Upload
others
View
1
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
Teste das Fábulas: Um Estudo com Crianças Abrigadas
Adriana Jung Serafini
Dissertação apresentada como exigência
parcial para obtenção do Grau de Mestrado em Psicologia
sob orientação da Profa. Dra. Denise Ruschel Bandeira
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Instituto de Psicologia
Curso de Pós-Graduação em Psicologia do Desenvolvimento
Fevereiro de 2004
2
Agradecimentos
Muitas pessoas foram importantes durante o desenvolvimento desta pesquisa por
abraçarem este projeto e contribuírem do seu modo para que ele se tornasse realidade. À
todas essas pessoas meu sinceros agradecimentos.
À Profa. Dra. Denise Ruschel Bandeira pela orientação e dedicação ao longo de
todo o mestrado, o que tornou possível a realização desta pesquisa.
Às professoras Dra. Rita de Cássia Sobreira Lopes, Dra. Blanca Werlang, Dra.
Viviane de Oliveira e Dra. Jurema Cunha (in memorian) pela leitura e contribuições
valiosas apresentadas desde o momento do desenvolvimento do projeto desta pesquisa.
Aos meus pais por sempre serem meus maiores incentivadores, e pelo apoio
durante toda minha trajetória acadêmica.
Ao meu irmão André pela amizade e, em especial, pelo auxílio na informática.
Ao Fábio pelo incentivo, companheirismo e por escutar minhas angústias durante
todo o processo de elaboração deste estudo.
À querida Carol Leal, por ser uma amiga para todas as horas, inclusive para a
leitura deste trabalho.
À Isabela Gozalvo, aluna de iniciação científica, pelo empenho, amizade e auxílio
durante o processo de análise dos dados.
A todos meus colegas de Pós-Graduação que nestes dois anos me acompanharam –
com certeza nos tornamos muito importantes uns para os outros durante essa caminhada!
Às minhas amigas e colegas Luciane, Aline, Marcia, Anita, Cristiane por estarem
sempre ao meu lado, e principalmente à Adriane Arteche pelo apoio e por se mostrar
sempre disponível a me ajudar!
À colega Vanessa Gomes por me estímular a ingressar neste curso de Pós-
Graduação.
À colega Clarissa Trentini, pelo conhecimento compartilhado e pelo bom humor
sempre presente, o que deixou nosso trabalho muito mais prazeroso!
Aos colegas integrantes do Laboratório de Mensuração pelas sugestões
apresentadas durante a elaboração do projeto desta pesquisa.
À UFRGS, pela possibilidade de realizar um Mestrado gratuito e ao CNPq, pelo
financeamento desta pesquisa.
3
À todas as instituições que mostraram-se abertas a me receber, pelo interesse
manifestado por esta pesquisa e pelos esforços dispensados para que ela pudesse ser
realizada. Agradeço principalmente às Psicólogas Suzana (CPT), Hildegard (Casa Lar São
Vicente), Carmen, Rosana, Ana Lúcia e Maria Cecília (FPE), às Assistentes Sociais
Ângela e Laicir (FPE) e à diretora da ADRA, Aldair, pela disponibilidade.
E finalmente, um agradecimento especial para todas as crianças que participaram
desta pesquisa, pela disposição durante essa participação e pela alegria demonstrada apesar
de todas as adversidades!
4
Sumário
Lista de Tabelas ....................................................................................................
Resumo ................................................................................................................
Abstract ................................................................................................................
Capítulo I
Introdução...................................................................................................
Teste das Fábulas.......................................................................................
Vínculo, Abandono e Institucionalização..................................................
Objetivos....................................................................................................
Objetivo Principal..........................................................................
Objetivos Secundários...................................................................
Capítulo II
Participantes...............................................................................................
Instrumentos...............................................................................................
Procedimentos............................................................................................
Questões Éticas..........................................................................................
Capítulo III
Resultados..................................................................................................
Teste das Fábulas...........................................................................
Fábula1...............................................................................
Fábula 2..............................................................................
Fábula 3 .............................................................................
Fábula 4 .............................................................................
Fábula 5 .............................................................................
Fábula 6 .............................................................................
Fábula 7 .............................................................................
Fábula 8 .............................................................................
Fábula 9 .............................................................................
Fábula 10 ...........................................................................
6 10 11 12 13 18 24 24 24 25 28 33 33 35 35 36 48 56 65 75 81 92 99 107 118
5
Capítulo IV
Discussão ...................................................................................................
Fábula1...............................................................................
Fábula 2..............................................................................
Fábula 3 .............................................................................
Fábula 4 .............................................................................
Fábula 5 .............................................................................
Fábula 6 .............................................................................
Fábula 7 .............................................................................
Fábula 8 .............................................................................
Fábula 9 .............................................................................
Fábula 10 ...........................................................................
Capítulo V
Conclusões ................................................................................................
Referências ............................................................................................................
Anexos
A - Questionário de dados sócio-demográficos ........................................
B – Questionário de dados da instuição ....................................................
C – Termo de consentimento informado ...................................................
D – Fantasias .............................................................................................
E – Estados emocionais .............................................................................
F – Mecanismos de defesa ........................................................................
G – Respostas comuns das crianças abrigadas ao Teste das Fábulas .......
H – Categorias acrescentadas dos itens fantasias, estados emocionais e
mecanismos de defesa ...............................................................................
126 126 131 133 136 138 140 142 143 145 146 148 152 157 159 160 161 165 167 174 176
6
Lista de Tabelas
Tabela 1- Percentuais dos Motivos para o Abrigamento das Crianças em Relação ao Tempo de Institucionalização.............................................................................................. Tabela 2 - Médias de Tempo de Reação à Fábula 1, em Segundos, por Faixa Etária ....... Tabela 3 - Percentuais dos tipos de Ação apresentados na Fábula 1 em Relação à Faixa Etária.................................................................................................................................... Tabela 4 - Percentuais dos Tipos de Enredo da Fábula 1, em Relação à Faixa Etária ....... Tabela 5 - Percentuais dos Personagens da Fábula 1 em Relação à Faixa Etária ............. Tabela 6- Percentuais de Desfechos para a Fábula 1, por Faixa Etária .............................. Tabela 7 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 1, em Relação à Faixa Etária ........................................................................................................ Tabela 8 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Estados Emocionais para a Fábula 1, em Relação à faixa etária .................................................................................... Tabela 9 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 1, em Relação à Faixa Etária ................................................................................. Tabela 10 - Médias de Tempo de Reação à Fábula 2, em Segundos, por Faixa Etária...... Tabela 11 - Percentuais de Tipos de Ação da Fábula 2, em Relação à Faixa Etária.......... Tabela 12 - Percentuais de Tipos de Motivos da Fábula 2, em Relação à Faixa Etária...... Tabela 13 - Percentuais de Participantes Apresentaram Fantasias na Fábula 2, em Relação à Faixa Etária ........................................................................................................ Tabela 14 - Percentuais Participantes que Apresentaram Estados Emocionais na Fábula 2, em Relação à Faixa Etária .............................................................................................. Tabela 15 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 2, em Relação à Faixa Etária .................................................................................. Tabela 16 - Médias de Tempo de Reação à Fábula 3, em Segundos, por Faixa Etária ..... Tabela 17 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Contaminação na Fábula 3, em Relação à Faixa Etária .................................................................................................. Tabela 18 - Percentuais dos Tipos de Ação da Fábula 3, em Relação à Faixa Etária......... Tabela 19 - Percentuais dos Tipos de Desfecho da Fábula 3, em Relação à Faixa Etária.. Tabela 20 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 3, em Relação à Faixa Etária ........................................................................................................
27 37 40 41 42 43 44 46 47 48 51 52 53 54 56 57 58 60 61 62
Tabela 21 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Estados Emocionais na
7
Fábula 3, em Relação à Faixa Etária................................................................................... Tabela 22 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 3, em Relação à Faixa Etária .................................................................................. Tabela 23 - Médias de tempo de Reação à Fábula 4, em Segundos, por Faixas Etárias.... Tabela 24 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Contaminação na Fábula 4, em Relação à Faixa Etária................................................................................................... Tabela 25 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Persevaração na Fábula 4, em Relação à Faixa Etária .................................................................................................. Tabela 26 - Percentuais dos Personagens da Fábula 4, em Relação à Faixa Etária........... Tabela 27 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 4, em Relação à Faixa Etária ........................................................................................................ Tabela 28 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Estados Emocionais na Fábula 4, em Relação à Faixa Etária .................................................................................. Tabela 29 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 4, em Relação à Faixa Etária ................................................................................. Tabela 30 - Médias de Tempo de Reação à Fábula 5, em Segundos, por Faixas Etárias.. Tabela 31 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Contaminação na Fábula 5, em Relação à Faixa Etária .................................................................................................. Tabela 32 - Percentuais dos Tipos de Objeto do Medo da Fábula 5, Em Relação à Faixa Etária .................................................................................................................................. Tabela 33 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 5, em Relação à Faixa Etária ........................................................................................................ Tabela 34 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 5, em Relação à Faixa Etária .................................................................................. Tabela 35 - Médias de Tempo de Reação, em Segundos, à Fábula 6, por Faixa Etária ..... Tabela 36 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Contaminação na Fábula 6, em Relação à Faixa Etária .................................................................................................. Tabela 37 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Perseveração na Fábula 6, em Relação à Faixa Etária .................................................................................................. Tabela 38 - Percentuais de Tipos de Natureza da Mudança da Fábula 6, em Relação à Faixa Etária .........................................................................................................................
63 65 66 68 68 70 71 73 74 75 77 78 79 81 82 83 84 85
Tabela 39 - Percentuais de Tipos de Identificação da Mudança da Fábula 6, em Relação à Faixa Etária .....................................................................................................................
86
8
Tabela 40 - Percentuais de Tipos de Locais da Mudança da Fábula 6, em Relação à Faixa Etária ........................................................................................................................ Tabela 41 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 6, em Relação à Faixa Etária ........................................................................................................ Tabela 42 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Estados Emocionais na Fábula 6, em Relação à Faixa Etária ................................................................................. Tabela 43 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 6, em Relação à Faixa Etária .................................................................................. Tabela 44 - Médias de tempo de Reação à Fábula 7, em Segundos, por Faixas Etárias ... Tabela 45 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Contaminação na Fábula 7, em Relação à Faixa Etária .................................................................................................. Tabela 46 - Percentuais dos Tipos de Ação da Fábula 7, em Relação à Faixa Etária ........ Tabela 47 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 7, em Relação à Faixa Etária ........................................................................................................ Tabela 48 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Estados Emocionais na Fábula 7, em Relação à Faixa Etária ................................................................................. Tabela 49 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 7, em Relação à Faixa Etária .................................................................................. Tabela 50 - Médias de tempo de Reação à Fábula 8, em segundos, por Faixas Etárias.... Tabela 51 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Contaminação na Fábula 8, em Relação à Faixa Etária .................................................................................................. Tabela 52 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Perseveração na Fábula 8, em Relação à Faixa Etária ................................................................................................. Tabela 53 - Percentuais dos Motivos da Fábula 8, em Relação à Faixa Etária................. Tabela 54 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 8, em Relação à Faixa Etária ........................................................................................................ Tabela 55 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Estados Emocionais na Fábula 8, em Relação à Faixa Etária .................................................................................. Tabela 56 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 8, em Relação à Faixa Etária .................................................................................. Tabela 57 - Médias de tempo de Reação à Fábula 9, em Segundos, por Faixas Etárias.... Tabela 58 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Contaminação na Fábula 9, em Relação à Faixa Etária .................................................................................................
87 88 90 91 92 93 95 96 97 98 99 100 101 103 104 105 106 107 108
9
Tabela 59 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Perseveração na Fábula 9, em Relação à Faixa Etária ................................................................................................. Tabela 60 - Percentuais das Categorias Relacionadas ao Item Medo na Fábula 9, por Faixa Etária ........................................................................................................................ Tabela 61 - Percentuais de Categorias do Item Desejos na Fábula 9, por Faixa Etária..... Tabela 62 - Percentuais das Categorias em Relação ao Item Proibições, Restrições e Deveres na Fábula 9, por Faixa Etária ............................................................................... Tabela 63 - Percentuais das Categorias Relacionadas ao Item Informações na Fábula 9, por Faixa Etária .................................................................................................................. Tabela 64 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 9, em Relação à Faixa Etária ....................................................................................................... Tabela 65 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Estados Emocionais na Fábula 9, em Relação à Faixa Etária ................................................................................. Tabela 66 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 9, em Relação à faixa etária ................................................................................. Tabela 67 - Médias de tempo de Reação à Fábula 10, em Segundos, por Faixas Etárias... Tabela 68 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Contaminação na Fábula 10, em Relação à Faixa Etária ................................................................................................ Tabela 69 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Perseveração de Conteúdos na Fábula 10, em Relação à Faixa Etária ........................................................................... Tabela 70 - Percentuais de Participantes que Introduziram Novos Conteúdos na Fábula 10, em Relação à Faixa Etária ........................................................................................... Tabela 71 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 10, em Relação à Faixa Etária ........................................................................................................ Tabela 72 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Estados Emocionais para a Fábula 10, em Relação à Faixa Etária ................................................................................ Tabela 73 - Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 10, em Relação à Faixa Etária ...............................................................................
109 111 112 113 114 115 116 117 118 119 120 122 123 124 125
10
Resumo
A avaliação psicológica, incluindo a aplicação de testes, foi uma das primeiras tarefas do psicólogo e até hoje é uma atividade de uso restrito desse profissional. Muitos testes já foram criados e alguns, por terem mostrado sua utilidade na avaliação psicológica, foram revisados. Entretanto, na área da avaliação da personalidade e, em especial, para os instrumentos projetivos, não se investiu muito em termos de revisão. Os testes voltados para crianças foram ainda menos privilegiados.Um dos poucos recursos projetivos construídos especificamente para esse tipo de público e recentemente adaptado para utilização com a população brasileira foram as Fábulas de Düss, nomeado no Brasil como Teste das Fábulas. A adaptação para a realidade brasileira é recente e foi realizada com crianças em desenvolvimento normal. Entretanto, estudos com populações especiais, como, por exemplo, crianças institucionalizadas, são limitados. Pensando nessas crianças, nos profissionais que trabalham com elas e na escassez de instrumentos que auxiliem em um melhor entendimento da realidade do seu desenvolvimento, torna-se necessária a realização de estudos para a utilização de testes com essa população. Frente a isto, esta pesquisa avaliou as respostas dadas ao Teste das Fábulas por crianças que residem em instituições, levando em consideração as variáveis sexo, faixa etária e tempo de abrigamento. A amostra foi composta de 62 crianças, com idades entre 4 anos e 9 meses e 11 anos e 8 meses, residentes em abrigos das cidades de Porto Alegre e Canoas, por um período mínimo de 6 meses. Os instrumentos utilizados foram um questionário sócio-demográfico, o teste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (versão tabuleiro) e o Teste das Fábulas. Os resultados demonstraram que as crianças que residem em abrigos, de um modo geral, respondem de forma diferente ao Teste das Fábulas do que as crianças com desenvolvimento considerado normal. Estes respostas remeteram à conflitiva da própria situação de abandono vivenciada. As maiores diferenças encontradas foram em relação a faixa etária, sendo que as variáveis tempo de abrigamento e sexo exerceram pouca influência. As crianças mais novas apresentaram respostas que indicaram o abandono como uma forma de agressão, enquanto as mais velhas atribuíram a si a culpa por tal acontecimento. Foram verificadas também diferenças entre as fantasias, estados emocionais e mecanismos de defesa quando comparadas as diferentes faixas etárias, assim como foram encontradas novas categorias desses itens nas respostas da amostra total. Palavras-Chaves: Teste das Fábulas, crianças institucionalizadas, testes projetivos
11
Abstract
Psychological evaluation, including tests administration, was one of the psychologist’s first tasks and up to today it is one activity of restricted use of this professional. Many tests have already been created and some, having shown their usefulness in psychological evaluation, have been revised. However, not much research investment is found in the area of personality evaluation, especially as far as projective instruments are concerned. The tests directed to children are even less privileged. One of the few projective resources specifically built up for this type of population and recently adapted for use with the Brazilian population were the Düss Fables, in Brazil named as the Fables Test. Its adaptation to the Brazilian reality is recent and was carried out with children with normal development. Studies with special population such as, for example, institutionalized children, are limited. Taking these children into consideration as well as the professionals who work with them and the scarceness of instruments that will help to a better understand the reality of their development, it becomes necessary to carry out studies focusing on the use of tests with this population. Therefore, this study explored the answers given to the Fables Test by children who live in institutions, taking into consideration variables such as sex, age and sheltering time. The sample was composed of 62 children, with ages between 4 years and 9 months and 11 years and 8 months, residents in shelters sited in the city of Porto Alegre and in the city of Canoas for a minimum period of 6 months. The instruments used were a social-demographic questionnaire, the Progressive Colored Matrices of Raven (tray version) and the Fables Test. The results indicated that the children who live in shelters, in a general manner, respond differently to the Fables Test than the children with a development considered normal. These answers led to the conflictive situation of the very abandonment undergone. The biggest differences found were related to the age, while variables such as sheltering time and sex had little influence. The younger children presented answers which indicated the abandonment as a way of aggression, while the older ones took upon themselves the guilt for such event. Differences were also found between the fantasies, emotional states and defense mechanisms when comparing the different ages, as well as new categories of these items were found in the answers of the total sample. Key words: Fables Test, institutionalized children, projective tests.
CAPÍTULO I
12
INTRODUÇÃO
A avaliação psicológica, incluindo a aplicação de testes, foi uma das primeiras
tarefas do psicólogo e até hoje é uma atividade de uso restrito desse profissional. Conforme
Alchieri e Noronha (2002), alguns testes foram desenvolvidos e utilizados antes mesmo de
a psicologia ser uma profissão reconhecida no Brasil. Dessa forma, pode-se dizer que a
avaliação psicológica deu origem à história da ciência psicológica no país.
Desde lá, muitos testes foram criados e alguns, por terem mostrado sua utilidade na
avaliação psicológica, foram revisados. A maior parte dos instrumentos revisados tem
como função a avaliação da inteligência, da memória e outras habilidades específicas. Na
área da avaliação da personalidade, poucos foram os instrumentos revisados.
Especialmente, pode-se citar o Rorschach, através do sistema Exner. Entre os instrumentos
projetivos de avaliação psicológica, não se investiu muito em termos de revisão,
principalmente instrumentos voltados para crianças. Um dos recursos projetivos
construídos especificamente para esse tipo de população e recentemente revisado (Cunha
& Nunes, 1993) foram as Fábulas de Düss (1950/1985). Considerando a época da sua
criação, a adaptação para a realidade brasileira é recente e foi realizada com crianças em
desenvolvimento normal. Estudos com populações especiais, como, por exemplo, crianças
institucionalizadas, são limitados (Rey, 1994; Cunha & Rey, 1996).
Hutz (1997) menciona as dificuldades que os psicólogos que trabalham com
populações de risco enfrentam ao se depararem com a falta de instrumentos adequados
para utilização com esse público. Os testes convencionais (desenvolvidos para a população
que se socializa da forma tradicional), por não passarem por um processo de adaptação,
quando são aplicados a grupos diferenciados (como crianças abrigadas ou em situação de
risco) não medem as variáveis que se necessita avaliar.
Pensando nessas crianças, nos profissionais que trabalham com elas e na escassez
de instrumentos que possam ser utilizados para melhor entender a realidade do seu
desenvolvimento, torna-se necessária a realização de estudos com testes para essa
população. Acredita-se que a utilização de um instrumento adequado para diagnosticar a
forma como está se dando o desenvolvimento dessas crianças é extremamente importante
para que se possa estabelecer as medidas necessárias de cuidado e/ou tratamento.
O Teste das Fábulas caracteriza-se por ser um instrumento bastante aceito pelas
crianças e por trazer um entendimento bastante amplo da sua psicodinâmica, como o
processo de separação-individuação, a simbiose materna, a rivalidade fraterna, a conflitiva
13
edípica, entre outros (Cunha, Freitas & Raymundo, 1993, Cunha & Nunes, 1993). Os
instrumentos projetivos, como o Teste das Fábulas, permitem a identificação e
compreensão dos “conflitos, mecanismos de defesa, estados emocionais, fantasias, os
traços de caráter e os aspectos sadios e/ou patológicos do sujeito” (Cunha & Werlang,
1993, p.123). Isso somente é possível através do fenômeno de projeção que estes
instrumentos suscitam.
A projeção foi descrita por Freud (1974) como uma forma de manejar conflitos
emocionais. No entanto, ela não tem somente o objetivo de defesa, mostrando-se também
presente quando não há a presença de conflito. Segundo Freud, a atividade de projetar
percepções internas para o exterior está relacionada também às nossas percepções
sensoriais, e por isso cumpre um papel importante na forma como encaramos nosso mundo
exterior. Desse modo, as percepções internas que as pessoas possuem em relação às suas
emoções e pensamentos podem ser projetadas para fora, assim como as percepções
sensoriais.
Entretanto, é freqüente a crítica aos testes projetivos pela forma subjetiva como são
interpretados. Assim, a fim de objetivar a interpretação do Teste das Fábulas, as autoras
Cunha e Nunes (1993) propuseram uma forma de levantamento objetiva.
Seus estudos englobaram crianças de classe baixa à média que possuíam estrutura
familiar fragmentada e/ou intacta. Entende-se que para crianças que não se enquadram
nessas características, como aquelas institucionalizadas ou em situação de risco pessoal e
social, as respostas esperadas não podem ser as mesmas.
Para investigar como as crianças institucionalizadas respondem ao Teste das
Fábulas foi idealizada esta pesquisa. Pretende-se, com isto, oferecer aos psicólogos que
fazem uso deste instrumento e aos que necessitam de um instrumento específico para a
avaliação de crianças em situação de institucionalização maiores subsídios para um
entendimento mais fiel desta população.
Teste das Fábulas
O Teste das Fábulas foi divulgado pela primeira vez em 1940, com a denominação
de “Método das Fábulas”. Criado por Louisa Düss, foi concebido como um instrumento
projetivo de vanguarda, sendo que a sua publicação como livro ocorreu primeiramente na
França, em 1950, e logo após na Alemanha (Cunha & cols., 1993). As Fábulas de Düss
seguiam um referencial teórico essencialmente freudiano e buscavam a investigação de
conflitos inconscientes (Cunha & Nunes, 1993).
14
Düss (1950/1985) refere a influência que o diagnóstico exerce no desenrolar do
tratamento psicoterápico. A autora faz a ressalva que aquilo que o teste busca não se trata
do diagnóstico da doença, mas sim do diagnóstico do complexo, ou seja, quais os conflitos
inconscientes que possuem um papel determinante na neurose da criança. As fábulas
caracterizam-se por detectar rapidamente o complexo e podem servir de ponto de partida
para uma análise. Assim, a autora criou dez fábulas em que um herói (uma criança ou um
animal) se encontra em uma situação determinada que representa uma situação de um
estágio psicossexual. A criança tem a possibilidade de determinar, então, que caminhos o
herói vai tomar. A hipótese é de que se o sujeito se sente afetado por alguma das histórias e
dá uma resposta simbólica, ou ao contrário, manifesta alguma resistência para responder, a
situação do herói da fábula determina uma cadeia de associações que revela o complexo
que está fixado. Düss (1950/1985) afirma que procurou eliminar o máximo possível
questões que pudessem influenciar respostas conscientes, questões ligadas à cultura ou
educação particular de cada criança.
Na década de 40, Louise Despert traduziu as fábulas de Düss para a língua inglesa.
Seu trabalho acabou repercutindo de tal forma, principalmente na literatura psicanalítica,
que acabou sendo conhecido como “Fábulas de Despert” (Cunha, Freitas & Raymundo,
1993).
Entre as décadas de 40 e 60, foram realizadas algumas pesquisas procurando revisar
e modificar a forma original e a tradução realizada por Despert. Alguns autores
preocuparam-se em entender as respostas dadas pelas crianças e em desenvolver sistemas
de escore. Reuben Fine (1949), por exemplo, produziu uma revisão das Fábulas de Despert
para crianças entre 4 e 14 anos, chegando a uma série de vinte fábulas, combinando-as para
testar as variáveis psicodinâmicas: dependência, hostilidade, identificação, rivalidade
fraterna, reações à rejeição parental, temores de castração, complexo de Édipo, medos e
desejos. Para avaliar as respostas, utilizou um sistema de escore desenvolvido por ele
mesmo.
Contribuindo para o avanço do conhecimento sobre o teste, Peixotto (1956, 1957,
1960) utilizou a versão de Fine em vários estudos. O primeiro deles foi sobre a
fidedignidade do Teste das Fábulas, que foram administradas a um grupo de 177 escolares,
com idades entre 8 e 14 anos. Peixotto encontrou que crianças mais novas eram mais
fidedignas e consistentes em suas respostas do que crianças mais velhas. Os resultados
foram discutidos de acordo com a formulação psicodinâmica de cada fábula. A autora
concluiu, através dos achados obtidos, que as 14 fábulas traziam resultados confiáveis e
que algumas delas se mostravam mais fidedignas em certas idades do que em outras. Dessa
15
forma, haveria um padrão diferente de fidedignidade conforme a maturidade dos sujeitos
(Peixotto, 1956).
O segundo estudo de Peixotto (1957) investigou quais seriam as respostas
populares ao Teste de Fábulas. Com uma amostra de crianças entre 6 e 14 anos chegou a
uma série de respostas que foram consideradas como populares, por demonstrarem
consistência suficiente em sujeitos normais. No seu entender, o número de fábulas
apropriadas para crianças mais novas era suficiente para qualquer situação clínica, porém
para sujeitos com mais de oito anos de idade seria necessário que novas fábulas fossem
adicionadas. Assim, Peixotto concluiu que essa técnica seria mais apropriada para crianças
menores de oito anos.
A terceira pesquisa de Peixotto (1960) com as fábulas de Despert buscou investigar
o uso desse instrumento com crianças com distúrbios emocionais. Foram comparados dois
grupos, um deles de 83 crianças (47 delas com idades entre 6 e 8 anos, 33 entre 9 e 12 anos
e 2 com 13 anos ou mais) em tratamento clínico (com distúrbios emocionais) e o outro de
crianças que não realizavam tratamento (sem distúrbios emocionais). Na maioria dos
casos, foram encontradas as mesmas respostas populares para ambos os grupos. As
diferenças encontradas entre os grupos não demonstraram uma significância
suficientemente alta para que fosse realizado um diagnóstico. Diferenças significativas se
deram em respostas não usuais isoladas em onze das vinte fábulas. Peixotto concluiu,
através desses resultados, que o Teste das Fábulas reflete a psicodinâmica da criança de
forma consciente e inconsciente, mas possui um valor pequeno para diagnósticos
diferenciais e que a psicodinâmica desses grupos clínicos e não-clínicos varia muito pouco,
não existindo uma etiologia simples para os distúrbios emocionais em crianças.
Kramer (1968) realizou estudos sobre a tradução do Método das Fábulas do francês
para o inglês, revisando essa tradução e trazendo uma nova versão na língua inglesa. O
autor também fez uma revisão da literatura e da utilidade clínica do teste. Revisando a
tradução realizada por Despert, Kramer encontrou diferenças do original em francês e
percebeu atenção e cuidados insuficientes na preservação da interação dos tópicos
psicanalíticos do original (tópicos referentes às fases psicossexais). Segundo Kramer, essas
mudanças e omissões provavelmente modificariam ou limitariam o repertório de respostas
que a criança poderia dar, apesar de nenhuma pesquisa ter confirmado isso. Desse modo, o
autor apresentou uma nova tradução para o inglês, buscando ser o mais fidedigno possível
ao original, assim como consistente com seus conceitos psicanalíticos e com uma
linguagem simples que pudesse ser entendida por crianças pequenas.
16
A tradução das Fábulas de Düss para a língua portuguesa foi realizada em São
Paulo, sob a supervisão técnica de Tardivo (citado por Cunha & Nunes, 1993). Passados
alguns anos de sua tradução, essa mesma autora normatizou o instrumento para o uso
nacional (Tardivo, 1992). Para a pesquisa de normatização foi mantida a série original de
10 fábulas proposta por Düss. Em sua tese de doutorado, Tardivo desenvolveu um
referencial para a análise das respostas, caracterizado por um conjunto de categorias usado
como um roteiro de interpretação para o teste, o que não existia até então. Através desse
estudo, ainda destacou a utilidade do instrumento para o diagnóstico psicológico.
Concomitantemente, as Fábulas de Düss vinham sendo utilizadas em outra pesquisa
no Brasil coordenada pela professora Jurema Alcides Cunha. Como o trabalho exigia a
utilização de um instrumento de avaliação de personalidade para crianças pré-escolares, o
grupo de pesquisa aproveitou a idéia de um projeto inacabado que se iniciou na Argentina
com o objetivo de criar uma versão pictórica para as Fábulas, acreditando que seria
vantajoso desenvolvê-la para a população brasileira (Cunha, Freitas & Raymundo, 1993).
Cunha e colaboradores (1989a) desenvolveram essa nova versão do Teste das
Fábulas. A forma verbal seguiu sendo a tradução brasileira das Fábulas de Düss. Foram
introduzidas algumas mudanças na formulação de determinadas fábulas e os desenhos da
forma pictórica foram realizados por uma desenhista sob a orientação das pesquisadoras.
Ao longo do desenvolvimento das ilustrações, estas sofreram diversas mudanças a fim de
eliminar aspectos que foram considerados sugestivos.
Foi, então, realizada uma pesquisa com o objetivo de analisar a fidedignidade dessa
nova versão do instrumento quanto à sua produtividade e aspectos clínicos. A amostra da
pesquisa foi composta por 18 crianças pré-escolares. As autoras desenvolveram um sistema
de categorização de respostas contendo itens1 e alternativas para cada fábula. Esse sistema
de categorização pelo qual as respostas são avaliadas considera questões como o tempo
médio de reação, o número de respostas populares dadas ao teste e fenômenos específicos
como auto-referência ao responder o instrumento, perseveração ou contaminação de
conteúdos de uma fábula para outra. As respostas ainda são classificadas através de itens
como o tipo de ação do herói, enredo da história, forma de desfecho, personagens citados,
medos ou desejos do herói, e também pelas fantasias, estados emocionais e mecanismos de
defesas apresentados. Esses itens variam de acordo com a fábula que está sendo levantada.
Posteriormente a esta classificação é necessário realizar a interpretação dinâmica de tais
resultados (Cunha, Freitas & Raymundo, 1993). Através desta pesquisa Cunha e
1 Cada um dos itens do sistema de categorização será explicado quando introduzidos no Capítulo III (Resultados).
17
colaboradores (1989a) concluíram que o Teste das Fábulas, em sua versão pictórica, se
mostrou fidedigno sob o ponto de vista formal e clínico.
Um novo estudo buscando investigar quais seriam as respostas populares ao Teste
de Fábulas para crianças pré-escolares e escolares foi desenvolvido por Cunha e
colaboradores (1989b). A amostra de crianças em idade pré-escolar foi de 60 meninos e 60
meninas com idades entre 3 e 6 anos e a amostra de crianças em idade escolar foi composta
por 146 meninos e 114 meninas entre 8 e 13 anos. As autoras concluíram que a média das
respostas populares nos grupos estudados era de três por participante. Foram identificadas
nove fábulas populares em cada grupo, sendo que quatro respostas apareceram com
conteúdo idêntico em todos os grupos. Também observaram diferenças entre meninos e
meninas que poderiam ser entendidas tanto pela dinâmica da fase como por influência de
variáveis sócio-culturais, sendo que as meninas demonstraram respostas tradicionalmente
simbólicas, diferentemente dos meninos.
Para avaliar a diferença do tempo de reação entre os testes CAT e o Teste das
Fábulas, em crianças pré-escolares, foi realizada uma pesquisa por Cunha, Werlang e
Nunes (1990). A amostra constituía-se de 24 crianças, que demonstraram um tempo de
reação menor ao Teste das Fábulas do que ao CAT, sugerindo, assim, uma maior prontidão
ao primeiro. As autoras concluíram que o fato de o Teste das Fábulas possuir dois
estímulos em conjunto (forma verbal e pictórica), é um fator facilitador para o
funcionamento psíquico dessa faixa etária.
O valor clínico do escore de concordância social no Teste das Fábulas foi objeto de
estudo de Nunes, Cunha, e Oliveira (1990). A pesquisa foi realizada com uma amostra de
40 crianças em idade pré-escolar, 20 delas freqüentando alguma instituição socializante há
pelo menos 6 meses, e 20 que não freqüentavam nenhuma instituição. As autoras chegaram
a resultados que indicaram que os fatores sócio-culturais não influenciam os escores e que
os problemas psicopatológicos poderiam estar relacionados a diferenças em termos de
concordância social.
Sem dúvida, o grupo de pesquisadores coordenado por Cunha foi o que mais
produziu estudos no Brasil utilizando o Teste das Fábulas, culminando com a publicação
desse instrumento (Cunha & Nunes, 1993). Entretanto, mesmo com toda essa produção, o
instrumento nunca chegou a sofrer modificações para ser utilizado com populações
diferenciadas. Nos estudos realizados com crianças institucionalizadas e abandonadas
(Rey, 1994; Cunha & Rey, 1996), por exemplo, foi utilizada a forma padrão de
levantamento do teste, na busca de compreender como se dá o Complexo de Édipo e o
desenvolvimento do ego dessas crianças. Acredita-se que o desenvolvimento delas se dá de
18
forma diferente quando comparado ao de crianças criadas dentro de uma organização
familiar caracterizada pela presença de pelo menos uma das figuras parentais. Para a
avaliação dessas crianças, portanto, devem ser realizados estudos para verificar como elas
respondem ao Teste das Fábulas e que conflitos tal instrumento suscita nessas crianças.
Este é, então, o objetivo do presente estudo. Para atingir esse objetivo, acredita-se que seja
necessária a análise de algumas questões relacionadas ao desenvolvimento normal da
criança, a sua formação de relações objetais e vínculos afetivos para, em seguida, entender-
se de que forma essas questões se dão nas crianças que são abandonadas, ou seja, que têm
seus vínculos afetivos rompidos.
Vínculo, Abandono e Institucionalização
No estudo do desenvolvimento infantil, vários autores destacam a importância da
figura materna nos primeiros anos de vida do bebê. Conforme Spitz (1965/ 1979), o
primeiro ano de vida da criança, em sua maior parte, tem como objetivo a sobrevivência e
a formação dos instrumentos necessários para esse fim. A criança, durante esse período,
apresenta-se indefesa e não pode sobreviver unicamente por seus próprios recursos. Essas
incapacidades serão supridas pela mãe. É ela que irá satisfazer todas as necessidades do
bebê, assim, formando uma díade.
Entretanto, de acordo com Brazelton (1981/1988), o vínculo com o bebê, apesar de
ser instintivo, não é instantâneo. Ele é um processo contínuo. Partindo dessa mesma idéia,
Bowlby (1989) refere que durante os primeiros meses de vida uma criança demonstra
várias respostas que mais tarde se transformarão em um padrão de apego. Contudo, um
modelo organizado de apego não se desenvolve antes dos primeiros seis meses de vida. De
acordo com Lewis e Wolkmar, (1993) para que um padrão de apego se desenvolva são
necessárias determinadas condições, como uma interação suficiente entre mãe e filho, uma
capacidade discriminativa do bebê em relação à figura materna e uma capacidade de
perceber a existência da mãe como permanente e independente, mesmo quando esta não se
encontra presente fisicamente.
A partir de seu nascimento, as crianças mostram uma capacidade cada vez maior
para se envolverem na interação social. Segundo Bowlby (1989), a tendência para
estabelecer laços emocionais íntimos com determinadas pessoas faz parte da natureza
humana. Na primeira infância, esses laços são estabelecidos com os pais (ou substitutos),
que possuem a função de proteção, conforto e suporte.
19
Winnicott (1979/1990) afirma que inicialmente o bebê depende da provisão física
da mãe. Essa necessidade de provisão física está presente não só quando o bebê ainda está
no útero materno, mas também posteriormente ao nascimento, quando é lactente.
Entretanto, psicologicamente, ele é visto, ao mesmo tempo, como dependente e
independente. Independente, pois é formado por tudo o que é herdado, incluindo seu
processo maturativo. E dependente, já que para que o processo maturativo ocorra, ele
precisa de um ambiente favorável, que possa prover suas necessidades.
A partir do início da vida é a mãe que serve de mediador de toda percepção, ação,
conhecimento e discernimento. As relações afetivas (através dos cuidados, gestos, olhares)
entre a criança e a mãe possibilitarão o desenvolvimento da atribuição de significados e da
consciência na criança. É a partir desse contato com a mãe que aos poucos a criança vai se
dando conta que existe um mundo externo (Spitz, 1965/ 1979). A ligação com a figura
materna perpetua-se até o terceiro ano de vida da criança. Após esse terceiro ano, o
comportamento de apego (protestar quando a mãe está longe), é menos utilizado (Bowlby,
1979/1982).
De acordo com Spitz (1965/1979), a privação de relações objetais para a criança,
principalmente no seu primeiro ano de vida, é um fator seriamente prejudicial. Essa
privação tem como conseqüência distúrbios emocionais graves. O autor refere que “quando
privamos crianças de suas relações com a mãe, sem proporcionar-lhes um substituto
adequado que o bebê pode aceitar, nós as privamos de provisões libidinais” (p.188). Como
conseqüência dessa privação originam-se as doenças de carência afetiva. Nessas doenças o
fator quantitativo é o fator primordialmente responsável. Essas condições geralmente
resultam da ausência da mãe, sendo que o seu substituto mostra-se inadequado ou
inexistente. Como o fator principal é o quantitativo, o dano sofrido pela ausência da mãe
mostra-se proporcional ao tempo de afastamento.
A ausência de oportunidades de estabelecer vínculos afetivos, ou prolongadas e
repetidas quebras de vínculos anteriormente estabelecidos estão entre as causas possíveis
de transtornos psiquiátricos (Bowlby, 1979/1982). Através de alguns estudos, Bowlby
(1976/1988) encontrou dados de que a privação materna durante os primeiros anos da
criança exerceria um efeito prejudicial sobre o seu desenvolvimento, sendo que
experiências graves de privação poderiam ter conseqüências graves sem reversão,
corroborando, assim, os dados trazidos por Spitz.
Em relação às privações maternas e o abandono infantil, Torres e Guerrerro (2000)
realizaram uma pesquisa buscando verificar quais seriam os modelos de relação mãe-filho
em crianças abandonadas. A amostra foi composta por dois grupos de crianças
20
abandonadas (60 crianças) e um grupo de 36 crianças que não haviam sido abandonadas,
em idade escolar. As crianças abandonadas possuíam diferentes experiências pessoais de
maus tratos físicos, emocionais e sexuais. O instrumento utilizado era composto de seis
pequenas histórias que buscavam explorar as razões, reações e atribuições dos
personagens. Os resultados do estudo demonstraram que as crianças abandonadas da
amostra apresentaram conceitos peculiares sobre as relações entre mãe e filho. Entre essas
peculiaridades foi encontrada uma obediência compulsiva como uma característica de
crianças maltratadas, sendo que o desejo da mãe prevalece sobre o da criança.
Na pesquisa de Torres e Guerrerro (2000), as crianças também pareciam
demonstrar uma deficiência nos sentimentos de afeição, possuindo uma menor expectativa
de afeto pelos pais, o que poderia ser explicado pelas experiências passadas com as figuras
de apego ou porque em experiências passadas foram punidos ou ignorados pelas suas
expressões positivas de afeto. Outra característica encontrada na amostra de crianças
abandonadas foi a tendência de justificar as injustiças das mães, direcionando a culpa aos
filhos, o que demonstraria um confuso senso de justiça dessas crianças, sendo que a reação
delas era de passividade em relação às injustiças e uma expectativa de uma disciplina mais
dura por parte da mãe.
Ao abordar as situações em que a criança é afastada da figura materna, Bowlby
(1979/1982) traz a questão dos lares substitutos. Segundo o autor, acreditou-se por um
tempo que a criança quando afastada de seu lar original o esquecia, iniciando uma nova
vida. Porém, estudos demonstraram que, contrariando essa idéia, por pior que fosse o
ambiente original da criança, sempre se mostrava muito mais benéfico que ela mantivesse
um vínculo com as figuras parentais ou familiares. De acordo com Bowlby, as crianças
“não são lousas das quais o passado pode ser apagado com uma esponja, e sim seres
humanos que carregam consigo suas experiências anteriores e cujo comportamento
presente é profundamente influenciado por tudo que passou antes”(p. 129).
Conforme Mussen, Conger, Kagan e Huston (1988), o número de pessoas
diponíveis para cuidar, dar assistência e estimular intelectualmente e emocionalmente as
crianças que crescem em instituições são fatores essenciais em seu desenvolvimento.
Apesar de não serem conhecidas as conseqüências, a longo prazo, da falta de uma figura
única e constante com quem a criança possa desenvolver uma ligação afetiva (situação
comum em instituições que abrigam crianças), existem indícios que apontam que essas
crianças tornam-se mais dependentes e mais indisciplinadas.
Em relação à influência que o abandono por parte das figuras parentais pode
exercer sobre o comportamento e desenvolvimento emocional dessas crianças, autores
21
como Rutter (2000) e Minty (1999) referem que as crianças que se encontram em lares
substitutos possuem um maior índice de problemas psicossociais, comportamentais e
educacionais do que a maioria da população em geral, até por serem provenientes de
ambientes de alto risco.
Em seus estudos sobre as conseqüências do abandono sobre a vida e personalidade
das crianças, Winnicott (1984/1987) tem como cenário as experiências de guerra, quando
essas crianças eram afastadas de suas famílias e abrigadas em lares substitutos por um
período determinado de tempo. Esse período de tempo poderia ser curto ou longo, sendo
que muitas vezes o destino das crianças acabava sendo o encaminhamento para adoção por
outras famílias.
Procurando entender a realidade brasileira, não foram as guerras as responsáveis
pelo abandono de muitas crianças, mas sim o fator miséria como determinante para a
grande maioria desses casos. Conforme a Câmara dos Deputados (1976), na CPI realizada
com objetivo de investigar o problema da criança e do menor carente no Brasil, as causas
mais freqüentes da marginalização da criança referiam-se à desagregação da família
causada pela pobreza.
Essa situação afeta a saúde física e mental das crianças, já que a falta de moradia e
a convivência direta com a violência aumentam a frustração, diminuem as esperanças e
expectativas e produzem sentimentos de rejeição, exclusão, e de injustiça (Caliman, 1991).
O mesmo padrão de sentimentos também foi encontrado por Alves (1999) em sua pesquisa
sobre os adolescentes brasileiros abandonados. Esse autor ainda afirma que uma das causas
para tais sentimentos seria a falta de acesso aos produtos culturais.
Em relação às práticas sociais de cuidado para as crianças que se encontram em
situação de abandono, Guirado (1986) refere que a internação delas em instituições tem
sido classificada como uma prática controversa. A autora realizou uma pesquisa
procurando analisar as relações afetivas nas instituições e afirma que, apesar de muitas
vezes a institucionalização de crianças ser inevitável, são conhecidos os prejuízos,
principalmente em termos afetivos, que ela causa.
As conclusões obtidas por Guirado, após ter estudado crianças abandonadas e
internadas na FEBEM foram de que a relação familiar dessas crianças aparece como a
marca da violência e revolta, da insatisfação, submissão e fuga. De acordo com a autora, o
cuidado substituto oferecido pela instituição “não cuida nem substitui completamente a não
ser pelo movimento do imaginário” (p. 200). A desorganização da família é tida como a
responsável pelo abandono, carência, pelo sentimento de rejeição e pela marginalidade, e a
instituição busca a contenção dessa desordem.
22
As crianças entrevistadas durante a pesquisa de Guirado trouxeram em sua fala a
forma que a instituição toma em um processo contínuo de abandono. As crianças chegam
“prejudicadas na FEBEM e lá, o seu prejuízo, na forma até certo ponto característica de
uma nova ordem instituída, perpetua-se, ou melhor, reproduz-se” (p. 201).
A pesquisa de Guirado ainda procurou detectar qual seria a imagem materna para
essas crianças que se encontravam institucionalizadas. Os resultados apontaram para uma
figura materna que sempre era percebida como alguém que não possuía capacidade para
contê-las, por isso as abandonava e institucionalizava. Dessa forma, pode-se entender que
o cuidado substituto da instituição altera o sentido da relação, que deveria ser afetiva, entre
mãe e filho. O elo entre a criança atendida e a pessoa que a atende é uma relação de
trabalho, ou seja, o ato de cuidar, ao invés de fazer parte de práticas que deveriam ser
naturais e automáticas, passam a ser uma prática profissional. Apesar disso, para as
crianças abandonadas, a instituição vem para preencher a falta e acaba sendo a única fonte
de segurança e de vida delas, mesmo que o presente se mostre insatisfatório (Guirado,
1986).
Estudos foram e vêm sendo desenvolvidos procurando investigar como se dá o
desenvolvimento dessas crianças que passam por situações de abandono e acabam sendo
institucionalizadas. Uma das preocupações principais é de que forma esse abandono e os
cuidados recebidos na instituição irão repercutir na vida emocional da criança. Aspectos do
desenvolvimento psicodinâmico também têm sido estudados com o mesmo objetivo.
Porém, são poucos os estudos que utilizam testes projetivos para avaliar as dificuldades e
características desse desenvolvimento (Rey, 1994; Cunha & Rey, 1996; Cariola & cols,
1988).
