pública antes das desonerações fiscais, das concessões de benefícios e

vantagens e mesmo, anteriormente, a implantação dos programas de parcelamento.

A escolha das despesas públicas, da mesma forma, deve ser

legitimada pela participação popular desde a elaboração até a execução orçamentária. É

preciso verificar o nível de atendimento às necessidades sociais da maioria, averiguar se o

meio empregado é o mais econômico e eficaz para obter o fim desejado, se foram estudadas

outras vias, quais foram os critérios sopesados para embasar a decisão do gasto, quais as

projeções de custo e quantos seriam os efetivos beneficiados. A análise adequar-se-á as

características culturais do local, observadas as prioridades eleitas pela população destinatária.

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Darcy Ribeiro dos Santos18 analisando as finanças públicas gaúchas

no ano de 2004 concluiu que do total da receita corrente arrecadada 80,3% correspondia a

receita corrente líquida (aquela disponível após a repartição das receitas tributárias). O autor

ainda informa que do total da receita corrente liquida vinculada (equivalente a 56%) não foi

totalmente atendida naquele exercício financeiro e conclui que o ERGS aplicou 49,6%

deixando de aplicar o equivalente a 9% da receita corrente líquida vinculada. O economista

avalia que tal situação decorreu do desequilíbrio orçamentário ocasionado pela excessiva

vinculação de receitas, pela higidez da despesa pública e, ainda, em virtude das desonerações

fiscais. Outros Estados da Federação também não conseguiram assegurar o mínimo de

recursos públicos para as áreas prioritárias.

A evolução das finanças públicas, por intermédio do esforço dos

gestores e agentes públicos, garantirá a efetiva participação e controle social servindo a

promoção da Justiça Social.

Transformar a realidade brasileira com a redução das desigualdades

sociais, a eliminação da segregação social e econômica é uma tarefa hercúlia, mas,

indispensável para que possamos buscar um mundo melhor.

Os Procuradores dos Estados devem unir as forças em prol da

transformação dos Estados da Federação atuando junto aos Poderes Legislativo, Executivo e

Judiciário com propósito de garantir a melhor distribuição dos direitos sociais, do bem-estar,

do desenvolvimento econômico-social e da igualdade, tudo para a efetiva concreção dos

propósitos do Estado Democrático de Direito.

18 SANTOS, Darcy Francisco Carvalho dos. A crise das finanças estaduais: causas e alternativas. Uma contribuição para o debate. Porto Alegre: Editora Age Ltda., p.50, 2006..

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7.Conclusão

1°. O Estado no desempenho da atividade orçamentária e financeira

deve propiciar ampla participação popular na elaboração das leis orçamentárias, no processo

legislativo, na execução orçamentária, na gestão da receita pública e na análise prévia do

gasto público, como forma de conferir maior legitimidade à administração pública

orçamentária e financeira e servir como instrumento promotor do desenvolvimento

econômico-social, tudo para a efetiva concreção dos propósitos do Estado Democrático de

Direito.