A pesquisa desenvolvida por Rey (1994) buscou analisar um aspecto específico da
psicodinâmica das crianças institucionalizadas, o complexo de Édipo. O Teste das Fábulas
foi o instrumento utilizado, pois este explora, entre outras questões, a conflitiva edípica. O
teste foi aplicado em uma amostra de 40 crianças, com idades entre 4 e 7 anos. Os
resultados da pesquisa indicaram que em apenas 35% dos casos houve evidência de
triangulação edípica. Presenças de relações duais mostraram-se mais características desse
grupo. As análises das respostas das crianças evidenciaram uma produção pobre (não
expressando muitos conflitos) e controlada pela utilização de mecanismos de defesa
variados. As crianças da amostra mostraram-se extremamente mobilizadas afetivamente
pelo instrumento. Os indicadores mais presentes nessa amostra foram os sentimentos de
exclusão, medos de perda de amor e proteção e as fantasias de castigo.
23
Cunha e Rey (1996) apresentaram dados relativos ao abandono e seus reflexos no
desenvolvimento do ego, através de uma pesquisa realizada com 40 crianças
institucionalizadas, com idades entre 4 e 7 anos, utilizando a Fábula 1 do Teste das
Fábulas. As autoras chegaram a resultados que indicaram que crianças que são
institucionalizadas precocemente (antes dos 2 anos e 6 meses de idade) apresentavam
respostas mais regressivas (respostas que não coincidiam com o que seria esperado para a
faixa etária) do que aquelas que foram institucionalizadas mais tarde. Dessa forma,
concluíram que o abandono infantil resulta em problemas graves durante o
desenvolvimento do ego, refletindo, assim, nas respostas que são dadas a uma técnica
projetiva. Porém, a autora coloca que ocorreram limitações em seu estudo pelo número
pequeno da amostra (40 sujeitos).
O estudo de Cariola e cols (1988) investigou os aspectos emocionais de crianças
institucionalizadas, por meio de outra técnica projetiva, o DFH, utilizando para a sua
análise a escala Koppitz. O teste foi aplicado em 152 crianças, com idades entre 6 anos e
12 anos e 22 meses. Os resultados encontrados levaram os pesquisadores a concluir que as
crianças institucionalizadas da amostra em questão possuíam um alto grau de dificuldades
emocionais.
Com base nas teorias psicanalítica e psicodinâmica apresentadas até aqui e em
estudos e pesquisas realizados nessa área, percebe-se que grande parte dos autores (Spitz,
1965/1979; Winnicot, 1984/1987; Bowlby, 1976/1988) e pesquisadores (Guirado, 1986;
Cariola, 1988; Alves, 1999) entendem o abandono e a institucionalização infantil como
uma experiência traumática e, na maioria dos casos, de efeitos irreversíveis para o
desenvolvimento emocional dessas crianças.
Dessa forma, considerando as conseqüências que o abandono infantil pode trazer
para o desenvolvimento psicológico e afetivo da criança e a falta de instrumentos
adequados para detectar essas conseqüências, o presente estudo tem como objetivo
verificar os tipos de respostas dadas ao Teste das Fábulas pelas crianças que se encontram
em situação de abrigamento. Devemos levar em conta a importância da avaliação dessas
crianças para que possam ser tomadas as medidas adequadas em seu cuidado e tratamento.
Objetivos
24
Objetivo Principal
- Realizar um estudo sobre as respostas dadas ao Teste das Fábulas por crianças que
residem em instituições.
Objetivos Secundários
- Verificar se existe um padrão de respostas diferente em termos de mecanismos
de defesa, fantasias e sentimentos ao Teste das Fábulas, para essas crianças;
- Verificar as respostas mais comuns da amostra e se estas diferem das respostas
da amostra padronizada do instrumento;
- Verificar se há influência do tempo de institucionalização nas respostas ao
Teste das Fábulas;
- Verificar se há influência do sexo e faixa etária nas respostas ao Teste das
Fábulas;
- Identificar novas categorias de mecanismos de defesa, estados emocionais e
fantasias.
CAPÍTULO II
25
MÉTODO
Participantes
Participaram desta pesquisa 62 crianças, de ambos os sexos, 41 meninos (66,1%) e
21 meninas (33,9%), com idades entre 4 anos e 9 meses e 11 anos e 8 meses [média de 8,5
anos para as meninas (d.p.= 2,1 anos), e 8,7 anos para os meninos (d.p.= 2,0 anos)]. Todos
os participantes eram residentes de abrigos da Grande Porto Alegre, sendo 40 deles
(64,5%) procedentes da FPE (Fundação de Proteção Especial, Porto Alegre), 12 (19,4%)
da CPT (Casa do Pequeno Trabalhador, Canoas), oito (12,9%) da Casa Lar São Vicente
(Canoas) e dois (3,2%) da ADRA (Porto Alegre). Os quatro locais foram selecionados pelo
fato comum de abrigarem crianças ainda passíveis de serem adotadas ou voltarem às
famílias de origem.
A FPE é uma instituição pública e está vinculada à Secretaria do Trabalho,
Cidadania e Assistência Social (STCAS), do Governo do Estado do Rio Grande do Sul. A
partir da extinção da Febem foram criadas duas novas fundações: a FASE (Fundação de
Atendimento Sócio-Educativo), responsável exclusivamente pelas crianças e adolescentes
infratores e a FPE, criada com o objetivo de oferecer cuidados às crianças vítimas de
violência, abuso sexual, abandono, entre outros maus tratos. Oficialmente, a FPE oferece
cuidados e abrigo a crianças e adolescentes de 0 a 18 anos de idade, apesar de alguns
adolescentes permanecem no abrigo após completarem os 18 anos. A instituição se divide
em diversos NARs (Núcleos de Abrigos Residenciais), espalhados por diversos bairros de
Porto Alegre. As crianças que fizeram parte deste estudo encontravam-se abrigadas nos
NARs do Bairro de Ipanema, Belém Novo e Zona Oeste.
O NAR Ipanema, na época em que os dados da pesquisa foram coletados, contava
com 118 crianças e adolescentes abrigados, divididos em uma média de oito crianças por
AR (abrigos residenciais). O NAR Ipanema conta com 10 ARs. O NAR Belém Novo
possuía 71 crianças e adolescentes abrigados, divididos em seis ARs e o NAR Zona Norte
contava com uma média de 60 crianças e adolescentes, divididas em cinco ARs. Em todos
os NARs existe a preocupação de que os irmãos sejam abrigados nas mesmas casas (ARs)
e que meninos e meninas, assim como os bebês e crianças menores, possuam quartos
separados. Cada AR de todos os NARs possui uma cozinheira e dois monitores por
plantão, além de oferecer serviços de recreação, artesanato, esporte, reforço
26
escolar e atendimentos psicológico, médico e odontológico na própria sede. Outros
serviços que se mostram necessários para o cuidado das crianças são buscados e oferecidos
pela comunidade.
O abrigo CPT (Casa do Pequeno Trabalhador) possui vínculo público e é mantido
pela prefeitura de Canoas, oferecendo proteção e cuidados a crianças e adolescentes de 0 a
18 anos. A estrutura da instituição conta com um prédio único que possui três quartos (um
para meninos, um para meninas e o terceiro para os bebês e crianças pequenas), refeitório,
sala de televisão, sala de estudos e pátio. Na época da coleta de dados, havia uma média de
65 crianças e adolescentes abrigados, com um monitor para cada 12 crianças. A instituição
oferece atividades de lazer (passeios), esportes, reforço escolar, teatro e grupos com
psicólogos (para crianças e funcionários). Atendimento médico, odontológico e
psicológico individual são buscados na comunidade e órgãos públicos.
A Casa Lar São Vicente também possui vínculo público e é mantida pela prefeitura
de Canoas. Sua estrutura é constituída por uma casa térrea com três quartos (um para
meninos, um para as meninas e um terceiro para o berçário), refeitório (que também é
utilizado como sala de estudos) e pátio. O abrigo oferece cuidados à faixa etária de 0 a 12
anos e, durante a coleta dos dados, contava com um número de 26 crianças abrigadas
cuidadas por quatro monitores (dois para o berçário e dois para as crianças maiores). As
atividades da instituição incluem as de lazer, estudo, acompanhamento psicológico e de
uma assistente social. Atendimento psicológico individual, assim como médico e
odontológico, são procurados na comunidade e órgãos municipais.
O abrigo ADRA localiza-se em Porto Alegre e possui caráter de organização não-
governamental, sendo vinculado à religião adventista. A instituição oferece cuidados a
crianças entre 0 e 6 anos. No período em que os dados foram coletados, 33 crianças
encontravam-se abrigadas na instituição, onde eram cuidadas por uma média de um
monitor para cada cinco crianças. A estrutura do abrigo conta com uma casa térrea com
três quartos (um para meninos, um para meninas e um para os bebês), enfermaria, sala de
televisão, sala de brinquedos, refeitório e pátio. A instituição oferece atividades de lazer,
sendo que atendimentos psicológico, médico e odontológico são buscados na comunidade.
Os critérios de inclusão para o presente estudo foram idade (entre 4 anos e 9 meses
e 11 anos e 8 meses2), tempo de abrigamento (mínimo de 6 meses), ausência de deficiência
mental e de diagnóstico de doença mental ou neurológica. Portanto, participaram todas as
crianças disponíveis na instituição que preenchiam estes critérios.
2 As idades foram estipuladas a partir da amostra padronizada do Teste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (Angelini & cols, 1999).
27
Em relação ao período de institucionalização, 17 crianças (27,4%) encontravam-se
abrigadas há no mínimo 6 meses e no máximo dois anos, 24 crianças (38,7%) residiam nos
abrigos há, no mínimo, 2 anos e 1 mês e no máximo 4 anos e 21 participantes (33,8%)
foram abrigados há mais de 4 anos e 1 mês. Em termos sexo e faixa etária, as crianças
encontravam-se relativamente equilibradas nos três períodos de institucionalização (χ2 =
1,653, gl = 2, p < 0,43 e χ2=3,17, gl = 4, p < 0,53, respectivamente).
A grande parte dessas crianças (80,6%) residia nos abrigos com um ou mais de seus
irmãos e nunca haviam sido adotadas (93,5%). As maiores causas de abrigamento das
crianças que fizeram parte da amostra se referem principalmente à negligência por parte
dos responsáveis, abandono, maus tratos e a falta de condições físicas e psicológicas dos
responsáveis. Os motivos do abrigamento das crianças, em relação ao período de
institucionalização, são apresentados na Tabela 1.
Tabela 1 Percentuais dos Motivos para o Abrigamento das Crianças em Relação ao Tempo de Institucionalização
Tempo de Institucionalização
Motivo abrigamento
6 meses à
2 anos
(n=17)
2 anos e 1 mês
à 4 anos
(n=24)
4 anos e 1 mês
ou mais
(n=21)
Total
(n=62)
% % % %
Negligência materna e/ou paterna 41,1 33,3 9,5 27,4
Abandono 5,8 25,0 33,3 22,6
Maus tratos 29,4 12,5 19,0 19,4
Pais sem condições físicas
e/ou psicológicas
5,8 12,5 23,8 14,5
Abuso sexual de irmãos 5,8 0,0 14,2 6,5
Abuso sexual da criança abrigada 5,8 8,3 0,0 4,8
Condições de miséria absoluta da
família
5,8 8,3 0,0 4,8
Quando comparadas em relação ao motivo e tempo de abrigamento, verifica-se que
as crianças que se encontravam abrigadas há mais de 4 anos e 1 mês foram
institucionalizadas por motivo de abandono em um percentual significativamente superior
(p<0,05) do que aquelas institucionalizadas há no máximo 2 anos. Já as crianças abrigadas
há um período menor (no mínimo 6 meses e no máximo 2 anos) possuem como motivo de
abrigamento a negligência materna e/ou paterna em uma freqüência significativamente
maior (p<0,05) do que as crianças institucionalizadas há mais de 4 anos e 1 mês.
28
Um pouco mais do que a metade das crianças da amostra, atualmente, não possui
qualquer tipo de contato (freqüente ou esporádico) com algum dos pais (56,5%). Entre o
grupo de crianças que possuem algum tipo de contato com os pais (43,5%), 14 (22,6%)
delas possuem um contato freqüente (semanal, quinzenal ou mensal) enquanto 13 (21%)
delas possuem um contato esporádico. Algumas das crianças que não possuem contato
com os pais, possuem algum tipo de contato com outros familiares ou não familiares
(padrinhos afetivos, vizinhos, etc.), porém a grande maioria dessas crianças (92,6%) não
mantêm com ninguém.
Sobre os dados relativos à ocupação profissional dos pais das crianças participantes
deste estudo, não existem registros sobre a atividade de 74,2% dos pais e 48,4% das mães.
O restante distribuiu-se em atividades do tipo: dona de casa, serviços braçais, biscate,
pensionista, serviços de segurança, guardador de carro.
Em relação à freqüência escolar das crianças, grande parte delas (91,9%) freqüenta
a escola e aquelas que não freqüentam possuem idade inferior a 7 anos. Dentre as crianças
que vão à escola, 68,4% nunca repetiram. Todavia, várias destas crianças encontram-se em
séries não-equivalentes à idade esperada o que, provavelmente, denota que tais crianças
passaram a freqüentar pela primeira vez a escola após seu abrigamento ou então que não
existem dados de repetências ou evasões anteriores ao abrigamento, caso tenham
freqüentado a escola naquele período.
Instrumentos
Questionário de dados sócio-demográficos
Com o objetivo de coletar dados sócio-demográficos das crianças e caracterizar a amostra
foi utilizado um questionário (ver Anexo A) com questões abertas e fechadas. Tal
instrumento buscava informações relacionadas aos dados de identificação da criança (sexo,
idade, data de nascimento, etc.), dados dos pais das crianças, causas do abrigamento,
tempo de abrigamento, situação familiar e situação atual da criança.
- Questionário de dados sobre o abrigo
A fim de obter dados dos abrigos, foi utilizado um questionário com perguntas
abertas (ver Anexo B). Esse questionário explorava informações relacionadas às
características da infra-estrutura das instituições, serviços oferecidos às crianças, faixa
etária atendida e vínculo da instituição (público, privado, ONG). Tanto os dados referentes
29
aos abrigos como as informações sócio-demográficas dos participantes foram fornecidas
pelos funcionários das instituições (diretores, psicólogos, assistentes sociais e monitores).
- Teste de Matrizes Progressivas Coloridas de Raven
A fim de preencher o critério de inclusão de ausência de deficiência mental, foi
utilizado o Teste de Matrizes Progressivas Coloridas de Raven, individualmente, em sua
forma Tabuleiro, como é proposto por Angelini, Custódio, Duarte e Duarte (1999), para
avaliar a inteligência dos participantes.
-Teste das Fábulas
O Teste das Fábulas (Cunha & Nunes, 1993) foi aplicado em sua forma verbal e
pictórica, em todas as crianças que fizeram parte da amostra, independente de faixa etária.
Na Fábula 4 foi utilizada a versão da viagem, excluindo-se a da morte já que este conteúdo
poderia mobilizar ainda mais os sujeitos. Todas as aplicações foram realizadas de forma
individual.
Na forma verbal, o teste é constituído por dez pequenas histórias incompletas, que
vão sendo apresentadas uma a uma para o sujeito, que deve completá-las. As fábulas que
fazem parte do teste são as seguintes: a do passarinho (Fábula 1); A do aniversário de
casamento (Fábula 2); a do cordeirinho (Fábula 3); a do enterro ou viagem (Fábula 4); a do
medo (Fábula 5); a do elefante (Fábula 6); a do objeto fabricado (Fábula 7); a do passeio
com a mãe ou com o pai (Fábula 8); a da notícia (Fábula 9) e por fim, a Fábula 10,
denominada “Fábula do sonho mau” (Cunha, Freitas & Raymundo, 1993).
A forma pictória do teste compõe-se de 12 lâminas, sendo que cada fábula possui
sua respectiva ilustração. Elas são apresentadas juntamente à forma verbal. A série de
lâminas possui duas a mais do que a de fábulas, já que existe a possibilidade de se aplicar a
lâmina respectiva ao sexo do sujeito (Fábula 8) e conforme a idade (Fábula 4) (Cunha,
Freitas & Raymundo,1993).
As fábulas são constituídas por dois subgrupos de histórias (Fábulas 1, 2, 3 e
Fábulas 6, 7, 8) que buscam explorar questões mais profundas, e são intercaladas pelas
fábulas 4 e 5 e finalizadas com as fábulas 9 e 10. Estas quatro últimas fábulas têm uma
função mais catártica e de controle. De acordo com Cunha e Nunes (1993), “as fábulas 1, 2
e 3 colocam o sujeito em situações problema que lidam com temas cruciais da vida infantil
e que, portanto, podem ser afetivamente mobilizadoras quando a criança está muito
próxima ou envolvida pelo conflito” (p.18). O conteúdo de todas as Fábulas que compõe o
instrumento serão descritos a seguir, assim como os conflitos que buscam explorar.
30
Fábula 1 (Fábula do passarinho):
A fábula 1 (Cunha & Nunes, 1993) relata a história de um passarinho filhote, que já
sabe voar um pouco, e que após uma ventania, encontra-se sozinho no ninho que caiu da
árvore. Seus pais haviam voado para árvores diferentes e agora ele deve tomar alguma
atitude.
Essa fábula sugere que a criança se identifique com um filhote de passarinho que já
voa um pouco e cujos pais voaram cada um para uma árvore diferente em razão de um
vento forte que derrubou o ninho em que se encontravam. Cunha e Nunes (1993) relatam
que esta fábula procura explorar a dimensão de dependência-independência e também
examinar a presença ou não de apego específico a um dos progenitores. Há um
enfrentamento do ego com a realidade externa na medida em que ele encontra-se
desprotegido e só, tendo que encontrar soluções frente a esta situação potencialmente
traumática, o que denota desta forma a atitude do sujeito frente ao mundo.
Fábula 2 (Fábula do aniversário de casamento):
A Fábula 2 (Cunha & Nunes, 1993) conta a história de uma criança que sai festa de
aniversário de casamento dos pais e vai ficar sozinha no jardim. As crianças que
respondem ao teste devem dizer o motivo pelo qual o personagem tomou tal atitude.
O conteúdo desta fábula coloca a criança frente a uma situação em que ele percebe
que seus pais possuem uma relação afetiva, independentemente de sua existência. Segundo
as autoras, a intenção desta fábula é explorar a reação da criança frente à cena primária.
Fábula 3 (Fáula do cordeirinho):
A Fábula 3 (Cunha & Nunes, 1993) traz como personagem um cordeirinho, que
apesar de já comer capim, ainda gosta muito de mamar. Tal cordeirinho vive sozinho com
a mãe. Um certo dia, surge um novo cordeirinho, mais novo, que ainda não come capim. O
cordeirinho pequeno está com fome, e como a mãe não pode alimentar os dois, pede que o
mais velho vá comer capim e deixe o leite para ele. A criança deve responder o que o
cordeirinho mais velho fará.
Esta Fábula, em geral, faz com que a criança se identifique com o cordeirinho que
se encontra privado do alimento que recebia até então (o leite materno). Conforme Cunha e
Nunes (1993), a situação descrita pela fábula foi desenvolvida para investigar rivalidade
fraterna, no entanto, acaba também por mobilizar temas mais amplos, como os de rejeição
materna e de dependência-independência.
31
Essas três primeiras fábulas, em conjunto, oferecem indícios acerca do nível de
frustração da criança pequena. Na medida em que elas são realmente vivenciadas como
frustrantes, pode ocorrer uma mobilização da agressão; é necessário então oferecer à
criança um escape para a expressão de aspectos agressivos, para que a ansiedade e a culpa
sejam de certa forma amenizados. Neste contexto é introduzida a F4.
Fábula 4 (Fábula da viagem):
O conteúdo da Fábula 4 (Cunha & Nunes, 1993) consiste em uma pessoa da família
que foi viajar de avião para muito longe e não voltará mais. A criança que responde ao
teste deve dizer quem é a pessoa que foi viajar.
A Fábula da viagem (ou da morte), como referido anteriormente, é introduzida
após as três primeiras fábulas, pois favorece a catarse e possibilita que a criança expresse
sua hostilidade, desejos de morte, culpabilidade e autopunição (Cunha & Nunes, 1993),
questões que possivelmente foram mobilizadas pelas fábulas anteriores.
Fábula 5 (Fábula do medo):
A Fábula 5 (Cunha & Nunes, 1993) descreve uma situação em que o personagem
da história (uma criança) está com medo. A criança que responde ao teste deve esclarecer a
causa do medo do personagem.
As autoras referem que a Fábula 5 aparece como uma oportunidade para
manifestação da ansiedade e autopunição, e assim como a Fábula 4, possibilita a catarse.
Fábula 6 (Fábula do elefante):
A Fábula 6 (Cunha & Nunes, 1993) relata a história de uma criança que tem um
elefantinho com uma tromba comprida. Em um determinado momento, essa criança
observa que o elefante se encontra diferente. Busca-se então, pela resposta dada ao teste,
entender qual é essa diferença.
De acordo com Cunha e Nunes (1993) esta fábula foi elaborada para explorar,
essencialmente, o complexo de castração. O herói da história é um elefante que possui uma
tromba bem comprida e que, em determinado momento, se encontra diferente. A criança
que responde à fábula deve relatar quais foram as mudanças que ocorreram no animal. É
esperado que sejam referidos danos no elefante, em especial em sua tromba.
Fábula 7 (Fábula do objeto fabricado):
32
O enredo da Fábula 7 (Cunha & Nunes, 1993) envolve um objeto de argila
construído pelo personagem e ele pode dá-lo ou não à sua mãe (após esta ter solicitado o
objeto) . Segundo as autoras, tal fábula propõe uma situação conflituosa associada à fase e
avalia o caráter possessivo e obstinado da criança.
Fábula 8 (Fábula do passeio):
A Fábula 8 (Cunha & Nunes, 1993, p.25) relata que uma criança (um menino ou
uma menina) fez um passeio com o progenitor do sexo oposto. Quando estes chegam em
casa, a criança acha que o progenitor do mesmo sexo está brabo. Quem responde ao teste
deve dar a razão para a ira do(a) pai /mãe.
Esta Fábula coloca, de forma evidente, uma situação triangular, configurando uma
cena com elementos edípicos. Cunha e Nunes (1993) referem que, muitas vezes, a resposta
dada a esta fábula corrobora indícios apontados pela Fábula 2. Entretanto, pode ocorrer de,
na Fábula 2, a criança elaborar uma resposta aceitável, não explicitando o conflito. Nestes
casos, este acaba por se insinuar, de algum modo, pela Fábula 8.
Fábula 9 (Fábula da notícia):
O conteúdo da Fábula 9 (Cunha & Nunes, 1993) envolve uma situação em que o
personagem (uma criança) ao chegar em casa recebe uma notícia de sua mãe. A criança
que responde ao teste deve contar que notícia foi esta.
A Fábula 9 faz parte de uma díade, juntamente com a Fábula 10. Essas duas fábulas
possuem função semelhante das Fábula 4 e 5, a catarse de questões (sentimentos, fantasias)
mobilizadas pelos conteúdos das fábulas anteriores (Fábulas 6, 7 e 8). Além disso, através
dela pode-se ter acesso aos desejos e medos da criança (Cunha & Nunes, 1993).
Fábula 10 (Sonho mau):
A Fábula 10 (Cunha & Nunes, 1993) descreve uma situação em que o personagem
da história (uma criança) acorda após ter um sonho mau. A criança que responde ao teste
deve relatar qual foi o sonho do personagem.
Essa fábula, como afirmado por Cunha e Nunes (1993), tinha como objetivo
original uma função de controle das fábulas que a antecederam, no sentido que, se a
criança ficou muito mobilizada por um dos temas anteriores, este é retomado na Fábula 10.
Porém, esta fábula também proporciona à criança a possibilidade de manejar
defensivamente a ansiedade desencadeada pelas demais fábulas. (Cunha, Freitas &
Raymundo, 1993, Cunha & Nunes, 1993).
33
Procedimentos
Para fins de realização da coleta de dados, inicialmente foi realizado contato com
instituições que abrigam crianças. Todas instituições contatadas preenchiam o critério de
serem abrigos de passagem, ou seja, todas as crianças que estavam sob os cuidados de tais
locais eram passíveis de adoção ou de voltarem às famílias de origem.
Após o consentimento das instituições (foi preenchido o consentimento informado
– Anexo C), foram realizadas visitas ao local, com a finalidade de ambientação das
crianças com a pesquisadora e desta com as crianças e local da coleta. Os participantes
foram selecionados de acordo com os critérios de inclusão citados anteriormente sendo
convidandos a participar da pesquisa. Com as crianças que desejaram participar do estudo
foram aplicados, de forma individual, os seguintes instrumentos (listados em ordem de
aplicação): Teste das Matrizes Coloridas de Raven em forma de tabuleiro e o Teste das
Fábulas. O questionário de dados sócio-demográficos das crianças e o questionário de
dados da instituição foram preenchidos por funcionários dos abrigos. Buscou-se investigar
as informações sócio-demográficas das crianças após a aplicação dos testes, já que o
acesso anterior a tais dados (dados da história de vida, causas do abrigamento) poderia
interferir durante a testagem (principalmente durante a realização do inquérito).
Questões Éticas
O presente estudo, conforme ementa sobre a realização de pesquisa em psicologia com
seres humanos (Resolução do CFP no 016/2000, 2000), não se enquadra na designação de
pesquisa com risco mínimo, uma vez que trabalha com variáveis que podem gerar
ansiedade, através da mobilização de afetos que poderão ser evocados com a aplicação de
um teste projetivo, o Teste das Fábulas.
Com o objetivo de minimizar eventuais sentimentos de ansiedade gerados pela
aplicação dos instrumentos, anteriormente a essa etapa, foram realizadas visitas às
instituições, com a finalidade de ambientação das crianças com a pesquisadora. Após essa
ambientação, foram aplicados os instrumentos, preservando-se o cuidado em relação à
realização de um rapport, procurando-se estabelecer uma relação de confiança com a
criança. O teste das fábulas foi apresentado, de uma forma acessível ao entendimento dos
participantes, como uma atividade de “contar histórias”, onde não existiriam questões
certas ou erradas.
34
Quando observado que alguma criança estava extremamente mobilizada, apresentando
sinais de que necessitava de auxílio, foi feito contato com a instituição, a fim de discutir o
eventual encaminhamento para avaliação ou atendimento psicológicos.
Além disso, o presente estudo seguiu as normas da ementa sobre a realização de
pesquisa em psicologia com seres humanos (Resolução do CFP no 016/2000, 2000), que
refere a necessidade do consentimento informado dos responsáveis (no caso desta
pesquisa, o consentimento da instituição). A criança participante também foi informada
dos objetivos e procedimentos da pesquisa e tinha a liberdade em aceitar ou não em
participar do estudo.
Em relação aos resultados da pesquisa, como as informações foram analisadas de uma
forma global, não serão dadas devoluções individuais dos instrumentos. Os resultados da
pesquisa serão comunicados às instituições das quais as crianças fazem parte, porém não
será fornecido nenhum resultado dos participantes de forma individual.
CAPÍTULO III
35
RESULTADOS
Os resultados relativos aos instrumentos utilizados serão apresentados abaixo,
conforme os objetivos propostos: realizar um estudo relativo à forma como as crianças que
residem em instituições respondem ao Teste das Fábulas, após a verificação da existência
de um padrão de respostas diferente em termos de mecanismos de defesa, fantasias,
estados emocionais, e da análise das respostas comuns para essas crianças. A seguir, serão
descritos os resultados referentes às aplicações do Teste das Fábulas (Cunha & Nunes,
1993), apresentando-os fábula a fábula, item a item.
Teste das Fábulas
O Teste das Fábulas (Cunha & Nunes, 1993) foi aplicado em todas as crianças
disponíveis nas instituições (n=64), que se enquadravam nos critérios de inclusão. Dessa
amostra, uma criança foi excluída por obter resultado indicativo de deficiência mental no
teste de inteligência, como descrito anteriormente, e um segundo participante foi eliminado
da amostra por apresentar respostas bastante comprometedoras em termos emocionais,
quando comparado com as demais crianças da amostra3. Desse modo, os resultados que
serão aqui apresentados referem-se a uma amostra de 62 participantes.
Todos os testes foram levantados de acordo com o sistema de categorização
proposto por Cunha e Nunes (1993), por dois juízes cegos. Os casos que não se
enquadraram nesse sistema de levantamento eram anotados a fim de criar novas categorias.
Em seguida todos as respostas dos protocolos de levantamento foram discutidas, sendo
adotado um critério de concordância para estabelecer quais delas permaneceriam para
análise dos dados. Porém, em caso de discordância destes juízes, um terceiro participava da
discussão para que se chegasse a um consenso sobre a resposta mais adequada.
Em relação ao tempo de reação a cada fábula, tempos extremamente altos (acima de
60 segundos) foram excluídos para fins de análise dos dados, já que poderiam alterar as
médias de tempo do grupo total.
Para fins de análise dos dados, os participantes foram divididos por faixas etárias,
sendo que 16 crianças se encontravam na faixa dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos (25,8%),
23 na faixa entre os 7 anos e 1 mês e 9 anos (37,1%) e 23 na faixa de 9 anos e 1 mês até 11
anos e 8 meses (37,1%).
3 Ambos os casos foram notificados para a psicóloga da instituição
36
Os dados foram analisados através de um levantamento das freqüências,
comparando-se os subgrupos estudados (levando-se em conta as variáveis sexo e faixa
etária). Para analisar possíveis diferenças entre os grupos, foi utilizado o Teste de
Diferença entre Proporções e serão apresentados somente seu resultado quando a diferença
significativa estiver presente.
O tempo de reação ao teste e as respostas populares foram analisadas através da
realização das médias da amostra para cada fábula, levando-se em conta também os
subgrupos divididos por sexo e faixa etária. Possíveis diferenças foram verificadas pelo
teste Kruskal Wallis, tendo em vista a não-normalidade das variáveis na amostra (em
função das médias, medianas e modas não terem valores aproximados, ou dos desvios
padrões serem maiores que a metade da média, ou pelo skewness ser maior que 1,6 – na
maioria dos casos os três requisitos foram encontrados).
Todos os dados serão apresentados em tabelas, divididos por faixas etárias, tendo
em vista que esta variável diferenciou mais os grupos. A análise por faixas etárias não
levará em consideração a variável sexo, pois o número de casos de cada sexo em relação a
esta variável é pequeno. Os percentuais por sexos e os por tempo de abrigamento que se
mostraram predominantes ou que apresentaram diferenças importantes, serão descritos no
texto. As diferenças entre faixas etárias que mostraram-se significativas serão apontadas
nas respectivas tabelas.
Fábula 1 (F1)
Na Fábula 1, denominada Fábula do Passarinho, cuja temática remete à separação e
individuação e atitude básica frente ao mundo (Cunha & Nunes, 1993), os resultados que
serão descritos referem-se aos seguintes itens: tempo de reação, fenômenos específicos
(distúrbio perceptual, confusão lógica e auto-referência), respostas populares, ação, enredo,
personagens, desfecho, fantasias, estados emocionais e defesas.
Tempo de reação – F1
O tempo de reação refere-se ao intervalo de tempo entre o final da verbalização da
Fábula até o início da resposta da criança. Para o teste das Fábulas o tempo de reação
esperado está entre 1 e 7 segundos, sendo que tempos superiores a 10 segundos são raros
(Cunha & Nunes, 1993).
A média do tempo de reação da amostra (n=61) para a Fábula 1 foi de 6,98
segundos. Um caso foi excluído por ultrapassar o tempo de 60 segundos para reação à
37
fábula. As meninas (n=20) apresentaram um tempo de reação médio de 7,95 segundos
(d.p.=7,77 seg.), enquanto os meninos (n=41) de 6,51 segundos (d.p.=7,98 seg.). As
médias de Tempo de reação por faixa etária podem ser observadas na Tabela 2.
Tabela 2 Médias de Tempo de Reação à Fábula 1, em Segundos, por Faixa Etária
Faixa Etária n Tempo de Reação *
(M) (d.p.)
4 anos 9 meses – 7 anos 16 6,88 7,79
7 anos 1 mês – 9 anos 22 7,00 9,66
9 anos 1 mês – 11 anos 8 meses 23 7,04 6,22
Total 61 6,98 7,87
* Em segundos
Distúrbio Perceptual – F1
Os distúrbios Perceptuais são caracterizados por omissões, adições ou distorções,
seja de estímulos verbais ou pictóricos. Cunha e Nunes (1993) afirmam que geralmente
este fenômeno resulta de uma forte mobilização afetiva. Ao responderem ao teste, as
crianças podem manifestar distúrbios perceptuais, por exemplo, adicionando personagens
que não foram citados na introdução da Fábula ou quando fica claro que ela visualizou no
cartão algo que não está lá.
Mais da metade das crianças da amostra (53,2%, n=62), tanto do sexo masculino
(53,7%, n=41) quanto do sexo feminino (52,4%, n=21), apresentaram distúrbio perceptual
na Fábula 1. Percentuais altos de distúrbio perceptual nas respostas dos participantes
também mostraram-se presentes em todas as faixas etárias. Na faixa etária entre 4 anos e 9
meses aos 7 anos, 56,3% das crianças apresentaram esse fenômeno em suas respostas.
Percentuais de 56,5% e 47,8%, dos participantes com idades entre 7 anos e 1 mês e 9 anos,
e 9 anos e 1 mês aos 11 anos e 8 meses, respectivamente, desenvolveram respostas com
indícios de distúrbio perceptual.
O distúrbio mais freqüente demonstrado pelos participantes foi acrescentar algum
personagem que não havia sido mencionado durante a introdução da fábula. Em geral, as
crianças adicionavam irmãos do filhote passarinho.
Confusão Lógica4 – F1
4 Item acrescentado após o levantamento dos testes das crianças da amostra
38
O item confusão lógica foi acrescentado na análise das respostas ao Teste das
Fábulas com o objetivo de classificar àquelas respostas que parecem incoerentes ou que
perdem a lógica e a linha de raciocínio no decorrer da verbalização. A confusão lógica
pode estar presente em respostas não adaptadas, porém estas últimas nem sempre
apresentam indícios de confusão lógica. Isto porque, respostas não adaptadas podem ter
conteúdos coerentes, compreensíveis, mas que não se adequaram ao tema proposto pela
fábula.
Na Fábula 1, a grande parte da amostra (91,9%, sendo 92,7% dos meninos e 90,5%
das meninas) não apresentou indícios de confusão lógica em suas respostas, sendo este
item mais presente nas crianças menores, na faixa dos 4 anos e 9 meses e 7 anos de idade
(25% das respostas com indícios de confusão lógica encontram-se nesta faixa etária, n=16).
Um percentual de 4,3% das crianças com idades entre 7 anos e 1 mês aos 9 anos de idade
apresentaram confusão lógica em suas respostas. Não houveram indícios deste fenômeno
na faixa etária dos 9 anos e 1 mês e 11 anos e 8 meses de idade.
Auto-Referência – F1
As respostas com auto-referência caracterizam-se por possuírem “referências
altamente personalizadas ou indícios expressivos de um auto-envolvimento” (Cunha e
Nunes, 1993, p.74). Uma forma de manifestação desse fenômeno ocorre quando a criança
refere-se a si mesma na verbalização.
A maioria das crianças da amostra (95,2%) não utilizou a auto-referência nas
respostas à Fábula 1, não havendo diferenças entre percentuais de meninos (95,1% não
apresentou auto-referência) e meninas (95,2% não utilizou auto-referência). A auto-
referência mostrou-se presente em um percentual de 12,5% das crianças na faixa etária de
4 anos e 9 meses aos 7 anos e 4,3% das crianças entre 7 anos e um mês e 9 anos de idade
deram respostas com auto-referência. As crianças com idades entre 9 anos e 1 mês e 11
anos e 8 meses não manifestaram esse fenômeno em suas respostas.
Respostas Populares - F1
As Respostas populares são definidas como uma medida de concordância social
(Cunha & cols., 1989b), ou seja, demonstram a opinião que uma pessoa tem em comum
com grupo ao qual pertence. Os autores variam em relação à razão que deve ser
estabelecida para que uma resposta seja considerada popular. Em sua pesquisa com o
Roschach, Vaz (1997) utilizou a razão de 1/6. Neste estudo, foi utilizado o critério de
39
Peixotto (1957), que estabelece como populares para o Método das Fábulas as respostas
que ocorrem em um percentual igual, ou superior à 25%.
As respostas populares para o Teste das Fábulas, no grupo estudado por Cunha e
Nunes (1993), foram divididas e analisadas de acordo com sexo e faixa etária (pré-escolar
e escolar). Considerou-se as crianças com idades a partir de 7 anos e 1 mês como escolares
e as da faixa dos 4 anos e 9 meses aos 7 ano, como pré-escolares.
Na Fábula 1 as respostas populares encontradas para essa amostra padronizada
foram aquelas em que as crianças relatam que o passarinho “Vai para outra árvore”, para as
crianças pré-escolares de ambos os sexos, e “ Vai para outra árvore ou um galho, ou lugar
abrigado”, para crianças escolares de ambos os sexos.
No grupo total de crianças institucionalizadas 43,8% das crianças pré-escolares
(60% das meninas e 36,4% dos meninos) e 60,9% das crianças escolares (56,6% dos
meninos e 65,7 % das meninas) apresentaram as mesmas respostas da amostra padronizada
do instrumento. Assim, conclui-se que a resposta comum (a partir de 25%) para a Fábula 1
da amostra de crianças institucionalizadas é a mesma do que a resposta popular das
crianças da amostra padronizada do teste.
Ação – F1
O item “Ação” refere-se à atitude que o herói da fábula (filhote passarinho) toma no
momento em que o ninho cai e ele encontra-se longe das figuras parentais. Um percentual
de 69,4% dos participantes da pesquisa apresentaram respostas com ações ativas na Fábula
1. Tanto as crianças do sexo feminino (76,2%) quanto as do sexo masculino (65,9%), em
todas as faixas etárias, apresentaram uma freqüência maior de respostas com ações deste
tipo.
As ações ativas são caracterizadas por respostas como: o passarinho vôou, buscou
ajuda, chamou a mamãe, etc. As demais crianças utilizaram em suas respostas ações
passivas (17,7%), ações inicialmente inseguras e posteriormente ativas (8,1%), ações
inseguras (3,2%) e ações inicialmente ativas e posteriormente passivas (1,6%).
Os percentuais de todos tipos de ações referentes às faixas etárias são apresentados
na Tabela 3.
Tabela 3
40
Percentuais dos tipos de Ação apresentados na Fábula 1 em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Tipo de Ação 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Ativa
Passiva
Insegura→Ativa
Insegura
Ativa→Passiva
62,5
12,5
25,0a
0,0
0,0
65,2
21,7
0,00a
8,7
4,3
78,3
17,4
4,3
0,00
0,00
Total 100,0 100,0 100,0
a- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05.
No entanto, foi constatada uma tendência (com diferenças não significativas), para
o aumento de respostas com ações passivas e diminuição das ações ativas, conforme
aumentava o tempo de abrigamento. Um percentual de 76,5% das crianças que estavam
abrigadas há no mínimo 6 meses e no máximo 2 anos e 70,8% das que se encontravam
institucionalizadas entre 2 anos e 1 mês e 4 anos, elaboraram respostas com ações ativas e
11,8% e 12,5% delas, respectivamente, responderam à Fábula 1, com ações passivas. As
crianças que se encontravam abrigadas por um período mais longo (acima de 4 anos e 1
mês) em uma freqüência de 61,9% apresentaram ações ativas e 28,6%, ações passivas.
Enredo – F1
O item “enredo” relaciona-se não somente à primeira atitude (ação) que o herói
toma (no caso da F1, a atitude que toma ao cair do ninho), mas sim ao que ocorre
posteriormente e dá continuidade à história, até chegar ao seu desfecho.
Em relação ao enredo, a maior freqüência das crianças (46,8%) referiram-se ao
herói apresentando uma solução manifestamente independente para o conflito introduzido
pela Fábula 1. Os maiores percentuais que se seguiram, relacionados ao enredo, foram: o
herói recebendo ajuda eficaz (em geral auxílio de figuras paternas ou outros personagens,
sem buscar essa ajuda) (19,4%), o herói, primeiramente, tentando uma solução
independente, mas ao final precisando de ajuda (12,9%) e o herói procurando ajuda
(8,1%).
As meninas e os meninos, em uma maior freqüência, apresentaram respostas em
que o herói apresentou uma solução manifestamente independente (57,1% e 41,5%,
respectivamente). Em todas as faixas etárias, freqüências mais altas de crianças elaboraram
41
histórias com enredos em que o herói apresentava uma solução manifestamente
independente. Todos os percentuais de enredos, por faixa etária estão apresentados na
Tabela 4.
Tabela 4 Percentuais dos Tipos de Enredo da Fábula 1, em relação à faixa etária Faixa Etária
Enredo
4 anos 9 meses
– 7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês
– 9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Apresenta solução manifestamente
Independente
37,5 34,8a 65,2a
Recebe ajuda eficaz 6,3 26,1 21,7
Tenta solução independente, mas
precisa ajuda
12,5 17,4 8,7
Procura ajuda 6,3 13,0 4,3
Apresenta solução aparentemente
independente
6,3 8,7 0,0
Sofre agressão do ambiente 12,5 0,0 0,0
Não procura nem recebe ajuda 12,5 0,0 0,0
Recebe ajuda não eficaz 6,3 0,0 0,0
Total 100,0 100,0 100,0
a- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
Através da análise das respostas por tempo de abrigamento observou-se uma
tendência (não significativa) para uma diminuição da freqüência de crianças que
elaboravam enredos manifestamente independentes conforme aumentava o período de
abrigamento. O percentual mais alto de crianças com este tipo de enredo (58,8%) residiam
no abrigo há, no mínimo 6 meses e no máximo 2 anos, e entre 2 anos e 1 mês e 4 anos
(50%), enquanto o menor percentual delas (33,3%) encontravam-se abrigadas há mais de 4
anos e 1 mês.
Personagem – F1
O item personagem relaciona-se àqueles elementos (pessoas, animais) que a criança
verbaliza no desenvolver da fábula, além do herói. Cada criança tem a possibilidade de
incluir na história quantos personagens, além do herói, desejar. Um percentual de 77,4%
das crianças da amostra fez referência às figuras paternas em suas respostas. O segundo
42
personagem mais freqüente foi “irmão(s)5”, citado por 45,2% das crianças. Já a figura
paterna e a figura materna, isoladamente, apareceram em 9,7% e 6,5% dos casos,
respectivamente.
Assim como na amostra total, quando comparados os sexos, os personagens, além
do herói, citados de modo mais freqüente, tanto para as meninas como para os meninos,
foram: “figuras parentais” (90,5% e 70,7%, respectivamente) e “irmãos” (57,1% e 39%,
respectivamente). Em relação às faixas etárias, a preferência segue pelos personagens:
“figuras parentais” e “irmãos”, nesta ordem. Os percentuais de personagens, por faixa
etária, podem ser visualizados na Tabela 5.
Tabela 5 Percentuais dos Personagens da Fábula 1 em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Personagem
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Figuras parentais 68,8 69,6 91,3
Irmãos 43,8 39,1 52,2
Figura Paterna 6,3 13,0 8,7
Figura Materna 6,3 13,0 0,0
Figuras não-parentais positivas 6,3 8,7 4,3
Figuras Negativas 6,3 8,7 0,0
Sem resposta 12,5 4,3 0,0
Desfecho – F1
O desfecho se refere a forma como a criança finaliza a história e como o herói
soluciona os conflitos apresentados. Na Fábula 1, 75,8% das crianças apresentaram
respostas características de um desfecho adaptativo, 12,9% de desfechos com adaptação
parcial6, 9,7% de desfechos não adaptativos e apenas 1,6% das crianças criaram desfechos
não adaptados. Não houve diferenças entre os sexos, (quando analisada a amostra total,
sem a análise por faixas etárias) em relação à maior incidência de desfechos adaptativos,
sendo que 85,7% das meninas e 70,7% dos meninos apresentaram esse tipo de resposta.
5 Personagem acrescentado após levantamento dos testes das crianças da amostra 6 O desfecho do tipo “adaptação parcial” foi acrescentado após o levantamento dos testes das crianças abrigadas. Um exemplo deste tipo de desfecho é quando o passarinho sobrevive às adversidades do ambiente, mas percebe-se que a adaptação não é completa em razão de um estado emocional desfavorável.
43
Em todas as faixas etárias, a maior frequência de crianças produziu respostas com
desfechos adaptativos. Pôde-se perceber que, com o aumento da idade, aumentava também
o percentual de participantes que apresentavam esse tipo de desfecho. As crianças com
idades entre 4 anos e 9 meses até os 7 anos, em um percentual de 43,8% desenvolveram
histórias com desfechos adaptativos, enquanto que 78,3% dos participantes na faixa etária
dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos, e 95, 7% daqueles com idades entre 9 anos e 1 mês até os
11 anos e 8 meses finalizaram suas respostas com essa forma de desfecho. Os percentuais
de desfechos, por faixa etária, estão apresentados na Tabela 6.
Tabela 6 Percentuais de Desfechos para a Fábula 1, por Faixa Etária Faixa Etária
Desfecho
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Adaptativo 43,8a,b 78,3a 95,7b
Adaptação parcial* 25,0 13,0 4,3
Não adaptativo 31,3c,d 4,3c 0,0d
Não adaptado 0,0 4,3 0,0
Total 100,0 100,0 100,0
*Categoria de desfecho acrescentada após levantamento dos testes das crianças da amostra a,c- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05 b- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,001 d- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,01
Fantasias - F1
Ao desenvolverem suas histórias as crianças trazem implícitas fantasias (ver Anexo
D) que podem ser detectadas através da análise dos conflitos apresentados nas tramas
elaboradas. Em suas respostas, cada criança podia apresentar mais de um tipo de fantasia
em sua verbalização, porém as análises foram realizadas de acordo com o número de casos
(participantes). Por tal razão, o total dos percentuais de fantasias ultrapassam 100%.
Através das respostas emitidas pela amostra para a Fábula 1, verifica-se que tal
história suscitou na maior parte das crianças fantasias de abandono (45,2%), seguida pelas
fantasias de agressão deslocada para o ambiente (38,7%), agregação familiar7 (37,1%) e de
impotência (30,6%). Poucas crianças da amostra (9,7%) não apresentaram fantasias
relativas à Fábula 1.
7 Fantasia acrescentada após levantamento dos testes das crianças da amostra (ver Anexo D)
44
Entre os meninos, observou-se que a fantasia mais prevalente foi a de abandono
(48,8%), assim como na amostra geral. Para as meninas, no entanto, a freqüência de
respostas indicativas de fantasias de agregação familiar foi maior (42,9%) do que as
demais fantasias. A segunda fantasia mais freqüente para o grupo dos meninos foi a de
agressão deslocada para o ambiente (41,5%), seguida pelas de agregação familiar (34,1%)
e de impotência (31,7%). No grupo das meninas, a segunda fantasia mais presente foi a de
abandono (38,1%), seguida pelas de agressão deslocada para o ambiente (33,3%) e
impotência (28,6%). Entretanto, não houveram diferenças significativas quando
comparadas as freqüências de cada fantasia em relação aos sexos.
Para a faixa etária dos 4 anos e 9 meses até os 7 anos a fantasia mais freqüente foi a
de agressão deslocada para o ambiente (68,8%). Os participantes desta faixa etária ainda
apresentam como mais freqüente as fantasia de abandono (43,8%). No grupo das crianças
com idades entre 7 anos e 1 mês e 9 anos, um maior percentual demonstrou fantasias de
agressão deslocada para o ambiente (43,5%) e de impotência (43,5%). Para essas crianças,
a fantasia de abandono se mostrou presente em 30,4% das respostas. Na faixa etária dos 9
anos e 1 mês aos 11 anos e 8 meses, um percentual mais alto de participantes apresentou
em suas respostas fantasias de agregação familiar (60,9%) e de abandono (60,9%). Os
percentuais de participantes que manifestaram fantasias, por faixa etária, podem ser
observados na Tabela 7.
Tabela 7 Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 1, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Fantasias
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Abandono 43,8 30,4a 60,9a
Agressão deslocada para o ambiente 68,8b 43,5c 13,0b,c
Agregação familiar* 0,0 d,e 39,1d 60,9e
Impotência 12,5f 43,5f 30,4
Superação* 0,0 8,7 13,0
Morte* 18,8g 4,3 0,0g
Volta ao útero 12,5 8,7 0,0
Privação 6,3 4,3 4,3
45
Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 1, em Relação à Faixa Etária (continuação da Tabela 7) Onipotência 12,5 0,0 0,0
Rejeição 0,0 0,0 8,7
Ganho secundário 0,0 0,0 4,3
Sem indícios 18,8 4,3 8,7
*Categorias de fantasias acrescentadas, após levantamento dos testes das crianças da amostra a,c,f,g- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05 b,e- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,001 d- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,01
Em relação às diferenças entre tempo de institucionalização, percebe-se uma
tendência (não significativa) para o aumento dos percentuais de crianças que apresentam
fantasias de agregação familiar em suas respostas, conforme aumentava esse período.
Enquanto 29,4% das crianças que estavam abrigadas há no mínimo 6 meses e no máximo 2
anos manifestaram esse tipo de fantasia, uma freqüência de 33,3% dos participantes
abrigados entre 2 anos e 1 mês e 4 anos, e 47,6% daqueles com mais de 4 anos e 1 mês de
institucionalização, elaboraram respostas com fantasias de agregação familiar.
Estados Emocionais – F1
O item estados emocionais (ver Anexo E) refere-se aos sentimentos ou sensações
que são atribuídos ao herói da história. Assim como o item “fantasias”, os “estados
emocionais” também foram avaliados pelo número de casos (participantes) que
expressaram tal item, sendo que cada criança poderia fazer referência a mais de um estado
emocional em sua verbalização.
Em relação à Fábula 1, o maior percentual de crianças da amostra total apresentou
em suas respostas estados emocionais de “mal-estar8”(27,4%), seguidas por “bem-
estar9”(17,7%), solidão (12,9%), tristeza (11,3%) e relacionadas à sensações físicas, como
fome, dor ou frio10 (11,3%). Uma freqüência de 3,2% das crianças não emitiu qualquer tipo
de resposta com indícios de estados emocionais.
Um percentual mais alto de meninas manifestou o estado emocional de bem-estar
(28,6%) em suas respostas, enquanto os meninos demonstraram sentimentos de mal-estar
(34,1%). Ainda, entre a maior freqüência de participantes do sexo feminino, foram citados
os estados emocionais de solidão (19%), mal-estar (14,3%), tristeza (14,3%) e medo
8 Categoria de “estados emocionais” acrescentada após levantamento dos testes das crianças da amostra (ver Anexo E). 9 Idem 8 10 Idem 8
46
(9,5%). Entre o sexo masculino, as respostas com maior incidência que se seguiram foram
as que se referiam a sensações físicas como fome, dor e frio (14,6%), bem-estar (12,2%),
tristeza (9,8%), solidão (9,8%) e alegria (9,8%).
Com relação à faixa etária, pode-se observar que os estados emocionais variaram
bastante conforme a idade da criança. Porém, ainda a descrição de que o herói se sentiu
mal com a situação, sem que a criança consiga dar mais detalhes sobre os sentimentos
prevaleceu sobre outros estados emocionais, em todas as faixas etárias (ver Tabela 8).
Tabela 8 Percentuais de Participantes que Apresentaram Estados Emocionais para a Fábula 1, em Relação à faixa etária Faixa Etária
Estados Emocionais
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Mal-estar* 25,0 30,4 26,1
Bem-estar* 18,8 26,1 8,7
Solidão 0,0a 8,7 26,1a
Tristeza 6,3 0,0b 26,1b
Fome, dor e frio* 18,8 8,7 8,7
Medo 12,5 13,0 0,0
Alegria 0,0 8,7 13,0
Impotência 6,3 4,3 4,3
Raiva 6,3 0,0 0,0
Desamor 0,0 4,3 0,0
Ambivalência 6,3 0,0 0,0
Sem indícios 6,3 4,3 0,0
* Estados Emocionais acrescentados após levantamento dos testes das crianças da amostra a - letras iguais indicam valores que se diferenciam entre si, p<0,05 b - letras iguais indicam valores que se diferenciam entre si, p<0,01
Defesas – F1
Os mecanismos de defesa (ver Anexo F) são recursos que o ego possui para manter
a estabilidade adaptativa (Bouchard & cols, 1998). Conforme Blaya, e colaboradores
(2003), eles servem como indicativo da forma como as pessoas lidam com seus conflitos.
Como para alguns dos itens anteriores, os mecanismos de defesa foram analisados
de acordo com o número de casos (participantes) sendo que cada criança pôde utilizar mais
de um mecanismo de defesa em suas respostas.
47
Na amostra total, um percentual maior de crianças utilizou as defesas de regressão
(17,7%), idealização11(16,1%), distorção (12,9%), e somatização (12,9%) em suas
respostas. Uma freqüência de 33,9 % das crianças não utilizou nenhum tipo de mecanismo
de defesa na Fábula 1.
Em relação aos sexos, os mecanismos mais utilizados pelas meninas foram os de
idealização (23,8%), distorção (19%), negação (14,3%) e regressão (14,3%), e pelos
meninos os de regressão (19,5%), idealização (12,2%) e distorção (9,8%). Os participantes
do sexo masculino e do sexo feminino, em uma porcentagem de 34,1% e 33,3%,
respectivamente, não apresentaram nenhum tipo de mecanismo de defesa para a Fábula 1.
A análise dos mecanismos de defesa por faixa etária demonstrou que as crianças
com idades entre 4 anos e 9 meses e 7 anos, utilizaram, em uma freqüência maior,
mecanismos de regressão (31,3%), distorção (31,3%), e de somatização (18,8%), sendo
que 25% delas não fizeram uso de nenhum tipo de mecanismo de defesa.
Na faixa etária entre 7 anos e 1 mês e 9 anos, percentuais mais altos dos
participantes utilizaram mecanismos de regressão (21,7%), de idealização(13%) e de
negação (13%). Uma freqüência maior de crianças desta faixa etária (39,1%) apresentou
respostas sem indícios de utilização de mecanismos de defesa.
Os participantes da faixa etária dos 9 anos e 1 mês até os 11 anos e 8 meses
apresentaram uma incidência maior de mecanismos de defesa de idealização (21,7%) e de
somatização (13%). O percentual de crianças dessas idades que não utilizou nenhum tipo
de mecanismo de defesa foi de 34,8%. Os percentuais dos participantes que utilizaram
defesas, por faixa etária, podem ser observados na Tabela 9.
Tabela 9 Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 1, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Mecanismos de Defesa
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Regressão 31,3a 21,7 4,3a
Idealização* 12,5 13,0 21,7
Distorção 31,3b 4,3b 8,7
Somatização 18,8 8,7 13,0
Negação 0,0 13,0 8,7
11 Mecanismo de defesa acrescentado após levantamento dos testes das crianças da amostra (ver Anexo F)
48
Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 1, em Relação à Faixa Etária (continuação da Tabela 9) Atuação 12,5 0,0 0,0
Compensação* 0,0 8,7 4,3
Racionalização 0,0 0,0 8,7
Evitação* 12,5 0,0 0,0
Hipocomdria 0,0 4,3 0,0
Introjeção 0,0 4,3 0,0
Sem indícios 25,0 39,1 34,8
* Mecanismos de defesa acrescentados após levantamento dos testes das crianças da amostra a,b - letras iguais indicam valores que se diferenciam entre si, p>0,05
Fábula 2 (F2)
A Fábula 2 (Fábula do Aniversário de Casamento) explora a reação da criança
frente à relação afetivo-sexual dos pais (Cunha & Nunes, 1993). Os resultados que serão
apresentados referem-se aos seguintes itens: tempo de reação, fenômenos específicos
(distúrbio perceptual, confusão lógica, auto-referência, contaminação, e perseveração),
respostas populares, ação, motivo, fantasias, estados emocionais e defesas.
Tempo de Reação – F2
Na Fábula 2, o tempo de reação da médio da amostra (n=62) foi de 9,45 segundos.
A média do tempo de reação das meninas (n=21) foi de 7 segundos (d.p.=7,67 seg.),
enquanto dos meninos (n=41) foi de 10,71 segundos (d.p.=11,50 seg.). Os participantes na
faixa etária dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos apresentaram uma média mais alta de tempo de
reação (M=11,52 segundos), enquanto a média de tempo mais baixa foi a das crianças com
idades entre 9 anos e 1 mês até 11 anos e 8 meses (M=7,30 segundos). No entanto, não
houve diferenças significativas entre as médias de tempo de reação em relação às
diferentes faixas etárias. As médias de tempo de reação, por faixa etária, podem ser
visualizados na Tabela 10.
Tabela 10 Médias de Tempo de Reação à Fábula 2, em Segundos, por Faixa Etária
Faixa Etária n Tempo de Reação*
(M) (d.p.)
4 anos 9 meses – 7 anos 16 9,56 9,22
7 anos 1 mês – 9 anos 23 11,52 13,62
9 anos 1 mês – 11 anos 8 meses 23 7,30 7,06
Total 62 9,45 10,45
* Em segundos
49
Houve uma diferença significativa entre à média do tempo de reação à Fábula 2 das
crianças abrigadas há no mínimo 6 meses e, no máximo 2 anos (M=9,41 seg, dp=14,81
seg.) em relação ao dos participantes institucionalizados há mais de 2 anos e 1 mês até 4
anos (M=13,33 seg.; d.p.=9,41seg.; p<0,02) e dos participantes que se encontravam
abrigados há mais de 4 anos e 1 (M=5,05 seg, d.p.=4,19 seg.; p<0,004). Além disso, a
diferença do tempo de reação entre as crianças abrigadas entre 2 anos e 1 mês e 4 anos e há
mais de 4 anos e 1 mês também foi significativa (p<0,001).
Distúrbio Perceptual – F2
A maioria das crianças (93,5%) não apresentou nenhum tipo de distúrbio perceptual
na Fábula 2. O percentual alto de respostas sem indícios de distúrbios perceptuais foi
comum para ambos os sexos (90,5% sexo feminino e 95,1% sexo masculino) e para todas
as faixas etárias (87,5% para a faixa dos 4 anos e 9 meses e 7 anos de idade, 95,7% para a
faixa dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos de idade e 95,7% para as idades entre 9 anos e 1 mês
aos 11 anos e 8 meses).
Confusão Lógica – F2
A maior parte da amostra (85,5%) não apresentou confusão lógica em suas
respostas à Fábula 2. Em relação aos sexos, um percentual maior de meninas (23,8%) do
que de meninos (9,8%) manifestou este fenômeno em suas histórias. A confusão lógica se
mostrou presente, em uma freqüência alta, na faixa etária dos 4 anos e 9 meses até os 7
anos de idade (43,8%) e também foi observada, em um percentual mais baixo, na faixa dos
7 anos e 1 mês até os 9 anos (8,7%). As crianças mais velhas, com idades entre 9 anos e 1
mês e 11 anos e 8 meses não apresentaram respostas com confusão lógica.
Auto-Referência - F2
Um percentual de 93,5% da amostra não manifestou indícios de auto-referência nas
respostas da Fábula 2. Desta amostra total 4,8% das meninas e 7,3% do meninos
apresentaram auto-referência em suas histórias. As respostas em que foram observadas
auto-referências distribuíram-se nas faixas etárias das crianças mais novas, entre 4 anos e 9
meses aos 7 anos (12,5%) e entre a dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos de idade (8,7%).
50
Contaminação – F2
A contaminação é considerada um dos fenômenos específicos e pode se manifestar
por diversos fatos: pela irregularidade no tempo de reação, por sinais de choque ocorrido
pela mobilização afetiva através de conteúdos de fábulas anteriores, ou quando um
elemento formal de uma fábula é transposto à outra. Porém, esse fenômeno acontece de
uma forma controlada, impedindo que ocorra fracasso ou uma perseveração ao responder à
fábula (Cunha & Nunes, 1993).
Apenas 9,7% das crianças da amostra apresentaram contaminação (da Fábula 1) ao
desenvolverem a história da Fábula 2. Desta amostra total, 12,2% das crianças do sexo
masculino e 4,8% das crianças do sexo feminino manifestaram esse fenômeno. Nas faixas
etárias dos 4 anos e 9 meses até os 7 anos, e dos 7 anos e 1 mês até os 9 anos, 25% e 8,7%
dos participantes, respectivamente, apresentaram contaminação da Fábula 1, enquanto que
na faixa dos 9 anos e 1 mês aos 11 anos e 8 meses não houveram indícios de
contaminação.
Perseveração – F2
O fenômeno específico de perseveração, diferentemente da contaminação, não é
somente a transposição de elementos formais, mas sim, de partes essenciais do conteúdo da
história ou da resposta que podem afetar a estrutura lógica da resposta (Cunha & Nunes,
1993). Na Fábula 2 não houve qualquer indício de perseveração do conteúdo da Fábula
anterior.
Respostas Populares – F2
A amostra utilizada para padronizar o Teste das Fábulas para a população brasileira
(Cunha & Nunes, 1993) apresentou como respostas populares da Fábula 2, na faixa etária
de crianças pré-escolares, tanto para o sexo masculino como para o feminino, a explicação
de que a criança saía da sala e ia para o quintal da casa pois “não gostou da festa”. As
crianças em idade escolar, por sua vez, verbalizaram respostas que indicavam que a criança
saía por que “não é festa de criança; para brincar; por que os pais queriam ficar sós ou com
os amigos; para pensar no que dar de presente”.
Um percentual de 62,5% das crianças pré-escolares da amostra (40% das meninas e
72,7% dos meninos) e 71,7% das crianças com idades acima de 7 anos (56,2% das meninas
e 80% dos meninos) apresentaram respostas “não-populares”. As respostas das crianças
51
abrigadas mostraram-se relacionadas à questão da rejeição, sendo a temática da relação
afetivo-sexual dos pais menos abordada por elas.
Ação – F2
Da amostra total 77,4% das crianças apresentaram respostas com ações passivas na
Fábula 1. As meninas, assim como os meninos, demonstraram uma freqüência maior de
respostas com ações deste tipo (71,4%, 80,5%, respectivamente). As ações passivas se
referem às respostas do tipo: “saiu da festa e ficou sentado na pedra, no jardim”, “saiu e
ficou chorando”, “saiu para pensar”. As demais crianças utilizaram em suas respostas
ações não adaptadas ao conteúdo da fábula (11,3%), ações ativas (9,7%) e ações projetadas
(1,6%). Os participantes de todas as faixas etárias apresentam uma freqüência maior de
respostas com ação passiva. Os percentuais dos tipos de ações referentes às diferentes
faixas etárias são apresentados na Tabela 11.
Tabela 11 Percentuais de Tipos de Ação da Fábula 2, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Tipo de Ação 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Passiva 50,0a,b 91,3a 82,6b
Não adaptada 25,0 8,7 4,3
Ativa 18,8c 0,0c 13,0
Projetada 6,3 0,0 0,0
Total 100,0 100,0 100,0
a- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,01 b,c - letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
Motivo – F2
A categoria “motivo” na Fábula 2 tem como objetivo investigar qual a razão dada
pela criança para que do herói da fábula saia da festa de casamento. Este é um item de
extrema importância para que se defina qual o conflito que está subjacente na história
desenvolvida pela criança.
As crianças que constituíram a amostra desta pesquisa apresentaram,
principalmente, motivos associados à rejeição (38,7%), exemplificados por respostas do
tipo: “ela saiu da festa porque os pais não davam atenção para ela, só para os amigos
deles”. A maior incidência de respostas com motivos deste caráter foi presente tanto nas
52
histórias das meninas (38,1%,), quanto nas dos meninos (39%,) e em todas as faixas
etárias.
Os demais motivos verbalizados pelas crianças da amostra total englobam motivos
não adaptados ao conteúdo da Fábula 2 (19,4%), motivos deslocados para temas orais
(12,9%), motivos associados ao conflito edípico (6,5%) motivos sugestivos de conflito
edípico (4,8%) e outros motivos variados, que não podem ser incluídos em nenhuma das
categorias anteriores (17,7%). Os percentuais de motivos da Fábula 2, por faixa etária,
podem ser observados na Tabela 12.
Tabela 12 Percentuais de Tipos de Motivos da Fábula 2, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Motivo 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Associado à rejeição 25,0 34,8 52,2
Deslocado para temas orais 12,5 13,0 13,0
Associado ao conflito edípico 12,5 4,3 4,3
Sugestivo de conflito edípico 0,0 8,7 4,3
Não adaptado 31,3 21,7 8,7
Outro 18,8 17,4 17,4
Total 100,0 100,0 100,0
Fantasias – F2
Em relação às fantasias, a maior freqüência de crianças da amostra total apresentou
em suas respostas a fantasia de rejeição (45,2%), seguida pelas de agressão deslocada para
o ambiente (27,4%), de heteroagressão ativa (17,7%) e edípicas (12,9%). Uma
porcentagem de 11,3% das crianças da amostra não demonstrou indícios de fantasias em
suas respostas.
Tanto as crianças do sexo masculino, como as do sexo feminino desenvolveram
com maior freqüência histórias em que as fantasias de rejeição (36,6% e 61,9%,
respectivamente), agressão deslocada para o ambiente (24,4% e 33,3%, respectivamente) e
heteroagressão ativa (17,1% para meninos e 19% para as meninas) estavam presentes.
Com relação à faixa etária, pode-se observar que, conforme aumentava a idade,
também crescia a freqüência de crianças que apresentaram fantasias de rejeição, em
53
contraposição à diminuição dos índices de agressão deslocada para o ambiente. Os
percentuais de fantasias para a Fábula 2, por faixa etária, são apresentados na tabela 13.
Tabela 13 Percentuais de Participantes Apresentaram Fantasias na Fábula 2, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Fantasias 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Rejeição 25,0a 43,5 60,9a
Agressão deslocada para o ambiente 43,8b 26,1 17,4b
Heteroagressão ativa 18,8 26,1 8,7
Edípica 18,8 13,0 8,7
Privação 6,3 8,7 17,4
Reparação 0,0 8,7 13,0
Abandono 0,0 4,3 13,0
Impotência 12,5 4,3 0,0
Castigo 6,3 0,0 4,3
Superação* 0,0 4,3 4,3
Heteroagressão passiva 6,3 4,3 0,0
Onipotência 0,0 4,3 4,3
Auto-agressão 0,0 4,3 0,0
Morte* 6,3 0,0 0,0
Agregação familiar* 0,0 4,3 0,0
Sem indícios 12,5 8,7 13,0
* Fantasias acrescentadas após levantamento dos testes das crianças da amostra a,b- letras iguais indicam valores que se diferenciam entre si, p<0,05
Observou-se também uma tendência (não significativa) que demonstrou que, com o
aumento do tempo de abrigamento, os percentuais de crianças que apresentaram fantasias
de agressão deslocada para o ambiente diminuíram (41,2% de crianças abrigadas entre 6
meses e 2 anos, 25% entre 2 anos e 1 mês e 4 anos e, 19% abrigadas há mais de 4 anos e 1
mês).
Estados Emocionais – F2
A maior freqüência crianças da amostra atribuiu ao herói estados emocionais de
tristeza (37,1%), de raiva (16,1%), sensações físicas como as de fome, dor ou frio (11,3%),
mal-estar (11,3%) e de culpa (9,7%). Um percentual pequeno de crianças da amostra total
54
(3,2%) não apresentou nenhum tipo de estado emocional, referente ao herói, em suas
respostas à Fábula 2.
A análise das respostas por sexo demonstra que uma incidência maior, tanto de
meninas quanto de meninos, apresentou estados emocionais de tristeza (52,4% e 29,3%
respectivamente). As meninas ainda apresentaram como percentuais mais altos os
sentimentos de raiva (19%), ciúme (9,5%) e solidão (9,5%). Já os meninos manifestaram
em suas respostas como mais freqüentes e em percentuais significativamente mais altos do
que de meninas, após o de tristeza, os estados emocionais de mal-estar (17,1%; p<0,05),
sensações físicas como as de fome, frio, ou dor (17,1%; p<0,05).
Na faixa etária dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos de idade, o maior percentual de
crianças desenvolveu respostas em que os sentimentos mal-estar (25%) e sensações de
fome, dor ou frio (25%) eram os mais freqüentes. Os participantes com idades entre 7 anos
e 1 mês e 9 anos de idade deram respostas, com um percentual mais alto, que
caracterizavam estados emocionais de raiva (30,4%) e de tristeza (26,1%). Na faixa etária
dos 9 anos e 1 mês até os 11 anos e 8 meses, uma freqüência maior de crianças apresentou
estados emocionais de tristeza (60,9%).
Percebe-se que, com o aumento da idade, as crianças parecem definir melhor os
estados emocionais. Já são menos utilizadas sensações físicas para caracterizá-los, como
também diminui o percentual de respostas onde não aparecem estados emocionais. Os
percentuais de crianças que demonstraram estados emocionais na Fábula 2, por faixa
etária, podem ser visualizados na Tabela 14.
Tabela 14 Percentuais Participantes que Apresentaram Estados Emocionais na Fábula 2, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Estados Emocionais
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Tristeza 18,8a 26,1b 60,9a,b
Raiva 12,5 30,4c 4,3c
Mal-estar* 25,0d 13,0 0,0d
Fome, dor, frio* 25,0 4,3 8,7
Culpa 6,3 8,7 13,0
Solidão 0,0 0,0 13,0
Ansiedade 6,3 4,3 0,0
Ciúme 0,0 4,3 4,3
55
Percentuais Participantes que Apresentaram Estados Emocionais na Fábula 2, em Relação à Faixa Etária (continuação da Tabela 14) Bem-estar* 6,3 4,3 0,0
Mágoa* 0,0 0,0 8,7
Alegria 0,0 8,7 0,0
Medo 6,3 0,0 0,0
Rebeldia 0,0 0,0 4,3
Pesar 0,0 0,0 4,3
Ambivalência 0,0 0,0 4,3
Mau-humor* 0,0 0,0 4,3
Sem indícios 6,3 4,3 0,0
* Estados Emocionais acrescentados após levantamento dos testes das crianças da amostra a,b,c,d – letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
Defesas – F2
A maior incidência de crianças da amostra utilizou mecanismos de defesa de
atuação (24,2%), idealização (22,6%), negação (17,7%), evitação (16,1%), distorção
(14,5%), introjeção (11,3%) e de somatização (11,3%). Uma freqüência de 9,7% dos
participantes não utilizou nenhum tipo de mecanismo de defesa em suas respostas.
A análise dos mecanismos de defesa mais utilizados por cada um dos sexos indicou
que meninas empregaram, com mais freqüência em suas respostas para a Fábula 2,
mecanismos de defesa de idealização (28,6%), seguidos pelos de atuação (23,8%), de
distorção (23,8%) e de negação (19%). Os meninos, em uma freqüência maior, utilizaram
mecanismos de atuação (24,4%), de idealização (19,5%) e de negação (17,1%). Estes
últimos ainda apresentaram percentuais significativamente mais altos de somatização
(17,1%; p<0,05) do que as meninas (0%).
Na faixa dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos de idade, a maior incidência de crianças
utilizaram o mecanismo de distorção (37,5%), evitação (37,5%) e de atuação (25%). Os
participantes com idades entre 7 anos e 1 mês e 9 anos, em uma freqüência maior,
utilizaram mecanismos de atuação (30,4%) e de idealização (26,1%). Um maior percentual
de crianças com idades entre 9 anos e 1 mês e 11 anos e 8 meses, utilizaram mecanismos
de idealização (30,4%) e de introjeção (21,7%).
Ainda em relação as diferentes faixas etárias observa-se um aumento no uso dos
mecanismos de idealização e introjeção, assim como uma diminuição dos mecanismos de
evitação, distorção e somatização de acordo com o aumento da idade dos participantes. Os
percentuais de participantes que utilizaram defesas na Fábula 2, por faixa etária, podem ser
observados na Tabela 15.
56
Tabela 15 Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 2, em Relação à Faixa Etária
Mecanismos de Defesa
4 anos 9 meses –
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
Atuação 25,0 30,4
Idealização* 6,3 26,1
Faixa Etária
7 anos
(n=23)
%
17,4
30,4
Negação 18,8 21,7 13,0
Evitação* 37,5 a,b 8,7 a 8,7 b
Distorção 37,5 c,d 8,7 c d
Introjeção
4,3
0,0e 8,7 21,7e
Somatização 18,8 8,7 8,7
Projeção 6,3 8,7 13,0
Racionalização 6,3 8,7 4,3
Deslocamento 6,3 4,3 0,0
Hipocondria 6,3 0,0 0,0
Regressão 0,0 4,3 0,0
Isolamento* 6,3 0,0 0,0
Repressão 0,0 4,3 0,0
Retorno contra si mesmo 0,0 4,3 0,0
Supressão* 0,0 0,0 4,3
Sem indícios 0,0f 4,3 21,7f
* Defesas acrescentadas após levantamento dos testes das crianças da amostra a,b,c,e,f – letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05 d- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,01
Percebeu-se também, que as crianças que se encontravam abrigadas por um período
menor de tempo (entre 6 meses e 2 anos) utilizaram, em uma freqüência maior,
mecanismos de projeção (29,4%) do que àquelas que estavam abrigadas há mais tempo
(4,8% das crianças abrigadas há mais de 4 anos apresentaram esse mecanismo e nenhum
dos participantes abrigados por um período de 2 anos e 1 mês a 4 anos o utilizaram). A
diferença entre as respostas das crianças da faixa etária dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos e
dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos que utilizaram este tipo de defesa foi significativa (p<0,01).
Fábula 3 (F3)
O conteúdo da Fábula 3 (Fábula do Cordeirinho) se refere à simbiose e a rivalidade
fraterna (Cunha & Nunes, 1993). Os resultados que serão descritos se referem aos
seguintes itens: tempo de reação, fenômenos específicos (distúrbio perceptual, confusão
57
lógica, auto-referência, contaminação e perseveração), ação, desfecho, fantasias, estados
emocionais e defesas.
Tempo de Reação – F3
O tempo de reação médio da amostra (n=62) para a fábula 3 foi de 2,95 segundos.
A média do tempo de reação para o sexo feminino (n=21) foi de 3,24 segundos (d.p.=3,03
seg.), enquanto que para os meninos (n=41) foi de 2,80 segundos (d.p.=2,34 seg.). As
médias do tempo de reação para a Fábula 3, por faixas etárias, podem ser observadas na
tabela 16.
Tabela 16 Médias de Tempo de Reação à Fábula 3, em Segundos, por Faixa Etária
Faixa Etária n Tempo de Reação*
(M) (d.p.)
4 anos 9 meses – 7 anos 16 3,63 4,51
7 anos 1 mês – 9 anos 23 2,91 1,37
9 anos 1 mês – 11 anos 8 meses 23 2,52 1,47
Total 62 2,95 2,58
* Em segundos
Distúrbio Perceptual – F3
Um percentual maior de crianças (74,2%) não apresentou distúrbio perceptual em
suas respostas para a Fábula 3. A incidência de distúrbio perceptual nas respostas de
meninos, no entanto, foi mais alto (31,7%) do que o nas respostas das meninas (14,3%).
As crianças que apresentaram esse fenômeno em suas respostas, em geral,
acrescentavam novos personagens na história (o dono das ovelhas, o dono da fazenda,
outra mamãe ovelha) que forneciam o leite para o cordeirinho, como uma alternativa para
não ser privado do alimento.
As respostas indicativas de distúrbio perceptual mostraram-se distribuídas por todas
as faixas etárias. Na faixa dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos, 25% das crianças apresentou
distúrbio perceptual em suas respostas. Entre os 7 anos e 1 mês e os 9 anos de idade,
30,4% das crianças manifestaram esse fenômeno específico em suas respostas e na faixa
dos 9 anos e 1 mês até os 11 anos e 8 meses de idade 21,7% dos participantes também
produziram respostas com distúrbios perceptuais.
58
Confusão Lógica – F3
A grande parte das crianças da amostra (96,8%, sendo 95,1% dos meninos e 100%
das meninas) não apresentou confusão lógica durante o desenvolvimento de suas histórias,
sendo que apenas os participantes na faixa etária dos 4 anos e 9 meses até os 7 anos
manifestaram esse fenômeno (12,5%).
Auto-referência – F3
Nenhuma das crianças da amostra desenvolveu histórias com auto-referência em
suas respostas à Fábula 3.
Contaminação – F3
Um percentual de 95,2% dos participantes não apresentou contaminação do
conteúdo de nenhuma das fábulas anteriores na Fábula 3. Uma freqüência de 3,2% das
respostas continham contaminação da Fábula 2 e 1,6% da Fábula 1.Um percentual de 4,9%
dos meninos e 4,8% das meninas da amostra apresentaram indícios de contaminação em
suas respostas.
No que se refere as faixas etárias, 6,3% as crianças da faixa etária entre 4 anos e 9
meses e 7 anos, desenvolveram respostas com contaminação apenas da Fábula 1. Os
participantes com idades entre 7 anos e 1 mês e 9 anos apresentaram contaminação
unicamente da Fábula 2 (8,7%) . As crianças mais velhas, com idades entre 9 anos e 1mês
e 11 anos e 8 meses não desenvolveram histórias com indícios de contaminação. Os
percentuais de crianças que apresentaram contaminação de conteúdos de outras fábulas na
Fábula 3, por faixa etária, estão presentes na Tabela 17.
Tabela 17 Percentuais de Participantes que Apresentaram Contaminação na Fábula 3, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Contaminação 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Da F1 6,3 0,0 0,0
Da F2 0,0 8,7 0,0
Sem resposta 93,8 91,3 100,0
Total 100,0 100,0 100,0
59
Perseveração – F3
Nenhum dos participantes da pesquisa desenvolveu histórias com perseveração de
conteúdos de fábulas anteriores.
Respostas Populares – F3
A resposta popular para a Fábula 3, no grupo estudado por Cunha e Nunes (1993),
é a mesma para crianças em idades escolares ou pré-escolares, de ambos os sexos, e
consiste na afirmativa de que o cordeirinho, após ter sido solicitado pela mamãe ovelha,
“vai comer capim”, ao invés de mamar, deixando esta posição para o coordeirinho mais
novo que chegou. Na amostra de crianças abrigadas 62,5% das crianças pré-escolares (80%
das meninas e 54,5% dos meninos) e 73,9% crianças escolares (75% das meninas e 73,3%
dos meninos) apresentaram as mesmas respostas da amostra padronizada do instrumento.
Dessa forma, observa-se que a resposta comum para a Fábula 3 para os participantes da
pesquisa é a mesma do que a resposta popular das crianças da amostra padronizada do
teste.
Ação – F3
A ação relaciona-se à atitude que o herói (carneirinho) toma após ser informado
pela mãe que ele não poderá mais tomar leite, e que agora deverá comer capim. Um
percentual de 72,6% dos participantes da pesquisa apresentou respostas com ações ativas e
adaptadas (respostas que indicam que o carneirinho irá comer capim) na Fábula 3. As
freqüências de respostas que seguiram foram de ações do tipo ativa, mas não adaptada
(9,7%), ambivalente (8,1%), com resistência ativa (4,8%), e com resistência passiva
(1,6%). Ações não adaptadas ao conteúdo da Fábula 3 foram verbalizadas em um
percentual de 3,2% das respostas. Em relação às respostas de meninos e meninas da
amostra total, em ambos os sexos as freqüências mais altas correspondiam às respostas
com ações ativas e adaptadas (70,7% e 76,2%, respectivamente).
Os participantes de todas as faixas etárias apresentam uma freqüência maior de
respostas com ação ativa e adaptada. Os percentuais dos tipos de ações referentes as
diferentes faixas etárias são demosntrados na Tabela 18.
60
Tabela 18 Percentuais dos Tipos de Ação da Fábula 3, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Tipo de Ação 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Ativa e adaptada 68,8 65,2 82,6
Ativa, mas não adaptada 6,3 17,4 4,3
Ambivalente 6,3 8,7 8,7
Com resistência ativa 6,3 4,3 4,3
Não adaptada 6,3 4,3 0,0
Com resistência passiva 6,3 0,0 0,0
Total 100,0 100,0 100,0
Através da análise dos dados por tempo de institucionalização, pode-se perceber
uma tendência (não significativa) das crianças que residiam no abrigo há um menor
período de tempo (entre 6 meses e 2 anos) apresentarem percentuais mais altos de ações
ativas e adaptadas (82,4%) do que as que crianças que encontravam-se lá há mais tempo
(75% entre 2 anos e 1 mês e 4 anos, e 61,9% acima de 4 anos e 1 mês).
Desfecho – F3
O desfecho está vinculadoado à forma como a criança finaliza a sua resposta (a
história que cria). As crianças da amostra apresentaram em uma freqüência maior de
desfechos não adaptativos para a Fábula 3 (51,6%). O segundo desfecho com maior
percentual foi o adaptativo (24,2%), seguido pelos desfechos com adaptação parcial12
(17,7%) e ambivalente (3,2%). Uma freqüência de 3,2% das histórias das crianças
possuíam desfechos não adaptados ao conteúdo da Fábula 3.
Todavia, ao analisar a amostra dividindo-a por sexos, observa-se que um percentual
significativamente maior das meninas elaborou respostas que indicavam desfechos
adaptativos (47,6%; p<0,01) do que os meninos (12,2%). O desfecho do tipo não
adaptativo aparece em segundo lugar, em um percentual de 38,1% das meninas. O grupo
dos meninos, por sua vez, segue a amostra total, revelando um percentual mais alto de
desfechos não adaptativos (58,5%).
12 O desfecho do tipo “adaptação parcial” foi acrescentado após o levantamento dos testes das crianças abrigadas. Um exemplo deste tipo de desfecho é quando a crianças refere que o carneirinho comeu o capim, mas se sentia muito triste com isso.
61
Na faixa etária dos 4 anos e 9 meses até os 7 anos de idade os participantes, em
uma freqüência maior apresentaram desfechos com adaptação parcial (37,5%), seguidos
pelos desfechos adaptativos (25%) e não adaptativos (25%). Nas faixas etárias dos 7 anos e
1 mês aos 9 anos e dos 9 anos e 1 mês e 11 anos e 8 meses, mais da metade das crianças
elaboraram respostas com desfechos adaptativos (56,% e 65,2%, respectivamente). Os
percentuais de tipos de desfechos apresentados para a Fábula 3, por faixa etária, são
apresentados na Tabela 19.
Tabela 19 Percentuais dos Tipos de Desfecho da Fábula 3, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Desfecho 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Não adaptativo 25,0a,b 56,5a 65,2b
Adaptativo 25,0 21,7 26,1
Adaptação Parcial* 37,5c 17,4 4,3c
Ambivalente 0,0 4,3 4,3
Não adaptado 12,5 0,0 0,0
Total 100,0 100,0 100,0
* Categoria de desfecho apresentada após levantamento dos testes das crianças da amostra a,b – letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05 c – letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,01
No que se relaciona ao tempo de abrigamento, constatou-se uma tendência (não
significativa) para que o percentual de crianças que apresentaram desfechos adaptativos
diminuísse conforme aumentava o período de institucionalização, ao mesmo tempo em que
os desfechos do tipo não adaptativos aumentavam. As crianças abrigadas há no mínimo 6
meses e no máximo 2 anos em percentuais de 35,3% e 41,2% apresentaram desfechos
adaptativos e não adaptativos, respectivamente. No período de 2 anos e 1 mês e 4 anos de
institucionalização, 20,8% das crianças apresentaram desfechos adaptativos e 50% delas
não adaptativos. As crianças que se encontravam abrigadas há mais de 4 anos, em uma
freqüência de 19%, elaboraram respostas com desfechos adaptativos e 61,9% de desfechos
não adaptativos.
Fantasias – F3
A fantasia de privação foi, sem dúvida, aquela que a maior freqüência de crianças
da amostra (79%) manifestou ao desenvolver as histórias referentes à Fábula 3. Algumas
62
crianças da amostra (9,7%) não demonstraram qualquer tipo de fantasia em suas respostas
para a Fábula 3. Um percentual mais alto de meninos e meninas apresentaram a de fantasia
de privação (82,9% e 71,4%, respectivamente). Percentuais mais altos deste tipo de
fantasia foram observados em todas as faixas etárias. Os percentuais de participantes que
manifestaram fantasias para a Fábula 3, por faixas etárias, podem ser observados na Tabela
20.
Tabela 20 Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 3, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Fantasias
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Privação 75,0 87,0 73,9
Agressão deslocada para o ambiente 12,5 8,7 4,3
Heteroagressão passiva 6,3 13,0 4,3
Rejeição 0,0 0,0a 17,4a
Morte* 6,3 13,0 0,0
Abandono 0,0 4,3 8,7
Heteroagressão ativa 12,5 0,0 4,3
Castigo 12,5 0,0 4,3
Volta ao útero 6,3 4,3 0,0
Ganho secundário 6,3 0,0 4,3
Agregação Familiar* 6,3 0,0 4,3
Superação* 0,0 4,3 4,3
Auto-agressão 6,3 0,0 0,0
Onipotência 0,0 4,3 0,0
Reparação 6,3 0,0 0,0
Impotência 0,0 4,3 0,0
Perseguição* 6,3 0,0 0,0
Sem indícios 6,3 8,7 13,0
* Fantasias acrescentadas após o levantamento dos testes das crianças da amostra a - letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
Através da análise das fantasias em relação ao tempo de abrigamento, observou-se que a
freqüência da fantasia de privação aumentou conforme também aumentou o período de
institucionalização. Entretanto, essas diferenças não foram significativas, indicando apenas
uma tendência.
63
Um percentual de 83,3% das crianças que estavam abrigadas entre 2 anos e 1 mês
e 4 anos e 85,7% daquelas que residiam no abrigo há mais de 4 anos, apresentaram esta
fantasia, enquanto uma freqüência de 64,7% das crianças abrigadas há menos tempo (entre
6 meses e 2 anos) produziram respostas com a presença da fantasia de privação).
Estados Emocionais – F3
Uma maior freqüência de crianças da amostra atribuíram aos heróis de suas
histórias, estados emocionais de tristeza (24,2%), bem-estar (24,2%), ciúme (16,1%), mal-
estar (12,9%) e de sensações físicas relacionadas à dor, fome ou frio (11,3%). Uma maior
incidência de meninas e meninos da amostra total apresentaram em suas respostas, estados
emocionais de tristeza (28,6% e 22%, respectivamente) e de bem-estar (28,6% e 22%,
respectivamente).
Em relação às diferentes faixas etárias, os participantes com idades entre 4 anos e 9
meses e 7 anos, em uma maior freqüência verbalizaram em suas respostas sensações físicas
de fome, dor ou frio (25%), estados emocionais de bem-estar (25%) e de mal-estar
(18,8%). Na faixa etária dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos de idade, a maior incidência de
crianças desenvolveram histórias com estados emocionais de tristeza (26,1%) mal-estar
(21,7%) e de alegria (21,7%). Uma incidência maior das crianças mais velhas, na faixa
etária dos 9 anos e 1 mês aos 11 anos e 8 meses, manifestaram respostas com estados
emocionais de tristeza (39,1%), bem-estar (26,1%), ciúme (26,1%) e de em-estar (17,4%).
Os percentuais de crianças que demonstraram estados emocionais para a Fábula 3, por
faixas etárias, podem ser observados na Tabela 21.
Tabela 21 Percentuais de Participantes que Apresentaram Estados Emocionais na Fábula 3, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Estados Emocionais
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Tristeza 0,0a,b 26,1a 39,1b
Bem-estar* 25,0 21,7 26,1
Percentuais de Participantes que Apresentaram Estados Emocionais na Fábula 3, em Relação à Faixa Etária (continuação da Tabela 21) Ciúme 6,3 13,0 26,1
Mal-estar* 18,8c 21,7d 0,0c,d
Fome, dor, frio* 25,0 8,7 4,3
64
Alegria 6,3 4,3 17,4
Ambivalência 0,0 4,3 8,7
Raiva 6,3 0,0 4,3
Ansiedade 12,5 0,0 0,0
Pena* 0,0 0,0 8,7
Impertinência 6,3 0,0 0,0
Sem respostas ou sem indícios 6,3 4,3 0,0
* Estados emocionais acrescentados após o levantamento dos testes das crianças da amostra a,c,d – letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05 b- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,01
Defesas – F3
Os mecanismos de defesa utilizados com maior freqüência pela amostra foram os
de negação (40,3%), regressão (38,7%), idealização (22,6%) e de distorção (16,1%). Desta
amostra total, 12,9% das crianças não utilizaram nenhum tipo de mecanismo de defesa em
suas respostas.
Tanto as meninas quanto meninos da amostra, em percentuais mais altos,
apresentaram mecanismos de defesa de negação (38,1% e 41,5%, respectivamente),
regressão (33,3% e 41,5%, respectivamente) e de idealização (28,6% e 19,5%,
respectivamente).
Analisando os percentuais de mecanismo de defesa utilizados pelas diferentes
faixas etárias, observa-se que na faixa etária dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos, a maior
freqüência das crianças utilizaram mecanismos de negação (31,3%), regressão (25%) e de
distorção (25%). Os participantes com idades entre 7 anos e 1 mês e 9 anos, uma
incidência maior dos participantes apresentaram mecanismos de negação (39,1%),
regressão (34,8%) e de idealização (21,7%). Uma maior incidência de crianças com idades
entre 9 anos e 1 mês e 11 anos e 8 meses manifestaram respostas com mecanismos de
defesa de regressão (52,2%), negação (47,8%) e idealização (39,1%). Os percentuais de
crianças que utilizaram defesas na Fábula 3, por faixas etárias, podem ser observados na
Tabela 22.
Tabela 22 Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 3, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
65
Mecanismos de Defesa
4 anos 9 meses –
7 anos
% (n=16)
7 anos 1 mês –
9 anos
% (n=23)
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
% (n=23)
Negação 31,3 39,1 47,8
Regressão 25,0 34,8 52,2
Idealização* 0,0a,b 21,7a 39,1b
Distorção 25,0 4,3 21,7
Atuação 18,8c 0,0c 4,3
Hipocondria 12,5 8,7 0,0
Formação reativa 12,5 8,7 0,0
Evitação 18,8d 4,3 0,0d
Altruísmo 0,0 0,0e 17,4e
Projeção 0,0 4,3 8,7
Somatização 12,5 4,3 0,0
Racionalização 12,5 0,0 4,3
Compensação* 6,3 4,3 4,3
Deslocamento 0,0 4,3 4,3
Comportamento passivo-agressivo 0,0 4,3 0,0
Retorno contra si mesmo 6,3 0,0 0,0
Identificação* 0,0 0,0 4,3
Sem indícios 12,5 21,7 4,3
* Mecanismos de defesa acrescentados após o levantamento dos testes das crianças da amostra a,c,d,e – letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05 b– letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,01
Fábula 4 (F4)
A Fábula 4 (Fábula da Viagem) é uma fábula de catarse, ou seja, serve para que os
sujeitos liberem afetos (em especial a agressividade) que foram mobilizados nas fábulas
anteriores, e pode suscitar na criança questões de hétero ou auto-agressão, culpabilidade e
autopunição. A associação dos conteúdos manifestados na Fábula 4 com os das fábulas
anteriores muitas vezes é percebido não de maneira direta, mas sim pelo aparecimento de
fenômenos específicos (Cunha & Nunes, 1993).
Os resultados que serão apresentados vinculam-se aos seguintes itens: tempo de
reação, fenômenos específicos (distúrbio perceptual, confusão lógica, auto-referência,
contaminação e perseveração), respostas populares, personagem, fantasias, estados
emocionais, e defesas.
Tempo de reação – F4
66
A média do tempo de reação da amostra (n=61) para a Fábula 4 foi de 5,95
segundos. Um caso (do sexo masculino) foi excluído por ultrapassar o tempo de 60
segundos para reação à fábula. As meninas (n=21) apresentaram um tempo de reação
médio de 6,76 segundos (d.p.=6,25 seg.), enquanto os meninos (n=40) de 5,53 segundos
(d.p.=6,55 seg.). A média de tempo de reação (em segundos) dos participantes para a
Fábula 4, por faixa etária, é apresentada na Tabela 23.
Tabela 23 Médias de tempo de Reação à Fábula 4, em Segundos, por Faixas Etárias
Faixa Etária n Tempo de Reação*
(M) (d.p.)
4 anos 9 meses – 7 anos 16 5,19 5,38
7 anos 1 mês – 9 anos 22 6,05 6,75
9 anos 1 mês – 11 anos 8 meses 23 6,39 6,97
Total 61 5,95 6,42
* Em segundos
Foi verificada uma diferença significativa entre à média do tempo de reação à
Fábula 4 das crianças abrigadas há no mínimo 6 meses e, no máximo 2 anos (M=11,31 seg;
d.p.=9,98 seg.) em relação ao dos participantes institucionalizados há mais de 2 anos e 1
mês até 4 anos (M=4,29 seg.; d.p.=2,90 seg; p<0,02) e dos participantes que se
encontravam abrigados há mais de 4 anos e 1 (3,76 seg; dp=2,84; p<0,01).
Distúrbio Perceptual – F4
Na fábula 4, um percentual de 74,2% das crianças da amostra apresentaram
distúrbios perceptuais em suas respostas. Esses distúrbios, em sua maioria, se
manifestaram através da negação do fato de que apenas uma pessoa iria viajar (em geral as
crianças disseram que a família toda ou ambos os pais embarcaram no avião) e da
informação de que a pessoa que viajou não voltaria mais.
No grupo das meninas a incidência de respostas em que o distúrbio perceptual
estava presente foi de 81% e no dos meninos 70,7%. Em todas as faixas etárias, para
ambos os sexos, o percentual de crianças que manifestou distúrbio perceptual em suas
respostas foi mais alto do que o daquelas que não apresentaram. As crianças com idades
entre 4 anos e 9 meses, em uma freqüência de 62,5%, desenvolveram respostas com
distúrbio perceptual. Percentuais de 73,9% e 82,6% das crianças das faixas etárias dos 7
anos e 1 mês aos 9 anos e dos 9 anos e 1 mês aos 11 anos e 8 meses, respectivamente,
apresentaram tal fenômeno.
67
Confusão Lógica – F4
Um percentual de 93,5% das crianças da amostra não apresentou nenhum tipo de
confusão lógica ao desenvolver suas histórias. Apenas 9,5% das meninas e 4,9% dos
meninos manifestaram esse fenômeno em suas respostas. Das crianças que apresentaram
confusão lógica, todas elas encontravam-se na faixa etária dos 4 anos e 9 meses até os 7
anos de idade (25%).
Auto-referência – F4
A maior parte das crianças da amostra (87,1%), não apresentou indícios de auto-
referência em suas respostas à Fábula 4. Um percentual de 9,8% dos meninos e 19% das
meninas manifestaram auto-referência em suas histórias.
Em todas as faixas etárias o percentual de crianças que apresentouo fenômeno de
auto-referência foi mais baixo do que o daquelas que não o manifestaram. Contudo, ele se
mostrou presente em todas as faixas etárias de modo semelhante (18,8% na faixa dos 4
anos e 9 meses aos 7 anos, 4,3% na faixa dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos, e 17,4% na faixa
dos 9 anos e 1 mês aos 11 anos e 8 meses).
Contaminação – F4
A maior parte das crianças da amostra (74,2%), de todas as faixas etárias, não
apresentou contaminação de outras fábulas ao desenvolver a resposta da Fábula 4. Das
crianças que demonstraram esse fenômeno específico em suas respostas, 11,3% delas
apresentaram contaminação da Fábula 2; 9,7% da Fábula 3 e 4,8% da Fábula 1. Um
percentual de 14,3% das meninas manifestaram contaminação da Fábula 2 e 9,5% delas da
Fábula 3. Os meninos mostraram contaminação de todas as fábulas anteriores à Fábula 4,
sendo um percentual de 9,8% das Fábulas 2 e 3 e 7,3% da Fábula 1. Os percentuais de
participantes que apresentaram contaminação nas respostas da Fábula 4, por faixa etária,
podem ser visualizados na Tabela 24.
Tabela 24 Percentuais de Participantes que Apresentaram Contaminação na Fábula 4, em Relação à Faixa Etária
68
Faixa Etária
Contaminação 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Da F1 6,3 4,3 4,3
Da F2 6,3 26,1 0,0
Da F3 18,8 4,3 8,7
Sem resposta 68,8 65,2 87,0
Total 100,0 100,0 100,0
Perseveração – F4
A maioria das crianças da amostra (90,3%), de todas as faixas etárias, não
apresentou indícios de perseveração em suas respostas. O percentual delas que manifestou
esse fenômeno distribuíu-se entre as fábulas 2 (1,6%) e 3 (8,1%). Ao desenvolverem suas
histórias, 7,3% dos meninos perseveraram conteúdos da Fábula 3. Um percentual de 9,5%
das meninas mostraram preseveração de conteúdos da Fábula 3 e 4,8% delas da Fábula 2.
Os percentuais, por faixa etária, dos participantes que manifestaram perseveração em suas
respostas para a Fábula 4 podem ser observados na Tabela 25.
Tabela 25 Percentuais de Participantes que Apresentaram Persevaração na Fábula 4, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Perseveração 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Da F2 0,0 0,0 4,3
Da F3 12,5 8,7 4,3
Sem resposta 87,5 91,3 91,3
Total 100,0 100,0 100,0
Respostas Populares – F4
As respostas populares da fábula 4 para a amostra padronizada do instrumento
(Cunha e Nunes, 1993) variaram conforme sexo e faixa etária. Ao serem questionadas no
enunciado da Fábula sobre quem seria a pessoa que viajou (ou morreu, dependendo da
versão utilizada), a resposta popular de meninas pré-escolares indicava que o personagem
em questão era a “mãe”. Já os meninos dessa faixa etáriaapresentaram como resposta
69
popular personagens como parentes fora da família nuclear ou uma pessoa amiga que vai
viajar. A resposta popular de crianças da faixa etária escolar, de ambos os sexos,
relacionou-se àquelas verbalizações em que uma pessoa idosa ia viajar.
Um percentual de 93,8% das crianças pré-escolares (100% das meninas e 90,9%
dos meninos) e 91,3% das crianças com idades acima de 7 anos (escolares) da amostra da
pesquisa (93,7% das meninas e 90% dos meninos) apresentaram respostas “não-
populares”. As respostas mais comuns para as crianças abrigadas indicavam que quem
viajava era toda a família.
Personagem – F4
O item personagem refere-se àquela pessoa (ou pessoas) que a criança indica como
sendo a que embarca no avião e vai viajar. O maior percentual das crianças da amostra, ao
desenvolverem a história da Fábula 4, referiram que quem havia viajado teria sido toda a
família (25,8%). O segundo maior percentual de crianças citou como personagem que
embarca no avião um filho ou filha da família (22,6%). Ainda 11,3% das crianças
responderam que o pai e a mãe (juntos) haviam viajado.
As respostas mais freqüentes para os meninos da amostra indicavam, como
personagem que viaja, a família (29,3%) e uma filha ou filho da família (24,4%). As
meninas, por sua vez, apresentaram uma incidência significativamente maior de respostas
em que o pai e a mãe viajaram (23,8%; p<0,05) do que os meninos (4,9%). Os percentuais
mais altos de meninas que se seguiram responderam que o personagem que partia era a
toda família (19%) e a filha ou filho da família (19%).
Na faixa etária dos 4 anos e 9 meses até os 7 anos, 31,3% das crianças verbalizou
em suas respostas que toda família havia viajado, 25% fez referência ao personagem
filho(a) e 18,8% aos personagens pai e mãe (juntos). A maior freqüência dos participantes
com idades entre 7 anos e 1 mês e 9 anos de idade citaram toda a família como personagem
que viaja e 17,4% deles, o pai ou a mãe juntamente com um filho.
Na faixa etária dos 9 anos e 1 mês até os 11 anos e 8 meses, um maior percentual
dos participantes apresentou respostas onde quem viaja é o filho ou filha da família
(30,4%) e a segunda maior freqüência (17,4%) foi de crianças que responderam que a
família toda viajou .Os percentuais de participantes que referiram personagens na Fábula 4,
por faixa etária, podem ser visualizados na Tabela 26.
Tabela 26
70
Percentuais dos Personagens da Fábula 4, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Personagens
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Família* 31,3 30,4 17,4
Filho ou filha* 25,0 13,0 30,4
Pai e Mãe 18,8 8,7 8,7
Pai 0,0 8,7 13,0
Mãe 0,0 17,4 4,3
Pai ou mãe e filho(a)* 6,3 4,3 4,3
Avô ou avó 0,0 4,3 4,3
Outro familiar 0,0 0,0 8,7
Criança(s) 6,3 4,3 0,0
Outro 6,3 4,3 0,0
Irmão ou irmã 6,3 0,0 0,0
Não familiar 0,0 0,0 4,3
Um homem* 0,0 4,3 0,0
Uma mulher 0,0 0,0 4,3
Total 100,0 100,0 100,0
* Categorias do item “personagens” acrescentado após o levantamento dos testes das crianças da amostra.
Fantasias – F4
Metade das crianças da amostra (50%) manifestaram a fantasia de agressão
deslocada para o ambiente em suas respostas à Fábula 4. Um percentual de 30,6% delas,
apresentou fantasia de abandono, 29% as fantasias de privação e agregação familiar e
14,5% das crianças demonstrou em suas histórias fantasias de heteroagressão ativa. A
maior parte das meninas (52,4%) e um maior percentual de meninos (48,8%) da amostra
apresentaram fantasias de agressão deslocada para o ambiente. As meninas da amostra
ainda revelaram maior incidência de fantasias de abandono (38,1%), privação (28,6%) e
agregação familiar (23,8%). Um segundo maior percentual de meninos manifestaram a
fantasia de agregação familiar (31,7%), seguida pelas de privação (29,3%) e abandono
(26,8%).
Analisando as crianças por faixas etárias, observou-se que nas idades entre 4 anos e
9 meses e 7 anos, a grande parte delas demonstrou a fantasia de agressão deslocada para o
ambiente em suas respostas (81,3%). A segunda fantasia mais freqüente foi a de agregação
familiar (31,3%).
71
Na faixa etária que vai dos 7 anos e 1 mês até os 9 anos de idade, mais da metade
dos participantes (52,2%) deram respostas que indicavam a presença da fantasia de
agressão deslocada para o ambiente. Percentuais também altos de crianças destas idades
demonstraram fantasias de abandono (39,1%), privação (39,1%) e de agregação familiar
(30,4%)
As crianças com idades entre dos 9 anos e 1 mês aos 11 anos e 8 meses
apresentaram com maior freqüência a fantasia a de abandono (30,4%), seguida pelas de
agressão deslocada para o ambiente (26,1%), agregação familiar (26,1%) e privação
(21,7%). Os percentuais de participantes, por faixa etária, que manifestaram fantasias na
Fábula 4, podem ser observados na Tabela 27.
Tabela 27 Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 4, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Fantasias
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Agressão deslocada para o ambiente 81,3a,b 52,2a 26,1b
Abandono 18,8 39,1 30,4
Privação 25,0 39,1 21,7
Agregação familiar* 31,3 30,4 26,1
Heteroagressão ativa 25,0 8,7 13,0
Reparação 0,0 8,7 17,4
Rejeição 0,0 13,0 8,7
Castigo 0,0 8,7 8,7
Onipotência 0,0 4,3 8,7
Gratificação* 0,0 4,3 4,3
Morte* 6,3 4,3 0,0
Ganho secundário 0,0 4,3 0,0
Sem indícios 0,0 0,0 8,7
* Fantasias acrescentadas após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05 b- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,01
72
Em relação ao período de institucionalização observou-se uma tendência (não
significativa) para a diminuição da incidência de fantasias de abandono de acordo com o
aumento do tempo de abrigamento das crianças. Os participantes abrigados há, no mínimo
6 meses e no máximo 2 anos, em um percentual de 52,9% apresentaram essa fantasia. Em
freqüências de 25% e de 19%, as crianças abrigadas há dois anos e 1 mês até 4 anos, e
àquelas abrigadas há mais de 4 anos e 1 mês, respectivamente, elaboraram respostas com
fantasias de abandono.
Estados Emocionais- F4
Os estados emocionais que são analisados na Fábula 4 geralmente correspondem às
pessoas que ficaram na casa e não às que foram viajar. No entanto, no caso das crianças
abrigadas, muitas foram as respostas em que toda a família foi viajar, ou em que facilmente
se observava que a criança estava se identificando com a pessoa que partia. Nestes casos os
estados emocionais considerados referiam-se a esses personagens.
O maior índice de crianças da amostra atribuiu aos heróis da Fábula 4 estados
emocionais de bem-estar (21%), tristeza (16,1%), culpa (9,7%), alegria (9,7%), pesar
(8,1%) e mal-estar (8,1%), e 14,7% delas não apresentaram indícios de estados
emocionais. O maior percentual de meninas da amostra total manifestou em suas histórias
estados emocionais de tristeza (28,6%), culpa (19%) e bem-estar (19%). As respostas dos
meninos em freqüências mais altas indicaram estados emocionais de bem-estar (22%) e de
alegria (12,2%).
Em relação às diferentes faixas etárias, as crianças com idades entre 4 anos e 9
meses e 7 anos, em percentuais mais altos, verbalizaram em suas respostas estados
emocionais de bem-estar (37,5%). A segunda freqüência mais alta foi a de respostas de
sensações físicas de dor, fome ou frio (18,8%). Na faixa etária dos 7 anos e 1 mês aos 9
anos de idade, a maior incidência de participantes construíram histórias em que estados
emocionais de alegria (17,4%) e bem-estar (17,4%) estavam presentes. Um percentual
mais alto das crianças mais velhas na faixa etária dos 9 anos e 1 mês aos 11 anos e 8
meses, atribuíu ao herói estados emocionais de tristeza (30,4%) e culpa (21,7%). Os
percentuais de crianças da amostra que manifestaram estados emocionais na Fábula 4, por
faixa etária, podem ser encontrados na Tabela 28.
Tabela 28 Percentuais de Participantes que Apresentaram Estados Emocionais na Fábula 4, em Relação à Faixa Etária
73
Faixa Etária
Estados Emocionais
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Bem-estar* 37,5 17,4 13,0
Tristeza 0,0a 13,0 30,4a
Culpa 0,0b 4,3 21,7b
Alegria 0,0 17,4 8,7
Pesar 0,0 13,0 8,7
Mal-estar* 12,5 4,3 8,7
Fome, dor, frio* 18,8 4,3 0,0
Medo 12,5 0,0 4,3
Saudades* 0,0 8,7 4,3
Raiva 0,0 8,7 0,0
Rebeldia 0,0 0,0 8,7
Solidão 0,0 4,3 4,3
Mágoa* 0,0 0,0 8,7
Ambivalência 0,0 0,0 4,3
Sem indícios 25,0 17,4 13,0
*Estados emocionais acrescentados após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a,b – letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
No que se refere ao período de institucionalização, observou-se uma tendência (não
significativa) em que a incidência de estados emocionais de bem-estar diminuía, enquanto
aumentava o tempo de abrigamento das crianças. As crianças abrigadas há, no mínimo 6
meses e no máximo 2 anos, em um percentual de 29,4% apresentaram esse estado
emocional. Em freqüências de 25% e de 9,5%, as crianças abrigadas há dois anos e 1 mês
até 4 anos, e àquelas abrigadas há mais de 4 anos e 1 mês, respectivamente, desenvolveram
respostas com estados emocionais de bem-estar.
Defesas – F4
A maioria das crianças da amostra utilizou mecanismos de defesa de negação
(59,7%) e de idealização (46,8%) ao responderem à Fábula 4. Um percentual de 12,9% dos
participantes manifestou mecanismos de introjeção. Os meninos e as meninas da amostra,
assim como constatado na análise do grupo total de crianças, também apresentaram
percentuais mais altos de mecanismos de negação (58,5% e 61,9%, respectivamente) e
idealização (43,9% e 52,4%, respectivamente). A incidência de meninas que utilizaram o
74
mecanismo de introjeção foi de 19% e dos meninos, 9,8%. Algumas crianças (9,7%) da
amostra não utilizaram nenhum tipo de mecanismo de defesa em suas respostas.
Uma maior freqüência de participantes com idades entre 4 anos e 9 meses e 7 anos
utilizou mecanismos de negação (31,3%) e em percentuais iguais de 18,8%, apresentou
mecanismos de idealização, evitação, distorção e somatização. Na faixa etária dos 7 anos e
1 mês aos 9 anos de idade, a maior parte das crianças fez uso de mecanismos de negação
(60,9%) e 52,2% delas do de idealização. Grande parte das crianças com idades entre 9
anos e 1 mês e 11 anos e 8 meses, apresentou mecanismos de negação e de idealização
(78,3% e 60,9%, respectivamente.) Os percentuais, por faixa etária, dos participantes que
utilizaram mecanismos de defesa na Fábula 4 podem ser observados na Tabela 29.
Tabela 29 Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 4, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Mecanismos de Defesa
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Negação 31,3a 60,9 78,3a
Idealização* 18,8b,c 52,2b 60,9c
Introjeção 6,3 13,0 17,4
Atuação 6,3 8,7 13,0
Evitação* 18,8 4,3 4,3
Distorção 18,8d 0,0d 4,3
Somatização 18,8e 4,3 0,0e
Deslocamento* 6,3 4,3 0,0
Racionalização 6,3 0,0 4,3
Supressão* 6,3 4,3 0,0
Regressão 0,0 0,0 4,3
Isolamento 0,0 0,0 4,3
Compensação* 6,3 4,3 0,0
Identificação projetiva* 6,3 0,0 0,0
Identificação introjetiva* 6,3 0,0 0,0
Projeção 0,0 0,0 4,3
Sem indícios 12,5 8,7 8,7
* Mecanismos de defesa acrescentados após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,01 b,c, d,e -letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
75
Em relação ao período de institucionalização, percebeu-se uma tendência (não
significativa) para o aumento da utilização do mecanismo de idealização,
concomitantemente ao aumento do tempo de abrigamento. As crianças que se encontravam
abrigadas entre 6 meses e 2 anos, em um percentual de 29,4%, utilizaram este mecanismo
de defesa. Uma freqüência de 50% dos participantes abrigados há mais de 2 anos e 1 mês
até 4 anos e 57,1% daqueles que residiam no abrigo há mais de 4 anos e 1 mês
apresentaram mecanismos de idealização.
Fábula 5 (F5)
A fábula 5, denominada “Fábula do Medo”, assim como a Fábula 4, também tem
por objetivo a catarse. Ela, em geral, facilita a expressão de sentimentos e fantasias de
culpa, medo, ansiedade e auto-punição, já mobilizados pelas fábulas anteriores (Cunha e
Nunes, 1993).
Os resultados que serão apresentados referem-se aos seguintes itens: tempo de
reação, fenômenos específicos (distúrbio perceptual, confusão lógica, auto-referência,
contaminação e perseveração), respostas populares, objeto do medo, fantasias, e defesas.
Tempo de Reação – F5
O tempo de reação médio da amostra para a Fábula 5 foi de 4,46 segundos (n=61),
sendo esta média de tempo praticamente a mesma para meninos (M=4,46 seg., d.p.=4,58
seg., n=41) e meninas (M=4,45 seg., d.p.=5,66 seg., n=20). O tempo de uma menina da
amostra foi excluído por exceder 60 segundos. A média do tempo de reação dos
participantes para a Fábula 5, por faixa etária, podem ser observados na Tabela 30.
Tabela 30 Médias de Tempo de Reação à Fábula 5, em Segundos, por Faixas Etárias
Faixa Etária n Tempo de Reação*
(M) (d.p.)
4 anos 9 meses – 7 anos 16 3,06 2,26
7 anos 1 mês – 9 anos 22 4,50 4,35
9 anos 1 mês – 11 anos 8 meses 23 5,39 6,47
Total 61 4,46 4,91
* Em segundos
76
Distúrbio Perceptual – F5
Nenhuma das crianças da amostra demonstrou indícios de distúrbio perceptual ao
responder à Fábula 5.
Confusão Lógica – F5
A grande parte das crianças da amostra (88,7%) não apresentou confusão lógica nas
histórias elaboradas para a Fábula 5. Das crianças que apresentaram esse fenômeno, foi
constatado um percentual de 12,2% de meninos e 9,5% de meninas.
As respostas com indícios de confusão lógica distribuíram-se entre as crianças com
idade até 9 anos. Na faixa etária dos 4 anos e 9 meses até os 7 anos este fenômeno foi
observado nas respostas de 31,3% das crianças e na faixa etária dos 7 anos e 1 mês até os 9
anos, em 8,7% das respostas.
Auto-Referência - F5
Um percentual de 21% das crianças da amostra elaborou respostas sem indícios de
auto-referência. Em relação aos sexos, 22% dos meninos e 19% das meninas apresentaram
tal fenômeno.
Na faixa etária dos 4 anos e 9 meses até os 7 anos, 18,8% dos participantes
desenvolveram histórias com auto-referência. Um percentual de 17,8% das crianças com
idades entre 7 anos e 1 mês e 9 anos e 26,1% na faixa etária dos 9 anos e 1 mês aos 11
apresentaram respostas com auto-referência.
Contaminação – F5
A maioria das crianças (88,7%) não apresentou contaminação do conteúdo de
outras fábulas ao desenvolverem suas respostas à Fábula 5. Daquelas crianças que
manifestaram contaminação, 4,8% delas contaminou as respostas com elementos da Fábula
3, 3,2% da Fábula 2 , e percentuais iguais de crianças (1,6%), das Fábulas 1 e 4.
As meninas apresentaram contaminação apenas da Fábula 3 (4,8%), enquanto os
meninos manifestaram indícios de contaminação das Fábulas 1 ( 2,4%), 2 (4,9%), 3 (4,9%)
e 4 (2,4%).
Em relação às diferentes faixas etárias a maioria das crianças não apresentou
indícios de contaminação. Na Tabela 31, podem ser observados os percentuais de
participantes, por faixa etária, que apresentaram contaminação na Fábula 5.
77
Tabela 31 Percentuais de Participantes que Apresentaram Contaminação na Fábula 5, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Contaminação 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Da F1 6,3 0,0 0,0
Da F2 6,3 4,3 0,0
Da F3 6,3 8,7 0,0
Da F4 0,0 0,0 4,3
Sem indícios 81,3 87,0 95,7
Total 100,0 100,0 100,0
Perseveração – F5
Um percentual de 8,1% das crianças da amostra total apresentou perseveração
somente de conteúdos da Fábula 4, ao responder à Fábula 5, sendo que 7,3% eram meninos
e 9,5% meninas. A perseveração de conteúdos de fábulas anteriores foi observada apenas
na faixa etária dos 4 anos aos 7 anos de idade, sendo que 31,3% dos participantes com
estas idades apresentaram tal fenômeno.
Respostas Populares – F5
As respostas populares para a Fábula 5, no grupo estudado por Cunha e Nunes
(1993), se diferem de acordo com a faixa etária das crianças (escolares ou pré-escolares),
sendo que não há diferenças entre os sexos. Para o grupo das crianças pré-escolares, a
resposta popular foi aquela em que a causa do medo da criança história se referia a um
bicho (especificado ou não). A resposta popular para as crianças escolares consistia em um
personagem de ficção (ex: fantasma, bicho papão, lobisomem) como o causador do medo
da criança.
Através da análise das respostas das crianças abrigadas, observou-se que 18,8%
delas em idade pré-escolar (9,1% dos meninos e 40% das meninas) e 47,8% das crianças
do grupo de escolares (46% dos meninos e 50% das meninas) apresentaram as mesmas
respostas da amostra padronizada do instrumento. Dessa forma, concluiu-se que a resposta
comum para a Fábula 5 da amostra de crianças abrigadas na faixa etária escolar é a mesma
do que a resposta popular das crianças da amostra padronizada do teste. Contudo,
verificou-se que as respostas mais comuns para os meninos do grupo das crianças pré-
escolares desta pesquisa não corresponderam às respostas populares do grupo estudado por
78
Cunha e Nunes (1993). As respostas mais comuns desses meninos consistiam em atribuir
como fonte de medo um personagem de ficção (36,4%).
Objeto do Medo – F5
O item “objeto do medo”, relaciona-se às respostas que a criança dá quando é
questionada de que o herói da história tem medo. O maior percentual dos participantes da
amostra (46,8%) respondeu que o objeto de medo da criança da Fábula 5 era um
personagem de ficção (um fantasma, lobisomem, bicho papão). As respostas que se
seguiram, como mais freqüentes, indicavam como causas do medo o escuro ou solidão
(17,7%) e bichos (11,3%). Os personagens de ficção, como objetos de medo, foram os
mais referidos por meninas (47,6%) e meninos (46,3%). O segundo maior percentual de
meninos atribuiu a causa do medo ao escuro e solidão (22%) e de meninas, a bichos,
especificados ou não (19%).
Na faixa etária dos 4 anos e 9 meses até os 7 anos, os percentuais mais altos de
participantes referiram que a criança da história estava com medo personagens de ficção,
como lobisomem, bicho-papão (31,3%) e de bichos (25%). A maior parte das crianças
(60,9%) com idades entre 7 anos e 1 mês e 9 anos deram respostas em que personagens de
ficção eram a causa do medo. Na faixa etária dos 9 anos e 1 mês até os 11 anos e 8 meses,
uma freqüência maior de participantes também respondeu que o objeto de medo era um
personagem de ficção (43,5%). Os percentuais de crianças, por faixa etária, em relação ao
objeto do medo nas respostas da Fábula 5, podem ser observados na tabela 32.
Tabela 32 Percentuais dos Tipos de Objeto do Medo da Fábula 5, Em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Objeto do Medo 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Personagens de Ficção 31,3a 60,9a 43,5
Escuro ou solidão 18,8 17,4 17,4
Bichos, especificados ou não 25,0 0,0 13,0
Pai e/ou mãe* 6,3 8,7 8,7
79
Percentuais dos Tipos de Objeto do Medo da Fábula 5, Em Relação à Faixa Etária (continuação da Tabela 32) Personagem de ficção + escuro ou solidão* 0,0 0,0 8,7
Ladrão, assassino ou similares 6,3 0,0 0,0
Outro animal feroz e nocivo 0,0 4,3 0,0
Outro 12,5 8,7 8,7
* Categorias acrescentadas após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a – letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
Fantasias –F5
A grande parte das crianças da amostra (87,1%) manifestou fantasias de agressão
deslocada para o ambiente em suas respostas à Fábula 5. Um percentual de 17,7% dos
participantes ainda demonstrou fantasias de abandono e 16,1%, de castigo. Em relação aos
sexos, tanto meninos (90,2%) quanto meninas (81%) apresentaram, em sua maioria,
fantasias de agressão deslocada para o ambiente. As meninas manifestaram, em um
percentual de 23,8%, fantasias de castigo, e 19% delas, fantasias de abandono. O segundo
maior percentual de meninos manifestou fantasias de abandono (17,1%). As fantasias de
castigo estão presentes nas respostas de 12,2% dos meninos.
Na faixa etária dos 4 anos e 9 meses até os 7 anos de idade, um percentual mais alto
de crianças manifestou fantasias de agressão deslocada para o ambiente (81,3%) e de
abandono (43,8%). A maioria dos participantes com idades entre 7 anos e 1 mês e 9 anos
(95,7%) apresentou fantasias de agressão deslocada para o ambiente e as crianças da faixa
etária dos 9 anos e 1 mês aos 11 anos e 8 meses, em freqüências mais altas, elaboraram
respostas em que as fantasias de agressão deslocada para o ambiente (82,6%) e de castigo
(39,1%) estavam presentes. Todos os percentuais das crianças que manifestaram fantasias
na Fábula 5, por faixa etária, podem ser visualizados na Tabela 33.
Tabela 33 Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 5, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Fantasias
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Agressão deslocada para o ambiente 81,3 95,7 82,6
Abandono 43,8a,b 4,3a 13,0b
Castigo 6,3c 0,0d 39,1c,d
80
Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 5, em Relação à Faixa Etária (continuação da Tabela 33) Impotência 6,3 4,3 13,0
Heteroagressão ativa 6,3 13,0 4,3
Morte* 6,3 8,7 4,3
Privação 12,5 0,0 0,0
Reparação 0,0 0,0 8,7
Rejeição 0,0 8,7 0,0
Heteroagressão passiva 6,3 0,0 0,0
Ganho secundário 0,0 0,0 4,3
Perseguição* 0,0 4,3 0,0
Engolfamento* 0,0 0,0 4,3
Sem indícios 6,3 4,3 0,0
* Fantasias acrescentadas após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,01 b,c,d- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
Defesas – F5
A maior frequência das crianças da amostra (25,8%) não fez uso de mecanismos de
defesa ao elaborar suas respostas para a Fábula 5. Percentuais de 22,6% delas utilizaram os
mecanismos de idealização, 21% de racionalização, 14,5% de distorção e 12,9%
mecanismos de introjeção e evitação.
Uma freqüência de 24,4% dos meninos, e 28,6% das meninas, não apresentou
mecanismos de defesa em suas respostas. Das meninas que desenvolveram respostas com
mecanismos de defesa, um percentual mais alto utilizou os mecanismos de racionalização
(28,6%), e de introjeção (23,8%). Os mecanismos de defesa mais utilizados pelos meninos
foram os de idealização (24,4%) e de racionalização (17,1%).
Na faixa etária dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos, percentuais mais altos das crianças
apresentaram mecanismos de distorção (31,3%) e de evitação (25%) em suas respostas. Os
participantes com idades entre 7 anos e 1 mês e 9 anos utilizaram, em frequências mais
altas, mecanismos de idealização (17,4%) e de distorção (17,4%). Na faixa etária dos 9
anos e 1 mês aos 11 anos e 8 meses, os participantes, em percentuais mais altos,
desenvolveram respostas com mecanismos de idealização (43,5%), racionalização (39,1%)
e de introjeção (21,7%). Os percentuais de participantes que utilizaram mecanismos de
defesa na Fábula 5, por faixa etária, são apresentados na Tabela 34.
81
Tabela 34 Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 5, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Mecanismos de Defesa
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Idealização* 0,0a 17,4b 43,5a,b
Racionalização 12,5 8,7c 39,1c
Distorção 31,3d 17,4e 0,0d,e
Introjeção 18,8f 0,0f,g 21,7g
Evitação* 25,0 13,0 4,3
Atuação 6,3 13,0 0,0
Projeção 6,3 4,3 4,3
Regressão 0,0 4,3 8,7
Supressão* 0,0 8,7 4,3
Deslocamento 6,3 4,3 0,0
Repressão 6,3 4,3 0,0
Identificação introjetiva* 0,0 4,3 4,3
Comportamento passivo-agressivo 6,3 0,0 0,0
Somatização 6,3 0,0 0,0
Compensação* 0,0 0,0 4,3
Retorno contra-si-mesmo 0,0 0,0 4,3
Sem indícios 31,3 34,8 13,0
*Mecanismos acrescentados após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a- letras iguais indicam ao valores que se diferenciam entre si, p<0,01 b,c,d,e,f,g - letras iguais indicam ao valores que se diferenciam entre si, p<0,05
Fábula 6 (F6)
A fábula 6 (Fábula do Elefante) que explora as reações da criança em relação a
experiências fálicas (Cunha & Nunes, 1993), terá seus resultados apresentados em relação
aos seguintes itens: tempo de reação, fenômenos específicos (distúrbio perceptual,
confusão lógica, auto-referência, contaminação e perseveração), respostas populares,
natureza da mudança, identificação da mudança, local da mudança, fantasias, estados
emocionais e defesas.
Tempo de Reação – F6
O tempo médio de reação dos participantes da pesquisa ao responderem à Fábula 6
foi de 5,03 segundos. A média de tempo de reação para o grupo do sexo feminino (n=21)
82
foi de 6,57 segundos (d.p.=7,23 seg) e para o do sexo masculino (n=41) de 4,24 segundos
(d.p.=4,67).
No que se refere às diferenças entre faixas etárias a maior média de tempo de tempo
de reação ocorreu na faixa etária dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos de idade (6,00 segundos).
Na Tabela 35, podem ser observadas as médias de tempo de reação dos participantes para a
Fábula 6, por faixa etária.
Tabela 35 Médias de Tempo de Reação, em Segundos, à Fábula 6, por Faixa Etária.
Faixa Etária n Tempo de Reação*
(M) (d.p.)
4 anos 9 meses – 7 anos 16 6,00 7,21
7 anos 1 mês – 9 anos 23 5,61 5,65
9 anos 1 mês – 11 anos 8 meses 23 3,78 4,55
Total 62 5,03 5,72
* Em segundos
Distúrbio Perceptual – F6
A grande parte das crianças da amostra (98,4%) não apresentou distúrbio perceptual
em suas respostas, sendo que todas as crianças que apresentaram esse distúrbio eram do
sexo masculino e encontravam-se na faixa etária dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos de idade.
Confusão Lógica – F6
O percentual de crianças que apresentou confusão lógica em suas respostas à
Fábula 6 foi de 1,6%. Todas eram do sexo masculino e situavam-se na faixa dos 4 anos e 9
meses e 7 anos de idade.
Auto-Referência - F6
A maioria dos participantes da pesquisa (96,8%) não utilizou auto-referência em
suas respostas. Um percentual de 2,4% de crianças do sexo masculino e 4,8% do feminino
apresentou esse fenômeno específico. Uma freqüência de 6,3% das crianças da faixa etária
dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos e 4,3% dos participantes com idades entre 9 anos e 1 mês
e 11 anos e 8 meses de idade elaboraram respostas com auto-referência. As crianças com
idades entre 7 anos e 1 mês e 9 anos não apresentaram indícios desse fenômeno.
83
Contaminação - F6
Um percentual de 91,9% das crianças da amostra não demonstrou indícios de
contaminação de conteúdos de outras fábulas ao responder à Fábula 6. Uma freqüência de
3,2 % dos participantes contaminou a Fábula 6 com elementos das Fábulas 1 e 3, e 1,6%
deles com conteúdos da Fábula 2. Em relação aos sexos, os meninos apresentaram
contaminações das Fábulas 1 (4,9%), 2 (2,4%) e 3 (2,4%) em suas verbalizações e as
meninas da Fábula 3 (4,8%).
As crianças que manifestaram contaminação de conteúdos de fábulas anteriores na
Fábula 6 encontravam-se nas faixas etárias dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos de idade e dos 9
anos e 1 mês aos 11 anos e 8 meses. Os percentuais desses participantes que mostraram
indícios de contaminação nas respostas à Fábula 6, por faixa etária, podem ser observados
na Tabela 36.
Tabela 36 Percentuais de Participantes que Apresentaram Contaminação na Fábula 6, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Contaminação 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Da F1 0,0 4,3 4,3
Da F2 0,0 4,3 0,0
Da F3 0,0 4,3 4,3
Sem resposta 100,0 87,0 91,3
Total 100,0 100,0 100,0
Perseveração – F6
Percentuais baixos das crianças da amostra (3,2%) apresentaram perseveração de
conteúdos de fábulas anteriores nas respostas referentes à Fábula 6, sendo que 1,6% das
contaminações eram da Fábula 1 e 1,6% da Fábula 4. O grupo das meninas (4,8%)
apresentou perseveração apenas da Fábula 1, o dos meninos (2,4%) somente da Fábula 4.
As crianças que manifestaram indícios deste fenômeno situavam-se na faixa etária
dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos, e dos 9 anos e 1 mês aos 11 anos e 8 meses de idade. Na
Tabela 37, estão apresentados os percentuais desses participantes que apresentaram
perseveração nas respostas à Fábula 6, por faixa etária.
84
Tabela 37 Percentuais de Participantes que Apresentaram Perseveração na Fábula 6, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Perseveração 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Da F1 0,0 0,0 4,3
Da F4 6,3 0,0 0,0
Sem resposta 93,8 100,0 95,7
Total 100,0 100,0 100,0
Respostas Populares – F6
A amostra pré-escolar, do sexo masculino, no estudo de Cunha e Nunes (1993),
teve como resposta popular da Fábula 6 a explicação que consistia em o elefante estar
diferente quanto ao seu estado psicológico ou físico. As meninas desta faixa etária não
apresentaram respostas populares. Já as meninas em idade escolar da amostra padronizada
verbalizaram respostas populares que indicavam que a tromba do elefante havia encolhido,
havia sido cortada ou machucada. As respostas populares de meninos escolares
demonstravam que o elefante estava diferente em sua aparência.
Os meninos pré-escolares, em um percentual de 72,7%, verbalizaram respostas
diferentes das consideradas como populares. Na faixa etária escolar, 100% das meninas e
93,3% dos meninos deram respostas não populares à Fábula 6.
As respostas mais comuns para os meninos pré–escolares (27,3%) foram aquelas
que indicavam que o elefante havia sumido, fugido ou sido seqüestrado, já as meninas
desta faixa etária não apresentaram respostas comuns (assim como a amostra padronizada).
Meninos (60%) e meninas (56,2%), em idade escolar, apresentaram como resposta mais
comum uma transformação física do elefante (aumento do tamanho ou doença).
Natureza da Mudança – F6
O item natureza da mudança se refere àquilo que ocorreu para que o elefante
parecesse diferente à criança (personagem da Fábula 6). Um percentual mais alto de
crianças da amostra (46,8%) citou como natureza da mudança uma transformação física do
elefante, o segundo maior percentual (11,3%) se relacionou ao fato de elefante ter sumido,
ter fugido ou ter sido seqüestrado. Estas respostas se mostraram comuns tanto para
85
meninos (48,8%-transformação física e 12,2%- seqüestro, sumiço ou fuga) quanto para as
meninas (42,9% - transformação física e 9,5% -seqüestro, sumiço ou fuga).
A maior incidência de participantes com idades entre 4 anos e 9 meses até os 7 anos
(25%), apresentou como natureza da mudança o seqüestro, sumiço ou fuga do elefante. Já
as crianças com idades entre 7 anos e 1 mês até os 9 anos de idade e entre os 9 anos e 1
mês aos 11 anos e 8 meses, em percentuais mais altos (43,5% e 73,9%, respectivamente),
atribuíram a natureza da mudança a uma transformação física. Na tabela 38, podem ser
observados os percentuais de participantes em relação a todos os tipos de natureza da
mudança da Fábula 6, por faixa etária.
Tabela 38 Percentuais de Tipos de Natureza da Mudança da Fábula 6, em Relação à Faixa Etária. Faixa Etária
Natureza da Mudança 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Transformação física 12,5a,b 43,5a,c 73,9b,c
Seqüestro, sumiço ou fuga* 25,0d 13,0 0,0d
Por acidente 6,3 13,0 8,7
Modificação na aparência 12,5 8,7 0,0
Transformação psicológica 6,3 4,3 4,3
Transformação fantasiada 12,5 4,3 0,0
Transformação física e psicológica* 6,3 4,3 4,3
Mutilação 6,3 4,3 0,0
Substitição 0,0 4,3 4,3
Mutilação e Transformação Física* 0,0 0,0 4,3
Outra 12,5 0,0 0,0
Total 100,0 100,0 100,0
* Categorias acrescentadas após o levantamento dos testes aplicados nos participantes a,c,d- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05 b- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,001
Identificação da Mudança - F6
O item identificação da mudança busca explorar mais profundamente o que ocorreu
de diferente com o elefante. Por exemplo, na resposta que indica transformação física na
natureza da mudança, a identificação dessa transformação física pode ter múltiplas
explicações: o elefante pode ter se transformado fisicamente mudando de tamanho, ficando
doente, entre outras. Na amostra das crianças abrigadas, um maior percentual delas
86
manifestou como identificação da mudança o fato do elefante ter ficado doente (24,2%) ou
ter aumentado de tamanho (17,7%). Ainda, 11,3% delas apresentou respostas que
caracterizavam como natureza da mudança o sumiço, fuga ou seqüestro do elefante.
Em relação aos sexos, 26,8% dos meninos apresentou como identificação da
mudança o elefante ter ficando doente e 17,1% deles uma mudança no tamanho do animal
(tamanho grande). As meninas, em uma freqüência igual, manifestaram em suas respostas
mudanças do elefante para um tamanho grande (19%), o elefante ficando doente (19%) ou
machucado (19%).
Os participantes com idades entre 4 anos e 9 meses e 7 anos apresentaram, em uma
maior freqüência, respostas que indicavam que a mudança do elefante estava relacionada
ao seu sumiço, seqüestro ou fuga (25%). Também é importante salientar quem percentual
alto de crianças desta faixa etária também apresentou respostas muito variadas (31,3%),
não características de nenhuma categoria específica.
Na faixa etária dos 7 anos e 1 mês até os nove anos de idade, freqüências iguais de
crianças (17,4%) apresentaram respostas em que o elefante ficava doente, aumentava de
tamanho ou aparecia machucado. Os participantes com idades entre 9 anos e 1 mês e 11
anos e 8 meses deram, em maior percentual, respostas em que o elefante havia ficado
doente (43,5%) ou havia mudado de tamanho, ficando maior (26,1%). Os percentuais de
todas as categorias de identificação da mudança da Fábula 6, por faixa etária, são
visualizados na Tabela 39.
Tabela 39 Percentuais de Tipos de Identificação da Mudança da Fábula 6, em Relação à Faixa Etária. Faixa Etária
Identificação da Mudança 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Doença* 6,3a 17,4b 43,5a,b
Tamanho grande 6,3 17,4 26,1
Seqüestro, sumiço ou fuga* 25,0c 13,0 0,0c
Machucado 6,3 17,4 4,3
Identidade 12,5 8,7 4,3
Tamanho pequeno 0,0 4,3 13,0
Cor 6,3 8,7 0,0
87
Percentuais de Tipos de Identificação da Mudança da Fábula 6, em Relação à Faixa Etária (continuação da Tabela 39) Sujeira 6,3 0,0 0,0
Outra 31,3 13,0 8,7
Total 100,0 100,0 100,0
* Categorias acrescentadas após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a,b,c – letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
Local da Mudança – F6
Neste item avaliam-se as respostas de acordo com o local onde a criança aponta que
possa ter ocorrido a mudança do elefante (embora algumas crianças atribuam a mudança
ocorrida à outros objetos , não localizados no próprio elefante).
Algumas crianças da amostra apontaram mais de um local onde havia ocorrido a
mudança do animal (algumas vezes citando mais de uma parte do corpo). Foram
consideradas todas as respostas de cada criança, porém, as análises foram realizadas de
acordo com o número de casos.
A grande maioria das crianças da amostra (72,6%) citou que a mudança havia
ocorrido no elefante por inteiro. Isto foi observado nas respostas tanto de meninos (73,2%),
quanto de meninas (71,4%) e em todas as faixas etárias. A Tabela 40 apresenta os
percentuais dos locais de mudança do elefante, por faixa etária dos participantes.
Tabela 40 Percentuais de Tipos de Locais da Mudança da Fábula 6, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Local da Mudança 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
O elefante 81,3 60,9 78,3
Mais de uma parte do corpo* 6,3 13,0 4,3
Rabo* 0,0 8,7 8,7
Tromba 6,3 4,3 4,3
Pata* 6,3 4,3 4,3
Orelha* 0,0 4,3 4,3
Objeto ou ambiente em geral 0,0 4,3 0,0
Outro 0,0 4,3 4,3
Total 100,0 100,0 100,0
*Categorias do item “local da mudança” acrescentado após levantamento dos testes das crianças da amostra.
88
Fantasias – F6
Na amostra total de crianças abrigadas, elas, em percentuais mais altos,
manifestaram, em suas respostas à Fábula 6, fantasias de agressão deslocada para o
ambiente (38,7%), privação (29%) e de abandono (19,4%). Uma freqüência de 14,5% das
crianças não apresentou fantasias ao verbalizarem suas histórias. Tanto meninos quanto
meninas seguiram o mesmo padrão da amostra total, tendo manifestado, em porcentuais
mais altos, fantasias de agressão deslocada para o ambiente (36,6% e 42,9%,
respectivamente), privação (29,3% e 28,6%, respectivamente) e abandono (19,5% e 19%,
respectivamente).
As crianças com idades entre 4 anos e 9 meses e 7 anos, em freqüências iguais
(31,3%), apresentaram respostas que traziam indícios de fantasias de agressão deslocada
para o ambiente (31,3%) e de abandono (31,3%). Ainda um percentual alto delas (25%)
manifestaram a fantasia de heteroagressão ativa.
Na faixa etária dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos, os participantes elaboraram respostas
em que as fantasias de agressão deslocada para o ambiente (52,2%), privação (26,1%) e de
abandono (21,7%) se mostravam predominantes.
As crianças com idades entre 9 anos e 1 mês e 11 anos e 8 meses, em sua maioria,
revelaram a fantasia de privação (52,2%), seguida pela de agressão deslocada para o
ambiente (30,4%). Os percentuais de todos os participantes que demonstraram fantasias na
fábula 6, por faixa etária, podem ser visualizados na Tabela 41.
Tabela 41 Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 6, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Fantasias
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Agressão deslocada para o ambiente 31,3 52,2 30,4
Privação 0,0a,b 26,1a 52,2b
Abandono 31,3 21,7 8,7
Rejeição 18,8 8,7 4,3
Heteroagressão ativa 25,0c 4,3 0,0c
Heteroagressão passiva 0,0 4,3 13,0
Impotência 6,3 4,3 8,7
89
Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 6, em Relação à Faixa Etária (continuação da Tabela 41). Reparação 6,3 4,3 4,3
Castração 0,0 8,7 4,3
Morte* 6,3 4,3 0,0
Auto-agressão 6,3 0,0 0,0
Onipotência 0,0 0,0 4,3
Castigo 0,0 4,3 0,0
Invasão* 6,3 0,0 0,0
Agregação familiar* 0,0 0,0 4,3
Sem indícios 25,0 4,3 17,4
* Fantasias acrescentadas após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a,c- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05 b - letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,001
Estados Emocionais – F6
Os estados emocionais mais presentes nas respostas das crianças foram os de
tristeza (22,6%), pesar (17,7%), mal-estar (12,9%) e alegria (12,9%). Um percentual de
8,1% dos participantes não demonstrou estados emocionais em suas verbalizações. Os
meninos e as meninas da amostra, em uma maior freqüência, manifestaram estados
emocionais de tristeza (24,4% e 19%, respectivamente) e pesar (17,1% e 19%,
respectivamente). Os meninos, ainda em um percentual alto, apresentaram estados
emocionais de mal-estar (17,1%) e as meninas, de alegria (14,3%).
Nas idades entre 4 anos e 9 meses e 7 anos, as crianças, em percentuais iguais
(18,8%), manifestaram estados emocionais de bem-estar e de mal-estar. Uma maior
freqüência de participantes da faixa etária dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos, apresentaram
estados emocionais de tristeza (34,8%) e de alegria (26,1%). Na faixa etária dos 9 anos e 1
mês aos 11 anos e 8 meses, as crianças, em um percentual mais alto revelaram sentimentos
de tristeza (26,1%), seguidos pelos de pesar (21,7%). Na Tabela 42 são apresentados todos
os percentuais de participantes, por faixa etária, que manifestaram estados emocionais
referentes ao herói em suas respostas à Fábula 6.
90
Tabela 42 Percentuais de Participantes que Apresentaram Estados Emocionais na Fábula 6, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Estados Emocionais
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Tristeza 0,0a,b 34,8a 26,1b
Pesar 6,3 21,7 21,7
Mal-estar* 18,8 8,7 13,0
Alegria 6,3 26,1c 4,3c
Medo 6,3 4,3 13,0
Pena* 6,3 8,7 8,7
Bem-estar* 18,8d,e 0,0d 4,3e
Raiva 6,3 4,3 4,3
Culpa 0,0 4,3 8,7
Ambivalência 0,0 0,0 8,7
Ciúme 0,0 4,3 0,0
Desamor 0,0 0,0 4,3
Mágoa* 0,0 0,0 4,3
Saudades* 0,0 4,3 0,0
Fome, dor, frio* 6,3 0,0 0,0
Sem indícios 25,0 4,3 0,0
* Estados emocionais acrescentados após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a - letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,01 b,c,d,e – letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
Defesas – F6
O maior percentual de crianças da amostra (48,4%) não fez uso mecanismos de
defesa ao responder à Fábula 6. Dos participantes que revelaram mecanismos de defesa,
pode-se verificar que a maior freqüência deles utilizaram mecanismos de idealização13
(14,5%) e de evitação14 (11,3%). Analisando-se o grupo de crianças do sexo masculino e
feminino, separadamente, observou-se que um percentual mais alto, tanto meninas (33,3%)
quanto de meninos (56,1%), apresentou respostas sem indícios de mecanismos de defesa.
Das meninas que fizeram uso de mecanismos de defesa, a maioria empregou mecanismos
de idealização (23,8%) e de evitação (9,5%). Os meninos também manifestaram, em sua
13 Mecanismo de defesa acrescentado após o levantamento dos testes das crianças abrigadas (ver Anexo F) 14 Mecanismo de defesa acrescentado após o levantamento dos testes das crianças abrigadas (ver Anexo F)
91
maioria, os mesmos mecanismos de defesa que as meninas, entretanto, para eles o mais
utilizado foi o de evitação (12,2%), seguido pelo de idealização (9,8%).
O maior percentual de participantes (31,3%) com idades entre 4 anos e 9 meses e 7
anos não apresentou mecanismos de defesa em suas respostas, 25% deles utilizaram o
mecanismo de evitação e 18,8% o de distorção. Mais da metade das crianças nas faixas
etárias dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos de idade (52,2%), e dos 9 anos e 1 mês aos 11 anos e
8 meses (56,5%) não mostrou mecanismos de defesa em suas respostas. Os percentuais,
por faixa etária, de todos os participantes que apresentaram defesas na Fábula 6 podem ser
observados na Tabela 43.
Tabela 43 Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 6, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Mecanismos de Defesa
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Idealização* 0,0a 8,7 30,4a
Evitação* 25,0b 13,0 0,0b
Introjeção 12,5 4,3 4,3
Projeção 6,3 8,7 0,0
Distorção 18,8c,d 0,0c 0,0d
Compensação* 6,3 0,0 8,7
Supressão* 0,0 4,3 8,7
Racionalização 0,0 4,3 4,3
Identificação introjetiva* 6,3 4,3 0,0
Atuação 0,0 0,0 4,3
Somatização 0,0 0,0 4,3
Formação reativa 0,0 4,3 0,0
Repressão 0,0 4,3 0,0
Retorno contra si mesmo* 6,3 0,0 0,0
Identificação 0,0 0,0 4,3
Sem indícios 31,3 52,2 56,5
* Mecanismos de defesa acrescentados após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a,b,c,d – letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
92
Fábula 7 (F7)
A Fábula 7 (Fábula do objeto fabricado) em geral suscita nas crianças reações de
conformidade social, ambivalência ou possessividade (Cunha & Nunes, 1993) ao depará-
las em uma situação em que são solicitadas à se desfazerem de algo criado por elas
mesmas.
Os resultados que serão apresentados referem-se aos seguintes itens: tempo de
reação, fenômenos específicos (distúrbio perceptual, confusão lógica, auto-referência,
contaminação e perseveração), respostas populares, ação, fantasias, estados emocionais e
defesas.
Tempo de Reação – F7
A média de tempo de reação na Fábula 7 para as crianças da amostra foi de 2,52
segundos (n=61). Um caso (sexo feminino) foi eliminado para análise do tempo de reação,
pois ultrapassou 60 segundos. As meninas (n=20) apresentaram uma média de 3,30
segundos (d.p.=3,23 seg.) e os meninos (n=41) de 2,15 segundos (d.p.=1,47 seg.). As
médias de reação à Fábula 7, por faixa etária, são apresentadas na Tabela 44.
Tabela 44 Médias de tempo de Reação à Fábula 7, em Segundos, por Faixas Etárias
Faixa Etária n Tempo de Reação*
(M) (d.p.)
4 anos 9 meses – 7 anos 16 2,06 1,23
7 anos 1 mês – 9 anos 22 2,05 1,04
9 anos 1 mês – 11 anos 8 meses 23 3,30 3,26
Total 61 2,52 2,24
* Em segundos
Distúrbio Perceptual – F7
A grande parte das crianças da amostra (93,5%) não apresentou distúrbio perceptual
em suas respostas, sendo que todas as crianças que demonstraram esse distúrbio eram do
sexo masculino (9,8%) e encontravam-se na faixa etária dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos de
idade.
Confusão Lógica – F7
A maior parte dos participantes (93,5%) não manifestou indícios de confusão lógica
ao desenvolverem suas respostas à Fábula 7. Um percentual de 4,9% dos meninos e 9,5%
93
das meninas mostraram esse fenômeno específico. As crianças que elaboraram respostas
com confusão lógica, encontravam-se nas faixas etárias dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos
(18,8%) e dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos (4,3%).
Auto-referência – F7
Apenas 8,1% das crianças da amostra apresentou auto-referência em suas respostas
à Fábula 7. Um percentual de 4,9% dos meninos e 14,3% das meninas manifestou esse
fenômeno específico em suas histórias. As crianças da faixa etária dos 4 anos e 9 meses
até 7 anos de idade, em uma freqüência de 6,3% demonstraram auto-referência. Os
participantes com idades entre 7 anos e 1 mês e 9 anos, e entre 9 anos e 1 mês e 11 anos e 8
meses, em percentuais iguais (8,7%) elaboraram respostas com indícios deste fenômeno.
Contaminação –F7
A maioria das crianças da amostra (91,9%) não apresentou contaminação de
conteúdos de outras Fábulas ao desenvolverem suas respostas à Fábula 7. Uma freqüência
de 3,2 % dos participantes contaminou a Fábula 7 com elementos da Fábula 6, e
percentuais iguais deles (1,6%) das Fábulas 1, 2 e 4. Em relação aos sexos, as meninas
manifestaram contaminações das fábula 1 (4,8%), 2 (4,8%) e 4 (4,8%) em suas
verbalizações e os meninos da Fábula 6 (4,9%).
Em relação às diferentes faixas etárias, em todas elas, a maioria das crianças não
apresentou indícios de contaminação. Na Tabela 45, podem ser observados os percentuais
de participantes, por faixa etária, que demonstraram contaminação na Fábula 7.
Tabela 45 Percentuais de Participantes que Apresentaram Contaminação na Fábula 7, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Contaminação 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Da F1 6,3 0,0 0,0
Da F2 0,0 4,3 0,0
Da F4 0,0 4,3 0,0
Da F6 6,3 4,3 0,0
Sem indícios 87,5 87,0 100,0
Total 100,0 100,0 100,0
94
Perseveração – F7
Nenhum dos participantes da amostra manifestou perseveração de conteúdos de
outras fábula ao responderem à Fábula 7.
Respostas Populares – F7
No grupo estudado por Cunha e Nunes (1993) as respostas populares para a Fábula
7 são as mesmas tanto para meninos quanto meninas, pré-escolares ou escolares, e
consistiam em verbalizar que o herói da história daria para a mãe a torre que ela havia
pedido.
Através da análise das respostas das crianças abrigadas, observou-se que 50% das
crianças em idade pré-escolar (40% das meninas e 54,5% dos meninos) e 65,2% das
crianças do grupo de escolares (56,2% das meninas e 70% dos meninos) apresentaram as
mesmas respostas da amostra padronizada do instrumento. Portanto, conclui-se que a
resposta comum para a Fábula 7 da amostra de crianças abrigadas (pré-escolares e
escolares) é a mesma do que a resposta popular das crianças da amostra padronizada do
teste.
Ação – F7
O item “ação” investiga as atitudes tomadas pelo herói no momento em que a mãe
pede o objeto de argila fabricado por ele. A maior parte dos participantes (61,3%) mostrou
ações ativas e adaptadas em suas respostas à Fábula 7, o segundo maior percentual deles
apresentou ações com resistência ativa (21%).
Isso foi observado nas respostas tanto de meninas (52,4% ações ativas e adaptadas e
23,8% ações com resistência ativa) quanto de meninos (65,9% ações ativas e adaptadas e
19,5% ações com resistência ativa). Em todas as faixas etárias, para ambos os sexos, a
preferência das crianças se deu por ações do tipo ativas e adaptadas. Na Tabela 46 estão
apresentados os percentuais dos tipos de ação, por faixa etária dos participantes.
95
Tabela 46 Percentuais dos Tipos de Ação da Fábula 7, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Tipo de Ação 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Ativa e adaptada 56,3 60,9 65,2
Com resistência ativa 25,0 17,4 21,7
Ativa, mas deslocada 0,0 13,0 4,3
Não adaptada 6,3 8,7 0,0
Insegura, bloqueada ou ambivalente 6,3 0,0 8,7
Com resistência passiva 6,3 0,0 0,0
Total 100,0 100,0 100,0
Fantasias – F7
As crianças da amostra, em percentuais mais altos, apresentaram fantasias de
privação (35,5%), ganho secundário (33,9%), gratificação15 (12,9%) e de agressão
deslocada para o ambiente (12,9%) ao desenvolverem suas histórias na Fábula 7. Tanto o
grupo de crianças do sexo masculino quanto do feminino, quando analisados
separadamente, seguiram a ordem da amostra total em relação às fantasias mais
manifestadas. Um percentual de 42,9% das meninas manifestou fantasias de privação, e
28,6% de ganho secundário, e uma freqüência de 31,7% dos meninos demonstrou fantasias
de privação e 36,6% de ganho secundário.
Em relação às faixas etárias, uma incidência mais alta de participantes com idades
entre 4 anos e 9 meses e 7 anos apresentou a fantasia de agressão deslocada para o
ambiente (37,5%), seguida, em percentuais iguais (25%), pelas de privação, ganho
secundário e de heteroagressão ativa (25%). As crianças com idades entre 7 anos e 1 mês e
9 anos, em percentuais mais altos, manifestaram fantasias de privação (39,1%) e de ganho
secundário (30,4%). Na faixa etária dos 9 anos e 1 mês aos 11 anos e 8 meses, uma
incidência maior de crianças demonstrou a fantasia de ganho secundário (43,5%), seguida
pela de privação (39,1%) em suas respostas. Os percentuais de todos os participantes, por
faixa etária, em relação às fantasias apresentadas na Fábula 7 podem ser observados na
Tabela 47.
15 Fantasia acrescentada após o levantamento dos testes dos participantes da amostra (ver Anexo D)
96
Tabela 47 Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 7, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Fantasias
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Privação 25,0 39,1 39,1
Ganho secundário 25,0 30,4 43,5
Gratificação* 12,5 8,7 17,4
Agressão deslocada para o ambiente 37,5a,b 8,7a 0,0b
Heteroagressão ativa 25,0c 0,0c 4,3
Onipotência 6,3 8,7 8,7
Reparação 6,3 8,7 8,7
Narcisista 0,0 8,7 8,7
Rejeição 0,0 13,0 0,0
Superação* 0,0 4,3 8,7
Impotência 0,0 4,3 4,3
Castigo 6,3 4,3 0,0
Edípica 6,3 0,0 4,3
Heteroagressão passiva 6,3 0,0 0,0
Sem indícios 0,0 13,0 4,3
* Fantasias acrescentadas após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a,c - letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05 b -letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,01
Estados Emocionais – F7
Uma incidência maior de crianças da amostra apresentou estados emocionais de
bem-estar (32,2%), alegria (24,2%) e de tristeza (12,9%) relativos ao herói da fábula 7. O
maior percentual de meninos demonstrou estados emocionais de bem-estar (39%),
seguidos pelos de alegria (19,5%) e tristeza (12,2%). Já a maior freqüência de meninas
manifestou os estados emocionais de alegria (33,3%) e logo após os de bem-estar (19%) e
de tristeza (14,3%).
Nas faixas etárias dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos e dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos
de idade, as crianças, em uma freqüência maior, demonstraram estados emocionais de
bem-estar (43,8% e 39,1%, respectivamente). Os participantes, com idades entre 9 anos e 1
mês e 11 anos e 8 meses, em percentuais mais altos, apresentaram estados emocionais de
97
alegria (39,1%). Na Tabela 48, são apresentados todos os percentuais de participantes, por
faixa etária, que manifestaram estados emocionais em suas respostas à Fábula 7.
Tabela 48 Percentuais de Participantes que Apresentaram Estados Emocionais na Fábula 7, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Estados Emocionais
4 anos 9 meses –
7 anos
% (n=16)
7 anos 1 mês –
9 anos
% (n=23)
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
% (n=23)
Bem-estar* 43,8 39,1 17,4
Alegria 12,5 17,4 39,1
Tristeza 6,3 13,0 17,4
Culpa 0,0 8,7 13,0
Mal-estar* 18,8a 8,7 0,0a
Ambivalência 6,3 0,0 4,3
Orgulho* 0,0 4,3 4,3
Raiva 0,0 0,0 4,3
Ansiedade 0,0 4,3 0,0
Pesar 0,0 0,0 4,3
Impotência 0,0 4,3 0,0
Desamor 6,3 0,0 0,0
Pena* 0,0 0,0 4,3
Saudades* 0,0 4,3 0,0
Fome, dor ou frio* 0,0 4,3 0,0
Sem indícios 6,3 4,3 0,0
* Estados emocionais acrescentados após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a – letras iguais indicam valores que se diferenciam entre si, p<0,05
Defesas – F7
Os mecanismos de defesa utilizadas por uma freqüência maior de crianças da
amostra, ao desenvolver suas respostas à Fábula 7, foram os de compensação16 (38,7%),
formação reativa (17,7%), distorção (14,5%) e de idealização (11,3%). Um percentual de
19,4% dos participantes não manifestou mecanismos de defesa em suas histórias (19,5%
dos meninos e 19% das meninas).
Uma incidência mais alta de meninos e meninas apresentou mecanismos de
compensação (48,8% e 38,1%, respectivamente). As meninas em percentuais iguais (19%)
ainda manifestaram em suas respostas mecanismos de distorção, de formação reativa e de
16 Defesa acrescentada após o levantamento dos testes dos participantes (ver Anexo F)
98
idealização. O segundo percentual mais alto de meninos utilizou mecanismos de formação
reativa (17,1%).
As crianças com idades entre 4 anos e 9 meses e 7 anos, em uma freqüência mais
alta (31,3%), empregaram o mecanismo de distorção em suas respostas, e percentuais
iguais delas (25%) utilizaram mecanismos de compensação e de evitação.
Na faixa etária que vai dos 7 anos e 1 mês até os 9 anos de idade, uma maior
incidência de participantes apresentou mecanismos de compensação (39,1%) e de distorção
(17,4%). Mais da metade das crianças com idades entre 9 anos e 1 mês e 11 anos e 8 meses
utilizou o mecanismo de compensação (47,8%), e 26,1% deles elaboraram respostas em
que o mecanismo de formação reativa estava presente. Os percentuais de todos os
participantes que apresentaram defesas em suas respostas podem ser visualizados na
Tabela 49.
Tabela 49 Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 7, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Mecanismos de Defesa
4 anos 9 meses –
7 anos
% (n=16)
7 anos 1 mês –
9 anos
% (n=23)
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
% (n=23)
Compensação* 25,0 39,1 47,8
Formação reativa 12,5 13,0 26,1
Distorção 31,3a 17,4b 0,0a,b
Idealização* 6,3 8,7 17,4
Projeção 18,8 8,7 4,3
Evitação* 25,0c 4,3 0,0c
Negação 0,0 8,7 4,3
Atuação 12,5 0,0 4,3
Deslocamento 0,0 8,7 0,0
Racionalização 0,0 8,7 0,0
Introjeção 0,0 0,0 4,3
Somatização 0,0 4,3 0,0
Repressão 6,3 0,0 0,0
Altruísmo 0,0 4,3 0,0
Supressão* 0,0 0,0 4,3
Sem indícios 12,5 17,4 26,1
* Mecanismos de defesa acrescentados após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a - letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,01 b,c - letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
99
Fábula 8 (F8)
A Fábula 8, denominada “Fábula do Passeio”, refere-se ao conflito edípico (Cunha
e Nunes, 1993). Os resultados que serão descritos correspondem aos seguintes itens: tempo
de reação, fenômenos específicos (distúrbio perceptual, confusão lógica, auto-referência,
contaminação e perseveração), respostas populares, motivo, fantasias, estados emocionais
e defesas.
Tempo de Reação – F8
O tempo médio de reação das crianças da amostra para a Fábula 8 foi de 5,18
segundos. Um caso (sexo masculino) foi eliminado para análise da média do tempo de
reação por ultrapassar 60 segundos. O grupo das meninas apresentou um tempo de reação
médio de 6,81 segundos (d.p.=10,52 seg.) e o dos meninos de 4,32 segundos (d.p.=4,42
seg.). Nas diferentes faixas etárias o tempo de reação foi semelhante, variando de 5 à 5,39
segundos. Na Tabela 50 são apresentadas as médias de tempo de reação dos participantes,
por faixa etária.
Tabela 50 Médias de Tempo de Reação à Fábula 8, em Segundos, por Faixa Etária
Faixa Etária n Tempo de Reação*
(M) (d.p.)
4 anos 9 meses – 7 anos 16 5,12 5,30
7 anos 1 mês – 9 anos 22 5,00 9,18
9 anos 1 mês – 11 anos 8 meses 23 5,39 6,27
Total 61 5,18 7,14
* Em segundos
Distúrbio Perceptual – F8
A grande parte da amostra (98,4%) não revelou indícios de distúrbio perceptual em
suas respostas à Fábula 8. Somente meninos (2,4%) manifestaram esse fenômeno ao
desenvolverem suas histórias e todos encontravam-se na faixa etária dos 4anos e 9 meses
aos 7 anos de idade.
Confusão Lógica – F8
Um percentual de 8,1% de crianças da amostra (9,8% de meninos e 4,8% de
meninas) manifestou indícios de confusão lógica ao desenvolver as histórias da Fábula 8.
100
Na faixa etária dos 4 anos e 9 meses, e na dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos, freqüências de
18,8% e 8,7% das crianças, respectivamente, apresentaram esse fenômeno em suas
respostas.
Auto-referência – F8
A maioria dos participantes (98,4%) não demonstrou auto-referência em suas
respostas relativas à Fábula 8. Somente as meninas (4,8% delas) manifestaram esse
fenômeno e todas encontravam-se na faixa etária dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos de idade.
Contaminação – F8
Um percentual de 79% das crianças da amostra não mostrou contaminação de
conteúdos de fábulas anteriores ao responder à Fábula 8. Uma incidência de 9,7% delas
contaminou as respostas com elementos da Fábula 7, 4,8% da fábula 2, 4,8% da Fábula 4 e
1,6% delas da Fábula 3. As meninas apresentaram contaminação das Fábulas 7 (19%), 1
(4,8%), e da 4 (4,8%) em suas respostas e os meninos das Fábulas 2 (4,9%) 4 (4,9%), 7
(4,9%) e da 3 (2,4%).
As crianças da faixa etária dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos de idade foram as que
apresentaram, em uma freqüência mais alta (43,7%), respostas com indícios de
contaminação. Os percentuais de todos os participantes, por faixa etária, que apresentaram
contaminação na Fábula 8, podem ser observados na Tabela 51.
Tabela 51 Percentuais de Participantes que Apresentaram Contaminação na Fábula 8, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Contaminação 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Da F2 12,5 4,3 0,0
Da F3 6,3 0,0 0,0
Da F4 6,3 4,3 4,3
Da F7 18,8 4,3 8,7
Sem resposta 56,3 87,0 87,0
Total 100,0 100,0 100,0
101
Perseveração – F8
As crianças da amostra, em um percentual de 91,9%, não apresentaram
perseveração de conteúdos de fábulas anteriores ao responderem à Fábula 8. Um mesmo
percentual delas (1,6%) demonstrou perseveração das Fábulas 2, 4 e 6, e 3,2% delas da
Fábula 7. Somente os meninos mostraram indícios deste fenômeno em suas histórias.
De todas as faixas etárias, os participantes com idades entre 4 anos e 9 meses e 7
anos de idade, foram os que apresentaram um maior percentual de respostas com
perseveração (25%). Na tabela 52 são demonstrados os percentuais de todos os
participantes, por faixa etária, que elaboraram respostas com indícios de perseveração.
Tabela 52 Percentuais de Participantes que Apresentaram Perseveração na Fábula 8, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Perseveração 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Da F2 0,0 4,3 0,0
Da F4 6,3 0,0 0,0
Da F6 6,3 0,0 0,0
Da F7 12,5 0,0 0,0
Sem resposta 75,0 95,7 100,0
Total 100,0 100,0 100,0
Respostas Populares – F8
A amostra utilizada para padronizar o Teste das Fábulas para a população brasileira
(Cunha & Nunes,1993), mostrou como respostas populares da Fábula 8, na faixa etária de
crianças pré-escolares, tanto para o sexo masculino como para o feminino, a explicação de
que o pai ou mãe estava brabo(a), pois não havia gostado ou não havia deixado que a
criança saísse com o(a) pai/mãe. As crianças em idade escolar, por sua vez, verbalizaram
respostas que indicavam que o pai/mãe estava brabo(a) por que não havia sido
convidado(a) ou avisado sobre o passeio, ou por que a dupla havia demorado.
As meninas pré-escolares, em um percentual de 40%, e 27,3% dos meninos
apresentaram respostas populares. Na faixa etária escolar, 23,3% dos meninos e 31,2% das
meninas desenvolveram respostas consideradas populares. Assim, percebe-se que as
respostas comuns para as crianças pré-escolares e para as meninas em idade escolar são as
mesmas da amostra padronizada do teste (Cunha e Nunes, 1993). O grupo de meninos
102
escolares da amostra, no entanto, revelou respostas comuns diferentes das populares. Para
eles, o motivo de o pai estar brabo relacionava-se, em geral, ao fato de o menino (herói)
não ter realizado alguma tarefa que era de seu dever (estudar, ajudar em casa, ir à escola).
Motivo – F8
O item denominado “motivo” se refere à explicação que as crianças dão para a
“brabeza” do pai ou da mãe, pelo fato do herói da história ter saído com o progenitor do
sexo oposto. Um maior percentual dos participantes apresentou motivos associados à
omissão de deveres (37,1%) seguidos por àqueles associados à rejeição (17,7%),
associados à conduta inadequada17 (14,5%), sugestivos de culpa edípica (9,7%) e
associados à culpa edípica (6,5%). Uma freqüência de 8,1% das crianças produziu
respostas não adaptadas ao conteúdo da fábula.
Os meninos da amostra, em um percentual mais alto, desenvolveram histórias em
que os motivos estavam associados à omissão de deveres (41,5%), à conduta inadequada
(19,5%) e à rejeição (9,8%). Entretanto, uma freqüência significativamente maior de
meninas do que de meninos apresentou motivos associados à rejeição (33,3%; p<0,05). As
meninas ainda desenvolveram, em percentuais altos, histórias com motivos associados à
omissão de deveres (28,6%), sugestivos de culpa edípica (14,3%) e associados à culpa
edípica (14,3%).
Uma maior incidência das crianças com idades entre 4 anos e 9 meses e 7 anos
elaboraram respostas com motivos sugestivos de culpa edípica (25%) e, em freqüências
iguais (18,8%), de motivos associados à omissão de deveres, e motivos não adaptados ao
conteúdo da fábula. Os maiores percentuais de participantes com idades entre 7 anos e 1
mês e 9 anos apresentou respostas com motivos associados à omissão de deveres (39,1%),
associados à conduta inadequada (21,7%) e motivos associados à rejeição (17,4%). Na
faixa etária dos 9 anos e 1 mês aos 11 anos e 9 meses de idade, o maior percentual de
crianças verbalizou respostas em que motivos associados à omissão de deveres estavam
presentes (47,8%). A segunda maior incidência de crianças, desta faixa etária, apresentou
motivos associados à rejeição (21,7%). Os percentuais dos motivos dados pelos
participantes na Fábula 8, por faixa etária, podem ser visualizados na Tabela 53.
17 Categoria acrescentada após o levantamento dos testes das crianças abrigadas. Ela se refere às respostas em que o progenitor do sexo oposto ao do herói está brabo pois este último demonstrou um comportamento não aprovado.
103
Tabela 53 Percentuais dos Motivos da Fábula 8, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Motivo 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Associado à omissão de deveres 18,8a 39,1 47,8a
Associado à rejeição 12,5 17,4 21,7
Associado à conduta inadequada* 12,5 21,7 8,7
Sugestivo de culpa edípica 25,0 4,3 4,3
Associado à culpa edípica 0,0 8,7 8,7
Não adaptado 18,8b 0,0b 8,7
Outro 6,3 8,7 0,0
Sem resposta 6,3 0,0 0,0
Total 100,0 100,0 100,0
* Categoria do item “motivo” acrescentada após o levantamento dos testes das crianças da amostra. a,b – letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
Fantasias – F8
Um percentual mais alto das crianças da amostra manifestou em suas respostas
fantasias de agressão deslocada para o ambiente (45,2%), castigo (40,3%), rejeição
(17,7%), edípicas (16,1%), privação (12,9%) e fantasias de reparação (12,9%). O grupo
dos meninos, em freqüências mais altas, demonstrou em suas verbalizações fantasias de
agressão deslocada para o ambiente (53,7%) e de castigo (41,5%), e o das meninas, as
fantasias de castigo (38,1%), rejeição (38,1%), agressão deslocada para o ambiente
(28,6%), edípicas (28,6%), de reparação (23,8%) e de privação (19%).
Metade das crianças com idades entre 4 anos e 9 meses e 7 anos (50%) desenvolveu
histórias em que a fantasia de agressão deslocada para o ambiente estava presente.
Percentuais altos delas também manifestaram fantasias de castigo (25%). Na faixa etária
dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos de idade, a maior parte dos participantes demonstraram
fantasias de agressão deslocada para o ambiente (60,9%) em suas respostas. Ainda, uma
freqüência alta deles apresentou a fantasia de castigo (39,1%). As crianças da faixa etária
entre 9 anos e 1 mês até os 11 anos e 8 meses, em percentuais mais altos, manifestaram
fantasias de castigo (52,2%) e de reparação (30,4%). Na Tabela 54 são apresentados os
percentuais de participantes que manifestaram fantasias na Fábula 8, em relação à faixa
etária.
104
Tabela 54 Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 8, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Fantasias
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Agressão deslocada para o ambiente 50,0 60,9a 26,1a
Castigo 25,0 39,1 52,2
Rejeição 12,5 17,4 21,7
Edípica 25,0 13,0 13,0
Heteroagressão ativa 12,5 26,1b 4,3b
Privação 6,3 26,1c 4,3c
Reparação 0,0d 4,3e 30,4d,e
Abandono 6,3 0,0 0,0
Auto-agressão 0,0 4,3 0,0
Ganho secundário 0,0 4,3 0,0
Morte* 6,3 0,0 0,0
Agregação familiar* 0,0 0,0 4,3
Superação* 6,3 0,0 0,0
Sem indícios 18,8f 0,0f 8,7
* Fantasias acrescentadas após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a,b,d,e,f – letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
Estados Emocionais – F8
Um maior percentual de participantes da amostra apresentou estados emocionais de
culpa (29%) tristeza (24,2%) e de mal-estar (11,3%) relacionados ao herói. Tanto meninas
quanto meninos, em uma freqüência mais alta, manifestaram em suas respostas os estados
emocionais de culpa (38,1% e 24,4%, respectivamente) e de tristeza (38,1% e 17,1%,
respectivamente). Ainda 14,6% dos meninos fizeram referência a estados emocionais de
mal-estar em suas respostas.
Na faixa etária dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos de idade, o maior percentual dos
participantes apresentou estados emocionais de mal-estar (12,5%), medo (12,5%), tristeza
(12,5%), raiva (12,5%) e de bem-estar (12,5%). As crianças com idades entre 7 anos e 1
mês aos 9 anos, em uma freqüência maior, ao responderem à Fábula 8, demonstraram
estados emocionais de culpa (26,1%) e mal-estar (17,4%). Na faixa etária dos 9 anos e 1
mês e 11 anos e 8 meses, mais da metade das crianças (52,2%) apresentaram estados
emocionais de tristeza e, ainda um percentual alto delas, citaram sentimentos de culpa
105
(47,8%). Os percentuais de todos os participantes que apresentaram estados emocionais na
Fábula 8, em relação à faixa etária, são visualizados na Tabela 55.
Tabela 55 Percentuais de Participantes que Apresentaram Estados Emocionais na Fábula 8, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Estados Emocionais
4 anos 9 meses –
7 anos
% (n=16)
7 anos 1 mês –
9 anos
% (n=23)
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
% (n=23)
Culpa 6,3a 26,1 47,8a
Tristeza 6,3b 8,7
Mal-estar*
Medo
Raiva
Alegria
Desamor
Ambivalência
Bem-estar*
Fome, dor ou frio*
Impertinência
Sem indícios
c 52,2b,c
12,5 17,4 4,3
12,5 4,3 13,0
12,5 8,7 0,0
6,3 4,3 4,3
6,3 8,7 0,0
6,3 8,7 0,0
12,5 4,3 0,0
6,3 4,3 0,0
0,0 4,3 0,0
Mágoa* 0,0 0,0 4,3
Alívio* 0,0 4,3 0,0
Pesar 0,0 0,0 4,3
12,5 4,3 0,0
* Estados emocionais acrescentados após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a,c - letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,01 b - letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,001
Defesas – F8
Os mecanismos de defesas utilizados por percentuais mais altos das crianças da
amostra foram os de idealização (24,2%), introjeção (17,7%), atuação (14,5%), distorção
(11,3%) e de racionalização (11,3%). Uma freqüência de 21% das crianças não utilizou
mecanismos de defesa em suas respostas. Os participantes do sexo masculino, em
percentuais mais altos, apresentaram mecanismos de idealização (29,3%), introjeção
(17,1%) e de atuação (14,6%) e os do sexo feminino os mecanismos de introjeção (19%),
racionalização (19%), distorção (14,3%), atuação (14,3%) e de idealização (14,3%). A
freqüência mais alta de meninas (28,6%) e 17,1% dos meninos não utilizaram mecanismos
de defesa em suas respostas.
106
Na faixa etária dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos de idade, o maior percentual de
crianças não apresentou mecanismos de defesa (37,5%) e 18,8% utilizou o mecanismo de
distorção.Uma incidência maior de crianças com idades entre 7 anos e 1 mês e 9 anos
utilizou os mecanismos de idealização (26,1%) e de atuação (26,1%). Na faixa etária dos 9
anos e 1 mês aos 11 anos e 8 meses, o maior percentual de participantes apresentou em
suas respostas os mecanismos de idealização (34,8%), de introjeção (30,4%) e de
racionalização (21,7%). Na Tabela 56 são observados os percentuais, por faixa etária, de
participantes que demonstraram mecanismos de defesas em suas respostas.
Tabela 56 Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 8, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Mecanismos de Defesa
4 anos 9 meses –
(n=16)
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Idealização* 6,3a 26,1 34,8a
Introjeção 6,3 13,0 30,4
Atuação 6,3
18,8
6,3
12,5
6,3
0,0
6,3
0,0
6,3
12,5 0,0
0,0
0,0
0,0
Identificação introjetiva* 6,3 0,0 0,0
37,5
26,1 8,7
Distorção 13,0 4,3
Racionalização 4,3 21,7
Negação 4,3 8,7
Supressão* 4,3 4,3
Projeção 8,7 0,0
Somatização 4,3 0,0
Isolamento 4,3 4,3
Retorno contra si mesmo* 4,3 0,0
Evitação* 0,0
Regressão 0,0 4,3
Compensação* 4,3 0,0
Identificação 4,3 0,0
Sem indícios 13,0 17,4
7 anos
%
7 anos 1 mês –
* Mecanismos de defesa acrescentados após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a - letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
107
Fábula 9 (F9)
A Fábula 9 (Fábula da Notícia), assim como as Fábulas 4 e 5, tem objetivo de
catarse e, em geral, suscita nas crianças questões relacionadas a desejos, medos,
proibições, restrições, deveres ou informações.
Os resultados que serão expostos correspondem aos seguintes itens: tempo de
reação, fenômenos específicos (distúrbio perceptual, confusão lógica, auto-referência,
perseveração e contaminação), respostas populares, medos, desejos, proibições, restrições e
deveres, informações, fantasias, estados emocionais e defesas.
Tempo de Reação – F9
A média do tempo de reação dos participantes da pesquisa para a Fábula 9 (n=60)
foi de 5,98 segundos. Dois casos (um feminino e um masculino) foram excluídos por
ultrapassarem 60 segundos. O tempo médio de reação para o grupo das meninas (n=20) foi
de 7,55 segundos (d.p.=9,44 seg.) e para o dos meninos (n=40) de 5,20 segundos
(d.p.=6,79 seg.). O maior tempo de reação ocorreu na faixa etária dos 4 anos e 9 meses aos
7 anos de idade (7,13 segundos). As médias de tempo de Reação à Fábula 9, em segundos
e por faixas etárias, podem ser observadas na tabela 57.
Tabela 57
Médias de tempo de Reação à Fábula 9, em segundos, por faixas etárias Faixa Etária n Tempo de Reação*
(M) (d.p.)
11,05 4 anos 9 meses – 7 anos 16 7,13
7 anos 1 mês – 9 anos 21 5,38 6,57
9 anos 1 mês – 11 anos 8 meses
5,98
23 5,74 6,18
Total 60 7,77
* Em segundos
Distúrbio Perceptual – F9
Nenhuma das crianças da amostra apresentou indícios de distúrbio perceptual ao
responder à Fábula 9.
Confusão Lógica – F9
Um percentual pequeno de participantes (3,2%) apresentou confusão lógica ao
responder à Fábula 9. Na faixa etária dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos de idade, 6,3% das
108
Um percentual de 77,4% das crianças da amostra não demonstrou contaminação de
conteúdos de fábulas anteriores ao responder à Fábula 9. Uma incidência de 4,8% delas
contaminou as respostas com elementos da Fábula 8, 4,8% da fábula 2, 4,8% da Fábula 4,
3,2% das Fábulas 1 e 3 e 1,6% delas, da Fábula 7. As meninas apresentaram contaminação
das Fábulas 2 (9,5%),4 (9,5%), e da 7 (4,8%) em suas respostas e os meninos das Fábulas 8
(7,3%), 1 (4,9%) 3 (4,9%), 2 (2,4%) e da 4 (2,4%).
Faixa
crianças manifestou confusão lógica em suas verbalizações e na faixa dos 7 anos e 1 mês
aos 9 anos de idade, 4,3% delas apresentou esse fenômeno. Respostas com indícios de
confusão lógica não foram observadas no grupo das meninas nem nos participantes com
idades entre 9 anos e 1 mês e 11 anos e 8 meses.
Auto-referência – F9
A maioria das crianças da amostra (98,4%) não utilizou auto-referência em suas
histórias. Do grupo das meninas 4,8% delas apresentou auto-referência e todas se
encontravam na faixa-etária dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos de idade. Nenhum dos meninos
manifestou este fenômeno em suas respostas.
Contaminação – F9
Os percentuais de participantes que apresentaram indícios de contaminação em suas
respostas se distribuíram por todas as faixas etárias de modo semelhante. Esses
percentuais, por faixa etária, podem ser visualizados na Tabela 58.
Tabela 58 Percentuais de Participantes que Apresentaram Contaminação na Fábula 9, em Relação à Faixa Etária
Etária
Contaminação 4 anos 9 meses –
7 anos
0,0
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Da F1 0,0 8,7
Da F2 0,0 4,3 8,7
6,3
Da F3 12,5 0,0 0,0
Da F4 0,0 4,3 8,7
Da F7 6,3 0,0 0,0
Da F8 4,3 4,3
Sem resposta 75,0 78,3 78,3
Total 100,0 100,0 100,0
109
Perseveração – F9
A maior parte dos participantes da pesquisa (72,6%), de todas as faixas etárias, não
apresentou perseveração de conteúdos de fábulas anteriores ao responderem à Fábula 9.
Um mesmo percentual delas (3,2%) manifestou perseveração das Fábulas 2,5,6 e 7 e
14,5% delas da Fábula 8. As meninas, em um percentual de 14,3%, demonstraram em suas
respostas perseveração de conteúdos da Fábula 8 e 4,8% delas, da Fábula 6. Uma
freqüência de 14,6% dos meninos apresentou em suas histórias perseveração de elementos
da Fábula 8 percentuais iguais deles (4,9%), das fábulas 2,5 e 7 , e 2,4% dos meninos da
Fábula 6. Os percentuais de participantes, por faixa etária, que demonstraram
contaminação de conteúdos de outras fábulas nas respostas da Fábula 9, podem ser
observados na Tabela 59.
Tabela 59 Percentuais de Participantes que Apresentaram Perseveração na Fábula 9, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Perseveração 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Da F2 0,0 8,7 0,0
Da F5 0,0 8,7 0,0
Da F6 6,3 4,3 0,0
Da F7 12,5 0,0 0,0
Da F8 12,5 4,3 26,1
Sem resposta 68,8
100,0
73,9 73,9
Total 100,0 100,0
Respostas Populares – F9
As respostas populares para a Fábula 9, no grupo estudado por Cunha e Nunes
(1993), são as mesmas para meninos ou meninas em idades escolares ou pré-escolares.
Essas respostas consistiam nas verbalizações das crianças que relacionavam a notícia da
mãe com desejos ligados à satisfação pessoal (ganhar um presente, ser elogiado, realizar
uma atividade prazerosa, um passeio).
Através da análise das respostas das crianças abrigadas, observou-se que 18,8% das
crianças em idade pré-escolar (18,2% dos meninos e 20% das meninas) e 45,6% das
crianças do grupo de escolares (43,3% dos meninos e 50% das meninas) apresentaram as
110
mesmas respostas da amostra padronizada do instrumento. Assim, conclui-se que a
resposta comum para a Fábula 9, da amostra de crianças abrigadas, na faixa etária escolar,
é a mesma do que a resposta popular das crianças da amostra padronizada do teste.
Do grupo de meninas, 14,3% delas verbalizou respostas em que a notícia da mãe
relacionava-se à perdas e 4,8% correspondia a respostas variadas, e não faziam parte de
nenhuma das categorias pré-existentes. Os meninos, em percentuais iguais (4,9%),
apresentaram respostas em que a notícia estava ligada à perdas e também respostas
variadas não enquadradas à categorias já existentes (categoria “outros”).
Todavia, verificou-se que as respostas mais comuns para os participantes, de ambos
os sexos e em idade pré-escolares, desta pesquisa não corresponderam às respostas
populares do grupo estudado por Cunha e Nunes (1993). Para as crianças pré-escolares da
amostra a resposta mais comum consistia em relacionar a notícia da mãe com proibições
ou deveres (ex: estudar mais para a escola, não brigar com os irmãos ou colegas).
Medos – F9
O item “medos” serve para categorizar respostas que demonstram que o herói
recebe uma notícia que poderia lhe causar apreensão, como àquelas relacionadas
aacidentes ou doença (que alguém sofreu um acidente, foi hospitalizado, entre outras), de
perdas (um objeto foi perdido, uma pessoa faleceu). Uma freqüência de 12,9% dos
participantes apresentou respostas correspondentes ao item “medo”, sendo que 8,1% delas
indicava medos de perdas e 4,8% eram variadas não se enquadrando em nenhuma das
categorias pré-existentes.
Na faixa etária dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos de idade, as respostas de 18,8% dos
participantes indicaram que a notícia era caracterizada por assuntos variados (categoria
“outros”), que se associavam a conteúdos relacionados ao medo, porém não faziam parte
de nenhuma das categorias citadas anteriormente. As crianças com idades entre 7 anos e 1
mês e 9 anos e as na faixa etária dos 9 anos e 1 mês aos 11 anos e 8 meses, desenvolveram
respostas com conteúdos de perdas (4,3% e 17,4%, respectivamente). Na Tabela 60 são
apresentados os percentuais das categorias do item medo na Fábula 9, por faixa etária.
111
Tabela 60 Percentuais das Categorias Relacionadas ao Item Medo na Fábula 9, por Faixa Etária Faixa Etária
Medos 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
De perdas 0,0 4,3 17,4
Outro 18,8a,b 0,0a 0,0b
Sem resposta 81,3 95,7 82,6
Total 100,0 100,0 100,0
a,b – letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
Desejos – F9
O item “desejos” é utilizado para categorizar respostas que demonstram que o herói
recebe uma notícia que corresponde a algo positivo e que ele ambiciona. As notícias
podem ser relacionadas a presentes ou lazer (mãe vai levar a criança para passear, vai dar
uma bicicleta para ela), à satisfação oral (a mãe dar um chocolate para a criança),
relacionado com melhoria de vida (a mãe ganhou na loteria), êxito pessoal (a criança
passou de ano), relacionados com relações familiares (a avó veio visitar a criança) ou
outros (não correspondentes a nenhuma das categorias anteriores, porém relacionados à
desejos).
Uma incidência de 38,7% dos participantes apresentou respostas correspondentes
ao item “desejos”, sendo que 25,8% delas eram notícias relacionadas a presentes ou lazer,
6,5% com êxito pessoal, 3,2% com satisfação oral e 3,2% relacionadas a relações
familiares. A categoria de desejos manifestada pelo maior percentual de meninas e
meninos era a relacionada com presentes ou lazer (23,8% e 26,8%, respectivamente),
seguida pelas categorias relacionadas com êxito pessoal (9,5% e 4,9%, respectivamente),
relacionadas com satisfação oral (4,8% e 2,4%) e a categoria de notícia relacionada com
relações familiares (4,8% e 2,4%, respectivamente).
Em todas as faixas etárias o maior percentual de crianças apresentou em suas
histórias desejos relacionados com presentes ou lazer. Os percentuais de todas as
categorias do item desejos na Fábula 9, por faixa etária, são observados na Tabela 61.
112
Percentuais de Categorias do Item Desejos na Fábula 9, por Faixa Etária
Tabela 61
Faixa Etária
Desejos 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Relacionado com presentes ou lazer 12,5a 17,4b 43,5ab
0,0 13,0 4,3
Relacionado com satisfação oral 6,3 4,3 0,0
Relacionado com relações familiares 0,0 0,0 8,7
Sem resposta 81,3c 65,2 43,5c
Total 100,0 100,0 100,0
Relacionado com êxito pessoal
a,b,c – letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
Proibições, Restrições e Deveres – F9
O objetivo do item “proibições, restrições e deveres” é classificar as respostas em
que a notícia dada pela mãe do herói corresponde à atribuições que são dadas à ele, ou
respostas em que a mãe impede que ele realize algo. As categorias que fazem parte deste
item são de notícias relacionadas com higiene ou alimentação (ex: a mãe manda a criança
tomar banho ou almoçar), relacionadas com a escola (ex: diz para a criança estudar),
relacionados com relações sociais (ex: a mãe fala para a criança não brigar com seus
irmãos) ou outros (não correspondentes à nenhuma das categorias anteriores, porém
relacionados à proibições, restrições e deveres).
Em uma freqüência de 40,4%, as crianças da pesquisa desenvolveram respostas
correspondentes ao item “proibições, restrições e deveres”. Um percentual de 21% dos
participantes deu notícias relacionadas com a escola, 9,7% com relações sociais, 3,2%
relacionados com a higiene ou alimentação e 6,5% verbalizou respostas que foram
agrupadas na categoria “outros”. A categoria de proibições, restrições e deveres
apresentada pelo maior percentual de meninas e meninos estava relacionada a escola
(14,3% e 24,4%, respectivamente). A segunda maior freqüência de meninos (14,6%)
desenvolveu respostas correspondentes às categorias relacionadas com relações sociais.
No que se refere às diferentes faixas etárias, em todas elas, o maior percentual de
crianças não apresentou respostas relacionadas à proibições, restrições e deveres. Porém, as
crianças com idades entre 4 anos e 9 meses e 7 anos e dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos,
também elaboraram respostas com percentuais relativamente altos (31,3% e 26,1%,
113
respectivamente) de proibições, restrições e deveres relacionados à escola. Na Tabela 62,
podem ser observados os percentuais de todas as categorias relacionadas ao item
proibições, restrições e deveres na Fábula 9, por faixa etária.
Tabela 62 Percentuais das Categorias em Relação ao Item Proibições, Restrições e Deveres na Fábula 9, por Faixa Etária Faixa Etária
Proibições, Restrições e Deveres 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Relacionados com a escola 31,3 26,1 8,7
Relacionados com as relações sociais 12,5 13,0 4,3
Relacionados com a higiene e alimentação 6,3 4,3 0,0
Outro
100,0 100,0
0,0 8,7 8,7
Sem resposta 50,0a 47,8b 78,3a,b
Total 100,0
a,b – letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
Informações – F9
O item informações tem por objetivo categorizar aquelas respostas que indicam que
a notícia contada pela mãe se refere à comunicação de assuntos que podem ser triviais,
sobre fatos da vida cotidiana ou, uma categoria nova denominada “estória”, que apareceu
nas respostas das crianças abrigadas, em que a notícia está associada ao fato da mãe estar
contando uma estória para a criança.
O maior percentual dos participantes (93,5%), de todas as faixas etárias, não
apresentou respostas relativas ao item “informações” porém, das crianças que elaboraram
respostas deste tipo (6,5%), todas elas desenvolveram histórias referentes à categoria
“estória”. No grupo dos meninos, 7,3% deles elaboraram respostas que se enquadravam
nesta categoria e no grupo das meninas, 4,8% delas, também apresentaram este tipo de
resposta. Na Tabela 63 são observados os percentuais das categorias relacionadas ao item
informações na Fábula 9, por faixa etária.
114
Tabela 63 Percentuais das Categorias Relacionadas ao Item Informações na Fábula 9, por Faixa Etária. Faixa Etária
Informações 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
A mãe contou uma estória* 6,3 8,7 4,3
Sem resposta 93,8 91,3 95,7
Total 100,0 100,0 100,0
* Categoria acrescentada após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa
Fantasias – F9
O percentual mais alto das crianças da amostra manifestou fantasias de gratificação
(32,3%), agressão deslocada para o ambiente (24,2%), castigo (17,7%), heteroagressão
ativa (11,3%) e fantasias de privação (11,3%) em suas histórias. Uma freqüência de 19,4%
dos participantes não apresentou indícios de fantasias nas respostas à Fábula 9.
Uma incidência maior de meninas da amostra desenvolveu histórias em que as
fantasias de gratificação (38,1%), privação (23,8%) e de agressão deslocada para o
ambiente (14,3%), estavam presentes. O maior percentual de meninos manifestou fantasias
de gratificação (29,3%), agressão deslocada para o ambiente (29,3%), castigo (22%) e de
heteroagressão ativa (12,2%). Em relação às histórias sem indícios de fantasias, 28,6% das
meninas e 14,6% dos meninos apresentou esse tipo de resposta. O percentual de meninas
que revelou a fantasia de privação foi significativamente mais alto (p<0,05) do que o de
meninos (4,9%).
Na faixa etária dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos de idade, o percentual mais alto de
crianças (37,5%) desenvolveu histórias com fantasias de heteroagressão ativa. Freqüências,
iguais, dos participantes dessas idades (25%) manifestaram fantasias de agressão deslocada
para o ambiente e de castigo.As crianças com idades entre 7 anos e 1 mês e 9 anos de idade
apresentaram freqüências mais altas de fantasias de gratificação (34,8%), agressão
deslocada para o ambiente (30,4%) e de castigo (21,7%). Na faixa etária dos 9 anos e 1
mês aos 11 anos e 8 meses, mais da metade dos participantes (52,2%) manifestou em suas
histórias fantasias de gratificação. Ainda 17,4% deles elaborou respostas indicativas de
fantasias de agressão deslocada para o ambiente e 17,4% de privação. Os percentuais de
participantes, por faixa etária, que demonstraram fantasias, na Fábula 9, podem ser
visualizados na tabela 6
115
Tabela 64 Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 9, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Fantasias
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Gratificação* 0,0a,b 34,8a 52,2b
Agressão deslocada para o ambiente 25,0 30,4 17,4
Castigo 25,0 21,7 8,7
Heteroagressão ativa 37,5 0,0 4,3
Privação 6,3 8,7 17,4
Rejeição 18,8c 4,3 0,0c
Abandono 0,0 0,0 8,7
Ganho secundário 0,0 8,7 0,0
Agregação familiar* 0,0 0,0 8,7
Superação* 0,0 0,0 8,7
Reparação 0,0 0,0 4,3
Impotência 0,0 4,3 0,0
Sem indícios 37,5d 17,4 8,7d
* Fantasias acrescentadas após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a -letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,01 b - letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,001 c,d -letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
Estados Emocionais –F9
As crianças da amostra, em uma maior freqüência, atribuíram ao herói estados
emocionais de alegria (37,1%), bem-estar (19,4%) e mal-estar (11,3%). Um percentual
mais alto das meninas demonstrou os estados emocionais de alegria (42,9%) e bem-estar
(23,8%), e dos meninos os estados emocionais de alegria (34,1%), bem-estar (17,1%) e
mal-estar (17,1%).
Na faixa etária dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos de idade, uma incidência maior das
crianças, fez referência aos estados emocionais de mal-estar (31,3%). Os participantes,
com idades entre 7 anos e 1 mês e 9 anos, em percentuais mais altos, manifestaram estados
emocionais de alegria (34,8%) e de bem-estar (30,4%). Mais da metade das crianças da
faixa etária dos 9 anos e 1 mês aos 11 anos e 8 meses, desenvolveu respostas em que o
herói manifestava estados emocionais de alegria (56,5%). Ainda um percentual alto delas
(21,7%), referiu o estado emocional de tristeza em suas respostas. Na tabela 65 são
apresentados os percentuais dos participantes, por faixa etária, que manifestaram estados
emocionais na Fábula 9.
116
Tabela 65 Percentuais de Participantes que Apresentaram Estados Emocionais na Fábula 9, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Estados Emocionais
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Alegria 12,5a 34,8 56,5a
Bem-estar* 18,8 30,4 8,7
Mal-estar* 31,3b 8,7 0,0b
Tristeza 6,3 0,0c 21,7c
Raiva 12,5 0,0 0,0
Culpa 0,0 0,0 8,7
Pesar 0,0 4,3 4,3
Ambivalência 6,3 4,3 0,0
Fome, dor ou frio* 6,3 4,3 0,0
Medo 0,0 4,3 0,0
Ansiedade 0,0 0,0 4,3
Saudades* 0,0 0,0 4,3
Sem indícios 6,3 8,7
* Estados emocionais acrescentados após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a,b - letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,01 c - letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
Defesas - F9
O percentual mais alto de participantes (45,2%) não utilizou mecanismos de defesa
em suas histórias. Entre as crianças que utilizaram mecanismos de defesa, as freqüências
mais altas foram para os mecanismos de introjeção (17,7%), idealização (16,1%) e de
atuação (11,3%). A maior parte das meninas da amostra (71,4%) não utilizou mecanismos
de defesa, assim como um maior percentual de meninos (31,7%), sendo que o percentual
de meninas foi significativamente superior ao dos meninos (p<0,01). Os mecanismos
utilizados por uma maior freqüência de meninos foram os de introjeção (26,8%), de
idealização (22%) e de atuação (12,2%), e das meninas os de distorção (9,5%) e atuação
(9,5%). O percentual de meninos que utilizou o mecanismo de introjeção foi
significativamente mais alto (p<0,01) do que o de meninas (0%).
Na faixa etária dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos, o maior percentual de crianças
apresentou mecanismos de atuação (37,5%) e distorção (25%) e 12,5% delas não
manifestou indícios de mecanismos de defesa em suas respostas.
117
O maior percentual de participantes com idades entre 7 anos e 1 mês e 9 anos de
idade (47,8%) desenvolveu respostas sem fazer uso de mecanismos de defesa. Porém, os
mecanismos mais usados pelas crianças desta faixa etária foram os de introjeção (21,7%) e
de idealização (21,7%). A maior parte das crianças da faixa etária dos 9 anos e 1 mês até os
11 anos e 8 meses (65,2%) também não utilizou mecanismos de defesa em suas respostas à
Fábula 9. Percentuais de 21,7% e 17,4% das crianças dessas idades demonstraram
mecanismos de idealização e de introjeção, respectivamente.
Pode-se verificar que, com o aumento da idade dos participantes, a utilização de
mecanismos de defesa passou a diminuir. Na tabela 66, podem ser observados os
percentuais de participantes, por faixa etária, que apresentaram mecanismos de defesa na
Fábula 9.
Tabela 66 Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 9, em Relação à faixa etária Faixa Etária
Mecanismos de Defesa
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Introjeção 12,5 21,7 17,4
Idealização* 0,0a,b 21,7a 21,7b
Atuação 37,5c,d 4,3c 0,0d
Distorção 25,0e 8,7 0,0e
Regressão 0,0 8,7 0,0
Somatização 6,3 4,3 0,0
Racionalização 6,3 0,0 4,3
Evitação* 6,3 4,3 0,0
Negação 6,3 0,0 0,0
Compensação* 0,0 4,3 0,0
Supressão* 6,3 0,0 0,0
Sem indícios 12,5f,g 47,8f 65,2g
* Mecanismo de defesa acrescentados após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a,b,e,f, - letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05 c,d,g - letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,01
118
A média do tempo de reação para as meninas (n=20) foi 3,85 segundos (d.p.=6,26
seg) e o e dos meninos (n=39) 2,92 segundos (d.p.=2,48 seg.). O tempo de reação variou
entre 2,12 e 4,05 segundos para as diferentes faixas etárias. As médias de tempo de reação
dos participantes, por faixa etária, podem ser observadas na Tabela 67.
Fábula 10 (F10)
A Fábula 10 é denominada “Fábula do Sonho Mau” e também tem por objetivo
favorecer a catarse. Essa fábula, em geral, explicita fantasias e sentimentos de hétero ou
auto-agressão, culpabilidade e autopunição das crianças (Cunha & Nunes, 1993).
Os resultados que serão apresentados referem-se aos itens: tempo de reação,
fenômenos específicos (distúrbio perceptual, confusão lógica, auto-referência e
contaminação), respostas populares, perseveração de conteúdos, introdução de novos
conteúdos, fantasias, estados emocionais e defesas.
Tempo de Reação – F10
A média do tempo de reação para a Fábula 10 dos participantes da pesquisa foi de
3,24 segundos (n=59). Três casos (um do sexo feminino e dois do sexo masculino) foram
eliminados para realização do cálculo da média de tempo de reação, pois ultrapassaram 60
segundos.
Tabela 67 Médias de tempo de Reação à Fábula 10, em Segundos, por Faixas Etárias
Faixa Etária n Tempo de Reação*
(M) (d.p)
4 anos 9 meses – 7 anos 16 2,12 1,36
7 anos 1 mês – 9 anos 21 4,05 6,31
9 anos 1 mês – 11 anos 8 meses 22 3,27 2,51
Total 59 3,24 4,13
* Em segundos Distúrbio Perceptual – F10
Nenhum dos participantes apresentou indícios de distúrbio perceptual ao responderem à
Fábula 10.
Confusão Lógica – F10
Um percentual de 4,8% das crianças da amostra (4,9% de meninos e 4,8% de
meninas) manifestou indícios de confusão lógica ao desenvolver as histórias da Fábula 10.
119
Auto-referência – F10
Tabela 68
As crianças que apresentaram este fenômeno em suas respostas encontravam-se nas faixas
etárias dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos de idade (6,3%) e dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos de
idade (8,7%).
Um percentual de 95,2% da amostra não apresentou auto-referência nas histórias da Fábula
10. Desta amostra total, 9,5% das meninas e 2,4% dos meninos manifestaram indícios de
auto-referência em suas respostas. Os participantes que apresentaram auto-referência
encontravam-se nas faixas etárias dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos (4,3%), e dos 9 anos e 1
mês aos 11 anos e 8 meses (8,7%).
Contaminação – F10
Um percentual de 11,2% das crianças da amostra desenvolveu histórias para a
Fábula 10 com contaminação de conteúdos de outras fábulas. Dessas crianças, 3,2% delas
apresentaram contaminação da Fábula 2, e, em percentuais iguais de 1,6%, elas
demonstraram contaminação das Fábulas 1, 3, 5, 6 e 7 em suas respostas. Os meninos da
amostra contaminaram suas respostas com elementos das Fábula 2 (4,9%), 1 (2,4%), 3
(2,4%), 6 (2,4%) e 7 (2,4%), e as meninas somente com conteúdos da Fábula 5 (4,8%).
Em relação às diferentes faixas etárias, a maior parte das crianças de todas as idades
não apresentou contaminação em suas respostas, no entanto, um percentual mais alto de
participantes que manifestouesse fenômeno foi observado na faixa dos 4 anos e 9 meses
aos 7 anos de idade (31,2%). Os percentuais de participantes, por faixa etária, que
apresentaram contaminação de conteúdos de outras Fábulas nas respostas à Fábula 10,
podem ser visualizados na Tabela 68.
Percentuais de Participantes que Apresentaram Contaminação na Fábula 10, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Contaminação 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Da F1 6,3 0,0 0,0
Da F2 6,3 4,3 0,0
Da F3 6,3 0,0 0,0
Da F5 0,0 0,0 4,3
120
0,0
Percentuais de Participantes que Apresentaram Contaminação na Fábula 10, em Relação à Faixa Etária (continuação da Tabela 68) Da F6 6,3 0,0
Da F7 6,3 0,0 0,0
Sem resposta 68,8 95,7 95,7
Total 100,0 100,0 100,0
Respostas Populares – F10
O estudo de Cunha e Nunes (1993) não apresentou respostas populares para a
Fábula 10.
Perseveração de Conteúdos – F10
Uma freqüência de 37% dos participantes manifestou perseveração de conteúdos de
outras Fábulas em suas respostas à Fábula 10. Dessas crianças, o maior percentual
demonstrou perseveração da Fábula 5 (16,1%) e 6,5% delas da Fábula 8. Ainda uma
freqüência de 4,8% dos participantes manifestou perseveração da Fábula 9, 3,2% da Fábula
2, 3,2% da 4, 1,6% da 3 e 1,6% da Fábula 6. Os meninos apresentaram perseverações das
Fábulas 5 (14,6%), 8 (7,3%), 9 (4,9%), e em percentuais iguais de 2,4%, das Fábulas 2, 3,
4 e 6. As meninas, em um maior freqüência (19%) desenvolveram respostas perseverando
o conteúdo da Fábula 5 e em percentuais iguais (4,8%), das Fábulas 2, 4, 8 e 9.
Em todas as faixas etárias, o maior percentual de crianças não apresentou
perseveração de conteúdos de outras fábulas ao responder à Fábula 10. Na faixa etária dos
4 anos e 9 meses aos 7 anos e dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos, o tipo de perseveração mais
comum foi o da Fábula 5 (18,8% e 26,1%, respectivamente), e na faixa dos 9 anos e 1 mês
e 11 anos e 8 meses foi a contaminação da Fábula 8 (8,7%). Os percentuais de todos os
participantes que manifestaram perseveração de conteúdos na fábula 10, por faixa etária,
são apresentados na Tabela 69.
Tabela 69 Percentuais de Participantes que Apresentaram Perseveração de Conteúdos na Fábula 10, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Perseveração de conteúdos 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Da F2 6,3 0,0 4,3
Da F3 0,0 4,3 0,0
121
0,0
Percentuais de Participantes que Apresentaram Perseveração de Conteúdos na Fábula 10, em Relação à Faixa Etária (continuação da Tabela 69) Da F4 6,3 4,3
Da F5 18,8 26,1a 4,3a
Da F6 0,0 4,3 0,0
Da F8 0,0 8,7 8,7
Da F9 6,3 4,3 4,3
Sem indícios 62,5 52,2 73,9
Total 100,0 100,0 100,0
a - letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
Introdução de Novos Conteúdos – F10
O item Introdução de Novos Conteúdos refere-se àquelas respostas que não
representam perseveração de conteúdos de fábulas anteriores. Ao responder à Fábula 10 a
criança tem a possibilidade de repetir conteúdos de fábulas anteriores e, assim demonstrar
uma perseveração, ou então de responder à fábula apenas com conteúdos novos que ainda
não se mostraram presentes em outras fábulas. Ainda há a possibilidade das crianças
apresentarem respostas em que aparecem de forma simultânea novos conteúdos e
perseverações.
Um percentual de 69,4% dos participantes apresentou novos conteúdos em suas
respostas à Fábula 10. Os conteúdos que foram verbalizados por uma freqüência maior de
crianças se referiam a bruxas ou entidades fantásticas (24,2%) e a acontecimentos
aterrorizantes (22,6%). Uma incidência menor de crianças verbalizou histórias com
conteúdos relacionados a pessoas reais ameaçadoras (8,1%), animais reais ou não (8,1%)
pai e/ou mãe (4,8%) e respostas não características de pesadelos (1,6%).
As meninas e os meninos da amostra, em freqüências mais altas, desenvolveram
respostas com novos conteúdos de bruxas ou entidades fantásticas (28,6% e 22%,
respectivamente) e de acontecimentos aterrorizantes (23,8% e 22%, respectivamente). Uma
incidência mais alta de meninos (12,2%) também apresentou histórias em que o pesadelo
era causado por pessoas reais ameaçadoras.
Na faixa etária dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos de idade, as crianças em percentuais
mais altos, responderem à Fábula 10 com conteúdos de bruxas ou entidades fantásticas
(31,3%), de acontecimentos aterrorizantes (12,5%) e de animais reais ou não (12,5%). A
maior freqüência dos participantes, com idades entre 7 anos e 1 mês e 9 anos, apresentou
respostas com conteúdos de bruxas e entidades fantásticas (21,7%) e pessoas reais
ameaçadoras (17,4%). Na faixa etária dos 9 anos e 1 mês aos 11 anos e 8 meses, o
122
percentual mais alto das crianças desenvolveu respostas caracterizadas por acontecimentos
aterrorizantes (47,8%), seguidas pelas respostas com conteúdos de bruxas ou entidades
fantásticas (21,7%). Os percentuais de novos conteúdos, por faixa etária, podem ser
observados na Tabela 70.
Faixa Etária
Tabela 70 Percentuais de Participantes que Introduziram Novos Conteúdos na Fábula 10, em Relação à Faixa Etária
Introdução de novos conteúdos 4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Bruxas ou entidades fantásticas 31,3 21,7 21,7
Acontecimentos aterrorizantes 12,5a 4,3b 47,8a,b
Animais reais ou não 12,5 8,7 4,3
Pessoas reais ameaçadoras
Total
6,3 17,4c 0,0c
Pai e/ou mãe* 6,3 0,0 8,7
Não característico de pesadelos 0,0 4,3 0,0
Sem indícios 31,3 43,5d 17,4d
100,0 100,0 100,0
* Categoria acrescentada após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a,c,d- letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05 b, - letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,001
Fantasias – F10
A maioria das crianças da amostra (79%) apresentou fantasias de agressão
deslocada para o ambiente em suas respostas. Os percentuais mais altos que se seguiram
referiam-se às fantasias de privação (19,4%), perseguição18 (16,1%) e de castigo (11,3%).
Tanto o grupo das meninas quanto o dos meninos, em índices bastante altos, manifestou
fantasias de agressão deslocada para o ambiente (85,7% e 75,6%, respectivamente). As
meninas ainda apresentaram percentuais mais altos das fantasias de privação (23,8%) e os
meninos das de perseguição (24,4%) e de privação (17,1%), sendo que a freqüência de
meninos que revelou fantasias de perseguição foi significativamente superior (p<0,05) à de
meninas (0%).
Grande parte dos participantes na faixa etária dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos de
idade (87,5%) e dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos de idade (87%), demonstrou fantasias de
agressão deslocada para o ambiente em suas respostas. Uma freqüência mais alta de
18 Fantasia acrescentada após o levantamento dos testes das crianças da amostra (ver Anexo D).
123
crianças, com idades entre 9 anos e 1 mês e 11 anos e 8 meses, desenvolveu respostas em
que as fantasias de agressão deslocada para o ambiente (65,2%) e de privação (34,8%)
estavam presentes. Os percentuais, por faixa etária, de todos os participantes que
manifestaram fantasias na Fábula 10 são apresentados na Tabela 71.
Tabela 71 Percentuais de Participantes que Apresentaram Fantasias na Fábula 10, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Fantasias
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Agressão deslocada para o ambiente 87,5 87,0 65,2
Privação 0,0a 17,4 34,8a
Perseguição*
Castigo
Gratificação*
6,3 21,7 17,4
12,5 4,3 17,4
Heteroagressão ativa 12,5 4,3 4,3
Abandono 6,3 0,0 8,7
Impotência 12,5 4,3 0,0
Morte* 6,3 4,3 0,0
Rejeição 0,0 0,0 4,3
Onipotência 0,0 4,3 0,0
0,0 4,3 0,0
Invasão* 0,0 4,3 0,0
Sem indícios 12,5 4,3 0,0
* Fantasias acrescentadas após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a -letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,01
Estados Emocionais – F10
O estado emocional, associado ao herói na Fábula 10, mais verbalizado pelas
crianças da amostra, foi o de medo (51,6%). Isto ocorreu tanto para os meninos (43,9%)
quanto para as meninas (66,7%). O segundo percentual mais alto de participantes (16,1%,
22% dos meninos e 4,8% das meninas) não descreveu nenhum tipo de estado emocional
para o herói.
Em todas as faixas etárias, o maior percentual de crianças atribuíu o estado
emocional de medo ao herói (43,8% da faixa etária dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos de
idade, 52,2% dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos e 56,5% com idades entre 9 anos e 1 mês e 11
anos e 8 meses). Pode-se perceber, também, que a freqüência de crianças que não
apresentou estados emocionais para essa Fábula decresceu de acordo com o aumento da
124
idade delas. Na Tabela 72 são apresentados os percentuais, por faixa etária, de todos os
participantes que manifestaram estados emocionais na Fábula 10.
Tabela 72 Percentuais de Participantes que Apresentaram Estados Emocionais para a Fábula 10, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Estados Emocionais
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Medo 43,8 52,2 56,5
Bem-estar* 18,8 4,3 4,3
Tristeza 0,0 8,7 8,7
Raiva 0,0 8,7 8,7
Mal-estar* 12,5 4,3 4,3
Alegria 0,0 4,3 4,3
Ansiedade 0,0 0,0 4,3
0,0 Rebeldia 4,3 0,0
Culpa 0,0 0,0 4,3
Pesar 0,0 0,0 4,3
Desamor 0,0 0,0 4,3
Saudades* 0,0 4,3 0,0
Alívio* 0,0 0,0 4,3
Mau-humor* 0,0 0,0 4,3
Sem indícios 25,0 17,4 8,7
* Estados emocionais acrescentados após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa
Defesas – F10
Metade dos participantes da pesquisa (50%) não utilizou mecanismos de defesa em
suas respostas à Fábula 10. Os maiores percentuais de crianças que utilizaram mecanismos
de defesas em suas histórias apresentaram os mecanismos de idealização (17,7%), evitação
(17,7%) e de distorção (11,3%). Uma freqüência de 51,2% dos meninos e 47,6% dos
meninos não elaborou respostas com mecanismos de defesa.
Em todas as faixas etárias, a maior freqüência de crianças não utilizou mecanismos
de defesa em suas respostas (56,3% da faixa etária dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos de
idade, 43,5% dos 7 anos e 1 mês aos 9 anos e 52,2% com idades entre 9 anos e 1 mês e 11
anos e 8 meses). Na faixa etária dos 4 anos e 9 meses aos 7 anos, um percentual de 25%,
dos participantes apresentou o mecanismo distorção. As crianças com idades entre 7 anos e
125
1 mês até os 9 anos, e dos 9 anos e 1 mês aos 11 anos e 8 meses, utilizaram principalmente,
os mecanismos de idealização. Os percentuais de todos os participantes, por faixa etária,
que apresentaram mecanismos de defesa na Fábula 10 podem ser observados na Tabela 73.
Tabela 73 Percentuais de Participantes que Apresentaram Mecanismos de Defesa na Fábula 10, em Relação à Faixa Etária Faixa Etária
Mecanismos de Defesa
4 anos 9 meses –
7 anos
(n=16)
%
7 anos 1 mês –
9 anos
(n=23)
%
9 anos 1 mês –
11 anos 8 meses
(n=23)
%
Idealização* 0,0a,b 21,7a 26,1b
Evitação* 12,5 30,4 8,7
Distorção 25,0 8,7 4,3
Atuação 12,5 4,3 4,3
Racionalização 6,3 0,0 8,7
Introjeção 0,0 4,3 4,3
Hipocondria 0,0 4,3 0,0
Regressão 0,0 4,3 0,0
Somatização 6,3 0,0 0,0
Repressão 0,0 4,3 0,0
Sem indícios 56,3 43,5 52,2
* Mecanismos de defesa acrescentados após o levantamento dos testes dos participantes da pesquisa a,b – letras iguais indicam os valores que se diferenciam entre si, p<0,05
126
CAPÍTULO IV
DISCUSSÃO
Este estudo partiu da hipótese de que crianças abrigadas, por terem seus vínculos
com as figuras parentais rompidos, seja de forma parcial (estão abrigadas, mas mantêm
algum tipo de contato) ou de forma total (não mantêm mais contato algum) se
desenvolvem de forma diferente de crianças que residam com ao menos uma de suas
figuras parentais. Por tal razão, essas crianças apresentariam respostas ao Teste das Fábulas
diversas daquelas dadas pela amostra padronizada do instrumento.
Através da análise dos resultados confirmou-se tal hipótese. Várias Fábulas
possuíram respostas comuns diferentes das populares apresentadas pela amostra
padronizada do teste e que muitas das que foram consideradas iguais às populares, ao
serem analisadas, não suscitavam os mesmos conflitos sugeridos por Cunha e Nunes
(1993). Além disso, foram encontradas diferentes categorias de fantasias, estados
emocionais e mecanismos de defesa, daquelas propostas pelas autoras do teste. Muitas
dessas novas categorias foram as mais manifestadas pelas crianças em suas respostas.
A maior parte das respostas das crianças não apresentaram fenômenos específicos e
as médias de tempo de reação encontraram-se, de uma forma geral, dentro do esperado
quando comparadas à amostra padronizada do instrumento. Todavia, em algumas Fábulas
específicas foi encontrado um percentual alto desses fenômenos, assim como uma variação
nas médias do tempo de reação. Esses achados serão discutidos nesta seção.
Os resultados encontrados serão discutidos em relação a cada uma das fábulas,
procurando-se contextualizar esses dados dentro da situação em que as crianças abrigadas
encontram-se e como a literatura contribui para que sejam entendidos.
Fábula 1
Na Fábula 1 observou-se que as crianças abrigadas demonstraram como resposta
comum o mesmo tipo de resposta considerada como popular para a amostra padronizada
do teste. Em sua maioria, essas crianças desenvolveram ações ativas, enredos
manifestamente independentes e desfechos adaptativos, respostas que foram evoluindo
conforme a faixa etária, de acordo com o esperado no desenvolvimento infantil.
127
Os personagens acrescentados pela maior parte dos participantes foram as figuras
parentais e, em segundo lugar, os irmãos. É importante ressaltar que os personagens “pais”
aparecem no próprio enunciado da fábula, já os “irmãos”, não são citados em nenhum
momento quando é introduzida esta fábula e a sua presença no desenvolvimento da
resposta foi considerada com uma forma de distúrbio perceptual.
Nas respostas dos participantes, de uma forma geral, esses irmãos apareciam como
figuras positivas, no entanto, não estavam ali para auxiliar o herói, mas sim, partilhavam de
uma mesma situação de abandono. Algumas crianças também demonstraram a necessidade
de que o herói da história devesse dispensar cuidados a esses irmãos.
O fato das crianças abrigadas citarem tal personagem [irmão(s)] possivelmente está
relacionado à questão de que a maioria dos participantes desta pesquisa residam no abrigo
com seus próprios irmãos, também partilhando com eles de uma mesma situação (a
situação de abandono). Pode-se entender, a partir disso, que os irmãos exercem um papel
significativo para as crianças abrigadas.
As fantasias mais presentes nas respostas das crianças foram as de abandono,
agressão deslocada para o ambiente e de agregação familiar. Isto indica que, apesar de as
crianças estarem apresentando ações ativas (onde o passarinho toma uma atitude voando
para outra árvore), enredos manifestamente independentes e desfechos adaptativos, existe
uma idéia de que o herói foi abandonado pelas figuras parentais, que esse abandono
propicia que a criança seja atacada pelos perigos do mundo externo, e que há uma
necessidade de voltar a reunir essa família que foi separada.
Pode-se entender esse tipo de resposta dentro da situação que essas crianças
vivenciam. De um momento para o outro, elas encontram-se longe da família, ficando a
mercê das agressões do ambiente. Visto que não terão mais as figuras parentais para
auxiliá-las precisam tomar atitudes, não podendo permanecer passivas e dependentes.
Outro fator que pode estar influenciando neste tipo de resposta tem relação com a situação
sócio-econômica da qual essas crianças provém. Em situações de risco pessoal e social é
comum que crianças muito jovens arquem com atribuições de adultos (cuidam dos irmãos,
dos trabalhos domésticos, trazem dinheiro para casa) e isso demanda uma maior
independência (Silva & cols, 1998, Bandeira, 1999)
Entretanto, foram encontradas diferenças entre as faixas etárias no que se refere às
fantasias e desfechos apresentados. As crianças pequenas manifestaram mais fantasias de
agressão deslocada para o ambiente e de morte do que as mais velhas, cujas fantasias mais
presentes eram as de abandono, de impotência e de agregação familiar.
128
O fato de as crianças pequenas apresentarem mais fantasias de agressão deslocada
para o ambiente parece sugerir que para elas o abandono dos pais é encarado como uma
forma de agressão. Bowlby (1973/1998) refere que as pessoas, ao se depararem com uma
perda definitiva (morte, abandono), muitas vezes não acreditam que esta seja permanente e
pensam que podem recuperar o que (ou quem) partiu, assim como reprovam esse
comportamento. Desse modo, as pessoas que sofrem a perda acabam desenvolvendo
sentimentos de raiva por aquelas que as deixaram, com o objetivo de desencorajar essa
pessoa a partir novamente.
De acordo com Papalia e Olds (1981), as crianças com idades inferiores aos 7 anos
ainda não possuem o conceito de irreversibilidade. Por tal razão, para essas crianças a
morte (ou um afastamento definitivo) não é compreendida como algo definitivo. Assim,
para ela é mais fácil atribuir aos pais que a abandonaram a culpa por terem partido (que
aparece como uma forma de agressão). As crianças mais velhas, por sua vez, por já terem
incorporado esse conceito, entendem que o afastamento pode ser irreversível e, por isso, a
agressividade não pode ser digirida àqueles que partiram. Essas crianças acabam
introjetando a culpa do abandono, acreditando que possam ter feito algo errado como razão
pelo abandono e as pessoas que partem são isentadas de tal culpa. Além disso, conforme
Mussen, Conger e Kagan (1977), somente entre os 6 e os 7 nos de idade as crianças
adquirem a capacidade de sentir culpa, em razão da formação do superego. Essas questões
tornam-se mais claras ao analisarmos as demais fábulas que também suscitam fantasias de
abandono, em que estados emocionais de culpa e a introjeção como defesa passam a ser
mais evidentes.
Um dos fatores que utiliza-se para entender a forma como a criança lida com a
situação de abandono originada pelo conteúdo da Fábula é o desfecho que esta desenvolve,
pois demonstra como a criança elabora a conflitiva estabelecida e finaliza a história. As
crianças mais velhas produziram mais respostas com desfechos adaptativos. Por sua vez, as
menores apresentaram um índice mais elevado de desfechos não adaptativos. Essas formas
de desfechos relacionam-se também aos tipos de mecanismos de defesa utilizados pelas
crianças.
Para as crianças da amostra em geral, as defesas mais utilizadas foram as de
regressão, idealização e distorção (defesas mais imaturas). Em muitas respostas das
crianças, a regressão aparecia quando, após aparentemente ter resolvido sozinho a situação
conflitiva, o herói apresentava a necessidade do auxílio dos pais. Conforme Cunha e Nunes
(1993), entre todas as Fábulas, a Fábula 1 é a que possibilita uma regressão mais profunda.
As autoras ainda referem que essa Fábula remete a uma situação de separação que, muitas
129
vezes, pode estar relacionada a uma fantasia de perda real e, se o ego não consegue
enfrentar as demandas dessa situação, acaba regredindo de tal modo que entra em um
processo não adaptativo, como se a perda fantasiada fosse real.
Em relação às diferentes faixas etárias, as crianças mais novas apresentaram mais
mecanismos de regressão do que os participantes mais velhos. Isto vem ao encontro da
questão levantada anteriormente, de que o conteúdo da Fábula 1 pode remeter as crianças a
perdas reais, fazendo com que a regressão seja tão profunda que não é possível
desenvolver um desfecho adaptativo. Observa-se também que estas crianças mais novas,
em um maior número, lançam mão da defesa de distorção, indicando que a forma mais
utilizada para sair dessa posição regressiva é distorcendo a realidade, ao invés de buscar
recursos mais maduros.
O fato de as crianças mais novas estarem realmente mais próximas de etapas
evolutivas anteriores talvez seja o motivo pelo qual a defesa de regressão seja mais
utilizada por elas. Além disso, por se encontrarem em fases de desenvolvimento anteriores,
seus recursos são mais escassos, e assim, para elas, é mais difícil “retornar” dessa condição
regressiva e desenvolver um desfecho adaptativo. As defesas de distorção também foram
maiores para essas crianças.
Já os participantes mais velhos, ao se identificarem com a perda objetal fantasiada,
parece que, para não se deprimirem e não entrarem em um processo não adaptativo,
acabam lançando mão de outras defesas, como as de idealização (em que de uma forma
“mágica” a situação que antes era adversa se transformando de uma forma positiva) . De
acordo com Petot (1982), a idealização, defesa introduzida por Melanie Klein, está
associada à posição depressiva e não maníaca. Esse mecanismo de defesa caracteriza-se
por um esforço do ego em manter separado o objeto bom do mau ocorrendo uma
supervalorização do objeto quando considerado como inteiramente bom. A idealização
serve como um meio de proteção contra a depressão e da preservação da própria vida.
A utilização do mecanismo de idealização possibilita também que as crianças
desenvolvam mais enredos do tipo manifestamente independente e mais desfechos
adaptativos, já que afasta as crianças dessa posição depressiva.
Observa-se que, embora as crianças de diferentes faixas etárias utilizem
mecanismos de defesa diversos, todas as defesas que foram mais utilizadas, eram mais
imaturas. Bee (1997) refere que, de acordo com o desenvolvimento e com a maturação do
ser humano, ocorre uma mudança gradativa no tipo de mecanismo de defesa utilizado,
sendo que mecanismos que distorcem a realidade vão sendo utilizados cada vez menos. A
autora cita que essas mudanças acontecem lentamente, e que em geral são mais observadas
130
Isto parece indicar que nos períodos iniciais de abrigamento as crianças percebem o
abandono como algo que pode ser temporário e que é possível tomar uma atitude para
“fugir” dessa situação. No entanto, com o passar do tempo, elas parecem de certo modo
no início da vida adulta e por volta da meia idade. De acordo com esses dados entende-se
por que as crianças apresentam defesas imaturas, já que este é um fato característico do
próprio desenvolvimento.
Os estados emocionais mais citados pelas crianças mais novas foram os de bem-
estar e mal-estar e sensações físicas de fome, dor ou frio. Ambos são bastante indefinidos e
não chegam a caracterizar sentimentos precisos. Já as crianças mais velhas manifestaram
mais estados emocionais de tristeza e solidão.
Tais diferenças podem ser explicadas pelo próprio desenvolvimento infantil e o
desenvolvimento da linguagem. Papalia e Olds (1981) relatam que entre os 3 e os 7 anos
de idade existe um acréscimo significativo na linguagem. Enquanto as crianças com idades
entre 3 e 4 anos formulam frases utilizando as palavras mais essenciais (3 a 4 palavras) e
possuem um vocabulário de 900 à 1200 palavras, as crianças com idades entre 6 e 7 anos já
possuem uma linguagem muito mais sofisticada com frases complexas e um vocabulário
mais desenvolvido (de 3000 à 4000 palavras).
Além disso, Gessel (1998) refere que a partir dos 7 anos a criança já é capaz de
refletir sobre si mesma e sobre seus próprios sentimentos. As crianças dessa idade são mais
assimilativas, podendo ordenar as experiências passadas e relacioná-las a novos eventos.
Por essas razões, é provável que para as crianças mais velhas seja mais fácil nomear os
estados emocionais não só por possuírem uma linguagem mais desenvolvida, mas também
por reconhecerem em si mesmas os sentimentos que são atribuídos aos personagens em
determinadas situações.
No que se refere ao tempo de institucionalização foi constatado que conforme
aumentava esse período menor era o tempo de reação à Fábula. Isso possivelmente se
relaciona ao fato de que crianças abrigadas por um período menor mostram-se mais
mobilizadas pelos conteúdos sugeridos pela Fábula do que aquelas que encontram-se
afastadas das figuras parentais por um tempo maior.
Também foi observado que crianças que estavam abrigadas por um maior período
de tempo apresentaram mais ações ativas em suas respostas, e que, conforme esse tempo
aumentava, cresciam também os percentuais de respostas com ações passivas. Outra
questão observada foi que os participantes que residiam há mais tempo nos abrigos
manifestavam índices maiores de fantasias de agregação familiar.
131
conformar-se com a situação em que se encontram, as ações se tornam passivas e o desejo
do retorno à família fica no nível da fantasia.
As respostas populares da amostra do instrumento para as crianças pré-escolares
referiram-se a motivos associados ou sugestivos de conflito edípico, como citado
anteriormente, o que não foi observado para a amostra de crianças abrigadas. Tais
resultados nos remetem ao estudo de Rey (1994), que investigou a hipóteses do complexo
de Édipo em crianças abandonadas, através do teste das fábulas. Os resultados
demonstraram que mais da metade das crianças em situação de abandono da amostra não
apresentaram indícios de estrutura triangular edípica em suas respostas, sendo que estas
indicaram relações duais pré-edípicas. Ainda de acordo com a autora, o aparecimento
desses conteúdos pré-edípicos estavam relacionados ao fato de o instrumento apresentar de
forma direta às crianças a própria situação em que ela se encontrava (a situação de
abandono e institucionalização).
Estes resultados vêm ao encontro do teoria de Spitz (1965/1979) que refere que os
danos proporcionados pela ausência da figura materna é proporcional ao tempo de
afastamento. Podemos observar esses “danos”, pelo comportamento cada vez mais passivo
que vai sendo instaurado nas crianças ao se depararem com a conflitiva do abandono.
Além disso, tais características relacionam-se aos dados referidos por Mussen, Conger,
Cagan e Huston (1988), de que crianças que crescem em instituições tornam-se mais
dependentes.
Fábula 2
As respostas comuns para as crianças da amostra, de ambos os sexos, escolares ou
pré-escolares divergiram daquelas consideradas como populares para a amostra
padronizada do instrumento. Foi constatado que para os participantes em idade escolar
(dos sexos feminino e masculino) e para os pré-escolares do sexo masculino respostas
comuns estavam relacionadas à rejeição. Já as meninas em idade pré-escolar dividiram-se
entre motivos associados à rejeição, deslocada para temas orais e outros (como brigas).
As crianças escolares da amostra também permaneceram apresentando,
principalmente, motivos relacionados à rejeição. No entanto, as respostas populares para
essa faixa etária se relacionavam a motivos que demonstravam que a criança encontrava-se
indiferente ao conteúdo da fábula .
Entre as fábulas que exploram predominantemente conteúdos edípicos (Fábula 2 e
8), em especial na Fábula 2, pode-se entender essa questão levantada por Rey (1994), de
132
As ações apresentadas pelos participantes, em sua maioria (para todas as faixas
etárias), foram ações passivas (a criança sai para ficar sentada, sozinha, chorando,
pensando). As fantasias predominantes foram as de rejeição e de agressão deslocada para o
ambiente e os sentimentos mais verbalizados referiam-se aos de tristeza, raiva, mal-estar
ou sensações de fome, dor ou frio. Através desses resultados, pode-se perceber que a
Fábula 2, para as crianças da amostra, explorou muito mais questões do abandono e da
própria rejeição, do que aquelas relacionadas à conflitiva edípica.
Em relação às diferentes faixas etárias, observou-se que as crianças mais novas
elaboraram mais respostas com ações e motivos não adaptados do que os participantes
mais velhos. Isso também parece relacionar-se ao fato de elas estarem demonstrando uma
maior incidência do fenômeno específico de confusão lógica.
Outra questão analisada relaciona-se, novamente, ao fato de as crianças menores
manifestarem mais fantasias de agressão deslocada para o ambiente do que as mais velhas,
que demonstraram um número mais alto de fantasias de rejeição. Como foi observado, a
Fábula 2 para as crianças abrigadas parece explorar mais as questões do abandono
vivenciado do que propriamente a conflitiva edípica. Desse modo, assim como na Fábula
1, percebe-se que as crianças pequenas sentem essa situação de abandono como uma forma
de agressão. Já as crianças mais velhas apresentaram mais fantasias de rejeição, associadas
a mecanismos de introjeção. Através da análise de suas defesas, verifica-se que as crianças
maiores, também como na Fábula 1, parecem atribuir a si a culpa pela situação de
abandono.
que a fábula acaba sugerindo para as crianças abrigadas, situações mais relacionadas ao
abandono ou rejeição. Esses conteúdos parecem ser mais manifestados nesta Fábula, já que
na introdução da história o herói sai do local onde encontram-se as figuras parentais para
ficar sozinho no fundo do quintal. Tal situação pode remetê-los à própria situação real
vivenciada, a do afastamento das figuras parentais.
Observou-se que mais meninos do que meninas manifestaram estados emocionais
de mal-estar e sensações físicas de fome, dor ou frio. Por tal razão, os participantes do sexo
masculino também utilizaram mais mecanismos de somatização do que os do sexo
feminino. Porém, essas diferenças são melhor explicadas pela faixa etária do que pelo
sexo, já que a maior parte dos meninos que apresentou tais estados emocionais tinha idades
entre 4 anos e 9 meses e 7 anos.
As crianças pequenas também apresentaram mais estados emocionais indefinidos,
como os de mal-estar ou ligados a sensações físicas, como fome, dor e frio. Essas crianças
133
também utilizaram mais mecanismos de evitação e distorção do que as demais. Já as
crianças mais velhas apresentaram mais sentimentos de tristeza.
Tais diferenças possivelmente estão relacionadas aos próprios aspectos
desenvolvimentais Como já foi explorado na Fábula 1, com o passar do tempo as pessoas
vão utilizando cada vez mais defesas maduras. Apesar de se encontrar ainda pouca
diferença entre as crianças mais novas (4 anos e 9 meses) até as mais velhas (11 anos e 8
meses), observa-se que as crianças menores, que possuem menos recursos de ego, ao se
depararem com uma situação conflitiva e extermamente mobilizadora em termos
emocionais, acabam utilizando defesas menos eficazes [as defesas de distorção conforme
Kaplan, Sadock e Grebb (1997) são mais imaturas do que as de introjeção].
Constatou-se que, conforme aumentava o tempo de abrigamento, menos as crianças
apresentavam fantasias de agressão deslocada para o ambiente e mecanismos de projeção.
O fato de atribuírem a agressividade ao exterior, ao ambiente, pode estar relacionado ao
fato também de utilizarem esses mecanismos de projeção (projetando no ambiente uma
agressividade que é própria deles).
A questão da agressividade também é apontada pela literatura. Caliman (1991)
refere que as crianças que se encontram em situação de pobreza (situação na qual todas as
crianças da amostra encontravam-se antes do abrigamento) têm sua saúde física e mental
afetada, já que estão expostas diretamente à violência. Esse convívio faz com que as
crianças desenvolvam sentimentos de frustração, injustiça, rejeição e exclusão.
Sendo assim, entende-se que as crianças nos primeiros períodos em que se
encontram abrigadas ainda trazem consigo esses sentimentos relativos a situações de
violência às quais estavam expostas. Entretanto, com o passar do tempo, ao se encontrarem
em um ambiente protegido, parecem aliviar tais fantasias.
Outra explicação para essa questão pode estar no fato de as crianças abrigadas mais
recentemente, assim como as crianças mais novas, podem estar encarando a ruptura com a
família (abandono) como uma forma de agressão. Entretanto, com o passar do tempo, a
possibilidade de voltar a viver junto dos pais torna-se cada vez mais distante e a situação
de abandono passa a ser encarada como algo irreversível. Dessa forma, elas idealizam a
relação que tinham, já que a agressividade não pode ser mais dirigida às figuras que se
encontram distantes.
Fábula 3
134
As defesas mais utilizadas pelas crianças da amostra foram as de negação,
regressão e de idealização, que parecem ter como objetivo a eliminação das fantasias de
privação, pois encontravam-se também relacionadas a esses desfechos não adaptativos.
Negar o fato de que a mãe não voltará a dar leite ao herói e idealizar uma situação
inusitada em que uma nova ovelha aparece para suprir a falta do alimento foram algumas
das soluções encontradas por essas crianças. A regressão aparece presente sempre que o
Na Fábula 3 as respostas comuns dos participantes da pesquisa foram as mesmas
consideradas como populares para as crianças da amostra padronizada do teste. Essa
resposta está relacionada a uma ação ativa e adaptada, em que o cordeirinho segue a ordem
da mamãe ovelha e vai comer o capim. Entretanto, observa-se que os desfechos
desenvolvidos por essas crianças são, em sua maioria, desfechos não adaptativos, em
especial nas respostas dos meninos. Esses finais, em geral, indicavam que o cordeirinho,
após ter obedecido à mãe e ter comido o capim, volta atrás, e a história é finalizada de uma
forma que herói o retorna a ter o leite como alimento.
Em muitas destas respostas com desfechos não adaptativos observou-se indícios de
distúrbio perceptual. Esse fenômeno, na maioria das vezes, era utilizado como uma forma
de o cordeirinho não ficar privado do leite, sendo que em algumas respostas eram
introduzidos novos elementos, como uma outra ovelha que aparecia para suprir essa falta.
Verificou-se, também, que a grande maioria dessas crianças manifestaram fantasias de
privação em suas respostas.
A forma como as crianças da amostra, em geral, responderam à Fábula 3, nos
remete à pesquisa de Torres e Guerrerro (2000). Os resultados do estudo indicam que as
crianças abandonadas tendem a apresentar um comportamento de obediência compulsiva,
em que o desejo da mãe sempre prevalece sobre o da criança. Isto poderia explicar a
tendência que os participantes desta pesquisa apresentaram, em que, em um primeiro
impulso, procuravam obedecer a ordem dada pela mãe. Porém, percebe-se que não é o
desejo das crianças, já que a fantasia de privação é manifestada principalmente por
sentimentos de tristeza, mal-estar e sensações físicas de fome, dor e frio (estes dois últimos
mais presentes nas respostas de crianças pequenas) e confirmadas pelos desfechos não
adaptativos.
As meninas apresentaram desfechos adaptativos em um maior número do que os
meninos. Entretanto, as fantasias de privação foram as mais freqüentes em suas respostas.
Isto possivelmente indica que as meninas parecem ser mais suscetíveis à necessidade de
adequação social, pois o fato de terem apresentado esse tipo de fantasia demonstra que não
era desejo delas ficar sem o leite.
135
cordeirinho, que no início da resposta se mostra pronto para comer o capim, retorna a uma
etapa anterior, voltando a depender do leite materno.
Em relação às diferentes faixas etárias, foram verificadas diferenças no que se
refere aos estados emocionais manifestados. Pode-se observar que a maior parte das
crianças pequenas (entre 4 anos e 9 meses e 7 anos) apresentou, também nesta Fábula,
estados emocionais mais imprecisos, como os de mal-estar e bem-estar ou sensações
físicas de fome, dor ou frio. Enquanto que as crianças mais velhas (acima de 7 anos), em
sua maioria, fizeram referência a estados emocionais de tristeza. Essa dificuldade em
definir estados emocionais parece estar relacionada ao próprio desenvolvimento infantil e
não ao conteúdo da Fábula 3, confirmando uma tendência de todas as fábulas apresentadas.
As crianças menores apresentaram mais desfechos com adaptação parcial, enquanto
que as maiores mais desfechos não adaptativos. Estas últimas ainda utilizaram mais
mecanismos de atuação e de evitação, e as mais velhas os de idealização. Nessas histórias,
as crianças mostraram-se descontentes com o fato de estarem privadas do leite, porém as
crianças maiores desenvolvem enredos em que de alguma forma o cordeirinho consegue
reaver o alimento finalizando a história de uma forma positiva para o herói. Já crianças
mais novas elaboram histórias em que o herói conforma-se com a situação de privação,
sendo finalizada de uma forma negativa para ele. O que indica que crianças maiores,
apesar de demonstrarem regressão não aceitando o novo alimento e voltando a tomar leite,
utilizam esses recursos de uma forma em que o final se torna positivo, enquanto as
crianças pequenas não conseguem encontrar soluções que façam com que o herói saia
dessa situação negativa.
Foi constatado que as crianças abrigadas por um período mais curto de tempo
apresentaram mais ações ativas e adaptadas, menos desfechos não-adaptativos e menos
fantasias de privação do que aquelas que estavam ali por um período mais longo. Isto pode
estar relacionado à questão levantada pela pesquisa de Torres e Guerreiro (2000).
Possivelmente, essas crianças abrigadas mais recentemente estariam com tendência à
obediência incorporada de uma forma mais forte, o que faria com que nem cogitassem a
possibilidade de desobecer à mãe, não sendo nem possível arrumar uma forma alternativa
de conseguir esse leite. De tal modo, as fantasias de privação também não se
manifestariam. Isso pode ser válido, principalmente porque não foi observado que
sentimentos negativos fossem menos presentes para essas crianças.
Outra forma de avaliar os resultados seria entendendo-se que um período maior de
abrigamento poderia suscitar nas crianças um número maior de fantasias de privação, já
que, de uma forma real, encontram-se por um período mais longo privados de sua figura
136
materna. Tal interpretação sugere que crianças abrigadas por um período mais longo de
tempo apresentariam respostas mais regressivas, o que é confirmado pelas demais Fábulas.
Fábula 4
A maior parte das crianças da amostra, de ambos os sexos, e de todas as faixas
etárias apresentaram respostas comuns diferentes das respostas populares da amostra
padronizada do instrumento. As respostas comuns para os participantes pré-escolares do
sexo masculino indicavam que toda a família havia viajado. As meninas desta faixa etária
dividiram-se em respostas que indicavam que os pais haviam partido e deixado o restante
da família e aquelas em que toda a família embarcava no avião. As crianças escolares da
amostra, de ambos os sexos, apresentaram como resposta comum que o filho ou filha da
família partia.
Os estudos de Cunha e Nunes (1993) indicam que a Fábula da viagem não é tão
reveladora quanto a da morte, já que viagens de turismo ou de negócios atualmente estão
muito presentes em nossa realidade. Isso faria com que as respostas das crianças se
baseassem em dados reais e culturais e não em uma projeção. Por essas razões, as autoras
levantam a hipótese de eliminar a fábula da viagem e substituí-la, em todos os casos, pela
da morte. Entretanto, para o grupo de crianças abrigadas esta fábula (da viagem) tornou-se
extremamente útil e significativa. As histórias elaboradas pelas crianças da amostra
pareciam refletir a própria situação de abandono em que se encontravam. Para essas
crianças, a Fábula da Viagem não parece exercer uma função de catarse das emoções e
fantasias suscitadas pelas fábulas anteriores, mas sim traz à tona, de uma forma bastante
direta, a conflitiva que vêm se mostrando predominante nesses casos: a ruptura da relação
com as figuras parentais.
As respostas em que toda a família viajava, elaboradas principalmente pelas
crianças mais novas relacionaram-se à fantasia de agressão deslocada ao ambiente, ou seja,
um ambiente desfavorável fazia com que as pessoas precisassem partir para um novo local.
Esse tipo de resposta parecia encobrir o medo do abandono. As fantasias de agressão
deslocada para o ambiente novamente demonstraram que crianças pequenas sentem a
separação delas em relação às figuras parentais como uma forma de agressão.
Neste tipo de resposta, as crianças tentam, através de mecanismo de negação, evitar
ao máximo entrar em contato com esse abandono, fazendo com que a família permaneça
como uma só, agregada (já que no enunciado é dito que apenas uma pessoa da família
137
viaja). Dessa forma essa fantasia (de abandono) não é explicitada, pois a crianças não
permitem que isso venha à tona. Assim, as fantasias que foram encontradas relacionavam-
se a esse desejo de manter uma família unida. Por esses motivos, estados emocionais de
bem-estar foram os mais freqüentes, já que sair do local insalubre em que se encontravam
era algo benéfico e, principalmente, porque a família não era separada. Essas respostas
reforçam a necessidade da inclusão de uma nova categoria para a análise de fantasias,
sugerida nesta pesquisa como a categoria de “agregação familiar”.
Algumas das respostas das crianças pequenas indicavam que os pais haviam
viajado e deixado a família. Essas respostas relacionaram-se à fantasia de abandono,
entendendo-se que os participantes da pesquisa naturalmente se identificaram com esses
filhos que ficaram.
A resposta comum para as crianças mais velhas trazia como personagem que viaja
um dos filhos da família (que, em geral, era com quem as crianças se identificavam). Em
sua maioria, tais respostas relacionavam-se a fantasias de privação, de agressão deslocada
para o ambiente, de reparação e de heteroagressão ativa. Nas histórias elaboradas pelas
crianças, o filho que estava sofrendo agressões ou privações por parte dos pais procurava
fugir dessas situações por preservação própria ou como uma forma de agredir também as
figuras parentais.
Mesmo nessas situações, para as crianças, partir vinculava-se ao estado emocional
de tristeza. Fantasias de reparação apareciam associadas a estados emocionais de culpa,
causados pelo fato de o filho ter abandonado a família. As defesas mais utilizadas por essas
crianças foram as de negação e idealização. Isso acontecia quando o personagem, ao se
sentir culpado, retornava para casa (mesmo após termos dito que a viagem era sem volta),
e a situação que antes o fizera fugir agora está completamente modificada. Novamente
observa-se que as crianças mais velhas passam a assumir a culpa pela separação em relação
às figuras parentais.
Também nesta fábula as crianças menores apresentaram mais estados emocionais
de mal-estar e de bem-estar e sensações físicas de dor, fome ou frio e as mais velhas,
sentimentos de culpa e tristeza. Estas últimas utilizaram mais mecanismos de idealização e
de negação, enquanto as mais novas os de distorção e de somatização.
No que se refere ao tempo de institucionalização, foi verificado, assim como na
Fábula 2, que conforme aumentava esse período, menor era o tempo de reação à Fábula.
Isso possivelmente relaciona-se ao fato de que crianças abrigadas por um período menor
mostraram-se mais mobilizadas pelos conteúdos sugeridos pela Fábula do que aquelas que
encontram-se afastadas das figuras parentais por um tempo maior.
138
Observou-se que com o aumento do tempo de abrigamento, também aumentou o
percentual de crianças que indicaram como personagem que viajava o filho ou filha da
família. Isso explica o fato de uma diminuição das fantasias de abandono e dos estados
emocionais de bem-estar e do aumento de sentimentos de culpa. As crianças abrigadas por
um período mais longo também apresentaram mais mecanismos de idealização.
As crianças abrigadas por um período mais curto de tempo apresentaram mais
respostas em que um dos pais ou ambos os pais haviam viajado, do que aquelas que se
encontravam na instituição por um tempo mais longo. Por tal razão, as fantasias de
abandono são mais presentes para esse grupo de crianças.
Podemos inferir, a partir de tais dados, que conforme aumenta o tempo de
institucionalização, as crianças acabam retirando a responsabilidade pelo abandono dos
pais e atribuindo a si a culpa por esse afastamento da família. Elas ainda idealizaram uma
volta para casa em que todos aqueles problemas que foram os causadores do afastamento
foram eliminados.
Nas situações relatadas pelas crianças em suas histórias também estavam presentes
as dificuldades da própria realidade social da qual são oriundas. Conforme dados da
Câmara dos Deputados (1976) as causas mais freqüentes da marginalização das crianças no
Brasil relacionavam-se à desagregação da família causada pela pobreza. Através dessas
respostas, encontramos o desejo das crianças de manter a família unida (fantasias de
agregação familiar) e de se manterem afastadas das agressões geradas pelo ambiente
(privações, pobreza, violência).
Fábula 5
As respostas comuns para as crianças da amostra foram iguais às consideradas
populares para a amostra padronizada (medo de “bicho” para as crianças pré-escolares de
ambos os sexos e de “personagem de ficção” para as escolares de ambos os sexos), com
exceção das elaboradas pelos meninos pré-escolares. Estes apresentaram como respostas
comuns aquelas que indicavam como objeto de medo “personagens de ficção”. Todas essas
respostas, porém, têm em comum o fato de buscarem ser a expressão simbólica de outros
temores, e se referem a objetos não-realístiscos. De acordo com Cunha e Nunes (1993), o
medo realístico caracteriza-se por respostas do tipo “medo de ‘rapto’, de ‘ser assaltado’, de
‘doenças’, de ‘atravessar a rua’, de ‘pedrada’ ou de ‘cair da bicicleta’” (p.154). Conforme
as mesmas autoras, o medo de bicho pode estar simbolizando diversos temores, e a
variabilidade de tipos de animais que são citados pelas crianças impede que se dê uma
139
única explicação para esse tipo de resposta. Cada caso deve ser analisado separadamente
para que se chegue a uma conclusão adequada.
Ainda segundo Cunha e Nunes (1993), respostas que indicam personagens de
ficção parecem se relacionar ao tipo de lazer infantil, que explora essas figuras de
monstros, fantasmas, bruxas. Mussen, Conger e Kagan (1977) afirmam que medos de
fantasmas, leões e bruxas podem estar representando de forma simbólica o temor do
castigo imposto pelos pais. Sabe-se que as crianças da amostra são provenientes de uma
realidade em que a violência é algo presente, inclusive a violência dentro da própria
família, o que pode ser confirmado pelos índices de crianças que encontram-se abrigadas
por maus-tratos e abuso sexual (ver Tabela 1).
Para todas as faixas etárias, a fantasia mais presente foi a de agressão deslocada
para o ambiente, o que é esperado, já que esta é uma fábula de catarse e favorece a
expressão de sentimentos de ansiedade e medo. A maioria das crianças atribuiu a causa do
medo a fatores externos e não a elas mesmas. Fantasias de abandono e castigo também
foram as mais presentes nas respostas das crianças. As defesas mais utilizadas foram as de
idealização e de racionalização, porém percentuais altos de crianças também não utilizaram
nenhum tipo de defesa.
As crianças mais novas da amostra apresentaram mais fantasias de abandono do
que as mais velhas. Já os participantes com idade mais elevada manifestaram um número
maior de fantasias de castigo. Isto pode estar relacionado ao fato de estas crianças mais
novas estarem percebendo a exposição ao objeto de medo (seja um animal ou o
personagem de ficção) como uma forma da própria negligência dos pais, que não se
encontram ali para protegê-las do perigo externo. Além disso, Cunha e Nunes (1993)
referem a questão da ansiedade de separação, que é mais própria desta idade (pré-escolar)
do que de crianças escolares, o poderia estar facilitando uma maior manifestação de
fantasias de abandono do que as de castigo. As crianças mais velhas parecem já ter
introjetado a culpa pelo próprio abandono, entendendo este como uma forma de castigo.
São expostas ao perigo, em geral, pelos próprios pais como uma punição por não terem se
comportado da forma adequada. Assim, nota-se que de acordo com a faixa etária é diversa
a forma como as crianças encaram o conteúdo da Fábula 5. Por tal razão, elas também irão
lidar com as fantasias e sentimentos suscitados por tal Fábula de modos diferentes.
As crianças mais velhas procuravam aliviar o medo e fantasias de castigo através de
mecanismos de idealização (dizendo que nunca mais a criança vai incomodar, assim os
pais não irão mais deixá-la de castigo) ou de mecanismos de racionalização, em que eram
utilizadas explicações fundamentadas no real (a criança não teve mais medo, porque
140
fantasmas não existem). Já as crianças menores utilizaram mecanismos de distorção ou de
evitação (a criança se escondeu embaixo da cama para não ver a bruxa) para se livrarem da
tensão ocasionada pelo objeto de medo. Estes mecanismos se mostraram menos eficazes na
solução de tais problemas.
Fábula 6
Na Fábula 6 os participantes demonstraram respostas comuns diferentes das
populares para o grupo de crianças estudado por Cunha e Nunes (1993). As crianças pré-
escolares da amostra, novamente, apresentam respostas que parecem se relacionar a
questões de abandono. As crianças em idade escolar, por sua vez, elaboraram respostas em
que fantasias de privação se mostraram mais presentes.
As meninas em idade pré-escolar da amostra não apresentaram uma resposta
comum, assim como aquelas da amostra padronizada também não apresentaram uma
resposta popular. As respostas dos meninos desta faixa etária revelaram como natureza e
identificação da mudança o fato do elefante ter sumido, sido seqüestrado ou fugido. Esse
tipo de resposta, em geral, estava relacionado a fantasias de abandono. A criança sentia que
o elefante a teria deixado por vontade própria.
As crianças escolares da amostra, meninos e meninas, apresentaram como resposta
comum uma transformação física do elefante. Essa transformação vinculou-se, na maioria
das vezes, ao fato de o elefante ter ficado doente. Tal resposta estava relacionada à fantasia
de privação. A criança entendia que poderia ficar sem seu animal, mas que isso não
dependia da vontade dele (do elefante). Por isso, entende-se a razão pela qual os estados
emocionais de tristeza e pesar foram os mais manifestados.
Peixotto (1957), em seu estudo, refere que poucas crianças atribuem a mudança à
tromba, e que por tal razão esta parece ser uma fábula ambígua, que nem sempre simboliza
o temor de castração. Cunha e Nunes (1993) relatam que na pesquisa desenvolvida por elas
a resposta popular de crianças pré-escolares envolvia transformações físicas ou
psicológicas do elefante. Para essas autoras, esta resposta poderia estar associada, de forma
simbólica, às questões de castração, pois esse tipo de transformação representaria a
ansiedade despertada pela sexualidade. De acordo com elas, respostas que focalizaram o
elefante como um todo e, em especial, aquelas que indicam mudanças internas serviriam
como organizadoras da identidade e poderiam estar relacionadas com a própria identidade
fálica (e não tanto em termos de conotação sexual e edípica, como respostas que indicam a
tromba danificada ).
141
Já as crianças em idade escolar da amostra de Cunha e Nunes (1993)
desenvolveram respostas em que ocorria uma modificação na aparência do elefante. Para
as autoras, respostas com conteúdo de aparência física não são tão abrangentes quanto
aquelas que indicam transformações físicas. As respostas dos escolares demonstrariam que
o conflito foi superado e a auto-imagem foi aceita, quando estas respostas indicassem que
isso é visto como algo positivo para a criança.
As respostas com conteúdos de transformação física elaboradas pelos participantes
da pesquisa não pareciam estar relacionadas ao medo de castração, pois a incidência deste
tipo de fantasia foi bastante baixa. Estados emocionais de medo também foram pouco
presentes e, como já foi citado anteriormente, tal resposta foi comum para crianças
escolares e não para as pré-escolares. As respostas dadas pelas crianças desta pesquisa
parecem vir ao encontro das idéias de Peixotto (1957), de que a Fábula 6 pode suscitar
conteúdos ambíguos.
Observou-se que crianças menores apresentaram respostas relacionadas à fantasia
de abandono provocada pelo sumiço, seqüestro ou fuga do elefante. As crianças mais
velhas manifestaram fantasias de privação pelo medo de perder o elefante que se
encontrava doente. Assim, como em fábulas anteriores, observa-se que crianças mais novas
parecem atribuir a culpa do abandono àqueles que partem. As crianças mais velhas sentem
o medo da perda, que é manifestado pelos estados emocionais de pesar e tristeza, porém
aquele que parte não é culpabilizado por isto.
Fantasias de agressão deslocada para o ambiente apareceram em um número alto
para todas as faixas etárias. Entretanto, este tipo de fantasia não é freqüente nas respostas
comuns do grupo das crianças com 7 anos ou menos, e sim em outras respostas diversas.
Para as crianças maiores, essas fantasias estão associadas às respostas comuns, já que a
causa da doença do elefante, muitas vezes, foi atribuída a algo externo (o elefante ficou no
frio, pegou chuva, deram comida estragada para ele).
A maior parte das crianças pequenas (com 7 anos ou menos) não conseguiram
manifestar nenhum tipo de estado emocional e aquelas que o fizeram, apresentaram
estados vagos como os de “mal-estar” e “bem-estar”. As crianças com idade pré-escolar
novamente utilizaram mecanismos de defesa de distorção e de evitação (para tentar não
entrar em contato com os sentimentos), apesar de a maioria delas não apresentar nenhum
tipo de defesa. Quanto mais velhas, mais essas crianças conseguiram definir seus
sentimentos. A grande parte das crianças mais velhas também não apresenta defesas para
resolver os conflitos da Fábula 6. Entretanto, quando fizeram uso de mecanismos
142
Os mecanismos de defesa mais utilizados foram os de compensação, que aparecem
quando a criança preenche essa falta do objeto (dá a torre, mas ganha algo em troca) e o de
formação reativa (percebe-se que o desejo da criança é de manter consigo o objeto, mas ela
dá para a mãe, pois é esta sua obrigação). Tais mecanismos também impedem que estados
emocionais negativos se manifestem, aparecendo para “camuflar” o real desejo de manter
consigo o objeto fabricado, pois isso seria socialmente reprovável. Por tal razão, os estados
emocionais mais citados pelas crianças são sentimentos positivos como os de bem-estar e
de alegria.
manifestaram os de idealização (algo mágico, como uma fada, aparece e cura o elefante
doente).
Fábula 7
As respostas comuns à Fábula 7 para as crianças abrigadas foram as mesmas das
consideradas populares para a amostra padronizada. Essas respostas indicavam que a
criança dava a torre para a mãe, após esta ter feito o pedido. Cunha e Nunes (1993) referem
que um tipo de resposta dado pelas crianças implica em a criança dar a torre, não porque
isso seja seu desejo, mas sim para obedecer a mãe. Tal resposta é considerada popular, já
que o primeiro reflexo é de dizer que dá a torre para a mãe. A análise da resposta é que faz
com que se entenda que a idéia é ser “bem-comportado” e não dar porque a mãe gostou do
objeto e a criança deseja presenteá-la (o que seria considerado adaptativo). Respostas desse
tipo envolvem o mecanismo de formação reativa. Segundo as autoras, a criança está
expressando um comportamento que é socialmente esperado e o ego deve se conformar
com o que o mundo externo exige.
Nas respostas dos participantes desta pesquisa, percebe-se tal fenômeno. A maioria
das crianças respondeu com respostas consideradas populares. No entanto, encontrou-se
nessas respostas um índice alto de fantasias de privação, sugerindo que dar a torre para a
mãe não era o desejo real dessas crianças. As fantasias de ganho secundário foram as
segundas mais presentes, o que implica em dizer que a criança cede a torre para a mãe, mas
em troca supre a falta do objeto com algum outro.
Como já foi discutido na Fábula 3, em que as crianças da amostra elaboraram
respostas em que o herói atendia prontamente ao pedido materno (mas através da análise
da resposta podia-se perceber que este não era o seu real desejo), nas respostas à Fábula 7
também observou-se a necessidade das crianças de se adequarem ao que é socialmente
aceito. As respostas a esta Fábula (dá a torre para a mãe porque ela pediu, não importando
143
o próprio desejo) corroboram os resultados da pesquisa de Torres e Guerrerro (2000), que
encontraram como padrão de comportamento das crianças institucionalizadas a questão da
obediência compulsiva.
Dentre as explicações que se poderia utilizar para entender por que as crianças
abrigadas, ao responder à Fábula 7, apresentaram essa maior incidência de fantasias de
privação (essa vontade de “reter” o objeto), pode-se inferir que para elas o significado da
“perda da torre” se relacione à própria perda do objeto (das figuras parentais), que já foi
vivenciada. Mais uma vez os resultados reforçam a necessidade de adaptação do Teste para
esta população.
Em relação às diferentes faixas etárias, observou-se que crianças mais novas
apresentaram um número alto de fantasias de agressão deslocada para o ambiente. Essas
fantasias apareceram em mais de um tipo de resposta (com ações ativas e adaptadas, não
adaptadas, com resistência ativa ou com resistência passiva) e, em geral, relacionavam-se a
algo do ambiente que impedia que a mãe ficasse com o objeto presenteado (um ladrão que
vem e rouba, água que cai na torre e desmancha). Ao contrário das crianças maiores que
demonstraram as fantasias de privação de forma mais direta, as crianças pequenas
projetaram para o ambiente a responsabilidade por não quererem dar seu objeto para a mãe
(a utilização de mecanismos de projeção é também mais alta nessa faixa etária). Essas
crianças também utilizaram, em um número mais alto, mecanismos de distorção e
manifestaram mais estados emocionais vagos, como os de bem-estar e de mal-estar, o que
parece ser uma característica desta faixa etária, tendo sido observada em outras fábulas.
Fábula 8
As meninas em idade pré-escolar e meninos e meninas na faixa etária escolar
apresentaram como respostas comuns o mesmo tipo de resposta considerada popular para a
amostra padronizada do instrumento. O conteúdo dessas respostas para crianças pré-
escolares está associado, ou é sugestivo de conflito edípico. Para as crianças escolares, a
resposta popular consiste em vincular a brabeza do pai ou da mãe à omissão de deveres
(esqueceu de avisar que iria sair), ou mesmo à rejeição (o pai/mãe ficou brabo(a) porque
ficou sozinho(a) em casa).
As respostas dadas pelas meninas em idade pré-escolar vão contra os achados de
Rey (1994) que demonstram que a maioria das crianças abandonadas não apresentaram
indícios de triangulação edípica. No entanto, as respostas dadas pelas crianças desta
pesquisa para a Fábula 2 (que também explora a mesma conflitiva) corroboraram os dados
144
do estudo citado acima, de que as crianças abrigadas traziam muito mais questões relativas
a situação de abandono real vivenciada.
A conclusão a que se chega é que, como já foi levantado na discussão em torno da
Fábula 2, tal fábula não parece tão diretiva como a Fábula 8. Esta última, por sua vez,
possui um conteúdo muito mais explicito pois, diferentemente da Fábula 2, quem se
encontra sozinho não é a criança, e sim o progenitor do mesmo sexo, enquanto que ela sai
para passear com o do sexo oposto. A Fábula 8, portanto, suscitaria de forma mais direta
fantasias edípicas.
Entretanto, os meninos em idade pré-escolar da amostra não apresentaram respostas
comuns associadas ou sugestivas de conflito edípico. As respostas dos meninos desta faixa
etária mostraram-se associadas a condutas inadequadas ou a omissão de deveres. As
fantasias mais presentes foram as de agressão deslocada para o ambiente. Essa diferença
entre sexos possivelmente relaciona-se ao fato dos meninos sentirem-se tão mobilizados
por esse conteúdo que não consigam expressar fantasias edípicas, pois a ameaça de
castração para os meninos é muito mais real do que para as meninas.
Como já citado anteriormente, sabe-se que as crianças da amostra são provenientes
de ambientes onde o convívio com a violência se dá desde muito cedo e de forma muito
próxima, inclusive dentro da própria família. Muitas dessas crianças encontram-se
abrigadas por maus tratos ou abuso sexual (ver Tabela 1). Desse modo, a retaliação por
parte do pai é uma ameaça mais próxima da realidade para esses meninos e pode estar
sendo expressada através das fantasias de agressão deslocada para o ambiente.
Outra explicação para essa diferença está no fato de as meninas amadurecerem
antes dos meninos, o que foi explorado por Peixotto (1957) ao encontrar divergências nas
respostas de meninos e meninas, em relação à Fábula 6. Através de tal motivo, poderia-se
entender que os meninos desta faixa etária, diferentemente das meninas, ainda não estariam
vivenciando o complexo de Édipo.
Em relação às crianças em idade escolar, observou-se que, conforme aumentou a
idade, aumentaram as fantasias de castigo e diminuíram as de agressão deslocada para o
ambiente. Os estados emocionais de culpa e de tristeza também se tornaram prevalentes.
As fantasias de castigo se relacionaram principalmente as respostas dadas como comuns
para essas crianças (omissão de deveres). Percebeu-se que, conforme amadureciam, as
crianças passaram a atribuir a si a culpa pela brabeza do progênitos do sexo oposto e
entender as agressões advindas do ambiente como uma forma de castigo (isto também
pode ser observado por um aumento da utilização de mecanismos de introjeção).
145
Fábula 9
As respostas populares para a amostra padronizada do instrumento para as
crianças de todas as faixas etárias e de ambos os sexos apresentam conteúdos de desejos
ligados à satisfação pessoal. Para os participantes em idade escolar desta pesquisa, a
resposta comum foi a mesma da amostra padronizada. Esta resposta, de uma forma geral,
relacionava-se à fantasia de gratificação e ao estado emocional de felicidade.
Entretanto, as respostas comuns para os participantes em idade pré-escolar estavam
relacionadas a notícias com conteúdos de proibições, restrições e deveres. Essas crianças
manifestaram mais fantasias de heteroagressão ativa, castigo e de agressão deslocada para
o ambiente.
Cunha e Nunes (1993) relatam que apesar das respostas populares para as crianças
de seu estudo corresponderem a desejos ligados à satisfação pessoal, respostas com
conteúdos de proibições, restrições e deveres também foram comumente encontradas. Para
Peixotto (1957), as respostas mais problemáticas seriam aquelas relacionadas a medos,
porém, Cunha e Nunes afirmam que este conteúdo pode aparecer também em respostas de
crianças normais, já que esta é uma fábula catártica, que favorece a expressão de fantasias
e sentimentos que foram mobilizados por Fábulas anteriores. Por tal razão, as autoras
fazem a ressalva de que todas as respostas devem ser analisadas de forma profunda, pois
mesmo respostas aparentemente adaptadas (como aquelas relacionadas a desejos) podem
estar manifestando algum tipo de problema.
Através da análise das respostas comuns dos participantes pré-escolares da
pesquisa, percebe-se que essas crianças parecem manter um padrão, que vem sendo
observado em respostas anteriores nas quais fantasias de agressão deslocada para o
ambiente mostram-se presentes. Essas fantasias apareceram associadas, em fábulas
anteriores, ao abandono por parte dos pais sendo que esse abandono era percebido como
forma de agressão das figuras parentais. Já na Fábula 9 a mãe aparece como figura
autoritária que vem cobrar atitudes ou deveres atribuídos às crianças. Essa cobrança se
estabelece de forma agressiva e a criança é xingada ou castigada. Diferentemente da
resposta a outras Fábulas, aqui as crianças, através de mecanismos de atuação,
manifestaram fantasias de heteroagressão ativa como uma maneira de expressarem a
própria frustração e raiva que sentem em relação ao abandono e agressões praticadas pelos
pais. A expressão de tais fantasias e estados emocionais pode ter sido facilitada nesta
146
fábula pelo fato dela ter como objetivo a catarse de sentimentos suscitados pelas fábulas
anteriores. Além disso, acredita-se que neste ponto da aplicação as crianças se
apresentavam menos defensivas, pois o grau de ansiedade frente ao teste que, até então era
desconhecido, já havia sido amenizado.
Fábula 10
O Teste das Fábulas (Cunha & Nunes, 1993) não propõe uma resposta popular para
a Fábula 10. De acordo com as autoras, essa fábula serve para o controle de fábulas
anteriores e para completar o seu sentido dinâmico. Além disso, a Fábula 10 é uma
possibilidade de a criança aliviar a ansiedade suscitada no decorrer da aplicação das outras
fábulas.
Cunha e Nunes (1993) apontam alguns tipos de respostas que são observadas na
Fábula 10. Um deles seriam as respostas em que perseveram conteúdos da F5. Entre os
participantes que apresentaram perseverações de conteúdos, a maioria perseverou os da
Fábula 5. Conforme as autoras, essa forma de perseveração sugere a mobilização de
fantasias e sentimentos de autopunição e ansiedade, ou mesmo de castigo.
Todavia, a maior parte das crianças introduziu novos conteúdos ao elaborar as
respostas da Fábula 10. Os conteúdos que mais apareceram correspondiam a bruxas ou
entidades fantásticas ou acontecimentos aterrorizantes. Observou-se que muitas das
crianças que apresentaram na Fábula 5 medo de personagens de ficção, na Fábula 10
produziram respostas em que o medo de entidades fantásticas estava presente. Entretanto,
isso não se constituiu em perseveração, pois nem o conteúdo das respostas elaboradas nem
o personagem citado eram os mesmos. As fantasias mais presentes nesse tipo de resposta
foram as de agressão deslocada para o ambiente e/ou de perseguição
As crianças que apresentaram respostas com conteúdos de acontecimentos
aterrorizantes desenvolveram histórias em que ocorria a perda de pessoas (em geral
pessoas da família, como os pais ou irmãos) ou objetos significativos para elas. Estas
respostas envolveram fantasias de privação e de agressão deslocada para o ambiente, pois,
na maioria das vezes, as perdas eram ocasionadas por elementos do ambiente externo.
As crianças mais velhas demonstraram um percentual mais alto de respostas de
acontecimentos aterrorizantes que as crianças mais novas. Na maioria dessas respostas, o
pesadelo se referia à morte de uma ou várias pessoas da família (em geral os pais e/ou
irmãos). As crianças pequenas, por sua vez, apresentaram mais respostas com conteúdos de
bruxas ou entidades fantásticas.
147
Como na Fábula 6, observou-se que as crianças mais velhas ainda apresentaram um
percentual alto de fantasias de privação. Essas fantasias de privação estavam associadas às
respostas em que o herói perde alguém significativo mas, novamente, essa pessoa não parte
porque esse é seu desejo, e sim porque o ambiente a agride.
As crianças pequenas, ao apresentarem respostas com conteúdos fantásticos,
remetem às respostas dadas na fábula 5. Elas não chegaram a demonstrar de forma clara
fantasias de abandono nesta fábula, porém mostram-se à mercê das agressões do ambiente,
não tendo ninguém para protegê-las. O abandono parecia estar sendo percebido por essas
crianças, mais uma vez, como uma forma de agressão.
A diferença entre as respostas das crianças mais velhas e das mais novas consiste
em que, para essas últimas, a agressão que provém do ambiente agride diretamente o herói
(criança). Nas respostas das crianças mais velhas a violência parece dirigida para outras
pessoas que não o herói, mas o atingem na medida em que ele perde pessoas significativas.
Para as crianças mais velhas observou-se uma tendência a perceber o abandono dos pais
como um fato em que estes estão isentos de culpa.
A maioria das crianças manifestou estados emocionais de medo e não apresentou
mecanismos de defesa em suas respostas. Daquelas que utilizaram defesas, as mais citadas
foram as de idealização (em que os acontecimentos ruins se transformam de forma mágica,
adquirindo um caráter positivo) e de evitação (ex:criança se esconde para não enxergar o
monstro).
148
Os dados obtidos demonstraram que crianças abrigadas, em geral, responderam de
forma diversa ao Teste das Fábulas quando comparadas às crianças da amostra
padronizada do instrumento (Cunha & Nunes, 1993). Tais diferenças mostraram-se
relacionadas principalmente pelos conflitos que são gerados pela ruptura do vínculo com as
figuras parentais. Mesmo que a amostra seja pequena para determinar as respostas
populares para a população de crianças abrigadas, pode-se perceber respostas comuns para
esse grupo (ver Anexo G). Foram encontradas também novas categorias de fantasias,
estados emocionais e mecanismos de defesas (ver Anexo H)..
CAPÍTULO V
CONCLUSÕES
A necessidade de estudos envolvendo testes projetivos em nosso país pode ser
comprovada pela resolução No002/003 do Conselho Federal de Psicologia. A última
divulgação (em 20/01/2004) da avaliação que vem sendo realizada com os instrumentos
psicológicos pelo CFP informa que o único instrumento projetivo aprovado para utilização
com crianças é o Teste das Fábulas. Por tal razão, pesquisas que busquem ampliar o uso
deste instrumento para outras populações mostram-se extremamente úteis.
Percebe-se através do contato com os psicólogos que trabalham com crianças
abrigadas, que pesquisas que privilegiem o estudo de instrumentos para a utilização com
essa população é uma necessidade urgente. São praticamente inexistentes em nosso país os
testes direcionados para a avaliação de crianças em situação de abandono e/ou
institucionalização, e os instrumentos psicológicos em geral não parecem satisfazer as
demandas desses profissionais.
Isto pode ser observado também pelas manifestações de interesse no projeto e nos
resultados desta pesquisa. As instituições que participaram deste estudo mostraram-se
disponíveis e abertas à realização do mesmo. Entretanto, mostraram-se rigorosos na
avaliação do projeto, demonstrando cuidados em relação às crianças pelas quais são
responsáveis.
Esta pesquisa tinha por objetivo investigar como as crianças abrigadas respondem
ao teste das Fábulas, partindo da idéia que suas respostas deveriam diferir daquelas
produzidas por crianças que residem com ao menos uma de suas figuras parentais
(população para qual o instrumento é adaptado).
149
Este estudo também tinha por objetivo verificar se as variáveis sexo, faixa etária e
tempo de abrigamento interferiam nas respostas dadas ao teste. Pode-se perceber que a
grande parte das diferenças encontradas entre os participantes vincularam-se às faixas
etárias que pertenciam. As questões desenvolvimentais exerceram um papel importante nas
respostas dadas ao Teste das Fábulas. Não foram observadas muitas relações significativas
entre as respostas ao teste e as variáveis sexo ou tempo de abrigamento.
No que se refere ao tempo de abrigamento, foram encontradas diferenças
significativas entre esta variável e as causas da institucionalização. As crianças que
residiam na instituição por um período mais longo tinham como causa de abrigamento o
abandono por parte dos pais ou a falta de condições psicológicas ou físicas destes (em
geral doenças graves ou em períodos terminais) para exercerem os cuidados necessários.
Percebe-se que tais razões tornam praticamente impossível o retorno da criança à família
de origem (o que é confirmado por esse período mais longo de institucionalização).
As crianças institucionalizadas por um período menor haviam sido retiradas do
convívio com as figuras parentais por estarem sofrendo principalmente negligência ou
mesmo maus tratos por parte destes. Observa-se que nesses últimos casos provavelmente o
retorno da criança à família de origem ainda é possível, pois em geral os pais buscam
retomar a guarda dos filhos.
No entanto, apesar dessas características e de autores como Spitz (1965/1979),
Mussen, Conger, Kagan e Huston (1988) referirem que um período longo de abrigamento e
o afastamento da criança em relação à figura materna serem fatores de influência negativa
para o desenvolvimento infantil, como já relatado, não foram verificadas muitas diferenças
significativas em relação ao período de abrigamento nas respostas dadas pelas crianças ao
Teste das Fábulas.
Talvez isso se explique pelo fato de que os participantes que se encontravam
abrigados por um período menor tinham como causa principal de abrigamento a
negligência por parte dos pais ou responsáveis. Pode-se pensar que crianças negligenciadas
pelas figuras parentais possivelmente já têm seus vínculos rompidos muito antes de serem
separadas “fisicamente” dessas figuras. São conhecidas as repercussões da privação do
afeto e atenção dispensados às crianças pela figura materna, ou mesmo de um substituto,
no decorrer de seu desenvolvimento(Spitz, 1965/1979; Bowlby, 1979/1982), assim como a
falta de uma figura de apego (Bowlby, 1989). É muito provável que as figuras parentais
que negligenciam ou maltratam, não consigam estabelecer essa relação de apego ideal, já
que para que tal relação seja consolidada é necessário que os pais possibilitem à criança a
150
exploração do mundo exterior, porém estando sempre disponíveis para confortá-los dando
toda a assistência física ou emocional necessária (Bowlby, 1989).
A descrição, assim como a discussão dos resultados deste estudo trazem
contribuições para os profissionais que trabalham na avaliação e acompanhamento
psicológico dessas crianças. Estes dados facilitam a compreensão das respostas dadas ao
instrumento pelo fato de levarem em conta todo o contexto em que a criança está inserida e
do qual ela provém, e as conseqüências que o afastamento das figuras parentais pode
acarretar ao seu desenvolvimento.
O Teste das Fábulas se mostrou útil para essas crianças, principalmente porque foi
bem aceito pela grande parte dos participantes da pesquisa. Em especial as crianças mais
velhas (a partir dos 7 anos), responderam ao instrumento com satisfação. Mesmo aquelas
crianças consideradas como extremamente agitadas pelas monitoras, permaneceram
centradas na tarefa durante toda a aplicação. Isso possivelmente sugere que o momento de
testagem pode ter sido encarado pelas crianças como uma forma de receberem atenção e de
sentirem de certa forma valorizadas. As crianças mais novas, apesar de demonstrarem um
maior cansaço no decorrer da aplicação, conseguiram completar toda a tarefa. Mesmo
tendo sido observados esses sinais de fadiga, responder ao Teste das Fábulas para essas
crianças pequenas não parece ter sido algo desprazeroso pois em mais de uma situação, ao
encontrarem a pesquisadora, elas questionaram quando iriam “contar histórias” novamente.
Todavia, uma das dificuldades deste estudo foi o de reunir uma amostra com um
número semelhante tanto de meninos e meninas quanto de pré-escolares e escolares. O
número de crianças do sexo masculino se mostrou superior às do sexo feminino, assim
como a amostra de crianças escolares foi maior que a de pré-escolares. Essa parece ser uma
característica própria da maioria das instituições que abrigam crianças. Percebe-se que
existe um número superior de meninos abrigados, assim como o de crianças em idade
escolar.
Desse modo, com o objetivo de obter resultados mais significativos e de estabelecer
as respostas populares para crianças residentes em instituições, sugere-se a aplicação do
Teste das Fábulas em uma amostra maior de crianças abrigadas e que esta possa abranger,
de forma semelhante, os sexos masculino e feminino, assim como as faixas etárias escolar
e pré-escolar.
Outra sugestão de estudo seria avaliar de forma mais aprofundada as questões de
tempo de abrigamento e causa de institucionalização. Como referido anteriormente,
acreditávamos que o tempo de abrigamento seria um fator significativo em relação à forma
como as crianças responderiam ao Teste das Fábulas. Entretanto não foi isto que ocorreu.
151
Tal resultado nos remeteu às causas pelas quais as crianças encontravam-se abrigadas. A
negligência por parte dos pais foi a razão mais presente nos casos das crianças abrigadas
por um período mais curto. Isto nos levou a pensar que crianças que são negligenciadas
pelos pais, na verdade, sofrem um rompimento do vínculo com as figuras parentais muito
antes de serem abrigadas.
Por tais razões seria importante comparar o grupo de crianças abrigadas com um de
crianças que residem com as figuras parentais, porém que encontram-se em situações de
risco e negligência. Tal estudo poderia esclarecer se a hipótese levantada é válida ou não,
assim como contribuir para um entendimento mais amplo dos fatores que favorecem o
rompimento ou manutenção dos vínculos entre as crianças e suas figuras parentais.
152
Bowlby, J. (1988). Cuidados Maternos e Saúde Mental.(V.L.B. Souza I. Rizzini,
Trad.) 2 (Originalmente publicado em 1976)
Bowlby, J.(1998). Apego e Perda: angústia e raiva. (L.H.B. Hegenberg, O .S.Mota,
M. Hegenber, Trad.) 3 ontes. (Originalmente publicado em 1973)
Câmara dos Deputados.(1976) A Realidade Brasileira do Menor: relatório da CPI destinada a investigar o problema da criança e do menor carentes no Brasil. Brasília: Coordenação de Publicações.
REFERÊNCIAS
Alchieri, J. C. & Noronha, A . P. P. (2002) Reflexões Sobre os Instrumentos de Avaliação Psicológica. Em R. Primi (Org.). Temas em Avaliação Psicológica (pp.7-16). Campinas: IBAP.
Alves, H. R. A.(1999). Por uma pedagogia de la sensibilidad: las rutas del abandono de los adolescentes abandonados de Brasil. La Salle Revista de Educação, Ciência e Cultura, 4(2), 37-45. Angelini, L. A., Alves, I. C. B., Custódio, E. M., Duarte, W. F. & Duarte, J. L. M. (1999). Manual de Matrizes Progressivas Coloridas de Raven: escala especial. São Paulo: Centro Editor de Testes e Pesquisas em Psicologia. Bandeira, D. R. (1999). Avaliação de um projeto social do ponto de vista do desenvolvimento psicológico de seus participantes. Tese de Doutorado Não-Publicada. Curso de Pós-Graduação em Psicologia do Desenvolvimento, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto alegre, RS.
Bee, H. (1997). O Ciclo Vital. (R. Garcez, Trad.) Porto Alegre: Artes Médicas. Blaya, C., Kipper, L., Perez Filho, J.B & Manfro, G.G. (2003). Mecanismos de
Defesa: uso do defensive style questionnaire. Revista Brasileira de Psicoterapia,5,67-80. Brazelton, T. B. (1988). O Desenvolvimento do Apego: uma família em formação.
(D. Batista, Trad.) Porto Alegre: Artes Médicas (Originalmente publicado em 1981) Bowlby, J. (1982). Formação e Rompimento dos Laços Afetivos. (A . Cabral, Trad.)
São Paulo: Martins Fontes. (Originalmente publicado em 1979)
a. ed.,São Paulo: Martins Fontes
Bowlby, J.(1989). Uma Base Segura: aplicações clínicas da teoria do apego. (S. M. Barros, Trad.) Porto Alegre: Artes Médicas.
a ed., São Paulo: Martins F Caliman, G. (1991). Crianças e adolescentes carentes e abandonados: respeito e
valorização da vida. Revista de Educação AEC, 20, 53-61.
Cariola, T. C & cols (1988). A análise da escala de Koppitz no desenho da figura
humana de crianças institucionalizadas. Pediatria Moderna, 23, 233-238.
153
Cunha, J.A . Nunes, M. L. T. & Werlang, B.G.(1990). Estudo do tempo de reação ao CAT e ao Teste das Fábulas, em crianças pré-escolares. Psico, 19, 23-27.
Conselho Federal de Psicologia (2000). Resolução n° 016/2000, de 20 de dezembro de 2000. Brasília, DF.
Conselho Federal de Psicologia (2003). Resolução n° 002/2003, de 24 de março de 2003. Brasília, DF.
Cabral, A. & Nick, E. (1997). Dicionário Técnico de Psicologia. São Paulo:
Cultrix.
Cunha, J. A . Oliveira, M. S. & Werlang, B. G., Nunes, M. L. T., Porto Alegre, A., Heineck, C. & Silveira, M. R. (1989a). Método das Fábulas: uma versão pictórica. Psico, 17, 51-61.
Cunha, J. A . Oliveira, M. S. & Werlang, B. G., Nunes, M. L. T., Porto Alegre, A., Heineck, C. & Silveira, M. R. (1989b). Respostas populares ao Teste das Fábulas. Psico, 18, 28-42.
Cunha, J. A . & Nunes, M. L. T.(1993). Teste das Fábulas: forma verbal e
pictórica. São Paulo: Centro Editor de Testes e Pesquisas em Psicologia.
Cunha, J. A., Freitas, N. K. & Raymundo, M. G. B. (1993) Catálogo de Técnicas Úteis. Em: J. A ., Cunha e Orgs. Psicodiagnóstico – R. (pp. 190-192). Porto Alegre: Artes Médicas. Cunha, J. A. & Rey, S. (1996). O Abandono Infantil: reflexo no desenvolvimento do Ego. Anais do I Encontro da Sociedade Brasileira de Rorschach e Outros Métodos Projetivos. Ribeirão Preto: Sociedade Brasileira de Rorschach.
Düss, L. (1985). El Método de Las Fábulas en Psicoanálisis Infantil. (A.C. Pando, Trad.) Madrid: TEA ediciones (Originalmente publicado em 1950)
Escobar, J.R. (1988). Mecanismos de Defesa. Revista de Psiquiatria do Rio Grande
do Sul, 10, 52-56. Fadiman, J. & Frager, R. (1986). Teorias da Personalidade. (O .G. pinheiro, Trad.).
São Paulo: Harbra.
Fine, R. (1949). Use of Despert Fables (revised form) in diagnostic work with children. Roschach Research Exchange, 12, 106-118. Resumo retirado em 28 de outubro de 2002 do PsycINFO.
Freud, S. (1974). Totem e Tabu. Em: Edição standart brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Fred. V.XVIII (p.185-212). Rio de Janeiro:Imago.
Gabbard, G. O. (1998). Psiquiatria Psicodinâmica: baseado no DSM-IV. (L.N.A. Jorge, M.R.S. Hofmeister). 2a ed. Porto Alegre: Artmed.
154
Gessel, A. (1998). A Criança dos 5 aos 10 Anos. (C. Reis, Trad.). São Paulo: Martins Fontes. (Originalmente publicado em 1946).
Guirado, M.(1986). Instituições e Relações Afetivas: o vínculo com o abandono. São Paulo: Summus.
Hutz, C. S. (1997) Avaliação Psicológica com Crianças e Adolescentes em Situação de Risco. Anais do VII Encontro Nacional sobre Testes Psicológicos e I Congresso Ibero-Americano da Avaliação Psicológica. Porto Alegre.
Kaplan, I.H., Sadock, B.J. & Grebb, J.A.(1997) Compêndio de Psiquiatria: ciências do comportamento e psiquiatria clínica. (D. Batista, Trad.) 7a ed., Porto Alegre: Artes Médicas.
Kramer, E. (1968). The Fables Test. J. Proj. Tech & Pers. Ass., 32, 230-532.
Kusnetzoff, J. C. (1982). Introdução à Psicopatologia Psicanalítica. 9a ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira.
Lewis, M. & Wolkmar, F. (1993). Aspectos Clínicos do desenvolvimento na Infância e Adolescência. (G. Giacomet, Trad.). 3a ed. Porto alegre: Artes Médicas.
Laplanche, J. & Pontalis, J.B. (1985). Vocabulário da Psicanálise. (P. Tamen, Trad.) 8a ed. São Paulo: Martins Fontes. (Originalmente publicado em 1967)
Laplanche, J. & Pontalis, J.B (1988). Fantasia Originária, Fantasias das Origens,
Origens da Fantasia. (A. Cabral, Trad.). Rio de Janeiro: Jorge Zahar. Minty, B. (1999). Annotation: Outcomes in long-term foster family care. Journal of Child and
Psychiatry, 40, 991-999.
Mussen, P.H., Conger, J.J. & Kagan, J. (1977). Desenvolvimento e Personalidade
da Criança. (M.S.M. Netto, Trad.) 4a ed. São Paulo: Harbra.
Mussen, P.H., Conger, J.J., Kagan, J. & Huston, A.C. (1988). Desenvolvimento e Personalidade da Criança. (A.B. Simões, Trad.) 2aed. São Paulo: Harbra.
Newcombe, N. (1999). Desenvolvimento Infantil: abordagem de Mussen. (C. Buchweitz, trad.) 8a ed. Porto Alegre: Artmed.
Nunes, M. T. N. Cunha, J. A. & Oliveira, M. S. (1990). O valor clínico do escore de concordância social no Teste das Fábulas. Psico, 20, 77-84.
Papalia, D.E. & Olds, S.W. (1981). O Mundo da Criança: da infância à
adolescência. (A . B. Simões, Trad.). São Paulo: McGraw-Hill do Brasil. Peixotto, H. E. (1956). Reability of The despert Fables, a story completion
projective test for children. Journal of Clinical Psychology, 12, 75-78. Peixotto, H. E. (1957). Popular responses for the Despert Fables. Journal of
Clinical Psychology, 13, 73-79.
155
Peixotto, H. E. (1960). Use of despert Fables with disturbed children. Journal of Clinical Psychology, 16, 173-179.
Petot, J.M. (1991). Melanie Klein II: o ego bom e o objeto 1932-1960. (B.P. Haber,
M.K. Bilenky, M.L. Wahrhafting, N.M. Kon, Trad.). São Paulo: Perspectiva. (Originalmente publicada em 1982).
Rey, S. (1994). Crianças em Abandono: a hipótese do complexo de Édipo. Dissertação de Mestrado. Curso de Pós-Graduação em Psicologia da Social e da Personalidade, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, RS.
Rutter, M. (2000). Children in substitute care: Some conceptual considerations and
research implications. Children and Youth Services Review, 22, 685-703. Silva, A. S., Reppold, C. T., Santos, C. L., Prade, L.T., Silva, M. R., Alves, P. B.,
Koller, S. H. (1998). Crianças em situação de risco: um estudo descritivo. Psicologia: Reflexão e Crítica, 11, 441-447.
Soifer, R. (1992) Psiquiatria Infantil Operativa: psicologia evolutiva e psicopatologia (J.C.A. Abreu, F.F. Settineri, Trad.). 3a ed. Porto Alegre: artes Médicas.
Spitz, R. A. (1979). O Primeiro Ano de Vida. (E.M.B. Rocha, Trad.) São Paulo:
Martins Fontes. (Originalmente publicado em 1965)
Tardivo, L. S. P. C. (1992). Teste de Apercepção Infantil com figuras de animais (CAT-A) e Teste das Fábulas de Düss: estudos normativos e aplicações no contexto das técnicas projetivas. Tese de Doutorado, Curso de Pós-Graduação em Psicologia Clínica, Universidade de São Paulo. São Paulo,SP.
Torres, B. G. Guerrerro, P. G. C. (2000). Working models about mother-child relashionships in abandoned children. Child Abuse e Neglect, 24,1227-1239.
Vaz, C. E. (1997). O Roschach: teoria e desempenho. 3a ed. São Paulo: Manole. Werlang, B.G. & Cunha, J.A. (1993) Avaliação da Personalidade sob o Enfoque
Projetivo. Em: J. A ., Cunha e Orgs. Psicodiagnóstico – R. (pp. 123-134). Porto Alegre: Artes Médicas.
Winnicott, D. W. (1987). Privação e Delinqüência.(A .Cabral, Trad.) São Paulo: Martins Fontes. (Originalmente publicado em 1984)
Winnicott, D. W. (1990). O Ambiente e os Processos de Maturação: estudos sobre a teoria do desenvolvimento emocional. (I.C.S. Ortiz, Trad.) 3a. ed., Porto Alegre: Artes Médicas. (Originalmente publicado em 1979)
Yoshida, E.M.P., Lépine, V., St-Amand, P. & Bouchard, M.A. (1998).
Configuração adaptativa e o nível de maturidade dos mecanismos de defesa. Estudos de Psicologia, 15, 3-16.
156
ANEXOS
157
Data da coleta dos Dados:___/___/____
22. Respeita as regras da instituição?
ANEXO A
Questionário de Dados Sócio-Demográficos
1. Nome:________________________________ 2. Sexo:__________ Data de Nascimento:_____________ Idade:_______________
3. Naturalidade:_________________________
4. Freqüenta a escola? ( )sim ( )não Série:________ Já repetiu alguma?_________
5. Data de Nascimento da mãe: _________ Profissão: _________________________
6. Data de Nascimento do pai: __________ Profissão: _________________________
7. N º de Irmãos:________ Idades:___________
8. Com quem / onde os irmãos vivem?
9. Há quanto tempo a criança está na instituição / Com que idade chegou?
10. Porque a criança foi institucionalizada?
11. Possui irmãos na mesma instituição? ( )sim ( )não
12. Quantos?______ Idades:___ ____Possui contato com esses irmãos? ( )sim ( )não
13. Os pais mantém contato com a criança?
14. Com que freqüência ou quando foi o último contato?
15. Outro familiar /outra pessoa mantém contato?
16. Com que freqüência ou quando foi o último contato?
17. Qual a estrutura atual da família de origem da criança?
18. Como é a relação com os cuidadores da instituição?
19. Como é a relação com as outras crianças da instituição?
20. Com quantas crianças convive na mesma casa/quarto?
21. Divide com algum irmão a mesma casa/quarto?
23. Quais as atividades que realiza dentro da instituição?
24. Quais as atividades preferidas da criança?
25. Saí da instituição? Em que ocasiões?
26. Já fugiu da instituição?
27. Já foi adotado por alguma família?
28. Possuiu alguma doença mental?
158
29. Possuiu ou já sofreu de alguma outra doença?
30. Já foi hospitalizado?
159
ANEXO B
Questionário De Dados Da Instituição
1. Nome da Instituição:
2. Vínculo da instituição (público, ONG...):
3. Oferece cuidados à que faixa etária?
4. Quantas crianças residem na instituição?
5. Como é feita a divisão das crianças por moradia/quarto? (idade, sexo, parentesco...)
6. Estrutura Física da instituição:
7. Por quantas crianças é responsável cada cuidador?
8. Qual a freqüência de troca de cuidadores?
9. Quais atividades/ atendimentos a instituição oferece às crianças?
160
ANEXO C
Termo De Consentimento Informado
Através do Curso de Pós-Graduação em Psicologia do Desenvolvimento, estamos
realizando uma pesquisa com o objetivo de adaptar o Teste das Fábulas para a população
de crianças que vivem em instituições .
O presente trabalho justifica-se pela ausência de instrumentos específicos que
avaliem as questões de desenvolvimento psicológico e afetivo dessas crianças. A falta de
instrumentos adequados pode comprometer o diagóstico e tratamento dessas crianças.
A participação das crianças nesse estudo consistirá na aplicação de um instrumento
para avaliar o nível intelectual e no Teste das Fábulas. Um questionário relativo aos dados
sócio-demográficos da criança serão preenchidos de acordo com as informações colhidas
nos prontuários e com as pessoas responsáveis pelas crianças na instituição.
As crianças serão claramente informadas que sua participação no estudo é
voluntária e pode ser interrompida em qualquer etapa, sem nenhum prejuízo. A qualquer
momento, tanto os participantes como o a diretoria da instituição poderão solicitar
informações sobre os procedimentos ou outros assuntos relacionados a esse estudo.
A identidade de todos os participantes será mantida em sigilo e os dados obtidos na
pesquisa serão de conhecimento apenas dos pesquisadores envolvidos e utilizados única e
exclusivamente para fins científicos, conforme sugerem recomendações éticas. A
instituição receberá os resultados da pesquisa logo que o trabalho de mestrado ao qual esta
se destina esteja concluído.
Os pesquisadores responsáveis pelo estudo são a mestranda Adriana Jung Serafini e
a Professora Doutora Denise Ruschel Bandeira. Esclarecimentos ou informações adicionais
poderão ser obtidos pelo telefone 3316.5352.
Concordamos que crianças sob guarda nessa Instituição participem desta pesquisa.
Data:___/___/___ _____________________________________________
Assinatura do responsável.
161
ANEXO D
Fantasias
A fantasia é definida como imaginação, ou seja, relaciona-se aos conteúdos do
mundo imaginário. As fantasias vinculam-se a uma situação em que há a oposição entre o
subjetivo e o objetivo. Onde um mundo interno busca a satisfação através da ilusão,
enquanto o mundo externo busca impor o princípio da realidade pela percepção.
(Laplanche & Pontalis, 1988). De acordo com Laplanche e Pontalis (1967/1985) elas
podem ser conscientes, como os sonhos diurnos, ou inconscientes. As fantasias
inconscientes são caracterizadas como “estruturas subjacentes a um conteúdo
manifesto”(p.228) que podem ser explicitadas através da análise.
Cabral e Nick (1997) referem que as fantasias são representantes dos desejos e das
necessidades instintivas nas relações objetais, representam a libido e durante o
desenvolvimento infantil passam a ser elaboradas como defesas, realizações de desejos e
conteúdos da ansiedade. Através da experiência externa as fantasias podem ser expressas,
principalmente, através de palavras, porém não deixam de existir se isso não ocorrer.
Através da aplicação do Teste das Fábulas no grupo de crianças abrigadas, pode-se
observar que as crianças manifestaram uma grande variedade de fantasias. Algumas dessas
fantasias foram as mesmas listadas por Cunha e Nunes (1993) no manual do instrumento,
porém novas categorias também foram verificadas. Todas as fantasias encontradas nas
respostas dos participantes da pesquisa, assim como exemplos retirados de tais respostas
serão apresentados a seguir.
-Abandono: Quando algo ou alguém deixa o herói por vontade própria (deixa “indo
embora” ou deixa “em desamparo”, por “negligência.) (Ex: Vai viajar, provoca a própria
morte). Ex: “Ele está se sentindo mal pq a mamãe dele voou para cima da árvore” (F1, M
9:0)
- Rejeição: Quando algo, ou alguém, “não quer” o herói. Isso, em geral, é manifestado por
um sentimento de desamor em relação ao herói. Ex:“Ele tá triste porque o papai e a mamãe
não dão bola para ele, tão conversando com outras pessoas”(F2, M 10:0)
- Agressão deslocada para o ambiente: Quando o agente agressivo está localizado no
ambiente. Pode ser algo ou alguém que comete um ato agressivo contra o herói ou
personagens da história, ou pode ser um ambiente hostil que priva o herói ou o expulsa.
162
Ex: “Ela sonhou que entrou um ladrão na casa dela e matou o pai dela e a mãe dela”(F10, F
11:1)
-Auto-agressão: Quando o herói sofre alguma conseqüência que não provém do ambiente
(como uma doença) e que pode estar ligado a um sentimento de culpa por ter feito algo
errado. Normalmente tem “um caráter de castigo”provocado pelo próprio herói contra si
mesmo. Geralmente está ligado a um mecanismo de defesa de “retorno contra si mesmo”.
“O menino pegou um fio e botou no elefante porque o elefante queria sair. (...) O menino
foi no médico porque ele tava doente. Ele machucou o pé e quebrou o sapato” (F6, F 6:10)
-Heteroagressão ativa: Quando a agressão provém do herói e é direcionada ao ambiente
(para outros personagens). Agride diretamente o outro. Geralmente está ligado a um
mecanismo de defesa de “atuação”.Ex: A criança foi, apertou, apertou a campainha e
assustou todo mundo! Pegou o bolo e virou na roupa deles e no chão” (F2, M 6:3)
-Heteroagressão passiva: A agressão provém do herói com a intenção de atingir o
ambiente, porém não agride diretamente o ambiente (outros personagens). Se auto-agride
para atingir o outro ou realiza uma ação que aparentemente não está relacionado à
agressão. Ex: “O elefante achou um remédio no chão tomou e ficou do mal. Depois ficou
pequeno” (F6, F 11:6).
-Volta ao útero: Está relacionado à uma impotência extrema, uma necessidade de ser
protegido e de se manter em uma posição completamente passiva. Ex: “Ele deita na grama
e fica triste porque a mamãe não pode dar leite. Termina ele embaixo da mamãe,
dormindo” (F3, M 8:3)
-Onipotência: quando o herói realiza coisas acima de suas capacidades físicas e/ou
maturativas. Herói que realiza grandes feitos, possui poder inesgotável, além da realidade.
“Ele vai construir mais três e vai ficar feliz. Depois ele fez...fez mais dez e fez uma
coleção, e quando chegasse o dia das mães ele dava. E ficou feliz porque sabia fazer um
monte e ele sempre achava argila”(F7, M 11:0)
-Edípica: Relacionado ao complexo de Édipo ou culpa edípica. Ex: “O menino saiu porque
tá triste ou brabo. Porque ele não queria que a mãe cassasse com ele” (F2, F 8:11).
-Privação: Quando o herói manifesta a falta de algo ou alguém ou quando algo (ou
alguém) deixa o herói, mas não por vontade própria (Ex: Morte – não provocada pelo
próprio personagem). “Ele tava se sentindo ruim porque o elefantinho não tava mais ali,
tava na rua, o pai dele botou” (F6, M 9:1). “Vai comer pasto porque não tem leite. Ele tá
mal porque tá com vontade de tomar leite” (F3, M 8:9)
163
-Reparação: Está relacionada a um sentimento de culpa por ter feito algo errado e há a
necessidade de reparar esse erro. “A mamãe deu um xingão no elefante e ele foi na rua. O
elefante é maldoso. Dá patada nela, ele tem umas unhonas. Ele corta ela. O elefante viu um
corte na perna dela e pediu desculpas. Depois ele virou educado” (F6, M 5:1)
-Narcisimo: Quando as qualidades ou o amor por uma produção, ou características do
próprio herói, são exaltados por ele mesmo. Ex: “Ele não deu para a mãe porque achou
muito linda a torre” (F7, F 7:2)
-Ganho Secundário: Quando há o sentimento ou efetivamente a perda de algo, mas essa
perda é compensada por outro objeto ou substituída. “Ele dá o objeto que fez para a mãe.
(...) Ele tá bem porque ele pode fazer outro ou a mãe pode dar um brinquedo para ele” (F7,
M 9:11)
-Castração: Quando há a mutilação de alguma parte do corpo dos personagens. Ex: “O
elefante tá com o rabo caído, a parte do meio saiu e ele ficou sangrando” (F6, F 8:6)
-Impotência: O herói não sente-se capaz, não demonstra capacidade de agir, de se proteger,
de realizar coisas, ficando à mercê do ambiente e necessitando auxílio e proteção de outros
personagens. Ex: “Ele vai chamar o pai dele. Porque ele caiu da árvore e não consegue
voar” (F1, M 9:4)
-Castigo: Pode se manifestar pelo medo do herói em ser castigado por algo que tenha feito
que é considerado como errado, ou pelo castigo realmente efetuado por algum personagem
da história. “O pai ficou brabo com o menino porque não disseram para ele que eles iam no
cinema. O pai vai bater no menino porque não avisaram ele.” (F8, M 8:9)
-Superação: Quando o herói “dá a volta por cima” em um ambiente ou situação de
dificuldade ou quando o herói consegue superar uma fase mais regressiva (apesar de
dificuldades impostas para que isso ocorra). Ex: “Ele se sentiu abandonado. (...) Eu acho
que depois ele vai voltar e vai para a festa, porque ele não vai ficar se sentindo abandonado
pela vida inteira” (F2, F 11:8)
-Perseguição: O herói é perseguido por outro personagem que pode agredí-lo. Ex: “Ele
sonhou com um monstro! Não! Com um cavaleiro sem cabeça. Ele corria atrás do guri para
pegar a cabeça do guri” (F10, M 11:7)
-Invasão: Quando algo do ambiente invade, como forma de agressão, o espaço ou mesmo
o corpo do herói. “Sonhou com o bicho-papão. (...) Ela sonhou que ele tava dentro do
corpo” (F10, F 7:11)
164
-Morte: Quando ocorre morte ou há risco de morte do herói. Ex: “O elefante começou a
soprar a tromba, a tromba começou a estragar. O elefante tava morrendo” (F6, M 5:1)
-Agregação familiar: Faz com que os membros de uma família tenham que permanecer
juntos para evitar um possível abandono. A separação do herói dos demais membros para
ser desestruturante. Ex: (Quem vai viajar?) “Uma família. Um gurizinho, a mãe dele, o pai
dele e a irmãzinha dele. Foram para a Disney. (F4, M 11:0)
-Gratificação: Relacionada à satisfação de desejos do herói. “Que, ela, a mãe vai dar um
jogo para a filhinha. Ela ficou faceira porque ia ganhar o jogo da mãe. (...) Ela continuou
indo para a aula, passou para a terceira série e ganhou mais coisas e ficou mais faceira
ainda” (F9, F 11:6)
165
-Ansiedade: “A menina ficou muito ansiosa para saber o que era” (F9, F 10:9)
ANEXO E
Estados Emocionais
A emoção pode ser definida como “a percepção consciente de uma mudança
específica no tom do sentimento interno”(Newcombe, 1999, p.156). Essa percepção
envolve, pelo menos, três questões: as mudanças físicas, pensamentos que se relacionam
com o acontecimento e pensamentos sobre as situações que causaram tal sentimento.
Mussen, Conger, Cagan e Huston (1988) referem que pode-se medir os estados emocionais
através das reações comportamentais, respostas fisiológicas e, nas crianças mais velhas e
adultos, pela descrição que os sujeitos fazem de seus sentimentos.
Os afetos e a forma como são expressos se desenvolvem a partir de
comportamentos corporais primitivos. O rir e o chorar são formas de expressão corporais
de sentimentos positivos (alegria, orgulho, amor) e negativos (raiva, medo, culpa). Esses
comportamentos e afetos irão se tornar mais refinados através da maturação neurológica,
do desenvolvimento do temperamento e da cognição, da aprendizagem, da experiência e
das respostas do ambiente (Lewis & Wolkmar, 1993).
Os testes aplicados no grupo de crianças abrigadas apresentaram variedade de
estados emocionais. Alguns desses estados emocionais foram os mesmos descritos por
Cunha e Nunes (1993) no manual do Teste das Fábulas, porém novas categorias também
foram verificadas. Todos os estados emocionais encontrados nas respostas dos
participantes da pesquisa, assim como exemplos retirados de tais respostas serão descritos
a seguir. Alguns estados emocionais foram citados de forma bastante direta pelas crianças,
outros não foram tão claros, mas puderam ser percebidos através da análise da descrição
das crianças. Nos exemplos que serão apresentados essas diferenças também poderão ser
observadas.
-Tristeza: “Ele tá triste porque tá longe do pai e da mãe”(F1, M 11:2).
-Medo: “Ela viu o lobisomem, ficou assustada e correu” (F10, M 10:3).
-Raiva: “Ele tava brabo, porque a mãe dele xingou ele” (F2, M 8:8). “Ele tava com raiva e
não queria mais ficar com elas e foi para outro lugar”(F4, M 8:3).
166
-Rebeldia: “O filho foi viajar. Foi para o espaço, passear por aí. Ele foi porque brigou com
a mãe e o pai. Ele pegou a bicicleta sem pedir permissão” (F4, F 10:0).
-Impotência: “A mãe vai vender a torre. (...) O menino ficou muito triste porque a mãe
vendeu a torre! A mãe vendeu! O menino não queria que ela vendesse...” (F7, F 7:4)
-Orgulho: “Ele vai dar. Vai ficar de enfeite na casa. Vai ficar para ver, para mostrar que foi
ele mesmo que fez. Vai ficar mais orgulhoso, porque o objeto não vai ficar só no quarto
dele, vai ficar em um lugar que dê para todo mundo ver. (F7, M 11:7)
-Saudades: É a mamãe. Ela foi porque tinha neve. daí de repente tinha uma coisa ali
embaixo, um gurizinho que esqueceram ele. Aí o avião não parou e foi embora. O guri tava
chorando, tava com saudades” (F4, M 7:11)
-Ciúme: “Acho que ele ficou um pouco triste porque ela vai começar a dar bola para o
outro e não para ele” (F3, F 11:8).
-Alívio: “Sonhou que o pai dele foi embora e a mãe também, e ele ficou sozinho. E aí ele
falou para a mãe se um dia ela ia embora, de manhã na hora do café. E ela falou que não.
Aí ele foi dormir tranqüilo.” (F10, M 9:11)
-Culpa: “A menina sentiu remorso, achou que tinha feito errado” (F8, F 11:8) “Ela estava
triste porque gosta muito da mãe e não queria brigar com ela (...) aí ela pediu desculpas”
(F8, F 10:9)
-Impertinência: “Ela ficou braba com a mãe que não deixou ela ir no passeio. A mãe disse
que ela tava incomodando muito para ir no passeio” (F8, F 7:2)
-Alegria: “A menina ficou muito feliz com a notícia porque ela sempre queria ganhar o
presente que ela mais queria, uma bicicleta! E a mãe comprou e ela começou a gritar de
felicidade” (F9, F 10:9)
-Pesar: “O elefante tava doente porque pegou frio e daí ficou doente. Ele ficou mal, muito
mal. O menino ficou mal porque gostava muito do elefante e queria saber o que estava
acontecendo” (F6, M 10:3)
-Desamor: “Ela não gosta da mamãe. A mamãe fica triste” (F7, F 7:11)
-Ambivalência: “A menina estava triste, mas por um lado ela queria viver a vida dela” (F4,
F 11:8)
-Solidão: “Ele estava se sentindo sozinho, porque queria ir para a mesma árvore dos pais,
mas não conseguiu porque machucou a patinha”(F1, F 11:8)
-Bem estar: “Ele estava se sentindo bem porque ele sabe cantar!” (F1, F 7:4)
-Mal estar: “Se sentiu mal porque caiu no chão”(F1, F 10:9)
-Mágoa: “Eles ficaram magoados porque o tio foi embora” (F4, M 9:11)
167
-Pena: “Ele ficou na chuva o tempo todo e ficou doente. A criança ficou com pena!” (F6, F
7:4)
-Mau-humor: “Ela acordou com mau-humor” (F10, M 10:3)
168
ANEXO F
Mecanismos de Defesa
Os mecanismos de defesa são recursos do ego que tem por objetivo manter a
estabilidade adaptativa (Bouchard & cols, 1998). Esses recursos indicam a maneira como
as pessoas lidam com seus conflitos (Blaya & cols, 2003).
Fadiman e Frager (1986) relatam que os mecanismos de defesas são meios que o
ego possui para lidar com a ansiedade. Quando a pessoa não consegue enfrentar
diretamente esta ameaça, as defesas entram em ação, deformando a realidade e assim
protegendo a personalidade.
De acordo com Kaplan, Sadock e Grebb (1997) as defesas podem ser divididas em
grupos conforme o grau relativo de maturidade ao qual correspondem. As defesas mais
primitivas seriam as narcisistas, utilizadas, especialmente, por crianças e psicóticos, como
os mecanismos de negação, distorção, idealização, projeção. As defesas características de
adolescentes e alguns pacientes não psicóticos, são as denominadas “imaturas”. Entre elas
estão as defesas de atuação, hipocondria, regressão e identificação. O grupo de defesas
neuróticas é mais utilizado por pacientes obsessivos compulsivos, histéricos e por adultos
em situações de stress e podem ser exemplificadas pelos mecanismos de deslocamento,
racionalização, formação reativa e repressão. Já as defesas maduras seriam adaptativas,
normais e saudáveis, utilizadas na vida adulta, como os mecanismos de supressão e de
altruísmo. Os autores ainda referem que sobreposições entre os grupos podem ocorrer, já
que essas divisões não possuem limites rígidos.
A seguir serão apresentados os mecanismos de defesa que foram encontrados durante o
levantamento dos testes dos participantes da pesquisa. Após a explicação teórica de cada
mecanismo de defesa, serão expostas as formas como esses mecanismos se manifestaram
nas respostas das crianças da amostra.
- Projeção: Laplanche e Pontalis (1985) referem que a projeção ocorre quando o indivíduo
atribui a outros, qualidades, sentimentos, desejos, que fazem parte de si mesmo, embora ele
não os reconheça assim. Desse modo, a ameaça acaba sendo tratada como algo que vêm do
exterior e não do próprio sujeito. (Fadiman & Frager, 1986). Na amostra das crianças
abrigadas a projeção ocorreu quando o herói atribuiu características, sentimentos ou a
culpa que era sua, a outros personagens. Ex: “O cordeirinho vai comer o capim porque a
169
mãe pediu. A mamãe ovelha está triste porque não pode dar leite para o filhinho” (F3, M
9:0)
- Negação: A negação é descrita por Fadiman e Frager (1986) como uma forma de não
aceitar na realidade algo que perturba o ego. Essa defesa afeta mais a forma de perceber a
realidade externa do que a interna. Ela evita que a pessoa tome consciência de alguma
parte dolorosa da realidade (Kaplan, Sadock & Grebb, 1997). Com o levantamento dos
testes dos participantes, pode-se perceber que esse mecanismo estava ligado,
principalmente, ao sujeito que respondia ao teste. Ocorria quando informações que eram
colocadas pelas fábulas eram omitidas no desenvolver da história. Possivelmente
encobriam alguma fantasia. Ex: “Ele caiu. Ele não vai poder fazer nada porque é muito
bebê” (F1, F 8:11). “Um família é que foi viajar. um guri, uma guria, o pai e a mãe” (F4, M
11:2).
- Distorção: Essa defesa, quando utilizada, provoca uma modificação extrema e até
grosseira da realidade externa para que esta possa servir às necessidades internas do
indivíduo (Kaplan, Sadock & Grebb, 1997). Para os participantes da pesquisa era a defesa
própria do sujeito que modificava a história, muitas vezes de forma bizarra, deixando-a
sem sentindo, com intenção de evitar o conflito, aplacar ansiedade. Geralmente
encontrava-se ligada ao fenômeno de confusão lógica. Ex: “Não sei...sonhou com um
bicho! A dona aranha. Não era. O grilo picou ela. Aí deixou a mãe dela muito braba porque
um dia ela fugiu, a mãe dela xingou porque ela não queria mais morar na casa dela. Porque
ela tinha um filme do sonho muito mal educado” (F10, F 5:11)
- Idealização: O mecanismo de idealização deriva-se de processos psíquicos em as
qualidades de um objeto são elevadas de tal forma que este torna-se perfeito (Laplanche &
Pontalis, 1985). Seria um modo de exaltar apenas características positivas de um objeto e
opô-lo a objetos que causam medo (Soifer, 1992). Nos testes das crianças da amostra este
mecanismo se manifestou como um meio de encontrar uma “solução mágica” para
problemas muitas vezes manifestados, quando um ambiente totalmente desfavorável, ou
características não aceitáveis do herói, “se transformam” de forma abrupta (situações ou
características negativas passariam a ser positivas). Ex: “Ele vai ter que obedecer a mãe e
comer capim para eles crescerem fortes. Vai comer porque a mãe não tem leite suficiente
para os dois. (...) Daí veio uma outra mamãe ovelha que tinha leite suficiente para dar para
os dois. (...) Daí eles viveram felizes para sempre e alegres e tinha leite suficiente para os
dois” (F3, M 11:8). “O filho foi viajar, porque os pais gritavam muito com ele, xingavam.
170
(...) Depois de alguns anos o filho voltou e tudo voltou a ser como era antes, só que eles
nunca mais xingaram o filho” (F4, M 11:8).
- Identificação projetiva: O mecanismo de identificação projetiva é caracterizado pela
introdução do indivíduo de forma total ou parcial no interior do objeto com o objetivo de
“controlá-lo, possuí-lo e ferí-lo”(Kusnetzoff, 1982, p.219). Um exemplo verificado nas
respostas das crianças da amostra relacionou-se à Fábula 5. Ex: “O avião foi viajar. O
papai e a mamãe pegaram o avião. Eles foram para a chuva, para o céu (...) A água
começou a vir e um jacaré vai morder o avião e vão ficar com medo e vai vir o avião e
morder o jacaré. O avião vai ficar grande e vai voar bem rápido. Ele vai crescer” (F4, M
5:1)
- Identificação Introjetiva: Conforme Escobar (1988), este mecanismo resulta da introjeção
do objeto no ego, este acaba se identificando com algumas ou todas as características do
objeto. Ex:“O elefante tá machucado, no bumbum. Ele se machucou num ferro, tava
enferrujado e ele se machucou. O menino chorou, se sentiu mal porque o elefante tava
muito machucado” (F6, M 9:0).
- Bloqueio: O Bloqueio é caracterizado por uma inibição, em geral, de afetos, mas que
também pode se manifestar no pensamento ou impulsos. Na maior parte das vezes essa
inibição é temporária. (Kaplan, Sadock & Grebb, 1998) Nos testes da crianças apareceu
como um mecanismo de defesa próprio do sujeito, quando esse se mostra incapaz de
verbalizar qualquer coisa relativa à história, em função da extrema ansiedade gerada em
contato com a mesma.
- Atuação: Conforme Blaya e colaboradores (2003) o mecanismo de atuação (ou acting
out) é uma forma direta (através da ação) que a pessoa utiliza para lidar com o conflito
emocional. Desse modo a ação substitui o ato de pensar, refletir ou de expressar os
sentimentos. Nas respostas da amostra esse mecanismo foi verificado quando o herói
manifestou através do comportamento o que não conseguia ou o que não podia verbalizar,
muitas vezes como forma de agressão (de agredir outros personagens). Ex: “A mãe disse
para a filha sair e não incomodar. A filha ouviu: ‘incomoda no colégio’. Aí ela
incomodou” (F9, M 6:7). “Acho que ela vai destruir o casamento dos pais dela, dizendo
que a esposa do homem traiu ele”(F2, F 11:0)
- Comportamento passivo-agressivo: Kaplan, Sadock e Grebb (1998) definem este
mecanismo de defesa como uma agressão algum objeto que se exprime de forma indireta e
não efetiva, através de uma passividade. Manifestou-se nas respostas da amostra em
histórias em que herói se submetia a um sofrimento para agredir outro personagem. Ex:
171
“Tá com medo porque tá sozinha. Ela não gosta de dormir sozinha sem o pai e a mãe. Ela
fugiu dos pais, foi para uma casa. (...) No fim ela vai morrer, ela não vai mais ter comida e
vai morrer. Ela vai pedir dinheiro na rua porque ela tá sozinha” (F5, M 6:1)
- Introjeção: De acordo com Escobar (1988) através da introjeção a pessoa “incorpora
um objeto e o assimila paulatinamente” (p.55). O sentimento, a culpa ou uma regra são
introjetados pelo herói. Essa defesa foi verificada nos testes dos participantes quando o
herói atribuiu a si características que são de outro personagem, a culpa que é de outro ou
incorporou uma regra sem questionamentos, por isso ser uma necessidade de outros
personagens. Ex: “O pai fechou a porta para o menino pensar que o ladrão ia pegar ele. (Pq
o pai faz isso?) Porque o filho brigou com o pai. (Pq?) Não sei.” (F5, M 6:7)
- Hipocondria: É caracterizada pela censura contra outras pessoas para a ser modificada
como auto-acusação e queixas relacionadas à problemas direcionados ao físico, como
doenças ou dor (Kaplan, Sadock & Grebb, 1997). Nos testes das crianças apareceu como
uma maneira de o herói “chamar a atenção para si”, mas não possuindo um caráter de
agressão. Ex: “Porque ela não queria brincar na festa. Ela tava bem mal. Ela tomava
remédio e ninguém deu remédio para ela. (...) Ela tava se sentindo doente porque os pais
era muito chatos para ela.” (F2, M 6:6)
- Regressão: De acordo com Kaplan, Sadock e Grebb (1997) é “um retorno a um estágio
anterior do desenvolvimento ou funcionamento, para evitar as ansiedades ou hostilidades
envolvidas em estágios posteriores” (p.244). Esta defesa apareceu nas histórias das
crianças abrigadas em situações em que o herói regredir a estágios anteriores, depois de já
ter atingido certa independência. Ex: “O cordeirinho vai comer capim. Ele ficou triste
porque a mamãe mandou ele comer capim. (...) Termina a mãe dele dando mamá para ele.
Ela não deu antes porque não tinha”. (F3, M 9:0).
- Somatização: Essa defesa consiste na transferência de sentimentos dolorosos para partes
do corpo. Como esses sentimentos não são aceitos, as preocupações emocionais se
manifestam somente pelo físico (Gabbard, 1998). As crianças da amostra utilizaram tal
defesa em histórias em que o herói não conseguindo expressar seu sentimento, atribuía
estes ao corpo (sentia frio, dor, fome, ficava doente). Ex: “Ele tava comendo capim. Ele tá
mal agora, tá enjoado”(F3, M 8:5)
- Retorno contra si mesmo: Esse mecanismo manifesta-se através do retorno a si mesmo de
um impulso que não era aceito e que havia sido dirigido a outros pelo próprio indivíduo
(Kaplan, Sadock & Grebb, 1997). Nos testes dos participantes da pesquisa esse mecanismo
foi observado quando, pelo sentimento de culpa de ter feito algo errado (contra outro), o
172
herói pune a si mesmo como castigo. Ex:“Tava com medo da mãe. A mãe ficou braba
porque não era pra ele ter saído. Ele subiu numa árvore, roubou uma goiaba e ficou doente
porque a goiaba tava verde” (F5, M 9:0).
- Identificação: A identificação é descrita por Nick e Cabral (1997) como uma forma pela
qual o sujeito assume características de personalidade de outra pessoa que foi internalizada
por ele. Um exemplo observado nos testes das crianças abrigadas relacionou-se à Fábula 8.
Ex:“Porque ele se sentiu mal porque o pai era do sangue dele. Aí o pai tava brabo, e filho
também se sentiu mal porque os dois eram do mesmo sangue. Se um se sentia mal o outro
também ficava mal.” (F8, M 11:0)
- Deslocamento: Conforme Gabbard (1998) esse mecanismo de defesa consiste em um
processo inconsciente em que sentimentos ligados à uma fonte são redirecionados à outra.
Para as crianças da amostra essa defesa pode ser observada quando era deslocado para
outro personagem (outra fonte) algo (um sentimento, uma fantasia) que era impensável,
insuportável, quando ligado á fonte original. Ex: “O cordeirinho vai tomar leite porque ele
tá com fome. Daí não tem mais leite, tiraram o leite. Um homem tirou” (F3, M 9:1)
- Isolamento: É a separação do afeto de seu conteúdo, ocorrendo uma repressão desse afeto
ou um deslocamento para um conteúdo diferente (Kaplan, Sadock & Grebb, 1997). Em
geral, nas respostas dos participantes da pesquisa, esta defesa aparecia em momentos em
que o herói não demonstrava um afeto coerente com a situação apresentada na história. Ex:
“A mamãe fica triste. A mãe dá nela. (E a criança como se sente?) Não sente nada.” (F8, F
7:11).
- Racionalização: Kaplan, Sadock e Grebb (1997) referem que esta defesa é uma forma de
justificar atitudes, crenças ou comportamentos que, sem tal explicação, não seriam
aceitáveis. Conforme Blaya, Kipper, Perez Filho e Manfro (2003) ela se manifesta através
da elaboração de justificativas satisfatórias ou consoladoras, porém despidas de afeto. Nas
respostas dos participantes esse mecanismo se manifestou como a busca de uma razão real
para amenizar a ansiedade. Ex. “Tava com medo de bicho, de um lobo. O lobo pode pegar
ela. (...) Aí ela vai parar de acreditar em lobo porque a mãe dela disse que não existe lobo.”
(F5, M 11:2).
- Formação reativa: De acordo com Blaya, Kipper, Perez Filho e Manfro (2003) a
formação reativa se caracteriza pelo fato do sujeito enfrentar o conflito emocional através
da substituição de seus próprios desejos, sentimentos ou pensamentos que podem ser
considerados reprováveis ou não aceitáveis. Nas respostas das crianças da amostra foi
verificada quando a ação realizada mostrava-se contrária ao real desejo do herói. Ex: “Ela
173
vai fazer o que a mãe pediu, vai dar para a mãe, pra mãe vender e conseguir dinheiro.
(como a criança se sente?) Sem argila.” (F7, M 11:2)
- Evitação: Esse mecanismo de defesa é caracterizado por um afastamento ou esquiva de
alguma situação que, aparentemente, parece ser insignificante, porém assume uma força
capaz de despertar um grande número de afetos e alta ansiedade. É uma defesa
característica das fobias. (Kaplan, Sadock & Grebb, 1997). Nas respostas das crianças
abrigadas, apareceu como uma tentativa de não entrar em contato com a situação
ansiogênica, fugindo dela. (Ex. F5: O herói está com medo de fantasma e se esconde
embaixo do cobertor). Como defesa do sujeito, aparece quando este evita falar do assunto
que está gerando ansiedade. Ex: “Tem medo de leão porque eles são bem fortes. (O que
mais acontece?) Não sei. (Como termina?) Não sei.” (F5, M 6:3)
- Repressão: Escobar(1988) define a repressão como um mecanismo que impede que um
impulso indesejável se torne consciente. Diferentemente da supressão esta defesa é
totalmente inconsciente (Blaya, Kipper, Perez Filho & Manfro, 2003). Um exemplo
ilustrativo verificado nos testes dos participantes refere-se à Fábula 5. Ex: “O menino tem
medo de fantasma! Porque o fantasma assusta só as crianças. Eu não sei o que eles
fazem...aí o fantasma vai embora e as crianças voltam para casa.” (F5, M 7:9).
- Compensação: O mecanismo de compensação foi descrito por Adler e refere-se à uma
forma de superar, preencher alguma falta (Fadiman & Frager, 1986). Quando há a perda de
algo, busca uma forma de preencher essa falta, podendo ser através do mesmo objeto que
falta ou de outro que cumpra a mesma função. Nas respostas das crianças da amostra
encontrou-se este mecanismo quando ocorria a necessidade de repor algo que era perdido.
Ex “O passarinho vai procurar um amigo para ficar com ele, morar com ele e quando ele
achar a mãe dele vai ficar com ela.” (F1, M 8:3).
- Altruísmo: A defesa denominada altruísmo conforme Blaya, Kippe, Perez Filho
e Manfro (2003) caracteriza-se por ser um meio de lidar com o conflito emocional
satisfazendo necessidades de outras pessoas. Através desse mecanismo o sujeito é
gratificado pela resposta dos outros. Nas respostas dos participantes observou-se esta
defesa quando o herói sentia a necessidade de “fazer o bem”, auxiliar outros
personagens, normalmente em situação desfavorecida. Ex: “O cordeirinho foi comer
capim. Ele já sabia comer mesmo. Aí ele deixou o outro que não sabia tomar o leite. Ele
tava feliz porque tava ajudando o coitadinho que não tinha família” (F3, F 11:8)
- Supressão: Kaplan, Grebb e Sadock (1997) definem esse mecanismo de defesa como
uma “decisão consciente ou semiconsciente de adiar a atenção para um impulso ou conflito
174
inconsciente”(p.245). Nas respostas das crianças observou-se esta defesa quando ocorria a
necessidade do sujeito de refrear um conteúdo ansiogênico que chegou à consciência, com
o objetivo de diminuir essa ansiedade. Geralmente substituía esse primeiro conteúdo por
um segundo que causava menos impacto (gerava menos ansiedade). Ex: “A mãe, o papai, a
filha e o filho foram para São Paulo. Vão ficar lá na rua....não, na rua não... vão ficar na
casa da Sandy e do Jr!” (F4, M 9:6)
175
ANEXO G
Respostas Comuns ao teste da Fábulas para as Crianças Abrigadas
Fábula Respostas comuns para os pré-escolares
Sexo Masculino Sexo feminino
1 Vai para outra árvore Vai para outra árvore
2 Ficou triste porque os pais ou os
convidados da festa não lhe deram
atenção...
Ficou triste porque os
da festa não lhe deram
pais ou os convidados
atenção, porque o
bolo estava ruim, porque tinha pouca
comida...
3 Vai comer capim Vai comer capim
4 Toda a família (“o pai, a mãe, o filho, a
filha”)
Toda a família (“o pai, a mãe, o filho, a
filha”), o pai e a mãe
5 Personagem de ficção Bichos (especificados ou não)
6 Sumiço, seqüestro ou fuga
7 Vai dar para a mamãe Vai dar para a mamãe
8 Porque o menino tirou notas baixas, não
estudou, brigou com os colegas, a
professora reclamou dele...
Não gostou que saíssem ou não havia
deixado que saíssem
9 Para ela ir estudar, para não brigar com
os irmãos, para ajudar nas tarefas de
casa...
Para ela ir estudar, para não brigar com os
irmãos, para ajudar nas tarefas de casa...
176
Fábula Respostas comuns para os escolares
Sexo Masculino Sexo feminino
1 Vai para outra árvore, uma galho, um
lugar protegido
Vai para outra árvore, um galho, um lugar
protegido
2 Ficou triste porque os pais ou os
convidados da festa não lhe deram
atenção...
Ficou triste porque os pais ou os
convidados da festa não lhe deram
atenção...
3 Vai comer capim Vai comer capim
4 O filho ou filha O filho o filha
5 Personagem de ficção Personagem de ficção
6 Transformação física Transformação física
7 Vai dar para a mamãe Vai dar para a mamãe
8 Demoraram, não avisaram, não
convidaram, não o levaram
Demoraram, não avisaram, não
convidaram, não o levaram
9 Desejo ligado à satisfação pessoal Desejo ligado à satisfação pessoal
177
ANEXO H
Fantasias, Estados emocionais e Mecanismos de Defesa Acrescentados a Partir do Levantamento dos Testes das Crianças Abrigadas
Fantasias Estados emocionais Mecanismos de Defesa
Agregação familiar Mal-estar Idealização
Superação Bem-estar Evitação
Morte Fome,dor,frio Compensação
Perseguição Mau-humor Isolamento
Engolfamento Magos Retorno contra-si-mesmo
Invasão Saudades Supressão
Gartificação Pena Identificação introjetiva
Alívio
178